O papel do Supremo Tribunal Federal nas
reformas do Código de Processo Penal:
a necessidade de revisão da teoria das
nulidades
Flaviane de Magalhães Barros1
INTRODUÇÃO
Já se tornou repetitivo falar da reforma parcial do
Código de Processo Penal, das dificuldades de um texto
fragmentado e sem coesão, da matriz inquisitorial que
perpassa a tradição do processo penal brasileiro inspirado
no Codice Rocco italiano.
Por outro lado, o discurso dos pesquisadores do
Direito, em especial processualistas como Jacinto Nelson de
Miranda Coutinho, Eugenio Pacceli de Oliveira, Aury Lopes
Junior, Paulo Rangel, Geraldo Prado, Alexandre de Morais da
Rosa e mesmo constitucionalistas como Lenio Streck, vem de
forma reiterada asseverando que muitas mudanças são uma
aproximação com o princípio acusatório esculpido na
Constituição da República. Nesse sentido, viu-se, após
2008, um esforço hermenêutico interpretativo para que as1 Doutora e mestre em direito processual (PUC Minas). Pós-Doutora(CAPES) junto a Università degli studi di Roma TRE. Professora adjunta da PUCMinas. Professora da UIT. Membro do Conselho Científico do Institutode Hermenêutica Jurídica (IHJ). Advogada.
reformas perpetradas pelas leis 11.689/08, 11.690/08,
11.719/08, 11.900/09 e 12.403/11 fossem interpretadas na
“melhor luz”, ou seja, a partir do texto constitucional.
Contudo, sabe-se que essas vozes que buscam uma
adequação do processo penal à Constituição, não são a
unanimidade na doutrina, muito menos nos inúmeros livros e
manuais de processo penal que povoam as estantes jurídicas.
Logo, vislumbra-se também um movimento oposto em sentido e
perspectiva que pretende manter tudo como estava, ou seja,
tudo como antes da Constituição de 1988, ou mais ainda,
tudo como a tradição do processo penal brasileiro de matriz
autoritária e inquisitorial estabelecia.
Se nas discussões acadêmicas e doutrinarias, essa
dicotomia é visível, é necessário ainda fazer referência à
dificuldade de implementação, no cotidiano da prática
forense brasileira, das mudanças efetivadas pela reforma
parcial.
Muitos pesquisadores, dentre eles Boaventura Sousa
Santos(ano) já vem advertindo que não basta mudar a lei,
reformar a legislação, mas que é necessário garantir que as
novas leis passem a ser vivenciadas no dia a dia dos
processos criminais, exigindo assim uma atualização
continuada dos operadores do direito envolvidos na questão,
como juízes, promotores, advogados, escrivães, delegados de
policia, peritos e muitos outros.
É justamente no plano da aplicação das novas leis e
seus impactos junto aos processos penais em andamento que a
pesquisa da jurisprudência dos tribunais tem verdadeiro
sentido. Pois, os pontos controversos, em que se exige uma
interpretação constitucionalmente adequada da norma
reformada e das novas situações processuais antes não
discutidas, aparecem na jurisprudência seja por meio da
arguição de uma nulidade seja por meio da arguição da
inconstitucionalidade da lei.
A partir desse cenário é que se busca perquirir qual o
papel do Supremo Tribunal Federal perante a aplicação das
normas reformadas da legislação processual penal,
principalmente quando tais normas buscam justamente uma
aproximação do texto normativo processual às normas
constitucionais. Tais questões são matéria constitucional
e, sendo o Supremo Tribunal Federal o último órgão de
decisão competente para a análise dos casos concretos, seja
por meio de recursos extraordinários2 ou pela via do Habeas
Corpus e ou seu Recurso Ordinário Constitucional, sua
atuação é fundamental, sobretudo como balizador
jurisprudencial. Além disso, lhe cabe como guardião da
constituição julgar a constitucionalidade, por meio dos
processos de controle concentrado ou ainda da extensão dos
efeitos pela sumulas vinculantes e a repercussão geral.
Assim, o Supremo tem importante papel de influenciar os
demais níveis decisórios sejam do Superior Tribunal de
Justiça, dos Tribunais Regionais Federais, e dos Tribunais
de Justiça dos Estados, até as decisões dos juízes
2 A possibilidade de reconhecimento da repercussão geral nos recursos extraordinários em processo penal deve considerar o direito fundamental de liberdade, que tais questões sempre estão submetidas e o respeito à garantia do processo estabelecida constitucionalmente condição para uma decisão válida no processo penal
criminais de primeira instancia. Tal influencia se da pela
declaração da inconstitucionalidade ou constitucionalidade
das normas processuais reformadas, ou ainda, pelo
reconhecimento de uma nulidade no processo quando a norma
processual reformada tem direta vinculação com as
determinações constitucionais.
Para analisar esse papel do Supremo tomou-se como pano
de fundo uma série de decisões sobre a nova ordem de oitiva
das testemunhas no processo penal decorrente da nova
redação dada ao art. 212 do CPP, já que ela foi objeto
também de acalorados debates no seio acadêmico e na
doutrina. Busca-se, com tal discussão, demonstrar a
necessidade de uma revisão da teoria das nulidades a fim de
que o arcabouço teórico do direito processual penal se
adéque às novas perspectivas hermenêuticas constitucionais.
Nesse ponto, o estudo tem como marco a compreensão
procedimentalista do Estado Democrático de Direito que
reconhece a relação interna entre Direito e democracia
pelas bases do estudo de Habermas (1997) e a noção de
direito como integridade de Dworkin(2010a, 2010b). Para
repensar o processo, parte-se da proposição do processo
como um procedimento em contraditório ( FAZZALARI, 1992),
mas aprimorando-a com uma perspectiva constitucional, em
que o processo é uma garantia de direito fundamentais
( BARROS, 2009).
Para contribuir com o projeto da presente obra tomou-
se como método a analise da jurisprudência, tentando
demonstra o encaminhamento da questão até a primeira
analise do STF sobre o tema do art. 212 do CPP por meio de
casos concretos. O estudo empírico escolheu caso em que o
MP do Distrito Federal e Territórrios apresentou Reclamação
junto ao TJ- DF em razão do não cumprimento pelo juiz da
nova disciplina de produção de prova definida na reforma
parcial de 2008. Após a analise do caso nas diversas
instancias buscou-se analisar todas as decisões do STF
sobre a temática tendo como parâmetros os anos de 2011 e
2012.
1- O debate sobre a nova ordem de oitiva de testemunhas
determinada pelo art. 212 do CPP
A nova redação do artigo 212 do CPP trouxe uma
acalourada discussão sobre a ordem de oitiva das
testemunhas na Audiência de Instrução e Julgamento. Desde a
publicação da Lei nº 11.690/2008, foi possível delinear
duas linhas de interpretação da referida norma, tomando
como base as etapas pré-interpretativas e interpretativas
propostas por Dworkin (2010, p. 82).
Assim, uma primeira linha tomava, na etapa pré-
interpretativa, a nova formulação do texto do art. 212 do
CPP, o qual assevera que as perguntas às testemunhas serão
feitas diretamente pelas partes e que o juiz fará perguntas
de forma complementar sobre pontos não esclarecidos pela
testemunha. Já, na etapa interpretativa, verificava-se uma
mudança na metodologia de inquirição da testemunha que,
pondo fim ao sistema presidencialista, permitia uma maior
aproximação da legislação processual ao princípio
acusatório. Tal modificação estaria, em termos de direito
comparado, aproximando o sistema brasileiro à prática do
direito norte americano do direct examination e da cross-
examination ou ainda a sistemática adotada no Código de
Processo Penal italiano no esame direto e controesame ( art. 498
do CPPit).
