Paleolítico

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A ARTE NO PALEOLÍTICO

James Ussher (1581-1656), Arcebispo de Armagh, Primaz da Irlanda e vice reitor do Trinity College, em Dublin, publicou em meados do século um estudo cronológico baseado na Bíblia em que fixava a data da criação: 23 de Outubro de 4004 a. C.

James Ussher: Annales Veteris Testamenti, a Prima Mundi Origine Deducti; 1650

The poor world is almost six thousand years old, and in all this time there was not any man died in his own person, videlicet, in a love cause (...)

William Sahekespeare: As You Like It (1599), fala de Rosalind (IV acto; cena I)

Francis Hayman (1708 – 1776)Fonte imagem: Wikipedia

As primeiras descobertas de vestígios paleolíticos foram atribuídas aos celtas.Em 1879, próximo de Santander, na Cantábria, descobriu-se na gruta de Altamira um conjunto de pinturas pré-históricas. Os especialistas recusaram-se a admitir a autoria do homem do paleolítico.

Em 1879, Marcelino Sautuola descobriu acidentalmente as pinturas de Altamira.

Maria Sautuola

Émile Cartailhac era a mais proeminente autoridade no estudo da

pré-história e recusou atribuir as pinturas ao período paleolítico.

Posteriormente, viria a reconhecer o erro, em 1902, assinando um célebre

artigo intitulado Mea culpa d'un sceptique.

Émile Cartailhac (1845 – 1921)

Motivos tectiformes

Também do Paleolítico Superior (±40 000 – 10 000) datam as pinturas de animais nas Grutas de

Lascaux, em França.

A gruta foi descoberta em 1940, por um grupo de crianças que procurava o seu cachorro que se perdera.

Metro S. Francisco

Keith Haring no metropolitano de

NY(1980 – 1985)

http://www.haringkids.com/art/subway/subway_swf.html

A mais famosa imagem de Lascaux é o chamado Bisonte Ferido, célebre por ser uma das raríssimas representações da figura humana.

Região franco-cantábrica com indicação das principais estações com achados de arte paleolítica. (Fonte: wikipedia)

Rio Vézère; Dordonha; França

http://www.culture.gouv.fr/culture/arcnat/chauvet/en/index.html

Chauvet

Niaux

Pech-Merle

Rouffignac

Font de Gaume

Pasiega

Trois Frères Chauvet

Chauvet

Font de Gaume

Grace Jones no clube nova-iorquino Paradise Garage, em 1985, pintada por Keith Haring.

Não sabemos quando surgiram as primeiras formas de manifestação artística.É provável que tenham sido efémeras, isto é, sob formas que não chegaram até nós.

Tatuagem de um guerreiro maori Dança guerreira

Sabemos que coleccionaram pedras e conchas atraentes e que as usaram como colares e objectos de adorno pessoal.

Seguramente, terão produzido objectos artísticos em materiais perecíveis.

Arte Móvel

A arte móvel inclui, além dos objectos de adorno pessoal, peças gravadas, pintadas ou esculpidas que, pelas suas pequenas dimensões, podem ser deslocadas ou transportadas.

Vénus de Willendorf Museu de História Natural; Áustria; 1908; 11 cm

Vénus de Hohle Fels 35000 anos

6cm; 33grachada Set 2008

Sudoeste da Alemanha

Vénus de Lespugue (Haute-Garonne); Pirenéus francesesMarfim; 14 cm; + 20 000 anos1922; Museu do Homem; Paris

Vénus de Laussel1911, Museu de Bordéus

43 cm

Dama de Brassempouy23 000 a. C.Osso de mamute; 3,7 cm1894Museum of National Antiquities, Saint-Germain-en-Laye

Vénus Kostienkic. 21 000 a. C.Museu Ermitage

Saint-Germain-en-Laye, Musée des Antiquités NationalesLa Madeleine; Tursac; Dordonha; 15 000 – 10 000 a. C.

IsturitzPaís Basco francês

Monte CastilloCantabria

Espelugues7,5 cmLourdes; França; Musee de Saint-Germain-en-Laye

CavaloGruta de Vogelherdc. 28 000 a. C.Col. Particular6,4 cm

Mamute marfim3,7 cm; c. 33 000 a. C.

