UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁRicardo Paleari da Silva
SIMETRIAS EM GEOMETRIA E FÍSICA
Curitiba, 2011.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁRicardo Paleari da Silva
SIMETRIAS EM GEOMETRIA E FÍSICA
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Matemática Aplicada da Universi-dade Federal do Paraná, como requisito parcial àobtenção do grau de Mestre em Matemática Apli-cada.
Orientador: Prof. Dr. Eduardo Outeiral Correa
Hoefel.
Curitiba, 2011.
Agradecimentos
Confesso que é realmente muito difícil escrever sucintamente um agradecimento a todos
aqueles cuja existência é, ou foi, essencial até o presente momento de minha vida. Se eu fosse
listar aqui todos os nomes importantes, provavelmente eu gastaria muitas horas digitando (bem
gastas certamente), porém, o espaço é curto para isto.
Quero agradecer aos meus amigos e colegas, desde os amigos de infância até os mais recentes
da universidade. Certamente eles são os principais responsáveis por muitos de meus momen-
tos mais felizes e das minhas peculiares risadas.
À Lilian, pelos ótimos momentos que somente com ela eu poderia ter vivido. Certamente ela é
uma pessoa com a qual posso contar em qualquer momento da minha vida, além de ser prova-
velmente a única pessoa no mundo que consiga me aguentar.
Um obrigado também ao Prof. Dr. Eduardo Hoefel, por ter me orientado neste trabalho e tam-
bém por ter me mostrado outras maneiras interessantes de pensar e ver matemática. Certa-
mente tudo isso fez com que eu evoluísse muito em vários sentidos. Não poderia deixar de
agradecer também pelos chocolates dos finais de semana.
Agradeço à CAPES pelo apoio financeiro. Agradeço também ao PPGMA por ter oferecido uma
estrutura razoável para que eu realizasse meus estudos nestes dois anos de mestrado. Agradeço
a todos aqueles professores que me ajudaram tanto durante toda a minha estadia na UFPR,
e também a aqueles que trabalham arduamente para que o departamento de matemática da
UFPR, seus cursos de graduação e seus programas de pós-graduação melhorem cada vez mais,
os quais espero que, num futuro próximo, sejam grandes referências em ensino e pesquisa de
ótima de qualidade.
Finalmente, agradeço aos meus pais por serem responsáveis pela pessoa que sou hoje, e por
todo o apoio que sempre tive para chegar onde estou. Tenho certeza de que minha mãe estaria
muito feliz se pudesse ler isto agora.
ii
“Algo só é impossível até que alguém duvidee acabe provando o contrário.”
Albert Einstein
“Uma geometria não pode ser mais verdadeira do que outra;poderá ser apenas mais cômoda.”
Henri Poincaré
“Nenhuma grande descoberta foi feita jamaissem um palpite ousado.”
Isaac Newton
“Rein!”
Resumo
O objetivo desta dissertação é fazer um estudo mostrando algumas ligações entre geometria
e física utilizando conexões em fibrados principais. Mais especificamente, descreveremos as
geometrias clássicas como exemplos de espaços simétricos e, além disso, mostraremos exem-
plos de field strenghts como expressões de conexões em certos fibrados principais. Começamos
fazendo uma apresentação sucinta dos conceitos: fibrado principal, conexão e curvatura. Em
seguida, dividimos o trabalho em duas direções. Na primeira, usamos a linguagem de fibrados
principais e conexões para definir o conceito de espaço simétrico e escrevemos, nestes termos,
as geometrias clássicas (simplesmente conexas) de curvatura constante: a geometria Esférica, a
geometria Hiperbólica e a geometria Euclidiana. No segundo, apresentamos uma relação entre
as fibrações de Hopf e alguns temas oriundos da física teórica: o eletromagnetismo e a teoria de
Yang-Mills.
Palavras-chave: conexão em fibrado principal, curvatura, espaço simétrico, fibrados de Hopf,
eletromagnetismo, teoria de Yang-Mills.
iv
Abstract
The aim of this work is to make a study showing some relations between geometry and physics
using connections on principal fiber bundles. More specifically, we will describe the classical ge-
ometries as examples of symmetric spaces and, besides, we will show examples of field strenghts
as expressions of connections in some principal fiber bundles. We start doing a quick presen-
tation of the concepts: principal fiber bundle, connection and curvature. In the following, we
divide the work in two directions. First, we use the language of principal fiber bundles and con-
nections to define the concept of symmetric space and we write, in these terms, the classical
geometries (simple connected) of constant curvature: the Spherical geometry, the Hyperbolic
geometry and the Euclidean geometry. Next, we present a relation between the Hopf’s fibrati-
ons and some topics arising from theoretical physics: the eletromagnetism and the Yang-Mills’
theory.
Keywords: connection on principal fiber bundle, curvature, symmetric space, Hopf ’s bundles,
electromagnetism, Yang-Mills’ theory.
v
Sumário
Introdução 1
1 Conceitos e resultados preliminares 4
1.1 Fibrados Principais e exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 Fibrados Associados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
1.3 Conexões em Fibrados Principais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
1.4 Forma de curvatura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
1.5 Fibrados Vetoriais e conexões lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2 Simetrias em Geometria 36
2.1 Espaços Homogêneos Simétricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
2.2 Transformações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
2.3 Exemplos de Espaços Homogêneos Simétricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
2.3.1 Geometria Esférica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51
2.3.2 Geometria Hiperbólica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
2.3.3 Geometria Euclidiana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
3 Simetrias em Física 61
3.1 Álgebra dos Quatérnios e Espaços Projetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
3.2 Fibrados de Hopf . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67
3.2.1 Fibrado Complexo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
3.2.2 Fibrado Quaterniônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
3.3 Fibrados sobre esferas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
Referências Bibliográficas 99
vi
Introdução
Estruturas fibradas têm sido objetos de fundamental importância em grandes áreas da mate-
mática e da física desde algumas décadas atrás. Na geometria diferencial, por exemplo, temos
naturalmente os fibrados vetoriais, nos quais guardamos ao mesmo tempo informação da vari-
edade base e, sobre cada ponto desta, guardamos também informação sobre o espaço vetorial
típico daquele fibrado vetorial em questão (por exemplo, o espaço tangente naquele ponto, o
espaço dual, espaço dos tensores, etc...). Outro exemplo é o fibrado de referenciais de uma va-
riedade, em que colocamos sobre cada ponto desta o conjunto de todas as bases ordenadas
do espaço tangente correspondente. A estrutura fibrada mais simples que podemos ter é um
produto cartesiano X × Y , o qual é pensado como uma estrutura fibrada sobre X e, em cada
ponto x ∈X , a fibra é uma cópia do espaço topológico Y , de modo que X ×Y pode ser pensado
como uma “colagem” de cópias da fibra Y sobre cada ponto x de X . Esta é a maneira mais
simples de fazer tal colagem. Uma estrutura fibrada em geral segue a mesma ideia, porém nem
todas são obtidas globalmente como um produto cartesiano, o que se exige é que isso aconteça
pelo menos localmente. Isso se tornará mais preciso posteriormente. Um dos objetos mais
importantes quando se considera um fibrado é o tipo de fibra que usamos. Nos casos de nosso
interesse, os fibrados terão uma “fibra típica”, sendo que nesta fibra age um grupo, chamado de
grupo estrutural do fibrado. Dependendo da situação, a fibra típica pode ter tipos de estruturas
diferentes, sendo, por exemplo, topológica, vetorial, de grupo de Lie, entre outras.
Nesta dissertação lidaremos com fibrados principais e seus fibrados associados (em particu-
lar, fibrados vetoriais). Sem muito rigor, podemos dizer que um fibrado principal é um fibrado
cuja fibra típica é o grupo estrutural e, além disso, a ação nas fibras é dada por translações à
esquerda. Um exemplo clássico que procura motivar uma tal estrutura é o seguinte: partículas
se movendo em uma região e que interagem. Por motivos físicos, é importante entender como
é a variação da fase destas partículas, porque sua fase relativa tem consequências observáveis.
A fase de uma partícula é representada por um número complexo de módulo 1 (isto é, um ele-
mento do grupo S1). Se o movimento de uma partícula é modelado em uma variedade M , uma
1
2
maneira para tentar manter o controle de variação da fase desta partícula é colocar em cada
ponto da variedade M uma cópia de S1 como fibra, e considerar assim um fibrado sobre M fa-
zendo uma “colagem” destas fibras (este fibrado é chamado de espaço de fases). O movimento
da partícula, pensado neste espaço de fases, é um exemplo de seção local deste fibrado. Neste
caso a fibra típica é o próprio grupo, que age por translações (rotações). Posteriormente, estu-
daremos esse exemplo com mais detalhes. O objeto que de fato tem o papel de medir a variação
da fase é uma conexão neste fibrado. Veremos que uma conexão em um fibrado principal induz
uma conexão em cada fibrado vetorial associado, o que corresponde a uma noção de derivação
de seções. No caso particular em que o fibrado vetorial é o fibrado tangente, recuperamos a no-
ção de conexão da geometria Riemanniana, ilustrando que a partir do estudo de conexões em
fibrados principais é possível, de certa maneira, estudar questões de geometria Riemanniana.
O exemplo de origem física do parágrafo anterior nos diz que a linguagem de fibrados prin-
cipais e conexões pode modelar questões teóricas do eletromagnetismo. De fato, o eletromag-
netismo foi a primeira teoria a ser considerada como um exemplo de Teoria de Calibre. Algumas
destas teorias têm o papel de tentar unificar em uma única linguagem certas forças da natureza.
Nesta linguagem, o eletromagnetismo é uma teoria de Calibre de grupo U (1) = S1 (abeliano),
que tem o papel de unificar as forças elétrica e magnética. Em 1954, C. N. Yang e R. Mills in-
troduziram uma teoria de Calibre, de certa maneira análoga à teoria do eletromagnetismo, para
tentar modelar a interação forte entre os nucleons de um átomo. Esta teoria, chamada de Teoria
de Yang-Mills, é uma teoria de Calibre com grupo SU (2) (não abeliano). Assim como no eletro-
magnetismo temos as Equações de Maxwell, existem também as equações de campo na teoria
de Yang-Mills. Em 1970, Sir Michael Atiyah começou a estudar a matemática das soluções des-
tas equações. Daí em diante muita matemática apareceu como consequência desses estudos,
com trabalhos de S. Donaldson, M. Freedman (existência deR4 “exóticos”), entre outros.
Dada assim um preliminar do que é a teoria de fibrados e um pouco da sua importância,
vamos comentar o que será feito nesta dissertação. No capítulo 1, apresentamos os conceitos
mais importantes deste trabalho: fibrados principais, conexões e suas respectivas curvaturas.
No capítulo 2, mostramos como estes objetos podem modelar diferentes tipos de geometrias,
introduzindo para isso o conceito de espaço simétrico. As três geometrias clássicas de curvatura
constante (e simplesmente conexas), a geometria Esférica, a geometria Hiperbólica e a geome-
tria Euclidiana são escritas na linguagem de espaços simétricos. Finalmente, no capítulo 3 são
estudados os fibrados de Hopf (complexos e quaterniônicos) e é apresentada uma ideia de como
estes fibrados modelam situações oriundas da física teórica: o monopolo magnético (um con-
ceito introduzido por P. Dirac) e a teoria de Yang-Mills. Por fim, veremos que o fato de que estas
3
teorias são quantizadas é refletido em um fato puramente topológico dos fibrados em questão.
Neste trabalho é assumido como conhecida a teoria básica de variedades diferenciáveis, gru-
pos de Lie, álgebras de Lie e o conhecimento dos elementos básicos da geometria Riemanniana.
Para uma apresentação da teoria de variedades diferenciáveis e grupos de Lie podem ser con-
sultados por exemplo [Lee03], [BG80], [Hel62], [KN69], [War83] e [Spi75]. Para elementos bási-
cos de geometria Riemanniana podem ser consultados [Car92], [Lee97], [O’N83] e [Pet06]. Para
elementos básicos de topologia algébrica recomendamos [Nab97], [Hat02] e [BT82]. Para ele-
mentos de álgebra recomendamos [Lan02]. Para uma apresentação em nível mais elementar
do capítulo 2 recomendamos [Mil77]. Para possíveis continuações dos temas desta dissertação
recomendamos, por exemplo, [Jar05] para uma primeira leitura e [DK90] para uma leitura mais
avançada.
Capítulo 1
Conceitos e resultados preliminares
Neste capítulo apresentamos os conceitos e os resultados principais que serão usados, os quais
tentamos expor de uma forma objetiva. Vamos esclarecer algumas convenções e notações. Em
todo o texto quando dizemos “P é uma variedade”, queremos dizer que P é uma variedade dife-
renciável de dimensão finita no sentido de [Lee03], além disso, diferenciável aqui vai ser sinô-
nimo de “diferenciável de classe C∞”. Se f : M → N é uma aplicação diferenciável entre duas
variedades, detonaremos por f ∗ : T M → T N a aplicação induzida entre os fibrados tangentes de
M e N respectivamente, a qual chamamos simplesmente de derivada de f . O espaço vetorial
dos campos vetores em M será denotado por X(M ). O elemento neutro de um grupo de Lie G
será denotado por e , a menos que seja especificado outro símbolo. O produto de dois elementos
g , h ∈G é denotado por g ·h (a menos que seja um grupo aditivo).
Definição 1.1. Uma ação (à direita) de um grupo de Lie G numa variedade P é uma aplicação
diferenciável f : P ×G → P, tal que f (u , e ) = u e f ( f (u , g ), h) = f (u , g · h) para todos u ∈ P e
g , h ∈G .
Para economia de notação, a ação de um elemento g ∈G em um certo u ∈ P será denotada
simplesmente por u · g . Com esta notação, as propriedades da ação são escritas como abaixo:
1. u · e = u , para todo u ∈ P .
2. u · (g ·h) = (u · g ) ·h, para todos u ∈ P e g , h ∈G .
Outra notação frequente é a seguinte: quando fixamos g ∈G , denotamos por Rg a aplicação
induzida pela ação: Rg (u ) = u · g . Podemos fazer considerações análogas a respeito de ações à
esquerda. A ação é dita livre se u · g = u , para algum u ∈ P , implicar g = e . A ação é dita efetiva
se u · g = u , para todo u ∈ P , implicar g = e .
4
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 5
Para cada g ∈ G , temos o difeomorfismo L g : G → G definido por L g (h) = g · h, chamado
a translação à esquerda por g . Analogamente, o difeomorfismo Rg : G → G , Rg (h) = h · g , é
a translação à direita por g . Temos também a aplicação adjunta ad(g ) : G →G , definida por
ad(g )(h) = g h g −1 = L g Rg −1(h) =Rg −1 L g (h).
A álgebra de Lie de G , denotada pela letra gótica g, será pensada ora como o espaço tangente
TeG , ora como o conjunto de campos de vetores invariantes à esquerda em G . Se X ∈ g, então
ad(g )∗(X ) = (Rg −1)∗X , pois (L g )∗X =X .
Dado X ∈ Tg G , existe um único campo invariante à esquerda que vale X em g , bastar tomar
o campo invariante à esquerda associado a ((L g )−1)∗(X ) ∈ g, que por simplicidade de notação,
também será denotado por X .
Definição 1.2. A forma de Maurer-Cartan é a 1-forma em G com valores em g definida por
Θg (X ) = Xe , em que Xe é o valor na identidade do único campo invariante à esquerda que vale X
em g .
1.1 Fibrados Principais e exemplos
Definição 1.3. Sejam M uma variedade e G um grupo de Lie. Um fibrado principal C∞ sobre
M com grupo de estrutura G consiste de uma variedade P e uma ação (à direita) de G em P,
(u , g ) 7→ u · g , tais que:
1. a ação é livre.
2. M é difeomorfo ao espaço quociente P/G e a projeção canônica π : P→M é diferenciável.
3. P é localmente trivial, isto é, para todo x ∈ M existe um aberto U ⊂ M contendo x e
um difeomorfismo ψ : π−1(U )→ U ×G da forma ψ(u ) = (π(u ),ϕ(u )), em que ϕ satisfaz
ϕ(u · g ) =ϕ(u ) · g para todos u ∈π−1(U ) e g ∈G .
Denotaremos um tal fibrado principal por B = P(M ,G ) ou apenas por P quando estiver
claro quem é a variedade M e o grupo de Lie G . É usual dizer que P é o espaço total, M é o
espaço base, e que para cada x ∈M a pré-imagem do conjunto unitário x pela aplicação π,
denotada por π−1(x ), é a fibra sobre x . Como π é uma submersão, as fibras são subvariedades
fechadas de P . As aplicaçõesψ da definição acima são chamadas de trivializações locais. Pela
forma como se escreve uma tal trivialização localψ, e também por esta ser um difeomorfismo,
segue que a restrição da aplicação ϕ a uma fibra π−1(x ), em que x ∈U é arbitrário, fornece um
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 6
difeomorfismo entre esta fibra e o grupo G . Assim, em um fibrado principal, qualquer fibra é
difeomorfa ao grupo estrutural G .
Note também que pela propriedade 2., a ação é transitiva quando restrita a uma fibra qual-
quer, isto é, fixado u ∈π−1(x ), para qualquer outro v ∈π−1(x ) existe g ∈G tal que u = v ·g . Além
disso, como a ação é livre, tal elemento g é único.
Seja P(M ,G ) um fibrado principal. Pela condição 3. da definição, existe uma cobertura de
M por abertos Uλλ∈Λ onde estão definidas trivializações locais ψλ : π−1(Uλ) → Uλ ×G , com
ψλ = (π,ϕλ). Suponha que α,β ∈ Λ sejam tais que Uα ∩Uβ 6= ;. Note que para cada
u ∈π−1(Uα ∩Uβ ) e g ∈G , temos que
ϕα(u · g ) · (ϕβ (u · g ))−1 =ϕα(u ) · g · g −1 ·ϕβ (u )−1 =ϕα(u ) ·ϕβ (u )−1.
Portanto, tem sentido definir a função de transição gαβ : Uα ∩ Uβ → G , colocando
gαβ (x ) = ϕα(u ) ·ϕβ (u )−1, em que u é qualquer elemento da fibra π−1(x ). A aplicação gαβ é
diferenciável, pois pode ser escrita como composição de aplicações diferenciáveis. De fato, se
i : Uα ∩Uβ → Uα ∩Uβ ×G é a inclusão i (x ) = (x , e ), como ψ−1α ,ϕα e ϕβ são diferenciáveis e o
produto e a inversão do grupo G são diferenciáveis, segue que gαβ = (ϕα ·ϕ−1β ) ψ−1
α i é dife-
renciável.
Se Uα ∩Uβ ∩Uγ 6= ;, então dado x ∈M nesta interseção e u ∈π−1(x ), temos:
g γβ (x ) · gβα(x ) =ϕγ(u )ϕβ (u )−1ϕβ (u )ϕα(u )−1 =ϕγ(u )ϕα(u )−1 = g γα(x ).
Isto é, as funções de transição satisfazem (quando tem sentido) g γα = g γβ · gβα, que é a cha-
mada condição de cociclo. Veremos posteriormente que o conjunto das funções de transição
determina o fibrado principal.
Definição 1.4. Seja P(M ,G ) um fibrado principal. Uma aplicação diferenciável s : U → P, U ⊂M
aberto, tal que π s = IdU é chamada uma seção local do fibrado. No contexto físico, é comum
dizer que s é um calibre.
Observação 1.1. Existe uma correspondência 1-1 entre seções locais de um fibrado princi-
pal e trivializações locais. De fato, dada uma trivialização local ψ : π−1(U ) → U ×G , com
ψ(u ) = (π(u ),ϕ(u )), podemos definir uma seção local s : U → P colocando s (x ) = ψ−1(x , e ).
Ela é chamada de seção local canônica associada a ψ. Reciprocamente, dada s : U → P uma
seção local, defina f : U ×G →π−1(U ) colocando f (x , g ) = s (x ) · g .
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 7
Temos que f é injetora, pois se f (x1, g 1) = f (x2, g 2), então x1 =π(s (x1) ·g 1) =π(s (x2) ·g 2) = x2
por definição de seção local, daí g 1 = g 2 pois a ação é livre. Esta aplicação também é sobrejetora
pois dado u ∈π−1(U ) temos que s (π(u )) está na mesma fibra de u por definição de seção local,
logo existe um único g ∈G tal que u = s (π(u )) · g . Isto define uma função u 7→ϕ(u ) := g . Segue
que f é bijetiva, e sua inversa ψ = f −1 é ψ(u ) = (π(u ),ϕ(u )). Finalmente, dados u ∈ π−1(U )
e g ∈ G , como s (π(u · g )) · (ϕ(u ) · g ) = s (π(u ))(ϕ(u ) · g ) = u · g , temos que ϕ(u · g ) = ϕ(u ) · g .
Portanto ψ é uma trivialização local. Observe daí a seguinte consequência dessa correspon-
dência. Suponha que um grupo de Lie G age livremente em uma variedade P e que M := P/G
seja uma variedade com a projeção canônicaπ : P→M sendo uma submersão. Se esta projeção
admitir uma família de seções locais definidas em abertos que cobrem M , então podemos cons-
truir uma estrutura de fibrado principal P(M ,G ). Outra consequência dessa observação é que
caso um fibrado principal possua uma seção global, então ele possui uma trivialização global, e
portanto esse fibrado é um produto cartesiano.
Definição 1.5. Um morfismo de um fibrado principalB1 = P1(M 1,G1) em um fibrado principal
B2 = P2(M 2,G2) consiste de um par de aplicações ( f , f ′), em que f : P1 → P2 é uma aplicação
diferenciável e f ′ : G1 →G2 é um homomorfismo de grupos de Lie tais que f (u · g ) = f (u ) · f ′(g )para todos u ∈ P1 e g ∈G1. Em geral, denotaremos um tal morfismo por ( f , f ′) :B1→B2.
Assim, um morfismo de fibrados preserva fibras, portanto induz uma aplicação F : M 1→M 2
determinada pela equação π2 f = F π1. A aplicação induzida é diferenciável. De fato, dado
x ∈ M 1 qualquer, considere um aberto U1 ⊂ M 1 contendo x e uma seção local (diferenciável)
s1 : U1→M 1 do fibrado P1. Por definição de seção local, temos que π1 s1 = IdU1 , de modo que
em U1 vale F =π2 f s1, e assim F é escrita como composição de aplicações diferenciáveis.
Definição 1.6. Um morfismo ( f , f ′) :B1 →B2 é um mergulho se f : P1 → P2 é um mergulho e
f ′ : G1→G2 é um monomorfismo.
Note que, usando trivializações locais, a primeira função coordenada de f é a aplicação
induzida F , portanto, se f é mergulho, então F é também um mergulho. No caso da definição
acima dizemos que P1(M 1,G1) é um subfibrado de P2(M 2,G2).
Definição 1.7. Se ( f , f ′) : B1 → B2 é um mergulho entre dois fibrados com mesma base M e
a aplicação induzida F é a identidade de M , dizemos que ( f , f ′) é uma redução do grupo de
estrutura do fibrado P2(M ,G2) para G1 e que P1(M ,G1) é um fibrado reduzido.
Definição 1.8. Se H é um subgrupo de Lie de G , dizemos que o grupo de estrutura do fibrado
P(M ,G ) é redutível a H se existe um fibrado reduzido Q(M , H ).
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 8
O teorema a seguir caracteriza quando um grupo de estrutura admite redução. Este teorema
não será usado posteriormente, porém, será enunciado e demonstrado pela sua importância na
Teoria de Fibrados Principais em geral.
Teorema 1.1. O grupo de estrutura G é redutível para um subgrupo de Lie H se, e somente se,
existe uma cobertura de M por trivializações locais tal que as funções de transição tomam valores
em H.
Demonstração: Suponha primeiramente que o grupo de estrutura G é redutível a H e seja
Q(M , H ) o fibrado reduzido. Considere Q como subvariedade de P . Seja Uα uma cobertura
aberta de M associada às trivializações locais ψα : π−1(Uα)→Uα×H , ψα = (π, ϕα), de Q(M , H ).
As funções de transição correspondentes tomam valores em H . Vamos estender agora cada ψα
para uma aplicação ψα : π−1(Uα)→Uα ×G que será de fato uma trivialização local do fibrado
P(M ,G ). Fazemos isso da seguinte maneira: dado u ∈ π−1(Uα), tome u ∈ π−1(Uα) e g ∈ G tais
que u = u · g e defina ϕα(u ) = ϕα(u ) · g e ψα(u ) = (π(u ),ϕα(u )). Vejamos que ϕα está bem de-
finida. Se u = u 1 · g 1 = u 2 · g 2, com u 1, u 2 ∈ π−1(Uα) e g 1, g 2 ∈G , então g 1 g −12 ∈H pela ação ser
livre, e portanto
ϕα(u 2) · g 2 = ϕα(u 1 · g 1 g −12 ) · g 2 = ϕα(u 1) · g 1 g −1
2 g 2 = ϕα(u 1) · g 1.
É fácil ver agora que ψα é de fato uma trivialização local de P(M ,G ). Suponha agora que
Uα ∩Uβ 6= ; e sejam x ∈ Uα ∩Uβ e u ∈ π−1(x ). Sejam também u ∈ π−1(x ) e g ∈ G tais que
u = u · g , então
gαβ (x ) =ϕα(u · g )ϕβ (u · g )−1 = ϕα(u )g g −1ϕβ (u ) = ϕα(u )ϕβ (u )−1 ∈H ,
e portanto as funções de transição tomam valores em H .
Reciprocamente, assuma que exista uma cobertura Uα de M com um conjunto de funções
de transição tomando valores em H . Da definição de subgrupo de Lie, é possível mostrar que
a restrição do contradomínio gαβ : Uα ∩Uβ → H é uma aplicação diferenciável na estrutura
diferenciável de H . Pelo teorema 1.1 é possível construir um fibrado principal Q(M , H ) a partir
desta cobertura e destas funções de transição. Seja fα : π−1(Uα)→π−1(Uα) a composição das três
aplicações abaixo (que são mergulhos):
π−1(Uα)→Uα×H →Uα×G →π−1(Uα).
As aplicações fα concordam nas interseções, definindo portanto um mergulho f : Q→ P .
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 9
Definição 1.9. SejamB1 = P1(M ,G1) eB2 = P2(M ,G2) fibrados principais e ( f , f ′) um morfismo
deB1 emB2. Dizemos que ( f , f ′) é um isomorfismo entre esses fibrados se f for um difeomor-
fismo e f ′ um isomorfismo de grupos de Lie. No caso em que P1 = P2 e G1 =G2, dizemos que ( f , f ′)
é um automorfismo do fibrado.
Dados dois automorfismos ( f 1, f ′1) e ( f 2, f ′2)de um fibrado principalB = P(M ,G ), tem-se que
( f 1, f ′1) ( f 2, f ′2) := ( f 1 f 2, f ′1 f ′2) é também um automorfismo do fibradoB . O conjunto dos au-
tomorfismos do fibradoB , denotado por G (B), é um grupo com a operação . Evidentemente
a identidade deste grupo é o morfismo (IdP , IdG ) e se ( f , f ′) é um automorfismo do fibrado, o seu
inverso é o morfismo ( f −1, f ′−1).
Observação 1.2. No caso de dois fibradosB1 eB2 sobre o mesmo espaço M e mesmo grupo G ,
um isomorfismo ( f , f ′) :B1→B2 tal que f ′ = IdG e F = IdM é chamado de equivalência.
SejaB = P(M ,G ) um fibrado principal e (Uλ,ψλ)λ∈Λ uma cobertura aberta de M por tri-
vializações locais para B . Considere um refinamento desta cobertura, isto é, uma cobertura
aberta U ′k k∈K de M tal que cada U ′
k está contido em algum Uλ. Para cada k ∈ K , selecione
λ = λ(k ) ∈ Λ com U ′k ⊂ Uλ. Se ψ′k : π−1(U ′
k ) → U ′k ×G é definida por ψ′k = ψλ|π−1(U ′k )
, então
(U ′k ,ψ′k )k∈K também é uma cobertura trivializante de B . Agora suponha que sejam dados
dois fibrados principais,B1 = P1(M ,G ) eB2 = P2(M ,G ), e considere coberturas abertas triviali-
zantes U 1λ1λ1∈Λ1 e U 1
λ2λ2∈Λ2 deB1 eB2 respectivamente. Segue então que U 1
λ1∩U 2
λ2λ1∈Λ1,λ2∈Λ2
é um refinamento comum destas coberturas e assim é uma cobertura trivializante para ambos
B1 eB2. Portanto, não há perda de generalidade supor que dois fibrados P1(M ,G ) e P2(M ,G )
tenham as mesmas vizinhanças trivializantes. Segue abaixo um critério para equivalência de
fibrados principais.
Teorema 1.2. SejamB1 = P1(M ,G ) eB2 = P2(M ,G ) fibrados principais e Uλλ∈Λ uma cobertura
trivializante para ambos B1 e B2. Sejam g 1αβ , g 2
αβ : Uα ∩Uβ → G as funções de transição cor-
respondentes para B1 e B2 respectivamente. Então B1 e B2 são equivalentes se, e somente se,
existem funções contínuas hλ : Uλ→G , λ∈Λ, tais que
g 2αβ (x ) = hα(x )−1 g 1
αβ (x )hβ (x ), x ∈Uα ∩Uβ .
Demonstração: Suponha primeiramente queB1 eB2 sejam equivalentes e seja f : P1→ P2 uma
equivalência. Fixe x ∈Uα ∩Uβ . Note que para qualquer u ∈ π−11 (x ), temos f (u ) ∈ π−1
2 (x ). Sejam
ψ1α :π−1
1 (Uα)→Uα×G eψ2α :π−1
2 (Uα)→Uα×G trivializações deB1 eB2 sobre Uα, e similarmente
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 10
sobre Uβ . Dado g ∈G qualquer, note que
ϕ1α(u · g )ϕ
2α( f (u · g ))
−1 =ϕ1α(u ) · g · g
−1ϕ2α( f (u ))
−1 =ϕ1α(u )ϕ
2α( f (u ))
−1,
de modo que tem sentido definir hα : Uα→G por hα(x ) =ϕ1α(u )ϕ
2α( f (u ))
−1, em que u é qualquer
elemento de π−11 (x ). Similarmente para hβ .
