UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE GESTÃO E NEGÓCIOS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
JOSÉ EDUARDO DE AGUIAR
GESTÃO DE PESSOAS E PARADOXOS ORGANIZACIONAIS: Contradições entre o discurso e a prática
UBERLÂNDIA - MG 2006
JOSÉ EDUARDO DE AGUIAR
GESTÃO DE PESSOAS E PARADOXOS ORGANIZACIONAIS: Contradições entre o discurso e a prática.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, da Universidade Federal de Uberlândia, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Administração. Área de concentração: Estratégia e Mudança Organizacional. Orientador: Prof. Dr. Edison Mello Júnior.
UBERLÂNDIA – MG 2006
- verso da folha de rosto -
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UFU / Setor de Catalogação e Classificação
A282g
Aguiar, José Eduardo de / 1961- Gestão de pessoas e paradoxos organizacionais: contradições entre o discurso e a prática / José Eduardo de Aguiar. - Uberlândia, 2006. 248f. : il. Orientador: Edison Mello Júnior. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Uberlândia, Progra- ma de Pós-Graduação em Administração. Inclui bibliografia. 1. Desenvolvimento organizacional - Teses. 2. Satisfação no trabalho - Teses. I. Mello Júnior, Edison. II. Universidade Federal de Uberlândia. Programa de Pós-Graduação em Administração. III. Título. CDU: 658.011.8
José Eduardo de Aguiar Gestão de pessoas e paradoxos organizacionais: contradições entre o discurso e a prática.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração, da Universidade Federal de Uberlândia, para obtenção do título de Mestre em Administração. Área de concentração: Estratégia e Mudança Organizacional.
Banca Examinadora:
Uberlândia (MG), 15 de fevereiro de 2006.
________________________________________
Prof. Dr. Edison Mello Júnior - UFU
________________________________________
Profª. Drª. Alessandra Rachid - UFSCar
________________________________________
Prof. Dr. João Bento de Oliveira Filho - UFU
À minha amada esposa Tânia e aos meus
queridos filhos Paula e Eduardo, pelo
estímulo e paciência em momentos
difíceis, pelo carinho e compreensão
quando mais necessitei.
AGRADECIMENTOS
À Faculdade de Gestão e Negócios da Universidade Federal de Uberlândia,
na perseverança e determinação da Profª. Kárem Cristina de Souza Ribeiro, pela
inestimável oportunidade de realizar este curso.
Ao meu orientador Prof. Edison Mello Júnior, leão incansável em seus
ensinamentos.
Aos professores do Programa de Mestrado em Administração, em especial ao
Prof. Valdir Machado Valadão Júnior, pelo incentivo e dedicação com os quais me
agraciaram.
Aos meus pais, irmãos e irmãs, pelo apoio incondicional.
Aos meus colegas, pela ajuda e alegre convivência.
Aos amigos e ex-colegas no Banco do Brasil S.A. e a todos que contribuíram,
direta ou indiretamente, para que esta pesquisa se transformasse em realidade.
As organizações empresariais podem e devem procurar a felicidade do homem em sua qualidade de vida, no conforto da
alta tecnologia, no dinheiro como instrumento de aquisição de bens de consumo que lhe facilitam a vida, na
oportunidade de explorar esse mundo maravilhoso, desfrutar a natureza, ter acesso à cultura, obter erudição pelo
conhecimento, conquistar a paz, viver em paz. Provar do bolo da vida um rico
pedaço... não mais as migalhas.
Maria Aparecida Rhein Schirato
RESUMO
A aceleração dos processos se transformou em um fator crítico para as empresas, obrigando-as à revisão do conceito de gestão de pessoas e à adoção de discurso que proporcione ao trabalhador a perspectiva de um maior controle sobre sua própria atividade, em nome da necessária flexibilidade organizacional. Entretanto, a rápida implementação de novos modelos de gestão de pessoas, voltados para a aprendizagem e a mudança, tem ocasionado certo descompasso entre a adoção do novo discurso formal de gestão de pessoas e a sua efetiva operacionalização, provocando a ocorrência do paradoxo organizacional conhecido como contradições discurso versus prática. Esta pesquisa se propôs a estudar a realidade traduzida pelo ambiente de trabalho em seis agências bancárias de atendimento ao cliente de uma instituição financeira, de forma a identificar as contradições existentes entre o discurso e a prática organizacional, através do resgate e do inter-relacionamento entre fundamentos teóricos vinculados à mudança organizacional, à gestão de pessoas, à satisfação para com o trabalho e à gestão de carreiras, tendo como objetivo geral conhecer de que forma estas possíveis contradições afetam o trabalhador, na sua satisfação para com a realização do trabalho e na sua gestão da carreira profissional. A partir do pressuposto de que a rápida adaptação das teorias administrativas ligadas ao fator humano da produção provoca uma série de efeitos colaterais, dentro de um contexto de implementação de mudanças organizacionais, é caracterizado o que vem a ser paradoxo organizacional, possibilitando o estabelecimento de uma correlação entre os conflitos organizacionais e a cognição do trabalhador, com esta última influenciando diretamente a satisfação para com o trabalho e a gestão da carreira profissional. De natureza aplicada, adotando o método fenomenológico e a abordagem qualitativa para a efetivação de um estudo de caso, este trabalho está apoiado na pesquisa bibliográfica, na observação participante, nos dados coletados através da análise documental e de entrevistas semi-estruturadas. As características do fenômeno observado são apresentadas de forma descritiva e os dados analisados indutivamente. O resultado traduziu a realidade do Corpus de pesquisa, materializada especificamente dentro do ambiente de trabalho delimitado, de onde foram registradas diferentes formas de reação do empregado às contradições existentes entre o discurso da organização e a prática gerencial efetiva, inclusive a não percepção de tais contradições, gerando conseqüências que vão da indiferença à revolta, da falta de comprometimento à determinação de deixar a empresa. Palavras-chave: mudança organizacional; paradoxo organizacional; satisfação no
trabalho; gestão de carreira.
ABSTRACT The acceleration of the processes became a critical factor for companies, causing a revision of the concept of people management and the adoption of a speech that provides to the worker a perspective of bigger control over their own activity, on behalf of the necessary organizational flexibility. However, the fast implementation of new models of people management, directed towards learning and change, has caused a certain lack of synchronizing between the adoption of the new formal speech of people management and its effective implementation, provoking the occurrence of the organizational paradox known as contradictions between the speech and the practical. This research studied the work environment in six bank agencies of attendance to the customer of a financial institution, in order to identify the existing contradictions between the speech and the practical organizational. This analysis was made through the definition and analysis of the existing relationship among the theoretical foundations linked to the organizational change, people's administration, satisfaction in the accomplishment of the work, and the administration of careers, with the general objective of determining if possible contradictions within this relationship affect the worker, in his/her satisfaction to the accomplishment of the work and administration of his/her professional career. Starting from the assumption that the fast adaptation of the administrative theories provoke a series of side effects, within a context of implementation of organizational changes, it is characterized what comes to be organizational paradox, making possible the establishment of a correlation between the organizational conflicts and the worker's cognition, with this last one influencing the satisfaction in the accomplishment of the work and the administration of the professional career. Of applied nature, adopting the phenomenology and the qualitative approach to build up a case study, this work is fundamented in the bibliographical research, in the participant observation and in the data collected through documents and interviews. The characteristics of the observed phenomenon are presented of a descriptive form and the collected data analyzed inductively. The results translate the reality of the Corpus of research, materialized inside of a delimited working environment, from where has been registered different forms of the employee to perceive the existing contradictions between the organization speech and of the effective managerial practice, including the failure to perceive these contradictions, with consequences that go from indifference to revolt, from the lack of the commitment to determination of leaving the company. Key Words: organizational change; organizational paradox; work satisfaction; career
management.
LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Características das pesquisas - Estudos Críticos em Administração . 27 Quadro 2 – Comparativo entre principais premissas: “Teoria X” e “Teoria Y” ....... 53 Quadro 3 – Comparativo entre o Modelo Instrumental e o Modelo Político .......... 60 Quadro 4 – Exemplos de Paradoxos Organizacionais .......................................... 65 Quadro 5 – Elementos essenciais para o sucesso – gestão de carreira ............... 97 Quadro 6 – Origem das contradições entre o discurso e a prática ........................ 205 Quadro 7 – Causas e efeitos das contradições entre o discurso e a prática ......... 210
LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Perfil do Profissional do Banco do Brasil ........................................... 148 Tabela 2 – Perfil do Corpus de Pesquisa ............................................................. 150 Tabela 3 – Despesa mensal real média por funcionário de bancos-em R$ mil. 175 Tabela 4 – BB - Comparativo entre vencimentos padrões por categoria-em R$ 177 Tabela 5 – Universidade Corporativa Banco do Brasil em grandes números...... 188
LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Linha lógica de raciocínio para composição do referencial teórico .... 18 Figura 2 – Modelo da curva de crescimento da mudança ................................... 35 Figura 3 – O modelo de Maslow: hierarquização das necessidades do trabalhador ......................................................................................... 52 Figura 4 – Modelo EPIA da gestão de carreira .................................................... 90 Figura 5 – Convergência de várias fontes de evidências ..................................... 124 Figura 6 – Gestão das mudanças ........................................................................ 160 Figura 7 – Degraus da ascensão ......................................................................... 190 Figura 8 – Estrutura de carreiras ......................................................................... 190
SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................... 13 1.1 Objeto, objetivos e problema de pesquisa ............................... 16 1.2 Estrutura do trabalho ............................................................... 21 2 REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................... 23 2.1 Teoria Crítica em Estudos Organizacionais ............................. 25 2.2 Mudança organizacional .......................................................... 32 2.3 Gestão do fator humano .......................................................... 46 2.4 Paradoxos organizacionais ...................................................... 64 2.5 Satisfação para com o trabalho ............................................... 72 2.6 Gestão de carreira ................................................................... 79 2.6.1 A entrada do homem no trabalho e na organização . 79 2.6.2 Carreira e empreendedorismo .................................. 85 2.6.3 Algumas considerações sobre o trabalho bancário .. 99 3 METODOLOGIA .................................................................................... 102 3.1 O método científico: base lógica da investigação .................... 104 3.2 Os objetivos e a abordagem das pesquisas ............................ 106 3.3 As técnicas de pesquisa – coleta de dados ............................. 109 3.3.1 A observação como técnica de coleta de dados ....... 111 3.4 O conjunto metodológico adotado ............................................ 117 3.4.1 Categorias de pesquisa e fatores de pesquisa .......... 119 3.4.2 Delimitação do ambiente e formação do Corpus de pesquisa ............................................................... 121 3.4.2.1 As agências do Banco do Brasil S.A. ...... 121 3.4.2.2 A formação do Corpus de pesquisa ........ 122 3.4.3 Técnicas de coleta de dados ..................................... 123 3.4.4 Técnicas de tratamento de dados ............................. 127 3.4.5 Limitações do método, da abordagem e das
técnicas utilizadas ..................................................... 128 4 A ORGANIZAÇÃO AMBIENTE DA PESQUISA .................................... 130 4.1 Um pouco da história do Banco do Brasil S.A. ........................ 130 4.2 O ambiente de pesquisa .......................................................... 140 4.3 O Corpus de pesquisa ............................................................. 148 5 RESULTADO E ANÁLISE DA PESQUISA ............................................ 151 5.1 Apresentação preliminar do relatório ........................................ 151 5.2 O contexto que marcou a identificação do problema de pesquisa .................................................................................... 154 5.3 O discurso, a prática, a percepção e a conseqüência .............. 157 5.3.1 Mudança Organizacional ........................................... 157 5.3.2 Satisfação para com o trabalho ................................. 171 5.3.3 Gestão de carreira ..................................................... 185 5.4 Resultado e análise final ........................................................... 203 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 211 7 BIBLIOGRAFIA........................................................................................ 217
8 ANEXOS ................................................................................................. 231 Anexo 1 - Estrutura Organizacional do Banco do Brasil S.A. .............. 232 Anexo 2 - O valor do Capital Humano ................................................. 233 Anexo 3 - Princípios Filosóficos e Organizacionais da UNIBB ............ 235 Anexo 4 - Roteiro de Entrevistas .......................................................... 238 Anexo 5 - Perfil individual dos elementos do Corpus de pesquisa ...... 240 Anexo 6 - Síntese das respostas às perguntas do roteiro de entrevistas 243
13
1 INTRODUÇÃO
Empresas, com formas de gestão flexível, voltadas principalmente para as
demandas do consumidor e da sociedade, fazem parte de uma realidade que vem
se consolidando na última década e, neste contexto, produtividade crescente e
custos baixos tornaram-se alguns dos objetivos a serem perseguidos para a
maximização do retorno do capital investido pelos acionistas, dentro de um mercado
cada vez mais competitivo e exigente.
Segundo Ansoff (1993, p.28-32), "[...] a partir de meados da década de 50,
houve uma aceleração e uma acumulação de eventos que começaram a alterar as
fronteiras, a estrutura e a dinâmica do ambiente empresarial [...]", com as empresas
enfrentando uma dificuldade crescente para anteciparem as mudanças e manterem
a flexibilidade para enfrentar as surpresas que não podiam ser antecipadas.
A aceleração dos processos, ou seja, fazer mais em menos tempo e pelo
menor custo, se transformou em um fator crítico para as empresas, obrigando-as à
revisão do conceito de gestão de pessoas, em nome da necessária flexibilidade
organizacional, permitindo que seus trabalhadores passem a ter mais controle sobre
suas próprias atividades.
Reinventar a empresa e flexibilizar a produção se tornou uma regra em um mercado em que o que interessa é o retorno a curto prazo para os acionistas e a pronta resposta à demanda do consumidor. (PAES DE PAULA, 2002).
A utilização de políticas de gestão de pessoas, alicerçadas em teorias
administrativas atuais e em estratégias elaboradas especificamente para a
14
implementação de mudanças organizacionais, não garante às empresas e aos
trabalhadores a satisfatória administração dos paradoxos existentes entre o discurso
formal e a realidade gerencial encontrada nos pontos de venda de serviços e
produtos ou de atendimento ao cliente.
Estudos apresentados por Lacombe e Tonelli (2004), Mascarenhas et al
(2004), Teixeira (2004), entre outros, apontam algumas das dificuldades encontradas
para a implementação dos novos modelos de gestão de pessoas voltados para a
aprendizagem e a mudança, ocasionadas principalmente pelo descompasso
existente entre a adoção de um novo discurso informacional de gestão de pessoas e
a sua efetiva operacionalização. Vasconcelos e Vasconcelos (2004, p. XVI)
confirmam esse descompasso, enfatizando que “[...] os discursos das organizações
mudam rapidamente, enquanto as mudanças efetivas nos sistemas produtivos
acontecem de modo mais lento em razão de sua grande complexidade.”
De um lado, a necessidade da empresa em aprimorar processos produtivos,
melhorar a produtividade e se modernizar tecnologicamente, de outro, a realidade
dos empregados, pressionados pela cobrança por produtividade, por uma
progressão geométrica de metas a cumprir e pela necessidade/exigência de uma
crescente capacitação profissional. Para Vasconcelos et al (2003) e Marcondes et
al (2004), a satisfação no trabalho, a educação pessoal, a gestão da carreira e até
mesmo a convivência social e familiar tendem a ser relegados a um segundo plano
na vida do trabalhador, apesar de tais atividades “retoricamente” serem incentivadas
pelas próprias empresas.
Nesse contexto, as empresas têm enfrentado dificuldades em comunicar de
forma compreensível seus objetivos às pessoas, de maneira a conseguirem a
adesão, a conformidade e a adaptação à constante necessidade de mudanças
15
(SILVA e VERGARA, 2000, p. 1), ao mesmo tempo em que o trabalhador tem
experimentado o desafio de se adaptar rapidamente à mutação do ambiente
organizacional, com o abandono de valores considerados pelas empresas como não
produtivos e, simultaneamente, realizado a aquisição de novas habilidades e
aptidões como forma de manter seus empregos.
Para fazer frente à necessidade de se promover a aproximação entre os
interesses de capital e trabalho, os mais recentes modelos organizacionais têm sido
descritos com um discurso em comum: a importância e a valorização do fator
humano no sucesso das organizações. (MARCONDES et al, 2004).
Entretanto, mesmo com essa suposta valorização do fator humano, a
realidade do trabalhador nem sempre está ancorada em práticas concretas que
minimizem o conflito de interesses nas relações entre capital e o trabalho, melhor
dizendo, entre o lucro necessário ao negócio e as necessidades do trabalhador,
sendo mais caracterizada por uma distância entre o discurso organizacional e as
práticas gerenciais efetivas. (VASCONCELOS et al, 2003)
Se analisada do ponto de vista do indivíduo, esse distanciamento entre o
discurso e a prática, em um cenário de conflitos e incertezas, parece aumentar uma
série de problemas já detectados pelos teóricos organizacionais: frustração com a
gestão da carreira por expectativas não atendidas, sobrecarga e acúmulo de
funções com o aumento de doenças ligadas ao trabalho e até mesmo o aumento do
cinismo organizacional e a perda do comprometimento para com a empresa. (SILVA
E VERGARA, 2003; CORRÊA, 2003; VASCONCELOS et al, 2004).
16
1.1 Objeto, objetivos e problema de pesquisa
Estando vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da
Universidade Federal de Uberlândia (MG), Mestrado com concentração na área de
Estratégia e Mudança Organizacional, esta pesquisa se propôs a estudar a realidade
traduzida pelo ambiente de trabalho em seis agências bancárias de atendimento ao
cliente do Banco do Brasil S.A., localizadas na cidade de Uberlândia (MG), de forma
a identificar as contradições existentes entre o discurso e a prática organizacional.
Através do resgate e da confrontação entre fundamentos teóricos vinculados
à mudança organizacional, à gestão de pessoas, à satisfação do trabalho e à gestão
de carreiras, esta pesquisa teve como objetivo geral conhecer de que forma estas
possíveis contradições afetam o trabalhador, em sua satisfação para com a
realização do trabalho e na sua gestão da carreira profissional.
Quanto aos objetivos específicos, a pesquisa procurou:
- Identificar como a empresa, no ambiente delimitado por esta pesquisa,
particularmente a partir de um contexto de mudança organizacional,
elabora e reproduz a contradição entre o discurso e a prática em seu
interior;
- Conhecer as realidades subjetivas materializadas pelo trabalhador1 em
seu ambiente de trabalho, buscando a identificação de sua percepção
a respeito da contradição entre o discurso da empresa e a prática
gerencial efetiva;
1 Pertencente ao Corpus de pesquisa, delimitado no tópico 3.
17
- Identificar como a contradição entre o discurso e a prática afeta a
atividade profissional dos empregados da empresa2, particularmente
naquilo que se refere à satisfação para com o trabalho e à gestão de
suas carreiras;
- Para o ambiente delimitado nesta pesquisa, apresentar sugestão que
possa contribuir para a busca de alternativas conciliatórias, entre as
necessidades organizacionais e as necessidades de seus
trabalhadores.
A partir de objetivo geral e de seus objetivos específicos, a pesquisa procurou
responder à seguinte pergunta:
Como as contradições entre o discurso organizacional e a prática
gerencial, dentro do ambiente delimitado por esta pesquisa,
afetam a satisfação para com o trabalho e a gestão de carreira do
trabalhador?
Para viabilizar a consecução dos objetivos desta pesquisa, buscou-se a
elaboração de um roteiro de estudo que, conforme demonstrado na Figura 1 – Linha
lógica de raciocínio para composição do referencial teórico, possibilitasse esclarecer
as maneiras pela quais as mudanças organizacionais afetam a teoria administrativa
voltada para o comportamento humano que, por sua vez, provoca a ocorrência do
paradoxo organizacional e impacta a satisfação para com o trabalho e a gestão da
carreira do trabalhador, dentro de um ambiente organizacional específico.
2 Idem à nota 1
18
Figura 1 – Linha lógica de raciocínio para composição do referêncial teórico
Inicialmente, procurou-se deixar explícitos os fundamentos que nortearam e
caracterizaram este trabalho de pesquisa, através da exposição dos pensamentos
relacionados aos Estudos Críticos em Administração de Davel e Alcadipani (2003),
PráticaDiscurso
Pressões internas e externas à Organização
Necessidade de adequação aos ambientes
Mudança organizacional
Objetivos, estratégias, meios materiais de produção etc
Gestão do fator humano
Prega a valorização do fator humano
Efetua o controle do fator humano
Discurso organizacional
Prática gerencial efetiva
XGestão de Carreira e Satisfação
no Trabalho
Contradições discurso x prática
Gestão de Carreira e Satisfação
no Trabalho
Estudo de Caso: verificar a realidade
19
Motta (2001), Alvesson e Deetz (1999), Wood Jr. (1999) Chanlat (1992), Clegg
(1992) e Tragtenberg (1980).
Em seguida, foram abordados os referenciais teóricos relacionados à
mudança organizacional, de forma a identificar as possíveis conseqüências que os
ambientes em rápida mutação trazem às teorias administrativas que fundamentam a
gestão de recursos humanos nas organizações. Para isso, foram utilizadas as
abordagens realizadas por Lewin (1965), Schein (1982; 1986), Bucholtz (1987),
Motta e Vasconcelos (2002), Dubrin (2003), Silva e Vergara (2003), Grey (2004),
Vasconcelos e Vasconcelos (2004), entre outros.
Através de Motta e Vasconcelos (2002), Stoner e Freeman (1985) e
Vasconcelos e Vasconcelos (2002), foram referenciados os teóricos que, dentro de
uma tradição instrumental, construíram as bases descritas como Teorias da
Motivação do pensamento administrativo científico, abrangendo da Escola Clássica
de Administração à atual Gestão de Pessoas. Oferecendo contraposição às Teorias
da Motivação, foram intercalados de forma sistemática os pensamentos exarados
por Vasconcelos e Vasconcelos (2004), Silva e Vergara (2003), Paes de Paula
(2002), Motta (2001), Enriquez (1997), Tragtenberg (1980; 1980a).
A partir do pressuposto de que a rápida adaptação das teorias administrativas
ligadas ao fator humano da produção provoca uma série de conseqüências não
desejadas, tidas como efeitos colaterais dentro de um contexto de implementação
de mudanças organizacionais, os estudos de Vasconcelos e Vasconcelos (2004;
2004a), Lacombe e Tonelli (2004), Teixeira (2004), Bertero (2004), Pinto e Faria
(2004), Schirato (2004), Vasconcelos et al (2003), Dejours (2001), entre outros,
definem e caracterizam o que vem a ser paradoxo organizacional. Possibilitam
assim o estabelecimento de uma correlação entre os conflitos organizacionais
20
ocasionados pelas teorias administrativas e a cognição do trabalhador, com esta
última influenciando diretamente a satisfação para com o trabalho.
Com os referenciais baseados em Corrêa (2003), Guimarães e Macedo
(2003), Dimatos (1999), Mendes (1999), Greco et al (1996), Dejours et al (1994),
Dejours (1992a), Laurell e Noriega (1989), Walton (1973), entre outros, são
apresentadas algumas considerações sobre o significado do trabalho para o homem,
abordando teorias que relacionam os processos de mudanças no ambiente de
trabalho à satisfação do trabalhador, em aspectos tais como a carga
psíquica/mental, as condições de trabalho e outros fatores que podem ser
considerados na determinação da qualidade de vida. Relaciona-se o homem, a
produção e a organização, em um tripé onde as diferentes formas e estilos de
perceber, tratar, organizar as informações e tomar decisões dependem da “visão de
mundo” e da personalidade do indivíduo.
Sendo que a formação da visão de mundo de cada ser humano é influenciada
diretamente por sua herança biológica, dos traços de caráter, da história pessoal e
das origens e escolhas pessoais, utilizou-se o referencial disponibilizado através dos
trabalhos de Filion (1993; 2001), Martins (2001), Greenhaus (1999), Hall (1998) e
Reardon (1999) para a apresentação das características e conceitos referentes aos
modelos propostos para a gestão da carreira profissional. Como contraposições, são
oferecidas as colocações de Motta (2001), Alvesson e Deetz (1999), Tragtenberg
(1980a) e principalmente de Lapassade (1969), a respeito da entrada do homem no
trabalho e na organização.
21
1.2 Estrutura do trabalho
As categorias de pesquisa, a partir dos objetivos gerais e específicos são a
mudança organizacional, a satisfação no trabalho e a gestão de carreira do
trabalhador. Cada uma dessas categorias foi estudada, de forma a identificar o
enfoque dado por teorias e pesquisas contemporâneas realizadas sobre o assunto.
Optou-se por dividir a parte formal desta pesquisa em oito tópicos, sendo seis
relacionados ao tema, um à referência bibliográfica e um destinado aos anexos. Os
conteúdos são apresentados resumidamente nos parágrafos a seguir.
No tópico um, é apresentada uma introdução ao tema, explicitando o assunto
estudado, a relevância da pesquisa, o objeto, o objetivo geral, os objetivos
específicos, a formulação do problema de pesquisa, o roteiro adotado na formatação
do referencial teórico e a estrutura formal desta dissertação.
No tópico dois, é desenvolvida a fundamentação teórica, apresentando o
referencial utilizado para o embasamento da pesquisa e a análise dos resultados,
utilizando-se de roteiro já descrito anteriormente.
No tópico três, é apresentada a base metodológica que norteou a pesquisa,
bem como o ferramental necessário para o seu desenvolvimento. Apoiando a
resolução do problema de pesquisa, são descritas a metodologia e as técnicas
utilizadas neste trabalho e que possibilitaram o estudo sobre os efeitos causados,
sobre os trabalhadores, pela contradição existente entre o discurso adotado pelo
Banco do Brasil e a realidade observada em seis de suas agências de atendimento
ao cliente.
22
No tópico quatro, é realizada a apresentação da empresa objeto do estudo de
caso, relatando alguns detalhes de sua trajetória nos últimos dezenove anos, de sua
adaptação aos períodos de crise e algumas características de sua cultura
organizacional. Também é apresentado e caracterizado o ambiente delimitado para
a pesquisa e identificado o perfil do Corpus de pesquisa. Em síntese, no tópico três
é descrita sucintamente a trajetória da empresa Banco do Brasil S.A., com alguma
ênfase em suas ações em Gestão de Recursos Humanos como estratégia utilizada
pela empresa no processo de mudança organizacional.
No tópico cinco, identifica-se o discurso da organização, confrontando-o com
a realidade administrativa e operacional do ambiente objeto de estudo, ou seja, as
seis agências do Banco do Brasil em Uberlândia (MG), apresentando os dados
obtidos através da observação participante e da análise documental, bem como os
dados obtidos nas entrevistas realizadas junto ao Corpus3 utilizado para a pesquisa,
com os respectivos resultados e análises.
No tópico seis, são apresentadas as considerações finais e as sugestões para
a continuidade dos estudos relacionados ao tema e aos problemas observados.
No tópico sete, é apresentada a referência bibliográfica e, encerrando, os
anexos representados por formulários e outros documentos julgados relevantes ao
estudo.
Em continuidade ao roteiro proposto para o desenvolvimento deste trabalho, a
seguir são explicitados os fundamentos que nortearam e caracterizaram esta
pesquisa, através da exposição dos pensamentos relacionados aos Estudos Críticos
em Administração.
3 Conforme metodologia apresentada no tópico 3.
23
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Com toda a sua complexidade, o comportamento humano provoca a
realização de pesquisas em diversas áreas de conhecimento, trazendo uma
inevitável economia de explicações para os fenômenos estudados, em função das
exigências metodológicas requeridas pela interdisciplinaridade de abordagens e pela
utilização de diferentes níveis de análise. Ainda segundo Chanlat (1992, p. 33), “[...]
esta visão estreita e parcelada deve ser combatida porque nenhuma abordagem
isolada esgotará sozinha a apreensão da totalidade do indivíduo nas organizações.”
Sujeito a essas limitações, o referencial teórico apresentado neste tópico é
iniciado através da explicitação dos fundamentos que nortearam e caracterizaram
este trabalho de pesquisa, através da exposição dos pensamentos relacionados aos
Estudos Críticos em Administração.
Foram abordados alguns conceitos teóricos relacionados à mudança
organizacional, como forma de identificar as possíveis conseqüências que os
ambientes em rápida mutação trazem às teorias administrativas que fundamentam a
gestão de recursos humanos e, a seguir, referenciados os teóricos que construíram
as bases descritas como Teorias da Motivação do pensamento administrativo
científico, intercalados de forma sistemática pelos pensamentos de autores que a
eles ofereceram contraposição.
A partir do pressuposto de que a rápida adaptação das teorias administrativas
provoca uma série de efeitos não desejados, dentro de um contexto marcado por
mudanças organizacionais, foram definidos e caracterizados os paradoxos
organizacionais. Foi estabelecida, dessa forma, uma correlação entre os conflitos
24
organizacionais ocasionados pelas teorias administrativas e a cognição do
trabalhador, com esta última influenciando diretamente a satisfação para com o
trabalho.
Foram também apresentadas algumas considerações sobre o significado do
trabalho para o homem, abordando teorias que relacionam os processos de
mudanças no ambiente de trabalho à satisfação do trabalhador, em aspectos tais
como a carga psíquica/mental, as condições de trabalho e outros fatores que podem
ser considerados na determinação da qualidade de vida. Relacionou-se o homem,
a produção e a organização, em um tripé onde as diferentes formas e estilos de
perceber, tratar, organizar as informações e tomar decisões dependem da “visão de
mundo” e da personalidade do indivíduo.
Supondo que a formação da visão de mundo de cada ser humano é
influenciada diretamente por sua herança biológica, dos traços de caráter, da história
pessoal e das origens e escolhas pessoais, foram oferecidas algumas considerações
a respeito da entrada do homem no trabalho e na organização e, em seguida,
abordado o referencial teórico relacionado aos conceitos referentes aos modelos
atualmente propostos para a gestão da carreira profissional.
Finalmente, encerrando o tópico, foram apresentadas algumas considerações
sobre as especificidades do trabalho bancário.
25
2.1 Teoria Crítica em Estudos Organizacionais
A teoria Geral da Administração é ideológica, na medida em que traz em si a ambigüidade básica do processo ideológico, que consiste no seguinte: vincula-se ela às determinações sociais reais enquanto técnica (de trabalho industrial, administrativo, comercial) por mediação do trabalho; e afasta-se dessas determinações sociais reais, compondo-se num universo sistemático organizado, refletindo deformadamente o real, enquanto ideologia. (TRAGTENBERG, 1980, p. 89).
Apesar de contar com um volume significativo de literatura a Teoria Critica
ainda é relativamente nova para os estudos de gestão. Conforme Alvesson e Deetz
(1999, p. 227) o seu estudo proporciona “[...] caminhos únicos e importantes para
compreender as organizações e sua administração.”
Os Estudos Críticos em Administração estão sendo embasados em três
grandes conjuntos de tradições teóricas, ou seja: em conceitos do marxismo, do
neomarxismo e da escola de Frankfurt (Adorno, Horkheimer, Marcuse e Habermas);
nas abordagens pós-analíticas (pós-estruturalismo, pós-modernismo, pós-
colonialismo); e nas teorias feministas. (DAVEL e ALCADIPANI, 2003, p. 75).
Seus trabalhos “[...] levam a uma posição basicamente crítica ou radical da
sociedade contemporânea, com uma orientação direcionada para a investigação da
exploração, repressão, injustiça, relações de poder [...]” etc, tendo como ponto
central o ataque à tradição modernista, enfatizando que, neste contexto, o termo
modernista é utilizado por Alvesson e Deetz (1999, p. 232)
26
[...] para atrair a atenção para a instrumentalização das pessoas e da natureza, pelo uso de conhecimento técnico-científico (modelado no rastro do positivismo e de outros modos “racionais” de desenvolver um conhecimento seguro e robusto) para realizar resultados previsíveis, medidos por produtividade e resolução técnica de problemas, conduzindo à “boa” vida econômica e social, definida principalmente pela acumulação de riquezas por parte de quem investe na produção e pelo consumo por parte dos consumidores.
A Teoria Critica, abrindo novas discussões em estudos organizacionais, tem
mostrado como o modernismo está baseado em mitos e que, de certa forma,
promove a capacidade do indivíduo em se emancipar das emoções do corpo e
colocar o espírito e a fé sob controle do instrumentalismo racional. Mostra, ainda,
como o modernismo através da utilização de uma autoridade arbitrária subordinou a
vida social à racionalidade tecnológica, protegendo os interesses de um grupo
dominante. (HORKHEIMER e ADORNO, 1979 apud ALVESSON e DEETZ, 1999, p.
232)
Empresa não é só o local físico onde o trabalho excedente cresce às expensas do necessário, o palco da oposição de classes, é também o cenário da inculcação4 ideológica. Nesse sentido, empresa é também aparelho ideológico. (TRAGTENBERG, 1980a, p. 28).
Para Davel e Alcadipani (2003, p.77), as pesquisas e os trabalhos
acadêmicos elaborados dentro do universo dos Estudos Críticos em Administração
são diferenciados dos demais pela adoção de critérios específicos, tais como os
relacionados no Quadro 1 – Características das pesquisas – Estudos Críticos em
Administração, a seguir:
4 Repetição (de alguma coisa) com insistência, para frisá-la no espírito; repisar. (FERREIRA, 1999)
27
CRITÉRIOS CARACTERÍSTICAS-CHAVE
Visão desnaturalizada
• A organização e/ou a teoria devem ser tratadas como sendo inseridas em um contexto sócio-histórico específico, como entidades relativas;
• O discurso organizacional deve ser apresentado como sendo suscetível de falhas, contradições e incongruências;
• Os aspectos de dominação, controle, exploração e exclusão na teoria ou na prática devem ser revelados e/ou questionados;
Desvinculação da performance
• A orientação da pesquisa não deve se preocupar com a melhoria de ganhos pecuniários, performance, rentabilidade, lucratividade e/ou produtividade;
• O conhecimento gerado não deve estar submetido às questões de melhoria da performance, eficiência, eficácia e/ou lucratividade;
Intenção emancipatória
• Devem ser identificados, denunciados ou levados em consideração os modos de exploração, dominação ou de controle que inibem a realização do potencial humano;
• Devem fazer parte dos objetivos da pesquisa a emancipação das pessoas e a humanização da organização.
Quadro 1 – Características das pesquisas - Estudos Críticos em Administração Fonte: Adaptado de Davel e Alcadipani (2003, p. 77)
Emerge, portanto, com o objetivo de promover ambientes de trabalho livres de
dominação, baseados em uma sociedade que proporcione aos seus membros igual
oportunidade para contribuir para a produção de sistemas que venham ao encontro
das necessidades humanas, podendo oferecer a estudantes, gestores e outros
profissionais conceitos que conduzam ao progressivo desenvolvimento de todos,
“[...] expondo as faces ocultas, as estruturas de controle e de dominação e as
desigualdades nas organizações.” (DAVEL E ALCADIPANI, 2003, p. 74).
Conforme argumenta Chanlat (1992, p. 27), a fragmentação e o reducionismo
com que o ser humano tem sido alvo de estudiosos das diversas áreas do
conhecimento, quer em seus aspectos biológicos, psicológicos ou sociológicos, não
tem nenhum sentido, pois “[...] todo o saber que se pode acumular sobre um
aspecto da vida humana não pode servir para explicar os outros aspectos e só uma
28
concepção unitária pode fazê-lo.” Fechar o ser humano em esquemas redutores,
como forma de captar a sua essência, jamais fornecerá respostas que identifiquem
a realidade enfrentada pelo indivíduo dentro das organizações.
Da mesma forma, Clegg (1992, p. 54) critica a focalização independente
levada a termo pelos estudos realizados sob o foco da teoria moderna das
organizações, que promovem a separação entre a pessoa enquanto ator na teoria e
na ação social (relações simbólicas) e a pessoa enquanto produtor na teoria radical
(relações de produção). Segundo aquele autor, “[...] esta separação constituiu até
agora um aspecto deplorável dos últimos desenvolvimentos teóricos, porque separá-
los é interessar-se por uma única dimensão das condições da participação na
organização.”
Combatendo o domínio do raciocínio instrumental, o cerceamento do discurso
e a distorção da realidade, sem ser, no entanto, contrária às boas práticas
administrativas desprovidas de ideologias e técnicas de dominação, as contribuições
da Teoria Crítica
[...] fornecem insumos para a reflexão na escolha de carreira, recursos intelectuais para contrariar tendências totalitárias na socialização corporativa administrativamente controlada, e estímulo para incorporar um conjunto maior de critérios e considerações na tomada de decisão – especialmente em casos nos quais lucro e crescimento não competem diretamente com outros fins ou em que existe incerteza em relação aos resultados de lucro de vários meios e estratégias alternativas. (ALVESSON E DEETZ, 1999, p. 238).
Necessário, entretanto, se ter o discernimento para entender que a razão
instrumental por si só não pode e não deve ser considerada como a responsável
pelos caminhos adotados pela administração ideológica. A razão instrumental é
uma forma produtiva de pensar e de agir quando praticada tendo como interveniente
o julgamento político eticamente informado, pois sem este requisito essencial o “[...]
29
seu caráter altamente especializado, preso a meios não reflexivos, torna-a
fortemente inclinada a também contribuir para a reificação das pessoas e da
natureza e, portanto, para várias formas de destruição.” (ALVESSON e DEETZ,
1999, p. 245). Como por exemplo:
- Condições de trabalho constrangidas, com as qualidades intrínsecas
ao trabalho (criatividade, variação, desenvolvimento e significação)
ignoradas ou subordinadas a valores instrumentais;
- O amplo controle do intelecto de empregados e o congelamento de sua
realidade social;
- O controle de longo alcance de empregados, consumidores e da
agenda político-ética geral da sociedade, por intermédio de meios de
comunicação em massa e lobbies, advogando o consumismo e a
prioridade do código do dinheiro como parâmetro para valores e
tomada de decisão política individual e coletiva;
- Destruição do ambiente natural por meio do desperdício e poluição.
Os estudos baseados na Teoria Crítica buscam favorecer a reflexão, o
questionamento e a renovação das estruturas que impedem o desenvolvimento
progressivo da autonomia e da responsabilidade social das pessoas (DAVEL e
ALCADIPANI, 2003, p.74), já que, servindo de instrumento para a perpetuação da
administração ideológica e das condições gerais dos processos de produção, a elite
composta de altos executivos (tecnoburocratas, gestores, burgueses de Estado, ou
simplesmente burocratas) forma uma “classe social” que procura legitimar seu
30
poder e perpetuar a hegemonia existente através do conhecimento técnico e político
instrumental.
Conforme argumenta Motta (2001, p. 87), “[...] pouco a pouco os tecnocratas
formados num sistema educacional acrítico assumem posições não só na
universidade, mas também nas grandes empresas multinacionais e no Estado [...]”,
de onde se planeja tudo, da natalidade ao consumo, da produção à educação,
sendo o conhecimento técnico a justificativa para o novo poder tecnocrático da
burocracia ascendente.
Tais conhecimentos são obtidos através da formação especial (habilidades
conceituais e sociais) objetivada nos diplomas de escolas de prestígio que,
inacessíveis ao “proletário”, tornam o capital cultural e o capital de relações sociais
as formas de reprodução básicas dessa classe.
Se a escola para os dominantes procura desenvolver o espírito de liderança, a ambição de poder e prestígio, a capacidade de adiar recompensas e a resistência à frustração, a escola para os dominados busca inculcar a disciplina e a conformidade. Como tudo se passa de modo a fazer crer na igualdade de oportunidade na ascensão tecnoburocrática, parte dos dominados busca, nas escolas sem prestígio no meio acadêmico e tecnoburocrático, os correspondentes desvalorizados dos diplomas das escolas de elite. (MOTTA, 2001, p. 112).
Assim, o inimigo a se combater é traduzido pela figura da administração e dos
estudos organizacionais, enquanto produtores de ideologias que legitimem e
fortaleçam as relações sociais vinculando-as a objetivos organizacionais específicos,
tal como a manutenção da hegemonia da razão instrumental, que pressupõe a
desvalorização do pensamento ético e da ação efetiva, que privilegia os meios
sobre os fins e ajuda a habilidade dos grupos dominantes em realizar seus fins
invisivelmente. (MOTTA, 2001, p. 100; ALVESSON e DEETZ, 1999, p. 239-58).
31
Combate-se a Administração representada por acadêmicos vistos como
ideólogos a serviço de grupos dominantes, que por meio da socialização em escolas
de negócios, “[...] dão suporte a administradores com idéias e vocabulários que
visam a um controle cultural-ideológico ao nível do local de trabalho e proporcionam
uma aura científica para apoiar a introdução e o uso de técnicas de dominação
administrativa.” (ALVESSON e DEETZ, 1999, p. 239-58).
No sentido de promover a quebra de uma realidade até agora desfavorável
nessa “luta de classes”, Wood Jr. (1999, p. 267-8) concita à adoção da Teoria Critica
com sua singularidade e contradição, força e fraqueza, para que se possa vislumbrar
caminhos de possibilidades múltiplas e inexploradas. Conforme declaram Davel e
Alcadipani (2003, p. 75), isso favorecerá o desenvolvimento racional e democrático
das instituições modernas, nas quais cidadãos responsáveis, auto-reflexivos e
autônomos se tornam progressivamente menos dependentes de receber
entendimentos sobre suas necessidades.
A abordagem crítica adotada pelos Estudos Críticos em administração não pretende solucionar de forma definitiva o problema da dinâmica social e política que modela a maneira como as pessoas pensam, ressentem-se e agem. Ela busca operar no fluxo diário das práticas opressivas, dominantes e excludentes que, inutilmente, atrapalham o desenvolvimento pessoal e coletivo no âmbito organizacional. (DAVEL E ALCADIPANI, 2003, p. 75).
Após esta breve introdução e explicitados alguns conceitos e características
que norteiam os Estudos Críticos em Administração, nos tópicos a seguir se dará
continuidade à apresentação do referencial teórico julgado compatível com a
abordagem pretendida nesta pesquisa, ordenado de forma a permitir a intercalação
dos posicionamentos de autores críticos frente às teorias que idealizam a
administração.
32
2.2 Mudança organizacional
A existência das organizações se confunde com a existência do próprio
homem que, diante da necessidade de se unir para a realização de tarefas,
construiu, ao longo do tempo, unidades sociais cada vez mais complexas para
orientar o trabalho e disciplinar as ações dos grupos. Em bases empíricas,
espontâneas ou experimentais a organização proporciona a racionalização, o
aperfeiçoamento e a simplificação de ações coletivas, objetivando um maior
rendimento e/ou o máximo de bem-estar com o mínimo de esforço. (MIRANDA,
1980, p. 21).
As organizações, como parte da microestrutura que compõe a sociedade,
estão sujeitas às mudanças impostas pela modernização da tecnologia, pelas
alterações na estrutura social e, por conseqüência, pelas necessidades das
pessoas. A velocidade com que o ambiente externo às organizações tem
experimentado mudanças exige igual capacidade de readaptação das práticas
organizacionais, com o propósito de dar continuidade à consecução eficaz de seus
objetivos, em um processo contínuo de instabilidade ou, conforme Katz e Kahn
(1978), em um processo permeado por um “equilíbrio dinâmico”.
As necessidades das organizações mudam com o passar do tempo, exigindo
repetidos episódios de socialização organizacional sob a forma de mudança das
normas e das estruturas organizacionais. As organizações são dinâmicas por
natureza, conseqüência da relação entre pessoas e os processos produtivos,
promovendo, de forma isolada ou em conjunto, mudanças em busca de um novo
posicionamento no seu ambiente, através da implementação de uma nova
33
arquitetura organizacional, do realinhamento de suas estratégias de negócio ou,
ainda, da redefinição dos seus objetivos. (SCHEIN, 1982).
Uma organização poderá efetuar mudanças através de técnicas de
downsizing ou reengenharia sem considerar a necessidade de regenerar sua
estratégia principal, sem repensar as fronteiras de seu setor, sem assumir a
preocupação com as expectativas futuras dos clientes, ou mesmo sem ter que
redefinir fundamentalmente o mercado servido. Contudo, sem essa reavaliação
fundamental de suas estratégias, a empresa corre o risco de ser surpreendida a
caminho do futuro, ao se manter presa a práticas obsoletas ou inadequadas às
novas expectativas do ambiente. (HAMEL e PRAHALAD, 1995, p. 87).
Segundo Katz e Kahn (1978), a classificação das organizações como
sistemas sociais abertos, dinâmicos e em constante interação com seus ambientes,
faz com que o processo de mudança signifique condição para a própria
sobrevivência da organização na medida em que ela se adapta às exigências do
meio e, ao mesmo tempo, seja fonte para o desenvolvimento econômico, social e
político da sociedade, evidenciando uma influência de caráter bilateral nas
transações entre a organização e seu ambiente de operação.
Neste contexto de influências de duplo sentido, Motta e Vasconcelos (2002, p.
255) inferem que os processos de adaptação podem incluir “[...] mudanças
extremamente importantes que não advêm de alterações iniciadas pela
administração, mas sim de um processo dialético que ocorre nas organizações de
forma absolutamente natural, quer a administração interfira ou não.” E
complementam:
Mudança organizacional é um conjunto de alterações na situação ou no ambiente de trabalho de uma organização, entendendo ambiente de trabalho como ambiente técnico, social e cultural.
