+ All Categories
Home > Documents > Classes sociais em Bourdieu

Classes sociais em Bourdieu

Date post: 18-Dec-2014
Category:
Upload: felipe-correa-de-mello
View: 285 times
Download: 0 times
Share this document with a friend
Description:
curso completo e detalhado sobre espaço social e espaço simbólico em Bourdieu
80
PLANO DE MARKETING Espaço social e classes sociais na teoria de Pierre Bourdieu Prof. MSc Felipe Correa de Mello 2012
Transcript
Page 1: Classes sociais em Bourdieu

PLANO DE MARKETINGEspaço social e classes sociais na teoria de Pierre Bourdieu

Prof. MSc Felipe Correa de Mello

2012

Page 2: Classes sociais em Bourdieu

O objetivo deste curso é apresentar os principais aspectos concernentes à teoria de

espaço social e espaço simbólico apresentados na obra do sociólogo Pierre Bourdieu, bem

como sua concepção de classes sociais, esta diretamente relacionada às reflexões acerca dos

espaços sociais e simbólicos.

Englobando pesquisas em diversos e diferentes campos da atividade social (alta

costura, literatura, sistema escolar, campo acadêmico, burocracia estatal, frequência a

museus, trabalhadores na Argélia entre vários outros) e colocando em prática e

resignificando uma série de conceitos de diversas tradições teóricas, a obra de Bourdieu é

bastante vasta e complexa.

Muitas vezes hermética, sua obra apresenta obstáculos para a leitura e compreensão

para aqueles que não estão familiarizados com ela.

Neste sentido, com objetivo em facilitar a melhor compreensão das noções de espaço

social e simbólicos é proposto neste curso uma apresentação inicial que indique os diversos

caminhos e perspectivas teóricas presentes na tradição das ciências humanas contra e com

as quais Bourdieu construiu sua teoria.

Tem-se, assim, como objetivo específico deste curso fazer um apanhado geral de

conceitos caros a Bourdieu, como habitus, estratégia, senso prático, poder simbólico,

reprodução, entre outros. Conceitos, estes, que fazem parte de um mesmo conjunto

conceitual e que podem ser integradas logicamente.

Page 3: Classes sociais em Bourdieu

O curso é dividido em três módulos:

I. Perspectivas sobre o mundo social e a

ação humana;

II.Bourdieu: para além do objetivismo e do

subjetivismo;

III. Espaço social e simbólico: a questão das

classes sociais.

Page 4: Classes sociais em Bourdieu

I. Perspectivas sobre o mundo social e a ação humana

O que é objetivismo?Quais seus méritos?Quais suas lacunas?Quais suas implicações na concepção da ação humana?

O que é subjetivismo?Quais seus méritos?Quais suas lacunas ?Quais suas implicações na concepção da ação humana?

II. Bourdieu: para além do objetivismo e do subjetivismo

Agentes situados e determinados: a influência de Durkheim; Quais são os cruzamentos teóricos que ajudaram na construção das teorias

bourdesianas ?

A dupla dimensão do mundo social;

Quais os procedimentos metodológicos adotados por Bourdieu?O poder simbólico na estruturação do mundo social: dimensão ativa do

sujeito.Quais são os conceitos mediadores que permitem a superação da falsa

oposição sujeito/objeto?

Page 5: Classes sociais em Bourdieu

III. Espaço social e simbólico: a questão das classes sociais

1. Os dois modos tradicionais de se pensar as classes sociais

2. Observações preliminares de caráter teórico-metodológico

3. O enfoque relacional proposto por Bourdieu

3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento

de classe

3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”

3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a

dialética da distinção

4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a

noção de capital em Bourdieu

5. Classificações e re-classificações: dominação e lutas; habitus

diferenciados e diferenciadores

6. Eliminando equívocos: o efeito da teoria

Page 6: Classes sociais em Bourdieu

I. Perspectivas sobre o mundo social e a ação humana

Page 7: Classes sociais em Bourdieu

Grosso modo, podemos dizer que existem duas perspectivas teóricas opostas acerca do mundo social, e, por conseguinte, da ação humana:

a) Física social (objetivismo)

b) Fenomenologia social (subjetivismo)

I. Perspectivas sobre o mundo social e a ação humana

Page 8: Classes sociais em Bourdieu

Física social

Sociedade concebida como uma estrutura objetiva, “captada a partir de fora,

cujas articulações podem ser materialmente observadas, mensuradas e

cartografiadas independentemente das representações que façam aqueles em

que ela vivem” (WACQUANT, 2005:31);

O ponto de vista da física social é também chamado de ponto de vista

objetivista;

Este ponto de vista encontra sua primeira forma teórica na figura de

Durkheim (LOPES: 2009) e seu epítome em sua obra “O suicídio” de 1897

(WACQUANT:2005).

Page 9: Classes sociais em Bourdieu

Ponto de vista expressado também em:

Linguística saussureana;

Estruturalismo de Levi- Strauss;

Marxismo althusseriano (de forma secundaria).

Segundo Burrel & Morgan (1979) esta perspectiva objetivista encerra dois paradigmas: o estruturalismo e o funcionalismo radical

Física social/objetivismo

Page 10: Classes sociais em Bourdieu

Ponto de vista objetivista/ física social

Este ponto de vista implica uma perspectiva substancialista. Ou seja,

privilegia as substâncias --"neste caso, os grupos reais, cujo número, cujos

limites, cujos membros etc. se pretende definir" -- em detrimento das relações”

(BOURDIEU, 2010: 133).

Esta visão é também correlata de um ponto de vista intelectualista, pois

considera a classe construída pelo cientista como uma classe real, efetivamente

mobilizada.

Page 11: Classes sociais em Bourdieu

Implicações desta perspectiva sobre a concepção da ação humana (praxeologia):

Tende a deslizar do modelo à realidade; a reificar as estruturas

construídas pelos teóricos as tratando como entidades autônomas

dotadas da habilidade de “atuar “ a maneira de agentes históricos;

Agentes são reificados: estruturados, não estruturantes. Meros

epifenômenos da sociedade;

A prática individual é interpretada como a execução do modelo

construído (executantes de regras ou papéis);

Agentes são meros suportes das estruturas objetivas;

Encerra uma perspectiva mecanicista da ação humana.

