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Leon.tolstoi.guerra.e.paz.Vol.1(.Doc)

Date post: 04-Jun-2018
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  • 8/13/2019 Leon.tolstoi.guerra.e.paz.Vol.1(.Doc)

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    Leon Tolstoi

    Guerra e Paz

    Livro I

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    http://groups.google.com/group/digitalsource

    2aedio

    Publicaes Europa-Amrica

    c PublicaesEuropa- Amrica,

    Traduo deIsabel da Nbrega

    e Joo Gaspar Simes

    Editor !rancisco L"on de #astro

    Edio n$% &&'(()()*

    http://groups-beta.google.com/group/digitalsourcehttp://groups-beta.google.com/group/digitalsource
  • 8/13/2019 Leon.tolstoi.guerra.e.paz.Vol.1(.Doc)

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    Captulo I

    Livro Primeiro.

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    Primeira Parte.

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    Nota. - Gra+amos em itlico o ue no te.to russo

    est em +ranc/s$ Era costume da alta sociedade da

    poca usar 0abitualmente a l1n2ua +rancesa nas

    conversaes mundanas$

    - Pois bem, meu pr1ncipe$ Gnova e Luca mais no so do que

    apan2ios, dom1nios, da +am1lia 3onaparte$ No, previno-o de que, se

    me diz ue no teremos guerra, se se permitir ainda atenuar todas as

    in+4mias, todas as atrocidades desse - !ticristo5palavra de 0onra,

    para mim, o ue ele 6, desco!"eo-o, dei#o de co!sider$-lomeu

    ami2o, meu +iel servidor, como costumo dizer$ 7amos, ve8amos, como

    est, como est9 3em%eio

    ue l0e meto medo$ :ente-se e conte-menovidades$

    !oi com estas palavras ue em ;ul0o de (aria !iodorovna$ Ana Pavlovna

    :c0erer, acol0eu o pr1ncipe 7assili, pessoa importante e de alta

    estirpe, o primeiro dos convidados a c0e2ar ? sua recepo dauela

    noite$ @avia al2um tempo 8 ue Ana Pavlovna tossicava, estava com

    2ripe, como ela dizia - 2ripe era ento um novo vocbulo, ue poucas

    pessoas ainda empre2avam$ essa mesma man0 tin0a ela mandadoentre2ar, por um lacaio de libr encarnada, a toda a 2ente,

    indistintamente, um bil0etin0o redi2ido nestes termos

    Se no tem nada mel0or a +azer$Se!"or &o!de - ou ento

    meu pr1ncipe -, e se a perspecti%a de passar a noite em casa de

    uma pobre doente no o assusta muito, sentir-me-ei encantada

    de o %er em min0a casa e!tre as ' e as () "oras.

    !!ette Sc"erer.

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    - *eu +eus, que %iol!cia- retoruiu o pr1ncipe no seu uni+orme

    de 2ala, o peito coberto de condecoraes, na +ace ac0atada um ar

    +lorescente, sem li2ar a m1nima import4ncia a semel0anteacol0imento$

    E.primia-se nesse +ranc/s precioso, ue +alavam e em ue at

    pensavam os nossos avBs, e a ue adicionavam esse sotaue

    protector, essas entoaes suaves to naturais a uem envel0eceu

    na sociedade e com prest12io na corte$ Apro.imou-se de Ana

    Pavlovna, bei8ou-l0e a mo, e.ibindo a calva per+umada e reluzente, e

    sentou-se, tranuilamente, num div$

    - !tes de mais !ada, diga-me, como tem passado, querida

    amigaTranuilize este seu ami2o - prosse2uiu ele no mesmo tom e

    numa voz em ue, sob a cortesia e a a+abilidade, transpareciam a

    indi+erena e at mesmo urna certa mo+a$

    - #omo ue uma pessoa 0-de passar bem de saCde$$, uando,

    moralmente, no pode dei.ar de so+rer9 Duem ue no nosso tempo

    0-de estar sereno, desde ue se8a pessoa de corao9 - redar2uiu

    Ana Pavlovna$- 7ai +icar toda a noite, no verdade9- E a +esta na Embai.ada de In2laterra9 0o8e uarta-+eira$ o

    posso dei.ar de aparecer - disse o pr1ncipe$- >in0a +il0a +icou de

    passar por aui para me levar$

    - ;ul2uei ue a +esta tin0a sido adiada$ &o!/esso-l"e que todas

    estas /estas e todos estes 0ogos de arti/1cio comeam a tornar-se

    i!s1pidos.

    - :e tivessem sabido ue era esse o seu dese8o, teriam adiado a

    +esta - tornou o pr1ncipe, o ual, como um relB2io certo, tin0a por0bito dizer, em determinadas circunst4ncias, +rases ue ele prBprio

    no esperava ue +ossem acreditadas$

    - No me atorme!te. /i!al, que decidiram em relao ao

    telegrama de No%osilto% 3 se!"or costuma saber tudo.

    - Due l0e 0ei-de eu dizer9 - volveu o pr1ncipe num tom +rio e

    en+astiado$- 4ue decidiram +ecidiram que 5o!aparte c"egou a

    po!to de !o poder recuar e eu ac"o que est$ aqui, est$ a aco!tecer-

    !os o mesmo.

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    F pr1ncipe 7assili +alava sempre com indol/ncia, como um actor

    ue recita um papel 0 muito decorado$ Ana Pavlovna, pelo contrrio,

    apesar dos seus uarenta anos, toda ela era vivacidade e e.panso$

    :er entusiasta era a sua +uno social, e at mesmo uando noera essa a sua disposio natural procurava s/-lo, para ue as

    pessoas suas con0ecidas se no sentissem desapontadas$ F sorriso

    constran2ido ue l0e andava sempre no rosto, conuanto no

    dissesse muito bem com os seus traos 8 +ati2ados, denunciava,

    como acontece nas crianas mimadas, a e.ist/ncia de um pecadil0o,

    pecadil0o de ue ela no ueria, nem podia, nem mesmo 8ul2ava Ctil

    corri2ir-se$

    o decurso da conversa sobre pol1tica$ Ana Pavlovna e.altou-se$

    - A0 o me +ale da Hustria Talvez eu se8a uma parva, mas

    estou convencida de ue a Hustria no uis nem uer a 2uerra$ Est a

    atraioar-nos$ ? Cssia sozin0a ue compete salvar a Europa$ F

    nosso ben+eitor con0ece a alta misso a ue est destinado e cumpri-

    la-$ a Cnica coisa em ue ten0o con+iana$ F nosso sublime

    imperador tem um 2rande papel a desempen0ar no mundo, e to

    virtuoso e to nobre ue Jeus no o abandonar e 0-de cumprir asua misso esma2ar a 0idra da evoluo, ainda mais terr1vel desde

    ue encarnou nesse assassino e nesse salteador$ a nBs, e sB a nBs,

    a uem compete res2atar o san2ue do 8usto$$$ E per2unto-l0e eu

    a2ora com uem poderemos nBs contar9 A In2laterra, com o seu

    esp1rito comercial, no compreende nem pode compreender toda a

    2randeza da alma do imperador Ale.andre$ ecusou-se a evacuar

    >alta$ F ue ela uer ver, procurar na nossa conduta ideias

    reservadas$ Due ue eles disseram a ovosiltzov9$$$ ada$ ocompreenderam, no podem compreender o desinteresse do nosso

    imperador, ue nada uer para ele e tudo +az para bem da

    0umanidade$ E ue prometeram eles9 ada$ E at auilo ue

    prometeram acabar por no vir a realizar-se$ A PrCssia 8 declarou

    ue 3onaparte era invenc1vel e ue a Europa inteira nada podia

    contra ele$$$ E eu por mim, no acredito numa sB palavra do ue

    dizem @ardenber2 ou @au2Kitz$ 6ssa /amosa neutralidade prussiana

    nopassa de uma armadil0a$ :B em Jeus con+io e no alto destino do

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    nosso au2usto imperador$ Ele salvar a Europa$$$

    Je sCbito calou-se, sorrindo ela mesma, antes de mais nin2um,

    da veem/ncia das suas prBprias palavras$

    - Estou persuadido - disse o pr1ncipe com um sorriso- de ue se ativessem mandado a si, min0a uerida ami2a, em lu2ar, do nosso

    muito uerido intzen2erode, a esta 0ora t1n0amos tomado de

    assalto a adeso do rei da PrCssia$ Duer dar-me uma .1cara de c09

    - #om certeza$ propsito - acrescentou ela num tom sereno -,

    ten0o 0o8e duas pessoas muito interessantes o %isco!de de

    *ortemart7 est$ apare!tado com os >ontmorenc"pelos o0ans, um

    dos mais ilustres nomes da !rana$ um dos nossos bons emi2rados,

    aut/ntico E tambm o abade *orio. #on0ece este esp1rito pro+undo9

    !oi recebido pelo imperador$ #on0ece-o9

    - Terei um 2rande prazer Ji2a-me uma coisa - acrescentou,

    ne2li2entemente, e como se sB nauele momento se tivesse

    lembrado disso, uando, realmente, esse era o ob8ectivo principal da

    sua visita$ - verdade ue a imperatriz-me se interessa pela

    nomeao do baro de !unMe para o lu2ar de primeiro-secretrio em

    7iena96sse baro, ao que parece, 8 uma triste perso!agem.

    F pr1ncipe 7assili pretendia ver nomeado para esse posto um

    +il0o seu, e o baro era a pessoa indicada para tal car2o pelas

    pessoas ue procuravam 2an0ar a in+lu/ncia da imperatriz >aria

    !iodorovna$

    - 3 Se!"or 5aro de 9u!:e /oi recomendado ? imperatriz pela

    irm - +oi tudo uanto ela disse em resposta, secamente, e com um ar

    triste$

    Duando Ana Pavlovna pronunciou o nome da imperatriz pintou-se-l0e no rosto, subitamente, a dedicao e o respeito mais pro+undos

    e sinceros, ao mesmo tempo ue l0e desceu sobre a mscara auele

    ar de tristeza ue nunca a abandonava sempre ue, no decurso de

    uma conversa, se +alava na sua au2usta protectora$ E acrescentou

    ue :ua >a8estade se tin0a di2nado testemun0ar ao baro de !unMe

    muita estima, enuanto o ol0ar novamente se l0e velava de tristeza$

    F pr1ncipe, como ue indi+erente, mantin0a-se calado$

    Ana Pavlovna, com a sua +inura especial de dama da corte e o

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    seu tacto +eminino, ao mesmo tempo- ue diri2ia um remoue ao

    pr1ncipe por ter ousado e.primir-se to livremente a respeito da

    conduta de uma pessoa recomendada ? imperatriz, procurava de

    certo modo consol-lo$

    - *as, a propsito da sua /am1lia- disse-l0e ela -, no sei se sabe

    ue a sua +il0a, desde ue +reuenta a sociedade, /a as del1cias de

    toda a ge!te. Jizem ue linda como os deuses.

    F pr1ncipe curvou-se em sinal de estima e 2ratido$ - #ostumo

    dizer muitas vezes de mim para comi2o - continuou Ana Pavlovna,

    depois de um momento de sil/ncio, apro.imando-se do pr1ncipe com

    um sorriso 2racioso, como se uisesse si2ni+icar ue estavam

    terminadas as conversas sobre assuntos pol1ticos e mundanos e ue

    as con+id/ncias 1ntimas iam principiar -, muitas vezes di2o a mim

    mesma ue a +elicidade neste mundo coisa muito desi2ualmente

    repartida$ Porue seria ue o destino l0e deu a si, meu ami2o, dois

    +il0os to belos, ? parte o Anatole, o seu ben8amim, ue no me

    a2rada por a1 alm - tin0a lanado esta observao num tom ue no

    admitia rplica, +ranzindo as sobrancel0as$$$ -, to encantadores9 :im,

    uando o sen0or, na verdade, a pessoa ue menos import4ncia li2aaos +il0osN no os merece$

    E teve um sorriso vitorioso$

    - 4ue quer ;a%ater diria que eu !o te!"o a bossa da

    pater!idade - respondeu o pr1ncipe$

    - Jei.emo-nos de brincadeiras$ Duero +alar-l0e a srio$ :abe9

    Estou descontente com o seu, +il0o mais novo$ Aui entre nBs - e um

    ar de tristeza l0e perpassou pelo rosto -, +alaram dele perante :ua

    >a8estade, e lamentam-no, a si$$$F pr1ncipe no respondeu, mas ela, lanando-l0e um ol0ar

    si2ni+icativo, a2uardava, sem dizer palavra, ue ele dissesse ualuer

    coisa$ F pr1ncipe 7assili +ranziu as sobrancel0as$

    - Due uer ue eu +aa9 - acabou por dizer$- 3em sabe ue +iz

    tudo o ue um pai pode +azer pela educao dos seus +il0os, e o ue

    certo ue ambos no passam de dois imbecis$ F @ipBlito, pelo

    menos, um imbecil sosse2ado, enuanto o Anatole um imbecil

    turbulento$ a Cnica di+erena entre os dois - acrescentou com um

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    sorriso mais constran2ido e acentuado ue de costume, enuanto as

    ru2as ue se l0e +ormavam em tomo da boca denunciavam mais

    claramente do ue nunca a amar2ura e a irritao ue

    inopinadamente o invadiam$- Para ue ue as pessoas como o sen0or 0o-de ter +il0os9 :e

    no +osse pai, nada teria a censurar-l0e - disse Ana Pavlovna,

    er2uendo os ol0os cismadores$

    - Sou o seu +iel escravo, e s a si o posso con+iar$ Fs meus +il0os

    so os impecil"os da min0a e#ist!cia. :o a min0a cruz,

    compreendo-o per+eitamente$ Due uer9$$$

    #alou-se, mostrando com um 2esto ue se submetia ao cruel

    destino$ Ana Pavlovna assumiu uma atitude cismadora$

    - unca se lembrou, meu caro pr1ncipe, de casar o seu +il0o

    prBdi2o, o Anatole9 Jizem ue as solteironas t/m a mania do

    casal"e!to. o creio ue eu 8 este8a em idade de ter +rauezas

    semel0antes, mas o ue certo ue con0eo uma criaturin0a ue

    muito in+eliz com o pai, uma nossa parente, uma princesa

    5ol:o!s:aia.

