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figueiredo_jf_me_rcla.pdf - Repositório Institucional UNESP

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307
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA MOTRICIDADE “A DISCIPLINA DE GINÁSTICA ARTÍSTICA NA FORMAÇÃO DO LICENCIADO EM EDUCAÇÃO FÍSICA SOB A PERSPECTIVA DE DOCENTES UNIVERSITÁRIOS” VOLUME I JULIANA FRÂNCICA FIGUEIREDO Outubro – 2009 Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção de título de Mestre em Ciências da Motricidade.
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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”

INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA MOTRICIDADE

“A DISCIPLINA DE GINÁSTICA ARTÍSTICA NA FORMAÇÃO DO LICENCIADO EM EDUCAÇÃO FÍSICA SOB A PERSPECTIVA DE DOCENTES

UNIVERSITÁRIOS”

VOLUME I

JULIANA FRÂNCICA FIGUEIREDO

Outubro – 2009

Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção de título de Mestre em Ciências da Motricidade.

ii

“A DISCIPLINA DE GINÁSTICA ARTÍSTICA NA FORMAÇÃO DO LICENCIADO EM EDUCAÇÃO FÍSICA SOB A PERSPECTIVA DE DOCENTES

UNIVERSITÁRIOS”

VOLUME I

JULIANA FRÂNCICA FIGUEIREDO

Orientadora: Dagmar Ap. C. F. Hunger

RIO CLARO Estado de São Paulo-Brasil

Outubro – 2009

Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção de título de Mestre em Ciências da Motricidade.

�����796.41 Figueiredo, Juliana Frâncica F475d A disciplina de ginástica artística na formação do licenciado em Educação Física sob a perspectiva de docentes universitários / Juliana Frâncica Figueiredo. – Rio Claro : [s.n.], 2009 2 v. : il. + CD-ROM Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Rio Claro Orientador: Dagmar Hunger 1. Ginástica. 2. Ensino superior. 3. Docência universitária. 4. Professores - Formação. 5. Licenciatura em Educação Física. I. Depoimentos orais – docentes de ginástica artística (v. 2). II. Título. � Ficha Catalográfica elaborada pela STATI – Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP

iii

iv

“O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente” Mário Quintana

“O melhor profeta do futuro é o passado” Robert Frost

v

DEDICATÓRIA

Vai, minha tristeza

E diz a ela que sem ela não pode ser

Diz lhe numa prece que ela regresse

Porque eu não posso mais sofrer

Chega de saudade, a realidade

É que sem ela não há paz, não há beleza

É só tristeza, e a melancolia

Que não sai de mim, não sai de mim, não sai!

(João Gilberto)

Dedico este trabalho, que passa a ser mais uma de minhas conquistas, àquela que

foi meu exemplo e sempre será. Àquela que foi boa filha, irmã, amiga, esposa, mãe,

prima, tia, um espírito de luz para todos que a cercaram. Todos os meus esforços

são dedicados com muito amor, carinho e saudade a você Paula, esperando que

possamos nos encontrar em outro momento espiritual dividindo a mesma

cumplicidade e ternura que tivemos durante nossa existência juntas nesse plano.

Paula Correa da Silva

(15/09/1969 – 17/10/2008)

vi

AGRADECIMENTOS

E talvez seja esta a parte mais difícil do trabalho! É muito complicado

agradecer a todas as pessoas que fizeram parte desta trajetória, já que ela se inicia

com o nascimento, construindo o próprio ser – eu – na aquisição de valores e

aspirações diante da vida. Portanto, àqueles que não estão aqui descritos, em meio

às frases de reflexão de alguns autores que aprecio, devem ter em mente que a

melhor forma de agradecimento vai além das palavras e vem do coração.

“A possibilidade de realizarmos um sonho é o que torna a vida

interessante” (Paulo Coelho). Assim, agradeço aos docentes entrevistados que, sem

sombra de dúvidas, tornaram esse sonho possível e interessante. Além deles, aos

funcionários do Programa de Pós-Graduação, em especial à Sandra, Rose e em

especial à Marcela (secretárias), pelo auxílio com todas as dúvidas esclarecidas.

“Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina” (Cora

Coralina). Ao Professor Samuel e aos colegas do NEPEF, agradeço a participação

em minha vida acadêmica, fortalecendo os passos de meu aprendizado.

“Imagine uma nova história para sua vida e acredite nela” (Paulo

Coelho). À Dag, minha orientadora, devo mais do que singelos agradecimentos. Mas

também agradecer sua paciência, quando problemas inevitáveis da vida estiveram

presentes e eu já não acreditava que poderia ir além. Sou grata à sua orientação,

sua compreensão e especialmente aos seus votos de confiança. Muito obrigada!

vii

“A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar

o mundo” (Nelson Mandela). Agradeço a todos os colegas de trabalho da E.E.

Antônio de Oliveira, por compartilharem comigo as aspirações de educar na intenção

de melhorar o mundo. Agradeço especialmente à Ângela, Carol, Toninha, Elizabel,

Eloísa, Renata e Cristiane por, de diferentes maneiras, estarem mais presentes.

“Por mais longa que seja a caminhada o mais importante é dar o

primeiro passo” (Vinícius de Moraes). Aos colegas do SESC Araraquara, em especial

à equipe do esportivo, sou grata pelos passos, prazerosos e desafiadores, no

encaminhar da profissão. Agradeço à Sônia pelos ensinamentos, ao Ju pela calma, ao

Fá pelo ‘colorido’ especial e à Cá pela elevação do espírito de equipe. Obrigada!

“Professor, uma profissão! Educador, a mais nobre de todas as

missões!” (Antonio Gomes Lacerda). Agradeço a todos os meus alunos, grandes ou

pequenos, crianças, jovens, adultos ou idosos, todos fazem parte da essência que

sou. Em especial aos alunos e amigos Neuzinha, Ju Palhares (e filhas Isa e Julia),

Maria e Elizeu, Sandra e Beatriz Arena por me fazerem perceber que a função de

educadora vai muito além da minha atuação profissional.

“A arte é a auto-expressão lutando para ser absoluta” (Fernando

Pessoa). Boa parte dos passos dados em minha ‘curta’ carreira até agora, foram

frutos de um belíssimo aprendizado. Assim, agradeço a você Henrique como colega

de profissão, como aluna e especialmente como amiga, por tudo. Obrigada!

Aos meus poucos, mas sinceros amigos, defini-los em uma única frase

seria impossível, então... “Metade de mim agora é assim, de um lado a poesia o

verbo a saudade, do outro a luta, a força e a coragem pra chegar no fim” (Fernando

Anitelli). Agradeço a vocês que mesmo longe, são essenciais: Rê, por nossas tantas

semelhanças, até nos defeitos! Ci, por todas as nossas ‘grandes’ diferenças... “A paz

não é um período de tempo, mas uma forma de vida” (Antônio Lisboa de Carvalho).

Obrigada à Silvia (minha psicóloga) e Tchôs, por serem sensatos e calmos me

levando a estados de paz... “Seus amigos de verdade amam você de qualquer jeito”

(Luís Fernando Veríssimo). À Priscila, acho que a frase fala por si!... "O Mundo está

nas mãos daqueles que tem coragem de sonhar, e correr o risco de viver seus

viii

sonhos" (Paulo Coelho). Márcio, Renato, Rafa e Dan, amigos tão especiais!

Agradeço a presença paciente e os abraços sinceros de cada um em momentos

distintos da minha vida... “Não fazemos amigos, reconhecemo-os” (Vinícius de

Moraes). É com essa frase que agradeço minha amiga Carmen, que apesar de

distante, se faz sempre presente, me apoiando e elevando meu humor e, que

agradeço também a Cris – “minha estagiária” (rs) – que eu espero tenha muito

sucesso na profissão, pois, usando as palavras de um sábio professor: ‘desejo-lhe

sorte, pois competência você já tem!’. A todos, o meu mais sincero obrigada!

À minha família, agradeço a todos com imenso carinho. Porém, devo

agradecer algumas pessoas em especial. “Só se consegue a simplicidade através

de muito trabalho” (Clarice Lispector). E, isso me lembra Tia Fã e Luis, em que tenho

que discordar de Clarice, pois vocês já são simples, não precisaram se esforçar para

isso. Obrigada pelo apoio! “Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo

começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim” (Chico Xavier). Tia

Vera (‘e suas três rosas Ana, Luca e Pepe’), obrigada por acreditar em mim!

“Se fôssemos todos pássaros a voar, nosso maior desejo seria nadar!”

(João Vitor Rocha). Às vezes desejamos ser diferentes e às vezes apenas somos, e

como ‘nós’ somos diferentes! À minha irmã Josy, que por muitas vezes me faz

entender a necessidade e a beleza das diferenças. Obrigada minha linda!

“Tenho em mim todos os sonhos do mundo” (Fernando Pessoa). E,

agradeço profundamente aos meus pais por isso! Meu pai (Cindinho), que me

possibilitou, apesar das dificuldades, buscar sempre mais. Não me acompanhou em

toda a minha estrada, porque me ensinou como tomar as decisões sozinhas para

pegar os caminhos certos. Minha mãe (Má), amiga, secretária, cozinheira,

costureira, conselheira... acho que ela é tudo o que se espera, com um porém, ela

consegue ir além. Como ser humano, ultrapassa com meu pai todos os limites da

simplicidade, bondade, compreensão, respeito ao próximo o que, com tanto amor e

carinho se dedicam a nos ensinar todos os dias. Agradeço com todo meu coração e

de forma carinhosa por me darem asas, me ensinarem a voar e mais ainda por me

libertarem na imensidão do céu! Amo vocês!

ix

RESUMO

A ginástica contemplada como uma das manifestações corporais mais antigas,

desenvolvidas pelo homem, abrange hoje um grande número de modalidades e

atividades. A ginástica artística, inserida na área da ginástica, desenvolveu-se como

modalidade esportiva e em geral faz parte tanto das grades curriculares dos cursos de

licenciatura, quanto dos conteúdos da Educação Física escolar. Assim, esse

conhecimento num curso de licenciatura deveria capacitar o professor para a tarefa do

ensino dessa manifestação gímnica na educação básica. No presente estudo objetivou-

se analisar a formação do licenciado em Educação Física no que se refere ao ensino da

ginástica artística, sob a perspectiva de docentes universitários. Para tanto, nomeou

como referencial teórico conceituações de sociologia propostas por Norbert Elias, no

qual o autor se atém às configurações que os indivíduos formam entre si no contexto da

sociedade. No âmbito destas configurações o autor discute, principalmente: relação de

poder, teias de interdependência, envolvimento, distanciamento, alienação, entre outros

conceitos diante das situações na vida cotidiana dos indivíduos. Tais conceitos do autor

apresentaram-se pertinentes ao estudo já que se observaram as configurações da

ginástica artística como conteúdo curricular e as relações que ela perfez até então entre

os docentes e o espaço acadêmico do qual dispõem. Na revisão de literatura,

abordaram-se temas relacionados à Educação Física, à docência no ensino superior, à

ginástica e à ginástica artística. A metodologia pautou-se num estudo qualitativo, tendo

como método de abordagem a história do tempo presente e enfocaram-se duas

técnicas de coleta de dados: questionário e entrevista. Fizeram parte do estudo doze

docentes de universidades públicas do Estado de São Paulo. Seus depoimentos foram

analisados por definições temáticas a partir da análise de conteúdo. Os relatos,

dispostos no texto de revisão de literatura, apontaram para a necessidade de uma

reorientação da Ginástica Artística na licenciatura, para que esta se configure como

disciplina pertencente a um currículo que pretende formar um professor que atue na

escola. Talvez, por intermédio de uma nova concepção da ginástica artística durante

seu ensino na formação profissional é que esta talvez possa chegar a contento na

Educação Física escolar. Diante disso, pontuou-se que a atuação docente poderia estar

voltada para um maior aporte das ciências humanas no contexto das disciplinas, pois a

pretensão da manifestação para a escola é a de proporcionar vivências aos alunos, e

não levá-los ao alto rendimento. Além disso, os docentes universitários, perante o que

x

foi observado, poderiam orientar-se a partir da realidade das escolas atuais para a

adaptação da modalidade, assim como estar preparados para uma re-construção da

Ginástica Artística aos discentes, diferente da que eles apreciaram até então.

Palavras Chaves: Ginástica Artística. Licenciatura em Educação Física. Docência

Universitária

xi

ABSTRACT

The gymnastics considerate as one of the oldest body manifestation developed by man

covers today a large number of procedures and activities. The artistic gymnastics,

placed in the gymnastics area, has developed as a sport modality and does part of both,

the grade curriculum for undergraduate courses, as the contents of Physical Education

at school. In this way, the artistic gymnastics discipline in a licenciateship course should

enable the teacher for this task in carrying out its role in basic education. In this study

aimed to examine the training of graduate in Physical Education as regards to the

teaching of artistic gymnastics, under the perspective of university teachers.

Nevertheless, appointed as a theoretical reference, sociology conceptualizations

proposed by Norbert Elias, in which the author abide by the configurations that the

individuals make between themselves in the context of the society. Within these

configurations, the author discusses, in particular: power relationship, interdependence

network, involvement, detachment, alienation, among other concepts front of situations

in individuals daily life. These author´s concepts presented themselves relevant to the

study once that observed the configurations of the gymnastics artistic as curriculum

discipline and the relationships that it does until then between the teachers and the

academic space of which they have. In the literature review, dealt with issues related to

Physical Education, to teaching in higher education, to gymnastics and to artistic

gymnastics. The methodology guided it by a qualitative study, having as the method of

boarding the present history time and focusing on two data collection techniques:

questionnaire and interview. Study participants were twelve teachers from public

universities in the State of Sao Paulo. Their testimonies were analyzed by thematic

definitions from the content analysis. The testimonials, presented in the text of literature

review, pointed to the necessity of an artistic gymnastics reorientation in the

licenciateship, to configure it as a discipline belonging to a curriculum that pretend to

train a teacher to act in school. Only through a new conception of the modality during

your teaching in the vocational training is that it might get satisfaction in Physical

Education school. In this way, pointed out that the teaching activities must be focused to

a greater contribution of the human sciences in the context of the disciplines, because

the intention of the modality to the school is to provide experiences to the students, and

not take them to high income. Moreover, the university teachers, in the face of what was

observed, should find your way around from the reality of the current schools to adapt

xii

the method, as well as should be prepared for a re-construction of the artistic gymnastics

to the university students, different from the one that them appreciated until then.

Keywords: Artistic Gymnastics. Licenciateship in Physical Education. University

Teaching

xiii

SUMÁRIO – VOLUME I

Página

INTRODUÇÃO...........................................................................................................12

CAPÍTULO I

A BUSCA POR UM SALTO METODOLOGICAMENTE BEM EXECUTADO...........23

1.1. Delineamento do Estudo e Método de Abordagem............................................23

1.2. Técnicas de Coleta de Dados.............................................................................25

1.3. Amostra do Estudo e Procedimentos de Coleta de Dados.................................28

1.3.1. Participantes do Estudo....................................................................................32

1.4. Materiais..............................................................................................................37

1.5. Procedimentos para Análise das Entrevistas......................................................37

CAPÍTULO II

O ROLAMENTO INICIAL: EM FOCO A EDUCAÇÃO FÍSICA.................................40

2.1. Da Ginástica para a Educação Física: seu surgimento no Brasil........................40

2.2.. Educação Física nas escolas brasileiras: da obrigatoriedade à atualidade.......43

CAPÍTULO III

VIRAR ESTRELA: O ENSINO SUPERIOR – DOCÊNCIA, FORMAÇÃO E

CURRÍCULO..............................................................................................................55

3.1. Docência no Ensino Superior..............................................................................55

3.2. Formação em Educação Física: dos primeiros cursos à formação atual............72

3.3. Currículo e Formação para Licenciatura em Educação Física............................89

xiv

SUMÁRIO – VOLUME I (Continuação)

CAPÍTULO IV

O GRANDIOSO MORTAL: CONFIGURAR A GINÁSTICA......................................97

4.1. Configuração Histórica da Ginástica...................................................................97

4.1.1. Os Métodos ou Escolas Ginásticas................................................................101

4.2. A Federação Internacional de Ginástica...........................................................108

4.3. Campos de Atuação da Ginástica.....................................................................109

4.4. Ginástica Artística..............................................................................................111

4.4.1. Ginástica Artística na Educação Física Escolar.............................................113

4.4.2. Ginástica Artística na Formação Acadêmica..................................................120

CONSIDERAÇÕES FINAIS

ENCAMINHANDO AS DISCUSSÕES PARA A ATERRISSAGEM........................137

REFERÊNCIAS........................................................................................................137

ABSTRACT..............................................................................................................xxx

ANEXO A.................................................................................................................146

APÊNDICE A ..........................................................................................................147

APÊNDICE B ..........................................................................................................149

APÊNDICE C ..........................................................................................................151

15

INTRODUÇÃO

O interesse pela área das ginásticas surgiu desde muito pequena, aos

sete anos. Como aluna, no então ensino primário público (hoje ensino fundamental),

não havia aula de Educação Física com professor especialista, tão pouco eram

proporcionadas atividades que envolvessem ginástica artística, tendo assim que

buscar esse aprendizado fora da escola.

O gosto pelas manifestações gímnicas foi construído durante

empenhados doze anos de prática como atleta de ginástica artística e praticante de

ginástica geral. Empenho e experiência juntos transformaram-se em incentivo na

busca por aprofundamento e conhecimento teórico para seguir carreira profissional

que previsse atuação com atividades de cunho ginástico. Assim, o curso de

Educação Física1 foi iniciado em 2001.

Como aluna de graduação em Educação Física, as experiências com

as ginásticas artística e geral possibilitaram ampliar os conhecimentos referentes a

essas modalidades, bem como permitiram expandir o conceito respectivo à própria

Educação Física como disciplina escolar e campo acadêmico. Entretanto, a

graduação apresentou-se limitada quanto à introdução de conhecimentos relativos à

história da ginástica artística, à utilização de materiais alternativos para sua prática,

tendo em vista que muitas escolas não possuem materiais/aparelhos oficiais, e à

1 Em 2001 foi iniciado o curso de Licenciatura Plena em Educação Física na UNESP/Bauru.

16

própria aplicabilidade da ginástica artística especificamente para escolares, uma vez

que se tratava de um curso de licenciatura.

Durante a graduação, o envolvimento referente à atuação profissional

foi seguindo a área escolar, o que resultou em inquietações quanto à introdução de

conteúdos ginásticos nesse âmbito. Essas inquietações transformaram-se em

estímulo para o Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “Ginástica Geral na

Escola: análise de uma proposta de intervenção”2 que concluiu, principalmente, a

dificuldade de ensinar conteúdos diferenciados dos esportes mais tradicionais como

futebol e vôlei nas aulas de Educação Física, uma vez que os alunos estavam

habituados apenas a essas vivências.

Agora, como professora de Educação Física em caráter efetivo,

lecionando em turmas de 1ª a 4ª séries na rede estadual de ensino, as experiências

anteriores ao ingresso na universidade e aquelas conquistadas durante a formação

profissional, foram aplicadas conjuntamente. A utilização de atividades ginásticas

com os escolares apresentou algumas restrições como espaço disponível para as

atividades, número de alunos por turma, escassez de materiais (inclusive

alternativos), porém fluiu de maneira surpreendente, na medida em que os alunos

realizaram movimentos nunca executados anteriormente, assim como conheceram

melhor as manifestações ginásticas em aulas expositivas.

A já referida experiência como praticante de ginástica, neste caso,

apresentou certa vantagem na aplicação deste conteúdo na Educação Física escolar,

dando a impressão que a falta de vivência seria um dos motivos da baixa

aplicabilidade da ginástica artística na escola por colegas de profissão. Contudo, ao

aceitar o ‘pretexto’ de que o professor de Educação Física vai ensinar somente aquilo

que vivenciou com plenitude, a pesquisadora – neste caso – ensinaria somente

conteúdos relacionados à ginástica e à dança em suas aulas, deixando falho os

conhecimentos dos alunos diante de outras manifestações esportivas/corporais.

Assim, estaria relegando a profissão de professor a uma evidente penúria

desvirtuando a formação, o compromisso profissional equiparado à busca de

aprofundamento das ações profissionais e aceitando que se ensina somente o que se

praticou – o que acontece de forma perniciosa na área, porém não deveria!

2 FIGUEIREDO, Juliana Frâncica. Ginástica Geral na Escola: análise de uma proposta de intervenção. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Educação Física) – Faculdade de Ciências, Universidade Estadual Paulista – UNESP, Bauru, 2005.

17

De fato, esse ‘pretexto’ não pôde ser aceito. Nesse sentido,

permaneceram as dúvidas a respeito da não aplicação da ginástica artística na

escola, pois, se há o conhecimento da ginástica artística sendo proporcionado

cursos de licenciatura em Educação Física e, se alguns documentos de orientação

do currículo escolar como Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e Caderno do

Professor3 colocam a modalidade como conteúdo a ser desenvolvido na escola, por

que isso não acontece? Onde estariam realmente os problemas? Seria o professor

que atua na escola o problema? Seria a ginástica artística inviável ao espaço

escolar? Seria a falta de aparelho ou ainda a baixa popularidade do esporte no

Brasil? Quais seriam os problemas?

Muitos questionamentos vieram à tona e, na tentativa de amenizá-los,

optou-se por tentar compreender junto a docentes responsáveis pelo ensino da

disciplina de ginástica artística em cursos de licenciatura, os motivos pelos quais a

modalidade é visivelmente ausente na escola, bem como ideais pessoais que os

docentes possam aludir na tentativa de solucionar essa defasagem.

Após relatar, resumidamente, uma trajetória de vida em que foi

possível abarcar experiência sobre o objeto de estudo e algumas dúvidas

envolvendo a ginástica artística, agora como pesquisadora, o anseio foi além de

inquietações individuais, chegando a pretensões que seguem na tentativa de

preencher lacunas, não apenas em meio às manifestações gímnicas, mas no campo

Educação Física como um todo. Assim sendo, os parágrafos que seguem presumem

informações pertinentes quanto aos objetivos, justificativa e relevância para que se

realizasse a referida pesquisa.

Para iniciar, é importante ressaltar que a ginástica olímpica ou artística,

objeto deste estudo, é mais popularizada no Brasil como ginástica olímpica, no

entanto, Nunomura et al. (2004, p.70) destaca que:

A FIG, instituição máxima da modalidade, define esta modalidade gímnica como GA, estabelecendo como modalidades olímpicas, as seguintes manifestações esportivas de ginástica: a ginástica artística masculina, a ginástica artística feminina, a ginástica rítmica desportiva, o trampolim acrobático e a ginástica aeróbica.

3 Ver nas referências: PCNs – Brasil (1997), Brasil (1998) e Brasil (2000); Caderno do Professor – São Paulo [Estado] (2008).

18

Dessa maneira, o termo ginástica olímpica estaria se referindo a

qualquer uma das modalidades gímnicas olímpicas, para isso buscou-se a

alternativa de troca na nomenclatura, o que para os autores gera ainda muita

controvérsia, tanto no mercado de trabalho quanto em questões institucionais. Este

estudo utilizará a nomenclatura ginástica artística, uma vez que a Federação

Internacional de Ginástica utiliza e foi o nome oficializado pelo Conselho Nacional de

Desportos, homologado pelo Ministério de Educação e Cultura e, publicado em

Diário Oficial da União em 16 de março de 1979.

Assim sendo, a importância em estudar as configurações atuais da

ginástica artística, tanto na escola quanto na universidade, faz sentido, na medida

em que seu processo de desenvolvimento modificou-se amplamente desde sua

inclusão nestes dois espaços (escolar e acadêmico).

A ginástica artística, pertencente a uma das áreas englobadas pela

Educação Física – ginástica (SOUZA, 1997), faz parte do conteúdo escolar

apresentada nos já citados documentos oficiais – PCNs e Caderno do Professor –

bem como está presente nas grades curriculares dos cursos de licenciatura. Dessa

forma, seriam necessários docentes especializados para ministrar essa disciplina na

universidade, preocupando-se com a formação pedagógica, no caso dos cursos de

licenciatura, contribuindo com a formação de professores.

Entende-se que o docente universitário que ministra essa disciplina em

cursos de licenciatura, deveria instrumentalizar os discentes de maneira

teórico/prática especificamente para trabalhar a ginástica artística na escola. Seria o

caso de ir além da técnica, ou da modalidade como esporte de rendimento,

alcançando plenamente o caráter pedagógico. É possível acreditar que a ginástica

artística, como modalidade esportiva elitizada, com exigência de técnica

especializada e aparelhos/materiais grandes e de alto custo, não demande trabalho

fácil em sua instrução universitária, sobretudo para atender o direcionamento

daqueles que pretendem atuar com escolares. Isso porque é preciso desconstruir

nos discentes universitários que a ginástica artística não é só o que se observa por

intermédio da mídia televisiva e que, como futuros professores, têm o dever de levar

essa modalidade ao contexto das aulas na escola.

19

Um fator de preocupação para a presente pesquisa é que a disciplina

de ginástica artística, apresentada nos curso de licenciatura, provavelmente não

está realizando essa ‘desconstrução’, nem oferecendo aos futuros profissionais

aparato técnico e pedagógico suficiente para o trabalho deste conteúdo na escola.

As manifestações ginásticas, e a ginástica artística inserida neste

contexto, fazem parte do processo de construção da Educação Física, desde que

algumas práticas de atividades físicas passaram a ser incluídas em âmbito

educacional. Na realidade o conceito ‘ginástica’ se confunde com ‘Educação Física’

quando ocorre a inclusão de atividades físicas na escola. Rinaldi (2004, p.79) coloca

que “os exercícios físicos, ao compor o conhecimento curricular permitido, recebem

o nome de ginástica (métodos ginásticos), constituindo-se em elemento laico na

educação escolar” (grifo da autora).

Rui Barbosa, advogado e grande defensor da prática de atividades

físicas nas escolas brasileiras, realizou em 1882 uma reforma em que “houve uma

recomendação para que a ginástica fosse obrigatória, para ambos os sexos, e que

fosse oferecida para as Escolas Normais” (DARIDO; SANCHEZ NETO, 2005, p.02).

Os autores ainda destacam que no século passado, por volta da década de 20

“vários estados da federação começam a realizar suas reformas educacionais e

incluem a Educação Física, com o nome mais freqüente de ginástica” (p.02).

Autores como Marinho (s/d), Soares et al. (1992), Soares (1994),

Castellani Filho (1994), afirmam que diferentes métodos ginásticos (alemão, sueco,

francês) foram introduzidos no Brasil e que tal inclusão foi gradativa em âmbito

nacional. No entanto, os autores também relatam que o direcionamento dado às

práticas era, a princípio, pautado no militarismo o que acabou levando instrutores

militares, sem um mínimo de suporte pedagógico, para dentro da escola. Os

objetivos da ginástica na escola durante essa fase militarista pela qual passou o

país, eram de disciplinar e fortificar o corpo dos alunos, baseados na proposta

européia que defendia a eugenia.

Incluída a ginástica na escola, pedagogos e médicos estabeleceram à

atividade física a tarefa de melhorar a saúde e educação das populações. “A

medicina tinha como objetivo a educação do povo e, por isso, a promoção da saúde

foi pedagogizada. As verdades das ciências biológicas são interpretadas

20

pedagogicamente e traduzidas em exercícios ginásticos” (RINALDI, 2004, p.80).

Assim, a ginástica é ‘promovida’ nas escolas brasileiras em meados do século XIX,

fato que necessariamente demandaria pessoal capacitado para atuar nesse meio.

Rinaldi (2004, p.83) destaca que “o ensino da ginástica nas escolas

brasileiras se dava por instrutores do exército e, [...] a formação profissional da área

ancorou-se, também, na instituição militar”. Mesmo com a criação das primeiras

escolas civis de Educação Física, por volta de 1930, o caráter militar era peculiar na

formação dos professores, dadas as características do momento histórico pelo qual

passava o país (ditadura militar).

Uma das primeiras habilitações de formação no campo era a de instrutor

de ginástica, o que perdurou por algum tempo, passando por mudanças após 1940

quando chegou ao Brasil o Método da Educação Física Desportiva Generalizada,

desenvolvido na França e divulgado no país por Auguste Listello. Nesse método

predomina a influência do esporte que, no pós-guerra, se afirmou “paulatinamente em

todos os países sob a influência da cultura européia como elemento predominante da

cultura corporal” (SOARES et al., 1992, p.54).

Os autores ainda destacam que a partir desse momento, as aulas de

ginástica passam a ser aulas de esportes ou Educação Física e, seqüencialmente,

as habilitações na formação superior passaram a ser de técnico e licenciado. Mesmo

com algumas mudanças de aspecto pedagógico ocorridas na década de 1960,

referentes à formação, estas não foram significativas no que diz respeito à atuação

na escola. As aulas ainda eram eminentemente técnicas, em que o esporte tinha

característica de treinamento.

De acordo com Soares et al. (1992), o conhecimento a ser transmitido

ao aluno nas aulas de Educação Física (modelo do esporte) eram – e, ainda são –

os fundamentos dos esportes como: drible, passe, arremesso, salto, etc. Sendo

assim, com o aprimoramento técnico dos alunos, já que o modelo tecnicista visava o

desenvolvimento da aptidão física, as aulas serviam para a seleção de novos

talentos que iriam fortalecer o esporte nacional.

A ginástica artística, que passou também a ser desportivizada e

difundida no início do século XX, é uma das disciplinas que permaneceram nas

21

grades curriculares dos cursos de formação profissional até os dias de hoje

(RINALDI, 2004). A autora coloca que, apesar de amplas mudanças no processo de

desenvolvimento da ginástica artística, estas se deram na esfera tecnológica e

técnica, voltadas para a modalidade esportiva de alto nível. Em relação ao caráter

teórico-pedagógico não houve alterações aparentes.

A ginástica artística fez e deve fazer parte da Educação Física tanto no

contexto acadêmico quanto no contexto escolar, como uma das variações da

‘ginástica como área de conhecimento’ (SOUZA, 1997; RINALDI, 2004) mas, para

tanto, é preciso rever os delineamentos da mesma nos cursos de licenciatura, na

expectativa de que se consiga compreender melhor as relações entre essa

manifestação gímnica e a Educação Física escolar.

Outro fator essencial a esse estudo, diz respeito ao docente do ensino

superior. Mizukami (2002) verificou que os trabalhos que apresentam como objeto

de estudo os docentes universitários, as dificuldades deles na atuação em contexto

acadêmico e as problemáticas afins são ainda insuficientes para se configurar o

perfil profissional desses docentes. No caso deste estudo, é possível entender que o

mesmo parece ocorrer no campo da Educação Física e, especificamente, no

trabalho com a ginástica artística.

Moletta Júnior et al. (2005, s/p) relata que “cada vez mais historiadores

e cientistas sociais têm se utilizado dos esportes e da Educação Física para o

entendimento dos processos históricos da sociedade”. Assim, tão importante quanto

as outras modalidades esportivas que fazem parte dos currículos nos cursos de

licenciatura em Educação Física, a ginástica artística também merece atenção

especial, uma vez que foi com a denominação de ginástica que a Educação Física

apresentou-se no mundo e no Brasil, configurando o processo histórico de

construção do campo, passando então a fazer parte da educação escolar.

Para que a explanação do tema de estudo, em conjunto com a análise

dos depoimentos, pudesse adquirir tanto um maior aprofundamento quanto maior

riqueza teórica, optou-se pela adoção de um referencial teórico pautado na

sociologia. Assim, o presente estudo toma como fonte de inspiração obras do

22

sociólogo Norbert Elias4, o que não o torna necessariamente um estudo sociológico,

mas que se pauta em conceitos da sociologia proposta pelo autor para a discussão

da literatura e análise dos dados. Também, apresenta-se uma significativa

construção histórica, o que não o torna um trabalho histórico. Porém, Norbert Elias

em razão de buscar analisar não o indivíduo em si, mas sim os conceitos

fundamentais de formação, interdependência, equilíbrio das tensões, revolução

social (ou das formações), mostrando os meios pelos quais se constroem e

entendem os envolvimentos sociais em suas diferentes épocas, oportuniza, então,

um entrelaçamento entre a história e a sociologia (CHARTIER, 1988)5. Destarte,

para o entendimento da conceituação e discussão da teoria de Norbert Elias no

decorrer do texto, faz-se necessária a construção histórica do tema de estudo.

Alguns conceitos do autor serão aqui apresentados, mas é no interior

do texto, balizando a problemática do estudo que eles poderão ser melhor

compreendidos. Inicialmente, é preciso ter claro que, para o autor, a sociologia traz

consigo, necessariamente, a conceituação de sociedade. Assim, Elias (1994, p.13)

vem questionar que tipo de formação é essa, esta sociedade, e argumenta que:

Ela só existe porque existe um grande número de pessoas, só continua a funcionar porque muitas pessoas, isoladamente, querem e fazem certas coisas, e, no entanto sua estrutura e suas grandes transformações históricas independem, claramente, das intenções de qualquer pessoa em particular.

A teoria sociológica formulada por Elias concebe sua tarefa como a de

analisar os processos sociais baseados nas atividades dos indivíduos que, por meio

de suas disposições básicas, ou, suas necessidades, são orientados uns para os

outros e unidos uns aos outros das mais diferentes maneiras, formando assim ‘teias

4 ELIAS, Norbert. Introdução à sociologia. Trad. Maria Luiza Ribeiro Ferreira. Lisboa: Edições 70, 1970. _____. Ensaio sobre o desporto e a violência. In: ELIAS, Norbert; DUNNING, Eric. A busca da excitação. Trad. Maria Manuela Almeida e Silva. Lisboa: Difusão Editorial Lda, 1992, p. 223-256. _____. A sociedade dos indivíduos. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 1994. _____. O processo civilizador: uma história dos costumes. Tradução de Ruy Jurgman. 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993a. _____. O processo civilizador: formação do estado e civilização. Tradução de Ruy Jurgman. 2ª ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993b. _____. Envolvimento e distanciamento. Trad. Maria Luíza Cabaços Meliço. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1997. _____. Envolvimento e alienação. Trad. Álvaro de Sá. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998. _____.; SCOTSON, John L. Os estabelecidos e os outsiders: sociologia das relações de poder a partir de uma pequena comunidade. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.

5 Para ver como Norbert Elias entende a História e faz uso dela em seus estudos - CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Trad. Maria Manuela Galhardo. Lisboa: Difel, 1988.

23

de interdependência’ que dão origem a ‘configurações’ de muitos tipos: família,

cidade, estado, nações. O conceito de configuração pode ser aplicado onde quer

que se formem conexões e teias de interdependência humana, isto é, em grupos

relativamente pequenos ou em agrupamentos maiores.

O termo ‘configuração’6, nas obras do autor, diz respeito a uma

conceituação mais ampla e apropriada que apresenta a rede de relações que as

pessoas constroem entre si. Segundo Landini (2005), essas configurações estão em

fluxo contínuo e passam por mudanças diversas, em que os processos inerentes a

elas possuem dinâmicas próprias, nas quais razões individuais possuem um papel,

mas não podem de forma alguma ser reduzidas a essas razões. Assim, o estudo do

todo pode ser mais significativo do que o estudo das partes.

O autor, então, propõe para o entendimento conceitual de

configurações os ‘modelos de jogos’. O jogo, inserido nos modelos propostos por

Elias (1970, p.79), apresenta “a competição realizada – mais ou menos – segundo

regras”, e pode ser visto como um sistema de interdependência complexo no qual se

pode pensar relacionalmente os grupos humanos. Como instrumento conceitual a

idéia de jogo pode ser utilizada tanto para analisar grupos menores, quanto grupos

maiores, tendo em vista que o foco são as relações sociais e as complexidades

apresentadas por estas relações no interior do grupo de jogadores.

Além destes conceitos, que caracterizam essencialmente Norbert Elias,

alguns outros serão descritos no texto como, poder, equilíbrio, autocontrole,

envolvimento, distanciamento, alienação, condição de saber e não saber,

conhecimento etc.

Destarte, trabalhar esses conceitos para entender a relação de poder

que está inserida no meio acadêmico, junto às modalidades esportivas na formação

inicial de professores de Educação Física, especialmente no contexto da ginástica

artística, faz-se importante à medida que o referencial teórico baseia-se em formas

6 Há grande discussão nos grupos de sociólogos adeptos da sociologia de Norbert Elias a respeito do uso do termo configuração ou figuração. Essa questão não advém de problemas de tradução do alemão para o inglês; o próprio autor, cuja obra foi escrita em sua maior parte em inglês, utilizou ambos os termos. Em grande parte de sua obra, utiliza “configuração”, palavra escolhida com o principal objetivo de fazer face ao termo parsoniano “sistema”. Apenas mais tarde em sua carreira é que passou a questionar a palavra em si, não seu significado. O ponto que incomodava Elias é que, no latim, o prefixo con significa exatamente “com”, ou seja, se figuração (figuration) quer dizer padrão (em inglês, pattern), con-figuração (configuration) quereria dizer com padrão (with pattern). Entretanto, como o objetivo do autor era entender o padrão em si, o prefixo con passou a ser visto como redundante e ele passou a preferir o uso de figuração (LANDINI; PASSIANI apud LANDINNI, 2005). Contudo, o presente estudo em sua linguagem recorrente, far-se-á uso do termo ‘configuração’, utilizado em boa parte das obras do autor.

24

de configurações sociais e como estas se processam. Isso possibilitará uma análise

em torno da configuração da disciplina de ginástica artística de maneira que possam

ser visualizadas as teias de interdependência que aí são formuladas.

Desse modo, na presente pesquisa, objetivou-se analisar a formação

do licenciado em Educação Física no que se refere ao ensino da ginástica artística,

sob a perspectiva de docentes universitários.

O estudo envolverá, prioritariamente, docentes que lecionam ou

lecionaram ginástica artística em cursos de licenciatura em Educação Física nas

universidades públicas no estado de São Paulo.

Optou-se pela coleta de dados em universidades públicas, pois são

“guardiãs por excelência da produção científica e cultural da sociedade” (PIRES,

1996, p.06). E, segundo Silva (2001), ao contrário do ensino privado, as

universidades públicas alcançam maior status no que diz respeito às exigências

didáticas e pedagógicas para o ensino.

As universidades públicas apresentam como princípio norteador a

indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, fator que pode ser importante

a esse estudo. Também as universidades públicas, no desígnio da responsabilidade

social, são capazes de gerar mudanças significativas e alterações favoráveis aos

cursos de Educação Física, podendo influenciar positivamente junto à atuação

docente e disposição da ginástica artística nos cursos de licenciatura.

A escolha por cursos de licenciatura deu-se pelo fato de esta,

originalmente, ter como foco a formação daquele que vai atuar na escola, porém não

é o que acontece normalmente. Mesmo com mudanças profundas, especialmente

nas diretrizes que norteiam cursos de licenciatura, muitos cursos ainda estão se

adaptando a essas mudanças, outros ainda trabalham perspectivando formar

recursos humanos para todo o mercado de atuação e aplicação da Educação Física.

Assim, ainda temos muitos professores ‘licenciados’, ou que estão por se formar,

com currículos que não condizem com a esfera escolar. Nesse sentido,

especificamente no contexto da disciplina de ginástica artística, prevalece o caráter

técnico em oposição ao pedagógico como já assinalou Rinaldi (2004), bem como há

falhas na formação de professores quanto a conteúdos gímnicos apontadas por

25

Souza (2001) e Schiavon (2003). Assim, enquadrar melhor a ginástica artística

dentro da licenciatura para que essa manifestação gímnica chegue a contento na

Educação Física escolar por meio dos professores trata de uma problemática

carente de solução.

Desse modo, a busca que segue quais são as configurações atuais da

disciplina de ginástica artística em cursos de licenciatura em Educação Física por

intermédio dos depoimentos, experiências e saberes de docentes universitários,

constitui objetivo principal deste estudo que vem apresentado em dois volumes:

Volume I – “A Disciplina de Ginástica artística na Formação do Licenciado em

Educação Física sob a Perspectiva de Docentes Universitários”; e Volume II –

“Depoimentos Orais – Docentes de Ginástica Artística”. O Volume I aqui exposto

aparece estruturado em cinco capítulos.

Iniciou-se os capítulos delineando a trajetória realizada até aqui – a

construção metodológica da investigação. Assim, no primeiro capítulo é descrito o

caminhar de um estudo qualitativo pautado no método de abordagem do tempo

presente que, ao ser explicitado inicialmente, pode tornar mais compreensível a

leitura e o modo de construção de todo o texto. O estudo não apresentou uma

categorização dos dados obtidos por intermédio dos relatos dos docentes reunidos

em um único capítulo. Ao invés disso, optou-se por apresentar tais relatos no interior

dos demais capítulos, juntamente à revisão de literatura, em que se buscou uma

articulação mais direta entre colocações de autores, fala dos depoentes e

conceituações de Norbert Elias. Além disso, o estudo enfocou revisão de literatura e

duas técnicas de coleta: o questionário e a entrevista. Foram também

minuciosamente apresentados neste capítulo a amostra do estudo, os

procedimentos de coleta e análise de dados, e os materiais utilizados.

O segundo capítulo versou sobre uma ‘parte’ da Educação Física que

diz respeito, à sua inclusão e desenvolvimento dentro das escolas brasileiras.

Pretendeu-se apresentar uma construção histórica que permitisse entender o que

configurou a Educação Física escolar atualmente, já que este estudo direciona-se à

licenciatura, habilitação responsável pela formação de profissionais neste espaço de

atuação.

26

No terceiro capítulo aborda-se o ‘ensino superior’ no qual estão

inseridos: a docência universitária, a formação e o currículo em Educação Física.

Discorre-se neste capítulo, embasamentos quanto à formação e atuação desses

docentes fazendo associações com o campo específico de Educação Física e com o

ensino da ginástica artística no ensino superior. Diante disso, optou-se por descrever

a construção histórica da formação profissional em Educação Física, tendo em vista

a responsabilidade dos docentes frente à formação inicial e profissional. Também

foram expostas questões curriculares a respeito do campo, pois elas é que deveriam

orientar a atuação docente.

Já no quarto capítulo apresenta-se a ginástica artística tendo como

precedente a contextualização histórica da ginástica. Foram descritos assim, as

escolas ou métodos ginásticos com maior divulgação mundial – alemã, sueca e

francesa – bem como a influência destas no Brasil. O capítulo também baliza sobre

a Federação Internacional de Ginástica, É NECESSÁRIO? órgão que rege as regras

oficiais da modalidade e os campos de atuação da ginástica, explicitados segundo

Souza (1997). Posteriormente a ginástica artística é apresentada sendo discutida em

meio ao âmbito da Educação Física escolar e no contexto da formação acadêmica.

Nas considerações finais discute-se a ginástica artística e as

configurações que perfaz como disciplina e conhecimento curricular de cursos de

licenciatura em Educação Física. Tais apontamentos foram orientados a partir do

referencial teórico utilizado – Norbert Elias – e com base nos depoimentos dos

docentes expostos no decorrer de todo o texto.

Nista-Piccolo (2005, p.30) afirma que “[...] a GA, ainda não apresenta

no Brasil, trabalhos de aprofundamento científico que possam gerar reflexões sobre

a prática existente atualmente”. Partindo da afirmação da autora, não seria

demasiado almejar que este estudo se prestasse um pouco a isso – uma

contribuição que pudesse gerar reflexões sobre a ginástica artística – tendo em vista

que há nestas folhas a pretensão de contribuir para um melhor entendimento dessa

histórica manifestação gímnica, da formação acadêmica para a escola, desde o que

ela já foi, até o que ela pode ser!

27

CAPÍTULO I

A BUSCA POR UM SALTO METODOLOGICAMENTE BEM EXECUTADO

1.1. Delineamento do Estudo e Método de Abordagem

O presente estudo, que objetivou analisar a formação do licenciado em

Educação Física no que se refere ao ensino da ginástica artística, na perspectiva de

docentes universitários, caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa.

De acordo com Molina Neto (2004, p.112) o estudo de natureza

qualitativa oferece “um leque de técnicas de investigação [...] que tratam de

descrever e interpretar as representações e os significados que um grupo social dá a

sua experiência cotidiana”. Complementando, André (1991) coloca que a abordagem

qualitativa considera os aspectos subjetivos do comportamento humano e preconiza

a entrada no universo conceitual dos sujeitos. Esta característica aplica-se ao

enfoque do estudo no qual se pretendeu analisar o ensino da ginástica artística, na

perspectiva de docentes universitários.

A pesquisa qualitativa dedica “atenção preferencial pelos pressupostos

que servem à vida das pessoas” (TRIVIÑOS, 1992, p.130) estabelecendo relação

entre o mundo real, sujeito e objeto, o que não permite a visão isolada e imutável do

problema, levando a uma interação dinâmica que se altera constantemente.

O método de abordagem utilizado no estudo define-se como história do

tempo presente.

28

Segundo Ferreira (2002, p.314), a história sempre foi vista e ainda é

definida como “interpretação do passado”, de forma que seria preciso tomar

distanciamento temporal de determinado problema ou fato para se avalizar sua

objetividade histórica. Assim sendo, “só o recuo no tempo poderia garantir uma

distância crítica” (FERREIRA, 2002, p.315). A história, por esse motivo, separou

drasticamente passado e presente, em que os estudos do mundo contemporâneo

eram recusados. Tal fato, que perdurou por muito tempo, delegou à história recente,

uma história sem historiadores (FERREIRA, 2002).

Ferreira (2002, p.319-320) relata que por volta de 1980 várias

mudanças ocorreram em relação à pesquisa histórica e, uma delas diz respeito à

inclusão do “estudo do contemporâneo”. Também a “expansão dos debates sobre a

memória e suas relações com a história veio oferecer chaves para uma nova

inteligibilidade do passado”. Para a autora, a história do tempo presente denota

A valorização de uma história das representações, do imaginário social e da compreensão dos usos políticos do passado pelo presente e, promoveu uma reavaliação das relações entre história e memória e permitiu aos historiadores repensar as relações entre passado e presente e definir para a, história do tempo presente o estudo dos usos do passado. (p.321)

De acordo com Chartier (1996, p.216), estudos da história

contemporânea “tentam identificar, além do mero discurso histórico, as formas

múltiplas e conflitantes de rememoração e utilização do passado”. O autor ainda

afirma que “a história do tempo presente [...], propicia uma reflexão essencial sobre

as modalidades e mecanismos de incorporação do social pelos indivíduos que têm

uma mesma formação ou configuração social” (p.217).

Esse método de abordagem permitiu questionar os docentes de

maneira que pudessem rememorar a ginástica artística e sua participação/atuação

no universo da mesma, apresentando um panorama atual e perspectivas para uma

construção futura desta modalidade nos cursos de licenciatura em Educação Física.

Segundo Ferreira (2002, p.321) “a memória é também uma construção

do passado, mas pautada em emoções e vivências; ela é flexível, e os eventos são

lembrados à luz da experiência subsequente e das necessidades do presente”.

Assim, as experiências e vivências dos depoentes no ensino da ginástica artística

29

trazem a possibilidade de se tentar configurar a disciplina na formação do licenciado

em Educação Física.

1.2. Técnicas de Coleta de Dados

O estudo enfoca além da revisão de literatura, que é característica

fundamental de todo trabalho acadêmico científico, duas técnicas de coleta:

questionário e entrevista.

Os trabalhos de revisão são definidos por Noronha e Ferreira (2000,

p.191) como

estudos que analisam a produção bibliográfica em determinada área temática, dentro de um recorte de tempo, fornecendo uma visão geral ou um relatório do estado-da-arte sobre um tópico específico, evidenciando novas idéias, métodos, subtemas que têm recebido maior ou menor ênfase na literatura selecionada.

A revisão de literatura compreendeu leitura crítica e análise de fontes

secundárias de informação (livros, periódicos, dissertações, teses etc.) com a

finalidade de embasar a temática do estudo e os objetivos nela inseridos. Além

disso, foi possível realizar uma reescrita de dados coletados durante a revisão, pois

estes foram simultaneamente dialogados com o material empírico adquirido por

intermédio dos relatos dos docentes. A revisão de literatura conjuntamente à

exposição dos relatos na construção do texto, pretendeu elucidar o que já fora

pesquisado, as lacunas existentes, bem como os pareceres dos docentes sobre

determinadas questões, proporcionando assim melhor colóquio de dados e

fundamentação teórica ao estudo. Os temas revisados e alguns relatados (pelos

docentes) compreendem: métodos qualitativos de pesquisa, enfocando história do

tempo presente e fontes orais; a docência no ensino superior; desenvolvimento da

Educação Física no Brasil atentando-se ao âmbito escolar, cursos de formação

superior e composição curricular; a trajetória histórica da ginástica, envolvendo a

ginástica artística nos cursos de licenciatura em Educação Física e na escola; e,

algumas obras do sociólogo Norbert Elias, na intenção de aprofundar o estudo.

30

Já o questionário consiste em questões escritas para serem

respondidas por uma população escolhida. E, “é um instrumento de coleta de dados,

constituído por uma série ordenada de perguntas, que devem ser respondidas sem a

presença do pesquisador” (RAMPAZZO, 1998, p.119).

O questionário utilizado no estudo encontra-se no apêndice A e foi

composto de nove questões, em que se utilizaram, conforme Vianna (2001),

questões abertas – possibilitando liberdade de resposta ao pesquisado, e questões

fechadas – em que o pesquisado deve optar dentre as respostas já colocadas pelo

pesquisador. A utilização do questionário permeou a caracterização dos docentes

participantes do estudo, objetivando coletar dados relativos à formação e

experiência em relação à ginástica artística e à docência no ensino superior.

Na utilização de fontes orais tem-se como possibilidade “esclarecer

trajetórias individuais, eventos ou processos que às vezes não têm como ser

entendidos e elucidados de outra forma” (AMADO; FERREIRA, 1996, p.xiv).

Tourtier-Bonazzi (1996, p.233) afirma que a “exploração do testemunho

oral [...] pressupõe que ele tenha sido colhido sistematicamente”, e que “cada

entrevista supõe a abertura de um dossiê de documentação”. O autor destaca que a

partir dos elementos colhidos elabora-se um roteiro de perguntas do qual o informante

deve estar ciente durante toda a entrevista.

Lakatos e Marconi (1986, p.173) apresentam a entrevista como:

Um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional. Trata-se, pois, de uma conversação efetuada face a face, de maneira metódica, proporcionando ao entrevistado, verbalmente, a informação necessária.

Na entrevista de caráter semi-estrutural ou semi-dirigido há “um meio

termo entre o monólogo de uma testemunha e um interrogatório direto” (TOURTIER-

BONAZZI, 1996, p.237), para dar possibilidade de diálogo entre pesquisador e

sujeito investigado, de forma que se tenham temas pré-estabelecidos de

questionamento. De acordo com Amado e Ferreira (1996), a entrevista semi-

estruturada se legitima como uma fonte histórica, dado seu valor informativo e por

incorporar perspectivas ausentes na literatura.

31

Antes da prática efetiva das entrevistas com os docentes participantes

do estudo, realizou-se uma entrevista piloto com um docente que ministra ginástica

artística em universidade privada na cidade de Araraquara, interior de São Paulo.

Esta entrevista permitiu avaliar o roteiro de questões em relação à pertinência e

entendimento das questões pelo docente. A partir desta entrevista piloto o roteiro da

entrevista inicial passou por alterações necessárias enquadrando-se melhor aos

objetivos do estudo.

O roteiro de questões utilizado para as entrevistas semi-estruturadas

(apêndice B) foi dividido em três blocos, nos quais as questões remetem aos

objetivos do estudo que pretendeu analisar a formação do licenciado em Educação

Física no que se refere ao ensino da ginástica artística, sob a perspectiva de

docentes universitários. As questões foram relacionadas à especificidade de cada

bloco de questionamento: I – Conhecimentos da ginástica artística ensinados na

formação (licenciatura) e maneira de ensiná-los; II – A ginástica artística na

formação do futuro professor; III – Programa de ensino e disposição da ginástica

artística no currículo em licenciatura.

Para a realização da coleta de dados, houve a necessidade de

aprovação do estudo por intermédio de Comitê de Ética (anexo A).

Também, no recebimento do convite de participação do estudo, foram

explicadas as intenções e características do estudo aos docentes participantes,

precisando para tanto de sua aprovação e consentimento. No momento da

entrevista os docentes preencheram um Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido (apêndice C) que dispõe sobre a participação voluntária no estudo com

omissão de nomes e locais mencionados, a possibilidade de desistência da

participação a qualquer momento, se desejado, bem como a publicação dos dados

obtidos. Também foi proporcionada ao docente a opção de receber ou não o

material transcrito (informação esta que optavam no momento em que assinavam o

termo de consentimento), para que tomasse conhecimento e pudesse fazer

sugestões sem alterar o depoimento, ficando a critério do pesquisador acatar

possíveis mudanças.

Os depoimentos foram gravados utilizando-se de aparelho gravador e

de câmera de filmagem, em que as fitas cassetes e os DVDs encontram-se

32

arquivados, em posse do pesquisador. As doze entrevistas, com os doze docentes

universitários, realizadas entre Julho/2008 e Dezembro/2008, foram transcritas na

íntegra, e constituem fonte documental a ser disponibilizada e, quem sabe, utilizada

para futuros estudos por intermédio de outros pesquisadores com olhares diferentes

e aspirações científicas que os guiem a outra direção. Assim, as referidas

entrevistas se encontram no Volume II – “Depoimentos Orais – Docentes de

Ginástica Artística”, deste estudo, na ordem em que foram realizadas. É importante

reportar que, além de nomes e locais, outros dados que pudessem fazer referência

ao docente entrevistado foram substituídos por designações fictícias.

1.3. Amostra do Estudo e Procedimentos de Coleta de Dados

Para a coleta de dados, primeiramente, buscou-se junto às

universidades públicas do Estado de São Paulo, aquelas que possuíam o curso de

licenciatura em Educação Física, bem como a disciplina ginástica artística (obrigatória

ou optativa) em sua grade curricular.

A escolha das instituições de ensino superior (IESs) abarcou apenas o

ensino público. Fazem parte das universidades públicas do Estado de São Paulo

três IESs Estaduais e quatro IESs Federais. Dentre estas sete IESs, quatro

oferecem cursos de graduação em Educação Física de caráter público no Estado de

São Paulo, sendo que uma das IESs estaduais possui três campi com o curso.

Os cursos de Educação Física nas IESs públicas do Estado de São

Paulo, configuram meios de formação inicial diferentes entre si que não se

restringem apenas a bacharelado ou licenciatura. Dessa forma, têm-se três cursos

oferecendo licenciatura e bacharelado (por intermédio de tronco comum); três cursos

que proporcionam somente a licenciatura; e um curso que oferece somente

bacharelado. Com isso, num total de quatro IESs públicas – uma delas com três

campi – o número de cursos em que se buscou a formação em Educação Física na

ênfase licenciatura, totalizou seis.

Optou-se pela coleta de dados em universidades públicas,

principalmente por sua responsabilidade social. Cabe explanar de forma mais

aprofundada, então, a universidade, inclusive a instituição universitária de caráter

33

público, como amostra deste estudo, descrevendo os motivos que justificam referida

escolha.

A universidade, como instituição co-responsável em oferecer à

sociedade, principalmente, formação profissional para áreas distintas, passa

atualmente por intensas críticas quanto ao tipo de conhecimento que proporciona. E,

um dos fatores que possivelmente leva a essas críticas na atualidade, trata da

dialética do mercado e da sociedade (PIRES, 1996, p.05). O autor destaca que:

A definição de princípios que balizam a função da universidade passa necessariamente pelas questões: deve a universidade estar direcionada para o mercado ou para a sociedade? Como combinar e desenvolver esta dupla função da formação universitária, sem desvirtuar e privilegiar esta orientação em detrimento de um ou de outro aspecto? Eis aí uma das contradições básicas da função da universidade e de sua crise de identidade. (p.05-06)

Silva (2001, p.299) afirma que as necessidades sociais às quais

responde o ensino superior privado são aquelas filtradas pelo mercado, “neste

sentido, a expansão do ensino privado é consequência da visão do mercado como

critério universal”. O autor observa que, semelhante à época da ditadura, quando o

ensino superior privado teve sua expansão, os parâmetros de lucratividade e

eficiência repercutiram diretamente na questão da qualidade e do nível de ensino

ministrado. A dependência da clientela para a sobrevivência econômica da empresa

gera naturalmente um nivelamento por baixo das exigências didáticas.

Em contrapartida, Silva (2001, p.299) garante que “boa parcela das

acusações de arcaísmo, corporativismo e ineficiência feitas à universidade pública

visa, na verdade, ao distanciamento que ela, em grande parte, ainda mantém do

mercado”. Para o autor, por não estar limitada por injunções do mercado,

[...] é que a universidade pública pode cumprir o seu papel histórico e social de produção e disseminação do conhecimento, e também manter com a cultura uma relação intrínseca que se manifesta numa possibilidade de reflexão que foge aos moldes do compromisso imediatamente definido pelas pressões de demanda e de consumo. (p.299)

Silva (2001) ainda coloca que apesar de inúmeras dificuldades e

pressões externas, as universidades públicas que se mantêm independentes em

34

relação às determinações imediatas do mercado são aquelas que optaram pela

valorização da dedicação exclusiva e pela pesquisa básica.

É possível, dessa maneira, entender que o desenvolvimento do ensino,

da pesquisa e da extensão, pilares essenciais em grande parte do ensino

universitário público do país, se reafirmam pela recusa de entender estes pilares

como serviço e mercadoria.

Pires (1996, p.06) destaca que nem sempre

[...] a pesquisa e a investigação científica conseguem se adequar às necessidades do mercado, e não são todos os pesquisadores que aceitam perder a liberdade de criação ou de elaboração de uma pesquisa, direcionando-a apenas a interesses que são eminentemente voltados para o mercado ou para o aperfeiçoamento do sistema produtivo nacional.

Todavia o autor afirma que seria um erro desvincular a universidade da

lógica reprodutiva do capitalismo que norteia boa parte do mundo atualmente. Para

tanto, aponta que uma solução seria “procurar formas de combinar estas duas

dimensões: o mercado e a sociedade, sem desvirtuar ou privilegiar um ou outro

aspecto da função institucional da universidade” (p.06).

Elucidando e sustentando as iniciativas do ensino superior público

optar pela sociedade e não pelo mercado, Silva (2001, p.301-302) questiona e

conclui: “A quem serve a pesquisa básica? Do ponto de vista de interesses

imediatos, a ninguém. Do ponto de vista de sua inserção num projeto histórico-

político emancipatório de dimensões amplas, serve a todos, serve à nação”.

Assim, a tríade ensino, pesquisa e extensão observada quase que

exclusivamente em universidades públicas deve servir à sociedade, fator que

apresentou extrema importância nesse estudo. São estas universidades também,

que possuem maior reconhecimento frente aos órgãos governamentais e à

população, podendo influenciar favoravelmente alternativas de mudanças quanto à

atuação docente e disposição da ginástica artística nos cursos de licenciatura.

O Estado de São Paulo, como fonte primária da amostra do estudo, foi

escolhido por questões relevantes, quais sejam: é o estado que concentra o maior

número de IESs públicas com cursos de licenciatura em Educação Física (um total

35

de seis); é no Estado de São Paulo também que se encontra a federação de

ginástica artística (regional) com mais adeptos – a Federação Paulista de Ginástica,

tendo conjuntamente a esse fato, mas não por conseqüência do mesmo, maior

número de praticantes da modalidade em relação a outros estados brasileiros; além

disso, é neste estado em que se encontra a residência fixa da pesquisadora, motivo

que facilitou a coleta dos dados, realizada por intermédio de entrevistas agendadas

com os docentes.

Justificando parte da amostra do respectivo estudo – universidades

públicas – o quadro abaixo apresenta, atribuindo sigilo às universidades, a situação

atual da disciplina de ginástica artística na grade curricular desses cursos, bem

como a situação do(s) docente(s) que a ministrou, ou ministra.

36

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cent

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disc

iplin

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Cu

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E

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E

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ísic

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l –

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Gin

ástic

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rtís

tica

e D

ocen

tes

37

1.3.1. Participantes do Estudo

Após seleção dos cursos de licenciatura em Educação Física que

apresentam ou apresentaram a disciplina de ginástica artística em suas grades

curriculares, buscou-se listar os docentes que se encaixavam no perfil requerido

pelo estudo – docentes que ministram ou ministraram disciplina em caráter efetivo

nesses cursos. A escolha pelos docentes que ministraram essa disciplina e hoje não

a ministram mais, seja por motivo de aposentadoria ou por opção, justifica-se no fato

deste estudo pretender observar as configurações atuais da disciplina de ginástica

artística. Assim sendo, faz-se oportuno observar a construção da disciplina em

âmbito acadêmico. Além disso, o método de abordagem utilizado – História do

Tempo Presente – permite que se faça esse diálogo com um passado que não

necessita de um espaço de tempo muito distante do presente para ser analisado.

Os docentes que se enquadravam no perfil foram contatados via

mensagem eletrônica (e-mail) e/ou telefonema, sendo convidados a participar do

estudo concedendo informações por meio de questionário e entrevista. Para tanto se

procedeu da seguinte maneira: após aceitação do docente, era lhe encaminhado o

questionário via e-mail, o qual tinha explicitado os objetivos do estudo; assim que

era devolvido o questionário (via e-mail), era agendada a entrevista com o docente.

Cada docente, num total de doze, elegeu o local em que se sentia mais

a vontade para a concessão da entrevista; assim, das doze entrevistas, oito foram

realizadas no local de trabalho e, quatro realizadas na própria residência dos

docentes. De qualquer forma, tanto no ambiente de trabalho, quanto na residência

do docente, os espaços mostraram-se adequados à realização dos depoimentos,

pois eram ambientes fechados oferecendo privacidade, silêncio e ausência de

interrupções, permitindo o diálogo e a qualidade da filmagem e da gravação.

Os quatro quadros que são apresentados na sequência caracterizam

os docentes participantes do estudo quanto a sua formação profissional, atuação e

experiência no âmbito da ginástica artística e do ensino superior. No quinto quadro

são apresentados os docentes aposentados e efetivos nas universidades públicas,

com a observação de que alguns docentes aposentados ainda lecionam e alguns

docentes efetivos não lecionam mais disciplina(s) da modalidade.

38

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tras

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(3 a

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Gin

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Gin

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co

(4 a

nos)

Atle

ta (

não

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rmou

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mpo

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Gin

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F

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Esp

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G

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Mes

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duca

ção

F

ísic

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outo

r em

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Fo

rmaç

ão/

Hab

ilita

ção

Lice

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tura

Ple

na

em E

duca

ção

Fís

ica

Lice

ncia

tura

Ple

na

em E

duca

ção

Fís

ica

Lice

ncia

tura

em

E

duca

ção

Fís

ica

Do

cen

tes

D.1

D.2

D.3

39

Ou

tras

info

rmaç

ões

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bre

o

Do

cen

te

Efe

tivo

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enta

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gin

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min

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utra

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scip

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ém d

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nást

ica

artís

tica

Efe

tivo

apos

enta

do; m

inis

trou

cu

rsos

de

giná

stic

a ar

tístic

a

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arb

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em e

m g

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tica

ar

tístic

a em

âm

bito

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l;

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iona

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nal

Efe

tivo

atua

ndo;

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lizou

pr

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ensã

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giná

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a ar

tístic

a; m

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tra

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tras

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cipl

inas

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e

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Dis

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M

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tica

Art

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Gin

ástic

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rtís

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Gin

ástic

a A

rtís

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Prá

tica

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Gin

ástic

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ástic

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Gin

ástic

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límpi

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Art

ístic

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num

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ano

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Hab

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ístic

a

(20

anos

)

Exp

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m

Gin

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Tip

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xper

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cia

Atle

ta (

2 an

os);

A

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écni

co (

1 an

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Téc

nico

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Atle

ta (

7 an

os);

T

écni

co (

25 a

nos)

Atle

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6 an

os);

T

écni

co (

16 a

nos)

Ou

tro

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urs

os

de

Fo

rmaç

ão (

Lat

o/S

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Sen

su)

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em

G

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tica

Art

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a;

Mes

tre

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ção;

D

outo

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Psi

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caci

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Esp

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lista

em

G

inás

tica

Art

ístic

a;

Mes

tre

em E

duca

ção

Fís

ica

Esp

ecia

lista

em

G

inás

tica

Art

ístic

a;

Mes

tre

em E

duca

ção;

D

outo

r em

Edu

caçã

o (c

ursa

ndo)

Fo

rmaç

ão/

Hab

ilita

ção

Lice

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Ple

na

em E

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ção

Fís

ica

Lice

ncia

tura

Ple

na

em E

duca

ção

Fís

ica

Lice

ncia

tura

em

E

duca

ção

Fís

ica

Do

cen

tes

D.4

D.5

D.6

40

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tras

info

rmaç

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bre

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te

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pro

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tica;

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ualm

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ou

tras

dis

cipl

inas

, mas

não

gi

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artís

tica.

Efe

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afas

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lice

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saúd

e (e

m p

roce

sso

de a

pose

ntad

oria

);

min

istr

ou o

utra

s di

scip

linas

, al

ém d

e gi

nást

ica

artís

tica

Efe

tivo

atua

ndo;

rea

lizou

pr

ojet

o de

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ensã

o co

m

giná

stic

a ar

tístic

a; m

inis

tra

at

ualm

ente

out

ras

disc

iplin

as,

mas

não

gin

ástic

a ar

tístic

a.

Exp

eriê

nci

a co

m

Do

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no

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M

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ástic

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ástic

a A

rtís

tica

(1

7 an

os)

Gin

ástic

a O

límpi

ca/

Art

ístic

a (2

1 an

os)

Exp

eriê

nci

a co

m

Gin

ásti

cas/

Tip

o d

e E

xper

iên

cia

Atle

ta (

4 an

os);

A

uxili

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écni

co (

3 an

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T

écni

co (

5 an

os)

Doc

ente

rel

ata

não

ter

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expe

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ias

com

a

Gin

ástic

a A

rtís

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ante

rior

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erío

do

de g

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. Dur

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a

grad

uaçã

o de

stac

ou-s

e na

di

scip

lina

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scou

ap

rofu

ndam

ento

em

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em c

urso

s té

cnic

os e

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nico

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men

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7 an

os)

Ou

tro

s C

urs

os

de

Fo

rmaç

ão (

Lat

o/S

tric

to

Sen

su)

Esp

ecia

lista

em

E

duca

ção

Fís

ica

Esc

olar

Esp

ecia

lista

em

T

rein

amen

to D

espo

rtiv

o;

Mes

tre

em F

isio

logi

a do

E

sfor

ço

Esp

ecia

lista

em

G

inás

tica

Art

ístic

a;

Dou

tor

em E

duca

ção

Fís

ica.

Fo

rmaç

ão/

Hab

ilita

ção

Lice

ncia

tura

em

E

duca

ção

Fís

ica

Lice

ncia

tura

em

E

duca

ção

Fís

ica

Gra

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ão e

m

Edu

caçã

o F

ísic

a

Do

cen

tes

D.7

D.8

D.9

41

Ou

tras

info

rmaç

ões

so

bre

o

Do

cen

te

Efe

tivo

atua

ndo;

rea

lizou

pro

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de

ext

ensã

o co

m g

inás

tica

artís

tica;

min

istr

a a

disc

iplin

a de

F

unda

men

tos

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inás

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po

rém

nun

ca m

inis

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Gin

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i com

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giná

stic

a em

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isso

ras

de T

V;

min

istr

ou o

utra

s di

scip

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, alé

m

de g

inás

tica

artís

tica

Efe

tivo

apos

enta

do; i

nteg

rou

com

issõ

es té

cnic

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de

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trag

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a F

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Pau

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e

Bra

silie

nse

de G

inás

tica,

da

Con

fede

raçã

o B

rasi

leira

de

Gin

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a e

da F

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In

tern

acio

nal d

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inás

tica;

foi

com

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rista

de

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stic

a em

em

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ras

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V; m

inis

trou

out

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disc

iplin

as, a

lém

de

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stic

a ar

tístic

a

Exp

eriê

nci

a co

m

Do

cên

cia

no

En

sin

o

Su

per

ior/

Dis

cip

linas

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42

Curso 1 Curso 2 Curso 3 Curso 4 Curso 5 Curso 6

Docente 1 (aposentado)

Docente 5* (deixou IES

pública – atuando em IES privada)

Docente 2* (atuando)

Docente 3 (atuando)

Docente 4* (aposentado – atuando em IES privada)

Docente 9 (atuando)

Docente 7 (atuando)

Docente 8* (efetivo

afastado por licença médica)

Docente 11 (aposentado)

Docente 12 (aposentado)

Docente 6* (atuando)

Docente 10 (atuando)

( * ) Docentes que ministram ginástica artística atualmente

1.4. Materiais

Utilizou-se para a realização das entrevistas uma câmera digital SONY

6.0 mpx com cartão de memória de 4GB, suportando até três horas de filmagem;

quatro DVDs para o armazenamento das entrevistas; um gravador COBY CX-R133;

e doze fitas microcassetes SONY de sessenta minutos cada uma (com ampliação

para cento e vinte minutos de acordo com a velocidade de gravação).

1.5. Procedimentos para Análise das Entrevistas

Todos os dados coletados constituíram fontes importantes e

fundamentais para os resultados do estudo e tiveram seus conteúdos

minuciosamente analisados. Por se tratar de uma pesquisa qualitativa, procedeu-se

à análise de conteúdo que, segundo Triviños (1992, p.159) serve “para o estudo das

motivações, atitudes, valores, crenças e tendências” da população pesquisada. A

análise de conteúdo tem sido muito utilizada na análise de comunicações nas

ciências sociais. Minayo (2000) afirma ser o método mais comumente adotado no

tratamento de dados de pesquisas qualitativas.

43

Para Bardin (1979), a análise de conteúdo abrange as iniciativas de

explicitação, sistematização e expressão do conteúdo de mensagens, com a

finalidade de se efetuarem deduções lógicas e justificadas a respeito da origem

dessas mensagens. Mais especificamente, a análise de conteúdo constitui:

Um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção destas mensagens. (Bardin, 1979, p.42)

Bardin (1979) coloca a análise de conteúdo como um recurso à análise

objetivando a extração de um material qualitativo. Também exemplificando como

análise de entrevistas relacionadas ao modo de pessoas viverem e sua relação com

seus objetos cotidianos.

Segundo Nunes et al. (2008, p.08),

[...] a análise de conteúdo oscila entre os dois pólos que envolvem a investigação científica: o rigor da objetividade e a fecundidade da subjetividade, resultando na elaboração de indicadores quantitativos e/ou qualitativos que devem levar o leitor a uma segunda leitura da comunicação, baseado na dedução, na inferência. Essa nova compreensão do material textual, que vem substituir a leitura dita “normal” por parte do leigo, visa revelar o que está escondido, latente, ou subentendido na mensagem. Logo, a análise de conteúdo pode ser utilizada tanto em pesquisas de cunho quantitativo, quanto qualitativo, nas ciências sociais.

Bardin (1979) caracteriza a análise de conteúdo como sendo empírica

e, por esse motivo, não pode ser desenvolvida com base em um modelo exato.

Contudo, para sua operacionalização, devem ser seguidas algumas regras, por meio

das quais se parte de uma leitura de primeiro plano para atingir um nível mais

aprofundado. Nesse sentido, a análise de conteúdo relaciona as estruturas

semânticas (significantes) com estruturas sociológicas (significados) dos enunciados

e articula a superfície dos textos com os fatores que determinam suas características

(variáveis psicossociais, contexto cultural e processo de produção da mensagem)

(MINAYO, 2000).

Para Bardin (1979), não se trata de atravessar os significantes para

atingir os significados, como se faz na leitura normal, mas de, por meio dos

44

significantes e dos significados (manipulados), buscarem-se diferentes significados

de natureza psicológica, sociológica, política, histórica, dentre outros.

Bardin (1979) aponta três etapas como sendo básicas em trabalhos

que se utilizam de análise de conteúdo: 1) pré-análise; 2) descrição analítica ou

exploração do material; 3) interpretação referencial ou tratamento dos dados obtidos:

• Pré-análise: organização dos materiais que serão utilizados para a

coleta dos dados, assim como de outros materiais que podem ajudar a

entender melhor o fenômeno e fixar o corpus da investigação, que seria a

especificação do campo em que o pesquisador deve centrar a atenção.

• Descrição analítica: nesta etapa o material reunido, que constitui o

corpus da pesquisa, é mais aprofundado, sendo orientado, em princípio, pelas

hipóteses e pelo referencial teórico, surgindo desta análise quadros de

referências, buscando sínteses coincidentes e divergentes de idéias.

• Interpretação referencial: é a fase de análise propriamente dita. A

reflexão e a intuição, com embasamento em materiais empíricos, estabelecem

relações com a realidade, aprofundando as conexões de idéias chegando, se

possível, à proposta básica de transformações nos limites das estruturas

específicas e gerais.

Para este estudo, especificamente, os depoimentos orais tiveram suas

transcrições sinalizadas por temas, em que cada um possuía uma cor

correspondente, sendo divididos em quatro grupos (gerais): a) Educação Física; b)

docência; c) ginástica; d) outras informações/referencial teórico. À medida que eram

realizadas as leituras (e re-leituras) dos depoimentos, era possível observar a que

grupo pertenciam as falas, e sinalizá-las com suas cores adequadas. Ao grupo

‘outras informações/referencial teórico’, buscou-se agrupar falas que não se

enquadravam aos demais grupos, mas apresentavam grande possibilidade de

inclusão na análise de dados, bem como contemplavam o referencial teórico.

Esse agrupamento das falas por temas e, sinalizando-as no interior do

corpo textual da entrevista, facilitou a busca de informações sobre os principais

assuntos abordados na revisão de literatura, sem que se perdesse o contexto da

própria fala do depoente.

45

Assim, o presente estudo encaminha suas pretensões metodológicas,

a serem observadas na sequência do texto, na direção das palavras de Barros e

Lehfeld (1986, p.60) em que, "[...] através da investigação científica o homem não só

reconstitui progressivamente o mundo dos objetos, em seu pensamento, como

também dá a ele significantes novos e mais próximos à verdade que os objetos

contêm”.

46

CAPÍTULO II

O ROLAMENTO INICIAL: EM FOCO A EDUCAÇÃO FÍSICA

2.1. Da Ginástica para a Educação Física: seu surgimento no Brasil

Realizar uma abordagem em que ginástica e Educação Física serão

contextualizadas historicamente não demanda tarefa fácil, uma vez que ambas

confundem-se por longo período no âmbito da prática de atividades físicas/corporais.

Na historiografia da área, ora tem-se a denominação ginástica, ora Educação Física.

Soares (1996, p.09) destaca que na última década do século XX “o termo ginástica

ainda é largamente utilizado para denominar a aula que trata das atividades físicas,

mas já vem surgindo outro termo, com o qual convivemos até hoje: Educação

Física”.

Deste modo, versar sobre o processo de desenvolvimento da

Educação Física no Brasil e, ainda relatar o contexto histórico da ginástica, poderia

deixar os escritos aqui recorrentes já que, neste desenvolvimento, ocorre uma

transição das referidas terminologias. Assim, optou-se por apresentar o

desenvolvimento da Educação Física concomitantemente às iniciativas de inclusão

da mesma na escola, bem como a partir da criação das primeiras escolas de

formação de seus profissionais no Brasil (no próximo capítulo), justificando pela não

repetição de informações.

A inclusão da Educação Física nas escolas brasileiras dá-se no século

XIX, e para os escritos que seguem, entende-se que a ginástica, naquele momento,

citada por alguns autores, iria ser futuramente denominada Educação Física.

47

No período imperial que data de 1822 a 1889, Tojal (2005, p.02) alega

que os fatos referentes à Educação Física não foram significativos no Brasil “a não

ser a criação do Colégio Pedro II (1837) que incluiu a ginástica nos seus currículos

no final desse período, sendo ainda indicada a utilização nas escolas do ‘método

alemão’ que já havia sido adotado nos meios militares”.

Passados quase quinze anos, em 1851, a atividade física começa a

fazer efetivamente parte dos programas escolares da corte por obra do ex-deputado

e então Ministro do Império, Luiz Pedreira do Couto Ferraz, com a chamada

Reforma Couto Ferraz (BRASIL, 1997). No entanto, sua regulamentação foi

expedida três anos depois e, entre as matérias a serem obrigatoriamente

ministradas, estavam a ginástica no primário e a dança no secundário, mas somente

nas escolas da corte.

No ano de 1882, Rui Barbosa, que era advogado e patrono no que diz

respeito às atividades corporais instituídas em âmbito escolar, apresenta, segundo

Tojal (2005, p.03),

[...] pareceres sobre a reforma do ensino Leôncio de Carvalho de 1879, os quais se constituíram num tratado sobre a Educação Física, defendendo a inclusão das atividades físicas e da prática da Educação Física nas escolas estaduais com fins de promover a saúde física, a higiene física e mental, a educação moral e a regeneração das raças.

Castellani Filho (1994, p.48) ressalta o destaque dado pelo advogado à

Educação Física no projeto n°. 224 de 12 de Fevereiro de 1882, no qual sintetiza as

propostas:

[...] a instituição de uma sessão especial de ginástica em escola normal (inciso primeiro), até a equiparação, em categoria e autoridade, dos professores de ginástica aos de todas as outras disciplinas (inciso quarto), passando pelas propostas de inclusão da ginástica nos programas escolares como matéria de estudo, em horas distintas das do recreio e depois das aulas.

Nesse projeto – reforma Couto Ferraz – fora designado por Rui

Barbosa, o método sueco na educação brasileira e como já colocado, “houve

recomendação para que a ginástica fosse obrigatória, para ambos os sexos, e que

48

fosse oferecida para as escolas normais” (DARIDO; SANCHEZ NETO, 2005, p.02).

Os autores, e também Betti (1991), colocam que até os primeiros anos da década de

1930, as leis propostas pela reforma foram aderidas apenas pelas escolas do Rio de

Janeiro, como município da corte imperial e capital da República, bem como as

escolas militares.

Piccoli (2006, p.14.19) destaca que em 1885 “a prática da ginástica nas

escolas públicas de instrução primária é declarada obrigatória, em 23 de Novembro,

através da Decisão Imperial nº. 71. Assim, a ginástica se tornaria obrigatória no

currículo das escolas primárias”.

A Educação Física que se estabelece no final do século XIX e início do

século XX é a Educação Física higienista que, segundo Ghiraldelli Júnior (1988,

p.22), trata de “uma concepção particularmente forte nos anos finais do Império e no

período da Primeira República (1889-1930)”. O autor afirma que a Educação Física

higienista “é produto do pensamento liberal em que sobre os ombros da educação e

da escola foram depositadas as esperanças das elites intelectuais de construção de

uma sociedade democrática e livre dos problemas sociais” (p.22). Essa concepção,

que incidiu principalmente nos discursos médicos, previa o fortalecimento das raças

(eugenia), dava ênfase à saúde, procurando assim formar seres humanos fortes e

saudáveis para livrar a sociedade das doenças infecciosas e vícios que prejudicam a

saúde, o caráter do ser humano e consequentemente a sociedade. Os padrões de

conduta da juventude robusta de uma elite social eram colocados como paradigma

para todos os indivíduos (GHIRALDELLI JUNIOR, 1988).

Piccoli (2006, p.14.19) destaca que nesse período – da Primeira

República,

[...] a educação brasileira estava sendo influenciada pelo movimento que discutia a reconstrução educacional do Brasil, através de uma nova educação voltada para o desenvolvimento integral do indivíduo. A Educação Física, como meio para se alcançar o objetivo almejado, seria um dos agentes de importância no processo. Nesse período, a Educação Física seguia os moldes europeus – o alemão, o sueco e o francês – baseados em princípios biológicos e que estavam inseridos num movimento mais amplo, de natureza política, cultural, e científica denominado de Movimento Ginástico Europeu. Assim, no período de 1889 a 1920, enquanto o método alemão era utilizado nos estabelecimentos militares, nas escolas civis brasileiras predominava o método sueco. O método alemão foi oficialmente substituído no Brasil em 27 de abril de 1921, pelo decreto nº. 14.784, emitido pelo, então, Ministério da Guerra que oficializou o método de

49

Géorges Hébert, adaptado às teorias da Escola Militar Francesa de Joinville-le-Pont. (grifo nosso)

Assim, em 1920, ganha espaço na escola o método francês que, a

partir de 1930, passa a ser usado como meio para a política getulista, em que se

pretendia um ser humano forte para a produção da indústria brasileira. Também na

década de 1920, outros estados da federação, que não somente o Rio de Janeiro,

“começam a realizar suas reformas educacionais e incluem a Educação Física, com

o nome mais freqüente de ginástica” (DARIDO; SANCHEZ NETO, 2005, p.02).

Até meados da década de 1930, a ginástica, como sessão de

exercícios físicos nas escolas – ainda não de forma obrigatória – assemelhava-se

muito às sessões de Educação Física das décadas posteriores. Porém, somente a

partir da década de 1930, com a disseminação dos benefícios da atividade física e a

abertura de escolas de formação de professores, é que a ginástica vai se

perfazendo Educação Física.

2.2. Educação Física nas escolas brasileiras: da obrigatoriedade à atualidade

A ginástica, que nesse momento passa a ter sua denominação

‘trocada’ por Educação Física, presencia a partir da década de 1930, por intermédio

de concepções políticas que orientam o governo brasileiro (militar) e iniciativas

legais, sua inclusão e obrigatoriedade nas escolas brasileiras.

É nessa década também que a Educação Física brasileira deixa de ser

uma Educação Física higienista para seguir uma tendência militarista. E, Ghiraldelli

Júnior (1988, p.26-27) assim relata:

A Educação Física higienista preocupada com a saúde, perde terreno para a Educação Física militarista que subverte o próprio conceito de saúde. A saúde dos indivíduos e a saúde pública, presentes na Educação Física higienista, de inspiração liberal, são relegadas em detrimento da ‘saúde da pátria’.

O autor observa que a concepção de Educação Física – militarista – vai

se distinguir da concepção higienista ‘liberal’ principalmente pelos “princípios

50

autoritários de orientação fascista [...] para a formação do homem obediente e

adestrado” (p.26). Deste modo, a preocupação com a saúde individual e pública

propalada na tendência higienista perpetuava-se na concepção militarista de

Educação Física, porém adquiriu novos contornos e direcionamentos uma vez que

“[...] o objetivo fundamental [...] é a obtenção de uma juventude capaz de suportar o

combate, a luta, a guerra. Para tal concepção, a Educação Física deve ser

suficientemente rígida para ‘elevar a nação’ à condição de ‘servidora e defensora da

Pátria’” (GHIRALDELLI JÚNIOR, 1988, p.18).

A concepção de Educação Física militarista estabelecia um processo

de seleção eliminando os fracos e premiando os fortes, buscando indivíduos aptos a

transformarem-se em cidadãos-soldados, prontos a obedecer cegamente e a servir

de exemplo para o restante da juventude (GHIRALDELLI JUNIOR, 1988).

Desse modo, Cantarino Filho (1982) observa que dentre as alterações

estabelecidas pelo ministro Francisco Luiz da Silva Campos na área da educação –

nomeada Reforma Campos – regulamentada em 18 de Abril de 1931, destaca-se o

estabelecimento da obrigatoriedade da Educação Física em todas as classes das

instituições de ensino secundário (correlativo às atuais 5ª a 8ª séries do ensino

fundamental e à 1ª a 3ª séries do ensino médio).

Ferreira Neto (1999, p.09) afirma que, nessa ocasião, "os militares são

os responsáveis pelo processo de escolarização da Educação Física brasileira". As

aulas de Educação Física na escola eram, até então, ministradas por instrutores

militares que assumiam precedentes nacionalistas do momento em questão – ‘Era

Vargas’. A disciplina é preconizada como redentora e amortizadora de conflitos,

sendo conveniente a utilização das aulas – as quais eram estruturadas nos

princípios do método francês – como um instrumento disciplinador eficaz.

No desenrolar de uma Educação Física militarizada no país, observa-

se que esta passa a ser um meio de fortificar e ‘controlar’ a nação. Assim, uma

ampla mudança social fora imposta e o autocontrole já fazia parte da personalidade

do indivíduo na medida em que “o controle mais complexo e estável da conduta

passou a ser cada vez mais instilado no indivíduo desde seus primeiros anos, como

uma espécie de automatismo, uma autocompulsão à qual ele não poderia resistir,

mesmo que desejasse” (ELIAS, 1993a, p.195-196).

51

Para o autor, muitas funções sociais são modeladas segundo as

respectivas estruturas sociais. O monopólio da força física que atua sobre o

indivíduo, refreando suas emoções, exerce influência decisiva em sua formação, na

medida em que modifica “todo o aparelho que modela o indivíduo, o modo de

operação das exigências e proibições sociais que lhe moldam a constituição social

e, acima de tudo, os tipos de medos que desempenham um papel em sua vida”

(ELIAS, 1993a, p.17).

Não é difícil compreender então, a negação de algumas pessoas em

relação à Educação Física, bem como seus aspectos de treinamento, que muito se

assemelhavam a adestramentos militares e fizeram parte da história do campo. Essa

história não foi esquecida e nem deveria, pois é com base nela que se pode

compreender as configurações que moldou o campo com o passar dos anos, quase

sempre na busca por mudanças.

A Educação Física no âmbito escolar, mesmo após a criação de

escolas de formação de professores não apresentou mudanças significativas, isso

porque esses professores ou eram formados segundo preceitos militares, ou se

tratava de um “professor não especializado em ensino polivalente” (TOJAL, 2005,

p.6). Segundo Beltrami (2001, p.27) os “professores, chamados no passado de

‘instrutores’, aplicavam para crianças, na escola, exercícios ginásticos praticados

nos quartéis”.

A necessidade da Educação Física à sociedade vai se tornando cada

vez mais evidente. Sobre o assunto Brasil (1997, p.20) coloca que:

Apenas em 1937, na elaboração da Constituição, é que se fez a primeira referência explicita à Educação Física em textos constitucionais federais, incluindo-a no currículo como prática educativa obrigatória (e não como disciplina curricular) [...] em todas as escolas brasileiras. Também havia um artigo naquela Constituição que citava o adestramento físico como maneira de preparar a juventude para a defesa da nação e para o cumprimento dos deveres com a economia.

É relevante considerar que, até o ano de 1945, a Educação Física não

foi objeto de profundo interesse teórico. Betti (1991) afirma que esta era considerada

uma atividade útil ao Estado, sendo sempre versada em separado nos currículos

escolares. Por muito tempo, a configuração de uma aula com vertentes militares foi

52

o que a Educação Física adotou na escola. A disciplina seguia um propósito político

e assim permaneceu sem mudanças expressivas em suas metodologias até por

volta da década de 1960.

No entanto, no processo de desenvolvimento da Educação Física,

Ghiraldelli Júnior (1988) observa nesse momento outra tendência – Educação Física

pedagogicista. O autor descreve que a Educação Física pedagogicista propunha-se

educativa, preocupada com a juventude que frequentava a escola, usando, para

tanto, ginástica, dança, desporto etc., como instrumentos capazes de levar o aluno a

aceitar as regras básicas de convívio democrático, preparando-o para o altruísmo e

o culto à riqueza nacional.

A Educação Física pedagogicista é, pois, a concepção que vai reclamar da sociedade a necessidade de encarar a Educação Física não somente como uma prática capaz de promover saúde ou de disciplinar a juventude, mas de encarar a Educação Física como uma prática eminentemente educativa. (GHIRALDELLI JÚNIOR, 1988, p.19)

Segundo Brasil (1997), o fim da década de 1940 e toda a década de

1950 foram marcados por amplos debates sobre o sistema de ensino brasileiro e

nestes debates também estava incluída a Educação Física como ‘atividade’ capaz

de promover educação. Na teoria de Elias (1997) as direções dos processos de

conhecimento são características universais, e envolvimento e distanciamento,

quaisquer que sejam suas funções, são indicadores complementares da direção dos

processos de conhecimento. Assim, pode-se pensar que o aumento de debates deu-

se pelo distanciamento que determinados indivíduos realizaram em relação à

Educação Física para poder analisá-la sob outra ótica – a ótica educacional.

A partir desse possível ‘distanciamento’, na década de 1960 observam-

se dois eventos significativos para a Educação Física: a criação da primeira LDB –

Lei de Diretrizes e Bases da Educação – nº. 4.024 de 20 de Dezembro de 1961; e o

Diagnóstico de Educação Física/Desportos editado no final da década de 1960. Silva

(2002) aponta que a LDB 4024/61 irá apresentar em seu artigo 22 a obrigatoriedade

da prática de Educação Física em todos os níveis de ensino, inclusive no ensino

superior, tendo este o esporte como prática.

53

Piccoli (2006) coloca que também na década de 1960 surge uma série

de dispositivos legais focalizados no ensino da Educação Física escolar brasileira,

bem como o esporte começa a fazer parte das aulas na escola. Afirma o autor que,

“após 1964, observa-se no Brasil a adoção do modelo esportivo, hoje muito utilizado

nas aulas de Educação Física no ensino fundamental e médio, levando a ginástica a

um segundo plano nos programas dessa prática educativa” (p.14.20).

Destarte, neste período, a Educação Física passa por atenuantes

influências advindas do Instituto Nacional de Esportes da França (BETTI, 1991).

Este instituto cria o já mencionado método que no Brasil será difundido por Auguste

Listello, conhecido aqui como método desportivo generalizado. Betti (1991, p.97)

afirma que este método “resumidamente procura incorporar o conteúdo esportivo

aos métodos da Educação Física, com ênfase no aspecto lúdico”.

Darido (2003, p.02) destaca que, por trás dessa ‘ludicidade’, “os

governos militares que assumiram o poder em Março de 1964 passam a investir

pesado no esporte na tentativa de fazer da Educação Física um sustentáculo

ideológico, na medida em que ela participaria na promoção do país através do êxito

em competições de alto nível”.

A tendência que caracteriza nesse momento a Educação Física é,

segundo Ghiraldelli Junior (1988), uma tendência competitivista. O autor destaca

que na Educação Física competitivista é possível observar, como na militarista, o

ranço da hierarquização e elitização social; esta cultua o atleta-herói, aquele que

apesar de todas as dificuldades consegue chegar ao podium; buscava, por

intermédio da prática desportiva massificada, a formação de grandes atletas; era

também um meio de as classes dirigentes buscarem a desmobilização da

organização popular, canalizando energias para o esporte-espetáculo.

Bracht (1992) reporta-se ao desenvolvimento do esporte no pós-guerra

como elemento hegemônico da cultura corporal em todos os países sob a influência

da cultura européia. O autor enfatiza que, no Brasil, “as condições para o

desenvolvimento do esporte, quais sejam, o desenvolvimento industrial com a

conseqüente urbanização da população e dos meios de comunicação de massa,

estavam agora, mais do que antes, presentes” (p.22).

54

Diante dessas colocações, é possível compreender uma tendência

competitivista em algumas falas do Docente 1, tendo em vista que ele se formou e

iniciou na carreira docente mais ou menos nesta época – 1960. Em seu relato,

quando vai responder à questão sobre sua metodologia de trabalho, coloca que: “eu

acho que a gente tem que trabalhar a base, é mirim, é infantil, é juvenil, pra você ter

adulto futuramente pra você representar o país”.

Nesse sentido, observa-se que o esporte é instituído muito semelhante

ao militarismo e como forma de controle social, pois, enquanto pratica esporte, o

indivíduo está de acordo com regras que, por mais que pareçam rígidas, não são tão

duras quanto as regras da sociedade – no esporte, as regras são representações

das regras da sociedade, não são réplicas. Conforme Elias (1993b, p.235), “a peça

fulcral da configuração de um grupo envolvido no desporte é, sempre, a simulação

de um confronto, com as tensões por ela produzidas controladas, e, no final, com a

catarse, a libertação de tensão”.

Assim, de acordo com Elias (1992, p. 243), “o desporto é, de facto,

uma das maiores invenções sociais que os seres humanos realizaram sem o

planear”. Além disso, o autor afirma que o desporto “oferece às pessoas a excitação

libertadora de uma disputa que envolve esforço físico e destreza, enquanto reduz ao

mínimo a ocasião de alguém ficar, no seu decurso, seriamente ferido” (p.244) –

ponto que o diferencia do militarismo.

Apesar das ‘imposições’ do esporte destacadas, houve, em meados da

década de 1960 e início da década de 1970, a tentativa de melhor direcionar a

Educação Física em seus aspectos legais dentro da escola.

O Ministro da Educação e Cultura, tomando como referência a Lei 4.024/61 e o decreto 58.130/66, aprovou a portaria ministerial nº. 148, de 27 de Abril de 1967, que determinava a composição do programa de Educação Física escolar pela ginástica, por jogos, pelos esportes, pelas danças e pela recreação, canalizados para a promoção do desenvolvimento harmonioso do corpo e do espírito e de modo especial, ao fortalecimento da vontade. Tinha, também, o objetivo de formar e disciplinar hábitos sadios, adquirir habilidades, equilibrar e conservar a saúde e incentivar o espírito de equipe de modo que fosse alcançado o máximo de resistência orgânica e de eficiência individual. (PICCOLI, 2006, p.14.20)

55

Mais tarde, aponta Silva (2002, p.171), a Lei nº. 5.692/71, em seu

artigo 7 viria, assim como na LDB 4024/61, “destacar a obrigatoriedade da Educação

Física nos estabelecimentos de 1º e 2º graus”. Não obstante, Carneiro (2006, s/p)

afirma que em ambas as leis, a Educação Física é facultativa; em 1961 em

parágrafo único do artigo 22, era facultativa aos cursos noturnos e, em 1971,

[...] excluía das aulas de Educação Física os alunos que trabalhavam por seis ou mais horas; os maiores de trinta anos de idade, os que estivessem prestando serviços militares; e aos alunos amparados pelo Decreto-lei nº. 1.044/691, mediante laudo do médico assistente do estabelecimento.

Subseqüente a este fato, é instituído o Decreto Federal 69.450, de 1º

de Novembro de 1971, que conferia à Educação Física um caráter de “atividade”

que, entre outros, tinha na “aptidão física” uma “referência fundamental para orientar

o planejamento, controle e avaliação da Educação Física, desportiva e recreativa, no

nível dos estabelecimentos de ensino” (SILVA, 2002, p.171).

Soares (1996, p.09) acrescenta que na década de 1970, com o

aumento de estudos na área da psicomotricidade, as “condutas motoras” passam a

ser foco de atenção na Educação Física escolar, negando-se assim os conteúdos

até então ensinados. Nesse momento, “passamos a vivenciar uma situação inédita.

A Educação Física perde a sua especificidade”. Segundo a autora, a Educação

Física e o professor, passam a se envolver mais com a escola e com a criança, bem

como com os processos que envolvem essa dialética.

Mergulhamos num outro universo teórico, metodológico e lingüístico. Descobrimos, naquele momento, que estávamos na escola para algo maior, para a formação integral da criança. A Educação Física era apenas um meio. Um meio para aprender matemática, língua portuguesa, história, geografia, ciências...era um meio para a socialização. Meio, esta metáfora biológica e evolucionista foi largamente utilizada pela educação de um modo geral e pela Educação Física de modo específico [...] O discurso e prática da Educação Física sob a influência da psicomotricidade, coloca de modo nunca antes visto a necessidade do professor de Educação Física sentir-se um professor com responsabilidades escolares, pedagógicas. Busca desatrelar sua atuação escolar dos cânones da instituição desportiva, valorizando o processo de aprendizagem e não mais a execução de um gesto técnico isolado. (p.09-10)

A ginástica artística, inserida num curso de Educação Física,

aparentemente apresenta vertentes técnicas voltadas ao esporte desde as décadas

56

de 1960 e 1970, que certamente não conseguiu apresentar vínculos com a escola,

pois o Docente 1, que já ministrava a disciplina da modalidade nessa ocasião, afirma

que “as escolas normalmente não trabalhavam com ginástica, os clubes é que

faziam tudo”. E o docente, que durante todo seu depoimento apresentou uma visão

diferenciada dos demais docentes (voltada mais ao treinamento, como já fora

apontado, dada sua formação/atuação) ainda afirma que:

eu acho que a maioria dos meus alunos que saíram foram trabalhar em clubes! Alguns, acho que muito poucos, foram trabalhar em escola. As escolas não te dão condição e não te pagam também. O clube além de ter uma aparelhagem, tem motivação de competir e tem dinheiro para comprar aparelhos e para pagar o técnico.

Soares (1996, p.10) aponta que nestas décadas tentava-se pensar e

contemplar uma Educação Física mais apropriada ao ambiente escolar, porém

destaca que se por um lado, essa experiência de participação maior na escola foi

um benefício à Educação Física, por outro lado “foi o início de um abandono do que

era específico da Educação Física”. Assim, na sequência de seu desenvolvimento, e

com a redemocratização do país, a Educação Física entrou na década de 1980

cercada por uma crise de identidade (BETTI, 1991).

Isso acontece porque “certas transformações sociais só podem

efectuar – se é que se podem mesmo efectuar – quando houver um

desenvolvimento que abarque várias gerações” (ELIAS, 1970, p.21). O autor,

quando faz essa colocação, refere-se a formas de pensamento, reorientações

lingüísticas e conceituais, contudo dada a abrangência de seus conceitos, entende-

se que as condições práticas de aplicação da Educação Física sejam uma extensão

de suas bases teóricas e vice-versa. O autor ainda afirma que

a compreensão e afinidade em relação a novos modos de falar e de pensar nunca se desenvolveu sem entrar em conflito com modos mais velhos e mais comuns. Torna-se necessária uma reorganização da percepção e do pensamento de todas as muitas pessoas interdependentes numa sociedade. Se uma grande maioria tiver que reaprender a repensar tudo isto, tendo que se acostumar a todo o complexo de conceitos novos – ou conceitos velhos com um novo significado – então torna-se necessário um período de duas ou três gerações, por vezes mesmo de muitas mais. (p.21)

57

Pensando nisso – numa reorganização do pensamento – pode-se

lembrar que diversas foram as iniciativas que buscaram uma reformulação da

Educação Física na década de 1980. Segundo Piccoli (2006, p.14.21):

Através das abordagens desenvolvidas na década de 1980, as relações entre a Educação Física e a sociedade passaram a ser discutidas sob a influência das teorias críticas da educação através do questionamento do seu papel e a de sua dimensão política. O aspecto biológico foi reavaliado e as dimensões psicológicas, sociais, cognitivas e afetivas foram enfatizadas, concebendo-se o aluno como um ser humano integral. Por outro lado, os objetivos educacionais tornaram-se mais amplos, isto é, não apenas voltados para a formação de um físico que pudesse sustentar a atividade intelectual. Eram aconselhados conteúdos mais diversificados, além dos exercícios físicos e dos esportes e pressupostos pedagógicos voltados mais para o aspecto humano do que para o adestramento.

As abordagens pedagógicas da Educação Física a que Piccoli (2006)

se referiu, foram estudos teóricos desenvolvidos por diversos estudiosos do campo

que, de alguma maneira, tentaram auxiliar na orientação da Educação Física

escolar, já que seus conteúdos anteriores (ginástica e esporte) foram extremamente

criticados e não eram adequadamente usados do espaço escolar. As abordagens

podem ser pensadas como movimentos engajados na renovação teórico-prática com

o objetivo de (re)estruturação do campo, bem como dos conhecimentos que são

específicos dela.

Segundo Darido e Sanchez Neto (2005), distintos autores se

propuseram a anunciar e organizar abordagens para a Educação Física escolar,

bem como estas apresentam perspectivas e tendências pedagógicas diferenciadas

em sua introdução. Para tanto, optou-se apenas pela citação de algumas destas

tendências, desenvolvidas a partir da década de 1980. São elas e seus precursores:

psicomotricidade – Jean Le Bouch (1984); humanista – Vitor Marinho de Oliveira

(1985), ensino aberto – Hildebrandt, Laging (1986) – estudada e disseminada no

país pelo Grupo de Trabalho Pedagógico da UFPE e UFSM (1991),

desenvolvimentista – Go Tani e outros (1988), construtivista-interacionista – João

Batista Freire (1989), fenomenológica – Wagner Wey Moreira (1991), sociológica –

Mauro Betti (1991), crítico-superadora – Carmen Lúcia Soares e outros (1992),

crítico-emancipatória – Eleonor Kunz e outros (1994) e, antropológica ou

cultural/plural – Jocimar Daólio (1995).

58

Nem todas estas abordagens ou teorias tiveram ampla aceitação

dentro da comunidade acadêmica, tão pouco foram utilizadas no cotidiano prático

das aulas de Educação Física escolar, dessa forma não cabe a este estudo explanar

uma abordagem em detrimento de outra, mas deixá-las descritas a título de

conhecimento, pois, como assinala Tani (2001, p.110), inauguraram uma “nova fase

da Educação Física escolar brasileira”. O autor também coloca que, em conseqüência

desse fato, intensificaram-se os debates no espaço acadêmico, envolvendo questões

de cunho político e ideológico, que, no entanto, não alcançaram a prática pedagógica.

