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O DISCURSO SECRETO
TOM ROB SMITH
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7/24/2019 62505506 o Discurso Secreto Tom Rob Smith
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UNIO SOVITICA
MOSCOVO
3 de Junho de 1949
Durante a Grande Guerra Patritica, tinha demolido a ponte de Kalach em defesa de
Estalinegrado, armadilhado fbricas com dinamite, reduzindo-as a escombros e ateado fogo a
refinarias indefensveis, enadrezando os contornos do horizonte com colunas de leo ardente,
com pressa de destruir tudo o !ue pudesse ser re!uisitado pelos invasores da "ehrmacht# $o
passo !ue os seus compatriotas choravam vendo as suas cidades natais desmoronarem-se % sua
volta, ele sobrevivera % devasta&'o com um sorriso de gozo nos lbios# ( inimigo podiacon!uistar um territrio devastado, uma terra !ueimada e um c)u repleto de fumo# *mprovisando
ami+de com !uais!uer materiais !ue estivessem % m'o lan&a-granadas, garrafas de vidro,
transvasando gasleo de camies militares abandonados e capotados ganhara a reputa&'o de ser
um homem de Estado no !ual se podia confiar# .unca perdera a calma, nunca cometera um erro,
mesmo !uando operava em condi&es etremas/ noites g)lidas de *nverno, com gua pela cintura
em rios de guas rpidas, a sua posi&'o a ser atacada por fogo inimigo# Para um homem com a
sua eperi0ncia e temperamento, a tarefa de hoe devia ser rotineira# .'o havia urg0ncia,
nenhuma bala a assobiar-lhe por cima da cabe&a# E, por)m, as suas m'os, reconhecidas como asmais firmes do of2cio, tremiam# Gotas de suor rolaram-lhe para os olhos, obrigando-o a enug-
los com a ponta da camisa# 3entia-se agoniado, como se fosse de novo um novi&o, pois esta era a
primeira vez !ue o !uin!uagenrioheri de guerra, 4e5abs Duva5in, fazia eplodir uma igrea#
Era preciso colocar mais uma carga de eplosivos, mesmo % sua frente, no local onde
anteriormente se erguia o altar# ( trono do bispo, os bancos, os santos, os menalia tudo fora
levado# $t) a folha de ouro tinha sido raspada das paredes# $ igrea estava vazia com ecep&'o
da dinamite enterrada nas funda&es e atada aos pilares# $pesar de profanado, pilhado e
sa!ueado, continuava a ser um espa&o amplo e impressionante# $ abboda central, encastoadacom uma coroa de vitrais coloridos, era t'o alta e t'o repleta de luz, !ue parecia fazer parte do
c)u# De cabe&a ar!ueada para trs, boca aberta, 4e5abs admirou o cimo da abboda, cin!uenta
metros acima dele# 6aios de luz penetravam nas anelas altas, iluminando as pinturas a fresco,
!ue em breve deveriam ser detonadas, reduzidas %s suas partes constituintes/ um milh'o de gr'os
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de tinta# $ luz espalhou-se pelo pavimento liso de pedra, n'o muito longe de onde estava
sentado, como se tentasse alcan&-lo, a palma de uma m'o dourada estendida#
8urmurou/
9 .'o h deus#
:ornou a repeti-lo, desta vez mais alto, as palavras a ecoarem no interior da c+pula/ No h deus!
Era um dia de ;er'o< era evidente !ue havia luz# .'o era um sinal de coisa nenhuma#
.'o era algo divino# $ luz n'o tinha !ual!uer significado# Estava a pensar demais, esse era o
problema# Ele nem se!uer acreditava em Deus# :entou recordar-se de um dos muitos slogans
anti-religiosos do Estado/
A Religio faz parte de uma poca em que cada um era para si
E Deus era para cada um.
Ele n'o estava a destruir uma igrea/ estava a criar um futuro melhor# $!uele edif2cio
n'o era sagrado ou aben&oado# Devia v0-lo como nada mais do !ue pedra, vidro e madeira
dimenses/ cem metros de comprido e sessenta de largo# 3em produzir nada, sem servir nenhuma
fun&'o !uantificvel, a igrea n'o passava de uma estrutura arcaica erigida por razes arcaicas por
uma sociedade !ue n'o eistia#
4e5abs recostou-se, correndo com a m'o ao longo do ch'o de pedra fria, polido pelos p)s
de muitas centenas de milhares de fi)is !ue ali tinham ouvido as missas durante muitas centenasde anos# *mpressionado pela magnitude do !ue estava prestes a fazer, come&ou a engasgar-se
como se tivesse deveras !ual!uer coisa presa na garganta# $ impress'o passou# Estava cansado e
trabalhara em demasia, nada mais# .ormalmente, num proecto de demoli&'o da!uela escala,
seria assistido por uma e!uipa, o trabalho seria repartido# .a!uele caso, decidira !ue os seus
homens podiam desempenhar um papel secundrio# .'o havia necessidade de dividir a!uela
responsabilidade, os colegas n'o precisavam de ser envolvidos desnecessariamente# .em todos
eram detentores de um pensamento claro como ele# .em todos se tinham epurgado de
sentimentos religiosos# .'o !ueria homens com uma motiva&'o conflitual a trabalhar a seu lado#:rabalhara cinco dias a fio, do sol nascer ao sol-p=r, posicionando todos os eplosivos de
forma estrat)gica para garantir !ue a estrutura se desmoronava para dentro, e as c+pulas ca2am
ordenadamente no topo umas das outras# >onge de ser uma demoli&'o catica, havia ordem e
precis'o no seu of2cio, e ele sentia orgulho desta sua habilidade especial# $!uele edif2cio
representava um desafio +nico# .'o se tratava de uma !uest'o moral, mas de um teste
?
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intelectual# @om uma torre do sino e cinco c+pulas douradas, cua maior de todas era sustentada
por um tabernculo de oitenta metros de altura, a demoli&'o controlada e bem-sucedida da!uele
dia constituiria um desfecho ade!uado % sua carreira# Depois da!uele trabalho, fora-lhe
prometida uma reforma antecipada# Aalara-se at) de receber a (rdem de >enine, como forma de
pagamento por um trabalho !ue mais ningu)m !ueria fazer#$banou a cabe&a# .'o devia estar ali# .'o devia estar a fazer a!uilo# Devia ter fingido
!ue estava doente# Devia ter obrigado outra pessoa a colocar a +ltima carga de eplosivos#
$!uilo n'o era trabalho para um heri# Por)m, os perigos de se es!uivar ao trabalho eram muito
maiores, muito mais reais do !ue !uais!uer ideias supersticiosas de !ue a!uele trabalho pudesse
estar amaldi&oado# :inha uma fam2lia a proteger a mulher, a filha e amava-a muito#
#
>azar encontrava-se entre a multid'o, afastado do per2metro da *grea de 3ancta 3ophia a
uma distBncia de seguran&a de cem metros, e a sua solenidade contrastava com o entusiasmo e a
tagarelice da!ueles % sua volta# @oncluiu !ue era o tipo de multid'o !ue teria assistido a uma
eecu&'o p+blica, n'o por uma !uest'o de princ2pio, mas apenas pelo espectculo, apenas para
estar entretida com !ual!uer coisa# Cavia uma atmosfera festiva, as conversas efervesciam de
epectativa# $s crian&as balou&avam-se nos ombros dos pais, esperando impacientemente !ue
acontecesse alguma coisa# $ igrea n'o lhes bastava/ tinha de desmoronar para seu
entretenimento#.a frente da barricada, sobre um pdio constru2do a propsito para proporcionar
eleva&'o, uma e!uipa de filmagens estava atarefada a montar trip)s e cBmaras, discutindo !uais
os melhores Bngulos para captar a demoli&'o# Prestavam especial aten&'o a acautelar !ue
apanhavam todas as cinco abbadas e havia uma s)ria especula&'o sobre se estas se iriam
despeda&ar no ar !uando colidissem umas nas outras, ou s !uanto embatessem no solo#
Dependeria, arrazoaram, da per2cia dos especialistas !ue estavam a colocar a dinamite no interior#
>azar !uestionou-se se poderia haver tamb)m tristeza entre a multid'o# (lhou para a
es!uerda e para a direita, procurando almas com um pensamento id0ntico ao seu o casal aofundo, ambos em sil0ncio, rostos eauridos de cor< a anci' l atrs, de m'o no bolso# Escondia
!ual!uer coisa no seu interior, um crucifio talvez# >azar !ueria dividir a!uela multid'o, separar
os !ue sofriam dos !ue se compraziam# ueria ficar ao lado da!ueles !ue davam valor ao !ue
estava prestes a ser perdido/ uma igrea de trezentos anos# aptizada e desenhada % semelhan&a
da @atedral de 3ancta 3ophia em Gor5F, sobrevivera a guerras civis e a guerras mundiais# (s
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recentes estragos causados por bombardeamentos eram uma raz'o para preserv-la, n'o para
destrui-la# >azar lera, com desprezo, o artigo publicado norada, !ue alegava insta"ilidade da
estrutura# n'o passava de um preteto, uma m'o cheia de falsa lgica para tornar a!uele feito
aceitvel# ( Estado ordenara a destrui&'o da igrea e o !ue era pior, muito pior, a ordem tinha
sido dada com o acordo da *grea (rtodoa# $mbas as partes envolvidas na!uele crime alegavam!ue a!uela se tratava de uma decis'o pragmtica, n'o ideolgica# :inham enumerado uma s)rie
de factores concorrentes para a decis'o/ estragos causados pelos raides da >uftHaffe< o interior
precisava de renova&es compleas, !ue n'o se podia pagar< al)m do mais, a terra no cora&'o da
cidade era necessria para um proecto de constru&'o de vital importBncia# :oda a gente no poder
estava de acordo com a resolu&'o# $!uela igrea, !ue n'o era com certeza uma das mais belas de
8oscovo, devia ser deitada abaio#
Por detrs do vergonhoso acordo ocultava-se a cobardia# $s autoridades eclesisticas,
depois de terem aliado todas as congrega&es a Estaline durante a guerra, eram agora uminstrumento de Estado, um departamento do Kremlin# $!uela demoli&'o era uma mostra de
subuga&'o# Aaziam-na ir pelos ares pura e simplesmente para provar a sua humildade/ um acto
srdido de automutila&'o para afirmar !ue a religi'o era inofensiva, dcil, domesticada# 4 n'o
precisava de ser perseguida# >azar compreendeu a pol2tica do sacrif2cio/ n'o seria melhor perder
s uma igrea do !ue perd0-las todasI
Em ovem testemunhara seminrios serem transformados em casernas de operrios,
igreas convertidas em centros de eibi&'o anti-religi'o#
(s 2cones eram usados como lenha, os padres postos na pris'o, torturados e eecutados#@ont2nua persegui&'o ou subservi0ncia irreflectida/ fora essa a escolha#
#
4e5abs ouvia o barulho da multid'o reunida l fora, o alarido en!uanto esperavam !ue o
espectculo come&asse# Era tarde# 4 devia ter terminado# Por)m, nos +ltimos cinco minutos
permanecera imvel, de olhos postos na +ltima carga, sem fazer nada# $trs dele, ouviu o ranger
da porta# >an&ou um olhar por cima do ombro# Era o seu colega e amigo, parado na soleira daporta, como se temesse entrar# @hamou, a sua voz repercutiu-se no interior/
$e%a"s! & que que se passa'
4e5abs respondeu/
Nada. Estou quase pronto.
