Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
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Austeridade no Reino Unido: o fim do estado de bem estar social?
Austerity in the UK: the end of the welfare state?1
Iain FERGUSON2
Abstract: This paper will explore the different rationales – economic, political and ideological - behind the
current coalition assault on the welfare state in Britain. Clearly one important driver is the desire to shift the
costs of a global crisis of capitalism onto the working-class. To what extent, however, does the rhetoric of
debt reduction also mask a more long-term ruling-class objective of rolling back the post-war welfare settle-
ment? And how far can a modern capitalist state, even one in the midst of what the former governor of the
Bank of England has described as ‚the worst crisis at least since the 1930s‛, do without some kind of welfare
state? Answering these questions involves addressing the role of welfare provision within capitalism.
Key words: Global Crisis. Welfare State. Capitalism. Britain.
Resumo: Este artigo irá explorar as diferentes justificativas - econômicas, políticas e ideológicas - por trás do
ataque atual feito pela coalizão sobre o estado social da Grã-Bretanha. Claramente, um dos motivos mais
importantes é o desejo de transferir os custos de uma crise global do capitalismo para a classe trabalhadora.
Até que ponto, no entanto, a retórica da redução da dívida também mascara um objetivo da classe dominan-
te de longo prazo, objetivo este de reverter o estado social do pós-guerra? E até que ponto um Estado capita-
lista moderno, mesmo em meio ao que o ex-governador do Banco da Inglaterra descreveu como ‚a pior cri-
se, pelo menos desde a década de 1930‛, pode fazer sem algum tipo de estado social? Responder a essas
perguntas envolve abordar o papel dos regimes sociais dentro do capitalismo.
Palavras-chave: Crise Global. Estado Social. Capitalismo. Grã-Bretanha.
Submetido em: 07/10/2013. Aprovado em: 04/11/2013
1 Traduzido por Sandlei Moraes de Oliveira. 2 Formado em Social Word pela University of Stirling (Escócia). PhD pela University of Glasgow (Escócia). É
professor de Social Work and Social Policy na University of the West of Scotland (UWS, Reino Unido).
E-mail: <[email protected] >.
ARTIGO
Iain FEGUSON
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Há uma cena em The Spirit of 1945, do-
cumentário de 2013 do diretor Ken Loach
(de esquerda) sobre as realizações do Go-
verno Trabalhista da Grã-Bretanha entre
1945-1951, na qual um médico fala sobre
visitar uma família pobre onde havia uma
criança que estava muito doente com
uma tosse seca. Remédios foram adminis-
trados, e um médico retornou à casa no
dia seguinte para verificar o progresso da
criança. Ao pé da escada, o médico pôde
ouvir claramente o som de uma criança
tossindo violentamente. ‚Ser{ que o re-
médio não funcionou, então?‛, perguntou
| mãe da criança. ‚Ah, sim, funcionou‛,
ela respondeu: ‚mas esse é um dos meus
outros filhos e eu não posso pagar por
remédios para ele também.‛ ‚Você pode
agora‛, disse o médico.
Era dia 05 de julho de 1948 e o médico
pôde fazer essa promessa porque naquele
dia um sistema de saúde universal foi
introduzido na Grã-Bretanha. Um sistema
que não se baseava na capacidade que as
pessoas tinham de pagar, e tampouco em
contribuições anteriores para a segurança
nacional, mas livre para todos no ato do
atendimento.
O Serviço Nacional de Saúde (SNS) trans-
formou a vida de milhões de pessoas da
classe trabalhadora. No nível mais básico
isso significava, por exemplo, que, pela
primeira vez, essa classe tinha direito a
cuidados de saúde básica, incluindo den-
taduras, óculos e receitas médicas gratui-
tas, sem ter que pagar ou recorrer a insti-
tuições de caridade ou charlatões.