Como g 1αβ (x ) =ϕ
1α(u )ϕ
1β (u )
−1 e g 2αβ (x ) =ϕ
2α( f (u ))ϕ
2β ( f (u ))
−1, segue que
g 2αβ (x ) = hα(x )−1 g 1
αβ (x )hβ (x ).
Para a recíproca, para cada λ∈Λ definimos fλ :π−11 (Uλ)→π−1
2 (Uλ) por
fλ(u ) = (ψ2λ)−1(x , hλ(x )−1ϕ1
λ(u )).
Verifica-se que estas aplicações coincidem nas interseções Uα ∩Uβ e que portanto definem
globalmente uma aplicação f : P1→ P2 e, além disto, pode-se mostrar que f é uma equivalência.
Teorema 1.3. Seja M uma variedade, Uλλ∈Λ uma cobertura aberta de M e G um grupo de
Lie. Suponha que em cada interseção não vazia Uα ∩Uβ seja dada uma aplicação diferenciável
gαβ : Uα ∩Uβ → G e de modo que esta família de aplicações satisfaça a condição de cociclo:
g γα = g γβ ·gβα em Uα∩Uβ ∩Uγ. Então existe um fibrado principal P(M ,G ) que possui esta família
de aplicações como funções de transição e, além disso, tal fibrado é único a menos de isomorfismo.
A demonstração do teorema acima pode ser encontrada em [KN69] pg. 52.
Finalmente, vamos apresentar os exemplos de fibrados principais que mais usaremos ao
longo deste trabalho.
Exemplo 1.1. Se M é uma variedade e G é um grupo de Lie, então G age livremente em P :=M×G
definindo a ação por (u , g ) ·h = (u , g ·h). Isto fornece o fibrado principal P(M ,G ) que é chamado
de fibrado principal trivial. Note que segue da definição de isomorfismo de fibrados principais
que todo fibrado é localmente isomorfo a um fibrado trivial.
Exemplo 1.2. SeB = P(M ,G ) é um fibrado principal e S é uma subvariedade da variedade M ,
podemos considerar a restrição π|π−1(S) :π−1(S)→S e verificar que π−1(S)(S,G ) é também, natural-
mente, um fibrado principal, chamado de porção deB sobre S e será denotado porB|S .
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 11
Exemplo 1.3. Seja G um grupo de Lie e H um subgrupo fechado de G . Temos que H age à direita
em G pela multiplicação do grupo: (g , h) 7→ g · h, para g ∈ G e h ∈ H. Sabemos que ([Lee03]
pg. 229) o espaço de órbitas G /H tem uma única estrutura de variedade para a qual a projeção
canônica π : G →G /H é uma submersão. Além disso, é possível mostrar que tal projeção admite
uma seção numa vizinhança de π(e ). Pela observação 1.1, temos então um fibrado principal
G (G /H , H ).
Exemplo 1.4. Seja M uma variedade de dimensão n. Um referencial linear u em um ponto
x ∈ M é uma base ordenada (X1, ..., Xn ) do espaço tangente Tx M . Seja L(M ) o conjunto de to-
dos os referenciais lineares em todos os pontos de M e π : L(M ) → M a aplicação que leva um
referencial u em x no ponto x . O grupo linear G L(n ,R) age à direita em L(M ) como segue. Se
a = (a i j ) ∈G L(n ,R) e u = (X1, ..., Xn ) é um referencial linear em x ∈M , defina u · a como sendo
o referencial linear (Y1, ..., Yn ) dado por Yj =∑
i a i j X i . Esta ação é livre e, além disso, dados dois
referenciais lineares u , u ′ em x ∈M , a existência da matriz mudança de base de u para u ′ nos diz
que esta ação é transitiva na fibra π−1(x ). Vamos colocar uma estrutura diferenciável em L(M ).
Seja (x1, ...,xn ) um sistema de coordenadas locais em um aberto coordenado U de M . Os cam-
pos X i = ∂ /∂ x j em cada ponto de U formam uma base do espaço tangente correspondente.
Portanto, dado um referencial linear Y = (Y1, ..., Yn ) em x ∈ M , temos que existe uma única
matriz (matriz mudança de base) a = (a i j ) ∈ G L(n ,R) para a qual Yj =∑
i a i j X i para cada
i = 1, 2, ..., n. Isso fornece então uma bijeção entre π−1(U ) e U ×G L(n ,R). Para tornar L(M ) uma
variedade diferenciável, tomamos (x1, ...,xn , a i j ) como coordenadas em π−1(U ). Assim, temos que
L(M )(M ,G L(n ,R)) é um fibrado principal, chamado de fibrado dos referenciais lineares sobre
M .
Um conceito importante que aparece na teoria de fibrados principais é o conceito de gera-
dor infinitesimal. Antes de definí-lo, lembremos o resultado importante de que o colchete de
Lie [X , Y ] de dois campos de vetores X , Y numa variedade M é dado por:
[X , Y ] = limt→0
1
t·
Y − (ϕt )∗Y
,
onde ϕt é o fluxo (local) do campo X . Mais especificamente, se x ∈M , então:
[X , Y ]x = limt→0
1
t·
Yx − ((ϕt )∗Y )x
.
Em particular, se A e B são campos invariantes à esquerda num grupo de Lie G , então
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 12
a t := exp(t A) =ϕt (e ) e para cada g ∈G temos ϕt (g ) = g ·a t =Ra t (g ), assim:
[B , A] = limt→0
1
t·
(ϕt )∗B − B
= limt→0
1
t·
(Ra t )∗B − B
= limt→0
1
t·
ad(a−1t )B − B
.
Seja f : P ×G → P uma ação à direita de um grupo de Lie G numa variedade P . Para cada
u ∈ P , seja f u : G → P a aplicação induzida: f u (g ) = f (u , g ). Dado A ∈ g, podemos associar
o campo A# ∈ X(P), chamado de gerador infinitesimal de A (ou campo fundamental de A),
colocando para cada u ∈ P , A#(u ) = ( f u )∗A, ou seja:
A#(u ) =d
d t
t=0
u ·exp(t A).
Proposição 1.4. A aplicação ε : g→X(P) definida por ε(A) = A# é um homomorfismo de álgebras
de Lie. Quando a ação for efetiva, então ε é injetiva e quando a ação for livre, então para todo
A ∈ g não nulo, o campo A# não se anula.
Demonstração: Evidentemente ε é linear. Para ver que [A#, B #] = [A, B ]#, sejam u ∈ P e
a t = exp(t A), daí
[A#, B #]u = limt→0
1
t·
B #u − (Ra t )∗(B
#ϕ−t (u )
)
= limt→0
1
t·
B #u − (Ra t )∗( f u ·a−1
t)∗B
,
e por outro lado
Ra t f u ·a−1(g ) =Ra t (u ·a−1t · g ) = u ·a−1
t · g ·a t = f u (ad(a−1t ))(g ),
para todo g ∈G . Portanto (Ra t f u ·a−1t)∗B = ( f u )∗(ad(a−1
t )∗B ), e então:
[A#, B #]u = limt→0
1
t
( f u )∗(B −ad(a−1t )∗B )
= ( f u )∗([A, B ]) = [A, B ]#u .
Assim ε é um homomorfismo de álgebras de Lie. Seja agora A ∈ g tal que A#u = 0 para algum
u ∈ P . Considere a curva α(t ) = u · a t . Temos que α′(0) = A#u = 0. Dado outro t0 ∈ R qualquer,
temos que:
α′(t0) =d
d t
t=t0
u ·a t =d
d t
t=0
u ·a t+t0 =d
d t
t=0
(u ·a t ) ·a t0 = (Ra t0)∗(A#
u ) = 0.
Portanto a curva α é constante, e como α(0) = u , segue que u · a t = u para todo t ∈ R.
Suponha agora que a ação seja efetiva. Para ver que ε é injetiva, seja A ∈ g para o qual ε(A) = 0,
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 13
isto é, A#u = 0 para todo u ∈ P . Mas isto implica que u · a t = u para todo u ∈ P , e como a ação
é efetiva temos que a t = e para todo t ∈ R, e assim A = 0. Se a ação é livre, como foi mostrado
acima, se em algum u ∈ P tivermos A#u = 0, então a t = e para todo t ∈R, e portanto A = 0.
Voltamos agora ao caso de fibrados principais. Se P(M ,G ) é um fibrado principal então, por
definição, a ação de G em P é livre. Portanto, dado A ∈ g não nulo, o campo A# ∈ X(P) não
se anula. Além disso, dado u ∈ P temos também por definição que A#u = d/dt|t=0(u · exp(t A)), e
como o caminho t 7→ u ·exp(t A) tem imagem na fibra sobre x :=π(u ), segue que A#u ∈ Tu (π−1(x )).
Podemos induzir assim a aplicação εu : g→ Tu (π−1(x )), εu (A) = A#u , que é injetiva pela observa-
ção acima, e portanto um isomorfismo pois dimg = dimTu (π−1(x )). A proposição abaixo será
usada posteriormente.
Proposição 1.5. Seja A# o gerador infinitesimal de A ∈ g. Então para cada g ∈ G , (Rg )∗A# é o
gerador infinitesimal correspondente a ad(g −1)∗A ∈ g.
Demonstração: Sabemos que para todos A ∈ g e g ∈G vale a relação:
exp(ad(g )∗A) = ad(g )(exp(A)).
Fixando u ∈ P e escrevendo B = ad(g −1) ∗A, temos que:
(Rg )∗A#Rg−1 (u )
=d
d t
t=0
Rg ((u · g −1) ·exp(t A))
=d
d t
t=0
u · (ad(g −1) ·exp(t A))
=d
d t
t=0
u ·exp(ad(g −1)∗A)
=d
d t
t=0
u ·exp(t B )
= B #(u ).
1.2 Fibrados Associados
Faremos agora uma importante construção que nos levará a definir os chamados fibrados ve-
toriais. Os fibrados associados têm um papel importante na relação entre fibrados principais e
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 14
fibrados vetoriais que será explorada mais adiante.
Seja P(M ,G ) um fibrado principal e suponha que tenhamos uma ação à esquerda ρ de G
em uma variedade F . Podemos definir uma ação à direita de G na variedade produto P × F
colocando (u , v ) · g := (u · g , g −1 · v ). Seja E = P ×G F := (P × F )/G o espaço quociente por esta
ação. Dado (u , v )∈ P×F , denotaremos por [u , v ] sua classe em E . Fica bem definida a aplicação
πE : E →M , πE ([u , v ]) = π(u ). Chamaremos a aplicação πE simplesmente de projeção, e como
em fibrados principais, dado x ∈M , o conjunto π−1E (x ) é chamado a fibra sobre x .
Daremos agora ao conjunto E uma estrutura de variedade diferenciável. Para isso, fixe
x ∈ M e uma trivialização local ψ : π−1(U ) → U ×G , em que U é um aberto de M contendo
x . Temos que ψ(u ) = (π(u ),ϕ(u )), em que ϕ : π−1(U ) → G satisfaz ϕ(u · g ) = ϕ(u ) · g . Va-
mos definir uma bijeção φ : π−1E (U )→U × F da seguinte maneira: dado [u , v ] ∈ π−1
E (U ), defina
φ([u , v ]) = (π(u ),ϕ(u ) ·v ).Para ver queφ está bem definida, suponha que (u , v ) e (u ′, v ′) sejam tais que [u , v ] = [u ′, v ′],
assim existe um elemento g ∈G para o qual (u , v ) = (u ′, v ′) · g = (u ′ · g , g −1 · v ′), o que implica
u = u ′ · g e v = g −1 · v ′. Então ϕ(u ′) · v ′ = ϕ(u · g ) · g −1 · v = ϕ(u )g g −1 · v = ϕ(u ) · v . Como
u = u ′ · g , u e u ′ estão na mesma fibra, e portanto π(u ) =π(u ′). Assimφ está bem definida.
Para ver que φ é injetiva, sejam [u , v ], [u ′, v ′] ∈ E tais que φ([u , v ]) = φ([u ′, v ′]). Segue que
(π(u ),ϕ(u ) ·v ) = (π(u ′),ϕ(u ′) ·v ′). Em particular π(u ) =π(u ′), portanto existe g ∈G para o qual
u ′ = u · g , assim
g −1 ·v = g −1ϕ(u )−1ϕ(u ′)v ′ = g −1ϕ(u )−1ϕ(u )g ·v ′ = v ′
e daí [u , v ] = [u ′, v ′]. Para ver queφ é sobrejetiva seja (y , v )∈U ×F e escolha u ∈π−1(y ). Temos
então queφ[u ,ϕ(u )−1 ·v ] = (y , v ).
Mostraremos agora que as aplicações φ induzem uma estrutura diferenciável em E . Para
isso, definiremos as cartas e verificaremos que as funções de transição são diferenciáveis. Se-
jam Uα e Uβ subconjuntos abertos de M tais que Uα ∩Uβ 6= ;, para os quais estejam definidas
trivializações locaisψα eψβ e com a função de transição correspondente gαβ : Uα∩Uβ →G . Se-
jamφα :π−1E (Uα)→Uα× F eφβ :π−1
E (Uβ )→Uβ × F as aplicações induzidas. Suponha que exista
x ∈ Bα ∩ Bβ , com Bα ⊂ π−1E (Uα) e Bβ ⊂ π−1
E (Uβ ), e que φα(Bα), φβ (Bβ ) sejam domínios de cartas
fα e fβ da variedade M × F . As cartas correspondentes em E são definidas por cα = fα φα,
cβ = fβ φβ . Dado p , temos que cα c−1β (p ) = fα φα φ−1
β f −1β (p ). Escrevendo f −1
β (p ) = (x , v ) e
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 15
escolhendo u para o qual π(u ) = x , temos que
cα c−1β (p ) = fα(φα([u ,ϕβ (u )−1 ·v ])) = fα(x ,ϕα(u ) ϕβ (u )−1 ·v ) = fα(x , gαβ (x ) ·v ).
Portanto as funções de transição são diferenciáveis e E é uma variedade diferenciável. Note
que com esta estrutura, πE : E → M é diferenciável. Chamamos E , ou mais precisamente
E (P, M ,G ,ρ, F ), de fibrado associado ao fibrado P(M ,G ) com fibra F .
1.3 Conexões em Fibrados Principais
Definição 1.10. Seja P(M ,G ) um fibrado principal sobre uma variedade M com grupo G . Para
cada u ∈ P seja Vu o subespaço de Tu P consistindo dos vetores tangentes à fibra que passa por u ,
isto é, Vu =Ker π∗u . Uma conexão C em P é uma escolha de um subespaço Hu de Tu P, para cada
u ∈ P, tal que:
1. Tu P =Vu ⊕Hu .
2. Hu ·g = (Rg )∗Hu para todo u ∈ P e g ∈G .
3. Hu é uma distribuição diferenciável.
O subespaço Vu é chamado subespaço vertical e Hu é chamado subespaço horizontal de
Tu P (com respeito à conexão C ). Cada vetor X ∈ Tu P se decompõe numa soma X =Xv +Xh , em
que Xv ∈Vu é a componente vertical de X e Xh ∈Hu é a componente horizontal de X .
Temos uma maneira natural de associar a cada conexão C em P uma 1-forma em P com
valores na álgebra de Lie g de G .
Definição 1.11. A forma de conexão ω de uma conexão C é definida em cada X ∈ Tu P como
sendo o único A ∈ g tal que (A#)u =Xv .
A formaω está bem definida pois temos o isomorfismo εu de g em Vu induzido pelo gerador
infinitesimal. Note que o núcleo desta 1-forma é, em cada ponto, o subespaço horizontal cor-
respondente. Segue abaixo uma proposição que apresenta as propriedades que caracterizam a
forma de conexão.
Proposição 1.6. A forma de conexãoω tem as seguintes propriedades:
1. ω(A#) = A para todo A ∈ g.
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 16
2. (Rg )∗ω = ad(g −1)∗ ω, isto é, ω(Rg )∗X = ad(g −1)∗(ω(X )) para todo g ∈ G e todo campo
vetorial X sobre P.
Reciprocamente, dada uma 1-formaω com valores em g sobre P tendo as propriedades acima,
existe uma única conexão C em P cuja forma de conexão éω.
Demonstração: Seja ω a forma de conexão. A primeira propriedade segue imediatamente da
definição deω. Para mostrar a segunda, por linearidade podemos separar nos casos em que X
é horizontal e em que X é vertical. Se X é horizontal, entãoω(X ) = 0 e além disso, pela condição
2. da definição de conexão, segue que (Rg )∗X também é horizontal, portanto ω((Rg )∗(X )) = 0,
e a igualdade segue pela linearidade de ad(g −1)∗. Se X é vertical, podemos supor que é então
um campo vetorial fundamental A#. Como (Rg )∗(X ) é o campo vetorial fundamental correspon-
dente a ad(g −1)∗(A), então
(R∗gω)u (X ) =ωu ·g ((Rg )∗X ) = ad(g −1)∗(A) = ad(g −1)∗(ωu (X )).
Reciprocamente, dada uma 1-formaω satisfazendo 1 e 2, definimos
Hu = X ∈ Tu P ;ω(X ) = 0
e mostra-se agora que u 7→Hu define uma conexão em P .
A projeção π : P →M induz uma aplicação linear (π∗)u : Tu P → Tx M , para cada u ∈ P , em
que x = π(u ). Na presença de uma conexão em P , (π∗)u é um isomorfismo quando restrito ao
subespaço horizontal Hu (o núcleo de (π∗)u é justamente Vu ). Isso nos permite definir levanta-
mento horizontal de campos vetoriais:
Definição 1.12. O levantamento horizontal de um campo vetorial X em M é o único campo
vetorial em P que é horizontal e que se projeta em X . Tal campo será denotado por X H . A condição
de se projetar em X significa π∗(X Hu ) =Xπ(u ) para todo u ∈ P.
Proposição 1.7. Dada uma conexão em P e um campo vetorial X em M , existe um único levanta-
mento horizontal X H . O levantamento X H é invariante por Rg para todo g ∈G . Reciprocamente,
todo campo vetorial Y em P que é horizontal e invariante por G , é o levantamento de um campo
vetorial X em M .
Demonstração: A existência e unicidade de X H segue do isomorfismo de Hu com Tπ(u )M . Para
ver que X H é diferenciável se X é diferenciável, tomamos uma vizinhança U de um dado ponto
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 17
x ∈M tal queπ−1(U )≈U×G . Usando este difeomorfismo, nós primeiro obtemos um campo di-
ferenciável Y emπ−1(U ) tal queπ∗(Y ) =X . Então X H é a componente horizontal de Y e portanto
é diferenciável. A invariância de X H por G é clara pela invariância dos subespaços horizontais
por G . Reciprocamente, para todo x ∈ M , tome um ponto u ∈ P tal que π(u ) = x e defina
Xx = π∗(Yu ). O vetor Xx é independente da escolha de u na fibra de x , pois se u ′ = u · g , então
π∗(Yu ′) =π∗(Rg )∗(Yu ) =π∗(Yu ). Segue então que Y é o levantamento do campo vetorial X .
Algumas propriedades do levantamento de campos:
Proposição 1.8. Sejam X e Y campos vetoriais em M e X H e Y H os levantamentos horizontais
correspondentes. Então:
1. X H +Y H é o levantamento horizontal de X +Y .
2. Para toda função diferenciável f : M →R, ( f π) ·X H é o levantamento horizontal de f ·X .
3. A componente horizontal [X H , Y H ]h de [X H , Y H ] é o levantamento horizontal de [X , Y ].
Demonstração: As duas primeiras são evidentes e a terceira segue da igualdade:
π∗([X H , Y H ]h) =π∗([X H , Y H ]) = [X , Y ].
Observe que se (x 1, ...,x n ) é um sistema de coordenadas locais no aberto U ⊂ M e X Hi é o
levantamento horizontal do campo vetorial X i = ∂ /∂ x i , então (X H1 , ..., X H
n ) é uma base para a
distribuição horizontal u 7→Hu em π−1(U ).
Seja P(M ,G ) um fibrado principal eω uma forma de conexão. Veremos comoω se comporta
com respeito a trivializações locais. Seja Uα uma cobertura aberta de M com uma família de
trivializações locais ψα : π−1(Uα)→Uα×G e a família correspondente de funções de transição
gαβ : Uα ∩Uβ →G . Para cada α, seja sα : Uα→ P a seção local canônica associada aψα. Seja Θ a
1-forma de Maurer-Cartan em G . Para cada α, o potencial de calibre, no calibre sα, é a 1-forma
com valores em g definida em Uα por
Aα = s ∗αω.
Em cada interseção Uα ∩Uβ não vazia, defina também uma forma Θαβ , com valores em g,
colocando
Θαβ = g ∗αβΘ.
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 18
Proposição 1.9. Em cada interseção Uα ∩Uβ não vazia, as formasAα,Aβ e Θαβ satisfazem
Aβ = ad(g −1αβ )∗ Aα+Θαβ .
Reciprocamente, dada uma família de formas Aα, cada uma definida em Uα e satisfazendo
a equação acima para cada α,β tal que Uα ∩Uβ 6= ;, existe uma única forma de conexãoω em P
para a qual as formasAα são dadas pela maneira descrita acima.
Demonstração: Seja f : P ×G → P a ação dada no fibrado e lembramos que denotamos por
f u 0 : G → P e Rg 0 : P → P as aplicações induzidas pela ação. Identificaremos T(u 0,g 0)(P ×G )
com Tu 0 P ×Tg 0G , de modo que para cada w = (wP , wG ) ∈ Tu 0 P ×Tg 0G a derivada da ação f se
expressa por f ∗(w ) = Rg 0∗wP + f u 0∗wG . Primeiramente fixe α,β para os quais Uα ∩Uβ 6= ;. Fixe
x ∈ Uα ∩Uβ e X ∈ Tx M . Temos que sβ (x ) = sα(x ) · gαβ (x ). Agora, para qualquer y ∈ Uα ∩Uβ ,
sβ (y ) = sα(y ) · gαβ (y ) = f (sα, gαβ )(y ), e daí
sβ ∗X = f ∗(sα∗X , gαβ ∗X )
= Rg 0∗(sα∗X )+ f u 0∗(gαβ ∗X )
= (Rg 0 sα)∗X +( f u 0 gαβ )∗X ,
em que g 0 = gαβ (x ) e u 0 = sα(x ). Para completar a primeira parte da demonstração, basta
mostrar que
ω((Rg 0 sα)∗X ) = ad(g −1αβ )(Aα(X ))
ω(( f u 0 gαβ )∗X ) = Θαβ (X ).
A primeira igualdade é a que segue:
ω
(Rgαβ (x ) sα)∗X
= ωsβ (x )
(Rgαβ (x ))∗sα(x )(sα∗X )
= ωsβ (x )
(Rgαβ (x ))∗sβ (x )·gαβ (x )−1(sα∗X )
= ad(gαβ (x )−1)∗
ωsβ (x )·gαβ (x )−1 (sα∗X )
= ad(gαβ (x )−1)∗
ωsα(x )(sα∗X )
= ad(gαβ (x )−1)∗
(s ∗αω)x (X )
= ad(gαβ (x )−1)∗ (Aα(X )) .
Para a segunda igualdade, seja A ∈ g o campo invariante à esquerda em G que satisfaz
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 19
A(gαβ (x )) = (gαβ )∗x (X ), de modo que
Θαβ (X ) = (g ∗αβΘ)(X ) =Θgαβ (x )(gαβ ∗X ) =Θgαβ (x )
A(gαβ (x ))
= A.
Portanto, precisamos mostrar queωsβ (x )
( f u 0 gαβ )∗X
= A. Considere o gerador infinitesi-
mal A#. Por definição, A#(u ) = ( f u )∗A, de modo que A#(sα(x ) · gαβ (x )) = ( f sα(x )·gαβ (x ))∗A. Mas
f sα(x )·gαβ (x )(g ) = (sα(x ) · gαβ (x )) · g = sα(x ) · (gαβ (x ) · g )
= f u 0(gαβ (x ) · g ) = f u 0(L gαβ (x )(g ))
= f u 0 L gαβ (x )(g ),
e daí
( f sα(x )·gαβ (x ))∗A = ( f u 0)∗((L gαβ (x ))∗A)
= ( f u 0)∗(A(gαβ (x )))
= ( f u 0)∗((gαβ )∗X )
= ( f u 0 gαβ )∗X .
Assim, A#(sα(x ) · gαβ (x )) = ( f u 0 gαβ )∗X , concluindo que
ω
( f u 0 gαβ )∗X
= ω
A#(sα(x ) · gαβ (x ))
= ω
A#(sβ (x ))
= A.
Para mostrar a recíproca, vamos dividir o argumento em algumas partes. Primeiramente,
seja (U ,ψ) uma trivialização local e s (x ) = ψ−1(x , e ) a seção canônica associada. Sejam
(x0, g 0) ∈ P ×G e (X , Y ) ∈ T(x0,g 0)P ×G . Fixando x0 e deixando variar g , a aplicação induzida
porψ−1 éψ−1x0(g ) = s (x0) ·g . Analogamente, fixando g 0 e deixando variar x , a aplicação induzida
porψ−1 éψ−1g 0(x ) = s (x ) · g 0 = (Rg 0 s )(x ). Deste modo
ψ−1∗ (X , Y ) =Rg 0∗(s∗X )+ f s (x0)∗Y .
Escrevendo A = (L g −10)∗g 0 Y , então Y = (L g 0)∗A e assim f s (x0)∗Y = f s (x0)∗((L g 0)∗A) = A#(s (x0) ·g 0).
Em particular, quando g 0 = e obtemos ψ−1∗(x0,e )(X , A) = s∗X + A#(s (x0)). Concluímos assim que
todo elemento em Ts (x0)(π−1(U )) pode ser escrito (de maneira única) como s∗x0(X ) + A#(s (x0))
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 20
para algum A ∈ g.
Primeiro definimos a forma em porções do fibrado. Dado um índice α, vamos definirωα em
π−1(Uα) como segue: se x0 ∈Uα, u = sα(x0), X ∈ Tx0 M e A ∈ g, defina
ωα(u )(sα∗X +A#(u )) =Aα(X )+A.
Note que qualquer ponto emπ−1(Uα) se escreve de maneira única como sα(x0)·g , para algum
x0 ∈Uα e algum g ∈G . Escreva u = s (x0) e para cada X ∈ Tu ·g (π−1(Uα)), defina
ωα(u · g )(X ) = ad(g −1)∗ ωα((Rg −1)∗X ).
Mostra-se daí queωα é uma forma de conexão em P |π−1(Uα). Sejam agora (Uα,ψα) e (Uβ ,ψβ )
trivializações locais tais que Uα ∩Uβ 6= ; e sejam x0 ∈Uα ∩Uβ e X ∈ Tx0 M . Derivando ambos os
lados da igualdade sβ (x ) = gαβ (x ) · sα(x ) = ( f (gαβ , sα))(x ) podemos obter
sβ ∗(X ) = (Rgαβ (x0))∗(sα∗(X ))+Θαβ (X )#(sβ (x0)).
Mostra-se com o auxílio desta expressão que as formasωα eωβ coincidem em π−1(Uα∩Uβ ),
de modo que definem uma formaω em todo o espaço total P .
No caso particular em que o grupo estrutural G é um grupo de matrizes, podemos escrever
as equações de compatibilidade de uma maneira mais simples. Seja x ∈ Uα ∩Uβ e X ∈ Tx M .
Considere um curva diferenciável α : (−ε,ε)→M com α(0) = x e α′(0) =X , daí
Θgαβ (x )
(gαβ )∗X
= Θgαβ (x )
(gαβ α)′(0)
=
L gαβ (x )−1
(gαβ α)′(0)
=
L gαβ (x )−1 gαβ α′(0)
=d
d t
t=0
(gαβ (x ))−1(gαβ α)(t )
= gαβ (x ))−1(gαβ α)′(0).
Na linguagem matricial, podemos escrever o resultado acima comoΘαβ = g ∗αβΘ= g −1αβd gαβ .
Sabemos também que em grupos de matrizes vale ad(g )∗A = g A g −1, de modo que
Aβ = g −1αβAαgαβ + gαβd gαβ .
Da mesma forma que dada uma conexão é possível fazer levantamentos horizontais de cam-
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 21
pos vetoriais no espaço base, temos também uma noção de levantamento horizontal de curvas
e transporte paralelo de uma fibra ao longo de uma curva. Seja α : [a ,b ]→ M , uma curva de
classe C 1 por partes em M . Um levantamento horizontal de α (ou simplesmente levantamento)
é uma curva α : [a ,b ]→ P tal que π(α(t )) =α(t ) para todo t ∈ [a ,b ]. Aqui, uma curva horizontal
quer dizer uma curva de classe C 1 por partes cujos vetores tangentes são sempre horizontais.
Proposição 1.10. Seja α : [0, 1]→M uma curva de classe C 1 em M e seja x =α(0). Para qualquer
ponto u ∈ P tal que π(u ) = x , existe um único levantamento α de α tal que α(0) = u .
Demonstração: Pela trivialidade local do fibrado podemos escolher uma curva β : [0, 1] → P
(não necessariamente horizontal) de classe C 1 por partes tal que β (0) = u e π(β (t )) = α(t ) para
todo t ∈ [0, 1]. Da transitividade da ação, qualquer outra curva α para a qual π(α(t )) = α(t ) e
α(0) = u deve ser da forma α(t ) = β (t ) · g (t ), em que g : [0, 1]→G é uma curva com g (0) = e .
