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New UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO … · 2019. 12. 15. · Universidade...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO CAROLYNE NÁTHALY DA SILVA SANTOS O SISTEMA INVESTIGATIVO BRASILEIRO E OS NOVOS PARADIGMAS DA CIÊNCIA: UMA ANÁLISE ACERCA DA ELABORAÇÃO DA PERÍCIA NO INQUÉRITO POLICIAL NATAL 2019
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

CAROLYNE NÁTHALY DA SILVA SANTOS

O SISTEMA INVESTIGATIVO BRASILEIRO E OS NOVOS PARADIGMAS DA

CIÊNCIA: UMA ANÁLISE ACERCA DA ELABORAÇÃO DA PERÍCIA NO

INQUÉRITO POLICIAL

NATAL

2019

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CAROLYNE NÁTHALY DA SILVA SANTOS

O SISTEMA INVESTIGATIVO BRASILEIRO E OS NOVOS PARADIGMAS DA

CIÊNCIA: UMA ANÁLISE ACERCA DA ELABORAÇÃO DA PERÍCIA NO

INQUÉRITO POLICIAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de graduação em Direito, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Dr. Walter Nunes da Silva Júnior.

NATAL

2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA

Santos, Carolyne Nathaly da Silva.

O Sistema investigativo brasileiro e os novos paradigmas da

ciência: uma análise acerca da elaboração da perícia no inquérito policial / Carolyne Nathaly da Silva Santos. - 2019.

76f.: il.

Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio

Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Departamento de Direito. Natal, RN, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Walter Nunes da Silva Júnior.

1. Investigação - Monografia. 2. Perícia Criminal - Monografia.

3. Segurança Pública - - Monografia. I. Silva Júnior, Walter Nunes

da. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/UF/Biblioteca do CCSA CDU 343.1

Elaborado por Eliane Leal Duarte - CRB-15/355

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À minha mãe, titular de todas as minhas conquistas e

merecedora de todas as homenagens.

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AGRADECIMENTOS

No decorrer dos últimos cinco anos, imaginei diversas vezes como seria

finalizar esse ciclo. Em todos esses pensamentos estavam presentes as pessoas

que tem compartilhado comigo as alegrias e angústias ao longo dos meus 22 anos.

É certo que eu não estaria aqui sem a compaixão e o amor de Deus na

minha vida, que tem se manifestado de grandes formas, me ensinando a

compreender tantas situações e crer que tudo posso através da fé. Pela força que

me foi concedida, me sinto imensamente grata pela obra de Deus.

Sem dúvida, houveram passagens nebulosas em meio a caminhada

percorrida no curso de Direito, mas tantos foram os dias de sol que me aqueceram a

alma, trouxeram boas risadas e esperança no amanhã, ao lado dos meus

companheiros de graduação e futuros colegas de profissão: João Paulo Brandão,

Rick Oliveira, Mirelly Moura, Vanessa Lira, Mariana Fernandes e Shâmalla Jewur.

Não poderia deixar de externar meus agradecimentos também a dois

colegas que me serviram de inspiração durante o período de estágio na JFRN,

Flávia Veras e Tito Torres, que me ensinaram tanto e me acolheram com toda a

ternura possível, própria de uma amizade que nunca será esquecida.

Pelo imenso aprendizado, jurídico e humano, agradeço, sobretudo, à equipe

da Defensoria Pública da União - DPU/Natal, casa em que vivenciei tantas e fortes

emoções, em especial à amiga Letícia Mesquita pela atenção que me dedicou no

período de construção desse trabalho. Sem esquecer, jamais, da querida Lorena

Costa e todas as lições sobre empatia que me foram ensinadas na prática.

Aos meus mestres, especialmente ao meu paciente orientador Walter

Nunes, com quem tive a honra de poder contribuir enquanto estagiária da JFRN e na

monitoria da Disciplina de Processo Penal II, pelos inúmeros ensinamentos

preciosos que me acompanharão por toda a carreira profissional.

Aos meus amigos, tantos que nem poderia mencionar todos aqui, nas

pessoas de Pedro Dias, Diane Caroline, Ianka Rayanne, Thaylson Rodrigues, Letícia

Bias, Jesiely Fernanda e Maria Eduarda, meus mais sinceros agradecimentos por

tonarem mais leve a caminhada e por toda compreensão e estímulos que me foram

prestados durante o período de elaboração desse trabalho. Certamente não seria

possível concluí-lo se não fosse o conforto prestado por cada um de vocês.

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Agradeço também, a minha amada família por todo cuidado e carinho, por

sempre me incentivarem de todas as formas possíveis e por moldarem a minha

educação, especialmente à Ana Glória e Francisco Carvalho, e aos meus

pequeninos, Vinícius e Helissa, a quem agradeço por todo o amor.

Por último e, certamente, o mais importante agradecimento, dedico à minha

mãe por ter travado tantas batalhas para que eu pudesse ter a oportunidade de

concretizar esse sonho e por sempre acreditar em mim e no meu potencial, quando

nem eu mesma acreditei. Obrigada por toda a doação, todo o amparo e por me

sustentar em todas as vezes em que eu desmoronei, sem você essa jornada não

teria o menor sentido.

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Não é o crítico que importa; o crédito pertence ao homem que

encontra-se na arena, cuja face está manchada de suor e

sangue; aquele que esforça-se bravamente; que erra, que se

depara com um revés após o outro, pois não há esforço sem

erros e falhas. (Theodore Roosevelt)

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RESUMO

Em diferentes épocas e contextos, a tecnologia tem sido forte aliada do processo

penal. O avanço da ciência vem fornecendo ferramentas que possibilitam a

descoberta de inúmeras espécies de crimes, cometidos sob as mais variadas

circunstâncias. Todavia, de acordo com as estatísticas, a investigação brasileira é

ineficiente, pois, não obstante a disponibilidade de novas técnicas, o que se tem

constatado é o aumento da criminalidade, situação que nos convida a refletir sobre a

aplicação de investimentos da Segurança Pública no setor de perícia.

Indubitavelmente, a implementação de técnicas e o investimento de qualidade em

produção pericial contribuem para o fortalecimento do arcabouço probatório no

âmbito da instrução processual e a consequente redução da impunidade. O

processo criminal brasileiro, da forma como é estruturado, tem suporte principal na

produção de elementos na fase pré-processual, lastreando-se nas peças de

informação contidas no Inquérito Policial. Nesse aspecto, se faz necessário um

cuidado demasiado com a cadeia de custódia da prova e produção de um acervo

completo e consistente, já que se trata, na maior parte das vezes, de provas

irrepetíveis. Em razão das consequências irreparáveis que o mau procedimento

poderá acarretar à instrução processual, o presente trabalho, através da análise do

cenário da perícia criminal, bem como, de seus impactos na persecução penal,

destaca a importância da implementação da investigação de qualidade. Examinando

ainda as normativas que regulamentam o tema, incluindo o posicionamento dos

poderes executivo e judiciário a respeito da temática, que cuida, em última análise,

da proteção dos direitos humanos. Dessa forma o se verifica é que a investigação

configura uma poderosa política de segurança pública e que além de ser priorizada

pelo poder público, merece especial cuidado pela legislação, devendo também ser

promovida pela defesa dos acusados e suspeitos.

Palavras-chave: Investigação. Produção de Provas. Perícia Criminal. DNA na

Ciência Forense. Segurança Pública.

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ABSTRACT

In different times and contexts, technology has been a strong ally of criminal

prosecution. The advancement of science has provided tools that enable the

discovery of countless kinds of crimes, committed under the most varied

circumstances. However, according to statistics, Brazilian research is inefficient

because, despite the availability of new techniques, what has been noted is the

increase in crime, a situation that invites us to reflect on the application of Public

Security investments in the sector of expertise. Undoubtedly, the implementation of

techniques and the quality investment in expert production contribute to the

strengthening of the evidential framework within the procedural instruction and the

consequent reduction of impunity. The Brazilian criminal process, as it is structured,

has main support in the production of elements in the pre-procedural phase, based

on the pieces of information contained in the Police Inquiry. In this regard, too much

care must be taken with the chain of custody of the proof and production of a

complete and consistent collection, as this is often unrepeatable evidence. Due to the

irreparable consequences that the bad procedure may trigger the procedural

instruction, the present work, through the analysis of the criminal expertise scenario,

as well as its impacts on the criminal prosecution, highlights the importance of the

implementation of the quality investigation. Also examining the regulations that

regulate the subject, including the position of the executive and judiciary powers on

the issue, which ultimately takes care of the protection of human rights. Thus it is

found that the investigation configures a powerful policy of public security and that

besides being prioritized by the public power, deserves special care by legislation,

and should also be promoted by the defense of the accused and suspects.

Keywords: Investigation. Evidence Production. Criminal Expertise. DNA in Forensic

Science. Public Security.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Percentual de unidades de medicina legal cujos profissionais participaram

de cursos de capacitação ou atualização, por UF, 2011.

Figura 2 - Média salarial dos profissionais de perícia, em reais, 2011.

Figura 3 - Existência de plano de carreira para peritos criminais, por UF, 2012.

Figura 4 - Existência e abrangência dos sistemas informatizados, em porcentagem,

nas unidades pesquisadas, 2012.

Figura 5 - Percentual de atendimento da demanda de casos de 2011 nas unidades

de medicina legal, por UF, 2011.

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LISTA DE SIGLAS

CPP Código de Processo Penal

DNA Ácido Desoxirribonucleico (em inglês Deoxyribonucleic Acid)

IC Instituto de Criminalística

II Instituto de Identificação

IML Instituto Médico Legal

IPL Inquérito Policial

ITEP Instituto Técnico-Científico de Perícia

SENASP Secretaria Nacional de Segurança Pública

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO....................................................................................... 11

2 AGENTES DA PRODUÇÃO DE PROVA PARA ALÉM DAS

NORMATIVAS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL........................

15

2.1 Da formação do condutor do inquérito: nulidades e provas

inservíveis à elucidação dos fatos.....................................................

16

2.2 Profissionais legistas e condições de trabalho sob a perspectiva

da literatura forense............................................................................

22

3 O DNA E A GENÉTICA FORENSE: A CIÊNCIA A SERVIÇO DA

JUSTIÇA PARA A SOLUÇÃO DE CRIMES VIOLENTOS...................

29

3.1 O cenário brasileiro em estatísticas.................................................. 32

3.2 A face do sistema de perícias no Rio Grande do Norte 36

4 IMPLEMENTAÇÃO DE NOVAS FERRAMENTAS E TÉCNICAS

AOS PROCEDIMENTOS DE EXAMES CRIMINALÍSTICOS E SUAS

IMPLICAÇÕES PRÁTICAS...................................................................

43

4.1 Investigação defensiva e produção de prova pericial: inovação e

dinamicidade ao processo de produção de provas.........................

44

4.2 Implicações da prova pericial na instrução processual e

decisões judiciais................................................................................

48

4.3 Investimento em política públicas de investigação versus

patrulhamento ostensivo e o combate à criminalidade...................

53

4.4 Importância do aparelhamento dos institutos de perícia,

formação e capacitação de delegados e peritos e atualizações

acerca do uso das novas técnicas.....................................................

58

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................. 64

REFERÊNCIAS..................................................................................... 68

ANEXO A – PORTARIA N° 021/2019 - GDG NATAL/RN,30 DE JANEIRO DE 2019................................................................................. 73 ANEXO B – LAUDO DE EXAME NECROSCÓPICO............................ 75

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1 INTRODUÇÃO

O tema da segurança pública sempre se mostrou uma pauta social de

extrema urgência. Não é à toa que o debate político centra-se, frequentemente,

nessa questão e governantes são eleitos através do discurso de reforma desse

setor, suscitando propostas para solucionar o problema da criminalidade.

Hodiernamente, a sensação de insegurança que permeia a sociedade tem

se intensificado em razão dos elevados índices da criminalidade violenta,

especialmente pelos crimes de homicídio e roubo.

Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade, do Ministério da

Saúde (SIM/MS), apresentados no Atlas da Violência, produzido pelo Fórum

Brasileiro de Segurança Pública (2019, p.5), apontam que no ano de 2017 foram

registrados 65.602 homicídios no Brasil, o que corresponde a 31,6 mortes para cada

100 mil habitantes. Essa estatística representa a maior taxa de letalidade violenta da

história do país.

Diante dessa realidade, a impunidade constitui um fator que contribui como

incentivo à criminalidade. O Instituto Sou da Paz (2017, p.4), evidencia que menos

de 15% das mortes violentas são denunciadas pelo Ministério Público, em razão da

fragilidade das provas, ocasionada pela estrutura deficitária da perícia e, ainda, a

excessiva duração na condução dos inquéritos policiais.

Países que investiram na produção de prova por meio do exame de DNA, a

exemplo dos Estados Unidos, têm logrado elevados índices de eficiência na

apuração de crimes de homicídio, inclusive fatos ocorridos em período anterior ao

surgimento dessa técnica, o que foi possível graças a adequada conservação do

material colhido à época dos acontecimentos.

Embora não seja indispensável, o inquérito policial constitui a gênese da

expressa maioria das ações penais que tramitam no país. Em que pese a polícia

judiciária, responsável pela condução do procedimento, atue em conjunto com o

Ministério Público no desiderato de embasar a acusação, o inquérito não deve

demonstrar seletividade na coleta de provas ou partir de uma concepção pré-

estabelecida a respeito dos fatos.

Diante da forte tendência inquisitiva do procedimento em análise, se faz

necessário conferir o máximo de garantias possível e assegurar o equilíbrio entre as

intervenções da acusação e da defesa, uma vez que o inquérito deve estar a serviço

da justiça e não em busca de uma condenação.

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É notório que diante de ações criminosas cada vez mais sofisticadas, há

necessidade de técnicas de investigação que acompanhem esse avanço. Em cotejo

com essa temática, afirma Soares (2014, p.206) que a criatividade, o dinamismo e a

inovação tem caracterizado o fenômeno da criminalidade e que, dessa forma, se faz

necessário que a repressão estatal também atue com criatividade, dinamismo e

inovação, atentando-se para uma importante diferença, a de que a ação criminosa é

seria completamente livre, enquanto a repressão estatal deve ser condicionada pelo

ordenamento jurídico, especialmente pelos direitos fundamentais.

Neste interim, a investigação preliminar enquanto embrião da ação penal,

tem sido, historicamente, subestimada, atribuindo-se a esta etapa menor importância

do que o devido. Todavia, conforme será analisado, o inquérito policial exerce um

papel relevante na instrução processual, já que, com frequência, recebe valoração

na fase de julgamento.

Nesta senda, a fase pré-processual demanda certa atenção que, até o

momento, não tem se observado por parte das autoridades responsáveis pelo

aparelhamento do sistema policial e órgãos de investigação.

Isso ocorre, notadamente, em decorrência da expectativa de que a instrução

processual possa suprir as lacunas e produzir provas robustas acerca dos fatos

alegados. No entanto, de acordo com o que será explanado no decorrer deste

trabalho, nem sempre é possível efetivar essa pretensão, embora fosse o ideal.

Para dar início à discussão a respeito da relevância do investimento em

investigação é preciso partir de premissas como a função do inquérito e seu impacto

na instrução processual. Neste compasso, acerca do referido instituto, Mirabette

(2003, p. 76) sustenta que se rata de uma instrução provisória e informativa. No

entanto, menciona que, por diversas vezes, são colhidos elementos difíceis de obter

na instrução processual como auto de flagrante e exames periciais

Por conseguinte, é importante frisar que as peças de informação contidas

em um inquérito policial não apenas se prestam a embasar uma denúncia, e que,

em muitas situações, o material colhido nesta etapa não constitui apenas uma

instrução probatória, mas, como bem assinalou Júlio Mirabete, serve como prova ao

processo judicial.

Desse modo, se supera a visão de que o inquérito se configura como um

elemento que serve tão somente à acusação para respaldar uma denúncia e fazer

prova das imputações alegadas na exordial.

