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As Relações Luso-brasileiras

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As Relações Luso-brasileiras
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18/9/2014 As relações luso-brasileiras http://www.gutenberg.org/files/30424/30424-h/30424-h.htm 1/88 The Project Gutenberg EBook of As relações luso-brasileiras, by José Barbosa This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.net Title: As relações luso-brasileiras a immigração e a «desnacionalização» do Brasil Author: José Barbosa Release Date: November 8, 2009 [EBook #30424] Language: Portuguese Character set encoding: ISO-8859-1 *** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK AS RELAÇÕES LUSO-BRASILEIRAS *** Produced by Rita Farinha, Chuck Greif and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This book was created from images of public domain material made available by the University of Toronto Libraries (http://link.library.utoronto.ca/booksonline/).) Nota de editor: Devido à existência de erros tipográficos neste texto, foram tomadas várias decisões quanto à versão final. Em caso de dúvida, a grafia foi mantida de acordo com o original. No final deste livro encontrará a lista de erros corrigidos. Rita Farinha (Nov. 2009) JOSÉ BARBOSA As relações luso-brasileiras
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18/9/2014 As relações luso-brasileiras

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The Project Gutenberg EBook of As relações luso-brasileiras, by José Barbosa

This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and withalmost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away orre-use it under the terms of the Project Gutenberg License includedwith this eBook or online at www.gutenberg.net

Title: As relações luso-brasileiras a immigração e a «desnacionalização» do Brasil

Author: José Barbosa

Release Date: November 8, 2009 [EBook #30424]

Language: Portuguese

Character set encoding: ISO-8859-1

*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK AS RELAÇÕES LUSO-BRASILEIRAS ***

Produced by Rita Farinha, Chuck Greif and the OnlineDistributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (Thisbook was created from images of public domain materialmade available by the University of Toronto Libraries(http://link.library.utoronto.ca/booksonline/).)

Nota de editor: Devido à existência de errostipográficos neste texto, foram tomadas várias decisõesquanto à versão final. Em caso de dúvida, a grafia foimantida de acordo com o original. No final deste livroencontrará a lista de erros corrigidos.

Rita Farinha (Nov. 2009)

JOSÉ BARBOSA

As relações luso-brasileiras

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LISBOA

1909

JOSÉ BARBOSA

As relações luso-brasileiras

(A immigração e a «desnacionalização» doBrasil)

LISBOA

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EDIÇÃO DE JOSÉ BARBOSARUA DO LORETO, 56, 1.º D.

1909

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

LISBOATYPOGRAPHIA DO COMMERCIO

Rua da Oliveira, 10, ao Carmo

1909

Amicus Plato sed magis amica veritas...

INTRODUCÇÃO

O Brasil já foi uma região mal conhecida. Hoje já onão é. Em todos os centros civilizados deixou de serignorado. Existe, emfim! E não existe sómente porser riquissimo de climas, de flora e de fauna, nempor offerecer, nos seus terrenos inexplorados, largocampo ás ambições insatisfeitas dos povos do VelhoMundo, nem sequer por haver desenvolvido demaneira collossal as suas producções.

Tudo isso torna conhecido o Brasil. Mas o que maislhe propaga o nome é a surpreza causada pela suacultura, ainda ha pouco representada de modoinolvidavel e memorando pelos seus delegados naConferencia de Haya e no Congresso de Hygiene deBerlim, Ruy Barbosa e Oswaldo Cruz.

O que, além disso, não escapa a ninguem é asupremacia que lhe cabe entre as nações sul-americanas, é a funcção de arbitro da paz docontinente, em que o investiram os estadistas daRepublica, entre os quaes se tem de destacar aexcelsa figura de Rio Branco.

Para o Brasil de hoje convergem todos os olhares. [6]

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Deixou de ser a terra do ouro e dos diamantes parase transformar em vasta arena aberta ás maislevantadas especulações da intelligencia e ás maisaudazes e fecundas iniciativas materiaes. O estudo eo trabalho congregam-se para o seu progresso. Aliberdade e a paz social acolhem e protegem osdesherdados que alli vão buscar pão e esperanças...

As sociedades européas, imbuidas de preconceitos eavassalladas pelos privilegios, trancam o futuro ásclasses trabalhadoras. Que lhes resta, senão orecurso da expatriação? O caminho é o Oceano; aChanaan é a America, a livre e egualitaria America,onde o trabalho é toda a nobreza.

Nós, os portugueses, acompanhamos o movimentogeral. A nossa America consiste principalmente noBrasil. Nem podia deixar de ser assim. A raça e alingua são factores decisivos na escolha do destino.

Nenhuma raça revéla maior resistencia do que anossa, nenhuma é mais soffredora e tenaz.

Como, porém, estamos desapparelhados para a luctahodierna pela falta de diffusão do ensino, sóexcepcionaes qualidades ethnicas[1] explicam aposição que ainda cabe á nossa colonia no Brasil.Seria, no emtanto, indigno occultar, neste momento,que essa colonia se encontra sériamente ameaçadapelos nossos concorrentes. Está, aliás, naconsciencia de todos esta verdade, que uns calampara lisonjear a nossa colonia no Brasil e outros pornão lhe vêrem solução deante da criminosapertinacia com que os governos dão tudo ásclientellas politicas e negam, por systema, a esmólado ensino primario aos filhos do contribuintefaminto e esfarrapado!

A obra da escola não se concilia com os interessesdo regimen, não ha duvida; mas recusem ao povo,forçado a emigrar para não morrer de fome, ainstrucção indispensavel para competir com osoutros estrangeiros no Brasil e esperem o resultadono volume das remessas de numerario com queacudimos ao nosso balanço economico!

O recurso das remessas do Brasil e a exportação quepara esse paiz fazemos tornaram-se essenciaes ávida portuguesa. E, como nada se fez para dispensartal dependencia e nada se procurou para asseguraraquelle estado de coisas, a nossa gente laboriosa,conscia dos riscos que corremos, mas sem noçãoexacta do problema, recebe com esperança eenthusiasmo todas as idéas apresentadas por pessoas

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bem intencionadas.

Isso bastaria para explicar o côro das adhesões áproposta do sr. Consiglieri Pedroso[2], se nãointerviessem, no lance, a especial categoria, aillustração e o talento do emérito professor.Discordando, em varios pontos, desse plano deapproximação luso-brasileira, dirigi a s. ex.a umacarta aberta a que o Mundo deu a sua largapublicidade e na qual se lia:

«O estreitamento das relações de Portugal com o Brasil,dada a vontade que nesse sentido revelam os dois povos, émais do que facil, porque é inevitavel, porque está nosdestinos de ambos.

Imaginar, porém, como deduzo dos considerandos de v.ex.a que, precisando nós da seiva do Brasil, temos meiode lhe conferir uma compensação primacial, qual seja ade evitar o risco da desnacionalização que esse povo correpela entrada cada vez maior de outros elementos ethnicos,é erro profundo que os factos condemnam de maneiraformalissima. E, sobre ser um erro, esse juizo levantarácontra Portugal e contra os portugueses a hostilidade dasoutras colonias e das outras raças, alli na mais intimaconvivencia e na mais constante fusão com a gentelusitana e luso-brasileira.

Com tal motivo, qualquer esforço de approximaçãoresultará contraproducente. Não posso, desde que se partedessa base, dar a minha insignificante collaboração a umatentativa que tenho por inefficaz, pelo menos.

O Brasil precisa de milhões de estrangeiros. Não lhospodemos dar. Ha de procural-os em outros paizes. Mas,como é um paiz que se sabe governar e que nunca, nemsob este nem sob o antigo regimen, deixou de demonstrarsentimentos patrioticos e ardor civico, não corre o perigo,que v. ex.a entreviu na colonização italiana e alleman, dese desnacionalizar.

Com mais vagar, em um opusculo, hei de deixardemonstrado quanto estão afastados da realidade os quepensam como v. ex.a. Se houvessemos de iniciarnegociações com a idéa de evitar esse supposto risco,creia v. ex.a que os brasileiros, cuja hospitalidade tivedurante dezeseis annos e cujo espirito conheço, nãoagradeceriam o aliás generoso empenho, porquanto nelleveriam menos apreço pelas qualidades de intelligencia ede patriotismo, de que, com justiça, se ufanam muito maisdo que das riquezas naturaes da sua patria.

Sei que v. ex.a, meu illustre correligionario, só é movidopor altos e nobres estimulos. Estou convencido de que sóá falta de documentos directos e de observação propria se

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póde attribuir o desvio do seu grande espirito critico emmateria em que estudos especiaes dão a v. ex.a merecidaauctoridade.

Felizmente, porém, entre muitas idéas de real utilidadeque constam da proposta de v. ex.a, vejo uma que megarante que o problema, nas suas linhas mestras, tem emv. ex.a o paladino ao lado do qual se poderão alinhar ossoldados da democracia portuguesa e os cidadãos dagrande Republica Brasileira.

Refiro-me á idéa de procurar approximar os dois povospela adopção de um espirito commum na legislação deambos. Nesse ponto estou enthusiasticamente com v. ex.a,porque, não podendo a democracia pura, que é aRepublica dos Estados Unidos do Brasil, seguir aevolução regressiva, essa aspiração impõe-nos, a nósportugueses, a marcha progressiva para a situação juridicado Brasil―o que só poderá ser conseguido por umatransformação politica e social, tão almejada por mimquanto por v. ex.a.

E comprehendo com que intimo constrangimento quemassim sente teria de obedecer ás regras protocolares docargo ao pedir ao joven rei D. Manuel a sua cooperaçãopara um emprehendimento que só póde ser levado a bomtermo pelos dois povos e que só se desentranhará emrealidades promissoras quando a realeza portuguesaconstituir méra recordação historica.

Faço votos por que v. ex.a veja em breve realizadas asnossas aspirações communs. Se, porém, o nosso esforçointerno não chegar para tanto, creia v. ex.a que, para nãofalharem os seus destinos historicos, o Brasil e Portugalse hão de approximar cada vez mais e cada vez maisintensamente a democracia brasileira ha de exercer fatalacção sobre a nação portuguesa, abreviando os dias doregimen monarchico e apressando o advento da RepublicaPortuguesa.

Não ha mais eloquente lição do que a dos factos. Não hamais violenta propaganda do que a comparaçãoantithetica dos povos brasileiro e português. E, cadaportuguês, que volta á patria, não tarda em sentir amagnitude da acção da Republica no Brasil e emreconhecer a falta das instituições a que lá se afizera.

Garanto-o a v. ex.a: se não fizermos a revolução, o Brasilha de republicanizar Portugal. V. ex.a conhece melhor doque eu o poder da osmose social.»

Eis a origem deste trabalho. Julguem brasileiros eportuguêses se as convicções, que elle traduz,carecem de fundamento.

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I

A PROPOSTA CONSIGLIERIPEDROSO

Eis a proposta do presidente da Sociedade deGeographia:

«Considerando que na evolução politica do mundocontemporaneo é facto historico, que se não pódecontestar, a irresistivel tendencia para a unificação moraldos grupos ethnicos, que falam o mesmo idioma, podendoaté por isso definir-se o dominio da lingua, na sua funcçãosocial, como a patria espiritual de uma nacionalidade;

Considerando que nem os mais poderosos Estados logrameximir-se a esta universal tendencia, como o prova omovimento de concentração que no momento actual seestá operando nos povos anglo-saxonicos, nos germanicospropriamente ditos e mesmo nos povos slavos, apezar dasdifferenças de religião e de linguagem que separam estesultimos entre si;

Considerando que, em virtude desta tendencia, é legitimoprevêr-se como irremediavel, em futuro relativamentepouco distante, se não o desapparecimento, pelo menos adesintegração das pequenas nacionalidades que nãoconsigam defender-se, pela massa dos seus habitantes, daabsorpção, consequencia fatal da lucta pela existencia,cada vez mais implacavel entre as grandes nações, que nasua ancia de açambarcamento inquietam os agrupamentossecundarios, embora muito adeantados em cultura;

Considerando que Portugal e Brasil, pela sua origem,historia e tradições, pela lingua que ambos falam, pelaraça a que pertencem e pelos multiplices interesses que osligam, sem embargo do glorioso facto consummado daindependencia brasilica, e, não obstante, portanto, seremduas soberanias politicas separadas e perfeitas, constituemna realidade, em face das outras agremiações nacionaes eexoticas, um grupo áparte, nitidamente delimitado, comindividualidade distincta e, por conseguinte, com umdestino historico completamente autonomo, circumstanciaa que o direito internacional não póde ficar estranho;

Considerando que, na situação de isolamento reciproco,em que se encontram, as duas nações estãocompromettendo a grandeza do papel primacial quedeviam representar no mundo, com grave prejuizo dosinteresses proprios e apenas com vantagem para as nações

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rivaes, que se estão aproveitando habilmente da desuniãode ambas;

Considerando que a grande nação brasileira, não obstanteos quasi illimitados recursos de que dispõe e as brilhantesqualidades dos seus filhos, que se estão impondo áconsideração universal pela sua intelligencia e illustração,pelo seu patriotismo e pela sua actividade, corre o risco dese ir desnacionalizando pouco a pouco pela introducção,cada vez em mais larga escala, de elementos deimmigração estranhos ao seu carater historico e atéantipathicos á sua idiosyncrasia ethnica―provaveiscausadores de futuras perturbações e de inevitaveisperigos para a União;

Considerando que este sério risco de desnacionalizaçãolenta, mas segura, sómente o Brasil póde conjural-o pelaapproximação e relações cada vez mais estreitas comPortugal, possuidor ainda hoje de um rico e vastissimoimperio em Africa, de territorio reduzido na Europa, nãoha duvida, mas berço de uma robusta e prolificapopulação largamente espalhada pelo mundo, deextraordinarias faculdades de adaptação e resistencia,população indispensavel―e não substituivel poroutra―para a conservação e pureza da raça nacional doBrasil;

Considerando mais que o problema da gradual eprogressiva fusão da numerosissima colonia portuguesa,que vive no Brasil, com a terra que lhe dá tão generosahospitalidade é para os futuros destinos da nacionalidadebrasileira de capital e decisiva importancia, mas sómentede solução integral possivel quando as duas nações, hojeseparadas e quasi estranhas uma á outra, se harmonizaremno superior interesse de uma fecunda approximação;

Considerando, por outro lado, que a economia nacionalportuguesa só ao contacto intimo da exuberante seivabrasileira póde robustecer-se e tonificar-se, sendo, alémdisso, fecundissimo campo para a nossa actividadematerial e progredimento moral as vastas regiões cobertaspela gloriosa bandeira auri-verde;

Considerando por isso como verdade evidente, sempossibilidade de discussão sequer, que a resoluçãodefinitiva do problema economico português dependegrandemente―quaesquer que sejam os esforços, asinceridade e a intelligencia que para ella se empreguemdentro das nossas estreitas fronteiras―de plenamente serealizar um forte e largo accordo luso-brasileiro, formulade renascimento mundial da nossa commumnacionalidade;

Attendendo a que a tradicional alliança de Portugal com aInglaterra, base da nossa situação politica internacional,assim como intimas relações de cordealidade com as tresnações latinas, nossas irmans, e com a Allemanha, nossa

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cooperadora em Africa, em coisa alguma são prejudicadaspela unificação moral de Portugal com o Brasil n'umpacto superior, permanente e sui generis, tal como oimpõem os especialissimos laços fraternaes existentesentre as nações que falam a lingua portuguesa;

E, attendendo, finalmente, a que á Sociedade deGeographia de Lisboa, pelos seus fins, pela sua constantetradição e pelo logar proeminente, tão excepcionalmenteem evidencia, que occupa na vida nacional portuguesa,compete, nesta hora difficil para a patria, cooperar, quantoem si caiba, no movimento de renovação do nossoquerido Portugal;

Tenho a honra de propôr que, nos termos do artigo 40.ºdos estatutos, se crie uma commissão geral permanentecom o titulo de «Commissão Luso-brasileira» a qual terá,entre outros, os seguintes fins:

1.º―Estudar a forma mais adequada de se realizaremcongressos periodicos luso-brasileiros, que devam, emprazos a fixar, reunir-se alternadamente em Lisboa ouPorto e no Rio de Janeiro ou outras cidades brasileirascom o intuito de discutir todos os assumptos de ordemintellectual e economica que interessem em commum eexclusivamente as duas nações, e onde haja de fazer-se apropaganda das deliberações que pelos mesmoscongressos e pelos governos dos dois paizes tenham deser tomadas a beneficio de ambos os povos, respeitando-se escrupulosamente a independencia de cada um delles eevitando-se toda e qualquer interferencia, por minima queseja, na vida interna e no modo de ser dos dois paizesreciprocamente;

2.º―Estudar a forma de se negociar um tratado deincondicional arbitragem entre Portugal e as suas coloniasde um lado e o Brasil do outro e de se realizar aconveniente cooperação das duas nações em assumptos decaracter internacional;

3.º― Estudar a fórma de se ultimar, com a urgencia querazões obvias aconselham, um tratado de commercio, ouantes um largo entendimento commercial entre as duasnações, procurando-se a maneira, até onde fôr possivelvencer as difficuldades naturaes inherentes ao assumpto,de que uma á outra concedam respectivamente vantagensespeciaes que deixem de ser transmittidas aos outrosEstados, não sendo, portanto, attingidas pela clausula denação mais favorecida, inscripta actualmente nos tratadosjá existentes tanto de Portugal como do Brasil com ospaizes estrangeiros;

4.º―Promover a creação de uma linha de navegação luso-brasileira entre os dois paizes, sob o alto patrocinio deambos os governos;

5.º―Promover a fundação em Lisboa de um entreposto

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central para o commercio do Brasil na Europa e de umentreposto central no Rio de Janeiro para o commercioportuguês na America, podendo, no caso de isso serconveniente, fundar-se outros dois entrepostos, um noPorto e outro no Recife, ou onde mais convenha ao Brasil;

6.º―Promover a construcção de dois palacios, um emLisboa e outro no Rio de Janeiro, destinados á exposiçãoe venda permanente dos productos nacionaes de cada umdos dois paizes no outro;

7.º―Promover, sempre que fôr possivel, a unificação oupelo menos a harmonização da legislação civil ecommercial dos dois paizes;

8.º―Promover a approximação intellectual―scientifica,literaria e artistica―dos dois paizes, dando aosprofessores e diplomados brasileiros em Portugal e aosprofessores e diplomados portugueses no Brasil osmesmos direitos com equivalencia dos respectivos titulosde habilitação;

9.º―Promover visitas regulares de excursionistas e deestudo―de intellectuaes, de artistas, de industriaes ecommerciantes portugueses ao Brasil e brasileiros aPortugal e ás suas mais importantes colonias;

10.º―Estudar a maneira de se fundar em qualquer dasduas capitaes, ou simultaneamente em ambas, uma revistaque seja o orgão para servir de interprete permanente aeste movimento de approximação luso-brasileira;

11.º―Promover mais intimas e continuadas relações entrea imprensa brasileira e a imprensa portuguesa pela trocade collaboração e pela instituição de reuniões periodicasdos editores de livros e dos representantes do jornalismode ambas as nações;

12.º―Promover a intelligencia entre si, respectivamente,das sociedades scientificas, artisticas, de instrucção, debeneficencia, de gymnastica, de tiro, de natação e outrosdesportos maritimos e terrestres, etc., pertencentes aosdois paizes, assim como das associações academicasbrasileiras e portuguesas, creando-se tambem bolsas deviagem para os estudantes de cada um dos dois paizes nooutro;

13.º―Promover o movimento de approximação luso-brasileira no Brasil, ou por intermedio de alguma dassociedades alli existentes, como a Sociedade deGeographia ou o Instituto Historico Brasileiro, que, ásemelhança da Sociedade de Geographia de Lisboa,queira no territorio da União pôr-se á frente destemovimento, ou contribuindo para a fundação no Rio deJaneiro de uma liga luso-brasileira, com os mesmosintuitos que os da commissão permanente cuja creaçãoaqui se propõe;

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14.º―Finalmente, estudar a maneira de se fazer dabenemerita colonia portuguesa no Brasil a activaintermediaria da approximação moral dos dois povos,approximação que terá como symbolo da realidade da suaexistencia a formosa lingua de Camões e Gonçalves Diasa falar-se dos dois lados do Atlantico e a servir, em duaspatrias fraternalmente enlaçadas, de vinculoinquebrantavel á raça luso-brasileira, cujo destinohistorico, assim engrandecido, deverá, a bem dacivilização, alargar-se triumphante pelas mais bellasregiões do globo, ás quaes o immortal genio latino,representado pela nossa commum nacionalidade,imprimirá, com o supremo encanto da forma, o estimuloda sua energia eternamente creadora.»

