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Revista Military Review 11182

Date post: 14-Jul-2016
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Revista especializada que trata sobre o papel das Forças Terrestres dos Exércitos dos países da América do Norte e América Latina.
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EDIÇÃO BRASILEIRA MARÇO-ABRIL 2012 http://militaryreview.army.mil As Premissas e a Grande Estratégia p. 2 Ben Lombardi O Emprego da Companhia de Precursores Paraquedista nas Ações nos Complexos do Alemão e da Penha p. 56 Major Anderson Ramos Marques, Exército Brasileiro Uma Nova Solução para a Doutrina das Forças Terrestres p. 72 Major Christopher Henry, Exército dos EUA CENTRO DE ARMAS COMBINADAS, FORTE LEAVENWORTH, KANSAS
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    Combatentes revolucionrios comemoram a preciso de um tiro de carro de combate disparado contra posies dos partidrios de Kada, em Sirte, Lbia, 13 Out 11.

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    PB-100-12-03/04Headquarters, Department of the Army

    PIN: 102772-000Approved for public release; distribution is unlimited

    EDIO BRASILEIRA MARO-ABRIL 2012

    http://militaryreview.army.mil

    As Premissas e a Grande Estratgia p. 2 Ben Lombardi

    O Emprego da Companhia de Precursores Paraquedista nas Aes nos Complexos do Alemo e da Penha p. 56 Major Anderson Ramos Marques, Exrcito Brasileiro

    Uma Nova Soluo para a Doutrina das Foras Terrestres p. 72 Major Christopher Henry, Exrcito dos EUA

    CENTRO DE ARMAS COMBINADAS, FORTE LEAVENWORTH, KANSAS

  • General David G. Perkins Comandante, Centro de Armas Combinadas (CAC)

    Cel John J. Smith Editor-Chefe da Military Review

    Ten Cel Jeffrey Buczkowski Subdiretor

    Redao Marlys Cook Editora-Chefe das Edies em Ingls Miguel Severo Editor-Chefe, Edies em Lnguas Estrangeiras Maj David Youngdoff Gerente de Produo

    Administrao Linda Darnell Secretria

    Edies Ibero-Americanas Paula Keller Severo Assistente de Traduo Michael Serravo Diagramador/Webmaster

    Edio Hispano-Americana Albis Thompson Tradutora/Editora Ronald Williford Tradutor/Editor

    Edio Brasileira Shawn A. Spencer Tradutor/Editor Flavia da Rocha Spiegel Linck Tradutora/Editora

    Assessores das Edies Ibero-americanas Cel Jorge Gatica Brquez Oficial de Ligao do Exrcito Chileno junto ao CAC/EUA e Assessor da Edio Hispano-Americana Cel Douglas Bassoli Oficial de Ligao do Exrcito Brasileiro junto ao CAC/EUA e Assessor da Edio Brasileira

    Foto da capa: Um Elemento de Eq Prec encontra material ilcito ao executar busca na mata prxima comunidade.

    2As Premissas e a Grande EstratgiaBen Lombardi

    Uma das crenas provavelmente mais difundidas com respeito ao pensamento estratgico no mundo ocidental, hoje, a de que nenhum pas deseja a guerra, sempre acompanhada de corolrios como o conflito armado irracional e a guerra nunca a soluo.

    14Um Ambiente com Limitao de Recursos: Um Guia para Pensar sobre Mudanas na Estrutura da Fora Major Jeremy Gray, Exrcito dos EUA, e

    Rickey Smith

    A partir do final de 2011 e do incio de 2012 muitas mudanas estaro ocorrendo no Exrcito, por conta de dois itens inter-relacionados: os resultados da Reviso da Estratgia de Defesa dirigida pelo Presidente Obama e o incio da entrada em vigor dos significativos cortes oramentrios no Departamento de Defesa.

    24Integrando Inteligncia e Informaes: Os Dez Pontos a Serem Considerados pelo Comandante General de Diviso Michael T. Flynn e General (BG) Charles A. Flynn, Exrcito dos EUA

    A integrao de Inteligncia e Informaes tem diferentes significados para diferentes pessoas, mas h um entendimento comum: sem ela, todo o processo decisrio fica comprometido, cheio de lacunas que podem levar a erros de avaliao.

    29Como Conduzir o Navio de Guerra Estadunidense em Direo Comunicao Moral (e ao Verdadeiro xito) no Sculo XXITenente-Coronel Douglas A. Pryer, Exrcito dos EUA

    As Foras Armadas no precisam de mais doutrina, e sim de uma doutrina melhor sobre a tica profissional. Essa nova doutrina deve ser menos moralmente esquizofrnica; mais clara, racionalmente fundamentada, de fcil compreenso e comunicada efetivamente em todas as Foras.

    41A Responsabilidade do ComandoTenente-Coronel Joe Doty (Reserva), Exrcito dos EUA, e Capito de Mar e Guerra Chuck Doty (Reserva), Marinha dos EUA

    Na cultura naval, h duas mximas. A primeira que, se um navio encalhar, a culpa do comandante. A segunda que ele sempre ser o responsvel, mesmo quando no for. Essas palavras no so mero discurso a Marinha dos EUA as coloca em prtica. Muitos comandantes de embarcaes foram destitudos da funo devido a colises ou abalroamentos.

  • Raymond T. OdiernoGeneral, United States Army

    Chief of Staff

    JOYCE E. MORROW Administrative Assistant to the

    Secretary of the Army

    Official:

    0633905

    Military Review Publicada pelo CAC/EUA, Forte Leavenworth, Kansas, bimestralmente em portugus, espanhol e ingls. Porte pago em Leavenworth Kansas, 66048-9998, e em outras agncias do correio. A correspondncia dever ser endereada Military Review, CAC, Forte Leavenworth, Kansas, 66027-1293, EUA. Telefone (913) 684-9338, ou FAX (913) 684-9328; Correio Eletrnico (E-Mail) [email protected]. A Military Review pode tambm ser lida atravs da Internet no Website: http://www.militaryreview. army.mil/. Todos os artigos desta revista constam do ndice do Public Affairs Information Service Inc., 11 West 40th Street, New York, NY, 10018-2693. As opinies aqui expressas pertencem a seus respectivos autores e no ao Ministrio da Defesa ou seus elementos constituintes, a no ser que a observao especfica defina a autoria da opinio. A Military Review se reserva o direito de editar todo e qualquer material devido s limitaes de seu espao.

    Military Review Edio Brasileira (US ISSN 1067-0653) (UPS 009-356)is published bimonthly by the U.S. Army, Combined Arms Center (CAC), Ft. Leavenworth, KS 66027-1293. Periodical paid at Leavenworth, KS 66048, and additional maling offices. Postmaster send corrections to Military Review, CAC, Truesdell Hall, 290 Stimson Ave., Ft. Leavenworth, KS 66027-1293.

    Edio Brasileira Revista Profissional do Exrcito dos EUA Publicada pelo Centro De Armas Combinadas Forte Leavenworth, Kansas 66027-1293 TOMO LXVII MARO-ABRIL 2012 NMERO 2 pgina na internet: http://militaryreview.army.mil correio eletrnico: [email protected]

    Professional Bulletin 100-12-03/04

    45As Lies da Lbia Amitai Etzioni

    O xito militar da campanha liderada pela OTAN na Lbia, em 2011, indica que, mesmo no atual contexto pleno de desafios econmicos, exigncias de corte de gastos e preocupao com o fato de as Foras estadunidenses estarem sobrecarregadas no exterior , as misses humanitrias podem ser executadas efetivamente.

    56O Emprego da Companhia de Precursores Paraquedista nas Aes nos Complexos do Alemo e da PenhaMajor Anderson Ramos Marques, Exrcito Brasileiro

    A Companhia de Precursores Paraquedista, bero das Operaes Especiais do Exrcito Brasileiro, foi amplamente empregada nas principais aes conduzidas durante esse perodo de ocupao, vindo a caracterizar-se como importante elemento multiplicador de combate das tropas componentes da Fora de Pacificao Arcanjo.

    65O Desenvolvimento de Lderes e a Liderana no Exrcito: Perspectivas de CampoRyan M. Hinds e John P. Steele

    A Pesquisa Anual de Liderana do Exrcito, realizada pelo Centro de Liderana do Exrcito (CAL), analisa e acompanha tendncias nas atitudes e no desenvolvimento de lderes, na qualidade da liderana e em sua contribuio para o cumprimento da misso. Mais de cem perguntas abordam temas relativos qualidade da liderana e ao desenvolvimento de lderes.

    72Uma Nova Soluo para a Doutrina das Foras TerrestresMajor Christopher Henry, Exrcito dos EUA

    Os responsveis pela elaborao da doutrina do Exrcito esto buscando desenvolver o maior nmero possvel de publicaes de emprego dual com o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN). As duas Foras Singulares projetam poder militar terrestre e empregam doutrina dentro de um mesmo princpio geral. A adoo dessas publicaes duais ajudar na reduo de gastos, na melhoria do processo de formulao de doutrina e no estabelecimento de uma literatura doutrinria que possa ser utilizada pelas duas para compartilhar.

    78Nosso Erro em Relao ao Mxico Paul Rexton Kan

    Definir o tipo especfico de violncia organizada tem implicaes profundas e de longo alcance para os responsveis pela concepo de estratgias destinadas aos que a enfrentam no dia a dia. Termos como insurgncia e terrorismo geram solues polticas e escolhas estratgicas diferentes das que seriam levantadas em resposta classificao do problema como criminalidade.

  • As Premissas e a Grande Estratgia Ben Lombardi 2011 Ben Lombardi

    Este artigo foi originalmente publicado na revista Parameters (Spring 2011).

    D urAntE umA EntrEvistA coletiva em Cabul, no incio de dezembro de 2010, o Primeiro-ministro britnico, David Cameron, declarou que estava cautelosamente otimista com relao situao no Afeganisto. Ele prosseguiu, dizendo que 2011 deve ser o ano no qual o progresso torna-se irreversvel, porque um Afeganisto mais seguro significa uma Gr-Bretanha mais segura e um mundo mais seguro1. seja qual for nossa avaliao acerca dessa misso liderada pela Organizao do tratado do Atlntico norte (OtAn), declaraes como essa nos fornecem as premissas que, aparentemente, orientam importantes lderes a seu respeito. nessa curta passagem, Cameron afirmou que houve progresso, que esse progresso pode ser tornado irreversvel (ou que, no mnimo, isso o que deve ser feito) e que a estabilidade no Afeganisto contribui diretamente para a segurana britnica. Que todas essas opinies so questionveis, no se discute... Que elas provavelmente fazem parte de um expediente poltico, tambm no... mas, essa, na verdade, a natureza da relao entre premissas e a formulao de estratgias. As premissas proporcionam a sustentao que permite o salto mental em direo a um objetivo poltico passvel de ser compreendido e aceito.