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Quanto à destinação do inquérito e sua utilidade para a instrução, assevera

Nucci (2013, p.131) que o inquérito não se destina unicamente ao órgão acusatório,

visando à formação da sua opinio delict, já que integra dos autos do processo,

autorizando ao magistrado utilizá-lo para embasar sua decisão, quando as

informações sejam ratificadas na instrução.

Em compasso com o que aponta Nucci, a eventual prova produzida em sede

de inquérito, ao integrar os autos processo, serve à ambas as partes, inclusive ao

juízo, não se destinando apenas à acusação.

O inquérito se reveste de suma importância para a instrução processual,

seja para compô-la, seja para evitá-la, uma vez que é possível, diante da

inexistência de indícios da ocorrência de um fato típico ou da impossibilidade de ligar

um suspeito a uma cena criminosa, o arquivamento do inquérito sem que o mesmo

culmine em uma ação penal.

Neste sentido, se estudará se como implicação prática de uma investigação

preliminar eficaz, teríamos a minimização da possibilidade de condenações injustas

e da instauração desnecessária de ações e ainda a redução de custos para a

máquina judiciária.

Para que a investigação possa atingir resultados satisfatórios, o estado

necessita de aprimoramentos, e de adequação às novas tecnologias, além de

ajustar a legislação à prática investigativa, de modo a garantir a ocupação desse

espaço pela defesa, compreendendo as nuances constitucionais de ampla defesa e

devido processo legal que não podem ser exclusivas da fase processual.

Quanto às diversas inovações, que vem sendo constantemente inseridas no

mercado da tecnologia, é possível citar as inegáveis contribuições das ciências do

campo da tecnologia da informação e do ramo da biociência, dentre outros. Todavia,

para fins de delimitação do objeto de análise e de um melhor aproveitamento desse

estudo, será observada a estrutura atual da perícia no país no tocante à intervenção

de novas ferramentas atreladas ao exame do perfil genético para a produção da

prova pericial.

O presente trabalho se debruçará sobre o cenário das perícias no país,

através de pesquisas desenvolvidas na área da segurança pública e da literatura

acerca dos temas de perícia e investigação preliminar.

Se buscará apresentar os benefícios e as desvantagens da implementação

do exame a partir do DNA, sopesando possíveis riscos, alinhados as necessidades

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dos institutos de perícia do Brasil, considerando os insumos físicos e recursos

humanos disponíveis.

Nessa esteira, também será tratado de que forma a defesa de um suspeito

ou indiciado poderá contribuir com a investigação, ainda na fase do inquérito, pois,

embora esse não seja o foco dessa pesquisa, se demonstrou relevante mencionar a

participação do defensor nesse momento pré-processual, levando em conta o

exíguo espaço que lhe foi atribuído nessa etapa e os óbices que encontra para a

efetivação plena do exercício das suas prerrogativas.

Ademais, por se verificar enquanto instrumento valioso ao processo, também

será demonstrado de que forma a prova colhida no inquérito impacta na instrução e

qual a pertinência que guardam com as decisões proferidas.

Será avaliada, também, a responsabilidade dos poderes estatais para a

consecução de uma justiça efetiva que vise à redução da impunidade e o

fortalecimento da área de segurança pública.

Para a elaboração desse trabalho será realizada pesquisa bibliográfica e

jurisprudencial, de natureza qualitativa, através da consulta a livros, publicações

acadêmicas, sites especializados, além de estudo de casos, bem como, da

legislação correlata, analisando a doutrina e a jurisprudência pátria quanto ao tema

escolhido.

O estudo também será pautado tanto em pesquisas relacionadas à perícia,

desenvolvidas na área de planejamento da segurança pública, quanto em produções

televisivas, quais sejam documentários que retratam o cotidiano da elaboração de

perícias e que reportam a condução de alguns julgamentos emblemáticos que

possuem ligação com a temática abordada.

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2 AGENTES DA PRODUÇÃO DE PROVA PARA ALÉM DAS NORMATIVAS DO

CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

A atividade recognitiva do juiz, segundo explica Lopes (2016)1, consiste em

recriar, através da prova uma realidade mais aproximada possível dos fatos que se

julga ocorridos num passado.

A respeito do verdadeiro objeto de julgamento no processo, nos ensina

Nunes (2009, p. 163) que “parece óbvio asseverar que o juiz não julga os fatos in

natura, tal como eles se verificaram no mundo fenomênico, mas apenas a versão

desses fatos, de acordo com a prova carreada aos autos”.

Poder-se-á atribuir aos agentes produtores da prova a função de locutores,

os quais emitem um parecer sobre determinado objeto ou situação destinado a

convencer, ou ao menos induzir, o juiz nos termos da conclusão do seu relatório.

É elementar que tal produção se dê em consonância com a mesma

legislação que cuida do processo, a despeito de ocorrer fora do mesmo, em etapa

que antecede a ação penal, uma vez que, após o recebimento da ação, as peças de

informação que embasaram o oferecimento da acusação passam a integrar o

processo e, em se tratando de provas irrepetíveis, são únicas e decisivas para a

elucidação dos fatos.

Todavia, o Código de Processo Penal, ao tratar dessa matéria não

regulamenta os pormenores da produção da prova, qual seja, especificamente a

prova pericial analisada no presente trabalho.

O que há, nesse sentido, é apenas a distinção entre elementos informativos

e prova, na qual o art. 1552 veda, expressamente, que o juiz utilize elementos

meramente informativos, que não constituem provas em si, como motivação das

suas decisões.

1 “É a prova que permite a atividade recognoscitiva do juiz em relação ao fato histórico (story

of the case) narrado na peça acusatória. O processo penal e a prova nele admitida integram o que se poderia chamar de modos de construção do convencimento do julgador, que formará sua convicção e legitimará o poder contido na sentença.”

2 Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008) Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

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De tal sorte, a disciplina, para não dizer escassa, é omissa no que tange às

condições de produção da prova pericial, deixando a cargo da legislação

infraconstitucional que o faça, e essa normatização se veicula, geralmente, por meio

de portarias expedidas pelos órgãos do poder executivo que cuidam da perícia.

A problemática, cabe esclarecer, não reside na espécie legislativa utilizada

para abordar a temática, mas sim no fato de incumbir ao poder executivo essa

função, o qual irá implementar o serviço de investigação da forma que se afigure

mais econômica, sem atentar para a qualidade dos resultados que serão obtidos.

Desta forma, primeiramente temos que, os profissionais que estão

diretamente envolvidos com a análise e o tratamento da prova são admitidos no

serviço público segundo exigências próprias da administração pública, que não

necessariamente guardam pertinência com o diploma processual penal.

Neste compasso, situação mais complexa é a das condições de manejo das

provas, quais sejam laboratórios e ferramentas utilizadas para perícia de coisas e

pessoas, porquanto não há, ainda que breve, regulamentação do CPP que defina

esses critérios, de modo a padronizar procedimentos ou de garantir a utilização da

tecnologia disponível.

Diante desse cenário, a intenção deste capítulo é a de apontar algumas

falhas identificadas na fase pré-processual que compreende o inquérito e a

produção da prova pericial, apresentando e analisando as condições de trabalho dos

agentes que protagonizam essa etapa.

2.1 Da formação profissional do condutor do inquérito: nulidades e provas

inservíveis à elucidação dos fatos

A atividade investigativa sofre a incidência de limitações que ditam as balizas

da atuação estatal. Nas palavras de Soares (2014, p.65), denomina-se direito

probatório o subsistema de normas jurídicas que, direta ou indiretamente,

regulamentem a reconstrução dos fatos sob julgamento.

Partindo da compreensão de que o inquérito policial é, também - mas não

apenas-, um dos principais elementos informativos que norteiam a acusação e

instruem a ação penal, é necessário um olhar cauteloso para a fase pré-processual

e a produção de provas nesse momento.

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De acordo com Ritter (2018, p.16) sendo o inquérito policial um meio de

preparação para eventual propositura de ação penal, a investigação realizada nessa

fase pode evitar a instauração de uma ação que, venha a se mostrar infrutífera por

ausência de provas ou de materialidade do delito, após todo um desgaste para o

acusado e movimentação da máquina estatal, situação que poderia ter sido

concluída ainda na fase pré-processual.

É possível, então, perceber que a função da investigação preliminar não é

meramente informativa e não se configura apenas como procedimento burocrático

que se presta a integrar uma denúncia. Mais do que isso, o inquérito é meio idôneo

e capaz de obstar a persecução criminal, quando não observadas as hipóteses

autorizadoras para início de uma ação penal.

No ordenamento jurídico brasileiro a função de operar a fase pré-processual

foi atribuída à polícia judiciária, embora sem exclusividade, salvo exceções

consignadas no texto constitucional, conforme acentuado por Walter Nunes (2015,

p.398).

Tal estrutura foi pensada com o intuito de que não houvesse participação do

órgão julgador no momento de produção da prova, já que esse contato tende a

interferir na convicção do juiz. Em consonância com esse pensamento, afirma

Almeida (2016, p. 217) que não é sem razão que a polícia judiciária, não integra a

estrutura do Poder Judiciário, e sim pertence ao Poder Executivo, pois explica que

tal estrutura constitucional se dá para prevenir a possível contaminação do Estado-

juiz, na medida em que pudesse controlar a atividade policial, no que diz respeito às

suas investigações.

Nas palavras de Nunes (2015, p. 413), o juiz só deve atuar na fase

investigatória, para resolver questões acerca da adoção de medidas ou da produção

de provas, às quais a lei e a Constituição imponham restrição, de tal sorte que ao

judiciário não cabe substituir a polícia ou o Ministério Público nessa função.

Nesta toada, para desempenhar suas funções, a polícia necessita dispor de

certa independência e autonomia, pois, como é evidente, a investigação não pode

estar a serviço de interesses particulares, mas da coletividade.

Neste sentido, Almeida (2016, p. 225) se filia a esse posicionamento ao

pontuar que a investigação criminal preliminar deve ser realizada por órgão

independente e descomprometido com as etapas posteriores da persecução, com o

intuito de evitar a contaminação decorrente da cumulação de funções distintas, para

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que o material produzido na investigação preliminar seja fornecido em igualdade de

condições à acusação e a defesa, para que sejam melhor elaboradas durante a fase

judicial.

A Constituição Federal de 1988, pautada nas garantias do indivíduo,

consignou a exigência de que devem ser observados os direitos da pessoa que se

ache submetida à persecução penal, podendo tal imposição ser entendida como

extensão da garantia do devido processo legal. Embora o inquérito, por constituir a

fase pré-processual, em tese, não compreenda as imposições destinadas ao

processo acusatório, entendemos que as mesmas garantias devem ser estendidas à

fase preliminar.

O Código de Processo Penal3 dita que o inquérito será conduzido pela

autoridade policial a quem será incumbido o dever de fornecer as informações

necessárias à instrução e ao julgamento do processo.

O conceito de autoridade policial, nada obstante venha sendo objeto de

discussão4 no âmbito da carreira policial, civil e federal, culturalmente, está atrelada

ao cargo de Delegado de Polícia, tal como pretendeu o legislador ao utilizar essa

expressão para fazer referência ao responsável pela condução dos procedimentos

de investigação, embora não haja definição desse termo no Código de Processo

Penal.

Ora, não se trata de excluir os agentes policiais das atividades de

investigação, mas de estabelecer o comando dessas operações, pois ao instituir

essa liderança se admite a participação dos agentes nos procedimentos

investigativos, uma vez que se há comandante, pressupõe-se que hajam também

comandados.

3 Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas

respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. Art. 13. Incumbirá ainda à autoridade policial: I - fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias à instrução e julgamento dos processos; II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público; III - cumprir os mandados de prisão expedidos pelas autoridades judiciárias; IV - representar acerca da prisão preventiva.

4 A Federação Nacional dos Policiais Federais – FENAPEF elaborou a NOTA TÉCNICA Nº 003/2016-FENAPEF, na qual vincula o posicionamento de que o termo “autoridade de policial” não deve ser restrito ao cargo de delegado de polícia, uma vez que é inerente a todos os agentes públicos policiais que integram os órgãos de polícia definidos pela Constituição da República Federativa do Brasil.

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Em relação à atribuição de tal competência, o Ministro do Supremo Tribunal

Federal, Gilmar Mendes, em decisão ao Recurso Extraordinário 593.727/MG5,

adotou entendimento de que a polícia militar possui competência para lavratura de

Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) em casos de crime de menor potencial

ofensivo, sob a afirmação de que a conferência dessa atribuição não estaria

deslegitimando nenhuma das corporações envolvidas (polícia civil e militar).

A respeito da trajetória do delegado de polícia em nosso ordenamento pátrio,

nos informa Lucena (2014)6 que o cargo de Delegado de Polícia nem sempre existiu

no ordenamento jurídico brasileiro e que nos primórdios da atividade contava com a

feição de função policial comum, de modo que, a carreira veio a ser estruturada

apenas em 1808, havendo período em que a profissão já foi extinta e momento em

que as autoridades policial e judicial. Atualmente, temos o Código de Processo

Penal de 1941 e a Constituição da República de 1988 como marcos da retomada

desta carreira jurídica e para a definitiva distinção entre essas autoridades.

Deste modo, não ocasiona espanto o fato de que muitas das nulidades

observadas nos processos judiciais são provenientes de ocorrências verificadas

durante o inquérito policial, de acordo com o que pontua Cardoso (2012, p.159), o

trabalho investigativo vem sendo realizado em condições inapropriadas, com

estruturas comprometidas e escassez e deficiência dos instrumentos. Menciona

ainda a ausência de suporte psicológico preventivo, além da má remuneração da

categoria, aliada à extrema dependência financeira do Estado, bem como chama

atenção para o déficit de profissionais.

Aliado a este cenário, o fator burocrático agrava essa situação. A rotina de

cartório e remessas infindáveis entre Delegacia e Ministério Público pulveriza a

investigação, em vários sentidos. O principal deles é o da duração do inquérito, pelo

que se excede – e muito – os prazos estabelecidos pelo CPP. Além disso, na

prática, as formalidades se sobressaem ao exame acurado dos fatos, e o simples

acúmulo e envio de papéis, que nada explicam, se torna suficiente.

5 O RE foi julgado pelo plenário em 14 de maio de 2015, teve como relator o Ministro Gilmar

Mendes, que teve seu voto acompanhado pelos ministros Celso de Melo, Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Rosa Weber e Cármen Lúcia; vencidos Cezar Peluso, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Marco Aurélio. Nos termos do voto do relator, se afirmou a tese de que o Ministério Público dispõe de competência para promover investigações, por autoridade própria e em prazo razoável.

6 O artigo não conta com paginação eletrônica.

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Relativamente ao aspecto da duração do inquérito, Silveira (2013, p.50)

explica que a eficiência do instituto implica na conclusão da atividade em tempo

razoável, ainda que se trate da constatação pela negatória de autoria ou pela

impotência das forças policiais em apontar a materialidade e autoria para certos

casos. Relata que isso não necessariamente constitui uma falha, sendo um

resultado passível de se obter.

Ainda com relação a este ponto, Silveira também defende que é

inimaginável a dilação do inquérito sem que se estabeleçam parâmetros temporais

de duração bem delimitados, sob a mera e corriqueira justificativa de a investigação

encontrar-se em andamento. Destaca que a manutenção de um inquérito em aberto

por extenso período de tempo, sendo remetido da Delegacia para o Ministério

Público e vice-versa, revela a sua própria ineficiência como peça capaz de justificar

um indiciamento consistente.

No que toca a função atribuída ao delegado, Silveira pontua que o cargo

conta com poucas permissões e proibições designadas pela legislação, o que abre

margem para uma atuação muito mais pautada na prática forense do que nos atos

formais emanados pelo legislador, o que nem sempre resulta na forma correta de

realização das ações.

