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Disciplina na Igreja

Date post: 10-Nov-2023
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1 Introdução Hoje em dia, falar de disciplina na igreja, parece ser algo terrível. A impressão que as pessoas têm da disciplina é: “Isso é algo ultrapassado, a igreja mudou, isso é coisa de antigamente!”, “na verdade, ninguém tem nada que ver com a vida de ninguém, na igreja, deveria ser cada um por si e Deus por todos”, “Esse negócio de disciplina afasta os incrédulos, é melhor deixar isso pra lá”, “Essa igreja não tem amor, como pode, chamar a pessoa de pecadora assim na cara dura, isso é falta de respeito...”, “Tem igrejas que não fazem isso e estão crescendo, acho que disciplinar é um erro”, “Ai credo! Isso parece inquisição, uma verdadeira caça as bruxas...”, “Estou na igreja há anos e nunca vi um absurdo desse...”. Esses são os pensamentos da maioria das pessoas quando se fala de disciplina na igreja. Tenho de admitir, que a disciplina que a maioria das igrejas têm aplicado causa realmente essa impressão. Quantos de nós, já não passaram por assembléias tórridas onde um casalzinho que teve relações antes do casamento foi execrado, massacrado, sua família publicamente humilhada, e isso, sem nenhum amor, carinho, ajuda ou solução para seus problemas. O pecador é abandonado à sua própria sorte, além de muitas vezes, eles já estar sendo punido pelas próprias conseqüências de seus atos, a igreja ao invés de ajudá-lo a se restaurar, o abandona, como já tenho ouvido por aí: “A igreja é o único exército que abandona seus feridos no campo de batalha...”. Na maioria das igrejas, a disciplina é sinônimo de exclusão, não se oferece tratamento, nem solução, nem oportunidade de restauração, é mais fácil amputar o membro do que tratá-lo. Isso ocorre, porque a igreja, e na maioria das vezes os pastores, não sabem como lidar com os casos, ou ainda por causa de membros pouco misericordiosos que se acham mais santos do que o infame pecador. Tudo isso, para se excluir em uma assembléia, quer dizer, tirar o nome da pessoa de uma lista de papel, e numa assembléia um mês depois, com uma carta de reconciliação, se aceita a pessoa novamente como membro, e isso, sem nenhum acompanhamento, aconselhamento ou qualquer tipo de ajuda que possa levar essa pessoa à restauração. Na cabeça de muitas pessoas, a disciplina é não tomar ceia, não dar aula ou deixar algum cargo, algo pura e simplesmente administrativo. Esquecemos que a igreja é organismo vivo, para torná-la uma instituição onde a administração suplantou o cuidado, e as pessoas se tornaram nomes em listas de membresia, e a disciplina é sinônimo de uma exclusão meramente administrativa, algo que faz parte de assembléia, movimento de membros, algo decidido em reunião de diretorias estatutárias. As pessoas pensam que a disciplina é ruim, porque se esqueceram de um fato básico sobre a igreja, ela não é uma instituição, nós fomos engolidos pela organização, absorvidos pelo institucionalismo a ponto de esquecermos que a igreja é um organismo espiritual vivo. Esquecemos que como organismo espiritual, fazemos parte de um corpo espiritual, que é o corpo de Cristo. E, se o corpo é de Cristo, deve ser um corpo santo. Assim como em nossos próprios corpos, sempre que há sujeiras, limpamos, quando há enfermidades, nós tratamos, e quando há um câncer, extirpamos, assim também é a disciplina no corpo de Cristo, ela é limpeza, é tratamento, é cura e em alguns casos onde o remédio não tem mais efeito é excomunhão.
Transcript

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Introdução

Hoje em dia, falar de disciplina na igreja, parece ser algo terrível. A impressão que

as pessoas têm da disciplina é: “Isso é algo ultrapassado, a igreja mudou, isso é coisa de

antigamente!”, “na verdade, ninguém tem nada que ver com a vida de ninguém, na igreja,

deveria ser cada um por si e Deus por todos”, “Esse negócio de disciplina afasta os

incrédulos, é melhor deixar isso pra lá”, “Essa igreja não tem amor, como pode, chamar a

pessoa de pecadora assim na cara dura, isso é falta de respeito...”, “Tem igrejas que não

fazem isso e estão crescendo, acho que disciplinar é um erro”, “Ai credo! Isso parece

inquisição, uma verdadeira caça as bruxas...”, “Estou na igreja há anos e nunca vi um

absurdo desse...”.

Esses são os pensamentos da maioria das pessoas quando se fala de disciplina na

igreja. Tenho de admitir, que a disciplina que a maioria das igrejas têm aplicado causa

realmente essa impressão. Quantos de nós, já não passaram por assembléias tórridas onde

um casalzinho que teve relações antes do casamento foi execrado, massacrado, sua família

publicamente humilhada, e isso, sem nenhum amor, carinho, ajuda ou solução para seus

problemas. O pecador é abandonado à sua própria sorte, além de muitas vezes, eles já estar

sendo punido pelas próprias conseqüências de seus atos, a igreja ao invés de ajudá-lo a se

restaurar, o abandona, como já tenho ouvido por aí: “A igreja é o único exército que

abandona seus feridos no campo de batalha...”.

Na maioria das igrejas, a disciplina é sinônimo de exclusão, não se oferece

tratamento, nem solução, nem oportunidade de restauração, é mais fácil amputar o membro

do que tratá-lo. Isso ocorre, porque a igreja, e na maioria das vezes os pastores, não sabem

como lidar com os casos, ou ainda por causa de membros pouco misericordiosos que se

acham mais santos do que o infame pecador. Tudo isso, para se excluir em uma

assembléia, quer dizer, tirar o nome da pessoa de uma lista de papel, e numa assembléia

um mês depois, com uma carta de reconciliação, se aceita a pessoa novamente como

membro, e isso, sem nenhum acompanhamento, aconselhamento ou qualquer tipo de ajuda

que possa levar essa pessoa à restauração. Na cabeça de muitas pessoas, a disciplina é não

tomar ceia, não dar aula ou deixar algum cargo, algo pura e simplesmente administrativo.

Esquecemos que a igreja é organismo vivo, para torná-la uma instituição onde a

administração suplantou o cuidado, e as pessoas se tornaram nomes em listas de

membresia, e a disciplina é sinônimo de uma exclusão meramente administrativa, algo que

faz parte de assembléia, movimento de membros, algo decidido em reunião de diretorias

estatutárias.

As pessoas pensam que a disciplina é ruim, porque se esqueceram de um fato

básico sobre a igreja, ela não é uma instituição, nós fomos engolidos pela organização,

absorvidos pelo institucionalismo a ponto de esquecermos que a igreja é um organismo

espiritual vivo. Esquecemos que como organismo espiritual, fazemos parte de um corpo

espiritual, que é o corpo de Cristo. E, se o corpo é de Cristo, deve ser um corpo santo.

Assim como em nossos próprios corpos, sempre que há sujeiras, limpamos, quando há

enfermidades, nós tratamos, e quando há um câncer, extirpamos, assim também é a

disciplina no corpo de Cristo, ela é limpeza, é tratamento, é cura e em alguns casos onde o

remédio não tem mais efeito é excomunhão.

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O que diz o Antigo Testamento

A primeira vez que a palavra disciplina aparece na Bíblia, é no Antigo Testamento,

em Levítico 26.14 – 15, 23 – 24: “... Se apesar disso vocês não aceitarem a minha

disciplina, mas continuarem a opor-se a mim, eu mesmo me oporei a vocês e os castigarei

sete vezes mais por causa dos seus pecados...”. Todo o capítulo 26 de Levítico mostra

como Deus trata o pecador obstinado, o texto tem uma seqüência lógica, que é marcada

pela frase “se apesar disso”.

Deus começa com um alerta, e lodo depois vem um “se apesar disso” (cf. vs. 18),

se o povo não se arrependesse Deus trataria com mais dureza, então, outro “se apesar

disso” (cf. vs. 23), e assim vai se repetindo até o versículo 27 onde os “se apesar disso”,

terminam, aonde o amor e fidelidade de Deus chegam ao limite do tolerável e Deus diz:

“...então com furor me oporei a vocês, e eu mesmo os castigarei sete vezes mais por causa

dos seus pecados. Vocês comerão a carne dos seus filhos e das suas filhas. Destruirei os

seus altares idólatras, despedaçarei os seus altares de incenso e empilharei os seus

cadáveres sobre os seus ídolos mortos, e rejeitarei vocês...”.