Vamos supor que um tal levantamento exista e estudar que equação diferencial a curva g deve
satisfazer. Denote por f : P×G → P a ação de G em P . Temos que α(t ) = f (β (t ), g (t )), e portanto:
α′(t ) = f ∗(β ′(t ), g ′(t )) = (Rg (t ))∗(β ′(t ))+ ( fβ (t ))∗(g ′(t )).
Para cada t , o vetor ( fβ (t ))∗(g ′(t )) é vertical, e portanto pode ser visto como um gerador in-
finitesimal A(t )# de algum vetor A(t ) ∈ g no ponto α(t ). Mostraremos agora que A(t ) deve ser o
valor na identidade do único campo invariante à esquerda cujo valor em g (t ) é g ′(t ). De fato,
para todo t0 ∈ [0, 1], temos
A(t0)#(α(t0)) =d
d t
t=0
α(t0) ·exp(t A(t0)) =d
d t
t=0
β (t0)g (t0)exp(t (L g (t0)−1)∗g ′(t0)),
e fazendo mudança de variáveis u = t − t0, encontramos
A(t0)#(α(t0)) =d
d t
t=t0
β (t0)g (t0)g (t − t0) = ( fβ (t0))∗g′(t0),
de modo que α′(t ) = (Rg (t ))∗β ′(t ) +A(t )#(α(t )). Assim, calculando a forma ω em cada um dos
termos do lado direito da igualdade que expressa α′(t ), encontramos
ω((Rg (t ))∗β ′(t )) = (Rg (t ))∗ω(β ′(t )) = ad(g (t )−1)∗ω(β ′(t ))
e
ω(A(t )#(α(t ))) = (L g (t )−1)∗g ′(t ).
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 22
Queremos que α(t ) seja horizontal, e para isso devemos terω(α′(t )) = 0. Como
ad(g (t )−1)∗ω(β ′(t )) = (L g (t )−1)∗(Rg (t ))∗ω(β ′(t )),
teremos:
g ′(t ) =−((Rg (t ))∗ ω)(β ′(t )).
Prova-se que esta equação diferencial acima tem solução única com g (0) = e ([Nab97] pg.
308).
Com a noção de levantamento de curvas, podemos definir o chamado transporte paralelo
de uma fibra ao longo de uma curva. Para isso, sejam α : [0, 1] → M uma curva de classe C 1,
x0 = α(0) e x1 = α(1). Para cada u 0 ∈ π−1(x0), o único levantamento de α começando em u 0
termina em um ponto α(1) = u 1 ∈π−1(x1).
Assim, fica bem definida uma aplicação τα : π−1(x0) → π−1(x1). Se fixarmos g ∈ G e res-
tringirmos a aplicação Rg a π−1(x0), teremos que τα Rg = Rg τα. Isto é verdade pois apenas
precisamos observar que se α é o levantamento de α começando em u 0, então por unicidade do
levantamento, o levantamento de α começando em u 0 · g é o caminho α · g . Em geral, podemos
definir a transporte paralelo para curvas de classe C 1 por partes de maneira evidente.
Para a proposição abaixo, dada uma curva α : [0, 1] → M , definimos α−1 : [0, 1] → M por
α−1(t ) = α(1− t ) para cada t ∈ [0, 1] e se β : [0, 1] → M é uma outra curva, com α(1) = β (0),
definimos a curva α ∗β : [0, 1]→M por α ∗β (t ) = α(2t ) se t ∈ [0, 1/2] e α ∗β (t ) = β (2t − 1) se
t ∈ [1/2, 1]. A curva α−1 é chamada de curva inversa de α e α ∗β é chamada de justaposição de
α e β .
Proposição 1.11. 1. Se α é curva de classe C 1 por partes em M , então o transporte paralelo ao
longo da curva α−1 é o inverso do transporte paralelo ao longo de α: τ−1α =τα−1 .
2. Se α é uma curva ligando x até y em M e β liga y até z em M , então o transporte paralelo
ao longo da justaposição α ·β , que liga x até z , é a composição dos respectivos transportes
paralelos: τα∗β =τα τβ .
Suponha agora que seja dada uma conexão C num fibrado principal P(M ,G ). Dado x ∈M ,
como observado acima, cada curva de classe C k por partes α começando e terminando em
x determina uma bijeção da fibra π−1(x ) nela mesma. O conjunto de tais bijeções forma um
grupo, o qual é chamado de grupo de holonomia de C com ponto base x , e é denotado por
Holx .
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 23
1.4 Forma de curvatura
Vamos definir nesta seção a chamada curvatura de uma conexão e mostrar a primeira equação
de estrutura. Começaremos definindo objetos mais gerais, as formas pseudotensoriais.
Seja P(M ,G ) um fibrado principal e ρ : G → Aut(V ) uma representação de G num espaço
vetorial real V de dimensão finita.
Definição 1.13. Uma r -formaϕ em P com valores em V é dita pseudotensorial do tipo (ρ, V ) se
(Rg )∗ϕ =ρ(g −1) ϕ
para todo g ∈G . A forma ϕ é chamada forma tensorial se ϕ(X1, ..., Xr ) = 0 toda vez que algum
X i é vertical.
Exemplo 1.5. Se ρ0 é a representação trivial, então uma r -forma tensorial do tipo (ρ0, V ) pode
ser escrita como ϕ =π∗ϕM , em que ϕM é uma r -forma em M com valores em V .
Exemplo 1.6. Sejam ρ uma representaçao de G em V e E o fibrado associado. Uma forma ten-
sorial de grau r e tipo (ρ, V ) pode ser pensada como uma associação que a cada x ∈ M for-
nece uma aplicação r -linear alternada ϕx : Tx M × ...× Tx M → π−1E (x ). Para isso, basta definir
ϕx (X1, ..., Xr ) = [u ,ϕ(X1, ..., Xr )], em que u ∈ π−1(x ) e X i é qualquer vetor em Tu P para o qual
π∗X i = X i . Reciprocamente, dadas r -formas alternadas ϕx : Tx M × ...×Tx M →π−1E (x ), definimos
ϕu (X1, ..., Xr ) = [π(u ), ϕπ(u )(π∗X1, ...,π∗Xr )]. Note que a escolha de uma 0-forma linear alternada
para cada x ∈ M com valores em π−1E (x ), é simplesmente uma seção de E . Em particular, uma
0-forma tensorial do tipo (ρ, V ), isto é, uma função f : P → V tal que f (u · g ) = ρ(g −1)( f (u )),
pode ser pensada como uma seção de E .
Proposição 1.12. Seja C uma conexão em P(M ,G ). Se ϕ é uma forma pseudotensorial de grau r
do tipo (ρ, V ), então:
1. A forma (ϕ ·h), definida por (ϕ ·h)(X1, ..., Xr ) =ϕ((X1)h , ..., (Xr )h), é uma forma tensorial do
tipo (ρ, V ).
2. A forma dϕ é pseudotensorial de grau r +1 do tipo (ρ, V ).
3. A (r +1)-forma Dϕ := (dϕ) ·h é forma tensorial de tipo (ρ, V ).
Demonstração:
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 24
1. Temos que
(Rg )∗(ϕ ·h)(X1, ..., Xr ) =ϕ(((Rg )∗X1)h , ..., ((Rg )∗Xr )h),
mas se X é horizontal e Y é vertical, então
((Rg )∗(X +Y ))h = ((Rg )∗X +(Rg )∗Y )h = (Rg )∗X
e
(Rg )∗(X +Y )h = (Rg )∗X .
Portanto (Rg )∗(Xh) = ((Rg )∗X )h , o que implica
(Rg )∗(ϕ ·h)(X1, ..., Xr ) = (Rg )∗ϕ((X1)h , ..., (Xr )h) =ρ(g −1)ϕ((X1)h , ..., (Xr )h).
Logo, R∗g (ϕ ·h) =ρ(g −1) (ϕ ·h) e ϕ ·h é pseudotensorial de mesma grau e tipo que ϕ. Da
forma como foi definida, ϕ ·h é evidentemente tensorial.
2. Como d (ρ(g −1) ϕ) =ρ(g −1) dϕ, temos que
(Rg )∗(dϕ) = d ((Rg )∗ϕ) = d (ρ(g −1) ϕ) =ρ(g −1)(dϕ).
3. É evidente juntando os itens anteriores.
A forma Dϕ é chamada derivada exterior covariante de ϕ. Note que se ω é a forma de
conexão de C , entãoω é uma forma pseudotensorial de grau 1 e tipo (ad,g).
Definição 1.14. A 2-forma tensorial de tipo (ad,g) definida por Ω :=Dω é chamada de forma de
curvatura deω (ou simplesmente curvatura deω).
Antes de mostrarmos a primeira equação de estrutura, precisamos de uma lema.
Lema 1.13. Se X é um campo horizontal e A# é um campo fundamental, então [X , A#] é um campo
horizontal.
Demonstração: Se a t = exp(t A), então
[X , A#] =d
d t
t=0
1
t·
(Ra t )∗X −X
.
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 25
Como X é horizontal, temos que (Ra t )∗X é também horizontal por definição de conexão e
portanto o limite acima acontece em subespaços horizontais (que são fechados por serem de
dimensão finita) e assim [X , A#] é horizontal.
Teorema 1.14 (Primeira Equação de Estrutura). Sejaωuma forma de conexão num fibrado prin-
cipal P(M ,G ) e Ω sua forma de curvatura, então para cada u ∈ P:
dω(X , Y ) =−[ω(X ),ω(Y )]+Ω(X , Y )
para todos X , Y ∈ Tu P.
Demonstração: Como ambas as expressões do lado esquerdo e do lado direito da igualdade que
queremos mostrar são formas bilineares, basta mostrá-la em 3 casos.
1. Se X e Y são horizontais.
Como Xh = X e Yh = Y , então Ω(X , Y ) = d (ω ·h)(X , Y ) = dω(X , Y ), assim a igualdade vale
poisω(X ) =ω(Y ) = 0 por definição de forma de conexão.
2. Se X e Y são verticais.
Podemos supor que ambos são campos fundamentais A# e B # e assim, pela fórmula de
Cartan ([Lee03] pg. 310) temos
dω(A#, B #) = A#(ω(B #))− B #(ω(A#))−ω([A#, B #])
= −ω([A, B ]#)
= −[A, B ]
= −[ω(A#),ω(B #)],
e como Ω(A#, B #) = 0, a igualdade segue.
3. Se X é horizontal e Y é vertical.
Estenda X para um campo horizontal em P e suponha que Y = A# é um campo fun-
damental e note que, desta maneira, o lado direito se anula. Então, basta mostrar que
dω(X , A#) = 0, mas
dω(X , A#) =X (ω(A#))−A#(ω(X ))−ω([X , A#]) =−ω([X , A#]) = 0,
em que na última igualdade acima foi usado o lema anterior.
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 26
Corolário 1.15. Para levantamentos horizontais X H e Y H de campos X e Y de M temos
Ω(X H , Y H ) =−ω([X H , Y H ]v )
Demonstração: Novamente usando que campos horizontais pertencem ao núcleo deω, temos
que:
Ω(X H , Y H ) = dω(X H , Y H )+ [ω(X H ),ω(Y H )]
= X H (ω(Y H ))−Y H (ω(X H ))−ω([X H , Y H ])
= −ω([X H , Y H ]h)−ω([X H , Y H ]v )
= −ω([X H , Y H ]v ).
Observação 1.3. Note que o corolário acima nos fornece uma interpretação geométrica para
a curvatura de uma conexão. De fato, se Ω é nula em todo par de vetores tangentes de P , en-
tão pelo corolário acima ω([X H , Y H ]v ) = 0, mas como o núcleo de ω é o conjunto dos vetores
horizontais, temos que [X H , Y H ]v = 0 e portanto [X H , Y H ] é horizontal. Isto significa que a dis-
tribuição horizontal desta conexão é uma distribuição integrável. Portanto a curvatura da co-
nexão mede a falha da distribuição horizontal correspondente ser integrável. Além disso, pela
proposição 1.8, o levantamento horizontal de [X , Y ] é [X H , Y H ]h , portanto se a curvatura é nula,
o levantamento horizontal de [X , Y ] é [X H , Y H ]. Isto significa que a aplicação de levantamento
horizontal preserva colchetes, em outras palavras, é um morfismo de álgebras de Lie. Assim,
podemos dizer também que a curvatura mede a falha do levantamento horizontal ser um mor-
fismo de álgebras de Lie.
Na terminologia física, a curvatura Ω de uma conexão ω é geralmente chamada de campo
de calibre. Note que o termo [ω(·),ω(·)] na primeira equação de estrutura é uma 2-forma com
valores em g. Dada uma seção local s : U → π−1(U ) do fibrado P(M ,G ), chamaremos o pull-
backF := s ∗Ω de intensidade (local) do campo, ou simplesmente intensidade. Isto não é uma
terminologia padrão, fizemos uma possível tradução do termo original oriundo do inglês: local
field strenght. SejaA o potencial de calibre deω (no calibre s ). Note que s ∗[ω,ω] = [s ∗ω, s ∗ω],
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 27
e como o pull-back comuta com a derivada exterior, temos que
F = s ∗Ω= s ∗(dω+[ω,ω]) = d (s ∗ω)+ [s ∗ω, s ∗ω] = dA +[A ,A ].
Se U é o domínio de um carta f : U → Rn (ou diminuindo U se necessário), as expressões
em coordenadas (s f −1)∗ω e (s f −1)∗Ω de A e F respectivamente, se relacionam de forma
semelhante:
(s f −1)∗Ω = ( f −1)∗(s ∗Ω)
= ( f −1)∗(d (s ∗ω)+ [s ∗ω, s ∗ω])
= d ((s f −1)∗ω+[( f −1 s )∗ω, ( f −1 s )∗ω].
Lembramos que se s i : Ui →π−1(Ui ), i = 1, 2, são calibres, com U1 ∩U2 6= ;, então os potenci-
ais correspondentesA1 eA2 devem satisfazer uma certa relação de compatibilidade. Veremos
agora qual é essa relação com respeito as intensidadesF1 eF2.
Teorema 1.16. Seja ω uma forma de conexão em um fibrado principal P(M ,G ) com curvatura
Ω. Sejam s i : Ui → π−1(Ui ) calibres com U1 ∩U2 6= ; e seja g 12 : U1 ∩U2→G a função de transição
correspondente. Então, em U1 ∩U2,
F2 = ad(g −112 ) F1.
Demonstração: Fixe um x0 ∈U1∩U2 e X , Y ∈ Tx0 M . Temos por definição de pull-back (omitindo
os pontos), que
F2(X , Y ) = Ω((s2)∗X , (s2)∗Y ).
Mas (s2)∗ = (Rg 12)∗(s1)∗X +Θ12(X )#, de modo que
F2(X , Y ) = Ω
(Rg 12)∗(s1)∗X , (Rg 12)∗(s1)∗Y
= R∗g 12Ω(s1∗X , s1∗Y ))
= ad(g −112 ) (Ω(s1∗X , s1∗Y ))
= ad(g −112 ) (F1(X , Y )) .
Onde usamos que Θ12(X )# e Θ12(Y )# são verticais e que Ω anula vetores verticais.
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 28
Se e1, ..., er é uma base da álgebra de Lie g, então existem escalares c ij k para os quais:
[e j , ek ] =∑
i
c ij k e i .
Estes escalares são chamados constantes de estrutura de g com respeito à base e1, ..., er .Nesta base podemos escrever ω =
∑
iωi e i e Ω =∑
i Ωi e i , em que ωi são 1-formas em P com
valores emR e Ωi são 2-formas em P com valores emR. Podemos expressar a primeira equação
de estrutura da seguinte forma:
dωi =−∑
j<k
c ij kωj ∧ωk +Ωi .
Teorema 1.17 (Primeira Identidade de Bianchi). DΩ= 0.
Demonstração: Temos que mostrar que para vetores horizontais X , Y e Z vale dΩ(X , Y ,Z ) = 0.
Aplicando a diferencial exterior na primeira equação de estrutura teremos que:
0= d dωi =−∑
j<k
c ij k dωj ∧ωk +
∑
j<k
c ij kωj ∧dωk +dΩi .
Comoωi (X ) = 0 quando X é horizontal, temos
dΩi (X , Y ,Z ) = 0
sempre que X , Y e Z são horizontais.
1.5 Fibrados Vetoriais e conexões lineares
Seja P(M ,G ) um fibrado principal, V = Fm , em que F=R ou F=C e seja ρ : G →G L(n ,F) uma
representação de G .
Definição 1.15. O fibrado associado E (P, M ,G ,ρ,Fm ) é chamado de fibrado vetorial de posto m
e fibra Fm .
Lembramos que uma trivialização local de E é uma aplicaçãoψE :π−1E (U )→U×Fm da forma
ψE ([u , v ]) = (πE (u ),ϕ(u ) ·v ), em queϕ é induzida de uma trivialização localψ :π−1(U )→U×G
de P(M ,G ). Fixando x ∈M ,ψE |π−1E (x )
:π−1E (x )→x ×Fm é um difeomorfismo. A fibraπ−1
E (x )pode
ser munida naturalmente de uma estrutura de espaço vetorial, que faz com que a aplicação
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 29
anterior seja um isomorfismo linear. De fato, dados [u , v ], [u ′, v ′] ∈ π−1E (x ), seja g ∈G o único
elemento tal que u ′ · g = u e defina
[u , v ]+ [u ′, v ′] := [u , v +ρ(g −1) ·v ′].
Desta maneira, cada fibra do fibrado E é um espaço vetorial isomorfo a Fm . Além disso, po-
demos também definir uma estrutura de espaço vetorial para o conjunto de seções de E (seções
diferenciáveis), denotado por Γ(E ). Para isso, sejam c ∈ Fm , s , s ′ ∈ Γ(E ) e defina c · s + s ′ ∈ Γ(E )colocando para cada x ∈M :
(c · s + s ′)(x ) := c · s (x )+ s ′(x ).
Claramente, se m ≥ 1 o espaço vetorial Γ(E ) tem dimensão infinita. Podemos considerar
também Γ(E ) como um módulo sobre a álgebra das funções suaves em M com valores em F.
Para isso, dada f : M → F e s ∈ Γ(E ), defina f · s ∈ Γ(E ) colocando para cada x ∈M :
( f · s )(x ) := f (x ) · s (x ).
Seja C uma conexão em P e α : [0, 1]→M uma curva de classe C 1 por partes em M . Lembra-
mos que dado u ∈ π−1(α(0)), existe um único levantamento horizontal α começando em u . Se
v ∈ Fm , definimos o levantamento horizontal de α em E passando por v como sendo a curva
[α(t ), v ]. Esta noção nos permite também definir o transporte paraleloτα :π−1E (α(0))→π
−1E (α(1))
colocando τα([α(0),v ]) = [α(1),v ]. Podemos verificar que esta aplicação é um isomorfismo de
espaços vetoriais.
Uma seção ao longo deα é uma aplicação diferenciávelϕ : [0, 1]→ E tal queϕ(t )∈π−1E (α(t ))
para todo t ∈ [0, 1], isto é, πE (ϕ(t )) =α(t ) para todo t ∈ [0, 1].
Exemplo 1.7. Seja M uma variedade de dimensão n. Considere o fibrado de referenciais lineares
L(M )(M ,G L(n ,R)) e seja V = Rn . O fibrado vetorial E associado a L(M ) com fibra V , sendo que
a ação de G L(n ,R) em V é a ação usual A · v = A(v ), é naturalmente identificado com o fibrado
tangente T M . De fato, a aplicação f : E → T M definida por f ([u , v ]) = u · v é um difeomorfismo
e é isomorfismo quando restrito às fibras. Aqui o referencial u = (X1, ..., Xn ) em x ∈M é pensado
como uma aplicação linear u :Rn → Tx M , e i 7→X i .
Exemplo 1.8. Sendo M como no exemplo anterior, agora consideramos V = T(r,s )Rn o espaço ve-
toriais dos tensores de tipo (r, s ) no espaçoRn . O grupo G L(n ,R) age à esquerda em V da seguinte
maneira: Se A ∈ G L(n ,R) e T ∈ T(r,s )Rn , definimos A · T colocando para ϕi ∈ (Rn )∗ e v j ∈ Rn ,
(A ·T )(ϕi , v j ) = T (A∗(ϕi ), A−1(v j )), em que A∗ é a aplicação transposta de A. O fibrado associado a
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 30
L(M ) e com fibra V dado pela ação comentada é identificado com o fibrado dos tensores T(r,s )M ,
cujas seções são os campos de tensores em M .
A conexão C em P nos permite definir uma maneira de derivar seções ao longo de curvas de
M . De fato, fixando t ∈ [0, 1], definimos a derivada covariante deϕ na direção α′(t ) por:
∇α′(t )ϕ := limh→0
1
h·
τα(ϕ(α(t +h)))−ϕ(α(t ))
.
Em que τα : π−1E (α(t +h))→ π−1
E (α(t )) é o transporte paralelo. Note que ∇α′(t )ϕ ∈ π−1E (α(t ))
para todo t ∈ [0, 1], e portanto a derivada covariante define uma nova seção ao longo de α.
Dizemos que a seção ϕ é paralela quando∇α′(t )ϕ = 0 para todo t ∈ [0, 1].
Seja agora x ∈M e suponha que exista uma seçãoϕ de E definida em uma vizinhança aberta
U de x . Seja u ∈ π−1(U ) e considere a aplicação associada u : Fm → π−1E (π(u )) definida por
u (v ) = [u , v ], a qual é um isomorfismo linear. Associada à seção ϕ, definimos f : π−1(U )→ Fm
por
f (u ) = u−1 ϕ(π(u )).
Fixe u ∈ π−1(x ) e seja α uma curva tal que α(0) = x . Sejam X = α′(0) e X ∈ Hu o vetor
horizontal tal que π∗(X ) =X .
Lema 1.18. ∇Xϕ = u (X ( f )).
Demonstração: Seja α o levantamento de α começando em u , então α′(0) = X . Temos então
que:
X ( f ) = limh→0
1
h·
f (α(h))− f (u )
= limh→0
1
h·
α(h)−1(ϕ(α(h)))−u−1(ϕ(x ))
e
u (X ( f )) = limh→0
1
h·
u α(h)−1(ϕ(α(h)))−ϕ(x ))
.
É suficiente mostrar então que
u α(h)−1(ϕ(α(h))) =τα(ϕ(α(h))).
Se ξ= α(h)−1(ϕ(α(h))), então [α(t ),ξ] é curva horizontal em E , e como
[α(t ),ξ]|t=h = [α(h), α(h)−1(ϕ(α(h)))] = α(h) α(h)−1(ϕ(α(h))) =ϕ(α(h))
segue que τα(ϕ(α(h))) = [α(0),ξ] = [u ,ξ] = u (ξ), o que conclui o lema.
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 31
Em particular, note que o valor ∇α′(0)ϕ não depende da curva α, mas apenas do vetor α′(0).
Isto nos permite definir para cada X ∈ Tx M a derivada covariante de ϕ na direção X em x como
sendo ∇Xϕ := ∇α′(0)ϕ, em que α é qualquer curva passando por x e tangente a X . Essencial-
mente da propriedade de τα ser um isomorfismo e do lema acima, podemos mostrar as seguin-
tes propriedades da derivada covariante enunciadas na proposição abaixo:
Proposição 1.19. Sejam X , Y ∈ Tx M e sejam ϕ e ψ seções de E definidas em uma vizinhança
aberta de x . Então:
1. ∇X+Yϕ =∇Xϕ+∇Yϕ;
2. ∇X (ϕ+ψ) =∇Xϕ+∇Xψ;
3. ∇λXϕ =λ ·∇Xϕ, em que λ∈F;
4. ∇X ( f ϕ) = f (x ) ·∇Xϕ+X ( f ) ·ϕ(x ), em que f é uma função definida numa vizinhança de x
com valores em F.
Se X é um campo numa vizinhança aberta U de x , a derivada covariante da seção ϕ na
direção de X , denotada por ∇Xϕ, é a seção de E definida por
∇Xϕ
(x ) := ∇X (x )ϕ para cada
x ∈U .
Uma métrica em um espaço vetorial V é uma aplicação g : V × V → F tal que se F = R,
então g é linear na primeira variável e simétrica nas duas variáveis, isto é, g (X , Y ) = g (Y , X ) e
se F = C, então g é linear na primeira variável e simétrica conjugada nas duas variáveis, isto é,
g (X , Y ) = g (Y , X ).
Definição 1.16. Uma métrica em um fibrado vetorial E é uma escolha de uma métrica g x em
cada fibra π−1E (x ), x ∈M , e que varie de maneira C∞ no seguinte sentido: dadas seções ϕ e ψ de
E , a função x 7→ g x (ϕ(x ),ψ(x )) é C∞. Se F = R o fibrado é dito semi-riemanniano e se F = Co fibrado é dito semi-hermitiano. Se, além disso, a métrica é positiva definida em cada fibra, o
fibrado é dito Riemanniano de F=R e Hermitiano se F=C.
Definição 1.17. Dada uma métrica g em E , uma conexão num fibrado principal P(M ,G ) é dita
conexão métrica, ou que a conexão é compatível com a métrica, quando o transporte paralelo
de E é isometria.
Dada uma métrica g em E , podemos construir uma redução Q(M , H ) de P(M ,G ) como se-
gue. Na fibra típica Fm de E consideramos o produto interno canônico:
<ξ,η>=∑
i
ξiηi para ξ= (ξ1, ...,ξm ),η= (η1, ...,ηm )∈Rm
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 32
<ξ,η>=∑
i
ξiηi para ξ= (ξ1, ...,ξm ),η= (η1, ...,ηm )∈Cm .
Seja Q o conjunto dos u ∈ P tais que g (u (ξ), u (η)) =<ξ,η> para todos ξ,η ∈ Fm , isto é, tais
que a aplicação u :Fm →π−1E (πE (u )) seja uma isometria. Então Q é um subvariedade fechada de
P . Fazendo as devidas restrições nas trivializações locais de P , mostra-se que Q é um subfibrado
reduzido de P com grupo de estrutura H dado por
H = g ∈G ;ρ(g )∈O(m ) se F=R
H = g ∈G ;ρ(g )∈U (m ) se F=C,
em que ρ é a representação de G em G L(m ,F).
Restringiremos nossa atenção agora ao fibrado de referenciais L(M )(M ,G L(n ,R)). Uma co-
nexão neste fibrado é chamada de conexão linear. Até o fim desta seção, denotaremos por P o
fibrado L(M ).
Definição 1.18. A 1-forma canônica ϑ de P é a forma com valores em Rn definida colocando
para cada X ∈ Tu P, ϑ(X ) = u−1(π∗X ), em que o ponto u = (X1, ..., Xn ) ∈ P é pensado como uma
aplicação u :Rn → Tπ(u )M , e i 7→X i .
Proposição 1.20. A forma ϑ é tensorial de tipo (ρ,Rn ), em que ρ é a ação canônica de G L(n ,R)em Rn .
Demonstração: Dados g ∈G L(n ,R) e X ∈ Tu P , temos que
R∗gϑ(X ) = ϑ((Rg )∗X ) = (u · g )−1(π∗X ) = g −1u−1(π∗X ) = g −1ϑ(X ),
o que mostra que ϑ é pseudotensorial. Se X é vertical, então π∗X = 0, e assim ϑ(X ) = u−1(0) = 0.
Dado v ∈ Rn , podemos associar o campo horizontal fundamental B (v ) em P como se-
gue. Dado u ∈ P , B (v )u é o único vetor horizontal em u para o qual π∗B (v )u = u (v ), em que
u : Rn → Tπ(u )M . Note no entanto que esta definição, ao contrário da definição de gerador
infinitesimal, necessita de uma conexão em P .
Proposição 1.21. Os campos horizontais fundamentais têm as seguintes propriedades (análogas
às propriedades dos geradores infinitesimais):
1. Se ϑ é a forma canônica de P, então ϑ(B (v )) = v para todo v ∈Rn .
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 33
2. (Rg )∗(B (v )) = B (g −1v ), para g ∈G L(n ,Rn ) e v ∈Rn .
3. Se v 6= 0, então B (v ) não se anula.
Lema 1.22. Vale que [A#, B (v )] = B (A ·v ) para todo A ∈ gl(n ,R) e v ∈Rn .
Demonstração: Se a t = exp(t A), então
[A#, B (v )] = limt→0
1
t·
B (v )− (Ra t )∗(B (v ))
= limt→0
1
t·
B (v )− B (a−1t v )
.
Por outro lado, como a associação v 7→ B (v )u é isomorfismo de Rn no subespaço horizontal
Hu , então teremos:
limt→0
1
t·
B (v )− B (a−1t v )
= B
limt→0
1
t· (v −a−1
t v )
= B (A ·v ).
Definimos a forma de torção Υ de uma conexão linear C por Υ := Dϑ. Assim, Υ é uma 2-
forma tensorial em P de tipo (Id,Rn ). Mostraremos agora a segunda equação de estrutura, a
qual envolve Υ.
Teorema 1.23 (Segunda Equação de Estrutura).
dϑ(X , Y ) =ω(Y ) ·ϑ(X )−ω(X ) ·ϑ(Y )+Υ(X , Y )
Demonstração: A demonstração é similar à demonstração da primeira equação de estrutura.
Procedemos separando em 3 casos.
1. Se X e Y são verticais podemos supor que X = A# e Y = B # são campos verticais fun-
damentais. Então ambos os lados se anulam pois ambas ϑ e Υ se anulam em campos
verticais.
2. Se X e Y são horizontais podemos supor que X = B (u ) e Y = B (v ) são campos horizontais
fundamentais. Como X e Y são horizontais, ω(X ) = ω(Y ) = 0 por definição de forma de
conexão e Υ(X , Y ) = dϑ(X , Y ) por definição de derivada exterior covariante, e a igualdade
segue.
