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QUARTA REGIÃO · 2011. 4. 18. · Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. – Vol. 1,...

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QUARTA REGIÃO
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  • QUARTA REGIÃO

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 1-348, 2003

    QUARTA REGIÃO

  • Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. – Vol. 1, n. 1

    (jan./mar. 1990). – Porto Alegre: O Tribunal, 1990 – v. – Trimestral.

    ISSN 0103-6599

    1. Direito – Periódicos. 2. Direito – Jurisprudência. 1. Brasil.Tribunal Regional Federal 4ª Região.

    CDU 34(051)34(094.9)

    TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL4ª Região

    Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300CEP 90.010-395 - Porto Alegre - RS

    PABX: 0 XX 51-3213-3000e-mail: [email protected]: 750 exemplares

    Ficha Técnica

    Direção:Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria

    Assessoria:Isabel Cristina Lima Selau

    Chefia de Gabinete:Adriana Ardenghy da Rosa

    Coordenação:Eliane Maria Salgado Assumpção

    Análise e Indexação:Eliana Raffaelli

    Maria Lenice Pinheiro BertoniMarta Freitas Heemann

    Revisão, Formatação e Layout:Maria Aparecida C. de Barros Berthold

    Maria de Fátima de Goes LanziottiRodrigo Meine

  • MARIA LÚCIA LUZ LEIRIADesa. Federal Diretora da Escola da Magistratura

    QUARTA REGIÃO

  • TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL4ª Região

    JURISDIÇÃORio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná

    COMPOSIÇÃOEm dezembro de 2003

    PLENÁRIODes. Federal Vladimir Passos de Freitas - Presidente

    Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler - Vice-PresidenteDes. Federal Vilson Darós - Corregedor-Geral

    Des. Federal Fábio Bittencourt da RosaDes. Federal Nylson Paim de Abreu

    Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves GoraiebDesa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria - Diretora da Escola da Magistra-

    turaDes. Federal Élcio Pinheiro de Castro

    Des. Federal José Luiz Borges Germano da SilvaDes. Federal João Surreaux Chagas - Vice-Corregedor-Geral

    Des. Federal Amaury Chaves de AthaydeDesa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère - Conselheira da Escola da

    MagistraturaDes. Federal Edgard Antônio Lippmann Júnior

    Des. Federal Valdemar CapelettiDes. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon - Conselheiro da Escola da

    MagistraturaDes. Federal Tadaaqui Hirose

    Des. Federal Dirceu de Almeida SoaresDes. Federal Wellington Mendes de Almeida

    Des. Federal Paulo Afonso Brum VazDes. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado

    Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores LenzDes. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira

    Des. Federal Néfi CordeiroDes. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

  • Juiz Federal Álvaro Eduardo Junqueira (convocado)Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira (convocado)

    Juiz Federal Fernando Quadros da Silva (convocado)PRIMEIRA SEÇÃO

    Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler - PresidenteDes. Federal Fábio Bittencourt da RosaDesa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria

    Des. Federal João Surreaux ChagasDes. Federal Dirceu de Almeida Soares

    Des. Federal Wellington Mendes de AlmeidaDes. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira

    SEGUNDA SEÇÃODesa. Federal Marga Inge Barth Tessler - Presidente

    Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves GoraiebDes. Federal Amaury Chaves de Athayde

    Des. Federal Edgard Antônio Lippmann JúniorDes. Federal Valdemar Capeletti

    Des. Federal Luiz Carlos de Castro LugonDes. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

    TERCEIRA SEÇÃODesa. Federal Marga Inge Barth Tessler - Presidente

    Des. Federal Nylson Paim de AbreuDes. Federal Néfi Cordeiro

    Des. Federal Victor Luiz dos Santos LausJuiz Federal Álvaro Eduardo Junqueira (convocado)

    Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira (convocado)Juiz Federal Fernando Quadros da Silva (convocado)

    QUARTA SEÇÃODesa. Federal Marga Inge Barth Tessler - Presidente

    Des. Federal Élcio Pinheiro de CastroDes. Federal José Luiz Borges Germano da SilvaDesa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère

    Des. Federal Tadaaqui Hirose

  • Des. Federal Paulo Afonso Brum VazDes. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado

    PRIMEIRA TURMADesa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria - Presidente

    Des. Federal Wellington Mendes de AlmeidaDes. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira

    SEGUNDA TURMADes. Federal Fábio Bittencourt da Rosa - Presidente

    Des. Federal João Surreaux ChagasDes. Federal Dirceu de Almeida Soares

    TERCEIRA TURMADesa. Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb - Presidente

    Des. Federal Luiz Carlos de Castro LugonDes. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

    QUARTA TURMADes. Federal Amaury Chaves de Athayde - Presidente

    Des. Federal Edgard Antônio Lippmann JúniorDes. Federal Valdemar Capeletti

    QUINTA TURMADes. Federal Néfi Cordeiro - Presidente

    Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira (convocado)Juiz Federal Fernando Quadros da Silva (convocado)

    SEXTA TURMADes. Federal Nylson Paim de Abreu - Presidente

    Des. Federal Victor Luiz dos Santos LausJuiz Federal Álvaro Eduardo Junqueira (convocado)

    SÉTIMA TURMADes. Federal José Luiz Borges Germano da Silva - Presidente

    Desa. Federal Maria de Fátima Freitas LabarrèreDes. Federal Tadaaqui Hirose

    OITAVA TURMA

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 1-348, 200310

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 1-348, 2003 11

    EDITORIAL

    O ano de 2003 é o décimo quinto ano de existência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e, coincidentemente, termina com a publicação do número 50 da sua Revista.

    Cinqüenta representa fase importante tanto na vida individual como na história de qualquer instituição. Representa muitas vezes o nascimento e a alteração de posturas, paradigmas em todas as áreas de uma sociedade organizada.

    Por isso, em face da manutenção ao longo deste período de nossa Revista como repositório da jurisprudência de nosso Tribunal, é, sem sombra de dúvida, necessário que se reapresente em nome da memória destas publicações algumas palavras de seus diretores até o número 50.

    Mister, outrossim, que se historie a sua existência.Em 1990, circulou o primeiro volume, tendo como Diretor do Gabinete

    da Revista o Desembargador Federal Teori Albino Zavascki, atualmente Ministro do Superior Tribunal de Justiça.

    Em 1991, na sexta edição, a Direção passou a ser exercida pelo Desembargador Federal Manoel Lauro Volkmer de Castilho, atual Consultor-Geral da União.

    Em 1993, no número 14, a função de Diretor foi assumida pelo Desembargador Federal Fábio Bittencourt da Rosa, único magistrado em exercício da configuração original deste Tribunal.

    Em 1995, o número 20 contou com a Direção do Desembargador Federal Ari Pargendler, hoje Ministro do Superior Tribunal de Justiça.

    Ainda, em 1995, no número 21, a Direção foi assumida pela Desembargadora Federal Luiza Dias Cassales, hoje, aposentada.

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    Em 1997, no número 27, esteve à frente da Direção o Desembargador Federal Vladimir Passos de Freitas, atual Presidente desta Corte.

    Em 1999, na edição de número 34, a Direção foi ocupada pela Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, atual Vice-Presidente desta Corte.

    Em 2001, foi criada a Escola da Magistratura, que incorporou a estrutura administrativa do Gabinete da Revista e as funções da extinta Comissão de Estudos e Cursos, mantendo como sua primeira Diretora a Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler.

    Em 2003, na edição de número 47, passei a exercer a direção da Escola da Magistratura – EMAGIS, que, desde o ano de 2001, assumiu, também, a responsabilidade pela edição da Revista deste Tribunal.

    Assim, repassando, em breves linhas, a história de nossa Revista, espero que a mesma continue a desvelar o direito aplicado pelos magistrados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

    A seguir, republicam-se algumas palavras dos eminentes diretores da Revista em homenagem aos seus esforços.

    Ao fim, desejo que continuem iluminados os caminhos dos integrantes deste Tribunal para que a nossa “prestação de contas à sociedade” permaneça firme, atual e efetiva.

    Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria Diretora da EMAGIS

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    AS PALAVRAS DOS DIRETORES:

    Revista nº 1

    A Jurisprudência dos Tribunais representa, do ponto de vista institucional, o resultado de uma das funções estatais básicas: a função jurisdicional, de solver querelas e julgar as lides, dando a lei ao caso concreto. Envolvem-se, nesta atividade, órgãos político-constitucionais, os juízes, que têm como instrumento e guia o direito positivo e como meta apaziguar os litigantes com decisões justas. A jurisprudência traduz, por isso, a face concreta da lei, seus acertos e desacertos, sua conveniência ou inconveniência social. Expõe, também, a alma dos juízes, suas virtudes e suas limitações, sua inteligência e seu coração.

    A publicação dos julgados atende, assim, a duas finalidades. Uma, institucional e regimental, de oferecer ao conhecimento público os precedentes da Corte, ensejando sua invocação, em caráter oficial, na interposição de recursos, na sustentação de razões, ou na prolação de sentenças. E outra, não menos importante, de revelar à sociedade, numa espécie de prestação de contas, o direito concretizado, facultando-lhe, desta maneira, as mudanças de rumos, quiçá reclamadas pelo interesse comum.

    É para atender a tais propósitos que surge a Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

    Teori Albino ZavasckiJuiz-Diretor da Revista

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    Revista nº 6

    Ao assumir as funções de novo Diretor da Revista do Tribunal, juntamente com a administração que se renova, quero, neste momento, logo à abertura do 6º número, render a mais justa homenagem ao Juiz Teori Albino Zavascki, primeiro Diretor deste órgão de divulgação e seu criador. Merece louvor o esforço deste competente e dedicado colega que soube nele lançar bases sólidas, seja pela agilidade editorial, seja por ter encontrado, com inteligência, as soluções inadiáveis para a sua publicação pontual, seja, ainda, pelo elevado apuro técnico que fez impor, culminando na elaboração de um valioso Ementário, que, por certo, auxiliará à compreensão dos trabalhos desta Corte.

