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8/9/2019 Blogosfera Policial - Do Tiro Ao Twitter
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Debates CIN1 - Outubro de 2009
ISSN 2176-3224
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Organizao
das Naes Unidaspara a Educao,a Cincia e a Cultura
Representao no BrasilSAS, Quadra 5, Bloco H, Lote 6,Ed. CNPq/IBICT/UNESCO, 9 andar70070-912, Braslia, DF, BrasilTel.: (55 61) 2106-3500
Fax: (55 61) 3322-4261E-mail: [email protected]
Centro de Estudos de Segurana e CidadaniaPr-reitoria de Ps-graduao e PesquisaUniversidade Candido Mendes
Rua da Assemblia 10, Sala 810, CentroRio de Janeiro, RJ Brasil, CEP: 20011-000Tel: (21) 2531-2000 ramal 284Telefax: (21) 2531-2033E-mail: [email protected]
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Debates CIN1 - Outubro de 2009
ISSN 2176-3224
Silvia Ramos e Anabela Paiva (Coords.)
Braslia, outubro de 2009
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CoordenaoSilvia Ramos
Anabela Paiva
Assistentes de pesquisa
Adriana Gomes pesquisadora do CESeC, socilogaAlberto Alvadia Filho pesquisadora do CESeC, socilogo
Leonardo Leo de Paris pesquisador do CESeC, estatstico
A pesquisa contou com a superviso tcnica e estmulo de:
Alexandre Souza, tenente da PMERJ, autor do blog Dirio de um PM
Danillo Ferreira, tenente da PMBA, autor do blog Abordagem Policial
Eduardo Machado, jornalista, autor do blog PE BodyCount
Jorge Antonio Barros, jornalista, autor do blog Reprter de Crime
Robson Niedson, soldado da PMGO, autor do blog Dirio do StiveRoger Franchini, advogado, ex-inspetor da PCSP, autor do blog Cultcoolfreak
Edney Sousa, da Plvora! Comunicao
Reviso: Jeanne Sawaya
Diagramao: Paulo Selveira
Capa e projeto grfico: Edson Fogaa
UNESCO 2009
Impresso no Brasil
BR/2009/PI/H/7
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S U M R I O
Apresentao................................................................................................................ 07
Resumo executivo ......................................................................................................... 09
Introduo .................................................................................................................... 11
Perfil do blogueiro policial ............................................................................................. 15
Perfil dos blogs policiais................................................................................................. 23
O impacto dos blogs policiais nas polcias, na mdia e a sociedade................................. 36
Concluses ................................................................................................................... 43
Bibliografia.................................................................................................................... 45
Anexos
1. Atividades da pesquisa: entrevistas, mesa-redonda, levantamento
quantitativo e pesquisa bibliogrfica.................................................................................. 47
2. Questionrio ............................................................................................................. 49
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com imenso prazer que a Representao da
UNESCO no Brasil apresenta o primeiro nmero da
Srie Debates em Comunicao e Informao. Nosso
objetivo central alimentar a esfera pblica de dis-
cusses com um conjunto de textos, muitos deles
subsidiados por pesquisas empricas inditas, que
possam estimular reflexes crticas e plurais acerca de
temas fundamentais para a extensa agenda da comuni-
cao e da informao para as sociedades contempo-
rneas, com especial ateno para o contexto brasileiro.
O texto que abre a srie particularmente insti-
gante, pois abriga um nmero diversificado de assun-tos-chave para o passado, o presente e o futuro dos
debates que se acumulam sob o amplo guarda-chuva
da Comunicao e da Informao.
A Blogosfera policial no Brasil: do tiro ao Twitter
consegue, de forma pioneira e original, apresentar
insumos tericos e empricos para que sejam levanta-
dos questionamentos, pelo menos, sobre:
as fronteiras da liberdade de expresso em
corporaes pblicas com rgidas hierarquias;
o papel dos agentes pblicos neste caso, das
foras de segurana na produo de informaes e
reflexes sobre o seu prprio fazer e, logo, na intera-
o direta com os pares, os superiores e a sociedade,
sem a mediao, por exemplo, da imprensa;
as possibilidades e riscos introduzidos com a
popularizao do uso da internet, particularmente da
ferramenta blog, por esses agentes;
os impactos da democratizao da informao
na construo, execuo e monitoramento das polti-cas pblicas aqui, as de segurana;
o comportamento do jornalismo mainstream
diante de novas formas de produo da informao e
de interao com a esfera pblica.
Estamos certos de que a melhoria qualitativa das
polticas pblicas, em geral, e das polticas de segu-
rana pblica, em particular, est fortemente atrelada
promoo, proteo e garantia do direito a infor-
mao, de tal forma que tomadores de deciso,
gestores, burocracia, agentes executores, agentes
fiscalizadores e populao possam, valendo-se de um
debate plural e contextualizado, convergir para a
elaborao e execuo de polticas mais efetivas,
eficazes e eficientes. O estudo coordenado pelas pes-
quisadoras Silvia Ramos e Anabela Paiva, do Centro
de Estudos de Segurana e Cidadania (CESeC), certa-
mente, apresenta uma contribuio concreta para se
trilhar o caminho na direo de uma esfera pblica
capaz de levar adiante uma reflexo robusta sobre
polticas da mais alta relevncia para promoo de
uma cultura de paz e, por conseguinte, para a redu-
o da violncia.
De fato, foi e motivo de satisfao para ns ter
ouvido de vrios dos blogueiros entrevistados para
essa pesquisa que o mero anncio do incio da inves-
tigao colaborou para provocar transformaes no
de pequena envergadura. Segundo eles, a preocupa-
o demonstrada pela UNESCO quanto ao fenmeno
colocou em evidncia que eles no faziam parte de
uma aventura isolada, novas pontes foram constru-
das, redes j existentes foram fortalecidas e medidas
na direo de reduzir a liberdade de expresso foram
contidas. O relatrio sublinha que se multiplicam osblogs sobre segurana pblica e mais do que isso, os 7
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A P R E S E N T A O
Direito a informao e pluralidade de discusses: um impulsoqualitativo nos debates sobre polticas de segurana pblica
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comandos das corporaes, antes resistentes, esto
anunciando a criao de blogs oficiais para debater
o tema. Com mais informao, das mais variadas
fontes, todos tm a ganhar.
No esperamos, contudo, que o presente estudo
tenha logrado apresentar respostas definitivas. Aocontrrio, voltamos a repetir que ele tem como obje-
tivo primeiro fomentar o debate sobre os temas
centrais de que se ocupou. No por outra razo, est
inaugurando esta Srie Debates.
O Setor de Comunicao e Informao da UNESCO
no Brasil est, portanto, de portas, e-mails e ouvidos
abertos para receber as dvidas, sugestes, crticas,
inquietudes e reflexes que sejam suscitadas por essa
pesquisa e por aquelas que viro no futuro prximo.
Muito obrigado e boa leitura!
Vincent DefournyRepresentante da UNESCO no Brasil
Guilherme CanelaCoordenador do Setor de Comunicao e Informao
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A convite da UNESCO, o Centro de Estudos de
Segurana e Cidadania (CESeC), da Universidade
Cndido Mendes, realizou o primeiro levantamento
sobre um novo e importante fator no debate sobre
segurana pblica e criminalidade no Brasil: os blogs.
A blogosfera policial, como chamada pelos seus
integrantes, um fenmeno recente da internet bra-
sileira, mas j rene dezenas de pginas assinadas
por policiais civis, militares e rodovirios de vrias
patentes, bombeiros e jornalistas especializados.
Com um contedo diversificado, vises divergentes e
ambies variadas, estas pginas comeam a exercer
influncia sobre instituies e formadores de opinio.
A pesquisa foi realizada atravs de entrevistas,
mesas redondas e um questionrio de 35 perguntas,
que ficou disponvel para preenchimento via internet
entre os dias 18 de maio e 8 de junho de 2009. Neste
perodo, 73 blogueiros, autores de 70 blogs, respon-
deram s questes, compondo uma amostra signifi-
cativa, j que levantamentos feitos por blogs como
Abordagem Policial identificaram um universo de 80
blogs. Este , certamente, um universo em expanso:
entre os 70 blogs estudados neste levantamento, 58
82,8% foram criados entre 2007 e 2009.
Participantes de 17 estados responderam
pesquisa, mostrando que a blogosfera policial um
fenmeno genuinamente nacional. Apesar disso, no
se pode deixar de observar que o Sudeste a regio
dominante: o Rio de Janeiro o estado que abriga o
maior nmero de blogs (22), seguido de So Paulo
(11) e Minas Gerais (10).
Os profissionais que mantm blogs sobre segu-rana e criminalidade so na maioria oriundos da
Polcia Militar (58%), seguidos da Guarda Municipal
(15,1%) e da Polcia Civil (13,7%). Em relao aos
postos que ocupam, a maioria dos blogueiros (58%)
provm dos estratos mais baixos das instituies poli-
ciais. Oficiais e delegados juntos representam 42%.
Isso no impede, no entanto, que a escolaridade dos
autores de blogs seja alta, como seria de se esperar:
62% dos entrevistados tem curso superior completo
ou ps-graduao completa ou em andamento.
Apenas 12,7% cursaram o ensino mdio.
Surpreendentemente, os jovens no so a maioria
na blogosfera. Os participantes da pesquisa com at
29 anos so aproximadamente um tero da amostra,
mas os que tm 30 anos ou mais representam
72,5%. J a diviso da amostra por sexo mostrou que
a tradicional predominncia masculina na rea de
segurana foi acentuada: apenas trs mulheres esto
entre os 73 entrevistados.
Quando questionados sobre as motivaes que os
levaram a criar blogs, mais da metade dos participan-
tes (55%) disse desejar expressar seus prprios pontos
de vista sobre segurana e justia. Outro grupo
pretende falar para a prpria categoria, divulgando
assuntos de interesse da corporao. Por fim, h
ainda os que usam as pginas para fazer denncias
sobre seus comandos ou outras instituies, e os que
pretendem mostrar sociedade a realidade das
corporaes.
