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H.O e o Cinema-Mundo - Eco.Pós - Programa de … Web viewOs trabalhos de Hélio Oiticica reunidos...

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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA. BENTES, Ivana. H.O and Cinema-Word in Hélio Oiticica Quasi-Cinemas. Edited by Carlos Basualdo. Kolnischer Kunstverein. New Museum of Contemporary Art. Wexner Center for the Arts. Hatje Cantz Publishers. Germany/New York. 2002. 139-155 pages H.O e o Cinema-Mundo * Ivana Bentes Os trabalhos de Hélio Oiticica reunidos sob o conceito de “quase-cinema”, formulado por ele na década de 70, se inscrevem numa busca original para derrubar todas as modalidade de expressão compartimentadas: pintura, escultura, fotografia, cinema, em nome de uma experiência expandida da arte que destruísse qualquer pretensa pureza artística (‘a pureza é um mito”, diz) e 1
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Page 1: H.O e o Cinema-Mundo - Eco.Pós - Programa de … Web viewOs trabalhos de Hélio Oiticica reunidos sob o conceito de “quase-cinema”, formulado por ele na década de 70, se inscrevem

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA.

BENTES, Ivana. H.O and Cinema-Word in Hélio Oiticica Quasi-Cinemas.

Edited by Carlos Basualdo. Kolnischer Kunstverein. New Museum of

Contemporary Art. Wexner Center for the Arts. Hatje Cantz Publishers.

Germany/New York. 2002. 139-155 pages

H.O e o Cinema-Mundo *

Ivana Bentes

Os trabalhos de Hélio Oiticica reunidos sob o conceito de “quase-cinema”,

formulado por ele na década de 70, se inscrevem numa busca original para derrubar

todas as modalidade de expressão compartimentadas: pintura, escultura, fotografia,

cinema, em nome de uma experiência expandida da arte que destruísse qualquer

pretensa pureza artística (‘a pureza é um mito”, diz) e celebrasse a cópula da arte

com o mundo que gera híbridos.

Devir estético da existência e do mundo, que está diretamente ligado a

ascensão da cultura de massas, com seu poder de criação e diluição de signos,

processos, imagens. Hiper-atividade estético-midiática que Hélio não parou de

afrontar e problematizar, colocando a seguinte questão, que atravessa toda sua

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obra: “que é ou quem poderia ser um criador?” 1 Como criar “estados de invenção”

abertos a qualquer um?

Os trabalhos agrupados sobre o conceito de “quase-cinema” (Cosmococas,

Neyrótika, Helena inventa Ângela Maria, Agripina é Roma-Manhattan) são uma

formulação dessas inquietações e poderiam ser pensadas numa linha “histórica”

que vem desde as vanguardas cinematográficas dos anos 20, passa pelo expanded

cinema e pelas experiências entre meios, nos anos 60 e 70, que aproximou as artes

plásticas do cinema, da fotografia, do super-8, até chegar aos híbridos atuais, como

as vídeo-instalações e experiências com Internet e realidade virtual.

Mas a singularidade e radicalidade de Hélio está na capacidade de converter

essas questões “históricas”, formais e conceituais do campo da arte (não-narração,

multimeios, interação, pop-arte e anti-arte, happening, performance) em

experiências vitais e originais, detonadas a partir da sua vivência de Nova York

(no período de 1970 a 1978). Hélio deu respostas “locais” para questões

estruturais, com propostas conceitualizadas de forma minuciosa e rigorosa em

textos e apontamentos que enchem centenas de páginas de seus “notebooks” ainda

inéditos.

Em Hélio não há separação entre o conceitual e a experiência direta. O

resultado da sua “newyorkaise” está diretamente ligado a cultura underground das

1 Oiticica, Hélio. “CRELAZER” in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.132

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drogas, do homossexualismo, do risco, do lazer inventivo (CRELAZER2), das

pequenas ocupações (Hélio trabalhava em NY à noite, como tradutor de textos),

mas também à uma sensibilidade igualmente plugada na super-produtividade

midiática urbana: cinema, rock, rádio, TV, toda a cultura pop norte-americana, a

iconografia hollywoodiana, o glamour e as celebrities que fascinavam Hélio.

Esse corpo contemporâneo habitando um cinema-mundo, a cidade midiática

que não pára de excitar e estimular todos os sentidos com imagens, sons e

sensações é uma das bases de “quase-cienema”. O artista concorre com a mídia, se

alimenta dela, faz da cultura urbana uma nova pele. Dentro dessa experiência

como “isolar” a arte, compartimentá-la, deixá-la fora das ruas e espaços de

convivência?

Os trabalhos reunidos sob a designação de quase-cinema são uma

formulação original dessa questão: um “cinema” que fala ao corpo, como a

experiência de ver TV ou o Rock, em que o espetáculo visual-sonoro detona

reações corporais e cria um estado de inquietude: fragmentos de imagens,

estímulos sensorias, ambientes sonoros “sujos” que incorporam o brake e a

interferência, excesso de estímulos “desintegrados” que desarmam as classificações

mentais prévias, eliminam a distância e criam um fluxo de imagens seriadas e sons

que são sentidos e experimentados pelo corpo antes de qualquer possibilidade de

reação verbalizada.2 CRELAZER, proposta para fazer do lazer e da preguiça estados inventivos. Ibidem.

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“Como soltar o CORPO no ROCK e depois prender-se a cadeira do numb-

cinema?”3 “Cadeira-prisão”, pergunta Hélio, ou limitar-se a relação tradicional

contemplativa diante de obras de arte em estado de galeria ou museu? Toda a obra

de Oiticica é um desdobramento dessas questões, mas poderíamos destacar os

Parangolés (1965) Tropicália (1967) e Quase Cinema (1973) como momentos

radicais, que problematizam a relação ambiente, corpo e imagem.

Os Parangolés _ estandartes, capas, tendas _ funcionam como estruturas

semelhantes à roupa, para vestir, dançar, onde o participador “veste” a obra, exibe-

se , vê e é visto. Nos panos e plásticos superpostos slogans/avisos/statments são

anunciados: “ESTOU POSSUÍDO, INCORPORO A REVOLTA, DA

ADVERSIDADE VIVEMOS, dimensão espetacular desse exibir-se inspirado na

estética do precário criada por mendigos e habitantes das ruas que transformam

cobertores, plásticos, papelão, restos de jornal e caixas numa segunda pele que os

protege e singulariza.