34
A necessidade de se planejar deliberadamente os processos de mudança,
como forma de minimizar os impactos causados por eles à organização e maximizar
os efeitos operacionais e sociais desejados, é traduzido como desenvolvimento
organizacional, ou seja, maneira pela qual se procura produzir alterações estruturais
e comportamentais, de forma sistematizada. Motta e Vasconcelos (2002, p. 257)
enfatizam que esse processo é dependente de um diagnóstico prévio do tipo de
mudança requerido, bem como de um levantamento das relações sociais entre os
grupos de participantes, da definição das alterações a serem perseguidas tendo em
vista os objetivos almejados e, finalmente, da avaliação não linear e interativa
(diagnóstico => planejamento => implementação => avaliação => diagnóstico).
Ainda segundo aqueles autores, o desenvolvimento organizacional considera,
também, os diversos níveis em que a mudança pode ser planejada e implementada,
já que, por lidar com aspectos ligados às relações sociais entre os grupos
participantes, também envolve as alterações de cunho comportamental. Alterações
trazidas por mudanças na organização formal implicam também em alterações
comportamentais que afetam a organização informal, sendo, portanto, necessário
incluir-se no planejamento formas para se controlar eventuais impactos que as
mudanças possam ocasionar ao plano cognitivo e ao plano emocional do
componente humano.
As alterações comportamentais merecem grande destaque nos estudos e nos trabalhos de desenvolvimento organizacional. As alterações comportamentais são dirigidas para o desenvolvimento da comunicabilidade e da criatividade para a formação de equipes administrativas coesas e homogêneas, para a quebra de resistência à mudança, para a valorização dos aspectos humanos e assim por diante. (MOTTA E VASCONCELOS, 2002, p. 270).
35
Bucholtz (1987), em sua tentativa de sistematizar os processos de mudanças,
propôs o Modelo da Curva de Crescimento da Mudança nas Organizações,
buscando explicar como as mudanças ocorrem em cada uma das fases do ciclo de
vida das organizações.
Conforme aquele autor, a Curva de Crescimento é dividida em três fases: a
formativa, a normativa e a integrativa:
Figura 2 – Modelo da curva de crescimento da mudança Fonte: Dubrin (2003, p.361)
Essas fases têm em comum, por um lado, a busca pelo equilíbrio do status
quo e, por outro, a resistência às mudanças relacionadas ao crescimento e às
transformações organizacionais:
- Na fase 1 - Formativa, a organização está no início de suas atividades
e as mudanças e inovações são extremamente bem vindas e
facilmente aceitas. O objetivo nessa fase é a busca pela estabilidade e
a organização está voltada para a sua inserção no mercado, com
sucesso. Todo tipo de ação (certa ou errada) é vista como
oportunidade de crescimento e aprendizagem;
- Na fase 2 – Normativa, a organização já conseguiu a estabilidade que
procurava na fase formativa e dá maior ênfase na manutenção do que
foi conseguido até então. A organização já não enxerga o fracasso de
36
algumas ações como oportunidade de aprendizagem, mas sim como
um risco que pode levá-la a arcar, no futuro, com conseqüências
indesejáveis;
- A fase 3 – Integrativa, é considerada a fase em que a organização se
redefine, seja por determinação dos stakeholders e executivos de alto
nível ou por forças externas à organização. Mudanças estratégicas e
de gestão são implementadas, ocasionando um confronto das forças
com origem em grupos defensores da condição de estabilidade e do
status quo reinantes (restritivas) e naqueles grupos considerados
estimuladores do processo de renovação (motrizes). Nesta fase é que
são registradas as maiores ambigüidades e incertezas, marcada por
estados de desconforto e de rejeição às novas rotinas. Mas também é
neste período onde se encontram as melhores oportunidades para a
observação dos fenômenos caracterizados pela Teoria de Campo de
Lewin (1965).
Pressupondo que a vida de um grupo social nunca pára de mudar, o que
existe, na realidade, são períodos em que as quantidades e os tipos das mudanças
provocam maiores ou menores forças de resistência. Em boa parte de sua
existência, os grupos experimentam o que Lewin (1965) chama de um equilíbrio
quase-estacionário, o que muito se assemelha à descrição da Fase Normativa
defendida por Bucholtz (1987) e ao Equilíbrio Dinâmico descrito por Katz e Kahn
(1978).
Fazendo uma análise de como as forças existentes em um sistema de
relacionamento de grupos sociais direcionam o processo de aprendizagem dos
37
indivíduos e como estes indivíduos reagem a essas forças, dando ênfase à
importância do fato de que qualquer acontecimento é a resultante de uma multidão
de fatores, Lewin (1965, p. 57) afirma ser “[...] impossível uma descrição adequada
de uma situação num determinado momento [...]” sem que se faça a análise de uma
faixa temporal suficientemente abrangente, permitindo a observação do contexto em
que ocorreu a alteração a partir do equilíbrio existente entre as diversas forças que
compõem o ambiente estudado, identificando o momento do rompimento do
equilíbrio pré-existente (descongelamento), o período de mudanças e a restauração
do equilíbrio do campo de força (recongelamento) e início de uma nova fase de
estabilidade.
O Modelo Descongelamento-Mudança-Recongelamento proposto por Lewin
(1965) é o processo onde, em um primeiro momento (descongelamento) há uma
ruptura na estabilidade em que a organização se encontrava, passando depois por
um processo de implantação de novos projetos e adaptação da organização aos
mesmos (mudança) e, por fim, novamente a estabilidade com a consolidação das
mudanças apresentadas (recongelamento).
Assim, segundo aquele autor, há dois tipos de forças atuantes nesse
processo: as forças restritivas e as forças impulsionadoras. As primeiras podem se
originar da cultura organizacional, de interesses dos indivíduos ou de diferentes
visões dos objetivos da organização. As segundas podem ser o resultado de
estratégias para melhorar a produtividade, de ações administrativas e do
desempenho dos indivíduos.
As forças impulsionadoras e restritivas tendem sempre a se equilibrarem, até
o momento em que a organização entre em um período de crise e/ou insatisfação.
Naquele instante, ocorre o desequilíbrio, levando a organização a iniciar um
38
processo de mudança. Para que esse processo aconteça, as forças restritivas têm
que ser mais fracas do que as forças impulsionadoras ou tem que haver um controle
e redução maior das primeiras em relação às segundas.
A relação entre a teoria de campo de força e a curva de crescimento de
mudança pode ser estabelecida a partir do pressuposto de que, em cada uma das
etapas da curva de crescimento de mudanças, há uma diferente intensidade em
cada um dos vetores que compõem o campo de força.
Na Fase Formativa as forças impulsionadoras são predominantes, afinal, a
organização teoricamente estaria mais aberta à absorção de novos valores. A
aprendizagem se dá fundamentalmente através da tentativa e erro. É maior a
propensão ao risco e o incentivo à inovação é forte.
Já na Fase Normativa percebe-se um relativo equilíbrio entre as forças
impulsionadoras e as restritivas. Vale destacar que existe uma tendência maior para
o lado conservador, haja vista que, neste momento, a organização busca a
consolidação de sua estabilidade, o que pode ser percebido pelo início de sua
burocratização e maior foco no status quo que no mercado.
A Fase Integrativa também é marcada pelo embate entre as forças
impulsionadoras e as restritivas. Porém, o destaque vai para as forças restritivas,
pois a resistência à mudança é muito maior: Muitos membros da organização
resistem ao desconforto que a mudança causa, por medo, insegurança ou até
mesmo por ignorância.
Freqüentemente, “aprender” a gostar ou a desgostar de determinadas atividades é o resultado de uma lenta mudança de necessidades que se verifica durante o desenvolvimento e parece particularmente marcante durante as assim denominadas crises. (LEWIN, 1965, p. 32).
39
Neste contexto, as crises serão momentos propícios para a aprendizagem e,
por assim dizer, à consolidação da mudança. Serão nestes períodos que as
organizações estarão mais propensas a aceitar a inovação. Como sugere o modelo
descongelamento-mudança-recongelamento, para a implantação do novo, o
descongelamento deverá ser caracterizado pela baixa resistência às mudanças.
No que diz respeito às resistências às mudanças, Kotter (1979, p. 106-113)
relaciona algumas estratégias que poderão ser utilizadas para superar as barreiras à
mudança:
- permitir discussões e negociações;
- permitir a participação;
- destacar os benefícios financeiros;
- evitar o excesso de mudanças;
- obter apoio político para mudança;
- prover educação;
- usar manipulação e cooptação;
- evitar referir-se ao baixo desempenho como a razão da mudança;
- usar coerção implícita e explícita.
Tais estratégias, entretanto, antes mesmo de serem delineadas, devem ter
como base a cultura organizacional da empresa onde serão implementadas, já que,
conforme Dubrin (2003, p. 352-3), “a cultura organizacional responde – e reflete –
às escolhas conscientes e inconscientes, aos padrões de comportamento e aos
preconceitos dos gerentes executivos [...]”, sendo diretamente influenciada pelo
setor econômico e pela cultura social onde opera a empresa.
40
Nesse sentido, na gestão da mudança interpola-se os aspectos relacionados
à cultura organizacional como um instrumento fundamental à aprendizagem. De
forma geral, a aprendizagem nas organizações se dá por meio da socialização, na
qual tal processo acontece através do “[...] entendimento dos valores, normas e
hábitos essenciais para que ocorra a adaptação à organização”, sendo também “[...]
um sistema de valores e crenças compartilhados que influenciam o comportamento
do trabalhador.” (DUBRIN, 2003, p. 352-355).
Ainda dentro dos princípios de aprendizagem tem-se o conceito que Schein
(1986, p. 47) constituiu para definir cultura:
o conjunto de pressupostos básicos que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com os problemas de adaptação externa e integração interna e que funcionaram bem o suficiente para serem considerados válidos e ensinados a novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir, em relação a esses problemas.
Em Fleury (1989, p. 34), são destacados três níveis de aprendizagem dentro
das organizações:
- nível dos artefatos visíveis: representado pelo ambiente construído
(layout, arquitetura, padrões de comportamento, etc);
- nível dos valores: responsáveis pelo juízo de comportamento das
pessoas;
- nível dos pressupostos inconscientes: representado pelos valores
consolidados.
41
Dessa forma, temos que o estudo da cultura é tão envolvente quanto
complexo, na medida em que tantas dimensões influenciam na construção da cultura
de uma organização: valores, histórias organizacionais, mitos, grau de estabilidade,
alocação de recursos e recompensas, ritos e rituais, senso de propriedade e
espiritualismo corporativo. (DUBRIN, 2003, p. 354-355).
Ao se considerar tais premissas, infere-se que a consolidação da cultura de
uma organização poderá variar de acordo com os pressupostos que alimentam o
cotidiano, os relacionamentos interpessoais e os processos de produção. Infere-se,
também, que uma cultura organizacional forte e cristalizada será a maior dificuldade
enfrentada para que se tenha processos de mudanças bem sucedidos.
Um processo de mudança bem sucedido, segundo Lewin (1965, p. 265), deve
incluir a fase de descongelamento ou quebra do equilíbrio do campo de força
existente, seguida da fase de implantação de inovações que conduza o campo de
forças ao deslocamento para um novo nível e a um recongelamento, este último
condicionado à permanência da organização na nova situação de forma
relativamente segura.
Por outro lado, os conceitos de mudança e estabilidade são considerados
muito relativos e somente devem ser analisados em conjunto, já que a vida do grupo
nunca pára de mudar. Afirma Lewin (1965, p. 225) que:
[...] o que existe são meras diferenças na quantidade e tipo de mudança, sendo que qualquer fórmula que afirma as condições de mudança contém como limite a não-mudança, e as condições de constância só podem ser analisadas num background de mudança ‘potencial’.
Em outras palavras, não podemos simplesmente considerar que a existência
de resistências ao processo de mudança seja um fator determinante para se definir
42
em qual estado se encontra determinado grupo – mudança ou estabilidade. O
desafio na realidade é distinguir até que ponto o deslocamento no ponto de equilíbrio
das forças produz uma alteração significativa na percepção dos indivíduos que
compõe o grupo, proporcionando novos valores e significados para a formação da
cultura organizacional.
O que hoje se observa, como forma de manter a competitividade, é que as
próprias organizações têm produzido de forma sistemática novas situações
conjunturais, econômicas, políticas e sociais, gerando uma incessante busca por
novas posições estratégicas, conquistas de novos nichos de negócios e rápidas
adaptações nas relações trabalhistas.
Tal postura pode significar simplesmente a extinção das fases denominadas
por Bucholtz (1987) como Normativa e Integrativa, já que as organizações, em
decorrência de pressões internas e/ou externas, se obrigam a um constante
processo de Formação, se reinventando a cada momento e não permitindo mais,
dentro deste contexto, o equilíbrio relativo das forças restritivas e impulsionadoras.
Contrapondo-se às atuais práticas de gestão de mudanças, através de um
enfoque crítico e tido por ele próprio como “polêmico”, Grey (2004), para quem o
modelo de descongelamento-mudança-recongelamento de Lewin (1965) é traduzido
por uma metáfora mecanicista e generalizante, apresenta alguns argumentos contra
a “ortodoxia” dos pressupostos e práticas existentes no campo da mudança
organizacional, refutando o que considera ter-se tornado uma tendência compulsiva
e obrigatória:
Praticamente todos os estudiosos de organizações, executivos e estudantes de Administração parecem persuadidos pela idéia de que vivemos tempos de mudanças sem precedentes, de que a sobrevivência organizacional depende da mudança e que o trabalho dos executivos gira em torno da mudança. (GREY, 2004, p. 11).
43
A invocação da mudança na recente literatura sobre gestão e organizações
pode ser comparada a um fetiche5, que transcrito de autor para autor na literatura
dos últimos 20 anos, “[...] cria um consenso não desafiado sobre o ‘fato’ mudança,
que toma forma em declarações apressadas em qualquer discurso sobre gestão
[...]”, transformando-se em “[...] um totem ante o qual nos imobilizamos e sob o qual
não temos poder.” (GREY, 2004, p. 12).
Ainda segundo aquele autor, o pressuposto de que é muito grande a
velocidade com que as mudanças estão ocorrendo no mundo atual não se traduz
em realidade, visto que, comparativamente aos outros períodos marcantes da
evolução da humanidade, não há consenso sobre os parâmetros que poderiam
confirmar tal alegação.
O que se tem, de fato, é um ciclo vicioso, onde a adaptação ao ambiente
natural está diretamente vinculada à necessidade de mudança difundida pelos meios
organizacionais e acadêmicos, levando à consolidação do paradigma da
imprescindibilidade e da obrigatoriedade de se mudar, causando impactos
significativos na cultura e na estrutura das organizações.
Longe de ser um ambiente natural a que as organizações devem responder, a mudança é mais bem entendida como uma construção afetada pela atuação das próprias organizações (e suas conseqüências não desejadas). Dizer que ela é um construto não é dizer que é real, mas de certa forma essa realidade é um efeito das práticas organizacionais, e não a precursora dessas práticas. Assim, ao construir um mundo em mudança, as organizações também criam a aparente necessidade de “gerir mudança”. (GREY, 2004, p. 16). (sem grifo no original).
5 Objeto animado ou inanimado, feito pelo homem ou produzido pela natureza, ao qual se atribui poder sobrenatural e se presta culto; ídolo. (FERREIRA, 1999)
44
Dentro de uma perspectiva permeada por uma inesgotável necessidade de se
promover contínuos processos de mudanças organizacionais, as pessoas passaram
a ser alvo de uma maior atenção e a fazer parte dos discursos dos gestores, já que
estão diretamente relacionadas com alguns dos principais problemas identificados
pelos estudiosos do assunto, ou seja, a dificuldade de: “[...] comunicar os objetivos
da organização; tornar esses objetivos compreensíveis para as pessoas; e fazer com
que as pessoas assimilem os objetivos e adotem as mudanças.” (SILVA e
VERGARA, 2003, p.11).
Entretanto, mesmo diante de tal preocupação em relação às pessoas
(KOTTER, 1979; DUBRIN, 2003), “[...] a fragmentação com que a administração tem
tratado o ser humano desde suas primeiras teorias [...]”, encontra nos processos de
mudança um ambiente favorável à ampliação das divergências existentes entre os
discursos das organizações e as percepções dos indivíduos que delas fazem parte
(SILVA e VERGARA, 2003), já que tais processos geralmente enfatizam
excessivamente a racionalidade e, conseqüentemente, não levam em conta a
complexidade, a ambigüidade e os paradoxos que fazem parte da organização.
(VINCE e BROUSSINE, 1996).
Assim, resgatando a expressão “e suas conseqüências não desejadas”
utilizada por Grey, infere-se que tais efeitos colaterais são oriundos de ações
deliberadamente planejadas pelas próprias organizações, dentro de um contexto
representado por tentativas ou experiências voltadas para a implementação de
reestruturações ou de reengenharia, provocando a ocorrência de rupturas com o
sistema organizacional anterior. A nova práxis gera polarizações perceptivas nos
indivíduos inseridos nos diversos níveis do sistema (VASCONCELOS e
45
VASCONCELOS, 2004, p. 9), polarizações descritas como paradoxos
organizacionais e que são apresentados em tópico específico desta pesquisa.
Antes, se faz necessário o resgate de teorias administrativas que permeiam o
“ambiente” organizacional e que servem de interface entre as empresas e seus
trabalhadores, em suas tentativas de promover a redução ou mesmo a negação dos
conflitos produzidos ao longo de décadas de dominação do capital sobre o trabalho.
46
2.3 Gestão do fator humano
Ao se considerar a necessidade que o desenvolvimento organizacional tem
em tratar de forma planejada os aspectos ligados ao cunho comportamental dos
grupos participantes, ou seja, o conflito produzido pelas relações entre a
organização e o componente humano, pode-se admitir também como
deliberadamente planejadas as ações voltadas ao controle dos planos cognitivos e
emocionais do trabalhador. (SILVA e VERGARA, 2003).
Para se entender como o controle do componente humano vem sendo
realizado pelas organizações, dentro do processo de mudança e modernização das
relações entre capital e trabalho, se faz necessário o resgate de algumas das teorias
elaboradas a partir do pensamento administrativo consolidado pela lógica de
mercado e alicerçado pela estrutura burocrática como forma de organizar as
relações entre o trabalhador e o capital representado pelas organizações produtivas.
Tais teorias têm como objetivo a redução ou a negação dos conflitos
organizacionais, visando o aumento da produtividade e a geração de lucros
crescentes para os proprietários dos meios de produção. (MOTTA e
VASCONCELOS, 2002, p. 11).
Considerando que o pensamento administrativo é a expressão da lógica
burocrática, torna-se necessária também uma breve definição do que vem a ser
burocracia.
Conforme Motta e Vasconcelos (2002, p. 19) estruturas burocráticas se
resumem em:
47
[...] uma solução organizacional que tenta evitar a arbitrariedade, o confronto entre indivíduos e grupos e os abusos de poder. Seu objetivo é o de organizar a atividade humana de modo estável para a consecução de fins organizacionais explícitos. A utilização de regras e a rotinização do trabalho humano fornecem segurança, pois estabelecem etapas e procedimentos a serem seguidos, tentando assim minimizar incertezas e riscos... sendo mecanismos de defesa contra a ansiedade e a insegurança típicas do ser humano. Além de fornecerem diretivas claras, as regras, ao formalizarem a interação entre os indivíduos, visam reprimir as relações face a face, a espontaneidade e a pessoalidade, evitando a eclosão de conflitos.
Paes de Paula (2002), em posicionamento mais crítico, faz referência à
burocracia como “[...] mediadora entre os interesses dos proprietários e os
interesses dos trabalhadores [...]”, através da utilização de variados instrumentos de
controle para, através do estabelecimento e a execução de normas, regular “[...] o
comportamento dos funcionários e preservam os interesses dos acionistas”,
assegurando, dessa forma, a produtividade e minimizando as tensões entre capital e
trabalho. Escreve ainda que:
Para organizar o trabalho e a produção, além de aperfeiçoar seus instrumentos de controle, os burocratas recorrem às teorias administrativas e suas práticas. Dessa forma, a organização burocrática é um repositório de discursos e práticas administrativas, um aparelho ideológico, que, analogamente às teorias, se adapta às novas condições históricas. (PAES DE PAULA, 2002).
Tragtenberg (1980, p. 188), afirmando que “[...] a burocracia constitui um
sistema de condutas significativas e não só sistema de organização formal”,
corrobora com a demonstração weberiana de que a organização burocrata é produto
de um contexto histórico formado pelo modo de produção asiático (egípcia e
chinesa) e do Estado moderno ocidental, tendo sido idealizada e utilizada, tanto pelo
Estado quanto pelo Capital, com o intuito de preservar interesses, manter a
hegemonia nas atividades de produção e reproduzir relações de dominação.
48
Aquele autor adverte para o fato de que a racionalização de procedimentos e
condutas propagadas como sendo o objetivo a ser alcançado não é, como se
acredita, a intenção real da burocracia, afirmando que “[...] a racionalização não
conduz necessariamente à burocratização, pois a primeira se processa num regime
fundado na exploração e a burocratização é um sistema de dominação.”
(TRAGTENBERG, 1980, p. 188).
Retomando a abordagem das práticas administrativas e o fator humano da
produção tem-se que, conforme descritas por Stoner e Freeman (1985), as primeiras
teorias ligadas aos aspectos comportamentais dos trabalhadores tentaram construir
um único modelo de motivação, aplicável em qualquer situação, em uma abordagem
positivista das relações sociais. Apresentavam, entretanto, visões diferentes a
respeito dos seres humanos, como descritas nos parágrafos a seguir.
No modelo tradicional ou clássico, representado por Frederick Taylor e Henry
Fayol, os administradores determinavam o modo mais eficiente de realizar tarefas e
eram criados sistemas de produção onde havia uma única maneira correta de se
executar uma tarefa, determinada pela medição dos tempos e movimentos e
regulada pelo estabelecimento de quotas de produção e remuneração proporcional
ao trabalho executado. Ao mesmo tempo em que a racionalização do trabalho era
implementada, também eram demarcados os parâmetros essenciais da organização
burocrática, ou seja, a vinculação do formalismo e da hierarquia às estruturas
administrativas que, inspirados no modelo militar, estabeleciam normas rígidas para
o controle da produção e mecanismos punitivos para manter a disciplina e obter a
obediência dos funcionários através de punições.
A suposição básica era que os administradores compreendiam o trabalho
melhor do que os trabalhadores, que eram essencialmente preguiçosos e só
49
poderiam ser motivados pelo dinheiro. Apesar de inicialmente o modelo
proporcionar ganhos significativos de produtividade, com o decorrer do tempo
também passou a significar a redução do número de trabalhadores para a execução
de uma determinada tarefa, gerando a extinção de postos de trabalho e, em
decorrência da criação de excedentes de mão-de-obra, também a redução dos
níveis salariais. A exigência por uma maior estabilidade no emprego tornou-se um
efeito colateral no modelo, já que os trabalhadores não mais eram motivados por
aumentos salariais temporários e insignificantes.
Conforme explicitado por Motta (2001, p. 65), “[...] o taylorismo implica alta
desumanização do trabalho. Sua lógica é a do apressamento, e sua implantação
implica um considerável aumento do aspecto rotineiro e monótono do trabalho”,
tendo sido possível sua implementação somente em virtude do alto poder econômico
e político das empresas à época, da debilidade dos sindicatos de trabalhadores, da
inexistência de uma legislação social e do excesso de mão-de-obra disponível no
mercado de trabalho.
Diante da alegação de que as organizações dependem diretamente de certo
nível de comprometimento e de esforço por parte de seus membros, os
administradores e estudiosos priorizam teorias que busquem uma compreensão dos
fatores que provocam, canalizam e sustentam o comportamento do trabalhador,
através da interação entre fatores individuais e ambientais. A respeito dessas
teorias motivacionais temos que:
Qualquer discussão sobre motivação, desempenho e satisfação no local de trabalho é de fato uma discussão sobre a psicologia industrial/organizacional: o estudo geral do comportamento organizacional com uma ênfase no comportamento no local de trabalho. (STONER E FREEMAN, 1985, p. 340).
50
O Modelo das Relações Humanas, representada por Elton Mayo, enfatizava
que os trabalhadores têm necessidades traduzidas por um efetivo relacionamento
social e que consideram relevante o reconhecimento da importância e da utilidade
de seu trabalho. Os administradores, através dos conceitos daquele modelo,
deveriam providenciar maior grau de liberdade para a tomada de decisões
pertinentes ao trabalho e maior número de informações sobre as intenções e
objetivos da organização, sem, contudo, deixarem de estabelecer uma vigilância
preventiva sobre as normas e os comportamentos dos grupos informais que
passaram a fazer parte do ambiente de trabalho. (TRAGTENBERG, 1980;1980a).
Apesar de também ter como objetivo a aceitação, pelos trabalhadores, das
condições de trabalho estabelecidas pela organização, o Modelo das Relações
Humanas esperava que o trabalhador aceitasse a autoridade da administração
porque estava sendo tratado com consideração e lhe era permitido influenciar na
sua situação de trabalho.
Motta e Vasconcelos (2002, p. 71-2) enfatizam que também este modelo se
mostrou insuficiente para proporcionar a maximização da produtividade, já que a
adoção de um estilo de gerência participativa não era o suficiente para aumentar a
produtividade dos grupos organizacionais, “[...] que dependia também de outros
fatores mais complexos que a simples melhoria do clima organizacional”. E
continuam, comparando o modelo clássico e o modelo das relações humanas:
Os autores da Escola de Relações Humanas, no entanto, têm um ponto em comum com os autores clássicos: consideram o ser humano como um ser passivo, que reage de forma padronizada aos estímulos aos quais eles submetidos na organização. A Escola Clássica de Administração considerava apenas os fatores econômicos. A Escola de Relações Humanas revelou a importância dos fatores afetivos e sociais, além dos econômicos, mas manteve o mesmo tipo de análise, por exemplo, a mesma forma de organização do trabalho.
51
Tragtenberg (1980, p. 85), complementa tal raciocínio ao afirmar que “[...] a
Escola de Relações Humanas aparece como uma ideologia manipulatória [...]” que
acentua uma pseudopreferência do operário pelos grupos informais fora do trabalho,
quando na realidade esses anseiam pela satisfação de voltar para casa. Promove
deliberadamente a ilusória crença de participação do operário no processo decisório,
já que as decisões, via de regra, eram tomadas em escalões superiores e
submetidas aos trabalhadores apenas como forma de legitimá-las.
Evoluindo a partir da Escola de Relações humanas e dos estudos de
Abraham Maslow, o Modelo dos Recursos Humanos introduziu as análises da
identidade social baseadas no conceito da racionalidade limitada e do “homem
complexo” descrito por Schein (1982), admitindo a existência de suas múltiplas e
complexas necessidades, ligadas ao ego, ao desenvolvimento social, à autonomia
de pensamento, ao desejo de autodesenvolvimento, à aprendizagem e à realização.
Contrapondo-se ao conceito de racionalidade absoluta, base da Escola
Clássica de Administração, em teoria, o pressuposto básico do Modelo dos
Recursos Humanos era de que o trabalho fornece sentido à existência do
trabalhador “[...] ao buscar ativamente a sua auto-realização no trabalho, os
indivíduos se envolvem mais com a organização e canalizam a sua energia vital
produtiva para a consecução dos objetivos organizacionais.” (MOTTA e
VASCONCELOS, 2002, p. 72; 281).
Dentro da teoria dos Recursos Humanos, o Modelo de Maslow, apesar de
demonstrar de forma hierarquizada as necessidades do indivíduo (Figura 3), rejeita o
pressuposto de que as necessidades são requeridas ou atendidas de forma linear e
alega a inexistência de estágios predefinidos e definitivos, já que as necessidades
52
podem variar de acordo com as experiências e as mudanças que o indivíduo
enfrenta em sua vida.
Figura 3 – O modelo de Maslow: hierarquização das necessidades do trabalhador Fonte: Adaptado de Motta e Vasconcelos (2002, p. 74)
Ainda segundo Motta e Vasconcelos (2002, p. 75), servindo de base para
outras teorias sobre motivação e liderança, este modelo pressupõe que:
As necessidades fundamentais vêm à tona e, uma vez satisfeitas, as necessidades mais complexas voltam a manifestar-se. Esse processo pode alternar-se várias vezes, variando o grau de intensidade e o tipo de necessidade do indivíduo.
Ancorada em alguns argumentos de Maslow, a “Teoria Y” critica a ideologia
da Escola de Administração Científica (“Teoria X”) em sua afirmação de que o ser
humano é avesso ao trabalho e o evitará sempre que puder. Conforme escrevem
Stoner e Freeman (1985, p. 322), a “Teoria Y” é mais otimista, pois pressupõe que o
trabalho “é tão natural quanto a diversão ou o descanso, que as pessoas desejam
Auto-estima
Auto-realização
Ex: Aprendizagem
Ex: Plano de carreira/Status
Ex: Inserção em grupos
Ex: Plano de saúde/benefícios
Condições básicas ambientais, equipamentos, remuneração
Sociais
Segurança
Funções fisiológicas
53
trabalhar e que, sob as circunstâncias corretas, obtêm muita satisfação trabalhando”.
Teoriza, ainda, que as pessoas procuram a responsabilidade na realização de suas
tarefas, colocando a serviço da organização a sua imaginação, sua inteligência e a
sua criatividade. Comparando as características das duas Teorias foi montado o
Quadro 2 - Comparativo entre principais premissas: “Teoria X” e “Teoria Y”,
apresentado a seguir:
“TEORIA X” “TEORIA Y”
- As pessoas são preguiçosas e indolentes; o trabalho inerentemente desagradável;
- O administrador deve supervisionar e controlar, ao mesmo tempo em que deve fazer com que o trabalhador se sinta útil e valorizado, exercitando prerrogativas de autocontrole só em questões rotineiras;
- As pessoas podem tolerar o trabalho, mediante uma remuneração decente, o compartilhamento de informações sobre a organização e a socialização das decisões;
- A intervenção e o controle gerencial são fundamentais para garantir a produtividade e a eficiência. Sem o controle, o ser humano tende a ser passivo e resistente a colaborar para o atingimento dos fins organizacionais;
- Satisfazer as necessidades econômicas e de relacionamento social irá aumentar o moral e reduzir a resistência à autoridade formal, fazendo com que os subordinados cooperem de boa vontade.
- As pessoas gostam do trabalho e o consideram natural, são esforçadas e dedicadas na sua realização e desejam contribuir para objetivos significativos;
- As pessoas são criativas e competentes, podendo controlar e assumir responsabilidades;
- O administrador deve criar um ambiente onde todos os membros possam contribuir, encorajando a participação total em assuntos importantes;
- A satisfação no trabalho pode aumentar como um subproduto da utilização total dos recursos da organização pelos seus trabalhadores;
- É responsabilidade do administrador proporcionar condições para que as pessoas desenvolvam a sua motivação, a dedicação ao trabalho e a capacidade de assumir responsabilidades, orientado o trabalhador de forma que possa atingir melhor seu objetivo pessoal.
Quadro 2 – Comparativo entre principais premissas: “Teoria X” e “Teoria Y” Fonte: Compilado de Motta e Vasconcelos (2002, p. 77); Stoner e Freeman (1985, p. 323)
A rápida aceleração nas mudanças da estrutura social experimentada a partir
dos anos 60 e 70, com a inserção no mercado de trabalho de jovens contestadores,
determinados a não aceitarem as mesmas condições de trabalho de seus pais,
provocou uma ruptura nos padrões comportamentais, nos valores e nas regras
vigentes à época. Registram Motta e Vasconcelos (2002, p. 78) que “[...] tratava-se
de uma geração idealista, que não aceitava recompensas monetárias para
54
compensar a alienação ou falta de sentido no trabalho [...]”, e era caracterizada pela
busca da independência, pelo questionamento de valores e pela busca de
autonomia.
Entretanto, tais movimentos pouco ou em nada abalaram a lógica
instrumental capitalista, pois, conforme nos ensina Tragtenberg (1980, p.89)
As teorias administrativas são dinâmicas, elas mudam com a transição das formações sócio-econômicas, representando os interesses de determinados setores da sociedade que possuem o poder econômico-político, sob o capitalismo ocidental e o poder político-econômico nas sociedades fundadas no coletivismo-burocrático.
Dessa forma, também ancorados nos pressupostos apresentados por
Maslow, foram construídos novos modelos destinados à identificação, explicação e
compreensão dos elementos reais e subjetivos que constituem o processo de
motivação do indivíduo, consolidando pouco a pouco o conceito de homem
complexo.
Partindo da separação realizada por Stoner e Freeman (1985), as visões
contemporâneas da motivação seguem duas correntes distintas: a corrente das
Teorias de Conteúdo da Motivação representada por pensadores que se
concentravam nas necessidades internas que motivavam o comportamento humano
e a corrente das Teorias de Processo da Motivação, representada por teóricos que
também consideravam o conteúdo das necessidades, mas enfatizavam que essas
necessidades eram apenas mais um elemento na formação do comportamento
humano, dando ênfase ao estudo dos processos de pensamento através dos quais
as pessoas decidem como agir.
55
A título de exemplo, de representantes das correntes de pensamento citadas
acima, temos os referenciados por Stoner e Freeman (1985) e Motta e Vasconcelos
(2002):
Da Teoria de Conteúdo
- Teoria da Contingência ou da Necessidade de Realização,
representada por David MacClelland e John W. Atkinson, que supôs
a pré-existência de um reservatório de energia útil nos adultos.
Essa energia era liberada dependendo da força do motivo básico ou
da necessidade básica envolvida, da expectativa do indivíduo em
ter sucesso e do valor de incentivo do objetivo a ser alcançado.
Basicamente relacionava o comportamento e o desempenho a três
impulsos, que são variáveis em intensidade de indivíduo para
indivíduo dependendo de suas características pessoais: a
necessidade de realização, a necessidade de poder e a
necessidade de afiliação, ou associação íntima com outros;
- Teoria dos Dois Fatores, elaborada por Frederick Herzberg e seus
colegas, que defendeu a teoria de que o comportamento do homem
no trabalho depende de dois conjuntos de fatores ligados a
percepções antagônicas: a insatisfação e a satisfação no trabalho.
Ao conjunto ligado à insatisfação (fatores higiênicos ou básicos) se
incluiu o salário, as condições de trabalho e a política da empresa,
esta última de fundamental na determinação da ineficiência ou
ineficácia operacional, ressaltando que, por se tratarem de
necessidades básicas, tais fatores não levam necessariamente à
satisfação no trabalho, mas apenas propiciam a “ausência da
56
insatisfação”. Ao conjunto ligado à satisfação (fatores motivantes
ou intrínsecos) se incluiu a realização, o reconhecimento, a
responsabilidade e o progresso profissional, todos relacionados ao
conteúdo do trabalho e às recompensas ao desempenho
profissional. Diferentemente da teoria de Atkinson, Herzberg não
considerou em sua teoria a diferença subjetiva existente entre os
indivíduos, onde o que é causa de insatisfação para um poderá ser
motivo para satisfação de outro.
Da Teoria de Processo
- Teoria da Expectativa, representada pelos estudos de David Nadler
e Edward Lawler, que apresenta um modelo de motivação
especificando que o esforço para se atingir um alto desempenho é
resultante de se perceber a possibilidade de que o alto desempenho
pode ser alcançado e recompensado e, se alcançado, a
recompensa valerá o esforço despendido. Baseia-se em quatro
pressupostos sobre o comportamento das organizações, ou seja,
que o comportamento é determinado por uma combinação de
fatores do indivíduo e do ambiente, que os indivíduos tomam
decisões conscientes sobre seu comportamento na organização,
que os indivíduos têm necessidades, desejos e objetivos diferentes
e, finalmente, que os indivíduos decidem entre alternativas de
comportamento como forma de possibilitar o atingimento de um
determinado fim. Os componentes básicos dessa teoria podem ser
caracterizados como a expectativa de resultado do desempenho
57
(conseqüências), a valência ou poder que o comportamento tem
em motivar (recompensa) e a expectativa de esforço-desempenho
sobre a tarefa a ser realizada (chance de concretização X custo X
benefício). Estes componentes podem ser sintetizados com as
seguintes perguntas: “Se eu fizer isso, qual será o resultado?”; “O
resultado vale o meu esforço?”; e “Quais são minhas chances de
chegar a um resultado que valha a pena para mim?”.
Stoner e Freeman (1985) também registram a Teoria do Reforço em sua obra,
associada principalmente ao psicólogo B. F. Skinner. Em seus pressupostos, essa
teoria afasta a questão da motivação interna e associa ao comportamento do
indivíduo as suas experiências passadas, com suas conseqüências, positivas e/ou
negativas, sendo parte de um ciclo de aprendizagem cíclico (estímulo => resposta
=> conseqüências => resposta futura => estímulo).
Considerada como instrumento na modificação do comportamento, a Teoria
do Reforço prevê a utilização de quatro métodos para atingir seus objetivos: o
“reforço positivo” encorajando os comportamentos desejados através de
recompensas e elogios; o “aprendizado da abstenção” fazendo com que os
trabalhadores mudem seus comportamentos para evitar conseqüências
desagradáveis traduzidas por críticas negativas ou má avaliação; a “extinção”
promovendo a exclusão do método do reforço positivo e ignorando comportamentos
não desejados; e a “punição” através da aplicação de conseqüências negativas e
desagradáveis ao indivíduo, visando a impedir ou interromper o comportamento não
desejado. Ao mesmo tempo em que a modificação do comportamento é
controversa por parecer ameaçar a liberdade individual, confrontando o indivíduo
58
com o grupo, também tem se demonstrado útil no “treinamento” de trabalhadores
com valores e níveis de motivação muito diferentes. (STONER e FREEMAN, 1985).
Na medida em que as mudanças alteravam o perfil da sociedade e a estrutura
das organizações, a concepção sobre o ser humano também foi alterada:
De um ser previsível e controlável por meio de estímulos econômicos e medidas punitivas, pouco a pouco foi-se concebendo o ser humano como um ser dotado de vontade própria, que busca ativamente a realização no trabalho, sendo dotado de poder de escolha e capacidade de ação política. (MOTTA E VASCONCELOS, 2002, p. 93).
A adequação aos novos tempos fez surgir, estrategicamente, uma nova
abordagem para tratar o componente humano dentro do contexto das organizações,
implicando até mesmo em substituir a expressão “recursos humanos” das propostas
teóricas, visto não ser mais adequada para referir-se às características assumidas
pela nova racionalidade do pensamento administrativo.
A substituição progressiva daquele termo por “gestão de pessoas”, confere
maior importância ao trabalhador, na medida em que o reconhece como portador de
múltiplas dimensões, e o retira do rol dos “recursos” utilizados pelas organizações.
Entretanto, para muitos que acompanham a evolução das teorias da
motivação, também possibilitou ocultar “[...] uma relação de dominação e poder que
continuaria presente, apesar das mudanças. Trata-se, pois, de uma nova ideologia
que não muda a situação de fato, ao contrário, a oculta.” Por outro lado, conforme
evidenciado por estudos recentes, o modelo político, em que o papel do gerente é o
de promover a participação e o debate, vem ganhando espaço e está
progressivamente ocupando o lugar do modelo Instrumental de Gestão de Pessoas,
que valoriza um perfil gerencial mais conservador e burocrático. (MOTTA E
VASCONCELOS, 2002, p. 93).
59
Inspirando programas ligados à melhoria das condições de trabalho, à
humanização do trabalho e à reestruturação das tarefas (enriquecimento e
ampliação), o Modelo Político de Gestão de Pessoas, que teve sua origem nos
estudos de Herzberg e nas pesquisas do Instituto Tavistock de Londres, incorpora a
idéia de conflito e divergência, tendo em vista os diferentes interesses e a
existências das várias lógicas dos atores organizacionais (VASCONCELOS E
VASCONCELOS, 2002, p. 71). O Quadro 3 - Comparativo entre o Modelo
Instrumental e o Modelo Político a seguir faz o comparativo entre as características
dos modelos:
60
O MODELO INSTRUMENTAL O MODELO POLÍTICO
- O mercado se impõe à empresa, instrumento racional de produção com estratégia definida por seus diretores em função das pressões desse mercado, do setor e dos valores organizacionais;
- A Gestão de Pessoas implanta essa estratégia, buscando a maximização do resultado econômico e um melhor desempenho dos empregados;
- O pagamento por produtividade e o valor “igualdade de oportunidades” são características importantes desse modelo. Base no conceito de eficiência econômica e no argumento de que a eficiência social gera a eficiência econômica e vice-versa;
- Os indivíduos devem ter mais autonomia, mas somente à medida que esta seja útil à empresa. Os empregados são considerados como seres utilitaristas e condicionáveis por meio de ações baseadas no conceito de estímulo-resposta, por uma interpretação própria e muitas vezes simplificada das técnicas behavioristas. Não se fala em atores sociais, mais em agentes;
- A Gestão de Pessoas tem o papel de avaliar as necessidades e os recursos dos grupos organizacionais; descrever os cargos e os provê-los segundo um recenseamento sistemático dos candidatos, por meio de procedimentos de seleção “objetivos”; avaliar os cargos e desempenhos dos empregados, remunerando-os eqüitativamente a fim de motivá-los; treinar os indivíduos, melhorar as condições de trabalho, comunicar e assegurar boas relações sociais;
- A empresa é considerada como um organismo adaptativo; o meio ambiente “natural” visto como um dado da realidade; o planejamento estratégico, seleção e gestão de pessoas feitos por profissionais da área; a estratégia utilitarista é determinada em função das pressões do mercado e do setor e pelos valores dos dirigentes;
- Existe o pressuposto de convergência de interesses da comunidade organizacional. A organização segue um modelo ideal com base na harmonia social e no desenvolvimento de uma estratégia “ótima” ;
- A mudança organizacional é normalmente imposta de cima para baixo e percebida como fruto de decisões estruturadas por uma diretoria central, que teria o poder de definir a política a ser seguida.
- Reconhece a existência de várias lógicas de ator e critérios de ação válidos, considerando-se o modelo da racionalidade limitada de Simon, segundo o qual toda a racionalidade é relativa ao ator social que decide, não existindo uma racionalidade absoluta inquestionável;
- Os dirigentes buscam a resolução de conflitos por meio da negociação, obtendo a coesão entre as partes envolvidas no processo de decisão;
- A eficiência econômica é negociada, não correspondendo, necessariamente, à eficiência social em curto prazo;
- Meio ambiente negociado e construído; - A avaliação dos resultados feita pelos grupos
organizacionais envolvidos no processo de decisão;
- O Ator-chave de recursos humanos é a direção-geral da empresa;
- A empresa é construída socialmente por meio da ação política dos diversos grupos organizacionais;
- A utilização de decisões racionais e éticas referindo-se à resolução de conflitos, à obtenção do consenso e às questões de poder;
- Os indivíduos são vistos como atores políticos válidos com potencial de desenvolvimento positivo buscando concretizar ativamente seus próprios interesses (“cidadania nas organizações”);
- Utilização de um modelo ético aplicado à organização;
- Mudança organizacional é percebida como uma resposta a um meio ambiente negociado e estruturado pelas organizações do setor, as quais influenciam ativamente o rumo dos acontecimentos e dos fatos característicos de sua indústria; os indivíduos são percebidos como atores participando e influenciando nessa mudança, nos seus diversos níveis de atuação;
- A organização é um espaço de jogo estratégico entre atores sociais, que possuem margem de atuação maiores ou menores dentro dessa arena política;
- O desenvolvimento econômico da empresa deve beneficiar, além dos acionistas, a sociedade global e os grupos organizacionais;
- É permeado pelo conceito de progresso e construção de uma harmonia social em longo prazo, a despeito dos conflitos e divergências.
Quadro 3 – Comparativo entre o Modelo Instrumental e o Modelo Político Fonte: Vasconcelos e Vasconcelos (2002, p. 71-2)
61
Evoluindo a partir do Modelo Político, conforme registram Vasconcelos e
Vasconcelos (2004, p.14), o Modelo Transformacional de Gestão de Pessoas
assimila questões ainda não tratadas pelos modelos anteriores, considerados mais
prescritivos, trazendo um conjunto de premissas, teorias e idéias, dispersas e inter-
relacionadas por meio de temas específicos e estruturado também em torno de
regras específicas. A estrutura é formada a partir das seguintes posições básicas:
- A organização é constituída por atores sociais e é considerada um
sistema cultural, psicológico, político e histórico;
- A organização apresenta convergências e divergências essenciais,
frutos de uma dialética de evolução contínua, a ser gerida em
permanência;
- Os atores organizacionais são, ao mesmo tempo, racionais e
irracionais, possuindo pulsões de vida e de morte;
- As referências teóricas são múltiplas (antropologia, sociologia,
economia, história, psicodinâmica, psicologia cognitivista,
construtivismo, filosofia etc.);
- A postura metodológica é eclética, adotando-se, entre outras
formas, a análise crítica e discursiva, a análise comparativa e
histórica, a análise do discurso, a pesquisa-ação e a pesquisa
etnográfica;
- A eficiência econômica não é ligada à eficiência social;
- O meio ambiente é considerado uma realidade socialmente
construída, e não um dado objetivo da realidade;
- Valoriza-se a diversidade cultural e os aspectos éticos da decisão;
62
- A mudança é estudada em seus efeitos locais e globais;
- As decisões são estudadas em seu aspecto contingente e
específico, não existindo um único modelo ideal de comportamento
e de estrutura organizacional a ser seguido (crítica a uma única
racionalidade superior ou modo de ação);
- Reconstituição da lógica de ação dos atores sociais.
