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Evolução sedimentar e tectónica da Bacia Carbonífera do ... · Cadernos Lab. Xeolóxico de Laxe...

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Cadernos Lab. Xeolóxico de Laxe Coruña. 2003. Vol. 28, pp. 107-125 ISSN: 0213-4497 Evolução sedimentar e tectónica da Bacia Carbonífera do Douro (Estefaniano C inferior, NW de Portugal) Sedimentary and tectonic evolution of the Douro Coalfield Basin (lower Stephanian C, NW Portugal) PINTO DE JESUS, A. 1 Abstract Facies analysis and tectonosedimentary analysis methods were used to study the sedi- mentary record of the Douro Coalfield Basin (NW Portugal). The data obtained was inte- grated with alocyclical processes, mainly those resulting from tectonic and/or magmatic activity. For interpretation the regional geological setting was taken into consideration. Consequently, the main tectonic structures and data related to the magmatism for the region were taken into account. Furthermore, in order to account for the thermal evo- lution of the coals and other rocks of the Douro Coalfield Basin, organic and sedimen- tary petrographic elements as well as geochemical and mineralogical controls for the illi- te crystallinity based on the Kubler Index were taken into account. Integrating all the elements and data obtained we present one model for the genesis and evolution of the Douro Coalfield Basin. Thus, after the formation of the pull-apart basin, controlled by the sinistral shear activity of the Douro-Beira Carboniferous Trough after the upper Westphalian D, the depocentres migrated from NW to SE. Changes in tectonic settings allowed for the development of “foreland style” sedimen- tary basin with input from alluvial fans, structured at the margins of the Douro Coalfield Basin, providing sediments into a trough with palustrine/lacustrine characteristics where important deposition of vegetation took place. These structures were strongly cut and highly reworked by multistory-multichannel trunk braided river downstreaming northwestwards. The tectonic activity at the NE margin lead to an asymmetrical basin deepening northeastwards. This process and the decrease in the fluvial hydrodynamic energy resulted in the formation of palustrine/lacustrine depositional systems, first on the floodplains, and then filling all of the Douro Basin. Sedimentary records suggest that sedimentation was syntectonic throughout the series, with a progressive decrease in energy levels.
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Cadernos Lab. Xeolóxico de LaxeCoruña. 2003. Vol. 28, pp. 107-125

ISSN: 0213-4497

Evolução sedimentar e tectónica da BaciaCarbonífera do Douro (Estefaniano C

inferior, NW de Portugal)

Sedimentary and tectonic evolution of theDouro Coalfield Basin (lower Stephanian C,

NW Portugal)

PINTO DE JESUS, A.1

Abstract

Facies analysis and tectonosedimentary analysis methods were used to study the sedi-mentary record of the Douro Coalfield Basin (NW Portugal). The data obtained was inte-grated with alocyclical processes, mainly those resulting from tectonic and/or magmaticactivity. For interpretation the regional geological setting was taken into consideration.Consequently, the main tectonic structures and data related to the magmatism for theregion were taken into account. Furthermore, in order to account for the thermal evo-lution of the coals and other rocks of the Douro Coalfield Basin, organic and sedimen-tary petrographic elements as well as geochemical and mineralogical controls for the illi-te crystallinity based on the Kubler Index were taken into account. Integrating all theelements and data obtained we present one model for the genesis and evolution of theDouro Coalfield Basin. Thus, after the formation of the pull-apart basin, controlled bythe sinistral shear activity of the Douro-Beira Carboniferous Trough after the upperWestphalian D, the depocentres migrated from NW to SE.

Changes in tectonic settings allowed for the development of “foreland style” sedimen-tary basin with input from alluvial fans, structured at the margins of the Douro CoalfieldBasin, providing sediments into a trough with palustrine/lacustrine characteristicswhere important deposition of vegetation took place. These structures were strongly cutand highly reworked by multistory-multichannel trunk braided river downstreamingnorthwestwards. The tectonic activity at the NE margin lead to an asymmetrical basindeepening northeastwards. This process and the decrease in the fluvial hydrodynamicenergy resulted in the formation of palustrine/lacustrine depositional systems, first onthe floodplains, and then filling all of the Douro Basin. Sedimentary records suggest thatsedimentation was syntectonic throughout the series, with a progressive decrease inenergy levels.

Cadernos Lab. Xeolóxico de LaxeCoruña. 2003. Vol. 28, pp. 107-125

The implantation of granitoid rocks in the region and the resulting thermal contribu-tion, concomitant with the downlift of the Douro Coalfield Basin, lead to the coalifica-tion of the coal measures allowing these to reach the meta-anthracite range of rank. Atthe same time, late variscan phases acting over brittle rocks (exception made to thecoals), with a stress torque oriented NE-SW, and associated with sinistral shear activity,resulted in the formation of thrust faults with a “piggy-back” style and the subsequentdeformation forming duplex and triplex tectonic structures. The obliqueness of the tec-tonic movement resulted in (diagonal) asymmetrical cut of the upper series of the DouroCoalfield Basin for the major overthrust fault. Also, related at this framework, at least inone mine (Germunde colliery), the rotation (plunging southeastwards) of the coal stratanearest to the major overthrust fault was recognized. Microfolds were observed in thecoals, and other associated rocks showed evidence of cleavage and of brittleness proces-ses.

