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7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
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Laboratrio de Histria ntiga
U R
ISSN 4 3 5787
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
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A
P O N X
9
Ano 5
Volume 5
Nmero
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
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ISSN 435787
L ABORATRIO DE H ISTRIA NG lU RJ
P O N X
9
no
Volume
Nmero
ll u d
X
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
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Phoinix2009
Ano
15 - Volume 15 NInero ISSN 1413-5787
Copyright by Neyde Them l, Fbio de Souza Lessa e Regina Maria da Cunha Bustamante
(editores)
et alii2 9
TIragem: 1 exemplares
Direitos desta edio reservados :
MAUAD Editora LIda.
Rua Joaquim Silva, 98, 5 andar - Lapa
Rio de Janeiro - RJ - CEP 20.241-110
Te .: (21) 3479-7422 - Fax: (21) 3479-7400
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Laboratrio de Histria Antiga - LHIA
IFCS
UFRJ
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Rio de Janeiro - RJ - CEP 20.051-070
Te .: (021) 2221-0034 ramais 205 e 213 - Fax : (021) 2221-4049
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Projeto Grfico:
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Ilustrao da Capa:
Fachada da Escola Politcnica (Foto : Marc Ferrez, ca . 1905)
Ao lado esquerdo da foto: Ladrilhos hidruli cos do pavimento
do entorno do peristilo (IFCS) (Foto : Regina Bustamante, 2009)
Phoinix . Laboratrio de Histria Antiga
UFRJ
P574 Ano 15, v. 15, n. 2
Rio de Janeiro: Mauad X, 2009 .
Semestral
ISSN 1413-5787
His tria Ant iga. Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Laboratrio de Histria Antiga.
CDD 930
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SS
4 3 5787
PHoiNIX 2009
Ano
15 - Volume 15 - Nmero 2
UNIVERSID DE FEDER L DO RIO DE J NEIRO UFRJ
Reitor
Prof. Dr. Alosio Teixeira
INSTITUTO DE FILOSOFI E CINCI S SOCI IS IFCS
DiretorProf . Dr . Jessie Jane Vieira de Sousa
DEP RT MENTO DE HISTRI
hefeProf. Dr. Fbio de Souza Lessa
L BOR TRIO DE HISTRI NTIG LHI
oordenadora
Prof . Dr . Marta Mega de Andrade
EDITORES
Prof . Dr . Neyde Theml
Prof. Fbio de Souza Lessa
Prof . Dr . Regina Maria da Cunha Bustamante
CONSELHO EDITORI L
Prof. Dr. Andr Leonardo Chevitarese - LHIA I
UFRJ
Prof. Dr. Ciro Flamarion S. Cardoso - UFF
Prof. Dr. Jos Antnio Dabdab Trabuls i - UFMG
Prof. Dr. Gilvan Ventura da Silva - UFES
Prof . Dr . Maria da Graa Ferreira Schalcher Filosofia I UFRJ
Prof
. Dr . Norma Musco Mendes - LHIAI UFRJ
CONSELHO CONSULTIVO
Prof . Dr . Ana Teresa Marques Gonalves - UFG
Prof. Dr. Alexandre Carne iro Cerqueira Lima - UFF
Prof. Dr. Gabriele Cornelli - UnB
Dr. Jean-Claude Gardin - EHESS
I
CNRS (Frana)
Prof. Dr. Jos Manuel dos Santos Encarnao - Universidade de Coimbra (Portugal)
Prof . Dr . Margarida Maria de Carvalho - UNESP
Prof . Dr . Maria Regina Candido - UERJ
Prof . Dr . Marta Mga de Andrade - LHIA
I
UFRJ
Prof. Dr. Pedro Paulo de Abreu Funari - UNICAMP
SERViOS TCNICOS
Vanessa Ferreira de S Codeo
Edson Moreira Guimares Neto
Indexada por: Ulrich s International Periodical Directory
(History, Archaeology, Anthropology and Classical Studies)
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SUMRIO
EDITORIAL 9
SETENTAANOS DE HISTRIA NA UFRJ 1939-2009) 13
Norma Crtes
UMA DISCUSSO SOBRE A LACEDEMNIA 29
Isabel Sant na Martins Romeo
NAVEGADORES EARTESOS HELENOS NO
MEDITERRNEO OCIDENTAL 54
lexandre Carneiro Cerqueira Lima
OS SENTIDOS DA ITINERNCIA DOS
EDOS
GREGOS 62
exandre Santos de Moraes
INTRODUO
HISTRIA DO CRISTIANISMO DO
SUL DO MEDITERRNEO NA PESQUISA DO NT 74
Jos Luiz Izidoro
RESSIGNIFICANDO O LIXO : ANLISE DE UM
MOSAICO DE
S RTOS OiKOS
DA FRICA ROMANA 99
Regina Maria da Cunha Bustamante
MOSES FINLEY E A ESCOLA DE FRANKFURT 114
lexandre Gaivo Carvalho
RESENHAS
REDUZZI MEROLA,
F.
Servo
parere
Studi
sulIa
condicione giuridica degli schiavi vicari e dei sottoposti a schiavi
nelIe sperienze greca e romana Pubblicazioni della Facolt di
Giurisprudenza della Universit di Camerino. Napoli :
Jovene, 1990,305 p 131
Marici Martins Magalhes
VIDAL-NAQUET, P. Atlntida:
pequena
histria de um mito
platnico.Traduo de LygiaArajo Watanabe.
So Paulo: Edunesp, 2008, 214 p 133
Diogo da Silva Roiz
PERFIL DA REVISTA 138
NORMAS PARA PUBLICAO 139
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EDITORI L
Em 2009, o Curso de Histria da UFRJ completou 70 Anos. Atingir
a maturidade dos 70 anos no perder de vista os ideais comumente asso
ciados jovialidade, como a vontade de crescer, de mudar sempre, de estar
sintonizado com as novas vises e/ou posturas. O artigo de Norma Crtes
resgata um pouco desse percurso e aponta novos horizontes com a criao
do novo Instituto de Histria. Que venham os prximos 70 Anos
Ontem e hoje, construmos e reafirmamos a nossa identidade a partir
da diversidade e da pluralidade. Atualmente, temos diferentes opes para
compreender uma sociedade. Por um lado, definindo suas relaes sociais
de produo, a luta de classes e seus conflitos , empregando como concei
tual: dominao, hegemonia, explorao, reformas ou revoluo. Essa foi,
por exemplo, a diretriz seguida pelo historiador norte-americano Finley,
conforme nos apresenta Alexandre Galvo em seu artigo para o presente
nmero da
Phoinix
Por outro lado, podemos tambm utilizar incluso ou
excluso, interaes, apropriaes, capacidade de difundir mensagens e/ou
formas de consumo .Assim, ao lado dos parmetros para nos situar frente aos
outros pelas relaes socioeconmicas e domnio poltico, esto surgindo
novos parmetros que privilegiam uma viso do
u
e do outro a partir
da experincia do quotidiano, objetivando perceber a dissociao crescente
entre o mundo objetivo e o espao de subjetividade, como tratados nos
demais artigos deste nmero da revista.
A questo da identidade na sociedade atual est sendo vigorosamente
debatida nas teorias sociais'. Argumenta-se que as velhas identidades, que
estabilizaram o mundo social por tanto tempo, esto em diluio, dando
lugar a novas identidades e fragmentando o indivduo moderno como sujeito
unificado . Essa denominada crise de identidade vista como parte de
um processo mais amplo de mudana, que est deslocando as estruturas
e desmanchando as armaes que davam aos indivduos e grupos a es
tabilidade no mundo social, ou seja, o conceito de identidades est sendo
descentrado . O mundo contemporneo vive uma volatilizao de sistemas
P OINIX RIO DE JANEIRO
15-2: 9-12, 2009.
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ticos, de identidades e de solidariedades locais . Estas, sendo criaes de
um tempo especfico e, portanto, histrico, so passveis de mudana, de
rearticulaes e, at mesmo, de desaparecimento.
A identidade - que antes oscilava entre a separao de um complexo
mltiplo de unidades definidas pelas suas diferenas e uma estrutura capaz de
absorver uma multiplicidade de variveis e, ainda assim, manter sua unidade
bsica - estaria, agora, sendo abordada como uma relao em que o outro
constitui a identidade do eu . Haveria, portanto, uma relao de alteridade no
processo de identificao.As identidades coletivas envolveriam, ento, sistemas
complexos de interpelaes e reconhecimentos atravs dos quais os agentes
sociais se inscreveriam na ordem das formaes sociais de forma voluntria,
negociada, consensual, imposta e outras.Assim sendo, o conceito de identidade
passa da tica do objeto para a do processo. De identidade para identificao a
partir da relao com o outro , ou seja, da alteridade. Evidencia-se a sensibili
dadepara a singular hibridez das experincias histricas e culturais,afastando-se
de uma perspectiva unitria, monoltica ou autnoma das culturas.
Se as identidades individuais no so algo dado quando do nascimento
do sujeito, mas algo construdo em sua relao com o exterior, muito menos
as identidades culturais so algo preexistente ao sujeito, numa perspectiva
essencialista criticada por Woodward 2000). As identidades so formadas e
transformadas dentro de um contexto social complexo, composto no apenas
de instituies, mas tambm de smbolos e representaes.A constituio de
u comunidade seria capaz de gerar um senso de identidade e aliana e de
construir significados que norteariam e organizariamas aes e auto imagens.
As identidades resultam, portanto, de processos de criao de identificao
e, mesmo as aparentemente mais bvias, abrigam negociaes e conflitos
em permanente curso, pois as identificaes ocorrem no plural , sujeitas a
u diferenciao e hierarquia em relao ao outro . Nesse contexto,
fundamental compreender as estratgias implementadas para a construo
de identidades com a elaborao de modelos de comportamento e valores
que permitam manter unidos grupos de pessoas que, identificando-se cultu
ralmente, reconheam-se como iguais e se distingam dos outros . Deve-se
atentar tambm para as relaes e as divises peculiares de cada cultura
distinta envolvida nesse processo. As formas de identidade e alteridade so
prprias de um contexto histrico e social determinado. Pertencer ou no
pertencer a um grupo ou a uma sociedade
u
construo social e cultural
cujo significado e forma variam no tempo e no espao.
10 P OINIX RlO DE
J NElRO
15-2: 9-12, 2009 .
