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Duarte, Rodrigo - Industria Cultural - Cap 1

Date post: 28-Sep-2015
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sobre o conceito de industria cultural
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  • a> s enFGV

    EDITORA3 ta.o d___O O T^ O a i _

    ly-iO

    Indstria CulturalUma introduo

    Rodrigo Duarte

  • Introduo

    Entre os fenmenos mais evidentes nossa percepo esto as fotos coloridas e atraentes dos outdoors e das capas de revistas semanais; fenmenos mais chamativos ainda so as imagens animadas e sonorizadas dos filmes, das telenovelas, dos videoclipes. A msica que lhes serve de trilha sonora tambm nos envolve, completando uma atmosfera de estmulos que, por sua onipresena e intensidade, se configura at mesmo como um novo tipo de poluio, que poderia ser chamada de "meditica" (ou seja, oriunda dos media), ao mesmo tempo sonora, visual e discursiva. Mas mesmo em nveis bem mais brandos, que no agridem nossa percepo visual e auditiva, esse conjunto de mensagens traz consigo um desafio que, no final das contas, foi o que me motivou a escrever este livro: a onipresena e a intensidade das imagens e dos sons advindos dos media normalmente no encontram uma contrapartida na compreenso intelectual e principalmente reflexiva, por parte da esmagadora maioria das pessoas, sobre suas origens, suas razes de ser e at mesmo suas intenes inconfessas. E

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    isso ocorre no apenas no nosso semialfabetizado Brasil, mas em todos os pases do mundo, inclusive nos econmica e culturalmente mais desenvolvidos.

    Naturalmente existem muitos modos de com preender uma dada realidade intelectual e reflexivamente, cuja escolha, na maior parte dos casos, depende tanto de pendores pessoais quanto da natureza do objeto a ser interpretado. No caso do conjunto de fenmenos audiovisuais abordados aqui, normalmente reunidos sob a rubrica de "cultura de massas", no me parece que haja um quadro conceituai mais apropriado do que a crtica proposta por Max Horkheimer e Theodor Adorno, no m bito da qual foi forjado o termo "indstria cultural". Esse term o causou estranheza quando foi empregado pela prim eira vez no incio da dcada de 1940, pois uma tradio que remontava ao Iluminismo europeu do sculo XVIII separava cirurgicam ente as esferas da cultura e da indstria: enquanto a prim eira tinha a ver com a expresso da liberdade hum ana (ou pelo menos com a aspirao a ela), a segunda delimitava o mundo da necessidade, da coero, da obrigatoriedade da produo, sob pena de no haver sobrevivncia possvel para a espcie humana como um todo. Curiosamente, constata-se que a estranheza do termo "indstria cultural" perm anece at hoje, talvez por razes diversas daquelas que a engendraram em meados dos anos 1940.

    Nessa poca, surgiu a Dialtica do esclarecimento, obra de autoria de Horkheimer e Adorno, cujo captulo intitulado "Indstria cultural, o esclarecimento como mistificao das massas" apresentou uma crtica implacvel ao fenmeno, ento recente, da cultura de massas regulada por agncias do capitalismo monopolista, organizadas em moldes industriais semelhantes aos dos ramos tradicionais da economia (inds

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    tria petrolfera, qumica, eltrica, siderrgica etc.). Essa nova indstria era voltada para a consecuo de dois objetivos bem-delimitados, a serem atingidos, quando possvel, simultaneamente: a viabilidade econmica atravs da lucratividade dos seus produtos e a oferta da possibilidade de adaptao de seus consumidores nova ordem imposta pela superao do capitalismo liberal, na qual o que restava de pessoalidade nas relaes entre o capital e o trabalho havia se extinguido em virtude da formao de conglomerados econmicos que tendencialmente tomavam o lugar das instncias estatais que anteriormente apenas representavam o poder material, sem se confundir diretamente com ele.

    Embora a indstria cultural tenha se modificado bastante desde os seus primrdios nos primeiros anos do sculo XX at hoje, evidente que alguns de seus elementos fundamentais se preservaram, o que justifica a incorporao de grande parte da crtica inaugurada por Horkheimer e Adorno, tomando-se o cuidado de averiguar em que medida um ou outro aspecto da situao se modificou tanto, que seria necessrio indagar sobre a possibilidade de alguma correo no quadro terico, a fim de preservar a acuidade da almejada abordagem crtica dos fenmenos em questo.

    Tendo em vista o exposto, parece-me que o mais acertado para um livro de introduo ao tema da indstria cultural, como este, iniciar com um pequeno memento histrico sobre o tipo de demanda que havia por entretenimento, mesmo antes de os mios tpicos da primeira fase da indstria cultural o cinema, o rdio, o gramofone terem sido inventados ou, eventualmente, no terem ainda se popularizado suficientemente para caracterizar o aspecto de produo e consumo em massa de bens "imateriais", tpicos da indstria cultural. Disso se constitui o primeiro captulo do livro.

