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Sustentabilidade e condições de vida em áreas urbanas ... · regiões metropolitanas...

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[47] Tema central Tánia Moreira Braga * Sustentabilidade e condições de vida em áreas urbanas: medidas e determinantes em duas regiões metropolitanas brasileiras ** Abstract This paper develops an Urban Sustainability Index System as part of a broader effort to provide better quality data and statistical analysis for local environmental decision-making. We show that urban sustainability can be measured in a comprehensive and synthetic way. In providing fair comparison across cities while keeping sensibility to local context, this index system can be used by policy-makers as a powerful tool to identify critical trends and policy gaps. This Urban Sustainability Index System has been applied to 57 cities in the metropolitan areas of São Paulo and Belo Horizonte, Brazil. The results indicate two different paths in relation to sustainability. The first is characterized by a gap between environmental quality and human development, leading away from sustainability. It is followed by the core cities and highly industrialized ones in both metropolitan areas. The second leads towards sustainability and is followed by a heterogeneous group of cities in both regions. Key words: urban sustainability, sustainability index, São Paulo metropolitan area, Belo Horizonte metropolitan area. Resumo Este artigo é parte de um esforço acadêmico recente de criação de ferramentas de mensuração do fenômeno sustentabilidade. Apresenta sistema de índices de sustentabilidade urbana, aplicando-o a 57 municípios das Regiões Metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte, Brasil. O sistema de índices foi criado considerando, principalmente, três fatores: a) incorporação das dimensões econômica, ecológica, político- social, espacial (ou territorial) e de planejamento; b) adoção da escala urbana/metropolitana; e c) incorporação de indicadores institucionais capazes de avaliar a capacidade do sistema político e da sociedade em oferecer respostas aos desafios presentes e futuros da sustentabilidade. Os resultados obtidos mostram a existência de dois padrões claros nas duas regiões. O primeiro, de desequilíbrio entre qualidade ambiental e desenvolvimento humano, verificado no município central e nos municípios fortemente industrializados de ambas as regiões. O segundo, mais sustentável, de equilíbrio entre qualidade ambiental e desenvolvimento humano, verificado em municípios com diferentes perfis em ambas as regiões. Palavras-chave: sustentabilidade urbana, indicadores de sustentabilidade, Região Metropoli- tana de São Paulo, Região Metropolitana de Belo Horizonte. Revista eure (Vol. XXXII, Nº 96), pp. 47-71. Santiago de Chile, agosto de 2006
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Tema central

Tánia Moreira Braga*

Sustentabilidade e condições de vida em áreasurbanas: medidas e determinantes em duas

regiões metropolitanas brasileiras* *

Abstract

This paper develops an Urban Sustainability Index System as part of a broader effort to provide better qualitydata and statistical analysis for local environmental decision-making. We show that urban sustainability canbe measured in a comprehensive and synthetic way. In providing fair comparison across cities while keepingsensibility to local context, this index system can be used by policy-makers as a powerful tool to identify criticaltrends and policy gaps. This Urban Sustainability Index System has been applied to 57 cities in the metropolitanareas of São Paulo and Belo Horizonte, Brazil. The results indicate two different paths in relation to sustainability.The first is characterized by a gap between environmental quality and human development, leading away fromsustainability. It is followed by the core cities and highly industrialized ones in both metropolitan areas. Thesecond leads towards sustainability and is followed by a heterogeneous group of cities in both regions.

Key words: urban sustainability, sustainability index, São Paulo metropolitan area, Belo Horizontemetropolitan area.

Resumo

Este artigo é parte de um esforço acadêmico recente de criação de ferramentas de mensuração do fenômenosustentabilidade. Apresenta sistema de índices de sustentabilidade urbana, aplicando-o a 57 municípiosdas Regiões Metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte, Brasil. O sistema de índices foi criadoconsiderando, principalmente, três fatores: a) incorporação das dimensões econômica, ecológica, político-social, espacial (ou territorial) e de planejamento; b) adoção da escala urbana/metropolitana; e c) incorporaçãode indicadores institucionais capazes de avaliar a capacidade do sistema político e da sociedade em oferecerrespostas aos desafios presentes e futuros da sustentabilidade. Os resultados obtidos mostram a existênciade dois padrões claros nas duas regiões. O primeiro, de desequilíbrio entre qualidade ambiental edesenvolvimento humano, verificado no município central e nos municípios fortemente industrializadosde ambas as regiões. O segundo, mais sustentável, de equilíbrio entre qualidade ambiental edesenvolvimento humano, verificado em municípios com diferentes perfis em ambas as regiões.

Palavras-chave: sustentabilidade urbana, indicadores de sustentabilidade, Região Metropoli-tana de São Paulo, Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Revista eure (Vol. XXXII, Nº 96), pp. 47-71. Santiago de Chile, agosto de 2006

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Tánia Moreira Braga

1. Sustentabilidade urbana: significado emedidas

A idéia de sustentabilidade urbana é umaferramenta poderosa na aproximação das temáticas ambiental e urbana, a qual se

consolidou ao longo da década de 90.

A oposição entre o ambiental e o urbano, o primeirovisto como pertencente ao reino do natural e o segun-do como a expressão do não-natural, dominou opensamento ambientalista em seus primórdios. Se nasraízes do ambientalismo e em suas vertentespreservacionista e conservacionista abre-se um enor-me ponto cego em relação à questão urbana (Costa,1995), a mudança de enfoque na definição da questãoambiental em direção à sustentabilidade nos anos 80permitiu uma aproximação das temáticas.

Temas como desenvolvimento urbano, controleda poluição atmosférica e hídrica nas cidades,utilização sustentável de recursos naturais econservação de espaços verdes no interior dos espaçosurbanos tiveram forte presença na agenda dasprincipais organizações multilaterais voltadas para odesenvolvimento e para a questão urbana nos anos90, bem como em seus critérios para aprovação deprojetos e concessão de financiamentos (UNCHS,1988; The World Bank, 1991; United Nations,1992; UNDP, 1992; UNDP/UNCHS/The WorldBank, 1994).

No caso das Conferências Internacionais, ésintomática a inclusão da questão ambiental noespaço urbano como um dos cinco grandes temasdo Hábitat II (conferência internacional da ONUsobre as cidades), bem como a inclusão das temáticascidades e poder local entre as principais questõesdiscutidos na Rio 92 (conferência internacional daONU sobre meio ambiente e desenvolvimento) esistematizados na Agenda 21.

* CEDEPLAR/UFMG y Universidade CândidoMendes (Brasil). E-mail: [email protected]

** Agradecemos à FAPEMIG (Fundação de Apoio àPesquisa do Estado de Minas Gerais) pelo apoio financeiroconcedido. Son coautores de este artículo Fausto Brito(CEDEPLAR/UFMG), Ana Paula Gonçalves de Freitas(CEDEPLAR/UFMG) y Denise Helena França Marques(CEDEPLAR/UFMG). Enviado el 9 de septiembre de2004, aprobado el 1 de junio de 2006.

Recentemente, o Millennium EcosystemAssessment, ou Avaliação Ecossistêmica do Milênio1,incluiu o sistema urbano entre as 10 categorias desistemas utilizadas para apresentar seus resultados(Millennium Ecosystem Assessment, 2005).

A Agenda 21 Brasileira elegeu o tema cidadessustentáveis como um dos seis pilares sobre os quaisse sustenta a construção da sustentabilidade ambien-tal, social e econômica do país (Novaes, 2000).

Como foi enunciado, a idéia de sustentabilidadeurbana corporifica a convergência entre o ambientale o urbano. Mas, a despeito da crescente importânciae amplo uso do conceito, este está longe de possuirsignificado consensual. Segundo Ferreira (1998: 59),“o conceito torna-se um ponto de referênciaobrigatório dos debates acadêmicos, políticos eculturais; na verdade, passa a ser uma idéia podero-sa, sobre a ordem social desejável e um campo debatalha simbólico sobre o significado desse idealnormativo”.

O que há subjacente às diversas versões do queseria o desenvolvimento sustentável urbano é umadisputa pelo estabelecimento da “verdade” no quetange a esse conceito. Verdade entre aspas, pois estanunca é absoluta, é sempre socialmente construídaatravés de uma disputa de poder. Segundo Foucault(1996:13) os discursos em si não são verdadeiros oufalsos, o que existe é “um combate pela verdade [...]pelo conjunto das regras segundo as quais se distin-gue o verdadeiro do falso e se atribui ao verdadeiroefeitos específicos de poder”. Para Bourdieu (1996:127), “quando se trata do mundo social, as palavrascriam as coisas, já que criam o consenso sobre aexistência e o sentido das coisas, o senso comum”.Nesse contexto, “se existe uma verdade, é que averdade é um lugar de lutas”.

Ao aplicar esta discussão à questão dasustentabilidade urbana, Acselrad (1999) alerta quea forma pela qual se articulam conceitos e se constroem

1 A Avaliação Ecossistêmica do Milênio foi conduzidasob o patrocínio das Nações Unidas, com o objetivo deavaliar as conseqüências das mudanças nos ecossistemas so-bre o bem estar humano, e estabelecer uma base científicaque fundamentasse as ações necessárias para assegurarconservação e uso sustentável dos ecossistemas e suascontribuições para o bem estar humano.

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matrizes discursivas que articulam as questões am-biental e urbana fazem parte de um jogo de poderem torno da apropriação do território e de seus re-cursos, que têm por objetivo legitimar ou deslegitimardiscursos e práticas sociais. Partindo daí, o autor in-vestiga os diversos discursos sobre a sustentabilidadeurbana e identifica matrizes discursivas derepresentação de forma a tornar claro o que está sendodisputado, quais são as visões de futuro de cidadeem disputa, o que se fazer durar, para quê e paraquem, tornando transparentes as diferentes propostaspolíticas existentes por trás dos rótulos meio am-biente e sustentabilidade. São três as matrizesdiscursivas de sustentabilidade urbana identificadaspelo autor. A primeira, representação tecno-materialda cidade, combina modelos de racionalidade ener-gética com modelos de equilíbrio metabólico e reduza sustentabilidade urbana a seu aspecto estritamentematerial. A segunda, representação da cidade comoespaço da qualidade de vida, combina modelos depureza, de cidadania e de patrimônio e remete asustentabilidade a um processo de construção dedireitos que possam equacionar as externalidadesnegativas responsáveis pela insustentabilidade ur-bana. A terceira matriz, centrada na reconstituiçãoda legitimidade das políticas urbanas, combina mo-delos de eficiência e eqüidade, além de remeter asustentabilidade à construção de pactos políticoscapazes de reproduzir suas próprias condições delegitimidade.