Com Tropicália , “tentativa ambiciosíssima de criar uma linguagem nossa

que fizesse frente à imagética Pop e Op, internacionais”, Hélio deu nome ao que

viria a ser o movimento tropicalista que expandiu-se pela música, cinema, teatro,

numa leitura original e antropofágica da cultura de massa brasileira. Nesse trabalho

surge uma outra relação de Hélio com a imagem e com os clichês de Brasil:

3 Oiticica, Hélio. “Bloco-Experiências in Cosmococa”. Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.177

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“(...) o Penetrável principal que compõe o projeto ambiental foi a minha

máxima experiência com as imagens, uma espécie de campo experimental com as

imagens. Para isto criei como que um cenário tropical, com plantas, araras, areia,

pedrinhas” (...) Ao entrar no Penetrável principal, após passar por diversas

experiências tactil-sensoriais, o participador cria sentidos e ao final do labirinto se

depara com um aparelho de TV ligado: “é a imagem que devora então o

participador, pois é ela mais ativa que o seu criar sensorial” 4

Hélio cria aqui o que chama de “imagens-táteis”, “uma tentativa-limite de

checar esse deslocamento da IMAGEM (visual e sensorial: o TODO DA

IMAGEM) numa espécie de salada multimídia sem muito ‘sentido’ ou ‘ponto de

vista’ (...): tão concreto quanto o q parecia evocar: fundação fragmentada de

limites da representação”. 5

A relação entre ambiente-corpo-imagem, a destituição da narração em nome

do fragmentação, essa experiência descondicionada da imagem, sem barreiras,

multissensorial, será buscada por Hélio nas experiências de quase-cinema, em que

o “ex-espectador” é estimulado a participar de uma experiência visual-sensorial,

imerso numa caixa de imagens e sons onde entra em contato e reage com os mais

diferentes materiais, no espaço real: areia, vinil, água, pano, bolas de gás,

4 Oiticica, Hélio. Tropicália 4 de março de 1968 in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.1245 idem, pg 125

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colchões, tomando posse do espaço, e incitado a “agir” e reagir, corporalmente, às

imagens e sons projetados.

Nas “caixas de imagens” criadas para Cosmococas, trabalho que configurou

o conceito de “quase-cinema”, o artista propõe ao “participador” andar pelo

ambiente, deitar-se, sentar-se, lixar as unhas, balançar numa rede ou, numa das

mais radicais propostas de Hélio ao público (para Nocagions ) nadar numa piscina

com o corpo totalmente imerso em matérias que fluem: imagens, luzes e água6.

O cineasta Neville d’Almeida, co-autor na série das primeiras cinco

Cosmococas: programa in progress, designadas pela abreviação de CC1 a CC5,

sublinha a relação fotografia-cinema 7 que marca esse trabalho, em que os artistas

invertem seus papéis habituais: Neville, cineasta, faz

desenhos/arranjos/maquiagens in progress sobre imagens pré-existentes e Hélio

Oiticica, artista plástico, fotografa as sequências8. A maquiagem, um rastro branco

de cocaína que oculta/revela o desenho original, é acompanhada pela sequência de

imagens (uma foto de cada arranjo) que segue o fluxo da “maquiagem’, sem repetir

ou interromper sua progressão. A transformação do desenho é acompanhada por

mudança de ângulos, de luz, de enquadramento.

6 in “Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13”, pg. (texto inédito transcrito por Ivana Bentes) Arquivo do Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro7 Carlos Basualdo indica essa relação narrativa, fotografia, cinema como uma das chaves desses trabalhos in Hélio Oiticica: Quasi-Cinemas. 19998 A gênese e conceituação das Cosmococas estão descritas por H.O em diferentes textos que sublinham a importância da parceria com Neville D’Almeida. As idéias de Neville forma apresentadas em depoimento à autora. Março de 2000.

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As Cosmococas são projeções de imagens-fixas (slides) num ambiente

“preparado” com trilha sonora: tem roteiro (instruções sobre a sequência e o tempo

de projeção dos slides), cenografia (indicações para a criação e montagem dos

ambientes), trilha sonora (faixas de músicas, fragmentos de som ambiente, trilhas

vindas diretamente do rádio, locução de poemas, ruídos, etc). Mas o movimento

se dá entre as imagens e não no interior da imagem-movimento, como no cinema e,

diferente do espectador, o “participador” reage às imagens fragmentadas de forma

tátil e com todo o corpo. Segundo Hélio a proposta dos “quase-cinema”, nasceu de:

“(...) não me contentar com a ‘linguagem-cinema’ e de me inquietar com a

relação (principalmente visual) espectador-espetáculo (mantida pelo cinema -

desintegrada pela TV) (....) a hipnotizante submissão do espectador frente à tela de

super-definição visual e absoluta sempre me pareceu prolongar-se demais (....) mas

tinha que aparecer G-O-D-A-R-D como MONDRIAN pra PINTURA GODARD

fundou o antes dele e o depois dele ”9.

Hélio busca essa nova experiência cinematográfica a partir do cinema

fragmentado de Godard, da estética da TV, da experiência do Rock como

acontecimentos instauradores de uma nova relação estética/existência A

importância de sua parceria com Neville D’Almeida, diretor de uma série de filmes

desconstrutores da linguagem tradicional_ Jardim de Espumas (1970), Mangue

9 Oiticica, Hélio. Bloco-Experiências in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.174

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Bangue (1971)_ surge dessa possibilidade do cinema passar da “glorificação do

visual a sua fragmentação” (...) “como se fora um longo strip feito sequência tirada

de história em quadrinhos”10

A experiência das Cosmococas passa ainda pela aproximação de Hélio com

o cinema underground brasileiro (Neville D’Almeida, Júlio Bressane, Ivan

Cardoso), com o cinema político-experimental de Glauber Rocha, passa pelo

desejo de destituir “a unilateralidade do cinema-espetáculo”, desejo que alimentou

as vanguardas cinematográficas de todas as épocas. A questão decisiva é menos

uma condenação moral do espetáculo, que fascinava Hélio, mas o desejo de abrir o

cinema e sua linguagem para outros domínios:

“no ESTRANGULADOR DE LOURAS 11 de BRESSANE a loura primeira

a ser estrangulada é a linguagem-cinema como que devorada na sua verbalidade

(...) em experiências extremas de cinema toda “inovação” é “devoração” e numa

tentativa de ver mais além é o ‘Fim do Cinema’ como linguagem de importância:

cinema passaria a ser instrumento?”12

Ao lado da experimentação estética, Oiticica encontrou no cinema

underground uma postura ético-existencial, próxima da sua proposição anárquica e

política: “Seja marginal, seja herói”, statemant que homenageava o bandido morto

10 Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.17711 Memórias de um Estrangulador de Louras, filme de Júlio Bressane, 1972. Com Guará Rodrigues. Londres.12 in Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13 pgs. 10 e 11 (texto inédito transcrito por Ivana Bentes)

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Cara de Cavalo. A violência e a miséria ganham um sentido existencial e estético

que marca um filme como Câncer, realizado em 1968 por Glauber Rocha, em que

Hélio Oiticica participa e que encena o encontro/confronto entre negros sambistas

da favela, pequenos marginais e a classe média carioca.