Com todas essas abordagens disponíveis, era de esperar transformações significativas na prática pedagógica da Educação Física escolar. Afinal, cada uma dessas abordagens propunha uma forma diferente de desenvolver a Educação Física no contexto da educação escolarizada, ou seja, uma alternativa àquela tradicional e hegemônica centrada em aptidão física e esporte. No entanto, não foi isso o que aconteceu [...], pois poucas mudanças concretas no cotidiano da prática pedagógica foram observadas. (p.110)

Tani (2001) descreve algumas possíveis causas do distanciamento

destas abordagens do cotidiano do professor, iniciando pelas discussões que

ocorreram basicamente em meio acadêmico, não alcançando de forma eficaz a

esfera da prática profissional na qual a Educação Física escolar de fato acontece; as

discussões no âmbito acadêmico caracterizam-se, usualmente, por enfatizar as

diferenças e não as semelhanças, já na esfera profissional as discussões buscam

pontos convergentes que sejam úteis ao desenvolvimento da prática; as discussões

acadêmicas focam as matrizes filosóficas, ideológicas e políticas das abordagens,

não alcançando a realidade da prática profissional para discutir aspectos

pedagógicos mais específicos relacionados a objetivos, métodos e conteúdos de

ensino; as abordagens apresentadas não tinham a característica de uma proposta

de roteiro completo, que contemplasse desde a definição clara dos objetivos e

significados da Educação Física escolar até critérios e procedimentos de avaliação,

passando naturalmente pela organização sequencial dos conteúdos e a escolha de

métodos de ensino.

A questão apontada pelo autor pode ser verificada no relato do

Docente 7. Ele esclarece que na ocasião em que ministrava a disciplina (década de

1980 e meados de 1990),

59

Naquele momento, daquele currículo da universidade, nós não tínhamos essa diferenciação era uma formação que ainda tinha um conceito técnico, então por conta disso se nós fôssemos trabalhar com as ementas, é trabalhar com o projeto pedagógico do curso, que tinha uma visão mais técnica, a ginástica artística era entendida como uma modalidade esportiva de competição [...] Mesmo na licenciatura [...] o objetivo, era trabalhar toda essa fundamentação da modalidade esportiva, como competição, como treinamento, e não voltada para o ambiente escolar.

Destarte, é possível pensar que toda a discussão pedagógica que se

fundamentava no interior do campo Educação Física, não era desenvolvida a

contento, inclusive em conteúdos de cunho mais prático como a ginástica artística,

tendo em vista a própria gênese do campo e seu subsequente encaminhamento nas

décadas anteriores – militarizada, esportivizada e competitivista.

As discussões teóricas permaneceram na Educação Física sem

alcançar diretamente a Educação Física escolar até a promulgação da LDB nº. 9.394

de 20 de Dezembro de 1996. Segundo Piccoli (2006, p.14.23) a referida lei “deu uma

nova roupagem à Educação Física [...] hoje se pode analisar a situação do ensino da

Educação Física frente a esta nova orientação legal”.

O artigo 26 desse dispositivo estabelece que a Educação Física,

integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular da educação

básica e deverá ser ajustada às faixas etárias e às condições da população escolar,

sendo facultativa aos alunos dos cursos noturnos (BRASIL, 1996).

Sobre o aspecto ‘facultativo aos cursos noturnos’, é possível

compreender a Educação Física como um descarte na condição de componente

curricular destacado na LDB 9394/96. Assim, facultativo possibilita sua exclusão nos

cursos noturnos, pois a maioria das escolas públicas, já pelas deficiências físicas,

não atendiam os alunos dos cursos noturnos com essa disciplina. O poder público,

ao invés de investir em soluções para esse problema, resolve-o eliminando, de certa

forma, a Educação Física nesses cursos (SILVA, 2002).

Num sentido de retrocesso, na LDB 9394/96, o ensino de Educação

Física não é obrigatório para todos os graus de ensino, conforme previa a LDB

4024/61 e o Decreto nº. 69.450/71. Na atual legislação, a sua obrigatoriedade limita-

se à educação básica – educação infantil, ensinos fundamental e médio – sendo

60

facultativa para os cursos noturnos e ensino superior. Observa-se que, aos poucos,

a Educação Física vai perdendo espaço exatamente onde se legitimou – na escola.

Segundo Carneiro (2006, s/p), outra ‘alteração’ vem aparentemente

tentar amparar a Educação Física em 2003:

A lei nº. 10.793 de Dezembro de 2003, alterando a redação do artigo 26 da lei anterior para a seguinte: "A Educação Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da educação básica, sendo sua prática facultativa ao aluno: que cumpra jornada de trabalho igual ou superior a seis horas; maior de trinta anos de idade; que estiver prestando serviço militar inicial ou que, em situação similar, estiver obrigado à prática da Educação Física; amparado pelo Decreto-Lei no 1.044, de 21 de Outubro de 1969; (Vetado); e que tenha prole", parece que somente contribui para demarcar e assegurar aos profissionais de Educação Física mais uma fatia do mercado de trabalho: o ensino noturno, que logo também poderá estar ameaçada no caso desses alunos que constituem a maioria dos estudantes do ensino noturno resolverem por não participar das aulas.

Trata-se de uma alteração superficial, pois a Educação Física ainda

continua sendo facultativa dando direito aos alunos de não participarem das aulas. A

autora ainda afirma que, assim como ocorria nas leis e decretos anteriores,

[...] a legislação não parece interessada com a socialização do conhecimento abarcado pela Educação Física junto aos alunos trabalhadores e torna cada vez mais evidente o fato de que o que confere legitimidade à Educação Física na escola é a legislação [...] A Educação Física deve buscar pela sua legitimidade junto à sociedade sem que necessariamente esteja respaldada pela legislação. Para isso, as informações a respeito dos esforços dos intelectuais da área no sentido de promover discussões e teorizações sobre a constituição do campo acadêmico e as diferentes formas de intervenção na área necessitam chegar com uma maior regularidade no espaço escolar. (s/p)

Atualmente, enfrentam-se estratégias de desqualificação dos

professores em geral, pelos baixos salários, péssimas condições de ensino, pela

política destrutiva de formação docente, pela ausência de políticas de capacitação

permanente assegurada e, em especial, pela desqualificação do professor de

Educação Física (TAFFAREL; SANTOS JÚNIOR, 2005). Além disso, o Docente 10

salienta que, “a nossa graduação ainda é muito redondinha, muito bobinha”, pois

segundo ele, ainda divide o conteúdo e faz cobranças descontextualizadas em

relação ao efetivo ambiente de trabalho que o aluno irá enfrentar depois. Esse fator

vai concretizar o que diz o Docente 5, quando relata que “o difícil é que os

61

professores estão totalmente sem base e sem orientação desse be-a-bá que nós

estamos falando agora”, e continua destacando que “infelizmente a Educação

Física, o profissional de Educação Física, a gente até não enxerga com bons olhos”,

ou seja, “a importância da Educação Física na escola é um pouco negada por falta

dos profissionais, então se os profissionais realmente trabalhassem, aí (...)”

E a partir destas colocações cabe questionar: ‘será que os profissionais

sabem realmente como trabalhar?’. Será que eles finalizam sua formação numa

‘condição de saber’, que Elias (1998) aponta como um dos elementos da aquisição

de conhecimentos? Essa condição de saber que o autor retrata depende também

das formas de envolvimento, distanciamento e, inclua-se aqui, alienação (ELIAS,

1997; 1998), pelas quais os indivíduos observam, experimentam e, por fim,

adquirem certo conhecimento. Estas ‘formas’ estão sujeitas a interesses e tensões

podendo pender para um lado positivo, ou não, em relação ao que se aprende, já

que todas as relações humanas, sejam entre pessoas ou ‘coisas’, estão sempre em

constante mudança. Para Elias (1998), a reconstrução do processo no qual os seres

humanos passaram da condição de não-saber para a condição de saber ou,

eventualmente, da condição de saber retornou à condição de não-saber deve ocupar

o centro da cena, produzindo-se assim um modelo verificável.

Portanto, entendendo que a aquisição de conhecimentos a respeito de

uma ginástica artística competitiva, com todas as suas variantes técnicas, num curso

de licenciatura, pode relegar ao professor de Educação Física escolar um estado de

alienação e que este professor pode, exageradamente, envolver suas formas de

pensamento com a grandiosidade da modalidade de alto rendimento, provavelmente

ele não conseguirá sozinho distanciar-se deste vínculo com o estado de alienação

para observar a ginástica artística de uma maneira não competitiva e mais

pedagógica. Certamente ele não irá ensinar ginástica artística na escola!

É necessário que, para que a Educação Física então chegue de forma

satisfatória ao ensino escolar, para além da legislação, a formação do profissional que

atua neste espaço seja amplamente coerente com ‘esse espaço’. Esta formação

poderia estar fundamentada na educação básica e em todos os seus pressupostos

pedagógicos e seus aspectos estruturais. Com veemência o trabalho com questões

pedagógicas da Educação Física e seus conteúdos – jogos, danas, esportes,

62

ginásticas – deveriam fazer parte do processo de formação do professor. Uma

formação em licenciatura estruturada tendo como foco exclusivamente o ambiente

escolar poderia garantir, talvez com maior segurança, um melhor reconhecimento ao

campo e melhores condições de estabilidade à Educação Física na escola. Assim

sendo, no próximo capítulo será apresentado o ensino superior, incluídos nele a

docência, a formação profissional em Educação Física e o currículo dos cursos,

direcionados à licenciatura.

63

CAPÍTULO III

VIRAR ESTRELA: O ENSINO SUPERIOR – DOCÊNCIA, FORMAÇÃO E CURRÍCULO

3.1. A Docência no Ensino Superior

O ensino superior desde a década de 1970, e especialmente na última

década passou por intensas mudanças no que diz respeito ao número de

instituições e cursos que cresceu vertiginosamente. Esse crescimento resultou num

sério problema quanto a profissionais para a realização do trabalho docente. A

formação de docentes preparados para esta função não acompanhou e, ainda não

acompanha, esse crescimento de forma a oferecê-lo com qualidade operacional.

Nesta perspectiva, Casati (2008, p.15) destaca que, mesmo após a

expansão do ensino superior no país, na qual foi possível observar “um grande

avanço quantitativo nas ações voltadas para a formação de professores

universitários”, este processo “ainda não pode ser considerado satisfatório em

termos de preparação destes profissionais, especialmente no que diz respeito à

docência em Educação Física” (grifo nosso).

Em relação à formação de professores universitários para o ensino da

ginástica artística “infelizmente nós carecemos disso” (D.4). Segundo o Docente 4,

“para você ser um especialista da área da ginástica, você tem que participar do

mundo da ginástica aí fora, você tem que participar de federações, de cursos de

arbitragem”. Então, como afirma o Docente 11, “vai assistir competição, vai participar

de cursos, porque só o que a gente faz na faculdade não é suficiente para dar tudo o

que a gente pode dar para os alunos”. Todavia, essa ‘formação continuada e

64

específica’ acaba sendo preterida, pois, “chega um momento em que se você está

no espaço acadêmico você tem que se dedicar ao espaço acadêmico, você tem que

publicar” (D.4) e, isso pode fazer com que o docente não avance junto com sua

especialidade, porque também tem quex atender à pesquisa em detrimento do

ensino.

Conforme Anastasiou e Pimenta (2002), o ensino superior brasileiro

vem obtendo uma nítida expansão da quantidade de instituições o que,

consequentemente, acarreta um aumento no quadro de docentes em atuação nos

últimos anos, bem como tende a elevar o número de estudos referentes ao exercício

da docência neste âmbito.

No aspecto legal, a partir da LDB 9394/96, houve a exigência de que

as IESs apresentassem 15% de seus professores como titulados na pós-graduação

stricto sensu, porém confrontando realidade e exigências legais, tem-se uma visão

bastante preocupante, pois muitas instituições não possuem a porcentagem mínima

de docentes com a titulação exigida. Esse fator acaba relegando à educação no

ensino superior uma deterioração evidente que, ao invés de formar indivíduos

críticos que solucionem com eficácia os problemas sociais contribuindo no

desenvolvimento da sociedade, está formando recursos humanos para as demandas

emergentes do mercado capitalista (RINALDI, 2004).

Casati (2008, p.16) observa a ‘exigência’ da lei corroborando que “a

formação da docência universitária não é concebida como um processo de

formação, mas como um caminho para o exercício do magistério superior, realizada

prioritariamente (não unicamente) nos cursos de pós-graduação stricto sensu”.

Com isso, aproveitando a não exigência de exclusividade no tipo de

formação, é que houve um aumento expressivo nos cursos de pós-graduação lato

sensu, com a introdução da disciplina Metodologia do Ensino Superior

(ANASTASIOU; PIMENTA, 2002). Amplia-se a demanda para a formação de

profissionais que atuem no ensino superior, mas, trata-se de uma formação com

curto prazo de preparação.

O fato do ensino superior passar por atenuantes mudanças, dentre elas

a necessidade latente de recursos humanos para seu funcionamento, enquadra-se

65

no conceito de configuração difundido nos trabalhos de Norbert Elias. Tal conceito

enfatiza as ligações entre mudanças na organização estrutural da sociedade,

mudanças na estrutura de comportamento e na constituição psíquica, pretendendo

escapar de visões centradas num indivíduo ‘encapsulado’ e numa sociedade como

‘ente externo’. Assim, uma mudança vai levando a outra no contexto acadêmico,

perfazendo, além das ‘teias de interdependências’, uma situação de ‘jogo’ –

conceitos também propostos pelo autor e que estão presentes em todas as relações

humanas. O jogo é um sistema de interdependência complexo que serve para

pensar, em termos de relacionamento, os grupos humanos e as configurações que

tecem. As configurações às quais o autor faz referência, seriam, portanto, a

abrangência relacional, o modo de existência do ser social e a possibilidade

conceitual de aproximação às emergências do cotidiano (ELIAS, 1970).

Assim sendo, diante de toda essa mudança nas configurações do

espaço acadêmico que reflete diretamente na sociedade, pois na teoria de Elias tais

mudanças constituem a sociedade e não apenas fazem parte dela, Anastasiou e

Pimenta (2002), afirmam que acaba existindo atualmente um grande número de

professores não qualificados atuando no ensino superior. Esse dado tem influências

na graduação, uma vez que os cursos acabam perdendo em qualidade por terem

docentes não capacitados ministrando suas disciplinas. Sobre essa questão, o

Docente 7 afirma que se um docente que ministre a disciplina de ginástica artística

tiver “uma formação ampla e não tiver tido nenhuma oportunidade de vivenciar a

experiência dentro da modalidade, eu acredito que ele não vai ter um conhecimento

significativo para trabalhar com os alunos conceitos mais específicos”; isso

certamente acarretará nas ‘influências’ que as autoras relatam acima.

De acordo com Pimenta (2002, p.154):

“Considerando que os programas de mestrado e doutorado em áreas diversas da educacional se voltam para a formação de pesquisadores em seus campos específicos, e não à formação de professores, permanecem estes sem condições institucionais de se formar na docência”.

Masetto (2003, p.141), seguindo este raciocínio faz a seguinte crítica:

Para a maioria de nossas escolas superiores e de nossos professores, o conteúdo possui uma relevância toda especial [...] de modo geral, uma disciplina vale pelo conteúdo que aborda, aprofunda e discute. Professores

66

para ministrá-la são selecionados e contratados pelo domínio teórico e experimental que possuem sobre seu conteúdo, e é aceita a crença de que “quem sabe o conteúdo daquela disciplina sabe transmiti-lo e sabe ensinar”.

O Docente 1 afirma a ‘crença aceita’ pontuada por Masetto (2003) ao

relatar que terminando o curso de formação como primeiro colocado e tendo

“facilidade para fazer por imitação os movimentos demonstrados, me chamaram para

ser instrutor da cadeira”. Contudo, demorou ainda alguns anos para possuir a

qualificação mínima ‘exigida’ para a docência, pois depois de três anos atuando, disse

ao seu ‘supervisor’ (docente efetivo da cadeira): “professor o senhor já reparou uma

coisa? Eu já formei três cursos técnicos de ginástica e ainda não sou técnico de

ginástica olímpica” (D.1). Em resumo, atuava como docente universitário, em uma

cadeira específica, mas não possuía os requisitos mínimos para isso. Esse fato

aconteceu há mais de trinta anos, mas é alarmante no sentido de ainda não se ter

uma avaliação coerente, especialmente em instituições privadas, dos docentes que

concorrem ou já atuam lecionando disciplinas tão específicas como é o caso da

ginástica artística.

Segundo Pimenta (2002), hoje há um significativo crescimento no

campo da pesquisa, que por sua vez traz para dentro da universidade o pesquisador

para atuar na docência. Entretanto, tal evento pode não garantir a excelência no

desempenho pedagógico, em função desses docentes não apresentarem uma

formação inicial e continuada que contemple os processos de ensino-aprendizagem.

No caso da ginástica artística para a licenciatura, deve-se considerar ainda o

conhecimento específico que o docente precisaria ter da modalidade. Sobre o

assunto, o docente 12 afirma:

[...] sem falsa modéstia, eu me julgo o maior capacitado, me julgava, hoje não porque eu já caí no esquecimento, eu já estou desatualizado, mas a base eu daria ainda melhor que muita gente, quer dizer, o que eu tenho de vivência, [docente cita vários locais em que atuou], tudo isso, e não posso dar aula numa universidade porque eu não tenho mestrado. (D.12 – grifo nosso).

É preciso ter em mente que uma coisa não é divorciada da outra.

Apropriar-se dos saberes científicos contribui para o domínio da área, assim como

apropriar-se dos saberes pedagógicos é fundamental para o exercício competente

67

da docência, de tal modo que os dois saberes são determinantes para a formação

de professores (ROSA; SOUZA, 2002).

Na falta de um espaço especialmente criado para a formação

pedagógica, inclusive nos cursos de bacharelado, esse investimento fica a cargo dos

próprios sujeitos interessados em seguir a carreira docente. Sobre isso, Pimenta

(2002, p.154) observa que “a formação docente para o ensino superior ainda fica a

cargo de iniciativas individuais e institucionais esparsas, que não se referem a um

projeto nacional ou da categoria docente”.

Pimenta (2002, p.124), com base na questão do ensino, destaca que,

O tempo integral normalmente solicita do docente as três funções características da universidade: ensino, pesquisa e extensão. Pode-se facilmente constatar que, nessas condições de trabalho, o tempo integral torna mais viável a efetivação das três funções. Estas devem estar integradas aos fins propostos no projeto político-pedagógico institucional, do qual o ensino é parte fundamental. (grifo nosso)

Nas colocações acima é possível acreditar que é aceito no espaço

acadêmico uma atenuante especialização dos docentes voltada para áreas muito

específicas em que questões pedagógicas não têm lugar claro. Paira sob essa

problemática uma característica evidente de jogo proposta por Elias (1970) – ‘jogos

multipessoais a vários níveis’. Elias (1970, p.91-92) então propõe: “Imaginemos um

jogo para muitas pessoas, em que o número de participantes está constantemente a

crescer”; é o que vem ocorrendo no espaço acadêmico – aumento de instituições,

cursos e consequentemente docentes (que serão os jogadores do exemplo dado).

“Isto aumenta a pressão efectuada sobre os jogadores para que mudem o seu

agrupamento e organização”; no caso dos docentes, são pressionados a realizar

pesquisas para manter ou aumentar seu status de pesquisador (e não docente!).

Com o crescente número de jogadores, fica difícil para que estes individualmente

consigam “efectuar jogadas adequadas ou correctas, avaliadas a partir da sua

própria posição na totalidade do jogo”; e, entende-se que a posição do docente no

jogo acadêmico é prioritariamente o ensino e posteriormente a pesquisa. Porém,

com a especialização na pesquisa, “o jogo tornar-se-á progressivamente mais

desorganizado; o seu funcionamento deteriorar-se-á”. Assim, pode se evidenciar um

68

dos motivos para a desqualificação do ensino como uma das faces da atuação

docente.

Destarte, o ensino e a pedagogia inerente ao ato de ensinar fazem

parte direta dos domínios mínimos e básicos para a docência também no ensino

superior. Parece necessário assim, pensar na esfera pedagógica que configura a

formação dos docentes universitários. Rosa e Souza (2002, p.185) apontam esse

fato fazendo um comparativo com vertentes técnicas de pesquisa:

Tal como nos debruçamos sobre os saberes científicos, tal como estabelecemos o objeto de pesquisa, as questões norteadoras, revisamos a literatura existente, definimos a metodologia, escolhemos e aplicamos técnicas e instrumentos de coleta de dados, é também necessário fazer na construção dos saberes pedagógicos.

Vale destacar que se trata aqui de outro nível de saber pedagógico,

pois aborda-se a docência em um outro plano que não o escolar e, por serem níveis

de ensino diferentes, com públicos diferentes e níveis de compreensão diferentes,

as pesquisas que se remetem à docência escolar não podem ser generalizadas à

docência universitária.

O que ocorre é que muitas pesquisas científicas têm se debruçado

profundamente sobre estudos acerca da docência, no entanto, determinando-se à

docência escolar. Mizukami (2002, p.153) afirma que, “a docência no ensino superior

é ainda território que apresenta iniciativas tímidas” e, poucos estudos foram

realizados a fim de constatar o trabalho docente neste contexto. Assim, cabe

ressaltar a contribuição deste estudo em função dessa lacuna constatada no ensino

superior e, também, nos cursos de licenciatura em Educação Física.

Para além da questão da docência em níveis de ensino e locais em

que se leciona, Barreiro (2003) alerta para o fato de que a história de vida do

docente tem considerada influência em sua atuação. Este estudo não se remete à

história de vida dos docentes pesquisados, mas observa esta como uma variável a

ser analisada nas pesquisas sobre a docência no ensino superior.

Pode-se pensar em várias questões que influenciam o docente e sua

atuação nesta complexa teia de variáveis, como: o que o impeliu à escolha do curso,

sua satisfação com a carreira, como considera sua formação, se esta lhe dá

69

segurança, quais anseios tem como docente, o que ele espera de seus alunos,

como é o relacionamento com os pares, o que julga complexo no ato de ensinar, o

que de importante pretende legar em sua atuação profissional e, na perspectiva de

Elias (1970), quais as inter-relações que mantém em meio à rede de configurações

que molda como docente universitário. Considera-se aqui, fundamentando-se no

autor, que a possibilidade de realização da pessoa é o resultado de relações

complexas definidas entre o indivíduo e a sociedade.

Com isso vale enfatizar o que coloca Isaia (2001, p.35), o docente

universitário “[...] é uma pessoa que se constrói nas relações que estabelece com os

outros que lhe são significativos, com a história social que o permeia e com sua

própria história”.

E, os docentes entrevistados deixaram claro em muitas falas suas

perspectivas pessoais quanto ao reflexo de sua atuação docente para os discentes.

O Docente 2 relata que possui a pretensão de instigar os discentes a pesquisar,

pois alerta sobre “como trabalhar em escola, o que você faz, o que você não faz [...]

enfim, a disciplina é uma chamada de atenção que existe um campo enorme de

pesquisa na área da ginástica que está inexplorado”. Já o Docente 3 aponta para a

competência profissional: “Eu não quero técnico, não quero ginastas ou atletas, eu

quero um ser humano no qual eu possa confiar, no qual eu possa acreditar, ‘poxa

esse cara tem um potencial profissional rico, agora posso dormir tranqüilo’”. O

Docente 4 queria “que eles escrevessem, porque eles tinham que aprender a

escrever também [...] eu queria que eles escrevessem sobre a importância da

ginástica para a criança”. E, o Docente 9 aponta para uma interdependência direta

entre ele, os discentes e a modalidade quando diz que “as aulas eram construídas

também em função, não só do meu momento [...] mas também em função da

expectativa dos alunos do curso de graduação e também [...] do espelho da própria

modalidade na sociedade”.

Sabe-se que para a atuação docente, seja ela em qualquer nível, há a

exigência de domínio de determinadas técnicas, métodos de ensino, conhecimentos,

saberes, entre outros. Alguns autores, que serão citados posteriormente, descrevem

fatores indispensáveis para a atuação docente. Estes fatores são relevantes à

medida que configuram aspectos para a atuação, podendo nortear embasamentos e

70

características do papel e perfil de docentes dentro da universidade, além de

apontar a ‘força relativa’ dos docentes na orientação do ‘decurso do jogo’ acadêmico

que envolve em alto grau a disseminação do conhecimento (Elias, 1970).

Nóvoa (1995) ao afirmar que ensinar não é tarefa simples, aponta que

esta requer conhecimento amplo no que diz respeito à realidade dos elementos

envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Independentemente do nível de

ensino em que atua, o docente deve diagnosticar seu contexto de trabalho, tomar

decisões, avaliar sua atuação, para reconduzi-la adequadamente ao seu contexto

profissional. Nessa perspectiva, o Docente 1 ao relatar sobre as situações de

ensino-aprendizagem e a necessidade de diagnosticar tais situações afirma que

sabe exatamente o que faz “porque eu entendo disso, o problema é aquele

professor que não entende!”. Além dele, o Docente 4 reafirma a colocação do autor

acima quando expõe que “essa é a diferença de se ter um estudo, de você docente

ter se aperfeiçoado, estudado, porque um professor que não tem essa preocupação

de estudar questões didáticas e pedagógicas, ele vai passar o modelo”.

Para Vasconcelos (1998), o profissional ‘completo’, com preparação

adequada para o correto exercício da função docente, deverá ter formação técnico-

científica, no sentido de domínio técnico do conteúdo que ministra, bem como a

formação prática para a qual seus alunos estão sendo educados; formação política,

encarando a educação como um ato político, intencional, para o qual se exige ética

e competência; formação pedagógica, no seu cotidiano em sala de aula, de modo

não ocasional e sim metodologicamente desenhado. Pensando no ‘domínio técnico’

e na ‘formação prática’, apontados pelo autor, o Docente 11 apresenta concordância

e afirma:

Eu acho muito mais importante para dar aula nas disciplinas práticas, uma boa formação naquele esporte, alguma experiência prática naquele esporte, não precisa ser de alto-nível, mas um envolvimento mais intenso do que simplesmente o que aprendeu na faculdade, acho que isso não é suficiente para dar aula.

Já Garcia (1999, p.243) julga imprescindível, por exemplo, “um

conjunto de atividades pré, inter e pós-activas que os professores têm de realizar

para assegurar a aprendizagem dos alunos”. Assim, para além de atividades

investigativas e de instrução, que são por excelência funções docentes, pode-se

71

citar no rol de atividades tratadas pelo autor, continuidade de formação; investigação

da própria prática; busca por estudos contemporâneos; socialização com os pares e

com discentes; autonomia no ato de lecionar, entre outros. Exemplificando o que o

autor diz, o Docente 2 coloca que sua forma de ensinar muda constantemente, de

acordo com o público para o qual leciona, bem como observando as mudanças na

modalidade e na própria Educação Física. “eu mudo, porque eu vou descobrindo

coisas que são mais eficientes na aula [...] e, em muitos casos, eu diria que eu volto

a estudar, eu volto a ler [...] porque as coisas vão mudando”.

Na visão de Anastasiou e Pimenta (2002) a docência universitária

configura-se como um processo contínuo de construção de identidade e tem por base

os saberes da experiência, construídos no exercício profissional mediante os saberes

específicos das áreas de conhecimento. Nos processos de formação de professores,

as autoras destacam que é preciso considerar a importância dos saberes das áreas

de conhecimento, em que ninguém ensina o que não sabe; dos saberes pedagógicos,

pois o ensinar é uma prática educativa que tem diferentes e diversas direções de

sentido na formação humana; dos saberes didáticos que articulam teorias de

educação e ensino nas situações contextualizadas; dos saberes da experiência do

sujeito professor, que diz respeito ao modo pelo qual o sujeito se apropria do ‘ser

professor’ na vida.

Já Tardif (2002) descreve como fatores importantes à atuação docente

a junção de determinados tipos de saberes. O autor menciona estes saberes como

um ‘saber plural’ que os professores possuem, compreendidos pelos saberes da

formação profissional, disciplinares, curriculares e experienciais. Os saberes de

formação profissional são os saberes transmitidos pela instituição responsável na

formação do professor. Os saberes disciplinares são aqueles saberes sociais

advindos de diversas áreas do conhecimento e que são incorporados na formação

docente. Os saberes curriculares são os saberes que os professores apreendem e

devem ensinar como atuantes. Os saberes experienciais são aqueles que o docente

adquire na sua prática cotidiana e nos conhecimentos e vivências que teve durante

sua vida. Os saberes de formação profissional, disciplinares e curriculares se

referem ao saber advindo do conhecimento. E, os saberes experienciais se referem

ao saber ser e ao saber fazer. Partindo dos diferentes saberes propostos pelo autor,

é possível observar na fala do Docente 10 que a junção destes no contexto de

72

atuação “não é simples”, pois, para ele “não é fácil ser um professor com conteúdo

pedagógico, com conteúdo fisiológico, com conteúdo social”.

Dentro desta esfera de saberes que os docentes devem dominar para

sua atuação, autores como Masetto (2003), Mizukami (2002), Barreiro (2003), Malusá

(2003), alertam para a necessidade do domínio dos saberes específicos da área de

conhecimento e dos saberes pedagógicos, em que estaria diretamente vinculado o

“domínio do como ensinar” (BARREIRO, 2003, p.47). O conhecimento específico

somado ao conhecimento pedagógico, Mizukami (2002, p.154) denomina de “corpo

de conhecimento profissional” que os docentes devem ter. E a autora afirma que a

união desses conhecimentos – específico e pedagógico – conformará um novo

conhecimento peculiar à docência, o “conhecimento pedagógico do conteúdo” (p.155).

O Docente 4 compartilha dessa visão quando afirma que o importante para a ginástica

artística na formação profissional é “que ela faça parte de todos os conteúdos de uma

forma pedagógica, com um enfoque pedagógico, uma preocupação pedagógica, e

isso não acontece”.

Desta forma, o docente do ensino superior precisa dominar, além dos

conhecimentos próprios da sua área, os princípios básicos do processo ensino-

aprendizagem de universitários; precisa conhecer em qual contexto sua disciplina

está inserida no currículo e quais as interfaces com as outras disciplinas; precisa

criar um ambiente no qual o papel do professor seja de mobilizador e orientador e,

por sua vez, o papel do graduando seja de protagonista da aprendizagem e

solucionador de problemas; tendo que, ao longo do processo, dominar os meios

pelos quais a aprendizagem se dará conjuntamente às estratégias e técnicas

correspondentes à tecnologia educacional (MASETTO, 2003; VERENGUER, 2004).

Deste modo, para que um docente ensine ginástica artística num curso

de licenciatura há a necessidade de uma tríade básica de saberes ou

conhecimentos, quais sejam: científico, pedagógico e específico da modalidade.

Nessa linha de raciocínio, conhecimentos distintos estão correlacionados a

diferenças específicas na situação dos grupos em que são produzidos. E, segundo

Elias (1998), uma das maiores fraquezas das teorias tradicionais do conhecimento, é

o descuido com a ‘condição de não-saber’. O não-saber sempre precede o saber.

Sem a reconstrução do não-saber, a ‘condição de saber’ e do processo de

73

conhecimento permanecem incompreensíveis. Pontua-se então que, sem ter

consciência de todos os processos, saberes ou conhecimentos necessários à

formação de indivíduos – diga-se neste caso indivíduos-professores – os docentes

universitários podem ser situados numa condição de não saber em relação à

magnitude de atributos que sua função/atuação requer.

Anastasiou e Pimenta (2002) também observam o expressivo aumento

da necessidade de docentes para a atuação acadêmica, todavia, afirmam que a

maioria destes não possui formação pedagógica. Assim, as autoras concluem que

as instituições brasileiras de ensino superior necessitam de um programa de

preparação para a docência universitária a fim de conscientizar os professores “do

ensinar e do formar no ensino superior; do formar profissionais, do formar

pesquisadores e do formar professores” (p.24). Mas, o que vem ocorrendo na visão

do Docente 3 é que, “nas faculdades se estão formando professores especialistas,

professores técnicos, em vez de professores generalistas, professores educadores”.

E se se pensar que a docência universitária não está consciente da formação do

‘professor’ de Educação Física especificamente, pode-se integrar aqui outro relato

do Docente 3 – que defende a formação do professor generalista – em que para ele

há “outro grande problema dentro do âmbito da formação do profissional: eu não

posso formar especialistas para que desenvolvam as funções de um generalista, é

tremendamente complexo”.

Para a atividade docente universitária, o professor compromissado com

sua atuação não pode perder seu foco profissional: ensinar. Porém o Docente 9

afirma que em sua universidade “o ensino é só uma faceta”, e continua:

o professor que entra aqui na universidade, não entra só para dar aula, ele não entra só como um professor, quer dizer, quem vai prestar esse concurso pode ser o melhor professor do mundo, mas se ele não tiver também um envolvimento com ensino e pesquisa ele dança [...] é cobrado dele um número de publicações, por exemplo; também não é qualquer publicação, tem uma exigência mínima dessas publicações.

Barreiro (2003, p.78) constata exatamente isto, que há especialmente

nas universidades públicas, uma “exigência exagerada de produção científica em

detrimento do ensino” pelo sistema institucional e órgãos financiadores e, com isso a

autora alerta para a urgência “da valorização da docência em igualdade com a

74

valorização da pesquisa” (p.90). O Docente 10, confirma a posição da autora quando

relata os motivos de não apresentar interesse no oferecimento de uma disciplina

específica de ginástica artística no curso em que leciona: “quer dizer, isso já me

remeteria a reestudar, ter contato novamente, e assim, eu não acho que a

universidade e o curso valorizem muito isso”. Notadamente, este tipo de evento

reporta disputas de espaço e poder dentro da universidade, uma vez que o docente é

pressionado para manter seu cargo e, como já colocado, seu status acadêmico de

pesquisador, o que pode influenciar negativamente o tempo a ser dedicado ao ensino

propriamente dito, bem como uma dedicação mais aprofundada em questões técnicas

e específicas de sua disciplina.

No plano universitário hoje, quando não se é um docente-pesquisador,

as funções de atuação são reduzidas apenas a dar aulas para um grupo de alunos

(GARCIA, 1999), ou ainda os docentes são arrolados como meros “executores

destinados à tarefa de transmissão de saberes” (TARDIF, 2002, p.41). Nessa

perspectiva, o Docente 12 descreve que o fato de não ser um ‘professor-

pesquisador’ o relegava a outras instâncias de valores, em que “era tido como o

inferior, vamos dizer assim, porque eu não era o cientista, eu não gostava de fazer

pesquisa”, e continua “meus colegas me valorizavam pela prática, pela parte prática,

mas eu era tido como aquele que não era cientista, que era o prático”.

Um ponto que leva a essa situação é o fator de coesão grupal. Elias e

Scotson (2000) demonstram em seus estudos na comunidade de Winston Parva,

próxima de Leicester, Inglaterra, há mais de meio século, como a coesão do grupo

influi para compor aquilo que se denominou ‘configuração estabelecidos-outsiders’.

‘Outsiders’ – ou “os de fora” – como aponta Elias e Scotson (2000,

p.20), poderia ser designado aqui ao Docente 12 e, a quem sabe, tantos outros

docentes, que por seu aspecto ‘prático’ ou ainda por não serem mestres ou

doutores, sentem-se postergados em relação aos demais. Já os ‘estabelecidos’,

formam um grupo que “tem um índice de coesão mais alto do que o outro e essa

integração diferencial contribui substancialmente para seu excedente de poder”

(p.22); também, nessa relação, “há sempre algum fato para provar que o próprio

grupo é ‘bom’ e que o outro é ‘ruim’” (p.23). No caso aqui relacionado envolvendo

75

docentes acadêmicos, o ‘fato’ é a pesquisa, o grupo considerado ‘bom’ a executa e o

grupo ‘ruim’ não – ou ainda, executa, mas não como o grupo que é ‘bom’.

Essa complexa teia de relações, em que os docentes estão em

posições interdependentes, evidencia que alguns possuem mais status e poder do

que outros. Isso reflete a ideia de que o docente universitário possuía um

determinado poder diante da busca, aquisição e manutenção do conhecimento que,

de acordo com o processo histórico atual vem se perdendo, pois hoje, o status

acadêmico está voltado à produção e não à docência. Assim, órgãos financiadores

de pesquisas atuam coercitivamente sobre estes docentes a fim de exigir uma

quantidade específica de produção.

Apesar de corroborar com a questão da pesquisa exposta, em que a

exigência existe, o Docente 10 aponta que para se atuar no ensino universitário,

especificamente num curso de Educação Física, o docente precisa ter

conhecimento da área de formação profissional, ele tem que saber lidar com a pesquisa, porque é cobrado disso, mas eu acho que isso é da atividade, ele não pode deixar de ser um professor de Educação Física, porque se não ele não tem um modelo para passar [...] a pesquisa que faz a gente inovar, faz a gente buscar, faz a gente atualizar conteúdo, e é a experiência prática que faz a gente reconhecer as alterações no mercado profissional.

Outro problema da docência no ensino superior, relatado por

Anastasiou e Pimenta (2002), é que os professores ingressam nos departamentos,

com as disciplinas que irão ministrar já estabelecidas, recebendo ementas prontas, e

acabam por fazer o planejamento de forma individual e solitária. Apesar de não ficar

claro que há um planejamento em grupo entre os docentes, diferentemente do que

as autoras colocam, todos sem exceção destacaram ter completa autonomia para

elaborar seus programas disciplinares. Nesse sentido, o Docente 1 relata: “Eu fazia

o programa dentro daquilo que eu achava que era o ideal para os alunos tomarem

conhecimento”; o Docente 8 traz que “tem que ser um programa de conteúdo da

disciplina, que abrange bastante a disciplina [...] e cada professor faz o seu

programa; já o Docente 10 afirma: “Eu faço tudo, por minha conta, la garantia soy yo”.

Referida autonomia leva ao que Anastasiou e Pimenta (2002) também apontam, em

que não há instruções metodológicas e de planejamento, nem avaliações e

reavaliações. Assim o processo segue sem controle institucional e sem progresso no

76

ensino superior. A docência em cursos de Educação Física é também bastante

intricada nessa esfera. O Docente 3 destaca um ponto interessante:

Nossa profissão não é acreditável, não é considerada uma profissão séria, agora para disfarçar essa falta de seriedade os professores vão para áreas esportivas como medicina do esporte e, com isso se transfere ao status do doutorado medicinal e, você vê na faculdade de Educação Física mais aventais brancos que num hospital; estão confundindo a profissão!

Também abordando a mesma questão, o Docente 12 relata que

[...] eu acho que eles valorizavam demais a parte teórica em detrimento (...) da atividade física, ai o professor que vai sair de lá, o que ele vai fazer? Não vai dar aula de Biomecânica, não vai dar aula de Antropologia, não vai dar aula de História, não vai dar aula de Pliometria, ele vai dar aula de atividade física, então eu acho que as atividades físicas deviam ser mais valorizadas do que eram.

Além disso, o que se nota, especialmente quanto a disciplinas de

caráter físico-esportivo, é que os professores designados a ministrar tais disciplinas

ou são ex-atletas/praticantes da mesma ou nunca a vivenciaram de forma

aprofundada (RINALDI, 2004). Especificamente para a ginástica artística, Nunomura

et al. (2004, p.69) afirma que para se lecionar a referida manifestação gímnica em

qualquer espaço, “somente a experiência de atleta não garantiria a qualidade de sua

atuação”. Barbosa (1999, p.91), que realizou um estudo a respeito de disciplinas

gímnicas em cursos de graduação, observou que em sua maioria, tais disciplinas

refletem “a hegemonia do aspecto tecnicista, possíveis falhas quanto ao

aprofundamento dos conteúdos e, que o trabalho em escolas é relegado a segundo

plano”. Observando esse tipo de orientação a autora cita Bonetti quando pontua que:

[...] a relação ensino-aprendizagem é caracterizada pela ‘transmissão’ e pelo ‘comando’ do professor, valorizando a formação tecnicista do aluno em detrimento de princípios educacionais críticos que se fundamentam na busca da autonomia, criatividade, conhecimento dos alunos. (p.88)

Em relação à questão da formação do docente que vai ministrar

ginástica artística em âmbito acadêmico, o Docente 12 coloca que basta

“simplesmente ser formado em Educação Física e ter sido um ginasta, ter tido uma

vivência na modalidade, basta isso”. Contudo, sem discutir parâmetros técnicos ou

77

pedagógicos, e, semelhante aos Docentes 10 e 11, defende seu ponto de vista com

uma colocação a ser refletida, na qual ser um especialista na área com vivência

específica na modalidade pode trazer um conhecimento muito mais rico aos alunos

no curso de licenciatura do que ser um mestre ou doutor.

(...) o que eu tenho visto por aí é que tem gente que presta concurso para ministrar aula de ginástica artística e nunca fez ginástica, nunca subiu numa barra fixa, mas como tem doutorado então ele é escolhido, e alguém que concorre tendo experiência, mas que não tem nem mestrado fica de lado, fica a par. Eu acho isso um erro inadmissível na Educação Física hoje em dia, porque estão preenchendo vagas que deveriam ser de especialistas, de gente que conhece a disciplina, com indivíduos que têm mestrado em antropologia, ou sei lá o que, para ministrar aula de ginástica ou de natação, quando não sabe nem nadar. (D.12)

Percebe-se nesse ponto que apesar de muitos cursos de Educação

Física e suas disciplinas ficarem um pouco restritos à hegemonia do esporte,

carregado de técnicas e regras, também a própria docência apresenta-se como um

espaço de tensão em que o status de formação é que vai apontar quem pode ou

não atuar no âmbito do ensino superior, mesmo que este não tenha a competência

específica requerida. No entanto, é fato que há aí um tema a serem dedicadas

pesquisas mais aprofundadas, pois cabe nesse momento a seguinte questão: qual o

melhor docente para ensinar – no caso ginástica artística – na universidade, o

especialista, o doutor, ambos, enfim qual?

Em relação à especificidade daquilo que se ensina Pimenta (2002,

p.80-81) destaca que “o ensino do conteúdo específico não deve se restringir à mera

apropriação enciclopédica”, assim, os fundamentos e regras de uma modalidade

esportiva, como a ginástica artística aqui retratada, não devem ser ‘depositados’ nos

alunos durante a formação para que estes a decorem. Para a autora, durante o

ensino,

[...] os docentes precisam se indagar sobre o significado que esses conhecimentos têm para si próprios, o significado desses conhecimentos na sociedade contemporânea, a diferença entre conhecimentos e informações, conhecimento e poder [...]. Isso requer preparação científica, técnica e social. (grifo nosso)

Diante do que coloca o Docente 2, é possível observar que a

afirmação da autora não está distante de sua atuação

78

Então é essa distinção que eu tenho que explicar para eles dentro da disciplina, se eu tenho quarenta e cinco minutos por semana, o que da ginástica eu vou tratar? O que é mais importante? É aí que muitos estudiosos ou muitos professores divergem muito, descobrir quais são aqueles conhecimentos mais importantes ou fundamentais da ginástica artística que você consegue trabalhar na escola.

A partir dos conhecimentos julgados essenciais, ou mais importantes

para se ministrar especificamente a ginástica artística no ensino superior, foi

possível observar exatamente o que o Docente 2 afirmou acima em relação ao

ensino dessa manifestação ginástica na escola. Para o ensino da mesma num curso

de formação profissional, segundo os depoimentos coletados, ‘também’ não há um

consenso de quais são os ‘conhecimentos mais importantes ou fundamentais’ a

serem ensinados, destacando seu direcionamento de forma completamente

pessoal. Dessa maneira, optou-se por apresentar na seqüência, as diferentes visões

dos docentes, em relação aos conhecimentos que julgam essenciais serem

ensinados na disciplina de ginástica artística em um curso de licenciatura.

Para o Docente 1, “a coisa mais importante é você conhecer tudo do

ser humano primeiro para poder trabalhar da melhor forma possível”.

Já o Docente 2 descreve que “o importante é que alguns princípios

básicos dessa modalidade sejam respeitados”. Dentro destes princípios destaca:

[...] conhecer o funcionamento dessa prática, o que dentro dos meus estudos a gente denomina lógica interna, ou seja, como esse esporte funciona [...] conhecer bem os objetivos e o público que você trabalha, se eu trabalho com atletas de alto nível eu tenho um objetivo e um público determinado, se eu trabalho com escolares eu tenho outro objetivo e outro público muito diferente.

Na visão do Docente 3, a preparação profissional deveria habilitar o

professor para “ampliar as experiências do domínio corporal das crianças e dos

alunos”, e dentro desse viés os objetivos da modalidade, “os caminhos para ter o

domínio do corpo nos diferentes aparelhos e o domínio do corpo no ar”.

O Docente 4 relata que partindo de uma ampla conceituação

pedagógica, “todos os movimentos básicos da modalidade devem ser ensinados”.

79

Pensando a modalidade como uma “atividade física de base, formativa

e educativa”, e sendo esse o ponto importante dentro dos conhecimentos essenciais

para o Docente 5, divide o mesmo em “dois grupos de atividades, de um lado a

atividade física, a importância da atividade física e do outro lado o esporte”.

Para o docente 6, a segurança e a proteção no ato de ensinar seriam

os requisitos básicos. Posteriormente, que o professor tenha “o conhecimento

específico geral da ginástica, não só o que é usado para a licenciatura (...) os

elementos técnicos mesmo”. Pois, considera complexo um professor trabalhar “com

o ensino da ginástica se o professor não sabe a técnica, normas, regras da própria

ginástica”.

Voltar a modalidade para um “processo pedagógico” é o que aponta o

Docente 7, e isso para

(...) o desenvolvimento das capacidades motoras, porque eu acredito que a ginástica artística seja uma modalidade que trabalha todas essas questões, a questão do equilíbrio, da atenção, então na licenciatura os conceitos que devem ser trabalhados são os conceitos de iniciação voltados para esse aspecto, para o desenvolvimento integral do aluno, como um processo pedagógico mesmo.

Já o docente 8 afirma que “seriam os fundamentos bem básicos, com

educativos para a iniciação da ginástica, seriam os educativos propriamente para

ginástica artística”.

Primeiramente, é preciso ter “esse conhecimento básico da nossa área

específica da Educação Física”, relata o Docente 9. “Então o conhecimento de

áreas, por exemplo, como da biologia, da fisiologia, da psicologia, da sociologia, da

pedagogia, todos esses fazem parte da formação do professor”. O Docente também

destaca o conhecimento específico da modalidade que se quer trabalhar e

complementa: “a gente não precisa ter um conhecimento de ginástica artística tal

como precisa ter um técnico de alto rendimento, é um conhecimento da área que vai

nos possibilitar trazer essa informação para a aprendizagem da ginástica artística”.

Conforme o Docente 10, os conhecimentos principais a serem

ensinados deveriam capacitar o professor para que este conheça “as modalidades

enquanto prova de competição, quais são as provas masculinas, quais são as provas

80

femininas e principalmente como iniciar, como dar oportunidade para que as crianças,

minimamente, experimentem a modalidade”.

O Docente 11 relata que “o professor de Educação Física tem que ter

conhecimentos básicos de qualquer esporte (...) então, não precisa ter sido ginasta

necessariamente, mas tem que conhecer o esporte para poder falar sobre ele e

ensinar os rudimentos”.

E, por fim, o Docente 12 aponta que o embasamento da ginástica

artística na formação do professor deveria ter como foco oportunizar ao mesmo um

“conhecimento mais ou menos profundo e uma vivência na modalidade esportiva

[...] principalmente porque a ginástica é um esporte muito difícil, muito técnico”.

Percebe-se com isso ampla divergência na visão dos docentes que

ministram ou ministraram a disciplina de ginástica artística quanto aos

conhecimentos a serem ensinados durante a preparação do professor de Educação

Física. Tal divergência gerou, certamente, tantas outras visões diferenciadas (dos

discentes) em relação à modalidade, que pôde ser aplicada ou não no âmbito

escolar, dependendo em certo grau da maneira como foi ensinada na graduação.

Estas visões certamente refletem as teias de interdependência nas quais os

docentes estão inseridos, bem como as relações que tecem no interior destas teias.

Baseando-se em Elias (1970) o que configura a atuação dos docentes, além da

construção histórica como ser social que é (e isso não se pode mudar), é também a

atual posição bem como as imposições que recebe no interior do espaço acadêmico

(e estas são passíveis de mudança). Assim, a atuação docente é também reflexo da

configuração na qual está inserida.

Sem um núcleo identificador da disciplina – e é possível fazer essa

referência a qualquer disciplina, especialmente às consideradas práticas – os

docentes poderão direcionar a autonomia que possuem ao lecionar sua disciplina à

já relatada ‘condição de não saber’ que Elias (1998) aponta. O Docente voltado a

uma condição de não saber em relação ao que é realmente significativo ensinar, e o

futuro professor em relação à realidade que enfrentará às vezes completamente

distante dos preceitos que adquiriu na universidade.

81

Para tanto, a docência no ensino superior deveria seguir um processo

de formação-avaliação que leve à construção de conhecimentos úteis e necessários

ao profissional que se deseja formar. Assim, da mesma maneira que querendo ser

um técnico de ginástica artística deve-se procurar, por exemplo, o curso de

bacharelado em Educação Física, para formar um técnico, o docente universitário

não deveria lecionar no âmbito da licenciatura! Nas palavras de Pimenta (2002,

p.110), “a docência no ensino superior necessita de uma proposta coletiva e

institucional, (que ao ser) assumida pelo coletivo docente, tem maiores

possibilidades de produzir mudanças significativas do que ações individuais”.

Assim, além de perspectivas e experiências pessoais, o que se nota é

que os docentes no enredamento de sua atuação, ainda carregam consigo toda a

complexidade inerente ao campo de estudos maior – a Educação Física. O teor

histórico e conceitual desse campo, problemas com sua identidade, diferenças que

chegam a ser extremas na composição curricular de cursos de formação, bem como

a própria aplicação prática em seus diferentes espaços de atuação. Estes fatos

fazem parte de todo um processo de construção de um campo de estudos ainda

novo dentro da universidade que, gerou e ainda permite ações flagrantes de seus

profissionais, mas que também conquistou vitórias no sentido de seu crescimento,

especialmente científico.

Tendo em vista o que já apontou Chartier (1988) na introdução deste

texto, em que Norbert Elias orienta sua teoria analisando a construção histórica dos

indivíduos e suas relações, também se julga importante aqui uma reapresentação

do desenvolvimento da Educação Física no contexto acadêmico, relatada já em

tantos outros estudos. A universidade, diante de sua necessidade e

responsabilidade na aquisição e disseminação de conhecimentos, gerou a atuação

docente – já exposta – e hoje é esta atuação docente, em grande parcela, que vai

orientar o espaço acadêmico.

Esta maneira de visualizar as configurações sociais, por sua própria

natureza, torna-se interessante, porque suscita uma complexa relação na medida

em que as determinantes apontadas tendem a mostrar as formas de existência e de

desenvolvimento entre os indivíduos na sua estrutura social (ELIAS, 1993). Assim,

na sequência, serão descritos fatos históricos que configuram a Educação Física

82

dentro da universidade, tendo como enfoque também os depoimentos dos docentes

entrevistados, já que a atuação docente está inserida diretamente na configuração

do campo.

3.2. Formação em Educação Física: dos primeiros cursos à formação atual

Segundo Souza Neto et al. (2006, p.201), “no Brasil, início do século

XX, sob o cuidado particular de militares e médicos, a Educação Física estrutura-se

primeiro na caserna e só mais tarde entre os civis”. Os autores ainda destacam que

o nacionalismo, o positivismo, e uma maior crença na educação foram influências

significativas ao desenvolvimento do campo.

O pioneirismo militar na Educação Física foi enfatizado por Melo (2000,

p.80), ao afirmar que "[...] parece claro que os militares foram os pioneiros a incluir

em seus programas de formação, disciplinas ligadas à prática de exercícios físicos"

sendo, fundamentalmente, estes “[...] os primeiros professores de Educação Física

do país". Inclusive um dos docentes entrevistados vem de uma formação

basicamente militar:

Vim para a escola de cadetes em 54 (1954) e, em 54 a gente tinha Educação Física e eu era um dos melhores na Educação Física dentro da escola de cadetes. Quando terminei a escola de cadetes fui para Escola A [hoje universidade]. Era um curso de nove meses equiparado ao curso da escola civil e, a gente se formava professor de Educação Física [...] fiz licenciatura plena na Escola A em nove meses e fui professor; e um senhor professor! E, fui técnico; e um senhor técnico! Fiz as duas coisas num curso de nove meses. (D.1- grifo nosso)

Segundo Souza Neto (1999, p.37) é no período da Primeira República

que o Brasil verá surgir os primeiros cursos superiores e “o nascimento das

primeiras universidades”. Concomitante a estes eventos o autor descreve que:

há o desenvolvimento da ginástica e dos esportes na caserna, nas colônias de imigrantes, escolas, bem como nos clubes. Porém, como formação técnica, a ginástica/Educação Física vai se desenvolver mesmo dentro da ordem militar e os esportes/Educação Física nas mãos de leigos especializados e/ou ex-atletas, constituindo-se em referência básica para a história da profissão. (p.38)

83

Perdurando mais de um século (1824-1931), houve “tentativas de

formação profissional sistematizada, identificada no trabalho desenvolvido pelos

mestres de armas, instrutores, treinadores, dependendo do seu escalão de origem”

(SOUZA NETO, 1999, p.38). No entanto, Marinho (1943) afirma que a primeira

iniciativa de sistematização de formação profissional só aparece mais

concretamente em 1902 com a fundação de uma escola de Esgrima, que oferecia

formação básica em ginástica. Essa proposta solidificou-se em 1909, quando por

meio desta escola de Esgrima, cria-se a Escola de Educação Física da Força Policial

(MELO, 1996; PIRES, 2006).

Junto às forças militares (Exército e Marinha) e policiais, outras escolas

de formação de pessoal para o trabalho com atividades físicas são instituídas,

especialmente no Rio de Janeiro e em São Paulo. Tojal (2006, p.21.38) afirma que a

preparação de profissionais em Educação Física no Brasil, por meio do sistema de

ensino superior, só vai ter início na década de 1930 com a abertura de cursos em

São Paulo, Vitória e Rio de Janeiro. “Antes deste estágio a formação ocorrera em

diferentes formas, por várias instituições e/ou por mera improvisação de instrutores”.

Uma dessas instituições de formação, merecedora de destaque é o

Centro Militar de Educação Física criado em 1922 que, conforme Souza Neto

(1999), passa a funcionar efetivamente em 1929 no Rio de Janeiro. Melo (1996)

aponta que a turma formada por esse curso é considerada a primeira turma

diplomada por um curso oficial, além de referido curso posteriormente, dar origem a

uma das escolas de Educação Física mais importantes do Brasil: a Escola de

Educação Física do Exército (EsEFEX).

Souza Neto (1999, p.42) descreve que a EsEFEX foi criada em 1933

“por decreto de uma portaria do Ministério da Guerra, sendo considerada a primeira

escola a permitir a matrícula de civis”. Pires (2006, p.180) afirma que os cursos

proporcionados pela escola mencionada eram “predominantemente oferecidos para

militares e, eventualmente civis poderiam realizar o curso de monitor”.

Apesar da EsEFEX ser um curso militar que aceitava a matrícula de

civis, Melo (1996) destaca que em 1931, no estado do Espírito Santo, por iniciativa

do tenente do exército Laurentino Bonorino, fora criado o curso especial de

Educação Física para a formação de normalistas especialistas, que apesar de ser

84

dirigido por militares, já havia se consagrado como o primeiro curso oferecido

prioritariamente para civis (PIRES, 2006).

No mesmo ano, Souza Neto (1999, p.45) destaca o Decreto nº. 4.855,

de 27 de Janeiro de 1931 – do Governo do Estado de São Paulo, que vai abrir “as

portas para a criação do Departamento de Educação Física e, posteriormente, da

primeira escola civil”. Entende-se posterior, pois, apesar de configurar-se como o

primeiro curso reconhecido e que também permite a matrícula de civis, só inicia seu

funcionamento a partir de 1934. O autor também afirma que “a preocupação da área

até 1931 restringiu-se a preencher os quadros ocupacionais da sociedade civil, nos

ambientes militar, escolar, esportivo (clubes)” (p.45).

A formação profissional proveniente deste primeiro curso – da escola

de Educação Física do Estado de São Paulo – constituía-se em dois tipos: Instrutor

de Ginástica e Professor de Educação Física (SOUZA NETO, 1999; PIRES, 2006).

Na disposição do governo provisório de Vargas, Souza Neto (1999)

enfatiza que será criado também em 1931 o Estatuto das Universidades Brasileiras.

Este estatuto visava ao controle do ensino superior pelo governo federal, bem como

uma maior organização do respectivo ensino7. O autor afirma que dentro desse

período, até 1945, “a Educação Física estruturou-se profissionalmente na luta pelo

seu espaço na sociedade” (p.50).

Neste processo de transformações, a Educação Física vai sair da caserna para se afirmar como uma área independente nos estabelecimentos de ensino superior [...] médicos, militares esportistas e intelectuais deram a sua contribuição sob perspectivas diferenciadas, observando-se que coube mais aos militares, principalmente ao exército, do que aos médicos higienistas e, bem menos aos intelectuais, a propaganda sobre a Educação Física. (SOUZA NETO, 1999, p.49)

A Constituição de 1937, que torna a Educação Física obrigatória nas

escolas, terá como reivindicação no âmbito da formação profissional a “exigência de

um currículo mínimo para a graduação” (SOUZA NETO, 1999, p.51). O autor

continua alocando que:

Esta conquista dá-se em 1939, com a regulamentação desse currículo por meio do Decreto nº. 1212 que cria a Escola Nacional de Educação Física e Desportos e estabelece as diretrizes para a formação profissional: instrutor

7 Ver Souza Neto (1999) – Capítulo II – sobre a organização de Institutos e Universidades da época.

85

(um ano), professoras primárias – educação física infantil (um ano), técnica esportiva (um ano), treinamento e massagem (um ano), medicina esportiva (um ano) e professor (dois anos) (p.51).

O grande passo para a criação de uma escola nacional foi dado dois

anos antes, com a criação da Divisão de Educação Física (DEF), do Ministério da

Educação e da Saúde (MES), pela Lei nº. 378 de 13 de Janeiro de 1937.

Em suma, a Escola Nacional de Educação Física e Desportos seria um centro de preparação de todas as modalidades de técnicos ora reclamados pela Educação Física, ora pelos desportos. Também funcionaria como um padrão para as demais escolas do país e como um estabelecimento destinado a realizar pesquisas sobre o problema da Educação Física e dos desportos. (AMARAL et al., 2006, p.05)

Porém, cabe apontar Melo (1999, p.11), ao descrever a Escola

Nacional de Educação Física e Desportos (ENEFD) como "[...] uma escola civil

extremamente militarizada, sendo, no início, uma continuação do projeto militar,

dentro da universidade do Brasil". Faria Junior (1987), reafirmou tal característica ao

explicar que, mesmo com a criação das escolas civis, a característica das escolas de

Educação Física era, predominantemente, marcada pela influência militar.

Referida influência permanece por décadas na ‘orientação’ da

Educação Física, já que o país adentrava um ‘estado de perigo’ que esboça as “lutas

comuns pelas oportunidades de distribuição de toda a espécie de poder” (ELIAS,

1970, p.26). Diante de questões como essa, o autor afirma que “as forças

compulsivas farão esforços contínuos para aumentar o seu potencial de poder”

(p.32). E, uma das formas de aumentar o poder de um grupo em relação a outro é a

opressão, bem como a difusão desta em variadas formas no arcabouço das relações

entre os indivíduos singulares e em grupos.

Isso leva ao que Taffarel (1993) registra quando observa que a

acentuada influência militar na Educação Física faz surgir, durante o regime militar,

um grande número de cursos superiores de Educação Física. Em 1968, foram

registradas quatro escolas superiores de Educação Física no Estado de São Paulo;

em 1975 este número cresceu para 36 e dois anos depois, constatou-se mais de 100

escolas no Brasil. Nota-se que a Educação Física foi um meio essencial para a

disseminação do poderio militar, assegurando status elevado e controle social.

86

Verifica-se então que após os eventos de 1937, a Educação Física terá

um considerável crescimento quantitativo no número de escolas/cursos de

formação, mas que passarão por uma reformulação curricular quase três décadas

depois com a criação da já mencionada primeira LDB nº. 4024/61. esta, em seu

artigo 70, diz que a formação em Educação Física “passa a ter exigência do

currículo mínimo, um núcleo necessário de matérias para não comprometer uma

adequada formação cultural e profissional” (SOUZA NETO, 1999, p. 61 – grifo do

autor). O autor também destaca que nesse programa de formação poderá ser afixada,

pelo estabelecimento de ensino, uma “parte complementar [...] visando a atender as

diversidades regionais e compor o currículo pleno” (p.51 – grifo do autor).

Na LDB nº. 4024/61 se instala a exigência de 1/8 da carga horária do

curso pretendendo atender a parte pedagógica. Entretanto, Tojal (2005) pontua que

a modificação em relação à Educação Física, especificamente, não é expressiva,

pois apenas coloca em seu artigo 22, que será obrigatória a prática da Educação

Física em todos os níveis e ramos de escolarização, com predominância esportiva

no ensino superior, e no parágrafo único, que os cursos noturnos podem ser

dispensados da prática da Educação Física. O autor assim coloca:

Como se pode perceber, a LDB/61, nada tratou sobre a formação superior em Educação Física e, portanto, no sentido de aprimorar a formação oferecida nos cursos superiores de Educação Física, no ano de 1962, o Conselho Federal de Educação, em 17 de Novembro, aprovou o Parecer nº. 298/62, estabelecendo o currículo mínimo para os Cursos de Educação Física e Desportos. Através desse Parecer, os cursos superiores de licenciatura em Educação Física seriam desenvolvidos em 03 (três) anos de duração mínimos e obrigatórios e deveriam apresentar na grade curricular 13 (treze) disciplinas específicas acrescidas das matérias pedagógicas, podendo ainda para que o profissional se tornasse Técnico Desportivo, existir o acréscimo de 02 (duas) matérias referentes a desportos para a especialização. Para desenvolvimento de curso exclusivo de técnica desportiva deveriam existir 12 (doze) matérias, não havendo necessidade de inclusão das matérias pedagógicas. (p.19)

Anterior ao Parecer nº. 298 do Conselho Federal de Educação (CFE)

citado por Tojal (2005), é instaurado pelo mesmo órgão o Parecer nº. 292. Nele são

estabelecidos os currículos mínimos dos cursos de licenciatura, em que

[...] são selecionadas as matérias destinadas à formação educacional, incluindo Psicologia da Educação, incluindo Adolescência e Aprendizagem, Didática, Elementos de Administração Escolar [...] e, a inovação, a introdução da Prática de Ensino, sob a forma de Estágio Supervisionado. (SOUZA NETO, 1999, p. 62-63)

87

Os Pareceres de 1962 são retomados no final da década com a

Resolução n°. 69, de 6 de Novembro de 1969, do CFE. Esta resolução aprovou no

Brasil o segundo modelo oficial de currículo para a formação dos profissionais de

Educação Física. Segundo Amaral et. al. (2006, p.31), esse modelo curricular

deveria atender nacionalmente os cursos de Educação Física e se caracterizava

“por um bloco de matérias obrigatórias, subdivididas em básicas e profissionais que

constituía o chamado currículo mínimo” (grifo nosso), este proposto em 1961/1962.

Os autores ainda colocam que:

Cada instituição superior de Educação Física teria a liberdade de complementá-lo de acordo com as características e necessidades de suas regiões. O curso passou a ter uma duração mínima de 1.800 horas/aula, ministradas, no mínimo, em três anos e, no máximo cinco anos [...] Nesse processo de mudança curricular, como reflexo da ditadura militar, a única matéria que não foi aprovada no Conselho Federal de Educação, apesar de ter sido consenso entre os professores de Educação Física e também apresentada no Parecer 894/69, como indispensável na formação educacional, foi a sociologia. (p.31-32)

No final da década de 1960, a Educação Física começa a se libertar

em certo grau das imposições militares que direta e indiretamente direcionaram, por

algumas décadas, seu campo tanto de estudos quanto de aplicação. Assim, a

Educação Física começa a vivenciar um momento de emancipação em relação à

configuração que a norteia. Sobre isso Elias (1970, p.17) aponta que ao se

emancipar, vivenciar determinado processo – no caso o estabelecimento de diversas

bases legais que dão suporte à Educação Física e seu novo contorno para a

formação – a sociedade (ou, os indivíduos) passa a “adquirir uma base crescente de

conhecimentos mais sólidos acerca desses processos”; resultando assim, na

disseminação de uma nova condição de saber (Elias, 1998), o que inevitavelmente

terá como conseqüência uma nova configuração, já que as teias de

interdependência que ligam agora um indivíduo a outro e à Educação Física é

diferente da anterior.

Outro fator que vem configurar uma distinta Educação Física ocorre

também na ‘movimentada’ década de 1960, quando foram nomeados grupos de

trabalho para repensar a formação acadêmica. Segundo Souza Neto (1999, p.64),

baseado no Parecer CFE nº. 894/69, estes grupos colocaram como

88

questionamento negativo que os cursos paralelos ao de professor de Educação Física e de técnico desportivo, na prática, não se mostravam exeqüíveis. Na formação de professor não havia as matérias pedagógicas e no curso de técnico desportivo constatou-se, pelos relatos desses grupos de estudo, que muitas escolas não estavam aparelhadas para manter cursos regulares das muitas especialidades existentes no país. Outro dado revelador, apontado pelos estudos, é que na prática não se estava atendendo efetivamente ao mercado de trabalho em quantidade e qualidade, permitindo que ex-atletas continuassem a ocupar o lugar dos profissionais formados por uma escola superior [...] Como alternativa para solucionar esse problema, foi sugerido, na reestruturação da proposta curricular, que esta dever-se-ia restringir, apenas à formação de professores e de técnicos.

É importante ressaltar que nesse processo de se ‘repensar’ a

formação, assim como as abordagens já citadas anteriormente, difundidas como

forma de melhor situar a Educação Física escolar, também houveram propostas

disseminadas no campo da Educação Física para revê-la como instrumento de

formação em nível superior. Souza Neto (1999) destaca quatro propostas, que

surtiram efeito após a década de 1960, influenciadas pelos grupos de trabalho que

repensavam a formação no campo, bem como incidiram no retorno de mestres e

doutores que buscaram suas titulações no exterior. Assim, o autor se refere a estas

propostas como “perspectivas distintas, mas que mantêm entre si vínculos de

estreita relação” (p.69). Não é intenção do presente estudo aprofundar estas

perspectivas, mas baseado na obra do autor, convém citá-las apontando os

estudiosos que as definem.

1. Perspectiva Esportiva: o cenário desta proposta é a Alemanha tendo

como fundador de duas escolas de preparação profissional Carl Diem. Com o

nazismo, a proposta inicial destas escolas fora desvirtuada e precisaria ser

repensada uma vez que, paralelamente há a ascensão do esporte como

fenômeno das massas, influenciando métodos e concepções de ensino. Em

1947 é fundada a Escola Superior de Esportes de Colônia sendo alicerçada por

quatro pilares – Força, Verdade, Bondade e Beleza – que posteriormente são

substituídos por – Pesquisa, Ensino, Educação e Esporte. O termo esporte

passa então a substituir Educação Física designando todo tipo de trabalho

desenvolvido na área de atividades físicas. Dentro da perspectiva esportiva,

esporte passa a significar área de conhecimento e referência profissional, e é

89

dessa maneira que a Educação Física foi e, ainda é, desenvolvida em quase

toda a Europa, tendo como sinônimo a denominação esporte.

2. Perspectiva Acadêmica (disciplina acadêmica): após diagnóstico feito

por James Bryant Conat – presidente da universidade de Harvard – sobre a

“Formação dos Professores na América” em todas as áreas, foi observado que

o ensino da Educação Física estava centrado nas habilidades motoras e

capacidades físicas como único conteúdo. Assim, diagnosticou-se que seu

ensino não encontrava justificativa para estar na universidade, podendo

adequar-se às escolas médias (2º grau – ensino médio), devendo ser

eliminados os cursos de graduação e de pós-graduação como reflexos da

primeira. Em resposta a este diagnóstico, Franklin M. Henry da universidade

da Califórnia, publica o texto: “Educação Física: uma disciplina acadêmica”

compreendendo a mesma como uma disciplina que possui um corpo de

conhecimento organizado e reunido coletivamente num curso formal de

aprendizagem. Com isso as críticas ao diagnóstico se expandem entre os

intelectuais da área que vão defendê-la como uma área de conhecimento cujo

objeto de estudo é o ser humano no contexto das atividades físicas. Também é

colocado que a formação não deve se apoiar apenas em profissionais que

tenham a habilidade de executar, mas para além da experiência e

conhecimentos sobre execução de habilidades, estes profissionais devem ter a

capacidade de ensinar estas habilidades a outras pessoas. No Brasil, esta

proposta é aprofundada pelo Prof. Dr. Go Tani que adota a terminologia

cinesiologia, significando, literalmente, o estudo do movimento humano. A

cinesiologia como área de conhecimento iria além da perspectiva de disciplina

acadêmica, apresentando uma estrutura transdisciplinar constituída de três

grandes sub-áreas de investigação e aplicação: biodinâmica do movimento

humano, comportamento motor humano e estudos sócio culturais do

movimento humano.

3. Perspectiva Motriz (motricidade humana): essa perspectiva tem como

proponente o Prof. Dr. Manuel Sérgio da Cunha, de Portugal, que apresenta de

forma filosófica a Motricidade Humana como uma área de conhecimento para a

Educação Física e não da Educação Física. Nesta proposta a matriz biológica

de conhecimento teórico que tem identificado a Educação Física desloca-se

90

para uma matriz humanística (ciências humanas). A Motricidade Humana é

entendida, então, como uma ciência que propõe o estudo do ser humano em

seus aspectos motores de forma antidualista e holística expresso na passagem

do físico ao motor, em que a Educação Física seria a pré-ciência da

Motricidade Humana. Nesta proposta, concretamente, tem-se o

reconhecimento da Motricidade Humana, como indicativo de uma área de

estudos centrada na área de humanas.

4. Perspectiva Pedagógica: esta perspectiva ganhou relevo com os

movimentos da escola nova, da psicologia humanística, do construtivismo e da

teoria crítica dentro do enfoque da Educação Física, tendo no corpo o seu

objeto de estudo e na cultura corporal, ou cultura de movimento e/ou cultura

corporal de movimento os seus pressupostos teóricos. Esta perspectiva tem

como proposta uma disciplina da Educação Física orientada pela pedagogia e,

não uma disciplina para a Educação Física. No domínio desta perspectiva tem-

se o advento da já citada psicomotricidade, esta vislumbrando o perfil de um

professor voltado para a aprendizagem, contudo perde-se a especificidade da

Educação Física. Na busca de um diálogo interdisciplinar, retoma-se o

conteúdo historicamente acumulado da Educação Física – ginástica, jogos,

danças, esportes e lutas, numa dimensão mais ampla e menos técnica para a

área escolar. Na esfera da formação profissional, o Prof. Dr. Alfredo Gomes de

Farias Júnior, principalmente, vai defender esta concepção com a formação do

professor generalista em oposição ao especialista, entendendo que se trata de

um profissional formado sob uma perspectiva humanista, com licenciatura

plena em Educação Física, podendo atuar tanto no âmbito escolar, quanto fora

dele.

Com base nas propostas apontadas por Souza Neto (1999), é bem

evidente o esforço do campo Educação Física em direção a uma reorientação

teórico-científica que o estabeleça como pertencente ao espaço acadêmico,

distanciando-se de uma mera função de indivíduos que por sua vez seriam práticos

executores na orientação dos homens em relação à atividade física.

Para adentrar o meio acadêmico, a Educação Física vivencia a

situação anteriormente mencionada entre estabelecidos e outsiders analisada por

91

Elias e Scotson (2000). Na situação de outsider, a Educação Física configurando-se

como um novo campo no espaço das instituições de formação profissional, encontra

problemas para se estabelecer devido a grupos que atuam coercitivamente para

estigmatizá-la como mera função de instrução prática, bem como por suas próprias

disputas internas. Estas disputas ocorrem no interior do campo na tentativa de

passar para a condição de estabelecidos que, ao tentar se constituir como um

campo que deve ser acadêmico, os próprios indivíduos não se observam como um

todo – nas palavras de Elias (1998), como um “nós”. Essa é uma das diferenças,

segundo o autor, entre teorias do conhecimento do tipo filosófico tradicional e a

teoria do conhecimento sociológica não-reducionista. Para ele,

A primeira trabalha com a imagem humana de um sujeito do conhecimento, um conhecedor, em um vácuo – de “eu” sem “nós”, “você” sem “eles”. A última trabalha com o conhecedor num grupo enquanto sujeito do conhecimento. Ninguém pode saber sem adquirir conhecimento de outro. Sem partir de um grupo de conhecedores que dividem uma função comum de conhecimento e, como parte disso, de uma linguagem específica do grupo, meio indispensável para adquirir qualquer conhecimento, uma teoria do conhecimento não passa de artifício que leva ao descaminho. (p.33-34)

Esse grupo de conhecedores dividindo uma função comum de

conhecimento – o campo Educação Física – tem, principalmente, sua linguagem

específica como fator discordante entre os indivíduos; é um ‘acordo’ que faltava, e

ainda falta, ao campo para se estabelecer como um ‘nós’ em seus diferentes

espaços, seja este acadêmico ou de atuação profissional.

Voltando às propostas de formação acima explicitadas, Souza Neto

(1999, p.84) destaca que subjacente a elas,

pode-se incluir os questionamentos que houve na década de 80 em relação à aptidão física e ao esporte quanto aos seus fins e objetivos, quase que num movimento de negação desses conteúdos historicamente presentes na Educação Física, fortalecendo também, em parte, a criação do bacharelado, como um campo não escolar.

Segundo o autor, foram estes episódios somados a vários encontros e

seminários em diferentes estados do Brasil, que influenciaram o “encaminhamento

do Parecer CFE 215/87 e que acabaram determinando a proposta de dois cursos

para a Educação Física” (p.84). Souza Neto (1999, p.96) ainda destaca que “a busca

pelo bacharelado vai ser justificada na questão do mercado de trabalho e na ênfase

à necessidade de conhecimento (científico) específico para a área”.

92

Por décadas as únicas opções de formação no campo eram a de

professor e a de técnico desportivo como aponta Barros (1998), e isto para atender,

respectivamente, a educação escolar em maior grau, bem como centros esportivos e

clubes, já que estes contextos apresentavam as maiores, senão únicas,

possibilidades de emprego. Todavia, o autor destaca que a partir da década de 1970

pode-se interpretar esse crescimento no emprego como “resultado das mudanças

em diversos aspectos da sociedade relacionados à saúde, educação e lazer

decorrentes de transformações sócio-ecônomicas ocorridas nos últimos anos” (p.14).

A prática de atividades físicas vai ganhando espaços e públicos diferenciados. Não

apenas a escola, nem somente crianças e jovens utilizam-se dos serviços e

benefícios da área. “Assim podemos perceber que as necessidades da sociedade

por serviços especializados no campo da Educação Física, do esporte, da dança e

do lazer tornaram-se evidentes” (BARROS, 1998, p.14). Dessas necessidades

sociais é que surge o bacharel.

Nesse momento – década de 1980 – além da possibilidade de distinta

titulação – licenciado e/ou bacharel em Educação Física – outras mudanças também

fazem parte desta reformulação legal. Assim, após o parecer 215/1987, que institui a

possibilidade de duas formações diferenciadas, a Resolução nº. 03 de 16 de Junho

de 1987, do CFE, destaca outras mudanças para a formação profissional. Dentre

elas, Pires (2006, p.187) enfatiza que aumenta significativamente a carga horária

dos cursos para 2880 horas-aula a serem cumpridas no prazo mínimo de quatro

anos, tanto para bacharelado quanto para licenciatura “dando, assim, um novo

modelo para formação profissional em Educação Física no Brasil”. Porém o Docente

1 evidencia o não cumprimento da carga horária de formação quando coloca que: “o

maior problema são as escolas [cursos] que apresentam o diploma sem cumprir a

carga horária exigida pelo Conselho Nacional, sem ter o currículo mínimo exigido

para a escola”. Dessa forma, sem ter o mínimo de requisitos necessários, como a

carga horária, por exemplo, os cursos de formação em Educação Física podem

perder fundamentalmente a característica de ‘disciplina acadêmica’ para serem

relegados à posição de ‘outsider’ como um curso técnico ou de nível médio.

Amaral et al. (2006, p.32) apontando também para as mudanças com a

implementação da Resolução 03/1987, afirma:

93

[...] vivenciou-se na Educação Física uma relação pioneira de formação universitária, pois foi conferida às Instituições Superiores de Educação Física (ISEFs) total autonomia na composição curricular para a formação própria de um perfil profissional.

Pires (2006, p.187) assinala que neste novo modelo de formação, o

currículo mínimo “passou a não ser mais concebido como um elenco de disciplinas

obrigatórias e sim áreas de conhecimentos, que seriam definidas e instituídas por

cada instituição de ensino superior de formação em Educação Física”.

Essa autonomia viria conferir a possibilidade de uma formação que

atendesse ao mercado regional, preocupado com as tendências tão diferentes de

cada região do Brasil. E o Docente 2 aponta esta autonomia quando questiona a

formação atual em Educação Física: “o Brasil é um pais muito diversificado [...] então

como eu adequo a formação do aluno pensando em realidades tão díspares?”.

Apesar de supostamente necessária, tal autonomia pode ser vista como um

complicador na definição de um perfil profissional. E, Souza Neto (1999), define bem

esta dificuldade quando descreve que se, por um lado, o curso ganhou em

autonomia e flexibilidade, por outro, esta nova organização curricular poderia

conduzir, como conduziu, à perda de um núcleo identificador do campo.

Outro problema que envolve a questão do oferecimento de duas

titulações ‘distintas’, se deu a partir do momento em que as IESs, oferecendo ambos

os cursos de preparação do profissional de Educação Física – licenciatura e

bacharelado – “acabavam propondo uma formação de ‘dois em um’” (PIRES, 2006,

p. 188). O autor ainda afirma que “na prática, continuava a acontecer o mesmo

modelo anterior à resolução 03/87, ou seja, uma licenciatura ampliada, porém,

conferindo os dois títulos em formação concomitante” (p.188), que na época

precedente a 1987 dava-se como licenciado e técnico desportivo.

Tojal (2005, p.41), sem aprofundar a discussão coloca que

os cursos vêm oferecendo um programa de licenciatura, que chamam de licenciatura ampliada, mas que na verdade oferece dupla formação através de um mesmo projeto pedagógico, como se fosse possível, coerente, competente e mesmo ético, preparar o profissional polivalente em especialidades.

94

Diante das falas dos docentes, observa-se que todos lecionaram e/ou

ainda lecionam sua disciplina da modalidade na perspectiva de formação ‘dois em

um’. A pretensão que fica é que assim é possível formar o professor de Educação

Física escolar que poderá utilizar-se da ginástica artística, bem como dar

embasamentos técnicos para quem optar pelo alto rendimento quando formado. Os

Docentes 1 e 5, no sentido de preferência à formação anterior a 1987, relatam que:

“o anterior de licenciatura plena é muito mais complexo e o profissional podia

desenvolver, ele se formava, era apto em qualquer área” (D.5)

O que eu acho errado e que eu não concordo hoje e, podem me criticar à vontade, é essa separação que fizeram entre os dois cursos [...] você faz um curso de quatro anos e você não pode formar um professor que possa atuar como professor e, possa atuar com administração, como técnico desportivo, como árbitro? (D.1)

Em outros casos, expostos pelos docentes, trata-se de uma questão

viabilizada já no projeto pedagógico do curso que institui a disciplina a ser oferecida

no currículo igualmente aos dois cursos. O Docente 2 afirma que onde leciona a

disciplina “é a mesma no curso de licenciatura e no curso que nós aqui temos de

bacharelado”, e complementa que em sua universidade é muito típico que os alunos

façam a “licenciatura e num segundo momento eles voltem para a faculdade e façam

um ano e meio do bacharelado, ou vice-versa”. Já o Docente 11 destaca que “os dois

programas eram iguais. Não havia razão para ser diferente, para dar a disciplina

juntos (risos). O que mudava era o nome da disciplina no programa” (D.11).

A discussão que se refere às formações distintas no campo alcança,

inevitavelmente, o mercado de trabalho, pois titulações diferentes deveriam resultar

em ações também diferentes sendo bem definidos os locais de intervenção destes

profissionais. Para tanto, “ao bacharel fica vedada a atuação na escola, enquanto

que ao licenciado não fica vedada a atuação em algumas áreas ‘tidas como do

bacharelado’” (SOUZA NETO, 1999, p.101 – grifo do autor).

Toda essa confusão no campo, que confere duas formações

profissionais, porém não determina claramente a atuação destas, gerou fortemente

na década de 1990, discussões em torno da formação profissional, bem como a

regulamentação da profissão no ano de 1998. Esta que ocorreu no dia 01 de

Setembro, sob a Lei nº. 9696/98, em meio a debates contrários e a favor, cria

95

segundo Souza Neto (1999) o Conselho Federal de Educação Física (CONFEF) e

os Conselhos Regionais de Educação Física (CREFs).

A maneira pela qual a formação do bacharel foi instituída no campo,

sem sombra de dúvida ocasionou uma evidente tensão no interior do mesmo. Os

diversos e diferentes grupos que compõem a Educação Física passaram a ter que

se decidir entre estar do lado do bacharelado ou do lado da licenciatura. Apesar de

ambos os ‘sub-campos’, se é que assim pode-se designá-los, se definirem a partir

do mesmo campo de estudos, os mesmos não se observavam e ainda não se

observam numa posição de ‘nós’ – Educação Física – e sim de ‘eu’ bacharelado e

‘eu’ licenciatura, diante da perspectiva de Elias (1998).

Outro fato curioso da criação do bacharelado é que ao mesmo foi, por

muitos indivíduos, designado como a parte científica e de pesquisas da Educação

Física, colocando assim a licenciatura num plano epistemologicamente inferior e não

científico. Numa visão mais ampla, Elias (1998) coloca que o conglomerado de

pessoas que forma a sociedade divide-se em dois campos opostos. De um lado o

advento das formações sócio-históricas, que confere ao indivíduo um papel social

diante de tantos outros indivíduos, estudando suas relações; e de outro a concepção

assentada nas ciências naturais – consideradas ‘teorias clássicas’ – que tratam o

indivíduo como algo que pode ser completamente isolado, desprezando suas

relações com as demais pessoas.

Destarte, essa mesma oposição pode ser observada entre licenciatura

e bacharelado, diante do qual, cria-se o bacharelado também em motivo da busca

de status, já que sua visão mais positivista do ser humano o eleva ao espaço das

ciências ‘clássicas’; estas que na perspectiva de Elias (1970) compreendem o grupo

de maior poder diante do conhecimento, em detrimento das ciências humanas ou

sociais, que realizam suas pesquisas com base no subjetivismo e a partir de

perspectivas pessoais dos indivíduos e dos grupos.

Ainda é válido apontar que a licenciatura, possuidora de uma tendência

mais arraigada, mas não exclusiva, nas ciências humanas, merece uma atenção

especial, bem como todo o repertório de estudos que são frutos dessas ciências, pois

estas tratam do ser humano no seu complexo ato de ser. Assim, nas palavras de Elias

(1994, p.16) o coletivo de seres humanos seria melhor que estes isoladamente.

96

O que nos falta - vamos admiti-lo com franqueza - são modelos conceituais e uma visão global mediante os quais possamos tornar compreensível, no pensamento, aquilo que vivenciamos diariamente na realidade, mediante os quais possamos compreender de que modo um grande número de indivíduos compõem entre si algo maior e diferente de uma coleção de indivíduos isolados [...]

A autonomia – já descrita – para elaboração curricular, somada ao fato

de se ter incoerências na distinção de habilitações apresentadas pela Resolução

03/1987, fez com que a maioria das IESs aderissem ao que se denominou

licenciatura ampliada garantindo duas habilitações a partir de um único curso de

formação. Assim, observa-se que na prática a diferenciação dos cursos de

Educação Física não ocorreu, principalmente, porque se ao licenciado cabia atuar

em qualquer campo de trabalho, não existia interesse de formar um especialista que,

legalmente, teria uma diminuição nas possibilidades de atuação nesse mercado de

trabalho (ANDERÁOS, 2005). A autora ainda afirma que o não cumprimento correto

da Resolução 03/1987 pela maioria das IESs culminou em um estudo mais ampliado

de reestruturação da formação profissional em Educação Física.

Deste modo, com base nos Pareceres do CNE/CP 009/2001 e 27/2001,

foi promulgada a Resolução 01 de 18 de fevereiro de 2002 que instituiu as Diretrizes

Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em

nível superior, curso de licenciatura de graduação plena, apontando as

características dos cursos de licenciatura, sem contanto especificar áreas de

conhecimento e proporcionando às IESs com cursos de licenciatura em andamento

o prazo de dois anos para sua adaptação a esta Resolução (BRASIL, 2002a).

A Resolução 01/2002 esclarece que a habilitação de professores em

curso de licenciatura para qualquer que fosse a área específica, ficaria restrita à

atuação exclusivamente nos três níveis de ensino da educação básica – ensino

escolar. Particularmente para a Educação Física, tal Resolução restringiu o espaço de

atuação do licenciado, que antes abrangia todas as possibilidades do mercado de

trabalho profissional do campo; bem como fez com que as IESs reestruturassem seus

cursos, pois algumas exigências faziam-se urgentes na Resolução 01/2002 no que diz

respeito à formação específica de professores para atuação no ensino escolar.

97

Diante dos relatos de dois dos docentes, observa-se que os cursos das

instituições que lecionam já se reestruturaram e inclusive a disciplina de ginástica

artística é oferecida num caráter específico para a escola, que está aparentemente

diferente do que se oferecia antes:

Atualmente, trabalha-se com a própria ginástica na escola mesmo, direcionada só para a escola. Então, hoje você tem que se ater, como um professor de um curso de licenciatura que tem uma disciplina direcionada só para a escola, são aqueles elementos (...) é tudo o que você vai trabalhar, mas é na escola, esquece a ginástica competição, esquece outras coisas da ginástica, é a ginástica formativa mesmo. (D.6 – grifo nosso)

Nós aqui hoje, pensamos a ginástica artística dentro da ginástica na escola. Não é só a ginástica artística, são todos os tipos de ginástica, ginástica geral, a GR e a própria ginástica artística, todos com movimentos básicos e de iniciação, sem nenhuma, eu diria, ligação direta com a modalidade esportiva. (D.8 – grifo nosso)

Em contrapartida, um dos cursos, entre os seis de caráter público deste

estudo, apresenta atualmente uma orientação bastante diferente em relação às

disciplinas práticas do currículo. E com indignação o Docente 1 comenta que:

Agora, hoje, num curso de licenciatura que abriram na universidade A, eles me pediram para dar quatro horas de ginástica olímpica no curso de licenciatura para os alunos tomarem conhecimento do que era ginástica. Quatro horas num curso de três anos, quatro anos, você vai dar o que para os moleques? Quer dizer, isso era para todas as disciplinas práticas, quatro horas de ginástica, de natação, de vôlei, de basquete para o curso do futuro professor. Aí ele chega na escola, ele não vai poder fazer nada disso, ele vai dar aula teórica de esporte para os alunos? Alguma coisa está errada aí e precisa mudar! (grifos nossos)

Retornando a instauração de elementos legais por intermédio do CNE,

é oficializada também a Resolução 02/2002, no dia 19 de Fevereiro que estabelece

a duração e carga horária dos cursos de licenciatura a serem integralizados em no

mínimo três anos letivos. Em seu artigo 1º coloca que:

A carga horária dos cursos de formação de professores da educação básica, em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, será efetivada mediante a integralização de, no mínimo, 2800 (duas mil e oitocentas) horas, nas quais a articulação teoria-prática garanta, nos termos dos seus projetos pedagógicos, as seguintes dimensões dos componentes comuns: I - 400 (quatrocentas) horas de prática como componente curricular, vivenciadas ao longo do curso; II - 400 (quatrocentas) horas de estágio curricular supervisionado a partir do início da segunda metade do curso; III - 1800 (mil e oitocentas) horas de aulas para os conteúdos curriculares de natureza científico-cultural; IV - 200 (duzentas) horas para outras formas de atividades acadêmico-científico-culturais (BRASIL, 2002b).

98

Após as disposições das Resoluções 01 e 02/2002, que norteiam a

composição curricular e habilitação para os cursos de licenciatura em Educação

Física, passa a ser necessário caracterizar a formação do bacharel em Educação

Física, pois ao se distinguir as licenciaturas de forma geral, o até então bacharelado

em Educação Física fica descontextualizado por falta de orientações próprias, uma

vez que se manteve por algum tempo ‘acoplado’ à licenciatura ampliada. Dessa

maneira, a Resolução nº. 7 de 31 de Março de 2004, baseada no Parecer 058/2004

do CNE, estipula as Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Graduação

em Educação Física. Esta última Resolução exposta consolida a divisão dos cursos

em licenciatura e graduação (BRASIL, 2004). Apesar do termo inadequado para

denominar o curso de bacharelado, uma vez que a licenciatura também é uma

graduação, Amaral et al. (2006, p.32) aponta que a denominação de graduação em

Educação Física só é proposta “para evitar ser confundido na Europa com curso de

ensino médio”.

A partir destas orientações legais para os cursos de formação, passa a

ser organizado no do campo, o que Amaral et al. (2006, p.32) considera como sendo

o “quarto modelo de currículo”. Com isso, tenta-se romper a tradição da formação

generalista e ampliada na Educação Física que, de maneira indistinta, formava o

profissional para trabalhar tanto no âmbito escolar quanto fora dele.

Reforçando um pouco o que já fora apontado, a distinção que suscita a

uma disputa de espaços entre licenciados e bacharéis não parece estar muito clara

para os docentes quando a maioria defende nas entrelinhas de seus relatos que sua

disciplina de ginástica artística poderia servir às duas habilitações ou a distintos

espaços de intervenção. O Docente 2, por exemplo, afirma que “quando eu falo de

fundamentos da ginástica [...] o tempo inteiro da minha disciplina eu fico falando que

aquilo se aplica na escola, em tais e tais circunstâncias, mas também pode ser

aplicado no treinamento em outras circunstâncias diversas”. Já o Docente 8 acredita

que “aqui era licenciatura plena, então ele poderia ensinar não só na escola, mas

numa academia de ginástica artística, então era por isso que a gente passava, parte

eram os fundamentos e a parte técnica também”. O Docente 11 destaca que da

maneira como é disposto o currículo, em que se tem alunos da licenciatura e do

bacharelado “a gente não tem como diferenciar” e continua pontuando que o que

oferecia em sua disciplina era “adequado para as duas, para base das duas

99

carreiras como queira dizer, e durante o desenvolver da disciplina, a gente procura ir

fazendo paralelos”. Parece clara a incoerência no que diz respeito à formação em

licenciatura, pois ainda tenta-se atender o espaço escolar e o espaço não escolar, e

de forma aparente, especialmente no contexto de disciplinas mais práticas como é o

caso da ginástica artística.

Enfim, com tantas propostas envolvendo o campo desde seu início,

concorda-se com Benites e Souza Neto (2005) que é possível evidenciar avanços

significativos. No entanto, muito ainda há de ser feito para melhor identificar o

conhecimento próprio do campo, bem como a pesquisa e intervenção na Educação

Física que, conceituada amplamente por Betti (2006, p.79),

[...] pode ser hoje entendida simultaneamente como área de conhecimento, profissão e disciplina escolar na educação básica. Como área de conhecimento, produz conhecimentos de natureza científica e filosófica em torno de seu objeto de estudo, diferentemente definido por seus diversos teóricos: movimento humano, motricidade humana, exercício, cultura corporal ou de movimento. Na qualidade de profissão, possui o caráter de intervenção, elaborando, executando e avaliando programas de atividades físicas e esportivas para diversos grupos, atendendo demandas sociais que se avolumaram no Brasil desde a década de 1980, diversificando o campo de intervenção profissional da Educação Física. Por fim, em sua vinculação fortemente estabelecida com a instituição escolar desde as primeiras décadas do século XX no Brasil, a Educação Física é um componente curricular formalmente integrado ao ensino fundamental e médio, alcançando também a educação infantil; como tal, busca contribuir, por seus meios e conteúdos específicos, com a formação e o desenvolvimento das crianças e adolescentes.

Com essa variedade de preceitos que envolvem e regem o campo, a

formação profissional talvez seja o núcleo orientador do mesmo, uma vez que é a

partir dele que se pode influir na pesquisa, melhorar o atendimento profissional e

atuar com plenitude no âmbito da educação básica. E há que se lembrar que os

responsáveis pela formação profissional são, em certo grau, os docentes

universitários. Para tanto, um dos instrumentos da formação profissional é

certamente o currículo que rege a referida formação, diante do qual estes docentes

devem estar esclarecidos, bem como atuando em concordância com o mesmo, ou

ainda, buscando a melhoria e harmonia desse referencial no contexto da formação.

Desse modo, é importante que se faça aqui uma breve menção ao currículo,

especialmente no que diz respeito à formação de licenciados em Educação Física.

100

3.3. Currículo e Formação para Licenciatura em Educação Física

Malaco (1996) escreve que, no âmbito legal existe por parte das

instituições autonomia e flexibilidade para elaborarem o seu próprio currículo, sendo

que estas devem levar em conta “necessidades e características culturais”

(BARBOSA, 1999, p.33), da comunidade onde a universidade se encontra. Malaco

(1996, p.17) ainda alega que para um país como o Brasil, “com características

regionais diferentes, clientela diversificada e mercado de trabalho distinto, esta

autonomia se faz necessária”. Apesar disso, tal autonomia leva à criação de

currículos excessivamente diferentes gerando, inclusive, descaracterização do perfil

do profissional de Educação Física, ou cria ainda currículos artificiais que não se

enquadram à demanda social circundante.

Assim, para atender ao mercado escolar e não-escolar no campo da

Educação Física, muitos cursos espalhados pelo país ainda atuam na perspectiva

do currículo ampliado e oferecem a formação em licenciatura, porém com inúmeras

disciplinas que não serviriam especificamente para uma atuação harmônica com a

escola. Sobre o assunto, o Docente 3 alerta que:

Pessoalmente é pesquisado em várias universidades, especialmente as particulares, sobretudo aquelas que construíram o currículo para satisfazer os modismos da sociedade, por exemplo, step, dança de salão, e uma série de coisas que vão incorporando ao currículo; esses modismos são para preparar esse profissional para atender a essa necessidade da sociedade, mas não a preparação para atuar na escola e, deturpam a formação profissional.

Focando especificamente a ginástica, Barbosa (1999, p.33-34)

evidencia que a autonomia na elaboração dos currículos dos cursos de Educação

Física, gerou também “diferenças nos currículos com relação às disciplinas

gímnicas”. A autora ainda retrata que na maioria das grades curriculares “as

disciplinas encontradas são: a ginástica (ou ginástica geral, que assume variadas

características de acordo com a instituição, inclusive a ginástica de academia), a

GRD e a ginástica artística (ou olímpica)” (p.34).

É fato que a adequação das estruturas curriculares se constitui em

desafios e limites legais existentes no processo de ensino para qualquer que seja o

curso de formação. Assim, Malaco (1996, p.17) afirma que:

101

O currículo, um dos fatores mais importantes na formação de qualquer estudante ou profissional, precisa ser construído com base em sólido referencial teórico. Em qualquer nível, o currículo está marcado pelo momento histórico, político, econômico e social, que reflete diferentes teorias da educação.

No entanto, como afirma Carmo (1982, p.135), a Educação Física

privilegiou e ainda privilegia a “perfeição de gestos e movimentos”, sendo assim,

muitas grades curriculares não consideram como deveriam os conhecimentos

históricos, sociológicos, filosóficos, econômicos, políticos e pedagógicos presentes

na sociedade e necessários à formação do educador. Entre os docentes foi possível

encontrar quem preferisse, inclusive, que a teoria fosse dada por outro: “você

evitava dar toda essa parte importante da teoria que o médico ia dar, o professor

[nome retirado] ia lá dar Método de Treinamento, e a gente se limitava à parte

prática de execução” (D.1); e docentes que visualizam – talvez sem se questionar

sobre isso – a prática como essência, levando sua disciplina a uma evidente

dicotomia (teoria e prática), ou ainda ao senso comum que empiricamente relega ao

discente de Educação Física a visão daquele que prefere a prática em oposição à

teoria. O Docente 6 aponta que: “inicialmente é aquela parte, geralmente os alunos

não gostam, que é o referencial teórico, justamente que você entra com o histórico,

de onde veio, de onde surgiu, a história dos aparelhos, tudo que tem na literatura”. Já

o Docente 10 afirma: “você sabe como são os alunos hoje em dia, eu tenho dos

quarenta e três, quase que cem por cento têm cem por cento de freqüência [...],

porque tem prática, eles querem porque tem prática” (grifos nossos).

Tal apontamento remete à ‘velha’ discussão em que as ciências sociais

não encontram espaço na universidade. As disciplinas que possuem maior força no

currículo ainda são aquelas relacionadas aos aspectos técnicos da Educação Física.

Segundo Malaco (1996, p.18), “o aspecto técnico é importante na formação do

educador, mas é essencial sua articulação com os conhecimentos teóricos”. Neste

sentido, Tojal (1989, p.20-21) afirma que:

[...] em geral, os currículos das escolas de Educação Física procuram dar uma formação não específica, objetivando ensinar atividades esportivas, porém a maneira dissociada como as matérias são desenvolvidas, acabou por formar um profissional com algum conhecimento da área pedagógica e de modalidades esportiva.

102

Destarte, Ferreira e Vilarinho Neto (1999, p.50) constatam que os

currículos dos cursos de Educação Física possuem, predominantemente, “sua matriz

epistemológica no positivismo, que determina a fragmentação do conhecimento, a

dicotomização entre teoria e prática, privilegiando uma formação com base

tecnicista”. A ginástica artística, por estar envolvida num variado rol de disciplinas

práticas entre as quais a Educação Física utiliza como recurso, especialmente

inserida no campo esportivo, inevitavelmente acaba refletindo as influências

históricas que são adventos de uma prática técnica (militarista) e de uma prática

esportiva (competitivista). Isso certamente pode fragmentá-la, dicotomizá-la e a

tornar técnica no espaço de formação, como observaram os autores acima.

Tal acontecimento está intimamente ligado ao fato de que a

modalidade, querendo ou não, leva para seus espaços de aplicação – seja na

universidade e/ou especialmente na escola – alguns tabus, algumas superstições

que a inviabilizam, por falta de um maior esclarecimento. Segundo o Docente 2,

“quando eu falo de ginástica artística eu já levo, querendo ou não querendo, uma

série de preconceitos daquela modalidade”. O Docente 4 assegura que, “dentro da

universidade eu sinto isso, falta essa facilitação, as pessoas ainda olham a ginástica

como um bicho de sete cabeças, infelizmente”. O Docente 5 já acha que “as

pessoas se assustam em relação aos gestos e aí pensam que a ginástica está fora

do alcance do currículo escolar”.

Ferreira e Vilarinho Neto (1999 p.51-52), diante da realidade e das

“exigências colocadas por uma intervenção social qualificada e comprometida nos

espaços de trabalho da Educação Física”, fazem referência a ações eficazes no

currículo de formação a fim de que o projeto político-pedagógico esteja de acordo com

uma realidade histórica maior e que vai além do meio acadêmico, “no intuito de

desenvolver ações sintonizadas com as necessidades de formação crítica”. Assim,

uma das propostas das autoras destaca possibilidades essenciais a uma

[...] reconceptualização curricular para a Educação Física, em articulação com um determinado campo do movimento nacional de educadores. Essas possibilidades apontam para a construção de uma base comum nacional para a formação de educadores, com novos eixos curriculares, inseridos num projeto político pedagógico que aponte para a unidade metodológica, para a auto-organização e para o trabalho cooperativo na produção de conhecimento, para a integração ensino-pesquisa-extensão, integração graduação-pós-graduação e universidade-comunidade, viabilizando a indissociabilidade entre teoria e prática.

103

Além disso, um dos aspectos da teoria sociológica de Elias (1970)

aponta para o entendimento do todo precedendo o entendimento das partes.

Portanto, é preciso compreender de antemão o que é Educação Física e a que este

campo se presta de uma maneira geral – o todo; também neste contexto, o que seria

a Educação Física na escola e como aplicá-la neste espaço. Isto certamente

designaria ao futuro profissional, a maneira mais adequada de avaliar, além de seus

anseios profissionais, como atuar diante do espaço de aplicação escolhido.

Entendendo que a licenciatura encontra-se no interior do ‘todo’ que Elias (1970)

destaca em sua teoria, o professor deve ser esclarecido de suas ‘partes’ específicas,

dentre as quais as questões sociais, pedagógicas, de aprendizagem e

desenvolvimento do ser humano, os conteúdos historicamente pertencentes ao

campo – jogos, esportes, danças, lutas e ginásticas – entre outros, devem compor

como elementos.

Decerto as bases legais de reestruturação dos cursos de Educação

Física precisam ser efetivadas, bem como precisam especificar sua grade curricular

de maneira que as formações embasadas em cada currículo – licenciatura e

bacharelado – sejam condizentes para posterior atuação. Parece então óbvio que a

licenciatura em Educação Física necessite de eixos norteadores no que diz respeito

a seu currículo de formação – seu ‘todo’ – pois as disciplinas pedagógicas, bem

como as disciplinas técnicas imbuídas de pedagogia – como ‘partes’ que são – é

que devem perfazer essas grades, uma vez que se pretende trabalhar com a

formação de educadores. Então, para o docente 5, por exemplo, a ginástica artística

na licenciatura “é só a parte formativa e educativa”, diferente de um bacharelado que

teria um aprofundamento mais técnico como aponta o Docente 7, que ainda diz que

“na licenciatura os conceitos que devem ser trabalhados são os conceitos de

iniciação [...] como um processo pedagógico mesmo”. Para o Docente 9, os

conhecimentos devem ser diferenciados também no currículo, pois o mesmo coloca

que sendo uma proposta de licenciatura, o currículo deve estar direcionado a este

foco, já que “uma coisa é eu trabalhar esporte numa forma de manifestação escolar,

pedagógico, outra coisa é eu trabalhar o esporte numa forma de manifestação do

treinamento de alto rendimento”.