II

O PROBLEMA LUSO-BRASILEIRO

O problema luso-brasileiro é uma realidade. Nãoestá definido, não se lhe conhecem com precisão ostermos; mas existe. Affinidades, claras e logicasumas, e outras obscuras e inconscientes, sollicitamos dois grupos sociaes e politicos, que compõem agens lusitana, se assim se póde exprimir oconjuncto ethnico em elaboração nas terras sob asoberania portuguesa e sob a soberania brasileira.

Existe o problema luso-brasileiro, como existe ohispano-americano, como existe o anglo-saxonio.Paizes que derivaram dos povos colonizadores porexcellencia e que mantêem com elles intimasrelações e permanente convivencia, ha tres nucleosde estados americanos que constituem, á maneiraque se desenvolvem e á maneira que prosperam, nãojá simples e justificados motivos de orgulho paraaquelles povos, mas poderosas engrenagens a cujasorte elles não podem, de maneira nenhuma, serestranhos.

Sentimos vagamente que ha laços insoluveis quenos prendem ao Brasil. Dia a dia, hora a hora,reconhecemos que existe uma verdadeirainterdependencia na vida luso-brasileira. O Brasilinflue sobre Portugal e Portugal influe sobre oBrasil. Como e em que espheras das respectivasactividades se exercita essa acção? Eis ondesurgem, cá e lá, as divergencias; eis onde collidemas opiniões e onde mais nitidamente se manifesta a

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complexidade do problema luso-brasileiro.

Ha quantos annos Castelar lançou a idéa de estreitaros vinculos hispano-americanos? Ha mais dequarenta e, todavia, o problema ficou sem solução...

Dizia Emilio Castelar:

«Reunir as idéas de todos os nossos escriptores;communicar ao Novo Mundo o espirito hespanholsob todas as suas formas raras e variadas; lembrar-lhe todos os dias, sob todos os tons da nossa lingua,que aqui vivem homens que são seus irmãos;mostrar a seus olhos o ideal de um futuro de paz,em que pela reunião das nossas forças e das nossasintelligencias poderemos fazer germinar nasentranhas dessa infeliz America, ferida pelatempestade, e no seio desta desgraçada Hespanhaconsumida pelas cinzas das suas ruinas, umasciencia nova e uma literatura nova; fazer tudo istocom uma constancia, que lembre o nosso antigocaracter, e fazel-o sem outra recompensa além dasatisfação da nossa consciencia, é um dos maiores emais positivos beneficios que se podem conceberpara a nossa raça abatida.»

A iniciativa do sr. Consiglieri Pedroso no tocante ásrelações luso-brasileiras relembra a de Castelar noque concerne ás hispano-americanas. A culturahistorica, em ambos fortalecida pelas scienciaspoliticas e sociaes, levou esses dois espiritos deeleição a encararem o mesmo problema sobaspectos quasi identicos. Ao lusitano, como aohespanhol, affigurou-se indispensavel a seivaamericana ao caule ibérico. Era, nos dois casos, averificação confessada de factos insophismaveis daeconomia da peninsula hispanica; mas problemaseconomicos têm de ser resolvidos economicamente.Ora, se Castelar queria que se puzesse em praticatodo o seu programma com a só recompensa daconsciencia satisfeita, o sr. Consiglieri Pedroso,mais positivo, estabeleceu um programma em queprevalece o do ut des, a troca de vantagens eserviços capazes de apertar os laços que prendem apatria de Camões á de Gonçalves Dias.

A forma pela qual se virá a tornar effectiva essasolidarizacão decorre forçosamente das bases que seadoptarem para a conseguir.

O estadista hespanhol Francisco Silvela, abordandoo problema hispano americano, dizia que, «para arenascença das forças da sua patria», eraindispensavel «luctar nos mercados» das antigas

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colonias, que considerava mercados naturaes daHespanha; mas, no seu plano, que ia até umaconfederação ibero-americana, entendia que «omercado hespanhol» devia «uma legitimareciprocidade ao commercio, á industria e áagricultura desses povos irmãos».

Como dar realidade ao ridente projecto? Não nol-osoube ensinar Castelar, não nol-o mostrou Silvela:morreram e tudo continua como antes... Oxalá sejamais proveitosa a nossa iniciativa.

O sr. Consiglieri Pedroso, com todo o seu saber,labóra num engano. Á sua perspicacia deve tercausado impressão a simples lista dos brasileirosque, com representação official, assistiram á sessãoda Sociedade de Geographia. Alli esteve o primeirosecretario de legação, sr. Alvaro de Teffé, filho doalmirante barão de Teffé, cuja familia, vonHoonoltz, se me não affigura lusitana, embora aosserviços do almirante deva o Brasil a mais gratarecordação de patriotismo; e, dos quatorze officiaesde marinha presentes, um era Burlamaqui, outroBardy, outro Lindenberg, outro Wegylin, outroCostallat... Este facto bastaria, numa representaçãotão diminuta, para nos desilludir ácerca da idéacorrente em Portugal de que sómente os filhos dosportugueses adoptam a nacionalidade brasileira.Antes, estivera no porto de Lisboa o destroyer«Piauhy», commandado por Pedro Frontin, tendopor immediato Armando Burlamaqui. E por Lisboatêm passado Filinto Perry e Octavio Perry, officiaesde marinha e filhos de outro illustre official, e tantosoutros, a quem nem o nome nem a origem attenuamo sentimento nacional.

Lauro Müller, filho de colonos allemães de SantaCatharina, é senador e coronel do exercito e foiministro da viação no governo Rodrigues Alves.

Olavo Bilac, Escragnolle Taunay, Pardal Mallet,Clovis Bevilacqua, Henrique Oswald, Felix deOtero, H. Chiaffitelli, Rodolpho e HenriqueBernardelli, Ludovico Berna, Elyseu d'AngeloVisconti, o architecto Stahlembrecher, o pintorChambelland, nas letras e nas artes; Raja Gabaglia,Lima Drummond, Alfredo Pujol, Vergueiro Steidel,G. Hasslocher, Wanderley Araujo, no direito;Chapot Prévost, Monat, Chardinal, Seidl, Niobey,Alberto Muylaert e Rebello Kock, na medicina;Paulo de Frontin, José e Jorge de Lossio Seiblitz,Estanislau Bousquet, Victor Villiot, EverardoBackeuser, Henrique Kingston, Julio Delamare

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Koeler, Van Erven, Dunham, na engenharia;Gaffrée, Guinle e Street, na industria―para citar sóde memoria e para pôr de lado aquelles queremontam a um passado já distante―são nomes queninguem póde crêr usados por pessôas alheias aoespirito nacional brasileiro.

Quem foi o ministro da marinha do governoprovisorio? Wandenkolk. E quem é o actualministro da guerra? Bormann. De sangue italianosão os filhos do insigne jornalista, hoje presidentedo Senado, Quintino Bocayuva; têm sangue francêsos filhos do extraordinario patriota que se chamaRio Branco.

E, apezar de toda esta fusão de raças, o sentimentobrasileiro nada soffre! E, apezar de quaesquerreceios de desnacionalização, o que se vê é que cadavez se vae robustecendo mais a nacionalidade!

E, se é certo que a lingua é o mais poderosoelemento caracteristico das nacionalidades, éevidente que, dentro do Brasil, todos os exoticos sãoabsorvidos e assimilados pela massa luso-brasileira,que forma a sua força ethnica preponderante.

O dr. Bulhões Carvalho, director geral daEstatistica, no prologo do «BoletimCommemorativo da Exposição Nacional de 1908»,dizia:

«Em relação á naturalidade, é extraordinario opredominio do elemento nacional do Brasil. Em1872, o numero de estrangeiros era de 383.546 para9.728.515 brasileiros; em 1890 o total dosestrangeiros era de 351.545 para 13.982.370brasileiros; em 1900 a cifra dos estrangeiros attingiaa 1.240.264 para 16.078.292 brasileiros.»

III

O SUPPOSTO PERIGO

Onde existe o perigo da desnacionalização?

Diz o sr. Consiglieri Pedroso, no seu 7.ºconsiderando, que «o Brasil corre o risco de se irdesnacionalizando pouco a pouco pela introducção,cada vez em mais larga escala, de elementos de

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immigração estranhos ao seu caracter historico e atéantipathicos á sua idiosyncrasia ethnica―provaveiscausadores de futuras perturbações e de inevitaveisperigos para a União».

A immigração não portuguesa―eis em que consisteo perigo, no dizer do eminente professor. Ora, averdade, falada pelos numeros, póde ser sem brilho,mas é irrecusavel.

Em todo o periodo que vae de 1820 até 1907, diz-nos a estatistica (Bulhões Carvalho, trabalho citado)que, nos portos do Brasil, entraram 1.213.167italianos, 634.585 portugueses, 288.646 hespanhoes,93.075 allemães, 56.892 austriacos, 54.593 russos,19.269 franceses, 11.731 turco-arabes, 11.068ingleses, 9.086 suissos, 3.780 suécos, 11 belgas e165.590 de outras nacionalidades.

Ao todo entraram 2.561.482 immigrantes. Tirandoos portugueses, temos 1.926.897 immigrantes, nãosabemos se todos «estranhos ao caracter historico eantipathicos á idiosyncrasia ethnica» do Brasil.

É claro que não constituiu a sua superioridadenumerica causa de perturbações nem de perigospara a nação... Esses elementos encontraram nasociedade organizada o meio propicio á adaptação.Foram assimilados. E, como a emigração nãorepresenta a cultura, porque é recrutada entre asclasses mais desprotegidas dos paizes europeus,essas ondas humanas foram fecundar as terras deSanta Cruz e lá puderam proporcionar á sua próle obem-estar, a instrucção e a educação que, deste ladodo Atlantico, ella desconheceria; mas não lhemodificaram a cultura: quando muito, integraram-senella.

Desses immigrantes ficaram os nomes. Oscruzamentos, o ambiente e a evolução peculiar dasociedade nova em que foram incorporados,formaram um typo nacional, em que predominam ascaracteristicas portuguesas, mas que, sob algunsaspectos, tende a differenciar-se do nosso.

Por que se deu esse predominio? Pelo facto politico-social da posse e da soberania, em primeiro logar;depois pela acção eugenica dos portugueses sobreos elementos indigenas e africanos; e, finalmente,pela continuação d'essa influencia na descendenciamestiça. Quando, ha oitenta e tantos annos seiniciou a corrente immigratoria não portuguesa parao Brasil, já lá havia uma consideravel populaçãocom a nossa cultura, com as nossas tradições e com

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as nossas instituições.

Era a nossa raça? O brasileiro era o luso? SylvioRomero nega que o fosse. Acha que a historia doBrasil não é a «historia exclusiva dos portuguesesna America», nem a dos tupys, nem a dos negros.«É, antes, a historia de um typo novo.»

Esse typo novo não podia deixar de ter com oportuguês―elemento superior da sua formaçãoinicial―affinidades mais intimas do que comqualquer outra nacionalidade. Os destinos de umpovo dependem dos seus elementos ethnicossuperiores. Assim foi que, dada a implantação dacivilização européa na America, as nações, quevieram a constituir-se n'esse continente, se tiveramde modelar e pautar pelas de que promanavam,reproduzindo, além da medida exacta do sangue, asqualidades essenciaes das raças originariassuperiores.

É sob este ponto de vista que o brasileiro é oportuguês da America, onde o Canadá aindarepresenta o francês e o inglês, o americano donorte prolonga a modalidade britanica, e os demaispovos conservam inconfundiveis traços dohespanhol.

Limitando-nos ao caso que nos respeita, quer istodizer que o brasileiro se encontra apparelhado pelaconsciencia nacional e pelas energias de ordemlegal, moral e material, que dão realidade aosgremios nacionaes, para proseguir na sua marchaevolutiva independente, apezar de quaesquernucleos extra-lusitanos que para o Brasil emigrem.

Os factos corroboram a nulla acçãodesnacionalizadora dos immigrantes nãoportugueses. De 1824 a 1859, anno em que osallemães deixaram de ir para o Brasil em virtude dorescripto famoso do ministro prussiano Van derHeydt, esses colonos, espalhados pelas provinciasdo sul, não logravam attingir a cifra de 30.000. AAllemanha, reconhecendo que cresciamextraordinariamente, apezar de prohibida aemigração, as populações germanicas no sul doBrasil, procurou conserval-as unidas á Vaterlandpor meio do ensino: creou escolas e na lingua tinhaum vinculo precioso e poderosissimo. Sãoconhecidos por teutos esses brasileiros, que, sepuderam ser motivo de preoccupações, deixaram deo ser desde que, á escola e á lingua allemans seoppuzeram a escola brasileira e a nossa lingua.

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Quinhentos mil teutos, muito prolificos, emincessante incremento, constituirão esse perigo? Ouserão os quasi cem mil que, nesse total, conservam anacionalidade alleman? Ou serão esses, mais os doismilhões e meio de italianos e filhos de italianos emais outro milhão de pessoas de outras linguas?

Quatro milhões dos seus dezoito a vinte milhões dehabitantes não podem desnacionalizar o Brasil.

E ai de nós se o pudessem fazer! Que remedio lhepoderiamos dar com os nossos seis milhões dehabitantes, em que só não são analphabetos1.200.000, quando esses paizes para lá mandamgente muito menos ignorante?

O perigo da desnacionalização não existe realmente.A actual população possue capacidadestriumphantes de resistencia á invasão exotica.

Quem o reconhece não somos nós, são os propriosallemães e italianos. A illusão desfez-se. ODeutschthum falliu na sua execução sul-americana.A Nova Italia foi fantasia logo batida pela realidade.E, como, afinal, á falta de melhor, basta, a quem faznegocios, não os perder, a politica dos povosemigrantistas, isto é, dos que precisam ir conquistara terras novas o pão que as velhas lhes negam,transformou-se; e em novas aspirações praticaspassou a traduzir-se.

Diz o allemão dr. Robert Jannassh:

«O immigrante que aqui vive e trabalha, tem de setornar brasileiro, deve aprender a lingua do paiz,esforçando-se por se exprimir n'ella tão bem comoem seu proprio idioma, sem o que não poderá tomarparte na vida publica em beneficio dacollectividade.»

Diz o professor Siever, da Universidade de Giessen:

«Se o imperio allemão quer recuperar a sua antigapreponderancia no concerto das potencias, procureadquirir, na America do Sul, real influencia; masnão sob a forma de annexações e sim na base derelações commerciaes, industriaes e pecuniarias...»

O professor Vincenzo Grossi, da Universidade deRoma, aconselha egualmente que os emigradosadoptem a lingua e a nacionalidade dos paizes emque se installam.

O remedio, está-o applicando a Republica dos

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Estados Unidos do Brasil: é a escola, é a legislaçãotendente á absorpção do estrangeiro.

Assim prevenido, o Brasil ha de receber, sem riscoalgum, as enormes lévas de trabalhadores, que o seuprogresso material e a sua missão no equilibrio sul-americano reclamam e que Portugal, já comescassas energias no ponto de vista demographico,não lhe póde offerecer.

IV

OS ESTRANGEIROS NO BRASIL

Chegou a haver no Brasil uma forte corrente deopinião contraria á immigração italiana e alleman.Não ha negal-o; mas a verdade é que essa correntedeixava de encarar o problema tal qual era naverdade, para vêr unicamente um factoapparentemente grave para a existencia nacional,qual era a formação de poderosos nucleos de linguaitaliana e alleman nos Estados do sul da Republica.

Esses nucleos não encontravam meio favoravel áconservação das suas nacionalidades de origem. Écerto que para onde convergiam os italianos, comoem S. Paulo, acorriam outros italianos, da mesmafórma que os allemães se congregavam no RioGrande do Sul, Santa Catharina e Paraná. Era tal aforça das affinidades nacionaes que em algumasregiões 80 a 95% da população era teutonica; e,como era natural, os teutos, por lá, eram os quetinham de desempenhar todas as funcções publicas ede exercer todas as fórmas da actividade segundo astendencias da sua raça e de accordo com asconquistas da propria civilização. Mas a verdadedos factos é que esses agglomerados ethnicosperdiam o espirito nacional á maneira que os filhosentravam na vida brasileira e á medida que aprosperidade no novo habitat os prendia á terra deadopção.

E adopção dizemos porque, de facto, os estrangeirosidos para o Brasil até 1890―anno em que, com aautonomia aos estados dada pela Republica, entroua crescer de modo consideravel aimmigraçao[3]―eram absorvidos, incorporados namassa nacional.

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Affirma-o a estatistica. O censo de 1890 accusa,com effeito, 351.545 estrangeiros para 13.982.370brasileiros. Quer isto dizer: 1.º que os filhos deimmigrantes tinham adoptado a nacionalidadebrasileira; 2.º que a propria gente exotica, emgrande parte, tinha acceitado a naturalização tacita,porquanto só nos annos de 1880 a 1889, a entradano Brasil―de todas as origens―tinha passado de300.000 estrangeiros.

É, porém, verdade que alguns homens, aliáseminentes, do Brasil tiveram receio dos grandesgrupos de população de lingua estranha. Dessefacto, nem sempre apreciado com justeza decriterio, resultou a noção de um perigo allemão e deum perigo italiano, que, se existiram algum dia, foipela possibilidade de conflictos internos de gentesde culturas divergentes em fusão, e não pela ameaçade desviar a nacionalidade dos seus destinosresultantes de tendencias acima de tudo definidaspela lingua.

A Republica, ao ser proclamada, encontrou-sedeante de «sérios problemas», neste terrenomelindrosissimo. Falava-se no espirito monarchicodos teutos; dizia-se que, a um aceno de SilveiraMartins, se ergueriam dezenas de milhares deteutos; havia quem acreditasse―na Europaprincipalmente!―que o Brasil se ia dividir em tresestados: ao norte, a Amazonia; ao centro uma naçãoem que viriam a preponderar os italianos; ao sul,uma nova Allemanha, que, lá para 1999, devia ter30 a 35 milhões de habitantes...

Andou isto pela imprensa francesa, inglesa ealleman, que, sobre um artigo do Tempo,[4] deLisboa, bordou longas e arbitrarias consideraçõeshistoricas e ethnologicas e se perdeu em estopantesdissertações de direiro.

Os «sérios problemas» existiam, em todo o caso.Era preciso introduzir trabalhadores no Brasil! Esseé que era o maximo problema. Faltavam os braços álavoura. Aonde ir buscal-os, senão aos paizes que ospodiam fornecer em maior abundancia? Aonde,senão aos paizes de lingua estranha, já que Portugalsó lhe dera 24.000 colonos em 1888 e 28.000 em1889? Aonde, se, apesar de todos os esforços, oestado de S. Paulo só conseguiu, de 1890 a 1904exclusivé, pouco mais de 36.000 portugueses contra190.000 italianos?

A immigracão subsidiada pelo Estado obedecia auma imperiosa necessidade economica. Tinha de ser

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feita, com as raças que offerecessem mais braçosdisponiveis. Mas, se já na epoca das fracas lévasexoticas se falára em «perigos», que não seriadepois de abolida a escravidão, depois de mudado oregimen politico?...

Mais do que nunca havia que cercar a nacionalidadede meios de defeza. Foi por isso que o governoprovisorio tratou, logo nos seus primeiros dias, dedecretar a grande naturalização. O decreto de 15 dedezembro de 1889, que deu a nacionalidade a todosos estrangeiros que, estando no Brasil em 15 denovembro, a quizessem, teve alcance muito maiordo que se imagina, embora os protestos de Portugal,Hespanha, Inglaterra e Hollanda contra a leitivessem attenuado, de certo modo, a sua efficacia.

No debate deste assumpto, no seio do governoprovisorio, propondo que se mantivesse a lei, diziaQuintino Bocayuva, ministro das relaçõesexteriores, que «a par da energia» que devia mantero governo para com as nações estrangeiras, «deviatambem usar de certa delicadeza» porque o Brasil«dependia do problema, maximo da immigração».[5]

Observou-se a delicadeza. Manteve-se a lei. Osresultados de tal politica estão no censo de 1890,como já vimos; mas vinha de longe esse esforço. Opartido republicano, tantas vezes accusado, depoisdo novo regimen, de hostilizar o estrangeiro, sempreadvogára as mais liberaes medidas para anaturalização. E essa pretensa hostilidade sómentesignificava justificado espirito nacionalista.