O filme é uma encruzilhada entre a pedagogia da violência, o lirismo

paternalista e o desejo de uma arte que atravessasse as fronteiras de classes, status,

cultura. Câncer faz parte desse movimento em direção à favela em que a classe

média artística frequenta o samba, a marginália dos morros, pungistas, o submundo

das delegacias. Discutem com eles comunismo, sexo, miséria, revolução, numa

tentativa de incorporar, existencialmente e esteticamente, a cultura dos morros.

Outros elementos importantes nas Cosmococas são a cultura da droga e das

celebridades, que Oiticica encara como laboratórios para experiências sensoriais e

comportamentais. O fato de usar cocaína como material para a maquiagem que

efetivamente seria cheirada, num consumo e dissolução literal da obra, criou,

segundo Neville d’Almeida, uma impossibilidade total e absoluta de mostrá-la em

1973, o que explicaria o fato dos trabalhos da série só terem sido montados pela

primeira vez, quase 20 anos depois da sua realização, por ocasião da exposição

mundial da obra de Hélio apresentada em Roterdã, Paris, Barcelona, Lisboa, EUA

e no Brasil, mostra que colocou Oiticica no circuito de arte internacional.

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“Não se pergunta a um pintor qual a marca da tinta usada num quadro”, diz

Neville, ecoando a frase de Hélio: “Essa PRESENÇA é mais uma blague geral,

why not?Se se usam tintas fedorentas e tudo o q é merda nas “obras (de artes

plásticas)” porque não a PRIMA tão branca-brilho e tão afeita aos narizes

gerais?”13 A idéia, diz Neville, era pensar uma “coca” cósmica ou tinta cósmica,

daí Cosmococas, que seria a transmutação da cocaína em material expressivo. É

preciso lembrar que nos anos 60/70 a droga ainda estava incorporada a um

momento “romântico” ou experimental, ligado a revolta e a contra-cultura, e não à

economia da droga como mercado/crime organizado em escala mundial e

altamente profissionalizado.

Mas o que está em questão nas Cosmococas, nessa brincadeira, jogo, blague

com as drogas e as celebrities?

O Acaso. Em CC1 TRASHISCAPES, o rosto do cineasta Luis Buñuel na

capa do New York Times Magazine, detonou a primeira experiência das

Cosmococas, elemento casual e cotidiano que será valorizado por Hélio na sua

proposta:

“a disposição dos slides q compõe EXP.CC1 é importante no q joga com a

sucessão do MAQUILAR: ela é tão acidental quanto à transformação

13 Oiticica, Hélio. Bloco-Experiências in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.190

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MAQUILAR: ela torna o framing ultra-visual da sucessão-MAQUIAR em nova

fluência orgânica (...) não são fotos para serem fotos: nem sequências com fim de

resultado: não chegar a montar uma ordem de slides em definitivo é importante:

jogo de posições de sound -track de maneira de projetar (jogam com o

espectador/ambiente/circustância projeção, etc.)”14

Atenção flutuante. A maquiagem torna Buñuel quase irreconhecível, com

traços negros e orientais que deixam o participador em estado de dúvida: quem é?

Outro elemento importante são as foto-poster de Luis Fernando Guimarães

vestindo um Parangolé: nos slides o canivete toca, “corte-carícia”, os bicos do

peito do modelo numa operação de beliscar, excitar, constatar que Hélio chama de

reconhecimento objetivo do corpo.

Reconhecimento do corpo buscado na ambientação criada para a projeção

dos slides, com colchões, travesseiros e uma lixa de unhas dada a cada pessoa,

elemento irônico, casual, de quem vê TV ou filme, distraído, fazendo uma outra

atividade ou, como se diz no Brasil, “se lixando” para tudo. Atenção flutuante,

percepção distraída intencionalmente buscada por Hélio.

Fenomenologia da celebridade. Em CC2 YOKO MASK, Hélio-Neville

partem da capa do disco Grapefruit, de Yoko Ono, figura que fascina Hélio por

estender sua atividade “pública” a uma faixa de experimentalidade: “a

14 in Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13 pg. 53 (texto inédito transcrito por Ivana Bentes)

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importância ímpar de sua ‘atuação pública como celebrity’ é a de q ela inventa a

situação não assumindo ‘imagem’ ou a velha submissão de star: ela é o anti star-

system no máximo de ‘celebrity’ o máximo controle inventivo: LENNON

casamento-a cama conjugal nos dias nos news: a ‘privacy” do casal exposta

metacriticamente: cama tribal media”15.

Hélio compara Yoko com Marilyn que “não conseguiu vislumbrar uma

‘eternidade estável’ e tornou-se abismo” e pergunta: “Como satisfazer ao SUPER-

DEUS CONSUMO Q CONSOME: Yoko transmuta-se como o Nô”.16

CC3 MAILERYN é o trabalho mais conhecido e montado da série

Cosmococas, detonado pela belíssima capa do livro do escritor Norman Mayler

sobre Marilyn, com o imenso e luxuriante rosto da estrela, com quem foi casado,

revestido em papel celofone e tomando toda a superfície.

Fragmentar o super-clichê. A maquiagem e sequência de projeção das

máscaras de Marilyn em quatro paredes e no teto, cria uma série de deslocamentos

na imagem: que dissolvem, deformam, ferem a imagem-star. O canivete corta a

boca branca e deixa ver lábios vermelho-sangue ou num efeito de maquiagem,

Marilyn surge com olhos e bocas de palhaço. A projeção dos slides cria efeitos de

fragmentação, fusão, animação, efeitos de luzes sobre o rosto plastificado. Marilyn

aparece e desaparece sob as carreiras de cocaína, fragmentada em olhos, boca,

15 idem, pgs. 75 e 7616 idem

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sobrancelhas. “O rastro cafungado, veste-despe a superfície pretensamente

acabada: fragmentar o acabado = adicionar máscara-plágio ao pretenso sagrado”.17

O ambiente proposto é lúdico e marcado por pequenos rituais: tirar os

sapatos para pisar num chão forrado de areia e vinil, tocar, jogar, abraçar os balões

brancos que flutuam no ambiente. Entreter-se e enredar-se com o ambiente, envolto

pela trilha sonora hot e latina. Hélio vê em Marilyn uma encarnação dos paradoxos

do star-system e da mitologia americana, um “furo” e disfunção na eficiência da

imagem hollywoodiana:

