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Artigo, Gest+úo e estrat+®gias de comunica+º+úo em situa+º+Áes cr+¡ticas

Date post: 27-Sep-2015
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Artigo de gestão de estratégias para administração
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  • artigos

  • Gesto e estratgias de comunicao em

    situaes crticas

    Management and communication strategies

    in critical situations

    Gestin y estrategias de comunicacin en

    situaciones crticas

    Wilson Costa BuenoJornalista, tem mes-

    trado e doutorado em

    Comunicao (USP)

    e especializao em

    Comunicao Rural.

    Professor do programa

    de ps-graduao em

    comunicao da Uni-

    versidade Metodista So

    Paulo, So Bernardo do

    Campo, SP, Brasil

    E-mail: wilson

    @comtexto.com.br

    http://lattes.cnpq.

    br/9495822246558650

  • 42

    RESUMOSituaes crticas, como a emergncia de epidemias e desastres naturais, exigem um complexo sistema de gesto de crises, com destaque a aes e estratgias em comunicao. A ausncia de planejamento, a interferncia de interesses polticos e empresariais, o sensacionalismo da mdia e a incapacidade de mobilizao das comunidades atingidas so desafios permanentes comunicao pblica nestes momentos.Palavras-chave: Comunicao pblica. Comunicao e crise. Comunicao e risco.

    ABSTRACTCritical situations, such as the emergence of epidemics and natural disasters, require a complex system of crisis management, highlighting the actions and strategies in communication. The lack of planning, the interference of political and business interests, the media sensationalism and the inability to mobilize affected communities are continuing challenges to public communication in these moments.Keywords: Public Communication. Communication and crisis. Communication and risk.

    RESUMENLas situaciones crticas, tales como la aparicin de epidemias y desastres naturales requieren un complejo sistema de gestin de crisis, destacando las acciones y estrategias de comunicacin. La falta de planificacin, la injerencia de intereses polticos y empresariales, el sensacionalismo de los medios y la incapacidad para movilizar a las comunidades afectadas siguen retos de la comunicacin pblica en estos momentos.Palabras-clave: Comunicacin pblica. Comunicacin y crisis. Comunicacin y riesgos.

    Submetido em: 11.1.2013Aceito em: 25.2.2013

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    De conceitos e classificaesA repetio dramtica de situaes crticas, com

    danos materiais e humanos significativos, como as enchentes e os consequentes deslizamentos de ter-ra que abalaram Angra dos Reis (RJ) em 2011, com um nmero formidvel de vtimas; a emergncia de epidemias planetrias ou continentais, como a gripe suna e a dengue; a violncia incontrolvel dos tufes, como o Katrina nos EUA, do tsunami na sia e do terremoto no Haiti, dentre muitas outras, tm eviden-ciado a necessidade de um competente processo de gesto de crises.

    Ele deve incorporar complexos e refinados pro-cessos de planejamento que privilegiem a preveno, o esclarecimento e a mobilizao das comunidades atingidas, a resposta imediata do poder pblico para mitigar o seu impacto e, em particular, um sistema de comunicao gil e transparente que promova a circulao ampla das informaes1.1 Segundo o Cred Centro de Pesquisa sobre Epidemiologia de

    Desastres (www.emdat.be), instituio considerada referncia nesse assunto, quase 30 mil pessoas (exatamente 29.782) morreram em 302 desastres naturais (furaces, secas, inundaes, terremotos etc.) em 2011. O Brasil, segundo a mesma fonte, apenas em janeiro de 2011, registrou 900 mortes por enchentes e deslizamentos. O maior nmero de vtimas por desastres naturais no perodo ocorreu no Japo em virtude do tsunami que provocou acidente nuclear em Fukushima (cf. RIGHETTI, 2012).

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    Wilson Costa Bueno

    As situaes crticas, comumente denominadas desastres2, obedecem a uma ampla e detalhada classificao e podem ter um perfil diverso a partir de sua origem, evoluo ou intensidade3.

    No que se refere sua origem ou causa primria, os desastres so tradicionalmente divididos em duas grandes modalidades: desastres naturais ou humanos.

    Os desastres naturais podem ser de quatro tipos:a) os de origem sideral, que dizem respeito ao

    impacto na superfcie da Terra de corpos vindos do espao, como os meteoritos;

    b) os relacionados com a geodinmica terrestre externa, ou seja, provocados por fenmenos atmos-fricos (meteorolgicos e/ou hidrolgicos), como os furaces, tornados, ciclones, avalanches ou nevas-cas, enchentes ou inundaes, estiagens ou secas ou mesmo incndios florestais;

    c) os associados geodinmica terrestre inter-na, como os relacionados com a sismologia (terre-motos, maremotos e tsunamis), com a vulcanologia (facilmente identificveis com a ao de vulces), ou com a geomorfologia, o intemperismo, a eroso e a acomodao do solo (deslizamentos, eroso do solo as conhecidas voorocas), as eroses marinhas ou fluviais e mesmo o soterramento por dunas e

    2 Segundo o Glossrio de defesa civi l: estudos de riscos e medicina de desastres, publicado em 2009 pelo Ministrio da Integrao Nacional/Secretaria Nacional de Defesa Civil, pgina 40, desastre o resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, sobre um ecossistema (vulnervel), causando danos humanos, materiais e/ou ambientais e conseqentes prejuzos econmicos e sociais.