    F pr1ncipe 7assili no respondeu, embora, com o seu 2olpe devista e a sua +inura de 0omem de sociedade, desse a entender, num

    simples movimento de cabea, ue no esueceria o +acto$

    - Pois a verdade ue o Anatole me custa por ano ? volta de

    uarenta mil rublos - disse ele, sem ue, evidentemente, l0e +osse

    poss1vel re+rear o curso dos pensamentos$ Esteve al2uns instantes

    calado$ - Due ser +eito dele, dentro de uns cinco anos, se as coisas

    continuarem da mesma maneira9qui tem a vanta2em de se ser pai.

    rica, essa sua princesa9- F pai riu1ssimo e avaro$ 7ive no campo$ Jeve ter ouvido

    +alar nele$ um tal pr1ncipe 3olMonsMi, ue se re+ormou ainda em vida

    do +alecido imperador e a uem c0amavam o Orei da PrCssia$ um

    0omem bastante inteli2ente, mas com as suas manias$ o nada

    cBmodo$ pobre peque!a 8 i!/eli como tudo. Tem um irmo ue

    casou 0 pouco com Lisa >einen, um a8udante-de-campo de Qutuzov$

    Jeve aparecer 0o8e por a1$

    - 3ua, querida !!ette - disse o pr1ncipe, pe2ando,

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    subitamente, na mo da sua interlocutora e pu.ando-a a si$ - rra!0e-

    me isso e eu serei o seu muito +iel escravo para sempre, como o meu estaroste costuma escrever nos seus

    relatBrios com um +$ :e de e.celente +am1lia e rica, no precisomais nada$

    E com os seus 2estos +ceis, +amiliares e 2raciosos ue tanto o

    distin2uiam, o pr1ncipe inclinou-se, apertou a mo da dama de 0onor,

    bei8ou-a, e de novo se enterrou na sua macia poltrona, desviando a

    vista$

    - 6spere - disse Ana Pavlovna, pensativa$ - Ainda 0o8e mesmo

    +alarei ? Lisa, a mul0er do 8ovem 3olMonsMi$ E talvez as coisas se

    arran8em$ Na sua /am1lia comearei a apre!der para solteiro!a.

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    Captulo II

    F salo de Ana Pavlovna +oi-se enc0endo a pouco e pouco$ Toda

    a aristocracia de Petersbur2o tin0a aparecido, 2ente de idades e

    caracteres muito diversos, mas toda do mesmo mundo$ #0e2ou

    tambm a +il0a de 7assili, a bela @elena, ue vin0a buscar o pai para

    a +esta da Embai.ada de In2laterra$ E.ibia o seu mono2rama imperial

    e trazia um vestido de noite$ E tambm apareceu a 8ovem e

    peuenina princesa 3olMonsMaia, con0ecida por a mul0er mais

    sedutora de Petersburgo, ue casara no Cltimo Inverno e ainda no

    aparecera na sociedade por causa do seu estado de 2ravidez, mas

    ue costumava +reuentar as reunies 1ntimas$ Por +im tambm

    sur2iu o pr1ncipe @ipBlito, o +il0o do pr1ncipe 7assili, na compan0ia de

    >ortemart, a uem apresentou, e em se2uida o abade >orio e muitos

    outros$- Ainda a no viram, no a con0ecem9 o con0ecem min0a tia9

    - dizia Ana Pavlovna para os seus convidados, e com a maior

    2ravidade ia-os conduzindo um por um, ? medida ue c0e2avam, -

    at 8unto de uma minCscula sen0ora de idade, en+eitada de 2randes

    +itas, ue estava na sala cont12ua$ Jepois, pronunciando o nome de

    cada um deles, passeava, lentamente, os ol0os entre os seus

    convidados e min0a tia, e da1 a pouco desaparecia$

    Todos eram obri2ados a cumprir auele ritual, saudando esta tiadescon0ecida e inCtil, ue a nin2um interessava$ Ana Pavlovna,

    muito sria e solene, assistia ? cerimBnia dos cumprimentos, dando a

    sua aprovao, sem abrir a boca$ >in0a tia +alava a toda a 2ente,

    invariavelmente, nos mesmos termos, do estado da saCde de cada

    um, do estado da sua prBpria saCde e do estado da saCde de :ua

    >a8estade, o ual, 2raas a Jeus, passava a2ora mel0or$ E todos,

    sem mostrar, por decoro, ue se davam pressa, se iam despedindo da

    idosa sen0ora com a sensao de al1vio ue se tem depois de se

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    cumprir uma en+adon0a obri2ao e, claro est, para a no tornarem

    a ver em toda a roda da noite$

    A 8ovem princesa 3olMonsMaia tin0a trazido consi2o o seu

    bordado num peuenino saco de veludo lavrado a ouro$ F seu bonitol?biozin0o superior, li2eiramente sombreado por uma breve

    penu2em, era um pouco curto, mas nem por isso parecia menos

    2racioso entreaberto nem era menos delicioso no momo ue +azia ao

    apoiar-se no lbio in+erior$ #omo em 2eral acontece com todas as

    pessoas realmente sedutoras, estas suas peueninas imper+eies, o

    lbio curto de mais e a boca entreaberta, tin0am nela um atractivo

    especial, uma beleza prBpria$ Era uma ale2ria para todos a presena

    desta +utura me to bonita, c0eia de saCde e de vida, suportando

    per+eitamente os incBmodos do seu estado$ Fs vel0os e os 8ovens

    entediados e c0eios de en+ado ima2inavam-se como ela sB por terem

    passado al2uns momentos na sua intimidade$ Todos os ue

    conversavam al2uns instantes com a princesin0a podiam ver como o

    seu luminoso sorriso cintilava apBs cada uma das suas palavras e

    como os seus dentes sempre ? mostra eram de uma brancura

    esplendorosa, uanto bastava para ue todos se sentissem nauelemomento de uma particular a+abilidade$ E era assim a iluso ue ela

    criava em toda a 2ente$

    A princesin0a, no seu andar ondulante, camin0ando em

    passin0os rpidos, deu a volta ? sala, o saco de trabal0o na mo, e

    depois de imprimir um 8eito 2racioso ? toilette veio sentar-se num

    div, 8unto do samovar de prata, como se tudo ue ela +izesse +osse

    uma espcie de divertimento no sB para ela prBpria, mas tambm

    para aueles ue a cercavam$- ?rou#e comigo o meu trabal"o - e.clamou ela, abrindo o

    sauin0o bordado a ouro e como se se diri2isse, a toda a 2ente ao

    mesmo tempo$

    - &uidado. !!ette, !o me /aa uma partida - prosse2uiu ela,

    desta vez para a dona da casa$ -*a!dou-me dier que era ape!as

    uma peque!a reu!io7 ol"e como eu %e!"o %estida.

    Jizendo o ue estendeu os braos para mel0or dei.ar ver o seu

    ele2ante vestido cinzento, 2uarnecido de rendas, com uma lar2a +ita

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    a servir de cinto, um pouco abai.o do seio$

    - 6ste0a desca!sada. ;isa, ser$ sempre a mais bela- replicou Ana

    Pavlovna$

    - Sabe, o meu marido %ai aba!do!ar-me - prosse2uiu ela nomesmo tom, diri2indo-se a um 2eneral$- 7ai procurar a morte$ Ji2a-

    me para que ser%e esta maldita guerra - disse ao pr1ncipe 7assili, e,

    sem esperar ualuer resposta, voltou-se para a +il0a deste, a bela

    @elena$

    - 4ue pessoa deliciosa, aquela pri!cesi!"a - murmurou o

    pr1ncipe 7assili, em voz bai.a, para Ana Pav(ovna$

    Pouco depois da princesin0a, entrou na sala um 8ovem

    corpulento e macio, de cabelo rapado, lunetas, calas claras, ? moda

    da poca, um alto 0abote +raue pardacento$ Este moo era +il0o

    natural de uma clebre persona2em do tempo de #atarina, o conde

    3esuMov, nauela altura moribundo em >oscovo$ Ainda no tin0a

    ualuer ocupao, acabava de c0e2ar do estran2eiro, onde +ora

    educado, e era a primeira vez ue aparecia na sociedade$ Ana

    Pav(ovna acol0eu-o com a saudao ue costumava usar para com

    as pessoas de mais bai.a classe$ o entanto, apesar deste seuacol0imento de in+erior ualidade, ao v-(o entrar dei.ou

    transparecer no rosto medo e inuietao, como uando nos vemos

    perante ualuer coisa de desmedido e +ora do seu lu2ar$ Pedro era,

    realmente, um pouco maior ue as outras pessoas, mas o receio ue

    se pintara no rosto de Ana Pavlovna podia ser antes motivado por

    esse ol0ar ao mesmo tempo t1mido e penetrante, observador e

    +ranco, ue o distin2uia de todos os demais convidados$

    - @ muito am$%el da sua parte. Se!"or Pedro, ter %i!do %isitaruma pobre doe!te - disse-l0e Ana Pavlovna, trocando um ol0ar de

    p4nico com a tia, a uem o ia conduzindo$

    Pedro resmun2ou uma +rase incompreens1vel enuanto com os

    ol0os continuava ? procura de ualuer coisa$ Teve um sorriso 8ovial

    ao cumprimentar a princesin0a, como se ela +osse um con0ecimento

    1ntimo, e apro.imou-se da tia$ F medo de Ana Pavlovna no era

    destitu1do de +undamento, pois a verdade ue Pedro a+astou-se

    dessa sen0ora sem esperar ue a tia conclu1sse as suas

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    consideraes acerca da saCde de :ua >a8estade$ Ana Pavlovna,

    0orrorizada, deteve-o$

    - o con0ece o abade >orio9 uma pessoa muito

    interessante$$$ - disse-l0e ela$- :im, ouvi +alar do seu plano de paz perptua, ue aliciante$