    Cumpre-me daqui por diante o encargo difícil de seguir esta linha com a mesma eficiência e propósito de revelar o espírito dinâmico dos julgadores, oferecendo à opinião pública uma verdadeira prestação de contas de suas responsabilidades. Afinal, o Poder Judiciário, enquanto instituição essencial ao Estado Democrático de Direito, só cumpre bem as suas altas funções, à medida em que conquista, transparentemente, o respeito e acatamento por parte dos jurisdicionados. No intuito de aprimorar os modos e os próprios fins da prestação da tutela jurisdicinal, tal aproximação democrática continuará sendo um dos objetivos precípuos e fundamentais desta Revista.

    Manoel Lauro Volkmer de CastilhoJuiz-Diretor da Revista

    Revista nº 16

    Nossa Revista, neste e no próximo número, dedica-se a atender à justa demanda da comunidade jurídica por Ementários que espelhem o conjunto da produção desta Corte, na desafiadora prestação da tutela jurisdicional. Com esse desiderato, procurou-se distribuir a matéria por ramos (na presente edição, Direito Administrativo, Direito Constitucional, Direito

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    Previdenciário e Direito Tributário), tendo em vista o mais fácil acesso aos leitores, a par de uma indexação analítico-remissiva semelhante ao de uma edição normal, porém, em lugar da página, com expressa referência à ordem numérica específica do Ementário (0001 a 0776).

    É de dizer, outrossim, que, em face de uma imprescindível seleção dentro de um universo de 117.193 julgados (da instalação do Tribunal, em março de 1989, até abril de 1994), preferiu-se adotar um critério misto, de maneira a: (a) privilegiar a contemporaneidade máxima possível, razão pela qual, dentre as ementas não publicadas na Revista, concentrou-se a seleção basicamente nos julgados de 1993; (b) registrar a grande maioria das ementas de acórdãos publicados na Revista, desde o último Ementário (RTRF-4ª, ano 2, n. 5), assinalando-se, nesses casos, os indicativos necessários, inclusive o Relator, o órgão julgador (Plenário, Turmas Reunidas ou Turmas), além da informação sobre o resultado, se unânime ou não.

    Espera-se com o presente trabalho cumprir a missão precípua desta Revista, qual seja, a de ampliar a transparência de nossas decisões.

    Fábio Bittencourt da RosaJuiz-Diretor da Revista

    Revista nº 20

    A partir deste volume, a Revista passa a refletir a nova fase do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, agora integrado por vinte e três juízes.

    Desde 9 de dezembro de 1994, ele está organizado em Turmas, Seções e Plenário.

    À 1ª Seção, constituída das 1ª e 2ª Turmas, compete o processo e julgamento de ações e recursos que versem matéria penal e tributária.

    À 2ª Seção, reunindo as 3ª, 4ª e 5ª Turmas, incumbe o processo e julgamento de ações e recursos que tratem de outras matérias.

    Ao Plenário, no âmbito jurisdicional, está reservado basicamente o julgamento dos incidentes de inconstitucionalidade de lei.

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    Ari PargendlerJuiz-Diretor da Revista

    Revista nº 21

    Assumo a Direção da Revista do Tribunal Regional Federal da Quarta Região após transcorridos mais de 5 anos do início de sua circulação. Nesse lustro, a Revista, sob a sábia e competente orientação dos Diretores que me antecederam, atingiu sua maturidade. Sem qualquer interrupção, a divulgação da jurisprudência, especialmente no que se refere a matérias mais polêmicas, vem sendo feita dentro dos critérios regimentalmente estabelecidos. Para facilitar a pesquisa, foi editado um EMENTÁRIO. Diante da excelência das Direções passadas e dos Funcionários que compõem seu quadro editorial, o desafio decorrente da expansão desta Corte, que, com a criação de mais 9 cargos de Juízes, passou de 14 a 23 membros, foi enfrentado e resolvido sem dificuldades. Agora, parece-me, está na hora de ousar e partir, quem sabe, para a tentativa de, junto com a publicação dos julgados, ainda que na forma de adendo, apresentar, por amostragem, o posicionamento Doutrinário dos Juízes deste Tribunal, sobre as matérias que têm polemizado este fim de século.

    Luiza Dias CassalesJuíza-Diretora da Revista

    Revista nº 38

    O número especial da Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região nasce com o propósito de constituir um marco e um veículo para a divulgação dos trabalhos doutrinários dos Eminentes Juízes do Colendo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e Juízes Federais. Vem, este especial, com a inestimável e valiosíssima colaboração de uma plêiade de notáveis juristas brasileiros e estrangeiros. A questão do Poder Judiciário como poder político é magistralmente desenvolvida pelo Eminente Ministro Carlos Mário da Silva Velloso. O preclaro Ministro José Néri da

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    Silveira aborda o tema da Fazenda Pública em Juízo, mas sob o ângulo do advogado público, cuja tarefa nem sempre é bem compreendida, mas essencial e valiosa quando exercida com dedicação e eficiência. O Eminente Ministro Ari Pargendler trata da questão da autoridade coatora no mandado de segurança, esclarecendo definitivamente as dúvidas que pairavam sobre alguns aspectos, especialmente, a questão do “ordenador de despesas”. Os juristas estrangeiros, Prof. Dr. Ernest Benda e Prof. Dr. Heinrich Scholler desenvolvem temas relacionados ao Direito Constitucional e Administrativo de grande atualidade, a saber, o espírito da lei fundamental e o princípio da proporcionalidade no Direito Constitucional e Administrativo na Alemanha. Os Juízes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, cumprindo o dever constitucional de aperfeiçoamento e estudos contínuos e atividade reflexiva desenvolvem diversas questões relacionadas com a esfera da competência federal e o direito público. O número especial agrega também um Ementário dos nos 31 a 37, muito útil para os trabalhos de pesquisa jurisprudencial.

    Finalmente, esperando as inestimáveis contribuições futuras de todos, é fundamental e indispensável agradecer aos Eminentes Ministros e Doutores os valiosíssimos trabalhos que substanciam este primeiro volume especial.

  • SUMÁRIO

    ACÓRDÃOS.......................................................................................21 Direito Administrativo e Direito Civil .....................................23 Direito Penal e Direito Processual Penal ............................... 119 Direito Previdenciário ............................................................185 Direito Processual Civil ......................................................... 211 Direito Tributário ...................................................................257

    ÍNDICE NUMÉRICO .......................................................................319

    ÍNDICE ANALÍTICO ......................................................................323

    ÍNDICE LEGISLATIVO ..................................................................341

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  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 49, p. 433-452, 2003 21

    ACÓRDÃOS

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  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 23

    DIREITO ADMINISTRATIVO

    E DIREITO CIVIL

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    APELAÇÃO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA Nº 1998.04.01.009684-2/SC

    Relator: O Exmo. Sr. Juiz Federal Joel Ilan PaciornikRelator p/Acórdão: O Exmo. Sr. Des. Federal Valdemar Capeletti

    Apelante: União Federal

    Advogado: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

    Apelante: Ministério Público

    Advogado: Dr. Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle

    Apelado: Mauro Antonio Molossi

    Advogados: Drs. Cícero Hartmann e outros

    Apelado: Município de Porto Belo/SC

    Advogada: Dra. Angie Mari Bitencourt Leonardo

    Apelado: Sérgio Luiz Biehler

    Advogados: Drs. João Omar Macagnan e outros

    Remetente: Juízo Federal da 6ª Vara Federal de Florianópolis/SC

    EMENTA

    Administrativo. Ambiental. Ação civil pública promovida pela União. Construção de hotel. Município de Porto Belo. Zona de promontório. Área de preservação permanente. Non aedificandi. Licença nula. Descumprimento da legislação ambiental. Inexistência de avaliação

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    ambiental. Princípio da prevenção. Desfazimento da obra. 1. O empreendimento está localizado em área de promontório,

    considerada de preservação permanente pela legislação estadual (Lei nº 5.793/80 e Decreto nº 14.250/81) e pela legislação municipal (Lei Municipal nº 426/84), e, por conseqüência, área non aedificandi, razão pela qual a licença concedida pela FATMA é nula, visto que não respeitou critério fundamental, a localização do empreendimento.

    2. A FATMA não possuía competência para autorizar construção situada em terreno de marinha, Zona Costeira, esta considerada como patrimônio nacional pela Carta Magna, visto tratar-se de bem da União, configurando interesse nacional, ultrapassando a competência do órgão estadual.

    3. Ante o princípio da prevenção, torna-se imperiosa a adoção de alguma espécie de avaliação prévia ambiental.

    4. Os interesses econômicos de uma determinada região devem estar alinhados ao respeito à natureza e aos ecossistemas, pois o que se busca é um desenvolvimento econômico vinculado ao equilíbrio ecológico.

    5. Um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado representa um bem e interesse transindividual, garantido constitucionalmente a todos, estando acima de interesses privados.

    6. Apelos providos.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos entre as partes acima indicadas, decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido o Relator, dar provimento aos apelos e à remessa oficial, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

    Porto Alegre, 18 de dezembro de 2002.Des. Federal Valdemar Capeletti, Relator p/acórdão.

    RELATÓRIO

    O Exmo. Sr. Juiz Federal Joel Ilan Paciornik: A União ingressou com ação civil pública contra Mauro Molossi e Silvio Luiz Molossi, Sérgio Luiz Biehler, José Antonio Rocha e contra o Município de Porto Belo,

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    visando à demolição da construção de um hotel pousada em Porto Belo/SC, iniciada em setembro de 1993, visto que prejudicial ao meio ambiente e lesiva ao patrimônio público.