    3 Uma classificao detalhada dos desastres pode ser encontrada no documento intitulado Poltica Nacional de Defesa Civil, editado em 2008 pelo Ministrio da Integrao Nacional/Secretaria Nacional de Defesa Civil, s pginas 39-67.

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    Gesto e estratGias de comunicao em situaes crticas

    d) os relacionados com os desequilbrios na bio-cenose (tipificados principalmente pelas chamadas pragas animais ou vegetais).

    Os desastres humanos, por seu turno, tambm so divididos em trs tipos, a saber:

    a) de natureza tecnolgica (relativos constru-o civil, aos meios de transporte, a incndios em instalaes industriais, a produtos perigosos, a colapso ou exaurimento de energia ou poluio);

    b) de natureza social (que envolvem convulses sociais, conflitos blicos, degradao dos recursos naturais) e

    c) de causas biolgicas (derivados da dissemina-o de doenas transmitidas por vrias fontes gua, alimentos, sangue ou secrees orgnicas contami-nadas, por insetos ou animais etc.).

    Mais recentemente, passou-se a admitir que, na prtica, um conjunto expressivo dos desastres pode ser pensado como misto porque, na verdade, resul-tam da conjugao de fatores naturais ou humanos, como os decorrentes da degradao da camada de oznio da ionosfera, do aumento dos gases de efeito estufa, pela ocupao desordenada do solo, pela construo inadequada de barragens etc.

    Os desastres tambm podem ter perfil diverso em funo de sua evoluo ou intensidade.

    Quanto sua evoluo, podem ser classificados como sbitos ou de evoluo aguda, como normal-mente acontece com os deslizamentos, enxurradas, terremotos ou erupes vulcnicas; ou de evoluo crnica ou gradual, como poluio do ar, da terra e da gua, seca ou eroso, ou ainda pela conjugao de efeitos parciais, como acidentes de trabalho ou de trnsito, ou em algumas epidemias, como clera ou malria, por exemplo.

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    Wilson Costa Bueno

    No que diz respeito sua intensidade, os desas-tres so classificados em acidentes, desastres de m-dio porte, de grande porte e de muito grande porte. Os de grande porte acabam gerando a decretao das chamadas situaes de emergncia (que cau-sam danos geralmente suportveis comunidade atingida) e os de muito grande porte, as situaes de calamidade pblica (que provocam srios danos comunidade, afetando sua incolumidade e a vida de seus integrantes). No Brasil, a decretao de situ-aes de emergncia e de calamidade pblica s pode ser feita pelo poder pblico.

    H ainda outras tipologias, ou classificaes, para caracterizar os desastres ou situaes crticas, mas, dado o espao deste texto, adotaremos as anterior-mente citadas.

    importante, porm, ter clara a distino entre alguns termos ou conceitos largamente utilizados em situaes crticas, como risco, dano e ameaa por-que, embora sejam muitas vezes, assumidos como sinnimos, eles apresentam aspectos distintivos, con-forme entendimento da literatura correspondente, nacional ou internacional.

    Assim, como acentua o documento que explicita a Poltica Nacional de Defesa Civil, temos:

    Risco a medida de danos ou prejuzos potenciais, expressa em termos de probabilidade estatstica de ocorrncia e de intensidade ou grandeza das conse-quncias previsveis.Dano representa a perda humana, material ou am-biental, fsica ou funcional, que pode resultar, caso seja perdido o controle sobre o risco.Ameaa a estimativa de ocorrncia e magnitude de um evento adverso, expressa em termos de proba-bilidade estatstica de concretizao do evento e da

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    Gesto e estratGias de comunicao em situaes crticas

    provvel magnitude de sua manifestao. (MINISTRIO DA INTEGRAO NACIONAL, 2008, p. 11).

    A percepo do risco aspecto fundamental na anlise das situaes crticas e, como poderemos perceber mais diante, representa um componente essencial no processo de preveno. Ela tem a ver com a prontido exigida das autoridades para impe-dir ou atenuar os desastres e com a capacidade de mobilizao das comunidades que potencialmente podero ser por eles afetadas. Um sistema de comu-nicao competente para situaes crticas deve ser capaz de alertar autoridades e comunidades sobre o risco, colocando-as em estado de ateno.