Na matriz dworkiana, a etapa interpretativa definida
por uma primeira linha de interpretação analisa a questão
com base no principio acusatório, e uma interpretação com
base em princípios reforça que tal concepção garante a
ampla defesa, a imparcialidade e o devido processo legal.
Já em uma segunda linha de interpretação entende-se,
na etapa pré-interpretativa, que a nova redação do art. 212
do CPP não mudou a ordem tradicional da inquirição das
testemunhas. Assim, o juiz é quem primeiro tem contato com
a testemunha e lhe faz as perguntas pertinentes, tendo a
nova redação apenas determinado que as perguntas das partes
sejam feitas diretamente às testemunhas e não mais por
intermédio do juiz, como no sistema presidencialista.
Assim, o parágrafo único do referido artigo traz apenas um
preciosismo do legislador que determina que o juiz, mesmo
perguntando inicialmente, pode após as perguntas das partes
reinquirir a testemunha. Na fase interpretativa se sustenta
que, pela analise dos demais artigos do Código de Processo
Penal, pode-se inferir que a reforma apenas pretendeu dar
maior celeridade ao processo penal, que manteve e até mesmo
reforçou os denominados poderes instrutórios do juiz como
na nova redação do art. 156 do CPP. Acrescenta-se ainda que
a norma do art. 212 precisa se conformar com a disposição
do art. 473 do CPP, que trata da instrução no tribunal do
júri, mantendo nesse caso a ordem tradicional de inquirição
da testemunha, sendo primeiro o juiz-presidente do Tribunal
do Júri, depois as partes e, por fim, os jurados.
Tanto nos estudos doutrinários como nas decisões
judiciais é possível reconhecer essas duas linhas
interpretativas. Para demonstrar tal questão e a
necessidade de buscar a interpretação a melhor luz que leva
a sério a Constituição, os direitos fundamentais e as
garantias do processo, passa-se a reconstruir a discussão
sobre a aplicação do art. 212 do CPP e as implicações dos
precedentes judiciais nas decisões em seus diversos níveis
recursais, por meio de casos concretos.
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios
apresentou perante o Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Territórios inúmeras reclamações em face de
juízes de primeiro grau. As reclamações decorriam das
recusas de diversos juízes de primeira instancia como os da
1ª e 2ª Vara Criminal de Ceilândia, 5ª Vara Criminal de
Brasília, 2ª Vara Criminal de Samambaia, e 2ª Vara Criminal
do Tribunal do Júri da Ceilândia. Em específico, ao iniciar
as audiências de instrução e julgamento o juiz iniciava
fazendo as perguntas às testemunhas, após a sua
qualificação e tomada de compromisso, ao invés de dar a
palavra ao Ministério Público para primeiro inquirir a
testemunha da acusação. A indeferir o pedido do MP de
respeitar a nova ordem de inquirição da testemunha definida
pelo art.212 do CPP, fundamentavam que a nova redação não
modificava a ordem das perguntas, apenas permitia a
inquirição direta das partes ( BRASILIA, TJ-DF 2009a,
2009b).
O Ministério Público ante tais decisões apresentou
reclamação perante o Tribunal de Justiça, já que não há
para a situação um recurso previsto. Reclamações como essas
foram submetidas às duas turmas criminais do Tribunal de
Justiça do Distrito Federal.
Em acórdão da 1ª Turma do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e Territórios, a relatora Desembargadora
Sandra de Sanchis diz que entre a posição de que o juiz
continua a perguntar primeiro e a linha interpretativa que
a nova redação determina a adoção da inquirição direta das
partes e a atividade judicial passa a ser supletiva, ela
como julgadora acompanha a segunda. Entende, contudo,
tratar o desrespeito ao art. 212 de nulidade relativa, que
deve portanto ser reconhecida quando houver prejuízo.
Prejuízo que não foi demonstrado na situação reclamada,
segundo a decisão da Desembargadora. Assim julgou
improcedente a reclamação. Voto esse acompanhado pelo
primeiro vogal. Já o segundo vogal, utilizando-se da linha
doutrinaria traçada por Guilherme Nucci, assevera que a
nova lei não mudou a ordem da oitiva, ou seja, primeiro a
testemunha é inquirida pelo juiz. Conclui que essa
interpretação decorre da matriz inquisitorial-garantista
adotada pelo Código de Processo Penal. Por esses
fundamentos julga improcedente a reclamação(BRASÍLIA, TJ-
DFT, 2009a).
As inúmeras reclamações feitas pelo Ministério Público
junto ao TJDFT, como a ora analisada, deram origem a
processos julgados no STJ. Em verdade, O Ministério Público
usou do Habeas Corpus3 como meio processual para obter a
pretendida anulação das Audiências de Instrução e
Julgamento realizadas em desconformidade com a nova redação
do art. 212 do CPP.
No STJ a discussão sobre a nova ordem de inquirição de
testemunhas gerou controvérsia, pois as duas turmas que
possuem competência criminal, a princípio, divergiam na
interpretação do artigo reformado, tendo consolidado um
único entendimento posteriormente. Logo, pelo marco adotado
nessa pesquisa, é importante reconstruir essa discussão.
Assim, seguindo o caminho da questão levantada pelo
Ministério Público do Distrito Federal, analisou-se três
decisões diferentes, todas tratando de Reclamações do MP
junto ao TJDFT.
A primeira decisão é no HC 121.216 julgado pela 5ª
turma do STJ (BRASÍLIA, STJ, 2009c), com relatoria do Min.
Jorge Mussi. Ao analisar o caso submetido a julgamento, o
Relator salienta que o MP, antes de iniciar a oitiva,
requereu ao juiz que o ato fosse realizado nos termos da
nova redação do art. 212 de CPP. O magistrado negou o
pedido sustentando que cabia a ele a presidência dos atos
procedimentais, logo o sistema se mantem presidencial e
3 Segundo o CPP, o MP tem legitimidade para impetrar ordem de HC em favor dos acusados, mesmo quando ele é o autor do processo penal.
fica mantido o poder/dever de arguir primeiro as
testemunhas. Quando da analise do caso pelo Tribunal de
Justiça, este entendeu tratar-se de erro de procedimento,
não reconhecendo a nulidade. Fundamentando seu voto, o
Relator apresentou posições da doutrina que asseveram que a
mudança do art. 212 do CPP é decorrência do principio
acusatório, devendo o juiz atuar na inquirição presidindo o
ato, indeferindo perguntas e, de forma suplementar, ao
final, fazer perguntas de pontos não esclarecidos.
Reconheceu que os dispositivos do art. 212 visam a garantia
do contraditório e da ampla defesa, razão pela qual o
respeito à determinação legal fere o devido processo legal,
ensejando assim nulidade absoluta. Admitiu que, a despeito
da nulidade ser absoluta ou relativa, houve no caso
prejuízo por desrespeito ao devido processo legal, já que o
acusado foi condenado em primeiro grau. Assim, decidiu o
Relator pela anulação do processo desde a audiência de
instrução. Os demais ministros da 5ª turma seguiram o voto
do Relator.
Já na 6ª Turma do STJ, foi julgado caso semelhante,
proveniente de reclamação do Ministério Público submetida
ao TJDFT, por meio do HC nº 121.215 - DF. A Relatora do
processo, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, após
apresentar o caso, asseverou que o HC 121.216 julgado pela
5ª turma deve ser seguido, considerando-o um leading case.
