UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
ESCOLA DE MÚSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA
LEANDRO FERNANDES DE OLIVEIRA
TÉCNICAS ESTENDIDAS DA MÚSICA CONTEMPORÂNEA:
o regente como mediador do processo interpretativo.
NATAL-RN
2017
LEANDRO FERNANDES DE OLIVEIRA
TÉCNICAS ESTENDIDAS DA MÚSICA CONTEMPORÂNEA:
o regente como mediador do processo interpretativo.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Música (PPGMUS) da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN), na linha de pesquisa – Processos e
Dimensões da Produção Artística, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Música.
Orientador: Prof. Dr. André Luiz Muniz
Oliveira.
NATAL-RN
2017
LEANDRO FERNANDES DE OLIVEIRA
TÉCNICAS ESTENDIDAS DA MÚSICA CONTEMPORÂNEA:
o regente como mediador do processo interpretativo.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Música (PPGMUS) da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN), na linha de pesquisa – Processos e
Dimensões da Produção Artística, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Música.
Aprovada em: ___/___/___
BANCA EXAMINADORA:
_________________________________________________________
PROF. DR. ANDRÉ LUIZ MUNIZ OLIVEIRA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN)
ORIENTADOR
_________________________________________________________
PROF. DR. CLEBER DA SILVEIRA CAMPOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (UFRN)
MEMBRO DA BANCA
______________________________________________________
PROF. DR. MARCO ANTONIO TOLEDO NASCIMENTO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ (UFC)
MEMBRO DA BANCA
Dedico este Trabalho, primeiramente, a minha mãe Ana Noronha e ao meu pai José
Hilton, pois sem a compreensão, ajuda e confiança deles nada disso seria possível hoje. A eles
além da dedicatória desta conquista dedico a minha vida.
À minha esposa Katiana pelo apoio incondicional, amor e carinho.
À minha filha Manuella, afago e ternura que me fazem esquecer das minhas
ansiedades e angústias. Dedico a você este Trabalho e todo meu amor e carinho.
Aos meus irmãos Leônidas e Letícia pelo carinho e afeto.
Ao meu Professor1, amigo e orientador Prof. Dr.
2 André Luiz Muniz Oliveira pelos
valiosos ensinamentos e apoio.
Ao Prof., amigo e conselheiro Yerko Tabilo, pessoa imensamente responsável por essa
conquista. Obrigado pelo carinho, apoio e amizade.
Ao Prof. Dr. Fábio Soren Presgrave pelo apoio e amizade.
À Eliane Torres pelo carinho, amizade e ensinamentos.
Ao Prof. Airton Guimarães pela grande amizade, apoio e carinho.
À todos os Profs. do Programa de Pós-Graduação em Música (PPGMUS) da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) pelos ensinamentos fundamentais para
a construção de conhecimentos que contribuíram, imensamente, para a minha formação.
À todos os meus colegas do Curso de Mestrado pelo companheirismo e parcerias
musicais. Em especial, à Fellipe Teixeira pelo apoio, amizade e companheirismo.
À todos os colegas da Fundação Francisca Fernandes Claudino (FUNFFEC).
Ao Prof. MSc.3 Isac Rufino pelo companheirismo e orientação desde meus tempos de
Licenciatura.
Aos integrantes da Orquestra Funffec de Cordas (OFC) pelo companheirismo, parceria
e aprendizagem recíproca em todos os momentos deste Trabalho: Edivânia Almeida, Lucas
Natanael, Sandrielly Bento, Daniela Santana, Gilberlandio da Silva, Joyce Aldaiza, Marina
Gabrielly, Miliene Souza, Andela Fonseca, Larissa Campos, Sofia Saturnino, Katia Luana,
Andre Borges e Andresa Laíze.
1Professor (Prof.).
2Doutor (Dr.).
3Mestre (MSc).
RESUMO
Apresenta a experiência de um trabalho de construção performática onde o regente
atua na qualidade de mediador no processo interpretativo utilizando, como ferramenta, as
técnicas estendidas de duas obras: As Quatro Estações Portenhas de Astor Piazzolla (1921-
1992) e Itinerário da Passagem: Verônica Nadir de Sílvio Ferraz (1959-). Utiliza a
metodologia da pesquisa ação considerando que a abordagem interpretativa é desenvolvida
pelo autor desta Pesquisa enquanto regente e diretor artístico da Orquestra Funffec de Cordas
(OFC). O contexto social da OFC inclui um trabalho desenvolvido a partir do ano de 2013 e
conta com a participação de jovens com idade entre 10 e 22 anos. Este Projeto possui uma
base técnica norteada pelos métodos tradicionais no ensino de cordas friccionadas escritos, em
sua maioria, no século XIX. O objetivo da pesquisa é apontar as principais dificuldades
encontradas no trabalho deste repertório em relação às técnicas estendidas. Deste ponto,
busca-se explorar as possibilidades e variáveis oferecidas e, através do diálogo e pesquisa,
estabelecer um critério para a interpretação. Após o trabalho de articulação teórica e analítica
das Obras, estabelece-se o processo de construção interpretativa, principalmente, no que tange
as técnicas estendidas utilizadas pelos compositores, anteriormente, mencionados. Assim,
elementos das técnicas estendidas foram abordados, bem como seus conceitos e aplicações e
os possíveis resultados sonoros. A comunicação nos ensaios abriu espaços para a opinião dos
jovens músicos na tentativa de estabelecer um processo em que suas experimentações e
concepções de sonoridades pudessem ser aplicadas no processo de interpretação do repertório
proposto.
Palavras-chave: Música contemporânea. Técnicas estendidas. Práticas interpretativas.
Regência.
ABSTRACT
Presents a experience of work of the performance construction where the conductor
acts as mediator in the interpretative process, using as tool the extended techniques of two
works: The Four Seasons of Buenos Aires by Astor Piazzolla (1921-1992) and Intinerário
de Passagem: Verônica Nadir by Silvio Ferraz (1959-). We used the action research
methodology, considering that the interpretative approach is developed by the author of this
research as a conductor and artistic director of the Orquestra Funffec de Cordas (OFC). The
social context of the OFC includes a work which was developed since 2013 and it counts on
the participation of young people with ages between 10 and 22 years old. This project has a
technical base guided by the traditional methods on the teaching of written friction strings,
mostly, in the 19th
century. The purpose of this research is to identify the main difficulties
encountered in the work of this repertoire in relation of the extended techniques, in the point
of view seeks to explore the possibilities and available variables and trough this dialog and
research, stablish a criterion to the interpretation. After the work of theoretical work and
analytical articulation of the work, we established the process of the interpretative
construction especially in what concerns the extended technique used by the compositors
mentioned above. In this way, elements of the extended techniques were mentioned, such as
its concepts and applications and the possible sound result. The communication on the
rehearsal opened up space to the opinion of the young musicians on the attempt of stablish a
process which its experimentations and conceptions of sonority could be applied on the
process of interpretation and suggested repertoire.
Keywords: Contemporary music. Extended techniques. Interpretive practices. Conduction.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Tastiera na secção dos violoncelos............................................................ 19
Figura 2 – Representação da tastiera pela abordagem do contrabaixo....................... 20
Figura 3 – Tambor escrito para a secção de segundos violinos.................................. 21
Figura 4 – Representação gráfica do efeito chicharra................................................ 22
Figura 5 – Representação do perro em tutti................................................................ 23
Figura 6 – Representação do látigo em tutti............................................................... 24
Figura 7 – Exemplo de figuras retórico-musicais....................................................... 33
Figura 8 – Reforço retórico dos lamentos................................................................... 34
Figura 9 – Lamentos representados por glissandos retos............................................ 34
Figura 10 – Escrita do pizzicato Bartók...................................................................... 36
Figura 11 – Esquema de cores e marcações para estabelecer referências................... 38
Figura 12 – Exemplo de harmônicos naturais na secção de violoncelos e baixos...... 45
Figura 13 – Exemplo de harmônico artificial na secção das violas............................ 46
Figura 14 – Indicação da variação da arcada em ordinário, ponticello e molto
ponticello................................................................................................
47
Figura 15 – Escrita do tremulo em ponticello representando a figura retórica do
som da matraca........................................................................................
49
Figura 16 – Escrita dos tremolos representando a figura do lamento em murmúrio.. 49
Figura 17 – Flautato sugerido em posição normal de arco......................................... 50
Figura 18 – Punta d’arco em ordinário representando o murmúrio........................... 50
Figura 19 – Posição punta d’arco em aspirato (murmúrio e lamentação)................. 51
Figura 20 – Representação dos glissandos retos......................................................... 51
Figura 21 – Exercício estruturado segundo as ideias de Aquino; Silva; Presgrave
(2012) para a resolução da mudança cromática entre os intervalos de
2ª menor com a ausência dos glissandos...............................................
52
Figura 22 – Proposição técnica do more pressure...................................................... 53
Figura 23 – Exemplo da notação do more pressure.................................................... 54
Figura 24 – Representação gráfica do tutto l’arco...................................................... 54
Figura 25 – Primeira aparição do pizzicato Bartók..................................................... 56
Figura 26 – Representação das matracas na partitura................................................. 57
Figura 27 – Matraca confeccionada pelo Sr. Josemar da Costa.................................. 58
Figura 28 – Matracas confeccionadas pelo Sr. Josemar da Costa e seu filho
Leonardo Costa.....................................................................................
59
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CA – Canadá
Dr. – Doutor
EMUFRN – Escola de Música da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
FR – França
FUNFFEC – Fundação Francisca Fernandes Claudino
h. – Hora
MG – Minas Gerais
min. – Minutos
MSc – Mestre
OFC – Orquestra Funffec de Cordas
PPGMUS – Programa de Pós-Graduação em Música
Prof. – Professor
RN – Rio Grande do Norte
Sr. – Senhor
UFC – Universidade Federal do Ceará
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................... 11
2 TÉCNICAS ESTENDIDAS....................................................................................... 16
3 TÉCNICAS ESTENDIDAS EM PIAZZOLLA....................................................... 18
3.1 Tastiera........................................................................................................................ 19
3.2 Tambor........................................................................................................................ 21
3.3 Efeito chicharra (cigarra).......................................................................................... 22
3.4 Látigo e Perro.............................................................................................................. 23
3.5 As Quatro Estações Portenhas: ensaios e performance.......................................... 25
4 O REGENTE COMO MEDIADOR DO PROCESSO: COMPETÊNCIAS E
SABERES À LUZ DO ITINERÁRIO DA PASSAGEM........................................
27
4.1 Atividades de apreciação para a busca do olhar subjetivo..................................... 27
4.2 Compreensão musical e performance....................................................................... 30
4.3 Figuras de retórica...................................................................................................... 32
4.4 O tempo liso e as dificuldades da construção do gesto............................................ 35
5 TÉCNICAS ESTENDIDAS NO ITINERÁRIO DA PASSAGEM: VERÔNICA
NADIR.........................................................................................................................
41
5.1 Harmônicos naturais.................................................................................................. 44
5.2 Harmônicos artificiais................................................................................................ 45
5.3 Sul tasto, Sul ponticello e Ordinário......................................................................... 46
5.4 Arcos, Trêmulos e Variações de Pressão.................................................................. 48
5.5 Pizzicato Bartók.......................................................................................................... 55
5.6 Matracas...................................................................................................................... 57
5.7 Itinerário da Passagem: ensaios e performance...................................................... 60
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 61
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 65
ANEXO A – ITINERÁRIO DA PASSAGEM: VERÔNICA NADIR DE
SÍLVIO FERRAZ.......................................................................................................
70
ANEXO B – AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR
PIAZZOLLA: PRIMAVERA PORTEÑA (I MOVIMENTO)..............................
78
ANEXO C – AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR
PIAZZOLLA: VERANO PORTEÑO (II MOVIMENTO)....................................
85
ANEXO D – AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR
PIAZZOLLA: OTOÑO PORTEÑO (III MOVIMENTO).....................................
92
ANEXO E – AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR
PIAZZOLLA: INVIERNO PORTEÑO (IV MOVIMENTO)................................
99
11
1 INTRODUÇÃO
Este texto apresenta um relato de experiência de uma pesquisa que objetiva discutir o
papel do regente como mediador do processo interpretativo. Neste contexto, busca-se
desenvolver argumentos e procedimentos pedagógicos que possam viabilizar o processo
interpretativo objetivando uma performance das Quatro Estações Portenhas de Astor
Piazzolla (1921-1992) (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d) e Itinerário da
Passagem: Verônica Nadir de Sílvio Ferraz (1959-) (FERRAZ, 2008). Como ponto de
partida, utilizar-se-á como ferramenta de trabalho, as possibilidades das técnicas estendidas da
música contemporânea. Estes recursos possibilitam abordagens técnico-instrumentais através
da exploração de sons que não fazem parte das convenções técnicas da escola tradicional do
ensino da técnica instrumental. A intenção é apontar as principais dificuldades encontradas no
trabalho deste repertório em relação às técnicas estendidas que demandam das partituras.
Deste ponto, busca-se explorar as possibilidades e variáveis oferecidas pelas técnicas
estendidas e, através do diálogo e pesquisa, estabelecer um critério para a execução.
Esta Pesquisa foi desenvolvida no contexto da Orquestra Funffec de Cordas (OFC) de
Luís Gomes - RN4. A realidade da OFC inclui um trabalho de cunho social. Trata-se de um
projeto de cordas friccionadas com 3 orquestras ativas que somam, no momento desta
Pesquisa, 82 estudantes com faixa etária entre 6 e 24 anos. Este projeto possui uma base
técnica norteada pelos métodos tradicionais no ensino de cordas friccionadas escritos, em sua
maioria, no século XIX. A OFC (orquestra principal do projeto) foi criada em 2013
apresentando-se como uma importante ferramenta de mobilização social e cultural através da
Música e tem a Fundação Francisca Fernandes Claudino (FUNFFEC)5 como instituição
mantenedora. A OFC, no início desta Pesquisa, era formada por 26 jovens e, no fim da
pesquisa, apresenta 38 integrantes com idade média entre 10 e 22 anos. Para fins desta
Pesquisa, o Grupo se caracteriza pelo pouco contato prático de seus integrantes com a música
produzida nas últimas décadas, principalmente, aquelas que apresentam novas possiblidades
técnico-interpretativas com a necessidade de utilização de técnicas estendidas.
Considerando que esta Pesquisa confronta a realidade desse Grupo social com a
inserção de uma nova realidade técnico interpretativa como também a escolha de resoluções
para os problemas que surgiram no processo, busca-se o norte metodológico pelas bases
4Rio Grande do Norte (RN).
5Entidade autárquica e sem fins lucrativos. A FUNFFEC desenvolve ações sociais, culturais e profissionalizantes
na comunidade de Luís Gomes - RN.
12
teóricas e proposição prática da pesquisa ação. Este método de pesquisa é apontado por
Thiollent (1992, p. 32):
A pesquisa ação é um tipo de investigação social com base empírica que é
concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a
resolução de um problema coletivo no qual os pesquisadores e os
participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de
modo cooperativo ou participativo.