Syntectonic sedimentation, as manifested in the sedimentary record and in the structu-re of the Douro Coalfield Basin, strongly suggests that, in the Douro-BeiraCarboniferous Trough, the regime changed from a transcurrent sinistral NW-SE oneduring Westphalian times to a transpressive sinistral regime with a W-E compressivecomponent. The latter increased in intensity, becoming predominant over the sinistralshear component already during the lower Stephanian C and earlier times of theVariscan Orogeny.

Key words: Lower Stephanian C; Terrestrial deposition; Tectonic control of sedimenta-tion; Douro-Beira Carboniferous Trough; NW Portugal.

(1) Departamento e Centro de Geologia da Universidade do Porto, Faculdade de Ciências, Praça de GomesTeixeira, 4099-002, Porto, Portugal. ([email protected])

1. INTRODUÇÃO

Enquadrado na Zona Centro-Ibérica[ZCI] e apresentando uma orientaçãoaproximadamente NW-SE, o SulcoCarbonífero Dúrico-Beirão [SCDB] (NWde Portugal) alonga-se desde as imediaçõ-es da Apúlia (Norte do Porto) até Mioma(NE de Viseu) (LEMOS DE SOUSA &WAGNER, 1983a,b), numa extensãocorrespondente a cerca de 85 km. Estaestrutura corresponde a uma faixa de cisal-hamento, cuja actividade foi particular-mente importante durante todo o ciclovarisco (DIAS & RIBEIRO, 1991), tendocontrolado a abertura de várias bacias sedi-mentares continentais intramontanhosasdurante o Carbonífero. A mais extensadessas bacias é a Bacia Carbonífera doDouro [BCD] (figura 1), a qual se encon-tra datada do Estefaniano C inferior atra-vés de estudos paleobotânicos (WAGNER& LEMOS DE SOUSA, 1983), paleozoo-lógicos (EAGAR, 1983) e palinológicos(FERNANDES et al., 1997) e cujas carac-terísticas intramontanhosas são atestadaspela presença de elementos paleobotânicosexteriores à bacia (WAGNER & LEMOSDE SOUSA, 1983). Tendo como limitesgeográficos as localidades de S. Pedro Finsa NW e de Janarde a SE, a BCD estende-se ao longo de 53 km e apresenta-se comouma estreita faixa que raramente ultrapas-sa os 500 m de largura (PINTO DEJESUS, 2001). Geologicamente, o muroda BCD corresponde a uma descontinui-dade por inconformidade com discordân-cia angular, encontrando-se delimitado aSW pelas formações do Complexo Xisto-grauváquico [CXG] em quase toda a

extensão da BCD à excepção do extremoSE da bacia em que o contacto é feito como terrenos do Silúrico. O tecto da BCDencontra-se invariavelmente cortado porimportante falha inversa que coloca as for-mações do Paleozóico inferior [PI], estru-turadas no flanco inverso do Anticlinal deValongo, sobre os terrenos da BCD(DOMINGOS et al., 1983; LEMOS DESOUSA, 1984; WAGNER et al., 1984;PINTO DE JESUS, 1987, 2001).

2. INVESTIGAÇÃO MULTIDISCI-PLINAR

O estudo do registo sedimentar daBCD e da respectiva estrutura sedimentarfoi efectuado pela aplicação da análise defácies (MIALL, 1996) e da análise tecto-nossedimentar (MEGIAS, 1982) integra-das com os factores alocíclicos, sobretudoos de índole tectónica e/ou magmática. Osresultados obtidos foram enquadrados einterpretados tendo em consideração ocontexto geológico regional.

Foram efectuados levantamentos sobreestruturas tectónicas e estudada a distri-buição dos eixos <c> dos quartzos parauma melhor compreensão acerca da defor-mação da geometria dos corpos sedimenta-res da BCD.

A formulação de hipóteses de trabalhoimplicou a análise sobre elementos resul-tantes da análise de parâmetros mineraló-gicos, tais como a cristalinidade da ilite ea petrografia sedimentar e orgânica. Apósa integração dos resultados obtidos nosdiversos estudos que efectuamos concluí-mos sobre o modelo genético e evolutivoque aqui apresentamos.

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2.1. Estrutura Sedimentar

A sedimentação e respectivo registosedimentar da BCD encontram-se forte-mente controlados pelas variações na acti-vidade tectónica, resultando assim numasedimentação predominantemente sintec-tónica cujas associações de litofácies(MIALL, 1996) (tabela 1) agrupamos emquatro unidades tectonossedimentares[UTS] fundamentais (MEGIAS, 1982)(figura 2), as quais se encontram tectoni-camente duplicadas.

UTS A – (Complexa; UTS A1 e UTS A2)

Os processos sedimentares associados ainstabilidade gravítica, levam à formaçãodas brechas de base que forram o substratoda BCD, respectivamente UTS A1 e UTSA2.constituintes da UTS A (complexa) Aproveniência dos sedimentos encontra-serelacionada, predominantemente, comtransporte marginal a partir de ambas asmargens da bacia e consequente incorpora-ção das diferentes litologias que consti-tuem as brechas da BCD. De acordo com

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Figura 1. Enquadramento regional da Bacia Carbonífera do Douro [BCD] (modificado de PINTO

DE JESUS, 2001).