“ Marilyn incorpora uma síntese-clichê do ‘media’ cinema/advertising como

um elemento concreto (...) “ela se esgueira das bitolas de uma imagem-fixa: ela é

desclassificada (...) como perfeito profissional ela encarna e assume ‘ser star’ de

maneira mais concreta e essencial: o mito é pois o q surge desse encontro-fusão da

star consigo mesma não numa imagem separada a q se quer adaptar mas no

reconhecimento-identificação com a própria situação de ser-star.”18

O rock e o fim da platéia. CC5 HENDRIX WAR, realizada em 26 de agosto

de 73, nasceu da verdadeira obsessão de Hélio-Neville por Jimi Hendrix, e

especialmente o discoWar Heroes, Hendrix é, para Hélio, um “instaurador” 19

como Godard no cinema, Malevitch na pintura, John Cage na música. Se o rock

desligou a música da terra, é aéreo, diferente do samba, dançado na ponta do pé,

17 idem, pg. 5218 idem, pgs. 76 e 7719 idem, pg. 159

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compara Hélio, Hendrix instaurou o trágico no rock e reinventou a performance,

destituindo o espetáculo para “ver”:

“Tudo começa quando em MONTREY POP (tudo muda, melhor dizendo)

JIMI HENDRIX extasia todas as velhas referências. “guitarra-amplificador-modo

de tocar: corpo-mãos-microfone”: sua perfomance ápice foi não só extática mas

histórica como divisor-limite (...) tão importante quanto o MALEVITCHIANO

branco no branco, como MALLARME coup de dados, (...) como se o orgasmo-

fogo estivesse consumindo todas as formas lineares-visuais-espacializadas de

performance”20

Nas máscaras e maquiagens de Hendrix o elemento fogo surge numa caixa

de fósforos com o logo Coca-Cola, e a trilha sonora, preparada por Neville traz

uma seleção de 5 ou 6 músicas com trechos da locução poderosa do próprio

Hendrix. O rastro-coca sobre o rosto de Hendrix na capa do disco o transforma

numa máscara monumental, um ícone “totêmico-negro-índio”. Toda a maquiagem

com a coca segue essa trilha “totêmica”, criando figuras geométricas e étnicas pela

superfície da pele negra.

O ambiente para Hendrix War é um intricado “redário”, uma teia formada

por redes de dormir (usadas principalmente no norte do Brasil) sobrepostas, onde o

participador pode deitar-se ou balançar. A rede, tecnologia indígena, feita de pano

e usada originalmente pelos índios brasileiros, se molda ao corpo numa sensação 20 idem pg.6

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de relaxamento e envolvimento. Como na platéia do show de Hendrix, Hélio

procurou nas Cosmococas incitar o participador a “viver seu fim como platéia”

Hélio realizou, com Neville, os 5 primeiros blocos de Cosmococas (de CC1

a CC5), mas nos seus cadernos de apontamentos encontramos uma série de

propostas “programa in progress” a serem realizadas por artistas, amigos,

“personagens conceituais” que para Hélio introduzem na sua obra novas questões.

Propõe a realização de uma Cosmococa em parceria com Guy Brett sobre o

conceito de “DREAMTIME dos aborígenes, descrito por Mircea Eliade, como um

período em que um membro da tribo é liberado de suas obrigações e relaciona esse

conceito com trabalhos seus como EDEN, BARRACÃO, CRELAZER.21 Também

propõe um trabalho para Silviano Santiago, intitulado Uber Coca ou VIGILIA,

que tem como ponto de partida a experiência da simultaneidade22, além dos

trabalhos propostos ao artista Carlos Vergara (Coca Oculta) e para Thomas

Valentin.

Também encontramos descrito no seu caderno, a ambientação para CC4

NOCAGIONS, 23com slides feitos a partir da capa, branca, do livro Notations, de

John Cage. O “plano-design para performance” prevê um dispositivo de projeção

de imagens em piscinas públicas , com telas ao fundo, onde as pessoas vão nadar

21 in Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13 pgs. 97/100 (texto inédito transcrito por Ivana Bentes )22 idem, pgs. 103 a 10923 ? idem, pgs. 56 a 62

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antes da projeção na água iluminada por diferentes cores (azul e verde), com caixas

de som na borda tocando uma peça de John Cage.

As Cosmococas se aproximam das experiências de Jack Smith com slides e

cinema (Flaming Creatures): “JACK SMITH com seus slides fez algo q muito tem

a ver com o q almejo com isso: do seu cinema extraiu-em vez de visão naturalista

imitativa da aparência -um sentido de não-fluir não narrativo: os slides duravam no

ambiente sendo q o projetor era por ele deslocado de modo a enquadrar a projeção

em paredes-teto-chão: o sound track era justaposto acidentalmente (discos)”24

A combinatória do “quase-cinema”: montagem de slides, ambientação e a

modulação da música, remete para uma dimensão tátil que McLuhan atribuía a

televisão, imagens e sons que nos acariciam e impregnam o seu significado por

baixo de nossa pele, proposta que seduzia Hélio. MacLuhan é outra referência

constante nos seus escritos, assim como Nietzsche (a vontade de potência, o

trágico) e Sartre (o nada, a revolta, a existência).

Agripina é Roma-Manhattan foi o único filme realizado por Hélio: um

super-8 rodado em Nova Yorque em 1972, com cerca de 15 minutos, e definido,

comoNeyrótika (1973) e Helena inventa Angela Maria (1975), como uma “não-

narração” onde o que está em questão não são as imagens ou a narrativa, mas o

corpo-perfomance que se expõe e se exibe assumindo novas máscaras e papéis

24 Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg. 180

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sexuais. “Bodywise” 25 que surge na feminilidade exuberante de Helena Lustosa

inventando um ícone-pop, a cantora Ângela Maria; na prostituição e travestimento

encenados em Agripina, ou na androginia e estética pansexual deNeyrótika.

Em Agripina é Roma-Manhattan, a encenação chichê do corpo prostituído

feminino se dissolve em imagens monumentalizadas de uma Nova York “grega” e

clássica: escadarias e colunas “greco-romanas” servem de ambiente a esse pôr o

corpo em cena. Uma mulher (Cristine Nazaré) usando um curtíssimo vestido

vermelho e sandálias “gregas” trançadas na perna, com uma maquiagem de

“Cleópatra” desliza pelas ruas de Manhattan levada com solenidade por um amante

latino. “Agripina” desliza entre colunas e escadarias, como num épico

hollywoodiano de Cecil B. De Mille em que os templos greco-romanos são

substituídos pelos monumentos urbanos: igrejas, o Empire State, o Manhattan

Bank, casas de cambio. Numa outra sequencia uma jovem de collant e saiote faz

o “troitois” numa esquina movimentada. Na sequência final, descem do carro da

prostituta, o travesti Mário Montez, ator de Flaming Creatures, de Jack Smith,

cineasta-mito que Hélio conheceu em Nova York numa experiência de “quase-

cinema” em que Smith apresentou Travalogue of Atlantis 26, projeção de slides

com sound tracks e manipulação do projetor.