A validade deste método encontra coerência com o objeto desta Pesquisa por viabilizar
um processo de tomada de decisões diante o dinamismo que a prática da orquestra oferece a
partir do trabalho das duas obras propostas.
Considera-se, para efeito prático, o ciclo da investigação ação apresentado por Tripp
(2005) que propõe o planejamento, implementação, descrição e avaliação. Neste espaço de
pesquisa é necessário considerar as variáveis apresentadas e as consequentes alternativas
encontradas para a resolução dos problemas. A participação e cooperação entre o regente e a
Orquestra buscaram a melhora e avanço das atividades na identificação dos problemas. Na
sequência, buscou-se o planejamento das possíveis soluções. A partir desses novos dados,
estabeleceu-se a implementação dessas ações, seu monitoramento e a avaliação de sua
eficácia.
A justificativa para a realização desta Pesquisa encontra-se no desafio de introduzir o
estudo de técnicas estendidas da música atual no repertório da OFC ampliando, assim, novas
possibilidades sonoro-interpretativas ao Grupo a partir da atuação do regente. Dividiu-se o
trabalho em duas partes: a primeira de articulação teórica, analítica e de estudo prático das
Obras. Esta primeira parte do trabalho forneceu os subsídios para a construção de uma
proposta de performance no que se refere a utilização de técnicas estendidas aos instrumentos
de cordas no contexto das Obras interpretadas nesta Pesquisa.
Nesta perspectiva, como segunda parte do processo de construção interpretativa,
estabeleceu-se uma dinâmica que abordou aspectos técnicos criando uma ponte entre a ideia
interpretativa do regente e a prática musical da OFC. Assim, elementos da técnica estendida
foram abordados. Neste ponto, o regente atuou na apresentação de conceitos e elaboração de
aportes pedagógicos para viabilizar a absorção e aplicação das técnicas estendidas, e seus
resultados sonoros no âmbito do repertório proposto. A comunicação nos ensaios abriu
espaços para a opinião dos jovens músicos na tentativa de estabelecer um processo em que
suas experimentações e concepções de sonoridades possam ser aplicadas no processo de
interpretação.
13
Para a construção do processo deve-se considerar que a interpretação da música
contemporânea requer um aprofundamento na gama de conhecimentos necessários para
assimilar a grande carga de informações, conteúdos, gestos e ideias. A música da atualidade
demanda novas possibilidades técnicas, alta complexidade rítmica e grande diversidade de
timbres. No caso do trabalho com os jovens instrumentistas, a dificuldade se apresenta pela
pouca oferta de referências que possam servir de norte interpretativo, pois, de acordo com
Mojola (2000, p. 32), “A não exigência de outra interpretação como referência e, em muitas
vezes, o não conhecimento da poética do compositor, introduzem dificuldades que não
ocorrem na execução de obras do repertório tradicional”. Aqui, a dificuldade em relação à
interpretação do repertório contemporâneo é proveniente de questões bem mais específicas e
de ordem expressiva, a exemplo, pontua-se o desconforto que alguns dos nossos intérpretes
costumam ter, tais como: a atonalidade, a polirritmia ou ausência dos padrões rítmicos dos
compassos simples e as poucas referências métricas encontradas nas partituras, em especial,
no Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008).
Esta dinâmica de trabalho visa contribuir para estabelecer, através deste Trabalho,
referências para futuras ações de outros regentes e/ou professores que pretendam utilizar o
repertório contemporâneo no ambiente musical de orquestras.
Considera-se também, no contexto estudado, uma exigência a respeito da produção de
repertório para a temporada de eventos e compromissos da OFC, tudo tem que ser resolvido
em poucos ensaios. Neste caso, há pouco tempo para se trabalhar repertórios de música
contemporânea. Considerando a ideia de que há pouco espaço para interpretação e execução
da música contemporânea, chega-se ao ponto e necessidade de atribuir maiores espaços para a
produção deste repertório, trabalho que demanda uma abordagem mais detalhada e séria do
ponto de vista interpretativo, pois, como observa Mojola (2000, p. 33):
Sobre os problemas que envolvem extrair a interpretação unicamente do
texto escrito, o sucesso dessa atividade depende das habilidades intelectuais
e sensíveis do músico. O domínio da análise, a capacidade de leitura
detalhada e inteligente de uma partitura e o conhecimento de aspectos da
estética da arte contemporânea são fundamentais nesse momento. Intérpretes
não acostumados a essa postura, intérpretes que mesmo em obras notadas
tocam „de ouvido‟, ou seja, alterando sem qualquer objetivo definido o
documento original, terão dificuldades nesse novo mundo.
Nesse caso, a atividade do intérprete deve recorrer ao estudo da literatura na intenção
de entender a poética musical empregada pelo compositor, suas intenções e sua perspectiva
das diversas etapas da composição. A inserção da música contemporânea, no contexto da
14
OFC, constitui um verdadeiro desafio considerando o estranhamento que os jovens músicos,
no geral, têm com as abordagens técnicas, rítmicas, melódicas e harmônicas das obras
musicais dos séculos XX e XXI. O processo foi desenvolvido no intuito de criar situações e
vivências de aprendizagem, elaborando um campo que possa contextualizar as nuances das
composições musicais contemporâneas com a prática do Grupo que será alvo desta Pesquisa,
pois como cita Amaral (2012 apud LIMA, 2014, p. 34):
A música contemporânea brasileira se tornou rica por sua diversidade
estilística e pela miscigenação de raças e culturas. No entanto, o acesso do
intérprete a esta música se torna difícil e restrito, ora pela escassez de
edições, como também pela carência de informações que busquem fornecer
elementos que auxiliem a interpretação e o desenvolvimento dos
procedimentos de preparação e execução das obras, a partir de uma
discussão analítica no âmbito das práticas interpretativas.
A intenção da pesquisa aqui reportada foi estabelecer os critérios de abordagem prática
e analítica para os jovens, proporcionando que os mesmos ampliem suas capacidades
interpretativas. De acordo com Padovani; Ferraz (2011, p. 11, grifos do autor):
Tradicionalmente associada às técnicas de performance instrumental, a
expressão técnicas estendidas se tornou comum no meio musical a partir da
segunda metade do século XX, referindo-se aos modos de tocar um
instrumento ou utilizar a voz que fogem aos padrões estabelecidos
principalmente no período clássico-romântico. Em um contexto mais amplo,
porém, percebe-se que em várias épocas a experimentação de novas técnicas
instrumentais e vocais e a busca por novos recursos expressivos resultaram
em técnicas estendidas. Nesta acepção, pode-se dizer que o termo técnica
estendida equivale a técnica não usual: maneira de tocar ou cantar que
explora possibilidades instrumentais, gestuais e sonoras pouco utilizadas em
determinado contexto histórico, estético e cultural.
Considerar-se-á a importância do estudo das técnicas estendidas como parte do
processo que almeja o entendimento dos recursos técnicos e interpretativos que se apresentam
nas obras dos compositores contemporâneos.
A música contemporânea demanda novas possibilidades técnicas, alta complexidade
rítmica e grande diversidade de timbres. Os problemas de execução e interpretação se dão
pelo fato da alta complexidade do conteúdo musical e, no caso do trabalho com jovens
instrumentistas, a dificuldade se apresenta pela pouca oferta de referências que possam servir
de norte interpretativo.
Este cenário constitui terreno fértil para o desenvolvimento da musicalidade. Com essa
dinâmica, o papel do regente enquanto pesquisador, se coloca na função de mediador do
15
processo, elencando a obra, apresentando os conceitos e sugerindo as ações que, de acordo
com o processo, podem ser transformadas pelas sugestões dos jovens músicos, sejam por
experimentações, seja por pesquisa.
16
2 TÉCNICAS ESTENDIDAS
O termo técnica estendida remete ao uso de recursos pouco usuais da técnica
tradicional de um instrumento. No âmbito desta Pesquisa, instrumentos de cordas friccionadas
(violino, viola, violoncelo e contrabaixo acústico), considerou-se que a técnica tradicional foi
estabelecida até o final do século XIX. O final do século XIX constitui período de profundas
mudanças no campo musical. A evolução dos instrumentos e a busca por novas possiblidades
sonoras produziu uma série de ideias e ações que demandam novas formas e maneiras de se
fazer música. Onofre; Alves (2011, p. 37) pontuam que:
A trajetória percorrida pela música do final do século XIX e início do século
XX orientou a esfera composicional a um novo paradigma a partir da
ampliação do domínio sobre o artefato sonoro. A compreensão da
organização do som em si, como base para novas linguagens, elevou o
timbre ao nível de outros parâmetros, tais como altura, duração e
intensidade.
Surge, principalmente no século XX, maior demanda na exploração dos instrumentos
convencionais assim como uma busca extensiva por novas sonoridades. Neste caso, no
contexto desta Pesquisa, busca-se promover o estudo das técnicas estendidas utilizando o
trabalho mediador do regente para resolver problemas de cunho interpretativo e expressivo na
intenção de explorar a Obra elencada e assim construir uma performance, na medida do
possível, condizente com a estética da música contemporânea.
Na abordagem das técnicas estendidas, buscar-se-á esclarecer as necessidades
interpretativas que demandam das ideias dos compositores, ocasionando a busca por novas
sonoridades que podem ser apresentadas através da exploração dos instrumentos musicais.
Nessa perspectiva, apresenta-se Nunes; Reis (2014) que colocam as técnicas
estendidas como meios dinâmicos à interpretação e o não consenso do seu uso entre os
compositores revelando um rico campo de possibilidades.
Daldegan; Dottori (2011) apresentam as possibilidades de inserção das técnicas
estendidas na construção da base técnica de jovens instrumentistas.
Padovani; Ferraz (2011) apresentam uma abordagem histórica da necessidade e
buscam por novas sonoridades que reforcem as ideias do compositor explorando meios e
possibilidades que ultrapassam a técnica casual dos instrumentos.
17
Tokeshi (2003) apresenta a abordagem das técnicas estendidas na tentativa de explorar
e apresentar soluções para os problemas de execução da linguagem contemporânea que está
em constante processo de renovação.
Onofre; Alves (2011) pontuam a compreensão da organização do som em si, como
base para novas linguagens.
Costa (2015) age nos processos da construção sonora estabelecendo as sonoridades
como fenômeno autônomo ou como uma entidade viva e independente (sujeito) na qual o
músico ou o ouvinte devem mergulhar para descobrir os seus dinamismos.
Nunes; Reis (2014) buscam apresentar soluções para o trabalho que demanda da
complexidade rítmica da música contemporânea.
Apoiado nessas ideias, buscou-se apresentar aos jovens instrumentistas que a
abordagem de técnicas estendidas é importante para a evolução do pensamento e
direcionamento das necessidades interpretativas que os compositores atribuem a seus
discursos musicais. A compreensão estilística e a apropriação dos conceitos são importantes
para a internalização dos gestos necessários para uma interpretação sólida. Desse modo, deve-
se entender que “O estudo de técnica estendida dá suporte, portanto, para o desenvolvimento
da técnica em geral, além da técnica específica para música contemporânea” (TOKESHI,
2003, p. 55).
Tem-se a intenção de promover nos jovens integrantes da Orquestra deste estudo, uma
postura crítica para a resolução de eventuais problemas que possam surgir em outros
processos interpretativos. Conhecimentos adquiridos a partir da experiência construída no
contexto desta Pesquisa.
18
3 TÉCNICAS ESTENDIDAS EM PIAZZOLLA
Para o primeiro momento desta Pesquisa, optou-se por utilizar As Quatro Estações
Portenhas de Astor Piazzolla (1921-1992) (PIAZZOLLA, 1965, 1969, 1970a, 1970b). Com o
título original Cuatro Estaciones Porteñas, esta Obra foi escrita para conjunto de tango
(violino, guitarra elétrica, piano, baixo e bandoneon) entre os anos de 1965 e 1970. Piazzolla
(1965, 1969, 1970a, 1970b) escreveu as estações separadamente, uma vez que ele não
pretendia escrevê-la em forma de suíte de 4 movimentos.
A versão das Quatro Estações Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c,
1998d) utilizada no âmbito desta Pesquisa é um arranjo para quinteto de cordas (orquestra de
câmara) feito pelo cearense Arthur Barbosa (1965-). O arranjador mantém as principais
características da versão original e opta por desconsiderar a figura do solista em destaque,
distribuindo os solos pelos chefes de naipe. A estrutura de suíte é a mesma: I – Primavera
Portenha (PIAZZOLLA, 1998a), II – Verão Portenho (PIAZZOLLA, 1998b), III – Outono
Portenho (PIAZZOLLA, 1998c) e IV – Inverno Portenho (PIAZZOLLA, 1998d).
A especulação sobre o possível estranhamento da aplicação de técnicas estendidas
logo se apresentou como fato por parte dos jovens músicos ficando evidente nos comentários
que surgiram no primeiro contato com a Obra. Esse estranhamento se coloca pelo uso
incomum das técnicas estendidas na formação técnica dos jovens instrumentistas, problema
que é colocado por Nunes; Reis (2014, p. 397):
Nunca fazem parte da formação musical do instrumentista, que geralmente
aprende a partir de uma breve explicação. Sendo assim, técnicas estendidas
são consideradas „secundárias‟ ou até mesmo triviais e, como resultado, são
interpretadas frequentemente de maneira descuidada. Porém, a prática de
técnicas estendidas promove desenvolvimento na técnica geral da viola.
Interpretar um novo estilo de música tem a tendência de aprimorar os estilos
que já dominamos. Essas técnicas são, de fato, essenciais para um domínio
completo do instrumento.
Para a inicialização do trabalho da primeira Obra optou-se por considerar a abordagem
descrita por Daldegan; Dottori (2011, p. 87):
O ensino tanto dos estudos quanto das peças, durante o estudo de campo, a
abordagem se dá basicamente seguindo o seguinte caminho: 1º. Exploração
da notação na partitura: identificando símbolos diferentes dos tradicionais e
avaliando se são ou não já conhecidos; em caso positivo, procurando determinar que efeito representam; 2º. Aprendizagem das técnicas
específicas referentes aos diferentes símbolos identificados.
19
Esta Obra apresenta importância para o objeto de estudo desta Pesquisa pois utiliza
ampla variedade de técnicas estendidas e, desta forma, promove a exploração de recursos que
podem finalizar em novas sonoridades. No primeiro momento, foi realizada uma atividade de
apreciação em que os integrantes da OFC puderam tomar contato com o estilo de
interpretação. Já na fase de escuta surgiram indagações sobre as formas de fazer alguns “sons
estranhos, mas bem interessantes” (informação verbal)6. Alguns já até propunham soluções,
demonstrando notável interesse com as novas possibilidades sonoras nunca exploradas pelo
Grupo. Após a fase de apreciação, o contato com a partitura se deu com o intuito de
identificar as frases e períodos. Posteriormente, para delimitar as ações, o regente/pesquisador
identificou e catalogou as técnicas estendidas presentes nos 4 movimentos da Obra. A partir
das atividades de apreciação, foi mostrado e ilustrado as formas de tocar das técnicas escritas
no arranjo de Arthur Barbosa, dispensando exercícios escritos. As técnicas estendidas
identificadas em um plano geral foram: tastiera, tambor, efeito chicharra (cigarra), látigo e
perro.