Page 12: Classes sociais em Bourdieu

Segundo Bourdieu, o mérito da sociologia de Durkheim é o de introduzir

na explicação sociológica a questão básica acerca das condições

particulares que tornam possível o mundo social (LOPES, 2009).

 

Ao investir contra a fé iluminista no ser humano auto-suficiente,

Durkheim desenvolve uma teoria voltada para a explicação das práticas

individuais a partir das relações objetivas que a estruturam -

"recusando quaisquer explicação psicologizantes destas práticas"

(idem: 309).

Mérito da perspectiva objetivista:

Page 13: Classes sociais em Bourdieu

O ponto de vista da fenomenologia social pode ser considerado como um ponto de vista subjetivista ( ou “construtivista” )

É expressado de forma hiperbólica por Sartre em “O ser e o nada”

Expressado em:

Etnometodologia em sua variante cultural;

Interacionismo simbólico apresentado em Garfinkel, Schutz, Berger & Luckmann;

Algumas variantes da Rational Action Theory.

Fenomenologia social

Page 14: Classes sociais em Bourdieu

“Sociedade aparece como produto emergente das decisões, ações

e cognições de indivíduos conscientes e alertas, a quem o mundo

se apresenta como imediatamente familiar e significativo”

(WACQUANT, 2005: 33);

A estrutura social é definido por Berger & Luckmann em seu

clássico livro A construção social da realidade como “a soma total

de tipificações[socialmente aprovadas] e dos padrões recorrentes

de interação estabelecida através delas” (apud Wacquant, 2005:

33).

Fenomenologia social

Page 15: Classes sociais em Bourdieu

Ponto de vista subjetivista/ fenomenológico

Limite máximo desta perspectiva é considerar que a realidade é

uma ficção construída pelos indivíduos;

Concepção esta, que ignora que exista um mundo social exterior à

vontades e ideias individuais e coletivas;

A este enfoque podemos chamar de nominalismo.

Page 16: Classes sociais em Bourdieu

Valor deste ponto de vista reside em reconhecer o papel que o

“conhecimento mundano, a significação subjetiva e a competência prática

desempenham na produção contínua da sociedade” (WACQUANT,

2005:33).

Segundo Bourdieu, o mérito do "construcionismo" (interacionismo e

etnometodologia) é recordar contra visões mecanicistas da ação, "que os

agentes sociais constroem realidade social, individualmente e

também coletivamente" (apud WACQUANT, idem: 34).

Praxeologia e méritos do ponto de vista da fenomenologia social

Page 17: Classes sociais em Bourdieu

Bourdieu aponta pelo menos dois erros neste ponto de vista:

I. Concebem as estruturas sociais como a mera agregação de estratégias e atos de classificação individual;

II. Não dá conta em explicar o porquê e de acordo com que princípios é produzido o trabalho de produção social da realidade em si.

O ponto de vista fenomenológico esquece que os agentes não construíram as categorias que põem em funcionamento este trabalho de construção.

Ignora que o princípio de construção é socialmente construído e é comum a todos os agentes socializados de certa maneira.

Esquece, enfim, a relação entre determinações externas, a incorporação destas determinações e, finalmente, as ações.

No

Equívocos da perspectiva da fenomenologia social/subjetivismo

Page 18: Classes sociais em Bourdieu

A perspectiva fenomenológica (subjetivista) lança tanta luz à dimensão estruturante dos agentes sociais que ignora a dimensão estruturada em que estão situados os agentes.

Page 19: Classes sociais em Bourdieu

II. Bourdieu: para além do objetivismo e do subjetivismo

Page 20: Classes sociais em Bourdieu

“[...]é porque os sujeitos não possuem a significação de seus

comportamentos como dado imediato da consciência e porque

seus comportamentos encerram sempre mais sentido do que

sabem e querem, que a sociologia não pode ser um ciência

puramente reflexiva [...]” .

Segundo Bourdieu, a sociologia é possível porque “existem

relações exteriores, necessárias, independentes das vontades

individuais e inconscientes (no sentido que elas não se dão a

simples reflexão) que não podem se compreendidas senão pelo

desvio da observação e da experimentação objetiva” (apud

SAPIRO, 2007: 53)

Como Durkheim, Bourdieu concebe a sociologia como a ciência das restrições que pesam sobre os indivíduos:

Page 21: Classes sociais em Bourdieu

“O mundo compreende-me, mas eu o compreendo”

(Blaise Pascal, parafraseado por Pierre Bourdieu)

Polissemia da palavra “compreender”:

O mundo compreende-me e aniquila-me como um ponto; “sou uma coisa do mundo; existo enquanto corpo; estou situado, datado, determinado; estou submetido a forças; se eu pular pela janela, fico à mercê da lei da gravidade etc.” (BOURDIEU, 2011: 48).

E eu o compreendo: tenho representação dele e não sou redutível à posição que ocupo neste mundo.

“Cada um de nós tem um ponto de vista, ele está situado em um espaço social e, partir desse ponto do espaço social, ele vê o espaço social” (idem: 49)

Dupla realidade do ser humano: objetivo ( como uma coisa no muno) e subjetivo ( ser que interpreta e tem representações sobre o mundo que o engloba).

