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PERCIVAL PUGGINA Politica e Subversção Caderno4_5_final

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    CADERNOS DE AO POLTICA

    Poltica

    &Subverso

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    A IMPORTNCIA DA POLTICAA SUBVERSO

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    CADERNOS DE AO POLTICA

    Poltica

    &

    SubversoA IMPORTNCIA DA POLTICA

    A SUBVERSO

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    Reunimos neste caderno Poltica e Subverso, que leva osnmeros 4 e 5 da srie Cadernos de Ao Poltica, dois trabalhos:

    A necessidade da poltica A subversoO primeiro um texto bsico da Fundao Tarso Dutra no

    qual se busca analisar a poltica que temos e as causas dosproblemas que enfrentamos nos planos da Histria, dosinstrumentos e dos critrios de deciso eleitoral. Ao tempo queso apontadas as dificuldades, vo sendo alinhadas as diretrizescapazes de super-las.

    O segundo inclui trs documentos: 1) uma abertura propostapelo ex-ministro Jarbas Passarinho em recente artigo intitulado"Um dilogo"; 2 ) a transcrio de trabalho da Srie Notas,editado pelo Instituto Liberal do Rio de Janeiro, com o ttulo"Subverso da ordem jurdica', que expande certas

    consideraes contidas no artigo anterior, com nfase a aspectosjurdicos do direito de propriedade, aparentemente esquecidosno Brasil; 3 ) artigo, tambm de autoria do ministro JarbasPassarinho, com o ttulo ''A vitrine e a Provncia do Rio Grandede So Pedro".

    A Fundao Tarso Dutra agradece ao IL/RJ pela autorizaoque nos deu para reproduzirmos, aqui, o referido texto.

    Percival Puggina

    Apresentao

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    Sumrio

    A importncia da poltica ........................................... 05

    A subverso .............................................................. 22

    4

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    A

    IMPORTNCIA

    DA

    POLTICA

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    PERCIVAL PUGGINAPresidente da Fundao Tarso Dutra

    Se eu lhe perguntar, leitor, se voc gosta de poltica, provvelque sua resposta seja negativa. Nesse caso eu o felicito por estarlendo um texto que trata de algo de que voc no gosta. Se o faz,

    porque reconhece a importncia de um assunto do qual no estobrigado a gostar mas do qual, queira ou no, dependem, emgrande parte, muitas questes que o afetam individual e social-mente. Com efeito, poucas atividades humanas deixam de terdefinio no mbito da poltica: a educao, a sade, o transporte,a produo primria ou industrial, os servios pblicos ou priva-dos, os preos dos bens, os tributos, a previdncia social, a maior

    parte dos componentes tidos como necessrios para definir maiorou menor qualidade de vida, tm equao, definio, soluo, ouas deixam de ter, no espao daquilo a que chamamos poltica.

    1. A pessoa humana, ser naturalmente poltico

    A pessoa humana um ser naturalmente poltico, ou seja, apoltica nasce da prpria natureza da pessoa, em sua condio deser individual com necessria e indispensvel existncia social.Cada pessoa nica e insubstituvel. nica na sua impresso

    digital e nica nas suas caractersticas genticas, na sua mem-ria, no conjunto das suas experincias e sentimentos. insubsti-tuvel porque arrasta em si uma infindvel cadeia de conjuga-es biolgicas que para ser reproduzida demandaria -

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    gerao por gerao - a reconstruo de toda a espcie humana.Indivduo em relao com outros indivduos, ser em relao

    com outros seres, carente e abundante, que necessita de outros

    que por sua vez necessitam de si, a pessoa humana traz inscritano prprio ser a natureza poltica da sociedade que vai integrar. Apoltica no algo que surge como produto de foras de domina-o, como crem alguns, nem um mero objeto de contratoestabelecido entre os membros da sociedade, como julgamoutros; ela resultado na prpria condio humana. Quanto

    mais o homem avana na sua condio deser em relao comoutros seres mais realiza a prpria natureza e melhor evoluem asinstituies sociais. Num sentido inverso, quanto mais a pessoaregride a condies primitivas, mais se desagrega a sociedade,menos civilizadas se vo tornando as relaes e mais se eviden-cia a ausncia das instituies polticas.

    Ningum sai da poltica por desgostar dela e ningum entra na

    poltica por gostar. Ela um barco onde se ingressa pelo ato dafecundao (decises polticas podem suprimir do feto o direitode viver) e do qual no se sai nem mesmo depois da morte(enterro, direitos sucessrios, etc., so fatos em que a pessoa domorro est envolvida e que tm definio no campo da poltica,assim como nela se definem os prprios efeitos jurdicos de sua

    vontade em atos post mortem). O gosto e o desgosto podemapenas determinar algumas das formas e dos nveis da participa-o poltica, mas no os suprimem. O fato de que muitos creiamque esto fora da poltica apenas desqualifica sua participaoem prejuzo pessoal e geral.

    2. Insatisfeitos, por vrias razes

    Por outro lado, se eu lhe perguntar, leitor, se voc estsatisfeito com a poltica que temos, sua respostaprovavelmente ser negativa. J fiz essa pergunta paramilhares de pessoas em dezenas de cursos de

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    formao poltica e pude observar que no chega a cinco porcento o conjunto dos "satisfeitos". Caberia indagar se esse ndicede insatisfao guarda relao com um elevado nvel de

    exigncia. Ser assim? Tudo indica que no porque pesquisas deopinio pblica a propsito do nvel de satisfao das pessoascom a qualidade da vida que levam mostram que passa dequarenta por cento dos entrevistados o nmero dos que sedeclaram satisfeitos. Note-se que qualidade de vida costuma serobjeto de exigncias superiores e crescentes.

    A questo, em relao poltica, agravada por um elevadonvel de desesperana. Compe-se, assim, um quadro realmentedesalentador, que combina baixa expectativa e grandeinsatisfao. Estamos diante de algo que depende de todos e doqual ningum espera grande coisa.

    Note-se que o subconsciente coletivo costuma produzirresultados. Entre esses resultados, no campo especfico da

    poltica, se alinham: o desapreo pela prpria democracia, queatinge parcela superior a vinte por cento da populao brasileira;a retirada da cena poltica de pessoas que a ela poderiam trazerimportante contribuio; e o conseqente ingresso de outras querespondem por muitos dos desvios que com facilidade podemosapontar.

    3. E a nossa democracia, com vai?

    Quando perguntamos s pessoas se, na opinio delas, o Brasil urna democracia, as opinies costumam divergir - urnasjulgam que sim, outras afirmam que no. Essa aparentecontradio se apoia em diferentes bases de anlise. Quem v ademocracia sob o aspecto formal, sustenta que sim porquenossas instituies polticas tm aspecto democrtico (h

    partidos, eleies, parlamentos, etc.); quem v a democracia sobo aspecto funcional, afirma em contrrio porque, de fato, muitasaes polticas - talvez as principais - no correspondem efetiva vontade da maior parte do corpo social.

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    Voc j viu um alfaiate trabalhando? Quando ele estende opano para riscar sobre o tecido, apenas pessoas afeitas quelaatividade so capazes de identificar o que ele est fazendo. No

    entanto, cortadas as primeiras partes do tecido e iniciada a tarefade costur-las, fica evidente, por exemplo, que ele est fazendoum casaco. Se o alfaiate no for competente, o casaco, vestido

    pelo cliente, apresentar problemas (mangas de comprimentosdesiguais, botes desencontrados das casas, ombros fora do lugare assim por diante). O casaco no deixa de ser um casaco mas um mau casaco.

    A situao, contudo, pode inverter-se. O alfaiate, competente,faz um bom casaco mas o fregus desaprumado. E o resultadoacaba ficando muito parecido com aquele a que conduz a situaoanterior. No muito diferente disso o que acontece com a demo-cracia brasileira: ternos problemas com o alfaiate e com o mane-quim (que, no caso, o corpo social brasileiro). Por isso, precisoavanar um pouco na compreenso do problema, posto que as

    deficincias funcionais de nossa democracia tm urna srie decausas, entre as quais poderamos destacar as causas culturais ehistricas (do corpo social) e as institucionais (de responsabilida-de dos alfaiates).