Já em 1881, ao dirigir-se aos eleitores de S. Paulo, ogrande cidadão, que se chamou Francisco RangelPestana, dizia (Programma dos Candidatos) que oseu partido tinha, no seu manifesto de 1880, tomadonessa materia um compromisso solemne, queimpunha «uma reforma na legislação de modo a serfacilitado ao estrangeiro domiciliado no Brasil omeio de entrar, sem vexame e com o conhecimentoexacto das necessidades do paiz, na communhãosocial» brasileira.

E, depois de criticar a legislação então vigente namateria e de mostrar as necessidades que havia parao bom exito da medida, dizia:

«Nem especialmente em relação ao augmento dacorrente de immigração, nem em relação aoprogresso moral e material do paiz, a propagandaem favor da naturalização trará resultado seguro e

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vantajoso, se outras reformas não vierem mudar esteestado de coisas que entristece os bons pensadoresde todos os partidos.»

Entendia Rangel Pestana que o estrangeiro nãoprocuraria adoptar a nova patria se nãoreconhecesse que havia nella «garantias para os seusdireitos civis e mesmo para os politicos».

A Republica não faltou aos seus compromissos.

V

O POVOAMENTO E ANACIONALIDADE

Os systemas geralmente adoptados para aacquisição de braços foram todos experimentadosno Brasil. Desde a immigração subsidiada ásmultiplas formas de colonização, não houveprocesso que, em maior ou menor escala, deixassede ser ensaiado.

Tratava-se realmente do problema maximo. Oselementos naturaes não bastam, as riquezas de todosos generos e os mais vastos territorios de nadaservem quando falta a população. É o homem quefecunda e valoriza tudo.

Escrevia, em 1901, o Dr. Luiz Pereira Barretto:[6]

«Variedade de climas; numerosos e volumososcursos de agua irradiando de um admiravel planaltocentral que convida a humanidade futura a alli virderramar 400 milhões de habitantes; exuberantesflorestas; uma flora e uma fauna de supremabelleza; riqueza de sólo; immensas jazidas demineraes de toda a sorte: 1.200 léguas de costa;portos abundantes e tocando ao ápice da perfeiçãoideal como largueza, segurança e elegancia eattingindo alguns a proporções colossaes; tudo, tudopossuimos na mais vasta escala.

Não seremos capazes de fazer valer tantos e tãoexcepcionaes recursos?»

O Brasil, para fazer valer os seus recursos, emverdade excepcionaes, precisou sempre, precisahoje, e precisará amanhan de augmentar a sua

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população, cujo crescimento vegetativo éinsignificante para o seu territorio, com gente dasregiões em que a lucta pela vida é mais dura. Aimmigração é o processo de crescimento que se lheimpõe.

Foi, com esse intuito que o estado subsidiou aintroducção de trabalhadores, fez as concessões dosburgos agricolas, creou os nucleos coloniaes, e, porfim, organizou um vasto e completo systema depovoamento do sólo.

A experiencia ensinou que era indispensavelpreparar o meio para attrahir e prender oestrangeiro. A esta orientação obedeceram recentesmedidas governativas, de entre as quaes podemosdestacar:

as leis que declararam privilegiadas as dividasprovenientes de salarios de operarios agricolas(janeiro de 1904, dezembro de 1906 e março de1907);

a organização do serviço de Propaganda e ExpansãoEconomica do Brasil no Estrangeiro (outubro de1907);

a regulamentação do serviço de povoamento do sólo(leis de 30 de dezembro de 1906 e 19 de abril de1907);

as instrucções para a fundação de nucleos coloniaese localização de immigrantes por conta da União(portaria de 21 de dezembro de 1907);

o decreto de 5 de janeiro de 1907, que creou ossyndicatos e as cooperativas―instituições correntesem alguns paizes emigrantistas.

As vantagens e garantias constantes de todas estasmedidas são obvias; todavia ha que lêr oregulamento do serviço de povoamento paracomprehender o espirito que guiou, nesta materia, ogoverno brasileiro.

É preciso fixar muita gente: por isso, «a Uniãopromove o povoamento, mediante accordo com osEstados, emprezas de viação ferrea e fluvial,companhias ou associações e particulares» (Art.o1.º); os immigrantes, cuja moralidade e cuja saudesão fiscalizadas (art. 2.º), constituem nucleos emlotes de terras escolhidas, em bôas condições desalubridade e com transporte facil e installam-se nosnucleos como proprietarios (art.o 5.º), e só

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excepcionalmente (art.o 4.º)―porque é precisoadmittir as surprezas de uma exploração que seinicía―os immigrantes poderão ser introduzidossem acquisição de terras; pelo Estado ou pelasemprezas serão fornecidas gratuitamente, aosimmigrantes, ferramentas e sementes (art.o 7.º,alinea V); os lotes em regra terão casa para a familiado immigrante e terreno preparado para as primeirasculturas (art.o 21.º); os lotes serão vendidos a prazoou á vista; os adquirentes dos lotes terão (art.o 36.º),durante os seis primeiros mezes, o auxilioindispensavel á sua manutenção e á da sua familia;terão, durante um anno, pelo menos, (art.o 27.º),serviços medicos e pharmaceuticos; se o adquirentemorrer, depois de pagar tres prestações, (art.o 43.º)serão dispensadas as outras em favor da viuva e dosorphãos; o Estado (art.o 96.º) restituirá aosimmigrantes espontaneos, que fôrem agricultores, aimportancia das passagens do porto de embarque aode destino, dar-lhes-ha (art.o 97.º) desembarque,agasalho, alimentação, medico e remedios atéseguirem para o seu destino, com transportegratuito; será concedida repatriação a viuvas,orphãos e inutilizados por doença ou accidente, osquaes (art.o 131.º) poderão vender os seus lotes; aosmelhores immigrantes com mais de tres e menos deseis annos de posse dos lotes serão concedidos (art.o132.º) premios de viagem ao seu paiz do origem.

Basta este insignificante extracto para se avaliar ointelligente esforço que o Brasil faz para fixar oestrangeiro.

Bem dizia o ministro Calmon, no seu relatorio de1908, que esse regulamento revelava «apreoccupação de assegurar ao immigranteelementos de feliz exito e garantias de bem-estar eliberdade». E, justificando as medidas queresumimos, ponderava que a «suprema ambição doproletario que se expatria é tornar-se proprietario.»

Introduzir immigrantes não é, porém, o unico fim dalei a que nos estamos referindo: tem ainda em mirapovoar o Brasil, isto é, preparar novas forças decrescimento vegetativo; e não deixa de attender áquestão da nacionalidade. Como? É o que vamosvêr resumindo outros dispositivos da lei.

O art.o 19.º manda reservar, em cada nucleo, lotespara grupos escolares.

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O art.o 44.º estabelece aulas de ensino primariogratuito; o art.o 57.º manda applicar o art.o 44 aosnucleos fundados pelos governos dos estados; oart.o 57.º impõe essas obrigações ás emprezas deviação, as quaes têm de promover o povoamentodas terras marginaes ou proximas das suas linhas.

Temos, pois, o ensino da lingua portuguesa, comomeio de nacionalização, aliás adoptado, de hamuito, em todas as regiões onde se agglomerammassas de immigrantes. Onde se abriu uma escolaestrangeira, não raro em um pardieiro, surgiusempre um edificio lindo, com bellos jardins, para aescola nacional.

Mas ha outras providencias com o mesmo intuitonacionalizador. Assim, os lotes são vendidos aprazo só aos immigrantes com familia, os quaespodem adquirir segundos lotes contiguos aosprimeiros (art.os 26.º, 27.º e 28.º).

Ao immigrante estrangeiro que contrahir casamentocom brasileira ou filha de brasileiro nato, ou aoagricultor nacional que se casar com estrangeiraaportada ha menos de dois annos como immigrante,será concedido (art.o 29.º) um lote de terra comtitulo provisorio, que se substituirá por outrodefinitivo de propriedade, sem onus algum para ocasal, se este tiver durante o primeiro anno, a contarda data do titulo provisorio, convivido em boaharmonia.

E se, após o casamento, quizer adquirir um lote atitulo definitivo (art.o 30.º) ser-lhe ha feita a vendapor metade do preço estipulado.

Em todos os nucleos (art.os 46.º e 53.º) serão dados10% dos lotes a nacionaes. Sempre que n'um nucleohouver 300 lotes de estrangeiros será organizada(art.o 46.º) uma secção de lotes para agricultoresnacionaes. O mesmo poderão fazer as emprezascontractantes de colonização (art.o 78.º). E sempreque «a necessidade publica o exigir e o Estadointeressado não os pudér organizar, a União fundaránucleos coloniaes destinados exclusivamente aagricultores nacionaes.

Julgamos que estas disposições legaes falam comsufficiente eloquencia.

Ainda ha outras precauções com identico fim.

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A constituição, que só véda ao naturalizado apresidencia da Republica, estatue que a navegaçãode cabotagem tem de ser nacional (art.o 13.º §unico).

A recente lei das successsões é de intuitosnacionalistas.

A lei dos syndicatos profissionaes, os quaes (art.o2.º) para gosarem de personalidade civil têm de terdirecções formadas por brasileiros natos ounaturalizados, tambem é um elemento de attracçãopara o operariado dos paizes mais cultos, que nesseestatuto encontra os conselhos, a que está habituado,de conciliação e arbitragem e as associações deprevidencia, assistencia e mutualidade, que lhe sãoindispensaveis.

VI

A IMMIGRAÇÃO PORTUGUESA

Ha porventura melhor immigrante do que oportuguês? Direi, sem receio de contradicta, que,para o Brasil, é o melhor, apezar das condiçõesespeciaes em que tem estado a nossa patria quanto áinstrucção publica.

No Annuario de Estatistica demographo-sanitaria de1895, Bulhões Carvalho, aliás nem sempre justocom a nossa colonia, reconhece que o português é oimmigrante «que tem mais inclinação para se fixarno paiz». É certo. Patriota até onde póde elevar-seesse sentimento, o português, em regra, não senaturaliza. Affeiçôa-se ao novo domicilio; não elegenova patria. Não significa o seu proceder menosestima ao Brasil, senão mais acendrado amôr aPortugal. Para elle ha um paiz sem egual: é o seu,que não tem defeitos, que é o mais intrépido e omais feliz do mundo...

O sentimento exalta-se-lhe com a distancia. Arecordação dos mais tenros annos amplifica a suavisão saudosa. Mas é preciso reconhecer que,mesmo quando revê a sua terra, a nossa, tão bella etão infeliz, a dôr que lhe causa o descalabro geralnão consegue arrancar-lhe do intimo esse ardenteamôr. Póde a evidencia dos factos transformar-lheas aspirações, rasgar-lhe horisontes fulgentes para o

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lado que antes se lhe affigurava caliginoso.

Que importa? O seu sonho é a felicidade dePortugal. E ou tenha visto e sentido o mal, ou tenhaficado alheio á verdade da situação portuguesa,permanece português.

O seu domicilio é que já não é Portugal. A sua vida,em geral, adaptou-se ao meio brasileiro. Fixou-se. Asua próle é brasileira; os costumes, que contrahiu,criaram-lhe segunda natureza.

O Brasil só lhe póde ser grato porque elle lhe dá oseu trabalho indefesso e honrado e porque os seusfilhos são brasileiros. Elle cumpre a missão dohomem que se expatria para melhorar de fortuna.

Não concordamos com a affirmação de BulhõesCarvalho, no Annuario referido, quanto á pretendidatendencia dos portugueses para afastarem, doslogares em que dominam, qualquer outro elementoestrangeiro. Existem, é certo, nucleos deportugueses e em alguns pontos póde um examesuperficial permittir a supposição de que seencontram sós por haverem expellido os outrosimmigrados. Não é essa a razão do phenomeno, quetambem se manifesta com os italianos, os allemães eos hespanhoes. Um inquerito minuciosodemonstraria que esses agrupamentos não selimitam ás nações, descem ás provincias, ás regiõese até ás villas e aldeias. Não se comprehenderia aimmigracão espontanea, que não é quantidadedesprezivel, sem o reencontro de parentes, visinhose conhecidos. Um parte porque o outro partiu antes.Assim se congregam os trabalhadores em todos ospaizes americanos. Assim tinha de acontecer com osnossos patricios no Brasil.

Forçoso é convir que o director geral da Estatisticatem razão quando affirma que «o progresso naindustria, no commercio, nas letras e nas artes émais bem representado por outros povos do quepelo velho Portugal com as suas grandiosastradições historicas».

Ha mistéres para todos, mesmo para os maisatrazados, num paiz novo: os mais humildes cabemaos menos preparados para a lucta pela vida. Oaccrescimo physiologico não soffre com essainferioridade. O que é claro é que dahi decorre aimminente subalternização da nossa colonia. Oaviso do distincto funccionario brasileiro mereceriaa nossa gratidão official, se acaso nas regiões dopoder se olhasse a sério para os interesses

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nacionaes. É um brado affectuoso: «Olhae para osvossos competidores. Defendei-vos!»

Defender nos... Como havemos de nos defender, seo regimen tem medo do a b c ?

A miseria impelle para o mar os camponiosanalphabetos e elles lá vão, heróes obscuros,trabalhar pela Patria! E como trabalham alegres,confiantes e esperançados!

A America, disse um publicista italiano, é, pelomenos, a esperança. A esperança move os queemigram, e emigra quem é capaz de luctar, quem sesente disposto a não mendigar e a não morrer defome. É a regra, com as naturaes excepções. Ora,sendo assim, os povos emigrantistas perdemenergias preciosas, que não sabem ou não podemutilizar, e que, bem ou mal, feliz ou infelizmente,são compensadas pelas remessas de dinheiro e peloconsumo dos seus productos.

É o nosso caso. Lévas de emigrantes vão para oBrasil, onde se fixam e de onde nos auxiliam.

Convém ao Brasil o trabalhador português?Convém, pelas affinidades dos dois povos, eprincipalmente porque, graças a essas affinidades, éo que mais se fixa no paiz.

Todavia o elemento emigratorio português éinsufficiente para o povoamento do Brasil. Seconstituissemos uma grande massa humana, mesmoatrazada e de pequena cultura, o Brasil nãorecorreria a outras raças. Não temos, porém, seismilhões de habitantes...

A colonia portuguêsa no Brasil, cuja importancia senos affigura tanto maior quanto menor é o numerodos que a compõem e acodem, ao nosso balançoeconomico, está muito áquem dos dois milhões aque o rei D. Carlos se referiu.

Os dados estatisticos que pudémos colher e conferirem documentos officiaes dos dois paizes dão asseguintes entradas de portuguêses nos annos de1890 a 1908, e são os de maior emigração dePortugal:

1890 25.1741891 32.3491892 17.797

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1893 28.9891894 25.7731895 40.3901896 23.9981897 17.7931898 20.1311899 13.3481900 14.4931901 14.4891902 15.0031903 14.5271904 21.4481905 24.8151906 26.1471907 31.4831908 37.628

445.775

Nos 19 annos de maior movimento emigratorio dePortugal, entraram, pois, no Brasil 445.775portugueses. A média annual do periodo de maioremigração é, segundo esses algarismos, de 23.461pessoas. Se imaginarmos que o português vive noBrasil até a edade de 70 annos―o que é absurdo; sesuppuzermos que a edade em que se emigra é de 11annos―outro exagero; se admittirmos―novoabsurdo―que nenhum português morreu desde1850, no Brasil, nem de lá voltou; e se, afinal,dermos de barato que ha 59 annos a média dosimmigrantes nossos patricios é alli a dos ultimosannos (e nos 40 annos de 1850 a 1889 foi muitomenor) poderemos dizer que ha no Brasil:

59 X 23.461 = 1.384.199 portugueses.

Muito menos do que os taes dois milhões. Ora, oretorno é de 25% a 30%; a edade média dosemigrantes é 28 annos; a média da vida é de 65annos; e em 1906, depois do saneamento, a médiada mortalidade no Brasil foi de 20,74 por milhabitantes.

Já em um artigo de imprensa[7] tivémos occasião dedizer que a média da emigração portuguesa para o

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Brasil não excede 18.000 e que o total da nossacolonia não chega a 700.000 pessoas. Diziamos,então:

«Isto não diminue, senão que augmenta o beneficiofeito pelos portugueses domiciliados no Brasil áeconomia da sua patria, visto que são menos amandarem esses 18.000 contos de réis, que são,segundo o sr. Anselmo de Andrade, a nossasalvação, o «dinheiro que melhor nos serve parasaldar a parte do deficit geral em ouro que odinheiro das outras proveniencias deixa adescoberto».

E depois de analysar as avultadas remessas que oscolonos de todas as origens fazem, concluiamos:

«É evidente que esta situação economica étransitoria. Um paiz em formação, como o Brasil,cujo povoamento se está fazendo com intensascorrentes immigratorias, tem de pensar em impedireste escoamento de ouro, que lhe sangraconstantemente as energias. Quer por instituiçõeslegaes tendentes a nacionalizar os estrangeiros, querpor medidas que fixem o colono á terra tornada sua,quer finalmente por providencias de franca defesa,esse é o caminho de todos os povos para cujo rapidocrescimento é aproveitado o excesso de populaçãoou de pobreza de outros paizes».

VII

A PERMUTA COMMERCIAL

A unica razão sólida que hoje determina os tratadosde commercio e, portanto, os favores que as naçõesfazem umas ás outras, é a capacidade que ellasofferecem para o consumo reciproco de producções.Estamos longe dos tempos em que não serealizavam estes pactos por motivos utilitarios, maspor méras combinações derivadas de relaçõesdynasticas.

Nos nossos dias prevalece a reciprocidade, tantoquanto tal criterio póde ser adoptado parapopulações deseguaes, de habitos differentes e deproducções em parte similares ou identicas, e tantoquanto o permittem as distancias entre osconcorrentes, distancias que influem no custo dos

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transportes e, em ultima analyse, no dos artigos.

Fala-se de ha muito e a proposta apresentada áSociedade de Geographia agora insiste nanecessidade de um tratado de commercio com oBrasil. Não querendo entrar em conjecturas, parece-nos que essa aspiração exige minucioso estudo,antes do julgamento das difficuldades oppostas atéaqui á sua realização.

Apesar de tudo quanto dizem os politicos desoluções retumbantes, a nossa producção gosa detratamento amistoso no Brasil. Ha annos, quando osr. Campos Salles foi presidente da Republica, oministro das relações exteriores ia enveredando porum caminho que, sem fundamentos consistentes,tendia á exigencia de fortes augmentos de consumo.

Era impossivel tal coisa; e logo se adoptouorientação mais logica, deixando o Brasil, queconsumia bastante do Uruguay e de Portugal epouco lhes vendia, de pensar em levar a exportaçãodos seus artigos para esses paizes a proporçõescompensadoras, reconhecendo que os seus generosexportaveis eram de natureza impropria a operaresse equilibrio.

O que os factos nos dizem é que o brasileiro, deorigem lusa ou exotica, tem o habito de consumir osproductos da nossa terra. Esses productos possuem,por isso uma situação realmente privilegiada nomercado brasileiro. Tanto basta para que, nacompetencia com os outros povos,tenhamos―como temos, de facto―vantagensindiscutiveis.

A actual situação da permuta commercial entre osdois paizes deixa muito a desejar. O Brasil podiaimportar muito maior volume de productosportugueses e Portugal podia consumir maisproductos brasileiros e preparar-se para vir a sercliente muito maior ainda da nação irman.

No anno de 1906, ultimo de que temos dadosofficiaes para confrontar com os do Brasil (de ondeja possuimos os de 1907 e 1908) os principaesartigos de lá exportados foram:

Algodão, 31.668 toneladas; areias monaziticas4.352 tonel.; assucar, 84.948 tonel.; borracha,31.643 tonel.; café, 13.965.000 saccas[8]; cacáo,25.135 tonel.; farinha de mandioca, 6.644 tonel.;tabaco, 23.630 tonel.; herva matte, 57.796 tonel.;manganez, 121.331 tonel.; caroços (oleaginosos)

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30.904 tonel.; couros, 32.765 tonel.; ouro nativo,4.548 kilogrammas.