Compreender que a sustentabilidade urbana éantes uma idéia em construção e disputa que umadefinição acabada, é fundamental para compreendero papel no estabelecimento de sua “verdade” dosesforços em torná-la mais operacional e mensurável,como a criação de indicadores. Portanto, é necessárioexplicitar aqui o que se entende por sustentabilidadeambiental.

Eximimos-nos, contudo, de efetuar comparaçõesentre o conteúdo aqui atribuído à idéia desustentabilidade urbana e outras definições impor-tantes no estabelecimento da “verdade” sobre o tema–como as provenientes da Agenda 21 (UnitedNations, 1992), do Habitat I (UNCHS, 1988),dentre outras– uma vez que esta se tornaria pordemais extensa no contexto deste artigo.

Optamos por utilizar, dentre os vários conteúdosatribuidos à idéia de sustentabilidade urbana, uma

que estivesse em consonância com a terceira dasmatrizes discursivas de sustentabilidade urbana iden-tificadas por Acselrad (1999). Nossa escolha recaiusobre a definição do Urban World Forum (2002),que define sustentabilidade urbana a partir doestabelecemineto de um conjunto de prioridades,são elas: superar a pobreza, promover equidade,melhorar a segurança ambiental e prevenir adegradação, estar atento à vitalidade cultural e aocapital social para fortalecer a cidadania e promovero engajamento cívico.

A esta definição adicionamos as observações feitaspro McGranahan e Satterthwaite (2002) e Miller eSmall (2003) de que para ser considerada sustentável,não é suficiente que uma cidade confira a seus habi-tantes condições ambientais equilibradas, mas que ofaça sem gerar externalidades negativas para outrasregiões (próximas ou distantes) e para as geraçõesfuturas. Isso implica em levar em conta não apenas aescala local, ou intra-urbana, da sustentabilidade,mas também considerar a escala regional, constituídapela cidade e suas relações com o entorno, e a escalaglobal, constituída pelos seus impactos sobre os pro-blemas ambientais globais, como o efeito estufa, epor questões relativas aos impactos agregados da redemundial de grandes cidades sobre o planeta.

Apesar dos esforços recentes empreendidos nasistematização de informações para a gestão ambien-tal urbana em cidades de diversos países e regiões, odesafio de lidar com a carência de informaçõessistematizadas sobre a questão ambiental urbanaainda é de grande monta. Não é por outra razão quegrande parte das decisões tomadas por órgãos públi-cos, na área ambiental, se dá a partir de informaçõesimprecisas que tornam-se “certezas” fragilmenteconstruídas.

Da necessidade de provisão de informação dequalidade para guiar a tomada de decisões relativas àsustentabilidade, surgiram desde o final da décadados 80, várias iniciativas de construção de índices eindicadores, a maior parte delas aplicadas à escalanacional. Tais iniciativas possuíam em comum oobjetivo de fornecer subsídios à formulação de polí-ticas, bem como monitorar o progresso nocumprimento de acordos internacionais e orientar atomada de decisão por atores públicos e privados.No seu conteúdo procuram descrever e mensurar ainteração entre a atividade antrópica e o meio am-

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biente, conferindo à idéia de sustentabilidade maioroperacionalidade e funcionalidade.

Em geral, tais iniciativas tomam por base o mo-delo de pressão-estado-resposta (OECD, 1994), ousua variante força motora-estado-resposta (UnitedNations, 2001). Neste modelo, os indicadores deestado buscam descrever a situação presente, físicaou biológica, dos sistemas naturais. Os indicadoresde pressão, ou força motora, tentam avaliar e mediras pressões exercidas pelas atividades antrópicas so-bre os sistemas naturais ou as forças motoras quegeram tais pressões, respectivamente. Os chamadosindicadores de resposta procuram avaliar a qualidadedas políticas e acordos formulados para responder,ou seja, minimizar os impactos antrópicos.

Um marco dentre tais iniciativas foi a criaçãopela Comissão de Desenvolvimento Sustentável dasNações Unidas de um Grupo de Trabalho deIndicadores de Desenvolvimento Sustentável. Oobjetivo de tal comissão foi construir indicadoresacessíveis aos tomadores de decisão que pudessemauxiliar os países nos seus esforços de medir oprogresso rumo ao desenvolvimento sustentável. Ametodologia básica proposta evoluiu de umaabordagem força motora-estado-resposta para umaabordagem baseada em temas e sub-temas dedesenvolvimento sustentável a partir da experiênciaacumulada nos testes e nas avaliações por experts.Alguns países participantes da etapa de testesconcluíram que a abordagem força motora-estado-resposta, embora adequada para a dimensão ambien-tal, não se mostrou adequada para as dimensões so-cial, econômica e institucional do desenvolvimentosustentável (United Nations, 2001).

Outra iniciativa digna de nota, esta mais especí-fica em relação ao urbano e à escala local, é a doPrograma de Indicadores Urbanos do Habitat, tempor objetivo servir de base para o estabelecimento deuma Rede Mundial de Observatórios Urbanos, bemcomo para a avaliação e controle da implementaçãodos programas do Habitat e da Agenda 21. A inicia-tiva contempla indicadores relativos a cinco temas:abrigo (shelter); desenvolvimento social e erradicaçãoda pobreza; gestão ambiental; desenvolvimentoeconômico; governança (UNCHS, 2004).

Na América Latina, uma iniciativa nesse sentidofoi a criação pela CEPAL da Rede de Indicadores de

Desenvolvimento Sustentável, como o objetivo deapoiar os países latino americanos nos processos deconstrução e implementação de indicadores dedesenvolvimento, promovendo tambémintercâmbio e troca de experiências. Entretanto, taliniciativa ainda é insipiente. No Brasil, destaca-se ainiciativa Indicadores de DesenvolvimentoSustentável-Brasil 2004, do IBGE (InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística), que calculaindicadores de sustentabilidade nas dimensões am-biental, social, econômica e institucional para os es-tados da federação (IBGE, 2004).

Recentemente, em junho de 2006, o BancoMundial anunciou durante o III Urban Fórum, umaproposta de facilitar o desenvolvimento deindicadores urbanos padronizados com uma fortedimensão de sustentabilidade. Nos dois primeirosanos do projeto serão construídos indicadores emparcerias com 5 cidades-piloto: Belo Horizonte e SãoPaulo, no Brasil, Bogotá na Colômbia e Toronto eVancouver no Canadá.

A consolidação de índices sintéticos como medi-da de desenvolvimento econômico e social, como oProduto Interno Bruto (PIB) e o Índice deDesenvolvimento Humano (IDHM), impõe aconstrução de medidas de sustentabilidade quepossam dialogar com esses indicadores historicamenteconsagrados. Desta forma, os índices desustentabilidade em geral, e os índices desustentabilidade urbana em particular, podem serconsiderados como parte de uma quarta geração, emconstrução, dos índices de desenvolvimento2.

Dentre as dificuldades metodológicas comunsna construção de indicadores de sustentabilidade,urbanos ou não, destacam-se a formulação conceitual

2 A primeira geração de tais índices tem como represen-tante principal o Produto Interno Bruto per capta (PIB percapta). A segunda geração tem como representante principalo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), propostopelo PNUD com o objetivo de incorporar aspectos da vidahumana, como educação e longevidade, não consideradospelo primeiro. A terceira geração de indicadores é compostapor índices que tem por objetivo aperfeiçoar o IDH, comoo IDG (Índice de Desenvolvimento ajustado a Gênero) e oIPH (Índice de Pobreza Humana), ambos do PNUD; oICV (Índice de Condições de Vida), produzido para osmunicípios brasileiros pelo IPEA e Fundação João Pinheiro;e o IPRS (Índice Paulista de Responsabilidade Social),produzido para os municípios paulistas pela Fundação Seade.

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apropriada, a tradução operacional em variáveis, aobtenção de dados fidedignos e o seu tratamentoestatístico adequado. Dada a inexistência de consen-so em relação aos conceitos de sustentabilidade e dequalidade ambiental, o processo de escolha dasvariáveis a serem utilizadas na suas mensurações aca-ba, muitas vezes, sendo mais uma função dadisponibilidade de dados do que uma decorrênciado conceito, o que compromete o rigor teórico dasrelações de causalidade encontradas entre os dife-rentes indicadores. A carência de informações siste-máticas tem sido um problema recorrente para to-dos aqueles que trabalham com indicadoresambientais e de sustentabilidade (EnvironmentalSustainability Indicators, 2002; Esty e Porter, 2002;United Nations, 2001; Herculano, 1998; Isla,1998).

2. O Sistema de Índices deSustentabilidade Urbana (SISU)

O Sistema de Índices de Sustentabilidade Urba-na (SISU) tem por objetivo fornecer uma ferramentade análise da sustentabilidade nos aglomerados me-tropolitanos brasileiros.

Faz parte, portanto, do esforço acadêmicodesenvolvido recentemente, no Brasil e em outrospaíses, para a construção de índices e indicadores desustentabilidade. Desse modo, refletindo o estadoda arte, nacional e internacional, na elaboração dessesíndices e indicadores, o sistema apresentado nesteartigo, certamente, ainda está sujeito aoaperfeiçoamento inerente ao debate acadêmico e comtodos os politicamente interessados.

Como poderia se esperar, a construção do siste-ma de índices deparou, inicialmente, com o proble-ma de tornar comparáveis os dados, geralmente, dediferentes fontes, produzidos em escalas distintas,com cobertura espacial e distribuição temporal di-versas. Compatibilizar essas informações não é umatarefa simples, tornando-se mais complexa quando,muitas vezes, não se dispõe de informações e necessita-se construir proxies adequadas. Essas limitaçõesiniciais, longe de se transformarem em impedimen-tos, acabaram servindo como desafios, respondidossem se perder o necessário rigor que o temasustentabilidade exige.