O SNS era a peça central de uma série de
reformas introduzidas pelo governo tra-
balhista do pós-guerra sob o comando do
primeiro-ministro Clement Attlee, refor-
mas essas que compunham o que se tor-
nou conhecido como o ‚Estado de bem
estar social‛. As reformas foram baseadas
nas recomendações do Relatório Beverid-
ge de 1942, intitulado em homenagem a
seu autor, o funcionário público liberal
Sir William Beveridge. No mesmo dia em
que o SNS começou a existir, duas outras
leis foram aprovadas, leis essas que tam-
bém melhoraram a vida de pessoas da
classe trabalhadora, embora com menor
impacto. A Lei Nacional de Seguros in-
troduziu um sistema de seguro estatal
que, em troca de contribuições de um
montante fixo, trouxe uma série de novos
e maiores benefícios, incluindo o auxílio
desemprego e doença, subsídios e licença
maternidade, pensões e seguro por morte
que permitia um funeral básico (abonos
familiares, ou o abono de família já havia
sido introduzido em 1945). E o objetivo
do autodeclarado Ato de Ajuda Nacional
era ‚colocar fim | Lei dos Pobres‛ que
existia, nacionalizando a responsabilida-
de por pagamentos em dinheiro para
aqueles que necessitassem e tirá-los das
mãos das Comissões de Assistência Pú-
blica, localmente odiados3.
Outras reformas introduzidas pelo go-
verno Attlee incluiam a construção de um
milhão de novas casas e a aprovação de
um ato que levou à criação de 25 novas
cidades, abrigando dois milhões de pes-
soas. E na área da educação, a Lei da 3 Timmins (1996) fornece uma narrativa completa
sobre o caso.
Austeridade no Reino Unido
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Educação de 1944 (que foi aprovada sob o
governo de coalizão de guerra comanda-
do pelo ministro conservador Rab Butler,
mas implementada durante o governo
Attlee) tornou legal a oferta do ensino
médio de forma gratuita para todos e ele-
vou a idade da escolaridade obrigatória
para 15 anos.
O conteúdo desses novos serviços e as
formas por meio das quais eles foram im-
plementados ficaram, na maioria das ve-
zes, muito aquém das promessas feitas,
por razões a serem exploradas a seguir.
No entanto, na Grã-Bretanha, em 2013,
governada por uma coalisão conserva-
dor/liberal-democrata eleita em 2010, no
qual o termo ‚reforma social‛ é um eu-
femismo para a privatização, cortes nos
serviços e os ataques aos benefícios - o
que o escritor marxista Chris Harman
(2008) chama de ‚antirreformas‛. É im-
portante ressaltar que muitas das refor-
mas introduzidas pelo governo trabalhis-
ta de 1945-1951 eram verdadeiras refor-
mas, no sentido mais básico de que me-
lhoraram substancialmente a vida (e as
chances de vida) de milhões de pessoas.
Como Cliff e Gluckstein observam na his-
tória do Partido Trabalhista, ‚para além
do que os mitos em relação ao governo
trabalhista de 1945-51 dizem, não há dú-
vida de que foi o mais efetivo governo
trabalhista de todos eles‛ (CLIFF; GLU-
CKSTEIN, 1988, p.218).
Sessenta e cinco anos após a sua funda-
ção, sob um governo de coalizão, cada
aspecto do Estado social está sob ataque.
O Ato de Saúde e Assistência Social de
2012 remove o imposto da Secretária de
Estado da Saúde para que esta preste um
serviço de saúde abrangente; ao mesmo
tempo, a exigência na Lei de que até 49
por cento dos serviços possam ser adjudi-
cados a ‚qualquer fornecedor qualifica-
do‛ levar{ rapidamente | privatização do
SNS na Inglaterra e no País de Gales. En-
tre um quarto e metade de todos os servi-
ços comunitários prestados já são geridos
pela VirginCare (DAVIS; TALLIS, 2013;
GOSLING, 2013).
Desde 2010 existe na assistência social
uma combinação de cortes de cerca de 30
por cento nos orçamentos das autorida-
des locais; critérios de elegibilidade para
os serviços cada vez mais restritivos e
orçamentos pessoais inadequados deixa-
rão milhões sem o apoio de que precisam
e cada vez mais dependentes da família,
em particular, os membros da família do
sexo feminino (HUMPHRIES, 2013).