Gruta de Vogelherdhohle; 2006 Universidade deTubinga; Alemanha

Propulsor Mas-d’Azil, AriègeMusée des Antiquités NationalesSaint-Germain-en-Laye

Arte parietal:

A arte que tem como suporte as paredes de grutas ou abrigos, incluindo baixos relevos, pinturas e gravuras.

Baixo relevo; mamuteGruta de Saint-Front; Domme; Dordonha1,25 m x 1,10

Silhueta feminina

Gruta de Cussac; Dordonha

A Arte Rupestre do Côa

A arte rupestre é a que decora superfícies rochosas ao ar livre.

Até à descoberta das gravuras do Côa, os vestígios de arte paleolítica eram raros em Portugal. Em 1963, descobrira-se a gruta do Escoural, próximo de Montemor-o-Novo.

Cavalos

Híbrido Arciformes Tectiformes

Sinais

Mazouco Freixo de Espada-à-Cinta

MazoucoFreixo de Espada-à-Cinta

198162 cm

Gravuras sobre xisto. Só uma completa: um cavalo de 62 cm com contorno obtido e avivado por abrasão. O sexo é bem visível, trata-se de um macho. Vê-se, sob o ventre, uma segunda linha, talvez para definir um segundo plano.

Em 1989, por causa da construção de uma barragem da EDP, realizou-se um estudo de impacte ambiental. Foram detectados vestígios, mas só em 1992, na Canada do Inferno, e em parte devido à seca, se tomou consciência da verdadeira dimensão do achado. Estalou a polémica.

Durante muito tempo se pensou que esta arte rupestre (que decora as superfícies rochosas) do paleolítico superior era uma arte das cavernas e que a região franco-cantábrica era o centro mais importante. As gravuras ao ar livre do Vale do Côa desmentem esta convicção.

Os trabalhos de prospecção assinalaram vários núcleos ao longo de uma extensão de cerca de 30 km pelo vale do rio Côa.

PenascosaRocha 3

BodePenascosaRocha 5C

CabraPenascosaRocha 8

VeadoPenascosa; Rocha 10 CTécnica de raspagem

Quinta da BarcaRocha 3

Rocha 1Quinta da Barca

As quatro principais espécies zoomórficas da arte do Côa (capríneos, equídeos, bovídeos e cervídeos) - Períodos Solutrense e Magdalenense

Vale dos CabrõesRocha 5

Figura filiforme de Cabra pirenaica É uma das poucas gravuras zoomórficas do Côa que parece apoiar-se no solo, (representado por uma linha curva).

«Cena sexual entre dois antropomorfos. As figuras apresentam na cabeça uma máscara com bico de ave. É provável que mais do que uma representação real se trate de uma cena de carácter mitológico ou mesmo propiciatório.»

Vale de CabrõesRocha 3

Vale de CabrõesRocha 4Incisão filiforme

«Rocha 1 de Vale de Cabrões. Cervídeo picotado, com a boca aberta e a cabeça virada para trás. Estilisticamente é uma gravura talvez já de tempos pós-glaciares.»

Ribeira de PiscosRocha 1

O vale do Côa constitui um local único por apresentar uma continuidade na ocupação que vai desde o Paleolítico Superior (30 000 – 10 000 a.p.) até à actualidade.

Ribeira de PiscosRocha 17Séc. XVIII – XIX ?

Canada do Inferno; gravura de comboio com data de 1944

Mapa da dispersão da arte paleolítica ao ar livre em território português (Norte do Tejo). Acrescentem-se a estes sítios duas rochas do Guadiana submersas pela albufeira do Alqueva.

Vale do Sabor

A construção de uma barragem no Sabor despoletou um intensivo projecto de prospecção que veio a revelar alguns importantes achados, como este auroque isolado na Ribeira da Sardinha. Além deste local, registem-se, também no vale do Sabor, o sítio da Fraga Escrevida, os auroques do sítio de Sampaio e…

A Foz do Pousadouro é o sítio mais importante do vale do Sabor. Num pequeno abrigo sob a rocha, vemos um excelente conjunto gravado por picotagem e abrasão, composto por cavalos e cervídeos

Rio Ocreza (afluente do Tejo)Envendos; Mação

Estudado na década de 70, o local foi submerso pela construção da barragem do Fratel. No ano 2000, por um feliz acaso, uma equipa de arqueólogos identificou este equídeo que constitui o único exemplar desta arte no vale do Tejo.