Uma caracterstica comum a vrios depoimentos
a ideia de que no passado muito se falou sobre a
polcia e os policiais, mas quase nada foi dito pelos
prprios agentes de segurana. O debate era sempreentre profissionais de meios de comunicao, os 9
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especialistas e os governantes. O crescimento acele-
rado da blogosfera mostra a urgncia com que os
policiais esto construindo um espao onde poss-
vel falar, tomar a palavra e elaborar concluses,
sempre na primeira pessoa. Diante de cinco opes
fechadas, 40% responderam que ser blogueiro um meio de expresso poltica. Um tero, isto ,
31,4%, responderam que parte do trabalho e
17% um servio pblico
Comparada a outras reas da internet, a blogos-
fera policial ainda tem um alcance limitado. Entre os
52 entrevistados que responderam sobre o nmero
mdio de acessos nos ltimos meses, dois teros
(69,2%) estimam receber at 500 visitas por dia.
E pouco mais de um quarto dos blogueiros (26,9%)
calcula que o blog vem recebendo mais de mil visitaspor dia. Mesmo assim, os blogueiros percebem que o
contedo destas pginas repercute entre os colegas e
seus chefes.
De um modo geral, os blogueiros acham que contam
com apoio dos seus colegas (91,8%). Quando se
trata de seus superiores hierrquicos, as avaliaes se
dividem. Apenas 24,3% acham que eles aprovam o
blog. Um quinto (20%) acha que eles reprovam e
uma parcela semelhante (21,4%) acha que eles so
indiferentes.
O temor de retaliaes ainda regula a blogosfera
policial. Entre os 73 entrevistados, 27 disseram j ter
sido censurados ou reprimidos. As ameaas de priso
e transferncia vm em primeiro lugar, com quase
26% dos casos. Casos notrios destas reaes foram
registrados no Rio, onde o comando da Polcia Militar
(PM) puniu trs autores de blogs, e em So Paulo,
onde o blog de um delegado foi retirado da internet
pela Justia, a pedido da Polcia Civil (PC) de So Paulo.
Os blogs policiais implantaram na sociedade bra-
sileira um novo espao de debate, onde no vigoram
as regras hierrquicas e a rivalidade estabelecidas nas
corporaes. Alm de apresentar a realidade do
trabalho policial e oferecer informaes teis aos que
desejam entrar para as foras de segurana, os blogs
fazem com regularidade anlises crticas das aes
dos gestores destas foras. Suas observaes rever-
beram entre colegas, comandantes, governantes, na
imprensa e na sociedade. O debate aberto de institui-
es tradicionalmente fechadas favorece a qualifica-
o das foras de segurana e a consolidao de
padres de conduta mais ticos e transparentes entre
comandantes e subordinados.
Atravs dos blogs, os policiais vm estabelecendo
canais de dilogo entre si. Em alguns estados, como
Sergipe e So Paulo, estas pginas tiveram impor-tante papel mobilizador em movimentos reivindicat-
rios. No ano de 2009, os comandos da PM de Gois,
Rio de Janeiro, Sergipe e So Paulo criaram seus pr-
prios blogs, anunciando que assim estabeleciam um
espao para o dilogo com os seus comandados.
Jornalistas comeam, tambm, a criar suas pr-
prias pginas dedicadas ao tema segurana pblica
e criminalidade, expressando opinies, abordando
assuntos esquecidos, estabelecendo novas fontes e
respondendo s demandas dos leitores. A ampliaodestas pginas tende a acelerar a qualificao profis-
sional dos reprteres e editores destas reas que
observamos a partir dos anos 1990.
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Do tiro ao Twitter
O fenmeno da proliferao dos blogs e seuimpacto na esfera da segurana pblica se impuseram
como tema de pesquisa a partir dos ltimos meses de
2008. Como coordenadoras da rea de Mdia e
Violncia do Centro de Estudos de Segurana e Cida-
dania (CESeC), da Universidade Cndido Mendes,
desde 2007 acompanhvamos os blogs criados
pelos principais jornais do Rio de Janeiro O Globo,
O Extra, O Dia e o Jornal do Brasil e a cobertura
diferenciada que faziam dos temas relacionados
polcia e criminalidade. A criao destas pginasrepresentou uma revoluo na cobertura da segu-
rana pblica no Rio de Janeiro. Temas que nossas
pesquisas haviam mostrado ser raros ou inexistentes
nas pginas de jornais poltica salarial e condies
de trabalho das foras policiais, nomeaes e transfe-
rncias de oficiais, direitos humanos, investigaes
de corregedorias, projetos comunitrios, inquritos
abandonados eram tratados frequentemente e
com destaque pelos blogs. A ausncia dos limites da
pgina impressa e a segmentao de pblico, almda necessidade de oferecer ao leitor informaes
diferentes das encontradas nos veculos impressos,
combinaram-se para produzir na internet um olhar
minucioso, constante e crtico sobre o crime e as
foras de segurana.
Mas estas no foram as nicas boas novidades
introduzidas pelos blogs de jornais no debate sobre
segurana. A participao dos leitores, por meio de
comentrios a cada texto oupost, no jargo usado
pelos blogueiros introduziu novas anlises e infor-maes e criou comunidades de interessados no
tema. Como descreveu o reprter Jorge Antnio
Barros, criador do blog Reprter de crime, do jornal
O Globo: O principal objetivo do blog era formar
uma rede de cidados preocupados. Uma espcie de
rede de informaes de preveno contra a violncia
urbana e a criminalidade.. Nestas pginas, vozes
que no seriam ouvidas de outra maneira se comuni-
cavam diretamente com o jornalista, como lembra o
reprter Gustavo Almeida:
O jornal no publica uma carta do praa dizendo
que o oficial est exigindo cem reais dele. No
faz matria sobre isto, no tem como fazer.
Ento a internet passou a ser o ponto das pes-
soas desabafarem, de passarem e trocarem
informaes entre si.
Por essas razes, percebemos que os blogs jorna-
lsticos haviam se tornado fontes obrigatrias de
informao, no s para ns, especialistas e pesqui-
sadores, mas para o pblico leitor. Hospedados em
sites de grande visibilidade, eles rapidamente ganharam
muita popularidade o Reprter de Crime chega a
ter 60 mil visitantes por ms. Casos de Polcia, o blog
do jornal Extra, costuma alcanar 250 mil acessos
por ms.
Longe de ser um fenmeno do Rio de Janeiro
ainda o estado com maior nmero de blogs, como
mostraremos nas prximas pginas a nova mdia
ganhou espao nacional. Em Recife, capital com as
maiores taxas de homicdios do pas, quatro jornalis-
tas criaram, em maio de 2007, o PE Body Count, um
blog independente que todos os dias contabilizava
as mortes violentas ocorridas no estado. Em vez dedepender das estatsticas oficiais, os jornalistas telefo-
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navam diariamente para hospitais, delegacias e necro-
trio para reunir dados sobre os homicdios ocorridos
desde a vspera. Ao meio-dia, osite era atualizado
com as novas mortes.
S este trabalho j seria suficiente para valer ao
blog os prmios que ganhou o Tim Lopes de Jorna-lismo Investigativo e o Vladimir Herzog de Anistia e
Direitos Humanos, ambos em 2008. Entretanto, as
denncias do PE Body Count foram alm do texto:
os jornalistas criaram o projeto Marcas da Violncia,
que assinalava os locais das mortes com os desenhos
de corpos no cho, e inauguraram um contador de
homicdios, exibido em um painel eletrnico fixado
numa das ruas mais movimentadas da capital pernam-
bucana. De narradores, os jornalistas se tornaram
personagens de reportagens da imprensa mundial,como disse o reprter Eduardo Machado em entre-
vista ao dirio francs Le Monde1:
Ao contabilizar os cadveres, chamamos a ateno
da populao e do poder pblico para a violn-
cia de Pernambuco. Alm da preocupao e da
perplexidade passiva, contribumos para a busca
de solues coletivas. difcil, mas possvel.
No entanto, os sites jornalsticos so apenas a
ponta mais visvel, mas menor e talvez menos
importante da blogosfera policial. A maior parte desta
comunidade virtual formada por blogs assinados
por policiais. Desde 2005, quando o ento investiga-
dor da Polcia Civil paulista Roger Franchini criou o
seu Cultcoolfreak, at hoje no ar, as pginas se mul-
tiplicaram com rapidez. Aos poucos, seus endereos
passaram a constar como links de pginas de jornalis-
tas,sites sobre segurana pblica e outros. Reprteres
especializados se acostumaram a ler as pginas dos
policiais, em busca de pautas e anlises. Nos blogs de
policiais, os bastidores de instituies notoriamente
fechadas estavam finalmente mostra. Acusaes de
corrupo, desmandos, falta de preparo e recursos,
baixos salrios todos estes temas se encontravam
presentes nos blogs.
A tendncia no passou despercebida aos
comandos da PM. No Rio de Janeiro e em So Paulo,
os blogs de policiais foram alvo de aes repressivas
por parte das chefias uma prova de que o contedo
destas pginas j repercutia o suficiente para ser
considerado incmodo. Em setembro de 2008, o
major Wanderby Medeiros, da PM do Rio de Janeiro,
foi alvo de um inqurito administrativo por crtica
indevida a um superior hierrquico. Na mesma poca,o major Roberto Viana recebeu 12 dias de priso
administrativa como punio por comentrios se soli-
darizando com o major Wanderby em um coment-
rio no seu blog. Em outubro de 2008, o blog Flit
Paralisante, do delegado Roberto Conde Guerra, foi
retirado do ar por determinao da Corregedoria da
Polcia Civil de So Paulo. Em dezembro do mesmo
ano, o capito Luiz Alexandre foi investigado pela
Corregedoria da PM do Rio de Janeiro por denunciar
que policiais militares usavam armamentos e carrosda Polcia Civil sem autorizao legal para isto. E, em
maro de 2009, o coronel Ronaldo Menezes foi
preso por ter escrito o artigoA perversidade do bico
e a privatizao da segurana, publicado na pgina
do coronel Ricardo Paul.
O conjunto desses fatos no deixava dvidas:
o advento dos blogs era uma presena renovadora
na rea da segurana pblica, que com certeza teria
repercusses cada vez maiores sobre o setor no futu-
ro. Para explorar melhor o novo fenmeno, a UNESCO,
por meio de edital pblico, selecionou as pesquisado-
ras do CESeC para investigar quem so os blogueiros
dedicados aos temas polcia, criminalidade e segu-
rana pblica no Brasil e quais as caractersticas dos
blogs que produzem. Em maro de 2009, o Seminrio
Internacional sobre Mdia e Violncia organizado, no
Rio de Janeiro, pelas embaixadas do Canad e dos
Estados Unidos, em parceria com a UNESCO, o CESeC
e a Universidade Federal do Rio de Janeiro, contou
com um painel sobre o tema Novas Mdias, que
teve a participao do blogueiro canadense Mauricio
Segura e do jornalista Jorge Antnio Barros, autor do
blog Reprter de Crime, de O Globo. Segura tambm
participou de um workshop sobre blogs no mesmo
evento. Em abril, a mesa sobre blogs no Frum Brasi-
leiro de Segurana Pblica*, realizado em Vitria,
colheu depoimentos de outros autores de blogs.