Page 22: Classes sociais em Bourdieu

Objetivismo e subjetivismo, mecanicismo e finalismo, necessidade estrutural ou finalismo individual são falsas antinomias. Cada termo da oposição reforça o outro e obscurece a verdade objetiva dos universos sociais e da prática humana. Uma ciência social deve desembaraçar estes termos rumo à uma compreensão e explicação total da sociedade (Wacquant, 2005)

Para Bourdieu, o maior obstáculo para uma ciência social é a falsa oposição entre indivíduo e sociedade. Podemos dizer que seu projeto de sociologia é voltado para a superação da oposição entre subjetivismo e objetivismo. Como recordava Bourdieu falsos problemas sociológicos e científicos estão muitas vezes apoiados em verdadeiros problemas sociais ou em verdadeiros problemas políticos: “é o caso, por exemplo, da oposição entre indivíduos e sociedade, individualismo e socialismo, individualismo e coletivismo, individualismo e holismo (...) (Bourdieu & Chartier: 47)

Page 23: Classes sociais em Bourdieu

Para transcender estas dualidades Bourdieu

converte paradigmas aparentemente antagônicos em

momentos de “uma forma de análise destinada a

recapturar a realidade intrinsecamente dupla do mundo

social” (WACQUANT, 2005: 35)

Page 24: Classes sociais em Bourdieu

Procedimentos metodológicos

Page 25: Classes sociais em Bourdieu

Contra as “grandes teorias” que constroem abstrações teóricas sem nunca verificá-las na realidade social objetiva, Bourdieu coloca no centro de sua obra a pesquisa empírica;

Seus conceitos nunca são examinados em si mesmos e por si mesmos; são utilizados e postos à prova num trabalho inseparavelmente teórico e empírico;

Para Bourdieu (2011:15), não é possível captar a lógica mais profunda do mundo social “ a não ser submergindo na particularidade de uma realidade empírica, historicamente situada e datada, para construí-la, porém como “caso particular do possível” [...] isto é, como figura em um universo de configurações possíveis”;

“Apanhar o invariante, a estrutura, na variante observada. Apreender estruturas e mecanismos” (idem: 15).

Prevalência da pesquisa empírica

Page 26: Classes sociais em Bourdieu

Procedimentos metodológicos

O processo sociológico bourdesiano passa necessariamente por dois movimentos distintos, porém vinculados entre si:

Primeiro movimento: Objetivação do objeto de pesquisa.

Processo amparado pela observação empírica (a partir da coleta de dados estatísticos , observação etc.), que corresponde ao que Durkheim chamava de “estabelecimento dos fatos” (Lenoir: 2007).

Segundo movimento: Análise das “representações” e pontos de vista dos agentes sociais.

Page 27: Classes sociais em Bourdieu

Cabe dizer que a oposição construída por Dilthey, nada mais é

que a sistematização no campo teórico-metodológico da

oposição sujeito (procedimentos compreensivos) x

objeto(procedimentos explicativos) e que a união dos dois

procedimentos em Bourdieu é o resultado lógico de seu

empreendimento voltado a superar a falsa oposição entre

sujeito e objeto.

Contra a tradicional oposição entre compreender (concernentes

às ciências humanas) e explicar (concernentes às ciências

naturais), definida por Dilthey, Bourdieu defende um trabalho de

pesquisa que ao mesmo temo explique e compreenda seu objeto

de pesquisa.

Explicar e compreender

Procedimentos metodológicos

Page 28: Classes sociais em Bourdieu

Primeiro movimento: Objetivação

Page 29: Classes sociais em Bourdieu

 Seguindo Durkheim, Bourdieu compreendia que a conduta humana é

devedora da sistematicidade imanente do mundo social, independente das vontades e consciências individuais;

 Esta sistematicidade das relações objetivas é, assim, inacessível à

simples reflexão ou intuição não mediada;

O meio de trazer à luz estas relações objetivas é o trabalho teórico e empírico (fundamentalmente, estatístico);

Este trabalho é concebido como um procedimento de objetivação;

Bourdieu concebe, assim, que existem relações objetivas entre as posições ocupadas pelos agentes sociais na estrutura social;

O conhecimento destas relações permite reintegrar a experiência e as representações dos agentes, concebidos como “pontos de vista” na análise sociológica;

Primado dado às estruturas objetivas, porém sem recair no estruturalismo mecanicista (objetivismo).

  

Page 30: Classes sociais em Bourdieu

Visível que é imediatamente percebido esconde o invisível que o determina. Assim, a verdade de uma interação nunca está nela mesma tal qual ela se oferece à observação (BOURDIEU, 2004)

 Objetivar é, assim, transformar visíveis mecanismos inconscientes. Ruptura objetivista com as pré-noções da sociologia espontânea e com a visão e percepção imediata da realidade social.

Movimento inevitável do trabalho científico que, diga-se de passagem, é dispensada pela etnometodologia, o interacionismo e algumas formas de psicologia social que se apegam a uma visão fenomenológica do mundo social.

 

Page 31: Classes sociais em Bourdieu

A partir de cálculos estatísticos, modelos e tipos ideais o

procedimento teórico-metodológico desenvolvido por

Bourdieu permitia atualizar as estruturas das

possibilidades de acesso, a distribuição de diferentes

espécies de capitais e os meios de apropriação destes

segundo os agrupamentos sociais.

Trabalho essencialmente científico que ilumina e explica

para além da evidência do senso comum. Para além da

aparência fenomênica das coisas cotidianas.

Procedimentos que ajudam a romper com pre-noções,

ilusões de transparência, pressupostos da evidência

cotidiana.

 

Page 32: Classes sociais em Bourdieu

Alcances:

O mérito do método estatístico é que ele anota, descreve; traz à luz “repartições”,

“distribuições”, “classes” e “agrupamentos”. No primeiro momento sua função é a de

medir. Não está ocupado em explicar e compreender.

Limites:

Porém, em se tratando de um objeto que fala e compreende, o procedimento estatístico,

por mais preciso que seja o peso numérico conferido à coleta e estruturação estatística,

continua sendo um dado puro. “Incompreensível”; uma vez que se trata de anotar e

buscar explicar e compreender comportamentos e opiniões subjetivas (BOURDIEU,

2011:14).