3. Se X é vertical e Y é horizontal podemos supor que X = A# e Y = B (u ). Temos que
Υ(X , Y ) = 0 pela definição de derivada exterior covariante, ω(Y ) = 0 por definição de
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 34
forma de conexão eω(X ) ·ϑ(Y ) =ω(A#) ·ϑ(B (v )) = A ·v . Pela fórmula de Cartan:
dϑ(X , Y ) = A#(ϑ(B (v )))− B (v )(ϑ(A#))−ϑ[A#, B (v )] =−ϑ(B (A ·v )) =−A ·v,
o que conclui a demonstração.
Seja e1, ..., en a base canônica deRn . Como as formas ϑ eΥ tomam valores emRn podemos
escrevê-las como
ϑ=∑
i
ϑi e i , Υ=∑
i
Υi e i ,
em que ϑi e Υi são formas em P com valores em R. Para cada i , j = 1, 2, ..., n , denote por E i j a
matriz n ×n cuja entrada na posição (i , j ) é 1 e é 0 nas demais. Como as formas ω e Ω tomam
valores em gl(n ,R), podemos escrever
ω=∑
i ,j
ωi j E i j , Ω=∑
i ,j
Ωi j E i j .
Assim, comparando coordenada com coordenada, podemos escrever as equações de estru-
tura como
1. dϑi =−∑
kωi k ∧ϑk +Υi , i = 1, 2, ..., n .
2. dωi j =−∑
k ωi k ∧ωk j +Ωi j , i , j = 1, 2, ..., n .
Sabemos que o conjunto das formas diferenciais com valores reais forma uma R-álgebra
com soma e o produto por escalares usuais e com o produto exterior. Podemos considerar então
a álgebra das matrizes cujas entradas são elementos na álgebra das formas diferenciais com
valores em R e definimos a diferencial exterior de uma matriz de formas como sendo a matriz
das diferenciais. Podemos daí escrever as equações acima na forma matricial:
1. dϑ=−ω∧ϑ+Υ
2. dω=−ω∧ω+Ω.
Teorema 1.24 (Segunda Identidade de Bianchi). Para uma conexão linear, temos:
DΥ=Ω∧ϑ,
Capítulo 1. Conceitos e resultados preliminares 35
isto é,
3DΥ(X , Y ,Z ) = Ω(X , Y )ϑ(Z )+Ω(Y ,Z )ϑ(X )+Ω(Z , X )ϑ(Y ) , para X , Y ,Z ∈ Tu P
Demonstração: Se aplicarmos d na primeira equação de estrutura vamos obter
0=−dω∧ϑ+ω∧dϑ+dΥ.
Por definição de forma de conexão, temos que ω(Xh) = 0, além disso, ϑ(Xh) = ϑ(X ) pois
π∗(X ) = π∗(Xh + Xv ) = π∗(Xh) e finalmente temos que dω(Xh , Yh) = Ω(X , Y ) por definição da
forma de curvatura. Portanto:
DΥ(X , Y ,Z ) = dϑ(Xh , Yh ,Zh) = (dω∧ϑ)(Xh , Yh ,Zh) = (Ω∧ϑ)(X , Y ,Z ).
Capítulo 2
Simetrias em Geometria
Neste capítulo mostraremos através de alguns exemplos como conexões em fibrados principais
podem fornecer diferentes tipos de geometrias. Essencialmente, mostraremos alguns exemplos
de espaços simétricos, os quais serão realizados como espaço base de certos fibrados principais.
Escolhemos em especial os exemplos de geometrias clássicas, isto é, as únicas variedades Rie-
mannianas simplesmente conexas e completas de curvatura constante: o espaço euclidianoRn
(Geometria Euclidiana), a esfera Sn (Geometria Esférica) e o espaço hiperbólico H n (Geometria
Hiperbólica)[Car92].
2.1 Espaços Homogêneos Simétricos
Antes de definir espaços homogêneos simétricos, vamos mostrar como é possível induzir cone-
xões por morfismos de fibrados. A proposição abaixo será usada posteriormente.
Proposição 2.1. Seja ( f , f ′) : P1(M 1,G1)→ P2(M 2,G2) um morfismo de fibrados principais tal que
a aplicação induzida F : M 1→M 2 seja um difeomorfismo. Seja C1 uma conexão em P1, ω1 e Ω1
as suas formas de conexão e curvatura, respectivamente. Então:
1. Existe uma única conexão C2 em P2 tal que os subespaços horizontais de C1 são levados em
subespaços horizontais de C2 pela aplicação f .
2. Seω2 e Ω2 são as formas correspondentes de C2, então f ∗ω2 = f ·ω1 e f ∗Ω2 = f ·Ω1, em que
( f ·ω1)(X ) = ( f ′∗)e (ω1(X )), e ( f ·Ω1) é definida de maneira análoga.
Demonstração:
36
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 37
1. Definiremos a conexão C2 expressando quais serão os subespaços horizontais desta.
Dado u 2 ∈ P2, temos que π2(u 2) ∈ M 2. Como F é sobrejetiva, existe x1 ∈ M 1 tal que
F (x1) =π2(u 2).
Escolha u 1 ∈ P1 para o qual π1(u 1) = x1, então π2( f (u 1)) = F (π1(u 1)) = F (x1) = π2(u 2) e
assim existe g 2 ∈G2 para o qual u 2 = f (u 1) · g 2. Defina Hu 2 := (Rg 2)∗( f ∗(Hu 1)), em que Hu 1
é o subespaço horizontal em u 1 da conexão C1.
Mostraremos agora que Hu 2 não depende da escolha de u 1 e nem de g 2. Suponha que
u 2 = f (u ′1) · g ′2. Então f (u 1) e f (u ′1) estão na mesma fibra, isto é, π2( f (u 1)) = π2( f (u ′1)),
e portanto F (π1(u 1)) = F (π1(u ′1)), o que implica π1(u 1) = π1(u ′1) pois F é injetiva. Assim,
existe g 1 ∈G1 tal que u ′1 = u 1 · g 1. Portanto
f ∗(Hu ′1) = f ∗(Hu 1·g 1) = f ∗((Rg 1)∗(Hu 1)) = (Rg 2
)∗( f ∗(Hu 1)),
em que a última igualdade acima segue de ( f , f ′) ser morfismo, onde g 2 = f ′(g 1). Como
f (u ′1) = f (u 1 ·g 1) = f (u 1) · f ′(g 1) = f (u 1) ·g 2, temos que f (u 1) ·g 2 = f (u ′1) ·g ′2 = f (u 1) ·g 2 g ′2,
o que implica g 2 = g 2 g ′2, e assim
(Rg ′2)∗( f ∗(Hu ′1
)) = (Rg 2 g ′2−1)∗ f ∗(Hu ′1
) = (Rg 2)∗(Rg 2−1)∗(Rg 2
)∗ f ∗Hu 1 = (Rg 2)∗ f ∗(Hu 1),
portanto Hu 2 está bem definido.
Para ver que esta distribuição é invariante, sejam u 2, u 1 e g 2 como acima e seja g ′2 ∈ G2
qualquer. Então u 2 · g ′2 = f (u 1) · (g 2 g ′2), o que implica, por definição da distribuição,
Hu 2·g ′2 = (Rg ′2)∗((Rg 2)∗ f ∗(Hu 1) = (Rg ′2
)∗Hu 2 .
Para ver que Tu 2 P2 =Hu 2 ⊕Vu 2 , basta mostrar que ((π2)∗)u 2 é isomorfismo quando restrito
à Hu 2 . Seja x2 = π2(u 2). Como existe u 1 ∈ P1 tal que f (u 1) ∈ π−12 (x2), basta mostrar que
(π2)∗ restrito à H f (u 1) é isomorfismo pois, se para u 1 é isomorfismo, então para u ′1 = u 1 · g 1
também é isomorfismo pela comutatividade do diagrama abaixo:
Hu 1
(π1)∗ //
(Rg 1 )∗
Tx1 M 1
Id
Hu 1·g 1
(π1)∗ // Tx1 M 1
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 38
De π2 f = F π1, podemos considerar o seguinte diagrama comutativo:
Hu 1
f ∗ //
(π1)∗
H f (u 1)
(π2)∗
Tx1 M 1F∗ // TF (x1)M 2
Da definição de C2, no diagrama acima temos que f ∗ é sobrejetiva e que (π1)∗ e F∗ são
isomorfismos. Segue que f ∗ é injetiva, pois se f ∗(X ) = f ∗(Y ), então (π2)∗ f ∗(X ) = (π2)∗ f ∗(Y ),
o que implica F∗(π1)∗(X ) = F∗(π1)∗(Y ), e portanto X = Y pois F∗(π1)∗ é isomorfismo. Assim,
a restrição de (π2)∗ a H f (u 1) é um isomorfismo, e o item está demonstrado.
A unicidade de C2 é clara da sua própria definição.
2. Vamos mostrar que para todo X ∈ Tu 1 P1 vale ω2( f ∗X ) = f ′∗(ω1(X )). Da linearidade dos
objetos envolvidos, basta separar em dois casos.
Primeiro, se X ∈Hu 1 , então os dois lados se anulam pois f preserva subespaços horizon-
tais, os quais são, em cada ponto, núcleo da forma de conexão.
Segundo, se X ∈ Vu 1 , então X = (A∗1)u 1 é um campo fundamental. Seja A2 = f ′∗(A1). Deno-
tando por L u a aplicação induzida por ambas ações nos fibrados Pi (M i ,G i ): L u (g ) = u · g ,
para u ∈ Pi e g ∈G i e da definição de morfismo de fibrados, temos que f L u 1 = L f (u 1) f ′,
então
f ∗(X ) = f ∗((A∗1)u 1) = f ∗(L u 1)∗(A1) = (L f (u 1))∗( f′∗(A1)) = (L f (u 1))∗A2 = (A∗2) f (u 1),
e assim
ω2( f ∗X ) =ω2(A∗2) = A2 = f ′∗(A1) = f ′∗(ω1(A∗1)) = f ′∗(ω1(X )).
Finalmente, para a equação correspondente para as formas de curvatura, observe que
f ∗dω2 = f ·dω1. Aplicando f ∗ na primeira equação de estrutura, teremos
f ∗dω2 =− f ∗([ω2,ω2])+ f ∗Ω2 =− f · ([ω1,ω1])+ f ·Ω1 = f ·dω1,
daí
−[ f ∗ω2, f ∗ω2]+ f ∗Ω2 =−[ f ·ω1, f ·ω1]+ f ·Ω1,
o que implica f ∗Ω2 = f ·Ω1.
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 39
Na situação da proposição acima, dizemos que ( f , f ′) leva a conexão C1 na conexão C2. No
caso particular em que ( f , f ′) é um automorfismo de um fibrado principal P(M ,G ) com uma
conexão C , dizemos que C é invariante por ( f , f ′) se este morfismo leva C em C . Existe uma
proposição análoga à anterior que será enunciada aqui apenas para constar, pois não será usada
posteriormente.
Proposição 2.2. Seja ( f , f ′) : P1(M 1,G1)→ P2(M 2,G2) um morfismo de fibrados principais tal que
f ′ : G1→G2 é um isomorfismo de grupos. Seja C2 uma conexão em P2, ω2 sua forma de conexão
correspondente e Ω2 sua forma de curvatura. Então:
1. Existe uma única conexão C1 em P1 tal que os subespaços horizontais de P1 são levados em
subespaços horizontais de P2.
2. Se ω1 e Ω1 são a forma de conexão e a forma de curvatura respectivamente de C1, então
f ∗ω2 = f ·ω1 e f ∗Ω2 = f ·Ω1.
Demonstração: Defina ω1 = f ′−1∗ ( f
∗ω2). Sejam X1 ∈ Tu 1 P1 e g 1 ∈G1 e colocando X2 = f ∗(X1) e
g 2 = f ′(g 1). Então nós temos:
ω1((Rg 1)∗X1) = f ′−1∗ (ω2( f ∗((Rg 1)∗)X1)) = f ′−1
∗ (ω2((Rg 2)∗X2))
= f −1∗ (ad(g −1
2 )∗ω2(X2)) = ad(g −11 )∗( f
′−1∗ (ω2(X2)))
= ad(g −11 )∗(ω1(X1)).
Sejam agora A1 ∈ g1 e A2 = f ′∗(A1). Temos queω1(A∗1) = f ′−1∗ (ω2(A∗2)) = f ′−1
∗ (A2) = A1. Portanto
ω1 é uma forma de conexão em P1. A outra afirmação tem uma prova análoga à da proposição
anterior.
Como dissemos antes, realizaremos alguns espaços simétricos como espaço base de alguns
fibrados principais, mas estes últimos por sua vez, não são quaisquer fibrados, são de fato fibra-
dos principais da forma G (G /H , H ), em que H é um subgrupo fechado de G . Nestes fibrados em
especial, temos uma maneira de definir conexões que é essencialmente a procura de um bom
complemento para a álgebra de Lie de H em g, o qual deve ser invariante pela representação
adjunta de H , como mostra o teorema a seguir.
Teorema 2.3. Seja G um grupo de Lie conexo e H um subgrupo fechado de G . Sejam g e h as
álgebras de Lie de G e H respectivamente.
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 40
1. Se existe um subespaço m de g tal que g= h⊕m e ad(H )∗m=m, então a componente em h,
denotada porω, da forma e Maurer-Cartan de G com respeito a decomposição acima define
uma conexão no fibrado G (G /H , H ), a qual é invariante pelas translações à esquerda em G .
2. Reciprocamente, qualquer conexão em G (G /H , H ) invariante pelas translações à esquerda
em G (se existir) determina uma tal decomposição e é obtida da maneira descrita no item
1.
3. A forma de curvaturaΩ de tal conexão invariante é dada porΩ(X , Y ) =−[X , Y ]h, para todos
X , Y campos invariantes à esquerda pertencentes a m.
Demonstração:
1. Seja A ∈ h e A# o gerador infinitesimal de A. Note que A# é invariante à esquerda:
(L g )∗A =d
d t
t=0
g ·exp(t A) = A#g .
Mas isto implica que Θ(A#) = A#e = A = ω(A#). Para ver que (Rh)∗ω = ad(h−1)∗ ω, seja
X ∈ Tg G e ϕ a projeção de g em m, então
Θ((Rh)∗X ) =ω((Rh)∗X )+ϕ((Rh)∗X ),
e por outro lado
ad(h−1)∗Θ(X ) = ad(h−1)∗ω(X )+ad(h−1)∗ϕ(X ).
Assim, comparando componente com componente:
ω((Rh)∗X )︸ ︷︷ ︸
∈h
+(ϕ((Rh)∗X )−ad(h−1)∗ϕ(X ))︸ ︷︷ ︸
∈m
= ad(h−1)∗ω(X )︸ ︷︷ ︸
∈h
+ 0︸︷︷︸
∈m
,
temos que ω((Rh)∗X ) = ad(h−1)∗ω(X ), o que mostra que ω é uma forma de conexão. Em
g = e , ω é a projeção sobre h, portanto m é o subespaço horizontal por esta conexão em
g = e (núcleo deω).
A forma ω é invariante à esquerda, isto é, L∗gω = ω para todo g ∈ G , pois se X ∈ Tg ′G ,
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 41
então
L∗gω(X ) = ωg g ′((L g )∗X )
= ωg g ′((L g )∗ (L g ′)∗(Xe ))
= ωg g ′((L g g ′)∗(Xe ))
= (Xe )h
= ωg ′((L g ′)∗(Xe ))
= ωg ′(X ).
2. Seja ω uma forma de conexão em G (G /H , H ) invariante pelas translações à esquerda de
G . Seja m o subespaço horizontal em g = e . Por definição de espaço horizontal temos
que g = h⊕m. Por definição de forma de conexão, m é o núcleo de ω em g = e , e pela
conexão ser invariante à esquerda, temos que esta forma de conexão é justamente, para
cada X ∈ Tg ′G , a componente em h do valor na identidade do único campo invariante à
esquerda em G cujo valor em g ′ é X . Note também que dado h ∈H e m ∈m temos que
ω(ad(h)∗m ) =ω((Rh−1)∗m ) =R∗h−1ω(m ) = ad(h)∗ω(m ) = 0,
o que implica ad(h)∗m ∈ Kerωe = m, e assim ad(H )m ⊂ m. Como ad(h)∗ é isomorfismo
para todo h, temos que dim ad(h)∗m= dim m, e portanto ad(H )m=m.
3. Combinando a primeira equação de estrutura com a fórmula de Cartan obtemos:
Ω(X , Y ) = dω(X , Y )+ [ω(X ),ω(Y )] =X (ω(Y ))−Y (ω(X ))−ω([X , Y ])+ [ω(X ),ω(Y )].
Mas se X , Y ∈m, entãoω(X ) =ω(Y ) = 0, o que implica Ω(X , Y ) =−[X , Y ]h.
Definição 2.1. Seja G um grupo de Lie conexo com um automorfismo involutivo σ não trivial,
isto é, σ2 = IdG e σ 6= IdG . Seja H um subgrupo fechado de G tal que Fix(σ)e ≤ H ≤ Fix(σ), em
que Fix(σ)e é a componente da identidade de Fix(σ). Dizemos que o espaço homogêneo G /H é
simétrico (definido porσ).
Como σ2 = IdG e σ(e ) = e , segue que o automorfismo de álgebras de Lie (σ∗)e : g→ g tam-
bém é involutivo. Isto implica que o polinômio minimal de T = (σ∗)e assume uma das seguintes
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 42
formas: p1(x ) = (x +1), p2(x ) = (x −1), ou p3(x ) = (x +1)(x −1). Em qualquer uma das possibili-
dades, temos que
g=m⊕h,
em que h = X ∈ g; T (X ) = X e m = X ∈ g; T (X ) = −X (podendo acontecer de algum destes
espaços ser nulo).
Note que ad(H )m = m. Para ver isso, sejam h ∈ H e X ∈ m. Como ad(h)∗X = (Rh−1)∗X e
σRh =Rσ(h)σ=Rh σ, sendo que esta última igualdade é verdade pois h ∈H ≤ Fix(σ), temos
que:
σ∗((Rh−1)∗X ) = (σ Rh−1)∗X = (Rh−1)∗σ∗X =−(Rh−1)∗X .
Isto é,σ∗(ad(h)∗X ) =−ad(h)∗X , e portanto ad(H )∗m⊂m, e de ad(h)∗ ser isomorfismo, temos que
ad(H )∗m=m.
Logo, m induz uma conexão invariante no fibrado G (G /H , H ), a qual é denominada a cone-
xão canônica de G (G /H , H ). Denotaremos esta conexão por CS . O automorfismo σ pode ser
pensado como um automorfismo do fibrado G (G /H , H ).
O automorfismoσ induz naturalmente um difeomorfismo involutivoσ0 : G /H →G /H , bas-
tando definir σ0([g ]) = [σ(g )]. Temos que π σ = σ0 π, em que π : G → G /H é a projeção
canônica, eσ0([e ]) = [σ(e )] = [e ], isto é, [e ] é ponto fixo deσ0.
Observação 2.1. A origem [e ] é um ponto fixo isolado deσ0. De fato, suponha por absurdo que
isto seja falso e seja ([g n ]) uma sequência em G /H de pontos fixos de σ0 que converge para [e ]
e tal que [g n ] 6= [e ] para todo n ∈ N. Pela existência de seções locais de G (G /H , H ) podemos
supor que g n converge para e , com g n 6= e para todo n ∈ N. Como, para cada n ∈ N, temos
σ0[g n ] = [σ(g n )] = [g n ], deve existir hn ∈H para o qualσ(g n ) = g n ·hn . Mas isto implica que
g n =σ2(g n ) =σ(g n ) ·σ(hn ) = g n ·h2n ,
sendo a última igualdade acima válida pois H é subgrupo de Fix(σ), e segue então que h2n = e .
Como hn converge para e , e a aplicação g 7→ g 2 é um difeomorfismo local em torno de g = e ,
segue que para n suficientemente grande, hn = e , e portanto σ(g n ) = g n . Assim, tomando n
maior se necessário, g n está na componente da identidade de Fix(σ), e portanto em H , o que
implica [g n ] = [e ], o que é absurdo pela escolha da sequência ([g n ]).
A involuçãoσ0 é dita uma simetria em torno de [e ].
Teorema 2.4. Seja G /H um espaço homogêneo simétrico e CS a conexão canônica de G (G /H , H ).
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 43
1. CS é invariante porσ (pensada como automorfismo do fibrado).
2. Para cada X ∈m, sejam a t = exp(t X ) e x t = π(a t ). Então o transporte paralelo da fibra H
ao longo da curva x t coincide com a translação à esquerda h 7→ a t ·h, h ∈H.
Demonstração:
1. Seja X ∈ Tg G pensado como campo invariante à esquerda e Xe = X1+X2 sua decomposi-
ção com respeito à g= h⊕m. Comoσ L g = Lσ(g ) σ, temos que:
σ∗ω(X ) = ωσ(g )(σ∗(L g )∗Xe )
= ωσ(g )((Lσ(g ))∗σ∗X )
= ωσ(g )((Lσ(g ))∗σ∗X1+(Lσ(g ))∗σ∗X2)
= ωσ(g )((Lσ(g ))∗X1− (Lσ(g ))∗X2)
= ωe (X1)−ωe (X2) =X1 =ω(X ).
2. Primeiramente note que as curvas integrais de X são curvas horizontais por X ser um
campo invariante à esquerda em m. Portanto, dado h ∈H , isto é, um elemento da fibra de
[e ], a curva integral de X passando por h é a t ·h, que é horizontal pela observação acima
e que claramente se projeta em x t . Por unicidade do transporte paralelo, segue então que
a translação à esquerda por a t é o transporte paralelo da fibra H ao longo de x t .
Por simplicidade de notação, até o final desta seção escreveremos M = G /H . Lembramos
que para cada g ∈ G , definimos L g : M → M , a translação à esquerda no espaço homogêneo
M , dada por L g ([g ′]) = [g · g ′], a qual é difeomorfismo com inverso L g −1 . O teorema acima nos
permite definir uma conexão linear no fibrado L(M )(M ,G L(n ,R)). Para isso, primeiramente
vamos definir um morfismo de fibrados principais ( f , f ′) : G (M , H )→ L(M )(M ,G L(n ,R)). Fixe
um referencial linear u = (X1, ..., Xn ) em [e ] (o qual pode ser identificado com uma base de m) e
para cada g ∈G defina f (g ) como o referencial em [g ] que é imagem de u pela diferencial de
L g . Defina também f ′ : H →G L(n ,R), colocando f ′(h) como a matriz da transformação linear
(L h)∗ : T[e ]M → T[e ]M na base u .
Note que ( f , f ′) é um morfismo de fibrados e que a aplicação induzida F é a identidade de
M a qual é, em particular, um difeomorfismo. Pela proposição 2.1 este morfismo induz uma
única conexão em L(M )(M ,G L(n ,R)) para a qual f leva subespaços horizontais em subespaços
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 44
horizontais (e portanto curvas horizontais em curvas horizontais). Tal conexão também será
denotada por CS e será chamada a conexão linear canônica de L(M )(M ,G L(n ,R)).Antes de estudar esta conexão linear canônica, na próxima seção apresentaremos algumas
proposições sobre transformações afins.
2.2 Transformações
Seja M uma variedade com uma conexão linear C . Já vimos que a conexão C induz uma noção
de derivação de seções ao longo de curvas em cada fibrado vetorial associado ao fibrado de re-
ferenciais L(M ) (pg. 29). No caso do fibrado tangente T M , uma seção ao longo de uma curva
diferenciável α : [0, 1] → M é chamada de campo de vetores ao longo de α. Em particular, o
campo de velocidades t 7→ α′(t ) é um campo de vetores ao longo de α. Quando este campo de
velocidades é paralelo, isto é, ∇α′(t )α′ = 0 para cada t ∈ [0, 1], dizemos que α é uma geodésica
(com respeito à conexão C ). Mais geralmente, uma seção do fibrado tangente em um subcon-
junto aberto de M é um campo de vetores neste aberto, portanto se X e Y são campos de vetores
em um aberto U de M , tem sentido o campo de vetores∇X Y em U .
O tensor de Torção, denotado por T , é definido por:
T (X , Y ) =∇X Y −∇Y X − [X , Y ].
Também definimos o tensor de Curvatura, denotado por R , colocando:
R(X , Y )Z =∇X (∇Y Z )−∇Y (∇XZ )−∇[X ,Y ]Z .
Definição 2.2. Sejam M e M ′ variedades com conexões lineares C e C ′ respectivamente. Di-
zemos que uma aplicação de f : M → M ′ de classe C 1 é uma aplicação afim se sua derivada
f ∗ : T M → T M ′ leva curvas horizontais em curvas horizontais, isto é, f ∗ leva cada campo vetorial
paralelo ao longo de uma curva α em um campo vetorial paralelo ao longo da curva f α.
Em particular, quando o campo de velocidades de uma curva α for paralelo, então o campo
de velocidades de f α também é paralelo, em outras palavras, f leva geodésicas em geodésicas.
Para a próxima proposição, lembramos que se f : M →M ′ é uma aplicação suave e se X e X ′
são campos vetoriais em M e M ′ respectivamente, dizemos que X e X ′ estão f -relacionados se
para cada x ∈M vale f ∗(Xx ) =X ′f (x ). Além disso, lembramos também que se X está f -relacionado
a X ′ e Y está f -relacionado a Y ′, então [X , Y ] está f -relacionado a [X ′, Y ′].
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 45
Proposição 2.5. Seja f : M →M ′ uma aplicação afim. Sejam X , Y e Z campos vetoriais em M
que são f -relacionados a certos campos vetoriais X ′, Y ′ e Z ′ de M ′ respectivamente. Então:
1. ∇X Y é f -relacionado a∇X ′Y ′, onde∇ denota a derivação covariante em ambas M e M ′.
2. T (X , Y ) é f -relacionado a T ′(X ′, Y ′), em que T e T ′ são os tensores de torção de M e M ′
respectivamente.
3. R(X , Y )Z é f -relacionado a R ′(X ′, Y ′)Z ′, em que R e R ′ são os tensores de curvatura de M e
M ′ respectivamente.
Demonstração: Seja x t uma curva integral de X e seja τ o transporte paralelo de x t até x0, então
por definição de derivada covariante:
(∇X Y )x0 = limt→0
1
t
τYxt −Yx0
.
Seja x ′t = f (x t ) e seja τ′ o transporte paralelo de x ′t até x ′0. Como f preserva campos para-
lelos e da unicidade do transporte paralelo, temos que f comuta com o transporte paralelo, e
portanto:
f ∗(∇X Y )x0 = limt→0
1
t
f ∗(τYxt )− f ∗(Yx0)
= limt→0
1
t
τ′Y ′xt−Y ′x0
= (∇X ′Y′)x ′0 .
As afirmações 2. e 3. seguem facilmente de 1. e de que os colchetes estão f -relacionados.
Definição 2.3. Um difeomorfismo f de uma variedade M nela própria é chamado de uma trans-
formação de M . Se é dada uma conexão linear em L(M ), uma transformação afim de M é um
difeomorfismo f : M →M que é ao mesmo tempo uma aplicação afim.
Uma transformação de M induz um automorfismo f de L(M ). Dado um referencial
u = (X1, ..., Xn ) em x ∈ M , definimos f (u ) = ( f ∗(X1), ..., f ∗(Xn )). A aplicação induzida por f é
justamente f , isto é, π f = f π.
Note que a definição de f nos garante que a forma canônica ϑ de L(M ) é invariante por f .
De fato, dado u = (X1, ..., Xn ) e X ∈ Tu P , temos que f ∗ u = f (u ). Portanto ( f (u ))−1 = u−1 f −1∗ , e
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 46
assim
f ∗ϑ(X ) = ϑ( f ∗X )
= ( f (u ))−1(π∗ f ∗X )
= ( f (u ))−1( f ∗π∗X )
= u−1 f −1∗ f ∗(π∗(X ))
= u−1(π∗X ) = ϑ(X ).
Suponha que seja dada uma conexão linear C em L(M ) com forma de conexão ω e que
f seja uma transformação afim. Da proposição 2.1, temos que f leva a conexão C em uma
conexão, digamos, f (C ). Por outro lado, seja X ∈ Tu P um vetor horizontal em u , o qual podemos
estender para um campo horizontal em P , e tome uma curva horizontal α em P tangente a X .
Daí f ∗(X ) = dd t
t=0f (α(t )).
Escrevendo α(t ) = (X1(t ), ..., Xn (t )), que é um referencial em π(α(t )) = eα(t ), temos que
f (α(t )) = ( f ∗(X1(t )), ..., f ∗(Xn (t ))) é um referencial em π( f α(t )) = f (α(t )). Como a curva α é
horizontal, segue que cada X i (t ), i = 1, 2, ..., n , é um campo paralelo ao longo de eα, e por defini-
ção de transformação afim temos que f ∗(X i (t )) é um campo paralelo ao longo de f eα. Assim,
a curva f α é também horizontal. Logo, o automorfismo f leva subespaços horizontais em
subespaços horizontais, isto é, preserva a conexão: f (C ) = C . Em termos da forma de conexão
de C , isto significa que f ∗ω=ω.
Note também que, por esta observação acima, os campos horizontais fundamentais são in-
variantes por f . De fato, sejam u = (X1, ..., Xn )∈ P , v ∈Rn e B (v ) o campo horizontal fundamen-
tal associado, se v =∑
i a i e i , então:
π∗( f ∗B (v )u ) = f ∗π∗B (v )u
= f ∗u (v )
= f ∗∑
a i X i
=∑
a i f ∗(X i )
= f (u )(v ).
Portanto, como f ∗(B (v )) é horizontal, temos que f ∗(B (v )u ) = B (v ) f (u ). Resumimos a discus-
são acima na seguinte proposição:
Proposição 2.6. 1. Se f : M →M é uma transformação, então a forma canônica ϑ de L(M ) é
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 47
invariante por f .
2. Se M possui uma conexão linear C e f : M → M é uma transformação afim, então C é
invariante por f .
Para finalizar as observações sobre transformações afins, temos a seguinte proposição:
Proposição 2.7. Seja C uma conexão linear em M . Para uma transformação f de M , as condições
abaixo são equivalentes:
1. f é uma transformação afim de M .
