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o direito ao meio ambiente sadio e equilibrado como direito difuso ...

Date post: 10-Jan-2017
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Daniela Richter e Joseane Ceolin Mariani de Andrade Pedroso O DIREITO AO MEIO AMBIENTE SADIO E EQUILIBRADO COMO DIREITO DIFUSO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES: UM OLHAR DO NEOCONSTITUCIONALISMO SOBRE AS NOVAS INCORPORAÇÕES DA CONSTITUIÇÃO EQUATORIANA 1 THE RIGHT TO A HEALTHY ENVIROREMNENT AS DIFUSE RIGHT OF CHILDREN AND ADOLENCENTS: AM APROACH OF NEOCONSTITUTIONALISM OVER NEW INCORPORATIONS OF THE EQUATORIAN CONSTITUTION Daniela Richter 2 Joseane Ceolin Mariani de Andrade Pedroso 3 Resumo O presente trabalho analisa no contexto do constitucionalismo, se o direito difuso das crianças e adolescentes ao meio ambiente sustentável é concretizado no direito pátrio e no direito equatoriano. Objetiva descrever sobre o constitucionalismo contemporâneo e seus ciclos na América Latina, e nesse contexto, resgata aspectos conceituais sobre o direito de crianças e adolescentes conviverem em um meio ambiente saudável, abordando a doutrina da proteção integral e sua positivação no Brasil para, ao final, buscar um diálogo entre o ordenamento brasileiro e equatoriano no que tange a concretização da proteção integral quanto ao direito ao meio ambiente sustentável. Assim, para a realização do trabalho, utilizar-se-á o método de abordagem dedutivo, partindo-se do paradigma constitucional brasileiro para se chegar no tratamento conferido às crianças e adolescentes na Constituição Equatoriana, bem como o método de procedimento comparativo, selecionando-se os artigos das duas constituições em análise para ao fim responder qual das duas responde de maneira mais adequada à proteção integral de crianças e adolescentes. 1 Artigo submetido em 02/06/2013, pareceres de aprovação em 15/07/2013 e 26/09/2013, aprovação comunicada em 07/10/2013. 2 Advogada, Professora de Direito Civil, Constitucional e de Direito da Criança e do Adolescente do Centro Universitário Franciscano-UNIFRA, da Faculdade Metodista de Santa Maria- FAMES, Especialista em Direito Constitucional, Mestre em Direito, Doutoranda pela Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC, integrante do grupo de Pesquisa Teoria Jurídica no Novo Milênio, do Curso de Direito da UNIFRA e do Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais de Criança e Adolescente – NEJUSCA – da UFSC.Endereço eletrônico: [email protected] 3 Advogada. Professora de Direito Civil e Direito Processual Civil do centro Universitário Franciscano-UNIFRA, da Faculdade Metodista de Santa Maria-FAMES, Mestre em Direito pela Universidade Federal de santa Maria-UFSM. Endereço eletrônico: [email protected] Constituição, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional. Curitiba, 2012, vol. 4, n. 7, Jul.-Dez. p. 376-400. 376
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  • Daniela Richter e Joseane Ceolin Mariani de Andrade Pedroso

    O DIREITO AO MEIO AMBIENTE SADIO E EQUILIBRADO COMO DIREITO DIFUSO DE CRIANAS E

    ADOLESCENTES: UM OLHAR DO NEOCONSTITUCIONALISMO SOBRE AS NOVAS

    INCORPORAES DA CONSTITUIO EQUATORIANA1

    THE RIGHT TO A HEALTHY ENVIROREMNENT AS DIFUSE RIGHT OF CHILDREN AND ADOLENCENTS: AM APROACH OF NEOCONSTITUTIONALISM OVER NEW

    INCORPORATIONS OF THE EQUATORIAN CONSTITUTION

    Daniela Richter 2

    Joseane Ceolin Mariani de Andrade Pedroso3

    Resumo O presente trabalho analisa no contexto do constitucionalismo, se o direito

    difuso das crianas e adolescentes ao meio ambiente sustentvel concretizado no direito ptrio e no direito equatoriano. Objetiva descrever sobre o constitucionalismo contemporneo e seus ciclos na Amrica Latina, e nesse contexto, resgata aspectos conceituais sobre o direito de crianas e adolescentes conviverem em um meio ambiente saudvel, abordando a doutrina da proteo integral e sua positivao no Brasil para, ao final, buscar um dilogo entre o ordenamento brasileiro e equatoriano no que tange a concretizao da proteo integral quanto ao direito ao meio ambiente sustentvel. Assim, para a realizao do trabalho, utilizar-se- o mtodo de abordagem dedutivo, partindo-se do paradigma constitucional brasileiro para se chegar no tratamento conferido s crianas e adolescentes na Constituio Equatoriana, bem como o mtodo de procedimento comparativo, selecionando-se os artigos das duas constituies em anlise para ao fim responder qual das duas responde de maneira mais adequada proteo integral de crianas e adolescentes.

    1 Artigo submetido em 02/06/2013, pareceres de aprovao em 15/07/2013 e 26/09/2013, aprovao comunicada em 07/10/2013.

    2 Advogada, Professora de Direito Civil, Constitucional e de Direito da Criana e do Adolescente do Centro Universitrio Franciscano-UNIFRA, da Faculdade Metodista de Santa Maria- FAMES, Especialista em Direito Constitucional, Mestre em Direito, Doutoranda pela Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC, integrante do grupo de Pesquisa Teoria Jurdica no Novo Milnio, do Curso de Direito da UNIFRA e do Ncleo de Estudos Jurdicos e Sociais de Criana e Adolescente NEJUSCA da UFSC.Endereo eletrnico: [email protected]

    3 Advogada. Professora de Direito Civil e Direito Processual Civil do centro Universitrio Franciscano-UNIFRA, da Faculdade Metodista de Santa Maria-FAMES, Mestre em Direito pela Universidade Federal de santa Maria-UFSM. Endereo eletrnico: [email protected]

    Constituio, Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional. Curitiba, 2012, vol. 4, n. 7, Jul.-Dez. p. 376-400. 376

  • O direito ao meio ambiente sadio...

    Palavras-chave: Neoconstitucionalismo; proteo integral; direitos difusos

    e coletivos; direito sustentabilidade; criana e adolescente.

    Abstract This paper examines the context of constitutionalism, the diffuse right of

    children and adolescents to sustainable environments is embodied in parental rights and Ecuadorian law. The paper aims to describe the contemporary constitutionalism and its cycles in Latin America, and in this context, rescue conceptual aspects of the right of children and adolescents living together in a healthy environment, addressing the doctrine of integral protection and its positiveness in Brazil for at the end, seek a dialogue between the Brazilian and Ecuadorian planning regarding the achievement of full protection to the right to a sustainable environment. Thus, to carry out the work, it will use the method of deductive approach, starting from the Brazilian constitutional paradigm to entake the treatment given to children and adolescents in the Ecuadorian Constitution, as well as the method of comparative procedure, selecting if the articles of the two constitutions in order to respond to analyze which one responds more adequately to the full protection of children and adolescents.

    Keywords: Neoconstitutionalism; full protection; diffuse and collective rights; the right to sustainability; children and adolescents.