    Ter cincia dos riscos primordial para o siste-ma de gesto de crises porque permite a adoo de procedimentos para evitar ou minimizar as perdas (humanas ou materiais) e contribui para o compro-metimento das comunidades na sua soluo.

    a gesto das situaes crticasComo todo planejamento de crise, a gesto dos

    desastres inicia-se antes de sua ocorrncia e deve englobar pelo menos trs etapas: a preveno da situao crtica, que inclui a avaliao dos riscos (anlise detalhada das ameaas, conhecimento do grau de vulnerabilidade do ecossistema e da po-pulao que pode ser potencialmente afetada), a adoo de medidas que permitam reduzir os riscos concretamente identificados e otimizar a resposta aos desastres, caso eles ocorram; o enfrentamen-to do desastre, que abrange a implementao de um sistema para avaliar o impacto do desastre, dar assistncia s pessoas ou comunidades vitimadas (resgatar pessoas ou propiciar seu tratamento no

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    caso de epidemias) e a reconstruo do ambiente atingido, visando devolver a ele suas condies ple-nas de funcionamento, com o restabelecimento dos servios pblicos e do ecossistema, realocamento de pessoas que perderam suas moradias e isolamento das reas de risco etc.

    H diferenas importantes entre a gesto das situaes crticas, tendo em vista sua origem ou na-tureza. Assim, no caso de epidemias, notadamente quando elas assumem propores globais, h um esforo internacional para impedir a circulao de pessoas que possam estar contaminadas, a identifi-cao do agente responsvel e, quando for o caso, a mobilizao para identificar ou pesquisar formas de atenuar o seu impacto na sade e na vida das pessoas, ou para aumento de produo e distribui-o de medicamentos. Busca, tambm, encontrar servios de assistncia (hospitais, por exemplo) que possam atender situao especfica e mesmo isolar os pacientes, se a situao crtica referir-se ao de doenas contagiosas. Quando ocorre um desastre natural tpico (enchentes com gran-des deslizamentos de terra, terremotos, tsunamis, incndios florestais etc.), implanta-se, de imediato, no local da ocorrncia, um Sistema de Comando em Operaes (SCO), que tem uma metodologia especfica, com procedimentos e protocolos pre-viamente determinados.

    o sistema de Comando em operaesPode-se definir o Sistema de Comando em Ope-

    raes (SCO) como uma ferramenta de carter ad-ministrativo, ou gerencial, que objetiva favorecer o atendimento a situaes crticas e caracteriza-se pela

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    Gesto e estratGias de comunicao em situaes crticas

    resposta imediata, padronizao das aes e uma viso sistmica. A implementao do SCO por oca-sio dos desastres acarreta uma srie de vantagens e benefcios (MINISTRIO DA INTEGRAO NACIONAL, 2010, p. 24):

    a) fornece um modelo de gerenciamento padroniza-do para situaes crticas de qualquer natureza ou tamanho;b) permite que pessoas de diferentes organizaes se integrem rapidamente em uma estrutura de gerencia-mento comum;c) facilita a integrao das comunicaes e o fluxo de informaes, melhorando os trabalhos de inteligncia e planejamento;d) fornece apoio logstico e administrativo para o pes-soal operacional;e) melhora a articulao do comando com elementos internos e externos operao, facilitando relaes;f) agrega valor operao evitando a duplicao de esforos e ampliando a segurana dos envolvidos.

    O modelo de Sistema de Comando em Ope-raes foi concebido, originalmente, nos EUA na dcada de 1970 e est associado ocorrncia de uma srie de incndios florestais que devastaram a Califrnia naquele perodo. O sucesso do sistema fez com que ele fosse ampliado, com sua adoo por importantes instituies norte-americanas, como as academias de bombeiros, as agncias policiais e ser-vios de emergncia na rea da sade. Ele mostrou--se til, inclusive, durante os atentados terroristas em Nova York, em 11 de setembro de 2001. O SCO tem sido empregado tambm no Brasil, h algum tempo, por coordenadorias de Defesa Civil, por corpos de bombeiros e disseminado, por exemplo, pela Secre-

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    taria Nacional de Segurana Pblica e pelo Ministrio do Meio Ambiente4.

    interessante perceber que o modelo tradicional de SCO contempla uma srie de aspectos que dizem respeito integrao da comunicao em situaes crticas e postula princpios e competncias necess-rios ao desenvolvimento de algumas funes.

    O Manual de Gerenciamento de Desastres, docu-mento bsico para orientar as aes em situaes cr-ticas, editado pelo Ministrio da Integrao Nacional/Secretaria Nacional de Defesa Civil, refere-se, explici-tamente, a duas modalidades de gerenciamento que devem merecer ateno especial: o gerenciamento integrado das comunicaes e o gerenciamento in-tegrado de informaes e inteligncia.

    O gerenciamento integrado das comunicaes admite a necessidade e destaca a importncia da adoo de um sistema de comunicao integrada durante toda a operao em situaes de desastres, postulando a elaborao de um plano de comunica-es e o estabelecimento de redes de comunicao.