O Modelo Transformacional de Gestão de Pessoas apresenta-se como o mais
crítico, se comparado ao Instrumental e ao Político, trabalhando com a gestão de
aspectos contraditórios característicos da vida atual e colocando em questão a
harmonia individual e a harmonia social, motivo pelo qual “[...] a maioria dos estudos
que tratam do tema paradoxos organizacionais segue as premissas deste modelo,
[...] retomando os clássicos de administração e atualizando-os sob uma perspectiva
crítica.” (VASCONCELOS e VASCONCELOS, 2004, p. 15-20).
Entretanto, os discursos orientados para a gestão de pessoas devem ser
interpretados com cautela, na medida em que rotulam o homem como sendo o
capital mais precioso das organizações, pois, como adverte Enriquez (1997), “se os
homens são considerados como recursos, não se vê por que milagre eles seriam
igualmente reconhecidos como personalidades autônomas, sujeitos de direitos e
sujeitos psíquicos que têm palavras a dizer “. E complementa:
Eles não percebem o aspecto diretamente instrumental de seu discurso: os homens são administrados, tratados – às vezes melhor, às vezes não tão bem – como estoques dos quais se deve garantir a rentabilidade, como mercadoria (às vezes de péssima qualidade: a expressão ‘cortar gorduras’ é o sintoma mais evidente) que deve ser utilizada convenientemente ou da qual se deve ser capaz de desvencilhar. (ENRIQUEZ, 1997, p.11).
63
Através do referencial teórico, até aqui abordado, é possível inferir que a
evolução dos processos de produção e a concorrência acirrada provocaram a
necessidade de se acelerar a implementação de mudanças no ambiente
organizacional. Por sua vez, a aceleração nos processos de mudanças impôs ao
idealismo capitalista a necessidade de promover a rápida adaptação das teorias
administrativas ligadas ao fator humano da produção, diante da necessidade de se
aumentar a produtividade e dos crescentes conflitos experimentados entre
dominadores e dominados.
Tais conflitos foram registrados como conseqüências não desejadas, tidos
como efeitos colaterais dentro de um contexto representado por tentativas ou
experiências voltadas para a implementação de reestruturações ou de reengenharia.
Conforme afirmam Vasconcelos e Vasconcelos (2004, p. 9), a cada experiência de
mudança, a nova práxis gera polarizações perceptivas nos indivíduos inseridos nos
diversos níveis do sistema, polarizações descritas no tópico a seguir sob a
denominação de paradoxos organizacionais.
64
2.4 Paradoxos organizacionais
Tem-se que os paradoxos básicos são originados da ação social e se
apresentam como conseqüências dessa ação, manifestando-se através de reações
secundárias, contraditórias, “[...] não desejadas e não previstas, ou seja, reações
que se contrapõem aos efeitos buscados pela ação original.” (MERTON, 1968
apud VASCONCELOS et al, 2004). (sem grifo no original).
A lógica do indivíduo tende a colocar em extremos suas percepções, quando
estas se fazem contraditórias em relação à sua realidade, uma vez que, ao tentar
atribuir sentido ao que foi vivenciado, faz interpretações complexas e normalmente
opostas, polarizadas em duas perspectivas contraditórias que passam a orientar a
sua ação (VASCONCELOS et al, 2003; LEWIS, 2000).
Pode-se então definir o paradoxo como a representação, pelo indivíduo ou grupo, de sua experiência, sentimentos, crenças e interações através de dois estados aparentemente inconsistentes, de duas realidades opostas e aparentemente inconciliáveis. O indivíduo percebe a realidade por meio de uma proposição ‘A e não-A’. Para esse indivíduo ou grupo, a fim de caracterizar-se como um paradoxo, deve haver o sentimento de que essas dimensões opostas são mutuamente excludentes e não podem coexistir ou serem conciliadas. (VASCONCELOS E VASCONCELOS, 2004, p. 5).
Consideradas a subjetividade das percepções e a individualidade das
necessidades do trabalhador, a materialização dessa dicotomia no ambiente de
trabalho conduz a fenômenos que influenciam negativamente o clima organizacional,
tais como a rejeição da autoridade formal dos administradores, a insatisfação na
realização do trabalho, a falta de motivação para a busca do crescimento
profissional, a falta de comprometimento para com os objetivos da organização, a
65
potencialização dos conflitos organizacionais e, pela ausência de credibilidade, a
resistência aos processos de mudança e reestruturação (LACOMBE e TONELLI,
2004; KETS DE VRIES, 1995).
Há que se compreender que o sistema organizacional é formado por regras,
normas e padrões de comportamento gerais, impostos ou adotados por subgrupos e
subsistemas com microdinâmicas e subculturas particulares (VASCONCELOS e
VASCONCELOS, 2004, p. 4-5). Assim, as organizações estão sujeitas às
ambigüidades e às contradições perceptivas materializadas por esse sistema social
(subgrupos e subsistemas) que questionam e tentam modificar constantemente a
práxis vigente, gerando energia para a transformação e estabelecendo um processo
dialético de mudança (LEWIN, 1965).
Os conceitos, as causas e as conseqüências dos tipos mais freqüentes de
paradoxos organizacionais são apresentados no Quadro 4 – Exemplos de
Paradoxos Organizacionais.
PARADOXOS CONCEITOS CAUSAS CONSEQÜÊNCIAS
Discurso versus Prática
Existência simultânea de duas realidades contraditórias: o discurso da organização e a sua prática em relação a um mesmo objeto.
Discursos gerenciais que produzem expectativas que não se realizam
Alguns grupos de atores sociais podem desenvolver reações defensivas que aumentam o nível de frustração, tensão e estresse no sistema organizacional.
Valores declarados versus Valores introjetados
Existência simultânea de valores declarados por gestores para orientar as ações de uma empresa e de outros valores não declarados que dela fazem parte no nível dos pressupostos inconscientes.
Existência de forças que muitas vezes não operam na mesma direção no sistema organizacional e de atitudes baseadas em interesses diversos não declarados, inclusive financeiros, econômicos e sociais.
Falta de transparência e de confiança nos relacionamentos entre gestores e trabalhadores, favorecendo a ocorrência do cinismo organizacional.
continua...
66
... conclusão
PARADOXOS CONCEITOS CAUSAS CONSEQÜÊNCIAS
Passado versus Futuro
Valorização de uma nova competência e a negação simultânea da competência anteriormente valorizada, apesar desta última ainda ser valorizada e importante em outras áreas da organização
Durante a transição entre o antigo e o novo sistema, ocorre a associação simultânea daquelas competências desvalorizadas tanto ao vigor e ao futuro da organização quanto ao seu passado e decadência
O indivíduo vivencia um processo de negação simbólica do que constituía sua identidade em dado sistema, aumentando sua angústia e provocando choque de crenças e valores, levando-o a resistir ao novo, ao progresso e ao futuro.
Permanência versus Transitoriedade
A exigência do comprometimento e envolvimento com o trabalho, que pressupõe a permanência como contrapartida e, simultaneamente, a construção discursiva da transitoriedade no posto de trabalho como condição normal diante das atuais condições do mercado.
Contexto socioeconômico que “forçam” a organização a adotar novas estratégias de relacionamento com seus empregados. Ao mesmo tempo em que são solicitados o comprometimento e a dedicação, é também anunciada a relação empregatícia transitória.
Elevados graus de ansiedade e de decepção, perda do poder do trabalhador em negociar e de impor suas diferenças individuais e a corrosão e o desmonte de sua identidade individual enquanto ator social.
Teorização versus Prática administrativa
Divergência entre acadêmicos e gestores profissionais quanto à “ordem” em que o conhecimento deva ser originado. A teoria deve levar à prática ou a prática deve ser posteriormente explicada pela teoria?
Acadêmicos enxergam os praticantes com olhar de superioridade científica e crítica, e são estigmatizados pelos gestores com a acusação de serem apenas teóricos e não possuírem vivência e experiência para administrar.
Criação de uma lacuna entre as áreas acadêmicas e de profissionais de gestão, consolidando atitudes de desprezo recíproco, com prejuízos de conteúdo tanto para a área de estudos organizacionais quanto para a área da prática administrativa.
Quadro 4 – Exemplos de Paradoxos Organizacionais Fonte: Adaptado de Lacombe e Tonelli (2004); Vasconcelos e Vasconcelos (2004a); Teixeira (2004); Bertero (2004); Vasconcelos e Crubellate (2004)
67
Por englobar, também, as características do paradoxo “valor declarado versus
introjetado”, interessa especificamente a esta pesquisa o paradoxo “o discurso
versus a prática”, reconhecido em situações as mais diversas dentro do universo
organizacional, com impactos relevantes na realidade do trabalhador, tanto na sua
satisfação para com o trabalho, como na gestão de sua carreira profissional.
Segundo Vasconcelos e Vasconcelos (2004, p. 19), as promessas e os
discursos gerenciais direcionados à melhoria das condições de trabalho, à melhoria
da qualidade de vida e ao crescimento profissional provocam, em tese, expectativas
positivas que podem ou não se tornar realidade diante da percepção do indivíduo,
visto que “[...] as organizações adotam rapidamente novos modelos de gestão em
um esforço adaptativo aos novos tempos, mas a efetiva implementação das novas
estruturas nem sempre é tão simples [...]” e acompanham o mesmo ritmo.
Desta forma, para Lacombe e Tonelli (2004, p. 53), a eventualidade de uma
não concretização das promessas leva às percepções contraditórias, polarizadas
entre a incoerência da subjetividade das expectativas geradas pelo discurso formal e
a realidade prática vivenciada, “[...] levando os atores sociais a desenvolverem
reações defensivas que aumentam o nível de frustração, tensão e estresse no
sistema organizacional.”
Na interpretação de Pinto e Faria (2004, p. 6), por discurso formal entende-se
o discurso materializado na forma de documentos publicados pela empresa, públicos
ou não, assim como em regulamentos internos das organizações. Tem por função
regulamentar as relações de trabalho, explicitando os direitos, os deveres e as
proibições aos indivíduos, representando o código de conduta convencionado pela
organização.
68
O discurso formal, que atinge a organização como um todo, impondo uma
disciplina destinada basicamente a defendê-lo e a sustentá-lo, é o mediador das
relações profissionais entre os diversos grupos de interesse, incitando-os à “venda”
de suas habilidades, competências e resultados, e desestimulando a crítica em
nome da união e da solidariedade. (PINTO e FARIA, 2004, p.6)
O discurso oficial sobre o trabalho e sua organização é, pois, construído, sobretudo, para servir a uma propaganda visando ao exterior da empresa: o mercado, a clientela, etc. Na verdade, contudo, atualmente ele é também construído para servir a objetivos internos, da cultura da empresa, que preconizam o rigoroso ajustamento da produção e da organização do trabalho às exigências do mercado e da clientela, devendo, além disso, atestar a satisfação e a felicidade dos empregados que trabalham na empresa. (DEJOURS, 2001, p.65).
Neste contexto, o discurso é simultaneamente origem e espelho da estrutura
burocrática, criando uma dimensão capaz de estabelecer regras de comportamentos
e de diálogos comuns a uma organização ou a uma sociedade em geral, aceito por
todos e legitimado como padrão de conduta a ser adotado pela maioria, com a
finalidade de que os atores sociais evitem o conflito entre si. (TRAGTENBERG,
1980; FOUCAULT, 1997).
Porém, apesar do discurso ser dirigido, preliminarmente, a todos os membros da organização, independente da posição hierárquica que ocupem, sugerindo condutas “eticamente corretas” nas relações interpessoais e de trabalho, percebe-se que a prática administrativa geralmente não é condizente com tal discurso. O discurso torna-se, portanto, instrumento ideológico ausente de ética e dirigido aos interesses da organização e de seu grupo dominante. (PINTO e FARIA, 2004, p. 7).
Conforme salienta Schirato (2004, p. 43), através da imposição de seu
discurso as organizações criam e perpetuam uma padronização do modo de vida em
seus ambientes, onde tudo se pode desde que não se fira e nem se discuta a
legitimidade do institucional. É por intermédio do institucional que a organização se
69
isenta de dar maiores explicações sobre suas omissões, sua inoperância e, até
mesmo, sobre suas arbitrariedades.
Para justificar os contínuos processos de mudança, as organizações, através
de seus discursos, sinalizam com melhorias nas condições de trabalho, incentivos,
qualificação etc, apontando para o trabalhador os percursos possíveis para o seu
crescimento profissional.
Mas, simultaneamente, dificultam a adoção do caminho apontado, utilizando-
se da burocratização de esquemas de treinamento, criando impedimentos para que
o trabalhador possa freqüentar cursos, reduzindo verbas, exigindo presença em
reuniões fora dos horários de expediente e transferindo para os empregados todo o
ônus da qualificação requerida para um bom desempenho. (SCHIRATO, 2004, p.44).
Schirato (2004, p. 17), em suas pesquisas junto a indivíduos que perderam
seus empregos em processos de reengenharia e/ou de downsize, revelou o quão
perversas podem ser o que chamou de “promessas dos discursos das políticas de
Recursos Humanos” na prática quotidiana dos trabalhadores, denotando requintes
de crueldade ao desapropriá-los de sua vida pessoal e explorá-los “[...] não só em
sua vida de trabalho, mas também em sua afetividade, em seu lazer e em toda a sua
agenda pessoal.”
As reflexões daquela autora também alertam para o quão desastrosos podem
ser os desfechos para tal “[...] jogo imoral que a organização, muitas vezes, faz com
o trabalhador [...]” (SCHIRATO, 2004, p.44), visto que, como já mencionado
anteriormente, ao provocar a existência simultânea de duas realidades contraditórias
(o discurso da organização e a sua prática em relação a um mesmo objeto) conduz o
indivíduo a um doloroso processo de manipulação, fazendo com que ele coloque em
extremos opostos as suas percepções do ambiente organizacional.
70
Partindo do pré-suposto de que os discursos das organizações procuram
mascarar os conflitos das relações existentes entre capital e trabalho, tendo como
justificativa a busca de retornos econômicos e financeiros favoráveis a toda a
sociedade, o paradoxo “discurso versus prática” pode potencializar os sofrimentos e
as angústias do trabalhador, na medida em que tal justificativa leva à constatação de
outro paradoxo, ou como descreve Dejours (1992, p.150), “[...] um paradoxo em
virtude do qual os objetivos da produção são, para o mundo exterior à empresa,
promessa de felicidade, enquanto no seu interior eles são freqüentemente, como é
preciso reconhecer, promessa de infelicidade [...]” e de insatisfação para com o
trabalho.
Entretanto, é necessário salientar que o trabalho por si só não deve ser
considerado como fonte de sofrimento, já que é através do trabalho que o ser
humano se sente útil, se reconhece como alguém que tem importância para a
organização e para a sociedade, sendo fonte de satisfação e prazer quando
experimentados sentimentos de valorização e reconhecimento. (MENDES, 1999, p.
23).
Por outro lado, Dimatos (1999, p.15) argumenta que, “[...] como toda ação
humana, o trabalho, normalmente, tem seu ponto de partida na insatisfação, pois a
extração, criação, produção ou transformação dele decorrentes ocorrem porque há
uma privação, uma necessidade”, cuja satisfação é um passo em um processo de
sucessivas necessidades. Portanto, o homem trabalha porque precisa garantir sua
sobrevivência.
Diante desta lógica, de onde se infere que o trabalho, apesar de ser originado
na insatisfação humana, também pode ser fonte de gratificação e de prazer, torna-se
necessária também a abordagem de alguns conceitos relacionados à satisfação
71
para com o trabalho, já que, além dos paradoxos existentes no ambiente
organizacional, são também relevantes outras situações que podem ser traduzidas
pelo trabalhador em cognições negativas ou positivas de seu ambiente de trabalho.
72
2.5 Satisfação para com o trabalho
A importância do trabalho, para o bem-estar e a saúde do ser humano, se
torna ainda mais relevante ao se considerar que é trabalhando que os indivíduos
passam a maior parte da vida, realizando no trabalho, ou por meio dele, grande
parte de suas aspirações. Neste contexto, o trabalho organizacional assume papel
vital e deve ser considerado como parte inseparável da vida humana. (HANDY, 1978;
SAMPAIO, 1999; RODRIGUES, 2005).
Além de propiciar a realização do homem como ser biológico, o trabalho traz, em seu bojo, um outro objetivo, qual seja, o de favorecer essa realização no nível espiritual psicológico. Para o alcance desse segundo objetivo, contudo, é necessário que o trabalho seja simultaneamente meio e fim: meio, na medida em que o seu produto provê a subsistência individual e a produção social; e fim, enquanto puder proporcionar, em algum grau, a autorealização e o crescimento dos indivíduos como seres humanos. (DIMATOS, 1999, p.18).
Reflexo de um contexto sócio-cultural e econômico mais amplo, a
organização do trabalho é um dos principais antecedentes do prazer e do
sofrimento, implicando um paradoxo marcado por um movimento de luta dos
indivíduos, enquanto trabalhadores, em sua busca por prazer e não sofrimento, com
a finalidade de manter o equilíbrio psíquico.
Enquanto categoria psicológica, o trabalho cria identidade social e pessoal. O ser não é dissociado do fazer. O trabalho transcende o concreto e instala-se numa subjetividade, na qual o sujeito da ação é parte integrante e integrada do fazer, resultando na realização de si mesmo. Quando trabalha, a pessoa tem oportunidade de aprender, criar, inovar e desenvolver novas formas para execução da tarefa, e ainda interage com os outros, o que reforça sua identidade pessoal. Esta identidade criada a partir do fazer reflete um homem em ação que, ao trabalhar, transforma a natureza e se constitui enquanto pessoa. O trabalho oportuniza a pessoa subjetivar a objetividade e objetivar sua subjetividade por meio da ação [...]. (GUIMARÃES E MACEDO, 2003, p. 1).
73
Ainda, segundo aquelas autoras, “[...] essa dinâmica é responsável pela
saúde psíquica, significando que a simples existência do prazer ou do sofrimento
não são os indicadores de saúde, mas a variabilidade das estratégias que podem
ser utilizadas pelos trabalhadores”, como instrumento, no combate àquelas situações
que possam causar o sofrimento, de forma a transformá-las em situações geradoras
de prazer.
A organização do trabalho exerce, sobre o homem, uma ação específica, cujo impacto é o aparelho psíquico. Em certas condições, emerge um sofrimento que pode ser atribuído ao choque entre uma história individual, portadora de projetos, de esperanças e de desejos, e uma organização do trabalho que os ignora. Esse sofrimento, de natureza mental, começa quando o homem, no trabalho, já não pode fazer nenhuma modificação na sua tarefa no sentido de torná-la mais conforme às suas necessidades fisiológicas e a seus desejos psicológicos – isso é, quando a relação homem-trabalho é bloqueada. (DEJOURS, 1992a, p. 133).
Afetando intensamente as condições psíquicas do trabalhador, Mendes
(1999, p. 24-30) destaca que as situações de sofrimento podem ser vivenciadas no
cotidiano organizacional através da presença de atitudes agressivas, da execução
de tarefas penosas ou perigosas, do medo dos boatos, da desconfiança, da
morosidade e do desânimo, da injustiça e da iniqüidade em níveis de remuneração,
do adiamento ou não reconhecimento dos serviços prestados, das tensões e crises
no interior das equipes, do egoísmo e do individualismo entre os colegas, da pouca
perspectiva de crescimento profissional etc.
Por estarem relacionadas à percepção do trabalhador, na formação de sua
realidade subjetiva e em sua satisfação para com o trabalho, a compreensão dos
conceitos referentes à Carga Psíquica ou Carga Mental pode oferecer auxilio na
identificação de situações de conflito, causadas por incompatibilidades entre a tarefa
74
e/ou comportamento formalmente solicitados pela empresa e o seu efetivo
cumprimento no ambiente de trabalho.
Estando habitualmente ligado aos estudos da Psicologia do Trabalho, a
Norma ISO 10075 – Princípios Ergonômicos Relacionados à Carga Mental de
Trabalho – Termos e Definições Gerais não apresenta nenhum conceito específico
para a expressão Carga Mental, mas traz o conceito ligado ao que se deve entender
por mental:
Mental é usado onde quer que processos de experiência e comportamento humano ocorram. Mental neste sentido refere-se ao cognitivo, informacional e aos processos emocionais da existência humana. O termo Mental é usado porque estes aspectos ocorrem de modo inter-relacionado e podem, ou não, ser tratados separadamente na prática. ISO 10075 (1991).
Conforme Laurell (1985, p. 36), as cargas psíquicas que afetam o trabalhador
podem ser reunidas em dois grupos distintos: o da sobrecarga psíquica, que engloba
situações tais como as de tensão prolongada; e o referente a situações de sub-
carga ou de impossibilidade de desenvolver e fazer uso da capacidade psíquica,
experimentadas em situações em que são impostos/requeridos estados
permanentes de atenção, de supervisão, de pressão por produtividade ou de
condições de trabalho que denotem periculosidade.
Para Corrêa (2003, p. 20) as cargas psíquicas dizem respeito, em tese, “[...] à
vivência de tensões ou descompensações psicológicas relativas à organização [...]”,
com a noção de carga psíquica encontrando diferentes enfoques entre os principais
autores da psicologia do trabalho, da ergonomia e da saúde do trabalhador,
conforme a complexidade teórica que lhe é atribuída.
75
Têm-se ainda os conceitos transcritos abaixo, de onde se pode extrair, como
ponto comum, a concordância quanto à origem da carga psíquica de trabalho: é
produzida na organização do trabalho.
São as cargas relativas à organização da jornada de trabalho, à periculosidade do trabalho, à freqüência de situações de emergência, ao grau de responsabilidade na resolução dessas situações, aos ritmos de trabalho, à pressão do tempo, ao grau de atenção e de mobilidade dentro do local de trabalho, à possibilidade de falar com os companheiros de trabalho, de tomar iniciativas e decisões a respeito de como realizar o trabalho em grupo, ao conteúdo da supervisão, ao grau de monotonia e a repetitividade das tarefas, ou a possibilidade de realizar atividades de defesa coletiva de trabalho. (GRECO et al, 1996, p.62).
As cargas psíquicas, finalmente, têm o mesmo caráter que as fisiológicas na medida em que adquirem materialidade através da corporeidade humana. As cargas psíquicas, pensadas sobre tudo em função de suas manifestações somáticas e não tanto psicodinâmicas, podem provisoriamente ser agrupadas em dois grandes grupos: um, que abrange tudo aquilo que provoca uma sobrecarga psíquica, ou seja, situações de tensão prolongada e outro, que se refere à sub-carga psíquica, ou seja, a impossibilidade de desenvolver e fazer uso da capacidade psíquica. Exemplos das primeiras características do processo de trabalho capitalista podem ser a tensão permanente, a supervisão com pressão, a consciência da periculosidade do trabalho, os altos ritmos de trabalho, etc... Pertence ao segundo grupo de questões a perda do controle sobre o trabalho ao estar o trabalhador subordinado ao movimento da máquina; a desqualificação do trabalho, resultado da separação entra e sua concepção e execução; a parcialização do trabalho, que redunda em monotonia e repetitividade, etc. (LAURELL E NORIEGA, 1989, p.112).
A preocupação pela busca da humanização nas condições de trabalho e pela
redução das cargas psíquicas associadas à sua realização, traduzida por estudos
que, via de regra, utilizam a expressão “Qualidade de Vida”, tem sido associada
tanto à satisfação dos trabalhadores quanto ao desenvolvimento da organização,
diante da expectativa, principalmente por parte das organizações, de que as
pessoas serão tanto mais produtivas quanto mais satisfeitas e envolvidas estiverem
com o próprio trabalho. (DIMATOS, 1999).
76
[...] para transformar um trabalho fatigante em um trabalho equilibrante precisa-se flexibilizar a organização do trabalho, de modo a deixar maior liberdade ao trabalhador para rearranjar seu modo operatório e para encontrar os gestos que são capazes de lhe fornecer prazer, isto é, uma expansão ou uma diminuição de sua carga psíquica de trabalho. (DEJOURS et al, 1994, p.31)
Como exemplo dessa preocupação relacionada à satisfação do trabalhador,
Walton (1973, p. 17) apresenta algumas categorias e fatores que podem ser
considerados na determinação da qualidade de vida no trabalho:
- Compensação justa e adequada: renda adequada ao trabalho,
eqüidade interna e externa de salários e benefícios;
- Condições de trabalho: jornada de trabalho e ambiente físico seguro
e saudável;
- Oportunidade para utilização e desenvolvimento da capacidade
humana: autonomia, significado do trabalho, identidade da tarefa,
variedade da habilidade e feedback;
- Oportunidade de crescimento e segurança: possibilidade de
carreira, crescimento profissional e segurança no emprego;
- Integração social na organização: igualdade de oportunidades e
relacionamento;
- Constitucionalismo: respeito às leis e direitos trabalhistas,
privacidade pessoal, liberdade de expressão e normas e rotinas;
- Trabalho e espaço total de vida: relação do papel do trabalho dentro
dos níveis de vida do emprego;
- Relevância social da vida no trabalho: responsabilidade social
empresarial.
77
Para as organizações, portanto, é fundamental a realização de avaliações
sistemáticas das condições de trabalho, já que nos dias atuais são registrados
aumentos significativos nas velocidades em que as mudanças nos procedimentos
formais são requeridas e impostas ao indivíduo. Necessário, então, que se disponha
de métodos confiáveis para avaliar estas mudanças em tempo hábil, de forma a
possibilitar, através dos conceitos de Carga Mental, uma avaliação do impacto
produzido nas condições de trabalho, como forma de minimizar os sofrimentos
causados ao trabalhador.
.
Efetivamente, após uma mudança qualquer, supomos um tempo de adaptação e uma posterior automatização dos processos cognitivos. Se tal não acontecer poderemos supor a criação de novos problemas a partir da mudança original. De fato, o conceito de Carga Mental permite uma coleta de informações em campo e a associação destas informações com os modelos teóricos propostos pela ergonomia cognitiva. Isto traz um ganho conceitual para as análises do trabalho mental e permite uma avaliação mais precisa dos impactos trazidos pelas mudanças organizacionais. (CORRÊA, 2003, p. 3-5).
De uma forma geral, a avaliação de rendimento de um sistema de trabalho
apóia-se sobre três tipos de componentes: o homem, a produção e a organização,
considerando-se sempre o meio ambiente em que as relações práticas se
concretizam. Nesse tripé, onde para a tomada de decisão é mobilizada uma
multiplicidade de processos cognitivos do trabalhador (sensório-motor, intuitivo,
raciocínio-concreto, raciocínio hipotético-dedutivo-formal), as diferentes formas e
estilos de perceber, tratar, organizar as informações e tomar decisões dependem da
“visão de mundo” e da personalidade do indivíduo. (CORRÊA 2003, p. 120)
A formação da “visão de mundo” de cada ser humano sofre influências diretas
de sua herança biológica, dos traços de caráter, da história pessoal e das origens
sócio-culturais, fatores que, em grande proporção, determinam as suas condutas e
78
escolhas pessoais (CHANLAT, 1992, p. 35). E é esta formação da “visão de
mundo”, em sua individualidade, que alguns autores consideram como fator crucial
para a entrada do homem no trabalho e para a gestão de uma carreira profissional
bem orientada, conforme abordagens realizadas no próximo tópico.
79
2.6 Gestão de carreira
A seguir são evidenciadas as influências da origem social, da história pessoal
e das escolhas pessoais na vida profissional do indivíduo, através de algumas
considerações, a respeito da entrada do homem no trabalho e na organização, da
abordagem de referencial teórico relacionado aos conceitos referentes aos modelos
atualmente propostos para a gestão da carreira profissional.
Logo após, encerrando este tópico, foram apresentadas algumas
considerações e informações sobre as especificidades do trabalho bancário, bem
como as características que fazem parte da vida profissional daqueles trabalhadores
que exercem suas atividades em instituições financeiras, ou mais especificamente,
em bancos.
2.6.1 A entrada do homem no trabalho e na organização
Se, do ponto de vista das organizações, a burocracia tem o significado de
harmonização dos conflitos entre capital e trabalho, para o homem, enquanto
trabalhador, a burocratização da sociedade tem se caracterizado pela negação ou
manipulação de conflitos, ou mais especificamente como uma forma de dominação
através da utilização de mecanismos diretos ou indiretos de controle social. (PAES
DE PAULA, 2002; CHANLAT, 1992; DEJOURS, 1992; TRAGTENBERG, 1980).
80
Publicado, ao final da década dos anos sessenta, o trabalho de Georges
Lapassade parece permanecer atual em aspectos que vinculam a vida do homem,
enquanto indivíduo, às suas experiências ligadas à infância, à adolescência, à
cultura familiar e à classe social a qual pertence.
Naquela época um período de constantes rápidas mudanças já se fazia sentir,
predizendo um futuro de conflitos e de rupturas definitivas com os padrões
conhecidos de maturidade do homem e de estabilidade social. A necessidade de se
adaptar constantemente aos novos ambientes e às novas demandas era
imprescindível para a sobrevivência e, nesse contexto, já não havia mais lugar para
um pretenso “homem adulto e acabado”, terminado em sua maturidade e em sua
formação, e nem para uma sociedade arraigada em valores ditos primitivos ou
arcaicos:
Para nós, pelo contrário, um grupo estável é já um grupo morto. Uma sociedade “acabada” é uma sociedade burocrática, fundada sobre uma ordem arbitrária, que recusa a mudança. Uma sociedade viva e livre pode construir-se sobre a invenção ininterrupta de novas instituições. (LAPASSADE, 1969, p. 10).
E afirma ainda que:
O homem moderno aparece cada vez mais, em todos os planos da sua existência, como um ser inacabado. O inacabamento da formação tornou-se uma necessidade, num mundo marcado pela transformação permanente das técnicas, o que implica uma educação igualmente permanente. (LAPASSADE, 1969, p. 16).
A primeira etapa, no caminho da vida do homem, é o seu nascimento
“prematuro”, organismo inacabado em sua dependência da mãe e da família que o
cerca, iniciando um processo eterno de aprendizado enquanto vida tiver. “Por isso, o
ser humano, desde o seu nascimento, vive sempre para além das suas
81
possibilidades”. Depois do nascimento e do protegido período da vida de criança, o
homem tem, na adolescência, a oportunidade de quebrar os primeiros laços que o
ata à tutela familiar. Os ritos de passagem de uma instância a outra, simbolizando a
proibição de ser criança e a iniciação nas estruturas sociais, eram marcantes em
sociedades ditas primitivas e auxiliavam na transmissão de valores culturais de
geração para geração. (LAPASSADE, 1969, p. 14-15).
Entretanto, conforme complementa aquele autor, já não há tempo a perder
com períodos improdutivos e dedicados ao ócio da juventude, pois “[...] a sociedade
industrial quebra essas estruturas estáveis que fundavam a transmissão cultural
[...]”. Na sociedade moderna, a adolescência e a juventude se transformam em
anos dedicados à aprendizagem, substituindo os ritos de iniciação e inscrevendo o
homem em uma nova estrutura da sociedade, marcada por classes que irão
concretamente definir as opções de “escolha“ da carreira e da entrada na profissão
de um “ser de classe”.
A estrutura de classe das sociedades funda-se em relações de produção que implicam essencialmente a divisão da sociedade em dirigentes e executantes. A estrutura das relações de produção torna-se cada vez mais visível no mundo contemporâneo, onde o sistema de organização, como dizem os sociólogos americanos do extero-condicionamento, se tornou a estrutura fundamental. (LAPASSADE, 1969, p. 15)
Resgatando a obra de Marx, Lapassade (1969, p. 174) reafirma a
dependência do indivíduo em relação à sua classe de origem, evidenciando o quão
diferente é a “entrada na vida” de um jovem operário, se comparada à de um jovem
estudante burguês. É a personalidade de classe e a prática social que
determinarão a situação do homem no mundo do trabalho, e estariam cometendo
um grande risco de efetuar uma construção idealista, uma psicologia desenraizada
82
ou uma relação não verdadeira com a realidade, aqueles que promovessem o
estudo do homem adulto sem considerar esses determinantes.
Citando J. A. Floud e A. Halsey, que em seus estudos da sociedade
analisaram os aspectos sociais da orientação profissional na Inglaterra, Lapassade
(1969, p. 178) escreve que a estrutura de classe “[...] exerce uma influência notável
sobre o recrutamento profissional, pondo sólidas barreiras à liberdade da escolha
individual e às possibilidades de orientação profissional. Esta escolha não pode
deixar de refletir o meio familiar da criança [...]”, sendo através e pela mediação da
família que o jovem realiza a sua pertença de classe, fator limitante de sua escolha
profissional.
Dessa forma, o autor não só reafirma a dependência do homem à sua classe
social para a escolha de sua profissão, como também atribui a esse determinante as
barreiras encontradas na realização do ensino secundário e superior: “somente três
por cento dos filhos de operários fazem estudos superiores; ao que algumas vezes
se opõe a possibilidade de obter bolsas de estudo que permitem de algum modo,
apagar as desigualdades de nascimento”.
O filho de operário não vive apenas a sua situação de classe – seu “ser de classe” – na fábrica, depois de se tornar um jovem operário, mas já na escola como no conjunto da sua existência. Nas relações com a sociedade e dum modo especial com a “cultura”, ele realiza a sua personalidade de classe. (LAPASSADE, 1969, p. 181).
Ao escrever especificamente sobre a entrada do homem na organização,
Lapassade (1969, p. 195) resgata os pensamentos de Max Weber ao declarar que
“[...] é à burocratização que pertence o futuro [...]”, referindo-se à forma como o
capitalismo moderno, em sua forma burocrática, “[...] organiza não somente as suas
empresas industriais, mas o conjunto da sociedade.”
83
Corroborado pelas afirmações de Alvesson e Deetz (1999) e Motta (2001),
citadas neste trabalho, a respeito dos inimigos da Teoria Critica6, Lapassade (1969,
p. 198) faz inferência ao que chamou de “atitude tecnicista” encontrada em todos os
estudantes de ciências sociais que consideravam as suas disciplinas não mais um
instrumento de protesto, mas uma forma de assegurar o equilíbrio e a estabilidade
de grupos dominantes. Por conseqüência há uma ”[...] multiplicação das escolas de
‘comércio’ e de ‘preparação para os negócios’ para aqueles que se tornariam os
futuros defensores da instrumentalização e escravos da doutrina da burocratização
imposta pelas organizações.”
E é através da doutrina da burocracia que a escola moderna prepara o
homem da organização, ao qual se pede menos trabalho de criação ou tomada de
iniciativas pessoais do que um ajuste harmonioso às necessidades da empresa e ao
conjunto da sociedade. Esta mesma sociedade, ainda citando Lapassade (1969, p.
211) e Motta (2001, p. 101), está cada vez mais nas mãos dos homens formados
pela e para a organização, “[...] sendo eles que vão fazer parte dos conselhos de
administração das universidades e que, já neste momento, desenvolvem através das
ciências sociais uma ideologia da conformidade”, conformidade não consentida, mas
aceita diante da realidade imposta pelas organizações.
O conteúdo teórico e empírico apresentado por Lapassade (1969) caracteriza,
ainda hoje, a primeira barreira que o trabalhador enfrenta ao ingressar na profissão e
na organização: sua origem social. Mesmo em um contexto atual, onde a aquisição
de novas competências tem o significado de empregabilidade, a argumentação do
autor leva à pressuposição de que o trabalhador continuará a ser remetido às suas
origens e ao seu lugar de “ser de classe”, em uma estrutura social que os revestem,
6 Assunto abordado no início deste tópico
84
já a partir da escola, com a doutrina e a orientação necessárias para satisfazer a
burocracia organizacional.
O estado e o patronato difundem, através da legislação e regulamentação sobre as finalidades idênticas da administração e do trabalhador na empresa, a ideologia do consenso, da ‘formação’ como realização da ‘vocação profissional’, que na realidade não significa a atualização de potencialidades inatas na mão-de-obra, mas a obediência à lei da oferta e procura da força de trabalho no mercado7. O conceito ’formação permanente’ foi considerado impróprio e modificado para ‘formação profissional contínua’, que tem como fim a ascensão social: adaptar os trabalhadores às mutações tecnológicas. (TRAGTENBERG, 1980a, p. 33).
Assim, a aquisição da “visão de mundo” e das habilidades necessárias para
uma gestão de carreira de sucesso, conforme descritas a seguir, sem que se tenha
acesso aos meios materiais, econômicos e sociais necessários para a formação e o
desenvolvimento de competências, apresenta-se, verdadeiramente, como uma
barreira à ascensão profissional do trabalhador.
7 Conforme salienta Tragtenberg, o conceito de finalidade comum é acoplado ao conceito de mudança social, que abrange toda a coletividade nacional. A falta de expressão política na ‘formação’ da mão-de-obra leva a uma regressão infantilizada.
85
2.6.2 Carreira e empreendedorismo
A rápida transformação nas relações entre capital e trabalho, como já descrito
previamente neste trabalho, transferiu de volta para o trabalhador grande parte da
responsabilidade sobre o seu futuro dentro e fora das organizações, impondo
obstáculos extras à sua formação profissional e dificultando ainda mais o processo
de seu posicionamento frente a questões pessoais e ao desenvolvimento de sua
carreira.
Traçando um paralelo entre os pressupostos teóricos e empíricos tratados por
Filion (1993; 2001), Martins (2001), Greenhaus (1999), Hall (1998) e Reardon (1999)
na escolha e gestão de carreiras profissionais, encontra-se diversos pontos em
comum e necessários à gestão de uma carreira de sucesso.
A abordagem tradicional de carreira identifica três conceitos, todos
relacionados diretamente ao contexto e ao meio ambiente a ser evidenciado pelo
pesquisador, já que teoricamente limitam o universo de atuação dos indivíduos.
Para Martins (2001, p. 35), o primeiro conceito é apresentado como a noção
de avanço dentro de uma hierarquia vertical organizacional, em busca de status e ou
ganhos financeiros; o segundo associa a carreira a profissões específicas, tendo
como exemplos médicos, militares, dentistas, sacerdotes, professor, etc; o terceiro e
último conceito é apresentado como a pressuposição de uma estabilidade
ocupacional, o que permitiria ao indivíduo não se desviar de sua opção, exercendo
uma única atividade até a aposentadoria.
Os aspectos relevantes a serem levantados, neste trabalho, não estão
diretamente relacionados à abordagem tradicional e aos seus respectivos conceitos,
86
conforme evidenciados acima, mesmo porque as modernas relações entre
organizações e profissionais já não permitem a acomodação e o conforto
anteriormente relacionados à segurança de uma carreira estável. Martins (2001, p.
33) enfatiza a importância das mudanças no ambiente profissional:
Após uma década de reestruturações radicais nas organizações, algo se alterou substancialmente nas relações de trabalho, em especial no universo das grandes corporações. Passada a fase aguda de reengenharias e downsizing, restou a percepção da precariedade do vínculo empregatício. Dedicação, senioridade e outras “virtudes” do antigo mundo corporativo perderam a condição de mantenedoras da estabilidade. Atualmente, já faz parte do senso comum a noção de que a empregabilidade é o novo alvo profissional, principalmente para aqueles que não vivenciaram a situação anterior de segurança no emprego.
Neste sentido, Greenhaus (1999, p. 9) conceitua carreira de forma mais
adequada aos tempos atuais: é “[...] um padrão de experiências relacionadas ao
trabalho que abrange o curso da vida de uma pessoa.” O que se pode inferir dessa
afirmação é a existência de uma construção permanente da realidade profissional,
onde todas as experiências e escolhas realizadas, ao longo de uma carreira, são
determinadas pela capacidade pessoal de perceber, assimilar e reagir ao ambiente.
Hall (1998, p. 23) também apresenta uma abordagem sobre o assunto, onde
o novo acordo empregador/empregado estaria se deslocando da modalidade
relacional de longo prazo, marcada pela lealdade mútua e baseada no desempenho,
para trocas utilitárias de curto prazo, traduzidas por um contrato transacional em que
os termos de troca são explicitamente negociados. Nesta fase de transição ou novo
contrato proteano8 de carreira, o profissional procura se ajustar às demandas do
ambiente, com flexibilidade e investimentos em suas habilidades, qualificações e
8 Conforme Hall (1996, p. 20) a carreira proteana é “...um processo que a pessoa, não a organização, está gerenciando...é desenhada mais pelo indivíduo que pela organização, e pode ser redirecionada de tempos em tempos para atender às necessidades da pessoa.”
87
competências, mas sempre tendo consciência dos seus objetivos individuais.
(MARTINS, 2001, p. 33).
A partir da identificação desta nova realidade, ou seja, deste novo
relacionamento entre organizações e trabalhadores, surge a necessidade de se gerir
estratégica e estruturadamente a carreira profissional, através do autoconhecimento
(personalidade, interesses e aptidões), com a contínua coleta de informações sobre
si mesmo e o mundo ao seu redor, o estabelecimento de metas e formas de atingi-
las, de forma a possibilitar, conforme Martins (2001, p. 36), a correta tomada de
decisões e a solução de problemas relativos ao embate entre desejos,
possibilidades, custos e benefícios da vida profissional.
Neste contexto, Reardon (1999, p. 19-22) identifica três domínios que
influenciam o processamento de informações que levam à decisão:
1. Domínios do conhecimento:
- Autoconhecimento – Início do processo de tomada de decisão, pois
gera informações sobre valores, interesses e habilidades individuais
necessárias às etapas subseqüentes;
- Conhecimento ocupacional – Pedra fundamental do processo de
decisão de carreira, o conhecimento das opções ocupacionais tem
como desafio identificar as categorias relevantes para o decisor, tais
como nível educacional exigido, retorno financeiro e tempo investido
na formação;
2. Domínio das habilidades da tomada de decisão:
- Condicionado pelas informações conhecidas sobre a personalidade
do decisor e pelas opções ocupacionais disponíveis. Este nível é
referente às habilidades de tomada de decisão e analisa como os
88
indivíduos decidem a partir das informações de que dispõe, dentro
de uma abordagem cognitivista, metaforicamente comparável aos
processos computacionais.
3. Domínio do processamento executivo:
- Representando o “topo da pirâmide”, se refere às habilidades
metacognitivas9 necessárias ao processo de solução de problemas
e tomada de decisão e carreira, envolvendo três habilidades
particularmente importantes (REARDON, 1999, p. 87-9):
Diálogo interno (self-talk), referente ao autoconceito a respeito
da própria capacidade de solucionar um problema,
demonstrando confiança em si mesmo;
Autoconsciência (self-awareness), referente a habilidade de
solucionar problemas através da consciência de si mesmo como
executor das ações, conseguindo transcender as habilidade
básicas necessárias e se perceber emocionalmente ao longo do
processo;
Controle e monitoramento, referente à capacidade de distinguir
ou perceber o momento de decidir avançar e agir ou parar e
coletar informações, através do equilíbrio entre impulsividade e
compulsividade.
9 Reardon (1999, p. 87) define cognição como sendo “... o processo de memória e pensamento no qual uma pessoa se envolve para desempenhar uma tarefa ou alcançar uma meta; é o processo de pensar. O prefixo “meta” significa simplesmente “além” ou “mais alto”, tal como “habilidades de pensamento de ordem mais elevada””.
89
O modelo descrito por Martins (2001, p. 54), sob a denominação de Modelo
EPIA10 de gestão de carreira (Figura 4), que teve como inspiração o ciclo de
Shewhart (PDCA11 da Qualidade Total), envolve as etapas listadas a seguir,
descritas de forma resumida e desacompanhadas de uma análise mais profunda,
interessando apenas a idéia central do processo:
- Escolha – Etapa relacionada às decisões fundamentais de carreira com
as quais o indivíduo se defronta desde a primeira definição profissional;
- Planejamento – Estabelecimento das metas e estratégias de carreira;
- Implementação – Etapa de execução do plano elaborado, ou seja,
operacionalização das estratégias em direção às metas;
- Avaliação – Atividade de verificação dos resultados obtidos, enfocando
a carreira de forma global. Ao final dessa etapa três caminhos se
abrem: Redefinição (mudança fundamental), Replanejamento (no caso
de metas inadequadas) e Manutenção (no caso de metas adequadas);
- Informações do Indivíduo – As informações geradas pelo
autoconhecimento, na forma de valores, habilidades, interesses, etc.,
afetam todas as etapas do ciclo EPIA, sendo indispensáveis ao
gerenciamento eficaz da carreira.
- Informações do ambiente – Englobam as informações relacionadas ao
ambiente ocupacional, organizacional, familiar e social que afetam, em
maior ou menor grau, as etapas do ciclo. São igualmente importantes
para a eficácia do processo.
10 EPIA: Escolha, Planejamento, Implementação e Avaliação. 11 PDCA: Planejamento, Desenvolvimento e implantação, Controle e Avaliação
90
Figura 4 – Modelo EPIA de gestão de carreira Fonte: Adaptado de Martins (2001, p. 54 e 71)
A partir do modelo EPIA, Martins (2001, p. 70-2) procura representar o fluxo
de informações do indivíduo em seu processo de escolha, sendo considerado
fundamental o autoconhecimento no processo de escolhas autênticas, considerando
que sem o referencial próprio “[...] o indivíduo tende a se perder na impessoalidade
dos parâmetros externos, reduzindo suas chances de auto-realização.”