De acordo com a resolução 03/87, já explicitada, “os cursos de

licenciatura plena foram originalmente concebidos como uma das possíveis

104

modalidades de aprofundamento e de habilitação docente (para atuar na educação

escolar) em uma determinada área do conhecimento” (KUNZ et al., 1998, p.39).

Assim, a formação nos cursos de licenciatura em Educação Física deveria preparar

profissionais para atuarem especificamente no contexto escolar, o que infelizmente

não acontece de forma diligente.

Tal fato é observado inclusive na própria contextualização dos cursos de

Educação Física no âmbito das universidades. A maioria dos cursos de licenciatura

em Educação Física vincula-se à área das ciências biológicas ou da saúde. Com raras

exceções, estão ligados à área de humanidades ou a centros e/ou departamentos de

educação, embora tenham por finalidade a formação do educador. Como já relatou o

Docente 3, trata-se de uma questão de status, “você vê na faculdade de Educação

Física mais aventais brancos que num hospital; estão confundindo a profissão!”. O

Docente 7 afirma ainda que, no curso no qual atua, que se trata atualmente de uma

licenciatura, os professores “eu diria oitenta por cento, têm a formação mais voltada

para a área da saúde, mais fisiológica”. Talvez então seja o momento de se

questionar em relação ao tipo de professor que se pretende formar num curso de

licenciatura.

O preocupante é que os licenciados no campo de Educação Física não

são, em sua maioria, capacitados pedagogicamente para atuar a contento.

Perspectivando uma formação generalista, a adoção do currículo ampliado, que

ainda persiste de uma maneira discutível, faz com que durante a formação o

discente aprenda um pouco de tudo, mas não se especialize em nada. No entanto, a

licenciatura nada mais deveria ser do que uma especialização do profissional de

qualquer área para atuar na escola (BETTI, 2002).

A formação generalista em Educação Física encontra suas justificativas

no seio da questão mercadológica, em que o profissional possa ter mais chances no

mercado de trabalho. Segundo Verenguer (1997), essa questão já fora criticada por

diversos autores, mas, a autonomia já retratada, possibilitada às IESs para a

constituição de seus currículos ainda permite a referida formação, sem contestá-la.

Nesta perspectiva de formação, Tojal (1989, p.20) lembra que há

grande dificuldade em definir o que é ser professor de Educação Física, pois este vai

atuar “de forma superficial em várias áreas perdendo, portanto, em qualidade e

105

especificidade, não conseguindo obter o reconhecimento nem mesmo dos seus

possíveis beneficiários”. Verenguer (1997, p.166) então, afirma que, “a defesa da

formação generalista provoca, também, problemas de reconhecimento e de status

profissional” (grifo da autora).

Na intenção de formar o licenciado e o bacharel concomitantemente,

para não perder de vista a introdução das ciências naturais no currículo como

garantia de status e pesquisa, perde-se a orientação da formação que não é mais

específica. Mas, ao formar apenas e unicamente o licenciado perde-se uma fatia do

poder na esfera dos conhecimentos bio-fisiológicos. Trata-se aqui de direcionar a

Educação Física em sua composição curricular mais para o lado dos ‘estabelecidos’

– ciências naturais – do que para o lado dos ‘outsiders’ – ciências humanas. Assim,

nessa esfera, aos licenciados cabe o estigma de grupo inferior e, segundo Elias e

Scotson (2000, p.30), “dê se a um grupo uma reputação ruim e é provável que ele

corresponda a essa expectativa”. Reporta-se tal colocação ao fato de os professores

do ensino escolar, não apenas os de Educação Física mas também os demais,

serem altamente desvalorizados em sua função, pois talvez inconscientemente

correspondam ao estigma que lhes foi designado.

Os cursos de licenciatura em Educação Física, devido à autonomia

curricular, passam por drásticas e penosas transformações. A licenciatura segundo

Barbosa (1999) deveria estar preocupada em formar educadores, no entanto, Betti

(2002, p.249-250) afirma que:

As licenciaturas em Educação Física têm fracassado, fundamentalmente, porque seu foco prioritário de estudo não está na pré-escola e nas escolas de educação básica, e na utilização das atividades físicas dentro delas, mas em outra parte qualquer onde o aluno possa futuramente encontrar emprego [...].

Em relação à formação do ‘professor-educador’ – denominação

utilizada pelo Docente 3 durante todo seu depoimento – o mesmo faz colocações

sobre a importância de se formar um profissional consciente em relação à sua

atuação na escola e, para ele,

um professor de Educação Física que trabalha no âmbito escolar deve ser um professor pesquisador, conhecedor das realidades dos espaços sociais de onde vêm os alunos, conhecer qual é a realidade de seus alunos, da escola, e da comunidade onde a escola está inserida, para trabalhar com a

106

cultura deles, trabalhar com seus códigos e superar o conhecimento de senso comum que os alunos têm de todas as coisas. Isso é educar. Educar não é apenas a parte corporal, não é ensinar técnicas, é na vivência ensinar os conceitos que estão por trás de cada uma das diferentes manifestações culturais, porque não dá mais para ensinar a dominar qualquer habilidade, que requer muito tempo, repetições todos os dias.

A formação do licenciado em Educação Física perpassa também por

outra problemática evidente e esta se refere ao tecnicismo das disciplinas cursadas

na graduação. Oliveira (1984, p.14) dá embasamento a essa questão quando afirma

que o perfil do professor de Educação Física ao atuar na área escolar “ficou

delineado pela sua inserção na esfera esportiva”. Na mesma linha de pensamento,

Kunz (1994, p.100) destaca que a tendência “técnico-esportiva é, sem dúvida, a

concepção hegemônica, atualmente no contexto escolar”. Ora essa hegemonia tece

nos cursos de licenciatura tal força de coesão, que as modalidades esportivas nos

seus aspectos técnicos detêm o poder em contraposição aos aspectos pedagógicos.

O Docente 3 ao ser questionado sobre a importância da ginástica artística na

formação do professor, aponta que a hegemonia esportiva muitas vezes vem a ser

reforçada de forma incoerente (com a escola) na medida em que os discentes

egressos dos cursos de Educação Física aderem ao mesmo “porque têm interesses

esportivos, porque praticaram alguma atividade e, a faculdade muitas vezes cumpre

com essa função de reforçar essa parte esportiva, porém é um erro, porque no

âmbito escolar o esporte de rendimento não tem vez”, ou pelo menos não deveria

ser uma variável tão enfocada na formação para posterior trabalho na escola.

Barbosa (1999, p.76) aponta que “os docentes dos cursos de

licenciatura em Educação Física acabam por reproduzir a hegemonia esportiva”, pois

os tecnicismos que as disciplinas proporcionam na formação, se apresentam com a

“justificativa de que as outras disciplinas que trabalham fundamentos históricos,

culturais, antropológicos, psicológicos, etc., devem trabalhar essas dimensões da

cultura de movimento”. O Docente 1, apesar de mostrar-se muito intricado nos

aspectos técnicos da modalidade durante todo o seu depoimento, aponta que achava

“uma estupidez você, num curso de ginástica olímpica, só ter exercícios práticos para

aprovar os alunos, já que você vai ser um professor. Professor é para orientar, não é

para ser executante!”. Apesar dessa fala, o próprio docente relator fazer exigências

mais práticas e técnicas de seus alunos em contraposição a aspectos teórico-

107

conceituais. Diferentemente o Docente 2, que afirma trabalhar a partir de reflexões

mais teóricas, relata que “entre entender e executar existe um mundo, um universo”,

no qual se seus alunos compreenderem a “lógica interna da ginástica” ele conseguiu

alcançar seu objetivo.

Igualmente ao que Barbosa (1999) apontou, a maioria dos depoentes

trabalha muito mais os aspectos práticos numa perspectiva técnica da modalidade, o

que inevitavelmente pode levar à reprodução da hegemonia esportiva. Com exceção

do Docente 1 que avaliava a execução prática como requisito para aprovação, os

demais relatam que não havia ou há exigência alguma em relação à execução,

desde que houvesse a vivência de elementos de base da modalidade, e que a

técnica para essa execução fosse aprendida. Em relação a questões mais teóricas,

percebe-se que esta vai variar muito de docente para docente, mas em sua maioria

um pouco do histórico da modalidade, descrição dos aparelhos, regulamentação,

provas e campeonatos é o que se trabalha na teoria.

Apesar de atualmente os cursos de licenciatura em Educação Física

possuírem documentos legais – como já destacado – que norteiam sua estruturação

curricular, a síntese da literatura bem como os relatos de alguns docentes, mostra

que embora exista um discurso pedagógico, o caráter técnico ainda persiste, quando

a prioridade deveria ser o conhecimento sobre a função da escola e da Educação

Física dentro dela. É possível que muitas mudanças ocorram dentro dos próximos

anos, tendo em vista que as adequações dos cursos na utilização das recentes

bases legais de orientação curricular estejam apresentando suas modificações

somente agora. Entretanto, baseando-se na disciplina de ginástica artística ofertada

para os cursos de licenciatura – e permitindo-se estender a outras disciplinas de

caráter prático – a formação inicial, após o direcionamento dessas bases legais

viabilizou e, ainda viabiliza, a formação de um profissional de Educação Física com

perfil um tanto quanto indefinido, não apenas diante do campo escolar, mas dos

campos que designam o bacharelado também!

A ginástica artística, inserida na Educação Física, sobretudo na

licenciatura, como se analisa neste estudo, vem de uma construção histórica no

contexto da ginástica e, esta última envolve mais de dois séculos de configuração no

que diz respeito às atividades físicas estruturadas pelo ser humano. Os escritos,

108

portanto, podem se apresentar repetitivos, pois no capítulo que segue, retorna-se a

um período precedente ao que já foi exposto até aqui. Tal fato torna-se viável neste

estudo por se utilizar um referencial teórico – Norbert Elias – que valoriza a história

pelas configurações que esta apresenta de época em época.

Elias, (1993b, p.239) escreve que, em todos os estudos que tomem

como base a sociologia, deve-se levar em conta “desde o princípio toda a

configuração do campo social, que é mais ou menos diferenciado e carregado de

tensões”. Só é possível fazer isso porque “o tecido social e sua mudança histórica

não são caóticos, mas possuem, mesmo numa fase de agitação e desordem, um

claro padrão e estrutura”. Destarte, o capítulo seguinte irá apresentar a construção

histórica da ginástica sendo esta um ‘todo’, observando a ginástica artística como

uma de suas ‘partes’ componentes.

109

CAPÍTULO IV

O GRANDIOSO MORTAL: CONFIGURAR A GINÁSTICA

4.1. Configuração Histórica da Ginástica

Ao analisar as ginásticas no tempo, notou-se que suas configurações

apresentaram mudanças significativas, dentre as quais Fiorin (2002, p.17) destaca

que “a ginástica, sendo entendida como sinônimo de atividades físicas em geral

vai ganhando roupagens diferentes de acordo com as épocas, culturas e interesses

distintos” (grifo da autora). Cabe colocar que, como a história num contexto geral,

também a história das ginásticas passou por uma mutação, com explicações às

suas mudanças (LE GOFF, 1992). Portanto, ao estudar a história das ginásticas,

deve-se estar convicto do objeto de estudo, já que a historiografia que a envolve

remonta de muitos anos aplicando-se a diversas formas de movimentações

corporais, que foram melhor ‘racionadas’ há cerca de meio século.

As ginásticas – com interpretação própria do termo – surgem na

Antiguidade, em que estudiosos gregos criaram o termo ‘Gymnus: nu’, e também as

primeiras sistematizações de atividades físicas, visando com isso benefícios físicos e

mentais. Nesse aspecto, Publio (2002) ressalta a importância da antiguidade grega

no aspecto histórico-evolutivo das ginásticas.

Os exercícios físicos neste período surgem em formatos variados, e

por não possuírem nomenclatura específica, todos eram denominados ‘ginástica’.

Com o passar dos séculos tais exercícios começam a se diferir muito em conceitos,

110

técnicas, práticas e objetivos, constituindo assim modalidades esportivas diferentes

como as que são conhecidas hoje por natação, hipismo, atletismo, lutas, etc.

Marrou (1966, p.185) coloca muito bem o auge das ginásticas na

Antiguidade grega:

[...] a ginástica permanece o elemento, senão preponderante, pelo menos característico da formação do jovem grego, o gosto pelos desportos atléticos e pela sua prática constitui, como na época arcaica, um dos traços dominantes da vida grega [...].

Foi na Grécia, mais precisamente em Atenas, que surgiu o ideal da

beleza, do culto ao corpo, sendo a prática de exercícios físicos altamente valorizada

como educação corporal (SOUZA, 1997). Na mesma época, espartanos praticavam

exercícios físicos para a preparação de soldados e formação de exércitos para

guerras na disputa de território.

Em Roma, assim como em Esparta, o objetivo da ginástica era para a

preparação de soldados e, para as atividades esportivas da época (SOUZA, 1997) –

luta de gladiadores e cavaleiros – hoje consideradas altamente violentas, porém

naquele tempo possuíam tanto valor e prestígio quanto possuem os Jogos

Olímpicos atualmente.

Já na Antiguidade, estudos sobre o corpo e o movimento começaram a

surgir, principalmente no que se refere à ginástica, realizados por Sócrates, Platão,

Aristóteles e Galeano, que atribuíam à mesma a qualidade de encontrar simetria

entre mente e corpo (PUBLIO, 2002).

Também no período greco-romano, Souza Neto et al. (2006, p.210)

alega que “havia uma divisão racional dos profissionais que trabalhavam com o

corpo, como o ginasiarca, ginasta, paidótriba”. Tal fato reporta a uma ‘tradição’ a

respeito da preocupação na formação daquele que ensina – o professor.

Com o surgimento do cristianismo, inaugurando a Idade Moderna,

passou-se a preconizar o abandono do corpo e os interesses centram-se na

conquista da vida celestial, o que vem contribuir, decisivamente, para o

enfraquecimento da prática de ginástica. Entretanto, as cruzadas organizadas pela

Igreja durante os séculos XI, XII e XIII exigiam, evidentemente, uma preparação

111

militar. Tal fato faz com que a ginástica, recentemente relegada a segundo plano,

volte aos poucos ao estágio anterior de prática.

Nesse momento na configuração da ginástica, é possível observar o que

aponta Elias (1970, p.24), no qual há “a diminuição dos elementos fantasiosos para o

aumento dos elementos realistas do nosso pensamento, como sendo características da

cientifização dos nossos modos de pensamento e de aquisição de conhecimentos”. Ao

se afastar dos elementos ‘mágico-míticos’, bastante centrados nos deuses da época, a

ginástica vai perder espaço na instauração de referenciais cristãos que se opunham à

mitologia e ao cientificismo. Mas, tal atividade será necessária para a aquisição de força

física e poder, que era obtido com as cruzadas.

Constituindo fonte preciosa de informações históricas, os documentos

da antiguidade, sobre o que fora a ginástica até então, serviram de base para

estudiosos do século XVI formatarem material referente à prática de ginástica da

nova época. Destacam-se nomes como, os franceses François Rebelais e Michel

Eyquem de Montaigne, o italiano Jerônimo Mercuralis autor da obra ‘Da Arte

Ginástica’, o alemão Arcangelo Tuccaro que escreveu um livro sobre os exercícios

acrobáticos que se faziam em sua época, entre outros.

Em meados do século XVII, início do século XVIII, consagrando assim

o Iluminismo, filósofos, médicos e pedagogos relegaram grande importância à

prática de exercícios físicos – ginástica – como um bem para o corpo, a mente e

formação do ser humano, auxiliando na ascensão da ginástica no ocidente (SIGOLI;

ROSE JUNIOR, 2004).

Perfazendo então a construção, diga-se de passagem, científica e

positivista da ginástica, outros estudiosos – destacados na seqüência – criaram

conceitos, métodos e doutrinaram sua prática pelo mundo, especialmente na

Europa. Nos contextos das sociedades da época a regência para o aumento do

conhecimento e prática de ginástica passou a vir principalmente dos discursos

médicos. Estes discursos foram, posteriormente, adotados por governantes na

busca da eugenia das raças e luta por espaços territoriais.

Paralelo à ‘propaganda médica de benefícios’ da ginástica, esses

estudiosos começaram a dar-lhe embasamento pedagógico, com o intuito de iniciar

112

os indivíduos desde cedo em sua prática. Estudiosos como o filósofo suíço Jean

Jacques Rosseau, que realizara estudos sobre o corpo, a ginástica e a Educação

Física; o também suíço, Johann Pestalozzi que introduziu exercícios ginásticos em

sua escola; Johann Bernhard Basedow que fundou um ginásio na Alemanha,

possuem grande importância literária no que diz respeito à ginástica.

Porém, foi com dois educadores, o alemão Johan Cristoph Friedrich

Guts-Muths e, o sueco Per Henrik Ling, que a ginástica atingiu o seu mais elevado

patamar pedagógico e doutrinário. O alemão Guts-Muths é considerado o ‘pai da

ginástica pedagógica’. Em seu manual ‘Ginástica para a Juventude’, preconiza a

busca da beleza e da agilidade, distinguindo didaticamente exercícios ginásticos,

trabalhos manuais e jogos para a juventude. Per Henrik Ling, o ‘pai da ginástica

sueca’, estabeleceu preceitos técnicos e pedagógicos segundo os quais a educação

deve visar o indivíduo de maneira integral. Ling também inseriu a ginástica na

Dinamarca e, cem anos após seu falecimento, sucessores e aplicadores de seu

método criaram grandes encontros de estudos denominados ‘Ligíadas’.

Passou-se a buscar a universalização dos conceitos ginásticos, atribuindo-se à mesma os fins competitivos tendo como marco fundamental a realização das Lingíadas em Estocolmo, desencadeando o processo de esportivização e universalização do conhecimento. O evento possibilitou aos pedagogos especializados observar, comparar e discutir as formas ginásticas, as técnicas de execução dos exercícios iniciando um tempo de influências recíprocas e universalização de conceitos. (LORENZINI, 2005, p.194-195)

Também Adolph Spiess, alemão, que criou a ginástica de grupos nos

aparelhos e os aparelhos coletivos e, Napoleão Laisné autor da obra ‘Pratique

Ginástica’, compõem o quadro de difusores da ginástica.

A ginástica passou a desenvolver-se em aspectos práticos, técnicos e

teóricos, pelos olhares de grandes estudiosos, filósofos, médicos, militares,

governantes, educadores renomados. Estes, analisaram, criaram e defenderam a

prática da ginástica para todos, no entanto, o grande nome dentro desse contexto,

intitulado até hoje como o ‘pai da ginástica’ é Friedrich Ludwing Jahn, teórico

nacionalista alemão que criou o termo ‘turnen’ (praticar ginástica). Jahn difundiu a

ginástica e a ginástica de aparelhos pelo mundo e, até os dias de hoje, ainda é

mantido como o nome mais representativo dentro da ginástica mundial.

113

Por intermédio de sua difusão, a partir de 1800, a ginástica passou a

exercer importantes funções na sociedade industrial, “[...] apresentando-se como

capaz de corrigir vícios posturais oriundos das atitudes adotadas no trabalho,

demonstrando assim, as suas vinculações com a medicina e, desse modo,

conquistando status” (SOARES, 1994, p.64).

O que vem a conferir mais popularidade então à ginástica, apenas

reforça o que Elias (1970, p.19) afirma em seus escritos quando aponta que “muitos

dos conceitos fundamentais das ciências da natureza, que gradualmente se foram

desenvolvendo, foram provando ser mais ou menos adequados à observação e

manipulação de processos físico-químicos”. Partindo para essa condição de maior

status, a ginástica passa a assimilar seus ‘novos’ conceitos – das ciências da

natureza – como fundamentais, que o autor afirma que “surgem àqueles que os

herdam como se fossem eternamente válidos e consequentemente eternos” (p.19).

Passando a adquirir maior importância e sistematização, a ginástica

passou a compor métodos. Principalmente nos países europeus, onde havia uma

maior preocupação com o corpo (dado às guerras freqüentes ocorridas no

continente), foram surgindo as escolas ou métodos ginásticos, que influenciaram (e

ainda influenciam) as manifestações gímnicas em todos os continentes.

4.1.1. Os Métodos ou Escolas Ginásticas

Segundo Sigoli e Rose Junior (2004, p.113) os métodos ginásticos

“tiveram desenvolvimento simultâneo em diversos países o que favoreceu o

intercâmbio de informações e tendências”. Soares (1994) destaca que os métodos

ginásticos em sua progressão apresentam finalidades semelhantes: regenerar a

raça, promover a saúde, desenvolver a força, a coragem, a energia de viver servindo

à pátria nas guerras e nas indústrias, desenvolvendo a moral.

Vale enfatizar que referidos métodos foram até certo ponto impostos

pelos governantes dos países – europeus – em questão, que segundo Elias (1993a;

1993b), passava mais diretamente por um processo civilizatório desde o século XVI.

Tal processo levou ao que Elias (1993b, p.207) constata como uma maior

interdependência entre os indivíduos o que levou também a um “fortalecimento do

114

autocontrole e a permanência das compulsões – a inibição de paixões e controle das

pulsões – imposta pela vida no centro dessas redes”, modificando inclusive a

constituição psicológica dos indivíduos.

Assim, muitos aspectos de cada um destes métodos foram impostos na

busca por mais poder entre as nações. O conceito de ‘poder’, segundo Elias (1970),

vem sendo distorcido há muito tempo, por ser associado sempre a uma de suas

conseqüências que seria o uso da força, brutalidade e a falta de escrúpulos, com os

quais os detentores de poder faziam e ainda fazem uso. Em sua obra, o autor usa o

referido conceito de forma coerente com o próprio significado que literalmente é o

direito de deliberar, agir e mandar, e entende que “o poder não é um amuleto que

um indivíduo possua e outro não; é uma característica estrutural das relações

humanas – de todas as relações humanas” (p.81 – grifo do autor).

Dentre os métodos, portanto, as relações de poder estão sempre

evidentes, diante das quais o autor destaca que frequentemente ocorrem provas de

força em que o equilíbrio de poder poderá variar de acordo com a situação.

Retornando a apresentação das escolas ou métodos, dentre as que

tiveram maior divulgação mundial e no Brasil, destacam-se as escolas: alemã, sueca

e francesa.

A Escola Alemã

Autores, como Marinho (s.d.), Soares (1994) e Souza (1997) entre

outros que abordam o tema ginástica, colocam que na Alemanha a referida prática

surge para atender particularmente à defesa da pátria, já que no início do século

XIX, este país não havia ainda se unificado territorialmente. Era preciso, então, criar

um forte espírito nacionalista para atingir a unificação, que só seria conseguida com

homens e mulheres fortes, robustos e saudáveis.

Oliveira (1985, p.06) afirma que “o desenvolvimento da Escola Alemã,

foi dirigido por intelectuais e médicos, mas o impulso decisivo para a implantação

dos alicerces dessa Escola veio da pedagogia”.

115

Guts Muths acreditava que a ginástica deveria se fundamentar em

bases fisiológicas e, de forma pedagógica, deveria ser organizada pelo Estado e

ministrada todos os dias para todos: homens, mulheres e crianças (SOARES, 1994).

Para Oliveira (1985), a ginástica de Guths Muths compreendia variações de

exercícios corporais, sem nunca ir contra a natureza; incluía a ginástica entre os

deveres da vida humana como, por exemplo: movimentos básicos, conhecidos como

habilidades e capacidades físicas (andar, correr, saltar, saltitar, rolar, trepar) e, sob

este aspecto, muito lembrava os princípios da educação grega.

No início do século XIX, surge uma preocupação com o corpo da

mulher, tanto no seu sentido estético como de saúde, pois ela é quem gera os ‘filhos

da pátria’ (MENEGHETTI, 2003). A ginástica deveria ser ministrada como meio

educativo fundamental da nação, incluindo as mulheres alemãs, difundindo pelo país

cuidados higiênicos com o corpo e com o espaço onde se vive.

De acordo com Soares (1994), os idealizadores da ginástica na

Alemanha utilizaram-se das teorias pedagógicas de Rousseau, Basedow e

Pestallozzi, teorias estas que justificam a idéia de formar o ser humano completo

(universal), nas quais o exercício físico ocupa lugar destacado.

Apesar de seguir preceitos altamente militares, Friederich Ludwing

Jahn também faz uso das idéias dos pedagogos liberais. Tinha como lema para a

educação do povo ‘viver quem pode viver’ (OLIVEIRA, 1985), acreditando que, para

formar o ‘ser humano total’, a ginástica deveria envolver desde os jogos até as lutas.

Em suas formulações práticas para a execução dos exercícios físicos, Jahn cria

obstáculos artificiais, que mais tarde serão denominados aparelhos de ginástica.

Oliveira (1985, p.07), relata que “se Guts Muths e Jahn preocuparam-

se com os exercícios destinados às massas, Adolph Spiess preocupa-se com a

ginástica nas escolas”, e ainda, segundo o mesmo autor, Spiess tem o mérito de ser

um dos maiores estimuladores da Educação Física feminina. Assim como Basedow,

Spiess propõe que um período do dia seja dedicado ao exercício físico.

Com a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, o sentimento

de derrota foi utilizado por idealizadores nacionalistas como Janh para levar jovens à

prática de atividades gímnicas individuais, aumentando e melhorando suas

116

capacidades físicas para, quem sabe, uma próxima guerra. A ginástica de massas,

ou a que era utilizada nas escolas para estes jovens, tratava de uma ginástica de

repetição bastante disciplinada assemelhando-se a um treinamento para soldados.

A Escola Francesa

Na França – como na Alemanha – também existiam preocupações com

o corpo, com a moral e o patriotismo: “a ginástica integra a idéia de uma educação

voltada para o desenvolvimento social, para o qual são necessários homens

completos: todo cidadão tem direito à educação” (OLIVEIRA, 1985, p. 09 – grifo do

autor). É nesta perspectiva que a ginástica será organizada não somente para

militares, mas também para toda a população, colocando-se como uma prática

capaz de contribuir para a formação integral do ser humano.

A ginástica na França desenvolveu-se na primeira metade do século

XIX, baseada nas idéias dos alemães Jahn e Guts Muths, contendo desse modo,

além das preocupações básicas com o corpo anátomo-fisiológico, um forte traço

moral e patriótico, e seu fundador Francisco de Amoros y Ondeaño, vai estruturá-la

sob forte característica militar, o que a afasta da escola.

Oliveira (1985) e Publio (2002) identificam que a ginástica criada por

Amoros, apesar de aspectos militares, reflete influências que podem ser definidas a

partir de uma variada fórmula, considerando-a uma ginástica utilitária (Rabelais),

com intenção pedagógica (Guths Muths), acrobática (Jahn) e atrativa (Pestalozzi).

Amoros acreditava que além das qualidades físicas, psicológicas e

morais, a ginástica também poderia alcançar a saúde, prolongar a vida e resultar em

um melhoramento da espécie humana, criando indivíduos fortes e aumentando a

riqueza e a força deste e do Estado, sem alterar a ordem política, social e

econômica. Oliveira (1985, p.09) registra ainda que o slogan da ginástica na Europa

do século XIX, adotado especialmente pela França era, “da flexão muscular ao

sucesso nas lutas industriais e nas guerras”.

Amoros, segundo Soares (1994), imbuído de ideais patrióticos e

morais, criou um método de ginástica bastante semelhante ao de Ling na Suécia –

117

que teve desenvolvimento simultâneo. Sua ginástica, de acordo com a finalidade,

poderia ser: civil e industrial, militar, médica e cênica ou funambulesca.

A partir de 1850, a ginástica amorosiana integrará os currículos de todas as escolas primárias e será obrigatória para as escolas normais, mesmo sem contar com pessoal capacitado para ministrar as aulas, que eram dadas por sub-oficiais do exército, absolutamente despreparados do ponto de vista pedagógico e científico (LANGLADE; LANGLADE apud SOARES, 1994, p.64).

A autora ainda escreve que “a partir dos trabalhos de Amoros, ocorre

um crescente envolvimento de estudiosos da biologia, da fisiologia, assim como de

médicos em torno da problemática do exercício físico”. Foram os estudos destas

áreas que contribuíram para elevar o nível dos exercícios físicos na França, sendo o

valor higiênico e o conteúdo fisio-anatômico sempre ressaltados.

Esses estudos, como afirma Oliveira (1985), deram origem a um

movimento de sistematização dos exercícios físicos na França que se pautou pelo

conteúdo médico-higiênico, e cujos representantes são George Demeny, Philipe

Tissié, Fernand Lagrande e Esteban Marey. Os trabalhos de Demeny e Tissié serão

bastante citados no Brasil por Rui Barbosa e Fernando de Azevedo ao defenderem

as bases científicas da Educação Física e a sua inclusão na escola.

Nos escritos de Soares (1994), Demeny era biólogo, fisiologista e

pedagogo, e acreditava que a Educação Física deveria abandonar procedimentos

empíricos e inspirar-se em leis físicas e biológicas para construir uma doutrina a

partir de resultados de experiências feitas com o auxílio do método científico.

Demeny apresenta em seus trabalhos também a preocupação com a mulher em que

“seus estudos sobre o movimento arredondado, contínuo e também o ritmo,

influenciados pela dança, fizeram-no trabalhar com a ginástica feminina” (SOARES,

1994, p. 66). Demeny desenvolve um trabalho muito diferenciado do método sueco

de Ling, cuja característica central eram os movimentos analíticos.

Assim, Soares (2000, p.57-58) coloca que os estudos de Demeny

auxiliam virtuosamente o desenvolvimento da ginástica, pois na segunda metade do

século XIX “quem ensina ginástica deve ter uma competência afirmada”; a partir

dessa nova compreensão de ginástica, advinda das sistematizações européias, é

118

que se permite “inscrevê-la como constitutiva da mentalidade científica, pragmática e

prática que se consolida ao longo do século XIX”.

A Escola Sueca

Voltada à extinção dos vícios da sociedade, a sistematização da

ginástica na Suécia ocorre no início do século XIX, concomitantemente à Escola

Francesa. Segundo Oliveira (1985), pretendia-se que a ginástica colaborasse para

elevar a moral do povo sueco, já que conforme o autor, a ginástica sueca possuía um

caráter racional e científico. Ling, criador do método sueco, propõe além da

regeneração do povo, a fixação do nacionalismo “para formar homens de bom

aspecto que pudessem preservar a paz na Suécia” (SOARES, 1994, p.57).

Seu método representa um avanço do ponto de vista da sistematização

da ginástica no plano mundial. Isso porque é o primeiro que toma por base a ciência,

deduzindo de uma análise anatômica do corpo que pratica uma série racional de

movimentos de formação (SOARES, 1994). Para Marinho (s.d.) o sistema de Ling

inspirou-se essencialmente na ginástica dos gregos e nos princípios filosóficos que

constituíam a sua base, adaptando-se às exigências da educação moderna. De

acordo com Oliveira (1985), Ling preocupou-se com a execução correta e perfeita

dos exercícios, emprestando-lhes um espírito corretivo, como já o havia feito

Pestalozzi.

Marinho (s.d.) constata que Ling considerava que a sua ginástica

poderia ser dividida em quatro partes, de acordo com os diferentes fins visados.

Assim, ela poderia ser: ginástica pedagógica ou educativa; ginástica militar; ginástica

médica e ortopédica; e ginástica estética.

Dessa forma, Soares (1994, p.60) conclui que o método sueco, por ser

um método de ginástica pautado na ciência com fins não acentuadamente militares,

ao contrário, mais pedagógicos e sociais, “será utilizado sempre que as nações se

encontrarem em paz”. O fato de apresentar uma base científica, a partir da anatomia

e da fisiologia, desperta o interesse dos meios intelectuais, que acabam justificando,

seja pelo idealismo ou pela razão a necessidade de sua prática.

119

A Influência das Escolas Ginásticas no Brasil

Como se observou, as escolas ou métodos ginásticos apresentaram

indiscutível importância para a configuração da ginástica no mundo, inclusive para a

introdução e desenvolvimento da ginástica no Brasil.

Marinho (s.d.) relata que a implantação da ginástica alemã no Brasil

ocorreu na primeira metade do século XX, tendo como principal fato de sua

introdução o grande número de imigrantes refugiados da guerra que se instalaram

no país e que tinham como hábito essa prática corporal. E, simultaneamente, como

forma intencional de elevação do contingente do exército brasileiro, Goellner (1992)

destaca que foram contratados por Dom Pedro II soldados mercenários para esta

função, que tinham como prática os ensinamentos da ginástica alemã.

Segundo Soares (1994, p.56) “esse contingente populacional de

origem alemã cria inúmeras sociedades de ginástica com as características básicas

traçadas por Jahn, Guts Muths e Spiess”.

Aproximadamente em 1860, por não ter um método próprio, o exército

brasileiro passa a utilizar o método alemão e este permanece oficial na Escola Militar

até o ano de 1912, quando então é substituído pelo método francês (SOARES,

1994). Apesar de não fazer mais parte da força militar brasileira, Goellner (1992)

afirma que o método alemão perdurou de forma hegemônica nas escolas brasileiras

até aproximadamente 1920.

Soares (1994, p.57) aponta que o método alemão, mesmo aprovado

pela população para ser inserido nas escolas, acabou sendo combatido deste

espaço por Rui Barbosa, “preferindo que as mesmas adotassem o método sueco”.

Goellner (1992) assinala que o método alemão a princípio, vai sendo

substituído pelo método sueco, primeiro entre os militares e depois na sociedade

civil, chegando à escola. Mas, segundo a autora “[...] na realidade, o método sueco

no Brasil, sustentou os mesmos objetivos que o método alemão e que estavam

ligados ao fortalecimento da raça e à consequente preparação do indivíduo

necessários à produção” (p.121).

Com isso, este espaço destinado à ginástica no Brasil, “acabou sendo

ocupado de forma mais efetiva pelo método francês que não apenas popularizou-se

120

no país como ainda foi adotado oficialmente e, mais que isso, tornou-se obrigatório

para todas as instituições de ensino” (GOELLNER, 1992, p.121-122).

A colonização que iniciou no Rio Grande do Sul, por intermédio militar,

espalhou sementes durante um longo tempo, vendo em 1951 a oficialização da

ginástica olímpica, com as Federações do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São

Paulo. Sobre o assunto, CBG (2008, s/p) destaca que em 1951 “[...] as atitudes

consolidaram os fatos que proporcionaram as maiores mudanças”. O docente 1

confirma estes dados ao relatar que quando entrou na esfera da ginástica, antes da

década de 1960, “só competiam três estados, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e

São Paulo, que eram os três filiados da Confederação Brasileira de Desportes na

época”.

Foi neste ano que a ginástica, filiou-se à Confederação Brasileira de

Desportos (CBD), realizou o primeiro campeonato brasileiro em São Paulo e o Brasil

filiou-se à Federação Internacional de (FIG).

Sem qualquer dúvida estes fatores alavancaram uma nova época, e a família recebeu outras notáveis personalidades, que aceleraram o desenvolvimento como a professora Ilona Peuker, uma húngara, responsável pela introdução e propagação da ginástica moderna, hoje denominada G.R.D. (ginástica rítmica desportiva). (CBG, 2008, s/p)

Ainda segundo a CBG (2008), o crescimento da ginástica se

concretizava a cada ano, com um incansável e determinado trabalho realizado entre

1951 e 1978. Foram inúmeras conquistas, que levaram centenas de pessoas

envolvidas a acreditar no desenvolvimento das manifestações gímnicas no país. Tal

desempenho acabou culminando na criação uma entidade especializada (a CBG),

para que as atividades englobadas pudessem adquirir uma identidade própria.

Com essa progressão, a ginástica, extremamente abrangente em suas

manifestações como pode ser constatado, necessita, em caráter mundial, de uma

melhor organização. Com isso, cria-se a Federação Internacional de Ginástica que

será descrita na sequência. Além disso, a ginástica começa a constituir esferas,

algumas semelhantes, outras com extrema disparidade conformando seus campos

de atuação que serão apresentados posteriormente.

121

4.2. A Federação Internacional de Ginástica

A FIG – Federação Internacional de Ginástica – é originária de uma

Federação anteriormente criada na Europa em 1981, a FEG – Fédérations

Européennes de Gymnastique (Federações Européias de Ginástica) – composta por

França, Bélgica e Holanda. Em 1921, quando os primeiros dezesseis países não

europeus foram admitidos na entidade, a FEG tornou-se a atualmente conhecida

FIG. O primeiro país a de fato integrar a nova Federação foram os Estados Unidos.

Apesar de reconhecida pelo Comitê Olímpico Internacional desde 1896, a FIG só

participou como federação oficial de ginástica nos Jogos Olímpicos de Londres em

1908 (SOUZA, 1997).

Hoje, a FIG é responsável por algumas das mais representativas

modalidades que envolvem ginástica, bem como auxilia na construção de regras e

calendários de competições utilizados por essas modalidades quais sejam: ginástica

artística masculina, ginástica artística feminina, ginástica rítmica, ginástica aeróbica,

ginástica acrobática, trampolim acrobático e também a ginástica geral, que não entra

no calendário de competições, pois tem na FIG, como principal característica a não-

competitividade.

A estrutura da FIG é bem organizada e composta por federações de

todo o mundo, seja a nível afiliado ou associado, em um total de 129 membros. Ela

está subordinada diretamente ao Comitê Olímpico Internacional (COI) e, atualmente,

possui sua sede em Moutier, na Suíça, tendo como presidente Bruno Grandi.

Apesar da existência de um órgão de tamanha abrangência como é a

FIG, as manifestações ginásticas possuem uma adversidade de objetivos e fins

específicos. Tais manifestações, resultam em ampla flexibilidade de aplicação, não

conseguindo ficar restrita às modalidades e atividades que esta Federação

compreende. Assim, as atividades gímnicas se difundiram pelo mundo de tantas

outras maneiras compondo os já citados campos de atuação diferenciados, que não

fazem parte da FIG em sua totalidade.

122

4.3. Campos de Atuação da Ginástica

A partir do contexto histórico de desenvolvimento da ginástica e de sua

atual organização, é possível observar que a abrangência desta ainda é ampla,

como designado, comportando diferentes esferas de movimentações corporais e,

segundo Souza (1997, p.25):

[...] o estabelecimento de um conceito único para ela, restringiria a compreensão deste imenso universo que a caracteriza como um dos conteúdos da Educação Física. Esta modalidade no decorrer dos tempos tem sido direcionada para objetivos diversificados, ampliando cada vez mais as possibilidades de sua utilização [...].

Souza (1997) apresenta uma divisão para demarcar o amplo

universo da ginástica e melhor compreendê-lo. Nele são apresentados cinco

grandes grupos que englobam os principais campos de atuação da ginástica. Dentro

destes campos de atuação a autora também exemplifica as modalidades que os

constituem.

I) Ginásticas de Condicionamento Físico – fazem parte todas as

ginásticas que objetivam adquirir ou manter a condição física do indivíduo.

Dentro deste campo tem-se: ginástica localizada, musculação, step, ritmos, etc.

– são exercícios de repetição com ou sem peso adicional, com ou sem

aparelhos, atuando sobre um ou mais músculos, aumentando ou mantendo a

capacidade aeróbica e/ ou anaeróbica do indivíduo.

II) Ginásticas de Competição – são todas aquelas que possuem códigos

e regras, nos quais o objetivo a ser alcançado é a vitória. As ginásticas

competitivas são:

�Ginástica Artística – com utilização de aparelhos, seis no masculino e

quatro no feminino, e para a contagem das notas são considerados:

dificuldade, combinação, originalidade e execução dos elementos;

�Ginástica Rítmica – é uma ginástica que já fora exclusivamente

feminina, mas hoje já existe a prática da modalidade por indivíduos do

sexo masculino, embora não faça parte da FIG. Envolve movimentos de

123

expressão corporal com ritmos variados e manipulação de cinco

aparelhos, quais sejam: corda, arco, maça, fita e bola;

�Ginástica Acrobática – também conhecida como Acrobacia, e apesar de

muito desenvolvida no século VII, devido à criação do circo, ela é uma

modalidade relativamente jovem, dividida em masculino, feminino e

mista, podendo ser trabalhada em duplas, trios ou quartetos;

�Ginástica Aeróbica – também utilizada como condicionamento, foi

recentemente incluída dentro da esfera competitiva, podendo ser

masculina, feminina ou mista, realizada em duplas, trios ou grupos;

�Trampolim Acrobático, Tumbling e Duplo-mini (mini-trampolim) – são

também modalidades novas no contexto esportivo. Estes trampolins

podem propulsar tão alto os atletas treinados, que estes chegam a até

trinta pés durante as performances, que exigem demonstrações

sequenciais de saltos ginásticos e acrobáticos, podendo ser realizados

individualmente ou em grupo, de forma sincronizada.

III) Ginásticas Fisioterápicas – utilizam o exercício físico para prevenção

e tratamento de doenças, e também auxilia na recuperação de lesões. São as

mais utilizadas: reeducação postural global; cinesioterapia; isostreching; dentre

outras.

IV) Ginásticas de Conscientização Corporal – reúnem as novas

propostas de abordagem do corpo, também conhecidas como técnicas

alternativas ou ginásticas suaves (Souza apud Souza, 1997). Estes tipos de

ginásticas, pelo menos grande parte, tiveram sua origem na busca da solução

de problemas físicos posturais. Fazem parte deste campo: ginástica holística;

anti-ginástica; eutonia; método feldenkrais; bioenergética; e outras.

V) Ginástica de Demonstração – a principal característica deste tipo de

ginástica é o fato de não ser competitiva, se preocupando mais com a interação

social entre os indivíduos. A ginástica geral é a única representante deste grupo

englobando várias atividades como: as modalidades oficiais de ginásticas

competitivas, a dança em seus aspectos coreográficos expressivos e pode ser

realizada com ou sem aparelhos/materiais.

124

Inserido neste vasto contingente de ginásticas situa-se o objeto de

estudo dessa pesquisa – a ginástica artística – que, como qualquer outra

modalidade ou atividade ginástica, possui suas particularidades, que são destacadas

a seguir.

4.4. Ginástica Artística

A ginástica artística, mesmo sendo fruto de uma prática antiga que é a

ginástica, ainda não completa dois séculos entre as derivações desta prática. É

entre as modalidades esportivas/competitivas de ginástica a mais antiga. Como já

mencionado, Nista-Piccolo (2005, p.30) versa que “[...] a GA, ainda não apresenta

no Brasil, trabalhos de aprofundamento científico que possam gerar reflexões sobre

a prática existente atualmente”. Corroborando esta afirmação, o Docente 4 destaca

que por mais que a ginástica artística tenha alavancado em âmbito acadêmico ainda

falta “a parte científica, estudos científicos que embasem o desenvolvimento do alto

rendimento dos atletas [...] e a associação das duas coisas, da universidade

chegando lá ao alto rendimento”. Em contrapartida o Docente 2 afirma que “não

existe só a possibilidade de pesquisa na área da biomecânica, da fisiologia, do

treinamento esportivo, que é a grande maioria dos trabalhos, existem n

possibilidades”.

Estas afirmações tratam de dificultadores para o desenvolvimento

deste estudo, pois há escassez de bibliografia sobre a modalidade no contexto da

pesquisa qualitativa, voltado especialmente às ciências humanas. Partindo de tais

premissas este estudo apresenta-se como uma opção que pode vir a somar o

material teórico/científico sobre a modalidade no âmbito da pesquisa qualitativa.

A ginástica artística, também conhecida no Brasil por ginástica

olímpica, é uma modalidade de ginástica em que os atletas realizam um conjunto de

exercícios em aparelhos oficiais. Os movimentos dos ginastas devem ser elegantes

e demonstrar força, agilidade, flexibilidade, coordenação, equilíbrio e controle do

corpo. É uma modalidade que na visão do Docente 3, “já tem codificado o tipo de

habilidade que deve ser ensinada, por isso as habilidades que constituem a

ginástica artística são classificadas como habilidades altamente estruturadas, que

125

têm formas específicas de serem executadas”, assim como, segundo o Docente 2 a

modalidade “tem alguns aparelhos, ela tem uma motricidade já muito bem definida,

estabelecida por um código de regulamentação, [...] e ela tem uma estética própria,

um jeito, uma técnica corporal própria”.

Tais apontamentos remetem ao tipo de técnica que a modalidade

apresenta e que pode ser um problema para sua aplicação efetiva nas escolas,

como aponta o Docente 7: “a modalidade de ginástica artística é um esporte difícil

de ser praticado por conta dos seus próprios movimentos, os movimentos são

complexos [...] e isso na escola eu não acredito que seja possível”.

Os aparelhos de ginástica artística masculina (GAM) são diferentes dos

aparelhos de ginástica artística feminina (GAF). Os aparelhos masculinos são: solo,

salto sobre a mesa, cavalo com alças, barras paralelas, barra fixa, argolas, e

procuram demonstrar a força e domínio do ginasta. Os aparelhos femininos são:

trave de equilíbrio, solo (com música), salto sobre a mesa, barras paralelas

assimétricas, e colocam maior ênfase nas vertentes artística e de agilidade.

Todas as competições oficiais de ginástica artística são reguladas pela

FIG, que estabelece as normas e calendários para os eventos internacionais. As

competições nacionais são geralmente regulamentadas pela CBG – Confederação

Brasileira de Ginástica – e pelas federações estaduais. A FIG tem ainda a

responsabilidade sobre o código de pontuação – publicação que orienta os ginastas,

técnicos e árbitros na elaboração, composição e avaliação das séries em todas as

provas, e que rege os resultados da modalidade. O código de pontuação tem um

ciclo de quatro anos sendo modificado após cada edição dos Jogos Olímpicos.

A FIG impõe um limite mínimo de idade para competições oficiais de

nível sênior de dezesseis anos. Este limite, importante, sobretudo nas provas

femininas, pretende impedir a entrada de ginastas pré-adolescentes em competição,

o que pode implicar em especialização esportiva precoce.

A ginástica artística está presente nos Jogos Olímpicos da era

moderna desde a sua primeira edição em Atenas 1896 e nos Jogos Pan-Americanos

desde 1951 em Buenos Aires. E, como já mencionado, é a FIG a responsável pela

organização do campeonato mundial de ginástica artística e pela copa do mundo de

126

ginástica artística, realizada em várias etapas. Existem diversas outras competições,

em nível continental, nacional e regional, organizadas com o auxílio, no Brasil, da

CBG e federações estaduais.

Para a obtenção do resultado completo de um campeonato de

ginástica artística os ginastas devem participar de quatro competições, cada uma

delas com características e objetivos próprios, sendo assim denominadas:

Competição I (qualificatória), Competição II (final individual geral), Competição III

(final individual por aparelho) e Competição IV (final por equipes).

4.4.1. Ginástica Artística na Educação Física Escolar

Nista-Piccolo (2005, p.30) descobriu em trabalhos realizados com

crianças que

[...] quanto mais a criança era estimulada para a aprendizagem dos elementos de G.A., mais enriquecia o vocabulário motor, mais ampliava suas possibilidades de ação motora, conseguindo executar um número cada vez maior de habilidades específicas.

A autora afirma que tal aprendizado, em que uma criança vivencia a

ginástica artística, o domínio do corpo pela criança é ampliado, podendo auxiliar

inclusive na melhora de outras habilidades específicas das quais ela faz uso em seu

cotidiano. Todos os docentes entrevistados corroboram as afirmações da autora

quando, de forma direta ou indireta, apontam que a ‘ginástica’ proporciona,

principalmente, amplo repertório motor. Dentre eles destacam-se as falas do

Docente 9 para o qual “nada melhor do que a gente pensar em desenvolvimento

motor global e se na ginástica a gente tem algumas dessas características [...]

porque não então a gente reforçar essa ideia da ginástica artística”. O Docente 11

que observa a ginástica artística como “um esporte básico que desenvolve uma

série de qualidades físicas, e psicológicas e sociais que são importantes para

qualquer criança, isso tanto vale na escola como em qualquer outro local”. Ainda o

Docente 12 que vê a modalidade como uma excepcional contribuição “para o

desenvolvimento motor das crianças, esse é o enfoque eu acho, essa é a razão da

qualidade,(...) da vantagem de se ensinar ginástica na escola”.

127

Assim, é possível perceber que o leque de atividades que pode ser

realizado por intermédio da ginástica artística tende a facilitar o desenvolvimento dos

alunos em diferentes e variados aspectos – de capacidades e habilidades físicas,

motoras, cognitivas, espaço-temporais, sócio-afetivas, inter e intrapessoais, etc.

Nista-Piccolo (2005, p.32) compreende a ginástica artística como sendo:

[...] composta por elementos considerados fundamentais para o desenvolvimento motor do ser humano, tais como o rolar, o equilibrar-se, o saltar, o girar, entre outros. Aprender a executá-los, combinando-os em seqüência de movimentos, facilita o aprimoramento das capacidades físicas mais complexas e amplia as possibilidades de desempenho de habilidades motoras.

Elias e Scotson (2000, p.87) escrevem que “determinar a estrutura do

não-saber humano através das palavras de seres humanos que já detêm o saber

não é tarefa fácil”. A partir dessa colocação fica fácil entender que, apesar de

autores aqui citados e os docentes do estudo visualizarem a ginástica artística com

tantas possibilidades, diante das quais a julguem conteúdo essencial para ser

ensinado na escola, talvez estes estejam numa condição de não saber em relação à

realidade atual das escolas. O complicador seria a condição de não saber dos

docentes e autores em relação a esta realidade, muitas vezes bastante distanciada

da realidade deles, camuflada pelos saberes que eles detêm no que diz respeito à

modalidade. Tais saberes – dos docentes e de autores – seriam ingenuamente

considerados conhecimentos ímpares capazes de ultrapassar, na visão de seus

detentores, inclusive o estado de prática real que o futuro professor irá enfrentar.

Em relação à realidade escolar, foram criados alguns documentos de

bases legais para auxiliar e/ou orientar os professores em sua atuação escolar

diante dos conteúdos a serem ensinados. Alguns documentos como Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCNs) – elaborados pelo Governo Federal a partir de

orientações da LDB 9394/96 – e Caderno do Professor – uma iniciativa da

Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, implantado no ano de 2008 –

trazem em seus conteúdos, fazendo referência a este estudo especificamente, a

ginástica e a ginástica artística para serem ministradas nas aulas de Educação

Física escolar nos diferentes ciclos de ensino.

128

Nos PCNs designando-se aos níveis de ensino primeira a quarta série

(BRASIL, 1997), quinta a oitava série (BRASIL, 1998) e ensino médio (BRASIL,

2000), as orientações são muito simples e abrangentes em relação à ginástica. E só

em Brasil (1998, p.97), é que a ginástica artística – que faz parte das ginásticas de

competição/esportivas – aparece melhor definida:

Construção do gesto na ginástica:

* vivência de situações em que se faça necessário perceber, relacionar e desenvolver as capacidades físicas e habilidades motoras presentes na ginástica esportiva e acrobática (estrelas, rodantes, mortais etc.);

* compreensão e vivência das situações em que estejam presentes os aspectos relacionados à repetição e à qualidade do movimento na aprendizagem do gesto ginástico, tanto no que se refere às acrobacias como à criação de seqüências de exercício com e sem material (espaldar, barra fixa, corda, exercícios em duplas, trios etc.). (grifo nosso)

Trata-se de uma humilde citação, tendo em vista que é um documento

apenas de ‘orientação’, porém a partir dela e das generalidades com que a ginástica

e a ginástica artística inserida dentro dela, são destacadas nesses documentos, é

possível refletir sobre a colocação do Docente 2 a respeito da modalidade na escola:

[...] eu defendo que o que se vai trabalhar na escola, não é a ginástica artística e sim ginástica (...) existe um repertório motor básico da ginástica que serve para qualquer uma das ginásticas que é o que a gente ensinaria na escola independente do adjetivo, do sobrenome dessa ginástica [...] alguns autores franceses vêm há muito tempo defendendo, que na escola é o lugar da ginástica e não da ginástica artística, ginástica rítmica e não sei o que, enfim, e eu sou bastante favorável nesse sentido (...) ou seja, se eu der para ela [a criança] ou, oferecer um conhecimento básico da ginástica na escola, mesmo que seja um pouquinho de cada uma das séries escolares, com certeza ela vai ter a oportunidade e a possibilidade de praticar o que ela achar mais conveniente para ela, ou seja, não fecho, eu abro um leque de possibilidades para ela [...] e eu sei que muita gente que fala ‘ah, eu dou aula de ginástica artística na escola’, não dá aula de ginástica artística, dá aula de ginástica, porque nem tem os aparelhos, muito menos a pretensão de dar aula de ginástica artística.

A alternativa que o Docente 2 aponta, além de diferenciada, pode ser

uma possibilidade para a ‘ginástica’ na Educação Física escolar, inclusive se

considerada diante do que Impolcetto et al. (2007, p.91) aponta. Para os autores, da

forma que são proporcionadas hoje, as ginásticas e a ginástica artística, dentre

outras manifestações corporais, “quando comparadas ao conteúdo esporte, não têm

atualmente nas aulas de Educação Física escolar a mesma importância”. Para tanto,

129

a ginástica artística inserida de outra maneira na escola pode ser uma alternativa

para sua adaptação no espaço escolar com aderência de professores e alunos.

Além disso, o Docente 3 alerta para o fato de que

[...] se deve ter presente que a ginástica é apenas uma porcentagem do conteúdo que o professor tem que ensinar no âmbito da Educação Física escolar. Tem muitos outros conteúdos que são concorrentes e que têm o mesmo direito de ser vistos, ou seja, o aluno tem direito a que lhe ofertem todos os conhecimentos da cultura corporal.

Os conteúdos da Educação Física escolar, por serem muitos e os

professores não serem preparados para ministrá-los, acabam configurando uma

espécie de tensão na atuação do professor. Diante de sua função como educador, o

professor deve proporcionar aos alunos todos os conhecimentos necessários frente

à prática da atividade física, bem como esmiuçá-los no intuito da formação do

indivíduo crítico que fará uso destes conhecimentos. Porém, estando na condição de

não saber em relação a muitos conteúdos, bem como perante as dificuldades de

aplicação de sua prática, o professor acaba optando pelos conteúdos que adquiriram

maior monopólio de poder no interior da escola (e na mídia), o que não significa que

estes conteúdos sejam os únicos, tão pouco que sejam os mais adequados.

Legitimando a conclusão acima e as colocações que Impolcetto et al.

(2007) apontaram anteriormente, dentre as quais a falta de conhecimentos, tanto de

alunos quanto de professores, para a compreensão da modalidade são

dificultadores de sua aplicação na escola, alguns dos docentes entrevistados

colocam em evidência o professor e sua atuação na escola. O Docente 4 tem claro

que “o problema maior das escolas são os professores”. Já o Docente 5 evidencia

que “o problema é o profissional ter vontade de trabalhar e desenvolver um

trabalho”. Para o Docente 6, o problema estaria na “própria segurança do professor

(...) se o professor que está lá conhece, sabe o que está fazendo, ele vai ter uma

maneira diferenciada de transmitir para o seu aluno”.

No estudo de Nista-Piccolo (1988), bem como em outros já citados,

realizados por Barbosa (1999), Souza (2001), Schiavon (2003), Nista-Piccolo (2005),

os autores alegam ser a obtenção e instalação permanente de materiais e aparelhos

caros e de grande porte, a maior dificuldade, citada por professores, em se ensinar a

ginástica artística nas aulas de Educação Física escolar. Alguns relatos dos

130

depoentes deste estudo, além do envolvimento e conhecimento do professor em

relação à ginástica artística, trazem exatamente a importância da

aparelhagem/material como motivo da ausência da modalidade na escola. O

Docente 1 afirma que “o maior problema aqui no país realmente é aparelhos bons

pra você dar aula e professores bem formados”. Os Docentes 7 e 8 compartilham

com essa idéia. Já o Docente 11 alega que “depende muito da vontade do professor

trabalhar com isso e ter o mínimo de apoio da direção da escola para criar um

ambiente, um local adequado”. E, por fim, o Docente 12 diz: “Olha, o impedimento é

sempre a falta dos aparelhos e de um local apropriado (...) agora eu vou abrir um

parênteses (...) se o professor tem criatividade, ele pode trabalhar com uma escola

que não tenha aparelhagem, eu trabalhei assim”.

Em relação à questão de aparelhos/materiais Nista-Piccolo (2005,

p.35) afirma que “é importante que o professor não faça desse motivo um

impedimento em proporcionar aos seus alunos a oportunidade de participar das

experiências motoras que a G.A. pode oferecer ao seu desenvolvimento”. O

professor de Educação Física na escola pode e deve criar, bem como improvisar!

Schiavon (2003; 2005) realizou estudos sobre materiais alternativos de

baixo custo e de fácil montagem para o ensino de ginástica artística na Educação

Física escolar. A autora alega que para a ampliação do acesso à ginástica artística

entre as crianças, a melhor alternativa é inserir a modalidade no contexto das

escolas, por isso idealiza materiais e faz um estudo acerca da utilização destes.

Os Docentes 3, 11 e 12, especialmente, fazem ressalvas a respeito do

uso de materiais e espaços alternativos durante todo o depoimento oral, fazendo-se

entender que é amplamente possível o trabalho da modalidade na escola, mesmo

que esta não possua equipamentos/materiais oficiais. Dentre suas falas estão:

Por exemplo, eu na escola, utilizaria cordas para balanceios, para intercâmbio de balanceios, barras horizontais, barras verticais, utilizando a infra-estrutura do ambiente que a escola dispõe, na escada, nas grades, nos corrimãos, por exemplo, nas rampas para fazer aí atividades. Tentaria ser altamente criativo, não um professor que não quer ensinar (D.3).

[...] como eu pratiquei ginástica na escola, e mesmo em clube numa época que não havia as condições que hoje tem, eu sei que é possível desenvolver o que a gente desenvolve aqui, quase tudo sem aparelhagem, quer dizer, a gente constrói o colchão, a gente faz uma barra de jardim, a

131

gente monta uma trave, um plinton qualquer marceneiro constrói e isso que é importante pra gente (D.11)

[...] eu dei ginástica de solo no gramado da escola [...] para salto de cavalo, se você não tem um plinton ou cavalo, você pode aproveitar carteira velha [...] põe um colchão em cima, pronto, você já tem um obstáculo para fazer salto; trave de equilíbrio você pode dar (...) num banco sueco ou então, eu cheguei a dar em (...) como é? Em muretinha, baixinha de canteiro de jardim, sabe, coisas desse tipo [...] Então, se o professor tem criatividade, ele pode trabalhar com uma escola que não tenha aparelhagem, eu trabalhei assim. (D.12)

A questão material, amplamente destacada por todos os docentes,

poderia ser para a Educação Física escolar indiferente se a pretensão nas aulas

fosse a de vivência. Porém, a necessidade dos equipamentos (às vezes até como

‘pretexto’ para não se ensinar a modalidade), já alcançou nos modos de

pensamentos dos indivíduos posições de discursos denotados como “verdadeiros,

racionais ou lógicos” (ELIAS, 1970, p.19), ou ainda tornam-se, nas palavras do

autor, ‘verdades absolutas’. Para uma reorientação desses modos de pensamento

duas opções poderiam surtir algum efeito ante a teoria do autor. Ambas já foram

mencionadas: o afastamento em relação à maneira como a ginástica artística é (ou

não) ministrada na escola, para observá-la de outra forma e assim propor uma

intervenção significativa; ou a proposta de mudança, que irá gerar conflitos até que

seja efetivada (ou não), no andamento de gerações e gerações.

Nesta linha de pensamento, pode-se entender como medida a uma

tentativa de reorientação do pensamento em relação aos conteúdos curriculares de

forma sequencial na Educação Física escolar – e a ginástica artística insere-se

nestes conteúdos – a introdução do documento de orientação ‘Caderno do

Professor’ – já citado. O Caderno é parte integrante da proposta curricular de 5ª a 8ª

séries do ensino fundamental – ciclos 3 e 4 e, do ensino médio. Os conhecimentos

expostos no Caderno são identificados e organizados por disciplina, série e

bimestre, tratando de orientações para a gestão de aprendizagem dos conteúdos.

No ‘Caderno do Professor’, estabelecido para o 3º bimestre da 5ª série,

são abordados dois temas a serem desenvolvidos e um deles é ‘Esporte Modalidade

Individual: Ginástica Artística’.

132

O tema ginástica artística começa com apresentação do histórico da

modalidade e com informações básicas sobre a mesma: posições básicas,

competições, provas e aparelhos, demais modalidades ginásticas e movimentos

característicos da ginástica artística (SÃO PAULO [Estado], 2008). O Caderno

apresenta o conteúdo da ginástica artística a ser desenvolvido na escola, dividido

em duas situações de aprendizagem: (1) ‘Conhecimento Declarativo sobre a

Ginástica’ – a modalidade no cotidiano dos alunos; exploração de movimentos;

gestos e movimentos da ginástica artística presentes nos jogos e brincadeiras de

rua. (2) ‘O Mundo em Diferentes Posições’ – os exercícios de solo e suspensão na

ginástica artística; associação dos movimentos com as regras da modalidade. Cada

uma destas situações de aprendizagem descreve quatro etapas, que seriam

possíveis atividades a serem desenvolvidas em aulas distintas (SÃO PAULO

[Estado], 2008, p.13-19).

Ao final do tema ginástica artística, o Caderno apresenta algumas

estratégias de avaliação e recuperação que tratam do reconhecimento do aluno

frente à modalidade, além de ‘Recursos para Ampliar a Perspectiva do Professor e

do Aluno para a Compreensão do Tema’ (livros, artigos, revistas e sites).

A maneira como é abordada a ginástica artística nesse documento traz

de forma resumida e simples algum conhecimento da modalidade com atividades

aparentemente coerentes com o atual espaço da Educação Física nas escolas

públicas, pois não há necessidade de material, bem como não requer um

conhecimento especializado do professor. Trata-se de uma proposta de vivência,

questão apontada pelo Docente 3 em seu relato:

Agora a função ou o espaço da ginástica artística no âmbito escolar é oferecer possibilidades ricas e diversificadas ao aluno para que ele queira continuar a realizar esta atividade (...) então, eu devo ter claro que na aula eu faço vivências e tento encantar os alunos com essas vivências que lhes permitam aplicá-las em diferentes situações (...) Então qual é o papel da escola? Vivência! [pesquisadora responde] Exato! (D.3)

Em perspectiva semelhante, o Docente 4 coloca que o professor de

Educação Física tem que “oportunizar a criança na escola dessas práticas, de virar

de ponta cabeça, de andar de ponta cabeça, de vivenciar isso do corpo da criança,

vi-ven-ci-ar isso!”

133

Koren (2004, p.57) também delega à Educação Física o trabalho com a

ginástica artística, devendo esta ser direcionada no contexto escolar com uma

coerente configuração educacional, para tanto afirma:

A ginástica artística é uma modalidade que possui amplo repertório de exercícios que podem ser executados através da combinação entre si. Dela fazem parte os mais diferentes tipos de ações motoras com uma técnica característica para cada movimento ou gesto. Seus elementos básicos de movimentação são essencialmente variados e, se tratados numa visão educativa, tornam-se fundamentais para as aulas de Educação Física escolar.

No enfoque dessa ‘visão educativa’, a autora faz referência ao lúdico

como direcionamento para a modalidade no âmbito escolar e assim também se

expressam a maioria dos docentes em seus relatos, que além do lúdico levantam

ainda a questão ‘desafiadora’ dos elementos gímnicos como fatores motivantes para

aulas que abordem a ginástica artística. A exemplo disso tem-se o docente 7 para o

qual a “criança aprende muito brincando através do lúdico, então eu posso brincar

de fazer rotação, de fazer apoio, de fazer suspensão, de fazer giro” . E, de forma

mais abrangente os Docentes 4 e 6 apontam que,

é esse desafio que a ginástica traz: ela é motivadora [...] a ludicidade, é uma facilitadora, é um instrumento de ação pedagógica, porque ele me facilita o acesso à criança [...] este desafio, quando é trabalhado de forma lúdica com a criança, em forma de brincadeiras, de alegria, de prazer, ele é muito bem direcionado e você consegue conduzir a criança a essa prática, seja ela gordinha, magrinha, com dificuldade, com facilidade. (D.4).

Olha, quando você está numa escola e você usa a ginástica para transmitir alguma coisa, você consegue muito mais do que numa aula normal, trabalhando com um jogo, ou com alguma outra atividade lúdica, mesmo você trabalhando com a ginástica em termos lúdicos [...] e o fator mais importante aí eu acho que é o benéfico da ginástica, é a motivação natural que ela traz para quem está praticando (D.6).

A ginástica artística, pelo que pode ser observado deveria fazer parte

dos conteúdos a serem ministrados na Educação Física escolar. No entanto, muitos

alunos passam pela sua vida escolar sem terem conhecimentos básicos a respeito

da modalidade. Esse fato, em muitos casos, decorre por falta de conhecimento do

próprio professor de Educação Física em relação à ginástica artística, entre tantos

134

outros fatores que tornam deficitária a educação básica, especialmente de caráter

público.

Portanto, uma breve explanação da ginástica artística na formação

acadêmica, pode, sem dúvida, esclarecer um pouco do seu ensino – que sai da

universidade e chega (ou não) à escola – bem como embasar melhor suas

configurações atuais.

4.4.2. Ginástica Artística na Formação Acadêmica

As disciplinas pautadas em manifestações ginásticas estão presentes

na formação dos profissionais desde a primeira escola superior de Educação Física

do Brasil. Barbosa (1999, p.26) afirma que “no Brasil, antes mesmo que existisse

uma escola de 3º grau que formasse professores para tal função, a ginástica já era

obrigatória nas escolas”. A autora ainda coloca que a ginástica existe em formatos

variados nos currículos dos cursos de Educação Física.

Devido a sua histórica conceituação, que abarcou diversas práticas de

atividades físicas, a ginástica por muito tempo e, ainda hoje, serve apenas como

suporte nas aulas de Educação Física, sem ter para si um delineamento particular e

específico. Por ter configurado também um tipo de treinamento para a guerra, a

ginástica acaba levando consigo características de exigências e imposições militares.

A ginástica artística entrou no Brasil no século passado, sendo utilizada pelos militares que influenciaram diretamente a formação das escolas de ensino superior em Educação Física no Brasil, porém não como disciplina independente, mas sim como um conteúdo que faz parte de outras disciplinas. (BARBOSA, 1999, p.31)

Barbosa (1999) constata que atualmente as disciplinas relacionadas às

manifestações gímnicas possuem independência nos currículos, principalmente

aquelas que se desportivizaram – ginástica artística e rítmica. No entanto, sua forma de

aplicação na escola é sempre um apêndice para outras modalidades esportivas. Essa

visão de ‘apêndice’ pode ser observada nos relatos dos depoentes, quando a maioria

afirma que a ginástica artística (ou somente a ginástica) serve para a

realização/melhoria de outras atividades físicas/esportes: “é uma preparação física para

135

outras modalidades esportivas, para outras atividades” (D.5); “a ginástica pode ser

utilizada nos esportes como parte do treinamento de condicionamento físico” (D.10).

Barbosa (1999, p.36) ainda afirma que a ginástica “embora apareça

nos currículos dos cursos de licenciatura em Educação Física em variadas

manifestações gímnicas, esse conteúdo da cultura corporal é praticamente

inexistente no meio escolar”. E o Docente 2, corrobora o apontamento da autora

quando coloca que a “maioria das universidades continuam tendo (...) pelo menos

uma disciplina de ginástica, muitas têm duas, algumas têm três ou quatro, o

problema é o que se ensina e, de que forma se ensina” e continua “não é o fato de

se ter a disciplina que garante que ela vai ser ensinada fora”.

Um dos motivos pelo ‘mau uso’ da ginástica artística na escola ocorre

porque, na licenciatura em Educação Física, as disciplinas de práticas esportivas

usam abordagens essencialmente técnicas – como já colocado – e esse tipo de

formação contribui para determinar características de profissionais não

comprometidos com o processo educacional (OLIVEIRA, 1983). O problema, ao ser

observado na perspectiva de Elias (1998), é que um conhecimento com alta

coerência com a realidade – o tecnicismo da ginástica artística – passa a ser

aprendido pelas pessoas, desde a fase inicial de suas vidas, como algo óbvio.

Para o autor, em função das teorias positivistas tradicionais do

conhecimento suporem a existência de um conhecimento científico praticamente

ímpar, estas mantêm um nível de verdade universal que é difícil de ser ultrapassado.

Trata-se de uma fase, nos movimentos da relação envolvimento-alienação, na qual a

alienação permanece em vantagem.

Evidenciando um estado corrente de alienação frente à ginástica

artística, não é difícil entender que esta só irá fazer parte do planejamento escolar

de professores que tiveram experiências nessa modalidade, ou que possuem a

capacidade de um ‘distanciamento’ em relação a ela para observá-la com

possibilidades no espaço escolar.

A maioria dos docentes concorda que vai depender basicamente do

professor ter ginástica artística na escola ou não. Estar alienado ou envolvido

demais com os conhecimentos da modalidade que não serviriam para a escola, ou

136

ser capaz para distanciarem-se destes e construí-la na dinâmica do espaço escolar,

vai depender de cada professor individualmente! O Docente 4 afirma que, “se o

professor que passou por aquela escola entende de ginástica [...] sabe que é

importante ensinar a ginástica ele vai se preocupar com isso”. Já para o Docente 8,

o professor “tem que correr atrás, tem que se especializar, ele tem que vivenciar a

ginástica realmente, não só o que ele vê na faculdade”. O Docente 10 já visualiza

pelo lado da competência: “vai muito da competência individual de cada um e de

querer trabalhar com a modalidade também”.

Alguns eu tenho certeza que conseguiram, que trabalham com isso, alguns que nunca imaginaram que iam fazer ginástica artística acabaram caindo em lugares que tinham tradição disso e foram atrás e continuaram, mas também isso não tem só a ver com ginástica artística, acho que qualquer outro esporte, o professor sempre puxa um pouco a sardinha para o lado daquilo que gosta (D.11 – grifo nosso)

Porém, mesmo aqueles que a vivenciaram mais profundamente podem

não incluí-la nos conteúdos a serem ministrados, por visualizarem apenas o caráter

esportivo e trabalhoso que esta requer em termos de material, espaço físico e

cuidado com os alunos. Alguns docentes acabam por ‘reproduzir’ essa idéia, como

por exemplo, Docentes 1, 7, 8 e 12, que apontam em seus relatos que, entre outras

coisas, a maior dificuldade ainda é a aparelhagem e o espaço físico. “Para você falar

hoje de ginástica artística (...) eu preciso de aparelhagem ou, de pelo menos alguns

aparelhos que correspondam àqueles em que se pratica a modalidade” (D.7)

No entanto, tem-se em meio aos relatos, docentes que observam que a

introdução quase nula da ginástica artística na escola é advento mesmo da falta de

conhecimento por parte do professor: os Docentes 2, 9 e 10 defendem essa idéia, e

nas palavras de um deles:

Então, eu acho que em primeiro lugar é, às vezes, a falta de um conhecimento mais atual de Educação Física, não é nem de ginástica (...) volto a repetir o material é sempre muito importante para a gente andar mais rápido e às vezes andar melhor, mas não é ele que vai deixar a gente andar ou não (...) falta às vezes conhecimento das pessoas em poder trabalhar esses elementos básicos sem precisar pensar naquela ginástica de competição (D.9).

137

Nessa perspectiva – da ausência da ginástica na escola em que foram

colocados alguns motivos acima – o Docente 4 pontua que “a culpa também é

nossa, porque nós somos responsáveis pela formação”. Dessa forma, pode-se

pensar que a maneira como a ginástica artística vem sendo estudada pela Educação

Física não propicia ao futuro professor o conhecimento e a condição de saber,

necessários para introduzi-la em seus planos de aula.

Entendemos que a GA possui uma característica “estética”, inerente e significativa, que lhe garantiu em grande parte o sucesso adquirido ao longo dos tempos, trazendo o respeito e a admiração de muitos daqueles que tiveram oportunidade de observá-la, contudo, no presente ela está cada vez mais direcionada e impregnada de valores do caráter Objetivo (Técnico). (BORTOLETO, 2000, p.38)

Apesar de algumas evoluções no sentido de inserção de disciplinas

gímnicas, inclusive ginástica artística, nas grades curriculares dos cursos de

graduação, isso tem se mostrado insuficiente para a capacitação dos profissionais

(NISTA-PÍCCOLO, 2005). Reforçando essa ideia, Nunomura (2000) observou que os

cursos de graduação não oferecem subsídios suficientes para que os profissionais

possam desenvolver essa modalidade em seu ambiente de ensino. A maioria dos

docentes relata que o tempo de duração da disciplina é muito curto, além de outros

empecilhos, para que se possa formar a contento um professor que atue com uma

base bem fundamentada de ginástica artística. Entre os relatos cita-se o Docente 6

que ressalta que “esse mundo da ginástica é muito grande, então você não consegue

transmitir todos os conhecimentos em um semestre letivo com sessenta horas aulas”.

Já o Docente 8 refere-se ao espaço da disciplina no curso: “desde dezessete anos

para cá a Universidade I nunca deu condições para dar aula de ginástica artística [...]

era a maior briga, a gente cansou de pedir, de insistir”. O Docente 12, aponta um

problema e diz aborrecido que:

[...] existem as disciplinas chamadas ginástica, em que a pessoa vai dar Aeróbica, ginástica de academia, ginástica de formação corporal e ginástica artística junto, eu acho isso péssimo nos cursos de Educação Física (...) uma coisa é você fazer ginástica simples, pura e simplesmente para formação corporal, educação motora, ginástica corretiva, o que seja, e outra coisa é o esporte ginástica artística.

138

Um possível fator que contribui para esta situação é a formação, muitas

vezes equivocada, dos discentes de licenciatura (futuros professores), devido à

visão tecnicista de seus docentes. Em muitos casos, “estes docentes foram técnicos

de modalidades gímnicas e não vêem a possibilidade dessa prática na escola sem

fins competitivos, e mostram-se com dificuldade de visualizar os aspectos

pedagógicos da ginástica” (SCHIAVON, 2003, p.16).

Sobre este assunto Souza (2001, p.25) destaca que:

[...] o maior enfoque dado nos cursos de graduação é para os aspectos relacionados ao treinamento dessas modalidades, ressaltando a técnica, o regulamento, o treinamento, o que estaria direcionado à atuação em clubes, junto a equipes competitivas e não à atuação na escola onde os aspectos pedagógicos deveriam ter mais destaque.

Elias (1992, p.230) coloca que “todos os tipos de desportos têm

funções específicas para os participantes, para os espectadores ou para os

respectivos países em geral. Quando a forma de um desporto fracassa na execução

adequada destas funções, as regras podem ser modificadas”.

Ao se deslocar as falas do autor para a ginástica artística no espaço

dos cursos de formação, observa-se que a mesma também possui funções

específicas ali dentro e que, se a partir da licenciatura, sua aplicação vem

fracassando fundamentalmente na escola, sua exposição acadêmica poderia, ou

ainda deveria, ser modificada.

Nesta perspectiva de mudança, Barbosa (1999) pontua que não se

trata de negar os aspectos técnicos da ginástica artística durante a formação, mas

que essa formação ofereça um equilíbrio, em que os aspectos históricos, culturais e

pedagógicos da modalidade também sejam trabalhados, para que o futuro educador

possa proporcioná-la na escola. O Docente 7 alerta para o fato de que a ginástica

artística é uma modalidade ampla que trabalha inúmeras questões, na licenciatura

então, “os conceitos que devem ser trabalhados são os conceitos de iniciação

voltados para esse aspecto, para o desenvolvimento integral do aluno, como um

processo pedagógico mesmo”. O Docente 4, corroborando com a questão

pedagógica relata que: “o primeiro ponto mais importante é que todo e qualquer

conhecimento da modalidade tenha sido desenvolvido, focado em uma questão

139

pedagógica”. Contudo, repete-se aqui parte de uma de suas afirmações, em que

apesar de a modalidade ter que ser desenvolvida “com um enfoque pedagógico,

uma preocupação pedagógica [...] isso não acontece” (grifo nosso). Isso pode não

acontecer, pois é possível que os docentes universitários não consigam relacionar

os conteúdos transmitidos com a realidade das escolas atuais, e,

consequentemente, não preparem adequadamente os futuros professores para

serem inventivos frente aos problemas com que se depararão no ensino da

modalidade nas aulas de Educação Física escolar. Sobre isso o Docente 11 explica

que: “nunca dei aula numa escola com uma turma normal de Educação Física,

também em função disso a minha dificuldade talvez de analisar melhor as

necessidades ou (...) a possibilidade de trabalhar com isso”.

Schiavon (2003, p.18) argumenta que nos cursos de graduação “falta o

desenvolvimento de aulas em que os graduandos possam vivenciar o ‘ensinar

ginástica’ de modo que possam desmistificar o tabu que muitos trazem consigo em

relação à prática da ginástica”. A autora ainda ressalta que tal fato pode favorecer a

“formação de um profissional que não sabe adaptar os conteúdos aos objetivos do

cenário escolar como espaço de aprendizagem de diferentes conhecimentos” (p.16).

Sobre isso, apesar de todos os docentes afirmarem que a maior parte de suas aulas

refletem mais momentos de prática da modalidade do que aulas teóricas, apenas

alguns tentam efetivamente levar seus alunos ao contato com crianças durante as

aulas, o que pode ajudar, mas não necessariamente se aproxima à atividade dentro

do contexto escolar. Dentre os docentes entrevistados, três deles – 4, 6, e 11 – levam

crianças às suas aulas, exclusivamente para que os discentes vivenciem o ato de

ensinar ginástica artística junto a estas crianças, e como exemplo cita-se o Docente

11 que acha importante “fazer alguma prática também, trazendo crianças de escolas,

coisa que eu fiz quase sempre”.

Além do apontamento acima todos os docentes dirigiram, alguns de

forma mais efetiva do que outros, projetos de extensão em que seus alunos

poderiam, não de forma obrigatória, realizar atividades de ensino da modalidade

para crianças. Dentre estes, o Docente 3 aponta que o espaço de extensão que o

curso criou serve para que “nossos alunos façam nesse espaço uma prática da

especialidade, como parte de sua formação profissional. Ali os alunos se defrontam

com o dilema entre a formação e a atuação profissional”. Além disso, o Docente 3

140

compartilha com o Docente 7, que a extensão deveria servir como uma oportunidade

que vem somar na formação profissional e que esta deveria ser parte integrante do

currículo ligada diretamente à prática de ensino e estágio supervisionado, assim,

“outra coisa que eu acho interessante dentro da universidade que poderia ser feito

[...] são os projetos de extensão [...] eu tive três anos de projeto de extensão de

ginástica artística e era vinculado à prática da ginástica artística” (D.7).

A ginástica artística faz parte dos conteúdos a serem desenvolvidos na

Educação Física escolar (SOARES et al., 1992), mas para que o futuro professor

coloque em prática a modalidade na escola, ele precisa ter conhecimento prévio das

dificuldades que poderá encontrar. Tratar disso no contexto de uma disciplina na

formação acadêmica não significa de antemão desconstruir a beleza da modalidade

de ginástica artística, que é apresentada via recursos de mídia. Trata-se de mostrar

a realidade ao futuro professor para que este possa criar e recriar a ginástica

artística. Em seu ambiente de trabalho, posteriormente, poderá ressignificar a

modalidade, unindo-a ao que a mídia oferece (ginástica artística de alto nível) com

aquilo que apreendeu no curso de formação (ginástica artística voltada para a

escola). Esses aspectos, somados à escola e aos alunos iriam compor uma

ginástica artística ímpar, com valor educacional amplo aos alunos, bem como o

auto-reconhecimento do objetivo alcançado pelo professor.

Entretanto, assim como alunos saem da escola sem terem vivenciado a

ginástica artística, muitos discentes deixam o curso de formação acadêmica inaptos

para trabalhar esse conteúdo na escola. Diante desses fatos, na condição de não

saber alienante que ronda a modalidade, esse estudo buscou compreender e

analisar a formação do licenciado em Educação Física, no que se refere ao ensino

da modalidade, sob a perspectiva de docentes universitários. Destarte o texto traz

na sequência uma breve discussão da análise que foi feita ao longo de todo o texto,

apresentando-se as considerações finais da pesquisa.

141

CONSIDERAÇÕES FINAIS

ENCAMINHANDO AS DISCUSSÕES PARA A ATERRISSAGEM

O primeiro ponto a se destacar, e talvez um dos mais importantes, é ter

em mente que a configuração da disciplina de ginástica artística nos cursos de

licenciatura em Educação Física, traz consigo um longo processo histórico – ora

militar, ora essencialmente técnico e ora amplamente competitivo diante da esfera

esportiva à qual pertence – no qual a fundamentação pedagógica encontra, de certo

modo, dificuldade para se estabelecer.

A revisão de literatura e os depoimentos orais mostraram que,

especialmente diante das questões técnicas e competitivas que a modalidade

apresenta – a concepção do alto rendimento e sem fundamentação pedagógica –

torna-se um conteúdo difícil de ser ensinado. Além disso, outras questões se fazem

complexas no ensino da ginástica artística na escola como se observou: a hegemonia

dos esportes tradicionais, que são mais acessíveis aos alunos, consequentemente

mais fáceis de serem aplicados; poucas aulas de Educação Física na semana com

número excessivo de alunos nas turmas, o que dificulta o aprendizado de movimentos

mais específicos; falta de espaço adequado e o mínimo de material (mesmo que

adaptado) para a realização de algumas peculiaridades da modalidade; o preconceito

em relação à Educação Física como componente curricular da educação básica, e à

ginástica artística como conteúdo da Educação Física; a desvalorização da própria

educação, e em maior grau no ensino público; as críticas aos professores que atuam

na escola, como consequência da desvalorização da educação e por ações

equivocadas de alguns profissionais; a concepção de ginástica artística que a

comunidade escolar tem e que os professores também têm; entre outros.

142

Todos estes pontos destacados acabam afastando a ginástica artística

do ensino escolar como conteúdo das aulas de Educação Física. Entretanto, ao se

reconhecer, ou ainda reafirmar algumas destas questões, buscou-se analisar a

gênese dessa problemática na tentativa de apontar algumas soluções. Assim sendo,

parte-se do termo ginástica que abrange hoje uma gama de atividades corporais que

a configura. A própria relação de indivíduos – sejam estes, estudiosos, idealizadores

ou praticantes – permitiu a troca de experiências entre eles, em que o termo

configuração enquadra-se de modo muito apropriado, pois segundo Elias (1970)

trata de uma rede de relações que as pessoas constroem entre si.

Dessa forma, não seria demasiado colocar que a maneira como a

ginástica artística – inserida em dois sub-campos da Educação Física: ginástica e

esporte – há muito se configura como sendo resultante dos tipos de relações que

seus ‘criadores’ tiveram uns com os outros e com os demais indivíduos em nossa

sociedade, possibilitando seu tecnicismo e aspecto competitivo. Também num outro

momento, das relações entre outras pessoas, que possam perceber a ginástica

artística de outra maneira, suas configurações possam ser moldadas por uma

tentativa com enfoque pedagógico. Diante de um direcionamento pedagógico,

entendido aqui como um enfoque lúdico; preocupado com o aprendizado dos

movimentos da ginástica artística e não com um resultado de alta performance; que

busque a formação de um indivíduo crítico que compreenda a modalidade quando

esta lhe é apresentada em outros segmentos que não o escolar; e acima de tudo

que saiba direcionar a modalidade em sua vida de forma que possa apreciá-la, e

que essa apreciação lhe traga prazer, sendo praticante ou não.

No encaminhar deste estudo foi possível observar também que apesar

de poucas pesquisas da modalidade no campo das ciências humanas, estas8 em

grande maioria defendem sua aplicação para o desenvolvimento motor e cognitivo

de crianças de maneira geral. Além disso, apontam que é na escola que isso poderá

ser melhor efetivado, já que é durante sua vida escolar que a criança irá passar por

profundas transformações, tanto na esfera biofísica, quanto na esfera sócio-cultural.

Além disso, dialogando a revisão de literatura, que trata exclusivamente da

modalidade, com os relatos dos docentes entrevistados, a ginástica artística, se

8 Algumas pesquisas foram mencionadas no interior da revisão de literatura e se encontram nas Referências – Nista-Piccolo (2005); Barbosa (1999); Schiavon (2003, 2005); Koren, (2004), Figueiredo (2005), Lorenzini (2005).

143

reformulada dentro da formação acadêmica, apresentou-se com grandes

possibilidades de inclusão na escola.

Para um estudo baseado em questões sociológicas, os diversos

grupos, os indivíduos que os compõem, bem como as configurações tecidas por eles

são de extrema importância. Assim sendo, a problemática que fundamentou este

estudo focou-se na compreensão – diante da teoria de Norbert Elias – do ensino da

ginástica artística em cursos de licenciatura, tendo em vista que ela não chega de

forma coerente à escola. Referida compreensão levou, dentre outras considerações,

à configuração dos grupos que compõem as ciências no espaço da universidade e,

portanto, nos cursos de Educação Física.

Por muito tempo, a universidade apresentou-se regida por grupos que

versavam deleitados sobre a concepção positivista de ciência para aquisição e

manutenção do conhecimento. As ciências naturais estiveram por séculos arraigadas

no contexto universitário crendo-se como singulares em validar objetivamente o

conhecimento. As ciências naturais que tiveram, de acordo com Elias (1970),

dificuldade para emancipar-se dos conceitos institucionalizados de caráter mágico-

mítico há dois ou três séculos, tornou e ainda torna a organização do conhecimento

acadêmico como refém de seus princípios. O autor ainda aponta que a ascensão das

ciências naturais deu-se pelo aumento de “elementos realistas” do nosso pensamento em

oposição aos “elementos fantasiosos”, estes “carregados de emotividade” (p.24-25).

A ginástica artística como disciplina curricular de muitos cursos de

licenciatura, em plena concordância com o que se observou até aqui, está

diretamente envolvida nesta discussão maior entre as ciências naturais e humanas.

Assim sendo, é válido lembrar que a modalidade está inserida na edificação teórica

da ginástica que há cerca de dois séculos teve seu suporte fundamental de base nas

ciências positivistas e não humanísticas. Como se observou na revisão de literatura,

a ginástica adquiriu status e uma maior ascensão social quando médicos atribuíram

a ela a tarefa de melhorar a saúde das populações. Com base então na medicina os

idealizadores, em especial aqueles intrincados na criação dos métodos ginásticos,

pautaram-se em aspectos das ciências naturais para produzirem seus pensamentos,

utilizando-se principalmente da biomecânica e fisiologia.

144

Já a ginástica artística, ao se efetivar como modalidade esportiva no

século passado estava e, ainda permanece, diretamente infiltrada na esfera das

ciências naturais, sendo rodeada de conceituações técnicas em que também

estudos biodinâmicos e fisiológicos perfaziam seu aporte teórico científico.

No entanto, a partir da segunda metade do século XX, com o aumento

da perspectiva humanística de estudos, o cientificismo passou a ser questionado

como único meio de validação dos diversos tipos de conhecimento produzidos pelo

ser humano e pela natureza. Neste momento, estaria ocorrendo, sob a ótica de Elias

(1970), o estabelecimento de um equilíbrio de poder entre referidas ciências, já que

este se constitui como “elemento integral de todas as relações humanas” (p.80). No

entanto, o autor afirma que em qualquer relação o equilíbrio de poder pode variar

muito; destarte, mesmo que as ciências humanas consigam algum status na busca

por mais poder, as ciências naturais se apoiam no poder de coerção contra os

métodos investigativos utilizados pela primeira.

Os grupos que compõem, de um lado, as ciências naturais e, de outro

as humanas, enfrentam-se frequentemente na disputa pela pesquisa, status, espaço

acadêmico etc. Na teoria de modelos de jogos de Elias (1970, p.82), não seria

exagerado afirmar que ocorre uma ‘competição primária’ entre tais grupos, uma vez

que a competição primária serve “como advertência de que é perfeitamente possível

estruturar as relações sociais entre os indivíduos, mesmo que estas se desenrolem

sem regras”. Não existem regras que expliquem a interrelação e as disputas entre

ambas, como pontua o autor; o conceito de estrutura seria o mais apropriado nesta

situação, pois “seria impossível explicar conflitos sem normas, se eles não tivessem

qualquer estrutura e, nesse sentido, qualquer ordem” (p.82). Assim tais ciências

formam uma estrutura sem regras para controlar o poder sobre o conhecimento,

dentro de uma ordem relacional e funcional que está em constante processo de

desenvolvimento – o próprio espaço acadêmico.

Pode-se pensar então, que não apenas a ginástica artística, mas toda

e qualquer modalidade esportiva estaria no espaço de cursos de licenciatura

vivenciando indiretamente uma disputa entre as ciências naturais e as ciências

humanas, uma vez que no processo de construção da Educação Física, durante

145

décadas fora o esporte – especialmente numa visão competitiva com certa intenção

social – o conteúdo mais desenvolvido.

A hegemonia do esporte, carregada de técnicas, regras e

competitividade, é adjacente a fatores como economia e política. Assim sendo,

parece, inclusive, exercer poder sobre o que os docentes lecionam no ensino

superior e, posteriormente, o que os professores ensinam na escola, já que estes

espaços não são neutros. Porém, não se deve pensar nesse ‘poder’ que subjuga os

conteúdos curriculares como “um amuleto que um indivíduo possua e outro não; é

uma característica estrutural das relações humanas – de todas as relações

humanas” (ELIAS, 1970, p.81). Assim, foi interessante observar que a maioria dos

docentes almeja uma ginástica artística menos competitiva e mais lúdica no espaço

da formação acadêmica. No entanto, evidenciou-se que é também uma minoria que

leciona essencialmente voltada a questões pedagógicas e lúdicas da modalidade.

Isso porque a força relativa dos docentes no que tange sua atuação e as decisões

que a norteia, ou está dirigida por um projeto pedagógico, ou é produto de alguma

fase histórica da ginástica artística – as quais já foram destacadas – ou ainda volta-

se ao senso comum que observa a ginástica artística numa esfera praticamente

inalcançável, do esporte de alto rendimento.

Na perspectiva de Elias (1970) os acontecimentos, as pessoas, têm

poder sobre os indivíduos, singulares ou em grupo, desde que se atribua algum

valor a estes acontecimentos e pessoas. Ora se a atuação do docente e todo o

conjunto no qual ela está inserida refletirem algum valor em sua vida, esta

provavelmente irá exercer algum poder sobre ele. Apesar disso, para que ele possa

exercer a função docente coerente com seu papel social – que no caso da ginástica

artística para a licenciatura significa formar um professor que a insira na Educação

Física escolar – não pode permitir que este poder seja exercido sobre sua atuação

de forma arbitrária, tão pouco pode perceber-se externo a ele.

Ainda referenciando Elias (1970), ficou evidente por intermédio dos

depoimentos e da literatura, que existe uma força de coerção que norteia não

apenas as disciplinas que serão dispostas no currículo, mas também de que

maneira elas serão apresentadas ao corpo discente. A pretensão de formação é

notadamente atender ao mercado e à hegemonia esportiva que ronda a Educação

146

Física, ao passo que a instrução pedagógica, histórica, filosófica e sociológica é

deixada de lado, ou descrita discursivamente.

Diante da teoria de Elias (1970) pode-se pensar que na disputa de

poder, no jogo que envolve o campo, o mercado é reverenciado, pois dita a

formação profissional, inclusive na atuação de docentes nas IESs públicas, em que

deveria estar o interesse primordial voltado à pesquisa e não tanto ao mercado. No

entanto, o mercado atua sobre o campo com proporção de poder relativa e segundo

o autor essa força gera um controle sobre o decurso do jogo. Sendo assim, o

mercado pode controlar o que é importante ou não para o campo, ou ainda, o que é

importante ou não ser ensinado no contexto das disciplinas, especialmente as

práticas, pois são mais concretas e estão mais acessíveis ao público, seja por

questões históricas, ou mais atuais, como o acesso a mídia.

Além dessas ‘situações problemas’ referentes às ciências naturais e

humanas, mercado e pesquisa, observou-se que a ginástica artística no contexto da

Educação Física, enfrenta uma disputa que diz respeito a docentes que trabalham

com disciplinas práticas versus docentes que trabalham com disciplinas mais

teóricas.

Segundo Elias (1970, p.81) “as oportunidades de poder são

distribuídas muito desigualmente” entre os grupos que, nesse caso, trata-se,

empiricamente falando, do embate entre de um lado o grupo dos ‘práticos’ (que

defendem as disciplinas de características mais práticas, como as modalidades

esportivas) e do outro o grupo dos ‘teóricos’ (que estão ao lado de disciplinas de

cunho eminentemente teórico), compondo o que o autor denomina de “jogos de

duas pessoas” (p.88).

Nesse tipo de jogo, o grupo dos ‘teóricos’ tem a capacidade de

controlar o grupo dos ‘práticos’, e isto foi sugerido em alguns depoimentos, quando

alguns docentes advertiram serem preteridos em relação a outros docentes, ou

quando relatam que ser um docente dedicado à teoria especificamente pode trazer

certo status que a destinação à prática talvez não traga. Isto porque, é muito

complicado lecionar estando em meio à prática e manter-se pesquisador

conjuntamente, como se notou. Entretanto, o grupo dos ‘práticos’ não se mantém

nulo, “se ele fosse zero não haveria jogo” (ELIAS, 1970, p.88), se ele fosse zero a

147

Educação Física perderia por completo sua identidade. O que há de diferença entre

ambos é a “proporção de poder” (p.88). Assim, os ‘teóricos’ exercem poder sobre os

‘práticos’ e determinam o decurso do jogo. É por eles ditada a maneira como as

disciplinas práticas – como a ginástica artística – serão ensinadas ou não no espaço

da grade curricular.

Para uma reestruturação da grade curricular, em que a ginástica

artística, bem como outras disciplinas de cunho prático e outras modalidades

esportivas pudessem ser oferecidas sem que estes docentes fossem postergados em

relação aos outros, o grupo dos ‘práticos’ talvez pudesse, como opção, buscar um

maior equilíbrio na distribuição do poder de delegar o que se ensina no interior do

currículo nos cursos de licenciatura. No entanto, cabe aqui a questão do ‘como’ isso

poderia ser feito, uma vez que intelectualmente os indivíduos que ali atuam possuem

semelhante status e nível de conhecimento. Para o autor, os indivíduos,

especialmente aqueles mais providos de conhecimentos e saberes, devem ser

capazes de dizer ‘nós’ tanto quanto ‘eu’. Isso poderia levar ao entendimento de que

falta a alguns cursos de licenciatura em Educação Física, e aos grupos contrários que

configuram tais cursos, uma maior consciência de se observarem como grupo

‘Educação Física’, tanto quanto ‘teóricos’ e ‘práticos’, ou ‘pedagógicos’ e ‘fisiológicos’,

ou ainda ‘especialistas’ e ‘generalistas’, etc.

Questões como disputa de espaço e status entre docentes e as

disciplinas que ministram, não foram apresentadas de maneira evidente nos relatos

de todos os docentes, porém ficaram certas nas entrelinhas de alguns. Estas

questões poderiam de alguma forma ser superadas, se os docentes conseguissem

realizar um movimento de maior distanciamento tanto no que concerne a sua

disciplina específica, quanto no seu campo maior de atuação, a Educação Física.

Entendendo-se distanciamento como uma opção para se observar melhor o espaço

de formação profissional em que atua, só que de outra posição, não dentro, mas fora

do espaço (ELIAS, 1997). E, se esta formação estiver habilitando um profissional à

licenciatura, que o docente tenha os requisitos básicos necessários, bem como

reconheça o espaço para o qual está pretendendo formar o profissional – a escola.

O docente precisa, como se pôde observar nos depoimentos orais, além de estar

distanciado, criar um distanciamento dos futuros profissionais com sua prática para

que aprendam a observá-la e analisá-la melhor, nada mais do que pesquisar!.

148

O envolvimento explicitado na teoria de Elias (1998) pode apresentar

alguns fatores dificultadores em relação ao conhecimento, pois se este envolvimento

for designado em uma única direção de determinado conhecimento pode causar o

medo do desconhecido, alienar. É o caso de associar essa conclusão do autor com

a não utilização da ginástica artística na escola, uma vez que os professores estão

extremamente envolvidos com o que conhecem da ginástica artística de alto

rendimento, segundo o que a maioria dos entrevistados apontou. Isso resulta em

medo desse desconhecido, medo da inovação, medo da ginástica artística na

escola, porque só se reconhece a modalidade como esporte de alto nível; assim, o

professor envolve-se numa penosa alienação e pouco desenvolve o referido

conteúdo.

No entanto, o envolvimento também pode ocorrer de maneira

favorável. Explica-se que o envolvimento, aquele que se pretende que docentes e

professores tenham, como sendo benéfico, refere-se ao que Elias (1998, p.39)

chama de “conhecimento obtido”, diversamente de “conhecimento revelado”, visto

que nesse último, fica evidenciado o “conhecimento envolvido dominante”, em que o

grupo detentor de poder é quem vai permitir o tipo de conhecimento que os

indivíduos podem adquirir, via observação ou experimentação. Destarte, esse

envolvimento citado diz respeito ao envolver-se agora diante de um novo

‘conhecimento obtido’, desconstruindo o ‘conhecimento revelado’ que os indivíduos,

antes de adentrar à formação inicial em Educação Física faziam da ginástica

artística.

Os docentes alegaram em suas falas essa questão, em que os discentes

chegam à universidade sem muito conhecimento sobre a ginástica artística. Porém,

não são todos que tentam desconstruir o ‘conhecimento revelado’ que os discentes

têm sobre a modalidade, para edificar um novo conhecimento – o ‘conhecimento

obtido’. Assim, observou-se que há latente necessidade de que os próprios docentes

desconstruam para si o ‘conhecimento revelado’, que só será possível, como já

mencionado, a partir de um distanciamento em relação à sua atuação.

O que também ficou evidente nos relatos é que a ginástica artística

apresenta uma dificuldade peculiar para ser ensinada nas aulas de Educação Física

escolar, bem como apresenta certa dificuldade para ser ensinada no contexto da

149

formação de professores. No entanto, em momento algum se observou que ela seria

uma prática inviável à escola, e muito menos à formação profissional. Segundo os

pareceres dos docentes, a modalidade é complexa, mas de maneira alguma deveria

estar excluída dos conteúdos de Educação Física escolar e dos currículos de cursos

no espaço acadêmico.

Poderia a ginástica artística, pelo que se notou, ser completamente

bem direcionada dentro da escola, ou ainda estar inserida dentro de um projeto de

ginástica para a escola. Porém, ela deveria ser melhor contextualizada no decorrer

da disciplina no curso de formação acadêmica, especificamente licenciatura. A

ginástica artística, de maneira independente, ou dentro de um campo maior que

envolvesse diferentes tipos de ginástica, deveria possuir um núcleo identificador da

disciplina para que fosse ensinada na licenciatura, tendo em vista nossa restrita e

deficiente formação de recursos humanos para a docência no ensino superior. Este

núcleo identificador poderia ser composto de um conjunto de conhecimentos e

habilidades que, via de regra, formam a base da ginástica artística e poderiam ser

ensinados no ambiente escolar.

A modalidade poderia e deveria alcançar com maior plenitude um

espaço nas aulas de Educação Física escolar; ser apresentada a todas as crianças

conceitualmente e que tal fato estivesse contextualizado num plano educativo maior,

com um formato de vivência eficaz. E, em virtude dessa rede de interdependência das

funções individuais que não se pode extirpar

os atos de muitos indivíduos distintos, especialmente numa sociedade tão complexa quanto a nossa, precisam vincular-se ininterruptamente, formando longas cadeias de atos, para que as ações de cada indivíduo cumpram suas finalidades (ELIAS, 1994, p.23)

Assim, para que tanto os docentes universitários, quanto os

professores nas aulas de Educação Física escolar, consigam promover uma

ginástica artística eficaz, as ações destes precisam ser pensadas em conjunto e de

maneira coesa com a realidade na qual está inserida. Uma ginástica artística eficaz

significaria proporcionar a aproximação dos alunos enquanto universitários à

inclusão dessa manifestação na realidade do contexto escolar. Aos escolares, a

eficácia no aprender ginástica artística estaria no conhecimento da mesma, da

150

maneira que o contexto escolar permitisse, desde que bem explorada e de forma

coerentemente orientada. Possibilitando o vivenciar a ginástica artística!

A ginástica artística, para que seja ensinada coerentemente no espaço

escolar, precisa, antes de qualquer coisa, ser viabilizada de maneira conexa na

formação em licenciatura. Assim, como Norbert Elias assinala a todo instante em

suas obras, que para uma relação eficaz entre os indivíduos e grupos que perfazem

a sociedade é preciso dinamismo, a configuração que determina esta modalidade

também deveria apontar para um dinamismo, o que não acontece no todo de sua

atual configuração.

A história de seu desenvolvimento deveria dar subsídios para uma

transformação que instaurasse uma visão mais aprofundada da modalidade,

tornando-a mais plural, abrangendo um número maior de possibilidades de sua

aplicação, inclusive dialogando com outras modalidades e manifestações corporais.