    INTRODUO

    Hodiernamente, tema de grande destaque o debate das questes ambientais e de sua consequente sustentabilidade, j que na atual conjuntura econmica, em meio ao mundo globalizado isto se apresenta como um desafio a ser enfrentado por todos. Desta maneira, torna-se salutar a necessidade de implementao de uma cultura preventiva e preservacionista para garantir o direito ao meio ambiente sadio e equilibrado as presentes e futuras geraes como reza a Carta Maior no verdadeiro desdobramento do direito paz.

    Pensando nisso, o estudo ora apresentado analisa dentro do contexto de um neoconstitucionalismo, se o direito difuso de crianas e adolescentes a tal meio ambiente possvel de concretizao no direito brasileiro e, no direito equatoriano, a tal ponto de se comparar os dois institutos buscando, igualmente, averiguar qual deles concretiza de maneira integralizada a proteo integral estendida a crianas e adolescentes.

    Para tanto, num primeiro momento, objetiva-se delinear os aspectos conceituais sobre o direito de crianas e adolescentes conviverem em um ambiente

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    saudvel e, a consequente caracterizao como novos direitos de terceira dimenso, enquadrado na categoria jurdica de direitos difusos ou coletivos, para depois abordar-se a questo da doutrina da proteo integral e a positivao jurdica do direito brasileiro.

    Ao final, pretende-se realizar um possvel dilogo entre os dois ordenamentos jurdicos citados acima Brasil e Equador - comentados no objetivo da exposio do paradigma do desenvolvimento humano e sustentvel de crianas e adolescentes.

    Assim, para a realizao do trabalho, utilizar-se- o mtodo de abordagem dedutivo, partindo-se do paradigma normativo inaugurado pelos artigos 225 e 227 da Carta Constitucional Brasileira que, segundo o primeiro, elege o direito humano como direito fundamental das presentes e futuras geraes enquanto que o ltimo consagra a doutrina da proteo integral como princpio que deve nortear o tratamento conferido a Crianas e adolescentes, bem como dos artigos 14, 26, 30, 32 e 71 da Constituio Equatoriana a fim de entender e desenvolver o direito de sumak kawsay, ou seja, do direito vida em sua plenitude. Para dar conta da segunda parte do artigo empregar-se- o mtodo de procedimento comparativo, selecionando-se os artigos das duas constituies em anlise para ao fim responder qual das duas responde de maneira mais adequada proteo integral de crianas e adolescentes.

    o que se passa a mencionar.

    1 O NEOCONSTITUCIONALISMO E OS VALORES AXIOLGICOS DAS CONSTITUIES

    Pode-se dizer que a Constituio Federal de 1988 foi o grande marco para instaurao do novo modelo constitucionalista no Brasil, ou seja, do constitucionalismo contemporneo. Tal fato se deve ao carter axiolgico desta Constituio. Nas palavras de Barroso (2007, p. 10) a referida Constituio foi o ponto culminante de processo de restaurao do Estado Democrtico de Direito e superao de uma perspectiva autoritria, onisciente e no pluralista de exerccio de poder, timbrada na intolerncia e na violncia. Lembre-se, aqui, a frase dita por

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    Konrad Hesse a essncia constitucional encontra suporte na sua vigncia (HESSE, 1991, p. 26).

    A este passo, a ideia de Estado Democrtico de Direito elencada no art. 1 da Carta Magna Brasileira, traz conceitos que so prximos, mas no devem ser confundidos, que so constitucionalismo e a democracia. Constitucionalismo, em essncia, significa limitao do poder e supremacia da lei, j democracia traduz-se em soberania popular e governo da maioria.

    Rememore-se, portanto, que o constitucionalismo contemporneo surge como um instrumento de concretizao dos valores, normas e direitos fundamentais trazidos pela Carta Magna de 1988. Deste modo, h elevao do indivduo para com o encontro de questes ligadas a solidariedade e responsabilidade para com o Estado para a realizao destes preceitos constitucionais. Novamente pode-se citar Hesse (1991, p.26) que afirma que a Constituio capaz de transformar a sociedade, mas, ao mesmo tempo, tem que ser lida a partir dessa sociedade, ou seja, de sua realidade. A se constata sua fora normativa.

    Portanto, nesse limiar da evoluo do constitucionalismo contemporneo tem-se o neoconstitucionalismo, que de uma forma bem sucinta vai se preocupar com a eficcia das normas constitucionais. Assim, Dimoulis e Duarte (2008, p. 435) tentam encontrar um conceito para que o neoconstitucionalismo possa ser definido

    infelizmente, no existe ainda uma preciso conceitual para a terminologia neoconstitucionalismo. Esse neologismo nasceu pela necessidade de exprimir algumas qualificaes que no poderiam ser devidamente explicadas pelas conceituaes vigentes no constitucionalismo avanado ou paradigma argumentativo. (DIMOULIS; DUARTE, 2008, p. 435)

    A princpio pode-se destacar o sentido do prefixo neo que presume considerar algo que novo ou que ainda no foi desvendado, que est em desenvolvimento, determinando certo avano em relao ao estado anterior. Tal a premissa do neoconstitucionalismo, ou seja, visualizar o constitucionalismo contemporneo, ou como prefere expor Tavares (2007, p.4) trata-se de um constitucionalismo do por vir.

    Em suma, nas palavras de Barroso

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    o neoconstitucionalismo ou novo direito constitucional, na acepo aqui desenvolvida, identifica um conjunto amplo de transformaes ocorridas no Estado e no direito constitucional, em meio s quais podem ser assinalados, como marco histrico, a formao do Estado constitucional de direito, cuja consolidao se deu ao longo das dcadas finais do sculo XX; como marco filosfico, o ps-positivismo, com a centralidade dos direitos fundamentais e a reaproximao entre Direito e tica; e como marco terico, o conjunto de mudanas que incluem a fora normativa da Constituio, a expanso da jurisdio constitucional e o desenvolvimento de uma nova dogmtica da interpretao constitucional. Desse conjunto de fenmenos resultou um processo extenso e profundo de constitucionalizao do Direito. (BARROSO, 2009, p. 40)

    Assim, conforme a doutrina pode-se dizer que o neoconstitucionalismo foi propulsionado por diversos aspectos, como a falncia do padro normativo que foi desenvolvido no sculo XVIII, baseado na supremacia do parlamento, na influncia da globalizao, na ps-modernidade, na superao do positivismo clssico, na centralidade dos direitos fundamentais, na diferenciao qualitativa entre princpios e regras e na revalorizao do Direito.

    Para Suzana Pozzolo (1998, p. 234) o neoconstitucionalismo apresenta peculiares caractersticas, como a adoo de uma noo especfica de Constituio juntamente com tcnicas interpretativas denominadas ponderao ou balanceamento e tambm com a consignao de tarefas de integrao jurisprudncia e de tarefas pragmticas teoria do Direito.

    Ademais, enfatizam Dimoulis e Duarte (2008) que o modelo normativo do neoconstitucionalismo no o descritivo ou o prescritivo, mas sim o axiolgico. No constitucionalismo clssico a diferena entre normas constitucionais e infraconstitucionais era apenas de grau; no neoconstitucionalismo, a diferena tambm axiolgica. A Constituio considerada como valor em si.

