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Aviso A Agenda 21 e a Governação Territorial Agenda 21 and the territorial governance

Date post: 16-Jan-2023
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Aviso O conteúdo deste website está sujeito à legislação aplicável sobre a propriedade intelectual. Os trabalhos disponibilizados neste website podem ser consultados e reproduzidos desde que a sua utilização seja estritamente pessoal ou para fins científicos ou pedagógicos, excluindo-se qualquer exploração comercial. A reprodução deverá mencionar obrigatoriamente o editor, o nome da revista, o autor e a referência do documento. Referência eletrónica Joaquim Poças, “A Agenda 21 e a Governação Territorial”, Revista Perspetivas Humanísticas Multidisciplinares [Online], 1 | 2013, disponível em http://rphmultidisciplinares.webnode.pt/ Editor: Revista Perspetivas Humanísticas Multidisciplinares http://rphmultidisciplinares.webnode.pt/ A Agenda 21 e a Governação Territorial Agenda 21 and the territorial governance Joaquim Poças Sociólogo Área Política Texto enviado em 6 de Abril de 2013 Abstract O artigo foca a importância da implementação da Agenda 21 Local - A21L como instrumento decisivo para o desenvolvimento sustentável e dá-nos pistas para reflexão sobre o processo de implementação à luz da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável - ENDS. Expõe-se a origem e o caminho percorrido até à atualidade pela A21L, dando-se nota da importância dos atores e das políticas locais para a sua implementação e êxito. Finalmente o artigo incinde sobre a questão do posicionamento e da participação política no processo de construção do desenvolvimento sustentável. The present article focuses on the importance of Local Agenda 21 - LA21’s implementation as key instrument for sustainable development and gives us clues to reflect on the process of implementation in light of the National Strategy for Sustainable Development - ENDS. It explains the origin and path to the present day by LA21,
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Aviso

O conteúdo deste website está sujeito à legislação aplicável sobre a propriedade intelectual.

Os trabalhos disponibilizados neste website podem ser consultados e reproduzidos desde que a sua

utilização seja estritamente pessoal ou para fins científicos ou pedagógicos, excluindo-se qualquer

exploração comercial. A reprodução deverá mencionar obrigatoriamente o editor, o nome da revista, o

autor e a referência do documento.

Referência eletrónica

Joaquim Poças, “A Agenda 21 e a Governação Territorial”, Revista Perspetivas Humanísticas

Multidisciplinares [Online], 1 | 2013, disponível em http://rphmultidisciplinares.webnode.pt/

Editor: Revista Perspetivas Humanísticas Multidisciplinares

http://rphmultidisciplinares.webnode.pt/

A Agenda 21 e a Governação Territorial

Agenda 21 and the territorial governance

Joaquim Poças

Sociólogo

Área Política

Texto enviado em 6 de Abril de 2013

Abstract

O artigo foca a importância da implementação da Agenda 21 Local - A21L

como instrumento decisivo para o desenvolvimento sustentável e dá-nos pistas para

reflexão sobre o processo de implementação à luz da Estratégia Nacional de

Desenvolvimento Sustentável - ENDS. Expõe-se a origem e o caminho percorrido até à

atualidade pela A21L, dando-se nota da importância dos atores e das políticas locais

para a sua implementação e êxito. Finalmente o artigo incinde sobre a questão do

posicionamento e da participação política no processo de construção do

desenvolvimento sustentável.

The present article focuses on the importance of Local Agenda 21 - LA21’s

implementation as key instrument for sustainable development and gives us clues to

reflect on the process of implementation in light of the National Strategy for Sustainable

Development - ENDS. It explains the origin and path to the present day by LA21,

giving note of the importance of local’s actors and policies for their implementation and

success. Finally it focuses on the question of positioning and political participation in

the construction of sustainable development.

Palavras-chave: A21L, desenvolvimento sustentável, reforma política, cidadania.

Keywords: A21L; sustainable development; political reform; citizenship.