Enfatiza, entretanto, que as referências externas podem exercer forte
influência nas escolhas individuais. O ambiente externo é estratificado pelo autor em
três diferentes níveis de influência:
1. Família – A escolha inicial pode ser diretamente afetada pela tradição
familiar, pela exteriorização de opiniões e conceitos formados em
âmbito coletivo, provocando uma maior exposição do jovem a um
determinado conjunto de estímulos motivadores ou impeditivos (reais
ou imaginários);
Ambiente
Indivíduo
E A
PI
Cultura
Sociedade
Família
91
2. Sociedade – As características da comunidade, da classe social à qual
pertence o indivíduo e a conjuntura sócio-econômica são fortes
condicionantes à tomada de decisão, pois determinam, via de regra, o
que é uma ocupação de prestígio e uma “sem futuro”;
3. Cultura – Apesar de poder ser facilmente incluída nos aspectos sociais,
a cultura tem grande peso na tomada de decisão, considerando que
desde a sua mais tenra idade os indivíduos são alimentados com
informações e conceitos pré-estabelecidos, por vezes confundidos com
seus próprios valores individuais. Tais conceitos ficam fortemente
arraigados ao conjunto de suas percepções e exercem notória
influência na formação de “juízo” e na percepção do mundo a seu
redor.
Diante da incerteza traduzida pelo ambiente sócio-econômico atual,
sabidamente mutável e instável, Martins (2001, p. 82) estabelece como essencial a
atitude proativa e o estabelecimento de uma visão de médio e longo prazos na
gestão de carreira, o que oferecerá uma vantagem competitiva considerável àquele
que planejar estrategicamente sua trajetória profissional:
O planejamento na carreira proteana parte das definições fundamentais para as operacionais. O indivíduo autoconsciente tem noção de seus objetivos de vida, valores, interesses e prioridades, de forma que consegue contextualizar seus objetivos de carreira nesses referenciais próprios. Numa analogia com o planejamento estratégico, o indivíduo definiria, neste ponto, o correspondente à missão de uma organização, a sua razão de ser. O autoconhecimento proporcionaria também a criação de uma visão de futuro: como o indivíduo se vê, adiante no tempo, com relação aos seus objetivos.
92
E continua:
À semelhança do que se faz via modelo SWOT12 para as organizações, o profissional confronta suas forças e fraquezas com as oportunidades e ameaças do ambiente de carreiras, identificando possíveis problemas e hiatos de competência. Concluído o diagnóstico, pode-se estabelecer as metas e, em seguida, definir as estratégias para atingí-las.
As características e os aspectos ligados à escolha e à gestão de carreiras,
definidas até este ponto, possibilitam a identificação de como deve ser teoricamente
conduzida a trajetória profissional no ambiente competitivo que se apresenta na
atualidade, bem como quais são os elementos básicos para que isso possa ocorrer
com sucesso.
Para que se possa traçar um paralelo entre tais características e os
elementos identificados por Filion (1993) para uma carreira empreendedora de
sucesso, faz-se necessário também explicitá-los, já que, segundo o autor, até o ano
de 2.020, aproximadamente um em cada dois trabalhadores assumirá um papel
empreendedor dentro ou fora de uma organização.
Dentre os motivos para esta tendência, Filion (2001, p. 36-8) relaciona os
seguintes:
- Tecnologias: afetam diretamente a produtividade e por conseqüência “o
tempo” de execução das tarefas, acarretando processos produtivos
com ocorrências de picos ou vales, resolvidos através da
subcontratação de mão-de-obra;
12 SWOT – Análise das Forças (strengths), Fraquezas (weaknesses), Oportunidades (opportunities) e Ameaças (threats), com o objetivo de situar a organização frente ao mercado e aos concorrentes -enfoque estratégico.
93
- Mudança Organizacional: necessidade de flexibilidade para se adequar
à pressão competitiva, melhor administrada através da subcontratação
de profissionais altamente experientes (consultoria).
- Segurança: O processo de redução organizacional experimentado na
última década proporcionou a quebra da confiança nas relações de
trabalho, deixando um número cada vez maior de indivíduos propensos
a investir e a trabalhar para eles mesmos.
Diante dessas constatações, é de se esperar uma completa reviravolta na
compreensão que se tem do termo carreira, sendo que muitas das carreiras hoje
conhecidas irão desaparecer e outras tantas irão mudar radicalmente para absorver
o sentido de empreendedorismo. As sociedades deverão se preparar para o futuro
através do investimento em currículos escolares que incentivem e estimulem o
conceito do que vem a ser o indivíduo empreendedor, ou correrão os riscos da
estagnação econômica e do isolamento diante do mundo desenvolvido. (FILION,
2001, p. 38).
O contexto sócio-econômico, em que se encontra inserido e no qual foi
formada a história pessoal do futuro empreendedor, incluindo a sua educação, suas
experiências, padrões de comportamento, métodos e disposição para o trabalho,
além dos valores sociais internalizados, são decisivos na formação do conhecimento
próprio e na sua percepção de mundo. Por seu turno, o modo como o conceito de si
é percebido e organizado parece ser diretamente ligado aos interesses que guiam
as intenções individuais, produzindo o que é descrito por Filion (2001, p. 49) como o
“[...] processo de seleção para a percepção e retenção das imagens que iniciam o
processo visionário.”
94
As habilidades e competência desenvolvidas propiciarão ao indivíduo o alcance de níveis de conhecimento próprio, Know-how, capacidade gerencial e direção própria necessários para realizar atividades que têm a ver com o papel organizacional escolhido [...] o conceito de si constitui um contexto central do qual o processo visionário emerge e dentro do qual o processo de aprendizado e enxertado. (FILION, 2001, p. 49).
O processo de pensar através de uma visão foi montado com quatro
elementos comuns aos empreendedores de sucesso, tendo sido considerados os
mais relevantes. Conforme metodologia adotada por Filion (1993, p. 56), estes
elementos têm estreita relação e influência entre si e são diretamente responsáveis
pela sustentação da visão empreendedora:
1. Weltanschauung13: Constituem a base com a qual se desenvolve o
processo de criação da visão do empreendedor, considerando tratar-se
da maneira como o indivíduo interpreta e enxerga o mundo ao seu
redor, influenciado por valores, atitude, humor, crenças e intenções. O
W é relevante pelo fato de simbolizar como o empreendedor,
individualmente, compreende seu ambiente, não traduzindo
necessariamente o significado produzido pelo mundo real. Filion
(1993, p. 56) afirma que “[...] um dos primeiros exercícios no processo
de desenvolvimento da visão consiste em descrever os elementos que
estão por trás dos Ws ou imagens da realidade, isto é, por trás da
maneira de perceber o mundo real”.
2. Autoconhecimento: Quanto mais cedo o empreendedor começar a
colecionar experiências na área que pretende dominar, mais visões
13 Apesar não existir uma tradução exata em inglês para a palavra derivada da língua alemã, Weltanschauung traduzido para o francês e seqüencialmente para o português, seria o correspondente a “imagem da realidade”.
95
realistas do que deseja fazer e alcançar ele irá produzir. Desta forma,
procurando o autoconhecimento através do entendimento de sua
própria história, valores e modelos resultantes do seu passado familiar,
suas experiências anteriores e de sua educação informal, o
empreendedor poderá identificar melhor a sua percepção de mundo e
desenvolver com mais segurança suas visões.
3. Energia: O engajamento e persistência com que o empreendedor se
entrega aos seus objetivos se traduzem como fator importante, sendo
esta energia traduzida pelo tempo e a intensidade ou conhecimentos
dedicados às atividades profissionais. A energia é influenciada
diretamente pelos Ws e pode conferir ao empreendedor mais liderança
na condução de suas atividades, o desenvolvimento de
relacionamentos e um fluxo constante de informações provenientes
destes relacionamentos. Deve ser destacado o fato de que a energia
gasta nas relações com os integrantes da organização, ou seja,
funcionários e colaboradores, explica a maioria dos casos de
empreendedores de sucesso.
4. Liderança: Surgindo de uma evolução gradual, na medida em que
adquire habilidades específicas, a liderança é resultado também dos
Ws, assim como também da energia e dos relacionamentos do
empreendedor. De igual maneira, exerce forte influência sobre a
evolução dos Ws e na quantidade de energia despendida, já que afeta
o desejo de realizar e, por conseqüência, grande parte do alcance da
visão em desenvolvimento. Filion (1993, p. 58) entende que “[...] a
96
habilidade para desenvolver uma visão parece conferir liderança, e
esta, para o empreendedor, depende do desenvolvimento da visão.”
5. Relação: Destacada por Filion (1993, p. 59) como o componente mais
importante no conjunto formador do metamodelo do pensamento
visionário, o sistema de relações (internas e externas) é o fator decisivo
para explicar a evolução da visão, principalmente no que se refere ao
fator interno da visão central. Neste sentido, a família do
empreendedor assume importante papel, pois influenciará diretamente
na formação da visão inicial, já que representa o sistema básico de
relacionamentos. Os homens são originalmente produtos dos
sistemas de ralações da família, que se desenvolvem posteriormente
em relacionamentos empresariais, proporcionando uma intensa troca
de informação, absorção de cultura e integração de valores.
Constata-se, dessa forma, que muitos aspectos são comuns às definições
apresentadas pelos autores referenciados, aproximando de forma bastante peculiar
as atitudes e pré-requisitos comuns a uma bem sucedida gestão de carreira e ao
empreendedorismo vencedor. A título de ilustração, no Quadro 5 – Elementos
essenciais para o sucesso - gestão de carreira e empreendedorismo são
evidenciados alguns desses pontos:
97
Nº de
referência Empreendedorismo Gestão de Carreira
1
Percepção do mundo ou imagens da realidade (W).
Autoconhecimento e domínio das habilidades da tomada de decisão, que gera informações sobre valores, interesses e habilidades individuais necessárias ao desenvolvimento subseqüente.
2 Energia representada pelo engajamento e persistência na consecução de objetivos.
Domínio do processamento executivo, representado pelo diálogo interno, autoconsciência, controle e monitoramento.
3 Liderança com a aquisição de habilidades específicas para a gestão de pessoal.
Não foi identificada referência direta sobre o elemento “liderança” nos textos consultados.
4 Relações, internas e externas, como parte fundamental na evolução do processo visionário.
Gerenciamento do processo de aquisição de habilidades necessárias às diversas etapas de desenvolvimento profissional (Carreira Proteana).
5
Visões Emergentes, ou opções dentre as quais será escolhida aquela a ser implementada.
Conhecimento das opções ocupacionais, tendo como objetivo a identificação das categorias relevantes para o decisor. Também representado pela “Escolha” no modelo EPIA.
6
Visão Central, incluindo seus componentes básicos, ou seja, a visão central focalizada para o exterior (ambiente) e a voltada para o interior (organização).
Relacionado ao autoconhecimento, que proporciona ao indivíduo a criação de uma visão de futuro: como o indivíduo se vê, adiante no tempo, com relação aos seus objetivos.
Informações do ambiente ocupacional, organizacional, familiar, cultural e social (modelo EPIA).
7
Visões Complementares, responsáveis pelo apoio e desenvolvimento da visão central.
Etapa de Avaliação no modelo EPIA, apoiado na capacidade e habilidade do indivíduo em confrontar suas forças e fraquezas, identificando possíveis problemas e hiatos de competência.
Quadro 5 – Elementos essenciais para o sucesso - gestão de carreira Fonte: Filion (1993; 2001); Martins (2001); Greenhaus (1999); Hall (1998); Reardon (1999).
Portanto, espera-se que, ao ingressar em uma organização, o trabalhador já
tenha boa parte de sua visão de futuro bem estabelecida, alicerçada no
desenvolvimento prévio do conhecimento de sua realidade, de suas habilidades
inatas e de suas capacidades latentes em criar e desenvolver projetos relacionados
às atividades profissionais, ou seja, o seu autoconhecimento deve ser uma
característica bem desenvolvida.
98
Como exposto anteriormente, não se deve ignorar que o sistema de relações
internas e externas, o conceito de si próprio e a consciência do contexto sócio-
econômico estão estreitamente interligados na produção de indivíduos perfeitamente
capazes de implementar e de gerir com sucesso suas carreiras profissionais.
Inegável, também, que a história pessoal de cada indivíduo está ligada às
experiências de sua comunidade, com seus valores, padrões, métodos de trabalho e
caminhos, influenciando a forma como direcionará a energia que o conduzirá à
aquisição do conhecimento próprio, ao seu comportamento singular e às ações que
promoverão o desenvolvimento de sua trajetória profissional.
Ninguém nasce trabalhador, mas em nossa sociedade, sociedades modernas, nascemos e somos preparados para o trabalho. Desde nossa primeira socialização, na família, passando pela escola, somos educados com a perspectiva “de ser alguma coisa quando crescer”, e esse ser alguma coisa implica uma escolha profissional, mesmo que apenas enquanto ideal. Assim, vemos que o trabalho está presente em nossas vidas desde um período muito precoce. (CARDOSO, 1997, p.106).
Neste contexto, ao se considerar as palavras de Lapassade (1969) a respeito
da trajetória do homem em sua entrada no trabalho e na organização, encontrar-se-
á a primeira barreira a ser transposta pelo homem complexo, ou seja, a dependência
do indivíduo em relação à sua classe de origem.
Finalizando a apresentação do referencial teórico, que ofereceu suporte a
esta pesquisa, a seguir, são apresentadas algumas características que fazem parte
da vida profissional dos empregados dos bancos, bem como considerações e
informações sobre as especificidades do trabalho bancário.
99
2.6.3 Algumas considerações sobre o trabalho bancário
Uma das peculiaridades do trabalho bancário é o seu objeto: a mercadoria-dinheiro. Ele concretiza os valores de troca criados e viabiliza a apropriação daqueles valores excedentes pelo capital, transformando-os em capital produtor de juros. É um processo onde dinheiro gera dinheiro. (CARDOSO, 1997, p. 62).
Durante as primeiras décadas do século, no Brasil, o trabalho bancário era
constituído basicamente por operações vinculadas à escrituração de conta corrente,
ao crédito e à cobrança, realizadas manualmente, envolvendo a manipulação e
contabilização de grande quantidade de papéis e documentos.
A mecanização dos trabalhos inerentes aos serviços bancários produziu
importantes mudanças no modo de realização do trabalho, com a introdução das
máquinas de datilografia nos serviços de escrituração e dos copiadores nos anos 20,
da máquina de calcular no decorrer dos anos 40 e, no final dos anos 50, de
equipamentos destinados à elaboração da contabilidade, aumentando
significativamente a produtividade. (CARDOSO, 1997, p. 64).
Ainda, conforme aquela autora, no decorrer dos anos 40, com a crescente
concentração de renda, a competição por um mercado ainda reduzido ocasionava a
gradativa diminuição do número de bancos, ao mesmo tempo em que aumentavam
o número de agências bancárias. As condições de trabalho nos bancos eram
bastante difíceis e a jornada de trabalho incluía os sábados (extinto apenas em
1962) e estendia-se muitas vezes pela madrugada, especialmente durante a
elaboração dos balanços.
O caráter excepcional e penoso do trabalho exercido pelo bancário é
reconhecido pelos legisladores brasileiros que, através dos Arts. 224 a 226 da
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, exaram normas especiais de tutela do
100
trabalho, com disposições especiais sobre a duração e condições de trabalho em
instituições bancárias. Especificamente sobre a duração da jornada de trabalho, o
Art. 224 apresenta o seguinte texto:
A duração normal do trabalho dos empregados em bancos, casas bancárias e Caixa Econômica Federal será de 6 (seis) horas contínuas nos dias úteis, com exceção dos sábados, perfazendo um total de 30 (trinta) horas de trabalho por semana. (BRASIL, 2002).
Na década dos anos 80 e 90, a intensificação das inovações tecnológicas e
organizacionais implementadas, nos bancos, mudou as formas de execução e
organização do trabalho bancário. A tradicional matéria-prima do trabalho bancário,
o papel, vem sendo substituída rapidamente pelos dados armazenados em sistemas
eletrônicos e baseados em redes de computadores, com informações trocadas no
momento em que são produzidas, dispensando grande parte da expertise do
trabalhador. (CARDOSO, 1997; OLIVEIRA, 2001; NAHAS, 2004)
Conforme salienta Cardoso (1997, p. 66), de trabalhador detentor de um
saber próprio, adquirido através de anos de práticas, o bancário passa a ser um
sujeito secundário do processo de transformação, pois já não manipula papéis em
sua atividade, o que faz a transição para a era do banco informatizado ser vivida
como um processo de desqualificação. Dessa forma, conclui a autora, “[...] a
inteligibilidade do processo de produção deixa de ser atributo de seus executores,
pois os novos aparelhos são programados para dar conta de um elenco de
possibilidades, extraído da análise de situações preexistentes.”
Para o autor deste trabalho de dissertação, em sua experiência como
bancário, por mais de vinte anos, já é do senso comum entre os empregados do
setor que o trabalho bancário faz sofrer, diante de uma longa jornada (apesar de
velada), das exigências e irritações dos clientes, do excesso de trabalho, dos
101
administradores autoritários e/ou manipuladores, dos riscos de assaltos etc. A
maioria dos bancários se refere, ao seu trabalho, como enlouquecedor e
estressante, deixando transparecer o que parece mesmo fazer parte de seu dia-a-
dia: um certo grau de sofrimento.
Este autor corrobora com os pensamentos de Cardoso (1997, p. 83), que
descreve com particularidade um complicador marcante na rotina dos empregados
do Banco do Brasil:
o estresse, configura-se como algo além do esperado, que está além do suportável, e que diz respeito não apenas à própria natureza do trabalho bancário, com todas as implicações previstas, mas, principalmente a perda da perspectiva de um projeto de vida, cujo trabalho bancário, com todos os agravos à saúde, poderia possibilitar.
No próximo tópico é descrita a metodologia adotada pelo pesquisador para a
condução desta pesquisa.
102
3 METODOLOGIA
A preocupação em apresentar este trabalho de forma ordenada, metódica e
lógica, com a adoção de procedimentos racionais e sistemáticos, foi traduzida pela
cuidadosa busca de conhecimentos adequados à consolidação de uma base
metodológica sólida, orientada à solução do problema proposto e à produção de
resultados satisfatórios e válidos, dentro de características essencialmente
científicas.
Conforme Bauer et al (2002, p.22), o caminho para a pesquisa social pode:
[...] ser encontrado através de uma consciência adequada dos diferentes métodos, de uma avaliação de suas vantagens e limitações e de uma compreensão de seu uso em diferentes situações sociais, diferentes tipos de informações e problemas sociais.
O problema de pesquisa que se apresenta está contextualizado no paradoxo
existente entre o discurso da empresa e a prática vivenciada pelos trabalhadores
envolvidos com atividades de atendimento ao cliente: por um lado, o levantamento
inicial de documentos (LAKATOS E MARCONI, 2001, p. 174) revelou no discurso da
empresa conceitos teóricos14 voltados para a valorização e aperfeiçoamento de seus
empregados e, por outro, a observação simples (GIL, 1999, p.111) realizada
preliminarmente pelo pesquisador identificou, em alguns trabalhadores, a falta de
satisfação na realização do trabalho, a indiferença pela gestão da carreira e o desejo
de se afastar do emprego.
14 Vide tópico 5
103
Dentro da realidade traduzida pelo ambiente de trabalho, em seis agências
bancárias de atendimento ao cliente do Banco do Brasil S.A., localizadas na cidade
de Uberlândia (MG), esta pesquisa teve como objetivo geral conhecer de que forma
possíveis contradições entre o discurso e a prática afetam o trabalhador, em sua
satisfação para com a realização do trabalho e na sua gestão da carreira
profissional, de forma a responder à seguinte pergunta:
Como as contradições entre o discurso organizacional e a prática
gerencial, dentro do ambiente delimitado por esta pesquisa, afetam
a satisfação para com o trabalho e a gestão de carreira do
trabalhador?
Partindo do objeto, dos objetivos e do problema de pesquisa, foram realizadas
leituras seletivas/reflexivas/interpretativas dos fundamentos metodológicos
apresentados por Bauer e Gaskell (2002), Silva e Menezes (2001), Gil (1987; 1999),
Godoy (1995; 1995a), Haguette (1999), Lakatos e Marconi (2001), Salm et al (2002),
Triviños (1987), Vergara (2000; 2005) e Yin (2001).
Inicialmente, de forma condensada, é apresentado o referencial teórico
proporcionado pelos autores citados no parágrafo anterior e, na seqüência, a
exposição dos métodos que nortearam e proporcionaram a base lógica, a natureza e
a linha desta pesquisa, assim como os procedimentos e técnicas utilizados na
coleta, tratamento e na interpretação dos dados obtidos.
Nas investigações, em geral, nunca se utiliza apenas um método ou uma técnica, e nem somente aqueles que se conhece, mas todos os que forem necessários ou apropriados para determinado caso. Na maioria das vezes, há uma combinação de dois ou mais deles, usados concomitantemente. (LAKATOS E MARCONI, 2001, p. 164).
104
3.1 O método científico: base lógica da investigação
A característica fundamental do conhecimento científico é, segundo Gil (1999,
p. 26), a sua verificabilidade. Neste sentido, o método científico é o conjunto das
“[...] atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia,
permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e verdadeiros -, traçando o
caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista”
(LAKATOS e MARCONI, 2001, p. 83), ou ainda “[...] o conjunto de procedimentos
intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento.” (GIL, 1999, p. 26).
Como base da investigação realizada em uma pesquisa, os métodos
esclarecem os procedimentos lógicos que deverão ser seguidos, sendo
diferenciados entre eles de acordo com as correntes filosóficas adotadas pelo
pesquisador para explicar como se processa o conhecimento da realidade.
Conforme Gil (1999) e Lakatos e Marconi (2001) podem ser incluídos neste universo,
dentre outros: o Método Dedutivo, o Método Indutivo, o Método Hipotético-dedutivo,
o Método Dialético e o Método Fenomenológico.
O método Fenomenológico, no qual está ancorado o presente trabalho,
propõe-se a estabelecer uma base segura para todas as ciências, liberta de
proposições. Não é um método dedutivo nem empírico, não tenta explicar os
fenômenos mediante leis, mas considera imediatamente o que está presente à
consciência, o objeto. Com tendência orientada totalmente para o objeto, “[...] a
fenomenologia ressalta a idéia de que o mundo é criado pela consciência, o que
implica o reconhecimento da importância do sujeito no processo da construção do
conhecimento[...]” (GIL, 1999, p. 32-3).
105
Triviños (1987, p. 47-8; 92) enfatiza que “[...] em nenhum momento esta
corrente do pensamento está interessada em colocar em relevo a historicidade dos
fenômenos[...]”, significando que “[...] o fenomenólogo estuda a realidade com o
desejo de descrevê-la, de apresentá-la tal como ela é, em sua experiência pura, sem
o propósito de introduzir transformações substanciais nela.” Assim, conforme aquele
autor, “[...] um fenomenólogo analisa as percepções dentro de uma realidade
imediata, buscando o significado e os pressupostos dos fenômenos sem avançar em
suas raízes históricas para explicar os significados.” E conclui:
A fenomenologia, sem dúvida, representa uma tendência filosófica que, entre outros méritos, parece-nos, tem o de haver questionado os conhecimentos do positivismo, elevando a importância do sujeito no processo da construção do conhecimento.
106
3.2 Os objetivos e a abordagem das pesquisas
Gil (1999, p. 43-5) apresenta a classificação das pesquisas em três
grupamentos, diferenciados basicamente pelos objetivos focados pelo pesquisador:
as pesquisas exploratórias, as pesquisas descritivas e as pesquisas explicativas.
Interessa a este trabalho a explicitação do que vêm a ser os dois primeiros
grupamentos.
As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver,
esclarecer e modificar conceitos e idéias ou mesmo proporcionar o desenvolvimento
de hipóteses que possam explicitar melhor o fato observado. São desenvolvidas
com o intuito de proporcionar uma visão geral sobre determinado assunto,
principalmente quando o tema escolhido é pouco explorado, constituindo-se muitas
vezes como a primeira etapa de uma investigação mais ampla. Considerando que
normalmente utiliza o levantamento bibliográfico, as entrevistas com pessoas com
experiência prática no problema, análise de documentos etc, essas pesquisas
assumem principalmente a forma de estudos de casos ou de pesquisas
bibliográficas.
As pesquisas descritivas, por seu turno, têm como objetivo a descrição das
características de determinada população ou fenômeno ou, ainda, o estabelecimento
de relações entre variáveis, utilizando-se de técnicas padronizadas de coleta de
dados. São incluídas no grupo de pesquisas descritivas aquelas que visam
descobrir a existência de associações entre variáveis, os levantamentos de opiniões,
atitudes e crenças de uma população. São, ainda, as que habitualmente realizam os
pesquisadores sociais preocupados com a atuação prática, estando entre as mais
107
solicitadas por organizações que se interessam em conhecer seu público interno e
externo.
Quanto ao tipo de abordagem, tem-se que tanto na abordagem quantitativa
quanto na abordagem qualitativa são observadas características que levam o
pesquisador a realizar um estudo cuidadoso e voltado para a evolução do
conhecimento humano. Entretanto, deve-se considerar que os procedimentos
adotados em cada uma delas se mostram diferentes em relação aos métodos e
técnicas de coleta e tratamento de dados, bem como na apuração e nas inferências
obtidas dos resultados.
Os métodos quantitativos supõem uma população de objetos de observação comparável entre si e os métodos qualitativos enfatizam as especificidades de um fenômeno em termos de suas origens e de sua razão de ser. (HAGUETTE, 1999, p. 63).
Utilizada na condução deste trabalho, a pesquisa com abordagem qualitativa
evita, tanto quanto possível, a apresentação de números. Lida com interpretações
das realidades sociais e com a atribuição de significados, estando mais relacionadas
aos dados obtidos com a utilização de textos, à análise baseada em interpretações
de informações obtidas em entrevistas de profundidade e às teorias explicativas
adotadas pelo pesquisador. (HAGUETTE, 1999, p. 18; BAUER et al, 2002, p. 23).
Ainda em seus estágios iniciais de desenvolvimento teórico e metodológico, a
pesquisa qualitativa se apresenta como alternativa viável, já que possibilita o
tratamento dos fenômenos sociais em sua imprevisibilidade, o que não tem sido
plenamente possível pelos métodos tradicionais. Haguette (1999, p. 21), apontando
a incapacidade dos métodos da ciência social tradicional em “[...] resolver os
problemas e as injustiças sociais dos países periféricos [...]”, considera a pesquisa
qualitativa como uma alternativa que dá ao investigador a possibilidade de se
108
posicionar politicamente, de intervir no ambiente de pesquisa, quebrar os limites
artificiais entre o sujeito e o objeto do conhecimento.
Nesse contexto, uma característica fundamental da pesquisa qualitativa é a
importância que a percepção cognitiva do cientista, em sua visão de mundo, tem
para o desenvolvimento e a confiabilidade dos resultados. Tal característica é
evidenciada por Gil (1999, p. 22) ao apontar que “[...] os pesquisadores sociais, por
serem humanos, trazem para as suas investigações certas normas implícitas acerca
do bem e do mal e do certo e do errado [...].”
Na pesquisa qualitativa os dados têm sua origem no ambiente natural e
aparecem sob a forma de transcrições de entrevistas, anotações de campo e
documentos variados, onde a palavra escrita tem lugar de destaque, tanto no
processo de obtenção como na divulgação dos resultados, sendo o pesquisador o
instrumento fundamental na observação, seleção, análise e interpretação dos dados
coletados. (GODOY, 1995, p.62),
Por adotar o raciocínio de que o ambiente e as pessoas devem ser olhados
holisticamente, ou seja, não serem reduzidos a variáveis e sim observados como um
todo, as pesquisas qualitativas oferecem a possibilidade de uma verificação mais
aprofundada de problemas formados a partir de elementos subjetivos, tais como os
relacionados à satisfação do trabalhador com o trabalho, a sua motivação e o clima
organizacional dentro de relações complexas. O estudo qualitativo é realizado com
o objetivo de auxiliar o investigador na compreensão dos fenômenos, a partir da
perspectiva dos sujeitos participantes. (HAGUETTE, 1999; GODOY, 1995)
109
3.3 As técnicas de pesquisa – coleta de dados
Através de Gil (1987; 1999) Haguette (1999), Lakatos e Marconi (2001),
Triviños (1987) e Yin (2001), são apresentados alguns dos delineamentos técnicos
utilizados em pesquisas científicas. Os procedimentos técnicos devem ser
determinados principalmente pelo objeto de investigação, pela dificuldade na
obtenção de dados, pelo nível de precisão exigido e pelos recursos materiais
disponíveis ao pesquisador.
O elemento mais importante para a identificação de um delineamento é o procedimento adotado para a coleta de dados. Assim, podem ser definidos dois grandes grupos de delineamento: aqueles que se valem das chamadas fontes de “papel” e aqueles cujos dados são fornecidos por pessoas. No primeiro grupo estão a pesquisa bibliográfica e a pesquisa documental. No segundo estão a pesquisa experimental, a pesquisa ex-post-facto, o estudo de campo e o estudo de caso. (GIL, 1999, p. 65).
Lakatos e Marconi (2001, p. 174-5) argumentam ser fundamental e
imprescindível à pesquisa científica a utilização de levantamento de dados de
variadas fontes, de forma a não só “[...] trazer conhecimentos que servem de
background [...] ao campo de interesse, como também para evitar possíveis
duplicações e/ou esforços desnecessários; pode, ainda, sugerir problemas e
hipóteses e orientar para outras fontes de coleta”.
Ainda segundo aquelas autoras e também para Gil (1999, p. 65-6), os
primeiros levantamentos de dados, destinados a recolher informações prévias sobre
o campo de interesse, são realizados com a utilização de documentação indireta,
que pode ser escrita ou não. Basicamente são utilizadas duas formas para o
levantamento inicial de dados utilizando-se a documentação indireta:
110
- a pesquisa documental de fontes primárias, ou simplesmente pesquisa
documental, que utiliza documentos compilados pelo próprio
pesquisador, antes ou após a ocorrência dos fatos, não se confundindo
com estes documentos aqueles considerados públicos e de autoria de
terceiros: livros, revistas, jornais, artigos científicos, teses etc;
- a pesquisa documental de fontes secundárias, mais conhecida como
pesquisa bibliográfica, que utiliza documentos produzidos por terceiros
e abrange toda a bibliografia tornada pública em relação ao tema em
estudo, ou seja, livros, revistas, jornais, publicações avulsas, artigos
científicos, monografias, dissertações e teses, além dos meios de
comunicação orais representados por rádios, gravações audiovisuais,
filmes e televisão. Como sua principal vantagem pode-se citar a
enorme gama de informações à disposição do pesquisador, o que não
seria possível caso tais informações tivessem que ser obtidas através
da observação direta dos fenômenos e ambientes sob estudo.
Lakatos e Marconi (2001, p. 187) ensinam que a documentação direta é
traduzida como aquela que fornece dados a partir dos próprios ambientes onde
ocorrem os fenômenos, como por exemplo: questionários, fotos e gravações em
vídeo ou áudio.
O que se deve salientar, a respeito da documentação envolvida na pesquisa,
independentemente de ter sido obtida de forma indireta ou direta, é que ambas
apresentam limitações que precisam ser consideradas pelo pesquisador.
Para que o investigador não se perca na “floresta” das coisas escritas, deve iniciar seu estudo com a definição clara dos objetivos, para poder julgar que tipo de documentação será adequado às suas
111
finalidades. Tem de conhecer também os riscos que corre de suas fontes serem inexatas, distorcidas ou errôneas. Por esse motivo, para cada tipo de fonte fornecedora de dados, o investigador deve conhecer meios e técnicas para testar tanto a validade quanto a fidedignidade das informações. (LAKATOS E MARCONI, 2001, p. 176).
Ainda com relação aos procedimentos técnicos, Gil (1987, p.60-1; 1999, p.
69-74) relaciona o Estudo de Caso, que é caracterizado pelo estudo profundo e
exaustivo de um ou de poucos objetos, de maneira que permita o seu amplo e
detalhado conhecimento, tarefa praticamente impossível mediante os outros
delineamentos. Yin (2001, p. 21) complementa esta característica afirmando que o
estudo de caso “[...] permite uma investigação para se preservar as características
holísticas e significativas dos eventos da vida real – tais como processos
organizacionais e administrativos.”
3.3.1 - A observação como técnica de coleta de dados
A observação, como técnica científica, tem sido referenciada como sendo
imprescindível e fundamental para a pesquisa, fornecendo ao pesquisador subsídio
para a formulação do problema, para a coleta de dados e para a obtenção das
diretrizes e alicerces necessários à análise e interpretação dos dados.
Para Gil (1999, p. 110), “[...] a observação nada mais é que o uso dos
sentidos com vistas a adquirir os conhecimentos necessários para o cotidiano.”
Entretanto, para que seja válida na produção de conhecimento cientifico, deve ser
utilizada de forma a servir a um objetivo formulado de pesquisa e ser
112
sistematicamente planejada, de modo que possibilite a verificação e controles de
validade e precisão.
Lakatos e Marconi (2001, p. 191) corroboram e complementam as exigências
exaradas por Gil (1999), apontando que a observação só se torna válida
cientificamente quando “[...] é registrada metodicamente e esta relacionada a
proposições mais gerais, em vez de ser apresentada como uma série de
curiosidades interessantes.”
Ainda segundo aquelas autoras, a observação apresenta vantagens que
devem ser consideradas ao se optar por sua utilização, já que haverá a necessidade
da aplicação, ao mesmo tempo, de técnicas complementares. Algumas vantagens
são exemplificadas abaixo:
- percepção direta dos fatos pelo pesquisador, reduzindo a subjetividade
inerente aos processos de investigação social, na medida em que
permite, in loco, o exame de uma ampla variedade de fenômenos;
- exige menos do observador do que outras técnicas;
- permite a coleta de dados sobre um conjunto de atitudes
comportamentais típicas;
- depende menos da introspecção ou da reflexão;
- permite a evidência de dados não constantes do roteiro de entrevistas
ou de questionários.
A respeito da realidade do pesquisador, enquanto observador, Triviños
(1987, p. 142) enfatiza a importância em se estabelecer, já a partir dos primeiros
contatos, um relacionamento de confiança, cooperação e respeito com os
113
observados, reconhecendo que uma das tarefas mais difíceis, neste momento inicial,
é a de definir com clareza a sua função dentro do ambiente, grupo ou comunidade a
ser estudada, de forma a não produzir sentimentos de rejeição e/ou desconfiança:
Num instante tão importante para a investigação, infelizmente não se podem dar orientações precisas sobre os modos de atuar e proceder. Cada situação tem suas próprias características. E o investigador deve avaliar as circunstâncias e buscar o melhor caminho. (TRIVIÑOS, 1987, p. 142).
Conforme descrevem Lakatos e Marconi (2001, p. 192), a técnica da
observação é dividida em dois grupos distintos: a observação direta intensiva e a
observação direta extensiva. A observação direta intensiva é dividida em algumas
modalidades: observação assistemática ou não estruturada – ou ainda simples
conforme Gil (1999, p. 111), observação sistemática ou estruturada, observação
não-participante, observação participante, observação individual, observação em
equipe, observação na vida real, observação em laboratório e a entrevista. Já a
observação direta extensiva é representada pelos questionários e formulários de
coleta de dados.
A observação assistemática, não estruturada ou simples, recolhe e registra os
fatos da realidade, sem que os pesquisadores utilizem meios técnicos especiais,
facilitando a obtenção de dados, e de forma que permaneçam alheios à
comunidade, sem interferir ou causar transtornos na rotina dos observados. Não
possuindo, via de regra, planejamento e controle previamente elaborados, essa
técnica é utilizada com freqüência em estudos exploratórios e em reportagens
jornalísticas. Por depender exclusivamente da visão de mundo, da perspicácia, do
discernimento, do preparo e do treino do observador, pode ter a fidedignidade dos
dados comprometida, por dar ampla margem à interpretação subjetiva ou parcial do
114
fenômeno observado ou, ainda, quando o pesquisador se deixa envolver
emocionalmente, pressupõe conhecimentos que não detém e/ou confia
excessivamente em sua memória. (LAKATOS e MARCONI, 2001, p. 192; GIL, 1999,
p. 111).
Embora a observação simples possa ser caracterizada como espontânea, informal, não planificada, coloca-se num plano científico, pois vai além da simples constatação dos fatos. Em qualquer circunstância, exige um mínimo de controle na obtenção dos dados. Além disso, a coleta de dados por observação é seguida de um processo de análise e interpretação, o que lhe confere a sistematização e o controle requeridos dos procedimentos científicos. (GIL, 1999, p. 111).
A observação participante, conforme relata Haguette (1999, p. 69), “[...] não
tem gozado de uma definição clara nas ciências sociais [...]”, em decorrência das
diferenciações existentes entre algumas concepções de suas grandes linhas de
abordagem, representadas por:
- Eduard C. Lindeman e Florence Kluckhon, para os quais a observação
participante se resume a uma importante técnica de coleta de dados,
empreendida em situações especiais e cujo sucesso é dependente das
técnicas convencionais de coletas de dados, tais como o questionário e
a entrevista;
- Morris S. Schwartz e Charlotte Green Schwartz, que concebem a
observação participante não só como um instrumento de captação de
dados mas, também, como instrumento de modificação do meio
pesquisado, ou seja, de mudança social (também classificada como
pesquisa ação);
115
- Severyn T. Bruyn, que tem na observação participante um processo de
interação entre a teoria e métodos dirigidos pelo pesquisador na sua
busca de conhecimento não só da perspectiva humana como da
própria sociedade..
Schwartz e Schwartz (1969, p. 89-104 apud HAGUETTE, 1999, p. 71)
apresentam a seguinte definição para a observação participante:
Um processo no qual a presença do observador numa situação social é mantida para fins de investigação científica. O observador está em relação face a face com os observados, e, em participando com eles em seu ambiente natural de vida, coleta dados. Logo, o observador é parte do contexto sendo observado no qual ele ao mesmo tempo modifica e é modificado por este contexto. O papel do observador participante pode ser tanto formal como informal, encoberto ou revelado, o observador pode dispensar muito ou pouco tempo na situação da pesquisa; o papel do observador participante pode ser uma parte integrante da estrutura social, ou ser simplesmente periférica com relação a ela.
Yin (2001, p. 116-7) corrobora com essa definição ao afirmar que o
pesquisador “[...] pode assumir uma variedade de funções dentro de um estudo de
caso e pode, de fato, participar dos eventos que estão sendo estudados.” Ainda
segundo aquele autor, a observação participante “[...] fornece certas oportunidades
incomuns para a coleta de dados em um estudo de caso [...]”, tais como a
participação de eventos e reuniões inacessíveis à investigação científica tradicional e
a possibilidade de se perceber a realidade do ponto de vista de alguém de “dentro”
do estudo de caso. Esta última possibilidade é considerada de valor inestimável
quando produz um retrato acurado do fenômeno do estudo de caso.
Gil (1999, p. 113-114) define observação participante como “[...] a técnica pela
qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interior de mesmo
116
[...]”, podendo ser de forma natural, quando o observador pertence à mesma
comunidade, ou artificial quando o observador se integra ao grupo com o objetivo de
realizar uma investigação e relaciona as seguintes vantagens da observação
participante:
- facilita o rápido acesso a dados sobre situações habituais em que os
membros das comunidades se encontram envolvidos;
- possibilita o acesso a dados que a comunidade ou grupo considera de
domínio privado; e
- possibilita captar palavras de esclarecimento que acompanham o
comportamento dos observados
117
3.4 O conjunto metodológico adotado
A seguir, será evidenciado o posicionamento metodológico adotado neste
trabalho, acompanhado das justificativas que levaram à sua adoção. Serão também
apresentadas as categorias de pesquisa, a formação do Corpus, as técnicas de
coleta de dados, as técnicas de tratamento, interpretação e análise e, finalmente, as
limitações do método, da abordagem e das técnicas de coleta de dados utilizadas.
A opção pela pesquisa de Natureza Aplicada fundamentou-se na intenção do
pesquisador em promover a geração de conhecimentos que possam ser utilizados
na prática, para a solução de um problema específico e explicitamente delineado,
envolvendo verdades e interesses locais. (SILVA e MENEZES, 2001, p.20).
Na primeira parte deste trabalho foi realizada Pesquisa Bibliográfica para a
obtenção de referencial teórico que revelasse o processo de formação do discurso
das organizações, através do resgate histórico das teorias administrativas e da
burocracia como agentes de transformação da realidade social, descrevendo seus
desenvolvimentos, suas bases sociais e suas influências no comportamento do
trabalhador. Foram apresentadas, também, as críticas sobre esse discurso,
caracterizando-o como forma de dominação, de manipulação de conflitos e como
causa do sofrimento no trabalho. Buscou-se, portanto, a explicitação do contexto
histórico-estrutural do desenvolvimento do discurso das organizações.
Para permitir as comparações, entre o discurso e a prática gerencial, foi
realizada a identificação do discurso da empresa sob estudo e a verificação da
prática gerencial dentro de seu ambiente operacional, com a coleta dos dados
realizada através da Observação Participante e Análise Documental. A
118
comparação dos dados possibilitou a identificação do fenômeno concreto gerado em
conseqüência dessas duas situações, interpretadas pelo pesquisador como sendo
antagônicas: a dicotomia entre o discurso e a prática.
Partindo do fenômeno “contradição entre o discurso e a prática” passou-se a
investigar, com a adoção do método Fenomenológico, se e de que forma tal
fenômeno é materializado na percepção dos trabalhadores, qual o impacto desse
fenômeno em sua satisfação para a realização de seu trabalho e em suas
perspectivas de carreira. Não houve, entretanto, a preocupação de se explicar tal
impacto, em função da delimitação do referencial teórico escolhido e da lógica
adotada pelos estudos embasados na fenomenologia.
Como forma de fundamentar o presente trabalho e atingir os objetivos
propostos, procurou-se obter maior familiaridade com o problema e a obtenção de
referencial teórico adequado ao assunto, utilizando a Pesquisa Descritiva, para
apresentar as características do fenômeno observado, de forma a estabelecer
relações entre o fenômeno e os fatores envolvidos no processo de construção da
realidade particular dos sujeitos.
A justificativa para a adoção de uma abordagem de Pesquisa Qualitativa
neste trabalho, pôde ser encontrada e está implícita no próprio problema de
pesquisa, já que o pesquisador foi o instrumento-chave na observação das relações
dinâmicas existentes entre o mundo real e o sujeito, através do vínculo existente
entre o mundo objetivo e a subjetividade do indivíduo. Outras características
consideradas foram (SILVA e MENEZES, 2001, p. 20; HAGUETTE, 1999, p. 63-64):
- a não utilização de métodos e técnicas estatísticas, com os dados
sendo colhidos diretamente no ambiente natural;
119
- a interpretação dos fenômenos observados, com reconhecimento da
relevância do aspecto subjetivo da ação social;
- a percepção de dados psicológicos que eventualmente são reprimidos
ou não facilmente articulados como atitudes, motivos e pressupostos;
- intenção do pesquisador em identificar o significado dos fenômenos
segundo as perspectivas subjetivas dos sujeitos em seu ambiente de
atuação.
As pesquisas qualitativas partem do fenômeno social e diretamente sobre ele
começa a análise. Segundo Triviños (1987, p. 129), quando a pesquisa qualitativa
assume um posicionamento fenomenológico há uma tendência de o pesquisador
analisar os dados indutivamente, ou seja, já que não existem hipóteses a serem
testadas, a abstração do resultado é conseguida com o apoio de uma base teórica
previamente delimitada, com os significados e a interpretação surgindo a partir do
fenômeno visto num contexto específico.
3.4.1 – Categorias de pesquisa e fatores de pesquisa
No referencial teórico foram priorizadas as seguintes categorias de pesquisa:
- A mudança organizacional, como pano de fundo na caracterização dos
conflitos e na formação de paradoxos organizacionais;
120
- A satisfação no trabalho, como suposto objetivo de teorias
administrativas motivacionais focadas no controle do componente
humano da produção;
- A gestão de carreira, como uma possibilidade de valorização e
crescimento pessoal, como mais uma obrigação vinculada ao
trabalhador do mundo atual e, eventualmente, como oportunidade de
obtenção da independência profissional desse mesmo trabalhador.
Por opção do pesquisador não foi utilizado o termo “variável”, substituído pelo
termo “fator” considerando a abordagem de caráter qualitativo da pesquisa, que
pretendeu identificar e qualificar as “variedades de representações” relacionadas às
percepções dos indivíduos pertencentes ao Corpus inicial de pesquisa, já que
aspectos de ordem subjetiva são dificilmente quantificáveis em termos práticos.
(HAGUETTE 1999, p. 63).
Apoiando-se no referencial teórico adotado pelo pesquisador, buscou-se a
identificação de fatores diretamente relacionados com a gestão de carreira, com o
desenvolvimento profissional, com as condições de trabalho e com a satisfação para
com o trabalho.
121
3.4.2 – Delimitação do ambiente e formação do Corpus de pesquisa
O Banco do Brasil S.A.15 é uma empresa de economia mista, com atuação
nacional e internacional. No Brasil, atua em mais de doze mil pontos de
atendimento ao público, empregando mais de 83 mil trabalhadores pelo regime da
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Possui, ainda, inúmeros departamentos
e órgãos destinados ao cumprimento de rotinas internas voltadas à área de
administração geral, tecnologia e logística.