Método estatístico: alcances e limites

Page 33: Classes sociais em Bourdieu

Segunda etapa: compreensão

Page 34: Classes sociais em Bourdieu

Contra o mecanicismo estruturalista, Bourdieu “reintroduz, em sua teoria da prática, a concepção finalista, cara à fenomenologia e a Max Weber, que descreve as condutas como orientadas em relação a seus fins” (SAPIRO: 54);

Bourdieu põe, assim, em sua análise sociológica um acento sobre a significação que os agentes sociais possuem acerca de suas práticas (podemos chamar esta etapa de “sociologia da percepção”;

Bourdieu recorda que este ponto de vista, embora não seja o princípio das condutas humanas (o que seria recair na perspectiva subjetivista), contribui para orientá-las” (SAPIRO:54-55);

“Ponto de vista” (“representações”) dos agentes como parte da realidade social observada;

Pontos de vista situados: recusa do sujeito transcendental da fenomenologia retomada pelos etnometodologistas. 

Page 35: Classes sociais em Bourdieu

A representação que os agentes têm do mundo (social e natural) são produto da incorporação das estruturas objetivas do mundo social em que eles estão inseridos. Em outras palavras, as representações, valorações, classificações que os agentes sociais têm acerca da realidade são efeitos, em parte, do mundo social em que estão inseridos.

Síntese dos dois movimentos: confrontação dos pontos de vistas com as estruturas objetivas:

“compreender a experiência vivida melhor que ela se compreende a si mesma, dar conta das representações e das racionalizações explicativas contra as quais a teoria foi construída”. (Bourdieu apud Lenoir, 2007:97)

 

Page 36: Classes sociais em Bourdieu

De um lado, "as estruturas objetivas que o sociólogo constrói no momento objetivista, descartando as representações subjetivistas dos agentes, são o fundamento das representações subjetivas e constituem as coações estruturais que pesam nas interações" (BOURDIEU, 2004:152). De outro, "estas representações devem também ser retidas, sobretudo se quisermos explicar as lutas cotidianas, individuais ou coletivas que visam a conservar ou transformar essas estruturas".

Bourdieu diz em seu livro “Coisas Ditas” ( 2004: 149) que se tivesse que categorizar sua obra em duas palavras a definiria como estruturalismo construtivista ou construtivismo estruturalistas.

O esforço de Bourdieu é o de unificar o método estruturalista ao estudo fenomenológico.

Bourdieu toma o termo “estruturalismo” segundo a conceituação dada pela tradição inaugurada por Levi-Strauss e Saussere que concebe que existem no mundo social e não apenas nos sistemas simbólicos estruturas objetivas exteriores e independente das vontades individuais e coletivas.

 

Relação dialética entre os dois pontos de vista. 

Resumindo....

Para além do subjetivismo e do objetivismo

Page 37: Classes sociais em Bourdieu

Construção do mundo social operada sob coações estruturais. Não é operada num vazio social;

Estruturas cognitivas são socialmente estruturadas; Construção da realidade não é um empreendimento

individual, mas sim coletivo;

Há assim, na sociologia de Bourdieu um primado das condições objetivas (estruturais) em relação às condutas, percepções e valorações individuais e coletivas;

Este primado da dimensão objetiva é devido ao fato de que equilíbrios estruturais são irredutíveis às interações simbólicas e as práticas nas quais elas se manifestam.

 

Lembrar!

Page 38: Classes sociais em Bourdieu

Conceitos mediadores

Page 39: Classes sociais em Bourdieu

 

Como observa Lenoir, noções como habitus, sentido prático, estratégia estão ligadas a um esforço teórico por sair do objetivismo sem, no entanto, recair em seu duplo invertido, o subjetivismo.

Page 40: Classes sociais em Bourdieu

Antes de tudo é preciso lembrar que a praxeologia bourdesiana foi

construída com e contra as perspectivas subjetivistas e objetivistas, no

intuito de superar as falsas oposições concernentes, e derivadas, destas

duas perspectivas.

Sendo assim a teoria da ação em Bourdieu se situa contra o finalismo

subjetivista (liberdade absoluta, sem determinações quaisquer;

transparência da consciência perante si mesmo: sujeito que age com

conhecimento de causa e com vista a fins colocados por si mesmo)

Porém, a concepção de “anterioridade do social em relação ao

indivíduo” (influência de Durkheim e que marca o distanciamento em

relação ao subjetivismo) não implicam uma concepção mecanicista/

determinista da ação.

Page 41: Classes sociais em Bourdieu

Neste caminho teórico podemos destacar três conceitos interligados caros para Bourdieu:

Habitus;

Estratégia;

Sentido prático.

Page 42: Classes sociais em Bourdieu

Ao falar de ação em Bourdieu (ou de habitus) devemos ter em mente que se

está falando de uma ação que deve sua lógica à uma história incorporada e a

incorporação das estruturas do espaço social.

 

Notar que esta concepção da ação não encerra uma perspectiva determinista

desta ação. Isto é muito importante. Não é por dizer que as condições materiais e

sociais de existência determinam o comportamento e a percepção que estamos

dizendo que as ações são necessariamente determinadas por estas condições.

 

Com o dito anteriormente, o conceito de habitus é construído em relação à duas

tradições (objetivista e finalista) e ilumina a dimensão de indeterminação e

improviso (plasticidade) da ação ao mesmo tempo que ilumina o fato dos agentes

nunca serem por inteiro sujeito de suas práticas(BOURDIEU, 2007:169)

 

Método estatístico, procedimentos teóricos e metodológico voltados para uma

ciência probabilística: buscar o que os agentes estão inclinados a fazer dadas

determinadas condições particulares de existência e de atualização das disposições

incorporadas.

 

Page 43: Classes sociais em Bourdieu

Caráter disposicional e corporal do habitus

Habitus relacionado à noção de hexis corporal aristotélica;

O “social” se instituí de modo multiforme, em objetos materiais ou imateriais, em mecanismos e dispositivos, em regulamentações e disposições;

Inércia do passado através das estruturas incorporadas sob a forma de disposições;

Corpo como centro da lógica da prática.