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Na perspectiva da construo da identidade, situam-se alguns artigos
do presente nmero da Phoinix. Assim,Alexandre Moraes considera as pr
ticas de itinerncia dos aedos gregos como um dos elementos constitutivos
na formao de uma identidade helnica, e Isabel Romeo trata a relao de
identidade e diferena sobre gneros como um vetor para compreender as
prprias construes sociais espartanas tanto das mulheres quanto
da
socieda
de em si. Por sua vez, Regina Bustamante destaca como um tema decorativo
musivo num dos cmodos de recepo das
domus
da elite provincial da
frica Romana pode ser inserido no processo de identificao que permite
evidenciar a pertena deste grupo civilizao romana.
Nos estudos sobre identificao, toma-se imprescindvel observar e
analisar as mltiplas interpenetraes do patrimnio simblico cultural, a
intensa circulao e as apropriaes culturais. Identidade e alteridade cultu
rais rompem com a representao retrica radical da separao de culturas
totalizadas, que vivem ou pretendem viver como se fossem isoladas histo
ricamente, abrindo-se, portanto, para as apropriaes e relaes dialgicas
de interaes e de assimilaes culturais sem deixar de serem reconhecidas
as diferenas. A questo do
deslocamento
e das interaes culturais
tambm analisada em diferentes temporalidades e espacialidades neste
nmero da Phoinix: Alexandre Cerqueira aborda os contatos entre helenos e
etruscos atravs da circulao da cermica, e Jos Luiz Izidoro apresenta as
experincias crists vivenciadas em sua pluralidade, extrapolando o mbito
original da Palestina.
Compreender os distintos processos sociais no mundo antigo em seu
dinamismo e pluralidade o liame que perpassa os artigos aqui apresentados
e, como muito
bem
apontou o poeta mexicano Octavio Paz em seu livro Os
filhos do barro
tambm acreditamos que
a pluralidade depassados torna
plausvel a pluralidade de futuros
Os Editores
efernci s bibliogrfic s
AUG, M. O sentido dos outros: atualidade da antropologia. Petrpolis, RJ:
Vozes, 1999. [original de c. 1994]
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11
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culturais . Petrpolis, RJ: Vozes, 2000 , p. 7-72. [original de 1997]
ot
I A ttulo de exemplo da produo sobre identidade, em fins da dcada de 1980
e na seguinte, quando as repercusses da queda do Muro de Berlim, da desagre
gao da URSS e da formao da Comunidade Europeia ainda estavam bastante
candentes, podemos citar: HALL, 1992, p. 273-326; RAMONET, 1998, p. 33-49;
FEATHERSTONE, 1990; FEATHERSTONE, 1997; GIDDENS e LASH, 1994;
BAUMAN, 1992; HARVEY, 1989; AUG, 1999; TOURRAINE, 1997.
12 P O N X , RIoDE JANEIRO 15-2: 9-12, 2009 .
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SETENTAANOS DE
HISTRIA
NA UFRJ 1939-2009)
.
Norma Crtes
Resumo:
Este artigo apresenta uma sntese da histria dos 70 anos do curso de
Histria da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Palavras chave: Histria; curso de Histria da UFRJ; cronologia
reve histrico do curso de istria
Em 05 de julho de 1937, o presidente da Repblica, Getlio Vargas,
sancionou a Lei 452, que estabelecia a Universidade do Brasil. Essa ins
tituio dava continuidade antiga Universidade do Rio de Janeiro , que
havia sido criada na antiga capital da Repblica, durante a dcada de 1920,
com a justaposio da Faculdade de Medicina, da Escola Politcnica e da
Faculdade de Direito. Dois anos aps o ato presidencial, em maro de 1939,
o ministro da Educao e Sade Pblica encaminhou o projeto de Decreto
Lei que organizava a Faculdade Nacional de Filosofia FNFi . O plano de
Gustavo Capanema contrapunha-se
Universidade do Distrito Federal UDF
- criada em 1935 e idealizada por Ansio Teixeira . Apesar de ter sido uma
experincia inovadora, a UDF durou apenas quatro anos. Mas, por fora do
Decreto-Lei 1.063, de 20 de janeiro de 1939, todos os seus quadros tcnicos ,
*
Professora adjunta de Teoria e Metodologia do Departamento de Histria e do
Programa de Ps-graduao em Histria Social Ppghis da Universidade Federal
do Rio de Janeiro UFRJ . E-mail: [email protected].
PHOlNIX,
RIODE JANEIRO,
15-2: 13-282 9.
13
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corpos docente e discente foram incorporados Universidade do Brasil. Em
4 de abril de 1939, o Decreto-Lei 1.190 constituiu a Faculdade Nacional de
Filosofia, cujas finalidades eram:
a preparar trabalhadores intelectuais r o exerccio das altas
atividades culturais de ordem desinteressada ou tcnica;
b preparar candidatosao magistrio do ensino secundrio e normal;
c realizar pesquisas nos vrios domnios da cultura, que consti-
tuam objeto de seu ensino.
Esse mesmo decreto de criao tambm estabeleceu a organizao da
FNFi em quatro sees fundamentais, a saber:
Seo
de Filosofia, Seo de
Cincias,
Seo
de Letras e
Seo
de Pedagogia. Havia ainda uma seo
especial de Didtica. A Histria estava compreendida na Seo de Cincias
junto e ao lado da Geografia. Diferente do que ocorrera na UDF, a Nacional
de Filosofia reuniu num s curso as duas formaes profissionais. Tratava-se
de novo captulo do processo de institucionalizao do ensino superior de
Histria, que, agora, semelhana dos trad icionais Institutos Histricos e
Geogrficos, vinculava-se aos saberes da Geografia . Na Universidade do
Brasil, a separao entre ambas as disciplinas s ocorreria bem mais tarde,
j
em 1955 - num prenncio do processo de especializao do conhecimento
e da departamenta1izao das estruturas universitrias.
Antes disso, porm, a sociedade brasileira assistiu a importantes transfor
maes sociais, e os professores da Histria foram intrpretes e atores desses
acontecimentos . Um novo modelo de ensino superior se conformava e logo
teria forte preponderncia sobre todo o restante do pas. Criada logo aps a Uni
versidade de So Paulo USP)3, a Nacional de Filosofia encerrava um iderio
de formao intelectual que grassou por geraes de estudiosos e profissionais
em diversos campos de conhecimento, constituindo-se como marco relevante
do desenvolvimento cultural, cientfico e tecnolgico brasileiro. Seu projeto
acadmico ambicionava uma educao universalista e integradora, que, en
tretanto e simultaneamente, distinguia, seccionando numa hierarquia tcita, a
carreira cientfica da vocao para o magistrio. Com efeito, embora legalmente
tivesse a pesquisa como seu objetivo, as atividades dainvestigao em Histria
continuaram restritas aos tradicionais institutos histricos, pois o foco da FNFi
foi prioritariamente voltado
formao para o magistrio - alvo que se tomou
padro para as faculdades de Filosofia nas dcadas de 1930
e
1940.
14 PHOIN[X,
R IO JA NEIRO,
[5-2: 13-28
2 9
.
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Em fins dos anos 1960, com o esgotamento dessa concepo educa
cional que englobava em uma nica instituio todos os ramos do saber e
cujos fundamentos metafisicos e epistemolgicos repousavam na ideia da
Filosofia como a ci ncia primeira , a Faculdade Nacional de Filosofia foi
desmembrada em diversos Institutos especializados, que hoje fazem parte
dos quadro s da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Contudo, e no obs
tante esse desmembramento, a sua memria continua viva
4
sendo referncia
obrigatria para a consolidao da universidade no Brasil.
As primeiras instalaes da Faculdade Nacional de Filosofia foram
no prdio da atual Escola Estadual Amaro Cavalcanti, uma das escolas
pblicas
fundadas pelo Impe
rador Pedro II, que permanece
de p at hoje e est situado no
Largo do Machado - bairro do
Flamengo
foto
esquerda).
Mais tarde ,
porm
, os cursos
da Nacional de Filosofia foram
paulatinamente transferidos para
o edificio Itlia - o edificio foi
enc
ampado
em meados 1942 ,
logo aps o ingresso do Brasil na II Grande Guerra- que ficava na Esplanada
dos Mini strio s, centro do Rio de Janeiro foto direita), bem prximo ao
lugar onde , em 1952, seria instalado o Restaurante Central dos Estudantes
Calabouo . Em maro de 1967, sob o impacto da Reforma Universitria,
o Instituto de Filosofi a e Cincias Sociais IFCS) foi criado pela reunio do
Instituto de Cincias Soci ais ICS/ e dos
Departamentos de Histria e de Filosofia
daquela
antiga Faculdade .
Ma
s log o em
seguida, sob forte oposi o do movimento
estudantil , o recm-criado IFCS foi trans
ferido para a sede do ICS , que ficava
num
a
casa do bairro de Botafogo, cuja propriedade
havia sido da famlia de Joaquim Nabuco,
localizada na Rua Marqus de Olinda, perto
da Livraria Editora Jos Olympio, que j
ento publicava e reuni a os mais express ivos
nomes da inteligncia brasileira. Finalmente,
P
Hoi
NIX. R IO DE JANEIRO, 15-2: 13-28.2009.
15
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em 1969, o curso de Histria mudou-se para o Largo de So Francisco de
Paula, onde, h quatro dcadas, o IFCS est localizado.
Nesse antigo prdio da Escola Politcnica
foto esquerda , seus
docentes tm formado numerosas geraes de professores estudiosos da
Histria. E, desde os anos 1980,
dedicam-se, com igual intensidade
e envolvimento, s atividades da
pesquisa e extenso. Porque, se,
no passado, nos tempos da antiga
Nacional de Filosofia, tais frentes
de atuao foram consideradas
excludentes - j que se preferiu
o ensino
r
o magistrio em
detrimento formao do pesqui
sador - desde a redemocratizao
poltica da sociedade brasileira, assinalando o retomo ao estado de direito
e, mais notadamente ainda, durante os anos noventa do sculo XX - com a
abertura do turno noturno no curso de Graduao 1994 , com a realizao
de sucessivos concursos pblicos para provimento de vagas docentes que
resultaram num impressionante sopro renovador do quadro permanente ,
com a consolidao do curso de Mestrado e a criao do Doutorado nos pro
gramas de Ps-graduao em Histria - enfim, com o somatrio combinado
de todos esses fatores polticos ou sociais e esforos para a reorganizao
institucional e reestruturao acadmica , o curso de Histria da UFRJ tem
se consagrado como um importante ncleo da produo historiogrfica
brasileira e de formao profissional de historiadores.