A palavra usada por Moisés para disciplina, é a palavra (yasar) a palavra

significa, “disciplinar”, “repreender”, “instruir” e a idéia da palavra é da correção que

resulta da educação. A disciplina tem seu fundamento teológico na aliança que o SENHOR

estabelece com seu povo, a disciplina corretiva de Deus faz com que o povo mude. Nunca

se deve interpretar negativamente a disciplina do SENHOR, pois as dificuldades do deserto

tiveram como contrapartida aquilo que Ele proveu miraculosamente, sendo que tanto um

quanto outro tiveram como objetivo testar; “o que estava no teu coração, se guardas ou

não os seus mandamentos” (Deuteronômio 8.2). Por essa razão, através da fome e também

do maná que Deus providenciou eles deviam; “entender que não só de pão viverá o

homem, mas de tudo o que procede da boca de Deus” (Deuteronômio 8.3). Dessa forma

eles deviam reconhecer em seus corações que o SENHOR estava disciplinado-os

(Deuteronômio 8.5). Essa disciplina pode, então, ser considerada como educação

teocêntrica (Deus como o centro) e que realmente parte de Deus.

Esses dois textos nos mostram que primeiro, a fonte da disciplina não são pessoas,

instituições, organizações ou leis, a fonte da disciplina, é o SENHOR, é Deus quem

disciplina. As pessoas, instituições, organizações ou leis muitas vezes são simplesmente a

vara que Deus usa para disciplinar. Em segundo lugar, o propósito da disciplina é o ensino,

ela é simplesmente um meio que Deus usa para ensinar a seu povo.

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Papai porque você está me batendo?

Até aqui, pudemos perceber, que a disciplina tem no coração de Deus um propósito

educativo, isso é claramente percebido com o paralelo feito em Deuteronômio 8.5 – 6 (cf.

Provérbios 3.12): “Saibam, pois, em seu coração que, assim como um homem disciplina o

seu filho, da mesma forma o SENHOR, o seu Deus, os disciplina. Obedeçam aos

mandamentos do SENHOR, o seu Deus, andando em seus caminhos e dele tendo temor”.

Aqui, Deus é o pai que corrige ao seu filho, como o paralelo é de pai e filho, seria

interessante observarmos alguns textos do porque um pai deve disciplinar seu filho, para

compará-los ao trato de Deus para conosco.

Provérbios 5.22 – 23: “As maldades do ímpio o prendem; ele se torna prisioneiro

das cordas do seu pecado. Certamente morrerá por falta de disciplina...”. Esse texto nos

revela, que a pessoa que não é disciplina se torna escravo do pecado, e numa progressão

assustadora, o texto mostra que o fim de um indisciplinado é a morte. Podemos ver aqui,

pelo menos dois motivos paternos de Deus para nos disciplinar. O primeiro deles, é que

Deus quer que seus filhos sejam livres do pecado (João 8.36). O segundo, é que nenhum

pai, por menos consciência que tenha, quer seu filho morto no pecado. É exatamente por

isso que Deus nos disciplina, para que aprendamos o caminho da justiça e nos desviemos

do caminho do pecado e da morte: “Meu filho, obedeça aos mandamentos de seu pai e não

abandone o ensino de sua mãe... Pois o mandamento é lâmpada, a instrução é luz, e as

advertências da disciplina são o caminho que conduz à vida” (Provérbios 6.20, 23).

Quando adquirimos como filhos tal conhecimento, faremos como Davi que deu graças a

Deus por ser disciplinado: “Antes de ser castigado, eu andava desviado, mas agora

obedeço à tua palavra. Foi bom para mim ter sido castigado, para que aprendesse os teus

decretos. Sei, Senhor, que as tuas ordenanças são justas, e que por tua fidelidade me

castigaste” (Salmo 119.67, 71, 75).

Provérbios 22.15: “A insensatez está ligada ao coração da criança, mas a vara da

disciplina a livrará dela” (cf. tb. Provérbios 23.13 – 14). A palavra usada aqui por

Salomão é (‟iwwelet) e significa “insensatez”, “loucura”. Essa palavra expressa a

atitude de alguém que é “grosseiro de mente”, “tolo”, alguém que é moralmente deficiente,

uma pessoa que possui carência em suas faculdades mentais e é normalmente corrupta. A

pessoa que tem esse tipo de atitude não é apenas um tolo, mas um insolente, alguém que

brinca com os mandamentos de Deus. Essa palavra está relacionada ao coração da criança

que necessita da vara da disciplina dada pelo pai para sair dessa condição de insensatez.

Quando trazemos essa noção do campo de disciplina entre o pai e sua criança, para a

relação de Deus com seus filhos, podemos traçar um paralelo, de que Deus usa Sua vara

em seus filhos insensatos assim como um pai com sua criança: “(Deus) Aquele que

disciplina as nações os deixará sem castigo?” (Salmo 94.10a). No caso do povo de Israel,

uma das varas que o Pai usou para discipliná-los foi a Assíria: “... assírios, a vara do meu

furor, em cujas mãos está o bastão da minha ira!” (Isaías 10.5). Depois de muitos anos de

orientação, de chances e mais chances para o arrependimento, a insensatez continuou a ser

a máxima em Israel, então Deus pegou sua vara (os Assírios) e disciplinou o povo de Israel

(cf. II Reis 17), depois da invasão Assíria, e do cativeiro Babilônico (as varas da disciplina

de Deus), o povo de Israel nunca mais voltou às práticas idólatras de antes (cf. todo o livro

de Esdras e Neemias), Deus os disciplinou com a vara e a insensatez saiu de seus corações.

Provérbios 29.15, 17: “A vara da correção dá sabedoria, mas a criança entregue a

si mesma envergonha a sua mãe... Discipline seu filho, e este lhe dará paz; trará grande

prazer à sua alma”. Nesse texto aprendemos que a disciplina traz grandes benefícios, não

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só para os filhos mas também para os pais. O primeiro versículo ensina que a criança

entregue a si mesma envergonha sua mãe. Obviamente, quando uma mãe é envergonhada,

o pai também o é. Quando ampliamos isso para a relação de Deus com seu povo,

percebemos que, seja na história de Israel, ou seja na da igreja, os momentos em que a

disciplina foi deixada de lado o nome de Deus foi envergonhado. Nós vivemos tempos

assim, as igrejas deixaram a disciplina bíblica de lado e se acostumaram com uma

disciplina segundo tradições humanas, por isso, hoje vemos a degeneração do nome

Cristão, não existe mais respeito a Deus, mesmo dentro das igrejas, as pessoas pecam sem

nenhum temor, pois sabem que o máximo que vai acontecer, é seu nome ser tirado de um

papel, no mais, tudo continua igual. Com isso as pessoas do mundo observam e dizem:

“Você viu fulano? Diz que é crente mas faz o mesmo que a gente... que Deus é esse que ele

vivia pregando...”. A igreja que deveria ser a vara da correção, usada nas mãos de Deus,

não tem feito seu papel, e com isso, assim como uma criança entregue a si mesma,

envergonha seus pais, os filhos de Deus entregues a si mesmos têm envergonhado ao Pai

celestial. Mas o texto que lemos, também traz uma luz, se nós tivermos o habito da

disciplina Bíblica na igreja de Deus, nosso pai terá prazer em nós como seus filhos

amados, assim como disse João de seus discípulos: “Não tenho alegria maior do que ouvir

que meus filhos estão andando na verdade” (III João 1.4). Referindo-se a seus discípulos

Paulo também escreve: “Façam tudo sem queixas nem discussões, para que venham a

tornar-se puros e irrepreensíveis, filhos de Deus inculpáveis no meio de uma geração

corrompida e depravada, na qual vocês brilham como estrelas no universo, retendo

firmemente a palavra da vida. Assim, no dia de Cristo eu me orgulharei de não ter corrido

nem me esforçado inutilmente” (Filipenses 2.14 – 16). O orgulho do ministério de Paulo

era a forma como os filhos de Deus o honram com suas vidas.

Como pudemos observar, a disciplina de um pai para com seu filho nos ensina

grandemente sobre os benefício da disciplina, e nos traça ótimos paralelos sobre a

disciplina de Deus para com os Seus filhos. Gostaria ainda de que pensássemos sobre

apenas mais um dos benefícios da disciplina expostos no primeiro texto que vimos

(Deuteronômio 8.6), e o beneficio a que me refiro é o temor. O texto diz: “...Obedeçam aos

mandamentos do SENHOR, o seu Deus, andando em seus caminhos e dele tendo temor”. A

palavra “temor” é tema central em toda a Bíblia ao tratar o relacionamento de Deus com o

homem, como diz o salmista: “Adorem o Senhor com temor; exultem com tremor... para

que ele não se ire e vocês não sejam destruídos de repente, pois num instante acende-se a

sua ira. Como são felizes todos os que nele se refugiam!” (Salmo 2.11 – 12). Temos que

nos recordar que estamos lidando com um Deus santo, que odeia o pecado, que não suporta

o orgulho e obstinação no coração dos homens, e que retribuirá a cada um conforme suas

obras.