2.1. O Sistema de Índices de SustentabilidadeUrbana: concepção e composição

A abordagem escolhida foi a da construção deum sistema de índices temáticos, como adotado pe-las versões mais recentes do Programa de IndicadoresUrbanos do Habitat (UNCHS, 2004), dosIndicadores de Desenvolvimento Sustentável dasNações Unidas (United Nations, 2001) e doIndicadores de Desenvolvimento Sustentável-Brasil2004 (IBGE, 2004), em lugar da construção deum único índice síntese. Isto porque, se por um lado,os índices sintéticos, ou compostos, possuem a claravantagem de uma comunicação ágil, por outro, sãomuitas as críticas a eles dirigidas. Argumenta-se, compropriedade, que indicadores sintéticos reduzem adimensão das diferenças e escondem desigualdadese heterogeneidades internas às unidades de análise(UNDP, 1992; Herculano, 2000; Fundação Seade,2002). De fato, testes estatísticos realizados pelosautores com o conjunto inicial de variáveis coletadaspelo projeto de pesquisa que deu origem a este artigo,revelaram a baixa sensibilidade de um índice sintéti-co para discriminar, significativamente, as diferentesunidades de análise no contexto dos indicadores aquicalculados.

Em consonância com a definição desustentabilidade urbana aqui adotada (item 1), oSISU é composto por três índices temáticos: índiceambiental, índice de capacidade político-institucionale índice de desenvolvimento humano municipal.Cada índice mede o progresso em relação a um con-junto de objetivos relacionados à sustentabilidadeurbana. O primeiro índice mede as prioridades desustentabilidade urbana relativas à melhoria dasegurança ambiental e à prevenção da degradação.O segundo mede as prioridades de sustentabilidadeurbana relativas ao fortalecimento da cidadania epromoção do engajamento cívico. O terceiro medeas prioridades de sustentabilidade urbana relativas àsuperação da pobreza e promoção da equidade.

Os índices ambiental e capacidade político-institucional foram elaborados e construídos pelosautores no âmbito da pesquisa aqui mencionada. Oíndice de desenvolvimento humano municipal éaquele produzido pelo IBGE/FJP/PNUD, que con-siste em uma aplicação da metodologia do IDH (Ín-dice de Desenvolvimento Humano) do Programa

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de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP)para o contexto dos mais de cinco mil municípiosbrasileiros.

Os índices temáticos são formados por um con-junto de indicadores, que por sua vez são compostospor uma série de variáveis relativas aos fenômenosestudados, observadas diretamente ou como proxies.

A escolha preliminar dos indicadores e variáveisfoi baseada nas matrizes de sustentabilidade propostasno projeto Biodiversidade, População e Economia(Paula, 1997), nas variáveis e indicadores utilizadosno ESI (Environmental Sustainability Index)(Environmental Sustainability Index, 2002) e nosindicadores do Programa de Indicadores Urbanosdo Habitat (UNCHS, 2004). Obviamente, foinecessário realizar adaptações importantes de modoa adequar os indicadores e variáveis à escala local e àrealidade metropolitana. Os critérios consideradospara tanto foram: a) relevância, isto é, capacidade davariável em traduzir o fenômeno; b) aderência local,isto é, a capacidade da variável (indicador) em captarfenômeno produzido ou passível de transformaçãono plano local; e c) disponibilidade, cobertura eatualidade dos dados.

A escolha final das variáveis foi feita através deabordagem indutiva, por meio de análise decorrelação e análise multivariada de componentesprincipais (ACP). As variáveis que mostraram altacorrelação com outras variáveis contidas no indica-dor foram excluídas. Na ACP, aquelas que mostrarambaixo poder explicativo da variância total foramexcluídas.

O Índice Ambiental é composto por oitoindicadores. Quatro deles medem a qualidade doambiente no momento presente, tanto em relaçãoao ambiente natural –recursos hídricos e coberturavegetal– quanto em relação ao ambiente construído–serviços sanitários e qualidade da habitação– e serelacionam tanto aos objetivos de segurança ambien-tal quanto aos objetivos de prevenção da degradação.Os outros quatro indicadores se relacionaminversamente com o estresse ambiental gerado pelaintervenção antrópica sobre as áreas urbanas e sãouma medida dos objetivos de segurança ambiental eprevenção da degradação.

Os indicadores utilizados em relação à qualidadedo ambiente foram:

- Recursos hídricos. A qualidade dos recursoshídricos é um dos aspectos mais importantesem relação aos objetivos de segurança ambien-tal urbana, uma vez que o comprometimentodos recursos hídricos fragiliza os sistemasnaturais e compromete as condições de vida dapopulação local. É também um aspecto impor-tante em relação à prevenção da degradaçãoambiental, pois uma alta qualidade dos recur-sos hídricos indica sucesso na prevenção dadegradação deste recurso natural básico. O cál-culo do indicador de qualidade dos recursoshídricos foi feito usando metodologia elabora-da pelos órgãos ambientais estaduais das regiõesmetropolitanas estudadas, que permitem acomparabilidade dos resultados. Este indica-dor é composto de uma série de variáveis físico-químicas, tais como temperatura, turbidez, Ph,condutividade, demanda química de oxigênio,demanda bioquímica de oxigênio, fenóis,oxigênio dissolvido, mercúrio, níquel, óleos egraxas, amônia, dentre outros. Os dados utili-zados na construção dos indicadores são prove-nientes dos órgãos ambientais estaduais.

- Cobertura vegetal. A preservação da cobertu-ra vegetal também é de importância centralpara os objetivos de segurança ambiental eprevenção da degradação, uma vez que avegetação original não apenas é, por si só, re-curso natural básico, como também é suportepara a biodiversidade faunística e age comouma proteção natural contra a poluição at-mosférica e alterações microclimáticas. O indi-cador de cobertura vegetal foi medido atravésda relação entre a cobertura vegetalremanescente e a área de domínio da cobertu-ra original, a partir dos dados obtidos atravésde processamento de imagens de satélite eestudos da Fundação SOS Mata Atlântica.

Um terceiro indicador de importância chave emrelação à qualidade do ambiente natural, a qualidadedo ar, não foi incorporado ao índice por ausência dedados de monitoramento atmosférico confiáveis paraa grande maioria dos municípios para os quais calcu-lamos o indicador. No entanto, dentre os indicadores

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de estresse ambiental, dois são boas proxies da pressãoexercida sobre a qualidade do ar, a saber, pressãoindustrial e pressão veicular. Desta forma, a ausênciade um indicador de qualidade do ar não comprome-te a validade do índice ambiental.

Esta versão também não incorpora indicador dequalidade do solo, também de importância chaveem relação à qualidade do ambiente natural, maisuma vez por falta de dados para a maior parte dosmunicípios estudados.

- Serviços sanitários. Este indicador é deimportância central para os objetivos desegurança ambiental e prevenção dadegradação. Água potável é uma dasnecessidades humanas mais básicas e o acessoa ela implica em redução de doenças deveiculação hídrica e em aumento da qualidadede vida. A falta de saneamento básico é umproblema grave de saúde pública, responsávelpor inúmeras doenças e mortes, além de seruma ameaça aos recursos hídricos. O indica-dor toma como proxy o acesso à rede públicade fornecimento de água, instalação sanitáriaadequada e acesso à coleta regular de resíduossólidos urbanos, baseado no pressuposto queacesso a infra-estrutura sanitária adequada im-plica muito provavelmente em acesso a águapotável, coleta de esgoto e disposição adequadade resíduos sólidos. Os dados utilizados naconstrução do indicador provém do CensoDemográfico de 2000 (IBGE, 2000).

- Habitação adequada. Este indicador é deimportância central para o objetivo desegurança ambiental, no que se refere àsegurança do ambiente construído, poishabitação inadequada implica em exposição amaiores riscos de morbidade e mortalidade.Além disso, diz respeito à necessidade huma-na básica de abrigo. O indicador toma comoproxy o inverso da taxa de habitações subnormais. Habitações sub-normaiscorrespondem a domicílios localizados emfavelas e cortiços. Os dados utilizados naconstrução do indicador provém do CensoDemográfico de 2000 (IBGE, 2000).

Os indicadores utilizados para medir o estresseambiental gerado pela pressão antrópica foram:

- Pressão industrial. Este indicador mede apressão exercida pelas atividades industriaissobre o ambiente e a qualidade de vida dapopulação e se relaciona aos objetivos deseguraça ambiental e prevenção da degradação.Atividades industriais estão as principais fontespontuais de poluição atmosférica, hídrica e dosolo. A intensidade energética –energia con-sumida sobre o valor da produção em reais-foi considerada proxy da pressão industrial,acompanhando a literatura internacional queconsidera que indústrias com maior potencialpoluidor apresentam, em geral, menoreficiência energética. Os dados utilizados naconstrução do indicador são provenientes dasempresas fornecedoras de energia elétrica.

- Pressão intra-domiciliar. Este indicador medea pressão exercida pelos domicíliossuperpovoados. Domicílios superpovoadosimplicam em reduzido espaço por pessoa e nouso de um único cômodo para cozinhar, dor-mir e realizar outras atividades domésticas, oque é considerado pela literatura comofrequentemente associado a alto risco para asaúde humana (UNCHS, 2004). Tambémrepresentam uma pressão para a construçãode novas unidades residenciais, uma vez quedevido ao baixo poder aquisitivo da populaçãoque demanda as novas unidades residenciaisestas serão, em geral, construídas em favelas eoutras ocupações irregulares, representandoportanto um potencial para o crescimento donúmero de domicílios em condições sub-normais. O indicador foi medido através deduas variáveis, média de residentes porcômodos e a média de moradores por domicílio.Os dados utilizados na construção do indica-dor provém do Censo Demográfico de 2000(IBGE, 2000).

- Pressão por consumo doméstico. Este indica-dor mede a pressão exercida por domicílios dealto poder aquisitivo. As metrópoles brasileiras,por sua heterogeneidade, combinam desafiosà sustentabilidade advindos da pobreza –comofavelas, domicílios superpovoados, domicíliosdesprovidos de infra-estrurura básica- comdesafios provenientes da riqueza –como aexistência de uma parcela da população com

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altos padrões de consumo e uso intensivo derecursos naturais. A intensidade no uso ener-gético domiciliar, medida pelo consumo ener-gético domiciliar per capta, foi tomada comopróxy da pressão por consumo doméstico. Talescolha se deu em função de um alto consu-mo de energia elétrica domiciliar estar via deregra relacionado à utilização intensiva deaparelhos elétricos e eletrônicos, o que por suavez denota um alto padrão de consumo. Osdados utilizados na construção do indicadorsão provenientes das empresas defornecimento de energia elétrica.