RONOLOGI SELE ION D
7
92
o Decreto 14.343, de 7 de setembro, institui a Universidade do Rio
de Janeiro - justaposio de trs escolas tradicionais que conservaram as
suas caractersticas originais.
P O i T X
R IO n F I R O
T
2 zx
2 9 ~
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17/138
1931
Reforma Francisco Campos. O governo sanciona um conjunto de
decretos, organizando o ensino secundrio e estabelecendo novo projeto de
ensino superior no Brasil: Decreto 19.850, de II de abril, cria o Conselho
Nacional de Educao; Decreto 19.851, de
de abril, institui o Estatuto
das Universidades Brasileiras, que dispe sobre a organizao do ensino
superior no Brasil, adotando o regime universitrio; o Decreto 21.241 , de
14 de abril, consolida as disposies sobre o ensino secundrio.
1934
Pela primeira vez, a Constituio estabelece que a educao direito
de todos e deve ser ministrada pela famlia e pelos Poderes Pblicos.
Incio das atividades do Conselho Nacional de Educao CNE e dos
Conselhos Estaduais de Educao CEEs .
instituda a Inspetoria de Monumentos Nacionais IPM , primeiro
rgo voltado para a preservao do patrimnio histrico Decreto n. 24.735,
de 14 de julho .
1935
O Decreto 5.513, de 4 de abril, cria a Universidade do Distrito Federal
UDF .
1937
A Constituiode 1937suprime o texto
a educao direito de todos
Lei 452, de 5 de julho: fundao da Universidade do Brasil. SeuArtigo
27 estabelece a natureza dos vnculos entre a Universidade e o Governo,
dispondo que o reitor e os diretores das unidades de ensino seriam escolhi
dos, dentre os catedrticos, pelo presidente da Repblica e nomeados em
Comisso, at que fosse decretado o Estatuto da Universidade.
criado o Servio do Patrimnio Histrico eArtsticoNacional Sphan :
seu primeiro presidente foi Rodrigo de Melo Franco de Andrade.
1938
Ano da fundao da Unio Nacional dos Estudantes UNE .
PHoiNIX. R
E
N
EIRO
15-2: 13-28.2009. 17
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18/138
939
o
Decreto-Lei 1.063 , de 20 de janeiro, extingue a Universidade do
Distrito Federal, e seus quadros so incorporados Universidade do Brasil.
O Decreto-Lei 1.190, de 4 de abril, cria a Faculdade Nacional de Filosofia
FNFi , organizando-a em quatro Sees fundamentais: Seo de Filosofia,
Seo de Cincias, Seo de Letras e Seo de Pedagogia; e Seo Especial
de Didtica.Ao professor catedrtico so concedidos poderes para requisitar,
conforme a necessidade do ensino, um ou mais professores assistentes para
a sua ctedra a vitaliciedade das ctedras foi estabelecida posteriormente,
no Artigo 168 da Constituio de 1946. Vigorando por quase trinta anos, o
sistema de ctedra ser extinto apenas em 1967 .
94
Em 9 de abril, promulgada a Lei Orgnica do Ensino Secundrio,
conhec ida como Reforma Capanema.
946
A nova Constituio determina a obrigatoriedade do Ensino Primrio
e d competncia Unio para legislar sobre as diretrizes e bases da edu
cao nacional. O texto educ o direito de todos volta a figurar na
carta constitucional.
aprovado o Estatuto da Universidade do Brasil. O Decreto 21.321,
de 18 de
julho
, estabelece o ensino e a pesquisa como seus objetivos, e o
regime de tempo integral para os docentes no desenvolvimento dessas ativi
dades. Tambm disps sobre a nova estrutura organizacional da FNFi, que
passava a congregar os seguintes Departamentos: Departamento de Filosofia,
Departamento de Matemtica, Departamento de Fsica, Departamento de
Qumica, Departamento de Histria Natural, Departamento de Histria e
Geografia, Departamento de Cincias Sociais, Departamento de Letras e
Departamento de Pedagogia. A partir de ento , so extintas as Sees na
estrutura acadmico-administrativa da
FNFi
.
O Decreto-Lei 9.092, de 26 de maro, prev alteraes no processo de
formao pedaggica. om dupla orientao, o EL mantinha o formato
adotado pela FNFi, mas tamb m permitia uma nova orientao curricular
suprimindo o curso de Didtica. Os
cur
sos passariam a ter quatro sries
consecutivas, e a formao pedaggica do candidato ao magistrio seria
18
PHoiNIX.
RIO DE JANEIRO.
15-2: 13-28. 2009.
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
19/138
reduzida, transcorrendo simultaneamente ao bacharelado. Ao contrrio da
USP, a Nacional de Filosofia rejeitou a nova modalidade.
O Decreto-Lei 9
0053
amplia o regime didtico das Faculdades de Fi
losofia, tomando obrigatria a existncia dos ginsios de aplicao futuros
Colgios de Aplicao - CAPs o
948
Emjulho, criao da Sociedade Brasileira para o Progresso da Cincia
SBPC): seu primeiro presidente foi Jorge Americano USP).
95
Criao do Conselho Nacional de Pesquisas CNPq) - lvaro Alberto
da Mota e Silva foi nomeado seu presidente. Criao da CampanhaNacional
deAperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior atual Capes): seu primeiro
dirigente foi Ansio Teixeira .
95
Com a criao doMinistrio da Sade, o antigoMinistrio da Educao
e Sade Pblica desmembra-se e passa a se chamarMinistrio da Educao
e Cultura
MEC o
Em 19de novembro, atravs do Processo 5.167, d-se a separao entre
os cursos de Geografia e Histria da Faculdade Nacional de Filosofia.
955
Reunindo intelectuais do Rio de Janeiro e So Paulo, foi criado do
Instituto Superior de Estudos Brasileiros Iseb), cujas finalidades eram o
estudo, o ensino e a divulgao das cincias sociais , notadamente da socio
logia, da histria, da economia e da poltica, especialmente para o fim de
aplicar as categorias e os dados dessas cincias anlise e compreenso
crtica da realidade brasileira, visando elaborao de instrumentos tericos
que permitam o incentivo e a promoo do desenvolvimento nacional .
Decreto 37.608)
958
Sob a inspirao dos ideais divulgados pelo Iseb, foi lanado o Boletim
PHONIX,
RIO DE J ANEIRO,
15-2: 13-28,2009.
19
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20/138
de Histria da Faculdade Nacional de Filosofia
publicao que passou a contar com a participao
de vrios alunos, dentre os quais : Jos Luiz Wemeck
da Silva, Pedro Celso Uchoa Cavalcanti Neto, Pe
dro de Alcntara Figueira, Ondemar Ferreira Dias
Junior, Jos Amrico Motta Pessanha
8
96
Na cidade de Marlia, So Paulo, entre os dias 15 e 21 de outubro, no
I Simpsio dos Professores de Histria do Ensino Superior, fundao da
Associao dos Professores Universitrios de Histria a atual ANPUH).
Seu primeiro presidente foi o catedrtico de HistriaAntiga e Medieval da
Universidade do Brasil, Eremildo Luiz Vianna - que, nessa mesma poca,
tambm exercia o cargo de Diretor da FNFi gestes 1953 - 1963).
Depois de treze anos de intensos debates, em 20 de dezembro, entrava em
vigor a Lei 4.024, que fixou as Diretrizes e Bases da Educao Nacional.
962
Em cumprimento LDB, criado o Conselho Federal de Educao,
que substitua o Conselho Nacional de Educao. O MEC estabelece o
Plano Nacional de Educao e o Programa Nacional de Alfabetizao, sob
a inspirao do mtodo Paulo Freire.
964
Posta na ilegalidade, a Unio Nacional dos Estudantes tem a sua sede
invadida e incendiada.
Em 2 de junho, a Reunio Extraordinria da FNFi foi iniciada com o
comunicado de que as atas das suas ltimas plenrias deixariam de ser lidas,
pois foram requisitadas pela Comisso de Inqurito instalada para averiguar a
acusao de subverso dirigida contra o corpo docente da Nacional de Filosofia.
Constituda no Conselho Universitrio, mas presidida pelo General Acyr Rocha
Nbrega, essa comisso, afirmou o professor Jorge Kingston, findou os seus tra
balhos demodoinfeliz .pois f ezacusaes noseu relatrio ao
ex diretor
Prof
Eremildo
Vianna
[acusadode peculato]
e
Congregao e, nemaomenosaplicou
penalidadesaos estudantes comprovadamente subversivos e desordeiros .
20 PHOINIX, RIo DE JANEIRO, 15-2: 13-28
2 9
.
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
21/138
96
A Lei 4.831, de 5 de novembro, altera as denominaes das Universi
dades Federais situadas nas cidades do Rio de Janeiro e Niteri, que passam
a chamar Universidade Federal do Rio de Janeiro U ~ R J e Universidade
Federal Fluminense (UFF), respectivamente.
Conhecido como Parecer Sucupira , o Parecer CES 977, de 3 de
dezembro, define a natureza e os objetivos dos cursos de Ps-graduao.
966
A UNE decreta greve geral e elege o dia 22 de setembro como o Dia
Nacional de Luta contra a Ditadura. Apolcia invade a Faculdade Nacional de
Medicina: o episdio ficou conhecido como o Massacre da Praia Vermelha.
967
Consolidando diversos instrumentos legais, a Reforma Universitriaj
indicava as suas diretrizes gerais no Decreto-Lei 252 e, ao fim, resultou: na
dissoluo do regime de ctedras, que foram substitudas pelos Departamen
tos (clulas bsicas da estrutura acadmica que passaram a integrar as reas
disciplinares); no estabelecimento do sistema de crditos e das matrculas por
disciplina, findando com as turmas anuais e com as tradicionais matrculas
por srie; na criao dos ciclos bsico e profissionalizante; na extino das
antigas Faculdades de Filosofia, Cincias e Letras.
Sob o mesmo nimo da Reforma Universitria, o artigo 20 do Decreto
Lei 60.455, de 13 de maro, d criao ao Instituto de Filosofia e Cincias
Sociais (IFCS). APortaria 354 (DOU 31/05/1967) designa o professorDjacir
Menezes (1907-1996) como o seu primeiro diretor pro-tempore.
Em 21 de novembro, o primeiro ponto de pauta da segunda Reunio de
Reorganizao do IFCS foi o debate acerca da atitude grevista dos estudan
tes dos cursos de Cincias Sociais Histria e Filosofia desde a transferncia
dos referidos da sede da Faculdade de Filosofiap r este Instituto [situado
na Rua Marqus de Olinda, 64 - Botafogo], dia 26 prximo passado .