O nosso consumo de artigos brasileiros cresceu de244.549 libras esterlinas a 312.755 ou 27,89%, de1901 para 1906; mas o consumo dos nossos noBrasil cresceu mais intensamente: cresceu 34%, aoque se vê do relatorio das finanças relativo a 1907.

Não se póde, portanto, gritar que o trafico luso-brasileiro decáe: médra e de maneira sensivel.

Ora, querendo nós, como se diz todos os dias,melhorar essas relações por um conveniocommercial com o Brasil, e, não sendo licito, hoje,negociar taes instrumentos diplomaticos sem claranoção das reciprocas concessões, occorrenaturalmente investigar o que podemos offerecer e oque pedimos, o que o Brasil nos offereceria e o quedesejaria.

Visto que a iniciativa nos pertence, vejamos o quepodemos offerecer e o que queremos conseguir.

Analysemos a producção brasileira exportavel nestemomento: compõe-se dos artigos que acimamencionámos com as quantidades respectivas.Olhemos para a nossa estatistica de 1906.

1.º Algodão. Importámos n'esse anno 13.013toneladas, no valor de 3.123 contos, de algodão emrama ou em caroço. Tendo industria de algodão, eindustria protegida pela tarifa, só poderiamosimportar do Brasil a materia prima, a rama. O Brasilnão está em condições de exportar fios e tecidos dealgodão visto que ainda os importa. Da sua materiaprima, 85% tem mercado na Inglaterra. Os 15%restantes destinam-se a outros paizesmanufactureiros. A sua producção póde crescermuito; mas poderemos nós adquirir quantidadesensivel desse accrescimo? Eis o que convém saber.Note-se que, em 1906, os 15% do algodão nãocollocado na Inglaterra montavam em 4.752toneladas, das quaes Portugal importava4.717―quasi o total dos 15%.

As nossas colonias começam a cultivar o algodão.Em 1906 recebemos: de Angola, 55.493 kilos; deMoçambique, 1.491 e da India, 2.600.

2.º Areias monaziticas. Os seus mercados serão, pormuitos annos, a Gran-Bretanha e a Allemanha.

3.º Assucar. Temol-o das colonias. Consumimos,

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em globo, 32.700 toneladas. O assucar colonial temauxilio pautal. Em 1906 recebemos das coloniasquantidade insignificante; mas o desenvolvimentoda lavoura da canna nas colonias, em especial na deMoçambique, é consideravel. Nesse anno, do Brasilrecebemos 159 toneladas. Para a exportaçãobrasileira, que tende a crescer muito, o nossomercado seria bom. Este genero, apezar daproducção colonial, póde entrar nas bases de umanegociação intelligente, não para escorraçar degolpe os demais fornecedores, mas para irmodificando a situação das permutas no sentido degarantir parte do nosso mercado ao Brasil.

4.º Borracha. O nosso consumo não é em bruto e épequeno. A producção colonial tende a avolumar-se, em especial a de Angola e Guiné.

5.º Café. O consumo português em 1906 não chegoua 3.103 toneladas, sendo do Brasil quasi 460toneladas. Das colonias exportaram-se, para outrospaízes, 4.177 toneladas, que, com 2.388,consumidas no reino, representam uma producçãocolonial superior ao dobro do consumo.

Portugal é um dos paízes de menor consumo decafé, per capita. Tendo menos de seis milhões dehabitantes, pode dizer-se que cada português nãoconsome mais do que meio kilo de café por anno.Se o consumo subisse ao dobro, o café colonialsobraria ainda. Na Allemanha o consumo é de 3kilos por habitante.[9]

6.º Cacau. A nossa producção, em 1906, de vinte ecinco mil toneladas, foi egual á do Brasil. O nossoconsumo orçou por 145 toneladas, das quaes só umaprocedia do Brasil.

7.º Farinha de pau. Importámos, em 1906, paraconsumo quasi 1.364 toneladas, não chegando auma tonelada a parte proveniente de fóra do Brasil.É consideravel, mesmo para a exportação dessepaíz.

8.º Tabaco. O consumo é importante. Estánaturalmente indicado para a exportação brasileira onosso mercado. Aqui está um artigo em quepoderiamos offerecer vantagens ao Brasil, que,directamente pelo menos, nos fornece pouco, sob oactual regimen de exclusivo.

9.º Herva matte. Consumo inaprehensivel, mas quese podia criar, substituindo parte do chá, que entrouno paiz por um valor de 315 contos no anno de

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1906.

10.º Manganez. O seu mercado é a Inglaterra.

11.º Caroços (oleaginosos). Consumimos 20.812toneladas, das quaes perto de 11.000 são dascolonias. Devia se encaminhar a exportaçãobrasileira para Portugal, onde ella foi representada,em 1906, por 11 toneladas.

12.º Couros. O Brasil está batendo, em Portugal, osmais concorrentes; sobre 2.371 toneladas de pellesdiversas que importámos, em 1906, pertenciam-lhe1.040.

13.º Ouro nativo. É insignificantissima a entrada. Aexportação brasileira é para a Inglaterra.

Além destes artigos exporta o Brasil muitos outrosem menor escala. Desses, diremos quaes podem serdirigidos, após as negociações precisas, paraPortugal, enumerando-as pela nossa pauta:

Fibras texteis; fructas; canhamo em rama; madeiraem bruto (genero em que o Brasil podia e deviaquasi monopolizar o nosso mercado); madeira dasdiversas categorias da pauta; paus, raizes e cascascórantes; milho (cuja producção cresceespantosamente no Brasil); amido em pó;especiarias; melaço; mariscos; carne secca e emconserva―além de outros que dentro em poucotempo o Brasil poderá exportar, como o arroz.

Offerecemos pouco? Não se nos affigura que oBrasil pense em obter de um paiz com a nossapopulação o que seria licito esperar de vinte milhõesde habitantes. É certo que o Brasil nos compramuito. Em 1906 o vinho entrado no Brasilrepresentou 1.628:854 libras esterlinas: a metadedessa quantia coube ao nosso paiz. É consideravel,sem duvida. O Brasil nesse anno consumiu, danossa exportação global de 908.492 hectolitros,435.652―quasi metade! A população portuguesa,se todo o seu mercado pertencesse ao cafébrasileiro, não representaria mais do que 60.000saccas de consumo, e se este subisse ao triplo, nãochegaria a 200.000 saccas, quantidade que nãopesaria sobre uma exportação que anda por 13milhões de saccas...

Exigir de Portugal, com menos de seis milhões dehabitantes, compensações que só com dezoito ouvinte milhões poderia dar, fôra absurdo. Não ha quereceiar que o Brasil pense em semelhante coisa. O

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grande perigo reside na perda da nossa clientellapela concorrencia dos outros productores de generossimilares, pela falta de perfeição do preparo e doacondicionamento dos nossos e pela inefficacia danossa organização mercantil. A esse risco acudiriamalgumas das idéas lembradas pelo sr. ConsiglieriPedroso, na sua proposta e, dentre ellas, citaremosas constantes das alineas 1.ª, 4.ª, 6.ª e 9.ª.[10]

Quanto ao conselho da alinea 3.ª discordamos dellepor completo. Porque entendemos que o tratado decommercio, ou como se lhe queira chamar, nãopóde, em hypothese alguma, dar-nos «vantagensespeciaes que não sejam attingidas pela clausula denação mais favorecida» concedida pelo Brasil aoutros paizes. Sem poder citar os accordos que oBrasil tem, julgamos, todavia, manifesto que, se ostem com concorrentes nossos, não seria possivelcollocar esses competidores de Portugal emtamanha inferioridade. Por quê? Pela razão singelade que business is business e elles são maiorescompradores dos generos brasileiros do quePortugal...

Não se leve á conta de mau patriotismo estafranqueza. Julgamos que não faremos coisa algumaneste terreno se procurarmos favores especiaes, queponham em perigo interesses collossaes do Brasil...

Cumpre estudar o problema, nos seus termos depuro negocio e não esquecer que a nossa vantagem,aquella que nenhum outro povo póde ter, é só isto: oBrasil prefere os nossos productos, como qualquerpessôa vae á loja de um negociante, porque o estimamais do que aos seus concorrentes.

VIII

A SITUAÇÃO REAL

O Brasil é o melhor dos grandes freguezes da nossaproducção exportavel.

Em 1906, ao passo que para a Inglaterraexportavamos 11.440 contos, para a Allemanha6.651 e para a Hespanha 6.290, mandavamos para oBrasil 5.961 contos.

Mas, em compensação destas vendas, compravamos

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ao Brasil só 1.965 contos que, com os generos emtransito, baldeação e reexportação, ascendiam a2.025 contos; e dos outros paizes recebiamos, emcontos de réis:

Inglaterra 19.864Allemanha 11.173Hespanha 5.948

Da França importámos 6.836 contos contra uma exportação de 1.299, e dos Estados-Unidos 4.960contos contra 974 de exportação.

O Brasil foi, pois, então, o que sempre tem sido, onosso melhor freguez. Ao crescimento docommercio universal com o Brasil é que nãocorresponde a nossa exportação actual.

Do relatorio do sr. David Campista, ministro dafazenda do Brasil[11], em 1907, resulta que de 1902para 1906 a importação proveniente de Portugalcresceu 34,9%, contra o augmento, em egualperiodo, de: 35,6% para a do Chile; 41,8% para a daGran-Bretanha; 45,6% para a da Hespanha; 49,5%para a da França; 68,4% para a da Argentina; 83%para a da Allemanha; 86,5% para a da Suissa; e132,5% para a da Belgica.

Os valores livres no Brasil, em mil réis, ouro,moeda brasileira, dão, no anno de 1906, osalgarismos seguintes para essa importação:

ProcedenciasImportação

emcontos de réis

Portugal 19.330Chile 393Gran-Bretanha 82.619Hespanha 2.379França 27.176Argentina 31.190Allemanha 43.316Suissa 2.660Belgica 11.432Italia 9.274

Bastaria este quadro para não acreditarmos que os

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outros paizes emigrantistas nos deslocaram, nofornecimento de artigos similares aos nossos. AItalia, que é a maxima fonte da colonizaçãobrasileira actual, teve, de 1902 a 1906, umaugmento de 28,4% na sua exportação para o Brasil.E quanto exportou? 9.274 contos, em1906―metade do que exportámos!

A Hespanha, que fornece tambem muitostrabalhadores, tem uma exportação aindainsignificante para o Brasil.

Da Austria-Hungria, que viu, de 1902 a 1906,crescer 19,3% a sua exportação para o Brasil, de4.556 contos de valor, a corrente emigratoria com omesmo destino egualmente é importante.

Dessas nações só podemos considerar concorrentes,por terem varios artigos similares aos nossos, aFrança, a Hespanha, a Italia e a Austria-Hungria.

Ora, que nos diz o estatistica brasileira? Diz-nosque, em 1906, a exportação, para o nosso e paraesses paizes, foi:

Destino Valor em£

Augmento oudiminuição de

1901para 1906

França 6.507.470 + 36,66%Hespanha 196.839 + 217,61%Italia 510.118 + 34,90%Austria-Hungria 1.821.959 + 60,58%

Portugal 312.755 + 27,89%

Isto quer dizer que, de todos esses paizes, aquelleque manifesta menos tendencias para augmentar oconsumo dos productos brasileiros é o nosso. Falamos numeros, affirma-o a estatistica, que, como diz oprofessor Rodolfo Benini, é o unico meio deverificar nos phenomenos collectivos o que ha detypico na variedade dos casos, de constante navariabilidade, de mais provavel no apparente acaso,e de decompôr, até onde o methodo o permitte, osystema das causas ou forças de que taesphenomenos são resultantes...[12].

Não ha que negar a conclusão: a estatistica é ounico processo logico de estudo dos phenomenossociaes, pondéra Rameri.[13]

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O Brasil está, portanto, deante de varios paizes,como productor que precisa de escoadouros para osseus artigos. O que tem de medir, não nos illudamoscom devaneios romanticos, é a capacidadeacquisitiva, que ha nesses paizes, para os seusproductos. Porque produzir presuppõe a idéa devender. Porque vender implica a existencia de quemcompre...

O utilitarismo não é uma doutrina, no sentidophilosophico da palavra. É uma necessidade, é umaimposição da lucta pela vida. Para não morrer épreciso a qualquer povo guiar-se por necessidadesuteis, nunca deixar de ter em vista os seus interessese conveniencias. O utilitarismo é o systema que aexperiencia aconselha aos povos, que querem vivernesta hora da evolução humana, para as suasrelações com os outros povos.

Deinde philosophari... Sejamos francos.Concordemos em que não nos move o receio dadesnacionalização do Brasil, que não nos ameaçaporque não ameaça o Brasil; mas sim opresentimento de que as relações economicas dessegrande mercado estão evolvendo de modo que nospoderá vir a ser desvantajoso.

Tratemos, em summa, de nos salvar e deixemo-nosde fantasias salvadoras em beneficio alheio.

Deante do crescimento espantoso das energias dopovo brasileiro, o nosso mal é a estagnação emtodas as fórmas da actividade humana. Só o poderenorme dos elementos estaticos das sociedades e aresistencia da inercia social explicam a posição queainda temos no commercio do Brasil. Nós, pelosnossos governos e pela nossa imprevidencia, graçasá autophagia historica que permitte que nosalimentemos de glorias de um passado visto por nósao bruxolear da mais pallida lamparina critica deque ha exemplo, e graças ao espiritoprovidencialista de latinos communarios, tudofizémos, ou deixámos de fazer, para perder essaposição.

Neste momento, o que nos cumpre é reconhecer ofeliz conjuncto de circumstancias de vária ordemque ainda sustenta esse estado de coisas eaproveital-o, com energias, que hão de ser creadas,com intelligencia, que precisa ser educada, e combom-senso, que unicamente os factos pódemnortear.

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Aspirar a grandezas e prosperidades e preparal-ascom elementos de ruina e pobreza é simples epuramente um absurdo, de que deveriamos esperar,como resultado, o suicidio nacional.

Ser patriota não é rufar tambores de preconicio emtorno dos desvarios da patria. É, antes, mostrar, semmedo de affrontar alheias opiniões e sem intuitos decaptar popularidade, os vicios e erros proprios, paraque tenham, na medida do possivel, remediosefficazes. Nenhum povo se deixa levar por boaspalavras, mas pelas suas conveniencias e pelos seusinteresses, com a restricção natural do respeito pelasconveniencias e interesses justos dos outros.

A perda do mercado brasileiro seria, hoje, paraPortugal, a ruina. Confessemol-o. Por que não, se éa verdade? Ruina definitiva? Não vem a pellodiscutir se o seria. Basta que saibamos que seria,neste momento, a ruina, para que o nosso dever sejaevitar essa contingencia aterradora.

Embora tenhamos de nos preparar para um futuromenos dependente de uma só nação, é de crêr que oBrasil continuará a representar, para o nossocommercio externo, cifras pelo menos eguaes áspresentes.

No seu progresso e na sua expansão economica edemographica, cabe bem á vontade a diminutaquota com que contribuimos. E ha muito logar paraa augmentarmos. Assim saibamos e possamos fazel-o!

Outro não é o perigo real, o perigo das coisas, estáclaro...

IX

A NOSSA RAÇA «AT WORK»

Permitta-se-nos, para a comprehensão exacta, daimportancia que o Brasil vae assumindo deante detodos os povos e do português em especial, umarapida analyse do seu desenvolvimento material,que explica assás a unanimidade de attenções deque é objecto.

A exportação do Brasil em 1889, anno em que caiu

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o imperio, foi de 24.160.000 libras esterlinas.Vejamos o que ella foi de 1901 a 1906.

Annos Valores em libras1901 40.621.9931902 36.437.4561903 36.883.1751904 39.430.1361905 44.643.1131906 53.059.480

Para avaliar a força de expansão productora dada ás antigas provincias pela autonomia concedida pelonovo regimen federativo aos seus estados, basta quecomparemos a exportação de 1901 com a de 1906.A differença, n'esse curto espaço, é de pasmar.Vejamol-a:

Estados Valores em £Augmento

oudiminuição

1901 1906MattoGrosso 356.180 376.023 + 5,57%

Amazonas 4.688.477 6.643.050 + 41,69%Pará 4.053.264 6.665.191 + 64,44%Maranhão ePiauhy 192.604 652.485 + 238,77%

Ceará 139.595 822.586 + 489,27%Rio Grandedo Norte 34.376 58.342 + 69,72%

Parahyba 92.561 540.535 + 483,98%Pernambuco 1.472.105 1.333.127 - 9,44%Alagoas 489.820 514.095 + 4,96%Sergipe 8.849Bahia 3.133.103 3.706.617 + 18,30%EspiritoSanto 553.195 784.726 + 41,85%

Rio deJaneiro eMinas

7.857.423 7.481.159 - 4,79%

S.Paulo 16.140.742 20.282.593 + 25,66%Paraná 653.039 1.310.832 + 100,73%Santa

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Catharina 145.264 315.522 + 117,21%

Rio Grandedo Sul 620.247 1.563.748 + 152,12%

Só diminuiu a exportação de dois estados: Rio deJaneiro e Pernambuco. É devido este facto á baixade um dos seus principaes artigos, o assucar, que de71 réis, ouro, em 1901, passou a vender-se a 60 réis,em 1906, por kilo. Apezar desta depreciação ser de15,59%, a diminuição representou, paraPernambuco, 9,44%, e, para o Rio de Janeiro,4,79%, o que indica que houve augmento naexportação global.

Nesse periodo a importação, que significa aacquisição de conforto e de instrumentos deprogresso, tambem teve sensivel marchaascendente.

Não houve estado em que a importação diminuissede 1901 para 1906. Cresceu 31,9% na Bahia; 33,1%em Pernambuco; 32,6% no Rio de Janeiro e MinasGeraes; 42,3% em S. Paulo; e 55,9% no Rio Grandedo Sul―para citar sómente os mais importantes daregião central e da do sul.

Em globo, a importação cifra-se nos seguintesvalores em libras esterlinas:

1901 21.377.2701902 23.279.4181903 24.207.8101904 25.918.4281905 29.830.0501906 33.204.041

Estes algarismos contêm uma relevante indicação evem a ser que as facilidades de vida augmentaram,porque, não tendo havido, de 1901 a 1906, nemsequer dez por cento de crescimento na população,houve augmento de mais de 50% na acquisição deartigos estrangeiros.

O que, porém, demonstra mais clara eelequentemente essa affirmação é a importação defarinha de trigo. É o que garante e prova que a vidamelhora no Brasil.

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Com effeito, em 1901, a importação do trigo―que éo classico pão!―era de 200.000 toneladas, e em1906 foi de 320.000!

Um augmento de 60%, em seis annos! A população,nesse periodo, não podia ter accrescimo que nem delonge influisse nesse facto. A quota, per capita, detrigo é que augmentou; o numero dos que o podemcomer é que passou a ser maior...

Fala-se muito na má administração de Republica,nos seus primeiros annos. Não a negaremos. Omecanismo era novo e as experiencias foram duras.Houve deficits; precisou-se de recorrer ao credito,até quasi ser fechada essa porta. Mas, com patrioticaenergia, souberam os governos emendar a mão einiciar obras fecundas, apparelhar, emfim, o paizpara a prosperidade. Erraram; mas resgataram osseus erros. Outros ha que só erram e só queremerrar...

Os orçamentos do imperio[14] tiveram deficits desde1857, ininterruptamente. Antes, houvéra algunssaldos, que sommados, desde a independencia até15 de novembro de 1889, perfazem 32:625 contos,contra um total de 891.960 contos de deficits,tambem de 1823 a 1889.

Os deficits de alguns annos da Republica não são deestranhar, não só porque os tivesse o imperio, mastambem porque o desenvolvimento do paiz e a crisepolitica, motivada pelas tentativas de destruição doregimen popular, impuzeram pesados sacrificios ánação.

A Republica, creando producção, fomentandoriquezas, assentando linhas ferreas de penetração,fazendo portos e saneando o Brasil―soube, porém,realizar o que o imperio não soubéra, soube armar opovo brasileiro com meios seguros de pagar os seussaques sobre o futuro.

É interessante a nota da receita e da despeza dosannos de 1899 a 1907, expressa em contos de réis,ao cambio de 15 dinheiros por mil réis:

Anno Receita Despeza1899 333.105 295.3631900 353.607 448.1601901 318.559 334.513

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1902 343.814 298.6911903 408.589 378.1871904 433.802 439.5531905 463.765 451.9771906 495.910 483.5681907 483.744 472.478

Em 1889 a despeza não chegava a 200.000 contos, eo deficit era pequeno.