Com base nos argumentos do parecer do Ministério Público,
pelo Sub Procurador Juarez Tavares, ressaltou que a questão
esta colocada na compreensão da nulidade absoluta ou
relativa, sendo a nulidade absoluta aquela que decorre de
violações diretas ou reflexas dos princípios
constitucionais, e as relativas aquelas que tratam de
interesses privados. Ressaltou que a questão do cumprimento
do art. 212 do CPP decorre do princípio acusatório.
Analisando o caso concreto em exame, asseverou que a recusa
do juiz em seguir a ordem definida do art. 212 do CPP,
assumindo a ordem presidencialista, compromete a acusação,
fragilizando o principio da imparcialidade, do devido
processo legal e da presunção de inocência. Por fim, no seu
voto a, Relatora aduziu que a mudança de ordem não se trata
de mero preciosismo como argumenta o magistrado que
determinou a manutenção da ordem anterior, mas sim de
respeito às garantias constitucionais. Ainda, que a nova
ordem valoriza a imparcialidade, já que o juiz, de produtor
da prova, em uma matriz inquisitiva, passa a destinatário.
Concluiu o voto, concedendo a ordem para anular o processo
desde a audiência de instrução.
O voto da Relatora não foi seguido pelos demais
Ministros. Ficou a cargo do Ministro Og Fernandes a
produção do voto vencedor. No seu voto, referido Ministro
estabeleceu que a discussão debruça na seguinte indagação:
a determinação do parágrafo único do art. 212 inverteu a
ordem de formulação das perguntas às testemunhas ou ela
continua a mesma? Ou seja, quem tem o poder de inquirir
primeiro é o juiz ou a reforma inverte a ordem de
inquirição com objetivo de garantir a imparcialidade?
Ao analisar o caso, o Relator sustenta que, se o juiz
de primeiro grau tivesse impedido as partes de perguntarem,
seria caso de nulidade absoluta. Mas isso não ocorreu na
hipótese, o juiz permitiu a inquirição das testemunhas
pelas partes de forma direta, somente mudando a ordem e as
inquirindo primeiro. Entendeu o Relator que, a partir de
uma interpretação sistêmica, a mudança da ordem pode gerar
nulidade relativa, se houver prejuízo, já que se trata
apenas de uma inversão, pois a redação do art. 212, da ao
juiz a possibilidade de fazer perguntas, subsidiariamente,
para esclarecer a verdade real, e assim o interesse a ser
protegido é exclusivamente das partes. Concluiu assim o
voto denegando a ordem de Habeas Corpus..
No voto do Ministro Celso Limongi, este apresentou sua
visão pessoalmente em razão da experiência como juiz de
primeiro grau que presidiu audiências de membros de
organização criminosa na década de 70. Defendeu que o juiz
não é uma estátua de pedra e que a presidência da audiência
pelo juiz que preside toda a prova, é permitida pelo CPC,
que tem mais cientificidade que o CPP. Assim argumenta:
Concluiu seu voto com uma critica ao legislador penal
e processual penal, dizendo que este devia preocupar-se com
questões importantes, ao invés de reformar esse tema. Por
fim, foi proferido voto-vista pelo Ministro Nilson Naves.
Em seu voto disse que, após inclusive uma consulta à
doutrina, esta é ainda incipiente, estando convencido que a
inobservância da nova ordem de inquirição do art.212 do CPP
não altera o sistema acusatório. Justificou que no modelo
brasileiro o juiz não é mero espectador, possui
participação ativa, no processo civil e mais ainda se
justifica no processo penal, no qual se discute liberdade e
se exige a verdade real. Reforçou a questão citando a
doutrina de Nucci e a redação do art. 473 do CPP que se
refere ao Tribunal do Júri. Concluiu que, seja o juiz
perguntando primeiro ou depois, num ou noutro procedimento,
o caráter acusatório esta preservado. Asseverou ainda que a
nulidade somente pode existir se houver prejuízo para a
defesa. Assim, Concluiu o julgamento denegando a ordem,
como voto vencido da relatora.
O terceiro acórdão referente à reclamação julgada pelo
TJDF, em caso semelhante, é da lavra do Ministro convocado,
Celso Limongi, na 6ª Turma do STJ. Em seu voto ( BRASILIA,
STJ, 2010b) reconhece a divergência de posicionamento dessa
Sexta Câmara com a Quinta Câmara, faz referencia a decisões
de sua própria Câmara, bem como do julgamento do Supremo
Tribunal Federal, no HC 103.5265/PE.
Com base na definição na consolidação do entendimento
pela Sexta Câmara, nessa vez por votação unanime, decide-se
pela denegação da ordem, já que no presente caso não houve,
pela parte, demonstração de prejuízo, sobretudo porque
argumentava-se que, por se tratar de nulidade absoluta,
aquele era presumido.
Cabe ressaltar que a posição acima ficou consolidada
com precedente a ser seguido não só pela Sexta Câmara, mas
também pela Quinta Câmara. Assim, na pesquisa
jurisprudencial realizada nesse estudo, verifica-se uma
mudança diametral entre as primeiras decisões do STJ,
vinculadas à primeira linha interpretativa definida no
inicio do presente trabalho, e as decisões mais recentes
que consolidou no Tribunal a segunda linha interpretativa
definida nesse trabalho. Atualmente o STJ, órgão do poder
judiciário responsável constitucionalmente pela
uniformização da jurisprudência brasileira em matéria
infraconstitucional, entende que o não respeito à ordem do
art. 212 do CPP, gera nulidade relativa, devendo ser
demonstrado o prejuízo.
Logo, há de se ressaltar a mudança, portanto, da linha
interpretativa da Quinta Câmara do STJ. Na pesquisa, a
referida Câmara indica que seu novo posicionamento se deu
no caso do HC 180.787, relatado pela Ministra Laurita Vaz.
Em julgados posteriores, da mesma turma, verifica-se a
manutenção do referido alinhamento jurisprudencial como no
acórdão relatado pelo Ministro Jorge Mussi, em outubro de
2011.
A diametral mudança de linha interpretativa se
deve,grande parte, em razão de um especifico julgado do
STF, que é o precedente referenciado por todos os acórdãos
do STJ decididos posteriormente. Trata-se do julgamento
ocorrido na primeira turma do STF, no HC 103.525/PE, da
relatoria da Ministra Carmen Lucia, datado de agosto de
2010. Como o presente estudo visa justamente analisar o
papel do Supremo, busca-se antes da analise dessa questão
apresentar a argumentação especifica do caso submetido a
julgamento pela Corte máxima brasileira.
Tal caso, diversamente dos analisados até então, não
se originou de uma reivindicação do Ministério Público para
que a audiência seguisse o novo tramite estabelecido pela
reforma de 2008. Trata-se de um julgamento em crime de
tráfico de entorpecentes, que possui legislação específica
( Lei 11.343/2006). Pelas informações no acórdão, o
paciente foi denunciado pela conduta tipificada nos art. 33
e 34 da Lei 11.343/2006. Narra que, na audiência de
instrução e julgamento, a juíza monocrática não seguiu a
ordem prevista no art. 212 do CPP para oitiva de
testemunhas. Em sentença a juíza condenou o acusado. Foi
impetrado Habeas Corpus junto ao TJ de Pernambuco, que
denegou a ordem, entendendo se tratar de nulidade relativa,
já que a parte tinha se insurgido tardiamente, operando-se
a preclusão e que não havia prejuízo. Os impetrantes do HC,
então, formularam outro pedido de Habeas Corpus junto ao
STJ, tendo sido decidido pela 6ª turma. O relator Ministro
Nilson Naves, em seu voto, repete a fundamentação
apresentada no voto vista do HC 121-215 DF, já analisado
nesse trabalho. Assim, denega a ordem pelos mesmos
fundamentos: a mudança da ordem não afeta o caráter
acusatório e tal alteração acarreta prejuízo para a defesa.