Além disso, deveria ser introduzida na escola diante do já destacado aspecto lúdico,

pensando principalmente nas séries iniciais de ensino, e ainda carregada de

preceitos pedagógicos para um maior aproveitamento da modalidade na Educação

Física escolar. Tais questões obviamente distanciariam a ginástica artística de seu

aporte no tecnicismo que leva a repetição para a perfeição dos gestos, em que o

exercício sem técnica é muitas vezes, frente à visão tecnicista, desprovido de

qualquer valor.

Se for esperado que os professores de Educação Física ofertem

vivências de ginástica artística na escola, eles precisam ter essa experiência já no

momento de sua formação inicial. Mas, da forma como se apresenta, a ginástica

artística ainda está carregada do tecnicismo conferido à modalidade em outras

épocas e, os grupos que a estabelecem, ou que deveriam estabelecê-la, seja na

formação acadêmica, seja na escola, ainda possuem seus pensamentos arraigados

na competitividade, na perspectiva técnica, em sua forma mais usual e alienante.

Enfim, evidenciou-se que a ginástica artística, e talvez outras

modalidades esportivas que compartilham das mesmas situações problemas,

precisam se re-estabelecer. Nas palavras de Elias (1970), o mais sensato seria uma

reorientação dos modos de pensamento, ou seja, re-estruturar a maneira pela qual

essa(s) disciplina(s) vem sendo disseminada(s) nos cursos de licenciatura. Isso,

151

como o autor destaca, pode levar anos e anos, certamente gerações, não importa, o

que importa é que o primeiro passo seja dado – e já foi – mas, mais ainda, que as

pessoas, os grupos, saibam caminhar juntos!

E, por ora, esse estudo se finaliza, buscando a possibilidade de

contribuição àqueles envolvidos com a Educação Física e que tenham algum

interesse, sobretudo em relação à ginástica artística. No entanto ele não é único,

nem deve ser estanque, pois como afirma Elias e Scotson (2000, p. 57):

Os modelos e os resultados das pesquisas de configurações fazem parte de um processo, de um campo crescente de investigação,`a luz de cujo desenvolvimento estão eles mesmos sujeitos a revisões, críticas e aperfeiçoamentos, fruto de novas investigações.

152

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VIANNA, Ilca Oliveira de Almeida. Metodologia do trabalho científico: um enfoque didático da produção científica. São Paulo: Editora Pedagógica e Universitária, 2001.

162

ANEXO A

Documento de Aprovação do Estudo por Comitê de Ética responsável

163

APÊNDICE A

Questionário de caracterização da população envolvida (Observação: Todas as questões foram encaminhadas em arquivo de Word o qual os docentes tinham a possibilidade de acrescentar espaço para suas respostas)

OBJETIVOS DA PESQUISA: Reconhecer entre docentes que ministram a disciplina de Ginástica Artística no ensino superior, as configurações atuais da mesma nas licenciaturas em Educação Física, as redes de poder que são tecidas em meio ao seu contexto na universidade, bem como alternativas de mudanças/melhorias nos programas da disciplina, de forma que esta se atenha com mais ênfase ao âmbito escolar. (Parte do pressuposto, já observado em outros estudos que, a Ginástica Artística é inexistente na Educação Física escolar). As tópicos de questionamentos determinados para o estudo são: a) formação inicial e continuada e, experiência docente; b) conhecimentos teóricos, práticos/técnicos e pedagógicos referentes à Ginástica Artística em cursos de licenciatura; c) papel da disciplina de Ginástica Artística na preparação do professor; d) programas de ensino da disciplinas: ementa, objetivos, conteúdo programático, avaliação, bibliografia, métodos e estratégias de ensino.

QUESTIONÁRIO INFORMATIVO População alvo: Docentes que ministram a disciplina de Ginástica Artística em Cursos de Licenciatura em Educação Física. Objetivo: Caracterizar a população envolvida na pesquisa. I - DADOS PESSOAIS:

Nome Completo:

Data de Nascimento:

Endereço Completo:

Telefone e E-mail:

Universidade:

II – FORMAÇÃO E EXPERIÊNCIA:

1. Curso de ensino superior realizado, respectiva habilitação, Instituição e ano de conclusão: (sendo mais de um curso, liste abaixo, numerando)

164

2. Outro curso (lato/stricto sensu) na área de Educação Física/ Ginástica Artística/ Docência: (sendo mais de um curso, liste abaixo, numerando)

3. Experiência na área de Ginástica Artística anterior à docência: ( ) sim ( ) não

4. Tipo de experiência (atleta, auxiliar, técnico, etc) e tempo de experiência (meses/anos): (sendo mais de um, descreva o tipo de experiência com Ginástica Artística e tempo, numerando)

5. Experiência com docência no ensino superior: ( ) sim ( ) não

6. Tipo de experiência (estágio, substituto, efetivo, etc. e tempo de experiência) (meses/anos): (sendo mais de um, descreva o tipo de experiência docente e tempo, numerando)

7. Disciplinas ministradas e tempo de experiência nas disciplinas (meses/anos): (sendo mais de uma, descreva as disciplinas e tempo em que ministrou, numerando)

8. Experiência com docência no ensino superior ministrando Ginástica Artística e tempo de experiência (meses/anos):

9. Outras informações/considerações importantes (este espaço fica reservado para quaisquer colocações que julgar importante a respeito de sua formação e experiência, que não tenha sido contemplada nas questões anteriores).

165

APÊNDICE B

Roteiro de Questões da Entrevista

I – CONHECIMENTOS DA GINÁSTICA ARTÍSTICA ENSINADOS NA GRADUAÇÃO

(LICENCIATURA) E MANEIRA DE TRANSMITÍ-LOS.

1. Quais conhecimentos você julga imprescindíveis no ensino da GA em turmas de

licenciatura em Educação Física?

2. Você diferencia conhecimento técnico de conhecimento pedagógico?

3. Como você realiza suas aulas?

4. A sua metodologia de trabalho no ensino da GA na graduação possui algum diferencial?

II – A GINÁSTICA ARTÍSTICA NA FORMAÇÃO DO FUTURO PROFESSOR

1. Como você observa a GA hoje, dentro e fora do contexto universitário?

2. Como você vê o papel e/ou importância da GA na formação de futuros professores de

Educação Física?

3. A partir do que você ensina na graduação, o seu aluno estaria apto a ensinar GA na

escola? Você acredita que os alunos que formou trabalham/trabalharam com a GA na

Educação Física escolar?

4. O que você considera impeditivo da aplicação da GA na escola?

5. Como a GA deve estar contextualizada nos cursos de licenciatura para que seu ensino

seja eficaz posteriormente na escola?

166

III – PROGRAMA DE ENSINO E DISPOSIÇÃO DA DISCIPLINA DE GINÁSTICA

ARTÍSTICA NO CURRÍCULO DE LICENCIATURA

1. Como se encontra a disciplina de GA no currículo da sua universidade nos últimos anos

de seu trabalho?

2. Você auxilia na montagem do programa de ensino da disciplina de GA? [Se sim] Como é

feito o programa? [Se não] Quem é responsável por isso? E, o programa da disciplina de GA

é coerente com a formação de professores para a atuação da modalidade dentro do

contexto escolar?

3. A avaliação esta contemplada no programa? Como você avalia os discentes, no que

concerne aos conhecimentos teóricos, técnicos, práticos e pedagógicos?

4. Você observa, dentro do contexto universitário, algum tipo de relação de poder entre as

disciplinas teóricas e as de modalidades esportivas de caráter mais prático? Como situa sua

disciplina (GA) nessa relação de poder?

5. Há alguma relação de poder entre você e a universidade (conselho de curso) no que diz

respeito à disciplina a ser ensinada – a maneira que deve ser ensinada versus a maneira

que você ensina ou gostaria de ensinar?

167

APÊNDICE C

unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Biociências – Campus de Rio Claro

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Prezado Professor, Estamos desenvolvendo uma pesquisa com docentes universitários que ministram ou ministraram a disciplina de Ginástica Artística/Olímpica para cursos de Licenciatura em Educação Física, prioritariamente em universidades públicas do Estado de São Paulo em sua carreira docente. A pesquisa tem como título “GINÁSTICA ARTÍSTICA EM CURSOS DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA: A DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA EM QUESTÃO”, tendo como objetivos reconhecer entre os docentes as configurações atuais da disciplina de Ginástica Artística na licenciatura em Educação Física, as redes de poder que são tecidas em meio ao seu contexto na universidade, bem como alternativas de mudanças/melhorias nos programas da disciplina, de forma que esta se atenha com mais ênfase ao âmbito escolar. Portanto, necessito de sua colaboração com seus depoimentos. Porém, cabe lembrar-lhe que a qualquer momento você poderá retirar seu consentimento livre e esclarecido e deixar de participar do estudo alvo da pesquisa. O seu nome será mantido em sigilo, sendo utilizado como identificação um pseudônimo ou número. Entretanto, preciso do seu consentimento para que possa, posteriormente, publicar os dados desta investigação em artigos ou apresentá-los em reuniões científicas. Se estiver de acordo, por favor, preencha a declaração que segue abaixo. Agradeço antecipadamente a sua participação e contribuição.

Atenciosamente,

Juliana Frâncica Figueiredo Dagmar Hunger Mestranda Orientadora Rua Castro Alves, 3170 Rua 13 de Maio, 7-27 CEP: 14801-450/Araraquara-SP CEP: 17015-270/Bauru-SP [email protected] [email protected] Tel: (16) 3336-9237/ (16) 8124-7712 Tel: (14) 3227-9335

TERMO DE CONSENTIMENTO (DECLARAÇÃO)

Eu,___________________________________________________________.RG:_______________, Residente e domiciliado à Av./Rua______________________________________________________ Bairro________________ Cidade de ____________________ UF_____ CEP_____________ declaro estar ciente dos objetivos do trabalho em pesquisa “GINÁSTICA ARTÍSTICA EM CURSOS DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO FÍSICA: A DOCÊNCIA UNIVERSITÁRIA EM QUESTÃO”, da mestranda Juliana Frâncica Figueiredo, e Profª. Drª. Dagmar Hunger, manifestando o meu consentimento com a publicação de minhas respostas, sejam elas favoráveis ou não, na forma de artigos e ou em reuniões científicas. Declaro também estar ciente de que o material poderá ser devolvido ou não para que eu avalie antes de ser analisado e/ou publicado. Assinale com um X a opção que lhe for mais conveniente: ( ) Gostaria que o material fosse devolvido. ( ) Não há necessidade de devolução do material.

_____________________________________ Assinatura

Data: ____/____/2008

UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”

INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA MOTRICIDADE

“DEPOIMENTOS ORAIS – DOCENTES DE GINÁSTICA ARTÍSTICA”

VOLUME II

JULIANA FRÂNCICA FIGUEIREDO

Outubro – 2009

Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção de título de Mestre em Ciências da Motricidade.

ii

“DEPOIMENTOS ORAIS – DOCENTES DE GINÁSTICA ARTÍSTICA”

VOLUME II

JULIANA FRÂNCICA FIGUEIREDO

Orientadora: Dagmar Ap. C. F. Hunger

RIO CLARO Estado de São Paulo-Brasil

Outubro – 2009

Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção de título de Mestre em Ciências da Motricidade.

iii

FONTE ORAL: CONSTRUINDO UM DOCUMENTO

Como já destacado no Volume I deste estudo, “A Formação do

Licenciado em Educação Física e as Configurações da Ginástica Artística sob a

Perspectiva de Docentes Universitários”, optou-se por apresentá-lo em dois

volumes. No Volume I encontra-se descrita toda a construção e desenvolvimento da

pesquisa, bem como revisão de literatura pertinente, análise e discussão dos dados

coletados por intermédio de questionários e entrevistas.

Já neste volume, encontram-se todos os depoimentos coletados com

docentes que ministram ou ministraram Ginástica Artística em cursos de licenciatura

de Universidades públicas do Estado de São Paulo. Totalizando doze entrevistas,

realizadas com doze docentes no segundo semestre de 2008. As páginas que

seguem contêm a transcrição destes relatos na íntegra, alterando-se apenas nomes

próprios ou situações que pudessem identificar o docente entrevistado.

Por ter nestes depoimentos um rico material no que se refere à

memória e, portanto, à história dos docentes entrevistados no que diz respeito às

configurações da Ginástica Artística, entende-se os mesmos não foram totalmente

esgotados em possibilidades de pesquisa. Assim, disponibilizam-se tais

testemunhos para que interessados no tema possam esmiuçá-los orientados por

outros objetivos.

Contudo, ao falar de fontes orais, não se pode negligenciar as

dificuldades existentes, particularmente quando se apresenta a tarefa de utilizá-las.

Além das questões metodológicas, que, a rigor, constituem-se num aprendizado

contínuo (entrevistar, transcrever, digitar, analisar e interpretar), é preciso, ainda,

atentar para o uso que se faz do material, já que se está lidando com experiências

de sujeitos, de seres humanos; e isso exige sempre sensibilidade, respeito e ética.

Assim sendo, a possibilidade de re-utilização destes dados está

disponibilizada, solicitando-se apenas o cuidado extremo com cada relato, pois ele

representa uma voz, diversas memórias, muitos pensamentos traduzidos em

palavras; enfim, representa um alguém!

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TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS

Docente 1 – Julho/2008 – 1h21min

P – Então a primeira pergunta seria, quais conhecimentos você julga imprescindíveis pra se ensinar Ginástica Artística na licenciatura?

D.1 – Eu acho que a coisa mais importante é você conhecer tudo do ser humano primeiro pra poder trabalhar da melhor forma possível, né!? Você tem que conhecer bem o aluno, conhecer a sua parte de flexibilidade, a sua parte de força, as suas possibilidades, porque tem muito acidente hoje em dia que acontece porque o professor não sabe ensinar e, o aluno muitas vezes tenta alguma coisa que ele pensa que ele pode fazer e só descobre que não pode quando ele se machuca. Então eu acho que é muito importante você dar essa noção de disciplina pro aluno e fazer a segurança adequada, saber auxiliar, saber ensinar a auxiliar, e saber quais os exercícios adaptados àquele aluno. Porque cada um é um, você (...) dança de acordo com a musica quando toca samba você dança samba, é valsa tem que dançar valsa, então tem aluno que não tem condição nenhuma, então você tem que dar uns exercícios bem mais elementares pra ele, tem aluno que tem melhores condições então você pode explorar essas boas condições dos alunos. Eu sempre dancei de acordo com a música e, normalmente, eu, vendo um aluno, eu sei das possibilidades reais dele e, eu começo meu trabalho do nível que eu tenho a turma. Se a turma é muito fraca eu começo com um trabalho bem fraco. Se a turma é mais forte eu começo com um trabalho mais forte.

P – Mas isso, nas suas turmas da graduação, você (...)

D.1 – Mesmo na graduação eu tinha um pessoal que tinha mais dificuldade e eu até brincava com a turma, quer dizer, qualquer um de vocês pode fazer um salto mortal, e aquele que era mais gordinho, que tinha mais dificuldade ria e eu dizia a ele: ‘você ta duvidando? Vem cá!’. E botava ele pra fazer um mortal. Ele fazia na hora, na frente de todo mundo e eles começavam a bater palmas. Como botava todo mundo no meu curso técnico da Universidade A. Depois da graduação aqueles melhores iam pro curso técnico e, no curso técnico botava todas as meninas e todos os rapazes pra fazer giro gigante na barra fixa, quer dizer, é inacreditável, mas eu tinha lá uma maneira especial de prender as mãos na barra, tinha dois plintons do lado com quatro rapazes substituindo os guindastes, então a gente balançava o indivíduo, fazia ele passar pela parada de mão e voltava tranquilamente, todo mundo fazia o giro gigante sem perigo nenhum.

P – Então seus alunos tinham uma vivência de experienciar mesmo a Ginástica Artística em todos os aparelhos?

D.1 – Todos os aparelhos! Tanto na Escola A, a gente tinha todos os aparelhos masculinos lá, praticamente não tinha feminino, mas na Universidade A eu comecei dar graduação só pro masculino e a Maria dava pro feminino e depois que a Maria saiu eu comecei dar pra ambos os sexos e, mais tarde inclusive com a mudança de currículo, nós passamos a ter aula mista. Então os homens e meninas faziam ao mesmo tempo. Então já dava trave de equilíbrio pra homem também e dava cavalo pra mulheres (...)

P – Na graduação mesmo era separado?

D.1 – Hein!?

P – Na graduação mesmo era separado?

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D.1 – Mesmo na graduação foi separado, um bom tempo foi separado, quando o curso era licenciatura plena foi separado masculino e feminino. E, tinha um professor pro masculino e um professor pro feminino.

P – E, bom, a Educação Física formava até a década de noventa, oitenta, noventa né, formava especificamente professor com uma complementação pra técnico (...)

D.1 – Era a licenciatura plena que a gente chamava. Ele era professor e podia ser técnico também, depois que inventaram essa separação de bacharel e licenciado a coisa complicou um pouco.

P – E você diferenciava conhecimentos técnicos da Ginástica de conhecimentos pedagógicos pra ser trabalhado na licenciatura?)

D.1 – Sim. Meu objetivo principal era dar a parte pedagógica, seriam uns processos pedagógicos que eu cheguei até chamar de “N” [o docente dava seu nome ao método que utilizava] que era pra você ‘como aprender a ensinar uma cambalhota pra frente’. É o exercício mais elementar que tem, mas eu tenho seis processos diferentes de ensinar a cambalhota pra frente. Exercícios que você pode dar numa aula de Educação Física normal sem que o aluno saiba que você ta querendo que daqui a pouco ele faça uma cambalhota, mas vai aí um educativo que vai facilitar com que ele consiga fazer aquele movimento. Agora eu dava os processos pedagógicos cambalhota pra frente, cambalhota pra traz, parada de mão, estrela. Estrela eu tenho uns processos pedagógicos fabulosos, então o pessoal tem muita dificuldade com a estrela, mas no método “N” eles faziam com facilidade.

P – E você chegou a publicar?

D.1 – É, o professor da Universidade A, o João Oliveira, ele fez comigo duas pesquisas no curso que eu dava lá pra comunidade, inclusive tinha cinqüenta alunos assim de oito, dez anos que se matriculavam lá pra fazer, a gente botava os alunos pra ajudar a dar aula e ele fez duas pesquisas comigo, foi publicado na Revista A e, ele me disse ‘agora professor o que adianta você dar essas aulas bacanas aí e não botar isso no papel, vai ter que colocar no papel’. Então o meu objetivo agora, depois de ter feito esse livro “Livro A” [livro de autoria do docente], que é um resgate da origem da nossa Educação Física e da Ginástica Olímpica no país e no mundo, eu quero fazer um outro livro com esses processos pedagógicos das aulas que eu dava na Universidade A, tanto no curso de graduação quanto no curso de técnica desportiva.

P – E, como que você realizava suas aulas, assim num resumo do semestre, você tinha uma parte teórica e já prática, ela era mais prática, como era?

D.1 – Eu dava uma parte teórica sobre o que era a Ginástica Olímpica, inclusive na parte internacional, como era feito o julgamento, o que era um código de pontuação, as dificuldades dos exercícios, o que precisava pra conseguir uma nota dez, que agora é vinte né, e depois na parte prática eu fazia os processos pedagógicos e, com um acréscimo assim na parte teórica dessa parte mais avançada eu mostrava pra eles filmes dos campeonatos mundiais, dos jogos olímpicos, dos melhores ginastas e fazia algum comentário com referência ao código de pontuação, dificuldade, combinação, ou execução técnica, como é que perdia ponto, como é que conseguia ponto, etc.

P – E os seus alunos, além da Universidade, eles tinham alguma vivência que ia além do espaço acadêmico?

D.1 – Alguns chegavam, alguns vinham fazer o curso de Educação Física como ex-ginastas de clubes, então eles tinham mais facilidades, mas eu não me apegava muito

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àquele que tinha facilidade em fazer o que já executava bem, eu queria que os piores realmente vivenciassem a Ginástica da melhor forma possível com todos os educativos necessários pra ele conseguir futuramente ensinar os exercícios acrobáticos e os exercícios nos aparelhos.

P – E esse ‘ensinar’, eles faziam essa vivência como? Entre eles, entre crianças, com (...)

D.1 – É, eu fazia o curso comunitário na Universidade A e usava alguns alunos, mas esse aí é mais do curso técnico desportivo, na escola em si eu tinha (...) eu tenho um livro que eu posso até te mostrar ali que é um PAD Plano de Ação Desportiva que eu fiz pra Secretaria Municipal de Esportes, onde eu botei ali dois esquemas de aula que eu acho fabuloso. Um do Jacques Leguet que tem doze primeiros passos pra Ginástica, e um do Roland Carrasco que tem as dez famílias. Então nessas dez famílias e nesses doze primeiros passos, se você ataca todos eles naquela ordem de dificuldade que vem nesses dois livros, você consegue qualquer resultado. Precisa é saber usar esses livros! E, eu praticamente traduzi esses dois livros em francês e, peguei o que tinha de mais importante e fiz o Plano de Ação Desportiva pra Secretaria Municipal de Esportes. Eles publicaram uma quantidade muito grande de exemplares desse livro no tempo do Coronel Renato de Souza, e, toda vez que eu tinha o curso técnico eu distribuía pra cada aluno aquele livro. Naquele livro você tem uma orientação de como trabalhar com a ginástica, partindo do mais elementar até o mais complexo. E você inclusive tem séries obrigatórias ali de nível um, nível dois, nível três, até nível oito, que é de um programa francês que eu tirei e, eu usei até na Federação de Ginástica isso aí como motivação pro pessoal, que você pega idade de zero a cem anos, unissex, masculino e feminino, pode ser a mesma série e você monta o campeonato e aquele que conseguir média sete é promovido pro nível seguinte. Então o nível um é muito fraco, o nível dois também fraco, o nível três é mais regular, o nível quatro já começa a ficar mais difícil. Então se você consegue média sete nessa dificuldade, você tem condição pra passar pra dificuldade seguinte. Inclusive eu fiz um campeonato de massificação no Centro A, ta também no meu livro, com três mil colegiais, também idade de zero a cem anos, série unissex, três aparelhos, solo, salto e barra e, passei três mil atletas em três horas de competição, mas a cada cinco minutos entrava oitenta dentro do ginásio, depois de quinze minutos tinha duzentos e quarenta fazendo ginástica ao mesmo tempo e ninguém se cruzava e, era algo que eu dava no meu curso como orientação de organização de campeonato tipo massificação. Hoje a Federação inclusive fez um torneio, ta fazendo um torneio “P” [o torneio leva o nome do docente] que é um torneio de massificação, tendo em vista aquela iniciativa que eu tive naquela oportunidade.

P – E você considera das suas aulas, alguma metodologia diferenciada, além desse método, que você pôs o seu nome nos exercícios iniciais né, na forma de montar e fazer os exercícios, você considera algo diferenciado na sua metodologia de aula, algum aspecto?

D.1 – Eu acho que sim porque os meus alunos me adoravam. Eu to recebendo até hoje cartas e homenagens de ex-alunos até dos Estados Unidos congratulando pela semente que eu plantei na Ginástica tradicional, por causa do resultado que nós temos, estamos tendo hoje. Quero dizer, que eu não tive nunca nada a ver com a Daiane a não ser encontrar com ela lá em Atenas e com o Diego Hipólito. O Diego inclusive esteve em São Paulo, uma certa época, quando era bem bem menorzinho. Embora eu não tenha tido nada com eles, eu comecei um campeonato mirim brasileiro chamando Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo pra competir que eram os três únicos Estados que faziam Ginástica no Brasil, depois iniciei na Confederação Brasileira de Ginástica como presidente do conselho de assessores de Ginástica da antiga CBD e, comecei os

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campeonatos juvenis e, no outro campeonato como teve muito sucesso sugeri que também fosse incluído o infantil. Então eu acho que a gente tem que trabalhar a base, é mirim, é infantil, é juvenil, pra você ter adulto futuramente pra você representar o país. Antigamente quando eu entrei na Ginástica antes de sessenta, só tinha campeonato brasileiro de dois em dois anos e só adulto, e só competiam três estados Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo, que eram os três filiados da Confederação Brasileira de Desportes na época. Quer dizer, agora nós estamos aí com mais de vinte estados fazendo Ginástica, estamos realizando campeonato mirim, infantil, juvenil, em âmbito nacional, e em âmbito estadual. Todas as Federações estão realizando. Tem mais de dez Federações hoje. Antigamente só tinha três. Agora, você falou do método “N”, quer dizer, não quero me dar assim a noção de ser um cara egoísta, os exercícios são os mesmos que todo professor deve ensinar, uma cambalhota, uma parada, uma estrela, mas o Docente 1 ensinando é diferente! Eu consigo melhores resultados do que quase todo mundo pela experiência que eu tenho, pela vivencia, por verificar a dificuldade do aluno, por saber ir lá e resolver aquela dificuldade porque assim ele adquire a confiança nele mesmo em fazer determinado movimento até chegar a fazer sozinho. E eu tenho hoje uns processos diferenciados. Até sinto, hoje, o pessoal me chamando pra dar aula, mas eu não estou mais em condição de dar aula, porque pelo meu excesso de atividade física durante meus cinqüenta anos de atividade física, eu tive que fazer prótese total nos dois quadris e eu tive agora uma lombalgia aguda que eu fui de ambulância pra São Paulo por causa de um problema na L5 e S1. Então eu to, eu to sem poder abaixar, sem poder fazer força e sem poder auxiliar mais ninguém, mas na minha época eu segurava o pessoal de setenta quilos tudo no colo pra poder ajudar no flick-flack, no mortal, ajudava aqui, ajudava lá. Porque quando eu seguro, eu dou confiança e você ensina o aluno como se segurar, pois num segurar brincando, daqui a pouco um cai e se machuca e eu nunca permiti acidente nas minhas aulas, era proibido!

P – Bom, você falou que a Ginástica, eu entendi que a Ginástica evolui a partir da iniciação, de você iniciar bem os seus alunos né!?

D.1 – Você tem que iniciar pela base!

P – Para iniciar essa base, temos que ter professor competente para isso (...)

D.1 – É o que falta por aí! A aparelhagem é muito cara, você tem pouca gente que tem aparelhagem, você não tem nenhuma fábrica de aparelhos de Ginástica no país compatível, você tem que importar aparelho pra trazer pro Brasil e, você não tem Escolas de Educação Física que dão Ginástica a contento. A maioria das escolas não tem nem professor de Ginástica pra dar, e quando tem é um professor sem experiência adequada. Então você é um professor sem experiência, vai formar um professor que não vai sair com a experiência adequada e depois vai trabalhar num clube? Vai fazer o que? Ele pode ser um executante, então ele fala pro aluno ‘reversão é isso aqui, o flick-flack é isso aqui’, o aluno vai fazer porque ele mostrou? Eu fiz uma pesquisa lá na Universidade A, com o Professor João Oliveira sobre demonstração, sobre fazer por imitação a parte demonstrativa, a parte verbal e as duas juntas. A pesquisa nossa foi publicada na Revista A. Essa pesquisa foi feita com aqueles alunos do curso comunitário né, e eu sempre aproveitava alguns melhores pra deixar separado, quer dizer pegava cinqüenta alunos, aí via dez ali melhorzinhos e deixava separados num canto pra evoluir mais rápido e os outros você fazia a parte básica que eles todos precisavam.

P – Certo! E como que você visualiza a Ginástica Artística hoje, dentro e fora do contexto universitário, mesmo você não dando mais aulas, mas você é uma pessoa que

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está no meio desse pessoal, está no Organização B também, como você visualiza a Ginástica Artística hoje nesses dois espaços?

D.1 – Eu acho que ela evoluiu de tal forma, que antigamente você tinha a Escola A, que é a primeira do país e a Universidade A que davam Ginástica Olímpica. A cadeira de Ginástica na Escola B foi criada porque eu estava lá como auxiliar do Professor Castilho da cadeira de Ginástica Geral, pra dar uma parte de acrobacia uma vez por semana na cadeira de Ginástica dele. Depois ele criou a cadeira de Ginástica Olímpica, abriram concurso na Universidade, eu entrei no concurso acabei passando e assumi a cadeira de Ginástica. Eu fui dar aula na Universidade A, que ainda era no Centro A, na Escola B e o pessoal tava pedindo o curso técnico de Ginástica Olímpica pro Castilho, e ele como tinha feito um curso nos Estados Unidos em 1947 ele abriu lá um curso para o pessoal entrar pra fazer esse Curso de Técnica Esportiva de Ginástica Olímpica. Depois de três anos eu falei pra ele: ‘professor o senhor já reparou uma coisa?’. ‘O que, que é?’. Eu falei, ‘eu já formei três cursos técnicos de Ginástica e eu ainda não sou técnico de Ginástica Olímpica?’. Quer dizer, eu dava todas as aulas, eu dava as notas eu fazia as provas e ele como chefe da cadeira que assinava tudo, aí ele falou pra mim, ‘ah então você não tem curso? Então você se matricula no próximo!’. Então eu me matriculei no outro curso, paguei exame médico, fiz os exames, fui meu aluno, e meu próprio professor. Hoje eu sou formado pela Escola B da Universidade A no ano de 1971, como técnico esportivo de Ginástica Olímpica.

P – Você mesmo se formou? (risos)

D.1 – É, eu mesmo me formei, mas fui segundo colocado, não fui primeiro não! (risos)

P – E qual é a importância da disciplina de Ginástica na formação do professor que vai atuar na escola, por que a atuação hoje ela é muito extensa, a atuação profissional em Educação Física hoje, é muito extensa! Qual é a importância da disciplina de Ginástica pra quem vai trabalhar na escola?

D.1 – Eu tenho dois setores diferentes aí né. Eu sempre gostei de trabalhar mais parte prática do que teórica com os alunos. Quanto mais prática eles tiverem pra vivenciar a dificuldade dos movimentos, sentir a dificuldade dos movimentos pra poder ensinar futuramente, eu acho que ajuda mais do que ficar vomitando teorias em cima da molecada. E hoje, tem muito professor aí com esse negócio de pesquisa científica, mestrado, doutorado, é teoria em cima de teoria e o pessoal não faz nada de prática. Então você não vai ter experiência nenhuma pra fazer prática futuramente. A própria Rosana, assumiu o meu lugar, Rosana Constantino assumiu o meu lugar lá na Universidade A, e ela é muito teórica pro meu gosto. Quer dizer, os alunos deixam de aproveitar muito a parte prática, eu acho que quanto mais parte prática você têm, você tem que dar uma orientação para os alunos de forma geral do que é Ginástica, depois eles vão se interessar pra procurar aprofundar futuramente. Agora como você tem poucas aulas práticas você deve aproveitar no máximo essas aulas, pra eles sentirem na carne a dificuldade de fazer os movimentos. Eu já tive gordões fazendo mortais na cama elástica lá no meu curso. Tinha um gordão lá que falava, ‘eu nunca vou fazer parada de mão’. Eu falei, ‘quer apostar uma cerveja?’; aí chegava lá eu pegava o cara, trazia ele aqui, e botava na parada de mão. ‘Olha aí faz ou não faz?’. E eu boto qualquer um na posição invertida da parada de mão, por pior que seja a dificuldade dele .Eu pegava o pessoal com muita dificuldade, trepava na parede correndo assim, vinha jogava a perna e fazia um mortalzinho saindo da parede, ou faz com ajuda, mas é aquele negócio você bota uns guindaste pra ajudar né. Os alunos gostam de chamar de guindaste, dois alunos aqui, dois pra lá, o cara vai lá e faz o movimento, ele vai girar sobre si mesmo, no ar, no espaço, porque o mortal pra frente o que que é? É uma

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cambalhota pra frente feita no ar, em um planinho mais elevado. Faça a cambalhota pra frente, depois faça em cima de uma gaveta de plinton, faz em cima de duas, em cima de três, em cima de quatro, em cima de cinco, agora tenta fazer a cambalhota sem encostar no plinton, porque tem cara que vem bate o pé e vai fazer a cambalhota, se ele não consegue ele bate as costas no plinton. Se ele fizer a passagem com impulso, sem encostar no plinton, ele ta fazendo o mortal pra frente.

P – Bom! Então você formou professores, formou técnicos esportivos, mas você acha que os alunos que você formou, por que o mercado antes era (...) a essência era a escola! Você acha que os alunos que você formou chegaram a trabalhar com a Ginástica?

D.1 – Eu não acho que a essência era a escola não, se você fala de uma escola de forma geral, escola de alunos de Educação Física você diz?

P – É, década de 60, 70, o mercado de trabalho ele era mais voltado pra clube e escola.

D.1 – É, sim, clube. Praticamente escola não existia, era muito raro, você tinha em Campinas, por exemplo, o Professor José Mário Neto, que era professor do Culto a Ciência. Então ele dava Basquete, dava Vôlei, dava Futebol, dava Ginástica e entrava nos campeonatos colegiais do estado e ganhava tudo. Nos Jogos Abertos do Interior, ganhava tudo. Um dia ele chegou pra um aluno dele uma vez e disse, ‘olha meu amigo você é um cara que vai ter condição de ser um campeão, ir pra um mundial, mas aqui em Campinas eu não posso te dar nada. Vai em São Paulo treinar com o Docente 1 no Clube A, e você logicamente vai pra um campeonato internacional’. O rapaz foi pra lá, treinou e acabou indo num Pan-Americano comigo, e também foi num mundial comigo. Isso quer dizer que o clube é que dava condições, a escola não dava. A escola quando ela tem alguns colchões e plinton já tem muita coisa. Você não tem argolas, não tem cavalo, não tem paralelas, não tem trave, não tem barra. De vez em quando você tem uma barra. Então você vai trabalhar como? As escolas normalmente não trabalhavam com Ginástica, os clubes é que faziam tudo. Eu sempre digo, que se você vai na Rússia, o estado te da tudo quando você é bom. Você vai para o Japão a indústria te dá tudo quando você é bom. Você vai para os Estados Unidos a Universidade te dá tudo quando você é bom. Aqui no Brasil é o clube que te dá tudo, porque as escolas não fazem nada. Secretarias não fazem nada. Governo não faz nada. Governo Federal não faz nada, ninguém te dá nada, então o clube dá e o clube não tem muita motivação, muito estimulo. Eu uma vez competi com um pessoal no Pan-Americano, a primeira vez que nós ganhamos a medalha de bronze em Porto Rico, tinha dois atletas meu do Clube A. O MEC deu oitenta mil pro clube, como bonificação pelas medalhas de bronze que os dois atletas do clube ganharam. Era uma motivação pro clube. Agora o clube trabalha, trabalha, trabalha, quando chega num Mundial, num Jogos Olímpicos o Comitê Olímpico Brasileiro ‘onde é que ta o melhor time de basquete aí?’; ‘Ah, ta lá em Campinas’. Vai lá em Campinas, pega o time e vai representar o país, mas o Comitê Olímpico Brasileiro, faz o que, pra ajudar? Agora eles tão dando verba, pras Confederações Olímpicas, mas antigamente eles não davam essa verba, e toda vez que você convocava uma seleção, você convocava a seleção através dos clubes que trabalhavam com o esporte. Nunca quando você faz uma seleção, por exemplo, de escola você nunca pega ninguém. De Universidade você nunca pega ninguém. O esporte universitário nosso também, se for pegar aí você vai pegar gente de clube pra competir numa Universidade né, não dá condição.

P – Então, você não acha que os seus alunos que foram atuar na escola, chegaram a trabalhar com Ginástica Artística?

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D.1 – Não, eu acho que a maioria dos meus alunos que saíram foram trabalhar em clubes! Alguns, acho que muito poucos, foram trabalhar em escola. As escolas não te dão condição e não te pagam também. O clube além de ter uma aparelhagem, ele tem motivação de competir e tem dinheiro pra comprar aparelhos e pra pagar o técnico. Teve uma época aí que eu estava fazendo curso técnico; eu ministrei dez anos de curso técnico na Universidade A e, eu era ao mesmo tempo presidente da Federação de Ginástica. Eu levava meus alunos para atuar lá como árbitros, como mesários, eles faziam de tudo. Quando eu ia numa competição, depois que eu saí, que eu abandonei, chegava numa competição e ficava lá na arquibancada assistindo. Se você contasse quem tava de árbitro, de mesário, quem tava de técnico, 80% tinham passado pelas minhas mãos. Então eu acho que eu fiz um senhor trabalho para o desenvolvimento da nossa Ginástica, considerando os professores que eu formei na Universidade A na Escola A. Dei aulas também em Cidade A e em Cidade B. Ta certo que lá eu só dava aula aos sábados e ia dar aula teórica sobre o código de pontuação a pedido do Professor Telarolli que era o professor da cadeira. Na Organização A lá em Cidade A, eu dei aula inclusive, para os curso técnico esportivo também. Na Escola A, eu era o dono da cadeira. Esse campeonato que eu fiz de massificação com três mil participantes, precisava de muita gente pra trabalhar, fiquei dois meses organizando e, essas três escolas entraram lá pra trabalhar, pra levar a garotadinha pela mão pra dar as voltas, pra não se cruzar, sabe.

P – E pensando nas condições mais atuais, no PCN, por exemplo, a gente tem que a Ginástica Artística tem que estar na escola, e você já falou que na escola não dá pra trabalhar, você não tem material, você não tem (...)

D.1 – A escola é um negócio tão difícil pra você trabalhar com Ginástica e até com Educação Física. Você falou, eu sou da Organização B hoje, da Organização B. Nós não podemos fiscalizar se a escola tem um professor de Educação Física ou técnico de Ginástica, quer dizer, como é que uma escola vai contratar um professor pra dar Educação Física? Se ele for um leigo você não pode entrar lá pra dizer ‘olha você ta prejudicando seus alunos, você pode quebrar o braço de um aluno’. Já recebemos queixas lá, denúncias de alunos que se acidentam em aulas. Há poucos dias saiu nos jornais, no mês passado, um menino que fraturou o braço, fraturou o calcâneo numa corrida, numa aula de Educação Física. Agora a gente não pode fiscalizar se aquele professor que ta lá dando a aula, realmente é formado em Educação Física, porque a função da Organização B é fiscalizar pra ver se não tem leigo tomando lugar do pessoal formado, mas você não pode fiscalizar a escola. Em qual país que nós estamos?

P – Mas, por exemplo, nas escolas públicas tem o concurso, o MEC faz essa exigência do diploma, então isso já seria um meio de fiscalizar, eles exigem a licenciatura, o bacharel não pode trabalhar na escola, isso também seria uma fiscalização né?

D.1 – O bacharel não pode trabalhar na escola, então você se for licenciada não pode dar aula de prática de esporte lá, porque o licenciado não pode dar aula pratica de esporte só o bacharel. Agora, o bacharel não pode porque ele não é licenciado, e o licenciado não pode porque ele é um pedagogo e não pode dar aula prática e, ele não tem o curso de bacharel.

P – Então, fica sendo incoerente a Ginástica Artística num currículo de formação pra licenciatura?

D.1 – Eu acho que todas as disciplinas práticas de esportes deveriam ter em todos os cursos entendeu?. O que eu acho errado e que eu não concordo hoje e, podem me criticar à vontade, é essa separação que fizeram entre os dois cursos. Eu fiz licenciatura

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plena na Escola A em nove meses e fui professor; e um senhor professor! E, fui técnico; e um senhor técnico! Fiz as duas coisas num curso de nove meses. É um curso sério, quer dizer, você faz um curso de quatro anos e você não pode formar um professor que possa atuar como professor e, possa atuar com administração, como técnico desportivo, como arbitro? É (...) eu não sei aonde é que nós vamos parar! Eu, faz tempo (...) to a mais de vinte e cinco anos aposentado né, muita coisa mudou, mas não sei se muita coisa mudou pra melhor ou pra pior (risos)

P – (Risos) E, quando você se aposentou, como que estava a disciplina de Ginástica Artística, ela era semestral, tinha mais de uma, Ginástica 1 (um), Ginástica 2 (dois) (...), como estava no currículo?

D.1 – É, tinha Ginástica 1 (um), Ginástica 2 (dois), um semestre, outro semestre, mas normalmente sempre um ano a Ginástica né. Tem que trabalhar no mínimo um ano, porque seis meses é muito pouco. A gente fazia G1 e G2 em dois semestres, aí você dava pra dar uma boa noção do que é a Ginástica pra um futuro professor né. Agora, hoje, num curso de licenciatura que abriram na Universidade A, eles me pediram pra dar quatro horas de Ginástica Olímpica no curso de licenciatura para os alunos tomarem conhecimento do que era Ginástica. Quatro horas num curso de três anos, quatro anos, você vai dar o que para os moleques? Quer dizer, isso era para todas as disciplinas práticas, quatro horas de Ginástica, de Natação, de Vôlei, de Basquete pro curso do futuro professor. Aí ele chega na escola, ele não vai poder fazer nada disso, ele vai dar aula teórica de esporte para os alunos? Alguma coisa ta errada aí e precisa mudar!

P – E você auxiliava na montagem do programa da disciplina?

D.1 – Não, eu é que fazia o programa da disciplina! Eu fazia o programa dentro daquilo que eu achava que era o ideal para os alunos tomarem conhecimento, e esse programa (...) grande parte dele, acho que 80% ainda consta, embora trocassem um pouco algumas práticas por mais aulas teóricas né.

P – E a Universidade dava essa liberdade total de montagem?

D.1 – Ah dava! Na Universidade A, que sem dúvida nenhuma é a melhor do país, é que muda muita coisa, quer dizer, eu acho que a única coisa ruim que tem ali, é o pessoal teórico brigar muito pela teoria né. Tem um pessoal que é pedagogo e é muito teórico, que não quer saber de aula prática. Provavelmente eles devem ter sido um bocado ruins quando foram alunos (risos), mas com exceção disso eu acho que a Universidade A ainda é a melhor escola e o professor tem total liberdade de fazer lá o que ele acha que é melhor pro curso.

P – E, como era a avaliação? Como você avaliava seus alunos na parte teórica ou parte prática, a parte pedagógica, como?

D.1 – Até hoje os alunos falam comigo do tal de ‘xizinhos’.Os ‘xizinhos’ eram quarenta exercícios que eu colocava lá numa relação para eles fazerem, tinha uma folha com os quarenta exercícios: cambalhota pra frente, cambalhota pra trás, estrela, giro de quadril e aviãozinho, um negócio assim, espacato; e a medida que eles iam fazendo esses exercícios, eu mostrava como é que eram os seus processos pedagógicos pra chegar lá e, eles faziam um treinamento extra e, na hora que eles conseguiam fazer ‘professor o senhor quer ver esse movimento?’; Ia ver, ‘ah legal! Vai lá e bota um ‘xizinho’ pra você nesse movimento’. E ele botava um ‘xizinho’. Então nos quarenta, se ele fizesse os quarenta, ele tirava nota quatro, aí eu dava dois de trabalho que eles faziam tipo monografia e, quatro de parte teórica. Então era quatro de parte prática com quarenta exercícios, e eu dava aula de tudo aquilo; na parte teórica eu perguntava os processos

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pedagógicos para usar em determinado exercício, parte de regulamentação, parte de pontuação e etc...; e, dois pontos de um trabalho que eu pedia para eles fazerem. Nunca gostei de trabalho de grupo, porque um trabalha e todos recebem nota, então tinha um trabalho de grupo individual é o método “N” também (risos). Então o trabalho de grupo seu é só você, e você vai falar sobre a biomecânica da Ginástica Olímpica, você vai falar sobre fisiologia, você vai falar sobre métodos de treinamento, você vai falar sobre processo pedagógico, cada um fazia a sua monografia e apresentava em classe a monografia para o pessoal, e aí eu fazia comentários “N” (risos) em cima das monografias deles, traçava as linhas e dava as notas deles.

P – Interessante! (risos)

D.1 – Eu quero te mostrar, eu vou pegar um livrinho lá no quarto pra você ver o que é esse negócio.

Pausa para o docente buscar os livros.

D.1 – Esse aqui é o livro de teoria que eu falo, onde você tem os doze primeiros passos da Ginástica.

P – Está traduzido?

D.1 – Esse aqui ta traduzido, pela Manolle.

D.1 – Tem um quadrinho aqui que mostra bem. Primeiros passos para a atividade de Ginástica, então ele cita: aterrissagem e equilibrar-se, girar sobre si mesmo, balançar em apoio, balançar em suspensão, passar pelo apoio invertido, passar para a suspensão de semi-invertido, deslocar-se em bipedia, equilibrar-se, passagem pelo solo, trave, abertura e fechamento, volteio e saltar. Esses aqui são os doze passos que você faz indicados no livro de Jacques Leguet; e, o Carrasco, ele tem as dez famílias: rotações para frente, rotações para trás, combinação das rotações, rotações longitudinais, impulsão alternada perna braço, posicionamento do dorso, impulsão simultânea perna braço, que seria o salto, abertura ante-pulsão, fechamento retropulsão, fazer kipe etc e, a evolução giratória. Então essas famílias, você usava com cambalhota pra frente começa assim, parte elementar, inclusive se você pegar aqui na frente do livro tem da letra A até R, um aumento de dificuldade das rotações para frente, olha aqui, rotação pra frente, rotação pra frente, rotação pra frente, você chega até lá rotação pra frente, então com uma simples cambalhota você chega num mortal pra frente, que é uma rotação pra frente também, de uma cambalhota de costas com plano inclinado você chega num mortal de costas num duplo de costas etc. Aqui seria o apoio, você vê combinação das rotações, uma pra frente, uma pra trás, rotações longitudinais, eixo do corpo, giro em sentido longitudinal, alternar perna braço, se é estrela, rondante, esse negócio (...). Então se você trabalha essas famílias separadamente e esses doze aqui, eu fazia trabalho muito com os alunos disso aí, ‘me faça uma diferenciação entre o método de Leguet e o método Carrasco, das dez famílias contra os doze primeiros passos’, que era o básico pra você dar Ginástica nas escolas. Então, com isso aqui você pode dar aula na escola, se você tiver aparelho você faz um de cada um aqui, ou você pode fazer dez desse aqui, ou dois ou três, quantos você queira.

P – Bom, nessa parte inicial aqui, da até pra você adaptar para a escola né?

D.1 – É claro! Olha, aqui é uma cambalhotinha com o auxílio de um plano mais elevado, quer dizer, todo mundo começa por aqui. Quando você diminui o plano, a altura aqui, do plano inclinação e fizer na horizontal você ta fazendo o movimento. Daqui a pouco você

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estica o braço, daqui a pouco você estica o corpo, faz a cambalhota de costas à parada de mão, mas tem que começar daqui, começar com ajuda.

P – E os seus alunos na licenciatura você ensinava a executar pelo menos essas partes iniciais?

D.1 – Eu fazia isso sim! Principalmente, esses processos pedagógicos de como fazer a cambalhota para frente. Eu faço essa cambalhota pra frente deitado num plinton, puxo o corpo e faço a cambalhota. Eu faço essa cambalhota ajoelhado num plinton, eu ponho a mão no chão e fazendo a cambalhota. Eu faço a cambalhota num banco sueco colocado num espaldar inclinado, coloco um colchão ele vai lá ajoelha, levanta o joelho e faz a cambalhota. Todos processos pedagógicos pra você chegar lá e, quando tiver fazendo cambalhota pra frente, aí você começa fazer em uma gaveta do plinto,, em duas gavetas, em três gavetas, pra você poder fazer o mergulho futuramente. Tem cara aí que já quer fazer o mergulho direto, puxa a cabeça e quebra o pescoço. Então, essas coisinhas que eu acho importante, e aqui você tem maneiras de ensinar, e aqui tem todos os aparelhos masculino e feminino né. Você tem aqui os masculinos e cada um deles tem seis níveis; tem solo nível 1 (um) A e B, nível 2 (dois) A e B e nível 3 (três) A e B; cavalo com alças A e B. Eu chamava de níveis 1 (um), 2 (dois), 3 (três), 4 (quatro), 5 (cinco) e 6 (seis) né, então, se você fizer aqui um total de pontos você passa pra esse nível aqui; você faz um total passa pra esse aqui. Agora, eu tinha quarenta exercícios lá, pegava um daqui um de lá, os alunos tentavam fazer aqueles movimentos e a medida que fizessem vinte movimentos ganhavam nota dois, se fizessem vinte e cinco ganhavam nota dois e meio, dava uma média para o bimestre. Então a turma falava dos ‘xizinhos’ “N” lá que não é mole né. E aqui você tem um trabalho, por exemplo, que eu fiz com o João Oliveira [mostra o título do trabalho] – Docente 1 e João Oliveira – nós fizemos esse trabalho lá na Universidade A no curso que eu fazia lá pra comunidade (...) espacato, paradinha de cabeça, espacato antero-posterior, cambalhotinha pra frente, cambalhota de costas, foram os exercícios que eu usei com os alunos do cursinho de aprendizagem, pra ver o rendimento que eles iam ter, e aqui você tem toda a parte de avaliação. É, foi uma pesquisinha bem bacana, instruções e conteúdos. Esse foi um outro trabalho feito só com a parte pedagógica, aqui, [mostra outra publicação]. Essa aqui nós até filmamos também, tem o filminho acho que até hoje aí e, essa aqui era uma sériezinha que eu tinha e os caras faziam a série completa, masculino e feminino e, a gente dava uma nota, levei arbitro lá pra dar nota, era uma série obrigatória.

P – Quando eu fiz esse chamava ‘solinho do xis’ (risos).

D.1 – ‘Solinho do xis’? (Risos)

P – É verdade, quando eu era novinha a gente competia o ‘solinho do xis’ e era parecido com esse.

D.1 – Essa aqui foi uma sériezinha que eu mesmo inventei e mandei desenhar.

P – É, eu acho que ela chegou lá na minha cidade (risos). A gente fazia competiçãozinha com ela (risos). Então, você avaliava também bastante a parte prática? Você acreditava que os seus alunos que pretendiam trabalhar com isso precisavam ter essa vivência, precisavam saber fazer?

D.1 – É melhor que tenham, eu acho. Eu tive, inclusive, exemplos gozados lá na Universidade que uma vez eu reprovei um aluno no vestibular, por que queria fazer o curso técnico comigo e ele era meio velho e, eu falei pra ele ‘olha você não tem condições de acompanhar meu curso então eu não vou deixar você entrar porque você vai perder o seu tempo’; ‘ah professor eu preciso fazer’; ‘não dá, você é muito duro, não

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tem a flexibilidade que eu tenho, então isso aqui não dá pra você fazer’. Mas eu tinha mandado os caras fazerem um trabalho ‘Porque desejo fazer o curso de Técnico Desportivo’, aí eu fui ler o trabalho dele lá ‘olha eu estou trabalhando com Ginástica Olímpica e eu queria aprender mais pra não prejudicar os meus alunos’. Aí eu chamei o cara lá ‘olha você quer topar fazer o curso? Você faz, sabendo que vai estar reprovado, mas você aproveita as aulas o ano inteiro, você vai aprender’; ‘não, ta bom professor, eu concordo, eu quero fazer o curso, não tem importância eu tirar o diploma ou não tirar o diploma’; ‘bom ta feito’. Foi um dos meus melhores alunos. Aí, eu tive uma outra aluna que veio lá, hoje ela é professora do Colégio A ou do Colégio B. Ela, quando veio, era meio rechonchudinha, aí eu disse ‘olha, você não vai ter condições de acompanhar o curso, por isso não vai dar pra te colocar aí, porque eu puxo muito e você não vai acompanhar’; ‘não, mas eu preciso fazer e não sei o que, não sei o que’; ‘ta bom’. Como aconteceu com o outro caso, ‘eu vou te deixar fazer, mas, você ta sabendo que vai ficar reprovada, não vai reclamar no fim do curso que ficou reprovada’; ‘não, não eu só quero assistir as aulas’; ‘tudo bem, faz as aulas’. Foi o melhor trabalho de biomecânica na Ginástica Olímpica que eu tive. Foi esse trabalho que eu mandei ela fazer. Ela traduziu todo o livro de biomecânica; tem aí o papa da biomecânica em italiano, traduziu inteiro, deu uma senhora aula, emagreceu dez quilos e até hoje me manda cartão de natal, de aniversário (risos).

P – É (...) e nesse processo de avaliação que eles tinham, era só o ‘saber fazer’, ou você avaliava, o ‘como ministrar a aula’?

D.1 – Um exercício prático, eu dava quarenta exercícios e tinham nota quatro, um décimo cada exercício. Essa aí era a parte prática e a parte teórica que eu fazia envolvia os processos pedagógicos, dos exercícios que eu pedisse e a parte da regulamentação, a parte de pontuação, a parte de organização de competição etc, e dois pontos do trabalho que eles faziam que todos assistiam, sobre biomecânica, sobre fisiologia do treinamento, sobre organização de competição etc.

P – E você sentia, enquanto docente, alguma relação de poder de disciplinas mais práticas como a Ginástica em relação às disciplinas mais teóricas?

D.1 – Bom, o que você podia sentir ali era o seguinte, o pessoal que tinha muita dificuldade prática, tinha gente que tirava só meio ponto, porque só fazia cinco ‘xizinhos’ dos quarenta e tirava meio ponto. Aí ele tinha que se dedicar na teoria porque ele só passava com média cinco né; como a teoria vale quatro, o cara que é bom de cabeça, ele vai lá tira quatro na teoria. É ruim de prática? Tira nota ruim na prática, tem que compensar com a teoria. O cara que era bom de prática não dava muita bola pra teoria, mas nota cinco é fácil, difícil é você tirar nota num trabalho de grupo individual que o cara tem que se dedicar pra fazer né.

P – Mas a Ginástica, o Basquete, são modalidades mais práticas; elas tinham algum entrave com as disciplinas que tratavam mais de teoria? Tinham a teoria e a prática essa disputa?

D.1 – Eu acho, que todos lá davam! Mesmo o Basquete, o Vôlei, davam também a parte teórica, mas a parte teórica de regras, a parte pedagógica a parte prática eles iam mais na quadra mesmo treinar. Quando eu chegava, dava aula de Ginástica, eu usava até bola de Basquete; aula de Ginástica eu dava na piscina; dei aula de Ginástica dentro da piscina, dava parada de mão, mortal pra frente, mortal de costa e ajuda e, flick-flack; uma aula por ano eu fazia na piscina com o grupo todo era a aula que todo mundo fazia de maiô (risos).

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P – Você dizia que a Universidade A ela está bem teorizada agora, ela valoriza mais a teoria e esquece da prática?

D.1 – Não! Não é que ta bem teorizada. Tem uma minoria que brigam pela teoria e isso aí anarquizou um pouco o esquema eu acho, mas hoje eu até concordo um pouco assim com o João Oliveira, que a pesquisa é realmente importante. Porque ele dava assim, 70% de valor para a pesquisa e deixava os outros trinta com a parte pedagógica e com a parte universitária lá, sei lá. Mas eu não concordava muito com aquilo porque eu achava que o aluno tinha que pegar na parte prática, tinha que pegar no breu para sentir na carne a dificuldade do Basquete, do Vôlei. Quer dizer, você não pode ensinar Atletismo, Basquete, Vôlei se você não sente como é que é a coisa né. Eu mesmo fui professor de uma escola Colégio C aqui em Cidade C e eu tinha que dar tudo. Tinha que dar todas as provas de Atletismo, todos os estilos de Natação, o Basquete, o Vôlei, o Futebol e a Ginástica. Eu era o único professor, mas tinha que dar todas as modalidades, quer dizer, na escola você tem separados os especialistas né. Naquela escola lá eles contratam um professor e você tem que dar de tudo para os alunos e, eu tinha o dia do esporte lá com provas de Atletismo, e o dia da Natação com todos os estilos, e a escola inteira competia, tinha recorde, tinha festa.

P – Mas os pareceres legais colocam o professor de licenciatura em Educação Física meio ‘multi-valente’, nem poli, mas ‘multi’ e, tem que fazer tudo isso (risos)!

D.1 – É tem que fazer tudo mesmo (risos). Eu gostava mais desse professor. Eu sempre gostei de ser meio eclético, nunca fui bom em nada, mas sempre fiz de tudo, então é para montar cavalo eu monto, é Esgrima eu faço, é nadar eu nado, é Ginástica eu faço, faço de tudo (risos). Quando eu vejo alguém, pelo olhar clínico sempre você pode dar uma informação. Eu agora vou na piscina; hoje mesmo eu fui na piscina nadar lá de manhã, fazer uns exercícios para a minha coxo-femoral aí, em virtude da minha prótese e, aí, de vez em quando, eu vejo um maluco fazendo coisa errada ‘olha corrigi o braço aqui, a perna lá’ (risos), quer dizer, não agüenta, você vê que ta errado você vai lá e tenta ajudar né.

P – E agora, não tanto mais na condição da formação dos seus alunos, mas você como professor mesmo, você buscou, você se formou no próprio curso (risos), o que você acha imprescindível aos docentes que estão vindo? Tantos cursos aí formando especialistas e mestres, doutores (...) o que é importante para eu trabalhar com Ginástica Artística, com Ginástica no ensino superior?

D.1 – É, outro dia eu fui convidado aqui pelo prefeito municipal para ir num festival de Ginástica aqui. Os meus ex-alunos dão aula aí no Clube B, eu cheguei aqui e descobri quando fui lá ver a Ginástica. Até encontrei com um num restaurante e, ele me convidou pra ir lá. Eu fui e vi as aulas dele, as instalações dele são muito boas e, ele falou ‘ah professor, nós vamos ter um festival o senhor pode vir aí?’; ‘eu vou lá pra ver o que vocês estão fazendo’ e, eu tava aqui em casa no domingo pensando ‘vou ou não vou’; veio convite do prefeito; a minha mulher estava dormindo, estava doente; eu falei ‘eu vou lá só pra falar que eu não vou né’; eu vou lá falo ‘ó vim aqui mostrei a cara só pra mostrar presença e ir embora’. Aí eu vi o aluno a hora que eu cheguei, ele veio correndo, ‘ah professor, vem que eu vou levar o senhor até lá embaixo’; eu falei ‘não, eu vim aqui, mas eu vou ter que sair rapidinho, minha mulher está doente em casa, eu não ia deixar de vim porque eu falei que eu vinha né, eu tenho que ir embora’; ‘não dá pro senhor esperar só a inauguração?’. Aí eu cheguei lá, a inauguração lá, o desfile, não sei o que, e tal, pediram pra eu falar umas palavrinhas, aí eu dei lá pra eles, a mensagem sobre a Ginástica, e aí fomos sentar pra ver a competição e vem lá um pessoal com uma placa, professor Docente 1, internacional, homenagem, não sei que e tal, então se

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eu não fosse ia ser um papelão né? (risos). Mas eu tenho um livro francês aí do Arthur Magakian que ele fala ‘a maior motivação da Ginástica Olímpica, hoje Artística, é a dificuldade superável’. Dificuldade superável, ela é sempre difícil, mas você pode sempre superar essa dificuldade! Hoje você não faz cambalhota, amanhã você faz; hoje, sei lá, a estrela ta com dificuldade, você vai treinando amanhã você faz; ah, eu não faço parada de mão, amanhã você faz; tem sempre uma dificuldade nova e ela é superável e, você vai superando e, vai aparecendo outra dificuldade, quer dizer, daqui a pouco você vai estar fazendo duplo mortal e, pô não tem mais, claro que tem, ainda tem triplo mortal.

P – Hum eu não cheguei no duplo mortal! (risos)

D.1 – (Risos) Não chegou no duplo? (risos). Mas depois que fizer o duplo, vai ter o triplo mortal. Essa dificuldade superável, você sempre podendo fazer alguma coisa mais difícil é uma motivação; mas, outra coisa que eu digo para os alunos é, que nem todos nós podemos ganhar medalhas, mas todos podemos fazer o nosso melhor pra conseguir o nosso melhor resultado. Hoje você tira uma nota cinco, ta horrível, amanhã você ta menos ruim, depois tira sete, já ficou mais ou menos, daqui a pouco tira oito já ta com um nível técnico compatível, que dizer, então a gente não pode todo mundo ganhar medalha. Tem oitocentos, uns vão ganhar medalha, os outros não vão, mas todo mundo pode dar o melhor de si pra conseguir a sua melhor nota, são duas coisas muito importantes. Então eu acho que o importante para o futuro professor, é isso aí, quer dizer, nem todos poderão ser ótimos e excelentes professores, ou técnicos ou executantes, mas, todos nós podemos fazer o nosso melhor, para dar o melhor de nós para o nosso aluno futuramente e, quanto mais você der para o seu aluno, mais conceitos você vai pegando deles, do público, da comunidade; o negócio é trabalhar sério, trabalhando sério e não brincando em serviço, você vai ter o seu lugar ao sol. O que me deixa muito triste hoje é, principalmente, é estar na Organização B e verificar que nós temos aí praticamente cento e quarenta Escolas de Educação Física no estado de São Paulo e, se tiver dez trabalhando bem, é muito! O resto dá o diploma e fala ‘olha, você hoje é professor de Educação Física’, quer dizer, o cara não vai trabalhar porque ele não tem competência, porque ninguém vai contratar um analfabeto pra dar aula né. Lá na Universidade B mesmo, eu vi um aluno aí no curso de alfabetização, quer dizer, uma professora que da aula no curso de alfabetização falou ‘professor, eu estou com um aluno lá’; eu falei ‘o que, que você anda fazendo?’; ‘to no terceiro ano do curso de direito’. Ele está no terceiro ano do curso de direito na Universidade B e não sabe escrever e, esses são os profissionais que as nossas escolas estão formando por aí. Hoje, a maioria das escolas de Educação Física, principalmente as particulares, fazem do aluno uma máquina de ganhar dinheiro, quer dizer, esquecem até que o aluno é um ser humano, coisa que eu briguei muito lá na Universidade B, por causa disso né. Pensam que o aluno é uma máquina de ganhar dinheiro, tem que ser tratado como ser humano, tem que dar tudo de melhor para ele, para ele ser um bom cidadão futuramente, um bom professor .

P – E, além da sua parte de vivência como atleta, onde mais você buscou esses subsídios para trabalhar com a docência, são trinta anos de professor universitário né?

D.1 – A minha vida começou, quando eu fui fazer o curso de Educação Física em 59 (1959) e tinha lá a cadeira de Ginástica de aparelhos e solo, que é a Ginástica Olímpica. Nós naquela época tínhamos, os (...) os sargentos monitores, que eram os executantes e, tinha um tenente instrutor, que era o homem da teoria, mas não tinha teoria na época. A gente até chamava de ‘carro de fogo’, porque só tinha a parte prática e um exame no meio do ano, quem não conseguisse média pra ser aprovado na parte prática era eliminado do curso. Eu terminei o curso, fui primeiro colocado no curso e, aí, como eu

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tive facilidade pra fazer por imitação os movimentos demonstrados, me chamaram para ser instrutor da cadeira. Eu achava uma estupidez você, num curso de Ginástica Olímpica, só ter exercícios práticos pra aprovar os alunos, já que você vai ser um professor. Professor é para orientar, não é pra ser executante! Então eu fui procurar a Federação pra descobrir alguma coisa teórica pra dar, porque não tinha nada de teoria. Eu fui procurar a Federação e achei lá uns regulamentos e etc, e depois acabei indo pra Federação como diretor técnico. Aí, fui organizar campeonatos, fazer regulamentos de campeonatos etc e tal, e comecei a me envolver com essa parte teórica e, introduzi no curso lá uma parte de teoria, de organização de campeonatos, de julgamento etc e tal, porque lá nós temos o curso de instrutor, que é o futuro professor e o de monitor que é o executante. Então o tenente, sempre que vai dar aula, bota lá o guia dele, que é o sargento, pra fazer a execução dos movimentos e, o curso de monitor nosso era mais uma parte prática. Na Federação eu, depois, fui convidado pra dar aula no Clube C, pra dar aula no Clube A, pra dar aula no Clube D e o Professor Castilho me chamou pra dar aula na Universidade A com ele, para dar acrobacia, dar Ginástica Olímpica numa das aulas de Ginástica dele, como eu te falei. Criaram aí a cadeira e eu comecei a dar a Ginástica Olímpica lá. Então, minha experiência foi assim, quer dizer, eu executava mais ou menos bem quando fiz o curso, fui para ser instrutor, vi as deficiências que tinha, comecei a modernizar o negócio e hoje praticamente, o que tem aí de regulamento fui eu. Até da Cidade D, o Professor Braulio me escreveu aí pedindo dados que ele ia dar um curso de Ginástica Olímpica e não sabia o que fazer. Então me mandou até a programação a ser desenvolvida no curso e eu fiz meus comentários e devolvi pra ele. Ele ta doido pra me levar lá, quer me levar de qualquer jeito, quer que eu vá dar uma aula de iniciação pedagógica pra seus alunos, mas não dá. Ele me disse ‘o senhor só diz como é e a gente faz’, e isso é outra coisa, quer dizer, eu falar ‘é desse jeito’ e deixo você fazer é uma coisa, eu ta lá pegando no breu é diferente, o aluno vibra mais quando eu mesmo oriento a aula.

P – Então a sua experiência anterior a sua formação, como atleta, foi essencial no seu trabalho porque você acabou inaugurando a disciplina?

D.1 – É! Eu, quando garoto, brincava com uma barra fixa no Clube E lá em Cidade E. Tinha uma barra fixa ao relento lá que eu balançava, fazia meia volta mas não sabia nem que existia o esporte Ginástica, Ginástica Olímpica. Vim para a escola de cadetes em 54 (1954) e, em 54 a gente tinha Educação Física e, eu era um dos melhores na Educação Física dentro da escola de cadetes. Quando eu terminei a escola de cadetes fui pra Escola A. Era um curso de nove meses equiparado ao curso da escola civil e, a gente se formava professor de Educação Física e, eu fui registrado na Divisão de Educação Física no Ministério de Educação e Cultura da época. Inclusive fui convidado pelo MEC para organizar dois Jogos Escolares Brasileiros de Ginástica Olímpica; fui dar aula nos quatro cursos nacionais de Ginástica Olímpica do MEC, quer dizer, a gente foi adquirindo aí uma experiência, saí muito do país né, fui fazer curso na França, fui fazer curso no Japão. Ganhei uma bolsa de estudos para o curso da França porque dançava o Ballet de Joinville-le-Pont. Eu dancei esse balé para o adido militar da França e fiz o histórico em francês, porque foi a Missão Francesa que o trouxe pra cá e, querendo manter a tradição em homenagem aos nossos mestres, a gente mantinha no Brasil aquela tradição. Ele me deu uma bolsa de estudos e eu fui pra França e fiquei cinco meses lá em 1968 e levei a esposa. Depois teve um concurso para professores, para ir estudar ginástica no Japão em 1972, bolsa do MEC também, que veio pro departamento de Educação Física de São Paulo.

P – Você era docente já?

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D.1 – É, era docente, e ganhei com isso. Fui lá pro Japão, fiquei dois meses lá na Universidade C também estudando Ginástica com o pessoal de lá e, comprei os livros do Kaneko. Akitomo Kaneko era uma das maiores autoridades em Ginástica Olímpica no mundo. Ele escreveu um livro de cada um dos aparelhos. Ele foi técnico até do Sawao Kato que foi quase tricampeão olímpico. Ele ganhou duas Olimpíadas, e ele ganhou até o obrigatório, mas no livre ele perdeu para o Andrianov. Eu tenho esses momentos todos aí, passei dois meses no Japão com os melhores ginastas do mundo lá. Um negócio de louco! Depois fui três vezes para a Rússia, fui para a Bulgária e fui para a França um monte de vezes.

P – Você foi fazendo uma pesquisa de campo nesses países?

D.1 – É. Fui para as Olimpíadas de Seul como comentarista da Rede de TV A. Quando teve os festivais de Ginástica aqui eu também comentava aqui para a televisão. Em 1978 teve a terceira Copa do Mundo no Centro A, e fui eu que organizei em Cidade C aquela Copa do Mundo. Sempre tive atletas nos Jogos Pan-Americanos, nos mundiais; fui técnico do Clube A por 20 anos; fui mais de seis anos campeão brasileiro de Ginástica no masculino. Em 1980, nos Jogos Olímpicos de Moscou, o representante brasileiro era meu ginasta Marco Aurélio do Clube A, treinado por um técnico japonês que trouxemos do Japão.

P – E pensando um pouquinho na pós-graduação, pensando na formação desse pessoal que vai trabalhar, porque você se aposentou alguém precisa entrar no seu lugar! Não pensando mais em quem vai para a escola, quem vai para o clube, mas quem vai para a Universidade. O que vamos fazer para conseguir esse pessoal para trabalhar na graduação? O que você acha que é preciso buscar, por que não seria coerente trabalhar mais com atletas e técnicos como professores, eles precisam ter uma formação superior (...)

D.1 – Hoje no CREF você tem (...) um termo técnico que você não é professor, você registra o cara como provisionado. Ele tem que provar que antes de 98 ele atuou por mais de três anos nessa modalidade em algum clube, aí ele recebe uma carteirinha para poder atuar em algum clube. Assim, mas, praticamente isso ta acabando, quer dizer, quem trabalhou antes de 98 (1998), hoje tem tudo menos de quatorze anos, quinze anos então, você não pode reconhecer mais isso. Hoje é aquele negócio, você tem que trabalhar num clube e, o clube é obrigado a contratar no mínimo um professor de Educação Física para dar aula de qualquer coisa. Se o cara não tiver registrado no CREF não pode. Agora o Conselho Nacional, ligado ao Conselho Federal de Educação Física e Conselho Regional de Educação Física é para fiscalizar a profissão, então você vai e faz academias e clubes, principalmente, porque em escolas você ta proibido de entrar. Até artes marciais diz que não pode. Você tem uma liminar que diz que artes marciais são artes, não é esporte, só que recebe verba do governo pra competir, fazem competição e vão para Olimpíadas. Como é que isso aí não é esporte? A arte, você só faz uma exposição do que é que arte é, não tem que ter patrocínio pra nada. Então tem uma briga besta aí e, não só no Conselho Nacional de Educação, o Ministério de Educação e Cultura ou as escolas de Educação Física também. É, o maior problema são as escolas que apresentam o diploma sem cumprir a carga horária exigida pelo Conselho Nacional, sem ter o currículo exigido mínimo para a escola, então quando você tem a carga horária de 2500 horas tal, chega lá no CREF não vai registrar. Então a função do CREF é fiscalizar se está tudo certo. Tem até escola que trabalha regularmente e estão aprovada pelo Conselho Nacional, quer dizer, a briga é justamente isso que está aí. Então a ligação do CREF com a Ginástica não pode falar sobre currículo, sobre disciplina, como é que tem que agir, como é que não tem, quer dizer, só vai fiscalizar o que está errado. Chega uma denúncia e ta errada o CREF vai fiscalizar,

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vai fiscalizar onde pode, não pode entrar em uma Universidade pra verificar se os caras tem CREF ou não. Quem trabalha em uma Universidade ou em uma escola, vem dizer ‘olha vai lá tirar seu CREF e não sei o que’, e a Universidade é que tem que exigir que o cara tenha CREF, uma escola tem que exigir, tem um regulamento dentro dos concursos que você tem que ter, tem concurso aí que no edital diz ‘precisa estar registrado no Conselho Regional de Educação Física’, mas tem outros que nem colocam. Então o professor de Educação Física que não é registrado lá, ele pode entrar na Secretaria Municipal de Esportes de qualquer cidade aí, ou estadual e poder dar aula em alguma escola, porque escola não é fiscalizada, quer dizer, tem um monte de coisa errada em todo lugar né. Agora o maior problema aqui no país realmente é aparelhos bons pra você dar aula e professores bem formados, quer dizer, a Faculdade A tem a professora Maria que ta lá há milênios, a Faculdade B também, na Universidade B ta o Flávio e Julia, que hoje estão lá. Eu mesmo passei por lá por uns dois anos. Eles são bons profissionais, que dão boas aulas, e que formam bons professores, mas a carga horária é muito pequena, não dá pra você dar quase nada. Então você tem que dar uma informação e, aquele que gosta realmente da especialidade, que é bom atleta, que executa bem e tem facilidade pra ir pra um clube qualquer, ele vai! Mas é muito pouca gente trabalhando. Hoje você faz até campeonato de massificação, que é assim de base e, tem poucos participantes, muito pouco.

P – Você falou da dificuldade de formação, e eu lembrei do que você falou antes, é do bacharelado e da licenciatura que você não é a favor né? Mas será que não seria um meio, já que a gente não consegue formar adequadamente? É uma imensidão de disciplinas, de modalidades, se é licenciatura ele tem que ter psicologia, pedagogia, história, sociologia e filosofia (...)

D.1 – Todos os “ias”! (risos)

P – É, todos os “ias”! (risos). Será que não seria uma alternativa para isso, especializar já que não podemos fazer tudo; você vê outra alternativa?

D.1 – Não, aí teria que mudar né! Teria que mudar pelo MEC ou pela própria Universidade A. Se a Universidade A mudasse o seu currículo e, parece que eles mudaram um pouco, porque houve muito (...) muita rejeição por parte dos alunos de licenciatura de não ter nada prático e, a despeito deles terem colocado aquelas duas ou quatro horas de cada disciplina prática para os alunos tomarem conhecimento, continuou a reação. Agora parece que eles tão tendo mais parte prática no curso de licenciatura também. Se a Universidade A mudasse seu currículo, mandasse pro MEC, fosse aprovado, poderia ser usado como exemplo pelas outras escolas né. Agora tem escola que faz o que quer né. Lá na Universidade B eu tinha Ginástica e, eu fazia o que eu queria na Ginástica. Mandei comprar um monte de aparelho. O homem era milionário lá, comprou os aparelhos que eu queria, comecei então uma guinada lá na Ginástica eu fazia o diabo. Agora, você precisa pegar um cara que tenha motivação pra fazer Ginástica, tenha um patrocinador, um patrão que acredite nele e lhe dê aparelho pra ele ter condição de trabalhar, pra ele mostrar o serviço né, e não adianta nada você ir pra uma escola que tenha colchão e plinton só, você não pode fazer nada. Você vai dar colchão e plinton, colchão e salto. Se você tem um salão pra dar Ginástica é diferente, quer dizer, você vai em qualquer escola dessa pra você montar sua Ginástica, pra você dar aula lá, você tem que pegar a quadra de Vôlei, de Basquete, uma hora que não tiver Vôlei, Basquete ou Futebol de Salão, a praga do Futebol de Salão! Isso, pra montar seus aparelhos pra poder dar aula e depois tem que desmontar tudo, para poder voltar a fazer o esporte coletivo lá dentro né. Isso aí é uma mão de obra dos diabos! O ideal era ter um salãozinho, uma quadra de Voleibol com os aparelhinhos todos montadinhos e,

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você ia lá dava sua aula, da pra falar de Ginástica, Ginástica Geral, GRD, Ginástica Olímpica.

P – A sua disciplina já tinha uma briga então? Você falou assim do Futebol de um jeito meio (risos)

D.1 – Não! O Futebol de Salão pro brasileiro, se você fizer um esporte que tenha bola ele é nato, ele faz aquilo muito bem feito e o Futebol de Salão é uma praga, que você vê. Até agora nas próximas Olimpíadas ele vai entrar. Nós fomos aí quantas vezes campeão mundial com o Falcão jogando aí jogando uma enormidade de bola? É lindo ver aquele Futebol de Salão, mas você vai nas escolinhas, em qualquer escola aí, maioria das escolas que tem, a molecada quer jogar Futebol de Salão, que é uma quadra, porque não tem a de Futebol grande, pega aquela bolinha pesada pra estourar o joelho, os tornozelo deles. Agora que estão começando a colocar uma bola mais leve, mas no meu tempo usava bola de Basquete comum, bola de Futebol de Salão comum, botava o molequinho pra jogar aí, estourava o joelho porque tava dando uma porrada com esse pesinho nessa puta bola pesada, quer dizer, nem isso a turma via. Agora, o meu neto está fazendo numa escola aqui em Cidade E aula de Educação Física. Fui lá assistir um festival de Basquete. Uma bolinha adaptada um tabela adaptada, na quadra da tabela grande e tal, para a molecadinha brincar e jogar regras maneiradas né. Você pode bater bola a vontade, correr com a bola na mão, tudo bem! Não tem andada, não tem nada, então facilita, mas essa parte pedagógica é muito interessante pra poder motivar a molecada, senão tira toda a motivação deles em progredir né.

P – Lá dentro da Universidade A vocês tinham essa disputa de espaço, a Ginástica com as outras modalidades?

D.1 – Não! Não, porque lá você tinha até duas quadras de Basquete, de Vôlei e como as aulas eram diferentes depois das aulas você ia brincar de bater bola e, depois a tardinha você também ia brincar, bater bola. Eu tinha um salão só pra Ginástica; tinha um salão de Ginástica e, o tablado do Judô servia pra Ginástica e, do lado tinha musculação, aí quando mudaram a Universidade A para outro local, eles tem lá inclusive o Centro B nesse outro local, tem um salão para a Ginástica Olímpica com todas as aparelhagens montadas. Então, teve época de eu ir dar aula lá, pegava os alunos e ia dar aula lá, eles fazem o campeonato universitário de Ginástica Olímpica lá no Centro B.

P – O tempo que você trabalhou era optativa ou obrigatória, a Ginástica no currículo?

D.1 – Obrigatória, desde que montaram a cadeira que eu prestei concurso e entrei, aí eu era o dono da cadeira.

P – Não tinha o perigo de ter mais alunos no Futebol e menos na Ginástica? (risos)

D.1 – (Risos) Não aí todo mundo faz igual, porque se a aula é Ginástica, todo mundo faz Ginástica, se a aula é Futebol, todo mundo faz Futebol. Agora, no curso de técnico desportivo nós fizemos um curso lá na Universidade A muito bom antes de mudar a licenciatura plena, que a gente fazia um núcleo comum com disciplinas como Fisiologia, Biomecânica, Metodologia do Treinamento, Condicionamento Físico etc. Essas disciplinas teóricas eram comuns para todos os cursos, e depois quem queria fazer Basquete, ia para o Basquete, Voleibol, Futebol, Ginástica, Natação, então dividia a classe. Então Fisiologia do Esforço, Métodos de Treinamento, aqueles negócios você dava na teoria, e na parte prática cada um ia para o seu lado. A gente dava o curso de técnico desportivo assim. Eu achava muito bacana, você evitava dar toda essa parte importante da teoria que o médico ia dar, o professor Claudio ia lá dar Método de Treinamento, e tal, e a gente se limitava a parte prática de execução.

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P – Bom, para meu questionamento está bom! Eu já perguntei o que servia para o meu estudo! Você tem alguma coisa a acrescentar da Ginástica Artística para curso de licenciatura hoje? Pensando que estamos lutando para a licenciatura trabalhar em escola e terminar a briga né (risos).

D.1 – Eu acho que todo mundo tem que ter uma noção do corpo humano, uma noção do biotipo inclusive do indivíduo, conhecer a Fisiologia, conhecer a idade, saber distinguir os movimentos por faixa etária do aluno que você tem na mão, porque você vai para escola, você tem aí os alunos de sete a quatorze, quinze anos, que é a parte mais importante que você tem que desenvolver, é a idade mais importante, porque depois ele já ta estragado não tem mais jeito. Embora você tenha uma Daiane dos Santos que começou tarde e só faz solo também né, solo e salto os outros aparelhos ela não faz aí. O Diego que só faz solo e salto e que não faz outro aparelho. Mas o ideal é que você dê o máximo possível de movimentação de exercício para os seus alunos. Então eu acho que se você puder dar Basquete, dar Vôlei, dar Futebol, dar Natação, dar Atletismo, dar Ginástica, depois o aluno vai escolher aquilo que ele mais gostou, porque o melhor esporte para você é aquele que você mais gosta, não é a Natação o esporte completo, porque se eu não gosto, não sei nadar, eu vou pegar a corrida. Quantos caras gostam de correr aí? No meu tempo eu achava uma estupidez, há 30 anos atrás, mas pessoas gostam de correr, faz bem pro organismo, faz bem pro sistema cardio-respiratório, é muito bom, desenvolve muito bem, evita aí um monte de infarto. É bom correr, mas vamos correr na intensidade que você pode correr, isso é coisa que a gente tem que aprender lá, quantos batimentos você pode ter para fazer um determinado esforço, essas coisas a gente tem que aprender, tem que saber, porque é coisa que o provisionado não sabe né; ele foi atleta três anos, você da uma carteirinha que ele pode dar aula, ele vai dar aula mas não sabe quantas repetições ele tem que fazer num exercício de força, num alongamento, você não tem noção do percentual de repetição que você tem que fazer, pela força que você pode fazer na hora. Eu fui numa academia, os caras fizeram um treinamento aí, um teste de força máxima comigo, pra depois da minha força máxima eles começarem a fazer exercício de repetição. Agora hoje você vai em 80% das academias, ‘ah eu queria fazer exercício aí’, ‘ah faz esse bíceps aqui três vezes de dez repetições’. É pra velho, é pra criança, é pra mulher, e depois ‘agora doze vezes’. Pô, se eu faço dez e não sinto nada, eu posso fazer trinta, agora se eu vou fazer dez e não chego nem em cinco, então eu vou fazer três em cada série, para ir desenvolvendo, quer dizer, isso é o que todo mundo tem que saber e, tem que aprender na teoria e, depois empregar na prática, porque senão não sabe como usar. Então você põe muita gente aí pra dar aula, o cara não tem noção do que é Fisiologia do Esforço, acaba com o aluno em determinado exercício, como eu falei; e tem aluno que fala ‘ah professor posso fazer um mortal pra frente?’. ‘Pode!’. Mas você nem viu se o cara tem condições de fazer ou não, agora ele vai lá se joga, puxa a cabeça bate a costa no chão, arrebenta a coluna, quer dizer, culpa de quem? Do professor? Do próprio aluno? Quer dizer, eu vou ver se o aluno tem condições de fazer, vou proteger ele algumas vezes para ver se ele ta em condição, a hora que ele puder fazer sozinho vou lá ajudar, a hora que eu achar que ele tem condições de fazer sozinho, faz sozinho. Hoje você tem fosso e cama elástica para treinar na Ginástica né. Aquele buraco de flocos de espuma, fiz o primeiro fosso feito no Brasil no Clube A.

P – Lá eu faria duplo hein? (risos)

D.1 – (Risos) Fazia sim. Lá no Clube A eu botava o trampolim de cama elástica, o cara pulava e fazia o duplo mortal lá caindo né. Ele cai de cabeça, cai de ombro, cai e não tem problema, mas eu sei avaliar a hora que ele pode fazer cada execução de

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movimento, sempre na hora certa, porque eu entendo disso, o problema é aquele professor que não entende!

P – Bom professor, é isso! Obrigado.

D.1 – Que é isso, de nada!

Docente 2 – Julho/2008 – 1h24min

P – Para começar eu queria saber dos conhecimentos. Quais conhecimentos você julga imprescindíveis, especificamente para o curso de licenciatura, da Ginástica Artística?

D.2 – Vamos por parte né!? No curso de licenciatura se supõe que toda formação, ela conduz a pessoa pra trabalhar na escola ou nas escolas. Bom, na verdade não existe um tipo de escola, existem n tipos de escolas, educação formal ou não formal, ou seja, hoje a gente discute o que é escola. Então, quer dizer, que se nem o conceito de escola está muito claro, então você imagina a formação! Então, hoje é muito difícil na licenciatura a gente definir que tipo de escola. O Brasil é um pais muito diversificado, então a gente tem escolas com estruturas maravilhosas, assim como a gente tem escolas que não tem nem uma quadra pra gente fazer aula. Então como eu adequo a formação do aluno pensando em realidades tão dispares? Então esse é o primeiro desafio né, de qualquer disciplina não a de Ginástica Artística e, no caso da Ginástica Artística isso piora mais ainda, porque é uma disciplina, é uma modalidade esportiva que, a priori, precisa de um certo material, a priori, exige uma formação muito específica do professor e, a priori, exige umas certas condições de segurança e cuidados que, se não forem bem esclarecidas, bem ensinadas, ela pode ser (...) o efeito pode ser pior do que a importância que essa atividade tem. Isso eu falo porque eu trabalho com Ginástica, eu fui ginasta durante doze anos, eu fui técnico, árbitro e uma monte de coisas mais e, hoje dou aula; quer dizer, passando por todas essas fases a gente vê que, por mais que eu goste e seja apaixonado por Ginástica Artística, não é isso que tem que me levar a ensinar cegamente o que é a Ginástica Artística; eu tenho que tomar uma série de precauções. Então, eu tenho sérias dúvidas quando eu ensino, mesmo aqui na Universidade D onde a gente tem uma estrutura relativamente boa de Ginástica, se tem várias disciplinas, vários conhecimentos sendo tratados, mesmo aqui, eu tenho sérias dúvidas se os alunos saem ou não saem preparados. Primeiro porque a carga horária não é a que a gente deseja, embora, aqui ta muito próximo disso e, segundo porque a Ginástica realmente exige um conhecimento muito apurado e muito específico que, durante uma formação, uma carreira universitária, poucas pessoas têm espaço e tempo pra aprender. Então, voltando um pouco à sua pergunta, isso foi um pressuposto básico (risos). Pra mim um dos conhecimentos mais importantes da Ginástica Artística independe de onde ela vai ser ensinada; na minha opinião, independe se ela vai ser ensinada em um clube, na escola, num exercito, onde seja, o importante é que alguns princípios básicos dessa modalidade sejam respeitados. O primeiro deles é conhecer o funcionamento dessa pratica, o que dentro dos meus estudos a gente denomina lógica interna, ou seja, como esse esporte funciona, se você conhece isso com profundidade você vai saber trabalhar em qualquer ambiente; segundo, conhecer bem os objetivos e o público que você trabalha, se eu trabalho com atletas de alto nível eu tenho um objetivo e um público determinado, se eu trabalho com escolares eu tenho um outro objetivo e um outro público muito diferente. Então, se você conhece bem aquilo que você tem que ensinar, que é a modalidade e, muito bem o público que você vai ter entre mãos, a coisa fica muito mais tranqüila. Então, é um pouco por aí que eu tento estruturar minha disciplina de Ginástica Artística. Portanto, a primeira parte dela, ela é a mesma no curso

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de licenciatura e no curso que nós aqui temos de bacharelado, é a mesma parte. Digamos que, no nosso caso aqui, o que a gente denomina é Ginástica Artística, essa disciplina ela é a base pra qualquer um desses dois grupos o da licenciatura e do bacharelado, porque ela aborda exatamente essa lógica interna, ou seja, esse funcionamento da prática, já aqui, a gente tem uma segunda que é de aprofundamento que seria pra quem quer o bacharelado, pra quem quer trabalhar com treinamento esportivo, daí a gente aprofunda na Ginástica, em métodos de treinamento, em periodização da Ginástica, em especificidade de cada um dos aparelhos, de cada categoria, enfim, isso é pra quem faz bacharelado. Mas a base pra essa disciplina de Ginástica Artística é a mesma pra ambos os grupos, inclusive é pré-requisito. Pra fazer aprofundamento, tem que fazer essa base! Não sei se fui muito claro, mas enfim, é onde eu abordo os princípios dessa Ginástica. Obviamente quando a gente trata dessa disciplina eu não sei ainda em que lugar os alunos vão trabalhar, mesmo eles estando fazendo licenciatura muitos deles num futuro fazem a segunda opção. É muito típico aqui da Universidade D, eles fazem licenciatura e num segundo momento eles voltam pra faculdade e fazem um ano e meio o bacharelado, ou vice-versa. Isso acontece aqui com muita freqüência. Então aqui, a gente sempre tem o cuidado de quando eu tenho os alunos, maioria, minoria, da licenciatura, eu também tenho que ter a atenção pros alunos do bacharelado, porque muitas vezes eles vêm e vão. Então isso significa que, quando eu falo de fundamentos da Ginástica, a base da Ginástica Artística, o tempo inteiro da minha disciplina eu fico falando que aquilo se aplica na escola, em tais e tais circunstancias, mas também pode ser aplicado no treinamento em outras circunstancias diversas. Então, eu não faço muito essa divisão enquanto conhecimentos a serem tratados, o que sim difere muito, lógico na licenciatura do bacharelado é o público. Que público que eu vou trabalhar, faixa etária, os objetivos desse público, a cobrança que é gerada em cima desse público, a dedicação que esse público vai ter com a Ginástica (...). É muito diferente trabalhar a Ginástica Artística numa escola onde eles têm duas aulas por semana de quarenta e cinco minutos do que eu trabalhar num centro de auto atendimento onde eles treinam seis, sete horas por dia, todos os dias, mesmo quando são crianças com a mesma faixa etária, que pode acontecer. Então é essa distinção que eu tenho que explicar pra eles dentro da disciplina, se eu tenho quarenta e cinco minutos por semana, o que que da Ginástica eu vou tratar? O que que é mais importante? E aí onde muitos estudiosos ou muitos professores divergem muito, descobrir quais são aqueles conhecimentos mais importantes ou fundamentais da Ginástica Artística que você consegue trabalhar na escola.

P – Mas você consegue fazer uma diferenciação entre os conhecimentos técnicos e os de cunho mais pedagógico nas aulas?

D.2 – Procedimentais, metodológicos, sim, em parte. Eu diria que, depois de alguns anos trabalhando com Ginástica Artística ou ensinando Ginástica Artística no ensino superior, inclusive essa reflexão partiu lá no País A e eu trabalhei três anos na Universidade E com essa mesma disciplina Ginástica, não Artística, só Ginástica. E, na minha opinião, não sei se isso vai caber no seu trabalho, mas é importante que você saiba, eu defendo que o que se vai trabalhar na escola, não é a Ginástica Artística e sim Ginástica. No meu entendimento e, muito autores franceses concordam com isso, eu poderia dar uma lista deles, o que se trabalha na escola é a Ginástica, e não a Ginástica Artística e, muito menos a Rítmica, a Acrobática, o Trampolim. Existem alguns (...) existe um repertorio motor básico da Ginástica que serve pra qualquer uma das Ginásticas que é o que a gente ensinaria na escola independente do adjetivo, do sobrenome dessa Ginástica, por que isso? Se supõe, e alguns estudiosos dizem, que a escola é lugar de você ampliar o máximo possível o conhecimento das pessoas ou dos estudantes sobre o seu corpo ou a motricidade humana, é o que aqui na Universidade

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D, muitos autores denominam de cultura de movimento ou cultura corporal. Enfim, quanto mais ampla essa cultura corporal, melhor, e, quanto mais contato com diversidade de culturas e de movimentos melhor pros escolares. Porque a gente nunca sabe o que eles vão fazer com esses conhecimentos, com esse saber depois. Eles vão poder usar para se tornar um atleta ou simplesmente pra ser um cidadão mais informado, ou melhor, com um conhecimento mais apurado sobre a cultura de movimento, sobre seu próprio corpo. Em função disso, na minha opinião, quando a gente fala de Ginástica pra escola ou, na escola ou, da escola, depende do autor, a gente fala de Ginástica e não de Ginástica Artística. Então, embora, por exemplo, na Universidade D a gente ainda tenha Ginástica Artística, Ginástica Rítmica, Ginástica Acrobática, várias Ginásticas com nome e sobrenome, existe uma disciplina aqui onde a gente fundiu todas elas pra que os alunos entendam que existe uma base que é comum pra todos e, que essa base vai ser usada, obviamente, muito mais por quem faz licenciatura, mas também pra quem faz bacharelado. Essa disciplina básica [nome da disciplina] é uma disciplina obrigatória no primeiro ano. Então, eles acabam de chegar na faculdade, a gente entende que é de suma importância e, é nela onde a gente apresenta toda a motricidade da Ginástica que, é uma motricidade que se você observar com cuidado, você vai ver que ela tem desdobramentos em quase todas as modalidades esportivas. Então, desde o correr, o saltar, o girar em diferentes eixos, as saltações, enfim, uma série de movimentos, os equilíbrios, apoio invertidos, os balanceios, a manipulação dos objetos, a sustentação e manipulação de outros corpos, enfim, uma série de habilidades que depois elas vão se concretizando em diferentes modalidades de Ginásticas ou não. O aprender a dominar o corpo no espaço e no tempo, que é a base da acrobacia, não é algo exclusivo da Ginástica. Se você realmente domina esse fundamento corporal, você vai usar no Snowboard, você vai usar no Skate, você vai usar nos Saltos Ornamentais, no Nado Sincronizado enfim, é por isso que alguns autores franceses vem a muito tempo defendendo, que na escola (...) a escola é o lugar da Ginástica e não da Ginástica Artística, Ginástica Rítmica e não sei o que, enfim, e, eu sou bastante favorável nesse sentido. Então, mesmo quando a disciplina é Ginástica Artística pra licenciatura eu trabalho uma base que ela é (...) vai muito além da Ginástica Artística. To tentando te explicar tudo isso, mas enfim não sei se vai ficar muito claro.

P – Não está ótimo! Fique a vontade!

D.2 – Por que isso? Quando eu dou um adjetivo ou um sobrenome pra uma modalidade Ginástica, na verdade eu levo junto, em primeiro, uma série de codificações do movimento e de outras questões, inclusive estéticas que restringe o que é a motricidade. Quando eu falo Ginástica Artística, nós sabemos que Ginástica Artística ela tem alguns aparelhos, ela tem uma motricidade já muito bem definida, estabelecida por um código de regulamentação né, um código de pontos, é um regulamento e, ela já tem uma estética própria, um jeito, uma técnica corporal própria. A estrela da Ginástica Artística é diferente da estrela da Ginástica Rítmica, que é diferente da estrela do Circo, enfim, quando eu falo de Ginástica Artística eu já levo, querendo ou não querendo, uma série de preconceitos né, daquela modalidade. Então se eu for fazer Ginástica Artística na escola, eu levo os bons e os maus, por isso que por muitos anos a escola sofreu de preconceitos, ‘ah, mas a Ginástica é perigosa’, ‘ah, mas Ginástica é só pra meninas’, ‘ah, mas a Ginástica é isso e aquilo’, ‘a Ginástica não deixa crescer’; são preconceitos que o esporte de alto nível gerou que, quando você fala Ginástica Artística na escola você já leva eles juntos, não tem como separar! Os pais, as pessoas na sociedade em geral, sempre atribuem um valor pra prática escolar igual a um outro esporte de rendimento ou igual das referências que eles têm, que normalmente é um esporte de alto rendimento. A gente sabe que a Ginástica não deixa ninguém ficar baixinho, a gente

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sabe que a Ginástica não é uma prática feminina, a gente sabe que a Ginástica (...) uma série de coisas, mas que quando a gente leva a Ginástica pra escola a gente arrasta toda essa série de preconceitos, mitos, falsas idéias, enfim. Portanto se a gente leva a Ginástica pra escola, a gente escapa de uma série de problemas do ponto de vista social, estética, enfim; por outro lado, se eu imagino que a escola é um espaço onde as crianças devam é (...) ampliar esse repertório motor, conhecer melhor seus corpos, ampliar melhor seu conhecimento sobre a cultura corporal, trocar seu conhecimento, eles sempre trazem já de casa uma cultura do corpo pra trocar com as demais etc e tal. Quando eu estipulo o que vai ter, eu acabei de delimitar o inicio, o meio e o final daquela ação, ou seja, se eu vou fazer Ginástica Artística, é Ginástica Artística! Por que não dar um conhecimento que permite essa criança que ela faça Artística, Rítmica, Acrobática, não sei o que? Ou seja, se eu der pra ela ou, oferecer um conhecimento básico da Ginástica na escola, mesmo que seja um pouquinho de cada uma das séries escolares, com certeza ela vai ter a oportunidade e a possibilidade de praticar o que ela achar mais conveniente pra ela, ou seja, não fecho, eu abro um leque de possibilidades pra ela. Quando eu dou o adjetivo eu fecho. Quando eu falar ‘é Ginástica Artística’, eu já falei, ‘não é Rítmica, nem Acrobática, nem Snowboard, nem nada e nem Capoeira, ela é isso!’. Daí a gente fecha mais ainda. Porque quando eu falo Ginástica Artística eu já falo que a estrela tem que ser assim, não pode ser assado, e aí eu fechei mais ainda. Por que que a estrela tem que ser assim? Na Capoeira ela é diferente! Na Rítmica ela é diferente! No Circo ela é diferente! Eu devo negar todas essas diferenças em função de um conceito da Ginástica? Não! E, mesmo eu, por exemplo, depois de vinte e poucos anos trabalhando com Ginástica Artística, sabendo que o modelo técnico da Ginástica hoje, é modelo bem apurado, que tem muito estudo por traz, mais de um século de evolução cientifica atrás do modelo técnico, eu sempre devo reconhecer os demais modelos. O problema é que quando eu falo de Ginástica Artística eu nevo os demais e acabou! A estrelinha que aquele meu aluno trouxe da Capoeira, o professor normalmente tende a falar ‘essa não é a certa, a certa é essa que começa assim e assado’. Não é bem assim! Existem várias estrelas, várias formas de se fazer o movimento, inclusive dentro da Ginástica de alto rendimento e, num salto mortal existem seis ou sete técnicas diferentes, pra cada um dos saltos da Ginástica. Os Russos têm quatro ou cinco maneiras de fazer, os Chineses tem outra, os Americanos tem outra. É lógico que são detalhes muito sutis que um público menos observador não vai perceber, mas pra quem trabalha com isso, você sabe a diferença de um braço aqui, um braço ali, ou seja, a técnica por mais apurada que seja ela vai se diferenciar pelas pessoas que fazem Ginástica Artística. Agora, você imagine se a gente abre pras demais práticas. É normal que elas sejam diferentes, o objetivo da Capoeira não é o objetivo da Ginástica Artística, a estrela da Rítmica tem um objetivo simplesmente de ter uma inversão, mas não é de ganhar velocidade, não é de aumentar a aceleração horizontal pra fazer um outro movimento, não é. Portanto ela não vai ser igual! Então, quando eu dou um adjetivo, eu acabei de condenar aqueles alunos a conhecerem um único modelo. Se, por outro lado, eu falo de Ginásticas e, por mais que eu use alguns conceitos técnicos pra fazer a aproximação dos alunos aos gestos típicos da Ginástica, eu nunca limito e nunca fecho na técnica, como se fosse um único modelo perante um único modelo possível. Existem n técnicas, n possibilidades, a Ginástica cientifica, a Ginástica Artística é uma delas, mas existem outras mais. O importante é que o aluno, no nosso caso aqui da graduação e, lá na escola dos alunos (...) dos escolares, entendam a lógica daquele movimento, ou seja, como ele se estrutura? Como ele funciona? Pra que ele foi inventado? Pra que eu faço uma estrela? Se eu entendi isso, obviamente que a mecânica, a técnica, o que a gente chama a forma de execução daquele movimento, ela vai ter uma característica ou outra dependendo do objetivo. Vou dar o exemplo da (...) volto na parada de mãos. Há um século atrás, a parada de mãos se assemelhava a uma

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virgula, todo mundo fazia parada de mãos torta, hoje na Ginástica se você fizer isso é uma aberração técnica, você vai ser (...) vai ter até chacota, mas na Capoeira ela continua existindo, no Circo muitos casos e técnicas tradicionais continuam existindo, e a pergunta é: funciona mais ou funciona menos? Eu sempre me questionei sobre isso e, hoje, eu tendo a dizer que depende pra que objetivo uma coisa funciona mais que a outra. É obvio que, se eu consigo manter o corpo totalmente na linha vertical, tende-se a gastar menos energia, tende-se a conseguir um equilíbrio mais estável, que esse é um dos princípios da ciência aplicado no movimento humano. Economia de energia, uma mecânica mais favorável, menos desgaste articular etc, esses são os princípios científicos, por isso que a Ginástica Artística hoje tem um modelo técnico cientifico. Já na Capoeira não existe esse modelo cientifico, no Circo em muito casos também não, são outros modelos muito mais (...) criados a partir da cultura, da transmissão oral, outros modelos, mas que solucionaram os problemas dessas pessoas durante muito tempo. Eu não posso chegar e falar ‘eu sou o senhor da verdade, eu nego os demais!’. Então o que que acontece quando eu vou e levo Ginástica Artística para uma escola? Vem um menininho e faz uma bananeira, que é uma parada de mãos do jeito que ele aprendeu na rua e do jeito que ele interpretou aquele conhecimento. Imediatamente o professor fala ‘não, a técnica correta é essa!’. Quer dizer, eu neguei aquele conhecimento da pessoa, provavelmente eu acabei de perder um possível aluno interessado em aprender. Se ao contrário eu tivesse falado ‘olha que legal, você já tem o conceito técnico, um modelo que é válido para o que você está querendo’, mas eu apresento outro e eu quero que ele aprenda os dois, possivelmente ele aprendendo esse segundo e, sem deixar de ter o dele, ele vai construir outros n a partir desse novo modelo que eu dei para ele, ou seja, uma técnica não nega a outra. Então, a minha preocupação, e eu sei que muita gente que fala ‘ah, eu dou aula de Ginástica Artística na escola’. Não dá aula de Ginástica Artística, dá aula de Ginástica, porque nem tem os aparelhos, muito menos a pretensão de dar aula de Ginástica Artística; mas o meu medo quando a gente fala Ginástica Artística na escola, a gente leva junto uma série de preconceitos e uma série de pressupostos desse esporte, que nem sempre são favoráveis, na maioria das vezes são desfavoráveis para a escola. Muita gente, muitos diretores de escola não gostam do esporte, muitas pessoas tiveram uma experiência ruim no passado, enfim. Por que falar Ginástica Artística, se no fundo, no fundo, na minha escola ninguém faz Ginástica Artística? E, se fizer, no meu modo de entender, está completamente equivocado, porque está restringindo em vez de ampliar as possibilidades. Eu já vi em muitos lugares, no Brasil e fora do Brasil, pessoas fazendo Ginástica Artística na escola, ou seja, usando os aparelhos como o código pede, fazendo séries básicas, como séries do troféu São Paulo nível elementar, na escola, pra mim isso é um absurdo! Usar o tempo do escolar para aprender oito ou nove movimentos codificados de solo, simplesmente porque ele quer montar uma série e ir para uma competição X, pra mim é a maior perda de tempo do mundo. Se ele usasse esse tempo pra aprender quarenta ou cinqüenta movimentos distintos ou, variações desses movimentos, mas não fizesse esse esforço de transformar isso em uma série ou (...) ter essa paranóia toda de estar fazendo Ginástica Artística, a contribuição seria muito maior. Essa criança com certeza teria muito mais respostas para outros problemas que ela vai enfrentar no resto da vida dela, fazendo Futebol, Vôlei, Basquete, porque com certeza ela vai ter maiores possibilidades de motricidade e, é isso que a Ginástica dá. Eu durante um bom tempo também, inclusive durante os meus estudos de doutorado, eu pensei seriamente se o que eu estava fazendo tinha validade, ou seja, se dedicar tanto tempo, tantas horas e tanto esforço para estudar Ginástica, se realmente valia a pena, por que não estudar outras coisas mais importantes? Daí, depois de pensar muito, discutir muito e ler muito, eu tenho a certeza hoje, de que o estudo da Ginástica né, da atividade física em geral, dos esportes, enfim, mas no meu caso

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particularmente da Ginástica, é tão importante quanto todos os demais, porque permite as pessoas aprenderem uma coisa que eu denomino domínio do corpo. Alguns autores franceses também usam esse conceito, assim, quanto eu domino meu corpo eu me transformo em outra pessoa, eu me transformo em uma pessoa muito mais confiante, uma pessoa muito mais prestativa, porque eu sei o que eu posso fazer com o meu corpo; uma pessoa mais consciente das suas possibilidades e limitações, conseqüentemente num cidadão muito diferente e, a gente tem visto com (...). Ex-ginastas são pessoas que chegaram a um nível muito grande de domínio corporal, sobretudo interno, proprioceptivo, que são pessoas extremamente confiantes, arrojadas, pessoas que se dão bem em n outras práticas, porque realmente sabem o que podem e o que não podem fazer. Na Ginástica, por exemplo, de alto nível, não tem espaço para aquela pessoa que não é arrojada, que não tem um domínio extremo do seu corpo, não dá pra arriscar, não dá pra ‘se der eu faço’, não existe, ou eu tenho certeza, ou eu não tenho e não faço. Então, a Ginástica cria uma certa condição de domínio do corpo que a pessoa vai levar para o resto da vida. Uma pessoa que fez Ginástica e que dominou o corpo em posições absolutamente anti-naturais, que é um dos princípios da Ginástica, você em posições invertidas, em balanços extremos, em movimentos com vários tipos de rotações em diferentes eixos, a pessoa que faz isso ela nunca mais vai sentir o corpo dela da mesma forma, ela vai sentir o corpo dela totalmente diferente. Conseqüentemente, em qualquer situação da vida dela, inclusive dirigindo um carro, ela vai ter um domínio muito mais apurado do que uma pessoa que nunca teve essa oportunidade. Então, hoje eu defendo a Ginástica com unhas e dentes na formação, por isso que a gente tem, por exemplo na Universidade D não sou só eu, obviamente tem vários professores que defendem, a Ginástica com uma importância enorme no currículo. Quatro aulas obrigatórias no primeiro ano, mais seis ou sete disciplinas até o final se as pessoas quiserem, ou seja, são poucas Universidades que tem tudo isso no currículo. Porque a gente tem certeza absoluta disso, e isso a gente vê durante a (...) formação dos alunos, que aqueles que fazem uma formação boa e que tem uma vivência boa na área de Ginástica, o corpo deles sai um outro corpo, a personalidade deles é outra, a confiança, motivação e o autocontrole e, em todos os aspectos emocionais etc. etc. etc e tal, é muito diferente! Por quê? Já falei! Na Ginástica a gente trabalha primeiro com ações anti-naturais, então a gente sai daquilo que é seguro, estável, a gente vai para um outro mundo do desconhecido, das rotações, das peripécias, então, a gente brinca com fatores de segurança, o que permite aí um desenvolvimento de uma concentração, de uma disciplina, de uma série de valores que a gente fala que pertence a formação do cidadão, da formação humana, que não todas as práticas corporais têm. A Ginástica é muito rica nesse sentido. Não é nem mais, nem menos rica que as demais, mas ela é muito rica nesse sentido. Então, quer dizer, tudo isso que eu estou falando é a base dessa disciplina que eu chamo pra você de Ginástica Artística ou, que eu diria aqui na Universidade D é muito mais adequado, [nome da disciplina].