Ademais, merece destaque o fato de que, apesar de veiculada na

Constituição de 1988, é possível considerar recente a exigência do título de bacharel

em direito para o ingresso na carreira de delegado. Tínhamos, portanto uma

investigação comandada por um profissional destituído de conhecimentos básicos

acerca dos direitos e garantias dos investigados. Tal realidade que perdurou por

tanto tempo não pode ser ignorada, tampouco pode-se esquecer o impacto

originado em razão disso e o ranço de diversas práticas, impregnado até os dias

atuais.

Hodiernamente, o diploma legal que regulamenta a atividade de investigação

criminal conduzida pelo delegado de polícia é a lei n° 12.830 de junho de 2013, na

qual se estabelece, em seu art. 2°7, que as funções exercidas pelo delegado de

7 Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo

delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado. § 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.

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polícia são de natureza jurídica, de onde se extrai a exigência do título de bacharel

em direito para o ingresso na carreira.

É possível concluir que tal exigência deriva do mandamento constitucional

de que a investidura em cargo público depende da demonstração de competências

específicas das quais demande o cargo, mediante a aprovação em concurso público

de provas e títulos.

Desta feita, é indiscutível que tal condicionamento foi inserido pela

Constituição e legislação infraconstitucional com o intuito de conferir a aplicação das

garantias inerentes aos acusados, também, na fase pré-processual. No entanto,

cabe salientar que essa transição entre profissionais ainda não foi totalmente

efetivada, tendo em vista ser recente a referida imposição.

Para se lograr êxito na fase inquisitorial, de acordo com os moldes

constitucionais, deve-se capacitar os agentes da investigação para que promovam,

além da busca pela verdade dos fatos, as garantias necessárias para os envolvidos,

acusados, vítimas e demais possíveis afetados.

Todavia é preciso abandonar também os estigmas que descredibilizam as

instituições policiais e a figura do delegado de polícia que, costumeiramente são

bombardeados pela sociedade e pela mídia sensacionalista, devendo receber

também o devido espaço dentre as demais carreiras jurídicas.

Conforme expressa Barilli (2018, p. 286), o Delegado de Polícia não pode

receber tratamento depreciativo em comparação com as demais carreiras jurídicas,

tendo em vista ser integrante de carreira técnica, com expertise específica, cuja

função é sobremaneira relevante na fase preparatória da persecução criminal.

Orienta o autor que, não é concebível que o inquérito policial sirva como instrumento

de garantias sem que o seu condutor tenha autonomia e independência funcional

imprescindíveis para efetivá-las.

As garantias não podem ser encaradas como óbice à investigação, pois

consubstanciam a sua razão de ser. Ademais, o compromisso do investigador é com

a prova, embora seja um compromisso eivado de subjetividade, uma vez que,

previamente se formulam hipóteses, que tentaram ser verificadas no decorrer das

atividades de perquirição.

§ 2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos.

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Desse modo, a procura seletiva por informações possui a tendência de

confirmar a hipótese originária que haja sido aceita pelo menos uma vez, o que

normalmente ocorre quando se obtém informações que ratificam uma preconcepção,

daí onde reside a preocupação quanto à imparcialidade da investigação preliminar,

que exige um comprometimento por parte do comandante da operação de não

formular posições que possam interferir na coleta de provas.

2.2 Profissionais legistas e condições de trabalho sob a perspectiva da

literatura forense

Segundo a inteligência do art. 158 do Código de Processo Penal8, a perícia

é obrigatória nos casos em que haja vestígios. O mencionado artigo está localizado

topograficamente no Capítulo II que cuida do exame de corpo de delito e das

perícias em geral, inserido no Título VII que se refere à prova.

Sobre a definição da prova pericial, Nunes (2009, p.216) traz a lume a

existência de uma discussão quanto ao tipo de prova pericial, se seria meio de

prova, tal como as demais espécies previstas no ordenamento jurídico; ou uma

espécie de prova testemunhal, já que se trataria de um testemunho prestado em

juízo por pessoa especialista em área específica do conhecimento; e ainda, que a

perícia seria mais do que prova, na medida em que consiste em uma análise

técnica, confeccionada por profissional expert em determinada matéria.

De toda sorte, a perícia, lato senso, pode ser desenvolvida por experts de

diversas áreas do conhecimento a depender do objeto periciado e da situação que

se pretenda revelar. Os profissionais pertencem desde a categoria das ciências

exatas, como as engenharias e ciências da informação e tecnologia até ciências

biomédicas, além de outras formações. Nesta breve análise, o enfoque está sobre

os agentes que realizam a perícia de crimes violentos, especificamente o perito

Criminal, o perito médico legista, o papiloscopista e o agente de necropsia.

8 Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de

delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. Parágrafo único. Dar-se-á prioridade à realização do exame de corpo de delito quando se tratar de crime que envolva: (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018) I - violência doméstica e familiar contra mulher; (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018) II - violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência. (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)

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Trata-se, pois, do trabalho de tornar algo tangível (material colhido) em algo

de natureza intangível (prova/convencimento). Isso porque, de um lado se tem as

evidências coletado na cena do crime e do outro lado da esteira, findado o

processamento, estão as interpretações e conclusões compactadas em um parecer.

Acerca do trabalho a ser desenvolvido pela área de perícia específica da

medicina legal, nos valemos dos ensinamentos de Rodrigues, Silva e Truzzi, (2010,

p.3) os quais explicam que a medicina-legal é composta, principalmente, por

médicos-legistas, que realizam os exames de necropsias em cadáveres, nos casos

de morte violenta, a exemplo de homicídios, suicídios e acidentes, e que também

procedem a exames de corpo delito em pessoas vivas, que foram submetidas a

algum ato de violência, ou acidente, bem como testes de alcoolemia, por exemplo.

Como é racional inferir, a atividade do perito não pode ser pautada em

subjetivismos ou concepções pessoais acerca do objeto periciado. É cautela a ser

tomada pelo médico perito, também de acordo com Rodrigues, Silva e Truzzi (2010,

p. 50, destaques dos autores), não basear suas conclusões em suposições,

probabilidades ou possibilidades, pois na atividade médico-pericial não há lugar para

achismos, sendo dever ético do médico-legista fundamentar seus pareceres em

fatos concretos e situações objetivas, de modo a não deixar qualquer margem para

interpretações inconsistentes.

Também cumpre ressaltar que tais profissionais necessitam de constante

aprimoramento das técnicas das quais se utilizam e, para isso, demandam de

treinamento e capacitação periódicas, de acordo com o que nos explica a literatura

em perícia médica.

O Conselho Federal De Medicina (2012, p.41-42) explica que o curso de

Medicina é o de maior carga horária entre os cursos da área da saúde. Nada

obstante esse fato, a constante evolução científica impõe aos profissionais médicos

a periódica necessidade de aprimoramento, de modo que o tempo regular da

graduação proporciona sólida base ao médico, mas que não o possibilita atuar como

perito em todos os campos da Medicina, por isso se faz necessário treinamento

específico voltado para o ramo da medicina legal.

No entanto, em descompasso a esse pensamento, o Conselho Regional de

Medicina do estado do Ceará (2005)9 editou parecer n° 9/05 estabelecendo que

9 O documento não conta com paginação eletrônica.

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concurso público para médico perito não está autorizado a exigir título de

especialização em perícia médica como pré-requisito para investidura no cargo. No

mesmo sentido, o Conselho Federal de Medicina (1998)10, por meio do parecer n°

33/98, dispõe que a perícia médico-judicial prescinde do título de especialista.

Ora, se é sabido que os conhecimentos básicos em medicina carecem de

complementação para a atuação em perícia forense, é contraditório estabelecer

vedação a exigência de nível de especialização desses profissionais, principalmente

tendo em vista que, em muitos casos, não recebem algum tipo de capacitação

quando ingressam no serviço.

Em relação ao plano de aperfeiçoamento dos servidores que trabalham com

a perícia, o Diagnóstico de Perícia no Brasil realizado pela Secretaria Nacional de

Segurança Pública (SENASP, 2011) verificou que o percentual de unidades pelo

país, nos quais há oferta de capacitação para o seu quadro de profissionais é

exíguo, sendo que algumas dessas unidades fornecem treinamento apenas para

alguns setores, como unidades de chefia:

Figura 1 - Percentual de unidades de medicina legal cujos profissionais participaram

de cursos de capacitação ou atualização, por UF, 2011.

10 O documento não conta com paginação eletrônica.

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Fonte: Brasil (2012, p.69).

Fator que também contribui sobremaneira para o cenário de escassez de

profissionais é a remuneração percebida pelos agentes, que indicam a

desvalorização das categorias, elemento responsável pela deflagração de greves ao

redor do país.

De acordo com o Diagnóstico de Perícia da SENASP (2012) a média salarial

dos peritos criminais e médicos legistas é de pouco mais de R$ 5.000,00 (cinco mil

reais) e papiloscopistas, pouco mais de R$ 2.000,00 (dois mil reais), havendo

estados que remuneram em valor bem abaixo da média, conforme os gráficos a

seguir:

Figura 2 - Média salarial dos profissionais de perícia, em reais, 2011.

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Fonte: Brasil (2012, p. 64-66).

Atrelada a essa realidade também se depara o profissional da perícia com a

inexistência de plano de carreira em muitos estados do país, de acordo como

também apontado pelo referido diagnóstico, muitos estados não contam com esse

tipo de progressão:

Figura 3 - Existência de plano de carreira para peritos criminais, por UF, 2012.

Fonte: Brasil (2012, p. 67).

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A partir de um olhar superficial, a atividade desenvolvida por um perito

criminal já demonstra certo grau de complexidade, pois lida diretamente com

situações naturalmente indigestas como mortes, variados tipos de violência física e

abusos diversos.

Contudo, além da tortuosa missão de identificar a ocorrência de um crime e

reconstituí-lo na tentativa de decifrar sua execução, a realidade enfrentada pela

equipe de perícia nos institutos técnicos-científicos pelo país revela que a profissão

pode ser ainda mais fatigante.

Estudo do Conselho Federal de Medicina (2012) que se dedicou a análise do

trabalho desenvolvido por peritos apontou que a carga de estresse a que se

submetem esses profissionais tem desencadeado um quadro de sintomas de ordem

psicológica.

Contudo, de acordo com o Ministério da justiça (2014, p.10), 63% das

unidades de medicina legal não disponibilizam assistência psicológica aos

profissionais do setor, o que sugere que a condição desses profissionais, embora

dentre as hipóteses com alto risco de incidência de doenças psicológicas, não

recebe a atenção necessária.

Ademais, as condições precárias de labor desses técnicos em nada

favorecem, tanto a elaboração de pareceres de qualidade que sejam conclusivos,

quanto um ambiente minimamente salubre do ponto de vista físico e psicológico.

Neste tocante, o Conselho Federal de Medicina (2012, p.64) traça algumas

considerações e recomendações sobre o tema, no intuito de tornar mais proveitoso

o exercício da profissão dos médicos legistas. Pontua sugestões como condições de

segurança nos locais de trabalho, de modo a aumentar a confiança e reduzir o

estresse do profissional; melhoria na estrutura do ambiente de trabalho, como

equipamentos e insumos necessários à atuação médico-pericial; remuneração

digna, além de treinamentos e atualizações constantes a serem fornecidos pelas

próprias instituições em que o perito exerça suas atividades.

Conforme evidenciado neste capítulo é possível concluir que os profissionais

que realizam perícia no Brasil necessitam de melhor estrutura para o

desenvolvimento satisfatório de suas funções, tais como melhoria na remuneração,

criação e revisão de planos de carreira e ofertas de capacitação e atualização

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periódicas, além de ambiente salubre e acompanhamento psicológico à disposição

nas unidades de perícia.

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3 O DNA E A GENÉTICA FORENSE: A CIÊNCIA A SERVIÇO DA JUSTIÇA PARA

A SOLUÇÃO DE CRIMES VIOLENTOS

O direito, como é sabido, não possui condições de, isoladamente, oferecer

respostas a todas as situações jurídicas observadas no contexto das relações

humanas. Para tal mister, o jurista busca amparo em diversas ciências, as quais

emprestam seus pressupostos e critérios próprios aos operadores do direito.

Conforme demonstrado no capítulo anterior, não seria possível ao judiciário,

sem a contribuição de experts pertencentes aos mais variados ramos do saber,

enfrentar grande parte das demandas propostas, especialmente no âmbito criminal,

em que, na quase totalidade dos casos, não se discute matéria de direito e sim

fática.

Neste capítulo será abordado como atuam a biologia e a química forense no

exame de crimes cometidos sob violência física, com foco em uma técnica não tão

recente, mas ainda pouco explorada no Brasil, especialmente pelos institutos de

perícia menos modernos, e que vem, cada vez mais, sendo protagonista da

investigação criminal.

Trata-se da análise de perfil genético, consistente na extração de DNA e

comparação com padrões existentes, por meio da qual é possível a identificação da

autoria de crimes, ou ao menos, fornece indícios para se chegar ao agente suspeito.

Tal técnica está atrelada à ciência da química forense, a qual compreende a análise

de alguns campos temáticos, tais como a toxicologia, a tanatologia, a asfixiologia, a

hematologia, bioquímica, dermatoglifia, semenologia e análise físicoquímica

instrumental de acordo com Miranda (2007, p.115).

A tipagem do DNA pode ser um auxiliar poderoso da ciência forense. De

acordo com o Conselho Nacional de Pesquisa (1999, p.1), o método foi usado pela

primeira vez em 1985 no Reino Unido, nos Estados Unidos no fim de 1986 por

laboratórios comerciais e em 1988 pelo Federal Bureau of Investigation (FBI).

Sua utilidade não se limita a inspeção de tipos específicos de crimes,

podendo se aplicar ao exame de qualquer caso de delito que apresente vestígios.

Todavia, é possível verificar o emprego dessa técnica, principalmente, em casos de

homicídio, agressão física e, sobretudo, em casos de estupro. Segundo o Conselho

Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos (1999, p.20) “entre os crimes com taxa

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elevada de recidiva, o caso mais comprovado é o de estupro, porque os criminosos

deixam material biológico (sêmen) que pode permitir sua identificação”.

O procedimento de extração e análise demanda a observância de uma rotina

específica de procedimentos a ser executada. Conforme nos explicam Dolinsky e

Pereira (2007, p.9) “o procedimento inclui sete etapas: Coleta da amostra;

Isolamento do DNA; Corte do DNA; Separação dos fragmentos; Transferência do

DNA; Hibridização de sondas; e perfil do DNA”.

Neste compasso, é possível observar que não se trata de um processo

simples e exige a capacitação dos profissionais ainda que estes possuam, em tese,

qualificação acadêmica para tal.

Outra questão que merece realce é a forma como a sociedade percebe essa

ferramenta, pois, não raras vezes, é atribuída a esta tecnologia uma carga

demasiada de expectativas quanto à apresentação de resultados inequívocos e à

resolução de crimes. Quanto a este ponto, é preciso se atentar para algumas

limitações enfrentadas por toda e qualquer técnica.

Com efeito, Dolinsky e Pereira (2007, p.12) consideram as técnicas de

identificação através da análise do DNA a maior revolução científica na esfera

forense desde o reconhecimento das impressões digitais como uma característica

pessoal. Os autores apresentam duas vantagens dessa técnica em relação aos

métodos convencionais de identificação, a estabilidade química do DNA, em razão

da resistência de sua composição, mesmo após longos períodos; bem como a sua

existência em todas as células nucleadas do organismo humano, fator que permite

identificar um suspeito por meio de uma única gota de sangue ou de um único fio de

cabelo encontrado na cena do crime.

Todavia, é possível discordar de alguns apontamentos apresentados na

produção supramencionada. De fato, é inegável a contribuição revolucionária

prestada à justiça criminal, não só pela análise do DNA, como pela ciência em geral,

todavia há que se ter cuidado com afirmações de que a prova produzida através do

exame do perfil genético tem o condão de, por si só, condenar ou absolver

suspeitos. Tal questão será melhor examinada adiante.