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Tabela 1. Codificação de litofácies (modificado de MIALL, 1996).

as características sedimentológicas da bre-cha de base presente na UTS A1, a sequên-cia de litofácies predominante é constituí-da por litofácies Gmm sobrepostas porGmg e Gmmf na fácies proximal, evoluin-

do umas e outras para Gcm em profundi-dade, indicando a progradação do debris-flow para a fácies média do leque aluvial.Esta passagem lateral, é também colocadaem evidência pelo incremento na maturi-

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Figura 2. Coluna simplificada do registo sedimentar da BCD. Litofácies segundo MIALL (1996);

UTS segundo MEGIAS (1982). Coluna total = 350m. (PINTO DE JESUS, 2001).

dade textural. Isto é, a evolução das fáciesproximais para as médias implicam adiminuição da viscosidade do meio porperda de carga sedimentar. O registo dadistribuição das características das fáciesfanglomeráticas, indicam a predominânciado transporte de SW, o qual se deu pordebris-flow na zona proximal, evoluindopara correntes mais fluidas em direcção aobordo NE. A ocorrência de vários corpossedimentares de fácies fanglomeráticaencimados por mud-flow com litofáciesGmmf e a sua distribuição vertical, encon-tram-se em relação com a existência devários impulsos tectónicos e/ou com asvariações climatéricas.

A UTS A2, junto à margem NE é cons-tituída por depósitos fanglomeráticosestruturados em leque aluvial e cuja fáciesmédia-distal apresenta clastos quase exclu-sivamente de litologias do Paleozóico infe-rior, com granulometria menos grosseira,melhor calibrados, com melhor arredonda-mento e esfericidade, distribuídos numatextura menos imatura. Também textural-mente menos imaturas, as litofácies predo-minantes são as Gh e as Gcm, apresentan-do por vezes litofácies Gci. Estas caracte-rísticas sedimentares levam-nos a concluirque a UTS A1 se estruturou a partir dedebris-flow. Por outro lado, e apesar daactuação da tectónica pós deposicional, naUTS A2 encontramos litofácies distais dedepósitos fanglomeráticos trabalhados eestruturados por fluxos pouco viscosos(pseudoplásticos). Apesar da aparenteausência das litofácies médias a proximaisdesta unidade, é indiscutível que as litofá-cies Gh passam lateralmente, para NE, alitofácies predominantes de Gcm (em pro-fundidade). Este facto indica não só a fonte

alimentadora a NE como também que aunidade foi estruturada por debris-flowpseudo-plástico, com alta energia, emestreita relação com a tectónica actuantesobre a área de alimentação.

A estrutura de ambas as brechas indicaa sua relação com um modelo deposicionaldo tipo debris-flow dominated fan.

Em resumo, relativamente à estruturada UTS A, e de acordo com a actual confi-guração da BCD, foram observadas asfácies proximais a médias dos leques alu-viais (brecha de base) que se depositaramjunto à margem SW. As primeiras foramobservadas à superfície e as segundas emprofundidade sendo evidente não só a loca-lização da área de alimentação como o tipoe sentido de transporte. Esta passagemlateral permite deduzir a continuação emprofundidade da UTS A1 até se atingiremas fácies distais. Relativamente à UTS A2a brecha que ocorre na base desta unidadetrata-se da brecha basal com proveniênciado quadrante Este. A distribuição de fáciesé simétrica em relação à UTS A1. Isto é, oreconhecimento de fácies distais à superfí-cie, passando a fácies médias em profundi-dade permitem-nos igualmente deduzirque a fácies proximal dos leques aluviaisdesta UTS se encontrará em profundidadesmaiores que as atingidas.

A ocorrência destes depósitos ao longode toda a bacia e a respectiva estrutura,parecem-nos argumentos suficientementefortes para deduzirmos a existência de umafalha no limite do bordo SW da bacia, i.e.,o controlo da sedimentação a SW teriasido condicionado, mais que pelo forelandbulge, por falha delimitada na margem SW.Por outro lado, existem depósitos fanglo-meráticos relacionados com a margem NE

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onde a instabilidade tectónica deveria ser,também, bastante forte. No entanto, a suaocorrência e exposição encontra-se prejudi-cada pelo basculamento e encurtamento daBCD, razão pela qual afloram em poucoslocais. Nesses poucos locais onde foi possí-vel deduzir esta edificação, as característi-cas sedimentológicas evidenciam zonasdistais, com uma estratificação nítida doscorpos sedimentares, no interior dos quaisa textura clasto-suportada se encontraestruturada a partir de clastos com calibra-gem e arredondamento razoáveis.

UTS B – (Simples; UTS B1 e UTS B2)

Formada a partir da deposição dasfácies pelíticas (tipo F) e das fácies fitogé-nicas (tipo C), provavelmente relacionadascom a planície de inundação da prograda-ção do leque aluvial longitudinal, e, poroutro lado, em relação com o transportesedimentar referido para a UTS A, consti-tuindo as fácies distais do respectivomodelo deposicional, já em ambientepalustre com passagem a lacustre poraumento progressivo da lamina de água.Isto é, as litofácies C ocorrem quase inva-riavelmente logo sobre a UTS A1, passan-do depois a alternar com litofácies tipo F,por vezes, com corpos lenticulares de are-nito no interior sugerindo a formação depequenos deltas. Relativamente quer àsfácies pelíticas, quer às fácies orgânicas, adeposição dos materiais que as constituemdeu-se essencialmente por acreção vertical,isto é, não estruturadas por correntes.Como resultado os diversos elementosdetríticos que aí ocorrem apresentamlaminação sedimentar com tendência para-lela devida à deposição quer de detritos

vegetais quer de clastos lamelares, uns eoutros ocorrendo invariavelmente com asua superfície de maior exposição paralelaà estratificação, numa estrutura própria deambientes lacustres com baixa energiahidrodinâmica.