2. f ∗ω=ω, em queω é a forma de conexão de C e f é a transformação de P induzida por f .
3. f deixa todo campo horizontal fundamental B (v ) invariante.
4. f ∗(∇X Y ) =∇ f ∗X ( f ∗Y ) para quaisquer campos vetoriais X e Y em M .
Demonstração: A equivalência entre 1. e 2. e a implicação 2.⇒ 3. já foram feitas. Para ver que
3. implica 2. note que se u ∈ P , então o subespaço horizontal em u é Hu = B (v )u ; v ∈Rn, pois
a hipótese significa que f leva subespaços horizontais em subespaços horizontais. Isto implica
que f (C ) =C e portanto f ∗ω=ω. A implicação 1.⇒ 4. foi feita na proposição 2.5. Finalmente,
para ver que 4. implica 1. seja Y um campo paralelo (não nulo) ao longo de uma curva x t . Seja X
o campo velocidade da curva x t e estenda estes campos para M (o que é possível em vizinhanças
suficientemente pequenas), denotando pelas mesmas letras tais extensões. A hipótese nos diz
que f ∗Y é paralelo ao longo de f (x t ), e portanto f é uma transformação afim.
Voltaremos agora a discutir o caso da conexão linear canônica no fibrado L(M )(M ,G L(n ,R)),em que M = G /H . Antes de enunciar as propriedades desta conexão linear canônica e partir
para os exemplos, veremos um lema.
Lema 2.8. Seja U ⊂ M um subconjunto aberto de uma variedade M com uma conexão linear.
Sejam x ∈ U e σ : U → U uma aplicação afim involutiva da qual x é um ponto fixo isolado.
Então σ∗(x ) =−IdTx M . Em particular, σ reverte as geodésicas que passam por x , isto é, para todo
X ∈ Tx M tal que a aplicação exp esteja definida, valeσ(exp(X )) = exp(−X ).
Demonstração: Denote por T = σ∗(x ). Como σ é uma involução em U que fixa x , temos que
T : Tx M → Tx M também satisfaz T 2 = Id. Segue então que o polinômio minimal de T só pode ser
p1(λ) = (λ−1)(λ+1), p2(λ) =λ−1 ou p3(λ) =λ+1. Se fosse p1 ou p2 teríamos que+1 é autovalor
de T , o que implica que existe X 6= 0 para o qual T (X ) = X . Tome então a geodésica α tal que
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 48
α(0) = x e α′(0) =X . Comoσ é afim, temos queσα é uma geodésica tal queσα(0) =σ(x ) = x
e (σ α)′(0) = T (X ) = X . Pela unicidade de geodésicas, devemos ter σ α = α e x não seria um
ponto fixo isolado. Logo p3 deve ser o polinômio minimal de T , o que implica T =−Id. Assim,
σ leva uma geodésica passando por x com velocidade X 6= 0 em uma geodésica passando por x
com velocidade −X , por unicidade de geodésicas, isto nos diz queσ(exp(X )) = exp(−X ).
Observação 2.2. Vale também a recíproca do lema acima. Uma simetria em torno de um ponto
x ∈M é definida como sendo um difeomorfismo Sx de uma vizinhança U de x nela própria que
manda exp(X ) em exp(−X ) para todo X ∈ Tx M (para o qual a aplicação exp(X ) esteja definido).
Uma tal simetria é uma involução (numa vizinhança possivelmente menor) na a qual x é ponto
fixo isolado. Além disso, (Sx )∗ =−Id em Tx M pois
(Sx )∗(X ) =d
d t
t=0
Sx (exp(t X )) =d
d t
t=0
exp(−t X ) =−X .
Teorema 2.9. A conexão linear canônica num espaço homogêneo simétrico G /H tem as seguintes
propriedades:
1. C é invariante por G bem como a simetriaσ0 em torno de [e ].
2. O transporte paralelo de vetores ao longo de x t = [a t ], em que a t = exp(t X ) com X ∈m, é a
diferencial (L a t )∗. Em particular, x t é uma geodésica.
3. O tensor de torção T é nulo.
4. Qualquer campo de tensores G -invariante K em G /H é paralelo com respeito à CS . Em
particular, o tensor de curvatura R é paralelo, isto é,∇R = 0.
Demonstração:
1. Mostraremos que a aplicação L g : M →M é afim para todo g ∈G , isto é, que a aplicação
L g preserva a conexão canônica de L(M ). Denote por ω a forma de conexão da conexão
canônica de L(M ). Sejam u = f (g ′)∈ L(M ) e X = f ∗(X ′)∈Hu = f ∗(Hg ′).
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 49
Como L g f = f L g eω é invariante por L g , temos que:
ω((L g )∗X ) = ω((L g )∗ f ∗X′)
= ω( f ∗(L g )∗X ′)
= f ∗ω((L g )∗X ′)
= f ′ · ω((L g )∗X ′)
= f ′∗(ω((L g )∗X ′))
= f ′∗(L∗gω(X
′)) = f ′∗(ω(X′)) = f ′(0) = 0.
E portanto L g leva subespaços horizontais em subespaços horizontais nesse caso.
Quando u = f (g ′) ·A e X = (RA)∗( f ∗(X ′))∈Hu = (RA)∗( f ∗Hg ′) temos que
ω((L g )∗X ) = ω((L g )∗(RA)∗ f ∗X′) = ω((RA)∗(L g )∗ f ∗X
′) = ad(A−1)∗ω((L g )∗ f ∗X′) = 0.
Assim, L g é uma aplicação afim. A invariância porσ0 segue essencialmente da invariância
de CS porσ, vista no item 1. do teorema 2.4.
2. Lembremos da definição de f que u = (X1, ..., Xn ) é o referencial fixado em [e ]. Lem-
brando que a curva a t é horizontal em G temos que, por definição da conexão em L(M ),
a curva f (a t ) é horizontal começando em f (a 0) = f (e ) = u . Dado v ∈ Rn , por definição
de transporte paralelo no fibrado associado com fibra Rn , o transporte paralelo de [u , v ]
é [ f (a t ), v ], que corresponde à f (a t ) · v pelo isomorfismo deste fibrado associado com o
fibrado tangente T M , em que f (a t ) :Rn → Txt M , e i 7→ (L a t )∗X i . Assim, o transporte para-
lelo de [ f (a t ), e i ] corresponde ao transporte paralelo de X i , portanto o transporte paralelo
de X i em t é f (a t ) · e i = (L a t )∗X i , isto é, o transporte paralelo no fibrado tangente T M ao
longo de x t é dado pela aplicação (L a t )∗.
Assim, a curva x t é geodésica pois para cada h fixado temos:
(L a t )∗x′h =
d
d t
t=h
L a t (x t ) =d
d t
t=h
[a t ·a t ] =d
d t
t=h
x t+t = x ′t+h .
3. Sejam X , Y ∈ T[e ]M . Como σ0 é uma aplicação afim temos, que o tensor de torção é inva-
riante porσ0, além disso, a derivada deσ0 em [e ] é −Id, e portanto:
−T (X , Y ) = (σ0)∗T (X , Y ) = T ((σ0)∗X , (σ0)∗Y ) = T (−X ,−Y ) = T (X , Y ).
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 50
Assim, T (X , Y ) = 0 em [e ], e portanto T ≡ 0 em M pois L g é aplicação afim para todo
g ∈G .
4. Se K é um tensor G -invariante, para ver que K é paralelo basta ver que ∇X K = 0 para
todo X ∈ T[e ]M . Por outro lado, X é tangente à uma curva da forma x t = [a t ], em que
a t = exp(t X ′) para um certo X ′ ∈ m. Então, da definição de derivada covariante, e do
transporte paralelo ser dado pela translação à esquerda por a t (item 2.), segue novamente
da G -invariância de K que∇X K = 0, e portanto K é paralelo.
Observação 2.3. Se existe alguma métrica Riemanniana g em G /H invariante por G , então sua
conexão Riemanniana é a conexão Γ. De fato, como g é invariante por G , segue por 4. que g é
um tensor paralelo com respeito à Γ, isto é, Γ é compatível com a métrica g . Como Γ tem torção
nula, a conexão Γ é simétrica, e a observação segue da unicidade da conexão Riemanniana. É
possível mostrar que se H é compacto, uma tal métrica g sempre existe.
Observação 2.4. Dado h ∈H , temos que para todo g ∈G valem π ad(h)(g ) =π(h g h−1) = [h g ]
e L h π(g ) = L h([g ]) = [h g ] e assim π ad(h) = L h π. Como L h fixa [e ] e ad(h)m=m, temos o
seguinte diagrama comutativo:
mad(h)∗ //
π∗
m
π∗
T[e ]M(L h )∗ // T[e ]M
Como π∗ : m → T[e ]M é um isomorfismo, podemos dizer que ad(h) em m corresponde à
translação à esquerda (L h)∗ em T[e ]M .
2.3 Exemplos de Espaços Homogêneos Simétricos
Antes de começar com os exemplos de espaços homogenêos simétricos precisamos de um teo-
rema que vai nos auxiliar.
Teorema 2.10. Sejam G um grupo de Lie e M uma variedade diferenciável com uma ação tran-
sitiva ϕ : G ×M → M . Então, dado x ∈ M qualquer, a aplicação ϕx : G /Gx → M dada por
ϕx ([g ]) =ϕ(g ,x ) é um difeomorfismo, em que Gx = g ∈G ;ϕ(g ,x ) = x é o subgrupo de isotropia
de x .
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 51
Demonstração: Para ver que ϕx está bem definida suponha que [g ] = [g ′] e seja h ∈ Gx para
o qual g ′ = g h. Então g ′ · x = (g h) · x = g (h · x ) = g · x . Esta aplicação é injetiva pois se
ϕx ([g ]) = ϕx ([g ′]), então g · x = g ′ · x , mas isto implica que g ′g −1 ∈ Gx , e portanto [g ] = [g ′].
Ela é sobrejetiva pois a ação de G em M é transitiva. Portanto ϕx é uma bijeção. Da existência
de seções locais no quociente G /Gx sabe-se que ϕx é diferenciável se, e só se, a composição
g 7→ [g ] 7→ϕx ([g ]) é diferenciável, mas este é o caso pois esta composição é a restrição da ação
(que é diferenciável) a G ×x . Esta aplicação é também G -equivariante no sentido de que pre-
serva as ações de G em G /Gx (ação por translação à esquerda) e em M (ação dada). De fato, se
g ∈G , então
ϕx (g · [g ′]) =ϕx ([g g ′]) = (g g ′) ·x = g (g ′ ·x ) = g ·ϕx ([g ′]).
A equivariância implica que ϕx tem posto constante. De fato, se [g ], [g ′] ∈G /Gx , podemos
tomar h ∈ G para o qual [g ′] = h · [g ] = [h g ]. Note daí que L h ϕx = ϕx Lh , em que Lh é a
translação à esquerda por h em G /Gx . Esta comutatividade nos garante que as derivadas (ϕx )∗[g ]e (ϕx )∗[g ′] são conjugadas pelos isomorfismos (L h)∗ e (Lx )∗, e portanto devem ter o mesmo posto.
Como ϕx é bijetiva, segue que é um difeomorfismo pelo Teorema do Posto.
2.3.1 Geometria Esférica
Dado x = (x0,x1, ...,xn )∈Rn+1, a norma euclidiana de x é dada por ‖x‖2 =∑n
i=0 x 2i . Realizaremos
primeiramente a esfera Sn = x ∈ Rn+1;‖x‖ = 1 como um espaço homogêneo. A aplicação ‖ · ‖é a forma quadrática associada à forma bilinear (x , y ) 7→
∑
i x i yi (que é o produto interno usual
de Rn+1). O grupo das transformações lineares de Rn+1 que preservam esta forma quadrática é
denotado por O(n +1), denominado grupo ortogonal (associado a norma euclidiana). Matrici-
almente, O(n + 1) = A ∈G L(n + 1,R); AT ·A = Id. O grupo ortogonal é um grupo de Lie com
álgebra de Lie o(n +1) = X ∈ gl(n +1,R); X T +X = 0. A componente da identidade deste grupo
é o subgrupo SO(n +1) = A ∈O(n ); det A = 1.
Existe uma ação natural de G =SO(n +1) em Sn dada por ϕ(A,x ) = A ·x . Usando o processo
de Gram-Schmidt é possível ver que esta ação é transitiva. Se e0 = (1, 0, ..., 0), então o grupo de
isotropia desta ação em e0 é Ge0 = A ∈ SO(n + 1); Ae0 = e0. Como Ae0 é o vetor na primeira
coluna de A, então A ∈Ge0 implica que a primeira coluna de A é o vetor e0. Como A deve ser or-
togonal, ou seja, seus vetores coluna devem formar uma base ortonormal deRn+1 com respeito
ao produto interno usual, temos que a primeira linha de A deve ser e T0 . Vemos facilmente agora
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 52
que o subgrupo de isotropia em e0 é
Ge0 =
(
A ∈SO(n +1); A =
1 0
0 A
!
, A ∈SO(n )
)
.
Mas note que este grupo é isomorfo a SO(n ), e por abuso de notação escreveremos simples-
mente Ge0 = SO(n ). Segue pelo teorema 2.10 que a aplicação ϕe0 fornece um difeomorfismo
entre SO(n +1)/SO(n ) e Sn .
Conseguimos assim explicitar a esfera como o espaço homogêneo SO(n +1)/SO(n ). Vamos
descrevê-la agora como um espaço homogêneo simétrico. Considere a matriz
S =
−1 0
0 Id
!
e a involução σ : SO(n + 1) → SO(n + 1) dada por σ(A) = SAS−1. Note que S−1 = S. Vamos
explicitar os elementos de Fix(σ) = A ∈SO(n +1);SA = AS.
Se A=
a u T
v A
!
, então para que A ∈ Fix(σ) devemos ter
a u T
v A
!
−1 0
0 Id
!
=
−1 0
0 Id
!
a u T
v A
!
,
ou seja
−a u T
−v A
!
=
−a −u T
v A
!
o que implica u = v = 0. Mas para que A ∈SO(n +1) devemos ter ainda
a 0
0 A
!
a −0
0 AT
!
=
a 2 0
0 AAT
!
=
1 0
0 Id
!
,
o que implica a = ±1 e A ∈O(n ). Mas como detA = 1, devemos ter que a = 1 e A ∈ SO(n ) ou
a =−1 e det A =−1. Reciprocamente, não é difícil ver que todas as matrizes A desta forma estão
em Fix(σ). Concluímos então que a componente da identidade de Fix(σ) é H = SO(n ) (com a
mesma identificação feita anteriormente). Desta maneira, G /H =SO(n+1)/SO(n ) é um espaço
homogêneo simétrico.
A derivada deσ em A = Id é dada porσ∗(B ) =SBS para B ∈ so(n+1). Por uma conta análoga
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 53
à que já fizemos, a álgebra de Lie de H =SO(n ) (que é o autoespaço de λ= 1) como subálgebra
de Lie de so(n +1) é
h=
(
B ∈ so(n +1); B =
0 0
0 B
!
, B ∈ so(n )
)
≈ so(n ).
Para ver qual é o subespaço horizontal m (que é o autoespaço de λ = −1) note que se
B=
0 u T
−u B
!
∈ so(n +1), então para que B ∈m devemos ter SBS =−B , ou seja
−1 0
0 Id
!
0 u T
−u B
!
−1 0
0 Id
!
=
0 −u T
−u B
!
=
0 −u T
−u −B
!
,
o que implica B = 0. Não é difícil verificar que toda B desta forma pertence a m, daí
so(n +1) = so(n )⊕m, em que
m=
(
B ∈ so(n +1); B =
0 u T
−u 0
!
; u ∈Rn
)
.
Se B ∈H , então a representação adjunta em m fica
ad
1 0
0 B
!
·
0 −u T
u 0
!
=
0 −(Bu )T
Bu 0
!
,
que é essencialmente (com as devidas identificações) a ação usual de SO(n ) em Rn .
Analogamente, para B ∈ so(n ), temos que
ad
0 0
0 B
!
·
0 −u T
u 0
!
=
0 −(Bu )T
Bu 0
!
,
o que nos diz que a ação adjunta de so(n ) em m é essencialmente a ação de so(n ) emRn . Trans-
fira o produto interno canônico deRn para m via a identificação
u ∈Rn ↔
0 −u T
u 0
!
∈m,
obtendo assim um produto interno em m que é invariante por ad(SO(n )). Note que se
u , v ∈ Rn correspondem às matrizes X , Y ∈ m respectivamente, então < u , v >= − 12
tr(A B ), as-
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 54
sim, o produto interno em m é a restrição a m do produto interno em so(n +1) dado por
< A, B >=−1
2tr(A B ),
o qual é invariante por ad(SO(n+1)) em todo so(n+1) (basta lembrar que para quaisquer matri-
zes A, B vale que tr(A B ) = tr(BA)). O produto interno em m≈ T[Id](SO(n + 1)/SO(n )) se extende
para uma métrica em SO(n+1)/SO(n ) invariante por SO(n+1). Explicaremos como isso pode ser
feito. Para fixar a notação, seja M =SO(n +1)/SO(n ). Sejam X , Y ∈ T[A]M e sejam X ′, Y ′ ∈ T[Id]M
para os quais (L A)∗X ′ = X e (L A)∗Y ′ = Y e defina < X , Y >:=< X ′, Y ′ >. Para ver que este pro-
duto está bem definido, suponha que [A ′] = [A] e seja B ∈ SO(n ) para o qual A ′ = A B . Sejam
X , Y ∈ T[Id]M tais que (L A ′)∗X =X e (L′A)∗Y = Y . Como L A ′ = L A L B , temos que
(L A)∗X ′ = (L A ′)∗X = (L A)∗(L B )∗X ,
o que implica (L B )∗X = X ′ (analogamente (L B )∗Y = Y ′). Pela observação 2.4, a transformação
(L B )∗ corresponde a ad(B ) em m, a qual preserva o produto interno. Assim < X ′, Y ′ >=< X , Y >,
e portanto a métrica está bem definida.
Encontraremos agora a diferencial de ϕe0 em [Id]. Seja X ∈m e u ∈Rn o elemento associado
a X . Então:
(ϕe0)∗X =d
d t
t=0
ϕe0[exp(t X )] =d
d t
t=0
exp(t X ) · e0 =
0
u
!
.
Assim, (ϕe0)∗ é uma isometria com respeito à métrica de Sn induzida porRn+1 (a qual é inva-
riante por SO(n + 1)). Agora, se A ∈ SO(n + 1), da relação ϕe0 L A = A ϕe0 e da invariância das
respectivas métricas por SO(n +1), é fácil mostrar que ϕe0 é uma isometria.
As geodésicas de SO(n + 1)/SO(n ) começando em [Id] são as curvas da forma π(exp(t X ))
com X ∈m. Por exemplo, se X corresponde a e1 = (1, 0, ..., 0)∈Rn , então
exp(t X ) =
cos t −sent 0 · · ·0sent cos t 0 · · ·0
0 0...
... Idn−1
0 0
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 55
e sua realização em Sn é
ϕe0(π(exp t X )) = exp(t X ) · e0 =
cos t
sent
0...
0
,
a qual representa um círculo máximo no plano x0,x1.
Todas as outras geodésicas em Sn começando em e0 são obtidas a partir desta usando as
rotações que deixam e0 fixo (aquelas de SO(n )). Fica realizada então a Geometria Esférica Sn
como o espaço homogêneo simétrico SO(n +1)/SO(n ).
2.3.2 Geometria Hiperbólica
Considere em Rn+1 a base canônica e0, e1, ..., en e considere também a forma bilinear simétrica
e não-degenerada F definida por
F (x , y ) =−x0y0+n∑
i=1
x i yi , x , y ∈Rn+1.
Seja O(1, n ) o grupo ortogonal para esta forma bilinear, isto é,
O(1, n ) =¦
A ∈G L(n +1,R); F (Ax , Ay ) = F (x , y ),∀x , y ∈Rn+1©
=¦
A ∈G L(n +1,R); AT SA =S©
em que
S =
−1 0
0 Id
!
,
como no exemplo anterior. No caso de n = 3, O(1, 3) é chamado de Grupo de Lorentz. Note que
A = (a i j ) pertence a O(1, n ) se, e somente se, os vetores coluna u 0, u 1, ..., u n satisfazem:
F (u 0, u 0) =−1 F (u i , u i ) = 1 para 1≤ i ≤ n
F (u i , u j ) = 0 para 0≤ i < j ≤ n.
Em particular, −a 200+
∑nk=1 a 2
k 0 = −1, o que implica a 00 ≥ 1 ou a 00 ≤ −1. Da relação AT SA = A,
obtemos det A = ±1. A partir disso pode-se mostrar que O(1, n ) tem 4 componentes conexas,
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 56
e que SO(1, n ) := O(1, n ) ∩ SL(n + 1,R) tem duas. Mostra-se também que a componente da
identidade de O(1, n ) é SO+(1, n ) = A ∈ SO(1, n ); a 00 ≥ 1. Denote por G esta componente da
identidade. A álgebra de Lie de G é
o(1, n ) = X ∈ gl(n +1,R); X T S+SX = 0.
Considere o hiperbolóide de duas folhas M = F−1−1, e seja M+ a componente conexa de
e0. A ação usualϕ de O(1, n ) em M pode ser restrita a G e M+ e obter que ela é transitiva usando
o processo de Gram-Schmidt. Dado x ∈ M+, temos que F (x ,x ) = −1 e x0 ≥ 1. Se pensarmos
M+ como uma hiperfície, temos que o espaço tangente Tx M+ pode ser identificado como o
subespaço de todos os vetores a ∈Rn+1 para os quais F (x , a ) = 0. Desta maneira, a restrição de
F a Tx M é positiva definida pelo Teorema da Inércia de Sylvester ([Lan02] pg. 577), e portanto F
define uma métrica Riemanniana em M+, a qual é invariante por G (pela definição de O(1, n )).
Dada A=
1 u T
0 A
!
∈Ge0 , então
1 0
u AT
!
−1 0
0 Id
!
1 u T
0 A
!
=
−1 −u T
−u −u u T +AT
A
!
=
−1 0
0 Id
!
.
Assim u = 0 e AT
A = Id. Como det A = 1, temos que A ∈ SO(n ). É fácil verificar que toda
matriz A desta forma está em Ge0 . Portanto Ge0 = SO(n ). Novamente pelo teorema 2.10, ϕe0
fornece um difeomorfismo G -equivariante entre SO+(1, n )/SO(n ) e M+.
Conseguimos assim explicitar o hiperbolóide (mais precisamente uma folha deste) como o
espaço homogêneo SO+(1, n )/SO(n ). Vamos explicitá-lo agora como um espaço homogêneo
simétrico. Considere a involuçãoσ : G →G definida porσ(A) =SAS. Como antes, se A ∈ Fix(σ),
a relação AS =SA nos fornece que A é da forma
A =
a 0
0 A
!
.
Da relação AT SA =S, obtemos que a =±1 e A ∈O(n ). Como a = a 00 ≥ 0, implica que a = 1,
e por det A = 1 segue que A ∈ SO(n ). Reciprocamente é fácil ver que toda matriz desta forma
está em Fix(σ), isto é, Fix(σ) = SO(n ). Desta maneira, G /H = SO+(1, n )/SO(n ) é um espaço
homogêneo simétrico. Como antes, a álgebra de Lie de SO(n ) como subalgebra de g é o conjunto
das matrizes da forma
0 0
0 B
!
, em que B ∈ so(n ).
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 57
Para ver qual é o subespaço horizontal m, temos que caracterizar os elementos B ∈ g para
os quais SBS = −B . Se B=
b u T
v B
!
, a relação SBS = −B nos fornece b = 0 e B = 0. A relação
B T S+SB = 0 nos fornece u = v . É fácil concluir agora que
m=
(
B ∈ g; B =
0 u T
u 0
!
, u ∈Rn
)
.
Identificando m com Rn nós vemos que ad(SO(n )) em m (como no exemplo anterior) é a
ação usual de SO(n ) em Rn :
ad
1 0
0 B
!
·
0 u T
u 0
!
=
0 (Bu )T
Bu 0
!
.
Analogamente, ad(so(n )) em m é expressa por:
ad
0 0
0 B
!
·
0 u T
u 0
!
=
0 (Bu )T
Bu 0
!
.
Podemos induzir o produto interno usual de Rn em m e definir uma métrica G invariante
em G /H de uma maneira semelhante à do exemplo anterior.
A diferencial da aplicação ϕe0 em X ∈ m é
0
u
!
, em que u ∈ Rn é o elemento associado à
X . Portanto ϕ é um isometria em [Id]. Como no exemplo anterior, mostra-se que ϕe0 é uma
isometria.
As geodésicas de SO+(1, n )/SO(n ) começando em [Id] são as curvas da forma π(exp(t X ))
com X ∈m. Por exemplo, se X corresponde a e1 = (1, 0, ..., 0)∈Rn , então:
exp(t X ) =
cosh t senht 0 · · ·0senht cosh t 0 · · ·0
0 0...
... Idn−1
0 0
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 58
a sua realização em M+ é
ϕe0(π(exp t X )) = exp(t X ) · e0 =
cosh t
senht
0...
0
que representa uma hipérbole no plano x0x1.
Todas as outras geodésicas em M+ começando em e0 são obtidas a partir desta usando
as rotações (hiperbólicas) que deixam e0 fixo (aquelas de SO(n )). Fica realizada então a Ge-
ometria Hiperbólica H+ (no modelo do hiperbolóide) como o espaço homogêneo simétrico
SO+(1, n )/SO(n ).
2.3.3 Geometria Euclidiana
Seja A(n ) o conjunto das aplicações afins em Rn , isto é, T ∈ A(n ) se T : Rn → Rn é da forma
T (x ) = Bx+u , em que B ∈O(n ) e u ∈Rn . O conjunto A(n ) é um grupo com a operação de com-
posição e age transitivamente emRn de maneira usual: ϕ(T,x ) = T (x ). Porém, vamos identificar
A(n ) com um subgrupo de G L(n +1,R)mediante o monomorfismo
T 7→ T =
B u
0 1
!
∈G L(n +1,R).
IdentificaremosRn com um subconjunto deRn+1 mediante a aplicação x 7→ x =
x
1
!
. Desta
maneira, T (x ) corresponde a T (x ). Note que o subgrupo de isotropia de 0∈Rn é o conjunto das
aplicações afins da forma T (x ) = Bx , que é isomorfo a O(n ). Portanto, pelo teorema 2.10, segue
que ϕ0 fornece um difeomorfismo entre A(n )/O(n ) e Rn .
Conseguimos assim explicitar o espaço euclidiano como o espaço homogêneo A(n )/O(n ).
Vamos explicitá-lo agora como um espaço homogêneo simétrico. Considere a matriz
S =
−Id 0
0 1
!
e a involução σ : A(n )→ A(n ) dada por σ(T ) =STS. Se T =
T ′ u
0 1
!
, então para que T ∈ Fix(σ),
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 59
devemos ter
TS =
−T ′ u
0 1
!
=
−T ′ −u
0 1
!
=ST,
o que implica u = 0. Analogamente, não é difícil verificar que toda matriz desta forma pertence
a Fix(σ), e assim Fix(σ) =O(n ). Então temos o espaço homogêneo simétrico G /H = A(n )/O(n ).
Como anteriormente, o subespaço horizontal m é o conjunto das matrizes B ∈ g tais que
SBS =−B . Se B=
B ′ b
0 0
!
, então
SBS =
B ′ −b
0 0
!
=
−B ′ −b
0 0
!
,
o que implica B ′ = 0. É fácil ver que toda matriz em g desta forma satisfaz SBS =−B , de modo
que
m=
(
0 u
0 0
!
; u ∈Rn
)
.
Se B ∈ g, então a representação adjunta em m fica:
ad
B ′ 0
0 1
!
·
0 u
0 0
!
=
0 B ′u
0 0
!
,
que é essencialmente a ação usual de O(n ) emRn . Induzindo o produto interno canônico deRn
em m teremos que se U , V ∈m, então <U , V >= tr(U T V ) e este produto é, portanto, invariante
por ad(O(n )). Como nos exemplos anteriores, podemos definir uma métrica G -invariante em
G /H . Se U ∈ m corresponde a u ∈ Rn , então (ϕ0)∗X=
u
0
!
, e portanto é uma isometria em
[0]. Como anteriormente, mostra-se que ϕ0 é na verdade uma isometria de G /H em Rn com a
métrica canônica.
As geodésicas de G /H começando em [0] são as curvas da forma π(exp(t X )) com X ∈m. Por
exemplo, se X ∈m corresponde a u ∈Rn , então
exp(t X ) =
0 u
0 0
!
Capítulo 2. Simetrias em Geometria 60
e sua realização em Rn é
ϕe0(π(exp t X )) = exp(t X ) · e0 =
t ·u1
!
a qual representa a reta t 7→ t ·u em Rn . Fica realizada então a Geometria Euclidiana Rn como
o espaço homogêneo simétrico A(n )/O(n ).
Capítulo 3
Simetrias em Física
Neste capítulo apresentaremos uma maneira de ver como conexões em fibrados principais se
relacionam com alguns temas oriundos da física (mais especificamente física teórica). O que
mostraremos, com exemplos, é que existem certas intensidades em espaços que são estudados
pela física, que correspondem a expressões locais de conexões em certos fibrados principais,
permitindo traduzir de algum modo o estudo de um objeto da física no estudo de um objeto
geométrico. Antes de começar, é necessário entender um pouco da álgebra dos quatérnios e
em seguida os espaços projetivos.
3.1 Álgebra dos Quatérnios e Espaços Projetivos
Existem algumas maneiras diferentes de apresentar a álgebra dos quatérnios. Aqui apresenta-
remos duas, e ambas serão usadas, fazendo a mudança de ponto de vista sempre que for con-
veniente. Como primeiro ponto de vista, podemos apresentar a álgebra dos quatérnios como
uma subálgebra da álgebra das matrizes de ordem 2 com coeficientes complexos. Seja
R=
(
α β
−β α
!