Além de representar uma inovação enquanto método que permite a

realização de perícias mesmo diante de casos com exígua quantidade de material

encontrado, o perfil genético apresenta algumas vantagens particulares. Em

compasso com o que expressa a obra de Luciana Dolinsky e Lissiane Pereira (2007,

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p.7), o DNA é resistente às muitas condições que destroem a maioria dos outros

compostos biológicos, como as proteínas, e são necessárias apenas pequenas

quantidades de DNA.

Apesar dessas vantagens, que podem ser obtidas através de técnicas que

ampliam e conservam o material coletado, a análise de perfil genético não oferece

resultados inquestionáveis em razão da possibilidade de degradação e

contaminação pelo material biológico de outrem, podendo conter ainda material de

pessoa estranha ao crime, de forma natural ou propositalmente plantada.

A respeito dessa possibilidade, interessante mencionar a situação ocorrida

com o norte-americano Steven Avery11, condenado a pena de dezoito anos por um

crime que não cometeu, em razão da manipulação das provas e condução da

acusação pela promotoria e o xerife do distrito de Manitowoc, no Wiscosin, EUA. O

caso foi contado no ano 2015 pela produtora de entretenimento Netflix através do

documentário em formato de série ‘Making a murderer’, ganhando ainda mais

visibilidade.

Há uma série de cautelas que devem ser adotadas e há que se considerar o

alto risco de atribuir completo crédito a essa prova tendo em vista as variáveis que

cercam seu pleno êxito em apontar uma conclusão.

Contudo, o fato de uma técnica não oferecer o máximo grau de

confiabilidade não é razão para se descartar essa ferramenta, até porque não há

meio algum que proporcione uma conclusão que possa ser infalível, completamente

confiável e verificável. De todo modo, a extração e análise do material genético

remanesce se apresentando uma solução útil e exitosa para a investigação criminal.

Isso porque tem contribuído decisivamente para a resolução de diversos

casos emblemáticos. Além de que a perícia brasileira não pode furtar-se de trilhar os

caminhos da evolução, permanecendo com o mesmo modo arcaico de investigação.

E aqui não se está a afirmar que a prova por DNA deva ser mais ou menos

acreditada ou que possua um maior valor probatório, posto que seria uma pretensão

incompatível com o sistema do livre convencimento motivado em que se abandona a

ideia de prova tarifada, cujo valor é pré estabelecido. Todavia, o juiz está livre para

fundamentar sua decisão exclusivamente nessa análise, em razão de constituir uma

11 “Steven Avery foi condenado em 1985, pelo tribunal de Manitowoc, no Wiscosin, pelos

crimes de violação e homicídio de uma mulher. Depois de cumprido 18 dos 32 anos de

pena, Avery foi exonerado graças a exames de DNA e libertado.”

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prova técnica, que apresenta mais confiabilidade do que outros meios, a exemplo do

reconhecimento pessoal feito pela vítima.

O que se pretende afirmar é que a prova genética é de fundamental

importância e configura meio idôneo se cercada de segurança na sua produção, e é

exatamente o que se reitera, pois antes da disseminação dessa tecnologia é preciso

fornecer qualidade a ela, sendo necessário gerar protocolos de confiabilidade.

Portanto, é preciso sempre se atentar para a necessidade de análise dessa

prova em cotejo com todas as demais provas coligidas na instrução.

3.1 O cenário brasileiro em estatísticas

No desiderato de mapear e identificar a realidade da produção de perícias

criminais no Brasil, a Secretaria Nacional de Segurança Pública. Vinculada ao

Ministério da Justiça, realizou uma pesquisa que culminou na produção intitulada

Diagnóstico da perícia criminal no Brasil (2011). O documento foi elaborado com o

propósito de fornecer subsídio para o implemento de ações de fortalecimento da

perícia forense, visando a diminuição da criminalidade violenta através da redução

da impunidade, com foco no aprimoramento da produção da prova técnica.

Na pesquisa se buscou mapear como os Estados e o Distrito Federal se

organizam para executar as análises periciais. Para isso foram divididas em três

grandes áreas, sendo elas a Criminalística, a Medicina Legal e a Identificação. O

estudo constatou que cada unidade federativa possui estruturas organizacionais

distintas e que, em linhas gerais, a maior parte delas atua nessas três áreas.

Também revelou-se latente a necessidade de desenvolvimento da técnica de análise

do DNA, que sequer é aplicada em, pelo menos, seis estados, de acordo com

BRASIL (2011, p.18).

É certo que não basta a existência de aparato de alta tecnologia para a

produção de uma prova confiável. O método empregado no exame e o manuseio do

material impactam sobremaneira no produto final. É preciso instituir uma

padronização dos processos de coleta e armazenagem, de forma a minimizar riscos

de contaminação e perda de material. Desse modo, um protocolo meramente formal

indicando a abertura do procedimento de perícia não supre essa necessidade de

cuidado que deve ser de trato prático por parte do agente que realiza a coleta e do

profissional que avalia a amostra. Neste sentido, constatou o Diagnóstico da Perícia

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Criminal no Brasil (2012, p.70) que, em mais da metade das unidades centrais de

Criminalística, de Medicina Legal e de Identificação, os vestígios não são lacrados

quando coletados no local de crime e nem guardados em local seguro para a

preservação de suas características, e que também não há rastreabilidade dos

vestígios na maior parte dessas unidades. Atrelado a esse aspecto, os dados

apontam, ainda, para a inexistência de procedimentos de cadeia de custódia na

Criminalística, funcionando apenas a parte burocrática relativa ao protocolo de

recebimento e encaminhamento dos vestígios dentro das unidades.

Neste interim, é possível citar, como sendo um dos principais cuidados, de

observância fundamental, a cadeia de custódia da prova, que revela a cronologia

dos acontecimentos, pelo que se torna imprescindível a sua preservação, pois, do

contrário estará eivada de vícios a conclusão final dessa prova. Vejamos o que foi

verificado pelo Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil em relação a este aspecto:

Um dos elementos fundamentais para se compreender os processos

de trabalho da atividade pericial é a existência e o funcionamento da

cadeia de custódia dos vestígios. Ela é essencial para a validação da

prova técnica uma vez que possibilita a rastreabilidade do vestígio,

ou seja, assegura o vínculo entre o material periciado e o fato

investigado. A cadeia de custódia também possibilita documentar a

cronologia da evidência e quem foram os responsáveis por seu

manuseio. O Brasil não tem uma normativa geral sobre cadeia de

custódia e o mesmo ocorre na grande maioria dos Estados, que

ainda encontram fragilidades na gestão da atividade pericial

(BRASIL, 2012, p.81).

Portanto, em face da ausência de normatização que discipline o processo de

cadeia de custódia da prova, se faz necessário que os institutos de perícia

operacionalizem protocolos que tratem da rotina desses procedimentos, evitando,

assim, o rompimento dessa cadeia.

É interessante ressaltar que, hodiernamente, as corporações adotam

sistemas de gestão informatizado para otimizar fluxos de processos de trabalho,

essa ferramenta permite o alcance de resultados mais satisfatórios ao final da

cadeia produtiva. Todavia, conforme demonstrado pela pesquisa que culminou no

Diagnóstico da Perícia Criminal no Brasil (2012), diversos estados ainda não adotam

esse tipo de gerência:

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Figura 4 - Existência e abrangência dos sistemas informatizados, em porcentagem,

nas unidades pesquisadas, 2012.

Fonte: Brasil (2012, p.39).

É possível atribuir, em parte, o déficit da perícia criminal brasileira, em

termos de resolutividade de casos e índices de produção ao fato de não haver, na

estrutura organizacional, a padronização de processos, por meio de uma rotina

institucional de procedimentos e de um sistema informatizado de gestão.

Outro aspecto preocupante e que merece destaque é a carência de recursos

materiais12 nas unidades de perícia, que vão desde insumos básicos, como

reagentes químicos, até equipamentos de custo mais elevado, como câmaras

frigoríficas para acondicionamento de corpos.

Ainda com relação ao aludido diagnóstico13, também foi constatado por

ocasião do estudo que não há, na maioria das unidades federativas, rotina de

12 Segundo a Secretaria Nacional de Segurança Pública, a regularidade no fornecimento de

reagentes é de suma importância para a realização dos exames e a pesquisa desenvolvida aponta que as unidades de medicina legal e de identificação, núcleos componentes dos institutos de perícia não recebem esses reagentes de forma contínua (BRASIL, 2012, p.43).

13 “A avaliação interna dos laudos periciais é um item importante para assegurar sua qualidade, uma ve que é executada por meio de um processo de revisão em que os próprios profissionais de perícia repassam o trabalho sistematizado por seus colegas, visando identificar eventuais incorreções” (BRASIL, 2012, p.91).

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avaliação interna para aferir critérios de qualidade, e parte das unidades que

realizam esse controle avaliam somente aspectos formais.

Outro quesito observado foi a produtividade, no qual se considerou a

quantidade de requisições realizadas às unidades e a quantidade de laudos

expedidos, no intuito de compreender a capacidade dos órgãos de atender às

demandas.

Neste aspecto, surpreende o fato de que as informações coletadas em

relação ao atendimento de requisições realizadas no ano de 2011 sugeriram um

panorama de alta capacidade de atendimento das demandas, o que chega a ser, no

mínimo, incongruente com o cenário evidenciado a partir dos demais fatores

analisados, tais como materiais e métodos de produção da perícia.

Isso se explica pelo fato de que tais informações foram fornecidas pelas

próprias entidades, que, ante a ausência de vistoria por parte da SENASP para

verificar a procedência dos dados alusivos à produtividade, podem ter repassado

dados incompatíveis com a realidade vivenciada nas unidades, ocorrência que pode,

inclusive, ser originada pela inexistência de sistema informatizado de requisições e

confecção de laudos.

Ademais, conforme se verá no item seguinte deste trabalho, restou

constatada a incapacidade de atendimento às requisições por parte do instituto de

perícia do estado do Rio Grande do Norte, que conta com um número expressivo de

demandas atrasadas e ausência de suporte para dar seguimento ao trabalho dentro

de prazo regular, mas que, ao revés dessa situação, declarou à pesquisa promovida

pela SENASP (2012) ter alcançado o percentual de 100% (cem por cento) de

atendimento de requisições, de acordo com a ilustração adiante:

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Figura 5 - Percentual de atendimento da demanda de casos de 2011 nas unidades

de medicina legal, por UF, 2011.

Fonte: Brasil (2012, p.109).

Deste modo, os dados relativos à perícia no estado do Rio Grande do Norte,

constantes na pesquisa da Secretaria Nacional de Segurança Pública, se encontram

em descompasso com a situação relatada pelas inspeções promovidas pelo

Ministério Público desse estado, que originaram a abertura de inquéritos civis, bem

como de reportagens que também registraram a situação.

3.2 A face do sistema de perícias no Rio Grande do Norte

A temática das condições da perícia no Brasil, em razão da extrema

precariedade verificada, recebeu destaque pela mídia nacional através da produção

do documentário “Desafios da Segurança Pública no Brasil”, exibido pelo programa

Fantástico14, da Rede Globo de Televisão.

A produção partiu do relato de aumento vertiginoso da taxa de homicídios na

capital do estado do Rio Grande do Norte, que passou de 10 para 70 mortes por

14FANTÁSTICO - Desafios da Segurança Pública no Brasil, exibido em 29/04/2018 consistiu

em uma reportagem em que se evidenciou a situação da perícia criminal e a atuação da polícia ostensiva em alguns estados do país, como fatores preponderantes para os crescentes níveis da criminalidade.

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cada 100 mil habitantes, observadas, principalmente, em virtude da disputa de

facções criminosas pelo mercado do tráfico ilícito de entorpecentes.

O documentário demonstra que no Instituto Técnico de Perícia do Estado

não há laboratório de DNA e nem programa de computador para análise de

impressões digitais, de modo que as digitais coletadas nas cenas de crime são

comparadas manualmente pelos peritos que somam, em todo o estado, a

quantidade de 23 profissionais.

A reportagem ainda mostrou a situação de peritos que se sujeitam a laborar

em suas residências, devido à ausência de infraestrutura nas unidades do ITEP/RN,

os quais relatam a insatisfação em executar suas funções dadas as referidas

condições.

Ainda em torno da temática da Segurança Pública, há outra reportagem

elaborada pelo Fantástico, alusiva a mesma realidade já explanada, na qual também

se narra as condições em que se desenvolve a investigação no país. O relato se

intitula “Situação da perícia criminal no Brasil”15.

A produção retratou a atuação de peritos que trabalham in loco, ou seja, que

colhem, na cena do crime, o material a ser periciado, sem o subsídio de auxiliares

de perícia e muitas vezes até sem motorista para efetuar a condução do perito ao

local da ocorrência.

Foi relatado, também, o posicionamento da Associação Brasileira de

Criminalística, que considera o número de peritos no Brasil insuficiente, apontando

que deveria haver, no mínimo, 38 mil profissionais em atividade, no entanto, o país

conta apenas com 6,5 mil agentes, quantidade quase seis vezes menor que o ideal,

que seria de perito 01 para cada 30 mil habitantes.

A situação chega a ser extrema quando se observa que perante a ausência

de equipamentos básicos, tais como uma câmera fotográfica, não é possível dar

cumprimento às diligências indispensáveis à investigação, paralisando o curso de

inquéritos que resultam em casos sem solução, sendo arquivados pois insuficientes

para embasar uma denúncia.

O mais preocupante é que não se está diante apenas da ausência de

maquinário moderno e ferramentas avançadas, mas da carência de recursos

15 Fantástico. Situação da perícia criminal no Brasil é precária, exibido em 02/10/2011.

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mínimos tais como impressora, tinta e papel para que os peritos possam registrar os

pareceres.

Em decorrência da impossibilidade de se proceder a perícia de coisas e

pessoas, os objetos, que deveriam ser restituídos e corpos que deveriam ser

identificados e entregues às respectivas famílias, continuam se acumulando nas

instalações das unidades de perícia, reduzindo mais ainda a capacidade de alocar

equipamentos e funcionários.

No estado do Rio Grande do Norte, a situação do Instituto Técnico-científico

de Polícia tem sido objeto de diversas portarias e inquéritos civis instaurados pelo

Ministério Público estadual.

A partir de denúncia recebida pelo órgão ministerial16, foram realizadas

inspeções nas dependências do ITEP, oportunidade na qual se constatou o acúmulo

de cadáveres, acondicionados sem a estrutura correta, muitos em estado de

decomposição e sem identificação, bem como o atraso na confecção de laudos.

Em decorrência da instauração de inquérito civil para apurar as

irregularidades, o ITEP/RN manifestou-se emitindo a portaria de n° 021/2019

(ANEXO A), veiculada através do Diário Oficial do estado do Rio Grande do Norte,

na qual restou determinada a realização de um mutirão para a regularização e

identificação de corpos e elaboração de laudos.

Nesta toada, a obsoleta legislação processual, acompanhando o progresso

que há certo tempo já é realidade em outros ordenamentos jurídicos, e com o

desiderato de modernizar o procedimento de identificação criminal, adotou o

procedimento de identificação através da extração do perfil genético, editando-se a

lei 12.654, de 2012 que previu a utilização desse método.

Segundo o novo diploma, o material genético do indivíduo poderá ser extraído em duas situações diferentes, a fim de identifica-lo criminalmente: (a) na fase investigatória e (b) na execução da pena. O ato atinge, consequentemente, tanto o investigado/acusado quanto os condenados. Não obstante, é notável que a intenção da coleta é diversa, dependendo da situação processual em que se enquadra: se

16 Notícia publicada em 27 de janeiro de 2019, pelo jornalista Everton Dantas no site OP9,

afirma que Portaria publicada em 26/01/2019 no Diário Oficial, com o objetivo de buscar soluções para a melhoria da estrutura do setor de antropologia forense do ITEP/RN, de autoria do promotor Vitor Emanuel de Medeiros Azevedo, que atua junto à 19ª promotoria de justiça da comarca de Natal/RN, constatou a existência de, pelo menos, 79 corpos acumulados nas instalações do ITEP, sendo dezenas de corpos esqueletizados, semiesqueletizados ou mumificados.