A proposta para o novo Regimento do IFCS finalmente estabeleceu
que
o s alunos aprovados no ano bsico dos cursos de bacharelado
p -
dero seguir simultaneamente as disciplinas pedaggicas exigidas p r a
licenciatura .
PHoiNIX,
R
DE JAN EIRO, 15-2: 13-28,2009.
21
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22/138
1968
Desde janeiro, as reunies de Reorganizao do IFCS passam a ser
reconhecidas como reunies de Congregao do Instituto de Filosofia e
Cincias Sociais. A Professora Maria Yedda Leite Linhares, do curso de
Histria, apresenta proposta para formao dos cursos de Mestrado e Aper
feioamento. Em fevereiro, a Professora Marina So Paulo de Vasconcellos,
do curso de Cincias Sociais, toma-se Diretorapro tempore do IFCS. Entre
outras deliberaes, ela apresenta Congregao de maro, uma moo de
solidariedade ao Professor Florestan Fernandes USP que fora forado a
solicitar demisso depois de
anos de magistrio .
Nas ruas do centro da cidade do Rio de Janeiro, em 26 de junho, a
Passeata dos Cem Mil.
Em 3 de outubro, no mesmo dia em
que ocorria a Batalha da Maria Antnio -
briga campal entre os estudantes da USP e
da Mackenzie - o IFCS sofreu um atentado
terrorista
10.
No dia seguinte, em reunio
da Congregao, a diretora do Instituto
nomeia uma comisso r a apurao
dos fatos , informando que as providncias
tomadas abrangem a presena da polcia
tcnica, uma viglia cvica de professores e
alunos, a visita reitoria. Informa tambm
que o reitor autorizou medidas imediatas
para a restaurao dos danos materiais.
Nessa mesma reunio, a professora Ma
rina So Paulo de Vasconcellos discorre sobre a aprovao pelo Conselho
Universitrio do novo Regimento do IFCS .
Atravs dos atos de exceo que culminaram no AI-5, foram cassados
os seguintes professores dos cursos de Cincias Sociais, Filosofia e Histria
da Universidade do Brasil / UFRJ: lvaro Vieira Pinto, Eullia Maria Lah
mayer Lobo , Evaristo de Moraes Filho , Guy Jos Paulo de Holanda, Hugo
Weiss, Lincoln Bicalho Roque , Manoel Mauricio de Albuquerque, Maria
Yedda Leite Linhares, Marina So Paulo de Vasconcellos, Mrio Antnio
Barata, Miriam Limoeiro Cardoso, Moema Eullia de Oliveira Toscano,
Victor Nunes Leal, Wanderley Guilherme dos Santos .
22 PHoiNIX,
RI O DE JANEIRO,
15-2: 13-28, 2009.
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23/138
1969
Entra em vigor o Decreto-Lei 477, de 26 de fevereiro, que
define
lrf raes disciplinares praticadas rprofessores alunos funcionrios ou
empregados de estabelecimentos de ensino pblico ou particulares .
O IFCS foi transferido para o antigo prdio da Escola Politcnica,
situado no centro histrico da cidade, no Largo de So Francisco de Paula.
Antes , na Congregao de fevereiro , a presidente do Diretrio Acadmico
apresenta as reivindica es estudantis para ampliao das vagas do vestibular
e abertura de cursos no turno noturno.
O Parecer CFE 77 regulamenta o Sistema Nacional de Ps-graduao.
9
Em reao crescente demanda por mais vagas, visando resolver a crise
dos chamados excedentes , o Decreto 68.908, de 13 de julho, dispe sobre
o ConcursoVestibular e fixa as condies para a admisso na Universidade,
estabelecendo o carter classificatrio dos vestibulares.
1975
Desenvolvimento do primeiro Plano Nacional de Ps-graduao (I
I NPG), que vigorou durante o periodo de 1975 a 1979.O Conselho de Ensino
para Graduados (CEPG) consolida a legislao atinente Ps-graduao na
U RJ e estabelece a regulamentao dos cursos de Ps-graduao (Reso
luo PG n. 1/75).
1978/1979
A Portaria 505 do M aprova as diretrizes bsicas para o ensino de
Moral e Cvica (EMC) e Organizao Social e Poltica Brasileira (OSPB)
nos cursos de 1 e 2 graus, e de Estudos de Problemas Brasileiros (EPB)
nos cursos superiores.
Em Congregao, o IFCS regulamenta as primeiras iniciativas de
formao de cursos de Ps-graduao em Histria, que
j
estavam em funcio
namento desde 1970, mas s obtiveram a aprovao do P G em 1979.
A Resoluo CFE 07/79 distingue os contedos programticos da dis
ciplina Estudos Sociais, permitindo, a partir das ltimas sries do
Grau,
o seu desdobramento em Histria e Geografia.
ruoxrx R IO DE JANEIRO, 152: 13-28, 2009. 23
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24/138
Em 25 de junho de 1979, a Associao de Docentes da Universidade
Federal do Rio de Janeiro ADUFRJ promove manifestao pela reinte
grao dos pro essores cassados.
198
No incio dos anos 1980, foi formado o primeiro
ncleo de pesquisa do Departamento de Histria: o
Ncleo de Pesquisa e Estudos Histricos NPEH . Pio
neiro, o NPEH foi anterior a qualqu er regulamentao
da UFRJ sobre a formao de Ncleos e Laboratrios de
Pesquisa. Sua formao visava renovar a historiografia
brasileira e as discusses terico-metodolgicas acerca
da escrita da histria, e sinali zou para o propsito de
no dissociar o ensino da pesquisa no curso de Graduao.
Com o objetivo de divulgar conferncias e eventos promovidos pelo
Mestrado do curso de Histria, so public ados
Histria em Cadernos
Du
rante toda a dcada de 1980, essas brochuras circularam e foram um impor
tante veculo para a consolidao das atividades de pesquisa e extenso.
1982
Com seu curso de Mestrado em funcionamento desde 1980, o Programa
de Ps-graduao em Histria Social Ppghis reconhecido pelo MEC e
ter o Doutorado credenciado dez anos depoi s, em 1992. Desde o seu incio,
o Ppghis formou mais de quinhentos estudiosos da Histria, sendo um
consagrado ncleo da produo historiogrfica brasileira.
1985
Jos Luiz Foresti Wemeck da Silva 1932-1995, na chefia do Depar
tamento de Histria da UFRJ , publica A deformao da histria; ou Para
no esquecer Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985 . Em um esforo
para passar a Histria a limpo , o livro reunia depoimentos, a memria e as
interpretaes sobre fatos da histri a recente de importantes historiadores
do Rio de Janeiro.
24
PHo iNIX. R IO DE J NEIRO15-2: 13-28. 2009.
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
25/138
988 1989
o
Artigo 207 da Constituio de 1988 prev que
a s
universidades gozam de autonomia didtico-cientfica [...]
e obedecero ao princip io de indissociabilidade entre
ensino pesquisa e extenso .
Depois de acirrado processo de escolha discente, em
que a sigla Casa (meno a Stuart Angel) foi preterida, o
rgo da representao estudantil do curso de Histria assu-
me o nome de Centro Acadmico Manoel Mauri cio de Albuquerque. (Cam
ma), homenageando o professor do IFCS que fora eassado pelo AI-S.
1994
Apartir do segundo semestre letivo, numa ampliao de 100 na oferta
de vagas do vestibular, o curso de Histria da UFRJ abre um novo turno e
passa a oferecer os cursos de Bacharelado e Licenciatura em dois regimes de
turno: o integral e o noturno. Sob o impulso dessa ampliao, o Departamento
de Histria renova cerca de 70 do seu quadro docente permanente.
1995
Em agosto, o Laboratrio de Histria Antiga (Lhia)
lana o primeironmeroda revista
oinix -
athojeanica
publicao nacional especializada em Histria Antiga. O
peridico caracteriza-se por ser frum isonmico de divul
gao cientfica que busca a peculiaridade das abordagens
historiogrficas brasi leiras, sendo um intermediador do
dilogo entre os estudiosos da Anti
guidad
e brasileiros
e es trange iros .Atualmente, a revista circula em
meio
impress o e em virtual (http
: ww
w.lhia.ufrj .br) .
19
96
997
Aps oito anos de discusses no Congresso Naeional, sancionada a
Lei 9.394, Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nac ional.
Sob a direo da Professora Yvonne Maggie de Leers Costa Ribeiro,
(em ineio a reforma e modernizao das instalaes da biblioteca do IFCS,
Biblioteca Marina So Paulo VasconcelIos.
I HOiNIX, R IO DE J ANEIRO, 15-2: 13-28, 2009.
25
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
26/138
2000
Foi publicado oprimeiro nmero deTopoi. Revis-
ta de Histria, peridicodoProgramadePs-graduao
em Histria Social Ppghis . O peridico objetiva pro
mover o debate intelectual e a reflexono campo
s
Ci
ncias Humanas e Sociais, atravs de recenses criticas
sobre a produo recente e da divulgao de pesquisas
realizadas por especialistas altamente qualificados no
Brasil e no exterior. Desde dezembro de 2008, Topoi
apresenta-se renovada, em formato eletrnico, acessvel
no stio http://www.revistatopoi.org
2002
Com o apoio da Reitoria, o Programa de Ps-graduao em Histria
Comparada PPGHC inicia as suas atividades. Em maio de 2004 , o PPGHC
obtm o credenciamento da Capes, sendo devidamente reconhecido pelo
MEC em 10 de novembro. Rapidamente, em 2007, o PPGHC d incio ao
curso de Doutorado, alcanando o conceito quatro na Capes.
2004
No fim do ano letivo, comea a circular o
Caderno
Universitrio de
Histria
CUH , peridico discente publicado pelos alunos de Graduao.
A partir de ento, o CUH promove uma srie de ciclos de debates acerca das
pesquisas do alunato. Poucos anos depois, em abril de 2008, os mestrandos e
doutorandos de ambos os programas de Ps-graduao do curso de Histria
PPGHIS e PPGHC organizam conjuntamente
Dilogos
Aproximaes:
Seminrio de Pesquisa da Ps graduao em Histria da UFRJ evento
acadmico que reuniu jovens historiadores de todo o Brasil.
2007
O Programade Ps-graduao em Histria Comparada PPGHC lana
a Revista de HistriaComparada em meio virtual http://www.hcomparada.
ifcs.ufij.br/revistahc .A revista caracteriza-sepor ser um espao de publicao
dedicado a: demonstrar a originalidade e a singularidade das abordagens com
parativas nos diversos modelos metodolgicos possveis; estabelecer um lugar
de dilogo de historiadores com os demais saberes ; e garantir a diversidade e
26
PHOINIX,
RI O DE JANEIRO,
15-2: 13-28
,2009
.