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    O prximo passo, constituinte do segundo captulo, mostrar como, relativamente pouco tempo depois de a indstria cultural se tornar uma realidade quase onipresente nos pases mais industrializados, amadureceram-se as condies para sua abordagem reflexiva, o que, na prtica, ocorreu apenas depois do advento da "Teoria Crtica da Sociedade", vertente filosfica que props desde o incio um dilogo com as cincias humanas, procurando tambm, a partir de uma conscincia terica originalmente marxista, se aproximar de correntes de pensamento no marxista, como a psicanlise de Sigmund Freud, a sociologia de Max Weber, ou a filosofia de Friedrch Nietzsche.

    No terceiro captulo, procura-se expor, do modo mais simples e direto, o que poderiam ser chamados de "operadores" da indstria cultural, de acordo com a abordagem crtica de Horkheimer e Adorno. Tendo em vista a dificuldade de vrias passagens do texto sobre esse tema na Dialtica do esclarecimento, optou-se aqui por uma descrio de procedimentos tpicos da indstria cultural o que chamei de "operadores" - , os quais se constituem tambm como critrios de identificao no apenas de suas prticas, mas, eventualmente, at mesmo dos seus produtos mais tpicos.

    No quarto captulo, considerando-se que, da dupla de autores responsvel pelo incio do debate, apenas Theodor Adorno continuou levando adiante a reflexo feita no incio dos anos 1940, procede-se a uma anlise de seus textos das dcadas de 1950 e 1960, nos quais o tema da indstria cultural retomado e, eventualmente, tambm atualizado, tendo em vista tanto os desenvolvimentos tecnolgicos posteriores quanto as modificaes na esfera sociopoltica e at mesmo esttica.

    O quinto captulo constitui uma tentativa de, baseando- se tambm em pesquisas por mim j realizadas e publicadas,

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    atualizar a abordagem crtica do tema da indstria cultural em funo das im portantes transformaes geopolticas e tecnolgicas ocorridas a partir do final da dcada de 1980 e incio da de 1990, naquilo que ficou conhecido como "globalizao" processo que, apesar de ter introduzido enormes mudanas de vrias ordens, no modificou sensivelmente, segundo nosso ponto de vista, a essncia do que vinha sendo a indstria cultural desde o seu incio.

    No sexto e ltimo captulo, procura-se averiguar em que medida a indstria cultural, mesmo tendo tido sua origem nos pases altamente industrializados, teria se estabelecido no Brasil num momento relativamente precoce, uma vez que, como se sabe, a industrializao em termos capitalistas modernos um fenmeno bastante tardio em nosso pas. Muitos elementos apontam para a confirmao dessa hiptese, embora se tenha de levar em conta algumas peculiaridades da cultura de massas no Brasil.

    Meus objetivos com a redao deste livro tero se realizado plenamente se ele contribuir, de algum modo, para uma abordagem menos ingnua e mais crtica desse fenmeno que to onipresente que corre o risco de passar despercebido como agncia de determinao e de direcionamento de nossas aes (inclusive polticas) e de nossas opes estticas.

    Belo Horizonte, setembro de 2009 Rodrigo Duarte

  • Captulo 1

    As origens histricas da cultura de massas

    1.1 Atividades no Ancien Rgime

    Um dos aspectos mais bvios de nossa realidade amplamente difundido em todo o mundo contemporneo a diviso do tempo de cada um numa parte dedicada ao trabalho e noutra dedicada ao lazer. Mas essa realidade atual, por mais evidente que seja para ns, no deveria nos levar crena enganosa de que ter sido sempre assim: a diviso entre tempo de trabalho e tempo livre inexistente na Idade Mdia e no perodo que a sucedeu imediatamente se consolidou apenas com o amadurecimento do modo de produo capitalista, ito eTpos'a chamada Revoluo Industrial, que eliminou o trabalho produtivo realizado nas prprias casas dos trabalhadores (quase sempre com o auxlio de suas famlias), limitando as atividades grande indstria: um estabelecimento exclusivamente dedicado produo por meio de maquinrio pesado, concentrando massas de operrios em turnos de trabalho previamente estabelecidos.