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a extração do perfil genético acontecer na fase investigatória, o DNA servirá de prova para um caso concreto e determinado, isto é, para um delito que já ocorreu; de outro viés, se a extração se der na execução da pena, o DNA que se encontrará em um banco de dados genético, será útil para casos futuros, em que se desconheça a autoria criminosa (GIONGO, 2016, p.379).

A respeito do tema, inaugurou-se uma discussão em torno da Lei 12.654, de

2012, em dois sentidos. O primeiro, diz respeito ao alcance da informação obtida a

partir da análise do perfil genético, precipuamente de sua utilização como prova no

processo criminal.

Nada obstante essa previsão, em que pese a aludida lei disciplinar o

procedimento de identificação de suspeitos enquanto uma obrigação a ser

desempenhada pelo poder público, nos casos em que não houver outro meio de

obtenção da identidade de uma pessoa submetida à investigação, a coleta desse

material deve observar o consentimento do suspeito para fins de utilização da

informação genética como prova no processo penal.

Consubstancia o direito fundamental à não autoincriminação, o qual, se por

ventura, restar maculado, enseja o reconhecimento e decretação da nulidade da

prova, ante o método empregado na extração, que irá configurar o vício desse

procedimento.

O segundo ponto de debate gravitou em torno da cogência dos

mandamentos desse diploma legal, se seriam normas de recomendação, a serem

seguidas de acordo com o senso de oportunidade e conveniência da administração

pública de cada estado da federação, ou seja, uma competência discricionária, ou se

seriam normas que impõe a implantação de seu conteúdo.

Sobre esse aspecto, passaremos à análise de uma situação judicializada no

estado do Rio Grande do Norte na qual se discutiu a respeito do tema.

O Ministério Público do Rio Grande do Norte ajuizou, no ano de 2012, ação

em face do Estado do Rio Grande do Norte, objetivando a condenação do requerido

ao cumprimento da Lei 12.037, de 2009, que posteriormente foi pela alterada pela

Lei 12.654, de 2012, no tocante à identificação criminal de acusados, por meio

fotográfico, datiloscópico e genético.

O poder executivo estadual alegou, em sua defesa, a ausência de peritos

nos quadros da polícia civil, bem como aduziu que a realização desses

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procedimentos não figura entre as atribuições de delegados, agentes e escrivãos da

polícia.

Afirmou ainda que a Lei 12.654, de 2012, que prevê coleta de perfil genético

como forma de identificação criminal, institui apenas uma faculdade e que, portanto,

não teria o condão de vincular o poder público a realizar a identificação criminal

através desses meios.

Em 26 de agosto do ano corrente, a 1ª Vara da Fazenda Pública de

Natal/RN proferiu decisão, posicionando-se pela obrigatoriedade de implantação da

identificação criminal, nos moldes da Lei 12.037/ 09.

No dispositivo restou consignada a determinação ao Estado do Rio Grande

do Norte de realizar o procedimento de identificação criminal por meio datiloscópico

e fotográfico em todas as unidades da Polícia Civil, incluindo na lei orçamentária

subsequente ao trânsito em julgado da sentença a rubrica necessária à compra dos

equipamentos necessários ao cumprimento da obrigação.

O entendimento foi assentado sob o argumento de que a ausência da

identificação criminal traz embaraços à atividade jurisdicional além da possibilidade

de violação do direito fundamental à liberdade, fazendo alusão ao art. 313 do CPP17

que autoriza da prisão preventiva em caso de dúvida acerca da identidade civil da

pessoa. Foi mencionada, ainda, a Lei de Execuções Penais (7.210/84)18 que traz a

17 Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão

preventiva: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). I - nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). IV - (revogado). (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011). Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

18 Art. 9o-A. Os condenados por crime praticado, dolosamente, com violência de natureza grave contra pessoa, ou por qualquer dos crimes previstos no art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, serão submetidos, obrigatoriamente, à identificação do perfil genético, mediante extração de DNA - ácido desoxirribonucleico, por técnica adequada e indolor. (Incluído pela Lei nº 12.654, de 2012).

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previsão da coleta de material genético do indivíduo para fins de criação de banco

de dados contendo informações sobre perfis genéticos.

Todavia, a decisão somente fez alusão à obrigatoriedade que a referida lei

impõe quanto aos métodos de identificação a serem adotados pela polícia. De tal

sorte, o mesmo não se aplica às ferramentas utilizadas para a realização de perícias

em geral, pois, em razão de inexistir disciplina legal, admite-se que nesta seara

prepondera a competência discricionária do poder público.

É certo que a Lei 12.654/2012 não possui alcance sobre a confecção de

conjunto probatório de perícia, nem poderia fazê-lo uma vez que é taxativa ao

disciplinar apenas o procedimento de identificação do indiciado.

O tema é controverso e divide opiniões entre doutrinadores, quanto à

extensão que esse material pode alcançar na seara criminal e se o material colhido

para a identificação poderia ser utilizado como meio de prova, bem como se esta

prova seria considerada lícita diante da garantia da não autoincriminação.

Temos que a autodefesa é um direito disponível, de modo que é facultado

ao acusado fornecer material biológico ou colaborar de outras formas com a

investigação. Contudo, havendo recusa, se instaura uma divergência doutrinária a

respeito da possibilidade de coerção para a realização do exame.

Para Lopes Jr (2005, p.356), é preciso se nortear pelos princípios

constitucionais e processuais, tal como o da presunção de inocência, não podendo a

autoridade proceder à coleta contra a vontade do suspeito. Nas suas palavras,

“submeter o sujeito passivo a uma intervenção corporal sem seu consentimento é o

mesmo que autorizar a tortura para obter a confissão no interrogatório quando o

imputado cala, ou seja, um inequívoco retrocesso”.

Na perspectiva de Nunes (2015, 508-517), embora o acusado não possa ser

compelido com o emprego de força a fornecer material biológico para exames,

endossando o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, tal direito não é

absoluto. Nada obstante essa garantia seja bastante alargada no ordenamento

§ 1o A identificação do perfil genético será armazenada em banco de dados sigiloso, conforme regulamento a ser expedido pelo Poder Executivo. (Incluído pela Lei nº 12.654, de 2012).

§ 2o A autoridade policial, federal ou estadual, poderá requerer ao juiz competente, no caso de inquérito instaurado, o acesso ao banco de dados de identificação de perfil genético. (Incluído pela Lei nº 12.654, de 2012).

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jurídico brasileiro, na maioria dos países, se restringe o direito do acusado de não

auto incriminar-se.

Nunes traz a distinção entre a produção forçada de prova e aquela que é

produzida, voluntária ou involuntariamente, ainda que para outro fim. Ressalta que,

por mais que não se admita que alguém possa ser submetido à força a realizar

exame de DNA, nada impede que os elementos necessários sejam obtidos de

outras formas. Neste prisma, podem ser apreendidos fios de cabelo da pessoa

contidos em roupas; sangue doado; cutículas; saliva rejeitada em recipientes, dentre

outros.

Acontece que, o que o texto constitucional proíbe é que a pessoa seja

forçada a produzi-la. Porém, se a pessoa produz o material para prova, esta pode,

ainda que contra a sua vontade, ser utilizada para incriminá-la. Para Nunes, essa

posição expressada pelo STF se apresenta acertada.

Retomando ao foco da decisão exposta, como já mencionado, não é objeto

de discussão a constitucionalidade da obrigatoriedade da identificação criminal por

análise de DNA, de modo que a aludida decisão nos foi útil para fins de ilustração do

crítico quadro de condições do Instituto Técnico-científico de Perícia do estado do

Rio Grande do Norte. Entretanto, em que pese não seja a intenção discutir acerca

do referido instituto, é conveniente salientar que tal coleta, coercitiva ou não,

demanda que a extração deverá ser feita da maneira menos invasiva e indolor

possível.

Desse modo, de acordo com o que restou evidenciado, é latente o estado de

coisas inconstitucional que se tem em relação à perícia no referido estado, o qual

reflete a situação da maior parcela dos estados do país, pelo que, diante de um

cenário em que não se tem condições de se executar garantias que visam a

proteção da liberdade e, que também atuam como políticas de segurança pública,

está configurada a urgência na intervenção estatal para sanar essa situação.

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4 IMPLEMENTAÇÃO DE NOVAS FERRAMENTAS E TÉCNICAS AO

PROCEDIMENTO DE EXAMES CRIMINALÍSTICOS E SUAS IMPLICAÇÕES

PRÁTICAS

É inegável que a introdução de um mecanismo novo em um processo, aliada

à forma como é aplicado, tende a modificar o resultado obtido ou, no mínimo, a

qualidade desse resultado.

Isso se dá em decorrência das variadas maneiras de se realizar uma mesma

tarefa, e que, por óbvio, apresentará ao final a qualidade correspondente à técnica e

o manuseio empregados.

Conforme evidenciado nos capítulos anteriores, é imperioso que seja

promovida uma reestruturação da perícia em crimes de violência no país, em razão

do quadro patente de descaso em que se encontra esse setor.

Cumpre mencionar, a título de exemplo acerca da utilização da ciência, que,

pelo país a fora, especialmente a nível federal, a perícia elaborada a partir da

tecnologia da informação tem logrado êxito na apuração de diversos delitos que

deixam vestígios no âmbito cibernético, tais como crimes patrimoniais envolvendo

sofisticados esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro e crimes contra a

dignidade sexual, a exemplo do armazenamento e compartilhamento de pornografia

infantil.

Pois bem, a experiência de sucesso obtida com o emprego de ferramentas

desenvolvidas pela ciência da computação e afins, a exemplo dos poderosos

softwares que conseguem explorar a deep web e obter dados com a perícia de

máquinas eletrônicas só tem sido possível graças a destinação de recursos em prol

da investigação.

O que se revela, nesse sentido, é a eleição de prioridades. Em virtude das

recentes descobertas de crimes contra o patrimônio da administração pública

ocorridos no Brasil, tem se observado uma preocupação por parte das autoridades,

especialmente do Ministério Público, em envidar esforços e investir nos setores de

inteligência para solucionar casos dessa natureza e promover o combate à

corrupção.

Todavia, ao que parece, a resolução de crimes de violência, que atingem,

consideravelmente mais, a população marginalizada da sociedade, não está na

pauta de enfrentamento.

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Nessa esteira, não será possível alcançar a efetivação da justiça apenas a

partir de investimentos nos órgãos do poder judiciário. É preciso que o setor técnico,

de polícia e científico, acompanhe esse progresso, sob pena de serem esvaziados

diversos direitos que, o poder judiciário, por si só, não é capaz de efetivar sem o

subsídio científico.

Diante disso, esse capítulo tem a finalidade de apresentar alguns dos

impactos da inserção de tecnologia na perícia e sua consequente melhoria, como

sugestão para atenuar a crise do sistema investigativo tratado neste trabalho, sem a

pretensão de alcançar um resultado ideal, que só pode ser originado através de um

debate profícuo entre autoridades, especialistas e a sociedade civil, bem como de

seus representantes.

4.1 Investigação defensiva e produção de prova pericial: inovação e

dinamicidade ao processo de produção de provas

No cenário atual do processo penal, vem ganhando relevo uma nova

vertente da advocacia criminal, que está balizada em uma atuação ativa por parte da

defesa, que não se contenta em apenas contraditar as alegações da acusação, mas

de produzir provas no âmbito da fase pré-processual. É o que se tem chamado de

investigação defensiva.

Tal modelo reflete o conceito de paridade de armas que a Constituição

brasileira de 1988 elegeu como fundamento do princípio do contraditório, premissa

basilar do devido processo legal, cujo propósito é o de colaboração para a

construção do processo, assegurando que ambas as partes tenham as mesmas

ferramentas e oportunidades para fazerem prova daquilo que afirmam em juízo.

Em compasso com esse entendimento, sustenta Luigi Ferrajoli (2010, p.

564) que para a disputa se desenvolver de forma leal, pautada na paridade de

armas, é necessário o perfeito equilíbrio entre as partes, no qual a defesa possa

contar com os mesmos poderes dos quais dispõe a acusação; e que o seu papel de

contraditar seja admitido por todo o Estado, independentemente do grau de

procedimento e em relação a cada ato probatório singular, desde as averiguações

de perícias ao interrogatório do imputado, dos reconhecimentos aos testemunhos e

às acareações.

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Neste interim, a investigação defensiva, se dá em conformidade com os

interesses do investigado, a partir de critérios traçados pelo defensor de maneira

autônoma, por meio de estratégias e linhas investigativas próprias, observando os

parâmetros constitucionais e legais na realização da prova. Desse modo, não cabe

ao defensor o papel de mero expectador, mas uma postura ativa no cenário

investigativo.

Para efetivar esse direito que assiste à defesa é facultado à parte constituir

assistente técnico, especialista no assunto do qual se trate a prova a ser produzida,

para colaborar com a produção de pareceres, podendo elaborar quesitos próprios

para análise do caso.

Todavia, até o ano de 2008, a figura do assistente técnico não era admitida

nem no Código de Processo Penal, nem pela jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal. No intuito de corrigir essa afronta ao princípio do contraditório, a Lei n°

11.690, de 2008, incluiu o §3° ao art. 15919, possibilitando ao Ministério Público, ao

assistente de acusação, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a indicação de

assistente técnico e a elaboração de quesitos.

Contudo, o §4° do mesmo artigo estabeleceu que a intervenção do

assistente poderia ocorrer apenas após a conclusão dos exames e da elaboração do

laudo pelos peritos oficiais e somente mediante sua admissão pelo juiz. O

doutrinador Walter Nunes tece críticas a esse dispositivo, apontando que o momento

pré-processual é, de regra, no qual se produz a prova pericial e que, portanto, o

assistente deveria atuar nessa fase, Vejamos:

19 Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial,

portador de diploma de curso superior. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008). § 1o Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do exame. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008). § 2o Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008). § 3o Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de assistente técnico. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008). § 4o O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008). § 5o Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à perícia: (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).

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[...] não se pode deixar de reconhecer o direito à nomeação do assistente ainda na fase do inquérito policial. Até porque, em verdade, na maioria dos casos, a perícia é feita exatamente apenas na fase do inquérito. E essa perícia mais qualificada, diante da permissibilidade da nomeação de assistente, poderá ser fundamental para, até mesmo o pedido de arquivamento da investigação criminal (NUNES, 2009, p.219).

Esse apontamento revela que, não apenas prudente, mas necessária a

permissão da intervenção do assistente durante o inquérito, pois, não raras vezes,

não é possível obter o material para realização de nova perícia na fase processual,

como também observa Nunes (2009, p. 220-221), o mais apropriado é se permitir o

acompanhamento pelo assistente contratado pelo suspeito ou indiciado, não apenas

na fase do processo como também no inquérito policial, quando da realização dos

trabalhos pelo perito, precipuamente nos casos em que não é possível a

conservação de todo o material probatório.

Em comparativo à essa sistemática, acerca de como se desenvolve o

processamento da prova pericial no sistema de investigação norte-americano, temos

que, de acordo com o Conselho Nacional de Pesquisa (1999, p.155):

O promotor trabalhará em conjunto com os investigados e terá acesso a laboratórios forenses adequadamente organizados e equipados. O promotor deve supervisionar cuidadosamente as atividades de investigação para ter certeza de que a evidência pela tipagem do DNA será admissível, se provar ser relevante. O promotor tem a grande responsabilidade de revelar integralmente aos advogados da defesa e aos especialistas contratados pelo réu todo material que possa ser necessário para avaliar as evidências. Isso inclui informações sobre testes comprovadamente inconclusivos, testes refeitos e sobre testes com outras pessoas.