- Pressão automotiva. Este indicador mede apressão exercida pelo número de veículos emcirculação. Veículos são a principal fonte deemissão de poluentes atmosféricos em regiõesdensamente urbanizadas. O número deveículos per capta é tomado como proxy dapressão automotiva. As informações para aconstrução deste indicador são provenientesda base de dados do governo estadual usadana cobrança de impostos sobre veículosautomotivos.

O Índice de Capacidade Político-Institucionalavalia a capacidade do sistema político-institucional eda sociedade de enfrentar os desafios dasustentabilidade urbana e oferecer respostas aos pro-blemas a ela relacionados. Está relacionado às priori-dades de sustentabilidade urbana relativas aofortalecimento da cidadania e promoção doengajamento cívico. Ele é formado por quatroindicadores: autonomia político-administrativa; gestãopública municipal; gestão ambiental municipal;informação e participação política. Como mostraEnvironmental Sustainabiliy Index (2002), para quea sustentabilidade ambiental possa ser atingida, énecessário dotar as administrações locais de capacidadesocial e institucional, assim como construir padrõessociais de habilidades, atitudes e trabalho, para que sepossa promover mudanças efetivas ao meio ambien-te. O índice de Capacidade Política-Institucional foimedido através dos seguintes indicadores:

- Autonomia político-fiscal. Este indicador cap-ta o grau de independência fiscal e política dogoverno local, que interfere diretamente emsua capacidade de executar políticas públicas

e estabelecer suas prioridades. Considerou-secomo proxies a autonomia fiscal e o pesoeleitoral. Autonomia fiscal é calculada como arelação entre arrecadação própria e os recursosadvindos das transferências inter-governamentais, expressando o grau deindependência do governo local na obtençãode receitas públicas, o qual condiciona emgrande parte o grau de autonomia paraestabelecer prioridades. O peso eleitoral é cal-culado como a relação entre o número deeleitores do município sobre o número deeleitores do estado e a população do municípiosobre a população do estado, aqui tomadocomo uma proxy da influência do municípiono processo eleitoral, visto que ocomparecimento às eleições no Brasil éobrigatório e a prática de ser eleitor emmunicípio outro que o da residência principalsignificativo em algumas regiões metropolita-nas. Os dados utilizados na construção dosindicadores provém de banco de dados daSecretaria do Tesouro Nacional e dos TribunaisEleitorais Estaduais.

- Gestão pública municipal. Este indicador cap-ta a eficiência da máquina pública municipale a existência de mecanismos de tomada dedecisão democráticos que facilitem oengajamento cívico e fortaleçam a participaçãocidadã. O indicador toma como proxies:porcentagem de funcionários com educaçãosuperior; grau de informatização da máquinapública local; existência de instrumentos degestão urbana; existência e regularidade nofuncionamento dos Conselhos Municipais deDesenvolvimento Urbano e de Habitação. Astrês primeiras proxies medem a eficiência damáquina pública e a última mede a existênciae funcionamento efetivo de mecanismos degestão urbana democrática. Os dados utiliza-dos na construção do indicador são provenien-tes da Pesquisa de Informações Municipais-Gestão Pública (IBGE, 2004).

- Gestão ambiental municipal. Este indicadorcapta a eficiência da máquina pública munici-pal na gestão ambiental. O indicador tomacomo proxies a existência e a regularidade dasreuniões do Conselho de Meio Ambiente e as

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Sustentabilidade e condições de vida em áreas urbanas: medidas e determinantes em duas regiões metropolitanas brasileiras

unidades de conservação municipal por 100mil habitantes. As primeira proxy mede aexistência e funcionamento efetivo de meca-nismos de gestão ambiental democrática e asegunda mede um resultado específico dapolítica pública local de conservação de recur-sos naturais. Os dados utilizados na construçãodo indicador são provenientes da Pesquisa deInformações Municipais-Gestão Pública(IBGE, 2004).

- Informação e participação política. Este indi-cador capta o grau de engajamento cívico e daparticipação cidadã. Toma como proxies:presença de ONGs ambientalistas registradasno Cadastro Nacional de ONGsAmbientalistas; participação político eleitoral–proporção de votos válidos nas últimaseleições municipais; peso da imprensa escrita efalada local na imprensa estadual (número dejornais ou rádios do município sobre o núme-ro de jornais ou rádios total no estado). Umaopinião pública bem informada é pré-requisi-to para o engajamento cívico. A participaçãopolítico-eleitoral é uma boa medida do graude interesse e envolvimento da população nogoverno local3. A presença de organizaçõesambientalistas legalizadas e acreditadas indicaexercício de cidadania ambientalizada eengajamento cívico em questões relacionadasà sustentabilidade. Os dados utilizados naconstrução do indicador são provenientes daPesquisa de Informações Municipais-GestãoPública (IBGE, 2004) e de banco de dadosdos Tribunais Eleitorais Estaduais.

O Índice de Desenvolvimento Humano Muni-cipal –IBGE/FJP/PNUD– foi incorporado ao siste-ma de índices por sua credibilidade, disponibilidadee atualização para todos os municípios estudados.Ele mede as prioridades de sustentabilidade urbanarelativas à superação da pobreza e promoção daequidade.

O IDHM mede em escala municipal os mesmosfenômenos medidos pelo consagrado Índice deDesenvolvimento Humano. Para a avaliação dadimensão educação, o cálculo do IDH municipalconsidera dois indicadores: taxa de alfabetização depessoas acima de 15 anos de idade (com peso dois) ea taxa bruta de freqüência à escola (com peso um). Oprimeiro indicador é o percentual de pessoas commais de 15 anos capaz de ler e escrever um bilhetesimples (ou seja, adultos alfabetizados). O segundoindicador é resultado de uma conta simples: osomatório de pessoas (independentemente da idade)que freqüentam os cursos fundamental, secundárioe superior é dividido pela população na faixa etáriade 7 a 22 anos da localidade. Para a avaliação dadimensão longevidade, o IDH municipal considerao mesmo indicador do IDH de países: a esperançade vida ao nascer. O indicador de longevidade sinte-tiza as condições de saúde e salubridade daquele lo-cal, uma vez que quanto mais mortes houver nasfaixas etárias mais precoces, menor será a expectativade vida observada no local. Para a avaliação dadimensão renda, o critério usado é a renda munici-pal per capita, ou seja, a renda média de cada resi-dente no município. A sua principal desvantagem éa pequena variação que apresenta de um municípiopara o outro nas regiões metropolitanas, nãorefletindo, em toda a sua amplitude, as profundasdesigualdades sociais intra-municipais (IBGE/FJP/PNUD, 2004).

2.2. O Sistema de Índices de SustentabilidadeUrbana: metodologia de cálculo

O primeiro passo na construção dos indicadorese índices foi tratar estatisticamente as variáveis. Oprimeiro passo para tanto foi identificar os valoresextremos das variáveis (outliers) e substituí-los pe-los valores correspondentes pelo limites superiordo percentil 2,5% e pelo limite inferior do percentile 97,5%, conforme o caso. Após a correção dosvalores extremos, as variáveis foram padronizadaspelo método z-score, de modo a permitir a suaagregação em uma escala numérica única, facilitan-do as comparações. Para algumas variáveis queapresentavam relação inversa com a sustentabilidade–quanto maior seu valor, pior o indicador–, apadronização foi feita a partir da fórmula inversa:subtraiu-se da média o valor da variável e o resulta-do foi dividido pelo desvio-padrão.

3 Votos válidos são aqueles dados a candidatos efetivos,excluindo votos em branco ou nulos. O comparecimento àseleições no Brasil é obrigatório. A não participação edesinteresse no processo eleitoral são medidos pela proporçãode votos válidos, uma vez que votos em branco e nulos sãoa forma existente de não participação eleitoral.

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O teste de adequação da composição dosindicadores, isto é, da adequação das variáveis que ocompõem, foi realizado utilizando-se o métodoestatístico de análise fatorial por componentesprincipais (ACP). Em todos os casos, o eingevalueacumulado para o primeiro e o segundo componen-tes dos indicadores compostos por mais de duasvariáveis foram significativos, indicando a adequaçãoda escolha das variáveis utilizadas em sua composição.O método dos componentes principais tambémmostrou a não redundância dos componentesprincipais de cada um dos indicadores, indicando asua sensibilidade para discriminar e classificar osmunicípios analisados.

Realizados os testes estatísticos, os indicadoresforam padronizados pelo método dos máximos emínimos, de forma que os seus valores variassementre zero e um, facilitando as comparações e acomunicação dos resultados. Com isso, o municípiocom melhor desempenho em um determinado in-dicador recebeu a pontuação 1, enquanto o piorrecebeu a pontuação 0.

Os índices temáticos foram obtidos a partir damédia simples dos seus respectivos indicadores. Aatribuição de pesos teóricos para os indicadores foidescartada devido à ausência de consenso científicoquanto à ponderação teoricamente pertinente. Aatribuição de pesos através de análise fatorial porcomponentes principais foi descartada em funçãoda aplicação da técnica ter retornado um númeromuito alto de componentes principais significativos(maiores ou iguais a 1) e a utilização da técnica decomposição do peso através da soma dos quadradosdos coeficientes de todos os componentes significa-tivos só ser indicada quando o número de unidadesde análise é muito alta. Versões futuras queincorporem outras regiões metropolitanas eaumentem o número de municípios poderão incor-porar ponderação através da referida técnica.

Cabe ressaltar, no entanto, que a ausência deponderação não compromete os resultados, uma vezque a aplicação da técnica estatística de ACP para cadaindicador em separado demonstrou ser a suacomposição bastante adequada, como já mencionado.

Cabe também destacar que índices de sustenta-bilidade consagrados, como o ESI, utilizam o mesmocritério de adoção da média não ponderada

(Environmental Sustainability Index, 2002). Emversão recente do ESI (Environmental SustainabilityIndex, 2005), foram realizadas uma série de testescomparando os resultados do índice não ponderadoà duas ponderações alternativas, os quaisdemonstraram não haver diferenças substanciaisentre eles, confirmando assim a adequação da opçãopelo índice não ponderado.

3. Sustentabilidade nas RegiõesMetropolitanas de São Paulo e BeloHorizonte

As Regiões Metropolitanas de São Paulo (RMSP)e a de Belo Horizonte (RMBH) foram escolhidaspara o cálculo dos indicadores.