As despezas publicas subiram consideravelmente;mas as receitas tambem subiram. Das visinhançasdos 200.000 contos em 1889 foram ás dos 500.000em 1906. E note-se que a Constituição republicanaconferiu aos estados da federação os impostos deexportação, os impostos sobre os immoveis ruraes eurbanos, sobre a transmissão de propriedade e sobreindustrias e profissões, ficando a União nacionalunicamente com os direitos de importação e osimpostos de consumo.

O balanço economico de 1906 é assim formuladopelo ex-ministro Campista, no seu relatorio de1907:

Activo

Exportação £ 53.000.000Capital novo 4.000.000

£ 57.000.000

Passivo

Importação £33.600.000

Despezas do governo federal 5.600.000Serviço das dividas dosEstados e municipios 1.231.940

Juros de capitaes estrangeiros 3.200.000Passageiros para o exterior 600.000

44.231.940

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Saldo £12.768.060

57.000.000

É uma situação de prosperidade. Na propriaAmerica, só os Estados Unidos do Norte têmmelhor situação, apezar da Argentina ser muitomais rica do que o Brasil, dadas as respectivaspopulações e producções.

A Argentina, em 1906, exportou £ 58.000.000, masimportou £ 53.565.000. O serviço dos juros docapital estrangeiro é lá muito maior do que noBrasil. E, nesse anno, o seu balanço economico nãopodia apresentar saldo.

Força é, porém, reconhecer a incomparavel riquezada Argentina, que possue a terça parte da populaçãodo Brasil, se não menos, e cuja producção cresce emsaltos prodigiosos.

Com os Estados Unidos não ha parallelo possivel.Em 1906, importavam 271 milhões esterlinos eexportavam 369 milhões.

O Canadá, com uma exportação de £ 45.791.000,importava 54.000.000.

Cuba exportou £ 22.638.000 e importou 19.482.000.

O Mexico exportou £ 24.724.009, e importou17.997.000.

O Chile offerece-nos, para essas duas parcellas doseu commercio, respectivamente, £ 16.200.000 e11.787.000.

O Brasil figura nesse anno com £ 53.059.480exportadas e 33.204.041 importadas―quasi vintemilhões de saldo a seu favor nas permutasinternacionaes de mercadorias!

Estará, porém, esta situação prejudicada pelascondições financeiras do Brasil? Longe disso.

Em 1906, a divida interna e externa doBrasil―incluindo a divida estadoal e a emissão depapel moeda, era de £ 195.581.677 ou £ 10-3-10 percapita.

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A capitação do norte-americano era de £ 5-9-3; a dojaponês de £ 6; a do egypcio de £ 9-17-2; a docanadense de £ 9-7-4.

Quasi todos os outros paizes devem mais per capita.

A Argentina figura com o coefficente de £ 14-2-4; aHespanha com o de £ 13-2-6 e o nosso Portugal,como compete ao seu desgoverno, inverte osalgarismos da nação visinha e estadeia a capitaçãode £ 31-18-6.

Bem sabemos que outros paizes supportamcoefficientes mais altos do que Portugal. Não naEuropa, em todo o caso... O prussiano contenta-secom £ 12-8-3; o inglês com £ 18-1-6; o italiano com£ 15-7-10; o austriaco com £ 14-11-1; o francêscom £ 27-19-9; o hollandês com £ 17-6-4; o belgacom £ 17-16-8.

O Brasil, paiz que progride e inicia melhoramentos,que se povoa e coloniza, está, como a Argentina, emoutras condições: saca sobre o futuro, porque o temnos braços que acodem todos os dias ás suas plagas.Nós estagnámos. Elles recebem vida nova com oadvento dos immigrantes; nós golfamos vida naemigração.

O mal está principalmente na applicação da divida,não na pequenez da população.

Vêde as colonias britanicas da Austrália: população,5 milhões de habitantes; divida, £ 292.401.351, em1906, devendo hoje estar em 300 milhõesesterlinos! O coefficiente de capitação é de 60 £,numeros redondos. Mas que importa, se 200milhões foram empregados em caminhos de ferro,obras de portos, resgate de serviços publicos―e se,em tudo isso, as rendas supportam o serviço dejuros e amortização do capital!

Mas... estavamos a tratar do Brasil.

Os onus do Brasil são annualmente, para resgate ejuros da divida, 82.000 e tantos contos―20% dareceita. Outros paizes―um dos quaes muito bemconhecemos―fazem o serviço da divida com quasi50% da receita...

Portugal pagaria a sua divida com o productointegral de 13 annos da sua receita.

O Brasil faria o mesmo serviço em 6 annos.

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Tal é, em linhas largas, o estado do paiz, que saiudo nosso e que hoje é o principal mercado da nossaproducção e o nosso melhor fornecedor denumerario.

X.

MEDIDAS PROPOSTAS

Não é de estranhar que o desenvolvimento da naçãobrasileira motive excogitações patrioticas de algunsportugueses.

Ha um século vivia a então nossa colonia americananuma inferioridade manifesta de cultura.

Escreveu Eduardo Prado que «a intelligencianacional do Brasil,» no começo do reinado de D.Pedro II, era talvez inferior á de Portugal no começodo século...»[15]

Entretanto―o espirito partidario não nos céga―oreinado desse imperador contribuiu para o progressointellectual e material do Brasil.

E tanto assim é que o novo regimen poude adoptaruma constituição que, no dizer do professor dedireito Almeida Nogueira[16], «compendiou emsuas paginas os principios mais adeantados dodireito publico moderno» e poude fomentar, nasproporções que vimos, os recursos do paiz.

Essa nação, que assim prosperou, pertenceu aPortugal, foi obra de portugueses na civilização e nopovoamento; e, durante um largo transcurso deannos, constituiu para o nosso povo uma especie deeldorado, em que era tão facil grangear a vida que,apezar de todo o nosso atrazo, se nos affiguravaterra mal empregada em mãos de possuidores anosso vêr indolentes e sem energias redemptoras.

Foi desse juizo falso, a que nos guindára aignorancia presumida, que caímos ao fundo darealidade.

Era a humilhação. Se tivérmos patriotismo ha de seconverter em grande estimulo―porque é uma liçãode coisas...

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Á nossa ruina contrapõe-se a prosperidade da ex-colonia? Imitemol-a. Á estagnação das nossasforças responde o Brasil com provas de actividade?Trabalhemos, com o cerebro e com os musculos,sejamos fortes de intelligencia e de vontade. É onosso dever.

A economia portuguesa depende do estrangeiro.Estamos roidos de todos os males de uma politicadesleixada, egoistica e corruptora. Falta-nos onecessario ao abastecimento do paiz. Produzimosartigos para que não encontramos bastantesmercados e procuramos mercados para que nãotemos artigos adequados.

É a anarchia, de alto a baixo.

Mas não é a ruina definitiva, porque queremos vivere é indispensavel que não nos deixemos morrermiseravelmente.

O Brasil é, como dizia Silvéla dos povos hispano-americanos para a sua patria, o nosso mercadonatural. O futuro do Brasil é immenso. Toda a nossaexpansão economica póde e deve acompanhar ocrescimento fatal desse enorme paiz.

Todavia, para que isso se realize, é preciso quePortugal saiba o que é possivel fazer e deixe de ladochiméras e utopías.

Que queremos, em ultima analyse? Queremos que oBrasil continue a comprar os productos da nossaterra; queremos que a nossa exportação para lácresça sempre; queremos que os generosportugueses sejam bem acolhidos pelo consumidorbrasileiro.

Sob o ponto de vista material―é quanto desejamos.

Moralmente aspiramos á mais perfeita intelligenciacom os brasileiros.

Ignora-se em Portugal o que se havia de offerecerao Brasil no dia em que porventura se iniciassemnegociações garantidoras dos nossos desiderata.

Quem procura vantagens tem de contar com estapergunta natural: «E que compensação nos dá?»

Ora, na proposta do sr. Consiglieri Pedroso, nada,absolutamente nada, existe que possa equivaler átroca de concessões, á permuta de vantagens.

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Bem sabemos que, muitas vezes, as negociaçõescommerciaes assentam, por uma parte, em favoresmateriaes e, por outra, em apoio diplomatico e atéde caracter militar; mas, na hypothese vertente,parece mais facil darmos favores da primeiraespecie do que da segunda.

O Brasil, na proposta Consiglieri, não encontrabases de reciprocidade commercial. Nem é crivelque a procure. Não lha poderiamos dar, devido áidentidade que ha entre muitas das suas producçõese as das nossas colonias.

Approximação, sim! Amemo-nos; conheçamo-nos;abramos as nossas fronteiras intellectuaes uns aosoutros; firmemos tratados de arbitragem e dereconhecimento de titulos de habilitaçãoprofissional; promovamos congressos periodicosluso-brasileiros; fundemos uma linha nossa, luso-brasileira, de navegação; construamos palacios deexposição dos productos de cada um dos dois paizesno outro; promovamos a fundação de revistas, oestreitamento dos laços que prendem a imprensa deum á do outro paiz; entendam-se as nossassociedades scientificas, artisticas, etc.; visitemo-nos;enlacemo-nos fraternalmente.

Quanto a negocios, porém, meditemos, porque oBrasil não os faz sem meditar. E é bom que se saibaque, se o sr. Wenceslau de Lima tem visto baldadostodos os seus esforços no sentido da realização deum tratado de commercio com o Brasil, não éporque esse paiz nos hostilize, mas sim porque nãotem reconhecido a conveniencia, nem a utilidadedesse tratado. Conveniencia para os seus interesses,utilidade para os seus interesses―é claro.

Não procurou ainda o Brasil accordo comnosco.Mas procurou-o, por exemplo, com os EstadosUnidos―mercado de café e de borracha e seufornecedor de muitos artigos, entre os quaes figura otrigo.

Portugal é que deseja o tratado de commercio.Portugal é que precisa garantir o seu mercado noBrasil, como o Brasil precisava assegurar aclientella yankee.

Negocios tratam-se como negocios. O vendedor éque se esforça por trazer o consumidor satisfeito...

Esta é a verdade. De nada serve disfarçar os factos.

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O tratado de commercio é irrealizavel?

Não iremos até lá. A diplomacia consegue, ás vezes,coisas espectaculosas, mas sem real alcance.

Far-se-á, talvez, o tratado de commercio; mas, em hypothese alguma, o Brasil nos concederá«vantagens especiaes que deixem de sertransmittidas aos outros estados, não sendo,portanto, attingidas pela clausula de nação maisfavorecida inscripta nos tratados do Brasil compaizes estrangeiros».

E o café? E a borracha? E o tabaco? E o cacau? Etoda a producção brasileira, no valor de 57 milhõesde libras?

Lembremo-nos de que não consumimos meiomilhão esterlino de productos brasileiros...Ponderemos as represalias alfandegarias a que oBrasil se exporia...

Amemo-nos; mas convém ter bom senso.Estreitemos relações; mas é prudente que nos nãolimitemos ao sonho.

Tambem se fala de entrepostos, do Brasil emPortugal e de Portugal no Brasil―aquelle destinadoá exportação brasileira para a Europa e estedestinado á portuguesa para a America...

É uma ideia velha. Velha e tão velha que já não seadapta ás condições presentes do commerciointernacional.

Não se deu por isso em Portugal. É tudo assim nanossa terra. Andamos tão atrás dos outros povosque, quando as idéas nos chegam, já têm saido dacirculação. Chegamos sempre tarde, como oscarabineiros da opereta.

O entreposto!

Ha trinta annos falou-se nisso; ha vinte, voltou-se alembrar essa maravilha; ha dez, resurgia a idéanovinha em folha. Terá de apparecer, além destavez de 1909, ainda algumas duzias de vezes esempre terá―quem sabe?―enthusiasticosapplausos...

O entreposto! Ficava realmente muito bem, alli, emCacilhas! Os navios atulhados da borracha da

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Amazonia; do café de Santos e Rio; do assucar dePernambuco, Sergipe e Alagôas; do tabaco bahiano;da monazite do Espirito Santo e Bahia; e do maisque fôra longo mencionar―incessantemente adescarregarem tudo isso, alli, em Cacilhas! Outrostransatlanticos, dia e noite, alli mesmo, a encheremos porões de productos brasileiros para o Havre epara Hamburgo, Antuerpia, Liverpool, Hull,Amsterdam, Plymouth, Londres, Rotterdam,Genova, Cádiz, Barcelona, Napoles, Marselha, etc!

Que lindo movimento maritimo!

Que negocio! Só é pena que se não possa fazer...

É que as baldeações, descargas, transbordos earmazenagens onerariam os productos, que hoje vãoo mais perto possivel dos consumidores, graças auma navegação collossal sob todas as bandeiras.

É que um entreposto que torna mais caros osproductos só serve para lhes diminuir o consumo.

É que a navegação demanda o Brasil porque, aovoltar, nos paizes por onde passa ou para que sedestina existem mercados dos generos brasileiros, eporque milhares de toneladas de carga para o Brasillhe compensam a viagem até lá.

O entreposto! Quando chegámos ao Brasil, em1893, fallámos delle a um grande jornalista, amigoextremoso de Portugal e dos portugueses.

Achou a idéa engraçada e ponderou: «Entrepostoideal é o navio―porque o café precisa sair de bordoe entrar no caminho de ferro para ser torrado no diaseguinte pela manhã, moido das 10 ao meio dia etomado dessa hora em deante. No dia seguintechega outro vapor e repete-se a historia.»[17]

O entreposto em Lisboa para abastecer a Europa!Como se todas as nações estivessem desprovidas deportos e a marinha mercante fosse exclusivoportuguês...

A incuria dos nossos governos é proverbial. A faltade curiosidade basta para explicar essa incuria empessôas tomadas da mania politicante.

Se assim não fôra, saber-se ia em Portugal que,tendo o governo do Brasil organisado um «serviçode propaganda e expansão economica», lheestabeleceu quatro delegacias; que a 4.ª delegacia,

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com séde em Barcelona, tem jurisdicção naHespanha e Portugal; que, portanto, na propriapeninsula iberica, o Brasil prevê mais possibilidadede expansão economica na Hespanha do que emPortugal...

É o que nos parece logico inferir da escolha da sédeda 4.ª delegacia.

A proposta do sr. Consiglieri nada offerece aoBrasil, além do serviço de lhe evitar o perigo dadesnacionalização. O perigo não existe; logo, oserviço reduz-se a zéro.

Dir-se-á: «E a emigração?»

A emigração―eis o que realmente damos ao Brasil.

A emigração é um mal necessario: quem não temtrabalho remunerador no paiz, vae arranjal-o fóra dopaiz, e, de lá, acóde ao nosso deficit economico.

Sendo assim, nem a propria emigração pódeconstituir base de um accordocommercial―porquanto ao Brasil, que precisa detrabalhadores, não assusta a idéa de a prohibirmos.

Como prohibil-a, se precisamos della? E, se, numplano de reforma economica, cortassemos a correnteemigratoria, os mercados brasileiros talvez tivessemde se fechar aos nossos productos...

É esta a triste situação a que o regimen monarchicoreduziu Portugal!

XI

A EVOLUÇÃO BRASILEIRA

Estamos deante do Brasil em deploravel ignoranciadas suas coisas.

Não fôra esta a verdade e teriamos clara noção dosphenomenos ethnicos alli operados ou ainda emelaboração e estariamos certos de que não ha perigode desnacionalização, mas tão sómente se dá, nessepaiz, uma evolução geral logica, inevitavel e fatal.

As instituições politicas e sociaes da nação

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brasileira seguiram o seu curso, sob influenciaspeculiares ao meio americano e ás exigencias doconcerto internacional, por um lado, e, por outro,em obediencia á educação e ás aspirações do povoque se foi e ainda está constituindo dentro da nossaantiga colonia.

A raça, sem perder as suas caracteristicas iniciaes,obedeceu ao determinismo do novo meio etransformou-se, como, com as successivasmigrações, succedeu, através da historia, a todas aschamadas raças e nacionalidades.

Portugal não deu por isso. A falta de curiosidadevae neste paiz, dos que governam aos que sãogovernados; dos assumptos mais sérios aos maisfacêtos, dos factos decisivos aos incidentessubalternos da politica, da economia, das artes―detudo!

Ora, se é verdade que, em 1615, nas instrucçõesdadas a Fragoso de Albuquerque para o tratado depaz com La Revardière,[18] se dizia que no Brasil«havia mais de tres mil portugueses» e, portanto,«as suas terras não estavam despovoadas», não haduvida, todavia, de que ao predominio da nossapopulação se deveu o não ter o Brasil caido emoutras mãos, apezar das vicissitudes por que passouPortugal, volvidos poucos annos sobre essa data.

Ao fechar o XVII século, o povoamento tinhatomado incremento notavel com o descobrimentodas minas de ouro de Caethé e Rio das Velhas. Nãosómente a miragem do ouro determinou aimmigração: havia, então, um systema colonizadorno espirito dos governantes portugueses. E, emboradeficiente, o critério que dictou as doações eradigno de um governo; e os seus fructos foramvaliosos. Em 1680, uma carta régia, reveladora danoção de imminente conflicto entre colonos egentios, mandava conceder terras a estes «aindamesmo as já dadas de sesmaria visto que deviam terpreferencia os mesmos indios naturaes senhores daterra».[19]

Não se repellia o gentio.

As ondas de africanos, que, desde os fins do séculoXVI, foram atiradas sobre a America portuguesa, oindigena e o português foram as componentesethnicas do typo brasileiro.

Os cruzamentos deram-se. Fez-se a selecção lenta,sob a preponderante acção da raça superior, cujos

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attributos a hereditariedade resalvou da existenciatransitoria do mestiço.

Estudando este phenomeno, Euclydes da Cunha,alto espirito de artista e pensador, escreveu que «araça superior se tornára objecto remoto para quetendiam os mestiços deprimidos, e estes,procurando-o, obedeciam ao proprio instincto daconservação e da defeza».

Junte-se a este facto, comprovado pela historia detodos os cruzamentos desse genero, o axiomaethnologico da tendencia das raças eugenicas parasubordinarem ao seu destino os elementos inferiorescom que se encontram e ter-se-á explicada ahegemonia do português na formação do typo novo,a que se refere Sylvio Roméro.

Não foram exterminadas as raças inferiores; foramabsorvidas lentamente, eliminadas peloscruzamentos sempre ascendentes. Tanto assim foique, apezar da enorme superioridade numerica dosafricanos, a immigração escassissima dos lusosindo-europeus foi capaz de formar a maioria brancaque ha no Brasil e que é uma evolução ainda nãobastante differenciada do typo português.

A nossa resistencia, como raça colonizadora,apresentou na America uma prova sem par. Asobreposição das heranças psychicas das raçasfundidas quasi se não distanciou da parcellalusitana, apesar da nossa falta de cultura nos tresséculos ultimos e apezar do evidente accrescimophysiologico da população ser devido aoscruzamentos.

Com absoluta razão, e em contrario do que affirmouo visconde de Ouguella na Questão social,sustentou o sabio brasileiro dr. Luiz Pereira Barrettoque a raça portuguesa não degenerou.

Não é, diz o dr. Barretto, um caso de degeneração, mas sim de inhibição cujas causas, a seu vêr, seencontram na educação clerical e na subservienciados poderes publicos ao clericalismo.

O Brasil curou-se desse mal, que ainda domina anossa terra.

O que se vê da estratificação dos primeiroselementos constitutivos da população do Brasil é aconservação das linhas geraes do typo português,com os seus defeitos, mas com as suas qualidades

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de adaptação e de resistencia.

Foi com essa massa que, a partir da abertura dosportos da ainda colonia ao commercio universal, setiveram de encontrar, em escala cada vez maior, oscolonos europeus de outras linguas.

Não se verificava, apezar do atrazo do português edo brasileiro, a hypothese da collisão de uma raçasuperior, a exótica, com outra inferior, a nossacommum.

Se tal acontecesse, repetir-se-ia a selecção realizadacom os indios e africanos, selecção que, desta vez,seria em prejuizo dos luso-brasileiros.

Ora, é precisamente o contrario―isto é, a absorpçãodo elemento exótico―o phenomeno que se tem dereconhecer na fusão de raças operada no Brasil,visto que, apezar da superioridade numerica dessesexóticos sobre os immigrantes portugueses, o typobrasileiro não se alterou sensivelmente e ascaracteristicas nacionaes permanecem intactas epredominantes nos proprios descendentes de gentede lingua estranha.