1 Reportagem republicada no site UOL em 4 de Junho de 2009.* O debate realizado em 3 de abril de 2009, em Vitria, no contexto do III Encontro do Frum Brasileiro de Segurana Pblica, reuniu parte
dos profissionais listados acima. A mesa-redonda foi realizada graas ao apoio do Frum Brasileiro de Segurana Pblica, da FundaoFord e da SENASP.
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Alm de Jorge Antonio Barros, participaram do encon-
tro Eduardo Machado (PE Body Count); o tenente
Danillo Ferreira (Abordagem Policial) e o soldado
Robson Niedson (Dirio do Stive).
A partir de entrevistas e consultas com alguns dos
membros mais ativos da blogosfera policial, desenha-mos um questionrio de 35 perguntas para ser res-
pondido via internet. Graas ao apoio dos blogueiros
Danillo Ferreira, Robson Niedson, Roger Franchini e
Alexandre Souza, tivemos um nmero surpreendente
de respostas. No fim do ano de 2008, Danillo Ferreira
e Alexandre Souza haviam listado todas as pginas
conhecidas da blogosfera policial. O nmero chegara
a 59. No entanto, nada menos que 73 blogs, de 20
estados, foram identificados pela pesquisa CESeC/
UNESCO.A internet tem se revelado um instrumento capaz
de revolucionar todos os setores da atividade humana.
A economia, a cultura, a poltica, o jornalismo e a
publicidade so alguns exemplos de reas que foram
e continuam a ser radicalmente modificadas pelo
nascimento do universo virtual. A difuso rpida de
informaes; a horizontalizao das relaes; a
formao de redes sociais a partir de tpicos de inte-
resse; a transparncia; a possibilidade de contato
direto entre prestadores e usurios de servios so
caractersticas evidentes desta nova realidade.
Elas tambm esto modificando o cenrio da segu-
rana pblica, impactando profundamente as foras
policiais.
At agora, as polcias se baseavam em rgidos
princpios hierrquicos, tinham o sigilo como lei e no
consideravam obrigatrio dar explicaes sobre seus
atos sociedade. As vrias foras pouco ou nada se
relacionavam entre si e era comum que os integran-
tes de uma corporao como a Polcia Militar mani-
festassem desconfiana e animosidade em relao
aos colegas de outra instituio, como a Polcia Civil.
Os blogs esto subvertendo a hierarquia nos quar-
tis e nas delegacias (o blog de um soldado pode
ser to importante quanto o de um coronel) e
criando canais de troca entre as foras policiais e
delas com os demais grupos e instituies. Os pr-
prios comandos j percebem a importncia do fen-
meno: os comandantes gerais da PM de Gois e doRio de Janeiro mantm blogs institucionais e o
comandante da PM de So Paulo anunciou a inten-
o de tambm criar a sua pgina. Em Sergipe, acaba
de ser lanado um blog da corporao. Talvez venha
a poca em que a segurana pblica dependa menos
dos tiros e mais do Twitter.
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A primeira surpresa revelada por esta pesquisa foi
o nmero de respostas reunidas. Entre os dias 18 de
maio e 8 de junho, um questionrio com 35 per-
guntas ficou disponvel no site do CESeC, para ser
preenchido pela internet (detalhes metodolgicos e
tcnicos sobre a pesquisa esto descritos no Anexo 1;o questionrio encontra-se no Anexo 2). Apesar da
tradio de baixa participao espontnea em
levantamentos e pesquisas sociais, ao fim do prazo
havamos reunido um nmero bem maior de partici-
pantes do que o esperado: 73 blogueiros, autores de
70 blogs (em dois blogs mais de um autor respondeu
ao questionrio). difcil estimar o universo total de
blogs policiais, porque ele cresce a cada dia e ao
mesmo tempo bastante mutvel. De qualquer forma,
todas as indicaes disponveis levam concluso que
o levantamento que aqui se apresenta est bastante
prximo do universo total da rede, ou seja, uma amos-tra bastante representativa do conjunto dos blogs.
Estados e regies. Se tomarmos as duas princi-
pais fontes de consulta sobre o tema, a seo Blogos-
fera Policial do blog Abordagem Policial e o blog
indexador Blogosfera Policial, teremos o seguinte
quadro comparativo:
15
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Perfil do blogueiro policial
Blog AbordagemPolicial2 Blog BlogosferaPolicial3 PesquisaCESeC/UNESCO4
Alagoas 1 - -
Amap 1 1 1
Amazonas - - 1
Bahia 6 4 3
Cear 3 - 1
DF 4 4 1
Gois 6 4 7
Mato Grosso 2 2 1
Minas Gerais 5 2 10
Par 1 1 1
Paran - - 2
Pernambuco 1 1 -
Piau 2 2 1
Rio de Janeiro 29 27 22
Rio Grande do Norte 1 1 2
Quadro comparativo de blogs identificados por estados da Federao
continua
2. Dados disponveis em 06 de agosto de 2009.
3. Dados disponveis em 06 de agosto de 2009.4. Dados coletados entre 18 de maio e 8 de junho de 2009.
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Quando queremos visualizar a existncia de blogs
por estados, obtemos o seguinte quadro dos que res-ponderam pesquisa:
Desta forma, fica bastante evidente que a regioSudeste rene o maior nmero de blogs, seguida da
regio Nordeste, Centro-Oeste, Sul e Norte.
Corporaes e instituies. Quando olhamos a
origem dos blogueiros, isto , de que instituies de
segurana pblica eles provm, obtemos o seguinte
quadro5:
Instituio a que pertence ou pertenceu
importante mencionar que a categoria outros
refere-se a: jornalistas que, paralelamente s suas
carreiras em veculos de imprensa, mantm blogsespecializados no tema da segurana pblica; a
representante de uma associao de policiais milita-
res; e ao blog do Disque Denncia do Rio de Janeiro.
Os critrios para identificar e classificar a blogos-
fera policial so variveis e vm mudando para contem-
plar o crescimento deste universo. O blog Aborda-
gem Policial apresentava a seguinte distribuio
Blog AbordagemPolicial2
Blog BlogosferaPolicial3
PesquisaCESeC/UNESCO4
Rio Grande do Sul 3 3 3
Roraima - - 1Santa Catarina 1 - 2
So Paulo 9 8 11
Sergipe 3 2 -
Outros 2 3 -
Total 80 65 70
continuao
Fonte: Pesquisa Blogosfera Policial CESeC/UNESCO, 2009.
11
10
7
3
3
2
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
22
0 10 20
RJ
SP
MG
GO
BA
RS
PR
RN
SC
AM
AP
CE
DF
MT
PA
PI
RO
N %
43 58,9
11 15,1
10 13,7
3 4,1
1 1,4
1 1,4
4 5,5
Total 73 100,0
Outros
Associao de militares
Polcia Rodoviria Federal
Policial Civil
Bombeiros
Policial Militar
Guarda Municipal
58,9
15,1
13,7
4,1
1,4
1,4
5,5
0 30 60
Policial Militar
Guarda Municipal
Policial Civil
Bo mbeiros
Associao de militares
Polcia Rodoviria Federal
Outros
5. A SENAPS (Secretaria Nacional de Segurana Pblica, do Ministrio da Justia) estima em 720.201 os profissionais de segurana no Brasil
distribudos da seguinte forma: Polcia Militar: 56%; Polcia Civil: 15%; Bombeiros: 9%; Guardas Municipais: 10%; Pessoal do SistemaPenitencirio: 7%, Polcia Federal (2%) e Polcia Rodoviria Federal (1%).
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por instituio para classificar os 80 blogs registrados
em sua base em 6 de agosto: policiais civis (1); bom-
beiros (3); policiais rodovirios federais (1); policiais
militares (75). Osite indexador Blogosfera Policial
usava, na mesma data, mais categorias para identifi-
car a origem dos blogueiros. Alm de policiais militares,civis e federais, apareciam as categorias: guarda muni-
cipal, cidado civil e conselheiro de segurana. Na
categoria cidado civil se situa os jornalistas e na
categoria conselheiro de segurana os blogs de
civis que compem conselhos comunitrios de segu-
rana. interessante observar que o site indexador
prev que blogs se inscrevam ou sejam indicados (por
intermdio de um formulrio eletrnico) para fazer
parte da pgina. Recentemente, em julho de 2009, um
blog de discusso sobre segurana pblica, assinadopor um egresso penitencirio, chamado Egressos em
Foco, passou a integrar a lista da Blogosfera Policial.
Sobre o assunto, o coordenador do blog, Robson
Niedson, disse em e-mailde 16 de agosto de 2009:
o critrio incluir todos os blogs que tratam sobre
segurana pbica, direitos humanos e cidadania.
Os pedidos pendentes so cadastrados a cada
uma ou duas semanas. Brevemente iremos incluir
novas categorias, como a de Ongs e Oscips, e
talvez a categoria de blogs institucionais.
As diferenas de classificao entre os dois sites
permitem vislumbrar duas tendncias conceituais.
Uma delas seria considerar apenas os blogs criadospor policiais integrantes da Blogpol. Neste caso, os
blogs jornalsticos, de guardas municipais, agentes
penitencirios, membros de conselhos de segurana
e outras lideranas civis, fariam parte do universo de
debate sobre segurana pblica, mas no da Blogpol.