3.1 Tastiera
A tastiera consiste em um recurso de mão direita que, segundo Pimentel (2007), foi
amplamente utilizado por Piazzolla em suas performances. Este recurso é aplicado no corpo
acústico do instrumento com o objetivo de produzir um efeito percussivo de altura grave.
Neste arranjo, a tastiera se apresenta no I Movimento (Primavera Portenha) (PIAZZOLLA,
1998a), nas sessões dos violoncelos e contrabaixos:
Figura 1 - Tastiera na secção dos violoncelos
Fonte: Piazzolla (1998a, p. 1).
6Informação verbal proferida por um violoncelista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em
agosto de 2016.
20
O arranjador não especifica, nas anotações da partitura, em qual parte do corpo do
instrumento esta técnica deve ser aplicada. Quando o regente provocou os músicos da OFC,
logo surgiram sugestões: “Vamos fazer na parte de trás do baixo, o som é mais grave e fica
parecido com um bombo de bateria. Eu acho legal” (informação verbal)7.
Figura 2 - Representação da tastiera pela abordagem do contrabaixo
Fonte: Piazzolla (1998a, p. 3).
Na partitura dos violoncelos foi sugerido pelo regente, como forma de testar a
absorção do conceito da tastiera, que a aplicação da técnica fosse feita percutindo as cordas
soltas, o objetivo foi produzir uma sonoridade contrastante com o contrabaixo, mas no mesmo
ritmo: “[...] se ficar batendo nas cordas soltas vai ficar produzindo os sons que não batem com
a tonalidade, e depois, não vai ser a tastiera por causa da batida que tem que ser no tampo do
instrumento” (informação verbal)8. Adiante ficou decidido que a percussão da tastiera seria
feita na parte frontal do violoncelo, com o uso da mão esquerda.
É oportuno pontuar que as primeiras abordagens das técnicas estendidas deste estudo
enfrentaram resistência por parte dos integrantes da OFC. No início do processo, alguns
músicos demostraram certa desconfiança de como abordar os recursos que lhes foram
apresentados. Esse problema já é discutido por Daldegan (2009, p. 4):
O aprendizado das técnicas estendidas, justamente com a exposição do
repertório contemporâneo e especialmente a execução de peças que
explorem este material sonoro pode vir a quebrar um ciclo vicioso com
relação à música contemporânea „não conheço, não toco, não gosto‟ que
7Informação verbal proferida por um violinista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em agosto
de 2016. 8Informação verbal proferida por um violista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em agosto de
2016.
21
afeta e prejudica inclusive músicos profissionais, que muitas vezes são
também professores de instrumento.
No ambiente de formação da OFC, o progresso se dá, justamente, pelo sentimento de
êxito que os jovens constroem no dia-a-dia dos ensaios. O início do trabalho das técnicas
estendidas trouxe desconforto uma vez que não eram recursos que podiam ser facilmente
absorvidos pela técnica comum do Grupo. Pretendeu-se convencê-los que as técnicas
estendidas poderiam culminar em novas descobertas, novas possibilidades sonoras. O
direcionamento e o uso correto das técnicas estendidas exigem um trabalho sério e o total
envolvimento dos músicos, tarefa desafiadora, porém, necessária para o crescimento do
Grupo.
3.2 Tambor
Ainda de acordo com Pimentel (2007), o tambor é um recurso técnico muito utilizado
nas obras de Piazzolla. Este efeito consiste em percutir a corda buscando o som de uma caixa
clara, para isso, abafa-se a corda com a ponta da unha e ataca-se a corda com a mão direita
aplicando um pizzicato de elevada intensidade. Encontra-se a abordagem desta técnica,
especialmente, no Outono Portenho (PIAZZOLLA, 1998c).
Figura 3 - Tambor escrito para a secção de segundos violinos
Fonte: Piazzolla (1998c, p. 6).
22
Os integrantes da OFC tiveram certa dificuldade em assimilar a técnica necessária para
a realização do tambor. Considerando que os instrumentos da Orquestra têm pouca
qualidade, as cordas não produzem o efeito adequado e esperado. Outra dificuldade é o nível
técnico de alguns integrantes da Orquestra, estes não conseguiram dominar a técnica do
tambor, mas entenderam o objetivo quanto ao som pretendido. Sendo assim, o efeito foi
aplicado apenas por instrumentistas mais experientes do Grupo.
3.3 Efeito chicharra (cigarra)
Piazzolla considerou a poética de representar, musicalmente, as mudanças climáticas
das estações. O efeito chicharra foi, amplamente, utilizado em sua obra e é uma técnica
estendida característica do Tango Argentino. Pimentel (2007) explica que o efeito é produzido
quando se passa a crina da região do talão do arco na porção de cordas que ficam atrás do
cavalete, assim é produzido um som de lixa (lija) que se assemelha ao canto da cigarra, esta
técnica estendida produz um som que faz referência ao canto da cigarra na primavera.
Figura 4 - Representação gráfica do efeito chicharra
Fonte: Piazzolla (1998c, p. 6).
Para este Trabalho de abordagem das técnicas estendidas, o efeito chichara foi o que
mais manifestou estranhamento e resistência por parte dos integrantes da Orquestra. O som, a
início, não agradava a ponto de provocar aborrecimentos. Depois da contextualização e
conceituação desta técnica estendida, os alunos passaram a ter a preocupação de representar a
sonoridade exigida e, dessa forma, caracterizar a interpretação dentro da estética do tango. O
estranhamento com determinadas técnicas estendidas é uma reação que ocorre dentro da
23
normalidade quando se trata de instrumentistas que praticam repertórios tradicionais. Copetti;
Tokeshi (2005, p. 321) pontuam que: “[...] o tratamento não convencional do material sonoro
por vezes exige o domínio de reflexos e combinações de movimentos ainda não
incorporados à técnica do instrumentista”. Dessa forma, entende-se que o processo de estudo
e aplicação das técnicas estendidas passam pela ampliação das capacidades técnicas dos
jovens músicos da OFC.
3.4 Látigo e Perro
Segundo Link (2009), o violinista Suárez Paz (1941-), integrante do Quintet Essemble,
grupo pertencente ao chamado Nuevo Tango, deu vida, através da parceria com Piazzolla, a
duas variações para o glissando. Estas técnicas são as que mais aparecem na estrutura
composicional das Quatro Estações Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c,
1998d). A primeira técnica estendida é o látigo, esta consiste em realizar um glissando
descendente de uma maneira rápida e com golpe curto de arco descendente em uma
determinada nota na corda Mi do violino.
Figura 5 - Representação do perro em tutti
Fonte: Piazzolla (1998a, p. 6).
O perro (latido) é a segunda variação do glissando aplicada por Suárez Paz. Para
conseguir este efeito, o instrumentista aplica a técnica do látigo, mas a direção do glissando é
ascendente. Esta técnica é utilizada, de forma mais frequente, nos naipes de violoncelo e
contrabaixo. O perro, ao contrário do látigo, tem o ataque do arco realizado de forma mais
24
livre. Na Primavera Portenha (PIAZZOLLA, 1998a), o perro aparece para execução em
todos os naipes do quinteto de cordas. Este efeito, segundo Link (2009), não possui uma
imagem de som clara e sua execução fica a critério do intérprete. Já o látigo possui direção
definida grafada pelo compositor ou arranjador.
Figura 6 - Representação do látigo em tutti
Fonte: Piazzolla (1998a, p. 4).
A OFC absorveu muito bem a ideia dessas duas técnicas estendidas. Os glissandos são
elementos técnicos que atraem a atenção dos jovens instrumentistas de cordas, eles se
divertem com a aplicação destes recursos. Essa liberdade implicou em uma necessidade de
estabelecer, objetivamente, uma forma de execução do látigo e do perro. O efeito sonoro
alcançado teve uma considerável aceitação entre os músicos. No trecho da Primavera
Portenha (PIAZZOLLA, 1998a) é possível aplicar estas técnicas estendidas de forma
simultânea entre os naipes.
Durante o processo de construção da interpretação, encontrou-se dificuldades na
questão de leitura e execução das técnicas estendidas. Recursos não convencionais da rotina
da Orquestra exigem uma abordagem mais cuidadosa, a variedade de ocorrências é numerosa
e acabam por tardar a fluência da Obra. Assim, considera-se o que diz Nunes (2014, p. 24)
quando diz que: “A dificuldade na fluência da leitura de técnicas estendidas se dá devido a
grande quantidade de informações e a rápida mudança de uma técnica para a outra. A
partitura pode ficar com muita informação de texto, dificultando a visualização e a sua
interpretação”.
25
O tempo de trabalho das Quatro Estações Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b,
1998c, 1998d) foi superior a qualquer obra que a OFC já tenha trabalhado. Diante dessa
situação, foi atribuída atenção especial ao controle das técnicas estendidas, trabalhando, cada
trecho, de forma isolada. Trabalhos em naipe foram necessários além da intervenção de
professores específicos em cada instrumento.
3.5 As Quatro Estações Portenhas: ensaios e performance
Foram necessários 26 ensaios gerais e 31 ensaios de naipe para finalizar a preparação
para a primeira performance. A Obra possui 4 movimentos, mas as técnicas estendidas
abordadas são comuns aos 4. A grande dificuldade do processo foi a unificação das técnicas
em cada sessão, o naipe, dos primeiros violinos, sofria, constantemente, com as rápidas
mudanças de posição e ponto de pressão do arco. Os violoncelos (naipe mais jovem da
Orquestra) levaram mais tempo que os demais naipes para absorver as técnicas propostas. O
ponto forte da preparação nasceu na relação que os jovens desenvolveram com o estilo do
tango criado por Piazzolla que, segundo Pimentel (2007, p. 1): “[...] inclui características do
tango, do jazz e da música erudita, uma amálgama de vertentes estéticas constituindo um
paradigma, chamado por ele próprio de Novo Tango”. Esta poética no repertório, logo se
tornaria muito popular na prática de músicos populares e eruditos atraídos por este tango mais
complexo, dotado de revolucionárias concepções timbrísticas, rítmicas e dissonâncias
harmônicas.
A vivacidade que os jovens externam muito contribui para a fluência da Obra.
Fazendo uma rasa comparação do nível técnico da Orquestra antes das Quatro Estações
Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d), pode-se dizer que houve uma visível
evolução técnica do Grupo. Esta reflexão leva, mais uma vez, a abordar a relevância da
prática com técnicas características da música contemporânea para a ampliação das
capacidades técnico-interpretativas dos jovens que frequentam projetos de formação.
A primeira performance das Quatro Estações Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a,
1998b, 1998c, 1998d) foi feita pela OFC em uma turnê internacional na província de Quebec -
CA9. Foram 5 concertos em cidades da província de Quebec - CA (Saint-Onésime-d'Ixworth,
Saint-Gabriel-Lalemant, Saint-Alexandre de Kamouraska, Baie Saint-Paul e a cidade de
9Canadá (CA).
26
Quebec). A turnê aconteceu pela ocasião do Festival Internacional Eurochestries10
. Optou-se
por apresentar 2 dos 4 movimentos da Obra: Verão (PIAZZOLLA, 1998b) e Outono
Portenho (PIAZZOLLA, 1998c). O desempenho do Grupo refletiu o cuidadoso processo de
preparação da Obra, os jovens músicos desempenharam uma performance convincente e
receberam boas críticas do público canadense, especialmente, no concerto realizado na
Universidade de Laval11
. A experiência de apresentar apenas 2 movimentos foi uma estratégia
para o trabalho de amadurecimento da Obra em apresentações públicas, pretendia-se também,
analisar a crítica do público especializado do Festival, público este que contava com a
participação de músicos de 6 países.
A Obra completa foi apresentada 4 meses após a turnê do CA, desta vez, na
oportunidade do Recital de Mestrado do autor deste Trabalho (RECITAL..., 2016), realizado
em 13 de dezembro de 2016, no Auditório Onofre Lopes da Escola de Música da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (EMUFRN). Não houve grandes problemas
nesta interpretação, nesse ponto, a OFC já apresentava amadurecimento da Obra, a prática das
técnicas estendidas era transparecida na fluidez do desempenho do Grupo.
Como já foi dito, escolher uma obra que apresentasse características da prática comum
da OFC foi um fator conciliador entre o antes e depois do trabalho com repertório
contemporâneo. O projeto da Orquestra Funffec de Cordas tem a natureza de formação de
plateias, uma vez que seu domicílio fica em uma região que não apresenta muitos espaços
para o trabalho com cordas friccionadas. O repertório da OFC engloba obras e arranjos de
música popular como também alguns temas de música erudita. As Quatro Estações
Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d) ofereceu uma situação de trabalho
que possibilitou abordar as técnicas estendidas sem fugir da zona de conforto dos jovens
músicos. Esta dinâmica estabeleceu certo conforto considerando a alta demanda de
informações de técnicas estendidas que são apresentadas na partitura, sendo assim, pode-se
dizer que o arranjo trabalhado trata-se de técnicas modernas na estrutura da música popular do
universo do tango.
10
Entidade Europeia, situada na França (FR), que promove festivais internacionais de orquestras de jovens. Já
reuniram mais de 17 mil jovens em 85 festivais realizados em todos os continentes. 11
Centro Universitário localizado na cidade de Quebec - CA.
27
4 O REGENTE COMO MEDIADOR DO PROCESSO: COMPETÊNCIAS E
SABERES À LUZ DO ITINERÁRIO DA PASSAGEM
Elenca-se algumas ideias consideradas pontuais para o desenvolvimento das
competências interpretativas frente ao processo que envolve o trabalho do Itinerário da
Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). São algumas considerações sobre aportes
teóricos e questões que viabilizam a melhor compreensão da proposta subjetiva e técnica.
Considera-se que as dificuldades do trabalho não são exclusivas dos jovens músicos da OFC.
No processo, é necessário a construção de uma base teórica e técnica que auxilie na tomada de
decisões e, em um olhar mais objetivo da Obra, considera-se que a proposta de trabalhar
música contemporânea é algo novo para a prática do autor deste Trabalho. O propósito é
otimizar as ações e assim, abrir caminho para que os músicos da Orquestra possam viver uma
experiência de efetivo aprendizado.
4.1 Atividades de apreciação para a busca do olhar subjetivo
Schafer (c1992) nos convida a realizar um tipo de escuta reflexiva, uma escuta
pensante. Promove debates sobre acústica ambiental, coordenando o projeto sobre World
Soundscape (anos 1970, no CA), onde o fio condutor destes debates parte de sua obra de
referência, o Ouvido Pensante: “Uma escuta pensante e cuidadosa caracteriza-se pela escuta
concentrada, pelo processo de abstração, utilizando-se da comparação na busca de
compreender o que permeia e finaliza o processo” (SCHAFER, c1992, p. 122).
