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Introdução Infectologia vol 1-2003 -...

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CAPÍTULO 3 - CATARATA 31 Cap. 3 Catarata
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CAPÍTULO 3 - CATARATA 31

Cap. 3

Catarata

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CATARATA

I - INTRODUÇÃO: O CRISTALINO

O cristalino é um disco biconvexo transparente quefunciona como uma lente convergente, contribuin-do com cerca um terço das dioptrias da refração ocu-lar (+20D), sendo os dois terços restantes (+40D)dependentes da córnea. O cristalino de um adulto,quando relaxado, tem em média um diâmetro ântero-posterior (espessura central) de 4 mm e um diâmetrocraniocaudal de 9 mm. Anatomicamente, o cristalinopossui o corpo ciliar a sua volta, localizando-se logoatrás da íris, à frente do corpo vítreo e tendo comuni-cação direta com a câmara anterior (humor aquoso)através da pupila (FIGURA 1).

Histologicamente, o cristalino é formado por 4 par-tes (FIGURA 1): (1) cápsula, composta de fibras co-lágenas derivadas da membrana basal do epitélio;(2) epitélio subcapsular, presente apenas na faceanterior do cristalino e formado por uma única cama-da de células cúbicas, das quais se originam as fi-bras do cristalino; (3) córtex, contendo as suas prin-cipais células estruturais: as fibras do cristalino, cé-lulas alongadas (comprimento de até 8 mm) que acom-panham o eixo maior da lente (no plano sagital) eencontram-se impactadas entre si, com quase ne-nhum espaço intersticial. Algumas destas células per-dem seus núcleos e a maior parte de suas organelas,e contêm as proteínas cristalinas – proteínas funda-mentais para a função refrativa da lente; (4) núcleo,contendo as fibras do cristalino mais antigas, forma-das no período embrionário, ainda mais impactadas.

As principais células que compõem o cristalino (asfibras do cristalino) são formadas no período embri-

onário e durante a fase de crescimento do olho,envelhecendo junto com o indivíduo, pois nãomorrem por apoptose e não são renovadas.

O tecido do cristalino é riquíssimo em proteína(35% de proteína e 65% de água), mais do quequalquer outro tecido do corpo. Contém tambémalguns eletrólitos, especialmente o potássio, esubstâncias antioxidantes, como o glutation. Ocristalino não recebe vascularização nemtampouco inervação, sendo portanto uma estru-tura avascular e indolor. A sua nutrição se dápela difusão de oxigênio e nutrientes por inter-médio do humor aquoso (anteriormente) e docorpo vítreo (posteriormente).

O cristalino precisa de duas características bási-cas para exercer a sua função de lente ocular: serum meio transparente e ter um bom índice derefração. Tanto a transparência quanto o poderrefrativo do cristalino dependem de proprieda-des das proteínas cristalinas, presentes no inte-rior de suas células (fibras). O poder de refra-ção da lente é proporcional à concentração des-tas proteínas nas fibras! As cristalinas normal-mente são pequenas (menores que o comprimen-to de onda da luz) e bastante solúveis, além deserem homogeneamente distribuídas ao longodo citoesqueleto das fibras do cristalino. São ca-racterísticas que garantem a transparência da len-te, por reduzir ao máximo a dispersão da luz. Aproporção proteína-água no citoplasma das fi-bras do cristalino também é importante para man-ter o cristalino transparente: tanto a hidrataçãoquanto a desidratação das suas fibras podemtornar o cristalino turvo.

Fig.1: À esquerda, você observa a sua relação anatômica com outras estruturas oculares, vista de perfil.À direita, está a representação de suas estruturas histológicas.

O cristalino é suspenso pelas fibras zonulares, acopla-das em disposição radial à zona equatorial da lente, li-gando-a ao músculo ciliar (FIGURA 1). Na posição derepouso muscular, as fibras tensionam o cristalino, redu-zindo a sua espessura central. Quando o músculo ciliarcontrai, as fibras zonulares relaxam e permitem o aumen-to natural da espessura central do cristalino, garantindoum maior poder refrativo, de +20D para +30D (FIGURA2). Como vimos no capítulo anterior, este é o mecanismode acomodação do cristalino, fundamental para a nitidezda visão de perto. Está comprometido na presbiopia...

II - CATARATA ADQUIRIDA (“SENIL”)

1. Patogênese da Catarata

Catarata é uma doença bastante comum na populaçãoidosa caracterizada pela opacidade progressiva do cris-talino, provocando perda parcial ou total da visão. Adoença é via de regra bilateral, embora assimétrica. Otermo vem do latin catarractes, que significa “cachoei-ra”, a qual foi comparado o aspecto da névoa observadano cristalino opacificado.

O mecanismo causador da catarata não é conhecido, mascertamente tem a ver com o envelhecimento. Como vi-mos, as células estruturais do cristalino (fibras do crista-lino) não são renovadas e possuem praticamente a mes-ma idade do indivíduo, o que as torna as células do cor-po humano mais suscetíveis ao desgaste do envelheci-mento. Parece que o estresse oxidativo constante pro-move a degeneração das proteínas cristalinas, que au-mentam de tamanho e perdem as suas propriedades quegarantem a transparência da lente.

Fig.2: Mecanismo de acomodação do cristalino.

Acomodação: m. ciliarcontraído, zônula relaxa-da, poder refrativo: +30D.

Estado de repouso: m. ciliarrelaxado, zônula tensionando ocristalino, poder refrativo: +20D.

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Na fase inicial da catarata, especialmente no tipo nu-clear (ver adiante), o cristalino aumenta o seu con-teúdo aquoso, a ponto de aumentar a convexidadeda lente e, portanto, o seu poder de refração. Issojustifica muitos pacientes iniciarem a doença pelosurgimento de miopia, com borramento para visãode longe e melhora da visão de perto, corrigindo par-cialmente a presbiopia relacionada à idade. Nestafase, o paciente pode voltar a ler sem óculos, ao quese chama “segunda visão”. Com o passar dos anos,a opacificação do cristalino vai progredindo e a lentevai desidratando, tornando a visão cada vez pior, atéchegar a uma grave deficiência visual.

2. Tipos de Catarata

A partir deste momento, faremos referência apenas àcatarata adquirida (do adulto), reservando o finaldeste capítulo para descrever alguns aspectos dacatarata congênita (da criança).

Do ponto de vista anatômico, existem três tipos decatarata quanto ao local do cristalino onde ocorre oupredomina a opacificação: (1) nuclear: núcleo do cris-talino, (2) cortical: região anterior do cristalino, e (3)subcapsular posterior: adjacente à cápsula posteri-or do cristalino. Pode haver a combinação de mais deum tipo no mesmo paciente...

Os tipos mais comuns de catarata são os dois primei-ros, que tendem a progredir muito lentamente, en-quanto que o tipo subcapsular anterior está maisassociado ao diabetes mellitus e aos corticoides (veradiante) e via de regra progride rapidamente (numperíodo de meses!). A catarata nuclear é o tipo maisassociado à miopia nas fases iniciais, pelo mecanismode hiperhidratação, bem como a um grau de perda dadiferenciação das cores. A catarata cortical é o tipo maisbrando, que menos compromete a acuidade visual. Acatarata subcapsular posterior é o tipo mais grave eprogressivo e está associado à sensibilidade a luzes debrilho forte, com ofuscamento da visão (glare).

3. Epidemiologia e Fatores de Risco

A catarata adquirida é considerada a causa mais co-mum de cegueira (perda visual completa) e de perdavisual parcial no Mundo, excluindo-se os distúrbiosde refração (hipermetropia, miopia, astigmatismo). NoBrasil as causas mais de cegueira nos adultos, porordem decrescente de frequência, são catarata, glau-coma, retinopatia diabética e trauma ocular. Na ter-ceira idade, surge uma outra importante causa decegueira: a degeneração macular senil. A definiçãode cegueira pela OMS é quando a acuidade visualno melhor olho (com distúrbio de refração corrigido)é de 20/400 ou campo visual no melhor olho inferiora 10o. Com esta definição, existem cerca de 50 mi-lhões de cegos em todo Mundo, sendo 50% delesportadores de catarata. No Brasil, são 1,25 milhõesde cegos. Vale ressaltar que existe uma definição paraa cegueira legal (em termos profissionais), com a me-nor visão corrigida de 20/200 ou campo visual nomelhor olho de 20o. Um outro conceito é o de baixavisão (visão subnormal), com a menor visão corrigi-da de 20/60 (visão três vezes pior que a normal, de

20/20). Por esta definição, existem cerca de 180 mi-lhões de indivíduos com visão subnormal no Mun-do. No Brasil, são 4 milhões deles. A catarata tambémé uma importante causa de deficiência visual.

Embora seja uma doença predominante dos idosos, acatarata adquirida pode eventualmente atingir indiví-duos mais novos, especialmente quando secundáriaa outras doenças. Diversos são os fatores de riscopara catarata adquirida (Tabela 1). O principal é a ida-de avançada, já que a catarata é um processo de enve-lhecimento das fibras do cristalino. A prevalência decatarata oscila em torno de 10% dos adultos e começaa se elevar significativamente a partir dos 50 anos, au-mentando para quase 50% na faixa etária entre 65-75anos e até 75% na faixa etária acima dos 75 anos!! Essasestatísticas incluem mesmo os casos leves de catarata,que afetam pouco a visão do paciente. Observe natabela seguinte que, além da idade avançada, tabagis-mo, exposição solar, diabetes mellitus e uso crônicode corticoides (sistêmicos, inalatórios em altas dosese tópicos) são os mais importantes fatores de risco.

O diabetes mellitus e o uso de corticoides são fato-res de risco importantes para o desenvolvimento decatarata precoce (antes dos 50 anos), do tipo sub-capsular posterior. Devemos lembrar que o uso decorticoides também é fator de risco para o glauco-ma... O risco de catarata por corticoides inalatóriosem altas doses parece ser significativo com dosescumulativas equivalentes a 2.000 mg (10 puffs/diapor 10 anos) e em crianças. O tabagismo está maisassociado à catarata nuclear.

4. Quadro Clínico

Como a catarata é uma doença bilateral, embora geral-mente assimétrica, à medida que o cristalino vai seopacificando, a visão vai ficando lenta e progressiva-mente borrada, de forma totalmente indolor. Como

vimos na patogênese, nas fases iniciais, especialmentena catarata nuclear, surge um certo grau de miopia ecorreção da presbiopia, fazendo o paciente se queixarde borramento visual para longe (sinais de trânsito,problemas para dirigir veículos à noite, etc.), emboramelhore a visão para perto (leitura). Pode surgir tam-bém uma perda da definição do contraste das letras eobjetos (tons parecidos podem não ser diferencia-dos), dificultando por exemplo o paciente identificarbordas, como a da calçada da rua... Com o tempo, oaumento da opalescência do cristalino vai agravandoo borramento visual e então o paciente passa a terdificuldade na visão para perto e longe. A visão cos-tuma ficar “nublada e enevoada” (FIGURA 3). Ou-tras queixas visuais podem ser: alteração da visão decores na catarata nuclear, sensibilidade ao brilho for-te (glare) na catarata subcapsular posterior).

5. Avaliação Visual, Diagnóstico e Evolução

Todo paciente com mais de 50 anos de idade com perdaparcial ou completa da acuidade visual corrigida (parao erro de refração) pelo teste da carta de Snellen (vercapítulo de Refração) deve ser avaliado quanto à pre-sença de catarata. O mesmo vale para pacientes maisjovens diabéticos e que usaram corticoides. O surgi-mento de miopia após 50 anos também é uma situaçãosuspeita... Os pacientes com catarata incipiente podeter um desempenho razoável na carta de Snellen, em-bora tenham a visão de contraste comprometida, oque acarreta problemas. Existem entretanto testes parasensibilidade ao contraste, como o teste de Pelli-Robson que avalia a capacidade do paciente identifi-car letras de tamanho equivalente à visão 20/60 comtonalidade decrescente (FIGURA 3). Outro teste quepode ser aplicado é o teste da sensibilidade ao brilho,em pacientes com sintomas de ofuscamento (glare).

O exame da lâmpada de fenda (biomicroscopia dosegmento anterior), de preferência com a pupila dila-

Fig.3: Visão normal (acima) e visão do paciente comcatarata (abaixo): nublada e enevoada.

Principais fatores (clássicos):1- Idade avançada2- Tabagismo3- Exposição solar4- Diabetes mellitus5- Corticoides

- Sistêmicos (>15 mg/dia de prednisona)- Inalatórios em altas doses- Colírio de corticoide

Outros fatores:6- Sexo feminino7- Raça negra8- Baixa escolaridade9- Alcoolismo10- Trauma ocular (incluindo queimaduras)11- Uveíte recorrente12- Alta miopia13- Distrofia miotônica14- Doença de Wilson15- Hipoparatireoidismo16- Uso de fenotiazinas17- Radioterapia intraocular18- Procedimentos oculares (vitrectomia posterior, fístula antiglaucomatosa)19- Pseudoesfoliação

Tabela 1: Fatores de risco para catarata adquirida

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CAPÍTULO 3 - CATARATA 35

Fig.5: Catarata: Exame da lâmpada de fenda.

Fig.5D: Catarata morganiana.

Fig.5C: Catarata hipermadura.

Fig.5B: Catarata madura.

Fig.5A: Catarata imatura.

tada, é o mais indicado para o diagnóstico da catara-ta, embora a simples observação da pupila iluminadapossa detectar a presença de catarata nos casos avan-çados. Pelo exame, o médico é capaz de verificar oestágio de evolução da catarata:

- Catarata imatura: há turvação do cristalino embo-ra seja possível observar a retina e o reflexo verme-lho pupilar (FIGURA 5A). Neste caso, o paciente apre-senta apenas uma perda parcial da acuidade visual.