Quando escrevia sobre esse assunto me lembrei de minha infância. Eu amo meu

pai, e de todos os filhos sempre fui o mais apegado a eles, quando ele saia de viajem,

muitas vezes eu ficava doente, e em algumas vezes fui até internado, os médicos diziam

que minha doença era saudade do pai, fato é, que sempre que ele voltava de viajem

qualquer doença tinha fim. Ele sempre nos instruiu e orientou, foi sempre um pai muito

carinhoso. Mas, eu me recordo claramente de quando eu aprontava alguma coisa e o

desobedecia, me lembro de quando ouvia aquela voz vinda lá de cima, forte como um

trovão, e com uma entonação tétrica e pavorosa, me recordo como se fosse hoje, que em

algumas vezes, com uma simples olhada, ou um levantar de voz, as pernas bambeavam, o

corpo se arrepiava até o coro cabeludo e quase fazíamos xixi nas calças de pavor, medo,

por saber as conseqüências de nossos atos. Só um detalhe, só apanhei dele, uma vez na

vida, uma única, mas que me convenceu de não querer outra. Não deveria ser muito maior

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nosso respeito a Deus? Não deveríamos temer muito mais o peso de sua mão do que as de

um pai humano? É exatamente para isso que serve a disciplina na igreja, para que, vendo

as conseqüências da desobediência, entre profundamente o desejo em nosso coração de

nunca mais desobedecer de novo, com profundo temor e tremor.

Nos já aprendemos que a disciplina na igreja tem como primeiro propósito a

educação e instrução do povo de Deus, outro propósito, muito ligado à esse é a correção,

vimos que assim como um pai disciplina a seu filho que ama, Deus disciplina aos seus

filhos, obviamente, se não somos disciplinados, não somos filhos. O terceiro propósito da

disciplina, que já observamos dentro da perspectiva educacional da disciplina é o temor do

Senhor. A disciplina mostra a santidade de Deus, e o furor de sua ira contra o pecado, e por

conseguinte, contra o pecador obstinado.

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Eu não Aceito...

Nesta parte aprenderemos os resultados terríveis de não aceitar a disciplina de

Deus, em Provérbios dois textos nos demonstram isso, o primeiro é Provérbios 3.11: “Meu

filho, não despreze a disciplina do Senhor nem se magoe com a sua repreensão...”. Esse

texto demonstra que a disciplina do Senhor é sinal de seu amor, por nós, aquele que

despreza a disciplina do Senhor, despreza o amor do Senhor. O povo de Israel foi clara

demonstração disso, eles desprezaram continuamente o amor fiel ( – hesed) do

Senhor, e como conseqüência Deus também os desprezou, vemos isso em Oséias 4.6: “...

Uma vez que vocês rejeitaram o conhecimento, eu também os rejeito... uma vez que vocês

ignoraram a lei do seu Deus, eu também ignorarei seus filhos...”. Aqueles que rejeitam o

amor de Deus, muitas vezes demonstrado através de Sua disciplina, rejeitam o próprio

Deus e assim sendo, perdem os benefícios de aprender de Deus.

Uma outra palavra curiosa usada no texto de Provérbios é a palavra (qûts –

“estar magoado”, “enojar-se de”), essa palavra, denota uma profunda reação emocional de

alguém, que resulta numa rejeição de alguma coisa, que no caso de provérbios é a

disciplina. Essa palavra é tão forte que seus sinônimos são: “jogar fora como imundo”, “ter

repugnância”.

Quantas, e quantas vezes nas igrejas de hoje essa não é a reação das pessoas quanto

à disciplina. Todos nós conhecemos histórias de fulanos que ao serem disciplinados pela

igreja ficaram indignados, indo embora para nunca mais voltar, ou talvez de sicranos que

ficaram revoltados pela igreja ter disciplinado o fulano, achando que a igreja foi dura

demais, se magoaram e mudaram de igreja. Essas histórias são muito comuns, e quase que

cotidianas. Hoje em dia não se aceita a disciplina, se esse texto de provérbios fosse

profecia, os tempos seriam seu cumprimento, nossa geração se esqueceu da pequena

partícula negativa que vem antes da palavra magoar-se que é “não”, “não” devemos nos

magoar com a repreensão de Deus, pois ela é prova de seu amor por nós.

Quantas vezes não temos ouvido que a disciplina é ruim, que magoa as pessoas, que

afasta as pessoas da igreja, que deixa os incrédulos inconfortáveis, etc... Mas ao

observarmos provérbios, Deus não diz que não devemos disciplinar, mas antes, nos ensina,

qual deve ser a nossa reação à disciplina. Com ela devemos aprender e nos alegrar, por

saber que Deus se interessa por nós, a ponto de nos corrigir.

Outro texto, também no livro onde Salomão ensina sobre a verdadeira sabedoria,

fala sobre o fim da pessoa que não quer saber da disciplina: “... No final da vida você

gemerá, com sua carne e seu corpo desgastados. Você dirá: „Como odiei a disciplina!

Como o meu coração rejeitou a repreensão! Não ouvi os meus mestres nem escutei os que

me ensinavam. Cheguei à beira da ruína completa, à vista de toda a comunidade‟”

(Provérbios 5.11 – 14).

Que infelicidade, saber que tem pessoas dentro da própria igreja que terminarão

suas vidas com frases parecidas a essas. Tudo isso, por medo da igreja corrigir, por

covardia, por timidez. Irmãos, que têm vergonha de exortar a outros irmãos, pastores que

por covardia, tem medo de perderem seus salários ou de causarem confusão na igreja,

“põem panos quentes”, “tratam em banho Maria”, preferem se calar diante do pecado. E é

assim, dessa forma que cada vez mais pessoas terminam suas vidas naufragando na fé.

A Bíblia é bem clara, a disciplina é uma das grandes bênçãos e demonstração do

amor de Deus para com seu povo, deveria ser tão aceita, como a ceia, o batismo, a

salvação, deveria fazer tão parte da igreja como o louvor, as mensagens, a evangelização,

ela deveria ser tão diária quanto a leitura bíblica e a oração. A disciplina é tão necessária ao

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homem de Deus, porque ela é o instrumento pelo qual, assim como diz a música, Deus

“quebra nossa vida e faz de novo...”.

Para terminar quero contar uma ilustração: “Certa vez, fui a uma olaria para

conhecer a fabricação de um vaso, primeiro com uma pá, vi o oleiro pegar um pouco de

barro, ele foi lavado, depois socado, amassado, e depois de tudo isso colocado em um

torno, onde ficou girando sem parar, ali ele foi apertado, espremido, torcido, por vezes

novamente socado o processo começa todo de novo até que tenha uma simétrica perfeita.

Depois desse processo, fiquei um pouco sozinho, perto de onde os vasos eram colocados

no forno, pensando em como era duro ser vaso. Quando de repente! Um frio me percorreu

a coluna, extremamente assustado, ouvi de dentro do forno um grito baixo, em grande

desespero, corri para atendê-lo, e para meu espanto, quando cheguei lá, era um vaso

ardendo a 3000 graus, e pedindo para sair. Disse que, não agüentava mais, já tinha sido

socado, espremido, e agora estava sufocando dentro daquele forno. Então lhe disse que

não poderia tirá-lo pois se o tirasse ele não suportaria e se despedaçaria inteiro, mas me

comprometi a ficar ao seu lado, depois de algum tempo veio o oleiro, fiquei calado,

apenas observando-o tirar o vaso do forno e colocá-lo em uma bancada, onde por fim

ficou descansando, mais tranqüilo, saí dali para ver o resto do processo, depois do forno,

os vasos eram pintados, com cores muito fortes, achei de mau gosto, pois as cores eram

muito grosseiras, então me apertou o coração ao ver que depois de

pintado, novamente o vaso era levado para um forno ainda mais

quente que o primeiro, meio atordoado só de pensar, sai para uma

sala grande bem fresquinha, cheia de prateleiras, e nelas vasos

lindos, de raríssima beleza. Estando ali, me perguntei em voz alta

pensando estar sozinho: Onde será que são feitos esses vasos, de

cores tão belas, e tão finos em detalhes? Quando fui surpreendido

por um daqueles lindos vasos que me disse: Somos os mesmos vasos

que você viu desde o princípio, por sinal, ali está o vaso que você

viu ser tirado do forno, é que para que nós fiquemos tão bonitos

precisamos ser bem amassados, torneados, e assados em tão alta

temperatura, no fogo ficamos fortes, resistentes, nossas cores se

firmam, se transformam, ganhamos brilho e aqui estamos. Nesse momento, sacudi a

cabeça e percebi que tudo não se passava de um sonho, e que vasos não falam”.

Desta “ilustração” aprendemos, que se Deus é o oleiro, e nós somos os vasos, para

sermos vasos bonitos, precisamos ser disciplinados, quer dizer, amassados, espremidos,

torneados, assados, até que no céu sejamos expostos, como belíssimos e raríssimos vasos

da graça de Deus.

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No Novo, é tudo... de Novo!!!

Até aqui, estudando a palavra de Deus, e observando em especial o Antigo

Testamento, pudemos aprender que o propósito de Deus com a disciplina é de amor,

cuidado e carinho, “assim como um pai com seu filho”. Vimos também que todas as vezes

que a palavra disciplina é usada, sua ênfase é educativa, buscando a restauração, e mesmo

quando a disciplina é extremamente dura, em todo o Antigo Testamento, vemos o amor

declarado de Deus para com o seu povo Israel.