( amigo hesitou antes de acrescentar um comentrio, adocicando a voz/
J
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(amos "e"er uns copos logo ) noite* n+s os dois* para cele"rar a tua reforma'
Amanh acordas com uma terr,el dor de ca"e-a* mas ) noite te sentes muito melhor.
4e5abs sorriu % tentativa de consolo do amigo/ a culpa n'o seria pior do !ue uma ressacaazar ali estava de p), os ouvidos a retinir, de olhos fios na nuvem de p, % espera !ue
esta assentasse# L medida !ue a nuvem se rarefez, revelou um buraco na parede do dobro da
altura de um homem e igualmente largo# Era como se um gigante tivesse acidentalmente enfiado
a ponta da sua bota na igrea, retirando depois o p) em constrangimento, poupando o resto do
M
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edif2cio# >azar levantou os olhos para as abbadas douradas# :oda a gente % sua volta seguiu o
eemplo, uma s !uest'o na mente de todos eles/ iriam as torres cairI
Pelo canto do olho, >azar conseguia ver a e!uipa de filmagens numa azfama para ligar
as cBmaras, a limpar o p das lentes, abandonando os trip)s, num desespero desenfreado para
capturar as imagens# 3e perdessem o colapso, fosse !ual fosse a desculpa, as suas vidas estariamem risco# $pesar do perigo, nenhum deles fugiu< ficaram parados no mesmo s2tio, % procura do
mais pe!ueno movimento/ um pendor, um aban'o, uma trepida&'o# Por um instante, parecia !ue
at) os feridos tinham feito sil0ncio na epectativa#
$s cinco abbadas n'o ca2ram, distantes do insignificante caos do mundo em baio#
En!uanto a igrea permaneceu de p), muita gente na multid'o sangrava, estava ferida, chorava#
:'o certo como o c)u acima se encobrir, >azar sentiu uma mudan&a de humor# Emergiram
d+vidas# :eria algum poder sobrenatural intervindo para impedir a!uele crimeI (s espectadores
come&aram a afastar-se, alguns lentamente, outros untaram-se-lhes, mais e mais, afastando-secom passo apressado# .ingu)m !ueria continuar a assistir# >azar debateu-se para conter uma
gargalhada# $ multid'o ca2ra, ao passo !ue a igrea sobrevivera ;oltou-se para o casal, na
esperan&a de partilhar com eles a!uele momento#
( homem !ue se encontrava atrs de >azar estava t'o primo !ue !uase se tocavam#
>azar n'o o ouvira aproimar-se# Ele sorria, mas os seus olhos eram frios# .'o usava uniforme
nem mostrou o seu cart'o de identidade# @ontudo, n'o havia d+vida de !ue era da 3eguran&a do
Estado, um oficial da pol2cia % paisana, um agente do 8G uma dedu&'o !ue podia ser feita
n'o a partir do !ue estava presente na sua apar0ncia, mas do !ue estava ausente# L sua direita ees!uerda encontravam-se pessoas feridas# :odavia, a!uele homem n'o tinha interesse neles#
Aora plantado na multid'o para vigiar a reac&'o das pessoas# E >azar falhara/ estivera triste
!uando devia ter estado contente, e contente !uando devia ter estado triste#
( homem falou por entre um sorriso fino, sem nunca desviar os seus olhos morti&os de
>azar/
0m pequeno res* um acidente* resole/se facilmente. Deia ficar1 talez ainda
aconte-a hoe* a demoli-o. 2uer ficar* no quer' 2uer er a igrea cair' (ai ser um
espectculo tremendo. 3im.
Nma resposta cautelosa e tamb)m a verdade, ele !ueria de facto ficar, mas n'o, ele n'o
!ueria ver a igrea cair e certamente n'o diria !ue sim# ( homem prosseguiu/
O
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Neste local ir situar/se uma das maiores piscinas co"ertas do mundo. ara que as
nossas crian-as cres-am saudeis. 4 "om as nossas crian-as serem saudeis. 2ual o seu
nome'
$ mais comum das perguntas e, por)m, a mais aterradora/
& meu nome 5azar. 2ual a sua ocupa-o'
$!uele dilogo deiara de estar sob o disfarce de uma conversa casual e passara a ser um
interrogatrio aberto# 3ubuga&'o ou persegui&'o, ser pragmtico ou reger-se por princ2pios/
>azar tinha de escolher# E ele tinha de facto uma escolha, ao contrrio de muitos dos seus
confrades, !ue eram instantaneamente reconhec2veis# Ele n'o tinha de admitir !ue era um padre#
;ladimir >vov, antigo Procurador-Geral do 3agrado 32nodo, defendera !ue os padres n'o tinham
de se diferenciar dos outros pela suas vestes e !ue podiam despir as suas sotainas, cortar o cabelo
e transfigurarem-se em comuns mortais# >azar concordava# De barba aparada e trivial apar0ncia,ele podia mentir %!uele agente# Podia negar a sua voca&'o e esperar !ue a mentira o protegesse#
:rabalhava numa fbrica de sapatos ou fazia mesas 9 tudo menos a verdade# ( agente esperava
de rosto apreensivo pela suspeita#
>azar teve de escolher#
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No mesmo d!
.as primeiras semanas, $nisFa n'o se preocupara muito com o assunto# 8aim tinha
apenas vinte e !uatro anos# Graduara-se no 3eminrio $cad)mico :eolgico de 8oscovo,
encerrado desde 1Q1 e recentemente reaberto como parte do esfor&o para a reabilita&'o das
institui&es religiosas# Ela era seis anos mais velha do !ue ele, casada, inating2vel, uma
perspectiva tentadora para um ovem !ue ela ulgava ter pouca, ou mesmo nenhuma eperi0ncia
seual# *ntrospectivo e t2mido, 8aim n'o se dava com ningu)m fora da igrea e tinha poucos
amigos ou fam2lia, ou pelo menos nenhum deles vivia na cidade# .'o era de surpreender, pois,
!ue tivesse desenvolvido !ual!uer tipo de sentimento a partir de um arrebatamento# Ela toleraraos seus olhares demorados, sentindo-se talvez at) lisoneada por eles# Por)m, de forma alguma o
havia encoraado# Ele compreendera mal o seu sil0ncio, considerando-o como uma permiss'o
para continuar a corte-la# Era por essa raz'o !ue ele agora lhe segurava na m'o e dizia/
Dei6a/o. (em ier comigo.
Estava convencida de !ue ele amais teria coragem de tomar uma atitude com base no
!ue poderia ser apenas um devaneio v'o e pueril/ os dois fugirem untos# Por)m, enganara-se#
Etraordinariamente, ele escolhera a!uele lugar para atravessar a fronteira da fantasia
privada para uma proposta aberta/ encontravam-se de p) no interior da igrea do marido, com aspinturas a fresco dos disc2pulos, demnios, profetas e anos ulgando os seus movimentos il2citos
das alcovas sombrias# 8aim arriscava tudo para o !ue estudara, enfrentando a desgra&a certa e
o e2lio da comunidade religiosa, sem esperan&a de reden&'o# ( seu pedido s)rio e sincero era
t'o errado e absurdo !ue ela n'o p=de se n'o reagir da pior forma poss2vel# 3oltou uma risada
curta, surpreendida#
$ntes !ue ele tivesse tempo de responder, a pesada porta de carvalho fechou-se com um
ba!ue# $nisFa voltou-se, assombrada, dando de caras com o marido >azar !ue se
aproimava deles com passo apressado, numa urg0ncia tal !ue s podia supor !ue ele interpretaraa!uela cena como uma prova da sua infidelidade# $fastou-se de 8aim, num movimento brusco
!ue apenas aumentava a impress'o de culpa# L medida !ue ele se aproimava, por)m,
compreendeu !ue >azar, o homem com !uem estava casada h dez anos, parecia preocupado com
!ual!uer outra coisa# >an&ava olhares para a porta atrs dele# (fegante, como se tivesse vindo a
Q
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correr, pegou nas suas m'os, m'os essas !ue apenas poucos segundos antes tinham sido
seguradas por 8aim/
7ui identificado na multido. 0m agente questionou/me.
>azar falou depressa, as palavras sa2ram-lhe atabalhoadamente, e a sua importBncia
relegou para segundo plano a proposta de 8aim# Ela perguntou/ 7oste seguido'
@onfirmou com um gesto de cabe&a/
Refugiei/me no apartamento de Natasha Niurina.
& que aconteceu'
Ele ficou l fora. 7ui o"rigado a sair pelas traseiras.
8ro prender Natasha e question/la'
>azar levou as m'os ao rosto/
Entrei em p9nico. No sa"ia para onde mais ir. No deeria ter ido para casa dela.$nisFa agarrou-o pelos ombros/
3e a :nica forma de nos encontrarem prendendo Natasha* temos algum tempo.
>azar abanou a cabe&a/
$ lhe disse o meu nome.
Ela compreendeu/ n'o podia mentir# .'o comprometeria os seus princ2pios, nem por ela
nem por ningu)m# (s princ2pios eram mais importantes do !ue as suas vidas# $ verdade ) !ue
n'o devia ter ido assistir % demoli&'o/ avisara-o de !ue era um risco desnecessrio# $ multid'o
iria inevitavelmente ser vigiada e ele seria um espectador fcil de identificar# Ele ignorara-a,como era seu costume, parecendo sempre !ue ouvia os seus conselhos, mas sem nunca lhes
prestar devida aten&'o# .'o lhe tinha ela pedido !ue n'o alienasse as autoridades eclesisticasI
$ posi&'o deles era t'o forte !ue se podiam dar ao luo de fazer inimigos tanto no Estado como
na *greaI 8as ele n'o tinha interesse nas pol2ticas da alian&a/ !ueria t'o-somente dizer a sua
opini'o, ainda !ue esta o deiasse isolado, por criticar abertamente a nova rela&'o entre bispos e
pol2ticos# :eimoso, obstinado, eigia !ue ela apoiasse a sua posi&'o, sem !ue a sua opini'o
contasse# Ela admirava-o, era um homem 2ntegro# 8as ele n'o a admirava a ela# Era muito mais
nova do !ue ele e tinha apenas vinte anos !uando se casaram# Ele tinha trinta e cinco# Por vezeschegara a !uestionar-se se ele se teria casado com ela por!ue por ser um Padre ranco, um padre
casado, !ue fizera um voto monstico, essa era em si uma declara&'o reformista# ( conceito era-
lhe apelativo, ade!uava-se ao seu es!uema filosfico liberal# Ela estivera sempre preparada para
o momento em !ue o Estado se iria atravessar nas suas vidas# Por)m, agora !ue esse momento
1R
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chegara, sentia-se defraudada# Estava a pagar pelas opinies dele, opinies essas para as !uais
nunca contribuira e !ue nunca tivera permiss'o para influenciar#
>azar colocou uma m'o no ombro de 8aim#
& melhor regressares ao 3eminrio e denunciar/nos. 0ma ez que amos ser
presos* a den:ncia seriria apenas para te distanciares de n+s. ;a6im* tu ainda s um oem.Ningum ir pensar mal de ti por partires.
;inda de >azar, a!uela oferta de fuga era uma proposta armada# >azar considerava esse
tipo de comportamento pragmtico abaio de si, ade!uado para os outros, homens e mulheres
mais fracos# $ sua superioridade moral era sufocante# >onge de oferecer uma sa2da a 8aim,
estava a encurral-lo# $nisFa atalhou, tentando manter um tom de voz amigvel/
;a6im* tens de partir.
Ele reagiu, rispidamente/
2uero ficar.8elindrado pela anterior risada, mostrava-se infle2vel e indignado# Aalando num duplo
sentido invis2vel para o marido, disse-lhe/
or faor ;a6im* esquece tudo o que aconteceu* no irs ganhar nada em ficar.