    Estratgia e PremissasEm um artigo recm-publicado, t. X. Hammes

    sustenta que premissas so frequentemente desprezadas na formulao de estratgia, com consequncias que, s vezes, podem ser extremamente srias2. inicialmente, podemos fazer duas observaes. Primeiro, dada a complexidade

    da poltica interna, as premissas so obviamente inevitveis e muitas vezes desempenham umpapel central no processo decisrio. difcil discordar quando Hammes alerta os leitores que [p]remissas so essenciais para definir o seu entendimento do problema. segundo, h uma razo prtica para que essas premissas sejam corretas, ou para que sejam eliminados tantos erros de juzo quanto possvel: h muita coisa em jogo. segundo Hammes, ter abandonado completamente a discusso acerca das premissas fez com que os Estados unidos tivessem muitas dificuldades na concretizao de seus objetivos polticos no iraque e no Afeganisto.

    sem pretender menosprezar a argumentao de Hammes, afirmamos que seu alcance desnecessariamente limitado. Ela se concentra quase exclusivamente nas premissas que influenciam as estratgias de combate ou, em outras palavras, em como lidar com as ideias preconcebidas daqueles que conduzem uma campanha militar ou uma batalha. Esses parmetros no so acidentais. Onde e quando essas pressuposies tm falhado em suas aplicaes militares , obviamente, a principal preocupao de Hammes; sua recomendao para que haja um rigoroso reexame das premissas est relacionada ao desejo de melhorar a eficcia das Foras Armadas dos Estados unidos da Amrica (EuA). Contudo, se analisarmos bem, fica evidente que as premissas afetam todos os nveis onde h formulao de estratgia, desde a grande estratgia at o nvel ttico, no combate. indo direto ao ponto: se as premissas bsicas empregadas na formulao da grande estratgia estiverem incorretas ou forem mal compreendidas, possvel que nem mesmo um excelente desempenho militar seja capaz de preservar, proteger e promover os interesses nacionais.

    Ben Lombardi um cientista de Defesa que atualmente Em geral, suas pesquisas e trabalhos tratam de temastrabalha na Pesquisa e Desenvolvimento de Defesa do relacionados segurana e defesa da Europa. Centro de Anlise e Pesquisa Operacional do Canad.

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  • Premissas e Grande estratGia

    Portanto, pode-se argumentar que h maior exigncia para que os responsveis pelas decises no nvel da grande estratgia estejam mais atentos. E por que assim? Porque nesse nvel que as decises sobre o emprego da capacidade militar so tomadas e como esse emprego de fora ir se relacionar a um cenrio muito maior, definido pelos interesses e objetivos nacionais. Em seu estudo sobre a Espanha do final do sculo Xvi, Geoffrey Parker elaborou uma definio que aplicvel ainda hoje, observando que a grande estratgia:

    Engloba as decises de um dado Estado sobre sua segurana geral a ameaa que ele percebe, as formas segundo as quais ele as enfrenta e os passos que ele toma para que haja coerncia entre os fins e os meios e cada uma delas envolve a integrao de objetivos polticos, econmicos e militares, tanto na paz quanto na guerra, para preservar os interesses de longo prazo, incluindo o gerenciamento dos fins e dos meios, a diplomacia, e o moral nacional e cultura poltica, nas esferas militar e civil3.

    Em outras palavras, no se trata apenas de derrotar um adversrio no campo de batalha, mas de como esses problemas militares contribuem para que os objetivos nacionais sejam atingidos. As premissas discutidas no nvel grande estratgia consideram, necessariamente, temas como o papel do pas, provveis rivais e os meios mais efetivos para alcanar os objetivos nacionais. tendo esse entendimento amplo em mente, a

    discusso a seguir argumenta que precisamos reconhecer que h diferentes tipos de premissas que afetam a formulao estratgica: as impostas, as originadas no processo de governo e as de cultura estratgica. Admitindo que a mitigao de erros tambm um componente essencial em qualquer tentativa de formular estratgia, o segundo objetivo deste artigo introduzir a ideia de eficcia nas premissas.

    Trs Tipos de PremissaAqueles que participaram de estados

    maiores de planejamento provavelmente esto familiarizados com premissas impostas. O contato com elas ocorre quando os encarregados so informados sobre as limitaes polticas de um governo. As premissas frequentemente definem o mtodo que as autoridades devem adotar quando tratando de questes relacionadas formulao de estratgia. uma premissa imposta pode assumir diversas formas: certos assuntos so rotulados como proibidos para anlise; pases especficos so submetidos a uma forma particular de avaliao; e o impacto positivo de certas polticas sobre os interesses nacionais deve ser aceito sem maiores consideraes. no meio militar, muitos se referem ao efeito de uma premissa imposta como situar a apreciao e dai que advm o aspecto controverso de sua aplicao. Essas restries que, por natureza, so altamente polticas parecem solapar um processo de anlise lgico e frequentemente so vistas

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    Esquerda: O Hms Dreadnought era um navio de guerra da Marinha Real. Direita: O Hms nelson foi um encouraado da classe Dreadnought, projetado para a Marinha Real depois da Primeira Guerra Mundial, incorporando todas as liesaprendidas naquele conflito. A Regra dos Dez Anos provocou grandes cortes nos gastos, o que afetou muito a Marinha Real.

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  • como arbitrrias. uma premissa imposta nem sempre lgica, mesmo quando responde a uma exigncia poltica no curto prazo.

    uma premissa imposta tambm pode interromper o processo de formulao de

    Grande Estratgia... no trata apenas de derrotar um adversrio no campo de batalha, mas de como os problemas militares contribuem para que os objetivos nacionais sejam atingidos.

    estratgia. Em certos casos, pode assumir a forma de um dogma que, embora tenha um dia se baseado em uma avaliao racional, permanece preservada pelo governo por razes que so frequentemente bem distintas daquelas que lhe deram origem. Esse tipo de premissa talvez seja capaz de resistir at mesmo a desafios representados por desenvolvimentos posteriores, que poderiam sugerir sua reviso. As dificuldades polticas e psicolgicas para a anlise e o abandono de tais premissas acabam por minar os prprios argumentos que recomendavam que isso fosse feito. um bom exemplo disso a regra dos Dez Anos, que influenciou o planejamento estratgico britnico durante certo perodo do entre-guerras e baseava-se na premissa de que o pas no enfrentaria um grande conflito por dez anos. um documento preparado em 1932 para o Comit de Defesa imperial (Committee of Imperial Defence CID) descreve como a regra dos Dez Anos alcanou progressivamente forte influncia sobre o planejamento estratgico do pas:

    O assunto de maior importncia para o qual chamamos a ateno do Comit de Defesa imperial a base das Estimativas das Foras de Defesa, que diz que deve ser compreendido, para fins de determinar

    as Estimativas das Foras singulares Combatentes, que, para qualquer data considerada, no haver uma guerra de grandes propores por dez anos. Essa premissa foi adotada em julho de 1928... Antes disso houve uma srie de premissas ligeiramente semelhantes (trs exemplos: a de agosto de 1919, que era aplicvel somente s estimativas daquele ano, quando a desmobilizao ainda estava em progresso; a de 1925, cuja aplicao estava relacionada ao Japo e ao esquema de expanso da Fora Area para Defesa territorial; e a de 1927, relativa a uma guerra em terras europeias). Excetuando-se a de 1919, somente aps 1928 o princpio tornou-se vlido para aplicao mundial e a data a considerar passou a avanar dia a dia4.

    A premissa que sustentava a regra dos Dez Anos foi fortemente apoiada por aqueles que defendiam o desarmamento por razes ideolgicas, bem como por aqueles que buscavam conter gastos governamentais. neste ltimo grupo, estava Winston Churchill, que, como ministro da Fazenda (1924-1929), recomendou com insistncia que a regra fosse tornada um princpio bsico perptuo5.

    Apesar de a regra no ter sido uma garantia de paz de dez anos, ela todavia determinou o planejamento estratgico, uma vez que os grandes oramentos de Defesa eram considerados politicamente impossveis. A aplicao da regra ocasionou que, particularmente depois de 1925, as avaliaes sobre a capacidade militar britnica ficassem fortemente subordinadas necessidade de reduzir riscos estabilidade financeira do pas. De fato, como o historiador John Ferris destaca, o governo usava a regra como uma forma de controle cerrado sobre o que ele considerava requisies oramentrias pouco realistas por parte das Foras Armadas6. A compra de novos equipamentos passou a ser feita somente se atendessem a necessidades imediatas, um requisito geralmente difcil de ser atendido pelos Chefes de Estado-maior. Ao analisar as defesas imperiais no Extremo Oriente, onde as aes japonesas sugeriam que a regra j no mais se aplicava, o subcomit de Chefes do Estado-maior observou que [o]

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  • Premissas e Grande estratGia

    s eventos apresentados sugerem a reviso de nossas prprias disponibilidades para enfrentar uma possvel agresso inesperada por parte do Japo. A posio no poderia ser pior. Embora uma avaliao da posio estratgica ocupada pela Gr-Bretanha fosse entregue ao governo a cada ano, desde 1919, a regra no foi abandonada at 1932. E, mesmo nessa ocasio, o governo decidiu excluir planejamentos para confrontos armados com a Frana, os Estados unidos e a itlia7. Curiosamente, cerca de quatro anos depois, o regime fascista de roma se alinhou com a Alemanha nazista, tornando essa nova premissa igualmente invlida. Ainda que no tenha impedido os substanciais investimentos da Gr-Bretanha em Defesa, a premissa de que uma guerra de grandes propores era improvvel, nos dez anos seguintes, levou as autoridades inglesas a enxergar a deteriorao da situao internacional com menos preocupao do que poderiam ter feito em outras circunstncias.

    Embora historiadores tenham sustentado que se tratava de uma poltica razovel, consideradas as circunstncias, a regra dos Dez Anos vista pelos contemporneos, em geral, como uma premissa imposta que racionalizava economia custa da segurana da Gr-Bretanha.

    importante reconhecer que nem todas asrestries desse tipo so incorretas. s vezes, elas podem refletir um senso estratgico muito apurado, fazendo com que as exigncias altamente complexas, impostas durante a formulao e a avaliao de estratgias, se tornem muito mais fceis de gerenciar. um exemplo disso a excluso dos Estados unidos como um possvel adversrio, nos planejamentos britnicos que antecederam s duas guerras mundiais. um documento preparado para o CiD, em 1928, afirmou que a improbabilidade de que haja uma guerra contra os EuA tem sido um fator na poltica deste pas por muitos anos8. O documento reconhecia que as consequncias de um conflito com os Estados unidos seriam

    O Imperador Meiji recebendo a Ordem da Jarreteira do Prncipe Artur de Connaught, em 1906, em funo da AlianaAnglo-Japonesa.

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  • desastrosas para os interesses b r i t n icos . O minis t ro das relaes Exteriores, sir Austen Chamberlain, observou que tal conflito estava alm de expectativas razoveis:

    nem seria necessrio para os Estados unidos iniciar uma ao blica contra ns, em protesto. Eles poderiam fechar m e r c a d o s e f o n t e s f i nance i r a s de suma importncia para ns. tal situao [seria] a nica capaz de originar uma guerra com os EuA, mas ele no podia imaginar que algum governo britnico fosse louco o suficiente para provocar tal posio9. Afirmar que uma guerra com os EuA no era

    plausvel exerceu muito mais do que apenas um papel passivo (a excluso de um conflito com os EuA dos cenrios militares) no planejamento britnico. Durante a consolidao da marinha real que se seguiu introduo de reformas nos primeiros anos do sculo XX, houve pouca preocupao com respeito reduo de meios navais em guas da Amrica do norte. Whitehall tambm seguiu essa filosofia quando definiu seu relacionamento com outros pases. O tratado Anglo-Japons de Arbitragem (1911) inclua uma clusula que liberava a Gr-Bretanha de suas obrigaes de aliana no caso de um conflito entre o Japo e os Estados unidos.