Considerando a amplitude de sua área de atuação (todos os Estados do
Brasil e alguns países ao redor do mundo), o Banco do Brasil S.A. congrega
indivíduos de diferentes raças, credos, religiões e graus de instrução, o que significa
a possibilidade de uma grande variedade de ambientes de trabalho e a formação de
climas organizacionais distintos entre os diferentes Estados, regiões, e cidades.
3.4.2.1 – As agências do Banco do Brasil S.A.
Para a realização desta pesquisa foram escolhidos pelo pesquisador os
ambientes representados por seis agências destinadas ao atendimento ao cliente do
banco, situadas na cidade de Uberlândia (MG).
A escolha foi realizada em decorrência de: 1) a facilidade de acesso ao
ambiente estudado pelo pesquisador, enquanto empregado em uma dessas
15 Um breve histórico da empresa é apresentado no tópico 4
122
agências e residente na cidade de Uberlândia-MG; 2) o longo período de tempo
necessário à realização das observações destinadas à coleta de dados para
subsidiar esta pesquisa; e 3) os custos envolvidos no processo, caso houvesse a
necessidade de deslocamento para outras cidades. (GIL, 1999; YIN, 2001;
VERGARA, 2005).
3.4.2.2 – A formação do Corpus de pesquisa
A formação do Corpus de pesquisa seguiu os conceitos e orientações
descritas por Bauer e Aarts (2002, p. 55-63), tendo sido selecionado inicialmente de
acordo com os seguintes critérios:
- População total de indivíduos (em out./2004): 167 empregados, sendo
46 do nível gerencial e 121 do nível de execução16;
- Grupo constituído de empregados envolvidos diretamente no
atendimento ao cliente: 92 empregados do nível de execução;
- Composição inicial do Corpus de pesquisa, considerando a tipificação
dos elementos exclusivamente pelo tempo de serviço na empresa:
- Doze empregados, escolhidos de forma intencional dentro das
funções operacionais desempenhadas: Dois empregados do
nível de execução por agência,
16 Empregados sem subordinados e/ou funções de gerência
123
- Divisão em dois sub-grupos: um sub-grupo formado com seis
indivíduos com mais de quinze anos de admissão na empresa e
um sub-grupo formado com seis indivíduos com menos de sete
anos de empresa. A separação se justifica pelo inicio do
período de fortes mudanças na gestão de pessoas no ano de
1995 e pela diferenciação e redução de benefícios para os
admitidos na empresa após o ano 1998.
Ao começar a coleta de dados através da aplicação de entrevistas semi-
estruturadas, o pesquisador teve a consciência de que o Corpus inicialmente
previsto poderia ser mantido, ampliado ou reduzido, dependendo das variedades
desconhecidas de representações (ou fatores) que fossem sendo identificadas no
decorrer do trabalho (critério da saturação). (BAUER e AARTS, 2002, p. 58-9).
Desta forma, concluída a análise dos dados coletados através das
entrevistas, verificou-se ter sido o Corpus delimitado suficiente, na percepção do
pesquisador, para a consecução dos objetivos almejados neste trabalho.
3.4.3 – Técnicas de coleta de dados
Seguindo as orientações de Yin (2001, p. 119-23), procurou-se a utilização de
várias fontes de evidência para a efetivação da coleta de dados, de forma a não se
perder uma vantagem inestimável da estratégia de estudo de caso:
124
Figura 5 – Convergência de várias fontes de evidências Fonte: adaptado de Yin (2001, p. 122)
Desta forma, foram utilizadas várias das técnicas de coleta de dados aqui
descritas, passando pela Pesquisa Documental de Fontes Indiretas,
representadas pelas anotações de campo realizadas pelo pesquisador (primária);
pela revisão bibliográfica sobre as categorias de pesquisa; e pela coleta da
documentação e publicações produzidas pela empresa sob estudo (secundárias).
Para a obtenção da Documentação Direta foram utilizadas as técnicas
relacionadas ao estudo de caso único, com a realização da observação participante
e de entrevistas semi-estruturadas, escolhidas pelo pesquisador em virtude de suas
compatibilidades com a linha de estudos delineada pelo referencial teórico, por
estarem condizentes com os objetivos propostos, por proporcionarem maior
flexibilidade na operacionalização dos procedimentos destinados à resposta do
problema apresentado e, principalmente, por apresentarem características que as
coadunam com uma pesquisa ancorada em abordagem essencialmente qualitativa.
(VERGARA, 2005; YIN, 2001; GIL, 1999; HAGUETTE, 1999; TRIVIÑOS, 1987).
Como já registrado anteriormente, a estratégia adotada para a condução do
trabalho foi a do Estudo de Caso Único, seguindo as orientações gerais descritas
por Yin (2001).
Documentos gerados pela empresa
Observação participante
Entrevistas semi-extruturadas
FATOS
125
A Observação Participante foi utilizada no período de 16/02/2004 a
18/04/2005, proporcionando a convivência com os indivíduos envolvidos no
ambiente de trabalho delimitado para esta pesquisa, possibilitando ao pesquisador,
através da anotação sistemática das ocorrências de campo, a coleta de evidências
que o levassem à confirmação da existência do fenômeno “contradição entre o
discurso e a prática”.
As Entrevistas Semi-estruturadas, realizadas entre outubro de 2004 e maio
de 2005, foram utilizadas como meio de coleta de dados referentes aos indivíduos
participantes do Corpus de pesquisa, de acordo com o roteiro previamente
determinado e seguindo as orientações de Lakatos e Marconi (2001, p. 195-201),
Yin (2001, p. 112-3) e Gaskell (2002, p. 64-89).
A seleção das questões para o roteiro levou em conta fundamentalmente
duas categorias: A satisfação para com o trabalho e a gestão de carreiras, sendo
que o roteiro da entrevista foi previamente testado com três empregados de três
diferentes agências.
Como conseqüência da pré-avaliação, foram feitas algumas alterações tanto
na formulação quanto na quantidade de questões apresentas. Algumas questões
foram retiradas do roteiro original por serem redundantes e outras por terem sido
consideradas pelos entrevistados como enviesadas. Após as alterações, as
entrevistas foram novamente realizadas com o grupo inicial de três pessoas e
consideradas apropriadas ao objetivo proposto.
Para a realização das entrevistas evitou-se o local de trabalho, objetivando
propiciar ao entrevistado um ambiente neutro, descontraído e longe de possíveis
pressões, inclusive de tempo, já que várias questões da entrevista exigiram dos
entrevistados períodos de avaliação e reflexão.
126
Foi incluída, no roteiro de entrevista, uma etapa destinada a fornecer
esclarecimentos a respeito dos objetivos da pesquisa e elucidação dos conceitos
referentes aos termos que, eventualmente, suscitassem dúvidas à compreensão das
perguntas, evitando-se eventuais problemas de interpretação.
Para a elaboração do roteiro17 utilizado na entrevista semi-estruturada, além
da parte referente à identificação de dados pessoais (idade, sexo, tempo de trabalho
na empresa etc), foram considerados três grupamentos de fatores:
- Grupo de fatores ligados ao contexto cognitivo: perguntas pré-elaboradas,
com respostas subjetivas, com o intuito de identificar se o entrevistado
efetivamente consegue identificar a existência da contradição entre o
discurso da organização e as práticas gerenciais experimentadas no
ambiente de trabalho e os eventuais significados que são atribuídos a
esse fenômeno;
- Grupo de fatores ligados ao contexto motivacional: perguntas pré-
elaboradas, com respostas subjetivas, com o intuito de identificar a
existência ou a ausência da satisfação na realização do trabalho:
- Grupo de fatores ligados ao contexto profissional: perguntas pré-
elaboradas, com respostas subjetivas, com o intuito de identificar a
existência ou não de um planejamento prévio de carreira, dentro ou fora
da organização.
17 Anexo 04
127
A pedido dos entrevistados, as entrevistas não foram gravadas, sendo as
respostas registradas manualmente pelo pesquisador, de forma a possibilitar a
efetivação do tratamento e análise de dados imediatamente após o seu término.
Foram também anotadas características relacionadas ao comportamento dos
entrevistados durante a entrevista, ou seja, entonação de voz, nervosismo,
hesitação ao responder, demora na reflexão, entusiasmo com o tema, dentre outros
achados relevantes para a análise.
Finalmente, no período de fevereiro de 2004 a abril de 2005, foram também
considerados os depoimentos espontâneos e informais de empregados do banco
que não fizeram parte do Corpus de pesquisa e nem foram submetidos à entrevista,
na maioria das vezes anotados a partir de diálogos estabelecidos em “corredores e
em ambientes destinados ao laser”. Os oito depoimentos registrados pelo
pesquisador foram compilados e posteriormente analisados, na medida de suas
relevâncias para o contexto deste trabalho.
3.4.4 – Técnicas de tratamento de dados
Foram utilizados os recursos proporcionados pela análise de conteúdo,
conforme descrita por Bauer (2002, p. 189), Godoy (1995a, p. 23-25) e as
orientações de Yin (2001, p. 131-187).
128
3.4.5 – Limitações do Método, da abordagem e das técnicas utilizadas
A Fenomenologia como método, por si só, impõe-se como um componente
restritivo às generalizações, embora alguns aspectos observados no resultado deste
trabalho possam ser utilizados como referenciais para o estudo dos fenômenos
apresentados em outras organizações, submetidas a processos de mudanças,
transformações organizacionais e formas de trabalho semelhantes. Via de regra,
tanto o método quanto a abordagem utilizados no presente trabalho, vinculam os
resultados obtidos exclusivamente ao ambiente delimitado para a realização da
pesquisa.
A Pesquisa Qualitativa tem em sua característica fundamental também a sua
principal limitação, ou seja, depende essencialmente da percepção cognitiva do
cientista, em sua visão de mundo, em seus valores “[...] acerca do bem e do mal e
do certo e do errado [...]” (GIL, 1999, p. 22).
Ainda quanto às limitações, as técnicas de coleta de dados utilizadas têm
pontos fracos, conforme descritos por Yin (2001, p. 108):
- Com referência à documentação: pode ter seletividade tendenciosa se
a coleta não estiver completa, relatar visões preconcebidas do autor e
ter o acesso à documentação estratégica deliberadamente negado;
- Com referência às entrevistas: podem ter visão tendenciosa devido a
questões mal elaboradas, respostas tendenciosas, imprecisões devido
à memória fraca do entrevistado e, em decorrência da reflexibilidade,
os entrevistados podem dar ao entrevistador o que ele quer ouvir;
129
- Com referência à observação: consome demasiado tempo e pode
ocasionar perda de foco; considerando estar o ambiente sob
observação, o fenômeno pode ocorrer de forma diferenciada; pode
ocorrer a obtenção de visão tendenciosa devido à manipulação dos
eventos por parte do pesquisador; pode ter resultados pouco confiáveis
se, por decorrência da presença do pesquisador, houver alterações no
comportamento dos observados. Complementando, Haguette (1999,
p. 76) faz referência à impossibilidade da generalização dos resultados,
visto tratar-se de uma “[...] técnica que procura mais os sentidos do que
as aparências das ações humanas” e, Lakatos e Marconi (2001, p.
194), alertam para a grande dificuldade enfrentada pelo observador
participante para manter a objetividade do estudo, pelo fato de exercer
influência no grupo, ser influenciado por antipatias ou simpatias
pessoais e pelo choque do quadro de referência entre observador e
observado.
A seguir, no tópico quatro, é realizada a apresentação da empresa objeto do
estudo de caso, relatando alguns detalhes de história, de sua adaptação aos
períodos de crise e algumas características de sua cultura organizacional, com
alguma ênfase em suas ações em Gestão de Recursos Humanos como estratégia
utilizada pela empresa no processo de mudança organizacional. Também é
apresentado e caracterizado o ambiente delimitado para a pesquisa e identificado o
perfil do Corpus de pesquisa.
130
4 A ORGANIZACÃO AMBIENTE DA PESQUISA
Inicialmente são apresentados, de forma sucinta, alguns episódios da história
do Banco do Brasil, intencionalmente escolhidos e julgados relevantes pelo
pesquisador, considerados os objetivos desta pesquisa. Logo a seguir são
descritos os ambientes específicos utilizados para a pesquisa e apresentado o
Corpus de pesquisa.
4.1 Um pouco da história do Banco do Brasil S.A.
Criado em 12 de outubro de 1808, o Banco do Brasil nasceu para ser um
banco de alcance nacional, com o objetivo de facilitar a circulação de fundos
considerados necessários ao atendimento das despesas do Estado brasileiro, tendo
sido o primeiro banco nos domínios portugueses. Já em 1809 era o quarto
organismo emissor de moeda no mundo, atrás somente de bancos da Suécia, da
Inglaterra e da França. (BANCO DO BRASIL, 2005a).
Ao longo de seus quase dois séculos de história, o Banco se consolidou como
instituição e estabelecimento bancário, sempre na função de principal agente de
desenvolvimento do país, apesar de ter seu percurso por vezes interrompido durante
as crises econômicas e políticas sofridas no período do império.
Em 31 de dezembro de 1964, com a edição da Lei n.º 4.595, foi instituída a
reforma do sistema financeiro brasileiro, com a criação do Banco Central do Brasil e
do Conselho Monetário Nacional, o que não retirou do Banco do Brasil a condição
131
de agente financeiro do Tesouro Nacional e de responsável pela administração da
“Conta Movimento do Governo Federal”, meio pelo qual recebia recursos oficiais
para financiar atividades consideradas prioritárias para o país. (OLIVEIRA, 2001, p.
2-3).
Desde a sua fundação na segunda metade do século XIX o Banco do Brasil
teve sua trajetória marcada por atuações decisivas nos mais importantes períodos
da história brasileira, exercendo as funções de agente financeiro do Governo
Federal do Brasil e consolidando sua posição de banco comercial e de principal
instituição de fomento econômico do país. Finalmente, em 1986 o Banco assumiu a
sua quinta e atual configuração institucional (BANCO DO BRASIL, 1996-) :
- a primeira, quando fundado por D. João VI, teve seu comportamento organizacional dirigido para dar suporte à implantação do processo produtivo no Vice-Reino, embora na prática tenha se dedicado à criação de condições para a instalação da corte portuguesa no Brasil;
- a segunda, ao ser recriado (1851) e gerido pelo Barão de Mauá, para suporte ao empreendimento privado, notadamente como carregador de recursos para o processo desenvolvimentista e já com forte atuação internacional;
- a terceira, a partir da fusão com o Banco Comercial do Rio de Janeiro (1853), ocasião em que, na condição de empresa de economia mista, tinha o papel de atrair recursos para a administração do Império;
- a quarta, iniciada em 1906 com nova configuração jurídica - estabelecendo a União como acionista majoritário - , quando veio a tornar-se a maior instituição financeira da América Latina e o maior banco agrícola do mundo, participando ativamente do desenvolvimento do Estado em todos os ramos da gestão pública e atuando no maciço financiamento ao setor privado;
- a atual, que teve início com a segregação de atividades típicas de Governo (gestão do meio circulante, administração do caixa do Tesouro, política de comércio exterior etc.) e também com o início da atuação em novas áreas de negócio, através da constituição de subsidiárias ou de participação acionária em empresas coligadas. Volta-se para a maior clareza dos resultados obtidos pelo Banco em suas operações, incluídas aquelas realizadas com a União, assim como para a sedimentação da empresa como grande conglomerado financeiro voltado para o varejo.
132
Assim, o Banco do Brasil funcionou como autarquia de crédito até 29 de
janeiro de 1986, perdendo esta condição em 30 de janeiro de 1986, através do voto
n.º 45 do Conselho Monetário Nacional, data em que foi extinta a “Conta Movimento”
que lastreava a custo zero grande parte de suas necessidades financeiras.
Apesar de continuar atuando como agente financeiro do Tesouro Nacional,
como principal executor da política oficial de crédito rural, como responsável pela
compensação de cheques e outros papéis e como gestor executivo da política de
comércio exterior, a partir daquele evento o Banco do Brasil passou a depender
diretamente dos recursos capitados junto ao mercado, fato que desencadeou o
maior processo de reestruturação organizacional sofrido pela empresa em sua
história recente. (BANCO DO BRASIL, 1996-).
Sua condição privilegiada de agente monetário do Governo Federal lhe
conferira, até então, vantagens competitivas que, se por um lado garantiam a
sobrevivência sem a preocupação com os riscos do mercado, por outro a tornaram
uma organização com características semelhantes às tipicamente encontradas na
administração estatal, ou seja, engessada e extremamente burocrática, lenta e de
baixa produtividade,.
Como parte das conseqüências trazidas por sua condição privilegiada, ao
longo dos anos, o Banco desenvolveu uma política de recursos humanos que lhe
conferiu uma imagem de bom empregador, o que possibilitou a seus trabalhadores a
obtenção de estabilidade no emprego, segurança e ascensão profissional e social.
Essa imagem fez com que um emprego no Banco do Brasil fosse algo
extremamente desejável, enquanto projeto de vida. Todos os benefícios oferecidos
facilitavam ou mesmo possibilitavam uma grande adesão por parte dos empregados
ao projeto do banco, de grande empresa, com grandes funções sociais, com
133
trabalhadores que “vestiam a camisa do banco”, e isto era, em última análise, o que
fazia com que os empregados mais antigos tomassem o Banco do Brasil não apenas
como um emprego, mas como uma profissão que demandava uma qualificação
específica, adquirida ao longo dos anos de trabalho. (CARDOSO, 1997, p. 56).
Oliveira (2001, p.80), em depoimentos obtidos a partir das entrevistas
realizadas com executivos do Banco, transcritas em seu trabalho de pesquisa,
tornou possível a identificação da fase vivida pela organização até 29/01/1986,
denominada por Bucholtz (1987) como Fase Normativa:
[...] não existia efetivamente um gerenciamento da Organização do ponto de vista financeiro. Porque o Banco, como autoridade monetária não tinha preocupação com isso e talvez nem fosse necessário. O Banco não precisava gerir fluxo de caixa. Ele tinha a tal famosa Conta de Movimento. (ENTREVISTADO, apud OLIVEIRA, 2001, p. 80).
E com relação ao comportamento dos empregados:
[...] o pessoal do Banco não se dá conta de que esse grau de acomodação é ruim para as pessoas. Para o próprio Banco. Eu não tenho de competir. Que raio de organização é essa? Eu não admitia chamar o Banco de organização. Quando alguém falava, eu dizia: isso é outra coisa, não é organização, é uma autarquia de crédito. (ENTREVISTADO, apud OLIVEIRA, 2001, p. 80)
A partir de 1986, durante a fase de comunicação interna das mudanças que
estavam em curso, as publicações editadas pelo Banco registraram as situações que
identificavam o grau de equilíbrio quase-estacionário (LEWIN, 1965) experimentado
pelo grupo organizacional, evidenciando um profundo torpor comportamental em que
ninguém se manifestava e nem era responsabilizado pelo estado de coisas. (BANCO
DO BRASIL, 1996-).
134
Constatou-se que, no período entre 1986 e 1994, só as forças exógenas à
organização, representadas pela nova regulamentação do sistema financeiro e pela
necessidade de atender às demandas dos acionistas, não foram suficientemente
fortes para que houvesse a ruptura definitiva com a estrutura organizacional anterior,
que relegava a um segundo plano a priorização do mercado e a busca por
produtividade e lucratividade. Juntamente com as forças internas, representadas
pela resistência imposta pela cultura organizacional dominante, o contexto
econômico também foi favorável à manutenção do estado de letargia do Banco, já
que os altos índices da inflação anual (1986/1994) proporcionavam às instituições
financeiras grandes lucros no mercado de intermediação e especulação. Oliveira
(2001, p. 148) apresenta com detalhes os dados relativos ao período.
Além disso, confirmando as premissas apontadas por Dubrin (2003, p. 360), o
tamanho da máquina administrativa a ser movimentada e os problemas que tal
tarefa significava, foram fatores decisivos para que as mudanças pretendidas pelos
gestores não ocorressem satisfatoriamente no período de 1986 a 1994.
A quebra definitiva do status quo, traduzido pela antiga cultura organizacional
e alicerçado em histórica estabilidade nas relações de trabalho, foi consumada 1995
através da aceleração no processo de mudança do modelo de Gestão de Recursos
Humanos.
O novo Plano Diretor de Recursos Humanos (BANCO DO BRASIL, 1996-)
promoveu a mudança estrutural, de um organograma vertical e com rigorosa
disciplina hierárquica, para um design mais horizontal, permitindo que os focos de
resistência pudessem ser identificados e combatidos, adotando mecanismos que
propiciaram gestão e responsabilidade compartilhadas, descentralização dos
poderes nas diversas esferas organizacionais, novos parâmetros organizacionais da
135
amplitude de comando ao posto de trabalho, além de uma redefinição integral das
políticas e práticas de recursos humanos.
Rezende (2001, p.110) descreve as principais metas do Plano Diretor de
Recursos Humanos:
- Desenvolver a cultura organizacional voltado para assegurar a
satisfação do cliente e atender às expectativas dos acionistas;
- Basear a gestão de pessoal nos princípios de qualidade, considerando-
a como responsabilidade intrínseca a todos os níveis de administração;
- Propiciar condições para o desenvolvimento profissional e pessoal dos
empregados visando ao alto desempenho organizacional;
- Implantação de novo instrumento de avaliação do desempenho,
voltado para o resultado e a profissionalização.
Além de adotar uma política de Gestão de Recursos Humanos aparentemente
apoiada no Modelo Instrumental (VASCONCELOS e VASCONCLEOS, 2002, p.71),
outro ponto importante no processo de mudança foi a redução do tamanho da
organização. Além de se traduzir em relevante economia de recursos, o downsizing
foi o instrumento utilizado para abalar e quebrar a resistência oferecida pelos
empregados (SCHIRATO, 2004).
Neste sentido, um programa de demissão voluntária proporcionou a
oportunidade para a saída de um grande número de empregados insatisfeitos e/ou
sem a necessária motivação para enfrentar os termos da nova relação de trabalho:
em 1995 cerca de 13.388 empregados deixaram o Banco, atingidos com o
encerramento de 108 agências no país e 8 no exterior; em 1996 houve a saída de
mais 9.308 empregados e 7.033 estagiários, o fechamento de 76 agências
136
deficitárias e de 34 Centros de Processamento de Serviços e Comunicações.
(OLIVEIRA, 2001, p.173).
Dessa forma, a imposição de uma nova situação ambiental despertou os
indivíduos para a necessidade de uma adaptação obrigatória ao novo “meio
ambiente proposto”, descrita pelo Banco como condição imprescindível para a
existência da organização como um todo, assim como também para a própria
sobrevivência individual. (BANCO DO BRASIL , 1996-).
O rompimento da camada de complacência e da auto-rigorosidade citadas por
Lewin (1965, p. 257), só foi provocado por uma forte e deliberada agitação
emocional:
De repente, as pessoas começaram a vislumbrar que aquela acomodação, aquela zona de conforto – não vejo, não ouço, não ligo – começou a incomodar. A zona de conforto foi quebrada. Talvez, seja esse o maior resultado, o maior produto do PDV18: a quebra da zona de conforto, a substituição do conceito de estabilidade pelo de empregabilidade e a certeza que as pessoas passaram a ter de que, se elas não derem resultado, elas correm risco. (ENTREVISTADO apud OLIVEIRA, 2001, p.107).
Após 1996, o processo de mudança passou finalmente a ser efetivo e a
ocorrer em ritmo acelerado em toda a estrutura da organização. A preocupação do
Banco em comunicar ao público interno sobre esse processo foi refletida no grande
número de publicações produzidas no período de 1996 a 1999, principalmente em
forma de fascículos e mensagens institucionais. (BANCO DO BRASIL, 1996-).
O processo de consolidação das mudanças implementadas vem ocorrendo de
forma satisfatória para a empresa desde 1999, ou seja, as pessoas que fazem parte
do dia-a-dia da organização estão sendo “encorajadas” a contribuir e a participarem
do processo.
18 PDV – Plano de desligamento voluntário, levado a terno pelo Banco do Brasil a partir de jul.1995.
137
A modernização dos pontos de atendimento, a automação de processos e o
aumento de produtividade foram mais intensamente perseguidos e conseguidos a
partir de 1999, tendo como força impulsionadora a forte determinação gerencial
voltada para a eficiência operacional, a otimização dos mercados já atendidos pela
organização e pelo resultado econômico.
Também como forma de atender às demandas do crescimento de sua base
de clientes e de pontos de atendimento, a partir do ano de 1999, o Banco promoveu
a realização de vários concursos públicos para a seleção de pessoal, formando uma
significativa reserva técnica de trabalhadores isentos da contaminação do modelo
organizacional anterior, voltando a concentrar esforços na contenção das
resistências produzidas por um quadro de pessoal arraigado em valores de uma
cultura organizacional não mais aceita pela maioria dos stakeholders, (BANCO DO
BRASIL, 2005a).
A partir de 2002, foram adotadas ações destinadas ao restabelecimento do
clima interno, desgastado pelo intenso “bombardeio emocional” da última década,
tais como a alteração e unificação das políticas de Gestão de Recursos Humanos e
a reformulação do discurso do Banco.
Como parte dessas ações, em 2004, a declaração da missão Institucional do
Banco do Brasil S.A passou para
Ser a solução em serviços e intermediação financeira, atender às expectativas de clientes e acionistas, fortalecer o compromisso entre funcionários e a empresa e ser útil à sociedade. (BANCO DO BRASIL, 2005a).
substituindo a adotada na primeira metade da década de 90, que era “Ser o melhor
banco do Brasil, assegurar a satisfação dos clientes, atender às expectativas dos
acionistas e contribuir para o desenvolvimento do país”.
138
No cumprimento de sua missão no país, o Banco do Brasil atua em mais de
12 mil pontos de atendimento ao público, através de 3,2 mil agências e 9,3 mil
postos de atendimento, empregando mais de 83 mil trabalhadores pelo regime da
Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Possui, ainda, inúmeros departamentos
e órgãos destinados ao cumprimento de rotinas internas voltadas à área de
administração geral, tecnologia e logística. Maiores detalhes são apresentados no
anexo 1.
Considerando a amplitude de sua área de atuação (todos os Estados do
Brasil e alguns países ao redor do mundo), o Banco do Brasil S.A. congrega
indivíduos de diferentes raças, credos, religiões e graus de instrução, o que significa
a possibilidade de uma grande variedade de ambientes de trabalho e a formação de
climas organizacionais distintos entre os diferentes Estados, regiões, e cidades.
Nesta pesquisa, a adoção da abordagem qualitativa, utilizada em conjunto
com a técnica da observação participante e o estudo de caso, implica
necessariamente na perfeita delimitação do ambiente a ser estudado e na
caracterização do perfil de um Corpus de Pesquisa. (BAUER e AARTS, 2002; GIL,
1999; HAGUETTE, 1999; TRIVIÑOS, 1987).
Desta forma, para atender parte dos requisitos necessários à validação deste
trabalho, foram escolhidos pelo pesquisador os ambientes representados por seis
agências destinadas ao atendimento ao cliente do banco, situadas na cidade de
Uberlândia (MG). No próximo sub-tópico são realizadas:
- a descrição do ambiente delimitado para a pesquisa, com as
características do ambiente de trabalho representado pelas agências
do Banco do Brasil em Uberlândia (MG), tais como leiaute, mobiliários,
iluminação, climatização, sistemas utilizados etc; e
139
- a caracterização do perfil administrativo dos principais gestores das
agências e a descrição sucinta das tarefas realizadas por aqueles
indivíduos que compõem o Corpus de pesquisa.
140
4.2 O ambiente de pesquisa
A grande maioria das agências do Banco do Brasil tem o leiaute elaborado
por departamento especializado do próprio Banco, sendo padronizadas na quase
totalidade dos itens relacionados à disposição dos ambientes, à iluminação, à
climatização, ao mobiliário e aos equipamentos de informática utilizados no
atendimento ao cliente. (BANCO DO BRASIL, 2005b).
Em Uberlândia (MG) as seis agências que formam o ambiente delimitado por
esta pesquisa são climatizadas, dotadas de mobiliários ergonômicos, salas bem
iluminadas e, na ausência dos clientes, apresentam nível de ruído bastante
reduzido. Tais informações são corroboradas por técnicos especializados do próprio
Banco e endossadas por pesquisa realizada junto ao empregados das agências
(BANCO DO BRASIL, 2005c).
As agências sob foco detêm cerca de 70 mil contas correntes e diariamente
atendem mais de 5 mil pessoas, efetuando mais de 30 mil transações bancárias por
intermédio de seus empregados, de suas salas de auto-atendimento e dos pontos
de auto-atendimento externos espalhados por diversos pontos na cidade.
Individualmente, uma agência pode atender a até mil clientes em um único dia,
sendo quarenta porcento deste total recepcionado pelos empregados disponíveis
para o atendimento personalizado.
Os prédios das agências são divididos em três áreas distintas, sendo duas
destinadas ao atendimento ao cliente e ao público em geral e uma destinada à
realização de serviços internos e com acesso restrito aos empregados.
141
Com referência às duas áreas destinadas aos clientes, constata-se que
utilizam ambientes totalmente separados: uma é utilizada como sala de auto-
atendimento, com a alocação de grande quantidade de equipamentos específicos; a
outra é reservada ao relacionamento direto e personalizado, composta por saguão
de espera e por plataformas19 onde são dispostos os mobiliários e os terminais de
computador utilizados pelos empregados na execução de suas tarefas diárias.
Antes e depois do horário de atendimento ao público, ou seja, antes da
entrada e depois da saída dos clientes, o ambientes de trabalho no saguão de
atendimento personalizado é agradável e tranqüilo, adequado ao desenvolvimento
de atividades que exijam concentração e reflexão, para a leitura, para a
comunicação entre colegas e para as reuniões de trabalho.
Em Uberlândia (MG) o horário de expediente externo dos bancos vai das
10:00 às 15:00 horas, perfazendo um total diário de cinco horas destinadas ao
atendimento ao público, de segunda a sexta-feira.
Com o início do horário do expediente externo, o ambiente de trabalho
assume condição completamente adversa da inicialmente relatada, com o nível de
ruído se elevando devido ao burburinho das pessoas e aos telefones que não param
de tocar, com as grandes filas que só terminam por volta das 16:00 horas, com
clientes irritados devido à demora no atendimento, com a pressão do horário pré-
determinado para o processamento dos papéis, com a dificuldade de concentração e
a possibilidade de errar durante a execução de transações financeiras e com a
grande quantidade de informações impostadas nos sistemas informatizados.
19 Dentro do saguão de espera, são os espaços delimitados através de pequena elevação em relação ao piso principal ou ainda com a colocação de pequenas divisórias, e onde ficam posicionadas as mesas e os terminais de computador utilizados pelos empregados responsáveis pelas tarefas de atendimento direto e personalizado ao cliente. Dentro do saguão de espera pode ser delimitada mais de uma plataforma, diferenciadas por tipo de clientes: pessoa jurídica – grande, média ou pequena empresa; pessoa física – baixa, média ou alta renda; público em geral – não correntistas.
142
A jornada de trabalho dos empregados do Banco (exceto cargos
comissionados20) é fixada em seis horas e quinze minutos, com o intervalo
regulamentar de quinze minutos previsto em lei já incluído neste total. O controle de
entrada e saída é realizado através do ponto eletrônico, integrado ao Sistema de
Informações Banco do Brasil – SISBB disponibilizado através dos terminais de
computador utilizados para o trabalho.
O SISBB (BANCO DO BRASIL, 2005b) é responsável pela integração dos
sistemas corporativos do Banco, possibilitando que todo o trabalho de atendimento
ao cliente seja realizado através de um terminal de computador. Todas as
informações de que o empregado necessita durante a realização de suas tarefas
estão disponíveis através desse sistema: instruções, rotinas de serviços, cadastro
dos clientes, informações das contas correntes e acesso a todos os tipos de
transações bancárias.
As rotinas e instruções de serviços são acessadas através do aplicativo Livro
de Instruções Circulares – LIC, que é atualizado várias vezes ao dia pelos diversos
departamentos do Banco, gerando um incessante fluxo de informações destinadas a
implementar ou atualizar as normas e os procedimentos operacionais.
O LIC e formado por dezenas de milhares de páginas eletrônicas com
informações, abrangendo todos os sistemas que fazem parte do ambiente
corporativo do Banco, sendo poucos os casos em que uma determinada tarefa ou
rotina não esteja prevista e descrita com detalhes na coleção de instruções
produzidas para e pelo Banco do Brasil (2005b).
20 Nota do autor: Cargos comissionados são cargos de confiança, com responsabilidades e remunerações diferenciadas entre si, assim como em relação ao empregado comum. O cargo comissionado não implica necessariamente em liderança de equipes, embora isso ocorra na grande maioria das vezes. A jornada de trabalho do comissionado é de 8 horas.
143
Também é através do SISBB que o empregado tem acesso ao sistema ARH -
Administração de Recursos Humanos, onde são registrados os dados referentes à
sua vida profissional dentro da empresa, impostando e recebendo informações dos
aplicativos21 TAO – Talentos e Oportunidades, GDP – Gestão do Desempenho
Profissional, e acessando o Portal Profissionalização da UNIBB – Universidade
Corporativa.
Com referência ao ponto eletrônico, foi implementado pela empresa para
controlar e restringir a jornada de trabalho, através da impostação dos horários de
entrada e saída do empregado, de forma a não permitir a entrada e/ou a saída do
trabalhador fora dos horários pré-estabelecidos por seus superiores hierárquicos,
evitando a dilação dos horários para além das seis horas previstas para os
bancários.
Considerando que, a quase totalidade das tarefas realizadas pelos
empregados da plataforma de atendimento é operacionalizada através do SISBB, e
que, o acesso ao SISBB só é possível durante o período pré-determinado no ponto
eletrônico, não há como se executar o atendimento ao cliente após o horário previsto
para o trabalhador. Em outras palavras, no horário estabelecido para a saída, o
sistema realiza o encerramento da jornada de trabalho de forma automática, mesmo
sem o comando do empregado, provocando instantaneamente o bloqueio de todos
os acessos os aplicativos baseados no SISBB.
Por sua vez, as salas de auto-atendimento não são afetadas pelo horário de
expediente externo determinado para os bancos, funcionando ininterruptamente das
06:00 às 22:00 horas em todos os dias do ano. Apesar do dilatado horário de
funcionamento, a maior movimentação é observada entre 09:00 e 16:00 horas dos
21 Os aplicativos TAO e GDP são mais bem explicados no tópico 5
144
dias úteis, com as salas de algumas agências registrando fluxo acima de 1,5 mil
transações por hora em dias de “pico bancário”, trazendo como conseqüência as
grandes filas, o elevado nível de ruídos e a irritação dos clientes.
Nas salas de auto-atendimento não há o atendimento personalizado ao
cliente através de terminas SISBB. Também não há cadeiras ou outro tipo de
mobiliário, com os empregados responsáveis pela sala executando em pé as tarefas
relacionadas à organização de filas, ao fornecimento de informações e ao auxílio na
utilização dos equipamentos: terminais de extratos, saques, pagamentos, depósitos,
emissão de cheques etc.
Os empregados das salas de auto-atendimento têm acesso aos aplicativos do
SISBB, apesar de não o utilizarem em suas tarefas de rotina. Da mesma forma que
os demais empregados, também estão sujeitos ao ponto eletrônico, que delimita os
períodos em que é possível o acesso aos sistemas do Banco, através do registro de
seus horários de entrada e saída.
Os empregados que trabalham nas salas de auto-atendimento, assim como
os que trabalham nas plataformas de atendimento personalizado ao cliente, são os
responsáveis diretos pela execução da grande maioria das tarefas de
relacionamento com os clientes, constituindo-se, dessa forma, na maior interface
que as agências têm com o ambiente externo ao Banco.
Em decorrência disso, tais trabalhadores sofrem pressões de lados
completamente opostos: dos clientes que, na eventualidade de não terem suas
expectativas atendidas, os “responsabilizam” pela qualidade do serviço recebido e
pelo tempo “perdido” nas filas de espera; e de seus superiores hierárquicos, que
buscam produtividade, resultados na vendas de produtos bancários e atingimento
das metas econômicas e financeiras das agências;
145
A administração de uma agência é formada por um Gerente Geral e um
Gerente Administrativo que, para a definição das estratégias a serem adotadas e
seguidas pela agência, eventualmente podem recorrer a um colegiado interno
composto também por alguns dos Gerentes Operacionais.
Todos os administradores possuem curso superior e a maior parte fez um ou
mais de um curso de pós-graduação, focados em gestão de negócios, finanças,
economia, agronegócio e marketing.
Em uma primeira etapa, são pré-selecionados para os cargos através do
aplicativo TAO – Sistema de Talentos e Oportunidades e, posteriormente,
submetidos a um processo de entrevistas realizadas por executivos do Banco e
profissionais especializados da área de gestão de pessoas, que escolhem entre os
pré-selecionados aqueles que mais se aproximarem do perfil desejado e estipulado
pelos departamentos responsáveis pelas estratégias de negócios da empresa
(BANCO DO BRASIL, 2005b; 2005c).
É perfeitamente possível identificar que o posicionamento dos departamentos
ligados à estratégias de negócios do Banco é voltado para o mercado e tem ênfase
“comercial” .
[...] ser o melhor banco para se trabalhar no País; ser um banco competitivo e exercer papel de liderança nos mercados Varejo, Atacado e Governo; ser o banco líder no mercado de crédito, no financiamento do comércio exterior, no agronegócio e no mercado brasileiro de capitais; ter suas ações do Banco com participação destacada em bolsas de valores [...]. (BANCO DO BRASIL, 2004).
Como parte da política de recursos humanos e da estratégia administrativa
seguida pelo Banco do Brasil (2005b), os administradores são transferidos entre as
agências no país em intervalos que vão de dois a quatro anos. Dessa forma, além
146
das mudanças de ordem operacional, os postos efetivos também experimentam, em
períodos regulares, as transformações impostas pelo estilo individual de administrar
de cada um dos novos gestores das agências.
Na prática, tem-se que o administrador de uma agência é essencialmente
orientado para o resultado financeiro e econômico, já que durante a última década a
formação desses administradores foi marcada por uma filosofia que promoveu o
aparecimento de “homens de negócios” voltados para o mercado. (OLIVEIRA, 2001,
p. 95).
Os objetivos são traçados de acordo com as metas de retorno sobre o patrimônio líquido que o Banco pretende atingir no exercício. A orientação geral parte da direção em Brasília e, a partir daí, cada agência tem definido seu quinhão na tarefa. (ANABB, 2005, p. 9)
Outra característica observada no administrador é a focalização do curto e
médio prazo, pois se preocupa com os resultados da agência somente durante o
período em que será seu principal gestor. Raramente o Gerente Geral será
responsabilizado pelas conseqüências negativas que seus atos de gestão possam
causar a clientes e empregados após a sua saída da agência, desde que tais atos
não envolvam imputação de prejuízos financeiros ao Banco em decorrência de
improbidade ou fraude.
Com posicionamento característico do Modelo Instrumental (VASCONCELOS
E VASCONCELOS, 2002, p. 71), priorizando o cumprimento de metas de vendas de
produtos e serviços, a abertura de novas contas, a maior rentabilidade por cliente, a
maior quantidade de clientes por empregado e a redução de despesas e custos, ao
administrador pouco importa os meios com os quais tentará alcançar seus objetivos
e raramente pensa nos problemas causados às pessoas envolvidas no processo,
147
principalmente no que diz respeito aos problemas relacionados às necessidades dos
empregados diante das rotinas de trabalho.
E é também para esse ambiente específico que o discurso do Banco do Brasil
é apresentado em sua forma institucional, atingindo indistintamente a empregados,
colaboradores, fornecedores, clientes e acionistas.
Para esta pesquisa, entretanto, interessa estudar se o discurso do Banco é
materializado através de ações práticas dentro do ambiente delimitado, bem como
se as eventuais contradições entre discurso e prática são percebidas pelo Corpus de
pesquisa identificado a seguir.
148
4.3 O Corpus de pesquisa
Partindo de 120 mil empregados no início da década de 90, passando pelo
número de 70 mil no ano de 1.999, o Banco do Brasil chegou ao final 2004 com
aproximadamente 83 mil profissionais. Ainda segundo os números apresentados
por Baptista (2004, p. 17), as mudanças promovidas pela empresa em seu
posicionamento estratégico, especialmente nos anos 90, trouxeram mais do que
uma redução de quantidade, alterando também o perfil do empregado do Banco.
O perfil geral do empregado do Banco do Brasil é o de um profissional do
sexo masculino, entre 32 e 47 anos de idade, curso superior, escriturário sem
funções administrativas e que trabalha em agências da região sudeste. A Tabela 1
– Perfil do Profissional do Banco do Brasil traz os números registrados em set./2004:
TABELA 1 – Perfil do Profissional do Banco do Brasil
CARACTERÍSTICAS ESPECIFICIDADE N.º DE EMPREGADOS %
Por sexo Homens Mulheres
53.596 28.859
65,0 35,0
Por formação
Fundamental Médio Superior em andamento Superior completo Pós-graduação
2.751 25.955 9.028
36.694 8.027
3,4 31,5 10,9 44,5 9,7
Por tempo de Banco
Até 5 anos 6 a 10 anos 11 a 20 anos acima de 20 anos
30.977 1.592
19.668 30.218
37,6 2,0 23,9 36,5
Por faixa etária
16 a 31 anos 32 a 47 anos 48 a 63 anos acima de 63 anos
21.459 45.253 15.726
17
26,0 54,9 19,1
-
Por cargo Executivo e Diretivo Gerencial Operacional Escriturários
8.245 24.736 49.473
10,0 30,0 60,0
Fonte: Baptista (2004, p.19); Banco do Brasil (1996-)
149
Para a aplicação do questionário incluindo junto ao roteiro das entrevistas
semi-estruturadas, o Corpus de pesquisa foi intencionalmente selecionado dentro do
universo de empregados pertencentes ao ambiente delimitado para este trabalho:
- População total de empregados (em out./2004): 167 empregados,
sendo 12 do nível diretivo, 34 do nível gerencial operacional e 121
postos efetivos22;
- Grupo constituído de empregados envolvidos diretamente no
atendimento ao cliente: 92 postos efetivos;
- Composição final do Corpus de pesquisa, considerando
exclusivamente a tipificação dos elementos pela função exercida e
pelo tempo de serviço na empresa:
- Doze empregados: escolhidos pelo tipo de funções desempenhadas: Dois postos efetivos por agência,
- Divisão em dois sub-grupos: um formado com seis indivíduos com mais de quinze anos de admissão na empresa e o outro com seis indivíduos com até sete anos de empresa. A separação se justifica pelo início do período de fortes mudanças na gestão de pessoas no ano de 1995 e pela diferenciação e redução de benefícios para os admitidos na empresa após o ano 1998.
- Não houve a diferenciação intencional por ambientes de atendimento onde os empregados executavam suas tarefas.
O perfil individual de cada elemento que compõe o Corpus de pesquisa foi
detalhado no anexo 5, devendo ser enfatizada a não realização de qualquer
tratamento estatístico destinado a validar ou inter-relacionar as diversas informações
22 O “posto efetivo”, nível básico ou ainda escriturário é a denominação dada ao empregado que não ocupa cargo de confiança (não tem comissão), exercendo apenas a função básica de execução dentro do plano de cargos e carreiras do Banco.
150
obtidas. Na Tabela 2 – Perfil do Corpus de pesquisa é apresentado o resumo das
características dos empregados entrevistados:
TABELA 2 – Perfil do Corpus de pesquisa
CARACTERÍSTICAS ESPECIFICIDADE N.º DE EMPREGADOS %
Por sexo Homens Mulheres
7 5
65,0 35,0
Por formação
Médio Superior incompleto Superior em andamento Superior completo
3 2 4 3
25,0 16,7 33,3 25,0
Por tempo de Banco de 5 a 7 anos acima de 15 anos
6 6
50,0 50,0
Por faixa etária 23 a 32 anos 32 a 38 anos 39 a 45 anos
5 4 3
41,7 33,3 25,0
Por renda dos pais à época da posse no BB
Acima de R$ 5.000 Entre R$ 2.500 e 5.000 Entre R$ 1.000 e 2.500 Não soube dizer
1 4 6 1
8,3 33,4 50,0 8,3
Por estado civil Casados Solteiros
7 5
58,3 41,7
Por local de trabalho Plataforma Auto-atendimento
9 3
75,0 25,0
Por local de posse Em Uberlândia Em outro local
2 10
16,7 83,3
Por quantidade de agências onde atuou
Em 1ou 2 agências Em 5 agências Em 6 agências
7 4 1
58,3 33,4 8,3
Por exercício de cargo comissionado
Já foi comissionado Nunca foi comissionado
5 7
41,7 58,3
Por ocupação anterior ao Banco do Brasil
Trabalhava antes do BB O BB é o 1º emprego
4 8
66,6 33,4
Fonte: Compilado das respostas contidas no roteiro de entrevistas – anexo 4.
Conhecidos o ambiente e o Corpus de pesquisa, necessária e oportuna se faz
agora a apresentação do conteúdo do discurso formal do Banco do Brasil,
especificamente aquele que interessa aos objetivos deste trabalho. O próximo
tópico trata o assunto.