Ao adentrarmos o Novo Testamento, observamos que a graça restauradora de Deus

através da cruz explodindo em misericórdia e amor em níveis nunca dantes observados,

mesmo assim, a perspectiva da disciplina não mudou, porque Deus não muda em Seus

princípios eternos, apesar de não estamos mais debaixo da Lei, estamos sob uma nova

legislação, Cristo, e essa, sobremaneira exaltada em relação à primeira, Deus continua

disciplinando a quem ama. Na verdade, o que mudou, foi Cristo, a expressão máxima da

graça de Deus, ele mudou a prática da disciplina, o que antes gerava morte imediata, agora

diante arrependimento, se torna graça sobre graça.

O exemplo vivo disso, foi a mulher adúltera, a quem os judeus queriam apedrejar,

mas, Jesus, conhecendo o coração daquela mulher, promulga o decreto do arrependimento:

“Vá e não peques mais...”. Se todavia estivesse em vigor a Lei de Moisés Jesus juntamente

com aqueles homens, em obediência à Deus apedrejariam aquela mulher até a morte. Mas

essa Lei foi substituída pela Lei do arrependimento, Cristo. Cristo dá chances e mais

chances para que o homem se arrependa e deixe o pecado, mas Jesus foi bem claro com

aquela mulher: “Não peques mais...”. A condição da graça é a confissão e o

arrependimento, a condição da graça é ouvir a Deus e deixar o pecado.

Seguindo esse princípio, o da graça, dois textos são cruciais, o primeiro deles, um

discurso do próprio Senhor Jesus Cristo em Mateus 18.15 – 20: “Se o seu irmão pecar

contra você , vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão.

Mas se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que „qualquer

acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas‟. Se ele se recusar

a ouvi-los, conte à igreja; e se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão

ou publicano. „Digo-lhes a verdade: Tudo o que vocês ligarem na terra terá sido ligado no

céu, e tudo o que vocês desligarem na terra terá sido desligado no céu‟. „Também lhes

digo que se dois de vocês concordarem na terra em qualquer assunto sobre o qual

pedirem, isso lhes será feito por meu Pai que está nos céus. Pois onde se reunirem dois ou

três em meu nome, ali eu estou no meio deles‟”.

Aparentemente aqui Jesus faz uma citação livre do princípio ensinado em Levítico

19.17, “... repreendam com franqueza o seu próximo para que, por causa dele, não sofram

as conseqüências de um pecado”. E a primeira palavra importante usada por Jesus é

(elénchô), essa palavra significa: “trazer à luz”, “expor”, “demonstrar”,

“convencer”. E a idéia que essa palavra expressa dentro do contexto, é a de procurar o

irmão pecador, “trazendo à luz” seu pecado, “demonstrando” através da “exposição” da

Palavra de Deus seu erro, para que ele, “convencido” do pecado se arrependa, confesse e

deixe de pecar. Sendo assim, o objetivo da disciplina na igreja de Cristo, é ganhar o irmão.

A palavra grega usada por Jesus aqui é (kerdaínô – ganhar, obter lucro) e o seu

sentido é o de obter lucro ao restaurar o irmão caído no pecado.

Porém, como infelizmente, muitas vezes nosso irmão está cega e obstinadamente

preso ao pecado, não o reconhece como pecado, nem aceita a exortação, o texto adiciona

uma seqüência, ou um segundo passo na disciplina desse irmão. Jesus ensina-nos a chamar

duas ou três testemunhas, novamente baseado no princípio veterotestamentário contido em

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Deuteronômio 19.15 que diz: “Uma só testemunha não é suficiente para condenar alguém

de algum crime ou delito. Qualquer acusação precisa ser confirmada pelo depoimento de

duas ou três testemunhas”. As testemunhas têm como objetivo confirmar se realmente há

algum pecado no irmão, e também para que pela boca delas toda a Palavra seja

confirmada. As testemunhas então, são importantes não só para confirmar um fato, mas

também, para completar a exortação, que por acaso possa ter sido esquecida na primeira

vez. Novamente o objetivo aqui é ganhar o irmão.

Se por fim o irmão pecador não ouvir ao seu irmão individualmente, nem às

testemunhas, é necessário um terceiro passo a ser dado com relação a esse irmão, sendo

então, segundo o texto, uma exortação pública. Deve ser contado para toda a igreja, a fim

de que a igreja ciente de tal fato possa exortar a esse irmão ainda em pecado.

É importante notar aqui, o uso de Jesus da Palavra (ekklesía – igreja),

demonstrando assim, que a exortação deve acontecer dentro da comunidade dos salvos,

não envolvendo incrédulos no processo, o que exige da igreja como um todo o máximo de

sigilo possível a fim de evitar o mau testemunho para os de fora. Até esse ponto, a única

preocupação de Jesus, quanto à disciplina na igreja é que o irmão seja preservado,

restaurado, ganho de volta. Como nem sempre isso é possível, mesmo diante de tamanho

amor demonstrado por Cristo, se esse irmão continuar impassível no pecado e não mudar,

ele deve ser tratado como gentio e publicano.

Neste ponto é importante notarmos o que significava para Jesus e para seus

ouvintes tratar alguém como gentil e publicano. Também é importante notar aqui a forma

comparativa ( – “como”, “assim como”, “do mesmo modo que”) que Jesus usa, não

significa, que esses irmãos obstinados se tornam gentis ou publicanos, perdendo sua

salvação, mas sim, que por agirem como incrédulos, eles deveriam ser tratados pela igreja

da mesma forma como os gentios e os publicanos eram tratados nos tempos de Jesus. As

palavras; “gentil” e “publicano”, eram usadas para designar certos tipos de pessoas que

eram inaceitáveis dentro da comunidade judaica.

O texto nesse ponto demonstra que a esse irmão, foram dadas todas as

oportunidades da Graça para seu arrependimento, o fato dele ter desprezado a graça de

Deus, e não ter reconhecido a supremacia de Cristo através do arrependimento verdadeiro,

ele então volta a ser considerado como era antes de Cristo, “gentil” e “publicano”, sendo

que ele despreza a graça, a graça é retirada dele. E como conseqüência disso perde

(temporariamente até que se arrependa) os benefícios de estar em Cristo. Isso significa

expulsá-lo da comunhão e do convívio da igreja, perda do privilégio de participar das

ordenanças especial de Cristo como a ceia, perda de comunhão com Deus em termos da

oração, e da proteção divina contra as forças do mal, ficando tal irmão, assim como um

incrédulo, suscetível à opressão Satânica.

Cristo designou este método para vindicar a honra da igreja, preservando assim sua

pureza, e para que os obstinados reconheçam seu erro e se arrependam.

Vimos que o principal propósito da disciplina é levar a pessoa que está em pecado

ao arrependimento, vimos que isso é um ato de amor e graça da parte de Deus, pois Ele nos

corrige por nos amar como a filhos. E dessa forma, podemos expressar: “Quem ama

corrige, e quem não corrige, não ama”.

Com isso em mente, entramos no Novo Testamento debaixo de um novo escopo,

não mais enfocando princípios ou doutrinas, mas na prática, no texto de Mateus 18, Jesus

pega todo esse conhecimento adquirido e aplica-o ao dia a dia de Sua Igreja, com passos

práticos a serem seguidos para que a disciplina demonstre todo o cuidado, zelo e amor que

o Senhor tem para com Seu povo, e de novo, o foco é “ganhar o irmão”.

10

Porém, nem sempre, o irmão indisciplinado no pecado quer ser ganho, em muitos

casos o pecado já está incrustado de uma maneira tão grande no coração da pessoa que ela

começa a amar mais a seus desejos do que a Deus, tornando-os ídolos para si, e assim, fica

tão obstinada no erro que não tem mais vontade de obedecer ao que a Bíblia diz, ao que a

igreja diz, ou em última instância, ao que o próprio Deus diz. Nestes casos é muito comum

ouvir: “Pode até ser certo, mas eu não quero fazer assim...”, algumas vezes quando a

pessoa obstina quer se livrar da culpa de seu pecado e sem aceitar ajuda ou fazer qualquer

tentativa séria de deixá-lo diz: “Eu sei que Deus quer assim, mas eu não consigo...”.

Nos coloquemos no lugar de Deus ao ouvir essas afirmações. Ele que nos deixou

Sua boa, Perfeita e Agradável Palavra, a preservou intacta e imaculada, durante milhares e

milhares de anos, se humilhou tornando-se ser humano, limitado como nós, foi

envergonhado de todas as formas morrendo na cruz, nos deu poder do Espírito Santo para

que pudéssemos obedecer todas as coisas que Ele nos ordenou, intercede por nós e habita

em nossos corações, esse Deus, que apesar de tudo de terrível que fazemos continua

perseverante e inexplicavelmente nos perdoando e fazendo o bem para nós. Para esse

Maravilhoso Deus, ouvir essas afirmações; “não quero...” e “não consigo”, é pior do que a

morte, mais humilhante do que a morte na cruz, pois tais afirmações desprezam toda Sua

obra, afrontam Seu caráter, menosprezam Sua Palavra, envergonham Seu Santíssimo

Nome. Tais pessoas, estão afirmando que tudo o que Jesus fez foi insuficiente para resolver

os problemas do homem, estão, nessas afirmações dizendo, que o poder do Espírito Santo

não é eficaz para a luta contra o pecado. No final das contas, tais afirmações soam nos

ouvidos de Deus como uma acusação, quase que: “a culpa é Sua, quem mandou não me

dar o que eu quero!!!”.