    O gerenciamento integrado de informaes e in-teligncia prev a captao, anlise e disseminao das informaes (dados meteorolgicos, socioecon-micos e culturais, esclarecimento sobre as causas dos acidentes etc.) de modo a permitir que a coordena-o do SCO esteja respaldada em dados precisos e confiveis, mas possa transmiti-los com preciso para os pblicos de interesse envolvidos (comunidade, au-toridades, imprensa etc.).

    4 O Ceped Centro Universitrio de Estudos e Pesquisas sobre Desastres, vinculado Universidade Federal de Santa Catarina, promove cursos de capacitao para o SCO e um manual bsico pode ser encontrado em .

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    Gesto e estratGias de comunicao em situaes crticas

    Uma das funes previstas no SCO a de infor-mao ao pblico e o sistema adotado em nosso pas (que repete experincias de outros lugares) incorpora a figura do coordenador de informaes ao pbli-co, que tem como principais atribuies:

    a) obter informaes sobre a emergncia ou situao crtica e o SCO;b) produzir informes sobre a situao crtica e a ope-rao, to logo quanto possvel;c) estabelecer locais e horrios para a divulgao das informaes;d) assumir pessoalmente ou identificar algum prepa-rado para ser o porta-voz da operao (pessoa que fale sobre o evento na mdia);e) estabelecer contatos regulares com a mdia para fins de disseminao de informaes;f) observar as restries para a divulgao de infor-maes estabelecidas pelo comando da operao;g) obter a aprovao dos informes antes de serem divulgados na mdia;h) organizar coletivas e intermediar o contato do co-mando com integrantes da imprensa em geral;i) controlar o acesso de integrantes da mdia na rea de operaes. (MINISTRIO DA INTEGRAO NACIO-NAL, 2010, p. 42-43).

    O SCO prev, inclusive, um local especfico para funcionar, em determinadas situaes crticas5, como centro de informao ao pblico e que, preferivel-mente, deve situar-se na chamada rea ou zona fria do desastre, que deve primar pela segurana dos que nela atuam e dispor de algumas facilidades para

    5 Recomenda-se um centro de informao ao pblico com maiores recursos no caso de grandes desastres onde a afluncia da mdia intensa em virtude, inclusive, da necessidade de divulgao rpida e ampla de informaes para atender aos interesses da comunidade atingida e da opinio pblica.

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    garantir o bom trabalho da imprensa (disponibilidade de energia eltrica, comunicaes, espao para a realizao de entrevistas coletivas etc.).

    A gesto de situaes crticas, no caso de epi-demias ou acidentes que digam respeito especifica-mente sade, pode, ou no, pressupor tambm um sistema de comando em operaes e, certamente, se esse for o caso, eles devem obedecer aos princpios bsicos j expostos.

    Em momentos de pico das epidemias de den-gue, como tem acontecido nos ltimos anos, parti-cularmente na cidade do Rio de Janeiro, o Governo v-se obrigado a providenciar estruturas alternativas (tendas, apoio do exrcito etc.) para dar conta do contingente de pessoas doentes e, nestes casos, pode ser justificada a implantao de um SCO em determi-nados locais e um trabalho competente e profissiona-lizado de comunicao para esclarecer a populao e dar encaminhamento dos pacientes para os locais de atendimento.

    Durante o surto da chamada gripe suna, a ges-to inadequada das autoridades e a postura irres-ponsvel de determinados laboratrios farmacuticos, bem como o sensacionalismo da mdia, acabaram evidenciando o precrio gerenciamento desta situ-ao crtica, com prejuzos para a sade pblica e para o Pas de maneira geral. Compras abusivas de medicamentos foram realizadas indevidamente e os estoques mantiveram-se elevados em quase todo o mundo, para satisfao dos fabricantes que se apro-veitaram da situao para aumentar formidavelmente seus lucros. Houve, inclusive, denncias de compro-metimento da prpria Organizao Mundial da Sade (OMS) com a chamada Big Pharma6.6 Expresso utilizada para designar os principais representantes

    da indstria farmacutica.

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    Gesto e estratGias de comunicao em situaes crticas

    a comunicao em situaes crticasA comunicao desempenha papel fundamental

    no processo global de gerenciamento de situaes crticas, permeando suas vrias etapas. De imedia-to, preciso ressaltar, como explicita a literatura que contempla a gesto de crises7, a importncia da preveno, isto , aes, processos, estratgias destinados a impedir que os problemas potenciais tornem-se realidade. Na maioria dos casos, as crises explodem porque as organizaes e seus gestores no dispem de um planejamento que contemple os riscos e as formas adequadas de enfrent-los. Elas no atuam preventivamente, mas apenas buscam minimizar as crises depois que elas foram deflagradas, o que, como sabemos, torna as solues menos geis e mais dispendiosas.