- Catarata madura: o cristalino está totalmente opa-co, não sendo possível ver a retina e nem o reflexopupilar (FIGURA 5B). A pupila encontra-se esbran-quiçada (leucocoria). Neste caso, o paciente já apre-senta cegueira (melhor visão de 20/400). Outras cau-sas de leucocoria são: infecção intraocular, retino-blastoma, persistência hiperplásica do vítreo primiti-vo, doença de Coat (retinopatia exsudativa).

- Catarata hipermadura: o cristalino sofreu desidra-tação e possui aspecto enrugado (FIGURA 5C). Umtipo de catarata hipermadura é a catarata morganiana,na qual o córtex está totalmente liquefeito e o núcleosolto dentro da cápsula (FIGURA 5D).

Além de observar a presença de opacidade do cris-talino, confirmando o diagnóstico, o exame da lâm-pada de fenda pode revelar o tipo de catarata (nucle-ar, cortical ou subcapsular posterior).

6. Complicações: o Facoglaucoma

O termo “faco” (do grego phaco = lentilha) refere-seao cristalino, a lente do olho. Este prefixo é utilizadopara descrever complicações e cirurgias relaciona-das à catarata. Uma complicação rara, porém temidada catarata madura ou hipermadura é o glaucomasecundário (facoglaucoma). Existem três tipos, clas-sificados de acordo com o mecanismo: (1) glaucomafacolítico: pelo extravasamento de proteínas do cris-talino para o humor aquoso (através de uma cápsulaanterior íntegra), bloqueando mecanicamente a suadrenagem, aumentando a pressão intraocular, (2)glaucoma facoanafilático: quando o mecanismo de-pende de uma reação imunológica local a essas pro-teínas, que extravasaram através de uma cápsula an-terior rôta, (3) glaucoma facomórfico: pela intumes-cência de uma catarata madura, bloqueando a pupilae fechando o ângulo iridocorneano. Os dois primei-ros tipos são glaucomas de ângulo aberto, enquantoque o facomórfico é um glaucoma de ângulo fecha-do. O glaucoma facolítico e o glaucoma facomórficomanifestam-se de forma aguda, com sintomas de olhovermelho, dor ocular, cefaleia, borramento visual epercepção de halos, com importante elevação dapressão intraocular. O paciente deve ser tratado pron-tamente com medidas clínicas para reduzir a pressãointraocular (ver Capítulo de Glaucoma) e evitar a per-da visual irreversível. A cirurgia para extrair a catara-ta deve ser programada o quanto antes!

7. Tratamento

Não existe tratamento clínico para a catarata, sendoa única opção a cirurgia, de caráter curativo. A histó-ria da cirurgia para catarata é bastante antiga, comodemonstram relatos arqueológicos das civilizaçõeshindu (4.000a.C.), egípcia, grega e romana. Durante aIdade Média, médicos-cirurgiões do Oriente Médioe outras partes do Mundo (mas não na Europa medi-eval...) realizavam com frequência cirurgias para ex-tração da catarata, com o paciente alcoolizado e into-xicado de analgésicos naturais. A técnica da extra-ção da catarata (facectomia) foi aprimorada porJacques Daviel em Paris, no ano de 1748. A cirurgiaganhou grande aceitação, mesmo deixando o paci-

ente afácico (sem o cristalino). A falta do cristalinocausava uma hipermetropia de alto grau, exigindoóculos com lentes bastante espessas (figura acima)e que distorciam a imagem lateral e faziam os objetos“pularem” no campo visual.

Em 1949, a grande revolução na cirurgia de catarataocorreu com o desenvolvimento da lente intraocularartificial para substituir o cristalino opaco retirado. Atecnologia das lentes intraoculares continua melho-rando a cada dia... Finalmente, em 1967 foi introduzi-da a técnica da facoemulsificação (cirurgia de esco-lha para catarata atualmente), com a retirada do cris-talino doente através de uma incisão bem menor doque a anterior.

Indicações da Cirurgia de Catarata

Antes de surgirem as técnicas modernas (lentesintraoculares e facoemulsificação), os pacientes de-veriam esperar a sua catarata “amadurecer” em am-bos os olhos para serem operados, ou seja, apenasquando se tornavam cegos do ponto de vista legalpela carta de Snellen (20/200). Esta restrição vinhado fato das inconveniências e complicações dafacectomia, como a imobilização por várias semanase a limitação pelo uso dos óculos afácicos. Atual-mente, com as novas técnicas, o índice de complica-ções é baixíssimo e, com a nova lente artificial, opaciente passa a enxergar normal (20/20) logo após acirurgia. Por isso, a indicação cirúrgica mudou... Hoje,a catarata deve ser operada quando o paciente julgarque a doença está limitando as atividades que eleprecisa ou deseja realizar diariamente. Ou seja, adecisão é tomada conjuntamente entre o médico e opaciente! A cirurgia de catarata é uma cirurgia eletiva,não havendo maiores problemas em ser adiada, casonecessário... As exceções são os casos em que aindicação de cirurgia precoce é mandatória, comonos casos de pacientes que precisam realizarfundoscopia seriada para doenças retinianas, proce-dimento este que pode ser bastante prejudicado pelalente opaca do cristalino, e nos raros casos defacoglaucoma. Pacientes portadores de patologiasoculares concomitantes, como retinopatia diabética,glaucoma primário ou degeneração macular senil,merecem ser operados da catarata, caso suas doen-ças retinianas estejam sob controle. Na maioria doscasos, a retirada do cristalino opaco traz uma grandemelhora na visão destes indivíduos, mesmo que nãopara uma correção visual completa (20/20).

Vale ressaltar que a cirurgia deve ser realizada emambos os olhos, com pequeno espaço de tempo, jáque a correção de apenas um olho traz problemasna qualidade de vida relacionados à visão monoo-cular.

Fig.4: Teste dePelli-Robsonpara asensibilidadeao contraste. Opaciente temque identificaras letras, àmedida que vãoreduzindo ocontraste (detrês em três).

Óculos afácicos (obsoletos)

V R S K D R

N H C S O K

S C N O Z V

C N H Z O K

N O D V H R

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Avaliação Pré-operatória

Além da avaliação clínica geral, diversos examesoftalmológicos são obrigatórios antes de se rea-lizar a cirurgia para catarata. Podemos dividir osexames em dois grupos: (1) aqueles necessáriospara a escolha da lente intraocular artificial ideale (2) aqueles para detectar oftalmopatias associ-adas, que poderão interferir nos resultados ope-ratórios.

No primeiro grupo estão os seguintes exames:

- Biometria com ultrassonografia modo-A: mé-todo mais usado para calcular o diâmetro ocularântero-posterior do globo ocular, utilizando aultras-sonografia unidimensional (A)..

- Topografia corneana computadorizada: estudodetalhado da morfologia da córnea e os distúrbi-os de refração da mesma. Em casos mais simples,uma ceratometria (medida da curva da córnea)pode ser suficiente.

No grupo de exames para avaliar patologias as-sociadas estão os seguintes:

- Tonometria de aplanação: exame ideal para semedia a pressão intraocular, para avaliar a pre-sença de glaucoma associado.

- Oftalmoscopia indireta: é a fundoscopia utili-zando espelhos que permite uma visão mais de-talhada da retina do paciente. Este exame só épossível em caso de catarata imatura.

- Potential Acuity Meter (P.A.M.): é o exame da“acuidade visual potencial”, realizado no con-sultório por meio de um aparelho eletrônico es-pecial que emite feixes de luz extremamente del-gados, capazes de passar por pequenos pontostransparentes no cristalino opacificado por umacatarata madura ou hipermadura (FIGURA 6). Opaciente então, com os olhos acoplados ao binó-

culo do aparelho, consegue perceber um análogo da cartade Snellen caso não tenha grave lesão vitreo-retiniana.

- Ultrassonografia modo-B: é a ultrassonografia bidimensi-onal do olho, realizada por um pequeno transdutor ocularespecífico. O exame é capaz de avaliar a presença de doen-ças vitreo-retinianas.

Técnica Cirúrgica

A cirurgia para catarata é realizada de forma rápida e seguracom o paciente recebendo alta para casa no mesmo dia. Aanestesia em geral é local, preferindo-se a retrobulbar ouperibulbar. Em casos selecionados, é possível a utilizaçãoda anestesia tópica (com colírios) não sendo obrigatória aoclusão do olho operado... Os resultados da cirurgia sãovia de regra excelentes! O tampão ocular deve ser usado porno máximo 24 horas (não mias que isso, exceto em rarasocasiões) e o paciente retorna ao trabalho geralmente em 1semana, embora o esforço físico vigoroso deva ser evitadopor semanas a meses. O paciente deve ser revisto pelo ci-rurgião 1 dia, 1 semana e 1 mês de pós-operatório. Colírio decorticoide pode ser necessário neste período e os pontosda sutura são removidos 6 semanas após a cirurgia.

A cirurgia para catarata mais realizada atualmente, pelas suasvantagens, é a facoemulsificação. Nesta técnica, por meiode uma pequena incisão de 2-4 mm, o córtex e o núcleo docristalino doente são fragmentados pela energia do ultrassome, em seguida, aspirados (FIGURA 7). Uma lente intraocularartificial de silicone dobrável é introduzida por esta incisãoe posicionada sobre a cápsula posterior deixada intacta. Emcasos de lentes artificiais mais rígidas, a incisão pode serlevemente ampliada a 5-7 mm. A segunda técnica é afacectomia extracapsular tradicional, na qual uma incisãomais ampla de 10-14 mm é realizada, por onde o córtex e onúcleo do cristalino doente são removidos em bloco, segui-do pela colocação da lente artificial sobre a cápsula posteri-or intacta.

vadas, no intuito de reduzir o risco de degenera-ção macular senil (ver adiante). Em pacientes comalta miopia ou certas formas de uveíte podem serdeixados afácicos.

Embora ambas as cirurgias possam ser utilizadasatualmente, dependendo da preferência do cirur-gião e do tipo de catarata, a facoemulsificaçãopossui vantagens, como a recuperação mais rá-pida da visão e a menor tendência ao astigmatis-mo pós-operatório.

Complicações da Cirurgia

A opacificação da cápsula posterior do cristali-no (catarata secundária) ocorre em 20-50% doscasos, sendo facilmente tratada pela capsuloto-mia com YAG-laser. Alguns oftalmologistas nãoconsideram exatamente uma “complicação”, dadaa sua fácil resolução.

Um astigmatismo iatrogênico pode ser criado,sendo menos frequente com a facoemulsificação.As demais complicações são raras, porém maisgraves. Aqui estão dispostas os seus percentuaisde ocorrência em grandes estudos: edema macularcistoide (1,5%), lenta artificial mal posicionada oudeslocada (1,1%), descolamento de retina (0,7%0,ceratopatia bolhosa (0,3%), endoftalmite bacteriana(0,13%), esta última a complicação mais temida.Alguns estudos sugerem um aumento da incidên-cia de degeneração macular senil após a retiradada catarata, por causar maior exposição da retinaaos raios ultravioleta do Sol. Contudo, faltam es-tudos para comprovar melhor esta associação.

8. Prevenção

Não existem medidas comprovadamente efetivaspara prevenir a catarata, embora estudos tenhamsugerido que o uso de óculos escuros (proteçãocontra os raios UV) e o uso prolongado de vita-minas antioxidantes possam retardar o apareci-mento da doença. Parar de fumar e dosar o usodos corticoides são importantes medidas. Aindanão foi comprovado que o controle rígido do dia-betes mellitus previne a catarata relacionada a estadoença... Alguns trabalhos sugerem que o uso deestrogênio na pós-menopausa pode reduzir o ris-co de catarata nuclear em mulheres.

III - CATARATA CONGÊNITA

A catarata congênita é uma forma de catarata pre-sente ao nascimento, embora possa se formar ouprogredir até 6 meses de idade. Segundo dadosda OMS, a catarata congênita é uma das causasmais comuns de cegueira ou visão subnormaltratável entre crianças.

Cerca de 1/3 das cataratas congênitas é esporá-dica e muitas delas possuem herança genética,geralmente transmitidas por caráter autossômicodominante. Os 2/3 restantes são associadas a

Fig.7: Facoemulsificação. Enquanto o cirurgião usa umaparelho ultrassônico para dissolver o cistalino doente,uma lente intraocular artificial (acima, à esquerda) é prepa-rada para a substituição.

Fig.6: Aparelho para medira o P.A.M.(Potential Acuity Meter).

Atualmente, existem diversos tipos de lentes intraocularesartificiais, feitas de materiais como PMMA (polimetilmeta-crilato), acrilase e as siliconadas. Em 1998, o FDA aprovouum tipo de lente intraocular do tipo multifocal, para corrigirpelo menos parcialmente a presbiopia pós-operatória. Len-tes com proteção contra UV e luz azul também já foram apro-

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CAPÍTULO 3 - CATARATA 37

doenças infecciosas do grupo TORCH (causa pre-dominante no Brasil), especialmente a rubéola con-gênita, metabólicas (galactosemia, hipoglicemia),trissomias (síndrome de Down, Pateau ou Edward),e outras doenças (hiperplasia persistente primáriado vítreo, distrofia miotônica, lenticonus posterior,etc.). A síndrome de Marfan não está associada àcatarata congênita, mas sim à ectopia ou desloca-mento do cristalino... De uma forma geral, as catara-tas esporádicas tendem a ser unilaterais; e as se-cundárias, bilaterais.