    A imposio dessa premissa no planejamento estratgico foi provavelmente influenciada por uma variedade de consideraes irracionais, tais como o entendimento de que um conflito entre as duas principais potncias anglo-saxs seria algo intrinsecamente errado. Afinal, foi um importante poltico britnico, Joseph Chamberlain, que, em 1896, referiu-se a uma eventual guerra angloamericana como um absurdo e um crime, acrescentando que um dia os dois pases trabalhariam juntos para conformar uma nova ordem mundial sancionada pela humanidade e pela justia10. igualmente significativo, contudo, o fato de que essa pressuposio tambm estava firmemente baseada em uma

    Foto de referncia da CIA mostra mssil balstico de alcance intermedirio sovitico na Praa Vermelha, em Moscou.

    CIA

    apreciao racional das vulnerabilidades e dos interesses estratgicos da Gr-Bretanha. J que tal avaliao exigia que a possibilidade de conflito com Washington fosse evitada, no havia razo para planejar contingncias militares contra os Estados unidos. O CiD e, presumivelmente, os estados-maiores dos escales subordinados foram instrudos a aceitar que tal conflito nunca aconteceria.

    O segundo tipo de pressuposio pode ser chamado de premissa de processo do governo. Em seu artigo, Hammes escreve que um elemento crtico de qualquer discusso sobre estratgia deduzir as premissas e, a seguir, prop-las. isso garante que todos os participantes da discusso estejam tentando solucionar o mesmo problema. Parece uma exigncia bvia para a formulao de estratgia, mas ela difcil de cumprir quando estamos lidando com assuntos de segurana nacional, especialmente quando uma poltica o produto de um sistema de governo que vem se tornando progressivamente mais complicado e que envolve uma grande quantidade de personalidades e rgos. Esse tipo de premissa tem forte impacto sobre a formulao de estratgia e gerado por negociao, persuaso e pela troca de opinies entre autoridades, que muitas vezes representam departamentos governamentais diferentes, frequentemente obedecendo a um ambiente predominantemente hierrquico11.

    Obviamente, o resultado de um processo desses muito menos predeterminado do que uma premissa imposta. Ainda que os participantes de um rgo estejam instrudos

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  • Premissas e Grande estratGia

    sobre quais posies defender, provvel que os integrantes de outro no se sintam to limitados. igualmente provvel que estes tragam diretrizes ou pontos de vista que ofeream alternativas, talvez opostas, mas muitas vezes perfeitamente justificveis. Quando autoridades se renem para tomar iniciativas, afirmam Graham Allison e Philip Zelikow, em seu clssico estudo Essence of Decision (A Essncia da Deciso, em traduo livre), com frequncia, o resultado ser diferente do que aquele que qualquer um deles buscava antes de comearem a interagir como um grupo12. De fato, possivelmente a imprevisibilidade dessa abordagem que empresta autoridade s premissas por ela geradas. nenhum indivduo ou rgo pode simplesmente avocar a si a autoria das concluses tiradas, ficando subentendido que todos contriburam para que se chegasse a elas. E, no menos importante, a culpa pelos eventuais juzos errneos compartilhada. A tendncia de que essas premissas sejam aceitas voluntariamente, mesmo quando as pessoas que as utilizam no tenham participado diretamente do processo.

    A evoluo da doutrina de conteno dos EuA no incio da Guerra Fria um exemplo de premissa de processo governamental que impacta a formulao de estratgia. Originalmente concebida por George Kennan, a conteno tomou um rumo que no recebeu seu apoio. sua oposio, contudo, teve pouco impacto nas decises. O nsC-68 (1950), documento que representou a abordagem oficial quanto poltica de conteno da unio sovitica, foi redigido por um comit composto por autoridades dos Departamentos de Estado e de Defesa, chefiado por Paul nitze. nele, os planejadores estratgicos formularam uma variedade de premissas cruciais: a crise nas relaes entre estadunidenses e russos s poderia ser superada por uma transformao interna na unio das repblicas socialistas soviticas (urss); os Estados unidos seriam capazes de acelerar as mudanas que j estavam acontecendo na unio sovitica; e a oposio expanso sovitica em todos os pases era um interesse nacional direto dos Estados unidos. Kennan no concordava com todas essas premissas e no foi envolvido na formulao desse documento. muitas de suas ideias foram transformadas pelo processo de

    formulao do nsC-68 e, embora a poltica de conteno tenha vigorado por muitos anos, ele no pode ser considerado como seu nico autor, nem mesmo como seu principal idealizador13. mesmo sem julgarmos a qualidade das premissas que influenciaram o nsC-68, devemos admitir que o processo interdepartamental foi bemsucedido ao gerar um conjunto de premissas de planejamento que durante muito tempo guiou a grande estratgia dos EuA, com relao Guerra Fria.

    Curiosamente, o esforo despendido para gerar um consenso (como uma premissa aceita por todos, por exemplo) pode revelar a diversidade entre as vises paroquiais que os rgos participantes possuem sobre o tema. Esse foi o caso, durante as acirradas discusses das autoridades britnicas, no final de 1943 e em 1944, sobre como o mundo ps-guerra deveria ser considerado. no cerne de um desses debates estavam as avaliaes conflitantes sobre o futuro das relaes anglo-soviticas. Os planejadores do ministrio de Defesa tendiam a se concentrar no equilbrio de foras e, ante a constatao da grande quantidade de meios sob o comando de stalin, passaram a considerar a urss como a ameaa mais provvel (na verdade, como a nica ameaa provvel) aos interesses britnicos. Devido a essa premissa, a confiana que o ministrio das relaes Exteriores da inglaterra depositava nas naes unidas para a organizao do novo mundo, parecia absolutamente perigosa necessidade de garantir os interesses britnicos. Fechados em torno de suas prprias concluses, os Chefes de Estado-maior rejeitaram categoricamente a posio do ministrio das relaes Exteriores, segundo a qual qualquer avaliao do ambiente ps-guerra tinha de se enquadrar linha imposta pela poltica de ento:

    A anlise de uma situao desagradvel que possa surgir no , de forma alguma, incompatvel com a busca de uma poltica destinada a evitar que essa mesma situao surja. mesmo assim, o ministrio das relaes Exteriores parece no aceitar a atitude prudente de considerar uma garantia para o caso de nossa poltica fracassar. na verdade, eles parecem presumir que a poltica que pretendemos seguir estar

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  • destinada ao xito desde que nenhum planejamento seja feito para lidar com a possibilidade de que ela fracasse14. Esse argumento gerou muita hostilidade contra

    o ministrio das relaes Exteriores e colocou em destaque tanto as rivalidades profissionais quanto as diferentes culturas burocrticas. Ao rejeitar os pontos de vista dos planejadores militares, uma autoridade dos altos escales arrogantemente atribuiu sua intransigncia falta de tempo suficiente para dar a devida ateno aos problemas do ps-guerra15. mas, de longe, o aspecto principal da disputa esteve relacionado ao entendimento da prpria tarefa. O ministrio das relaes Exteriores, propenso a manter-se restrito s linhas j definidas da poltica, recusava-se a aceitar a posio dos Chefes de Estado-maior, segundo a qual eles deveriam analisar todas as possibilidades de contratempo. Longe de querer admitir que a urss era um potencial adversrio aps a derrota da Alemanha, o ministrio das relaes Exteriores considerava a preservao da aliana anglo-sovitica como o objetivo principal. Havia grande temor de que o planejamento para contingncias que os comandantes militares britnicos propunham pudesse prejudicar esse resultado, gerando grandes preocupaes entre os soviticos e, provavelmente, levando a uma espiral descendente de suspeio mtua. Como descreveu uma autoridade do governo: Os Chefes de Estado-maior no esto apenas atravessando uma ponte antes de terem chegado a ela, esto construindo sua prpria ponte, para depois atravess-la16. O ministrio das relaes Exteriores obviamente considerava que uma habilidosa diplomacia seria capaz de superar as tenses criadas pelo equilbrio de foras no psguerra, que tanto inquietava os chefes militares.

    nesse caso, superar as diferenas se tornou uma ponte longe demais. Gerar consenso com base em pontos de vista opostos, cada qual gerado por um rgo do governo com seu prprio conjunto de premissas e responsabilidades, era algo impossvel. A tarefa de formular um nico documento, estabelecendo um conjunto de premissas sobre o qual a poltica futura seria fundamentada, tornou-se refm do processo interdepartamental. O ministrio das relaes Exteriores buscou superar a resistncia ao

    encaminhar a disputa ao gabinete britnico, onde o ministro de relaes Exteriores, Anthony Eden, logrou neutralizar as preocupaes de seu prprio partido poltico e concordou que o planejamento de contingncia para uma guerra com a rssia deveria continuar, mas confinado a um crculo muito pequeno17. no final, foi preparado um documento aceito pelo ministrio das relaes Exteriores porque minimizava a ameaa sovitica enquanto, ao mesmo tempo, os planejadores de Defesa trabalhavam (mais secretamente) nesse mesmo problema.

    O ltimo tipo de premissa a ser analisado mais difcil de documentar com base em fatos, mas que se revela, normalmente, quando tentamos explicar as diferentes reaes do pas a eventos de repercusso internacional. Esse tipo de premissa captura os entendimentos implcitos que expressam e do forma ao intento e s aes coativas dos estadistas e planejadores de polticas de qualquer pas18. Para melhor entendimento, pode ser chamado de cultura estratgica. segundo Colin Gray, a cultura estratgica e o estilo nacional:

    tm razes muito profundas, em uma corrente de experincias histricas prpria como por uma interpretao local. Embora no se esteja afirmando que a cultura e o estilo sejam imutveis isso seria absurdo admite-se que a forma de pensar e agir em um pas, o modo preferencial de lidar com os problemas e as oportunidades, s pode ser alterada de maneira gradual...19.

    Embora nunca possa ser considerada como sendo a principal determinante de qualquer deciso ou ao, a cultura estratgica fornece o enquadramento dentro do qual as abordagens s questes de guerra e paz so consideradas. As atitudes nacionais nas relaes entre pases obviamente afetam o modo como a poltica externa conduzida e, quando grandes potncias esto envolvidas, o ponto de equilbrio entre o consenso e o conflito na poltica internacional20. Para cada pas, a cultura estratgica definir o ambiente no qual ser formulada sua estratgia e sero tomadas decises relacionadas diplomacia e ao emprego de fora armada21.