151
5 RESULTADO E ANÁLISE DA PESQUISA
Quando a gente pensa que sabe todas as respostas vem a vida e muda todas as perguntas.
Emily Paul
Retornando ao problema de pesquisa, neste tópico são apresentadas
algumas das partes julgadas relevantes no discurso da empresa Banco do Brasil,
intercaladas com os dados obtidos através da observação participante e das
entrevistas semi-estruturadas realizadas junto ao Corpus de pesquisa e, ao final, o a
síntese do resultado deste trabalho.
5.1 Apresentação preliminar do relatório
Esta pesquisa teve como objeto o estudo da realidade traduzida pelo
ambiente de trabalho em seis agências bancárias de atendimento ao cliente do
Banco do Brasil, localizadas na cidade de Uberlândia (MG), e, como objetivo geral,
conhecer de que forma as possíveis contradições entre o discurso organizacional e a
prática gerencial afetam o trabalhador, em sua satisfação para com a realização do
trabalho e na sua gestão de carreira profissional.
Os dados obtidos e suas respectivas análises foram apresentados em sub-
tópicos, observados os limites estabelecidos pelo referencial teórico em suas
respectivas categorias de pesquisa, conforme enumerados abaixo:
152
5.2 O contexto que marcou a identificação do problema de pesquisa:
Através do histórico profissional do pesquisador é realizada a
explicitação dos contextos que influenciaram diretamente a sua
percepção, o que permitiu e facilitou a idealização e a realização
desta pesquisa;
5.3 O discurso, a prática, a percepção e a conseqüência: Com a
utilização dos documentos produzidos e divulgados pela
empresa, foi realizada a identificação de seu discurso formal,
enfatizados os aspectos ligados à gestão de recursos humanos;
com a utilização da técnica da observação participante, dentro do
ambiente previamente delimitado, foi identificada a prática
operacional que, confrontada com as informações referentes ao
discurso formal, possibilitou a confirmação da existência de
contradições entre eles; com a utilização dos dados fornecidos
através de entrevistas semi-estruturadas, foram identificadas as
percepções materializadas pelos empregados diante das
contradições entre o discurso e a prática, bem como as
conseqüências sobre sua satisfação para com o trabalho e sobre
a gestão de sua carreira profissional; e
5.4 O resultado e análise final: Com a síntese e a interseção das
análises realizadas, foi oferecida resposta ao problema de
pesquisa.
153
Desta maneira, buscou-se:
- Identificar o discurso da organização e a prática gerencial efetiva no
local de trabalho;
- Comparar o discurso da organização com a prática gerencial;
- Identificar as percepções materializadas pelos empregados a
respeito das contradições entre o discurso e a prática;
- Identificar a existência ou não do paradoxo organizacional
provocado pelas eventuais contradições entre o discurso e a
prática; e
- Identificar as eventuais conseqüências para o trabalhador, em sua
satisfação para com o trabalho e em sua gestão de carreira.
154
5.2 O contexto que marcou a identificação do problema de pesquisa
A pesquisa envolveu dois períodos distintos, conforme descrito nos
parágrafos seguintes, perfazendo um total de vinte anos e três meses de
convivência no ambiente administrativo e operacional da empresa onde foi realizado
este trabalho.
Em um primeiro momento, sem a intenção de consolidar qualquer tipo de
trabalho científico em ciências sociais, o pesquisador trabalhou como empregado do
Banco do Brasil S.A. durante o período compreendido entre novembro de 1979 e
dezembro de 1998, passando por todos os níveis da Carreira Administrativa daquela
empresa e ocupando os mais variados cargos de gerência. Ao final de 1998 pediu
desligamento da empresa, enquanto atuava como administrador em um se seus
Centros de Processamento de Serviços e Comunicações - CESEC.
Durante os últimos doze anos de sua carreira naquela empresa (1986/1998),
teve a oportunidade de testemunhar as profundas mudanças organizacionais
implementadas pela direção do banco na estratégia de negócios e na área de
gestão de pessoas, bem como o correspondente impacto que tais transformações
causaram ao “estado de espírito” dos empregados23.
Vivenciou, in loco, a pouca importância dada por alguns administradores às
dificuldades dos indivíduos frente às necessidades impostas pelo novo modelo
organizacional, implantado gradualmente pela empresa a partir de 1986, dificuldades
estas relacionadas à adaptação dos trabalhadores aos padrões de produtividade
que passaram a ser exigidos, à cobrança velada de dedicação à empresa em tempo
23 As mudanças e os impactos aqui mencionados foram descritos no tópico 4.
155
integral, ao congelamento de salários, ao desenvolvimento profissional, às pressões
dos acionistas e da sociedade por resultados econômicos positivos etc.
Ao longo do tempo, o pesquisador foi observador atento dos problemas e
questões relacionados à performance profissional de razoável parcela dos indivíduos
que pertenciam ao seu grupo de trabalho e, como parte integrante daquela
comunidade, especificamente no período de 1986 a 1998, experimentou as
conseqüências da situação de insegurança que passou a dominar uma parcela dos
empregados do Banco do Brasil, confirmadas em pesquisas realizadas por Cardoso
(1997), Oliveira (2001), Nahas (2004), entre outras.
Em fevereiro de 2004, decorridos cinco anos de seu primeiro desligamento da
empresa e após aprovação em novo concurso público, o pesquisador voltou aos
quadros do Banco do Brasil, desta vez imbuído do propósito de investigar com rigor
científico o outro lado da organização, ou seja, as pessoas e suas percepções do
ambiente em que trabalham.
Naquele segundo momento o pesquisador foi empregado do banco por mais
quatorze meses (fev./2004 a abr./2005), o tempo julgado suficiente para que
identificasse, através de metodologias e técnicas previamente definidas, os efeitos
causados ao trabalhador pela contradição entre o discurso da empresa e a prática
gerencial levada a termo no ambiente de trabalho representado por seis agências
bancárias, situadas na cidade de Uberlândia (MG) e dedicadas ao atendimento dos
clientes do banco.
A importância do longo período de convivência experimentado pelo
pesquisador demonstrou ser de grande valia para o planejamento, delimitação,
execução e conclusão desta pesquisa, confirmando as afirmações de Triviños (1987,
p. 93) de que:
156
A graduação dá um suporte substancial que permite a movimentação do pesquisador com certo grau de segurança no manejo de algumas idéias básicas. A prática cotidiana e as vivências dos problemas no desempenho profissional diário ajudam, de forma importantíssima, a alcançar a clareza necessária ao investigador na delimitação e resolução do problema. [...] A definição do problema de pesquisa, às vezes, torna-se árdua, especialmente quando as pessoas envolvidas no desejo de pesquisar têm pouca experiência, invadem terrenos nos quais têm escassas informações ou sua concepção do mundo e suas posições teóricas não estão conscientemente delineadas ou apenas existem em forma inconsciente.
Esclarecidos os aspectos que determinaram a idealização e a realização
desta pesquisa, a seguir são apresentados os resultados e suas respectivas
análises, dentro das categorias previamente estabelecidas: Mudança
Organizacional, Satisfação para com o Trabalho e Gestão de Carreiras.
157
5.3 O discurso, a prática, a percepção e a conseqüência
5.3.1 Mudança Organizacional
Sendo a atividade bancária caracterizada pela prestação de serviços, em um
cenário onde a busca por qualidade e a rápida evolução da tecnologia são
denominadores comuns à maioria das empresas do setor financeiro, a organização
ambiente desta pesquisa entende que:
[...] a empresa necessita dispor de elementos internos que monitorem as mudanças e ajam de forma adequada [...] as pessoas são os “elementos” que uma organização dispõe para tal tarefa. São elas que têm a incumbência de perceber as mudanças que ocorrem no ambiente, interpretá-las e promover os ajustes internos necessários. Ajustes esses, tanto em sua estrutura quanto em suas metas, necessários para garantir a continuidade da organização. São os “meios” que a organização dispõe para atingir suas metas. (aspas no original). (BANCO DO BRASIL, 2005d).
Nessa lógica, o Banco do Brasil (2004) definiu seus objetivos estratégicos
para:
- Criar valor para os acionistas, através do retorno sobre o
patrimônio líquido, do pagamento de juros sob capital próprio e da distribuição de lucros;
- Ampliar a participação no mercado de empréstimos e financiamentos, através de linhas de crédito acessíveis a todas as faixas da população;
- Atuar em Políticas Públicas, com prévia alocação de recursos e adequada remuneração, atuando como o principal financiador da agricultura no país;
- Ampliar a base de clientes, fortalecendo o relacionamento e garantindo qualidade de serviços, tanto aos novos quanto aos 22,2 milhões de correntistas já existentes ao final de 2004;
- Disponibilizar serviços com tecnologia avançada e em canais complementares, tendo como premissas comodidade, rapidez e
158
segurança, através de sua rede de terminais de auto-atendimento e do reforço de outros canais de tecnologia avançada; e
- Fortalecer a sua atuação como empresa socialmente responsável, através do processo de gestão de pessoas, com investimento em treinamento e capacitação, e no relacionamento com a Comunidade, por meio da estratégia de Desenvolvimento Regional Sustentável -DRS.
Como posicionamento institucional pretendido, o Banco do Brasil (2004)
elenca três elementos básicos:
- Marca: Identidade com o cliente; - Empresa: Banco completo, especializado em segmentos de
mercado; e - Público interno: Compromisso com a ética, o diálogo, a formação e
a valorização do funcionário;
Os direcionadores do comportamento organizacional, adotados pelo Banco do
Brasil (2004) são:
- Atuar com ética e estabelecer excelência em competência profissional e desempenho dos funcionários; e
- Implementar práticas de gestão de pessoas que assegurem qualidade de vida no trabalho e a satisfação dos funcionários.
O Banco do Brasil (2004), dando continuidade ao processo de mudança
organizacional iniciado em 1986, efetivou no ano de 2004 diversos ajustes em sua
estratégia corporativa e na orientação geral de negócios, o que trouxe, segundo o
próprio Banco, um refinamento de sua missão institucional, que passou a reconhecer
o compromisso com o desenvolvimento do país:
Para cumpri-la, o BB estabeleceu princípios que expressam valores compreendidos, aceitos e aplicados na Organização e na vida profissional de seus colaboradores. São eles:
- Compromisso com o desenvolvimento das comunidades e do País;
- Ética e transparência;
159
- Responsabilidade sócio-ambiental e respeito à diversidade; - Inovação e melhoria contínua de produtos, serviços e processos; - Pró-atividade e prudência no gerenciamento do risco, da
rentabilidade, da liquidez e da segurança; - Excelência e especialização no relacionamento com o cliente; - Estímulo ao cooperativismo e ao associativismo; - Tradição da marca BB como diferencial competitivo; - Gestão participativa, decisão colegiada e trabalho em equipe; - Valorização do trabalho eficiente e inovador, incentivo ao
autodesenvolvimento dos funcionários e ascensão funcional baseada no mérito.
A direção estratégica também foi reformulada, indicando o que Banco deseja:
- Ser um banco competitivo e exercer papel de liderança nos mercados Varejo, Atacado e Governo;
- Ser o banco líder no mercado de crédito, no financiamento do comércio exterior, no agronegócio e no mercado brasileiro de capitais;
- Ter suas ações do Banco com participação destacada em bolsas de valores;
- Ser o melhor banco para se trabalhar no País; - Atuar como principal:
o Banco de empresas brasileiras no País e no exterior; o Agente em crédito para investimento; o Banco oficial de crédito do Governo Federal e agente
captador e repassador de recursos dos Governos Federal, Estadual e Municipal.
- Ser o banco referência em: o Responsabilidade sócio-ambiental; o Financiamento do desenvolvimento sustentável do País; o Gestão e integração de riscos; o Controle e compliance; o Tecnologia, logística e segurança bancária; o Processo de análise, condução e cobrança do crédito; o Atendimento ao cliente; o Gestão da força de vendas.
Para isso, foi levantado o que é preciso ter:
- Rentabilidade compatível com padrões de mercado e desempenho auto-sustentável;
- Capacidade de desenvolver instrumentos financeiros inovadores e adequados ao estágio de desenvolvimento do País;
- Capacidade de antecipar ou rapidamente responder aos desafios impostos pela concorrência;
- Negócios remunerados em função dos riscos envolvidos; - Produtos e serviços com atributos valorizados pelos clientes; - Soluções integradas, com disponibilidade, conveniência e
segurança nos canais; - Relacionamentos duradouros com os clientes; - Processos racionalizados e automatizados; - Competências organizacionais que diferenciem a Empresa da
concorrência e que sejam reconhecidas pelos clientes como geradoras de benefícios únicos;
160
- Padrões de Governança Corporativa referenciais para o mercado;
- Funcionários especializados, capacitados e motivados.
Dentro da área de gestão de recursos humanos, o Banco formulou um
discurso direcionado especificamente para os seus administradores, aos quais foi
delegada a responsabilidade para a gestão da mudança organizacional junto aos
seus subordinados.
De maneira esquemática, a gestão da mudança é compreendida pelo Banco
do Brasil (2005d) como um sistema interdependente de fatores relacionados aos
seus empregados, conforme demonstrado na Figura 6 – Gestão das mudanças:
Figura 6 – Gestão das mudanças Fonte: Banco do Brasil (2005d)
Dessa forma, as orientações traçadas pelo Banco do Brasil (2005d), tendo
como público alvo os líderes e administradores, remetem a um ambiente de rápidas
e constantes transformações, evidenciando a necessidade de uma constante
preparação para lidar com a mudança, capacitando-se para adaptar e se relacionar
com elas. Ainda segundo o Banco, aos administradores é necessária especialmente
a capacidade de:
161
- Saber observar o contexto: perceber as mudanças externas, ler tendências, conhecer avanços tecnológicos e analisar o ambiente sócio-político;
- Ser um facilitador: contribuir para a construção de um ambiente de aprendizagem junto à sua equipe, estimulando os relacionamentos, a reflexão crítica e autocrítica;
- Ser um orientador: contribuir com o desenvolvimento da organização a partir do estímulo ao desenvolvimento das pessoas;
- Aprender a aprender: reconhecer e praticar o autodesenvolvimento contínuo em um ambiente de mudanças constantes.
Enfatiza, ainda, que em seu relacionamento com as pessoas o gestor precisa
alavancar a equipe. Para que isso se torne possível é necessário que ele tenha:
- Habilidade em disseminar objetivos e valores da empresa, de modo a que todas as unidades atuem em sintonia;
- Capacidade de administrar e estimular o desenvolvimento das pessoas de sua equipe para a busca dos resultados;
- Habilidade para orientar profissionais com potencial para assumirem postos de liderança;
- Atitude de estimular a participação da sua equipe de trabalho nas discussões e decisões;
- Flexibilidade para aceitar as opiniões e sugestões, quando as argumentações forem consistentes e demonstrarem possibilidade de sucesso;
- Intenção de aproximar as diversas unidades da organização; - Capacidade de avaliar as pessoas, acordando o desempenho
esperado, sendo ético e justo nas avaliações; - Atenção para com o Clima Organizacional, buscando a sua
contínua melhoria, em conjunto com sua equipe.
Com a parte do discurso até aqui apresentada, pode-se inferir que o Banco do
Brasil transmite mensagens passíveis de serem interpretadas de formas
diferenciadas, dependendo do receptor a ser alcançado.
Aos acionistas e à sociedade é evidenciada a remuneração sobre o capital
investido, tendo como vantagem competitiva: a formação de um banco completo e
especializado em segmentos de mercado; o relacionamento com a comunidade
utilizando a estratégia de desenvolvimento regional sustentável; a utilização de
tecnologia avançada para proporcionar comodidade, rapidez, qualidade de serviços
162
e segurança, identificando-se com o cliente através da excelência e especialização,
tornando-se referência em atendimento através de relacionamentos duradouros.
Estabelece como imprescindível para alcançar seus objetivos o compromisso
com a ética, o diálogo, a formação e a valorização do seu funcionário, através do
processo de gestão de pessoas. Enfatiza a busca pelo profissionalismo, pela
motivação, pela especialização e qualificação de seus empregados, que trabalham
voltados para o atendimento das necessidades dos acionistas, do cliente e da
sociedade.
Junto ao público interno, assume o compromisso de prover condições dignas
de trabalho, através: do compromisso com a ética, o diálogo, a formação e a
valorização individual; da formação de administradores que valorizem o ser humano,
com gestões participativas e trabalho em equipe.
Na prática, entretanto, o que primeiro se observou foi a segregação dos
clientes através da diferenciação no tipo de atendimento oferecido pelas agências.
Aos clientes de alta renda24, são oferecidos ambientes diferenciados, são
disponibilizados gerentes e postos efetivos em número suficiente para que não haja
a formação de filas e adotadas providências para que o tempo de espera seja o
menor possível.
Por determinação administrativa, para atendimento aos clientes de baixa e
média renda, que transitam em muito maior número pelas agências, são designados
atendentes em quantidade reduzida e desproporcional em relação ao disponibilizado
para clientes de alta renda, motivo pelo qual são registradas as formações de
grandes filas, traduzidas em dilatados tempos de espera.
24 Renda mensal acima de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Para aqueles com renda mensal acima de R$10.000,00 (dez mil reais) há inclusive a possibilidade de atendimento domiciliar, sem a necessidade de seu comparecimento ao Banco.
163
A alocação de atendentes nas plataformas de atendimento é uma prerrogativa
do principal gestor da agência (Gerente Geral), que a seu critério e dentro de
padrões pré-determinados, pode solicitar à instância administrativa superior o
aumento de seu quadro de pessoal. Entretanto, aumentar o quadro de pessoal
significa também aumentar despesas e custos e, por conseguinte, reduzir a
lucratividade da agência e se expor a uma avaliação de desempenho negativa.
Durante o período utilizado para a observação participante, foram registradas
duas solicitações de redução de quadro, apesar das quase duas mil novas contas
correntes abertas pelas agências. A redução foi efetivada através do não
preenchimento de duas vagas, uma deixada por empregado que pediu demissão
antes mesmo de completar o seu segundo ano de empresa e a outra por empregado
aposentado por tempo de serviço.
Tal contradição contribui de forma negativa para imagem do Banco, já que os
clientes, irritados pela má qualidade do atendimento, tendem a registrar protestos
junto aos órgãos de defesa ao consumidor e a mudar de instituição financeira.
Já para os empregados, tal problema é materializado pela necessidade de
escolher entre: o atendimento mais demorado e completo, com efetivação de todas
as tarefas pertinentes; ou o atendimento mais rápido e com tempo pré-determinado,
quando o cliente é “incentivado” a abreviar ao máximo a sua presença, postergando
a realização das tarefas secundárias para depois do expediente externo (arquivos,
coletas de referências cadastrais, extração de cópias etc).
O que foi efetivamente registrado através da observação participante foi a
determinação administrativa dos gestores das agências pelo atendimento rápido, de
forma a reduzir o tempo de espera do cliente que aguarda a vez na fila. Este tipo
de estratégia produz sensível queda na qualidade do relacionamento com o cliente
164
que, apesar do período de espera já cumprido, é pressionado a “desocupar
rapidamente o lugar” para o próximo a ser atendido.
Com a adoção dessa estratégia, apesar da vigilância do ponto eletrônico,
sobra para os atendentes grande parte das tarefas burocráticas que, via de regra,
serão realizadas somente após a saída dos clientes do ambiente da agência, o que
significa a dilação involuntária da jornada de trabalho. Sendo considerada pelos
gerentes como sinal de “falta de produtividade”, não raras vezes a dilação da
jornada é imposta de forma compulsória ao empregado, com a peculiaridade de ser
realizada sem a necessária remuneração.
Para aqueles que fazem a opção pelo atendimento mais demorado e
completo, também surgem problemas relacionados à produtividade, desta vez
decorrentes da pressão dos gerentes, que invariavelmente determinam a
“agilização” das filas de espera. Os empregados que fazem esta opção, além de
serem avaliados por seus superiores como não produtivos e eventualmente
“indisciplinados”, também são criticados pelos colegas ao deixarem o maior volume
de atendimentos para os outros fazerem.
A percepção deste conflito foi confirmada por dez dos integrantes do Corpus
de pesquisa, através das entrevistas, de onde se obteve depoimentos como os
apresentados a seguir:
[...] quem não conhece o serviço interno do Banco até acha que é tudo uma beleza; não sabe do sufoco que é, da correria para atender todo mundo e dos insultos que escutamos dos clientes quase todos os dias. [...] as mesas da plataforma não têm gaveta, sob a alegação de que o funcionário do atendimento não deve guardar nada para fazer depois. Só que, se você olhar dentro dos armários, vai encontrar um monte de coisas por fazer: clientes para contactar, cadastros para atualizar, limite de cheque especial para renovar, assinaturas para coletar, documentos para arquivar etc. (ENTREVISTADO 11, fev./2005).
165
Eu não “esquento” a cabeça não [...] cumpro minhas seis horas direitinho e não me importo com “cara ruim” de gerente, “frescura” de colega ou com “bronca” de cliente. Faço apenas o que eu acho certo fazer; se o Banco promete qualidade eu procuro oferecer o melhor que posso [...] e depois, quem não estiver satisfeito que procure outra coisa pra fazer; o que não pode é trabalhar contrariado o dia inteiro e descontar a raiva nos colegas que não têm nada a ver com o problema. (ENTREVISTADO 7, jan.2005). [...] isso aqui em dias de maior movimento é um inferno: fico na porta de entrada da agência “cercando” a entrada dos clientes que não querem ser atendidos por máquinas. Para não aumentar as filas na plataforma, a administração determina que a gente direcione as pessoas para o auto-atendimento [...] as pessoas de origem mais simples geralmente concordam, mas tem muita gente que não aceita, diz que tem direito de ser atendida por um funcionário, fica irritada e até faz “escândalo” para conseguir [...] é algo frustrante porque, apesar de estar cumprindo meu dever, no final do expediente estou com os nervos em frangalhos de tanto escutar “besteira” e de lidar com a falta de educação dos mais “esquentadinhos”. (ENTREVISTADO 10, fev./2005). Em vez de bancário, o pessoal do atendimento deveria ser bombeiro. Não dá tempo de ser proativo em nada. O negócio é tocar o dia-a-dia e, quando a quantidade de pendências chega a um limite insuportável, faz-se um mutirão e se “apaga o incêndio” [...] assim que me formar vou dar um jeito de mudar de profissão. (ENTREVISTADO 11, fev./2005). O que me dá mais vergonha de trabalhar aqui é esta “venda” de uma imagem que nem sempre é verdadeira. Do tipo: o Banco do Brasil mudou; agora nós respeitamos os clientes, aqui você é bem recebido, temos os melhores e mais atenciosos funcionários, estamos “sempre com você” [...] aí o cliente mais humilde chega na agência e fica um tempão esperando para falar com o gerente. O gerente diz que não pode atendê-lo e o faz conversar com um posto efetivo. O posto efetivo não tem tempo e nem alçada para resolver o problema, porque tem que cumprir as instruções do LIC. E o cliente sai “com uma mão na frente e outra atrás” achando que é a pior pessoa do mundo. (ENTREVISTADA 8, jan./2005).
Dentro do Corpus de pesquisa, todos os entrevistados reconheceram as
características instrumentais utilizadas pelos gestores, sem, entretanto, as
relacionarem com um determinado Modelo Administrativo.
[...] até eu ter condições de sair estou aceitando as regras do jogo, mesmo que elas mudem todo dia [...] eu acho que se a empresa não for ágil e se adaptar com rapidez ao mercado ela quebra; portanto, a
166
gente tem que dançar conforme a música, e os gerentes são orientados para isso. (ENTREVISTADO 7, jan./2005). Cansei de ouvir meu gerente falar que no Banco os funcionários estão acostumados a “trocar a turbina com o avião no ar”. [...] realmente é uma loucura, muitas das vezes as instruções chegam no mesmo dia em que o serviço tem que ser feito, mas o sistema só fica operacional um tempão depois. Resultado: um monte de pendências para acertar e erros para arrumar, o cliente nervoso porque teve prejuízos e você estressado porque não pode fazer nada para evitar. (ENTREVISTADA 8, jan./2005). [...] de repente a administração convoca uma reunião para comunicar a determinação de uma nova meta recebida da SUREG25. O “pacote” já vem pronto na quantidade e no tempo que se tem para atendê-lo [...] apesar dos gerentes pedirem sugestões, na grande maioria das vezes as estratégias já vêm “mastigadas”: o fulano vai pra tal lugar, o beltrano vai prorrogar, a equipe tal vai trabalhar na rua, o pessoal do atendimento vai fazer assim assado [...] para nós “simples mortais” resta “engolir” e fazer a coisa do jeito que foi engendrada, pois: se discutir está correndo o risco de ser chamado de pessimista; se não conseguir fazer, será incompetente; se falar que não pode por qualquer motivo, será indisciplinado. (ENTREVISTADO 6, jan./2005) Eu não culpo os gerentes não. Eles são do jeito que são porque recebem ordens de cima e têm que se virar para cumpri-las. Se eles forem dar atenção para os todos os problemas de clientes e funcionários a coisa não vai andar direito. Afinal, de uma forma ou de outra, todo mundo tem algum tipo de problema, alguma desculpa para dar e um “se não” com argumento, não é mesmo? (ENTREVISTADO 10, fev./2005).
O que mais chamou a atenção do observador foi o fato de que dez dos
entrevistados conseguiram perceber que tais características instrumentais são
contraditórias ao discurso do Banco. O motivo foi principalmente a qualidade do
serviço disponibilizado aos clientes de baixa e média renda, sendo que a alocação
insuficiente de mão-de-obra e a falta de recursos materiais adequados foram
identificadas como as principais causas das conseqüências relatadas, por não serem
compatíveis ao fluxo de pessoas observado nas agências.
25 A Superintendência Regional – SUREG é o órgão administrativo responsável pela coordenação de negócios em determinada região. Através de linha hierárquica direta e a instância administrativa superior das agências.
167
As conseqüências se tornaram evidentes através dos depoimentos transcritos
a seguir:
As mudanças nas rotinas são muito freqüentes e nunca dão tempo de saber tudo o que está acontecendo. Por isso, vivo estressado com o medo de deixar alguma coisa escapar e ter que pagar o prejuízo. (ENTREVISTADA 1, nov./2004). Falta tempo para ler as instruções e o sistema nem sempre acompanha a alteração de rotinas. O risco de fazer uma besteira é relativamente alto para mim. Se alguém pega um empréstimo com a taxa errada, por falha minha, adivinha quem tem que enfiar a mão no bolso? [...] Estou concorrendo a várias comissões, pois não quero ficar na plataforma durante muito mais tempo; essa pressão faz mal para a saúde da gente. (ENTREVISTADA 2, nov./2004).
A modernização é importante [...] o duro é quando o sistema fica off-line e não tem como a gente atender ninguém. É o cliente olhando para você e você olhando para o cliente. Ele com pressa e você sem fazer nada. Ele com vontade de te xingar e você com vontade de correr. É nessa hora que eu me pergunto se toda esta parafernália informatizada não vai me causar um infarto [...] Só fico triste e frustrado porque não tenho perspectivas dentro do Banco e, para eu ficar longe dessa encrenca, vou ter que me aposentar. (ENTREVISTADO 9, jan./2005).
O equipamento é uma “salada”, alguns relativamente modernos e confiáveis, outros estão caindo aos pedaços e não agüentam todo esse movimento [...] nervosa eu fico quando pára uma máquina no pico do movimento e sou obrigada a desligá-la. É uma chuva de reclamações para administrar. [...] já aconteceram duas vezes este ano: com a sala de auto-atendimento cheia de gente, uma fila quilométrica, e a “encrenca” do sistema “sai do ar” [...] aí o técnico me diz que perdemos a conexão do satélite, ou pifou a controladora, ou “deu pau” no modem, ou quebrou a “mola da grampôla”, ou qualquer coisa relacionada com essas geringonças filhas da era da informática [...] nessas horas eu quero morrer, tenho vontade de não vir mais trabalhar aqui, principalmente quando sou obrigada a ficar dando desculpas para todo mundo que entra e sai da sala, dizendo que provavelmente o sistema vai “voltar” em alguns minutos; se ele demora a voltar, são pagos todos os meus pecados, dessa e das próximas “encarnações”. (ENTREVISTADA 12, fev.2005).
Assim, registrou-se um discurso voltado para o modelo político conforme já
referenciado nesta pesquisa, mas foram observadas práticas ancoradas nas gestões
168
instrumentalistas voltadas para o mercado, que promovem a imposição da mudança
de cima para baixo através:
- da busca prioritária pela rentabilidade em detrimento da qualidade;
- da imposição de novos estilos gerenciais, causando o descompasso
entre a velocidade registrada para a comunicação da mudança e a sua
efetiva operacionalização (ex: a troca regular dos administradores das
agências e solicitação aos administradores de uma conduta desejável
para a gestão da mudança).;
- da constante alteração nas rotinas e do lançamento sistemático de
novos produtos e serviços, o que ocasiona curtos espaços de tempo
para a aprendizagem e adaptação;
- da imposição de metas e de meios para alcançá-las; e
- da adoção de novas tecnologias, que nem sempre se tornam
disponíveis e operacionais em tempo hábil;
Esta contradição, entre o discurso organizacional e a prática gerencial,
identificada pela maioria dos elementos pertencentes ao Corpus de pesquisa, traz
conseqüências que de certa forma também são percebidas por todos, confirmando
as observações realizadas:
- Pela falta de conhecimento e falta de tempo para a realização do
aprendizado: insegurança na realização das tarefas;
- Pela incerteza e pela possibilidade de errar: medo;
- Pela velocidade das mudanças e pelo excesso de trabalho: estresse;
169
- Pela impossibilidade de influenciar na situação: nervosismo;
- Pela constante pressão psicológica: riscos à saúde;
- Pela falta de confiança no sistema e pela falta de credibilidade nas
promessas da empresa: vergonha e vontade de abandonar o trabalho;
- Pela falta de recursos humanos e materiais: desgaste emocional e
físico; e
- Pela falta de perspectiva no futuro: tristeza e vontade de deixar o
banco.
Neste contexto, dentro do ambiente delimitado, o que se observou foi a
inexistência do que Motta e Vasconcelos (2002, p. 257) chamam de diagnóstico
prévio das relações sociais entre os grupos participantes, necessário para o
planejamento das formas que serão utilizadas para se controlar eventuais impactos
que os processos de mudanças possam ocasionar ao plano cognitivo e ao plano
emocional do trabalhador, já que tais processos também provocam resistências e
alterações de cunho comportamental.
Ainda dentro do ambiente delimitado, notou-se a falta de algumas estratégias
para superar a eventual resistência à mudança, tal como permitir discussões e
negociações e evitar o excesso de mudanças. Por outro lado, os administradores
das agências se utilizam, com freqüência acentuada, da manipulação e da coerção
implícita e explícita. (KOTTER, 1979, p.106-113).
Foram confirmadas, também, as afirmações realizadas por Silva e Vergara
(2003), quando enfatizam que à ampliação das divergências entre os discursos das
organizações e as percepções dos indivíduos que delas fazem parte é
potencializada pela “[...] fragmentação com que a administração tem tratado o ser
170
humano desde suas primeiras teorias [...]”. Os processos de mudança observados
realmente enfatizaram excessivamente a racionalidade e, de certa forma, ignoraram
a complexidade, a ambigüidade e os paradoxos que fazem parte do ambiente.
(VINCE E BROUSSINE, 1996).
Dessa forma, as contradições entre o discurso e a prática, observadas pelo
pesquisador e percebidas pelo Corpus de pesquisa, parecem influenciar diretamente
a satisfação para com a realização do trabalho, pois denotam situações de conflito e
sofrimento: através de atitudes agressivas, da execução de tarefas penosas, do
medo, da frustração, do desânimo, das tensões e crises no interior da equipes
(MENDES, 1999, p. 24-30). Além dessas, também foram identificadas a falta de
autonomia e a falta de tempo adequado para adaptação às mudanças (CORRÊA,
2003, p. 3).
No próximo sub-tópico é apresentado o discurso que expõe o posicionamento
do Banco do Brasil frente à abordagem do assunto satisfação no trabalho, assim
como os dados coletados através da observação participante e das entrevistas semi-
estruturadas, tendo como parâmetro para analisá-los os fatores citados por Walton
(1973, p.17).
171
5.3.2 Satisfação para com o trabalho
Para o Banco do Brasil (2004), o comprometimento com a qualidade de vida,
com a satisfação e com o aprimoramento profissional de seus funcionários e
colaboradores está expresso nas políticas do Conglomerado, com algumas de suas
ações extrapolando significativamente o exigido por lei, podendo ser destacados os
compromissos em:
- Buscar conciliar os interesses do Conglomerado com os interesses dos funcionários e suas entidades representativas, tendo a negociação como prática permanente;
- Criar e manter condições de qualidade e segurança no ambiente de trabalho e assegurar aos funcionários condições previdenciárias, assistenciais e de saúde, de forma que propiciem melhoria da qualidade de vida e do desempenho profissional;
- Observar o desempenho profissional como referência nas decisões que digam respeito a desenvolvimento, reconhecimento, retribuição e ascensão profissional, utilizando critérios previamente estabelecidos e baseados no mérito, competência e contribuição ao Conglomerado;
- Considerar as práticas de mercado na retribuição aos funcionários; - Adotar os princípios de aprendizado contínuo e investir em
educação corporativa para permitir o desenvolvimento pessoal e profissional; e
- Manter contratos e convênios com instituições que asseguram aos colaboradores condições previdenciárias, fiscais, de segurança do trabalho e de saúde.
Como forma de viabilizar seus programas sociais internos, o Banco do Brasil
(2004) disponibiliza diferentes instrumentos destinados a promover o aumento da
qualidade de vida, segurança e satisfação de seus empregados e colaboradores:
- Com relação à saúde e qualidade de vida: Programa Qualidade de Vida e a existência da CASSI – Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, criada em 1944, e o seguro-saúde oferecido aos adolescentes trabalhadores.
172
- Com relação a benefícios previdenciários complementares: A PREVI – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, criada em 1904.
- Com relação ao compromisso de promover o aprimoramento profissional: A Universidade Corporativa Banco do Brasil - UNIBB.
- Com relação à ética nas relações: A Ouvidoria Interna e os Fóruns Gestão de Pessoas e Responsabilidade Sócio-ambiental representam a disposição em manter um canal de diálogo franco e aberto com o público interno.
Para avaliar a satisfação de seus funcionários com a empresa, o Banco do
Brasil (2005c) conta com a pesquisa de clima e comprometimento organizacional,
disponibilizada semestralmente aos seus empregados através do aplicativo de
Administração de Recursos Humanos – ARH. Sobre o resultado da pesquisa o
Banco do Brasil (2004) afirma que:
A avaliação vem sendo aplicada semestralmente desde 2001 e, no fim de 2004, havia sido respondida por 56,9% dos funcionários do Banco. Deste percentual, 98,1% apresentou os conceitos globais de clima satisfatório a desejável. Respondida por meio eletrônico, a Pesquisa preserva os princípios de anonimato e confidencialidade.
A respeito da pesquisa de clima referenciada acima, vale registrar a seguinte
declaração, coletada informalmente nos bastidores de uma das agências:
Ninguém que tenha vontade de “soltar o verbo” contra o clima dentro da agência tem coragem de impostar os dados no sistema ARH. Primeiro porque o índice do clima organizacional impacta diretamente a avaliação da administração e o bolso de todo mundo na agência, ou seja, índice baixo, avaliação baixa, resultado comprometido e menor participação na distribuição dos lucros. [...] e depois, quem me garante que esse processo é mesmo confidencial se, para responder ao questionário, eu tenho que digitar matrícula e senha para entrar no sistema? (INFORMAL 2, out./2004)26
26 Ao final de 2004 o Banco realizou pesquisa destinada a mensurar o clima organizacional e a satisfação no trabalho em três das seis agências observadas. Utilizando o tradicional formulário impresso e sem a necessidade de identificação do respondente, tal pesquisa teve o resultado tratado de forma confidencial, impossibilitando a comprovação ou não da hipótese levantada pelo depoimento aqui registrado.
173
Foi considerado relevante, para o observador, registrar a postura do Corpus
de pesquisa durante a abordagem do assunto satisfação no trabalho e gestão de
carreira: com variações nas intensidades, foram observadas e registradas algumas
alterações nos comportamentos de cada um dos elementos do Corpus de pesquisa,
cujas falas passaram a apresentar tons mais agressivos e dominados pela emoção.
Ao contrário do que ocorreu na abordagem sobre mudança organizacional, os
entrevistados assumiram posição física mais tensa e evitaram, tanto quanto
possível, as brincadeiras e as ironias.
Dando continuidade à exposição dos resultados, verificou-se que, na prática,
o discurso do Banco sobre a satisfação no trabalho mostrou-se apenas parcialmente
implementado. Os dados coletados pelo pesquisador através de documentos, da
observação participante e das entrevistas semi-estruturas revelaram algumas
contradições.
Foi observada uma situação marcada pela desmotivação e pela vontade de
deixar a empresa, principalmente entre os postos efetivos com menos de sete anos
de Banco. Ficou registrado que a renda adequada ao trabalho e a equidade interna
e externa de salários, vantagens e benefícios foram itens que se destacaram como
causa de insatisfação.
Quando eu entrei para o Banco em 1984, o salário inicial era de nove salários mínimos. Hoje, não passa dos quatro, já incluído o auxílio alimentação [...] e ainda tem muita gente que chama o funcionário do Banco de “marajá”27. Só que o pessoal do lado de fora não sabe dos 6 anos sem um centavo de aumento, e dos outros quatro com aumentos que nem mesmo repunham a inflação [...] Conheço colegas que passam necessidade e, mesmo sendo comissionados, não conseguem pagar escola particular para os filhos [...] mas a quantidade de serviço e a cobrança por resultado e o lucro do Banco subiram que nem um foguete. [...] aí ficam cobrando mais
27 O termo “marajá” surgiu no início da década de 90, durante o governo do Presidente Fernando Collor de Mello. Era utilizado para caracterizar os servidores públicos que, à época, dizia-se trabalharem pouco, receberem altos salários e várias mordomias.
174
compromisso com o negócio do Banco. Só não sei em troca de que. (ENTREVISTADO 9, jan./2005). Lembro bem que a primeira coisa que me irritou foi o fato de um gerente me chamar de “genérico”. Quando eu perguntei o porquê do apelido, ele respondeu rindo: é porque vocês novatos são iguais aos medicamentos genéricos, fazem o mesmo trabalho, mas custam muito mais barato. [...] comparação mais besta essa, no mínimo é falta de respeito e discriminação. [...] ainda bem que não vou ficar muito mais tempo nesse emprego. (ENTREVISTADO 4, dez./2004). [...] na realidade o Banco está servindo apenas de “trampolim” para que eu consiga terminar minha faculdade e montar meu escritório. Foi a forma que eu encontrei de sair de uma cidade pequena do interior e conseguir pagar meus estudos [...] meu pai nunca conseguiria pagar meus estudos e ainda sustentar meus irmãos [...] trabalhar em banco é uma loucura, se a gente deixar sugam até o tutano dos ossos, e de graça [...] não nasci para ser bancário. (ENTREVISTADO 4, dez./2004). [...] faço o trabalho que o salário que eles me pagam pode comprar; se o dinheiro é pouco ou muito, eu não sei, mas para mim é o suficiente para eu agüentar até passar em um bom concurso federal. (ENTREVISTADO 7, jan./2005). [...] o pessoal mais velho diz que antigamente o funcionário do Banco era tido como um “partidão” por conta do salário e que depois passou a fazer “bicos” para complementar o orçamento doméstico e tentar manter o padrão de vida [...] hoje, para muita gente, o “bico” é o Banco, principalmente para o pessoal mais novo, que na primeira oportunidade “bate as asas”. (ENTREVISTADA 5, dez./2004). Quando tomei posse no interior de Goiás, em 2000, eu já sabia o tamanho da encrenca [...] na minha cidade eu tinha alguns amigos que trabalhavam no Banco e que haviam me alertado para o fato de o Banco do Brasil não ser mais aquele paraíso de que a gente ouvira falar [...] não me vejo fazendo carreira aqui [...] foi o tempo em que se conseguia subir na vida com o salário do Banco. (ENTREVISTADO 6, jan./2005). [...] Só fico triste porque não tenho perspectivas dentro do Banco, e para eu largar essa encrenca, vou ter que me aposentar. (ENTREVISTADO 9, jan./2005).
Apesar do Banco do Brasil (2004) “considerar as práticas de mercado na
retribuição aos funcionários”, levantamentos divulgados pela ANABB (2005, p. 4)
revelaram outra realidade. O que foi apurado coloca a média dos salários dos
empregados do Banco como apenas a 37ª mais alta entre os cinqüenta maiores
175
bancos do país, conseqüência da política de arrojo salarial que, de 1998 a 2004,
promoveu uma redução real de 29,6% nos vencimentos praticados pelo Banco do
Brasil.
Ainda segundo o levantamento da ANABB (2005, p. 5), “o ritmo de redução
praticado pelo Banco do Brasil foi quase três vezes maior do que a diminuição
verificada na média dos dez maiores bancos que atuam em território nacional: 9,7%
nos últimos cinco anos.”
A Tabela 3 – Despesa mensal real média por funcionário de bancos ilustra a
evolução dos salários dos dez maiores bancos brasileiros entre 2000 e 2004, em
valores de dez./2004, ajustados pelo INPC – Índice Nacional de Preços ao
Consumidor:
Tabela 3 – Despesa mensal real média por funcionário de bancos – em R$ mil.
ANO BANCOS
2000 2001 2002 2003 2004
SAFRA
SANTANDER BANESPA
ABN AMRO
NOSSA CAIXA
UNIBANCO
BANCO DO BRASIL
BRADESCO
ITAÚ
HSBC
CEF
4,1
-
3,4
4,0
2,2
3,6
2,7
2,4
3,2
2,1
4,5
4,7
2,8
3,8
2,7
3,4
2,6
2,7
2,8
2,4
3,8
4,0
3,3
3,2
2,4
2,8
2,4
2,6
3,0
1,8
3,6
3,3
3,2
3,5
2,7
3,2
2,6
2,2
2,8
1,8
3,8
3,3
3,1
2,9
2,9
2,6
2,6
2,2
2,2
2,0 Média dos 10 maiores 3,1 3,3 2,9 2,9 2,8
Fonte: ANABB (2005, p. 5)
176
Não foi apenas o salário inicial que sofreu redução com a estratégia adotada
pelo Banco a partir de ago./1997. O Plano de Cargos e Salários e a política de
reajuste salarial sofreram alterações que impactaram todas as categorias da carreira
(BANCO DO BRASIL, 2005c; ANABB, 2005):
- Foram reduzidos os percentuais da promoção automática por
antiguidade, antes concedida a cada três ou quatro anos de serviço
prestado, que passaram de 12% (de E1 a E9) e 16% (de E09 a
E12) para um percentual fixo e linear de 3% a cada três anos, para
todos os níveis.
- Foi retirada a concessão dos abonos assiduidade28 para os
ingressantes no banco a partir de 1999. No acordo coletivo de
trabalho realizado durante o dissídio de 2003, o Banco concordou
em incluir cláusula que estende, aos empregados admitidos a partir
de 1999, a vantagem representada pelos cinco abonos assiduidade.
Porém a referida cláusula precisa ser renovada anualmente;
- Foi extinto, a partir de 1999, o acréscimo de 1% pago a título de
anuênio. Hoje nenhum empregado recebe esta remuneração;
- Foi retirada da lista de vantagens a concessão da licença-prêmio29
de dezoito dias anuais aos empregados admitidos após 1999;
- Foi adotada a política de reajuste zero entre 1994 e 2000 e de
reposições abaixo da inflação de 2001 a 2004. Dependendo do 28 O Banco do Brasil (2005b) concede a seus empregados anualmente cinco dias a título de abono assiduidade. Os abonos assiduidade, concedidos aos empregados admitidos antes de 1999, podem ser utilizados a qualquer época, sendo acumuláveis ao longo dos anos e, a critério do empregado, podem ser convertidos em espécie por ocasião das férias anuais. Os abonos concedidos aos admitidos após 1999, não podem ser acumulados e nem convertidos em espécie. 29 A licença-prêmio de dezoito dias é concedida a cada ano de trabalho realizado pelos funcionários admitidos antes de 1999, são acumuláveis ao longo dos anos, utilizadas a qualquer tempo (com a concordância do principal gestor da dependência) e esporadicamente podem ser convertidas em espécie.
177
índice de correção que for utilizado para os cálculos, a não
reposição da defasagem ocasionada pela inflação resultou em
perdas salariais acumuladas que oscilam entre 57,7% e 60,5%,
enquanto nos bancos privados a diferença em relação à inflação do
período ficou entre apenas 11,5% e 17,4% .