    Alegou na exordial de fls. 03/16 que a referida obra encontra-se rigorosamente dentro do mar, visto que efetuado um aterro e erguido um muro de proteção, o que acarreta agressão ao meio ambiente e prejuízo ao paisagismo e turismo da região. Aduziu também que, em razão da inexistência de rede pública de esgoto e da impossibilidade da construção de uma fossa séptica no local, todos os dejetos de 160 (cento e sessenta) hóspedes, assim como dos funcionários do hotel, poderão ser lançados diretamente no mar. Ressaltou, por outro lado, que a construção do aterro acabou por bloquear o curso natural das correntes marítimas, o que ocasiona o acúmulo de detritos naquelas águas. Destacou ainda que o muro que cerca o aterro fez desaparecer a faixa de areia e interrompeu a praia, impedindo a passagem e circulação de veranistas, turistas e da própria população. Ponderou que os réus Sérgio e José Antonio, respectivamente Prefeito e Secretário de Obras de Porto Belo, bem como o referido Município, também devem ser responsabilizados porque aprovaram o projeto de construção de tal hotel em área pertencente ao domínio público contra todas as leis federais, estaduais e municipais e também porque não limitaram, embargaram ou pediram a adequação da obra. Ratificou que o conhecimento da obra por parte das autoridades executivas municipais é impossível de ser negado, tendo em vista que a obra se situa a 400 metros de distância da sede da Prefeitura Municipal, na mesma rua e que fica em ponto único de passagem para outras localidades. Requereu, por fim, a demolição da construção, a anulação do ato que aprovou referida edificação, bem como a cassação de eventual direito de ocupação dos réus Mauro Antonio Molossi e Silvio Molossi sobre aquela área de marinha.

    Ingressou a União com medida cautelar, obtendo liminar para a suspensão da obra sob pena de multa diária (fl. 90), a qual foi confirmada pela sentença de fls. 512/517.

    Através do despacho saneador às fls. 353/354, os réus José Antonio Rocha e Sílvio Luiz Molossi foram excluídos do pólo passivo da ação pelo reconhecimento de sua ilegitimidade passiva.

    O MM. Juiz a quo, em sentença de fls. 572/590, julgou extinto o

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    processo sem julgamento do mérito em relação ao demandado Sérgio Luiz Biehler, reconhecendo sua ilegitimidade passiva ad causam e julgou improcedente o pedido em relação aos demandados Mauro Antonio Molossi e Município de Porto Belo.

    À fl. 597, Mauro Antonio Molossi ingressou com petição requerendo a autorização para a realização de atividades de manutenção da obra, o que restou deferido à fl. 603.

    A União Federal interpôs recurso de apelação às fls. 594/597, requerendo a reforma de sentença, sob o fundamento de que a área objeto do litígio é de propriedade da União e que qualquer empreendimento nela a ser realizado irá danificar a orla marítima e agredir o meio ambiente, com prejuízo ao Poder Público e a comunidade de Porto Belo. Ressaltou ainda a inexistência de estudo prévio de impacto ambiental, consoante determinação contida no art. 225, § 1º, IV, da CF/88.

    O Ministério Público Federal ofereceu embargos de declaração às fls. 599/601, aduzindo a existência de omissão no que se refere ao questionamento do memorial de fls. 561/570, relativo à necessidade de prévia EIA/RIMA para a viabilidade do empreendimento, como também de contradição quando afirma ser possível a construção em promontório desde que autorizadas pelos órgãos municipais ou federais.

    Após terem sido rejeitados os embargos de declaração da União às fls. 604/606, o Ministério Público Federal interpôs recurso de apelação às fls. 609/622, alegando que o Sr. Mauro Molossi sequer tem a regular ocupação da totalidade do imóvel e que a prova pericial concluiu ser do mesmo a responsabilidade pela construção do muro de arrimo. Afirmou ainda que o imóvel (terreno de marinha) pertence em sua integralidade ao patrimônio público. Ponderou que o vício originário que macula o alvará de construção não pode ser sanado pela ocorrência de aterro hidráulico realizado pelo Município de Porto Belo. Ressaltou que, inobstante isto, a violação ambiental subsiste no que concerne à efetiva utilização da praia artificialmente criada, posto que o terreno permanece avançado sobre o bem público de uso comum. Destacou ainda que, como a área em questão constitui zona de preservação permanente, deveria ser precedida de estudo de impacto ambiental e do respectivo relatório de impacto ambiental, consoante disposição da Lei nº 7.661/88 e da Resolução do CONAMA 01/86. Asseverou que no plano estadual os promontórios constituem

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    áreas de proteção especial, por força de disposição contida no Decreto nº 14.250/81, que regulamentou a Lei Estadual nº 5.793/81. Ressaltou ainda que a autorização para a construção em promontório prevista no parágrafo único do referido decreto não afasta a exigência de relatório de impacto ambiental, o que tornaria inválida a autorização da FATMA. Aduziu que a legitimidade da intervenção municipal na concessão do alvará é duvidosa, eis que o Secretário de Planejamento e Urbanismo, subscritor do referido alvará, é o engenheiro responsável pela obra. Ponderou que por se tratar de bem pertencente à União, mostrava-se imprescindível a autorização do órgão federal responsável pelo patrimônio da União, DSPU. Argumentou, por fim, serem objetivos os critérios para avaliar os impactos da obra sobre o meio ambiente, especialmente no que se refere à edificação sobre fauna marinha.

    À fl. 624, a União manifesta ter conhecimento da interposição da apelação pelo Ministério Público Federal, nada requerendo.

    Em contra-razões de fls. 627/635, Mauro A. Molossi requereu, em preliminar, a intempestividade do recurso de apelação do Ministério Público Federal. No mérito, pugnou pela manutenção da sentença recorrida.

    À fl. 637, o Ministério Público Federal refuta a alegação de intempestividade de sua apelação, aduzindo que os embargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos.

    Remetidos os autos a esta Corte, também por força do reexame necessário, Marco Antônio Molossi requereu, por meio da petição de fls. 641/642, a juntada do projeto arquitetônico do local para comprovar que, antes de ter adquirido o direito de ocupação do terreno onde iniciou a construção de um hotel pousada, a área ocupada já tinha as características físicas atuais.

    Ao se manifestar sobre referido documento, a União aduziu que sequer restou demonstrado que o referido projeto tenha sido aprovado, uma vez que o carimbo do Ministério do Interior, Departamento de Obras de Saneamento, contém tão-somente a expressão “visto”. Ressaltou ainda que a juntada do projeto arquitetônico foi feita de forma extemporânea, não podendo ser aceita a tese de que tal documento não era de conhecimento do autor/apelado e que apenas recentemente foi encontrado, posto que o proprietário no projeto arquitetônico Sr. Nilo Pio Marcelino, foi ouvido como testemunha. (fls. 524/526)

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200330

    À fl. 648, o Ministério Público Federal requereu o desentranhamento do documento de fls. 643, alegando ter sido intempestivamente juntado aos autos.

    Em parecer de fls. 657/658, a Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo provimento das apelações.

    É o relatório. Ao revisor.

    VOTO

    O Exmo. Sr. Juiz Federal Joel Ilan Paciornik: Trata-se de ação civil pública proposta pela União objetivando a demolição de um hotel pousada edificado na praia de Porto Belo/SC, em setembro de 1993, reputada como lesiva ao patrimônio público e ao meio ambiente, bem como a anulação do ato pelo qual o Município autorizou a construção e a cassação do direito de ocupação do réu Mauro Antonio Molossi.

    Primeiramente, por força do reexame necessário, cumpre destacar que a legitimidade passiva do Município de Porto Belo/SC decorre do fato de que o mesmo foi quem concedeu o alvará para construção do hotel, o qual foi deferido pelo Secretário de Planejamento e Urbanismo (doc. de fl. 216), Secretaria esta pertencente à Prefeitura Municipal de Porto Belo/SC.

    Assim, como o Município de Porto Belo autorizou a edificação do hotel pousada em terreno de marinha, contribuíram seus agentes para a prática da atividade alegada como prejudicial ao meio ambiente, daí decorrendo a legitimidade passiva para a causa.

    Neste sentido inclusive já se posicionou Hugo Nigro Mazzili, em seu livro A defesa dos interesses difusos em juízo, 13ª edição, 2001, p. 256:

    “União, Estados, Municípios ou Distrito Federal podem ser legitimados passivos para a ação civil pública, pois que, quando não parta deles o ato lesivo, muitas vezes para ele concorrem quando licenciam ou permitem a atividade nociva, ou então deixam de coibi-la quando obrigados a tanto.” (grifo nosso)

    De igual maneira leciona Rodolfo de Camargo Mancuso, em seu livro Ação Civil Pública – Em defesa do Meio Ambiente, do Patrimônio Cultural e dos Consumidores, 7ª edição, 2001, p. 170/171:

    “É claro que esta responsabilidade objetiva colocará no pólo passivo da ação todos

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 31

    os que, por ação ou omissão, contribuíram para o evento danoso à sociedade. É a socialização do risco e do prejuízo, a que se referia Savatier. A propósito, já escreveu Sergio Ferraz: ‘Creio que, em termos de dano ecológico, não se pode pensar em outra colocação que não seja a do risco integral. Não se pode pensar em outra malha senão a malha realmente bem apertada que possa, na primeira jogada da rede, colher todo e qualquer responsável pelo prejuízo ambiental’.