O grande problema da catarata congênita é o riscode ambliopia, especialmente quando unilateral, talcomo acontece no estrabismo congênito permanen-te e nos altos distúrbios de refração congênitos.

Mas o que é ambliopia? Conhecida popularmentecomo “olho preguiçoso”, a ambliopia é um mecanis-mo neurológico desencadeado por uma importantediferença acuidade visual entre os dois olhos em cri-anças de até 6 anos de idade. Durante os seis primei-ros anos de vida, as estruturas de percepção visualdo sistema nervoso central (córtex visual dos lobosoccipitais e corpos geniculados laterais do tálamo)apresentam uma exuberante aquisição de informa-ções provenientes da visão. Quando um dos olhospossui significativa queda da acuidade visual, porqualquer mecanismo (reversível ou não), as informa-ções não chegam sistema visual central, impedindode se desenvolver e permitindo que se torne atrofiado.A visão no olho melhor acentua este mecanismo,convertendo toda informação visual para um só ladodo encéfalo. Se a visão no olho ruim não for corrigi-da até 3 anos de idade, este olho nunca mais teráuma visão totalmente normal, e se a correção nãoocorrer até os 6 anos de idade, o déficit visual nesteolho será grave, podendo chegar a amaurose. Aambliopia, apesar de ser mais comum em criançascom déficit visual monocular ou assimétrico, podede fato ocorrer em crianças que nascem com gravedefeito visual bilateral simétrico.

A catarata congênita não corrigida precocementeacarreta ambliopia, sendo unilateral, bilateral assi-métrica ou bilateral simétrica. Entretanto, esta com-plicação é mais acentuada nos casos unilaterais ebilaterais assimétricos, bem como nos casos commenor acuidade visual no pior olho e quando a cor-reção é feita num período tardio. Daí a extrema ne-cessidade de se fazer o diagnóstico o mais preco-cemente possível, de preferência no recém-nasci-do!! Algumas vezes, ao nascimento a catarata não édetectada por ser muito incipiente; neste caso, sehouver progressão, a doença poderá ser diagnosti-cada nos próximos meses de vida, quando se torna-rá prontamente visível.

A suspeita diagnóstica é feito pela inspeção com aluz de um oftalmoscópio, mantido a 20 cm dos olhosda criança (este exame é obrigatório e rotineiro emtodo o recém-nascido!!!). A confirmação se dá peloexame da lâmpada de fenda (FIGURA 8), tal como noadulto. Alguns sinais associados eventualmente ácatarata congênita são: nistagmo, microftalmia e al-terações na fundoscopia.

Exceto nos casos de catarata leve e não progressi-va (sem acarretar importante perda da acuidadevisual), o tratamento é sempre cirúrgico, com a re-tirada do cristalino opacificado. O método maisempregado é a lensectomia com vitrectomia ante-rior (retirada de todo o cristalino e parte anteriordo vítreo). A cirurgia deve ser feita entre 4-6 se-manas de vida (não ultrapassando 12 semanas).Antes da cirurgia, uma bandagem ocular deve serposta no olho de melhor visão, para já começar areverter a ambliopia. Como o olho da criança cres-ce, juntamente com as suas propriedades refrati-vas, a colocação de lentes intraoculares artificiaisdeve contar com as variações futuras. Apesar desteproblema, estudos recentes demonstraram que cri-anças > 6 meses de idade podem ser operadascom a colocação destas lentes, sem maiores pro-blemas (embora alguns oftalmologistas ainda con-siderem a idade mínima de 2 anos). As criançasque operaram catarata e foram deixadas afácicassem cristalino ou substituto precisam utilizar ócu-los para corrigir os consequentes erros refrativos(hipermetropia).

Uma outra consideração é o desenvolvimento deglaucoma secundário à cirurgia de catarata congênita(de mecanismo desconhecido), sendo mais comumquando o procedimento é realizado entes de 4 sema-nas de vida.

Fig.8: Catarata congênita unilateral (olho esquerdo).

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SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

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CAPÍTULO 4 - GLAUCOMA 39

Cap. 4

Glaucoma

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GLAUCOMA

é direcionado da câmara posterior para a câmara an-terior através da pupila. Uma vez na câmara anterior,este líquido é drenado por tecidos do ângulo de fil-tração iridocorneano. Neste local existe uma estrutu-ra denominada rede trabecular (trabeculado córneo-escleral), que acompanha toda a circunferência dajunção iridocorneana em conjunto com mais duasestruturas: o esporão escleral, interpondo-se entrea rede trabecular e a raiz da íris, e o canal de Schlemm,um microvaso de drenagem. O humor aquoso é filtra-do na rede trabecular, ganhando o canal de Schlemm,de onde flui para o plexo venoso episcleral.

Agentes colinérgicos (mióticos), como o colírio pi-locarpina, aumentam a drenagem do humor aquosopor esta via por aumentar a contração do músculociliar e do esfíncter da pupila, provocando tensão doesporão escleral e consequentemente a “abertura”das trabéculas da rede trabecular, deste modo redu-zindo a pressão intraocular. As fibras longitudinaisdo músculo cilar ligam o esporão escleral ao estromacoroide, daí o seu efeito de abertura trabecular. Oesfíncter da íris contrai para provocar a miose pupilar;a pupila miótica traciona a raiz da íris junto ao espo-rão escleral e as trabéculas.

Agentes que provocam midríase, como os colírioscicloplégicos (usados em exames de refração e defundoscopia), podem desencadear uma crise agudade glaucoma em pacientes que apresentam o ângulode filtração anatomicamente pequeno (ângulo fecha-do), provocando grandes aumentos da pressãointraocular!! Este fenômeno não acontece nos indi-

ação da anidrase carbônica, uma enzima intracelularque converte CO

2 + H

2O em H

2CO

3, que prontamente

se dissocia em H+ + HCO3. Agora você também pode

compreender o uso da acetazolamida (Diamox) noglaucoma, um fenômeno geralmente não bem expli-cado nos principais livros texto...A acetazolamida éum inibidor da anidrase carbônica e, portanto, inibea secreção de bicarbonato pelo corpo ciliar, com issoreduzindo a produção de humor aquoso e conse-quentemente a pressão intraocular. As catecolami-nas também influem na regulação da secreção dehumor aquoso pelo corpo ciliar, por mecanismos não-conhecidos. O efeito beta-adrenérgico aumenta en-quanto que o efeito alfa2-adrenérgico reduz a produ-ção de humor aquoso. Não é por acaso que colíriosde beta-bloqueadores e de alfa2-agonistas são utili-zados para reduzir a produção de humor aquoso eassim baixarem a pressão intraocular no glaucoma!!Os alfa2-agonistas também agem aumentando a dre-nagem do humor aquoso (ver adiante)...

Drenagem do Humor Aquoso

Em condições normais, cerca de 80-95% da drena-gem do humor aquoso ocorre no ângulo de filtraçãoiridocorneano, a chamada “via convencional”, e os5-20% restantes por uma “via alternativa”, atravésdo fluxo úveo-escleral.

Via Convencional (ângulo de filtração irido-cor-neano): este mecanismo é fundamental para o en-tendimento do glaucoma e a sua terapia... Observenovamente a FIGURA 1... O fluxo do humor aquoso

I - INTRODUÇÃO

1. Dinâmica do Humor Aquoso e PressãoIntraocular

Observe a FIGURA 1... O globo ocular pode ser se-parado anatomicamente em três espaços fluidos in-tercomunicantes: (1) câmara anterior, que se locali-za entre a córnea e a íris, (2) câmara posterior, locali-zada entre a íris e o plano equatorial do cristalino ecorpo ciliar, e (3) corpo vítreo, entre o cristalino e aretina. O segmento anterior do olho contém as câma-ras anterior e posterior, que se comunicam atravésda pupila e são preenchidas pelo humor aquoso. Entrea câmara posterior e o corpo vítreo também há comu-nicação, através do espaço em volta do cristalino,por onde cruzam as fibras zonulares.

O humor aquoso está em constante renovação, exis-tindo um perfeito equilíbrio entre a sua produção edrenagem.

Produção do Humor Aquoso

O humor aquoso é produzido pelas células do epitélioduplo do corpo ciliar, sendo lançado na câmara pos-terior do olho, entre a íris e o cristalino. As células docorpo ciliar secretam sódio, cloreto e bicarbonato(HCO

3) que carreiam água por mecanismo osmótico.

Cerca de 70% do sódio secretado acompanha a se-creção de bicarbonato que, por sua vez, depende da

Fig.1: Anatomia da câmara anterior e posterior do olho e o fluxo normal de produção e drenagem dohumor aquoso (via convencional e via alternativa).

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víduos com glaucoma de ângulo aberto!São duas as explicações para a crise deglaucoma de ângulo fechado por essasdrogas: (1) afrouxamento da raiz da íris,obstruindo a rede trabecular e (2) bloqueiopupilar: a posição de meia-midríase co-loca a íris em justo contato com cristalino,o que poderia provocar um bloqueio pu-pilar parcial ou total. Este bloqueio difi-culta a passagem do humor aquoso entrea câmara posterior e anterior, criando umgradiente de pressão que desloca a írisanteriormente, provocando a obstruçãodo ângulo de filtração.

Via Alternativa (Úveo-escleral): uma par-te do humor aquoso (5-20%) é drenada sempassar pela rede trabecular, difundindo-seatravés de canais que correm pela raiz daíris e pelo músculo ciliar até alcançar o va-sos da esclera (FIGURA 1). Os análogosda prostaglandina Falfa, como o colírio delatanoprost, aumentam o fluxo do humoraquoso por esta via e atualmente são asdrogas mais usadas no tratamento do glau-coma de ângulo aberto nos EUA...

Pressão Intraocular (PIO)

A pressão intraocular de indivíduos hígi-dos costuma ser de 14 a 16 mmHg, embo-ra a faixa considerada normal seja de 12-21 mmHg. Portanto, o aumento da PIO édefinido quando acima de 21 mmHg. Umdos problemas na confiabilidade da medi-da da PIO é a sua variação circadiana, comníveis maiores de manhã (entre 08h e 11h)e menores de madrugada (entre 0h e 2h).O exame mais usado para medí-la é a to-nometria de aplainação (ver adiante).

Como o globo ocular não pode aumentaro seu volume, o aumento da quantidadede humor aquoso eleva automaticamentea pressão intraocular (PIO) que, por suavez, é transmitida para todo o olho, já queos três espaços fluidos se intercomunicam.Os axônios da papila óptica são bastantesensíveis a este aumento pressórico!!

A quantidade de humor aquoso (e por-tanto a PIO) aumenta no olho sempre quea drenagem deste fluido for inferior à suaprodução. Poderia ocorrer por um aumen-to da produção ou por um comprometi-mento da drenagem. Contudo, na práticao bloqueio da drenagem de humor aquosoé sempre o fator causal! Diversos são osmecanismos de bloqueio da drenagem dohumor aquoso, todos agindo sobre a “viaconvencional”. Esta via pode estar dis-funcionante mas estruturalmente preser-vada, como no glaucoma primário de ân-gulo aberto, ou podem existir importantesalterações estruturais ou anatômicas queobstruem o ângulo de filtração e/ou pro-

vocam bloqueio pupilar, como no glaucoma de ângulo fechado e no glau-coma secundário, quando a PIO pode alcançar valores extremos.

2. Definição de Glaucoma

Ao contrário do que muitos pensam, glaucoma não é simplesmente o au-mento da pressão intraocular. Glaucoma é uma doença de causa desconhe-cida caracterizada pela degeneração dos axônios da papila do nervo óptico,podendo levar à cegueira irreversível. Está na maioria das vezes associa-do ao aumento da pressão intraocular, mas existe uma minoria de casos deglaucoma (em torno de 15%) com pressão intraocular normal... Ou seja, oglaucoma é uma neuropatia da papila óptica. Apesar da relação causa-efeito não ser precisa, é fato consagrado que o aumento da pressãointraocular pode provocar e frequentemente provoca a neuropatia glauco-matosa, especialmente quando esta pressão encontra-se bastante eleva-da. Por conta disso, o tratamento do glaucoma se baseia em medidas parabaixar a pressão intraocular, uma conduta capaz de controlar a doença,evitando que ela progrida.

Anátomo-histologia da Papila Óptica

A papila óptica é uma estrutura em forma de disco, com diâmetro de cercade 1,5 mm, facilmente visualizada pelo exame da fundoscopia. Representaa origem do nervo óptico, sendo formada pela convergência de todos os

Fig.2: Anátomo-histologia da papila e nervo ópticos (visão longitudinal):normal versus glaucoma.

axônios (fibras desmielinizadas) das célu-las ganglionares da retina (cerca de 1 mi-lhão). Ao ganhar a região da papila, osaxônios curvam-se para trás a 90o, cruzan-do a lâmina cribiforme da esclera (uma es-trutura fenestrada), quando se tornam fi-bras mielinizadas para formar os feixes queirão compor o nervo óptico (FIGURA 2).

O glaucoma causa uma degeneração dosaxônios das células ganglionares na papilaóptica, antes de cruzarem a lâmina cribi-forme, provocando a morte desses neu-rônios. A papila torna-se tipicamente es-cavada e afilada, deformando a lâmina cri-biforme que pode eventualmente apare-cer no exame fundoscópico (FIGURA 2).

Tipos de Glaucoma

O glaucoma é classificado em quatro ti-pos, na verdade, quatro entidades clíni-cas diferentes:

- Glaucoma primário de ângulo aberto(mais comum)- Glaucoma agudo de ângulo fechado- Glaucoma secundário- Glaucoma congênito.

Estas entidades serão discutidas separa-damente neste Capítulo...