No Brasil, há um anseio jurídico no sentido de atribuir ao Ministério Público a

titularidade da instrução direta da investigação, estando a polícia subordinada aos

comandos do Parquet.

Ora, se a acusação detém todos os recursos ao seu favor, forçoso concluir

que não estará em posição privilegiada no processo, mais ainda do que

culturalmente já tem sido favorecida.

Portanto, além de completamente desarrazoado se cogitar essa estrutura

para a investigação, essa ideia, per si, impõe uma atuação mais engajada e incisiva

por parte da defesa nos atos investigatórios.

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Conforme bem aponta Miranda (2007), o inquérito não tem por única

finalidade instruir uma denúncia. Considerando que a sua pretensão é de apurar a

existência de ilícito e reunir indícios de materialidade e autoria, também é natural

que, ao seu término se conclua pela desnecessidade da acusação e para tal, a

participação da defesa é sobremaneira importante.

No que pertine ao impacto ocasionado por um processo criminal, Miranda

(2007, p.93) destaca que “embora dê subsídios para a acusação, o inquérito policial

tem, ainda, a finalidade de filtrar as futuras ações penais, tendo em vista que o

processo, em si, não deixa de ser uma pena para a pessoa a ele submetida”.

Sempre existiu um pensamento de que, no inquérito, por não haver a

exigência de se garantir o contraditório, seria uma fase que não comportaria uma

participação ativa e diligente por parte dos defensores, restando ao acusado

aguardar a eventual propositura de ação penal para realizar as manifestações que

entender de direito.

Nesta senda, ao defender que a assistência prestada por advogados e

defensores não pode ser meramente passiva, mas sim efetiva, o Delegado de

Polícia, Mario Wagner (2007, p. 10) preceitua que:

O exercício da ampla defesa não desqualifica a atividade de polícia judiciária, e sim, ao contrário, a solidifica, na medida em que reforça a prova colhida sob a sua égide. O indiciado não pode ficar indefinidamente, qual personagem kafkaniano, a bater de porta em porta, a falar com porteiros e meirinhos, para saber do que é acusado, por quem e com base em que diploma legal.

A este respeito cabe mencionar um conhecido caso ocorrido nos Estados

Unidos no ano de 2001, que foi narrado através de um documentário lançado

recentemente pela distribuidora de entretenimento Netflix. Na produção The

Staircase20, o caso da escada, é apresentado como é possível que haja falhas na

20 The Staircase, o caso da escada, traz como protagonista o escritor Michael Peterson,

acusado da morte de sua esposa, que teria vindo a óbito, segundo Michael em razão de uma queda acidental na escada da casa em que residiam juntos, em Durham, na Carolina do Norte. Após seu julgamento em 2003, foi condenado pelo júri à prisão perpétua pelo crime de homicídio em primeiro grau. Após diversos recursos de apelação, patrocinados pelo advogado Larry Pollard, Peterson foi libertado em 2011, tendo a condenação anulada e sido submetido a novo julgamento no qual foi orientado pela defesa a admitir que a acusação possuía provas contra ele, por meio do instituto “Alford Plea”.

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perícia técnica e como a defesa tem de estar atenta para esse tipo de ocorrência,

possuindo domínio dos momentos em que haja necessidade de intervenção.

O documentário, dirigido por Jean-Xavier de Lestrade, foi gravado entre

2004 e 2018, registrando os procedimentos policiais mal conduzidos e a postura

inquisitiva da promotoria para com o réu. Após condenação à prisão perpétua, o

acusado tem reconhecido o seu direito a novo julgamento em razão da constatação

das declarações emitidas pelo perito encarregado do caso, que inclusive, também

cometera equívocos na condução de outras perícia relacionadas a crimes de

homicídio no estado da Carolina do Norte.

O caso ilustra como pode ser decisiva a atuação da defesa, pautada na

produção das provas, questionando e contestando o trabalho dos experts, através

de uma equipe técnica engajada na função de analisar e desenvolver hipóteses para

o caso concreto.

É pertinente o aludido relato, na medida em que convida à reflexão por parte

da advocacia criminalista brasileira a atuar com vistas a contribuir para um processo

mais efetivo e menos burocrático, a se iniciar desde a o momento do inquérito, o

que, certamente, proporcionará melhores resultados para o suspeito ou indiciado.

4.2 Implicações da prova pericial na instrução processual e decisões judiciais

Muito embora as discussões em torno do tema do descaso com a

investigação preliminar sejam revestidas de cunho, quase sempre, administrativo o

que implicaria a adoção de medidas no ramo cível, a problemática suscitada por

este trabalho se refere aos impactos da investigação preliminar para o processo

criminal, mais precisamente no que toca à produção da prova, conforme se verá a

seguir.

Por conseguinte, se impõe o controle rígido na admissão e produção da

prova. Mas não só isso, conforme pontua Aury Lopes e Alexandre Moraes da Rosa

(2019) não é possível “abrirmos espaço para o decisionismo, para o decido-

conforme-a-minha-consciência”.

Nessa esteira, explicam Lopes e Rosa, acerca de standard probatório, que

se deve estabelecer as regras de admissão e produção da prova, definindo o grau

de convicção necessário em termos de prova (qualidade e credibilidade) para

proferir uma sentença condenatória ou absolutória.

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Dentre as espécies de standard elencadas, a mais exigente, segundo os

mencionados autores, seria a beyond a reasonable doubt, na tradução literal para o

português, além de toda dúvida razoável.

Nessa toada, é possível perceber as nuances do processo penal em relação

à processualística civil, a qual não prevê exigências tão elevadas, isso porque as

consequências de uma condenação criminal são, por natureza, mais gravosas ao

sentenciado.

É preciso trazer a lume que tal critério se reveste também de subjetividade.

Não há, portanto, balizas exatas. O critério consiste em se aproximar de um juízo de

certeza, afastando as dúvidas apresentadas na instrução. Desse modo, diante da

impossibilidade de se explicar os acontecimentos do caso e de se desconstruir a

dúvida razoável que paire sobre a situação21, se impõe a absolvição.

Esta exigência nos direciona à ideia do standard de prova que segundo a

conceituação do aludido autor, pode-se afirmar que significa o “quanto” de prova é

necessário para proferir uma decisão.

Tal parâmetro constitui requisito mínimo para a prolação das decisões, que

devem enfrentar, de modo consistente todos os fatos trazidos à apreciação

jurisdicional através das provas colacionadas, no desiderato de balizar os

provimentos judiciais e ser, em última análise, fonte garantidora da presunção de

não culpabilidade.

Esse assunto se revela de extrema pertinência diante do tema central

abordado por este trabalho, uma vez que não basta rigor técnico e científico no

momento da produção de provas, como também é essencial a adoção de critérios

robustos para aferição e valoração dessas evidências. Do contrário, haverá sempre

uma ponta solta na esteira do processo, impedindo, de toda sorte, a consecução dos

fins da justiça.

O ônus da prova para a acusação tem de ser maior no desiderato de

dificultar a condenação de inocentes. É nessa premissa que se baseia o standard de

prova que consiste na superação da dúvida razoável.

21 Nesse sentido recebe a conotação de plausível, ou seja, uma narrativa que possa ser

concatenada à realidade e possuir sentido, considerado aquilo que pode ser formulado e aceito pelo homem médio.

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Dessa forma, com vistas a reduzir o subjetivismo da livre valoração da prova

se faz necessário instituir um protocolo de confiabilidade, o que só será possível

através de investimentos em produção e conformação da prova.

Nesse interim, é inegável a fragilidade probatória de um parecer técnico

produzido sem a descrição pormenorizada do objeto periciado, bem como das

circunstâncias em que a análise foi realizada.

Não é suficiente a mera menção de condições que são facilmente aferíveis,

muitas vezes até por leigos, sem qualquer estudo aprofundado. Se faz necessária a

indicação dos métodos utilizados na confecção das análises, além de apontamentos

como o horário em que foram coletadas e analisadas as amostras, tendo em vista a

cronologia das etapas do exame, diante da imprescindibilidade de preservar a

cadeia de custódia da prova. Ademais, sempre que possível deve conter imagens

dos objetos avaliados.

Tais elementos devem ser considerados e observados durante a elaboração

de um parecer já que, além de não repetível, é sabido que diversos fatores, tais

como o tempo, condições do objeto, quantidade e qualidade de material analisado,

equipamentos e técnicas geram contextos diversos que podem induzir diferentes

conclusões ao se alterar qualquer alguma dessas variáveis.

Para ilustrar a deficiência de um laudo pericial produzido sem as devidas

minúcias e a mácula que essa prova pode ocasionar ao processo, se mostra

pertinente apresentar um exame produzido no âmbito de um inquérito policial no

qual se identificou um completo descuido quando da produção da prova pericial.

O laudo em comento (ANEXO B) integra o IPL que foi utilizado como

material base da disciplina do currículo obrigatório do curso de graduação em Direito

da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Direito Processual Penal II22,

ministrada pelo Professor Doutor Walter Nunes da Silva Júnior.

O caso em tela consistiu na apuração de um crime de homicídio praticado

com arma branca, qual seja um instrumento pérfuro-cortante. A perícia realizada no

corpo da vítima apontou como causa mortis anemia aguda. A particularidade do

caso residiu na completa ausência de clareza do exame necroscópico apensado aos

22 A atividade consiste na reprodução de um processo criminal, mediante a confecção de

peças processuais a partir de um inquérito policial disponibilizado pelo docente. No caso em análise, foi trabalhado em sala um caso real possibilitando aos discentes a experiência da prática forense.

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autos, carente de descrição minuciosa de métodos empregados e de explicações

acerca da causa da anemia constatada.

A vítima fazia uso de uma bolsa de colostomia no mesmo flanco onde se

efetuou a cutilada, fator que pode ter ocasionado a perda agressiva de sangue que

levou a vítima a óbito. Além de não descrever de que forma esse elemento

contribuiu para a morte, careceu, ainda, de informações básicas como peso e altura

da vítima que, neste caso, teriam imensa relevância para aferir se de fato a vítima

restou impossibilitada de exercer algum tipo de defesa.

Outro aspecto que também não foi esclarecido diz respeito às dimensões da

arma utilizada, elemento que consistiu em ponto nevrálgico da instrução, pelo que

não havia, sequer, fotografias da arma ou da lesão ocasionada no corpo da vítima.

Tais imagens seriam imprescindíveis para a elucidação das circunstâncias em que o

fato ocorreu, já que o acusado alegou que portava a faca, no instante da agressão,

para cortar uma laranja

Este caso demonstra o quão precária é a perícia de crimes de sangue no

Instituto Técnico-Científico de Polícia do estado do Rio Grande do Norte, pois os

quesitos constantes no parecer, além de pouco elucidativos são insuficientes para

autorizar um julgamento.

Todavia, esse inquérito culminou no processo judicial de n° 0101329-

03.2012.8.20.0002, que tramitou perante a 1ª vara criminal de Natal/RN, no qual o

júri considerou o acusado culpado e o condenou, como incurso no art.121, §2°,

inciso IV à pena de treze anos de reclusão.

Esse caso reflete o cenário dos processos criminais por homicídio no estado.

Uma situação, aparentemente, sem grande complexidade que, em razão da prova

testemunhal colhida e do interrogatório do acusado, poderia ter alcançado uma

conclusão.

Contudo, o standard probatório não apresentou robustez capaz de superar a

dúvida razoável, o que não foi empecilho para a condenação do acusado, uma vez

que foi julgado pelo Tribunal do Júri, no qual se julga com íntima convicção, não

havendo a necessidade de enfrentar o grau de certeza da prova e sua influência no

veredicto, como ocorre no julgamento por juízes togados.

Percebe-se que, na situação mencionada, não se esteve diante da

necessidade de utilização de alta tecnologia para elucidação da materialidade ou de

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autoria de um crime, mas tão somente de um cuidado na análise de um óbito e do

consequente registro da narrativa técnica em um documento médico oficial.

O caso em discutido autoriza a constatação de que: a) a perícia em apreço

poderia ser realizada sem o implemento de tecnologia de difícil manejo e/ou

equipamentos e técnicas que demandassem elevada despesa em recursos

materiais e humanos, apenas de elementos simples, tais como fotografias; b) o

laudo de exame necroscópico não consignou declarações que possibilitassem a

formulação de uma conclusão com razoável grau de certeza.

Nesse raciocínio, tais verificações permitem inferir que o exame, no qual se

necessite de uma análise mais acurada ou emprego de avançada tecnologia

também não seria realizado com êxito, já que iria exigir do profissional aplicação de

atenção e cuidados ainda mais consideráveis, bem como de descrição substancial

do procedimento realizado, de modo que fosse possível extrair elementos

formadores de convicção dos excertos do parecer, não apenas para quem possua

conhecimento técnico, mas também por leigos, destinatários finais da prova.

Neste aspecto, estudo conjunto realizado por especialistas de várias áreas

da ciência, dentre eles, juristas e geneticistas, sobre prova produzida por meio da

análise do DNA, consignou, através de publicação do Conselho Nacional de

Pesquisa americano (1999, p.155), a sugestão de que o tribunal deve encorajar o

uso de gráficos, relatórios e cópias de materiais produzidos pelos experts, de modo

a esclarecer ao júri acerca da avaliação da prova pela análise do DNA, bem como

que os termos técnicos sejam reduzidos à linguagem leiga e compreensível e as

informações científicas sejam apresentadas ao júri da forma menos confusa

possível.

É possível perceber, portanto, o quão nociva se torna a omissão em

pareceres técnicos e o quanto exigem zelo na sua preparação, uma vez que atuam

sobre a consciência do julgador e influenciam decisivamente o resultado final do

processo que tem como objeto principal a liberdade uma pessoa sujeita a

persecução penal do estado.

A partir dessa regra, nos processos que, não sendo da competência do

Tribunal do Júri, possuindo arcabouço probatório frágil, ou seja que não

transponham a dúvida razoável, não poderia haver uma sentença condenatória. Isso

porque tal baliza impõe um rigor de tratamento da prova que vai desde a sua

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produção até a sentença, ou seja, a decisão deve, necessariamente, ser motivada

com lastro em provas suficientes, superando a dúvida razoável.

A problemática se concentra no âmbito da competência do Tribunal do Júri,

nos crimes dolosos contra a vida, pois nesse caso o juiz está autorizado a

pronunciar o acusado havendo indícios suficientes de autoria, ainda que não haja

juízo de certeza acerca da imputação que paira sobre o réu. Daí, então, reside a

grande possibilidade de prejuízo que pode ser causada por uma perícia mal

produzida, a indução a erro dos jurados que, além de leigos, julgam com íntima

convicção, podendo ser facilmente confundidos ou induzidos por amostragens mal

elaboradas e/ou mal descritas.

Acerca da elaboração de um parecer, quanto ao alcance da sua

compreensão por todos os integrantes do processo, explica Walter Nunes (2009, p.

217) que a perícia deve ser elaborada levando em consideração que será analisada

por um interlocutor que não é um expert na área, e deverá ser entendida por quem é

leigo no assunto, pois a prova não se destina somente ao juiz, como também às

partes. Explica Nunes que isso se dá em decorrência do princípio da comunhão da

prova, segundo o qual os elementos de prova não pertencem exclusivamente a uma

das partes, e sim ao processo.

Com efeito, por mais que haja nos autos um laudo emitido por profissional,

em tese, habilitado, se este não houver sido elaborado em observância a padrões de

qualidade estabelecidos, não há como considerar aquela prova enquanto elemento

de convicção capaz de autorizar uma condenação criminal.

4.3 Investimento em política públicas de investigação versus patrulhamento

ostensivo e o combate à criminalidade

A sensação social de impunidade contribui expressivamente para o aumento

da criminalidade. Diariamente, a população se encontra estarrecida com o

bombardeio midiático noticiando a ocorrência de crimes cometidos sob violência, o

que gera o sentimento de insegurança e o estímulo à perpetração de condutas

criminosas.