Os sistemas deposicionais alimenta-dores não foram observados. A explicaçãopara a sua ausência, deve ser encontrada,por um lado, em relação com a erosão dobordo SW da bacia, e, por outro lado,com o basculamento da bacia por descidado bordo NE, encontrando-se o referidosistema deposicional em zonas não expos-tas. Ainda em relação com esta margemnão excluímos a hipótese de eliminaçãotectónica associada ao processo de escami-zação da BCD.

UTS C – (Simples; UTS C1 e UTS C2)

Sobre a sedimentação anterior desen-volve-se um sistema deposicional fluvialdo tipo braided com curso longitudinaljunto e paralelo à margem SW. Parte daalimentação continua a ser efectuada atra-vés das margens da bacia tal como indicamas estruturas de canal, a imbricação declastos e a estratificação oblíqua, observá-vel no contacto com a UTS anterior, nasquais é notório o fluxo longitudinal predo-minante e interferido por paleocorrentesprovenientes de SW. A edificação deleques aluviais com alimentação marginala partir de SW e cujas associações de lito-fácies são essencialmente do tipo G compassagem gradual a S e culminando porlitofácies F, indica a zona média do lequealuvial e o recuo da margem SW, provo-cando uma configuração mais ampla daBCD. Este sistema deposicional marginal

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constitui a UTS C1. No interior da baciadesenvolve-se um sistema fluvial tipo brai-ded, com fluxo predominante SE - NW,constituindo também a UTS C2. A trunca-tura e respectiva erosão da zona distal daUTS C1 pelos sistemas que edificaram aUTS C2, coloca-nos perante um sistemaaluvial tributário de um sistema fluvialem vale encaixado cuja estrutura sedimen-tar evidencia a existência de cursos de águacom escorrência geral SE a NW. Apesar daintensidade de retrabalhamento dos sedi-mentos através destas correntes, a alimen-tação sedimentar é inequivocamente mar-ginal. Assim o comprovam as litologiasdos clastos presentes nos corpos sedimen-tares edificados pelos sistemas deposicio-nais fluviais, bem como as estruturas sedi-mentares. De um modo geral a transiçãodas litofácies anteriores para as litofáciesfluviais é uma transição gradual e desen-volve-se através de ritmos bissequenciaisassimétricos. Isto é, na base desta UTS,encontramos a evidência de litofácies flu-viais dispersas e alternantes com litofáciesde planície de inundação. Para tecto destaUTS as litofácies arenosas fluviais passama ter maior representatividade, desenvol-vendo granosselecção inversa na base epassando a normal para tecto. A distribui-ção dos corpos sedimentares nesta UTS,cujo registo vertical, tal como já referido,é bissequencial assimétrico iniciando-sepor coarsennig and thickning upward e pas-sando a finnig and thinnig upwards. Estetipo de registo sedimentológico encontra-se em consonância com um sistema fluvialtipo braided e com a activação e/ou reacti-vação dos canais superficiais, assim comocom a mobilidade das barras. O maior des-envolvimento dos corpos sedimentares,

retrabalhados por este sistema fluvial,junto à margem SW pressupõe uma maioralimentação a partir deste sector, isto é,controlado pelo foreland bulge. Junto àmargem NE e devido ao afundimento dabacia, com o consequente aumento de pro-fundidade neste sector da bacia, a relaçãoS/F diminui assim como a representaçãodas litofácies fluviais. Este cenário leva-nosa admitir que após o episódio tectónicoresponsável pelo incremento da energiados meios sedimentares houve um estádiode acalmia tectónica.

Na zona intermédia da bacia, a ausên-cia de estruturas sedimentares que com-provem a proveniência marginal dos sedi-mentos, torna difícil a percepção e a ava-liação dos fenómenos sedimentares. Isto é,são raríssimas as estruturas (geralmentelaminação oblíqua e imbricação de clas-tos) que nos indicam cursos de água trans-versais à bacia. Acresce ainda que essasestruturas podem ser interpretadas emtermos de migração das barras que separa-vam os canais, pelo que a validade dasmesmas, como indicadoras do transportemarginal, é duvidosa.

A formação e o desenvolvimento dosistema fluvial longitudinal se bem que,eventualmente, em relação com mudançasclimatéricas, deve ter sido controladasobretudo pela tectónica. Assim, o levan-tamento do sector SE da bacia e conse-quente basculamento do eixo da baciacom mergulho para NW, bem como aactivação da falha que limita a margemNE da bacia e a contínua sobreelevação dosector SE, provocaram um aumento daenergia nos meios sedimentares. Dada apaleocorrente dominante e a estrutura doscorpos sedimentares, parece-nos evidente

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uma maior actividade tectónica relaciona-da com o levantamento do sector SE emrelação à envolvida na activação da mar-gem NE da bacia.