II - GLAUCOMA PRIMÁRIO DE ÂNGULO ABERTO

O glaucoma primário de ângulo aberto(GPAA) é a forma mais comum de glauco-ma no Mundo e no Brasil, sendo respon-sável por 90% de todos os casos de glau-coma. É uma doença crônica de causa des-conhecida, definida pela presença de qua-tro elementos em conjunto: (1) neuropatiaglaucomatosa, confirmada por alteraçõesclássicas na fundoscopia e estudo docampo visual, (2) “ângulo aberto”, refe-rindo-se à ausência de alterações estru-turais obstrutivas no ângulo de filtraçãodo humor aquoso, (3) ausência de causassecundárias, (4) início da fase adulta.

A GPAA é uma patologia de evolução in-sidiosa, quase sempre bilateral, emborageralmente assimétrica. É assintomáticanas fases iniciais, exigindo consultas pre-ventivas no oftalmologista para o seu di-agnóstico precoce pois, caso contrário, osurgimento dos primeiros sintomas jápode significar uma perda irreversível degrande parte da visão.

1. Epidemiologia

O glaucoma de ângulo aberto é a segun-da causa de cegueira entre adultos no

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CAPÍTULO 4 - GLAUCOMA 43

Mundo, perdendo apenas para a catarata, sendo estaúltima uma causa de cegueira curável. Como infeliz-mente este não é o caso do glaucoma, a doença podeser considerada a causa mais comum de cegueirairreversível no Mundo. Os mesmos dados valem parao nosso meio...

Estima-se uma prevalência da doença de 1-3%. Sãoquatro os principais fatores de risco do glaucoma deângulo aberto: aumento da pressão intraocular, ida-de avançada, raça negra e história familiar positiva(Tabela 1).

Em relação à pressão intraocular (PIO), cerca de 85%dos pacientes com GPAA apresentam PIO > 21 mmHg(geralmente entre 25-45 mmHg), sendo os 15% res-tantes com pressão intraocular normal, ao que cha-mamos de glaucoma com pressão normal!! Pelo fatode não estar sempre presente o seu aumento, a PIOelevada passou a ser considerada um fator de riscoe não um determinante da doença! A enxaqueca podeser um fator de risco para o glaucoma com pressãonormal, postulando-se um mecanismo vasoespásticopara a isquemia da papila óptica...

Indivíduos com PIO elevada mas sem lesão glauco-matosa apresentam um “glaucoma suspeito”. Em-bora o risco de glaucoma seja bem maior neste grupodo que em pessoas com PIO normal, apenas um ter-ço (30-40%) deles evolui para glaucoma ao longodos próximos anos, numa taxa de 1% por ano. Estu-dos demonstram que quanto maior a PIO média dopaciente, maior a chance de ele desenvolver o glau-coma. Ou seja, dois terços (60-70%) das pessoascom PIO elevada sem lesão glaucomatosa não evo-luirão para glaucoma ao longo dos próximos 10 anos.Estima-se em 10% a prevalência de PIO elevada napopulação acima de 40 anos.

Em relação à idade, estudos americanos mostram umaprevalência de glaucoma de menos de 1%, 1% e 3%,respectivamente, nas faixas etárias < 65 anos, entre65-75 anos e acima dos 75 anos. Estes percentuaissão 5x maiores na população da raça negra!

Os corticoides oculares tópicos são fatores de riscomais importantes para o glaucoma do que os corti-coides sistêmicos. A pseudo-exfoliação da íris é uma

condição na qual um material algodonoso é deposi-tado no segmento anterior do olho, obstruindo a redetrabecular. O diabetes mellitos e a hipertensão arteri-al são fatores de risco possíveis, mas não comprova-dos para glaucoma, pois a relação foi demonstradaem estudos baseados em dados hospitalares e nãopopulacionais. Há de fato uma relação estatística en-tre hipertensão arterial e aumento da PIO, mas nãonecessariamente entre hipertensão arterial e glauco-ma. A pressão de perfusão ocular diastólica é deter-minada pela diferença entre os componentes diastó-licos da pressão arterial sistêmica e da pressãointraocular (PA dist – PIO diast). Uma redução destapressão de perfusão pode provocar isquemia dapapila óptica sendo, portanto, também um fator derisco para glaucoma. No hipertenso, esta relação ten-de a se manter constante.

2. Patogênese

A patogênese do GPAA não é conhecida. Contudo,atualmente se sabe que a neuropatia glaucomatosa émultifatorial. O efeito mecânico da PIO sobre as fi-bras axonais da papila óptica é sem dúvida um fatorimportante. No glaucoma, parece haver uma susceti-bilidade maior dos axônios da papila ao efeito daPIO. Existem indivíduos que só desenvolverão a le-são glaucomatosa com PIO muito alta enquanto ou-tros farão a lesão mesmo com a PIO levemente eleva-da ou até na faixa normal. A suscetibilidade da papilaóptica ao glaucoma é um mecanismo pouco compre-endido, mas a hipótese mais aceita é de que existeum comprometimento microvascular, levando à is-quemia crônica da papila, fator bastante relacionadocom a idade. Outro mecanismo descrito é o bloqueiodo fluxo axoplasmático (por dentro do axônio) defatores tróficos para o corpo da célula ganglionar,que morreria por apoptose. Em alguns pacientes, umavez instalada a neuropatia glaucomatosa, o proces-so pode se autoperpetuar, mesmo com a redução te-rapêutica da PIO (especialmente quando a lesão foravançada!). Mecanismos propostos para este fenô-meno são a liberação de neurotransmissoresexcitotóxicos (glutamato) e de óxido nítrico (NO) nolocal da lesão inicial. Estas substâncias induziriam àmorte de mais axônios por apoptose.

O aumento da PIO no GPAA costuma ser leve a mo-derado. O mecanismo parece ser uma degeneraçãoda rede trabecular, ao lado de proliferação endoteliale edema, com consequente redução da drenagem dohumor aquoso. O depósito de fatores da matrizextracelular na rede trabecular talvez seja o fator maisimportante.

3. Manifestações Clínicas

O grande problema do GPAA é o fato do pacientenão apresentar queixa visual alguma durante as fa-ses iniciais da doença. Ou seja, já apresenta aneuropatia da papila óptica, porém, a perda visualnão é grande o suficiente para que o paciente noteproblemas na sua visão. Isso vem dos seguintes fa-tores: (1) não há sintomas oculares do tipo dor, des-conforto, etc., (2) o comprometimento ocular, embo-ra seja bilateral, geralmente é assimétrico (com um

olho enxergando bem, o paciente não percebe o dé-ficit visual no olho pior!), (3) a principal visão com-prometida é a periférica, que é menos utilizada para acompreensão da imagem, (4) a doença progride insi-diosamente (o glaucoma de ângulo aberto é “um as-sassino silencioso do olho”). Quando o paciente per-cebe que a sua visão está comprometida, geralmentejá existe um grande déficit visual irreversível. Daí aextrema necessidade de se fazer os exames de tria-gem no oftalmologista, especialmente nos indivídu-os que apresentam fatores de risco.

Na FIGURA 3 podemos perceber a evolução do défi-cit visual do glaucoma de ângulo aberto. Primeirosurgem escotomas na periferia do campo visual, de-pois há perda da visão periférica até a completatunelização visual.

4. Tonometria (medida da PIO)

A tonometria deve ser um exame rotineiro em todaconsulta oftalmológica. Uma PIO > 21 mmHg, comovimos, é um importante fator de risco para glaucoma.No entanto, nunca podemos confiar apenas nesteexame para fazer uma adequada triagem para o GPAA,pois a PIO de um indivíduo é um parâmetro bastantevariável no tempo e além disso, existe o glaucoma depressão normal. Estes fatores justificam o encontrode uma PIO normal numa primeira avaliação em até50% de portadores de GPAA! Como veremos adian-te, os exames para diagnosticar o glaucoma de ângu-lo aberto são diferentes da tonometria e devem ser

Principais fatores (clássicos):1- Aumento da pressão intraocular (>21 mmHg)2- Brancos > 65 anos3- Negros > 40 anos4- História familiar positiva (parente de 1º grau)Outros fatores:5- Corticoides

- Sistêmicos (>15 mg/dia de prednisona)- Inalatórios em altas doses- Colírio de corticoide (principal)

6- Diabetes mellitus7- Hipertensão arterial8- Baixa pressão de perfusão ocular diastólica9- Miopia de alto grau10- Pseudo-exfoliação

Tabela 1: Fatores de risco para glaucoma primário deângulo aberto.

Fig.3: Fases da visão no glaucoma primário de ângu-lo aberto.

Visão Normal

Fase precoce do glaucoma

Fase intermediária do glaucoma

Fase avançada do glaucoma

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realizados não somente naqueles com PIO> 21 mmHg,mas também em qualquer indivíduo que pertença aogrupo de risco (independente da PIO)...

É importante relembrar que o paciente que possuiPIO elevada, mas sem glaucoma confirmado, podeser considerado como “glaucoma suspeito”.

Existem vários métodos de tonometria, embora o maisutilizado e confiável seja a tonometria de aplanação.

Este método se baseia no princípio da lei de Imbert-Fick, na qual a pressão no interior de uma esfera podeser precisamente determinada quando se exerce umaforça sobre a sua superfície, capaz de produzir umaárea de aplanamento. A pressão pode ser obtida pelocálculo P = F/A, sendo F = força exercida e A = área deaplanamento. O instrumento mais usado na prática é otonômetro de Goldmann (FIGURA 4A). Este apare-lho é munido com dois biprismas de plástico na pontaque ao tocar a córnea do paciente produzem semicírcu-los visualizados pelo examinador com a luz azul, atra-vés da lâmpada de fenda. Quando a córnea á aplanada,os semicírculos se unem formando um círculo, momentono qual pode ser lida a PIO. O exame é realizado apósaplicar no olho um colírio anestésico e um colírio defluoresceína. Com o paciente sentado e a cabeçaacoplada a uma lâmpada de fenda, o aparelho é tocadocuidadosamente em sua córnea, enquanto o examinadora observa utilizando a luz azul. Na união dos semicírcu-los é feita a leitura. Outro aparelho que usa o mesmoprincípio da aplanação é o Tono-Pen (FIGURA 4B), uminstrumento portátil, em forma de caneta, que ao serencostado na córnea do paciente, faz a leitura automa-ticamente.

O método mais antigo de tonometria, ainda utilizadopor alguns é a tonometria de identação, utilizando otonômetro de Schiotz (FIGURA 5). É um aparelhoportátil de baixo custo, que se baseia em princípios

Fig.4: Tonometria de aplanação. Fig.4A:tonômetro de Goldman. Fig.4B: Tono-Pen.

Fig.4A

Tonômetro de Goldmann

Tono-Pen

Fig.4B

Fig.5: Tonometriade identação:tonômetro deSchiotz.

Fig.6: Fundoscopia no glaucoma.

Papila ópticaglaucomatosa

avançadaobserve a escavação

(setas)

Papila ópticaglaucomatosa

avançadaobserve a escavação e

o aspecto da lêminacribiforme

Glaucoma (escavação)

Papila normal

Oftalmoscopia diretal

mecânicos, calculando a PIO indiretamente pelo graude identação da córnea após aplicação de um pesode 5,5g. O exame precisa ser feito obrigatoriamentecom o paciente em decúbito dorsal. Este método émenos confiável que a tonometria de aplanação,embora seja mais disponível e interessante para ternas emergências hospitalares (ver adiante em Glau-coma de Ângulo Fechado)!

5. Diagnóstico e Triagem

Como vimos, o diagnóstico do glaucoma não podeser feito pela tonometria, pois a elevação da PIO éapenas um fator de risco e não um definidor de doen-ça e além disso a PIO pode ser normal em indivíduoscom glaucoma. Os exames de escolha para o diag-nóstico do glaucoma são: (1) estudo da morfologiada papila óptica (fundoscopia ou oftalmoscopia), (2)estudo do campo visual (perimetria). Estes são osprincipais exames para a triagem diagnóstica para oglaucoma de ângulo aberto!!

Quem são os indivíduos com indicação de triagem?

A princípio, são aqueles que possuem PIO > 21 mmHgna tonometria ou algum fator de risco importante paraGPAA. Veja na Tabela 2 as indicações de exames detriagem para glaucoma. A presença de pelo menosuma delas já indica a avaliação! Quando negativospara glaucoma, a repetição dos exames deve ser rea-lizada periodicamente.

com o diâmetro total da papila (relação escavação-papila). Este achado pode ser facilmente visualizadopor um oftalmologista treinado. Na escavação papilar,eventualmente pode ser notada a lâmina cribiforme...

Estudo do Campo Visual (Perimetria): a perimetriaé um exame capaz de avaliar o campo visual de cadaolho de forma precisa. Este exame somente demons-trará alterações nos pacientes com perda de mais de40% das fibras do nervo óptico, não devendo, por-tanto, ser utilizado de forma isolada na avaliação doglaucoma... Atualmente, dois métodos têm sido utili-zados: (1) perimetria manual de Goldmann e (2)

1- Aumento da pressão intraocular (> 21 mmHg)2- Brancos > 65 anos3- Negros > 40 anos4- História familiar positiva (parente de 1º grau)5- Diabetes mellitus6- Miopia de alto grau

Tabela 2: Indicações de se realizar triagem (perimetria efundoscopia) para glaucoma de ângulo aberto

Fundoscopia (Oftalmoscopia): este é o exame inici-al obrigatório na avaliação do glaucoma, sendo emseguida complementado pelo estudo do campo vi-sual. Pode ser feito por maio da oftalmoscopia direta(FIGURA 6) ou indireta (ver capítulo de Retinopatias).As alterações aparecem antes de ocorrerem déficitsno campo visual detectáveis na perimetria... O acha-do clássico é a escavação no centro da papila óptica(FIGURA 6), que deve ser mensurada e comparada

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CAPÍTULO 4 - GLAUCOMA 45

perimetria computadorizada de Humphrey. Para o di-agnóstico do glaucoma, a preferência é a para o se-gundo método. O paciente sentado olha através doaparelho (um olho de cada vez), focalizando volun-tariamente a sua visão em um alvo fixo (FIGURA 7).Pontos luminosos aparecerão piscando em diversasporções do campo visual e cada vez que o pacienteenxergá-los, deve apartar um botão. O computadorfaz a leitura. Na presença de glaucoma, o exame irárevelar defeitos no campo visual característicos des-ta doença (FIGURA 7), tais como degrau nasal, es-cotoma paracentral, escotoma de Siedel, escotomaarqueado, etc.