Nesse cenário, a desinformação da sociedade em geral, a respeito de como

ocorre a persecução penal, dado o desconhecimento sobre direitos e garantias

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constitucionais, atreladas a ineficiência da máquina estatal em solucionar crimes e

punir responsáveis, acaba por constituir fator de aumento de criminalidade.

É certo que a repressão estatal, quando fundada em julgamento que

observe as devidas garantias ao acusado, cuja condenação foi pautada em juízo de

alta probabilidade em que se superou a dúvida razoável, resulta em ganho social, da

mesma forma que, finda a instrução processual se obtém uma decisão de

absolvição. De todo modo, ambas impõem uma análise minuciosa, respaldada por

um conjunto satisfatório de provas que forneça o mínimo amparo para a decisão,

pois do contrário, qualquer resposta do judiciário será frustrante para aqueles que

aguardam um posicionamento.

Dessa sorte, não raras vezes, é possível identificar o inconformismo com

tantas decisões judiciais proferidas sem o mínimo arcabouço probatório que, sejam

condenatórias ou absolutórias, causam indignação social e rompem com a ideia de

segurança jurídica, abrindo margem para a ocorrência de julgamentos que

desprezam a imprescindibilidade de confecção de provas e análise e valoração

criteriosa das mesmas.

Por conseguinte, em relação ao problema da segurança pública, se observa

uma discrepância em termos de investimentos em policiamento e investigação,

atribuindo apenas ao primeiro a função de erradicação da violência. Contudo,

conforme se verá adiante, patrulhamento ostensivo não é a única e nem a melhor

solução para a contenção da criminalidade.

Neste prisma, por mais que se observe o aumento de investimentos em

segurança pública, não se verifica a diminuição dos índices de violência. Desse

modo, é possível concluir que o investimento não tem logrado os resultados

esperados.

Tal situação enseja uma reflexão acerca da forma como são empregados

esses recursos. Isso porque o modelo de militarização tem se revelado cada vez

mais letal e pouco eficiente no cenário das comunidades com altas taxas de

mortalidade, dentre as quais, parte significativa é decorrente de confronto entre

policiais e a população. Segundo Bueno, Marques, Pacheco e Nascimento (2018,

p.59), “a cada 100 mortes violentas intencionais (MVI) que ocorrem no país, 11 são

de autoria da polícia”.

Atualmente, em razão da recente intervenção federal no âmbito da

segurança pública ocorrida no país, muito se tem questionado acerca da eficácia

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das tropas armadas para a contenção da criminalidade. Isso porque tem se

observado um aumento nas taxas de mortalidade após a inserção desses agentes

nas comunidades alvo dessa intervenção, situação que constrói um paradoxo com a

pretensão de um estado de segurança.

A presente discussão não se cinge da sugestão de substituir a função de

policiamento ostensivo por policiamento investigativo, tampouco abolir o

patrulhamento efetuado pela classe de policiais militares, mas sim propõe uma

reflexão quanto à alocação dos recursos destinados às atividades dessas

corporações.

Isso porque, durante muito tempo, se acreditou que a única alternativa

possível para o combate à violência, que sempre constituiu uma realidade no Brasil,

seria ampliar, cada vez mais, o policiamento nas ruas, como se a presença da

instituição atuasse como um desestímulo à prática delituosa e pudesse oferecer ágil

repressão às infrações cometidas.

No entanto, a experiência social tem mostrado que o controle da ordem, qual

seja a missão da polícia nos moldes da Constituição da República, por diversos

fatores, não vem sendo efetivada.

A configuração desse cenário é constituída de alguns elementos, tais como

má remuneração da categoria e ausência de treinamento e capacitação, além de

fatores culturais, como a estrita obediência hierárquica, própria das corporações

militares, o que legitima as diversas agressões das quais cotidianamente se tem

notícia.

A letalidade policial integra as estatísticas de homicídios no país e põe em

cheque a esperança social de atuar como garantidor da ordem e da segurança.

Relativamente a este aspecto, a pesquisa exposta no Anuário Brasileiro da

Segurança Pública de 2019, intitulada Análise da letalidade policial no Brasil (2018,

p.56), revelou que os estados que mais obtiveram sucesso em diminuir suas taxas

de letalidade policial também alcançaram significativas reduções nas taxas de

mortes violentas intencionais.

Essa projeção se explica pelo fato de que a letalidade policial incita um ciclo

vicioso de violência social, no qual se encontra uma correlação de causa e

consequência.

Além de uma reestruturação de carreira e plano de qualificação para essa

classe de servidores, é imperioso desincumbir à polícia da tarefa de oferecer

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resultados que, por si só, não tem condições de alcançar, abandonando a visão de

que essa é a via exclusiva para o combate à criminalidade, passando a adotar

outros pontos de vista, o que em diversos países já tem apresentado êxito.

Segundo Daniel Cerqueira (2018, p. 167), “O coração das polícias modernas

chama-se inteligência e investigação. Alguns dos melhores departamentos de polícia

nos países desenvolvidos se baseiam em um modelo conhecido como Polícia

Orientada pela Inteligência.”.

Portanto, nem ao agente e nem à autoridade policial pode-se atribuir o

encargo da redução, ou quiçá da erradicação, da violência, uma vez que, conforme

vimos ao longo deste trabalho, esse resultado só pode ser alcançado através da

atuação sistêmica entre polícia e ciência, cada qual executando seu mister da forma

mais qualificada e com as ferramentas mais adequadas quanto forem possíveis.

Desse modo, se configura atualmente um dilema em torno da rubrica

orçamentária da segurança pública, qual proporção e de qual forma aplicar recursos

nessas áreas, distribuindo-os, principalmente em custos com investigação e

aparelhamentos da polícia militar.

Para Paula Ballesteros (2014, p.18) existe um binômio prevenção e

repressão que não encontra equilíbrio em virtude da cultura policialesca no Brasil.

Segundo a autora há uma dicotomia entre políticas preventivas e repressivas na

área da segurança pública, que se apresenta não apenas como uma questão

ideológica, mas também enquanto uma decisão administrativa, utilizando-se do

argumento de que os recursos são limitados, ou da justificativa de que não há como

conciliar as duas vertentes de forma harmoniosa e eficiente, optando-se, dessa

forma, pela de maior repercussão e familiaridade, qual seja, o uso da força.

Com efeito, partimos da concepção de que a investigação é sim parte

integrante da política de segurança pública e que deve ser pauta na agenda do

executivo e receber a devida atenção, tal qual a área de policiamento ostensivo.

Pesquisadores das áreas afins ao direito endossam esse pensamento,

conforme frisou o doutor em ciências políticas pela USP, Bruno Manso (2018, p.35),

os governos exitosos compartilham entre si uma estratégia consolidada para reduzir

os índices de violência. O autor cita exemplos como o investimento em investigação

e inteligência, inclusive no sistema penitenciário; o compartilhamento de

informações, identificação e punição dos homicidas; a compreensão das dinâmicas

territoriais de vingança, entre outras medidas.

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A respeito do investimento realizado na área de investigação, uma pesquisa

veiculada no Anuário Brasileiro da Segurança Pública (CERQUEIRA, 2019, p.156)

que reflete os gastos com segurança pública, informa que as despesas com

informação e inteligência correspondem a apenas 0,6% das despesas totais dos

estados.

A SENASP (2011) afirma que uma das suas principais pautas é o

reconhecimento da importância do investimento da perícia como fator fundamental

para realização de investigações inteligentes e profissionais, que resultem na

identificação do criminoso e na produção de provas que possibilitem sua

condenação. Nesse intuito surgiu a necessidade de conhecer o perfil das instituições

de perícia e mapear com precisão suas demandas.

Nesse contexto, outro aspecto que deve ser levado em consideração é a

finalidade que se pretende obter com cada tipo de investimento, sopesando

benefícios e desvantagens, bem como o custo de aplicação e o custo de

manutenção e ainda o custo com cada etapa dos procedimentos.

Isso porque mais de uma tecnologia pode se prestar a mesma função e

apresentar custos distintos e também alcances distintos. Por essa razão, ter

conhecimento de como cada uma delas contribuirá para a perícia é fundamental

para fazer escolhas de destinação de recursos.

Em relação a esse dilema, interessante mencionar os investimentos em

tecnologia para a captura e comparação de impressões digitais e a técnica de

extração e análise de DNA, traçando comparativos entre elas. Primeiramente, no

que tange as suas aplicações, segundo o Conselho Nacional de Pesquisa, temos

que:

[...] o valor probatório das impressões digitais frequentemente se limita a estabelecer que o suspeito estava presente em um certo local – e isso não implica automaticamente culpa. Quando presente, o DNA-prova frequentemente será mais probatório que as impressões digitais, pois é mais difícil atribuir a presença de fluidos corporais a causas inócuas (CONSELHO NACIONAL DE PESQUISA, 1999, p.119).

Já no que diz respeito ao valor a ser despendido com ambas as operações

podemos ter custos diferentes em cada etapa, quais sejam o momento de coleta do

material a ser analisado e a fase de análise da amostra.

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O Conselho Nacional de Pesquisa (1999, p.119) afirma que obter

impressões digitais é barato e relativamente fácil de realizar por pessoas com

treinamento técnico mínimo, já a tipagem do DNA é dispendiosa e requer instrução e

treinamentos extensivos. No entanto, consigna que a criação de banco de dados

para perfil genético não demanda softwares ou hardwares de alto custo, ao contrário

dos sistemas de comparação de impressões digitais, que exigem softwares que

analisem padrões geométricos complexos.

Sobre custos da implantação de laboratórios de análise de DNA, o Conselho

Nacional de Pesquisa (1999, p.158) informa que atualmente, não é possível estimar

com precisão o custo da utilização da tipagem do DNA, porém se avalia que chegue

a atingir dezenas de milhões de dólares por ano. No entanto, o custo para operação

do sistema é exíguo. O Conselho destaca que a qualidade da justiça tende a

melhorar com o uso completo da tipagem do DNA, pois acreditam que os gastos

com a implantação desse sistema serão compensados pelas vantagens que serão

obtidas.

No entanto, atenta para o fato de que os benefícios não financeiros incluem

a prevenção a futuros crimes, o que corrobora com o exposto neste capítulo, de que

investigação é política, não só de repressão, mas de prevenção e que se apresenta,

atualmente, como alternativa viável para a promoção da segurança pública.

Por fim, uma conclusão possível a esse respeito é que ampliação do

patrulhamento ostensivo, ainda capacitado, isoladamente, não apresentará a

solução esperada. Todavia, se aliado ao investimento em inteligência, perícia e

tecnologia, será mais significativa a probabilidade de minoração dos danos da

criminalidade e do consequente desestímulo a perpetração do delito.

4.4 Importância do aparelhamento dos institutos de perícia, formação e

capacitação de delegados e peritos e atualizações acerca do uso das novas

técnicas

A identificação criminal passou, ao longo das épocas, por diferentes

roupagens e técnicas, desde a mutilação, passando pela marcação com ferro em

brasa, depois pela fotografia, até a consagração do método de identificação através

das impressões digitais, a datiloscopia.

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De acordo com o delineado por Ferreira (1962, p.89), representante da

literatura médico-legal, o progresso da sociedade impõe à polícia novas formas de

se preparar para o combate à criminalidade, pois em razão do conflito de interesses

e das dificuldades econômicas da vida, em geral, nos centros civilizados, a

tendência para o crime é cada vez maior.

A obra, escrita em 1962, chama atenção para a complexidade dos delitos e

a estrutura sofisticada dos esquemas criminosos. Observa-se que, mais de

cinquenta anos depois, esse cenário vem sendo cada vez mais desenvolvido e os

métodos de investigação deveriam evoluir na mesma proporção, acompanhando o

avançar da tecnologia.

Tomando como base uma análise puramente pragmática acerca da

destinação de recursos públicos, os benefícios da utilização de tecnologia devem ser

apreciados sob o aspecto econômico, uma vez que, como é cediço, movimentar a

máquina judiciária implica em custos para o estado, de modo que a minimização

desses gastos deve ser levada em consideração quando da escolha das técnicas a

serem aplicadas.

Neste ponto, destaca o Conselho Nacional de Pesquisa (1999, p.157), que a

exclusão precoce de suspeitos, através da evidência do DNA, tende a reduzir custos

para o sistema judiciário, evitando, inclusive, a ocorrência de julgamentos.

Não é objeto deste trabalho o complexo debate sobre a legitimidade da

criação de bancos de dados para catalogar informações genéticas de suspeitos e

condenados. Contudo, interessante mencionar a temática que circunda a discussão

em torno do implemento da tecnologia do DNA, destacando possibilidades de

aplicação e consequências.

Sobre esse complexo debate, o Conselho Nacional de Pesquisa (1999, p.

128), ao defender a criação de bancos de dados genéticos, argumenta que um

criminoso contumaz pode ser responsável por várias outras infrações das quais não

é suspeito. Logo, se o perfil de um DNA de um suspeito for colocado em um banco

de dados, estaria disponível para pesquisa em casos, passados ou futuros, não

solucionados.

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A respeito dessa temática, se traz à baila um caso emblemático ocorrido nos

Estados Unidos na década de 1980, envolvendo o julgamento de cinco jovens

acusados de um crime de estupro nos Estados Unidos, cometido no ano de 198923.

O caso foi contado através de uma série de quatro episódios, exibida pela

Netflix, sob a direção de Ava DuVernay, que recebeu o título When they see us, e

que, no Brasil, foi intitulado como Olhos que condenam.

A produção narra como se verificaram inúmeras agressões aos direitos

humanos, ocorridas durante a coleta de provas na apuração do caso, incluindo a

tomada de depoimento dos suspeitos, os quais foram submetidos à pressão, alguns

interrogados na ausência dos seus responsáveis legais e também sem a presença

de defensor, sendo quatro deles ainda menores de idade.

Após essa fase preliminar, os jovens foram julgados e condenados. Os

menores foram sentenciados às penas entre cinco a dez anos de prisão e o jovem,

condenado como adulto, recebeu pena de cinco a quinze anos de prisão.

No ano de 2002 as condenações foram revogadas após um detento ter

confessado a prática do crime imputado aos rapazes, e então se procedeu à

comparação entre o DNA do detento e o material genético encontrado no corpo da

vítima, na qual se confirmou que os jovens não haviam participado do crime.

A situação traz à baila inúmeras discussões que circundam o tema da

investigação, tais como influência da mídia na condução da persecução criminal,

racismo e xenofobia.

Trazendo o debate para o centro do tema discutido, qual seja, investigação e

prova pericial, temos que, no caso vertente, se empregados os meios científicos

pertinentes, o julgamento poderia ter se encaminhado para um desfecho justo para

esses jovens, que foram coagidos, sentenciados sem um conjunto probatório

23 “No fim da tarde de 19 de abril de 1989 um bando de rapazes entrou no Central Park de

Nova York na esquina da 110th Street e Quinta Avenida – cerca de 30 adolescentes ao todo. Entre eles estavam os teens negros e latinos que acabariam ficando conhecidos como os Cinco de Central Park. Mais ou menos na mesma hora, uma mulher branca de 28 anos, Trisha Meili, entrou no parque na altura da 84th Street com Quinta Avenida para correr. Mais tarde nessa noite, Trisha Meili foi espancada e estuprada brutalmente na trilha 102nd Street Cross Drive, onde estava correndo. Quando ela foi encontrada, viva mas gravemente ferida, a polícia vinculou o ataque contra ela aos teens negros e latinos no parque e deteve mais rapazes para serem interrogados, incluindo McCray, Wise e Salaam” Matéria de Huffpostbrasil, disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/entry/olhos-que-condenam_br_5d0bdfd0e4b0aa375f49b084. Acesso em: 02 de novembro.

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substancial e tiveram suas vidas e a de seus familiares devassadas pela mídia

americana.