Em alguns sectores, nomeadamente emGermunde e em S. Pedro da Cova, encon-tram-se vestígios de reactivação fluvialsobre os sedimentos lacustres, em relaçãocom sedimentação deltaica. Esta últimaencontra-se condicionada pelo fluxo longi-tudinal predominante e pela existência dedepressões lacustres, também longitudi-nais, as quais dada a configuração da BCD,nessa altura, se encontravam com depocen-tros mais profundos em direcção a NW.No conjunto, poderemos situar o desen-volvimento completo de leques aluviaislongitudinais alimentados a partir de SE eespraiando-se para NW, desaguando eestruturando lóbulos deltaicos no interiorde depressões (depocentros) ocupadas porsistemas deposicionais lacustres. Isto é, aexistência de altos relevos e de depressõesassociadas, levou ao desenvolvimento deleques aluviais longitudinais, eles tam-bém, de sistemas fluviais tipo braided cujafoz se encontrava em lagos.

UTS D – (simples; UTS D1 e UTS D2)

Na base desta UTS ocorrem associaçõ-es de litofácies que denunciam sedimenta-ção deltaica.

O enfraquecimento das condicionantestectónicas e consequentemente da energiados processos sedimentares induziu a sedi-mentação pelítica e fitogénica por perdade energia e por migração dos meios sedi-mentares. Assim, este tipo de sedimenta-ção em ambientes palustres que anterior-mente já ocorria nos levées e nas planícies

de inundação assim como no preenchi-mento de canais abandonados, sofre agorauma generalização a toda a bacia instalan-do-se uma sedimentação com migração depalustre na base a lacustre para o topo (poraumento da lâmina de água) provavelmen-te relacionada com o máximo de afundi-mento da BCD.

2.2. Estrutura Tectónica

A estrutura actual (figura 3), tectonica-mente algo complexa, resultou da duplica-ção da série estratigráfica em relação com aactividade dos cavalgamentos que contro-laram a BCD durante as fases tardias dociclo varisco (PINTO DE JESUS, 2001).A implantação de rochas granitóides naregião e as respectivas consequências geo-térmicas, simultaneamente e em relaçãocom o afundimento da BCD, levou àincarbonização dos carvões da BCD até aograu de meta-antracite (LEMOS DESOUSA, 1973, 1978).

O enquadramento tectónico, durante oEstefaniano C inferior, estando sobretudorelacionado com o cisalhamento dúrico-beirão e, obviamente, com a componentecavalgante com topo para SW, leva-nos aadmitir que a depressão da bacia sedimen-tar se encontrava controlada por falhasinversas, provavelmente relacionadas coma edificação da estrutura em flor (flowerstructure) varisca (RIBEIRO et al., 1990b;DIAS & RIBEIRO, 1995), a actividadetectónica sendo muito superior na mar-gem NE em relação à SW. Neste contexto,o tipo de bacia formada corresponde a umabacia tipo foreland basin, com o forelandbulge ligeiramente falhado e situado namargem SW. O uplift do bloco SW, prova-

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velmente já iniciado com a implantação dogranito da Serra da Freita (ca. 324 Ma,REAVY, 1987), continua controlado pelosfenómenos orogénicos, mas agora em rela-ção com a implantação dos granitos tardi-a pós-fase D3 (PINTO, 1985a; PINTO etal. 1987; FERREIRA et al., 1987).Conjugando este fenómeno com o uplift daestrutura do Anticlinal de Valongo, con-trolado por cavalgamentos, dá-se o incre-mento da subsidência da BCD, iniciadoem D1 e continuado em D3 varisca. Osubstrato da BCD adquire então uma con-figuração transversal assimétrica dada amaior velocidade de subsidência a NE quea SW. As fontes de alimentação dos sedi-mentos que constituem a brecha de base

encontram-se relacionadas com a activida-de tectónica de ambas as margens. Assimse justifica a maior representação de clas-tos arrancados ao CXG na litofácies proxi-mal da brecha de base e, igualmente, amaior densidade de clastos com litologiasdo Paleozóico inferior na brecha mais pró-xima da margem NE. Após estes episódiostectónicos o registo sedimentar da BCDrevela alguma acalmia tectónica interrom-pida apenas pela instalação de um sistemafluvial, o qual terá tido o controlo orogé-nico associado à granitização a SE deJanarde. No cômputo geral, o registo sedi-mentar revela, da base para o tecto, amigração de ambientes mais energéticospara meios sedimentares com menor ener-

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Figura 3. Esquema da formação e enchimento sedimentar da Bacia Carbonífera do Douro e res-

pectivas paleocorrentes. O perfil longitudinal refere-se à abertura da bacia por extensão de pull-

apart e o esquema transversal reporta-se ao início da inversão tectónica (PINTO DE JESUS, 2001).

Simbologia de acordo com figura 2. Arquitectura do modelo inspirada em EINSELE (1992).

gia, marcando assim a dedução acerca daacalmia tectónica durante a sedimentação,pese embora a grande mobilidade eviden-ciada pelos corpos sedimentares.