    Nessa senda, quanto expanso do neoconstitucionalismo pode ser aferir que o neoconstitucionalismo no postula o surgimento de um judicial power, os marcos normativos devem ser obedecidos pelos poderes estatais. Ocorre que, em pases como o Brasil o ativismo judicial pode ser admitido quando houver a premncia da realizao de direitos fundamentais, assegurando a densidade suficiente, estabelecida de forma conjunta pela seara poltica e pela seara jurdica, enquanto que o carter ideolgico do constitucionalismo clssico era apenas o de limitar o poder, dentro do delineamento estabelecido pela separao de poderes,

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    enquanto que o carter ideolgico do neoconstitucionalismo o de concretizar os direitos fundamentais (DIMOULIS; DUARTE, 2008, p. 435).

    Ressalte-se, que Moreira faz uma distino entre dois momentos do neoconstitucionalismo, o terico, embasado pela teoria de Direito e o neoconstitucionalismo total. Em suas palavras:

    o neoconstitucionalismo terico estabelece que o Direito Constitucional o centro do ordenamento e da teoria do Direito, em que os outros campos jurdicos so todos constitucionalizados. Parte da conexo entre direito e moral, embora tal medida no seja um consenso entre seus adeptos. Trabalha seu principal elementos, os princpios constitucionais, estabelecidos e a serem preenchidos pela interpretao jurdica que integra o Direito, e o Estado visto como Estado ponderador. Enfoca uma teoria dos princpios positivados, essencial para o desenvolvimento do modelo, os quais atuam diretamente em todo o sistema, principalmente pela leitura da constitucionalizao do Direito. (MOREIRA, 2008, p. 52)

    Por outro lado, o mesmo autor diz que o neoconstitucionalismo total faz a unio entre o direito constitucional e a filosofia do direto, em que os dois estudos ocupam o ponto mximo, regendo conjuntamente o ordenamento. Alis, ele aceita as premissas conquistadas no neoconstitucionalismo terico como ponto de partida. Diz-se antipositivista e quer chegar ainda a ser tambm vetor da filosofia do direito aplicada e da filosofia poltica do Estado, um completo e novo paradigma. Ainda, para ele o referido modelo faz a conexo necessria entre o direito e a moral por via dos princpios e insere a poltica na relao e todos os seus efeitos, trabalhando o Direito em um sistema de regras e princpios, estes agindo pela pretenso de correo e o ponto de vista o do participante interno, ativo e moral. Ensina o Direito como ele pode ser, com aberturas (MOREIRA, 2008, p. 52).

    Em anlise peculiar, Moreira explica ainda que, para o neoconstitucionalismo ser alcanado, alguns pressupostos oriundos da afirmao do constitucionalismo devem estar necessariamente presentes. Sem eles jamais se poderia falar em Estado Constitucional de Direito. Deste modo, para ele

    so sete as condies para que se possa verificar a constitucionalizao do Direito. As trs primeiras so condies que chamamos de pressupostos, so de natureza formal, a saber: uma constituio rgida, a presena de uma jurisdio constitucional e a fora vinculante da Constituio. As outras condies so de natureza material, a aplicao direta das normas constitucionais, a sobreinterpretao, a interpretao conforme a

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    Constituio e a influncia da mesma sobre as relaes polticas. (MOREIRA, 2008, p. 73)

    Portanto, esse rol pode ser percebido como integrador de elementos comuns ao neoconstitucionalismo, que utiliza todos eles. Podem ainda ser includos outros, mas aqueles que realmente so antecedentes e por isso pressupostos na melhor acepo da palavra (MOREIRA, 2008, p. 73).

    Por fim, nas palavras de Cambi (2009, p.136) pode-se concluir que o neoconstitucionalismo a teoria que abrange e explica essa linha comum de pensar o direito contemporneo. E, neste sentido, pode-se enfrentar o estudo do neoconsitucionalismo como um novo paradigma do Direito, j que ele enxerga o direito como ele pode ser: transformador. Mais do que a superao de uma metodologia jurdica o que j seria uma grande proposta o neoconstitucionalismo muda a forma de pensar, pois pretende superar o debate entre positivistas e jusnaturalistas, lanando mo de uma nova teoria para o direito, tomando como ponto central a Constituio. Dito de outro modo passa-se de um direito em que as normas ditam o que fazer para um direito em que os princpios indicam o que se pode fazer, j que

    a diferena entre o pensamento formalista e o pensamento neoconstitucionalista que, o segundo, consegue alcanar as transformaes prticas dentro do sistema jurdico, neste ponto se afasta por completo de qualquer tese jusnaturalista, pois no sai do sistema nem defende valores universais. (CAMBI, 2009, p. 136)

    Por fim, pode-se dizer ento que as duas constituies objeto deste estudo, no af de se adequar as novas conquistas constitucionais acrescentaram valores axiolgicos ao seu texto. Antes de analis-los especificamente cabe, por fim, acrescentar os atuais estgios do constitucionalismo latino americano, para aps continuar o desdobramento proposto do tema.

    Assim, um primeiro ciclo multicultural, vai ser enquadrado de 1982-1988 e vai introduzir o conceito de diversidade cultural, do reconhecimento da configurao multicultural da sociedade e alguns direitos especficos para os povos indgenas. (MINISTRIO PBLICO FEDERAL, 2013)

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    Alguns pases como Canad (1982), por exemplo, reconhece sua herana multicultural e os direitos aborgenes, enquanto que a Guatemala (1985), Nicargua (1987) e Brasil (1988) reconhecem a conformao multicultural da nao ou Estado, o direito identidade cultural e novos direitos indgenas (FAJARDO, 2006).

    Especificamente quanto ao Brasil tm-se dois artigos incorporando os direitos indgenas e outros dois tratando de direitos das comunidades quilombolas (neste ltimo ponto, com muitas disputas judiciais para seu reconhecimento, exemplificativamente a luta dos proprietrios contra os remanescentes de quilombos de So Miguel e dos Martiminianos- Restinga Seca-RS).

    J o segundo perodo de reformas, o constitucionalismo pluricultural est compreendido entre 1989-2005, marcando a internacionalizao da Conveno 169-OIT, que revisa a Conveno 107 e adota um amplo leque de direitos indgenas, exemplificativamente o caso da lngua, da educao bilngue, das formas de participao etc4. (MINISTRIO PBLICO FEDERAL, 2013)

    Pode-se ainda, citar um ltimo ciclo, o do constitucionalismo plurinacional, que vai de 2006-2009 e traz nessa seara as Constituies boliviana e equatoriana, no contexto da discusso sobre os direitos dos povos indgenas e, pois, fundado em dispositivos para refundao do Estado, reconhecimento de indgenas como naes/povos originrios e nacionalidades e, portanto, como sujeitos polticos coletivos com direito a definir seu prprio destino, governar-se em autonomias e participar nos novos pactos de Estado. (MINISTRIO PBLICO FEDERAL, 2013)

    Realizados os apontamentos sobre o atual estgio do direito constitucional brasileiro e dos ciclos do constitucionalismo, passa-se a delinear sobre o direito da criana e do adolescente e o direito ambiental serem enquadrados nesse contexto como novos direitos, direitos de fraternidade e, consequentemente de terceira

    4 A jurisdio indgena reconhecida na Constituio colombiana de 1991 e depois pelo Peru (1993), Bolvia(1994-2003), Equador (1998) e Venezuela(1999); Paraguai (1992) e Mxico(1992-2001),por sua vez, reconhecem pluralismo jurdico e direito indgena. Argentina altera, em 1994, o texto original da Constituio de 1853, admitindo a preexistncia de direitos indgenas, assegurando-lhes direitos especficos, mas deixando ao Congresso a competncia para regulao em matria indgena. Ver Ramrez, 2008.