    (...)Ordinariamente, como já se fez referência, a responsabilidade dos Poderes e

    órgãos públicos resulta de conduta omissiva (devem agir e não o fazem) ou da faute du service (agem, mas fazem-no mal). Nesse ponto merecem transcritas as palavras de H. N. Mazzili: ‘Co-legitimado à propositura das ações civis públicas e coletivas, por paradoxo, o Estado muitas vezes é diretamente responsável ou co-responsável pelas lesões a interesses metaindividuais. Muitos danos ambientais decorrem de atividades concedidas, permitidas ou autorizadas pelo Poder Público’.” (grifo nosso)

    Por outro lado, não há como se sustentar a ilegitimidade passiva do Município pelo fato de ter o Secretário de Planejamento e Urbanismo atendido à legislação municipal (Lei Municipal nº 533/89), que lhe confere competência para aprovar o projeto de construção em apreço com a expedição do respectivo alvará. Isto porque, conforme muito bem salientado na decisão recorrida (fl. 578),

    “em sede de Direito Ambiental e de Direito Urbanístico, a competência legiferante é concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal (art. 24 da CR). Ainda que tenha sido respeitada a legislação municipal, e mesmo que ao Município compita dispor sobre assuntos de interesse local (art. 30 da CR) pode haver ofensa às legislações estadual e nacional, e até antinomias (entre preceitos da legislação municipal em face das outras duas) e, neste caso, em tese, justifica-se a inclusão do Município no pólo passivo.”

    Passo à análise dos recursos de apelação interpostos pela União e pelo Ministério Público Federal, visto que ambos preenchem os requisitos de admissibilidade.

    Impende destacar que a alegada intempestividade do recurso de apelação do Ministério Público Federal resta afastada em virtude da disposição contida no artigo 538 do Código de Processo Civil no sentido de que os embargos de declaração interrompem os prazos para a interposição de outros recursos.

    Assim, como no caso sub judice o Ministério Público foi intimado da sentença de fls. 604/606 que decidiu os embargos de declaração em 19.09.97, consoante se infere da certidão de fl. 606, verso, e tendo sido o recurso de apelação por ele interposto em 20.10.97, conforme se observa

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200332

    do protocolo à fl. 609, restou obedecido o prazo legal para interposição do recurso de apelação na forma ditada pelo artigo 508, combinado com art. 188 do Código de Processo Civil.

    Com efeito, no que tange ao mérito propriamente dito, a Lei nº 7.347/85 em seu artigo 1º previu a ação civil pública para a defesa do meio ambiente, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.

    Segundo o artigo 3º, inciso I, da Lei nº 6.938/81, “meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.” Portanto, dentro do conceito de meio ambiente pode ser enquadrado a defesa da flora, fauna, das águas, do solo, do subsolo e do ar.

    A Constituição Federal, por seu turno, no artigo 225 preceitua que:

    “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

    De igual forma, estabelece a Carta Magna no artigo 20, inciso VII, que os terrenos de marinha e seus acrescidos são bens da União.

    O fato de o hotel pousada estar sendo construído em terreno de marinha restou incontroverso nos autos. A construção em terrenos de marinha não encontra óbice legal.

    Cinge-se o questionamento recursal, no entanto, em analisar se a construção do referido hotel obedeceu ao contido na legislação estadual e federal que se sobrepõem à legislação municipal em matéria de direito ambiental em decorrência da competência concorrente estabelecida na Constituição. (art. 24)

    Com efeito, em nível federal temos o Código Florestal (Lei nº 4.771/65) com as alterações trazidas pela Lei nº 7.803/89, que estabelece em seu artigo 2º diversas áreas como de preservação permanente, nelas não se enquadrando a área objeto do presente litígio.

    Por sua vez, a Lei nº 7.661/88 ao instituir o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro prevê em seu artigo 3º:

    “Art. 3º. O PNGC deverá prever o zoneamento de usos e atividades na Zona Costeira e dar prioridade à conservação e proteção, entre outros dos seguintes bens:

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 33

    I – recursos naturais, renováveis e não renováveis; recifes, parcéis e bancos de algas; ilhas costeiras e oceânicas: sistemas fluviais: estuarinos e lagunares, baías e enseadas; praias; promontórios, costões e grutas marinhas; restingas e dunas; florestas litorâneas, manguezais e pradarias submersas;”

    No plano estadual, a Lei nº 5.793/80 em seu artigo 6º dispõe expressamente que:

    “Art. 6º. O Poder Executivo poderá, mediante decreto, criar áreas de proteção especial e zonas de reserva ambiental, visando preservá-las e adequá-las aos objetivos desta Lei.

    § As áreas de que trata este artigo poderão compreender:b) promontórios e ilhas fluviais, costeiras e oceânicas.”

    Para regulamentar esta Lei, o Poder Executivo de Santa Catarina editou o Decreto nº 14.250/81 que contém dispositivos pertinentes à matéria:

    “Art. 42. São consideradas áreas de proteção especial:II – Os promontórios, as ilhas fluviais, e as ilhas costeiras e oceânicas, estas quando

    cedidas pelo Governo Federal;”

    “Art. 43. Para efeito deste regulamento, considera-se:III – promontório – a elevação costeira florestada ou não que compõe a paisagem

    litorânea do continente ou de ilhas...”

    “Art. 47. Nos promontórios, numa faixa de até 2.000 (dois mil) metros de extensão, a partir da ponta mais avançada é proibido:

    I – o corte raso da vegetação nativa;II – a exploração de pedreiras e outras atividades que degradem os recursos naturais

    e a paisagem; eIII – a edificação de prédios ou construção de qualquer natureza.Parágrafo único – Mediante prévia autorização, desde que admitida pelos órgãos

    municipais ou, quando for o caso, pelos órgãos federais competentes, poderá ser deferido o pedido de construção de que trata o item III, deste artigo.”

    Em nível municipal, a Lei de Planejamento Urbano do Município de Porto Belo, Lei nº 426/84, em seu artigo 10º, alínea d, permite a instalação de hotel, pensão ou hospedagem em área urbana do Município, nela se enquadrando a área discutida, e a Lei nº 533/89 em seu artigo 58, incisos VII, VIII e XIII respectivamente, preceitua ser incumbência da Secretaria do Planejamento e Urbanismo inspecionar e fiscalizar as obras públicas e particulares; fornecer certificado de habite-se e licenciar a construção civil.

    Portanto, não há dúvida quanto à legitimidade da autoridade

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200334

    administrativa que expediu a licença ambiental prévia (doc. de fl. 214), a licença ambiental de instalação (doc. de fl. 215) e o alvará de construção (doc. de fl. 216) da obra impugnada.

    A área objeto do litígio, ao contrário do entendimento esposado na sentença recorrida, a meu ver, detém a qualidade de promontório, que pode ser conceituado como “cabo formado de rochas elevadas ou alcantis” (apud Minidicionário Aurélio, p. 387). Fundamento tal convicção nas fotografias acostadas aos autos às fls. 238 e 244 e nas informações trazidas pelo laudo pericial à fl. 381:

    “A construção do Hotel Pousada foi feita sobre um promontório, componente da geografia natural daquele lugar, cujo litoral é entrecortado por baias e outras pontas que avançam ao mar.”

    Logo, como a construção foi erigida sobre um promontório natural, constitui área de preservação permanente nos termos do artigo 6º da Lei nº 5.793/81 e do artigo 3º da Lei nº 7.661/88.

    O Decreto nº 14.250/81 acima transcrito permite a construção em promontórios, desde que haja prévia autorização, e desde que admitido pelos órgãos municipais ou, quando for o caso, pelos órgãos federais competentes.

    Restou indubitável que, no caso sub judice, a entidade responsável pelo controle ambiental em Santa Catarina – FATMA – concedeu a autorização para instalação (doc. de fl. 215), e a Prefeitura Municipal de Porto Belo expediu o respectivo alvará, autorizando a construção. (doc. de fl. 216)

    Entretanto, não restou observado quer a disposição contida no artigo 225, inciso IV, da Constituição Federal de 1988, quer a contida no § 2º do artigo 6º da Lei nº 7.661/88, os quais exigem o estudo prévio de impacto ambiental para a construção de obra em zonas costeiras, senão vejamos:

    “Art. 225, IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou de atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental do meio ambiente estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;”

    “Art. 6º. O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalação das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, além do disposto nesta lei, as demais normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.

    § 2º. Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 35

    Relatório de Impacto Ambiental – RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.”

    Tal fato restou comprovado nos autos da informação prestada pela Fundação do Meio Ambiente-Gerência Regional da Grande Florianópolis (doc. de fl. 55) da qual consta expressamente:

    “1. – não houve propriamente consulta acerca da situação ambiental ou consulta sobre o impacto ambiental, formulada pelo Sr. MAURO ANTONIO MOLOSSI – ocupante de um terreno de marinha situado no município de Porto Belo – mas, em 27.07.93, foi-nos requerida a análise dos documentos entregues para a obtenção da Licença Ambiental Prévia (LAP) desta Fundação, referente a implantação de um Hotel nas imediações da Enseada da Encantada, originando – administrativamente – o Processo GRF/P 101/93 nesta Gerência;.

    2. – baseado em Declaração, expedida em 21.07.93 pela Prefeitura Municipal, de que ‘é admissível a atividade de Hotelaria previsto na Lei de Zoneamento do Plano Diretor Físico e Territorial do Município de Porto Belo enquadrando-se na ZR-1A, em vistoria do local e parecer interno favorável (considerando que a vegetação remanescente já havia sido ‘descaracterizada’ por ocupações anteriores e pela implantação de grama em área aplainada de solo argilo-arenoso), em 01.10.93 foi emitida a LAP nº 71 F93 – através da qual declaramos a viabilidade locacional do empreendimento ou seja, a localização de um Hotel num imóvel de 2.378 m2 na localidade em questão, sem autorizar o início de sua construção e condicionada a entrega de projeto hidrossanitário;”

    No caso dos autos, portanto, a FATMA dispensou o estudo de impacto ambiental em razão da implantação de grama em área aplainada de solo argilo-arenoso e da descaracterização da vegetação remanescente por ocupações anteriores. Portanto, a dispensa do estudo de impacto ambiental e do respectivo relatório de impacto ambiental foi feita de forma implícita, mas com a devida motivação. Ressalte-se ainda que a motivação utilizada pode ser tida como razoável, eis que a Constituição Federal exige o prévio estudo de impacto ambiental para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente. Não é o que se verifica no caso dos autos, tendo em vista que à frente do terreno foi construído um aterro hidráulico por obra do poder público e atrás foi construída a estrada que liga Porto Belo a Bombinhas.