    4. Jogamos fora a carteira de identidade

    O brasileiro sofre de urna baixa auto-estima que deriva, em

    grande parte, de urna perda de sua prpria identidade. Certasrupturas havidas em nossa histria acabaram por descaracterizar-nos corno povo a ponto de no mais sabermos o que somos. Maisdo que ningum, falamos mal de ns mesmos, de nosso passado,amaldioamos nossas razes ibricas, lusas, e latinas, nossaformao catlica, nossa mestiagem, nosso idioma. Desde oincio deste sculo comeamos a desprezar tudo isso. Ficamos

    dizendo que este pas no tem jeito, que Deus fez um pas maravi-lhoso mas colocou um povinho aqui dentro, queDe Gaulle tinharazoe o pas no srio. Ensinaram-nos que os maiores navega-dores do sculo XVI, com a simultnea pane de todas

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    as bssolas e com o inexplicvel apagamento de todas as estrelas,foram varridos, pela mais fantstica e unidirecional calmaria dahistria, para o outro lado do Atlntico, onde perdidos, ao sabor

    do acaso e para nosso azar, trombaram com o Brasil.Ensinaram-nos que presidirios e prostitutas povoaram oterritrio descoberto, esquecidos de que para aqui tambm veio aelite do pequeno Portugal dedicado gigantesca tarefa decivilizar um continente. Os jesutas, que para c enviaram seusmelhores homens, pessoas como Nbrega e Anchieta, caem navala comum do desprezo que parecemos cultivar em relao aos

    nossos ancestrais. Ensinaram-nos a invejar os que forambafejados pela fortuna de uma cultura anglosaxnica, como sechineses, egpcios, indianos e sul-africanos tivessem colhidograndes frutos junto aos seus colonizadores. bem provvel,tambm, que tenha prosperado em ns a idia de que a expulsodos holandeses consistiu num grave erro de apreciao, o que nosfaria, ao que parece, privados de sua generosa obra civilizadora

    nas Antilhas e na Rodsia.Quem, at hoje, lembrou-se de nos sublinhar o sentido polticopositivo da vinda de D. Joo VI para o Brasil e o que representou ogesto, singularssimo, do assentamento de uma coroa europiafora da Europa? Quem, at hoje, nos valorizou a obra titnica deconstruo de um imprio ultramarino por um pas to diminutoquanto Portugal, ou a integrao que levou tantos brasileiros a

    postos de mando poltico em Lisboa, ou a dignidade do ReinoUnido de Brasil, Portugal e Algarves? Bem ao contrrio, a vindada famlia real nos foi, sempre, apontada apenas como uma fugatemerosa ante a avalanche napolenica. No entanto, aodiscernimento poltico daquele ato que devemos a integridade doterritrio nacional, ao passo que a falta de igual conduta por parteda coroa espanhola se conta entre as causas da diviso do restantedo subcontinente em dezenas de pequenos domnios entregues acaudilhos regionais.

    Vivemos dando sinais de que gostaramos de ser anglo-saxes, materialistas, individualistas e racistas, quando, naverdade, teramos sobradas razes para nos orgulharmos do

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    que somos: latinos e ibricos, cristos e mestios. Nossa origemlatina e ibrica nos faz parte dinmica de uma cultura de influn-cia europia, sim, mas de resultados autnomos. E so esses

    resultados autnomos que descortinam perante ns um horizontede mundo novo. A nenhum outro povo cabe, como a ns, latino-americanos, a tarefa de construir uma civilizao. Tarefa gigan-tesca, multirracial, continental, herana de tragdias e de sonhosde grandeza. Entraremos em nosso sexto sculo ainda como ummundo novo. Prefiro-o assim. De outra parte, somos mestios, oque nos faz um caso singular e exemplar de herana multirracial

    integrada e consolidada, dando ao mundo um exemplo de solida-riedade e integrao observado com espanto por povos quediscriminam e segregam os estrangeiros e os que diferem de suasorgulhosas e pretensiosas maiorias tnicas. E, por fim, somoscatlicos -pela graa de Deus - desde que os descobridores

    plantaram uma cruz nas areias de Porto Seguro e diante dela seajoelharam reverentes para que os espantados nativos, nas

    palavras de Caminha, "vissem o respeito que lhe tnhamos". pena que tais valores sejam, freqentemente, apontados

    como se males fossem, levando-nos a querer ser diferentes do quesomos e a seguir padres culturais em quase tudo opostos aosnossos. Essa crise de identidade, essa baixa auto-estima, esseesprito do "no tem jeito, mesmo", produz conseqncias polti-cas e institucionais. Trocamos - trocamos mesmo - o brilhante

    projeto histrico luso-brasileiro pela periferia do projeto histri-co dos fathers of Amrica. E o justificadssimo orgulho da maiornao dos trpicos cedeu lugar a um desajuizado complexo deinferioridade. Ns mesmos, brasileiros, de modo sinistro, cuida-mos de cultiv-lo para justificar as mudanas polticas do fim dosculo XIX.

    5. Acreditamos em Papai NoelA maior parte dos pases foi constituda de cima para baixo:um monarca estendeu seu poder sobre determinado territrio eimps sua autoridade sobre um certo conjunto de sditos.

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    Poucos pases surgiram por deciso pessoal de sociedadespreexistentes aos governos que neles se estabeleceram. Dentre ospases feitos de cima para baixo o Brasil um dos casos em que

    isso se deu de maneira mais radical. Com efeito, quando Tom deSouza estacionou no litoral da Bahia, em 1549, para assumir afuno de Governador-Geral, trazia em sua bagagem um governocompleto e tudo o que era necessrio para cumprir suaincumbncia, inclusive as Ordenaes (espcie de Constituioda poca). Desnecessrio dizer que o Brasil governado por Tomde Souza era um impreciso territrio, com desconhecida

    populao nativa qual se somavam portugueses embrenhadosna mata em busca de algum Eldorado particular.

    Tivemos governo sem ter povo e o povo, quando surgiu,habituou-se a receber as coisas desde as instncias superiores.

    parte integrante de nossa tradio cultural o costume de esperarque o governo decida e faa em vez de cobrar do governocondies para que a sociedade, ela mesma, assuma seu prprio

    destino. Do banqueiro ao feirante, todos dependem do Papai Noelbrasiliense.

    6. Votamos com srdidas razes

    Diga-me, leitor, quantas pessoas voc j viu votando no ltimosantinho que encontram no cho, prximo ao local de votao(por isso mesmo atapetado por esse tipo de material)? E quantos

    votam no ltimo nome que lhe proclamam aos ouvidos numindispensvel trabalho de "boca de urna"? E quantos vendemseus votos por ternos de camiseta, meia dzia de tbuas, uma latade tinta, algumas telhas, um rancho, pagamento de contas de guae luz, bolsas de estudo, promessas de emprego? Quantos (e talvezesteja a a maior parte da militncia poltico-eleitoral) votam na

    pessoa que mais promete cuidar de seus interesses corporativos,

    sindicais, patronais ou apenas regionais (sem qualquer outrocritrio de honestidade, competncia, liderana, e compromissocom o bem comum)? Quantos elegem quem distribui cadeiras-de-roda, caixo de defunto, armao de culos, remdios,

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    rodadas de cerveja? Quantos -como se o pleito fosse uma escolhado destaque esportivo -votam no treinador do time, no capito, nogoleiro ou goleado r do clube de sua preferncia? Quantos

    transformam o pleito num concurso de beleza, sufragando ocandidato mais vistoso ou a mais vistosa? Quantos votam comdio, contra algo ou algum, desatentos para o fato de que o voto uma sinaleira apontada para o futuro?

    O nmero de bons polticos que temos proporcional aonmero de bons eleitores. E o contingente de polticos

    interesseiros ou venais no desproporcional ao de eleitores comigual carter. Voltaremos a este assunto mais adiante.

    7. As culpas do alfaiate

    O tema institucional no sai da pauta poltica brasileira.Convivemos h longos anos com um intil consenso de que

    precisamos rever nossas instituies. A cada eleio elaboramos

    uma nova lei eleitoral, tornada necessria apenas porque a novalei que rege cada pleito surge como resultado da combinao dosmuitos casusmo locais, regionais e nacionais.

    No temos uma regra permanente para o jogo poltico. Fala-se,com razo, em mudar o sistema de governo pois o

    presidencialismo, num pas pluralista, a frustrada versopoltica da lenda do Papai Noel. Fala-se em estabelecer oprincpio da fidelidade partidria, desatentos para o fato de que ainfidelidade partidria produto de uma regra de jogo que

    permite aos polticos se elegerem em representao de grupos deinteresse. Fala-se em mudar o sistema eleitoral mas o sistemaeleitoral no muda porque a mudana depende da deciso demudar, tomada por congressistas eleitos pelo modelo vigente.

    Quer-se partidos com posies doutrinrias claras mas ospartidos se abrigam sob programas que so, acima de qualquercoisa, boas cartas de nobres e imprecisas intenes, com as quaisningum se compromete alm do discurso.

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    Nosso sistema eleitoral permite que um candidato em eleiesparlamentares (proporcionais) se eleja com os votos obtidosjunto a uma determinada base territorial ou funcional organizada.

    Assim, os grandes grupos de interesse (professores, policiaiscivis e militares, servidores das grandes empresas estatais,corporaes patronais ou sindicais, instituies religiosas,ruralistas, sem-terra, aposentados, inquilinos, proprietrios deimveis urbanos, e por a afora) constituem os grandesinteressados no processo e nas decises polticas. Por isso, os

    partidos vo buscar neles seus candidatos. A quem sero fiis

    esses detentores de mandatos? Ao partido que usaram comocartrio para inscrio de suas candidaturas, ou base eleitoralque os elegeu? Com o que se ocuparo em sua atividade

    parlamentar? Com proporcionar, manter e ampliar os privilgiosde tais segmentos, ou com o bem comum?

    No por outra razo que a maior parte da atividade legislativade origem parlamentar envolve privilgios e a negociao de

    privilgios! E no por outra razo que a estabilidade e aprosperidade de tantas carreiras se constri na destreza emproduzir tais resultados operacionais.

    As cadeiras vazias, em tantas e tantas sesses do CongressoNacional, encontram tambm a sua justificativa. O eleitorcorporativo ou regional mantm um duplo interesse: ele quer queseu deputado cuide bem do que lhe diz respeito e volte correndo

    base para saber o que mais ele deseja. O deputado assim eleito,responde zelosamente a essa expectativa: vota qualquer coisa queconvenha sua base por absurda que seja, e pega o primeiro avio

    para registrar a promissria eleitoral. Do resto ele no emende eem nada lhe diz respeito.

    O eleitor, egosta e interesseiro, jogando o jogo poltico como aregra lhe permite e como bem lhe convm, quer que seu deputado

    tenha essa conduta mida. Mas quer, ao mesmo tempo, que todosos demais tenham a grandeza de cuidar bem do pas, do bemcomum e que permaneam, assduos e atentos em suas cadeiras ...