A outra tendncia incluir na Blogpol pginas que
discutem segurana pblica em dilogo com as
pginas de policiais. Tudo indica que a perspectiva
predominante atualmente a segunda. Um dos
autores do blog Abordagem Policial apresentou umponto de vista preciso sobre este processo, expli-
cando que no incio foi necessrio caracterizar a
exclusividade dos blogs assinados por policiais
porque havia o risco de diluio da iniciativa em rela-
o blogosfera em geral. Mas na medida em que a
Blogpol se fortaleceu, j possvel ampli-la (veja a
ntegra deste raciocnio na nota abaixo).6
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DebatesCI
ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
6. Sobre os critrios para classificar os blogs da Blogpol, Danillo Ferreira enviou o seguinte e-mail em 6/8/09: A inteno inicial foi dar certodestaque aos policiais que escreviam sobre seu ofcio, na tentativa de mostrar um contraponto ao que jornalistas e outros profissionaispublicavam sobre polcia e segurana. Mas hoje, depois de estabelecido o dilogo entre os vrios atores da segurana que se precisa daparticipao dos policiais, no pode ficar apenas com ela vemos que fundamental expandir o conceito da blogosfera policial. Estouescrevendo umpostsobre TODOS os blogs de guardas municipais, e em breve vou dar um destaque maior a eles no Abordagem. Assim,digo que as categorias do Abordagem esto defasadas, por motivos histricos (a no-percepo do quanto as Guardas Municipais fazem
e podem fazer parte do Sistema de Segurana Pblica) e por motivos estratgicos (destacar os policiais como produtores de conheci-mento) que no mais so necessrios.
A BLOGOSFERA BRASILEIRAPrimeiros blogs foram criados no Brasil h 11 anos
Desde 1994, quando o estudante americano Justin
Hall lanou o seu dirio on-line considerado um
dos primeiros blogs do mundo os dirios na internet
proliferaram numa escala indita na histria das
comunicaes. O ltimo relatrio do Technorati, um
indexador que monitora pginas em 66 pases e 81
lnguas, mostra que a multiplicao dos blogs umfenmeno global que est mudando todos os setores
da atividade humana. Segundo o Technorati, entre
2002 (incio do monitoramento) e 2008 foram inde-
xados cerca de 133 milhes de blogs no mundo.
No Brasil, os nmeros da internet so divergen-
tes. O Ibope estima o nmero de usurios da inter-
net brasileira em 62,3 milhes. J o Centro de
Estudos sobre as Tecnologias da Informao e da
Comunicao (Cetic) calcula este nmero em
71,7 milhes. Deste total, o Cetic estima que 17%
teriam blogs ou pginas na internet. A realizaode uma verso nacional da Campus Party, conside-
rada o maior evento de inovao tecnolgica e
entretenimento eletrnico no mundo, revela o
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ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
dinamismo do mercado brasileiro. O Brasil foi o
primeiro pas escolhido para iniciar o processo de
internacionalizao do encontro realizado na
Espanha desde 1997.
Um blog pode ser definido como um dirio on-
line, um espao no qual o autor do blog ou blo-gueiro publica suas ideias a respeito de diversos
assuntos, pessoais ou pblicos, em textos organi-
zados cronologicamente, e onde os leitores
podem se manifestar por meio de comentrios.
No Brasil, o primeiro blog surgiu no Rio Grande do
Sul, criado por Viviane Vaz de Menezes, em 1998.
Era escrito em ingls. No mesmo ano, Renato
Pedroso Jnior, o Nemo Nox, iniciou o seu Dirio
da Megalpole. O surgimento desites que ofere-
ciam ferramentas de fcil utilizao para criaode blogs, como o Blogger e o Groksoup, em 1999,
permitiu o rpido crescimento da nova mdia.
No ano de 2001, o reconhecimento da populari-
dade dos blogs levou o IG a se tornar o primeiro
portal a criar uma rea destinada hospedagem
de blogs: o Blig. A princpio, os blogs eram pginas
de expresso pessoal, sem fins comerciais. No
demorou, entretanto, para que as corporaes de
mdia percebessem o potencial dos blogs. Em janeiro
de 2003, o portal Terra foi o primeiro a levar paraas suas redaes dois blogueiros. Dois anos depois,
o Portal do jornal O Globo tambm abriu espao
para que os seus colunistas criassem seus prprios
blogs.
Em 11 anos, o Brasil ganhou variada blogosfera,
abrangendo de dietas poltica, do sexo arte.
Segundo ranking do site Mundo Techo, em 2008,
os blogs mais populares do Brasil eram os que dis-
cutiam tecnologia. Mas pginas de humor, como Co-
cada Boa, e de jornalismo, como a de Josias de Souza,tambm aparecem bem colocadas no ranking.7
Os blogs jornalsticos de poltica esto entre os
mais bem-sucedidos e influentes do pas. Um dos
pioneiros nesse campo foi o jornalista Ricardo
Noblat, que criou o seu blog em 2004, quando
ainda trabalhava como colunista do jornal carioca
O Dia. Em 2005, j hospedado no portal IG, Noblat
mostrou o poder da nova mdia ao cobrir as inves-
tigaes do escndalo que ficaria conhecido como
mensalo (um esquema de compra de votos deparlamentares). Personagem central no episdio, o
deputado federal Roberto Jefferson citou o blog
do jornalista como fonte de informao durante os
trabalhos de investigao da Comisso Parlamen-
tar de Inqurito (CPI). O depoimento deu nova
relevncia aos blogs como formadores de opinio.
Os blogs tambm tm atrado os polticos. Muitos
deles se utilizam deste instrumento para apresen-
tar suas prprias interpretaes dos fatos polticos.
O ex-chefe da Casa Civil, Jos Dirceu, assim comoo ex-governador do Estado do Rio de Janeiro,
Anthony Garotinho, e o ex-prefeito da cidade do
Rio, Csar Maia, investiram nos blogs para publicar
notcias, entrevistas e suas opinies pessoais a
respeito de assuntos pblicos.
Para personalidades, assim como para estrelas
do mundo da msica e da TV, as pginas pessoais
representam um meio de falar diretamente com o
pblico, dispensando os filtros da imprensa e
assegurando que o contedo do texto postadoseja exatamente o desejado. De veculos de expres-
so pessoal, os blogs tornaram-se grandes meios
de propaganda e divulgao profissionais, adota-
dos inclusive pelas grandes corporaes. Blog, hoje,
j no significa apenas uma pgina feita por uma
pessoa ou um grupo, a partir dos seus pontos de
vista. No mundo corporativo, blog qualquer pgina
atualizada periodicamente, onde osposts se suce-
dem em ordem cronolgica e os leitores podem se
manifestar em comentrios. Grandes empresastm blogs, que apresentam notcias sobre seus pro-
jetos e opinies sobre a companhia. De postagem
em postagem, uma nova paisagem se desenha
na blogosfera.
7. Leia o ranking completo em http://www.mundotecno.info/noticias/os-200-blogs-mais-populares-do-brasil-em-2008. Outro ranking, ela-
borado em 2007 pelo especialista em mdias sociais Edney Souza, a partir de metodologia diferente, lista um nmero bem maior de sitesjornalsticos entre os 100 blogs mais populares. Veja em http://www.interney.net/?p=9760065.
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Patentes. Quando verificamos as patentes ou
cargos dos 73 blogueiros que responderam pes-
quisa, encontramos a seguinte distribuio:
Patente, cargo ou funo que ocupa na instituio
Os oficiais da PM aparecem como a maior catego-
ria, sendo 35% dos pesquisados. De fato, eles so uma
presena forte na blogosfera policial. Mas, se somar-
mos os profissionais que esto nas bases das institui-
es (praas da PM, agentes da PC, bombeiros, guardas
e agente da PRF), eles so a maioria, com 58%, en-
quanto oficiais e delegados, que so a elite de comando
das instituies, juntos representam 42%.
Talvez essa seja a maior inovao, a grande
mudana no campo da segurana pblica produzida
pela Blogpol: as hierarquias se dissolvem, bem como
o sentido corporativista das instituies. No s poli-
ciais civis interagem com policiais militares, bombeiros
e guardas, mas tambm praas e oficiais, inspetores e
delegados se relacionam e dialogam independente-
mente de hierarquia. A respeito disto, o major Wan-
derby, do Rio de Janeiro, disse:
Eu sou major de polcia, diferente fazer blog
como major ou fazer como soldado... Esse oidealista, esse o real, esse o cone, o Nied-
son, esse garoto, soldado de polcia, estudante
de direito que est fazendo a revoluo que ele
est fazendo, de forma bastante inteligente.
Outro oficial disse claramente:
A blogosfera policial legal porque a gente
conversa de soldado a coronel, a gente con-
versa de policial militar com policial civil, policial
militar com bombeiro, com guarda, com profes-
sor, com socilogo.
A criao deste novo espao de debate, onde no
vigoram as regras hierrquicas estabelecidas nas
corporaes, tende a contribuir para a qualificao
da gesto das foras de segurana. Alguns blogs
assumiram como misso a anlise crtica das aes
dos gestores de foras policiais, e suas observaes
reverberam entre os integrantes destas foras, na
imprensa e na sociedade. Este papel de vigilncia
certamente favorece a consolidao de padres de
conduta mais ticos e profissionais e diminui a proba-
bilidade de que desmandos possam ocorrer.
O autor de um blog do Rio de Janeiro, conhecido
pelas crticas constantes ao comando da Polcia Mili-
tar, diz que os blogs podero:
Aumentar a pluralidade, diminuir a opacidade
das instituies policiais e se Deus quiser, dificul-
tar a tomada de decises equivocadas, dificultara elaborao de polticas falsas na esfera de segu-
rana pblica, fazer que mscaras caiam. (...)
Acredito que a tendncia seja de crescimento e
de contribuio pra cidadania.
Um jornalista carioca, tambm blogueiro, acredita
da mesma forma em um impacto positivo:
Acho que est tornando a segurana pblica
mais inteligente. No os seus gestores, mas seus
agentes, que tendem a ficar mais inteligentes,
tendem a trocar mais. Porque assim, a mesmacoisa da salsicha, voc no sabe como feita e
melhor no saber, segurana pblica a gente
no sabe como feita, mas melhor saber.
Sexo e idade. Como era previsvel, os blogueiros
so esmagadoramente do sexo masculino, com
apenas trs mulheres entre os 73 entrevistados (trs
no responderam pergunta sexo). A tendncia
segue e acentua a tradio das profisses de
segurana pblica. O levantamento da Senasp Perfil
das organizaes de segurana pblica identifica 7%de mulheres nas PMs e nos Bombeiros e 22% nas PCs.
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SRIE
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ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
35,6
23,3
15,1
9,6
6,8
4,1
4,1
1,4
0 25 50
Oficial PM
Praa PM
Guarda Municipal
Inspetor / Investigador PC
No Policial
Delegado PC
Praa Bombeiro
Policial Rodovirio Federal
Fonte: Blogosfera Policial no Brasil. CESeC/UNESCO, 2009.