Poço do CaldeirãoVale do ZêzereBarroca, Fundão

http://marialynce.wordpress.com/2009/02/10/lugares-magicos-barroca/

http://dafinitudedotempo.blogspot.com/2008/11/vandalismo-rupestre-02-fraga-do-gato.html

Fraga do GatoFreixo de Espada-à-Cinta

Esta estação é conhecida desde os anos 80 do séc. XX e apresenta um bufo (espécie de mocho) e uma lontra, a vermelho. Ambos são temas muito raros na arte pré-histórica.

Siega VerdeProvíncia de SalamancaEspanha1988

Arte Móvel em Portugal

Toca do Pai LopesSetúbal

Plaqueta gruta CaldeirãoTomar

Vénus do EscouralMontemor-o-Novo

Período pré-figurativo - (...) não há notícia para este período de nenhuma obra figurativa. O Chatelperronense (aprox. - 35 000) inaugura os objectos de adorno, mas desconhece-se ainda qualquer figura explícita. Pelo contrário, encontram-se numerosos ossos e pequenas placas de pedra com incisões regularmente espaçadas: o ocre é muito abundante e é possível que um dia se venham a encontrar figuras.

Estilos da arte paleolítica de acordo com André Leroi-Gourhan

Período primitivo (estilos I e II) - O Aurinhacense (aprox. - 30 000) forneceu indiscutíveis figuras gravadas ou pintadas sobre placas de calcário (...). São representações muito abstractas e desajeitadas, representando cabeças ou partes dianteiras de animais, geralmente inidentificáveis, misturadas com representações genitais. O estilo II destaca-se lentamente do estilo I no decorrer do Gravettense e do Solutrense antigo (aprox. - 25 000 a - 20 000). (...) As figuras de animais estão construídas de modo muito uniforme sobre uma curva cervico-dorsal muito sinuosa, à qual se prendem detalhes frequentemente muito sumários, que caracterizam o bisonte, o cavalo, o mamute, o cabrito-montês, etc. As figuras humanas seguem uma estilização muito próxima: a parte central do corpo é enorme em relação à cabeça e às extremidades, o que faz nascer a ideia de mulheres paleolíticas particularmente esteatopígias. As mais antigas figuras parietais são deste período ( Pair-non-Pair; Gargas).

Abrigo Blanchard; DordonhaSímbolo sexual feminino

Período arcaico (estilo III)

O Solutrense vê o estilo II amadurecer e dar lugar, no Solutrense recente (Roc-de Sers, Fourneau-du-Diable) ao estilo II (aprox. - 20 000 a - 15 000). O domínio técnico é então perfeito e as pinturas, esculturas ou gravuras são de uma qualidade de execução extraordinária. O cânon permanece, no entanto, próximo do estilo II e as figuras animais mantêm um corpo enorme e uma cabeça e extremidade pequenas. As proporções muito especiais do estilo II levaram muitas vezes a que se considerasse que as figuras representavam «animais grávidos» (...).

Período clássico (estilo IV antigo) - No Madalenense (aprox. - 15 000 a - 10 000) a transformação alcança um realismo de formas já muito desenvolvido; os animais encontram-se integrados em proporções próximas das reais e o seu enchimento envolve uma multidão de detalhes de pelagem e de modelado muito bem codificados. As figuras permanecem no entanto como que suspensas, com os membros pendurados, e só nos finais do período é que as extremidades parecem repousar sobre um solo. As estatuetas e as figuras parietais revelam uma transformação na figura humana, muitas vezes reduzida ao meio do corpo, sem cabeça, sem peito e sem braços, e representada de perfil. As cavernas ornamentadas atingem o seu máximo de extensão geográfica, e a maior parte dos grandes sítios pertence a esta época (Angles-sur-L'Anglin, Font-de-Gaume; Cap-Blanc, Les Combarelles; Ariège, Niaux, Les Trois Frères, Montespan, Altamira, El Castillo).