    A comunicao efetivamente estratgica pressupe um trabalho de planejamento para gerenciar momen-tos difceis, como toda crise costuma ser. H vrios processos, aes e estratgias que devem ser defini-dos, elaborados e implementados visando prevenir, gerenciar ou mesmo evitar as crises. No podemos ignorar que muitas delas so, basicamente, crises de comunicao ou que so aprofundadas por m ges-to da comunicao. A crise da Coca-Cola na Europa e o episdio da plula da farinha no Brasil foram, sem dvida, exemplos emblemticos de como a co-municao no transparente, no profissional, pode gerar ou incendiar a crise. E haja bombeiro quando isso acontece! (BUENO, 2009, p. 144).

    7 Ver, por exemplo, os trabalhos de Rosa (2001; 2003; 2006), Barbeiro (2010), Neves (2002), Luecke (2007), Sina (2005) e Bueno (2009) sobre gesto de crises, em particular sobre o processo de comunicao em momentos de crise.

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    Muitas organizaes no incluem a comunicao como prioridade no processo de planejamento para as crises e encontram dificuldades, s vezes insupe-rveis, para interagir com seus pblicos de interesse no momento em que elas ocorrem, quase sempre permanecendo a reboque dos acontecimentos. So, por isso, pautadas pela mdia e, dependendo da si-tuao crtica em que se veem envolvidas, acabam batendo cabea com sindicatos, consumidores, investidores ou entidades de defesa do consumidor, tornando-se refns do torvelinho informativo que cos-tuma caracterizar esses momentos.

    No caso de desastres, como os que temos indi-cado neste texto, que tm impacto significativo na vida das comunidades e dos cidados em particular, a ausncia de um planejamento em comunicao contribui para o desencontro de informaes, para leituras ambguas dos fatos e, sobretudo, para que o pnico se estabelea, comprometendo o esforo de resposta e de mitigao dos danos e prejuzos.

    O planejamento em comunicao, para dar con-ta de situaes crticas, deve, prioritariamente, estar centrado na disseminao de informaes de quali-dade com o objetivo de aumentar a percepo dos riscos e conseguir o comprometimento da comunida-de, dos governos, da sociedade civil com sua soluo.

    Ao mesmo tempo em que os setores responsveis promovem o mapeamento das reas e situaes de risco e estabelecem condies adequadas para a reduo das vulnerabilidades, o esforo de comuni-cao deve ser dirigido para formar, informar e mo-bilizar os interessados, com o objetivo de minimizar o impacto provocado pelos desastres. Para tanto, indispensvel contar com o apoio da mdia, das

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    Gesto e estratGias de comunicao em situaes crticas

    instituies (escolas, igrejas, empresas) que podem, preventivamente, esclarecer os cidados sobre os riscos, impedindo que eles se agravem, ou mesmo se originem pela ao impensada de representantes das comunidades.

    Muitas tragdias acontecem porque pessoas desavisadas tomam medidas que colocam em risco seus vizinhos (e elas prprias e seus familiares), como construir casas s margens de rios ou em encostas inseguras, improvisar instalaes eltricas (o que tem provocado incndios de grandes propores em fa-velas nas grandes cidades), e assim por diante. A circulao de informaes qualificadas pode, tam-bm, orientar as pessoas no caso da ocorrncia de desastres, favorecendo o processo de evacuao das reas ou locais de risco, aumentando a eficcia dos processos de socorro e assistncia s vtimas etc.

    Pode ser importante, para os gestores das situa-es crticas, tomar conhecimento dos erros e solu-es que foram percebidos/adotados em situaes anteriores e, por isso, recomenda-se sempre o ben-chmarking das experincias acumuladas. H desafios considerveis para o trabalho de comunicao em desastres porque, quase sempre, a percepo e a reduo dos riscos e vulnerabilidades esbarram em barreiras culturais, lingusticas etc. Algumas comuni-dades assumem uma perspectiva fatalista em rela-o aos desastres e imaginam-nos como resultado da vontade divina (isso aconteceu porque Deus quis), abrindo mo de sua responsabilidade em relao a eles. H uma mudana cultural que precisa ser im-plementada em boa parte dos casos, de tal modo que a Poltica Nacional de Defesa Civil prev, em uma de suas propostas para o enfrentamento das

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    situaes crticas, aes especficas neste sentido. Ela reconhece a necessidade de desenvolvimento de projetos de mudana cultural que se baseia, en-tre outros, nos seguintes fundamentos: a) todos tm direitos e deveres e a segurana contra os desastres resultado de um esforo coletivo; b) os cidados devem estar conscientes da necessidade de partici-par de um sistema de segurana que os proteja dos desastres e que aes ou omisses humanas contri-buem para agrav-los ou provoc-los; c) os cidados devem estar dispostos e comprometidos a no per-mitir que outras pessoas, por seus atos, provoquem e agravem os desastres8.