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27/138
a qualidade cientfica, sendo, por excelncia, um campo de experimentao
comparada dos resultados de pesquisa, aberta a criticas e sugestes.
9
Em 13 de maio, a Plenria Ordinria do Departamento de Histria
aprova a iniciativa para a autonomia do curso de Histria, indicando os inte
grantes da Comisso Constituinte que iro elaborar o documento de criao
com as diretrizes do futuro Instituto de Histria da UFRJ. Em 27 de agosto,
a Plenria Ordinria do Departamento de Histria aprova a criao do Insti
tuto de Histria da UFRJ. No dia 12 de novembro, o Instituto de Histria
aprovado pela Congregao do IFCS, em reunio extraordinria.
SEVENTY
YEARS OF
HISTORYAT
UFRJ
1939-2009
Abstract: This artic e shows a resume of the 70 years of the Universidade
Federal do Rio de Janeiro s History course
Keywords: History;
U RJs
History Course; chronology
Notas
Este Breve Histrico fragmento de Histria
-
Diretrizes para o novo projeto
acadmico do curso de Histria da U RJ
documento de criao e constituinte do
Instituto de Histria da UFRJ . A sua elaborao s foi possvel graas s pesquisas
da Comisso Organizadora das Celebraes dos setenta anos do curso de Histria
COC-70 , instituda na Plenria Ordinria do Departamento de Histria, em 19 de
maro de 2008, e composta pelos professores Jos Murilo de Carvalho presiden
te , Francisco Falcon titular aposentado , Manoel Salgado Guimares, Marieta de
Moraes Ferreira e Norma Musco Mendes.
2
Para um quadro comparativo entre as concepes de histria que orientaram os pro
jetos acadmico pedaggicos da UDF e da FNFi, ver FERREIRA, Marieta M. Notas
sobre a institucionalizao dos cursos universitrios. ln: GUIMARAES, M. S. Org.
Estudos
sobre
a escrita da Histria. Rio de Janeiro : 7 Letras, 2006, p. 139-I61.
J
Sobre a histria da USP, ver MOTOYAMA, S. Org .
USP
70
anos
- Imagens de
uma histria vivida. So Paulo: Edusp e Centro de Histria da Cincia, 2006 .
P lO
IY
U Ull \c l I lu n
lo
R:
O
7
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
28/138
Sobre a FNFi, ver o importante trabalho de FVERO, M. L. A. (Coord.) Facul-
dade Nacional de Filosofia. Rio de Janeiro: ProedeslUFRJ,
1992 6
v.
5 O Instituto de Cincias Sociai s da Universidade do Brasil, cujo primeiro presiden
te foi Victor Nunes Leal (1914-1985), foi oportunamente criado em 1959, obtendo
recursos em virtude da meta 30 do Plano de Metas do governo JK. A propsito,
cf
FARIA, L. de C. A Antropologia no Brasil. Depoimento sem compromisso de
um militante em recesso. ln : Anurio antropolgico, n. 82. Edies UFC; Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984. Sobre a histria das Cincias Sociais no Rio
de Janeiro, entre outros, ver os trabalhos de Glaucia Villas Bas, particularmente:
VILLAS BAS , G. K.
Mudana
provocada Passado e futuro no pensamento so
ciolgico brasileiro. Rio de Janeiro: Editora da Fundao Getlio Vargas, 2006 .
6 Sobre a histria do prdio da Politcnica, que remonta Real Academia Militar
fundada aps a vinda da famlia real, h uma importante referncia bibliogrfica
de autoria do historiador Mrio Barata (1921-2007), professor emrito do curso de
Histria da UFRJ : BARATA, M.
Escola
Politcnica do
Largo
de So Francisco:
bero da Engenharia brasileira. Rio de Jane iro: Clube de Engenharia, 1973.
7 As informaes para esta cronologia foram compiladas nos arquivos do IFCS e
do Proedes pelos seguintes bolsistas da COC-70, alunos do curso de Graduao em
Histria: Andr Barbosa Fraga, Jorge Moraes, Daiane Lopes Elias, Elizete Gomes
Coelho dos Santos, Daniela Baeta e Fernanda de Souza Antunes.
8
Imagem da capa do segundo nmero do Boletim de Histria
da
Faculdade
Nacional
de Filosofia.
9 Em 28/11/1968, a Lei 5.540 extingue a estrutura das ctedras nas instituies de
ensino superior brasileiras. A Lei 5.540, de 28/11/1968, fixa normas de organiza
o e funcionamento do ensino superior e sua articulao com a escola mdia. O
Decreto-Lei 464, a Reforma Universitria, fixa normas para incremento de matri
culas no ensino superior.
10 Sobre o atentado terrorista, Gilberto Velho, ento aluno, recorda: Marina
j
diretora
{ ..]
jogaram uma bomba na Marqus de Olinda. Essa bomba explodiu naquela rvore
que ainda est l nojardimda Marqus de Olinda 64. Apud R EIRO A. M.Marina
de Vasconcellose o IFCSIUFRJ em tempos extraordinrios:AI-5, represso, conflitos e
o sentido da universidade pblica.
ln:
MUNTEAL
et alii.
(Org.) Tempo negro, tempe
ratura sufocante - Estado e sociedade no Brasil doAI-5. Rio de Janeiro: Contraponto,
2008, p 248. Tombada pela Prefeitura, a rvore, um belo espcime de pau-ferro plan
tado em 1867, permanece intacta at os dias de hoje (foto da pgina anterior); a casa,
contudo, foi demolida e deu lugar a um moderno edificio residencial.
11 Imagem da capa do livro de LOBO, E. et alii. (Org.) Manoel Mauricio de Al
buquerque:
mestre-escola bem-amado; Historiador maldito. Obra pstuma. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1987, 236p.
PHOlNIX R
O
JANPIR O 1 .? 200 1
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UM DISCUSSO SO RE L CEDEMNI
.
Isabel
Sant
Ana Martins Romeo
Resumo:
Adaptao doprimeiro captulo de minha dissertao este artigopretende
introduzir alguns questionamentos baseados na historiografia recente
sobre a posio e a atuao da esposa bem nascida espartana no perodo
compreendido entre os sculos Ve VI a.c.
Palavras chave: Esparta; Histria Comparada ; gnero discursos de
identidade.
tulo sugestivo deixa claro nosso objetivo neste artigo: discutir os
discursos. Entretanto, os discursos aos quais nos referimos limitam-se
historiografia. Mas por que ela? Para respondermos, vale relembrarmos um
pouco o paradigma ps-moderno.
Na introduo de Domnios da Histria Cardoso escreve sobre a
influncia ps-modema nos estudos voltados para Histria como contra
ponto do paradigma iluminista , que buscava uma Histria com aspiraes
cientficas e racionais .
Acreditava se que fora de tal atitude bsica o saber histrico no
responderia s demandas surgidas da prxis socialhumana no que
tange existncia e experincia dos seres humanos no tempo
nem seria adequado no enfoque da temporalidade histrica como
objeto. CARDOSO, 1997, pA)
Mestre em Histria Comparada pelo Programa de Ps-graduao em Histria
Comparada PPGHC da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ .
P oiNIx RIo DE JANEIRO,
15-2: 29-53, 2009.
29
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30/138
Crticas apontavam falhas no paradigma iluminista . Censuravam a
ideia de progresso e a prpria racionalidade dos discursos historiogrficos
medida que reconheciam o poder nos prprios discursos.Alm disso, mui
tos estudiosos incomodavam-se com a falta de preocupao da Histria com
o indivduo, o subjetivo. Os ltimos anos do sculo XIX caracterizaram-se,
ento,
por
um mal-estar terico e epistemolgico entre os cientistas naturais,
similar aos cientistas sociais da atualidade CARDOSO, 1997, p l3
Ento, comea a construo do paradigma ps-moderno , quando se
declarou a morte aos centros - centro entendido como lugar de fala - pois
todas as posturas no so legtimas ou naturais, mas articulam interesses,
vises particulares imersas em poderes.A Histria cede terreno s Histrias.
Assim, compreenderam que:
od s
as represent es humanasde todosostipossosimbolicamente
mediadas. Em outraspalavras, o conhecimento humanoem todasas
suasformas tema ver com linguagens nosentidosemitico: verbais
tanto quanto no-verbais e processos de significao semioses .
CARDOSO, 1997,
p l8
Assim, o anseio pela verdade abriu caminhos para a aceitao de mlti
plos olhares e de diversas verdades graas ao reconhecimento da historicidade
da prpria Histria. Essa trilha reconheceu, na prpria historiografia, uma
construo. E, com esse ponto clarificado, respondemos nossa primeira
pergunta .
Como amaioria dos estudiosos, nosso primeiro contato com as esposas
lacedemnias foi atravs da historiografia, na qual o esteretipo de liberda
de e autonomia jamais conquistado por nenhuma outra mulher no mundo
antigo era, e ainda , muito latente. Construes, evidentemente embasadas
na documentao escrita do mesmo perodo. Porm, ao retornarmos a esses
escritos, uma nova interpretao aconteceu, no que esta seja especifica
mente revolucionria ou coisa parecida: um novo olhar, uma constatao
interessante e capaz de transformar as construes e consideraes geradas
ao redor dessas mulheres.
Dedicamo-nos a essas construes historiogrficas porque, muitas
vezes, elas direcionam olhares dos historiadores e criam a verdade . Os
olhos ficam to acostumados a certas relaes e percepes, que acabam
direcionando as pesquisas para lugares conhecidos. No entendemos esse
7/25/2019 Phonix, 2009 - V. 5, N. 2
31/138
adestramento como algo negativo, muito pelo contrrio, preciso estabe
lecer princpios bsicos e aceitos para um maior aprofundamento nos objetos
de pesquisa. Sem eles, haveria uma dificuldade maior para avanarmos nos
estudos. A obra historiogrfica , pois, uma das formas possveis de repre
sentao
do passado, o que leva a dar relevncia , e submeter a discusso ,
dois conceitos: verdade e verossimilitude (VALDIVIESO, 2004, p.14) .
Trabalhando de forma qualitativa e, com uma historiografia geralmente
recente, percebemos uma forte vinculao dos estudos sobre as esposas
espartanas e a histria de gnero .