Page 44: Classes sociais em Bourdieu

“Agentes sociais são dotados de habitus, inscritos nos

corpos pelas experiências passadas: tais sistemas de

esquema de percepção, apreciação e ação permitem tanto

operar atos de conhecimento prático, fundados no

mapeamento e no reconhecimento de estímulos

condicionais e convencionais a que os agentes estão

dispostos a reagir, como tanto engendrar, sem posição

explícita de finalidade nem cálculo racional de meios,

estratégias adaptadas e incessantemente renovadas,

situadas porém nos limites das constrições estruturais de

que são produto e que as definem” (BOURDIEU, 2007:169)

Page 45: Classes sociais em Bourdieu

“A noção de estratégia é o instrumento de uma ruptura com o ponto de

vista objetivista e com a ação sem agente que o estruturalismo supõe

(recorrendo, por exemplo, à noção de inconsciente). Mas pode-se recusar a

ver a estratégia como o produto de um programa inconsciente, sem fazer

dela o produto de um cálculo consciente e racional. Ela é produto do senso

prático como sentido do jogo, de um jogo social particular, historicamente

definido, que se adquire desde a infância [...] O bom jogador, que é de

algum modo o jogo feito homem, faz a todo instante o que deve ser feito, o

que o jogo demanda e exige. Isso supõe uma invenção permanente,

indispensável para se adaptar às situações indefinidamente variadas, nunca

perfeitamente idênticas. O que não garante a obediência mecânica à regra

explícita,codificada (quando ela existe)” (BOURDIEU, 2004: 81).

Page 46: Classes sociais em Bourdieu

Das regras à estratégia  

Segundo Bourdieu, na lingüística e antropologia estrutural os agentes aparecem como simples suportes de estruturas ou executantes de regras ou papéis (2004);

 Bourdieu critica (este suposto) mecanicismo estruturalista;  Neste caminho, o modelo chomskiano de competencia gerativa de

condutas permite superar a oposição entre mecanicismo e liberdade absoluta da ação (Idem: 54);

 

Estratégia: conceito criado a partir da teoria dos jogos e da linguística que restitui aos agentes margem de inovação e de improviso;

 Noção de estratégia é o meio de romper com o que Bourdieu

denominava o ponto de vista do modelo que as diferentes disciplinas (lingüística, etnologia, economia e direito) utilizam, e ao mesmo tempo, com a ação sem agente que implica o estruturalismo.

  

  

 

Page 47: Classes sociais em Bourdieu

Sentido prático

Lógica da lógica x lógica das práticas.  Senso prático: Condutas vinculadas com a percepção das factibilidades como prováveis e com suas esperanças subjetivas mais ou menos ajustadas a possibilidades objetivas. Sentido prático é o que tende a ajustar as esperanças subjetivas às possibilidades objetivas, e pois, o possível ao provável.

 

Page 48: Classes sociais em Bourdieu

III. Espaço social e simbólico: a questão das classes sociais.

Page 49: Classes sociais em Bourdieu

1. Os dois modos tradicionais de se pensar as classes sociais

2. Observações preliminares de caráter teórico-metodológico

3. O enfoque relacional proposto por Bourdieu

3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de

classe

3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”

3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a

dialética da distinção.

4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a

noção de capital em Bourdieu

5. Classificações e re-classificações: dominação e lutas; habitus

diferenciados e diferenciadores.

6. Eliminando equívocos: o efeito da teoria.

Page 50: Classes sociais em Bourdieu

1. Os dois modos tradicionais de se pensar as

classes sociais

Page 51: Classes sociais em Bourdieu

Espaço social e classes sociais

Duas maneiras como os sociólogos encaram o problema das classes sociais.

Cada uma delas implicando, de modo bastante concreto, práticas e métodos de pesquisas diametralmente opostos.

1. Modelo analítico

Caracterizado por procedimentos de coleta e estruturação de dados

estatísticos;

Tratamento analítico dos dados coletados;

Tendem a não contribuir com uma abordagem de tipo relacional.

2. Modelo teórico-abstrato

Permite compreender as classes em termos estruturais;

Implica a noção de espaço social, “no sentido de uma configuração construída

de relações regulares e hierarquizadas” (LENOIR, 2007:95).  

Tradições teóricas

Page 52: Classes sociais em Bourdieu

O projeto sociológico de Bourdieu objetiva conciliar estas duas posturas;

Segundo ele, a sociologia não pode ser reduzida a uma axiomática das interações sociais, tampouco uma ciência das estruturas objetivas do mundo social (LENOIR, 2007:95);

Neste caminho, Bourdieu privilegia o enfoque relacional (estrutural);

O conceito de espaço social, devido a sua relativa indeterminação e plasticidade, é uma das ferramentas conceituais que permitem escapar a alternativa entre nominalismo ou realismo.

Page 53: Classes sociais em Bourdieu

2. Observações preliminares de caráter teórico-

metodológico

Page 54: Classes sociais em Bourdieu

 

As tomadas de posição não se deduzem de um corpo de preposições, mas

sim da trajetória social e da posição ocupada pelo agente. O objeto da ciência

social não é o “indivíduo”, mas o campo ou espaço social;

 

Não obstante, a análise estatística está vinculada geralmente a indivíduos

ou instituições singulares (só da para construir um campo ou um espaço social a

partir de indivíduos: informação necessária para a análise estatística);

 

Campo (ou espaço social) está no centro das operações que constituem a

pesquisa. Isto não significa dizer que os indivíduos não existam, que são meras

ilusões. Porém a ciência constrói estes indivíduos como agentes e não como

indivíduos biológicos, atores ou sujeitos;

 

São agentes: atuantes e ativos no campo (espaço social) dado que

possuem as propriedades necessárias para ser eficientes nele, para ali produzir

efeitos.

 

Observações preliminares

Procedimentos para a análise dos espaços sociais

Page 55: Classes sociais em Bourdieu

“O indivíduo concreto sincreticamente apreendido” (ao

preço de um trabalho de construção do objeto da pesquisa)

“não existe como tal a não ser no espaço teórico das

relações de identidade e de diferença entre o conjunto

explicitamente definido de suas propriedades e dos conjuntos

singulares de propriedades definidas segundo os mesmos

princípios, que caracterizam a outros indivíduos” (BOURDIEU

apud LENOIR, 2007: 100).