Como avaliar o ângulo írido-corneano?

Além de diagnosticar o glaucoma, é importante sa-ber se realmente é um glaucoma de ângulo aberto.

tipos de substâncias com este efeito (beta-bloquea-dores, análogos de prostaglandinas, alfa2-agonis-tas, inibidores da anidrase carbônica e colinérgicos).A droga de escolha para iniciar o tratamento é ocolírio de beta-bloqueador, na ausência de contrain-dicações. Se a PIO alvo não for atingida, deve-seassociar outra droga ou trocar. A terapia tópica com-binada possui um excelente efeito em pacientes nãocontrolados pela terapia isolada. Uma estratégia muitoutilizada é iniciar a administração da droga tópica emum só olho, observando-se a PIO neste olho ficarásignificativamente menor que no outro olho, provan-do que a queda da PIO foi realmente o efeito da dro-ga e não uma variação espontânea... Uma vez com-provada a eficácia, a droga deve ser aplicada emambos os olhos!

Um problema que afeta os clínicos é o fato da maioriadas substâncias usadas em colírios para tratar o glau-coma terem alguma absorção sistêmica, podendoprovocar efeitos adversos. A explicação é que umaporção variável do fármaco é absorvida pelo ductonasolacrimal, ganhando o plexo nasal e a circulaçãosistêmica. Uma forma de atenuar este problema é ori-entando o paciente para ocluir o ducto nasolacrimalpor 5 minutos, com pressão digital ou oclusão palpe-bral, após pingar o colírio.

Beta-bloqueadores: os beta-bloqueadores são asdrogas de escolha no GPAA, pela sua tradição e efi-cácia comprovada. Reduzem em média 30% da PIO,por reduzir a produção de humor aquoso no corpociliar. Em nosso meio, dispomos dos colírios detimolol 0,25-0,5% 2x/dia (Timolol), levobunolol 0,25-0,5% 2x/dia (Betagan) e o betaxolol 0,5% 2x/dia(Betoptic). Existe o timolol gel ocular 0,5% 1x/dia. Otimolol e o levobunolol são beta-bloqueadores não-seletivos (bloqueio beta1 e beta2), enquanto que obetaxolol é um beta-bloqueador beta1-seletivo. Es-sas drogas possuem ótima tolerância ocular, porémpodem acarretar efeitos adversos sistêmicos, comobroncoespasmo, bradicardia, hipotensão arterial,descompensação da insuficiência cardíaca e dislipi-demia. São contra-indicados em indivíduos asmáti-cos moderados a graves ou com bradiarritmia ou comICC descompensada!! O médico deve estar atento,pois um dia pode se deparar com um paciente emcrise asmática, sem razão aparente, quando na ver-dade, o culpado foi o colírio de beta-bloqueador.

Análogos da prostaglandina: são agonistas dosreceptores da PGFalfa e agem aumentando a drena-gem do humor aquoso pela via alternativa (úveo-escleral). Atualmente são as mais usadas no trata-mento do GPAA nos EUA... Os consensos reco-mendam essas drogas em pacientes cujo glaucomanão foi devidamente controlado por beta-bloque-daores ou quando estes são contra-indicados ounão tolerados. Ou seja, são as drogas de segundaescolha no GPAA. A grande vantagem é a posologia(1 aplicação ao dia em cada olho) e a raridade deefeitos adversos. O grande problema é o seu altocusto. Efeitos estéticos na íris e nos cílios podemser observados em 10% dos casos: escurecimentoda íris (a cor castanho-azulada ou castanho-esver-deada pode se converter em cor castanho puro e

Perimetrianormal

Escotoma arqueadocom degrau nasal

Fig.7: Perimetria no glaucoma (em graus progressivos).Obs.: O ponto cego é um achado normal em todo examede perimetria, pois ele corresponde à área da papilaóptica, que não possui nem cones nem bastonetes (cé-lulas visuais).

Pontocego

Escotomaarqueado

Pontocego

Tunelização

Pontocego

Escotoma paracentrale periférico

Pontocego

Escotoma periféricocom degrau nasal

Pontocego

Perimetria computadorizada de Humphrey.

Pontocego

Fig.8: Gonioscopia no glaucoma.Observe a técnica (acima), neste caso utilizando-sea lente de Zeiss. Observe (abaixo) uma gonioscopianormal (ângulo aberto).

Para isso, utilizamos a gonioscopia (FIGURA 8), exa-me que mostrará uma medida normal do ângulo írido-corneano (FIGURA 8).

6. Tratamento

Embora o glaucoma seja causado por fatores vascu-lares e metabólicos da papila óptica, até o momentonão existem medidas eficazes que agem diretamentesobre tais fatores. A única forma de tratamento dis-ponível para o GPAA é a redução da PIO. Estudosrandomizados, como o EMGT (Early Manifesta Glau-coma Trial) e outros, publicados recentemente (2002),demonstraram que a redução farmacológica da PIOrealmente estabiliza a doença, prevenindo a sua pro-gressão. Em geral, a cada queda de 1mmHg na PIO,há uma redução de 9% no risco de progressão doglaucoma... A PIO alvo deve ser individualizada emcada paciente, geralmente uma redução de 20-40%em relação à PIO anterior. Durante o tratamento, opaciente deve ser acompanhado com tonometria, fun-doscopia e perimetria. Se a redução inicial da PIOnão estiver prevenindo a evolução da lesão glauco-matosa, uma nova PIO alvo deve ser estabelecida. Opaciente deve ser acompanhado a cada 3-4 meses (2-4 semanas inicialmente nos casos de PIO muito ele-vada). Não se pode perder de vista que o objetivofinal do tratamento do GPAA é estabilizar a lesãoglaucomatosa, contendo a sua progressão!! Infeliz-mente, a visão que já foi perdida não pode ser maisrestaurada...

Tratamento Farmacológico

O paciente com GPAA deve sempre receber inicial-mente tratamento farmacológico, com medicaçõestópicas (colírios) redutores da PIO. Existem diversos

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mais escuro) e espessamento, alongamento e hi-perpigmentação dos cílios. Em nosso meio dispo-mos do latanoprosta 0,005% 1x/dia (Xalatan), in-cluído em estudos randomizados, travoprosta(Travatan), bimatoprost (Lumigan) aprovados peloFDA e já amplamente utilizados no Brasil, e uno-prostone (Rescula).

Alfa2-agonistas: são análogos da clonidina queagem reduzindo a produção de humor aquoso pelocorpo ciliar e aumentando a drenagem do mesmo pelavia convencional. Produzem poucos efeitos colate-rais, embora eventualmente causem boca seca,retração palpebral ou reações alérgicas, como a con-juntivite papilar e dermatite de contato. Em nossomeio estão disponíveis: apraclonidina 0,5% 3x/dia(Iopidine), brimonidina 0,15% 3x/dia (Alphagan),esta com menos efeitos alérgicos, porém mais cara.O colírio de dipivefrina é uma pró-droga da epinefrina(adrenalina), um alfa-beta-agonista com efeitos ocu-lares semelhantes aos alfa2-agonistas. Esta pró-dro-ga é convertida em epinefrina pelas células da cór-nea, aumentando o efeito ocular e reduzindo os efei-tos sistêmicos da epinefrina. A dipivefrina possuiefeito antagônico com os beta-bloqueadores, o temreduzido o seu uso no GPAA.

Inibidores da anidrase carbônica: houve uma épo-ca em que se tratava GPAA com acetazolamida(Diamox) via oral; contudo, esta droga possui efei-tos adversos que a tornou obsoleta para este intui-to. Entretanto, foram criados os inibidores da anidra-se carbônica tópicos, sob a forma de colírios, que semostraram drogas adequadas para o tratamento doGPAA. Agem reduzindo a produção de humor aquo-so pelo corpo ciliar por inibir a secração de bicarbo-nato. Dispomos em nosso meio dos seguintesfármacos: dorzolamida 2% 3x/dia (Trusopt) ebrinzolamida 1% 3x/dia (Azopt).

Colinérgicos (mióticos): foram as primeiras drogastópicas utilizadas no tratamento do glaucoma, desde1870 e são as mais baratas do mercado. Como vimosno início deste capítulo, agem por aumentar a drena-gem do humor aquoso pela via convencional, aocontrair o músculo ciliar e o esfíncter da íris (miose),tracionando o esporão escleral e abrindo a rede tra-becular. No mercado existe a boa e conhecida de to-dos, a pilocarpina 1-2% 3-4x/dia (Pilocarpina, Isop-tocarpine). O grande problema do colírio colinérgi-co é induzir a miopia, por manter o músculo ciliarcontraído e, portanto, o cristalino persistentementeacomodado para visão de perto. Com isso, a visãopara longe mantém-se desfocada (miopia). Outro pro-blema é estético: o paciente passa a apresentar pupi-las mióticas não responsivas...

Marijuana: a substância da marijuana (“maconha”),o tetraidrocanabinol, parece ter efeitos de baixar aPIO. Foram criados canabinoides tópicos em colírio,utilizados em alguns países para tratar GPAA. Entre-tanto, os resultados dos estudos randomizados atéo momento foram conflitantes, bloqueando a apro-vação destes produtos pelo FDA. O uso sistêmicoda marijuana é contraindicado pelos seus efeitosadversos deletérios.

Fig.9: Trabeculoplastia a laser.

Tratamento Intervencionista

Dois tipos de tratamento intervencionista têm sidoutilizados no tratamento do GPAA: trabeculoplastiaa laser e trabeculectomia cirúrgica. A intervenção noGPAA é indicado nas seguintes situações: (1) a PIOalvo não foi atingida com a farmacoterapia otimizada,(2) a lesão glaucomatosa continua a progredir, mes-mo quando a PIO alvo foi atingida com a farmacote-rapia, (3) intolerância à terapia farmacológica.

Trabeculoplastia a Laser de Argônio: é realizadacom colírio anestésico, através de uma fonte de laserde argônio focada no ângulo iridocorneano por umalente refletora (FIGURA 9). O efeito do laser é “abrir”anatomicamente a rede trabecular, facilitando a dre-nagem do humor aquoso. São várias aplicações delaser, até cobrir meia circunferência da junção irido-corneana. O procedimento é extremamente seguro eassintomático, tendo bons resultados em baixar aPIO a curto e médio prazo, mas o seu grande proble-ma é que o efeito costuma durar apenas 3-5 anos. Acirurgia possui melhor eficácia em pacientes comolhos mais escuros (íris mais pigmentada) e no glau-coma secundário à síndrome da pseudo-exfoliaçãoou à síndrome de dispersão pigmentar. Atualmente,alguns oftalmologistas o indicam como terapia inici-al do GPAA em pacientes que não desejam ou têmdificuldades com a aplicação regular dos colírios anti-glaucoma...

Trabeculectomia cirúrgica (Cirurgia de filtragemantiglaucoma): está indicada nos casos refratáriosa todas as demais modalidades de terapia não-cirúr-gica (incluindo os casos relativamente comuns derecorrência após a laserterapia) ou em pacientes queprecisam operar catarata (cirurgia combinada glau-coma-catarata). Alguns oftalmologistas preferem atrabeculectomia como procedimento inicial, ao invésda laserterapia... Esta cirurgia é realizada no centrocirúrgico, com anestesia local peribulbar e com o pa-ciente sedado. O objetivo é criar um canal alternati-vo de drenagem do humor aquoso entre a câmara

anterior e um “novo” espaço criado entre a esclera ea conjuntiva (“bolha de filtração”), de onde o líquidoganha facilmente a circulação venosa.

Acompanhe a técnica cirúrgica pela FIGURA 10...Com um fio de sutura tracionando a córnea superior-mente, o cirurgião injeta uma solução balanceada noespaço subconjuntival para a incisão da conjun-tiva,expondo a esclera. Em seguida, é levantado umretalho quadrangular da esclera, após o qual é resse-cado um bloco de tecido córneo-escleral e um peque-no fragmento triangular da íris (iridectomia), criandoum canal de drenagem para o humor aquoso. O cirur-gião conclui a cirurgia fechando o retalho escleral compontos de sutura separados depois e suturando a con-juntiva com pontos próximos. A “bolha de filtração” foicriada. Durante a cirurgia, são injetados antibióticose corticoides tópicos.

O paciente deve ser obrigatoriamente revisto nos pri-meiros 2 dias pós-operatórios, para a avaliar a neces-sidade de nova intervenção. Se houver sinais de baixafiltração (PIO elevada, bolha achatada), deve ser apli-cado laser para aumentar a drenagem pelo retalhoescleral (lise de sutura por laser). As primeiras 2semanas também exigem acompanhamento rigoroso.Colírios de antibiótico e corticoide devem ser utiliza-dos por 2 meses, para garantir um boa cicatrização,essencial para o funcionamento ideal da “bolha de fil-tração”. Nos casos em que o cirurgião antecipa umabaixa filtração pós-operatória, durante a cirurgia, deveser aplicado no espaço subconjuntival um agenteantimitótico tópico (5-fluoracil ou mitomicina-C).Estas substâncias inibem a fibrose local e melhoram oresultado cirúrgico. Com o uso desses agentes, a lisede sutura por laser, quando indicada, deve ser realiza-da tardiamente (primeiras 2 semanas para o 5-FU eprimeiros 2 meses para a mitomicina-C). As complica-ções da trabeculectomia cirúrgica são infrequentesquando realizada por cirurgião experiente. Existem di-versas complicações possíveis e a sua discussão estáfora do escopo deste compêndio...