8aim abanou a cabe&a/
$ tomei a minha deciso.
$nisFa notou o sorriso de >azar# .'o havia d+vida de !ue o marido gostava de 8aim#
:omara-o sob a sua protec&'o, cego % pai'o do seu protegido por ela, alerta apenas %s
defici0ncias do seu conhecimento das escrituras e da filosofia# Parecia estar satisfeito com adecis'o de 8aim em ficar, acreditando !ue tinha alguma coisa a ver com ele# $nisFa
aproimou-se mais de >azar/
No podemos dei6ar que ele arrisque a sua ida.
No podemos o"rig/lo a partir.
5azar* esta luta no dele.
E n'o era tamb)m a sua#
Ele fazar eclamou/
=asta! No temos tempo! 2ueres que ele estea seguro. Eu tam"m. ;as se
;a6im quer ficar* fica.
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>azar encaminhou-se apressadamente para o altar de pedra, despoando-o
precipitadamente# :odas as pessoas ligadas %!uela igrea corriam perigo# .'o podia fazer muito
pela sua mulher ou 8aim/ tinham uma liga&'o muito prima a ele# $ sua congrega&'o,
por)m, as pessoas !ue se confidenciavam a ele, !ue compartilhavam os seus medos, era essencial
!ue os seus nomes se mantivessem em segredo#
@om o altar despido, >azar agarrou num dos lados/
Empurra!
.'o muito sbio, mas obediente, 8aim empurrou o altar, retesando-se com o peso# $
spera base de pedra resvalou ruidosamente pelo ch'o, deslizando devagar para o lado e
revelando um buraco, um esconderio criado cerca de vinte anos antes, durante os ata!ues mais
intensos % igrea# $s laes de pedra tinham sido retiradas, epondo a terra !ue foracuidadosamente escavada e aprumada com suportes de madeira para a impedir de aluir, criando
um espa&o de um metro de profundidade e dois de largo# @ontinha uma arca de metal# >azar
debru&ou-se para a cova e 8aim fez o mesmo, segurando na outra ponta da arca e levantando-a,
colocando-a depois no ch'o, pronta para ser aberta#
$nisFa levantou a tampa# 8aim agachou-se a seu lado, incapaz de suprimir o espanto
da sua voz/
;:sica'
$ arca estava repleta de partituras escritas % m'o# >azar eplicou/ & compositor costumaa ir aqui ) missa* era um oem* no muito mais elho do que
tu* estudaa no >onserat+rio de ;oscoo. rocurou/nos uma noite* aterrorizado porque estaa
prestes a ser preso. ?emendo que o seu tra"alho fosse destru,do* confiou/nos as suas
composi-@es. rande parte do seu tra"alho fora condenado como anti/soitico.
orqu
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No sei ler m:sica. E a minha mulher tam"m no. ;as* ;a6im* no ests a
compreender a questo. A minha promessa de auda no dependia dos mritos do seu tra"alho.
Esto a arriscar as ossas idas' 3e no tier alorB
>azar corrigiu-o/
Estamos a proteger estes papisC estamos a proteger o seu direito a so"reier.$nisFa achou a seguran&a do marido easperante# ( ovem compositor em !uest'o
tinha-a procurado a ela, n'o a ele# Ela falara depois com >azar e convencera-o a aceitar a m+sica#
.o recontar da histria, suavizara as suas d+vidas e ansiedades, reduzindo-a a uma simples
apoiante passiva# Perguntou-se se ele estaria se!uer consciente dos austes !ue fizera % histria,
enaltecendo automaticamente a importBncia do seu papel, recentrando a histria em torno de si
prprio#
>azar tomou a inteira colec&'o de folhas de m+sica soltas, cerca de duzentas pginas no
total# Entre as partituras encontravam-se alguns documentos relativos ao negcio da igrea evrios 2cones originais !ue tinham sido escondidos e substitu2dos por r)plicas# Dividiu
apressadamente o conte+do da arca em tr0s pilhas, verificando com a mima acuidade !ue lhe
foi poss2vel !ue as partituras se mantinham untas# ( plano era transport-las dali para fora
clandestinamente, mais ou menos em partes iguais# Divididas em tr0s, havia uma probabilidade
razovel de !ue a m+sica sobrevivesse# $ maior dificuldade era arranar tr0s esconderios
distintos, tr0s pessoas !ue estivessem dispostas a sacrificar as suas vidas em prol de notas escritas
numa pgina, sem nunca terem conhecido o compositor ou ouvido a sua m+sica# >azar conhecia
muitos na sua par!uia !ue poderiam audar# 8uitos deles estariam provavelmente sob algumtipo de suspeita# Para a!uela tarefa precisavam da auda de um 3oviete perfeito, de algu)m cuo
apartamento nunca fosse ser revistado# :al pessoa, a eistir, nunca os audaria# $nisFa atirou
sugestes/
;artemian 3rtso.
7ala demais.
Artiom Na%hae.
Ele concordaria* learia os papis e depois entraria em p9nico* perderia a coragem e
queim/los/ia. Niura Dmitriea.
Ela aceitaria* mas depois iria odiar/nos por lho termos pedido. No iria conseguir
dormir* nem comer.
.o final, dois nomes/ foi tudo em !ue conseguiram concordar# >azar decidiu guardar
parte da m+sica escondida na igrea, unto com os 2cones maiores, tornando a deposit-los na arca
1?
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e empurrando o altar para o seu lugar# @omo >azar tinha maiores probabilidades de ser seguido,
cabia a $nisFa e 8aim transportar parte da m+sica at) %s duas moradas# 3airiam em separado#
$nisFa estava pronta/
Eu ou primeiro.
8aim abanou a cabe&a/ No. Eu irei primeiro.
Ela adivinhou a raz'o por !ue se oferecera/ se 8aim conseguisse escapar, haveria
hiptese de ela tamb)m o conseguir#
$briram a porta principal, levantando a grossa travessa de madeira# $nisFa sentiu
8aim hesitar, indubitavelmente temeroso, come&ava a interiorizar os perigos !ue enfrentava#
>azar apertou-lhe a m'o# 8aim deitou-lhe um olhar por cima do ombro do marido# uando
>azar terminou, 8aim aproimou-se dela#
=oa sorte* ;a6im.$bra&ou-o e viu-o entrar na noite#
>azar fechou a porta, trancando-a atrs dele, reiterando o plano/
Esperamos dez minutos.
3ozinha com o marido, sentou-se num banco primo da dianteira da igrea# Ele untou-
se-lhe# Para sua surpresa, em vez de rezar, ele segurou-lhe na m'o#
#
Dez minutos depois, aproimaram-se da porta# >azar ergueu a travessa de madeira# (s
pap)is encontravam-se num saco, !ue ela levava a tiracolo# $nisFa saiu para a rua# 4 se haviam
despedido# Ela voltou-se, observando em sil0ncio >azar fechar a porta atrs de si# (uviu a
travessa de madeira assentar no lugar# Depois come&ou a caminhar em direc&'o % rua, vigiando
os rostos %s anelas, os movimentos nas trevas# Nma m'o segurou-lhe o pulso# $ssombrada, deu
meia volta#
Era 8aim#
;a6im'ue faria ele aliI (nde estava a m+sica !ue transportava consigoI Das traseiras da igrea
uma voz, severa e impaciente, chamou/
5eo'
$nisFa avistou um homem envergando um uniforme escuro/ um agente 8G# Cavia
mais homens atrs dele, apinhados como baratas# $s suas !uestes dissiparam-se, concentrando-
1
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se no nome !ue ouvira chamar/ 5eo# @om o pu'o de uma simples palavra o novelo de mentiras
deslindou-se# Era por isso !ue ele n'o tinha amigos ou fam2lia na cidade, era por isso !ue ele
estava t'o calado nas li&es com >azar/ ele nada sabia acerca de escrituras ou filosofia# Aora por
isso !ue !uisera sair da igrea primeiro, n'o para proteg0-la mas para alertar a vigilBncia, para
reunir a sua e!uipa, para preparar a pris'o deles# Ele era um >he%ist, um oficial da pol2ciasecreta# Enganara-a a ela e ao marido# *nfiltrara-se nas suas vidas com o propsito de reunir
tanta informa&'o !uanto poss2vel, n'o apenas sobre eles, mas tamb)m sobre as pessoas !ue com
eles simpatizavam, desferindo um golpe contra os restantes n+cleos de resist0ncia no interior da
*grea# :entar seduzi-la fora um obectivo ditado pelos seus superioresI :0-la-iam identificado
como um alvo fraco, fcil de enganar, instruindo depois a!uele belo oficial a criar uma persona
;a6im para manipul-laI
Aalou com voz branda, intimista, como se nada houvesse mudado entre ambos/
Anisa* dei/te mais do que uma oportunidade. (em comigo. 7iz alguns acordos. Elesno esto interessados em ti. Esto atrs de 5azar.
( timbre da sua voz, carinhoso e preocupado, era aterrador# $ oferta !ue lhe fizera
anteriormente, para fugir com ele, n'o fora uma fantasia ing)nua# .'o fora romBntico# Aora o
calculismo frio de um agente# Prosseguiu/
3egue o conselho que me deste e denuncia 5azar. osso mentir por ti. osso
proteger/te. 4 a ele que eles querem. No ais ganhar nada com manter/te fiel. e-o/te* por
faor.
#
>eo estava a ficar sem tempo# Ela tinha de compreender !ue ele era a sua +nica hiptese
de sobreviv0ncia, independentemente do !ue pensasse dele# .'o ganharia nada em agarrar-se aos
seus princ2pios# ( seu oficial superior, .i5olai orisov, encaminhou-se para eles# @om !uarenta
anos, possu2a o corpo de um halterofilista envelhecido, ainda forte, muito embora desleiado com
o ecesso de bebida/
Ela est a cooperar'>eo estendeu a m'o, os seus olhos suplicando !ue lhe entregasse o saco#
or faor'
Em resposta, ela gritou t'o alto !uanto conseguiu/
5azar!
1J
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.i5olai avan&ou um passo, esbofeteando-a com as costas da m'o# Gritou aos seus
homens/
(o!
(s machados come&aram a cravar-se na porta da igrea#
>eo viu dio no rosto de $nisFa# .i5olai arrancou-lhe o saco com um pu'o# Ele tentou sal/la* ca"ra mal agradecida.
Ela inclinou-se para diante, sussurrando ao ouvido de >eo/
Acreditou deeras que eu poderia am/lo' No foi'
(s oficiais seguraram-lhe nos bra&os# En!uanto a levavam, ela sorriu-lhe, um sorriso
maldoso/
Nunca ningum o ir amar. Ningum.
>eo voltou-lhe costas, aguardando com desespero !ue a levassem# .i5olai pousou-lhe
uma m'o consoladora no ombro/9 De qualquer maneira* teria sido muito complicado e6plicar como que ela no era
uma traidora. >omplicado para si. 4 muito melhor assim. ;elhor para si. mais mulheres*
5eo. sempre mais.