Santos (2015) nos diz que o ouvinte desenvolve sua competência sonológica baseado
em diferentes atitudes culturais. Considerando esse pressuposto, pode-se dizer que a
parcialidade parece ser evidente mesmo que a escuta atenta seja trabalhada com cuidado. O
centro de debate deste tema circunda na ideia de que a compreensão do contexto da obra está
sujeita às experiências que os integrantes da OFC possuem sobre o subjetivismo e a
imaginação. Esses aspectos encontram base nas possibilidades sonoras que a obra nos oferece.
Quais os significados de tais sonoridades e como elas atribuem valores culturais ao modo de
interpretação da obra? Lima; Oliveira (2013)12
discorrem que: “É possível formular que a
interpretação musical se encontre dividida sobre duas tendências subjacentes: a subjetividade
e a objetividade interpretativa, afluindo em caminhos distintos sobre a obra musical”.
12
Documento online não paginado.
28
A partir dessas indagações, foi preciso pensar formas (caminhos) de trazer melhor
entendimento ao subjetivismo da Obra como também a elaboração de modos de leitura e
abordagem técnica. Essa imaginação contextual pode ser a chave para agregar valores a uma
interpretação específica, uma leitura que possa ser inovadora, subsidiada pelos valores
culturais dos sujeitos do processo, pois como diz Presgrave (2016, p. 72):
Às vezes acertamos sobre qual foi a ideia germinal da peça, por vezes
erramos, mas precisamos ter um imaginário sobre o que estamos tocando, e
como a música contemporânea nos proporciona inúmeras possibilidades,
nossa fantasia pode mudar constantemente, podemos mudas [sic] as
histórias... mas tem de haver alguma história.
Para dar ênfase a essa postura imaginativa, buscou-se a abstenção da escuta por
referências (intervalos, escalas, modos e ritmos regulares) na tentativa de quebrar hábitos
construídos na experiência musical comum da prática da Orquestra. Mas, isso não significa
limitar o modo de escuta e compreensão de modelos, mas sim considerar a multiplicidade da
escuta sujeita a transformações que integra os níveis de percepção dos sons ou das
possibilidades sonoras.
Para avivar o processo da abstração, por exemplo, optou-se por desenvolver uma
atividade de apreciação onde os integrantes da Orquestra pudessem ambientar o que seria uma
Procissão de Sexta-feira Santa. A abordagem se mostrou pertinente, uma vez que alguns dos
músicos não possuíam a prática comum em participar de atos religiosos com semelhança à
proposta do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). Munidos de velas,
véus, matracas, arrastando os pés, pronunciando murmúrios e ao som do canto de Verônica
(protagonizado por uma integrante da OFC), os integrantes da OFC realizaram, em um
pequeno percurso, uma série de sonoridades (mais especificamente, a sessão A da partitura)
inerentes ao ambiente sonoro proposto por Ferraz (2008) no Itinerário da Passagem:
Verônica Nadir (OLIVEIRA, 2018). A intenção aqui não é de reproduzir, fielmente, a
proposta de Ferraz (2008), mas, principalmente, entender como os jovens músicos pensam
esse ambiente sonoro e como essa experiência pode influir no processo interpretativo. Neste
ponto, o objetivo deste Trabalho é atingir um nível de concepção que busque “[...] saber de
onde veio a ideia ou a inspiração para a composição” e assim poder “[...] solucionar os
problemas técnicos de formas diferentes do que as proporcionadas pela racionalidade técnica”
(PRESGRAVE, 2016, p. 59).
O subjetivismo e a ambientação sonora do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir
(FERRAZ, 2008) também remetem a realidades religiosas de outros contextos. Apesar de a
29
Obra se ambientar na região do Rio das Mortes - MG13
e trazer o canto característico das
Carpideiras14
, as procissões de Semana Santa na cidade de Luís Gomes - RN também
carregam sua gama de simbolismos. Estes códigos, tão particulares aos ritos religiosos,
presentes na cultura local possibilita trabalhar uma reescritura do Itinerário da Passagem:
Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). Sobre esta prática, Taffarello (2016)15
diz que:
O ato de reescrever uma obra a partir de outra pré-existente é uma prática
recorrente não só na área da composição musical, mas constitui também uma
atividade bastante comum a todo processo de criação. E quando se busca
falar sobre o processo de reescritura em relação a algum autor específico, o
foco recai mais nos pormenores de como uma determinada obra foi
modificada, e quais as técnicas que o autor utilizou para recontextualizar
aquela fonte de referência.
Tafarello (2016) apresenta o conceito de utilização de reescritura como exercício
para composição. Buscou-se a adaptação no contexto deste Trabalho com vistas à abordagem
prática da interpretação. A concepção dos jovens, inerente às possibilidades sonoras que
ambientam uma Procissão de Sexta-feira Santa, é o que se pode considerar como
possibilidades para uma construção sonora de maneira ligeiramente particular, ou até mesmo
a inclusão de novas formas de tocar em um determinado trecho. Essas experiências
agregadas estão, diretamente, ligadas ao processo performático, ou seja, ao que eles entendem
sobre a obra escrita e de como eles imaginam esse ambiente sonoro que, aliado a abordagem
técnica, influi no resultado final. De acordo com Presgrave (2016, p. 73):
Entrar no jogo de descoberta dos impulsos criativos dos compositores atuais
é um grande exercício para os intérpretes. Isso nos deixa mais conectados às
obras, faz-nos criar nossas próprias versões e nos conecta com o público
também, influencia-nos na forma de tocar qualquer tipo de repertório.
Apesar das dificuldades técnicas de leitura e da abordagem e execução das técnicas
estendidas, a concepção da ambientação se coloca como um momento fundamental para a
finalização do processo interpretativo.
As dificuldades da leitura técnica são identificadas e, a partir disso, elaborou-se planos
e estratégias para sanar problemas de interpretação. Nessa perspectiva, conseguiu-se elucidar
questões de ordem técnica, aplicando modos de execução que possam representar as ideias
13
Minas Gerais (MG). 14
Carpideiras são figuras que praticam o canto fúnebre. Com cânticos piedosos, o intuito é velar os mortos com
seus lamentos. 15
Documento online não paginado.
30
básicas do texto musical. Neste ponto, colocou-se a importância principal na percepção da
subjetividade da Obra considerando que “O entendimento e a reflexão sobre os aspectos
subjetivos nos levam a determinadas escolhas técnicas e muitas vezes esse caminho é o
preferido pelos compositores para explicar as soluções para as passagens” (PRESGRAVE,
2016, p. 60).
A atenção e busca da subjetividade da obra em detrimento da abordagem técnica, ou
ação contrária, é tema recorrente na literatura que trata desses aspectos na interpretação da
música contemporânea. Presgrave (2016) afirma que estamos em processo constante de
escolhas que podem influir em diferentes modos de escuta por parte dos nossos ouvintes.
Desta forma, “[...] podemos nos concentrar em aspectos técnicos ou em abstrações, qual
dessas escolhas gera uma interpretação mais convincente?” (PRESGRAVE, 2016, p. 59).
Segue refletindo sobre a dificuldade de estabelecer um critério, já que “[...] uma preparação
mais concentrada na técnica não gera necessariamente uma performance mais precisa, assim
como uma interpretação mais concentrada em abstrações não leva necessariamente a uma
execução mais convincente” (PRESGRAVE, 2016, p. 59).
Essa problemática também encontra espaço nas palavras de Domenici (2012) que
chama atenção para a ausência de posturas e posicionamentos de comunicação das
informações presentes no texto, onde tudo é absoluto e invariável, pois “A ética modernista
do controle absoluto da performance trouxe consigo a renúncia à oralidade e à comunicação.
Pagamos um preço muito alto pela autonomia da música ao subsidiá-la na crença, no poder
universal e totalizante do texto” (DOMENICI, 2012, p. 170).
4.2 Compreensão musical e performance
Ferraz (2012 apud TAFFARELLO, 2016) discorre que um dos desafios pontuais na
estruturação do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008) foi a de conciliar
a técnica instrumental mais avançada do solista com uma escrita musical mais acessível aos
músicos da Orquestra de São Brás do Suaçuí - MG, formada, basicamente, por instrumentistas
de cordas iniciantes ou com um nível intermediário de desenvolvimento da técnica
instrumental. Com base nessa citação, reforça-se o argumento no que compete à dificuldade
técnica do processo. A Orquestra Funffec de Cordas mescla esses 2 níveis de
desenvolvimento técnico: iniciantes e intermediários. Tal como foi a escolha das Quatro
Estações Portenhas de Piazzolla (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d) - obra tonal,
de rítmica regular – que buscava apresentar a possibilidade de novas sonoridades a partir de
31
uma escrita que não impactasse, de forma abrupta, na prática da orquestra. A escolha do
Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008) também buscou seguir esse
critério de adaptação técnica ao contexto deste estudo. Como as técnicas estendidas são os
objetos deste estudo, não se encontrou grandes dificuldades em desenvolver uma técnica de
preparação. O principal desafio deste Trabalho foi, justamente, de aplicar essas técnicas no
contexto interpretativo. A partir desse ponto, e reforçando a importância do domínio subjetivo
da Obra, lançou-se um olhar sobre a ideia de compreensão musical e performance. Sobre essa
ideia, França (2000, p. 52, grifo do autor) pontua que:
Podemos delinear tanto o fazer musical quanto o desenvolvimento musical,
como ocorrendo em duas dimensões complementares: a compreensão
musical e a técnica. Consideramos a compreensão como o entendimento do
significado expressivo e estrutural do discurso musical. As modalidades
centrais de comportamento musical – composição, apreciação e performance
– são, portanto, indicadores relevantes da compreensão musical, as „janelas‟
através das quais esta pode ser investigada. A técnica, por sua vez, refere-se
à competência funcional para se realizar atividades musicais específicas,
como desenvolver um motivo melódico na composição, produzir um
crescendo na performance, ou identificar um contraponto de vozes na
apreciação. Independentemente do grau de complexidade, à técnica
chamamos toda uma gama de habilidades e procedimentos práticos através
dos quais a concepção musical pode ser realizada, demonstrada e avaliada.
França (2000, p. 53) argumenta que: “[...] a compreensão é uma dimensão conceitual
que permeia todo fazer musical [...]” e sugere que pode ser “[...] possível identificar um nível
consistente de compreensão através das modalidades de composição, apreciação e
performance”. França (2000) nomeou esse processo de simetria objetivando descobrir se
existe a possibilidade de que a compreensão musical se desenvolva de forma simétrica
(consistente) entre compreensão e performance. No contexto deste estudo, buscou-se, com
grande cuidado, desenvolver um processo onde a compreensão estética dá subsídios a ideia de
intepretação. Por seguinte, buscou-se vencer a dificuldade de aplicar a devida técnica no
processo de interpretação, considerando o nível técnico elementar de alguns integrantes da
Orquestra. Devido a ideia de Ferraz (2008), em estruturar uma escrita acessível aos
instrumentistas de nível básico (iniciante), ao fim, deduziu-se que se conseguiu desenvolver a
simetria entre compreensão e técnica, ou seja, os jovens músicos atingiram um nível
satisfatório de compreensão musical do processo e obtiveram êxito no trabalho da técnica.
Sobre este ponto, França (2000, p. 59, grifo do autor) aponta que:
32
Só é possível a um indivíduo tomar decisões expressivas dentro de uma
gama de exigências técnicas que ele possa controlar. Como é possível, por
exemplo, produzir um rallentando expressivo se não se consegue tocar a
tempo? Certamente o repertório deve oferecer desafios para que os alunos se
desenvolvam tecnicamente. Mas é preciso que, paralelamente, haja
oportunidade para tocar peças mais acessíveis, que possam realizar mais
confortavelmente, com expressão, toques imaginativos e com um senso de
estilo, tomando decisões expressivas sobre um material que podem controlar.
É essencial encontrarmos um equilíbrio entre o desenvolvimento da
compreensão musical e da técnica, pois somente quando um indivíduo toca
aquilo que pode realizar confortavelmente é que podemos avaliar
efetivamente a extensão de sua compreensão musical.
Buscou-se, nesse processo, não se concentrar, exclusivamente, na performance.
Objetivou-se propiciar variadas experiências musicais (atividades de apreciação, encenação e
exercícios) no intuito de validar a compreensão musical como elemento primordial para o
desenvolvimento do processo interpretativo. Estes elementos aparecem em conformidade com
a ferramenta metodológica, aqui utilizada, da pesquisa ação como proposição de ações para a
resolução de problemas advindos da prática os quais aparecem descritos, de acordo com as
dificuldades encontradas, no corpo do texto.
4.3 Figuras de retórica
O Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008) apresenta um discurso
que valoriza o idiomatismo de um evento religioso, as sonoridades provenientes do ritual
católico exigem que os motivos composicionais não sejam, absolutamente, meios que estejam
presos ao formalismo da notação tradicional e muito menos no que compete à abordagem
técnica da orquestra, ou seja, a forma de tocar ocorre no que seria incomum em possíveis
interpretações. Sobre pontuar figuras de retórica no aspecto interpretativo do Itinerário da
Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), respaldou-se as ações de acordo com a ideia
de Silva; Ferraz (2015, p. 157):
As figuras retórico-musicais representavam a totalidade desses elementos
por abrangerem o sensível, o estrutural e o semântico; todavia, o fetichismo
do aspecto gestual teve em tanto enfatizado seu atributo simbólico, que por
oposição foi formalizado a ponto de se bastar em uma figura, o que na
acepção tripartite classifica melhor aquela primeira ideia de motivo, ainda
que também não tenha conseguido atingir tal autonomia.
O entendimento das figuras de retórico-musicais presentes na estrutura da obra
subsidia o trabalho do regente e cria bases conceituais sólidas para a atuação dos jovens
33
instrumentistas. Uma vez munidos dos conceitos e representações, a Orquestra atribui maior
valor e sentido à interpretação, isso facilita a aplicação das técnicas estendidas em um
contexto artístico. A apreciação, neste Trabalho, comprova a eficiência quanto ao
entendimento dos motivos musicais e da ambientação sonora durante o processo. É de
extrema importância se ater das variações morfológicas e gestuais que a partitura demanda
para assim, finalizar um processo interpretativo mais convincente. Oliveira (2002) coloca a
importância dos estudos das figuras de retórica a fim de reforçar, musicalmente, a ideia do
texto, pontuando que essa estrutura está associada a uma “[...] busca de relações simbólicas no
uso de recursos intervalares, de desenhos melódicos, de textura musical e de palheta
timbrística” (OLIVEIRA, 2002, p. 47).
No Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), notou-se diversos
motivos que justificam abordar o tema das figuras de retórica como recurso interpretativo. A
ambientação sonora da Obra, as escolhas e os timbres representam como o discurso das
secções são representadas e reforçadas pelos instrumentos da Orquestra. O primeiro exemplo
deste Trabalho é o uso das matracas (já indicadas na partitura), os instrumentos que compõem
os 6 naipes além de manusear as matracas (indicação da partitura) também reforçam essa
sonoridade aqui representada pelo tremolo na punta d’arco, em grande intensidade (f, ff e fff).