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    dimenso, j que o ltimo ciclo, em especial ser retomado adiante na questo especfica da incorporao do suma kawsay ao texto constitucional equatoriano5.

    2 A PROTEO INTEGRAL ESTENDIDA A CRIANAS E ADOLESCENTES E O DIREITO DIFUSO DE TUTELA DO MEIO AMBIENTE: DESCRIES LEGAIS NO BRASIL

    Inicialmente, cumpre rememorar que as crianas ao longo da histria foram tratadas como objetos, sem direitos e, que com a promulgao da Conveno da ONU de 1989, introduziu-se a teoria da proteo integral. Esta teoria tem a sua culminncia e consagrao na referida Conveno, que tem entre seus sustentculos o interesse maior da criana, sendo um documento que expressa de forma clara, sem subterfgios, a responsabilidade de todos com o futuro (VERONESE, 1999, p. 101).

    No mbito interno, a proteo integral est estabelecida na Carta Magna, em seu art. 227, caput, onde todos esses direitos especiais da criana e do adolescente6 devem ser garantidos pela famlia, pelo Estado e pela sociedade.

    Esclarece Veronese e Silveira que

    so eles que iro proteger e promover o desenvolvimento integral da criana e do adolescente, devendo cada qual cumprir seu dever, desempenhar os seu papis, objetivando assegurar a efetividade e o respeito aos direitos da criana e do adolescente. (VERONESE; SILVEIRA, 2011, p. 34)

    inevitvel, pois, tal referncia aos entes responsveis, j que tambm reafirmada no art. 4 do ECA. E mais, o pargrafo nico deste artigo fala acerca da prioridade absoluta que deve ser ostentada a estes sujeitos. No entanto, conforme o entendimento da autora acima mencionada trata-se de carter no exaustivo e sim

    5 Reitera-se aqui que se partir do pressuposto de que as demais dimenses de direitos fundamentais j so de conhecimento comum, analisando-se especificamente os direitos de terceira dimenso pelos limites permeados a este trabalho.

    6 Nessa seara, convm relembrar que a emenda 65/2010, estendeu tal proteo tambm ao jovem e que o projeto de Lei 27/2007 que dispe sobre a criao do Estatuto da Juventude est em tramitao na Cmara dos Deputados e foi apensado ao Projeto 4529/2004, cuja finalidade primordial estabelecer polticas pblicas para este novo segmento que vai de 15 a 29 anos.

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    meramente exemplificativo, pois no preveem todas as situaes de preferncia. (VERONESE; SILVEIRA, 2011, p. 34).

    Para Liberati, a Doutrina de Proteo Integral:

    baseada nos direitos prprios e especiais das crianas e adolescentes que, na condio peculiar de pessoas em desenvolvimento, necessitam de proteo diferenciada, especializada e integral. diferenciada porque impe uma distino entre o tratamento que se deve dar maioridade e menoridade. Por serem pessoas em desenvolvimento, as crianas e os adolescentes so considerados absolutamente incapazes no campo civil. (LIBERATI, 1991, p. 2)

    Alerte-se de que no se tem como limitadamente conceituar essa prioridade, pois sua condio peculiar de desenvolvimento e sua consequente fragilidade fsico-psquica que garantem os direitos a este grupo, seja com relao ao atendimento de suas necessidades, seja no tocante formulao de polticas pblicas (VERONESE; SILVEIRA, 2011, p. 34).

    J Fonseca (2011, p. 19) expe a mesma prioridade sob o aspecto da responsabilidade, momento em que diz que ela

    vincula a famlia, os administradores, os governantes em geral, os legisladores em suas esferas de competncia, os magistrados da Infncia e da Juventude, os membros do Ministrio Pblico, os Conselhos Tutelares, bem como as demais autoridades e organizaes, em virtude dos riscos a que constantemente esto submetidas crianas e adolescentes. (FONSECA, 2011, p.19)

    Referido autor ainda complementa dizendo que esta prioridade de proteo d-se pela necessidade de cuidados especiais que seus destinatrios necessitam, isso em decorrncia da fragilidade com que se relacionam no meio social e o status de pessoas em desenvolvimento (FONSECA, 2011, p. 19).

    Nesse nterim, o Estado confere s crianas e adolescentes tratamento especial e diferenciado, objetivando sua proteo integral. Esse conceito de proteo resulta no reconhecimento e promoo de direitos, sem viol-los e nem restringi-los, podendo ser um meio coercitivo da interveno estatal. Exemplo disso justamente o caso da Ao Civil Pblica, que por meno especfica do art. 201, V,

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    do ECA, tem cabimento para a defesa de direitos difusos e coletivos relativos infncia e adolescncia.

    Para explicar esta proteo judicial, Ischida diz que se costuma dividir os interesses individuais e interesses metaindividuais, os primeiros se referem a pessoas determinadas, enquanto que os ltimos atingem um grupo de pessoas (2010, p. 453). Ainda na sua viso

    Os interesses individuais podem ser estritamente individuais e tambm os individuais homogneos que possuem uma origem comum. J os interesses metaindividuais so divididos em coletivos quando pertencentes a uma categoria determinada de pessoas e os interesses difusos pertencentes a uma categoria indeterminvel de pessoas. (ISCHIDA, 2010, p. 453)

    O artigo 208 do ECA trata dos direitos individuais homogneos, coletivos e difusos da criana e do adolescente a ser defendidos, em especial, pelo representante do Ministrio Pblico. Para fins deste artigo, dar-se- nfase aos direitos difusos. Segundo Veronese (1997) os direitos difusos possuem origem no direito romano, mas foi somente a partir dos anos 60-70 que se comeou a preocupao cientfica com os mesmos. Tal mudana de paradigma est profundamente ligada a complexidade das sociedades hodiernas, na qual as atividades econmicas e sociais podem atingir prejudicialmente um grande nmero de pessoas, lesando direitos e interesses, no s do indivduo, considerado como ente isolado, mas de grupos, classes. (VERONESE, 1997, p. 69)

    Para Fiorillo (2003, p. 6-7), o direito difuso apresenta-se como um direito transindividual, tendo um objeto indivisvel, titularidade indeterminada e interligada por circunstncias de fato, ou seja, so aqueles que transcendem o indivduo, ultrapassando o limite da esfera de direitos e obrigaes de cunho individual. Possuem natureza indivisvel, pois ao mesmo tempo a todos pertence, mas ningum especificamente o possui e, deste modo, no possui um titular determinado, so pessoas que esto interligadas por uma situao ftica, mas inexiste uma relao jurdica entre eles.