Período tardio (estilo IV recente) - No Madalenense recente ( aprox.-10 000), as grutas cessam progressivamente de ser ornamentadas e a arte torna-se essencialmente móvel. As figuras perderam os últimos vestígios dos estilos antigos e os animais encontram-se integrados num realismo onde a exactitude das formas e de movimento é impressionante. A arte móvel estende-se então até à Grã-Bretanha, à Bélgica e à Suíça. Por volta de 9 000 um declínio bastante brusco assinala o fim do paleolítico superior, dissolvendo-se os raros documentos do Madalenense final na imperícia e no esquematismo. (adaptado de A. LEROI-Gourhan- «As Religiões da Pré-História»; Lisboa; Edições 70;1983.)

Bibliografia comentada: Para uma primeira abordagem ao tema da arte paleolítica, principalmente na região franco-cantábrica, recomenda-se a consulta de uma das muitas obras disponíveis no mercado. Há várias sínteses, citadas na bibliografia geral da disciplina e disponíveis na biblioteca da ESEC: Francesc Navarro (dir.) (História da Arte; Barcelona; Salvat; 2006; pp. 40 e ss.) Ana Lídia Pinto, Fernanda Meireles e M. Cernadas Cambotas (História da Arte Ocidental e Portuguesa, das Origens ao final do século XX; Porto; Porto Editora; 2001; pp. 13-27). Esta uma reedição de um manual escolar, com as limitações próprias de uma edição escolar destinada ao ensino secundário. A obra de André Leroi-Gourhan (As Religiões da Pré-História; Lisboa; Edições 70; s/d) continua a ser incontornável, não havendo outra edição portuguesa senão esta pequena síntese. Uma pesquisa na internet fornece rapidamente excelentes sítios que poderão revelar-se mais acessíveis, actualizados e proveitosos: http://www.culture.fr/culture/arcnat/lascaux/fr/ [Lascaux, França]; http://www.culture.fr/culture/arcnat/chauvet/fr/index.html [gruta de Chauvet, França]; http://www.europreart.net/index.htm [European PreArt. Excelente base de dados com vasta documentação sobre arte pré-histórica na Europa]; http://museodealtamira.mcu.es/ [sítio oficial do Museo Nacional y Centro de Investigación de Altamira]. Relativamente à arte paleolítica em Portugal, onde centrámos, por razões óbvias, a nossa atenção, deve dizer-se que, como se percebe, muitas das melhores sínteses de história da arte em Portugal se encontram desactualizadas. O achado de Mazouco é noticiado por um artigo de Susana Oliveira Jorge, entre outros, na revista Arqueologia (nº 3; GEAP; Porto; 1981; pp. 3-12). O recurso à internet é igualmente precioso: http://www.ipa.mincultura.pt/coa/ [sítio electrónico do Ministério da Cultura sobre o Parque Arqueológico do Vale do Côa]; http://www.uc.pt/fozcoa/index.html [sítio electrónico da Universidade de Coimbra. Contém um arquivo sobre as notícias e polémicas do achado]. Muito útil e de excelente qualidade é o documentário realizado por Jean-Luc Bouvret, intitulado Côa, o Rio das Mil Gravuras (edição DVD em 2007). Segundo creio, a primeira história da arte a incluir os achados do Côa foi a dirigida por Paulo Pereira, num artigo de Mila Simões de Abreu: O Universo da Arte Rupestre, in História da Arte Portuguesa; Lisboa; Círculo de Leitores; 1995; volume I; pp. 25 e seguintes. A mais recente é o volume de Conceição Lopes, na colecção dirigida por Dalila Rodrigues: Expressões Artísticas Anteriores à Formação de Portugal; Lisboa; Fubu Editores; 2008. Muita bibliografia dispersa e especializada tem sido editada sobre o tema, nomeadamente pelo Parque Arqueológico do Vale do Côa, destacando-se a excelente síntese intitulada Vale do Côa Arte Rupestre e Pré-História; Lisboa; Parque Arqueológico do Côa; 1996. Porém, a melhor obra, que constitui já o grande trabalho de referência é o excelente livro do especialista António Martinho Baptista (O Vale do Côa e a Arte Paleolítica de Ar Livre em Portugal); Lisboa; Edições Afrontamento; 2009. O blog pessoal deste autor é de consulta obrigatória: http://dafinitudedotempo.blogspot.com. Uma referência final para um pequeno mas esclarecedor artigo de Vítor Oliveira Jorge: Algumas reflexões em torno da Arte Rupestre do Centro-interior do País, com Principal Referência ao Côa; in «A Irrequietude das Pedras»; Porto; Afrontamento; 2003; pp. 117 – 136.