A Agenda 21 e a Governação Territorial

1. Introdução. 2. Os atores e as políticas territoriais. 3. A Agenda 21. 4.

Implementação da Agenda 21 em Portugal. 5. Um desafio para a cidadania. 6.

Conclusões.

1. Introdução

A Agenda 21 é um documento que contém os princípios defendidos pelos países

participantes na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e

Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, para a mudança do padrão de

desenvolvimento sustentável. O objetivo fundamental foi a construção de um plano de

ação participativo com envolvimento nos níveis global, nacional e local, capaz de

permitir um novo paradigma de desenvolvimento. A Agenda 21 local difundiu-se

através da prática e das campanhas organizadas pelo ICLEI (International Council for

Local Environmental Iniciatives) como plataforma para apoiar governos e comunidades

locais na implementação dos planos de ação para o desenvolvimento sustentável. Em

Portugal, a Agenda 21 foi lançada pela Estratégia Nacional de Desenvolvimento

Sustentável (ENDS) constituindo o modelo de ação para responder às preocupações de

sustentabilidade colocadas em face das ameaças e das oportunidades que afetam o

tecido social, a estrutura das atividades económicas e o equilíbrio ambiental1.

É neste enquadramento que a gestão do território assume uma importância

decisiva de suporte e de coordenação de relações entre os diversos atores e o ambiente,

num dado espaço territorial, tendo como principal objetivo o aproveitamento das

dinâmicas em presença. Um dos temas que chama a atenção é a necessidade de

descentralização da administração central do estado de forma a preencher o espaço que

se situa entre o local e o nacional. Na verdade, falamos da instauração das regiões

administrativas como estrutura eleita pelos cidadãos revestida de legitimidade

democrática capaz de aprofundar o grau de participação dos cidadãos e de desenvolver

com a sua participação e com a de outros atores locais e regionais, estratégias

considerando as novas lógicas de desenvolvimento sustentável. A descentralização do

estado é essencial para torná-lo mais leve e eficaz, mais próximo do cidadão e das

empresas, sendo estes fatores decisivos para o relançamento e competitividade da

economia num mundo globalizado.

2. Os atores e as políticas territoriais

O conceito de desenvolvimento sustentável, tal como foi definido pela

Organização das Nações Unidas (ONU), não foi suficientemente entendido pela

diversidade dos atores que de forma mais direta intervêm na vida da comunidade. É um

verdadeiro desafio a mudança de uma lógica em que os governos locais atuam numa

gestão centrada sobre si mesmo, fechados na sua autarquia, para uma lógica onde

privilegiem e acentuem a participação e o envolvimento dos atores económicos, sociais,

culturais e ambientais da sua localidade e da sua região.

Nesta mudança de paradigma aos autarcas cabe o papel fundamental de

liderança do processo participativo que mobilize as forças vivas e institucionais locais

por forma a integrar nos diversos planos e projetos as suas opiniões e preocupações,

sem descurar, obviamente, o rigor e demais questões de natureza técnica que importa

assegurar. Outro fator decisivo para o êxito desta mudança de paradigma será a

participação das entidades da administração central.

1 - A ENDS foi aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros nº 109 / 2007 de 20 de Agosto.

Entendendo-se que a política territorial se configura pelo conjunto de enfoques

de médio e longo prazo, dirigidos a intervir sobre o território, a fim de que assumam as

formas mais adequadas ao conjunto dos interesses que controlam o poder político

(Sanchez, 1992, p. 72) – entendendo, também, que a política territorial extrapola a

noção dos planos regionais de desenvolvimento. Verifica-se que a política territorial

abrange toda e qualquer atividade que implique uma dada conceção do espaço nacional.

Simultaneamente, uma estratégia de articulação estre os diversos níveis da estrutura

territorial com mecanismos concretos capazes de viabilizar estas políticas (Costa, 1988,

p.13), justificam a integração dos Planos Diretores Municipais nos Planos de

Desenvolvimento Regional. Da mesma forma, os representantes regionais eleitos

participariam na elaboração dos diversos Planos Nacionais – Programa Nacional de

Ação para o Crescimento e Emprego, Programa Nacional da Política de Ordenamento

do Território, Programa Nacional para as Alterações Climáticas, e Plano Estratégico

Nacional de Desenvolvimento Rural.