    Ressalte-se que essa categoria de direitos tem sido cada vez mais importante e de carter imprescindvel no contexto das sociedades pluralistas e multiculturais e de difcil caracterizao, haja vista que alguns autores os tratam

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    como sinnimos. No entanto, Vigoritti (apud Veronese, p. 71) menciona que apesar dos direitos coletivos e difusos possurem o mesmo contedo de agrupamento de interesses possvel diferenci-los. Em suas palavras

    [...] enquanto o interesse coletivo caracteriza-se por ser organizado e coordenado, o difuso constitua-se numa fase de formao do interesse coletivo, portanto, sem sistematizao; mas, de qualquer forma, estava este ltimo inserido no processo de agregao de interesses. (VERONESE, p. 71)

    Portanto, verifica-se que os direitos difusos so marcados pela caracterstica da indeterminao do sujeito e abstratividade, ultrapassando a esfera individual. Dentre os mais debatidos na sociedade contempornea, cita-se o direito ao meio ambiente, de extrema importncia para fins deste trabalho. A Constituio brasileira de 1988 reconheceu o meio ambiente como sendo um interesse difuso, ou seja: interesse que pertence a todos os homens, independentemente do grupo, rgo ou associao a que pertena. Prova disso o local de insero das normas atinentes ao meio ambiente na Constituio da Repblica: Ttulo VIII Da Ordem Social (arts. 193 a 232). Ora. Se importa ordem social, coletivo (MORAES, 2001, p. 15).

    Alm de ser um direito difuso acredita-se ferrenhamente que o direito ao meio ambiente se constitui em um Direito Humano e Fundamental de terceira dimenso. Trata-se de direito individual e coletivo, porque a vivncia em um local agradvel ambientalmente sempre estar vinculada ao princpio fundamental da Dignidade da Pessoa Humana, especialmente em relao ao fato do meio ambiente ecologicamente equilibrado e sadia qualidade de vida estar preconizados no caput do artigo 225 da CF, como direitos de todos, das presentes e futuras geraes o que ser explorado adiante. Antunes (2012, p. 21) refora essa afirmativa dizendo que o direito ao desfrute de um ambiente sadio uma condio para o exerccio da dignidade humana.

    Neste passo, nos limites que permeiam este trabalho, preciso que se caracterize o dever de respeito e, a necessidade de aes sustentveis, para aps, fazer-se a relao de que a proteo integral pode ser um meio concretizador daqueles objetivos (frise-se: caminhar para o desenvolvimento de um meio ambiente ecologicamente equilibrado e assegur-los s presentes e futuras geraes), pois o

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    prprio art. 7 do ECA exige o fomento de polticas sociais pblicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condies dignas de existncia como um direito comum de toda criana e adolescente e, para este objetivo, perpassa-se por aquele.

    Cabe acrescentar com Milar (2007, p. 61), que a sociedade atual convive com trs metas indispensveis: a conciliao entre o desenvolvimento integral, a preservao do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida, o que pode ser traduzido nas condies necessrias para um desenvolvimento de um ambiente sustentvel. No entanto, para o to sonhado meio preciso abarcar vrios ramos do saber, no apenas o direito e sim a economia, a cultura, a poltica, o campo sociolgico, tecnolgico, etc., ou seja, de difcil conceituao o que seja o tal desenvolvimento sustentvel apesar de sua presena constante na mdia.

    Completa o autor

    melhor do que falar em desenvolvimento sustentvel que um processo prefervel insistir na sustentabilidade, que um atributo necessrio a ser respeitado no tratamento dos recursos ambientais, em especial dos recursos naturais. (MILAR, 2007, p. 68)

    O paradigma da sustentabilidade est em constante processo de construo e, infelizmente, a vida sustentvel carece de princpios que a sustentem (MILAR, 2007, p. 72). Para ele, viver de forma sustentvel implica aceitar a imprescindvel busca de harmonia com as outras pessoas e com a natureza, no contexto do direito natural e do direito positivo (MILAR, 2007, p. 74).

    Diante do permanente desafio, sendo o direito ao meio ambiente claramente regrado por diretrizes da Constituio Federal e da legislao ordinria, confiado ao Estado tarefas de controle e fiscalizao, onde se verifica a conformao de um direito subjetivo pblico em face desse mesmo Estado ou, no mnimo, de um interesse difuso a que crianas e adolescentes tenham pela proteo integral a eles ostentada o direito de convivncia em um meio ecologicamente equilibrado e sustentvel.

    Frise-se, conforme Ayala que

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    Em uma perspectiva de interdependncia, que tambm aquela que orienta a compreenso do contedo do prprio direito fundamental ao meio ambiente, e do princpio da livre iniciativa (do modo como este se encontra protegido pela Constituio brasileira), as liberdades econmicas somente tm o seu exerccio viabilizado sob o condicionamento de imperativos ecolgicos, ao mesmo tempo em que a proteo do meio ambiente somente tem sua justificativa se esta tambm puder ser integrada com um dos pressupostos que viabilizam a existncia humana, e de todas as demais formas de vida. (AYALA, 2011, p. 8)

    Trata-se, pois, de uma gesto de desenvolvimento sustentvel a ser protagonizada pelo comprometimento do poder pblico e pela completude do direito de crianas e adolescentes, podendo eles prprios participar deste processo salvaguardando os seus prprios direitos. O processo de mudana um caminho longo e requer interdisciplinaridade, pois no mundo sustentvel, nada pode ser praticado em apartado, preciso um dilogo permanente entre as pessoas de uma sociedade e, aqui, quer-se demonstrar a viabilidade do direito da criana e do adolescente, em especial da atuao do Ministrio Pblico juntamente com os principais atores da concretizao da proteo integral ser capazes de desenvolver um mundo sustentvel que ratifique a condio de direitos das presentes geraes.

    No se pode esquecer que a realidade que se apresenta que a economia ambiental est assentada na poltica e, por intermdio dela se realiza. Por isso, um caminho a ser apresentado para a reconciliao da economia com a natureza localiza-se longe da monetarizao do ambiente e dependente da modificao vinculada a prticas polticas (DERANI, p. 125-126).

    Quanto ao aspecto da proteo integral indubitvel que ela por proteger e promover a corresponsabilidade de famlia, Estado e sociedade no que tange aos direitos dos infanto-adolescentes parte integrante da luta pela efetivao de padres sustentveis, para, inclusive, poder concretizar os demais direitos7.

    Tais assertivas reforam a renomada teoria de Bobbio (1992, p. 1), que expressa sobre a estrutura jurdica dos direitos fundamentais de que se deve

    7 Rememore-se o artigo 5 e 15, do ECA, exemplificativamente: Nenhuma criana ou adolescente ser objeto de qualquer forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso, punido na forma da lei qualquer atentado, por ao ou omisso, aos seus direitos fundamentais. Art. 15. A criana e o adolescente tm direito liberdade, ao respeito e dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituio e nas leis.

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    distinguir entre um direito que se tem do direito que se gostaria de ter. Assim, segundo ele no primeiro caso investigo no ordenamento jurdico positivo, do qual fao parte como titular de direitos e deveres, se h uma norma vlida que a reconhea e qual essa norma, enquanto que na segunda situao ele tenta buscar boas razes para defender a legitimidade do direito em questo e para convencer um nmero maior de pessoas [...] a reconhec-lo (BOBBIO, 1992, p. 15).