    Neste sentido, destaco o acórdão nº 9504220347/SC, da 5ª Turma desta Corte, da lavra da Juíza Marga Barth Tessler:

    “ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. PRELIMINARES DE NULIDADE DA SENTENÇA. JULGAMENTO NÃO-SIMULTÂNEO DE AÇÕES CONEXAS. AFRONTA AO ART. 398 DO CPC-73. CONTRADIÇÃO DA R. SENTENÇA.

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200336

    INOCORRÊNCIA AUTORIZAÇÃO PARA CORTE DE VEGETAÇÃO E LICENCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO DE ANFITEATRO. REGULARIDADE. PROVA PERICIAL. CREDIBILIDADE. POLUIÇÃO E IMPACTO AMBIENTAL. EIA E RIMA. DISPENSABILIDADE. MATA CILIAR. PRECEDENTE DE AÇÃO DIRETA 73-0/SP. INAPLICABILIDADE.

    (...)4. Pelo conjunto probatório, não houve quaisquer irregularidades na autorização do

    IBAMA e FATMA ao Município para corte de vegetação. Inexistentes, também, provas de que o Município teria agido com má-fé e ambigüidades contra todas as determinações legais, ou que teria apresentado laudo falso sobre a vegetação.

    5. Conforme a prova pericial, o Município teria extrapolado a autorização concedida pelo IBAMA e pela FATMA no que tange ao impedimento para a retirada da floresta ciliar, ou seja, a área referente a 30 (trinta) metros de cada lado dos dois córregos existentes.

    6. (...)7. (...)8. Segundo o laudo pericial oficial, não restou comprovada a hipótese de poluição

    ambiental alegada pelo recorrente com a construção do anfiteatro; outrossim, não foi constatada, pela perícia, a produção de impacto ambiental nos termos previstos pelo art-1 da Res-1 do CONAMA.

    9. A dispensa do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do seu relatório (RIMA) foi feita pela FATMA, autoridade ambiental competente, com a devida motivação e segundo critérios razoáveis e comprovados nos autos. Ademais, in casu, a perícia judicial serve ao propósito instrumental do RIMA.

    10. A proibição de desmatamento na mata ciliar dos rios e cursos d’água feita pelo Código Florestal não se aplica a este caso, face às circunstâncias de reduzida ou nenhuma repercussão ambiental.

    (...)”

    Ademais, a ocupação anterior, bem como o aterramento da área ocorreu antes da obtenção por parte do réu Mauro Antonio Molossi do seu direito de ocupação.

    Para corroborar tal assertiva transcrevo alguns depoimentos colhidos na fase de instrução probatória:

    “O local era uma espécie de um istmo de pedras, sem praia, onde foi feito um aterro, provavelmente na década de 80. Ali foi edificado um muro que fazia divisa com o mar.” (Flávio Gilberto Neumann, detentor de casa de veraneio em Porto Belo – fl. 455)

    “Que a área onde esta pousada ou hotel está sendo construída não é aterro recente, pois o terreno já existia... que o terreno tem um formato redondo com um muro muito antigo em volta; ... que desde que Nilo detinha a ocupação daquele terreno o muro

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 37

    circundante já existia; que é o mesmo muro até hoje; que não foi Mauro Molossi que construiu tal muro...” (Maria Francisca Santos Ribeiro, vizinha – fl. 469)

    “Que no local onde está a construção antigamente era água do mar, digo, inclusive ao redor... Nesta época já havia um muro em volta do terreno. Foi feito pelo anterior proprietário.” (Audi Marli Antune, vizinho – fl. 477)

    “Que o hotel foi construído sobre o aterro feito pelo Sr. Nilo.” (Cezar Zillig, vizinho –fl. 493)

    “Que o depoente no ano de 1972, aproximadamente, comprou uma área com cerca de 1700m2 de um francês que morava em Itajaí; que esta área pertencia anteriormente a João Bayer Neto, e o francês tinha procuração outorgada por ele; que por volta de 1976 o depoente adquiriu uma área contígua, de quase 700m2 de um cidadão que era diretor da Farmácia Catarinense em Joinville; que, verificando o mapa da fl. 42, o depoente esclarece que a segunda área adquirida ficava ao lado direito do terreno maior, que ali está retratada; que no mapa de fl. 240 a área menor adquirida é aquela na qual existe um rancho para barco; que entre 1979 e 1980 o depoente fez um muro em volta de todo o terreno; que, olhando o mapa de fl. 240, esclarece o depoente, os muros que ali constam foram por ele construídos; que o depoente vendeu as duas áreas para Mauro Molossi, há, pelo menos, 5 anos atrás; que a área menor comprada do diretor da Farmácia Catarinense, não tinha nenhum documento, pois antigamente era terreno de pescador; que, com relação a essa área, foi feito um documento de venda por instrumento particular; que as duas áreas juntas ficaram com, aproximadamente, 2400 m2; que quando vendeu o terreno para Mauro Molossi, constou a metragem das duas áreas unificadas; que foi um engenheiro do DNOS que fez o desenho do muro que foi construído pelo depoente; que quando o depoente comprou o terreno, ele já era todo cercado; que esclarece que todos os dois terrenos eram cercados, inclusive pelo lado de fora; ... que o depoente fez um nivelamento do terreno até os muros;”

    O laudo pericial de fls. 381/382, por sua vez, ao se manifestar sobre o aterro assim concluiu:

    “O aterro, que elevou para 1.892,11 m2 a área, pela observação da planta de fls. 241, teria sido efetuado até os limites à frente do promontório. Como a linha que delimitava o mar, segundo o DSPU/SC (fl. 45) era formada por costão (rochas), o aterro fez nivelar o promontório nesses pontos.”

    Desta forma, a autora não se desincumbiu do seu ônus de provar que o aterro tenha sido feito pelo réu Mauro Molossi e que parcelas do mar tenham sido objeto de aterramento. Ademais, o muro de arrimo pode eventualmente até ter sido reformado pelo réu Mauro Molossi diante do depoimento da testemunha Nilton Rodrigues de que no mesmo havia uma parte velha e uma nova (fl. 522) , mas já existia há muito tempo no local.

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200338

    Inobstante isto, as fotos de fls. 385/396, a prova testemunhal e a prova pericial noticiam a alteração na geografia da região consubstanciada na construção de um aterro hidráulico na praia de Porto Belo, o que fez surgir uma larga faixa de areia bem em frente do terreno onde estava sendo edificada a obra impugnada.

    Assim, ainda que se considerasse que o autor tivesse invadido parcelas do mar, agora esta área, como bem salientou o magistrado a quo,

    “deve ser considerada como acrescido de marinha (assim entendidos como os terrenos que se formem, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimentos aos terrenos de marinha – art. 3º do DL nº 9.760/46), uma vez que aterro posterior foi realizado (e em relação a tal obra não há dúvida alguma) por ação do poder público. A construção em acrescidos de marinha, quanto ao aspecto ambiental, não é, em princípio vedada.”

    Em razão da construção do aterro hidráulico por obra da dragagem da Prefeitura Municipal de Porto Belo, ficaram sem sentido as alegações de interrupção da praia, de impossibilidade de acesso à praia por parte da população, bem como a de interrupação do curso das correntes marítimas.

    A tese atinente à impossibilidade de dar adequada destinação ao esgoto, já havia sido afastada pela conclusão do perito abaixo transcrita:

    “Existem técnicas corriqueiras de engenharia para a solução do problema apontado e que podem ser adotadas no Hotel Pousada, como a que foi condicionada na LAI (Licença Ambiental de Instalação) nº 19F96, concedida pela FATMA para controle ambiental através de um sistema de tratamento de esgoto com aeração por ar difuso, conforme cópia anexa.” (fl. 381)

    De fato, a FATMA, ao conceder a Licença Ambiental de Instalação em 06 de março de 1996, reconheceu a viabilidade do tratamento do esgoto com aeração por ar difuso com todas as especificações (fl. 387, verso). Não bastasse isto, a superveniência da construção do aterro hidráulico na frente do terreno acaba por tornar inócua qualquer discussão sobre o adequado tratamento do esgoto.

    A menção ao fato de que a obra implicaria agressão ao paisagismo e à beleza da praia de Porto Belo foi refutada pela conclusão do perito no sentido de que “o empreendimento, além de não prejudicar, valoriza o visual do lugar.” (fl. 383)

    Por derradeiro, cabem algumas ponderações acerca da questão da ocupação do réu Mauro Molossi.

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 39

    Consta da escritura pública acostada aos autos à fl. 43 que o réu Mauro Antonio Molossi adquiriu de Nilo Pio Marcelino um terreno de marinha com área de 2.460 metros quadrados. À fl. 212 dos autos consta a certidão da inscrição de ocupação referente à mesma área.

    Junto com o depoimento do Sr. Wilson Borlin (fl. 520), servidor da Delegacia de Patrimônio da União, foi acostado aos autos o Registro Patrimonial Imobiliário – RIP de duas áreas, sendo uma em nome de Nilo Pio Marcelino com área de 697,29m2 (fl. 529) e outra em nome de Mauro Antonio Molossi com área de 2.460,00 m2 (fl. 531). Tal depoente asseverou que “supõe que a certidão de número 191 englobe também a área da certidão 192, obtendo-se, assim, o total aproximado de 2.400 m2.”