    >as ser poss1vel9$$$

    - Ac0a ue sim9$$$ - observou Ana Pavlovna, para dizer al2uma

    coisa, pronta a voltar ao cumprimento dos seus deveres de dona de

    casa$

    Pedro, porm, cometeu uma se2unda indelicadeza primeiro

    a+astara-se da sua interlocutora antes de ela ter acabado de +alarN

    a2ora retin0a esta, diri2indo-l0e a palavra, uando ela precisava de o

    dei.ar$ Je cabea bai.a e a+astando as suas 2randes pernas, pRs-se a

    demonstrar a Ana Pavlovna a razo por ue considerava uimrico o

    plano do abade >orio$

    - !alaremos disso mais tarde - disse Ana Pavlovna, sorrindo$

    E, libertando-se dauele 8ovem sem 0bitos de sociedade,

    re2ressou ?s suas ocupaes de dona de casa, continuando a ouvir e

    a observar, pronta sempre a intervir onde a conversa esmorecesse$Tal ual como um contramestre de uma +brica de +iao ue, depois

    de instalar cada um dos seus operrios diante do seu tear, se pe a

    andar de um lado para o outro, observando se os +usos param ou se

    esto a produzir ualuer ru1do anormal, ran2ente ou spero de mais,

    e incansavelmente os retm ou l0es imprime o andamento

    necessrio, assim Ana Pav(ovna ia e vin0a pelo salo, se apro.imava

    dos 2rupos ue se calavam ou +alavam de mais, e com uma palavra

    pronunciada a tempo obri2ava a muina a comportar-se nos 8ustoslimites das conveni/ncias mundanas$ >as todos estes mCltiplos

    cuidados no a impediam de dei.ar perceber aos outros o receio

    especial ue l0e causava o comportamento de Pedro$ Ia-o se2uindo

    atentamente com os ol0os uando ele se apro.imava para escutar o

    ue se dizia ao p de >ortemart e depois diri2ia-se para o outro

    2rupo onde ponti+icava o abade$ Para Pedro, ue tin0a sido educado

    no estran2eiro, esta soire em casa de Ana Pavlovna era a primeira

    reunio mundana a ue assistia na Cssia$ o i2norava ue nestas

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    salas estava reunida a +ina +lor da 2ente instru1da de Petersbur2o e

    por isso abria muito os ol0os, como uma criana diante de uma lo8a

    de brinuedos$ :B receava perder ualuer sbia observao ue l0e

    +osse dado ouvir$Ao ver reunidas ali todas auelas persona2ens de aspecto

    distinto e c0eias de certezas, estava sempre ? espera de ualuer

    coisa particularmente espiritual$ Por +im, apro.imou-se de >orio$ A

    conversa tin0a-l0e parecido interessante$ Jeteve-se, a2uardando o

    momento de e.por o seu ponto de vista, como costuma +azer a 2ente

    nova$

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    Captulo III

    soir8e de Ana Pavlovna atin2ia o au2e$ Fs +usos esparsos pela

    sala roncavam sem atritos e constantemente$ :e se abstra1sse de

    min0a tia, 8unto da ual no estava seno uma sen0ora idosa, de

    rosto esulido e como ue consumido pelas l2rimas, al2o

    deslocada no meio dauela bril0ante sociedade, todos os demais

    convidados se 0aviam repartido em tr/s 2rupos$ Sm deles, +ormado

    especialmente de 0omens, tin0a por centro o abadeN no outro, uma

    roda de 2ente nova, ponti+icava a princesa 3olMonsMaia, toda rosada e

    de +ormas um tudo-nada amplas de mais, atendendo ? sua 8uventudeN

    o terceiro era diri2ido por >ortemart e Ana Pavlovna$

    F visconde era um 8ovem amvel, de traos +inos e maneiras

    suaves, ue a si mesmo, visivelmente, se considerava uma +i2ura

    sensacional, embora, por mera boa educao, se o+erecesse,modestamente, ? curiosidade da sociedade em ue se encontrava$

    Ana Pav(ovna, visivelmente tambm, dele tirava partido para re2alo

    dos seus convidados$ A semel0ana do c"e/e de mesa, ue 2osta de

    apresentar, como coisa superlativamente delicada, uma posta de

    carne em ue nin2um ousaria tocar numa cozin0a sBrdida, assim, na

    sua reunio$ Ana Pavlovna ia servindo aos seus convidados, primeiro

    o visconde, e em se2uida o abade, como se se tratasse de i2uarias

    superlativamente reuintadas$ o 2rupo de >ortemart tin0a vindo ?baila, imediatamente, o assass1nio do duue de En20ien$ F visconde

    era de opinio de ue o duue +ora v1tima da sua ma2nanimidade e

    ue 0avia razes particulares para o ressentimento de 3onaparte$

    - ", %e0amos. &o!te-!os isso, %isco!de - e.clamou Ana

    Pavlovna, apercebendo-se com 8Cbilo de ue esta simples +rase

    &o!te-!os isso, %isco!de, tin0a um sabor a ;u1s AB.

    F visconde inclinou-se em sinal de obedi/ncia e sorriu com toda

    a cortesia$ Ana Pavlovna +ez ue o 2rupo o rodeasse e convidou toda

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    a 2ente a ouvir a sua 0istBria$

    - 3 %isco!de co!"eceu mo!se!"or pessoalme!te- se2redou ela

    ao ouvido de um dos convidados$ - 3 %isco!de 8 um !arrador per/eito

    - 2arantia a outro$- B-se logo !ele o "omem de sociedade - dizia aum terceiro$ E o 8ovem +oi apresentado ? sociedade sob o seu 4n2ulo

    mais distinto e +avorvel, como um rosbi+e, num prato bem uente,

    todo 2uarnecido de salsa$

    F visconde preparou-se para dar princ1pio ? sua narrativa e

    sorriu com +inura$

    - 7en0a c, querida Cele!a- disse Ana Pavlovna ? bela princesa,

    ue estava a dist4ncia, no centro do outro 2rupo$

    A princesa @elena sorriu levantou-se, conservando nos lbios

    esse sorriso imutvel de mul0er impecavelmente bela com ue

    entrara no salo$ o li2eiro roa2ar do seu vestido de baile todo

    branco, 2uarnecido de 0era e mus2o, no esplendor das suas brancas

    espduas, no bril0o da sua cabeleira e no cintilar dos seus bril0antes,

    avanou por entre uma ala de caval0eiros, e, emperti2ada, sem +itar

    nin2um em especial, embora sorrindoa todos, como se assim +osse

    dando a cada um o direito de admirar a beleza da sua cintura, dosseus ombros c0eios, do seu decote muito pronunciado, con+orme a

    moda da poca, levando apBs si, na sua esteira, todo o esplendor da

    reunio, apro.imou-se de Ana Pavlovna$ @elena era to bela ue no

    tra1a a mais peuena sombra de coquetterie7pelo contrrio, parecia

    ter ver2on0a da sua incontestvel, da sua por de mais poderosa e por

    de mais triun+ante beleza$ Jir-se-ia ser seu dese8o, sem o conse2uir,

    amortecer-l0e o prBprio esplendor$

    - 4ue bela mul"er- eis a +rase ue vin0a aos lbios de toda a2ente uando ela passava$ #omo ao peso de uma estran0a

    impresso, o visconde curvou-se um pouco e bai.ou os ol0os no

    >omento em ue ela se instalava diante dele e o iluminava, a ele

    tambm, com o seu imutvel sorriso$

    - *i!"a se!"ora, dia!te de um tal auditrio, receio !o ser capa

    - disse ele, inclinando-se e sorrindo$

    A princesa apoiou num 2uridon um dos seus braos nus, bem

    modelados, sem pensar ue seria Ctil responder$ Esperava,

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    sorridente$ Enuanto durou a 0istBria manteve-se com o busto erecto,

    contemplando, uma vez por outra, o seu lindo brao, cu8a +oi-ma

    per+eita se esma2ava contra a mesa, ou o prBprio colo, mais

    encantador ainda, sobre o ual a8eitava a 2ar2antil0a de diamantesNvrias vezes procurou acertar as pre2as do vestido, e, uando a

    narrativa produzia al2um e+eito, trocava um ol0ar com Ana Pavlovna,

    copiando, imediatamente, a e.presso da dama de 0onor, para

    depois imobilizar, de novo, a mscara no seu resplandecente sorriso$

    #omo @elena, a princesin0a tin0a tambm abandonado a sua mesa

    de c0$

    - 6spere, %ou buscar o meu bordado- disse ela$ - 6!to, em que

    est$ a pe!sar - acrescentou, diri2indo-se ao pr1ncipe @ipBlito$ -

    ?raga-me o meu saqui!"o.

    A princesa, ue sorria, e diri2ia a palavra a todos, produziu um

    certo burburin0o ao sentar-se, ale2remente, enuanto a8eitava as

    pre2as do vestido$

    - A2ora, sim - e.clamou, e, pedindo ue se principiasse, pRs-se

    ela prBpria a trabal0ar$

    F pr1ncipe @ipBlito, ue veio trazer-l0e o sauin0o, acompan0ou-a na sua mudana de lu2ar, e, apro.imando dela um /auteil,sentou-

    se a seu lado$

    F e!ca!tador @ipBlito impressionava pela sua e.traordinria

    parecena com a irm, tanto mais ue, apesar dessa semel0ana, era

    muit1ssimo +eio$ Fs seus traos pareciam-se, de +acto, com os da

    irm, mas nesta tudo resplandecia iluminado pelo seu eterno sorriso,

    8ovem, satis+eito, pleno de vida, e (6ela rara per+eio da sua beleza

    clssicaN no irmo, pelo contrrio, o rosto era como ueentenebrecido pela +alta de inteli2/ncia e por uma constante

    e.presso a um tempo su+iciente e azeda$ Duanto ? +i2ura, era de

    corpo ma2ro e en+esado$ Tin0a os ol0os, o nariz, a boca

    continuamente contra1dos numa careta inde+inida e desa2radvelN os

    braos e as pernas tomavam-l0e sempre posies pouco naturais$

    - No se trata de uma "istria de +antasmas9 - murmurou ele, ao

    sentar-se ao lado da princesa, enuanto assestava o lorg!o!, como

    se no pudesse dispensar esse acessBrio para abordar uma conversa$

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    - No, meu caro - e.clamou o narrador, surpreendido,

    encol0endo os ombros$

    - @ que detesto as "istrias de /a!tasmas - tornou ele, num tom

    de ue se depreendia ue ele +alava e sB depois de +alar compreendiao ue ueria dizer$

    Taman0a era a se2urana ue pun0a nas suas palavras ue

    nin2um poderia dizer se essas palavras eram muito sensatas ou

    muito estCpidas$ 7estia um +raue verde-carre2ado, uns cales cor-

    de-rosa-p$lidos, meias de seda e escarpins$

    F visconde contava com muito a2rado a 0istBria, ento muito

    divul2ada, se2undo a ual o duue de En20ien tin0a ido

    secretamente a Paris encontrar-se com >ademoiselle Geor2es e a1 se

    l0e deparara 3onaparte, ue, por essa altura, tambm era 1ntimo da

    +amosa actriz$ a presena do duue$ apoleo tin0a tido, de sCbito,

    um peueno desmaio, coisa ue l0e acontecia +reuentes vezes, e

    +icara ? merc/ do duue, circunst4ncia de ue este no uisera tirar

    partido$ 3onaparte, mais tarde, vin2ara-se desta ma2nanimidade do

    duue mandando matar o adversrio$

    A 0istBria era muito bonita e c0eia de interesse, sobretudonauele ponto em ue os dois rivais se recon0eciam de repente, e as

    sen0oras pareceram muito emocionadas com isso$

    - 6!ca!tador - e.clamou Ana Pavlovna, lanando um ol0ar

    interro2ativo ? princesin0a$

    - 6!ca!tador- murmurou a princesin0a, espetando a a2ul0a no

    bordado, como para mostrar ue o interesse e o encanto da 0istBria a

    impediam de trabal0ar$

    F visconde mostrou apreciar esta 0omena2em muda, e, sorrindo,2rato, prosse2uiu na sua narrativaN mas nesse momento Ana

    Pavlovna, ue ainda no tin0a dei.ado de observar o 8ovem ue tanto

    a assustava, ao ver ue ele pun0a calor demasiado na sua conversa

    com o abade, +alando muito alto, deu-se pressa em comparecer no

    local ameaado$ E+ectivamente$ Pedro tin0a-se embren0ado com o

    abade numa conversa sobre o euil1brio pol1tico, e este, visivelmente

    interessado pelo in2nuo entusiasmo do 8ovem, pusera-se a

    desenvolver perante ele as suas teorias +avoritas$ Ambos ouviam e

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    respondiam com 2rande vivacidade e muito espontaneamente, e isso

    no a2radava a Ana Pavlovna$

    - A soluo o euil1brio europeu eo direito dos po%os - dizia o

    abade$ - de toda a conveni/ncia para um Estado poderoso como aCssia, reputado brbaro, colocar-se 2enerosamente ? +rente de uma

    li2a ue ten0a por ob8ectivo o euil1brio da Europa, e assim ue a

    Cssia salvar o mundo

    - E como ue se obter esse euil1brio9 - principiou Pedro$

    >as neste momento Ana Pavlovna apro.imou-se, e, +itando este

    com severidade, per2untou ao italiano como ue ele ac0ava o clima

    do pa1s$

    F rosto do abade mudou repentinamente, tomando auela

    e.presso morti+icada e doce ue era a sua e.presso 0abitual

    uando +alava com sen0oras$

    - To encantado ando com a 2entileza de esp1rito e a distino

    da 2ente da sociedade, sobretudo do elemento +eminino, em cu8o

    meio tive a +elicidade de ser recebido, ue ainda no tive tempo de

    pensar no clima - respondeu ele$

    :em abandonar o abade nem Pedro$ Ana Pavlovna, para mel0oros observar, arrastou-os consi2o para o 2rupo em ue estava$

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    Captulo IV

    essa altura um novo convidado penetrou no salo$ Era o 8ovem

    pr1ncipe Andr 3olMonsMi, o marido da princesin0a, um belo moo, de

    peuena estatura e traos acentuados e secos$ Tudo nele, desde o

    ol0ar lasso e en+adado ao andar tranuilo e circunspecto, o+erecia o

    mais violento contraste com a sua mul0erzin0a, a inuietao em

    pessoa$ #on0ecia to bem por dentro e por +ora a 2ente da

    sociedade, ue tanto o en+adava, ue bastava v/-la e ouvir-l0e o

    ru1do das vozes para a sentir insuportvel$ E entre todas as pessoas

    ue mais o e.asperavam contava-se, precisamente, a sua linda

    mul0erzin0a$ #om um ricto ue l0e alterou os traos re2ulares,

    a+astou-se dela assim ue a viu$ Jepois, bei8ando a mo de Ana

    Pavlovna e piscando os ol0os, perpassou a vista pela assist/ncia$

    - listou-se para ir para a guerra, meu pr1!cipe - disse AnaPavlovna$

    - F 2eneral Qutuzov - volveu 3olMonsMi, acentuando a Cltima

    s1laba o%, como os !ranceses - te%e a co!desce!d!cia de me

    c"amar para a0uda!te-de-campo...