    Deste modo, tal direito necessita de caractersticas que podem emanar dos direitos civis e polticos, como tambm dos direitos econmicos, sociais e culturais para chegar sadia qualidade de vida, tudo aps a anlise da previso legal e da tentativa do seu reconhecimento, como dito. Ressalte-se, outrossim, que tanto o direito ambiental quanto o direito da criana e do adolescente so direitos de terceira dimenso e so aqueles designados como os de direitos dos povos, de cooperao, de fraternidade e at mesmo de direitos humanos morais e espirituais. Ademais, eles surgiram como resposta dominao cultural e como reao ao alarmante grau de explorao, no mais da classe trabalhadora dos pases industrializados, mas das naes em desenvolvimento por aquelas desenvolvidas e dos quadros de extrema injustia do ambiente dessas naes (LEITE, 2004, p. 293).

    Diante do contexto salutar as palavras de Ayala

    O art. 225, caput, da CF/1988 tambm define um direito fundamental ao meio ambiente como um dos instrumentos que poderia viabilizar esta realidade adicional para o conceito de existncia digna, comprometida com um projeto de justia que no se restringe ao tempo, e que se tem sua definio sujeita reviso permanente das demandas condicionadas por padres intergeracionais de justia. Sob essa configurao de ordem constitucional esboada na experincia nacional, o valor solidariedade, e o objetivo dignidade de vida integram-se neste momento, como partes de um projeto de sociedade, de um modelo de organizao do poder e, sobretudo, como um dos fundamentos de uma Repblica ecologicamente sensvel. (AYALA, 2011, p. 7)

    Especificamente, ento se est diante de um Direito Fundamental e Humano, como afirmado alhures, tal qual o direito vida, liberdade, pois assegurado nas principais declaraes ao nvel internacional e subscrito pela Carta Magna, em momento posterior. Resguarda-se, aqui, ateno especial a Conveno dos Direitos da Criana da ONU, de 1989 ponto fulcral da ligao dos temas da

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    http://revistadostribunais.com.br/maf/app/relationships/document?stid=st-rql&marg=LGL-1988-3&ds=BR_LEGIS_CS;BR_JURIS_CS;BR_DOUTRINA_CS;BR_SUMULAS_CS&disableHighlighting=true&fcwh=true&unit=A.225&unit2Scroll=LGL-1988-3|A.225http://revistadostribunais.com.br/maf/app/relationships/document?stid=st-rql&marg=LGL-1988-3&ds=BR_LEGIS_CS;BR_JURIS_CS;BR_DOUTRINA_CS;BR_SUMULAS_CS&startChunk=1&endChunk=1

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    presente pesquisa de que em seu artigo 29, item 1, letra e, houve previso expressa da necessidade de imbuir na criana o respeito ao meio ambiente e, em seu artigo 24, 2, c previu que a criana tem direito de gozar do melhor padro de sade possvel, com o dever dos estados-membros de erradicar as doenas e o comprometimento na aplicao de tecnologia disponvel e o fornecimento de alimentos nutritivos e de gua potvel, tendo em vista os perigos e riscos da poluio ambiental. (ORGANIZAO, 1989), o que sem dvida corrobora a necessidade de um padro de vida sustentvel e com o direito que os infantes tm de conviver em ambientes livres de tratamentos desumanos, seja pela completude da proteo integral estendida a eles, seja pelas previses legais acima mencionadas.

    Portanto, quer-se instaurar um clima de fraternidade na sociedade, onde todos possam lutar pela concretizao da proteo integral e da preservao ambiental por meio de atitudes sustentveis, pois se acredita no sopesamento dos direitos envolvidos, em especial pelo aspecto antropocentrista dos direitos citados. Fraternidade, pois, como conceito jurdico, como valor maior do que um respeito ao Direito, mas como forma de solidariedade que interpela diretamente o comportamento individual e o responsabiliza pela sorte do(s) irmo(s) (BRITO, 2013, p. 175)

    A fraternidade revela-se como

    valor com condio de possibilidade comum para todas as formas de Sociedade nos diferentes campos de atuao da atividade humana, em uma verdadeira resposta da conjugao de unidade que anseia a humanidade e que foi sinalizada pela trilogia: Libert, egalit, fraternit. (SILVA, 2011, p. 141)

    No plano ideal da existncia humana, pois, necessrio uma reconstruo da fraternidade que parte da compreenso de que o movimento circular de interdependncia mtua entre os trs princpios se dar a partir da vivncia no contexto das relaes humanas, o que acarreta compromissos novos e adequados para a resoluo de problemas que envolvem bem-estar dos outros, que, direta e indiretamente, por consequncia, acabam preservando o prprio bem. (SILVA,

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    2011, p. 141-142) Este um dos desafios do processo de desenvolvimento sustentvel.

    Enfim, retomando o aspecto sob o ponto de vista da Constituio Brasileira de 1988, tem-se que mencionar ainda o 1 do supracitado artigo que traz a imposio ao Poder Pblico de aes com o desgnio de asseverar a efetividade do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Ressalte-se que h um vasto campo de regulamentao infraconstitucional a respeito. Exemplificativamente, pode-se citar o Cdigo Florestal e a Lei de Crimes Ambientais (Lei n 9605/1998).

    Realizados os apontamentos sobre a contextualizao geral do direito ambiental como direito humano e fundamental no Brasil, e demonstrada a aproximao do direito ambiental com a proteo integral ostentada s crianas e adolescentes como direitos fundamentais das presentes e futuras geraes, cumpre fazer o comparativo com o direito de sumak kawsay incorporado na Constituio do Equador, tendo em vista que o desdobramento dos dois temas levaro a mdio e, longo prazo, ao desenvolvimento do direito paz entre as naes.

    3 O ORDENAMENTO JURDICO EQUATORIANO: UMA ANLISE DA NOVA CONSTITUIO DE 2008 E O DIREITO DE SUMAK KAWSAY

    Inicialmente cumpre salientar que se far um conceito do termo sumak kawsay, para somente aps tratar-se do conjunto de direitos estendidos na Constituio de 2008 do Equador que representa uma nova fase do constitucionalismo hodierno.

    Assim, tem-se que sumak kawsay descreve um antigo modo de viver em harmonia no seio das comunidades indgenas, da sua vivncia entre as pessoas e, em especial, desse contato com a natureza. Numa traduo literal significa vida boa ou boa vida. Mas o seu sentido muito mais profundo do que parece a primeira vista, eis que na Amrica do Sul este sentido est embutido nos valores culturais e ticos dos povos, principalmente dos indgenas e, tem sido considerado como uma forma de viver em harmonia no seio da comunidade e do seu contato com a natureza, como dito. (PACHAMAMA, 2013)

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    Ressalte-se que a Constituio do Equador de 2008, foi a primeira Constituio a incorporar os direitos de natureza em seu corpo legal, o que vai alm do reconhecimento do direito ao meio ambiente sadio e equilibrado s presentes e futuras geraes asseguradas pela CRFB/88.