Em relação provável com a implanta-ção dos granitóides tardi- a pós-fase D3, aolongo (obliquamente) do bloco a SW daBCD, ocorre o incremento da incarboniza-ção da matéria vegetal embora a um grauinferior ao que actualmente patenteia.Simultaneamente, a actividade cavalgantee de desligamento do cisalhamento dúri-co-beirão provoca o basculamento daBCD. Os indicadores cinemáticos surgemregistados sobretudo nas litologias dúc-teis, formando microdobramentos nos lei-tos de carvão. Nas litologias menos com-petentes registamos sobretudo a compo-nente de cavalgamento materializada pelaconfiguração da penina, a qual apresenta omesmo estilo estrutural que as estruturasem rosário das camadas de carvão levandoà conclusão acerca de uma componentecavalgante predominante sobre o movi-mento de desligamento. A escamização daBCD, ocorreu nesta altura, seccionando abacia. O modelo estrutural tipo piggy-back(cf. BUTLER, 1982) foi extensível àsrochas da, então, bacia de Ervedosa e aospaleorrelevos internos da BCD. A conti-nuação da transpressão associada a ω1 pro-voca a laminação oblíqua do flanco inver-so do anticlinal de Valongo assim comodas camadas do tecto da BCD.Cartograficamente, é evidente a elimina-ção de NW para SE quer do flanco inversodo anticlinal de Valongo quer da série doEstefaniano C inferior.

Neste contexto, registam-se dois fenó-menos interligados. Por um lado, ocorre obasculamento e afundimento da BCD,aproximando-se assim do foco térmico e

adquirindo um grau de incarbonização cadavez maior; a implantação dos granitóidesque incarbonizaram os carvões da BCD.

O basculamento e afundimento daBCD em simultâneo com a implantaçãodos granitos a SW da BCD, provocaram aincarbonização dos carvões num contextosin-tectónico bem registado.

Após o enchimento da BCD, o qualpropomos ter sido contemporâneo da gra-nitização que incarbonizou a BCD, a com-ponente de cavalgamento associada aoflanco inverso do anticlinal de Valongomanifestou-se intensamente. A escamiza-ção que afectou a BCD desenvolveu umestilo piggy-back relacionado com o com-portamento semi-frágil e as falhas inversasoriginadas pelas fases tardias (D4) da oro-genia varisca tendo-se iniciado aquando dagranitização, um e outro processos deco-rrendo no mesmo contexto tectónico.

Após a incarbonização dos carvões daBCD, a continuação do binário tectónicolevou à formação da “bacia oriental” nosector de S. Pedro da Cova por secciona-mento da 3ª camada. Em relação com esteprocesso ocorreu, também, a formação daescama tectónica que actualmente consti-tui o afloramento de Ervedosa.

Assim, ainda em relação com o proces-so de incarbonização dos carvões da BCD aactuação do binário transpressivo provocounas litologias mais dúcteis o registo cine-mático do controlo tectónico, tendo ocorri-do a formação de microdobras no interiordas camadas de carvão em relação com arotação da camada de tecto da mina deGermunde. A continuação destes eventosdeu-se por migração centrípeta, dado a tec-tónica compressiva actuante, a qual provo-cou o consequente encurtamento da BCD.

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3. MODELO GENÉTICO E EVOLUTI-VO

De uma forma sintética abaixo lista-mos os principais episódios da evoluçãoestrutural da BCD (figura 4).

i) Abertura do sulco em duas etapas. Aprimeira relacionada com o dobramentoD1 e a segunda relacionada com transpres-são esquerda com passagem a componentecavalgante predominante;

ii) Resultante da componente caval-gante predominante formação de umabacia tipo foreland estendida ao longo dacuveta sinclinal relacionada com o flancoinverso do anticlinal de Valongo;

iii) Momento tectónico activo com aformação da UTS A;

iv) Inundação do sulco por alimentaçãomarginal;

v) Paragem tectónica, favorecendo adeposição de material pelítico e fitogénicorelacionado com sedimentação palustreassociada ao desenvolvimento dos lequesaluviais;

vi) Aumento da lâmina de água emigração dos meios sedimentares com amigração de ambientes palustres paralacustres (UTS B);

vii) Início da granitização relacionadacom a implantação dos granitos (tipoRegoufe e Lamas), provocando o bascula-

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Figura 4. Esquema da estrutura actual da BCD (PINTO DE JESUS, 2001).

mento axial da bacia em relação comtranspressão esquerda. Os fenómenos oro-génicos relacionados com esta granitizaçãoocorrem sobretudo no bloco SW (CXG) eno extremo SE do SCDB (zona do Maciçode Castro Daire) Consequentemente, aBCD adquire forma de cunha com a espá-tula orientada para NW e a ponta para SE,isto é com mergulho de SE para NW;

viii) Desenvolvimento de leques alu-viais longitudinais (Janarde–Fojo;Arda–Midões; Covelo–S.Pedro da Cova)alimentados por leques aluviais marginaistributários. Recuo erosivo da margem SWe avanço tectónico da margem NE;

ix) Continuação da implantação dosgranitóides e início da incarbonização doscarvões da BCD. Contexto tectónico con-trolado pelo cavalgamento ω1;

x) Instalação de um sistema fluvial,tipo braided, com escorrência superficialsobre os leques aluviais longitudinais. Altaenergia hidrodinâmica com a formação decamadas planas superiores e por vezes coma formação de “estruturas turbidíticas”.Barras sedimentares de reduzida expressãorelacionadas com a energia hidrodinâmicaforte e consequente e equivalente mobili-dade dos corpos sedimentares;

xi) Levantamento dos sectores situadosa SE do Fojo. O registo sedimentar, nestessectores, revela possanças muito inferioresàs que se observam a NW. Não só a lâmi-na de água apresenta uma diminuição sig-nificativa, como também os sistemas flu-viais têm uma menor expressão vertical.Embora se mantenham os processos auto-génicos e alogénicos relacionados com osmesmos sistemas deposicionais que seencontram a NW, a actuação de uns e de