O progressivo esvaziamento da soberania do Estado resultante em grande parte

pela integração europeia, pelo conjunto de acordos internacionais de comércio e

serviços e sobretudo pelo processo de globalização, não se compadece com visões

centralistas nem com sensibilidades políticas avessas às grandes reformas que é

necessário fazer, quer no domínio fiscal, quer na administração central do estado, quer

no redimensionamento das funções sociais do estado e dos Municípios portugueses,

sendo estes os fatores que podem fazer a diferença na atratividade e na competitividade

que Portugal carece.

O processo de globalização em curso, as transformações e a maleabilidade do

sistema capitalista como um todo, a falência do planeamento centralizado e o fim dos

padrões tecnológicos dominantes de desenvolvimento que se espalharam desde o pós

guerra, associados a um ideário político-económico liberal, passaram a nortear as

grandes linhas inspiradoras da ação que visam a recuperação económica e o

ordenamento territorial. A crise do desenvolvimento e do planeamento centralizados

conduzem a redefinições da geopolítica clássica que perde os seus sentidos originais,

dado que a tendência do funcionamento das economias cada vez mais flexíveis e

desregradas, nos diversos planos – macro, meso e micro –, subjuga, pela mobilização do

capital, a inserção dos territórios nos processos de globalização financeira e de

mercados, convocando a emergência de processos políticos descentralizadores e,

simultaneamente, democratizantes conducentes a uma redefinição e redistribuição de

competências e atribuições pelos diversos níveis de governação – local, regional,

nacional e europeu – em ordem a ajustar as necessidades de ordenamento territorial às

novas lógicas de desenvolvimento sustentável, por oposição aos padrões atuais.

A década que vivemos é disso testemunha, com tempos de globalização

financeira e de desindustrializações crescentemente flexíveis, de sistemas

desterritorializados de gestão e produção, de capitais descomprometidos com os lugares

e com as pessoas, de investimentos e desinvestimentos em mercados financeiros

voláteis e de ameaças constantes aos Estados pelas intempéries financeiras. O novo

ciclo prenuncia que os atores das comunidades locais e regionais deverão ser chamados

a desenvolver experiências associativas nas comunidades de que fazem parte, nas quais

o poder do Estado central deverá ser respeitado enquanto ordenador da ordem social e

da coisa pública, mas não como interventor direto dos destinos da vida cotidiana das

populações.

A valorização do local e do regional não será apenas mais uma novidade, são

cada vez mais as experiências comunitárias que indicam ser esse um percurso que

tenderá a desenvolver-se e a consolidar a dimensão do poder local e regional, porquanto

poder genuíno ao alcance das populações na construção do seu destino, tendo como

referência p.e. a Comunidade de Barcelona, as cidades de Bilbao, Málaga ou Rio de

Janeiro.

De facto vem à tona a insustentabilidade do desenvolvimento, as dívidas

soberanas, os excessos de consumo, dos estados, das empresas e das famílias,

confirmando a urgência de ajustamento a padrões de sustentabilidade, assumindo

ruturas com paradigmas socioeconómicos e políticos gastos e que deixaram de ser

solução, para tornar possível o desenvolvimento sustentável “de forma a satisfazer as

necessidades do presente sem comprometer as necessidades das gerações futuras”.

(Relatório Brundtland, 1987).

3. A Agenda 21

A Agenda 21, como ficou mundialmente conhecida, é o resultado das discussões

havidas por ocasião da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o

Desenvolvimento (Cimeira do Rio 92), que incluiu na agenda da comunidade

internacional a implementação de ações conducentes ao desenvolvimento sustentável.

A Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento da

Organização das Nações Unidas, através do relatório Brundtland conhecido como “O

Nosso Futuro Comum”,2 estabeleceu, pela primeira vez, o conceito de desenvolvimento

sustentável como forma de se encontrar, coletivamente, um caminho para salvar o

planeta e a sua biodiversidade. O caminho foi denominado de Agenda 21 e em quase

todos os seus capítulos reforça os valores e as práticas participativas nos diferentes

processos de implementação da Agenda.

Um dos grandes desafios desta relaciona-se com a resistência a novas formas de

pensar e de agir. Esse é o grande desafio da Agenda 21: propor e firmar compromissos

comummente aceites que conciliam desenvolvimento socioeconómico e proteção

ambiental. Assim, trilhar os caminhos do desenvolvimento sustentável num equilíbrio

entre os eixos económico, social e ambiental de forma a satisfazer as necessidades do

presente sem comprometer as gerações futuras é romper com as bases fortemente

enraizadas de um modelo de crescimento económico que perpetua disparidades sociais e

a devastação do meio ambiente. Viola (1995:34) refere: ”Do ponto de vista do

ambientalismo, o aspeto mais forte da Conferência do Rio de Janeiro não foi os acordos

assinados pelos governos, mas precisamente a emergência germinal de uma sociedade

civil planetária expressada na constituição de um espaço público comunicativo onde se

encontram as diversas dimensões que compõem o ambientalismo, com raízes tanto no

Sul como no Norte, no Leste como no Oeste e pertencente tanto ao sistema político

como aos sistemas social e económico”. Este autor realça a questão da importância da

formação de consensos capazes de reverter padrões de consumo e o surgimento de uma

sociedade civil que vai reforçando a sua voz num mundo cada vez mais pequeno dada a

expressão cada vez maior das comunicações no nosso quotidiano.

Figura 1: A intersecção das dimensões do desenvolvimento sustentável.

2 Disponível em http://www.un-documents.net/wced-ocf.htm.

Fonte: Adaptado de Hernández del Águila (2003).

A Agenda 21 é, porventura, um dos documentos mais importantes aprovados na

Cimeira da Terra enquanto documento que define um conjunto de diretrizes a seguir

para alcançar o desenvolvimento sustentável. Nele não são tratadas apenas questões

ligadas à preservação e conservação da natureza, são consideradas, entre outras,

questões estratégicas ligadas à criação de emprego, diminuição das disparidades,

construção de cidades sustentáveis e adoção de novos modelos e instrumentos de

gestão.

Seria redutor considerar a Agenda 21 apenas como uma agenda ambiental, dado

que as dimensões que envolve e a abrangência das áreas que foca transcendem a mera

questão ambiental, remetem-nos sim para um novo modelo de desenvolvimento, assente

nos três pilares, cujo objetivo final é atingir um modelo de desenvolvimento mas

sustentável.

Embora não tendo carácter obrigatório para as Nações signatárias, traduz-se num

compromisso político por parte dos cerca de duas centenas de chefes de estado que o

subscreveram.

No espaço europeu, o trabalho em torno do desenvolvimento sustentável

assumido pela União Europeia teve implicações em todos os Estados Membros

refletindo a importância da integração das preocupações ambientais nas metas de

crescimento económico e equidade social traçadas para a UE, enquadradas no objetivo

global de um desenvolvimento sustentável. Para tal foram implementados vários

Programas Comunitários de Política e Ação Comum para o Ambiente e o

Desenvolvimento Sustentável dedicando especial importância aos problemas ambientais

de gestão do território e problemas urbanos relacionados com o processo de construção

da Agenda 21 local.

Na linha dos objetivos traçados pela UE, a Estratégia Europeia de

Desenvolvimento Sustentável,3 aprovada em 2001 e revista em 2006, reforça o papel da

Agenda 21 Local, no seu ponto 29º:

"With regard to the important role of local and regional levels in delivering sustainable

development and building up social capital, it is the overall aim to build sustainable

communities in urban and rural areas where citizens live and work and jointly create a

high quality of life. Approaches like Local Agenda 21 and other processes with broad

public participation must be further strengthened and promoted. Municipalities, cities

3 Disponível em http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/en/com/2001/com2001_0264en01.pdf

and towns should be invited to sign and implement the Aalborg Commitments. Networks

at different levels should support these activities."