>eo tinha conclu2do a sua primeira pris'o#
$nisFa estava e!uivocada# Ele era amado/ pelo Estado# .'o !ueria o amor de um
traidor/ esse n'o era se!uer amor# Engano, trai&'o/ esses eram instrumentos de um oficial# Ele
tinha um direito leg2timo a eles# ( seu pa2s dependia da trai&'o# $ntes de se tornar agente do
8G, fora soldado e eperienciara a necessidade de viol0ncia na derrota do Aascismo# 8esmo amais terr2vel das coisas podia ser desculpada pelo bem maior !ue estas serviam#
Entrou na igrea# Em lugar de tentar escapar, >azar aoelhara-se diante do altar, rezando,
aguardando o seu destino# $o ver >eo, o seu ar de desafio altivo dissipou-se# .a!uele momento
de compreens'o pareceu envelhecer vrios anos/
;a6im'
Pela primeira vez desde !ue se conheciam, procurou respostas no seu protegido/
& meu nome 5eo 3tepanoich Demido.
>azar permaneceu em sil0ncio durante vrios segundos# Por fim, disse/ 7oi/me recomendado pelo atriarca'
& atriarca Frasi%o um "om cidado.
>azar abanou a cabe&a, recusando-se a acreditar na!uelas palavras# ( Patriarca era um
informador# ( seu protegido era um espi'o !ue lhe fora enviado pela mais proeminente figura
religiosa do pa2s# Aora sacrificado ao Estado, do mesmo modo !ue a *grea de 3ancta 3ophia fora
1M
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sacrificada# Era um idiota, aconselhando outros para !ue tivessem cuidado, pregando cautela
!uando mesmo a seu lado, tirando notas, se encontrava um oficial do 8G#
.i5olai avan&ou/
9 &nde esto os restantes papis'
>eo gesticulou para o altar/ or "ai6o.
:r0s agentes desviaram-no para o lado, descobrindo a arca# .i5olai indagou/
Ele deu/te mais alguns nomes'
>eo respondeu/
;artemian 3rtso. Artiom Na%hae. Niura Dmitriea. ;oisei 3emash%o.
;islumbrou o rosto de >azar/ o cho!ue transformava-se em repulsa# >eo aproimou-se
dele/
;antenha os olhos no cho!>azar n'o se voltou# >eo empurrou-lhe a cabe&a para baio#
&lhos no cho!
>azar tornou a erguer a cabe&a# Desta feita, >eo desferiu-lhe um murro# >entamente, de
lbio aberto, >azar tornou a erguer a cabe&a, goteando sangue, olhando para ele, repulsa
mesclada com desafio# >eo respondeu, como se os olhos de >azar lhe fizessem uma pergunta/
Eu sou um "om homem.
3egurando o seu mentor pelos cabelos, >eo n'o se deteve, murro aps murro,
continuando mecanicamente como um soldado de corda, repetindo a mesma ac&'o uma e outravez, at) lhe doerem os ns dos dedos, at) os seus bra&os ficarem doridos, e a face de >azar se
tornar mole# uando finalmente parou e o soltou, >azar caiu por terra, uma po&a de sangue a
formar-se em torno da sua boca, com a forma de um bal'o de fala#
.i5olai passou um bra&o pelo ombro de >eo, observando >azar a ser carregado para fora,
ao mesmo tempo !ue deiava um rasto de sangue do altar at) % porta# .i5olai acendeu um
cigarro#
5eo* o Estado precisa de pessoas como n+s.
8eio entorpecido, >eo limpou o sangue das cal&as, comentando/ Antes de irmos* gostaria de um momento para reistar a igrea.
.i5olai aceitou a proposta sem protestar#
0m perfeccionista* e6celente. ;as despacha/te. Esta noite amos "e"er. dois
meses que no "e"es nada! ?ens iido como um monge!
1O
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.i5olai riu-se da sua prpria piada, dando palmadinhas nas costas de >eo, antes de se
encaminhar para a sa2da# $ ss, >eo dirigiu-se para o altar !ue fora desviado, de olhos fios no
buraco# Presa entre o flanco da arca e a parede de terra encontrava-se uma +nica folha de papel#
*nclinou-se, apanhando-a# Era uma pgina de m+sica# @orreu os olhos pelas notas# Decidindo
!ue era melhor n'o saber o !ue se perdera, ergueu a folha acima da chama de uma vela prima,observando o papel a enegrecer#
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Se"e !nos de#os
1Q
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MOSCOVO
1$ de M!%&o de 19'(
3uren 8os5vin era gerente de uma pe!uena tipografia acad)mica e tornara-se conhecido
por produzir manuais escolares da mais reles !ualidade, usando tinta !ue se esborratava e um
papel fin2ssimo, tudo seguro por uma lombada de cola !ue come&ava a deiar cair as pginas
poucas horas depois de se abrir o livro# .'o por ser pregui&oso ou incompetente, pelo contrrio/
come&ava a trabalhar logo cedo pela manh' e terminava a tardas horas da noite# $ raz'o por !ue
os livros eram t'o miserveis encontrava-se nas mat)rias-primas !ue o Estado lhe fornecia#
Embora o conte+do das publica&es acad)micas fosse cuidadosamente controlado, n'o era
considerado um epediente prioritrio# Aechado num sistema de !uotas, 3uren era for&ado aproduzir um grande n+mero de livros a partir da pior categoria de papel, num per2odo de tempo o
mais curto poss2vel# $ e!ua&'o nunca mudara e ele estava % sua merc0, etremamente
constrangido por a sua reputa&'o ter descido t'o baio# @ontavam-se piadas/ com dedos
manchados de tinta, estudantes e professores graceavam !ue os livros de 8os5vin ficavam
sempre com a pessoa# 6idicularizado, nos +ltimos tempos sentia dificuldades em levantar-se da
cama# .'o se alimentava como deve de ser# ebia durante todo o dia, as garrafas escondidas nas
gavetas, por detrs das prateleiras dos livros# @om cin!uenta e cinco anos, descobrira algo novo
sobre si/ n'o tinha est=mago para a humilha&'o p+blica#Estava a inspeccionar as m!uinas impressoras lintipo, cismando nas suas falhas,
!uando reparou num ovem parado % porta# 3uren dirigiu-se-lhe na defensiva/
3im' & que foi' No normal estar a, parado sem se fazer anunciar.
( homem avan&ou, num trae tipicamente estudantil, um casaco comprido e um len&o
preto barato# 3egurava um livro, estendido# 3uren arrancou-lho das m'os, preparando-se para
mais reclama&es# Deitou uma olhadela % capa/ & Estado e a Reolu-ode >enine# :inha sido
impresso um novo volume ainda na semana passada, distribu2do h coisa de um dia ou dois atrs,
e a!uele homem, ao !ue parecia, era o primeiro a detectar !ual!uer coisa mal# Nm erro numaobra fundamental era um assunto grave/ durante o governo de Estaline, um erro era !uanto
bastava para garantir a pris'o# ( estudante inclinou-se para diante e abriu o livro, folheando-o
para as primeiras pginas# .o frontisp2cio havia uma fotografia a preto e branco# ( estudante
comentou/
& te6to por "ai6o diz que uma fotografia de 5enine masBcomo pode erB
7R
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.a fotografia encontrava-se um homem !ue n'o se parecia nada a >enine, um homem de
p), encostado a uma parede, uma parede completamente branca# (s cabelos estavam revoltos#
(s olhos desvairados#
3uren fechou o livro bruscamente, voltando-se para o estudante/
$ulgas que poderia ter imprimido mil c+pias deste liro com a fotografia errada' orquem te tomas! 2ual o teu nome' orque que ests a fazer isto' &s meus pro"lemas deem/
se aos limites dos meus materiais* no a deslei6o!
$o recuar, o livro embateu-lhe no peito, fazendo com !ue len&o !ue trazia enrolado ao
pesco&o se soltasse, revelando a ponta de uma tatuagem# $ vis'o fez 3uren deter-se# Nma
tatuagem era incongruente com a, de resto, t2pica apar0ncia de um estudante# .ingu)m, com
ecep&'o dos or, criminosos profissionais, marcaria a pele da!uela forma#
Passada a impetuosa indigna&'o de 3uren, o homem aproveitou-se da sua hesita&'o e
apressou-se a sair# @om pouco entusiasmo, 3uren seguiu-o, ainda de livro na m'o, observando amisteriosa figura desaparecer na noite#
$preensivo, fechou a porta e trancou-a % chave# $lgo o perturbava/ a!uela fotografia#
:irou os culos, abriu o livro e perscrutou o rosto um pouco mais de perto/ a!ueles olhos
aterrorizados# @omo um navio fantasma emergindo lentamente de um denso mar de nevoeiro, a
identidade da!uele homem surgiu perante si# @onhecia a!uele homem# ( seu rosto era-lhe
familiar# ( seu cabelo e olhos estavam na!uele estado selvagem por!ue fora preso e arrastado
para fora da cama# 3uren reconheceu a fotografia por!ue fora ele !uem a tirara#
Ele n'o fora sempre tipgrafo# $ntes disso, estivera ao servi&o do 8G# ;inte anos deservi&o leal, a sua carreira na pol2cia secreta prolongara-se por mais tempo do !ue a de muitos
dos seus superiores# 6ealizando uma variedade de tarefas banais limpar celas, fotografar os
prisioneiros a sua baia patente fora uma vantagem, e ele fora suficientemente sagaz para n'o
mostrar pretenses de maior responsabilidade, para nunca dar nas vistas, escapando %s purgas
c2clicas dos escales mais elevados# Caviam-lhe sido eigidas coisas dif2ceis e ele cumprira as
suas obriga&es com perseveran&a# .a!uela )poca, ele era um homem a temer# .ingu)m se
atreveria a fazer piadas acerca de si# Por razes de sa+de, fora obrigado a reformar-se# Embora
recebesse uma boa remunera&'o e vivesse confortavelmente, achara a ociosidade intolervel#Deitado na cama, sem !ue houvesse !ual!uer propsito no seu dia, a mente perdia-se em
digresses, arrastada para o passado, recordando-se de rostos como a!uele !ue agora se
encontrava cravado na!uele livro# $ solu&'o era manter-se ocupado com encontros e
compromissos# Precisava de uma ocupa&'o# .'o !ueria entregar-se a reminisc0ncias#
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Aechou o livro e enfiou-o no bolso# ( !ue se passava na!uele diaI .'o podia ser mera
coincid0ncia# $pesar da sua falha em produzir um livro ou um ornal de m2nima !ualidade, fora-
lhe inesperadamente pedido para publicar um importante documento de Estado# .'o lhe fora
comunicada a natureza do documento# @ontudo, o prest2gio de tal tarefa re!ueria recursos de
elevada !ualidade/ bom papel e tinta# Ainalmente era-lhe dada a oportunidade de produzir!ual!uer coisa de !ue se pudesse orgulhar# ;iriam entregar o documento na!uela noite# E
algu)m inveoso estava a tentar denegri-lo, logo agora !ue a sua sorte estava prestes a mudar#
3aiu da fbrica e encaminhou-se apressadamente para o escritrio, alisando
cuidadosamente o fino cabelo para o lado# Envergava o seu melhor fato/ possu2a apenas dois, um
para o dia-a-dia, e outro para ocasies especiais# $!uela era uma ocasi'o especial# .'o precisara
de auda para se levantar da cama nesse dia# $cordou antes da mulher# arbeou-se, trauteando
uma melodia# :omou um pe!ueno-almo&o completo, o primeiro em semanas# uando chegou
de manh' % fbrica, tirou a garrafa de vodca da gaveta e despeou-a na pia, antes de passar o dia alimpar, a esfregar o ch'o e a tirar o p, removendo as manchas de gordura das m!uinas lintipo#
(s seus filhos, ambos estudantes universitrios, tinham vindo visit-lo, impressionados com a
transforma&'o# 3uren lembrou-os de !ue era uma !uest'o de princ2pio manter o local de trabalho
impecvel# ( local de trabalho era onde uma pessoa revia a sua identidade e o sentido de si#
Despediram-se dele com um beio, deseando-lhe boa sorte com a enigmtica nova encomenda#
Por fim, depois de muitos anos de secretismo e dos recentes anos de fracasso, estavam finalmente
orgulhosos dele#
@onsultou o relgio# Eram sete da noite# Estariam ali a !ual!uer minuto# :inha de sees!uecer do estranho e da fotografia, n'o era importante# .'o podia deiar !ue isso o distra2sse#
3ubitamente, deseou n'o ter deitado a vodca fora# Nma bebida t0-lo-ia acalmado# Por outro
prisma, poderiam t0-la cheirado no seu hlito# Era melhor n'o ter nada, era melhor estar nervoso/
mostrava !ue levava o seu trabalho a s)rio# 3uren pegou na garrafa de Kvass# Nma cervea de
p'o de centeio sem lcool/ teria de servir#
.a sua pressa, e com a tr)mula coordena&'o de movimentos provocada pela abstin0ncia
de lcool, derrubou uma caia de moldes de letras de a&o# Esta tombou da secretria, e o seu
conte+do espalhou-se pelo ch'o de pedra#
?lim* ?lim
( corpo retesou-se-lhe# 3uren n'o se encontrava no seu escritrio/ achava-se agora
num estreito corredor de tiolos, com uma s)rie de portas de a&o num dos lados# 6ecordou-se
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da!uele lugar/ a Pris'o (riol, onde fora guarda a!uando da eclos'o da Grande Guerra Patritica#
Ele e os seus colegas, for&ados a bater em retirada com a rpida aproima&'o do e)rcito alem'o,
tinham recebido ordens para li!uidar a popula&'o de reclusos, sem deiar nenhum recruta
solidrio para os invasores .azis# En!uanto os edif2cios eram bombardeados por 3tu5as e
Panzers a uma distBncia muito prima, eles enfrentavam o !uebra-cabe&as log2stico de eliminarvinte celas apinhadas de centenas de criminosos pol2ticos numa !uest'o de minutos# .'o havia
tempo para balas ou cordas# $ ideia de usarem granadas fora sua/ duas atiradas para o interior de
cada cela# $travessou o corredor direito % porta, puou a pe!uena grade de a&o e atirou-as l para
dentro tlim* tlim o som da granada a embater no ch'o de cimento# Depois, precipitou-se a
fechar a grade, para !ue n'o pudessem ser atiradas para fora, e correu at) ao fundo do corredor,
para se afastar da eplos'o, ao mesmo tempo !ue imaginava os homens a tentar
atabalhoadamente alcan&ar as granadas, os seus dedos imundos escorregadios, tentando atir-las
pela pe!uena anela gradeada#3uren tapou os ouvidos com for&a, como se tal pudesse deter a!uela memria# 8as o
barulho persistia, cada vez mais alto, granadas a embater no ch'o de cimento, cela aps cela, aps
cela#
?lim* ?lim* ?lim* ?lim
Gritou/
arem!uando afastou as m'os dos ouvidos, apercebeu-se de !ue estava algu)m a bater % porta#
7?