    Pode-se notar a influncia de cultura estratgica pela forma como a atual poltica

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    Conferncia de Yalta, fevereiro de 1945. Sentados, da esquerda para a direita, o Primeiro-Ministro Winston S. Churchill, o Presidente Franklin D. Roosevelt e o Primeiro-Ministro Josef Stalin. Junto a eles, alguns dos oficiais do alto-comando dos trs pases, Fev 1945.

    externa estadunidense v o emprego de poder militar. nela, a avanada tecnologia enfatizada e a reduo do nmero de baixas uma limitao operacional. Ao mesmo tempo, ela limita os tipos de operaes militares que podem serempreendidas ou contempladas. famoso o conselho de robert Kennedy a seu irmo, durante a crise dos msseis de 1962, para que no iniciasse um ataque-surpresa contra Cuba, porque isso seria incompatvel com os valores estadunidenses. De modo mais amplo, a cultura estratgica tambm influencia as polticas internacionais de Washington. A campanha de Kosovo (1999) e a guerra com o iraque foram iniciadas, em parte, em funo da crena arraigada de que os valores dos EuA so universais. no importa o quanto se deseje comparar a liderana global estadunidense quela do imprio romano de h vinte sculos ou a qualquer outra grande

    potncia desde ento, a perspectiva estratgica dos Estados unidos muito menos pragmtica do que a maioria e frequentemente afetada por consideraes normativas.

    O fato de considerarmos a existncia da cultura estratgica nos destaca a realidade de que as premissas nacionais sobre temas globais, ou sobre o emprego de poder militar, no so universais. O fato de que a Alemanha pr1914 era uma sociedade altamente militarizada contribuiu para a grande estratgia usada por Berlim. incentivou lderes alemes a considerar a guerra como uma opo atraente (dada a influncia das ideias do darwinismo social) e til (dada sua histria pregressa). A cultura estratgica tambm pode mudar, sendo uma derrota catastrfica em combate capaz de ser um desses catalisadores. Hoje, a identidade alem est fundamentada em premissas que

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    O Presidente afego, Hamid Karzai, e o Secretrio de Defesa dos EUA, Leon E. Panetta, reunidos em Cabul, em 14 Dez 11. Panetta reiterou o compromisso de seu pas com a reconstruo do Afeganisto como um pas livre e independente.

    basicamente deslegitimam muito da histria nacional anterior a 1945. Frequentemente citada como um poder civil, a repblica Federal descrita como tendo uma cultura de segurana reticente. Graas sua preferncia pelo multilateralismo, o pblico alemo notoriamente ambivalente quando se discute o desdobramento do Bundeswehr no exterior22. Apesar de as recentes misses militares fora do pas (no Afeganisto, por exemplo) sugerirem que esteja havendo um novo incremento na poltica externa alem, a realidade que essas participaes foram concebidas pelos lderes alemes mais como um dever internacional do que como sendo necessrias exclusivamente aos interesses nacionais. um entendimento da cultura estratgica de um pas melhora em muito as previses de como ele reagir a acontecimentos externos.

    A Eficcia das Premissas Por que devemos informar aqueles que tomam

    as decises sobre a existncia de premissas

    que influenciam a grande estratgia? O artigo de Hammes que nos conclama a ampliar nossa conscincia crtica acerca da existncia de premissas, se quisermos melhorar nossas chances de sucesso militar parece muito mais apropriado aos pases envolvidos em guerras. mas no ser possvel que, justamente porque consideramos as premissas como sendo to naturais, estejamos deixando de fazer um esforo verdadeiro para analis-las quanto a seu contedo e sua efetividade? se, em ltima instncia, fazia sentido no planejamento estratgico britnico no incio do sculo XX a premissa imposta de no planejar uma campanha militar contra os Estados unidos, no estaria validada, tambm, a premissa contrria a de que havia diferenas fundamentais e irreconciliveis com a Alemanha? responder a essa pergunta na negativa obriga o escritor a passar pelo corredor polons da histria, porque a Gr-Bretanha acabou enfrentando a Alemanha em uma segunda guerra. Ainda assim, havia autoridades em Whitehall, poca,

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  • Premissas e Grande estratGia

    que estavam preocupadas que as impresses negativas criadas pela prpria Gr-Bretanha, com suas aes e seu vasto imprio, estivessem sendo ignoradas23.

    O que queremos dizer quando falamos sobre a eficcia de uma premissa? na vida cotidiana, as premissas ajudam as pessoas a construir seu entendimento do mundo. Essas crenas nem sempre dependem de outras para serem confirmadas. no entanto, h um elemento bilateral inescapvel envolvido na grande

    quo adequadamente uma premissa descreve o contexto estratgico e representa as intenes dos atores polticos que ela descreve?

    estratgia, porque o objetivo geral controlar, coagir ou influenciar outros atores polticos para avanar a busca pelos objetivos nacionais. Contudo, o ambiente no qual esses objetivos esto sendo buscados tambm ocupado por interlocutores ativos. E o que talvez seja at mais interessante eles esto fazendo exatamente a mesma coisa: aplicando premissas para controlar elementos do mundo que habitam. Essa ideia, que prega levarmos em considerao as atividades desenvolvidas por outros atores, adaptando nossa estratgia de acordo, foi captada pela nova Estratgia de segurana nacional britnica, quando ela recomenda que sejam buscadas ideias criativas sobre como melhor alcanarmos nossos prprios objetivos e impedir que os adversrios alcancem os seus24.

    A eficcia , portanto, uma medida da perspiccia quo adequadamente a premissa descreve o contexto estratgico e representa as intenes dos atores polticos que ela descreve? isso nos lembra o que Clausewitz chamou de um julgamento perspicaz e judicioso e uma hbil inteligncia capaz de captar a verdade25. Concentrarmo-nos nesse aspecto das premissas serve, portanto, no apenas para enfatizar o entendimento, mas tambm para expor a

    necessidade de termos o mximo controle possvel desse ambiente altamente dinmico. nesse contexto, devemos sempre ter em considerao que a incerteza companheira da eficcia. nunca poderemos saber com certeza se nossas premissas esto corretas, a menos que elas sejam confrontadas com a realidade que pretenderam descrever. Portanto, diversas premissas com relevncia estratgica estaro constantemente sendo questionadas: sero todos os Estados prestes a fracassar ou j fracassados uma ameaa? ir a globalizao levar a maior interdependncia internacional e reduo da probabilidade de conflito entre pases? ser a guerra sistmica uma possibilidade remota? Hoje, questes como essas so frequentemente convertidas em declaraes que descrevem temas de segurana internacional atuais, mas devemos nos lembrar de que talvez a realidade no seja assim.

    uma das crenas provavelmente mais difundidas com respeito ao pensamento estratgico no mundo ocidental, hoje, a de que nenhum pas deseja a guerra, sempre acompanhada de corolrios como o conflito armado irracional e a guerra nunca a soluo. no livro The Twenty Years Crisis, 1919-1939, (A Crise dos vinte Anos, 19191939, em traduo livre) E. H. Carr discute detalhadamente o impacto que uma forma de pensar semelhante exerce sobre os coraes e as mentes daqueles que, nas democracias ocidentais, esto engajados na formulao e

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    Durante a Crise dos Msseis de Cuba, analistas do Centro de Interpretao Fotogrfica Nacional recebiam imagens obtidaspor aeronaves de reconhecimento u-2 e rF-101, da Fora Area dos EUA.

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  • no gerenciamento da poltica internacional. Orientando-se pela filosofia liberal angloamericana do sculo XiX, os proponentes de tais crenas inspiraram o surgimento daquilo que Carr denominou o mito da harmonia de interesses. Este gerou a premissa de que todas as naes tm idntico interesse em manter a paz, e que qualquer nao que deseje perturbar essa paz , portanto, irracional e imoral26. O conflito internacional concebido como ilusrio, pois o interesse comum une os lados em disputa e, para evit-lo, basta destacar essa harmonia essencial. Ao observar a influncia desse pensamento em nosso prprio tempo, Adda Bozeman advertiu sobre o erro de deixar de considerar a pluralidade de quadros de referncia que caracteriza a poltica internacional27. O nivelamento resoluto, afirma, levou aos poucos convico geral de que na realidade no h outros e que a inimizade, a hostilidade e os equvocos so fenmenos temporrios, sempre sujeitos a um acordo ou a algum tipo de arranjo28. uma grande estratgia que presuma que ningum deseja a guerra e que todo mundo est satisfeito com o status quo, ou que a ele pode se conformar por meios diplomticos (por concesses e negociaes ou recorrendo s leis internacionais), deixa o pas vulnervel a qualquer governo que discorde dessa crena.

    A busca da eficcia exige que pressuposies profundamente arraigadas, como as identificadas por Carr e Bozeman, sejam reconhecidas e analisadas com critrio. Proceder assim ser cada vez mais importante, medida que a ordem global

    Premissas erradas representam um significativo impedimento na busca dos objetivos estratgicos.

    (definida por valores fundamentais, conceituao poltica e instituies internacionais) que baseada, em grande parte, em ideais dos pases ocidentais seja desafiada de forma crescente pelo mundo no ocidental. sobre isso, o filsofo Charles taylor escreveu:

    O grande desafio do sculo vindouro, tanto para a poltica como para a cincia social, ser compreender o outro. J se foram os dias em que os europeus e outros ocidentais podiam considerar sua experincia e cultura como a norma para a qual toda a humanidade estava direcionada, de modo que o outro pudesse ser visto como algum experimentando um estgio anterior do mesmo caminho que havamos trilhado.

    Agora sentimos, alerta ele, a total presuno existente na ideia de que j possuamos a chave para entender as demais culturas e normas29. Como culturas tradicionais vm passando por uma fase de forte reafirmao, em todo o mundo, a suposio das elites ocidentais, de que essas diferenas primordiais no tm sentido poltico, pode nos desencaminhar de modo perigoso.

    Desde o 11 de setembro, temos testemunhado a inabilidade na busca pela compreenso desse desafio. As autoridades pblicas na Europa e nos Estados unidos tm, por exemplo, afirmado que os terroristas inspirados no jihad no entendem a religio que alegam servir. Alguns negam totalmente o papel da religio no jihadismo e, em vez disso, oferecem uma explicao baseada no entendimento do indivduo pelo prisma secularmaterialista (socioeconmico) do Ocidente. Ainda assim, argumentos como esses levam pergunta: por que algum presumiria que pessoas imersas em um ambiente cultural to diferente iriam definir seus objetivos de vida (e o martrio, paradoxalmente, um objetivo de vida) utilizando-se essencialmente de ideais ocidentais? Essa imposio de um quadro de referncia implcito distorce a realidade do povo que ele pretende entender. razovel presumir que a Al Qaeda e aqueles que apoiam suas aes no compartilhem a interpretao liberal que o Ocidental faz sobre o que e o que no aceitvel segundo os princpios do isl.

    P r emi s sa s e r r adas r ep re sen t am um significativo impedimento na busca dos objetivos estratgicos. Elas no apenas desorientam aqueles que so responsveis pelas decises com relao ao contexto estratgico geral. tambm podem errar na definio dos adversrios, de suas capacidades polticas e de suas intenes. O resultado que os recursos, por vezes limitados, acabam mal aplicados. na luta

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  • Premissas e Grande estratGia

    contnua contra o jihadismo, a descrena de que as motivaes do adversrio so bem diferentes daquelas que predominaram nas sociedades ocidentais j levou at mesmo inabilidade de entender quem realmente o inimigo. tais erros geraram uma vulnerabilidade estratgica. no ambiente ps-11 de setembro, a relutncia das autoridades pblicas em reavaliar tais crenas tem ajudado os oponentes do Ocidente, permitindo-lhes refinar as premissas que influenciam seu prprio processo de formulao de estratgia.