Impetrado outro HC, agora junto ao STF, teve liminar
indeferida. O Ministério Público Federal lançou parecer
pela denegação da ordem.
Em seu voto, a relatora Ministra Carmen Lucia disse
que os fundamentos fáticos e jurídicos não afastaram do que
foi decidido pela Sexta Turma do STJ. Assim, reproduz a
fundamentação do voto vista do Ministro Nilson Naves do HC
121.215 DF, que tinha sido a base para fundamentação da
denegação da ordem do HC do presente caso de Pernambuco.
Após reafirmar que não há novos fundamentos jurídicos para
não manter a decisão do STJ, reforça que a questão se trata
de nulidade relativa, que deveria ser arguida nas alegações
finais, o que não ocorrera no caso, já que a questão fora
suscitada apenas em sede de apelação ao Tribunal de
Justiça. Ademais, independente da sanção prevista ser
decorrente nulidade absoluta ou relativa, não se declara
nulidade por presunção do prejuízo. Logo, afirmou a
Ministra, o prejuízo deve ser concreto, em decorrência do
caráter instrumental do processo. Concluiu, após analisar
os demais pedidos dos impetrantes, pela denegação da ordem.
No julgamento ainda votou o Ministro Marco Aurélio,
apresentando seu entendimento que o processo é liberdade em
sentido maior. Considerou que a forma prevista no art. 212
do CPP é essencial à valia do ato. Reconheceu que o juízo
no caso “se empolgou” ao iniciar seus questionamentos às
testemunhas sem aguardar as partes. Concluiu avaliando que
o prejuízo esta demonstrado pela sentença condenatória, mas
que, como a questão encerra uma nulidade relativa, no caso
em pauta não houve o insurgimento da defesa em momento
próprio. Assim, concluiu pela denegação da ordem. O
julgamento foi finalizado com decisão unanime de denegação
da ordem.
A partir da referida decisão do STF no ano de 2010,
até o final do ano de 2012 foram proferidas mais 10
decisões de ambas as Câmaras. Em 2011, um único Habeas
Corpus foi julgado com esse tema, sendo que seu mérito não
foi analisado haja vista a ausência de liquidez, pela não
comprovação documental da inversão da ordem de oitiva de
testemunhas alegada pelo impetrante ( HC 108.834/PE).
Somente em 2012 a Segunda Turma do STF analisou a
questão da inversão da ordem de oitiva de testemunhas pelo
juiz, nos termos da nova redação do art. 212 do CPP. O
acórdão da lavra do Ministro Relator Ricardo Lewandowski,
usando o leading case julgado na Primeira Turma ( HC
103.525/PE) aduz que a nulidade para ser reconhecida exige
a demonstração do prejuízo, que não foi demonstrado no caso
em apreço.
Em 2012, temos então mais nove decisões do STF sobre o
tema da lavra de diversos Ministros, que ao analisar a
questão tem posicionamentos e fundamentos diferentes mas
que partem de uma mesma premissa, que a demonstração de
prejuízo concreto para o reconhecimento da nulidade, seja
essa absoluta ou relativa.
Seguindo o termos do leading case do HC de Pernambuco, o
Ministro Lewandoski, no HC 112.21.2 reconhece que a
questão é de nulidade relativa e o exige a demonstração do
prejuízo. Entendeu que os argumentos do impetrante que
demonstram que as provas testemunhais obtidar pela atuação
do juiz na instrução foram utilizada na defesa e que na AIJ
o paciente foi patrocinado por defensor ad hoc, ante a
ausência do defensor constituído. Na conclusão do julgado o
Relator decidiu que a defesa não tinha se desimcumbido do
ônus de demonstrar o prejuízo, e assim denegou a ordem.
Em 2012, foi julgado pelo STF, por acórdão da
Relatoria da Ministra Carmen Lucia no Recurso Ordinário em
Habeas Corpus proveniente do STJ, caso concreto que tinha
como origem a Reclamação do Ministério Público do Distrito
Federal, analisada anteriormente. No voto unanime ( RHC
113.382/DF) confirmou-se mais uma vez que a nulidade para a
presente questão é relativa e o prejuízo deve ser concreto.
O STF ainda julgou mais dois Habeas Corpus em que a
ilegalidade apresentava subsistia na inversão da ordem de
oitiva de testemunha pelo juiz. No HC 110.936/RS, da
relatoria da Ministra Carmen Lucia, a ordem é requerida
para anular audiência na qual o promotor de justiça não
estava presente, e que o juiz atuou perguntando primeiro.
Na decisão que denega a ordem, assevera a Relatora que a
defesa do acusado, na audiência não protestou pela ausência
do órgão do Ministério Público. Assim, sustenta que as
alegações finais não seriam mais momento processual
adequado para arguir a nulidade, por se tratar de hipótese
de nulidade relativa. Decidindo pela imprescindibilidade do
protesto em audiência.
Nos julgados de relatoria da Ministra Rosa Weber ( HC
112.446/SP, HC 107.318/SP, tambem se reconhece que a
nulidade no caso de inversão é relativa, necessita a
demonstração do prejuízo. Mesmo que o juiz ao realizar as
perguntas em primeiro lugar descumpra a norma reformada, o
prejuízo somente se evidencia ao princípio da celeridade.
Apresenta ainda entendimento da necessidade de verificação
se no termo da audiência há o protesto da defesa, pela
inversão.
Cabe destacar dois votos do Ministro Marco Aurélio, no
HC 103.525/PE e no HC 107.318/SP, que sustenta o
reconhecimento da nulidade em razão do desrespeito ao
principio acusatório, a distribuição das funções de
acusação e defesa e a equidistância do juiz com as partes.
Reforçando que a negação ao procedimento e a demonstração
do prejuízo fica estampado nos documentos da Audiência. Ao
passo que no voto proferido pelo mesmo Ministro, no HC
105.538/GO, analisando a mesma temática sustenta que a
inversão não atrai vicio de procedimento capaz de ensejar
nulidades, demonstrando assim divergente com a posição
apresentada.
No ultimo caso decidido em 2012 pelo STF sobre a
matéria (HC 112.217/SP), o Ministro Relator Gilmar Ferreira
Mendes reconhece que o entendimento da Corte é que se trata
de nulidade relativa. No caso submetido a julgamento o
advogado do paciente abandonou a causa, e em audiência o
juiz fez as perguntas inicialmente. Na decisão conclui-se
que o prejuízo no caso não foi demonstrado.
Nesse momento vale a pena relacionar todos os pontos
apresentados nessa série de julgados delineando as duas
linhas interpretativas definidas no inicio do estudo,
conjugando o uso da teoria das nulidades.
As interpretações possíveis para o descumprimento do art.
212 do CPP e sua vinculação com a teoria das nulidades
Fica bem claro que ambas linhas interpretativas
inicialmente apresentadas nesse estudo foram utilizadas nos
diversos casos analisados e que sobrepõem a discussão. Bem
como, é possível vislumbrar em alguns julgados a adoção de
uma linha interpretativa intermediária, que se aproxima ou
da primeira linha interpretativa que propõe uma
interpretação com base em princípios ou da segunda linha
realiza uma interpretação sistêmica do Código de Processo
Penal (CPP).