Muitas vezes quando isso acontece, temos a tendência a ser complacentes,

pensando que a pessoa é uma vítima do pecado, mas na verdade, a Bíblia não nos dá

margens para pensar assim, em Tiago capítulo 1 versículos de 13 a 15 a Palavra de Deus

diz: “Quando alguém for tentado, jamais deverá dizer: „Estou sendo tentado por Deus‟.

Pois Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta. Cada um, porém, é tentado

pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido. Então esse desejo, tendo

concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ter se consumado, gera a morte”.

Aqui vemos claramente, que o pecado só tem uma fonte, e esta não é externa,

segundo o texto de Tiago, a tenção não acontece porque alguma coisa muito forte me foi

oferecida; uma comida, um amor, uma noite de sexo, uma dose de droga... Não! Nada

disso! O pecado está dentro, na alma, nós mesmos somos os nossos maiores inimigos,

assim como diz Jeremias: “Enganoso é o coração, mais perverso do que todas as coisas;

quem o poderá conhecer?” (Jeremias 17.9), ou Jó: “... quanto menos o homem abominável

e corrupto, que bebe a iniqüidade como a água?” (Jó 15.16), e também Salomão: “O que

confia no seu próprio coração é insensato...” (Provérbios 28.26a). Se quisermos dizer que

somos vítimas, seremos sempre, e sem exceção, vítimas de nós mesmos.

Sendo assim, só pecamos se quisermos, não existe pecado impossível de resistir,

não existe tentação que Deus não tenha nos dado força suficiente para enfrentar. O pecador

obstinado que não se arrepende e não deixa o pecado, não o faz somente por dois motivos:

Ou porque de fato não é salvo, ou porque está deliberadamente dizendo a Deus que gosta

do pecado, que não teme a Deus e Sua Palavra e que mais importante é o seu desejo, a sua

vontade e o seu próprio prazer egoísta do que todas as outras coisas.

É exatamente por isso, que o único pecado que pode levar alguém a ser excluído do

corpo de Cristo é a obstinação, a falta de arrependimento e o continuar no pecado. Por pior

que nós achemos o pecado; estupro, assassinato, roubo, pedofilia, divórcio, etc... ou por

mais inocente que o achemos; fofoca, mentira, omissão, desrespeito aos pais, namoro

11

misto, etc... Nenhum desses pecados pode levar um membro a ser excluído da igreja, desde

que ele se arrependa, confesse e deixe. Não querendo ser repetitivo, mas já sendo, com o

objetivo de fixar, gravemos isso, por menos grave, ou mais grave que o pecado seja, por

causa do infinito amor de Deus, ele não leva o membro do corpo de Cristo a amputação, o

único pecado que leva alguém à exclusão é: Não confessar, não se arrepender, e não deixar

qualquer pecado por “menos ou mais” grave que seja.

12

As podas no Jardim de Deus

Nenhum corte é fácil, nenhuma exclusão é prazerosa, quando temos uma árvore em

casa e queremos vê-la linda na primavera, temos que podá-la e cortar grande parte de seus

galhos. Uma árvore podada sofre, fica feia, sem brilho, demora alguns meses para se

restabelecer, mas, quando começa a sair novos brotos ela cresce mais bonita do que antes,

mais frondosa do que antes, ela se fortalece e nos oferece um espetáculo de flores e beleza.

A igreja também é assim, as podas são dolorosas, cortar um único galho é sofrido, a igreja

fica feia por um tempo, perde seu brilho, os sorrisos desaparecem, a tristeza e melancolia

vêem. Mas as podas são necessárias, pois juntamente com elas, as pessoas se unem mais,

se fortalecem mais, e quando começam a surgir os primeiros brotos do temor do Senhor.

Uma igreja bem podada, oferece a Deus um espetáculo de flores santas que darão frutos

deliciosos ao Senhor.

Na verdade queridos irmãos, as podas são tão necessárias para a sobrevivência

saudável de uma árvore quanto elas também são no corpo de Cristo, uma igreja que não

poda os galhos secos, seca por inteira. Uma igreja onde os pecados são omitidos, onde se

faz vista grossa sobre pessoas obstinadas no seu erro, é uma igreja doente, é uma igreja que

ainda não entendeu o amor de nosso Maravilhoso Salvador.

Talvez, aqui chegamos ao ponto mais difícil da disciplina Bíblia, o momento da

poda, esse momento é terrível, creio que nem a pessoa disciplinada, nem a igreja, nem

mesmo o próprio Deus gostam de chegar a esse momento, porém ele é Bíblico, e por vezes

necessário.

Dois textos são fundamentais no Novo Testamento se referindo à excomunhão de

um membro do corpo de Cristo, o primeiro deles é: “Eu sou a videira verdadeira, e meu

Pai é o viticultor. Toda vara em mim que não

dá fruto, ele a corta; e toda vara que dá fruto,

ele a limpa, para que dê mais fruto. Vós já

estais limpos pela palavra que vos tenho falado.

Permanecei em mim, e eu permanecerei em

vós; como a vara de si mesma não pode dar

fruto, se não permanecer na videira, assim

também vós, se não permanecerdes em mim. Eu

sou a videira; vós sois as varas. Quem

permanece em mim e eu nele, esse dá muito

fruto; porque sem mim nada podeis fazer.

Quem não permanece em mim é lançado fora,

como a vara, e seca; tais varas são recolhidas, lançadas no fogo e queimadas” (João 15.1

– 6).

Nesse texto Jesus usa uma palavra fundamental a cerca de nossa participação em

seu corpo: “permanecer”, a palavra grega usada por Jesus é a palavra (ménô) que

aparece 10 vezes no trecho dos versículos de 1 a 10 do capítulo 15 de João. Essa palavra,

intransitivamente significa “permanecer num só lugar”, num determinado tempo, com

alguma pessoa. Metaforicamente, pode significar “honrar um acordo”, “permanecer em

determinada esfera de vida”, “enfrentar com firmeza” circunstâncias difíceis (em geral

doença ou morte), e as mudanças de modo geral.

Temos que nos perguntar aqui, o que de fato Jesus quis dizer com “permanecer em

Mim”?. A primeira coisa que podemos destacar, é que, quem permanece em Cristo dá

frutos de Cristo (cf. v. 5) sendo que esses frutos são: “... o amor, o gozo, a paz, a

longanimidade, a benignidade, a bondade, a fidelidade. a mansidão, o domínio próprio;

13

contra estas coisas não há lei. E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne com as

suas paixões e concupiscências” (Gálatas 5.22 – 24). Deste modo, Jesus acrescenta “se

permanecerdes em mim e as minhas palavras em vós” (v. 7), e “se guardardes os meus

mandamentos... do mesmo modo que eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai” (v.

10) ou ainda “Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama...”

(João 14.21). Sendo assim, o que podemos perceber claramente é que a idéia do texto é de

que “permanecer” em Cristo significa obedecê-lo irrestritamente. Nossa ligação a Ele é

comprovada na medida de nossa obediência, se obedecemos somos Dele, estamos Nele, e

Ele em nós, sobre isso diz Karlfried Munzer em seu artigo sobre (ménô) no

Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento:

“... o habitar de Cristo nos Seus fiéis vincula-se inseparavelmente com a

permanência de Sua – palavra neles (João 15.7; I João 2.24; cf. João 8.31) e

com a contínua aceitação do poder reconciliador que flui da morte de Jesus.

João expressa este fato sobretudo nas seguintes palavras: “Quem comer a

minha carne e beber o meu sangue, permanece em mim e eu nele” (João 6.56).

Este conceito expressa o verdadeiro significado que a – Ceia do Senhor tinha

para João. Nesta íntima comunhão entre Cristo e o crente “a lealdade que se

exige não é primariamente uma continuada existência para, mas, sim, da parte

de, não é sustentar uma posição, mas, sim, deixar-se segurar, de modo

correspondente com o relacionamento entre (klema – ramo) e o

(ámpelos – videira). Neste sentido,o relacionamento pode ser recíproco; na

realidade, deve ser assim.

Esta permanência em Cristo faz com que o homem seja possessão de

Cristo até às profundezas do seu ser. Não se confina um relacionamento ou

concordância espirituais, mas, sim, importa em experiência presente da

salvação e, portanto, da vida (João 6.57). Logo, “aquele que diz que permanece

nele, esse deve também andar assim como ele andou (I João 2.6). O Cristo que

habita nos Seus, ou a vida mediante a palavra de Cristo, exige e forma uma vida

em conformidade com Seu espírito e natureza, e deseja e realiza santificação.