    - 6 ;isa, sua mul"er

    - Ir para o campo$

    - E no tem escrCpulos de nos privar da presena da sua

    encantadora mul0er9- !dr8 - e.clamou esta Cltima, diri2indo-se ao marido com a

    mesma couetterie com ue se diri2ia aos estran0os -, ue 0istBria

    essa de >ademoiselle Geor2es e 3onaparte ue o visconde acaba de

    nos contar9

    F pr1ncipe Andr +ranziu as sobrancel0as e desviou a cara$ Pedro,

    ue desde o momento em ue Andr entrara no salo no mais tin0a

    dei.ado de o se2uir com o seu ol0ar ale2re e amistoso, apro.imou-se

    dele e pe2ou-l0e no brao$ F pr1ncipe Andr, sem se voltar, teve uma

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    visa2em de descontentamento para com auele ue l0e pe2ava no

    brao, mas, ao deparar-se-l0e o rosto sorridente de Pedro, um sorriso

    inesperado, amvel e bom se l0e pintou tambm na +i2ura$

    - Due ve8o9 Tambm tu na alta-roda9 - e.clamou$- Tin0a a certeza de ue o 0avia de encontrar aui - retoruiu

    Pedro$- Dueria pedir-l0e ue me desse de cear - acrescentou em voz

    bai.a, para no perturbar o visconde, ue continuava a sua 0istBria -

    poss1vel9

    - o, imposs1vel - respondeu Andr, rindo e +azendo

    compreender a Pedro, pela maneira como l0e apertou a mo, ue isso

    era coisa ue nem se per2untava$

    Duis dizer mais, mas nessa altura o pr1ncipe 7assili e a +il0a

    levantaram-se, e os 8ovens abriram alas para os dei.ar passar$

    - Jesculpe, meu caro visconde - disse em +ranc/s o pr1ncipe

    7assili, se2urando-o amistosamente pela man2a, para ue ele se no

    levantasse$ - Esta estopada da +esta em casa do embai.ador priva-me

    do prazer de o ouvir e obri2a-me a interromp/-lo$ Lamento muito ter

    de abandonar a sua maravil0osa recepo - disse ele, diri2indo-se a

    Ana Pavlovna$:ua +il0a, a princesa @elena, soer2uendo li2eiramente a cauda

    do vestido, passou entre uma ala de cadeiras e o sorriso ainda l0e

    iluminou mais o belo rosto$ Pedro contemplou esta beldade, ao v/-la

    passar diante de si, com ol0os onde 0avia admirao e uase receio$

    - muito bela - disse o pr1ncipe Andr$

    - - repetiu Pedro$

    Ao passar, o pr1ncipe 7assili pe2ou no brao de Pedro, e

    voltando-se para Ana Pavlovna- Jomestiue-me este urso - disse$ - @ um m/s ue o ten0o em

    min0a casa e a primeira vez ue o ve8o na sociedade$ o 0 nada

    mel0or para os rapazes ue o conv1vio das mul0eres inteli2entes$

    Ana Pavlovna teve um sorriso e prometeu tomar conta de Pedro,

    o ual, como ela muito bem sabia, era aparentado com o pr1ncipe

    7assili pelo lado paterno$ A sen0ora idosa ue estava a +azer

    compan0ia a min0a tia levantou-se, apressadamente, e correu para

    +alar com o pr1ncipe 7assili, ue 8 estava no vest1bulo$ Perdera por

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    completo o +also ar de interesse mundano ue aparentara at ento$

    F seu bondoso rosto macerado pelas l2rimas sB re+lectia receio e

    inuietao$

    - Due me diz, pr1ncipe, do meu 3Bris9 - e.clamou ela, correndoatrs dele$ Pronunciava o nome 3Bris acentuando particularmente o

    o.- ; no posso estar mais tempo em Petersbur2o$ Ji2a-me, ue 0ei-

    de eu comunicar ao meu desventurado +il0o9

    #onuanto o pr1ncipe 7assili estivesse a ouvi-la com desprazer e

    uase ue impolidamente, dando a perceber, mesmo, uma certa

    impaci/ncia, a sen0ora ue o perse2uia sorria-l0e com uma

    amabilidade enternecedora e, para o no dei.ar a+astar-se dela,

    pe2ava-l0e, inclusivamente, num brao$

    - o l0e custava nada dizer uma palavrin0a ao imperador, estou

    convencida de ue ele seria lo2o trans+erido para a Guarda -

    prosse2uiu ela$

    - Este8a certa de ue +arei tudo o ue puder, princesa -

    respondeu o pr1ncipe 7assili -, mas no me +cil diri2ir-me assim ao

    imperador$ Ac0ava mel0or ue pedisse antes a umiantsov por

    intermdio do pr1ncipe Galit4ne$ Era bem mel0or$A sen0ora idosa era a princesa JrubetzMaia, um dos mais ilustres

    nomes da aristocracia russa, mas, pobre, 0 muito ue no

    +reuentava a sociedade e tin0a perdido as suas anti2as relaes$

    7iera ?uela reunio para tentar obter a trans+er/ncia do seu +il0o

    Cnico para a Guarda$ o se apresentara na recepo de Ana

    Pavlovna seno para +alar ao pr1ncipe 7assili e no +ora por outra

    razo ue escutara a 0istBria do visconde$ >as as palavras do

    pr1ncipe 7assili tin0am-na desoladoN no belo rosto pintou-se-l0e, porinstantes, uma espcie de irritao, mas no por muito tempo$ Lo2o

    se pRs a sorrir, e apertando muito o brao do pr1ncipe

    - Fua, pr1ncipe disse -, nunca l0e pedi coisa al2uma, nunca

    mais l0e tornarei a pedir se8a o ue +or, nunca l0e +alei na amizade de

    meu pai por si$ >as a2ora peo-l0e em nome de Jeus ue +aa isso

    por meu +il0o e +icar-l0e-ei recon0ecida at ao +im da vida -

    acrescentou, precipitadamente$- o se zan2ue e prometa-me

    interessar-se$ ; pedi a Galitzine, e ele no me uis atender. Se0a bom

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    me!i!o como a!tigame!te- e procurava sorrir, embora as l2rimas

    l0e boiassem nos ol0os$

    - Pai, vamos c0e2ar tarde - e.clamou a princesa @elena, ue

    esperava ? porta, inclinando a bela cabea sobre o ombro de esttuaanti2a$

    A in+lu/ncia de ue se des+ruta na sociedade um capital ue

    convm salva2uardar para ue se no dissipe$ F pr1ncipe 7assili

    sabia-o muit1ssimo bem, e, por isso, persuadido de ue, se se pusesse

    a interceder por toda a 2ente, nada mais poderia pedir para si

    prBprio, raramente lanava mo do crdito de ue dispun0a$ o caso

    da princesa JrubetzMaia, no entanto, sobretudo depois do seu Cltimo

    apelo, viera-l0e ao esp1rito uma espcie de remorso$ Tin0a ela

    evocado ualuer coisa de muito verdadeiro$ Fs primeiros passos na

    carreira devia-os ele, e+ectivamente, ao pai da princesa$ Alm disso,

    pela +orma como ela a2ia, veri+icava estar em presena de uma

    dessas mul0eres, ou, antes, de uma dessas mes, ue, uando se

    l0es mete ualuer coisa na cabea, sB desistem desde ue

    conse2uem o ue dese8am, ou ento, no caso de uma ne2ativa, so

    muito capazes de teimar, dia apBs dia e a toda a 0ora, c0e2andoinclusivamente a recorrer a cenas pCblicas$ !oi esta Cltima

    considerao ue o demoveu$

    - Duerida Ana >iMailovna - disse ele, no seu tom +amiliar 0abitual

    e ao mesmo tempo desprendido -, -me uase imposs1vel +azer o ue

    me pedeN mas, para l0e demonstrar uanto a estimo e como respeito

    a memBria do seu +alecido pai, prometo-l0e ue +arei tudo uanto

    estiver na min0a mo$ Jou-l0e a min0a palavra de ue o seu +il0o

    ser trans+erido para a Guarda$ Est contente9- >eu uerido ami2o, meu ben+eitor o esperava outra coisa

    de siN eu bem sabia ue era bom$

    F pr1ncipe +ez meno de partir$

    - Espere, mais duas palavras$ Sma vez na Guarda$$$ -0esitou$-

    #omo est em boas relaes com >iMail Ilarionovitc0 Qutuzov, peo-

    l0e ue l0e +ale de 3Bris para a8udante-de-campoN +icarei assim mais

    tranuila e nada mais l0e pedirei$$$

    F pr1ncipe 7assili teve um sorriso$

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    - ada l0e prometo$ >al ima2ina os pedidos ue c0ovem sobre

    Qutuzov desde ue +oi nomeado 2eneral-c0e+e$ Ele prBprio me disse

    ue todas as sen0oras de >oscovo tin0am armado um complot para

    l0e o+erecer os +il0os como a8udantes-de-campo$- A0, prometa-me$ o o dei.arei partir, meu uerido ami2o,

    meu ben+eitor$$$

    - Pai - voltou a bela @elena, no mesmo tom -, vamos c0e2ar

    tarde$

    - 3em, at D vista, adeus$ Est a ver9

    - Ento +ala aman0 ao imperador9

    - :em +alta, mas no ue diz respeito a Qrituzov no prometo

    nada$

    - A0, prometa, prometa$ 3asile - e.clamou Ana >iMailovna,

    perse2uindo-o com um sorriso de mul0er coquette,outrora natural

    nela, certamente, mas ue ento estava lon2e de se 0armonizar com

    a sua mscara decrpita$

    Evidentemente ue tin0a esuecido a idade e, pela +ora do

    0bito, pusera em campo todos os seus e.pedientes +emininos$ o

    entanto, mal o pr1ncipe 7assili saiu, lo2o ela retomou o aspecto +rio econstran2ido ue aparentava anteriormente$ 7oltou ao 2rupo em ue

    o visconde continuava a contar as suas 0istBrias e +in2iu ue

    escutava, a2uardando a oportunidade de se eclipsar, pois o assunto

    ue a levara ali estava resolvido$

  • 8/13/2019 Leon.tolstoi.guerra.e.paz.Vol.1(.Doc)

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    Captulo V

    - >as ue me diz dessa Cltima comdia da sagrao de >ilo9 -

    observou Ana Pavlovna$- 6 a !o%a com8dia dos po%os de G8!o%a e

    ;uca, que iam aprese!tar as suas "ome!age!s ao se!"or 5o!aparte

    se!tado !o tro!o e recebe!do as "ome!age!s das !aes

    dor$%eis No, mas 8 de e!doidecer +ir-se-ia que o mu!do i!teiro

    perdeu a cabea

    F pr1ncipe Andr pRs-se a sorrir ol0ando nos ol0os Ana Pavlovna$

    - @ +eus quem ma d$, ai de quem l"e tocar - disse ele$ !oram

    estas as palavras ue 3onaparte pro+eriu na coroao$ +iem que

    esta%a muito belo qua!do pro!u!ciou estas pala%ras - acrescentou, e

    repetiu a +rase em italiano - +io me lE"a data e guai a c"i la tocca.

    - 6spero, en+im - prosse2uiu Ana Pavlovna - que esta se0a a gota

    que+ar transbordar

    o %aso. 3s sobera!os8 no podem mais comeste "omem, que a todos ameaa.