São Paulo foi escolhida por ser o maior aglomera-do metropolitano do Brasil, o segundo maior daAmérica Latina e o quarto do mundo. Nela concen-tra-se, aproximadamente, 25% de toda a atividadeindustrial do Brasil e cerca de 10% da sua população.

Já a escolha de Belo Horizonte para o estudo decaso apóia-se nas seguintes razões. O estado de MinasGerais, do qual Belo Horizonte é a capital, foi um dospioneiros na formulação e implementação de políticaambiental no Brasil. O município de Belo Horizontetambém está entre os pioneiros na institucionalizaçãoda política ambiental local no país. Belo Horizonte criouuma secretaria municipal para tratar especificamentedo meio ambiente urbano no início dos anos 80, arti-culando-a com instâncias de participação popular compoder decisório efetivo em meados dos anos 90,enquanto em outras capitais, como Rio de Janeiro e SãoPaulo, a criação das secretarias só se deu nos anos 90 esua articulação com instâncias de participação no finalda referida década. Além disso, as pesquisas quepossibililitaram a construção dos índices foi realizadadentro de um programa financiado pela fundação deapoio à pesquisa do Estado de Minas Gerais.

3.1. As Regiões Metropolitanas de São Paulo e BeloHorizonte: semelhanças e diferenças

As duas regiões metropolitanas estudadasocupam posições muito diferentes no contexto dasociedade e da economia brasileira.

Desde o início do século XX, a Região Metropo-litana de São Paulo já se destacava como centro daprincipal atividade econômica do país, o café, e da

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Sustentabilidade e condições de vida em áreas urbanas: medidas e determinantes em duas regiões metropolitanas brasileiras

Tabela 1. Regiões Metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte, população dos núcleos centrais e dos municípiosrestantes (1970-2000).

Regiões 1970 1980 1991 2000Total RMSP (1) 8.113.873 12.552.203 15.395.780 17.768.135São Paulo (2) 5.924.615 8.493.226 9.646.185 10.406.166Restante da RMSP (3) 2.189.258 4.058.977 5.749.595 7.361.969 Total RMBH (4) 1.619.792 2.570.281 3.385.386 4.161.028Belo Horizonte (5) 1.235.030 1.780.855 2.020.161 2.229.697Restante da RMBH (6) 384.762 789.426 1.365.225 1.931.331 (1) / (4) 5,0 4,9 4,5 4,3(2) / (5) 4,8 4,8 4,8 4,7(3) / (6) 5,7 5,1 4,2 3,8

Fonte: IBGE (1970, 1980, 1991 e 2000).

Tabela 2. RMSP, tamanho da população e produto industrial segundo o tamanho dos municípios (2000).

Tamanho dos municípios População Produto industrial

segundo o Nº de habitantes Absoluto % Absoluto %São Paulo 10.406.166 58,57 24.472.157 41,95Guarulhos 1.071.299 6,03 5.493.557 9,42São Bernardo do Campo 700.405 3,94 8.446.131 14,48Osasco 650.993 3,66 1.247.178 2,14Santo Andre 648.443 3,65 2.323.889 3,98Maua 363.112 2,04 1.762.580 3,02Diadema 356.389 2,01 2.481.164 4,25Carapicuíba 343.668 1,93 127.350 0,22Moji Das Cruzes 329.680 1,86 695.290 1,19Itaquaquecetuba 272.416 1,53 302.278 0,52Suzano 228.439 1,29 1.845.317 3,16Barueri 208.028 1,17 1.999.652 3,43Embu 206.781 1,16 271.476 0,47Total municípios > 200.000 15.785.819 88,84 51.468.019 88,22Municípios entre 100 e 200.000. 1.264.783 7,12 5.034.236 8,63Municípios < do que 100.000 717.533 4,04 1.840.949 3,16Total 17.768.135 100,00 58.343.203 100,00

Fonte: IBGE (1970, 1980, 1991 e 2000) e Fundação Seade (2002).

Tabela 3. RMBH, tamanho da população e produto industrial segundo o tamanho dos municípios (2000).

Tamanho dos municípiossegundo o Nº de habitantes

População Produto industrial (r$)

Absoluto % Absoluto %Belo Horizonte 2.229.697 53,59 6.446.340 46,15Contagem 536.408 12,89 2.115.005 15,14Betim 303.588 7,30 3.179.866 22,77Ribeirão das Neves 246.589 5,93 150.257 1,08Santa Luzia 184.721 4,44 261.925 1,88Ibirité 132.843 3,19 156.094 1,12Sabará 114.557 2,75 156.968 1,12 Total municípios > 100.000 3.748.403 90,08 12.466.453 89,26Municípios entre 20 e 100.000 316.875 7,62 1.268.117 9,08Municípios < 20.000 95.750 2,30 232.264 1,66Total 4.161.028 100,00 13.966.835 100,00

Fonte: IBGE (1970, 1980, 1991 e 2000) e Fundação Seade (2002).

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população da RMSP, com 17.768 milhões de habi-tantes, ainda era 4,3 vezes superior à da RMBH,com 4.161 milhões. Essas diferenças significativaspodem, também, ser observadas entre as cidades deSão Paulo e Belo Horizonte e entre os demaismunicípios das duas regiões metropolitanas (Tabelas2 e 3).

Entretanto, se há uma nítida diferença entre asgrandezas demográficas e econômicas das duasregiões, podem ser observadas algumas semelhançasimportantes entre elas.

Tem havido, em ambas, uma enorme reduçãodo ritmo do crescimento demográfico, principalmen-te nas capitais, mas não apenas nestas. A populaçãode Belo Horizonte cresceu na última década a umataxa anual de pouco mais de 1,0% e São Paulo nãoalcançou 0,9% (Tabela 4). O crescimento dos outrosmunicípios metropolitanos é bem maior, porém emnítido processo de retração. Essa redução docrescimento demográfico tem sido função do declíniogeneralizado das taxas de fecundidade no Brasil, mas,principalmente, pela diminuição dos fluxosmigratórios.

Outro processo comum às duas regiões metro-politanas é o de inversão demográfica, pelo qual osmunicípios metropolitanos não centrais têm sido,cada vez mais, os grandes responsáveis pelocrescimento populacional das RMs. Nos anos 90,

sua emergente industrialização. Essa posição seconsolidou com o amadurecimento do capitalismobrasileiro, na década de 50, quando a região setransformou no locus preferencial dos investimentosprivados, nacionais e internacionais, e dos investi-mentos públicos. Apesar de um relativo processo dedesconcentração industrial que se observa desde osanos 80, a hegemonia industrial da RMSP ainda semantém até os dias atuais. A sua capacidade de atraçãopopulacional foi proporcional à sua relevânciaeconômica, sendo assim, até os dias atuais, a regiãode maior atração demográfica do país.

A expansão econômica da RMBH por sua vez,se deu, de fato, somente após a segunda metade dosanos setenta, quando ela emerge como um pólo deconvergência de investimentos na indústriaautomobilística e no setor metal-mecânico.

O resultado do desenvolvimento industrial nasduas regiões metropolitanas pode ser verificado peladiferença entre os valores da produção industrial:em 2000 a produção industrial da RMSPultrapassava os R$58 bilhões (Fundação Seade,2001), mais de quatro vezes superior ao da RMBH,próximo dos R$14 bilhões (Fundação João Pinheiro,2001).

Essas diferenças podem ser observadas, tambémem relação à população (Tabela 4). Apesar dasdiferenças diminuírem desde 1970, em 2000 a

Tabela 4. Regiões metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte, taxas de crescimento geométricas anuais dapopulação (1970-2000).

Regiões 1970/80 1980/91 1991/2000Total RMSP 4,46 1,87 1,62São Paulo 3,67 1,16 0,85Restante da RMSP 6,37 3,22 2,81

Total RMBH 4,73 2,54 2,34Belo Horizonte 3,73 1,15 1,11Restante da RMBH 7,45 5,11 3,97Fonte: IBGE (1970, 1980, 1991 e 2000).

Tabela 5. Regiões metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte, participação do núcleo e dos restantes dosmunicípios no crescimento populacional do total das regiões (1970-2000).

Regiões 1970/80 1980/91 1991/2000São Paulo 57,87 40,55 32,03Restante da RMSP 42,13 59,45 67,97Belo Horizonte 57,43 29,36 27,01Restante da RMBH 42,57 70,64 72,99Fonte: IBGE (1970, 1980, 1991 e 2000).

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Sustentabilidade e condições de vida em áreas urbanas: medidas e determinantes em duas regiões metropolitanas brasileiras

eles deram conta de 68% do crescimento popul-acional da RMSP e de 73% da RMBH (Tabela 5).Esse processo de inversão demográfica tem sidofortemente alimentado pelas migrações das capitaispara os outros municípios metropolitanos em funçãonão apenas da redistribuição espacial das atividadeseconômicas, mas, principalmente, das característicasexcludentes do mercado imobiliário nos núcleoscentrais, que expulsa boa parte da população maispobre para os municípios vizinhos.

No que tange às características da rede urbana,existem diferenças substantivas entre as duas regiões.A RMSP possui um sistema urbano maisdesenvolvido, com um número mais significativode cidades de porte médio.

Contudo, apesar das diferenças de porte dosmunicípios, há semelhanças no que tange à forteconcentração espacial da população. Na RMSP, quase90% da população reside nos 13 (treze) municípiosmaiores que 200.000 habitantes e na RMBH,porcentagem semelhante mora nos 7 (sete)municípios maiores que 100.000 habitantes. Omesmo ocorre em relação à concentração econômica,estes mesmos municípios são responsáveis, nas duasregiões, por aproximadamente 90% do PIB indus-trial. Somente as capitais, São Paulo e Belo Horizon-te, em 2000, geravam 42% e 46% do PIB indus-trial metropolitano, respectivamente.

Um grau tão elevado de concentração demográ-fica e econômica representa um desafio à gestão ur-bana e à busca da sustentabilidade em suas váriasdimensões. A concentração de população e dasatividades econômicas e, conseqüentemente, dasfontes poluidoras traz efeitos imediatos sobre aqualidade do ar e da água, além de representar uma

pressão crescente sobre os recursos naturais e de com-prometer a reprodução adequada do sistema am-biental micro-regional. Por outro lado, essa mesmaconcentração propicia sinergias políticas e sociaiscapazes de estimular uma melhor gestão e a adoçãode medidas de promoção da sustentabilidade.