outros condiciona e encontra-se condicio-nada por uma sedimentação em ambientescom menor chegada de sedimentos;

xii) Enfraquecimento dos sistemas flu-viais, e aumento da lâmina de água no inte-rior do sulco, dando origem a sedimentaçãopalustre inicialmente nos canais abandona-dos e na planície de inundação, migrando,por expansão, a toda a BCD submersa, comexcepção, provável, dos levées;

xiii) O controlo de ω4 provoca o bas-culamento da BCD com mergulho SWpara NE. Consequentemente, no sectorNE da BCD, forma-se um sistema lacus-tre, por aumento da lâmina de água edada a subsidência ter sido mais forte nosector referido.

xiv) Em relação provável com a grani-tização em curso, acentua-se o mergulhoaxial do sulco, com levantamento do sec-tor SE e afundimento para NW, provo-cando a migração das fontes de alimenta-ção de SE para NW. Isto é, a sedimenta-ção lacustre tende a desenvolver-se maisacentuadamente nos sectores a NW doFojo. Exposição provável dos sectores aSE do Fojo;

xv) Migração dos sistemas fluviais tipobraided de SW para NE, os quais vão ter afoz nos lagos então formados no sector NE,dando origem a estruturas deltaicas, comprolongamento palustre para SW;

xvi) Paragem da sedimentação flu-vial, em provável relação com acalmiatectónica. Sedimentação palustre e des-envolvimento acentuado de sedimenta-ção lacustre;

xvii) Reactivação tectónica com levan-tamento do sector a SE de Germunde eafundimento para NW. O desenvolvimen-

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to do ciclo sedimentar fluvio-palustre-lacustre, surge assim menos evidente emGermunde e assume maior expressão em S.Pedro da Cova;

xviii) Continuação da granitização comincarbonização das então formadas 1ªcamada (toda a bacia), 2ª camada (zonaintermédia e norte da bacia) e 3ª camada(zona norte da bacia). Continuação do bas-culamento da BCD, com mergulho dainclinação de SW para NE, seguida daescamização da BCD pela continuação dobinário tectónico actuante, isto é, desliga-mento esquerdo subordinado a cavalga-mento esquerdo do bordo NE sobre aBCD. Por ordem temporal, do mais anti-go para o mais tardio, formação da escamacontrolada por ω4; máximo da incarboni-zação; formação da escama controlada porω4, dando origem à designada bacia orien-tal de S. Pedro da Cova e à escama carbo-nífera no sector de Germunde; formaçãoda escama que constitui o Afloramento deErvedosa em relação com ω1 e com ω2. Osacidentes referidos prolongam-se para SEcom encurtamento e subsequente elimina-ção das formações de tecto, incluindoEstefaniano C inferior, Afloramento deErvedosa e Paleozóico inferior. Desaparecimentodos cavalgamentos de NW para SE, unin-do-se e mantendo-se apenas um (ω4 ou ω2)nos sectores a SE de Germunde.Configuração oblíqua das escamas, cujaformação arrasta o substrato e o forro daBCD (paleorrelevos do Paleozóico inferiore brecha de base);

xix) o binário tectónico oblíquo resultan-te de transpressão esquerda controlada porcavalgamento com topo para W provoca arotação da parte superior da série da BCD.

Em relação com os fenómenos ante-riormente descritos, ocorre a formação daclivagem de fractura com sigmoidizaçãodas estruturas, ocorrendo um reforço dageometria sigmoidal nos corpos sedimen-tares cuja geometria primária era lenticu-lar (lóbulos deltaicos predominantemen-te), assim como a deformação evidenciadapelo microdobramento das camadas com-petentes formadas por carvão, controladapelas falhas inversas que as delimitam atecto e a muro.

4. CONCLUSÕES

Em síntese, a nossa perspectiva quantoao modelo genético-evolutivo é a que abai-xo se expõe.

Em regime transcorrente relacionadocom a fase D3 varisca, o SCDB funcionoucontrolado pelo cisalhamento que delimi-ta a SW o flanco inverso do anticlinal deValongo. Essa actividade tectónica origi-nou a abertura de bacias sedimentares, emregime de pull-apart, com migração dedepocentros de NW para SE. Como resul-tado, e, com idades mais recentes migran-do no mesmo sentido, estruturaram-sevárias bacias de fácies continental duranteo Carbonífero, tendo a BCD sido a últimabacia a formar-se, já durante o EstefanianoC inferior.

A continuação da actividade do bináriotectónico compressivo de D3 varisca, induzà formação de um sistema “transpressivo”durante as fases tardias (D4) com a preva-lência da componente cavalgante sobre odesligamento esquerdo associado ao SCDB.Assim se justifica, durante este estágio, aestrutura da BCD como uma bacia com

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estilo foreland e com o foreland bulge situadona margem SW e associado a falha normal.O produto sedimentar resultante destaetapa evolutiva encontra-se estruturado nasbrechas dos leques aluviais tipo debris flowdominated que se estruturaram nas margensda BCD. Simultaneamente, o controlo tec-tónico nas zonas de fecho da BCD, situadasrespectivamente a NW e a SE provocamidêntico fenómeno com enchimento sedi-mentar para SE e para NW, respectivamen-te. Da conjugação destes processos resultoua UTS A que forra a base da BCD.