P – E como que você realiza (...)

D.2 – Agora eu chacoalhei toda a sua entrevista (...) você ia por um caminho e eu fui por outro (risos).

P – (risos) Não! É assim mesmo, você já antecipou alguns questionamentos, a gente já vai prevendo algumas coisas, mas você antecipou, não tem problema.

D.2 – (risos) É, vai saindo!

P – Sem problemas! (risos) E, como que você realiza as suas aulas?

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D.2 – Eu ainda sou daqueles que acredita que a parte teórica é muito importante, mas que a parte prática é fundamental. Então, nas disciplinas de Ginástica eu diria que uns 70%, aproximadamente isso, das horas são práticas. Quase todas as minhas aulas eu parto de uma fundamentação teórica, ou ao contrário, faço uma parte prática e no final a gente desenvolve algum tipo de reflexão, de discussão sobre aquilo que foi feito. Obviamente, como a gente esta pensando na formação de formadores, eu utilizo alguns textos que servem como disparadores de um certo raciocínio, de uma certa lógica. Então uso textos que vão desde textos técnicos da Ginástica, onde a gente vê que existe uma análise muito específica do movimento, por exemplo, uma análise biomecânica do movimento, onde a pessoa vai tentar esmiuçar uma das variáveis daquele movimento para descobrir uma oscilação de energia, ou de altura de um movimento, ou seja, a gente pode usar isso como disparador para uma discussão de como se analisa um movimento na Ginástica, até textos sobre metodologia de ensino, como pode ser (...) ou formas do professor proceder, se o professor impõe o conhecimento ou se o professor ele oferece o conhecimento e discute com os alunos, ou seja, eu uso textos dos mais diversos possíveis, inclusive alguns textos históricos, para discutir o como a gente pode trabalhar essa Ginástica. Eu uso, por exemplo, textos antigos de Ginástica, para que eles entendam que, os modelos técnicos vão sendo mudados e superados com o passar dos anos. Então, não dá para eu como professor usar um modelo e falar ‘esse é o definitivo, a ginástica é isso’. Não! A Ginástica Artística dos anos sessenta se parece em muito pouco, do ponto de vista técnico, com a Ginástica Artística de hoje, os movimentos até são parecidos, são os mesmos, mas a técnica de execução deles é totalmente diferente. Mudou-se o material, mudou-se as formas de treinamento, mudaram os conhecimentos biomecânicos, os fisiológicos, portanto a técnica acabou sendo modificada. Então, se eu usasse o modelo dos anos sessenta como o meu referencial de Ginástica Artística eu estaria totalmente equivocado e, se eu usar o de 2008 como o certo eu também vou estar me equivocando, porque em 2025 vai ser outro! Então, quer dizer, eu mostro para eles com alguns textos, ou com vídeos de Ginástica antigos, olha ‘aqui nesse momento, nesse contexto sócio cultural era uma coisa, hoje é outra, o que que está certo?’. Ambos! Naquele momento aquilo era o certo, mas só que as pessoas não ficaram dormindo, não ficaram paradas, elas foram revendo os seus conceitos até chegar nisso. Então, como professores eles vão ter que fazer isso o tempo inteiro. A minha forma de ensinar Ginástica Artística muda a cada dia. Cada ano que eu ofereço essa disciplina eu mudo, porque eu vou descobrindo coisas que são mais eficientes na aula, coisas que os alunos fixam com mais precisão, coisas que os alunos nunca fixam, então eu falo e eles nunca entendem. Então eu tenho que mudar, porque não é possível que eu fale e eles não entendam. Então todo ano a minha disciplina é diferente e em muitos casos, eu diria que eu volto a estudar, eu volto a ler, eu tento ler durante todo o ano novos textos sobre a modalidade, sobre Educação Física, inclusive sobre coisas maiores, sobre metodologia de ensino, porque as coisas vão mudando, mas, em geral é isso, são 70% de aula prática, mas, com muita fundamentação, sobretudo muita discussão. O que eu quero mais mesmo é que os alunos entendam como funciona a Ginástica, se eles entenderem isso eu estou tranqüilo, porque eu sei que eles vão conseguir trabalhar em qualquer contexto, com qualquer pessoa, em qualquer faixa etária, em qualquer nível de performance. Se ele entendeu o que é Ginástica; se ele entender como se constrói uma cambalhota, ele vai poder construir a cambalhota na aulinha dele de Capoeira, na aulinha dele de Ginástica Rítmica, na escola, num clube, porque ele vai conseguir assimilar os objetivos, as necessidades e as possibilidades de cada lugar ao movimento chamado rolamento para frente. Pronto é isso que eu tento!

P – E nessa parte prática de 70% que você mencionou, tem também o ensinar a ensinar ou é só a vivência?

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D.2 – Não, não, não. Não sei se eu entendi muito bem, mas enfim, se tem uma coisa que eu vivi na graduação e que eu tento não fazer meus alunos viverem. Por exemplo, eu jamais exijo deles que eles sejam bons executores daquilo que eu ensino, jamais! Nunca exigi de nenhum. Eu exijo que eles entendam e compreendam aquilo que eu to ensinando, isso sim! Isso eu exijo até o final. Se eles não entenderam a lógica, o funcionamento, a estruturação, do que é uma estrela, do que é um apoio invertido, uma parada de mão, eles não entenderam nada do que eu falei. Eles têm que entender isso. Agora, entre entender e executar existe um mundo, um universo, grande parte dos nossos alunos aqui que optam pela licenciatura nunca fizeram Ginástica na vida, nenhuma espécie e, nos últimos anos a primeira pergunta que eu faço aos alunos de primeiro ano na disciplina de [nome da disciplina] é o que eles viveram de Ginástica. A tendência é que menos de 10% tenham feito Ginástica na escola, num clube, em qualquer lugar, essa é a tendência. E, olha que a gente está em Cidade F, no Estado de São Paulo, onde tem muita Ginástica. Cidade F é uma cidade que tem muitos clubes de Ginástica, tem uma tradição enorme, mas está decaindo, então, cada vez menos os alunos vem com Ginástica. Se você perguntar em compensação lutas, 80% dos alunos já fizeram algum tipo de luta, Karatê, Taekwondo, Jiu-Jitsu, alguma coisa eles já fizeram. Quer dizer, existe uma mudança. Há vinte anos atrás, no meu caso, há uns dezessete anos atrás, quando a gente falava na graduação de quem fez Ginástica, aqui em Cidade F pelo menos uns 50% da classe tinha feito Ginástica, na Universidade D; por isso que existe um Grupo A há muitos anos. O Grupo A é fruto de muita gente que fazia Ginástica e queria continuar depois que acabou a carreira atlética, e o grupo existe há muitos anos. Então há muitos anos atrás tinha muita gente que fazia Ginástica. Hoje, a grande maioria dos meninos que entram no Grupo A, nunca fizeram nada de Ginástica. Nunca! Nem uma cambalhota. É comum nas minhas aulas pessoas que nunca subiram em uma cama elástica, que nunca fizeram uma parada de mãos, nem brincando quando crianças, muito menos de forma sistemática na escola ou em qualquer outro lugar, portanto se eu tenho uma realidade dessa o que, que eu vou exigir deles? É muito difícil! Eu vou exigir, por exemplo, na minha época em alguns outros lugares e até hoje acontece, o professor que exige do aluno aprender a fazer um kipe na barra; um kipe na barra é uma preparação de alguns meses, é uma preparação que você tem um desgaste enorme na mão, é uma preparação que exige toda uma pré-condição física e técnica enorme, sobretudo para um adulto; um kipe para uma criança de uns sete, oito aninhos, com um treinamento razoável ela aprende o kipe rápido, porque ela tem um corpo, uma força relativa muito diferente de um adulto com dezessete, dezoito anos que chega aqui na faculdade. Se eu exigir para ele um kipe, primeiro que ele vai odiar Ginástica para o resto da vida, segundo que ele não vai conseguir fazer e, se ele fizer o kipe vai ser à um preço tão alto, que não valeu nenhum tipo de esforço, nem o dele, nem o meu. Isso acontece em muitos lugares do Brasil. Eu continuo ouvindo esse tipo de coisa e, aí é onde eu dou o meu segundo puxão de orelha nos meus companheiros que é, já que a gente tem poucas pessoas fazendo Ginástica, poucas pessoas que optam por ensinar na escola e menos ainda que optam por ensinar na escola Ginástica, se eu procedo dessa forma, exigindo execução ou resultado dos meus alunos, eu to acabando de extinguir a Ginástica, porque as pessoas vão odiar a Ginástica. Porque a Ginástica, se eu trabalho com execução, ou seja, com execução perfeita em cima de um procedimento técnico, os resultados demoram muito e são a custa de muito esforço, e aí é onde eu perco meus alunos, e perco o pouco de vontade que eles tinham de fazer Ginástica, aí acabou! Sobretudo na graduação, acaba. Metade dos alunos sai odiando os professores, isso é dito e feito! Em compensação, e aí eu exijo muito deles, é que eles entendam. Obviamente eu tenho que reconhecer que os saberes de quem estuda na teoria e os saberes de quem faz na prática são diferentes. Em alguns aspectos, no meu entender, são complementares; conhecer o movimento do ponto de vista teórico é

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diferente de conhecê-lo do ponto de vista prático, pelo menos da minha perspectiva. Agora, quando você tem essas duas informações, se supõe que a pessoa conhece muito mais do que quem tem só uma parte dessas informações, se eu tenho só de um lado a teoria ou só de um lado a prática. Se supõe que um pedagogo mais completo é aquele que tem ambas, então por isso que eu insisto aos meus alunos, e a gente faz muito aulas vivenciais, aulas práticas; eles vão vivenciar, eles vão fazer sem que eu cobre que eles façam com aquela técnica, mas eles vão fazer, todos saem das minhas disciplinas tendo feito todos aqueles movimentos que eu acho que são fundamentais ou básicos da Ginástica, desde os saltos mais simples até os equilíbrios, apoios invertidos, alguns movimentos em aparelhos, os balanços (...) os apoios, enfim uma série de movimentos que eu entendo que são básicos. Todos fazem! Claro que com níveis dos mais diferentes possíveis de execução e de (...), digamos, de rendimento técnico, acontece de tudo. Uns que parecem uma barata fazendo uma estrela, outros que parecem a Daiane dos Santos, mas pra mim todos estão aprendendo. Desde que conheçam aquele movimento, eu não posso exigir o mesmo de um aluno meu que fez oito anos de Ginástica e de uma pessoa que nunca fez Ginástica. Então, eu tenho que ter como professor, essa capacidade de discernir as pessoas e exigir coisas diferentes. Eu já cheguei a exigir à alunos meus um certo rendimento técnico durante a execução porque conhecia eles e sabia que eles vinham de dez anos de Ginástica, portanto na minha disciplina eles tinham que mostrar esses dez anos de Ginástica. Eles não podiam fazer igual a uma pessoa que nunca fez, por relaxo ou por uma série de coisas; ao mesmo tempo, eu tenho que saber o que eu posso exigir de uma pessoa que jamais fez Ginástica, que nunca nem pensou que ia fazer Ginástica, que está fazendo só porque está dentro da faculdade, não posso exigir o mesmo! Agora o que eu vou exigir de ambos, sem nenhuma concessão é entender aquele movimento. Se ele entendeu, ele é capaz de ensinar, e é isso que eu quero, que eles ensinem para alguém no futuro. Se ele entendeu, fez e gostou, a probabilidade de um dia ele vir a ensinar é enorme Se ele entendeu, se ele fez e se ele gostou, não importa como ele fez, ele fez, ele teve a aquela sensação de girar no eixo, e falar ‘nossa me perdi e agora eu to me retomando’, ele fez, ele teve aquela sensação, aquela emoção e ele gostou, ele vai ensinar. Agora, se ele entendeu, ele fez e não gostou, ou seja, eu exigi algo que ele não podia ou ele tentou algo que ele não estava preparado, provavelmente ele jamais vai ensinar isso. É aí onde a gente peca, e aí é onde a gente perde muitos professores de Ginástica. Muita gente não ensina Ginástica por que teve uma experiência péssima com a Ginástica, fez alguma coisa que não tava preparado. Esse é um outro fator importante da Ginástica que diz respeito a procedimentos de metodologia de trabalho, pedagogia. Lá no País A eu trabalhei com a Seleção do País A na tese e, um dos técnicos era um bielo-russo, Dimitri, que foi técnico de alguns campeões do mundo. Ele me falou uma coisa que até hoje eu uso nas minhas aulas com todos os níveis, inclusive na escola ou fora da escola, ele falou ‘a Ginástica é muito simples, ela não tem segredo. A Ginástica se fundamenta em muita dedicação, muita disciplina e sobretudo muita atenção com os detalhes. Isso é a Ginástica, não tem segredo, não tem mistério, não é algo do outro planeta, são detalhes que você tem que se ater todos os dias e fazer com muita persistência, paciência, calma, vai acontecer, não tenha pressa’. Então quando eu ensino aos professores, uma das coisas que eu mais reforço para eles é que eles têm que ter muita calma no ensino da Ginástica. As crianças, os escolares, os atletas, eles aprendem em ritmos muito diferentes. Alguns vão aprender a estrelinha, a parada de mãos, o rolamento ou uma pirueta em questões de minutos, horas; outros vão precisar de meses para isso, mas não significa que eles não estão aprendendo, eles estão aprendendo, mas com ritmos e velocidades muito diferentes. Identificar essa diferença do aprendizado é função do professor. Se ele não consegue fazer isso ele está se frustrando, porque ele acha que ele não está ensinando nada, as pessoas não estão

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aprendendo nada, e pior ele pode vir a cobrar coisas que as crianças não estão preparadas. Daí a gente cai no segundo erro, que é o professor explicar ou tentar que a criança execute uma coisa que ela ainda não está preparada. Se eu tento explicar alguma coisa e a maioria dos meus alunos, ou executam muito mal, ou não executam, significa que algo está errado. Em Ginástica é muito comum você ver técnicos ou professores brigando com os alunos porque eles não conseguem fazer algo. Ninguém da espécie humana, com o mínimo de inteligência normal, não quer executar alguma coisa. Não executa por que não pode, ou por que não tem condições para isso. Toda criança, exatamente pela natureza das crianças, ou quase todas né, não dá para generalizar sempre, gostaria de fazer uma cambalhota bem executada, de se divertir fazendo uma rotação a frente, por que realmente é na maioria das vezes um movimento prazeroso, um movimento que dá uma certa emoção. Se a criança não quer executar ou não consegue, é porque o professor não seguiu os passos, ou seja, uma metodologia adequada àquela criança, não usou os recursos pedagógicos, alguns chamam de educativos da Ginástica pra atingir aquele movimento, não fez alguma preparação que precisava, não explicou para a criança o que é o apoio invertido, ou não explicou o que que é a passagem pela inversão, ou seja, alguma informação ela não tem, por isso ela não quer fazer e, não adianta insistir, a insistência vai causar um acidente, e muita gente insiste nisso. Então tudo isso forma o que eu estou chamando para você de lógica da Ginástica, funcionamento da Ginástica. Pra mim isso é mais importante do que saber se o professor ensinou na graduação cambalhota, parada de mãos, kipe, estrela, giro de quadril na barra, balanço nas paralelas ou avião na trave. Pra mim o que ele ensinou é o menos importante, o importante é que se o que ele ensinou ta bem ensinado e, se o que ele ensinou vai servir de base para o cara continuar aprendendo. Isso é o segredo da Ginástica, o que você aprender tem que servir para você continuar aprendendo, se você aprendeu uma coisa que não te permita aprender mais nada, você, do ponto de vista da lógica da Ginástica, você cometeu um grave erro. Do ponto de vista da motricidade da Ginástica em geral, são infinitas as possibilidades dos movimentos da Ginástica. No caso da Ginástica Artística masculina são dois mil e setecentos movimentos em seis aparelhos. Nenhum ginasta na face da terra faz hoje mais do que oitocentos movimentos e são dois mil e setecentos! Nenhum consegue em dez, doze, vinte anos de carreira esportiva, nenhum deles faz mais do que oitocentos, ou seja, nem o campeão do mundo de Ginástica conseguiu chegar perto dos dois mil e setecentos movimentos que existem codificados, agora imagina os que existem e não estão codificados, devem ser milhões. Se existe uma motricidade tão ampla, é natural que eu tenha que buscar um movimento que permita continuar aprendendo, isso é uma máxima da Ginástica. Você nunca para de aprender em Ginástica. Todos os dias você pode aprender algo diferente. É impossível não aprender nada novo, a não ser que o pedagogo seja muito ruim. Você deve ter feito Ginástica, eu fui ginasta e eu terminei doze anos de ginástica, querendo aprender quinhentos movimentos que eu nunca consegui aprender, porque no meu tempo nunca ia conseguir mesmo, mas eu terminei querendo aprender, porque a cada dia eu aprendia algo novo, a cada dia eu dominava o meu corpo um pouquinho mais, e é infinito isso. Se o que o professor ensinou e não é capaz de despertar isso na criança, ou possibilitar isso, tchau! Acabou a Ginástica! Então para mim é indiferente se o cara ensinou parada de mãos, cambalhota, o que ele quiser. Se ele não permite que a pessoa continue aprendendo, tchau! Ele condenou ela a um desfecho sem graça!

P – Você acha que isso é um diferencial na sua metodologia?

D.2 – Eu diria que é um diferencial daquilo que eu falo para os meus alunos, daquilo que eu exijo dos meus alunos. Eu exijo que eles entendam que cada movimento tem um sentido e um objetivo que me prepara para fazer tantos outros; se eu conheço bem

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aquele movimento e ensino da melhor forma possível, eu estou abrindo a possibilidade do meu aluno de aprender outros n movimentos, que não necessariamente sou eu que vou ter que ensinar, outro professor em outro momento, em outra série, em outro lugar, mas eu abri essa possibilidade. Eu sempre uso os exemplos do auto rendimento, porque obviamente eu trabalhei muito nesse âmbito e eu transfiro muito essa informação. Eu acho que na Ginástica a gente consegue fazer bastante. O Brasil sofreu durante várias décadas um problema que até hoje é muito difícil de ser superado, que é os ginastas brasileiros, até a categoria júnior, juvenil, tinham um rendimento internacional razoável, inclusive alguns deles tinham uma capacidade de executar elementos de dificuldade mais altos do que os companheiros de outros países da mesma idade, que isso significava? Por desconhecimento, ou por falta de formação, os treinadores brasileiros aceleravam o processo e ensinavam coisas que não eram para ser ensinadas naquele determinado momento e, pior, ensinavam com uma técnica pouco eficaz, que impedia que eles continuassem aprendendo, então os ginastas brasileiros chegavam aos dezesseis, dezessete anos e não conseguiam aprender mais nada de novo, porque aquela técnica que eles tinham, impossibilitava. Vou dar um exemplo só pra concretizar o que eu estou falando. Hoje, a saída da barra fixa em Ginástica adulta masculina, são sempre duplos mortais estendidos com uma, duas, ou três piruetas, sempre! Menos que isso ninguém faz! Se você ensinar a saída em duplo com uma técnica não muito eficiente, você dificilmente vai conseguir colocar uma pirueta, muito menos duas, e jamais três. Então volto a usar meu colega Dimitri nesse sentido. Quando ele ensinava para os meninos de onze ou doze anos a fazer a saída em dupla da barra, lá no centro de alto rendimento, ele sempre brincava com eles, ele falava assim ‘o que que você quer? Você quer sair em duplo? Ou você que sair em duplo com tripla pirueta? Se você quer sair em duplo, eu te ensino já e acabou e pronto, se você quer continuar mais cinco, seis anos aprendendo até chegar num duplo com dupla ou tripla pirueta, tenha paciência, você vai demorar o dobro de tempo para aprender essa saída, mas eu garanto que a hora que você aprender você vai ter domínio suficiente para colocar uma, ou duas, ou três piruetas, ou o que mais você quiser’. E eu pude comprovar isso! Um dos atletas que hoje é bi-campeão olímpico, Andrev Arman, de salto, que foi treinado pelo Dimitri e pelo Alejandro, que passou por essa metodologia. Ele conseguia fazer algo que eu jamais vi em nenhum ginasta brasileiro, que era fazer essa saída em duplo com tripla pirueta conversando e falando o que tava acontecendo, isso eu jamais vi na minha vida! O domínio dele, lógico ele demorou seis, sete anos para aprender isso, mas o domínio dele era tal, que ele sabia o que estava acontecendo em todos os momentos e ele relatava os erros que ele tinha em cada movimento, ele terminava e falava ‘eu errei aqui e aqui, porque eu comecei essa pirueta antes e tal, tal, tal’, ou seja, ele não fazia o movimento, ele tinha entendido o movimento, ele podia alterar aquele movimento no momento que ele quisesse. Isso eu jamais vi nos ginastas brasileiros, porque os ginastas brasileiros durante muito tempo nunca entenderam os movimentos, eles simplesmente repetiam os movimentos e jamais pararam para pensar porque aquilo era assim e não assado. Se você entende o movimento, você é capaz de fazer o que você quiser, inclusive, reajustar ele quando você tem algum problema. A altura não é suficiente, você vê que você vai cair, você pode mudar seu corpo, mudar sua posição, acelerar o giro, antecipar rotação, para cair em pé. Essa é a diferença de um campeão olímpico para os demais; é um cara que a gente sabe que erra, assim como os demais, mas que conhece tão bem o movimento que ele consegue reajustar o corpo dele e o erro dele é minimizado; todos erram, obviamente, o campeão olímpico um pouco menos! Mas, a diferença é que quando o campeão olímpico erra, ele conhece tanto o movimento, e domina tanto o corpo dele, que ele conserta o próprio erro dele, e isso da uma diferença de zero, dois (0,20); zero, três (0,30) em cada exercício que, no fundo, no fundo, é a medalha de ouro, de prata e a de bronze. Essa é a diferença e não o que ele

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faz! Todos fazem os mesmos movimentos, mas a diferença é o domínio que aquele cara tem do corpo dele, e esse domínio começa aqui, na cambalhotinha no chão. Esse é o segredo da Ginástica, a cambalhota no chão bem aprendida e bem entendida. Ela pode se transformar num triplo mortal num artista de circo, que é uma das coisas que eu venho fazendo, se você não aprendeu muito bem essa cambalhota você jamais vai fazer um salto triplo bem feito; se você aprendeu ela mal, não entendeu aquilo lá, o seu salto triplo vai ser sempre temerário, sempre arriscado, sempre um passo da morte, porque você não entende o que você está fazendo, você está fazendo, mas não entende, isso é um problema, entendeu?

P – Certo! E como você vê a Ginástica Artística hoje, dentro e fora do contexto universitário?

D.2 – Eu até falei que a gente vem fazendo uma pesquisa bem grande, com muita gente envolvida, a nível nacional, tentando traçar um panorama do que vem sendo ensinado nas Instituições de Ensino Superior de Ginástica, Geral, Artística, Rítmica, o que for. A gente tem visto que se ensina bastante até, mais do que a gente acreditava há alguns anos atrás, ou seja, a grande maioria das Universidades continuam tendo uma (...) pelo menos uma disciplina de Ginástica, muitas têm duas, algumas têm três ou quatro, o problema é o que se ensina e, de que forma se ensina; porque dependendo, voltando àquilo que eu falei, dependendo do que eu ensino, eu restrinjo meus alunos a aprenderem mais coisas, e o como eu ensino, eu restrinjo o prazer que o meu aluno tem daquilo que ele está fazendo. Então se eu limitei o vocabulário motor e por outro lado limitei a motivação dele, significa que fora da Universidade, mesmo tendo disciplinas que se ensinam, eles não vão aplicar isso nunca, porque eles não têm nem conhecimento e muito menos motivação, vontade de aplicar aquilo fora, então isso é uma das coisas que a gente vem observando. Não é o fato de se ter a disciplina que garante que ela vai ser ensinada fora, pelo contrário, tem algumas Universidades que não tem, mas na região tem outros clubes que trabalham a Ginástica e tem mais Ginástica na escola do que dentro das Universidades, a gente vê isso em cidades pequenas enfim. O como se ensina, ou seja, se eu consigo, na graduação, transportar para o meu aluno um conhecimento, um entendimento de que aquilo que eu estou ensinando é bom para aquelas pessoas, para aqueles escolares, se eu conseguir fazer ele entender isso, se eu conseguir fazer ele entender que o domínio do corpo só favorece aos nossos alunos, ele vai querer usar aquilo lá, ele vai querer trabalhar com aquilo em algum lugar. Na escola, ele vai sentir, vai falar ‘nossa que legal, eu faço aquilo na escola e eu noto que os meus alunos mudam’, e é batata! Isso, por exemplo, em muitos países da Europa se tem certeza absoluta. Na França eles não exitam, e não tem a menor dúvida que a Ginástica é disciplina importantíssima. A Ginástica como um todo para a escola, eles têm certeza absoluta. Se você for em todas as escolas, eles trabalham com Ginástica, a quantidade de publicações na área pedagógica é gigantesca, a quantidade de cursos de formação de professores de Educação Física e reciclagem na Ginástica é monstruosa, o ano inteiro milhões de cursos. Porque eles entendem que aquilo é importante e eles conseguem visualizar com nitidez que as pessoas que fizerem Ginástica na escola vão se transformar em excelentes atletas em n modalidades no futuro, e em excelentes, não todos obviamente, mas em excelentes cidadãos, que dominam melhor o corpo, que sabem se expressar, que sabem se portar na frente de uma pessoa, tem menos problemas de postura, tem menos problemas de saúde, tem menos problemas com uma série de coisas; porque conhecem o corpo, sabem que quando ta sentado estranho o corpo não ta legal, ele sabe a postura, a Ginástica trabalha com isso! Na Ginástica, é impossível você fazer certas coisas se você não tiver uma postura correta, ou correta do ponto de vista técnico da Ginástica. Se você não assumir uma certa postura, você não consegue fazer uma estrela, você cai e

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esse conhecimento do seu equilíbrio, da sua organização de postura se transforma, ou se transfere até quando eu to sentado no meu escritório, eu consigo perceber que o meu corpo não ta bem orientado, porque eu sei qual é a orientação do meu corpo. O problema são aquelas pessoas que nunca tiveram essa formação, pra elas é indiferente como elas estão, porque elas não conhecem o corpo delas, não sabem se ta bom, se ta ruim, ou qual é o problema, então vai um pouco por aí. Eu me perdi um pouco do que você estava falando, mais a gente vai e volta é assim que funciona! (risos).

P – (risos). Você já chegou a formar turma aqui? Você dá aula há pouco tempo, mas das turmas que você pegou, alguma já formou! Você acredita que eles levaram o que você ensinou para a escola?

D.2 – Sim! Eu acredito que sim! Isso a gente só vai poder comprovar a longo prazo. Eu acho que um projeto pedagógico como o nosso, na verdade o currículo atual da Universidade D estreou recentemente, então todo esse investimento na Ginástica que já vem sendo feito aqui há vinte anos, mas que agora ta feito de uma forma muito melhor organizada, muito mais ativa, só vai ser visto daqui seis ou sete anos, quando várias turmas estiverem formadas. O impacto desse conhecimento, dessa forma com que gente está trabalhando a Ginástica aqui, só vai ser conhecido daqui a um bom tempo, mas pelo retorno que a gente tem local, daquilo que a gente consegue acompanhar dos alunos não só aqui dentro, mas nos projetos da Universidade, nos projetos sociais da cidade, nas escolas da cidade, a gente tem visto que pelo menos se eles fossem chamados para trabalhar, eles poderiam trabalhar com Ginástica porque eles têm uma formação mínima, e eles têm essa capacidade de encontrar a lógica daquilo que ele vai fazer e adequar aquilo ao espaço, ao público, aos objetivos pedagógicos ou sociais, eles conseguem transformar tudo isso e trabalhar, isso é o mais importante! Isso eu tenho visto não só com a Ginástica, mas com outras disciplinas, que os nossos alunos têm tido essa grande flexibilidade, essa grande capacidade plástica, de aplicar aquele conhecimento em qualquer lugar aonde eles forem. Com o Grupo A, por exemplo, talvez seja o meu maior laboratório de experimentação com a Ginástica, grande parte deles foram meus alunos nos anos anteriores e a gente tem feito muito com o Grupo A não só apresentações, mas oficinas, workshops em escolas, clubes, SESCs, tudo que você pode imaginar, e aí é onde eu vejo se eles aprenderam, porque é onde eu coloco eles pra aplicar aquele conhecimento, e por grata surpresa eu tenho visto eles realmente saberem o que eles estão fazendo. Não importa se eles estão ensinando crianças que nunca fizeram, se estão fazendo só saltitos simples, rolamento simples, mas eles sabem o que eles estão fazendo, eles têm certeza do que eles estão fazendo. Isso é ótimo! Independente se eles são bons ou péssimos ginastas, não tenho problema nenhum com isso. Então, esse é o público que eu consigo acompanhar mais de perto. Agora, o grande público dos professores de escolas, eu acho que eu ainda vou ter que esperar alguns anos para ver o que é que vai acontecer (risos).

P – Você auxilia na montagem do programa da disciplina?

D.2 – Como assim?

P – Você tem o programa das disciplinas de Ginástica que ministra, é você quem monta? A universidade impõe alguma coisa?

D.2 – Sou eu que monto!

P – A universidade impõe, ou estabelece alguma coisa?

D.2 – Não, na Universidade D não! Quando foi criado o currículo, pra cada disciplina obviamente, foi feito um programa padrão, um programa pra propor essa nova grade

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curricular. Então pra cada uma das disciplinas foi criado uma ementa, os objetivos, o programa, até pra conseguir diferenciar uma disciplina da outra, o que essa vai trabalhar, o que aquela outra vai trabalhar, os limites de cada uma enfim, mas uma vez iniciada a disciplina o professor tem total autonomia para fazer todas as mudanças que ele quiser inclusive, na ementa a gente pode sugerir, ano a ano, pequenos ajustes aí, mas o conteúdo, a metodologia de trabalho, referências bibliográficas, outros materiais de referência ou mesmo o programa de uma forma geral é totalmente pessoal; embora, por exemplo, a mesma disciplina que eu trabalho hoje o Carlos Ferraz trabalhou, a Márcia Vasquez trabalhou, a Josi trabalhou, outros vários professores, o Figueira trabalhou, mas o meu programa não tem nada a ver com o deles, por que foi sendo refeito, foi sendo aperfeiçoado e eu diria que o meu programa de cada ano é diferente, cada ano eu volto a rever o programa, eu volto a sentar com orientandos ou com as pessoas do grupo de pesquisa onde a gente debate, onde aquilo funcionou, onde aquilo não funcionou, eu debato com os alunos, eles fazem sugestões, algumas aulas práticas que aquele conteúdo deveria ser trabalhado por um tempo maior, ou outros conteúdos que podem ser trabalhados com um tempo menor, o que faltou, o que que eles acharam que precisava, enfim eu acho que a gente precisa ta constantemente revendo e atualizando os programas, no meu caso todo ano acontece.

P – A de [nome da disciplina] que é obrigatória né, a de Ginástica Artística é optativa?

D.2 – É! É optativa!

P – Todas as outras de modalidades Ginásticas são optativas?

D.2 – Todas são optativas! É, com certos poréns. Por exemplo, quem vai fazer bacharelado ele tem que optar por três esportes individuais, então no fundo, no fundo ele acaba fazendo. Mas eu diria que, como as disciplinas de esportes individuais, mesmo para quem faz licenciatura, não são muitas, a maioria opta por Ginástica, uma disciplina que normalmente a gente (...) tanto Ginástica Artística, Ginástica Rítmica a gente tem casa cheia. As disciplinas de trampolim que o Carlos trabalha são casa cheia também, todo ano. Então a gente tem bastante vida de Ginástica na Universidade. Se tem uma coisa importante nas Universidades que tem a ver com a disciplina e que você, talvez em algum momento do seu trabalho você possa falar, é a cultura que se cria dentro do ambiente universitário com relação aquilo que se ta trabalhando. Ou seja, não funciona, por exemplo, eu trabalhar aqui Esgrima. Não existe nenhuma cultura de Esgrima no Brasil, ou quase nenhuma, no estado de São Paulo, em Cidade F, na Universidade, ninguém eu acho que nunca pegou um florete na mão. Eu trabalhar aqui, obviamente isso pode ser feito, é valido, seria uma coisa maravilhosa para os alunos que nunca viram ter a oportunidade, mas isso não se sustentaria por muito tempo e isso dificilmente geraria uma mudança na própria Universidade. A gente tem que criar condições para que quanto maior for a cultura, quanto maior for as possibilidades em trabalhar aqueles conhecimentos, sejam maiores para que os alunos realmente tenham vontade. Então aqui a gente tem vários projetos de extensão universitária com Ginástica, a gente tem Ginástica Rítmica para criança, Ginástica Artística para criança, Grupo A tanto da Universidade quanto da Faculdade de Educação Física, Rope Skiping, Roda Alemã, vixe, um monte de projetos que atendem a comunidade, onde os alunos podem trabalhar, onde os alunos podem fazer aula pra aprender. Nós temos várias disciplinas eletivas, que permite que o aluno possa fazer durante todos os semestres da formação dele, algo de Ginástica. Então portanto, se ele quiser fazer Ginástica ele vai poder fazer praticamente a carreira dele inteira. Tudo isso, o Grupo A que se apresenta constantemente em todos os eventos, a gente tem um evento específico a cada dois anos, a gente tem uma série de atos dentro da Universidade, um grupo de pesquisa vivo que trabalha semanalmente, que produz bastante, enfim uma série de estratégias e

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acontecimentos em volta da Ginástica. Isso significa que os alunos daqui, queiram ou não, vão ver Ginástica, por muitas frentes de batalha. Traduzindo isso em miúdos, significa que o interesse em Ginástica é grande ao longo dos anos, muita gente vem fazer faculdade aqui por conta da Ginástica, vem de longe, isso eu pude constatar, em Cidade G acontecia o mesmo fato! Em Cidade G eles tinham um ginásio maravilhoso de Ginástica que foi usado nas Olimpíadas dentro da faculdade, quatro professores especialistas, dois deles ex-seleção do País A de Ginástica, muita atividade de Ginástica. Então, muita gente ia para Cidade G porque queria fazer Ginástica. Se eu quero fazer Educação Física, onde tem o que eu quero? Em tal lugar. Então eu vou! Então tinha gente que atravessava o país, como acontece aqui, gente que vem de muito longe porque quer ter a Ginástica e sabe que aqui vai ter uma vivência enorme, se quiser vai ter! Então, quer dizer, eu acho que essa estratégia que garante êxito de uma certa atividade, assim como tem outras faculdades que tem cultura de outras coisas, tem (...) sei lá (...) de lutas, tem faculdade que tem muita luta. Na Universidade A já teve muita Ginástica, hoje tem menos por conta de que saíram alguns professores muito importantes, por conta de que a Ginástica em Cidade C decaiu muito, por conta de que a Ginástica na Universidade A enquanto prática de extensão, é separada da faculdade, então não tem muito vínculo, uma série de coisas. Mas a Universidade A já foi referência de Ginástica durante muito tempo porque tinha muita coisa, grupo de pesquisa, uma série de coisas, hoje não tem tanto e, talvez nós tenhamos muito mais do que eles. Quer dizer, esse contexto amplo que é o que garante ter formação boa de Ginástica e eu sempre admiti e continuo admitindo que eu ensino para os meus alunos um pouquinho de Ginástica, mas eles aprendem muito mais de Ginástica na Universidade D fazendo as outras atividades, ou seja, sendo monitores, alunos dos projetos de extensão, participando dos grupos de Ginástica, vindo aos grupos de pesquisa, fazendo iniciação científica, ajudando como monitores nos eventos que a gente faz (...) fazendo mil coisas, é aí que eles realmente efetivam o conhecimento que eu iniciei nas aulas. Se não tivesse isso tudo, provavelmente eles apenas teriam aquele conhecimento que não difere de outras faculdades, também boas, com professores bons, que trabalham com uma boa metodologia. O que difere mesmo são anos trabalhando com Ginástica, eles vão sair daqui tendo feito muita Ginástica, tendo vivenciado, tendo trabalhado como monitor, como monitor de projetos de extensão e isso faz uma diferença monstruosa. Volto a insistir, o currículo oficial de uma graduação é apenas uma parte da formação, em grande parte o currículo oculto, aquilo que não ta na linha, é o que garante uma boa formação, no nosso caso da Ginástica, o currículo oculto é monstruoso.

P – E a avaliação?

D.2 – Como eu avalio?

P – É, como você avalia?

D.2 – Eu sou meio estranho nesse (...) cada um avalia de uma forma. Tem professores dos mais exóticos possíveis, dos mais ortodoxos possíveis, eu sou meio estranho. Primeira coisa, isso também vem de um outro mestre que eu tive, um outro professor que eu quero muito. Eu avalio muito o que eu chamo de participação, mas não é simplesmente estar presente. Eu tenho um diário pequenininho, toda aula eu levo, todos os fatos interessantes positivos e negativos eu anoto, fulano veio, mas não fez nada eu anoto ‘fulano veio, mas não fez nada’; fulano fez alguma coisa maravilhosa na aula eu anoto; as vezes eu anoto duas coisas em uma aula, as vezes eu anoto vinte e vou anotando aula a aula. No final do semestre eu tenho um panorama daquilo que aconteceu, eu sei quem veio, quem não veio, quem fez, quem não fez, quem estava lá simplesmente de estátua, quem quis aprender, quem não quis, aquele não sabia nada e

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aprendeu um monte, aquele que sabia um monte mas não aprendeu nada, eu tenho um panorama, isso pra mim é participação, isso pra mim tem um valor tão importante quanto as provas. Normalmente eu dou peso de zero a dez para participação, zero a dez para uma prova teórica e zero a dez para uma prova prática. Essa prova prática, normalmente, salvo exceções, acontece com apresentação ao público de um trabalho, mesmo sendo Ginástica Artística, eles montam coreografias que tem à ver muito com a nossa grande influência de Ginástica Geral aqui na Universidade D, mas enfim eles, em grande parte, eles preparam uma coreografia que tem a ver com o que eles trabalharam, no caso da Ginástica Artística, Ginástica Rítmica e apresentam nos nossos festivais. Nós temos dois festivais de Ginástica, um em Junho e um em Novembro, um interno e um externo, um é para a comunidade local e um a gente convida um monte de gente, mas todo semestre tem um festival. Então todo semestre eles têm a oportunidade e aí muda tudo, a gente entra num outro campo que é o campo da expressão. Se a Ginástica é uma prática expressiva, é exatamente mostrando para o público onde eles vão sentir essa emoção da expressão, então a apresentação prática é isso, salvo exceções. Existe ano que acontece alguma coisa e não tem o festival, que é muito raro, então eles preparam uma apresentação. Fora isso, fora essas três grandes notas, participação, prova teórica e prova prática, durante o semestre eu faço alguns trabalhos que contribuem com a nota, não são pesos iguais, mas contribuem. Por exemplo, quando a gente ta falando de metodologia, como se ensina certos movimentos, eu peço para eles se organizarem e eles vão preparar como se eles fossem dar aula pra um grupo, então eu preparo um grupo e, um professor. Às vezes, dois ensinam esse grupo a fazer tal coisa, eles preparam um pequeno trabalho teórico de como eles dariam aula. O que eu tento, no caso da licenciatura é que, por exemplo, todo mundo saia com pelo menos uma ou duas aulas prontas. Então o cara, durante o semestre, ele conseguiu preparar uma aula, ‘olha professor nessa aula eu vou trabalhar alguns deslocamentos, saltitos, saltos e grandes saltos da Ginástica’; ‘muito bem!’; ‘com crianças de quarta série, de seis ou sete anos, durante duas aulas de quarenta e cinco minutos’. Ele programa, ele prepara, ele vem aqui e apresenta pra gente. Se você pensar que normalmente em uma disciplina dessa tem quarenta alunos e a gente vai apresentar umas vinte aulas, se eu juntar essas vinte aulas, ele tem material pra trabalhar um ano e alguma coisa dentro da escola. Então é isso que eu falo. É lógico que cada um apresentou uma aula, mas aí eu somo todas essas aulas e falo pra eles ‘olha o seu material de trabalho já ta pronto’; ‘vocês estão prontos pra dar aulas’; ‘se vocês pegarem a experiência de todos os seus colegas e juntarem, vocês têm vinte aulas prontas, vinte aulas de Educação Física prontas’. Nessa matemática você tem um ano, um ano e meio, as vezes dois anos de trabalho. Quer dizer, eu tento transformar aquilo que é um conhecimento acadêmico numa coisa imediatamente aplicável pra eles, no caso deles saírem amanhã pra uma escola, independente da idade. Ás vezes eu limito o uso de material ‘para ensinar tal coisa vocês só vão poder usar dois colchões e vocês têm trinta crianças’. Pode acontecer! Nos meus primórdios eu dei aula no estado e eu tinha quatro colchões verdes de judô, mas eu dei aula, eu ensinei equilíbrios de trave em cima dos bancos que a gente tinha no pátio, eu ensinei estrela, cambalhota, eu consegui uma série de aprendizagens lá, com quatro colchões verdes. Pra mim talvez foi uma das experiências mais ricas da minha vida, porque foi onde eu tive que quebrar mais a minha cabeça pra ensinar mantendo os níveis de segurança, motivação etc. etc. e tal e, eu dei aula! Nunca tive problema! Eu acredito, e defendo isso com os meus alunos, que não é a falta de material que impede, ela dificulta. O que impede é a falta de conhecimento sobre a temática, se você tem muito conhecimento você consegue de alguma forma adaptar. Os equilíbrios todos de Ginástica você praticamente pode treinar sem material algum, os saltos e os saltitos quase todos sem material algum, as rotações em dois eixos pelo menos, sem material algum, o que nós estamos esperando para

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fazer Ginástica? Esperando cair uma barra fixa do céu? Vai esperar até morrer! Esperando cair uma trave, uma barra assimétrica? Vai morrer, porque o Estado não vai por uma em cada escola, são equipamentos caríssimos. Um tumbling de solo? Jamais! A gente só não ensina porque tem pouco conhecimento ou porque não entende as prioridades. Muita gente fala ‘ah, mas eu não dou Ginástica Artística porque eu não tenho cavalo’. Cavalo é a última prioridade para o ginasta, a criança sobe no cavalo no treinamento por último, depois que ela aprendeu tudo, porque o cavalo é o mais difícil que tem. Pra que que eu quero um cavalo na escola? Eu já escutei de muitos professores ‘eu não tenho cavalo, não tenho barra paralela’; ‘ah, mas você não tem chão?’. No chão eu faço um milhão de coisas. Na Capoeira eles não fazem tudo no chão e aprendem estrela e até saltos mortais? Eu não digo que um salto mortal é bom fazer no chão, mas aprendem uma série de coisas, por que na Ginástica não? ‘Ah é perigoso!’. Será? Será que as crianças estão preocupadas com isso? Será que um bom conhecimento aplicado de uma forma bem correta, não é possível ensinar uma estrela no chão? Eu tenho sérias dúvidas! A estrela é um movimento que a priori não tem impacto, a priori não tem vôo, então se eu não tenho impacto e vôo, eu poderia muito bem fazer ela no chão, se eu souber o que eu estou fazendo, obviamente, ou na grama ou em qualquer outro lugar. A priori não é um movimento que requer colchão, pelo contrário o colchão vai dificultar mais ainda o aprendizado da estrela e uma série de outros pré-requisitos aí que são no mínimo duvidosos, no mínimo.

P – E você observa alguma relação, algum entrave, entre disciplinas de caráter mais prático, no caso da Ginástica, comparada a outras disciplinas do currículo, mais teóricas?

D.2 – Se tem relação?

P – Não! Se tem relação de poder, algum entrave?

D.2 – Eu diria que aqui não! Em outros lugares que eu já estive, às vezes participando de algum curso tal, sim, acho que existe muitos conflitos de poder e espaços e etc. A Ginástica quando ela esta dentro da Universidade ela é complicada, porque ela precisa de um espaço grande, ela utiliza de um material caro (...) aparatoso, grande, volumoso, as pessoas vêem, não tem como não ver um ginásio de Ginástica! Ninguém passa sem ver, ela atrai muita atenção. Então os professores de Ginástica sempre são muito visados para uma série de coisas, qualquer escola que visita a Universidade ela quer ir no ginásio de Ginástica primeiro, ela não vai querer ir na pista de Atletismo ficar dando volta na pista, se ela vê a cama elástica, o tablado, não sei o que. Hoje eu não tenho a menor duvida, é só você colocar a criança e dizer ‘você quer ir para cá ou para lá?’; ela vai falar ‘pra lá, pra cama elástica’, com certeza! Então isso tudo gera uma série de fatores, de inveja, de sei lá o que. Aqui, eu diria que não temos esse problema. Eu acho que (...) obviamente eu sou novo, muitas coisas podem acontecer ainda, mas os meus companheiros me tratam muito bem. A Ginástica aqui é muito querida, muito bem tratada, até porque os meus antecessores e alguns que ainda estão (...) trabalharam e trabalham muito bem, fizeram uma história. Então aqui não se nega essa história, todo mundo reconhece; falei que tem um grupo de Ginástica há muitos anos, um grupo de pesquisa também de anos, quer dizer, não é pouca coisa e, se respeita muito. Então, eu peguei o bonde andando, só tenho o cuidado de empurrar ele bem pra uma boa direção, mas ele já estava andando. Então tudo isso faz com que aqui não tenha muitos problemas. Não significa que aqui não tenha problema de espaço, aqui tem muito problema de espaço. A Ginástica ocupa um espaço enorme, então eu divido as vezes com lutas, com não sei o que, então a gente tem esses conflitinhos, mas algo extremamente natural. Eu queria falar outra coisa do poder da Ginástica, mas acabei esquecendo (...) bom, mas vamos embora (risos)

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P – (risos) Para finalizar, a gente falou da formação com Ginástica, formação de professores, mas assim, tem a sua formação, você é docente universitário, você forma outros professores. Lógico que você buscou outros subsídios, você é atleta (...)

D.2 – Fui, fui! (risos)

P – (risos) Você foi, foi, mas você ainda participa, participa com seu grupo (...)

D.2 – Sim, quando eu tenho possibilidades eu ainda brinco.

P – Bom, mas você está no meio da Ginástica acadêmica e extra-acadêmica, e aqui, no programa de Pós, que eu tenho conhecimento, é a única disciplina de Ginástica para um Mestrado ou Doutorado (...)

D.2 – A Universidade A teve uma, mas que está inativa, faz alguns anos que não tem, que era uma disciplina de [nome da disciplina] que era com a Rosana, mas faz algum tempo que não tem porque ela está fora há um ano, um ano e meio. Mas eu acho que já faz uns quatro anos que não se oferece, é a única que eu conheço, também não conheço mais.

P – E aí como que fica essa formação de quem vai trabalhar no Ensino Superior? E, pode falar resumidamente, porque esse não é o objetivo principal e eu não quero te atrasar.

D.2 – Eu diria que na pós aqui, mesmo a gente tendo duas, nós temos aqui [nome da disciplina I] e (...) vixe, a outra eu não lembro! Não, é [nome da disciplina II]. São as duas que a gente tem. Inclusive esse semestre agora, daqui a duas semanas começa a primeira que é [nome da disciplina I].

P – Que vocês não aceitam alunos especiais (risos).

D.2 – (risos) Não, olha isso foi um erro na verdade. Aceita! Sou eu o professor, aceita sim! Só que foi publicado errado. Se você tem interesse de fazer, não sei se ainda é interessante, vai ser de quarta-feira de manhã, você teria que vir aqui no dia cinco ou dia seis, alguma coisa assim, falar com a Jô, ela vai fazer uma carta, daí você vai lá no Departamento e faz a matrícula, por que pode. Isso foi um erro! Na verdade eu tenho quatro alunos especiais matriculados, mas saiu no papel errado e alguém veio me falar depois, ‘Docente 2 na sua disciplina não aceita’; eu falei ‘sempre aceitei, aceita sim!’.

P – Eu imaginei que, por ser o único programa, que talvez tenha (...)

D.2 – Que tava lotada né!? (risos)

P – É, pensei ‘acho que eles não abrem para especial porque deve vir gente de toda parte!’.

D.2 – Não! Tem bastante procura, mas não é tanta assim. Ginástica não é a galinha dos ovos de ouro (risos), então não tem tanta gente assim. Ainda não, espero que um dia lote (risos).

P – São pouquíssimas disciplinas voltadas para práticas ou modalidades esportivas nos programas de pós né!?

D.2 – É! E hoje, a gente tem uma produção na pós, no mestrado e doutorado no estado de São Paulo muito pequena na área de Ginástica. Temos (...) sei lá, uma ou duas teses por ano, duas dissertações por ano, no máximo. Quer dizer é uma produção muito pequena, você não tem muita gente pesquisando nessa área, tem três, quatro grupos de

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pesquisa no estado de São Paulo, vinte no Brasil, se tiver. Ativos de verdade, conhecidos, trabalhando, não enchem a palma de uma mão! Então, quer dizer, pós-graduandos realmente interessados em Ginástica são pouquíssimos, a maioria das Universidades privadas onde poderia ter alguém interessado não tem pós-graduação, portanto a gente tem (...) é muito especial o público, então não tem muita gente. Embora, eu reconheça que a oferta de disciplinas na área da Ginástica é mínima na graduação e muito mais na pós. Mas eu diria que o objetivo da disciplina aqui na pós vária um pouco logicamente da da graduação, a medida do que o que eu tento com os alunos é que aquelas pessoas que vieram buscar essa disciplina e que obviamente tem um desejo de pesquisar na área da Ginástica, que eles vejam as múltiplas possibilidades de pesquisa da Ginástica e isso significa, não existe só a possibilidade de pesquisa na área da biomecânica, da fisiologia, do treinamento esportivo, que é a grande maioria dos trabalhos, existem n possibilidades. Aqui, por exemplo, a gente produz muita coisa na área da Ginástica Geral voltada pra escola, grande parte da nossa produção é pra isso! Como trabalhar em escola, o que você faz, o que você não faz, como produz material alternativo enfim, quer dizer, a disciplina é uma chamada de atenção pra que existe um campo enorme de pesquisa na área da Ginástica e que, está inexplorado, pouquíssima gente explora e que, pelo contrário as poucas pessoas que fazem, por exemplo, estudos de biomecânica, fisiologia, nós somos, eu diria que, pouco competentes nessa área. Eu tenho um amigo na Inglaterra que faz estudos sobre a fisiologia da Ginástica Artística e eu seria incapaz de competir com ele, nem que eu estudasse vinte anos, porque os caras trabalham com dois, três milhões de dólares ao ano de investimento, possuem um laboratório monstruoso, com uma equipe enorme de pessoas, trabalham com uma seleção vinte e quatro horas, o ginásio da seleção é dentro do laboratório, os caras fazem experimentos com os atletas todos os dias, como eu vou competir, do ponto de vista da pesquisa, com eles? É ridículo! Não tem como! Eu vou fazer um estudinho de fisiologia por ano, pagando do meu bolso, pedindo por favor pra vir um atleta, ou fazendo experimentos de fisiologia com gente que mal pratica Ginástica. Pra que? Então o que eu tento despertar nos alunos é que existem problemas mais urgentes, mais reais e mais nossos aqui do dia-dia, de aula, de escola, que a gente pode pesquisar com uma competência enorme, mais que o cara da Inglaterra. Ele é tão bom, ele é excelente na fisiologia, mas se ele vier resolver os nossos problemas da Ginástica aqui no Brasil, provavelmente ele não consiga. Por que que eu quero resolver o dele lá? Não tem infra-estrutura para isso, o que que eu vou fazer? Biomecânica é a mesma coisa, o cara que chama Freddy Eagle, que é o papa da biomecânica, faz trinta anos que ele estuda a biomecânica da Ginástica. Já estudou quase todos os movimentos, ele tem milhões de dólares por ano para trabalhar, tem todos os (...) tem matemático, físico, o que é que eu vou fazer na biomecânica com esse cara? Competir como com ele? Eles estão anos luz na nossa frente. Se eu quero aprender biomecânica eu vou lá, fico dois anos no laboratório dele, acompanho ele, vou aprender muito; agora fazer pesquisa para ajudar o desenvolvimento da arte, eu vou demorar trinta anos pra chegar no nível que eles estão, não compensa! Compensa eu resolver os nossos problemas locais que são muito maiores. Isso é o que eu tento nessa disciplina, o que já é muito. Vai passar uns três séculos a gente vai ta (...) a galera ainda vai estar pensando “eu quero estudar a biomecânica da Ginástica!”. Não precisa mais! Isso eu brinco todos os dias com eles, não precisa! Os problemas biomecânicos na Ginástica quase todos estão sanados, os que não estão sanados não carecem de estudo. Brincando né, lógico que carecem! Mas pra nós brasileiros não, deixa os caras lá que tem milhões de dólares por ano estudar, eles vão resolver esses problemas tranqüilamente, aí eles passam a informação pra gente, não tem problema nenhum. A gente tem problemas muito mais básicos, ter Ginástica na escola, entender bem da Ginástica na escola, isso é básico, isso é importante pra gente, agora saber se o triplo

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mortal usa um coeficiente de força mais ou menos que 5,85 (cinco, oitenta e cinco), não vai mudar a Ginástica brasileira não! Não vai fazer nada na Ginástica brasileira (risos). Nós vamos continuar caminhando de ré, esse é o problema entendeu? Os alunos têm muita dificuldade, sobretudo os pós-graduandos, muita dificuldade nisso. Ainda há muita gente querendo fazer estudos nessas áreas que, aparentemente são mais científicas, dão mais renome, mas do ponto de vista internacional. Se realmente a gente quer produzir e, ter uma inserção internacional, produzir em biomecânica da Ginástica não vai levar ninguém daqui a lugar nenhum, porque os caras tão muito na nossa frente. No Japão, nos Estados Unidos, na Alemanha, eles têm laboratórios monstruosos, grandíssimos, só de biomecânica da Ginástica. Não é laboratório de biomecânica, é de biomecânica da Ginástica, e aqui a gente não vai ter tão pronto um laboratório de biomecânica da Ginástica, mal a gente consegue manter um de biomecânica que tem quatro aparelhos. As caras lá têm dezenas de aparelhos só pra Ginástica, os caras sabem tudo, a angulação de todos os movimentos da Ginástica que você quiser, ta lá, entendeu? É isso que é difícil colocar na cabeça dos nossos alunos ou pelo menos fazer com que eles reflitam sobre isso.

P – Legal!

D.2 – Certo?

P – Certo e muito obrigado!

D.2 – De nada e vamos que eu ainda tenho um ensaio pela frente (risos).

Docente 3 – Agosto/2008 – 1h23min

P – Bom então a primeira pergunta é: quais são os conhecimentos que você julga essenciais para ministrar a Ginástica Artística para licenciatura?

D.3 – Bom primeiro se deve entender claro qual é o espaço acadêmico dentro da instituição destinado ao âmbito escolar. Quais as conexões que são realizadas pela direção e pelas diferentes disciplinas que compõem a grade curricular da faculdade ou curso com o âmbito escolar; que tipo de reflexão é feita; qual é a infra-estrutura do curso e qual é o tipo de material que a instituição conta para a formação profissional de seus alunos; quanto e o número de alunos; que tipo de aluno se quer formar, como ginasta ou como educador, isto é como o professor da disciplina trata o aluno, como um aluno atleta ou como um aluno acadêmico que vai a aplicar ou utilizar esse conhecimento na escola. Na minha perspectiva, a preparação profissional deve habilitar o professor que tem intenção de administrar a Ginástica Artística no âmbito escolar, para ampliar as experiências do domínio corporal das crianças e dos alunos. Criar uma base de experiências tão ricas em seus alunos que eles consigam um domínio e controle do corpo. Essa distinção facilita muito, já que a Ginástica Artística tem uma diferença interessante, ela já tem codificada o tipo de habilidade que deve ser ensinada, por isso as habilidades que constituem a Ginástica Artística são classificadas como habilidades altamente estruturadas, que tem formas especificas de serem executadas. Quando você utiliza modelos de habilidades altamente estruturadas e tenta executá-las, utilizando metodologias que permitam a execução dessas habilidades gímnicas, você perde um potencial enorme de diversificar essas habilidades para que sejam utilizadas em um ambiente aberto que está em constante mudança. Assim, com esse tipo de aprendizagem o aluno não amplia suas experiências para viver em um ambiente em constante transformação, o ambiente do dia-a-dia, ali você termina afunilando as

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experiências apenas para ser utilizada no âmbito esportivo competitivo, ideal para alunos talentos, mas não para o aluno normal. O talento já tem uma condição psicomotora excepcional que lhe permite o domínio de outras habilidades, também altamente estruturadas, por exemplo, saltos acrobáticos, saltos ornamentais, saltos em cama elástica, etc, etc, que lhe permitem complementar sua formação como atleta, mas não do aluno corriqueiro, os alunos normais. Então essa condição deve estar clara no âmbito escolar, e focalizar quais seriam, dentro da quantidade enorme de possibilidades de movimentos, as que mais se adequam para o âmbito escolar; quais habilidades da Ginástica Artística que se poderiam utilizar para encantar ao aluno, ou seja, motivá-lo intrinsecamente, para que com a vivencia das habilidades da Ginástica Artística, ele dê continuidade em suas atividades extra-classe. E (...), por exemplo, quando eu te falo de uma habilidade altamente estrutural, para o domínio de uma técnica, por exemplo, um flick, quantos flicks você precisou fazer para dominá-lo? São muitos! Uma reversão, uma simples reversão. Extremamente complexa, porque tem elementos biomecânicos bem específicos, um talento consegue fazê-la rapidamente, mas, um aluno normal (...) que tem que começar a sentir os aspectos proprioceptivos, sentir o corpo em cada uma das posições, para poder então modificar a inércia do movimento para executar outros exercícios, então ai vai ter vários problemas! Então, qual é o espaço da Ginástica Artística no âmbito escolar? Para mim no ambiente escolar o aporte da Ginástica Artística estaria nas diferentes dificuldades que as habilidades da Ginástica Artística têm, selecionado aquelas que por seu grado de dificuldade e complexidade estejam mais adequadas às características e interesses dos alunos. Para a descoberta de talentos, você tem que pensar na pré-escola ou na educação infantil; de fato, por exemplo, todos os talentos de Ginástica são do âmbito escolar, qualquer talento de Ginástica Artística com projeção internacional, foi encontrado no tempo em que estava cursando o jardim l, o jardim ll, com quatro ou cinco, seis anos, ou nas escolinhas de Ginástica. Agora a função ou o espaço da Ginástica Artística no âmbito escolar, é oferecer possibilidades ricas e diversificadas ao aluno para que ele queira continuar a realizar esta atividade. Nas outras instituições como os clubes ou no espaço extra-escolar são espaços mais técnicos. Assim, podemos distinguir duas diferenças entre o espaço escolar e os espaços extra-classe ou de clubes. No espaço escolar a função do professor é aproximar os alunos aos conhecimentos que existem na Ginástica, isto é, levar aos alunos à compreensão dos códigos simbólicos pelo quais se estrutura e direciona à Ginástica Artística, porém, não somente para a Ginástica Artística, mas, também para as outras modalidades esportivas. Essa é a função do professor educador. O professor educador desvenda os códigos simbólicos internos ocultos que estão no interior de cada uma das manifestações da cultura corporal. Por essa razão, a função do professor de Educação Física na escola deve ser muito mais conceitual, para que o aluno compreenda as dificuldades e a complexidade das manifestações da cultura corporal, caracterizando-se a aula como uma vivência. Uma vivencia onde o aluno vai precisar de muito auxílio, muita ajuda, para que ele sinta a dificuldade de execução de alguns exercícios e também saber porque se faz, para que se faz, onde pode fazer e qual é a abertura que essa experiência pode-lhe oferecer ou dar. Abertura no sentido de utilizar estas experiências nas atividades circenses, ou de fazer outro esporte que tenha características similares à Ginástica Artística. Então, esse espaço de aula, de vivência é muito diferente de um espaço extra-classe ou de clube, onde se faz a prática efetiva. Na escola você tem uma limitação muito grande de tempo, tem um encontro semanal de duas horas acadêmicas que são cinqüenta minutos cada uma com os alunos, e uma quantidade aproximadamente de quarenta alunos, e praticamente sem nenhuma condição material, salvo um colchonete e algum caixão de salto, uma coisa mínima. Nessas condições preferiria ampliar as experiências dos alunos, fazer um elemento acrobático através de uma pratica diversificada, por exemplo, iniciar a Ginástica

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Acrobática como uma brincadeira conhecida por eles, assim eu brincaria com o “Le Parkour”, isto é atividades que eles já conhecem associadas aos filmes ou em entrevistas e reportagem sobre este tema na TV. Nesta brincadeira você pode utilizar metodologias que facilitem a execução, a vivencia desta manifestação, por exemplo, como transpor algum obstáculo e, à medida que ele vá conseguindo, incorporar algumas dicas ou elementos técnicos da Ginástica Artística. A Ginástica Artística, propriamente dita, na escola, estaria resumida a algumas habilidades de solo, que não seria muito além da cambalhota – e eu prefiro somente para frente, não gosto da cambalhota para trás por causa da cervical, sobretudo os meninos que são gordinhos vai que tem problema, incluiria a vivência das sensações de parada de mão, da estrela e do rodante. No âmbito escolar, é muito difícil passar além disso. Para o salto, seriam saltos onde os alunos possam utilizar a coberta do caixão de salto como outro ponto de apoio para pisar e saltar de novo, ou ir transpondo outros obstáculos, criando as condições para que o aluno consiga fazer isso com a mínima ajuda necessária. Obviamente que a forma mais fácil é com a técnica da Ginástica, então você poderia incluir outros obstáculos diferentes com algumas sugestões que obriguem ao aluno a se suspender, por exemplo. Agora para isso, você precisaria incluir um outro elemento, um elemento que é fácil de fazer e que não tem um alto custo, a Barra cilíndrica baixa, que permita fazer uma oitava; uma pendulação que é uma suspensão com impulso; mudança de suspensão, subir na oitava, fazer transposições de pernas; impulsos com saída. Brincar um pouquinho na barra, fazer circuitos com exercícios de solo, salto e barra é mais que suficiente. Se a escola não tem material para isso, já que uma paralela sai muito cara, é possível utilizar a infra-estrutura que a escola possui, traves de futebol colocando-as numa posição que permita, por exemplo, fazer uma sustentação como nas paralelas, já que você tem que pensar nas escolas do Brasil. Eu, normalmente penso nas escolas do Brasil e da América Latina que tem uma realidade muito similar. Nestas escolas o professor deveria oferecer atividades com jogos e brincadeiras, onde o aluno exercite ou vivencie algumas situações que levem a ele certo risco. O nível de risco deve estar de acordo com a evolução de cada um, e que lhe aproximem de certa forma da Ginástica Artística. Porém os alunos devem saber muito bem o que é a Ginástica Artística, quais são os aparelhos, quais são as provas que se realizam, quem são os que conseguem chegar a esse nível de desempenho, qual é o tipo de treinamento que os ginastas realizam, qual é o tipo de sofrimento que eles passam pra chegar até ali, a quantidade de lesões e acidentes que estão atreladas à atividade. Eu tomaria como exemplo, o Centro de Curitiba onde, onde estão os talentos, este centro é um internato e, eles saem esporadicamente para a escola, normalmente vem professores dar aula nessa escola, são cárceres, onde as pessoas, os alunos estão sendo objetivados pela sociedade para poder ter rendimento. Esse aluno já perde sua própria autonomia, ele não é autônimo! Obviamente que muito deles fazem porque gostam e por estar vinculado, mas vendo de uma perspectiva, digamos mais psicológica, isso é um aluno preso, esse aluno está obrigado a realizar determinadas atividades por causa de seu talento e ai é de onde se encontra o problema, quando se passa da pratica para o treinamento. A pratica é o espaço extra-escolar ou de clubes, onde se ampliam as possibilidades de técnica e onde os alunos podem escolher voluntariamente esse tipo de atividade, por isso a pratica está no espaço extra-escolar, nos clubes que não têm tanto interesse na competição, senão em ofertar experiências mais técnicas de uma modalidade especifica. Depois daí vem o treinamento que é muito diferente. A pratica é um espaço bastante interessante, é muito diferente da aula de Educação Física, que tem apenas um encontro semanal. Normalmente, qualquer escola quando abre este espaço com escolinhas, cada escolinha têm duas ou três sessões semanais, é muito mais rico que o espaço de aula. Porém, esse espaço é muito diferente da aula porque é um espaço mais técnico, porque existe aí uma escolha de uma modalidade especifica. A partir da

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prática vem o treinamento. Para iniciar um treinamento, três condições são fundamentais: 1.- a criança tem que ter talento, para não ser traumatizada com os tipos de treinamentos de sobrecarga característicos do alto rendimento; 2.- O Centro de Treinamento tem que possuir tecnologia, toda a infra-estrutura necessária para que a criança faça com segurança o processo de domínio das habilidades técnicas; 3.- O Centro deve ter um técnico preparado com um conhecimento profundo de desenvolvimento infantil, de psicologia, de sociologia, ou seja, um profissional altamente preparado que o Brasil não tem, nem a América tão pouco tem. Temos talentos, mas falta tecnologia, porque existem poucos centros habilitados para o alto rendimento, para ter concorrência, competir entre ginastas de alto rendimento, quando precisam competir tem que viajar ao exterior, já que o número de atletas de alto rendimento no Brasil e na América Latina é baixo. Você viu a pista de trampolim que tem vinte metros de comprimento e dois metros de largura? Ali os ginastas podem fazer combinações e execuções de habilidades de forma muito interessante, porque o trampolim amplia o tempo de execução das habilidades, portanto fazer correções técnicas é muito mais fácil ali, e com um fosso adequado para isso; elemento de filmagem para que o ginasta veja seu erro e entenda e compreenda onde está seu problema. Isso é outro mundo, é um mundo totalmente diferente da realidade nacional.

P – Que a Universidade não tem e nem a escola!

D.3 – A Universidade tem laboratórios e pesquisadores, quem está mais próximo disso.? Eu acredito que a Universidade A, porque eles já têm um laboratório para alto rendimento, talvez aqui na Universidade D que tem um laboratório de biomecânica, mas estão muito mais interessados em outro tipo de esporte e não na biomecânica do movimento altamente estruturado, que seria, os da Ginástica, dos Saltos Ornamentais e outros esportes similares. Então qual é a realidade, neste sentido, do professor? O professor no âmbito escolar tem múltiplos valores, e nessa idéia de multi valor deve pensar na utilização da fantasia para criar situações para que a criança se sinta com vontade de realizar e executar diferentes tipos, digamos, de habilidades. Em que ela vai sentindo como é que é para fazer, por exemplo, salto em profundidade, em diferentes alturas, em uma escada saltando desde diferentes degraus para os colchões ou colchonetes, aprendendo a amortecer ou a rolar; saltando em qualquer obstáculo que apareça, e criando estratégias para aumentar o domínio corporal, levando em conta que esse domínio corporal é diferente do domínio de malabarismo. Dentro da Ginástica se encontra a Ginástica Acrobática com exercícios de malabarismos e equilibrismos, além de algumas habilidades individuais da Ginástica Artística. Utilizando a Ginástica Acrobática, você pode brincar juntando duas pessoas e inventar figuras acrobáticas simples. Essa riqueza estaria na criatividade que deveria ter um professor para poder encantar a criança com esse tipo de atividade, sabendo que ele não vai poder ensinar técnica porque o domínio de uma técnica demora muitos anos para ser incorporado. Se encontrar uma criança com aptidão para a Ginástica Acrobática o professor deve ou pode informar a essa criança de espaços onde ela este sendo praticada, onde ai sim a técnica vai ser introduzida. Por outro lado se deve ter presente que a Ginástica é apenas uma porcentagem do conteúdo que o professor tem que ensinar no âmbito da Educação Física escolar. Tem muitos outros conteúdos que são concorrentes e que têm o mesmo direito de ser vistos, ou seja, o aluno tem direito a que lhe ofertem todos os conhecimentos da cultura corporal, especialmente apropriar-se de todo o conhecimento da cultura corporal patrimonial, aquele que lhe da sentido de pertença, por exemplo, não há outra atividade mais rica em cunho patrimonial que a Capoeira. A Capoeira possui uma série de elementos acrobáticos em que o aluno pode ir adquirindo seu domínio, agora tem um problema de transferência das acrobacias de Capoeira, das habilidades de Capoeira para as atividades gímnicas. Na Capoeira há um diálogo com outra pessoa

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que está sendo todo tempo modulado. Esse diálogo na Ginástica Artística não existe, não tem diálogo, já que o ginasta tem que responder a uma performance ou a uma execução correta de uma determinada habilidade ou série de habilidades. Por isso é diferente! Agora aquilo que você vai ensinar; aquilo que eu ensinaria para um futuro professor para que ensine Ginástica Artística são os objetivos da Ginástica Artística, quais são os caminhos para ter o domínio do corpo nos diferentes aparelhos e o domínio do corpo no ar. Então criaria situações dentro da aula onde isso se apresente e ampliaria enormemente as possibilidades de ação dos alunos, utilizaria muitas variantes, por exemplo, que se use saltar em profundidade, saltar com meio giro, caminhar com duas mãos, saltar sobre objeto como caixa de salto caindo em cima, daí de cima saltando novamente, além de uma série de outros elementos que podem ser feitos. Agora o que o aluno da escola deve saber muito bem é o que é a Ginástica Artística, em que consiste e, quais são as características. E desvendar o máximo de códigos simbólicos possíveis para que o aluno tenha uma compreensão profunda, conceitual, dessa manifestação cultural. Isso significa que quando o aluno vir na televisão, ou esteja brincando com a Ginástica, ele entenda, compreenda, que tenha esse domínio, que não seja apenas um repetidor de exercícios e movimentos. É daí que vem o que chamam de atividades transversais, onde elementos da biologia, da história, etc. de todos os conhecimentos que estão na escola e no dia-a-dia das crianças estão presentes. A criança tem que saber do porque algumas crianças são forçadas a praticar, ou a saber como a Ginástica pode contribuir com o condicionamento físico, já que é mais difícil fazer abdominais e muito mas gostoso fazer uma oitava em que leva um domínio muito melhor do corpo e, tem uma série de outras coisas.

P – Você falou agora pouco o que ensinar para aquele aluno que vai ensinar na escola, você falou de alguns elementos mais práticos, mais técnicos. Como que você diferencia esse conhecimento técnico do conhecimento pedagógico que ele tem que saber da Ginástica Artística, para ensinar?

D.3 – Na faculdade o aluno de Educação Física deveria ter contato com todo o sistema de aparelhagem de Ginástica do ginásio, tanto dos aparelhos oficiais quanto dos aparelhos complementares, por exemplo, mini trampolim, duplo mini trampolim, trampolim acrobático, argola em movimentos, rampa para a execução de exercícios e uma série de outros elementos que são necessários. Agora, o aluno de Educação Física, futuro professor, deve aprender a ensinar, ou seja, deve vivenciar e aprender a ensinar os meios para a aquisição de determinadas habilidades, pelo menos o básico para cada um dos aparelhos, é o mínimo que deve saber. Por quê? Porque no âmbito escolar ele pode ter algum elemento de referência para poder ampliar a base de experiência dos alunos com os elementos da Ginástica Artística, para que possa ofertar aos alunos experiências básicas dos diferentes aparelhos e que, futuramente, um aluno interessado possa, digamos, chegar à Ginástica de competição. Por exemplo, eu na escola, utilizaria cordas para balanceios, para intercambio de balanceios, barras horizontais, barras verticais, utilizando a infra-estrutura do ambiente que a escola dispõe, na escada, nas grades, nos corrimãos, por exemplo, nas rampas para fazer ai atividades. Tentaria ser altamente criativo, não um professor que não quer ensinar.

P – E como que você realizava suas aulas? Porque você não esta ministrando Ginástica Artística agora!

D.3 – É (...) como eu ministrava? Com loucura, com muita loucura! O que devemos saber: primeiro, nem todos os alunos que chegam a Educação Física, teve contato com a Ginástica Artística, nessa situação vamos a dar todas as informações sobre essa modalidade, em que consiste, quais são as características das habilidades altamente

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estruturadas, qual é tipo de treino necessário para ir esculpindo, modelando o corpo do ginasta, quais são as demandas energéticas para a execução de determinadas habilidades, qual é o tipo de condicionamento físico necessário para chegar a isso e quais são as técnicas das principais habilidades, porque através destas informações eles podem inferir uma metodologia específica para o domínio dessa habilidade. Por exemplo, se eu já sei auxiliar em uma reversão ou num flick ou num mortal, é muito mais fácil transferir essa experiência para os outros aparelhos, então os alunos da Educação Física devem adquirir esse domínio, e o domínio, digamos, corporal de execução de ajudas, saber auxiliar, saber que existem diferentes tipos de ajuda, tem umas ajudas que são de segurança, que acompanham permanentemente o ginasta durante a execução, colocando os pontos técnicos corretos da habilidade e fazendo correções e alterações. E ajudas de proteção, que são utilizadas quando o aluno tem medo ou dificuldade em algum ponto da trajetória de execução, ai você tem que colocar a mão no momento justo e oportuno sem atrapalhar a execução, ao contrário, auxiliando a execução do ginasta, isso é um malabarismo, isso se adquire com muita prática mesmo. Isso nos leva de volta ao lugar pedagógico de atuação, qual é o lugar? Escolinha de Ginástica para que os alunos aprendam essas habilidades e não fiquem apenas com a experiência da aula na escola. Isto significa que durante a preparação profissional o futuro professor deve dominar um conjunto de estratégias metodológicas que vão além do espaço escolar, da aula de vivência na Educação Física escolar, esse domínio deve permitir ao professor dar continuidade de sua ação pedagógica no âmbito extra-escolar. Para o alto rendimento no Ensino Superior é impossível preparar a um profissional na graduação.

P – Vocês conseguiam aqui fazer essa vivencia com crianças?

D.3 – Claro! Nós criamos um espaço de extensão aberto para todas as crianças da comunidade de Bairro A, e temos muita atividade de extensão além da escolinha de Ginástica. O objetivo da escolinha é para que as crianças se aproximem da Ginástica, para que elas adquiram as experiências que não conseguiriam adquirir nas aulas de Educação Física na escola, dado que uma aula tem duas ou três horas semanais, com quinze encontros no semestre em média. E nossos alunos façam nesse espaço uma pratica da especialidade, como parte de sua formação profissional. Ali os alunos se defrontam com o dilema entre a formação e a atuação profissional. Que elementos o professor deve saber e que coisas ele deve fazer na escola. Na escola, no meu ponto de vista, o professor que passou por uma experiência dessas, que se habilitou no domínio da ajuda, ele estará preparado para oferecer essa vivência, dando aos alunos a informação necessária para que estes compreendam o mundo da Ginástica, de como a Ginástica está vinculada com outros conhecimentos e, também de ter a capacidade de no espaço de prática extra-escolar de criar pequenos grupos de exibição e de participação em pequenas competições, dado que as competições escolares são de solo, salto e barra, mas as escolas não têm mais aparelhos. A partir desse ponto se pode ampliar as expectativas e encontrar alunos talentos para ser orientados a procurar centros de rendimento onde existam os três “T”: técnicas ou tecnologia, talentos e, técnico com conhecimentos. Agora a função do professor é educar, e educar significa uma educação além do corpo, no sentido de domínio corporal, educar o aluno para adquirir uma linguagem corporal necessária, para ser fluente no domínio dessa linguagem. Por isso que a educação do aluno na escola deve ser diversificada, se eu afunilo as experiências e utilizo apenas as habilidades de uma modalidade, como é o caso do Ballet Clássico, por exemplo, a criança passa a desenvolver sua comunicação corporal somente através dos elementos técnicos. Seu corpo perde a flexibilidade adaptativa, o que não deveria acontecer com um aluno que esta abrindo suas expectativas frente ao mundo altamente complexo e rico em possibilidades. Então, eu

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devo ter claro que na aula eu faço vivências e, tento encantar os alunos com essas vivências que lhes permitam aplicá-las em diferentes situações, por exemplo, brincadeiras que induzam os alunos a continuar praticando no recreio, na rua, na casa em qualquer lugar. Ele tem que se entusiasmar pela prática e, a função do professor é oferecer informações e criar esse entusiasmo. Aquele que se entusiasmar e adquirir técnica tem que ter um espaço diferente, um espaço extra-escolar de prática, porque ele escolheu isso que gostou! Essa filosofia educativa serve para a Capoeira, ou mesmo para o Futebol, ou Basquete e em todas as demais manifestações culturais, já que tudo é exatamente igual! Incluso até nas disciplinas mais teóricas, se a professora de música faz cantar os meninos, e dentre eles há algum que gostam de cantar, ela deve criar um espaço de canto, mas interessante ainda, se a professora não tem tempo e tem algum aluno que tem certos domínios, ele pode ser responsável por isso. Você fez isso, com Leonardo! Quantas vezes você foi monitora dele?

P – Várias vezes!

D.3 – E você não era professora de Educação Física!

P – Não.

D.3 - Eu tive uma escolinha de Ginástica Artística que foi a base da Seleção Nacional do País B e entre eles, se ajudavam perfeitamente bem, e ajudavam as outras ginastas, porque é um conhecimento técnico especifico que elas podem transmitir. Agora, o professor deve estar por atrás para assegurar que exista todo o âmbito pedagógico. Mas, transferir técnica é fácil, o que é difícil é procurar informações e desvendar os códigos simbólicos que estão ocultos em cada uma das manifestações culturais, isso é papel de professor educador. Na minha visão para o âmbito escolar, o aluno de ensino médio, deve ser transformado num agente sócio-cultural, responsabilizando-se pelas atividades extra-escolares de sua escola e da comunidade onde ele vive ou na comunidade da escola que freqüenta. Esse aluno, perfeitamente bem, pode ter um grupo de Capoeira, ou ser monitor de Capoeira, ou de Teatro, ou de Canto, ou de Violão, ou de Ginástica, Ginástica Rítmica, Ginástica Artística, Ginástica Geral, esse é o mundo que eu vejo para poder formar cidadão na escola. Aquele que conquistou tantas experiências praticando determinadas manifestações culturais deve ser capacitado para transmitir essa experiência, tanto em conhecimentos quanto em habilidades técnicas, mas sempre com responsabilidade social. No caso do talento é diferente, este deve ser encaminhado a centros de rendimento. Essa é a função do professor! No âmbito universitário o futuro professor deve saber diferenciar muito bem os espaços de intervenção profissional, seja para utilizar as manifestações da Ginástica, da Dança ou de qualquer outra manifestação da cultura corporal. Você na faculdade tem Dança, mas tem um montão de alunos que não querem fazer Dança, porque o tipo de Dança que é feita ali esta orientada para ensinar aos alunos a dançar. Ali muitos alunos pagam um mico horrível, e ninguém quer pagar mico frente a sua turma. Fica pior ainda quando se ensinam as técnicas de Dalcraux para aprender a dançar. Na disciplina de Dança que estou dando agora, ensino os alunos a ser professor/pesquisador, isto é, ensino os alunos a pesquisar! Pesquisar todos os códigos simbólicos ocultos que organizam e estruturam as diferentes manifestações da cultura corporal, especialmente dentro das manifestações da Dança. E ensinar a seus alunosa uma Dança, onde eles devem trazer informações sobre esses códigos simbólicos e os alunos contribuírem com as experiências que eles têm dessa Dança; nessa união de informações e experiências é onde se produz o conhecimento. A partir dali esse aluno tem que montar uma aula de vivência para que os alunos experimentem, tomando as referencias que têm da coleta de dados do aluno/pesquisador, referências de vídeos e de outras coisas. Devem criar

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uma metodologia que se adeque às características da Dança e às característicos dos alunos, dentro do contexto da classe. Uma vez feita a interpretação da Dança, os alunos são orientados a fazer uma recreação da Dança vista na aula. Essa metodologia esta sendo um sucesso! Estão vindo alunos da Universidade A, da Faculdade C da Universidade D, para fazer minha disciplina de Dança, sobretudo porque ali se estão formando pesquisadores, para que eles no âmbito escolar façam isso, já que eles não têm que ensinar técnica! Então no âmbito escolar esse professor vai procurar a informação necessária de cada uma das manifestações de Dança, vai ver que tipo de experiências os alunos têm em relação a ela e, em conjunto vão formar um conhecimento de Dança. Na recreação da Dança, os alunos vão interpretar do jeito que eles querem essa Dança, porque ali o conhecimento vai fazer parte dele e, é a mesma situação pedagógica que pode ser utilizada na Ginástica Artística. O aluno pode perfeitamente bem, utilizar como ele bem entender, o domínio conceitual dessa manifestação da cultura corporal, incorporando outros elementos que ele domina. Levando para um exemplo na Ginástica Artística, o aluno que aprende a fazer um mortal na rua (...) você não vê os meninos aí fazendo Le Parkour? No Le Parkour existem dois movimentos, o Le Parkour e o Free-Runnig, para mim como professor ensinaria o Le Parkour tradicional, que é bem mais seguro que o Free-Runnig. No Free-Runnig o praticante desta modalidade vai querer fazer exibicionismo na rua. O Le Parkour é bem mais simples, se trata de passar obstáculos em diferentes alturas, algo tremendamente importante quando existe uma situação de conflito ou de perigo. Com isso os alunos têm recursos para poder saltar, passar, por exemplo, de um edifício em chamas a outro edifício. Aprende, a sair em uma situação de conflito ou perigo, ou seja, esse é um tipo de Ginástica muito mais utilitária e muito mais interessante que uma Ginástica Artística no âmbito escolar, mas eu posso aproximar ambas, posso criar elementos similares a ambas modalidades. Então é outro mundo! Como professor eu tenho muito claro o que estou ensinando, não estou desviando o objetivo pedagógico da aula, mas, estou projetando esse conhecimento para outros âmbitos de aplicação, estou enxergando através do futuro, o que os alunos poderiam fazer com a experiência que estão recebendo, com as informações acadêmicas que estão lhes entregando para que no futuro possam aplicá-las em suas próprias vidas.

P – E você acredita que a sua metodologia de aula tem algum diferencial? Você já foi aluno, já observou colegas trabalhando com Ginástica Artística, o seu método de aula especificamente, tem algum diferencial?

D.3 – Eu não tenho metodologia, eu crio metodologias para cada uma das situações e contextos, aplico minhas experiências de trinta e sete anos de professor universitário; utilizo minha experiência de ginasta, pois, passei por todos os treinos; aprendi sozinho muitas das habilidades da Ginástica, porque meu professor não tinha domínio de técnica e, uma das formas de aprender era praticando sozinho e com péssima infra-estrutura porque não se tinha colchonetes, era tudo no chão. O medo maior eram as saídas da barra ou das paralelas, não era a execução do exercício, era a saída, tínhamos que cair no chão; você entende? São momentos diferentes e eram também formas, mentalidades de educar no âmbito escolar também muito diferentes. Agora, a idéia de vincular as experiências dos alunos no processo de ensino-aprendizagem aponta para uma nova perspectiva educativa. É importante porque o aluno se sente respeitado, o conhecimento que ele trás é considerado. Este conhecimento passou a ser válido dentro do âmbito escolar, não é uma coisa alheia. Em uma situação tradicional é o professor quem sabe e é o único que determina como devem ser feitas as coisas e acabou, ele não permite a interferência. Em nossa óptica todas as diferenças são bem vista, todos os tipos de soluções são interessantes, agora se futuramente esse aluno vá querer abraçar, alguma modalidade esportiva, iniciando primeiro pela prática e depois pelo

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treinamento e, no caso que o aluno seja um talento poderá ir diretamente para o treinamento, porém, através da orientação de um professor que descobriu esse talento e o derivou para um centro de alto atendimento, perfeito! A Ginástica é extremamente complicada. Quando eu voltei do País C depois de ter feito especialização em Ginástica Artística lá, eu fui praticamente obrigado a criar um centro de rendimento no País B. Como criar esse um centro de alto rendimento sem ter os três “T”, técnica, talento e bom técnico? Bom, uma das “T” eu tinha, eu estava com o conhecimento técnico adequado, com a outra “T” de tecnologia de excelente qualidade eu consegui uma doação de equipamentos do País C, equipamos o ginásio completo com barras que saiam do chão, em diferentes alturas, com colchões, cama elástica e outras coisas; faltava a outra “T” de talento, e ai o que eu fiz? Apliquei um teste de procura de talentos usando uma ferramenta de pesquisa minha, com a intenção de criar um centro de rendimento. Para criar uma escolinha de rendimento em Ginástica Artística o técnico deve ter muito claro como confeccionar um teste para talentos da Ginástica Artística; são os componentes, as capacidades biológicas fundamentais para um ginasta? Força natural! Interessante sobre isso, para fazer um teste de força natural, testamos 5.725 crianças na faixa etária de 9 a 11 anos, todos alunos das escolas da Cidade H, ao sul do País B. Sabe quantos passaram no teste? Duas crianças! Talentos puros! Em que consistia o teste? Uma flexão-extensão de braço pendurado, bem feita, por ano/idade, é um teste muito rápido. Você testa ao aluno numa barra transportável feita com um cabo de vassoura, ele se pendura na barra com o corpo totalmente esticado e deve realizar uma flexo-extensão de braços por cada um dos anos de idade que ele tem. Quantas fez? Quantos anos tem? Dez? Tem que fazer dez flexo-extensões bem feitas! Com três meses de treinamento, esses talentos foram campeões nacionais nos seis aparelhos. Nunca tinham feito Ginástica antes. Porém, com o domínio corporal adquirido através de repetição e execução das próprias habilidades da Ginástica Artística e, criando situações homólogas para a aquisição de habilidades mais complexas aprenderam a dominar os exercícios básicos da Ginástica Artística, é talento puro! É o caso, por exemplo, da menina Jade Barbosa, a principal ginasta brasileira que está neste momento na China. Numa reportagem que fizeram dela a mostraram num vídeo quando ela estava com três aninhos, de chupeta na boca, subindo uma trave de futebol de salão e, a mamãe correndo para pega-la. Ela subindo com três aninhos! Procura no Brasil uma menina que faça isso (...) não tem! Isso é talento puro! Para uma pessoa que tenha força tudo é mais fácil, já que sobe em todos os aparelhos e, esse subir fácil é a gratificação que ela tem, é a parte emocional, a parte afetiva, é esse o encantamento que esta em jogo. Assim, os futuros professores devem ter muito claro isso, na hora da preparação profissional. Devem saber que vai se encontrar alunos que podem fazer coisas muitos difíceis, e para outros a mesma tarefa pode ser muito complicada. Por isso, o professor tem que dar tarefas diferenciadas para que cada aluno trabalhe seu cem porcento. Para isso o professor deve estar muito antenado, para saber que coisa fazer, como complicar, como dar um grau de dificuldade a uma pessoa que esta executando uma tarefa de uma forma muito fácil, ou para facilitar a outra que está com problemas. Deve saber criar duas metodologias para o mesmo exercício, para uma, por exemplo, pode utilizar planos inclinados, escadas feitas com plintons, ou aproveitar as escadas que a escola tenha e aproveitar esses materiais para cumprir com a função que ele tem que fazer. Deve saber que professor de Educação Física, no âmbito escolar, não é um técnico e não dá para avaliar os alunos no desempenho e execução das atividades gímnicas. É diferente!

P – E como você vê a Ginástica Artística, o espaço da Ginástica Artística, hoje, dentro da Universidade e fora dela?

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D.3 – Olha a Ginástica Artística, por ter aparelhos que te permitem executar uma série de ações, que podem estar vinculados a outras manifestações culturais, não somente à Ginástica Artística, é uma possibilidade. Para mim a Ginástica Artística deveria continuar sendo ofertada, porém, de forma diferente. Por exemplo, existe no mercado uma patente sobre argolas em movimentos que se abaixam e sobem em diferentes alturas, desde trinta centímetros até a altura normal. Pode ser utilizada como argola fixa, ou como argola em movimento e, você pode tirar as argolas e colocar trapézio fixo ou volante, pode colocar lira ou arco de aço. É um aparelho que se multiplicou em quatro, cinco ou mais aparelhos, então ai está a diversidade e a riqueza. Se a faculdade não tem paralelas, pode-se utilizar ou confeccionar uma com as traves de futebol. As traves de futebol te permitem, dependendo da posição fazer barras paralelas de um metro de altura, se colocadas de outra forma, da para fazer barras paralelas de um metro e sessenta, e se colocar de outra forma de barras paralelas de um metro e oitenta ou um metro e noventa. Claro que devem ter pessoas que segurem as traves. Pessoalmente, prefiro a barra cilíndrica, já que é de fácil construção. Uma barra cilíndrica é um tubo, que pode ser feita de um tubo de ferro que tenha um pouco de flexibilidade. Esse aparelho tem mais utilidade que paralela. Agora, se tem uma paralela dá para fazer duas barras; desta forma aproveita muito melhor um equipamento caro. Existem projetos para abaratar a construção de aparelhos da Ginástica Artística, agora o que não dá é utilizar a barra cilíndrica ou as argola para fazer flexão-extensão de braço, como é muito comum nas faculdades de Educação Física, já que os únicos que conseguem utilizar os aparelhos de forma adequada são aqueles alunos que já tinham experiência como ginasta, adquirida, não na escola, mas no clube. Os alunos ginastas que chegam na faculdade de Educação Física não aprenderam na escola, aprenderam em clube. Então qual é o papel da escola?

P – Vivência!

D.3 – Exato! Então essa é a lógica; a lógica para poder cumprir com a função de professor.

P – E a importância da Ginástica Artística nessa formação para professor?

D.3 – Olha é interessante, porém vai depender muito do que o professor queira fazer com sua profissão e, aí, tem outro problema tremendamente interessante, a grande maioria dos alunos que entram, ingressam na faculdade de Educação Física, é porque têm interesses esportivos, porque praticaram alguma atividade e a faculdade muitas vezes cumpre com essa função de reforçar essa parte esportiva, porém é um erro, porque no âmbito escolar o esporte de rendimento não tem vez, porque os alunos que estão ali são muito diferentes. Então (...) nessa característica o que eu preferiria, e temos um projeto de mestrado aqui focalizando isso, é habilitar os futuros professores que estejam interessados em uma modalidade oferecendo capacitação (...) te explico! Estamos desenvolvendo uma dissertação de mestrado, um projeto de capacitação e, estamos fazendo com que os alunos de Educação Física, escolham, após ter feito uma disciplina, ser monitor dessa disciplina. Fizemos um projeto piloto com a Disciplina A e um projeto com a Disciplina B. O aluno que fez Disciplina B-1 podem se inscrever em Disciplina B-2, como monitor de Disciplina B-1, onde essa monitoria é considerada ‘Prática de Ensino’, ou ‘Prática da Especialidade’, que permite reduzir a quantidade de horas de Estágio Supervisionado que, no âmbito escolar tem uma quantidade enorme de horas, que ninguém faz. Então para evitar essa ‘ilusão’ preferimos dividir as horas do Estágio Supervisionado em ‘Prática da Modalidade’ e Estágio Supervisionado. O aluno de ‘Prática da Especialidade’ vai fazer no interior da faculdade, junto com o professor essa monitoria, ajudando o professor com as turmas iniciantes. Ali se produz a co-

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responsabilidade na formação profissional, que se multiplica se for aplicada desta forma em todas as disciplinas. Com isso os alunos já vão sair com uma experiência maior, porque vão receber do professor outras dicas que não recebem quando são alunos da disciplina. Com essa experiência dentro da faculdade, acreditamos que os alunos estariam muito mais preparados para realizar atividades de ‘prática’ no espaço extra-escolar, porque estariam habilitados para isso. Como as faculdades têm varias disciplinas onde essa metodologia de preparação profissional poda ser aplicada, se abre a possibilidade de escolha para o aluno. O aluno pode escolher em que disciplina ele pode fazer a ‘Prática de Especialidade’, permitindo que o aluno tenha a possibilidade de ter um currículo flexível, escolher em que tipo de esporte ou de atividades ele quer fazer sua prática; não sendo necessário que ele faça em todas as disciplinas, construindo seu próprio currículo profissional. Uma faculdade não te dá tudo, te dá muito pouco, por isso se chama formação inicial. A formação brasileira é muito ruim, os alunos de graduação possuem um currículo de no máximo duas mil e oitocentas horas outras três mil e duzentas que são as Universidades estatais ou federais. Já na América Latina como é o caso do País D, ou País B, ou País E, o currículo de formação profissional deles é de mais de quatro mil e oitocentas horas na graduação; por muito ruim que sejam, são quatro mil e oitocentas, quase o dobro que o aluno brasileiro passa na faculdade. Então há uma diferença muito grande, agora qual é a parte boa? É a pós-graduação no Brasil; essa é muito boa!

P – Você acredita que os alunos que formou nas disciplinas de Ginástica Artística utilizaram em suas aulas o que aprenderam (...)

D.3 – Não! Eu, o que posso dizer e acredito é que, meus alunos têm a competência para poder realizar vivência e prática no âmbito escolar, agora vai depender muito da escola, do tipo de material e dos interesses pessoal do professor. São varias variáveis que estão aí. Têm alunos que passaram por Dança, fizeram muito bem, mas não dão Dança porque não gostam! Agora, isso é problema da escola, é problema da concepção da preparação profissional. Nas faculdades se estão formando professores especialistas, professores técnicos, em vez de professores generalistas, professores educadores. Esse é outro grande problema dentro do âmbito da formação do profissional, eu não posso formar especialistas para que desenvolvam as funções de um generalista, é tremendamente complexo. Se eu tenho uma disciplina com trinta, trinta e cinco, quarenta e cinco, sessenta horas, será que estou habilitado para desenvolver-me como técnico? Será que eu quero fazer isso? Por exemplo, na minha formação tive que fazer Futebol compulsoriamente, porque não gosto de Futebol nem de Basquete. Não gosto por uma simples razão, não pelo domínio da bola, mas pela agressão que você recebe e, como são atividades de confronto, você sempre esta recebendo agressões, socos ou puxões, que eu não permito, porque eu não jogo assim. Essas experiências me motivaram para não ofertar esse tipo de atividade quando trabalhei na escola e preferi fazer outras atividades mais relacionadas com a Ginástica. Utilizai a Ginástica Rítmica Formativa, que te permite ensinar a utilizar ritmos, pulsos musicais, durante a execução das habilidades esportivas ou recreativas, a construção de elementos coreográficos, muito mais direcionados para a parte artística, e não tanto para a parte técnica, obviamente dentro do âmbito escolar, onde tudo é diferente e essa foi minha opção! Agora, se fosse técnico, estaria ensinando modalidades esportivas como Voleibol, ou Futebol, ou Basquetebol. E esse é um erro na atuação profissional na escola, estimulado por algumas escolas que contratam professor de Educação Física ‘especialista em’ (...), grave problema! E, dentro das escolas têm professores que já estão divididos atuando apenas em Basquete, em Vôlei, em Futebol, em Dança. Se na formação profissional temos múltiplas escolhas, porque alguns colegas se limitam a dar aulas apenas de uma modalidade? Uma das razões que acredito é, a falta de orientação

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da formação profissional, que lhes indique o que eles têm que fazer, uma regulamentação que te diga ‘professor sua obrigação é esta’. Para isso é necessário ter claro qual é a compreensão do professor de Educação Física que trabalha no âmbito escolar. Para mim, um professor de Educação Física que trabalha no âmbito escolar deve ser um professor pesquisador, conhecedor das realidades dos espaços sociais de onde vêm os alunos, conhecer qual é a realidade de seus alunos, da escola, e da comunidade onde a escola esta inserida, para trabalhar com a cultura deles, trabalhar com seus códigos e superar, o conhecimento de senso comum que os alunos têm de todas as coisas. Isso é educar. Educar não é apenas a parte corporal, não é ensinar técnicas, é na vivência ensinar os conceitos que estão por trás de cada uma das diferentes manifestações culturais, porque não dá mais para ensinar a dominar qualquer habilidade, que requer muito tempo, repetições todos os dias. Então se você pelo menos deixa o aluno entusiasmado e querendo fazer, ele vai procurar opções, que seja sozinho na rua, ou pequenos grupos, ou se na escola se oferte esse espaço, melhor ainda.

P – E como você acha que a Ginástica Artística poderia se inserir melhor então no currículo para formar professores, já que ela é uma prática eminente técnica, então é (...)

D.3 – Deveria ser uma área com várias disciplinas; aqui na estruturação curricular utilizou-se esse critério, uma área que englobe três disciplinas que tratam de Ginástica; uma disciplina de Ginástica Formativa, onde você vai ter todos os elementos de condicionamentos físicos, step, hidroginástica, trabalho com alteres, etc; uma disciplina com as Ginásticas Competitivas: Ginástica Rítmica, Artística, Trampolim, etc; e uma disciplina com a Ginástica de demonstração que é Ginástica Geral, onde você dialoga com toda essas outras experiências, para criar composições coreográficas que te permitam demonstrar tudo o que o aluno sabe e o que conquistou na sua formação profissional, utilizando temas dentro de um contexto, ou uma mensagem que você tem que transmitir. É outra concepção de Ginástica, mas todas são Ginásticas! Após essas três disciplinas de Ginástica, eu colocaria as disciplinas eletivas onde o aluno possa adquirir conhecimentos mais aprofundados, sobretudo nas Ginásticas Competitivas. Por exemplo, vou usar a Disciplina B para explicar. Disciplina B pode ter Disciplina B II e III. Disciplina B I é o básico, Disciplina B II para formar monitores e Disciplina B III é preparar pessoas para auto rendimento. Pode ser disciplinas eletivas, porque o aluno pode escolher, pode ir selecionando as disciplinas que quer cursar, pelo menos na Universidade D o aluno tem essa possibilidade para que construa um currículo mais adequado à sua expectativa, à sua necessidade, à sua característica.