    A comunicao competente contribui tambm para tornar claro para as comunidades envolvidas em desastres (bem como para a mdia e outros inte-ressados) quais so as fontes que podem, com cre-dibilidade, prestar informaes sobre o ocorrido, evi-tando que as chamadas fontes oportunistas, comuns nesses momentos, possam valer-se da situao para disseminar a desinformao ou mesmo o pnico. Esse esforo legitima as autoridades (que, evidentemente, devem ter credibilidade junto s comunidades) res-ponsveis pela gesto das situaes crticas, criando uma relao de confiana, indispensvel para o en-caminhamento de solues e para o comprometi-mento dos cidados.

    Postula-se, em situaes crticas, a adoo de um processo de comunicao integrada, criando condies para a articulao entre os vrios rgos

    8 Ver a respeito o projeto 10, intitulado Projetos de Mudana Cultural, inserido na Poltica Nacional de Defesa Civil, conforme documento editado pelo Ministrio da Integrao Nacional/Secretaria Nacional de Defesa Civil, em Braslia, em 2008, pginas 28 e 29.

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    que integram o Sistema de Defesa Civil, o que per-mite a conjugao de esforos, a minimizao de problemas e mesmo a reduo de rudos de comu-nicao pela ausncia de um comando e de um discurso unificados.

    o protagonismo da comunidade e dos lderesA mobilizao da comunidade e de seus lderes,

    tendo em vista prevenir ou minimizar o impacto dos desastres, pressupe que o processo de comunicao a ser adotado tenha, como atributos bsicos, o profis-sionalismo, a tica e a transparncia, no assumindo os cidados como objetos ou como pblicos-alvo, mas como protagonistas. Isso significa admitir como natural a diversidade (sociocultural, econmica, lingustica) e estar empenhado em um dilogo franco e construtivo.

    A comunidade deve participar ativamente do processo de planejamento (inclusive em comunica-o) voltado para situaes crticas porque, sem sua participao efetiva, as respostas aos desastres po-dem ocorrer com menor agilidade, incorrer em equ-vocos ou enfrentar resistncias.

    Na maioria dos casos, a mobilizao e o compro-metimento dos cidados ocorrem apenas (ou mais intensamente) a partir da participao de seus lde-res, e isso tem a ver com sua identificao com a comunidade, o conhecimento de suas demandas e expectativas e mesmo a adequao de seu discurso. Muitas vezes, por absoluta falta de sensibilidade, as autoridades que respondem pela gesto dos desas-tres assumem uma perspectiva arrogante, autoritria e, com isso, encontram a oposio dos envolvidos. H, voluntria ou involuntariamente, em razo des-ta postura de distanciamento, um boicote ou no

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    Wilson Costa Bueno

    comprometimento com as solues, dificultando a realizao das operaes durante o desenvolvimento das situaes crticas.

    Durante os desastres, as pessoas afetadas esto fragilizadas, tm dificuldade para agir racionalmente e, portanto, ser sempre razovel valer-se de pessoas prximas, em quem elas confiam, para orient-las, mobiliz-las, tendo em vista a soluo rpida e ade-quada dos problemas. Algumas culturas so arredias a estranhos, no toleram ordens sem que estejam plenamente justificadas (e essas justificativas devem estar inseridas em seu contexto, em sua percepo do mundo etc.) e recusam interferncias em sua ro-tina de vida, em sua privacidade etc.

    Os lderes, quando reconhecidos e respeitados, tendem a colaborar com o processo de gerenciamen-to de desastres porque, em princpio, tm obrigaes junto comunidade, esto com elas identificados (porque, obviamente, pertencem a ela) e sabem en-caminhar adequadamente solues que no atentem contra a vontade e a aspirao dos cidados.

    a parceria com a mdiaOs meios de comunicao desempenham papel

    primordial no sistema de gerenciamento de desastres porque so acessados antes, durante e depois de sua ocorrncia, constituindo-se, muitas vezes (sobretudo para quem est distante dos fatos), nas fontes nicas de informao sobre os acontecimentos.

    O problema reside no fato de que a mdia no tem necessariamente os mesmos objetivos dos que coordenam os processos de gesto de situaes crti-cas e, recorrentemente, busca espetacularizar os fatos com o intuito de atrair ou aumentar a audincia. Para

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    tanto, ela no se compromete com a qualidade da informao; pelo contrrio, dramatiza os fatos, ma-nipula os dados e estatsticas, quase sempre aumen-tando o impacto dos desastres (nmero de vtimas, prejuzos materiais etc.) e, com isso, contribuindo para aumentar a insegurana e o medo.