25 “Bodywise”, segundo Guy Brett, seria o nome de um dos 14 capítulos de um livro chamado Newyorkaises ou Conglomerado , reunindo os trabalhos de Nova York., não realizado. Ver Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.208

26 Ver carta de HO para Wally Salomãoe in“Hélio Oiticica e a cena americana”, catálogo do Centro de Arte Hélio Oiticica. 1998.

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Em Agripina, o travesti Montez, vestido de Carmem Miranda ou de

“espanhola” joga uma partida de dados em plena calçada com o artista plástico

brasileiro Antônio Dias. Arte, acaso, jogo, transexualidade, a decifração de signos

de consumo, imagens clichês encenadas num espaço urbano monumentalizado, são

alguns elementos desse super-8 “inacabado”, onde a arte joga dados, de forma

prazerosa, com a cidade-cinema-prostituta.

Experimentar o outro através de máscaras, imagens, poses e figurinos que

sublinham a sexualidade e a indefinição masculino/feminino é uma marca de

Agripina, Neyrótica e Helena inventa Ângela Maria. Pansexualidade que aparece

no estudo de corpos e rostos fragmentados de belos garotos em poses

displicentemente sexy e sensuais da série Neyrótika (1973), constituída por cerca

de 250 slides 27, para projeção com trilha sonora de 90 minutos.

Na linha das Cosmococas, os 7 blocos de slides e trilha de Neyrótika

constituem uma nãonarração “porque não é estorinha ou imagens de fotografia

pura ou algo detestável como ‘audiovisual’ 28, cada série é identificada pelo nome

27 Hélio fala de “80 slides com marcação de tempo e trilha sonora: inacabado”, provavelmente tendo como referência a apresentação deste trabalho na Expoprojeção, em São Paulo, em 73. mas encontramos 7 séries ou blocos com sete diferentes “modelos” num total de cerca de 250 slides identificados no arquivo do Centro de Arte Hélio Oiticica pelo nome do modelo fotografado.

28 Oiticica, Hélio in NEYRÓTIKA citado por CANONGIA, Ligia in Quase Cinema: Cinema de Artista no Brasil, 1970/80. Funarte. Rio de Janeiro, 1981

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dos garotos/amantes/amigos de Hélio clicados nos “ninhos/ambientes” de seu

apartamento/célula29: Joãozinho, Dudu, Conell, Romero, Didi, Carl, Artur.

Cada série cria um “estilo”, blocos de luzes, cores, poses e “reações” à

câmera diferenciadas. Na definição de Hélio, “NEYRÓTIKA é NÃOSEXISTA”,

“NEYRÓTIKA é o q é pleasurable”. As fotografias criam climas distintos, a série

lânguida e casual de Joãozinho (João Carlos Rodrigues, um dos poucos modelos de

Hélio que pudemos localizar); as imagens arrebatadoras, de um vermelho violento,

de um homem-fêmea glamouroso: Dudu, louro e sexy, de longos cabelos, usando

um leve baton que adoça sua virilidade; um jovem negro, Conell, em posições de

meditação e fazendo poses sensuais, nu de chapéu.

O ritmo de projeção das fotos criam uma “quase animação”, braços e mãos

que mudam de posição, aproximação e afastamento de partes do corpo, o corpo

que se “levanta”, pela simples mudança de enquadramento: horizontal que pula

para vertical e vice-versa.

As imagens exploram esse movimento do rosto e corpo dos modelos,

esquartejados e fixados pelo enquadramento e “reconstruídos” pela sequência da

projeção. A horizontalidade dos corpos _ deitados em ninhos, redes e esteiras_ é

verticalizada no enquadramento de Hélio, deixando os corpos “em pé”. Romero,

29 Hélio transforma os apartamentos em que viveu em Nova York em ambientes, “mundo abrigo” onde dispõe “ninhos”, espaços sensoriais, em que instala os amigos e visitantes. Os lofts recebem nomes como BABYLONESTS, HENDRIXSTS ou tornam-se, como as pessoas, os lugares, os blocos de sensações e pensamentos, matéria de conceituação e experimentação.

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que aparece em muitos trabalhos da fase novaiorquina, vestindo parangolés 30, é

fotografado em Neyrótika numa rede vermelha, o peito nu em close. As imagens

exploram o rosto e o torso nu de Romero, cabelos longos e perfil clássico. As

sequências de imagens criam uma disjunção rosto/corpo, esquartejados em closes

frontais de pernas, torso, perfis, e explora na passagem de um slide pra outro, a

mudanca de eixos vertical/horizontal, reto/oblíquo.

João Carlos Rodrigues, “Joãozinho”, descreve a sessão de fotos, feita em

1972, em que foi modelo, contactado por uma amiga, a pedido de Hélio, para esse

fim e que durou entre 4 a 5 horas:

“Conversamos durante uma hora sobre vários assuntos, entre eles música ,

Dalva de Oliveira e Yma Sumac. Hélio me mostrou outras séries de slides, já

prontas, de um portoriquenho, de um negro e de outro garoto que pode ser o Dudu.

Como eu tinha trabalhado na peça Roda Viva, sugeriu uma maquiagem branca

para todo o rosto, como no teatro Nô. Ele mesmo me maquiou. As fotos foram

feitas numa espécie de beliche [os “Ninhos” espalhados pelo apartamento], Hélio

ficava rondando em volta e dizendo o que queria: posição das pernas, do corpo.

30 As mais conhecidas criações de Hélio, os Parangolés são estruturas para ‘vestir’, dançar, correr, exibir no próprio corpo: capas, estandartes, tendas, “camadas de pano de cor”, semelhante a roupas que se tornam uma segunda pele. O espectador veste a obra e torna-se, segundo Helio, “participador”, fazendo do próprio corpo “suporte’, numa experiência lúdica que constitui um “ato expressivo”. “Anotações sobre o Parangolé”, de H.O para a exposição “Opinião 65” no Museu de Arte Moderna do rio de Janeiro em 1965 in Catálogo Hélio Oiticica.

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Peguei uma revista pra ler e ele achou ótimo e incorporou. Havia música e rádio

no ambiente”31.