A atuação do Ministério Público do Distrito Federal e
o Ministério Público Federal por seus órgãos junto ao STJ
adotaram a primeira linha interpretativa. Sendo importante
ressaltar que, como os titulares da atribuição
constitucional de órgão de acusação no processo penal,
outra não deveria ser sua posição institucional. Afinal, ao
permitir que o promotor de Justiça faça as perguntas
primeiro às testemunhas de acusação, aquele assume de forma
concreta o seu lugar no processo penal. Assim, terminar-se-
ia com uma pratica recorrente nas instruções processuais
penais brasileiras em que o juiz começa fazendo as
perguntas, depois quando da a palavra à parte acusatória,
esta não tem mais perguntas relevantes a serem formuladas,
pois todas já forma feitas pelo juiz. Logo, deve-se
ressaltar a atuação do Ministério Público em requerer antes
do inicio da inquirição o cumprimento da norma do art. 212
do CPP, como ocorreu de forma reiterada no Distrito
Federal, após a mudança da lei, bem como, a atuação em
apresentar a reclamações junto ao Tribunal de Justiça e por
fim impetrar Habeas Corpus no STJ. Tal atuação esta
vinculada ao seu papel constitucional no processo penal.
Assim, exigir o cumprimento de tal norma não se trata
apenas de dever da defesa do acusado, mas de direito das
partes.
O voto do Ministro Jorge Mussi no HC 121.216 DF também
adota a primeira linha interpretativa. Sustentando toda a
sua fundamentação no respeito aos princípios
constitucionais, desde o principio acusatório, passando
pelo devido processo legal. No que se refere à compreensão
da teoria da nulidade, percebe-se a adoção, por parte de
referido Ministro, da distinção entre nulidade absoluta e
relativa, entendendo ser direito das partes o cumprimento
do devido processo legal, que é garantia para uma decisão
justa. Assim, reconheceu a nulidade como absoluta. Mesmo
considerando tratar-se de nulidade absoluta, não deixou de
analisar a questão do prejuízo, reconhecendo-o em razão da
existência de sentença condenatória fundada em provas
produzidas ao arrepio do devido processo legal. No mesmo
sentido, o voto vencido da Ministra Maria Thereza de Assis
Moura também seguiu a primeira linha interpretativa
construindo a fundamentação da decisão com base no
principio acusatório, no papel do juiz como destinatário da
prova e sua importante função de garantir a imparcialidade
do julgador. Reconheceu a nulidade como absoluta por
contrariar os ditames constitucionais.
A tônica do voto do Ministro Og Fernandes, que foi
estabelecido como voto vencedor do HC 121-215, labora em
uma linha interpretativa intermediária, mas aproximando
ainda mais na segunda linha interpretativa que entende que
o juiz continua perguntando primeiro. Sua fundamentação não
aduz às questões constitucionais, fica ancorado em parte da
doutrina que sustenta justamente que os limites da cross
examination no Brasil permitir que as partes perguntem
diretamente às testemunhas, e não mais passe pela
sistemática anterior que o juiz é quem se dirigia à
testemunha para fazer a pergunta requerida pelas partes.
Assim, conclui que, se o juiz não permitisse às partes
fazer perguntas diretas à testemunha, essa nulidade seria
absoluta, mas se o juiz perguntasse antes das partes ai se
trataria de nulidade relativa, pois atingiria interesse
exclusivo das partes. Utiliza-se, portanto, a teoria das
nulidades, fazendo uso da distinção clássica entre nulidade
absoluta e relativa, em que a primeira é de interesse
público e a segunda de interesse privado. Portanto, não
chega a afirmar categoricamente que nada mudou, mas contudo
chega à mesma conclusão da segunda linha interpretativa,ou
sejam caso o juiz pergunte primeiro, tal atitude não gera
prejuízo algum .
Também adota uma posição intermediária o voto do
Ministro Marco Aurélio quando analisa o leading case do HC de
Pernambuco, mas se aproximando da primeira linha
interpretativa quando reconhece o processo penal como uma
garantia constitucional e entende que se deve cumprir o
art. 212 do CPP, com a atuação preponderante das partes.
Contudo, ao usar as bases da teoria das nulidades sem
vinculação com os princípios, reconhece a questão como
nulidade relativa, exigindo a arguição no tempo oportuno.
Já o voto do Ministro Celso Limongi se enquadra na
segunda linha interpretativa que entende que o juiz deve
sempre perguntar primeiro, justificando que nada mudou
porque os juízes não são estátuas de pedra, são sempre
imparciais, não havendo lesão a interesse público algum
quando ele pergunta primeiro.
O voto do Ministro Nilson Naves também segue a segunda
linha interpretativa pois considera que, se o juiz
perguntar primeiro ou depois, isso não violará a lei, pois
o caráter acusatório é o mesmo em um ou noutro
procedimento. Mesmo fazendo uma referencia a princípio, a
faz para manter o reconhecimento que se desdobra da
legislação processual anterior à Constituição. Usa a teoria
da nulidade, reconhecendo a nulidade relativa, mas de forma
irônica, pois duvida que se possa demonstrar algum prejuízo
pelo fato do juiz perguntar primeiro.
Já o voto apresentado no Supremo Tribunal Federal pela
Ministra Carmen Lucia, por se subsidiar na analise do voto
do Ministro Nilson Naves, segue também a segunda linha
interpretativa, pois diz que não há mais fundamentos a
incluir na decisão que os pontos já apresentados no STJ.
Assim, não se pode obter nesse voto uma análise da questão
que enfrente as questões constitucionais negadas por essa
linha interpretativa. O voto ainda utiliza-se da teoria da
nulidade para afastar a necessária análise da questão
constitucional inserta na discussão. Ao reconhecer que a
nulidade é relativa e que portanto deve ser arguida em
momento oportuno, que seria as alegações finais, não
debruça sobre as questões constitucionais.
Do leading case do STF analisado até as ultimas decisões
do STF4 sobre o tema, não há nos acórdão analise a questão
em termos de princípios constitucionais, perpassando todas
elas no uso da teoria da nulidade. Dessa feita, todas elas
sustentam que o caso enseja nulidade relativa e que
precisam da demonstração do prejuízo. Há sutis diferenças
entre os julgados do STF, mas que demonstram que é na
teoria da nulidade, no recurso ao argumento da existência
de uma nulidade relativa que se sustentam a maioria dos
votos.
Nessa linha interpretativa o dissenso em termos da
etapa interpretativa se apresenta apenas quanto aos limites
e possibilidades do juiz complementar a prova produzida
diretamente pelas partes de forma inicial. Uma
interpretação imparcial, nos termos de Dworkin,seria aquela
que sustenta a não interferência do juiz no depoimento das
testemunhas, já que assim ele passaria a gestor da prova,
4 Em termos metodológicos, foi realizada pesquisa no sitio do STF,utilizando-se como marcos de pesquisa a referencia ao art.212 do CPP ea data de publicação. No ano de 2012, foram 9 decisões sobre o temaRHC 110.623/DF, HC 105.538/GO, HC 112.466/SP, HC 107.318/SP, RHC111.414/DF, HC 112.212/SP, RHC 113.382/DF , HC 110.936/RS, HC112.217/SP. Nos anos anteriores, apenas duas decisões do STF: HC108.834/PE, HC 103.525/PE.
como no sistema inquisitorial, e portanto estaria quebrada
sua imparcialidade. Nesse sentido, o juiz estaria cruzando
os braços aos abusos e/ou omissões das partes que
prejudicariam a melhor compreensão do fato probatório.
Seria, assim, uma interpretação nos termos do liberalismo
processual, fundado no principio dispositivo.
Em outro sentido, esta a proposição de uma
interpretação radical, que estabelece limites claros para a
atuação do juiz na inquirição das testemunhas, que permite
então fazer perguntas que esclareçam o tema já proposto
pelas partes em suas perguntas, permitindo assim a produção
de uma prova mais fidedigna com o relato da testemunha.