Figura 7 - Exemplo de figuras retórico-musicais
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
Com a elucidação desse conceito, a aplicação da técnica reforçou o aparato
interpretativo, reforçando o direcionamento do som e deixando os jovens instrumentistas da
OFC em posição de uma reflexão mais aprofundada do conceito sonoro.
Outro exemplo de fruição do discurso musical pela abordagem técnica são os
lamentos das carpideiras. A representação dessas figuras só é possível quando se domina o
entendimento de sua função frente à proposta interpretativa. Aqui, o objeto sonoro pode variar
dependendo da concepção do intérprete, como se trata de um lamento característico da cena
que se desenvolve, pediu-se aos violinistas que representassem, no instrumento, a própria
34
ideia de lamento. Isso pode ser ilustrado no seguinte trecho do Itinerário da Passagem:
Verônica Nadir (FERRAZ, 2008):
Figura 8 - Reforço retórico dos lamentos
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
Os murmúrios estão presentes como figuras de retórica por estes reforçarem a ideia do
texto musical, principalmente, nas secções H e J, são murmúrios representados por uma
escrita flutuante, desprovidos de coerência métrica.
Figura 9 - Lamentos representados por glissandos retos
Fonte: Ferraz (2008, p. 6).
As figuras retórico-musicais, aqui exemplificadas, remetem o conceito de abordagem
defendido por Silva; Ferraz (2015, p. 155) onde as figuras retóricas “[...] se relacionam às
transformações semânticas que o dispositivo causa no discurso”, essa ideia evidencia o tipo de
abordagem feita no processo deste Trabalho assim como a apoderação do discurso para dar
representatividade à ideia do texto.
35
4.4 O tempo liso e as dificuldades da construção do gesto
As dificuldades técnicas que encontradas no tratamento interpretativo está associado,
entre outros pontos, a abordagem técnica e subjetiva da partitura. Os longos pedais rítmicos e
harmônicos estão associados à concepção do tempo liso, recurso característico amplamente
debatido por Boulez (1992). Estes recursos finalizam em uma complexa abordagem da
partitura uma vez que requerem uma reflexão profunda do aspecto interpretativo no tocante a
subjetividade e seu efetivo entendimento. Sobre o tempo liso e estriado como modelo
musical, Deleuze; Guattari (1997, p. 161) dizem que:
Foi Pierre Boulez quem primeiro desenvolveu um conjunto de oposições
simples e de diferenças complexas, mas também de correlações recíprocas
não simétricas, entre espaço liso e espaço estriado. Criou esses conceitos e
esses termos no campo musical, e os definiu justamente em diversos níveis,
a fim de dar conta ao mesmo tempo da distinção abstrata e das misturas
concretas. No nível mais simples, Boulez diz que num espaço-tempo liso
ocupa-se sem contar, ao passo que num espaço-tempo estriado conta-se a
fim de ocupar. Desse modo, ele torna sensível ou perceptível a diferença
entre multiplicidades não métricas e multiplicidades métricas, entre espaços
direcionais e espaços dimensionais. Torna-os sonoros e musicais. Sua obra
pessoal sem dúvida é feita com essas relações criadas, recriadas
musicalmente.
Segundo Boulez (2002, p. 93), no tempo liso “o controle escapa”. Este controle, ou a
perda dele, está ligado a uma das características centrais desse modo composicional que é a
falta de referência do tempo marcado por padrões rítmicos tradicionais. Segundo Santos
(2015, p. 114): “Espaços lisos não podem ser classificados senão de uma maneira mais geral,
pela distribuição estatística das frequências. Distribuição relativamente igual gera espaço não
dirigido. O espaço dirigido, por sua vez, pode ter um ou mais pseudofocos”.
Para a prática no contexto deste estudo, a abordagem desse estilo composicional causa
grande dificuldade uma vez que as referências rítmicas tradicionais não estão postas, cabendo,
ao fluxo da leitura, outras formas de ver a Obra como também a necessidade de estabelecer
referências. Neste caso, há uma preocupação em direcionar a abordagem da Obra sem que se
perca a essência interpretativa que é baseada em tempo liso, as contagens e marcações visuais
são recursos que podem influir em uma descaracterização do tempo liso e assim, acabar
criando o que seria o tempo estriado (tempo estruturado em referências claras de ritmo e
marcação). Com isso, Deleuze; Guattari (1997, p. 184) dizem que: “Um espaço liso
fortemente dirigido tenderá a se confundir com um espaço estriado e um espaço estriado, em
36
que a distribuição estatística das alturas utilizadas de fato se dá por igual, tenderá a se
confundir com um espaço liso.”
Deleuze; Guattari (1997, p. 184) ainda reforçam que no “[...] espaço liso, os pontos
estão subordinados aos trajetos, pois é o trajeto que provoca a parada. Mudanças de direção
decorrem da natureza do percurso ou da variabilidade do alvo ou do ponto a ser atingido.”
O que se pretende colocar é que ambos os tempos (liso e estriado) não se apresentam
como formas isoladas, ou seja, os 2 parecem dialogar, em uma espécie de estriamento dos
espaços lisos que não buscam descaracterizar o tempo, mas na tentativa de atribuir conceitos
para uma interpretação mais convincente no que pensam os jovens músicos desta Pesquisa.
Com isso, Boulez (2002, p. 94) argumenta a dialógica dos tempos liso e estriado: “No tempo
liso, ocupa-se o tempo sem contá-lo. No estriado, conta-se o espaço-tempo, para ocupá-lo. No
tempo liso, há multiplicidades não métricas; no estriado, há multiplicidades métricas. Mas
tempo liso e tempo estriado são categorias suscetíveis de interação recíproca”.
Desta forma, no processo de leitura da Obra, se fez necessário estabelecer pontos onde
o tempo estriado domina o cenário. É difícil desconsiderar o peso da atração gravitacional dos
pizzicatos Bartók anotados para os violoncelos e contrabaixos entre os compassos 38 e 44,
como também a entrada das matracas na abertura da sessão A (compassos 17, 19, 20 e 21),
abertura da sessão D (compasso 34) e na sessão M (compassos 99 a 100). Estas sonoridades,
quase sempre, estão escritas em tempo forte da métrica medida (tempo estriado). No que
compete ao ato do gesto regencial, é de grande necessidade a aplicação do gesto de entrada da
segunda metade do primeiro tempo do compasso 38 e a sequência de entradas para os
pizzicatos Bartók que seguem até a abertura da sessão E.
Figura 10 - Escrita do pizzicato Bartók
Fonte: Ferraz (2008, p. 3).
37
Estes 2 aspectos sonoros exigem a presença rígida de marcação estriada, tais
sonoridades estão anotadas em ff e fff. Essas dinâmicas são escritas em tempos fortes, o que
demanda a aplicação de um gesto mais preciso e necessário para uma entrada concisa e
segura.
Sobre o andamento (lento com semínima a 52), optou-se por aumentar, um pouco, a
velocidade praticando um adágio com semínima a 65. Esta escolha se dá ao fato de que as
mudanças de velocidade estão sujeitas a ideia de simetria rítmica, a saber, de Boulez (1992, p.
88):
O tempo pulsado, isolado, é suscetível de ser modificado pela velocidade ou
aceleração: a referenciação regular ou irregular sobre a qual se funda, é
função, com efeito, de um tempo cronométrico e do número de pulsações
será o índice de velocidade. O tempo amorfo será somente mais ou menos
denso segundo o número estatístico de acontecimentos que acontecerão
durante o tempo global cronométrico; a relação desta densidade com o
tempo amorfo será o índice de ocupação.
O que se pontuou foi a situação de que, no tempo liso, o impacto vem da mudança de
acontecimentos e não a distribuição organizada e pulsada de mudanças de frases musicais,
períodos e sessões. No processo do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ,
2008), buscou-se mais valorizar essas mudanças de caráter, como as figuras de retórica
aparecem no desenvolvimento do texto e como a aplicabilidade das técnicas estendidas
podem ocorrer na efetivação dos timbres que ambientam a Obra.
Considerou-se, a início, uma abordagem estriada da Obra, a leitura técnica da partitura
se mostrou desafiadora para uma abordagem pura do tempo liso. O ato regencial se deu com a
contagem verbal das unidades de tempo como também as anotações destas marcações nas
partituras das estantes.
Para melhor referenciar as mudanças de caráter e variações de timbre, sonoridades e
efeitos, foram realizadas tanto na partitura do autor deste Trabalho quanto nas partituras dos
músicos, uma série de marcações para estabelecer pontos de controle.
38
Figura 11 - Esquema de cores e marcações para estabelecer referências
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
39
Para este Trabalho, apropriou-se do exemplo de Martino (1966 apud SILVA;
AQUINO; PRESGRAVE, 2012), notadamente, a obra Parisonatina al’dodecafonìa:
violoncelo solo dedicada ao violoncelista potiguar Aldo Parisot. Nesta, Martino (1966 apud
SILVA; AQUINO; PRESGRAVE, 2012, p. 17): “[...] cria um sistema de cores para a
identificação visual das diversas formas de tocar.” Na ideia de referências estabelecidas pelo
autor deste Trabalho (FIGURA 11) apresenta-se cores para os variados gestos da partitura:
AMARELO para as mudanças de arco; LARANJA para os trêmulos; VERDE para as
entradas; VERMELHO ESCURO para indicar o compasso anterior à mudança de sessão
(letra); MARROM para as contagens estriadas (apenas no naipe onde está escrito); AZUL
para as intensidades p, pp e ppp; VERMELHO para as intensidades mf, f, ff e fff; ROSA para
os glissandos retos e PRETO para mudanças de caráter.
Optou-se por flexibilizar a leitura ocultando algumas técnicas que foram isoladas de
acordo com a proposta, de abordagem pedagógica, estabelecida pelo autor deste Trabalho.
Com o avanço da leitura das sessões, optou-se por ir diminuindo, gradativamente, o tamanho
do gesto a fim de progredir de tempo estriado à tempo liso. Nessa prática, a abordagem
gestual assumiu um plano mais horizontal procurando diminuir a marcação do tempo liso até
o desaparecimento desta marcação. Esse controle do tempo liso busca evidenciar, a partir da
concepção dos jovens instrumentistas, que a mudança demandada, a partir deste ponto, não
obedece, rigorosamente, à leitura da métrica, mas sim, a leitura de timbres e as mudanças das
paisagens sonoras. Esta ideia é de grande importância para que se pense que o entendimento
da Obra, nesse sentido, sirva para um aprofundamento artístico dos instrumentistas da
Orquestra quanto à compreensão da subjetividade da Obra.
Aqui, o papel do autor deste Trabalho enquanto regente, está mais sujeito a um
interlocutor que anuncia as mudanças de uma série de acontecimentos frutos do discurso do
objeto composicional, que a de um regente que orienta as mudanças de frases, períodos e
seções apoiados na métrica e na ideia da modulação harmônica.
Como o discurso musical do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ,
2008), construído no contexto deste Trabalho, compreende as ideias e concepções dos jovens
músicos. Trabalhou-se, aqui, na construção de uma ideia interpretativa a partir do pensamento
coletivo por acreditar que o conhecimento sobre “Os significados em interação no contexto
performático é produzido no campo das experiências, que reúnem as dimensões sensíveis e
simbólicas” (RIBEIRO, 2017, p. 4) sobre o objeto a ser interpretado. Desta forma, construiu-
se uma interpretação concebendo o modes de jeus (formas de tocar) através de toda proposta
estrutural que lança uma proposição técnica e subjetiva da Obra. A partir desse ponto,
40
compreende-se o processo a partir da ideia de mediação simbólica e social (RIBEIRO, 2017).
Aqui, entende-se que os significados informam as interpretações dos sujeitos sobre o processo
interativo; e as experiências informam como esse processo foi corporal e mentalmente
construído, destacando-se como forma de elaboração de um conhecimento específico sobre a
performance.
41
5 TÉCNICAS ESTENDIDAS NO ITINERÁRIO DA PASSAGEM: VERÔNICA NADIR
As Quatro Estações Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d) foi uma
Obra que apresentava rítmica em tempo regular e estrutura tonal. As técnicas estendidas
presentes na estrutura da Obra serviram para introduzir os jovens músicos da OFC no campo
das experimentações de timbres e de inúmeras possibilidades sonoras sem que eles
abandonassem, a princípio, seus conhecimentos, previamente, adquiridos:
Para se passar para uma fase mais aprofundada da pesquisa de interpretação
o músico pode partir à procura de sonoridades conhecidas, que estejam
previamente associadas a outros compositores ou estilos. „Pistas‟ como tipos
de textura, harmonia, desenvolvimento melódico e rítmico, fraseado e
articulações, chamarão a atenção do músico levando-o a associações com
outros compositores ou estilos, que já, como mencionamos anteriormente,
tenham seus procedimentos padrão definidos (TOKESHI; BORGHOFF;
SILVA, 2001, v. 1, p. 10).
Agora, para o aprofundamento da proposta deste Trabalho, será trabalhado o
Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). Escrita pelo compositor e
professor paulistano Sílvio Ferraz (1957-), esta Obra busca transmitir as sonoridades advindas
de uma Procissão de Sexta-feira Santa:
Em sua concepção, a peça trabalha a reescritura de sonoridades provenientes
de uma Procissão de Semana Santa, com seus cantos, motetos, sinos de
igrejas, toques de matracas, arrastar de pés, vozes murmurantes. Para essa
peça especificamente, o compositor é movido pela Procissão do Enterro
ocorrida na Sexta-feira Santa da cidade de Prados - MG, no ano de 1978,
quando o Canto de Verônica foi realizado por Nadir Ladeira. A junção
desses dois nomes femininos gerou o subtítulo da peça, Verônica Nadir.
(FERRAZ, 2008 apud TAFFARELLO, 2016, p. 303, grifo do autor).
Na primeira etapa deste Trabalho foi realizada a leitura à primeira vista da Obra, a
partitura foi entregue e fora solicitado aos músicos da OFC que fizessem a leitura e, depois,
externassem suas dúvidas e impressões. Mesmo anteriormente havendo uma experiência com
técnicas estendidas, aqui, a subjetividade da Obra requer um maior aprofundamento sobre a
estética da música contemporânea.
O processo, aqui, caminhou mais lento, os ensaios não permitiram passagens longas.
Pequenas sessões foram trabalhadas e muitos problemas apareceram, sendo preciso
interromper o ensaio para resolver problemas em naipes. Outro problema evidente é a questão
das arcadas, a Obra apresenta grandes pedais e o uso recorrente de trêmulos,
42
simultaneamente, acontecem variadas abordagens de técnicas estendidas que são inéditas à
prática da OFC.
No decorrer deste processo, não se teve contato direto com o compositor e/ou
arranjador (tanto na fase de estudo da Peça quanto no momento da performance). Buscou-se
abrir espaço para uma abordagem majoritária da criatividade onde se dá espaço para
reescrituras16
ou até mesmo recriar a composição. Essa liberdade criativa é a razão que
justifica as reflexões aqui aventadas e como estas serão úteis aos regentes que tenham
interesse nesse tema, possibilitando abordagens interpretativas àqueles dedicados à
performance da música contemporânea. Compactuando com esta ideia, Laboissière (2007, p.