O resultado da série “Joãzinho” são fotos não ostensivamente posadas, num

clima sexy e íntimo. Em outras séries (Didi, Carl, Artur), Hélio explora os contra-

plongés, claro/escuro, as cores fortes, azulado, avermelhado ou a luz natural,

suave e “casual”, “não fotografia artística”. Vistos hoje, esses takes de garotos em

poses casuais e cotidianas, tem o fescor, a crueza e leveza perseguidos pela

fotografia de moda e pelo mundo fashion de forma ostensiva e nem sempre bem

sucedida.

Hélio não faz “belas” fotos de garotos belos: “uma noite sentei a Beleza

sobre os meus joelho - e achei-a amarga - E praguejei contra ela” 32, diz, fotografa

o desejo desejando. Em algumas sequências, os garotos exibem-se para a câmera,

como Didi, fotografado em fundos escuros e azulados, em contra-plonges, enrolado

num cutíssimo saiote/toalha. As sequências exploram os ângulos inusitados, de

baixo para cima. Na sequência de fotos de Artur, Hélio explora uma luz suave e

envolvente, delicadas contra-luzes entre os cabelos, valorizando a pele, seu modelo

não olha para a câmera, é fotografado de perfil olhando em direções opostas. A

sequência dos slides cria um sobressalto pela mudança da direção do olhar: para

fora do quadro, para direita, para a esquerda, para cima.

31 Depoimento a Ivana Bentes em março de 2000. João Carlos Rodrigues é pesquisador e crítico de cinema e diretor de uma série de vídeos sobre as cantoras-ícones do rádio, nos anos 50.32 Hélio Oiticica in Quase Cinema: Cinema de Artista no Brasil, 1970/80. pg. 22

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Entre os slides de Neyrótika, está uma foto do gravador e rádio, utilizados na

composição da trilha: “trilha de som é continuidade pontuada de interferência

acidental improvisada na estrutura gravada do rádio q é juntada à sequência

projetada de slides de modo acidental e não como sublinhamento da mesma - é

play-invenção”33.

Na composição de sua não-narração, Hélio quebra e barra o “artístico” das

fotos ou mesmo sua carga de erotismo direta com a trilha-interferência de uma

rádio de Nova York (música, publicidade, locução, serviço de tempo e hora, vozes

graves, infantis, sedutoras, cômicas) e trechos de poemas de Rimbaud

(Illuminations ) lido por ele 34. Esse som-ambientação, ao lado do ritmo-projeção

dos slides, ritmo variável conforme o operador, interfere e, no limite, desfaz as

configurações da imagem. Rádio-poesia-áudio incidental, projeções ritmadas,

invenção-improvisação no som e na projeção que esvaziam as imagens de seu

significado imediato, criando novas associações e sensações, além de sobressaltos

pela mudança brusca de direções do olhar, da luz, dos eixos do quadro.

Em Helena inventa Angela Maria, último trabalho da série quase-cinema, a

atriz Helena Lustosa encarna a mítica cantora popular brasileira, Ângela Maria, que

fez estrondoso sucesso na época de ouro do rádio brasileiro, nos anos 50 e entrou

definitivamente para o imaginário pop, como síntese de feminilidade e vigor, uma

33 idem34 A voz e entonações características de Hélio foram exploradas em vídeos e filmes em sua homenagem como H.O.N.Y. de Marcos Bonisson e Tavinho Paes e HO, curta de Ivan Cardoso.

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espécie de Maria Callas popular brasileira, ao alcance dos olhos e ouvidos. As

fotos revelam um fascínio de Hélio pela feminilidade exuberante e forte: Marilyn

Monroe, Elizabeth Taylor, Yoko Ono, Yma Sumac (presente na trilha das

Cosmococas), Maria Callas, Ângela Maria.

A juventude e beleza de Helena, seu rosto forte e violenta sensualidade,

também fascinaram o artista. Helena foi atriz de uma série de curtas em super-8 de

Ivan Cardoso 35 , fez teatro de revista, criando “cigarets girls” e vedetes para

Carlos Machado. No período em que conheceu e frequentou o apartamento de

Hélio Oiticica em Nova York, julho de 75 a janeiro de 76, andava pelas ruas de

Manhattan com roupas e adereços que ela mesmo costurava e arranjava, invenção

no cotidiano, vestir-se e exibir-se, que capturou o artista: Helena passeava pela 5º

Avenida com o amigo e arrancava olhares que intrigavam um Hélio acostumado a

reação cool e indiferente dos novaiorquinos36.

Em Helena inventa Ângela Maria, a performance da atriz, suas

improvisações na composição de uma “diva” sensual e trágica, misteriosa, passa

da expressividade absoluta (a empáfia e fragilidade de um rosto) a pose-máscara de

boneca, trata-se de uma real contribuição à invenção de uma imagem-ícone que

não é travestimento ou fantasia (Helena “vestida” de Ângela), mas uma

composição de signos (os óculos escuros, a rosa e a boca vermelhas, o cabelo-

35 Os filmes da série Quotidianas Kodaks (1970-1975): “Piratas do sexo voltam a atacar”, “programa Nosferato no Brasil: Amor &Tara”, “Sentença de Deus”, “A Múmia volta a Atacar’, etc.36 Depoimento de Helena Lustosa a Ivana Bentes. Março de 2000. Rio de Janeiro.

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ninho, o terno, os panos, brilhos e luzes) que fragmentam e reinventam Ângela

Maria, cuja voz aveludada e balsâmica e as letras das canções por si só já evocam

outros tempos, narrativas e mundos.

As composições de Hélio a partir da performance de Helena chegam a uma

sofisticação e suntuosidade extremas neste trabalho. O corpo semi-nu de Helena

surge enrolado em panos e plásticos brilhantes, ou esvanecido sob telas e tramas.

Fotografando à noite, nas ruas de Manhattan, em cenários escuros, com poucos

pontos de luzes (garagens, docas, Wall Street, referências que desaparecem na

iluminação mínima), Hélio cria fundos negros salpicados de pontos brilhantes,

explora a contra-luz e o corpo de Helena que sai da luz ou mergulha na escuridão.

Em alguns slides, as luzes transformam o asfalto em espelho d’água. Brilhos

azulados e o negro do exterior que contrastam com os vermelhos e prateados que

iluminam o rosto e corpo de Helena nos interiores: “meu amor quando te beijo,

vejo o mundo delirar, vejo o céu aqui na terra e a terra no mar”, canta a canção de

Ângela Maria que ouvimos.