3.3. O Sistema de Índices de SustentabilidadeUrbana: resultados para as regiõesmetropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte

A metodologia acima descrita foi aplicada a 57municípios, 36 da RMSP e 21 da RMBH, escolhidosa partir da definição de Aglomeração Metropolita-na, segundo IPEA/IBGE/NESUR (1999). Antesde passar para a apresentação dos resultadospropriamente dita cabe fazer duas observações sobreo contexto no qual os resultados devem ser interpre-tados.

A primeira observação consiste em relembrar queos índices são uma medida relativa de desempenho enão uma medida absoluta. Isto é, que medem odesempenho relativo de cada município em relaçãoaos extremos superiores e inferiores de desempenhono conjunto de municípios para os quais os índicesforam calculados. Portanto, um hipotético municípiocom pontuação 1 no índice de qualidade ambiental,por exemplo, ainda poderia aprimorar seudesempenho, e assim elevar o nível geral dedesempenho do conjunto de municípios, essapontuação não significa, em absoluto, que ele possuiuma qualidade ambiental perfeita.

A segunda observação diz respeito às limitaçõesreferentes ao escopo temporal utilizado na construçãodos índices, que foram calculados para um únicoano-base. A utilização de séries temporais permitiria

Tabela 6. Média dos índices temáticos por classe de tamanho, RMSP e RMBH (2000).

Município central IQA ICP IDHMRMSP São Paulo (capital) 0,47 0,97 0,84RMBH Belo Horizonte (capital) 0,50 0,95 0,84Municípios de porte médioRMSP Municípios > 200 mil 0,56 0,27 0,80RMSP Municípios entre 100 e 200 mil 0,58 0,18 0,80RMBH Municípios > 100 mil 0,59 0,31 0,76Municípios pequenosRMSP Municípios < 100 mil 0,56 0,18 0,79RMBH Municípios entre 20 e 100 mil 0,50 0,27 0,77RMBH Municípios < 20 mil 0,53 0,18 0,75Fonte: elaboração própria.

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comparações mais refinadas entre os índices. Entre-tanto a construção de índices para anos-base ante-riores demandaria a utilização de dados primários, oque poderá ser incorporada em trabalhos futuros.

Os resultados obtidos estão apresentados atravésdas médias dos índices de Qualidade Ambiental(IQA), Capacidade Sócio-Política (ICP) eDesenvolvimento Humano Municipal (IDHM),para as duas Regiões Metropolitanas, segundo osseus núcleos e os demais municípios agrupados se-gundo classes de tamanho. As classes de tamanhopara as regiões metropolitanas de Belo Horizonte e

Tabela 7. Índices temáticos e VA industrial municipal, RMSP (2000).

Município IQA ICP IDHM VA industrial(R$ 1.000 de 2000)

Sao Paulo 0,47 0,97 0,84 24.472.157Municípios > 200 mil

Guarulhos 0,55 0,30 0,80 5.493.557Sao Bernardo do Campo 0,50 0,28 0,83 8.446.131Osasco 0,52 0,18 0,82 1.247.178Santo André 0,48 0,40 0,84 2.323.889Mauá 0,58 0,27 0,78 1.762.580Diadema 0,54 0,33 0,79 2.481.164Carapicuiba 0,57 0,18 0,79 127.350Moji das Cruzes 0,66 0,32 0,80 695.290Itaquaquecetuba 0,63 0,20 0,74 302.278Suzano 0,61 0,21 0,78 1.845.317Barueri 0,56 0,21 0,83 1.999.652Embu 0,55 0,33 0,81 271.476

Municípios entre 100 e 200 milTaboao da Serra 0,60 0,18 0,81 1.187.101Itapevi 0,61 0,15 0,76 235.218Cotia 0,56 0,26 0,83 737.017Ferraz de Vasconcelos 0,64 0,14 0,77 164.121Sao Caetano do Sul 0,50 0,21 0,92 1.698.602Francisco Morato 0,54 0,11 0,74 2.570Itapecerica da Serra 0,59 0,21 0,78 606.453Franco da Rocha 0,59 0,21 0,78 138.500Ribeirao Pires 0,61 0,19 0,81 264.654

Municípios < 100 milPoa 0,66 0,19 0,81 104.032Jandira 0,67 0,21 0,80 212.627Santana de Parnaiba 0,42 0,31 0,85 224.757Caieiras 0,63 0,21 0,81 166.228Mairiporã 0,52 0,24 0,80 59.551Aruja 0,47 0,20 0,79 192.001Embu-Guacu 0,61 0,12 0,77 120.105Cajamar 0,55 0,18 0,79 507.033Santa Isabel 0,56 0,30 0,77 74.506Rio Grande da Serra 0,55 0,03 0,76 13.779Vargem Grande Paulista 0,48 0,17 0,80 102.998Guararema 0,58 0,14 0,80 26.735Pirapora do Bom Jesus 0,47 0,09 0,77 32.887Sao Lourenco da Serra 0,65 0,16 0,77 3.708Fonte: elaboração própria.

São Paulo são ligeiramente diferentes, uma vez quedevido à diferença de composição das mesmas, paraa primeira foi necessário dividir os municípiospequenos em dois grupos e para a segunda foinecessário dividir os municípios de porte médio emdois grupos, de modo a tornar explícitas diferençasimportantes.

As capitais, Belo Horizonte e São Paulo,apresentaram IQA menor ou igual à média dosdemais municípios agrupados e o IDHMsensivelmente maior. Entretanto, é em relação aoICP que as duas capitais se destacam sensivelmente

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dos demais municípios, com índicessignificativamente superiores, resultado consisten-te com sua capacidade de polarização e centralizaçãodo poder e com o maior desenvolvimento erobustezes institucionais decorrentes, próprios dascapitais dos estados.

Em ambas as regiões metropolitanas, o IQA paraas cidades de porte médio (com mais de 100 milhabitantes), tende a ser ligeiramente superior aoobtido tanto pelas cidades de menor porte quantopelas capitais. O IDHM apresenta-se ligeiramentesuperior para os municípios de maior porte demo-gráfico, em ambas as regiões metropolitanas.

Incorporando à análise o valor da produção in-dustrial, observa-se, no caso específico da RMSP,para os municípios com mais de 200 mil habitan-tes, as diferenças entre o IQA e o IDHM tendem aser maior nos municípios onde há uma maiorindustrialização. Um caso interessante é o de SantoAndré, que apresenta o IQA mais baixo e os ICP eIDHM mais altos dentre os municípios desse gru-po. Ouros dois casos interessante são os de

Guarulhos e Moji das Cruzes, que apresentamsituação mais equilibrada, com menores distânciasentre o IQA e o IDHM. Estes resultados sugeremque o trade-off entre o IQA e o IDHM, rejeitadopara o conjunto das duas regiões metropolitanasconforme discussão no item 4, seja umapossibilidade no caso específico dos municípiosfortemente industrializados.

Nos municípios entre 100 e 200.000 habitan-tes, na RMSP, a distância entre o IQA e o IDHMtende a ser significativamente menor do que aquelaverificada no grupo imediatamente superior. A gran-de exceção é São Caetano do Sul, com o maior IDHMe a segunda maior distância entre IQA e IDHM daregião metropolitana, apresentando também ICPligeiramente superior ao apresentado pelos demaismunicípios de sua classe de tamanho. Note-se queesse município, apesar de ter uma população de ape-nas 140 mil habitantes, se situa em nono lugar entreos mais industrializados.

Para os municípios com menos de 100.000 ha-bitantes, pequenos e com um valor da produção

Tabela 8. Índices temáticos e PIB industrial municipal, RMBH (2000).

Município IQA ICP IDHMPIB industrial( R$ 1.000,00

de 2000)Belo Horizonte 0,50 0,95 0,84 6.446.340

Municípios > 100 milContagem 0,53 0,50 0,79 2.115.005Betim 0,62 0,43 0,78 3.179.866Ribeirao das Neves 0,54 0,12 0,75 150.257Santa Luzia 0,62 0,20 0,75 261.925Ibirite 0,62 0,25 0,73 156.094Sabara 0,61 0,35 0,77 156.968

Municípios entre 20 e 100 milVespasiano 0,36 0,31 0,75 367.874Nova Lima 0,57 0,32 0,82 411.824Pedro Leopoldo 0,38 0,30 0,81 282.459Lagoa Santa 0,36 0,40 0,78 110.223Caete 0,72 0,16 0,79 18.920Igarape 0,52 0,36 0,75 38.925Mateus Leme 0,60 0,05 0,71 37.893

Municípios < 20 milSao Joaquim de Bicas 0,50 0,21 0,75 24.866Sarzedo 0,58 0,17 0,75 37.507Juatuba 0,54 0,18 0,75 59.426Sao Jose da Lapa 0,45 0,25 0,71 83.876Raposos 0,61 0,23 0,76 17.407Mario Campos 0,53 0,09 0,75 6.824Confins 0,50 0,13 0,77 2.359Fonte: elaboração própria.

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industrial relativamente industrial inexpressivo, nãose observa uma regularidade nas distâncias entre oIQA e o IDHM.

Os municípios da Região Metropolitana de BHapresentam, em geral, menor distância entre IQA eIDHM do que os municípios paulistas analisados.Tal característica é válida, principalmente, para osmunicípios com mais de 100.000 habitantes, com aexceção de Contagem. Aqueles com população en-tre 100 e 500 mil apresentam uma maior incidênciade IQA alto, quatro dos seis maiores índices daRMBH, uma surpresa devido à pobreza generaliza-da desses municípios, que servem de alternativa demoradia de baixo custo no entorno da capital mineira,pouco refletida no IDHM. A exceção clara é Betim,que possui o segundo produto industrial da região etambém apresenta alto IQA e pequena distância entreIQA e IDHM.

Embora a capacidade político institucional seapresente sensivelmente superior em Belo Horizon-te, outros dois municípios, Contagem e Betim,destacam-se significativamente dos demais,fenômeno para o qual não há paralelo na RMSP.

Dentre os municípios com população entre 20 e100.000 habitantes, os quais não apresentam umaregularidade expressiva, vale a pena chamar atençãopara Nova Lima com IDHMM de 0,82 e Caetécom IQA de 0,72. Ambos são municípios maisantigos, de tradição mineradora, e que hoje servemcomo alternativa para a expansão imobiliária da classemédia de BH. O alto valor de IQA encontrado paraCaeté explica-se pela existência no município de umaimportante área de preservação ambiental o que re-sulta em uma cobertura vegetal bastante superior àmédia da região metropolitana.