    Esta suposição restou confirmada com o relato de Nilo Pio Marcelino à fl. 524:

    “Que o depoente no ano de 1972, aproximadamente, comprou uma área com cerca de 1700m2 de um francês que morava em Itajaí; que esta área pertencia anteriormente a João Bayer Neto, e o francês tinha procuração outorgada por ele; que por volta de 1976 o depoente adquiriu uma área contígua, de quase 700m2 de um cidadão que era diretor da Farmácia Catarinense em Joinville; que, verificando o mapa da fl. 42, o depoente esclarece que a segunda área adquirida ficava ao lado direito do terreno maior, que ali está retratada; que no mapa de fl. 240 a área menor adquirida é aquela na qual existe um rancho para barco; que entre 1979 e 1980 o depoente fez um muro em volta de todo o terreno; que, olhando o mapa de fl. 240, esclarece o depoente, os muros que ali constam foram por ele construídos; que o depoente vendeu as duas áreas para Mauro Molossi, há, pelo menos, 5 anos atrás; que a área menor comprada do diretor da Farmácia Catarinense, não tinha nenhum documento, pois antigamente era terreno de pescador; que, com relação a essa área, foi feito um documento de venda por instrumento particular; que as duas áreas juntas ficaram com, aproximadamente, 2400 m2; que quando vendeu o terreno para Mauro Molossi, constou a metragem das duas áreas unificadas;”

    Em 22 de abril de 1994, por força de decisão da Delegacia da Secretaria do Patrimônio da União em Santa Catarina, a área de ocupação de Mauro Antonio Molossi foi reduzida para 1.672,01 metros quadrados.

    Todavia, em que pese o seu direito de ocupação ter sido reduzido por força da referida decisão administrativa, consta dos autos à fl. 213 uma outra escritura pública através da qual o réu Mauro Antonio Molossi teria adquirido de Erico Manoel da Silva e de sua mulher Marli Guerreiro da Silva um terreno de marinha com benfeitorias com área de 298 metros

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200340

    quadrados, na qualidade de terreno anexo ao adquirido anteriormente de Nilo Pio Marcelino.

    Assim, mesmo que considerada a área originária de 1.672,01 metros quadrados, ainda assim a construção do hotel na forma licenciada, ou seja, com 1.800 metros quadrados do terreno, não estaria a princípio além do direito de ocupação do demandado.

    Portanto, a autora não provou de forma inequívoca a existência de irregularidade no que tange à ocupação do imóvel.

    Ressalte-se, outrossim, que a juntada do projeto arquitetônico de fls. 643/ não alterou em nada o deslinde da causa, em razão de que a questão ali versada já se encontrava esclarecida por meio da prova testemunhal produzida no feito.

    Ademais, mesmo que houvesse a referida comprovação, as questões referentes à dominialidade e ao direito de ocupação refogem do âmbito da ação civil pública.

    Por derradeiro, como nenhum óbice à proteção ambiental restou caracterizado em razão da edificação combatida, a improcedência da presente ação civil pública se impõe.

    Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação da União, do Ministério Público Federal e ao reexame necessário.

    VOTO DIVERGENTE

    O Exmo. Sr. Des. Federal Valdemar Capeletti: A questão central da presente ação civil pública é a legalidade da construção de um Hotel Pousada no Município de Porto Belo/SC, situado em terreno de marinha e seus acrescidos, utilizando um aterro sobre o mar, em zona chamada de promontório, e, conseqüentemente, área de preservação permanente.

    O eminente Relator Juiz Joel Ilan Paciornik nega provimento aos apelos, mantendo a sentença que julgou improcedente a Ação Civil Pública promovida pela União.

    Revisando o feito, peço vênia para divergir do nobre Relator, ressalvando o exame das questões preliminares, com as quais estou de acordo.

    Primeiramente, cabe ressaltar a natureza do bem que, em última análise, está sob discussão. Trata-se de ambiente ecologicamente equilibrado,

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    bem de uso comum do povo, indispensável à sadia qualidade de vida, erigido pela Constituição de 1988 à condição de direito fundamental da pessoa humana.

    Art. 225, caput, da CF/88:

    “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

    Assevera José Afonso da Silva, in Curso de Direito Constitucional Positivo, que:

    “As normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente”.

    Considera que a tutela da qualidade do meio ambiente é instrumento, não só para a defesa do direito à vida, mas, sim, para a defesa de um valor maior, que é a qualidade da vida humana e todos os seres vivos.

    Frente a isso, pode-se aferir a existência de princípios norteadores e fundamentais na tutela do meio ambiente, como o Princípio da Natureza Pública da Proteção Ambiental - tornando o interesse na tutela ambiental indisponível -, Princípio da consideração da variável ambiental no processo decisório de políticas de desenvolvimento - buscando um desenvolvimento sustentável -, bem como o Princípio da Prevenção - ensejador do Estudo do Impacto Ambiental -, entre muitos outros.

    Entre os princípios referidos, destaco o da Prevenção, uma vez que considero a função do Direito Ambiental muito mais preventiva do que reparadora, mesmo porque esta, na maioria da vezes, é de possibilidade incerta.

    Sobre o Princípio da Prevenção ensina Édis Milaré, in Direito do Ambiente, 2ª edição, Editora Revista dos Tribunais:

    “Vale dizer, a incerteza científica milita em favor do ambiente, carregando-se ao interessado o ônus de provar que as intervenções pretendidas não trarão conseqüências indesejadas ao meio considerado”.

    Diante dessas considerações, passo a analisar as questões pontuais.Entendo, por vários motivos a seguir expostos, que as licenças

    concedidas pelo órgão estadual (FATMA) não estão regulares.

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200342

    O licenciamento ambiental ganhou status de verdadeiro instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente por meio da Lei nº 6.938/81. A Resolução nº 237/97 do CONAMA conceituou licenciamento ambiental como sendo:

    “O procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas aplicáveis ao caso”.

    A licença prévia concedida pela FATMA não respeitou as exigências legais. O Decreto nº 99.274/90, que regulamentou a Lei nº 6.938/81 (Lei da Política Nacional do Meio Ambiente), no seu art. 19, previu os tipos de licença, in verbis:

    “O Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as seguintes licenças: I – Licença Prévia (LP), na fase preliminar do planejamento da atividade, contendo

    os requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e operação, observados os planos municipais, estaduais ou federais de uso do solo:” (grifei)

    Corroborando, a Resolução nº 237/97 do CONAMA, no seu art. 8º, inc. I, conceituou licença prévia, in verbis:

    “Licença Prévia (LP), concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade, aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação”. (grifei)

    Como se extrai da leitura dos dispositivos acima descritos, a licença prévia deve conter a análise de requisitos primeiros e fundamentais, como a localização do empreendimento.

    O empreendimento em questão está localizado, segundo consta no próprio laudo pericial, às fls. 381-386, em área chamada de promontório. Esta área é considerada de preservação permanente pela legislação do Estado de Santa Catarina por meio da Lei nº 5.793/80 e do Decreto nº 14.250/81, bem como pela legislação municipal. (Lei Municipal nº 426/84)

    O art. 47 do referido decreto dispõe, in verbis:

    “Nos promontórios, numa faixa de até 2.000 (dois mil) metros de extensão, a partir da ponta mais avançada é proibido:

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    (...)I - o corte raso da vegetação nativa;II - a exploração de pedreiras e outras atividades que degradem os recursos naturais

    e a paisagem;III - a edificação de prédios ou construção de qualquer natureza”. (grifei)

    O art. 9º da Lei Municipal, no item 07, dispõe:

    “07 - Zona de Preservação Permanente (ZPP) representa três categorias de áreas non aedificandi:

    ZPP1 – destinada à preservação das faixas de areia existentes em todo o Município, bem como as áreas acrescidas de Marinha natural ou artificialmente, pertencentes ao Patrimônio da União, e destinadas exclusivamente para o uso público”. (grifei)

    Sendo assim, resta claro que a licença prévia possui um vício originário na sua concessão, visto que o órgão estadual não respeitou um critério fundamental nesta fase, ou seja, a localização. Concedeu licença a um empreendimento localizado em área onde é proibida a construção de qualquer natureza, área non aedificandi. Esta aprovação indevida do órgão estadual quanto à localização do projeto, torna a referida licença viciada de forma absoluta, tornando-a nula. Por decorrência lógica, a licença de instalação está contaminada pelo vício da primeira.

    Apenas a fim de argumentar, acho importante referir os seguintes aspectos quanto à concessão das licenças:

    A Licença Prévia foi concedida pela FATMA, em 1º.10.93, condicionada a entrega de um projeto hidrossanitário (fl. 69). Em 1º.02.94, foi concedida a Licença de Instalação com as condições de que o empreendimento não deveria impedir o livre acesso do povo em qualquer direção e sentido da orla e de implantação do sistema de tratamento de esgotos. (fls.73-74)

    Realizadas vistorias, foi verificado que havia o descumprimento da condição de acesso à praia. Em 28.03.94, a FATMA aplicou pena de advertência ao Sr. Mauro Molossi e cancelou a Licença de Instalação, na qual tinha sido dado prazo de 30 dias a fim de o mesmo apresentar um novo projeto, de forma que não mais impedisse o acesso à praia e minimizasse as agressões ao meio ambiente. (fls. 60-61)

    Ocorre que, em 1996, a FATMA concedeu uma nova Licença de Instalação, entendendo por resolvida a questão do acesso à praia, tendo em vista a dragagem feita pela Prefeitura, onde se criou uma praia

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    artificial em área marítima, aumentando a praia de maneira considerável. Comparando-se as fotos juntadas aos autos antes (fls. 238, 244, 250-

    254) e depois da dragagem (fls.385-386,398), percebe-se que, de fato, o problema do acesso à praia não existe mais.