E no lugar do que já foi chamada de
‚previdência social‛, h{ cortes sem pre-
cedentes em todas as áreas de benefícios,
especialmente nos benefícios por invali-
dez. A introdução de regimes de sanções,
contribuiu para que 500.000 pessoas fos-
sem forçadas a usar os bancos de alimen-
tos (food banks), e um imposto de quar-
tos 4 recentemente introduzido afetará
cerca de 600.000 pessoas que vivem em
habitações sociais com ‚muitos quartos‛,
4 NT - Aprovado em 2013, o bedroom tax repre-
senta um impacto sobre famílias que possuem
quarto(s) vago(s)em suas casas que podem terre-
duzidos os benefícios em torno de 14%. Esta redu-
ção no atual contexto de crise econômicaé grande.
Iain FEGUSON
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aumentando o número de crianças que
vivem em situação de pobreza em 200.000
(BUTLER; GENTLEMAN, 2013), minan-
do as famílias, forçando dezenas de mi-
lhares de pessoas a mudar-se para outras
áreas do país ou o serem expulsas. Tudo
isso tem sido sustentado por uma força
brutal e ideológica contra as pessoas que
recebem os benefícios, e isso tem contri-
buído para um aumento significativo dos
níveis de crime de ódio, aumento das ta-
xas de depressão e ansiedade e um au-
mento na taxa de suicídio entre aqueles
que recebem algum benefício.
Este artigo irá explorar as diferentes justi-
ficativas - econômicas, políticas e ideoló-
gicas - por trás do ataque atual feito pela
coalizão sobre o Estado social da Grã-
Bretanha. Claramente, um dos motivos
mais importantes é o desejo de transferir
os custos de uma crise global do capita-
lismo para a classe trabalhadora. Até que
ponto, no entanto, a retórica da redução
da dívida também mascara um objetivo
da classe dominante de longo prazo, obje-
tivo este de reverter o Estado social do
pós-guerra? E até que ponto um Estado
capitalista moderno, mesmo em meio ao
que o ex-diretor do Banco da Inglaterra
descreveu como ‚[...] a pior crise, pelo
menos desde a década de 1930‛ (KING,
2011), pode fazer sem algum tipo de Es-
tado social? Responder a essas perguntas
envolve abordar o papel dos regimes so-
ciais dentro do capitalismo, assunto da
próxima seção deste artigo.
Avaliar o passado, presente e futuro do
Estado social do pós-guerra, no entanto,
também é importante por outro motivo.
O surgimento de Syriza na Grécia levou a
um redespertar do interesse de toda a
Europa na possibilidade de criar forma-
ções eleitorais de esquerda e governos de
esquerda, que podem representar uma
alternativa à austeridade e ao neolibera-
lismo. Esse interesse tem-se refletido na
Grã-Bretanha em uma cheia Assembleia
do Povo (um encontro de ativistas e sin-
dicalistas), em 2013, e também em uma
nova Unidade de Projetos da Esquerda,
iniciada pelo próprio diretor Ken Loach5.
O renascimento do que têm sido descrito
como as ideias e estratégias dos ‘reformis-
tas de esquerda’(no sentido de aborda-
gens que querem a mudança radical, mas
que evitam ou rejeitam a distinção histó-
rica entre reforma e revolução), aparece
após duas décadas nas quais partidos
social-democratas de todo o mundo fo-
ram apanhados nas garras do neolibera-
lismo (BLACKLEDGE, 2013). Ele também
traz perigos, no entanto.
The Spirit of 1945, de Loach, por exemplo,
enquanto documentário poderoso e co-
movente, apresenta um retrato acrítico,
em grande escala, de um governo social-
democrata, que, ao lado de suas realiza-
ções consideráveis, também enviou tro-
pas em 18 ocasiões diferentes para que-
brar greves, deixou os ex-patrões estatais
a cargo de indústrias recém-
nacionalizadas, e recolocou encargos
odontológicos e prescritivos em 1951
(CLIFF; GLUCKSTEIN, 1988, chapter 11).