15) coloca o dilema sobre interpretação musical: "[...] a interpretação é uma „cópia‟ ou
recriação?". Desta forma, Laboissière (2007, p. 15) busca comprovar que: "[...] a interpretação
musical, ao envolver elementos que transcendem a leitura da partitura, resulta em criação,
cuja a origem é o processo significativo do texto". Laboissière (2007, p. 16) ainda defende
que:
O conceito de interpretação musical como atividade recriadora, na medida
em que a música - arte de produção, performance e recepção individuais, arte
subordinada a diferentes fatores sociais, ideológicos estéticos, históricos e
outros - caracteriza-se pela impossibilidade de reconstruir sua origem
legítima, ou seja, qualquer outra imagem de estabilidade.
Para o próximo passo, foi feita a análise e catalogação das técnicas estendidas
presentes no Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), segundo os
critérios analíticos explicados e praticados na abordagem das Quatro Estações Portenhas de
Piazzolla (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d) no capítulo 4. Além de indicar quais
técnicas estão presentes bem como quais possibilidades sonoras que elas indicam, serão
sugeridos meios interpretativos que possam evocar sonoridades características da ambientação
que se busca na finalização deste processo interpretativo. De acordo com as colocações
expostas neste Trabalho, no tocante à participação coletiva na construção de sonoridades, o
foco estará centrado na dinâmica de experimentações e escolhas sobre o que será mais
pertinente, dentro das possibilidades técnicas da OFC, quanto à interpretação da Obra. 16
De modo geral, pode-se dizer que a reescritura corresponderia a uma estratégia composicional com forte
tendência à experimentação do novo, ao encontro com o inusitado e o imprevisível, mas motivado e
impulsionado por uma série de referências passadas musicais e não musicais; sonoras e não sonoras.
Reescritura, dessa forma, não é entendida apenas em um sentido mais comum, a de refazer uma música
existente com um novo formato, uma re-composição ou mesmo um arranjo musical. A ideia proposta por
Ferraz (2008), enquanto fórmula composicional, está também relacionada a esta noção comum, mas vai além
disso, buscando a “retomada de uma determinada situação de escuta”, forjando uma espécie de “campo de
invenção de imagens sonoras” (TAFARELLO, 2016, p. 6).
43
As principais técnicas estendidas encontradas no Itinerário da Passagem: Verônica
Nadir (FERRAZ, 2008):
[...] são os harmônicos naturais e artificiais, molto ponticello, ponticello,
ordinario, sul tasto, transformações gradativas entre eles e punta d’arco,
detalhes de pressão do arco sobre a corda, variando entre com muita
pressão, pressão normal e aspirato; uso de cordas duplas; uso de arpejos
com 3 ou 4 cordas; trêmulos de arco, muitas vezes, em imitação à sonoridade
das matracas; arcadas em tutto l’arco, nas quais o instrumentista deve usar
toda a extensão do arco de maneira bastante rápida, indo da ponta ao talão e
provocando um efeito de crescendo rápido; pizzicatos Bartók, nos quais o
instrumentista puxa com força a corda a ponto de, na volta, ela colidir com o
espelho do instrumento, soando um som percussivo e seco; e glissandos que
representam os lamentos na paisagem sonora das procissões de Sexta-feira
Santa (TAFFARELLO, 2016, p. 8).
Apenas o violoncelo solista faz uso das técnicas de cordas duplas e arpejos de 3 a 4
cordas.
A escrita da parte da Orquestra foi direcionada para instrumentistas que não possuíam
muita experiência com as técnicas estendidas em um aspecto geral. Com isso, as mudanças
das sonoridades acontecem de forma gradual, esse pensamento estrutural oferece boas
condições de leitura e devida execução. A Obra apresenta uma forma de desenvolvimento da
ideia musical onde, a princípio, apresenta uma série de variações do que seria o Canto de
Verônica, mas, isso é feito de forma fragmentada onde o material do canto, propriamente e
musicalmente, aparece apenas no final da Obra. Presgrave, durante entrevista concedida ao
autor deste Trabalho, afirma que: “Podemos dizer que se trata de um tema com variações ao
contrário” (informação verbal)17
.
Embora se proponha a abordagem da Obra em um processo dinâmico e participativo,
respeitaram-se as anotações de dinâmica, articulação, timbre e andamento feitas pelo
compositor. O ponto deste Trabalho é a apresentação de situações e escolhas que, de certa
forma, possam surgir contrárias a alguma anotação original, estas poderiam ser justificáveis e
fundamentadas nas decisões tomadas durante o processo. Como está se tratando das
possibilidades de um procedimento que possa ser adotado como critério para uma
interpretação, a intenção deste Trabalho é a soma dos elementos de uma interpretação
particular haja vista a realidade sonora das procissões de Semana Santa em outros lugares que
são, em boa parte, diferentes considerando o material que serviu de base para a construção
original do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). Dessa forma,
17
Informação verbal proferida por Fábio Presgrave – professor de violoncelo da EMUFRN – durante entrevista
concedida ao autor deste Trabalho, na EMUFRN, em Natal – RN, em dezembro de 2017.
44
preferiu-se observar a utilização desse procedimento de escolhas como um suporte à partitura
adicionando informações extras, sem negar as informações do texto original.
Adotou-se procedimentos e soluções que buscam, na forma de exercícios, a resolução
de problemas que, até então, representarão gastos de tempo e energia na leitura. Desta forma,
objetivou-se estabelecer o desenvolvimento dos recursos técnicos apoiados na concepção de
Silva; Aquino; Presgrave (2012, p. 17) que propõem o isolamento dos elementos técnicos,
“[...] como um gesto, a fim de que se estabeleça a memória física de cada um”. Com esse
pressuposto, busca-se uma forma objetiva de agilizar o aprendizado.
A luz deste processo, considera-se que estas proposições pedagógicas são elaboradas
para a resolução de problemas e dificuldades específicas à dinâmica do contexto deste
Trabalho visto que as propostas, aqui sugeridas, buscam nortear atitudes sempre considerando
as estruturas físicas e mentais dos integrantes da OFC. Portanto, considera-se as inúmeras
possibilidades técnico-interpretativas que a abordagem dessa mesma Obra possa representar
e/ou finalizar a partir do trabalho de outros intérpretes.
As técnicas estendidas presentes na partitura representam, na questão técnica, atenção
cuidadosa na execução e/ou interpretação. Porém, vale reforçar que os recursos das técnicas
estendidas, antes explorados na proposta inicial das Quatro Estações Portenhas
(PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d), agora encontram melhor fluidez em um grupo
mais amadurecido tecnicamente. Porém, na abordagem específica do Itinerário da
Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), a OFC, agora, conta com a presença de 22
novos instrumentistas de nível iniciante.
Para ilustrar, de forma precisa, a abordagem das técnicas estendidas no Itinerário da
Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), seguem tópicos das técnicas estendidas
catalogadas, suas representações e elucidações práticas dento da dinâmica deste Trabalho.
5.1 Harmônicos naturais
Som harmônico produzido a partir de uma corda solta. Os harmônicos naturais são
classificados pela ordem em que os parciais aparecem na série harmônica, isto é, 2º
harmônico natural, 3º harmônico natural, 4º harmônico natural, e assim por diante
(CARDOSO, 2000).
45
Figura 12 - Exemplo de harmônicos naturais na secção de violoncelos e baixos
Fonte: Ferraz (2008, p. 3).
Sobre a abordagem técnica pela OFC, esses 2 tipos de harmônicos ainda não haviam
sido trabalhados em repertórios anteriores. Desta forma, foi preciso trabalhar estas abordagens
técnicas pelo recurso do isolamento. O isolamento trata do trabalho da técnica fora do
contexto da obra, o objetivo é o domínio do recurso, para depois aplicá-lo com mais
efetividade e qualidade no contexto da Obra. Uma das dificuldades encontradas, e que estarão
presentes nas demais técnicas estendidas deste Trabalho é, justamente, a qualidade dos
instrumentos musicais (principalmente, violinos e cordas de baixa qualidade). Esta
dificuldade trouxe muita reflexão quanto à abordagem das técnicas sem que haja perda
substancial de qualidade no resultado sonoro.
Realizou-se exercícios de pressão parcial para obter o harmônico natural. Nestes,
optou-se por utilizar a aplicação do 1º dedo para promover a familiarização da técnica. Alguns
dos integrantes da OFC já possuem um nível técnico que possibilita uma rápida absorção
desta técnica, então, depois de algumas orientações, atribuiu-se, a estes, a responsabilidade de
trabalhar como monitores para com os demais integrantes de nível técnico iniciante.
O trabalho foi gradual até o envolvimento dos 4 dedos da mão esquerda. Para reforçar
a absorção desta técnica, aplicou-se a mesma em uma escala simples de Ré Maior partindo da
corda solta (Ré) em todos os instrumentos. Em todos os ensaios, antes de iniciar o estudo
prático da Obra, realizou-se exercícios de sons harmônicos na intenção de mecanizar e
facilitar a absorção da técnica.
5.2 Harmônicos artificiais
Som harmônico produzido a partir de uma corda presa, com pestana artificial. Os
harmônicos artificiais são classificados pelo intervalo musical entre a pestana artificial e a
nota sobre a qual o dedo toca o nodo, isto é, harmônico artificial de 8ª, harmônico artificial de
5ª, harmônico artificial de 4ª, e assim por diante (CARDOSO, 2000).
46
Figura 13 - Exemplo de harmônico artificial na secção das violas
Fonte: Ferraz (2008, p. 3).
O conceito de harmônico artificial foi praticado com menos dificuldade de absorção
técnica, uma vez que o trabalho do harmônico natural já atribuiu um conceito de abordagem
técnica. Aqui, construiu-se exercícios isolados onde a pressão do 1º dedo, colando a corda ao
espelho (pestana artificial) contrasta com a pressão parcial do 2º dedo no grau conjunto ou
intervalo de 4ª justa superior para a produção do harmônico artificial. A principal dificuldade
desta abordagem técnica é, justamente, sua aplicação no Itinerário da Passagem: Verônica
Nadir (FERRAZ, 2008). Os instrumentistas, principalmente aqueles de nível técnico
iniciante, demoram muito a construir uma aplicação técnica do recurso de maneira fluente,
além de terem que atribuir atenção às indicações gestuais feitas pelo regente. Para resolver
esse problema, optou-se por isolar os trechos (às vezes por 2, 3 e 4 compassos, no máximo) na
tentativa de recorrer ao recurso de memorização para que os instrumentistas pudessem dar
maior atenção ao gesto do regente e as devidas ações de entrada (levare), cortes e gestos
específicos que referenciam as mudanças de frase e caráter presentes na partitura.
5.3 Sul tasto, Sul ponticello e Ordinário
Segundo Dourado (2009), ponticello ou sul ponticello são ações de aplicação da
arcada na região da corda que fica próxima ao cavalete. O sul ponticello pode atingir nível
mais intenso com o ataque da arcada posta, o máximo possível, sobre o cavalete, produzindo
sonoridade metálica. Ainda de acordo com Dourado (2009), sul tasto é a aplicação técnica
que orienta a passagem da crina do arco na região sobre o espelho do instrumento de cordas,
esse recurso finaliza em uma sonoridade suave.
47
De acordo com Dourado (2009), ordinário significa o som natural quando se
considera a passagem da crina do arco na região intermediária entre ponticello e tasto. Em
alguns casos, este recurso serve como quebra da instrução anterior indicada por ponticello, sul
ponticello, tasto ou sul tasto. No contexto deste Trabalho, essas indicações acontecem na
intenção de produzir variações de sonoridades decorrentes da variação das arcadas entre o
cavalete e espelho. Na partitura, essas indicações aparecem da seguinte forma:
Figura 14 - Indicação da variação da arcada em ordinário, ponticello e molto ponticello
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
Este exemplo de transição de arco já é proposto na primeira sessão da Obra no naipe
dos violoncelos. Neste caso, o compositor propõe a mudança gradativa entre o ordinário que
evolui até o ponticello, em seguida, há o retorno à posição de ordinário e, no compasso
seguinte, há o ataque súbito de ponticello que vai progredir para molto ponticello. Essa
proposta de variação sonora busca ambientar a ideia composiconal, timbres que, de acordo
com Ferraz (2008 apud TAFFARELLO, 2016, p. 303): “[...] não seguia os padrões do canto
ocidental, mas um canto metálico, cheio de volteios, com mudanças súbitas de timbre, um
grito no meio da rua.”
Na abordagem deste Trabalho, optou-se por isolar essa proposta técnica entendendo
que os instrumentistas da OFC não conseguiam associar a leitura técnica à aplicação no
instrumento, ou seja, a maior dificuldade é o controle preciso do arco diante às mudanças de
articulações e deslocamentos entre sul tasto e sul ponticello. Realizou-se pequenos exercícios
onde, verbalmente, indicou-se as variações entre ponticello, molto ponticello, ordinário, tasto
e sul tasto. Após alguns exercícios, foi proposta a aplicaçao técnica de acordo com as
indicações da partitura. O que se observou, a princípio, foi a discrepância entre as posições do
arco dentro da métrica, ou seja, enquato um realizava a variação de ponticello a tasto, outro
ainda se encontrava na posição inicial do ordinário. Desta forma, existiam duas ideias de
timbre para o mesmo trecho, como o naipe de violoncelos possui 6 instrumentistas, as
sonoridades se apresentavam heterogêneas. Essas alternativas elencadas pelo autor deste
48
Trabalho, partem de dificuldades provenientes do conhecimento e aporte técnico por parte dos
jovens músicos e também da prática comum da OFC, por isso, compartilha-se a ideia de
Tokeshi 2003, p. 52) que considera que: o “[...] desconhecimento de formas mais recentes de
escrita acarreta a criação de dificuldades técnicas que, posteriormente, dificultam a
aproximação à musica contemporanea, sua execução e interpretação.”
5.4 Arcos, Trêmulos e Variações de pressão
A seguir, apresenta-se uma série de abordagens técnicas as quais não serão
apresentadas de forma isolada por se entender que estas apresentam uma conjuntura
trabalhada de forma, praticamente, simultânea. O Itinerário da Passagem: Verônica Nadir
(FERRAZ, 2008) agrupa uma série de sonoridades provenientes de técnicas de arco,
apresentadas, a seguir:
Tremolos e tremolo sul l’harmonic – tremolo executado sobre sons harmônicos
(DOURADO, 2009);
Punta d’arco e punta d’arco murmurando – para ser executado na região perto da
ponta do arco (DOURADO, 2009);
Glissando reto (FERRAZ, 2008 apud VALENTE, 2014);
Variações de pressão do arco:
a) Aspirato – Sem pressão na mão direita e esquerda em molto sul tasto
(informação verbal)18
;
b) Flautato – com flauta, pressão reduzida do arco e muita velocidade, fazendo o
som assemelhar-se a um instrumento de sopro (DOURADO, 2009);
c) Tutto l’arco (todo o arco) – De acordo com o tamanho da figura, aplicar,
dependendo da orientação do ataque, toda a extensão do arco (DOURADO, 1998); e
d) Com maior pressão (more pressure) – Atribui maior pressão onde há a
indicação na partitura (RODRIGUES, 2008).