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13 de M!%&o
( pesco&o da v2tima tinha sido devassado por uma s)rie de cortes fundos, irregulares#
.'o havia ferimentos acima ou abaio do !ue restava do pesco&o do homem, dando a impress'o
contraditria de frenesi e controlo# @onsiderando a ferocidade do ata!ue, apenas uma pe!uena
!uantidade se sangue se espalhara % es!uerda e % direita das incises, formando uma po&a com a
forma de asas esvoa&antes de anos# ( assassino parecia ter derrubado a v2tima ao ch'o,
imobilizando-o nessa posi&'o, continuando a cort-lo, muito depois de 3uren 8os5vin de
cin!uenta e cinco anos, gerente de uma pe!uena tipografia acad)mica ter morrido#( seu corpo fora encontrado nesse dia, de manh' cedo, !uando os seus filhos, ;sevolod e
$5vsenti, entraram no estabelecimento, preocupados por o pai n'o ter regressado a casa#
Perturbados, tinham contactado a mil2cia, !ue se deparara com um escritrio virado do avesso/ as
gavetas arrancadas da secretria, pap)is espalhados pelo ch'o, armrios de ar!uivo abertos#
@onclu2ram !ue se tratara de um assalto desorganizado# 3 ao final da tarde, cerca de sete horas
depois da descoberta, a mil2cia contactou enfim o departamento de homic2dios, chefiado pelo e-
agente do 8G, >eo 3tepanovich Demidov#
>eo estava habituado %!uele tipo de atrasos# @riara o departamento de homic2dios tr0sanos antes, usando da influ0ncia !ue ganhara ao resolver os crimes de mais de !uarenta e !uatro
crian&as# Desde a sua cria&'o !ue a rela&'o do departamento com a mil2cia comum era
problemtica# $ coopera&'o era errtica# $ prpria eist0ncia da!uele departamento era
considerada por muitos oficiais da mil2cia e do KG como uma insinua&'o de um grau de
criticismo inaceitvel, tanto do seu trabalho como do do Estado# Em rigor, estavam certos# $
motiva&'o de >eo para criar a!uele departamento partira de uma reac&'o contra o seu trabalho
en!uanto agente# Prendera muitos civis durante a sua anterior carreira, prises essas !ue fizera
com base em simples listas de nomes dactilografadas, !ue lhe eram entregues pelos seussuperiores# ( departamento de homic2dios, pelo contrrio, procurava uma verdade baseada em
evid0ncias, n'o uma verdade politizada# ( dever de >eo era apresentar os factos de cada caso aos
seus superiores# ( !ue eles faziam com essa verdade, era com eles# .o fundo, alimentava a
esperan&a de um dia conseguir e!uilibrar os registos das prises, de o n+mero de culpados
ultrapassar o de inocentes# 8esmo calculando por baio, tinha um longo caminho a percorrer#
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$s liberdades garantidas ao departamento de homic2dios resultavam de o seu trabalho
estar sueito ao mais elevado n2vel de secretismo# 6eportavam directamente a a altos cargos no
minist)rio do *nterior, operando como uma subdepartamento clandestino do 8inist)rio @entral de
*nvestiga&es @riminais# $ esmagadora maioria da popula&'o ainda precisava de acreditar na
evolu&'o da sociedade# $ diminui&'o dos 2ndices de criminalidade era uma doutrina dessacren&a# Portanto, os factos contraditrios eram filtrados da consci0ncia nacional# .enhum
cidad'o podia contactar o departamento de homic2dios por!ue nenhum cidad'o sabia !ue a!uele
eistia# Por esta raz'o, >eo n'o podia emitir re!uisi&es de informa&'o nem pedir %s testemunhas
!ue se apresentassem, uma vez !ue tais ac&es e!uivaleriam a propagandear a eist0ncia do
crime# $ liberdade !ue lhe fora garantida era bastante peculiar e >eo, !ue fizera tudo ao seu
alcance para p=r a sua carreira na pol2cia secreta para trs das costas, encontrava-se agora a dirigir
um tipo de pol2cia secreta muito diferente#
$preensivo com a eplica&'o preliminar !ue fora encontrada para a morte de 8os5vin,>eo estudou a cena do crime e os seus olhos fiaram-se na cadeira# Esta encontrava-se
despercebidamente arrumada diante da secretria, com o assento ligeiramente inclinado#
$proimou-se, agachando-se, e passou com o dedo por uma fina linha fracturada numa das
pernas de madeira# $o testar timidamente o seu peso, empurrando-a na parte traseira, a perna
cedeu imediatamente# $ cadeira estava partida# 3e algu)m se tivesse sentado nela, teria ca2do#
@ontudo, estava arrumada diante da secretria como se estivesse em perfeito estado de
conserva&'o#
;oltou a concentrar as suas aten&es no corpo, pegando nas m'os da v2tima# .'o haviacortes, nem arranhes/ nenhum sinal de !ue o homem se tentara defender# >eo aoelhou-se,
aproimando-se do pesco&o da v2tima# uase n'o restava pele, com ecep&'o da nuca, a zona
!ue tocava no ch'o, protegida de repetidos cortes# >eo pegou numa faca, for&ando-a por debaio
do pesco&o da v2tima e !uando retirou a lBmina, esta trazia um pe!ueno peda&o de pele !ue n'o
tinha sido cortado# Estava escoriado# 6etirou a faca e, preparava-se para se levantar, !uando
divisou o bolso do fato do morto# Enfiou a m'o l dentro, retirando um livro delgado/ & Estado e
a Reolu-o de >enine# $inda antes de o abrir, descobriu !ue havia algo de invulgar na
encaderna&'o/ tinha sido colada uma pgina# $o folhear para a pgina em !uest'o, viu afotografia de um homem desgrenhado# Embora >eo n'o tivesse ideia de !uem era o homem,
reconheceu de imediato o tipo de fotografia/ o pano de fundo muito branco, a epress'o
desorientada do suspeito# Era a fotografia de um homem !ue fora detido#
Desnorteado com a!uela anomalia cuidadosamente preparada, ergueu-se# :imur
.esterov entrou na sala, deitando um olhar ao livro/
7J
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Alguma coisa importante'
No sei ao certo.
:imur era o colega e amigo mais chegado de >eo# $ amizade !ue se desenvolvera entre
eles era do tipo discreto# .'o bebiam untos, n'o graceavam um com o outro nem falavam
muito, ecepto sobre trabalho/ uma parceria acompanhada de longos sil0ncios# $ um observadoreterior poderia parecer !ue nem se!uer eram amigos e para um c2nico tal atitute denunciava a
eist0ncia de um ressentimento nas suas rela&es# >eo era !uase dez anos mais novo do !ue
:imur, e era agora seu superior, apesar de ter sido, em tempos, seu subordinado# :ratava-o
sempre, com formalidade, por General .esterov# (bectivamente, >eo fora !uem mais
beneficiara do seu sucesso conunto# Cavia !uem inisuasse !ue ele era um individuo oportunista,
um individualista a !uem s interessava a carreira# :imur, por)m, n'o mostrava invea# $
!uest'o do posto era meramente incidental# 3entia-se orgulhoso do seu trabalho e o sustento da
fam2lia estava assegurado# uando se mudara para 8oscovo conseguira enfim, depois delangorosas listas de espera, !ue lhe fosse designado um apartamento moderno, com gua !uente
corrente, canaliza&'o decente e corrente el)ctrica durante as vinte e !uatro horas do dia#
*ndependentemente do !ue a sua rela&'o parecesse aos olhos dos outros/ ambos confiavam as
suas vidas ao outro#
:imur apontou em direc&'o ao piso da fbrica principal onde se erguia uma torre de
m!uinas lintipo, gigantescos insectos metlicos/
9 &s filhos chegaram.
?r/los c. >om o corpo do pai deles estendido no cho'
3im.
(s rapazes tinham sido autorizados a sair do local, enviados para casa pela mil2cia antes
!ue >eo pudesse !uestion-los na cena do crime# Pediria desculpa por terem de ver o corpo do
pai novamente, mas n'o tinha inten&'o de confiar nas informa&es em segunda m'o !ue lhe
tinham sido passadas pela mil2cia# $l)m do mais, estava curioso para observar as suas reac&es#
@onvocados, ;sevolod e $5vsenti ambos dos seus vinte e poucos anos apareceram %
porta, lado a lado# >eo apresentou-se/9 3ou o &ficial5eo Demido. >ompreendo que isto dea ser muito dif,cil.
.enhum deles olhou para o corpo do pai, mantendo os olhos fios em >eo# ( mais
velho, ;sevolod, falou/
$ respondemos )s perguntas da mil,cia.