“Aquele, porém, que faz a vontade de Deus permanece eternamente” (I João

2.17). Permanecer em Cristo implica em produzir frutos (João 15.5). Caso não

haja fruto, é sinal que a comunhão já foi interrompida (João 15.6; I João 3.6).

Quando tal coisa acontece, a ira de Deus permanece sobre o descrente (João

3.36). “O relacionamento entre um homem e Deus se determina de modo

definitivo pelo relacionamento do homem com a palavra de Jesus” (A. Schlatter,

Der Evangelist Johanes, 1960, pg. 112). João esclarece este fato mais uma vez

em 15.9 – 17, que é paralelo de 15.1 – 8. “Permanecer no amor, o que se exige

da parte do discípulo, implica em permanecer no amor que recebeu, no estado

de ser amado; importa (conforme já foi dito no v. 4) em sua existência

fundamentar-se completamente na obra do Redentor, conforme o lava-pés já

esclarecera de modo simbólico” (Rudolf Bultmann, The gospel of John, 1971,

pg. 540, sobre John 15.9; cf. John 13.1 – 20). Permanecer no amor fica sendo

uma realidade em ação (João 15.10), ao dar frutos que permanecem (João

15.16), o que, por exemplo, torna-se visível no amor ilimitado pelos irmãos (I

João 2.10; 3.14 – 15).

Depois dessa clara e excelente análise do que é “permanecer” feita por Munzer,

podemos observar que a desobediência continuada da Palavra de Deus ou a “permanência”

no pecado causa automaticamente a secura do ramo, pois este mesmo já não mais se nutre

da videira, mas sim de si mesmo, de seu próprio ego e vontade, tornando-se assim espiritual

e fisicamente inativo, infrutífero e portanto inútil para a videira.

14

Jesus nesta parábola é a videira na qual precisamos permanecer, mas aqui, um

segundo personagem é introduzido, o Pai, que recebe o título de viticultor, Ele é aquele que

corta o ramo que não dá fruto: “... Toda vara em mim que não dá fruto, ele a corta...” (v.

2). Aqui temos pelo menos duas aplicações práticas quanto à disciplina na igreja, o Pai é

quem corta o ramo infrutífero, e não a igreja, sendo assim a igreja não tem a opção de não

excluir uma pessoa que por suas obras demonstra nitidamente que não está em Cristo, se o

Pai já a cortou, quem somos nós para discordarmos do Pai?

Uma outra implicação do texto está no versículo (v. 6): “Quem não permanece em

mim é lançado fora, como a vara, e seca; tais varas são recolhidas, lançadas no fogo e

queimadas”. Aqui, os ramos infrutíferos, além de serem cortados são recolhidos e jogados

no fogo, temos que nos perguntar o que essa parábola significa em termos da disciplina na

igreja.

Muitos absurdos foram cometidos na pela Igreja Católica Apostólica Romana por

causa dessa passagem, quando a mesma foi interpretada literalmente sem levar em conta os

princípios de interpretação de uma parábola, e dessa forma milhares de pessoas foram

queimadas vivas pela inquisição, isso é inaceitável em quaisquer termos.

Obviamente, toda a passagem é ilustrativa, quando Jesus se denomina a videira, não

significa que ele é uma árvore, nem que nós devemos ficar pendurados Nele, tudo isso é

ilustrativo como já observamos acima, sendo assim, aqui também não está falando de jogar

pessoas no fogo e queimá-las vivas, mas senão de que as pessoas que são cortadas da

videira devem ser separadas da videira para sofrer algum tipo de castigo, físico e espiritual.

O fogo na Bíblia por vezes é usado como sinal do juízo de Deus, como no caso de

Sodoma e Gomorra (Judas 1.7), como Nadabe e Abiú filhos de Arão que ofereceram fogo

estranho ao Senhor (Levítico 10.1), como Acã e sua família (Josué 7.25), como Uzá que

colocou a mão na Arca quando Davi a trazia de volta dos Filisteus (II Samuel 6.6 – 7), ou

ainda como as diversas referências ao fogo do inferno como sinal da justiça final de Deus.

Dentro de uma perspectiva agrícola, isso é feito para que o galho seco não seque toda a

videira, sendo que o objetivo é a preservação da sanidade dos outros ramos.

15

A Sentença

Um texto que nos ajuda a perceber a parte final da passagem de João está na

primeira carta de Paulo aos Coríntos 5.4 – 5: “... Em nome de nosso Senhor Jesus,

congregados vós e o meu espírito, pelo poder de nosso Senhor Jesus, seja entregue a

Satanás para destruição da carne, para que o espírito seja salvo no dia do Senhor Jesus”.

Sendo que o contexto é o mesmo, disciplina, aparentemente esse “entregar a Satanás” a

que Paulo se refere, é o mesmo que “... lançadas no fogo e queimar” de João 15.6, e sendo

esse também, o sentido encontrado em Mateus 18 quanto ao “considerar gentil e

publicano”, ou quando se refere aos “desligados na terra, desligado no céu”.

Mas o que seria isso, perda de salvação? Obviamente, não. Pois Paulo é bem claro

em dizer que o corpo é entregue a Satanás, e a alma salva no dia de Cristo. Também um

ramo da videira, por mais que seja cortado, seco e queimado, ele continuará sendo cinza de

uma videira. Sendo assim, quais são as reais implicações da excomunhão de alguém?

Seja, se preferirmos usar o termo, cortado da videira, ou desligado na terra e no céu,

ou ainda o forte termo entregue a Satanás, todos os textos se referem a uma mesma

condição, a pessoa que mesmo sendo de Deus perdeu todos os privilégios de ser de Deus.

É crucial agora fazermos um paralelo entre nossa condição em Cristo e fora Dele,

quando Paulo coloca entregar a Satanás a palavra que ele usa é (paradídômi),

a palavra é formada pela junção da preposição (pará – ao lado de, para o lado de) do

vocábulo (dídômi – dar, conceder) significando então “dar para o lado” e a idéia da

palavra é de “legar”, “passar a diante”, “transmitir”, “entregar”. Como termo jurídico,

que é exatamente o contexto (cf. I Coríntios 5.3 – “já julguei”), significa “trazer diante” de

um tribunal, “entregar” um preso. O significado básico do Novo Testamento é de

“entregar” ao julgamento e à morte. Vemos um exemplo claro disso no caso de João

Batista, que foi “entregue” (Mateus 4.12), e aqui, se referindo à prisão que levou à sua

execução. Dessa forma, quando Paulo fala para entregar alguém a Satanás, é porque de

fato, essa pessoa já foi cortada da videira por Deus o viticultor, desligada na terra e nos

céus pela Igreja, e agora entregue a Satanás, que é apenas o carrasco e executor do pecador

obstinado.

Essa perspectiva, de que a igreja simplesmente reconhece algo que já foi ordenado

por Deus, fica clara ao observarmos as palavras do apóstolo: “... Em nome de nosso Senhor

Jesus... pelo poder de nosso Senhor Jesus...”. Ambas as afirmações paulinas deixam

evidentes que tal entrega a Satanás é uma obra divina e não humana.

Sendo que duas coisas são importantes destacar, primeiramente a frase: “... Em

nome de nosso Senhor Jesus...”, usar o nome de Cristo, nesse sentido é reivindicar sua

autoridade sobre todas as coisas, como o nome que está sobre todo nome, como Ele

próprio disse: “... e tudo quanto pedirdes em meu nome, eu o farei, para que o Pai seja

glorificado no Filho...” (João 14.13), também, reivindicar o nome de Cristo significa

reivindicar Sua presença: “... Pois onde se acham dois ou três reunidos em meu nome, aí

estou eu no meio deles...” (Mateus 18.2). Dessa forma, Paulo tinha a nítida certeza de que

entregar alguém a Satanás era algo que poderia fazer debaixo da autoridade de Cristo, e em

segundo lugar, levando a disciplina a termos mais elevados, o próprio Cristo estaria

presente nessa reunião e concordando com a oração de Sua Igreja. Se não for assim, temos

então que afirmar que Paulo pecou ao usar o nome de Cristo indevidamente.

O outro ponto a se destacar está vinculado à segunda afirmação: “... pelo poder de

nosso Senhor Jesus...”. Quando Paulo afirma que a igreja deve fazer isso pelo poder de

Cristo, deixa claro para a Igreja, que essa oração não deveria ser feita pelo poder de Paulo

como apóstolo, ou ainda pela autoridade da própria igreja, mas sim pelo poder dado a

16

Cristo, provavelmente aqui Paulo se refere ao poder que Cristo tinha sobre a vida como

Deus todo poderoso. Novamente aqui, se afirmamos que não é assim, Paulo reivindicou

indevidamente o poder de Cristo, abusando assim de seu próprio poder, o que tiraria toda

sua credibilidade.

Se reconhecermos que de fato Paulo não está indiscriminadamente usando

indevidamente sua autoridade apostólica, mas reivindicando a autoridade, presença e poder

de Cristo, então temos aqui um princípio eterno de Deus, para casos de disciplina na igreja,

quando o pecador obstinado em seu pecado, não se arrepende, não deixa o pecado e não

aceita a repreensão da Igreja.