N %
26 35,6
17 23,3
11 15,1
7 9,6
5 6,8
3 4,1
3 4,1
1 1,4
Total 73 100,0
Guarda Municipal
Inspetor / Investigador PC
No Policial
Oficial PM
Praa PM
Delegado PC
Praa Bombeiro
Policial Rodovirio Federal
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20
SRIE
DebatesCI
ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
Outro levantamento recente produzido pela Senasp
(O que pensam os profissionais de segurana pblica
no Brasil, 2009) realizado a partir da Rede de Ensino
a Distncia da Renaesp (EAD/Renaesp), identificou
13,7% de mulheres entre todos os profissionais de
segurana integrados rede. Ou seja, sob qualquercritrio, a participao feminina na Blogpol extre-
mamente baixa e trata-se de um fenmeno a ser
observado no desenvolvimento da rede no futuro.
Sexo do autor
Outra surpresa da pesquisa a idade dos blo-
gueiros. Imaginvamos que predominariam os jovens
com menos de 30 anos, porm no foi isto o que
verificamos. Os jovens at 29 anos so aproximada-
mente um tero da amostra, mas os que tm 30 anos
ou mais representam 72,5%. Se pensarmos apenas nos
que tm 40 anos ou mais, a parcela ainda muito
expressiva, com 37,7% do total dos participantes.
Faixas etrias dos autores do blog
De fato, os mais jovens parecem ter intimidade
maior com a internet, pois j navegavam na rede
antes de ingressarem na polcia. Um policial de 25
anos contou: Eu sempre tive facilidade de escrever,
era bom em redao, mas no tive na minha adoles-
cncia o meu dirio, um caderninho... Escrever pra
mim comeou com os blogs mesmo. Para muitos
deles, a criao de um blog sobre o cotidiano da
corporao foi a consequncia natural de um hbito
j adquirido. Dos entrevistados, 49% disseram que j
tinham tido um blog antes do atual.
Entre os blogueiros mais velhos entrevistados, a
razo de iniciar um blog mais ligada a uma motiva-
o poltica apontar os problemas da instituio
policial e da poltica de segurana oficial e von-
tade de expressar frustraes ou questionamentos.
Nos seus relatos, a internet aparece como ferramenta,
e o desafio a ser superado o desconhecimento sobre
seu funcionamento e suas possibilidades:
Eu acessava a internet pra ler notcias, eventual-
mente ler e-mails, e a eu vi l que havia possi-
bilidade de criar um blog, na pgina do Google
ou coisa assim. Fui aos pouquinhos aprendendo
a lidar. Fui tentando e continuo tentando at
hoje. Meu foco principal no a questo tecno-
lgica, me aperfeioar na blogosfera, no mesmo,
s um acessrio pra minha realidade pessoal,pra minha profisso, pras minhas convices...
Eu poderia estar escrevendo um livro, mas eu
encontrei o blog, talvez uma forma mais prtica,
mais rpida.
Outros relatam ter recebido a ajuda dos mais
jovens:A meu filho tinha um blog, ele criou um blog
pra ele e disse Pai, por que voc no faz um
blog? ... [Ele] me ensinou aquilo e eu vi que era
molinho, criei um blog, que no andou, porque
era coletivo e ningum alimentava. Depois crieio meu e ento fui aprendendo a mexer.
N %
Masculino 67 95,7
Feminino 3 4,3
Total 70 100,0
Nota: sem informao para trs formulrios
Masculino95,3%
Feminino4,3%
Nota: sem informao para trs formulrios
Fonte: Blogosfera Policial no Brasil. CESeC/UNESCO, 2009.
N %
24 34,8
19 27,5
16 23,2
10 14,5
Total 69 100,0
30-39 anos
20-29 anos
40-49 anos
50 ou mais
27,5
34,8
23,2
14,5
0 15 30 45
20-29 anos
30-39 anos
40-49 anos
50 ou mais
Nota: sem informao paraquatro formulrios
Fonte: Blogosfera Policial no Brasil. CESeC/UNESCO, 2009.
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No caso do blog Capito Mano, mais detalhado
frente, o incio foi o presente de um oficial para o
outro. A histria comea com uma conversa em um
almoo, como descreveu o blogueiro.
Mano, eu gostaria de ter um blog, mas no sei
como criar. O outro diz: O que isso?. Blog uma pgina na internet que a gente coloca as
nossas opinies e o povo comenta. Horas aps
o almoo, um oficial liga para o outro e diz:
Mano, acesse a pgina capitaomano.blogspot.
com, esse o seu blog. O seu presente.
Escolaridade. A escolaridade dos blogueiros
previsivelmente alta. Quando somamos os que tm
superior completo e ps-graduao completa ou em
andamento, obtemos 62% dos entrevistados. Os
que tm apenas at o ensino mdio so 12,7% dosentrevistados. Outro dado interessante que 57,7%
dos respondentes afirmam j ter participado de cursos
no programa de Educao a Distncia (EAD) da Rede
Nacional de Altos Estudos em Segurana Pblica
(Renaesp), da Senasp.
Escolaridade do autor
Dedicao ao blog. Perguntamos quantos res-
ponsveis havia em cada blog. A grande maioria
(70%) mantida apenas pelo autor. Indagamos
sobre o tempo mdio de dedicao ao blog com base
nos ltimos trs meses e as respostas revelaram
grande diversidade. Embora a maioria tenha decla-
rado perodos de duas a dez horas semanais, encon-
tramos um nmero relativamente grande de blogueiros
(quase 20%) que dedicam mais de 21 horas por
semana, isto , mais de trs horas por dia em mdia.
Em vrias entrevistas houve meno s relaes,digamos, sazonais entre os autores e os blogs, com
perodos de intensa postagem (ato de adicionar
comentrios no blog) seguidos de perodos de escassa
presena, chegando quase ao abandono. Aparente-
mente, as relaes de culpa quanto alimentao
do blog so bastante frequentes na vida dos bloguei-
ros policiais, assim como em toda a blogosfera.
Tempo que o autor dedica ao blog
Divulgao e monetizao. As horas gastas,
contudo, no so compensadas por retorno finan-
ceiro para a grande maioria dos blogueiros. Apenas
16 entre os 73 respondentes disseram possuir algum
tipo de ferramenta de monetizao do blog, isto ,
de gerao de receitas (22%). Entre estes, quase
todos mencionaram que isto se fazia via anncios
do Adsense, ferramenta do Google que permite
exibir automaticamente anncios relacionados ao
contedo do site. Os administradores das pginas
so remunerados sempre que os visitantes clicam
nos anncios exibidos. Fcil e sem custo, o meca-
nismo, entretanto, nem sempre resulta em ganho.
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SRIE
DebatesCI
ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
2,8
9,9
25,4
33,8
28,2
0 50 100
Ensino fundamental
Ensino mdio
Superior incompleto
Superior completo
Ps-graduao completa ou em
andamento
N %
Superior completo 24 33,8
Ps-graduao completa ou em andamento 20 28,2
Superior incompleto 18 25,4
Ensino mdio 7 9,9
Ensino fundamental 2 2,8
Total 71 100,0
Nota: sem informao para dois formulrios 16,4
21,9
24,7
16,4
19,2
1,4
0,0 10,0 20,0 30,0
Menos de 2
2 - 4
5 - 10
11 - 21
Mais de 21
Outro
N %
18 24,7
16 21,9
14 19,2
12 16,4
12 16,4
Outro 1 1,4
Total 73 100,0
De 11 a 21 horas semanais
Menos de duas horas semanais
De cinco a 10 horas semanais
De duas aquatro horas semanais
Mais de 21 horas semanais
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SRIE
DebatesCI
ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
Vrios participantes fizeram comentrios como: Ins-
talei o Adsense ms passado, mas at agora nenhuma
receita foi gerada. Um blogueiro esclareceu: ainda no
temos anncios que banquem as despesas do site.
Seu blog gera algum tipo de receita?
Entre os que no tinham adotado qualquer meca-
nismo de gerao de receitas, 50% disseram que
gostariam de incorporar esses recursos ao blog. Um
nico entrevistado mencionou diretamente que pre-
tendia tornar o blog um empreendimento de gerao
de renda, uma alternativa ao bico o trabalho,
geralmente em empresas de segurana privada, que
grande parte dos policiais e bombeiros faz nas horas
vagas.
Os mecanismos de divulgao dos blogs tambm
no esto profissionalizados. A troca de links, meca-
nismo natural de interao entre blogs, o mais fre-
quente. O uso de redes sociais (como Orkut, Twitter
etc.), na poca era praticado por penas 55,2%. A
incluso em sites indexadores foi mencionada por
apenas 38,8%.
Voc usa algum recurso para a divulgao do blog?
A concluso que a noo de que o blog pode
ser uma fonte de receita, ou ao menos gerar umarecompensa financeira pelas horas gastas, ainda
bastante inicial num campo em que o idealismo,
como veremos a seguir, predomina sobre o sentido
pragmtico.
Os autores de blogs jornalsticos que responde-
ram a esta pesquisa parecem ter as mesmas motiva-
es. Suas pginas so atividades paralelas ao
trabalho. O blog para mim um trabalho volunt-
rio. No ganho nada com ele. Eu fao fora do horrio
de servio, disse um jornalista, titular de um blog.8
Dos blogs de jornalistas que participaram da
mostra, o nico monetizado o Santa Barbara e
Rebouas, do jornalista Gustavo Almeida. No entanto,
o sistema de remunerao ainda no resultou em
qualquer ganho expressivo, conta ele. No Santa
Brbara ganho dinheiro nenhum. Porque eu s tenho
o Google Adsence 9 no Santa Brbara, at hoje no
juntou 50 dlares.
Sim
22,0%
Outrasituao4,0%
Fonte: Blogosfera Policial no Brasil. CESeC/UNESCO, 2009.
N %
No 54 74,0
Sim 16 22,0
3 4,0
Total 73 100,0
Outra situao
No
74,0%
N %
46 68,7
39 58,2
37 55,2
37 55,2
26 38,8
11 16,4
3 4,5
Troca de links entre parceiros
Divulgao offline (bocaaboca,cartes, adesivos, cartaz, outdoor, etc)
Incluso em sites de busca(Google, Yahoo, Ask, etc)
Divulgao em redes sociais(Twitter, Orkut, Myspace, etc)
Incluso em sites de indexaode blogs (blogblogs, technorati, etc)
Incluso em diretrios(Google Directory, Dmoz,Yahoo Directory)
Outros
8. O blog Casos de Polcia, do jornal Extra, que no fez parte dos entrevistados, tem como editor o prprio responsvel pela editoria de Pol-cia do jornal, e publica textos enviados por vrios reprteres da casa. Funciona, assim, como a pgina de noticirio de polcia e seguranapblica do veculo.