Glaucoma com pressão normal

Como vimos, o glaucoma de pressão normal respon-de por 15% dos pacientes com GPAA. Estudos re-centes demonstraram que baixando a PIO em tornode 30% (mesmos recursos terapêuticos do GPAAcom PIO elevada) reduziu a progressão da lesão glau-comatosa, embora no grupo controle (sem tratamen-to), 2/3 dos pacientes evoluíram sem progressão.

Glaucoma suspeito (PIO elevada sem lesão glau-comatosa)

Um grande estudo randomizado (OHTS ou OcularHYpertension Treatment Study) está em andamentopara verificar a melhor conduta nos pacientes comglaucoma suspeito, que perfazem 10% da populaçãoacima de 40 anos. Na prática, as indicações de baixara PIO (para menos de 21 mmHg) no glaucoma sus-peito são: (1) pelo menos um fator de risco importan-te para GPAA (raça negra, história familiar positiva,uso prévio de corticoide, etc.), (2) oftalmopatias dealta predisposição ao glaucoma (miopia de alto grau,pseudo-esfoliação, trauma ou cirurgia ocular prévi-os, uveíte prévia, síndrome da dispersão pigmentaretc.), (3) PIO > 30 mmHg.

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CAPÍTULO 4 - GLAUCOMA 47

III - GLAUCOMA PRIMÁRIO DE ÂNGULO FECHADO

O glaucoma primário de ângulo fechado (GPAF) re-presenta cerca de 10% dos adultos com glaucomaidiopático, sendo definido pela presença de um ân-gulo iridocorneano (ângulo de filtração) estreito navigência da lesão neuropática glaucomatosa. O GPAFé uma entidade clínica totalmente diferente do GPAA,tanto nos aspectos clínicos como terapêuticos. Oângulo estreito é decorrente de alterações anatômicasque aproximam a raiz da íris da córnea, o que podecomprometer estruturalmente a drenagem do humoraquoso pela rede trabecular.

Como veremos, o GPAF pode se manifestar de formaaguda (considerada uma emergência médica), suba-guda ou crônica. Via de regra, a PIO está significati-vamente elevada, sendo este o grande fator defla-grador da lesão glaucomatosa.

1. Epidemiologia

O GPAF predomina na faixa etária entre 55-70 anos.Em adultos da raça branca, a prevalência acima de 40anos está em torno de 0,1%. Nos asiáticos e nosesquimós, a prevalência deste tipo de glaucoma émuito maior, atingindo cifras entre 2-5%. A Tabela 3lista os principais fatores de risco para o GPAF.

Fig.10: Trabeculectomia cirúrgica.

1- Ângulo iridocorneano estreito (constitucional)2- Idade > 40 anos3- Sexo feminino (3:1)4- Asiáticos5- Esquimós6- História familiar positiva (parente de 1o grau)7- Hipermetropia8- Diabetes mellitus9- Íris plateau10- Pseudo-esfoliação

Tabela 3: Fatores de Risco para o GPAF.

O sexo feminino, a etnia asiática ou dos esquimós ea hipermetropia são fatores relacionados com umacâmara anterior rasa, determinando maior probabi-lidade de um ângulo iridocorneano constitucional-mente estreito. Na hipermetropia, isto vem do fatodo olho apresentar um diâmetro ântero-posteriorpequeno.

É importante compreender que nem todo pacientecom ângulo iridocorneano estreito (um problemaconstitucional) terá glaucoma de ângulo fechado...Isto é apenas um fator de risco. Por exemplo, cercade 2-8% da população possui um ângulo iridocor-neano estreito e somente 5% destes indivíduos de-senvolverão glaucoma de ângulo fechado! Dizemosque um ângulo estreito é um ângulo “fechável”, ouseja, tem um potencial para glaucoma...

A idade avançada cursa com alterações estruturaisdo cristalino, tais como aumento de sua espessura,aumento da curvatura anterior e leve deslocamento

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anterior. Estas alterações aproximam o cristalino daíris, um mecanismo que pode induzir ao bloqueiopupilar em pacientes predispostos (mecanismo queserá abordado a seguir...).

2. Patogênese

Bloqueio pupilar

O principal mecanismo mais comum do GPAF é obloqueio pupilar. Este fenômeno geralmente ocorreapós os 50 anos de idade em indivíduos predispos-tos, ou seja, que nasceram com uma câmara anteriorestreita. Este tipo de anatomia coloca a íris mais pró-xima do cristalino. Como a espessura do cristalinoaumenta com a idade, esta estrutura pode encostardemais na íris, dificultando a passagem do humoraquoso pela pupila. O acúmulo inicial de líquido nacâmara posterior forma um gradiente de pressão queempurra a íris para frente (“íris bombe”), estreitandoainda mais o ângulo írido-corneano (FIGURA 11).

Apesar da alteração anatômica, estes pacientes fre-quentemente apresentam PIO normal... Porém, ficampropensos à crise de fechamento total do ângulo defiltração, desencadeando a crise aguda de glaucoma(glaucoma agudo de ângulo fechado). Esta crise ge-ralmente é precipitada por situações que provocam ameia-midríase (3,5-4 mm). Entre elas, estão o estresseemocional, a meia-luz (ex.: cinema, teatro, restau-rante, etc.) e a aplicação de colírios cicloplégicos(midriáticos) utilizados para exames de fundosco-pia ou de refração. Durante o sono, a as pupilasficam mióticas, não sendo portanto um fator desen-cadeante... Após a aplicação do colírio, o pacientefaz uma midríase máxima (sem risco para fechar oângulo), porém, durante a recuperação (uma a algu-mas horas depois), a pupila atinge a meia-midríase,

precipitando a crise... A posição de meia-midríase éaquela que mais encosta o cristalino na íris, pois amesma se encontra tensionada. Com isso, pode sur-gir um bloqueio pupilar total (FIGURA 11), impedin-do totalmente a passagem do humor aquoso da câ-mara posterior para a câmara anterior, empurrandoainda mais a íris para frente e fechando completa-mente o ângulo de filtração. O resultado final é umgrande aumento da PIO ao nível da câmara posteriore anterior, precipitando a crise de glaucoma agudo.Nesta crise, a PIO costuma chegar a valores entre 40-80 mmHg, o que pode lesar a papila óptica em poucashoras, provocará amaurose irreversível se a PIO nãofor prontamente controlada!! A primeira crise de glau-coma agudo geralmente afeta apenas um olho, mas ooutro olho pode ser afetado numa próxima crise.

O glaucoma subagudo de ângulo fechado possui umapatogênese semelhante, mas quantitativamente me-nos pronunciada, pois o bloqueio pupilar agudo e ofechamento do ângulo não chegam a ser totais. Es-tes pacientes fazem crises brandas autolimitadas re-correntes de elevação da PIO.

O glaucoma crônico de ângulo fechado é decorrenteda formação de sinéquias anteriores periféricas, ouseja, aderências entre a raiz da íris e a rede trabecular,causando a obstrução total permanente de parte dacircunferência do ângulo iridocorneano. Tais siné-quias no glaucoma primário são formadas pela apro-ximação iridocorneana decorrente de um bloqueiopupilar parcial crônico. Raramente, o glaucoma crô-nico de ângulo fechado pode ser desencadeado pelouso crônico de colírios colinérgicos (mióticos),como a pilocarpina. Estes colírios mantêm o músculociliar contraído, exagerando a acomodação do crista-lino, o que aumenta a espessura do mesmo, facilitan-do o bloqueio pupilar em indivíduos predispostos.

Íris Plateau

É um defeito constitucional da íris que se apresentaachatada no centro e angulada demais na periferia,devido à proeminência do corpo ciliar empurrando asua raiz . Com isso, o ângulo iridocorneano torna-sebastante estreitado e o paciente pode evoluir comqualquer um dos três tipos de glaucoma de ângulofechado (agudo, subagudo ou crônico), embora aforma crônica seja mais comum... É mais comum emmulheres jovens, entre 30-40 anos; por isso, todoglaucoma de ângulo fechado que ocorre antes dos50 anos deve aventar a hipótese da síndrome da írisplateau. Na maioria das vezes, a íris plateau vem as-sociada ao bloqueio pupilar, embora numa minoriados casos possa ser a única causa do glaucoma...

3. Avaliação Diagnóstica

O exame oftalmológico rotineiro deve avaliar o ân-gulo iridocorneano, especialmente em pacientes commais de 40 anos, para triar os pacientes que possuemângulo estreito e, portanto, apresentam risco poten-cial para desenvolver o glaucoma de ângulo fecha-do. Existem quatro exames neste intuito: (1) teste dailuminação oblíqua, (2) teste de van Herick na lâmpa-da de fenda, (3) gonioscopia, (4) biomicroscopia comultrassom. Além disso, todo paciente com ânguloiridocorneano estreito confirmado deve ser avaliadocom outros exames para determinar a PIO e se já exis-te glaucoma. Portanto, estão indicados: tonometriade aplanação, fundoscopia (oftalmoscopia) para ava-liação da papila óptica e perimetria do campo visual.Testes provocativos monitorados podem ser realiza-dos em pacientes com ângulo estreito para avaliar orisco de fechamento do ângulo e, portanto, de glau-coma. O erro de refração deve ser determinado paraavaliar a presença de hipermetropia...

Teste de iluminação oblíqua: este teste pode ser rea-lizado até pelo clínico! Utilizando uma lanterna com aluz iluminando tangencialmente a porção temporal doolho, observa-se a íris. Se o ângulo for aberto, toda aíris será iluminada; se o ângulo for estreito, a luz sóiluminará a porção temporal da íris, deixando umasombra em sua porção nasal (FIGURA 12). O motivoé que os pacientes com ângulo estreito possuem umaíris levemente abaulada no centro, pelo mecanismodo bloqueio pupilar parcial. Este teste à beira do lei-to, embora de execução muito fácil, possui umaacurácia inferior aos outros métodos. Portanto, é in-dicado apenas na impossibilidade dos mesmos...

Fig.11: Mecanismo do bloqueio pupilar como causa do estreitamento ou fechamento doângulo iridocorneano. Fig.12: Teste da iluminação oblíqua.

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CAPÍTULO 4 - GLAUCOMA 49

Teste de van Herick: utilizando a lâmpada de fenda,o examinador posiciona uma fenda de luz angulada a60o na periferia da córnea , observando-se a distân-cia entre a fenda de luz corneana e a fenda de luz daíris, comparando-a com o diâmetro da fenda de luzcorneana (FIGURA 13). O ângulo iridocorneano érepresentado pela distância entre as fendas, sendonomeado ângulo da câmara anterior (AC).

Testes Provocativos: são usados para simular as si-tuações de meia-midríase. Qualquer que seja o teste,é medida a PIO antes e depois de 60-90min da “pro-vocação”. Existem quatro tipos: (1) teste do quartoescuro: o paciente fica num ambiente escuro; (2) tes-te do decúbito prona: o paciente fica em decúbitoventral; (3) teste do decúbito prona em quarto escu-ro: mistura dos dois anteriores; (4) teste do midriáti-co: é aplicado tropicamida (Midriacyl) a 0,5-1%. Ostestes provocativos são considerados positivosquando há um aumento acima de 8 mmHg na PIO,indicando maior probabilidade de o indivíduo de-senvolver um glaucoma de ângulo fechado. Estestestes têm sido questionados por muitos oftalmolo-gistas por não terem demonstrado boa acurácia nosestudos. Eles preferem confiar nos achados dagonioscopia e no julgamento clínico para decidir aconduta nos pacientes com ângulo estreito, sem glau-coma ainda presente...

4. Glaucoma Agudo de Ângulo Fechado (Crise Aguda de Glaucoma)

Este tipo de glaucoma é o mais importante para oclínico! Trata-se de uma emergência médica que, senão reconhecida e prontamente e adequadamentetratada, acarreta a perda completa e irreversível davisão do olho afetado, o que pode ocorrer ao longode poucas horas!!! Como vimos, a crise aguda de glau-coma pode ser desencadeada pelo próprio médico,após aplicar um colírio midriático-cicloplégico antesde fazer, por exemplo, uma fundoscopia, exame tam-bém realizado pelo clínico!! Para que isso não ocorra,é importante a realização pelo menos do teste de ilu-minação oblíqua (e idealmente o teste de van Herick)antes de aplicar qualquer um destes colírios... Emcaso de ter sido aplicado um colírio midriático-cicloplégico num paciente sabidamente com ânguloestreito, a midríase pode ser prontamente revertidacom o colírio alfa-adrenérgico dapiprazol 0,5%. Nãose deve usar um colírio colinérgico miótico nestecaso, pois, em combinação com o colírio midriático,provocará a meia-midríase...

Esta síndrome ocorre geralmente após os 50 anos empacientes do grupo de risco (ver anteriormente), sen-do precipitada por qualquer situação indutora dameia-midríase, como estresse emocional, meia-luzou de forma iatrogênica.

Manifestações Clínicas

O “ataque” quase sempre acomete somente um olho,iniciando-se de forma abrupta e bastante dramática.Observe os principais sintomas na Tabela 4 e veja aFIGURA 14. Uma crise no outro olho é bastante pro-vável (até 50%) nos próximos 2 anos.