    O acontecimento relatado pelo jornalismo (e os desastres so acontecimentos) no tem a ver, obri-gatoriamente, com a realidade dos fatos porque a imprensa est contaminada pela subjetividade, pela interpretao, e lcito afirmar que, em muitos casos, os jornalistas enxergam o que querem ver. Como es-clarece Felipe Pena (2010, p. 73-74), os jornalistas se valem de uma cultura prpria para decidir o que ou no notcia e a noticiabilidade tem a ver com uma srie de valores-notcia, como acentua Wolf (2002), dos quais os mais importantes so os inseridos nas chamadas categorias substantivas, como a im-portncia dos envolvidos, a quantidade de pessoas envolvidas, o interesse nacional, o interesse humano, os feitos excepcionais.

    fcil perceber que alguns desses valores-no-tcia assumem grande intensidade por ocasio dos desastres porque costumam envolver muitas pessoas (o grande tsunami na sia vitimou centenas de mi-lhares de pessoas) de maneira inusitada, despertam o interesse da opinio pblica (h situaes crticas, como tsunamis, acidentes nucleares, maremotos e terremotos etc. que impactam o mundo todo), incor-poram o drama da vida humana em sua plenitude e permitem a expresso de feitos excepcionais (relatos pungentes de pessoas que so retiradas dos escom-bros, de heris annimos que se destacam nesses momentos etc.).

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    A mdia no est, em geral, capacitada, mesmo quando demonstra boa vontade, para cobrir estas situaes crticas e, involuntariamente, pode compro-meter sua gesto.

    Profissionais de imprensa acabam envolvendo-se com os fatos (e os relatos) e, no calor da cobertura, ouvem fontes que no tm qualquer credibilidade, ou tm interesse em disseminar suas verses pessoais, testemunhas muitas vezes no confiveis, que cons-troem cenrios imaginrios e identificam personagens que nunca existiram.

    A gesto da comunicao em desastres deve admitir que a preciso da informao tambm sofre abalos em situaes crticas e que qualificar a informa-o, nestes momentos, , portanto, uma rdua tarefa.

    Esforos tm sido realizados para capacitar os jornalistas, e a esse respeito digno de louvor o tra-balho realizado pelo Centro Universitrio de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (Ceped), da Universidade Federal de Santa Catarina, que em 2010 organizou um curso a distncia de Comunicao de Riscos e Desastres, com o apoio do Ministrio da Integrao Nacional/Secretaria Nacional de Defesa Civil9.

    Alguns cuidados devem ser observados pelos res-ponsveis pela gesto da comunicao em desastres, como a capacitao dos porta-vozes, a exigncia de um discurso unificado, a checagem cuidadosa dos dados e informaes etc.

    Os porta-vozes tm um papel importante duran-te o desenvolvimento da operao de resposta aos desastres e devem estar disponveis e capacitados imediatamente aps sua ocorrncia. Na prtica, eles 9 Ver informaes sobre o curso em .

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    precisam ter o perfil adequado e capacitao para o desempenho desta funo estratgica, o que im-plica dizer que devem ter um conhecimento mais do que bvio sobre o sistema de produo e a cultura jornalsticas10, serem capazes de responder compe-tentemente s demandas da mdia em momentos de grande presso, estarem articulados com as v-rias instncias de deciso11 e exibirem competncia como comunicadores.

    Sugere-se que os porta-vozes sejam identificados j no momento do planejamento prvio do processo de comunicao em desastres e possam passar por um programa de treinamento conhecido por media training, cada vez mais comum nas organizaes p-blicas e privadas. Em situaes crticas as tenses che-gam a um nvel insuportvel e os porta-vozes devem estar suficientemente preparados para enfrent-las.

    Um instrumento importante para subsidiar o traba-lho de gesto da comunicao em desastres, nota-

    10 A pressa, a ansiedade, o sensacionalismo e a impreciso so atributos deste sistema de produo. A cultura jornalstica, por seu turno, repudia a arrogncia, o autoritarismo e muito sensvel tentativa de cercear o trabalho dos jornalistas, ainda que, em alguns casos, isso possa ser necessrio em funo da sua prpria segurana. Na nsia de conseguir um furo jornalstico, uma boa foto, o jornalista pode ficar exposto a grandes riscos e eles so reais em situaes crticas.

    11 Muitas vezes, os desastres com dimenso nacional acabam envolvendo, no apenas autoridades locais, mas regionais ou federais e no incomum perceber que porta-vozes so sistematicamente desautorizados aps emitirem as suas opinies sobre o ocorrido. Alguns porta-vozes desconhecem a legislao especfica, confundem conceitos bsicos como os apresentados no incio deste trabalho e fazem julgamentos sem o respaldo de dados confiveis. No jogo poltico que pe em confronto representantes de partidos polticos diversos a inteno , nesses momentos, de creditar ao adversrio a responsabilidade pelo ocorrido.

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    damente no que diz respeito ao relacionamento com a mdia, dispor de um banco de dados atualizado com a relao dos principais veculos e espaos de divulgao jornalstica, bem como de profissionais de imprensa, de que se possa lanar mo na ocorrncia de um desastre. Este banco de dados deve incor-porar, obrigatoriamente, os meios de comunicao locais e regionais porque eles tero um papel funda-mental na cobertura dos desastres e podem, efeti-vamente, constituir-se em parceiros para o processo de esclarecimento e mobilizao das comunidades, favorecendo o bom andamento da operao.