9. O Adsense indexa o contedo das pginas de sites cadastrados e exibe automaticamente anncios relevantes para os leitores de cada
site. A cada vez que os leitores clicam em um anncio, o administrador da pgina remunerado. Para receber, ele precisa acumular umcrdito de US$ 100 ou mais.
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Razes de ser. Perguntamos aos blogueiros os
motivos que os levaram a criar as pginas. As explica-
es foram variadas, ricas e longas. Muitas respostas
expressam a crena no potencial renovador da blo-
gosfera policial, outras lembram manifestos polticos
no surgimento de um movimento social. Uma carac-
terstica comum a vrios depoimentos a ideia de
que no passado muito se falou sobre a polcia e os
policiais, mas quase nada foi dito pelos prprios
agentes de segurana. O debate era sempre entre os
profissionais de meios de comunicao, os especialis-
tas e os governantes. O crescimento acelerado da
blogosfera mostra a urgncia que os policiais esto
construindo um espao onde possvel falar, tomar a
palavra e elaborar concluses, sempre na primeira
pessoa.
Tempo de falar
Enquanto outros profissionais utilizavam-se da
mdia tradicional para discutir os temas [em] que ns,
operadores da segurana pblica, somos especialis-
tas, os policiais militares tinham suas discusses
limitadas aos corredores dos quartis.
Discutir e divulgar nossos pontos de vista.
Os policiais no so de Marte, tm opinio,
famlias, so sujeitos portadores de deveres e direitos,
investidos de um poder concedido pela sociedade,mas que dela tambm fazem parte.
Por anos, a exposio de ideias e juzos sobre
temas comuns segurana pblica ficou adstrita
a pequeno grupo de cientistas de humanidades.
Os meios de comunicao se limitavam a ouvir os
chamados especialistas, que em sua maioria pos-
suam inventrios tericos sobre o tema, organizados
atravs de estudos abstratos. Com o advento dos
blogs, os canais regulares de mdia deixaram de ser
os nicos para veiculao da temtica e a discussopde ser ampliada.
Tempo de mudar
O entendimento que o cenrio no est nada
bom e a esperana de que outras pessoas tivessem a
mesma percepo que eu.
Uma forma de gritar e efetivamente ser ouvido,
o que via de regra no posso fazer na minha corpora-
o.
Era hora da democracia entrar nas Polcias, aca-
bando com preceitos defasados que militar no pode
emitir opinio que desagrade seus superiores.
Tempo de mostrar
Mostrar um pouco do mundo policial. A oportu-
nidade de mostrar a realidade do policial. Na mdia,
apenas destacam as notcias negativas e isto acaba
deixando aparecer que a corporao se resume a
trabalhos malfeitosA busca de um veculo atravs do qual minhas
impresses sobre erros e acertos na esfera da segu-
rana pblica pudessem ser externadas.
Mostrar a viso de segurana pblica de algum
de dentro da corporao.
Mostrar o cotidiano, os bastidores da polcia.
Tempo de protestar
Informar populao a realidade nua e crua e
no a mscara que o governo vende.
Desabafo no incio e posteriormente ferramenta
de divulgao de ilegalidades e arbitrariedades do
governo e do comando.
Usar o blog como tribuna. Se nos quartis o poli-
cial militar no pode opinar, sugerir ou reivindicar algu-
ma coisa, no nosso blog o espao democrtico.
Tempo de informar
Fazer o marketing institucional do meu setor.
Necessidade de divulgar nosso trabalho, e os
avanos que as Guardas Municipais esto tendo e do
quanto elas podem ser importantes para a SeguranaPblica. 23
SRIE
DebatesCI
Perfil dos blogs policiais
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DebatesCI
ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
Tempo de guardar e intercambiar
Construir a memria coletiva e a pessoal, com
fotos e textos que registrem, alm da histria do
setor e da instituio, a minha prpria histria.
Experimentar uma forma de interao entre a
polcia e a sociedade, ainda que no oficial, para aconstruo de um futuro projeto institucional.
As respostas, apesar da sua diversidade, permitem
vislumbrar um ethos policial predominante na blo-
gosfera: amor profisso e carreira, responsabili-
dade no debate sobre segurana pblica, desejo de
ser ouvido e reconhecido, desejo de mudar e ter voz
nas mudanas.
Num esforo de sntese, classificamos cada resposta
em um dos quatro grupos que, de alguma maneira,
caracterizam as linhas predominantes entre os blogsexistentes atualmente. Ainda que vrias respostas
permitissem a classificao em mais de um grupo, o
resultado quantitativo indica que a linha predomi-
nante a de elaborao e expresso de pontos de
vista prprios dos policiais sobre segurana e justia
(55,6%). Em seguida, vem uma srie de blogs, espe-
cialmente os de guardas municipais, preocupados
com a informao para a prpria categoria e a divul-
gao de agendas de interesse coletivo. Depois, vm
os blogs voltados para denunciar as injustias, as
manipulaes de governos, comandos e da grande
mdia.10 Por ltimo, vm os blogs dedicados a mostrar
para o mundo externo a realidade interna das corpo-
raes.
Motivos que o levaram a criar o blog
A categorizao indicada acima foi inspirada na
excelente exposio de Danillo Ferreira, sobre os
objetivos da Blogpol, desenvolvida numpostno seu
Abordagem Policial que acabou sendo adotado por
vrios blogs (Dirio de um PM, Blogosfera Policial e
outros). Segundo Danillo, em texto de 9 de fevereiro
de 2009, os objetivos da blogosfera so basicamente
trs: interao interna (policiais escrevendo para
policiais); interao externa (policiais se relacio-
nando com no policiais) e reivindicao (os militares
militando). Um exemplo do primeiro grupo seria o
blog Blitz Policial e as redes do tipo Orkut. No segundo
tipo, os blogs mais bem-sucedidos so o Dirio de
um PM, o Aspiras do Brasil (voltado para jovens que
desejam fazer concurso para as polcias) e o PM Tube
(vdeos e imagens sobre aes policiais). Os exemplos
tpicos da ltima categoria so o blog do major Wan-
derby e o blog Flit Paralisante, do delegado Guerra,
de So Paulo. Segundo o blogueiro,
a notoriedade de ambos diretamente propor-
cional s retaliaes a seus trabalhos nos
blogs. Ferreira lembra que os trs mbitos so
inter-relacionados e os blogs tm parcelas dos
trs aspectos11.
medida que novas pginas surgem na blogos-
fera policial, aparecem tambm blogs que no se
enquadram precisamente nessas categorias. No caso
do blog O grito de Ana, o PM Andr Luiz Souza e
10. Curiosamente, a linha poltica ou ideolgica da maioria dos blogs parece se inclinar para a defesa da liberdade de expresso e acrtica hierarquia e a rigidez disciplinar. Poucos so os que exaltam o militarismo e a manuteno de rituais e tradies. Uma explicaopara este vis seria a percepo de que a internet, e a prpria criao dos blogs, representam um desafio a estas tradies, como explicaDanillo Ferreira, do blog Abordagem Policial. Na Blogosfera Policial como um todo, percebemos a presena de conservadores maseles so minoria. Isso porque, suspeito, o blog visto no somente como uma ferramenta, mas como uma bandeira dos que nunca
tiveram oportunidade de falar e se expressar. Esses mudos geralmente no so conservadores, j que desejam expressar seu desejo de
mudana.11. O endereo do texto na ntegra :
N %
19 26,4
40 55,610 13,9
3 4,2
Total 72 100,0
Informar, divulgar e atualizar
Expressar pontos de vistaCombater as injustias
Aumentar aauto-estima
55,6
26,4
18,1
4,2
0 25 50
Informar, divulgar, atualizar
Expressar pontos de vista
Combater as injustias
Aumentar aauto-estima da
corporao frente sociedade
Nota: sem informao para um formulrio
Fonte: Centro de Estudos de Segurana e Cidadania/UNESCO
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23/50
Silva decidiu abordar a violncia de gnero como
uma maneira de continuar a pesquisar o tema da sua
monografia, ao qual pretende dar continuidade no
mestrado (veja quadro). Assim, trata-se de um tipo de
militncia, misturado pesquisa acadmica e tambm
ao interesse profissional Andr busca atuar no com-bate violncia domstica dentro da PM mineira.
Desta forma, o blog e o trabalho de agente na PM se
enriquecem mutuamente, num crculo virtuoso.
Mesmo assim, a classificao acima consistente
com as respostas dadas pergunta: a atividade de
blogueiro ? Diante de cinco opes fechadas, 40%
responderam que ser blogueiro um meio de
expresso poltica. Um tero, isto , 31,4% respon-
deram que parte do trabalho e 17% um servio
pblico. Entre os quatro que responderam que serblogueiro principalmente diverso, um explicou
um hobby, outro disse uma teraputica e um
esclareceu um tipo de diverso na qual posso ajudar
aos meus colegas a terem maior acesso a informa-
es (...) dignificando o nome da corporao. Um
blogueiro declarou que ser blogueiro Inutilidade a
toda prova... pelo menos o meu o , at agora!
A atividade de blogueiro :
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DebatesCI
ABlogo
sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
40,0
31,4
17,1
5,7
5,7
0 25 50
Um meio de expresso poltica
Parte do meu trabalho
Um servio pblico
Principalmente diverso
Mais importante do que meutrabalho
Nota: sem informao para trs formulrios
Fonte: Blogosfera Policial no Brasil. CESeC/UNESCO, 2009.
N %
28 40,0
22 31,4
12 17,1
Principalmente diverso 4 5,74 5,7
Total 70 100,0
Nota: sem informao para trs formulrios
Um meio de expresso poltica
Parte do meu trabalho
Um servio pblico
Mais importante do que meu trabalho
VIOLNCIA CONTRA MULHER NA MIRADepois de escrever monografia, PM cria blog sobre o tema
Capixaba de Vitria, Andr Luiz Souza e Silva, 29
anos, tornou o seu blog uma extenso da rea que
vem pesquisando. H cinco anos na PM de Minas
Gerais, ele escolheu a violncia de gnero como
tema da sua monografia no curso de especializa-
o em Estudos de Criminalidade e Segurana
Pblica do Centro de Estudos de Criminalidade e
Segurana Pblica (Crisp) www.crisp.ufmg.br ,da Universidade Federal de Minas Gerais, que fre-
quentou em 2006.