Essa interpretação deve levar em conta a advertência de
Cordeiro (1986) sobre o primado da hipótese sobre o fato,
de modo que, quando o juiz formula alguma pergunta para
esclarecer a questão, ele desde já apresenta mentalmente
uma projeção da sua compreensão sobre o fato e, portanto,
age direcionado a um sentido pré-compreendido. Assim, seria
uma interpretação voltada ao socialismo processual, que
sustenta o protagonismo do juiz no processo, não se
vinculando tal protagonismo à quebra da imparcialidade.
O núcleo da questão está exatamente em analisar se a
inversão da ordem de inquirição das testemunhas se trata de
violação de um direito decorrente de um princípio
constitucional, ou seja, uma hipótese de nulidade a ensejar
uma repetição do ato processual. Conforme já demonstrado,
as questões constitucionais não foram enfrentadas pelos
juízes de primeira instância no DF, nem tampouco pelo STJ e
STF, sobretudo porque as decisões proferidas desconsideram
tal questão encobrindo-as com uma teoria das nulidades em
desarmonia com a Constituição.
Para se pretender uma interpretação conforme a
Constituição para a questão, sem fugir do marco proposto,
precisa-se primeiro pensar em uma teoria das nulidades
conforme a Constituição, segundo analisar as questões
constitucionais que estão por de traz das reformas parciais
contrapondo-as com a tradição do processo penal brasileiro.
2 – POR UMA TEORIA DAS NULIDADES ADEQUADA AO MODELO
CONSTITUCIONAL DE PROCESSO
Para se reconstruir uma teoria das nulidades adequada
à Constituição e ao seu modelo constitucional precisa
afastar das bases liberais da teoria das nulidades, fundada
na rigidez das partes. As bases liberais ainda são
reconhecidas no texto original do CPP de 1941, como o art.
564, que define um elenco de hipóteses de nulidades para
deveriam ser aplicadas pelo juiz acriticamente.
Por outro lado as bases da teoria das nulidades
fundada exclusivamente socialismo processual, construída a
partir da instrumentalidade das formas definida pelo
prejuízo a ordem publica ou ao interesse das partes. Tal
medida visa obter a maior eficiência dos atos processuais,
no sentido de uma economia processual. Mais do que isto, as
nulidades em termos processuais passam a ser reconhecidas
de ofício pelo magistrado, sem a provocação das partes. Ela
passa a ser hipótese de não aplicação do princípio
dispositivo, por se tratar de questão de ordem pública.
Estas características aproximam a teoria das nulidades às
influências do socialismo processual, que tem como
importante característica a atuação ativa do juiz no
processo, ou seja, o protagonismo judicial (NUNES, 2008),
inclusive no sentido de suprir as deficiências
argumentativas das partes.
Há, portanto, necessidade de se rediscutir a teoria
das nulidades, no sentido de garantir uma interpretação
adequada ao Estado democrático de direito e coerente com a
própria noção de processo, como garantia de direitos
fundamentais, ou ainda, à noção de modelo constitucional de
processo (BARROS, 2009a; 2009b).
Assim, na perspectiva do Estado Democrático de Direito
a nulidade não pode ser reconhecida como vicio, como um
defeito intrínseco ao ato, mas sim uma sanção ao
desrespeito aos princípios constitucionais de processo.
A necessidade de que a nulidade processual seja
reconhecida e declarada judicialmente já é compreendida por
diversos autores, desde Grinover(2007) a Gonçalves(2000,
2012), mesmo que em determinadas expressões legais tal
noção não seja verificada. Ao se construir a noção de que o
processo se vincula aos princípios constitucionais, deve o
ordenamento prever uma sanção para o seu desrespeito, ou
seja, as nulidades5. O ato processual não nasce nulo por
5 Ou ainda, na doutrina estrangeira: Ocorre ben distinguire tra il dovere delgiudice di garantire il contraddittorio – e la correlativa affermazione di diritti delle parti – dalla
faltar um de seus requisitos, mas a nulidade é vista de
forma externa, a partir das consequências do ato processual
no interior do processo.
Nos termos de uma reflexão sobre a teoria das
nulidades adequada à noção de processo como garantia,
aquelas devem ser consideradas como forma de controle dos
atos processuais, de sua regularidade e conformidade com o
modelo constitucional de processo. Assim, a nulidade
somente pode ser considerada como uma consequência do
reconhecimento pelo órgão julgador da desconformidade do
ato frente ao modelo constitucional de processo, gerando,
como consequência, a necessidade de se refazer o respectivo
ato, declarando-o nulo. Ou seja, a nulidade é uma sanção
decorrente da desconformidade do ato face à Constituição.
Portanto, a cognição sobre a nulidade se dá em duas
fases. Em uma primeira fase, deve-se perquirir se o ato é
regular ou irregular. Isto é, se o ato é desconforme o
modelo normativo de processo como se refere Gonçalves
(2000, p. 62), o que significa desconformidade com as
normas processuais. Em uma visão mais adequada à noção de
processo como garantia de direitos fundamentais, própria do
Estado Democrático de Direito, discute-se se o ato é
desconforme ao modelo constitucional de processo. Pois, um
ato processual desconforme às normas processuais afeta a
garantia do processo e, portanto, é um ato irregular.
conseguenza della sua violazione: non si può ridurre il significato della garanzia a quest’ultimoaspetto, poichè la zanzione di nullità non è affatto “inutile”, se opera come sanzione deterrenteossia per indurre il giudice a rispettare il contraddittorio prime di dicidere.(FERRI, 1988,p. 782)
Na segunda fase, se discute argumentativamente se o
ato irregular deve ser reconhecido como nulo, devendo-se
demonstrar que o ato não cumpriu sua finalidade, gerando,
portanto, prejuízo.Gonçalves ( 2000, p58) critica a adoção
dos princípios da instrumentalidade das formas, da
causalidade, do interesse e da economia processual como
critérios para discussão das nulidades. Assim, Gonçalves
(2000) propõem a substituição dos referidos princípios
pelos critérios da finalidade e do prejuízo, para
demonstração da nulidade. Ou, dizendo de outra maneira, se
o ato for irregular, mas cumprir sua finalidade e não gerar
prejuízo, não haverá razão para anulá-lo.
Finalidade do ato significa “construir o procedimento
válido” (GONÇALVES, 2000, p. 61). Ou seja, o ato processual
deve cumprir seus fins, no sentido de garantir as bases do
processo constitucional, logo, que respeite o
contraditório, a ampla argumentação, a imparcialidade do
julgador e a fundamentação racional da decisão (BARROS,
2009a, p.17-18).
Ausência de prejuízo significa que a irregularidade do
ato não prejudicou as garantias do processo. Isto é, o ato
garante a participação dos afetados por meio do
contraditório, garante o tempo para que as partes possam
apresentar os argumentos e fatos relevantes para a formação
do processo. E, ainda, que o processo seja dirigido por um
juiz imparcial e que a decisão tenha uma fundamentação
adequada e apresente aceitabilidade racional, levando em
consideração o esforço reconstrutivo e argumentativo das
partes.
A análise da sanção, que é a declaração da nulidade,
passa então por uma dupla ambivalência, pois a
argumentação se pauta pela discussão do cumprimento de
finalidade e não geração de prejuízo, ou do não cumprimento
de finalidade e ocorrência de prejuízo. Ou seja, o binômio
finalidade e prejuízo são indissociáveis.
O ponto da revisão da nulidade voltada ao Estado
Democrático de Direito deve precipuamente vincular a sanção
ao desrespeito dos princípios constitucionais de processo.
Logo a nulidade não pode ser usada para encobrir uma
analise sobre uma interpretação conforme a Constituição,
mas ao contrario exige que uma fundamentação fundada em
princípios.