P – E tem público que opta?

D.3 – Na Disciplina B damos todos os semestres Disciplina B I e II, já faz dois anos; ainda não chegamos a Disciplina B III que deixamos para o próximo ano. No próximo ano vamos dar Disciplina B III para todos os que fizeram Disciplina B I e II. A III é para os que queiram especializar-se em rendimento, mas, é eletiva. Com isso criamos uma base forte de Disciplina B, muitos alunos passaram por isso, todas as eletivas desde Disciplina B um a três e, teremos monitores que perfeitamente teriam a competência de abrir um curso de extensão sendo eles os monitores.

P – Vocês têm uma cultura de Ginástica muito forte aqui?

D.3 – Temos sim!

P – Ai os alunos, mesmo os que nunca vivenciaram acabam fazendo (...)

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D.3 – Lógico, eles fazem com maior facilidade, eles vão com uma mentalidade, uma predisposição diferente, porque sabem que não vão ser submetidos a um tipo de treinamento que lhes vai exigir performances que não teriam condições de realizar. Tira essa pressão deles e procura mais a compreensão de como ele pode construir e desenvolver algum programa no âmbito escolar. Agora, para isso, o aluno deve se sentir seguro, com uma sensação afetiva de tranqüilidade e de aceitação de sua condição, permeado por valores de convívio social. Pessoalmente é pesquisado em varias Universidades, especialmente as particulares, sobretudo, aquelas que construíram o currículo para satisfazer os modismos da sociedade, por exemplo, step, dança de salão, e uma série de coisas que vão incorporando ao currículo esses modismos para preparar esse profissional para atender a essa necessidade da sociedade, mas não a preparação para atuar na escola e, deturpam a formação profissional. Com horas aulas hiper escassas de três mil e duzentas horas ou de duas mil e oitocentas horas, preparam técnicos para academias e, perderam a noção do como se preparar um professor educador. Vejo uma diferença muito grande entre o professor educador e o professor técnico; professor técnico é o que desvenda os códigos técnicos e táticos de uma modalidade e, professor educador também desvenda os códigos técnicos e táticos, porém também os outros códigos simbólicos que estão por trás dessas manifestações culturais (...) é diferente! Por exemplo, prefiro colocar um elemento de Dança, que é muito mais complexo pela quantidade de código que se tem, (o docente apresenta um de seus livros). Neste livro explicamos os códigos que estão por trás da Dança, tomamos como exemplo a ‘dança da garrafa’. Você ensinaria a ‘dança da garrafa’ na escola? Por que sim? Por que não? Quando? Em que faixa etária? Em que nível? Qual o grau de execução? O que significa a garrafa? O que significa o movimento circulatório que estão fazendo? O que significa a roupa? Os significados disso são códigos que estão atrelados a essa manifestação, se você analisa a Ginástica Artística pela ótica do professor técnico vai enxergar código estético, e nenhum outro. Agora se você observa os outros códigos que estão na Ginástica Artística é outro mundo interessantíssimo; tem o código do biótipo, o código estético, o código de valor e, uma quantidade enorme de outros códigos. Dependendo de que tipo de códigos que o professor desvende, será a postura profissional que ele assume. Para isso esse professor tem que ter claro qual é a função social que ele quer satisfazer com sua postura profissional, como ele vê a função social que ele tem pela frente, é formar atleta? Existe uma grande quantidade de atletas que são bandidos, de preferência os que estão ganhando. Esses estão ganhando a base de esteróides, anabolizantes e uma série de outras coisas; ali está claríssimo. Você se lembra da nadadora que foi suspensa por utilizar drogas? O técnico não discute esses códigos, inclusive às vezes favorece a aquisição de suplementos. Muitos chegam a oferecer esteróides nas academias para os que estão na procura da condição física ou da estética do corpo. São pontos de vista de valor e, se é de valor é ético e, se é ético é profissional. É complicadíssimo, porque tem uma série de elementos que estão em torno de cada um de seus objetos de estudo que neste caso seria a Ginástica Artística. Por isso o professor educador deve ter uma compreensão muito mais global daquilo que ele precisa saber para poder atender as demandas, não só da sociedade, do estado; ou do Brasil. O Brasil tem um código onde está escrito quais são as funções da escola, e esta função é a de formar cidadão. A pergunta agora seria, porque não estão formando cidadão? Nas faculdades o que menos se discute é a ética, e a ética neste sentido é desvendar os códigos e entender os porquês e, não apenas fazer atividades quando o contexto sócio-cultural o permite. Saber diferenciar; saber que cada contexto social tem códigos específicos. Então, como lidar com essa situação? Como ser civilizado nesta situação? E ai tem outro elemento, qual a concepção de civilização que se tem? Sempre você deve ter claro que os conhecimentos e as técnicas não são neutras e que os profissionais não são neutros. Todos nós temos ideais, temos religião, temos filosofias

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que orientam nossa vida, que são os códigos de orientação e de estruturação que a gente tem, e são diferentes de um individuo para outro. No entanto existem alguns códigos que devem estar presentes numa determinada instituição, porém dentro dessa instituição outros códigos não devem estar presentes, por exemplo, eu não sou o mesmo na minha casa que quando estou aqui na faculdade. Na minha casa sou muito mais solto, ando talvez com outra roupa, eu falo diferente (risos). Então são códigos diferentes, você, por exemplo, quando chegou aqui bateu na porta, não chegou e entrou, você respeitou uma série de códigos que estão para a boa convivência de uma sociedade, uma sociedade harmônica, para poder ter inter-relacionarmos, para poder conversar, para poder dialogar. A função do professor é permitir que o aluno dialogue, não somente, com a fala, mas com o corpo inteiro; dialogue com a gestualidade, com a compreensão dos códigos que estão presentes em determinados contextos, saber como situar-se, como colocar-se, essa é a vida em sociedade, isso é formar cidadão, ter presente qual é o aluno que queremos formar.

P – E como que se encontra a Ginástica Artística aqui no currículo da faculdade?

D.3 – A gente tem uma área com três disciplinas, Disciplina C que esta dentro do currículo obrigatório, tem a Disciplina D onde se abordam as modalidades esportivas, ambas do currículo obrigatório e tem uma eletiva, a Disciplina E , que todos os que querem podem fazer, e se não querem podem fazer outra eletiva (...)

P – Especificamente de Ginástica Artística como (...)

D.3 – Como disciplina? Tem Ginástica Artística com quatro horas crédito, portanto tem sessenta créditos, isto é sessenta horas/aula em quinze encontros de quatro horas cada um, e tem outra onde se vêm às modalidades esportivas competitivas da Ginástica, como as Ginásticas competitivas são quatro: Artística, Acrobática, Rítmica e Trampolim, somente nessa disciplina, você já pode perceber que cada uma dessas modalidades não pode ser tratada com a profundidade técnica necessária. Essa profundidade técnica necessária para aquele que queira utilizar isso em sua vida profissional pode adquirir nas disciplinas eletivas de Ginástica Artística, Ginástica Artística dois ou três. Ou seja, Ginásticas Competitivas, você vai abrindo a medida da existência de alunos interessados, assim você tem um leque enorme de possibilidades. Pode criar uma disciplina eletiva de ‘Hope Skiping’, que é de pular corda, que está na moda; você cria uma disciplina de pular corda, se interessar o aluno faz, ou se não se tem um mínimo, mínimo doze ou quinze alunos para abrir uma disciplina não se oferece, ou pode oferecer uma outra que seja de interesse dos alunos.

P – E você auxilia ou auxiliava na montagem do programa da disciplina?

D.3 – Eu participei da construção do currículo, do segundo e terceiro currículos da Faculdade D de forma permanente todo tempo.

P – Com total liberdade pra escolher...

D.3 – Bom, você vai dando sugestões, as mais importantes, por exemplo, foi uma de minha sugestões, antigamente para o atendimento do âmbito escolar havia uma Disciplina F I, que dava subsídio ao professor para atuar na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental e, havia a Disciplina F II, que dava esses subsídios para atender as turmas 5ª a 8ª série e Ensino Médio; agora isso mudou, existe agora uma Disciplina F especifica de Educação Infantil, outra de Ensino Fundamental e, outra de Ensino Médio, com todas as característica que cada modulo

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tem; são disciplinas do currículo obrigatório da licenciatura. Ali você encontra uma linha. Essas foram algumas das contribuições. Na Ginástica também propus separar as Ginásticas de condicionamento físico e concentrá-las em uma disciplina chamada de Disciplina C, agrupando ali as modalidades orientadas para a saúde e a estética corporal, onde estão todas as Ginásticas de academia, nesta disciplina se analisam os aspectos da biomecânica, medição e outras coisas e, as formas de substituir os equipamentos, para facilitar ao futuro professor o trabalho em ambientes com pouca infra-estrutura. Desta forma criamos a autonomia no professor e esta autonomia ele deve passá-la para seus alunos escolares. Assim, esses alunos podem criar em grupos, em sua casa, em outros cantos, ou na própria escola em um espaço extra-escolar de prática, com a supervisão de um aluno que domine esse conhecimento e que goste desse tipo de atividade. Obviamente supervisionado pelo professor.

P – E a avaliação na disciplina Ginástica Artística, como que você realizava suas provas (...)

D.3 – A avaliação nossa é pela freqüência ou participação e, depois pela demonstração de um trabalho coletivo que demonstre o domínio conceitual e técnico que os alunos atingiram nos festivais da Faculdade D. Temos dois festivais anuais, em Junho e em Novembro, um em cada semestre e, aí os alunos apresentam as coreografias ou interpretações dos conhecimentos que eles adquiram nas aulas.

P – E aqui dentro da Universidade você observa alguma relação, algum embate entre as disciplinas de cunho mais teórico e as de caráter mais prático como a Ginástica?

D.3 – Olha pelo menos na minha disciplina eu não vejo, a vejo mais como uma disciplina de sínteses! O que significa isso? Que se aproveitam os conhecimentos das áreas biológicas, da área neuro-comportamental e da área sócio-cultural, para que eles compreendam a complexidade das ações pedagógicas, isso se faz na Disciplina E e na Disciplina A, disciplina que estou ministrando agora e nas Disciplinas G que estavam sob minha responsabilidade. Se utilizam os conhecimentos adquiridos nas outras disciplinas e se aproveitam os conhecimentos das experiências individuais dos alunos. Na disciplina de Ginástica Artística oferecida nas faculdades da maneira tradicional os alunos são obrigados a adquirir determinadas técnicas de execução. Outra coisa é oferecer a disciplina objetivando sua aplicação. Ali há uma diferença grande, tem disciplina pra instrumentalizar a você como atleta, a outra que vê o aluno como professor. Sendo que a maioria das faculdades não faz isso, preparam o aluno como atleta e te manda para o mercado de trabalho. Também isso é clássico na Natação, como você foi avaliada?

P – Eu tive que dar uma aula de nado craw.

D.3 – Mas as avaliações não eram por tempo, por cronômetro, essas coisas?

P – Não, na minha (...) não, minha irmã foi assim, a da minha irmã foi!

D.3 – Bom eu te digo, na grande maioria que eu já vi, em Atletismo, a cobrança é pelo que o aluno salta, pelo que corre. Aos alunos da disciplina de Ginástica Artística pela técnica de execução, que está de acordo com os códigos de pontuação da Ginástica Artística competitiva, na Rítmica também não é diferente! Aí te prepararam como atleta e, te deixaram como atleta para virar professor, esse aluno vai transmitir aquilo que vivenciou na faculdade, vai transmitir exatamente o mesmo que viu na faculdade na escola. Isso está errado, porque as aulas de Educação Física na escola não têm tempo

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nem espaço para isso. Com um encontro semanal, com uma hora e vinte no máximo, não há tempo suficiente, nem para condicionamento físico, muito menos para aquisição de técnica e, isso qualquer pessoa de senso comum sabe, mas não o professor de Educação Física que insiste em cometer essa besteira.

P – E, uma curiosidade mais pessoal agora, eu, por exemplo, estou fazendo Mestrado e, como seria a minha formação? Como você acha que seria minha formação pra de repente ministrar Ginástica na graduação, porque que eu tenha conhecimento, são quase inexistentes os cursos de pós-graduação que tenham uma disciplina especifica de Ginástica (...)

D.3 – A gente já ministrou Disciplina de Ginástica na pós-graduação. São discussões muito mais acadêmicas, para poder compreender a atuação profissional nesse âmbito, nessa área especifica então, você desvenda os códigos do mundo e indica quais são os caminhos, nesse sentido se discute o que se está fazendo na prática, qual é o problema e o porque não está vingando a utilização da Ginástica Artística na escola, nos clubes, nos centros de rendimento e de alto rendimento. Porque não temos mais centros de rendimento espalhados pelo país? Porque que agora o Brasil esta levando a maior delegação de sua história aos Jogos Olímpicos e com excelente chance na Ginástica Artística e nenhum dos atletas da Ginástica Artística foram formados na escola. Os corredores são da roça, e nem se quer escola tiveram os, lutadores, boxeadores, canoagem, tampouco se formaram na escola, o mesmo com os voleibolistas; te garanto que nenhum deles aprendeu na escola, todos em clube ou no espaço extra-escolar, ou aqueles que eram talentos o professor permitiu que se formassem sozinhos. Uma das respostas é que na escola não tem tempo, nem espaço para isso. No âmbito escolar, se você se preocupa com um talento, deixa trinta e cinco ou quarenta alunos de lado. Ou se preocupa com um ou dois, ou se preocupa com toda a turma! Criar uma atividade tão rica que tenha a diversidade, enquanto a dificulta para que todo mundo se esforce em seu com porcento; para isso você tem que ter um professor muito flexível, muito antenado em tudo, conhecer muito bem seus alunos e saber utilizar o que o meio lhe proporciona. Na escola utilizar escadas, cadeiras, uma cerca como trave de equilíbrio, uma trave de futebol como paralela, como barra; por exemplo, aqui no ginásio tem um trampolim feito com tábua e pneus; cortaram os pneus em dois colocaram um dentro do outro para aumentar a flexibilidade e duas tábuas parafusadas e, está funcionando, ou seja, criou-se uma condição na faculdade e mostro ao meu aluno que quando ele vai a escola tem a obrigatoriedade de desenvolver sua função profissional o melhor possível dentro dessa condição e, dentro do melhor possível tem que levar seu próprio material, ou construir material, ou organizar a sociedade para conseguir a infra-estrutura necessária, é papel do professor. O técnico normalmente chega e, ‘ah não tem material então não dou aula’. Tem discurso de professores que se recusam a dar Basquetebol porque não tem uma bola oficial de Basquetebol, está entendendo? Esse não é professor! Professor é aquele que tem uma responsabilidade com seus alunos. Alunos que estão ali e que tem o direito de ter boas aulas, que o professor assuma sua responsabilidade. Não se podem esperar queimar duas ou três turmas até que chegue o material. O problema é do professor, ele é que se tem que virar! Essa é a diferença na preparação profissional de nossos alunos, pelo menos dentro do discurso que a gente tenta reforçar que ele tem que cumprir com essa função social. Agora a grande dicotomia que a gente tem é estar preparando o aluno para as piores condições, porém nossos alunos vão trabalhar nas melhores condições; a grande maioria deles está trabalhando na prefeitura e ao menos ali eles podem analisar os problemas educacionais e aproveitar sua experiência, pelo menos por ali fazem a diferença.

P – É isso!

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D.3 – Só? (risos). Bom, se tem outras dúvidas, como eu fui expandindo, mas o problema é de múltipla complexidade, não pode utilizar uma variante sozinha, a Ginástica é apenas um elemento da cultura corporal que está ali e, que tem uma historia, uma tradição na Educação Física, e a Educação Física justamente se estruturou com base na Ginástica. Mas não era Ginástica competitiva, era uma Ginástica formativa. No desenvolvimento da Ginástica formativa se foram criando e inventando os aparelhos, que derivaram em modalidade esportiva. Mas, o problema é definir qual é a função do professor no âmbito escolar, no âmbito da sociedade e no âmbito competitivo; vivência, prática, treinamento.

P – É, as Universidades publicas ainda tem esse diferencial curricular o problema são as particulares.

D.3 – As Universidades particulares, em sua grande maioria são “caça níquel”. Se eles percebem que estão perdendo matrícula, criam ou inventam outra coisa para fazer, sobretudo o que está na moda. Neste momento tem muitas Universidades que funcionam um ou dois dias através da internet, já nem se quer o aluno vai presenciar a aula. E esse aluno vai ser professor, um futuro professor, complicado né!? E, no currículo, um currículo que prepara o aluno como técnico e bem ruimzinho ainda. Tomemos como modelo uma Universidade particular, ela tem máximo vinte horas semanais de aula, certo? Quantas das vinte horas semanais são efetivamente feitas? Ausência de professores, e sempre um jeitinho brasileiro, muito brasileiro, começam quinze ou vinte minutos depois de iniciado o horário normal e terminam sempre na hora, ai são pontuais, para terminar a aula. Em outro país não tem essa (...) se é de oito a meio dia, é de oito a meio dia e não das nove ao meio dia, agora é característica cultural, eu já sei, sou flexível nisso e dou quinze minutos, mas quem estourou quinze minutos fica sem freqüência. Por isso sou considerado linha dura. Mas (...) mais mole que isso não tem, por quê? Porque não há uma seriedade profissional, tudo deve ser nas coxas, o mais fácil possível, se te dão a freqüência em uma disciplina e o aluno não vem mais. Já temos exemplo de professor que deu freqüência livre, o primeiro dia a sala estava cheia, o segundo dia estava com metade, no terceiro dia de aula tinha apenas dois ou três alunos. Então, tem que se entender também, compreender o outro lado, quem é o aluno que vai e freqüenta nossas aulas, quais são seus interesses, qual é a sua vocação ou interesse profissional? A maioria dos alunos somente quer divertimento. Quando se encontra um bom aluno, ou quando o aluno vê na sua frente uma fonte acreditável, uma fonte na qual ele pode acreditar, esse aluno vai muito longe, e aí o que se faz, o professor vai dando-lhe responsabilidades, vai orientando-o para que ele tenha continuidade em seus estudos. Muitos alunos meus, que fizeram disciplina comigo, já fizeram Mestrado comigo. Neste momento tenho quatro alunos no Mestrado, os quatro são alunos daqui; tenho uma aluna no doutorado, é o ultimo doutorado que defendeu eras aluna minha no mestrado. Isso quer dizer que quando se encontra um alunado bom, se investe forte nele. O problema que isso também elimina a possibilidade de que outras pessoas queiram vir a fazer o mestrado ou o doutorado contigo. Mas, você sabe muito bem que a pós-graduação é um casamento, tem um compromisso muito firme, não pode haver traição nem nada, tem que ser franco e correto. A todos meus alunos eu falo primeiro quais são as condições para ser meu orientando, se eles as aceitam então vão fazer a pós-graduação comigo, se não, não! Mas, eles têm que levar a sério. Nossa profissão não é acreditável, não é considerada uma profissão séria, agora para disfarçar essa falta de seriedade os professores se vão para áreas esportivas como medicina do esporte e, com isso se transfere ao status do doutorado medicinal e, você vê na faculdade de Educação Física mais aventais brancos que num hospital; estão confundindo a profissão! Mas, para ganhar prestígio, status (...). O status se ganha de outra forma, se ganha com competência profissional. Eu tenho doutorado em psicologia

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e eu não sou psicólogo, eu fui procurar na psicologia experimental informações que eu acredito que são boas para minha área, mas não por isso deixei de ser professor de Educação Física que é minha área de formação, minha formação inicial.

P – Mas é uma busca pessoal (...)

D.3 – Claro!

P – Que às vezes nós não somos estimulados né!?

D.3 – É que o aluno tem que aprender que a realidade é diferente. Ele tem que ver qual é o potencial que existe em nossa área, em nosso mundo e, sobretudo da existência de uma responsabilidade tremendamente grande que é a de formar cidadão; o papel da gente de formar cidadão é incrivelmente forte, mas, a gente não sabe. Trabalhamos com atividade, mas não vemos que dentro da atividade está acontecendo um sem número de elementos, de códigos simbólicos que estão aí aflorando, de interação, de amor, de solidariedade, cheio de desejos, de uma série de coisas que estão por trás, e que são a base do ser humano. Então, se vemos que a atividade está sendo rica, que está sendo interessante, que estão todos envolvidos, isso é muito mais rico que o próprio conteúdo, porque se está dando um tipo de experiência de viver em sociedade, de criar coisas em conjunto. A matéria pode ser um conteúdo, pode ser mil conteúdos diferentes, isso vai depender muito da habilidade do professor, de como ele vai desenvolver sua aula e, o que é que ele pretende, aquilo que quer com seus alunos, é diferente! Eu não quero técnico, não quero ginastas ou atletas, eu quero um ser humano pelo qual eu possa confiar, o qual eu possa acreditar, ‘poxa esse cara tem um potencial profissional rico, agora posso dormir tranqüilo’. Eu não quero ser mais assaltado (...) já fui assaltado quatro vezes em casa com gente armada, eu não quero viver isso mais, eu quero viver tranqüilo, saber que sou respeitado por toda comunidade e, isso é o que eu pretendo, pelo menos no final da minha carreira é isso, então é diferente, temos que formar cidadãos diferentes, é isso! (risos).

P – (risos) Obrigada professor!

D.3 – De nada!

Docente 4 – Agosto/2008 – 1h17min

P – Quais conhecimentos você julga imprescindíveis no ensino da Ginástica Artística na licenciatura?

D.4 – O primeiro ponto mais importante é que todo e qualquer conhecimento da modalidade ele tenha sido desenvolvido focado em uma questão pedagógica, que o pedagógico seja o fator mais importante a ser transmitido naquele conhecimento modalidade, então eu considero todos os movimentos básicos da modalidade devam ser ensinados, o básico do salto, o básico da trave, o básico da paralela, falando do feminino, que na verdade é assim, não há necessidade de você passar elementos específicos de um nível mais elevado. Mas eu acho que, o que eu quero que o meu professor saiba, eu quero que meu professor consiga desenvolver de Ginástica Artística, é que dê oportunidade às crianças que estão na escola de vivenciarem a Ginástica Artística, que tenham vivências de Ginástica, então eu acho que não é tão importante eu ensiná-lo a como ensinar um duplo mortal, por que ele não vai conseguir na escola desenvolver um nível onde a criança consiga executar um duplo mortal. Eu penso

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assim, eu tenho que ensinar o básico, em geral as disciplinas têm oitenta horas, às vezes quarenta horas, metade disso, dependendo do curso ou têm quarenta, ou têm oitenta, no máximo cento e vinte horas; em cento evinte horas eu não consigo ensinar todos os aparelhos do básico da iniciação até uma especialização né, num nível mais avançado, então o que que eu tenho que ensinar? Eu tenho que ensinar a importância da Ginástica, porque que a Ginástica é tão importante para a criança, esse ponto pra mim é imprescindível. Eu primeiro, quando eu dou essa disciplina, eu passo vídeo, eu dou muitos textos pra eles lerem né, de questões que falam do desenvolvimento da criança, do desenvolvimento motor da criança e, vou buscando até o momento em que eles mesmos conseguem associar a prática da Ginástica Artística como fator imprescindível do desenvolvimento do aluno, da criança, auxiliando no desenvolvimento motor da criança Pra mim a Ginástica é completa, ela ajuda a todas, a ampliar as necessidades de movimento da criança, eu não tenho ali o arremessar, eu não trabalho com o arremessar, o lançar, porque eu não tenho aparelho nas mãos, então toda vez que eu falo nisso eu sempre trago a GR [Ginástica Rítmica] junto, por que ela se complementa quando eu penso em todas as capacidades físicas básicas da criança, aprimorando as suas habilidades específicas. Então, eu acho que a Ginástica vai auxiliar; então se eu penso assim, eu tenho que dizer ao professor que tem que ter condições de oportunizar a criança na escola dessas práticas, de virar de ponta cabeça, de andar de ponta cabeça né, de vivenciar isso do corpo da criança, vi-ven-ci-ar isso! Então, eu preciso dar condições pra esse aluno entender que isso é importante, se ele entendeu que isso é importante ele tem que ter elementos que o ajudem ou, o auxiliem na evolução disso, no desenvolvimento disso na escola, como é que ele vai ter isso? Se eu propiciar pra ele uma vivência desse básico, em geral eu costumo trazer crianças para a aula da docência, eu fazia isso na Universidade D, faço isso nas particulares hoje né, trazer crianças para os alunos darem aula, é claro que tudo antes muito bem preparado, muito bem estudado né, eles é que desenvolvem essa aula, como é que seriam essas aulas, então quando eu criei o Projeto A na Universidade D eu tinha essa intenção, de que eles tivessem uma prática aplicada, é a prática aplicada do conhecimento adquirido em sala de aula e essa é a melhor forma de aprender.

P – A prática pedagógica?

D.4 – Exato só que é uma vivência né, e como que eu ia fazer isso na Universidade D? Era perfeito! O que a gente fazia era o seguinte; nós tínhamos reuniões semanais na hora do almoço com os alunos que participavam desse projeto, então nesses encontros nós dividíamos, uma parte era o encontro pedagógico, onde a gente discutia alguma questão pedagógica, por exemplo, como ensinar a criança a se pendurar melhor na barra ou nas argolas, quais os movimentos das argolas tal, então essa questão é uma questão técnica do trabalho com Ginástica, que no momento era desenvolvido, em outro momento eu discutia questões didáticas. Então ali era bárbaro ver os alunos falando assim pra mim ‘professora não sabia o que fazer hoje, me deu pane, porque o moleque cuspiu na minha cara’, ‘e o que você fez?’, ‘ah eu cuspi na cara dele’, ‘pára tudo, então vamos conversar sobre isso’. Era uma questão didática, uma questão pedagógica que estava ali influenciando no ato de ensinar, eu precisava parar, nós discutíamos aquilo, então os depoimentos que eu tenho dos ex-alunos da Universidade D dizendo que ali eles aprenderam a dar aula, que hoje eles dão aula graças àqueles momentos que eles passaram ali, àquelas vivências que eles tiveram ali, então só o livro não ensina, só a parte teórica não ensina, então pra mim ensinar o que precisa é essencial. Vai ser ensinado todo o básico da Ginástica fazer os alunos vivenciarem, aprender como é que segura; a segurança é uma coisa importante né; como segurar, fazer eles vivenciarem essas práticas desses elementos básicos da Ginástica e ao mesmo tempo, paralelamente, cuidando da forma de ensinar, do como ensinar, dos caminhos para

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ensinar. Eu, por exemplo, tenho uma aula que eu coloco uma caixa de plinton, duas, três, quatro, várias alternativas, colchão enrolado né, e eu vou ensinar um rolamento, eu vou ensinar de várias maneiras, um banco sueco, um plano inclinado, então eu ensino em várias maneiras o rolamento; eu começo ensinando um rolamento pra eles numa brincadeira, na carriola, brincando de carriolinha rolou, perceberam? Aí, eu vou sentar com os alunos e perguntar, ‘o que que facilitou?’, ‘foi fácil rolar assim?’, ‘foi, foi fácil’, ‘a ta, então, se foi fácil, por que foi fácil?, eu quero que vocês reflitam isso’. Essa é a diferença da gente ter um estudo né, de você docente ter se aperfeiçoado, estudado, porque um professor que não tem essa preocupação de estudar questões didáticas e pedagógicas, ele vai passar o modelo; eu aprendi na minha faculdade de Educação Física tudo por modelo, a seqüência pedagógica é essa ‘pum’, vinha pronto eu não precisava pensar em nada né. A Ginástica Artística eu aprendi por modelos, mas eu não queria ensinar assim, eu queria te ensinar uma proposta e a partir dela que você descobrisse como criar outras propostas de ensinar e, pra isso, então, eu fazia os alunos pensar e refletirem, até que eles chegassem e discutiam, ‘não, é por que o outro estava segurando’, ‘ah, então segurar é importante’, ‘ah legal que mais?’, ‘como é que estava o teu corpo’, ‘ah estava em uma posição favorecida’, ‘porque estava em uma posição favorecida o que que tinha mais?’, ‘ah, o quadril estava elevado’, quando alguém falava o quadril estava elevado, ‘ok, então o quadril estava elevado, ele tem que estar acima do ombro, perfeito! Então, acharam a chave mestra do rolamento, essa é a chave mestra, quais são as possibilidades que eu tenho de fazer isso com a criança para facilitar o rolamento então?, Vão buscar, eu quero agora modelos, exemplos de como, um educativo para ensinar esse movimento’. A partir dessa chave mestra, ou seja, eu dou elementos para os alunos pensarem exercícios que possam atender as necessidades básicas da criança aprender o rolamento.

P – A sua aula então, pelo que você esta me dizendo, tem uma parte pedagógica bem forte.

D.4 – Foi o que eu disse no começo, o ponto forte é o pedagógico, é o ato de ensinar.

P – E você diferenciava para os alunos o conhecimento técnico do conhecimento pedagógico?

D.4 – Eu chego com eles até isso, então, por exemplo, aprender o educativos, como ensinar a rolar, de brincadeiras né, em pé, com as pernas abertas, eu vou olhar lá atrás, você vem fazendo caretas, vem caminhando, conforme você vem caminhando eu sou obrigado a rolar, a cair para poder enxergar sua careta ou o número que você está me fazendo, alguma coisa assim. Então, por meio de brincadeira que os levava a vivenciar essas propostas, ‘aprender foi fácil?’, ‘perceberam quais foram os pontos biomecânicos importantes para facilitar o rolamento?’, ‘ok, daqui pra frente vocês já sabem criar exercícios educativos pra ensinar, muito bem!’; mas como é o rolamento propriamente dito? Aquele que eu fiz no meu primeiro livrinho lá atrás, em mil novecentos e bolinha? Você não era nem nascida, eu já estava usando o livro (risos); eu falava do rolamento propriamente dito né, o que é isso? É o rolamento corretamente perfeito, como é que ele é executado então? Eu mostro um rolamento com a vela, com a passagem pela vela né, esse é um rolamento perfeito, ‘ta bom, entenderam o que é um rolamento perfeito?’, ‘mas vocês não são obrigados a executar o rolamento perfeito, só a entendê-lo, compreende-lo e a buscar formas de ensinar esse rolamento tecnicamente correto’, é isso, esse é o ponto dois! Ponto três, as variações que eu tenho desse elemento, então se eu estou ensinando parada de mãos, quais são as variações de parada de mãos que eu tenho? Se é o rolamento, quais são as variações do rolamento? Como é que eu posso variar isso? Aí eles vão falando, ‘eu posso abrir as pernas’, é aí que eu finalizo, ‘ah, mas eu posso abrir’ isso para começar, então o início e o fim podem fazer variações

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do movimento né. Então eu saí da primeira fase e entrei na segunda que é o movimento propriamente dito onde eles conhecem por vídeo ou por crianças executando o movimento, ou uma ginasta quando eu levo uma né; quando eu consigo levar alguma ginasta na aula, para eles poderem perceber isso, olhar, ver, porque até rolamento perfeito eu ainda sei fazer (risos), mas vai ficando mais difícil e eu não sei fazer mais (risos). Aí, eles mostram, aprendem e vamos para uma terceira fase que são as variações né, porque eu posso variar isso e sempre eles têm que criar pra mim, eles têm que criar uma seqüência; eu dou uma seqüência obrigatória e peço uma seqüência livre, por que? Eu to falando no solo. Para que eles aprendam as variações que eles podem fazer, como que eles podem combinar isso, então eu tenho alguns pontos básicos pra voltar na sua primeira questão. Primeiro, essencialmente pedagógico né, o pedagógico é forte, é o ato de ensinar, eu to mostrando sempre pra eles que eles tão fazendo pra eles vivenciarem quais as dificuldades, como é difícil, como é que se segura, eu faço todo mundo vivenciar como que se segura, onde que segura melhor né, como é que é mais fácil segurar, uso muito o vídeo do Maurício, o DVD do Maurício, porque ajuda, ele mostra muito bem como segura. Então, explico pra eles essa vivência ta, porque que eles estão vivenciando, que eu não estou querendo transformá-los em ginastas e, que não vai tirar nota mais alta aquele que executar melhor né, mais aquele que criar elementos diferenciados, educativos diferenciados e, chego até a executar uma seqüência livre criada por eles onde eu vou analisar o que? A criatividade deles, a forma como eles compreenderam a união dos elementos, porque se não eles saem da faculdade como ‘repetecos’; eles repetem tudo o que você ensinou, se eles vão ensinar eles vão ensinar exatamente como você ensinou. A minha prática, minha vivência na graduação tem mostrado isso, se você dá pronto, amanhã eles vão estar ensinando, repetindo exatamente o que você deu, não são capazes de elaborar um exercício a mais, entendeu? Isso eu vejo quando eu trabalho também com as disciplinas de Educação Física escolar, você pede pra criar uma dinâmica, uma aula de Educação Física escolar e você vai ver exatamente o que eles fazem, aquilo que eles aprenderam lá, eu me lembro uma vez na faculdade eu parei a aula e falei ‘a minha vó fazia esse exercício, eu não acredito que nessa fase da vida nós vamos fazer esse exercício, polichinelo? O que, que é isso né!’, parei a aula, acabei com a aula deles, mudou, dali para frente foram outros sabe. Então eu penso bastante nessa (...), me preocupo muito com essa compreensão deles dos elementos, elemento reversão o que que é reverter o corpo? O que que é uma reversão? É reverter o corpo! Reverter? Ta bom, ta nessa posição, vai pra outra posição, então ok. Como é que ele pode ser revertido? A onde ele pode ser? Que jeito eu posso fazer? Ah então eu vamos buscar na Ginástica quais são os elementos que trabalham reversão, aí eu vou lá no salto, vejo no solo, então reversão se trabalha assim! Como é que nós vamos criar educativos pra isso? O que que eu tenho que fazer? Ah eu tenho que ajudar a elevar o pé, ok, pra ficar na posição inclinada pra entrar na reversão, ah então esse é um elemento biomecânico importante pra eu iniciar a criação de educativos. É assim, eu vou dando bastante ênfase nessas questões, para que eles possam sair com uma bagagem forte e, uma terceira coisa, além do pedagógico, da criação, o terceiro é a ludicidade. É (...) a Ginástica Artística, ela traz muitos desafios né, ela é desafiante pras crianças, porque todo mundo tem uma bola no pé, já chutou bola, já arremessou bola, já rebateu né, a Ginástica Artística dificilmente você vai ver alguém fazendo por aí a não ser as estrelinhas, todo mundo brinca de fazer estrelinha, parada de mãos, mas por que viu, hoje isso já acontece um pouco mais por que tem a mídia, no tempo que eu ensinava não existia mídia, as pessoas olhavam e falavam o que que é isso? [Entrevista interrompida para o docente atender ao telefone]. A terceira coisa que é importante para mim é a questão da ludicidade, a ludicidade Juliana é algo que, a partir do meu contato com as crianças eu fui percebendo que esse desafio que a Ginástica traz ela é motivadora, ‘será que eu

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consigo virar que nem aquele menino, que nem aquele moleque?’; então eu tenho um desafio corporal que me leva, que me instiga, que me dá vontade de fazer igual. Isso para algumas crianças, é representado pelo medo né, algumas crianças tem medo de fazer isso, se sentem acuadas, outras são mais atiradas, depende da personalidade de cada um e de como elas foram criadas desde de paquenininhas, as mais atiradas vão e vão querer se jogar né. Então este desafio, quando ele é trabalhado de forma lúdica com a criança, em formas de brincadeiras né, de alegria, de prazer, ele é muito bem direcionado e você consegue conduzir a criança a essa prática, seja ela gordinha, magrinha, com dificuldade, com facilidade né. O que eu fui percebendo no decorrer da minha trajetória é que a ludicidade é uma facilitadora, é um instrumento de ação pedagógica, porque ele me facilita o acesso à criança ta, então por isso que eu brindo de rolar cambalhota, eu brinco de me pendurar, eu brinco de macaquinho teimoso pra eu ensinar parada de mãos, entendeu, eu sempre trago o aspecto lúdico próximo da aprendizagem do elemento.

P – E como que eram suas aulas, durante o semestre, mais teórica, menos teórica, mais prática, menos prática?

D.4 – Eu não gosto muito dessa coisa de teórica - prática, eu gosto da práxis (risos), porque, percebe, como eu te falei, se eu sento com eles e brinco com de carriola, carriolinha rolou, percebeu? Pára, senta e vamos pensar, ela vira teórica ali, naquele momento no chão, porque eu estou fazendo com que eles pensem, que eles reflitam sobre o movimento e descubram qual era o eixo biomecânico que estava facilitando aquela ação corporal, isso não é teoria. Então, eu não posso dizer que a minha aula é essencialmente prática, ou que ela é essencialmente teórica, ela é teórico-prática; eu gosto de estar num ambiente onde eu posso fazer a prática porque eu vou estar sempre usando as duas coisas juntas. Mas eu sempre tenho algumas aulas em que eu privilegio (...) que eu vou para a sala de aula, por exemplo, onde eu vou passar um vídeo ou vou trabalhar algum texto com eles, então existe uma mescla disso, mas eu to muito mais lá na prática, na área, no espaço onde eu desenvolvo a prática e, não necessariamente eu to dando só a prática na aula.

P – E você observa algum diferencial no seu modo de dar aula, na sua metodologia, alguma característica sua, você acha que tem algum diferencial?

D.4 – Acho! Eu sempre fui uma estudiosa assim das questões metodológicas, estudiosa não no sentido de ficar lendo todos os métodos que existem, mas de ficar buscando qual é o melhor jeito de ensinar. Eu sempre me preocupei muito com, ‘qual é que melhor maneira de ensinar isso’, ‘como eu posso fazer com que o meu aluno compreenda isso’, é uma das coisas que eu estudei bastante foi (...) a aprendizagem pela compreensão. Na Universidade F eu tive a oportunidade de estudar isso. Eu me deparei com essas teorias que são desenvolvidas e, essas teorias me levaram a pensar muito se o meu aluno esta compreendendo aquilo que eu estou falando, aquilo que eu estou querendo passar pra ele né, por conta também de ter vivenciado com muitos professores modelos pedagógicos prontos, isso me questionava e me fazia repensar e refletir que nem todo mundo aprende da mesma forma. Então assim, lá atrás, há muitos anos, acho que quando eu estava iniciando o meu mestrado, eu me lembro de uma aula do João Oliveira que me chamou muito a atenção e fez com que eu mudasse a forma de trabalhar que, era buscar desenvolvermos nos alunos que seriam professores, essa questão de criação, deles criarem coisas diferenciadas, porque eu nunca vou conseguir esgotar todas as possibilidades de ensinar né, de repente você vai arrumar um jeito de ensinar cambalhota muito melhor do que eu tá, mais apropriado. E eu percebia, paralelamente, que cada criança eu conseguia que aprendesse de um jeito, tudo isso foi com a vivência, conforme eu fui vivenciando com as crianças eu fui observando isso; ao

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mesmo tempo Juliana eu tinha uma preocupação com que eles vivenciassem sem transformar aquilo numa coisa ruim, uma aula ruim. Eu me lembro que eu odiava nadar, eu não gosto de Natação e eu era obrigada a nadar né, eu não queria isso, que eu fosse obrigada a fazer, mas no começo tinha que obrigar se não ninguém fazia, ninguém queria fazer, então eu comecei a buscar métodos que deixassem aquilo mais prazeroso, que não transformassem aquilo numa aula diretiva ta. No Projeto A era eu que dava aula pras crianças no começo e esses meus alunos da faculdade me ajudavam até o ponto em que eles estavam preparados e, eles começavam a dar aula, depois do primeiro ano no segundo, eles começavam a dar aula agora auxiliados por outros alunos que estavam entrando; isso foi gradativamente acontecendo e o projeto durou dez anos e, o projeto gerou muitos estudos, muitas dissertações, muitas monografias e teses, a partir desse projeto, pesquisas (...) enfim, uma das pesquisas que foi gerada nele começou com a minha observação no método de ensino, como ensinar as crianças? Como é que eles aprendiam melhor? Então, por exemplo, eu dava aula de um jeito e chegava no final da aula eu sentava com as crianças e tentava ver o que que eles aprenderam, o que tinha ficado retido e qual foi a forma mais prazerosa, ‘o que foi mais gostoso fazer, a primeira parte ou a segunda parte, por que?’, ‘ah porque ali a gente brincou disso’, ou o outro falava ‘é por que ali acho que a senhora ensinou de um jeito que eu consegui aprender’, ou seja, eu fui buscando na fala das crianças no discurso deles, meios e maneiras para facilitar a aprendizagem daquele elemento, com isso que eu cheguei naquele método dos três momentos. [Entrevista interrompida para o docente atender ao telefone]. Eu fiz aquele método dos três momentos, você já leu alguma coisa sobre isso?

P – Sobre o método não, só tenho leitura do Projeto A, inclusive li um estudo, acho que de uma orientanda sua que reaplicou um estudo que você havia feito anos antes (...)

D.4 – Sei, muito bom o trabalho dela.

P – Sim, era para fazer comparação de como estava a Ginástica na Cidade F, mas sobre o método dos três momentos não cheguei a ler.

D.4 – O método dos três momentos nasceu dessa observação, eu ali com as crianças e tal, eu fui percebendo, que a criança quando (...) a aula traduzida em três momentos era a melhor forma de ensinar. Então isso veio da prática, de uma vivência na prática dessa busca, eu criei essa forma de ensinar. Então eu buscava ensinar os professores por esse caminho, porque eu dizia para eles ‘não há só essa forma de ensinar, não há só esse caminho’. Uma das teorias que eu estudei em Universidade F, mostra que cada criança aprende de uma forma, nem todas aprendem pelo mesmo caminho, então descobrir a rota de acesso ao conhecimento da criança é mais importante, então quando eu sei se a criança aprende melhor ouvindo, vendo ou fazendo, eu vou pelo caminho mais fácil para ela.

P – Você colocou isso no seu livro, o Livro B, logo no capítulo de introdução né?

D.4 – Sim, isso! E, quando eu sei se a criança aprende melhor vendo, eu vou filmar e reproduzir para ela ver o erro, então esses estudos pedagógicos que, na verdade, eu trouxe de quando eu estudei lá e apliquei à Ginástica, apliquei à Educação Física, porque lá eu estudei questões pedagógicas eu não estudei Educação Física, foi na pós-graduação em Educação, ao fazer isso eu estava exatamente atendendo aquela especificidade que eu trabalhava com esse método dos três momentos. O método dos três momentos, num primeiro momento eu deixo a criança a vontade com o tema da aula, vou sintetizar pra você, ela simplesmente tem primeiro, contato com o material, por exemplo, eu digo ‘olha hoje nós vamos brincar com essas gavetas do plinton ta, o que

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que eu possível fazer com isso?’ Ou, eu dou um arco na mão e pergunto ‘o que que eu faço com isso, eu consigo fazer o que?’ E deixo que a criança explore, então é um momento de exploração dos movimentos que a criança traz na sua bagagem motora, eu vou observar o que ela faz e, a partir dessa minha observação é que eu dou seqüência a um segundo momento. Quanto tempo? Que horas passar de um momento pra outro? É só por observação. Eu já cheguei a ficar uma aula com crianças de cinco anos só na exploração de tão rica que estava, de tão maravilhosa que estava e, esse primeiro momento ficou gravado pra mim de tão rico que ele foi, a aula inteira foi no primeiro momento, não houve segundo, não houve terceiro. Em geral, eu sinto a necessidade de sair desse primeiro momento de exploração, já está super explorado e tal, eu to vendo que só tem repetição porque tem criança que olha o que o outro faz e faz igual e não vai criar nada novo, aí eu vou para o segundo momento. Nesse segundo momento eu vou dar dicas, pistas pra a criança de dizer o que fazer sem dizer como fazer; é ela que me dá o como ela vai fazer. Então a gente vai brincar de rolar, ‘quais são os jeitos que eu tenho de rolar?’, e a criança vai dizer como ela vai conseguir rolar, ‘ah, tia assim eu não consegui rolar’, ‘então tem um outro jeito que você consegue rolar?’, eu vou sempre jogando pra a criança tentar mostrar para mim o que ela sabe fazer, o que ela já consegue fazer e, nessas pistas que eu dou eu vou acrescentando sempre pistas pra que elas possam ir chegando sozinhas as possibilidades corporais e, isso se esgota também, então eu preciso sempre de um terceiro momento que é o momento que eu chamo mais diretivo. Então eu brinquei de saltar, das possibilidades de saltar, quantas são as possibilidades de saltar que eu tenho? Mas, ninguém saltou, por exemplo, o grupadinho e, eu quero que eles aprendam o grupadinho, então agora, nessa hora, eles vão me seguir, vão fazer aquilo que eu fizer. Então, é diretivo? É! Mas, eu precisei desse momento diretivo porque eles não chegaram naquilo que eu queria que eles chegassem, que era o objetivo maior da aula; então eu traço o objetivo, tracei a meta e vou tentando chegar lá. Se eles chegarem sozinhos lá, ótimo, melhor, se eles não chegarem eu sou obrigada a entrar no terceiro momento. Então foi a partir dessas observações que eu fui fazendo isso; existe uma dissertação de Mestrado que trabalhou isso e, existem várias outras monografias que se pautaram nesses três momentos aplicando em outras modalidades, aplicando em adultos, aplicando em idosos, então criou o método dos três momentos né, que eu preciso publicar um livro disso para facilitar (risos). E, aí assim, eu tento passar para os meus alunos esse método, entendeu?

P – Sim! E como você vê a Ginástica Artística hoje dentro do contexto universitário e fora dele, você tem anos de prática de docência, conhece bem a Ginástica, como você pontua a Ginástica Artística nesses dois espaços?

D.4 – A Ginástica Artística como uma modalidade Olímpica?

P – Isso, como modalidade e dentro do espaço acadêmico.

D.4 – Bom, eu acho que ela ainda está deficitária, eu acho que ela ainda não alcançou o nível que a gente imagina que ela deva alcançar, que é ser desenvolvida, pelo menos esse conhecimento básico, em todas as graduações obrigatoriamente, pra que os professores não saiam das escolas ser ter vivenciado pelo menos alguma coisa da Ginástica ou saber o que é Ginástica. Eu digo sempre pra eles assim, eu tenho uma aula que eu falo de arbitragem, não adianta eu ficar ensinando como que eles vão arbitrar, a soma da nota como que é feita eu mostro como é que é feito como que um juiz chega nisso, porque eu acho que você não pode ser leigo no assunto, você é um profissional da área, você tem que entender o que se passa, então eu falo pra eles assim, ‘vai passar Olimpíadas e seu vizinho vai assistir na tua casa ta, e aí ta passando Ginástica, uma série de solo e, nossa todo mundo achou que a menina foi super bem e

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ela tira nove, não tira dez’, e o seu vizinho, ‘ah, por que que deram nove?’. Você tem que saber pelo menos o porque, como é que é feito aquilo, como é que se chega numa nota né, o conhecimento básico geral disso, é isso que eu quero que eles entendam, quais são os quesitos, o que que tira o que descontou, o código de pontuação, ‘olha ta aqui, esse é um código, vê se vocês conseguem manusear, o que dá para entender desse código, o que vocês conseguem entender disso, para não ser um bicho de sete cabeças’; porque eu dava muitos cursos para professores da rede, muitos, a vida inteira eu dei cursos para professores da rede, ensinando Ginástica, ensinando a série obrigatória para o colegial para eles participarem de campeonatos colegiais, eu montava os campeonatos colegiais junto com as secretarias municipal de esportes que existia, eu ensinava a série obrigatória para eles, mas os professores não sabiam como corrigir, não sabiam o que corrigir, a vivência deles era nula, então a vida inteira Juliana eu me deparei com professore que nunca tiveram vivência na trajetória de vida deles na escola e, também na graduação, nada, então aí ficava difícil o que que eu ia fazer? Nunca eu ia ensinar Ginástica! Foi a partir daquela minha pesquisa de 1988, faz vinte anos isso, nunca vivenciou, não sabe, não vai ensinar mesmo, ‘por que você não ensina Ginástica Artística na escola?’, ‘porque eu não sei com é que ensina!’, ‘e você não tem vontade de aprender?’, ‘ah tenho, mas eu morro de medo que os alunos quebrem o pescoço, quebrar pescoço de aluno pelo amor de Deus, deixar todo mundo machucado’. O medo de ensinar Ginástica, porque ele tem esse medo, ele não vivenciou né, a gente não conseguiu facilitar; aquilo que eu falava lá, da ludicidade né, pra quebrar um pouco a coisa do medo, esse adulto não teve isso né, então eu acho que ela ainda não atingiu o ideal, ou seja, que ela seja desenvolvida em todas as graduações assim como é o Voleibol, como é o Futebol, como é o Basquetebol né. Dois, ainda dentro da Universidade, mesmo que ela atinja, na minha opinião, é importante que ela atinja os conteúdos, que ela faça parte de todos os conteúdos de uma forma pedagógica, com um enfoque pedagógico, uma preocupação pedagógica, e isso não acontece. Então aqui, por exemplo, que eu tenho as duas graduações, eu tenho bacharel e licenciatura, quem está no bacharel não quer saber da questão pedagógica, ‘como assim? Você vai ensinar! O ato de ensinar é o mesmo em escola, em um clube, a onde for né’, ‘ah não, mas eu quero me especializar, eu quero ser técnico’, ‘então você quer ser técnico, você tem que saber ensinar o be-a-bá, ensinar o básico né’. Então o mais importante é que o aspecto pedagógico faça parte também dessas questões de ensino das modalidades na formação do aluno. Então dentro da Universidade eu sinto isso, falta essa facilitação, as pessoas ainda olham a Ginástica como um bicho de sete cabeças, infelizmente. Por outro lado eu acho que a culpa também é nossa, porque nós somos responsáveis pela formação, por isso aonde eu vou eu tento quebrar isso e eu vou em cima da Ginástica e fico quebrando, quebrando, quebrando o medo, esse tabu que existe da prática da Ginástica Artística. Fora da Universidade eu acho que nós crescemos bastante por duas razões, em primeiro por que houve um investimento, e esse investimento ele é necessário pra uma modalidade alavancar; Eu preciso investir na modalidade pra surgirem ídolos e a medida que surgem ídolos, eu consigo disseminar mais, eu consigo ampliar mais, massificar mais a prática da Ginástica né. Não vou dizer que isso não era feito. Em 1975 eu levei para Cidade C no Centro A cinco ônibus, eu Docente 4 sozinha, de crianças, cinco ônibus lotados de crianças para participar de um evento que tinha mais de mil. Em 1975, mais de mil crianças, naquele ginásio do Centro A participando de uma competição tipo massificação.

P – Eu participei, só que em 1990! (risos)

D.4 – (Risos) Bom! Para você ter idéia em 75 tá, isso já era feito. Então, muitos de nós trabalhamos sim, Alecar, eu, Maria, Rafael Oliveira, muitos de nós batalhamos pra que essas coisas acontecessem e a Ginástica crescesse no país, mas hoje tem mídia, hoje

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tem investimento, patrocínios, que fazem com que a coisa alavanque, que era o que faltava pra a gente. Eu saia de Cidade F de ônibus aos sábados, pra ir pra Cidade B pra ensinar Ginástica lá, por que lá ninguém sabia Ginástica, ninguém sabia o que era Ginástica Artística, Ginástica Olímpica, eu ia pra lá de sábado pra ensinar, pra disseminar, pra plantar uma sementinha.

P – Você plantou bem viu, porque eles sempre ganharam da gente nos Jogos Regionais (risos).

D.4 – (Risos) Então, mais não tinha nada, eu fui a primeira professora de Ginástica Olímpica do interior do estado de São Paulo; no estado inteiro não tinha em nenhuma cidade do interior; eu viajei muito, pra muitas cidades. Eu levava minha equipezinha, ia lá, fazia uma demonstração, trazia professores da rede municipal, da rede estadual pra ensinar Ginástica. Isso eu fiz em milhões de cidades durante quinze anos, de 1970 à 1985 eu só fiz isso, eu ensinava Ginástica pra todo mundo, eu era técnica do Clube F e eu trazia várias escolas. Em 1985 eu entrei na Universidade D, que abriu o curso de Educação Física. Entrei lá, aí eu comecei lá dentro a fazer isso, fazia por meio de cursos da rede no estado de São Paulo inteiro; eu dava cursos, Curso A, Curso B, esses eram os cursos que eu dava pra quebrar o tabu da Ginástica, depois disso Juliana eu criei na Universidade D com os meus alunos na disciplina que tinha lá chamada Disciplina I, eu queria que eles aprendessem a desenvolver um evento desse tipo massificação, então a gente começava no início do ano, ‘qual é o tipo de evento que vocês querem fazer?’, ‘tipo massificação’, ‘ok , o que que vai ser, vai ser uma série obrigatória?’, ‘vai’, ‘então vamos criar a série’, criavam a série uma série obrigatória, ‘quais aparelhos?’, ‘esse, esse, esse’, os alunos escolhendo, ‘ta bom o que que nós temos que fazer agora?’, ‘por isso num papel e mandar pra todas as escolas’, eles faziam isso, mandavam pra todas as escolas. Chegando nas escolas aí nós vamos ter que marcar uma data para o professor vir aqui trazendo algumas crianças pra aprenderem o movimento, a série, marcávamos a data, alguns professores vinham, outros não vinham, traziam crianças para eles ensinarem; nós temos que treinar árbitros pra que alguns aprendam a arbitrar isso. [Entrevista interrompida para o docente atender ao telefone]. Então, nós fazíamos isso ensinávamos as crianças, ensinávamos os árbitros, preparávamos; vamos buscar dinheiro, ‘como é que a gente pode buscar dinheiro para preparar um evento desse?’, ‘como é que se faz um ofício pra solicitar um espaço?’, tudo, tudo, tudo pra organização de um evento, quem devia fazer isso era a disciplina de organização de eventos, como eles não faziam direito e eu queria que eles aprendessem fazer, fazia eu. Aí nós organizávamos a Copa A, você chegou a participar de alguma?

P – Não, que eu me lembre não!

D.4 – Não? Porque em 1990 você falou que participou de massificação, a Copa A vinha mil, mil e quinhentas crianças, eu lotava o Ginásio A.

P – É que eu só comecei a praticar mesmo e competir em 1993, 1994, aí viajávamos bastante, mas em 1990, foi o primeiro grande evento que eu fui.

D.4 – Essa Copa A ela foi bastante tempo até eu sair da Universidade D até mais ou menos 1997 ela aconteceu, eu sai em 1999, acho que até 1997 ela aconteceu

P – Bom, depois nós entramos mais pra linha de Ginástica Geral e aí (...)

D.4 – É, é diferente! Bom, aí nessa Copa A os alunos aprendiam como organizar esse evento de massificação e a gente fazia esse tipo de evento de massificação. Então eu acho que (...) tudo isso pra te dizer que hoje se eu olhar, se você perguntar pra mim eu acho que está muito melhor, porque eu comi o osso lá que foi difícil roer (risos), porque

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você ensinava as coisas e as pessoas ‘ah, mas isso aí é uma praticazinha que amanhã acaba’, não sabiam o que era, hoje não, hoje a mídia ajuda muito, mas eu acho que faltam estudos científicos pra a prática da Ginástica Artística, infelizmente, eu acho que não tem. Eu sempre levava (...) todo ano eu levava os alunos na Academia A pra assistir o treinamento e aí eles viam que era um horror, que era tudo na base do senso comum; primeiro, a parte de psicologia não existia nada, ‘errou?’, ‘faz de novo’, eram coisas assim deprimentes; ali a gente se deparava também com pessoas que vinham estudar a parte nutricional das ginastas e a técnica não permitia, não a Maria, a Maria já sabia a importância alcance disso, mas a técnica que ela tinha ali naquele momento não permitia. Pra você ter uma idéia, uma vez eu escrevi pra (...) nossa eu faço questão de sempre esquecer o nome daquela técnica a (...) escrevi pra Janaína, que eu precisava de dados das ginastas por que eu estava estudando a menarca em atletas e eu estava estudando exatamente na Ginástica Artística como se dava a menarca, ela me respondeu que se eu quisesse ela poderia vender os dados (risos). Então eu acho que a Ginástica fora da Universidade ela cresceu bastante por conta do investimento e da mídia, mas falta também a parte científica, estudos científicos que embasem o desenvolvimento do alto rendimento dos atletas; infelizmente o alto rendimento alavancou na base do sofrimento né, por exemplo, como chama aquela ginasta, que eu não me lembro o nome, que não conseguiu competir na Olimpíada?

P – Érica?

D.4 – Érica! Lembra que na véspera (...)

P – Se machucou.

D.4 – Uma analise de stress oxidativo teria demonstrado que não podia mais exceder o treinamento ali, ou seja, estudos científicos que se fazem hoje em cima de (...) scouts que se faz né, não existe scout na Ginástica por que? Como? Fazer análise de cada ginasta, do desenvolvimento de cada uma, até onde cada uma pode chegar, entendeu, eu acho que falta muito estudos científicos, a associação das duas coisas, da Universidade chegando lá ao alto rendimento, que é o que eu fiz aqui, eu criei um Instituto de Esporte, o Instituto A ele tem dado assessoria às equipe de alto rendimento que tem por aqui, os meus alunos vão junto com o professor, fazer análise biomecânica dos saques no Tênis de Campo, eles vão com o Júnior no Futebol do Time A fazer análise de stress oxidativo nos jogadores né, por meio de projetos que tem dentro do Instituto do Esporte.

P – Nossa que legal! Bom, você reforça bastante a parte pedagógica para os seus alunos, mas você acredita que os seus alunos chegaram a usar essas metodologias ministrando a Ginástica Artística na escola.

D.4 – Eu não acredito, eu tenho certeza, porque eu tenho prova e eles vem me contar, já vieram me contar; eu cruzo com ex-alunos na Universidade G, é fora de série isso, acontece muito, muito, muito, ‘professora eu dei aquela aula que a senhora ensinou de carriolinha, não sei o que, não sei o que’, muito, muito isso (...)

P – E você acha que a Ginástica Artística possui fatores que a impedem de crescer na escola, de alcançar melhor as escolas?

D.4 – Eu acho que o problema maior das escolas são os professores, porque naquela pesquisa que eu fiz já mostrava pra mim, por exemplo, uma escola tinha todos os aparelhos de GR não eram usados mais tinha, por que que em uma escola pública tinha todos os aparelhos de GR e na outra escola pública não tinha? O dinheiro que vai pra uma vai para a outra né, como que uma tem e a outra não tem? Em outra escola eu

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encontrava quinze bolas de Voleibol e nenhuma de Handebol, por que isso? Isso é a prova de que depende do professor que passa por ali, se o professor que passou por aquela escola entende de Ginástica, gosta de Ginástica, fez Ginástica, acha importante, sabe que é importante ensinar a Ginástica ele vai se preocupar com isso e vai na hora de solicitar o material, ele vai solicitar um colchão (...) ai posso contar uma historinha pra você? (risos)

P – Pode, lógico!

D.4 – Não é estória, é história mesmo, é real, eu fui dar um curso em Cidade I e o curso foi para professores da rede, não me lembro se era estadual, acho que era estadual, de Educação Física e, nesse curso tinha um aluno que era de uma outra cidade ali vizinha que eu não me lembro o nome e ele foi lá fazer. Eu trabalhei com essa forma de brincar com a Ginástica, com as brincadeiras e tudo mais e ele se encantou com isso, ele nunca tinha ensinado Ginástica na vida e nunca tinha feito Ginástica na vida e, ele começou a dar aula numa escola em Cidade C na periferia, muito pobre, uma escola bem pobre, bem periferia mesmo, não tinha nada na escola e o número de evasão na escola era muito alto, então o que que ele fez? Ele pegou, implantou um trabalho de Ginástica com as crianças, ele tinha lá só um colchão verde, aquele cheio de ondas de algodão (risos) e aí Ju ele ensinou só com esse colchãozinho; a sala, segundo o que ele me descrevia, era um pedacinho que cabia só aquele colchão, então ali ele começou a ensinar Ginástica pra algumas crianças e dessa forma de brincar com a Ginástica, ele fez o meu curso e eu nunca mais vi o professor e lá ele foi ensinando isso e um dia eu recebo um telefonema da Secretaria de Educação, de uma Delegacia de Ensino, me convidando pra dar uma palestra para algumas escolas da região, tudo bem e tal, ‘mas como vocês tem o meu nome’, ‘ah, então foi indicado por um professor’, aí a pessoa me disse ‘é por que ele fez um trabalho na escola dele e transformou a escola’, é claro que a diretora comprou a idéia dele e foi bárbaro por que eles encheram o colégio assim, quem faz Ginástica não suja o chão, quem faz Ginástica não pinta parede, ou seja, usou a Ginástica, que poderia ter sido o Voleibol, poderia ter sido qualquer outra modalidade, eu sei disso, mas ele usou a Ginástica porque foi essa que ele aprendeu brincando e aí ele desenvolveu isso e o número de evasão caiu muito, chamando a atenção da Delegacia e a Delegacia chama essa escola pra verificar e aí eles se deparam com esse trabalho e, com esse professor e, o professor fala que fui eu quem deu o curso, aí eles me chamam lá pra dar um curso pra todos os professores das outras escolas da região, isso há milhões de anos atrás (risos). Então, pra você ter uma idéia de que depende muito do professor né, é ele que vai alavancar a Ginástica na escola, então pra mim a razão principal dessa carência de Ginástica na escola ainda é o professor, a causa ainda é o professor, você pode dizer ‘ah, mas não tem nada de aparelhos’, ‘hum, hum, ta bom mas é ele que vai buscar’, eu também não tinha nenhum aparelho quando eu comecei no clube, não tinha colchão, não tinha nada, como é que eu comecei? Do zero, do nada, levando bolada de Basquete, bolada de Vôlei e tal, mas foi assim, ‘é mais ali não tem nenhum espaço para trabalhar’, ‘hum, hum, eu também já dei aula numa escola pública, de trave de equilíbrio na mureta, no tronco de árvore, barra fixa era tronco de árvore, o plinton era uma escada’, ou seja, eu também já tive que adaptar, fazer essas coisas, agora eu não sou a favor que as escolas não tenham os aparelhos, ao contrário, mas eu sou a favor de que, esse caminho eu trilhei, não adianta alguém me dizer assim, ‘ah mais esse caminho é muito difícil’, é difícil mais eu trilhei, eu dava aula num lugar e tinha que exigir silêncio de todo mundo, por que o único lugar que tinha para dar aula era do lado das salas de aula, então as crianças não podiam nem vibrar, quando conseguia fazer os exercícios (risos). Então eu sei o que é isso, sair do nada, sair do zero, rolar cambalhota, aprender a rolar na grama inclinada, numa descida que tinha, num gramado, num campinho em um terreno baldio do lado da escola, entendeu, eu sei

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tudo isso, eu também passei por isso, eu não sou a favor de que a escola não compre tudo isso. A primeira vez que eu entrei em uma escola particular, pra dar aula tinha um cimentão assim, um pátio pintado inclinado e eu pegava a criançada e ‘o coelhinho como faz, joga a perna pra cima’, ‘e o coelhinho faz assim’, fui chamada na primeira semana, ‘você pare com isso porque você esta arriscando a vida das crianças’, ‘ah, desculpe madre, mais eu não posso, eu fiz um juramento que eu ia cuidar do desenvolvimento motor das crianças e eu to cuidando, eu não posso parar de fazer isso, mas o que a gente pode fazer é comprar colchão, por que aí eles podem fazer em cima do colchão’, e aí na semana seguinte eu tinha cinqüenta colchões pra trabalhar, então eu arrisquei, era o meu emprego, eu me arrisquei porque eu podia ser mandada embora por ser topetuda, mas eu tentei argumentar de uma forma consistente, teoricamente, então eu vejo que os professores hoje eles são muito descompromissados com a formação das crianças, porque se todos eles se preocupassem com a formação das crianças todos dariam Ginástica, de qualquer forma.

P – Bom, eu dou! (risos)

D.4 – (Risos) Que bom! Mas será que você dá por que vivenciou?

P – Não, eu não vivenciei Futebol e dou Futebol também!

D.4 – Então ta! (risos)

P – Você acha que a Ginástica Artística poderia ser contextualizada de uma maneira diferente, no ensino de graduação para ela alcançar melhor a escol?

D.4 – É o que eu tenho tentado fazer na minha trajetória inteira de vida, é desmistificar esse tabu que existe com a Ginástica, a desmistificação dele eu acho que é um ganho né, a partir do momento que o professor não tem mais medo de trabalhar com aquela modalidade, ou de brincar com aqueles elementos da Ginástica ele passa a mudar a forma de ver a Ginástica, de interpretar a Ginástica e ele vai com certeza fazer isso. Eu vejo os meus alunos lá que nunca fizeram Ginástica, que nunca viram Ginástica na vida, ensinar Ginástica, isso eu vi acontecer a minha vida inteira, dentro da Universidade D principalmente né; a criação do Grupo A, ele nasceu na sala da minha casa, que era Ginástica Geral, mas o que que a gente estava tentando ali? A gente estava tentando traduzir uma forma mais simples de olhar a Ginástica, eu acho que o que a gente conseguiu com a Ginástica Geral também foi um caminho diferente, não foi pela Ginástica Artística, por que ela tinha uma coisa diferente, a questão assim, a gente foi pela Ginástica Geral e eu acho que o que a gente fez na Universidade D foi quebrar tabus com a Ginástica, a gente conseguiu coisas maravilhosas lá, só o fato de mandar mais de cinquenta estudantes para a Dinamarca fazer estágio, hoje o Grupo A ser uma referencia internacional e ser apontado como referencia internacional em Ginástica do Brasil; se você olhar todos os nosso alunos que já passaram pelo Grupo A, quem já passou pelo Grupo A, todos eles ensinam Ginástica nas escolas né, quem atua em escola ensina Ginástica na escola. Então a Ginástica Geral foi uma forma de facilitar a relação com a Ginástica e, por aí a Ginástica Artística ser trabalhada, desenvolvida, os elementos ta, mas também por outro lado descaracterizou um pouco a Ginástica Artística, porque quando no Projeto A eu colocava elementos, a criança andando em cima da trave com o arco, pulando o arco, eu estava descaracterizando a Ginástica Artística, mas eu sabia, porque ali o meu objetivo maior era a formação motora da criança, eu estava buscando a formação motora, entendeu, eu não tinha o objetivo da formação (...) só que eu fazia paralelamente eu tinha uma equipezinha, aquelas que gostavam e que queriam aprender mais, eu tinha um grupo de Ginástica Artística,

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participava de copa, essas copas que tinha aí (...) não lembro agora, Copa B,essas coisas todas.

P – E como que estava a disciplina de Ginástica Artística quando você deixou, quando você parou de lecionar lá, ela era obrigatória como que se encontrava?

D.4 – Bom, ela tinha (...) ela era trabalhada na prática pedagógica como prática pedagógica e como treinamento, eles escolhiam, alguns alunos escolhiam (...)

P – Ela era optativa!

D.4 – Ela era optativa! Acho que ainda é né?

P – Não, mdou a estrutura curricular. Agora eles têm uma disciplina base e aí depois você escolhe as outras e não é obrigatório, Disciplina J eu acho que ela chama, Disciplina J.

D.4 – É mas geral, Ginástica em geral.

P – É, todos os tipos de Ginástica, depois você opta pelas que você (...)

D.4 – Quando acontece isso eu sou contra isso, porque eu acho que isso não te da a base da GA, a base da GR, porque eu vou dar como um todo, eu vou dar o arremessar, o rebater, eu vou dar os elementos, eu não vou dar o rolamento propriamente dito da Ginástica, o rolamento da GR é diferente do rolamento da GA, então quando é que eu vou caracterizar isso? Quando eu dava era assim, a parte pedagógica, Disciplina K IV, que a gente dava GA e GR ta, depois tinha a Disciplina L da Ginástica e Disciplina M em Ginástica Artística e Rítmica, separadas.

P – Então, mas todas eram optativas?

D.4 – Não, só as Disciplinas M.

P – Ah, as outras eram obrigatórias. Certo, e você auxiliava na montagem do programa, era você quem fazia sem oposição da faculdade, interferência?

D.4 – Não, era eu sim, eles ma respeitavam. Claro, a gente discutia muito né, mas o meu departamento era ótimo, Frederico Costa, Ângela, Josiane, Edson, Guilherme (...) era um departamento delicioso, a gente discutia questões pedagógicas juntos (...).

P – E como que você avaliava seus alunos?

D.4 – Várias formas de avaliar. Eu queria que eles escrevessem, porque eles tinham que aprender a escrever também, sobre a importância da Ginástica depois de ter lido tudo que a gente escrevia, artigos né; eu queria que eles escrevessem sobre a importância da Ginástica para a criança; eu fazia uma avaliação prática onde eles criavam uma seqüência livre, eu avaliava uma seqüência obrigatória que eles faziam, pra ver se eles compreenderam o desenhinho, a interpretação pra ir pra escola e receber aquele folhetozinho que vem com a descrição do exercício no desenhinho né, para ver se compreendeu aquilo; é (...) eu avaliava nas visitas que a gente fazia aos treinamentos, isso já lá na Disciplina M, na parte básica eu ficava mais na criação dos elementos educativos, criar um educativo, tudo vale ponto, toda aula é pontuada, a minha avaliação sempre foi processual, nunca foi uma avaliação única, sempre avaliação em processo, a organização de um evento né, era uma avaliação também, ou seja, eu tinha “n” formas de avaliar de avaliar, muitas, não tinha uma única.

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P – E você percebia algum embate, alguma relação de poder entre as disciplinas de caráter mais teórico e as de caráter mais prático que é o caso da Ginástica?

D.4 – Eu percebia que existia (...) é cultural nos alunos dar mais importância às questões fisiológicas, fisiologia, biologia, bioquímica, então essas são disciplinas mais difíceis né, e na verdade não é isso, na verdade o que acontece é que esses professores até hoje ainda ensinam de uma forma só, uma única maneira de ensinar e os alunos são obrigados a aprender, então quem não aprende daquela forma que o professor ensina vai ter dificuldade, então são disciplinas mais difíceis, por que que elas são mais difíceis? Porque elas são ensinadas sempre da mesma forma né. Aqui eu faço o professor de fisiologia dar situações problema, assim como o professor de Ginástica dar situação problema, eu quero situação problema e o aluno vai resolver o problema ta; então é pra tentar igualar o nível de dificuldade das disciplinas, então muitas vezes eles ficam em DP em uma disciplina prática do que em uma disciplina teórica, isso não tem nada a ver. A idéia é (...) o meu objetivo é levar o aluno à compreensão, mas eu sentia que na Universidade D, existia um pouco mais de respeito às disciplinas teóricas porque elas eram mais difíceis, não é que elas eram mais difíceis, é que nós já estávamos mais avançados e avaliávamos processualmente, então o aluno vai chegar lá lógico. Eu devolvia a prova, ‘faz de novo, não chegou na compreensão que eu quero, faz de novo’, e aí ele tinha que fazer de novo, a refacção. Poxa! Em dois mil, quando eu fui pra Universidade F estudar se falava nisso, em avaliação processual, em refação de prova e, eu já fazia isso na Universidade D; então eu percebo assim, que os professores que davam as disciplinas essencialmente teóricas, ainda estavam muito presos e amarrados naquela visão de que prova, é uma prova onde você avalia um conteúdo em um dia e tem que fazer de um jeito bem difícil para o aluno não compreender, quando eu fazia o contrário, eu quero que o aluno compreenda o que eu to perguntando.

P – Bom para fechar uma curiosidade mais pessoal. Para docência de Ginástica Artística, na graduação, porque para eu dar aula em uma Universidade, ou eu fiz uma especialização de Ginástica Artística, que no Brasil tem um pingado, do que eu já observei, do que eu já estudei, já faz muito tempo que não tem especialização em Ginástica Artística (...)

D.4 – Nós criamos uma na Universidade D, eu criei uma especialização em Ginástica, você começava com básico depois escolhia GA, GR ou GG.

P – É que hoje tem especialização em Ginástica Geral né.

D.4 – Hoje é só Geral por que a Josiane que ficou e ela ficou só com a Geral.

P – É, então, eu tenho que fazer um Mestrado também, para dar aula na graduação e só na Universidade D tem disciplina de Ginástica no Mestrado, no Doutorado (...), então como, como né, como a gente vai pensar em formar novos docentes né.

D.4 – Quem dá? O Carlos?

P – O Fábio.

D.4 – Ah, o Fabinho!

P – (...) então como, como a gente vai pensar em formar novos docentes?

D.4 – Infelizmente nós carecemos disso. A gente abre cursos de preparação, por exemplo, cursos de especialização em treinamento esportivo, nós abrimos um curso aqui e tivemos poucos alunos fazendo, só que esse curso preparava o profissional para a Ginástica também né, tinha uma grande parte geral e uma parte específica que a Kátia

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dava de Ginástica Artística. O que eu vejo é que pra você ser uma especialista da área da Ginástica, você tem que participar do mundo da Ginástica aí fora, você tem que participar de federações, de cursos de arbitragem né, que era o que eu fazia na época, antes de ir pra Universidade D eu fazia isso, eu também era técnica, eu também trabalhava com arbitragem, era arbitra internacional, eu também estudei bastante isso, atuei em federação e tal, como o Rafael, o Alecar, a Maria, como todo mundo, mas chega um momento em que se você está no espaço acadêmico você tem que se dedicar ao espaço acadêmico, você tem que publicar, você tem (...) hoje, aqui, por exemplo, a Kátia ela é professora da área de Ginástica Artística (...) e ela ta tanto no treinamento né, ela é responsável pela equipe do Clube F e é arbitra internacional e, ao mesmo tempo ela trabalha na instituição acadêmica, ela divide as duas coisas; ela tem publicado, ta terminando o doutorado dela, mas vai chegar uma hora que ela vai pender ou pra lá ou pra cá, se não fizer isso dificilmente você se especializa pra ser uma boa docente né, não que eu ache necessário você conhecer, mas se atualizar porque, por exemplo, eu já não sei mais, eu dou Ginástica Artística e eu não sei mais o código de pontuação né, porque muda muito, então eu não sei mais o que que eu faço? Eu convido, eu levo pessoas e eu falo para os alunos, ‘gente eu não sei mais isso, mas eu vou trazer alguém que sabe pra vocês falarem, ou falar pra vocês saberem’, aí eu convido a Ká, eu convido outro arbitro, pra ir falar de Ginástica Artística, de arbitragem, de questões de código. Então eu acho assim, da pra ser, dá pra ser uma professora sem estar nesse mundo? Dá, eu acho que eu sou uma boa professora de Ginástica Artística porque eu consegui ensinar Ginástica Artística para os meus alunos, eles saem sabendo, alguma coisa eles saem sabendo, porque eu vejo que transforma, que modifica, que eles começam a olhar a Ginástica com um outro olhar. Ta bom, então por conta disso se há uma transformação no conhecimento deles eu acho que eu atinjo meu objetivo como professora, mas, eu não estou hoje mais especializada em Ginástica Artística, pra acompanhar o nível (...) eu quero fazer pesquisas com isso, eu não tenho dificuldade em ler, em traduzir as questões da Ginástica, mas eu não quero mais ficar estudando a técnica do ‘tsukahara’. Ah, o ‘tsukahara’ não existe mais (risos), de qualquer exercício aí.

P – (Risos) Pode ser o ’dos santos’, que é mais moderno (risos).

D.4 – (Risos) É o ‘dos santos’ é mais recente! (risos). Não quero, entendeu, ficar estudando mais isso, da para ser professora assim? Dá, mas eu tenho que ter consciência disso e trazer pessoas que saibam pra falar para os meus alunos, para atualiza-los.

P – É isso, eu acho que já está muito bom por enquanto (risos). Obrigado!

D.4 – (Risos) Falei tudo o que você queria saber e mais um pouco né (risos), mas de qualquer forma agradeço a participação.

P – Eu é que agradeço.

Docente 5 – Setembro/2008 – 0h38min

P – A primeira pergunta é sobre os conhecimentos de Ginástica Artística a serem ensinados, quais seriam imprescindíveis para cursos de licenciatura?

D.5 – Aham (...) a Ginástica Artística é uma atividade física de base, formativa e educativa, então nós pensamos em desenvolver a Ginástica em dois grupos de atividades, de um lado a atividade física, a importância da atividade física e do outro

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lado o esporte. Então, talvez o preconceito que existe em relação a nossa atividade é que as pessoas não conhecem a importância e as contribuições que a Ginástica possa trazer exatamente do desenvolvimento e, que os elementos específicos da Ginástica vêm da própria evolução do movimento né. Então eu sempre coloco assim, como exemplo né, a criança é colocada de bruços, ela apóia, começa a se locomover, rasteja, tira o tronco, engatinha e, a partir daí é a criança e a necessidade de movimento! Então qual é a necessidade de movimento da criança? É pular, pendurar, girar o corpo, então se a gente pensar em grupos de (...) estruturais de movimentos e posicionamentos e o quanto a Ginástica pode proporcionar em relação a vivências e experiências motoras, é (...) os grupos estruturais que a gente pode simplificar apenas em (...) posições invertidas, rotações, e saltos, e depois balançar em apoio, balançar em suspensão, basicamente isso é o que engloba toda a Ginástica, e isso vai de encontro à criança e a necessidade de movimento e, às oportunidades de experiências motoras que vão só enriquecer o acervo motor de uma criança né, e, não visualizar a Ginástica como um esporte, apenas como esporte! O que fica na mente das pessoas é o esporte, esporte de alto nível, então se a gente pensar nos gestos do esporte de alto nível, de qualquer outro tipo de esporte ou atividade física, é o mesmo né? Então tem a natação, o nado crawl, o gesto é aquele, borboleta é aquele, no entanto, na Ginástica não né!? Os primeiros gestos, quais são? É a própria natureza envolvida na atividade física e na formação.

P – Os gestos básicos devem ser ensinados?

D.5 – Os gestos básicos! Quer dizer, se a gente pensar em rotações, posições invertidas, então qual é o início? Então, no momento que a criança vai no parquinho e (...) toma posição de suspensão, quer dizer, se pendura, passa as pernas entre os braços, faz uma rotação pra trás aí volta faz uma rotação pra frente, ou apóia e faz uma rotação pra frente, qualquer coisa nesse sentido. Esse gesto será o mesmo futuramente de um mortal né, só que quando a gente visualiza o esporte de alto nível são rotações, combinações de rotações nos vários eixos né, então o que a gente visualiza? Que ta totalmente fora do nosso alcance, enquanto o nado crawl é aquele que a gente aprende no be-a-bá e vai continuar até p Phelps nadando e, é o mesmo gesto né. Então eu acho que as pessoas se assustam em relação aos gestos e, aí pensam que a Ginástica está fora do alcance do currículo escolar né, então vamos pensar na atividade física formativa e educativa e, nas vivências e experiências motoras que ela proporciona, na importância da Ginástica como uma preparação física básica, como uma preparação física específica (...)

P – E quando você dava aula você dividia, separava para os alunos os conhecimentos práticos, ou mais técnicos dos conhecimentos pedagógicos da Ginástica?

D.5 – Sem dúvida! Porque a parte do esporte é um (...) dentro da teoria é apenas um conhecimento geral, então você como uma professora de Educação Física, um profissional da área, pode conhecer o esporte. Então, eu assisti a Olimpíada, como é que funciona? Nunca há detalhes, porque não é como medir ou marcar tempo né. Todo esporte artístico tem muita coisa altamente complexa, mas pelo menos você conhecer como funciona o esporte né, então isso na teoria é só uma aula de conhecimento geral né, do esporte, mas o que se enfoca na Educação Física, principalmente num curso de licenciatura é a importância da Ginástica como atividade física de base.

P – E como que você fazia suas aulas, como eram formatadas suas aulas?

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D.5 – As aulas então, elas sempre iniciam com essa primeira parte da natureza, então se nós estamos visualizando o que caracteriza a Ginástica, quando a gente pensa qual é o símbolo quando pensamos em Ginástica Artística? Vem logo em mente alguém na posição invertida, então uma parada de mãos é o símbolo da Ginástica, aí do outro lado você pensa em alguém girando o corpo, são as rotações né, logo você imagina isso. Então como é que nós pensamos em trabalhar? A princípio nós vamos levar a criança e a necessidade de movimento, vamos brincar de quadrupedia, por que, o que que é isso? A quadrupedia né, como eu disse anteriormente, que é (...) vem do próprio desenvolvimento do movimento e da necessidade de movimento, são os primeiros processos pedagógicos né, pra (...) as posições invertidas. Então a gente tem que começar do be-a-bá, as vivências de rotações, como girar o corpo, então como eu disse anteriormente, se a criança vai no parquinho e faz essas rotações então é por aí, nós vamos pensar em utilizar o nosso ambiente, os nossos aparelhos como uma (...) como um parque de diversões onde a gente utiliza o nosso corpo e, aí a partir daí mostrar que a Ginástica, o be-a-bá da Ginástica é importante, o be-a-bá da Ginástica é que vai levar futuramente ao que nós chamamos Ginástica Artística, que é a busca da perfeição, precisão né. Então a gente faz um trabalho primeiro de vivências, pensando na natureza e o movimento, na alegria e o movimento, na superação e, ao mesmo tempo fazendo um trabalho de preparação física que vai desenvolver a consciência corporal. Então o problema da Ginástica é outro (...) eu digo aos alunos ‘perna pra frente, perna pra trás’, tudo bem, todo mundo eleva, mas a Ginástica ela educa a você entender e pensar em cada parte do seu corpo, porque através da consciência corporal, a orientação do corpo no espaço que a Ginástica proporciona, é que você vai conseguindo desenvolver sua consciência corporal e aí a partir daí você pode evoluir né; se você simplesmente faz e se você entende o que faz, como é que você vai evoluir apenas fazendo? Girando? ‘Bom, girei. Girei e caí de pé!’. Vamos entender cada parte do corpo e, isso é essa preparação física específica que dá essa consciência.

P – E aos seus alunos, você dava alguma vivência, assim (...) prática, como que acontecia essa vivência?

D.5 – Sim, sempre! Sempre, porque as aulas são sempre práticas e teóricas, então a gente vai praticando e os alunos vão entendendo, porque se você não vivencia, fica no blá, blá, blá, na teoria, as coisas passam assim (...) é muito importante que você tenha essa vivência; ninguém vai exigir que você seja (...) tenha uma alta performance, mas pelo menos que vocês tenham essa vivência e saibam (...) entendam e saibam corrigir, ensinar e corrigir, quer dizer, se você não tem nenhuma vivência, por exemplo, se você nunca entrou na água, como é que você vai dar uma aula de natação? Você tem que ter vivência, a vivência do movimento, se você nunca pegou numa bola, como é que você vai dar uma aula né, então essa vivência é muito importante; então, as aulas são práticas e teóricas explicando no momento da prática, vai vivenciando e vai entendendo o porquê e, como ensinar e, como corrigir.

P – E sua metodologia de trabalho na graduação possuía algum diferencial? Você julga ela com algum diferencial?

D.5 – Diferencial em que sentido?

P – No sentido atrativo (...) o que o seu método de ensino, seu jeito de dar aula diferenciava, por exemplo, de quem ensinou Ginástica a você?

D.5 – Bom, eu nem tive aula de Ginástica na faculdade. Na minha época não tinha essa disciplina, então eu me formei e fui estudar no País F, fui fazer um curso de

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especialização no País F, porque não tinha essa disciplina na minha escola naquela época, mas minha metodologia para ensinar, aprendi muito mais na prática, tentando né.

P – E como você observa a Ginástica Artística hoje, dentro e fora do contexto universitário?

D.5 – Olha eu não conheço muitas escolas, mas todas as escolas que eu conheço, assim, conheço o trabalho né, estão desenvolvendo e as pessoas estão conseguindo entender a Ginástica como uma outra opção, uma atividade importante e necessária, tanto é que as escolas estão trabalhando com Ginástica, quer dizer, os professores tem que ter uma formação, tem que ter uma capacitação pra poder desenvolver (...) agora mesmo a prefeitura ta fazendo uma programação e, é bem um be-a-bázinho mesmo, tem até aí o programa pra você ver [docente mostra um livro]; e que a gente fez um trabalho que as escolas da prefeitura vão fazer um festival né, e são muitas. Eu fui dar uma palestra e tinha mais de duzentos professores da rede municipal presentes ali, depois nós demos um curso de capacitação, então não são só as escolas particulares; porque a Ginástica, a gente pensa (...) a Ginástica Artística esporte é uma coisa que está fora de alcance, esses materiais sofisticados, assim a gente não consegue trabalhar, mas se você pensar na natureza, da onde vieram esses materiais e, ligar na natureza tudo é possível, através da criatividade e da boa vontade, qualquer espaço você pode trabalhar com Ginástica, e é exatamente esse conceito que nós estamos tentando difundir, mas fora isso tem muitas escolas que fazem até festivais, competições escolares, então dentro da área da escola a Ginástica ta tomando um rumo de grande destaque.

P – E você tem conhecimento se tem essa evolução dentro da graduação, dentro da Universidade?

D.5 – Então, dentro da graduação aí depende da filosofia de cada escola né. Então as escolas que têm, eu conheço várias escolas que têm a disciplina e que dão uma grande ênfase, com professores especializados, porque eu conheço vários professores que desenvolvem a disciplina em várias escolas particulares, até na Universidade A mesmo que a Rosana era responsável, agora tem a (...) acho que é a Joyce, tem grupo de estudo sobre a Ginástica, então eles estão aí trabalhando né.

P – E nesse contexto mais competitivo, da evolução da modalidade no Brasil, como você vê a Ginástica?

D.5 – Da Ginástica esporte?

P – É, esporte!

D.5 – Olha, a Ginástica ela é até bastante praticada né; infelizmente uns mitos, preconceitos existem em torno da modalidade, porque a imprensa ela divulga só coisas negativas, que ta machucado, agora pensa bem que qualquer esporte de alto nível é agressivo, é a busca da superação de qualquer limite é o (...) né, é uma carga, quer dizer, uma sobrecarga sobrenatural, então claro que os atletas de alto nível têm problemas, porque quando se diz que esporte de alto nível não é saúde é verdade né (risos); é a superação de qualquer limite humano. E aí o que nós temos assim como preconceito é em relação ao crescimento, que as pessoas acham que a Ginástica prejudica o crescimento, ou que quem faz Ginástica encolhe, também isso é (...) bom, ninguém pensa no biótipo ideal pra cada atividade ou pra cada modalidade, então,

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esportes que têm peso aí tudo bem, mas os demais esportes, então vai me dizer que, nos que somos praticantes de Ginástica iríamos crescer se a gente tivesse jogado Basquete? Então, é claro que os menores se sobressaem porque se a gente pensar que a Ginástica de alto nível exige uma combinação de rotações e (...) então quanto mais rápido e mais girar o corpo é melhor, então é claro que um corpo menor é capaz de fazer isso com muito mais facilidade, então pode comparar uma bola pequena e uma bola grande, vamos arremessar e vamos pensar na quantidade de rotação e na velocidade de rotação, então a Ginástica de alto nível é isso, e a divulgação que tem em relação ao curso de licenciatura e a importância né como a gente estava dizendo anteriormente, essa Ginástica sim como atividade formativa e educativa, as pessoas não enxergam, só enxerga assim, ‘nossa a Ginástica é perigosa’, ‘fazer Ginástica? Imagina como é que vou fazer uma coisa dessa’, o que tem de positivo é que atualmente é que as pessoas curtem os esportes radicais coisas assim e tal, já ampliou-se um pouquinho mais as pessoas de buscarem a Ginástica. Mas em relação à competição que você perguntou, a Federação, a Confederação estão trabalhando em projetos de desenvolvimento; não sei se você ficou sabendo que a CBG fez um projeto e vários estádios montaram o trabalho, então a Ginástica ta indo né, ta caminhando; tivemos bons resultados, resultados que se devem ao profissionalismo, então as pessoas já estão fazendo com um período muito mais longo porque são profissionais, então, veja a Daiane já tem vinte e cinco, a Daniele vinte e quatro e seguem por que? Porque são profissionais e estão recebendo pra isso, o que antigamente se dizia que a ginasta que esta com dezesseis ou dezessete anos já esta velha né é porque tinha que pensar na escola e no futuro profissional, agora não né o próprio esporte, claro que para uma elite mínima né, minúscula infelizmente, o Brasil tem que formar e preparar muito mais centros de treinamento, que agora que começou, e esses centros de treinamentos são bem de iniciantes mesmo, que tem uma cartilha que hoje tem que seguir, mas os objetivos podem ser diferentes, na escola um objetivo de vivência, experiências motoras, agora neste caso, são centros específicos para treinamento de preparação e formação de atletas né, diferente! Não é simplesmente fazer a Ginástica, mas tem que fazer uma base muito bem feita porque qualquer tipo de trabalho da Ginástica como (...) digo é a busca da perfeição e precisão, então desde muito pequena tem que se trabalhar com a postura, correção postural, então a correção postural é que leva à técnica e à evolução.

P – Você falou a pouco que te chamaram para um curso para professor, como você vê a importância da Ginástica Artística na formação de professor?

D5 – Então, o difícil é que os professores estão totalmente sem base e sem orientação desse be-a-bá que nós estamos falando agora né, então é muito importante essa iniciativa da Secretaria Municipal da Educação; foi muito importante porque muitos professores estão participando e estão fazendo, iniciando a sua capacitação profissional porque a Ginástica, infelizmente a Educação Física, o profissional de Educação Física, a gente até não enxerga com bons olhos e, por exemplo, desde a minha época, quando eu fui fazer Educação Física, todo mundo na escola falou que ‘nossa quer ganhar dinheiro na moleza né?’, porque muitos professores e profissionais da Educação Física estão atuando ali na quadra a vista de qualquer um, são folgados mesmo né, dão uma bola e não fazem e, a Ginástica dá trabalho, porque você tem que estar ali o tempo todo, corrigindo e preparando e, não é assim, vai lá e você joga a bola e o outro aluno apita. Infelizmente uma grande parte dos profissionais são assim né, então a gente tem um conceito ruim perante a sociedade ou a Educação Física, a importância da Educação Física na escola é um pouco negada por falta dos profissionais né, então se os profissionais realmente trabalhassem ai (...)

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P – E a partir do que você ensinava na Graduação, seus alunos saiam capazes de ensinar Ginástica Artística na escola?

D.5 – Sim claro! Eu até fico muito feliz. Por muitas vezes, mesmo nesse curso, depois de tantos e tanto anos, encontrei tantos alunos, tantos ex-alunos que me agradeceram, que utilizaram muito das nossas (...) utilizaram e utilizam muito do que aprenderam durante o período de Graduação, então a gente fica muito feliz de saber que os alunos estão aplicando.

P – E o que você considera impeditivo da Ginástica Artística na escola?

D.5 – Não tem nada que empeça, o problema é o profissional ter vontade de trabalhar e desenvolver um trabalho né, esse é o problema do profissional, quantos profissionais estão se formando, saindo das escolas né, se tornando profissionais? E quantos desses profissionais realmente querem e gostariam de trabalhar realmente trabalhar e desenvolver um bom trabalho? Infelizmente os profissionais da Educação Física, tem também essa coisa de preconceito, eles não entenderem (...) a Ginástica como uma atividade física de base formativa, então eles vão achar que precisa de todos esses materiais oficiais né, falta de criatividade, de vontade de fazer alguma coisa para que as crianças tenham essa oportunidade de vivenciar né. Os profissionais precisam conhecer a importância e quais as contribuições, porque não é apenas um aspecto motor, porque a Ginástica é uma constante de enfrentar e conquistar, superar-se e o quanto isso é importante e necessário pra formação de uma pessoa?

P – E como se encontrava a Ginástica Artística no curso que você lecionava antes de você sair da USP, como que se encontrava? Era semestral (...).

D.5 – Era anual. Dois semestres, só de Ginástica Artística, que na época chamava Disciplina N, eram dois semestres, um ano. O curso era sempre anual naquela época, e foi em 1990 que eu saí, e hoje muitas escolas estão adotando este sistema ainda anual, mas a grande maioria esta passando semestral né, então é uma grande preocupação porque você pensa em como você vai desenvolver um bom trabalho em apenas um semestre né, porque você pensa no semestre, quantos meses você tem, quantas aulas você tem durante o semestre?

P – Dezesseis?

D.5 – Dezesseis? Se você contar de fato você tem menos de dez, porque se você pensar que tem que fazer avaliação nesse período, tem avaliação, tem muitas escolas que tem ainda a recuperação, praticamente você passa um mês e meio em prova, então são pouquíssimas as aulas né, porque muitas vezes são aulas duplas normalmente.

P – Eu pensei assim, uma aula por semana, quatro meses.

D.5 – Eu não sei, eu não entendi bem essa mudança, por que um semestre? Porque o que que vai acontecer? Nós vamos formar professores com muito menos conteúdo de conhecimento né com um semestre de cada disciplina e, nós não somos favoráveis a isso e estamos ainda bastantes assustados com essa historia de um semestre, e como que vai ser aqui, porque ta mudando né, cada escola ta tomando um rumo diferenciado.

P – É, algumas já estão com o curso em três anos (...).

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D.5 – É porque alguma são três anos de licenciatura, três anos de bacharelado ou tem algumas que lidam com três anos e faz um especifico, tem outras que usam três e três mesmo, não sei como está agora nas escolas públicas, está bastante difícil agora nesse momento que nós estamos pagando essa transição estamos discutindo e preocupados né, o tanto de aulas que nós temos para desenvolver um conteúdo tão amplo e tão importante.

P – Você auxiliava na montagem do programa da disciplina.

D.5 – O programa da disciplina era totalmente feito por nós mesmos, cada professor fazia da sua disciplina.

P – Vocês tinham completa autonomia para selecionar conteúdo de aulas, livros, referências, então? E tinha alguma relação de poder entre disciplinas mais teóricas e de caráter mais prático como a Ginástica?

D.5 – Olha eu sai da Universidade A e foi bem numa época em que estava iniciando essa transição, meus próprios amigos saíram daqui e foram fazer Mestrado e Doutorado e viraram filósofos da Educação Física (risos). Então a discussão era o que é a Educação Física? Uma ciência, uma disciplina acadêmica, uma filosofia e ai começaram a desvalorizar as atividades físicas em relação ao que é esporte e, esporte não faz parte da Educação Física. Então foi nessa época que, realmente, porque fazer isso? As aulas, pra que fazer isso, fazer essas coisas? E as pessoas estão bastante confusas e foi exatamente isso que me fez sair, eu tive que sair, então saí da escola exatamente por isso; então estou trabalhando até hoje em escola particular porque desvalorizaram a gente, eu acho até que as coisas mudaram até na própria (...) lá mesmo né, teve muitos problemas em relação a (...) alguns professores tiveram muitos problemas, essa divisão de três anos de bacharelado, licenciatura que veio desde aquele inicio dos anos (...) no final dos anos 80 que agora que as escolas particulares estão adotando, ta todo mundo um tanto quanto confuso, que este ano aqui, no inicio do ano, a hora que recebemos a visita do MEC, eles mesmos (...) olha, são do MEC, e veio fazer a avaliação das escolas (...) ninguém fala né mas ele próprio é contra a esse sistema que esta dividindo (...) três anos de licenciatura é totalmente (...) um curso totalmente separado e o anterior de licenciatura plena é muito mais complexo e o profissional pode podia desenvolver, ele se formava né era apto a em qualquer área e depois claro que cada um vai se especializar né, então dessa forma né, você fica muito restrito e alguns alunos até bastante prejudicados porque vamos supor, faz a licenciatura em três anos e só pode dar aula em escola? Aí vai fazer um bacharelado e tem que cursar mais, sei lá, dois anos porque tem que fazer as adaptações e tal né, então é isso ai, isso ta criando uma (...) acho que as pessoas elas não conseguiram chegar num consenso (...)

P – E como que acontecia a sua avaliação?

D.5 – Avaliação é sempre, trabalhos (...) é utilizar a atividade da Ginástica, os movimentos no ambiente, os aparelhos e fazendo avaliações individuais, porque se as escolas as vezes preparam festivais e até competições né, então as pessoas tem que ter uma noção de como monta, então a gente trabalha bem na iniciação, sempre com series obrigatórias e depois é que monta as séries livres né pra desenvolver criatividade, isso na parte individual e depois a gente utiliza a Ginástica e os movimentos como apresentações, então nós fazemos com que os alunos desenvolvam a criatividade utilizando tudo que se refere a Ginástica em relação a movimento e o ambiente e elaborando apresentações, porque quando chegam nas escolas é da responsabilidade do professor, que ele saiba fazer as apresentações né, ai chega Dia da Mães, Dia dos

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Pais, encerramento, quem que tem que fazer? A gente orienta nesse sentido, então a avaliação é exatamente isso, trabalhos individuais e trabalhos em grupos, só que na parte prática né.

P – E de teoria o que é que você trabalhava?

D.5 – Da parte teórica a gente desenvolve a parte pedagógica e essa orientação do que que é a Ginástica Artística em relação a atividade física, as contribuições que a Ginástica pode proporcionar ou a importância e, depois em relação as ações motoras da Ginástica né, a importância pra que as pessoas consigam entender e um pouquinho de orientação e noção do que é o esporte e a Ginástica. E você mostra um pouquinho de código, eu mostrava o código de pontuação, mostra praticamente assim, eles tem que ter uma noção, por exemplo, agora teve as Olimpíadas, ‘nossa quantos dias?’, ‘O que que é isso?’, ‘Quantas medalhas?’. Então as etapas, os objetivos de cada etapa de competição, ‘nossa quanto árbitro’, ‘como será que sai essa nota?’, então é só sobre isso, e ai em relação às provas é só ter uma característica, como que é composta uma série, quais são as provas femininas e quais são as provas masculinas, uma coisa assim que acaba sendo bastante superficial, mas apenas ilustrar um conhecimento, pelo menos as pessoas assistiram as Olimpíadas e sabiam o que que estavam vendo, o que que estava em disputa, como é que saiam aquelas notas, então só pra (...) esse tipo de noção, que nem da tempo né.

P – Se você pudesse melhorar a Ginástica Artística no curso de licenciatura como que você iria contextualizá-la para formar um professor mais capacitado?

D.5 – Então porque o importante dentro de uma escola é apenas um trabalho formativo, então nós temos como objetivo entender, fazer com que os alunos entendam a Ginástica como atividade física, então se for pra criança em nível escolar é formativo e educativo como nós dissemos, mas também como opção de uma atividade física que ta ao alcance de todos em relação a saúde, bem estar, porque não né? Utilizar a Ginástica, porque é como qualquer tipo de atividade física, além do que tem um ponto positivo em relação a superação, você trabalha o corpo e você se realiza, porque você vai conseguir fazer coisas que você nunca pensou que fosse, então por isso que a gente fala, é uma constante de enfrentar e conquistar, superar e obter sucesso. Então isso é uma coisa muito importante pro bem estar, não é simplesmente ta lá fazendo vinte vezes disso, trinta daquilo e não sei o que, não é assim não, não aprenderam. Você pensa que seu limite é esse, não, você tem muita possibilidade, então aqui mesmo, nós já tivemos alunos com mais de setenta anos praticando Ginástica e se divertindo, porque a gente pode até pensar que esses elementos específicos são manifestações de alegria, quando você vê um jogador feliz, ou quando você fica feliz, da vontade de ficar de ponta cabeça, vontade de virar o corpo e os mais habilidosos fazem mortal né e os menos habilidosos fazem uma estrela, da vontade de virar de ponta cabeça e valeu. Então, nesse sentido, a gente teria que dar essa orientação da Ginástica, licenciatura é só a parte formativa e educativa, mas se for num curso de Educação Física ou licenciatura plena ou bacharelado, você tem que dar essa noção, que Ginástica esta ao alcance de todos, a preparação física, por exemplo, a Marcela. A Marcela além de ter sido ginasta, por isso que rapidamente se destacou, várias ginastas estão indo pro salto com vara porque a Ginástica é que deu formação, e treinam como preparação física especifica para evoluir pra desenvolver a modalidade através da Ginástica, então um pessoal vem aqui todo dia, todo sábado pratica, faz os elementos específicos da Ginástica como preparação física porque o gesto ali, além do salto, além da força, flexibilidade, orientação de corpo-espaço, a consciência corporal que adquiriu, o movimento que é feito e a preparação vem através do giro gigante. Então é uma

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preparação física para outras modalidades esportivas, pra outras atividades, então o pessoal das lutas, seja da Capoeira, do Circo, Le Parkur, não sei o que, eles fazem a Ginástica como uma preparação física, porque a Ginástica é técnica, se você não faz tecnicamente você não evolui, então o pessoal que seja da Capoeira, do Circo eles fazem (risos), eles giram, mas não passam disso, porque se eles não aperfeiçoarem a técnica eles não vão evoluir, então deste lado até do lado esporte à iniciação esportiva por que? Porque as escolas trabalham com festivais e competições escolares, então são regras adaptadas, até aí é interessante e importante no curso de Educação Física.