    Outras regras (como, por exemplo, a do voto distrital misto)

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    conduziriam a um distinto e superior comportamento dos agentespolticos. Inclusive dos partidos.

    8. Qualificar a Poltica

    imperioso qualificar a poltica. Faz-lo tarefa de todos masse constitui, principalmente, em tarefa dos partidos. A cena

    poltica composta por trs elementos: os eleitores, os partidos eos polticos. Cabe aos partidos a mediao entre os outros dois.

    No dia em que os partidos polticos reconhecerem que eles foramsubstitudos pelos grupos de interesse, como agentes intermedi-

    rios do processo, talvez encontrem a as motivaes necessriaspara desencadear as necessrias alteraes que a realidadenacional exige.

    Por outro lado, so os partidos os maiores interessados nafidelidade partidria. E eis a mais uma razo para que eles,

    pondo-se em contato com a opinio pblica, passem a denunciar

    as mazelas do atual sistema e favoream o surgimento de lideran-as comprometidas com as reformas polticas. Qualificar a

    poltica implica colocar esses temas na pauta das discussespartidrias e nacionais.

    A poltica um jogo que se joga sempre. A maior parte doseleitores usa expresses do tipo" na hora da poltica", este ano

    tem poltica", como se poltica fosse sinnimo de eleio. Ora, omais superficial raciocnio mostra que poltica uma coisa eeleio, outra. A eleio uma etapa transitria do processo

    poltico permanente. Portanto, fazer poltica apenas na hora deeleio a mesma coisa que jogar a partida decisiva de um cam-

    peonato que sequer se acompanhou pelos jornais. O resultadodessa irresponsabilidade ou desateno em rudo semelhante aoobtido pelo atleta que se veja na situao correspondente: despre-

    parado, desaquecido, fora de forma, proporcionar um desastrepessoal e coletivo.

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    9. Uma Viso Crist do Poder

    Uma das grandes mudanas culturais que precisamos estabe-lecer entre ns consiste em modificar nossos conceitos sobre oPoder especialmente sobre o poder poltico. Temos como hbitocerc-lo de "excelncias", ao passo que os poderosos, simetrica-mente, reclamam para si reverncias. Mais do que isso, noshabituamos idia de que o poder esteja revestido de privilgios ede que seja to maior quanto mais amplos os privilgios que

    possa distribuir aos que dele se aproximam.

    Ensina o Cristianismo, em contrapartida, que o poder polticodeve ser usado para realizar o bem comum (e isso, por si s, afastaa idia de quaisquer regalias entre os frutos do poder). E ensina,tambm, que todo o poder legtimo, vindo de Deus, deve serusado para o servio do prximo. Como estamos longe disso, no mesmo? Entendido em conformidade com a s doutrina ele seconverte em nobilssima expresso da caridade; exercido como

    se tornou hbito entre ns, ele se converte em fonte de arbtrio,injustia ou violncia.

    No raro os atores da cena poltica parecem rezar s avessas aorao de So Francisco - no s porque tomam maliciosamenteo sentido dos verbos dar e receber - mas porque semeiam dio,desesperana, trevas, dvida, incapacidade de perdoar.

    Por isso, parece importante lembrar o exemplo de Cristo,nico personagem da histria a se apresentar como algum aquem todo poder foi dado no cu e na terra. Note-se que Ele nofalou de "um grande poder na terra" ou de "um grande poder nocu"; ele disse todo poder. Detentor, portanto, desse ilimitado

    poder que lhe permitia multiplicar alimentos e saciar a fome dasmultides, fazer andar os paralticos, fazer ver os cegos, falar os

    mudos, ressuscitar os mortos, perdoar pecados, levar Dimas dacruz ao Paraso, Jesus s o utilizou para servir.

    A partir do exemplo do Mestre, o pensamento cristo semprese preocupou com a questo do Poder, principalmente porque seu

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    exerccio implica, em muitos casos, a capacidade de submeteroutros vontade de quem o detm. Toda sociedade humana sehierarquiza em nveis de poder. Tem poder o pai ou a me de

    famlia, o professor, o presbtero, o chefe de escritrio, ogovernante, o legislador, o juiz.

    Quando refletimos sobre o poder poltico, transparecem suaimportncia e a necessidade de sua legitimidade. Quando nolegtimo, esse poder se torna abusivo; por isso, precisa serlegitimo na origem, no meio e no fim. Na origem, o poder polticose legitima pela democracia e o respeito s leis legitima o poder

    poltico quanto aos meios (a expresso estado democrtico dedireito aponta exatamente para essas duas caractersticas).

    Cabe agora indagar: o que torna legtimo o poder polticoquanto aos fins? So duas as condies indispensveis -arealizao do bem comum e o esprito de servio. Quando a ao

    poltica converge para o bem de alguns em detrimento de todos,surgem desequilbrios, tenses e injustias. E quando exercidosem esprito de servio se torna autoritrio e rejeitado pelasociedade.

    Numa perspectiva sadia, como resultam ridculos osrompances e regalias de que tantas vezes se reveste o poderhumano. E como resulta absurda a conduta de determinadosdisputantes das vagas do poder quando pretendem chegar a elas

    semeando dios, ressentimentos e malquerenas! Tenho dvidas,sinceras dvidas, de que precisaramos realizar eleies se apoltica fosse, efetivamente aquilo que a sociedade tem o direitode esperar dos que a ela se dedicam: um espao de serviodesinteressado ao bem comum. Assim como no so comuns asfilas para servir, tampouco me parece que teramos maiscandidatos do que vagas para as funes pblicas.

    10. A Regra do jogoExistem basicamente dois tipos de interesse dentro da

    sociedade, agindo como importantes molas propulsoras dasaes humanas: a imensa gama dos interesses individuais

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    e os interesses grupais. Os primeiros movem os indivduos e so,muitas vezes, determinados por aspiraes pessoais egosticas;os segundos, movem grupos inteiros e, de certa forma, organizam

    e do coeso social ao mesmo egosmo individual.Na ausncia da poltica e das instituies polticas esse jogo de

    interesses acabaria produzindo conflitos que, no encontrandooutra forma de expresso e mediao, resultariam em violncia edesagregao social. Bem ou mal constitudas, as sociedadeshumanas so, de alguma forma, entes ordenadores das tensesque decorrem de interesses divergentes. Mal constitudas, elas

    estabelecem supremacias e sujeies nas quais o bem de algunsprevalece sobre o bem comum; bem constitudas, elas conse-guem harmonizar os vrios interesses para compor o bemcomum. A definio do contedo do bem comum em cada reali-dade e momento histrico ainda no encontrou formulaoadequada fora dos processos democrticos.

    Os partidos polticos surgem como instituies que organizam

    e exprimem o pensamento social com vistas construo do bemcomum, se constituem como instrumentos do processo poltico eformam quadros dirigentes para o exerccio do poder. evidenteque em tais funes cabe aos partidos, principalmente, operar no

    plano das idias em torno das quais se desenvolveria, em essn-cia, o jogo poltico.

    Evidencia-se, assim, um dos problemas fundamentais dapoltica brasileira: estabeleceu-se entre ns uma apropriao dospartidos pelos grupos de interesse. dentro deles que as legendasbuscam seus quadros, deles que provm os candidatos e so elesque dominam as decises polticas, em prejuzo do bem comum.

    Nossos mais graves desajustes institucionais, as principais crisespolticas, o cotidiano fracasso do bem comum em favor do bemde alguns, a desigualdade perante a lei, a distribuio de privilgi-os, a feroz defesa dos corporativismos e da hipertrofia do estado

    pela esquerda bem como a pertincia com que a direita busca aatrofia dos poderes de estado so expresses desse mesmofenmeno.

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    Precisamos compreender suas causas instrumentais. Seno,continuaremos com uma democracia formalmente mal concebidae costurada com os prprios panos e fios que produzem uma

    representao social comprometida, desde a origem, com osprprios grupos de interesse. E, o que pior, imaginando quetemos azar nas cartas quando, na verdade, o problema est naregra do jogo.

    No estou dizendo novidade. Em qualquer jogo, a regra deter-mina a conduta dos participantes. O futebol, sem a norma doimpedimento, teria menos drible e mais trombada na rea; o

    basquete, sem a regra do tempo jogado, seria um esporte dormenteem que a bola permaneceria mais tempo parada do que em dispu-ta; o vlei, sem rodzio, seria repetitivo e montono.

    Na poltica no diferente. Se o sistema de governo e a leieleitoral induzem representao poltica dos grupos de interesse,teremos raros estadistas e muitos polticos distribuindo privilgi-os para uns e mandando a conta para outros. Se a regra do jogo

    estimula que se elejam porra-vozes de regies, corporaes,sindicatos patronais e de trabalhadores, etc., a mobilizao e amilitncia se dar muito mais nessas reas do que nos partidos. Eser a essas reas e no s respectivas legendas que os polticossero fiis.

    Tambm as cadeiras vazias no Congresso Nacional so conse-qncia da regra do jogo e no da indolncia de muitos. Na medi-

    da em que os congressistas so eleitos para zelar pelos interessesespecficos de seus representados (critrio determinante de suaseleies), eles s estaro atentos aos temas que lhes digam respei-to. E exatamente por isso que tantos votam sem saber o qu ou seausentam quando a pauta lhes estranha. Como a regra vincula odetentor de mandato a uma base eleitoral interesseira, ele fazqualquer negcio por esses interesses e volta correndo base para

    converter a operao em promissria eleitoral.Contam-se nos dedos os polticos ocupados com o bem comum

    porque nada estimula os votantes a terem critrios superiores. E omesmo eleitor que exige a presena do poltico junto a si e se

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    fizeram dela uma lei assim, com um grave pecado originaldecorrente da regra de jogo que selecionou seus elaboradores.