;α,β ∈C
)
⊂M 2(C).
Como um espaço vetorial sobreR, R tem dimensão 4, tendo como base canônica o conjunto
de matrizes:
1=
1 0
0 1
!
, i=
i 0
0 −i
!
, j=
0 1
−1 0
!
, k=
0 i
i 0
!
.
61
Capítulo 3. Simetrias em Física 62
Temos então um isomorfismo de espaços vetoriais dado por
x0 ·1+x1 · i+x2 · j+x3 ·k 7→ (x0,x1,x2,x3)∈R4.
Podemos assim definir um produto interno em R, exigindo que este isomorfismo seja uma
isometria. Note daí que se α= x0+ i x1, β = x2+ i x3 e x = (x0,x1,x2,x3), então ‖x‖2 é o determi-
nante da matriz
α β
−β α
!
.
Podemos também ver, como segundo ponto de vista, a álgebra dos quatérnios como sendo
o espaço vetorial R4 munido do produto induzido de R, fazendo do isomorfismo de espaços
vetoriais do parágrafo anterior um isomorfismo deR-álgebras. Valem as seguintes relações:
i2 = j2 = k2 =−1
ij=−ji= k, jk=−kj= i, ki=−ik= j
Denotaremos por H a álgebra (R4,+, ·) e chamaremos ela de álgebra dos quatérnios (ou a
álgebra R, pois são isomorfas). Note que, pelas relações acima, esta álgebra é não comutativa.
Todo elemento deH pode ser escrito como q = x0 ·1+x1 · i+x2 · j+x3 ·k. Definimos Re(q ) = x0
e Im(q ) = x1 · i+ x2 · j+ x3 · k. Se Im(q ) = 0, chamamos q de quatérnio real. O conjunto des-
tes é naturalmente isomorfo (como álgebra) a R, e, além disso, este é exatamente o centro da
álgebraH. O conjunto dos quatérnios para os quais Re(q ) = 0 são chamados de quatérnios ima-
ginários puros e é denotado por Im(H). Como nos complexos, definimos o conjugado de q por
q = x0 ·1−x1 · i−x2 · j−x3 ·k.
Valem as relações abaixo para todos q ,q ′ ∈H e c , d ∈R:
a ) cq +d q ′ = cq +d q ′ b ) q =q
c ) |q |= |q | d ) |cq |= |c ||q |e ) qq ′ =q ′q f ) |qq ′|= |q ||q ′|
Além destas, temos também que qq = qq = |q |2, e para q ,q ′ ∈ Im(H), valem qq ′ = q ′q
e qq ′ − q ′q = 2Im(qq ′). Todo elemento não nulo q ∈ H tem um inverso, o qual é dado por
q−1 =q · |q |−2, mostrando queH é um corpo não comutativo.
Considere o conjunto dos quatérnios unitários x ∈ H; |q | = 1. Pelas propriedades acima,
vemos que este conjunto é na verdade um grupo com a operação de multiplicação deH. Como
conjunto de matrizes, note que toda matriz A ∈ R satisfaz AA∗ = det A · I (A∗ denota a matriz
transposta conjugada de A, isto é, A∗ = At), e da relação |A |2 = det A, segue que toda matriz
Capítulo 3. Simetrias em Física 63
de norma 1 em R é unitária, formando portanto um subconjunto de SU (2). Por outro lado,
podemos verificar facilmente que toda matriz de SU (2) está em R e tem norma 1, de modo que,
como conjunto de matrizes, o conjunto dos quatérnios unitários nada mais é do que o grupo
SU (2). Por outro lado, pensando H como o conjunto R4, o conjunto dos vetores de norma 1 é
exatamente a esfera S3, e assim, podemos induzir a estrutura de grupo de SU (2) em S3, de modo
que agora sejam grupos isomorfos.
O conjunto Hn = (q1, ...,qn );qj ∈ H é R4n como R espaço vetorial, mas também pode ser
pensado como umH-módulo à direita com as operações:
(q1, ...,qn )+ (q ′1, ...,q ′n ) = (q1+q ′1, ...,qn +q ′n )
e
(q1, ...,qn ) ·q = (q1 ·q , ...,qn ·q ).
Podemos definir também um produto interno canônico emHn , colocando
< (qi ), (q ′i )>=∑
i
qi q ′i ∈H.
Este produto é não degenerado no seguinte sentido: se<ξ,η>= 0 para todo η, então ξ= 0.
Existe também uma base canônica e1, ..., en paraHn , em que e j = (0, ..., 1, ..., 0). Um endomor-
fismo P deHn , isto é, um morfismo doH-móduloHn nele próprio, é inteiramente determinado
pela matriz (p i j ) ∈M n (H) definida por P(e j ) =∑
i e i p i j . A matriz (p i j ), também denotada por
P , é chamada de matriz de P na base canônica e1, ..., en, como é feito usualmente no caso de
espaços vetoriais. O conjunto de tais endomorfismos é denotado por EndHHn . Se Q :Hn →Hn é
um outro endomorfismo, então a composição Q P também é um endomorfismo e sua matriz
na base canônica é a matriz produto definida por
Q ·P =
∑
i
qk i p i j
!
.
Deste modo, temos um isomorfismo deH-álgebras EndHHn →M n (H), P 7→ (p i j ). Além disso,
P ∈ EndHHn é bijetiva se, e somente se, (p i j ) é invertível. O conjunto das matrizes invertíveis em
M n (H) é um grupo com a operação de multiplicação de matrizes e é denotado por G L(n ,H)(que corresponde ao grupo dos endomorfismos invertíveis em EndHHn ).
Note que P ∈ M n (H) satisfaz < Pξ, Pη >=< ξ,η >, para todos ξ,η ∈ Hn , se, e somente se,
P∗P = Id. O conjunto de tais matrizes é um grupo e é denotado por Sp (n ), chamado de grupo
Capítulo 3. Simetrias em Física 64
simplético de ordem n . Em particular, para n = 1, note que < Pξ, Pη >= PξPη = ξPPη = ξη
para todos os ξ,η∈H se, e somente se, PP = 1, e portanto Sp (1) =S3 ∼=SU (2).
Existe ainda outra maneira de ver o grupo simplético Sp (n ). Para cada q = x0+x1i+x2j+x3k,
escreva z 1 = x0+x1i e z 2 = x2+x3i, então z 1+ z 2j= q . Assim podemos identificarH com C2 via
a aplicação q 7→ (z 1, z 2). Dada P ∈M n (H), escrevendo P = A + B · j, com A, B ∈M n (C), defina
φ(P) =
A B
−B A
!
∈M 2n (C).
Entãoφ é um monomorfismo da álgebra M n (H) na álgebra M 2n (C) e é tal queφ(Pt) =φ(P)
t.
Apesar da não comutatividade deH, podemos definir o determinante de uma matriz P ∈M n (H)por det P := detφ(P). Mostra-se que P é invertível se, e somente se, φ(P) é invertível. Segue
então que, com a estrutura canônica de variedade diferenciável de M n (H), G L(n ,H) é um sub-
conjunto aberto.
Da igualdade φ(Pt) = φ(P)
ttemos que P ∈ Sp (n ) se, e somente se, φ(P) ∈ U (2n ). Assim,
podemos identificar Sp (n ) com os elementos de U (2n ) da forma
A B
−B A
!
.
Há uma caracterização de tais matrizes da forma acima. Note que M ∈M 2n (C) tem a forma
acima se, e somente se, J M J −1 =M , em que
J =
0 Id
−Id 0
!
.
Se M é unitária, então a condição J M J −1 = M é equivalente a M t J M = J . Assim, pode-
mos identificar Sp (n ) como o subgrupo de U (2n ) cujos elementos M satisfazem M t J M = J .
G L(n ,H) é identificado como o grupo das matrizes invertíveis 2n × 2n tais que J M J −1 = M .
Temos também o grupo linear especial SL(n ,H), definido como o conjunto de matrizes quater-
niônicas P para as quais detφ(P) = 1, o qual é evidentemente subgrupo de G L(n ,H). Podemos
identificar SL(n ,H) como o conjunto das matrizes M ∈M 2n (C) tais que J M J −1 =M e det M = 1.
Passaremos agora a descrever brevemente os espaços projetivos. Seja F = R,C ou H, e fixe
n ≥ 2. Definimos uma relação de equivalência em Fn colocando ξ≡ η se existe a ∈ F não nulo
para o qual η= ξ ·a . A classe de equivalência de ξ é [ξ] = ξ ·a ; a ∈F−0. O espaço quociente
por essa relação de equivalência é denotado por FPn−1 e é chamado de espaço projetivo de
dimensão n − 1. Denote por π a projeção canônica π(ξ) = [ξ] e coloque neste espaço projetivo
a topologia quociente.
Capítulo 3. Simetrias em Física 65
Podemos ver tambémFPn−1 como um quociente da esfera S = ξ∈Fn ;<ξ,ξ>= 1 e mostrar
que induz a mesma topologia quociente. Desta maneira, se ξ ∈ S, então sua classe agora é
[ξ] = ξ ·a ; a ∈F e |a |= 1.
Mostraremos que FPn−1 é uma variedade diferenciável (real). Note primeiramente que se
ξ= (ξ1, ...,ξn ) ∈S, então ξk 6= 0 se, e somente se ξk ·a 6= 0 para todo a ∈ F tal que |a |= 1. Assim,
tem sentido dizer que [ξ]∈FPn−1 satisfaz ξk 6= 0. Para cada k = 1, 2, ..., n defina
Vk = [ξ]∈FPn−1;ξk 6= 0,
de modo que π−1(Vk ) = ξ ∈S;ξk 6= 0 é um aberto em S. Pela definição de topologia quociente,
segue que Vk é aberto em FPn−1. Definimos então uma aplicação f k : Vk →Fn−1 por
f k ([ξ]) = f k ([ξ1, ...,ξk , ...,ξn ])
=
ξ1(ξk )−1, ..., 1, ...,ξn (ξk )−1
em que 1 denota que 1 foi deletado na posição k . A inversa de f k é dada por
f −1k (x1, ...,xn−1) = [x1, ..., 1, ...,xn−1]
onde 1 aparece na posição k . Das expressões de f k e sua inversa, concluímos que f k nos fornece
um homeomorfismo de Vk em Fn−1. Para analisar as funções de transição, fixe k , j ∈ 1, 2, ..., ne analisemos a diferenciabilidade de
f k f −1j : f j (Vk ∩Vj )→ f k (Vk ∩Vj ).
A escrita no caso geral deve ficar clara se escrevermos a expressão da função acima apenas
para k = 2 e j = 1 (caso particular que será de interesse posterior):
f 2 f −11 (x2, ...,xn ) = f 2([1,x2, ...,xn ]) = ((x2)−1,x3(x2)−1, ...,xn (x2)−1).
Segue então que, pela expressão das funções de transição, (Vk , f k ) fornece um atlas para
FPn−1. Em particular, se F = C, as funções de transição acima são de fato analíticas, de modo
que CPn−1 tem uma estrutura de variedade complexa, mas não é nessa estrutura que nos con-
centraremos, só nos importará a estrutura como variedade real.
Capítulo 3. Simetrias em Física 66
No caso de n = 2, (V1, f 1) e (V2, f 2) fornecem um atlas para FP1. Note que
f 2 f −11 (a ) = f 2([1, a ]) = a−1,
e o mesmo acontece para f 1 f −12 . Assim, f 1(V1 ∩V2) = f 2(V1 ∩V2) = F−0. Para descrevermos
certas identificações dos espaços projetivos no caso n = 2, vamos modificar um pouco a carta
f 1. Defina f 1 : V1 → F colocando f 1([ξ]) = f 1([ξ]) (se F = R colocamos a = a ). Então (V1, f 1)
ainda é uma carta para FP1 (como variedade real), e com esse ajuste temos
f 2 f−1
1 (a ) = a−1 = f 1 f −12 (a ), a ∈F−0.
Usaremos esta expressão para mostrar os seguintes difeomorfismos:
RP1 ∼= S1
CP1 ∼= S2
HP1 ∼= S4
Para fazer isso, vamos lembrar primeiramente como eram definidas as projeções estereo-
gráficas na esfera Sn ⊂Rn+1.
Sejam N = (0, ..., 0, 1) e S = (0, ..., 0,−1) os pólos norte e sul na esfera Sn , respectivamente.
Sejam US =Sn −N e UN =Sn −S. Defina pS : US→Rn e pN : UN →Rn por
pS(ξ1, ...,ξn ,ξn+1) =
ξ1
1−ξn+1, ...,
ξn
1−ξn+1
e
pN (ξ1, ...,ξn ,ξn+1) =
ξ1
1+ξn+1, ...,
ξn
1+ξn+1
.
As inversas dessas projeções em x = (x1, ...,xn )∈Rn são
p−1S (x ) = (1+ |x |
2)−1(2x1, ..., 2xn , |x |2−1)
e
p−1N (x ) = (1+ |x |
2)−1(2x1, ..., 2xn , 1− |x |2),
de modo que para cada x ∈Rn −0, vale
pS p−1N (x ) =
1
|x |2x = pN p−1
S (x ).
Capítulo 3. Simetrias em Física 67
Para mostrar os difeomorfismos mencionados, vamos considerar as projeções estereográ-
ficas (US , pS) e (UN , pN ) de S1,S2 e S4 como aplicações em R,C e H respectivamente. Então,
para todo a ∈ F− 0 temos pS p−1N (a ) = a−1 = pN p−1
S (a ). Temos assim difeomorfismos
p−1S f 2 : V2→US e p−1
N f 1 : V1→UN . Estes difeomorfismos coincidem em V1 ∩V2. De fato, dado
[ξ]∈V1 ∩V2, então f 2([ξ])∈ f 2(V1 ∩V2) =F−0, mas, em F−0, f 1 f −12 = pN p−1
S , daí:
( f 1 f −12 )( f 2[ξ])) = (pN p−1
S )( f 2[ξ])
f 1[ξ] = pN (p−1S f 2)[ξ]
p−1N f 1[ξ] = p−1
S f 2[ξ]
Como V1∪V2 =FP1 e UN ∪US é a esfera, temos que a colagem destes difeomorfismos fornece
os difeomorfismos requeridos.
3.2 Fibrados de Hopf
Nesta seção introduziremos os fibrados de Hopf a partir dos espaços projetivos descritos na
seção anterior.
1. Para o caso de F = R, temos a projeção canônica π : Sn−1 → RPn−1. Primeiramente veja
que Z2 = −1,+1 age à direita em Sn−1 colocando, para cada x ∈ Sn−1, x · (+1) = x e
x · (−1) =−x , que evidentemente é ação livre. Para cada k = 1, 2, ..., n , sejam
U+k = x = (x1, ...,xn )∈Sn−1;xk > 0,U−
k = x = (x1, ...,xn )∈Sn−1;xk < 0,
os quais formam uma cobertura aberta de Sn−1 e são disjuntos para cada k . A restrição de
π a qualquer um deles é injetiva e, mais que isso, é uma aplicação aberta, o que implica
que π(U±k ) é um aberto em RPn−1 difeomorfo a U±
k . Defina então
ψk :π−1(π(U±k )) −→ π(U±
k )×Z2
x 7−→ (π(x ),ϕk (x ))
em que ϕk (x ) = +1 se x ∈ U+k e ϕk (x ) = −1 se x ∈ U−
k . Verifica-se facilmente que as
aplicaçõesψk são trivializações locais. Temos assim um fibrado principal Sn−1(RPn−1,Z2).
2. Para o caso de F = C, temos a projeção canônica π : S2n−1 → CPn−1. Pensando S1 ⊂ C e
S2n−1 = (z 1, ..., z n )∈Cn ; z 1z 1+...+z n z n = 1, temos que S1 age à direita de S2n−1 colocando,
Capítulo 3. Simetrias em Física 68
para cada z ∈S1 e (z 1, ..., z n )∈S2n−1, (z 1, ..., z n ) · z = (z 1 · z , ..., z n · z ). Na mesma notação de
antes, temos as cartas (Vk , f k ) de CPn−1, e daí podemos definir
ψk :π−1(Vk ) −→ Vk ×S1
ξ= (z 1, ..., z n ) 7−→ (π(ξ),ϕk (ξ))
em que ϕk (ξ) = z k · |z k |−1. A inversa deψk em ([z 1, ..., z n ], z ) é
ψk ([z 1, ..., z n ], z ) = (z 1z−1k |z k |z , ..., z n z−1
k |z k |z ).
Verifica-se que as aplicações ψk são trivializações locais, e portanto temos um fibrado
principal S2n−1(CPn−1,S1).
3. Este item é muito semelhante ao item 2. Temos a projeção π : S4n−1→HPn−1 e pensamos
S3 ⊂H e S4n−1 = (q1, ...,qn ) ∈Hn ;q1q1+ ...+qnqn = 1. A ação de S3 em S4n−1 é definida de
maneira semelhante à do item anterior, (q1, ...,qn )·q = (q1 ·q , ...,qn ·q ), e acontece o mesmo
com as aplicaçõesψk :
ψk :π−1(Vk ) −→ Vk ×S3
ξ= (q1, ...,qn ) 7−→ (π(ξ),ϕk (ξ))
com ϕk (ξ) =qk |qk |−1. Teremos assim um fibrado principal S4n−1(HPn−1,S3).
Resumindo, temos os chamados Fibrados de Hopf:
Sn−1(RPn−1,Z2), S2n−1(CPn−1,S1), S4n−1(HPn−1,S3).
Em particular quando n = 2, usando os difeomorfismos citados na seção anterior, temos os
fibrados
S1(S1,Z2), S3(S2,S1), S7(S4,S3).
É comum distinguir estes fibrados entre a classe dos fibrados de Hopf reais, complexos e
quaterniônicos. O que pretendemos fazer agora é mostrar que existem conexões naturais nos
fibrados complexo e quaterniônico no caso n = 2, e calcularemos as curvaturas corresponden-
tes. Para fazer isso, precisaremos primeiro descrever mais explicitamente as aplicações que en-
volvem cada um desses fibrados, para daí fazer contas com a forma de conexão e curvatura em
cada caso.
Capítulo 3. Simetrias em Física 69
3.2.1 Fibrado Complexo
Nos atentaremos agora ao fibrado complexo de Hopf S3(CP1,S1). Temos duas trivializações
(Vi ,ψi ), i = 1, 2, e duas seções locais associadas s i : Vi →π−1(Vi ) dadas por
s1([z 1, z 2]) =
|z 1|,z 2 · |z 1|
z 1
e s2([z 1, z 2]) =
z 1 · |z 2|z 2
, |z 2|
.
Lembramos que a aplicação p−1S f 2 fornece um difeomorfismo entre CP1 e S2. Algumas
contas mostram que este difeomorfismo pode ser escrito da seguinte forma:
p−1S f 2([z 1, z 2]) = (2z 1z 2, |z 1|2− |z 2|2)∈S2 ⊂C×R.
Verifica-se que se z 1, z 2 ∈C, então z 1z 2+ z 1z 2 = 2Re(z 1z 2) e −i z 1z 2+ i z 1z 2 = 2Im(z 1z 2), de
modo que
2z 1z 2 = (z 1z 2+ z 1z 2)+ (−i z 1z 2+ i z 1z 2).
Podemos escrever a projeção π : S3→S2 nestes termos:
π(z 1, z 2) = (z 1z 2+ z 1z 2,−i z 1z 2+ i z 1z 2, |z 1|2− |z 2|2)∈S2 ⊂R3.
Dado um ponto (z 1, z 2) ∈ S3 ⊂C2, podemos escrever z 1 = r1e iξ1 e z 2 = r1e iξ2 com r1, r2 ≥ 0 e
r 21 + r 2
2 = 1, daí existeφ ∈ [0,π] tal que r1 = cos(φ/2) e r2 = sen(φ/2), de modo que
S3 =¦
cos(φ/2)e iξ1 , sen(φ/2)e iξ2
; 0≤φ/2≤π/2 e ξ1,ξ2 ∈R©
.
Nestas coordenadas π é expressa por
π(φ,ξ1,ξ2) = (senφ cosθ , senφsenθ , cosφ), θ = ξ1−ξ2,
que é justamente uma parametrização de S2 por coordenadas esféricas. Por outro lado, dado
um ponto (senφ cosθ , senφsenθ , cosφ)∈S2, qualquer par da forma
(z 1, z 2) = (cos(φ/2)e iξ1 , sen(φ/2)e iξ2)∈S3,
com ξ1−ξ2 = θ , satisfaz
|z 1|,z 2|z 1|
z 1
=
cos(φ/2), sen(φ/2)e−iθ
Capítulo 3. Simetrias em Física 70
e
z 1|z 2|z 2
, |z 2|
=
cos(φ/2)e iθ , sen(φ/2)
.
Lembrando que pelo difeomorfismo p−1S f 2 o subconjunto V2 corresponde a US , e por p−1
N f 1
o subconjunto V1 corresponde a UN , então as seções locais s1 e s2 correspondem, respectiva-
mente, às seções sN : UN → S3 e sS : US → S3, de modo que, pela expressão calculada acima
temos
sN (senφ cosθ , senφsenθ , cosφ) =
cosφ
2, sen
φ
2e−iθ
e
sS(senφ cosθ , senφsenθ , cosφ) =
cosφ
2e iθ , sen
φ
2
.
Com a identificação usualC2 ≈R4 e sendo ι : S3→R4 a inclusão, então
ι sN (senφ cosθ , senφsenθ , cosφ) =
cosφ
2, 0, sen
φ
2cosθ ,−sen
φ
2senθ
ι sS(senφ cosθ , senφsenθ , cosφ) =
cosφ
2cosθ , cos
φ
2senθ , sen
φ
2, 0
Considere agora a 1-forma α em R4 definida, relativamente as coordenadas canônicas de
R4, por
α=−x2d x1+x1d x2−x4d x3+x3d x4
e sua restrição
α= ι∗α
a S3. Mostra-se sem dificuldades que ω = i ·α é uma conexão neste fibrado complexo. Vamos
nos referir a esta conexão como a conexão canônica do fibrado complexo de Hopf. Usaremos
agora os calibres sN e sS para expressar os potenciais de calibre correspondentes da conexão
canônica (a menos do fator i , apenas para não carregar a notação) e em seguida encontraremos
as intensidades correspondentes. Mas observe primeiramente que, como o grupo do fibrado
complexo é S1, que é abeliano, para encontrar as intensidades precisamos apenas diferenciar
(usualmente) os potenciais de calibre, já que na expressão da curvatura o termo envolvendo o
Capítulo 3. Simetrias em Física 71
colchete é nulo.
(s ∗Nα)(φ,θ ) = ((ι sN )∗α) (φ,θ )
= −0 ·d
cosφ
2
+ cosφ
2d (0)+ sen
φ
2senθd
senφ
2cosθ
+senφ
2cosθd
−senφ
2senθ
= senφ
2senθ
1
2cos
φ
2cosθdφ− sen
φ
2senθdθ
−senφ
2cosθ
1
2cos
φ
2senθdφ+ sen
φ
2cosθdθ
= −sen2φ
2dθ
= −1
2(1− cosφ)dθ
Analogamente, mostra-se que em US temos (s ∗Sα)(φ,θ ) =1
2(1+cosφ)dθ . Portanto, as inten-
sidades correspondentes (a menos do fator i ) se expressam por
FN = d
−1
2(1− cosφ)dθ
=−1
2senφdφ ∧dθ
e
FS = d
1
2(1+ cosφ)dθ
=−1
2senφdφ ∧dθ .
Observe que as expressões acima são as mesmas, o que nos permite definir uma 2-forma F
globalmente em S2. Segue então que a intensidade F = i F neste caso é definida globalmente
em S2. Enfatizamos novamente que isto aconteceu (e isto não acontecerá no caso da cone-
xão canônica no fibrado quaterniônico) porque S1 é abeliano (o que não é verdade no caso de
SU (2)). Comentaremos agora um fato interessante, no qual veremos uma outra maneira de en-
tender a formaω, expressando uma relação entre esta conexão e a forma de Maurer Cartan de
SU (2).
Se A ∈ gl(n ,C), então o único campo invariante à esquerda em G L(n ,C) cujo valor na iden-
tidade é A é, em cada g ∈ G L(n ,C), o vetor g · A ∈ Tg G L(n ,C) ∼= R2n , de modo que podemos
escrever a forma de Maurer-Cartan de G L(n ,C) como o produto Θ(g ) = g −1d z (g ), onde d z é a
matriz das formas d z i j .
A forma de Maurer Cartan de SU (2) é a restrição a SU (2) da forma de Maurer Cartan de
Capítulo 3. Simetrias em Física 72
G L(2,C). Dado g =
α β
−β α
!
∈ SU (2), temos que a forma de Maurer Cartan de SU (2) em g é a
restrição de
g −1d z =
α −ββ α
!
·
d z 11 d z 12
d z 21 d z 22
!
=
αd z 11−βd z 21 αd z 12−βd z 22
βd z 11+αd z 21 βd z 12+αd z 22
!
a Tg SU (2). Como su(2) = A ∈G L(2,C); At=−A e tr(A) = 0, segue que a entrada 11 (e também
a entrada 22) da forma de Maurer Cartan de SU (2) é imaginária pura. Além disso, temos que
−β = z 21(g ) e portanto a entrada 11 da forma de Maurer Cartan de SU (2) é a restrição a SU (2)
da forma Im(z 11d z 11+ z 21d z 21).
O interessante é que a forma Im(z 11d z 11 + z 21d z 21) já apareceu antes. Se z 11 = x1 + i x2 e
z 21 = x3+ i x4, temos
Im(z 11d z 11+ z 21d z 21) = Im((x1− i x2)(d x1+ i d x2)+ (x3− i x4)(d x3+ i d x4))
= −x2d x1+x1d x2−x4d x3+x3d x4,
que é justamente a forma α. Assim, a conexão canônica do fibrado complexo é a restrição a
SU (2) da forma i · Im(z 11d z 11+ z 21d z 21).
Descreveremos agora o conceito de monopolo magnético introduzido por Dirac e relaciona-
remos este conceito com a conexão canônica do fibrado S3(S2,S1). Lembramos que uma carga
elétrica pontual q , em repouso na origem de um referencial inercial, determina um campo elé-
trico ~E descrito nesse referencial de acordo com a Lei de Coulomb: ~E = (q/ρ2)eρ, para ρ 6= 0
(aqui estamos escrevendo em coordenadas esféricasρ,φ,θ com vetores coordenados unitários
eρ, eφ e eθ ). O campo magnético correspondente, ~B , é identicamente nulo neste referencial:
~B = 0,ρ 6= 0. Em R3−0, ~E e ~B satisfazem as chamadas equações de Maxwell estáticas:
div~E = 0 div~B = 0 rot~E = 0 rot~B = 0 .
Paul Dirac procurava uma maneira de justificar o porquê da carga elétrica ser quantizada,
isto é, aparecer apenas em quantidades múltiplas de alguma quantidade básica de carga. Para
isso, ele pensou que deveria existir um “análogo” magnético para a carga elétrica. A ideia é
supor que exista uma partícula tal que quando está em repouso na origem de algum referencial
Capítulo 3. Simetrias em Física 73
inercial, ela determina um campo eletromagnético descrito neste referencial por
~E = 0, ~B =g
ρ2eρ, ρ 6= 0
onde g é uma constante, chamada a carga do monopolo. Os campos ~E e ~B também satisfazem
as equações de Maxwell estáticas. O campo ~B assim definido não possui um potencial vetor
em R3 − 0 (isto é, um campo ~A diferenciável em R3 − 0 tal que rot~A = ~B). Assim como o
fibrado de Hopf complexo só pode ser descrito por no mínimo duas trivializações locais (vere-
mos posteriormente que este fibrado não é trivial), precisamos de pelo menos dois potenciais
vetores locais para descrever ~B . Lembrando primeiramente que se ~A = Aρ eρ +Aφ eφ +Aθ eθ é
um campo diferenciável escrito em coordenadas esféricas, então
rot~A =1
ρsenφ
∂
∂ φ(Aθ senφ)−
∂
∂ θAφ
eρ +1
ρ
1
senφ
∂
∂ θAρ −
∂
∂ ρ(ρAθ )
eφ
+1
ρ
∂
∂ ρ(ρAφ)−
∂
∂ φAρ
eθ .
Defina Z− = (0, 0, z ) ∈ R3; z ≤ 0 (chamada uma corda de Dirac) e seu complemento
U+ =R3−Z−. Usando a expressão acima para o rotacional em coordenadas esféricas, verifica-se
que o campo
~A+(ρ,φ,θ ) =g
ρsenφ(1− cosφ)eθ
é um potencial vetor diferenciável para ~B em U+. De modo análogo, se Z+ = (0, 0, z )∈R3; z ≥ 0e U− =R3−Z+, então
~A−(ρ,φ,θ ) =−g
ρsenφ(1+ cosφ)eθ
é um potencial vetor diferenciável para ~B em U−. Na interseção U− ∩U+ (que é o comple-
mento do eixo z em R3) os campos ~A− e ~A+ não coincidem (caso contrário definiriam um po-
tencial vetor em todo o R3 − 0), e de fato, nesta interseção, a diferença entre os campos é
~A+− ~A− = (2g /ρsenφ)eθ . Por outro lado, lembrando que a expressão do gradiente em coorde-
nadas esféricas é
∇ f =∂ f
∂ ρeρ +
1
ρ
∂ f
∂ φeφ +
1
ρsenφ
∂ f
∂ θeθ ,
vemos que (2g /ρsenφ)eθ é o gradiente de f = 2g θ , isto é:
~A+− ~A− =∇(2g θ ), em U+ ∩U−.