Daqui tem de se inferir que os dezoito a vintemilhões de brasileiros―a estatistica dirá, em 1910,se são mais ou menos―possuem energias nacionaescapazes de subordinar os adventicios ao seu modode ser proprio.

A civilização varía de clima para clima.

O homem, ao expatriar-se, está condemnado, poruma fatalidade invencivel, a aspirar, para si e para asua descendencia, á civilização adequada ao paizque escolheu para domicilio.

Por isso, o emigrante procura, em regra, as regiõesem que a sua adaptação é menos violenta.

Por isso, como diz Cesar Zumeta[20], «quaesquerque sejam as raças povoadoras, na zona tórrida nãoimperará senão uma civilização lentamenteprogressiva».

Por isso, o italiano e o allemão se congregam nosestados do sul do Brasil.[21]

Por isso, finalmente, todos os estrangeiros das raçassuperiores são assimilados no Brasil, cujo meio,antes de se modificar, os modifica a elles, até a suacompleta identificação com o typo nacional, que, é

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claro, por sua vez tambem se transforma, comoacontece aos typos de todos os outros paizes.

As migrações nunca deixaram de ter este resultado:adaptam-se ao meio, mas influem na sua evolução.

XII

O BRASIL E O AMERICANISMO

Perguntar-se-á se achamos que, apezar de tudo, seconservarão no povo brasileiro, indissoluveisaffinidades com o povo português.

O caso dos Estados Unidos da America, em quesommam nove milhões de habitantes os cidadãos deorigem alleman, inclina-nos a prevêr que assim viráa ser. Esses nove milhões fundiram-se dentro damassa yankee; e conservou-se o caracter anglo-saxonio do povo americano.

Ha differenças entre o inglês e o yankee. Decerto;mas os traços dominantes são communs; cada vezmais se estreitam os laços que prendem os doispovos e maior é a influencia de um sobre o outro.

A differenciação lenta do brasileiro do português éum facto, do qual, porém, não é licito tirar illaçõespessimistas quanto ás futuras relações entre ambosnem agourar phenomenos de desnacionalização.

O Brasil de ha muito que está em progresso, sob todos os aspectos. Portugal não está parado: a suaevolução é regressiva; vive á procura de umMessias, com instituições cada vez maisanachronicas, resistindo á democracia triumphanteem todo o planeta...

São dois povos que seguem rumos divergentes eque, portanto, não se encontrarão nunca mais, salvose um delles se decidir a tomar o caminho dooutro...

O Brasil, pela sua integração no corpo democraticoamericano, pelas exigencias da politicainternacional e por tendencias de ordem politica,economica e moral, que demonstrava desde a suaindependencia, poude transformar-se por completo.

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A raça regenerou-se, livrando-se das causas dainhibição, que a combalia.

O espirito americano já não póde ser consideradosimples phrase de jactanciosa literatura politica paraeffeitos oratorios. É uma realidade.

Toda a America latina evolve segundo normasnovas. Donde surgiram essas normas? Da influenciada civilização norte-americana, não ha duvidaalguma.

Os hispano-americanos estavam realmente feridospela tempestade, como dizia Castelar. Era atempestade resultante do conflicto da civilizaçãoancestral com o meio. Verificava-se, mais uma vez,que a cada clima convém uma civilização especial,que não ha, no planeta, uma civilização uniforme etypica.

A adaptação lenta do que, da civilização norte-americana, podia coadunar-se com os nucleosdiversos do povoamento da America, gerou acorrente de sentimentos e de idéas que, porconstituir uma série de evidentes pontos de contactoentre os povos americanos, teve a denominação deespirito americano.

Este espirito, em que pése aos snobs queachincalham o papel da democracia norte-americana, derivou da attitude dos Estados Unidosdeante da ameaça de intervenção da SantaAlliança―tão santa como a Inquisição!―a favor daHespanha e contra as colonias que se lhe tinhamdeclarado independentes.

Bem sabemos que o governo americano hesitoudeante da situação. A Santa Alliança era poderosa eos Estados Unidos eram, então, uma naçãorelativamente fraca.

Em 1823, o presidente Monröe, com o auxilio daInglaterra, ou sem elle―pouco importa―resolvia-se, afinal, a assumir a posição de que havia dedecorrer a chamada mais tarde «doutrina deMonröe».

Foi na mensagem de 23 de dezembro do referidoanno. Dizia o presidente dos Estados Unidos, depoisde exprimir o seu respeito pela partilha, entãoconsummada, da America:

«Em relação aos governos que declararam e têm

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mantido a sua independencia, a qual, depois degrande reflexão e obedecendo a principios dejustiça, reconhecemos, toda e qualquer interferenciapor parte de alguma potencia européa com o fim deos opprimir e de qualquer forma pesar sobre os seusdestinos, só poderá ser olhada por nós comodemonstração pouco amigavel feita aos EstadosUnidos.»

Esta é, em resumo, a célebre doutrina com que, ánascença, se viram protegidas as republicashispano-americanas. É certo que os inglesessecundaram, no proprio interesse, a defeza dessesnovos estados proclamada por Monröe.

Mas, se essas nações estavam, até certo ponto,garantidas contra a antiga metrópole, deviam-no áiniciativa dos Estados Unidos. A sua marchaevolutiva tinha de resentir-se desse facto e ainfluencia, que o progresso vertiginoso da união doNorte veiu a exercer sobre ellas, accentuou aindamais profundamente a idéa de que interessessuperiores prendiam entre si os povos americanos.

O espírito americano, sobre essa base effectiva da protecção reciproca do principio nacional, não podiadeixar de se fortalecer e consolidar.

Para isso contribuía a differenciação que o meio eos cruzamentos ethnicos impunham a esses estados,apartando-os mais e mais, se bem que lentamente,dos colonizadores.

O esforço das sociedades hispano-americanas parase adaptarem ao espirito americano, desvincilhando-se de instituições e costumes do outro lado doOceano, é a explicação que dão todos os sociólogos,que estudaram o phenomeno, das suas luctas civis edos seus frequentes eclypses de legalidade.

Não assim com o Brasil. A evolução brasileira, até oinicio do derradeiro quartel do século passado,operou-se quasi livremente do espirito americano.Quasi, dizemos, porque a sua influencia se encontraem todo o imperio como elemento modificador dastendencias, intrinsecas do povo brasileiro.

É facil comprehender a disparidade apontada.

Em primeiro logar, a antiga colonia americana dePortugal constituiu um imperio, uma realeza, sobum principe português. Pedro I do Brasil, mais tardeIV de Portugal, já não poude deixar de conceder ao

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Brasil o systema representativo, despojando-se dosattributos divinos da realeza absoluta. É que aAmerica, pelo seu espirito, já não podia tolerar essainstituição politica ainda vigente em Portugal.

Não ha barreiras nem muralhas chinesasimpermeaveis ás idéas; e o principe português, aosentar-se no unico throno da America,comprehendeu essa verdade.

A Pedro IV deveu Portugal a dadiva de um systemavasado nos mesmos moldes que elegêra o auctoringlês a quem o filho de João VI e Carlota Joaquinaencommendára a primeira...

Tanto basta para vêr, com nitidez, que a evoluçãobrasileira não estava destinada a seguir, desde aindependencia, o espirito americano.

O phenomeno politico-social occorrido no Brasildefendeu, durante largo periodo da sua elaboraçãonacional, as affinidades entre a antiga metrópole e aex-colonia contra as idéas e os sentimentos de queos Estados Unidos iam impregnando os maisestados do Novo Mundo.

Ao passo que os hispano-americanos, sob novasinstituições politicas, entravam em violentadifferenciação com a Hespanha, os luso-americanos,logo após a separação, tinham convivio intimo efamilial com Portugal e dos portugueses recebiam eaos portugueses transmittiam, num commercioininterrupto, idéas e sentimentos.

É, pois, absolutamente diversa a historia dosdescendentes dos dois povos da peninsula ibérica.

Não foi senão nas duas ultimas décadas do imperioque os brasileiros denotaram o influxo americano.

O casamento civil dos acatholicos e a questão daextensão do estado civil, o debate jornalístico ácêrcada liberdade de cultos e da secularização doscemiterios e a idéa de federar as provincias[22] sãoprovas da acção americana, que, no Brasil,continuava, assim, a obra encetada quando seadoptára o principio da eleição, se bem querestricta, dos membros da segunda camara, osenado.

Dahi por deante accentuou-se o contagio e oestatuto politico saido da revolução de 1889consagra de maneira definitiva a adhesão do Brasilao americanismo.

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A lei basica de 24 de fevereiro de 1891 é calcada naamericana de 1787, na qual Gladstone via «acreação mais admiravel que a intelligencia humanaproduziu de um só jacto».

Não são, todavia, bem fundadas as criticas queattribuem á adopção desse modelo institucional ocaracter de uma quebra de continuidade na historiado Brasil. Se assim fôsse, tambem não teria outrosignificado o advento do regimen representativo,nos paizes antes sob realezas absolutas, a valerinviolaveis e sagradas.

Os povos, por mais que o queiram, não interceptamo curso da sua historia. Quando o arbitrio o tenta,logo surge a reacção invencivel do seudeterminismo a repôr tudo no logar adequado e nosnecessarios termos.

Mudam-se, de uma hora para outra, os systemaspoliticos, que são obra de interesses colligados edefendidos pela força material do poder detentor dasarmas, dos sellos do estado e das arcas da nação.

Não se mudam, porém, em dias, nem ás vezes emannos, os systemas sociaes, conjunctos de institutosjuridicos, de tradições e de costumes, que evolvem,sem saltos, serena e continuamente.

O Brasil passou de um imperio centralizado a umarepublica federativa. Mudou de regimen politico;mas conservou, melhorando-as, como preceitúaComte, as suas instituições sociaes.

Não o affirma, de modo frisante e de per si, o factode ter ainda em vigor as ordenações do reino,modificadas, natural e logicamente, por leisexigidas, em todos os ramos do direito, peloprogresso humano e pelo progresso nacional?

Portugal codificou o seu direito civil. O Brasil aindanão o fez; mas a verdade é que a sua legislaçãofragmentaria revogou e alterou, de accordo com asnecessidades dos tempos, as velhas leis portuguesas,aproveitando, dellas, o que podia em cada momentoser conservado.

Este feitio da vida juridica brasileira denota raroapêgo ao passado e constitue eloquente protestocontra a asseveração gratuita de que o Brasilpropende voluntariamente para se afastar do espiritodas leis portuguesas. Era-lhe, porém, impossivelcrystalizar dentro da rigidez de normas legaes

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correspondentes a um estadío transitorio do seudesenvolvimento. Transformou-se, porqueprogrediu. E, como, ao progredir, não podia ficar apar da nossa marcha morosa e ás vezes regressiva,distanciou-se de nós e acceitou as idéas que ás suascondições mais quadravam.

O meio politico e social do Novo Mundo assimilou,afinal, o espirito juridico brasileiro; comtudo, opovo brasileiro permaneceu, no ponto de vista dalingua, das tradições moraes e da propriaconstituição da familia, muito chegado e proximodo povo português.

Por quê? Pela simples razão de não haver o Brasilassentado a sua ascensão para a radiosa doutrinaamericana sobre os destroços das conquistasdefinitivas dos seus maiores e das suas proprias.

No Brasil não se violentaram os costumes, crenças etradições fundamentaes do povo. Eliminou-se o queo desfiar dos annos tornou caduco ou discordante danova sociedade. Não houve rompimento com opassado e, portanto, no dizer conceituoso de Burke,«não se desorganizou o futuro» porque seaproveitou «a experiencia accumulada de geraçõessuccessivas».

Esta sequencia do espirito juridico, que caracteriza edistingue a raça anglo-saxonia, revela-se, mais doque em todas as nações ibero-americanas, no Brasil.

Assim é que o Brasil, mais do que todas essasnações, mantem radicaes affinidades com o seupovo de origem, com Portugal. É no sul o que nonorte do continente é a federação americana: ambasrepresentam typicamente os colonizadores, muitoembora as condições politicas, as exigencias doambiente novo e a fusão de raças estranhas tenhamestabelecido, entre os dois ramos de cada umadessas familias, signaes distinctivos e peculiares.

O que se deu em ambos os paizes está compendiadona phrase de Story[23]: «O direito da Inglaterra nãodeve ser considerado a todos os respeitos como o daAmerica. Os nossos maiores trouxeram os seusprincipios geraes e defenderam-no como o seudireito patrimonial. Mas trouxeram-no comsigo eadoptaram sómente a parte applicavel á suacondição.»

Com effeito, como vimos, o Brasil tambem adoptousómente a «parte applicavel á sua condição». Assim

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foi que repudiou a camara dos senhores e instituiu ados senadores, em que a democracia americanaenxertára o principio da eleição popular.

Isto já no imperio! Na Republica, em consequenciado regimen adoptado e de precendentes influenciasintra-continentaes, a doutrina do aproveitamento daparte do direito tradicional applicavel á condição donovo povo tinha de ser posta em pratica maislargamente. Era inevitavel. Ia-se proceder a umaselecção á qual tinham de succumbir muitos dosarchaicos e obsolétos principios do direitoportuguês, já adaptado ao ser introduzido no Brasil.

Apparecia, na reconstrucção republicana do Brasil,o agente differenciador americano, que já lhe nãoera estranho. Encontrava, porém, no proprioregimen politico, facilidades que antes lhe tinhamfaltado.

A Constituição Brasileira, de 24 de fevereiro de1891, foi o promotor principal desta reforma, que, aperdurar o alheiamento de Portugal ao progressocontemporaneo, parece destinada a precipitar odivorcio entre as duas civilizações.

XIII

AS DIVERGENCIAS

Agora, volvidos vinte annos sobre a quéda doimperio de D. Pedro II, não é licito a pessôas de sãojuizo admittir a possibilidade da restauraçãomonarchica.

A Republica é definitiva. Com os della estãoconfundidos os destinos nacionaes.

Em vão, em 1896, o visconde de Ouro Pretoexprimia, na carta-prefacio dos Fastos daDictadura, de Eduardo Prado, esperanças derestauração e dirigia uma saudação «á phalange dosbatalhadores do porvir, investidos da sagradamissão de sanar os males causados á sociedade»brasileira, «reencaminhando-a aos seus luminososdestinos»!

Em 1900, o sr. Joaquim Nabuco, num artigo daNoticia, confessava que havia muito que a «sua

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attracção politica» era «para se conciliar com osnovos destinos do paiz, quaesquer que ellesfossem». E quando se realizou o 3.º Congresso Pan-Americano no Rio de Janeiro, o preclaro diplomataexplicou a sua adhesão ao novo regimen peloreconhecimento de que só com a Republica a suapatria podia realizar a parte que lhe compete na obracontinental decorrente da doutrina de Monröe.

As novas instituições incorporaram o Brasil ao pan-americanismo.[24]

O exito republicano consolidou essa transformaçãoe garantiu a continuidade de acção do espiritoamericano na vida nacional brasileira. Não haduvida.

Vinte annos de democracia, num paiz em que nãohavia privilegios de casias, bastam para tornardefinitiva a abolição do velho systema politico, comtodas as suas consequencias e para dar consistenciaindestructivel á actual ordem politica e ás suaslogicas illações sociaes.[25]

Quem tinha quinze a vinte annos, ao ser proclamadaa Republica, conta hoje entre trinta e cinco equarenta annos: fez-se homem na Republica.

E quem tinha menos do que essa edade recebeueducação absolutamente republicana, formou o seuespirito nos principios trazidos pela orientaçãopolitica americana.

É, portanto, a parte activa da sociedade brasileiraque representa as aspirações pan-americanistas.

O futuro pertence lhe. Nella abdicam os queconseguiram accommodar-se dentro das instituiçõesnovas e os que, por uma incompatibilidade intima,quasi organica, estão condemnados á abstenção parao resto dos seus dias.

A essencia do espirito americano é a liberdade,comprehendida como a maxima amplitude deixadae garantida á acção individual.

Diz um publicista notavel que, se o principio doself-government é um axioma politico para o norte-americano, o seu complemento, no terreno social, éo self-help, base dos direitos individuaes.

A soberania do direito, alicerce do direito publicoanglo-saxonio, oppõe-se a que as garantiasindividuaes sejam postergadas pelo povo ou pelos

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seus mandatarios. É o que Laboulaye exprime,quando diz que os direitos individuaes, naConstituição Americana, são consideradospreexistentes e superiores á Constituição.

A Constituição Brasileira, no seu artigo 72, em quefoi mais completa do que a de 1789 na declaraçãodos direitos do homem e do cidadão, consagra adoutrina americana.

Eis uma divergencia essencial entre o Brasil ePortugal ou qualquer outro estado do continenteeuropeu. Com effeito, pondéra Arthur Orlando,professor de direito no Recife:

«Segundo o direito europeu compete ao soberanoregular de modo absoluto as relações entre osparticulares e os poderes publicos. No direitoamericano, vis-à-vis das auctoridades publicas, oparticular tem direitos imprescriptiveis,inalienaveis, cuja garantia compete aos tribunaesjudiciarios.»[26]

«Em face dos principios do direito constitucionaldas nações européas, o soberano, chame-seimperador ou povo, não encontra obstaculos á suavontade: perante os principios do direitoconstitucional dos povos americanos, os direitosindividuaes estão ao abrigo da acção, mesmocollectiva, dos poderes publicos, e, portanto, isentosde todo ataque.»[26]

Mas desta differença deriva outra, por egualimportante.

O poder judiciario americano véla pelo respeito dosdireitos individuaes, cohibindo as exorbitancias dosoutros poderes, isto é, tanto do executivo como dolegislativo.

«As leis―lê-se em Story―sem tribunaes queinterpretem e indiquem o seu verdadeiro sentido eapplicação, são letra morta.»[27]

Foi com o mesmo fim que a Constituição Brasileira,art.o 59, III, § 1.º, alinea a, deu ao SupremoTribunal Federal competencia para julgar davalidade ou applicação dos tratados e leis federaes edas leis e actos dos governos estadoaes.[28].

No Brasil e na Argentina, como nos Estados-Unidos, não é raro vêr o poder judiciario decretar,por sentença, a inconstitucionalidade de leis votadas

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pelo Congresso e sanccionadas pelo poderexecutivo.

Aliás, a tendencia do espirito americano é pararesolver todas as questões de direito por tribunaescompetentes. O julgamento arbitral é a forma dedecidir os litigios internacionaes.

O Brasil, cuja lei basica, art.o 88, prohibe as guerrasde conquista, tem demonstrado amplamente a suaadhesão ao arbitramento.[29].

E, sem pormenorizar a doutrina Drago, em que oex-ministro argentino quiz firmar o principio da nãointervenção armada para a cobrança de dividas deestados, é evidente que, na America, se caminhapara um accôrdo de que ha de resultar uma justiçainternacional, continental pelo menos, destinada adar realidade ao espirito americano nessa espherajuridica.

E essa tendencia, como observa Calvo[30], «ha detransformar as relações entre os povos, porque,hoje, não ha meias soberanias e a America cada vezha de pesar mais nessas relações»,[31] com a entradados seus estados na linha das forças com que se teráde contar, como se contou sempre, para que odireito internacional tenha sancção e se torneeffectivo.

Nesta materia tambem nos vamos inevitavelmenteafastando dos nossos irmãos de além-mar:quedámo-nos atidos e atados á enygmatica,mysteriosa e confusa politica, que consiste em ter enão perder o apoio de uma grande potencia, a qualtem sido a Inglaterra, mas que, ahi por 1886 a 1891,esteve para ser a Allemanha...

Não nos móve a consciencia do nosso destino;tratamos de alcançar arrimo. Não obedecemos ainteresses claros da nacionalidade nem a exigenciasda nossa expansão, nem sequer a affinidades decultura ou imposições da economia portuguesa:requestamos um bom encosto, embora só nos sirvapara satisfazer vaidades e pavonear forças alheias.

Seria longo enumerar todos os aspectos sociaes emque divergem, já neste momento, os povosbrasileiro e português. Não ha, porém, duvidaalguma de que a causa primordial desse facto, que afatalidade do menor esforço ha de estender eampliar de dia para dia, é o espirito americano, que

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incorporou, afinal, na consciencia continental, aconsciencia brasileira.

Os povos de toda a America sentem que têmdestinos communs no desenvolvimento dahumanidade.