    12. A reforma poltica que queremos

    Como veremos em maior detalhe mais adiante, existem nademocracia aspectos formais e aspectos funcionais. A existnciade partidos, a realizao de eleies, a representao da

    pluralidade social nos parlamentos, por exemplo, so aspectosformais da democracia. Sabe-se, contudo, que tais aspectos soinsuficientes: preciso que as instituies da democracia

    funcionem bem para que uma sociedade seja, de fato,democrtica.

    E a comeam os nossos problemas. A cada eleio fica-se espera de uma nova e sempre diferente lei eleitoral; ela no buscaa perfeio mas o resultado dos muitos casusmo locais,regionais ou nacionais e do poder de articulao desses interessesdentro do Congresso. A necessria reforma poltica, com a

    adoo de regras permanentes, eticamente vlidas e que faam ademocracia funcionar bem, vai sendo adiada, ano aps ano,enquanto se consolida a suspeita da sociedade em relao s suaslideranas e decaem os prprios critrios dos eleitores como

    participantes ativos e decisivos nos resultados de cada pleito.

    Diga-me o leitor se, de um modo geral, no isto O que todos

    os brasileiros queremos: a) reduzir drasticamente o nmero delegendas; b) instituir a fidelidade partidria; c) obrigar os partidosa ter claros compromissos doutrinrios e a agir em coerncia comseus programas; d) acabar com a perniciosa representao

    parlamentar por grupos de interesse; e) assegurar aos governosbases de sustentao parlamentar no necessariamentenegociadas; f) dentro de regras constitucionais claras, possibilitar

    a substituio dos maus governantes (e no apenas dos quepraticam ilegalidades); g) acabar com os atuais currais eleitorais egarantir representao poltica a todas as regies, para quenenhuma fique sem representao ou excessivamente

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    representada; g) proporcionar, tambm, um quadro derepresentao geral, no regional nem classista, formado porpessoas com ampla viso poltica e comprometidas com o bem

    comum, eleitas em mbito estadual; h) acabar com apossibilidade de que os votos dados a algum candidato sirvampara eleger outros em quem no se votou; i) asseguradar ep r e s en t ao m n i ma , r e s t ab e l ece r u ma j u s t a

    proporcionalidade, em todos os estados e regies, entre onmero de representantes e o nmero de eleitores; j) reduzir o

    nmero de congressistas; k) restringir severamente os custos e aspossibilidades de financiamento das campanhas eleitorais.

    decepcionante perceber que malgrado toda a nao anseiepor tais medidas, a pauta poltica se envolva com questesmenores, casustas, eleitoreiras, personalistas e desqualificadas.

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    A

    SUBVERSO

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    JARBAS PASSARINHOPresidente da Fundao Milton Campos,foi senador (PPB-PA) e Ministro de Estado.

    Um pedagogo, dirigente educacional do MST, define amisso deste como: "A construo da nova sociedade socialista,para o que os sem-terra devem ser postos ombro a ombro com osoperrios, pois os camponeses foram peas importantes nos

    processos revolucionrios, desde a Rssia, China, Cuba eNicargua". Prepara futuros quadros nas escolas itinerantes,freqentadas por milhares de filhos dos sem-terra, recebendomacia doutrinao, desde as cartilhas de alfabetizao.

    A revista Isto, h trs anos, publicou reportagem feita numaescola no interior de Santa Catarina, que comprova o objetivo da

    educao nos assentamentos: "Os alunos aprendem a discutirconceitos complicados como luta de classes, reforma agrria eexcluso social... So 40 mil crianas em cerca de mil escolas deprimeiro grau. A pedagogia vai das idias de Paulo Freire s deChe Guevara, Karl Marx, Mao Tse T ung e Antnio Gramsci".Em um assentamento provisrio, na praa pblica de Braslia,

    esse tipo de escola funcionou, ornamentada com posters deGuevara, Mao e Fidel. A rede escolar financiada tambm porcertas ordens religiosas e por ONGs internacionais, com oobjetivo de "preparar o homem novo".

    Um dilogo

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    Esse quadro foi mostrado a um militar estudioso da teoria daguerra revolucionria e a um professor universitrio de tendnciasliberais. O militar comeou por uma observao sinttica: o MST

    cumpre, risca, o mote do Foro de So Paulo, em 1990: "O que foiperdido no Leste Europeu ser reconquistado na Amrica Latina".Mas teme preparar, em vez do "homem novo" revolucionrio, o

    pequenoburgus a partir da posse individual da propriedade. Porisso, vem usando ttica de impacto poltico. Em maio de 2000,cerca de 5 mil militantes ocuparam prdios pblicos ao mesmotempo em 14 capitais. Outros 25 mil foram empregados em

    invases de propriedades rurais ou em marchas to organizadasque fazem inveja aos militares profissionais.Em Braslia, ministrios foram ocupados. Gilmar Mauro, um

    dos lderes nacionais do MST, disse revista Veja: "A vontade denosso povo pegar a foice e descer o cacete". As propriedades

    produtivas passaram a ter o mesmo destino: a invaso, com roubode gado, depredaes e agresses, que bispos habilmente chamam

    de ocupao, como se de terra devoluta fosse. A invaso e o forrna fazenda dos filhos do presidente caracterizaram deboche e adesmoralizao do poder. O ento ministro Raul Jungman,egresso do Partido Comunista, criticou a pedagogia do MST ementrevista: "Um modelo como esse est voltado para a formaode quadros para um projeto poltico e no para a formao decidados. um modelo fracassado, como o usado na Unio

    Sovitica e em Cuba, pas que leva zero em democracia. Falo istocomo socialista que sempre fui e continuo a ser". O MST j noquer terra, mas toda a terra. Consolidou as invases rurais e j temos cadveres que buscou ou fez. Na rea urbana, no vejo

    possibilidade de repetir o movimento estudantil e as grevespolticas de 1968. O movimento religioso dos cristos-marxistas,sim. uma aliana ntida, alimentada pela Teologia da

    Libertao, a estimular as invases. Se Lula no vencer aseleies de outubro prximo, o MST pode tentar a aventura do"foquismo" que marcou a guerrilha do Araguaia. Na teoria daguerra revolucionria, a revoluo j esgotou as fases iniciais. S

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    espera as famosas "condies objetivas", ensinadas por Marx.

    O professor universitrio discorda. No v a menorpossibilidade de um ressurgimento do comunismo. Reconhece a

    escalada violenta do MST, mas no passa de baderna, merabaguna. Da esquerda, no Brasil, so adeptos intelectuais eburgueses da classe mdia. Marx, no Manifesto de 1848, afirmaque a classe mdia no revolucionria, mas conservadora. Os

    pobres, entre ns, votam nos populistas. No h massa parafermentar a revoluo leninista. Discorda de enquadramento do

    MST na lei. Nisso, louva o governo por no agir contra os que sedeclaram revolucionrios. So apenas retricos. Deles arepresso legal faria vtimas e geraria repercusso negativa nosforos democrticos do mundo. De resto, qualquer aventura quetivesse -mas no tem -possibilidade de vencer uma luta armadano Brasil, no duraria em face do imperativo da Nova OrdemMundial, que rejeita qualquer violncia contra os Estados

    democrticos.So duas vises, distintas e antagnicas. Ambas preocupantes.

    O professor raciocina com probabilidade; o militar, compossibilidades.

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    A SUBVERSO DA ORDEM JURDICA*Notas trata habitualmente do exame de projetos de lei que tramitam noCongresso recomendado sua aprovao total, parcial ou sua rejeio.

    Fugindo s suas caractersticas, esta edio faz uma avaliao das agressesconstitucionais cidadania e dignidade dos brasileiros. As agressesperpetradas contra o direito de propriedade ferem uma pedra angular da

    ordem jurdica e econmica.

    H vrios anos o Movimento dos Sem-Terra (MST) vem tentando

    subverter a lgica econmica e jurdica brasileira. Em relao

    primeira, foi muito bem-sucedido desde o incio de suas atividades. A

    inteligentsia nacional caiu rapidamente nos contos da "fixao do

    homem no campo", da "justa e adequada distribuio da terr', da"reforma agrria como fator de reduo da misria rural" e tantos

    outros que foram propositadamente criados. Quanto ordem jurdica,

    apesar das inconsistncias introduzidas na Constituio de 1988, o

    MST pouco conseguiu subverter, at recentemente. Bem ou mal, a

    Constituio Federal assegura o direito de propriedade, e o velho

    Cdigo Civil, de 1916, melhor servio ainda presta a esse antigoinstituto.

    O fato de muitos economistas, jornalistas e intelectuais terem se

    comprometido com o MST no surpreende; 99,99% deles vivem em

    zonas urbanas e, em geral, no tm a menor noo dos problemas

    vividos no campo. O desconhecimento facilita o apoio a qualquer

    Uma Subverso Anunciada

    * Publicao do Instituto Liberal do Rio de Janeiro, reproduo autorizada

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    idia mal justificada. Basta que ela seja simptica ou que tenha aaparncia de ser politicamente correta.