Os mapas temáticos abaixo espacializam os re-sultados dos índices de qualidade ambiental edesenvolvimento humano municipal para todos osmunicípios das duas regiões metropolitanas.

4. Sustentabilidade e condições de vidanas regiões metropolitanas de SãoPaulo e Belo Horizonte

Para melhor caracterizar a sustentabilidade nasregiões metropolitanas, em suas diferentes dimensões,elas foram devidamente comparadas através do

barômetro de Prescott-Allen, assim como através detestes estatísticos de correlação entre os três índicestemáticos e deles com os indicadores econômicos epopulacionais tradicionais.

As relações entre as dimensões ambiental e hu-mana da sustentabilidade foram exploradas a partirda construção do barômetro de sustentabilidade ins-pirado na metodologia criada por Prescott-Allen(1995). Ele consiste na plotagem de índices ouindicadores em dois eixos, o primeiro representandoo sistema humano e o segundo o sistema natural. Nobarômetro aqui construído o IDHM compõe o eixodo sistema humano e o IQA compõe o eixo do siste-ma ambiental.

Para determinar os intervalos de qualidade dosdois índices, foram calculados os quartis dadistribuição dos seus valores para cada região metro-politana. Aqueles situados no primeiro quartil foramconsiderados de baixa qualidade ambiental, no se-gundo quartil como razoável, no terceiro quartil comoboa, e no último quartil como de alta qualidadeambiental.

O IQA foi então plotado no eixo vertical e oIDHM no eixo horizontal em ordem decrescente eos dezesseis quadrantes resultantes foram entãoclassificados em quatro situações distintas:sustentável, potencialmente sustentável, potencial-mente insustentável e sustentável. Situações consi-deradas sustentáveis são aquelas que apresentamambos indicadores altos; as potencialmentesustentáveis combinam bons e altos indicadores; aspotencialmente insustentáveis apresentam pelo me-nos um dos indicadores baixo ou razoável e asinsustentáveis apresentam pelo menos um dosindicadores muito baixo ou baixo.

O objetivo desta análise é tornar mais explícita epermitar uma discussão mais aprofundada dassituações de equilíbrio e das situações de trade-off en-tre qualidade ambiental e desenvolvimento humano.As situações onde há um trade-off, uma alta qualidadeambiental vem acompanhada de um baixodesenvolvimento humano e vice-versa, foram consi-deradas insustentáveis. Também foram consideradasinsustentáveis situações de equilíbrio negativo, isto é,baixa qualidade ambiental e baixo desenvolvimentohumano. Foram consideradas como sustentáveissituações de equilíbrio positivo. Cabe ressaltar mais

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Mapas 1-4. Índices de qualidade ambiental e desenvolvimento humano municipal para todos os municípios dasduas regiões metropolitanas.

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Tabela 9. Barômetro de sustentabilidade RMSP.

IDHM –Índice de Desenvolvimento Humano MunicipalMuito baixa Baixa Média Alta

Alta Itaquaquecetuba Ferraz CaieirasItapevi Vasconcelos São LourençoJandira da Serra

Moji das CruzesPoáRibeirao Pires

Média Franco da Rocha Mauá Embu-Guaçu Taboao da SerraQA - Barueri Cotia SuzanoQualidade ItapecericaAmbiental Serra

CarapicuibaBaixa Francisco Morato Santa Isabel Cajamar Mairiporã

Embu Guarulhos OsascoRio Grande da DiademaSerra

Muito baixa Aruja São Paulo Santo AndreVargem Gd Pirapora Bom São Bernardo doPaulista Jesus Campo

Guararema São Caetano doSantana de SulParnaíba

sustentável potencialmente sustentável potencialmente insustentável insustentável

Barômetro de Sustentabilidade RMBH.

IDHM –Índice de Desenvolvimento Humano MunicipalMuito baixa Baixa Média Alta

Alta Caete Mateus Leme RapososSanta LuziaIbirité

Média Betim Sarzedo Sabara Nova LimaQA - JuatubaQualidadeAmbiental

Baixa Igarape Ribeirao das Contagem MairiporãNeves OsascoDiademaMario Campos

Muito baixa S Joaquim de Vespasiano São Jose da Lapa Belo HorizonteBicas Lagoa Santa Confins

Pedro Leopoldo sustentável potencialmente sustentável potencialmente insustentável insustentável

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uma vez, que as quatro situações são comparativasdentro do conjunto dos municípios estudados, e nãosituações de sustentabilidade derivadas da comparaçãocom valores de referência ou benchmarks.

São Paulo e Belo Horizonte, as capitais, foramclassificadas como insustentáveis. Na RMSP, cincomunicípios foram classificados como sustentáveis, ena RMBH apenas um município recebeu talclassificação. Os municípios industriais da RMSP,em sua maioria, foram classificados comoinsustentáveis, com a exceção de Diadema, Osasco eGuarulhos, classificados como potencialmenteinsustentáveis e Suzano como potencialmentesustentável. Na RMBH, Betim e Contagem, os doismunicípios industriais, foram classificados comoinsustentável e potencialmente insustentável, respec-tivamente.

É interessante observar, também, no que se refereàs situações de equilíbrio, doze municípios da RMSPe cinco da RMBH apresentam a mesma classificaçãonos dois índices. Foram encontrados três municípiosna pior situação de equilíbrio, qualidade ambientalbaixa e desenvolvimento humano muito baixo.

No melhor equilíbrio, ou seja, alta qualidadeambiental e alto desenvolvimento humanoencontram-se um município da RMBH e cincomunicípios da RMSP. Raposos na RMBH e Caieiras,São Lourenço da Serra e Poá na RMSP sãodemograficamente pequenos e de atividade indus-trial inexpressiva. Ribeirão Pires é um municípiomédio, entre 100 e 200 mil habitantes, com umaatividade industrial inexpressiva. Moji das Cruzespossui população acima de 200 mil e atividadeindustrial relevante.

As situações de grande desequilíbrio, combinan-do situações opostas de qualidade ambiental edesenvolvimento humano, são também bastantesugestivas. Com qualidade ambiental muito baixa ealto desenvolvimento humano, se situam Belo Ho-

rizonte, Confins e Pedro Leopoldo na RMBH e San-to André, São Bernardo do Campo e São Caetanodo Sul na RMSP. Na situação assimétrica oposta, altaqualidade ambiental e desenvolvimento humanomuito baixo, foram encontrados três municípios emcada uma das regiões metropolitanas.

A comparação dos índices temáticos entre siatravés de testes de correlação traz resultados bastan-te interessantes.

A fraquíssima correlação encontrada entre oIDHM e o IQA afastam a hipótese de um trade-offrecorrente entre desenvolvimento humano equalidade ambiental nos municípios estudados. Já acorrelação positiva significativa entre o ICP e oIDHM são um bom indicador de que na regiãoestudada o desenvolvimento humano e a capacidadeinstitucional caminham lado a lado.

A existência de uma correlação negativa encon-trada entre o IQA e o ICP, ainda que baixa, ésurpreendente, uma vez que se esperava tendo porbase a literatura uma correlação positiva entrequalidade ambiental e fortalecimento institucional.Ou seja, esperava-se que municípios mais fortesinstitucionalmente possuíssem sinergias políticascapazes de estimular uma adoção de medidas depromoção da sustentabilidade que se refletissem noíndice ambiental. Esta surpresa é reforçada pelos re-sultados das capitais, Belo Horizonte e São Paulo,classificadas como insustentáveis na análise dobarômetro e detentoras dos indicadores decapacidade política sensivelmente superiores aosdemais. Cabe portanto, levantar aqui uma série dequestões sobre o significado desse resultado. Acorrelação negativa estaria indicando uma falha gra-ve nos mecanismos de governança? Ou tal resultadopoderia ser atribuído a outros fatores? Levantamosaqui a hipótese de que esta correlação negativa espelhapossivelmente um gap temporal entre os esforçosempreendidos na gestão e os resultados efetivos em

Tabela 10. Correlações entre índices temáticos.

IQA ICP IDHMIQA 1 -0,28 -0,14ICP -0,28 1 0,38IDHM -0,14 0,38 1Fonte: elaboração própria. Nota. Números em negrito: correlação significativa ao nivel 0,01 (2-tailed). Números em itálicoe negrito: correlação significativa ao nível 0,05 (2-tailed).

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relação à qualidade ambiental. Ou seja, os resultadospresentes positivos nos indicadores de capacidadeinstitucional irão se refletir em melhorias na qualidadeambiental futuras de médio e longo prazo. Vistoque os sistemas ambientais precisam de tempo parase recuperar, os resultados de ações presentes paramelhoria da qualidade dos recursos hídricos eampliação da cobertura vegetal, por exemplo, seriamvisíveis apenas no futuro. Tal hipóse somente poderáser comprovada em estudos futuros. Comprovar talhipótese através da construção de ambos os índicespara ano-base na década anterior é uma possibilidadeinteressante que também poderá ser adotada emversões futuras do sistema de índices desustentabilidade urbana.

A literatura recente sobre o tema sustentabilidadeaponta para correlações diversas e por vezes opostasentre os fenômenos qualidade ambiental edesenvolvimento econômico. Parte da literaturaaponta para uma relação direta entre os fenômenos,indicando que a qualidade ambiental se beneficiado desenvolvimento econômico. Uma segundacorrente sustenta a existência de uma relação inver-sa, um trade-off, refletindo uma supremacia dasexternalidades negativas sobre as positivas. Umaterceira corrente aponta para a existência de umarelação que pode ser descrita por uma curva em Uinvertido, denominada curva de Kuznets. A primeirametade da curva de Kuznets indica que em níveisbaixos e médios de desenvolvimento econômicohaveria uma relação inversa entre qualidade ambien-tal e desenvolvimento econômico, ou seja, à medidaque um país ou cidade fosse se desenvolvendoeconômicamente iriam aparecendo externalidadesambientais negativas que implicariam em altos níveisde degradação e baixa qualidade ambiental. A se-gunda metade da curva de Kuznets indica que emníveis médios e altos de desenvolvimento econômicoa relação inversa seria substituída por uma relação

direta, na qual à medida que o desenvolvimentoeconômico prossegue e se reforça as externalidadespositivas iriam se tornar mais importantes que asnegativas, implicando em melhorias da qualidadeambiental e reversão do processo de degradação.Cabe atentar entretanto para o perigo de leiturasmaniqueístas da terceira corrente sugerirem seremválidas estrategias do tipo “crescer para depoislimpar”. (Environmental Sustainability Index,2002; Esty e Porter, 2002; Dasgupta et al., 1995).