Os fundos indefinidos, asfalto, mar e areia de luzes, plástico, tecido, os

“materiais” entram em relação e contraste com o corpo-rosto de Helena, enormes

superfícies de pele suave que enchem o quadro. Em alguns takes Hélio-Helena

inventam verdadeiras “natureza mortas” contemporâneas: corpo, cabelo, olhos,

seios embrulhados ou expostos, derramados em sofisticados arranjos. Uma diva

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sensualíssima e melancólica, uma boneca delicada, uma pin-up, uma mulher

trágica e bela. A sequência de fotos e música explora os contrastes de um corpo-

passivo e olhado com o erotismo violento em ‘flagrantes” do corpo que se exibe e

encara o olhar da câmera e do espectador.

A voz envolvente de Ângela Maria na trilha sonora, com músicas tocadas

inteiras funcionam como fragmentos de “narração” (vidas dilacerados, dores de

amor, exaltação da beleza e da mulher brasileira), todo um imaginário sentimental,

que contrasta com as imagens-ícones, pop e contemporâneas da Helena-Ângela

inventada: de casaco de couro e óculos escuros, semi-nua, enrolada numa

bandagem vermelha, envolta em telas.

O pop se mistura com a iconografia do romântico-trágico: a rosa vermelha

na boca, os olhares dilacerados, a canção triste: “Quem descerrar a cortina da vida

da bailarina há de ver cheiro de horror”, mas também uma marchinha de exaltação

do Rio de Janeiro e da mulher brasileira que descreve “morenas faceiras”, “sereias

que fazem sonhar” e conclui pela superioridade sensual do Rio sobre Paris:

“Falam de Paris, de la France, de l’amour, dizendo que lá tudo é bom. Mas é aqui

que a gente sente neste Rio quente, quente o verdadeiro minuto do amor”.

Nesse trabalho, como em muitos outros de HO, a relação Helena-Ângela

veio a posteriori, a partir do resultado das fotos. “A invenção é cega”, “ se já

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soubéssemos o que estávamos fazendo, por que fazer, então”? é a questão repetida

por Helena Lustosa e que sempre definiu o “experimental” para Hélio.

Hélio, nesse trabalho põe uma pergunta nova e inquietante: como reinventar

uma persona pública, como “apropriar-se” de sua imagem para fins outros que não

o da representação-imitação ou da caricatura, como experimentar o “outro” pela

imagem-performance? Como experimentar Ângela Maria ou Marilyn ou Liz Taylor

ou Yoko em mim? Devir-outro que desqualifica o comportamento de mera

imitação do ídolo, do vestir-se como, do agir como. Hélio radicalizou a pop-

antropofagia que come os signos do outro e o reinventa e se reinventa ao lhe

devorar, seu quase-cinema é uma tentativa de instaurar uma nova relação com as

imagens-mundo, um ver com o corpo.

Ivana Bentes é pesquisadora de cinema e artes visuais, professora da Escola de

Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, curadora de cinema, arte

e novas mídias.

NOTAS

1.Oiticica, Hélio. “CRELAZER” in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica.

Rio de Janeiro. 1996 pg.132

2. CRELAZER, proposta para fazer do lazer e da preguiça estados inventivos. Idem.

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3. Oiticica, Hélio. “Bloco-Experiências in Cosmococa”. Catálogo Hélio Oiticica. Centro de

Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.177

4. Oiticica, Hélio. Tropicália 4 de março de 1968 in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de

Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.124

5. idem, pg 125

6. in “Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13”, pg. (texto inédito transcrito por

Ivana Bentes) Arquivo do Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro

7. Carlos Basualdo indica essa relação narrativa, fotografia, cinema como uma das chaves

desses trabalhos in Hélio Oiticica: Quasi-Cinemas. 1999

8. A gênese e conceituação das Cosmococas estão descritas por H.O em diferentes textos

que sublinham a importância da parceria com Neville D’Almeida. As idéias de Neville

forma apresentadas em depoimento à autora. Março de 2000.

9. Oiticica, Hélio. Bloco-Experiências in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio

Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.174

10. Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.177

11. Memórias de um Estrangulador de Louras, filme de Júlio Bressane, 1972. Com Guará

Rodrigues. Londres.

12. in Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13 pgs. 10 e 11 (texto inédito

transcrito por Ivana Bentes)

13. Oiticica, Hélio. Bloco-Experiências in Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio

Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg.190

14. in Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13 pg. 53 (texto inédito transcrito por

Ivana Bentes)

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15. idem, pgs. 75 e 76

16. idem

17. idem, pg. 52

18. idem, pgs. 76 e 77

19. idem, pg. 159

20. idem pg.6

21. in Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13 pgs. 97/100 (texto inédito

transcrito por Ivana Bentes )

22. idem, pgs. 103 a 109

23. idem, pgs. 56 a 62

24. Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996 pg. 180

25. “Bodywise”, segundo Guy Brett, seria o nome de um dos 14 capítulos de um livro

chamado Newyorkaises ou Conglomerado , reunindo os trabalhos de Nova York., não

realizado. Ver Catálogo Hélio Oiticica. Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro. 1996

pg.208

26. Ver carta de HO para Wally Salomãoe in“Hélio Oiticica e a cena americana”, catálogo

do Centro de Arte Hélio Oiticica. 1998.

27. Hélio fala de “80 slides com marcação de tempo e trilha sonora: inacabado”, provavelmente tendo

como referência a apresentação deste trabalho na Expoprojeção, em São Paulo, em 73. Mas encontramos

7 séries ou blocos com sete diferentes “modelos” num total de cerca de 250 slides identificados no arquivo

do Centro de Arte Hélio Oiticica pelo nome do modelo fotografado.

28. Oiticica, Hélio in NEYRÓTIKA citado por CANONGIA, Ligia in Quase Cinema:

Cinema de Artista no Brasil, 1970/80. Funarte. Rio de Janeiro, 1981

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29. Hélio transforma os apartamentos em que viveu em Nova York em ambientes, “mundo

abrigo” onde dispõe “ninhos”, espaços sensoriais, em que instala os amigos e visitantes. Os

lofts recebem nomes como BABYLONESTS, HENDRIXSTS ou tornam-se, como as

pessoas, os lugares, os blocos de sensações e pensamentos, matéria de conceituação e

experimentação.

30. As mais conhecidas criações de Hélio, os Parangolés são estruturas para ‘vestir’,

dançar, correr, exibir no próprio corpo: capas, estandartes, tendas, “camadas de pano de

cor”, semelhante a roupas que se tornam uma segunda pele. O espectador veste a obra e

torna-se, segundo Helio, “participador”, fazendo do próprio corpo “suporte’, numa

experiência lúdica que constitui um “ato expressivo”. “Anotações sobre o Parangolé”, de

H.O para a exposição “Opinião 65” no Museu de Arte Moderna do rio de Janeiro em 1965

in Catálogo Hélio Oiticica.