    - 3s sobera!os No /alo da Fssia - observou o visconde com o

    seu ar cort/s e desencantado, - 3s sobera!os, mi!"a se!"ora 4ue

    /ieram eles por ;u1s ABI, pela rain0a, por >adame 6lisabet" Nada -

    continuou com animao$ - 6 pode crer, esto a receber o castigo

    pela traio D causa dos 5ourbo!s. 3s sobera!os *a!dam

    embai.adores cumprimentar o usurpador$

    E, suspirando, retirou-se com uma e.presso desden0osa$ Fpr1ncipe @ipBlito, depois de ter estado a +itar lon2amente o visconde

    com o seu lorg!o!, ao ouvir estas palavras, desviou-se subitamente,

    voltando-se para a princesin0a, e, pedindo-l0e urna das suas a2ul0as,

    pRs-se a indicar-l0e, desen0ando-as em cima da mesa, as armas dos

    #onds E e.plicava-l0as com uma tal seriedade ue dir-se-ia ue ela

    l0e pedira um tal servio$

    - 5asto de goles, de!teado de goles de blau, 8 a casa de &o!d8

    - murmurou ele$

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    A princesa ouvia-o, sorrindo$

    - :e 3onaparte +icar ainda um ano no trono da !rana -

    prosse2uiu o visconde com ar de uem no ouve o ue os outros

    dizem e est apenas a se2uir o +io das suas ideias a respeito de umassunto ue con0ece mel0or do ue nin2um -, no sei onde iremos

    parar$ #om tantas intri2as, tantas viol/ncias, tantos e.1lios, tantos

    supl1cios, no tarda ue a sociedade +rancesa, a alta sociedade, claro

    est, se ve8a completamente aniuilada e para sempre, e ento$$$

    Teve um movimento de ombros ao a+astar os braos$ Pedro uis

    dar a sua opinio, pois a conversa interessava-o, mas Ana Pavlovna

    ue o vi2iava de perto, interrompeu-o$

    - F imperador Ale.andre - disse ela com auele tom srio com

    ue se re+eria sempre ? +am1lia imperial- declarou ue dei.aria os

    prBprios +ranceses escol0erem a sua +orma de 2overno$ E estou

    convencida de ue no 0 dCvida de ue toda a nao, uma vez

    liberta do 8u2o do usurpador, se lanar nos braos do seu soberano

    le21timo - acrescentou ela, para se mostrar amvel para com um

    emi2rado e um realista$

    - Juvido - observou o pr1ncipe Andr$- FSe!"or Bisco!de

    temtoda a razo ao pensar ue as coisas 8 +oram lon2e de mais$ #reio

    ueser muito di+1cil voltar ao passado$

    - Pelo ue eu ten0o ouvido dizer - interveio Pedro, corando -,

    uase toda a nobreza est 8 do lado de 3onaparte$

    - Isso o ue dizem os bonapartistas - observou o visconde sem

    ol0ar para Pedro$ - muito di+1cil, actualmente, con0ecer a opinio

    pCblica em !rana$

    - 5o!aparte disse-o - ob8ectou o pr1ncipe Andr, sorrindo$ 7ia-semuito bem ue o visconde l0e no a2radava e ue, sem ol0ar para

    ele, era ele ue visava como seu adversrio$

    - =*ostrei-l"es o camin0o da glria> - acrescentou ele, depois de

    uma li2eira pose, citando as prBprias palavras de apoleo=eles !o

    o quiseram7 abri-l"es as mi!"as a!tecHmaras, e!traram por ali de!tro

    aos mo!tes>.., !o sei at8 que po!to te%e o direito de o dier.

    - en0um - replicou o visconde$- Jepois do assassinato do

    duue, at os seus mais +iis partidrios dei.aram de ver nele um

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    0erBi$ Se essa peste c"egou a ser um "eri para certa ge!te -

    acrescentou, diri2indo-se a Ana Pavlovna -, depois do assassi!ato do

    duque "$ mais um m$rtir !o &8u, um "eri de me!os !a ?erra.

    >al tiveram tempo$ Ana Pavlovna e os outros, de aprovar estaspalavras com um sorriso, e 8 Pedro se tin0a lanado, uma vez mais,

    no meio da conversa$ Ana Pavlovna, conuanto pressentisse ue ele

    ia dizer coisas +ora de propBsito, no +oi capaz de o deter$

    - A e.ecuo do duue de En20ien - disse o Se!"or Pedro- +oi

    uma necessidade pCblicaN e para mim o +acto de apoleo no ter

    receio de assumir a responsabilidade de um tal acto sB atesta

    precisamente a sua 2randeza de alma$

    - 3" *eu +eus - murmurou Ana Pavlovna, aterrorizada$

    - &omo. Se!"or Pedro, ac"a que o assassi!ato 8 gra!dea de

    alma- disse a princesin0a, sorrindo e debruando-se sobre o seu

    bordado,

    - " 3" - e.clamaram vrias pessoas$

    - &apital - disse em in2l/s o pr1ncipe @ipBlito, dando palmadas

    na co.a$

    F visconde contentou-se em encol0er os ombros$ Pedro ol0outriun+antemente os seus interlocutores atravs das suas lunetas$

    - Eu +alo assim - prosse2uiu ele, pondo de lado todos os rodeios

    de lin2ua2em- porue os 3ourbons +u2iram da evoluo

    abandonando o povo ? anaruiaN sB apoleo soube compreender a

    evoluo e domin-la$ E a1 est porue, em nome do bem-estar de

    todos, ele no podia deter-se perante a vida de um 0omem$

    - o uereria sentar-se aui a esta mesa9 - interro2ou Ana

    Pavlovna$ >as Pedro, sem l0e responder, continuou- :im - disse ele, cada vez mais animado - apoleo 2rande

    porue soube elevar-se acima da evoluo, porue su+ocou os

    abusos a ue ela tin0a levado, aproveitando o ue nela 0avia de bom,

    isto , a i2ualdade dos cidados e a liberdade do pensamento e da

    imprensa$ E no +oi por outro motivo ue subiu ao Poder$

    - ealmente - interrompeu o visconde -, se, tornando conta do

    Poder, ele o no tem aproveitado para cometer um crime, e con+iasse

    o trono ao seu rei le21timo, era 8usto c0amar-l0e um 2rande 0omem$

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    - apoleo nunca podia ter a2ido dessa maneira$ F povo

    con+iara-l0e o Poder e.actamente para ue ele o livrasse dos

    3ourbons, e por isso mesmo ue o povo viu nele o esto+o de um

    2rande 0omem$ A evoluo +oi uma 2rande coisa - continuou o:en0or Pedro, demonstrando, com esta audaciosa e provocante

    a+irmao, no sB a sua muita 8uventude, mas tambm o seu dese8o

    de dizer tudo de uma vez$

    - A evoluo e o re2ic1dio, 2randes coisas9$$$ Jepois disso$$$ >as

    no seria mel0or sentar-se aui a esta mesa9 - repetia Ana Pavlovna$

    - 3 &o!trato Social - disse o visconde com um sorriso

    condescendente$

    - Eu no +alo do re2ic1dio, +alo de ideias$

    - :im, sim, as ideias de pil0a2em, de assass1nio, de re2ic1dio -

    interrompeu ainda uma voz irBnica$

    - #laro Due se praticaram e.cessos, mas no era isso ue tin0a

    import4nciaN o ue importava eram os direitos do 0omem, a abolio

    dos privil2ios, a i2ualdade dos cidados$ E estas ideias manteve-as

    apoleo inte2ralmente,

    - A liberdade e a i2ualdade - e.clamou, desden0osamente, ovisconde, ue parecia uerer, +inalmente, mostrar a srio ?uele

    mancebo a tolice dos seus ar2umentos -, tudo isso so +rases sonoras

    de 0 muito sem sentido$ Duem ue no 2osta da liberdade e da

    i2ualdade9 ; o :alvador pre2ava a liberdade e a i2ualdade$ !oram os

    0omens mais +elizes depois da evoluo9 Pelo contrrio, nBs ue

    uer1amos a liberdade, e apoleo +oi uem acabou com ela$

    F Pr1ncipe Andr, sorrindo, ora +itava Pedro, ora o visconde, ora a

    dona da casa$ o primeiro momento, uando Pedro pronunciou asprimeiras palavras$ Ana Pavlovna +icou como +ulminada, no obstante

    todos os seus 0bitos de sociedade$ >as, ao veri+icar ue, apesar dos

    sacr1le2os ar2umentos de Pedro, o visconde no perdia as estribeiras,

    uando se convenceu de ue no era poss1vel su+ocar tais palavras,

    2an0ou 4nimo e, unindo as suas +oras ?s do visconde, caiu sobre o

    orador$

    - *as, meu caro Se!"or Pedro e.clamou -, como ue o sen0or

    e.plica ue esse 2rande 0omem mandasse e.ecutar o duue, um

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    simples cidado a+inal, sem 8ul2amento prvio e sem ue ele +osse

    culpado9

    - E eu - acrescentou o visconde- atrever-me-ei a per2untar como

    ue o sen0or e.plica o (< de 3rumrio$ o ac0a ue +oi um lo2ro9

    @ um logro que !o parece prprio da ma!eira de proceder de um

    gra!de "omem.

    - E os deportados de H+rica c0acinados ? ordem dele9 0orr1vel

    - e.clamou a princesin0a, +azendo um 2esto de p4nico$

    - @ um plebeu, diga o se!"or o que disser - corroborou o pr1ncipe

    @ipBlito$

    F :en0or Pedro no sabia a uem prestar atenoN +itava-os a

    todos, sorrindo$ F seu sorriso no era como o das demais pessoas, ?

    mistura com ualuer coisa de srio$ Ele, pelo contrrio, uando se

    lembrava de sorrir, perdia, de repente, toda a seriedade, e a mscara,

    sempre um pouco en+adon0a, trans+i2urava-se-l0e +icava com o seu

    u/ de in+antil, de pobre diabo, um pouco estCpido at, com o ar de

    uem uer pedir perdo$

    F visconde, ue o via pela primeira vez, compreendeu

    imediatamente ue auele 8acobino no era to terr1vel nos actoscomo nas palavras$ Todos se calaram$

    - #omo uerem ue Pedro responda a toda a 2ente ao mesmo

    tempo9 - interro2ou o pr1ncipe Andr$ - Alm disso, nos actos de um

    0omem de Estado preciso saber distin2uir os ue ele pratica como

    simples particular dos ue ele pratica como c0e+e do e.rcito ou

    como imperador$ Parece-me da mais elementar 8ustia$

    - #laro, claro - interveio Pedro, satis+eito com a a8uda ue

    recebia$- imposs1vel no o recon0ecer - continuou o pr1ncipe Andr$ -

    apoleo, o 0omem, 2rande na ponte de Arcole, no 0ospital de ;a+a,

    uando aperta a mo aos pest1+eros, mas$$, mas 0 outros actos seus

    di+1ceis de 8usti+icar$

    F pr1ncipe Andr, ue mani+estamente pretendera atenuar o

    embarao ue tin0am provocado as palavras de Pedro, er2ueu-se

    para se retirar, e +ez sinal ? mul0er$

    Je sCbito, o pr1ncipe @ipBlito, levantando-se, pediu a todos, com

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    um 2esto, ue se conservassem sentados e principiou a dizer

    - &o!taram-me "o0e uma a!edota mosco%ita e!ca!tadora7 tm

    de a ou%ir. 4ueira perdoar-me, %isco!de, te!"o de a co!tar em russo.

    +e outra ma!eira, perde o sal.

    E o pr1ncipe @ipBlito pRs-se a +alar russo como o +alam os

    +ranceses c0e2ados ? Cssia 0 menos de um ano$ Todos prestaram

    ateno, to viva e instantemente o pr1ncipe reclamara ue l0e

    +izessem esse +avor$

    - Em *osco%o 0 uma se!"ora$ E muito avara$ E precisava de

    arran8ar dois lacaios para a sua carrua2em$ E de 2rande estatura$ Era

    assim ue ela 2ostava$ E tin0a uma criada de uarto tambm de

    2rande estatura$ E ento disse$$$

    este ponto, o pr1ncipe @ipBlito teve um momento de re+le.o,

    mostrando certa di+iculdade em combinar as +rases$

    - E ento disse$$, sim, disse O>enina para a criada de quarto

    en+ia a libr8 e vem da1 comi2o /aer %isitas.>

    esta altura o pr1ncipe @ipBlito deu uma 2ar2al0ada, rindo antes

    de mais nin2um, o ue criou um pouco de embarao ao narrador$

    Entretanto, vrias pessoas, entre as uais a sen0ora idosa e AnaPavlovna, sorriram$

    - L +oram$ Je repente levantou-se um 2rande vendaval$ A

    rapari2a +icou sem o c0apu e a cabeleira desprendeu-se-l0e$$$ Aui

    no pRde a2uentar-se mais e um 2rande acesso de riso o tomou, ao

    mesmo tempo ue dizia

    - E toda a 2ente soube$$$

    E assim terminou a anedota, ainda ue nin2um pudesse

    compreender porue a tin0a ele contado e a ue propBsito l0eparecera indispensvel narr-la em russo$ Ana Pavlovna e os demais

    convivas apreciaram a cortesia mundana do pr1ncipe @ipBlito, ue

    assim tin0a posto ponto +inal ao penoso e pouco cort/s despropBsito

    do Se!"or Pedro. A conversa dispersou-se em se2uida por miCdos e

    insi2ni+icantes dizeres a propBsito de bailes em perspectiva ou 8

    passados, em aluses a espectculos ou ento em re+er/ncias a

    circunst4ncias ou a locais onde as pessoas poderiam vir a encontrar-

    se$

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    Captulo VI

    Jepois de +elicitarem Ana Pavlovna pela sua e!ca!tadora

    reu!io,os convidados principiaram a retirar-se$

    Pedro era um desa8eitado$ Gordo, estatura acima de mediana,

    lar2o de ombros, com enormes mos vermel0uscas, se no sabia

    estar numa sala, como se costuma dizer, muito menos sabia sair dela,

    uer dizer, muito menos sabia pronunciar, antes de partir, as palavras

    atenciosas da pra.e$ Alm disso, era distra1do$ Duando se levantou,

    em vez de pe2ar no c0apu ue l0e pertencia, pe2ou num tricBrnio

    empenac0ado de 2eneral e assim esteve, com ele na mo, sacudindo

    o penac0o, at ue o proprietrio veio pedir-l0e ue l0o restitu1sse$

    certo ue estas suas distraces e o seu descon0ecimento de usos e

    costumes da sociedade eram lar2amente compensados por um ar

    in2nuo, simples e modesto$ Ana Pavlovna virou-se para onde eleestava, e c0eia de indul2/ncia crist perdoou-l0e a intempestiva

    sa1da, dizendo-l0e, enuanto meneava a cabea

    - Espero tornar a v/-lo, mas tambm dese8o ue mude de ideias,

    meu caro Se!"or Pedro.