    Os juristas, entretanto, mais por vcio profissional do que por

    virtude, pareciam menos propensos a aceitar incondicionalmente aagenda do MST. De um lado, o Governo Federal implementou um

    plano de Reforma Agrria -de resto l autorizado em lei desde ocomeo do regime militar, pelo Governo Castelo Branco -, quedistribui terras desapropriadas de particulares, a um custo exorbitan-te, sem que se tenha a menor noo de seus resultados (confessado

    pelo ex-ministro Francisco Graziano, em seu livro Qual ReformaAgrria?). De outro lado, o Poder Judicirio, em todas as unidades dafederao, vinha determinando a reintegrao de posse sempre que oMST invadia propriedades privadas. A situao legal do emprego daviolncia pelo MST, entretanto, ganhou novos contornos h poucotempo, depois que uma das cmaras do Tribunal de Justia do RioGrande do Sul negou reintegrao de posse porque o proprietrio no

    comprovou que o imvel de sua propriedade atendia a "funosocial". necessrio, pois, que se faa uma anlise mais detalhada doque estabelece a ordem jurdica brasileira para se compreender averdadeira extenso em que o MST quer (e est conseguindo agora)subverter a ordem legal brasileira.

    De fato, a Constituio Federal asseaura o direito de propriedadeem seu art. 5, inciso XXII, determinando que o mesmo "atender asua funo social" (inciso XXIII). O debate sobre o que seja a"funo social" a propriedade longo e complexo mas aqui caberessaltar apenas que a Constituio Federal no define objetivamen-te o seu contedo, tendo adotado para definir o que seja a "funo

    social" praticamente os mesmos critrios do Estatuto da Terra (Lein 4.504, de 30 de novembro de 1964). Assim, a Constituio, emseu art. 186, estabelece que a "fundo social" da propriedade ruralest cumprida quando, simultaneamente, atende aos seguintes

    A Proteo ao Direito de Propriedade na Ordem

    Jurdica Brasileira - A Constituio federal

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    requisitos: "I - aproveitamento racional e adequado; II -utilizaoadequada nos recursos naturais disponveis e preservao do meioambiente; III - observncia das disposies que regulam as relaes

    de trabalho; IV - explorao que favorea o bem-estar dosproprietrios e dos trabalhadores" (destaques nossos). Observa-seque, exceo do inciso lII, os demais requisitos so de avaliaomanifestamente subjetiva.

    O Estatuto da Terra, outorgado quase 25 anos antes da atualConstituio, foi sua bvia fonte, ao estabelecer tambm quatrocritrios que devem ser satisfeitos simultaneamente para determinarse uma propriedade rural atende sua funo social (art. 2, pargrafo

    primeiro): "a) favorece o bem-estar dos proprietrias e dostrabalhadores que nela labutam, assim como de suas famlias; b)mantm nveis satisfatrios de produtividade; c) asseguraconservao dos recursos naturais; d) observa disposies legais queregulem as justas relaes de trabalho entre os que a possuem e a

    cultivam" (destaques nossos). Como se v, os trs primeiros critrios,repetidos quase ipsis literis pela Constituio, so de avaliaoeminentemente subjetiva. O que significa bem-estar das pessoas?Haveria um nvel mnimo de renda que a propriedade deveria gerar

    para os proprietrios? Ou o que so "nveis satisfatrios" deprodutividade? Como medir esses nveis de produtividade quando aqualidade do solo brasileiro extremamente heterognea, mesmo

    dentro de microrregies? Ou o que se deve compreender porconservao dos recursos naturais? Em que extenso pode-se fazerum desmatamento ou praticar o extrativismo? O uso do agrotxicosno representa uma agresso ao meio ambiente? Quais os critrios

    para avali-lo? O nico critrio objetivo para verificar se a "funosocial" est sendo atendida o ltimo enunciado nesse artigo, quedetermina uma obrigao que, de resto, todos tm que cumprir, em

    qualquer esfera de atuao: a observncia da lei. Em outras palavras,em termos estritamente objetivos nenhuma disposio legalconseguiu adequada e claramente definir o que seja essa "funosocial", bem como nenhum doutrinador foi tambm capaz

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    de faz-lo. O economista e Prmio Nobel de Economia, F. A. Hayek,em longo estudo sobre a "Miragem da Justia Social" (em obraintitulada Direito, Legislao e Liberdade), demonstrou detalhada-

    mente como o emprego dessa palavra "social", conjuntamente comoutra, capaz de esvaziar o seu contedo. Na verdade, tudo o que serefere convivncia do homem em sociedade "social".

    A justia, a linguagem a propriedade, etc., so frutos da interaodo homem e no tem sentido fora da sociedade. A conseqncia disso que a definio do que seja "justia social", "funo social da

    propriedade" , etc., termina ficando ao arbtrio do intrprete da lei. No

    caso dos imveis rurais essa avaliao feita pela Poder Executivo,atravs da burocracia do Ministrio da Reforma Agrria, e quando hum conflito entre o governo e particulares, como mais adiante vere-mos, o conceito de "funo social" preenchido pelo PoderJudicirio, atravs dos Tribunais de Justia dos Estados ou da JustiaFederal. fcil perceber que critrios tcnicos (e h vrios disponve-is para estabelecer nveis de produtividade, bem-estar e preservaodo meio ambiente) podem ser substitudos por critrios meramenteideolgicos, a fim de atender a outros interesses que no sejam osdeclarados pela Constituio ou pelo Estatuto da Terra. Isso temocorrido porque o objetivo do MST no a erradicao da pobreza nocampo, conforme os dados mostrados ao final claramente indicam,mas sim uma vitria ideolgica, ou seja, a extino do direito de

    propriedade sobre um dos meios de produo, a terra. E como aagenda da reforma Agrria monoplio do MST no Brasil, o debate exclusivamente de fundo ideolgico, jamais tcnico-jurdico e muitomenos tcnico-econmico.

    O que resulta evidente, bvio (e por isso muitas vezes difcil de serpercebido), em toda a legislao brasileira, e que o direito de proprie-dade,tout court, assegurado ainda que a atual ordem constitucional

    apresente limites injustificveis, fruto das injunes polticas quedeterminaram a redao da Constituio de 1988 (no se deve esque-cer que o atual texto constitucional foi redigido antes da queda dosocialismo real no leste Europeu e antes que o mundo vivesse

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    a dcada de prosperidade que o livre-mercado proporcionou ao longodos anos 90). Por exemplo no mesmo are 5 da Constituio; determi-na-se que a "lei estabelecer o procedimento para desapropriao por

    necessidade ou utilidade pblica, ou por interesse social, mediantejusta e previa indenizao em dinheiro, ressalvados os casos previstosnesta Constituio (inciso XXIV, destaques nossos). Uma das exce-es previstas na Constituio exatamente a de desapropriao deterras que no estejam cumprindo com sua "funo social", para finsde reforma agrria, que podem ser previamente indenizadas mediante

    pagamento com ttulos da dvida agraria, "com clusula de preserva-

    o do valor real" (art. 184, caput, destaques nossos). Ou seja, odireito brasileiro, em especial a Constituio, embora seja fluida nadefinio do que seja a funo social da propriedade, repudia clara-mente a expropriao. Autoriza, sim, a desapropriao, desde que o

    proprietrio seja previamente indenizado - via de regra em dinheiro -por valor justo ou com ttulos que no percam o seu valor no tempo.

    importante esclarecer, entretanto, que as constituies brasilei-ras do sculo XX, de uma maneira ou de outra, trataram do direito de

    propriedade. Entretanto, na medida que os textos constitucionaisforam se sucedendo (1934, 1937, 1946,1967/69), nota-se que essedireito foi sendo mitigado, chegando-se ao mximo de contradies eambigidades no texto de 1988. Mesmo assim, alguns princpiostiveram que ser preservados, pois a sua excluso representaria uma

    afronta muito grande a direitos consagrados h longa data, inclusiveinternacionalmente. o caso, por exemplo do domiclio, que foipreservado inclusive contra qualquer abuso por parte do Estado (art.5, Xl: "a casa inviolvel do indivduo, ningum nela podendo

    penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrantedelito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, pordeterminao judicial"). A Constituio Federal de 1988 tambm teve

    que manter o princpio consagrado em todos os ordenamentos jurdi-cos de povos civilizados de que "ningum ser privado da liberdadeou de seus bens sem o devido processo legal" (art. 5, inciso LIV,destaques nossos).

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    Esse um dos princpios brasileiros do Estado de Direito, origin-rio do Direito ingls sob a denominao de due process of law, ou seja,trata-se da garantia que os indivduos desfrutam de que no sero

    arbitrariamente despojados de seus bens, inclusive os intangveis,como a liberdade, sem que determinados procedimentos legais sejamobservados e certos direitos garantidos (como o da ampla defesa). Isto, a Constituio Federal procurou manter os brasileiros a salvo doarbtrio dos governantes que eventualmente estejam ocupando cargosrepresentativos ou na burocracia estatal. O art. 5, inciso XXX, paracitar mais um exemplo constitucional, ao assegurar o direito de

    herana, garantiu a transmisso da propriedade imobiliria, quer sejaurbana, quer seja rural. Mas por outro lado essa mesma Constituiointroduziu o imposto progressivo sobre a transmisso de propriedade

    por herana, uma limitao ao direito de propriedade, mas cujaregulamentao infra-constitucional, felizmente ainda no foi capazde limit-lo severamente.