Como os críticos marxistas do governo
John Saville e Ralph Miliband argumen-
tam (SAVILLE, 1957-1958; MILIBAND,
5 See <http://leftunity.org/>.
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1972), quaisquer que sejam suas realiza-
ções, até mesmo o governo operou de
forma muito clara no quadro do capita-
lismo e não hesitou em colocar as neces-
sidades do capital antes daquelas da clas-
se trabalhadora. Há perigos que podem
ser vistos claramente, então, tanto no ex-
cesso de exaltação das realizações de tais
governos quanto na minimização das
pressões que enfrentarão a capitular às
pressões do capitalismo global. Essas
questões serão exploradas mais adiante
neste artigo. Antes disso, no entanto, é
necessário olhar mais de perto o papel
contraditório do Estado social dentro do
capitalismo.
Capitalismo e Estado Social
Tendo em conta que a essência do sistema
capitalista é, na expressão de Marx, a
acumulação pela acumulação, o motivo
(MARX, 1976, p. 742) pelo qual se extrai o
máximo de valor excedente possível de
trabalhadores, pode-se perguntar por que
os capitalistas se preocupam em gastar
qualquer valor que seja com o social. E a
resposta simples e correta é que onde eles
têm escolha, não o fazem. Considere estes
dois depoimentos sobre trabalho infantil:
Crianças de nove e dez anos são arrastadas
de suas camas imundas às duas, três, qua-
tro horas da manhã e obrigadas a trabalhar
para a subsistência até os dez, onze ou doze
anos, à noite; os membros desgastados, seus
corpos diminuem, seus rostos empalide-
cendo, e sua humanidade absolutamente
afundando em um torpor de pétreo, absolu-
tamente horrível de contemplar (MARX,
1976, p. 353).
[As crianças traficadas] vieram do distante
Liangshan em Sichuan e a maioria delas
ainda não tinha 16. Os superintendentes
procuraram e as recrutaram de famílias na
pobreza, prometendo-lhes altos salários, al-
guns eram até mesmo sequestrados e ex-
pulsos em lotes para Dongguan e, de lá,
distribuídos pelo caminhão de fábricas em
todo o Delta do Rio das Pérolas. Em solo
desconhecido, essas crianças muitas vezes
eram repreendidas e espancadas e tinham
apenas uma refeição adequada algumas ve-
zes por semana. Algumas meninas eram es-
tupradas. Dia após dia, eles trabalham ar-
duamente. Algumas crianças pensam em
fugir, mas a estrada está bloqueada. Os su-
perintendentes ameaçam-nos e os advertem
de que, se eles tentarem fugir, haverá um
preço a pagar (HSIAO-HUNG PAI, 2012, p.
52).
O primeiro é um relato contemporâneo,
citado por Marx, feito por um magistrado
local das condições na indústria de ren-
das em Nottingham, na Inglaterra, em
1861; a segunda de um estudo recente das
condições de vida dos migrantes rurais
na China, descritos no título do livro co-
mo ‚areia espalhada‛.
O que os dois exemplos mostram é que
onde há uma oferta abundante de força
de trabalho, o que Marx chamou de uma
superpopulação relativa (MARX, 1976, p.
782-798); como nos primórdios da revolu-
ção industrial na Grã-Bretanha assim co-
mo na China atual, então, o problema de
como preservar e reproduzir o trabalho
não é uma preocupação central para os
capitalistas ou para o Estado. Não é sur-
preendente, então, que para os 200 mi-
lhões de trabalhadores migrantes chine-
ses que deixaram suas casas em busca de
trabalho nas cidades não haja provisão de
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bem-estar, incluindo a prestação de cui-
dados de saúde. Da mesma forma que
seja uma tragédia indescritível para as
famílias e amigos dos mais de 1100 traba-
lhadores de vestuário em um colapso de
construção da fábrica em Dhaka, Bangla-
desh em abril de 2013, sendo a maioria
deles mulheres com salários de subsistên-
cia, o fato é de pouca importância, a não
ser pelas preocupações sobre a publicida-
de negativa, para empresas como a Pri-
mark6 , para quem eles estavam produ-
zindo roupas baratas, simplesmente por-
que há trabalhadores muito mais deses-
perados que vão tomar seus lugares
(BANGLADESH, 2013).