Os indicadores econômicos utilizados nacomparação com os índices de sustentabilidade ur-bana foram o PIB industrial, ou o valor da produçãoindustrial, e a renda per capta familiar, com o objeti-vo de captar as diferenças entre o grau deindustrialização e a riqueza relativa apropriada pelapopulação. Adotamos o PIB industrial, e não o PIBmunicipal, com o objetivo de investigar se o trade-offentre grau de industrialização e o índice de qualidadeambiental, sujerido pela verificação de um grandeafastamento entre os valores do IDHM e do IQA nocaso específico dos municípios com alto grau deindustrialização, seria ou não verificável para o con-junto de municípios como um todo.

No que se refere à relação com os indicadores de-mográficos, utilizou-se a população urbana e adensidade urbana (população urbana sobre área doperímetro urbano), considerados pela literatura comoimportantes indutores de sustentabilidade(McGranahan e Satterthwaite, 2002; EnvironmentalSustainability Index, 2002; Miller e Small, 2003).

Ambos indicadores econômicos possuem umaexpressiva correlação positiva com o ICP e com oIDHM. A renda per capta familiar média apresentouuma correlação pouco relevante com a qualidadeambiental, com sinal negativo, e uma alta e positivacom o IDHM.

Tabela 11. Correlações entre índices temáticos e indicadores econômicos/demográficos.

IQA ICP IDHMPIB/VAF industrial -0,19 0,73 0,36Renda per capta familiar média -0,25 0,43 0,89População urbana -0,16 0,72 0,28Densidade populacional urbana 0,04 0,25 0,43Fonte: elaboração própria.Nota. Números em negrito: correlação significativa ao nivel 0,01 (2-tailed). Números em itálico e negrito: correlaçãosignificativa ao nível 0,05 (2-tailed)

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Tabela 12. Correlações entre indicadores componentes do IQA e ICP e indicadores econômicos/demográficos.

Indicador Tipo de Abrangência PIB/VAF Renda per População Densidadeindicador espacial industrial capta urbana populacional

familiar urbanamédia

Gestão pública municipal Resposta Municipal 0,47 0,37 0,41 0,3Redução da pressão veicular Pressão Global -0,59 -0,79 -0,49 -0,24Autonomia política

Resposta Municipal 0,66 0,69 0,65 0,21administrativaRedução da pressão

Pressão Intra-Urbano 0,4 0,69 0,33 0,18domiciliarServiços sanitários Estado Intra-Urbano 0,33 0,4 0,25 0,62Gestão ambiental Resposta Municipal 0,71 0,22 0,72 0,26Informação e participação

Resposta Municipal 0,75 0,23 0,81 0,13políticaQualidade da habitação Estado Intra-Urbano -0,36 -0,09 -0,22 -0,51Redução da pressão

Pressão Regional -0,3 -0,83 -0,25 -0,23do consumoCobertura vegetal Estado Regional -0,1 -0,2 -0,09 -0,28Qualidade recursos hídricos Estado Regional 0,05 -0,26 -0,05 -0,2Redução da pressão

Pressão Regional 0,17 0,13 0,13 0,26industrialNota. Números em negrito: correlação significativa ao nivel 0,01 (2-tailed). Números em itálico e negrito: correlaçãosignificativa ao nível 0,05 (2-tailed).

O grau de industrialização não pode ser consi-derado, isoladamente, como um indutor dasustentabilidade urbana. Apesar de ser um indutordireto da capacidade político institucional, suainfluência sobre o desenvolvimento humano é me-nos determinante, assim como sobre a qualidadeambiental. Desta forma, rejeitou-se a hipótese deque o trade-off entre industrialização e qualidadeambiental fosse válido para o conjunto demunicípios.

Por outro lado a renda per capta familiar média,que pode ser considerada um indutor direto dodesenvolvimento humano, possui correlação positi-va com a capacidade político institucional e correlaçãonegativa com a qualidade ambiental, não podendotambém ser considerada, isoladamente, como umindutor da sustentabilidade urbana.

Verifica-se uma correlação positiva significativaentre os índices de capacidade político-institucionale o tamanho da população urbana, fortementeinfluenciada pelas populações das capitais das duasregiões metropolitanas. Não foi encontrada nenhumacorrelação entre o índice de qualidade ambiental e osindicadores demográficos, eliminando-se assim ahipótese de que cidades maiores são aquelas queapresentam necessariamente pior qualidadeambiental.

A tabela 11 apresenta os resultados de análisesemelhante realizada para cada um dos 12 indicadoresque compõem os índices de qualidade ambiental ecapacidade político-institucional. Para efeitos deanálise agrupamos em indicadores segundo seu tipo–estado, resposta, pressão– e segundo suaabrangência geo-espacial –global, regional, munici-pal, intra-urbano.

Embora existam diferenças entre os resultadosapresentados individualmente, pode-se discernir umclaro padrão para as cidades estudadas, no qual osindicadores de resultado apresentam correlações maisfortes com os indicadores econômicos, seguidos pe-los indicadores de pressão. Já os indicadores de esta-do apresentaram fraca relação com os indicadoreseconômicos. Em um segundo padrão, pode ser ob-servado que todos os indicadores intra-urbanos,municipais e de impacto global, se correlacionavamcom as medidas econômicas, enquanto a maior partedos indicadores de impacto regional nãoapresentaram correlação significativa com osindicadores econômicos.

Ao examinar as correlações com os indicadoresdemográficos, pode-se constatar que os indicadoresde resultado apresentaram novamente as correlaçõesmais fortes. Entretanto, de forma distinta da relaçãocom os indicadores econômicos, a estes seguem os

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indicadores de estado que apresentaram correlaçãosignificativa com a densidade populacional. Dentreos indicadores de pressão, apenas um, a redução dapressão veicular, apresentou correlação significativacom o indicador população urbana. Tais resultadosindicam que os efeitos relacionados ao tamanho dascidades são refletidos pelos indicadores de pressão eresposta, ao passo que os efeitos da maior ou menordensidade populacional estão refletidos nosindicadores de estado.

Os indicadores municipais possuem correlaçãosignificativa com as medidas populacionais. Ao passoque alguns indicadores de impacto global e intra-urbano apresentaram correlações interessantes coma densidade demográfica, os indicadores de impactoregional não apresentaram relação expressiva com osindicadores demográficos.

5. Considerações finais

O sistema de índices de sustentabilidade aquiapresentado é um projeto piloto, ainda aberto a novasconstruções e (des)construções.

A cálculo dos índices para os municípios dasregiões metropolitanas de São Paulo e Belo Horizon-te foi realizada em menos de seis meses, com recursose equipe limitados. Ainda assim, os resultados semostraram consistentes, o que demonstra ser possívela construção de índices temáticos e indicadorescompreensivos de sustentabilidade urbana,imprescindíveis para que se possa fazer deste umconceito mais operacional e mensurável.

O ponto forte do SISU é sua possibilidade deutilização como ferramenta de monitoramento dosesforços na promoção da sustentabilidade urbana.Tal ferramenta é uma base racional eficaz parapriorizar esforços e direcionar políticas públicas.

Os resultados obtidos indicam claramente osmunicípios de maior e menor sucesso relativo emcada uma das três dimensões consideradas dasustentabilidade. Moji das Cruzes e Ribeirão Piresna RMSP e Raposos, Nova Lima e Sabará na RMBHsão exemplos de municípios que vem trilhando umcaminho mais sustentável e podem trazer luzesinteressantes sobre como atingir maior equilíbrioentre qualidade ambiental e desenvolvimento hu-mano. Arujá e Vargem Grande Paulista na RMSP e

São Joaquim de Bicas na RMBH são exemplosopostos, de uma clara e extrema fragilidade, ambien-tal, sócio-econômica e político-institucional, deman-dando atenção especial e ações urgentes.

Os resultados também sugerem Santo Andrécomo município prioritário para monitoramento, poisapesar dos resultados pífios que apresentou na pre-sente versão do índice ambiental, vem realizandonos últimos anos esforços consideráveis naimplementação de políticas urbanas com uma fortedimensão ambiental, o que se espera irá se refletir emmelhoras substanciais neste índice no futuro.

Os resultados obtidos também explicitamtendências, positivas e negativas, que indicamcaminhos a ser seguidos. Por exemplo, a rejeição dahipótese de um trade-off recorrente entredesenvolvimento humano e qualidade ambiental eentre os índices de sustentabilidade e o tamanho dascidades, traz bastante alento e indica ser possíveltrilhar caminhos mais sustentáveis, mesmo regiõesmetropolitanas do porte de São Paulo. Por outro lado,é preocupante o grande desnível entre qualidadeambiental e desenvolvimento humano verificado nascapitais e nos municípios fortemente industrializados.

Claramente, existem limitações importantes dedados. A melhoria e ampliação das bases de dados,utilizando-se de dados recém-produzidos e emdesenvolvimento, irão trazer avanços consideráveispara versões futuras do SISU. O IBGE publicourecentemente nova base de dados, específica sobregestão ambiental municipal no Brasil, a qual irá con-tribuir para a produção de indicadores de capacidadepolítico-institucional mais acurados. Nos próximos18 meses serão construídos índices para as três regiõesmetropolitanas do Estado de São Paulo, que possuibases de dados mais completas, o que possibilitarátanto a incorporação de indicadores importantesausentes nesta versão, como os de qualidade do ar edo solo, quanto a construção de séries temporais.

A construção de séries temporais é fundamentalpara se avaliar de forma mais dinâmica o desempenhodos municípios, captando melhorias e retrocessos.Também é imprescindível para que se possa respon-der adequadamente aos questionamentos em relaçãoà correlação negativa encontrada entre o índice am-biental e o índice de capacidade política.

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Versões futuras dos índices para poderão tambémincorporar proxies de qualidade ambiental, as quaispodem ser obtidas através da modelação dasinformações disponíveis de qualidade do ar atravésde um sistema de informações geográficas, bem comoproxies da qualidade do solo urbano, como aocorrência de acidentes de deslizamentos de terraem áreas urbanas.

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