    Em relao especificamente a propriedade de imveis ruraisapesar da ambigidade em algumas passagens da Constituio,estes ainda desfrutam de algum grau de proteo, especialmente

    pelo art. 185, quando declara serem "insucetveis de desapropriaopara fins de reforma agrria (...) a propriedade produtiva", e que "alei garantir tratamento especial a propriedade produtiva". Ou seja,uma propriedade rural produtiva somente poderia ser desapropriada

    por necessidade ou utilidade pblica, (corno por exemplo a constru-o de uma estrada ou de uma usina hidreltrica mas), mas jamaispara transferi-la a uma outra pessoa como decorrncia de umprograma de reforma agrria. E mesmo a desapropriao deveobedecer a um rito especfico (o "devido processo legal") e compen-sar previamente o proprietrio, independentemente da justificativaempregada para a desapropriao. O que temos observado, no

    entanto, que o MST invade propriedades depois que ele prprio as"declara" improdutivas (onde fica o "devido processo legal"?). Maso que de fato se tem verificado que o MST torna essas terrasinvadidas improdutivas ao destruir lavouras, abater cabeas de

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    gado (inclusive matrizes), derrubar cercas e currais e incendiarcampos. Quando expulso dos imveis invadidos, no raro o MSTdeixa para trs um rastro de destruio e prejuzos, sem que os

    responsveis respondam civil e criminalmente por esses atos, comodetermina a legislao ordinria brasileira, como a seguir veremos.

    O Direito de propriedade nos Cdigos Civil e de

    Processo Civil

    A Legislao Civil brasileira, de 1916, que cuida maisdetalhadamente da posse e da propriedade dos imveis, muito mais

    clara e objetiva do que a Constituio Federal. Sem ter sofrido asmitigaes impostas pelos socialistas e sociais-democratas pr-quedado muro de Berlim, o direito de propriedade emerge cristalino emrodas as linhas do Cdigo Civil, que ainda se encontra plenamente emvigor. Relembrar alguns artigos especialmente para os leigos emtemas to ridos, pode ser muito til para formar um melhor juzosobre os recentes acontecimentos protagonizados pelo MST que tm

    vitimado centenas de proprietrios rurais.A propriedade de um imvel se adquire, de acordo com o direito

    brasileiro (Cdigo Civil, art. 530), de apenas quatro formas: 1) pelatranscrio do ttulo de transferncia no Registro do Imvel; 2) pelaacesso; 3) pelo usucapio; e 4) pelo direito hereditrio. O primeirocaso ocorre tipicamente numa compra e venda, quando se lavra acorrespondente escritura; ou quando o poder pblico outorga o ttulode um imvel a um beneficirio da reforma agrria (embora nessecaso haja uma restrio temporria ao direito de transferir a

    propriedade o que habilmente muitos "beneficirios" do programa deReforma Agrria tm conseguido contornar). O segundo caso ocorretipicamente quando o proprietrio constri um prdio sobre umimvel seu j existente; ou atravs de fenmenos naturais, como a

    avulso, que consiste no deslocamento de pedaos de terra por um rio,que se agrega a uma rea j de propriedade de algum. O terceiro casose da quando algum tem a posse mansa e pacfica de um bem aolongo de um determinado perodo. Nesse caso, atravs de um

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    processo judicial, outorgado o ttulo ao detentor da posse, observadoo devido processo legal, conforme tambm determina a ConstituioFederal. O quarto caso consiste tipicamente no direito de herana.

    Ao proprietrio que adquiriu um imvel de acordo com uma dasformas aqui enumeradas assegurado o "direito de usar, gozar edispor de seus bens e do poder de quem quer que injustamente o

    possua" (Cdigo Civil, art. 524). O proprietrio tambm deve cuidarpara que a "funo social" do imvel seja cumprida a fim de no correro risco de uma desapropriao, especialmente em caso de imvelrural (cuja desvantagem consiste em receber uma indenizao em

    ttulos da dvida agrria, e no em dinheiro). Em se tratando de umimvel urbano, o proprietrio que no d uma "funo social" sua

    propriedade fica sujeito, alm da desapropriao (paga em dinheiro), edificao compulsria, a um imposto predial progressivo no tempoou mesmo a uma desapropriao paga com ttulos da dvida pblica(previamente aprovada pelo Senado), "assegurados o valor real daindenizao e os juros legais" (Constituio Federal, art. 182, par-grafo quarto, destaques nossos).

    o Instituto do Desforo PossessrioAs invases de propriedades rurais que tm ocorrido rotineiramen-

    te em diversos quadrantes do Pas, sempre sob o comando e patrocniodo MST, uma flagrante violao da Lei Civil. Isso porque o art. 497 do

    Cdigo Civil estabeleceu que "no induzem posse os atos de merapermisso ou tolerncia, assim como no autorizam a sua aquisio osatos violentos, ou clandestinos, seno depois de cessar a violncia, oua clandestinidade" (destaques nossos).

    O proprietrio que tiver sido privado da posse do seu imveldevido a uma invaso poder recorrer ao Poder Judicirio, para queo este mantenha ou restitua na posse (Cdigo Civil, art 502). Este o

    conhecido instituto jurdico do "esforo possessrio".O proprietrio est autorizado por lei a recorrer a fora fsica para

    garantir a posse de um imvel seu, especialmente quando o PoderPblico no est presente (ou omisso) para proteg-lo. um

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    instituto que guarda grande semelhana com o da legtima defesa. Ouseja, assim como a lei autoriza que uma pessoa se utilize de meios dafora bruta para garantir a sua integridade fsica, ela tambm autoriza

    esse mesmo meio para a garantia da posse de seus bens.Evidentemente que a pessoa que dessa forma se defende no podeempregar meios excessivos, mas deve se limitar ao "indispensvel amanuteno ou restituio da posse", como o prprio Cdigo Civilestabelece.

    O recurso ao Poder Judicirio em casos de invases de terra, porser o procedimento normal e mesmo prefervel em qualquer pasminimamente civilizado, bastante simples e eficaz. O Cdigo deProcesso Civil Brasileiro, que regulamenta as chamadas "aes

    possessrias", estabelece que a vtima de uma invaso deve, perante ojuiz, apenas provar a sua posse, a turbao, o esbulho, bem como adata que este ocorreu (art. 927). Estando presentes esses pressupostosna petio inicial da vtima " o juiz deferir, sem ouvir o ru, a expedi-

    o de mandado liminar de manuteno ou de reintegrao" (art. 928,destaques nossos). Caso os invasores no cumpram a determinao

    judicial, o Juiz dever convocar o uso de fora policial para o seucumprimento (sempre que, para efetivar a execuo, for necessrio oemprego da fora policial, o juiz a requisitar", estabelece o Cdigode Processo Civil em seu art. 579).

    Alm do direito a recorrer ao Poder Judicirio, ou aos prpriosmeios, se necessrio, a fim de reaver a posse, ao proprietrio turbadoou esbulhado a lei assegura o direito a uma indenizao pelos preju-zos sofridos. o que determina o Cdigo Civil em seu art. 141:"havendo usurpao ou esbulho do alheio, a indenizao consiste emse restituir a coisa, mais o valor das suas deterioraes, ou, faltandoeia, em se embolsar o seu equivalente ao prejudicado". Em outras

    palavras, h muito tempo que o MST j deveria ter sido condenadojudicialmente a pagar indenizaes a todos os proprietrios quetiveram as suas terras invadidas e que, via de regra, tiveram planta-es, edificaes e bens destrudos, alm de rebanhos dizimados.

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    Ocorre que os tribunais muitas vezes tomam decises tardias oumesmo contrrias aos legtimos direitos dos proprietrios, sob ainfluncia dos falsos argumentos utilizados pelos que defendem uma

    reforma agrria por razes meramente ideolgicas. A conseqnciadesse estado de coisas a longo prazo de estmulo ao armamento de

    proprietrios rurais, para que eles, por meios prprios, consigamgarantir aquilo que primariamente obrigao do Poder Pblico.Com isso estar se estimulando a anarquia no campo, o que certa-mente um objetivo, ainda que inconfessvel, do MST, mas totalmenteindesejvel numa sociedade que se quer civilizada ou pautada pelo

    Estado de Direito.

    A Invaso de Terras Crime Capitulado pelo

    Cdigo Penal Brasileiro

    Tambm importante ressaltar os aspectos penais da conduta dealguns integrantes do MST, quando ocorre uma invaso. Um grupo desem-terra, ao invadir uma propriedade, fazendo uso da violnciacontra quem tem a posse do imvel, visando obter para si, do poder

    pblico, aquele imvel ou mesmo outro mvel, est claramentepraticando o crime de extorso, que assim qualificado pelo CdigoPenal brasileiro (art. 158): "constranger algum, mediante violnciaou grave ameaa, e com o intuito de obter para si ou para outremindevida vantagem econmica, a fazer, tolerar que se faa ou deixar

    de fazer alguma coisa.O imvel rural que atualmente invadido no pode ser objeto dedesapropriao, mas o funcionrio pblico encarregado da reformaagrria tambm no pode entregar qualquer ttulo de terra a invasores,sob pena de conivncia com o crime de extorso. Se o crime forcometido por duas ou mais pessoas (como sempre ocorre nas invasesde terra), a pena aumentada de um tero at metade.

    H ainda a prtica de outro crime atrelado ao da extorso. Sempreque uma invaso empregar o uso da violncia, causando destruio

    propriedade alheia, tambm estar tipificado o crime de dano (art. 163do Cdigo Penal): "destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia".

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    Tambm no onde ser esquecido outro aspecto de repercusso civile penal da mais alta gravidade, que na verdade representa umaviolao brutal a um dos direitos humanos universalmente

    reconhecidos: as invases de terras geralmente ocorrem na calada danoite, e muitas vezes os invasores no se contentam em ocupar apenasas terras, mas tambm a prpria casa que moram os proprietriosdespertando-os do sono e os expulsando, sempre mediante o empregode violncia fsica. Ora, esse direito no dado nem mesmo ao Estadoque, como estabelece a Constituio Federal, s pode entrar na casade um cidado de dia, por determinao judicial.