    Concluso A estratgia e, como este artigo explanou, a

    grande estratgia, sero sempre elaboradas em ambientes altamente complexos, multifacetados e extremamente dinmicos. O controle dos eventos , com frequncia, algo ilusrio30. E, admitindo que qualquer sucesso depende, em grande medida, das aes do adversrio, ela precisa ser passvel de receber adaptaes.

    Certa feita, Bismark observou que [o] estadista como algum que caminha na floresta, que sabe em que direo est andando, mas no em que ponto sair da mata31. no necessria grande sabedoria para perceber que, sob tais condies, as premissas so inevitveis. Elas nos ajudam a mapear uma linha de ao e, embora possam assumir uma variedade de formas, sua capacidade de nos fornecer discernimento que determina seu valor. isso ainda mais verdadeiro no campo de batalha, mas tambm vlido para a grande estratgia. no ltimo pargrafo de seu artigo, Hammes escreve que, [e]m resumo, como demonstrado amplamente nos recentes conflitos, uma premissa incorreta pode invalidar um planejamento por completo. uma srie de premissas incorretas pode levar ao fracasso estratgico. Elas tm a possibilidade de ser, como afirma o artigo, um descuido fatal. Ante todos esses riscos, devemos levar realmente a srio a advertncia de que precisamos prestar mais ateno s premissas.MR

    RefeRncias

    1. united Kingdom, Press Conference with President Karzai, 7 December 2010, Number10 The Official Site of the Prime Ministers Office, December 8, 2010. Disponvel em: http://www.number10gov.uk/news/speeches-andtranscripts/2010/12/press-conference-with-president-karzai-57937. Acesso em: 18 abr. 2011.

    2. HAmmEs, t. X. Assumptions A Fatal Oversight, Infinity Journal, issue 1 (Winter 2010): p. 4-6.

    3. PArKEr, Geoffrey. The Grand Strategy of Philip II (new Haven: Yale university Press, 1998), p. 1.

    4. united Kingdom, imperial Defence Policy; Annual review for 1932 by the Chiefs of staff sub-Committee, The National Archives, Committee of Imperial Defence (CID) 1082-B, Feb. 1932.

    5. BELL, Christopher M. Winston Churchill, Pacific Security and the Limits of British Power, 1921-41, in Churchill and Strategic Dilemmas Before the World Wars: Essays in Honor of Michael I. Handel (British Foreign & Colonial Pol), ed. John H. maurer (London: routledge, 2003), p. 62.

    6. FErris, John robert. Men, Money and Diplomacy: The Evolution of British Strategic Foreign Policy, 1919-1926 (Cornell studies in security Affairs) (ithaca, nY: Cornell university Press, 1989), p. 171-173.

    7. united Kingdom, imperial Defence Policy, The National Archives, CP 264 (33), 10 nov. 1933.

    8. united Kingdom, three Questions of imperial Defence related to Anglo-American relations, The National Archives, CP 368 (28), 27 nov. 1928.

    9. ibid. 10. Citado em OWEn, John m. How Liberalism Produces Democratic

    Peace, in Debating the Democratic Peace, ed. michael E. Brown, sean m. Lynn-Jones, e steven E. miller (Cambridge, mA: the m.i.t. Press, 1996), p. 146-147.

    11. ALLisOn, Graham; ZELiKOW, Philip. Essence of Decision: Explaining the Cuban Missile Crisis, 2nd ed. (London: Addison-Wesley, 1999), p. 256.

    12. ibid., p. 258. 13. GADDis, John Lewis. Strategies of Containment: A Critical Appraisal

    of Postwar American National Security Policy (Oxford: Oxford university Press, 1982), p. 90-95.

    14. LEWis, Julian. Changing Direction; British Military Planning for Postwar Strategic Defence, 1942-1947, 2nd ed. (London: routledge, 2008), p. 131.

    15. united Kingdom, Comment by William Cavendish-Bentinck, The National Archives FO 371/40741A, 31 jul. 1944, in security in Western Europe

    and the n. Atlantic; Attached paper giving the comments of the Chiefs of staff on PHP memorandum, 29 Jul. 1944.

    16. ibid., minute por Frank roberts, 31 Jul. 1944. 17. rOtHWELL, victor. Britain and the Cold War, 1941-1947 (London:

    Jonathon Cape, 1982), p. 123. 18. Hunt, Lynn. Politics, Culture, and Class in the French Revolution

    (Berkeley: university of California Press, 1984), p. 10. 19. GrAY, Colin. Comparative strategic Culture, Parameters 14, no. 4

    (Winter 1984): p. 26. Disponvel em: http://www.carlisle.army.mil/usAWC/ Parameters/Articles/1984/1984%20gray.pdf. Acesso em: 20 jul. 2006.

    20. LEGrO, Jeffrey W. Rethinking the World: Great Power Strategies and International Order (ithaca, nY: Cornell university Press, 2005), p. 8.

    21. GrAY, Colin. Out of the Wilderness: Prime time for strategic Culture, Comparative Strategy 26, no. 1 (January-February 2007): p. 5.

    22. HArnisCH, sebastian; WOLF, raimund. Germany; the Continuity of Change, in National Security Cultures: Patterns of Global Governance, ed. Emil Kirchner e James sperling (London: routledge, 2010), p. 43.

    23. nEiLsOn, Keith; OttE, thomas G. The Permanent Under-Secretary of Foreign Affairs, 1854-1946 (London: routledge, 2009), p. 121.

    24. united Kingdom, Hm Government, Apresentado ao Parlamento pelo Primeiro-ministro, sob Ordens de sua majestade, A Strong Britain in an Age of Uncertainty: The National Security Strategy (October 2010), p. 10.

    25. CLAusEWitZ, Carl von. On War, ed. e trad. por michael Howard e Peter Paret (Princeton, nJ: Princeton university Press, 1976), p. 101.

    26. CArr, Edward Hallett. The Twenty Years Crisis, 1919-1939 (London: macmillan, 1946), p. 51.

    27. BOZEmAn, Adda B. Strategic Intelligence and Statecraft: Selected Essays (new York: Brasseys, 1992), p. 29.

    28. ibid., p. 14. 29. tAYLOr, Charles. Gadamer on the Human sciences in The Cambridge

    Companion to Gadamer, ed. robert J. Dostal (Cambridge, uK: Cambridge university Press, 2002), p. 126.

    30. KrEPinEviCH, Andrew F. e WAtts, Barry D. Regaining Strategic Competence (Washington, DC: Center for strategic and Budgetary Assessments, 2009), p. 17.

    31. GALL, Lothar. Bismarck, the White Revolutionary; Volume One, 18151871 (London: unwin Allan, 1986), p. 92.

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  • um Ambiente com Limitao de recursos: um Guia para Pensar sobre mudanas na

    Estrutura da Fora major Jeremy Gray, Exrcito dos EuA, e rickey smith

    Devo dizer-lhes que, quando se trata de prever a natureza e o local dos nossos prximos engajamentos militares, desde o Vietn, nosso desempenho tem sido perfeito. No acertamos nem uma vez sequer, desde Mayaguez, passando por Granada, Panam, Somlia, Blcs, Haiti, Kuwait, Iraque e outros um ano antes de qualquer uma dessas misses no tnhamos a menor ideia de que estaramos to engajados.

    secretrio de Defesa robert Gates, 25 Fev 11

    No passado, tal como ocorreu aps a Guerra do Vietn, nosso governo aplicou cortes que atingiram todo o oramento da Defesa, resultando em uma Fora insuficiente e inadequadamente provida de recursos quando confrontada com as suas misses e responsabilidades. Historicamente, esse processo tem levado a resultados que enfraquecem nossa segurana nacional, em vez de fortalec-la e que, no final, acabaram custando mais nossa nao, quando ela precisou rearmar-se rapidamente para enfrentar novas ameaas. Estou determinado a no repetir os erros do passado.

    secretrio de Defesa Leon Panetta, 03 Ago 11

    a PArtir DO FinAL de 2011 e do incio de 2012 muitas mudanas estaro ocorrendo no Exrcito, por conta de O Major Jeremy Gray estrategista no Destacamento Avanado do Centro de Integrao de Capacidades do Exrcito em Arlington, Virgnia. Ele serviu em vrias funes ligadas ao planejamento e formulao de polticas noEstado-Maior Conjunto, no Departamento do Exrcito e em apoio s Operaes Enduring Freedom e unified response. Ele mestre em Administrao de Projetos pela Georgetown University e mestre em Inteligncia Estratgica pela National Defense Intelligence College.

    dois itens inter-relacionados: os resultados da reviso da Estratgia de Defesa dirigida pelo Presidente Obama1 e o incio da entrada em vigor dos significativos cortes oramentrios no Departamento de Defesa2. O secretrio Panetta declarou que, no passado, nosso governo aplicou cortes que atingiram todo o oramento da Defesa, resultando em uma Fora insuficiente e inadequadamente provida de recursos quando confrontada com as suas misses... Estou determinado a no repetir os erros do passado3. A declarao do secretrio pode servir tanto como uma chamada ao, como pode ser vista como um prenncio da runa. As redues oramentrias provavelmente atingiro mais o Exrcito do que as outras Foras singulares, em funo da j anunciada reduo do oramento-base da Fora e da verba destinada s Operaes de Contingncia no Exterior.

    O mais bvio alvo de cortes dentro do oramento do Exrcito est na estrutura da Fora. Os custos dessa estrutura geram grandes obrigaes oramentrias e, portanto, proporcionam uma forma rpida de reduzir gastos de longo prazo. Contudo, a j anunciada reduo no efetivo total tambm proporciona uma oportunidade de transformar o Exrcito de modo que ele possa cumprir as exigncias de sua misso a custos menores. Ou seja, o Exrcito precisar tomar

    Rickey Smith o Diretor do Destacamento Avanado do Centro de Integrao de Capacidades do Exrcito em Arlington, Virgnia. Ele foi o Chefe do Estado-Maior da Fora-Tarefa Responsvel pelos Estudos para a Modularidade do Exrcito, trabalho que levou mais completa reorganizao das Foras combatentes do Exrcito desde a Segunda Guerra Mundial. O Sr. Smith bacharel em Administrao de Empresas pela Middle Tennessee State University, mestre em Administrao de Empresas pela Tennessee Technological University e Mestre em Estratgia de Segurana Nacional pela National Defense University.

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  • Uma guarnio de lana-rojes, na Batalha de Osan.

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    decises sobre a estrutura da Fora que sejam fundamentadas por avaliaes de custo-benefcio. Essas avaliaes dos requisitos futuros iro exigir que sejam assumidas hipteses, as quais podem levar ao aumento do risco. Por essa razo, uma contnua anlise dessas hipteses e dos riscos deve apoiar as decises tomadas a caminho de uma Fora de melhor valor. se isso no for feito, haver aumento da probabilidade de que se organize uma Fora insuficiente e, o pior de tudo, inadequada para o ambiente de segurana enfrentado. uma abordagem disciplinada, objetiva e baseada em fatos um quadro lgico deve influenciar continuamente as decises que afetam as opes sobre a organizao e o tamanho da Fora terrestre.