7M
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As minhas perguntas no demoram muito. Esta sala est tal e qual a encontraram
esta manh'
3im* est tudo na mesma.
;sevold era o +nico !ue falava# $5vsenti permanecia em sil0ncio, erguendo os olhos
ocasionalmente# >eo prosseguiu/ Esta cadeira estaa ) mesa' ode ter sido derru"ada* na luta talez'
Na luta'
Entre o seu pai e o assassino'
Aez-se sil0ncio# >eo prosseguiu/
A cadeira est partida. 3e se sentasse nela* ter/se/ia partido. No estranho que se
tenha uma cadeira partida diante de uma secretria' No nos podemos sentar nela.
$mbos os filhos se voltaram para a cadeira# ;sevold respondeu/
?rou6e/nos de olta para falar so"re a cadeira' A cadeira importante. Acredito que o seu pai a usou para se enforcar.
$!uela sugest'o devia ter sido absurda# (s filhos deviam ter ficado indignados# Por)m,
permaneceram em sil0ncio# Pressentir !ue a sua especula&'o era acertada, >eo reafirmou a sua
teoria/
$ulgo que o osso pai se enforcou1 talez o tenha feito numa iga do tecto da f"rica.
3u"iu ) cadeira e depois pontapeou/a de de"ai6o dos ps. (oc
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>ortei/lhe a garganta.
( ovem prosseguiu/
Estaa a desceo insistiu no assunto/
0m homem de cinquenta e cinco anos no se suicida porque os leitores teo acompanhou-os % sa2da do escritrio, e encaminhou-os para o piso da fbrica, longeda vista do corpo do pai/
No ficaram alarmados com o facto de o osso pai no ter regressado a casa at de
manh. $ estaam ) espera que tra"alhasse at tarde ou teriam ficado preocupados ontem )
noite. 3e assim * porque que no h pginas prontas a imprimir' aqui quatro mquinas
lin+tipo. &ra* eu no estou a er aqui pginas nenhumas. No h nada que indique que tenha
estado a tra"alhar.
$proimaram-se das imensas m!uinas# .a fronte havia um aparelho id0ntico a uma
m!uina de escrever, um teclado# >eo dirigiu-se aos filhos/ Neste momento esto a precisar de amigos. No posso dei6ar passar o suic,dio do
osso pai. ;as posso solicitar aos meus superiores que eitem que as suas ac-@es afectem as
ossas carreiras. &s tempos mudaram1 os erros do osso pai no t
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;ostra/me como funciona.
;as como lhe dissemos1 destru,mos tudo.
or faor.
$5sventi lan&ou um olhar ao irm'o, procurando evidentemente a sua permiss'o# ( irm'o
anuiu/ & te6to introduzido aqui no teclado. G medida que se o introduzindo as letras* a
mquina ai dei6ando cair as respectias matrizes na parte de trs , onde ficam alinhadas* pela
ordem em que foram caindo. >ada linha formada por matrizes indiiduais* e os espa-os so
dados por placas de chum"o sem graa-@es. 0ma ez terminada a linha, carrega/se nesta
alaanca que elea a linha at ) sec-o de fundi-o onde moldado um s+ "loco de chum"o e
estanho. Essas linhas so colocadas nesta cai6a* at se ter uma pgina inteira de te6to. A
pgina de a-o ento co"erta de tinta e o papel rola por cima1 o te6to impresso. ;as* como
lhe dissemos* derretemos as pginas todas. No so"rou nada.>eo circundou a m!uina# (s seus olhos seguiram o processo mecBnico, uma colec&'o
de matrizes de letras para compor uma linha# Perguntou/
2uando introduzo o te6to no teclado* as matrizes de letras so reunidas nesta cai6a'
3im.
4 erdade que no h linhas completas de te6to. Essas foram destru,das. ;as eo
aqui uma linha parcial* uma linha que no foi aca"ada.
>eo estava a apontar para uma fileira incompleta de matrizes de letras#
& osso pai estaa a meio de uma linha.(s filhos espreitaram para a m!uina# >eo tinha raz'o#
2uero imprimir estas palaras.
( filho mais velho come&ou a bater na barra de espa&os, observando/
3e acrescentarmos material "ranco ao final da linha* teremos o comprimento
completo* pronto para fundir um "loco.
$s matrizes individuais de espa&os foram acrescentadas % linha incompleta at) a caia
estar cheia# Nm pist'o inectou chumbo derretido no molde, saindo uma linha composta/ as
+ltimas palavras de 3uren 8os5vin assentadas antes de tirar a prpria vida#( bloco-linha estava virado de lado, as letras estavam inclinadas de uma forma !ue n'o
se viam# >eo perguntou/
Est quente'
No.
7Q
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>eo pegou na linha composta, colocando-a na caia# @obriu a superf2cie com tinta e
colocou uma +nica folha de papel branco sobre esta, pressionando#
@uidadosamente, voltou a pgina#
?R
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No mesmo d!
3entado % mesa da cozinha, >eo olhava fiamente para a folha de papel# :r0s palavrasera tudo o !ue restava do documento !ue levara 3uren 8os5vin a tirar a prpria vida/
3o" tortura* Ei%he
>eo tinha lido as palavras vezes sem conta, incapaz de desviar delas os olhos# 8esmo
descontetualizadas, o seu efeito era hipntico# uebrando o seu feiti&o, afastou a folha de papel
para o lado e pegou na pasta, pousando-a na horizontal sobre a mesa# .o seu interior,
encontravam-se dois dossi0s secretos# Para poder ter acesso a eles, precisara de autoriza&'o# .'otinha sido dif2cil obt0-la no caso do primeiro, sobre 3uren 8os5vin# @ontudo, o segundo
levantara algumas !uestes# ( segundo dossi0 !ue re!uisitara era sobre 6obert Ei5he#
$o abrir o primeiro conunto de documentos, sentiu o peso do passado da!uele homem, o
n+mero de pginas acumuladas sobre ele# 8os5vin tinha sido oficial da 3eguran&a Estatal tal
como >eo , um >he%ist*e estivera ao servi&o durante muito mais tempo do !ue ele, mantendo o
seu emprego, ao passo !ue centenas de oficiais tinham sido abatidos# 4unto com o dossi0 havia
uma lista/ as den+ncias !ue 8os5vin fizera ao longo da sua carreira/
Nestor 8uros%. (izinho. E6ecutado
Rozalia Reisner. Amiga. HI anos
8a%o =lo%. >omerciante. J anos
Farl 0rits%. >olega. uarda. HI anos
Dezanove anos de servi&o, duas pginas de den+ncias e !uase cem nomes por)m, s
tinha dado o nome de um familiar uma +nica vez#
8ona Rade%. rima. E6ecutada
>eo reconheceu uma t)cnica/ as datas das den+ncias eram aleatrias, muitas calhavam no
mesmo m0s, e depois nada durante vrios meses# ( espa&amento catico era deliberado, ocultava
um cuidadoso calculismo# Denunciar a prima tinha sido !uase de certeza uma decis'o
?1
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estrat)gica# 8os5vin tinha de garantir !ue n'o parecia !ue a sua lealdade para com o Estado
acabava na fam2lia# Para conferir credibilidade % sua lista, a prima tinha sido sacrificada/
defendera-se assim da acusa&'o !ue ele apenas nomeara pessoas !ue n'o o interessavam
pessoalmente# $!uele homem era um sobrevivente consumado, e o seu suic2dio parecia uma
improbabilidade#$o verificar as datas e locais onde 8os5vin trabalhara, >eo recostou-se na cadeira,
surpreendido# :inham sido colegas/ ambos se encontravam no >ubFan5a, sete anos antes# (s
seus caminhos nunca se haviam cruzado, pelo menos n'o !ue se recordasse# >eo era
investigador, fazia prises, seguia suspeitos# 8os5vin era guarda, transportava prisioneiros,
supervisionava a sua deten&'o# >eo fizera todos os poss2veis para evitar as celas de interroga&'o
na cave, como se acreditasse !ue as tbuas do soalho o protegiam das actividades realizadas por
baio, dia aps dia# 3e o suic2dio de 8os5vin era uma epress'o de culpa, o !ue desencadeara
tais sentimentos etremos depois de tanto tempoI >eo fechou a pasta, voltando a sua aten&'o parao segundo ar!uivo#
( dossi0 de 6obert Ei5he era mais grosso, mais pesado, no frontisp2cio lia-se
@(.A*DE.@*$>, as pginas estavam atadas como !ue para manter algo pernicioso recluso no
interior# >eo desenrolou nervosamente o cordel# ( nome parecia-lhe familiar# Aolheando as
pginas, reparou !ue Ei5he fora um membro do partido desde 1QRJ antes da revolu&'o , na
altura em !ue ser um membro do Partido @omunista implicava o e2lio ou a eecu&'o# $ sua
ficha era impecvel/ um e-candidato ao @omit) @entral do Politburo# .'o obstante, tinha sido
preso no dia 7Q de $bril de 1Q?# 8anifestamente, a!uele homem n'o era um traidor# E, noentanto, Ei5he confessara/ o protocolo estava no dossi0, pgina e pginas detalhando as suas
actividades anti-sovi)ticas# >eo esbo&ara demasiadas confisses pr)-preparadas para n'o
reconhecer !ue a!uilo era o trabalho de um agente, pontuado de frases feitas sinais do estilo
interno, uma minuta onde !ual!uer pessoa podia ser for&ada a assinar o seu nome# Aolheando
para diante, encontrou uma declara&'o de inoc0ncia escrita por Ei5he en!uanto estivera detido#
$o contrrio da confiss'o, a prosa era humana, desesperada, um amontoado de louvores
compassivos ao Partido, proclamando o amor pelo Estado e apontando com t2mida mod)stia a
inusti&a da sua pris'o# >eo leu-a, !uase sem conseguir respirar/
or no ser capaz de suportar as torturas a que fui su"metido por 0sha%o e Ni%olae
# especialmente pelo anterior* que se aproeitou de as minhas costelas partidas no estarem
ainda "em curadas* inflingindo/me uma dor terr,el # fui for-ado a acusar/me a mim pr+prio e
outros.
?7
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>eo sabia o !ue se seguiria#
.o dia de Aevereiro de 1QR, Ei5he tinha sido fuzilado#
#
6aisa estava de p), a observar o marido# $bsorto nos dossi0s confidenciais, n'o tinha
notado a sua presen&a# $!uela vis'o de >eo plido, tenso, de ombros corcovados sobre os
documentos secretos, o destino de outras pessoas nas suas m'os podia ter sido retirada do
infeliz passado de ambos# 3entia-se tentada a reagir como reagira tantas outras vezes antes,
afastando-se, evitando-o e ignorando-o# ( afluo de ms memrias atingiu-a como uma esp)cie
de nusea# >utou contra essa sensa&'o# >eo n'o era esse homem# Ela n'o estava presanesse casamento# $van&ou alguns passos e estendeu a m'o, pousando-a no ombro do marido,
elegendo-o o homem !ue ela aprendera a amar#
>eo retraiu-se ao seu to!ue# .'o tinha dado not2cia da entrada da mulher# $panhado de
surpresa, sentiu-se eposto# Ergueu-se abruptamente, ao mesmo tempo !ue a cadeira produzia
um estr)pito atrs dele# (lhando-a nos olhos, sentiu o seu nervosismo# .'o !ueria !ue ela se
voltasse a sentir assim# Devia ter-lhe eplicado o !ue estava a fazer# @a2ra de novo nos velhos
hbitos/ sil0ncio e segredos# 6odeou-a com os bra&os# De cabe&a encostada ao seu ombro, sabia
!ue ela espreitava os ar!uivos pousados em cima da mesa# Eplicou/ 0m homem matou/se* um eis agente da ;=.