Nesse sentido, no instrumentalismo a teoria das
nulidades é estruturada a partir de quatro características
(denominadas de princípios), propostos inicialmente por
Dinamarco, Grinover e Cintra (2005, p. 352-353), que são a
instrumentalidade das formas, o interesse, a causalidade e
a economia processual. No presente estudo, adota-se posição
diversa, que sustenta a discussão apenas na finalidade do
ato e na ocorrência de prejuízo, como já apresentado. Mas
esse binômio se vincula ao modelo constitucional de
processo, sustentado pelos princípios do contraditório,
ampla argumentação, imparcialidade e fundamentação da
decisão, e no caso do processo penal, seus princípios que o
identificam, como a presunção de inocência, o princípio
acusatório e as garantias individuais do cidadão,
descriminadas na Constituição.
Quando se distingue as nulidades entre absolutas e
relativas, seja pelo critério do socialismo processual em
que as primeiras objetivam garantir a ordem pública e as
segundas o interesse das partes, ou, então, pelo critério
da atipicidade constitucional que as primeiras desrespeitam
normas constitucionais e as segundas normas
infraconstitucionais (GRINOVER, FERNANDES, GOMES FILHO,
2007) está se graduando as nulidades.
Ao se discutir as nulidades sob o binômio finalidade e
prejuízo não se admite uma gradação da nulidade, no sentido
da existência de uma nulidade relativa ou absoluta. Tomada
a noção de processo como garantia tem-se que: ou os
princípios constitucionais foram garantidos e o ato não
será irregular ou, se foram desrespeitados, discutir-se-á
se houve, então, prejuízo. Logo, não se pode admitir
gradação de nulidade, pois ou o ato é nulo ou foi
convalidado. Não há que se falar em “meia” nulidade, em ato
mais ou menos certo. Em especial, no processo penal em que
o processo é garantia do direito de liberdade do acusado
não se pode dizer que a norma processual cumpriu
parcialmente sua finalidade ou gerou parcial prejuízo.
Nesse sentido a teoria do Estado Democrático de
Direito se aproxima do entendimento do STF que não existe
prejuízo presumido e que para decretação da nulidade deve-
se verificar um prejuízo concreto6. Tal prejuízo não se
evidencia tão somente pela analise do resultado final do6 Ver HC 73099, HC 74.356, HC 74.671, HC 81.510, todos do STF.
processo, no sentido de condenar ou absolver o acusado. No
binômio finalidade/prejuízo o que se busca é verificar se
as garantias do processo penal no referido caso concreto em
razão de um ato irregular foram ou não cumpridas.
Assim a partir das premissas aqui apresentadas para a
compreensão das nulidades, é possível questionar se o
tratamento dado até então pelo STF ao tema do art. 212 do
CPP, subsidiado pela noção de que tal irregularidade gera
uma nulidade relativa, se sustenta em bases
constitucionais. Por fim, refletir sobre o importante papel
que o STF deve cumprir de conformador das praticas
judiciais às reformas processuais realizadas pelo processo
legislativo, influenciando ou não uma mudança dessa
prática.
A história institucional do Supremo Tribunal Federal
em matéria processual penal, em decisões dos últimos 10
anos, reconhece a importância da garantia do processo penal
como um dos pontos da interpretação da Constituição. Nesse
sentido, vale ressaltar as duas súmulas vinculantes
relacionadas ao uso de algemas e ao acesso aos autos do
inquérito policial pelo advogado do investigado, o
reconhecimento da inconstitucionalidade do art. 595 do CPP,
o novo direcionamento da ordem pública como critério para
decretação da preventiva, bem como a exigência de
fundamentação que analise os fatos ensejadores da prisão.
Retroceder nessa historia é ressuscitar o Estado de
Policia(MOHL, 1844) e ignorar o Estado de Direito,
reconhecendo um retrocesso civilizatório.
Quando nos acórdãos analisados das instancias
inferiores se faz referencia ao entendimento consolidado do
STF, que a inversão da ordem de oitiva de testemunhas entre
a acusação e defesa é nulidade relativa, chancela uma
pratica de que o juiz pode não cumprir as normas
processuais, que teria caráter procedimental7. Ficando ao
alvedrio do “livre convencimento do juiz” aplicar ou não a
norma reformada.
Nos casos analisados que originaram as Reclamações ao
TJDF o juiz iniciava perguntando à testemunha por entender
que o art. 212 se trata de mero preciosismo. Não analisava
a questão como uma excepcionalidade. Também não declarava
inconstitucional a norma do art. 212 do CPP, para
fundamentar o não cumprimento da determinação. Certamente,
não se esta aqui a justificar a rigidez interpretativa
própria do positivismo jurídico, mas também não se pode
autorizar o juiz a descumprir a determinação de uma
garantia especifica do processo penal, bem como não se pode
admitir que seu descumprimento gere uma nulidade relativa,
pois essa interpretação não se vincula aos princípios
constitucionais. É nesse sentido que se pode concluir que
para a formação continuada dos juízes no sentido de
aprimoramento das praticas judiciais a partir das reformas
processuais a posição do STF tem sim um sentido pedagógico,
7 O termo procedimental se refere a noção de que o procedimento é aforma com a qual o processo se exterioriza, não se sustenta na noçãofazzalariana (FAZZALARI, 1992) de que o processo e um procedimentorealizado em contraditório, ou mesmo na noção proposta por ScaranceFernandes(2005) de que o procedimento garante os direitosfundamentais.
de estimular a correção das decisões a uma interpretação da
Constituição em sua melhor luz.
Já na perspectiva teórica o uso da teoria da nulidade
relativa pelo Supremo demonstrou que a questão
constitucional inserida do debate, sustentada pelo devido
processo penal, pela garantia da imparcialidade e pelo
princípio acusatório não foi até então apreciada. Nos
votos analisados não há debate ou esforço hermenêutico
específico em interpretar a norma do art. 212 do CPP
conforme a Constituição e seus princípios. Ademais, há
oscilações nos votos dos Ministros ou mesmo incorreções na
forma de aplicar as nulidades no processo penal, pelo uso
não fundamentado de noções do processo civil ou do trabalho
nessa seara.
Nesse sentido, é emblemático o primeiro posicionamento
do Ministro Marco Aurélio( voto no HC 103.525-PE) que
entendia que o processo penal era uma garantia, mas no caso
em exame por ser nulidade relativa operou a preclusão pela
não arguição no momento processual oportuno.
Posteriormente, no HC 105.528/GO apresenta entendimento que
a inversão é um vício de procedimento, e de difícil
demonstração do prejuízo. Por fim, no voto vencido no
julgamento do HC 107.318/SP analisa a questão a partir do
princípio do contraditório e da garantia da equidistância
do juiz para com as partes, ou seja, uma nulidade absoluta.
Logo, se a questão for analisada a partir dos princípios
certamente a interpretação da norma e a consequente
fundamentação da decisão anulará o processo por prejuízo
aos princípios constitucionais. Mas se analisar como
nulidade relativa invariavelmente ensejará o não
reconhecimento de nulidades.
Nesse sentido, verificando um dos casos concretos
submetidos ao STF tal assertiva fica demonstrada. No
julgamento do HC 110.936/RS, ficou demonstrado que estava
ausente o Promotor de Justiça na Audiência quando foram
ouvidas as testemunhas policiais. Na audiência, o juiz
primeiro fez perguntas e depois deu-se a palavra à defesa
para fazer as suas. Segundo a decisão do STF, a nulidade no
referido caso deve ser considerada relativa, exigindo que a
defesa apresenta-se um protesto em Audiência. Na conclusão
do julgamento a ordem denegada, por não existir prejuízo.