Aluno da professora Marlise Matos, especialista
no tema, Andr j tinha atuado em ocorrncias de
violncia domstica. Liguei as aulas com a minha
experincia de rua. O negcio foi me chamando
ateno e pensei: vou fazer a minha monografia
em cima disso.
Orientada por Marlise Matos, a monografia de
Andr intitula-seA Polcia Militar de Minas Gerais e
a violncia domstica conjugal contra a mulher.
No resumo, Andr definiu a tese como uma pro-
posta de:
criao de um cdigo estatstico especfico para o
crime de violncia domstica conjugal contra a
mulher. A criao deste cdigo no sistema de
estatstica de ocorrncia da Polcia Militar de
Minas Gerais possibilitaria a produo de dadosquantitativos sobre o atendimento a ocorrncias
com esta natureza criminal que, transformados
em informaes, somaria como mais uma fonte
confivel de dados no combate a este tipo de vio-
lncia e desrespeito aos direitos humanos das
mulheres.
No texto, Andr continua:
A Polcia Militar um rgo estratgico no sis-
tema de Defesa Social por ser, geralmente, o
policial militar o primeiro a chegar ao local da
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sferapolicialnoBrasil:dotiroaoTwitter
ocorrncia e relatar o fato. Ser uma grande
contribuio para a luta contra a violao dos
direitos humanos da mulher a participao
eficaz e eficiente da Polcia Militar, tanto no
atendimento quanto na produo de dados
estatsticos que (...) subsidiaro pesquisas e
polticas pblicas.
Terminada a especializao, em 2008, Andr
passou a pensar em temas para candidatar-se ao
mestrado. Foi assim, pesquisando na internet,
que descobriu os blogs de policiais. No incio do
ms de abril de 2009, voltou Vitria para parti-
cipar do Frum Brasileiro de Segurana Pblica.
L, assistiu mesa-redonda sobre blogs. J
conhecia o trabalho de Jorge Antonio Barros no
blog Reprter de Crime e foi o seu nome que oconvenceu a conferir o painel. Assistiu palestra
e se entusiasmou com a ideia de ter um blog
prprio. Eu me encontrei ali. Passei a acompa-
nhar ossites.
Faltava definir um tema para o seu blog. Refle-
tindo, pensou que o melhor seria escrever sobre
o tema que j havia pesquisado. Assim surgiu
O Grito de Ana.
Escolhi este nome para representar todas as
mulheres agredidas. Na semana em que estavatrabalhando na ideia do blog, peguei um jornal
daqui de Minas e duas mulheres chamadas Ana
haviam sido mortas violentamente. Uma apare-
ceu morta no carro, com o filho ao lado. Outra
sumiu e apareceu morta depois. Foi encontrada
pela famlia no IML.
Andr criou o blog em abril. At agora, o n-
mero de leitores pequeno. O assunto, diz Andr,
no dos mais populares. As pessoas no ligam
muito, acham que mulher apanha porque quer.
A maior parte das reaes so comentrios de
colegas que destacam o fato de um homem es-
crever sobre violncia contra a mulher.
Formado em Jornalismo e filho de um coronel
reformado da PM capixaba, Andr v no blog apossibilidade de atuar de forma militante na rea.
Quando voc comea a estudar, crescer e se
identificar com o assunto, quer fazer as coisas
acontecerem, participar. Andr ainda no con-
seguiu entrar em um grupo especializado em
violncia domstica, mas j participou de treina-
mentos destinados a melhorar o atendimento
das vtimas deste fenmeno. J existe um esforo
da PM de se adequar para atender melhor
violncia domstica.O policial ainda no percebe na PM mineira
um grande interesse pelos blogs, mas acha que a
chegada dos novos veculos parte do processo
de qualificao da fora.
Antes os policiais s precisavam ter o primeiro
grau. Hoje, j entram com ps, e alguns cursam
mestrado. O salrio e a formao intelectual
so melhores. Isso est criando um choque com
o sistema militar. O policial no pensa mais
como vaquinha de prespio.
Os blogs, diz Andr, vo expor para a socie-
dade o que realmente a polcia e quais so seus
desafios e problemas. Isto vai gerar um avano
da polcia.
Apesar dessa convico, Andr confessa que
teve o cuidado de escolher um tema que no o
levasse a bater de frente. Meu assunto no
mexe com o sistema. Eu evito. Sei como funciona
o militarismo.
Os jornalistas. A presena de jornalistas na
blogosfera policial chama a ateno. Quais seriam os
objetivos e as razes dos profissionais da imprensa
que j dispem de canais de expresso como respon-
sveis pela cobertura diria em jornais de grande
circulao ao criar blogs e aliment-los nas noites,
fins de semana e horas de folga, em geral com poucoou nenhum apoio de seus rgos?
A partir dos depoimentos dos jornalistas entrevis-
tados, percebe-se que para eles o blog surge da
angstia provocada pelo fazer cotidiano do jornal.
Diante do ofcio de apenas relatar os crimes e aes
de segurana, seguindo padres de objetividade, o
reprter sente necessidade de criar um espao para
expressar suas opinies, mobilizar a sociedade, divul-
gar denncias e escrever sobre fatos e anlises que
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25/50
no encontram lugar nas pginas de seu veculo.12
Outro motivo importante a possibilidade de receber
informaes por intermdio dos leitores do blog. O
pblico que acompanha um blog sobre segurana
pblica inclui muitos profissionais ligados rea, que
pelos comentrios estabelecem um dilogo com oautor da pgina, fornecendo informaes que quali-
ficam a sua atuao profissional.
Eduardo Machado, jornalista doJornal do Comr-
cio, de Pernambuco, explicou a sua adeso mdia
virtual em debate em Vitria, em abril de 2009:
Eu j estava h dez anos no jornal, mas eu via
que, neste tempo todo, a gente estava fazendo
a mesma matria todos os dias, porque todo
dia eu dizia que algum havia sido assassinado.
Mudava somente o nome da vtima, o nome dosuspeito e o nome da autoridade que dava uma
desculpa para aquilo continuar acontecendo,
mas a matria era praticamente a mesma. O
que eu e meus colegas estvamos vendo que
ns, como jornalistas, estvamos fazendo parte
dessa engrenagem de violncia. A gente no
estava refletindo. A gente estava apenas rever-
berando a violncia e deixando que ela fosse
incorporada nossa paisagem, de uma maneira
bizarra.
Por isso, Eduardo e outros trs jornalistas decidi-ram criar, em maio de 2007 um site contador de
homicdios, o PE BodyCount.13 A partir do blog, que
atingiu enorme notoriedade, ganhou prmios e
status de interlocutor poltico das diretrizes de segu-
rana do governo Eduardo Campos, o grupo de
reprteres desenvolveu atividades de rua e perfor-
mances para chamar a ateno da populao sobre a
banalizao das mortes de jovens das favelas e das
reas pobres do estado.
Jorge Antonio Barros, autor de Reprter de Crime,blog de significativa repercusso dentro de um portal
da grande mdia, explica:
Quando eu comecei a fazer o primeiro blog sobre
segurana, antes de estar no site do Globo,
no existia nenhum outro jornalista fazendo
este tipo de blog. Desde ento, eu tinha alguns
objetivos, o principal era a pretenso de formar
uma rede de cidados preocupados em debater
contra a violncia. A chave do blog, para mim,
a interatividade. difcil, tm leitores chatos,
carentes, voc precisa responder, mas eu acho
que este o grande barato do blog. Se o blog
no descobre este caminho, ele no blog, um site. O outro aspecto, a opo de usar o
texto na primeira pessoa. Um blog tem o carter
mais alternativo e se impe como uma janela
realmente do debate. Em alguns casos, o jornalista
vira um ator, interfere diretamente no noticirio,
cobrando imediatamente providncias.
O jornalista carioca Gustavo de Almeida, que em
2006 criou o blog Santa Brbara-Rebouas, ento
hospedado no Jornal do Brasil, revela que um dos
objetivos do jornalista da rea criar redes de relacio-namento.
Na hora em que vou fazer uma cobertura, o
policial sabe quem eu sou, como eu penso e se
sou confivel. Ento se cria aquela rede de con-
fiana, e a todo tempo, nos comentrios,
chega informao que muitas vezes tenho que
deletar, porque no sei se so confiveis, mas
que ajudam muito a entender o panorama.
No caso de Gustavo, a rede acompanhou o jorna-
lista mesmo quando ele deixou o JB para trabalhar
em outros veculos. Gustavo mantm o blog inde-
pendente e continua a publicar notcias e comentrios
relacionados segurana pblica.
Alm, desses, h blogs de referncia na Blogpol,
com perfil jornalstico. O blog Casos de Polcia e
Segurana, do jornal Extra, do Rio de Janeiro,
citado inmeras vezes e aparece como uma das
fontes mais visitadas pelos blogueiros, como veremos
mais frente. Apesar de ter o nome de blog, pro-
duzido coletivamente pelos reprteres do dirio e seu
contedo opinativo se restringe aos artigos de colu-
nistas convidados. Na verdade, funciona como a
editoria policial do site do jornal, dedicando-se
divulgao de notcias apuradas ao longo do dia, ou
a notcias complementares edio do Extra em
papel. O jornalista Fbio Gusmo, editor do site, diz:
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12. A pesquisa Mdia e Violncia, do CESeC, que monitorou nove jornais do Sudeste, em 2005, mostrou que 63,8% dos textos sobre crime,violncia e segurana pblica eram factuais simples notcias, sem anlise ou contexto. O tema polticas de segurana era o assuntoprincipal de apenas 3,6% das matrias. O relatrio completo da pesquisa pode ser lido na pgina .
13. Inspirado inicialmente no Iraque BodyCount, um site que motivou diversas aes ligadas segurana humana e aos direitos humanosno mundo. Veja .
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Somos um blog com cara de site. Optamos pelo tom
jornalstico com pitadas de opinio. a forma mais
fcil de administrar um blog feito por uma equipe.