    H vrios aspectos que devemos considerar quando pensamos sobre estrutura da Fora. Primeiro, as projees sobre quais conjuntos de misses que a Fora precisar cumprir. segundo, as premissas sobre os recursos que estaro disponveis ao longo dos anos para desenvolver uma Fora capaz de cumprir o conjunto de misses que se visualiza. terceiro, as caractersticas relacionadas organizao de meios e combinao de capacidades, no projeto de Fora. Esses aspectos no so variveis binrias, mas escalas mveis que, juntas, proporcionam um quadro descritivo

    estrUtUra da FOra

    da melhor estrutura possvel para que a Fora possa cumprir as misses visualizadas dentro das limitaes impostas pelos recursos disponveis. na busca por essa estrutura, os necessrios ajustes terminam por criar brechas entre as misses do Exrcito e os recursos que esto disponveis. Os responsveis pelo planejamento da Fora identificam, ento, os riscos impostos por essas brechas e consideram formas de mitiglos. Portanto, a identificao de riscos e as estratgias de mitigao a eles associadas compem o quarto aspecto a considerar quanto tratamos de estrutura da Fora. Finalmente, h crenas comuns que podem confundir o desenvolvimento

    e a avaliao crtica das solues propostas para a estrutura da Fora, e se faz importante abordar esses fatores.

    O Propsito da Estrutura daFora

    O que a Fora deve ser capaz de fazer? Essa a principal pergunta para quem trabalha no desenvolvimento da Fora, e cuja formulao enseja uma resposta bem simples para a poltica de Defesa. O discernimento das expectativas atuais, no entanto, no to bvio. As exigncias impostas pela programao oramentria do Congresso provavelmente iro obrigar o Exrcito a planejar a Fora do futuro sem que haja uma expectativa publicamente declarada e politicamente aceita sobre a capacidade que o Exrcito deve ter. Com as questes sobre a reeleio tomando vulto neste ano fiscal de 2012, a incerteza tende a aumentar.

    na ausncia de clareza de propsito, os recursos disponveis iro exercer peso desproporcional sobre as decises tomadas, aumentando, assim, a distncia entre os fins e os meios na estratgia de segurana nacional. Embora ainda estejam indefinidos, os parmetros oramentrios definitivos iro provavelmente surgir antes das definies do Departamento de Defesa (DOD, na sigla em ingls) sobre aquilo que se espera do

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  • Exrcito. Em face dessa situao, as discusses sobre a estrutura da Fora iro se concentrar na parte da equao que est relacionada aos meios, guiada por uma interpretao dos fins presumidos pelo DOD, entendidos como vlidos. O ex-secretrio da marinha, sean OKeefe, reitera esse ponto: [s]e no h um enquadramento estratgico... [o] processo assume o controle... [s]ero os programadores e os contadores de centavos que iro conduzir o trem para chegar a um nmero4. seria, basicamente, uma transio de uma estratgia influenciada pelos recursos para uma estratgia determinada pelos recursos.

    Efeito dos Recursos Disponveistendo menos espao para lidar com uma

    variedade maior de futuros, uma estratgia determinada pelos recursos requer maior dependncia de preciso nas previses sobre o futuro. Contudo, como disse o ex-secretrio de Defesa em sua palestra na Academia militar dos EuA, quando se trata de prever a natureza e o local de nossos prximos engajamentos militares, desde o vietn, nosso desempenho tem sido perfeito. no acertamos nem uma vez sequer5. Portanto, a adaptabilidade a capacidade de lidar com as diferenas que se apresentem com relao ao futuro que ns previmos torna-se uma estratgia para diminuir os riscos quando tratamos da estrutura de Fora futura. De modo ideal, um oramento mais controlado deveria induzir a decises no sentido de uma Fora flexvel. no entanto, talvez contrariando a intuio natural, possvel que a Fora se torne mais especializada para cumprir um limitado conjunto de misses especficas com maior eficincia.

    uma Fora adaptvel exige uma medida de liquidez. Em uma Fora extremamente enxuta, as unidades iro refletir uma abordagem voltada para maior especializao por definio ou de facto , o que limita a possibilidade de haver uma estratgia de mitigao de riscos ante futuros alternativos, alm de aumentar os efeitos potencialmente adversos, caso estejam organizadas de modo inadequado. Ou seja, oramentos mais controlados devem induzir uma aposta em uma estrutura de Fora futura que inclua de tudo um pouco, a no ser que haja mecanismos de mitigao de riscos embutidos na sua estrutura. O compromisso com um equilbrio

    aceitvel entre a adaptabilidade e a especificidade deve ser a base das decises de estrutura da Fora.

    Aspectos da Estrutura da ForaA ao de determinar a estrutura da Fora

    anloga de tentar construir um avio em pleno voo. H aspectos fsicos a serem levados em considerao para garantir o voo efetivo: sustentao, empuxo, gravidade e arrasto. A gravidade o fator limitador constante, enquanto se manipulam os outros trs, para super-la. A partir da manipulao desses aspectos, surgir o projeto do avio que ir atender s necessidades do construtor.

    na estruturao da Fora, o desafio est na necessidade contnua de decises para satisfazer as exigncias mutveis e os recursos variveis, enquanto a Fora evolui ao longo do tempo. A evoluo da Fora uma reao contnua reavaliao das premissas sobre o futuro e da reao a elas. As misses j conhecidas, as novas misses que surgem e a disponibilidade varivel de recursos iro afetar a mudana. reagindo a isso, a manipulao ao longo do tempo afeta a evoluo da estrutura da Fora em quatro aspectos:

    Alinhamento geogrfico. Densidade. Organizao. modelo de prontido da Fora. Cada aspecto representa uma escala mvel. O

    alinhamento geogrfico diz respeito ao equilbrio entre os alinhamentos mundial e regional. A densidade se refere ao equilbrio entre os efetivos orgnicos e da reserva. A organizao se refere ao equilbrio entre tropas especializadas e de emprego geral. O modelo de prontido da Fora um equilbrio entre a prontido por ciclos e a prontido por diferentes nveis de aprestamento. Esses aspectos nos proporcionam excelentes pontos de ajuste quando trabalhamos com a estrutura de Fora no Exrcito.

    Alinhamento Geogrfico:Equilbrios Mundial e RegionalO equilbrio entre tropas disponveis para atuar

    em qualquer parte do globo e tropas concentradas em teatros regionais ou a eles alocadas reflete a adaptabilidade da Fora para a diminuio de riscos e sua especificidade para atender s contingncias esperadas.

    Maro-Abril 2012 MILITARY REVIEW 16

  • estrUtUra da FOra

    O primeiro tipo de tropa proporciona flexibilidade para reagir a crises em todo o globo, custa da percia regional. Foras globais preparam-se para executar misses em qualquer ambiente e esto prontas para serem incorporadas nos diversos planos de contingncia regionais. Como tal, elas carecem de percia para misses em um ambiente cultural ou geogrfico especfico de dada regio. no entanto, proporcionam reduo do risco contra a incerteza sobre os futuros locais onde ocorrero as misses.

    O alinhamento regional permite que as unidades concentrem-se nos desafios culturais e geogrficos dentro de uma rea. Essas Foras treinam e esto concentradas nos planos de contingncia dentro de sua regio especfica. tropas alinhadas regionalmente tm maior probabilidade de desenvolver relacionamento com as naes parceiras, devido aos repetidos engajamentos em apoio ao plano de campanha do teatro de operaes preparado pelo respectivo Comandante Combatente. Ao mesmo tempo em que possuem esse nvel de percia para dada regio, as tropas com alinhamento regional deixam de ter a prontido necessria para cumprir misses fora dela. uma mistura de Foras globais e regionais pode mitigar algumas das deficincias identificadas em cada um dos dois tipos.

    Densidade: Equilbrio entre

    Meios Orgnicos e Meios

    Mantidos Centralizados

    O equilbrio entre a quantidade de tropas orgnicas e a manuteno de unidades centralizadas, para agirem como reforo, reflete o escalo mais adequado ao que se concede autonomia operacional ou seja, o menor escalo capaz de executar operaes independentes. Por exemplo, em 2003 o Exrcito tomou a deciso de proporcionar autonomia operacional s brigadas de combate (BCt, na sigla em ingls), em vez de restringi-la ao escalo Diviso. Essa deciso fez com que alguns elementos de apoio antes orgnicos das Divises passassem s BCt, enquanto os demais foram reunidos em um pool de unidades para que fossem empregados mais eficientemente por todo o Exrcito, a partir da organizao por tarefas. O ponto de equilbrio entre meios orgnicos e aqueles em condies de reforar foi deslocado da Diviso Brigada.

    O conjunto de misses que se espera cumprir determinar o equilbrio ideal. uma analogia semelhante quela que se atribui ao General Peter schoomaker, ento Chefe de Estadomaior do Exrcito, ilustra este ponto. imagine as Divises orgnicas como notas de us$ 100, BCts modulares com notas de us$ 20 e as tropas que podem ser colocadas em reforo como valores de um centavo a us$ 10. Com um equilbrio apropriado entre meios orgnicos e em reforo, o Exrcito pode prover recursos conta do Comando Combatente com o troco praticamente exato. na estrutura antiga, com a Diviso como base, todas as quantidades devidas eram pagas em notas de us$ 100 e o troco tornava-se difcil de utilizar. Com a BCt modular, ainda existem problemas com troco, mas h menos margem para desperdcios. A tabela proporciona uma perspectiva histrica da mudana de densidade do Exrcito ao longo do tempo, com vistas a cumprir o conjunto de misses que se visualizava.

    Organizao: Equilbrio entre

    Tropas Especializadas e de

    Emprego Geral

    Em geral, quanto mais especfica for a definio

    da organizao a adotar por uma Fora, menor ser a flexibilidade de suas formaes. Foras especializadas so planejadas para cumprirem conjuntos de misses especficos. Elas cumprem essas tarefas efetiva e eficientemente. Em misses que no pertenam a esses conjuntos, sua eficincia e efetividade diminuem significativamente, situao que se agrava na mesma proporo com que a nova finalidade se afasta do propsito para o qual a tropa foi idealizada. Como exemplos, um batalho de assuntos civis e uma equipe de purificao de gua teriam muita dificuldade em cumprir misses fora daquilo para o qual sua estrutura foi planejada. Algumas unidades so mais especializadas do que outras. Quanto mais especializada ou exclusiva for a organizao de uma unidade, menos flexvel ser seu conjunto de misses.

    As unidades de emprego geral so planejadas para proporcionar uma soluo aceitvel para circunstncias no previstas. Espera-se que essas tropas sejam capazes de se adaptarem com mais facilidade durante o desenvolvimento da misso em campanha ou por meio de treinamento, caso

    MILITARY REVIEW Maro-Abril 2012 17

  • Cronologia Estrutura da Fora

    Histrico Consideraes

    1776 a 1917

    Bas

    eada

    no

    esca

    lo

    Reg

    imen

    to

    De 1776 a 1917; os regimentos eram as maiores unidades permanentes no Exrcito regular dos EUA

    Com exceo dos grandes conflitos, como a Guerra Civil, o propsito principal era garantir a expanso dos Estados Unidos, seus territrios e protetorados, rumo ao Oeste .