    Neste nterim, cita-se o fato de que a Constituio Equatoriana inova trazendo direitos em sete categorias. De acordo com Baldi apud Santamara (2011)

    um catlogo de direitos que rompe tanto com o geracional (civis e polticos; econmicos, sociais e culturais; terceira gerao) quanto o eurocentrado. Isto fica mais evidente no caso do Equador (ttulo II, arts. 10 a 83) que reconhece sete categorias de direitos: do buen vivir; de pessoas e grupos de ateno prioritria (velhos, jovens, gestantes, pessoas com deficincia, privadas de liberdade, usurios e consumidores, mobilidade humana, enfermidades catastrficas); de comunidades, povos e naes; de participao; de liberdade; da natureza; de proteo; alm de um apartado de responsabilidades. Mas pode ser visto no caso boliviano com a introduo de direitos das naes indgenas e um catlogo de deveres constitucionais (arts. 30 a 32 e 108). (SANTAMARIA, 2011)

    Portanto, este novo ciclo constitucional equatoriano se embasa no protagonismo indgena, se sobrepondo, inclusive sobre o direito/dever dos juzes de paz, o que se pode facilmente aferir no artigo 189 da Constituio da nao citada.

    Neste contexto, Santos (2011, p. 15) destaca que Bolvia e Equador foram justamente os dois pases latinoamericanos que passaram por maiores transformaes constitucionais,

    [...] protagonizadas por los movimientos indgenas y por otros movimientos y organizaciones sociales y populares. No es de extraar, por tanto, que las constituciones de ambos pases contengan embriones de una trans-formacin paradigmtica del derecho y el Estado modernos, hasta el punto de resultar legtimo hablar de un proceso de refundacin poltica, social, econmica y cultural. El reconocimiento de la existencia y legitimidad de la justicia indgena que, para remitirnos al periodo posterior a la independencia, vena de dcadas atrs, adquiere un nuevo significado poltico. (SANTOS, 2011, p.15)

    Portanto, no se trata de uma mera inteno poltica, mas de uma poltica capaz de terminar com a viso descolonizadora e anticapitalista, que seja capaz de romper com o crculo eurocentrista de ditames de direitos, representando uma

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    demostracin viva y realista de las posibilidades creadas por la plurinacionalidad (SANTOS, 2011, p. 17).

    No que tange especificamente ao tema do presente artigo, analisar-se- apenas aqueles dispositivos que contribuam para os direitos de natureza e ao direito da criana e do adolescente.

    Deste modo, o segundo captulo da Constituio Equatoriana comenta os Derechos del buen vivir, dos artigos 12 a 34, englobando direitos elementares gua, soberania da alimentao, ao meio ambiente sadio que seja capaz de assegurar, de modo equilibrado, o bem vivir e, portanto, o direito de suma kawsay, a sustentabilidade, o direito informao e a comunicao, a cultura e a cincia, a educao, ao habitat seguro e saudvel, sade, seguridade social e o direito ao trabalho.

    Adiante, prev, a exemplo do que j assegurou a Constituio Brasileira (art. 227), o mesmo direito proteo integral e ao princpio do melhor interesse s crianas e adolescentes em seus artigos 44-46.

    Especificamente, no artigo 71, trata dos direitos de natureza e do reconhecimento do Pacha Mama8. Pode-se citar ademais, o fato da soberania energtica no se fazer em detrimento da soberania alimentar e do fomento da economia solidria e social (art. 281.1), bem como da proibio de cultivos e sementes transgnicos (art. 401).

    Assim, apresentados os principais artigos, passa-se aos devidos comentrios relativos relevncia dessas modificaes do nvel constitucional Equatoriano.

    Pode-se afirmar que um grande xito das constituies do novo constitucionalismo da Amrica Latina a preocupao com a questo da

    8 Art. 71. La naturaleza o Pacha Mama, donde se reproduce y realiza la vida, tiene derecho a que se respete integralmente su existencia y El mantenimiento y regeneracin de sus ciclos vitales, estructura, funciones y procesos evolutivos.

    Toda persona, comunicadad, pueblo o nacionalidad podr exigir a La autoridad pblica el cumplimiento de los derechos de la naturaleza. Para aplicar e interpretar estos derechos se observaran los princpios establecidos en la Constitucin, en lo que proceda.

    El Estado incentivar a las personas naturales y jurdicas, y a ls colectivos, para que protejan la naturaleza, y promover el respeto a todos los elementos que forman un ecosistema.

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    descolonizao e da importncia dos direitos humanos, como dito anteriormente. Isso fica claro, no caso do Equador, quando revela que a educao uma condio indispensvel para o buen vivir (art. 26) e, que ela deve ser guiada pelo respeito aos direitos humanos, ao meio ambiente e a democracia, sendo intercultural, includente e diversa, impulsionando a igualdade de gnero e a paz (art. 27). Ao mesmo tempo, fica assegurado o direito a aprender em sua prpria lngua e ambiente cultural (art. 29), devendo o Estado promover o dilogo intercultural em suas mltiplas dimenses (art. 28).

    Nas palavras de Prada

    Asumir el vivir bien como un objetivo estatal y de gestin gubernamental, como se ha hecho en las Constituciones de Bolivia y Ecuador, es un acto profundamente descolonizador pues, por un lado, reconoce que la fuente de vivencia de este concepto nos viene desde la cosmovisin indgena, e inspira y recrea otro sentido de convivencia plurinacional para convertirse en el rumbo que orienta nuestra convivencia social, econmica, poltica y cul-tural. (PRADA, 2011, p. 231)

    Destaque-se a viso inversa desse povo. Enquanto todos tendiam a separar os direitos da natureza, eles se preocuparam em mant-los unidos e a desenvolv-los em conjunto. Veja-se nas palavras de Simbaa

    Para ellos, alcanzar niveles altos de civilizacin necesariamente tiene que estar ligado a la naturaleza, porque no es posible entenderse fuera de ella: sociedad y naturaleza son una totalidad. Por lo tanto, concebirse parte de no es sinnimo de barbarie, al contrario. Este es el caso de los pueblos originarios de Amrica; para estos pueblos Abya Ayala no era un continente rico en recursos naturales, sino una tierra de abundante vida; la naturaleza no era un recurso, sino la Pachamama, la madre de todo lo existente. (SIMBAA, 2011, p. 221)

    Assim, o direito de sumak kawsay um grande exemplo de direito construdo historicamente pelos povos indgenas que representa esta ligao revelada acima, ou seja, um direito pautado na harmonia e no equilbrio com a natureza, pois a vida humana no pode ser concebida sem uma adequao ao pacha mama. Por lo tanto garantizar el buen vivir de la sociedad, implica considerar a la Naturaleza como sujeto. (SIMBAN, p. 222)

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    Frise-se que el sumak kawsay, como sistema, del brazo de los derechos de la Naturaleza, exige una reorganizacin y nuevos enfoques en el modelo poltico-

    econmico, lo que transformara a su vez no solo a la sociedad, sino y sobre todo al Estado. (SIMBAN, p. 223)

    Portanto, o ideal de bem viver uma nova perspectiva para encarar o futuro, ou seja, uma nova forma de pensar em desenvolvimento econmico, poltico e social, revelando-se como uma verdadeira crtica aos ideais capitalistas, ou seja, um direito integral. Optar por uma ideologia de bem viver optar por resguardar direitos s presentes e futuras geraes, ponto esse que se aproxima com a Constituio Brasileira, mas est de forma bem mais tmida por assegurar apenas que o direito ao meio ambiente sadio e equilibrado deve ser resguardado s presentes e futuras geraes. Andou bem a Constituio equatoriana ao ampliar o reconhecimento e o significado do bem viver e da me natureza e da resignificao do carter intercultural e interdisciplinar do Estado que precisa pautar-se num conceito de economia plural e anticapitalista.