Page 56: Classes sociais em Bourdieu

 

De acordo com Bourdieu, a sociologia deve construir espaços sociais e não classes;

No interior dos espaços sociais devem ser recortadas as classes. Ou melhor, isolar configurações de propriedades que formam unidades sociais relativamente homogêneas;

Estas configurações não possuem existência a não ser no “papel” (mesmo que estas divisões operadas na cabeça do sociólogo correspondam a divisões reais.);

Espaço social não possui existência em si mesmo. É um universo de posições dependentes uma das outras e hierarquizadas através de várias dimensões. O universo social é um conjunto de limites mais ou menos instituídos. A tarefa do sociólogo é construir os princípios geradores que estão no fundamento destas diferenças na objetividade e que podem variar conforme os lugares e momentos;

Ponto chave: quais são os critérios de estratificação? Quais os critérios para se medir a posição social de um indivíduo?

 

Observações preliminares

Procedimentos para a análise dos espaços sociais

Page 57: Classes sociais em Bourdieu

3. O enfoque relacional proposto por Bourdieu

Page 58: Classes sociais em Bourdieu

As análises de Bourdieu conduzem a destacar a divisão social em classes:

Como observa Clóvis de Barros Filho(2002:46-7), obras como “Os herdeiros”, “Amor à arte”, “Nobreza de Estado” “A distinção”, colocam “em evidência uma repartição das práticas fortemente diferenciadas segundo a origem e o pertencimento de classe.

Se nos fixarmos neste critério, observamos uma continuidade entre estas análises e uma longa tradição anterior (Eugéne, Buret, Proudhon, Marx, Sorel..) que nunca parou de repensar as práticas sociais a partir da repartição dos agentes em classes sociais”.

3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de classe

Page 59: Classes sociais em Bourdieu

As representações dos agentes variam segundo sua posição (e os interesses

que estão associados a ela) e segundo seu habitus como sistema de esquemas de

percepção e apreciação, como estruturas cognitivas e avaliatórias que eles adquirem

através da experiência durável de uma posição do mundo social;

O habitus é ao mesmo tempo um sistema de esquemas de produção de

práticas e um sistema de esquemas de percepção e apreciação das práticas. E, nos

dois casos, suas operações exprimem a posição social em que foi construído.

(BOURDIEU,“Coisas Ditas”: 2004, 158-9)

3.1 Relação entre as práticas e a origem e pertencimento de classe

Page 60: Classes sociais em Bourdieu

“Munidos da noção de espaço social, podemos recortar

classes no sentido lógico do termo. Ou seja, recortar

conjuntos de agentes que ocupam posições semelhantes

no espaço social e que, “colocados em condições

semelhantes e sujeitos a condicionamento semelhantes,

têm com toda a probabilidade, atitude e interesses

semelhantes, logo, práticas e ações semelhantes

(Bourdieu, 2010: 136)”.

 

Page 61: Classes sociais em Bourdieu

O modo de pensamento estrutural ou relacional (não se confunde com o estruturalismo) ataca diretamente o modo de pensar substancialista (realista), cuja forma mais freqüente é o “sujeito”, e também a “estrutura” que tende a ser reificada sobre a forma, por exemplo, de grupos (como a família, entidade que existe na natureza das coisas; ou as classes sociais que estão inscritas na lógica das coisas econômicas)

“O modo de pensar substancialista, que é o do senso comum –e do racismo-- e que leva a tratar as atividades ou preferências próprias a certos indivíduos ou a certos grupos de uma certa sociedade, em um determinado momento, como propriedades substanciais, inscritas de uma vez por todas em uma espécie de essência biológica ou –o que não é melhor – cultural[...]” (BOURDIEU, 2011: 17)

Olhar relacional sobre as organizações sociais

3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”

Page 62: Classes sociais em Bourdieu

O modo de pensamento estrutural ou relacional (não se confunde com o estruturalismo) ataca diretamente o modo de pensar substancialista (realista), cuja forma mais freqüente é o “sujeito”, e também a “estrutura” que tende a ser reificada sobre a forma, por exemplo, de grupos (como a família, entidade que existe na natureza das coisas; ou as classes sociais que estão inscritas na lógica das coisas econômicas)

“O modo de pensar substancialista, que é o do senso comum –e do racismo-- e que leva a tratar as atividades ou preferências próprias a certos indivíduos ou a certos grupos de uma certa sociedade, em um determinado momento, como propriedades substanciais, inscritas de uma vez por todas em uma espécie de essência biológica ou –o que não é melhor – cultural[...]” (BOURDIEU, 2011: 17)

Olhar relacional sobre as organizações sociais

3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”

Page 63: Classes sociais em Bourdieu

Leitura substancialista considera cada prática (por exemplo, a prática do golfe) ou consumo (por exemplo, a cozinha chinesa) em si mesmas e por si mesmas, independente do universo das práticas intercambiáveis;

Leitura substancialista concebe a correspondência entre as posições sociais (ou as classes) e os gostos ou as práticas numa relação mecânica.

Análise relacional ilumina o caráter flexível e dinâmico das relações entre posições sociais e as práticas.

Evita transformar uma prática (ou um conjunto de práticas)em propriedades necessárias e intrínsecas de um grupo qualquer.

3.2 Visão sistêmica contra interpretações “substancialistas”

(BOURDIEU, “Razões Práticas”, 2011: 16)

Page 64: Classes sociais em Bourdieu

3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética da distinção.

O problema para os sociólogos é o de classificar um objeto (sujeito) que classifica. Donde a indagação fundamental: de onde vêm as classificações?;

A classe, segundo Bourdieu, existe na objetividade e em estado subjetivo, porém em estado incorporado, em estado de esquemas práticos, de esquemas inconscientes de classificação;

Corpos são instrumentos de classificação (ou melhor, de classes incorporadas). Neste sentido, o habitus é um modo de existência da classe social;

Desde o princípio de seus trabalhos Bourdieu criticou a compreensão

“realista” das classes sociais. Segundo o sociólogo, toda classe social deve grande parte de suas propriedades à posição que ela ocupa na estrutura social. Como uma parte no todo, cada classe recebe do sistema de relações com outras classes uma parte de suas propriedades.