    Frente a isso, cabe salientar que a Lei nº 7.661/81 (Lei de Gerenciamento Costeiro), no seu art. 10, caput, disciplinou o uso e acesso às praias, dispondo in verbis:

    “As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica”.

    Nota-se que o legislador brasileiro concebeu as praias como sendo um bem de uso comum, isto é, de utilização comum pela coletividade, devendo seu acesso ser garantido a todos.

    Sobre o sentido da expressão bem de uso comum do povo associada ao meio ambiente, o douto professor José Afonso da Silva, in Direito Ambiental Constitucional, refere:

    “pode-se dizer que tudo isso significa que esses atributos do meio não podem ser de apropriação privada, mesmo quando seus elementos constitutivos pertençam a particulares”.

    Ensina o ilustre Paulo Affonso Leme Machado, in Direito Ambiental Brasileiro, sobre o uso e acesso às praias:

    “Contraria a finalidade de utilização comum pela população a concessão de parte da praia para clubes construírem áreas esportivas, a ocupação por guarda-sóis de edifícios fronteiriços ou a autorização para a construção de bares, restaurantes ou hotéis nas praias”. (grifei)

    Diante disso, entendo que a apropriação e transformação da praia para interesses meramente individuais, vai de encontro à destinação comum dada pelo legislador, devendo essa atitude ser coibida pelas vias competentes, impedindo que um bem dessa natureza seja modificado a bel-prazer de alguns, que acreditam que possuem direito exclusivo sobre ele.

    Assim sendo, mesmo que se considere o problema do acesso à praia

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 45

    não mais existente em face da transformação da paisagem por obra da Prefeitura, subsiste o vício originário da licença prévia, no que toca à localização do empreendimento em zona non aedificandi.

    Passo a analisar a questão da competência para a concessão do licenciamento.

    Estabelece a Carta Magna que a competência para proteger o meio ambiente e combater a poluição é comum entre os entes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 23, inc.VI). É de se tomar em conta que essa competência é administrativa, dizendo respeito ao poder de polícia ambiental, como atos de fiscalização, licença, autorização, etc.

    Com vista a efetivar a proteção ao meio ambiente, existem regramentos específicos que disciplinam a competência para o licenciamento ambiental, tendo em vista o bem ou interesse em discussão.

    No caso presente, o licenciamento foi dado para um empreendimento situado na Zona Costeira. Esta foi titulada pela Carta Magna como patrimônio nacional. (art. 225, § 4º)

    Não é sem razão que o constituinte deu um tratamento especial à Zona Costeira, instituindo-a como patrimônio nacional e estabelecendo um Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei nº 7.661/88), no qual se busca a conservação e proteção dos bens relativos a essa zona, como recifes, parcéis, bancos de algas, ilhas costeiras e oceânicas, praias; promontórios, costões, grutas marinhas, restingas, dunas, entre outras, pois os recursos naturais envolvidos são de salutar importância para o equilíbrio ambiental, tanto da região em si (determinada localidade) como do ecossistema visto como um todo.

    Cabe referir que o interesse da União mostra-se presente, pois se trata de terreno de marinha, de propriedade da União, segundo o art. 20, inc.VII, da CF/88. Ademais, esses terrenos, em face da sua localização, desempenham funções de interesse público de proteção da natureza, advindas da proteção especial dada à Zona Costeira.

    Neste sentido, com muita propriedade, ensina o ilustre professor Paulo Affonso Leme Machado “a vocação ambiental dos terrenos de marinha é amparada, portanto, pela noção de ‘patrimônio’ conjugada com a noção de domínio público federal, chamando-se também à colação a função

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    social e ambiental da propriedade (art. 170, CF)”.Pois bem, a FATMA, órgão estadual, concedeu duas licenças, a Prévia e a

    de Instalação. Entretanto, por tratar a área em questão de terreno de marinha, situado em Zona Costeira e por todas as razões acima expostas, entendo não ser razoável defender que licença concedida por órgão estadual seja eficaz para se autorizar uma construção que envolve, de maneira incontestável, um interesse nacional.

    Reforçando a idéia, preleciona o professor Paulo Affonso Leme Machado, que na Zona Costeira há, sim, um interesse preponderantemente nacional:

    “O interesse nacional está claramente delineado nas atividades e obras que sejam levadas a efeito nas áreas do patrimônio nacional enumeradas pela CF no art. 225, § 4º- ‘a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira’ ”.(grifei)

    Frente ao interesse nacional presente, entendo que a competência para o licenciamento deveria ter sido atribuída ao IBAMA, conforme o que dispõe o art. 10, § 4º, da Lei nº 7.804/89:

    “Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis – IBAMA o licenciamento previsto no caput deste artigo, no caso de atividades e obras com significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional”. (grifei)

    Da mesma forma, a Resolução nº 237/97 do CONAMA estabelece:

    “Art. 4º. Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, a saber:

    I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União;”

    Em razão da argumentação exposta, resta dizer que tampouco seria possível defender a idéia que a autorização concedida pelo Município seria suficiente para regularizar a situação da obra, pois ao Município não compete licenciar ou autorizar obras e empreendimentos desta qualidade e amplitude, visto que o art. 30, inc. I, da CF/88, restringe-lhe assuntos de interesse local, e, no presente caso, o interesse refoge, e muito, a um

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    mero interesse local. Ademais, é de se cogitar da imparcialidade da precária declaração

    expedida pela Municipalidade por meio do Secretário de Planejamento e Urbanismo (fl. 64), bem como do Alvará de Construção (fl. 216), uma vez que, por coincidência, a pessoa que os subscreveu é o próprio engenheiro responsável pela obra do Sr. Mauro Molossi. (fl. 35)

    Diante dessas considerações, entendo por precárias e irregulares as licenças concedidas pela FATMA, bem como o alvará do Município, pelo critério da competência.

    Quanto à necessidade do Estudo do Impacto Ambiental (EIA): A Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela Lei nº

    6.938/81, elegeu como instrumentos de gestão ambiental ações de cunho preventivo afetas ao Estado, como a avaliação de impactos ambientais e o licenciamento, para a instalação de obras ou atividades potencialmente poluidoras.

    A Carta Magna, no Capítulo VI, que trata do Meio Ambiente, dispõe que incumbe ao Poder Público, para assegurar a efetividade do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;”. (art. 225, § 1º, inc. IV)

    No que toca à Zona Costeira, a Lei nº 7.661/88, que instituiu o Plano de Gerenciamento Costeiro, no seu art. 6º, fixa a exigência de realização do Estudo do Impacto Ambiental a fim de obtenção do licenciamento:

    “Art. 6º. O licenciamento para parcelamento e remembramento do solo, construção, instalações das características naturais da Zona Costeira, deverá observar, além do disposto nesta lei, as demais normas específicas federais, estaduais e municipais, respeitando as diretrizes dos Planos de Gerenciamento Costeiro.

    § 1º. A falta ou o descumprimento, mesmo parcial, das condições do licenciamento previsto neste artigo serão sancionados com interdição, embargo ou demolição, sem prejuízo da cominação de outras penalidades previstas em lei.

    § 2º Para o licenciamento, o órgão competente solicitará ao responsável pela atividade a elaboração do estudo de impacto ambiental e a apresentação do respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, devidamente aprovado, na forma da lei.”

    Com muita propriedade assevera Édis Milaré, em sua obra Direito do

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    Ambiente, p.316, sobre os instrumentos de gestão ambiental, in verbis:

    “Trata-se de um meio de atuação preventiva, que visa a evitar as conseqüências danosas, sobre o meio ambiente, de um projeto de obras, ou de qualquer atividade. Seu objetivo central é evitar que um projeto (obra ou atividade), justificável sob o prisma econômico ou em relação aos interesses imediatos de seu proponente, se revele posteriormente nefasto ou catastrófico para o meio ambiente. Valoriza-se, na plenitude, a vocação essencialmente preventiva do Direito Ambiental, expressa no conhecido apotegma: é melhor prevenir que remediar (...)”

    Desta forma, mesmo que se defendesse o licenciamento pelo órgão estadual – FATMA, este não poderia ter sido simplesmente “dispensado” o prévio estudo do impacto ambiental, porquanto não possuía elementos concretos e técnicos capazes de concluir que a interferência do empreendimento não iria ocasionar riscos de degradação ou agressão ao meio ambiente.

    No caso em tela, tornava-se imperioso o estabelecimento de alguma espécie de avaliação prévia ambiental, entre as que o ordenamento prevê.

    Não se pode conceber a total inexistência de avaliação ambiental, mesmo porque os laudos periciais juntados aos autos demonstram uma total carência quando o assunto é de ordem ambiental, além de ser questionável a competência de engenheiros civis para assuntos dessa ordem, já que estes profissionais não possuem capacitação para avaliar impactos ambientais.

    É o que se verifica pelas respostas dadas às perguntas referentes à transformação do meio ambiente:

    “Quanto a alegar que pode ter representado agressão ao meio ambiente, é uma consideração subjetiva, que depende de interpretações estéticas sobre o que é mais bonito, rochas nuas ou o terreno nivelado, pois o comportamento ambiental em nada foi alterado” (p. 382)

    Quando perguntado se haveria prejuízos paisagísticos com a edificação da obra no local, respondeu:

    “É uma questão bastante subjetiva. A nós parece que o projeto arquitetónico (sic) foi muito feliz na fixação da predominância das linhas horizontais o que o torna bastante adequado ao local, onde existe a mesma predominância, como a linha do horizonte, a orla da praia, etc..”(p.396)

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 49

    Não obstante, às fls. 405-413, em laudo oferecido pelo Ministério Público Federal, exarado por uma Bióloga da instituição, vê-se bem presente a análise apurada da degradação ambiental na área do empreendimento, no qual foi concluído que o empreendimento causa danos ambientais de gravidade considerável ao ecossistema da zona costeira.