    Pedro nada teve para responder a estas palavras, contentando-

    se em inclinar-se e em mostrar mais uma vez o seu sorriso, um

    sorriso em ue se lia OAs min0as ideias so as min0as ideias, mas,

    no entanto, reparem como eu sou bom rapaz, Fra era issoe.actamente o ue Ana Pavlovna e todos os demais estavam a dizer

    com os seus botes$

    F pr1ncipe Andr saiu para o vest1bulo, e ao mesmo tempo ue

    voltava as costas ao lacaio ue l0e vestia o sobretudo ouvia,

    distraidamente, a +r1vola ta2arelice da mul0er com o pr1ncipe @ipBlito,

    ue tambm se preparava para abalar$ F pr1ncipe @ipBlito, ao lado da

    linda princesin0a 2rvida, +i.ava-a obstinadamente com o lor2non$

    - 7-se embora$ A!!ette, est a apan0ar +rio - disse ela,

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    despedindo-se de Ana Pavlovna$ - 6st$ decidido- acrescentou em voz

    bai.a$

    Ana Pavlovna 8 tivera tempo de dizer duas palavras a Lisa sobre

    o pro8ecto de casamento entre Anatole e a cun0ada da princesin0a$- #onto consi2o, uerida ami2a - respondeu Ana Pavlovna

    i2ualmente em voz bai.a -, escreva-l0e e di2a-me depois como

    encarar o pai o caso$t8 D %ista- e saiu do vest1bulo$

    F pr1ncipe @ipBlito apro.imou-se da princesin0a e, debruando-

    se muito para ela, murmurou-l0e ualuer coisa ao ouvido$ Jois

    lacaios, o da princesa e o do pr1ncipe, a2uardando ue os amos

    acabassem de +alar, ali estavam, um com um .ale, o outro com um

    sobretudo, e ouviam-nos +alar +ranc/s, l1n2ua ue descon0eciam, mas

    dando-se ares de uem compreende e o no uer dar a perceber$

    A princesa, como de costume, sorria enuanto +alava e escutava

    sorrindo,

    - Estou radiante por no ter ido ? Embai.ada - dizia o pr1ncipe

    @ipBlito$ - Due estopada$$$ Encantadora noite, no verdade9 Sm

    encanto$

    - Jizem ue o baile vai ser uma beleza - retoruiu a princesa,desen0ando-se-l0e um tre8eito no lbio sombreado pela li2eira

    penu2em$ - 7o l aparecer todas as nossas beldades mundanas$

    - em todas, visto ue a princesa l no estarN nem todas -

    disse o pr1ncipe @ipBlito com 8ovialidade, e, pe2ando no .ale, ue

    tirou das mos do lacaio, a uem deu mesmo um encontro, lanou-o

    sobre os ombros da princesa$

    Por +alta de 8eito ou de propBsito, uem o poderia dizer9, uedou-

    se muito tempo sem bai.ar as mos, embora o .ale 8 estivesse noseu lu2ar$ Jir-se-ia enlaar a 8ovem princesa$

    Evitando-o 2raciosamente, e sem dei.ar de sorrir, a princesa

    voltou-se e ol0ou para o marido$ F pr1ncipe Andr, de ol0os +ec0ados,

    parecia +ati2ado e sonolento$

    - Est pronta9 - per2untou ele ? mul0er, envolvendo-a num ol0ar$

    F pr1ncipe @ipBlito en+iou apressadamente o sobretudo, ue l0e

    descia at aos taces, ? Cltima moda, e, tropeando nas pre2as do

    casaco, deu-se pressa em se2uir a princesa, escadaria abai.o, ue

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    subia para a carrua2em, au.iliada pelo lacaio$

    - Pri!cesa, at8 D %ista - 2ritou ele, tropeando nas palavras

    como tin0a tropeado nas dobras do sobretudo$

    A princesa, soer2uendo o vestido, entrou na obscuridade dacarrua2emN o marido a+ivelava o sabreN o pr1ncipe @ipBlito, com o

    prete.to de ser Ctil, incomodava toda a 2ente$

    - #om licena - disse em russo o pr1ncipe Andr, num tom seco e

    pouco amvel, diri2indo-se a @ipBlito, ue l0e vedava a passa2em$

    - Pedro, espero-te em casa - articulou a mesma voz com um ar

    a+vel e carin0oso$

    F postil0o pRs a euipa2em em andamento, ue arrancou com

    +ra2or$ F pr1ncipe @ipBlito +icara na escadaria, rindo ainda, aos

    saces, enuanto esperava pelo visconde, a uem prometera

    reconduzir a casa$

    - Pois bem, meu caro, a sua pri!cesi!"a 8 um e!ca!to, um

    e!ca!to- dizia o visconde, ao sentar-se ao lado de @ipBlito$- *as o

    que se c"ama um e!ca!to. - E atirando um bei8o com a ponta dos

    dedos - 6 /ra!cesa at8 D medula.

    @ipBlito riu estrepitosamente$- Sabe que 8 terr1%el com o seu ari!"o i!oce!te - prosse2uiu o

    visconde$- ;ame!to o pobre marido, esse o/icialito, que se d$ ares

    de pr1!cipe rei!a!te.

    @ipBlito continuava a rir a bom rir, e, mesmo rindo, +oi dizendo

    - 6 diia o se!"or que as damas russas !o c"ega%am aos

    calca!"ares das /ra!cesas. @ preciso 8 saber tratar com elas.

    Pedro, ue c0e2ara primeiro, como 1ntimo da casa ue era,

    entrou no 2abinete do pr1ncipe Andr, e mal se sentou no div tirouda estante o primeiro livro ue l0e veio ? mo - cal0ou ser os

    #omentrios, de #sar -, pondo-se a ler, ao acaso, apoiado sobre os

    cotovelos$

    - !izeste-la bonita em casa de >ademoiselle :c0erer certo e

    sabido ue a pobre sen0ora vai cair doente - disse o pr1ncipe Andr,

    ao entrar no 2abinete, enuanto es+re2ava as mos brancas$

    Pedro voltou-se com todo o peso do seu corpo, e de tal maneira

    ue o div ran2eu debai.o dele$ F seu rosto animado +i.ou-se no do

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    seu compan0eiro e com um sorriso aberto +ez-l0e um 2esto amistoso$

    - ealmente, o abade uma pessoa muito interessante, mas no

    compreende as coisas como elas so$$$ a min0a opinio, a paz

    perptua poss1vel, mas, como direi9$$$, no por meio do euil1briopol1tico$$$

    Andr, visivelmente, no apreciava estas discusses abstractas$

    - A0, no, meu caro, no podemos dizer em toda a parte o ue

    pensamos$ Fra conta-me l, 8 te resolveste, +inalmente, a +azer

    ualuer coisa9 Due ueres tu ser, cavaleiro da Guarda ou diplomata9

    - per2untou o pr1ncipe Andr, depois de al2uns instantes de sil/ncio$

    Pedro voltou a sentar-se no div, encol0endo as pernas debai.o

    de si$

    - 7e8a l, no sei, realmente$ em uma nem outra dessas

    situaes se me d com o +eitio$

    - o entanto, precisas de tomar uma resoluo$ Teu pai est ?

    espera ue te decidas$

    Pedro +ora enviado para o estran2eiro, aos dez anos, na

    compan0ia de um padre, seu preceptor$ E por l +icara at aos vinte$

    Duando voltou para >oscovo, o pai despediu o padre e disse ao8ovem OA2ora vai at Petersbur2o, observa e escol0e$ Estou de

    acordo desde 8 com o ue tu decidires$ Aui tens uma carta para o

    pr1ncipe 7assili e din0eiro$ 7ai-me dando not1cias, e conta comi2o$

    @avia 8 tr/s meses ue Pedro procurava decidir-se por uma carreira

    e no c0e2ava a concluso al2uma$ Era a tal escol0a ue o pr1ncipe

    Andr aludia$ Pedro passou a mo pela testa$

    - Estou convencido de ue o 0omem mao - murmurou,

    pensando no abade ue encontrara na recepo$- 3asta de +rioleiras - voltou Andr, interrompendo-o$- !alemos de

    coisas srias$ Ests decidido pela Guarda montada9$$$ - o, mas vou

    dizer-l0e urna coisa ue me veio a cabea$

    Estamos actualmente em 2uerra com apoleo$ :e se tratasse,

    de uma 2uerra de libertao, ento, sim, compreendia, seria mesmo

    o primeiro a alistar-me$ >as a8udar a (n2laterra e a Hustria contra o

    maior 0omem ue 0 no mundo$$, no est certo$

    F pr1ncipe Andr contentou-se, em encol0er os ombros perante

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    as in+antis consideraes de Pedro$ F seu ar ueria dizer ue nada

    tin0a a replicar a uma tal pateticeN e, com e+eito, seria di+1cil

    responder de outra maneira a uma tal in2enuidade$

    - :e as pessoas +ossem para a 2uerra sB por convico, no0averia 2uerra - disse ele$

    - E era isso ue convin0a - respondeu Pedro$

    F Pr1ncipe Andr sorriu$

    - muito poss1vel, mas a1 est uma coisa ue nunca acontecer$

    - E ento por ue diabo ue o Andr vai para a 2uerra9

    per2untou Pedro,

    - Poru/9 o sei$ assim$ Alm disso, eu vou$$$ - #alou-se$- Eu

    vou porue esta vida ue levo aui, esta vida no me- convm$

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    Captulo VII

    a sala cont12ua ouviu-se o ru2e-ru2e de um vestido$ Andr teve

    um sobressalto, como se recuperasse os sentidos, e a sua mscara

    tomou a e.presso com ue se e.ibira nos sales de Ana Pavlovna$

    Pedro tirou os ps de cima do div$ A princesa entrou$ Tin0a outro

    vestido, um vestido 1ntimo, mas nem por isso menos +resco e

    ele2ante$ F pr1ncipe Andr levantou-se e o+ereceu-l0e, cortesmente,

    uma cadeira,

    - Sma coisa eu nunca dei.o de per2untar a mim mesma - disse

    ela, como sempre, em +ranc/s, sentando-se com prontido - porue

    ue a Annette se no teria casado9 Due tolos voc/s +oram, sen0ores,

    no casando com ela Jesculpem, mas voc/s no percebem nado de

    saias$ >uito 2osta de discutir$ :en0or Pedro$$$

    - Precisamente, no +ao outra coisa seno discutir com o seumarido$ o compreendo porue ue ele uer ir para a 2uerra -

    disse Pedro, diri2indo-se ? princesa sem o mais peueno

    acan0amento, coisa, alis, per+eitamente natural, tratando-se de um

    rapaz e de uma sen0ora 8ovem$

    A princesa estremeceu$ Evidentemente ue as palavras de Pedro

    a tin0am atin2ido no ponto sens1vel$

    - o ue eu l0e estou sempre a dizer - redar2uiu ela$ o

    compreendo, decididamente no compreendo como ue os 0omensno podem passar sem a 2uerra E ue nBs, mul0eres, no possamos