P – E você, nesse momento, você esta vivenciando vários aspectos da Ginástica. Você trabalha com graduação ainda, você tem o auto rendimento aqui, tem também a arbitragem, tem o senhor de oitenta anos, que é mais uma atividade lúdica, e como que você consegue lidar com tudo? Por que são diferentes formas de Ginástica, né?

D.5 – É! Mas se eu to aqui divulgando e orientando os alunos (...) a gente coloca lá Ginástica Artística, subdividir em dois grupos de atividade, de um lado atividade física do outro lado esporte, se eu mesma to enfocando isso, trabalhar com isso é simples né, porque a cada (...) é dar um enfoque diferenciado pra cada objetivo, então é assim, o que é importante na Ginástica, ela é muito ampla não é só aquele esporte lindo e maravilhoso da Olimpíada, a Ginástica é ampla, aí nós temos que divulgar, e o papel da Educação Física, da escola de Educação Física é exatamente dar esse conhecimento, dessa amplitude da Ginástica, então nosso papel responsável por essa disciplina é passar esse conhecimento para os alunos, é isso.

P – Bom, eu estou satisfeita por enquanto, foi rapidinho né? (risos)

D.5 – (Risos) Foi sim!

P – Então, eu agradeço imensamente sua participação.

Docente 6 – Setembro/2008 – 0h21min

P – Então primeiro, sobre os conhecimentos da Ginástica, quais você julga imprescindíveis para o ensino da Ginástica Artística na licenciatura?

D.6 – Bom, para a licenciatura, no caso só o ensino da Ginástica, então eu acho que é saber todo o procedimento normal da Ginástica dentro das aulas, o normal em primeiro lugar o professor tem que saber, e depois para transmitir para o aluno, para que o aluno saiba, é a segurança, a proteção, os elementos básicos ta, de como estar ensinando aquilo, então isso ele tem que saber, como ensinar e como proteger para os alunos, só que o professor (...) eu entendo que o professor também tenha que ter o conhecimento específico geral da Ginástica, não só o que é usado para a licenciatura.

P – E qual seria esse conhecimento específico?

D.6 – Os conhecimentos técnicos, os elementos técnicos mesmo. Porque fica muito difícil um professor trabalhar só num curso de licenciatura com o ensino da Ginástica se o professor não sabe a técnica, normas, regras da própria Ginástica e isso eu acho que em qualquer outra modalidade.

P – E durante o seu trabalho, quando você está dando aula, você diferencia para os alunos conhecimentos técnicos dos conhecimentos pedagógicos, para eles poderem trabalhar isso na escola?

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D.6 – Sim, sim! Apesar de não constar, por ser aqui um curso de licenciatura, ele não consta. O curso de licenciatura vai trabalhar com o ensino da Ginástica, mas a gente sempre faz uma pausa, até quando na escola eu posso trabalhar, o que eu devo trabalhar e o que eu não devo trabalhar na escola, mesmo por que tem todas as aparelhagens e a escola nunca tem.

P – E até onde você vai com eles, assim elementos básicos (...) até onde você vai com os alunos na graduação?

D.6 – Ta, eu sigo uma seqüência do simples até o mais complexo, mas o mais complexo que eu falo é até os mortais simples, a gente não trabalha com duplo, com nada, é só o mortalzinho; vai desde o rolamento, as rotações, as posições invertidas, as rotações todas elas e aí vai seguindo a estrela, rodante, até chegar no mortal simples para frente e para traz, só até aí.

P – E os alunos vivenciam esses elementos?

D.6 – Sim!

P – Até onde eles têm que (...)

D.6 – Aí depende de cada aluno. Eu acho que quando você trabalha com a Ginástica num curso de licenciatura, a gente tem que atender um pouquinho o aluno, a necessidade dele, então aqui eu trabalho assim, eu tenho um programa a cumprir ta, eles vão aprender a ensinar Ginástica, eu não to ensinando eles a fazerem Ginástica, não to ensinando eles a praticar, mas o que a gente nota é uma realização muito pessoal de cada aluno; porque quando você vai ensinar todos os procedimentos pra sei ensinar, por exemplo, um mortal, a maior realização deles é quando eles aprendem a fazer, então você percebe que eles querem aprender a fazer e esses que aprendem também a execução são os que mais (...) que a gente vê até através de avaliação ou nos outros trabalhos que a gente faz, é o desempenho deles para ensinar; eles conhecem o movimento, eles fazem o movimento, mas não é uma exigência, só aqueles que querem a gente até fica um pouquinho a mais só para ensinar o movimento a eles e a execução também; mas até mortal, isso em todos os aparelhos, não só no solo, mas em todos os aparelhos.

P – E como que é a sua seqüência de aulas, como que é a parte teórica, a parte prática, como que acontecem suas aulas?

D.6 – Ta, inicialmente é aquela parte, geralmente os alunos não gostam, que é o referencial teórico, justamente que você entra com o histórico, da onde veio, da onde surgiu, a história dos aparelhos, tudo que tem na literatura. Aí depois, que nós trabalhamos já na seqüência, alguma coisa básica do movimento do corpo, os rolamentos simples, o que o corpo pode fazer, o que ele não pode e como que eu vou ensinar a criança a trabalhar com o próprio corpo para poder aprender, para poder ensinar esses elementos da Ginástica. Aí depois a gente segue uma seqüência pedagógica de aprendizagem, eu ensino para eles porque o aluno precisa aprender primeiro todos os rolamentos; eu não posso ensinar uma estrela, um rodante, se eu não ensinei o dois apoios. Então a gente vem naquela seqüência pedagógica mesmo de aprendizagem, é o rolamento, os fliks, dois apoios, as posições invertidas ta, e assim vai.

P – Você considera algum diferencial na sua metodologia de trabalho, você tem conhecimento de outros professores, considera no seu trabalho algum diferencial?

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D.6 – Olha, eu já fiz algumas experiências em termos de aula, você trabalhar em uma sala de aula sem ser dentro de um ginásio, mostrando, explicando, mesmo que com imagem, com multimídia, imagem da Ginástica, você ensinando tudo o que você tem que fazer, mas o que eu achei melhor e, eu acho que aí talvez esteja um diferencial, é quando nós passamos a usar junto, cada assunto a ser ensinado, dentro do próprio ginásio, com multimídia ao lado, com uma tela ou qualquer coisa, então você trabalha junto a teoria e a pratica, passo a teoria e já na seqüência a prática ta, de como ensinar aquilo.

P – Você consegue por multimídia aqui quando você quiser?

D.6 – Sim, normalmente tem multimídia e, eu consegui inclusive, colocar um telão lá, como na sala de aula eu tenho telão, eu tenho retro, eu tenho caixa de som, eu tenho até a filmadora, qualquer coisa a gente pode colocar lá, eu só não consegui colocar ainda a vídeo conferencia. Até isso a gente conseguiu instalar aqui no ginásio, uma vídeo conferência, mas por problemas técnicos eu não consegui usar ainda, porque aí eu fiz os convênios com a própria Curitiba, para gente trabalhar e fazer simultâneo né, o pessoal de lá e, eu não consegui isso.

P – E o que você mostra, o que você apresenta para os alunos nessas aulas multimídia?

D.6 – A interação! Mais crianças, nunca um adulto.

P – Não auto nível!

D.6 – Não auto nível, mas a iniciação e com crianças.

P – E você já conseguiu assistir aulas lá de Curitiba por essa tecnologia?

D.6 – Não porque aqui no Ginásio eu não consegui, por um problema técnico da fiação que instalaram lá e não deu certo.

P – Não, mas você. Você já conseguiu ter acesso fora do ginásio, fora daqui?

D.6 – Sim, sim, mas não aqui dentro, não aqui dentro do Campus.

P – E como você observa a Ginástica Artística hoje dentro e fora do contexto acadêmico?

D.6 – Esse contexto acadêmico ele tem muita limitação né, ele é um pouco limitado, até em função da carga horária né. Você não consegue, mesmo eu acho que dentro da licenciatura você não consegue, porque esse mundo da Ginástica, ele é muito grande, então você não consegue transmitir todos os conhecimento em um semestre letivo com sessenta horas aulas. Então você se apega naquilo que é mais importante para aquele aluno que está fazendo a aula, ele na escola, ele consegue desenvolver o mínimo necessário, dentro da escola.

P – E fora?

D.6 – Não, fora da graduação ele vai ter que estudar um pouquinho mais, porque nós não temos tempo para desenvolver tudo o que tem na Ginástica né.

P – E como que você observa a evolução da Ginástica Artística até hoje, depois de ser atleta, praticante?

D.6 – Olha, a gente pode falar que essa evolução foi assim que nem um estalo né, foi de estalo (risos). Ela ficou muito tempo muito humilde, sem (...) até uma divulgação que

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não tinha, não se falava em Ginástica, as pessoas não conheciam a Ginástica [Entrevista interrompida para o docente atender a porta].

P – Bom, você estava falando que era humilde, que era ruim o nível de divulgação da Ginástica (...)

D.6 – Sim, aí depois eu acho que quando começou lá no próprio Clube G né, começou a se despontar, aí sim a mídia começou a ir em cima, e outra, em função dos próprios patrocinadores; os próprios patrocinadores, da Daniele, que deu essa explosão né, foi da Daniela e do Diego, a explosão da mídia, tinha toda aquela expectativa, e depois a Daiane, aí sim, aí ela tornou-se conhecida como é hoje, porque ela não era! Antigamente as pessoas não conheciam, não sabiam o que que existia na Ginástica, como que era essa Ginástica, hoje você já percebe que as pessoas já conhecem um pouco da Ginástica, como você conhece (...) que normalmente as pessoas conheciam o Futebol, conheciam o Vôlei, olha tem tantos jogadores é assim, hoje eles conhece não tudo, o expectador ele não conhece tudo, por causa desse bum, mas ele tem uma noção geral do que é aquela Ginástica, uma noção humilde, mas já tem.

P – E como você vê o papel ou a importância da Ginástica Artística na formação de professores?

D.6 – Olha, quando você está numa escola e você usa da Ginástica para transmitir alguma coisa, você consegue muito mais do que numa aula normal, trabalhando com um jogo, ou com alguma outra atividade lúdica, mesmo você trabalhando com a Ginástica em termos lúdicos; porque a Ginástica eu considero como (...) que é completo, você trabalha com todos os seguimentos, tudo que você precisa trabalhar com a criança, e o fator mais importante aí, que eu acho que é o benéfico da Ginástica, é a motivação natural que ela traz para que está praticando. Qualquer criança ou adulto mesmo, ele que que ele faz? Ele adora Ginástica, mesmo sem conhecer, mesmo sem saber fazer e, a criança, quando você pega as menores, elas são motivadas porque é novo ta, é desafiante, e porque é perigoso para ela. Então isso são características que é típico da criança, então a criança vai, ela se desenvolve bem e você consegue desenvolver tudo o que você quer o cognitivo, o social, o motor, através desses elementos.

P – E mesmo com as limitações que você já relatou de pouco tempo no semestre, você acha que a partir do que você leciona aqui os alunos vão estar aptos para aplicar ela na escola?

D.6 – Com certeza! Aquele aluno que freqüenta as aulas, ele se interessa pelas aulas, eu fico tranqüila e de olhos fechados, eu sei que ele vai trabalhar bem com essa modalidade na escola, com certeza!

P – E o que seria um impeditivo da Ginástica Artística na escola?

D.6 – A própria segurança do professor. Se o professor não estiver seguro, porque ela é taxada, taxada só, vamos falar assim, a Ginástica que ela é perigosa. Ta, mas se o professor que está la, ele conhece, ele sabe o que ele está fazendo, ele vai ter uma maneira diferenciada de transmitir para o seu aluno, ele não vai ter aquele receio de ensinar. Então a confiança do professor é o mais importante naquilo que ele está passando, transmitindo para a criança.

P – E como que fica a questão do material, por exemplo, numa escola pública que tem pouco, isso seria um impedimento?

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D.6 – Não, não! Porque se você vai trabalhar com a Ginástica na escola, o que eu preciso para trabalhar com essa Ginástica? Qual é a escola estadual que não tem um colchão, um plinton e um trampolim, mesmo que escondido? Porque o que acontece (...) eu já fiz a pesquisa sobre isso. Todas as escolas na região de Cidade J e jurisdicionadas por Cidade J, foram visitadas todas, eu visitei todas. O que acontece? Eles têm colchão, eles têm plinton, eles têm trampolim, e ás vezes até outros aparelhos (risos), só que a direção da escola, ou o professor ele não usa, ou porque não sabe usar ou porque tem medo de usar ta. Então todas as escolas, mesmo escondidinho, pode procurar lá que tem e, tem material, foi encontrado material, que nunca foi usado.

P – Interessante! E, como se encontra a disciplina, atualmente, aqui no currículo da Universidade?

D.6 – Atualmente ta se trabalhando com a própria Ginástica na escola mesmo, direcionada só para escola. Então, hoje você tem que se ater, como um professor de um curso de licenciatura que tem uma disciplina direcionada só para a escola, são aqueles elementos (...) é tudo o que você vai trabalhar, mas é na escola, esquece a Ginástica competição, esquece outras coisas da Ginástica né, é a Ginástica formativa mesmo.

P – E é só um semestre?

D.6 – Só um semestre!

P – Não tem uma disciplina de complementação, aprofundamento, nada?

D.6 – Não, não tem. Se tivesse o aprofundamento eu teria que propor a disciplina, como optativa, aí poderia, mas eu não fiz isso.

P – E você auxilia na montagem do programa da disciplina?

D.6 – O programa é o professor que faz.

P – Você tem total liberdade para montar esse programa?

D.6 – Tenho! Todo semestre você pode fazer alteração do conteúdo, das referências e seguindo a ementa né; você seguindo a ementa da disciplina, a programação você pode alterar todo semestre.

P – Quem propõe a Ementa, você também?

D.6 – O professor e, depois junto com o conselho, conselho de curso, é analisado.

P – Você sempre teve toda a liberdade para fazer alterações que quis?

D.6 – Sim, sim, sem nenhum problema

P – E a avaliação, como você realiza a avaliação dos alunos?

D.6 – A avaliação, nessa disciplina, ela é constante, desde a participação dos alunos, com as avaliações tradicionais né, tem a teórica e a prática. A teórica normal e a prática sempre com crianças; então se traz crianças aqui para o campus e os alunos eles aplicam alguma coisa e ensinam naquele momento para a criança, então eles são avaliados dessa forma.

P – Você observa alguma disputa de espaço, de poder entre as disciplinas de caráter mais teórico e as disciplinas de caráter mais prático, como a Ginástica?

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D.6 – Não (...) eu acho que cada um trabalha com a sua, não há interferência de uma para a outra, o que há é uma relação entre as disciplinas, mas não que uma consiga interferir na outra, por exemplo, na ginástica, ás vezes algum conteúdo que eu estou dando ta, os alunos já viram em outra disciplina na forma teórica, então traz esse conhecimento pra cá ou vice-versa, entendeu? Mas conflito não!

P – E a sua disciplina é optativa, tem procura constante, como é?

D.6 – Tem! Todo semestre que ela é oferecida, até sempre tem um número a mais do que o permitido e outros alunos, que a gente acaba autorizando, são alunos de outros cursos que pedem pra fazer a disciplina como aluno especial, só pra conhecer, aí eu acho que é bem mais pessoal.

P – E você tinha também aqui um trabalho de extensão, um projeto de extensão, como que funcionava esse projeto?

D.6 – Ele funciona!

P – Ah, ele funciona. Mesmo você estando afastada, ele funciona normalmente?

D.6 – É, tudo continua. Tem um projeto aqui na Universidade H, que atende crianças, ele funciona normalmente de quarta e sexta-feira, atende crianças da região e, é aquela parte de formação da criança, a gente não trabalha Ginástica de competição aqui com essas crianças desse projeto. Eles conhecem todos os elementos, o que o corpo pode fazer, todas as possibilidades corporais e, o máximo que nós fazemos não é uma competição, talvez um festival, alguma coisa assim para final de semestre. Os alunos são bolsistas, eles trabalham, são todos alunos que já tem um conhecimento da Ginástica, que já freqüentaram a disciplina, então eles que desenvolvem esse projeto.

P – E eles são avaliados por você?

D.6 – Constantemente.

P – Você coordena ele inteiro?

D.6 – Sim, coordenação minha.

P – Esses alunos que são monitores do projeto, eles são ex-ginastas?

D.6 – Já tive ex-ginastas e não ginastas; já tive aqui esses bolsistas né, que atuam no projeto, já tive ginastas como já tive também aquele que não tinha nada a ver, que conhecia a Ginástica, fez a disciplina, gostou e acabou indo para o projeto né (risos) a gente acabou oferecendo bolsa pra esse também. Até me espanta, por exemplo, um aluno que nunca tinha visto a Ginástica, ele gostou tanto e se interessou tanto e teve uma afinidade, que hoje ele trabalha com a Ginástica, ta trabalhando no projeto, desenvolvendo muito bem, aprendeu a fazer também a prática, não só o ensinar, mas aprendeu a execução também.

P – Agora a Ginástica saiu no Caderno do Professor do Estado, tem lá a Ginástica Artística na 5ª série, a Ginástica rítmica na 6ª série, então os professores têm que estar ensinando esses conteúdos na escola, e como você acha que ela poderia ser melhor contextualizada dentro do ensino da licenciatura para que eles efetivamente conseguissem lecionar ela na escola?

D.6 – Olha, a exemplo nosso aqui, o aluno que faz a disciplina, ele está apto a desenvolver esses conteúdos, o que cursa realmente a disciplina, pelo menos a minha

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experiência aqui nesse campus, nesse curso, eu estou tranqüila que o que for para a escola ele vai conseguir desenvolver sim.

P – Por enquanto é isso (...)

D.6 – Pronto? (risos).

P – (Risos) Prontinho e eu agradeço sua participação, obrigado!

D.6 – Imagine, de nada!

Docente 7 – Outubro/2008 – 0h29min

P – Primeiro eu gostaria de saber sobre os conhecimentos da Ginástica, quais os conhecimentos imprescindíveis a serem trabalhados na licenciatura da Ginástica Artística?

D.7 – Bom, na licenciatura, partindo do princípio de que nós vamos trabalhar somente na escola né, é (...) a Ginástica tem que ser voltada como processo pedagógico, então para o que? Para o desenvolvimento das capacidades motoras, porque eu acredito que a Ginástica Artística seja uma modalidade que trabalha todas essas questões né, a questão do equilíbrio, da atenção, então na licenciatura os conceitos que devem ser trabalhados são os conceitos de iniciação voltados para esse aspecto, para o desenvolvimento integral do aluno, como um processo pedagógico mesmo.

P – E quando você ministrava a disciplina você diferenciava conhecimentos técnicos de conhecimentos pedagógicos?

D.7 – Não muito. Por que não muito? Naquele momento, daquele currículo da Universidade, nós não tínhamos essa diferenciação era uma formação que ainda tinha um conceito técnico né, então por conta disso se nós fôssemos trabalhar com as ementas, é trabalhar com o projeto pedagógico do curso, que tinha uma visão mais técnica, a Ginástica Artística era entendida como uma modalidade esportiva de competição.

P – E só era ensinado para os alunos a Ginástica de competição em si?

D.7 – Isso, exatamente, treinamento de alto nível.

P – Mesmo na licenciatura?

D.7 – Mesmo na licenciatura. Embora eles não conseguissem trabalhar todos os movimentos né, eles trabalhavam os movimentos mais simples, mais básicos, a intenção, ou melhor, o objetivo, era trabalhar toda essa fundamentação da modalidade esportiva, como competição, como treinamento, e não voltada para o ambiente escolar.

P – E como eram as suas aulas, numa linha do semestre, como você realizava as suas aulas?

D.7 – Então, era o conhecimento dos aparelhos, especificamente os aparelhos femininos, porque eu trabalhava a Ginástica Artística na parte específica feminina, o outro professor trabalhava a parte masculina. Então, era o conhecimento dos aparelhos e os fundamentos de cada aparelho, e aí os alunos trabalhavam os conceitos teóricos depois nós íamos para a prática, onde eles tinham que executar os movimentos, claro que em um grau (...) assim, não era um grau elevado porque elas não tinham tempo,

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nem preparo, então elas não tinham condições de fazer os movimentos adequadamente, corretamente, mas esse era o objetivo e era dessa forma que eu trabalhava.

P – E isso dava para ser utilizado na escola, dessa maneira?

D.7 – Não, por isso que eu falei para você, com o objetivo que estava a disciplina naquele momento, eles poderiam até aproveitar, mas os conceitos eram voltados para a competição né. Se você for analisar na escola, no meu conceito a Ginástica Artística não deveria ser utilizada num primeiro momento para a competição não, e sim a prática em si dos movimentos, do controle corporal, enfim de todas as capacidades envolvidas.

P – E na sua metodologia de trabalho especificamente, você acha que ela tinha algum diferencial ministrando essa disciplina, tem alguma coisa que você acha que era diferente, talvez de conhecer outros trabalhos de outros professores?

D.7 – Não, eu acredito que não! Como eu vim de uma prática, trabalhei muito tempo como técnica de Ginástica Artística, eu trouxe isso para dentro da Universidade, então talvez isso tenha sido o diferencial; porque eu pratiquei a modalidade, depois eu fui técnica né, e aí eu trouxe essa vivência para dentro da Universidade, essa relação, por isso que eu disse a você que o meu trabalho, naquele momento, era voltado para a competição, porque era a minha experiência, então talvez seja somente isso.

P – E como que você observa a Ginástica Artística hoje dentro e fora do contexto universitário?

D.7 – Bom, ainda acredito que a Ginástica Artística é uma modalidade que enfrenta assim, sérios desafios, por que? A questão da aparelhagem, começa aí né. Se você for ver para a gente trabalhar a Ginástica Artística na escola, na verdade a gente tem que fazer adaptação né, porque não existe material. Ah tudo bem, existe o colchão, os bancos suecos, mas se a gente for olhar a modalidade em si né, isso não corresponde à realidade da Ginástica Artística certo? Por isso que eu disse a você que hoje, se a gente pensar a Ginástica Artística como um processo pedagógico, se você trabalhar aqueles rolamentos, aquela questão de equilíbrio, a questão de paradas, então você vai trabalhar o desenvolvimento muito básico da Ginástica, não vai chegar em movimentos mais complexos, por conta da realidade escolar não ter esse material adequado para prática da Ginástica.

P – E ela dentro do contexto universitário?

D.7 – Nós aqui hoje, pensamos a Ginástica Artística dentro da Ginástica na escola. Então hoje nós temos uma disciplina a Disciplina O, e o que é para ser trabalhado na Disciplina O? Não é só a Ginástica Artística, são todos os tipos de Ginástica, Ginástica Geral, a GR e a própria Ginástica Artística, todos com movimentos básicos e de iniciação, sem nenhuma (...)eu diria, ligação direta com a modalidade esportiva.

P – E você vê importância na vivência da Ginástica Artística para futuros professores de Educação Física?

D.7 – Sim! Eu acho que a Ginástica ela deveria ser mais estimulada, deveria ser trabalhada é (...), mas na verdade, eu acho que faltam profissionais para trabalhar com os conteúdos da Ginástica Artística.

P – Na escola?

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D.7 – Na escola! Porque a licenciatura, ela realmente não da conta hoje de trabalhar essas questões, até porque se você for olhar vários currículos, eles trabalham nesse sentido, trabalhar uma Ginástica mais ampla. Então se a gente for pensar que na escola o professor trabalha a modalidade Ginástica Artística, nela como um todo, o que que significa a modalidade Ginástica Artística? Você tem todos os aparelhos para trabalhar, e na escola não existe essa realidade, por isso que eu digo para você que eu penso que na escola,a Ginástica Artística ela seja apenas um processo inicial, um processo pedagógico, mas não a modalidade em si, porque a realidade não comporta isso, nem profissionais, porque a Universidade, ela não da conta de trabalhar os conceitos todos da Ginástica Artística, e na escola por conta da realidade escolar, como é que você vai só trabalhar saltos? O que você vai trabalhar na Ginástica Artística dentro da escola? Tem escola que não tem colchonete, por exemplo, eu tenho colchonetes aqui, então eu levo para escola para os estagiários fazerem com as crianças, rolamentos e isso, e aquilo, mas eu tenho que trazer de volta, porque se eu deixar na escola acaba.

P – Você já disse que a Ginástica como ela era trabalhada aqui, ela não tem como chegar na escola. Você acredita que a Ginástica, como vocês estão proporcionando hoje, a Ginástica Artística dentro da Disciplina O, você acha que os alunos, quando eles saem daqui, conseguem trabalhar com ela na escola?

D.7 – Eles conseguem trabalhar os conceitos básicos, então, pra mim, eu tenho duas interpretações sobre isso, como pensar a Ginástica Artística? São dois momentos. Se você for pensar a Ginástica Artística como uma modalidade esportiva né, então a Universidade não dá conta, porque ela não trabalha esses conceitos voltados para a modalidade esportiva. Aí, eu posso pensar a Ginástica Artística só como um processo inicial, um processo de base para a aquisição das capacidades motoras, físicas? Enfim, eu posso pensar a Ginástica Artística dessa forma? Ela é só isso? Então por isso eu acho que, a Ginástica Artística não vai ser desenvolvida na escola, porque ela não é só isso, ela é muito mais. Para você falar hoje de Ginástica Artística, eu digo feminina, por exemplo, que é o que eu tenho mais conhecimento, eu preciso de aparelhagem ou, de pelo menos alguns aparelhos que correspondam àqueles né, em que são praticados a modalidade. Então eu acho que há uma distancia muito grande, da Ginástica Artística que pode ser trabalhada na escola, para a modalidade esportiva, então os conceitos trabalhados na escola hoje, que o professor vai ter dentro da Universidade para aplicar na escola, são muito básicos mesmo, são fundamentos básicos e que não correspondem à modalidade esportiva, então eu acho que são dois momentos diferentes.

P – É além da aparelhagem você acha que tem algum outro impeditivo para a Ginástica Artística na escola?

D.7 – A dificuldade dos movimentos em si. Como esse professor que está indo para a escola não tem uma formação mais técnica, uma formação mais ampla né, e que aborda diversas dimensões. A Ginástica Artística, ela precisa de movimentos específicos entendeu? A modalidade de Ginástica Artística é um esporte difícil de ser praticado por conta dos seus próprios movimentos, os movimentos são complexos, então vamos supor, a menina para chegar a executar as piruetas, todos aqueles movimentos né, ela precisa ter condições, ter tido uma iniciação muito boa né, para poder chegar àquela fase, e isso na escola eu não acredito que seja possível entendeu? Porque não é fácil praticar a modalidade de Ginástica Artística, é um esporte complexo.

P – E como você acha que ela poderia estar inserida no currículo de forma que ela conseguisse alcançar a escola? Porque você já disse que aqui ela agora está na Disciplina O e mesmo assim muito básico, vocês têm ela como aprofundamento?

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D.7 – Não, não temos, nem como optativa.

P – E como você acha que ela poderia estar melhor inserida nos currículos dos cursos, para conseguir chegar à escola?

D.7 – Bom, primeiro vamos supor, se for um curso de licenciatura, eu acredito que vá ter que ser oferecida uma disciplina optativa mesmo, vinculada as práticas curriculares. Porque os cursos de licenciatura hoje, eles têm essas quatrocentas horas de práticas curriculares que podem ser divididas e trabalhadas em diversas áreas da Educação Física mesmo né, inclusive a própria Ginástica Artística. Então como seria essa relação da prática curricular? Aí teria a disciplina oferecida como optativa, vamos supor, e vincular a disciplina à prática curricular, que o aluno vai lá, vivência isso, coloca em prática o conhecimento dele, faz essa relação teoria e prática junto com o professor né, que já tem o conhecimento e, aí sim eu acredito que poderia haver uma evolução, fora isso eu não vejo como ele, da forma como ela está estruturada hoje, poderia se sobressair entendeu? Ela não se sobressai.

P – E como que estava a Ginástica Artística no currículo quando você ministrava?

D.7 – Então, ela era uma disciplina mesmo, de sessenta horas e trabalhava estruturada dessa forma, voltada para a prática da modalidade esportiva.

P – Ela não era optativa?

D.7 – Não, a optativa era Disciplina P, mas que se eu não me engano foi oferecida somente um ano e, nós tivemos dezessete anos o currículo com ela dessa forma, mas somente um ano que ela foi oferecida como Disciplina P, aí vinha com aprofundamento, com coreografia, com a parte de treinamento, a parte fisiológica, então foi só um ano.

P – E vocês têm essa estrutura material aqui para ter essa disciplina?

D.7 – Nós temos um ginásio de esportes que tem a aparelhagem, porque a equipe da cidade treinava aqui né, até o ano passado. Agora, outra coisa que eu acho interessante dentro da Universidade que poderia ser feito, desculpa eu retornar aqui, são os projetos de extensão, porque os projetos de extensão quem trabalha são os alunos do curso; eu tive três anos de projeto de extensão de Ginástica Artística e era vinculado à prática da Ginástica Artística e não a Disciplina O.

P – Para crianças?

D.7 – Para crianças, mas era para competição, não era voltada à escola. Então você pode sim fazer um projeto de Ginástica Artística na escola, um projeto de extensão e aí ser trabalhados os conceitos, e aí é oi que eu falei para você, que de repente você vai ver a realidade, você estrutura um projeto, chega lá e não tem condições de trabalhar a modalidade.

P – Você auxiliava na montagem do programa de ensino do currículo quando você ministrava a disciplina?

D.7 – Aqui é assim, a disciplina, o planejamento anual da disciplina, nós, cada professor responsável pela disciplina é quem organiza; o que nós não conseguimos interferir era no projeto pedagógico que já estava estruturado, na ementa da disciplina que já estava estruturada, porque para isso precisaria ser feito uma comissão, um estudo, uma justificativa para que seja mudada a grade ,e isso é muito complicado, então a gente não conseguia trabalhar com isso, agora nos conteúdos da disciplina, o que seria trabalhado, era a gente que fazia.

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P – Então você ficava um pouco presa ao projeto da pedagógico e à ementa?

D.7 – Totalmente! Você não podia fugir daquilo, porque tinha um perfil, tinha toda aquela questão, que eu diria, era especificamente técnica, então ficava complicado você trabalhar, mesmo sendo um curso de licenciatura. Porque na verdade Juliana, quando eu trabalhei com essa disciplina nós não tínhamos ainda nem a LDB de 1996 e nem o reconhecimento do profissional, que veio com o advento de 1998, que veio toda essa questão de se trabalhar a licenciatura voltada para a escola, porque o curso de Educação Física não era isso, ah era licenciatura, mas, ele formava o profissional para trabalhar em qualquer segmento, inclusive técnicos, que foi o meu caso né. E hoje não, hoje a gente tem um outro momento, naquela época era estruturado dessa forma, hoje esta tudo muito diferente.

P – E acontecia algum entrave quando você tentava mudar alguma coisa?

D.7 – Não, nas ementas e tudo, não. E eu vou ser mais sincera para você Juliana, eu até nem olhava por esse ângulo porque naquela época não se havia essa discussão, então a gente tinha essa formação. Eu ainda pensava, eu estou sendo bem sincera, na minha disciplina na Universidade com formação técnica, e é aí que a gente vê o processo de evolução até nosso, porque hoje para mim isso não tem mais sentido, mas naquela época, e já faz um bom tempo, eu pensava realmente dessa forma, eu ainda trabalhava com a equipe, então eu ainda tinha formação técnica, eu ainda tinha conceitos técnicos e ainda acreditava que deveria se formar profissionais para se trabalhar com a modalidade esportiva e não com a Ginástica Artística somente dentro da escola, com outros conceitos, com outros objetivos, então naquela época eu ainda pensava dessa forma e trabalhava dessa forma.

P – E como você realizava a sua avaliação?

D.7 – Bom, eles tinham a avaliação teórica né, do que? De regras, de fundamentos, então aí você vê mesmo a formação técnica. Nós trabalhávamos as regras dos aparelhos femininos né, e aí eu trabalhava assim, essa era a primeira avaliação e a segunda avaliação nós íamos à prática. Na avaliação prática eles tinham que passar, por exemplo, um salto naquela época era cavalo, hoje é mesa, e também eles tinham que fazer um salto simples, eles escolhiam que tipo de salto eles queriam fazer, tinha que ultrapassar, quem não conseguisse ultrapassar não pontuava, eles tinham que fazer uma coreografia no solo, com saltos e aí tinha os fundamentos que tinha que ter né, um rolamento, um exercício ginástico enfim, tinha alguns itens que eles tinham que colocar na coreografia, era uma coreografia com o tempo menor, não com o tempo da Ginástica e com ritmo, com música, inclusive os meninos tinham que fazer com música. Foi talvez assim uma coisa que eu fiz diferente; eles ficavam bravos que eles tinham que seguir, ‘não, vocês têm que ter ritmo’, eu pensava dessa forma né, por que que as meninas têm que seguir o ritmo? Eu sei que na modalidade em si não se trabalha, mas aqui eu trouxe isso e os meninos gostavam, nossa apareceu cada coisa. E, o que eu achei mais interessante nesse trabalho que eu desenvolvi foi que, em uma das coreografias nós tínhamos um aluno que era deficiente, ele tinha um braço mais curto que não se movimentava e eu nunca me esqueço da coreografia dele, já faz tantos anos e ele conseguiu fazer, eu me lembro dele fazendo os saltos, ele estendia só um braço porque o outro não mexia, mas ele fazia, fazia estrela com uma mão só. Era isso, essa era a segunda parte prática da avaliação, tinha a prova de equilíbrio que eles tinham que fazer na trave mais baixa e eles faziam entrada com o trampolim, e nas paralelas, eu não tinha avaliação nas paralelas, achava muito difícil.

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P – Então eles saiam daqui tendo uma vivência corporal da Ginástica, mais ampliada, você fazia com que eles executassem os elementos. Mas isso era o mais importante da nota deles, ou não, tinha que ensinar o colega também a fazer, vamos avaliar como ele ensina?

D.7 – [Docente sinaliza com a cabeça que não]. Aí foi que eu falei para você sobre processo de evolução, naquele momento era dessa forma, hoje é diferente.

P – E aqui na faculdade vocês tinham alguma disputa, por espaço; disciplinas teóricas e disciplinas mais práticas, tinha algum entrave aí, entre vocês?

D.7 – Não, naquele momento não! Naquele momento, eu acredito que os profissionais que estavam aqui vinham todos de formação técnica, quase todos os professore que faziam parte aqui do grupo eram professores oriundos de esportes, e de vários esportes Basquete, Vôlei, Atletismo.

P – Inclusive os professores que ministravam as disciplinas mais teóricas?

D.7 – Isso! O que que aconteceu? Quando o curso sofreu a primeira reformulação, logo que encampou e a gente passou por um processo de avaliação, que foi em 1991, que se eu não me engano foi o professor Bruno Vinícius, que foi o relator e tudo e, aí a gente precisou fazer uma adequação, naquele momento começou a se pensar e aí começou a trazer os professores de outros departamentos com concepções teóricas mais aprofundadas, professores especialistas. Então, demorou para a gente perceber essa relação teoria e prática, as diferenças; hoje elas são pontuais, a gente começa a perceber que são pontuais mesmo, eu que vim de uma formação técnica, sempre trabalhei na questão técnica e hoje eu trabalho só na área pedagógica, então da pra ver uma diferença, da para sentir, e os professores aqui, eu diria oitenta por cento, tem a formação mais voltada para a área da saúde, mais fisiológica.

P – Bom, do meu questionamento já está excelente, mas eu quero saber de você, você teve a vivência da Ginástica Artística, eu também tive a vivência da Ginástica Artística e hoje acredito que só isso não garante uma boa docência (...)

D.7 – Não, não garante!

P – Pois é, e os mestrados e os doutorados formam pesquisadores e não professores. Com isso, como você pensa na formação dessa pessoa que vai ministrar aula aqui, na Disciplina O, por exemplo; porque no caso esse profissional não pode só saber Ginástica Artística ou só Ginástica Rítmica, como fica a formação?

D.7 – É, ele tem que ter um conhecimento mais amplo eu diria, dos diversos tipos de Ginástica que podem ser trabalhados dentro da escola. Quando eu digo e faço essa referência a esse conhecimento amplo, eu diria que não vai vir um especialista e, quando não vem o especialista dificilmente ele vai ter uma experiência significativa na modalidade, porque para você falar com propriedade da modalidade você tem que ter vivenciado. Então (...) eu acredito nisso ainda, porque você tem que vivenciar? Quer dizer, o professor que só trabalhou a teoria ele não está preparado? Se for trabalhar só como processo pedagógico Juliana, perfeito! Ele consegue, a gente consegue fazer isso em qualquer modalidade esportiva, que você vai trabalhar o fundamento básico, que na verdade se você for voltado para processo pedagógico ou para trabalhar as capacidades motoras e físicas, isso é básico de qualquer esporte, mas se você for pensar em conceitos da modalidade, aí eu acredito que você tenha que ter tido uma experiência, seja ela em projeto de extensão no seu curso de formação inicial, seja numa disciplina específica, numa disciplina optativa vamos supor, que você consiga ter

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essa vivência corporal, para que você consiga entender o que o seu aluno vai passar né. Agora, se ele vier com uma formação ampla e não ter tido nenhuma oportunidade de vivenciar a experiência dentro da modalidade, eu acredito que ele não vai ter um conhecimento significativo para estar trabalhando com os alunos conceitos mais específicos, só fundamentos.

P – E a disciplina que vocês têm aqui hoje é um semestre?

D.7 – Um semestre, sessenta horas.

P – Sessenta horas para trabalhar todas as Ginásticas a ser transmitidas na escola? Em sessenta horas?

D.7 – Isso, só que dentro de prática curricular, mas dividido entre todos os tipos de Ginástica . E aí é suficiente para trabalhar conceitos da Ginástica Artística? Não! Porque é um esporte complexo, assim como é a GR; a GR também tem todos os aparelhos, exige muito do praticante, e aí exigiria também do professor que vai trabalhar esses conceitos. O que que você entende sobre isso? Eu entendo que o professor na Universidade que vai trabalhar os conceitos amplos, ele vai trabalhar o mínimo da Ginástica Artística, o mínimo da GR, porque são modalidades mais difíceis de serem trabalhadas na escola do que uma Ginástica Geral, por exemplo. Então ele vai destinar um tempo muito curto no processo de formação inicial dos futuros professores para essa modalidade, no caso aqui Ginástica Artística. Então o que que você pensa? O professor, ou melhor, aquele aluno da Universidade que gostaria de trabalhar ‘ah eu quero trabalhar mais conceitos de Ginástica Artística’, ele vai ter que procurar se vincular a um projeto, um estágio, qualquer ação nesse sentido, porque a Universidade ela não dá esse conceito mais aprofundado pra ele trabalhar isso lá na escola, é básico eu diria, ‘agora, o básico você vai ter’, você pode falar para o seu aluno, agora vai depender muito do aluno que vai ser o futuro professor de buscar mais conhecimentos sobre isso.

P – Então é isso Docente 7?

D.7 – Só? (risos).

P – (Risos) Não, ainda falta agradecer (risos). Obrigado!

P – (Risos) Ah, de nada!

Docente 8 – Outubro/2008 – 0h47min

P – Quais os conhecimentos fundamentais a serem transmitidos num curso de Licenciatura da Ginástica Artística?

D.8 – Eh, os fundamentos são a iniciação na Ginástica Artística, o conhecimento prático que você pergunta né? Seria os educativos para a aprendizagem da Ginástica Artística, da Ginástica Olímpica. Eles seriam, para a licenciatura, eles seriam a base, só os exercícios educativos de aprendizagem né, seria mais ou menos isso, que você (...) então seria isso que a gente passava, seria os fundamentos bem básicos, com educativos para a iniciação da Ginástica, seria os educativos propriamente para Ginástica Artística né, não era uma Ginástica Geral né.

P – Você ministrava Ginástica Artística especificamente?

D.8 – Isso, também ministrava Ginástica Geral em outro termo, em outra época eu ministrei também.

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P – Mas eram diferenciados os conteúdos?

D.8 – Sim era bem voltado para a aprendizagem da Ginástica Artística realmente, para a aprendizagem e ensinamento, passar como se devia ensinar os fundamentos da Ginástica Artística especificamente, seria isso.

P – E você separava conhecimentos técnicos de conhecimentos pedagógicos?

D.8 – Não, era praticamente uma seqüência da outra. A gente passava os conhecimentos pedagógicos, metodologia e depois as partes técnicas também, era separado, mas apresentado em uma seqüência né.

P – Mesmo sendo o curso de licenciatura tinha a parte técnica?

D.8 – Tinha, tinha! Tinha porque a gente tinha que passar para o aluno como ele iria ensinar Ginástica Artística mesmo, não seria um movimento geral, o movimento generalizado né, seria para ele aprender e ensinar um movimento específico da Ginástica Artística.

P – Para qualquer pessoa não só para a escola, assim?

D.8 – É, apesar do curso, que era licenciatura, acabava sendo para qualquer pessoa, porque o nosso curso não era específico licenciatura até um ano atrás, dois anos atrás ele era abrangente, o aluno poderia sair e dar aula na licenciatura, na escola e poderia sair e dar aula em academia particular, por causa dessa mudança de licenciatura e bacharelado (...) licenciatura plena, aqui era licenciatura plena, então ele poderia ensinar não só na escola, mas numa academia de Ginástica Artística, então era por isso que a gente passava, parte era os fundamentos e a parte técnica também, por isso.

P – E como que você conseguia diferenciar para eles esses conhecimentos, você transitava de uma paro outro, como que você diferenciava esses conhecimentos técnicos de pedagógicos?

D.8 – Então a gente começava, tem o programa né, começava com os movimentos bem básicos, movimentos educativos como eu falei, por exemplo, ia ensinar um exercício, dividia esse exercício em partes para poder ensinar e depois quando aprendeu os movimentos por partes desse exercício, aí sim passaria a aprender a parte técnica dele completo, dele inteiro. Como vai ensinar, por exemplo, um flic né? Tem diversos movimentos, tem o movimento da ponte, do fechamento da perna, a repulsão, então por partes, essa era a parte dos fundamentos, depois ensinava ele por inteiro na parte técnica, como era executado.

P – E como que você realizava, nessa seqüência, as suas aulas, era um semestre né?

D.8 – Era um semestre, mas teve época que foi um semestre, teve época que foi um ano, mas a mesma quantidade de aulas, ou era quatro aulas num semestre, ou era duas aulas num ano, teve algumas mudanças né. Teve períodos que tinha que adaptar por causa do horário, então como que eu ensinava? Eu costumava seguir um livro do Mendonça né, você deve conhecer o Luis Henrique Mendonça né? Além dele em muitos livros de Ginástica existe os fundamentos né, a parte técnica, existe aquelas figurinhas né, então a gente passava a parte teórica, passava toda a nomenclatura dos exercícios né, que a gente ia desenvolver durante o ano, passava todo o conteúdo, exercício por exercício, passava em retro-projetor, passava em multimídia o nome, a nomenclatura e o exercício, mostrando o exercício como ele era e depois passava por uma parte prática, aqueles movimentos bem básicos que foi visto na figura né. Era feito para a pessoa fixar mesmo o nome do exercício, e eu passava uma apostila que continha todos os

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exercícios que eu ia passar durante o ano na prática e com seus educativos juntos né, eu ia passar o flic, mas como chega no flic?

P – Você fez uma apostila?

D.8 – Foi, a gente tinha uma apostila que aí eles seguiam aquilo ali. Então naquilo ali ele vendo o exercício, vendo os educativos, a gente ia para a prática, daqueles educativos mais simples, até chegar no complexo pra ele conseguir executar, que dizer, conseguir executar em parte, não era cobrado para isso né, não era exigido que se tornasse um ginasta, não era essa a função, mas pelo menos eles saberem a dificuldade que tinha para ele ensinar uma criança a executar aqueles movimentos básicos daquele certo exercício.

P – Eles faziam uma vivência?

D.8 – É eles faziam uma vivência durante a aula prática, a gente procurava fazer com que eles executassem pelo menos aqueles primeiros exercícios básicos, aqueles movimentos básicos para chegar em um exercício, então eles tinham que sentir, viver ali para poder cobrar deles como é que eles iam fazer para dar aula depois. Era dessa forma que eu fazia, mostrava os exercícios né, inclusive em vídeo também e depois a gente decompõe o exercício ali para eles fazerem na prática, pra tentar fazer né, não tinha essa exigência, eu não fazia uma avaliação de que a pessoa tinha que executar o exercício, isso eu jamais fiz porque eu sei que a dificuldade é grande dos alunos em um curso superior em aprender o exercício que nunca fez né, e depois ter que ser avaliado, isso não era o objetivo.

P – E a sua metodologia de trabalho, em todos esses anos com a Ginástica, você acha que ela tinha algum diferencial, tem alguma coisa que você acha que é sua, na forma de você planejar e ensinar Ginástica Artística?

D.8 – Ah, eu, como em outras disciplinas, eu procurei desenvolver da mesma forma né, é (...) mostrando os exercícios, tentando fazer a parte prática, aprendendo através de visual, então eu não vejo nada, eu acho, penso eu, que seria uma forma correta, eu nunca copiei de uma outra Universidade como é que se dava, então eu acho que a minha forma é como todo lugar faz.

P – É só sua.

D.8 – É eu acho, não foi copiado a minha metodologia né. Porque quando eu entrei na faculdade para dar aula, eu entrei para dar aula de Ginástica Geral né, e eu já gostava de Ginástica Olímpica e, do jeito que eu aprendi na faculdade, quando eu fazia não existia Ginástica Olímpica, existia Ginástica Geral que, inclusive, estava incluída, mas como eu gostei aí eu fui atrás né; gostei, aprendi, pratiquei um pouco, então eu desenvolvi a minha forma, do jeito que eu achava que a pessoa poderia sair da faculdade e ensinar o básico da Ginástica Artística.

P – E como que foi isso, você nunca ter sido atleta, nunca ter sido técnico, não ter se envolvido de outras formas com a Ginástica Artística, você fez na graduação, gostou e virou professor da disciplina por tantos anos?

D.8 – É (risos), quando eu entrei na faculdade, eu fui chamado para trabalhar com a Disciplina E, auxiliar de um professor mais antigo que tinha lá né, e aí teve uma encampação do curso que era municipal pela Universidade I, então foi mudada a grade curricular, então abriu a Disciplina E em diversas disciplinas, que é a Ginástica Artística,

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metodologia de treinamento esportivo, que estava dentro da Ginástica. Então a Disciplina E antigamente, englobava treinamento esportivo, um monte de coisa, então foi aberto, aí abriu a Ginástica Artística e eu já estava lá, eu que gostava, eu que quando dava ela na Disciplina E eu me empolgava, procurei aprender bastante né, então falaram ‘você vai para a Ginástica Artística’, e aí eu fiquei na disciplina, fiquei efetivo da cadeira da disciplina de Ginástica Artística e aí eu fui desenvolvendo, fui trabalhando da forma que eu achava ideal.

P – Certo! E como você observa a Ginástica Artística hoje, dentro da Universidade e fora dela?

D.8 – Dentro da faculdade ela, já há um bom tempo, não é de agora não, eu acho que ela não estava (...) pela nossa cidade ou pela região do próprio país, fica difícil ela ser uma disciplina específica só de Ginástica Artística, porque no mínimo são sessenta horas que você vai ficar ali martelando numa coisa que, eu vou falar a verdade, poucos alunos que se interessam pela Ginástica Artística né; então a melhor forma foi o que aconteceu agora no nosso curso né, ela saiu, foi para Disciplina O, que é um curso de licenciatura, e entra como conteúdo também. O aluno que gostar ele vai se especializar e correr atrás né, que são poucos. Como disciplina específica, eu acho que não convém mesmo né, do jeito que ficou agora eu acho que está melhor. Fora da faculdade, fora do curso, eu acho que não é tão desenvolvida, divulgado, batalhado para ter alguma coisa, para ter um ginásio, por exemplo, aqui os equipamentos que tem aqui são antigos né, em todo lugar eu acho que é assim; não tem um incentivo tão grande; é uma modalidade difícil de se fazer; tem que achar a pessoa certa para ser atleta, a pessoa certa para ser o professor, dedicado; então eu acho que (...) além do material ser caro né; o local ideal para isso, coisa que a faculdade, a Universidade I daqui nunca teve, foi uma coisa que a gente sempre brigou para ter espaço e nunca teve; o que tem ali é tempo do municipal ainda, é tempo da escola municipal ainda, não é da Universidade I! A Universidade I nunca fez nada para melhorar aquilo alí, para ter um espaço, um ginásio, um espaço onde você pode fazer muitas coisas ao mesmo tempo; você não pode nem armar um aparelho né, daqui a pouco você tem que tirar correndo e aí já vai meia hora de aula para armar e desarmar, então é uma coisa muito difícil para ser desenvolvida tanto dentro do curso, da faculdade, quanto fora, como você perguntou né.

P – Mas você vê importância na Ginástica Artística para a formação de professores?

D.8 – Eu vejo importância sim, porque eu acho que uma matéria específica, como eu falei, fica difícil, mas dar uma ênfase bem grande na Disciplina O, ou na própria Disciplina E como conteúdo, sempre vai surgir alguém que vai gostar disso, que vai gostar da Ginástica. Então essa pessoa, ela já vai sair com alguma coisa básica da faculdade, a interessada ela vai correr atrás, vai procurar fazer alguns cursos né, vai participar de competições para ver como é que funciona, então isso é para gente apaixonada por Ginástica Artística, pra quem gosta mesmo. Então é importante que se mantenha, lógico, na faculdade né, para a formação do professor, mas ele tem que correr atrás, tem que se especializar, ele tem que vivenciar a Ginástica realmente, não só o que ele vê na faculdade. Antes, quando era disciplina específica, ele tinha um pouquinho mais né, era um básico, um pouquinho mais do que agora como não disciplina, como na Disciplina O, e como dentro da Disciplina E, ele vê o conteúdo, mas aí vai surgir alguém que sempre vai estar gostando, que sempre vai estar levando para frente a Ginástica.

P – E você acha que entre os alunos que você formou, algum deles conseguiu ensinar alguma coisa da Ginástica Artística na escola?

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D.8 – Eu acho sim, principalmente nas cidades da região aí. Eu tenho sempre conversado com o pessoal, e o pessoal fala ‘ah, tem uns colchões lá e eu queria ver uns livros tal’, vem pedir um reforço ‘pra mim dar rolamento como é?’, apesar de que eles já aprenderam né, mas eles viram que na hora do trabalho a coisa é diferente né. Mas eu percebi que, principalmente em cidades pequenas, o pessoal se preocupa mais com a Ginástica do que a cidade onde a gente vive, uma cidade grande né, onde você tem vários esportes o pessoal gosta de trabalhar em academias né, de outras modalidades não Ginástica né, então a gente viu, percebeu que tem aluno né, aluno que tem escolinha em cidades da região, escolinha de Ginástica. Aqui em Cidade K, que é uma cidade já maior, ela só tem uma escolinha só que é a da Prefeitura, que é uma aluna que passou pela faculdade já há um bom tempo; então eu acho que facilita mais nas cidades pequenas aqui da região do que na própria cidade grande, que é aqui; então esses alunos, eu sei que tem alunos por aí que estão dando Ginástica, tem um plinton lá, com um caixão velho e uns colchões velhos, eles estão dando saltos, estão dando rolamentos, só não tem (...) só não investe em aparelhos né, aparelhos bem mais caros né, argola, trave, paralelas, então não existe praticamente esse desenvolvimento aqui, em Cidade K e na região.

P – E o que você acha impeditivo de ter a Ginástica Artística na escola?

D.8 – Eu acho que é o equipamento e o espaço físico né; porque o aluno que vai para dar aula lá, pelo menos da faculdade ele sai com uma base para dar uma iniciação de Ginástica. Equipamento e espaço físico, porque não dá para dar Ginástica (...) se bem que estão cobrindo as quadras agora né; aí você requer material, equipamento, você tem que por o equipamento lá na quadra, daqui a pouco tem que tirar de novo, porque alguém vai ocupar a quadra né, geralmente a falta de equipamento é o fundamental para não se desenvolver a Ginástica né, para impedir o desenvolvimento da Ginástica né, esse é o grande problema eu acho.

P – E como você acha que a Ginástica Artística poderia estar contextualizada no currículo para que ela conseguisse alcançar a escola de forma mais plena, porque você disse a pouco que poucas pessoas acabam se direcionando para a Ginástica Artística e acabam tendo (...)

D.8 – (...) a preocupação de fazer ela andar para frente, para desenvolver né. Mas o que que falta? Eu acho que a dedicação né, o conteúdo na grade curricular, seja lá se for dentro da disciplina específica de Ginástica Artística ou de outras disciplinas, ele tem que estar bem amplo né, para ser passado para os alunos e a pessoa sair de lá com vontade de dar aula de Ginástica Artística, eu acho que é o conteúdo que tem que estar melhorado, embutido em qualquer disciplina, se não tiver a Ginástica Artística específica né, quando tem a especifica você força mais, incentiva mais. Então como você me disse no começo, ‘a Ginástica Artística está saindo da grade curricular aqui’, então se vai sair, que ela esteja embutida aí em uma disciplina com conteúdo bem forte e que o professor que dá essa disciplina, que ele goste da Ginástica Artística e que force as aulas em cima da Ginástica Artística né, isso é o que falta, se não ela vai ficar esquecida, o aluno vai sair de lá, do jeito que está mudando, o aluno sai de lá, ele não vai saber como é que faz um rolamento, o que é um flic, o que é uma reversão para frente, não vai saber o que é uma estrela; a gente quando vai dar aula, a pessoa não conhece esses nomes, não sabe como é o exercício, e essa é uma das avaliações que eu faço no começo, passo todas as nomenclaturas, mostro os desenhos, a gente faz a prática, depois eu pergunto o nome dos exercícios, para pessoa sair da faculdade sabendo o nome dos exercícios, pelo menos isso né. Então saindo a disciplina de Ginástica Artística, ela está perdendo força para poder desenvolver mais e, quem está com a disciplina agora, onde está embutido o conteúdo, tem que gostar, tem que fazer, se não, não vai mesmo.

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P – E como se encontrava a disciplina quando você parou de ministrar, já tinha mudado na grade, tinha saído a Ginástica Artística?

D.8 – Já, já. Ela foi o primeiro ano no ano passado, deixa eu pensar, foi o ano retrasado que foi o último ano, o ano passado começou a entrar a Disciplina O, mudou, ela era conteúdo da Disciplina O, mas eu não cheguei a dar a disciplina porque era no segundo semestre e, no segundo semestre eu estava me afastando da faculdade.

P – E essa Disciplina O, trabalha todas as Ginásticas em um semestre, o que você acha disso?

D.8 – Olha é abrangente também, tem que saber trabalhar. Eu cheguei a fazer o programa né, no programa estava incluída a Ginástica de apresentação, a Ginástica de competição, as diversas Ginásticas né, de academia, inclusive tinhas umas disciplinas separadas, mas eu, como vinha sempre dando aula de Ginástica Artística né, então o conteúdo de Ginástica Artística que eu coloquei ali no programa, ele estava bem, estava bonito (risos), não sei se o professor que vai pegar ele vai dar continuidade, vai se utilizar disso, vai fazer isso, então eu não sei como é que vai ficar daqui para frente a Ginástica Artística, pelo menos aqui. Apesar de que tinha um professor que estava entrando né, que foi ginasta, ele vai dar uma disciplina que não tem nada a ver (...) eu não sei, eu acho que ele não vai pegar essa disciplina né, e ele foi aluno né, ele dava uns mortais bonitos, ele fazia, era um ginasta mesmo e agora ele está entrando aí como contratado né, mas ele dá aula de treinamento desportivo, alguma coisa assim, então tinha que aproveitar o professor que tem habilidade, que goste e jogar ali, para dar a disciplina, mas não é essa a visão da coordenação do curso né, então as vezes não encaixa as pessoas certas.

P – E você falou do programe agora, você que montava o seu programa?

D.8 – É cada professor na Universidade I, monta o seu programa, da sua disciplina.

P – E tem algum entrave para montar esse programa, você que monta sozinho, você tem que seguir alguma coisa?

D.8 – Não, não tem que seguir, tem que ser um programa de conteúdo da disciplina, que abrange bastante a disciplina. É certo que às vezes a gente, isso é todo professor, estudam o programa de outras Universidades né, para saber o que está faltando para melhorar o programa, então cada professor faz o seu programa.

P – E a ementa, ou o projeto pedagógico, não impõe que tenha alguma coisa, ou não tenha alguma coisa?

D.8 – A gente já faz baseado no projeto pedagógico também.

P – E você acha que o programa era coerente com a formação de professores, de licenciados?

D.8 – Era! Como eu falei, no nosso caso aqui, até o ano retrasado, o aluno ele sairia para dar aula em qualquer lugar, era permitido isso, então era coerente, ele saia tanto com o processo pedagógico de iniciação, como com várias técnicas, poderia dar aula em qualquer lugar.

P – Coerente com a formação ampliada.

D.8 – É, com a formação ampliada, o curso nosso aqui era assim.

P – E como você realizava a sua avaliação, como você fazia?

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D.8 – Eu fazia a avaliação teórica, uma parte prática, não com a preocupação de executar alguma coisa, mas de montar, que seria séries acrobáticas de solo, montar né, poderia colocar uma criança para fazer, poderia ela própria fazer, poderia um adulto fazer no lugar dessa pessoa, desde que tinha coerência.

P – Ela tinha que saber montar?

D.8 – Isso ela tinha que saber montar.

P – Não precisava realizar?

D.8 – Não, saber montar” Podia colocar outra pessoa para fazer e estava ótimo, ela só tinha que ensinar a pessoa a executar né, e a avaliação teórica, e trabalhos que tinha que fazer também. A primeira coisa que a gente trabalha nessa disciplina é história da Ginástica, como desenvolveu, pra saber mesmo a história e a evolução da Ginástica, então seria trabalho, avaliação prática e avaliação teórica,; a avaliação teórica seria duas avaliações, uma de nomenclatura como eu falei, da parte de solo, de exercício de solo, teórica né, até lá a pessoa já tinha aprendido; e a parte um pouco mais técnica que seria a parte da avaliação, dos aparelhos, de competição, alguma coisa assim.

P – E os seus alunos tinham oportunidade de vivenciar com outras pessoas que não fossem os próprios colegas, ou como estágio, ou projeto de extensão, ou com crianças na aula?

D.8 – Não, eles não tinham a obrigação, mas a gente colocava, tinha uma escolinha ali na Universidade I, ‘olha tem a escolinha, tem o projeto, se vocês participarem vocês acompanham junto com a professora que está lá no projeto de extensão’. Não tinha a obrigação de um estágio assim não, não tinha, mas era colocado que a única escolinha que tinha seria aquela que funcionava lá, precariamente né, e continua precariamente, é um ginásio para tudo né, material tem até algum material pela Universidade I tem, mas imagina como é.

P – Então vocês têm o problema de disputa de espaço né?

D.8 – Ah, isso sempre foi! Desde dezessete anos para cá a Universidade I nunca deu condições para dar aula de Ginástica Artística, e eu também dava aula de Disciplina Q, a gente nunca teve também, no mesmo lugar no mesmo salão, era a maior briga, briga não né, a gente cansou de pedir, de insistir; agora até que Disciplina Q a pouco tempo arrumou uma salinha ali, de uns três anos para cá, uma que foi desocupada pela Fisioterapia.

P – Conseguiram então? (risos)

D.8 – É, nós conseguimos uma salinha (risos), mas isso durou dezessete anos ao todo, ali é complicado.

P – Mas você tinha ali um ginásio montado, ou tem que montar?

D.8 – Não, é como eu falei, é um ginásio só para o curso de Educação Física, para tudo, aula de Vôlei, Basquete, Ginástica, Judô, Handebol, apesar de ter uma quadra descoberta, quem ia fazer aula nesse sol? Iam todos para o ginásio, Futebol de Salão, além dos projetos de extensão que vão todos para o ginásio, todos pedem lá. É um ginásio que tem quatro paredes e a linha fica a um metro da parede, então o que você faz ali, você imediatamente tem que correr e desmanchar porque vem vindo outra turma, então é um stress a vida toda ali dentro (risos).

P – Tem uma barra lá, alguma coisa?

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D.8 – Tem, encostada lá, mas não montada. Se eu vou dar aula (...) tem um aparelho lá, as argolas, eu montava aquelas argolas lá uma vez por ano, porque não tinha jeito a argola era aquele baita (...) aparelho alto, de ferro, a gente chamava os alunos, ‘olha vamos ter aula de argolas’, a parte prática, para o pessoal ver experimentar, fora a parte teórica, então a gente tinha que armar logo porque senão a aula acabava, todo mundo levantando e, acabava a aula você tinha que desmanchar, desarmar, guardar lá no quarto, porque já estava vindo outra aula atrás. Então se perde tempo armando os aparelhos e desarmando, isso para barra paralela simétrica, assimétrica, a simétrica até que fica lá encostada na parede, mas a assimétrica a mesma coisa, barra fixa a mesma coisa, tem que ficar armando e desarmando logo em seguida, então eles aproveitavam o mínimo durante o curso.

P – Assim você acabava sendo, dentre as disciplinas esportivas, talvez o maior prejudicado?

D.8 – É, por causa dos aparelhos, da aparelhagem. Você tinha que estar montando, desmontando, então era um negócio aquilo lá, um stress mesmo (risos). Isso foi sempre pedido, sempre uma briga, para ter um puxado lá, deixar os aparelhos montados, isso seria ótimo para desenvolver os projetos de extensão, mas não funciona, o projeto de extensão que funcionava (...) a Ginástica Artística que funciona lá é só o solo, não funciona, os aparelhos (...) solo e salto, porque tem um cavalo lá também né, mesa não existe, mesa para as aulas não existe; colocava o cavalo para salto lá, o plinton, esse é o projeto de extensão que tem lá, e a trave de equilíbrio para as meninas, mas os aparelhos de montar, não monta, não dá tempo, não tem condições, porque vem gente atrás, então essa é a estrutura que a gente tem na Universidade I e, isso sempre foi assim.

P – Isso atrapalha na formação (...)

D.8 – Lógico, e muito! Você não vivencia, o aluno não podia vivenciar, por exemplo, se tivesse uma sala armada, um ginasinho lá armado, as pessoas iam lá brincar, iam lá subir na barra, ia tentar fazer um movimento, mas sem estar montado, sem estar lá no lugar, não tem jeito, não tem como fazer, não tinha como vivenciar nada né, porque é gostoso, se tivesse uma barra lá até eu mesmo ia brincar sempre, armada né, fixa, mas sempre foi assim, então fica difícil.

P – Além dessa disputa de espaço você percebia alguma disputa entre disciplinas de cunho mais prático, como a Ginástica, com as de cunho mais teórico, tinha algum embate?

D.8 – Não, porque as de cunho teórico raramente era lá no ginásio né, então não tinha problema.

P – Não, mas dentro da própria Universidade, minha disciplina é melhor que a sua e (...)

D.8 – Ah ta. Não, eu nunca percebi isso não, não, nunca senti isso não, porque achava que porque era teórico, a pessoa fica mais na sala (...) nunca senti isso não, porque a minha era prática e teórica também, eu não ia só para a prática não; na verdade a porcentagem era um pouco mais na prática do que teórica né, mas eu me sentia bem, me sentia bem na disciplina, não me sentia assim discriminado por outra disciplina que fosse teórica não, nunca percebi, nunca senti isso.

P – E para a gente fechar, porque do meu questionamento já terminou, agora é curiosidade mesmo (risos), o que você acha que falta para melhorar a Ginástica; você falou que a Ginástica, aqui especificamente, ela não está funcionando; num contexto

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mais amplo você disse que não é reconhecida e tudo mais; e também tem a briga de espaço que você relatou em vários momentos; o que você acha que poderia ser feito para melhorar a Ginástica Artística em todos esses contextos?

D.8 – Se fosse para melhorar mesmo, que nas escolas, como estão cobrindo quadras, as escolas públicas estão cobrindo quadras agora, que investissem em equipamento nas escolas públicas, e nessas próprias quadras aí ter um espaço para desenvolver Ginástica; nos programas, não sei, do MEC ou do governo, que coloque no programa escolar o desenvolvimento da Ginástica Artística né, e dando condições para isso, comprando os aparelhos, comprando pelo menos colchões bons, mesa para salto, pelo menos os aparelhos mais básicos, trave de equilíbrio né; que fizesse isso, porque aí ia começar surgir crianças, que nunca teve oportunidade e nem sabem o que é isso, e aparecer talento que brincando ali elas iam ser pescadas por escolinhas né, pelo menos o que tem aqui de autarquia, que tem aqui essa escolinha que funcionava né, pescar nessas escolas e selecionar; fazer um evento né, uma vez por ano ou duas vezes por ano das escolas, um Festival de Ginástica Artística, porque ali ia ter professor da escolinha de olho em crianças que podem surgir né, porque pode surgir um talento e levar para a escolinha, daí da escolinha ela vai se especializar, ela vai começar a treinar. Eu acho que faltaria o incentivo dessa forma né, e exigir que se dê um pouco de Ginástica na escola, no programa estadual, no programa escolar, que se dê a Ginástica e dar condições para isso. Então dessa forma, eu acho que ia surgir talento, porque deve se perder muito, deve se perder muito, é o exemplo da Daiane, que ela foi achada por acaso, meio tarde, se ela tivesse oportunidade na escola, se ela tivesse aparecido um pouquinho antes, bem antes já teria conseguido muitas competições aí, bem antes já teria ido para as Olimpíadas, mas eu acho que falta esse incentivo né, festivais para depois a escolinha chegar (...)

P – Seria (...) se a gente melhorar a base, talvez a Universidade abrace e (...)

D.8 – Pois é. Porque a Universidade com os seus alunos poderia estar indo fazer um estágio nas escolas públicas, e o professor da Universidade cobrar dele a parte de Ginástica Olímpica nas escolas; ele não vai encontrar na escola um professor já de idade dando Ginástica Artística né, eu acho difícil, mas que nos estágios práticos ele fizesse com que eles desenvolvessem Ginástica Artística na escola e dali, dessas escolas, depois fazer um evento, para poder detectar algum talento, mesmo que tenha feito uma vez, duas vezes, a criança as vezes faz e não sabe que consegue fazer aquilo, ela própria não sabe e alguém olhando fala ‘essa tem futuro, tem talento’, e ela pode ser pescada e jogada em uma escolinha e aí sim aparece, aparece alguém que vai despontar no esporte, na Ginástica; eu acho que seria uma das saídas, deve ter diversas formas pra poder evoluir a Ginástica, eu acho que essa aí seria uma forma delas, você não acha também que poderia ser assim? (risos)

P – Eu acho que a minha escola poderia comprar alguns equipamentos também (risos), porque eu sou uma ex-ginasta e poderia ensinar outras coisas para os meus aluninhos né. Mas eu já consegui ensinar cambalhota, porque tem colchão, ensinar saltinhos, eles sabem saltar grupadinho, girinho, afastado, e assim vai (risos).

D.8 – Mas então, é dessa forma. Eu acho que se fosse querer mesmo fazer um desenvolvimento no Brasil, deveria partir do governo né, dar subsídios para as escolas, mas tem que ter gente competente também, forçar que escola encontre uma maneira de desenvolver o conteúdo de Ginástica Artística na escola. A escola não tem um professor capacitado, que não é o seu caso, o que ela faria? Buscaria um estagiário da faculdade, porque o estagiário ele vai estar ali por dentro, o cara que já fez a disciplina de Ginástica Artística, o básico, ele vai lá na escola e faz o desenvolvimento lá, que seria o estágio

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dele, então a partir daí eu acho que poderia ajudar quem não tem a prática, o professor que não consegue dar né, pode ter o matérial e não consegue dar, não é o seu caso, você sabe, pode dar e não tem o material.

P – Mas eu tento e consegui muitos resultados.

D.8 – A sim, a gente tem que se virar né, tem que ser polivalente. Mas eu sei que você vai sempre ter dificuldade por falta do resto da aparelhagem, não vai ter um desenvolvimento (...) é você descobrir alguém que é bom no solo, ali com movimentos básicos, e encaminhar para uma escolinha onde tem os aparelhos, porque na escola não vai ter jeito né.

P – Porque na escola não especializa aluno.

D.8 – É, mandar para uma escolinha onde tem um professor que vivencia no dia-a-dia aquilo lá, que ensina a técnica, ensina tudo, encaminhar (...) mas eu acho que a Ginástica sempre foi, e sempre será meio complicado o desenvolvimento, sair disso aqui para melhorar muito, se melhorar vai melhorar pouco né; é ter mais competições dentro do país, nacional; ter competições entre cidades, não só (...) temos o regional, temos o aberto, mas são poucas equipes que se destacam, são poucas cidades que tem escolinhas para competir, mas eu acho que a Ginástica no geral ela tem muita coisa (...) deveria ter muita coisa para desenvolver, para melhorar, apesar que melhorou, o Brasil nunca foi em uma Olimpíada com uma equipe completa, como foi, a classificação que eles ficaram, classificaram a equipe (...) acho que eles levaram na outra uma equipe (...)

P – Essa última foi equipe, em Atenas acho que competiu Daiane e Daniele, e lá em Atlanta foram quatro, mas destacou Daniela e Camila Comim.

D.8 – A primeira com equipe foi agora, então você vê que melhorou, eu não sei se essa melhora foi devido a vir técnico de fora, não sei se foi isso né, pode ter ajudado, e ele fez uma seleção permanente para ficar treinando direto.

P – Eu acho, e é só uma opinião, que quando você tem uma pessoa de fora, você da um valor tão grande, que ela consegue trabalhar, se investissem em gente daqui, acho que trabalharia da mesma maneira.

D.8 – É verdade, mas no geral lá em cima já melhorou, melhorou bastante, chegou em finais né, com as meninas, o masculino nem a equipe ainda não foi, e chegou também em uma final lá, quer dizer, falta bastante ainda, mas está aparecendo, ta chegando. Eu acho que no mundo todo dá para contar nos dedos os países que se destacam também né...

P – Mas, alguns têm na escola, como você falou, ‘ter a Ginástica na escola’, tem país que tem (...)

D.8 – Mas esse já é um país que sempre vai estar ali na cabeça, nas finais, é um incentivo grande, aqui no Brasil, pó se chegar a ter isso, pela vontade das meninas, eu acho que se tivesse nas escolas que nem em outros países, eu acho que seria uma potencia em Ginástica né, ia destacar; um país grande como esse, ter um inter-estadual, um nacional, um campeonato nacional, ia aparecer atleta de tudo quanto é lado que ia estar brigando pela Seleção, pra estar permanente na Seleção; eu acho que se tivesse incentivo ia ser de ponta mesmo, país de ponta mesmo, as Olimpíadas ia estar nas cabeças (risos).

P – Eu pretendo ver isso! (risos)

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D.8 – Eu também (risos), mas eu não sei se tem algum projeto para isso, eu não sei, você sabe se tem?

P – Eu ouvi falar de centros que estão sendo montados, centros específicos como tem lá em Curitiba, mas eu não sei o quanto isso beneficia tantas outras pessoas, que não só o esporte de alto rendimento, não sei se tem escolinhas, creio que se faça seletiva, se selecionam crianças.

D.8 – Aham, porque as escolinhas era o ideal também, porque se tem muita criança, e que ia tirar a criança do (...) se ela não fosse desenvolver a Ginástica, acho que ela ia desenvolver uma vontade de fazer esporte né (..)

P – É! Ia desenvolver uma consciência corporal melhor, mas eu não sei, esses centros talvez se direcionem só para o alto rendimento até, então não sei até que ponto isso melhora para se disseminar a Ginástica Artística para outros lugares, mas espero que mude, ou que não seja isso (risos)..

D.8 – A gente espera mesmo que desenvolva, seria bom para a população, para o Brasil, seria ótimo.

P – Sim e nosso bate papo também foi ótimo (risos), eu agradeço.

D.8 – (Risos) Não tem de que. Eu também achei muito bom, e se precisar de mais alguma coisa é só ligar.

P – Ah, obrigado.

Docente 9 – Outubro/2008 – 0h49min

P – Eu queria saber primeiro dos conhecimentos essenciais para se ministrar Ginástica Artística na licenciatura, quais são os conhecimentos imprescindíveis a serem passados?

D.9 – Bom, é (...) pra trabalhar não só Ginástica Olímpica, mas qualquer modalidade na licenciatura, primeiro eu preciso de uma coisa, é ter esse conhecimento básico da nossa área específica da Educação Física; diga-se de passagem que o nosso conhecimento específico da área de Educação Física hoje passa pelo conhecimento de outras áreas, hoje não existe mais uma Educação Física isolada de outras áreas né. Então o conhecimento de áreas, por exemplo, como da Biologia, da Fisiologia, da Psicologia, da Sociologia, da Pedagogia, todas essas fazem parte da formação do professor; então a primeira coisa é essa, é a gente ter esse conhecimento básico né, numa direção à licenciatura já que a proposta é licenciatura, porque uma coisa é eu trabalhar esporte numa forma de manifestação escolar, pedagógico, outra coisa é eu trabalhar o esporte numa forma de manifestação do treinamento de alto rendimento, então esse é um lado da história; o segundo lado da história é eu ter o conhecimento específico da modalidade que eu quero trabalhar, eu também volto a repetir a gente não precisa ter um conhecimento de Ginástica Artística tal como precisa ter um técnico de alto rendimento, é um conhecimento da área que vai nos possibilitar trazer essa informação para a aprendizagem da Ginástica Artística, então basicamente são essas duas coisas: um – é o conhecimento específico da área da Educação Física né, ressaltando que o conhecimento específico da Educação Física se entrelaça com o conhecimento de outras áreas; segundo, é ter um conhecimento específico daquela modalidade que eu quero trabalhar, no caso a Ginástica Artística.

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P – E quando você ministrava a disciplina você separava para os seus alunos conhecimento técnico de conhecimento pedagógico?

D.9 – É separar só se for em termos de estratégias de ensino-aprendizagem, porque na verdade essas coisas tem que estar juntas, por exemplo, um erro muito comum é a gente pegar aquele esporte que a gente vê na televisão como o das Olimpíadas e levar direto para dentro da sala de aula né, são tratamentos completamente diferentes, por um outro lado essas duas coisas não devem estar desconectadas; o que eu ensino na sala de aula, apesar de ser de forma completamente diferente do que se faz numa Olimpíada, no caso do esporte Ginástica Artística, esse conhecimento deve estar conectado. Quer ver só uma coisa? Criança aprende muito brincando através do lúdico, então eu posso brincar de fazer rotação, de fazer apoio, de fazer suspensão, de fazer giro, então não necessariamente eu tenho que pensar num mortal, numa pirueta carpada ou estendida, com elementos carpados ou estendidos, não necessariamente eu posso pensar num Tsukahara, mas o que eu posso pensar são nesses elementos que constroem a base da Ginástica Olímpica né, brincando; agora se eu não souber para onde eu quero ir eu brinco, brinco e não chego em lugar nenhum, então é muito importante que eu faça essa conexão, mas elas têm que ser coisas completamente diferentes diante da sua proposta, porque lá na escola, ou seja, na licenciatura a idéia não é formar atletas é levar o conhecimento de uma modalidade também esportiva, não só esportiva, mas nesse caso esportiva né, mais especificamente a Ginástica Artística, como você pergunta.

P – E como que eram as suas aulas?

D.9 – Bom, as minhas aulas, pra dizer bem a verdade, não eram as minhas aulas só, mesmo por que elas tiveram momentos muito diferentes no decorrer as vezes de um semestre, ou de um ano, ou de quatro anos, então as aulas eram construídas também em função, não só lógico do meu momento, ou seja, daquilo que a gente podia ter assimilado durante determinada época, mas também em função da expectativa dos alunos do curso de graduação e também do momento que a própria modalidade, é (...) o espelho da própria modalidade na sociedade, então de repente numa época onde existe uma Olimpíada, talvez modelos teóricos e modelos pedagógicos fossem mais ou menos enfáticos aí em função desses Jogos né, porque é uma coisa que faz parte da discussão social naquele momento; as próprias crianças em determinado momento elas são mais ou menos distantes de determinado conhecimento; então veja só, vamos pegar aqui o exemplo da Daiane, quando a Daiane ganhou lá a sua medalha, isso de repente apareceu muito mais no mundo de algumas crianças do que no de outras, isso não significa que as crianças iam ter que virar a Daiane, mas poderia favorecer a gente a falar mais de assuntos que não são tão necessários as vezes de a gente falar em aula, como regra disso, regra daquilo né, então as minhas aulas eram aulas (...) em função também da construção e da expectativa dos alunos de graduação e do conhecimento ou da cultura das crianças que seriam alunos desses futuros professores.

P – E assim, em termos de materiais, de metodologia, como que você oferecia esse conhecimento para os alunos?

D.9 – Bom, aqui na Faculdade D a gente tem bastante material, então isso né, pra ensinar à ensinar, nesse aspecto, esse conteúdo é bastante facilitado, por outro lado a gente sabe que a realidade fora daqui da Universidade é outra, então muitas das tarefas, vamos dizer assim, que eram discutidas durante as aulas, era justamente essa né, como que a gente poderia estar trabalhando esses conteúdos da Educação Física sem ficar preso a questão física, física material? Lógico que isso não significava que os alunos não deveriam sempre estar lutando, independente do lugar que eles fossem

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trabalhar, por melhores ambientes em termos de materiais de Ginástica né, mas isso também não poderia resultar na idéia de que a Ginástica Artística, na sua iniciação, ela depende de questões físicas; por exemplo, uma rotação, uma rotação eu posso fazer na grama, eu posso fazer em um colchãozinho fininho trazido de casa, uma impulsão, uma impulsão eu posso fazer saltando cordas, saltando arcos, uma aterrissagem, eu posso saltar até de cima de uma mesa para o chão, eu posso saltar de algumas gavetas de plinton para o chão né, agora o que, que é um mortal pra frente? Nada mais é do que uma impulsão, uma rotação no ar e uma aterrissagem né, é lógico que as três coisas juntas não são a mesma coisa que as três separadas, mas essas três coisas separadas é que vão construir esse elemento que a gente diria onde estão as três juntas.

P – E sobre a sua metodologia de trabalho, você acha que ela tem algum diferencial?

D.9 – É, eu acho que sim, mas não é por que eu sou melhor ou eu sou pior; eu acho que sim porque eu acho que é muito importante que todo professor tenha uma identidade própria, tenha uma possibilidade, nós não estamos mais na época da ditadura onde todo mundo tem que seguir o que vem só de cima pra baixo, eu acho que as aulas também tem que ser um pouco de dentro para fora, então nesse sentido eu acho que ela era um pouco sim diferente, da mesma forma que eu tive aula com ótimos professores, independente de serem de Ginástica Artística ou não, e os conteúdos eram praticamente os mesmos entre professores da mesma área, mas mesmo assim essas aulas tinham a possibilidade de ter um pouco a cara do professor; eu ia ficar muito triste se todos os meus alunos saíssem daqui formados e dessem aulas iguaizinhas a mim, espero que cada um depois tenha o seu jeitão próprio de ministrar o conteúdo.

P – E como você observa a Ginástica Artística hoje, dentro e fora do contexto universitário?

D.9 – Dentro do contexto universitário eu acho que ela avançou bastante né, porque a Universidade tem esse papel, de buscar e atualizar esse conhecimento, infelizmente fora da Universidade isso ainda é muito pobre; agora, se ta melhor dentro da Universidade, como que pode estar pior fora da Universidade se o papel da Universidade é justamente atingir, trabalhar no contexto social? Bom, é que a Universidade tem um papel, mas ela não é a dona da verdade; então a cultura esportiva né, ela não depende só do que a Universidade faz, do que os professores fazem, ela depende também; então, o que existe fora da Universidade em termos de aprendizagem de Ginástica Artística ainda é muito pobre né, talvez até por conta dessa falsa idéia da maioria dos professores acharem que a questão do recurso físico é primordial no ensino da Ginástica Artística, eu acho que ela pode ser até essencial, pensando no grande desenvolvimento, no desenvolvimento mais rápido e melhor, mas ela não é essencial para que você possa levar essa informação básica; como a gente comentou antes, num apoio invertido, que pode se transformar numa parada de mãos num aparelho como nas argolas, ou nas paralelas, ou mesmo de forma dinâmica num salto Tsukahara de repente onde você praticamente passa pela posição invertida e, não que você pare na posição invertida, mas tudo isso pode ser imaginado ou pode ser trabalhado como uma base né, em qualquer lugar que não tenha muito material, desde que o professor saiba dar segurança de forma adequada.

P – E como você vê a Ginástica na formação do professor ou a importância dela na formação do professor?

D.9 – Na formação do professor no curso de Educação Física? Em licenciatura?

P – É, de licenciatura!

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D.9 – Então, eu acho assim que a gente deve ter, porque a Ginástica não só por conta da sua história, independente de hoje ela ser menos popular que outras modalidades, a Ginástica carrega consigo algumas características bem diferenciadas né em relação a outras modalidades; o equilíbrio para você ter uma idéia, nós temos o equilíbrio em quase todas as modalidades, mas na Ginástica Artística nós temos um aparelho específico que trabalha o equilíbrio; os apoios invertidos, em muito poucas outras modalidades nós temos o apoio invertido; as rotações, nessa forma de rotação para frente ou rotação para traz ou combinação de rotações, também temos muito pouco em outras modalidades; vale lembrar que a Ginástica não é melhor que as outras, por exemplo, os jogos coletivos trazem consigo né, uma idéia de sociabilização e tal, que a Ginástica não tem por si; o trabalho com bola, por exemplo, os aparelhos da Ginástica são todos fixos, a bola é um material onde o aluno de repente não tem uma certa dimensão de relação espaço temporal; então na aprendizagem na licenciatura eu acho que é possível trabalhar Ginástica Artística buscando também esses itens como sociabilização, jogos coletivos, por que não (?0 apesar de ser uma modalidade individual né, atividades com bola, com arco, com bastões, tudo isso também pode estar acontecendo no ensino da Ginástica Artística. Agora já que nós estamos falando em licenciatura, então nada melhor do que a gente pensar em desenvolvimento motor global, e se na Ginástica a gente tem algumas dessas características né, que se trabalha com mais ênfase do que em outras modalidades, porque não então a gente reforçar essa idéia da Ginástica Artística.

P – E você acha que os alunos que você chegou a formar trabalharam Ginástica Artística na escola?

D.9 – Bom, os alunos que a gente tem conhecimento, quer dizer, tem vários alunos que a gente tem conhecimento que trabalham, a gente tem desde um menino, um dos primeiros alunos aqui que foi um monitor da disciplina de Ginástica Artística, o Marcelinho, que depois foi para os País G fez mestrado, doutorado e hoje é professor de uma Universidade lá, quando ele saiu daqui ele saiu com um projeto que ele fez aqui no curso de graduação, foi o projeto dele que ele ingressou no mestrado lá nos País G e, junto com o mestrado o que ele fazia era lecionar a Ginástica Artística né, para crianças lá, que era um dos focos do trabalho dele, que era desenvolvimento motor com o conteúdo da Ginástica Artística; nós temos outras pessoas, como um pessoal que depois foi morar em Cidade E, que acabou fazendo um trabalho de Ginástica com crianças da periferia lá né, esse trabalho tem até hoje nos centros esportivos, ele é que não está mais, ele está em outro emprego né, que esse era vinculado a prefeitura; então a gente tem, a gente tem outro tipo de trabalho de Ginástica Artística que foi de uma outra aluna daqui, que hoje está fazendo mestrado também com esse foco, que trabalha Ginástica Artística com pessoas com deficiência visual; então a gente tem aí, esse da deficiência visual foi com crianças e, nós tivemos outro aí, que era aquele que você estava vendo no filme, que era com adultos, mas era iniciação; então a gente tem sim essa feliz notícia de saber que tem uma porção de gente que esta trabalhando com Ginástica Artística; tem uma outra ex-aluna que virou professora que esta trabalhando na faculdade com formação de recursos humanos, então a gente tem bastante gente aí trabalhando com Ginástica Artística.

P – Vocês têm a vantagem de ser bem cultural aqui né?

D.9 – Como assim cultural?

P – A Ginástica tem uma cultura forte aqui. As Ginásticas né!?

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D.9 – É tem, tem sim! Agora eu, por exemplo, eu não estou mais lecionando Ginástica Artística né, e por uma coisa saudável, a gente tem outro professor aqui que veio pra Faculdade, prestou concurso e, que ele está muito mais envolvido com esse conteúdo da Ginástica Artística e ta também bastante atualizado sobre tais conteúdos, então (...) assim, nesse sentido, a gente pode dizer que a cultura da Ginástica Artística ela não é mais de domínio de um ou de outro professor, ela já faz parte um pouquinho da cultura da escola.

P – E você estava me falando das pessoas que saíram daqui e que se formaram e que estão trabalhando, mas e na escola, você acha que a partir do que você ministrava eles estariam aptos a apresentar alguma coisa para as crianças na escola?

D.9 – Não, não só estariam, como estão e, estão fazendo, por exemplo, nós temos duas meninas aqui que se formaram e uma já está no doutorado e a outra no mestrado também, elas têm um trabalho com Ginástica nas escolas, assim (...) tem algumas cidades, até uma no interior, uma em Cidade L, tem essa em Cidade E também, tem uma em Cidade M, então eles têm um trabalho de Ginástica nas escolas.

P – E o que você julga impeditivo para a Ginástica estar sendo lecionada nas escolas?

D.9 – Então, eu acho que em primeiro lugar é, as vezes, a falta de um conhecimento mais atual de Educação Física, não é nem de Ginástica, é (...) vou tentar reforçar uma coisa que talvez eu tenha falado rapidamente; vamos pegar aqui dois autores clássicos da Ginástica Artística, bem fáceis, vamos pegar três aqui Jaques Leguet, o Carrasco e o Pierre Soler; os três pensam na Ginástica sedimentando-a em vários elementos; então o Carrasco, por exemplo, tem o que ele chama de as dez famílias da Ginástica, o Leguet faz mais ou menos a mesma coisa só que ele tem doze, lembrando que algumas dessas famílias se multiplicam; por exemplo, o Carrasco coloca lá rotação para frente, rotação para traz, combinação de rotações, o Leguet já coloca rolar sobre si mesmo, se eu não me engano, pode ser qualquer um daqueles rolamentos; então se eu pensar na Ginástica Artística dessa forma, eu não preciso de material, muito material, eu volto a repetir o material é sempre muito importante para a gente andar mais rápido e as vezes andar melhor, mas não é ele que vai deixar a gente andar ou não; então rotação, apoio invertido, suspensão, apoio, giro, todas essas coisas que eu acabei de falar você pode fazer sem material nenhum, pode fazer com um arco, pode fazer com uma corda, com uma barra qualquer né, que não necessariamente a barra fixa específica da Ginástica; então eu acho que falta as vezes conhecimento das pessoas em poder trabalhar esses elementos básicos sem precisar pensar naquela Ginástica de competição, tudo isso é encaminhamento; é como se eu estivesse em uma escola e eu não tivesse bola de Basquete, tivesse só aquela bola de futebol de couro, não tivesse cesta, tivesse só cesto de lixo, e não tivesse uma quadra de cimento, tivesse só uma quadra de terra, se eu ensinar para os meus alunos os fundamentos básicos do Basquete como, arremessar, recepcionar, fazer a cesta, fazer o drible, fazer a bandeja, tudo isso eu posso fazer nessas condições mínimas; o aluno vai aprender a jogar direitinho Basquete? Talvez não, mas ele vai aprender os fundamentos, no primeiro momento que ele tiver numa escola que tenha mais material, com certeza ele vai fazer isso muito melhor do que alguém que nunca vivenciou isso, e na Ginástica é a mesma coisa, se os alunos aprenderem a vivenciar essas situações básicas, na primeira oportunidade que ele tiver de encarar um lugar que tenha material mais seguro, mais adequado, ele vai ‘tchum’, avançar muito mais rápido; agora eu também acho que não é por causa disso que a gente tem que pensar que todo mundo que vai trabalhar na escola vai ter oportunidade um dia de ir para um lugar que tenha bastante material, mas esses elementos básicos podem fazer parte do desenvolvimento motor da criança global e, isso é que é importante; então eu acho que o que falta é um pouco de reflexão às vezes,

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ou falta de debate, de conhecimento das pessoas em saber que a Ginástica Artística, em determinados momentos pode ser tratada de um jeito né, e depois em outros momentos de outro, esses determinados momentos de um jeito significa que se eu não tiver muito material ela pode ser trabalhada sim com uma forma bastante simples, básica, mas própria da Ginástica Artística.

P – E cada Universidade utiliza um programa, uma ementa, como você acha que poderia estar contextualizada nos currículos para que ela chegasse melhor ou mais fácil na escola?

D.9 – Bom, aí já é uma discussão mais (...) que eu diria maior; aí nós não estamos mais falando só de uma relação entre o professor e a disciplina, nós estamos falando de uma relação entre a disciplina e o currículo todo da escola né, ou as expectativas da escola, ou seja, numa Universidade onde você tem licenciatura, bacharelado e também já, diretamente vinculado a isso, você tem pesquisas na pós-graduação, então o jeito talvez de você pensar o currículo da graduação já possa ser diferente, porque você não esta pensando numa coisa estanque. Agora você vai para uma Faculdade, nós temos Faculdades muito boas, inclusive aqui na região, mas que trabalham só a graduação e não tem pós-graduação e, trabalham só licenciatura e não tem bacharelado, é (...) então a expectativa, a perspectiva na formação lá da grade curricular e, mais especificamente da Ginástica Artística, eu acho que tem que ser diferente do que numa Universidade como aquela que a gente comentou, então não dá pra a gente falar que tem que ter um padrão igual pra todas as Faculdades não, eu acho que não.

P – E quando você estava ministrando a disciplina, como que ela se encontrava no currículo, optativa, um semestre, dois, como que era?

D.9 – Tinha as duas coisas. Tinha a disciplina no currículo comum básico lá pra licenciatura, depois a gente tinha no bacharelado e tinha inclusive a disciplina eletiva, que era oferecida, inclusive, para alunos de outros cursos que não são só da Educação Física.

P – Você chegou a atuar em todas?

D.9 – É!

P – E você que montava os programas?

D.9 – Então, até um determinado momento, tínhamos eu e uma outra professora, a professora Márcia, nós dois que montávamos, depois a professora se aposentou e fiquei eu, agora para o próximo semestre é que deve ficar o outro professor que eu comentei que entrou, aí eu posso ficar mais dedicado a outras áreas que fazem parte mais da minha atividade de pesquisa.

P – E você, ou melhor, quando vocês montavam o programa, tinha interferência da comissão de graduação?

D.9 – Tinha, sempre tinha interferência, porque tudo o que a gente pretendia fazer ou que ia formalizar, era discutido na comissão de graduação, agora essa interferência sempre foi muito saudável, porque ela sempre vinha acrescentar, as vezes a gente não conseguia enxergar algumas coisas, vinham sugestões e, é lógico que sempre quem tem mais propriedade pra falar sobre os encaminhamentos necessários é o professor que está envolvido mais diretamente, no caso o professor da disciplina né, então a opinião dele também era sempre muito respeitada, mas isso não significava que os professores da disciplina não tinham que aprender ou que discutir com os professores das outras disciplinas, já que nós comentamos anteriormente, que não dá mais para

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pensar em Educação Física como uma coisa só do movimento do homem, como diz Parlebas nós temos que pensar o homem em movimento, então a gente tem várias questões aí que elas não podem ser pensadas só pelo viés mecânico ou técnico da modalidade.

P – E o programa era coerente com a formação de professores?

D.9 – Pelos resultados que a gente tem tido, a gente acredita que sim, porque os resultados tem sido bastante satisfatórios, tanto aqueles que acabaram indo pra trabalhar em escolas, quanto aqueles que resolveram fazer isso como uma ponte pra vida acadêmica, trabalhando hoje com pesquisa ou com Faculdade; nós tivemos até aluno que nunca conheceu, que nunca tinha feito Ginástica Artística, isso é uma coisa diferente, acabou conhecendo isso aqui na escola e hoje faz parte daquele Cirque du Solei, então eles acabaram se dedicando assim, digamos a uma outra perspectiva, mas que ainda é sobre a tutela aí da Ginástica Artística.

P – E a avaliação desses alunos?

D.9 – Ah a avaliação, aí eu vou dizer uma coisa pra você, isso eu acho que também é uma coisa que a gente tem aprendido muito aqui na Universidade, porque tem muitas coisas que são avaliadas, muitas coisas diferentes e, por exemplo, o vestibular é uma coisa que cresceu demais dentro da história da avaliação; os próprios cursos de graduação e pós-graduação também tiveram modelos aí que sempre vinham sendo repensados; particularmente como a Ginástica Artística, particularmente eu digo aqui com os casos que a gente convivia, como a Ginástica Artística na maioria das vezes ela quase que não fazia parte da cultura da maioria dos alunos que vinham fazer, então a idéia primeira era fazer com que os alunos gostassem de Ginástica Artística né, num segundo momento que eles tentassem se aprofundar sobre esse conteúdo, então falar que a prova era um elemento essencial para dizer que eles aprenderam ou não, isso a gente percebeu que não cabia muito, então talvez coubesse mais como avaliação né esse feedback dos alunos em termos do interesse deles quererem se aprofundar mais, ou se envolver até com outras disciplinas posteriormente, como aquela disciplina eletiva que a gente falou, ou participar de projetos de extensão, como esses que a gente falou, como esse com as pessoas com deficiência, ou com as crianças, então isso tudo para a gente era uma resposta, que a gente não podia de certa forma formalizar até o final do semestre né, mas que era o que a gente queria tentar alcançar; então a avaliação entre essa disciplina e, talvez até outras disciplinas que a gente mesmo estivesse envolvido, eram completamente diferentes; então quando a gente fala em avaliação logo a gente pensa em prova, aquela coisa toda, então eu estou falando tudo isso pra você não pensar em prova quando eu penso em avaliação, isso pra mim são duas coisas completamente diferentes.

P – E então como você dava essa nota? Se eu não posso pensar na prova né, como que você fazia?

D.9 – Bom, algumas coisas são essenciais né e, a gente precisa ter um termômetro aí. Um, é a participação, ela é essencial; a segunda coisa é o interesse, porque o aluno podia estar participando e estar completamente desinteressado, e esse interesse podia vir não só em função do envolvimento dele prático na aula, como também do envolvimento de outra forma; vamos pegar aqui um aluno que de repente tivesse operado o joelho e não ia poder fazer praticamente nenhuma parte prática durante o semestre todo, o que já aconteceu, isso não significava que o aluno não estivesse lá presente, que ele não estivesse lá, as vezes, tentando até proteger ou não algum aluno, ou não estivesse elaborando atividades quando os alunos todos estão elaborando

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atividades para acontecer na aula, ou que ele não estivesse fazendo anotações durante a aula, então eu acho que essas duas coisas são as mais importantes pra mim né, a presença e a participação. Agora, é lógico que se o aluno faltar muito ele repete? Se o aluno faltar muito ele podia repetir sim, até por uma característica do modelo oficial aqui que a gente tem de cobrança, então a presença é importante, mas muito mais que a presença é a participação; agora a presença ela pode ser justificada, pode ter um motivo para ele ter faltado né, então quando o motivo é desinteresse a gente pensa mesmo nessa não presença como uma coisa ruim, agora pode ser que ele não venha em uma, duas, ou até três aulas em função de uma coisa que era necessária e isso não retrata potencialmente o desinteresse dele; mas vamos assim, para ficar mais fácil a história pensar, que a participação e o interesse sejam os itens mais importantes para a gente poder avaliar o aluno.

P – Você estava falando da avaliação e, eu acho que faltou eu perguntar isso lá atrás, a parte teórica e prática, como você vivenciava isso com eles?

D.9 – Bom em determinados momentos é preciso que você realmente (...) torne a aula muito mais teórica do que qualquer outra coisa e, quando eu falo teórica, isso também não é uma coisa só do professor. Por exemplo, digamos que os alunos tivessem que estar em um determinado momento, elaborando estratégias para ensinar um grupo de alunos em uma escola sem muito material, então quer dizer, eles estão todos lá pensando, escrevendo, formalizando, debatendo, então é como se fosse muito mais uma atividade teórica do que prática, isso não impede que a gente levasse essas idéias depois para a prática, ou dentro da Universidade, ou mesmo fora da Universidade. Agora, nas aulas práticas elas, na minha opinião, elas tinham e devem ter dois sentidos. Um, é o aluno curtir as aulas, às vezes, em determinados momentos, principalmente para aqueles que não conheciam Ginástica, às vezes eles curtirem, brincarem e gostarem de fazer Ginástica né, dentro das possibilidades de cada um; é lógico que a gente tinha aí aluno que era atleta até de Ginástica e, aqueles que nunca tinham feito Ginástica na vida, mas de qualquer forma para todos o importante era gostar de fazer, então esse era um momento; o outro momento da prática era também brincar e aquilo incorporar na vida profissional dele; então tinha momentos de prática que era importante as pessoas entenderem pra que que aquilo ia servir, se aquilo de repente poderia servir para qualquer grupo, as vezes algumas coisas que a gente faz para uns alunos do curso de graduação pode ser super legal, super importante, mas não significa que a gente ia fazer aquela mesma brincadeira com criança né, porque nós estamos trabalhando aqui com idades, com aspectos afetivos e cognitivos de outra escala, eu não digo maior ou menor, mas diferentes, escalas diferentes; então as vezes brincar de uma forma com um adulto, para eles gostarem, é importante, é importante eles também perceberem isso, ou mesmo no aspecto físico, vamos dizer que as vezes a gente fizesse uma brincadeira aqui no tablado de quadrupedia, de correr, brincar de pega, então isso dava para fazer, nesse material, e se eles fossem para uma quadra que fosse só de cimento? Eles poderiam fazer trabalho, um trabalho de quadrupedia, mas talvez brincando de corrida, de pega, não fosse adequado porque as crianças poderiam se machucar. Então a prática ela tinha que ter também por si, em função da idéia de as aulas serem ensinar a ensinar e não ensinar a fazer, elas tinham que ter uma reflexão em resumo teórica e prática, elas andavam casadinhas aí.

P – E você percebia, especificamente quando você estava ministrando Ginástica Artística, se a Ginástica sendo uma disciplina de cunho mais prático, tinha alguma disputa com as disciplinas de caráter mais teórico?

D.9 – Não! O que não dá pra negar é que tem gente que gosta mais de Basquete, do que de Vôlei, tem gente que gosta mais de Anatomia do que de Biomecânica, e não é

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difícil de a gente acreditar que tenha gente que goste mais de Futebol do que de Ginástica Artística, ou tenha gente que goste mais de Ginástica Artística do que de Natação, ou tenha gente que goste mais de Sociologia do que de Ginástica Artística, ou gente que goste mais de Ginástica Artística do que de Biologia, então não é que exista uma disputa entre uma disciplina ou outra, o que há é um entendimento de que todas essas disciplinas são importantes né, então, por vezes algumas que a gente não gosta tanto quanto outras, elas não devem ser desmerecidas né diante da formação de alunos, agora é lógico que não podemos negar que tem gente que goste muito mais de uma disciplina, mesmo por que como a gente disse a Ginástica, ou algumas disciplinas práticas, elas trabalham assim de forma mais fácil, não que as outras não devam ser trabalhadas, mas trabalham de forma mais fácil com outras relações junto com o aluno além daquelas cognitivas, por exemplo, quando você está em um esporte coletivo né, você pode chorar, ficar bravo, ficar contente, é muito mais espontâneo e faz até parte do momento ali de prática, do que sentado assistindo uma aula de anatomia; não que a aula de anatomia não possa ter uma relação mais direta, alias essa é uma critica de vários conteúdos que acontecem na escola né, a gente acha que a escola esta atrasada porque não trabalha determinados conteúdos, em algumas escolas a gente vê História, Geografia sendo trabalhadas numa relação com o mundo que está ali fora né muito rica, por outro lado as vezes a gente não vê isso em algumas escolas; e também não dá para negar que Educação Física a gente também enxerga aí em algumas escolas que exploram um conteúdo, como a gente comentou antes, uma coisa só de cima pra baixo, tipo o que se fazia a muito tempo atrás, fazer mais para pensar menos né e isso não deveria acontecer. Então essa disputa, ou esse clima isso vai depender muito dos alunos, do interesse dos alunos, do interesse dos professores, não só de uma disciplina mas de várias, porque não, a gente não pode pensar que a gente poderia ter aqui na escola uma disciplina de Neuro-Anatomia que fosse muito mais interessante do que uma aula de Futebol, pode ser né, isso vai depender de um e de outro professor.

P – E para finalizar, e o professor, falando agora do professor universitário, não da formação daquele que vai atuar na escola, porque você forma aquele que vai atuar na escola; mas como que chega esse professor para ministrar aqui, como você entende que deveria ser a formação de quem vai chegar aqui para ministrar Ginástica Artística; hoje você não ministra mais, tem a sua vaga lá, como que tem que chegar esse professor que vai entrar no seu lugar, porque também há o fato verídico de que o mestrado forma um pesquisador e não um docente, então quem forma, como ele deve chegar aqui para atuar?