    No caso das epidemias ou de riscos iminentes sade pblica, os meios de comunicao podem ser aliados inestimveis no processo de preveno e esclarecimento junto opinio pblica, assim como podem prejudicar dramaticamente o processo de co-municao. A Organizao Mundial da Sade (OMS ou WHO, em ingls) tem dado ateno especial ao trabalho de interao com a imprensa e dispe de um manual bastante detalhado para subsidiar o tra-balho das entidades pblicas e dos governos12.

    o jogo de interesses e os lobbiesO Sistema Nacional de Defesa Civil (Sindec), que

    tem atuao na reduo de desastres em todo o Pas, integrado por uma srie de rgos federais, estaduais e municipais e ainda incorpora entidades privadas, organizaes no governamentais e asso-ciaes (de clube, de voluntrios, comunitrias).

    12 O trabalho, publicado em 2005, em ingls, com o ttulo Effective Media Communication during Public Health Emergencies: a WHO Handbook, tem uma verso em portugus, intitulada Comunicao eficaz com a mdia durante emergncias de sade pblica: um manual da OMS, editada pelo Ministrio da Sade, em 2009.

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    Na prtica, isso significa que o Sindec exige ar-ticulao entre vrias instncias do poder poltico, econmico, administrativo e da sociedade civil e, portanto, possvel aquilatar os desafios envolvidos neste processo.

    A conjuntura poltica brasileira caracterizada por um nmero amplo de partidos que assumem posies nem sempre coincidentes em suas representaes pelos vrios estados brasileiros, estabelecem alianas locais e regionais que antagonizam com a direo central e assim por diante. Com raras excees, h uma alternncia partidria no poder poltico brasileiro e um embate permanente tendo em vista, inclusive, a realizao de eleies majoritrias a cada dois anos.

    Esta situao gera tenses que podem ser im-portantes durante o desenrolar das situaes crticas pela sobreposio de aes e conflitos de autorida-de, pela multiplicao de falas e comandos e pela disposio das figuras polticas de creditar aos ad-versrios a parcela maior de responsabilidade pelos desastres. Prefeitos e secretrios municipais (notada-mente os que respondem pela sade, meio ambiente, defesa civil/segurana) costumam culpar seus ante-cessores pela ocorrncia de uma situao crtica, notadamente quando pertencentes a outro partido poltico, ou, at mesmo, quando adversrios, ainda que do mesmo partido ou da base de sustentao do Governo. Dependendo da magnitude do desastre e de seu impacto na comunidade, notadamente em perodos prximos s eleies (quando a memria do cidado/eleitor ainda retm a dimenso da tragdia, particularmente se ela o envolveu ou sua famlia ou conhecidos recentemente), a m gesto ou a responsabilidade pelo ocorrido pode ter influncia

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    decisiva no desempenho dos candidatos e partidos nos pleitos futuros. Explica-se, portanto, a disposio das autoridades de no assumirem a responsabilidade (direta ou indireta) pelo problema, ou de credit-la a outro, especialmente se for um adversrio poltico.

    H uma tendncia manifesta de, mesmo em eventos marcadamente locais, e que deveriam ser previstos e gerenciados pelas autoridades do muni-cpio com a participao da comunidade, de fazer com que esta ltima acredite que a questo (motivos e solues para os desastres) esteja afeta admi-nistrao federal, com o objetivo de descartar sua relao com os desastres. Esse embate acaba ocor-rendo pela mdia, com a consequente desarticulao do Sistema que, fragmentado pela disputa poltica, perde agilidade e eficcia para dar resposta ade-quada aos desastres.

    A gesto da comunicao em desastres no pode ignorar estas circunstncias e deve trabalhar a partir delas, buscando, insistentemente, comprome-ter todos os integrantes para um trabalho integrado que descarte os caprichos polticos e as ambies pessoais em nome do interesse pblico.

    Os desafios da comunicao em desastres extra-polam, portanto, a competncia tcnica e, muitas vezes, localizam-se em territrios distantes do campo da comunicao pblica ou organizacional nos quais os gestores de comunicao costumam experimentar um razovel desconforto.

    Quem est no olho do furaco precisa tomar medidas urgentes, com grande preciso, para no ser tragado pelas circunstncias. A comunicao em desastres sempre um embate heroico contra o tem-po, as intempries e as fatalidades. A transparncia, a

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    capacitao profissional e o planejamento adequado tm permitido, apesar das tenses e dos abalos inevi-tveis, que os gestores de comunicao saiam ilesos quando as situaes crticas acontecem. Sem estes instrumentos e competncias, provavelmente eles, como as vtimas dos desastres, tambm sucumbiriam.

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