Perceba que esta crise pode simular uma crise gravede enxaqueca! Contudo, uma boa anamnese e umadequado exame físico podem diferenciar facilmenteas duas entidades. Na dúvida, a PIO extremamenteelevada pode confirmar o diagnóstico. Geralmente,utiliza-se o tonômetro de Schiotz ou o Tono-pen (verem “Glaucoma Primário de Ângulo Aberto”), por se-rem aparelhos portáteis. Um desses tonômetros é

peça essencial numa sala de emergência! A crise agu-da de glaucoma é uma das múltiplas causas de “sín-drome do olho vermelho”, como descreveremos emoutro capítulo.

Tratamento da Fase Aguda

O tratamento deve ser realizado no hospital, geral-mente na sala de emergência. A demora no seu iní-cio pode ter consequências graves e irreversíveispara a visão do olho comprometido. O objetivo ébaixar o mais rapidamente possível a PIO, para ocontrole da crise e a prevenção de um dano glauco-matoso imediato. Após a crise ser devidamente con-trolada com terapia farmacológica, o paciente devereceber a intervenção a laser (iridotomia periféricaa laser), como medida definitiva para o tratamentodeste glaucoma. A terapia medicamentosa emergen-cial utiliza drogas tópicas (colírios) e sistêmicas (via

Fig.14: Glaucoma Agudo de Ângulo Fechado.Observe a injeção conjuntival perilímbica e o hazecorneano.

Sintomas1- Dor ocular e retroorbitária2- Cefaleia frontal3- Fotofobia4- Lacrimejamento5- Náuseas e vômitos6- Sudorese fria7- Borramento visual8- Visão de halos em volta de luzesSinais1- “Olho vermelho”, com injeção conjuntival perilímbica (em volta da córnea)2- Haze corneano (certa opalescência da córnea decorrente do edema corneano)3- Pupilas em meia-midríase, não fotorreagentes ou pouco fotorreagentes, devido à isquemia iriana4- PIO extremamente elevada, entre 40-90 mmHg (quando possível medir)

Tabela 4: Sinais e Sintomas da crise Aguda de Glaucoma.

Fig.13: Teste de van Herick.

Grau 4: ângulo aberto

Grau 2: fechamento provável

Com esta técnica, pode-se classificar o ângulo da câmaraanterior (AC) pela sua comparação com a fenda corneana(FC): grau 0 = não há espaço: AC = zero (ângulo fechado);grau 1 = AC < 1/4 FC (ângulo de 10o, fechamento provável);grau 2 = AC = 1/4 FC (ângulo de 20o, fechamento possível);grau 3 = AC = 1/2 FC (ângulo de 30o, fechamento imprová-vel); grau 4 = AC = FC (ângulo aberto, acima de 35o).

Pacientes com ângulo grau 3 e 4 podem receber colí-rio midriático, sem maiores riscos, enquanto que pa-cientes com ângulo grau 0, 1 e 2 devem ser poupa-dos do uso desses colírios... Este é o teste de tria-gem mais usado, tendo uma acurácia muito maior doque o teste de iluminação oblíqua.

Gonioscopia: é indicada quando o teste de van Herickfor positivo. Este exame é considerado o teste padrão-ouro para a determinação do ângulo írido-corneano,sendo importante também para diagnosticar a írisplateau e outras doenças oculares associadas a glau-coma de ângulo fechado, o que pode nortear a terapia.O método foi discutido e mostrado anteriormente quan-do falamos sobre o glaucoma de ângulo aberto...

Biomicroscopia com Ultrassom: exame capaz deavaliar com precisão o ângulo iridocorneano e a pre-sença de anormalidades anatômicas relacionadas aoglaucoma de ângulo fechado. Por ser um exame caro,é reservado apenas nos poucos casos em que existedúvidas após a gonioscopia...

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oral e venosa). Todas as medidas devem ser toma-das em conjunto:

- Agentes osmóticos sistêmicos: fazer manitol ve-noso 2,5-10 ml/Kg de uma solução a 20% (ex.: 70 Kg= 175-700 ml; na prática usa-se 250-500 ml). Essesagentes aumentam subitamente a osmolaridade plas-mática, retirando líquido dos tecidos. No caso doolho, haverá saída de líquido do corpo vítreo, redu-zindo de imediato a PIO. Alguns autores preconizamo uso do manitol apenas nos casos em que a PIO nãobaixar para o normal (< 21 mmHg) após 1h de terapiacom os demais medicamentos... Devemos ter cuida-do ao usar manitol em cardiopatas e nefropatas, pelorisco de edema agudo de pulmão...

- Inibidores da anidrase carbônica sistêmicos: fazeracetazolamida (Diamox) 500 mg VO, seguido de250 mg VO a cada 6h. Esta droga reduz com altaeficácia a produção de humor aquoso pelo corpociliar. A única contra-indicação é a história de alergiaà sulfa (já que a acetazolamida é derivado de sulfa).Pacientes com hipersensibilidade à acetazolamidapodem desenvolver graves reações idiossincrásicas,inclusive aplasia de medula...

- Colírio de Beta-bloqueador: fazer timolol (Timolol)0,5% 1 gota, repetindo 1h depois, se necessário.Manter com 1 gota a cada 12h até a realização dairidotomia a laser. Em pacientes com contraindica-ções a beta-bloqueadores (ex.: história de broncoes-pasmo), o colírio de timolol deve ser evitado. Nestecaso, se disponível, pode-se optar pelo colírio debetaxolol (Betoptic) 0,25%, um beta-bloqueadorbeta1-seletivo e de menor absorção sistêmica.

- Colírio de Alfa2-adrenérgico: deve-se fazer o colí-rio de apraclonidina (Iopidine) 1% 1-2 gotas, repe-tindo-se após 1h, se necessário. Esta droga age re-duzindo a produção de humor aquoso pelo corpociliar e possui efeito aditivo aos beta-bloqueadores.

- Colírio de Colinérgico (Miótico): deve-se fazer ocolírio de pilocarpina 2% (em olhos claros, ou 4%em olhos escuros) a cada 15-30min, num total de 2-4doses. Não devemos exceder a dose, sob o risco dedesencadear uma crise colinérgica (náusea, vômitos,diarreia, sudorese, bradicardia, hipotensão), especi-almente em idosos. Esta droga age no esfíncter daíris, provocando miose, e no músculo ciliar, repuxan-do o esporão escleral. A miose e o repuxamento doesporão escleral afastam a raiz da íris da rede trabe-cular, aumentando a drenagem do humor aquoso.Estes agentes não agem na íris isquêmica, situaçãocomum quando a PIO está acima de 40 mmHg. En-tretanto, a droga deve ser aplicada precocemente paraalcançar o seu pico de efeito no momento que a PIOtiver baixado com o restante das medidas.

- Identação corneana: um swab ou uma lente degonioscopia é forçada gentilmente no centro dacórnea para provocar uma identação. Este proce-dimento rechaça o humor aquoso da câmara ante-rior para o ângulo iridocorneano, facilitando a suadrenagem, além de eventualmente desfazer o blo-queio pupilar.

- Terapia adjuvante: (1) colírio de esteroide (acetatode prednisolona 1%) 1 gota a cada 6h até a realizaçãoda iridotomia a laser. Este colírio é usado para aliviara inflamação ocular, que contribui para os sintomas;(2) analgésicos sistêmicos, em caso de dor refratáriade maior intensidade; (3) antieméticos, para contro-lar as náuseas e vômitos.

Durante o tratamento da crise aguda de glauco-ma, a tonometria deve ser aferida a cada 30min.Se a PIO não cair abaixo 21 mmHg após 2h detratamento farmacológico, a iridoplastia a laserde argônio, deve ser feita em caráter de emer-gência. Se a PIO continuar acima de 21 mmHgapós 4-6h de tratamento, o paciente é encami-nhado para a cirurgia de urgência (ou iridotomiaa laser de urgência).

Após o controle da PIO (< 21 mmHg), a crise sópode ser considerada realmente abortada quan-do o ângulo não estiver mais fechado. Portanto,uma gonioscopia está indicada neste momento.Se o ângulo estiver fechado, mesmo após a re-solução da sintomatologia, a crise de glaucomapoderá voltar após horas ou dias! Neste caso,um procedimento (ou um novo procedimento,caso algum já, tenha sido realizado) precisa serprontamente realizado.

A iridotomia a YAG laser está sempre indicadaapós 2-7 dias do abortamento da crise, como pro-cedimento definitivo, prevenindo as recidivas. Atéo dia do procedimento, o paciente continua rece-bendo colírios de pilocarpina 2% e corticoide acada 6h em ambos os olhos e de beta-bloquerador (timolol 0,5%) a cada 12h no olhoacometido.

O olho não acometido também deve ser trata-do após uma crise de glaucoma agudo, pois achance deste olho apresentar uma nova crise éalta nos próximos anos. Por isso, a iridotomia aYAG laser deve ser realizada em ambos osolhos!!

Laserterapia

Um procedimento para corrigir em definitivo o dis-túrbio de drenagem no glaucoma de ângulo fechadoé sempre necessário! A terapia medicamentosa demanutenção não previne a evolução da doença e aocorrência de novas crises. Em anos recentes, a la-serterapia substituiu em grande parte o tratamentocirúrgico no glaucoma de ângulo fechado. Existemdois tipos de laserterapia para esta patologia: (1)iridotomia periférica a laser, e (2) iridoplastia periféri-ca a laser. Não confunda os nomes, pois são proce-dimentos bem diferentes e com funções e indicaçõesdiferentes... O procedimento de escolha é a iridoto-mia periférica com YAG laser (realizada 2-7 dias apóso controle da crise, quando retorna a transparênciacorneana), mostrando-se um excelente método paraa correção definitiva do problema básico destes pa-cientes: o bloqueio pupilar.

Iridotomia periférica a YAG laser: neste procedi-mento, realizado em ambulatório sob efeito de colírioanestésico, um feixe de laser (geralmente Nd:YAGlaser) é focalizado em um ponto na borda periféricada íris, criando um orifício para que o humor aquosopossa passar da câmara posterior para a câmara an-terior, desfazendo o bloqueio pupilar. Para a sua rea-lização, é necessário que a córnea esteja transparen-te, o que costuma ocorrer 2-7 dias após o controle dacrise aguda. Em casos de urgência, a transparênciacorneana pode ser eventualmente conseguida com aaplicação tópica de glicerina. Como o laser pode ele-var transitoriamente a PIO, é preciso que o pacientemantenha a medicação tópica até o dia do procedi-mento. As complicações mais comuns não trazemmaiores problemas, são elas: borramento visual tran-sitório, uveíte anterior transitória e pequenas hemor-ragias. As complicações mais temidas são o descola-mento de retina (raríssimo) e a ocorrência de novascrises de glaucoma agudo (que ocorriam com maisfrequência com o uso do laser de argônio).

Iridoplastia periférica a laser de argônio: tambémchamado de gonioplastia periférica a laser de argônio.Este procedimento (também ambulatorial e sob colí-rio anestésico tópico) não é via de regra considera-do um tratamento definitivo para o glaucoma de ân-gulo fechado, pois não desfaz o bloqueio pupilar. Éindicado em situações de emergência, para abortar acrise aguda não resolvida com os medicamentos, jáque não exige a claridade da córnea (o laser não ne-cessita de tanta precisão como no utilizado no pro-cedimento anterior...). O laser é aplicado diretamenteà extrema periferia da íris, visando desfazer uma par-te de seu tecido, sem provocar a formação de orifí-cio, para simplesmente afastar a sua raiz da rede tra-becular e facilitar a drenagem do humor aquoso. Ascomplicações são menos frequentes que as da irido-tomia, porém a maioria dos pacientes terá que fazer airidotomia a laser em um segundo tempo.

Cirurgia

O tratamento cirúrgico atualmente tem sido menosindicado no glaucoma de ângulo fechado, após oadvento da laserterapia. Entretanto, há casos em quea sua indicação é mandatória, como nos casos refra-tários à laserterapia. Raramente, uma crise aguda deglaucoma não consegue ser abortada mesmo com ouso do laser, necessitando de cirurgia de urgência.Outras vezes, mesmo após a iridotomia a laser, o pa-ciente volta a elevar a PIO, necessitando da cirurgia.

A cirurgia mais indicada é a iridectomia periférica,na qual é retirado um diminuto fragmento da íris, des-fazendo o bloqueio pupilar.

5. Glaucoma Subagudo de Ângulo Fechado

A patogênese é a mesma do glaucoma agudo, po-rém, a elevação da PIO é de menor gravidade e semanifesta em surtos repetidos oligossintomáticos.O diagnóstico deve ser suspeitado e confirmado, paraque a iridotomia a laser possa ser realizada, caso con-trário o paciente evoluirá com progressão da lesãoglaucomatosa.

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CAPÍTULO 4 - GLAUCOMA 51

6. Glaucoma Crônico de Ângulo Fechado

O glaucoma crônico de ângulo fechado (GCAF) ocor-re em indivíduos com ângulo iridocorneano estreitoe discreto bloqueio pupilar, que apresentam a forma-ção progressiva de sinéquias na periferia da íris, quepreenchem uma porção da circunferência iridocor-neana (geralmente a metade superior). Outros meca-nismos relacionados a este glaucoma são: íris plateau,uso crônico de colírios colinérgicos mióticos e a sín-drome de glaucoma combinado (ângulo fechado eângulo aberto: após a correção anatômica, o pacien-te permanece com os achados do GPAA). A PIO au-menta paulatinamente e o paciente desenvolve glau-coma assintomático, tal como no caso do glaucomade ângulo aberto primário. A necessidade de se me-dir o ângulo iridocorneano pela gonioscopia em todopaciente com glaucoma assintomático está no fatodeste glaucoma ter um tratamento totalmente dife-rente do glaucoma de ângulo aberto! Alguns pacien-tes com glaucoma crônico de ângulo fechado podem“agudizar”, desenvolvendo crises de glaucomasubagudo ou agudo...