Capítulo 3. Simetrias em Física 74
Note que se ~A é um potencial vetor para um campo ~B , então ~A +∇Ω é também um poten-
cial vetor deste campo para qualquer função diferenciável Ω, já que rot(∇Ω) = 0. Para ver como
essa observação anterior influi no nosso estudo, consideremos agora uma carga elétrica q se
movendo nas vizinhanças do monopolo (pensada como uma carga teste, de modo que seu pró-
prio campo não afeta o monopolo). Desta maneira, a carga pode ser pensada como um objeto
da mecânica quântica, o qual pode ser descrito por sua função de onda ψ(x , y , z , t ). Tal fun-
ção toma valores complexos e deve conter toda a informação fisicamente mensurável sobre a
carga. A função de onda ψ para q é encontrada resolvendo a chamada equação de Schrödin-
ger para este sistema carga/monopolo. Tal equação é construída escrevendo o Hamiltoniano
clássico e substituindo pelas “regras de correspondência” cada quantidade clássica no Hamilto-
niano por um operador apropriado. O fato é que o Hamiltoniano para uma carga em um campo
eletromagnético envolve a escolha de um potencial vetor, ~A, para o campo eletromagnético.
É possível mostrar que se trocarmos ~A por ~A +∇Ω na equação de Schrödinger, a solução ψ é
trocada por e iqΩψ:
~A −→ ~A +∇Ω=⇒ψ−→ e iqΩψ.
Note que a observação mostra que uma mudança de potencial vetor muda apenas a fase
da função de onda ψ, e não o seu módulo (a fase em coordenadas esféricas é representada
pelo ângulo θ ). Tais mudanças não têm significado físico já que todas as quantidades físicas
mensuráveis associadas à carga q dependem somente do módulo ao quadrado da função de
onda. Porém, é observado experimentalmente que tal mudança de fase tem consequências
importantes na situação em que existem cargas interagindo, de modo que é necessário entender
a fase relativa das cargas.
Voltamos agora ao caso de um carga q se movendo nas vizinhanças de um monopolo. De-
note por ψ+ (respec. ψ−) a função de onda para a carga q determinada (via equação de
Schrödinger) por ~A+ (respec. ~A−). Sabemos que em U+ ∩U− temos ~A+ = ~A−+∇(2g θ ). Assim,
da observação sobre mudança de potenciais vetores feita acima, devemos ter ψ+ = e i (2q g θ )ψ−.
Mas em U+∩U− (o qual contém o círculo (ρ,φ,θ ) = (1,π/2,θ )), para cada t fixado o valor deψ+
em (1,π/2,θ ) e em (1,π/2,θ + 2π) deve ser o mesmo. Vale a observação análoga para ψ−. Isto
implica que a mudança θ → θ +2π deve deixar e i (2q g θ ) inalterado, daí
e i (2q g (θ+2π)) = e i (2q g θ )e i (4q gπ).
Consequentemente, devemos ter e i (4q gπ) = 1, o que acontece se, e somente se, 4q gπ= 2nπ
Capítulo 3. Simetrias em Física 75
para algum inteiro n . Concluímos assim que
q g =1
2n , para algum inteiro n .
Esta condição acima é chamada de Condição de quantização de Dirac, que é interpretada
como a asserção de que se existe um monopolo magnético, então a carga elétrica deve ser quan-
tizada.
Escreveremos agora a procura dos potenciais vetores em termos de formas diferenciais. Pri-
meiramente note que ~B = (g /ρ2)eρ = (g /ρ3)(x , y , z ) em R3−0, em que ρ = (x 2+ y 2+ z 2)1/2.
A 2-forma correspondente é F = (g /ρ3)(x d y ∧ d z + y d z ∧ d x + z d x ∧ d y ). Nesta linguagem,
um potencial vetor para ~B corresponde a uma 1-forma A tal que d A = F . Novamente, não deve
existir uma tal forma em todo o R3−0, entretanto, nos seus respectivos domínios U+ e U−, as
1-formas
A+ =g
ρ
1
z +ρ(x d y − y d x )
e
A− =g
ρ
1
z −ρ(x d y − y d x )
tem a propriedade d A+ = F e d A− = F . Em coordenadas esféricas estas formas se expressam
por:
A+ = g (1− cosφ)dθ
e
A− =−g (1+ cosφ)dθ .
Note pelas expressões acima que elas não dependem de ρ. Isto nos permite fixar ρ = 1 e
identificar tais formas como sendo formas definidas em S2 (pelas mesmas expressões), em que
U+ corresponde a UN e U− corresponde a US . No caso em que a carga é unitária, isto é, q = 1,
temos que g = (1/2)n para algum inteiro n . Isto nos diz que o menor valor positivo para g é
g = 1/2 (n = 1). Neste caso, as 1-formas para o monopolo são
AN =1
2(1− cosφ)dθ , em UN ⊂S2,
e
AS =−1
2(1+ cosφ)dθ , em US ⊂S2.
Essas expressões são exatamente aquelas que encontramos para os potenciais de calibre da
Capítulo 3. Simetrias em Física 76
conexão canônica do fibrado complexo (a menos do fator i ). Assim, a conexão canônica do
fibrado de Hopf complexo (mais precisamente sua curvatura) corresponde ao campo eletro-
magnético do monopolo de menor carga magnética. Para finalizar esta seção, voltamos ao caso
geral de um monopolo de carga g = n/2 e vamos deixar calculada a seguinte expressão (que é
associada ao fluxo magnético do campo ~B):
i
2π
∫
S2
F =−1
2π
∫
S2
F =−g
2π
∫
S2
senφdφ ∧dθ =−g
2π·4π=−2g .
Como g = n/2, temos portanto que
i
2π
∫
S2
F =−n ∈Z.
Posteriormente, voltaremos nossa atenção para o valor inteiro que apareceu acima.
3.2.2 Fibrado Quaterniônico
Analogamente ao caso complexo, se A ∈ gl(n ,H), então o único campo invariante à esquerda em
G L(n ,H) cujo valor na identidade é A é, em cada g ∈G L(n ,H), o vetor g ·A ∈ Tg G L(n ,H)∼=R4n ,
de modo que podemos escrever a forma de Maurer-Cartan como o produto Θ(g ) = g −1d q (g ),
onde d q é a matriz das formas d qi j .
A forma de Maurer Cartan de Sp (2) é a restrição a Sp (2) da forma de Maurer Cartan de
G L(2,H). Dado g =
α β
−β α
!
∈ Sp (2), temos que a forma de Maurer Cartan de Sp (2) em g é a
restrição de
g −1d q =
α −ββ α
!
·
d q11 d q12
d q21 d q22
!
=
αd q11−βd q21 αd q12−βd q22
βd q11+αd q21 βd q12+αd q22
!
a Tg Sp (2). Como sp(2) = A ∈ G L(4,C); At= −A e J A + A t J = 0, segue que a entrada 11 da
forma de Maurer Cartan de Sp (2) é imaginária pura. Como −β = q21(g ), a entrada 11 da forma
de Maurer Cartan de Sp (2) é a restrição a Sp (2) da forma Im(q 11d q11+q 21d q21).
O estudo do fibrado complexo nos mostrou que é interessante entender a entrada 11 da
forma de Maurer-Cartan de SU (2), pois esta é (a menos do fator i ) a conexão canônica do fi-
brado complexo, a qual está relacionada com o monopolo. Vamos, por analogia, estudar a en-
trada 11 da forma de Maurer Cartan de Sp (2), que é a restrição da forma Im(q 11d q11+q 21d q21)
Capítulo 3. Simetrias em Física 77
a Sp (2). Esta forma não é, a princípio, uma forma definida em S7, porém é possível induzir esta
forma para uma correspondente em S7. Veremos agora como isso pode ser feito.
Considere S7 = (q1,q2) ∈H2; |q1|2+ |q2|2 = 1 e Sp (2)⊂M 2(H) como o conjunto das matrizes
g tais que g · g ∗ = g ∗ · g = Id. Temos uma ação transitiva natural de Sp (2) em S7, definida como
o produto usual de matrizes de Sp (2) por vetores de S7 ⊂H2 (pensados como vetores coluna).
Se g =
α β
γ δ
!
∈ Sp (2), temos que αβ + γδ = 0 e γγ+δδ = 1. Fixe e1=
1
0
!
∈ S7 e g ∈ Sp (2)
um elemento na isotropia de e1 por esta ação. Temos que α = 1 e γ = 0, o que implica β = 0 e
δδ = 1. Mostra-se daí que o grupo de isotropia de e1 por esta ação é o conjunto das matrizes
g da forma g =
1 0
0 q
!
, com q ∈ Sp (1) (quatérnio unitário), de modo que a isotropia em e1 é
isomorfa a Sp (1).
Fixando g =
α β
γ δ
!
∈Sp (2), a classe de g em Sp (2)/Sp (1) é o conjunto
[g ] =
(
α β
γ δ
!
·
1 0
0 q
!
; |q |= 1
)
=
(
α β ·qγ δ ·q
!
; |q |= 1
)
,
de modo que a primeira coluna de qualquer representante da classe [g ] é o mesmo vetor em
H 2. Segue então que o difeomorfismo entre Sp (2)/Sp (1) e S7 do Teorema 2.10 do capítulo 2 é
ϕe1 : Sp (2)/Sp (1) −→ S7
[g ] 7−→ g · e1 =
α
γ
!
em que (α,γ) é a primeira coluna de qualquer representante g de [g ].
Como a forma Im(q 11d q11+q 21d q21) só depende das entradas 11 e 21 de g ∈Sp (2), segue que
esta forma tem o mesmo valor em qualquer elemento da classe [g ]∈Sp (2)/Sp (1), e deste modo
é possível induzir uma forma no quociente Sp (2)/Sp (1). Via a expressão do difeomorfismo ϕe1 ,
temos que a forma correspondente em S7 é a restrição a S7 da forma ω em H2 definida por
ω = Im(q 1d q1 + q 2d q2). Se ι : S7 → H2 é a inclusão, então a forma que queremos estudar é
ω := ι∗ω.
Antes de fazer esse estudo, observamos que será conveniente escrever os objetos envolvidos
na linguagem dos quatérnios. Vamos pensar então o fibrado quaterniônico como S7(HP1,Sp (1)),
com S7 ⊂ H2 e Sp (1) ⊂ H. A álgebra de Lie de Sp (1) será identificada com a álgebra de Lie
Im(H) com o colchete [q ,q ′] =qq ′−q ′q = 2Im(qq ′). Lembramos também os elementos básicos
Capítulo 3. Simetrias em Física 78
envolvidos no fibrado quaterniônico.
As trivializações locais são (Vk ,ψk ), para k = 1, 2, em que Vk = [q1,q2] ∈ HP1;qk 6= 0 e a
aplicação ψk : π−1(Vk )→ Vk ×Sp (1) é definida por ψk (q1,q2) = (π(q1,q2), |qk |−1qk ). As inversas
ψ−1k correspondentes são dadas por
ψ−11 ([q1,q2],q ) = (|q1|q ,q1q−1
1 |q1|q ) e ψ−12 ([q1,q2],q ) = (q1q−1
2 |q2|q , |q2|q ),
de modo que a função de transição g 12 : V1 ∩V2→Sp (1) é
g 12([q1,q2]) = |q1|−1q1q−12 |q2|.
Os calibres sk : Vk →S7 associados são, respectivamente,
s1([q1,q2]) = (|q1|,q2q−11 |q1|) e s2([q1,q2]) = (q1q−1
2 |q2|, |q2|).
Lembrando também que V1 e V2 são cartas de HP1, com difeomorfismos f k : Vk → H dados
por f 1([q1,q2]) = q2q−11 e f 2([q1,q2]) = q1q−1
2 . As inversas correspondentes são f −11 (q ) = [1,q ] e
f −12 (q ) = [q , 1], de modo que f 2 f −1
1 (q ) = q−1 = f 1 f −12 , para todo q ∈ H−0. Como os pares
(1,q ) e (q , 1) em geral não pertencem a S7, é mais conveniente escrever as seguintes descrições,
equivalentes, de f −11 e f −1
2 :
f −11 (q ) =
h
(1+ |q |2)−12 ,q (1+ |q |2)−
12
i
e f −12 (q ) =
h
q (1+ |q |2)−12 , (1+ |q |2)−
12
i
.
Observe daí que (s1 f −11 )(q ) =
1p1+|q |2
(1,q ) e (s2 f −12 )(q ) =
1p1+|q |2
(q , 1).
Recordados os objetos necessários, vamos estudar agora a formaω= ι∗ω. Para todos u ∈S7
e X ∈ Tu S7, temos ωu (X ) = ωu (ι∗X ). Colocando u = (q1,q2) e X = (v1, v2) ∈ Tu S7 ⊂ Tq1H×Tq2H,
vale
ωu (X ) = Im(q 1v1+q 2v2).
Vamos ver agora que ω é uma forma de conexão no fibrado quaterniônico. Se q ∈ Sp (1),
então ((Rq )∗)u q−1 X = (v1q , v2q ), então
ωu ((Rq )∗u q−1 X ) = Im
q 1(v1q )+p 2(v2q )
.
Capítulo 3. Simetrias em Física 79
Por outro lado, como q−1 =q , pois q ∈Sp (1), temos
ωu q−1 X = Im
q1q−1v1+q2q−1v2
= Im
qq 1v1+qq 2v2
e portanto
ad(q−1)∗ ωu q−1 X =q−1 ·ωu q−1(X ) ·q = Im(q 1(v1q )+q 2(v2q )).
Vamos ver agora queω(A∗) = A, para cada A ∈ Im(H). Mas como
A∗(q1,q2)=
d
d t
t=0
(q1,q2) ·exp(t A) =d
d t
t=0
(q1 ·exp(t A),q2 ·exp(t A)) = (q1 ·A,q2 ·A),
temos que
ωu (A∗u ) = Im
q 1(q1 ·A)+q 2(q2 ·A)
= Im
(|q1|2+ |q2|2)A
= Im(A) = A.
Assim,ω é uma forma de conexão do fibrado S7(HP1,Sp (1)), chamada de conexão canônica
do fibrado quaterniônico. Encontraremos agora os potenciais de calibre desta conexão usando
os calibres s1 e s2 e, posteriormente, encontraremos as intensidades correspondentes. Antes
disso, encontraremos expressões para (sk f −1k )
∗ω, com k = 1, 2. Note que pela definição de
pull-back
((sk f −1k )
∗ω))q ·X = (( f −1k )
∗(s ∗kω))q ·X = (s∗kω) f −1
k (q )( f −1
k ∗ ·X ).
Seja s = s1 f −11 . Então para cada q ∈ H, temos que s (q ) = (1+ |q |2)−
12 (1,q ). Identificando
cada v ∈ TqH com dd t
t=0(q +v t ), teremos que
(s∗)q ·v =d
d t
t=0
s (q + t v ) =d
d t
t=0
1p
1+ |q + t v |2(1,q + t v ),
mas
|q + t v |2 = (q + t v )(q + t v ) = |q |2+2Re(v q ) · t + |v |2t 2,
e portanto
(s∗)q ·v =
−Re(v q )(1+ |q |2)3/2
,1
p
1+ |q |2v −
Re(v q )(1+ |q |2)3/2
q
!
.
Vamos expressar agora (s ∗ω)q (v ) =ωs (q )(s∗q (v )). Da definição deω, podemos expressar cada
Capítulo 3. Simetrias em Física 80
uma de suas parcelas:
(q2d q2)s (q )(s∗q (v )) = q2(s (q ))d q2(s∗q (v ))
=
1p
1+ |q |2q
!
1p
1+ |q |2v −
Re(v q )(1+ |q |2)3/2
q
!
=1
1+ |q |2qv −
Re(v q )|q |2
(1+ |q |2)2
e, de modo análogo, (q1d q1)s (q )(s∗q (v )) =−Re(v q )(1+ |q |2)2
, daí
ωs (q )(s∗q (v )) = (Im(q1d q1+q2d q2))s (q )(s∗q (v )) =Im(qv )1+ |q |2
,
e finalmente, temos a expressão
((s1 f −11 )
∗ω)q ·v = Im
q
1+ |q |2v
,
a qual pode ser escrita como
(s1 f −11 )
∗ω= Im
q
1+ |q |2d q
.
Mostra-se analogamente que
(s2 f −12 )
∗ω= Im
q
1+ |q |2d q
.
Por mais que as expressões acima sejam “a mesma”, deve estar entendido que usamos coor-
denadas diferentes nos casos k = 1 e k = 2. Mas não são exatamente estas expressões que nos
interessam. O que precisamos encontrar são os pull-backs s ∗1ω e s ∗2ω, porém, o serviço mais
trabalhoso já foi feito. Se p ∈V1 e X ∈ TpS4, então
A1(X ) = (s ∗1ω)p X = ((s1 f −11 )
∗ω) f 1(p )(( f 1)∗p X ) = Im
f 1(p )v1+ | f 1(p )|2
,
em que v = d q ((( f 1)∗)p X ). Similarmente, para p ∈V2 e X ∈ TpS4 temos
A2(X ) = (s ∗2ω)p X = ((s2 f −12 )
∗ω) f 2(p )( f 2)∗p X = Im
f 2(p )w1+ | f 2(p )|2
,
Capítulo 3. Simetrias em Física 81
em que w = d q (( f 2∗)p X ).
O próximo passo é calcular a curvatura dessa conexão. Para isso, usaremos a primeira equa-
ção de estrutura. Antes disso, vamos recordar uma definição um pouco mais geral de produto
exterior de 1-formas. Sejam U , V e W espaços vetoriais reais e ρ : U ×V →W uma aplicação
bilinear. Se M é uma variedade diferenciável, ω é uma 1-forma em M com valores em U e η
é uma 1-forma em M com valores em V , podemos definir o produto ρ-exterior, denotado por
ω∧ρ η, colocando
(ω∧ρ η)x (X , Y ) =ρ(ωx (X ),ηx (Y ))−ρ(ωx (Y ),ηx (X )),
para cada x ∈M e X , Y ∈ Tx M .
Se u 1, ..., u c e v1, ..., vd são bases para U e V respectivamente, então podemos escrever
ω =∑
iωi u i e η =∑
j ηj v j , para certas 1-formas reais ωi e ηj definidas em M . A partir daí,
temos que
ω∧ρ η=c∑
i=1
d∑
j=1
(ωi ∧ηj )ρ(u i , v j ).
Faremos dois exemplos de produto ρ-exterior, os quais aparecerão no cálculo da curvatura
da conexão canônica. Primeiro, considere U = V = W = H e ρ sendo a multiplicação de H,
ρ(q ,q ′) =q ·q ′. Sejam d q = d q0+d q1i+d q2j+d q3k e d q = d q0−d q1i−d q2j−d q3k as 1-formas
usuais em R4 =H, então
d q ∧ρ d q = 2(d q2 ∧d q3i+d q3 ∧d q1j+d q1 ∧d q2k)
d q ∧ρ d q = −2((d q0 ∧d q1+d q2 ∧d q3)i+(d q0 ∧d q2−d q1 ∧d q3)j+
+ (d q0 ∧d q3+d q1 ∧d q2)k)
d q ∧ρ d q = 2((d q0 ∧d q1−d q2 ∧d q3)i+(d q0 ∧d q2+d q1 ∧d q3)j+
+ (d q0 ∧d q3−d q1 ∧d q2)k).
O segundo exemplo é o seguinte. Suponha que U = V =W = Im(H) e que ρ seja o colchete:
ρ(q ,q ′) = [q ,q ′] = 2Im(qq ′). Sejam ω e η 1-formas em M com valores em Im(H) e tome i, j, kcomo base de Im(H), daí
ω∧ρ η = ω1 ∧η1[i, i]+ω1 ∧η2[i, j]+ω1 ∧η3[i, k]+
+ ω2 ∧η1[j, i]+ω2 ∧η2[j, j]+ω2 ∧η3[j, k]+
+ ω3 ∧η1[k, i]+ω3 ∧η2[k, j]+ω3 ∧η3[k, k].
Capítulo 3. Simetrias em Física 82
Das relações entre i, j e k, a expressão acima de reduz a:
ω∧ρ η= 2
(ω2 ∧η3−ω3 ∧η2)i+(ω3 ∧η1−ω1 ∧η3)j+(ω1 ∧η2−ω2 ∧η1)k
.
Em particular, quando a variedade M é R4 =H, podemos escrever cadaωi como
ωi =3∑
α=0
ωiαd qα, i = 1, 2, 3,
e daí
ω =
3∑
α=0
ω1αd qα
!
i+
3∑
α=0
ω2αd qα
!
j+
3∑
α=0
ω3αd qα
!
k
= (ω10i+ω2
0j+ω30k)d q0+(ω1
1i+ω21j+ω2
1k)d q1+(ω12i+ω2
2j+ω32k)d q2+
+ (ω13i+ω2
3j+ω23k)d q3
= ω0d q0+ ω1d q1+ ω2d q2+ ω3d q3,
em que as funções ωi tomam valores em Im(H). Fazendo η=ω, teremos
ω∧ρω= 4(ω2 ∧ω3i+ω3 ∧ω1j+ω1 ∧ω2k).
Explicitando cada um dos coeficientes em termos dos d qα’s, teremos
ω∧ρω= 4
∑
α,β
ω2αω
3βd qα ∧d qβ
i+
∑
α,β
ω3αω
1βd qα ∧d qβ
j+
∑
α,β
ω1αω
2βd qα ∧d qβ
k
,
Por outro lado, temos as seguintes relações:
ωα · ωβ = −(ω1αω
1β +ω
2αω
2β +ω
3αω
3β )+ (ω
2αω
3β −ω
3αω
2β )i+(ω
3αω
1β −ω
1αω
3β )j
+ (ω1αω
2β −ω
2αω
1β )k,
e3∑
α,β=0
(ω1αω
1β +ω
2αω
2β +ω
3αω
3β )d qα ∧d qβ = 0,
3∑
α,β=0
(ω2αω
3β −ω
3αω
2β )d qα ∧d qβ = 2
3∑
α,β=0
ω2αω
3βd qα ∧d qβ ,
Capítulo 3. Simetrias em Física 83
similarmente paraω3αω
1β −ω1
αω3β eω1
αω2β −ω2
αω1β , assim
3∑
α,β=0
ωα · ωβd qα ∧d qβ =3∑
α,β=0
2ω2αω
3βd qα ∧d qβ i+2ω3
αω1βd qα ∧d qβ j
+ 2ω1αω
2βd qα ∧d qβk
=1
2ω∧ρω.
Finalmente, observe que em termos dos colchetes [ωα,ωβ ] = ωα · ωβ − ωβ · ωα, podemos
escrever1
2ω∧ρω=
3∑
α,β=0
ωα · ωβd qα ∧d qβ =1
2
3∑
α,β=0
[ωα,ωβ ]d qα ∧d qβ .
Daqui por diante omitiremos o símbolo ρ no produto exterior, pois fica implícito qual pro-
duto está sendo usado em cada expressão. A derivada exterior dω pode ser escrita em termos
dos d qβ ’s:
dω= d ω0 ∧d q0+ ...+d ω3 ∧d q3 =∑
β
d ωβ ∧d qβ .
Mais ainda,
d ωβ = dω1β i+dω2
β j+dω3βk=
∑
α
(∂αω1βd qα)i+(∂αω2
βd qα)j+(∂αω3βd qα)k,
em que ∂α é uma abreviação de ∂ /∂ qα. Assim,
d ωβ =∑
α
(∂αω1β i+ ∂αω2
β j+ ∂αω3βk)d qα =
∑
α
∂αωβd qα,
(em que a derivada na última igualdade é tomada componente a componente de ωβ ), e por-
tanto:
dω=∑
α,β
∂αωβd qα ∧d qβ =1
2
∑
α,β
(∂αωβ − ∂βωα)d qα ∧d qβ ,
concluindo que:
dω+1
2ω∧ω =
∑
α,β
∂αωβ + ωαωβ
d qα ∧d qβ
=1
2
∑
α,β
∂αωβ − ∂βωα+[ωα,ωβ ]
d qα ∧d qβ .
Capítulo 3. Simetrias em Física 84
Em particular, considereω= Im( f (q )d q ), em que f (q ) = f 0(q )+ f 1(q )i+ f 2(q )j+ f 3(q )k é uma
aplicação diferenciável em H com valores em H. Se escrevemos ω na forma ω =∑
αωαd qα,
devemos terω0 = f 1i+ f 2j+ f 3k,ω1 = f 0i+ f 3j− f 2k,ω2 =− f 3i+ f 0j+ f 1k eω3 = f 2i− f 1j+ f 0k.
Não é difícil verificar que dω= Im(d f ∧d q ) e 12ω∧ω= Im( f (q )d q ∧ f (q )d q ), de modo que
dω+1
2ω∧ω= Im(d f ∧d q + f (q )d q ∧ f (q )d q ).
Aplicaremos estas fórmulas ao caso da 1-forma
A = Im
q
1+ |q |2d q
,
isto é, para f (q ) = q1+|q |2 . Esta forma é a expressão em coordenadas de um potencial de calibre
da conexão canônica de S7. Note que
f (q )d q ∧ f (q )d q = (1+ |q |2)−2(qd q ∧qd q ).
A diferencial de f é calculada como segue:
d f = d ((1+ |q |2)−1q )
= d ((1+ |q |2)−1(q0−q1i−q2j−q3k)
= d ((1+ |q |2)−1q0)−d ((1+ |q |2)−1q1)i−d ((1+ |q |2)−1q2)j−d ((1+ |q |2)−1q3)k.
Como d ((1+ |q |2)−1qα) = (1+ |q |2)−1d qα+qαd ((1+ |q |2)−1), temos
d f = (1+ |q |2)−1d q +qd ((1+ |q |2)−1),
e por outro lado
d ((1+ |q |2)−1) = ∂0(1+ |q |2)−1d q0+ ∂1(1+ |q |2)−1d q1
+ ∂2(1+ |q |2)−1d q2+ ∂3(1+ |q |2)−1d q3
= −(1+ |q |2)−2(2q0d q0+2q1d q1+2q2d q2+2q3d q3)
= −(1+ |q |2)−2(qd q +qd q ),
daí
qd ((1+ |q |2)−1) =−(1+ |q |2)−2(|q |2d q +qd qq ),
Capítulo 3. Simetrias em Física 85
e finalmente
d f = (1+ |q |2)−2(d q −qd qq ).
Agora note que
d f ∧d q = (1+ |q |2)−2(d q ∧d q − (qd qq )∧d q )
= (1+ |q |2)−2(d q ∧d q − (qd q )∧ (qd q )),
de modo que d f ∧d q+ f (q )d q ∧ f (q )d q = (1+ |q |2)−2d q ∧d q . Como (1+ |q |2)−2 é real e d q ∧d q
é imaginário puro, obtemos finalmente a expressão em coordenadas de uma intensidade da
conexão canônica (na verdade a expressão é a mesma no outro calibre):
F = dA +1
2A ∧A =
1
1+ |q |22 d q ∧d q .
A expressão acima é de fato a expressão de uma intensidade pois
1
2ω∧ρω(X , Y ) = [ω(X ),ω(Y )]− [ω(Y ),ω(X )] = [ω(X ),ω(Y )].
De modo semelhante, dados n ∈H e λ > 0, a 1-formaAλ,n definida em H, com valores em
Im(H), dada por
Aλ,n = Im
q −n
|q −n |2+λ2d q
satisfaz
Fλ,n = dAλ,n +1
2Aλ,n ∧Aλ,n =
λ2
|q −n |2+λ22 d q ∧d q .
Calculada a expressão em coordenadas da curvatura da conexão canônica, caminharemos
agora, mais uma vez, na direção de relacionar geometria com física por meio das conexões em
fibrados principais. Existe uma relação entre as formasAλ,n (em particular a conexão canônica,
que é o caso λ = 1 e n = 0) e a chamada Teoria de Yang-Mills. Comentaremos esta relação a
seguir e para isso, começaremos com alguns comentários históricos sobre esta teoria.
Em 1932, Heinsenberg sugeriu a possibilidade de que os conhecidos nucleons (o próton e o
neutron) eram, na verdade, apenas dois “estados” diferentes da mesma partícula e propôs uma
ferramenta matemática para modelar isto, chamada de estado de spin isotópico de um nucleon.
Assim como a fase de uma partícula carregada é representada por um número complexo de
módulo 1 e as mudanças de fase são acompanhadas por uma ação de U (1) em S1 (uma rotação),
o spin isotópico de um nucleon é representado por um par de números complexos, cuja soma
Capítulo 3. Simetrias em Física 86
dos quadrados de seus módulos é 1, e mudanças no estado de spin isotópico são acompanhadas
por uma ação de SU (2) em S3. Em 1954, C. N. Yang e R. L. Mills se preocuparam em construir
uma teoria de spin isotópico análoga à teoria do eletromagnetismo. Eles consideraram funções
potenciais a valores matriciais e os campos correspondentes, construídos a partir das derivadas
das funções potenciais. A hipótese física desta teoria (que não é o ponto desta observação)
levou-os a propor certas equações diferenciais que os potenciais devem satisfazer, que são as
chamadas equações de Yang-Mills (veja [YM54]). Posteriormente, em 1975, Belavin, Polyakov,
Schwartz e Tyupkin (veja [BPST75]) encontraram soluções para estas equações, as quais foram
chamadas de “pseudo partículas” (apenas o caso n = 0 aparece explicitamente em [BPST75]).
O fato mais importante é que estas soluções coincidem essencialmente com as formas Aλ,n
definidas acima. Isto foi feito explicitamente e generalizado por Trautman (veja [Tra77]).
É importante observar que não era conhecida a linguagem de fibrados principais naquela
época, de modo que por um potencial de calibre (ou simplesmente potencial), se entendia
uma 1-forma A em R4 com valores em su(2), e sua intensidade correspondente é dada por
F = dA + 12A ∧A . De fato podemos considerar (mas não precisamos)A como um poten-
cial de calibre da maneira como definimos anteriormente. Basta considerar o fibrado trivial
R4×SU (2) sobre R4, e notar que a hipótese da proposição 1.8 do capítulo 1 é satisfeita vacua-
mente. Comentaremos um pouco mais sobre as equações de Yang-Mills posteriormente.