Tanto em Mateus 18, como em João 15 e aqui em I Coríntios 5, o fim do pecado é a

morte. Em João 15, vemos isso no sentido da morte espiritual, não em questão de vida

eterna, mas a perda de grande parte dos benefícios adquiridos na salvação (paz, amor,

consolo, iluminação, etc...), em Mateus 18, é refletida a perspectiva do convívio com os

irmãos, onde o enfoque fica em considerar o pecador obstinado como se nunca tivesse se

salvado, ficando assim carente da salvação, e em I Coríntios 5 o enfoque é a conseqüência

física do pecado, além de toda perda espiritual, da perda de consideração dos irmãos.

Agora Paulo demonstra que o pecado obstinado pode trazer conseqüências físicas, que

podem ser definitivas como a morte.

O quadro abaixo mostra a diferença prática daquele que está em Deus e o obedece,

e daquele que está obstinadamente no pecado, não se arrepende e então é desligado do

corpo.

Ligado na Terra e no Céu...

X

Desligado na Terra e Céu...

Frutifica na Videira... Cortado da Videira...

Entregue a Deus... Entregue a Satanás...

Tem os Privilégios de Filho de Deus

(João 1.12)

Perde os Privilégios de Filho de Deus

(João 8.44; Atos 13.10; I João 3.8 – 10)

Amigos de Deus

(João 15.15)

Inimigos de Deus

(Tiago 4.4)

Paz com Deus

(Romanos 5.1; Filipenses 4.7)

Guerra contra Deus

(Romanos 8.7; Efésios 2.14 – 16)

Deus atende a oração

(Provérbios 15.29; Mateus. 21.22; João 14.13)

Deus não atende a oração

(Mateus 6.15; Isaías 59.2)

Santidade

(II Coríntios 7.1; Efésios 4.24; I Timóteo 3.13; 4.4)

Desobediência

(Judas 1.8; I João 2.16; II Pedro 2.10 – 18)

Comunhão com a Igreja

(I João 1.7)

Separação da Igreja

(I Coríntios 5.11; 10.21; II João 1.10)

Iluminados pelo Espírito Santo

(João 16.7 – 15; I Coríntios 2.10 – 12)

Não entendem a verdade

(I Coríntios 2.14; II Timóteo 3.1 – 9; II Pedro 2; Judas 1.10)

17

É difícil, mas necessário

Obviamente essas são coisas duríssimas e

causam muita dor, em todos os sentidos, sofre a

família, sofrem as pessoas envolvidas, sofre a igreja,

os amigos e o próprio disciplinado, porém temos que

considerar que há certos sofrimentos necessários,

pois se o pecado reinar dentro da Igreja, ele será

como um tumor, como um câncer que vai corroendo

a Igreja de dentro pra fora. Assim como num cesto

de frutas, se deixarmos uma fruta estragada no meio

das sadias, logo todas estarão estragadas às vezes,

também na igreja, é necessário tirar as frutas que estão com o pecado, pois se não seu

pecado pode contaminar todo o resto do corpo. Gostaria de usar um fato verídico para

demonstrar isso:

O alpinista americano Aron Ralston sempre foi conhecido por seu sangue frio.

Nunca, porém, poderia imaginar que teria de amputar o

próprio braço para salvar a vida, depois de uma pedra

tê-lo prendido durante uma escalada. "Nunca vi tanta

vontade de viver", frisou Steve Swanke, um guarda

florestal do Colorado que acompanhou o alpinista ao

hospital onde, segundo os médicos, Ralston permanece

em estado grave.

“Ele teria morrido se tivesse ficado com o

braço preso à rocha”, disse o sargento Mitch Vetere,

bombeiro do condado de Emery, à rede de televisão

NBC. Vetere disse que outros dois membros da equipe de resgate que voltaram ao cânion

com a esperança de recuperar a parte do braço amputado descobriram que a pedra pesava

quase meia tonelada, e não cerca de 90 quilos, como se supunha.

O montanhista americano que amputou o próprio braço depois de ter ficado cinco

dias com ele preso sob uma rocha disse que não espera a hora de voltar à ação.

Aron Ralston contou como cortou o braço direito durante uma entrevista em Grand

Junction, Colorado, onde está se recuperando. "Eu fiz o que tinha que fazer", disse. Ele

próprio admitiu que não sabe de onde surgiu a força para lidar com a situação.

A aventura de Ralston começou no dia 26 de abril. Ele foi até o Parque Nacional

dos Cânions, no Colorado, com sua picape, parou o veículo no estacionamento, pegou sua

bicicleta e pedalou cerca de 24 km até a abertura de uma garganta profunda.

A idéia era descer o cânion, que terminava próximo do local onde a picape estava

parada, pegar o veículo e ir buscar a bicicleta. O drama começou quando uma grande rocha

escorregou e prendeu a mão de Ralston contra a parede de pedra.

O montanhista tentou várias alternativas para soltar a sua

mão, desde tirar lascas da pedra com seu canivete até usar as

polias e cordas que estava carregando para mover a rocha. Nada

funcionou. Após três dias, a água e a comida acabaram. Nesse

ponto, diz, ele começou a pensar que teria que se salvar sozinho.

Ralston contou que tentou decepar sua mão com o

canivete, mas que a lâmina estava quase cega. No quinto dia, ele

diz ter percebido que a faca não seria suficiente para cortar os

18

ossos, e decidiu que precisaria quebrá-los. Mesmo depois da cirurgia improvisada, Ralston

teve que rastejar por um cânion tortuoso, descer um precipício de 18 metros e andar 10 km.

Quando encontrou outros aventureiros e foi socorrido, estava a apenas cerca de 2

km de seu carro. Apesar de ter sangrado bastante e ter ficado desidratado, o alpinista

chegou andando ao hospital onde foi tratado.

Existem muitas igrejas que estão paradas espiritualmente, as coisas não andam,

pastores não permanecem por muito tempo, saem mais pessoas do que chegam, e apesar de

todos os esforços nada parece resolver, assim como esse alpinista, muitas igrejas já fizeram

todos os esforços possíveis para eliminar o pecado do meio da comunidade, retiros

espirituais, acampamentos, vigílias, séries de conferências, aconselhamentos pessoais,

internações, retirada de cargos, porém, na vida de alguns o pecado continua sendo uma

pedra de meia tonelada, estática e imóvel diante de todo esse esforço, infelizmente, em

muitas situações, quando uma pessoa está obstinada no pecado, só há uma alternativa.

Quando tudo o que era possível já foi feito, para que o corpo todo não padeça, temos que

cortar o membro que está debaixo do pecado.

Essa não é uma opção para a Igreja, nos três textos neotestamentários que vimos até

agora, todos eles são postos como uma ordem, “será cortado...” (João 15), “considere tu...”

(Mateus 18) e “entregue...” (I Coríntios 5).

Ainda considerando o texto de I Coríntios 5, uma das coisas que Paulo fala é que se

deve reunir a igreja para realização da oração de exclusão, obviamente Paulo não está

falando em assembléia ordinária ou extraordinária, até porque isso está relacionado com a

realidade da Igreja como sociedade religiosa sem fins lucrativos, quando Paulo escreveu a

carta aos Coríntos nada dessas coisas institucionalizadas existiam, não havia rol de

membros, nem cartas disso ou daquilo, o que de fato é uma obrigação legal, mas, não

espiritual. A reunião a que Paulo se refere é uma reunião espiritual, me parece também,

que, como neste caso todo o processo de Mateus 18 já ocorreu, inclusive a exortação

pública, não deve haver votação ou deliberação, ou ainda se quer é necessária a presença

do irmão disciplinado, a reunião ocorre, para que a autoridade e poder de Cristo seja

demonstrado também no agir de sua Igreja: “Aos que vivem no pecado, repreende-os na

presença de todos, para que também os outros tenham temor” (I Timóteo 5.20).

19

Os Benefícios da Disciplina

A mentalidade da maioria das pessoas é de que excluir alguém só traz coisas ruins,

mas de fato isso não é verdade, existem benefícios. Um deles é expresso no texto de

Timóteo, é o temor. Um dos fatores para que uma sociedade possa existir é a punição, já é

sabido que em uma sociedades onde não há punição para o transgressor, a sociedade

descamba, até por isso uma sociedade completamente anárquica é utópica e surreal.

É notado, que mesmo nas sociedades mais primitivas, existem códigos éticos e

morais que delimitam a ação individual, e mesmo se formos da tribo mais primitiva até a

mais avançada e tecnológica, se for tirada essa realidade, a estrutura social desmorona.

Assim sendo, o benefício da punição é o temor, o temor nos leva à reflexão, quando vemos

alguém sendo punido pensamos: “eu não quero isso pra mim”. Esse pensamento, nos leva

a ser mais cuidadosos em nossas atitudes, e talvez, coisas que poderiam nos levar a pecar

são rejeitadas ao lembrarmos da direção a que isso pode nos levar, isso nos faz buscar uma

vida de santidade e também a corrigirmos qualquer pecado antes que cheguemos ao

mesmo ponto da pessoa que vemos ser punida.