    Diante disso, pondero que os órgãos autorizadores da obra, de forma alguma, poderiam ter dispensado “implicitamente” o EIA, sem ao menos, usar qualquer meio para avaliar a existência efetiva ou potencial de degradação. Ressalto que em matéria ambiental a dúvida é pro ambiente, ou seja, se houver qualquer dúvida, deve-se fazer o prévio estudo antes de conceder qualquer espécie de licença, já que somente assim esse instrumento servirá ao objetivo a que foi criado, prevenir danos ambientais.

    No magistério do douto Paulo Affonso Leme Machado:

    “Deixa de buscar eficiência a Administração Pública que, não procurando prever danos para o ser humano e o meio ambiente, omite-se no exigir e no praticar medidas de precaução, ocasionando prejuízos, pelos quais será co-responsável”.

    Ademais, só para explicitar, considero inconcebível que, atualmente, após o alto grau de conscientização de preservação ambiental, pregar-se que “por já estar degradado”, não há necessidade de preservação futura. A FATMA, às fls. 55-56, entendeu como fator para conceder a licença prévia o fato de a área sob discussão já não possuir suas características originais, afirmando: “(...) considerando que a vegetação remanescente já havia sido ‘descaracterizada’ por ocupações anteriores e pela implantação de grama em área aplainada de solo argilo-arenoso”; afirmações como essa não possuem nenhuma razoabilidade dentro da ordem vigente.

    Por fim, salienta-se que o desenvolvimento econômico da região deve estar alinhado ao respeito comum à natureza e aos ecossistemas; pois o que se defende é um desenvolvimento econômico vinculado ao equilíbrio ecológico, respeitando as normas ambientais de maneira a não se ter um progresso a qualquer custo, ou seja, um progresso, que trará benefícios econômicos imediatos a determinadas pessoas, mas, em contraposição, os prejuízos ambientais serão indeterminados, imensuráveis e, na maioria das vezes, irreparáveis.

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200350

    Os interesses privados possuem relevância no ordenamento jurídico e devem ser tutelados. Entretanto, eles não se encontram acima de interesses e direitos transindividuais, como é um meio ambiente ecologicamente equilibrado, garantido constitucionalmente a todos.

    No que toca à defesa do patrimônio público, entendo que pode e deve ser defendido por meio de ação civil pública. Na área ocupada pelo réu Mauro, houve um nivelamento do terreno e a construção de um muro, sem autorização da União. À fl. 54, a Delegacia de Patrimônio da União expediu notificação na qual era dado prazo de 30 (trinta) dias para demolição do muro e aterro realizados irregularmente (25.04.94). O réu nada fez. Assim sendo, o direito de ocupação concedido ao réu Mauro Molossi para a área de marinha deve ser cassado. Ele desrespeitou as normas administrativas sobre o seu direito de ocupação.

    Trago à colação julgados que corroboram com o entendimento exposto neste voto:

    “ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. TERRENOS DE MARINHA. INTERESSE PROCESSUAL DA UNIÃO FEDERAL. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. PREVALÊNCIA DA PRESERVAÇÃO DO MEIO AMBIENTE. (...) 2. Tratando-se de empreendimento que envolve terrenos de marinha e seus acrescidos, bem como cobertura vegetal densa, além de manguezais, cujos ecossistemas restariam completamente destruídos, não há que se falar em falta de interesse processual da União Federal.

    3. O interesse em proteger e preservar o meio ambiente, previsto na Constituição Federal em seu Capítulo VI, Título VIII, deve prevalecer sobre qualquer tipo de interesse de empresas ou indivíduos, motivo pelo qual não há razão para ser indeferida a realização de perícia antes da aprovação de projeto ecológico pelo IBAMA.

    4. Agravo regimental improvido. (TRF 4ª Região, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 71221, Terceira Turma, Relatora Desa. Federal Luiza Dias Cassales, decisão unânime, DJU 21.03.2001, p. 389)

    AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE. EDIFICAÇÕES EM TERRENOS DE MARINHA SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS FEDERAIS COMPETENTES.

    1. As praias são bens públicos e devem ser preservados para uso comum do povo. Todo e qualquer ato causador de degradação ao meio ambiente estará sujeito à intervenção e controle pelo Poder Público tal como assegura a CF em vigor (art. 225).

    2. As construções de bares sem as mínimas condições higiênicas, em plena orla marítima não só prejudicam o bem estar da coletividade quanto degradam o meio ambiente.

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 2003 51

    3. Padecem de nulidade os atos praticados pela Prefeitura do Município, que permitiu a edificação dos referidos bares em terrenos de marinha, pertencentes à União Federal, sem autorização legal. (TRF 5ª Região, REO AC 26.101/ PE, Terceira Turma, Rel. Juiz José Maria Lucena, DJU 10.03.95) (grifei)

    ADMINISTRATIVO. MEIO AMBIENTE. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. ATERRO SANITÁRIO. LICENÇA ESTADUAL. ATUAÇÃO SUPLETIVA DO IBAMA.

    1. A licença deferida pelo órgão estadual de controle ambiental, não exclui a possibilidade de que o IBAMA, no exercício da competência prevista no artigo-23, inciso VI, da Constituição, venha a impedir a realização da obra, ainda mais porque a mesma afeta área de preservação permanente, nos termos da Lei nº 4771/65.” (TRF4ª Região, AMS 0404060/SC, Terceira Turma, Relator Juiz Sílvio Dobrowolski, decisão unânime, DJ 15.04.92, p. 9532)

    Desta forma, anulo o alvará concedido pela Prefeitura de Porto Belo, assim como casso o direito de ocupação do réu Mauro Molossi pelo uso abusivo. Condeno os réus a procederem, solidariamente, à demolição das edificações do Hotel Pousada, incluindo o aterro e o muro realizados irregularmente, sem lançar os detritos e entulhos no mar. Para isso, fixo o prazo de 60 (sessenta) dias, a partir do trânsito em julgado desta decisão, cominando multa diária pelo descumprimento em R$ 1.000,00 (mil reais).

    Condeno os réus ao pagamento, a título de honorários advocatícios, da quantia de R$ 1.000,00 (mil reais) devidos ao procurador da União. Sem custas a ressarcir.

    Em face do exposto, dou provimento aos apelos e à remessa oficial.É o voto.

    APELAÇÃO CÍVEL Nº 1999.71.01.001786-0/RS

    Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon

  • R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 14, n. 50, p. 21-318, 200352

    Apelantes: Moacyr Guimarães Braga e outro

    Advogados: Drs. Raulim da Costa Gandra e outro

    Apelada: Caixa Econômica Federal - CEF

    Advogados: Drs. Amanda Angélica Gonzales Cardoso e outros

    EMENTA

    Administrativo. Sistema Financeiro de Habitação. Código de Defesa do Consumidor. Reajuste do saldo devedor. URV. Aplicabilidade. IPC. BTNF. Março/90. Reajuste das prestações. Plano de equivalência salarial. Súmula nº 39/TRF4.

    1. Caracterizada como de consumo a relação entre o agente financeiro do SFH, que concede empréstimo oneroso para aquisição de casa própria, e o mutuário, as respectivas avenças estão vinculadas ao Código de Defesa do Consumidor - Lei n. 8.078/90.

    2. Ao desincumbir-se da sua missão, cumpre ao Judiciário sindicar as relações consumeristas instaladas quanto ao respeito às regras consignadas no CDC, que são qualificadas expressamente como de ordem pública e de interesse social (art. 1º), o que legitima mesmo a sua ação ex officio, declarando-se, v.g., a nulidade de pleno direito de convenções ilegais e que impliquem excessiva onerosidade e vantagem exagerada ao credor, forte no art. 51, IV e § 1º, do CDC.

    3. A aplicação da variação da URV no encargo mensal do contrato de mútuo habitacional tem por objetivo manter o equilíbrio entre a prestação e a renda do mutuário, justamente para atender ao conteúdo da cláusula PES.

    4. Uma vez estabelecido o BTNF como critério de reajustamento da poupança em abril de 1990, cujos recursos existentes até a data da Medida Provisória nº 168, de 16 de março de 1990, que se converteu na Lei nº 8.024, de 12 de abril de 1990 (Plano Collor), serviram como fonte dos contratos de financiamento até então celebrados, o mesmo índice deve servir para a atualização do saldo financiado dos contratos de mútuo celebrados no âmbito do SFH.

    5. O reajuste dos encargos mensais de contrato de mútuo com cláusula PES vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação deve ficar limitado

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    aos índices de aumento dos salários da categoria profissional do mutuário, se empregado, e à variação do salário mínimo, se profissional liberal, autônomo ou assemelhado.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

    Porto Alegre, 30 de setembro de 2003. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Relator.

    RELATÓRIO

    O Exmo. Sr. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon: Trata-se de apelação de sentença que julgou parcialmente procedente a ação de revisão de mútuo habitacional para os efeitos de: a) julgar procedente o pedido de declaração do direito de os autores pagarem os reajustes de acordo com o Plano de Equivalência Salarial, mediante a aplicação dos índices de variação do salário mínimo, nos termos da cláusula décima nona, parágrafo segundo, do contrato de compra e venda firmado entre as partes; b) julgar improcedente o pedido de condenação da ré à devolução de quantias pagas a título de reajuste de prestações; c) julgar improcedente o pedido de condenação da ré a abster-se de corrigir as prestações e o saldo devedor acima dos índices indicados na exordial, bem como de fi


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