Em 2004, na sua comunicação ao Conselho e ao Parlamento Europeu – Building

our Common Future –4 a Comissão Europeia definiu como o primeiro dos três grandes

objetivos da União Europeia no período 2007/2013, o “ Desenvolvimento Sustentável”

através da mobilização das políticas económicas, sociais e ambientais (os três pilares

base do Desenvolvimento Sustentável), precisando que os futuros programas a

apresentar pelos Estados membros para concorrerem a Fundos Estruturais deveriam ter

o Desenvolvimento Sustentável como orientação central. Esta decisão poderá ter reflexo

nas respetivas políticas de desenvolvimento, tanto de nível nacional como regional e

local, com expressão nas orientações estratégicas para o território e para as cidades até

2013.

Segundo o International Council for Local Environmental Iniciatives – ICLEI a

Europa apresenta o segundo maior número de membros aderentes a nível mundial,

perfazendo um total de 177 membros, o que poderá refletir a importância que os países

europeus dão a esta matéria (ICLEI, 2011), conforme figura 2.

Figura 2 – Membros do ICLEI

Fonte: ICLEI – Local Governments for Sustainability, Corporate Report 2011/2012.

Acompanhando esta dinâmica crescente, relativa às preocupações da União

Europeia com o desenvolvimento sustentável, a evolução do número de comunidades,

municípios e cidades que aderiram à Carta de Aalborg na última década foi bastante

significativo, com destaque para alguns países mediterrânicos, designadamente Espanha

4 Disponível em http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/site/en/com/2004/com2004_0101en02.pdf

com 17 e Itália com 11 novas adesões. No Sul da Europa, as Agendas 21 Locais são

mais complexas, mais racionalistas, com grandes opções, grandes investimentos e com

alguma dificuldade de implementação, comparativamente aos países do Norte que

procuram agora uma escala mais próxima do cidadão e do seu território, com ações

mais pequenas e fáceis de implementar (Schimdt, et al, 2005).

Face a um panorama diversificado, em vários países da Europa, de diferente

evolução dos processos de Agenda 21 Local, importa fazer uma breve caracterização

sobre a situação em Portugal.

4. Implementação da Agenda 21 local Em Portugal

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 39/2002, de 1 de Março

institucionalizou na ENDS 2002 a promoção de uma “Política de Ordenamento do

Território Sustentável”, defendendo como prioritário a “promoção e a elaboração de

Agendas 21 Locais, estimulando a intervenção dos níveis locais e regionais no processo

de desenvolvimento sustentável, de acordo com o artigo 28º da Agenda 21” (ENDS,

2002).

Em 2004, o Governo reformulou os princípios e as linhas de orientação

estratégica através da aprovação do novo texto da ENDS 2005-20155. Na referida

Resolução o Conselho de Ministros aprovou seis objetivos, sendo de salientar o quarto

objetivo – Organização Equilibrada do Território que valorize Portugal no espaço

europeu e que proporcione qualidade de vida – propondo como meta: “adotar e

implementar até 2010 uma estratégia nacional para as cidades que coloque em vigor os

princípios da Agenda 21 Local, que integre a dimensão de reabilitação urbana em pelo

menos 80% dos municípios”.

Fruto da queda do XVI Governo Constitucional, por demissão do seu Primeiro-

ministro, o processo foi interrompido, tendo sido retomado em 2006, com a aprovação

de novos textos da ENDS e do plano de implementação PNIEDS, tendo entrado em

vigor em 20076.