    No Brasil deste comeo de sculo XXI assistimos a um movimentoarmado que pratica atos de violncia que nem mesmo polcia, nocumprimento de seu dever legal, so permitidos. Esse movimentocomete crimes e causa prejuzos na mais absoluta impunidade, ante osolhos passivos do Poder Executivo na Unio e dos Estados, a quemcaberia garantir a segurana dos cidados. Como se tudo isso nofosse o suficiente para caracterizar um estado de anomia, como se

    houvesse verdadeiramente uma ausncia de leis, at o PoderJudicirio tem deixado ao desamparo as vitimas de invases violentasde terras.

    Uma Deciso que pode representar o Fim do

    Estado de Direito no Rio Grande Do Sul

    Recentemente, como se mencionou antes, o Tribunal de Justia do

    Rio Grande do Sul, por meio de uma deciso (isolada, a bem daverdade) de uma de suas turmas, inverteu o nus da prova (ou melhor,

    passou a exigir uma prova que a lei no determina que seja feita numaao possessria, determinando que o autor de uma aoreintegratria prove que sua propriedade cumpre a "funo social".Ora, isso quem tem que determinar, no devido processo legal, oPoder Executivo, depois de decretar o imvel de utilidade pblica e

    previamente indenizar o seu proprietrio, antes de realizar umassentamento. A referida deciso parece ter ferido todos os preceitosestabelecidos na Constituio Brasileira, no Cdigo Civil, no Cdigode Processo Civil e at mesmo no Cdigo Penal.

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    A situao no Estado do Rio Grande do Sul ganha contornos aindamais dramticos quando se observa que o cumprimento de decises

    judiciais no ocorre porque, em muitos casos de terras invadidas, o

    Poder Executivo no empresta a fora policial necessria para deso-cup-las, depois que o Judicirio analisou e determinou a restituio aseu proprietrio. De fato, o Poder Judicirio gacho tem determinado,via de regra, a reintegrao de posse como determina a lei, mas oExecutivo tem decidido "negociar" o cumprimento da deciso, comose isso fosse perfeitamente possvel em um Estado de Direito. O MSTtem sido muito bem-sucedido na subverso da ordem jurdica naquele

    Estado da Federao, quer por obter decises ao total arrepio da lei eda Constituio, quer por enfraquecer o Judicirio, que tem ficado aodesamparo quando o emprego de fora se faz necessrio para coibirum ato de violncia.

    A cidadania e a dignidade da pessoa humana so fundamentos doEstado brasileiro, e o direito de propriedade pedra angular da ordem

    jurdica e econmica. A invaso violenta de propriedades, inclusiveresidncias rurais na calada da noite, e a destruio de bens e do meiode subsistncia de famlias, so atos condenados por todo o ordena-mento jurdico brasileiro. Pior ainda as vtimas ficarem ao totaldesamparo, primeiro do Poder Executivo, que no capaz de preveniresses atos que reiteradamente tm-se verificado por todo o territrionacional. Em segundo lugar, por alguns segmentos do Poder

    Judicirio contaminados pelo chamado "direito alternativo", que seesquecem dos princpios do Estado de Direito (que pode ser sintetiza-do como o primado das leis sobre os homens) para abrigarem interes-ses de natureza poltico-ideolgica e no os legtimos interesses doscidados.

    A Subverso do Raciocnio Econmico Promovida

    pelo MSTVistos, ainda que rapidamente, alguns dos aspectos legais mais

    relevantes da subverso legal que o MST tenta promover no Brasil, importante analisar alguns aspectos da j bem-sucedida subverso do

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    raciocnio econmico promovida por esse movimento. De fato, osresultados preliminares do Censo 2000, realizado pelo InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), divulgados no ms de

    maio da 2001 mais uma vez confirmam que o MST no tem o menorcompromisso com a realidade econmica. O Censo concludo no ano

    passado constatou novamente que a realidade rural brasileiraapresenta uma forte tendncia de esvaziamento demogrfico, aexemplo de todos os pases do mundo onde a agricultura encontra-seem desenvolvimento. Assim sendo, pretender implantar um programavisando "fixao do homem no campo" vai na contramo de um

    processo histrico, to inevitvel quanto necessrio.

    O Censo 2000 e a Nova

    Realidade Rural Brasileira

    O primeiro dado do Censo 2000 que chama a ateno sobre arealidade rural brasileira diz respeito evoluo da populao no

    campo nos ltimos 50 anos. De fato, no ano 2000 se verifica que apopulao rural diminuiu em relao existente em 1950, em termosabsolutos. A estatstica comprova: a populao rural brasileira, em1950, era precisamente de 33.161.506 de pessoas. Esse nmerodiminuiu, decorridos exatos 50 anos, para 31.835143 de pessoas. Naverdade, desde o Censo de 1970 vem-se verificando contnuodecrscimo demogrfico no campo. Nos ltimos 30 anos nada maisnada menos do que 10 milhes de pessoas deixaram de viver em zonasrurais (sendo que metade desse contingente deixou o campo nosltimos nove anos, demonstrando que houve uma acelerao noxodo rural brasileiro). A reduo nas populaes rurais ainda maisacentuada quando avaliada em termos relativos. Em 1950, 64,84% da

    populao brasileira morava em zonas rurais. Hoje, esse percentual

    reduziu-se para 18,77%. Esses dados tornam-se ainda maisimpressionantes quando se considera que foi a partir dos anos 70 queo Brasil comeou a abrir as suas maiores fronteiras agrcolas, noCentro-Oeste e no Norte.

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    A Situao Demogrfica de

    So Paulo: Um Caso Exemplar

    A realidade dos deslocamentos humanos em direo aos centrosurbanos brasileiros ainda dever evoluir fortemente nos prximosanos, mesmo que o governo insista em cair na armadilha da "fixaodo homem no campo". Como observa o prprio IBGE, "o acrscimode 26,8 milhes de habitantes urbanos (em relao ao ltimo Censo,de 1991) resultou no aumento no grau do urbanizao, que passou de75,59%, em 1991, para 81,23 em 2000. A maior parcela de

    incremento populacional urbano correspondeu, sistematicamente, aolongo dos ltimos anos, Regio Sudeste que, entre 1995 e 2000,absorveu 38,17% desse incremento". De fato, So Paulo, o estado dafederao mais desenvolvido do ponto de vista agrcola com osmelhores ndices de aproveitamento da terra, acrescentou no Censo2000 a menor populao rural relativa de sua histria e entre osestados: 6,59%. Ou seja, 93,41 % dos paulistas vivem hoje em centrosurbanos. Com essa relao entre populao urbana/rural, So Pauloaproxima-se dos ndices de pases desenvolvidos, onde osagricultores so altamente produtivos, representam uma pequenafrao da populao economicamente ativa e, conseqentemente,dispem de uma elevada renda.

    Na outra extremidade da estatstica, constata-se que as unidades da

    Federao com populaes rurais ainda expressivas (como oMaranho e o Piau, com 40,49% e 37,10%, respectivamente) soexatamente aquelas em que os agricultores dispem da menor renda eesto mais dependentes das variaes climticas. relativamentefcil familiar e de mo-deobra intensiva tornou-se incapaz deremunerar adequadamente a atividade rural. compreender o porquedesse fenmeno: a agricultura s consegue remunerar

    adequadamente o produtor se esse dispuser de capital e de extensesde terra relativamente grandes. A agricultura Hoje, o agricultornecessita mais do que nunca de capital para poder aplicar modernastecnologias nas suas atividades produtivas: a engenharia gentica,

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    a mecanizao, a irrigao artificial, as vacinas o a biotecnologiaexigem enormes investimentos.

    O chamado xodo rural de fato uma situao inevitvel em at

    desejvel. Inevitvel, pois a renda agrcola historicamente e crescen-te. O preo dos produtos agrcolas tende a cair, quer em termosabsolutos, quer em termos relativos. Um dos exemplos clssicos odo decrscimo brutal do preo do trigo em relao aos salrios,observado nos Estados Unidos entre 1800-1980 hoje, o trabalhadormdio norte-americano consome um percentual nfimo de seu salriocom a compra de trigo, quando no passado chegou a gastar ate 35%. A

    crescente produo mundial de alimentos, com o seu conseqentebarateamento, viabilizou o gigantesco crescimento da populaomundial. As estatsticas comprovam que nunca houve no mundo umaquantidade to elevada de pessoas dependendo da produo agrcolade um nmero to pequeno de produtores. Assim, desejvel que omenor nmero de habitantes de um pas se dedique produo dealimentos, para que possam obter uma renda melhor. Por outro lado,esse xodo tambm desejvel, pois atende um anseio primevo dohomem de viver em aglomeraes.

    O Falso Dilema apresentado pelo MST

    Assim, a alternativa oferecida pelo MST completamente falsa. Aopo do homem rural no escolher entre a misria como emprega-do ou desempregado no campo, de um lado, ou continuar no campo

    como assentado, tocando o seu prprio negcio agrcola, de outro. Averdadeira opo entre habitar uma zona rural (onde as chances deobter uma renda razovel so pequena, independentemente de suacondio) ou uma zona urbana (onde as chances so significativa-mente maiores). Se esta ltima opo fosse de fato oferecida aos

    pobres liderados pelo MST, a necessidade de assentamentos ruraispraticamente desapareceria. Basta constatar que a tendncia demo-

    grfica, nos pases de agricultura desenvolvida, ter apenas 1% (umpor cento) da populao economicamente ativa dedicada a produode alimentos. O Estado de So Paulo, como antes se referiu, j estsinalizando claramente nessa direo.