Page 65: Classes sociais em Bourdieu

A força das proposições de tipo estrutural varia segundo a posição das classes sociais. Esta define a margem deixada à propriedade de posição. Classe média: propriedades estão menos determinadas pela situação e mais por sua posição entre classes dominantes e classes dominadas (ocorre o inverso nos sub proletários)

A posição de um grupo na estrutura social não pode ser definido somente a partir de um ponto de vista estritamente estático, pois o ponto da trajetória, que toma um corte sincrônico, não contempla a questão da trajetória social do grupo.

3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética da distinção.

Page 66: Classes sociais em Bourdieu

3.3 Propriedades de posição e propriedades de condição: a dialética da distinção.

Dinâmica das classes

O que comumente chamamos de distinção, uma certa qualidade, “mais frequentemente considerada como inata (fala-se de “distinção natural”) de porte e de maneiras, é de fato diferença, separação, traço distintivo, resumindo, propriedade relacional que só existe em relação a outras propriedades” (BOURDIEU, 2011: 18)

Ideia de diferença está fundamento da noção de espaço: “conjunto de posições distintas e coexistentes, exteriores umas às outras, definidas em relação às outras” (idem:18)

Por exemplo: “várias características dos membros da pequena burguesia podem ser deduzidas do fato de que eles ocupam uma posição intermediária entre duas posições extremas” (idem:19)

Page 67: Classes sociais em Bourdieu

4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a noção de capital em Bourdieu

Page 68: Classes sociais em Bourdieu

Segundo Bourdieu, o que permite estruturar o universo social é a posse de diferentes tipos de capital. A posição dos agentes no espaço das classes depende do volume e da estrutura de seu capital

Page 69: Classes sociais em Bourdieu

No espaço social as distâncias se medem em quantidade de capital. Define proximidades e afinidades, distanciamentos e incompatibilidades. Em suma, probabilidades de pertencer a grupos realmente unificados: famílias, clubes, ou classes mobilizadas.

O espaço social se apresenta nas sociedades estratificadas como um conjunto fortemente estruturado: os agentes estão provistos de propriedades comuns e diferentes sistematicamente vinculadas entre elas. Para compreender seu sentido, essas propriedades devem ser “classificadas” (no sentido de Durkheim), reagrupadas segundo suas similaridades e suas diferenças em relação ao objeto estudado.

Em a Distinção, cujo objeto é a contribuição dos efeitos da dominação cultural nas relações sociais, a descrição se realiza aparentemente sobre os estilos de vida, a práticas religiosas, as opiniões políticas, único meio empírico de marcar as posições no espaço das posições de poder.

Topografia duplamente construída: eleição de variáveis e a maneira de tratá-las. Análise das correspondências múltiplas calcula as “distâncias” entre os valores das variáveis estabelecidas segundo os critérios definidos pelo sociólogo em função de seu objeto.

Nas sociedades mais desenvolvidas dois princípios repartem os grupos em função de sua posição na distribuição estatística. Os dois princípios entre os mais eficientes são (embora não os únicos) o capital econômico e o capital cultural.

(“Coisas Ditas”, 2004:158-9)

Page 70: Classes sociais em Bourdieu

Segundo os resultados da análise de correspondência, o espaço das classes sociais está construído segundo três dimensões:

i. Volume global do capital

ii. Estrutura do capital: peso relativo das diferentes espécies de capital

no volume total de seu capital.

iii.Trajetória social: evolução no tempo do volume e da estrutura das

espécies de capital.

A estas posições no espaço social correspondem práticas que a análise dos dados permite estabelecer, de modo que o espaço das posições se retraduz sob a forma de um espaço de disposições incorporadas (de gostos, desejos, de afinidades, de bens possuídos).A cada classe de propriedades está vinculado uma classe de habitus produzida pelas condições e os signos sociais associados à condição correspondente.

4. Estruturação do espaço social: princípios de diferenciação e a noção de capital em Bourdieu

Page 71: Classes sociais em Bourdieu

Segundo Bourdieu, o habitus é o princípio que dá conta da unidade de estilo que une as práticas e os bens de uma classe de agentes.

De modo que todos os agentes que se encontram no interior desta classe compartilham um conjunto de propriedades que são preditivas de numerosos comportamentos e opiniões.

Page 72: Classes sociais em Bourdieu

.À primeira análise, a noção de capital está ligada àa abordagem econômica. A

analogia se explica pelas propriedades reconhecidas do capital: ele se acumula por meio de operações de investimento, transmite-se pela herança, permite extrair lucros segundo a oportunidade que o seu detentor tiver de operar as aplicações mais rentáveis.

Estas características fazem dele um conceito heurístico e, como faz Bourdieu, seu uso não é limitado apenas à área econômica. Bourdieu (2000).

O capital econômico é constituído “pelos diferentes fatores de produção (terras, fábricas, trabalho) e pelo conjunto de bens econômicos: renda, patrimônio, bens materiais” (BONNEWITZ, 2005: 53).

O capital cultural corresponde ao “conjunto das qualificações intelectuais produzidas pelo sistema escolar ou transmitidas pela família”. Pode existir sobre três formas: “em estado incorporado, como disposição duradoura do corpo (p. ex, a facilidade de expressão em público); em estado objetivo, como bem cultural (a posse de quadros, de obras); em estado institucionalizado, isto é, socialmente sancionado por instituições (como títulos acadêmicos)” (idem: 54).