    Assim, para Prada

    Decir que el vivir bien es un modelo civilizatorio y cultural alternativo al capitalismo y a la modernidad es mostrar plenamente el carcter de un proyecto que contiene la irradiacin de voluntades colectivas, de perspectivas polticas, que apunta a las transformaciones institucionales, econmicas, polticas, culturales. (PRADA, 2011, p. 253-254)

    Portanto, resta o dever de transformar tais desejos em realidade, para que o novo projeto poltico do Equador no passe de uma mera iluso, de que a Constituio Equatoriana enquanto Carta Poltica, seja capaz de conceber uma poltica de Estado compatvel com este momento de transio pluralista, sendo capaz de efetivar as condies interculturais e reconstrutivas desse novo pluralismo.

    Desta maneira, a vista do exposto e, cientes dessa importncia, ocupar-se-, a partir de agora, sobre a relao dos direitos de bem viver com o direito da criana e do adolescente como meio de desenvolvimento desta sustentabilidade s presentes e futuras geraes, ou seja, acredita-se que o Equador, com tais inseres na sua Carta poltica, pode, veementemente, por meio de polticas pblicas fomentar em primeiro plano a melhoria de vida de crianas e adolescentes,

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    para num segundo momento, empreender transformaes sociais a partir de sua conscincia e de sua atuao de preocupaes com um mundo sustentvel incutindo nelas o objetivo da Conveno dos direitos da Criana da ONU, onde se imbua j em 1989, a necessidade do respeito ao meio ambiente.

    , pois, pela via do desenvolvimento de polticas pblicas que se partir para a tentativa de concretizao da educao ambiental e de um direito sustentvel. Por conseguinte, pode-se dizer que a estrutura legal-constitucional do Equador vincula no s o administrador a produzir polticas que respeitem o resguardo dos direitos ambientais como ainda o legislador e o julgador, que ao atuarem, no exerccio de suas funes de Poderes de Estado no podem contrariar os preceitos a que estas normas se destinam, sob o risco de criarem-se normas inconstitucionais e de interpretaes contrrias constituio.

    Deste modo, afirma-se que para o direito humano-fundamental ao meio ambiente equilibrado poder ser realizado, seja no Brasil, seja no Equador, necessrio uma viso humanstica, tal qual a proteo integral ostentada s crianas e adolescentes, ou o direito de sumak kawsay, pois eles devem estar no centro das preocupaes daquele direito. Por fim, atravs de novas posturas sociais, poltica, econmica, filosfica e tica, que se poder assegurar a existncia da educao ambiental capaz de preservar os direitos das presentes e futuras geraes e, em longo prazo, ser capaz de desenvolver atitudes que levem ao direito paz.

    CONCLUSO

    Inicialmente, cumpre salientar que muitos pontos podero ter ficado em aberto, mas que apenas se arrazoou aqueles mais importantes para o desdobramento do tema. A discusso sobre o direito ambiental no pode fugir da contextualizao da teoria e prtica do constitucionalismo contemporneo, j que os novos direitos vm sofrendo o impacto de aglutinao dos problemas essenciais e corriqueiros das condies de vida aceleradas pela expanso do capitalismo. Tal situao estimula e determina o esforo de se propor novos instrumentos jurdicos, novas polticas pblicas, mais flexveis, mais geis, capazes de regular essas novas transformaes.

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    No presente caso, demonstrou-se a caracterizao do modelo constitucional atual, enquadrando-o no neoconstitucionalismo. Foram demonstradas suas caractersticas e preocupaes, bem como os ciclos do constitucionalismo, dos quais se retirou dois exemplos de Constituies para anlise, qual seja, a do Brasil e a do Equador, no que tange a promoo e desenvolvimento do direito e promoo de sustentabilidade ambiental.

    Aps, descreveu-se a relao entre o direito ambiental e a categorizao do direito de crianas e adolescentes como direitos humanos e fundamentais, cotejando a necessidade da preservao ambiental e da garantia dos direitos s presentes e futuras geraes como meio necessrio concretizao dos pilares da teoria da proteo integral.

    No h como negar que a Constituio Federal de 1988 traz a noo de uma cidadania solidria, ou seja, corresponsvel pela definio de que o Estado, por meio da apresentao dos servios e polticas pblicas sejam necessrios, com vistas ao atendimento dos interesses da sociedade, em especial: construir uma sociedade livre, justa e solidria; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalizao e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raa, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminao (art. 3, CRFB).

    Ao final, demonstraram-se os artigos da Constituio Equatoriana sobre o desenvolvimento do direito de bem viver e, portanto, do sumak kausay. Por conseguinte, pode-se dizer que a estrutura legal-constitucional do Equador vincula os trs poderes a execuo de um direito ambiental e com vistas de sustentabilidade, como meio de promoo e reconhecimento da interao com os direitos de natureza. Isto , alm da preocupao ambiental, este Estado, preocupou-se em fomentar o processo de descolonialismo e do antimovimento capitalista.

    Portanto, diante do exposto, os direitos das duas naes, devem ser compreendidos como elementos de reconhecida imprescindibilidade relacional, ou seja, como elemento presente (fundante) nas relaes, seja na relao com o outro singularmente considerado, seja na relao com o outro em termos institucionais, pois por meio da proteo integral e do direito integralizado ao sumak kauwsay

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    possvel viabilizar o sonho de muitos: uma sociedade fomentada e fomentadora da cultura fraterna, da cultura da no violncia e num ambiente de bem viver, sadio e equilibrado.

    REFERNCIAS

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    O DIREITO AO MEIO AMBIENTE SADIO E EQUILIBRADO COMO DIREITO DIFUSO DE CRIANAS E ADOLESCENTES: UM OLHAR DO NEOCONSTITUCIONALISMO SOBRE AS NOVAS INCORPORAES DA CONSTITUIO EQUATORIANA0FTHE RIGHT TO A HEALTHY ENVIROREMNENT AS DIFUSE RIGHT OF CHILDREN AND ADOLENCENTS: AM APROACH OF NEOCONSTITUTIONALISM OVER NEW INCORPORATIONS OF THE EQUATORIAN CONSTITUTIONINTRODUO1 O NEOCONSTITUCIONALISMO E OS VALORES AXIOLGICOS DAS CONSTITUIES2 A PROTEO INTEGRAL ESTENDIDA A CRIANAS E ADOLESCENTES E O DIREITO DIFUSO DE TUTELA DO MEIO AMBIENTE: DESCRIES LEGAIS NO BRASIL3 O ORDENAMENTO JURDICO EQUATORIANO: UMA ANLISE DA NOVA CONSTITUIO DE 2008 E O DIREITO DE SUMAK KAWSAYCONCLUSOREFERNCIAS


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