A Tabela 4 – BB - Comparativo entre vencimentos padrão por categoria
demonstra a diferença verificada entre os valores praticados em mar./2005 e os
valores da base salarial de dez./1997 corrigidos pelo INPC – Índice Nacional de
Preços ao Consumidor no período. Os valores representam os salários brutos de
cada categoria do plano de cargos e salários do Banco, não estando incluídos em
seus montantes os valores da ajuda alimentação (R$ 495,56), os valores da
gratificação mensal (25% do VP) e os valores recebidos em caráter pessoal pelos
empregados empossados antes de 1999:
Tabela 4 – BB - Comparativo entre vencimentos padrão por categoria – em R$
Categoria e Tempo de Banco
VP* atual VP* de 1997 corrigido (INPC) Diferença Perda (%)
E1 – 0 a 3 E2 – 3 a 6 E3 – 6 a 9 E4 – 9 a 12 E5 – 12 a 15 E6 – 15 a 18 E7 – 18 a 21 E8 – 21 a 24 E9 – 24 a 27 E10 – 27 a 30 E11 – 30 a 33 E12 – acima de 33
780,30 803,70 828,00 852,30 877,80 904,50 931,50 959,10 988,50
1.017,60 1.048,50 1.079,70
1.036,87 1.161,82 1.301,40 1.457,57 1.632,86 1.820,40 2.049,31 2.295,78 2.571,46 2.983,13 3.460,66 4.014,89
256,57 358,12 473,40 605,27 755,06 924,90
1.117,81 1.336,68 1.582,96 1.965,53 2.412,16 2.934,99
24,74% 30,82% 36,38% 41,53% 46,24% 50,56% 54,55% 58,22% 61,56% 65,89% 69,70% 73,11%
(*) Vencimento-padrão Fonte: ANABB (2005, p. 4-5)
178
Com relação aos itens saúde e previdência, apesar de efetivas as
contribuições realizadas pelo Banco Brasil (2004) à Caixa de Previdência dos
Funcionários do Banco do Brasil - PREVI e à Caixa de Assistência dos Funcionários
do Banco do Brasil - CASSI, foram identificadas e registradas as seguintes
situações:
- CASSI: As condições da CASSI têm se deteriorado rapidamente com a
redução dos salários dos empregados do Banco, que contribuem com
o percentual fixo sobre o salário bruto, e com a redução de 4,5% para
3% da contribuição realizada pelo próprio Banco, também calculada
sobre o salário bruto de cada empregado. As dificuldades financeiras
geraram cortes nos convênios com hospitais, nas especialidades
médicas disponíveis e no reembolso das despesas com
medicamentos, assim como foram responsáveis pela redução das
reservas da entidade. (ANABB, 2005, p. 8);
- PREVI: Os aportes do Banco ao fundo de pensão foram reduzidos aos
mesmos 7% recolhidos pelo empregado, em uma redução de 50% em
relação à contribuição patronal anterior. Houve também a redução do
teto máximo do benefício de aposentadoria, que passou a ser
calculado sobre 75% do salário bruto, quando anteriormente o
percentual aplicado era o de 100%. Tais “ajustes” ocasionaram perdas
acumuladas de R$ 4 bilhões para os beneficiários do fundo de pensão.
(ANABB, 2005, p. 9)
179
Sobre o programa Qualidade de Vida no Trabalho – QVT, foi observado que,
dentro do ambiente delimitado por esta pesquisa, também não proporcionou os
resultados positivos divulgados pelo Banco. Aplicado durante noventa dias, em três
agências observadas por esta pesquisa, o QVT se demonstrou incapaz de mobilizar
os funcionários para uma efetiva participação nas atividades previstas para o
segundo semestre de 2004: Ginástica laboral, sessão de massagem com
fisioterapeutas, reuniões com lanches especiais, distribuição de brindes e encartes
sobre saúde ocupacional etc.
Em entrevista informal obtida pelo observador junto a um dos responsáveis
pelo acompanhamento do programa QVT, que veio a Uberlândia especialmente para
avaliar o andamento do programa, foi anotado o seguinte depoimento:
Tivemos muita dificuldade para conseguir as verbas necessárias para implementar o piloto do programa. O pessoal da Diretoria de Varejo e Distribuição concorda que o clima nas agências não está bom, que os índices de doenças ocupacionais estão elevados, mas ainda acha cedo para realizar grandes investimentos na área. Foi preciso a intervenção da Vice-presidência de Gestão de Pessoas para que o piloto QVT saísse do papel. (INFORMAL 1, jun./2004)
Ainda sobre o QVT, nas entrevistas realizadas junto ao Corpus de pesquisa,
foram registrados os seguintes depoimentos:
[...] ao anunciarem que a agência tinha sido escolhida para fazer parte do piloto do QVT eu fiquei entusiasmada. A coisa parece que vai melhorar, pensei. [...] depois vieram com o papo de que não tinha jeito da gente fazer os exercícios de relaxamento durante o expediente, pois prejudicaria o atendimento ao cliente. A proposta da administração era para que nós fizéssemos os exercícios depois do expediente. Resultado: ninguém aparecia, alegando que aquilo era prorrogação de expediente. [...] eu mesma era a primeira a ir embora, pois prefiro relaxar em casa junto com meus filhos. (ENTREVISTADA 5, dez./2004). [...] quando vieram com o programa QVT o gerente da agência queria porque queria que a gente chegasse uma hora antes do horário
180
normal, para fazer os exercícios de relaxamento. Esta eu não entendi, em vez de reduzir a carga de trabalho para melhorar a nossa vida, ele estava querendo era que aumentássemos o tempo dentro do Banco [...] até parece que eu não tenho vida lá fora, mais nada para fazer além de trabalhar aqui. (ENTREVISTADA 1, nov./2004). [...] tenho apenas cinco anos de Banco, mas já engordei quinze quilos. Aqui o pessoal não tem tempo nem para comer direito, pois os quinze minutos de intervalo mal dão para tomar um refrigerante e comer um salgadinho qualquer. Na primeira quinzena do mês eu não consigo nem mesmo jantar. Trabalho feito um condenado e saio da agência direto para a faculdade [...] chegar antes para fazer exercício físico e “lanchinho” saudável, nem pensar. (ENTREVISTADO 4, dez./2004).
Realmente foi observado que o ritmo e o excesso de tarefas obrigam o
trabalhador a saltar refeições, a comer depressa e em horários irregulares. O
horário de trabalho, normalmente das 10:00 às 16:15 horas, divide o dia ao meio, e o
tempo disponível, de apenas quinze minutos, prejudica a principal refeição da
maioria: o almoço.
Uma pesquisa sobre a saúde dos empregados do Banco do Brasil, feita pela
CASSI com 87% dos trabalhadores do Banco em 2003, revelou que 47,66% deles
estão acima do peso, 50,70% apresentam risco cardíaco potencial e 24,71% risco
moderado. As causas vão do sedentarismo e má alimentação ao estresse provocado
pela carga excessiva de trabalho. Com referência ao estresse, que pode provocar
ansiedade, fadiga, insônia e dores no corpo, 16,85% dos trabalhadores pesquisados
apresentaram algum tipo de problema relacionado ao estresse, 13,47% já têm um
grau considerável e 3,05% um índice elevado de estresse. (ANABB, 2004, p. 4).
Durante muitos anos dei o suor e o sangue pelo Banco, gostava do que fazia e tinha prazer em fazer. [...] o resultado foi uma LER30 que até hoje não me permite digitar sem sentir dores e formigamento nas
30 Lesões por esforço repetitivo, doença ocupacional que costuma acometer digitadores e pessoas que realizam movimentos repetitivos durante longo período de tempo, sem a necessária prática de exercícios específicos de alongamento e relaxamento.
181
mãos e braços. O pior de tudo e que, no início de minha doença, os gerentes não acreditavam em mim, dizendo que era frescura de mulher grávida [...] Por conta disso eu fiquei um tempão em licença saúde e perdi minha comissão. [...] em vez de ginástica, massagem de relaxamento e lanche especial eu prefiro é trabalhar um pouco menos, sem toda essa pressão psicológica por produtividade e resultados. (ENTREVISTADA 2, nov./2004).
Outro motivo de contradição é a utilização do ponto eletrônico. Inicialmente foi
aclamado pelos empregados, pois proporcionaria meios para que fossem evitadas
as prorrogações de expediente gratuitas e compulsórias, gratuidades que
impuseram ao Banco do Brasil (2004) milhares de ações judiciais e um razoável
passivo trabalhista em seus balanços sociais.
Com o passar do tempo, o ponto eletrônico demonstrou ser, na prática, mais
uma maneira de controle e de cobrança por produtividade, mais um motivo para
preocupação dentro da rotina apertada do empregado. Além disto, não evita que os
administradores imponham a prorrogação gratuita da jornada de trabalho, utilizando-
se de artifícios que vão desde o compartilhamento de terminal por mais de um
empregado até a postergação, para depois do expediente, daquelas tarefas que não
dependem do sistema SISBB (arquivos, contatos telefônicos etc.) Isto é evidenciado
em alguns depoimentos:
[...] as mesas da plataforma não têm gaveta, sob a alegação de que o funcionário do atendimento não deve guardar nada para fazer depois. Só que, se você olhar dentro dos armários, vai encontrar um monte de coisas por fazer: clientes para contactar, cadastros para atualizar, limite de cheque especial para renovar, assinaturas para coletar, documentos para arquivar etc. (ENTREVISTADO 11, fev./2005). Tenho saudades de quando a gente “assinava” o ponto.[...] sou do tempo em que compensava ficar trabalhando depois do horário; gostava de resolver os desafios, achar as diferenças, fechar os balanços [...] hoje em dia tudo depende do ponto. Se você se atrasa o ponto não abre, se não fizer tudo dentro do horário o ponto fecha; nos dois casos é bronca na certa. [...] virei escravo do sistema, só trabalho se o sistema deixar. (ENTREVISTADO 9, jan./2005).
182
[...] o que o pessoal mais novo não percebeu é que o ponto eletrônico só serve para pressionar ainda mais o ritmo de trabalho [...] eu tenho “um caminhão de serviço” para fazer, um punhado de gente para atender e só seis horas à disposição [...] depois que o ponto fecha só se algum comissionado “abrir” um terminal no nome dele para eu trabalhar. (ENTREVISTADO 3, dez./2004). [...] mas eu tinha pouco tempo de Banco quando o ponto eletrônico foi implantado, por isso talvez não tenha sentido tanto quanto o pessoal mais velho. [...] esse negócio de você perder o acesso ao sistema depois que o ponto “cai” realmente é um “sa..”, principalmente porque todo mundo sabe que os comissionados ficam “abrindo” terminal para os postos efetivos continuarem trabalhando. [...] sem falar na necessidade de ficar monitorando o horário; se o ponto cair no meio de um serviço, temos que começar tudo de novo. (ENTREVISTADO 11, fev./2005).
Através do discurso da empresa, da observação participante e dos
depoimentos recolhidos através do Corpus de pesquisa, é possível se identificar o
cumprimento apenas parcial de alguns itens relacionados ao discurso do Banco,
motivo pelo qual foram detectadas contradições com relação:
- aos salários e vantagens, a partir da constatação de um discurso
voltado para adoção das práticas de mercado na retribuição aos seus
empregados, mas com a prática de política de arrocho salarial e
redução de vantagens e benefícios três vezes maior do que a da
concorrência, nos últimos cinco anos (1999/2004);
- à equidade de tratamento entre iguais, com o discurso direcionando
para ética e a responsabilidade social, mas com a falta de isonomia no
tratamento dado aos novos e aos antigos empregados, no que se
refere aos direitos a vantagens, benefícios e salários;
- à manutenção do plano de saúde e previdenciário, com o discurso de
ser o mantenedor e o patrocinador de condições favoráveis à qualidade
183
de vida, mas com a prática do corte em benefícios de aposentadoria,
com a efetiva redução nas contribuições para a Caixa de Assistência e
com a prática sistemática de uma jornada de trabalho que, marcada
pelo excesso de tarefas, compromete a saúde física e mental de seus
empregados;
- à melhora da qualidade de vida, com um discurso que divulga a
implementação de um programa de incentivo à melhoria da qualidade
de vida no trabalho (QVT), mas com a realização de apenas um projeto
piloto, que na realidade durou noventa dias e ainda provocou a dilação
da já sobrecarregada jornada de trabalho, única forma de viabilizar a
sua aplicação;
- ao combate à exploração do trabalhador, com o discurso de um ponto
eletrônico capaz de limitar os abusos de alguns administradores, mas
que na prática impôs ritmo de trabalho ainda mais desgastante e
sujeito à pressão do horário, além de não coibir efetivamente a
prorrogação de expediente gratuita.
Estas contradições entre o discurso organizacional e a prática gerencial
trazem conseqüências identificadas e percebidas pelo Corpus de pesquisa, algumas
delas semelhantes às relacionadas à mudança organizacional, confirmando desta
forma as observações realizadas. Entretanto, deve-se registrar que algumas dessas
conseqüências estão vinculadas a fatores diferentes:
184
- Pela falta de uma remuneração justa e adequada e pela falta de
equidade no tratamento: indiferença, falta de motivação, determinação
em deixar a empresa;
- Pela falta de condições para a realização de uma jornada de trabalho
adequada: desgaste físico e mental;
- Pela falta de condições de trabalho compatíveis com a saúde: doenças
ocupacionais (LER, obesidade e cardiopatias) e organismo debilitado;
- Pela falta de respeito às leis e direitos trabalhistas: revolta e
indisciplina; e
- Pela falta de liberdade para determinar as próprias tarefas: nível
reduzido de compromisso para com os negócios da empresa
Nos indivíduos do Corpus de pesquisa, o que se observa é a crença de que
as ações divulgadas pelo Banco realmente existem e que, apesar de estarem sendo
desenvolvidas dentro de uma estratégia favorável aos interesses da empresa, estão
direcionadas para a melhoria da satisfação do trabalho e do clima interno.
Entretanto, esses mesmos indivíduos têm também a plena consciência de
que, diante da situação experimentada em seus ambientes de trabalho, tais ações
não foram suficientes ou mesmo foram irrelevantes para que houvesse uma efetiva
melhora na satisfação para com o trabalho realizado, provocando nos empregados
uma atitude de rejeição e de negação das “pretensas” intenções do Banco.
Neste contexto, as condições psíquicas dos trabalhadores foram afetadas
negativamente por situações de conflito causadas pela incompatibilidade entre o que
era esperado dentro do ambiente de trabalho e as tarefas efetivamente
desempenhadas, proporcionando a vivência de tensões psicológicas relativas à
185
organização (CORRÊA, 2003; MENDES, 1999). Os empregados experimentaram
tanto situações de sobrecarga, marcadas por tensões prolongadas, como também
de sub-carga, caracterizadas pela impossibilidade de desenvolver e fazer uso da
capacidade psíquica em tarefas onde são requeridos estados permanentes de
atenção, de supervisão e de pressão por produtividade (LAURELL, 1985).
As conseqüências encontradas durante a abordagem da categoria satisfação
para com o trabalho, tais como falta de motivação e indiferença, também têm
influência sobre as percepções do trabalhador, no que diz respeito à gestão de sua
carreira profissional, conforme será visto a seguir.
5.3.3 Gestão de carreira
Para viabilizar a consecução dos objetivos previstos em seu Plano Diretor de
Recursos Humanos, no que diz respeito ao aprimoramento de seus trabalhadores e
reconhecimento do Valor do Capital Humano31, o Banco do Brasil lançou o
Programa Profissionalização32 em 1996, a TV Corporativa TVBB33 em 1998, o
Portal de Desenvolvimento Profissional34 (intra e internet) em 2001 e, em 2002, a
Universidade Corporativa Banco do Brasil – UNIBB, esta última destinada a dar
continuidade à evolução da educação corporativa. (BANCO DO BRASIL, 2005)
31 Vide anexo 2 32 O Programa Profissionalização surgiu em 1996 com o objetivo de estimular a discussão de assuntos sócio-organizacionais no contexto de um mundo em constante mutação e de proporcionar instrumentos para estimular a discussão de conceitos como empregabilidade, planejamento de carreira e autodesenvolvimento profissional (BANCO DO BRASIL, 2005d). 33 Experiência do Banco do Brasil em teletreinamento através de rede de televisão fechada. (idem, ibidem) 34 Substituído pelo portal da Universidade Corporativa Banco do Brasil – UNIBB. (BANCO DO BRASIL, 2005)
186
No Banco do Brasil, os funcionários têm a possibilidade de administrar sua trajetória funcional e de planejar a sua carreira. Um rico mercado de trabalho interno está à disposição de quem quer aproveitar suas aptidões e realizar suas vocações. Além das oportunidades de trabalho em áreas que demandam conhecimentos administrativos e econômicos (negócios, vendas, estratégias de mercado etc.), há também outras áreas correlatas que aproveitam aqueles que possuem competências nas áreas de Tecnologia, Direito, Logística, Pedagogia, Psicologia, Comunicação e Marketing, dentre muitas outras. O Programa Ascensão Profissional existe para auxiliar você a programar, reprogramar e gerenciar sua carreira, conciliando seus interesses, ambições e aptidões com as necessidades estratégicas da Empresa. Democratiza o acesso às oportunidades de ascensão e funciona como identificador de talentos necessários às várias especialidades de que a Empresa necessita. (BANCO DO BRASIL, 2005d).
Assumindo o seu papel, como principal instrumento na profissionalização dos
funcionários do Banco, no cumprimento de sua missão institucional, a Universidade
Corporativa Banco do Brasil – UNIBB tem como meta (BANCO DO BRASIL, 2005):
- Contribuir para o fortalecimento da imagem do Banco do Brasil; - Desenvolver a excelência humana e profissional de seus públicos; - Estimular a criatividade e a inovação; - Favorecer o desenvolvimento da cultura empresarial; - Ampliar as oportunidades de pesquisa; - Criar uma base corporativa de conhecimentos que assegura a
competitividade do Banco; - Estimular a organização de espaços educativos em todas as
unidades do Banco; - Ampliar a comunidade de aprendizagem do Banco do Brasil; - Expandir oportunidades educacionais ligadas à profissionalização,
ao desenvolvimento da cidadania, da qualidade de vida e da cultura;
- Democratizar o acesso ao conhecimento, por meio de recursos de educação à distância;
- Valorizar o papel de gestores e executivos, que atuam como educadores;
- Estabelecer parcerias com instituições de ensino.
E, ao mesmo tempo, desenvolver suas atividades buscando:
- Ser amplamente reconhecida pela qualidade de seus programas; - Ser percebida pelos funcionários como um importante espaço de
desenvolvimento pessoal e profissional;
187
- Contribuir para intensificar o relacionamento do Banco com a sociedade e o mercado;
- Contribuir com a ampliação dos negócios; - Desenvolver o Capital Intelectual da organização.
Quanto aos programas e ações de aprendizagem, tem-se que são
fundamentados em princípios filosóficos e organizacionais35, orientando-se pelos
seguintes propósitos:
- Desenvolver a excelência humana e profissional; - Prover soluções para problemas de desempenho profissional; - Aperfeiçoar a performance organizacional; e - Formar sucessores para quadros técnicos e gerenciais do Banco
do Brasil.
Quanto à produção e ao acesso ao conhecimento, ocorrem através de um
sistema que foi organizado para disponibilizar as seguintes oportunidades:
- Aprendizagem por meio de diversificadas e modernas tecnologias
educacionais, dentre as quais ensino presencial, treinamento em serviço e a distância (mídia impressa, vídeo, treinamento baseado em computador e na web);
- Programas em parceria com as melhores instituições de ensino do país;
- Variadas opções de autodesenvolvimento, tais como biblioteca para consultas a livros e periódicos especializados, bancos de teses, dissertações e monografias;
- Portal Virtual, com acesso via internet e intranet, que permite acessar publicações digitalizadas, biblioteca virtual, sumário de periódicos, trilhas de desenvolvimento profissional, treinamento baseado em tecnologia web, dentre outros.
Quanto à forma, o Banco do Brasil (2005) mantêm programas de Educação
Corporativa, voltados para o aperfeiçoamento contínuo dos seus funcionários:
- Ciclo de Palestras, destinado à atualização técnico-gerencial; - Cursos Internos, presenciais, auto-instrucionais e em serviço; - Programa de Formação e Aperfeiçoamento em Nível Superior, que
inclui: 35 Vide anexo 3
188
- Bolsas de graduação; - Bolsas de pós-graduação lato sensu, em nível de
especialização; - Bolsas de pós-graduação stricto sensu - mestrado e doutorado;
- Programa de Desenvolvimento em Idiomas Estrangeiros; - Programa BB MBA - Desenvolvimento da Excelência Técnico-
Gerencial; - Programa Excelência Executiva, destinado ao aperfeiçoamento das
competências estratégicas dos dirigentes do BB; - Outros eventos de atualização profissional - cursos, palestras e
congressos diversos.
A Tabela 5 – Universidade Corporativa Banco do Brasil em grandes números,
traz o resumo das atividades realizadas durante o ano de 2004:
Tabela 5 – Universidade Corporativa Banco do Brasil em grandes números
Número de Treinandos e de Horas de Treinamento em 2004
Modalidade de Treinamento Número de Treinandos
Horas de Treinamento
Cursos e Seminários Internos - Presenciais
Cursos Internos - Auto-Instrucionais e em Serviço
Eventos de Atualização e Cursos Contratados no Mercado
Seminários e Cursos Realizados no Exterior
Cursos do Programa BB MBA (pós-graduação lato sensu)
Cursos de Aperfeiçoamento em Idiomas Estrangeiros
Cursos de Graduação (bolsas em andamento)
Cursos de Especialização (bolsas em andamento)
Cursos de Mestrado e Doutorado (bolsas em andamento)
Programa Extraordinário de Aprimoramento Profissional e Pessoal
35.206
67.414
18.456
19
2.377
466
1.006
7.306
35
131.519
945.309
1.759.977
199.883
2.387
175.718
60.782
309.000
3.979.360
57.120
722.881
Totais 263.804 8.212.417
Fonte: Banco do Brasil (2005)
Para o Banco do Brasil (1996-) a gestão de carreira é realizada através da
orientação profissional, que é um processo de reflexão e planejamento da trajetória
profissional, no qual o empregado pode a qualquer momento de sua vida traçar
novos projetos. A gestão de carreira está diretamente ligada e é interdependente
com o programa de educação corporativa.
189
Entretanto, enfatiza ser necessário que, antes, o empregado promova o
conhecimento de suas próprias habilidades e competências para a construção de
seu projeto profissional, motivo pelo qual coloca à disposição dos interessados,
orientadores que poderão acompanhá-lo nesse processo.
Ainda segundo o Banco, os temas que podem ser associados à orientação
profissional são: orientação para o trabalho, orientação de carreira, planejamento de
carreira, coaching, mentoring, aconselhamento, recolocação profissional e
orientação vocacional.
O Programa de Orientação Profissional do Banco do Brasil presta ações de
suporte e apoio nos processos de escolha profissional e gestão da carreira, de
acordo com a estrutura do plano de cargos e salários vigentes na empresa.
A estrutura hierárquica e a forma de ascensão são ilustradas pela Figura 7 –
Degraus da ascensão, onde a linha cheia sinaliza o caminho principal da trilha de
ascensão profissional, percorrendo os vários níveis comissionados. A linha
pontilhada indica a possibilidade de se trilhar caminhos alternativos, o que pode
ocorrer especialmente por meio de programas corporativos ou processos seletivos
específicos.
Os números inseridos na Figura 7 – Degraus da ascensão representam os
diversos Adicionais por Função e Representação – AFR, mais conhecido
internamente como “comissão”, e são referentes aos diversos cargos de confiança
existentes na empresa. O número do AFR representa o valor adicionado ao salário
base e a importância do empregado na hierarquia da organização, quando no
exercício de cargo de confiança (cargo comissionado). Quanto menor for a
referência numérica, maior será o valor recebido e mais alto é o cargo ocupado
dentro da empresa. Exemplo: O AFR 13 corresponde à “comissão” de um
190
Assistente Administrativo, enquanto o AFR 1 corresponde à “comissão” de um
Executivo do Banco.
Figura 7 – Degraus da ascensão Fonte: Banco do Brasil (1996-)
O tipo de carreira é ilustrado pela Figura 8 – Estrutura de carreiras, sendo que
o nível básico é representado pelos empregados sem cargos comissionados, o nível
técnico por profissionais comissionados específicos (arquitetos, médicos,
engenheiros, agrônomos etc) e a linha gerencial por empregados com cargos
comissionados administrativos (agências e demais órgãos internos):
Figura 8 – Estrutura de carreiras Fonte – Banco do Brasil (1996-)
191
Como principal ferramenta no processo de gestão de carreira, o Banco do
Brasil (2005d) se utiliza de banco de dados em meio eletrônico com informações de
todos seus empregados, denominado Sistema Identificador de Talentos e
Oportunidades, ou simplesmente TAO:
O TAO é um banco de dados composto por dois módulos: Talentos e Oportunidades. Algumas informações constantes deste banco de dados são inseridas pelos funcionários; as demais são extraídas de outros sistemas e bancos de dados da Organização. É um sistema informatizado, utilizado pela empresa tanto para identificar talentos, facilitando o Recrutamento, quanto para evidenciar Oportunidades, apoiando o processo seletivo.
No sistema TAO estão consignados, como itens que compõem os Talentos,
todos os treinamentos realizados pelo empregado, tais como cursos técnicos,
superiores, de especialização, de pós-graduação, cursos de curta duração e
aplicados ao serviço, ou seja, todos os eventos registrados no PFP - Programa de
Formação Profissional do banco.
São registrados também todos os aspectos relativos ao exercício profissional
e o percurso do empregado ao longo de sua vida na empresa, ou seja, o seu
currículo funcional constituído com informações tais como a avaliação realizada
através da Gestão do Desempenho Funcional - GDP, o cargo atual, a relação dos
cargos exercidos e a indicação para cargos que está apto a ocupar, a relação de
conhecimentos por ele detidos com os respectivos níveis de aprofundamento e as
suas realizações mais significativas ao longo da carreira.
Em relação às Oportunidades, o TAO registra as características dos cargos
comissionados que compõe a estrutura hierárquica do Banco, os impedimentos e
pré-requisitos técnicos para o exercício dos cargos (experiências, formação e
conhecimentos necessários), a localização, a existência ou não de vagas para
192
concorrência aos cargos comissionados, sendo que, o que vai determinar a
classificação do funcionário numa determinada Oportunidade, é o conjunto das
informações constantes dos módulos Talentos e Oportunidades.
Além de facultar aos seus usuários as inscrições a cargos comissionados,
havendo ou não a ocorrência de vagas, as oportunidades que o TAO disponibiliza
também facilitam para o Banco as indicações e a escolha de colaboradores para
setores específicos e para a participação em grupos especiais de trabalho.
No tocante a avaliação do desempenho funcional, o sistema de Gestão do
Desempenho Profissional – GDP constitui-se em uma ferramenta de
acompanhamento do desempenho por competências, integrando desenvolvimento
profissional, desempenho e participação do empregado no dia-a-dia da organização.
(BANCO DO BRASIL, 2005d).
O sistema GDP proporciona a avaliação do desempenho do empregado,
através da inclusão de conceitos impostos por seus superiores hierárquicos, por
seus pares e por seus subordinados (se for o caso), relacionados ao
desenvolvimento de suas competências pessoais e diante de perspectivas ligadas à
área financeira, ao relacionamento com clientes, aos processos internos, ao
comportamento organizacional e à sociedade. Pressupõe que o processo de
avaliação ocorra de forma efetiva e ininterrupta, como forma de feedback
permanente a respeito do desempenho observado no dia-a-dia de avaliados e
avaliadores.
O sistema GDP proporciona ao empregado a possibilidade de elaborar, ao
final de cada ciclo avaliatório, um plano de desenvolvimento de competências que
irá auxiliá-lo em seu plano de carreira e desenvolvimento profissional. É também
através deste sistema que o empregado conseguirá pontuações que o habilitem ao
193
exercício de cargos comissionados e ao recebimento de sua participação na
distribuição dos lucros e resultados do Banco, ao final de cada semestre.
Na prática, todo o aparato construído pelo Banco para viabilizar uma
estratégia voltada para a aprendizagem e para a formação profissional de seus
empregados é verdadeiro, sendo percebido como tal pelo Corpus de pesquisa. Os
números apresentados comprovam a implementação do processo de educação
corporativa, o que, no entanto, não esclarece se os benefícios oferecidos
conseguem alcançar a todos os seus trabalhadores.
Sobre o tipo de aprendizado proporcionado pelos diversos meios disponíveis,
normalmente está direcionado às necessidades específicas do Banco, apesar de
existirem também opções que possibilitem a aquisição de conhecimentos
multidisciplinares e aplicáveis em diversas áreas empresariais, tais como direito,
contabilidade básica, negociação, informática, gestão de pessoas etc. Neste sentido
foram registradas apenas duas opiniões a respeito do assunto, transcritas a seguir:
[...] o treinamento destinado ao posto efetivo quase sempre é específico para você ser bancária. O que você aprende aqui, em suas rotinas de serviço, só serve para quem quer continuar a ser funcionário de banco. [...] antigamente o pessoal se especializava em cálculos financeiros, auditoria, análise de balanço, análise de cadastro e uma série de outras coisas que eram úteis tanto dentro de um banco como em outras empresas. [...] apesar de ser formada em Administração de Empresas, lembro pouca coisa dessas matérias, pois tudo que se fez no atendimento nos últimos anos foi utilizar um programa de computador que calcula quase tudo automaticamente. A metodologia da análise de crédito e de risco, por exemplo, é um segredo de estado que pouca gente conhece: a única coisa que se faz é alimentar o sistema com as informações do cliente e depois anotar o resultado. (ENTREVISTADA 12, fev.2005). [...] qualquer um que se limitar aos treinamentos patrocinados pelo Banco pode se considerar um futuro desempregado [...] principalmente porque no Banco o emprego não é mais garantido e, se acontecer a fatalidade dele sair, vai encontrar uma grande dificuldade em conseguir algo que preste no mercado de trabalho aí fora. (ENTREVISTADO 11, fev./2005).
194
Importante ressaltar que são cadastrados no TAO com pontuação válida para
se concorrer aos cargos comissionados, somente os cursos realizados por
intermédio da intranet ou através da presença em sala de aula. Os demais servem
apenas para complementar o currículo, para um eventual desempate entre
concorrentes.
Apesar das estatísticas apresentadas pela UNIBB serem significativas em
termo de quantidades, o que foi observado e registrado, através dos depoimentos
obtidos junto ao Corpus de pesquisa, aponta para uma divergência entre o que é
disponibilizado pelo Banco e o que é possível de ser concretizado pelos empregados
do ambiente delimitado pela pesquisa. Alguns depoimentos refletem esta
contradição:
Fazer curso auto-instrucional dentro de agências é quase impossível. Há serviço demais, tempo e gente de menos, indisponibilidade de espaço físico adequado e de terminais de computador para o acesso ao curso [...] quando tenho um tempinho livre em casa eu uso a internet para acessar o Portal da UNIBB [...] tem muita informação disponível. (ENTREVISTADA 1, nov./2004). Recentemente, o Banco instituiu a obrigatoriedade de que cada funcionário realizasse pelo menos trinta horas de treinamento por ano. [...] até pensei que a iniciativa fosse dar uma “amolecida” nos gerentes. Enganei-me, pois eles preferem priorizar a realização do atendimento a cumprir essa meta não financeira [...] com o Portal da UNIBB eu aprendo muito, tem muita coisa interessante [...] só que a gente tem que ter acesso à internet. (ENTREVISTADA 2, nov./2004). Só consegui fazer cursos dentro do Banco enquanto era comissionada. Depois que eu perdi a comissão, no final de 96, só me sobrou um punhado de cursos auto-instrucionais, daqueles que só se faz por intermédio do Portal da UNIBB na intranet. Mas como eles só podem ser realizados durante o horário de trabalho, por causa do ponto eletrônico, fico só na vontade [...] não tenho acesso à internet, mas quase todo mês peço um livro da biblioteca do Banco, que tem de tudo. (ENTREVISTADA 8, jan./2005). Curso eu só fiz o de introdução ao Banco do Brasil, que eles dão na primeira semana após a posse no Banco. Depois disso, nunca mais. [...] para começar, a prioridade para os cursos é dos comissionados. Posto efetivo só por um milagre sai da agência para fazer curso, pois tem sempre a desculpa do gerente: “não dá para te
195
liberar, está faltando gente no atendimento e o ‘seu Zé’ e a ‘dona Maria’ só voltam de férias no dia tal”. [...] o que salva é o Portal da UNIBB, não tem jeito de fazer curso em casa não, mas oferece uma grande quantidade de artigos e entrevistas com assuntos interessantes. (ENTREVISTADO 10, fev./2005).
Resultado dessa limitação, foi observado que apenas nove elementos do
Corpus de pesquisa utilizam, regularmente, os canais disponíveis fora do ambiente
das agências. Em virtude principalmente da indisponibilidade de recursos materiais,
os demais 25% deixam de usufruir os benefícios oferecidos.
Por outro lado, as constantes alterações promovidas nos critérios para a
ascensão na carreira profissional do Banco, desconsideradas as promoções
automáticas por antiguidade, provocam invariavelmente reviravoltas no
planejamento de carreira dos empregados. O conceito de empregabilidade
(contrato proteano), adotado a partir do ano de 1996 pelo Banco do Brasil (1996-),
provocou o rompimento unilateral de um “acordo de trabalho” que estava em vigor
há várias décadas. Sobre isso, foram registrados alguns depoimentos provenientes
de empregados com mais de quinze anos de Banco e que anteriormente ocupavam
cargos comissionados:
[...] depois, por volta de 1997, o Banco começou a pressionar para que a gente voltasse para a escola, dizendo que gerente sem curso superior não servia mais, que esse negócio de ficar esperando a vida passar atrás de uma mesa era coisa do passado [...] simplesmente jogaram para alto 10 anos de “ralação” que eu passei em cidades que não tinham sequer uma escola de 2º grau que prestasse para educar meus filhos. (ENTREVISTADO 3, dez./2004). [...] e de repente todo meu sacrifício dentro do Banco, em jornadas de até 12 horas por dia, trabalho em final de semana e tal, simplesmente não valiam mais nada. Antes, para fazer carreira, a gente tinha que ir para o “meio do mato”, trabalhar onde ninguém queria [...] o curso de Administração que eu comecei em 1983 e que abandonei no 8º período em 1987, porque para ser comissionado era preciso trabalhar full time, de repente passou a ser obrigatório para que eu continuasse minha carreira no Banco [...] como é que eu ia
196
voltar pra escola naquela altura do campeonato (1997), morando em cidadezinha do interior? (ENTREVISTADO 9, jan./2005).
Foram observados, também, alguns problemas de operacionalização do
sistema TAO – Talentos e Oportunidades. Os critérios de ascensão profissional,
considerados pelo TAO, possuem falhas que possibilitam o desrespeito do princípio
da igualdade, ao permitir que um administrador “manipule” uma lista de até vinte
candidatos para que um seja escolhido. Há ainda o fato de serem considerados os
mesmos critérios para cargos totalmente diferentes, tratando igualmente
profissionais com conhecimentos às vezes antagônicos e de áreas não relacionadas.
Alguns dos depoimentos refletem esses problemas:
[...] às vezes o TAO se torna mais uma ferramenta gerencial para “inglês ver” [...] não faz muito tempo recebi o telefonema do administrador da agência “x”. Quando ele perguntou se eu ainda estava interessado no cargo pelo qual estava concorrendo em sua agência, achei que iria conseguir minha primeira oportunidade em anos [...] o que na realidade ele queria era que eu retirasse minha concorrência, de forma a possibilitar que o “afilhado” dele ficasse entre os 20 primeiros da lista [...] apesar de ser uma prática relativamente comum entre os administradores das agências, acho isso um tremendo desrespeito. O TAO existe, funciona, mas quem tem um “padrinho” consegue as coisas mais facilmente. (ENTREVISTADO 9, jan./2005). Aqui mesmo na agência eu tive um exemplo da precariedade do atual sistema de concorrências: nosso colega foi selecionado através do TAO para participar de entrevistas e testes para o cargo de analista em Brasília; estudou feito um condenado; ficou uma semana em Brasília por conta do processo de seleção [...] No final, diz ele que por uma incrível coincidência, todas as vagas foram ocupadas por funcionários do próprio departamento que promoveu a seleção, um sem ter sequer formação na área pretendida. Para os demais, sobraram apenas os cargos dos que haviam sido “promovidos” após processo seletivo [...] É por esta e outras coisas do gênero que perdi o interesse em ficar no Banco. (ENTREVISTADO 6, jan./2005). [...] dos 3 colegas que tomaram posse junto comigo no interior de São Paulo, só um ainda continua no Banco; é comissionado no interior de Minas, trabalha 10 horas por dia para receber pouco mais de R$2.800 líquidos por mês. Diz ele que conseguiu a indicação para uma vaga na direção geral e dentro de pouco tempo vai para
197
Brasília, ganhar mais, trabalhar menos e largar de ficar se matando para cumprir metas, tentando vender produto do Banco para quem não quer comprar. (ENTREVISTADO 7, jan./2005). Cansei de ver “pára-quedista” cair dentro das agências. [...] de repente aparece um funcionário e, vindo não sei de onde, mas com um “QI” poderoso, toma o lugar de um colega que estava batalhando há vários anos pelo cargo [...] eu acho que o Banco tenta, mas ainda não conseguiu evitar este tipo de ocorrência, ainda não perdeu as características de “órgão público”, onde manda quem pode mais e obedece quem tem juízo [...] se eu tivesse “padrinho” você acha que eu estaria “atolado” no atendimento, morrendo de trabalhar? (ENTREVISTADO 3, dez./2004).
Entretanto, para um universo representado por mais de 83 mil funcionários, o
sistema TAO parece cumprir sua função de ordenar todo um processo de gestão de
carreira, que possui algumas centenas de opções em termos de cargos
comissionados. Porém, o que se tornou visível para o Corpus de pesquisa foram as
exceções registradas na sua experiência prática.
Quanto ao sistema GDP – Gestão do Desempenho Profissional, instrumento
utilizado pelo Banco para avaliar o desempenho e estimular o crescimento
profissional de seus empregados, foi constatada a existência de um certo grau de
rejeição e/ou de ceticismo ao processo de avaliação, tanto por parte dos avaliados
quanto por parte dos avaliadores.
Ficou registrada a percepção de que a GDP é uma carga a mais, carregada
em meio a uma infinidade de tarefas diárias. É considerado, pela maioria do Corpus
de pesquisa, como um processo elaborado para atender às necessidades
operacionais da empresa, mas que também proporciona auxílio para o crescimento
e orientação do empregado, quando bem executado.
Na prática, nem avaliadores e nem avaliados recebem preparação apropriada
para utilizar a ferramenta, fazendo com que o acompanhamento dos envolvidos no
processo seja realizado de forma precária. As anotações referentes às metas a
198
serem alcançadas são registradas no início de cada ciclo da avaliação (seis em seis
meses), com as anotações relacionadas ao desempenho alcançado sendo
registradas, para muitos, somente ao final do período.
Por envolver o cumprimento de metas pessoais e coletivas, financeiras ou
não, a GDP funciona também como um instrumento de pressão, intimidação e
coação, pois uma nota baixa ao final do período significa a não participação na
distribuição de lucros e o impedimento do empregado à concorrência a cargos
comissionados.
As observações realizadas foram confirmadas por depoimentos anotados
através das entrevistas junto ao Corpus de pesquisa, alguns transcritos abaixo:
[...] na teoria a GDP é uma beleza, mas na prática só serve para tomar um tempo que eu não tenho [...] pelo menos, do jeito que está, perturba só duas vezes por ano. (ENTREVISTADA 1, dez./2004). Pena que não funcione da forma como foi planejada, seria muito bom você ter condições de receber e proporcionar feedback em tempo real, enquanto a memória ainda está fresca e todo mundo lembra do que aconteceu. (ENTREVISTADO 4, dez./2004). [...] e daí eu só lembro da GDP quando está na hora do encerramento semestral, quando sou obrigado a colocar um “de acordo” em anotações que foram realizadas na véspera. (ENTREVISTADO 6, jan./2005). [...] tudo quanto é obrigação fica registrada lá, meu chefe só não lembra dos sacrifícios que a gente faz, do tipo ficar em pé por quase seis horas, sem sequer ir ao banheiro, para não deixar o cliente sem ninguém para ajudar. (ENTREVISTADO 10, fev./2005). [...] este ano começa a avaliação 360º. [...] agora eu quero ver coleguinha “puxar saco” de comissionado para receber notas altas e indicações para concorrer à comissão. Vai estar todo mundo de olho em todo mundo [...] (ENTREVISTADO 7, jan./2005). [...] por duas vezes já fiquei sem conseguir uma boa avaliação na GDP [...] os comissionados ficam te olhando atravessado, te rotulam como encrenqueira [...] tudo porque não concordei com os métodos que meu avaliador usa, obrigando o funcionário a fazer as coisas do jeito dele [...] não aceito este tipo de chantagem, vou continuar brigando até chegar o dia de assinar minha carta de demissão. Acho que agora falta pouco. (ENTREVISTADA 5, dez./2004).
199
De maneira geral, o discurso do Banco parece adotar um posicionamento
voltado à educação continuada, bem como ao processo permanente de formação
profissional de seu funcionário, ambos vinculados estreitamente à gestão da carreira
dentro da empresa. Tal posicionamento é pertinente com os conceitos e princípios
da carreira proteana, apresentados por Hall (1999, p. 9), na qual o profissional
procura se ajustar às demandas do ambiente, com flexibilidade e investimentos em
suas habilidades, qualificações e competências, mas sempre tendo consciência dos
seus objetivos individuais (MARTINS, 2001, p. 33).
As influências da classe social, do ambiente de origem e do sistema de
relacionamento desenvolvido durante a vida do indivíduo podem, segundo Filion
(1993), Lapassade (1969) e Martins (2001), determinar a forma como cada pessoa
irá formar sua “visão de mundo” e as dificuldades que irá enfrentar no planejamento
de seu futuro profissional.
Neste contexto, o Corpus de pesquisa apresentou uma característica que
tende a confirmar as teorias apresentadas por aqueles autores, uma vez que entre
os elementos que o compôs estão pelo menos seis empregados que se dizem
originários da classe média baixa, com a renda da família (pais e irmãos) não
ultrapassando os R$ 2.500 (dois mil e quinhentos reais) por mês: um possui apenas
o ensino médio; dois o curso superior incompleto; e três o curso superior em
andamento graças ao emprego “transitório” no banco.
A gestão estratégica e estrutural da carreira profissional, através do
autoconhecimento (personalidade, interesses e aptidões), com a contínua coleta de
informações sobre si mesmo e o mundo ao eu redor, o estabelecimento de metas e
formas de atingi-las (MARTINS, 2001, p. 36), pareceu não estar presente nas
200
respostas36 de pelo menos sete empregados pertencentes ao Corpus de pesquisa:
dois deles não têm qualquer planejamento ou perspectivas de futuro e cinco
aguardam, esperançosos por tempos melhores, a transformação de um ambiente,
hoje, desfavorável.
Apesar disso, todos os empregados entrevistados reconhecem que, para
tornar possível o sucesso de uma carreira profissional, dentro ou fora do banco, são
necessários determinados requisitos, tais como: o curso superior, de preferência
com pós-graduação; educação continuada; saber mudar de ambiente quando
necessário; e capacidade de adaptação às mudanças e exigências do mercado.
Tais requisitos são descritos por Reardon (1999) como pertencentes aos “domínios
do conhecimento.”
O estudo do discurso do Banco, a observação participante e os depoimentos
recolhidos através do Corpus de pesquisa possibilitaram a identificação de
contradições originadas no cumprimento parcial de itens relacionados à educação
corporativa e à gestão de carreira. As contradições detectadas foram relacionadas
principalmente ao posicionamento administrativo adotado pelos gestores das
agências e dizem respeito:
- À disponibilização de cursos durante a jornada de trabalho, com o
discurso oferecendo democraticamente oportunidades a todos, mas
com a prática trazendo a exigüidade do tempo disponível, imposta pelo
elevado volume de trabalho, assim como o maior direcionamento dos
cursos para os empregados detentores de cargos comissionados;
36 A síntese das respostas ao questionário de entrevista é apresentada no anexo 6
201
- à ascensão profissional através da concorrência por méritos e
competências, com o discurso direcionando para ética e apoiado na
imparcialidade do sistema TAO, mas com a prática revelando a
mudança constante de critérios de ascensão e as atitudes
protecionistas de alguns administradores (apadrinhamento);
- à existência de um sistema destinado ao gerenciamento do
desempenho profissional – GDP, com o discurso evidenciando um
processo capaz de proporcionar feedback imediato e os meios
apropriados para o aperfeiçoamento e crescimento profissional, mas
com a prática mostrando a utilização da GDP como instrumento de
pressão, intimidação e coação, além de proporcionar, em muitos
casos, o prometido feedback somente ao final dos períodos de
avaliação.
Estas contradições, entre o discurso organizacional e a prática gerencial,
trazem conseqüências identificadas e percebidas pelo Corpus de pesquisa:
- Pela falta de oportunidades para a participação nos cursos
patrocinados pelo banco: baixa ou nenhuma motivação, desânimo e
descrença na possibilidade de ascensão profissional;
- Pela falta de equidade e oportunidades justas no TAO: descrença no
sistema de ascensão profissional e adoção de atitudes condenadas
pelo código ético da empresa (conseguir padrinhos) e desânimo diante
da alteração constante de critérios de ascensão; e
- Pela falta de uma condução célere da GDP: cinismo, irritação e revolta.
202
Nos indivíduos do Corpus de pesquisa, o que se observa é a crença de que
as ações divulgadas, pelo Banco, realmente existem e que estão direcionadas para
o crescimento profissional do trabalhador.