    +azer nada, no ten0amos voz nesse cap1tulo Fra, oua, +aa de

    conta ue um 8uiz$ Passo a vida a dizer-l0e a mesma coisa$ F Andr

    a8udante-de-campo do tio, tem aui uma bril0ante situao$ Toda a

    2ente o con0ece, toda a 2ente o aprecia$ o outro dia, em casa dos

    Apra.ine, ouvi uma sen0ora per2untar =6ste 8 que 8 o /amoso

    pr1!cipe !dr8 Pala%ra> - Ele pRs-se a rir$ - assim ue o recebem

    em toda a parte$ Tin0a toda a +acilidade em vir a ser a8udante-de-

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    campo do imperador$ :abe ue o imperador l0e diri2iu 2raciosamente

    a palavra9 A Annette e eu estamos convencidas de ue era to +cil

    Due ac0a9

    Pedro ol0ou para o pr1ncipe Andr, e, vendo ue a conversa noa2radava ao ami2o, nada respondeu$

    - Duando parte9 - interro2ou ele$

    - " No me /ale dessa partida, !o me /ale. No quero ou%ir

    /alar !isso - e.clamou a princesa nesse mesmo tom de coquetterie

    satis+eita de si ue ela mostrara uando, no salo de Ana Pavlovna,

    conversava com @ipBlito, mas ue nauele ambiente de intimidade

    +amiliar em ue Pedro era recebido no ca1a nada bem$ -

    Actualmente, uando me lembro de ue temos de interromper todas

    as nossas ueridas relaes$$$ E, alm disso, no sei, sabes$ Andr9 -

    Teve para o marido um li2eiro piscar de ol0os$ - ?e!"o medo, te!"o

    medo -acrescentou muito bai.o, estremecendo$

    F marido ol0ou para ela com o ar surpreendido ue teria se

    estivesse mais al2um presente ue no +osse Pedro e ele prBprio$

    Andr$ Jepois, com uma +ria polidez, disse

    - Due receias$ Lisa9 o compreendo$$$- Fra aui est o e2o1smo dos 0omens o 0 um ue se salve

    so todos, todos e2o1stas, para satis+azerem os seus capric0os :B

    Jeus sabe porue ue ele me vai dei.ar enclausurada no campo$

    - #om meu pai e min0a irm, no te esueas - articulou,

    tranuilamente, o pr1ncipe Andr$

    - em por isso estarei menos sB, sem as min0as ami2as$$$ E

    ainda ele uer ue eu no ten0a medo$

    Tin0a adoptado um tom de amuo e +azia um tre8eito ue l0e davaum ar 8 no ale2re, mas uase animal, um ar de um peque!i!o

    esquilo. #alou-se, pensando no ser conveniente +alar diante de

    Pedro do seu estado, no +undo a causa de tudo$

    - #ontinuo a no compreender de que 8 que te!s medo- disse,

    lentamente, o pr1ncipe Andr, sem dei.ar de a +itar$

    A princesa corou e +ez um 2esto impetuoso$

    - No. !dr8, eu ac"o 8 que mudou ta!to, ta!to...

    - F teu mdico aconsel0ou-te a ue te deitasses cedo - disse o

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    pr1ncipe Andr$ - Era mel0or ue te retirasses$

    A princesa nada disse, mas, de sCbito, o seu lbio, sombreado

    por uma penu2em li2eira, pRs-se a tremerN Andr levantou-se,

    encol0endo os ombros, e comeou a andar de um lado para o outro$Pedro, com um ar espantado e in2nuo, ol0ava por detrs das

    lunetas ora um ora outro, e a2itava-se, como se ele tambm uisesse

    levantar-se, mas continuava indeciso$

    - Duero l saber ue este8a aui o Se!"or Pedro - disse,

    abruptamente, a princesin0a, e pelo seu delicado rosto perpassou, de

    sCbito, um ricto como de uem vai c0orar$- @ muito tempo ue eu te

    ueria dizer$ Andr$ Porue ue mudaste tanto para comi2o9 Due te

    +iz eu9 7ais para a 2uerra e no tens pena de mim$ Poru/9

    - Lisa - +oi tudo uanto disse Andr$

    >as nesta palavra 0avia ao mesmo tempo uma sCplica e uma

    ameaa, e sobretudo ualuer coisa em ue se lia ue ela 0avia de

    arrepender-se de ter pro+erido auelas palavras$ Precipitadamente,

    ela continuou

    - Tratas-me como uma doente ou como uma criana$ Eu bem

    ve8o$ Ac0as ue eras assim 0 seis meses9- Lisa, peo-te ue te cales - disse Andr numa voz cortante$

    Pedro, cada vez mais perturbado com auela troca de palavras,

    levantou-se e apro.imou-se da princesa$ Jir-se-ia no poder suportar

    a vista das l2rimas e ele prBprio estava uase a c0orar$

    - :osse2ue, princesa$ o ue l0e pareceN porue eu prBprio tive

    a mesma impresso$$, porue$$$ ue$$$ A0, desculpe-me, sinto ue

    estou aui a mais$$$ A0, sosse2ue$$$ Adeus$$$

    F pr1ncipe Andr se2urou-o por um brao$- Sm momento$ Pedro$ A princesa to boa ue no uerer

    privar-me do prazer de passar a noite conti2o$

    - 7/, v/, no pensas seno nele - e.clamou a princesa, sem

    poder reter as l2rimas, onde 0avia revolta$

    - Lisa - disse o pr1ncipe secamente, er2uendo o tom da voz a

    uma altura tal ue si2ni+icava ter perdido por completo a paci/ncia$

    :ubitamente, o arzin0o de esuilo +urioso ue se pintara no rosto

    da princesa converteu-se num medo impressionante, di2no de

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    piedade$ Lanou, +urtivamente, com os seus belos ol0os um rpido

    ol0ar ao marido e teve essa e.presso t1mida e submissa de um co

    batido ue +o2e com a cauda entre as pernas$

    - *eu +eus, meu +eus - murmurou, pe2ando na cauda dovestido, e, apro.imando-se do marido, bei8ou-o na testa$

    - 5oa !oite. ;isa- disse o pr1ncipe Andr er2uendo-se e bei8ando-

    l0e a mo com cortesia, como se +osse uma estran0a$

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    Captulo VIII

    Fs dois ami2os +icaram silenciosos$ em um nem outro ousavam

    +alar$ Pedro tin0a os ol0os pousados no pr1ncipe Andr, ue passava a

    +ina mo pela testa$

    - 7amos cear - disse ele, suspirando$ Levantou-se e diri2iu-se

    para a porta$

    Entraram na sala de 8antar, ele2ant1ssima, recm-arran8ada e

    ricamente posta$ Tudo, desde os 2uardanapos ?s pratas, ? bai.ela e

    aos cristais, tin0a esse aspecto novo caracter1stico das casas dos

    recm-casados$ o meio do repasto o pr1ncipe Andr apertou a

    cabea entre as mos, e, como al2um muito preocupado ue

    +inalmente resolve abrir-se, principiou a dizer, com um nervosismo

    ue Pedro l0e no con0ecia$

    - o, te cases nunca, nunca, meu ami2oN o consel0o ue tedou$ o te cases antes de estares convencido de ue +izeste tudo de

    ue eras capaz, antes de teres dei.ado de amar a mul0er ue

    escol0este, antes de a teres visto bemN sem isso, en2anar-te-s

    cruelmente e sem remisso$ #asa-te uando +ores vel0o e 8 no

    prestares para coisa al2uma$$$ :e o no +izeres, perder-se- tudo

    uanto 0ouver em ti de bom e de 2rande$ Tudo ir por 2ua abai.o$

    :im, sim, sim o me ol0es com essa cara de espanto$ :e ests

    convencido de ue sers capaz de +azer al2uma coisa no +uturo,veri+icars ue tudo acabou para ti, ue tudo te est vedado, salvo o

    salo onde virs a encontrar-te ao n1vel de ualuer lacaio ou de

    ualuer imbecil$$$ E aui tens

    Teve um 2esto enr2ico$

    Pedro tirou as lunetas, +icando com outra cara, ainda mais

    bondosa, e +itou o ami2o com espanto$

    - A min0a mul0er - continuou o pr1ncipe Andr- uma e.celente

    sen0ora$ uma dessas raras pessoas ue no +azem peri2ar a nossa

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    0onra$ >as$ Jeus meu, o ue daria eu para me no ter casado s tu

    a primeira e a Cnica pessoa a uem o di2o, porue sou teu ami2o$

    Enuanto +alava, o pr1ncipe Andr cada vez se parecia menos

    com esse 3olMonsMi enterrado numa cadeira em casa de AnaPavlovna dei.ando passar por entre dentes, de ol0os piscos, +rases

    +rancesas$ Todos os mCsculos da sua seca mscara estavam a2itados

    por movimentos nervososN os seus ol0os, em ue o +o2o da vida, at

    ento, parecia e.tinto, bril0avam a2ora com um +ul2or luminoso e

    claro$ Jir-se-ia ue uanto menos vida nele 0avia 0abitualmente mais

    enr2ico parecia nestes instantes de uma e.citao uase anormal$

    - Tu no compreendes porue eu +alo assim$ o entanto ests

    diante da 0istBria de toda uma e.ist/ncia$ Tu dizes 3onaparte e a sua

    carreira - continuou ele, embora Pedro nada tivesse dito acerca de

    3onaparte$ - Jizes 3onaparte$ >as 3onaparte, uando trabal0ava,

    uando camin0ava, passo a passo, para o seu +im era livre, no tin0a

    mais nada em vista seno esse ob8ectivo, e atin2iu-o$ Porm, se tu te

    li2ares a uma mul0er, como um +orado com uma bra2a aos ps,

    perders toda a liberdade$ E tudo uanto em ti possa 0aver de

    esperana e de ener2ia tornar-se- um peso morto, ue te oprimirde des2osto$ Fs sales, a m-l1n2ua, os bailes, a vaidade, as

    +utilidades, eis da1 por diante o c1rculo vicioso de ue imposs1vel

    uma pessoa evadir-se$ 7ou partir para a 2uerra, para a maior das

    2uerras, e no sei nada, e no presto para nada$ Sou muito am$%el e

    muito c$ustico e as pessoas ouvem-me uando eu +alo em casa de

    Ana Pavlovna$ E a1 tens essa estCpida sociedade mundana sem a ual

    no podem passar nem a min0a mul0er nem essas mul0eres$$$ :e tu

    ao menos pudesses +azer uma ideia do ue so todas as mul"eresdisti!tas e todas as mul0eres em 2eral$ >eu pai tem razo$ F

    e2o1smo, a vaidade, a tolice, a nulidade em tudo, a1 tens a mul0er

    uando se mostra tal ual $ Duando a 2ente a v/ na sociedade, 8ul2a

    ue vale al2uma coisa, e no vale nada, nada, nada o ue te di2o

    no te cases, meu caro, no te cases - concluiu$

    - Due vontade de rir ue isto me d - disse Pedro$ - Pois o

    Andr, o Andr, precisamente, ue se considera a si prprio um

    incapaz, ue considera +al0ada a sua vida9 F Andr ue tem o +uturo

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    diante de si, todo um +uturo9 F Andr$$$

    OJe ue no ser capaz9, pensou, mas o tom da sua voz

    denunciava claramente a alta estima em ue ele tin0a o ami2o e o

    ue esperava dele para mais tarde$O#omo pode ele +alar assim, dizia Pedro de si para consi2o$

    E e+ectivamente Pedro via no pr1ncipe Andr como ue um

    modelo de todas as per+eies, precisamente porue ele era dotado

    no mais alto 2rau das ualidades ue ele prBprio no tin0a, essas

    ualidades ue mais do ue uaisuer outras e.i2em +ora de

    vontade$ :empre l0e causara admirao a serenidade ue o pr1ncipe

    Andr sabia manter nas relaes com as pessoas mais diversas e a

    sua memBria e.traordinria, as suas vastas leituras - tin0a lido tudo,

    sabia tudo, compreendia tudo - e sobretudo a sua capacidade de

    trabal0o e de assimilao$ E, se verdade ue +reuentes vezes o

    impressionava, a ele$ Pedro, a pouca tend/ncia ue o pr1ncipe Andr

    mani+estava pela re+le.o e pela +iloso+ia, coisas para ue Pedro

    sentia mais inclinao, estava lon2e de pensar ue isso constitu1sse

    um de+eitoN pensava at ue representava uma +ora$

    as mel0ores relaes, nas mais amistosas e mais simplesrelaes, a adulao ou os louvores so coisas indispensveis, tal

    ual como o azeite indispensvel nas rodas dos carros$

    - :ou um 0omem liuidado - murmurou o pr1ncipe Andr$ Para

    ue 0avemos nBs de perder tempo a +alar de mim9 !alemos antes de

    ti - acrescentou depois de um curto sil/ncio e sor- rindo, como se

    re2ressasse, +inalmente, a um assunto mais consolador$

    essa altura um sorriso apareceu nos lbios de Pedro$

    - E para ue 0avemos nBs de +alar de mim9 - disse abandonando-se a uma despreocupada ale2ria$- Due sou eu, no +im de contas9 :ou

    um bastardo - E, subitamente, corou at ?s orel0as$ 7ia-se bem ue

    +izera um 2rande es+oro para pronunciar estas palavras$- Sem !ome,

    sem /ortu!a...E, de resto, para +alar +rancamente$$$ - Duereria ter dito

    tanto mel0or, mas no concluiu a +rase$ - Enuanto espero, sou livre,

    estou satis+eito com a min0a sorte$ >as o certo ue no sei o ue

    0ei-de +azer$ :eriamente, ueria pedir-l0e ue me aconsel0asse$

    F pr1ncipe Andr ol0ou-o com bondade, mas, apesar disso, no

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    seu ol0ar amvel e amistoso sentia-se-l0e a superioridade$