Algum que conhecias'
No de que me recorde.
?ens de inestigar'
& suic,dio tratado comoB
Ela interrompeu-o/
2uero dizerB tens de ser tu a faz
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>eo tornou a guardar os dossi0s na pasta# uando passou unto da mulher, inclinou-se
para bei-la, um beio !ue ela blo!ueou gentilmente com um dedo, olhando-o nos olhos# .'o
disse nada, antes de desviar o dedo e de o beiar um beio !ue subentendia !ue ele lhe fizera a
mais in!uebrvel e sagrada das promessas#
uando entrou no seu !uarto, guardou os dossi0s num lugar seguro, um velho hbito#Depois, por)m, mudou de ideias e resolveu dei-los em cima da mesa-de-cabeceira, no caso de
6aisa os !uerer ler# 6egressou apressadamente ao corredor, encaminhando-se para o !uarto das
filhas, ao mesmo tempo !ue tentava suavizar a tens'o do seu rosto# De sorriso largo, abriu a
porta#
>eo e 6aisa tinham adoptado duas meninas pe!uenas# SoFa tinha agora catorze anos e
Elena, sete# $proimou-se da cama de Elena, esticando-se unto a esta para retirar um livro do
armrio, uma histria infantil de TurF 3trugats5F# $briu o livro e come&ou a ler em voz alta#
uase imediatamente SoFa interrompeu-o/ $ ouimos essa antes.
Esperou um momento, antes de acrescentar/
Detestamo/la da primeira ez.
$ histria era sobre um menino !ue !ueria ser mineiro# ( pai do garoto, tamb)m
mineiro, tinha morrido num acidente e a m'e temia muito !ue o seu filho enveredasse por uma
profiss'o t'o perigosa# SoFa tinha raz'o# >eo a tinha lido antes# SoFa resumiu,
desdenhosamente/
& filho aca"a por escaar mais caro do que algum amais escaara* torna/se umher+i nacional e dedica o seu prmio ) mem+ria do pai.
>eo fechou o livro#
?ens razo. No muito "om. ;as Koa* em"ora possas dizer o que quiseres dentro
desta casa* tem mais cuidado l fora. E6primir opini@es cr,ticas* mesmo so"re assuntos "anais*
como uma hist+ria infantil* perigoso.
(ais prender/me'
SoFa nunca aceitara >eo en!uanto seu guardi'o# .unca o perdoara pela morte dos seus
pais# E nem t'o pouco >eo se referia a si prprio como pai delas# SoFa tratava-o por >eoDemidov, dirigindo-se a ele com formalidade, pondo tanta distBncia entre eles !uanto lhe era
poss2vel# $proveitava todas as oportunidades para lhe recordar !ue estava a viver com ele por
razes prticas, a us-lo como um meio para atingir um fim/ proporcionar conforto material %
irm', libert-la do orfanato# $inda assim, assegurava-se de !ue nada a impressionava, nem o
apartamento, nem os seus passeios, sa2das ou refei&es# :'o severa !uanto bonita, n'o havia a
?
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menor suavidade na sua apar0ncia# $ infelicidade perp)tua parecia ser de importBncia vital para
ela# >eo pouco podia fazer para encora-la a p=r tudo para trs das costas# Esperava !ue a
determinada altura as suas rela&es melhorassem lentamente# E ainda estava % espera# Esperaria,
se fosse preciso, o resto da vida#
No* Koa* eu no fa-o isso. E nunca mais o farei.>eo inclinou-se para o ch'o, apanhando um dos ornais de Dets%aa 5iteratura, uma
publica&'o nacional para crian&as# $ntes !ue pudesse come&ar, SoFa atalhou/
orque que no inenta uma hist+ria' ostar,amos muito* no Elena'
Elena chegara a 8oscovo ainda muito pe!uena, com !uatro anos, e a idade facilitara a
adaptar-se %s mudan&as na sua vida# $o contrrio da irm' mais velha, fizera amigos e era muito
aplicada muito na escola# 8uito dada a elogios, procurava a aprova&'o dos professores, tentando
agradar a todos, incluindo os seus novos pais adoptivos#
Elena ficou ansiosa# @ompreendeu pelo tom de voz da irm' !ue esta esperava !ueconcordasse# @onstrangida por ter de tomar partidos, apenas assentiu com a cabe&a# 3entindo
perigo, >eo replicou/
muitas hist+rias que ainda no lemos* tenho a certeza que amos encontrar uma
de que gostemos.
SoFa, por)m, n'o cedia/
3o todas iguais. >onte/nos uma coisa noa. 8nente qualquer coisa.
Duido que fosse capaz de inentar alguma coisa "oa.
Nem sequer ai tentar' & meu pai costumaa inentar muitas hist+rias. ist+rias deuma quinta long,nqua* uma quinta no 8nerno* com o solo co"erto por uma camada de nee. &
rio ali pr+6imo estaa congelado. odia come-ar assim. Era uma ez duas meninas pequenas*
irmsB
Koa* pe-o/te.
As irms iiam com a me e o pai e eram muito felizes. At que um dia* um homem
de uniforme eio prendeo interrompeu/
Koa' ela Elena* pe-o/te.SoFa lan&ou um olhar % irm' e calou-se# Elena estava a chorar# >eo levantou-se#
Esto as duas muito cansadas. (ou arranar liros melhores amanh. rometo.
>eo apagou a luz e fechou a porta# .o corredor, reconfortou-se, dizendo para consigo
!ue as coisas iriam melhorar, um dia# SoFa apenas precisava de um pouco mais de tempo#
?J
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#
SoFa estava deitada na cama, ouvindo o rumor da irm' a dormir/ as suas lentas e suaves
golfadas de ar# uando viviam na !uinta com os pais, os !uatro dormiam num pe!ueno !uarto
com paredes de barro grossas, a!uecidas pelo fog'o a lenha# SoFa dormia ao lado de Elena,
debaio dos cobertores speros, cozidos % m'o# ( rumor da sua pe!uena irm' a dormir
representava seguran&a/ significava !ue os pais estavam perto# .'o pertencia ali, na!uele
apartamento, com >eo no !uarto ao lado#
SoFa nunca ca2a no sono facilmente# Aicava deitada na cama durante horas, remoendo
pensamentos at) a eaust'o se apoderar dela# Era a +nica pessoa !ue se agarrava % verdade/ a
+nica pessoa !ue se recusava a es!uecer# Deslizou para fora da cama# L parte da respira&'o da
irm' mais nova, o apartamento estava em sil0ncio# Aoi a rastear at) % porta, com os olhos
habituados % escurid'o# 3eguiu pelo corredor, mantendo a m'o na parede para se orientar# .acozinha, a ilumina&'o da rua derramava-se pela anela# 8ovendo-se com ligeireza, como um
ladr'o, abriu uma gaveta e segurou no cabo, sentindo o peso da faca#
?M
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No mesmo d!
@om a faca encostada % perna, SoFa encaminhou-se para o !uarto de >eo# $briu
lentamente a porta at) haver suficiente espa&o para se esgueirar para o interior# @aminhou em
sil0ncio sobre o soalho de madeira# $s cortinas estavam fechadas, o !uarto mergulhado na
escurid'o, mas ela conhecia o espa&o, sabia onde pisar para chegar a >eo, !ue dormia ao fundo#
Parada mesmo por cima dele, SoFa ergueu a faca ao alto# Embora n'o o pudesse ver,
delineou com a imagina&'o os contornos do seu corpo# .'o tencionava apunhal-lo no est=mago/
os cobertores poderiam absorver a lBmina# 8ergulharia a lBmina no seu pesco&o, enterrando-a o
mais !ue pudesse, antes !ue ele tivesse hiptese de a dominar# De faca na vertical, dirigiu-a parabaio, com controlo perfeito# $trav)s da lBmina conseguia sentir-lhe o bra&o, o ombro subiu
em direc&'o ao pesco&o, afundando a ponta da faca aos poucos, at) esta lhe tocar directamente na
sua pele# $gora !ue estava em posi&'o, s precisava de segurar no cabo com ambas as m'os e
empurr-lo para baio#
SoFa fazia este ritual em intervalos irregulares, por vezes uma vez por semana, outras
passava um m0s sem o fazer# $ primeira vez tinha sido tr0s anos antes, pouco depois de ela e a
irm' se terem mudado do orfanato para a!uele apartamento# .essa ocasi'o, tivera mesmo a
inten&'o de o matar# .esse mesmo dia, ele tinha-as levado ao ardim zoolgico# .em ela nemElena tinham ido alguma vez a um ardim zoolgico e visto de perto animais eticos, criaturas
!ue ela nunca vira antes/ es!uecera-se dela prpria# Durante pouco mais do !ue cinco ou dez
minutos, desfrutara da visita# 3orrira# Ele nunca a vira sorrir, sabia-o, mas isso n'o lhe
importava# ;endo-o com 6aisa, um casal feliz, imitando uma fam2lia, fingindo, mentindo,
compreendeu !ue estavam a tentar roubar o lugar dos seus pais# E ela permitira-o# .o caminho
de regresso a casa, no el)ctrico, sentira uma culpa t'o intensa !ue vomitara# >eo e 6aisa
culparam os doces e o movimento do el)ctrico# .essa noite, febril, ficara deitada na cama, a
chorar, a co&ar as pernas at) fazer sangue# @omo podia ter tra2do a memria dos pais t'ofacilmenteI >eo acreditava !ue podia ganhar o seu amor com roupas novas, comidas raras,
passeios e chocolates/ era rid2culo# 4urara !ue a!uilo nunca mais voltaria a acontecer# E s havia
uma maneira de o garantir/ fora buscar a faca e resolvera mat-lo# Aicara ali de p), tal como
agora, pronta para matar#
?O
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:odavia, a mesma memria !ue a levara ao !uarto, a memria dos seus pais, fora a raz'o
por !ue n'o o matara# .'o teriam !uerido o sangue da!uele homem nas suas m'os# :eriam
!uerido !ue tomasse conta da irm'# (bediente, chorando em sil0ncio, permitira !ue >eo vivesse#
De vez em !uando voltava, esgueirando-se para dentro do !uarto, armada com uma faca, n'o
por!ue mudara de ideias, n'o por vingan&a, n'o para o matar, mas como um memorial aos seuspais, uma forma de dizer !ue n'o os havia es!uecido#
( telefone tocou, estridente, inesperado# $larmada, SoFa deu um salto para trs, e a faca
escorregou-lhe das m'os, caindo com estr)pito no ch'o# $oelhou-se, aos apalpes % escurid'o,
tentando encontr-la# >eo e 6aisa remeiam-se, a cama rangeu com os seus movimentos#
Estariam a estender a m'o para acender a luz# SoFa procurava com frenesi nas tbuas do soalho,
guiando-se apenas pelo tacto# uando o telefone tocou pela segunda vez, n'o teve outra hiptese
!ue n'o deiar a faca para trs# @ontornou a cama apressadamente, correndo em direc&'o % porta,
e esgueirou-se pela nesga da porta no mesmo instante em !ue a luz se acendeu#
#
>eo sentou-se na cama, com os pensamentos vagarosos da sonol0ncia, sonhos
confundidos com a realidade tinha visto um movimento, uma figura, ou talvez n'o# ( telefone
estava a tocar# 3 tocava !uando se tratava de trabalho# ;erificou o relgio/ era !uase meia-
noite# >an&ou um olhar a 6aisa# Estava acordada, % espera !ue ele atendesse o telefone#
8urmurou um pedido de desculpas e levantou-se# $ porta estava aberta# .'o fechavam semprea porta antes de ir dormirI :alvez n'o, n'o era importante, e encaminhou-se para o corredor#
>eo levantou o auscultador# $ voz no outro lado era urgente, alta/
5eo' 4 Ni%olai.