Entretanto, esses mesmos indivíduos têm também a plena consciência de
que, diante do contexto apresentado em seus ambientes de trabalho, os recursos
disponibilizados pela UNIBB, as oportunidades propiciadas pelo TAO e o
acompanhamento tempestivo da GDP, não são acessíveis de forma igualitária para
todos os empregados, provocando uma atitude de rejeição e de negação das
virtudes anunciadas e prometidas pelo Banco.
Considerando que as contradições observadas interferem com a oportunidade
de crescimento profissional e a igualdade de oportunidades (WALTON, 1973),
novamente são experimentadas condições psíquicas que afetam negativamente a
realidade do trabalhador, aumentando as situações de conflito causadas pela
incompatibilidade entre o que é esperado e o que esta sendo efetivamente recebido
(CORRÊA, 2003; MENDES, 1999).
A seguir, com a síntese e a interseção das análises realizadas, será oferecida
resposta ao problema de pesquisa.
203
5.4 Resultado e análise final
A partir do resgate dos referenciais teóricos relacionados à mudança
organizacional, à gestão de pessoas, à satisfação para com o trabalho e à gestão de
carreiras, e através da utilização de técnicas metodológicas ligadas à pesquisa
documental, à observação participante, ao estudo de caso e às entrevistas semi-
estruturadas, o que se procurou obter foi resposta para a seguinte pergunta de
pesquisa:
Como as contradições entre o discurso organizacional e a prática
gerencial, dentro do ambiente delimitado por esta pesquisa,
afetam a satisfação para com o trabalho e a gestão de carreira do
trabalhador?
Através deste trabalho, foi possível demonstrar que o processo de
modernização da sociedade tem como possível conseqüência a mudança do
contexto organizacional que, por sua vez, pode gerar a necessidade de teorias
administrativas idealizadas com o propósito de amenizar os eventuais conflitos entre
capital e trabalho.
Tais teorias vêm sistematicamente alterando os discursos das organizações,
provocando, desta forma, também a necessidade de se alterar as práticas gerencias
utilizadas nos locais de trabalho.
A ausência e/ou a demora na eliminação das contradições entre o novo
discurso organizacional e a velha prática gerencial também podem, eventualmente,
ocasionar percepções contraditórias nos empregados, que tendem a polarizá-las em
204
dimensões opostas, mutuamente excludentes e inconciliáveis, tidas como paradoxos
organizacionais.
Os paradoxos organizacionais trazem conseqüências não previstas e não
desejáveis, tanto às organizações quanto aos seus empregados, provocando
situações que levam à insatisfação para com o trabalho e ao abandono de uma
possível carreira dentro das empresas.
Para o Corpus formado especificamente para essa pesquisa, o que se
percebeu foi a crença de que os conflitos referentes aos processos de trabalho são
inevitáveis e fazem parte do contexto organizacional, seja como forma de
acompanhar as tendências e exigências do mercado, seja para viabilizar o resultado
financeiro e econômico do Banco.
Entretanto, a partir do momento em que a insatisfação, o estresse ou
qualquer outro tipo de sofrimento dos empregados é causado por posicionamentos
ou atitudes que tenham origem dentro do ambiente administrativo de suas próprias
agências, tais sofrimentos se transformam em realidades operacionais opostas ao
prometido pelo discurso da empresa, que passam a não ser compreendidas e
nem aceitas como parte normal do contexto de trabalho.
Resgatando Vasconcelos e Vasconcelos (2004, p. 5) tem-se que:
Pode-se então definir o paradoxo como a representação, pelo indivíduo ou grupo, de sua experiência, sentimentos, crenças e interações através de dois estados aparentemente inconsistentes, de duas realidades opostas e aparentemente inconciliáveis. O indivíduo percebe a realidade por meio de uma proposição ‘A e não-A. Para esse indivíduo ou grupo, a fim de caracterizar-se como um paradoxo, deve haver o sentimento de que essas dimensões opostas são mutuamente excludentes e não podem coexistir ou serem conciliadas.
205
Através da utilização da observação participante, na condução deste estado
de caso, foi possível identificar como o Banco do Brasil provoca o surgimento de
contradições entre o seu discurso institucional e a prática administrativa levada a
termo em seis de suas agências bancárias, localizadas na cidade de Uberlândia
(MG), tendo como referência três categorias de pesquisa: a mudança organizacional,
a satisfação para com o trabalho e a gestão da carreira profissional.
O Quadro 6 – Origem das contradições entre o discurso e a prática, apresenta
de forma condensada os motivos que deram origem às contradições observadas
dentro do ambiente delimitado por esta pesquisa:
CATEGORIAS DE PESQUISA
Mudança Organizacional Satisfação para com o Trabalho
Gestão da Carreira Profissional
- busca prioritária pela rentabilidade em prejuízo da qualidade;
- imposição de novos estilos gerenciais, causando o descompasso entre a velocidade registrada para a comunicação da mudança e a sua efetiva operacionalização;
- constante alteração nas rotinas e do lançamento sistemático de novos produtos e serviços;
- imposição de metas e de meios para alcançá-las;
- adoção de novas tecnologias, que nem sempre se tornam disponíveis e operacionais em tempo hábil.
- prática de política de arrocho salarial e redução de vantagens e benefícios;
- falta de isonomia no tratamento dado aos novos e aos antigos empregados, no que se refere aos direitos a vantagens, benefícios e salários;
- corte em benefícios de aposentadoria
- redução nas contribuições para a Caixa de Assistência
- prática sistemática de uma jornada de trabalho com excesso de tarefas;
- realização de projeto piloto de Qualidade de vida, que provocou a dilação da já sobrecarregada jornada de trabalho;
- imposição do ponto eletrônico;
- prorrogação de expediente gratuita.
- exigüidade do tempo disponível para a realização de cursos, imposta pelo elevado volume de trabalho;
- maior direcionamento de cursos para detentores de cargos comissionados;
- mudança constante nos critérios de ascensão profissional;
- atitudes protecionistas de alguns administradores (apadrinhamento);
- utilização da GDP como instrumento de pressão, intimidação e coação, proporcionando o feedback somente ao final dos períodos de avaliação.
Quadro 6 - Origem das contradições entre o discurso e a prática
206
Dentro da abordagem referente ao processo de Mudança Organizacional,
foram observadas contradições entre o discurso organizacional e a prática gerencial,
contradições que geraram conseqüências não esperadas e indesejáveis ao Banco
do Brasil e aos seus empregados. A percepção das contradições por dez indivíduos
pertencentes ao Corpus de pesquisa confirmou a ocorrência do paradoxo
discurso versus prática, já que este grupo vem experimentando a existência
simultânea de duas realidades contraditórias em relação ao mesmo objeto.
Neste sentido, não foi registrada percepção contraditória no processo de
Mudança Organizacional para apenas dois elementos do grupo:
Eu não culpo os gerentes não. Eles são do jeito que são porque recebem ordens de cima e têm que se virar para cumpri-las. Se eles forem dar atenção para os todos os problemas de clientes e funcionários a coisa não vai andar direito. Afinal, de uma forma ou de outra, todo mundo tem algum tipo de problema, alguma desculpa para dar e um “se não” com argumento, não é mesmo? (ENTREVISTADO 10, fev./2005). [...] até eu ter condições de sair estou aceitando as regras do jogo, mesmo que elas mudem todo dia [...] eu acho que se a empresa não for ágil e se adaptar com rapidez ao mercado ela quebra; portanto, a gente tem que dançar conforme a música, e os gerentes são orientados para isso. (ENTREVISTADO 7, jan./2005).
Dentro da abordagem relativa à Satisfação para com o Trabalho, também
foram observadas contradições entre o discurso organizacional e a prática gerencial,
contradições que geraram conseqüências não esperadas e indesejáveis ao Banco
do Brasil e aos seus empregados. Entretanto, apesar de todos os elementos
entrevistados relatarem fatores de insatisfação, somente foram consideradas como
ocorrências relacionadas ao paradoxo discurso versus prática as percepções de
sete indivíduos pertencentes ao Corpus de pesquisa.
207
Para cinco empregados não houve a percepção simultânea de duas
realidades contraditórias, pois, ao entrarem para o Banco, já possuíam pleno
conhecimento do ambiente que iriam enfrentar e tinham data certa para deixar a
empresa. Assim, para eles, o ambiente em que estão reflete apenas o que era
esperado, um local onde o trabalho é desgastante, mas que será oportunamente
substituído. Como exemplo tem-se dois depoimentos:
Quando tomei posse no interior de Goiás, em 2000, eu já sabia o tamanho da encrenca [...] na minha cidade eu tinha alguns amigos que trabalhavam no Banco e que haviam me alertado para o fato de o Banco do Brasil não ser mais aquele paraíso de que a gente ouvira falar [...] não me vejo fazendo carreira aqui [...] foi o tempo em que se conseguia subir na vida com o salário do Banco. (ENTREVISTADO 6, jan./2005). [...] por duas vezes já fiquei sem conseguir uma boa avaliação na GDP [...] os comissionados ficam te olhando atravessado, te rotulam como encrenqueira [...] tudo porque não concordei com os métodos que meu avaliador usa, obrigando o funcionário a fazer as coisas do jeito dele [...] não aceito este tipo de chantagem, vou continuar brigando até chegar o dia de assinar minha carta de demissão. Acho que agora falta pouco. (ENTREVISTADA 5, dez./2004).
Finalmente, dentro da abordagem relativa à Gestão da Carreira
Profissional, foram observadas mais algumas contradições entre o discurso
organizacional e a prática gerencial, contradições que geraram conseqüências não
esperadas e indesejáveis ao Banco do Brasil e aos seus empregados. Semelhante
ao que foi registrado na abordagem sobre a satisfação para com o trabalho, apenas
parte dos elementos entrevistados relataram ocorrências que foram consideradas
como inerentes ao paradoxo discurso versus prática. Estas percepções foram
detectadas em cinco empregados pertencentes ao Corpus de pesquisa.
Com referência aos sete empregados que não experimentaram a experiência
relativa ao paradoxo dentro da gestão de carreira, dois deles declararam o seu
208
conformismo com a situação, alegando que não têm qualificação suficiente para
qualquer pretensão de carreira e que aguardam apenas a aposentadoria. Os outros
cinco empregados são os mesmos citados anteriormente e que têm data certa para
pedirem demissão e, por isso, não mantêm nenhum interesse em uma carreira
profissional dentro do Banco.
[...] Só fico triste porque não tenho perspectivas dentro do Banco, e para eu largar essa encrenca, vou ter que me aposentar. (ENTREVISTADO 9, jan./2005). [...] assim que me formar vou dar um jeito de mudar de profissão. (ENTREVISTADO 11, fev./2005).
Identificados os motivos das contradições, conhecidas as realidades
vivenciadas pelo trabalhador e confirmada a existência do paradoxo discurso versus
prática, em cada uma das categorias de pesquisa, no Quadro 7 – Causas e efeitos
das contradições entre o discurso e a prática são apresentados os efeitos
provocados pelas contradições existentes entre o discurso organizacional e a prática
gerencial, materializados pelos trabalhadores de seis agências de atendimento ao
público na cidade de Uberlândia (MG), empregados do Banco do Brasil S.A..
Para os empregados mais antigos, para quem o emprego no Banco do Brasil
caracterizava-se por uma espécie de ascensão social qualificada e onde estariam
embutidos os seus projetos de carreira e de vida, os efeitos causados na satisfação
para com o trabalho e na gestão da carreira profissional foram mais intensamente
percebidos e sentidos. Esses empregados agora experimentam, de forma
potencializada: a redução na satisfação pela realização do trabalho, traduzida pelo
baixo compromisso para com a empresa, pela baixa motivação, pela determinação
em deixar a empresa, pelo desgaste físico e mental, pela saúde debilitada, pela
revolta e pela indisciplina; o abandono da carreira no Banco, em virtude da
209
descrença na possibilidade de ascensão profissional, do desânimo diante das
constantes alterações nos critérios para a ascensão, do cinismo dos
administradores, da crescente irritação e da revolta diante da incapacidade de
reverter o quadro desfavorável.
Tais efeitos foram sentidos não porque o trabalho no Banco do Brasil faz
sofrer, já que a fama do “estressante” trabalho bancário é conhecida há várias
décadas (CARDOSO, 1997), mas sim pela perda de grande parte do valor social, da
estabilidade e da segurança, implícitas no “contrato de trabalho” e que
representavam uma significativa parcela dentro das retribuições oferecidas pela
empresa.
O funcionário do Banco do Brasil sofre mais do que os outros bancários, porque o Banco do Brasil mudou muito mais do que os outros bancos. No Banco do Brasil o projeto neo-liberal deixou mais marcas, porque ele não era só uma empresa para dar lucro e competir no mercado, e passou a ser. (CARDOSO, 1997, p. 140)
Para os empregados mais novos, as conseqüências provocadas pelas
contradições entre o discurso e a prática, também foram sentidas na categoria
satisfação para com o trabalho, para a qual foram observados e relatados
praticamente os mesmos fatores e conseqüências, mas impactaram de forma
bastante reduzida às pretensões ligadas à carreira profissional: conforme já exposto,
cinco empregados pertencentes ao Corpus de pesquisa não tinham qualquer
intenção em seguir uma carreira no Banco do Brasil.
Para esses cinco “novatos”, o emprego no Banco é apenas o instrumento
para a obtenção de um título acadêmico que possibilitará o exercício da verdadeira
profissão. Parecem fazer um uso mais instrumental do emprego na empresa,
encarando-o como uma possibilidade para realizarem seus projetos, já que o
210
reconhecimento social, a segurança e a boa remuneração que o Banco do Brasil
proporcionava foram destituídos pelas políticas implementadas nas últimas duas
décadas. (CARDOSO, p. 107; 132) .
CATEGORIAS DE PESQUISA
Mudança Organizacional Satisfação para com o Trabalho
Gestão da Carreira Profissional
- Pela falta de conhecimento e falta de tempo para a realização do aprendizado: insegurança na realização das tarefas;
- Pela incerteza e pela possibilidade de errar: medo;
- Pela velocidade das mudanças e pelo excesso de trabalho: estresse;
- Pela impossibilidade de influenciar na situação: nervosismo;
- Pela constante pressão psicológica: riscos à saúde;
- Pela falta de confiança no sistema e pela falta de credibilidade nas promessas da empresa: vergonha e vontade de abandonar o trabalho;
- Pela falta de recursos humanos e materiais: desgaste emocional e físico;
- Pela falta de perspectiva no futuro: tristeza e vontade de deixar o banco.
- Pela falta de uma remuneração justa e adequada e pela falta de equidade no tratamento: indiferença, falta de motivação, determinação em deixar a empresa;
- Pela falta de condições para a realização de uma jornada de trabalho adequada: desgaste físico e mental;
- Pela falta de condições de trabalho compatíveis com a saúde: doenças ocupacionais (LER, obesidade e cardiopatias) e organismo debilitado;
- Pela falta de respeito às leis e direitos trabalhistas: revolta e indisciplina;
- Pela falta de liberdade para determinar as próprias tarefas: nível reduzido de compromisso para com os negócios da empresa.
- Pela falta de oportunidades para a participação nos cursos patrocinados pelo banco: baixa ou nenhuma motivação, desânimo e descrença na possibilidade de ascensão profissional;
- Pela falta de equidade e oportunidades justas no TAO: descrença no sistema de ascensão profissional e adoção de atitudes condenadas pelo código ético da empresa (conseguir padrinhos) e desânimo diante da alteração constante de critérios de ascensão;
- Pela falta de uma condução célere da GDP: cinismo, irritação e revolta;
Quadro 7 – Causas e efeitos das contradições entre o discurso e a prática
211
6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sei que meu trabalho é uma gota no oceano. Mas sem ele, o oceano seria menor [...]
Madre Tereza de Calcutá.
Como parte da microestrutura que compõem a sociedade, as organizações
estão sujeitas às mudanças impostas pelas alterações na estrutura social, pela
modernização da tecnologia e pelo acirramento da concorrência em um mundo
globalizado. Pressionadas pela velocidade com que o ambiente externo tem
experimentado os processos de mudanças, as organizações enfrentam uma
frenética procura por novas práticas organizacionais, em busca de um melhor
relacionamento entre as pessoas e os processos produtivos, com o propósito de dar
continuidade à consecução eficaz de seus objetivos.
Dentro desta perspectiva, permeada por uma inesgotável necessidade de se
promover contínuos processos de mudanças organizacionais, as pessoas passaram
a ser alvo de uma maior atenção e a fazer parte dos discursos dos gestores, já que
estão diretamente relacionadas com alguns dos principais problemas identificados
pelos estudiosos do assunto, ou seja, a dificuldade de comunicar os objetivos da
organização; tornar esses objetivos compreensíveis para as pessoas; e fazer com
que as pessoas assimilem os objetivos e adotem as mudanças.
Dessa forma, observa-se, como característica mais marcante nos discursos
das empresas, a visão do homem como sendo o capital mais precioso da
organização. Na prática, entretanto, não se deve ignorar que se os homens
permanecerem com o “status” de recursos à disposição das empresas, dificilmente
212
serão reconhecidos como personalidades autônomas, sujeitos de direitos e sujeitos
que têm palavras a dizer.
Assim, o ambiente interno e externo das organizações de hoje é influenciado
por um elevado grau de ambigüidades e confusão, provocando o surgimento de
novos modelos administrativos e a busca pela redução do desgaste provocado por
um novo tipo de trabalhador, representado pelo indivíduo existencialista, que não
mais se ajusta facilmente à estrutura de valores organizacionais e institucionais
baseada em percepções e interesses previamente fixados, que se norteia pelos
variados pontos de referência adotados ao longo de sua vida e que tem um foco
central para o atingimento de seus objetivos (GUERREIRO RAMOS, 1984, p. 8-9).
Em certa medida isso explica porque, em situações organizacionais similares,
alguns trabalhadores se comportarão ou reagirão diferentemente no plano individual:
o conformismo ou a revolta, a aceitação ou a crítica, o sofrimento em maior ou
menor grau, a resistência ou a autodestruição têm raízes em grande parte na visão
de mundo individual e é indissociável da própria história, da própria experiência e
das vivências de cada um.
Neste estudo de caso, não se procurou quantificar tais comportamentos,
reações ou percepções, mas apenas descobrir se eles estão de alguma forma
relacionados com as contradições provocadas por um discurso institucional que não
é materializado dentro do contexto específico de trabalho. Mas o que foi observado
permitiu inferir que os processos de mudanças organizacionais trazem situações que
potencializam os conflitos existentes entre o capital e o trabalho, na medida em que
as organizações não conseguem implementar na sua prática gerencial, com a
necessária tempestividade, as promessas e intenções exaradas através de seus
discursos.
213
Permitiu inferir também que as contradições entre o discurso e a prática
existem e afetam a muitos, mesmo àqueles que conhecem o “jogo” e sabem que as
regras podem e serão mudadas sempre que a produtividade, a lucratividade, o
ganho financeiro e econômico estiverem ameaçados. Que o discurso será mudado
toda vez que os interesses e a hegemonia dos grupos dominantes estiverem sob
risco, com as promessas significando apenas intenções abstratas dentro de uma
realidade às vezes desfavorável ao trabalhador.
A famosa desconexão entre a teoria e prática, que tanto se discute nas organizações, talvez tenha sua explicação justamente na composição das imagens produzidas pela organização e pelo trabalhador. Por mais que se esforcem em denunciar a incoerência entre o que prega a organização e o que de fato pratica, os analistas organizacionais deparam freqüentemente com situações de denúncia vazia. [...] É no reino das intenções e promessas que o quotidiano da organização se realiza e, ingênua ou cegamente, se passa por cima de situações de evidente contradição e justifica-se a realização da imagem idealizada: somos mais o que pretendemos ser do que aquilo que realmente conseguimos ser. É, portanto, no seio do imaginário que se efetivam as relações entre a organização e o trabalhador: muito mais no desejo do que se quer ser do que nos recursos e meios disponíveis para isso ou aquilo que se pretende. (SCHIRATO, 2004, p. 56).
Este estudo de caso não teve como objetivo descobrir se o empregado do
Banco do Brasil sofre mais ou menos do que outros bancários, ou se existe alguma
forma de se evitar tal sofrimento, mesmo porque o estresse, a irritação e as doenças
ocupacionais, parecem fazer parte da atividade bancária.
Também não se pretendeu discutir ou mesmo avaliar se as contradições
existentes entre o discurso institucional do Banco do Brasil e a prática gerencial de
seus administradores, dentro do ambiente delimitado, são resultado de uma
estratégia deliberadamente planejada e implementada pela empresa.
214
Mas este estudo de caso demonstrou que as contradições existem e
impactam negativamente o trabalhador em sua satisfação para com o trabalho e em
sua gestão de carreira. Possibilitou descrever que tais contradições têm origem
também no posicionamento instrumental adotado por alguns administradores dos
ambientes de trabalho estudados, caracterizando adicionalmente a existência do
paradoxo entre valores declarados e atitudes.
Permitiu que a cobrança pela responsabilidade do empregado para com a
empresa pudesse ser observada na lógica utilizada para descrever a missão
institucional do Banco, traduzida por “Ser a solução em serviços e intermediação
financeira, atender às expectativas de clientes e acionistas, fortalecer o
compromisso entre funcionários e a empresa e ser útil à sociedade”: ao público
externo estabelece a prioridade de ações, ou seja, a prestação dos serviços e o
atendimento às expectativas; ao público interno, ao estabelecer a ordem com que
as palavras são inseridas na frase, infere que são os empregados que têm que
fortalecer o compromisso com a empresa, pressupondo a já existência do
compromisso da empresa para com seus empregados.
Ao se resgatar a frase que representava a missão estabelecida entre 1996 e
2003, verificar-se-á que não consta em seu conteúdo a referência aos empregados
do Banco, provavelmente devido ao fato daquele período ter sido utilizado para a
quebra da resistência interna ao processo de mudança, período em que a confiança
e o comprometimento dos empregados foram deliberadamente enfraquecidos por
iniciativa da própria empresa.
Para o Banco do Brasil, os benefícios das estratégias adotadas ao longo das
duas últimas décadas apontam para uma atuação financeira e econômica favorável,
com a consecução de crescentes e sucessivos lucros em seus balanços
215
patrimoniais, culminando com a projeção de um resultado líquido positivo de mais de
R$ 3 bilhões para o final do exercício de 2005.
Entretanto, no que diz respeito ao trabalhador, a convivência de vinte anos e
a observação participante, levada a termo pelo pesquisador, possibilitaram o
testemunho de situações marcadas pela insegurança, pela desconfiança em relação
à empresa e de desmotivação com relação ao futuro profissional, pela perda da
saúde e até mesmo, em casos de desespero extremo, pela perda da própria vida
diante da completa falta de perspectivas.
Talvez as políticas adotadas, pelo Banco, tenham realizado o prodígio de
tornar realidade a crença de que o sofrimento faça mesmo parte do contexto, que
esteja implícito no dia-a-dia de seu empregado. Mas tal situação não deve sofrer
solução de continuidade, pois mesmo que tais sofrimentos de fato não possam ser
eliminados, podem ser pelo menos amenizados através de relacionamentos
centrados na verdade e em compromissos que busquem o cumprindo tempestivo
dos discursos ou, no mínimo, com a não utilização de discursos organizacionais
montados para mascarar promessas que não se espera sejam cumpridas pelos
Gerentes responsáveis pelas agências aqui estudadas.
Neste sentido, as crescentes pressões realizadas pela sociedade, para a
emergência de um posicionamento ético dentro e fora das organizações, fazem com
que as responsabilidades política, cívica, ecológica e psíquica sejam cada vez mais
requeridas no ambiente organizacional, “não porque o dinamismo da organização
exige, mas porque é impossível, a quem quer que seja, ignorá-las, sob o risco de ver
triunfar unicamente o cinismo perverso.” (ENRIQUEZ, 1997, p.13).
Conclui-se, portanto, que os processos de mudança alicerçados em práticas
gerenciais contraditórias, em relação ao discurso institucional, podem ser os
216
responsáveis pela produção de ciclos viciosos geradores de conflitos e sofrimentos.
Mas também podem gerar ciclos virtuosos, se forem conduzidos com base no
diálogo franco entre as partes, se houver compromisso com a celeridade na
implantação efetiva das promessas dos discursos realizados e se forem respeitados
e conciliados os interesses de todos os envolvidos, ou seja, da sociedade, das
organizações e dos trabalhadores, promovendo o respeito e a efetiva valorização do
ser humano.
O mesmo homem que escraviza liberta. O mesmo homem que submete faz parceria. O mesmo homem que destrói pode generosamente operar o milagre da vida, da justiça, do progresso comum, da menor desigualdade entre iguais. (SCHIRATO, 2004, p. 30)
Encerrando, sugere-se a condução de trabalhos de pesquisa que busquem
identificar as conseqüências, trazidas à cultura organizacional, pelo paradoxo
discurso versus prática. Os ambientes, a exemplo do Banco do Brasil, seriam os
das empresas que passam ou passaram por grandes transformações em sua
política de gestão de pessoas, consideradas as conseqüências aqui registradas e o
significativo número de “novos empregados” que, insatisfeitos e inseguros quanto ao
futuro, deixam o trabalho por falta de expectativas que favoreçam a consecução de
uma carreira profissional de sucesso.
217
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231
ANEXOS
232
ANEXO 1
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DO BANCO DO BRASIL S.A
Fonte: Banco do Brasil (2005a)
233
ANEXO 2
O Valor do Capital Humano
Com quase dois séculos de história e participação expressiva no mercado
brasileiro, o Banco do Brasil foi construído por um corpo de funcionários altamente
comprometido e qualificado. Atualmente, o BB é um dos principais empregadores do
País, com 82,7 mil funcionários, 10,4 mil estagiários, 8,3 mil contratados
temporários, além de 4,7 mil adolescentes trabalhadores.
O perfil médio do funcionalismo do BB, com base em dados estatísticos, é o
do profissional do sexo masculino, entre 32 e 47 anos de idade, com curso superior.
O BB tem cerca de 37 mil funcionários graduados e 8 mil pós-graduados –
aperfeiçoamento, especialização, mestrado ou doutorado.
Na cultura do Banco do Brasil, encontra-se uma singularidade que motiva
profissionais de todas as idades: o BB é um banco comprometido com o
desenvolvimento do País e uma instituição financeira voltada para o mercado. Com
a nova máxima “Seus valores são os nossos valores”, o Banco ratifica mais uma vez
essa dualidade, que o torna único, assim como as pessoas que nele trabalham.
A maioria dos funcionários BB sente orgulho de fazer parte do Banco do
Brasil, tanto por perceberem que seu trabalho faz as cidades crescerem como, por
participarem de campanhas de vacinação promovidas pelo Banco em suas
agências, por exemplo. Do mesmo modo, consideram a Empresa totalmente inserida
no mercado e se esforçam para manter e conquistar negócios e posições de
liderança.
234
Da própria história da Empresa surgem características como flexibilidade e
grande capacidade de adaptação, que dão ao BB um diferencial em relação ao
mercado, colocando-o, muitas vezes, à frente de seus pares no desenvolvimento de
produtos e serviços, nas inovações tecnológicas, na gestão dos negócios e nas
estratégias de atuação.
Exemplos atuais são: o cartão Ourocard Visa Electron pré-datado; a
contratação de linhas de crédito por meio dos cartões Ourocard Visa (BB Crediário,
para Pessoas Físicas, e BB Giro Automático, para o segmento de microempresas); e
a estratégia de atuação Desenvolvimento Regional Sustentável (DRS).
A política de Gestão de Pessoas do Banco enfatiza o aprimoramento
profissional de seus funcionários, procurando compatibilizar habilidades e
expectativas individuais com as necessidades e os objetivos da Empresa; assegura
condições previdenciárias, assistenciais, de segurança e de saúde que propiciam
melhoria de qualidade de vida e do desempenho profissional; valoriza o trabalho
eficiente e inovador e reconhece o esforço individual e da equipe na construção do
resultado.
Fonte: reproduzido na íntegra de Banco do Brasil (2004)
235
ANEXO 3
Princípios Filosóficos e Organizacionais da Universidade Corporativa Banco do Brasil
Profissional do Banco do Brasil - o profissional do Banco é sujeito do seu
processo formativo: participa da ação que gera o seu próprio crescimento e o
desenvolvimento da Organização. É uma pessoa que, ao lidar com os desafios,
faz a diferença, na medida em que detém capacidade intelectual, conhecimentos e
valores que conferem um caráter único à Empresa. Pode, assim, contribuir para o
desenvolvimento das pessoas com as quais interage no dia-a-dia. É, também,
agente de resultados, capaz de posicionar o Banco do Brasil na liderança dos
mercados em que atua. De sua condição humana decorre que:
- É um ser situado, isto é, existe sempre numa situação específica e é por ela
determinado. Ele não pode existir fora de um lugar, de meio físico,
geográfico, histórico, cultural. As ações de educação Corporativa devem
alcançar esse ser humano, que vive nessa realidade concreta, ajudando-o
a conhece-la para transformá-la. Por isso, a Educação Corporativa é
realizada a partir do conhecimento e do respeito às condições reais do
funcionário do Banco;
- É um ser de consciência, isto é, ele não está abandonado à sua situação.
Como sujeito de consciência ele pode alcançar um distanciamento da
própria situação e abrir possibilidade de apreensão e análise crítica de sua
realidade. A Educação Corporativa deve acreditar e investir na capacidade
do funcionário de transcender e determinar essa realidade. Por isso, o
236
trabalho educativo se desenvolve por meio da reflexão crítica sobre o ser
humano, o Banco e a sociedade;
- É um ser de liberdade, isto é, ele é capaz de superar os condicionamentos
de sua situação, de nela intervir pessoalmente, aceitando-a, rejeitando-a ou
transformando-a. Se o funcionário é um ser capaz de decisões, de querer
ou recusar, de escolher, as ações de Educação Corporativa deverão se
desenvolver no sentido da compreensão e discussão de seus próprios
objetivos, assim como os do Banco do Brasil e da sociedade; e
- É um ser inacabado, que busca complementar-se na cooperação com
outros homens e mulheres, construindo um ambiente de igualdade - em
valor e dignidade - onde ninguém é tão rico que se possa conceber
completo, acabado.
O Alinhamento Estratégico - As ações da Universidade alinham-se com o
Direcionamento Estratégico do Banco do Brasil. Contribuem para a realização da
missão do Banco, a concretização de sua visão de futuro e o desenvolvimento de
suas crenças e valores, consolidando o compromisso da Organização com os
acionistas, os clientes, a sociedade e os funcionários.
O Trabalho - A Universidade Corporativa Banco do Brasil parte da
concepção de que o trabalho é criador de riquezas, desenvolvimento social e
qualidade de vida, além de espaço para o exercício da cidadania.
O Espaço Educativo - O Banco do Brasil constitui um espaço educativo
essencial na vida de seus profissionais. As políticas e os programas de educação
são formulados em estreita relação com o trabalho e operacionalizados por meio
de ações de capacitação e desenvolvimento de curta, média ou longa duração. A
237
educação para o trabalho desenvolve competências essenciais para a
Organização e consciência social e profissional para o indivíduo. Fundamenta-se
na relação indissociável entre o pensar e o fazer, como forma de evitar processos
de ensino e aprendizagem mecânicos e inibidores da criatividade. Os processos
de ensino são desafiadores, dinâmicos e fundamentados no diálogo.
Além disso, o espaço educativo estende-se às relações que o Banco
estabelece na sociedade e no mercado. Ele se amplia na medida em que a
Empresa influencia e é influenciada por esses relacionamentos, a partir de suas
ações cotidianas. Portanto, a Organização pode contribuir com ações de
desenvolvimento dirigidas aos familiares de funcionários, clientes, parceiros e
fornecedores, de modo a garantir a qualidade de seus relacionamentos negociais
e sociais.
A Estratégia Educacional - As ações da Universidade fundamentam-se na
estratégia de educação contínua, algo que ocorre ao longo de toda a carreira do
indivíduo, que está em constante processo de transformação e de crescimento. A
educação permanente representa a contínua construção do ser humano, do seu
saber e das suas aptidões, assim como da sua faculdade de julgar e de agir. As
experiências profissionais, as tecnologias de aprendizagem, as atividades culturais
e de lazer representam um potencial educativo que se soma à base educacional
formal oferecida pela sociedade.
As Ações Educacionais - As ações da Universidade são direcionadas à
expansão de oportunidades educacionais ligadas à profissionalização, ao
desenvolvimento da cidadania, da qualidade de vida e da cultura.
Fonte: reproduzido na íntegra de Banco do Brasil (2005)
238
ANEXO 4
ROTEIRO DE ENTREVISTAS
Data de realização: Hora: Tempo de duração:
Identificação do entrevistado
Nome (ou apelido): Sexo:
Idade: Agência:
Estado civil: Escolaridade:
Renda familiar dos pais (família de origem à época da entrada no Banco):
Tempo de banco: Local da Posse:
Em quantas dependências do banco já trabalhou:
Já exerceu cargos comissionados no banco:
Exerceu emprego anterior ao Banco:
Questionário
Parte 1
o Você já identificou ou percebeu alguma contradição entre os discursos referentes à melhoria das condições e relações de trabalho, divulgadas nos meios de comunicação internos e externos da empresa, e o que realmente é praticado dentro do ambiente de sua agência? Caso existam, qual(is) e a quê você atribui essas ocorrências? Em sua opinião, esta(s) contradição(ões) traz(em) algum tipo de reflexo para o seu trabalho? Qual(is)?
o As exigências realizadas pelos gerentes, referentes às metas a serem alcançadas e às tarefas a serem realizadas, são compatíveis com os recursos disponibilizados pela empresa (material, mão-de-obra, tempo de execução, qualidade de atendimento, tecnologia etc.)? Argumente sobre sua resposta?
239
Parte 2 o O quê você mais gosta e o quê você menos gosta em seu
emprego? Justifique sua resposta. o Quais são os fatores que você considera mais importantes para que
o seu trabalho seja realizado de forma a lhe proporcionar satisfação em realizá-lo? Justifique sua resposta.
o Seu trabalho é realizado de forma a lhe proporcionar condições de melhorá-lo continuamente? Você tem autonomia para adequá-lo às suas necessidades pessoais (forma e tempo de atendimento ao cliente, desgaste físico e emocional, pressão do ambiente etc.)? Justifique sua resposta.
o Seu trabalho lhe proporciona boas condições econômicas e sociais fora da empresa, satisfazendo suas necessidades pessoais? Justifique sua resposta.
Parte 3
o Quais habilidades e capacidades você julga importante para o profissional nos dias atuais? Justifique sua resposta.
o O que tem feito para ampliar suas capacidades e habilidades? o Você está satisfeito com a sua carreira dentro da empresa? Ela é
compatível com suas pretensões profissionais e pessoais? Justifique sua resposta.
o Quais são suas perspectivas de carreira dentro da empresa? Justifique sua resposta.
o A empresa lhe oferece possibilidades de desenvolvimento pessoal, efetivas e exeqüíveis, dentro de seu ambiente de trabalho (desenvolvimento de carreira, treinamento, oportunidades de promoção etc)? Elas são aproveitadas? Justifique sua resposta.
o Você tem algum plano para o seu futuro profissional? Qual(is)?
240
ANEXO 5
PERFIL INDIVIDUAL DOS ELEMENTOS DO CORPUS DE PESQUISA
Nome: ENTREVISTADO 1
Localização: AGÊNCIA 1
Sexo: feminino
Formação: Ensino médio
Tempo de Banco (anos): 19
Idade (anos): 38
Estado civil: Casada
Renda família de origem (R$): Não sabe
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 5
Exercício de comissão: Sim
Emprego anterior: Sim
Data da entrevista (mês/ano): Nov./2004
Nome: ENTREVISTADO 2
Localização: AGÊNCIA 1
Sexo: feminino
Formação: Superior completo
Tempo de Banco (anos): 16
Idade (anos): 37
Estado civil: Casada
Renda família de origem (R$): 2.500 a 5.000
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 5
Exercício de comissão: Sim
Emprego anterior: Sim
Data da entrevista (mês/ano) : Nov./2004
Nome: ENTREVISTADO 3
Localização: AGÊNCIA 2
Sexo: masculino
Formação: Ensino médio
Tempo de Banco (anos): 19
Idade (anos): 40
Estado civil: casado
Renda família de origem (R$): 1.000 a 2.500
Local de trabalho: plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 6
Exercício de comissão: sim
Emprego anterior: sim
Data da entrevista (mês/ano) : Dez./2004
Nome: ENTREVISTADO 4
Localização: AGÊNCIA 2
Sexo: masculino
Formação: Superior em andamento
Tempo de Banco (anos): 5
Idade (anos): 27
Estado civil: solteiro
Renda família de origem (R$): 1.000 a 2.500
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 2
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano) : Dez./2004
241
Nome: ENTREVISTADO 5
Localização: AGÊNCIA 3
Sexo: feminino
Formação: Superior em andamento
Tempo de Banco (anos): 6
Idade (anos): 34
Estado civil: casada
Renda família de origem (R$): 1.000 a 2.500
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 2
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Dez./2004
Nome: ENTREVISTADO 6
Localização: AGÊNCIA 3
Sexo: masculino
Formação: Superior em andamento
Tempo de Banco (anos): 5
Idade (anos): 24
Estado civil: Solteiro
Renda família de origem (R$): 1.000 a 2.500
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 2
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Jan./2005
Nome: ENTREVISTADO 7
Localização: AGÊNCIA 4
Sexo: masculino
Formação: Superior completo
Tempo de Banco (anos): 7
Idade (anos): 25
Estado civil: Solteiro
Renda família de origem (R$): 2.500 a 5.000
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 2
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Jan./2005
Nome: ENTREVISTADO 8
Localização: AGÊNCIA 4
Sexo: feminino
Formação: Ensino médio
Tempo de Banco (anos): 22
Idade (anos): 45
Estado civil: Casada
Renda família de origem (R$): 2.500 a 5.000
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 5
Exercício de comissão: Sim
Emprego anterior: Sim
Data da entrevista (mês/ano): Jan./2005
242
Nome: ENTREVISTADO 9
Localização: AGÊNCIA 5
Sexo: masculino
Formação: Superior incompleto
Tempo de Banco (anos): 22
Idade (anos): 43
Estado civil: casado
Renda família de origem (R$): 1.000 a 2500
Local de trabalho: Plataforma
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 5
Exercício de comissão: sim
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Jan./2005
Nome: ENTREVISTADO 10
Localização: AGÊNCIA 5
Sexo: masculino
Formação: Superior incompleto
Tempo de Banco (anos): 5
Idade (anos): 23
Estado civil: solteiro
Renda família de origem (R$): 1.000 a 2.500
Local de trabalho: Auto-atendimento
Local de posse no BB: Outro local
Agências por onde passou: 2
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Fev./2005
Nome: ENTREVISTADO 11
Localização: AGÊNCIA 6
Sexo: masculino
Formação: Superior em andamento
Tempo de Banco (anos): 5
Idade (anos): 29
Estado civil: Solteiro
Renda família de origem (R$): 2.500 a 5.000
Local de trabalho: Auto-atendimento
Local de posse no BB: Uberlândia
Agências por onde passou: 1
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Fev./2005
Nome: ENTREVISTADO 12
Localização: AGÊNCIA 6
Sexo: feminino
Formação: Superior completo
Tempo de Banco (anos): 17
Idade (anos): 38
Estado civil: casada
Renda família de origem (R$): Acima de 5.000
Local de trabalho: Auto-atendimento
Local de posse no BB: Uberlândia
Agências por onde passou: 2
Exercício de comissão: Não
Emprego anterior: Não
Data da entrevista (mês/ano): Fev./2005
243
ANEXO 6
SÍNTESE DAS RESPOSTAS ÀS PERGUNTAS
DO ROTEIRO DE ENTREVISTAS
Dentro da abordagem relacionada à satisfação para com o trabalho, é
relacionada abaixo a síntese das respostas ao questionário utilizado nas entrevistas
realizadas junto ao Corpus de Pesquisa:
- Sobre o que mais gosta e o que menos gosta no emprego
o os doze empregados estão assustados com a grande
quantidade de serviço, com a pressão pelo cumprimento de
metas cada vez mais ousadas e com a falta de solidariedade
dos administradores. Também estão insatisfeitos com os
salários,
o seis empregados dizem ainda gostar da segurança e dos
benefícios que ainda são mantidos pelo Banco, apesar das
reduções experimentadas nos últimos anos,
o nove empregados apreciam o clima de camaradagem e
coleguismo entre os iguais.
- O mais importante para a realização do trabalho com satisfação
o Constaram da resposta de cinco empregados o domínio e o
conhecimento sobre o que está fazendo, gostar do que faz e
a liberdade de escolha em como trabalhar,
244
o Para seis empregados, a possibilidade de fazer bem feito o
trabalho e oferecer qualidade e satisfação aos clientes,
o Foram mencionados por todos os doze a disponibilidade de
recursos suficientes (material e pessoas) para realizar seu
trabalho com qualidade e dentro do horário normal de
expediente.
- Sobre a forma como o trabalho é realizado, sobre autonomia e
necessidades pessoais
o Todos em responderam que não têm condições de melhorar
o trabalho continuamente e nem a possibilidade de adequá-lo
às suas necessidades pessoais. As justificativas são
baseadas na padronização das normas e instruções, na falta
de tempo e no excesso de trabalho, na imposição de
condutas e na falta de flexibilidade de alguns
administradores.
- Sobre as condições econômicas e sociais fora da empresa
o sete empregados entendem que por se tratar do Banco do
Brasil os salários deveriam ser maiores, mas pela natureza
dos serviços automatizados, que exigem pouca qualificação,
e se for considerada a carga semanal de apenas trinta horas,
a quantia ainda é razoável,
245
o o gasto com a aparência pessoal incomoda aos doze, motivo
pelo qual em algumas agências as mulheres resolveram pela
adoção de um uniforme,
o para quatro dos sete empregados casados há a necessidade
de complemento da renda familiar. Já para os cinco
empregados solteiros a renda é suficiente, apesar de
entenderem que ganham menos do que gostariam,
o os seis mais antigos reclamam do congelamento e da
redução real nos salários, da perda dos anuênios e redução
no valor das promoções automáticas por tempo de serviço,
o os seis mais novos lamentam não terem direito à licença-
prêmio e aos cinco abonos acumuláveis.
Dentro da abordagem relacionada à gestão da carreira profissional, é
apresentada abaixo a síntese das respostas ao questionário utilizado nas entrevistas
realizadas junto ao Corpus de Pesquisa:
- Sobre a satisfação com a carreira atual e a sua compatibilidade com
as pretensões profissionais
o dois empregados afirmaram que estão parcialmente
satisfeitos e que não querem deixar o Banco, mas têm
restrições referentes à evolução dos salários e à velocidade
com que são efetuadas as mudanças nas “regras do jogo”,
246
o dois empregados afirmaram que estão conformados com a
situação, pois não possuem qualificação para outras
pretensões.
o Seis empregados não estão satisfeitos com a carreira. Um
em virtude das dificuldades encontradas na ascensão
profissional e os outros cinco por que já não tinham maiores
pretensões quando entraram, por entenderem ser
possuidores de potencial suficiente para enfrentar o mercado
de trabalho,
o dois empregados alegam que ainda não refletiram sobre
isso.
- Quanto às habilidades e capacidades julgadas necessárias e
importante para o profissional nos dias atuais
o os requisitos que apareceram nas respostas de pelo menos
dois empregados foram: curso superior, de preferência com
pós-graduação, educação continuada, saber mudar de
ambiente quando necessário e capacidade de adaptação às
mudanças e exigências do mercado.
- Sobre as providências para ampliar capacidades e habilidades
pessoais
o oito empregados se dedicam a o exercício da leitura de
jornais, revistas e livros,
o quatro empregados estão concluindo o curso superior,
247
o dois empregados não estão fazendo nada, mas alegam que
pretendem voltar para a escola.
- Sobre as possibilidades de desenvolvimento profissional e pessoal
oferecidas pela empresa dentro do ambiente de trabalho
(desenvolvimento de carreira, treinamento, oportunidades de
promoção etc.)
o A conclusão oferecida pelas respostas da maioria é de que a
empresa disponibiliza os meios e as oportunidades, apesar
de na prática serem inacessíveis para uma parte dos
empregados. As bolsas de estudo são ótimas, assim como
também as bibliotecas e o Portal da UNIBB . Mas os cursos
internos, que contam pontos para as concorrências através
do TAO, são de difícil operacionalização pela falta de
conciliação entre os interesses de empregados e
administradores das agências.
- Quais são suas perspectivas de carreira dentro da empresa?
o dois empregados não têm nenhuma, apenas fazem seu
trabalho da melhor forma possível e esperam pela
aposentadoria,
o cinco empregados ainda têm esperanças de ser
comissionados, pois acreditam que, da mesma forma que o
Banco mudou para pior, um dia poderá reverter o processo,
o cinco não pretendem seguir carreira de jeito nenhum.
248
- Quanto aos planos para o futuro
o dois empregados pretendem trabalhar por conta própria, em
seu próprio negócio, mas não têm qualquer planejamento
específico neste sentido,
o três pretendem entrar/voltar para a faculdade e,
oportunamente, exercerem uma profissão fora do banco,
o dois vão esperar a aposentadoria antes de planejar alguma
coisa,
o cinco pretendem mudar de empregador o mais rapidamente
possível.