Pelo relato do caso verificou-se que o MP não estava
presente, a defesa e o MP no interrogatório dos acusados
não perguntaram nada, mas não se reconhece existência de
prejuízo as partes.
Ora a ausência do Ministério Público em ação penal
publica sempre foi causa de nulidade absoluta, mesmo antes
da nova redação do art.212 do CPP (GRINOVER, FERNANDES,
GOMES FILHO, 2007). Como que agora ao se analisar um caso
que consoante a ausência o MP também se argui a inversão da
ordem de oitiva de testemunha, tal nulidade se torna
relativa. Mais ainda, se decide pela ausência de prejuízo.
Como se a Constituição e seu art. 129 não determinasse a
separação entre a acusação e a função jurisdicional.
Ao se relativizar a nulidade não foi a questão
constitucional analisada, qual seja no referido caso o juiz
ao substituir o órgão de acusação não desrespeita o
princípio da imparcialidade e o princípio acusatório?
Verifica-se o não desvelamento da questão constitucional
pelo uso da teoria da nulidade relativa.
Ademais, quanto à preclusão temporal os julgados do
supremo analisados demonstraram o uso inadequado das
disposições do processo civil e do processo trabalho ao
processo penal. Ora, preclusão é sanção processual, e como
tal deve ser expressamente prevista em norma processual.
Logo se pergunta, quando se deve arguir a ocorrência de ato
irregular que enseja nulidade relativa no processo penal? A
previsão legal estabelecida no art. 571 em um esforço de
interpretação sistêmico8 estabelece as alegações finais com
marco final preclusivo.
Contudo, ao se analisar a sistemática da reforma de
2008 com a introdução da audiência de instrução e
julgamento verifica-se a opção pela oralidade e
concentração de atos de instrução e julgamento. Quando se
utiliza de tal técnica de concentração de atos, como
consequência, as decisões interlocutórias tomadas em
audiência são irrecorríveis, como assevera Ovídio Baptista
da Silva e outro (2006, p 54). Nesse caso a impugnação da
decisão ou será feita em preliminar no recurso de apelação,
ou em recurso de agravo, que não há no processo penal. Ao
se apoiar na teoria da nulidade relativa a questão da
preclusão foi decidida de forma diversa pelo STF quando se
8 O artigo 571 do CPP mantem ainda com a redação de 1941. Se eles foremadaptados às mudanças decorrentes da reforma parcial de 2008, pelas Leis 11.689/2008 e 11.719/2008, seriam as alegações finais orais no procedimento ordinário o momento para a sua arguição
compara os julgados de 2012, e utilizando-se de institutos
processuais estranhos ao processo penal, como a figura do
protesto antipreclusivo, definido a partir do art. 795 da
CLT, ou ainda, do art. 202, II do Código Civil, ou do art.
245 do CPC.
No leagin case do STF, entendeu-se que a defesa deveria
arguir o desrespeito ao art. 212 do CPP em alegações finais
orais.Ja no HC 107.318/SP de relatoria da Ministra Rosa
Weber e no HC 110.936/RS de relatoria da Ministra Carmen
Lucia cria-se a exigência do protesto em audiência para
impedir a preclusão. Exigir tais atos processuais
antipreclusivos é impedir a demonstração do prejuízo, pois
antes da sentença não sabe como a prova testemunhal será
avaliada na fundamentação da decisão. O prejuízo não é
demonstrável nem mesmo presumível, pois não se sabe como as
perguntas feitas pelo juiz antes das partes serão
consideradas pelo próprio juiz na sentença. Logo, seria
mais adequado reconhecer a possibilidade de arguir a
nulidade na preliminar de apelação em razão da concentração
da instrução e julgamento, bem como para se permitir a
argumentação da nulidade pelo binômio finalidade e
prejuízo. Ademais, protesto não é uma figura da técnica do
processo penal, não há previsão legal, bem como não é
considerado na doutrina e na jurisprudência até então.
Verifica-se aqui o amparo em normas e praticas judiciais do
processo do trabalho, que não podem ser admitidas no
processo penal, ante aos princípios que fundam as garantias
desse microsistema.
Conclusão
Assim, ao se analisar os julgados do Supremo Tribunal
Federal sobre a questão verificou-se que as decisões se
fundaram exclusivamente na analise de requisitos para se
reconhecer a nulidade relativa, sem discutir a matéria
constitucional implicada na questão processual do caso
concreto. Ao se optar pelo uso da nulidade relativa, toda e
qualquer questão constitucional fica subjugada e encoberta
por um procedimentalismo descomprometido com o Estado
Democrático de Direito e em bases técnicas incompatíveis
com o processo penal.
Mais que um interesse teórico, a revisão da teoria das
nulidades, notadamente por parte do Supremo Tribunal
Federal, no sentido de convergência com o modelo
constitucional de processo é medida imperiosa, para a
formação continuada dos juízes, para a revisão das praticas
judiciais autoritárias e, sobretudo para equalizar o atual
momento legislativo, de reformas processuais.
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JULGADOS
BRASÍLIA, Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
Territórios. Reclamação n.2008.00.2.012057-9 do Ministério
Publico do distrito Federal e DF. Primeira Turma. Relatora
Sandra de Santis. Julgado em 29 de janeiro de 2009a.
BRASILIA, Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
Territórios. Reclamação n. 2009.00.2.009543-4 do
Ministério Publico do distrito Federal e DF. Segunda Turma.
Relator Roberval Casemiro Belinati. Julgado em 22 de
outubro de 2009b.
BRASILIA, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus
n.121.216- DF. Relator Ministro Jorge Mussi. Publicado no
Diário da Justiça Eletrônico: 01/09/2009c.
BRASILIA, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.
121.215- DF. Relatora Ministra Maria Thereza de Assis
Moura. Relator para o Acórdão Ministro Og Fernandes.
Publicado no Diário da Justiça Eletrônico:22/02/2010a.
BRASILIA, Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.
180.787. Relatoria Laurita Vaz. Publicado no Diário de
Justiça Eletrônico: dezembro de 2010b.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.103.525
PE. Relatora Carmen Lúcia. Publicado no Diário de Justiça
Eletrônico em 27/08/2010c.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.108.834
PE. Relator Celso de Mello. Publicado no Diário de Justiça
Eletrônico em 18/10/2011a.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Recurso em Habeas
Corpus n.110623 DF. Relator Ricardo Lewandowski. Publicado
no Diário de Justiça Eletrônico em 13/03/2012a.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus
n.105.538/GO. Relator Marco Aurelio. Publicado no Diário de
Justiça Eletrônico em 10/04/2012b.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus
n.112.446/SP. Relatora Rosa Weber. Publicado no Diário de
Justiça Eletrônico em 08/05/2012c.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.107.318
SP. Relatora Rosa Weber. Publicado no Diário de Justiça
Eletrônico em 05/06/2012d.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Recurso em Habeas
Corpus n.111.414 DF. Relator Gilmar Mendes. Publicado no
Diário de Justiça Eletrônico em 14/08/2012e.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.112.212
SP. Relator Ricardo Lewandowski. Publicado no Diário de
Justiça Eletrônico em 18/09/2012f.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Recurso em Habeas
Corpus n.113.382. Relatora Carmen Lúcia. Publicado no
Diário de Justiça Eletrônico em 25/09/2012g.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.110.936
RS. Relatora Carmen Lúcia. Publicado no Diário de Justiça
Eletrônico em 25/09/2012h.
BRASILIA, Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus
n.112.217/SP. Relator Gilmar Mendes. Publicado no Diário de
Justiça Eletrônico em 13/11/2012i.