Para o trabalho de arco na execução dos tremolos utilizou-se a proposição técnica de
Carl Flesh (1873-1944), este indica o manuseio do arco, quase que somente, pelo polegar e o
indicador da mão direita, a variação de pressão se dá pela maior ou menor força no dedo
indicador.
18
Informação verbal proferida por Fábio Presgrave – professor de violoncelo da EMUFRN – durante entrevista
concedida ao autor deste Trabalho, na EMUFRN, em Natal – RN, em dezembro de 2017.
49
O trabalho dos tremolos no Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ,
2008) é a representação das figuras retórico-musicais presentes na proposta interpretativa.
Ferraz (2008) representa 2 direcionamentos: o 1º trata na representação das matracas e o 2º
ambienta os murmúrios e lamentações.
Figura 15 - Escrita do tremulo em ponticello representando a figura retórica do som
da matraca
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
Figura 16 - Escrita dos tremolos representando a figura do lamento em murmúrio
Fonte: Ferraz (2008, p. 6).
A representação das matracas e murmúrios pelo recurso da punta d’arco assume 3
formas de tocar: ordinário à posição de tasto e/ou sul tasto, posição em aspirato (murmúrios
e lamentações) e punta d’arco em região de ponticello e molto ponticello (matracas). Além
dessas abordagens técnicas, tem-se como recurso de ampliação de possibilidades timbrísticas,
o murmúrio e lamentação representados pelo som flautato. Na técnica do flautato não há
rigorosidade quanto à posição do arco, aqui reduziu-se, ao máximo, a pressão do arco, o
deslizando de forma rápida, com isso, finaliza-se uma sonoridade leve que se assemelha a um
instrumento de sopro em dinâmica de pianíssimo.
50
Figura 17 - Flautato sugerido em posição normal de arco
Fonte: Ferraz (2008, p. 2).
Essa proposição de arco flautato pretende criar uma variação de timbre. Nota-se que o
arco vem em posição normal (ordinário) e segue para variação do flautato com tremulo,
provocando uma suave mudança de timbre. É um recurso de confortável execução por parte
dos músicos da OFC, a proposta de tirar o peso do arco decorre da retirada da pressão,
principalmente, do indicador da mão direita.
Figura 18 - Punta d’arco em ordinário representando o murmúrio
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
51
Figura 19 - Posição punta d’arco em aspirato (murmúrio e lamentação)
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
Em determinados pontos da Obra, os tremulos são aplicados em ação simultânea com
os glissandos executados em intervalos de 2ª menor. Pelo fato da Obra possuir estrutura
atonal, a afinação dos glissandos assume resultado sonoro de afinação microtonal, uma vez
que os músicos não conseguem, precisamente, controlar a partida e o repouso da mão
esquerda no início ou final do glissando.
Figura 20 - Representação dos glissandos retos
Fonte: Ferraz (2008, p. 3).
Essa abordagem técnica finaliza na dificuldade de controle de arco em ação simultânea
ao trabalho do dedilhado da mão esquerda.
“Eu não consigo fazer isso! Ou eu penso no arco ou na afinação do som, se o professor
diz que devemos apresentar a sonoridade, acho que a afinação ficaria solta... Sei lá. Não
podemos fazer um murmúrio do mesmo jeito por várias vezes” (informação verbal)19
.
Como as ações idiomáticas do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ,
2008) não buscam precisão melódica, aqui, há a preocupação da não representação das notas e
sim, a representação de timbres/sonoridades. É comum que os jovens músicos da OFC
tenham certa dificuldade e estranhamento na execução desses sons por, justamente, ficarem
19
Informação verbal proferida pelo violinista 2, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em maio de
2017.
52
incomodados em representar a altura real da nota segundo as convenções da afinação
temperada. Silva; Aquino; Presgrave (2012, p. 50) refletem que: “Devido há anos de
treinamento muscular e auditivo, é comum que o nosso corpo tenda a voltar à afinação
temperada, especialmente nos intervalos de quinta justa, que seriam formados caso o quarto
de tom não fosse especificado”.
Para amadurecer a proposta técnica estabelecendo a ligação com uma das propostas
metodológicas deste Trabalho voltada para a criação de uma memória física, optou-se por
utilizar a ideia que Silva; Aquino; Presgrave (2012) postularam para a obra Movimentações
para violoncelos (RODRIGUES, 2009). Para criar esse novo reflexo, Silva; Aquino;
Presgrave (2012) propuseram o exercício de trabalhar a passagem das notas sem o uso dos
glissandos. A Figura 21 traz um recorte do exercício construído:
Figura 21 - Exercício estruturado segundo as ideias de Aquino; Silva; Presgrave
(2012) para a resolução da mudança cromática entre intervalos de 2ª menor com
a ausência dos glissandos
Fonte: O autor (2017).
É cada vez mais uma característica recorrente que tais abordagens da música
contemporânea, se coloquem desafiadoras frente a um contexto que demonstra desconforto
com questões estruturais (técnicos) e, por isso, careça de ações pedagógicas que viabilizem
melhor entendimento desses recursos sonoros. Diante dessa situação problema, pontua-se uma
colocação de Boulez (2002, p. 204) sobre as tendências da música recente:
O ponto a ser descoberto ainda é o dos universos sonoros não-temperados.
Por que, de fato, considerar como um tabu essa decisão que prestou imensos
53
serviços, mas perdeu de agora em diante sua razão de ser, uma vez que a
organização tonal que comandou essa normalização foi praticamente
destruída? É verdade que o fator instrumental não é dos menores obstáculos
ao desenvolvimento de um pensamento musical fundamentado nos
intervalos não temperados, apelando para noções de notas complexas ou de
complexos sonoros. Todas as aproximações acústicas acumuladas pouco a
pouco no curso da evolução do Ocidente devem desaparecer, pois não são
mais necessárias; mas como resolver, no momento, o problema proposto
pela produção dos sons?
A técnica more pressure (maior pressão) também instigou o autor deste Trabalho a
buscar maneiras de aprimorar a execução através de exercícios. Para tanto, estruturou-se um
pequeno exercício onde, na primeira nota, há a aplicação normal do arco e, em uma contagem
de dois tempos, é aplicada a more pressure. O domínio desse recurso não apresentou maior
dificuldade e a aplicação técnica logo foi possível.
“Não é uma coisa muito difícil de fazer, basta só aumentar a pressão do indicador na
hora em que aparece a escrita. O ruim é fazer em pianíssimo, é difícil de controlar...”
(informação verbal)20
.
O que é preciso pontuar é a ausência de controle quanto à intensidade do recurso
sonoro, ou seja, a cada execução percebem-se pequenas variações de intensidade. Essa
característica se dá pelo nível técnico elementar de alguns dos instrumentistas da OFC.
Propõe-se essa abordagem pedagógica na Figura 22 a seguir:
Figura 22 - Proposição técnica do more pressure
Fonte: O autor (2017).
A técnica do more pressure representa uma variação de timbre bem acentuada.
Trazendo sempre a característica rítmica da obra que apresenta o tempo liso, o
estabelecimento de referências se fez necessário neste ponto. Para isso, elaborou-se um sinal
20
Informação verbal proferida por um violinista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em maio de
2017.
54
onde o regente, com um leve toque da mão esquerda no peito direito, indica a aplicação do
more pressure.
Figura 23 - Exemplo da notação do more pressure
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
A primeira aparição do more pressure se dá nos naipes de 1º e 2º violinos. Aqui, tem-
se a aplicação do more pressure como recurso para reforçar a carga dramática do murmúrio
representado pelos violoncelos. Vale ressaltar, aqui, a presença de um dos recursos de figura
retórico-musical, os murmúrios e lamentações são aplicados pela parte de acompanhamento
na sessão A.
Por fim, traz-se o tutto l’arco como recurso expressivo para indicar, retoricamente, o
texto dos lamentos e gritos, elementos estes presentes na proposta de ambientação sonora do
Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). Apontou-se a aplicação da
técnica nas sessões dos 1º violinos, 3º violinos e violas.
Figura 24 - Representação gráfica do tutto l’arco
Fonte: Ferraz (2008, p. 2).
55
No trecho em destaque da Figura 24, pode-se notar a aplicação do tutto l’arco nas
secções dos 3º violinos e nas violas. Neste contexto, as duas secções constroem um diálogo
alternando o ataque. Esta escrita acontece na sessão C, aqui, Ferraz (2008, p. 2) anota:
“Lamento de sexta feira – Verônica – o vos omnes qui transiti”. A representação subjetiva de
lamentos, choros e murmúrios leva-se a uma abordagem imaginativa dessa cena. Aqui,
utilizou-se, a priori, a técnica do solfejo livre, a proposta é que os jovens músicos entendam
que se trata de um jogo dramático onde as sonoridades representam essas figuras. Só depois
desse momento, realizou-se a abordagem técnica.
“Se eu usar o arco todo nessa técnica, não vou conseguir controlar a intensidade, o
som vai ficar muito forte!” (informação verbal)21
.
Para esta técnica, a principal dificuldade foi o controle do arco. Como o tutto l’arco
exige a passagem de todo arco de acordo com a indicação da direção, mais uma vez, a
construção de exercícios foi necessário para a efetivação e aplicabilidade da técnica no
contexto da Obra. No exercício construído para desenvolver a memória física, Silva; Aquino;
Presgrave (2012) sugerem que o ataque do arco fosse aplicado de forma gradual, dividindo a
ação em 3 velocidades: lento, pouco rápido e rápido. Foram necessárias, em média, 20
repetições no modo lento, 25 repetições no modo pouco rápido e mais 20 repetições no modo
rápido. Vale ressaltar que esse número de repetições foi o necessário para a absorção da
técnica por parte dos instrumentistas da OFC, o número de repetições de um exercício pode
variar dependendo do contexto, do músico e seu nível de desenvolvimento técnico.
5.5 Pizzicato Bartók
Presgrave, durante entrevista ao autor deste Trabalho, afirma que o Pizzicato Bartók,
na abordagem técnico-interpretativa do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir
[(FERRAZ, 2008)] deve ser realizado puxando-se a corda com os 2 dedos, soltando-a e
deixando-a colidir, violentamente, contra o espelho do instrumento (informação verbal)22
. No
Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), o pizzicato Bartók aparece,
especialmente, nos naipes de violoncelo e contrabaixo:
21
Informação verbal proferida por um violista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em maio de
2017. 22
Informação verbal proferida por Fábio Presgrave – professor de violoncelo da EMUFRN – durante entrevista
concedida ao autor deste Trabalho, na EMUFRN, em Natal – RN, em dezembro de 2017.
56
Figura 25 - Primeira aparição do pizzicato Bartók
Fonte: Ferraz (2008, p. 25).
Ainda não é um consenso entre os 3 contrabaixistas e os 6 violoncelistas sobre a
precisão do ataque deste gesto. Optou-se por trabalhar o ataque isolado da Obra, mas o
descontrole se dá pela complexidade que é puxar a corda e deixar que ela colida com o
espelho. Em alguns ensaios, o ataque funcionou adequadamente, em outros, houve falta de
sincronia no gesto e no som. Portanto, foi uma técnica problemática de se aplicar no contexto
da Obra. Destaca-se os comentários de 1 contrabaixista e uma violoncelista quando
praticavam, em um determinado ensaio, a sincronia do pizzicato Bartók:
“O professor muito fala que devemos fazer o som das coisas que acontece na
Procissão, quando a gente toca esse pizzicato, eu só consigo pensar nas chicotadas que Jesus
levava dos romanos” (informação verbal)23
.
“Perfeito! Daí a gente diz que as chicotadas nunca eram dadas de uma só vez, no
mesmo tempo. Nós seríamos os guardas e que tentaríamos dar as chicotadas no mesmo tempo
e que, às vezes, não conseguiríamos a sincronia” (informação verbal)24
.
Estas informações verbais se destacam pelo aspecto criativo e imaginativo que os
integrantes da OFC atribuem ao processo os quais são sempre instigados a imaginarem o
cenário da Obra para a sua representação sonora. Essa representação traz, ao contexto deste
debate, a possibilidade de considerar, no discurso musical do Itinerário da Passagem:
Verônica Nadir (FERRAZ, 2008), o uso de figuras retórico-musicais como processo de
apoderação do discurso.
23
Informação verbal proferida por um contrabaixista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em
abril de 2017. 24
Informação verbal proferida por uma violoncelista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em
abril de 2017.
57
5.6 Matracas
O uso recorrente das matracas remete as sonoridades características do ambiente de
uma Procissão de Semana Santa. O contexto do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir
(FERRAZ, 2008) propõe o uso de matracas originais. A atribuição dessa sonoridade é
responsabilidade tanto das matracas quanto a apropriação dessas figuras pelos naipes da
Orquestra. Ferraz (2008) propõe que, os próprios instrumentistas de cordas toquem as
matracas. Constatada a dificuldade de controle entre o manuseio das matracas (dificuldade
vista pela transição entre o uso destas e o retorno para a posição dos instrumentos de cordas),
sugeriu-se que as matracas fossem manuseadas por instrumentistas específicos, retirando essa
função dos instrumentistas dos naipes das cordas.
Figura 26 - Representação das matracas na partitura
Fonte: Ferraz (2008, p. 1).
Visando uma fiel representação sonora e uso de matracas originais, iniciou-se uma
pesquisa para averiguar se existem matracas na comunidade de Luís Gomes - RN e como elas
se encaixam (ou se encaixavam) nos ritos religiosos. Neste ponto, considerou-se a ideia de
Lima (2014), que defende, em seus escritos, o estudo dos aspectos estéticos, históricos e
estruturais na busca de informações que consubstanciam na interpretação / execução.
Munidos da importância histórica e representativa do uso das matracas no contexto
religioso de Luís Gomes - RN, buscou-se por pessoas da Comunidade que participavam ou,
até mesmo, manuseavam as matracas em atos religiosos, especialmente, na Procissão da
Sexta-feira Santa. O objetivo dessa ação seria a averiguação de como se davam as sonoridades
e em quais circunstâncias eram utilizadas. Encontrou-se o Sr.25
Josemar Costa (1956-), figura
popular e que tem a marcenaria como profissão. Josa (como é conhecido popularmente) deu
25
Senhor (Sr.).
58
valiosas contribuições relatando como se davam os ambientes sonoros da Procissão da Sexta-
feira Santa:
Antigamente se começava bem cedo, 11 horas da manhã. Seu Ananias era o
primeiro a tocar as matracas. Lá de casa se escutava o som que se espalhava
por toda a Cidade. Eu, na época, era o 3º a tocar a matraca, naquela época, a
Procissão acontecia por todas as ruas. Não existia carro de som, só se ouvia
as matracas e as rezas do povo (informação verbal)26
.