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    Quando se mencionou que a diferenciao de momentos de trabalho e de lazer no existia no Ancien Rgime, isso significa que no perodo feudal e mesmo nos seus resqucios capitalismo adentro as classes dominante e dominada no conheciam a distino entre um tempo dedicado produo da vida material e outro que poderia ser empregado em qualquer atividade no imediatamente produtiva, como, por exemplo, a diverso. Por um lado, a aristocracia, mesmo no tendo de se dedicar a qualquer forma de trabalho produtivo, reservava para si atividades que, no obstante seu carter socialmente obrigatrio, eram tambm consideradas prazerosas. Kaspar Maase sintetiza bem esse estado de coisas, quando afirma: "No Ancien Rgime, os bailes e jantares, as festas e os concertos, as caadas e a frequncia s peras eram parte integrante da vida cortes e nobre" (Maase, 1997:38). Por outro lado, o horizonte vital das classes servis e possivelmente tambm da burguesia em sua fase inicial era dado pelo trabalho de sol a sol, com pouqussimo tempo para qualquer atividade que extrapolasse a produo material. Esse exguo perodo antes do sono preparador para a prxima jornada de trabalho, embora no deva ser entendido como tempo de lazer no sentido moderno do termo, provavelmente constitua o momento coletivo de se cantar e narrar, tempo que servia, ao mesmo tempo, como pretexto e elemento aglutinador para a comida e a bebida em comum.

    Uma vez que o tipo de trabalho em questo era essencialmente rural, evidente que o seu ritmo fosse obrigatoriamente determinado pelas estaes do ano, gerando momentos de mxima exigncia laborai e outros em que algum tempo livre poderia ser dedicado a atividades no materialmente produtivas. Talvez seja possvel dizer que a origem da moderna concepo de lazer se encontre nesses perodos de me-

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    nor exigncia de trabalho, mas no sentido de que, a partir deles, surgiu um calendrio de festas dedicadas aos santos padroeiros das diversas localidades, nas quais quermesses e mercados temporrios eram a principal atrao:

    Com o passar do tempo, as datas das festas e feiras locais eram to coordenadas entre si, que numa mesma regio, principalmente no fim do vero e no outono, quase no havia coincidncias. Quem era bom andarilho, podia facilmente frequentar uma dzia no mesmo ano (Maase, 1997:39).

    No apenas nossa noo atual de lazer deve ter tido a sua origem, mas tambm outra, diretamente a ela associada, que a de entretenimento. Se as mencionadas festas eram to procuradas a ponto de gerar um trnsito entre as localidades em que se realizavam, isso significava a existncia de uma aglomerao de pessoas que era vista como pblico potencial para artistas populares das mais diversas especialidades. Desse modo, no cardpio dessas festas no constavam apenas especialidades da lavoura e da culinria locais, mas tambm atraes como malabaristas, msicos, atores de pantomima etc.1.2 Diferenciao entre tempo de trabalho e de lazer

    Apesar da existncia disso que poderia ser considerado um embrio da moderna noo de entretenimento, faltava a essa condio feudal a concepo tipicamente capitalista do trabalho no como algo orgnico, integrado na prpria vida de quem o realiza, mas como mera condio de sobrevivncia fsica. Para se entender melhor o significado desse fato, lembremos de sua avaliao feita pelo jovem Marx, nos M anuscritos econmico-filosficos, como um dos aspectos mais evidentes do que ele chamou de trabalho alienado:

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    A atividade vital consciente diferencia o homem imediatamente da atividade vital do animal. Exatamente por isso ele um ser genrico. (...) Somente por isso sua atividade atividade livre. O trabalho alienado inverte a relao na medida mesma em que o homem, porque um ser consciente, torna sua atividade vital, seu ser, num meio para sua existncia (Marx, 1981a:89).

    Independentem ente da avaliao crtica que se possa fazer dessa caracterstica do trabalho assalariado pressuposto nas relaes capitalistas de produo - , ela foi o fato imediatamente gerador da ideia de que o trabalho realizado por um indivduo, apenas como meio da prpria subsistncia fsica e de seus familiares, deve pressupor um tempo em que o corpo do trabalhador pertena a si mesmo e no ao trabalho montono e extenuante que ele tem que realizar jun to mquina e, principalmente, obedecendo ao ritmo dessa e no ao do seu prprio organismo.

    Outro fator de reforo do surgimento da diferenciao entre tempo de trabalho e tempo de lazer foi o supramencionado estabelecimento das fbricas como espaosos locais em que a labuta deveria ser realizada, o qual rompeu com uma situao comum tambm aludida acima , principalmente na Inglaterra dos primrdios do capitalismo, em que o trabalho era realizado nas casas dos operrios, com ajuda dos seus familiares. O fato de o trabalho ter por parmetro a quantidade produzida, no havendo um espao e um tempo pr-estabele- cidos nos quais se deveria laborar, dificultava a distino entre os momentos dedicados ao cumprimento do contrato com o capitalista e aqueles que pertenciam ao prprio operrio.

    inegvel que, nos pases mais industrializados, o desenvolvimento do capitalismo foi marcado inicialmente por uma