O processo de abertura da BCD, logo nafase inicial, ocorreu de molde a que a aber-tura de espaço fosse suficiente para acomo-dar os sedimentos com proveniência margi-nal, cujos fluxos de transporte provocaram oalagamento da BCD, bem como a formaçãoe instalação de meios palustres que evoluí-ram, por aumento da lâmina de água, paraambientes lacustres. Ao longo destes pro-cessos resultam produtos sedimentarescaracterizados pela deposição pelítica e fito-génica que constituem a UTS B.

Nas áreas envolventes da BCD, os efei-tos da granitização sinorogénica pós-faseD3 varisca começam a fazer-se sentir e ini-cia-se a incarbonização da BCD.

Em relação com a granitização pós-faseD3, e pela continuação do regime “trans-pressivo” no SCDB ocorre o basculamentodo eixo da BCD em sentido oposto àmigração do depocentro, isto é, bascula-mento mergulhante para NW e prograda-ção do depocentro para SE.

A reactivação tectónica inerente à gra-nitização provoca um aumento de energianos ambientes sedimentares provocando ainstalação de sistema fluvial com escorrên-

cia predominantemente longitudinal einterferida por fluxos marginais formandoa UTS C. Com arquitectura multistory mul-tichannel o sistema fluvial entrançado (tipobraided) desenvolve, longitudinalmente,um estilo de canais amalgamados, marca-damente erosivos na base, com as planíciesde inundação a estenderem-se preferen-cialmente para NE.

Por diminuição da energia nos meiossedimentares, condicionada por acalmiatectónica, os ambientes fluviais passamlateral e verticalmente a meios palustres,os quais, sob a continuação de enfraqueci-mento da energia hidrodinâmica, evoluempara ambientes com características lacus-tres. Os fracos impulsos tectónicos relacio-nados com a actividade orogénica daregião durante esta etapa, encontram-seapenas registados na ocorrência de lóbulosdeltaicos no interior desta unidade (UTSD) em que ocorre a sedimentação conjun-ta de material pelítico, de matéria vegetale a intercalação de corpos deltaicos.

Na área envolvente da BCD, ainda acontinuação da granitização pós-fase D3provoca o máximo da incarbonização docarvão do tecto da BCD. Em boa correla-ção com os estudos de LEMOS DESOUSA (1973, 1978) a resultante térmi-ca encontra-se situada a Sul da BCD emclara correlação com os episódios regio-nais do magmatismo nas fases finais daorogenia varisca.

A rotação gradual do binário compres-sivo para E-W durante as fases tardias(D4) da orogenia varisca na BCD, encon-tra-se registada na predominância dacomponente cavalgante sobre a desligati-va. As razões inerentes a esta circunstância

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e que reforçam esta conclusão encontram-se na “soldadura” do SCDB através dasrochas granitóides presentes no maciço deCastro Daire. Os elementos resultantes daanálise petrográfica, do registo dos trabal-hos mineiros e da estrutura tectónica daBCD também corroboram e suportamesta conclusão.

Assim, ocorre o início do basculamentopós-sedimentar dos corpos sedimentares daBCD e a duplicação da respectiva sérieestratigráfico-sedimentar, particularmentenotória no sector de São Pedro da Cova coma formação da designada “bacia oriental”.

Com as etapas finais da instalação dosgranitóides na proximidade da margemSW da BCD e a Sul da mesma ocorre aaquisição de rang das camadas de carvão daUTS B. A diluição e o enfraquecimento dofluxo térmico para tecto da BCD não pos-sibilita que esta etapa de incarbonizaçãofique registada nos carvões da UTS D dadoque o rang adquirido na etapa anterior ésuperior ao que resulta desta etapa.

Após o final da instalação dos granitói-des variscos pós-fase D3 e consequenteconclusão da incarbonização da BCD, ocontexto tectónico provoca o seccionamen-to da BCD e a consequente duplicação desérie sedimentar e, obviamente, das UTSanteriormente referidas num estilo tipopiggy-back, isto é com a migração das falhasinversas para muro desenvolvendo o ramo

ocidental da estrutura em flor (flower-struc-ture) varisca para a ZCI, provocando, tam-bém, o desenraízamento das escamas cons-tituídas pelo substrato de Paleozóico infe-rior em contacto estratigráfico com a entãodesignada brecha intracarbonífera.

Nesta etapa e, pelo menos, em relaçãoà falha inversa que trunca a parte superiorda BCD no sector de Germunde, encontra-se também associada uma componentedesligativa esquerda cujo movimento con-jugado com a componente de cavalgamen-to apresenta uma resultante oblíqua pro-vocando a rotação das camadas de tecto daBCD. Durante todo o processo tectónico(D4) que actuou após a formação e a con-solidação das rochas sedimentares da BCDe em flagrante concordância com a escami-zação, desenvolveu-se clivagem de fracturanas rochas com comportamento mais frá-gil e, por outro lado, as litologias maisdúcteis (principalmente o carvão) respon-deram com microdobramento da estratifi-cação.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi efectuado ao abrigodo projecto PRAXIS/ CTA/ 82/ 1994 (Centrode Geologia da Universidade do Porto).

Recibido: 04-VII-03Aceptado: 14-VIII-03

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