Foi definitivamente na segunda metade do sculo XX que a Histria
rendeu-se a temas e grupos sociais at ento excludos. Em muitos casos
relacionados aos movimentos feministas , o estudo das mulheres no Brasil
ganhou fora na dcada de 1980 e modificou de vez a antiga forma de se
fazer Histria. At finais de 1970, os historiadores sociais compreendiam
mulheres como uma categoria homognia de pessoas biologicamente
femininas que, apesar de contextos e papis sociais diferentes, existiam
enquanto essncia inaltervel (SCOTT, 1995; BURKE, 1992; SOIHET,
1997; TILLY, 1994).
As tenses na disciplina Histria dasMulheres
2
aparecemjusto quando
questionam essa categoria essencial e reconhecem as mulheres enquanto
mltiplas e diferentes. Emerge da a Histria de Gnero, a pala vra [que]
indica uma rejeio ao determinismo biolgico implcito no uso de termos
como sexo ou diferena sexual (SOIHET, 1997, p.279).
Partindo do pressuposto de que compreender interpretar e que toda
compreenso depende dos contextos e jogos lingusticos preexistentes que
so expressos nos discursos , s escapamos da homogeneidade do discurso
dominante, quando percebemos ali mais que um ponto de vista: uma cons
truo de uma verdade imersa num conjunto delas. Nesse caso, como to os
os atores sociais , as mulheres so construes discursivas .
Seja como for, a histria de gnero sempre relacional, obrigando
os estudiosos a uma estratgia metodolgica relacional (de comparao) e
poltica. Apesar de muitos historiadores discordarem desse ltimo ponto,
entendemos todas as histrias sob o aspecto de histria poltica, como ex
presso de um olhar, de uma interpretao e enquanto escolha de um sujeito
de conhecimento em relao a documentao, bibliografia, mtodos, teorias
e vises de mundo que, obviamente, influem no trabalho final.
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No se trata de estudarmos experincias, mas construes, isto , com
preender os homens e as mulheres espartanos como categorias discursivas,
produto s culturais dotados de intenes e poderes que se reproduzem e se
transformam pelo tempo .
Percebendo o processo de socializao do gnero , a conscincia social
do papel de cada ator social inculcada em meninos e meninas , elaborada
por discursos e linguagens prprias, compreendemos as relaes de poder
e negociao estabelecidas entre os sexos e ratificadas socialmente. Com a
relao de identidade e diferena sobre gneros, estabelecida no espao de
fala, exposta, fica mais acessvel vivenciar as prprias construes sociais
espartanas, tanto das mulheres quanto da prpria sociedade em si.
A Historiografia e os modelos de Esparta
Em um artigo de agosto de 2002 , ainda balanado com o ataque s
torres gmeas do WTC, Paul Cartledge escreve o artigo intitulado
oie
or
CARTLEDGE, 2002) que, no portugus tosco, poderia ser traduzido
por: para morrer por? . A ideia era entender os atos terroristas . Fruto de seu
tempo, Cartledge tentou fazer uma ponte entre os acontecimentos que tanto
o chocaram em seu momento atual com a histria espartana, para perceber
at onde poderia ir uma ideologia de morte .
Desenhou o mais famoso ato espartano a Batalha das Termpilas)
como a grande prova de honra
3
para os antigos , questionou o fato de esta
Termpilas) ser menos um ato heroico , mas principalmente um desprendi
mento da vida. A mquina de guerra caminhava para a morte rumo a uma
luta em que a desproporo numrica era de assustar qualquer mortal. A
ligao de Esparta com o poder de guerra era conhecida desde seus antigos
ancestrais dricos . Porm, quais seriam as razes para tanto? A defesa da
Grcia e a preservao de uma cultura ou civilizao que influenciou toda
uma forma de vida ocidental? Essa uma informao retroativa, sabemos
disso porque vivemos neste tempo, mas ser que havia essa conscincia
nos guerreiros?
No referente s mulheres , o autor enfatiza um carter dbio . Ele se
remete ao comportamento feminino como no usual, e ressalva que isso
apenas acontece em relao a um padro grego. Traz tona as mulheres
de Atenas como contraparte e diz que as espartanas sofrem uma forma de
educao estatal - state education - que separa meninos e meninas, mas
32
PH lNIX,
RIO DE JANEIRO,
15-2: 29-53 009.
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omparavelmente rigorosa e fsica. A quantidade de comida a mesma para
ambos os sexos devido a um carter eugnico. Elas no se acovardavam e
o
permitiam que seus filhos o fizessem. Humilhavam aqueles que ficavam
solteiros por muito tempo herdavam propriedades e terras. s vezes eram
i nfiis e fugiam - neste caso o autor faz referncia a Helena mulher do
rei espartano que ao fugir causa a Guerra de Troia - outras dormiam com
outros homens encorajadas por seu prprios cnjuges.
Cartledge expe algumas caractersticas femininas espartanas sem fazer
meno a d ocumentao ou pensar em comprov-las. Parte do pressuposto
de que essas caractersticas foram assimiladas por todos e reconhecidas
como verdadeiras - at porque so anos de validao da historiografia -
no pretendendo alongar-se por demais nesse assunto pois como indicamos
anteriormente ele tenta um paralelo entre os espartanos e o fundamentalismo
do homem-bomba .
Num trabalho organizado por Cameron e Kuhrt em 1993 Mary
Lefkowitz trabalha o poder femin ino nas sociedades antigas. Segundo seu
raciocnio as sociedades antigas
por razes prticas oferecem poucas
oportunidades s mulheres para agir como indivduos fora do contexto de
suas famlias. As mulheres podi am ser corajo sas mas no independentes.
As mulheres estariam ligadas manuteno dos costumes.
Mais adiante a autora escreve que Aristteles resguardava como nor
mativo tudo que julgava aceitvel na vida ateniense c considerava desviante
todas as demais condut as. Para ela - deixando de lado a viso aristotlica
do poder da espartana as mulheres s afetavam o rumo dos eventos se
agissem a favor de um homem de sua famlia : para Lefkowitz no existe
poder feminino no espao pblico.
Chocando-se com o esteretipo de recluso Marta Mega de Andrade
escreve:
Sem querer entrar no mrito das concluses, gostaria contudo de
chamar a ateno para uma estrutura quefaz do aparecimento e da
atividade em lima esferapblica a razo da emancipao, que,por
sua vez, existe
u
stamenteporque as mulheres ocidentais de classe
mdia , hoje, tm umpa
p
lpoltico, econ mico e socialfim damen-
tal na esfera pblica do trabalho, do consumo e da op inio. Isto
subentende que a capacidade das mulheres atuarem como suj eitos
PHoiNIX
R IO DE JANEIRO
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sociais plenos depende de seu acesso aos instrumentos que regem
a esf era pblica o que est na base da conquista dos movimentos
f eministas contemporneos. Nesta viso coloca se a premissa de
que toda liberdade e emancipaofeminina pressupe um combate
na e pela esf era pblica. ANDRADE, 2003, p.2)
Ao pr em xeque a viso de liberdade atrelada ao espao pblico, a auto
ra antecipa nossa indagao sobre a relao espartana/liberdade devido a sua
atuao no espao pblico. Todavia , seu trabalho est envolvido em repensar
o lugar social das gregas e, neste sentido , confronta-se com a historiografia
sobre as atenienses, analisando estelas funerrias de algumas delas.
Andrade caminha lado a lado com Sourvinou-Inwood. Segundo esta,
os estudos da Antiguidade constituem um
lcus muito interessante,
me
dida que so muitas e diversas as histrias construdas ao longo de vrios
sculos em diferentes meios culturais, cada uma reverberando construes
ideolgicas do presente e moldando as construes do passado atravs de
geraes sucessivas SOURVINOU-INWOOD, 1995, pIII .A autora no
diminui o valor das construes, mas pondera sobre as revises recentes que,
baseadas na antropologiamodema, discutem a recluso feminina acreditando
que caminham em terrenos seguros.
Esse tipo de mtodo explicativo perigoso porque encobre diferenas e
estrutura-sepor meio de modelos algenos capazes de distorcerema realidade
especfica da sociedade antiga. Resulta numa criao de construes cuja re
lao com a realidade vivida e a idealizao normativa da sociedade observada
problemtica SOURVINOU-INWOOD, 1995, p. 113).
Trabalhando com a hiptese de complementaridade entre os sexos
na esfera pblica ateniense - pois a mulher era responsvel
por um setor
de extremo valor social, cultural e poltico: a religio - , a autora acredita
que a desigualdade e a relao de subordinao encontravam-se justamente
no interior do
oikos.
Sourvinou-Inwood trabalha, antes de mais nada, o
posicionamento estrutural normativo, o poder e o controle, que deveriam
ser conquistados pela afeio pessoal. Quando trabalha o poder feminino
no espao pblico ateniense, inicia-se uma reescritura historiogrfica em
que o prprio modelo de recluso ateniense e o de liberdade espartana so
postos na berlinda.
Trazemos tona modelos atenienses, ou melhor, novos modelos de
leitura da sociedade ateniense porque, assim como estes, construiremos uma
34
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nova Esparta por detrs de novas espartanas - a prpria forma de conside
rao feminina muda toda a concepo ideolgica de uma sociedade , como
acontece nos trabalhos citados de questionamento da chamada recluso como
padro feminino.
5
rprio redirecionamento no olhar j balana antigas
estruturas, e estas fendas abertas permitem a construo de novas bases.
Sentimos o grande vcuo historiogrfico, quando trabalhamos os arti
gos organizados por Elisa Garrido sobre as mulheres no mundo antigo, nos
quais espartanas e atenienses so estudadas acentuando suas diferenas . No
artigo de Calvo-Sotelo intitulado A Lisstrata deAristfanes , o autor, aps
explicar detalhadamente o enredo da comdia, ressalta algumas personagens.
Dentre elas, caracteriza a espartana - Lampito - como bela, inteligente,
valorosa e desenvolvida , e acrescenta: Como toda espartana tpica,
de constituio atltica, vigorosa, pratica ginstica , jura pelos Dioscuros ,
sua
r
erncia geogrfica o Taigetos, fala lacnico e desconfia do sistema
democrtico ateniense . Em outro artigo, intitulado A Mulher e a Plis
Grega , escrito por Garcia Iglesias , encontramos:
Se h algo para destacar da mulher espartana que se movia
pela cidade com bastante maior soltura que o admitido em outros
lugares. sdemais gregos de forma particular os atenienses
censuravam muito duramente (...) a liberdade das mulheres lace-
demnias. (GARRIDO, 1986, p. 117)
Nes se sentido, o autor entende a opinio de Aristteles sobre as
espartanas, e essa ideia exposta, de forma bem clara, como extensiva a
qualquer grego no espartano, porque justificava seu sistema peculiar e sua
moral particular. Resumidamente, Iglesias entende Esparta no s como
o contraponto da plis de Pricles, mas como o contrassenso de toda uma
mentalidade grega. Com as palavras sistema e moral salienta que tanto os
costumesquanto a forma de organizao da sociedade espartana encontram-se
em desconformidade com o padro ateniense-grego .