No Brasil, recentemente foi realizada uma coleta massiva de perfis genéticos

de 10 mil presos com o intuito de comparar esse material com vestígios encontrados

em vítimas de crime de estupro que já estavam registradas em banco de dados, de

acordo com a matéria jornalística divulgada pelo Jornal Nacional24. O experimento

inédito no país, ocorreu no estado de São Paulo e se restringiu a condenados em

razão da prática de crimes sexuais. O procedimento identificou a autoria de sete

crimes de estupro ocorridos no estado.

Tal acontecimento ilustra a utilidade da criação de banco de informações

contendo perfis genéticos, bem como respalda o posicionamento de que seria

possível e constitucional, isto é, não violaria o direito à intimidade, a extração do

material genético de pessoas já condenadas para inserção de dados biológicos em

sistema a serviço da justiça.

A exemplo do que demonstrou a reportagem, é pertinente mencionar o caso

de Alexandre Batista, que foi preso e condenado em razão do reconhecimento

pessoal por meio fotográfico realizado pela vítima. No entanto, após a investigação e

comparação do seu material genético com o que foi encontrado na vítima, Alexandre

foi inocentado das acusações.

A situação narrada evidencia o quão técnica e confiável é a prova pericial

que examina o DNA em contraste com o reconhecimento pessoal, que é eivado de

subjetividade, sendo, assim, uma prova frágil para fins de condenação. O grau de

certeza fornecido por essa prova resta ainda mais prejudicado em razão de o

cérebro humano produzir falsas memórias e ainda da curta duração de tempo e

condições desfavoráveis em que pode se dar a ação criminosa.

Ademais, em relação ao reconhecimento pessoal, o texto do CPP é arcaico.

Disciplinado pelos art. 22625 e 22826, o procedimento não pode ser considerado

24 Publicado por Jornal Nacional em 04/11/2019 às 21h30.Jornal Nacional é uma programação da grade de noticiários da rede brasileira de televisão Globo.

25 Art. 226. Quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa, proceder-se-á pela seguinte forma: I - a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever a pessoa que deva ser reconhecida; Il - a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem qualquer semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la;

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confiável, ainda que em consonância com a legislação, isso porque a própria

disciplina legal não foi pensada segundo os padrões recomendados pela ciência.

Diante dessa realidade, são elevadas as possibilidades de condenações de

pessoas inocentes.

Como exemplo de procedimentos nos quais incorrem riscos, temos aqueles

que são feitos através de visualização de fotografia ou vídeo. Ademais, também não

se pode atribuir credibilidade ao reconhecimento realizado tão somente pela polícia,

pois, não raras vezes, é feita a mera associação a um alvo previamente

estabelecido, o qual não se logrou demonstrar a participação em outras infrações.

Nos casos em que houver vestígios biológicos que possam ser submetidos a

exame do material genético, a despeito da possibilidade de que seja feito o

reconhecimento, deverá ser feita obrigatoriamente esta analise, pois, será possível

sanar falhas cometidas no procedimento de reconhecimento através da prova do

DNA, esta isenta de qualquer subjetivismo ou ilusória percepção.

No entanto, nos casos em que não seja possível empregar a análise do

material genético, a fim de se evitar o cometimento de equívocos, é preciso

submeter o reconhecimento pessoal ao crivo de softwares que já estão disponíveis e

que examinam e comparam padrões geométricos de caracteres físicos entre

suspeitos.

Um dos peritos criminais do Núcleo de Biologia do Instituto de Criminalística

de São Paulo, Alexandre Learth Soares, afirmou que não se trata apenas de

absolver inocentes ou de condenar culpados, mas de produzir uma prova técnica

que seja conclusiva no sentido de indicar a autoria de um crime.

Através de um olhar superficial para os resultados obtidos por meio da prova

no processo penal, observamos que está ligada diretamente ao deslinde da

persecução e consequente aplicação da lei, o que por sua vez promove a satisfação

III - se houver razão para recear que a pessoa chamada para o reconhecimento, por efeito de intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa que deve ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela; IV - do ato de reconhecimento lavrar-se-á auto pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais. Parágrafo único. O disposto no III deste artigo não terá aplicação na fase da instrução criminal ou em plenário de julgamento. 26 Art. 228. Se várias forem as pessoas chamadas a efetuar o reconhecimento de pessoa ou de objeto, cada uma fará a prova em separado, evitando-se qualquer comunicação entre elas.

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dos envolvidos que aguardam o provimento jurisdicional. Essa todavia é apenas a

ponta do iceberg, pois a prova proporciona, em última análise, a efetivação da

justiça, o que impacta sobremaneira nas relações sociais, dissuadindo a prática

criminosa e contribuindo para a redução da violência no seio de uma comunidade.

Neste prisma, a agenda Segurança Pública é a solução, documento

desenvolvido pelo Fórum de Segurança Pública (2018, p.8), tem como uma de suas

propostas, incentivar os estados a aprimorarem o desempenho das forças policiais,

especialmente as atividades de prevenção, investigação e de perícia, com foco na

proteção da vida.

Neste sentido, afirma Barilli (2018, p.286-287) que uma das principais

necessidades em termos de reforma processual penal é o investimento no sistema

de investigação criminal. O autor argumenta que os avanços em litigância

processual e aparelhamento das instituições no âmbito do processo, como

Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública, não irão adiantar se a

investigação criminal que é a etapa preliminar que lhe dá suporte, permanecer

obsoleta, pois essa debilidade da investigação irá comprometer o processo como um

todo.

Tal medida de fomento ao desenvolvimento de estudos e expansão dos

laboratórios existentes nos institutos de perícia, pode se dar, também, através de

convênios com instituições de pesquisa como o Conselho Nacional de Pesquisa

(CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

(CAPES), além das universidades, terrenos profícuos para o avanço da tecnologia.

Neste aspecto, não se atribui responsabilidade exclusiva ao poder executivo

em efetivar políticas de combate à criminalidade por meio da investigação, mas

também impõe-se ao legislativo uma postura ativa para suprir lacunas de

regulamentação da atividade pericial, já que, conforme foi possível verificar, não há,

além da parca menção contida no Código de Processo Penal, legislação federal

sobre a perícia. De igual forma, é possível conferir também ao judiciário certa

parcela de responsabilidade em relação a essa temática, por meio das decisões

estruturais proferidas, tal como a decisão apresentada no capítulo anterior, proferida

pela 1ª Vara da Fazenda Pública de Natal/RN.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A impunidade é um elemento que acarreta a perpetuação do ciclo da

criminalidade de um modo geral e para ser combatida demanda uma persecução

estatal capaz de comprovar, de forma técnica, a culpa dos agentes responsáveis

pela prática de delitos.

Diversos são os fatores que contribuem para os resultados insatisfatórios da

perícia no país, dentre eles, é possível mencionar a desvalorização dos profissionais

que estão incumbidos da produção das provas; a ausência de recursos financeiros a

serem injetados no setor de investigação e inteligência das polícias e institutos

técnicos científicos e a legislação exígua a respeito da matéria.

A partir da análise das condições em os delegados, peritos e médicos

legistas realizam suas funções, verificou-se que o resultado final do inquérito e das

perícias guarda íntima relação com a forma com a qual esses profissionais estão

inseridos no serviço público.

Em relação à figura da autoridade policial, responsável pela condução do

inquérito, não há normatização suficiente pela legislação processual penal dessa

função. Ademais, fatores como ausência de treinamento, baixa remuneração, falta

de autonomia e independência, além de escassez de recursos materiais e estruturas

adequadas à realização dos exames, são os aspectos que ocasionam o rendimento

insatisfatório do exame pericial nos institutos de perícia do país

Se constata que o acervo probatório construído na fase pré-processual não

é meramente informativo, mas integra o processo e influencia no convencimento do

julgador, principalmente se tratar-se de prova irrepetível.

Percebe-se a importância de um zelo na elaboração da prova e atenção

para a sua cadeia de custódia que deve ser preparada para servir à instrução

processual.

Alerta-se também para a necessidade de articulação da defesa em

desenvolver um mecanismo de investigação defensiva com vistas a produzir os

meios comprobatórios que embasem sua linha defesa.

A análise de periódicos especializados e o levantamento de dados revela

que a atividade pericial no Brasil, a despeito do rápido caminhar da tecnologia, ainda

atua de forma precária e arcaica na maior parte do país.

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Este fenômeno, em parte, pode ser atribuído às condições insalubres de

trabalho experimentada pelos peritos que, além de mal remunerados, enfrentam

obstáculos à realização de suas atribuições devido à ausência de equipamentos e

capacitação técnica periódica carecendo também de uma política de

acompanhamento psicológico desses profissionais que lidam de perto com uma

realidade tão indigesta.

A par desse contexto, temos ainda a figura do condutor do inquérito policial,

profissão que até pouco tempo se destinava à oficiais da carreira que não contavam

com habilidades e conhecimentos necessários para a realização dessa atividade de

gestão da produção de prova. Pode-se inferir que tal fator contribuiu com a

ocorrência de nulidades pré-processuais e vícios nas provas produzidas, e os

resquícios ainda estão impregnados na sociedade, visto que ainda há, nos quadros

ativos da polícia, a presença de delegados sem a formação necessária.

A respeito do desenvolvimento do uso da tecnologia do DNA e de que modo

vem sendo aplicada nas perícias criminais pelo Brasil, os números mencionados

indicam que a perícia realizada através de análise de DNA ainda é tímida e isso é

facilmente constatável pela exígua quantidade de laboratórios vinculados aos

institutos de perícia criminal, sendo que desse número limitado, expressa parcela

dos laboratórios foram classificados como autônomos, ou seja, prestam serviço a

administração pública mas não integram sua estrutura.

Nessa esteira, quanto à discussão acerca dos benefícios e empecilhos à

adoção da análise de DNA para a perícia, resta evidenciado que o maior óbice à sua

expansão reside no alto custo para a implementação da tecnologia, diante da

escassez de recursos públicos.

Diante desse cenário, destaca-se a importância de a defesa técnica do

acusado se apropriar do momento de produção da prova pericial, de forma a

concretizar o pleno exercício direito de defesa e alcançar o equilíbrio da instrução

processual por meio da paridade de armas. Os casos analisados neste tópico

tiveram a finalidade de ilustrar as falhas que o sistema, tanto o pericial como judicial,

podem cometer durante a construção do acervo probatório e a sua valoração. Se

demonstra, ainda, como o DNA pode interferir na realização da justiça do caso

concreto, promovendo um julgamento baseado em evidências de modo a afastar

subjetivismos.

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Verifica-se a distinção de alcance probatório entre impressões digitais e DNA

e quais os casos em que há pertinência de cada exame, comparando-se custos e

resultados, financeiros e sociais, dessas técnicas.

O debate em torno das políticas de segurança pública indica a urgência da

destinação de recursos para o setor de investigação, sem negar a

imprescindibilidade do investimento em força policial e patrulhamento ostensivo, mas

reafirmando as vantagens de promover a qualidade da investigação, de modo a

fomentar uma aplicação equilibrada do orçamento público.

Os índices permitem inferir que a impunidade é uma das causas da elevada

taxa de crimes no país e que a identificação dos agentes que tenham cometido

delitos e sua consequente responsabilização é um desestímulo à prática de crimes,

nesse aspecto haverá a indução de um comportamento social no sentido de

abstenção de condutas delituosas.

Dessa sorte, é preciso qualificar a perícia para se alcançar resultados

conclusivos e confiáveis. Para tal, indispensável se faz capacitar os agentes que

lidam diretamente elaborando os exames, bem como a equipe policial que conduz

as investigações.

Imprescindível, também, promover a manutenção e a renovação periódica e

estratégica dos laboratórios e equipamentos dos institutos oficiais de perícia e

unidades credenciadas.

Sobremaneira relevante considerar que o mapeamento do perfil genético por

si só não é capaz de comprovar a culpa do suspeito, todavia, aponta a relação

desse investigado com a cena dos fatos. Logo, é assim que as provas devem ser

apreciadas, compulsando-as com todo o conjunto probatório, e com a prova pericial

não seria diferente.

Temos, desse modo, que a técnica de reconhecimento de perfil genético é

uma poderosa aliada da perícia forense, não possuindo, contudo, validade absoluta

se analisada isoladamente e que não apresenta resultados infalíveis, como qualquer

outro tipo de exame, frise-se.

Na fase de investigação, visando garantir a confiabilidade dessa prova,

deverão ser instituídos protocolos que disponham sobre a rotina de procedimentos

com o manejo das amostras e da análise do material colhido. No momento da

instrução processual, se impõe a verificação dessa prova. Saliente-se que a atuação

incisiva do defensor é primordial para se alcançar resultados confiáveis.

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Ademais, se evidencia a necessidade de atuação não apenas por parte do

poder executivo, mas também uma postura ativa do legislativo e do judiciário para o

enfrentamento da realidade demonstrada ao longo desse trabalho, tendo em vista

que apenas a soma de esforços pode ocasionar uma mudança de fato.

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ANEXO A – Portaria N° 021/2019 - GDG Natal/RN,30 de janeiro de 2019

Portaria N° 021/2019 - GDG Natal/RN,30 de janeiro de 2019.

O Diretor Geral do INSTITUTO TÉCNICO-CIENTÍFICO DE PERÍCIA- ITEP, no uso de suas atribuições legais, conferidas pelo art.6º, VI, da Lei Complementar nº 571, de 31 de maio de 2016,

RESOLVE: Art. 1º Instituir comissão para, no prazo de 60 (sessenta) dias, realizar exames periciais nos cadáveres armazenados nas dependências do Instituto de Medicina Legal, que estão aguardando conclusão do exame pericial e, quando possível, identificação, para posterior inumação. Art.2º A comissão será composta por quatro Peritos Odontolegistas e dois Peritos Médico Legista, sendo eles, respectivamente: Claudete Bezerra Martins, matrícula nº 92.504-7; Eduardo Araújo Ramos, matrícula nº 91.457-6 Maria Luiza Costa Lopes Cardoso, matrícula nº 91.364-2; Ricardo José Barbalho Azevedo, matrícula nº 172.300-6; Camila Waleska de Macedo Caldas, matrícula nº 223.315-0; Flávio Alexandre Santos Azevedo, matrícula nº 151.798-8. Art.3º Os cadáveres que tenham registro de entrada e/ou perito identificado serão encaminhados, pela Direção do IML, aos responsáveis para a conclusão das perícias, devendo ser juntada justificativa para a não conclusão, nos casos cabíveis. Art.4º Os exames periciais dos cadáveres que se encontram sem número ou sem informação que vincule à sua entrada no Instituto serão analisados pela comissão instituída pela presente Portaria. §1º Devido a ausência de guia de solicitação junto aos cadáveres a serem periciados, serão feitas novas guias, cujo solicitante será o Diretor Geral do ITEP, sendo registrado novo número de laudo pericial. §2º No histórico do novo laudo deverá constar: a)Data de quando o cadáver foi encontrado e catalogado, bem como data provável de entrada neste Instituto; b)Inventário do cadáver referente às vestes e pertences encontrados; c)Estimativa do sexo, ancestralidade, idade e estatura; d)Tempo de morte e causa mortis. §3º A comissão deverá colher amostra biológica para exame de DNA, bem como fotografar as estruturas anatômicas para futura identificação e preencher Declaração de Óbito.

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§4º A comissão deverá, ainda, cruzar as informações periciais com informações prestadas por familiares que buscam parentes desaparecidos, visando futuro confronto genético através do DNA. Art.5º Após realizadas todos os procedimentos determinados no art.4º, a comissão providenciará, junto à Direção do IML, a entrega dos cadáveres identificados às famílias, e inumação dos não identificados. Art. 6º. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. PUBLIQUE-SE E CUMPRA-SE.

Marcos José Brandão Guimarães Diretor Geral

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ANEXO B – LAUDO DE EXAME NECROSCÓPICO

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