O Brasil não podia deixar de commungar nessesentimento. Em todas as manifestações da sua vidaactual é facil reconhecel-o:

É o resultado da acção exercida pelos Estados-Unidos, cuja constituição, «sobre a qual são vasadastodas as constituições politicas dos povosamericanos», creou um direito novo, sui generis.

Sui generis é, com effeito. A capacidade juridica damulher, que na Europa não é completa nem naGran-Bretanha, é-o nos Estados-Unidos. «Pódepraticar qualquer acto juridico ou extra-judicialindependente da auctorização do marido», dizArthur Orlando.

A essa corrente obedeceram, no debate recente deum projecto de lei regulador da dissolução dovinculo conjugal, alguns dos mais adeantadoslegisladores brasileiros.

Á liberdade de testar, principio inherente áformação individualista dos povos anglo-saxonios,tem de se attribuir o dispositivo da lei brasileira de31 de Dezembro de 1907, que confére «ao testador,que tivér descendente ou ascendente successivel, afaculdade de dispôr de metade dos seus bens», emvez da terça parte.

É um passo dado para a conquista de mais essaliberdade, á qual, em grande parte, devem ingleses eyankees a sua iniciativa e, portanto, o exito na luctapela vida.

Nós, latinos, avergados ao pavor do principio daauctoridade, veneradores do estado providencia,picados da tarantula romana das conquistas e dapartilha das presas, revendo na gloria das armas afórma ancestral e exclusiva de triumphar―estamoshoje, como ha trezentos annos, naquella these deque a herança é um dever que os paes cumprempara com os filhos.

Não é, porém, só isso.

Ao mesmo espirito já era devida a instituição:

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1.º Do habeas-corpus, no estatuto basico daRepublica, art.o 72 § 22;

2.º Da responsabilidade do chefe da nação por meiodo impeachment ou accusação pela camara, art.os 53e 54;

3.º Da competencia privativa do poder legislativopara orçar a receita e fixar a despeza, art.o 34 § 1.º,e para resolver definitivamente sobre os tratados econvenções com as nações estrangeiras, art.o 34 §12.º;

4.º Da indissolubilidade do Congresso[32], da suareunião de direito proprio, e da faculdade privativade deliberar sobre a prorogação e adiamento dassuas sessões, art.o 17 e seus §§;

5.º Da concessão aos estrangeiros de todos osdireitos pelo art.o 72 dados aos nacionaes, entre osquaes a liberdade de cultos e o ensino publico leigo.

Em Portugal nada disso existe. Como se ha dequerer que caminhem parallelamente povos quedivergem tão radicalmente nos seus costumespoliticos e nas suas concepções juridicas?

Pura utopía! Vêde o que contrapômos a esses cincopontos enumerados acima:

1.º Não ha garantias que defendam os cidadãoscontra o arbitrio da auctoridade: o juizo deinstrucção criminal―por suspeitas e denuncias!―prendeu, por quasi tres mezes, quatro homens,para o inquerito sobre o regicidio;

2.º A irresponsabilidade do chefe da nação éconstitucional; o caso dos adeantamentosestereotypa o nosso estado em materia deresponsabilidades dos proprios ministros,responsaveis, segundo a ficção legal;

3.º A dictadura financeira é a regra, a que só se foge«quando os ares andam turvos»: o orçamento,confessaram-no todos os partidos portugueses, éuma mentira; quanto á competencia do parlamento,em materia de tratados, basta citar o caso maisrecente, o tratado luso-sul-africano, em que aopoder legislativo... se reservou a nobre funcção denão o discutir sequer;

4.º A camara electiva em Portugal foi dissolvida

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quasi systematicamente durante o reinado do reiCarlos, já o foi neste e quanto a prorogações eadiamentos só se não dão os que o governo nãoquer; as côrtes não se reunem de direito proprio; é orei que as convoca;

5.º Dos direitos do estrangeiro em Portugal avalie-sepela expulsão de Souza Carneiro, Salmerón eFrancisco Ferrer, entre muitos mais; a liberdadereligiosa aquilata-se pelo julgamento recente de umjornalista republicano em Vizeu; o ensino leigodefine-se pela obrigação de recitar préces catholicasnos actos da Universidade. É verdade que, antes dejurar defender a Patria, o rei tem de jurar, pelaCarta, manter a religião catholica, apostolica,romana!...

Isto tudo acontece neste paiz de gloriosas tradições,regido por formulas já esquecidas pela maioria dospovos civilizados.

Será, por acaso, a nossa terra uma das wastedcountries (paizes desperdiçados, não utilizados) aque alludiu, ha annos, sir John Lubbock?

Será um desses estados para que o patricio e nossotristemente conhecido marquez de Salisburyaconselhava a expropriação por utilidadeinternacional?

Dir-se-ia Portugal transferido para os trópicos, cujaherança, no dizer de Kidd, está sendo agoradisputada, depois da conquista da terra habitavelpela raça branca.[33]

XIV

A APPROXIMAÇÃO

Não é facil comprehender como o conjuncto de leis,costumes e pendores, que acabamos de summariar eindicar á attenção dos homens de intelligencia e boavontade, tivesse, em regra, escapado ao espirito dosconselheiros da nossa terra de doutores.

Não ha, todavia, vestigio algum de que sehouvessem apercebido da realidade os nossosestadistas de pechisbeque nem tampouco os argutosdiplomatas, que sáem do favoritismo cortezão para

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o desempenho das suas missões com o cérebrovasio de idéas e até das noções elementares dasmais comesinhas coisas divulgadas pelasbibliothecas populares com que a limpidaintelligencia francesa procura chamar ás cercaniasda civilização as gentes retardatarias.

Que aos cidadãos portugueses, que formam o grossodos setenta e tantos por cento que a estatisticadeclara analphabetos, seja inattingivel ophenomeno, admitte-se, explica-se e justifica-se.

Mas que, nas proprias classes tidas por cultas e, defacto, dirigentes, se pense ainda que o Brasil nosfóge das mãos e que o podemos e devemos segurar,bastando para tanto a vontade de o fazermos; que,nessas classes, se attribua a animadversão por partedos governos brasileiros o que deflue logicamentedos elementos vitaes das sociedades; que, nessesmeios venturosos, se procurem soluções a umproblema, que se presume conhecer mas realmentese desconhece, e não se lembre ninguem deinvestigar os seus precisos termos―é symptomaalarmantissimo para todos aquelles que ainda amamesta nossa patria e aspiram a uma vida nacionaldigna e próspera.

Acaso ha quem julgue que perduram no Brasilresentimentos contra a antiga metrópole?

Acaso toda essa gente graúda e fútil não tem olhospara vêr e ouvidos para ouvir?

Não chegam á sua intelligencia preguiçosa nem ásua alma embotada pelo egoismo as provasconstantes de intenso affecto que os brasileiros nosdão?

Não se sente em Portugal que as nossas máguas e asnossas alegrias fazem pulsar, para lá do Atlantico,milhões de peitos e tremer milhões de labios em queas primeiras palavras balbuciadas o foram na linguacommum?

Triste, tristissimo estado da nossa alma, vergonhosacondição da nossa intelligencia!

Mandemos ao Brasil homens intelligentes, que lheestudem a vida sob todos os aspectos e venhamesclarecer-nos.

Deixemo-nos de confiar em diplomatas, que sabemelegancias e pragmaticas, mas ignoram as maissingélas noções dos phenomenos sociaes,

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economicos e juridicos.

Os nossos colonos no Brasil, os nossos patricios quelá trabalham em qualquer esphera da actividade,valem muito mais, para a indicação dasnecessidades das relações luso-brasileiras, do quetodos os viajantes que têm saído do Terreiro doPaço, para destinos varios, a curtir saudades damanga de alpaca e do Deus guarde a V. Ex.a dopapelorio nacional.

Desta desidia collectiva, em que o menos culpado eo mais sacrificado é o povo laborioso e honesto,resultou a absurda situação em que nosencontramos.

Reconhecemos―dir-se-ia que de subito!―que, nofim de contas, o português encontra concorrentesnas outras raças que contribuem para o povoamentodo Brasil...

Não foi sem tempo; mas, infelizmente, nãoatinamos com o caminho que nos convém! Serão asleis inflexiveis da historia que hão de nosencarreirar para essa senda.

Por nossa vontade ou contra o nosso querer,havemos de lá ir ter.

Basta que assim seja para que presintamos, noanceio geral por estreitar os laços que prendem ospovos de lingua portuguesa, promessas de que vemperto o dia da redempção desta terra em que oshomens livres parecem escravizados, em que tudotransuda o bafio de remoto passado e tudo é bolôr,caruncho e poeira.

Com que então queremos approximar-nos do Brasile mais intimamente conviver com elle?

Vamos, pois, procurar «unificar ou pelo menosharmonizar a legislação civil e commercial» dosdois paizes?

Ora, ainda bem! Aos republicanos portugueses sorriessa idéa. Já o dissémos na introducção a estaspaginas.

E sorri porque traria a Republica, se nós a nãopudéssemos fazer num impeto dignificante; porquesó a Republica póde levar Portugal a entender-se, dequalquer modo, com o Brasil republicano.

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A legislação commercial e civil! Como conciliar osdois povos, sob esses aspectos do direito, seemquanto lá no Brasil tudo tende a amoldar-se aoregimen politico e ás instituições sociaes e juridicasdo continente―como deixámos exposto―cá emPorttugal nada caminha para a democracia, tudoretrocéde para o absolutismo de ha um século?

Ide pedir a um cidadão affeito á garantia do habeas-corpus que se despoje della e acceite as delicias doinquisitorial Juizo de Instrucção Criminal, alli áParreirinha...

Chamae os lavradores de um paiz em que existe ocredito real e o credito agricola, a mobilisação dovalor da terra e do valor da producção, e perguntae-lhes se lhes apraz voltar á condição dos agricultoresdo nosso Alémtejo...

Invertei, porém, os papeis e vereis como oalémtejano corre febril e esperançado a abraçar asinstituições que florescem nos paizes da America ecomo o lisboeta acolhe com enthusiasmo o habeas-corpus...

Mas os factos affirmam que dependemoseconomicamente do Brasil, que convém ao Brasil ocolono português e que, além da lingua, hapoderosos vinculos, principalmente de ordemaffectiva e psychica, entre os dois paizes.

Queremos, lá e cá, viver como uma só familia. Nãohaverá, para isso, razões de conveniencia e deinteresse, mas ha razões de sentimento, a que oshomens nunca se furtam.

O exemplo anglo-americano é caracteristico.Quando foi da famosa nota comminatoria dogabinete de Washington ao de Londres, a propositode Venezuela e no tempo de Grover Cleveland,pareceu que o resfriamento ia abrir éra nova.

Puro engano!

Os Estados-Unidos e a Gran-Bretanha cada vez seligaram mais intimamente e a influencia que, sobreesta, exerce aquella nação é tal que fôra loucuranegal-a.

A propria crise dos lords que vem a ser senão osurto da opinião democratica yankee dentro dademocracia inglesa, socialmente congénere daamericana?

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Que querem os liberaes, os radicaes, os socialistasdo Labour Party[34] e todos os que acompanhamAsquith, senão realizar a idéa americana do senadoelectivo e fazer prevalecer, no tocante á iniciativaorçamentaria e tributaria, a doutrina que determinoua independencia dos Estados Unidos?[35]

E tamanha é a influencia yankee na vida inglesa quehomens da estatura de William Stead e de Westlakejá falaram na americanização da Gran-Bretanha...

Não é, porém, isolado o facto. A rapidademocratização italiana que os nossos liberaes dasduzias attribuem ao, aliás, unico principeintelligente que reina em nossos dias―não passa,no criterio dos mais eminentes sociólogos italianos,de inevitavel consequencia da emigração para aAmerica republicana, progressiva e trabalhadora.Fare l'America ha de redundar num novo fare da se,desta vez proferido pelo povo ao conquistar a possedos seus destinos!

Todos os convivios prolongados e intimos de povosdifferentes os conduzem ao nivelamento de cultura.É o facto sociologico correspondente ao physico doequilibrio dos liquidos em vasos communicantes.

As necessidades do progresso humano e asexigencias da ordem social são os unicosindicadores do sentido que esse nivelamento tem detomar.

Caso typico é o da alliança franco-russa: ella nãopodia, como os energumenos realistas suppuzeram,levar a França á monarchia, mas tinha de arrastar oimperio de Nicoláo para o systema representativo,que, afinal, reconheceu a existencia do povo e o seudireito a intervir na gestão da sociedade, que o seutrabalho alimenta e enriquece.

Deante da nação brasileira, cuja cultura já nãopodemos pôr em duvida, cuja expansão alenta onosso organismo economico e cujo consumo é umadas melhores garantias effectivas da nossaproducção, estamos nas condições que acabamos dereferir.

É uma verdadeira dependencia material. O sr.Consiglieri Pedroso com razão a reconhece nos seusconsiderandos quando diz que «a economianacional portuguesa só ao contacto intimo daexuberante seiva brasileira pode robustecer-se e

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tonificar-se».

Accresce a esse facto o de uma absolutainterdependencia dos dois paizes, sob o ponto devista moral e affectivo. Julgamos tel-o deixadoclaramente deduzido; e se tal não fosse verdade,todo o nosso esforço e todo o esforço brasileiro pararealizar a desejada approximação redundariam empura perda.

É, porém, certo que os laços que ligam Portugal aoBrasil assim como a Hespanha ás republicashispano-americanas não apresentam indicios deenfraquecimento, apezar das divergencias antesapontadas.

O erro, por parte dos povos da peninsula iberica é omesmo: portugueses e hespanhóes persistem, peloseu ferrenho conservantismo, que a ignoranciatutéla e couraça contra todas as conquistas doprogresso, em vêr as coisas de hoje com os olhoscom que viam as dos tempos do seu poderío...

Ambos esses paizes esquecem que se lhes foram, delonga data, as colonias americanas e que, lá, onde astinham, existem hoje florescentes estados e povostrabalhados por uma nova civilização...

Supino erro de apreciação: porque o facto de teremos povos americanos de origem ibérica evolvido emsentido differente do adoptado até agora pelosibéricos não implica necessariamente definitivodivorcio ou rompimento.

Dil-o o simples bom-senso. Effectivamente, apezardas divergencias verificadas, e incontestaveis, temde se reconhecer, de ambos os lados do Oceano, queperduram as intimas relações e a consciencia de queellas se hão de estreitar ainda mais entre os doisramos de cada uma dessas familias.

O que é evidente é que os americanos, do sul, docentro e do norte, só podem proseguir no caminhoencetado.

Nem é admissivel o capricho em materia destanatureza. Os povos têm os seus destinos prescriptospelas condições do meio em que se desenvolvem.

Meio physico, meio psychico, meio politico, meiosocial, meio internacional―é claro.

Esse complexo meio impõe aos povos da Americadestinos americanos.

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Dir-se-á que tambem as mesmas causas impõem ápeninsula ibérica destinos não americanos.

Nada o prova.

Antes de tudo, o que se vê é que existe, tanto emPortugal como na Hespanha, a conscienciacollectiva de que é indispensável refazer a antigavitalidade com a seiva das ex-colonias. É aconsciencia de um destino...

Depois, com que povos, com que culturas daEuropa, formam os dois povos e as duas culturas daIbéria um systema que se contraponha ao daAmerica, ao pan-americanismo?

E, finalmente, não se sente, pela Europa inteira, osopro revivificador do individualismo americano?Não se percebe, nas mais insignificantes coisas, oinfluxo dessa poderosa alma americana, querevoluciona as sciencias, as industrias e as artes?Não se vêem legiões de homens intelligentesacudindo á America a haurir, nas suas coisas novas,nos seus processos novos e nas suas instituiçõesnovas, a energia que falece á Europa e a esperança,que fugiu das suas velhas nações?

É o eixo da civilização superior e guiadora que sedesloca...

É a America que herda a hegemonia do planeta,como, nesse papel, a Europa succedêra á Asia.

E, se ha quarenta annos se assistiu ao inicio daprodigiosa «occidentalização» do Japão, que áEuropa veiu buscar uma cultura, que nem por serexótica e antagónica com as suas tradições deixoude ser aproveitada no que era «aproveitavel ácondição» do seu povo―por que havemos dereluctar em conceber que Portugal terá de ir, alémdo Atlantico, procurar, na cultura brasileira, que lheé affim, elementos de reforma e de regeneração?

Acaso pretendemos, desprovidos de tudo, reatar, namodalidade hodierna, a acção directora da phase donosso esplendor?

Porventura aspiramos ao que a Gran-Bretanha sabeimposivel―á anullação da obra do espiritoamericano?

Não nos illudamos. O eixo da

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civilização―perdõem-nos o chavão em queinsistimos pelo expressivo da fórmula―está-se adeslocar, está mesmo a mais de meio caminho dasua deslocação para a America.

Ponhamos, frente a frente, os dois paizes de linguaportuguesa:

Um, pujante de seiva, ávido de progresso, confiantena acção, audaz na iniciativa, próspero e rico! É oBrasil...

Outro... Bem o conhecemos: largos tratos incultos,aldeias despovoadas pela miseria, desalento, gloriaspassadas, deficits, emprestimos em agiotas, povofaminto sob o azorrague de iniqua tributação! ÉPortugal...

Reunamol-os, esquecendo que são dois povos elembrando apenas que são uma familia unica,vivendo em tamanha amizade que não recusemcoisa alguma um ao outro.

É a approximação, tudo quanto se possa pedir comoestreitamento de relações.

Pois bem: no dia em que um conjuncto decircumstancias de pura fantasia tivésse realizadoesse amplexo, que vae além da aspiração da horapresente, o que havia de acontecer, em obediencia atodas as leis sociaes, era fatal e irremediavelmente aadaptação portuguesa á civilização brasileira.

A monarchia de Portugal estaria nesse dia com a suasentença de morte lavrada, com as suas horascontadas!

A Republica Portuguesa resultaria, irresistivelmentee sem demora, da acção, tornada mais intima eportanto mais efficaz, da democracia brasileira emtodas as suas formas de actividade e em todos osseus modos de ser.

Não! A monarchia que, para viver, nos reduziu atodos nós á condição de escravos e de selvagens enos condemnou ao obscurantismo, não seabalançará a esse passo.

Seria o suicidio. E a monarchia quer viver visto quese arma todos os dias para se defender...

Não! A monarchia é o crime, mas não é a estupidez.E estupidez seria encaminhar-se para a morte. A nãoser que se désse, dentro da monarchia, um caso de

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loucura collectiva...

XV

CONCLUSÃO

A approximação luso-brasileira é fatal, apesar deimplicar a queda das instituições politicas quereduziram Portugal ao deploravel estado de ruinaem que se debate entre as oligarchias, que oexploram, e o povo, que olha ancioso para odespontar dessa vida nova, que só homens novos, deidéas novas e sentimentos novos, serão capazes decrear.

O Brasil e Portugal hão de harmonizar os seusinteresses e as suas aspirações.

Quando?

Quando esse desideratum não exigir o impossivel.Porque é tão impossivel que a monarchiaportuguesa se transforme a ponto de poder adoptaros principios e sentimentos da democracia brasileiraquanto é impossivel que esta retroceda ao que era oBrasil de ha cincoenta annos, sómente pelo caprichode estreitar as suas relações com o reino do sr. D.Manuel de Orléans e Bragança―o unicorepresentante coroado das duas casas que o actoemancipador de 15 de novembro de 1889 depoz dothrono exótico de uma nação da livre America...

Diz o professor Arthur Orlando, a cujo fulguranteespirito são familiares as questões americanas, quena America «existe um meio social superior quepaira acima da vida nacional».

Esse meio social chegaria para contrabalançar todoo problematico esforço que os nossos hypotheticosestadistas monarchicos fizessem no sentido dedeterminar―se não fosse absurdo―a evoluçãoregressiva do Brasil.

O mesmo escriptor explica o atrazo do povoportuguês, de modo implicito, ao explicar o atrazoda raça latina: «Elles (os individuos dessa raça, quenão têm iniciativa e não contam senão com acollectividade) não se decidem por si, mas pelomeio familiar, politico e religioso, de que fazem

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parte.»

Falta-nos a iniciativa; appellamos para acollectividade, como se ella fosse mais do que aintegração das iniciativas individuaes.