Tal como nos demais glaucomas de ângulo fechado,no GCAF, a idirotomia periférica a YAG laser estásempre indicada para desfazer ou prevenir qualquergrau de bloqueio pupilar. Se após o procedimento, oângulo permanecer estreito e “fechável” (graus 1, 2ou 3 de van Herick), deve ser também realizada umairidoplastia periférica a laser de argônio. O proce-dimento cirúrgico da goniosinesquiálise é utilizadopara retirar a sinéquias, se estiverem presentes. Seapós a abertura do ângulo (confirmado pela gonios-copia), a PIO continuar elevada, provavelmente opaciente apresenta a síndrome do glaucoma combi-nado, devendo ser tratado de forma igual ao GPAA.

IV - GLAUCOMA SECUNDÁRIO

Existe um sem número de doenças oculares que po-dem provocar glaucoma, tanto de ângulo fechadocomo de ângulo aberto. Faremos uma sumária revi-são sobre as principais.

Síndrome da Pseudo-exfoliação(ângulo aberto)

É uma doença idiopática na qual a cápsula anteriordo cristalino “descama” um material que, através dapupila, alcança a câmara anterior e obstrui lentamen-te a rede trabecular. O diagnóstico é feito no exameda lâmpada de fenda quando o oftalmologista obser-va um material algodonoso na borda da pupila. Estespacientes costumam evoluir para glaucoma de ângu-lo aberto e devem ser tratados tal como o GPAA.Eles apresentam uma resposta particularmente exce-lente à trabeculoplastia a laser de argônio.

Síndrome da Dispersão Pigmentar(ângulo aberto)

É uma desordem idiopática caracterizada pela libera-ção de pigmento da face posterior da íris, ao ser

atritada contra as fibras zonulares do cristalino. Ma-nifesta-se geralmente em homens jovens (entre 20-50 anos), sendo mais comum nos negros e nos mío-pes. O pigmento se dispersa, passando pela pupila,atingindo a câmara anterior e obstruindo insidiosa-mente a rede trabecular. O paciente desenvolverá umglaucoma de ângulo aberto. Antes do glaucoma seinstalar, o paciente pode referir sintomas da síndro-me, como episódios de borramento visual e dor ocu-lar induzida pelo exercício físico. O diagnóstico é fei-to pela transiluminação da íris, notando-se peque-nos defeitos (“janelas”) despigmentados. O trata-mento inclui o uso crônico de colírios colinérgicosmióticos (pilocarpina), para afastar a íris das fibraszonulares. Possuem boa resposta à trabeculopastiaa laser de argônio.

Glaucoma traumático com Recessão angular(ângulo aberto)

Embora existam vários mecanismos para o glaucomatraumático (sinéquias, deslocamento do cristalino,etc.), o mais importante é o da recessão angular.Esta síndrome geralmente ocorre após muitos anosde um trauma ocular fechado, associado à formaçãode um hifema (sangue na câmara anterior) não ade-quadamente tratado. O sangue se acumula num ân-gulo iridocorneano traumatizado, levando paulatina-mente á formação de aderências e obstrução da dre-nagem pela rede trabecular. O paciente então podedesenvolver um glaucoma de ângulo aberto. O trata-mento é semelhante ao do GPAA, com algumas dife-renças, como evitar usar os colírios mióticos e acres-centar um colírio midriático ciclopégico ao esquema.Nos casos refratários, indica-se a trabeculectomiacirúrgica (utilizando agentes antimitóticos).

Glaucoma Pós-Uveíte (ângulo aberto ou fechado)

Uveíte é a inflamação da túnica vascular do olho, outrato uveal, formado pela íris, corpo ciliar e coroide.O tipo relacionado ao glaucoma é a uveíte anterior,ou iridociclite, uma causa clássica da “síndrome doolho vermelho”. Cerca de 20% dos pacientes quetiveram ou apresentam uveíte anterior desenvolve-rão glaucoma futuramente. O glaucoma de ânguloaberto é o tipo mais comum, decorrente do acúmulode debris leucocitários e de proteínas inflamatóriasna rede trabecular. O glaucoma de ângulo fechadopode ocorrer pela formação de sinéquias posteriores,tornando a íris aderida ao cristalino e, com isso, indu-zindo ao bloqueio pupilar, ou de sinéquias anterio-res, provocando a aderência da raiz da íris ao ânguloiridocorneano, tornando-o mais estreito.

A síndrome da uveíte heterocrômica de Fuchs éuma rara e interessante desordem caracterizada poruveíte leve unilateral, provocando alterações da pig-mentação de sua íris, deixando um olho mais claroque o outro. Esta síndrome aumenta o risco de glau-coma e de catarata precoce. Outra síndrome rara é asíndrome de Posner-Schlossman, também chama-da de crise glaucomatociclítica, descrita como cri-ses agudas de elevação da PIO, com pouca ou ne-nhuma inflamação ocular, devido à liberação agudade prostaglandinas.

O tratamento das uveítes anteriores é a aplicaçãoregular de colírios de corticoide e colírios midriáti-cos-cicloplégicos, para prevenir ou desfazer as siné-quias posteriores da íris. Uma vez instalado o glau-coma, o paciente deve receber colírios de beta-blo-queador associados. Nos casos refratários, indica-se a trabeculectomia cirúrgica.

Facoglaucoma (Secundário à Catarata)(ângulo aberto ou fechado)

Este tema foi descrito no capítulo sobre catarata.Existem três tipos: (1) facolítico, (2) facoanafilático e(3) facomórfico. Somente este último é de ângulo fe-chado. Estes glaucomas são complicações raras dacatarata, mas, como catarata é extremamente comum,a sua ocorrência não é incomum...

Glaucoma Neovascular(Glaucoma da Retinopatia Diabética Proliferativa)(ângulo fechado)

Trata-se de uma causa de glaucoma de ângulo fe-chado de prognóstico reservado e difícil tratamento.Está associado à retinopatia diabética proliferativae à oclusão da veia central da retina e, menos fre-quentemente, a causas como oclusão da artéria cen-tral da retina, doença carotídea aterosclerótica earterite temporal. A patogênese em comum é a isque-mia crônica dos tecidos oculares, provocando a libe-ração de fatores angiogênicos que são responsá-veis pela formação de neovasos na retina, papilaóptica, corpo ciliar, íris e ângulo iridocorneano. A raizda íris torna-se espessada e produz o estreitamentodo ângulo. O diagnóstico e o tratamento devem serrealizados precocemente, para garantir a eficácia daterapêutica. O tratamento mais indicado é a fotocoa-gulação panretiniana a laser.

V - GLAUCOMA CONGÊNITO

O glaucoma é uma importante causa de cegueira eambliopia (ver capítulo de Catarata) na criança, em-bora seja menos comum do que a catarata congênita.Embora o glaucoma primário da infância (que temcomo um dos tipos o glaucoma congênito) seja omais comum, existem diversas outras causas de glau-coma secundárias a outras doenças oculares. Des-creveremos primeiramente o glaucoma congênito esuas implicações clínicas e terapêuticas. Depois men-cionaremos sumariamente alguns conceitos funda-mentais sobre os outros tipos de glaucoma infantil.

1. Glaucoma Congênito Primário

O glaucoma congênito é uma entidade na qual umacriança nasce com um defeito na formação do ân-gulo de filtração iridocorneano (disgenesia angu-lar). A doença é congênita (malformação orgânicadurante a vida fetal) e não hereditária! Acomete 1 acada 10.000 nascimentos vivos. O ângulo encon-tra-se aberto (glaucoma de ângulo aberto), mas pos-sui alterações estruturais que dificultam a drena-gem do humor aquoso. O glaucoma é unilateral em

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1/3 dos casos e bilateral em 2/3 dos casos, sendogeralmente assimétrico.

Os sinais e sintomas podem aparecer ao nascimento(glaucoma congênito verdadeiro) ou durante os pri-meiros 2-3 anos de vida (glaucoma infantil). As ma-nifestações clínicas compõem um conjunto típico desinais e sintomas (Tabela 5).

talmoscopia), que irá revelar a escavação da papilaóptica, característica principal de qualquer glaucoma.

O tratamento deve ser programado o mais precocepossível, caso contrário, o risco de cegueira ou deambliopia é muito alto. A lesão glaucomatosa na cri-ança, para um dado aumento da PIO, progride maisrápido que no adulto, embora com a normalização daPIO, a possa ocorrer a redução da escavação papilar(diferentemente do adulto).

A terapia é sempre cirúrgica!! A cirurgia deve serrealizada o mais rápido possível, evitando-se ultra-passar o primeiro ano de vida, após o qual os resul-tados quanto à queda da PIO e ao controle da lesãoglaucomatosa começam a reduzir a sua taxa de su-cesso. Existem duas cirurgias como primeira opção:(1) goniotomia (corte sobre a rede trabecular), indi-cada quando não há opalescência significativa dacórnea, e (2) trabeculotomia (abertura do canal deSchlemm), procedimento preferido nos casos de opa-lescência corneana. O sucesso dessa cirurgia oscilaem torno de 80-90%. Em caso de falha, outras técni-cas cirúrgicas podem ser executadas, como atrabeculectomia. A terapia medicamentosa tópica(beta-bloqueadores e colinérgicos mióticos) tem oseu maior benefício no pós-operatório, com intuitode evitar uma segunda cirurgia...

2. Glaucoma Congênito Secundário

Diversas doenças oculares congênitas podem cau-sar glaucoma, geralmente sendo parte de um quadrosindrômico. As doenças mais associadas a glauco-ma congênito secundário são: síndrome de Sturge-Weber, aniridia, disgenesia do segmento anterior eretinopatia da prematuridade.

3. Glaucoma Afácico

Como vimos no capítulo sobre Catarata, o único tra-tamento disponível para a catarata congênita é a re-tirada do cristalino. Abaixo de 6 meses de idade, nãohá boa adaptação à colocação de uma lenteintraocular artificial e, portanto, estas crianças ficamsem cristalino (afácicas). Por mecanismos diversos,incluindo a presença de microftalmia associada à ca-tarata, as crianças afácicas possuem um risco em tor-no de 12% de desenvolver glaucoma dentro dos pró-ximos 4-6 anos do pós-operatório.

1- Lacrimejamento excessivo crônico (epífora)2- Fotofobia3- Blefaroespasmo4- Aumento da córnea (nos casos unilaterais ou bi-laterais muito assimétricos, há uma diferença notá-vel no tamanho da córnea entre um olho e o outro)5- Córnea opalescente (translúcida)6- Aumento do globo ocular (buftalmo)7- Injeção conjuntival

Tabela 5: Sinais e Sintomas do Glaucoma Congênito.

Os sinais de glaucoma congênito podem ser reco-nhecidos pela inspeção em apenas 30% dos recém-nascidos; no restante dos casos, a doença se apre-senta mais claramente nos primeiros 3 meses de vida(FIGURA 15), quando está completo o desenvolvi-mento do corpo ciliar e a produção do humor aquosoaumenta. A famosa tríade do glaucoma congênito (asaber: epífora + fotofobia + blefaroespasmo), deveser bem conhecida pelos pediatras, que são os pri-meiros médicos a examinar a criança e precisam sa-ber quando referenciá-la para o oftalmologista!! Oaumento da córnea se dá tanto no seu diâmetro quan-to na sua espessura. Por vezes, o alargamento dacórnea é assimétrico, provocando astigmatismo. Esteaumento estica o tecido corneano e costuma lesar oendotélio e a membrana de Descemet (capítulo 1 so-bre anátomo-histologia do olho), formando as estri-as de Haab, pequenas cicatrizes de aspecto linear ouarqueado, em posição horizontal. Por estas “que-bras” de membrana, o humor aquoso invade oestroma corneano causando edema de córnea (espe-cialmente em crianças menores de 6 meses de vida).A maioria dos sinais e sintomas do glaucoma congê-nito são provenientes deste edema: opalescênciacorneana, epífora, fotofobia, blefaroespasmo, des-conforto e irritação conjuntival. O aumento do glo-bo ocular (buftalmo) ocorre quando o glaucoma seinstala antes dos 3 anos de vida, causando proble-mas estéticos e provocando miopia secundária.

O diagnóstico do glaucoma congênito é suspeitadoclinicamente e deve ser confirmado pela medida dapressão intraocular (PIO), por meio da tonometria(feita com a criança dormindo) e da fundoscopia (of-

Fig.15: Glaucoma congênito: observe a assimetria ealargamento da córnea, além de opalescência dacórnea esquerda.

SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS

1. Weinreb, RN, Khaw, PT. Primary open-angle glau-coma. Lancet 2004; 363:1711.

2. Congdon, N, O’Colmain, B, Klaver, CC, et al. Causesand prevalence of visual impairment among adultsin the United States. Arch Ophthalmol 2004; 122:477.

3. Friedman, DS, Wolfs, RC, O’Colmain, BJ, et al.Prevalence of open-angle glaucoma among adultsin the United States. Arch Ophthalmol 2004; 122:532.

4. Quigley, H. Number of people with glaucoma world-wide. Br J Ophthalmol 1996; 80:389.

5. Quigley, HA, Vitale, S. Models of open-angle glau-coma prevalence and incidence in the United States.Invest Ophthalmol Vis Sci 1997; 38:83.


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