31. Depoimento a Ivana Bentes em março de 2000. João Carlos Rodrigues é pesquisador e

crítico de cinema e diretor de uma série de vídeos sobre as cantoras-ícones do rádio, nos

anos 50.

32. Hélio Oiticica in Quase Cinema: Cinema de Artista no Brasil, 1970/80. pg. 22

33. idem

34. A voz e entonações características de Hélio foram exploradas em vídeos e filmes em

sua homenagem como H.O.N.Y. de Marcos Bonisson e Tavinho Paes e HO, curta de Ivan

Cardoso.

35. Os filmes da série Quotidianas Kodaks (1970-1975): “Piratas do sexo voltam a atacar”,

“programa Nosferato no Brasil: Amor &Tara”, “Sentença de Deus”, “A Múmia volta a

Atacar’, etc.

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36. Depoimento de Helena Lustosa a Ivana Bentes. Março de 2000. Rio de Janeiro.

Filmografia [por Ivana Bentes para o catálogo da exposição no Wexner Center

for the Arts.2001]

A partir de anotações de Helio Oiticica in Quase Cinema:Cinema de Artista

no Brasil, 1970/80 e Apontamentos 22 de junho de 1973, notas inéditas em

NTBK 2/73, arquivos do Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro e

“Filmografia” Catálogo Hélio Oiticica (Rio de Janeiro. Centro de Arte Hélio

Oiticica.1996. p.270)

QUASE-CINEMA

Brasil Jorge. c.1971, super-8

Agripina é Roma-Manhattan. New York, 1972 - Super-8 não terminado:

material a ser utilizado como parte de programa futuro

Neyrótika. New York, 1973 - Nãonarração montada em NEW YORK

abril/maio 73: 80 slides com marcação de tempo e trilha sonora: inacabado

Cosmococa. Programa in progress, New York, 1973 - Constituído de BLOCO-

EXPERIENCIAS com a designação CC de CC1 a CC5 com NEVILLE

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DALMEIDA a partir de 13 de março de 73 inaugurando o conceito-designação

de quase-cinema.

CC1 -TRASHISCAPES

CC2- YOKO MASK/ONOBJET

CC3- MAILERYN

CC4 - NOCAGIONS

CC5 -HENDRIX WAR

CC6 com THOMAS VALENTIN

CC7 com GUY BRET

CC8 sozinho ou VIGILIA/ UBER COCA proposta para SILVIANO

SANTIAGO [Mr. D or D. of Dado]

CC9 COCA OCULTA proposta para CARLOS VERGARA

São BLOCOS constituídos de slides-trilha sonora-INSTRUÇÕES: essas

instruções são especiais em cada caso exigindo a construção de ambientação-

ocasião próprios.

Helena inventa Ângela Maria. New York, 1975

5 BLOCOS-SEÇOES a serem tomados do mesmo modo q COSMOCOCA

e NEYROTIKA como experiências de quase-cinema: suas INSTRUÇOES

variam conforme a situação pedida: quanto à trilha sonora também: há

maquete feita do ambiente-PENTÁGONO feito como protótipo para sua

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apresentação: programação nova e especial a ser feita para cada

apresentação.

Norma inventa La Bengell. New York, 1975, inacabado [segundo informação

dada por Norma Bengell em depoimento para o catálogo da exposição. Agosto

de 2001]

Participação em filmes:

Câncer, de Glauber Rocha 1968/1972, 16 mm. Com Hugo Carvana, Antonio

Pitanga, Odete Lara, Rogério Duarte. Hélio Oiticica atua, numa performance

minimalista, ao lado dos sambistas da Mangueira.

Mangue-Bangue. Filme de Nevile D’Almeida, 1971. Com Paulo Villaça, Maria

Gladys, Erico de freitas, Maria Regina, Neville D’Almeida. Filme

referência/manifesto que detonou o trabalho das Cosmococas.

O Gigante da América, de Júlio Bressane (1980). Hélio realiza o penetrável

Tenda-Luz, como ambientação.

O Segredo da Múmia, de Ivan Cardoso (1982). Combinação de terror e

chanchada, onde Hélio Oiticica faz figuração, como um egípcio.

Outros filmes que incluem obras de Hélio Oiticica:

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Dr. Dyonélio, de Ivan Cardoso (1978). Rio de Janeiro, 35mm

Uma Vez Flamengo, de Ruy Solberg (1979). Rio de Janeiro, vídeo

Lágrima Pantera Míssil, de Júlio Bressane (1973). New York. 16mm

Kleemania Cajú, de Sômia Miranda (1979). Rio de Janeiro, vídeo

Pau Brasil, de Jef Conelis, Chris Dercon (1991), p. BRTN Brussel, vídeo.

Bibliografia

“Apontamentos 22 de junho de 1973. NTBK 2/13”, de Hélio Oiticica. Texto

inédito transcrito por Ivana Bentes do caderno de anotações de Helio Oiticica.

Arquivo do Centro de Arte Hélio Oiticica. Rio de Janeiro (fev/março de 2000)

“Aspiro ao Grande Labirinto” , de Hélio Oiticica (textos selecionados 1954-

1969). Ed. Rocco, 1996

“Neyrótika”, de Hélio Oiticica in Expo-Projeção. São Paulo, 1973

“Mangue Bangue”, de Héliuo Oiticica, in Hélio Oiticica, Quasi cinema (Filmes

de, com e sobre HO) Funarte, Rio de Janeiro, 1983

“Cinema de Artista: a experiência brasileira e o contexto internacional” de Lígia

Canogia, in A Missão e o Grande Show: políticas culturais no brasil dos anos

60 e depois . Organização: Ângela Maria Dias. Ed. Tempo Brasileiro. 1999

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Page 34: H.O e o Cinema-Mundo - Eco.Pós - Programa de … Web viewOs trabalhos de Hélio Oiticica reunidos sob o conceito de “quase-cinema”, formulado por ele na década de 70, se inscrevem

“Quase Cinema -Cinema de Artista no Brasil 1970/80”, de Lígia Canongia. Ed.

Funarte, Rio de Janeiro, 1981.

“A invenção de Hélio Oiticica," de Celso Favaretto, Edusp. São Paulo, 1992.

"Hélio Oiticica: Qual é o parangolé?," de Wally Salomão, Relume Dumará, Rio

Arte, Rio de Janeiro, 1996.

"Hélio Oiticica e a cena Americana," Glória Ferreira, Centro de Arte Hélio

Oiticica, Rio de Janeiro, 1998.

* Texto publicado originalmente em inglês por ocasião da exposição Hélio Oiticica Quasi Cinemas, com curadoria de Carlos Basualdo, no Wexner Center for the Arts em 2001, para o catálogo da exposição.

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