É por isso que não comprehendemos ainda aquelladoutrina da Declaração da IndependenciaAmericana em que a propria independencia eraconsiderada «um acto de soberania immanentepraticado pelo povo e resultante do seu direito demudar a fórma de governo e instituir governo novo,sempre que o entender necessario á sua felicidade esegurança».

Quando o comprehendermos estaremos senhoresdos nossos destinos e poderemos ter uma politicanossa, portuguesa, nas relações com outros povos,em vez de uma politica dynastica, que subordina osinteresses nacionaes até aos casos mais intimos epessoaes da vida dos reis e dos seus conselheiros,guias ou inspiradores.

Até lá, esperemos, se não soubermos antes cumpriro nosso dever cívico. Reconhecem os propriosmonarchicos que temos de conviver com o Brasil,que precisamos do Brasil. Lentamente, o Brasil hade nos enviar, com os cheques e as libras trazidaspelo retorno da emigração e nas formas multiplas doconvivio internacional, as suas idéas e as suasinstituições, a lição do seu progresso e o exemplo dasua prosperidade.

E, assim, como dissémos na introducção a estetrabalho, o Brasil acabaria por levar o povoportuguês á Republica.

Mas já este povo dá signaes evidentes de vitalidadenas suas camadas profundas. A democracia transpozos limites das povoações urbanas e invadiu,impetuosa, as villas, as aldeias, os casaes...

A monarchia não resolverá o problema das relaçõesde Portugal com o Brasil. Falhará mais estatentativa em que o sr. ConsiglieriPedroso―partindo de um falso perigo dedesnacionalização do Brasil e de uma suppostapossibilidade de Portugal evitar esse perigo, se elleexistisse―levou o escrupulo da imparcialidade comque preside á Sociedade de Geographia até pôr departe as divergencias essenciaes que, sob amonarchia que S. Ex.a combateu toda a vida, seoppõem á obra pan-portuguesa da qual a sua

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proposta pareceu, a tantos enthusiastas «por indole epor disposição da lei», preciosissima pedrafundamental.

A monarchia não é, todavia, indispensavel aPortugal.

Portugal ha de sobreviver a esse regimen.

Então os portugueses resolverão os problemasnacionaes.

Por agora, é escusado pensar em tal coisa. Assim éque, apezar de todas as adhesões e de todos osapplausos, não será, desta vez ainda, realizada aapproximação luso-brasileira.

Só a Republica, fecunda geradora de patrias,creadora de consciencias livres e de cidadãos, nosarmará para todas as victorias.

Só a Republica, com a qual em breve ha de resurgira energia viril da antiga e heroica patria, saberá epoderá reirmanar as duas nacionalidades em que sefala a forte e rude, a dôce e plangente lingua emque, ou fôsse sobre o tumulo da nacionalidade ou noarco triumphal da sua resurreição, se teria de lêr oepisodio do Adamastor e o episodio de Ignez.

INDICE

Pag.a

Introducção 6I ― A proposta Consiglieri Pedroso 11

II ― O problema luso-brasileiro 17III ― O supposto perigo 23IV ― Os estrangeiros no Brasil 29V ― O povoamento e a nacionalidade 35

VI ― A immigração portuguesa 41VII ― A permuta commercial 47

VIII ― A situação real 55IX ― A nossa raça «at work» 61

X ― Medidas propostas 69XI ― A evolução brasileira 77

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XII ― O Brasil e o americanismo 83XIII ― As divergencias 93XIV ― A approximação 103XV ― Conclusão 113

Indice 117

Acabou de se imprimiraos sete

de dezembro de 1909,em Lisboa,

na Typographia do Commerciorua da Oliveira, 10, ao Carmo.

Notas:

[1] «Lá onde nenhuma outra raça medra o portuguêsprospéra...» «A elle pertence a palma dos dotesmásculos na tarefa dos cruzamentos...» «É a raçaprivilegiada, é a única que teve o dom de anullar aseu favor as mais inclementes influenciasclimatericas...» «O português é o preferido noserviço das baleeiras norte-americanas e nesse postoo vemos arrostar os frios glaciaes...» «Na zonatórrida... encontramol-o sempre a prumo, robusto,inabalavel, jovial e altaneiro.»―Dr. Luiz PereiraBarretto.―O Seculo XX sob o ponto de vistabrasileiro.

[2] Sessão de 10 de Novembro de 1909 daSociedade de Geographia de Lisboa.

[3] A desorganização do trabalho, pela abolição doelemento servil, impunha o fomento da immigraçãopelos Estados e até pela União. Foram, por isso,subvencionadas emprezas varias que contractaram oserviço de introducção de trabalhadores ruraes.

[4] O artigo do Tempo era de Oliveira Martins, aoque diz Eduardo Prado, (Fastos, pag. 14). O.Martins previa a absorpção do sul pela Argentina! Oartigo, com o ser citado em tanta parte, foi, segundoPrado, um «exito virgem para a imprensaportuguesa.» A prophecia é que desacredita o auctore não menos os que lhe deram curso.

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Tal qual no caso Mac-Murdo... (Vide JoséCaldas,―Os Jesuitas―em nota.)

[5] Dunshee de Abranches―«Actas e actos dogoverno provisorio».

[6] «O seculo XX sob o ponto de vista brasileiro.»

[7] Carta ao Seculo, publicada, em 14 de janeiro de1909, sob a epigraphe «Portugueses noBrasil―Quantos são?»

[8] A sacca é de 60 kilos.

[9] Entraram, em 1906, quinze mil e tantos kilos dechicoria não preparada, dois mil trezentos edezenove kilos de café torrado, moido e suasimitações... em Portugal!

O consumo, por cabeça e por anno, é: na Itália, 970grammas; na Hespanha, 652 gr; na França, 2,350 k;na Allemanha, 3 k; na Dinamarca, 3,900 k; naSuissa, 3,500 k; na Noruega, 5,536 k; na Belgica,4,700 k; na Suecia, 6,566 k; na Hollanda, 7,200 k.

[10] Vide proposta referida, pag.a 13 a 15.

[11] Relatorio do Ministerio da Fazenda em 1907,pag. 60.

[12] Statistica metodologica―Torino, 1906.

[13] Elementi di Statistica―Torino, 1904.

[14] Castro Carreira―«Historia financeira».

[15] Fastos, pag. 15, in fine.

[16] Liberdade profissional, discurso parlamentar.

[17] A phrase é de Ferreira de Araujo, insignejornalista, cujos meritos não foram excedidos porqualquer homem de imprensa de não importa qualpaiz.

O conceito parecerá exagerado; não é. Com effeito,tendo a exportação do Brasil chegado a mais dequinze milhões de saccas de café, a exportaçãodiaria, excedente de quarenta mil saccas, ia além dacarga habitual de dois dos cargo-boats que faziamesse transporte.

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[18] Ayres de Casal―«Chorographia».

[19] Apud Euclydes da Cunha―«Os Sertões».

[20] «El Continente Enfermo»―Nova-York, 1899.

[21] «Deve-se reconhecer que o poder do meio e oesforço dos brasileiros têm conseguido muito nalucta pela adaptação dos immigrantes. O RioGrande e Santa Catharina fornecem-nos exemploseloquentissimos desse facto. No ultimo dessesestados, principalmente, desde o imperio filhos deallemães têm subido a altas posições politicas e emtodos elles o espirito nacional se encarnou comtanta elevação como nos descendentes maisafastados de europeus.» Tobias Monteiro―«OFantasma Allemão.»

[22] É sabido que o partido liberal, antes daRepublica, estava inclinado a essa reforma.Confessou-o, numa entrevista, o visconde de OuroPreto, chefe desse antigo partido.

[23] Commentarios á constituição dos EstadosUnidos da America § 157, nota 1 (a), edição de1891.

[24] «O pan-americanismo é uma obra defraternização entre o pan-latinismo e o pan-saxonismo, despertando entre todos os povos daAmerica a idéa e o sentimento de um destinocommum.»―Arthur Orlando―«Pan-Americanismo», Rio de Janeiro, 1906.

Na nota 25, in fine, vide transcripção do «Estado deS. Paulo».

[25] Depois de lançadas no papel estas linhas,recebeu o auctor os jornaes brasileiros com asnoticias das festas solennissimas com que foicelebrado, na Capital Federal, o 20.º anniversario doadvento da Republica.

Commentando a obra das nova instituições, diz oJornal do Commercio, órgam das classesconservadoras da sociedade brasileira, sempre defrancas opiniões liberaes, mas, em que pése asuperficiaes julgadores, incontestavelmenterepublicano desde que o dirige o dr. José CarlosRodrigues, espirito formado pela cultura americanae inglesa e que, ao mais intransigente

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individualismo, allia profundas convicçõesdemocraticas:

«O regimen democratico é o regimen da opinião epor ella se orienta, e, sendo a Republica a fórmapura desse regimen acreditamos que a opiniãobrasileira, que a consagrou ha vinte annos, amantém, a ampara, a defende e a estima.

«Neste anniversario todos se congratulam: oGoverno com o povo de que saiu, o povo com oGoverno, que é feitura sua.»

O Paiz, que na sua propaganda tomoucompromissos com o povo, ufana-se nestes termosda obra republicana:

«Se, volvidos os olhos para a construcção feitanestes vinte annos de Republica, collocarmos ojulgamento da obra do regimen no terreno concretodos beneficios feitos á nacionalidade, do confortodado ao povo, do prestigio trazido ao paiz, é forçosoreconhecer que a fórma de governo estabelecida a15 de novembro de 1889 não mentiu ás promessasque em seu nome fizeram os propagandistas e temcumprido dignamente a sua missão.

A federação e a autonomia municipal estimularam,pela alforria de actividades acorrentadas, forçasinertes e fecundas. Cada provincia, cada municipio,foi centro de vida á parte, forte, cheia de estimulos,progressista tributario da vida nacional; ocommando dos proprios destinos, a defesa dosproprios interesses, trouxe a todas essas zonas doterritorio patrio uma vigorosa expansão e com ellasdesenvolveu-se a collectividade, engrandeceu-se opaiz.»

No Estado de S. Paulo, tambem órgam dapropaganda republicana, entre cujos directores ecollaboradores figuram Rangel Pestana, Prudente deMoraes, Campos Salles e Bernardino de Campos,todos de acção capitalissima no actual regimen, dizPaulo Rangel Pestana:

«Victoriosos a 15 de novembro de 1889, osrepublicanos tinham a grandiosa missão dereconstruir a Patria por outros modelos, de accôrdocom as normas da san democracia. Precisavamreformar tudo―as leis e os costumes, as coisas e oshomens. Mas, infelizmente, logo desunidos edesorientados, ainda não lograram realizar tãoformosa tarefa, sem embargo dos maravilhososprogressos levados a effeito no vintennio que hoje

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se completa.

O Brasil inteiro, cheio de esperanças, festeja e saúdao dia 15 de novembro de 1889 como o principio dasua regeneração. Ella tem de acabar-se com osdedicados esforços dos contemporaneos, tornando-auma verdadeira republica―livre e pacifica,laboriosa e culta, que seja uma gloria da America euma admiração do mundo civilizado.»

[26] «Pan-Americanismo», pag. 68.

[27] «Commentarios» citados, § 266.

[28] É doutrina dominante em toda a America. Só asanomalias dictatoriaes, a que todos os povos têmsido, aliás, transitoriamente sacrificados, podemhaver postergado a sua pratica em periodos deillegalidade manifesta.

[29] Assim foram resolvidas: em 1895, pelo laudo deCleveland, o litigio das Missões, com a Argentina;em 1901, por sentença do Conselho Federal Suisso,a questão de limites com a Guyana Francesa; em1904, sendo juiz o rei de Italia, o conflicto delimites com a Guyana Inglesa.

[30] «A doutrina Drago»―Paris. (Possuimos atraducção inserta no «Estado de S. Paulo»).

[31] A guerra russo-japonesa, a conferencia deAlgeziras e o ultimo congresso da paz confirmampor completo o conceito do grande internacionalistaargentino.

[32] Deodoro da Fonseca teve de resignar o mandatode presidente por ter dissolvido o Congresso. O seuacto é ainda hoje denominado, muisignificativamente―o golpe de estado...

[33] Kidd―«The control of the tropics».

[34] Aos que se assustam com as divergencias delingua entre Portugal e Brasil, vem a propositolembrar que os yankees escrevem labor, honor, etc.,e não labour, honour, etc. E ha muitas mais... É ocaso do argueiro no olho do visinho.

[35] A declaração do Congresso das Nove Colonias,reunido em Nova-York, em 1765, já frisára, na suadeclaração, que Story julga o melhor summario dosdireitos e liberdades reclamados pelas então

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colonias inglesas, esta doutrina: «Nenhuma taxalhes poderá jámais ser imposta constitucionalmentea não ser pelas suas respectivaslegislaturas.»―Story, «Commentarios». § 190.

E a declaração de direitos do Congresso Colonial de1774 repetiu o preceito na sua 4.ª resolução, em quediz, ademais, que a base da liberdade e de todo ogoverno livre está no direito do povo fazer as suasleis. A mesma declaração, na resolução 10.ª já seinsurgia contra conselhos legislativos nomeados ávontade da corôa: taxava-os de inconstitucionaes.

Vê-se que o anglo-saxonio, apesar de não haver,hoje na Inglaterra nem, portanto, em 1765 nas suascolonias, constituição escripta, fez sempre questãoda constitucionalidade. Os liberaes ingleses dosnossos dias sáem aos seus avós.

Lista de erros corrigidos

Aqui encontram-se listados todos os erros encontradose corrigidos:

Original Correcção

#pág.25

a o dos ... a dos

#pág.48

o nossa ... a nossa

#pág.81

resultatado ... resultado

Variantes dos nomes próprios foram mantidas deacordo com o original.

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1.A. By reading or using any part of this Project Gutenberg-tmelectronic work, you indicate that you have read, understand, agree toand accept all the terms of this license and intellectual property(trademark/copyright) agreement. If you do not agree to abide by allthe terms of this agreement, you must cease using and return or destroyall copies of Project Gutenberg-tm electronic works in your possession.If you paid a fee for obtaining a copy of or access to a ProjectGutenberg-tm electronic work and you do not agree to be bound by theterms of this agreement, you may obtain a refund from the person orentity to whom you paid the fee as set forth in paragraph 1.E.8.

1.B. "Project Gutenberg" is a registered trademark. It may only beused on or associated in any way with an electronic work by people whoagree to be bound by the terms of this agreement. There are a fewthings that you can do with most Project Gutenberg-tm electronic workseven without complying with the full terms of this agreement. Seeparagraph 1.C below. There are a lot of things you can do with ProjectGutenberg-tm electronic works if you follow the terms of this agreementand help preserve free future access to Project Gutenberg-tm electronicworks. See paragraph 1.E below.

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1.C. The Project Gutenberg Literary Archive Foundation ("the Foundation"or PGLAF), owns a compilation copyright in the collection of ProjectGutenberg-tm electronic works. Nearly all the individual works in thecollection are in the public domain in the United States. If anindividual work is in the public domain in the United States and you arelocated in the United States, we do not claim a right to prevent you fromcopying, distributing, performing, displaying or creating derivativeworks based on the work as long as all references to Project Gutenbergare removed. Of course, we hope that you will support the ProjectGutenberg-tm mission of promoting free access to electronic works byfreely sharing Project Gutenberg-tm works in compliance with the terms ofthis agreement for keeping the Project Gutenberg-tm name associated withthe work. You can easily comply with the terms of this agreement bykeeping this work in the same format with its attached full ProjectGutenberg-tm License when you share it without charge with others.

1.D. The copyright laws of the place where you are located also governwhat you can do with this work. Copyright laws in most countries are ina constant state of change. If you are outside the United States, checkthe laws of your country in addition to the terms of this agreementbefore downloading, copying, displaying, performing, distributing orcreating derivative works based on this work or any other ProjectGutenberg-tm work. The Foundation makes no representations concerningthe copyright status of any work in any country outside the UnitedStates.

1.E. Unless you have removed all references to Project Gutenberg:

1.E.1. The following sentence, with active links to, or other immediateaccess to, the full Project Gutenberg-tm License must appear prominentlywhenever any copy of a Project Gutenberg-tm work (any work on which thephrase "Project Gutenberg" appears, or with which the phrase "ProjectGutenberg" is associated) is accessed, displayed, performed, viewed,copied or distributed:

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1.E.5. Do not copy, display, perform, distribute or redistribute thiselectronic work, or any part of this electronic work, withoutprominently displaying the sentence set forth in paragraph 1.E.1 with

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1.E.7. Do not charge a fee for access to, viewing, displaying,performing, copying or distributing any Project Gutenberg-tm worksunless you comply with paragraph 1.E.8 or 1.E.9.

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- You pay a royalty fee of 20% of the gross profits you derive from the use of Project Gutenberg-tm works calculated using the method you already use to calculate your applicable taxes. The fee is owed to the owner of the Project Gutenberg-tm trademark, but he has agreed to donate royalties under this paragraph to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation. Royalty payments must be paid within 60 days following each date on which you prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax returns. Royalty payments should be clearly marked as such and sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the address specified in Section 4, "Information about donations to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation."

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1.E.9. If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tmelectronic work or group of works on different terms than are setforth in this agreement, you must obtain permission in writing fromboth the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and MichaelHart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark. Contact theFoundation as set forth in Section 3 below.

1.F.

1.F.1. Project Gutenberg volunteers and employees expend considerableeffort to identify, do copyright research on, transcribe and proofreadpublic domain works in creating the Project Gutenberg-tmcollection. Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic

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works, and the medium on which they may be stored, may contain"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate orcorrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectualproperty infringement, a defective or damaged disk or other medium, acomputer virus, or computer codes that damage or cannot be read byyour equipment.

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Section 2. Information about the Mission of Project Gutenberg-tm

Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution ofelectronic works in formats readable by the widest variety of computersincluding obsolete, old, middle-aged and new computers. It existsbecause of the efforts of hundreds of volunteers and donations from

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people in all walks of life.

Volunteers and financial support to provide volunteers with theassistance they need are critical to reaching Project Gutenberg-tm'sgoals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection willremain freely available for generations to come. In 2001, the ProjectGutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secureand permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations.To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundationand how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4and the Foundation web page at http://www.pglaf.org.

Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary ArchiveFoundation

The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit501(c)(3) educational corporation organized under the laws of thestate of Mississippi and granted tax exempt status by the InternalRevenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identificationnumber is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted athttp://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project GutenbergLiterary Archive Foundation are tax deductible to the full extentpermitted by U.S. federal laws and your state's laws.

The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S.Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scatteredthroughout numerous locations. Its business office is located at809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, [email protected]. Email contact links and up to date contactinformation can be found at the Foundation's web site and officialpage at http://pglaf.org

For additional contact information: Dr. Gregory B. Newby Chief Executive and Director [email protected]

Section 4. Information about Donations to the Project GutenbergLiterary Archive Foundation

Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without widespread public support and donations to carry out its mission ofincreasing the number of public domain and licensed works that can befreely distributed in machine readable form accessible by the widestarray of equipment including outdated equipment. Many small donations($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exemptstatus with the IRS.

The Foundation is committed to complying with the laws regulatingcharities and charitable donations in all 50 states of the UnitedStates. Compliance requirements are not uniform and it takes aconsiderable effort, much paperwork and many fees to meet and keep upwith these requirements. We do not solicit donations in locationswhere we have not received written confirmation of compliance. ToSEND DONATIONS or determine the status of compliance for anyparticular state visit http://pglaf.org

While we cannot and do not solicit contributions from states where wehave not met the solicitation requirements, we know of no prohibitionagainst accepting unsolicited donations from donors in such states whoapproach us with offers to donate.

International donations are gratefully accepted, but we cannot make

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any statements concerning tax treatment of donations received fromoutside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff.

Please check the Project Gutenberg Web pages for current donationmethods and addresses. Donations are accepted in a number of otherways including including checks, online payments and credit carddonations. To donate, please visit: http://pglaf.org/donate

Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronicworks.

Professor Michael S. Hart is the originator of the Project Gutenberg-tmconcept of a library of electronic works that could be freely sharedwith anyone. For thirty years, he produced and distributed ProjectGutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support.

Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printededitions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S.unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarilykeep eBooks in compliance with any particular paper edition.

Most people start at our Web site which has the main PG search facility:

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This Web site includes information about Project Gutenberg-tm,including how to make donations to the Project Gutenberg LiteraryArchive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how tosubscribe to our email newsletter to hear about new eBooks.


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