A Agenda 21 Local é parte integrante da ENDS e do PNIEDS e envolve a

responsabilidade das autoridades locais, no sentido de atingirem os objetivos da política

5 - Resolução do Conselho de Ministros n.º 180/2004, de 11 de Novembro de 2004, e publicada no Diário

da República – I Série – B, n.º 298, de 22 de Dezembro de 2004. 6 - Resolução do Conselho de Ministros nº109/2007, de 20 de Agosto.

global aprovados na Conferência do Rio. A Agenda 21 incentiva as autoridades locais,

atribuindo-lhes responsabilidades no início e na coordenação do diálogo com os

cidadãos, organizações locais e empresas de modo a determinar a forma e o conteúdo

específico da Agenda 21 Local. Este aspeto é definitivamente uma forma diferente dos

habituais processos de participação pública, isto porque, podemos lembrar as sessões

das assembleias municipais e de freguesia, que prevêem, não apenas, a participação dos

eleitores no período que antecede o início da ordem de trabalhos, como lhes confere o

direito de requerer a realização da assembleia7. A forma inovadora como a Agenda 21

apela ao envolvimento da comunidade, rompe com a participação formal, corporativa e

tradicional como a administração pública olha e trata o cidadão. Esta rotura com o status

quo instalado situa-se não apenas na forma mas também no conteúdo dado que a

Agenda 21 Local assume de forma integral a necessidade de participação do cidadão e

das forças vivas da comunidade, partindo do princípio que o governo local é o principal

dinamizador do processo.

O International Council for Local Environmental Iniciatives – ICLEI trabalha

com as comunidades e os governos locais para ajudar na tomada de consciência sobre as

políticas de desenvolvimento sustentável, na implementação de planos de ação e na

definição de metas de desenvolvimento sustentável. A colaboração abrange diversas

áreas de intervenção: Biodiversidade; Adaptação às Alterações Climáticas; Mitigação

das Mudanças Climáticas; Gestão da Sustentabilidade; Governança Urbana; Compras

Sustentáveis; Energia; Água; Mobilidade e Eventos Sustentáveis. No entanto, a

colaboração implica a subscrição da carta e dos compromissos de Aalborg que visam

garantir que os governos locais desempenhem um papel crescentemente ativo na

sustentabilidade, o que pode justificar, em parte, que tais compromissos sejam

demasiado ambiciosos para explicar o reduzido número de entidades do poder local, em

Portugal, reconhecidas pelo ICLEI, que cumpriram os requisitos8. Em claro contraste, a

Universidade Católica Portuguesa num levantamento realizado em 2009, sobre a

7 - De acordo com os artigos 13º e 14º da Lei nº 5-A / 2002, de 11 de Janeiro estabelece o quadro de

competências e o regime jurídico de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias. 8 - Segundo a informação disponibilizada no sítio: http://www.iclei.org/home.html em 28-03-2013 as

organizações do poder local em Portugal que cumpriram os requisitos da carta Aalborg são seis: Junta

Freguesia de Agualva; Camara Municipal de Águeda; Camara Municipal de Almada; Camara Municipal

de Cascais; Camara Municipal de Oeiras; Camara Municipal de Torres Vedras. Tais compromissos

implicam: (1) Um ano para desenvolver um relatório de base, descrevendo os esforços do município

dentro do campo da sustentabilidade e dos desafios que tem pela frente; (2) Dois anos para estabelecer as

metas e os planos de ação em cooperação com os cidadãos locais e outros interessados, bem como definir

os compromissos do desenvolvimento sustentável; (3) Publicar anualmente os relatórios dos

compromissos das metas estabelecidas e as respetivas realizações.

implementação da Agenda 21 em Portugal, deu a conhecer os 118 municípios e as 21

freguesias que declaravam ter Agenda 21 Local9. Atualmente existirão 69 organizações

do poder local que têm em curso processos de A21L: “23 subscreveram a Carta de

Aalborg, 16 os Compromissos de Aalborg e 30 subscreveram ambos os marcos de

sustentabilidade local”, (2012:5).

Num olhar sobre a implementação em Portugal da A21L transparece a pergunta:

Tínhamos condições ou não para implementar um maior número de A21L?