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    superexplorao da fora de trabalho, a qual no permitia aos trabalhadores a realizao de qualquer outra atividade a no ser aquela imediatamente dedicada sua sobrevivncia fsica: trabalhava-se um mnimo de 12 horas dirias (muitas vezes chegando a 15) e apenas o domingo, por questes religiosas, era resguardado da labuta. Ainda assim, tais condies foram a semente da concepo moderna da diviso do tempo entre trabalho e lazer. Para Kaspar Maase,

    a distino de trabalho e lazer significou tambm um extraordinrio ganho em liberdade. Trabalhadores e trabalhadoras assalariados dispunham ento de tempos e espaos que eram livres de obrigaes profissionais, de regulamentaes legais e de controles senhoris. Eles possuam meios financeiros prprios que podiam aplicar de modo determinado por eles prprios. Usufruto de lazer a partir de ento se torna um fim em si mesmo, o contedo da vida (Maase, 1997:42).

    preciso, no entanto, levar em considerao que dessa possibilidade estava excluda, a princpio , a grande maioria da massa trabalhadora, cujos salrios mal davam para obter o mnimo necessrio para a sobrevivncia fsica. At que, nos pases mais industrializados, como Inglaterra, Frana e Alemanha, fossem paulatinam ente introduzidas leis que limitassem a jo rnada de trabalho, o usufruto do lazer propriam ente dito era privilgio dos trabalhadores mais especializados, que no apenas percebiam salrios maiores como tinham poder de barganha para negociar um tempo de trabalho mais curto do que a esmagadora maioria de operrios sem praticam ente qualquer conhecimento tcnico especfico.

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    1.3 A irrupo do entretenimento anterior cultura de massas

    Na medida em que a maior quantidade de tempo livre foi se generalizando na classe trabalhadora dos pases mais industrializados, principalm ente a partir da luta dos movimentos operrios, mas tambm pela interveno dos governos nacionais no sentido de garantir melhores condies de sade pblica, comeou a surgir pela primeira vez na histria a necessidade de meios de entretenimento de massa, nesse momento ainda concretizados pelos meios tradicionais das artes populares, de modo semelhante ao das mencionadas quermesses e feiras de origem medieval, mas com caractersticas fsicas adaptadas a um nmero muito superior de participantes. Para isso contriburam tambm as sensveis melhorias nos transportes pblicos (principalmente ferrovirios), que davam maior mobilidade s massas trabalhadoras rumo aos seus destinos de entretenimento.

    Um dos principais fenmenos desse perodo foi a multiplicao, inicialmente na Inglaterra, depois tambm na Frana, na Alemanha e nos Estados Unidos, de estabelecimentos chamados music halls, de frequncia tipicamente operria, onde os trabalhadores comiam e bebiam, assistindo a shows de variedades, os quais destacavam nmeros musicais e circenses. Outra especialidade dos music halls era a dana, atravs da qual operrios e operrias tinham um tipo de contato fsico que era considerado abusivo para os padres morais da poca. Tambm por isso - e no apenas pelas constantes brigas ocorridas entre os frequentadores que se excediam na bebida , esses estabelecimentos sempre estiveram sob a mira da polcia em todos os pases nos quais se multiplicaram nas ltimas dcadas do sculo XIX e no incio do XX.

    Esse um perodo em que o surgimento de tempo livre para a classe trabalhadora foi marcado no apenas pela vi

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    gilncia de autoridades policiais e legais, mas tambm por aes pedaggicas de entidades assistencialistas, leigas e religiosas, que se empenhavam em ministrar lies aos trabalhadores sobre como utilizar ordeira e frutiferamente, sem lcool e danas "lascivas", seu perodo de lazer. Alis, no apenas embriaguez e diverses consideradas imorais eram condenadas e, se possvel, proscritas, mas at mesmo entretenimentos- praticados ainda de modo "selvagem", se comparados aos padres de hoje como futebol, rugby e apostas em corridas de cavalos.

    Por outro lado, os locais tradicionais de diverso das classes populares quermesses e estalagens no apenas se adaptavam para receber maior nmero de pessoas, mas tambm procuravam se modernizar, apresentando artistas cada vez mais profissionalizados. No caso dos music halls, artistas trocavam a condio prvia de nmades pela de assalariados dos proprietrios desses estabelecimentos, na maior parte dos casos muito explorados por eles. Comea a se delinear, desse modo, ainda em escala muito pequena, a situao do entretenimento popular como um promissor ramo de negcios, que inclua tambm a edio de folhetins, vendidos ao preo de poucos centavos, com histrias adocicadas, em captulos que se encerravam no momento de maior tenso da trama, no melhor estilo das telenovelas atuais (inclusive brasileiras).

    interessante tambm observar que a prpria burguesia estava consolidada como classe dominante no capitalismo industrial havia relativamente pouco tempo e excetuando-se suas parcelas radicalmente moralistas por motivos religiosos buscava estabelecer o seu padro de entretenimento, que, sob muitos aspectos, apresentava caractersticas semelhantes ao tipo de lazer tipicamente proletrio que se encontrava em plena ascenso. Dentre elas, destacam-se os contedos das