O capital simbólico “é uma propriedade qualquer (de qualquer tipo de capital, físico, econômico, cultural, social), percebida pelos agentes sociais, cujas categorias de percepção são tais que eles podem entendê-las (percebê-las) e reconhecê-las, atribuindo-lhes valor. (BOURDIEU, 2011: 107)

A noção de capital

Page 73: Classes sociais em Bourdieu

5.Classificações e re-classificações: dominação e lutas; habitus diferenciados e diferenciadores

Page 74: Classes sociais em Bourdieu

Uma das dimensões fundamentais da luta de classes é a luta de classificações e re-classificações;

Habitus são diferenciados, mas enquanto poder estruturante são também diferenciadores;

Agentes que lutam por se apropriar do mundo social buscando impor a representação do mundo social mais conforme a seus interesses;

Objeto do livro “A distinção”: as classificações sociais como instrumentos simbólicos das lutas sociais;

Diferenças entre posição e situação se transmutam em signos distintivos (em distinções simbólicas). Lógica da estrutura social é a da distinção e das lutas de classe a que estão associadas;

Cabe observar, porém, que as condições sociais de possibilidade de transmutação simbólica das diferenças de posição e de situação de classe variam segundo a posição que as classes mesmas ocupam no conjunto do espaço social.

Page 75: Classes sociais em Bourdieu

Estilos de vida

Representações do mundo social (de si mesmos e dos outros) se

traduzem em estilos de vida.

Práticas de consumo das diversas classes, dos diversos grupos,

manifestam as representações que eles tem do mundo social.

(representações que não se organizam de maneira

necessariamente conscientes)

Sistema adquirido de preferências, de princípios de visão e de

divisão: o que comumente chamamos de gosto.

Page 76: Classes sociais em Bourdieu

“Em conseqüência, o babitus produz práticas e representações que estão

disponíveis para a classificação, que são objetivamente diferenciadas; mas elas só

são imediatamente percebidas enquanto tal por agentes que possuam o código, os

esquemas classificatórios necessários para compreender-Ihes o sentido social.

Assim, o babitus implica não apenas um sense of one´s place, mas também um

sense of other's place. Por exemplo, a propósito de uma roupa, de um móvel ou de

um livro, nós dizemos: "Isso é coisa de pequeno burguês", ou: "Isso é coisa de

intelectual". [....] os agentes se autoclassificam, eles mesmos se expõem à

classificação ao escolherem, em conformidade com seus gostos, diferentes

atributos,roupas, alimentos, bebidas, esportes, amigos, que combinam entre si e

combinam com eles, ou, mais exatamente, que convêm à sua posição. Mais

exatamente: ao escolherem, no espaço dos bens e serviços disponíveis, bens que

ocupam nesse espaço uma posição homóloga à posição que eles ocupam no espaço

social. Isso faz com que nada classifique mais uma pessoa do que suas

classificações”

(Coisas Ditas, 2004: 158)

Page 77: Classes sociais em Bourdieu

6. Eliminando equívocos: o efeito da teoria.

Page 78: Classes sociais em Bourdieu

Munidos da noção de espaço social, podemos recortar classes no sentido lógico do termo. Ou seja, recortar conjuntos de agentes que ocupam posições semelhantes no espaço social e que, “colocados em condições semelhantes e sujeitos a condicionamento semelhantes, têm com toda a probabilidade, atitude e interesses semelhantes”, logo, práticas e ações semelhantes (Bourdieu, 2010: 136)

É preciso ressaltar que esta classe está situada no papel; na cabeça do pesquisador. É uma classe que possui existência teórica.

Não é uma classe que possui estatuto de existência “em si”, independente do trabalho teórico.

A existência desta classe teórica é a existência das teorias “enquanto produto de uma classificação explicativa, perfeitamente semelhante à dos zoólogos ou dos botânicos”: ela permite que o pesquisador explique e previna as práticas e as propriedades das coisas classificadas – “e, entre outras, as das condutas de reunião em grupo”.

Sendo assim, a classe teórica não é realmente uma classe, no sentido de ser uma classe atual e mobilizada. No sentido de um grupo mobilizado para a luta. Pode –se dizer que é uma classe provável, “enquanto conjunto de agentes que oporá menos obstáculos objetivos às ações de mobilização do que qualquer outro conjunto de agentes”

O efeito da teoria 

Page 79: Classes sociais em Bourdieu

O poder simbólico. Rio de Janeiro: Betrand, 2010.

Razões Práticas. São Paulo: Papirus, 2011.

Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004

Meditações Pascalianas. Rio de janeiro: Bertrand, 2008.

A distinção. Crítica social do julgamento. Porto Alegre: Zouk, 20006.

O sociólogo e o historiador. (BOURDIEU, P & CHARTIER, R) Belo Horizonte: Autêntica, 2011.

Obras de Bourdieu

Referências bibliográficas

Page 80: Classes sociais em Bourdieu

BONNEWITZ, P. Primeiras lições sobre a sociologia de Pierre Bourdieu. Petrópolis: Vozes, 2005

BURREL, G., & MORGAN, G. Sociological Paradigms and Organizational Analysis Heinemann,

1979

FILHO, Clóvis de Barros. “A sociologia de Pierre Bourdieu e o campo da comunicação”: Uma proposta de

investigação teórica sobre a obra de Pierre Bourdieu e suas ligações conceituais e metodológicas com o

campo da comunicação. Tese de doutorado, Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São

Paulo, 2003. Tomo 1, Capítulo1.

LENOIR. Remi. “Espacio social y classes sociales” In. In CHAMPAGNE, P; PINTO, L ; SAPIRO, G . (dir.)

Pierre Bourdieu. Sociólogo. Buenos Aires: Nueva Visión, 2007

LOPES, Felipe Tavares Paes. “Bourdieu e Goffman: um ensaio sobre pontos comuns e as fissuras que

unem e separam ambos autores sob a perspectiva do primeiro”. in Estudos e pesquisas em

psicologia UERJ, RJ, ano 9, n.2,p. 389-407. Segundo semestre de 2009.

SAPIRO, G. “Una libertad restringida. La formación de la teoría del habitus”. In CHAMPAGNE, P; PINTO, L ;

SAPIRO, G . (dir.) Pierre Bourdieu. Sociólogo. Buenos Aires: Nueva Visión, 2007.

WACQUANT, Loic. “Hacia una praxeologia social: la estructura y la lógica de la sociología de Bourdieu”.

In BOURDIEU, P & WACQUANT, L . Una invitación a la sociología reflexiva Buenos Aires: Siglo XXI, 2005.


Recommended