Embora não se trate de imputar responsabilidades, a verdade é que os diversos

patamares de governação, do local ao nacional, ao que parece, ainda não colocaram de

forma efetiva na sua agenda, a A21L, face ao reduzido número de entidades do poder

local que afirmam ter A21L considerando a existência de 4.260 Freguesias, 308

Municípios, 23 Comunidades Intermunicipais, 2 Áreas Metropolitanas e 5 Comissões

de Coordenação de Desenvolvimento Regional.

A fraca implementação da A21L pode ser entendida numa dialética em que a

“nossa” cultura tende a desenvolver os processos de forma descomprometida,

provavelmente até ad-hoc, sem a carga de compromissos “acessórios” exigidos pelo

ICLEI. O problema coloca-se perante o reconhecimento internacional da

implementação, acompanhamento e desenvolvimento das Agendas 21 Locais

portuguesas. Das dezenas de municípios que subscreveram a Carta de Aalborg, os

respetivos Compromissos ou ambos, uma parte significativa “demora mais de 2 anos a

arrancar, o que coloca, desde logo, os municípios portugueses em incumprimento em

relação ao documento que subscreveram” (UCP, 2012:10). Como referido na publicação

da Universidade Católica Portuguesa – UCP: “A Agenda 21 em Portugal segue um

caminho próprio” (ibidem).

5. Um desafio para a cidadania

Antes de mais importa referir que a implementação e o desenvolvimento das

A21L significam o reforço da participação democrática dos cidadãos na vida da sua

comunidade e simultaneamente constitui um desafio para a cidadania. A cidadania é um

processo em construção que depende da forma como os cidadãos apreendem o conjunto

9 - Segundo a publicação “Agenda 21 local em Portugal” do Grupo de Estudos Ambientais, da Escola

Superior de Biotecnologia da Universidade Católica Portuguesa, Marta Macedo, 2012.

de deveres e direitos sociais, cívicos e políticos. A materialização destes direitos

resultou em grande medida da consolidação do Welfare State.

A cidadania expressa-se, também, no direito dos cidadãos participarem nas

decisões e na gestão da coisa pública, quer diretamente, quer através dos seus

representantes10

.

As transformações sociais processadas pela globalização colocam-nos perante

novas formas e novos conteúdos que mudam a consciência social e exigem novas

respostas. Os problemas relacionados com a liberalização de mercados e os avanços

tecnológicos colocam-nos perante pressões acrescidas de aumento da competitividade e

condicionamento ao aprofundamento da cidadania. As dificuldades económicas e

financeiras dos Estados, as macroestruturas e as ineficiências económicas, a perda de

soberania regulatória em favor da autorregulação dos mercados, a perda de

produtividade das empresas como resultado do peso da burocracia e da carga tributária

fiscal, o peso dos custos energéticos e os custos salariais, levaram muitas empresas a

deslocalizar a sua atividade para outros mercados e, legitimada por estes motivos, a

ascensão de ideologias neo-liberais põem em questão o papel do Estado na realização

dos direitos económicos e sociais.

Por outro lado, as novas relações sociais e familiares que decorrem dos

processos de metropolização conduzem a ruturas com as formas tradicionais de

solidariedade onde a família tinha, como é sabido, um papel de extraordinária

importância.

Ao pensarmos em novas formas de cidadania no que diz diretamente respeito

com a A21L iremos salientar duas dimensões de participação. A primeira refere-se ao

conjunto de competências que foram descentralizadas, quer para os Municípios, quer

para as Freguesias, que permitem ao cidadão reivindicar diretamente os seus direitos

num vasto leque de assuntos11

. A outra forma refere-se à participação associativa que,

embora não sendo nova, ganhou novas formas de intervenção, são as ONG´s para o

desenvolvimento, para o ambiente, para a defesa do património, para a proteção de

deficientes, dos direitos das mulheres, das minorias, etc.

10

- Consagrado no artigo 21º da Declaração Universal dos Direitos do Homem. 11

- De acordo com o artigo 13.º e 14.º da Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro que estabelece o quadro de

transferência de atribuições e competências para as autarquias locais, são do domínio dos Municípios e

das Juntas de Freguesia as competências sobre equipamento rural e urbano, energia, transportes e

comunicações, educação, património, cultura e ciência, tempos livres e desporto, cuidados primários de

saúde, ação social, habitação, abastecimento público, ambiente e saneamento básico, ordenamento do

território e urbanismo.