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    peas teatrais, literrias e musicais de mais fcil compreenso, considerando a condio da maior parte da burguesia como mais ativa e menos reflexiva (as excees eram suas camadas mais cultas, que na Alemanha levavam o nome de Bildungs- brgertum). As diferenas entre o entretenimento proletrio e o burgus eram mais exteriores: naquele, as casas de entretenimentos se localizavam nos subrbios e deviam se parecer mais com galpes ou mesmo estbulos, enquanto os similares burgueses, localizados nas regies mais nobres das cidades industrializadas, emulavam o brilho dos teatros e das casas de pera legados pela classe dominante do perodo anterior, isto , a aristocracia. Alm disso, segundo Kaspar Maase, havia j uma tendncia ao surgimento de uma cultura de massas que congregasse todos os estratos da populao, marcada pela experincia comum de uma vida essencialmente urbana:

    At aqui se falou do paralelismo das necessidades de entretenimento das camadas inferior e superior. Mas havia diversos tangenciamentos, influncias mtuas e superposies. Seguramente nenhum trabalhador alugaria um camarote na pera parisiense por 25.000 francos ao ano; sem dvida um gentleman evitaria um snging pub. No todo, no sculo XIX, cresceu a delimitao social dos locais e das encenaes do entretenimento; criaram-se e se desenvolveram mundos de lazer especficos de classe. Mas o Professor Rath, eternizado por Heinrich Mann em 1908, o qual caiu vtima dos encantos de uma cantora vulgar, no era o nico caminhante secreto da fronteira. Palcos populares e feiras, grandes circos e panoramas atraam visitantes das mais diferentes origens (Maase, 1997:62-3).

    At aqui, falou-se do cqntexto sociaLem que surgiu a noo de entretenimento. Se se considera esse entretenimento

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    do ponto de vista do contedo, inevitvel que se pense naquilo que ficou conhecido como "kitsch". A palavra de origem alem designa um objeto de forte apelo sensvel e emocional que poderia ser identificado, na maior parte das vezes, como uma espcie de fraude, j que nunca o que parece ser. Ele agrada as camadas mais amplas da populao sem ter necessariamente (alis, quase nunca o tem) um enraizamento na cultura propriamente popular. Nesse sentido, sua caracterizao, em 1939, pelo crtico de arte norte-americano Clement Greenberg vem ao encontro do que j foi dito sobre a gnese do entretenimento moderno:

    Os camponeses que se estabeleceram nas cidades, formando o proletariado e a pequena burguesia, aprenderam a ler e escrever por razes de eficincia, mas no conquistaram o cio e o conforto necessrios para o desfrute da cultura tradicional da cidade. Contudo, como as novas massas urbanas tinham perdido o gosto pela cultura popular, ambientada no campo e, ao mesmo tempo, descoberto uma nova capacidade de tdio, passam a exigir da sociedade um tipo de cultura adequado a seu prprio consumo. Para satisfazer a demanda do novo mercado, criou-se uma nova mercadoria: a cultura de Ersatz [substituio/rd], o kitsch, destinada aos que, insensveis aos valores da cultura genuna, esto contudo vidos pela diverso que s algum tipo de cultura pode oferecer (Greenberg, 2001:32).

    Fenmenos tpicos da ltima dcada do sculo XIX e da primeira do sculo XX, tais como a aquisio do hbito de leitura de jornais e de romances (de amor para as mulheres e de aventuras para os homens) e a difuso de pianos nos lares da pequena burguesia mais cultivada (com o consequente

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    consumo de partituras de canes da moda e msica leve em geral) indicam que, em termos de mercado, tudo parecia estar pronto para o advento da cultura de massas, faltando para Isso apenas os imprescindveis meios tecnolgfcbs.1.4 A passagem para os meios da cultura de massas

    O mais im portante avano nessa direo foram as invenes que, no final da dcada de 1880 e incio da de 1890, possibilitaram o surgimento do cinema, das gravaes sonoras e das transmisses de rdio. No caso da radiodifuso, Reginald Fessenden um inventor canadense, empregado desde 1886 no laboratrio de Thomas Edison conseguiu fazer a primeira transmisso de sons por ondas de rdio na vspera do Natal de 1906, na qual executou ao violino O, Holy night ("Noite feliz") e leu um trecho do Evangelho segundo So Lucas (cf. Trclce, 2002:13).

    Depois de mais bem-estabelecida tecnologicamente, a radiodifuso encontrou um uso militar durante a Primeira Guerra M undial e apenas a partir do incio da dcada de 1920 comearam as transmisses para ouvintes privados. Nessa poca um receptor de rdio era carssimo, de modo que o seu uso era bastante elitizado e a programao refletia essa restrio, havendo a transmisso quase exclusiva de msica erudita, de leitura de obras literrias e/ou dramatizaes de peas teatrais. Somente a partir de meados da dcada de 1930, quando a produo em massa de receptores tornou- os mais acessveis, o rdio comeou a se constituir como um meio tpico da cultura de massas, inclusive com uma drstica reduo de elementos da "alta cultura" nos programas e um acrscimo de transmisso de msica popular, principalmente na forma de discos produzidos pela recm-estabelecida indstria fonogrfica.