Este valioso relato reforçou a ideia interpretativa deste Trabalho em atribuir diferentes
intensidades ao som das matracas, considerando que as mesmas poderiam ser acionadas de
diferentes pontos da Procissão.
Na sequência da entrevista, perguntou-se ao Sr. Josa quem confeccionava as matracas
e, para a surpresa do autor deste Trabalho, o próprio fabricava as matracas na sua oficina de
marcenaria (informação verbal)27
.
Figura 27 - Matraca28
confeccionada pelo
Sr. Josemar da Costa
Fonte: O autor (2017).
26
Informação verbal proferida por José Josemar da Costa (Josa), na Marcenaria Irmãos Costa (Marcenaria do
entrevistado), em Luís Gomes – RN, em novembro de 2017. 27
Informação verbal proferida por José Josemar da Costa (Josa), na Marcenaria Irmãos Costa (Marcenaria do
entrevistado), em Luís Gomes – RN, em novembro de 2017. 28
Matraca pertencente à Igreja Matriz de Senhora Santana de Luís Gomes - RN. Esse instrumento foi construído,
segundo o relato do Sr. Josemar da Costa, no ano de 1976.
59
Perguntou-se ao Sr. Josa se ele gostaria de construir uma matraca, explicando, na
sequência, a preocupação do autor deste Trabalho em representar a sonoridade original e
assim, ambientar, com fidelidade, o que se praticava nas antigas Procissões. O Sr. Josa e seu
filho Leonardo Costa confeccionaram as matracas utilizadas no Recital do Itinerário da
Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008). O Sr. Josa também orientou como manusear
as matracas segundo a tradição religiosa de Luís Gomes - RN.
Figura 28 - Matracas29
confeccionadas pelo Sr. Josemar
da Costa e seu filho Leonardo Costa
Fonte: O autor (2017).
Vale ressaltar que estes relatos em muito consubstanciaram com esta Pesquisa,
considerou-se o discurso de um personagem histórico e atuante da cultura local e, estas
colocações, reforçaram a aplicação contextual da sonoridade das matracas.
29
Matracas confeccionadas, especialmente, para a performance do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir
(FERRAZ, 2008) no II Recital de Mestrado do autor deste Trabalho.
60
5.7 Itinerário da Passagem: ensaios e performance
Para a preparação do Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008)
foram necessários 3 meses de trabalho, dos quais contabilizaram-se 25 ensaios com duração
média de 1h30
40min31
. Nestes encontros considerou-se, também, os momentos de
desenvolvimento das propostas pedagógicas que objetivaram subsidiar a construção da
técnica condizente com a proposta interpretativa. Os primeiros ensaios foram,
consideravelmente, problemáticos em relação à leitura do tempo liso. A ausência de
referências logo se mostrou um sério problema para o prosseguimento da leitura. No
Itinerário da Passagem: Verônica Nadir (FERRAZ, 2008) não se tem a marcação rítmica
convencional, tudo está estático, não há uma distribuição coerente dos valores musicais.
A Obra possui 13 sessões (A, B, C, etc.). Para se referenciar as mudanças entre as
sessões, criou-se um gesto que era aplicado sempre no compasso anterior à chegada da nova
sessão. Esta ideia se mostrou eficaz considerando que alguns músicos costumavam se perder
na leitura e se utilizavam do sinal de referência para retornar ao próximo ponto comum.
A Orquestra realizou, a maioria dos ensaios, sem a presença do violoncelo solista.
Após 22 ensaios, as referências estabelecidas ofereciam solidez nas mudanças sonoras da
Obra e a regência em tempo liso já não apresentava grandes problemas para a condução.
Porém, nos 3 ensaios que antecederam a performance, encontrou-se dificuldades em aliar o
desempenho do solista ao que já estava estabelecido pela OFC. Desta forma, foi preciso
estriar a marcação de 6 secções (antes não estriadas) para referenciar, com mais precisão, o
desenvolvimento do solo.
Chegado o momento da performance (RECITAL..., 2017), em 10 de novembro de
2017, a OFC e solista apresentaram uma interpretação convincente e mostraram evolução no
processo e consequente interpretação. O desempenho positivo mostra a eficiência do método
de construção pedagógico influindo no resultado artístico. Considerou-se a dificuldade do
repertório tanto técnica quanto musicalmente, mas, o ponto alto da abordagem foi o
envolvimento de músicos, de nível iniciante, promovendo a inclusão não só pela técnica, mas
pela proposta artística. A ideia da reescritura transpareceu na performance, os discursos e
concepções das sonoridades foram atribuídas na interpretação dos jovens instrumentistas.
30
Hora (h.). 31
Minuto (min.).
61
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O regente constrói seu processo de interpretação dialogando com os músicos sobre as
possibilidades sonoras oferecidas pelas técnicas estendias levantadas. A elucidação,
abordagem e exploração das técnicas estendidas buscaram promover, nos jovens, uma nova
concepção do fazer musical, fazendo-os considerar a importância das tendências técnicas e
como elas se apresentam para as correntes interpretativas da música contemporânea. Após a
execução da Obra, através de Recital apresentado em dezembro de 2016, notou-se um
significativo avanço da técnica da OFC. O crescimento do Grupo também é visível quanto à
postura reflexiva e analítica sobre os melhores caminhos na busca das sonoridades. A
exemplo desse espaço dinâmico, cita-se a sugestão de um violinista para aproveitar um ritmo
na secção dos violoncelos para aplicação do tambor: “Deixe eu fazer tambor usando o ritmo
dos cellos, vai ficar um som que vai trazer mais presença ao trecho da frase” (informação
verbal)32
. Esta citação apresenta como o processo ganhou fluência dentro das possibilidades
que foram propostas.
A construção da 2ª Obra revela o grande desafio que é o trabalho voltado para a
promoção de uma nova postura de abordagem técnica e estética a partir prática do autor deste
Trabalho como regente bem como o desempenho dos jovens estudantes da OFC, ou seja, a
interpretação da música contemporânea se mostra desafiadora tanto para a OFC quanto para o
regente e mediador deste processo. Muitas horas de estudo e reflexão foram necessárias para a
construção de uma interpretação comprometida com os preceitos da estética e poética da
Obra, investigando e analisando as melhores possibilidades de construção sonora. Nesta
dinâmica, pontua-se a necessidade de atribuir maior atenção à questões específicas no uso de
determinadas técnicas. O processo transpareceu um amadurecimento técnico e de pensamento
da Obra, uma postura que valoriza o processo e mostra diferentes caminhos na construção da
interpretação sem apontar para verdades absolutas, conforme afirma Tokeshi (2003, p. 54):
A música contemporânea, por estar em processo dinâmico de transformação,
não apresenta, ainda, convenções consolidadas. O aumento das
possibilidades de interpretação de um mesmo fenômeno torna a abordagem
da música contemporânea mais complexa e carente de investigação sob a
perspectiva do intérprete.
32
Informação verbal proferida por um violinista, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em maio de
2017.
62
Neste pensamento busca-se, no decorrer deste processo, meios para que os jovens
músicos que integram a OFC possam estabelecer seus próprios olhares, conseguir realizar sua
leitura e assim, propor formas e alternativas para o desenvolvimento das suas recorrentes
propostas interpretativas. Desse modo, pode-se colocar que:
A investigação de aspectos característicos da produção musical do século
XX, como o uso de recursos de técnica expandida, é importante para a
compreensão das intenções do compositor, sendo subsídio imprescindível
para a elaboração de uma interpretação estilisticamente rica. Em âmbito
geral espera-se também contribuir para o aumento do interesse pela música
da atualidade (COPETTI; TOKESHI, 2005, p. 322).
No processo de construção interpretativa da obra Itinerário da Passagem: Verônica
Nadir (FERRAZ, 2008) neste Trabalho, a caminhada se deu a passos, relativamente, lentos.
O impacto da abordagem da Obra se mostra muito superior em comparação com as Quatro
Estações Portenhas (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d). Mas, agora, há um maior
entendimento a respeito das técnicas estendidas, dessa forma, a curiosidade pelas
possibilidades de construção sonora são bem mais presentes. À luz dessa ideia, enfatiza-se o
pensamento de Boulez (1992, p. 206):
Estamos à espreita de um mundo sonoro de que não há exemplo, rico em
possibilidades, e ainda praticamente inexplorado. Começa-se apenas a
perceber as consequências ligadas à existência de um tal universo.
Observamos a feliz coincidência (não esperamos que seja fortuita nem nos
cause espanto que os músicos interessados por essas pesquisas nos diferentes
países estejam unidos em uma segura comunidade de opinião) que ocorre na
evolução do pensamento.
Os integrantes da Orquestra se mostram mais envolvidos e interessados no processo,
porém, foram constatados diferentes níveis de envolvimento ao fim das performances das
duas Obras. O que se notou, ao final, foi uma aceitação maior das propostas artísticas por
parte dos músicos de nível iniciante (com idade média de 12 anos), estes se mostravam ávidos
pelas possibilidades que surgem em um processo dinâmico e participativo e pelas novidades
sonoras decorrentes, principalmente, da proposta do Itinerário da Passagem: Verônica
Nadir (FERRAZ, 2008). Os músicos, de nível mais avançado, divergiram quanto ao interesse
de desenvolver, com mais frequência, o repertório contemporâneo. Nos próprios comentários,
é possível avaliar como essas experiências (PIAZZOLLA, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d) e
(FERRAZ, 2008) impactaram os músicos da OFC de formas variadas:
63
“Eu achei divertido tocar essas coisas, eu sinto uma liberdade na hora de tocar porque
eu tenho que fazer o som da Procissão do jeito que eu imagino, isso fica mais fácil”
(informação verbal)33
.
“Eu pensei que não ia conseguir tocar esse negócio, mas depois vi que ia ser possível e
que é bom apresentar as sonoridades de um jeito mais solto, mas sempre se preocupando em
fazer o som correto” (informação verbal)34
.
“Eu já não aguentava mais tocar isso, a música do Itinerário tem uma carga dramática
muito forte, gera muita tensão, até dá medo” (informação verbal)35
.
“O som das matracas já estava dando nos nervos, e é muito enfadonho sustentar os
pedais com sons harmônicos no baixo” (informação verbal)36
.
“Tocar Piazzolla traz um prazer porque é música com tom, o Itinerário não tem essas
referências e, por isso, a coisa é mais confusa. Mas, se o objetivo é produzir sonoridades, acho
que me saí bem, mas não sei se gostaria de ficar tocando música moderna” (informação
verbal)37
.
“A música [Itinerário] me deu medo, mas fiquei feliz conseguir tocar o que
ensaiamos” (informação verbal)38
.
“Não vejo a hora de tocar esse Recital pra [sic] me livrar do Itinerário” (informação
verbal)39
.
Essa variedade de depoimentos mostra como o repertório trabalhado impactou, de
maneiras diferentes, na concepção dos jovens músicos, Daldegan; Dottori (2011) pontuam
como alunos iniciantes estão mais sujeitos a absorver novas sonoridades (sons estendidos),
quando afirmam que:
Alunos adiantados têm maior dificuldade em começar a produzir sons
„estendidos‟ do que os iniciantes, que geralmente conseguem fazê-lo
brincando, literalmente. Portanto o incentivo e o trabalho com estas técnicas
33
Informação verbal proferida por um violonista iniciante, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN,
em junho de 2017. 34
Informação verbal proferida por um violoncelista iniciante, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes –
RN, em maio de 2017. 35
Informação verbal proferida por uma violista veterana, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN, em
junho de 2017. 36
Informação verbal proferida por um contrabaixista veterano, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes –
RN, em junho de 2017. 37
Informação verbal proferida por uma violinista veterana, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN,
em maio de 2017. 38
Informação verbal proferida por um violinista iniciante, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes – RN,
em junho de 2017. 39
Informação verbal proferida por uma violoncelista veterana, no Auditório Zéo Fernandes, em Luís Gomes –
RN, em junho de 2017.
64
desde o início, inclusive com crianças, pode ser de grande valia para o seu
desenvolvimento. (DALDEGAN; DOTTORI, 2011, p. 3).
Esta ideia move o autor deste Trabalho no ativismo de propor repertórios que possam
ampliar as capacidades técnicas dos jovens músicos. O regente deve pensar maneiras de
facilitar o processo para que os pensamentos das novas correntes estéticas possam fazer parte
da prática das orquestras. Um trabalho sério e detalhado deve ser estruturado pensando nas
dificuldades e nas melhores formas de encaminhamento para a luz de uma interpretação
condizente com a proposta de interpretação. Pode-se assegurar, como regente mediador deste
processo, que esta ação produziu forte impacto no contexto da OFC, o crescimento técnico e
perceptivo foi ampliado, enriquecendo as capacidades artísticas do Grupo. Como diretor
artístico da OFC, o autor deste Trabalho adotará a prática de repertório contemporâneo,
permanentemente, no contexto da Orquestra em até 4 concertos anuais. Entende-se a
importância de seguir com trabalhos dessa natureza por entender os benefícios absorvidos
pela Orquestra bem como a busca de formação de plateias.
Finaliza-se esses dizeres evocando as palavras de Boulez (1992) sobre a necessidade
de atribuir significados da música contemporânea em espaços de pouca produção deste
repertório:
Não obstante, essas possibilidades não são tão utópicas que possam ser
ignoradas; é mesmo provável que o interesse crescente suscitado pela
epifania de um mundo sonoro inusitado, extraordinário, só poderá acelerar as
soluções. Fazemos votos para que possamos figurar entre seus primeiros
artesãos; modestamente (BOULEZ, 1992, p. 207).
Para oportunizar tais espaços para a produção da música contemporânea, é preciso se
abster dos próprios preconceitos em não oferecer um repertório considerando, possivelmente,
uma má receptividade por parte da plateia. Só se pode ampliar a produção da nova música
quando os próprios jovens das nossas Orquestras possam ser interlocutores e sensíveis a
produção artística do nosso tempo.
65
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70
ANEXO A - ITINERÁRIO DA PASSAGEM: VERÔNICA NADIR DE SÍLVIO FERRAZ
71
72
73
74
75
76
77
Fonte: Ferraz (2008, p. 1-8).
78
ANEXO B - AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR PIAZZOLLA:
PRIMAVERA PORTEÑA (I MOVIMENTO)
79
80
81
82
83
84
Fonte: Piazzolla (1998a, p. 1-7).
85
ANEXO C - AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR PIAZZOLLA:
VERANO PORTEÑO (II MOVIMENTO)
86
87
88
89
90
91
Fonte: Piazzolla (1998b, p. 1-7).
92
ANEXO D - AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR PIAZZOLLA:
OTOÑO PORTEÑO (III MOVIMENTO)
93
94
95
96
97
98
Fonte: Piazzolla (1998c, p. 1-7).
99
ANEXO E - AS QUATRO ESTAÇÕES PORTENHAS DE ASTOR PIAZZOLLA:
INVIERNO PORTEÑO (IV MOVIMENTO)
100
101
102
103
104
105
106
107
Fonte: Piazzolla (1998d, p. 1-9).