    Departamentos Geogrficos representavam a estrutura de comando acima dos regimentos, em tempos em paz. Operaes dispersas, de pequena escala, eram a norma.

    Divises, Corpos de Exrcito e Exrcitos caracterizavam a estrutura de comando em tempos de guerra no nvel operacional guerras de grande escala eram consideradas exceo.

    Guerra Civil Os Estados organizavam regimentos de milcia/ voluntrios, e o governo federal fornecia a estrutura de comando que os centralizava.

    Guerra Hispano-Americana

    Grandes campanhas militares eram consideradas a exceo e no a regra.

    Ps-Primeira Guerra Mundial

    Bas

    eada

    no

    esca

    lo

    Div

    iso

    Sendo uma potncia mundial, os EUA se organizaram para futuras guerras, como sua atribuio normativa primordial.

    Propsito Principal: Evitar outra guerra mundial e, caso isso no fosse possvel, estar preparado para uma guerra de escala global. Presumiu-se que, estando preparadas para guerras de grande escala, as Foras poderiam enfrentar contingncias menores com facilidade. Manter a excelncia na Europa e na Coreia exigia muito investimento em pessoal e grande poro do efetivo empenhado em rotaes, treinamento e outras situaes que retiravam militares da disponibilidade de emprego. Muitas unidades do Teatro de Operaes e do Componente da Reserva estavam nos nveis de prontido mais baixos (em pessoal e em equipamento) e no se tornavam prontas para emprego sem que houvesse muito tempo e recursos investidos. Divises permanentes tinham dificuldade em controlar e/ou apoiar unidades de manobra adicionais sem que fossem reforadas em seu efetivo, particularmente quando essas no eram de capacidades similares (por exemplo, uma Diviso de Infantaria Leve que recebesse uma Brigada Blindada). Divises permanentes eram organizadas permanentemente para satisfazer as demandas em operaes de combate de grande escala (dotao orgnica de artilharia de apoio direto, defesa qumica, etc.). Divises permanentes ainda eram dependentes de meios no orgnicos encontrados no escalo Corpo de Exrcito ou superiores (evacuao aeromdica, CH-47s, Msseis Patriot, remoo de engenhos falhados, etc.). Comandos de Apoio de Diviso (DISCOM) otimizados apenas para apoiar Grupos de Apoio de Corpo de Exrcito (CSG) de Diviso. Comandos de Apoio de Corpo de Exrcito (COSCOM) otimizados para apoio de corpos de exrcito,Grupos de Apoio por rea (ASG). Comandos de Apoio de Teatro (TSCs) otimizados apenas para apoio do Teatro. Estruturas de apoio para Escales Superiores Diviso (EAD) comearam a se tornar modulares nos anos 90. Havia 17 diferentes tipos de brigada de manobra por todo o Exrcito (Regimento de Cavalaria Blindado - Leve, Brigada de Apoio de Engenharia, etc.), sem contar o Regimento de Rangers. A maioria das necessidades de tropas recebidas pelo Exrcito, especialmente no ps-Vietn, era relacionada ao escalo brigada, mas era proporcionada por Divises, incluindo os rodzios de unidades na Bsnia e no Kosovo.

    1917-2004 O Exrcito foi organizado com base no escalo Diviso de 1917 a 2004. Segunda Guerra

    Mundial Mais de 55 Equipes de Combate Regimental foram empregadas na Segunda Guerra Mundial.

    Coreia 4 Equipes de Combate Regimental foram empregadas durante a Guerra da Coreia.

    Vietn

    7 brigadas independentes foram empregadas no Vietn, com certa flexibilidade. Em 1968, trs delas foram combinadas para constituir a Diviso Americal.

    Granada Operaes em Granada e no Panam e at mesmo a Desert Storm expuseram as limitaes das Divises permanentes e as vantagens das Brigadas.

    Panam

    Desert Storm

    Final da Guerra Fria

    J no final da Guerra Fria, entre 1990 e 2003, a maioria dos exrcitos do Ocidente e at a Rssia havia convertido suas estruturas baseadas nas Divises permanentes para estruturas baseadas na Brigada.

    1991-1995

    Tendo de enfrentar as profundas redues no efetivo total, o Gen Sullivan escolheu manter 10 Divises do Exrcito Regular custa de todas as brigadas independentes, organizando 7 Divises com apenas duas brigadas na mesma sede e uma brigada fisicamente separada, sem sua parcela de tropas divisionrias.

    2004 at hoje

    Bas

    eada

    na

    Brig

    ada

    Mod

    ular

    Foram implantadas as recomendaes relativas Modularidade de Fora-Tarefa, a partir de 2004, para aumentar a flexibilidade, a agilidade e para proporcionar uma estrutura intercambivel ao Exrcito Operacional. As iniciativas Crescer o Exrcito e Gerao de Foras do Exrcito (ARFORGEN) surgiram no mesmo perodo.

    Objetivo principal: possibilitar um fluxo constante de Foras prontas para emprego em operaes de longa durao, dentro de uma poltica de revezamento entre unidades. A prontido por ciclos e a modularidade eliminaram o escalonamento por nveis de aprestamento aqueles que tm e aqueles que no tm passaram a ser aqueles que tm e aqueles que tero. A prontido por ciclos e o rodzio de unidades reduzem o efetivo de no prontos para emprego. A estrutura de apoio modular vlida para qualquer escalo, fornecendo apoio sob medida. As grandes unidades equivalentes brigada so adaptadas s situaes operacionais especficas para atender aos objetivos estratgicos, com menor comprometimento de pessoal. A fatia de brigada no teatro de operaes (aproximadamente 10.000) menor do que a fatia de Diviso anterior (aproximadamente 45.000, com trs brigadas de manobra). A composio de uma Fora de combate pode ser feita de acordo com as tarefas (ou seja, brigadas pesadas, leves ou Stryker), e esta pode ser colocada sob qualquer quartel-general de Diviso ou Corpo de Exrcito. Todas as unidades do Exrcito (dos Componentes da Ativa e da Reserva) contam com alta prioridade durante algum tempo, em um ciclo de revezamento.

    A variao do Exrcito em densidade ao longo do tempo, com vistas a atender s misses que se visualizava.

    18 Maro-Abril 2012 MILITARY REVIEW

  • estrUtUra da FOra

    lhes seja dado tempo suficiente. Elas proporcionam uma Fora adaptvel que pode minimizar o risco contra a incerteza. Alm disso, com o devido treinamento e apoio, a tropa de emprego geral pode prover uma capacidade ampliada que no existe nas unidades especializadas. uma unidade menos especializada e mais voltada ao emprego geral, como um batalho de artilharia de campanha, pode se adaptar rapidamente a novos conjuntos de misso, como no caso da segurana de comboio realizada no iraque. A efetividade de uma Fora de emprego geral no cumprimento de novas misses reflete tanto o tempo que lhe foi concedido para se adestrar como o tempo que vem executando a nova misso.

    O Modelo de Prontido da Fora:

    Equilbrio entre Prontido por

    Ciclos e Prontido por Nveis de

    Aprestamento

    Os modelos de prontido da Fora so metodologias para administrar riscos por meio da definio de como os recursos serodisponibilizados. preciso considerar o equilbrio entre os dois modelos na estrutura da Fora para que se obtenha o melhor valor dentro de um risco aceitvel. A prontido por nveis de aprestamento se refere atribuio de uma hierarquia de prioridades certas unidades tm os recursos para manter o nvel de prontido mais alto enquanto outras recebem recursos conforme determinado para o nvel de prontido a que pertencem. As unidades de maior prioridade so empregadas com mais frequncia e tm menos tempo para se preparar. se a contingncia exigir mais do que as unidades de pronto emprego, ser agilizado o fornecimento de recursos s unidades das prioridades seguintes, de modo a que seja criado um fluxo estvel de tropas para reforar as unidades j empregadas e atender s necessidades do Comando Combatente.

    no passado, o Componente da reserva do Exrcito agia principalmente como uma reserva estratgica, sendo mantido nos nveis de prontido mais baixos. A abordagem por nveis de aprestamento o mtodo de prontido mais eficiente nas situaes em que as exigncias raramente excedem a capacidade da tropa de pronto emprego. nessa situao, no entanto, essencial que haja significativa capacidade

    para uma mobilizao no planejada, de modo a aumentar o aprestamento das unidades nos nveis mais baixos (quando a procura excede a oferta de tropas de pronto emprego). Para que a rpida mobilizao seja possvel, necessrio que haja investimentos em tempos de paz em um sistema para o rpido recrutamento de pessoal, em instalaes para o adestramento e nas capacidades de aumento da produo industrial.

    A anlise de custo-benefcio de um sistema de prontido que assume que haver uma significativa mobilizao em caso de necessidade precisa incluir os custos de manuteno da infraestrutura correspondente, capaz de satisfazer os prazos envolvidos. no mnimo, a anlise deve reconhecer o risco, em termos de probabilidade de ocorrncia e possveis consequncias, de no serem feitos ou mantidos os investimentos no sistema de mobilizao.

    A prontido por ciclos se refere a manter o nvel mais alto de prontido em toda a Fora, com as unidades separadas em grupos de prontido por prazos preestabelecidos. A unidade que estiver designada para emprego ou para responder a uma contingncia tem a prioridade de recursos. uma vez terminado o desdobramento ou o prazo prescrito para essa unidade, ela retorna ao menor nvel de prontido de fornecimento de recursos. Ao longo do tempo, a prontido e a quantidade de recursos da unidade aumentaro progressivamente antes mesmo do prximo perodo de prioridade ou antes do prximo desdobramento. O Componente da reserva do Exrcito tambm pode funcionar com um ciclo de prontido desse tipo, mais prolongado, mas complementar ao da Fora do Componente da Ativa. Quanto mais alta for a exigncia de meios da Fora, mais rapidamente as unidades se revezaro pelo ciclo.

    A abordagem por ciclos a mais efetiva quando se pretende estabilidade no fornecimento de tropas para atender s contingncias de durao indefinida, quando se faz necessrio o revezamento de unidades (em vez do rodzio de indivduos). Contudo, esse mtodo se transforma em um inadequado emprego de recursos caso as tropas que estejam no perodo de prontido mxima no sejam empregadas. Analisando a partir da perspectiva de custo-benefcio, preciso que o benefcio considere o compromisso com a misso atual, bem como a misso de prevenir e deter.

    MILITARY REVIEW Maro-Abril 2012 19

  • As Consideraes da Fora Total Quando se discute a estrutura da Fora,

    normal que o foco seja mantido sobre a Fora operacional do Componente da Ativa. nos ambientes fiscal e operacional que se antev, preciso que todo o Exrcito seja considerado. Considerar o todo da Fora inclui no apenas os Componentes da Ativa e da reserva do Exrcito, mas tambm um pensamento holstico que inclua as Foras operacional e geradora como sendo uma s por toda a gama de misses. um Exrcito menor, com recursos limitados, precisar se valer de todos os meios para satisfazer s exigncias das misses que receber. todos os esforos iro exigir cada vez mais sincronizao com solues desatreladas da percepo tradicional sobre os papis desempenhados. Ao repensarem a Fora total, os decisores precisaro considerar as seguintes realidades:

    Foras determinadas por requisitos legais e por acordos, incluindo os efetivos alocados aos teatros de operaes.