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    Pressuposto dessa indstria foi o rpido desenvolvimento da tecnologia de gravaes de som: j em 1877, Thomas Edison conseguiu pela primeira vez registrar mecanicamente vozes humanas num cilindro de cera, num aparelho a que ele atribuiu o nome comercial de "fongrafo". Esse aparelho tinha ainda grandes desvantagens, tais como a m qualidade de som e o fato de que cada gravao podia ser usada numa s audio. O aperfeioamento desse aparelho foi o "grafofo- ne", de Alexander Graham Bell, cujos cilindros permitiam mltiplos usos de uma mesma gravao, mas tinham o inconveniente de exigir uma gravao por cilindro, no perm itindo sua reproduo em srie. O avano decisivo nessa direo coube, em 1887, a um inventor de origem alem, residente nos Estados Unidos, Emile Berliner, que, com seu "gramofone", eliminou os cilindros e introduziu os discos, inicialmente feitos de vidro, de zinco ou mesmo de plstico. A forma plana permitia a reproduo em srie, a partir de um disco- mestre, o que facilitou a produo industrial, com a consequente incluso da gravao sonora na categoria de meio da cultura de massas.

    Emile Berliner foi tambm um exmio negociador de suas invenes, pois, pouco tempo depois de inventar o gramofone, fundou a empresa The Gramophon Company, para a qual contratou cantores como Enrico Caruso e Nellie Melba, num movimento que deu origem a gravadoras importantes no perodo posterior como a Deutsche Grammophon e a Gramo- phone Co. inglesa. Depois de estabelecer o desenho de Fran- cis Barraud do cozinho ouvindo o gramofone (His Master Voice, "A Voz do seu Mestre") como logomarca do seu invento, Berliner vendeu o direito de fabricao Victor Talking Machine Company (RCA), que iniciou a produo massiva dos aparelhos.

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    A princpio, tanto os gramofones quantos os discos com gravaes musicais eram muito caros, excluindo, na prtica, a imensa maioria das populaes dos pases mais industrializados, composta principalmente de trabalhadores, de setores de classe mdia e de pequena burguesia. Com o passar do tempo, a economia de escala perm itiu um barateamento dos custos de produo, o qual ocasionou um surto de consumo de discos e de aparelhos reprodutores. Por volta de 1908, a Deutsche Grammophon fabricou 6 milhes e 200 mil discos e, em 1913, a francesa Path vendia diariamente 9 mil discos e 500 "Path-phones" (marca comercial dos seus aparelhos reprodutores). Esse fato ocasionou uma transformao ainda no ocorrida na situao do entretenimento moderno, a saber, o consumo privado de produtos culturais:

    Fongrafo e gramofone foram os primeiros aparelhos de comunicao que eram usados preferencialmente no entretenimento privado. Eles transformaram a msica numa mercadoria tecnicamente reproduzida e individualmente consumvel ao bei prazer (Maase, 1997:92).

    No que tange ao cinema, houve uma histria semelhante quanto inveno da aparelhagem, mas com um tipo de uso- preferencialmente coletivo - muito diferente. Enquanto nos Estados Unidos o mesmo Thomas Edison produtor do "fongrafo" inventava o "cinetoscpio", considerado a primeira cmara capaz de captar imagens em movimento, na Frana, pouco tempo depois, os irmos Lumire pediam a patente do seu equipamento similar, o "cinematgrafo".

    A partir da rpida proliferao desses aparatos nas casas de diverso das grandes cidades europeias (e, quase simultaneamente, tambm das norte-americanas), ocorre o momento

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    em que podemos ver claramente a transio de uma cultura de entretenimento ainda feita com meios tradicionais para aquilo que se convencionou chamar de "cultura de massas", realizada majoritariamente com meios tecnolgicos de reproduo e de difuso de sons e imagens. Kaspar Maase aponta para o fato de que os filmes, a princpio, figuravam como nmeros finais de shows populares de variedades nos music halls e estabelecimentos semelhantes, passando, depois de poucos anos, a ser o prato principal dessas apresentaes:

    [em 1903/rd] O filme ainda era integrado como nmero de concluso. Poucos anos depois, a mais nova das artes comeou a ascenso a meio principal de uma cultura popular, que deveria realizar, a seu modo, o sonho da obra de arte total. Nos programas dos variets, nos locais de entretenimento das cidades e nos destinos de excurses, pouco depois de 1900, o panorama completo das modernas artes de massa j estava montado (Maase, 1997:107).