No primeiro livro voltado exclusivamente para as mulheres de Espar
ta, Sarah Pomeroy defende que a viso que possumos sobre esse assunto
moldada pelas obras de Xenofonte e Plutarco. Seu livro cobre uma linha
temporal bastante longa, o que transforma sua obra, de certa forma, em algo
superficial. Comparando com a plis democrtica, diz que pouco sabemos
sobre a vida desses homens e mulheres. i entretanto, afirma existir um acordo
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nas evidncias daquilo que os demais gregos criam ser Esparta.Nesse senti
do, pede cuidado com as fontes , para distinguirmos uma pretensa realidade
histrica daquilo que se convencionou chamar miragem espartanaY A
prpria cronologia da Antiguidade est vinculada estritamente com uma
viso poltica que, em muitos momentos, deixa de lado eventos importantes
da histria espartana. A linha do tempo tal como conhecemos no nos diz
como os Espartanos manipularam, criaram e recriaram sua prpria histria
(POMEROY, 2002 , p. 9).
No primeiro captulo - sobre a educao - , a autora apresenta os
primeiros passos pela educao das mulheres de Atenas, cuja responsa
bilidade era dos pais, no havendo uma vigilncia por parte da plis,
proporo que estas jovens deveriam se encontrar a distncia dos olhares
pblicos. O sistema educacional parte importante da organizao polti
ca, construdo e reafirmado desta forma. S na plis de Lenidas havia
um sistema educacional para ambos os sexos, imposto e obrigatrio a
todos. Pomeroy salienta que a educao dispunha-se
para
que as meninas
se tomassem mes espartanas e que os rapazes se convertessem no tipo
de soldado desejado. O sistema masculino encarado como diferente da
quele proposto para as meninas, mais rduo e de dedicao total - tanto
que a
gog
abrangia at o momento do sono , pois os rapazes dormiam
11)
Juntos.
Tendo por fim que as meninas dessem luz as melhores sementes e
criassem os melhores
hplit s
Pomeroy fala numa expectativa de homoge
neizao de um tipo de me. Todavia sua explicao tropea ao entender que,
para atingirem essa meta, no havia necessidade de uma prtica frequente,
nem muito menos de um exame minucioso como era imposto aos rapazes
(POMEROY, 2002, p. 4).
Mais adiante, escreve que, pela repetio dos coros, geraes suces
sivas aprenderam a pensar e agir como seus pais: no seria este um meio
eficaz de conscincia e conservao de valores? E, em relao educao
feminina, a autora frisa o suporte e o cuidado da autoridade pblica. Nesse
caso , a afirmao descrita no pargrafo perde-se na prpria construo do
discurso.
Ainda em relao educao, a autora salienta que as espartanas ti
nham muito tempo para dedicarem-se ao aprendizado da leitura e da escrita.
Defende a ideia de que a comunicao entre mes e filhos - educados na
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gog - era feita atravs de cartas . Fortifica sua hiptese com as evidncias
arqueolgicas de pedidos por escrito nos templos religiosos - mas, nesse
caso, apesar de no haver expresso de Pomeroy neste sentido, o aprendizado
da escrita se estenderia a outras gregas POMEROY, 2002 , p. 8).
Confronta as atenienses e espartanas em busca de um padro de
dif
erenciao. Espartanas, como encorajadoras da guerra,ll estariam no
espao da fala, em detrimento do silncio ateniense. A corrida fazia parte
de festivais , sendo assim, no apenas as espartanas participavam disso , mas
tambm outras mulheres de outras
p eis
Cita uma competio pan-helnica,
mas sugere dvidas quanto participao feminina de Atenas. Mas o fato
de existir uma competio feminina entre p eis j nos oferece ferramentas
para continuarmos nosso caminho rumo desconstruo da associao
EspartanalLiberdade.
Diferente de Claude Moss MOSS, 1991, p. 141), que escreveu
que os exerccios fisicos cessavam com o casamento.T Pomeroy defende a
hiptese, com base em Aristfanes e Crtias , que tanto as grvidas quanto
as mulheres maduras se exercitavam.
Na eterna ausncia dos pais, as crianas eram formadas principalmen
te, senounicamente , pelas mes POMEROY, 2002 , p. 52). Entendemos o
advrbio unicamente restrito s crianas do sexo feminino , caso contrrio,
estaramos deixando para trs toda uma tradio segundo a qual a educao
masculina espartana era fomentada nos ginsios .
Por diversas vezes e de diferentes maneiras a autora escreve sobre a
influncia polade
nos costumes e expectativas da sociedade proposta por
Licurgo: chega a comparar espartanas a mes republicanas norte-americanas
em matria de sacrificios patriticos. Entretanto, no articula a hiptese
de essa ser a ponta do fio de Ariadne em relao a toda nossa construo
ocidental das mulheres espartanas.
Desvincula a possibilidade de herana como
status
diferencial da
espartana, e explica que isso indica a existncia de muitas famlias em que
no havia filhos sobreviventes, revelando que a herana s acontecia no caso
de ausncia masculina na famlia POMEROY, 2002 , p. 56).
Na concluso desse trabalho, Pomeroy percebe as espartanas como
mulheres diferentes: eram sadias, se exercitavam e estudavam
M O V T K ~
eram livres para relaes homossexuais, e impossvel deixar de falar
destas mulheres quando discutimos a economia espartana. Mas preciso
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relativizar as diferenciaes porque a maneira grega de pensar exagera
as diferenas para enquadr-Ias em categorias comparadas POMEROY,
2002, p. 141).
Em O Homem Gregoorganizado por Pierre Vemant, James Redfield
trabalha o homem e a vida domstica seguindo parmetros interessantes.
Segundo o autor, os gregos sempre aprenderam que, na ordem da plis , o
poder legtimo encontrava-se em mos masculinas, e qualquer ameaa de
poder feminino devia ser controlada rapidamente, por isso a desqualificao
de tudo aquilo contrrio a essa ordem. Quando trabalha Esparta, diz ser
uma sociedade de regime ambguo . No ritual, as mulheres adquiriam status
equiparados aos homens , logo, sendo a sociedade espartana ritualizada,
isso acontecia o tempo todo. Esse argumento explicaria a viso negativa do
espao de atuao feminina frequente na documentao textual REDFIELD,
1994, p. 153-5).
Se as mulheres so o sinal da nossa queda na condio de natureza
no devemos esquecer que a natureza quem nos alimenta As
mulheres so oproblema e a soluo; so o sinal da nossa mortali-
e mas tambm tornam
pos
svel que a vida continue
-
no s
letra com a sua fertilidade mas tambm no plano das instituies
REDFIELD, 1994, p. 171)
Referindo-se s gregas em geral , Redfield acredita na participao
feminina na construo social , seja espartana ou ateniense. Como explica
Bourdieu, as estruturas de dominao masculina so produtos deum trabalho
rduo histrico) de reproduo, em que agentes como os prprios homens
e mulheres , e instituies como a famlia, a escola e o estado fazem parte.
O poder simblico no pode se exercer sem colaborao dos que lhe so
subordinados e que s se subordinam a ele porque o constroem como poder
BOURDIEU, 2002, p. 52).
Em Os Gregos ntigosFinley argumenta que:
Todos os gregos apes r de espalhados tinham conscincia de
pertencer a uma nica cultura -
>
tal como Herdoto se expressou
FINLEY, 1988, p. 15)
38 P Oi rx, RIo
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Para o autor, a civilizao comum no significava identidade ab
soluta, mas, para os gregos, as diferenas eram pequenas em relao
aos pontos
comuns.Y
Organizando seu trabalho temporalmente, quando
faz referncias ao perodo clssico, critica o conceito de plis e lana o
desafio: se a plis tem tanto poder, em que sentido os gregos eram livres
como julgavam ser?
liberdade no se equiparava anarquia, mas a
uma
existncia ordenada, dentro de
uma
comunidade que era governada por um
cdigo estabelecido, por todos respeitado FINLEY, 1988, p. 51). O fato
de a comunidade ser a fonte da lei era justamente a garantia de liberdade.
Todavia, se a plis era a fonte da lei , at onde haveria nela um espao
de liberdade para que a prpria comunidade alterasse a ordem estabeleci
da? Essa provocao arremessada no pretende disponibilizar a resposta.
Nessa mstica em tomo do conceito de liberdade, nessa impreciso que
impulsionamos nosso estudo.
Em outro trabalho de Finley, ele expe que o amor pela vitria em Es
parta definiu vencedores e perdedores, criando diferenas entre os iguais .
Tudo isso era compactamente reforado psicologicamente e
institucionalmente Vivendo em pblico durante a maior parte
de suas vidas os espartanos eram muito mais suscetveis que
a maioria dos povos s presses da opinio pblica e rede de
recompensas em punies com sua grande nfase durante a
infncia no castigo corporal e na fase adulta em variedade
rica e imaginativa de expresses de desagrado social ou mesmo
ostracismo
FINLEY, 1991, p. 29)
Se incorporarmos as espartanas interpretao de Finley, perceberemos
um modelo coerente, no qual, obedecendo a padres
polades
as mulheres
ficavam expostas para que o cuidado com sua conduta acontecesse de forma
contnua. Nesse caso, aquilo que hoje a historiografia considera liberdade
de ao estaria preso a um modelo de conduta reconhecido simbolicamente
como aquele que deve ser seguido. Assim, muitos estudiosos poderiam at
arriscar que o modelo espartano obtinha um controle maior sobre suas
mulheres que o ateniense.
Um trabalho que nos ajuda no desenvolvimento dessa histria o de
Jos Carlos Rodrigues, O Tabu do orpo Nele evidenciamos que a socie
dade humana basicamente um sistema de significao.