    - Gosto de ti, sobretudo porue s tu, entre toda a 2ente das

    nossas relaes, o Cnico ser vivo$ Jizes ue ests satis+eito$ Escol0e o

    ue uiseres, indi+erente$ Em toda a parte sers +eliz$ :B te peouma coisa dei.a de conviver com esses Qura2uine, dei.a a vida ue

    levas$ Isso no te convm toda essa devassido, esse conv1vio com

    0Cssares, tudo ue$$$

    - 4ue quer, meu caro - disse Pedro encol0endo os ombros$ -s

    mul0eres, meu caro, as mul"eres

    - o compreendo - retoruiu Andr$ -s %erdadeiras se!"oras,

    sim, essas so outra coisa, mas as mul"eres de Qura2uine, as

    mul"eres e o %i!"o,con+esso-te ue no compreendo

    Pedro vivia em casa do pr1ncipe 7assili Qura2uine e

    acompan0ava nas suas or2ias o +il0o deste$ Anatole, esse mesmo

    Anatole ue ueriam casar, para o corri2ir, com a irm do pr1ncipe

    Andr$

    - Duer saber9 - disse Pedro, como se acabasse de ter uma +eliz

    ideia$ - :eriamente, 0 muito tempo ue penso nisto$ #om a vida ue

    levo, nem posso decidir-me por coisa al2uma, nem re+lectir se8a sobreo ue +or$ :B dores de cabea e o nosso din0eiro perdido$ F Anatole

    convidou-me para esta noite, mas no vou$

    - Js-me a tua palavra de 0onra9

    - Palavra de 0onra

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    Captulo IX

    Eram uase duas 0oras da madru2ada uando Pedro saiu de

    casa do ami2o$ Era uma noite de ;un0o, uma noite t1pica de

    Petersbur2o, sem obscuridade$ >eteu-se numa carrua2em de

    alu2uer, decidido a voltar para casa$ >as ? medida ue se

    apro.imava, ia sentindo ue l0e no era poss1vel dormir numa noite

    dauelas, ue mais parecia um crepCsculo ou uma aurora$ A vista

    perdia-se ao lon2e pelas ruas desertas$ o camin0o$ Pedro lembrou-

    se de ue em casa de Anatole Qura2uine deviam estar reunidos os

    convivas 0abituais, os 8o2adores, ue depois do 8o2o se entre2avam,

    normalmente, ao prazer da bebida, um dos seus divertimentos

    +avoritos$

    O:e eu +osse a casa de Qura2uine9, disse ele para consi2o

    mesmo$Je sCbito, porm, lembrou-se de ue tin0a dado a palavra de

    0onra a Andr$ >as, de repente tambm, coisa natural nas pessoas

    ue de uso considerar-se sem carcter, sentiu um to intenso

    dese8o de voltar uma vez ainda a 2ozar auela louca vida, ue ele to

    bem con0ecia, ue se decidiu$ E ento veio-l0e ? mente ue o

    compromisso tomado no valia nada, visto ue antes de o ter

    assumido para com o pr1ncipe Andr tin0a prometido ao Anatole ue

    iria a casa deleN e depois, em concluso, dizia de si para consi2oOTodas estas palavras de 0onra so coisas convencionais, sem

    ualuer +undamento srio, sobretudo uando uma pessoa pensa ue

    aman0 pode estar morta ou em circunst4ncias tais ue as palavras

    de 0onra e desonra no ten0am o mais peueno si2ni+icado$ Pedro

    costumava +azer muitas vezes racioc1nios deste 2osto, ue tornavam

    nulos todos os seus pro8ectos e todas as suas resolues$ E diri2iu-se

    para casa de Qura2uine$

    Duando c0e2ou ? escadaria da vasta mole +ormada pelas

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    casernas da Guarda montada, onde Anatole vivia, subiu os de2raus

    iluminados e deparou-se-l0e a porta aberta$ o 0avia nin2um no

    vest1buloN por um lado e pelo outro sB se viam 2arra+as vazias,

    sobretudos, 2aloc0asN c0eirava a vin0o$ Fuviam-se ru1dos de vozes e2ritos distantes$

    F 8o2o e a ceia tin0am acabado, mas os convivas ainda se no

    0aviam dispersado$ Pedro despiu o sobretudo e entrou na primeira

    depend/ncia, em ue se viam ainda os restos do +estim e onde um

    lacaio, 8ul2ando-se sB, bebia, ?s escondidas, os restos de vin0o dos

    copos$ Ja sala cont12ua sa1a um alarido risos, 2ritos de pessoas

    con0ecidas e 2run0idos de ursos$ Fito rapazes comprimiam-se, muito

    e.citados, 8unto da 8anela aberta$ Tr/s outros entretin0am-se com um

    ursin0o novo, ue um deles pu.ava por uma corrente para atemorizar

    os compan0eiros$

    - Eu aposto por :tevens cem rublos - 2ritou uma voz$

    - Due ideia essa de apostar por ele - e.clamou um terceiro$-

    Qura2uine, s/ tu o rbitro$

    - Est bem, ento dei.em o *ic":a 5Nome /amiliar do urso !a

    Fssia. N, dos ?.N vamos l +azer a aposta$- Je um sB tra2o, ou ento perde - 2ritou uma uarta voz$

    - IaMov, traz uma 2arra+a$ IaMov - clamou o dono da casa, um

    rapa2o ma2n1+ico, ue estava no meio de todos os outros,

    enver2ando apenas uma li2eira blusa toda aberta no peito - Sm

    momento, meus ami2os E0 At ue en+im$ Petruc0a, meu caro -

    e.clamou diri2indo-se a Pedro$

    Sma outra voz, a de um 0omem de peuena estatura, de ol0os

    azuis-claros, ue contrastava pelos seus modos cordatos no meio detodas auelas vozes avin0adas, 2ritou da 8anela

    - 7amos, serve de rbitro na aposta - Era JoloMov, um o+icial do

    re2imento :eminovsMi, +amoso 8o2ador e no menos +amoso

    espadac0im, ue compartil0ava dos aposentos de Anatole$

    Pedro sorria, lanando um ol0ar ale2re a toda a compan0ia$

    - o 0 maneira de nin2um se entender$ Je ue se trata9

    - Esperem, ele no est b/bado$ 7en0a de l uma 2arra+a - disse

    Anatole, e, pe2ando num copo de cima da mesa, deu dois passos

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    para Pedro$

    - Antes de mais nada, bebe,

    Pedro pRs-se a beber copo sobre copo, ol0ando de soslaio para

    toda auela 2ente embria2ada ue se tin0a 8untado ao p da 8anela eescutava o ue se dizia$ Anatole deitava-l0e vin0o no copo e contava

    ue JoloMov apostara com o in2l/s :tevens, o+icial de marin0a ali

    presente, ue ele$ JoloMov, seria capaz de beber uma 2arra+a de rum

    sentado na 8anela do se2undo andar com as pernas dependuradas

    para a parte de +ora$

    - Ento, despe8a-me l essa 2arra+a - e.clamou Anatole,

    apresentando a Pedro o Cltimo copo$- Enuanto o no beberes, no te

    lar2o$

    - o, 8 basta - tornou Pedro recusando, ao mesmo tempo ue

    se apro.imava da 8anela$

    JoloMov se2urava o in2l/s por uma mo e e.plicava claramente,

    com preciso, as condies da aposta, diri2indo-se de pre+er/ncia a

    Anatole e a Pedro$

    JoloMov era de estatura me, +risado, com ol0os azuis-claros$

    Tin0a apro.imadamente vinte e cinco anos$ o usava bi2ode, comoos outros o+iciais de in+antaria dauela poca, e tin0a a boca, o trao

    mais caracter1stico da sua +i2ura, completamente descoberta$ Era

    uma boca com um desen0o e.traordinariamente +ino$ F lbio superior

    descia sobre o +orte lbio in+erior +ormando dois 4n2ulos a2udos, em

    cu8os cantos se via sempre esboado uma espcie de duplo sorriso,

    um sorriso de cada lado$ o seu con8unto, sobretudo com os seus

    ol0os decididos, impudentes e inteli2entes, dava uma impresso ue

    obri2ava as pessoas a +it-lo$ JoloMov no era rico nem tin0aualuer parente$ E, conuanto Anatole 2astasse dezenas de

    mil0ares de rublos$ JoloMov compartil0ava das suas instalaes e

    sabia arran8ar as coisas de tal maneira ue o prBprio Anatole e todos

    os seus con0ecidos o estimavam mais ue ao prBprio dono da casa$

    :abia todos os 8o2os e 2an0ava uase sempre$ Por mais ue bebesse,

    tin0a sempre a cabea no seu lu2ar$ Qura2uine e JoloMov eram

    nauela poca, tanto um como o outro, verdadeiras celebridades no

    mundo das cabeas loucas e dos bomios de Petersbur2o$

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    Trou.eram a 2arra+a de rum$ Jois lacaios, aza+amados e

    visivelmente estupe+actos, desnorteados no meio dos 2ritos e das

    ordens ue l0es davam, procuravam demolir o cai.il0o ue impedia

    ue uma pessoa se sentasse sobre o parapeito e.terior da 8anela$Anatole apro.imou-se com ares vitoriosos$ Tin0a necessidade de

    uebrar +osse o ue +osse$ A+astou os lacaios e pRs-se a pu.ar pelo

    cai.il0o, o ual no cedeu$ Duebrou um vidro$

    - E.perimenta tu, valento - e.clamou diri2indo-se a Pedro$

    Pedro a2arrou-se ? couceira, pu.ou e arrancou com +ra2or o

    enuadramento de castan0o$

    - Tudo +ora, seno depois so capazes de dizer ue eu me

    a2arrei a al2uma coisa - intimou JoloMov$

    - F in2l/s perdeu a cabea$$$ E0 o verdade9 - inuiriu

    Anatole$

    - #om certeza - disse Pedro ol0ando para JoloMov, ue, com a

    2arra+a na mo, se apro.imava da 8anela, atravs da ual se via o cu

    claro e a aurora, ue se con+undia com o crepCsculo$

    JoloMov, sempre com a 2arra+a na mo, saltou para cima da

    8anela$- Fuam - 2ritou de p sobre o parapeito, voltado para a

    assist/ncia$ Todos se calaram$

    - Aposto - +alava em +ranc/s para ue o in2l/s o compreendesse,

    embora este no +osse um portento nessa l1n2ua -, aposto cinuenta

    imperiaisN uer apostar cem9 - acrescentou, para o in2l/s$

    - o, cinuenta - retoruiu este$

    - 3om, aposto cinuenta imperiais em como sou capaz de beber

    a 2arra+a de rum at ? Cltima 2ota, de um sB tra2o, sentado na8anela, neste s1tio - debruou-se e apontou para o parapeito inclinado

    no sentido da rua- e sem me se2urar a coisa al2uma$$$ Est,

    apostado9

    - Per+eitamente - volveu o in2l/s$

    Anatole voltou-se para este, e, se2urando-o por um boto da

    +arda, ol0ou-o de cima, pois o outro era de peuena estatura, e pRs-

    se a repetir-l0e em in2l/s as condies da aposta$

    - Ateno - 2ritou JoloMov, batendo com a 2arra+a na 8anela,

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    para ue o ouvissem- Sm momento$ Qura2uine$ Fuam$ :e 0ouver

    al2um capaz de +azer o mesmo, dou-l0e cem imperiais$ Esto a

    compreender9

    F in2l/s disse Osim com a cabea, sem com isso uerer dizerue tin0a inteno de aceitar a nova aposta$ Anatole no o lar2ava, e,

    embora ele tivesse dado a entender ue compreendera, traduzia-l0e

    para in2l/s as palavras de JoloMov$ Sm rapazola escanzinado, um

    0Cssar da Guarda, ue toda a noite estivera a perder ao 8o2o, trepou

    ? 8anela, debruou-se e ol0ou l para bai.o$

    - Si Si Si e.clamou, apontando as pedras da calada$

    - !ora da1 - 2ritou JoloMov, obri2ando a descer da 8anela o

    o+icial, ue, embaraado nas esporas, t


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