D.9 – Bom, na Universidade D tem uma série de regrinhas que fogem daquela alçada comum de uma Faculdade que não forma também pesquisador, então o que, que eu estou querendo dizer? Para um professor ingressar aqui na Universidade D para lecionar, ele tem que prestar um concurso público, como também em outras Universidades públicas, não é só aqui; esse professor a cada três anos, no começo era a cada dois anos, agora é a cada três anos, ele tem que fazer um relatório que não é um relatório só para a Faculdade, começa a ser analisado na Faculdade e termina de ser analisado lá na reitoria; esse relatório se não estiver adequado às exigências da Universidade, olha só não as exigências da Faculdade, as exigências da Universidade, ele pode perder o seu contrato, ou ter a sua carga de trabalho reduzida aqui, então o professor que entra aqui na Universidade ele não entra só pra dar aula, ele não entra só como um professor, quer dizer, quem vai prestar esse concurso, pode ser o melhor professor do mundo, mas se ele não tiver também um envolvimento com ensino e pesquisa ele dança, aliás ele, nesse relatório trienal, tanto quanto o número de aulas, o número de alunos que ele se viu envolvido nesses três anos, é cobrado dele um número de publicações, por exemplo; também não é qualquer publicação, tem uma exigência

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mínima dessas publicações. Então eu posso ter dado muitas aulas, mas se não tiver nenhuma publicação, se eu não tiver tido nenhum compromisso, como esses solicitados na área da pesquisa, eu posso procurar outro lugar pra ir trabalhar, que nesse lugar eu não fico. Então, muito diferente de Faculdades particulares, ou de outras Faculdades que não têm pesquisa né, eu posso, às vezes, até ter condição nessas outras Faculdades de me empenhar mais na questão do ensino, mas aqui não, aqui o ensino é só uma faceta, então o professor, às vezes, tem que se desdobrar e, tem mais, na maioria dos casos, além do envolvimento com o ensino, pesquisa e extensão, os professores acabam também se envolvendo com cargos administrativos e, isso também acaba tomando muito tempo, então não é fácil ser professor numa Universidade de pesquisa, porque você tem que ser professor, tem que ser pesquisador e por vezes administrador.

P – Mas aqui são delegadas as disciplinas de acordo a característica do professor, por exemplo, eu conheço Ginástica Artística então eu vou ministrar Ginástica Artística?

D.9 – Não, isso é lógico! O professor quando presta concurso, além dessa cobrança em termos de publicação e de pesquisas, tem o envolvimento dele de experiência acadêmica em determinada área. Eu também entro, por exemplo, na área da Ginástica ou das Lutas, ou de um esporte coletivo, então eu já entro com um conhecimento específico sobre aquilo lá e, mais do que isso, nenhum professor é obrigado a dar aula daquilo que não gosta, se de repente eu não quiser mais dar aula de Ginástica, eu não dou, aí vai ser um problema administrativo meu e da chefia de departamento, da comissão de graduação, mas se eu não me sinto bem mais pra trabalhar com uma determinada disciplina, isso é possível que aconteça sem prejuízo nenhum para ninguém, desde que essas arestas sejam cobertas, tanto a aresta, vamos dizer assim da disciplina, que venha alguém com a competência de ministra-la, tanto a aresta que o professor tem que cumprir com relação as tarefas dele, dele trabalhar em outro lugar, produza em outra área e tudo mais.

P – É isso!

D.9 – Tudo bem então?

P – Sim e eu agradeço sua atenção.

D.9 – Não precisa agradecer. Agora vou responder seu questionário.

Docente 10 – Dezembro/2008 – 0h42min

P – Então, Docente 10, você não ministra uma disciplina específica de Ginástica Artística, mas você trata da Ginástica Artística dentro da sua Disciplina J, e como que você trabalha ela dentro da disciplina?

D.10 – Na verdade o que eu faço (...) a minha disciplina chama Disciplina J, é uma disciplina do primeiro ano do curso. Eu considero ela uma disciplina técnica, no sentido deles entenderem essa seção, a questão da construção, de você programar, quais são os fatores que você considera, e aí eu trabalho com eles algumas modalidades, porque eu falo que hoje a gente tem as Ginásticas do Fitness, as Ginásticas que a gente chama de as Ginásticas formativas, ou os condicionamentos físicos, a gente tem as Ginásticas de demonstração, como é a Ginástica Geral e ainda a gente tem as Ginásticas de competição, que é a Ginástica Olímpica ou a Ginástica Artística que deu origem a esse processo de formação do corpo através do exercício construído. Então nesse contexto,

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eu trabalho o conteúdo da Ginástica Olímpica, com o técnico que é o responsável pela equipe de Ginástica Olímpica da Cidade N, ele foi nosso aluno, ele tem academia com todo o equipamento, todo o material, e aí eu consigo, eu faço intercâmbio, a gente agenda aula do primeiro ano lá na academia e ele perpassa por toda essa orientação, por tudo, um pouco o histórico da Ginástica, como é a equipe, como é que ele faz para ensinar, e eu sei que é pouco assim, a princípio no currículo, mas é o suficiente para os alunos terem assim, conhecimento, contato com a atividade, e assim futuro interesse; o Alex, que é o responsável, ele aceita, ele recebe o aluno enquanto estagiário na academia, enquanto possível professor de Ginástica Olímpica, se esse tiver interesse. Nós não temos hoje mais nenhum equipamento da modalidade na Universidade em condições de uso, então esse tem sido o jeito de eu pelo menos colocar os alunos em contato com essa modalidade de competição.

P – E quais conhecimentos, agora só da Ginástica Artística, você acha que tem que ser passado durante a graduação, durante a licenciatura?

D.10 – Eu acho que tem que ter um histórico e contextualização, inclusive assim, com relação a própria modalidade dentro do nosso país, que tipo de desenvolvimento, como é que acontece essa questão da Ginástica Olímpica no país, e eu acho que ele tem que ter a capacidade de conhecer as modalidades enquanto prova de competição, quais são as provas masculinas, quais são as provas femininas e principalmente como iniciar, como dar oportunidade para que as crianças, minimamente, experimentem a modalidade; a questão dos rolamentos, do trabalho no solo, principalmente, a facilidade, todas as paradas, que são todos movimentos, elementos básicos da Ginástica, as posturas de equilíbrio, que isso é independente de material; você simular uma trave para as meninas, você ter um banco sueco e poder trabalhar. Então eu acho assim, essa parte de iniciação, de identificação do seu gestual, enquanto criança, com a modalidade e a possibilidade de você ter essa modalidade como prática esportiva, eu acho que é o conteúdo mínimo que deve ser apresentado. O aluno da Educação Física deve ter contato, a ponto de ele saber orientar, minimamente, uma questão que algum aluno possa levantar né, ‘o que é Ginástica Artística? Por que que a gente não compete? Por que que a gente compete? Por que que a gente não pratica na escola?’, quer dizer, a gente tem condição. Que tipo de material a gente pode reproduzir na escola? Então eu acho que tem algumas coisas, que o que falta para os nossos atletas é (...) para as nossas crianças na verdade, é essa oportunização com as diversas modalidades, independente do grau de dificuldade ou da complexidade da modalidade. Porque é aquela história, se a criança não passa a ter experimentação, ela não tem como fazer opção né; a gente fala tanto do Futebol, mas em qualquer esquina tem alguém disposto a ensinar e a montar um jogo de Futebol, o que não acontece com as outras modalidades né. Então se você der oportunidade para a criança experimentar outra modalidade, provavelmente, vão aparecer um monte de talentos naquelas modalidades diferenciadas, e eu acho que é isso que o professor de Educação Física tem que saber, porque assim, de um modo geral, cada dia que passa é criada uma nova modalidade esportiva; no nosso tempo a gente nem ouvia falar dos esportes radicais, mas (...) quer dizer, a questão das práticas básicas, da Ginástica como elementar, ela é fundamental para outras modalidades inclusive, quem não conhece o saltar, pular, agarrar, levantar, trepar, numa corrida de aventura, entendeu? Eu acho que isso é que é importante, a gente ter essa consciência ou esse conhecimento mínimo pra poder estimular e oferecer, oportunizar a modalidade para as crianças com quem ele vai trabalhar na escola.

P – Para o curso de licenciatura no caso?

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D.10 – Ou mesmo para o bacharel. Eu acho que a gente não enxerga, mas quem tem um bom tatame pode iniciar uma modalidade com as crianças sem, necessariamente, precisar ter todos os outros equipamentos, e ser uma escola de Ginástica Olímpica, entende o que eu quero dizer? Eu acho que dá. Dá pra você passar por um monte de experiências dentro de uma academia, que são similares a Ginástica, mas a gente não reconhece os conteúdos e eu acho que é isso que o aluno precisa ter clareza, o conhecimento, a riqueza dos conteúdos da Ginástica, qualquer modalidade delas, inclusive a de competição, na vivência da criança, isso eu acho fundamental.

P – E dentro da disciplina você conseguia, na parte de Ginástica Artística, diferenciar conhecimentos técnicos da modalidade e conhecimentos pedagógicos?

D.10 – Então, como hoje não sou eu quem trabalha muito esses conteúdos, quer dizer, fica por conta do profissional, a gente vai a academia, a gente vai conhecer, eu acho assim, é como se fosse uma demonstração, mas ela existe; tem a demonstração da menininha que vai competir, então ele leva uma menina que sabe fazer todo o gestual técnico, que é capaz de apresentar uma série, uma rotina para eles vislumbrarem o conteúdo técnico específico, como ele passa a gente tenta na aula passar, não só o aluno, mas ele entender esse processo de iniciação, como você ensina um aluno a fazer um rolamento, qual é o processo pedagógico para você incorporar, ou refinar sua estrela, entendeu, os rodantes, então isso eu acho fundamental, como é que você faz o apoio? Quantos você precisa ter, entendeu? Em termos de professor da pra dar aula de Ginástica Olímpica sozinho para dez, quinze alunos, é assim se você estiver em fase de iniciação, então é um processo complicado, porque tem toda a segurança, a questão do apoio, a orientação correta com relação ao processo pedagógico; eu acho que isso eles captam, mas é quase como uma demonstração entendeu, porque a gente não tem tempo para que todos esses conceitos possam ser efetivados, então o conteúdo da disciplina é pequeno para que a gente possa cumprir a contento todas essas características da Ginástica Olímpica, então eu acho que fica bem no nível da demonstração.

P – E como que você realiza suas aulas, em termos de apresentação de material?

D.10 – Na verdade, desde que eles começam, a gente vai fazendo práticas, entende, eu sempre questiono isso, a gente chega e faz uma prática, que prática que a gente fez hoje? Faz referencia a que? E aí, eu também uso a referencia de eles prepararem alguma prática específica, e eu passo, eu caracterizo muito os conteúdos específicos de qualquer aula de Ginástica, tipo, quais são as três partes fundamentais de uma seção de Ginástica? A coisa do aquecimento, parte principal e volta calma. Quais são as capacidades físicas, quais são as possibilidades? Falando da Ginástica de um modo geral. O que a gente treina num sujeito? Quais são os atributos que a gente pode treinar? Quais são os fatores que a gente pode considerar? A gente fala, fala e eles não dão bola; que material que você tem? Qual o espaço físico que você vai trabalhar? Quais são os objetivos da sua turma? Desde o questionar as aulas pré-coreografadas, aquela coisa de a gente ter hoje as aulas de Ginástica prontas em vídeo e fita etc, na própria academia né, na área do Fitness não trabalha com esse processo de construção, ele vem em cima daquilo do que ta pronto. Então eu questiono muito eles a questão da possibilidade de transformação, se a gente efetivamente souber compor todos esses conteúdos, entendeu, não é por que é uma aula de Ginástica Geral, não é por que é uma aula de Ginástica Olímpica, não é por que é uma aula de Ginástica de academia, toda aula deve ter aquecimento, parte principal, você deve explicar a aula para as pessoas terem uma expectativa com relação aos objetivos dela, ‘na minha aula hoje vai treinar força, eu quero que vocês morram de dor no braço de fazer força’, entende o que eu quero dizer? É uma opção da pessoa querer ficar forte ou não, não é

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sua, é uma opção de quem vai para a prática; então eu tento trabalhar com eles um pouco dessa revolução do professor, enquanto líder, enquanto sujeito, enquanto ter ação, enquanto ser propositivo e prestar mais atenção nessa composição, porque não é simples, não é fácil ser um professor com conteúdo pedagógico, com conteúdo fisiológico, com conteúdo social, eu já falei para eles, ‘será que é assim, será que a gente não tem que inserir esses objetivos no nosso contexto?’. Porque é aquilo que eu te falei, eu questiono eles (...) na escola, a escola enquanto sessão de atividade física, por exemplo, da conta de um obeso? Não dá! A escola da conta de um diabético duas vezes por semana, cinqüenta minutos? Se você pensar na Educação Física, não dá e, isso não pode estar sendo o conteúdo da Educação Física, senão a gente vai pecar do mesmo jeito concorda? Lá fora, todo mundo está dizendo que para ser eficiente para o obeso, tem que ser cinco vezes por semana, então é balela você falar para mim que ‘a Educação Física não tem que ter esse propósito’, bom não é esse, então qual que é? É um processo pedagógico de desenvolvimento? É a formação do cidadão? Qual que é? O que a gente vai cobrar do aluno? Então para que eles tenham clareza de que é muito além do físico, mesmo se você for para competição, para Ginástica de competição, a palavra competição tem um monte de outros pré-supostos de formação, de cidadania, de disciplina, de regra, que são muito maiores do que aquela prática simples e, eu acho que isso faz diferença, eu acho que hoje eles vem muito, eu to brigando agora com a progressão continuada né, porque eles chegam na faculdade achando que você tem que jogar eles lá no mercado profissional, é incrível, e eles vem com senso comum com relação a prática, concorda? Eles vêm com esse senso comum da academia, da competição, eles não conseguem enxergar o início, porque mesmo na Ginástica Olímpica, você pensa na competição, eles pensam na Daiane e no Hipólito, é muito longe do que a gente pode fazer aqui enquanto base, então eles não são propositivos.

P – Eles morrem por aquilo que eles vêem na TV (risos).

D. 10 – (Risos) É! Eles vêem aquilo, eles não têm o histórico da Daniele na Ginástica Olímpica no Brasil, da dificuldade, do que foi feito enquanto base para chegar lá, quantas crianças estão praticando Ginástica no Brasil hoje, para você ter um ou dois talentos; a possibilidade da Ginástica, enquanto vida para o sujeito, se você pensar o fator social hoje das modalidades de competição, são muito grandes, você tem um país com trezentos milhões, eu não to querendo dizer, mas você tem que dar oportunidade das diversas modalidades para o sujeito, porque se não nós só vamos ter jogador de Futebol mesmo. Se a gente não passa pela experimentação, se o professor não sabe oferecer uma experimentação diferente na aula de Educação Física, ta danado, mesmo na academia ou em qualquer lugar, a gente foge ou vai para o senso comum.

P – E a sua metodologia de aula, você acha que ela tem algum diferencial?

D.10 – Eu tenho tentado trabalhar muito com as questões que a gente chama da educação permanente, que eu acho que isso é um pouco o que eu tenho introduzido de diferencial; uma que eu sei que é o meu diferencial, é a minha prática, a minha prática é diferenciada, eu sempre fui uma praticante, você entendeu? Então o meu domínio de sala para dar uma aula de qualquer modalidade das Ginásticas é muito grande, eu acho assim um diferencial, eu vejo pouquíssimos professores com uma prática razoável hoje em dia, na Universidade então eu acho isso um problema, porque o aluno se forma achando que o único lugar que ele tem para trabalhar é a própria Universidade, que é aquela coisa da pesquisa, do só teórico, do continuar aqui, então esse é um; e o outro é tentar chamar um pouco os alunos para a discussão do processo de formação, para a reflexão, parar com aquela coisa de achar que eu tenho um monte de conteúdos específicos, eles têm que aprender aquilo, eles têm que saber aquilo, a gente tem, porque ninguém detém conhecimento. Hoje tem muito conhecimento, então a gente tem

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que ter (...) eu tento oportunizar para os alunos coisas que são mais significativas para eles, que fazem diferença. Eu acho que uma coisa assim, legal, por exemplo, esse semestre eu ofereci Disciplina J, ta bom que é obrigatório, mas você sabe como são os alunos hoje em dia, eu tenho dos quarenta e três, quase que cem por cento tem cem por cento de freqüência, então eu acho isso um diferencial, porque eles gostam, porque tem prática, eles querem porque tem prática, eles gostam porque a gente está fazendo o que eles escolheram, o que eles optaram, um pouco do jeito deles.

P – Retomando o que você falou, que você tem como exemplo ser praticante, você acha que é importante, é essencial que eles tenham pelo menos a experiência prática para poder ensinar?

D.10 – Eu acho assim, dificilmente o aluno (...) você vai convencer, ou alguém vai se propor a dar uma aula de Ginástica Olímpica só olhando os livros, nenhum professor pelo menos que eu me lembre se refere só a teoria, para dar aula prática qualquer que seja ela, eu nunca vi um professor falar pra mim que leu os livros, elaborou a aula, foi lá e deu uma aula prática legal sem ele ter experimentado uma hora. Se chegam para você e falam assim, ‘tem dez aulas no estado de Ginástica Olímpica, é um projeto de treinamento lá que eu montei, mas eu não vou poder tocar, você pega?’. Você nunca deu aula, nunca experimentou, você não vai lá sem olhar nos livros, você vai procurar onde tem aula de Ginástica Olímpica, você vai pelo menos passar pela prática antes de ir lá com o mínimo, entende o que eu quero dizer? Você não vai assumir quando falar pra você, você não vai assumir, você vai procurar quem da aula de Ginástica Olímpica, quem sabe, quem podia ajudar, quem praticou, porque não tem jeito é o referencial didático, é o referencial da prática, entende? Então eu acredito assim, é obvio que se você foi um atleta né, e você é um excelente professor fechou, mas, às vezes, um excelente professor, eu não to querendo dizer que ele tenha que ter passado corporalmente pela experiência, mas ele ta na prática, ele está desde o comecinho vendo o outro ensinar, ele pode não saber, nada fazer, mas ele pode ensinar tudo muito bem para o outro. Então eu acho que é importante sim, sem experimentação nenhuma a gente não vai a prática, o professor vai continuar sendo um professor teórico, é capaz de ele ir lá e dar uma aula teórica para os seus alunos no curso de Ginástica Olímpica, entende o que eu quero dizer? Ele vai nos livros, ele vai lá e vai contar a história da Ginástica Olímpica, ele vai fazer trezentas mil coisas, mas ele não vai dar uma aula prática, não vai fazer as crianças experimentarem o movimento, entende? Essa é a minha opinião, eu posso estar equivocada.

P – E como que você vê a Ginástica Artística hoje dentro e fora do contexto universitário, você já foi atleta, então você já visualizou ela fora, como você vê??

D.10 – Eu acho que a Ginástica Artística, não sei com relação as outras Universidades, mas ela saiu bem fora do contexto universitário. Eu não sei as pessoas que tinham, como é que ficou, por exemplo, eu não tenho conhecimento de outras Universidades, nem públicas, nem particulares, que tenham esse salão de Ginástica Artística, que trabalham com a Ginástica Artística, que tenham atletas universitários competindo; eu acho que hoje o atleta no Brasil é um E.T. com relação aos outros brasileiros, por sedentarismo, por tudo; eu acho que na Universidade ainda tem aquele contexto do cara parar para estudar para entrar numa Universidade pública, isso distancia ainda mais o atleta de da Universidade pública, os atletas hoje estudam no máximo em escolas particulares e competem e, nem sempre a Universidade é o centro de treinamento, então eu acho que a Ginástica Artística está muito distante, hoje do contexto das Universidades, eu posso estar falando besteira.

P – E assim em termos de evolução da Ginástica Artística?

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D.10 – Eu acho que piorou, as pessoas tem menos contato do que a gente tinha mesmo que a gente não praticasse muito, tinha material disponível, hoje os adolescentes têm menos espaço para esse tipo de prática, menos contato, pode ser impressão minha.

P – Mesmo com essa evolução, tendo atletas hoje na mídia?

D.10 – É isso que eu to te dizendo, a impressão que dá é que é uma coisa distante, de poucos, de centros de treinamentos, não é uma coisa que vem de um trabalho de base forte, a gente não sabe cadê essa base, ficou restrita àqueles centros de treinamentos específicos.

P – E como que você vê o papel da Ginástica Artística na formação de professores, professores de licenciatura?

D.10 – Olha, na minha opinião, fundamental, se eles tivessem a compreensão efetiva da grandeza dessa técnica, que é a técnica mais generalizada que a gente tem, a Ginástica ela pode ser utilizada nos esportes como parte do treinamento de condicionamento físico; uma das coisas que eu mais questiono é essa coisa do formato da Ginástica enquanto sessão pedagógica, com aquecimento, parte principal e volta calma, que não acontece nem em treinamento, eu fico vendo eu morro de dó das crianças. As crianças vêm jogar Futebol, vem fazer uma aula, não tem aquecimento, não tem alongamento, ninguém trabalha a flexibilidade, é uma judiação, e a Ginástica se propõe (...) como é uma coisa construída, você pode ter objetivos tão específicos só para alongamento, você pode ensinar essas coisas para as crianças, como ficar forte sem ter que carregar peso, que tipo de exercício global, como é que você aquece, como é que você prepara o coração para as atividades, então assim, enquanto grandeza enquanto técnica eu acho que a Ginástica ela tem que ser ampliada no contexto de graduação, eu acho, essa é a minha opinião.

P – E você acha que a partir do que você ensina aqui os alunos conseguem levar Ginástica para a escola, Ginástica Artística também?

D.10 – Eu acho assim (...) isso é outra coisa engraçada, porque como a disciplina é no primeiro ano, e aí eles vão se imbuindo e até o final do curso já estão com a parte pedagógica, com a questão da licenciatura, eu não sei se eles tem conseguido levar muito, mas pelo menos no contexto do lúdico, com essa coisa da brincadeira, a gente tem conseguido pelo menos transformar a possibilidade de não ser só o esporte na Educação Física né, deles enxergarem um pouco a Ginástica mesmo na aula de Educação Física, Ginástica para a saúde, o trabalho com postura, mas não sei se ainda com um poder de transformação, eu acho que a hora que cai na escola, cai naquele contexto pesado, do pedagógico, da falta de recursos, de tudo, porque é o que você falou, eles saem com o conceito de tudo lindo, ‘ah vamos fazer uma aula de step’, que step, pirou? Não tem, nem um radinho para por música. Como é que eu vou fazer, peso e estatura, IMC de aluno se não tem nem uma balança na escola? Então eu acho que eles travam bem, ficam naquela do não tem, não faço, então ainda falta muito a coisa da experimentação mesmo, desse agir em conjunto, que é o que você falou, eu acho que isso ainda não está chegando tão transformador na escola.

P – E o que você acha de impeditivo de chegar a Ginástica Artística na escola?

D.10 – Tem a ver com infra-estrutura mínima na escola e conhecimento do professor mesmo. É aquilo que eu te falei, se ele não vivencia, ele não vai ter no mínimo essa idéia de criar, por exemplo, se tem o tataminho do judô eu posso ensinar a Ginástica Olímpica, mas só se eu vivenciei, se não, eu só vou enxergar o tataminho, se eu não vi nada diferente acontecendo no tatame eu não vou propor, muito difícil. Minha opinião,

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eu acho que a diversidade é que deixa a gente criativo né, a não ser que você seja travado, sei lá. Eu falo pra eles, ‘gente, curso superior não é um curso técnico’, a diferença entre o curso superior e o curso técnico é essa nossa possibilidade de mudar a nossa ação mediante outros lugares, o professor de Educação Física, é o mesmo na escola, é o mesmo em outro trabalho? Não, não é! A nossa capacidade de ação tem que ser diferenciada, é essa a reflexão do profissional de nível superior, a gente não é técnico; igual o técnico de Pilates, ele só dá aula de Pilates, se você for lá e pedir pra ter aula de Hidroginástica ele não vai, não tem condições de ser resolutivo com você, então esse é o técnico, ‘eu faço essa técnica’; professor de Educação Física é profisional de nível superior, então a gente tem que trabalhar essa reflexão, mas eu acho que eles ainda não fazem, eu acho que a nossa graduação ainda é muito redondinha, muito bobinha, a gente ainda faz essas cobranças bobas com relação a provas, conteúdo teórico de aluno, a gente não sabe cobrar coisas diferentes, sair para além da prova, para além da aula simulada aqui na classe, é o que você falou, eu dar aula para os meus colegas; então sei lá, tem muitas coisas e tem a ver com a infra também, você vai ter um pavilhão de Ginástica, a infra-estrutura montada e ninguém usa, duvido, se você não usar, as crianças usam, então também tem a ver com a infra, põe um banco sueco virado para você ver se as crianças não vão ficar pra lá e para cá, agora se você não tem material como é que faz?

P – Aqui a Ginástica Artística está dentro de outra disciplina, algumas Universidades tem a disciplina específica de Ginástica Artística, como você acha que deveria estar contextualizada a Ginástica Artística na licenciatura?

D.10 – Aqui, por exemplo, a gente trabalha como disciplinas optativas, as modalidades, eu acho que poderia ter modalidade de Ginástica de competição como uma disciplina optativa para os alunos, porque é como eu te falei, é um procedimento, é uma técnica, é uma modalidade esportiva, que pode ser um argumento seu enquanto professor de Educação Física, você pode escolher a Ginástica Olímpica como seu recursos pedagógico de trabalho, é ele que você vai usar para transformar sua aula etc e tal; então, eu acho que deveria ser assim, como as outras modalidades, eu poderia oferecer e teria como, oferecer uma disciplina de quatro créditos, optativa, só Ginástica Artística, posso fazer um pacto lá com o Alex, etc e tal, mas sai totalmente fora do meu contexto hoje, porque eu não tenho, na Universidade, o espaço físico adequado, material, eu vou depender de um convênio com outro professor, hoje, o meu nível técnico, por conta de estar fora da modalidade, se você me perguntar ‘qual é a série de competição?’, ‘quais são os elementos obrigatórios?’, quer dizer, isso já me remeteria a re-estudar, ter contato novamente etc e tal, e assim, eu não acho que a Universidade e o curso valorizem muito isso, não sei, hoje eu não tenho essa clareza. Porque é isso que eu te falei, eu dependo de um acordo com um cara que é de uma academia particular, ele não é da prefeitura, a prefeitura tem parceria, porque ele treina a equipe da cidade, mas a academia é dele, ele cede de muito boa vontade porque foi meu aluno, se ele fala ‘você não vem aqui’, o que eu faço com os alunos sessenta horas ao longo de um semestre? Vou ser criativa, eu concordo, mas aí vai ficar no nível do pedagógico, do que eles podem ensinar etc e tal, que aí eu acho que vai muito da competência individual de cada um e de querer trabalhar com a modalidade também, e tem outros tramites para ser aprovada um disciplina que dependa de um convênio.

P – E você auxilia na montagem do programa da sua atual disciplina, como é feito?

D.10 – Eu faço tudo, por minha conta, la garantia soy yo, digamos assim (risos), assino embaixo, todo o conteúdo. Eu apresento um leque bem grande para eles, coloco a questão do horário, coloco a questão do que, ao meu ver, seria o meu obrigatório, que são questões relevantes para a gente refletir para que eles sejam professores de

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Ginástica, entende? Vai desde a postura profissional, o que é ter voz de comando, a necessidade de uma voz de comando em uma aula de Ginástica; brinco com eles citando o exemplo do professore de axé, que entra mascando chiclete e rebolando, se você sabe dançar junto vem aí, se você não sabe, não tem quem te ensina, então que aula é essa? Então aula é algo onde você vai ensinar alguma coisa para alguém, envolve um processo pedagógico você é o facilitador desse processo, então como é que a gente faz? Tem alguns conteúdos que eu acho que são fundamentais, e vem da minha experiência, e que eu acho que eles têm que saber. Agora, as modalidades, ou como é que a gente vai fazer isso, depende muito deles e o conteúdo escolar, embora eles não se enxerguem na escola eu faço eles levarem, jogos desde a pré-escola, do ensino infantil, que tipo de atividades que a gente faz, é para facilitar o desenvolvimento motor ou não é, como é que a gente constrói uma Ginástica para uma criança, né.

P – A Universidade passa pra você uma base de programa?

D.10 – Tem uma ementa, que foi montada no currículo; a partir da ementa que é o que tem que seguir, quem for dar aula de Ginástica tem que seguir e você pode, por exemplo, propor até vinte e cinco porcento de mudança no conteúdo da ementa, caso contrário você tem que criar uma nova disciplina, que tem que ser aprovada, tipo eu falo ‘ essa Ginástica que está aqui eu não vou oferecer, vou oferecer outra’, eu posso, eu crio outra e tem que ser aprovada em todas as instancias da Universidade de novo, inclusive até na pró-reitoria de graduação, mas a autonomia é o departamento quem tem, o departamento é responsável pelas disciplinas.

P – Você tem total autonomia?

D.10 – Completamente. A gente tenta atender a proposta curricular, porque se não também não faz sentido, mas acontece, porque, por exemplo, tem disciplinas que são oferecidas por outros departamentos tipo Fisiologia, e aí o cara não quer nem saber se o conteúdo está adequado, você entende o que eu quero dizer? A disciplina é dele (...)

P – E você acha que ocorre embate entre disciplinas mais teóricas e as disciplinas de cunho mais prático?

D.10 – Não.

P – São valorizadas as disciplinas desportivas no currículo?

D.10 – São, são valorizadas. A gente classificou como modalidades esportivas, ou individual, ou de aspecto coletivo, quer dizer a idéia era caracterizar a estrutura da modalidade, então assim, de um modo geral, eu acho que a gente contempla isso, e elas são oferecidas da maneira como a gente falou, como optativas. Então tem estudos avançados, por exemplo, em Natação, Pólo Aquático, Handebol e por aí a fora, que é aquilo que eu te falei da possibilidade de oferecer como optativa só na área de Ginástica Olímpica.

P – E a avaliação, como que você realiza a avaliação?

D.10 – Olha, hoje até isso a gente teve que dar uma questão de continuidade, então eu trabalho desde aspectos de freqüência, por exemplo, tarefinha pra cumprir na próxima aula, a semana que vem nós vamos discutir sobre Ginástica de Academia né, o que é Ginástica de Academia? O que está contemplado? Então eles trazem, eles apresentam as diferenças, comento das bases, então é diferente você pegar um texto, um livro, é diferente uma Boa Forma de uma pesquisa, o que você trouxe escrito, o que você trouxe de referência, eu faço esses trabalhos em sala de aula, eu aplico prova prática, ‘vocês vão ter que elaborar uma aula’, eu trabalho essa questão do ser professor, não

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ser aluno, ver sua voz de comando, como é que você organizou a sua aula, como é que você deu a sua prática, eu aplico prova teórica e eu também trabalho com seminário, eles terem que preparar, por exemplo, como é que seria uma Ginástica pra criança (...) a parte escolar eu do toda na forma de seminários, então eles têm que ir pra busca, eles têm que ver em que parte do desenvolvimento motor que a criança está, que atividade física é proposta para a creche, por exemplo, se a gente fosse atuar aqui na creche, o que você ia contemplar para as crianças nessa fase, pré-escola o que é que está previsto na legislação, você concorda, por que tem toda uma LDB com relação, então, até a discussão do porque que só a partir da quinta série é que efetivamente é necessário um professor de Educação Física, até a quarta série você concorda o professor da classe pode trabalhar os conteúdos; então a parte escolar eles trabalham na forma de seminários, porque aí eles têm que ir atrás, fazer pesquisas e apresentar uma aula, como é que seria uma aula de Educação Física naquele âmbito de ensino, uma proposta transformadora eu peço viu Juliana, e nem sempre é assim. Esse ano, o pessoal da turma dos três aos cinco anos, eu falei pra mim ‘gente como é que as crianças de três a cinco anos (...) ah não faz isso de jeito nenhum?’; no ano passado eles resolveram ir na creche, eu fui na creche ver a aula do grupo, e foi muito engraçado, porque eu vi o papel e eu deixei Ju, estava lá, relaxamento, e eu fiquei bem quietinha, imagina criança de três a cinco anos a hora que abre a porta, que fila o que, e eu deixei, é o que eu te falei, se você não vai lá na escola e vê como é o dia de uma criança de três a cinco anos esquece; você acha que eles conseguiram fazer relaxamento no final da aula? Mas eles aprenderam fazendo. Eu tento oportunizar as diferentes formas de avaliação, eu digo que a aula é prática, se você não fez, você não está presente, ficar sentado olhando para mim não resolve, então eles têm que vivenciar as práticas, é um jeito de cobrar, já vem essa geração um pouco mais sedentária, menos altiva, então eu acho assim, a pessoa com dificuldade de reconhecer, e aplicar, e sentir os benefícios da atividade física, e do exercício físico, não tem muito amor para passar isso para frente, e aí mesmo o contexto pedagógico fica meio perdido, eu acho. Então eu tento avaliar assim, não precisa ser atleta, fazer uma aula de Ginástica, me imitar e copiar, embora eu cobre desde nomenclatura, braço não estica, perna não dobra, entende o que eu quero dizer, isso é avião, isso é postura inicial, voz de comando é fundamental, você tem que ter controle, liderança sobre os seus alunos, sobre a classe, é uma herança bendita do militarismo, das poucas, entende o que eu quero dizer. Então assim, eu tento trabalhar bastante esse conceito do ser professor, vai olhar a aula do fulano, mas não vai olhar como aluno, ‘ah eu não gostei, a música não me agradou’, o professor conversou com a classe, como é que o professor tratou, ele tentou minimamente falar o que ele ia fazer, entende, mudar o foco, pra ver se eles saem do senso comum do atleta.

P – Pra finalizar, a gente falou até agora da formação do licenciado, quem você forma, mas o que é necessário para quem vem amanhã dar aula no seu lugar, porque já é uma outra formação, um docente no Ensino Superior para estar trabalhando com a Ginástica Artística, ou com as diferentes Ginásticas né?

D.10 – Eu acho que o professor precisa voltar para a prática né, porque hoje a gente enxerga muito o profissional universitário como esse da carreira acadêmica, eu acho legal, eu acho que tem que ser um professor doutor, mas eu vou ter que lembrar em como eu vou estar atuando, onde é que vai estar o cara que eu estou formando? Eu não formo quarenta alunos para serem os quarenta professores universitários, entende o que eu quero dizer? Então o cara pra ta aqui no meu lugar, ele tem que ser alguém que tem conhecimento da área de formação profissional, ele tem que saber lidar com a pesquisa, porque é cobrado isso, mas eu acho que isso é da atividade, ele não pode deixar de ser um professor de Educação Física, porque se não ele não tem um modelo

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pra passar; se ele vier pra cá, ele vai ser um pesquisador, então eu estou pensando no professor universitário, ele tem que ter sim esse contato para além da técnica, por quê? Porque a pesquisa que faz a gente inovar, faz a gente buscar, faz a gente atualizar conteúdo, é a experiência prática que faz a gente reconhecer as alterações no mercado profissional, entendeu? Pra você melhorar, e refletir, e questionar com o seu aluno que mercado profissional que ele vai entrar e ao mesmo tempo o que é que a gente precisa mudar aqui, pra outros profissionais, pra outras formações. Então eu acho assim, é mais difícil, não tem lugar para todo mundo, mas eu espero que alguém que venha para o meu lugar, tenha no mínimo (...) mantenha esse contato com a prática, com a experiência profissional e com a área de atuação que ele escolher, porque eu acho que o nosso maior problema são os professores teóricos hoje, porque nós temos um papel muito grande de agora para frente para lidar com toda a falta de cultura corporal que a população anda né, não só o sedentarismo, é a questão do relaxo com relação ao corpo, com relação à saúde, com relação à estética, com relação à forma, com relação à expressão, eu acho que o corpo humano está muito empobrecido de tudo isso, nós temos um papel muito pedagógico, muito profissional com relação a isso, então eu acho que o professor universitário ele tem que ser alguém diferenciado sim, tem que ser alguém com sessenta, setenta horas no lombo viu Ju (risos), pra dar conta, minimamente, de contemplar essas dimensões da formação de alguém de nível superior, essa é a minha opinião, não basta a gente só estudar para um doutorado.

P – Então finalizamos aqui, gostei muito, obrigado.

D.10 – Que é isso Ju, espero ter minimamente, atendido a sua entrevista.

Docente 11 – Dezembro/2008 – 0h32min

P – Então, a primeira pergunta é relacionada aos conhecimentos, quais seriam imprescindíveis para estar ensinando Ginástica Artística no Ensino Superior, para licenciatura?

D.11 – Bom, eu acho que tem que ter conhecimento básico dos fundamentos da Ginástica Artística de uma maneira geral. Mesmo trabalhando em escola pensando em licenciatura, eu acho que o professor de Educação Física tem que ter conhecimentos básicos de qualquer esporte, até pra responder uma pergunta de uma criança curiosa, né, que assiste uma televisão e pergunta ‘porque que é assim, porque que é assado?’. Então, não precisa ter sido ginasta necessariamente, mas tem que conhecer o esporte pra poder falar sobre ele e ensinar os rudimentos.

P – E você conseguia diferenciar para eles os conhecimentos técnicos dos conhecimentos pedagógicos, fazer essa divisão na disciplina?

D.11 – Como é que você consegue diferenciar estanquemente conhecimento técnico de pedagógico?

P – Assim, o que ensinar, para qual público, talvez no sentido (...)

D.11 - Para os estudantes de Educação Física?

P – Isso.

D.11 – Olha do jeito que é o currículo, não sei se esse ano de 2008 já foi diferente na Universidade J, a gente não tem como diferenciar, porque as turmas são mistas, quer dizer, tem ao mesmo tempo alunos da licenciatura e do bacharelado, então o que nós

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oferecíamos, eu trabalhava junto com o Rafael na disciplina, e que eu acho que é adequado, é adequado pras duas, pra base das duas carreiras como queira dizer, e durante o desenvolver da disciplina, a gente procura ir fazendo paralelos né, não só com a área da atividade que vai ser desenvolvida, também como outros esportes, porque a Ginástica Artística na minha opinião é um esporte, se pensar em esporte de competição, eu entendo a palavra do esporte como uma coisa mais generalizada, talvez pela minha formação alemã; Pra mim esporte é tudo e esporte de rendimento é outra coisa, eu sei que aqui no Brasil, pelo menos nas Universidades se use o termo um pouco diferente, enfim, a Ginástica Artística, a Ginástica de aparelhos, no meu modo de entender é um esporte básico que desenvolve uma série de qualidades físicas, e psicológicas e sociais que são importantes pra qualquer criança, isso tanto vale na escola como em qualquer outro local. Aí como a gente trabalhava com grupos mistos era difícil de fazer programas separados, era impossível fazer programas separados. Não sei se eu respondi tua pergunta.

P – Ah sim, mas vocês tinham enfoques então para quem ia trabalhar fora do espaço escolar e também quem ia trabalhar nele, todos acabavam perpassando então pela vivência para a escola especificamente?

D.11 – É, de certa forma sim, porque a iniciação da Ginástica Artística em qualquer lugar que for, não a iniciação para o esporte, mas os primeiros passos nessa modalidade esportiva são iguais, o fundamento é igual.

P – E como aconteciam as aulas no período de um semestre, como que vocês desenvolviam?)

D.11 – Bom, nosso programa era o seguinte, a gente começava sempre com um solo, porque é (...) aparelho, como queira chamar, mais básicos, mais simples e fácil de encontrar; a maior parte das coisas que a gente fez naquele tablado, a gente pode fazer em cima de um colchão ou até num gramado e, além da Ginástica de solo a gente (...) eu trabalhava mais especificamente iniciação ao salto, agora sobre o cavalo, mas enfim iniciação a saltos utilizando o plinton basicamente, rudimentos de barra fixa, que servem tanto de iniciação para Ginástica Artística como pra desenvolver as habilidades que tem a ver com o se pendurar, que em outras atividades a gente pouco faz e é importante, normalmente o que a gente tem de deficiência é dos membros superiores, então era barra baixa, que serve de iniciação pra Ginástica Artística, mas que serve também pra fazer uma barrinha de jardim na escola e se pendurar, balançar, se pendurar pelo joelho, de cabeça para baixo, rolar pra frente, rolar pra trás, enfim, era solo, barra, salto, trave que é bom pra desenvolver o equilíbrio e que você pode fazer em qualquer muretinha de caixa de areia na escola, ou murinho baixo que tem ou uma barra de madeira pra desenvolver o equilíbrio; então na prática o que a gente mais fazia era isso e, além disso, o programa incluía assim, noções muito básicas de julgamento na Ginástica Artística, então como é que é montado uma série também pra entender o que ta havendo, de repente porque que saem essas notas que as vezes parecem inexplicáveis, o que que é valorizado, que tipo de exercício se faz em cada aparelho, quais (...) qual a preparação física necessária e adequada pra prática da Ginástica, não só de alto nível também o que a gente precisa fazer antes de começar fazer Ginástica, tipo com crianças, a quadrupedia pra começar desenvolver a musculatura de apoio, (...) aproveitamento de outros aparelhos auxiliares tipo espaldares, mas sempre mostrando que dá pra trabalhar em grupo, o que não dá pra fazer sozinho a gente faz com ajuda.

P – E o que você acha que tinha de diferencial no seu método de ensino?

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D.11 – Então é meio complicado pra mim falar de diferencial em função da minha formação. Quando eu fiz a faculdade eu não tive uma disciplina de Ginástica Artística; a Ginástica Artística fazia parte da disciplina de Ginástica e quem deu pra minha turma fui eu, como monitora, porque a professora não era especialista, ela solicitou e eu dei a parte de Ginástica Artística. Eu aprendi a Ginástica com o Rafael, como ginasta de início e depois vendo ele dar aula em faculdade, então eu praticamente levei o que eu aprendi com ele, muito, muita coisa que eu li, basicamente alemães e professores que a gente teve contato, cursos que eu fiz no exterior, então eu não fiz aula de Ginástica Artística em Universidade com outro professor, e o que eu assisti ou o que eu conversei com outros professores dando aula, não sei se diferencia muito do que eu fazia.

P – Você construiu o seu método de ensino?

D.11 - É praticamente(...).

P – E como você observa a Ginástica Artística hoje, dentro e fora do contexto universitário, em termos de evolução ou não desses dois espaços?

D.11 – Pensando em licenciatura, não no esporte..

P – Não, pensando nela fora da Universidade, como ela se encontra fora, independente do local que você queira me apresentar e pensando nela dentro da Universidade, na licenciatura.

D.11 - É então, o que eu conheço de Ginástica dentro de Universidade, eu conheço (...) de repente eu tenho mais contato com os locais que tem uma condição um pouco melhor, porque é aquilo que a gente acaba interagindo através de campeonatos universitários de Ginástica tal, ai você vai conhecer algum lugar, mas que eu saiba as Universidades são muito carentes em termos de aparelhagem pra poder oferecer um pouco mais aos seus alunos. Fora da Universidade a gente tem visto resultados bons da Ginástica brasileira, mas a custa de um trabalho que eu não sei se é muito saudável, sem pensar em termos de educativo, porque a Ginástica Artística como um esporte de alto nível é muito sacrificado, pra mim esporte de alto nível não é mais esporte, é profissão (risos), é outra coisa. Agora as Universidades pra formar seus alunos, acho que, de uma maneira geral, pensando no grande número de escolas de Educação Física que tem no Brasil, a grande maioria deve ter condições ínfimas, muito menores do que o mínimo necessário pra poder desenvolver qualquer base nesse esporte. Acredito também que por falta de formação de quem ministra disciplina, sei lá, um pouquinho de criatividade, de disposição pra montar ou adaptar as coisas que a gente não tem, porque eu não trabalhei só em Universidade, muito pelo contrário, eu comecei em clube, nunca trabalhei em escola como professora de Educação Física, sempre com treinamento em base, iniciando muitas vezes do zero, mas nunca dei aula numa escola com uma turma normal de Educação Física, também em função disso a minha dificuldade talvez de analisar melhor as necessidades ou as (...), a possibilidade de trabalhar com isso. Mas como eu pratiquei Ginástica na escola, e mesmo em clube numa época que não havia as condições que hoje tem, eu sei que é possível desenvolver o que a gente desenvolve aqui, quase tudo sem aparelhagem, quer dizer, a gente constrói o colchão, a gente faz uma barra de jardim, a gente monta uma trave, um plinton qualquer marceneiro constrói e isso que é importante pra gente.

P – Você iniciou na Educação Física a Ginástica, na sua Educação Física escolar?

D.11 – Na minha Educação Física, mas eu estudei em uma escola alemã, aí então na escola tinha plinton, tinha colchão, a gente fazia trave na mureta da caixa de areia do

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jardim da infância, tinha barra de jardim, então alguma coisa eu fiz na escola, e eu fiz Ginástica desde os nove anos de idade também no clube.

P – E como você vê o papel, a importância da Ginástica Artística na formação de futuros professores?

D.11 – Então, eu acho importante na formação dos professores, porque eu acho importante na formação das crianças e jovens, porque toda e experiência que a gente teve aqui, quanta gente que não tinha feito um cambalhota na vida e conseguiu fazer um monte de coisa e se diverte com aquilo, então além de desenvolver tudo o que precisa ser desenvolvido na criança, é muito divertido você conseguir uma coisa que jamais imaginou. Então é isso o que eu acho importante, formar bem os professores pra que eles consigam, de forma que eles consigam identificar os valores e como pode ser agradável a Ginástica Artística pra crianças e jovens e que percebam que é possível fazer, mesmo em condições não ideais de aparelhagem; mesmo porque tem muitos movimentos da Ginástica Artística que preparam pra outros esportes, eu já ouvi diversos técnicos de outros esportes dizerem, ‘ah, quem já fez Ginástica Artística chega aqui pra mim, é muito mais fácil trabalhar, tem bom domínio do corpo, salta bem, se vira, não tem medo’, então eu acho importante trabalhar a Ginástica de aparelhos com todo mundo, e esse todo mundo devia ser na escola, nos primeiros anos preferencialmente da escola.

P – E você acha que os alunos que você chegou a formar, eles conseguiram trabalhar a Ginástica na escola?

D.11 – Alguns eu tenho certeza que conseguiram, que trabalham com isso, alguns que nunca imaginaram que iam fazer Ginástica Artística acabaram caindo em lugares que tinham tradição disso e foram atrás e continuaram, mas também isso não tem só a ver com Ginástica Artística, acho que qualquer outro esporte, o professor sempre puxa um pouco a sardinha pro lado daquilo que gosta, então (...)

P – Na escola também (risos).

D.11 – Na escola também, com certeza. (risos).

P – E o que você considera de impeditivo, pra essa modalidade ser trabalhada na escola?

D.11 – Impeditivo? Acho que não tenha nada que não possa ser superado (...) em termos de aparelhagem, se tiver um espaço onde guardar, não precisa ser coberto, se tiver condições financeiras pra comprar algum colchão ou pra montar alguma coisa, quer dizer, depende muito da vontade do professor trabalhar com isso e ter o mínimo de apoio da direção da escola pra criar um ambiente, um local adequado. No que se refere aos praticantes, as crianças, a gente sempre consegue adaptar a condição física de todo mundo. É possível.

P – Então a aparelhagem para você não seria um fator de impedimento?

D.11 – Não, porque o mínimo necessário você cria, e se fizer o básico só no solo, no chão, na grama, em cima de um colchão, colchão velho de espuma que trouxe de casa, já da pra virar muita cambalhota que é importante, ficar de cabeça pra baixo, que é outra coisa que ninguém faz e é importante experimentar, acho que a noção básica, o que a Ginástica tem de bom, da pra fazer em qualquer lugar.

P – Você me disse antes que as turmas eram mistas, vocês tinham bacharéis e licenciados juntos, como você acha que a modalidade poderia ser melhor colocada no

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currículo, pensando em quem vai trabalhar na escola, como que ela poderia ser melhor contextualizada?

D.11 – Então, se a turma fosse separada, com certeza a gente podia dar um enfoque maior, se preocupar mais com, de repente com a realidade atual e procurar adaptar atividades, se bem que, quando a gente tem tantas disciplinas que se preocupam com tantas coisas num currículo amplo como é o da Universidade J, por exemplo, eu acho que nos esportes a gente pode se preocupar mais com a coisa em si, então, o que que é importante naquele esporte, quais são as coisas básicas e acessíveis, e como é que a gente pode desenvolver elas com qualquer tipo de clientela; então dependendo da turma que você tem, se você ta na escola, você não pode separar os mais habilidosos dos menos habilidosos normalmente, então como é que você monta uma aula de forma que todos consigam experimentar aquela atividade? Se for trabalhar fora você já pode ter turmas mais homogêneas, por exemplo, então acho que seria mais nesse sentido, porque de repente, fazer alguma prática também, trazendo crianças de escolas, coisa que eu fiz quase sempre, apesar de estar trabalhando com o bacharelado, mais a experiência de lidar com as crianças é válida pra todo mundo, quer dizer, do jeito que eu dava aula eu acho que não modificaria muita coisa não.

P – E como se encontrava a disciplina de Ginástica Artística quando você encerrou suas atividades docentes na Universidade J, ela era um semestre, optativa, como estava?

D.11 – Ela era como todos os esportes na Universidade J, era um semestre, Disciplina R, o pessoal chamava de optatória, porque não sei se você conhece o currículo da Universidade J?

P – Ele mudou, eu tenho o novo, eles me mandaram o novo. Estou tentando conseguir o anterior.

D.11 – Então eram seis esportes individuais e não sei quantos coletivos e os alunos tinham que fazer desses seis, quatro e dos coletivos, sei lá eu quantos, isso eu realmente não lembro, mas, então era isso, era os fundamentos esportivos, tinha que fazer um determinado números deles, mas podia escolher dentro de um hall. A maioria dos alunos, principalmente nos últimos anos, estava fazendo tudo, porque o tempo era suficiente durante os quatro anos que eles tinham, eles faziam a maioria dos esportes e, isso acho que é uma coisa que não devia ser optativa, porque eu acho que a gente já oferece tão pouco, pelo menos o pouco que oferece todo mundo deveria experimentar.

P – Mas vocês não tinham uma obrigatória, da área de Ginástica?

D.11 – Tinha a de Ginástica Artística, essa era optatória, quer dizer, alguém podia não fazer, porque tinha seis esportes e eles podiam escolher quatro e a Ginástica podia ficar de fora.

P – Aham. Mas não tinha assim, uma de fundamentos, porque algumas Universidades (...)

D.11 – Isso era Disciplina R, além disso, tem Disciplina S que era optativa pra quem fazia área de esporte. Da licenciatura um ou outro aluno que tinha mais ligação com a Ginástica fez também, mas era extra, fora das exigências do currículo da licenciatura, e tinha, na Universidade J tinha Disciplina R um semestre, sessenta horas aula, e a optativa, Disciplina S voltado pro lado técnico esportivo, vamos dizer assim, com cento e vinte horas aula.

P – E vocês chegaram a ministrar Disciplina B também?

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D.11 – Disciplina B como optativa também para os dois, para os dois cursos, licenciatura e bacharelado.

P – Então alguém que (...), um aluno que de repente deixasse ela fora, poderia se formar sem nenhum embasamento com Ginástica?

D.11 – E teve. Teve gente que telefonou pra gente falando, ‘Docente 11, eu não fiz Ginástica Artística, agora to numa escola e eles querem que eu dê Ginástica Artística, o que que eu faço?’, eu falei, ‘ah é, vai se virar’ (risos), é, e isso aconteceu.

P – E você auxiliava na montagem do programa, você que montava, como era feito?

D.11 – Não, o programa nós que fizemos.

P – E não tinha nenhum impedimento?

D.11 – Não. Existem as ementas, as ementas de cada disciplina são fixas, pra mudar ementa tem uma série de processos ai que é mais complicado, mas o programa a gente fazia e ele era aprovado com certeza pelo conselho de curso e as outras instâncias aí cabíveis, mas era basicamente nosso.

P – E a ementa que vocês tinham que seguir, ela tinha também um enfoque pra formação de professores?

D.11 – A ementa era separada, aliás, os programas. Tinha um programa para o bacharelado e um programa para a licenciatura e as ementa também eram diferenciadas; porque a ementa, você sabe o que é uma ementa né? São três ou quatro frases, não da pra colocar muita coisa ali.

P – E vocês faziam dois programas, mas davam a disciplina junto?

D.11 – Os dois programas eram iguais. Não havia razão pra ser diferente, pra dar a disciplina juntos (risos). O que mudava era o nome da disciplina no programa.

P – Então nem era necessário fazer dois programas?

D.11 – Não. A gente liga o computador né, se muda lá, invés de bacharelado em Educação Física, licenciatura em Educação Física, o resto é igual praticamente, aí não sei se tinha lugar pra ementa, assim, alguma mudança na ementa, isso eu não lembro.

P – E como vocês realizavam a avaliação dos alunos?

D.11 – A avaliação constava de, normalmente uma prova teórica, onde se perguntava tudo o que foi dado durante o semestre, termos técnicos, didáticos, como ensinar isso, como é que deve ser aquilo, alguma noçãozinha das regras, as características, os aparelhos; uma prova prática, mas que era uma sériezinha de solo muito simples, que de certa forma também ajuda a avaliar uma coisa que é importante não só pra ginasta, mas também para o professor, que é a disponibilidade de se colocar lá na frente de um monte de gente olhando e fazer uma coisa, e a participação dos alunos durante a aula, isso também é muito importante.

P – Você falou da prova prática, vocês também trabalhavam o ajudar e o fazer, eles tinham que vivenciar?

D.11 – Isso. Na Ginástica, você deve conhecer, já que você está trabalhando com isso (risos), depende muito de um ajudar o outro, então teve um ano que eu fiz uma avaliação também de segurança, sorteei exercícios lá em grupos, e o grupo tinha que ensinar aquele exercício ao resto da turma, numa determinada aula, isso num fim de

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semestre. Eu acho que é uma boa maneira também, uma maneira interessante de avaliar os alunos, mas não fazia isso sempre.

P – E tinham aqueles que não queriam fazer? Que não participavam?

D.11 – Sempre tem os que não querem fazer, mas eu (...) tem os que se machucam, mas eu sempre tentei colocar mesmo quem não quer fazer, pra pelo menos ajudar os outros, mesmo porque isso é importante vivenciar, não da pra aprender Ginástica se você, pelo menos, não puser a mão na massa e segurar o colega ali. Se tiver aluna grávida, mas são exceções, gente que operou o joelho no segundo mês de aula, ai não pode fazer mais nada, mas assistiu e tava lá, e tem gente que tem dificuldade porque é muito grande, ou porque é muito duro, então consegue fazer algumas coisas, outras não conseguem, mas participa assim, intensamente da aula, aprende a segurar tudo, ajuda todo mundo, e pode ser, de repente, um excelente técnico, mas o importante (...) eu acho, se você faz o movimento, você também percebe melhor as dificuldades e os erros possíveis, você consegue enxergar melhor nos outros o que que ta errado, o que pode ser corrigido, onde é que você tem que por a mão para o exercício ir para o lugar certo.

P – E no currículo, tem as disciplinas mais teóricas, a Ginástica já entra numa parte mais prática, você percebia algum embate entre disciplinas mais teóricas e disciplinas de esportes, tinha algum problema na faculdade em relação a isso, disputa de espaço, por exemplo?

D.11 – Tinha alguns conceitos talvez e de vez em quando que os alunos chegavam ‘ah mas o professor falou isso’, (...) nos exercícios que acham que não podem ser feitos nunca na vida, a tal da ponte (risos), mas é coisa pouca que a gente conversa, eu nunca quis entrar em polêmica com ninguém, quer dizer, o espaço aqui na Universidade J acho que pra teoria é imenso em relação a prática, acho que nunca ninguém achou que estava sendo preterido em favor do outro, não sei, não sou de entrar nesses detalhes.

P – E o espaço de prática de vocês, o espaço físico, ele é bem (...)

D.11 – O espaço físico é excelente, não sei quantas outras Universidades tem um espaço como a gente tem. Aparelhagem é velha, obsoleta, o tablado ta perigoso, já faz três anos que eu saí de lá, já tava ruim, agora deve estar horrível, mas o espaço é muito bom.

P – Porque ele fica fixo né, vocês não tem que montar?)

D.11 – Fica fixo, nós fizemos. Quando nós mudamos para Cidade O, o ginásio não estava construído. A gente começou dando aula (...) a primeira turma, sabe onde é a musculação?

P – Sei.

D.11 – Ali era a sala de Disciplina A. A gente dava aula ali, com aparelhos que em parte nós trouxemos, eram nossos. Aí o ginásio foi sendo construído, nós fizemos questão de fazer aqueles buracos lá no meio do caminho, pra não poder ser usado pra outra coisa (risos). Aí ta lá.

P – E vocês tinham sempre uma porcentagem de alunos muito grande procurando a Ginástica Artística, não tinha, assim, um semestre que (...)

D.11 – Normalmente as turmas estavam lotadas. Aí eu tive alguns alunos de primeiro ano que gostavam de Ginástica ou porque já tinham praticado, ou porque eram apaixonados por alguma razão e nunca tinham tido oportunidade, que não tinham

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conseguido vaga e que estava assistindo a disciplina sem estar matriculado. Isso aconteceu algumas vezes. Teve aluno que, fez assim e depois no ano que se matriculou fez tudo de novo, quer dizer, isso (...) vaga sobrando, acho que nunca teve.

P – E, para terminar, eu queria saber em relação a quem vai, por exemplo, substituir o lugar de vocês, o docente universitário agora, que vai dar aula. O que você acha que seria imprescindível para formação dele, porque você já falou numa das perguntas, que a formação as vezes não é a melhor, e eu observei aqui que por enquanto eles só estão colocando substitutos (...)

D.11 – Eu nem sei quem deu aula esses últimos semestres.

P – É vai rodando, porque não teve concurso, devido a questão de não criar vínculos e eles vão colocando o pessoal lá. O que seria necessário para formar, para essa pessoa estar atuando lá?

D.11 – Pois é. Eu acho muito mais importante pra dar aula nas disciplinas práticas, uma boa formação naquele esporte, alguma experiência prática naquele esporte, não precisa ser de alto-nível, mas um envolvimento mais intenso do que simplesmente o que aprendeu na faculdade, acho que isso não é suficiente pra dar aula. Mas tem gente lá dando aula nessa situação, mas continua estudando, pode (...) tem ex-alunos nossos que acho que devem estar dando excelentes aulas, também, mas que, provavelmente deixa a desejar na hora que passa para aquilo que (...) toda aula tem os seus extras, vamos se dizer assim, alguém que tem uma curiosidade, ‘mas como é que é lá fora’, e quem nunca teve experiência não vai poder responder certas perguntas. Então eu acho importante que quem vai ministrar uma disciplina prática tenha uma experiência grande, anterior ou posterior, ou se viu Ginástica pela primeira vez na faculdade, não importa, mas se é aquilo que quer fazer o resto da vida, então vai assistir competição, vai participar de cursos fora, porque só o que a gente faz na faculdade não é suficiente pra dar tudo o que a gente pode dar para os alunos, mesmo porque tem cursos que dão só licenciatura, então pode restringir mais o programa, mesmo no caso da Universidade J, que depois tem os Disciplina S, também é preciso um pouco mais. E, eu acho isso mais importante que título de mestre e doutor.

P – Bom Docente 11, por ora esclareceu meu questionamento. Agradeço muito sua disponibilidade.

D.11 – Tudo bem e, se faltar alguma coisa, você me avisa.

Docente 12 – Dezembro/2008 – 1h02min

P – Então a primeira pergunta é a respeito dos conhecimentos, quais conhecimentos você julga imprescindíveis para ministrar a Ginástica Artística na licenciatura?

D.12 – Eu acho que precisa conhecimento mais ou menos profundo e uma vivência na modalidade esportiva, porque o que eu tenho visto por aí é que tem gente que presta concurso pra ministrar aula de Ginástica Artística e nunca fez Ginástica, nunca subiu numa barra fixa, mas como tem doutorado então ele é escolhido, e alguém que concorre tendo experiência, mas que não tem nem mestrado fica de lado, fica a par. Eu acho isso um erro inadmissível na Educação Física hoje em dia, porque estão preenchendo vagas que deveriam ser de especialistas, de gente que conhece a disciplina, com indivíduos que tem lá mestrado em Antropologia, ou sei lá o que, pra ministrar aula de Ginástica ou de Natação, quando não sabe nem nadar; então eu acho que precisa ter uma vivência

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na disciplina e precisa ter um conhecimento mais ou menos profundo, principalmente porque a Ginástica é um esporte muito difícil, muito técnico e pode inclusive (...) o ensino errado da Ginástica pode até acarretar problemas e acidentes.

P – E o que você acha, você como professor universitário, você é especialista inclusive (...)

D.12 – Essa é a segunda pergunta?

P – Oi? Não é um bate papo (...)

D.12 – Tá (risos).

P – O que que você acha que você tem que ensinar para o seu aluno que vai trabalhar depois, que você gostaria que ele trabalhasse depois com Ginástica, o que ele precisa sair dali sabendo?

D.12 – Mas não na Universidade? Trabalhando no clube ou no (...) onde quer que seja, mas com Ginástica?

P – Na Universidade, isso. Para aquele que vai trabalhar especialmente na escola.

D.12 – O que ele precisa saber?

P – É.

D.12 – Ele precisa saber(...) ele precisa ter uma base sólida, saber os fundamentos com muita precisão.

P – Com as vivências também, de fazer, execução de movimento (...)?

D.12 – A vivência também, eu acho que também, porque é difícil uma pessoa que nunca experimentou, pelo menos os exercícios básicos, poder aquilatar como ensinar, como é o movimento um pouco mais difícil, porque todos os movimentos são (...) a dificuldade vem em cadeia, quer dizer, vou dar um exemplo rústico, um rolamento, depois se transforma num mortal, que depois é um duplo-mortal e assim por diante, então eles são sempre dependentes, os mais difíceis são dependentes dos mais básicos, então o aluno para começar a trabalhar com Ginástica, ele tem que ter passado por esses movimentos mais básicos e ter conhecimento da técnica, da didática desses elementos mais básicos, um conhecimento bem seguro.

P – E vocês conseguiam (...) vocês eu digo porque conheci sua colega de disciplina e ela disse que trabalhou com você, diferenciar conhecimentos técnicos e conhecimentos pedagógicos a serem trabalhados?

D.12 – Pedagógicos ou didáticos?

P – Vamos dizer que eles estão ali juntos. Os pedagógicos que eu digo, por ser mais voltado pra escola (...)

D.12 – Não. O que eu acho é o seguinte, todas as modalidades esportivas são ferramentas maravilhosas pra se promover com prazer a educação motora e a formação física dos alunos, dos indivíduos, das crianças e dos jovens, ta? Todas as modalidades esportivas. É muito (...) como dizer? Desmotivante fazer só Ginástica assim, de formação corporal; é muito mais fácil você promover formação física e a educação motora dos alunos através de modalidades esportivas, sem que essas modalidades esportivas, no entanto, sejam dirigidas pra competição de alto-nível, não precisa ser; então, na escola a Ginástica, principalmente a Ginástica por ser muito rica em

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movimento, ela tem uma qualidade muito boa, um potencial muito grande pra desenvolver a educação motora dos alunos e também a formação física, força, elasticidade, flexibilidade, porque ela é rica em movimentos, então ela tem essa possibilidade, ele é muito (...) se presta muito a isso; então eu acho que a Ginástica, mais até do que outras modalidades esportivas, ela deve ser ensinada na escola, por esse motivo, porque ela é muito rica em movimento, e ela proporciona um bom desenvolvimento físico e coordenação motora dos alunos. Agora, não de forma competitiva, ela tem que ser feita de forma mais lúdica, e ser ministrada de uma maneira diferente; é diferente, por exemplo, você tem num clube seis alunos pra dar uma aula, treinar eles numa barra fixa, então seis alunos pra um treino de barra fixa, ta ok. Agora quando você pega uma turma de trinta alunos, não basta ter uma barra fixa, então você tem que ter uma cadeia de barras fixas, em diferentes alturas, porque os alunos têm diferentes alturas, e aí trabalhar com eles de forma que o aproveitamento seja maior. Um outro exemplo que eu dou, você quer saber como aplicar Educação Física em escola? Como ensinar os professores para que eles trabalhem bem numa escola? Então um outro exemplo que eu dou, se você tem seis colchões e trinta alunos, seria um erro clássico você fazer uma fileira de colchões e fazer os alunos passarem numa fila de trinta, um a um, por essa fileira de seis colchões, o melhor é você por os seis colchões um ao lado do outro e fazer seis colunas de alunos passando por aquele colchão, fazendo um exercício naquele colchão de cada vez, entende? Então a Ginástica é muito rica, ela é excelente pra formação física e educação motora dos alunos, excelente para ser ministrada na escola, só que precisa saber como, precisa ter uma didática especial na escola, muito diferente do clube, ta respondida a pergunta? (risos)

P – Sim, mas vocês tinham que atender tanto a licenciatura quanto o bacharelado?

D.12 – Não, nós tínhamos uma situação muito providencial na Universidade J, nós tínhamos Disciplina R, ali sim a gente dava só os rudimentos, os fundamentos e ali sim a gente podia mostrar a didática de como ensinar em escola e, nós tínhamos Disciplina S, aí é mais pra quem quer ser técnico, quem quer ser treinador, quem quer trabalhar em clube, ta? Então nós tínhamos essa diferenciação, o que eu acho muito bom. Quando eu fiz meu curso de Educação física na Universidade A, nós tínhamos a Disciplina E, dentro da Ginástica nós tínhamos alguns rudimentos de Ginástica Artística, mas existia o curso técnico que eu fiz (...)

P – Com o professor Eduardo Alencar?

D.12 – Foi. Na verdade nós éramos colegas, a gente treinava junto durante a aula (risos). Mas, eu queria o diploma né? (risos). Então, mas enfim, lá tinha o curso técnico, e tinha outros que não tinham a experiência que eu tinha, e não eram ginastas como eu era, então iam fazer o curso lá com o Alencar; eu acho isso muito providencial, porque é difícil você dar uma aula para futuros professores de Educação Física, uma aula de Ginástica, onde você vai ensinar alto nível, e elementos básicos ao mesmo tempo, você tem q diferenciar. Agora tem um porém, o aluno que tem uma boa base, se ele depois entrar num clube e começar a trabalhar com iniciação e se interessar, ele vai desenvolvendo os conhecimentos pra trabalhar com alto nível, mas se a faculdade puder diferenciar isso, eu acho que não só na Ginástica hein, todas as modalidades esportivas, eu acho que o Basquetebol, por exemplo, pode ser ensinado com enfoque para a escola e ter uma disciplina de técnico de Basquetebol, ou alto nível do Basquetebol, ou estudos avançados em Basquetebol, para aqueles que desejam ser treinadores de Basquetebol.

P – E como, em termos de estrutura, de um semestre, que deveria ser o tempo da disciplina, como que aconteciam as aulas?

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D.12 – Eu acho um semestre muito pouco.

P – Muito pouco?

D.12 – Eu acho pouco.

P – E como que você dividia, assim, todo esse conhecimento no muito pouco? (risos)

D.12 – Nossa, eu quase nem me lembro, to aposentado há mais de dez anos (...) era um semestre só. Era muito pouco, eu achava muito pouco. Era isso mesmo, era um semestre só e eu achava muito pouco, porque é uma modalidade, como eu já disse, muito rica em movimento. Veja bem, você tem a Natação, o que que é a Natação? É uma modalidade que (...) bom ta certo que tem os quatro estilos lá, mas é muito mais reduzido do que a Ginástica que são dez provas, quatro femininas e seis masculinas; assim como Atletismo, eu acho que Atletismo seria muito pouco um semestre, mas enfim, você tem que, se é um semestre, você tem que reduzir e adaptar e correr mais com o currículo, enfim.

P – E como eram suas aulas nesse tempo de um semestre, assim, mais ou menos?

D.12 – Como eram?

P – A seqüência, (...)

D.12 – Era mais focada na didática dos movimentos básicos, os elementos básicos. Eu procurava passar por todos os aparelhos. Agora, por exemplo, um cavalo com alça, é difícil você usar ele numa escola, a menos que você faça em forma de rodízio em todos os aparelhos; então existe e eu mostrava isso em aula, exercícios elementares e passagens por sobre o cavalo com alça, pura e simplesmente, que poderiam ser ministrados numa aula de Educação Física numa escola, só que, raro, ou nenhuma escola aqui no Brasil, aposto, que nenhuma escola no Brasil tem dez cavalos com alça, então o que você tem que fazer? Junto com aqueles movimentos de cavalo com alça, você tem que fazer movimentos também na barra fixa, alguma coisa no solo, no mini-tranpolim, então você faz em forma de rodízio com os alunos, vários grupos de alunos passando por vários aparelhos; essa é a maneira mais prática de se trabalhar numa escola, se você tiver todos os aparelhos, é fazer vários grupos, rodando nos diversos aparelhos; a única prova, ou as únicas provas, vamos dizer, que você pode fazer aula só dessa atividade, dessa prova, eu acho, no meu entender, pela condições das escolas brasileiras, você teria o salto sobre o plinton, se você tiver uma escola com vários plintons, o solo, você dispõe de vários colchões, e a barra fixa que é fácil de fazer, em toda escola que eu trabalhei eu construí uma seqüência de barras fixas, são vigas com canos, e ai você faz um trabalho com um grupo grande, pode se fazer um trabalho muito bom com um grupo grande de alunos. Agora, argola, desconheço alguma escola no Brasil que tenha várias argolas, ou várias paralelas, ou vários cavalos, ou várias traves, ou várias camas elásticas, por exemplo.

P – E parte positiva, assim, mais teórica, era trabalhado também?

D.12 – Nos fundamentos básicos não. A parte teórica era dada junto com a parte prática, por exemplo, você ensina um movimento, então você da uma pincelada na Biomecânica daquele movimento, agora (...) e vale também um ligeiro histórico da modalidade também, agora teoria aprofundada de arbitragem, de regras, isso ficaria para Disciplina S, para dirigir, para outra disciplina que seria dirigida para quem quer ser técnico na modalidade, porque para quem vai trabalhar ó na escola, não interessa saber as regras, interessa saber a técnica do movimento, a didática do movimento para ele poder ensinar pros seus alunos.

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P – E o que você considera um diferencial na sua metodologia de aula?

D.12 – Na minha própria? Eu era muito didático posso dizer, vou dar um exemplo, quando eu ensinava o salto básico na cama elástica, eu esmiuçava ele desde a ponta dos artelhos até as pontas dos dedos da mão; se eu fosse ensinar um rolamento, eu ensinava ele de uma maneira bem esmiuçada, eu era muito perfeccionista, vamos dizer assim, era o meu estilo, sabe, de ser; eu não admitia um movimento fora da linha sabe, tinha que ser tudo perfeito, acho que por isso eu tive bons alunos, bons ginastas no solo, eu tive, inclusive, não sei se você sabe um campeão sul-americano, o Gil de Cidade F, campeão sul-americano de solo; meus alunos no solo eram bem plásticos, bem harmoniosos, porque eu era muito meticuloso.

P – Mas você conseguia isso? Na, faculdade, você conseguia isso ?

D.12 – Eu conseguia em termos (...)

P – Porque lá é um público muito diferenciado né?

D.12 – Em termos, claro. Em termos! Mas, por exemplo, se tivesse que ter um certo movimento de braço, aquele movimento de braço eu exigia, corrigia sempre, sabe, não deixava fazer o exercício de uma maneira não técnica, por exemplo, eu sempre, outra (...) bom isso é mais específico do solo, vale dizer?

P – Vale, claro!

D.12 – No solo, por exemplo, eu pregava muito o dinamismo no solo. Então, um exemplo, após um rolamento, pra mim tinha que ter um salto estendido, não podia rolar e simplesmente levantar em pé, devagarzinho, tinha que rolar e saltar, quer dizer, eu pregava muito o dinamismo no solo, e (...) enfim, eu era muito meticuloso na parte básica, técnica básica, quer dizer, não precisava ser bonitinho, mas se o braço tem que ser pra cima, ele tem que ser pra cima, ele não pode ficar pra baixo, entendeu? É isso aí.

P – E como você observa a Ginástica Artística hoje, ela fora do contexto universitário e ela dentro da Universidade?

D.12 – Olha, dentro da Universidade, hoje, eu to há doze anos fora, eu nem sei como é que ta, eu só lamento isso, que eu sei que em muitas Universidades tem gente dando Ginástica (...) e outra coisa também que eu acho péssimo, existem as disciplinas chamadas Ginástica, em que a pessoa vai dar Aeróbica, Ginástica de academia, Ginástica de formação corporal e Ginástica Artística junto, eu acho isso péssimo nos cursos de Educação Física; porque uma coisa é Ginástica Geral, e outra coisa é a Ginástica, esporte competitivo, é a mesma coisa que você queira dar, por exemplo, sei lá, o que que eu posso dar um exemplo? Voleibol junto com Basquete, ‘ah os dois são de bola!’, são disciplinas diferentes, sabe, então uma coisa é você fazer Ginástica simples, pura e simplesmente pra formação corporal, educação motora, Ginástica corretiva, o que seja, e outra coisa é o esporte Ginástica Artística; então eu acho que tem que ser separado e, existe nas Universidades, que eu sei, muitas delas, muitos dos cursos de Educação Física, tem uma disciplina de Ginástica e a Ginástica Artística é dada ali dentro, de que maneira? Péssimo! Porque não dá (...) pra Ginástica Artística só você precisa de muito tempo, pra Ginástica Geral também, o que é muito importante, e tem vários enfoques que você pode dar na Ginástica Geral, então eu acho que tem que ser separado. E outra coisa que eu vejo com maus olhos também, é que os especialistas estão sendo preteridos em razão de pessoas que não tem experiência, mas tem mestrado ou doutorado, então, ‘ah não, mas a Universidade precisa de doutor’;

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sabe, os alunos é que perdem com isso, a Educação Física e o esporte nacional perde com isso. Nós tivemos um exemplo aqui na Universidade J, que foi Anderson, é (...) eu não vou citar! (risos).

P – Não, os nomes verdadeiros eu não vou citar.

D.12 – Isso nem interessa (risos), mas enfim, existe e isso, acontece isso de um super especialista, ou não tem mestrado, ou ta só fazendo mestrado, não ganha vaga numa Universidade pra dar aula de Ginástica porque tem um outro lá que fez só a aulinha lá na faculdade, mas ele tem doutorado ou pós-doutorado, as vezes em Antropologia em bio (...) biomecânica até que seria bom (risos), mas em outras áreas, História, ou sei lá o que, que não tem nada a ver com esporte; então eu acho que as Universidades deveriam contratar, embora não tenham pós-graduação, deveriam contratar especialistas para as disciplinas esportivas, ta? Não só Ginástica, eu digo todas.

P – E a Ginástica fora da Universidade, isso você tem visto, acredito eu?.

D.12 – Muito pouco.(risos).

P – Na televisão (...)

D.12 – Você não imagina, as vezes a Gabriela me chama, ‘Rafael a Ginástica’, eu vou lá dou uma olhadinha e vou embora (risos). Você sabe, eu perdi o interesse com o tempo e, depois, eu acho que a Ginástica hoje está num nível, eu hoje não voltaria de jeito nenhum a ser treinador de Ginástica, acho que está num nível muito difícil, quase que além da capacidade física humana, com muitos acidentes e eu não gosto muito não, eu acho que a Federação Internacional de Ginástica dirigiu a Ginástica com muita valorização da dificuldade em detrimento de uma boa execução, ta? Eu cito sempre como exemplo uma coisa que eu vivi; eu assisti, como dirigente esportivo na ocasião, eu tinha (...) eu era presidente da União de Ginástica A e fui para Europa e fui pra uma reunião da Federação internacional de Ginástica, na ocasião do campeonato mundial de Cidade P, e me convidaram, como convidado pra assistir o campeonato; houve naquele campeonato dezesseis fraturas, dezesseis fraturas num campeonato mundial, e uma delas, se não me falha a memória, uma delas foi de coluna cervical que a menina ficou paralítica, acho que foi nesse campeonato, mas enfim, dezesseis fraturas em um campeonato mundial, eu acho que tem alguma coisa errada; eu acho que as regras valorizam muito a dificuldade, e pouco a execução e a parte artística, e os aparelhos, eu acho que eles ainda mudaram algumas coisas, mas eu acho que devia ser (...) eles deviam ser construídos numa forma, principalmente os colchões nas áreas de queda, deveriam ser construídas de uma forma protegendo mais os ginastas. Por que não em baixo da barra fixa ter um negócio bem fofo? E a aterrissagem na barra fixa ser bem mais benevolente? Porque num negócio muito fofo não dá pra você plantar em pé, mas pelo menos se alguém caísse de cabeça ali não ia quebrar o pescoço, sabe? Então, eu acho que a Ginástica, eu não treinaria Ginástica (...) não gostaria de ser treinador de Ginástica hoje. Inclusive, eu terminei a minha carreira, não como técnico de Ginástica, porque paralelamente, não se se você sabe, na Universidade J, a gente desenvolvia um atendimento a comunidade em que a gente ensinava Ginástica e o Trampolim.

P – Projeto de extensão né?

D.12 – Extensão universitária. E nós tínhamos vários alunos da comunidade, do bairro que iam fazer aula com a gente de noite e alguns alunos de Educação Física também, que se interessavam, era depois das aulas, então a gente desenvolvia e participava de competições com esses alunos pela Universidade J, e eu terminei a minha carreira, não como treinador de, se é que eu posso chamar isso de treinador, porque na verdade eu

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treinava uma equipe da Universidade J que participava de competições oficiais, eu terminei minha carreira, eu me aposentei e minha última ação ou função como treinador foi na cama elástica, foi no Trampolim Acrobático, e não na Ginástica, porque eu já num gostava mais da Ginástica como ela tava, achava muito perigosa, muito difícil, enfim, já não concordava; e o Trampolim é o contrário, o Trampolim valoriza muito a execução e pouco a dificuldade, e isso me agradava muito. Eu assisti vários campeonatos mundiais de Trampolim, quatro ou cinco, e me lembro de um entorse de tornozelo, enquanto que em num campeonato mundial que eu assisti tiveram dezesseis fraturas,.

P – E (...)

D.12 – Essa é a minha visão da Ginástica hoje (risos).

P – Interessante. Eu não tinha ouvido ainda nenhum professor falar por essa perspectiva (risos). E, o que você acha de importante da Ginástica Artística para formação, como você vê o papel dela na formação de professores, o pessoal que vai atuar na escola?

D.12 – Eu acho importante por isso que eu disse, como a Ginástica Artística é muito rica em movimentos, então ela é uma ferramenta excepcional pra educação do movimento, pra educação motora das crianças, porque (...) imagina, corrida; a corrida é muito bom, desenvolve a musculatura da perna, resistência orgânica, velocidade, agilidade, mas é um movimento único, estanque. Agora na Ginástica você rola, fica de cabeça pra baixo, pendura, balança, enfim, tem uma gama enorme de movimentos, e isso da uma percepção do corpo, do aluno, muito grande, e (...) é uma contribuição enorme que ela da para desenvolvimento motor das crianças, esse é o enfoque eu acho, esse é a razão da qualidade, da (..) da vantagem de se ensinar Ginástica na escola.

P – E você acha que os alunos que você formou, eles conseguiram levar esses conceitos para escola?

D.12 – Espero que sim, porque eu enfiava tanto na cabeça deles isso, sabe (risos).

P – Mas você tem ou teve contato com alguém que conseguiu desenvolver Ginástica em escola?

D.12 – Sim, vários, alguns, vários não, alguns. Sabe, pra mim tem muitas coisas difíceis de eu te responder, porque eu me aposentei, acho que faz doze anos, doze anos, exatamente; eu me aposentei em dezembro, em fevereiro eu mudei pra esse lugar aqui, me tornei de um mês paro outro um apreciador da natureza, eu não saía daqui de dentro, eu quando comprei isso aqui, são quatro mil e quinhentos metros quadrados, não tinha um arbustinho, eu plantei todas essas árvores, construí tudo o que você vê aqui dentro; não tinha cerca, não tinha nada, só tinha capim brachiaria nesse pasto de vaca, só, porque aqui era o pasto da fazenda que lotearam. Então eu entrei aqui, eu me embuti sabe, só uns anos depois de eu ter aposentado me convidaram pra dar a Disciplina B na Universidade J, dei um semestre de Disciplina B na Universidade J, e assinei, li e assinei alguns trabalhos de formatura; não participei mais de competição nenhuma, uma ou outra no começo e assisti quando a Gabriela participava com os alunos da Universidade J ainda, no fim ela também já não participava mais, então eu me desliguei completamente da Ginástica, eu me desliguei do Ensino Superior, então é difícil em algumas perguntas, qual foi a última que você fez? (risos)

P – Da importância para formação de professores e depois se a partir do que você ensinava, se eles levavam para escola.

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D.12 – Ah é. Eu tive pouco contato com os alunos sabe? Eu sei que alguns estão trabalhando e tem até gente trabalhando com Ginástica de alto-nível sabe, mas enfim, eu espero que eles tenham aprendido. Eu sempre dizia o seguinte, é uma convicção que eu tenho, que se eu fosse o todo poderoso da Educação Física no Brasil, eu ia instituir isso ditatorialmente, sabe, para o Brasil ser melhor no esporte e para os cidadãos serem mais bem formados fisicamente; eu acho que a escola devia dar Natação, mas não com função de nadar cinqüenta metros num tempo tal, mas sim ter o domínio no meio líquido, então é, brincar com bola, pegar pedrinha no funda da água, passar por dentro de arco, enfim, várias atividades dentro da água e ensinar a nadar também, mas não a preocupação de tempo de bater record e coisa assim. Esse é o um! Eram quatro, vamos dizer, pés numa mesa sólida que eu dizia. Um pé era esse, a outra base era a seguinte, Ginástica Artística, não com preocupação de alto-nível, de ganhar competição ou não [Entrevista interrompida para o docente atender ao telefone]. Então Juliana, a segunda base seria a Ginástica Artística não como preocupação de estilo, de elegância, de competir, mas balançar na barra, rolar na base, subir no apoio, numa paralela, andar na paralela, rolar no chão, fazer uma roda, saltar por cima de um plinton, quer dizer, desenvolvimento motor através da Ginástica. O primeiro foi Natação, habilidade no meio líquido, o segundo, habilidade motoras na Ginástica, o terceiro, bola, mas não ensinar a cesta com perfeição ou fazer uma manchete perfeita, nada disso, é um jogar pro outro, rolar, passar, chutar, e enfim, é mexer com bola a vontade, brincar com bola a vontade, desenvolver a habilidade com bola. E o quarto, seria Atletismo, mas não com finalidade competitiva, e sim com finalidade de desenvolver as condições atléticas, as qualidades atléticas, então é, correr, saltar, arremessar; aí você pega um aluno que passou anos numa escola fazendo tudo isso, desde pequeno ta, e com doze anos ele fala, ‘poxa, eu sou grandão e eu gosto de Basquete’, ele vai ser um excelente jogador de Basquete; ou então ele é pequenininho, baixinho, habilidoso, fala, ‘ah eu sou apaixonado por Ginástica’, ele vai ser um excelente ginasta; ou então o outro fala, ‘Hum adoro água e tenho uma envergadura boa e tal’, vai ser um excelente nadador; então esses quatro pilares, pra mim, se constituem numa base sólida da Educação Física que, se fosse aplicada de maneira assim, bem veemente aqui no Brasil em todas as escolas, o Brasil em poucos anos seria uma potência mundial no esporte, tenho certeza disso.

P – Da pra escrever um livro hein? (risos)

D.12 – (Risos) Eu já escrevi, mas meu livro foi sobre Ginástica.

P – Ginástica (risos) e eu gostei. Bom, e o que você acha que é impeditivo para a Ginástica, de repente, não ser trabalhada na escola?

D.12 – Olha, o impedimento é sempre a falta dos aparelhos e de um local apropriado, eu diria mais até dos aparelhos, dos implementos, local você pode até fazer ao ar livre, mas o ideal seria ter um ginásio com todos os aparelho. Esse é um impedimento, agora eu vou abrir um parênteses, embora tenha esse impedimento, eu enfiava na cabeça dos meus alunos, experiência que eu tive, numa escola em Cidade C, que não tinha um ginásio, tinha só um galpão, ali naquele galpão eu punha os colchões e dava Ginástica de solo aos alunos, de saltos no plinton, fiz as barras fixas em diferentes alturas e dava aula de barra fixa pra eles, e com prazer no recreio eu ficava olhando, e eles saiam correndo da aula e pra onde eles iam? Não iam pro campinho de Futebol jogar bola, eles iam pra barra fixa e ficavam girando, girando; e, eu dei Ginástica de solo no gramado da escola, e você pode aproveitar, por exemplo, pra salto de cavalo, se você não tem um plinton ou cavalo, você pode aproveitar carteira velha, escola tem sempre umas carteiras guardadas no depósito, pega as carteirinhas, põe um colchão em cima, pronto, você já tem um obstáculo pra fazer salto; trave de equilíbrio você pode dar num (...) num banco sueco ou então, eu cheguei a dar em (...) como é? Em muretinha,

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baixinha né, de canteiro de jardim, sabe, coisas desse tipo; gramado então é ótimo, porque as vezes tem, inclusive, talude de grama assim que você pode aproveitar como plano inclinado. Então, se o professor tem criatividade, ele pode trabalhar com uma escola que não tenha aparelhagem, eu trabalhei assim, ta, e ai teve (...) entrei num campeonato mirim escolar, não sei se existe ainda essa competição hoje, com os meus alunos, treinando eles nessas condições, meia dúzia de colchão daqueles que tem os botõezinhos assim que paina, tinha um plinton ou dois, não me lembro se era um ou dois, barra fixa de cano com viga no jardim, solo eu treinei eles na grama, porque tinha que fazer desenhinho, e fomos campeões estaduais mirim com uma equipe treinada desse jeito, ganhando de escola que tinha equipe que treinava toda num clube, ou Colégio D que tinha ginásio todo montado, e eu cheguei a ganhar a competição, treinando os alunos desse jeito, quer dizer, o treinamento não era feito na aula, tem que frisar bem isso, o treinamento era feto depois das aulas, quem queria vinha treinar depois, nas aulas o meu enfoque era pra todos os alunos, o gordinho, aquele que tinha facilidade, aquele que tinha dificuldade, pra promover educação motora pros alunos, desenvolvimento físico dos alunos, agora, aqueles que gostavam, que tinham mais tendência, alguns eu chegava a convidar, outros procuravam porque gostavam, então eu mantinha uma aula pós curricular, um treinozinho, pra levar eles pra essas competições. Então você não pode se acomodar, mas que esse empecilho existe, existe, que é a falta de aparelhagem adequada pra desenvolver a modalidade nas escolas.

P – E como você colocaria a disciplina de Ginástica Artística no currículo da Universidade, para que ela atendesse a formação para se atuar na escola?

D.12 – É como eu já falei, a Ginástica Artística deveria ser dividida em dois, a Ginástica Artística como fundamentos para a Ginástica Artística, como é feito na Universidade J, acho que a Universidade J ta certa, não sei se ainda é assim, quando eu trabalhei lá era, tinha Disciplina R e tinha Disciplina S, então na primeira, você vai dirigir, vai ensinar os alunos, os futuros professores, que aquela modalidade é uma modalidade rica em movimentos, que ela se presta muito a educação motora dos alunos, Educação Física, formação corporal dos alunos nas escolas e que pode ser também, essa iniciação básica, também pode ser usada num clube.

P – Um semestre então de disciplina (...)

D.12 – Então um semestre de Disciplina R, esse mais dirigido a (...) ou melhor, o enfoque da Ginástica Artística seria como uma ferramenta de educação motora e de formação corporal, e em Disciplina S, seria uma outra disciplina para pessoas interessadas em serem depois, exercerem a função depois, de treinador desportivo naquela modalidade, aí então seria aprofundado, a modalidade esportiva seria estudada com mais profundidade, ai eles veriam as regras e tudo o que precisa ser, tudo o que precisa saber pra que o indivíduo possa ser um bom treinador.

P – E você que iniciou as disciplinas de Ginástica aqui na Universidade J?

D.12 – Eu fui o primeiro professor.

P – E elas, elas (...)

D.12 – Eu junto com a Gabriela.

P – Mas não foi você que começou primeiro?

D.12 – Não, nós fomos (...) na verdade, é o seguinte, você conhece o Bruno Coelho do Basquete?

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P – Só de nome, assim, pessoalmente não!

D.12 – O Coelho é do meu tempo (risos), ele é do Basquete; ele era o chefe do departamento aqui, e eu estava indo para Brasília e ele falou, ‘Rafael, eu ia te convidar para você (...)’, eu falei, ‘poxa, se você tivesse falado eu preferia do que ir pra Brasília’, ele falou, ‘não, mas não é pra agora, é pra daqui uns três anos’; aí voltaram a me convidar, só que aí mudou o chefe e tal, mas eu acabei caindo aqui. E quando eu vim, quer dizer, tive uma conversa com o diretor do instituto, na ocasião era o Gerson, eu falei, ‘ó, vou contratar a Gabriela também’, ele, ‘contrata os dois’, e a Gabriela foi contratada também, e nós começamos, acho que eram duas disciplinas, a Ginástica, porque lá na Universidade J tem Disciplina E que se chamava Disciplina T, um nome que eu não concordo, porque o nome envolve muita coisa, Basquete é, Natação é, então eu acho que devia ser Disciplina E ta; enfim, a gente dava essas duas disciplinas, depois, ai sim eu fui o primeiro a dar Disciplina B não tinha em nenhuma Universidade no Brasil todo, ai algumas outras Universidades também passaram a dar, mas Disciplina E, eu que fui o primeiro no Brasil, ministrar uma Disciplina E, no Brasil.

P – E a disciplina de Ginástica Artística nunca foi obrigatória, ela sempre entrava no hall das optativas?

D.12 – Eu não me lembro mais. Não me lembro mais. Eu tenho a impressão que no começo, parece que era assim, era optativa, não, obrigatória, fazia parte do hall das obrigatórias, mas você podia escolher algumas, sabe? Então ela podia ficar de fora, o que eu acho errado, porque já que é uma ferramenta tão excelente pra educação motora e formação física e, condição física, devia ser ensinado como obrigatória, como a Natação, por exemplo, a Natação tem que ser obrigatória eu acho, ta, Atletismo eu acho que tem que ser obrigatório, são modalidades esportivas que pela sua qualidade, sabe, elas têm que ser obrigatórias; eu acho que os esportes coletivos é que não precisam ser obrigatórios, sabe, eu não sou contra não, acho que eles tem o valor deles, eles também promovem educação motora e formação física, mas como é tudo trabalho com bola, o professor pode (...) ‘ah Futebol eu já sei, mas Basquete, eu nunca me envolvi com Basquete, então eu vou fazer a disciplina de Basquete’, entende? Agora, Atletismo, Ginástica e a Natação, pela qualidade dessas três modalidades, elas deviam ser obrigatórias, agora os esportes coletivos não precisa, alguém que já jogou Voleibol a vida inteira, vai fazer a disciplina de Voleibol na faculdade por quê? É preferível fazer Handebol, porque ele não entende nada de Handebol, então ele vai aprender Handebol, aí quando ele for professor, ele sabe Voleibol porque ele teve a vivência e vai saber Handebol porque ele aprendeu na faculdade, entendeu? Agora a Ginástica, o Atletismo e a Natação, pela sua qualidade, acho que tem que ser obrigatória.

P – E você montava o programa, era autonomia sua o programa?

D.12 – Completamente, quem que ia meter o bedelho nisso? Eu que entendia, ninguém lá entendia nada disso.

P – Vocês nunca tiverem problemas de parecer quando ao programa?

D.12 – Não.

P – E a avaliação, como que ela era realizada?

D.12 – Olha, aí eu vou dar outro exemplo, eu fiz um semestre como aluno ouvinte na escola de Cidade Q, País C, entre outras disciplinas, eu fiz Ginástica, fiz também, Musculação, Saltos Ornamentais, Escafandrismo, que é um mergulho sub-aquático, Trampolim, Ginástica Geral e Ginástica Artística, eu fiz todas essas disciplinas. Na

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Ginástica Artística, até os pirulão do Basquete lá, precisavam fazer de prova uma série na paralela, na argola, e precisavam fazer, com a baita dificuldade que eles tinham, é lógico que a avaliação era bem benevolente, mas eles eram obrigados a fazer alguma coisa de Ginástica, ta? Porque que o Basquete faz uma avaliação, o sujeito tem que mostrar uma técnica no jumping, no drible, coisa que valha, e porque que a Ginástica não? Pelo menos o básico, aquele básico que eu tenho batido sempre aqui com você, aquele básico tem que ser mostrado pelos alunos, os alunos tem que passar por aquilo, tem que mostrar que fez, que sabem fazer ta? Então a minha avaliação eu sempre tinha alguns exercícios pra eles fazerem e perguntas sobre a didática, por exemplo. O que é que você ensina primeiro, este ou aquele exercício? Um exemplo de pergunta didática, ta? Então é um absurdo, por exemplo, ensinar rodante flick antes de ensinar o rodante, entendeu? Você foi ginasta você sabe! Então eu fazia a prova teórica, com algumas perguntas, e algumas perguntas também de Biomecânica, mas muito rudimentares, porque eu não era professor de Biomecânica, entendeu? E perguntas assim, de caráter mais didático, e fazia uma prova prática, mas com exercícios muito fáceis, onde eu não ia olhar só perfeição, mas se o aluno pos o braço pra cima, quando devia ser pra cima, entendeu? Com coisas desse tipo, como ele executou, pode ter executado de uma maneira feia, sem elasticidade, porque ele é todo duro, nunca fez Ginástica, mas pelo menos ele me mostrou que ele sabe que tem que ser o braço lá, a perna ali, entendeu? Então eu fazia uma prova prática muito fácil, mas eles tinham que fazer uma prova prática, e eu acho isso muito útil.

P – E tinha na Universidade assim, algum, embate, alguma luta de espaço entre as disciplinas de cunho mais teórico e as práticas, no caso a sua?

D.12 – Acho que tinha. Acho que tinha. Eu era tido como o, o inferior vamos dizer assim, porque eu não era o cientista, eu não gostava de fazer pesquisa, minhas pesquisas eram muito técnicas, uma, por exemplo, foi terminologia na Ginástica, ta, então eu era aquele que era o ovelha negra da Universidade, é lógico que com, eu diria até um única exceção, os meus colegas me valorizavam pela prática, pela parte prática, mas eu era tido como aquele que não era cientista, que era o prático; e eu não acho ruim isso, porque eu sou mesmo, sempre fui, nunca escondi. Então existe sim, eu acho que existe, eu acho que eles valorizavam demais a parte teórica em detrimento dos (...) da atividade física ai o professor que vai sair de lá, o que que ele vai fazer? Não vai dar aula de Biomecânica, não vai dar aula de Antropologia, não vai dar aula de História, não vai dar aula de Pliometria, ele vai dar aula de atividade física, então eu acho que as atividades físicas deviam ser mais valorizadas do que eram. E, não é só na Universidade J isso, eu acho, eu vejo isso (...) eu via isso, não sei como é hoje, eu estou doze anos fora do metiê, eu não sei como é hoje, mas na minha época eu sentia em todas as Universidades uma valorização muito grande de mestrado e doutorado, não importa em que disciplina, em que área fosse, em detrimento da atividade física em si.

P – E para finalizar como que você acha, você já falou da questão do especialista, que você acha que tem que ser especialista para trabalhar, então como que você acha que deveria ser a formação para essa pessoa que entra no seu lugar?

D.12 – Simplesmente ser formado em Educação Física e ter sido um ginasta, ter sido tido uma vivência na modalidade, basta isso. Mas não, exigem mestrado, agora acho que estão exigindo doutorado, pra que? Pra que, se as vezes um recém-formado, um estupendo ginasta recém-formado, com uma capacidade didática fantástica, pode ser muito melhor do que um porcaria lá que, porque tem doutorado em Antropologia, vai dar ginástica, porque fez ginástica lá na faculdade, mas nunca foi ginasta, nunca se envolveu com Ginástica, nunca assistiu uma competição de Ginástica, sabe? Então eu

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acho que a formação devia ser, professor de Educação Física e ter a especialidade, a vivência na modalidade, ter tido vivência na modalidade, como ginasta mesmo.

P – Não necessariamente de alto rendimento?

D.12 – Não, não precisa ser, não precisa ser nenhum campeão brasileiro, nem campeão mundial, não precisa ser nenhuma Daiane dos Santos..

P – Porque ele pode deixar técnica a disciplina, é isso?

D.12 – Exatamente. Eu tenho certeza, eu não sei quem ta dando aula lá, mas eu tenho certeza que eu, sem mestrado ou doutorado, dou aula de Ginástica Artística, daria, hoje nem quero mais, mas eu daria aula de Ginástica Artística ou dava aula de Ginástica Artística muito melhor do que muita gente que tem mestrado, doutorado, mas não tinha tido a vivência que eu tive; eu fui ginasta, eu fui árbitro, eu fui dirigente, entendeu? Arbitrei Olimpíada, sabe? Fui presidente da União de Ginástica A, dirigi jogos, Ginástica em Jogos Pan-Americanos, quer dizer, essa vivência me capacita muito mais do que um doutorado em sei lá o que, em Fisiologia do Esforço, ou coisa do tipo, sabe? Então eu acho que a capacitação (...) eu acho um erro, eu poderia estar dando aula todos esses anos, de muito bom grado, sabe porque que eu não fui? Propuseram lá que tinha que ter mestrado, pra dar aula; eu to aqui desperdiçado, fazendo jardinagem, criando galinha (risos), quando eu podia estar dando aula na Universidade J todo ano, formando muito melhor os alunos pra disciplina do que estão formando lá, sei lá quem ta dando aula lá. Por quê? Puseram lá que precisa de mestrado, acho que agora até doutorado precisa, então eu acho isso um absurdo, um absurdo tremendo, ta? Eu cito meu caso aqui, se me convidassem, falassem ‘Rafael não tem ninguém, você quer vir dar aula um semestre aqui?’, ‘Dou!’, ‘não precisa mestrado, não precisa nada, só ter seu diploma de Educação Física’ (...)

P – Mas você se aposentou?

D.12 – Eu me aposentei.

P – Você está dizendo que para ter continuado a carreira docente lá eles queriam que você fizesse mestrado (...)

D.12 – Eu me aposentei e, eu ainda fui desses professores que fui contratado pela Universidade sem ter mestrado, porque hoje em dia, nem contratam mais sem ter mestrado.

P – Concurso né?

D.12 – É! Mas eu ainda fui dessa leva, eu e a Gabriela. A Gabriela ainda fez mestrado depois, eu não quis fazer, eu tava na boca de me aposentar, eu falei ‘eu não vou fazer mestrado’, ainda mais que tava assim ó, se eu me aposentasse, ou eu me aposentava, ou eu passava a estatutário, tinha que fazer mestrado, e tinha mais sete anos pra trabalhar. Eu falei, ‘não, eu vou me aposentar’, e eu me aposentei, não quis mais. Mas eu me aposentei e ainda dei um ano, não sei qual foi o sistema que foi lá, que eu pude, me convidaram, e eu de bom grado fui lá e dei a Disciplina B, um semestre? Não, um ano! Depois nunca mais, porque tinha que fazer concurso, tinha que ter mestrado, e tinha que dar uma aula e não sei o que sabe? Eu falei (...) eu tava completamente (...) a prova que tinha que fazer, o concursinho, vamos dizer, para dar um semestre de disciplina temporário, um período temporário, me impossibilitava de eu preencher a vaga, eu não tinha os requisitos, imagina? Eu, não ter os requisitos pra dar aula de Ginástica em uma Universidade, você acredita? É um absurdo o que acontece na Educação Física no Brasil, o que está acontecendo, essa valorização exacerbada da

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parte científica em detrimento dos especialistas práticos, sabe? Dos especialistas de qualquer (...) um caso, por exemplo, [Docente cobre a câmera e sussurra um nome] uma sumidade em Basquete, foi tão perseguido aqui dentro que foi embora, ou mandaram ele embora, eu não me lembro, pode um negócio desse? É um absurdo o que está acontecendo no Brasil, na Educação Física. Você vê aqui, lá com a Ginástica, eu nem sei quem tem dado Ginástica ai, e eu to aqui e não posso, e quem é mais capacitado do que eu? Eu conto nos dedos, se é que tem no Brasil, pela vivência que eu tive, sabe? Só eu e uma professora do Estado A que é a atual presidente da Organização C, que fomos presidentes da União de Ginástica A, quer dizer, a maior autoridade de Ginástica no continente pan-americano, só que ainda ganho dela, sabe por quê? Porque ela nunca foi ginasta, ela se meteu a dirigente de Ginástica, depois de velha, sabe, ela nunca fez uma cambalhota na vida, então sem falsa modéstia, eu me julgo o maior capacitado, me julgava, hoje não porque eu já caí no esquecimento, eu já to desatualizado, mas a base eu daria ainda melhor que muita gente, quer dizer, o que eu tenho de vivência, [Docente cita vários locais em que atuou], tudo isso, e não posso dar aula numa Universidade porque eu não tem mestrado, durma-se com um barulho desse. Fui ginasta, fui campeão brasileiro, por equipe, mas fui, eu era o pior da equipe, mas fui campeão brasileiro, quer dizer, competi várias vezes, em várias competições, fui treinador, fui arbitro, fui arbitro de Olimpíada, arbitro de campeonatos mundiais, Pan-Americanos, baita vivência que eu tenho e não posso dar aula porque não tenho mestrado; aí vai um cara lá que aprendeu Ginástica na faculdade, mas não fez Ginástica na vida, não sabe nem como é uma competição de Ginástica pra dar, mas isso foi um desabafo (risos), chega de desabafar. Tem mais alguma pergunta? (risos)

P – Não, não, era só essa. Essa era a última mesmo. Eu gostei bastante, muito obrigado (risos).

D.12 – De nada, disponha (risos).


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