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39
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[ ..}
esta atribuio de sentido ao mundo s se torna possvelporque
a sociedade
ela mesma um sistema estruturado cujos componentes
relacionam-se segundo uma determinada lgica lgica esta que
introjetada nas mentes dos indivduos e por esse caminho pro
j etada sobre o mundo na medida em que este p r ser apreendido
p elos indivduos deve
s r
representado em suas mentes e portanto
concebido . (RODRIGUES, 1983, p. 43)
O que muitas vezes no considerado historiograficamente a
consonncia do papel feminino com o modelo social existente, fruto de
resqucios da luta da Histria das Mulheres, que ganhou espao graas
articulao feminista inicialmente - e algumas excees que persis
tem ainda hoje - , vitimando a po re mulher combatente no mundo
dos homens . E, nessas bases, construmos a Esparta que conhecemos
e reproduzimos.
ent
idades e alteridades nas construes de Esparta
As alteridades das espartanas so muitas: as atenienses, as gregas
em geral e seus compatriotas. Todas elas confluem estabelecendo uma
identidade de autonomia e liberdade . Tendo em vista o fato de a construo
identitria pautar-se em smbolos reconhecidos socialmente e existir enquan
to oposio de outra , nosso modelo de identidade feminino espartano s se
reconhece enquanto tal medida que as suas alteridades so reconhecidas
como o so. Isso quer dizer que a construo da espartana no se encontra
sozinha, mas numa rede de articulaes identitrias que traam o caminho
pelo qual a Histria acontece.
A escolha das caractersticas na construo de uma identidade no
invalida possveis contradies - como o caso das referentes s esparta
nas. Essas qualidades e/ou defeitos esto sempre imersas em sistemas de
representaes produzidos por uma cultura particular, gerando significados
que permeiam todas as relaes sociais, medida que so responsveis pelo
sentido das experincias vividas . Essa prtica de significao est envolta
por relaes de poder (capazes de definir os includos e os excludos dessa
identidade). Todavia, vale lembrar que no podemos desarticular os signifi
cados sociais de seus contextos, pois tanto o processo de significao quanto
a identidade so histricos.
40 PHOiNIX, RIo DE JANEIRO, 15-2: 29-53, 2009.
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Todaprtica social simbolicamente marcada. As identidades so
diversas e cambiantes tanto nos contextos sociais nos quais elas so
vividas quanto nos sistemas simblicos
por
meio dos quais damos
sentido as nossas prprias posies.
WOODWARD, 2000, p.33)
Se imaginarmos que os sistemas classificatrios produzem significados
estabelecendo diferenas, criando, assim, uma ordem social, um sistema
partilhado de significao cultura), apenas exagerando a diferena entre o
que est dentro e o que est fora, acima e abaixo, homem e mulher, a favor e
contra, que se cria a aparncia de
uma
ordem. ...)A ordem social mantida
por meio de oposies binrias WOODWARD, 2000, p.46).
Assim, a identidade plena quando:
Quaisquer que sej am os conjuntos de significados construdos pelos
discursos eles s podem ser efi cazes se eles nos recrutam como
sujeito . Ossuj eitos so assimsujeitados ao discurso e devem eles
prprios assumilo como
ind
ivduos que dess rm se posicio-
nam a
si
prprios.
WOODWARD, 2000 , p.55)
Trazendo isso para o nosso contexto, temos acesso, pela documentao,
s identidades criadas, mas no a uma confirma o feminina lacedemnia
de posicionamento de si.
Nessa documentao, capturamos os sistemas
simblicos gregos, em geral, e espartanos, em particular, para, a partir da ,
entender a identidade da esposa lacedemnia em conformidade com os
padres culturais da poca.
Como descrevemos, as opinies e concepes historiogrficas transfor
mam-se em vista do tema abordado e da apreenso significativa de cada autor.
Em contrapartida, boa parte da interpretao acontece seguindo um legado j
institudo e caracterizado verdadeiro. Na maioria dos casos, na relao direta
com as atenienses que as espartanas so desenvolvidas.As releituras correntes
do feminino na
plis
de Pricles ainda no atingiram espao suficiente a ponto
de abalar a rgida estrutura, lac nica , das esposas de Esparta.
ls
Na pers
pectiva da diversidade, a diferena e a identidade tendem a ser naturalizadas,
cristalizadas, essencializadas. So tomadas como dados ou fatos da vida social
diante dos quais se deve tomar posio SILVA, 2000, p. 73).
Percebendo a relao de dependncia existente entre a identidade e a di
ferena , em que uma s se define quando a outra est claramente estabelecida,
PHOiNIX , RIo
DE JANEIRO,
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e, sendo ambas criaes lingusticas, o que acontece quando um dos pilares
destrudo?
Uma
nova relao firmada e as identidades redefinidas.
A possibilidade de cruzar front eiras e de estar nafronteira
de ter
uma identidade ambgua, indefinida, uma demonstrao do carter
artificialmente imposto das identidadesfixas.
O
cruzamentodefron-
teiras
e o cultivo propositado de identidades ambguas , entretanto,
ao mesmo tempo umapoderosa estratgiapoltica de questionamento
das operaes defixao da identidade. (SILVA,2000, p. 89)
A representao - entendida como sistema de significao do real
assenta tanto identidades quanto diferenas. Sendo fruto de um trabalho
discursivo, capaz de demarcar fronteiras simblicas, est imbuda de po
deres. O sujeito produzido
como
um efeito do discurso e no discurso
(HALL, 2000, p. 119).
Se o sujeito, no nosso caso, a espartana, produto do discurso e s tem
vida por meio do mesmo, a ambiguidade16 na construo de sua identidade,
a princpio, no uma contradio. Visto que o processo de instituio
identitria enreda ambiguidades.
Divagando para os discursos sobre o Oriente, entendidos orientalistas,
Edward Said escreve:
... por
causa do orientalismo, o Oriente no era e no ) um tema
livre de pensamento e de ao. Isso no quer dizer que o orien-
talismo determine de modo unilateral o que
po e ser
dito sobre o
Oriente, mas que toda a rede de interesses que inevitavelmente
f z valer seu prestgio e, portanto, sempre se envolve) toda vez
que aquela entidade peculiar, o Oriente , esteja em questo.
(SAID, 1990, p. 15)
Depreendemos que, por maior que seja o leque de discursos existentes
- no caso dele, em relao ao Oriente e, em nosso caso, em relao
plis
de Licurgo - , o discurso de credibilidade parece avanar num sentido nico .
Explicando de outra forma, o poder creditado a esses discursos grande o
suficiente para macular todos os que dele tentam se desvencilhar.
Trabalhando no sentido de Woodward, Silva e Hall , sentido dos
utros
de Marc Aug, compreende as identidades coletivas segregando
alteridades. Para o antroplogo que estudou rituais de feitiaria africanos, o
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- divduo no existe seno pela sua posio num sistema de relaes cujos
armetros principais so a filiao e a aliana (...) Elas no tm existncia a
o ser na e pela relao ao outro, de que so o instrumento (AUG, 1999,
p. 28). S existem sentidos nos atos quando em relaes sociais .
pr
eciso aprender a
jog r
o
jogo
e, muito literalmente, a respeitar
as regras da civilidade, de sorte que uma cultura mas que
tam-
bm uma sociedade ou uma sociedade mas que tambm uma
cultura po eria ser definida como zona imposta de consenso sobre
as regras do eu dojogo
-
este jogo depalavras que se empenham
desajeitadamente em sugerir a necessidade de um ponto de vista
nico sobre o homem singular/plural.
(AUG, 1999, p.37)
Uns trabalham a existncia identitria individual contraindo sentido
em meio a laos sociais , ao passo que outros afirmam o mesmo sentido
partindo de um discurso. Sejam relaes sociais, sejam linguisticamente,
ambos implicam poder.
O poder do discurso acontece segundo uma aceitao social, um regi
me de verdade reconhecido por um grupo que possu i laos identitrios. O
discurso aco lhido - e, por que no dizer, escolhido - socia lmente assume
o carter de verdade, estabelecendo ferramentas capazes de diferenciar
enunciados verdadeiros dos falsos. O discurso de verdade produzido cria os
efeitos que regulam tanto a si mesmos quanto todos aqueles que ajudaram
em sua construo . A verdade est circularmente ligada a sistemas de
poder, que a produzem e apoiam, e a efeitos de poder que ela induz e que a
reproduzem (FOUCAULT, 1979, p.14). Por isso, nossa preocupao com
os modelos descritos nos discursos.
lacedemnias: autonomia e liberdade
Levando em considerao a percepo de liberdade para os antigos,
seguindo a interpretao de Finley (FINLEY, 1988, p.51), segundo a qual a
liberdade estava circunscrita numa ordem, e seguindo a linha de raciocnio
de Ginzburg (GINZBURG, 2002, p.59), que afirma que, na Grcia Antiga, a
retrica, a histria e a prova esto estritamente ligadas, aceitariamos de bom
grado o juzo de liberdade entre as esposas espartanas . Todavia, os discursos
no evidenciam ordem , mas desregramento Y
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Historiograficamente, a liberdade narrada no inclui a regulao do
r e vir , tanto que a argumentao de que as esposas espartanas podiam
herdar, o que ocasionaria uma estabilidade e uma mobilidade, e a prtica de
exerccios no espao pblico. Persistindo em Finley FINLEY, 1991, p.29),
podemos considerar essa ltima caracterstica como um ponto a mais de
controle,18no s do corpo quanto da mente dessas mulheres, pois, nesse
momento, elas cantavam coros que ressaltavam a tradio oral de costumes
espartanos e exercitavam-se seguindo um programa
polade
Nesse sentido,
o modelo de liberdade e autonomia deixam de ser vlidos, pois encontram-se
enquadrados dentro de padres modernos.
Quando falamos em mtodo cientfico, o modelo cientfico no de
forma alguma um guia pelo qual deve se pautar a realidade FONTES,
1997, p.355): ele um instrumento de trabalho, convertendo pontos de
identificao de dados e ordenando-os a fim de estabelecer uma leitura da
sociedade estudada. modelo representa relaes ou funes entrelaando
unidades de um sistema, da as generalizaes adequadas para a elaborao
das hipteses. Esses modelos permitem a construo explicativa , que seria
parte da construo da realidade ou, pelo menos, parte dessa realidade.
questionamento dos modelos construdos aparece na prpria relao
do discurso expresso no documento com seu contexto. Elos entre as concep
es devem ser criados pelos estudiosos para compreenso dos discursos em
que so expressas determinaes extratextuais que presidem a produo, a
circulao e o consumo dos discursos CARDOSO, 1997, p. 378).
Salientamos a prpria construo dos discursos historiogrficos e
colocamos prova a edificao de modelos muito latentes. Como explica
Momigliano:
homens escrevem a Histria quando querem registrar aconteci-
mentos em um quadro cronolgico Todo registro uma sel