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    O Governo Federal melhor faria se destinasse os recursos dareforma agrria para programas de melhoria e qualificao da mo-deobra que, oriunda do campo, se fixasse em zonas urbanas. Cinco

    milhes de brasileiros mudaram-se para as cidades na ltima dcada,sem a menor assistncia, engrossando os cintures da misria doscentros urbanos. Mesmo assim, para eles, prefervel ser miservelnuma periferia da cidade do que continuar numa zona rural. A provairretorquvel desse fato est na expectativa de vida. As populaesurbanas brasileiras vivem em mdia, segundo os dados do prprioIBGE, dois anos a mais do que as rurais, atestando que as condies

    de sade, saneamento, alimentao, habitao, etc. so melhores noscentros urbanos. Na verdade, uma anlise mais apurada desses dadoscomprova que essa diferena de expectativa de vida diminui quando a

    participao relativa da populao rural tambm diminui. Assimsendo, no Estado de So Paulo a diferena entre a expectativa de vidadas populaes urbanas e rurais praticamente a mesma.

    Desgraadamente, a grande maioria das pessoas que aindapermanece no campo no possui sequer a percepo de que continuarna zona rural - mesmo que num assentamento do MST - significasimplesmente encurtar as suas prprias vidas.

    Concluso

    Pode-se concluir, das informaes e dos fatos aqui acrescentados,que o MST conseguiu com enorme sucesso confundir a opinio

    pblica e at mesmo a elite quanto aos fundamentos econmicos desuas propostas. Apesar das estatsticas disponveis no Brasil e noexterior, a reforma agrria se constitui hoje numa das rarasunanimidades nacionais. Ningum ousa contest-la, ou talvez at

    parea que se trata de um assunto de menor importncia e que no valea pena perder tempo com ela. O modus operandi da reforma agrria,entretanto, vem-se alterando paulatinamente, com o poder pblico

    cada vez mais inerte ante a violncia e o arbtrio das invasespromovidas pelo MST, Primeiro o Poder Executivo sucumbiutotalmente, deixando de reprimir as invases, inclusive sob o olharcomplacente do Ministrio Pblico que, ao que se saiba, jamais

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    processou criminalmente nenhum lder do MST. Nem se tem notciado pagamento de qualquer indenizao pelo MST ainda que se tenhanotcias de seu vultuoso oramento, inclusive de fontes

    internacionais. E, recentemente, deciso isolada do Tribunal deJustia do Rio Grande do Sul parece apontar que caber ao PoderJudicirio jogar a p de cal que falta para o Estado de Direito sejadefinitivamente letra morta da Constituio Federal.

    Recomendao

    Por isso que a situao vivida no estado do Rio Grande do Sulenseja a aplicao da interveno federal, conforme determina aConstituio, para que seja posto "termo a grave comprometimentoda ordem pblica" e "assegurar a observncia dos direitos da pessoahumana' (Constituio Federal, art. 34). Com a interveno federal

    decretada o mais prontamente possvel naquele estado da Federao oEstado de Direito seria restaurado, restituindo-se a necessriaconfiana nas instituies, especialmente o direito de propriedade.Caso contrrio, essa subverso da ordem pode contaminar outrasunidades, com desastrosos efeitos sociais, inclusive com oagravamento da misria no campo, exatamente o contrrio do que

    pregado pelas autoridades do Poder Executivo gacho. Se atualmente

    permitido que se invada um imvel exclusivamente devido sualocalizao geogrfica, amanh estaria legitimada a invaso dequalquer imvel urbano, por movimentos de "sem-teto", ou de "sem-comrcio", ou de "sem indstria", e assim por diante.

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    JARBAS PASSARINHOPresidente da Fundao Milton Campos,foi Senador (PPB-PA) e Ministro de Estado.

    A ambiciosa poltica lusitana de traar as fronteiras do Brasilcolonial no amplo territrio que teria o limite, no norte, a foz do RioAmazonas e, no sul, o Rio da Prata levou a um paradoxo. Enquanto a

    posse da Colnia do Sacramento, afinal perdida, causou gravesembates militares, a Amaznia, que pelo Tratado de Tordesilhas

    pertenceria Espanha, foi conquistada sem luta, seno no campo dadiplomacia com a consagrao do princpio do uti possidetis.Perdemos a fronteira sonhada no Rio da Prata, mas ganhamos umimenso territrio, mais tarde ampliado, no Segundo Imprio, at o RioOiapoque, no norte, e o Acre, no oeste, comprado da Bolvia peloTratado de Petrpolis.

    Na rea meridional, a fronteira continuou, at sua fixaodefinitiva nas lutas contra espanhis e posteriormente contraargentinos. Regou com o sangue, ora de portugueses, ora de

    brasileiros, o solo da Provncia de So Pedro, "a que sangrara maisque codas pela preservao de nossas divisas territoriais, na palavrade Moyss Vellinho. Evoco esse passado glorioso para falar do RioGrande do Sul atual. No por qualquer veleidade de antagonismo

    externo, que isso parece morto e sepultado, mas para refletir sobre opresente poltico, marcado pela vocao guerreira dos gachos e peloseu amor ao Brasil. Na histria poltica do Brasil, o Rio Grande temlugar proeminente. Desde a Proclamao da Repblica, gachos

    A vitrine e a Provncia doRio Grande de So Pedro

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    tm sido a maioria de nossos presidentes, generais formados nacaserna do Rio Grande os mais recentes. Caxias, mais que generalvencedor dos bravos de Bento Gonalves e Canabarro, foi o pacifica-

    dor que, tratando com os Farrapos de igual para igual, selou a Paz dePoncho Verde.

    Hoje, o governo estadual, o da prefeitura de Porro Alegre pelaquarta vez sucessiva, bem como de outros municpios importantes,so administrados pelo PT No Estado a bandeira vermelha domina, oque levou Lula a dizer, com uma ponta de orgulho - e no parece termudado de opinio depois de aderir estratgia da moderao - que "oRio Grande a vitrine do PT". Infere-se da que o padro de governoque adotar, se eleito.

    Como que o PT governa o Rio Grande? Intelectuais, em bomnmero de antigos opositores do regime autoritrio de 1964, denunci-am o governador Olvio Dutra por cercear a liberdade de expresso deadversrios, processar jornalistas que ousam criticar-lhe os atos e de

    ajuizar denncia-crime contra professor universitrio acusado deanlise desfavorvel do governo.

    Dizem-no atrabilirio, com vocao de pequeno dspota. Acusam-no de, a ttulo de democratizar o governo, comprometer a disciplinada Brigada Militar - parte dela levada a Cuba - e impedi-la de garantira ordem interna se petistas estiverem envolvidos. Criticam-no pordesviar recursos pblicos para financiar encontros da esquerda

    internacional. No campo, o MST instalou a baderna com suas inva-ses de fazendas, inclusive as produtivas.

    O ministro Paulo Brossard acusa o governo de conivncia no"esbulho possessrio e de implantar um sistema que visa a destruirsistematicamente os valores polticos fundamentais da democracia, orespeito lei, a segurana da ordem. Aplicado paulatina, mas progres-

    sivamente, por um movimento paramilitar, enfrenta sobranceiramen-te a autoridade da lei e a organizao do Estado". Quando senadorpelo MDB e posteriormente lder da oposio, Paulo Brossardenfrentou bravamente os governos de ento.

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    Emblemtico lutador pelas liberdades Fundamentais, tinha a suapalavra retumbante repercusso na mdia, que lhe oferecia espaonobre.

    Agora, o Rio Grande parece imobilizado em suas fronteiras.Voltou a Provncia, mas sem a flama dos tempos coloniais. Umaespcie de cortina silencia a gravssima denncia, limitando-a aoespao local. O Rio Grande est s. Nem as empresas ruraistradicionais e produtivas escapam fria dos invasores, apoiados naconivncia das autoridades que deveriam combat-la. A Zero Hora, ogrande matutino de Porto Alegre - que tem em Lula um articulistadominical bem pago por ela -, ainda ano passado alertava para o

    perigo de um clima de confronto permanente no campo. "Os avanosalcanados por integrantes do MST", dizia em editorial, "com o apoioexplcito do governo do Estado e de setores do Judicirio aferrados aestratgias de manter o campo sob tenso permanente, tm umcontraponto na reao ruralista." Conclua o prestigioso jornal: "Em

    impasses como o do setor agrrio, o que se espera do governo queatue no como parte, mas como mediador." Perdida a esperana de ogoverno fazer respeitar a lei, os ruralistas intentam organizar-se paradefender suas propriedades, o que pode gerar desfecho extremamente

    perigoso. No h mais segurana para investir na atividade rural.

    A desordem - que tudo indica planejada - chega ao ponto desensibilizar o arcebispo de Porto Alegre. Solidarista, e no

    conservador insensvel s injustias sociais, Sua ExcelnciaReverendssima deixou clara, em diretriz publicada, a suacondenao violncia propriedade legtima.

    Sem garantias das liberdades fundamentais - em que se baseia oEstado Democrtico de Direito -, causador das tenses na cidade e nocampo, incapaz de absorver crticas, logo apelidadas de crime decalnia ou difamao, hospedeiro de guerrilheiros comunistas dasFarc, este o governo do Rio Grande do Sul, a julgar pelas acusaessem resposta convincente. Ser essa a vitrine que Lula acena como

    padro a seguir, caso vena as eleies de outubro prximo?

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    CADERNOS DE AO POLTICA

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