.i5olai/ o nome n'o lhe dizia nada# .'o respondeu# *nterpretando correctamente o
sil0ncio de >eo, o homem prosseguiu/
9Ni%olai* o teu e6/patro! & teu amigo! 5eo* no te recordas de mim' 7ui eu quem te
deu a tua primeira misso! & padre* lem"ras/te 5eo'
>eo lembrava-se# C muito !ue n'o tinha not2cias de .i5olai# $!uele homem n'o tinha!ual!uer relevBncia na sua vida presente e por isso ressentiu o seu telefonema#
Ni%olai* tarde.
?arde' & que que te aconteceu' 3+ come-amos a tra"alhar a estas horas.
Agora no.
No* agora no.
?
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$ voz de .i5olai fez-se fraca, antes de acrescentar/
reciso de lhe falar.
$s suas palavras eram indistintas# Estava b0bado#
Ni%olai* porque que no ais dormir e logo falamos amanh'
?em de ser esta noite.$ voz !uebrava# Estava prestes a chorar#
& que que se passa'
(em encontrar/te comigo* pe-o/te.
>eo !ueria dizer !ue n'o#
&nde'
Nos teus escrit+rios.
Estarei l dentro de trinta minutos.
>eo desligou# $ sua irrita&'o estava mesclada de uma ponta de desassossego# .i5olain'o o teria voltado a procurar sem uma boca causa# uando regressou ao !uarto, 6aisa estava
levantada# >eo esbo&ou uma eplica&'o, dando de ombros#
9Era um e6/colega. 2uer encontrar/se comigo. Diz que tem de ser esta noite.
0m colega de que altura' Daquela poca'
3im.
E telefona/te assim* sem mais nem menos'
Estaa "
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@hegado ao corredor, estendeu a lBmina na palma da m'o# >an&ou um olhar ao !uarto
das filhas# $proimou-se da porta e abriu-a devagar# ( !uarto estava %s escuras# $s duas
raparigas estavam deitadas, a dormir# uando ia a retirar-se, fechando silenciosamente a porta,
sorriu ao ouvir a respira&'o lenta e !uase sumida de Elena# E depois estacou, ouvindo com mais
aten&'o# .'o conseguia ouvir nenhum rumor, vindo do lado do !uarto onde se encontrava SoFa#Estava a suster a respira&'o#
R
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14 de M!%&o
>eo conduzia muito depressa e acabou por derrapar numa curva, os pneus escorregaram
no gelo enegrecido# $liviou o p) do acelerador e levou o carro de novo para o centro da estrada#
.um estado de agita&'o, as costas h+midas de suor, sentiu-se aliviado ao chegar aos escritrios
do departamento de homic2dios# Encostou, repousando a cabe&a no volante# .o interior frio, sem
a!uecimento, a sua respira&'o formou uma neblina fina# Era uma da manh'# $s ruas estavam
desertas, forradas por uma camada de neve desigual# @ome&ou a tremer de frio< tinha-se
es!uecido de pegar numas luvas ou num chap)u, !uando sa2ra precipitadamente do apartamento,
na pressa de sair, de fugir do por!u0 !ue a porta do !uarto estava aberta, do por!u0 !ue a sua filhafingia dormir, e do por!u0 !ue havia uma faca debaio da sua cama#
Caveria certamente eplica&es, mundanas e simples eplica&es# :alvez tivesse
deiado a porta aberta# :alvez a sua mulher tivesse ido ao !uarto de banho, es!uecendo-se de
fechar a porta !uando regressara# uanto a SoFa fingir estar a dormir/ tinha ouvido mal# .a
verdade, por !ue ) !ue ela precisava de estar a dormirI Aazia sentido !ue estivesse acordada,
tinha acordado com o telefone, e estava deitada na cama a tentar cair no sono novamente,
enfastiada com raz'o# uanto % facaUn'o sabia, simplesmente n'o conseguia pensar, por)m,
deveria haver uma raz'o inocente, mesmo !ue n'o fizesse a mais pe!uena ideia de !ual seria#Desceu do carro, fechou a porta, e encaminhou-se para os escritrios# ( seu
departamento de homic2dios, localizado no distrito de Samos5vareche, a sul do rio, uma zona
com uma elevada concentra&'o de fbricas, tinha sido instalado num espa&o situado por cima de
uma grande padaria# Cavia um !u0 de caricato na localiza&'o e, silmultaneamente, a mensagem
de !ue o trabalho deles deveria permanecer invis2vel# (s escritrios estavam identificados como
7"rica de =ot@es HL, levando >eo a pensar, de tempos a tempos, o !ue se passaria nas outras
treze fbricas de botes#
Depois de entrar no decr)pito vest2bulo, cuo pavimento se encontrava entrecruzado depegadas de farinha, >eo subiu as escadas, passando os acontecimentos da!uela noite em revista
na sua mente# :inha conseguido ustificar duas das tr0s ocorr0ncias, mas a terceira a faca
resistia a !uais!uer tentativas de desagravo# ( assunto teria de esperar at) % manh' seguinte,
!uando tivesse oportunidade de falar com 6aisa# $gora o telefonema inesperado de .i5olai
preocupava-o mais# >eo tinha de se concentrar na raz'o por !ue um homem com o !ual n'o
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falava h seis anos lhe ligava a meio da noite, b0bado, suplicando !ue se encontrassem# .'o
havia nada entre eles, nenhuma liga&'o ou amizade, nada com ecep&'o da!uele ano 1QQ o
seu primeiro ano como agente do 8G#
.i5olai esperava-o no topo das escadas, esparramado % entrada como um vagabundo#
$ssim !ue viu >eo, levantou-se# ( seu casaco de *nverno era de bom corte, talvez at) feito noestrangeiro, mas encontrava-se em muito mau estado por desmazelo# $ barriga sa2a-lhe para fora
da camisa desabotoada# Ganhara peso, perdera cabelo# :inha um ar envelhecido e cansado, o
rosto oprimido de preocupa&'o, arrepanhado em torno dos olhos# :resandava a fumo, suor e
lcool o !ue, combinado com o habitual cheiro a forno e a massa cozida !ue impreganava o ar do
edif2cio, formava uma mescla irrespirvel# >eo ofereceu-lhe a m'o# .i5olai desviou-a para o
lado, abra&ando-o, agarrando-se a ele como se tivesse acabado de ser salvo da vertente de uma
montanha# .'o havia nada de piedoso na!uele abra&o/ isto de um homem !ue constru2ra a sua
reputa&'o sendo impiedoso#(correu-lhe de repente o entalhe no ch'o de madeira# Por !ue se es!uecera da!uele
detalheI .'o era importante, fora por isso# *n+meras coisas podiam t0-lo causado# Podia estar
ali h algum tempo, n'o era algo em !ue ele fosse necessariamente reparar, um arranh'o
causado pelo arrastar da mob2lia# @ontudo, bem no fundo de si, sabia !ue a faca e o entalhe
estavam ligados#
.i5olai tinha come&ado a falar, num discurso incoerente, desarticulado# >eo !uase n'o
lhe prestava aten&'o, acenando com a cabe&a % medida !ue abria o departamento, conduzindo o
convidado pelo seu escritrio# 3entados diante um do outro, >eo untou as m'os, apoiando oscotovelos na mesa, e ficou a observar .i5olai a falar sem ouvir !uase nada, ora prestando aten&'o
ora n'o, apanhando a!ui e ali alguns fragmentos do discurso/ !ual!uer coisa sobre umas
fotografias !ue lhe tinham sido enviadas# Aosse o !ue fosse !ue .i5olai estava a dizer, a mente
de >eo n'o tinha espa&o para isso# @rescia dentro dele uma singular e terr2vel tomada de
consci0ncia, !ue apartava todos os outros pensamentos# $ faca tinha ca2do, a ponta da faca
cravara-se no ch'o antes de ricochetear para debaio da cama< tinha ca2do por!ue !uem !uer !ue
a tivesse segurado na m'o, tinha entrado em pBnico, alarmado por um barulho s+bito, um
telefonema inesperado# $ pessoa tinha fugido do !uarto, deiando a porta aberta, pois ia comdemasiada pressa para ter tempo de fech-la#
Era ela
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8esmo agora, !ue todas as pe&as estavam encaiadas, era com relutBncia !ue articulava a
+nica conclus'o lgica/ a pessoa !ue estava a segurar na faca era SoFa#
>evantou-se, foi % anela e abriu-a# ( ar frio bateu-lhe no rosto# .'o soube ao certo
!uanto tempo permaneceu na!uela posi&'o, a fitar o c)u nocturno, ouvindo, por)m, uma voz atrs
dele !ue lhe recordou !ue n'o estava sozinho# ;oltou-se< preparava-se para pedir desculpa!uando engoliu as palavras# .i5olai, um homem !ue lhe ensinara !ue a crueldade era necessria
e boa, estava lavado em lgrimas/
5eo' Nem sequer estaa a escutar.
$inda de lgrimas no rosto, .i5olai soltou uma risada, um som !ue transportou >eo de
volta para as obrigatrios festeos aps terem feito uma pris'o# .essa noite, por)m, o riso de
.i5olai era diferente# Era !uebradi&o# $ insol0ncia e a confian&a tinham desaparecido/
2ueres esquecer' No queres* 5eo' No te condeno. Daa tudo para poder
esquecer. 2ue "elo sonho seria esseB e-o desculpa* Ni%olaiC a minha ca"e-a est noutro s,tio* uma questo familiar.
3eguiste o meu conselhoB 0ma fam,lia* isso "om. As fam,lias so importantes. As
fam,lias so tudo. 0m homem no nada sem o amor da sua fam,lia.
odemos falar amanh' 2uando estiermos menos cansados'
.i5olai assentiu com um gesto de cabe&a e ergueu-se# 4unto % porta estacou, de olhos
postos no ch'o/
EstouBenergonhado.
No te preocupes. ?odos n+s "e"emos demais de ez em quando. 7alamos amanh..i5olai fitou-o# >eo ulgou !ue ele fosse soltar nova risada, mas desta vez deu meia
volta, dirigindo-se para as escadas#
>eo sntiu-se aliviado por se encontrar finalmente a ss e ser capaz de se concentrar# .'o
podia continuar a fingir# Ele era uma recorda&'o sempre presente da terr2vel perda de SoFa#
.unca falara sobre o !ue se passara na!uele dia, !uando os seus pais tinham sido mortos a tiro#
:entara ignorar o passado# $ faca era um grito de socorro# :inha de agir para salvar a sua
fam2lia# Ele era capaz de resolver a situa&'o# Aalar com SoFa/ essa era a solu&'o# :inha de falar
com ela imediatamente#
?
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No mesmo d!
.i5olai saiu para a rua, as botas a afundarem-se na fina neve# $o sentir o frio no
est=mago descoberto, enfiou a camisa para dentro das cal&as mal conseguia focar os olhos, o
corpo balan&ava como se estivesse no conv)s de um barco# Por !ue ligara a >eoI ue esperava
ele !ue o seu antigo protegido fizesseI :alvez tivesse vindo apenas pelo companheirismo, n'o
a!uele companheirismo de um companheiro de copos< vie