Outra realidade da disciplina na Igreja que é boa, é que a pessoa que vive no

pecado, muitas vezes não se arrepende pois pensa: “ninguém nunca vai descobrir”, “já fiz

isso tanta vezes e nunca deu em nada”, “o fulano faz, e nunca aconteceu nada com ele”,

etc... Quando a disciplina é uma realidade diária da Igreja, outras questões e conclusões se

levantam em nossa mente, como o fato de que não há pecado que Deus não saiba, e não

existe pecado tão escondido que não possa ser descoberto, e também que há sim

conseqüência, e que não importa quanto tempo demore sempre acontece alguma coisa.

Um caso que agora me vem à mente é de um casal de jovens crentes que

namoravam há anos, e praticavam sexo durante todo o período de namoro, como eles

tomavam todos os cuidados (camisinha, anticoncepcional, etc...) que entendiam ser

necessários para manter escondido esse fato, viviam pensando, ninguém nunca vai

descobrir. Um belo dia, a menina chega para o rapaz e diz, estou grávida, minha

menstruação está atrasada a dois meses, eles não entenderam nada, não conseguiam

entender como isso era possível. Eles tinham tomado todos os cuidados, mas, vendo-se

encurralados e não dando mais para continuar a esconder o pecado, procuraram o pastor da

igreja e confessaram seu pecado, três dias depois a menina é internada em um hospital,

com uma forte infecção urinária e os médicos detectam que ela nunca estivera grávida que

a menstruação estava atrasada por causa da infecção.

Outro caso é de um casal de noivos que estavam para se casar. Na véspera do

casamento, foram até a nova casa, recém alugada, para levar alguns presentes que haviam

acabado de ganhar de seus amigos e padrinhos, e não resistiram à tentação: “vamos casar

amanhã mesmo! Já seguramos por tanto tempo! Que diferença um dia faz! Mesmo que eu

fique grávida ninguém vai saber mesmo...”. Bom! Adiantaram a lua de mel, antes do

casamento. Naquele mesmo dia, após deixar a noiva em casa, a caminho de sua casa o

rapaz sofreu um acidente de carro e morreu. Dois meses depois a moça procurou um

médico para tratar a tontura causada pelo estresse de perder o noivo um dia antes do

casamento e descobriu que seu “estresse” viria ao mundo dali a sete meses.

Ambos esses casos, são reais, e poderia escrever um livro sobre casos semelhante,

escrevi dois casos que envolvem relacionamento sexual e gravidez, mas poderia escrever

sobre roubo, mentira, fofoca, ira, pornografia na Internet, etc...

Tenho plena certeza que simplesmente ao tomar conhecimento de casos assim,

casais crentes que estão em pecado, já sentem um frio na espinha, já começam a questionar

suas afirmações mais seguras, e se esses fatos tivessem ocorrido em suas próprias igrejas,

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talvez eles buscariam ajuda de seu pastor para deixar o pecado, antes que o pior aconteça.

Uma coisa é certa, o temor contribui grandemente para que haja na igreja santidade,

e é um fator elementar em toda a Bíblia para a obediência: “O temor do Senhor é o

princípio da sabedoria; e o conhecimento do Santo é o entendimento” (Provérbios 9.10);

“Servi ao Senhor com temor, e regozijai-vos com tremor” (Salmo 2.11).

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O que o amor tem à ver com isso...

Um dos grandes questionamentos de todas as pessoas quanto à disciplina é: “onde

está o amor em tudo isso?”. De alguma maneira já falamos sobre isso, mais acima, quando

falamos sobre o relacionamento do Pai com seus filhos. Mas esse é um ponto que podemos

explorar mais. Gostaria de começar com Israel, mesmo sendo Igreja, às vezes não bate uma

pontinha de ciúme desse povo, como Deus os amou, como Ele se manifestou a eles de

maneiras inacreditáveis? Lógico, que nada comparado com Seu amor demonstrado na cruz,

mas em toda a história humana, não houve, e nem haverá amor tão poderoso como o de

Deus por Israel.

Porém, apesar de tanto amor, e isso é claro até os dias de hoje, Deus fez coisas com

esse povo que para alguns não é amor. Por exemplo, depois que o povo saiu do Egito com

Moisés, mais ou menos 1 milhão de pessoas, Deus condenou toda aquela geração por

desobedecerem a ele na entrada da terra prometida, por causa disso Ele deixou-os rodando

pelo deserto por mais ou menos 38 anos, nesse período, morreu toda a geração que saiu do

Egito, menos Moisés, Josué, Calebe e suas famílias. Se calcularmos que 1 milhão de

pessoas (uma estimativa relativamente baixa) saíram do Egito e que todos eles morreram

num período de 38 anos, dá uma média de quase 200 pessoas mortas por dia, para

comparação, a população atual da cidade de São Paulo é de cerca de 11 milhões de

habitantes, e as estimativas são de 120 mortes por dia. Isso significa que Israel, tendo uma

população dez vezes menor tinha o dobro de mortandade no período do deserto. E a Bíblia

é clara em afirmar que toda essa mortandade, foi causada por Deus. Diante destes fatos,

que diremos? Deus é mau? A resposta certa é, claro que não, pois ao vermos o povo

entrando na terra do Egito percebemos que a população de Israel havia aumentado no

deserto. Ao mesmo tempo em que Deus causou a morte de toda a população que saiu do

Egito, também abençoou o povo com centenas de nascimentos diários. Percebemos esse

tipo de atitude de amor, onde Deus pune com justiça mas ao mesmo tempo preserva em

( – hesed) seu amor fiel.

Podemos ver isso em todo livro de juízes, onde Deus envia julgamento por meio de

exército inimigos que invadiam Israel e os espoliava, mas ao mesmo tempo, diante do

arrependimento do povo, Deus levantava juízes que os libertava do opressor e restaurava a

paz na terra. Essa relação, punição e amor, também é nítida nos livros poéticos como por

exemplo na vida de Jó e também nos livros proféticos, como no caso de Oséias e Gomer. E

por fim, esse amor que pode ser demonstrado em forma de ira vindicadora é nítida na

invasão Babilônica onde toda a terra é destruída, todos os habitantes escravizados e

humilhados publicamente diante de todas as nações, para que, assim como diz Zacarias: “O

remanescente de Israel não cometerá iniqüidade, nem proferirá mentira, e na sua boca

não se achará língua enganosa; pois serão apascentados, e se deitarão, e não haverá

quem os espante”. O objetivo final de todo o sangue derramado, da ira justa do Senhor, é

demonstrar Seu Amor Fiel na purificação de seu povo.

Obviamente, não estamos mais na dispensação da Lei, nem estamos sob o pacto

mosaico, nossa Lei é Cristo, somos lavados no sangue da nova aliança, aliança essa,

infinitamente superior à primeira. Não somos Israel, somos Igreja. Não estamos debaixo da

Lei, mas sim, debaixo da graça. Não somos uma mesma etnia, mas sim povos reunidos de

todas as línguas, raças e nações. Com tudo isso, temos que nos perguntar, Deus mudou?

Será que Ele abandonou Sua vontade de ter um povo santo? Será que Ele deixou de lado

Sua Ira, e Justiça usando só o amor?

Sejamos sinceros: “... Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra de

variação” (Tiago 1.17), e também: “Pois eu, o SENHOR, não mudo; por isso vós, ó filhos

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de Jacó, não sois consumidos” (Malaquias 3.6), ou ainda: “Jesus Cristo é o mesmo, ontem,

e hoje, e eternamente” (Hebreus 13.8). Diante desses textos, fica claro para nós que Deus

não mudou, que seu caráter não mudou, que suas ações não mudaram.

Podemos ver isso no Jesus irado com chicote nas mãos derrubando as mesas dos

negociantes e soltando os animais no templo, vemos isso nas respostas aos fariseus:

“sepulcros caiados... raça de víboras... guias cegos... etc...”, percebemos que mesmo

sendo Igreja e estando de baixo da graça, Ananias e Safira caíram mortos diante de Pedro

por causa da mentira. Vemos o mesmo apóstolo Pedro, pastor da Igreja de Jerusalém

chamando homens e mulheres que se desviaram da fé de cães que voltam ao vômito e de

porcos que voltam à lama depois de limpos. Vemos os textos doutrinários de Paulo

enfatizando a justiça de Deus exercida por meio de sua igreja. Podemos até dizer que sim,

pela, graça de nosso Deus, através de Jesus Cristo, ninguém mais é apedrejado, ou tem que

fazer sacrifícios, porém, há sim, nessa nova dispensação, punição para o pecador

obstinado, que não leva Deus a sério e que vive uma vida de continuamente chafurdar na

lama do pecado. Para esse, o amor de Deus é demonstrado em Sua justiça que pune o

pecador por amor para levá-lo ao arrependimento e à restauração. E Deus por

instrumentalidade, usa a igreja nesse processo, sendo que ela tem papel fundamental em

ambos os casos, seja para restaurar o arrependido, seja para punir o obstinado.


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