A democracia precisa de cidadãos ativos, informados e responsáveis para

assumir o seu papel na comunidade e contribuir para o processo político. Perante a

diversidade e complexidade das sociedades do nosso tempo a participação de todos é

um bem para a sociedade que não poderemos desperdiçar.

6. Principais conclusões

Se partirmos do princípio que os processos de desenvolvimento sustentável

comportam em si a capacidade de criar novos padrões socais e que a A21L abre a

possibilidade de “superação de conflitos por via da promoção da sustentabilidade

através da ação política e técnica em ordem a envolver as forças vivas da comunidade e

ao reforço das redes de cooperação, procurando a construção partilhada de formas de

desenvolvimento sustentáveis” (Queiróz, 2007:73) estamos perante desafios que podem

representar oportunidades. Parece óbvio que os exemplos conhecidos de outras

comunidades e cidades deixam no ar a possibilidade de se terem desenvolvido em

condições supostamente definidas em outros níveis de decisão. No entanto, será uma

evidência que sobreviverão melhor às crises os mais criativos e inovadores, com

capacidade de intuição para adaptar-se aos novos factos e a novas contingências. “Num

quadro de incertezas, os sistemas locais serão tanto mais resilientes quanto menos

rígidas forem as suas estruturas, quanto mais descentralizados e flexíveis forem os

circuitos de tomada de decisão, quanto mais denso for o tecido social e mais vivas

estejam as redes de conveniência para dar respostas rápidas e imaginativas a eventuais

situações de risco”. (Novo, 2006).

As A21L constituem instrumentos de gestão e promoção do desenvolvimento,

numa lógica de adaptação do sistema local enquadrando-o nas determinações de

patamares de decisão superiores, seja no plano político seja económico, sem, no entanto,

abdicar das especificidades ambientais e culturais de cada local. Como refere Queiróz,

(2007:73):

Tal como um sistema orgânico, o sistema social onde se inserem as A21L, alimenta-se de

energia que, neste caso, corresponde à diversidade dos agentes da rede, à sua

conectividade, interdependência e comunicação (...). A diversidade é a matéria-prima

para as ideias inovadoras, valores, interesses e conhecimento (…) A interdependência é

a fonte energética que junta e sustenta os agentes (...). O diálogo assemelha-se ao código

genético, que confere a coerência da estrutura onde os agentes processam a sua

diversidade e interdependência.

Existe com alguma evidência uma lacuna no que diz respeito à implementação

da A21L no nosso país, é a necessidade de sensibilizar a opinião pública para o

importante papel das autarquias locais. O associativismo - designadamente, por via das

ONG´s - pode constituir uma importante frente de ação para ajudar a desenvolver os

objetivos de desenvolvimento sustentável. É necessário o estabelecimento de uma maior

cooperação com a academia no sentido de ser estudado um plano que ajude e facilite a

implementação das A21L. Da mesma forma, importa ser definida uma metodologia para

a definição de um quadro de critérios genéricos e específicos a aplicar às A21L, tendo

em vista criar condições para que no médio prazo um número bastante mais

significativo de Municípios e Freguesias possam aderir à Carta e aos Compromissos de

Aalborg.

Por último apenas mais dois aspetos, o primeiro seria a criação de um plano

formativo certificado pela ANQ, com o objetivo de capacitar os diversos atores

interessados no que diz respeito à metodologia, objetivos, metas e resultados da A21L,

o outro, não menos importante que o primeiro, seria o reforço da educação e da

formação para a cidadania como fator indispensável para atingir um desenvolvimento

sustentável.

Bibliografia

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Outras Fontes Consultadas

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http://www.iclei.org/home.html

Sítio da Agenda 21 Local em Portugal: http://www.agenda21local.info/ ou

http://www.cidadessustentaveis.info/


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