O jornal O Dia mantm um blog desde maro de
2008, intitulado Blog da Segurana, em moldes
semelhantes, ou seja, perfil jornalstico e colunistasconvidados.
Ainda so muito poucos os veculos de imprensa
que abriram espao para blogs de jornalistas especia-
lizados em crime e segurana pblica. Um fator para
este pequeno nmero de pginas pode ser o desinte-
resse dos profissionais da rea, pouco afeitos a usar o
espao da imprensa de forma opinativa e temerosos
da carga extra de trabalho que a manuteno de um
blog representa.
No entanto, provavelmente, o principal fator paraa escassez desses blogs a postura das corporaes
de mdia, que ainda encaram os blogs como compe-
tidores das redaes tradicionais, no que diz respeito
ao acesso s informaes, e no veem neles produtos
potencialmente geradores de renda, capazes de justi-
ficar investimentos maiores. Podemos especular
embora no tenhamos realizado entrevistas com
chefes de redaes sobre este assunto que, na viso
dos editores de dirios, o reprter pode terminar
valorizando mais o espao autoral do blog do que assuas tarefas na redao, o que representaria uma
perda para o principal negcio da empresa. Existe,
ainda, o risco de abrir um espao opinativo para dis-
cutir temas potencialmente explosivos.
Pode-se argumentar que existem blogs sobre pol-
tica e economia, temas igualmente srios, que reper-
cutem na sociedade e provocam respostas das
autoridades. No entanto, os blogs dedicados a estes
assuntos costumam ser responsabilidade de colunis-
tas especializados, jornalistas de grande reconheci-mento nas suas reas e com muita experincia no
delicado equilbrio entre a opinio e a informao.
Ao menos nos jornais impressos, so quase inexisten-
tes os colunistas dedicados exclusivamente segu-
rana e criminalidade.14
Os profissionais do chamado setor policial das
redaes sempre foram considerados menos qualifi-
cados do que os de economia e poltica. O processo
de formao de jornalistas focados em segurana
pblica, que acompanhou o agravamento da violn-
cia no Brasil, recente, como observou em 2006
Marcelo Beraba, poca ombudsman da Folha de
S. Paulo e diretor da Associao Brasileira de Jorna-lismo Investigativo (Abraji):
Se voc comparar com as atenes que recebem,
nas redaes, reas como economia, cincia e
meio ambiente, essa evoluo fica aqum do
que aconteceu ou vem acontecendo nestas
reas. A rea policial continua sendo um primo
pobre, no s dentro da imprensa, mas tambm
na sociedade e na Academia 15.
Apesar da carncia de investimentos, desde os
anos 1990 a cobertura de segurana pblica e crimeganhou novos padres de qualidade e passou a
investir mais em temas abrangentes em vez de
apenas cobrir o fato criminoso. O fenmeno dos
blogs tende a acelerar estas mudanas. Os jornalistas
especializados em segurana pblica, crime e violn-
cia, contam agora com cerca de uma centena de
pginas que discutem estes temas. Por intermdio
destes blogs, eles podem descobrir pautas, avaliar o
impacto de uma notcia e estabelecer novas fontes
estas, por sinal, fatores centrais na qualidade do tra-balho jornalstico. At agora, a maioria dos reprteres
podia contar apenas com a declarao de um porta-
voz ou, raramente, uma entrevista com um dos
gestores de uma corporao ou secretaria. Agora, o
jornalista pode estabelecer contato com policiais de
vrias patentes, origens e experincias.
Outra contribuio importante dos blogs para a
cobertura jornalstica o contato com o leitor. O blo-
gueiro jornalista obrigado a estar em contato
permanente com seus leitores, que tanto podemaplaudi-lo como critic-lo duramente. Este contato
cotidiano tende a ampliar as exigncias ticas sobre a
atividade do jornalista, incentivar a reflexo e o
debate nas redaes.
Anonimato ou identificao. O anonimato um
tema em debate permanente na blogosfera, espe-
cialmente na blogosfera policial, j que profissionais
14. O Jornal Zero Hora criou uma coluna especializada em segurana pblica em 2006.
15. RAMOS, S.; PAIVA, A. Mdia e violncia: novas tendncias na cobertura de criminalidade e segurana no Brasil. [Rio de Janeiro]: IUPERJ,2007.
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de segurana podem ter problemas srios nas suas
carreiras e algumas vezes chegam a ser processados
e presos por declaraes publicadas no blog. Entre os
70 blogs participantes da consulta, apenas cinco
mantinham a condio de annimos.16
O blog identificado ou annimo? (por blog)
Embora esta seja uma parcela muito pequena,
quase nfima, da blogosfera policial, o debate no
irrelevante. Em primeiro lugar porque comentrios
postados nos blogs podem ser annimos. Em segundo
lugar, porque alguns blogs comearam como anni-
mos e depois que mudanas ocorreram no contexto
onde atuavam eles se tornaram identificados.
Um dos blogueiros comentou: tenho observado
em alguns blogs policiais que utilizam do anonimato
para expressar ressentimentos com seus superiores.
Entendo que o annimo no existe na histria, logo,
o que dizem no tem valor. Mas um blogueiro an-
nimo explicou claramente: esta nica coisa que
posso fazer at o momento! No estou satisfeito
em ter que ficar annimo e on-line! Gostaria de estar
exigindo mudanas ao vivo e a cores!.
No por acaso, talvez, um entrevistado definiuassim a atividade de blogueiro policial: Um ato silen-
cioso para ter voz. Um caso emblemtico da funo
do anonimato na atividade na internet o do blog
Capito Mano, de Sergipe, que recentemente teve
papel central no processo vitorioso de mobilizao
de policiais militares (veja o quadro).
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16. Um quinto blog annimo teve que ser excludo da base, porque no pudemos confirmar a sua origem, j que o respondente no for-neceu o nome do blog nem respondeu aos e-mails de contato.
N %
65 92,9
5 7,1
Total 70 100,0
Identificado
Annimo
Annimo
7,1%
Identificado
92,9%
Fonte: Blogosfera Policial no Brasil. CESeC/UNESCO, 2009.
No incio do ano de 2009, dois policiais militares
almoavam juntos em Sergipe. Um deles comentou:
Mano, eu gostaria de ter um blog, mas no sei
como criar.
O que isso? perguntou o outro agente.
Blog uma pgina na internet em que a gente
coloca as nossas opinies e o povo comenta. Tem
muita gente que tem na internet.
Hum... Deve ser legal.Horas aps o almoo, o oficial que nada sabia
sobre blogs telefonou para o colega:
Mano, acesse a pgina capitaomano.blogs-
pot.com. Esse o seu blog. O seu presente.
assim que um dos responsveis pelo blog Capi-
to Mano descreve o surgimento da pgina, em
janeiro de 2009. A histria, que demonstra a sim-
plicidade e a rapidez que surgem os blogs, ainda
mais impressionante quando se pensa na impor-
tncia que o Capito Mano ganhou em Sergipe.
Irnica e aguerrida, a pgina annima tornou-se
uma fora a ser reconhecida pelos gestores da
Segurana Pblica do Estado, mobilizando os
agentes em uma inteligente campanha por maio-
res salrios, criticando o titular da Secretaria e
fazendo denncias contra comandantes da PM.
A popularidade do blog to grande entre os PMsque a Polcia Militar decidiu criar o seu prprio
canal de comunicao com a tropa, lanando, em
agosto, um blog oficial, o Papa Mike 1835.
Lido por uma mdia de mil pessoas por dia j
conta com mais de 200 mil acessos desde a sua
criao, em janeiro de 2009 o Capito Mano foi,
junto com o blog da Associao Beneficente dos
Servidores Militares de Sergipe (ABSMSE) o princi-
BLOG ANNIMO LIDEROU CAMPANHA SALARIAL EM SERGIPE
Sucesso do Capito Mano faz que PM crie seu prprio blog institucional
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pal articulador de uma estratgia de mobilizao
dos policiais sergipanos intitulada Tolerncia Zero.
Divulgada em posts dirios durante o ms de
junho, a campanha pretendia pressionar a Secreta-
ria de Segurana por melhores salrios, valendo-se
de uma estratgia original. Os policiais passaram aexigir que a lei fosse cumprida, tambm, no seu
ambiente de trabalho. Os PMs que aderiram
campanha exigiam equipamentos de proteo,
recusavam-se a dirigir viaturas sem curso espec-
fico e ameaavam deixar de trabalhar em presdios
e delegacias.
Elegemos a questo salarial como prioridade e
trabalhamos arduamente o tema, acrescido do
pr-requisito de nvel superior para ingresso na
corporao na carreira de praas e oficiais e naimplementao de uma carga horria,
escreveu em e-mail um dos autores do blog, que
fez questo de manter o anonimato mesmo ao
responder pesquisa do CESeC. A mobilizao
acabou vitoriosa: em 26 de junho, o governador
Marcelo Dda anunciou reajustes que at 2010
somariam mais de 90%.
Segundo o entrevistado, a mobilizao para
que os policiais militares exigissem seus direitos
mexeu com a tropa. Um exemplo:
Antes do blog, muitos policiais militares trabalha-
vam em eventos particulares coercitivamente e de
forma gratuita. Hoje, o militar tem plena cons-
cincia de que no deve trabalhar e se o fora-
rem, ele denuncia no blog e ainda coloca o
superior para responder na Justia.
Por conta dessa atuao, dizem os autores, o
Capito Mano teria sido alvo de investigao e
tentativas de censura em Sergipe.
H algum tempo o acesso ao blog foi bloqueado
nos quartis da Polcia Militar de Sergipe. Em vir-
tude deste fato publicamos um post de crtica
condenando tal atitude que, felizmente, os MANOS
E MANAS conseguiram burlar pelo site de busca
do Google. Atualmente, como perceberam que
no podem bloquear, passaram a criar mecanis-
mos que impossibilitam que o leitor coloque
comentrios e outros mecanismos virtuais para
mandar vrus e etc. Acrescente-se que tivemos
uma informao recente que o Ministrio Pblico
Estadual pediu apoio Polcia Federal para desco-
brir de onde que o Capito Mano est postando,
ou seja, ele quer descobrir o IP do computador
que o Capito Mano usa. Desde j avisamos que
ser uma busca infrutfera, mas fiquem vontade.
informou o blogueiro.Os autores classificam o blog como um produto
coletivo. Seus colaboradores, diz o entrevistado,
so pessoas de 18 a 100 anos, do primeiro
pos