    Aps um perodo de mostras itinerantes de filmes, comeam a surgir os estabelecimentos voltados exclusivamente para a exibio de cinema, sendo que, nas primeiras dcadas do sculo XX, eles se multiplicam nas principais cidades dos pases mais industrializados da Europa. Nesse mesmo perodo surgiram nas regies proletrias das grandes cidades norte-america- nas os nickelodeons, ou seja, salas em que, por uma moedinha, poder-se-ia assistir a apresentaes cinematogrficas curtas (cerca de meia hora de projeo). Essa multiplicao de salas de exibio cinematogrfica foi, naturalmente, resultado de uma espcie de demanda reprimida por um meio de entretenimento acessvel s massas e que, de algum modo, refletisse sua recm- adquirida experincia das metrpoles industriais.

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    interessante observar que, at que o cinema adquirisse a caracterstica de um espelho da vivncia coletiva de ento, para o grande pblico ele no passava de uma novidade tecnolgica, em que eram retratadas pessoas apressadas nas grandes cidades, trens em movimento e sadas de operrios das fbricas. Apenas quando a narratividade popular j bastante exercitada nos folhetins e nos romances de amor ou de aventura 1'oi aplicada ao novo meio, os filmes atraram efetivaie definitivamente a ateno das massas. Ao tratar do destino da imitao da realidade na histria das rtes visuais, A rthur Danto lembrou oportunam ente que,

    se os filmes, por exemplo, no tivessem se tornado narrativos, nosso interesse na mera exibio do movimento se empalideceria afinal de contas, podemos ver as coisas reais quantas vezes quisermos. E eu penso que geralmente o caso, que, a menos que a mmesis seja transformada em digese, ou narrativa, uma forma de arte morre por diminuio do entusiasmo (Danto, 1986:97).

    Voltando a considerar o contexto scio-histrico de surgimento da cultura de massas, uma das constataes mais evidentes a de que ele se deu inicialmente por meio de uma concentrao de capital no ramo do entretenimento. Pois, mesmo que na fase imediatamente anterior j tivesse havido uma notvel profissionalizao dos artistas e do pessoal de apoio produo dos espetculos populares, a monta de investimento necessria para um empresrio tocar o negcio era ainda relativamente pequena (sobretudo se fosse um music hall na periferia de alguma metrpole industrial). Com o advento dos meios tecnolgicos especialmente do cinema , mesmo o custo de manuteno de uma sala de exibio

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    era proporcionalmente muito mais alto; os custos de produo de um filme eram, ento, comparativamente, astronmicos. Um indcio disso que, nos seus primrdios, a indstria cinematogrfica era muito concentrada em poucos pases, havendo, na Europa, um claro predomnio da Frana: as produes prprias na Inglaterra e na Alemanha no chegavam a um quinto do consumo, enquanto as empresas francesas dominavam os cinemas de todo o continente (cf. Maase, 1997:109).

    Por outro lado, nos Estados Unidos, por volta de 1908, portanto no perodo anterior ao surgimento dos grandes estdios em Hollywood, no havia uma produo prpria que atendesse crescente demanda. Desse modo, "mais da metade dos 4.000 filmes lanados anualmente [nos EUA/rd] vinham da Frana, da Alemanha e da Itlia. Raramente o tema americano do rags to riches [ascenso da misria riqueza/rd] ou o motivo do velho oeste era retratado" (May, 1983:37).

    O que se observou acima sobre a permeabilidade social do entretenimento moderno na Europa, mesmo antes de os meios de massa se consolidarem plenamente, reforado com a proliferao das salas de exibio de filmes: apesar de eles serem, a princpio, dirigidos preferencialmente a um pblico mais amplo, de origem principalmente proletria, seu poder de seduo tendia a estabelecer um tipo de flexibilizao no contato entre as classes sociais que a cultura tradicional no permitia: mesmo nos "palcios" de projeo de filmes (nome comumente dado aos cineteatros maiores, mais bem localizados e mais luxuosos) o espao no era dividido por estratos sociais e/ou econmicos, como ocorria, por exemplo, nos teatros convencionais e nas casas de pera. Nos Estados Unidos, essa "vocao" dos cinemas para serem um espao compartilhado por diversas camadas sociais era uma tendncia ainda mais evidente. Lary May, para quem "paulatinamente, os ob

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    servadores comearam a reparar que os filmes tambm dirigiam apelo a uma audincia que atravessava linhas de classe" (May, 1983:36), lembra ainda que esse fenmeno se refletiu tambm na prpria arquitetura das salas de exibio:

    As "catedrais" dos filmes pareciam oferecer uma redeno secular; os assentos no divididos por classes e a mistura sexual de ambos os gneros numa arena anteriormente de classe baixa sugeria uma interrupo na formalidade. Depois de 1914, essa interrupo foi intensificada quando o classicismo abriu caminho para estilos arquitetnicos que misturavam cultura estrangeira, baixa e alta, conjuntamente (May, 1983:166).