    O apoio do Exrcito a outras Foras singulares e outras exigncias de carter conjunto, interagncias, intergovernamental ou multinacional (resumido, em ingls, pela sigla JIIM), como, por exemplo, prover proteo e apoio logstico, ou preparar o teatro de operaes para futuras operaes JIIM.

    uma Fora organizada com um misto de meios dos Componentes da Ativa e da reserva.

    Os aspectos polticos envolvidos em qualquer mudana que se faa na estrutura das Foras do Componente da reserva.

    requisitos de liquidez da Fora como, por exemplo, efetivos alocados aos quartis-generais conjuntos e multinacionais ad hoc de longo prazo; contabilizao do efetivo no pronto (o pessoal em treinamento militar inicial ou movimentado para novas guarnies, os baixados nos hospitais e os alunos dos diversos cursos) e dos militares que no podem ser empregados em operaes; e a razo entre o tempo de desdobramento em campanha e o tempo de permanncia em sede.

    Risco As decises sobre a estrutura da Fora devem

    abordar o delta que existir entre esta e as misses que se pode esperar, deixando claros os riscos a assumir. identificar, avaliar e mitigar

    riscos so tarefas fundamentais na estruturao da Fora. Em resumo: uma explicao sobre os riscos assumidos deve instruir os formuladores de polticas quanto s limitaes que a reviso na estrutura da Fora ocasionar nas capacidades e habilidades. um detalhamento desse risco ir moldar o apoio nas discusses polticas e ajudar a determinar o ponto em que ele se torna inaceitvel o limite ou a linha limtrofe da Fora singular para uma misso especfica. A taxonomia utilizada para a elaborao da anlise de risco para o Chefe do Estado-maior Conjunto proporciona uma abordagem simples para caracterizar o risco segundo fatores nos campos operacional, institucional, de desafios futuros e de administrao da Fora. Ela aprimora a caracterizao dos riscos especificando suas probabilidades e possveis efeitos. Destacar o risco associado s opes para estruturar a Fora do Exrcito no quadro do Chefe da Junta de Chefes de Estado-maior oferece um mtodo mais familiar aos formuladores de polticas de Defesa, alm de ajudar a definir as expectativas e a estabelecer a base para a contribuio da Fora terrestre avaliao do Chefe da Junta, to logo a estrutura tenha sido escolhida.

    Crenas Comuns Agora precisamos abordar trs crenas comuns: A estrutura da Fora influencia a eficincia

    no treinamento e o quanto h de aconselhamento na relao entre os comandantes superiores e os comandantes subordinados.

    um aumento no efetivo das Foras de Operaes Especiais (FE) pode mitigar as desvantagens de se ter uma Fora convencional menor.

    A mobilizao sempre ser rpida. Os efeitos da estrutura da fora no

    aconselhamento e no treinamento. na cultura do Exrcito, muitos veem a estrutura da Fora como uma forma de abordar temas relacionados liderana e ao treinamento. Contudo, mudanas na organizao da Fora no resolvem prontamente todos os desafios relativos a essas duas reas. Os desafios de hoje talvez estejam mais relacionados, por exemplo, ao intenso ritmo operacional e ao plano de realinhamento de bases do que falta de um comandante de Diviso para enquadrar

    Maro-Abril 2012 MILITARY REVIEW 20

  • as brigadas. na verdade, mesmo na antiga estrutura da Fora, centrada no escalo Diviso, mais de dois teros do Exrcito no estavam subordinados a comandos de Diviso, sendo simplesmente organizados por suas tarefas, em suas guarnies. A Fora no divisionria evoluiu para uma organizao mais modular, nos anos 90. Pode-se argumentar que os desafios relacionados atuao dos comandantes e ao treinamento da tropa so maiores para as tropas enquadradas por comandos de escales superiores brigada, porque as equipes, destacamentos e companhias se desdobram rotineiramente sem obedecerem organizao por tarefas tpica de seu aquartelamento-sede.

    O aconselhamento executado pelos comandantes no existe exclusivamente quando h relao de subordinao orgnica. O desenvolvimento de comandantes uma responsabilidade inerente, que deve existir entre todos os escales de comando e liderana, seja o relacionamento baseado em uma situao de subordinao, de apoio direto ou em uma organizao por tarefa. um bom relacionamento resultar quando o comandante mentor e o comandante mais moderno buscarem e fomentarem uma relao aberta, bidirecional e duradoura. O aconselhamento se desenvolve frequentemente a partir de um rela cionamento em que o desenvolvimento de lderes facili tado. De fato, ter um mentor externo sua cadeia de comando tradicional que esteja aberto discusso franca pode significar melhor padro de aconselhamento aos comandantes mais modernos. nem a estrutura nem a organizao da Fora proporcionam a varivel predominante para o desenvolvimento de lderes ou para esse aconselhamento.

    estrUtUra da FOra

    Provavelmente, o ritmo operacional varivel (entendido como o intervalo entre os desdobramentos operacionais consecutivos de um militar ou de uma tropa n. do t.) impe desgastes a essas relaes informais, da mesma forma como faz com os relacionamentos familiares. Quando diminui o ritmo operacional, as unidades organizadas por tarefas retomam muitas de suas atribuies orgnicas nas guarnies, tanto as benficas quanto as prejudiciais.

    H pouca diferena entre o treinamento de tropas orgnicas das Divises e aquelas organizadas por tarefas nas guarnies, quando o ritmo operacional diminui. Quanto maior for o tempo sob o qual a tropa esteve submetida a uma organizao por tarefas, maiores sero os reflexos sobre suas atribuies orgnicas. Pode-se argumentar, contudo, que o constante revezamento de unidades permite melhor acesso s instalaes de adestramento e ao material em um dado local. se todas as unidades desdobradas pertencessem a um nico aquartelamento, as exigncias de treinamento poderiam ultrapassar a capacidade das instalaes locais.

    Mais tropas de operaes especiais. A ideia de aumentar a quantidade de tropas e unidades de FE para mitigar os efeitos negativos da

    O Subcomandante do 8o Exrcito dos Estados Unidos discursa em nome do Gen Ex Walter Sharp, Comandante das Foras dos Estados Unidos na Coreia, em uma cerimnia realizada em 10 Jul 08.

    Ex

    rcito

    dos

    EU

    A

    MILITARY REVIEW Maro-Abril 2012 21

  • reduo de efetivo da Fora convencional vlida, at certo ponto. Para que essa afirmao esteja correta, ela precisa estar vinculada a uma estratgia apropriada e deve considerar o mtodo para o desenvolvimento de Foras de Operaes Especiais. Estas avaliam e selecionam seus integrantes dentre os mais experientes da Fora convencional. retirar candidatos de um efetivo relativamente grande permite que seatribua maior foco qualidade. medida que a proporo entre Foras convencionais e de FE diminua, pode haver queda da qualidade desse pessoal. A recente expanso das tropas Especiais do Exrcito um subsistema dentro da comunidade de Foras Especiais iniciou um mtodo para aumentar o efetivo recrutando diretamente da populao civil. Apesar de essa ser uma descrio simplista do programa, fato que ele produz graduados de FE que no tm qualquer experincia na Fora convencional alm da recebida no treinamento militar inicial. Atualmente, os candidatos selecionados de modo tradicional proporcionam um contrapeso a esse mtodo. Aumentar a dependncia das Foras Especiais por esse tipo de seleo pode levar a caminhos indesejados. uma das principais lies obtidas como resultado dos conflitos atuais foi o fato de que ambas as comunidades passaram a reconhecer a natureza mutuamente c o m p l e m e n t a r entre as operaes convencionais e as operaes especiais. se no possu rem u m e n t e n d i m e n t o mnimo das Foras convenc iona is , a s F o r a s E s p e c i a i s tero l imitado sua c a p a c i d a d e d e trabalhar efetivamente com esse tipo de tropa e de auxiliar Foras Armadas estrangeiras a desenvolver suas tropas convencionais. A s o p e r a e s n o

    iraque e no Afeganisto confirmam o aumento de efetividade das Foras de Operaes Especiais pela incorporao criteriosa de t ropas convencionais . um universo de tropas convencionais suficientemente grande possibilita a mxima das Foras Especiais: qualidade, antes de quantidade.

    Rpida mobilizao. A capacidade de mobilizar meios rapidamente e expandir a estrutura da Fora em tempos de guerra uma premissa comum, na maioria das abordagens para a reduo da estrutura da Fora. H um custo associado a essa premissa, que geralmente no includo: desenvolver e manter uma infraestrutura de mobilizao.

    Foram quase dez anos para que o Componente da Ativa do Exrcito conseguisse aumentar em 80 mil militares seu efetivo, desde que comeou a expandi-lo gradualmente, aps o 11 de setembro de 2001 e isso inclui uma reduo nos padres de admisso e considerveis bnus para a reteno de pessoal. Leva tempo aumentar os efetivos de uma Fora composta somente por voluntrios mesmo mediante reconvocao de pessoal includo na reserva imediata (Individual Ready Reserve, na designao em ingls). As

    As primeiras tropas terrestres estadunidenses desembarcam em uma estao de trem em algum ponto da Coreia do Sul, Jun 1950.

    NA

    RA

    Maro-Abril 2012 MILITARY REVIEW 22

  • unidades do Componente da reserva do Exrcito j so parte da estrutura da Fora e possuem certa infraestrutura para manter tropas treinadas. O sistema que prev o emprego de unidades da reserva conta, ainda, com a experincia de anos atendendo s seguidas mobilizaes para atuar nos conflitos recentes. A mobilizao da populao civil diferente.

    A expanso imaginada na maioria das abordagens para a reduo da Fora est na capacidade de rapidamente mobilizar a populao civil, bem como no pronto acionamento da indstria para atender s necessidades em equipamentos. A infraestrutura para essa mobilizao no existe, em termos prticos. Ela teria de incluir sistemas para rpida admisso de recrutas, capacidade de treinamento para essa rpida admisso de pessoal e planos industriais para fornecer o equipamento decorrente do rpido aumento do efetivo. Essa infraestrutura de mobilizao custosa e tem uma baixa probabilidade de ser empregada. torna-se, portanto, um alvo preferencial para cortes oramentrios. Qualquer reduo da estrutura da Fora que pressuponha uma rpida expanso tambm deve incluir, em sua anlise custo-benefcio, o tamanho e a velocidade que se visualiza para essa expanso, o tempo e o custo para implant-la e os riscos associados sua execuo. Quanto menor for o efetivo da Fora

    estrUtUra da FOra

    permanente, maior ser a probabilidade de que a infraestrutura de mobilizao ser necessria e maior ser o risco decorrente, caso ela no esteja altura da demanda.

    Concluso A reviso estratgica apresentou elemen


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