Considere agora um potencial de calibreA emH eF seu campo correspondente. Para cada
q ∈ H, definimos ‖F (q )‖2 como sendo a soma das normas, ao quadrado, das componentes de
F (q ) relativamente a d qα ∧ d qβ . A norma que usamos em su(2) ∼= Im(H) é a norma relativa
à forma de Killing de su(2), e verifica-se que tal norma vale o dobro da norma euclidiana em
Im(H)∼=R3. Definimos a ação de Yang-Mills deA como sendo
‖F‖2 =
∫
R4
‖F (q )‖2.
Eventualmente o valor acima é denotado por Y M (A ). O funcional Y M que associa a cada
potencialA sua ação de Yang-Mills Y M (A ) é chamado de funcional de Yang-Mills de R4.
No caso do potencial oriundo da conexão canônica do fibrado de Hopf, temos que sua in-
Capítulo 3. Simetrias em Física 87
tensidade nas coordenadas usuais deH é dada por
F =1
(1+ |q |2)2d q ∧d q
=2
(1+ |q |2)2[(d q0 ∧d q1−d q2 ∧d q3)i
+ (d q0 ∧d q2+d q1 ∧d q3)j+(d q0 ∧d q3−d q1 ∧d q2)k]
=2i
(1+ |q |2)2d q0 ∧d q1+
−2i
(1+ |q |2)2d q2 ∧d q3+ ...
de modo que
‖F‖2 = 48
∫
R4
1
(1+ |q |2)4.
A integral acima pode ser calculada usando coordenadas esféricas emR4, definidas por:
q0 = ρsenχsenφ cosθ
q1 = ρsenχsenφsenθ
q2 = ρsenχ cosφ
q3 = ρ cosχ
para ρ = |q | ≥ 0, 0≤χ ≤π, 0≤φ ≤π e 0≤ θ ≤ 2π. Então
‖F‖2 = 48
∫
R4
1
(1+ |q |2)4
= 48
∫ 2π
0
∫ π
0
∫ π
0
∫ ∞
0
1
(1+ρ2)4ρ3sen2χsenφdρdχdφdθ
= 48
∫ ∞
0
ρ3
(1+ρ2)4dρ
∫ 2π
0
∫ π
0
∫ π
0
sen2χsenφdχdφdθ
!
= 48
1
12
(2π2)
= 8π2.
Assim, Y M (A ) = 8π2. De modo análogo, mostra-se que Y M (Aλ,n ) = 8π2.
Capítulo 3. Simetrias em Física 88
3.3 Fibrados sobre esferas
Um fato importante que nos interessa é que podemos classificar os fibrados principais sobre
as esferas Sn , com n ≥ 2. O caminho pelo qual nós faremos isso não faz menção à estrutura
diferenciável dos objetos em questão, de modo que podemos considerar fibrados principais
apenas topológicos. Isto significa que vamos supor que o grupo de estrutura do fibrado seja
um grupo topológico (conexo por caminhos), que o espaço total e o espaço base sejam apenas
espaços topológicos e que as trivializações locais sejam homeomorfismos. Não será necessário
supor que o espaço base seja o espaço de órbitas da ação, mas sim que tenhamos uma projeção
π : P → X contínua e sobrejetora e que a ação preserve as fibras, isto é, π(u · g ) = π(u ) para
todos u ∈ P e g ∈G . Isso nos permite considerar fibrados principais sobre, por exemplo, cubos
ou discos. Nesta seção usaremos as notações I = [0, 1], I n = [0, 1]× ...× [0, 1] ⊂ Rn para o cubo
n-dimensional e Dn = x ∈Rn ;‖x‖ ≤ 1 para o disco n-dimensional.
Se P(X ,G ) é um fibrado principal (topológico) e f : Z → X é uma aplicação contínua de um
espaço topológico Z em X , diremos que f possui um levantamento se existe uma aplicação
contínua f : Z → P tal que π f = f . Precisaremos de um teorema de levantamento de homo-
topia para fibrados. Uma versão que nos interessa é enunciada abaixo, e a sua demonstração
pode ser encontrada em [Nab97] (pg. 172).
Teorema 3.1 (Levantamento de Homotopia). Seja P(X ,G ) um fibrado principal topológico e n
um inteiro positivo. Suponha que f : I n → X é uma aplicação contínua que possui um levanta-
mento f : I n → P. Seja F : I n × I → X uma homotopia tal que F (x , 0) = f (x ) para todo x ∈ I n .
Então existe uma homotopia F : I n × I → P tal que π F = F e F (x , 0) = f (x ) para todo x ∈ I n .
Lema 3.2. Seja G um grupo topológico e n um inteiro positivo. Então qualquer G -fibrado prin-
cipal sobre o cubo I n é trivial.
Demonstração: Seja P(I n ,G ) um fibrado principal. Fixe x0 ∈ I n e u 0 ∈ π−1(x0). Como I n é
contrátil, a aplicação Id : I n → I n é homotópica à aplicação constante f : I n → I n , f (x ) = x0. Seja
F : I n × [0, 1]→ I n uma homotopia com F (x , 0) = x0 e F (x , 1) = x para todo x ∈ I n . Observe que
a aplicação constante f : I n → P , f (x ) = u 0, é um levantamento de f , isto é, π f = f . Portanto
segue do teorema de levantamento de homotopia que existe uma homotopia F : I n × I → P tal
que π F = F . Em particular, π F (x , 1) = F (x , 1) = x para todo x ∈ I n , de modo que a aplicação
x 7→ F (x , 1) é uma seção global do fibrado, assim P deve ser trivial.
Como corolário do lema acima, obtemos que qualquer fibrado principal topológico sobre o
disco Dn também é trivial pois I n é homeomorfo a Dn .
Capítulo 3. Simetrias em Física 89
Identificaremos Sn−1 como o subconjunto do pontos x ∈Sn ⊂Rn+1 para os quais xn+1 = 0 (o
“equador” de Sn ). Fixe x0 ∈ Sn−1 e um número 0 < ε < 1. Defina os seguintes subconjuntos de
Sn :
H1 = x ∈Sn ;xn+1 ≥ 0
H2 = x ∈Sn ;xn+1 ≤ 0
U1 = x ∈Sn ;−ε< xn+1 ≤ 1 ⊇H1
U2 = x ∈Sn ;−1≤ xn+1 <ε ⊇H2.
Assim, U1 ∩U2 é uma “faixa aberta” contendo Sn−1. SejaB = P(Sn ,G ) um fibrado principal.
Veremos agora que U1 e U2 são vizinhanças trivializantes e, além disso, podemos escolher tri-
vializações ψi : π−1(Ui )→Ui ×G de modo que todas as funções de transição g i j levam x0 em
e ∈G . Considere primeiramente a restriçãoB|U i. Tal restrição é trivial pois U i é homeomorfo
ao disco Dn , o qual é contrátil, e portanto esta restrição tem uma seção global. Consequen-
temente, a porção B|Ui também é trivial. Escolha então equivalências ψi : π−1(Ui )→ Ui ×G ,
i = 1, 2. Segue facilmente que ψi , i = 1, 2, são trivializações locais paraB .
Agora seja g 12 : U1 ∩U2 → G a função de transição correspondente às trivializações locais
(U1,ψ1), (U2,ψ2) e suponha que g 12(x0) = g ∈G . Escreva ψ2 = (π, ϕ2). Para ajustar as funções
de transição, colocamosψ2(u ) = (π(u ),ϕ2(u )), em que ϕ2(u ) = g ϕ2(u ), daí
ϕ1(u )ϕ2(u )−1 = ϕ1(u )ϕ2(u )−1 g −1 = g g −1 = e .
Assim, com as trivializações locais ψ1 = ψ1 e ψ2 = (π,ϕ2), temos que todas as funções de
transição correspondentes levam x0 em e ∈G .
Assim, podemos supor que para qualquer fibrado principalB = P(Sn ,G ), U1 e U2 são vizi-
nhanças trivializantes e, além disso, as funções de transição correspondentes levam x0 em e .
Definimos, para cada fibradoB , a aplicação característica
T : (Sn−1,x0)→ (G , e )
por
T = g 12|Sn−1
Usamos a notação f : (X , a )→ (Y ,b ) para dizer que a aplicação f satisfaz f (a ) =b .
Capítulo 3. Simetrias em Física 90
Lema 3.3. Qualquer aplicação contínua T : (Sn−1,x0) → (G , e ) é a aplicação característica de
algum fibrado principalB sobre Sn com grupo G .
Demonstração: Seja r : U1 ∩U2 → Sn−1 a restrição da projeção esteográfica (do pólo sul ou
norte) à faixa U1 ∩U2 e defina g 12(x ) = T (r (x )), para x ∈U1 ∩U2. Então g 12|Sn−1 = T . Colocamos
g 21(x ) = g 12(x )−1 em U1 ∩U2, g 11(x ) = e em U1 e g 22(x ) = e em U2. Então as funções g i j satis-
fazem a condição de co-ciclo e portanto definem (pelo teorema 1.1 do cap.1) um único fibrado
principal P sobre Sn com grupo G (a menos de equivalência) que possui as funções g i j como
funções de transição.
Lema 3.4. Seja G um grupo topológico conexo por caminhos eB1 eB2 dois fibrados principais
sobre Sn com grupo G , n ≥ 2. Sejam T1 e T2 as aplicações características respectivas. EntãoB1 e
B2 são equivalentes se, e somente se, as aplicações T1 e T2 são homotópicas relativas a x0.
Demonstração: Suponha primeiramente queB1 eB2 sejam equivalentes. Como nós estamos
supondo que tais fibrados tem as mesmas vizinhanças trivializantes, temos que (da equivalên-
cia) existem funções contínuas h j : Uj →G , j = 1, 2, tais que g 212(x ) = h1(x )−1 g 1
12(x )h2(x ), para
todo x ∈U1 ∩U2. Seja µj = h j |Sn−1 . Então T2(x ) = µ1(x )−1T1(x )µ2(x ), para todo x ∈ Sn−1. Como
T1(x0) = T2(x0) = e , temos que µ1(x0) =µ2(x0) e vamos denotar este elemento por g ∈G .
Agora, cadaHi , i = 1, 2, é homeomorfo a Dn e possui bordo Sn−1, de modo queHi é contrátil
e, como x0 ∈Sn−1 ⊂Hi , temos
πn−1(Hi ,x0) = 0, i = 1, 2.
Isto significa que todas as aplicações contínuas de (Sn−1,x0) em (Hi ,x0) são homotópicas à
aplicação constante x0. Em particular, as aplicações de inclusão (Sn−1,x0) ,→ (Hi ,x0) são ambas
homotópicas, relativas a x0, à aplicação constante igual a x0 de Sn−1 emHi . Para cada i = 1, 2,
seja Hi tal homotopia.
Defina K i = h i Hi : Sn−1× [0, 1]→G e note que
K i (x , 0) = h i (x ) =µi (x ),x ∈Sn−1
K i (x , 1) = h i (x0) =µi (x0) = g ,x ∈Sn−1
K i (x0, t ) = h i (x0) =µi (x0) = g , t ∈ [0, 1].
Assim, K i é uma homotopia, relativa a x0, entre µi e a aplicação constante de Sn−1 em G cujo
Capítulo 3. Simetrias em Física 91
valor é g . Finalmente, defina K : Sn−1× [0, 1]→G por K (x , t ) = K1(x , y )−1T1(x )K2(x , t ), e assim
K (x , 0) = K1(x , 0)−1T1(x )K2(x , 0) =µ1(x )−1T1(x )µ2(x ) = T2(x )
K (x , 1) = K1(x , 1)−1T1(x )K2(x , 1) = g −1T1(x )g
K (x0, t ) = K1(x0, t )−1T1(x0)K2(x0, t ) = g −1e g = e ,
de modo que K é uma homotopia, relativa a x0, entre T2 e g −1T1 g . Para construir uma homo-
topia, relativa a x0, entre g −1T1 g e T1, usamos que G é conexo por caminhos e escolhemos um
caminho contínuo α : [0, 1]→G , com α(0) = g e α(1) = e , e verificamos que H : Sn−1× [0, 1]→G
definida por H (x , t ) = (α(t ))−1T1(x )α(t ) é a homotopia desejada. Concluímos assim que seB1 e
B2 são equivalentes, então T1 é homotópica, relativa a x0, a T2.
Reciprocamente, suponha que T1 ' T2 relx0 (a notação relx0 significa que existe uma ho-
motopia entre T1 e T2 que é relativa a x0). Não é difícil verificar que T1T −12 : Sn−1 → G de-
finida por (T1T −12 )(x ) = T1(x )T2(x )−1 é homotópica, relativa a x0, à aplicação constante igual
a e . Sendo assim, ela tem uma extensão contínua ν : H1 → G . De fato, ela tem uma ex-
tensão contínua para o disco Dn e daí podemos fazer a composição da inversa da projeção
(x1, ...,xn ,xn+1) ∈ H1 7→ (x1, ...,xn , 0) ∈ Dn com tal extensão, obtendo assim uma extensão defi-
nida emH1. Defina h1 : U1→G por
h1(x ) =
(
ν (x ), , x ∈H1
g 112(x )g
212(x )
−1 , x ∈H2 ∩U1.
Como H1 ∩ (H2 ∩U1) = Sn−1 e, sobre Sn−1, ν (x ) = T1(x )T2(x )−1 = g 112(x )g
212(x )
−1, segue que
h1(x ) é contínua.
Agora seja H2 o interior de H2 (de modo que H2 ⊂ U2) e ψi2 = ψ
i2|π−1
i ( H2), i = 1, 2. Então
(U1,ψ11), ( H2, ψ1
2) e (U1,ψ21), ( H2, ψ2
2) trivializam B1 e B2 respectivamente, e as correspon-
dentes funções de transição são justamente as restrições apropriadas de g 1i j e g 2
i j (continuamos
a usar os mesmos símbolos para estas restrições). Agora defina h2 : H2 → G por h2(x ) = e .
Então, para x ∈U1 ∩ H2,
h1(x )−1 g 112(x )h2(x ) = h1(x )−1 g 1
12(x )
= g 212(x )g
112(x )
−1 g 112(x ) = g 2
12(x ),
e assim podemos concluir que os fibradosB1 eB2 são equivalentes.
Capítulo 3. Simetrias em Física 92
Assim, juntando os dois lemas anteriores, demonstramos o seguinte teorema:
Teorema 3.5. Seja G um grupo topológico conexo por caminhos. Então o conjunto de classes
de equivalência de G -fibrados principais sobre Sn , n ≥ 2, está em bijeção com os elementos de
πn−1(G ).
É importante ressaltar que tal bijeção é obtida pela aplicação característica. Como obser-
vamos, um fibrado principal sobre Sn pode ser descrito por duas trivializações locais, e assim,
essencialmente uma função de transição. O teorema anterior nos afirma que toda informação
sobre o fibrado está contida na classe de homotopia da função de transição. Embora a classifi-
cação obtida pelo teorema acima seja de natureza topológica, ela tem uma versão diferenciável.
A grosso modo, a razão para isto é que a classificação acima depende apenas de classes de ho-
motopia, e qualquer aplicação contínua entre variedades diferenciáveis é homotópica a uma
aplicação diferenciável.
Como casos particulares de nosso interesse, observamos que os fibrados principais sobre S2
com grupo S1 são classificados por π1(S1) ∼= Z. O mesmo acontece com os fibrados principais
sobre S4 com grupo SU (2)∼=S3, pois π3(S3)∼=Z.
Sabemos que um grande resultado devido a Hopf nos diz que, em geral, πn (Sn ) ∼= Z, sendo
este isomorfismo dado pelo grau da aplicação. Assim, quem classifica um fibrado principal
sobre S2 com grupo S1 é o grau da função de transição, a qual pode ser pensada como uma
aplicação se S1 em S1. Uma maneira de caracterizar o grau de uma aplicação de S1 em S1 é
que pensando que ela é uma curva fechada em S1, e daí o grau dessa aplicação é o número de
rotação desta curva, isto é, o número líquido de voltas que a curva dá em torno da origem no
sentido anti-horário (grau positivo). Lembramos que no fibrado de Hopf complexo a função
de transição é, em coordenadas polares, e iθ , de modo que seu grau é 1. Portanto o fibrado
complexo de Hopf corresponde à classe 1 de homotopia de π1(S1)∼=Z.
Esse valor inteiro, como já vimos anteriormente, pode ser obtido calculando uma certa in-
tegral. Faremos isso agora novamente, porém, relacionando explicitamente esta integral com
o grau da função de transição. Considere um fibrado principal P(S2,S1) e ω uma forma de co-
nexão neste fibrado, com forma de curvatura Ω. Vamos supor, como antes, que U1 e U2 são
vizinhanças trivializantes. Sejam s1 e s2 as seções canônicas associadas a estas trivializações.
Escreva A1 = s ∗1ω, A2 = s ∗2ω, F = s ∗1Ω e g 12 a função de transição correspondente. Pensare-
mos g 12 como uma curva fechada do intervalo [0, 2π] em S1, de modo que podemos escrever
Capítulo 3. Simetrias em Física 93
g 12(t ) = e iϕ(t ), em que ϕ : [0, 2π]→R. Na interseção U1 ∩U2, temos que
A1 = g −112A2 g 12+ g −1
12 d g 12 =A2+ i dϕ.
EscrevemosA1 = i A1 eA2 = i A2 eF = i F . Temos então que dϕ = A1−A2 e pelo teorema
de Stokes
i
2π
∫
S2
F = −1
2π
∫
S2
F
= −1
2π
∫
H1
F +
∫
H2
F
!
= −1
2π
∫
H1
d A1+
∫
H2
d A2
!
= −1
2π
∫
S1
A1−A2
=−1
2π
∫ 2π
0
dϕ.
Lembrando que o grau de g 12 é dado por k = 1/(2πi )∫
g 12d z/z , temos que
∫
g 12
d z
z=
∫ 2π
0
1
e iϕ(t ) iϕ′(t )e iϕ(t )d t = i
∫ 2π
0
ϕ′(t )d t = i
∫ 2π
0
dϕ,
logoi
2π
∫
S2
F =−1
2π· (2πk ) =−k ∈Z.
De modo similar, vamos agora expressar uma certa integral (relacionada com o funcional
de Yang-Mills) de uma intensidade de uma conexão em um fibrado principal P(S4,S3) como o
grau da função de transição. Antes de fazer isso, é necessário fazer alguns comentários sobre
o operador Estrela de Hodge, que será denotado por ∗, e sobre uma relação deste com o funci-
onal de Yang-Mills. Para ver uma definição deste operador, consulte por exemplo [Ble81]. Em
geral, se M é uma variedade Riemanniana orientável de dimensão n , então fixado um inteiro
0≤ k ≤ n , o operador estrela de Hodge é definido no espaço das k -formas Λk (M ) e toma valores
no espaço de formas Λn−k (M ). Este operador é um isomorfismo de espaços vetoriais, cujo in-
verso é ∗−1 = (−1)k (n−k )∗. Mais geralmente ainda, pode-se definir um operador estrela de Hodge
para formas com valores em um espaço vetorial V de dimensão finita. Para isso, primeiro fixa-
mos uma base de V e definimos o operador componente a componente. Deve-se mostrar que
esta definição não depende da base escolhida. A situação que nos interessa é o caso em que M
Capítulo 3. Simetrias em Física 94
tem dimensão 4 e ∗ atua em 2-formas. Neste caso, ∗ : Λ2(M )→ Λ2(M ) e ∗−1 = ∗, de modo que ∗ é
uma involução e, portanto, em cada ponto tem autovalores+1 e−1. Isto nos permite decompor
o espaço Λ2(M ) em uma soma direta de C∞(M )-módulos:
Λ2(M ) = Λ2+(M )⊕Λ
2−(M ),
em que Λ2+(M ) é o espaço das 2-formasF que satisfazem ∗F =F , que chamaremos de formas
auto duais, e Λ2−(M ) é o espaço das 2-formasF que satisfazem ∗F =−F , que chamaremos de
formas anti auto duais. Dada F ∈ Λ2(M ) qualquer, temos a decomposição F =F++F−, em
queF+ = 12(F + ∗F )∈Λ2
+(M ) eF− = 12(F −∗F )∈Λ2
−(M ).
É mais simples explicitar a ação do operador ∗ quando M =H (métrica e orientação canôni-
cas):
∗(d qi ∧d qj ) =1
2εi j k l d qk ∧d ql ,
em que
εi j k l =
+1 se i j k l é uma permutação par de 1234
−1 se i j k l é uma permutação ímpar de 1234
0 caso contrário
é o chamado símbolo de Levi-Civita. Usando isto, temos bases canônicas para os espaços de
formas auto duais e para o espaço de formas anti auto duais:
Λ2+(H) =< d q1 ∧d q2+d q3 ∧d q4, d q1 ∧d q3+d q4 ∧d q2, d q1 ∧d q4+d q2 ∧d q3 >
e
Λ2−(H) =< d q1 ∧d q2−d q3 ∧d q4, d q1 ∧d q3−d q4 ∧d q2, d q1 ∧d q4−d q2 ∧d q3 > .
É fácil verificar agora que seF ∈Λ2+(H) e G ∈Λ2
−(H), entãoF ∧G = 0.
Note que, da expressão de d q ∧ d q obtida na seção anterior, as formas Fλ,n são todas anti
auto duais. É importante observar que os conceitos anti auto dual e auto dual se invertem
quando revertemos a orientação da variedade, de modo que a distinção entre esses conceitos
não tem significância substancial, sendo apenas uma escolha de convenção.
Uma observação importante a respeito do operador ∗ com respeito à conformalidade deve
ser feita. Se (M 1, g 1) e (M 2, g 2) são variedades Riemannianas orientadas de dimensão 4 e
f : M 1 → M 2 é um difeomorfismo conforme que preserva orientação, então ∗ comuta com o
pull-back por f : ∗( f ∗F ) = f ∗(∗F ), para todaF ∈ Λ2(M 2). Por exemplo, podemos considerar R4
Capítulo 3. Simetrias em Física 95
e S4 (com métricas e orientações canônicas). A projeção estereográfica pS : US → R4 é um dife-
omorfismo conforme que preserva a orientação, de modo que uma 2-forma em US é anti auto
dual se, e somente se, seu pull-back por p−1S é anti auto dual em R4 (espaço no qual já sabemos
uma base relativamente simples de formas anti auto duais). Por continuidade, uma 2-forma em
S4 é anti auto dual se, e somente se, seu pull-back por p−1S é anti auto dual em R4. Seja P(S4,S3)
um fibrado principal e ω uma 1-forma de conexão em P com forma de curvatura Ω. Se sS é a
seção canônica definida em US , então FS = s ∗SΩ é uma 2-forma em US ⊂ S4. Dizemos que ω é
anti auto dual (respec. auto dual) seFS é anti auto dual (respec. auto dual).
Vamos agora discutir uma relação entre o operador ∗ e o funcional de Yang-Mills. Usaremos
explicitamente a identificação entre Im(H) e su(2) dada por i= iσ3, j= iσ2 e k= iσ1, em que
σ1 =
0 1
1 0
!
σ2 =
0 −i
i 0
!
σ3 =
1 0
0 −1
!
,
são as matrizes de Pauli. Considere também as matrizes 2×2 E i = (a k l ), em que a k l = 0 se k 6= i
ou l 6= i e a i i = 1. Daí i= i E1− i E4, j= E2− E3 e k= i E2+ i E3. SeF é uma 2-forma em H com
valores em Im(H), podemos escrevê-la como F =F1i+F2j+F3k. Usando a identificação de
Im(H) com su(2), podemos pensarF como uma 2-forma com valores em su(2) e escrevê-la em
forma matricial. Consideraremos novamente a álgebra de matrizes com entradas na álgebra das
formas diferenciais com o produto ∧. Entretanto, agora precisamos considerar apenas matrizes
2× 2 cujas entradas são formas de grau par. Note que a R-álgebra das formas de grau par é
comutativa. ExpressamosF na linguagem de matrizes e calculamos tr(F ∧∗F ):
F = F1(i E1− i E4)+F2(E2−E3)+F3(i E2+ i E3)
= iF1E1+(F2+ iF3)E2+(−F2+ iF3)E3− iF1E4
=
iF1 F2+ iF3
−F2+ iF3 −iF1
!
,
de modo que
F ∧∗F =
iF1 F2+ iF3
−F2+ iF3 −iF1
!
∧
i ∗F1 ∗F2+ i ∗F3
−∗F2+ i ∗F3 −i ∗F1
!
=
−∑3
i=1Fi ∧∗Fi ×× −
∑3i=1Fi ∧∗Fi
!
,
Capítulo 3. Simetrias em Física 96
e portanto
tr(F ∧∗F ) =−23∑
i=1
Fi ∧∗Fi .
Podemos escrever F também em função dos d qi , d qj : F =∑
i<j Fi j d qi ∧ d qj , em que
Fi j = F 1i j i+F 2
i j j+F 3i j k. Desta maneira, Fk =
∑
i<j Fki j d qi ∧ d qj , para k = 1, 2, 3, e a soma
é calculada sobre 0≤ i < j ≤ 3. Expressando nestes termos ∗F , vemos que vale
Fk ∧∗Fk =
∑
i<j
(F ki j )
2
d q0 ∧d q1 ∧d q2 ∧d q3,
de modo que
tr(F ∧∗F ) =−2
3∑
k=1
∑
i<j
(F ki j )
2
d q0 ∧d q1 ∧d q2 ∧d q3 =−‖F (q )‖2d q0 ∧d q1 ∧d q2 ∧d q3
e concluímos que, seF é oriundo de um potencialA , vale
Y M (A ) =∫
R4
‖F (q )‖2 =−∫
R4
tr(F ∧∗F ).
Em particular, com respeito aos potenciais anti auto duaisAλ,n , teremos que
1
2
∫
R4
tr
iF2π
2
=−1
8π2
∫
R4
tr(F 2)
=1
8π2
∫
R4
tr(F ∧∗F )
=−1
8π2Y M (Aλ,n )
= −1∈Z,
em queF k é a k -ésima potência exterior deF .
Lembramos que o funcional de Yang-Mills é definido para potenciais em R4. É de interesse
físico encontrar os potenciais que minimizam (localmente) o funcional de Yang-Mills. Para
encontrá-los, encontram-se primeiramente as equações de Euler-Lagrange correspondentes ao
Capítulo 3. Simetrias em Física 97
funcional de Yang-Mills. Mostra-se que tais equações são
3∑
i=0
∂iFi j +[Ai ,Fi j ]
= 0, j = 1, 2, 3.
Estas equações são não-lineares e são de segunda ordem nas componentesAi do potencial
A . Existe um interesse particular em física nos mínimos absolutos deste funcional, os quais
são chamados de instantons. Um fato que queremos comentar, o qual faz uma ligação impor-
tante entre a linguagem de conexões em fibrados e os potencias de ação finita que são soluções
das equações de Yang-Mills (chamados de potenciais de Yang-Mills), é uma consequência do
Teorema das Singularidades Removíveis de Uhlenbeck ([Uhl82]), que é o seguinte: SeA é um
potencial de Yang-Mills em R4, então existe um único fibrado principal P(S4,S3), uma forma de
conexão ω em P e uma seção local s : US → π−1(US) tais queA = (s p−1S )∗ω. Neste caso, note
que a ação deA , por ser finita, pode ser escrita como uma integral do seu correspondente em
S4 (o seu pull-back por pS), o qual também denotaremos porF . Mostra-se que o número
k =1
2
∫
R4
tr
iF2π
2
é um inteiro, em que F é a intensidade de qualquer conexão neste fibrado, e que este inteiro
classifica o fibrado principal P(S4,S3) pois ele coincide com o grau da função de transição do
fibrado. O fato de que tais integrais (no caso do grupo S1 e do grupo SU (2)) não dependem da
escolha da conexão no fibrado está associado ao tipo de formas que estamos integrando. De
fato, em ambos os casos estamos integrando formas que são polinômios emF , e mais que isso,
são polinômios invariantes, o que significa que tais polinômios são invariantes por conjugação
(como é o caso de tr). Estas formas são casos particulares das chamadas classes características
(veja por exemplo [KN69] vol.2 ou [MS74]). No caso do grupo S1, a forma F corresponde ao
primeiro caracter de Chern e no caso do grupo SU (2), a forma (1/2)tr
iF2π
2=−(1/8π2)tr(F∧F )
corresponde ao segundo caracter de Chern.
Para finalizar, se F e G são 2-formas em H com valores em Im(H), e se escrevermos
F =F1i+F2j+F3k e G =G1i+G2j+G3k, então é fácil verificar que tr(F ∧G ) =−2∑
iFi ∧Gi .
Em particular, seF é auto dual e G é anti auto dual, entãoFi ∧Gi = 0, e portanto tr(F ∧G ) = 0.
Assim, dado um potencial de Yang-MillsA emH qualquer, eF a intensidade correspondente,
Capítulo 3. Simetrias em Física 98
temos a decomposiçãoF =F++F−, e daí
Y M (A ) = −∫
R4
tr (F ∧∗F )
= −∫
R4
tr
F+ ∧∗F+
+ tr
F− ∧∗F−
= ‖F+‖2+ ‖F−‖2,
e além disso,
8π2k = −∫
R4
tr (F ∧F )
= −∫
R4
tr
(F++F−)∧ (F++F−)
= −∫
R4
tr
F+ ∧∗F+
+ tr
F− ∧∗F−
= ‖F+‖2−‖F−‖2.
Combinando algebricamente as duas igualdades obtidas acima, podemos obter a desigual-
dade Y M (A )≥ 8π2|k |. Verifica-se daí que a igualdade ocorre se, e somente se, ∗F = (sinal k )F ,
de modo que os mínimos absolutos do funcional de Yang-Mills são exatamente os potenciais
anti auto duais (auto duais). Em particular, os potenciaisAλ,n , os quais correspondem a k =−1
(fibrado de Hopf quaterniônico), são todos mínimos absolutos do funcional de Yang-Mills.
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