    Exatamente nesse perodo, ocorre o fato que pode ser considerado o marco inicial da moderna cultura de massas: a ascenso de Hollywood como principal centro produtor de filmes em bases verdadeiramente industriais. Por volta de 1910 j havia na Costa Leste dos Estados Unidos, principalmente em Nova York, Chicago e Filadlfia, muitos estdios de produo cinematogrfica pertencentes a anglo-saxes, os quais produziam filmes dirigidos a uma classe trabalhadora urbana, composta principalmente por imigrantes das mais diversas origens, com um contedo quase sempre moralista e potencialmente "disciplinador" das massas. Nessa poca entraram em cena vrios judeus, emigrados da Europa Central e do Leste, no fim do sculo XIX, principalmente em virtude de violentas perseguies antissemitas nas suas regies de origem. Quase todos chegaram a Nova York numa situao prxima do miservel, trabalharam como mascates e comerciantes de roupas, tornando-se depois proprietrios de nickelodeons de subrbios posteriormente de reas nobres de grandes cidades da Costa Leste dos EUA. Provavelmente porque per

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    ceberam que a oferta dos produtos cinematogrficos norte- americanos no estava totalmente adequada demanda por entretenimento de uma qualidade mais onrica e menos moralista, alguns desses judeus se lanaram tarefa de produzir os filmes a serem exibidos nos seus "palcios", encontrando, a princpio, grandes dificuldades. A primeira era o custo dos financiamentos, que pode ser contornado pela oferta dos teatros como garantia; pesavam tambm os custos de produo em cidades como Nova York, que se encontrava na regio de maior carestia dos EUA da poca. Mas talvez o principal obstculo fosse o cartel de Thomas Edison, que restringia as produes sob a alegao de que sua inveno do cinetosc- pio era patenteada, sendo que, em muitos casos, essa objeo aparentemente judicial era fachada para a censura por parte de uma elite anglo-saxnica pautada por valores morais e polticos hiperconservadores, oriundos do vitorianismo.

    Mesmo com todas as vantagens de se produzir em Nova York, que j possua uma indstria cinematogrfica considervel, facilidades de comunicao, transportes e divulgao dos filmes, os mencionados emigrantes judeus se sentiram atrados pelas facilidades oferecidas pelo governo estadual da Califrnia, principalm ente no tocante ao baixo preo de grandes extenses de terras e de uma legislao eficiente contra a formao e a atuao de sindicatos de trabalhadores, o que barateava os custos de produo. Desse modo, mesmo que a administrao das suas empresas tenha permanecido em Nova York, depois de 1910 grandes estdios cinematogrficos comearam a ser construdos na Califrnia. O primeiro empreendimento de monta foi a construo, por Cari Laemmle, em 1913, da "Universal City", sendo que, at 1920, todas as principais empresas de entretenimento de imigrantes judeus (as "oito grandes", ou big eight: Universal, Paramount, Warner,

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    Columbia, 20th Century-Fox, Metxo-Goldwin-Mayer, United Artists e Radio-Keith-Orpheum) tinham construdo estdios gigantescos, principalm ente na pequena localidade que ficou conhecida como a Meca da produo cinematogrfica:

    Antes de 1916, Hollywood no tinha sido mais do que uma sonolenta comunidade de mudas de laranjeiras. Mas depois que a indstria se mudou para o oeste, ela passou a simbolizar os frutos da tela e do paraso de Los Angeles. No era o local dos estdios; de fato, era quase um lugar mtico onde o pessoa do cinema gastava dinheiro com expresso pessoal (May, 1983:189).

    "Expresso pessoal" tem um significado importante aqui, pois, ao lado da organizao, pela primeira vez na histria, de um ramo de entretenimento em bases de grande indstria e com uma estrutura empresarial que emulava os enormes conglomerados - formados nas dcadas anteriores - dos mbitos da economia tradicional, a mudana da indstria cinematogrfica para o sul da Califrnia representava uma espcie de "novo comeo" em termos morais e de sociabilidade, sem a rgida estratificao consolidada na Costa Leste dos EUA. Isso tinha uma repercusso no apenas imediata, vivencial, para milhares de pessoas (atores e atrizes, roteiristas, cengrafos, produtores etc.) que se mudaram para a Califrnia, atradas pelas recm-criadas oportunidades de trabalho, mas tambm uma ressonncia claramente ideolgica, considerando todo o pblico, no apenas norte-americano, que passaria a ver nos astros e estrelas dos filmes e nos seus personagens um ideal de vida que deveria ser seguido: beleza e vigor fsicos em meio a um paraso natural de montanhas, florestas, campos e mar; prometendo, alm disso, uma mobilidade social nunca antes imaginada como concretamente possvel.


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