Todavia, quando a oferta de trabalho é
menos abundante, ou quando o trabalho
se torna mais especializado e, consequen-
temente, mais caro, não faz sentido eco-
nômico que os trabalhadores fiquem pa-
rados por lesão ou invalidez, ou que se-
jam submetidos a um trabalho que os ex-
ponham ao risco de morte.
É uma questão explorada por Marx em
sua discussão sobre a duração da jornada
de trabalho no primeiro volume de O Ca-
pital. Idealmente, diz ele, os proprietários
ingleses de moinhos prefeririam que os
seus trabalhadores trabalhassem por 24
horas:
Tempo para educação, para desenvolvi-
mento intelectual, para preencher funções
sociais de convívio social, para o livre exer-
cício das forças físicas e espirituais. ... O ca-
pital não pergunta pela duração de vida da
força de trabalho. O que lhe interessa é úni-
6NT - Loja popular de departamentos no Reino
Unido.
ca e exclusivamente o máximo de força de
trabalho que, num dia de trabalho, pode ser
feito fluir. Atinge este objetivo por encur-
tamento da duração da força de trabalho,
como um agricultor ganancioso alcança um
maior rendimento do solo por roubo da fer-
tilidade da terra (MARX, 1976, p.375-376).
No entanto, ter trabalhadores, incluindo
crianças pequenas, que trabalham 14 ou
16 horas por dia é muito desperdício em
longo prazo - como Marx argumenta, é
como se fosse uma sobre-exploração do
solo. Dado, porém, que os capitalistas,
individualmente, não vão fazer nada so-
bre isso por medo de perderem sua van-
tagem competitiva sobre seus rivais, en-
tão o Estado, como representante da clas-
se capitalista como um todo, é forçado a
intervir, neste caso, na forma das leis fa-
bris de 1830 e 1840, que estabelecem um
tempo máximo para o dia de trabalho.
Anne Rogers (1993, p. 29) resume isso da
seguinte forma:
A discussão entre os usineiros e o resto da
classe dominante na década de 1840 foi a
primeira versão de um dilema que a classe
dominante tem enfrentado desde então. O
sistema como um todo precisa gastar di-
nheiro para obter lucros, mas cada capitalis-
ta quer gastar o menos possível. Este dile-
ma não pode ser resolvido e ele aparece
constantemente em diferentes subterfúgios.
Revelações recentes dos esforços que as
empresas gigantes como Amazon, Google
e Starbucks fazem a fim de evitar o pa-
gamento de impostos no Reino Unido
mostram como esse dilema é, ainda hoje,
uma constante (AMAZON<, 2013).
Assim, a primeira razão que faz com que
o Estado social seja necessário é garantir a
Austeridade no Reino Unido
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reprodução da força de trabalho em nível
que permita que os capitalistas possam
competir. E isso não se aplica apenas à
competição econômica, mas também a
competição militar - as reformas sociais
introduzidas na Grã-Bretanha pelos go-
vernos liberais de 1906-1914, por exem-
plo, que incluíam refeições escolares gra-
tuitas, subsídio de desemprego e pensões
por idade foram o resultado da descober-
ta de que um terço de todos os homens
britânicos que se ofereceram como volun-
tários para lutar na Guerra dos Bôeres em
1900 eram fisicamente inaptos para o ser-
viço militar (ROGERS, 1993, p. 11-12).7
Uma segunda razão para os gastos sociais
é moldar a força de trabalho para atender
às necessidades de capital. O ato de alte-
ração da Lei dos Pobres de 1834, por
exemplo, foi uma das primeiras medidas
que visaram incutir a disciplina do traba-
lho na nova classe trabalhadora. O prin-
cípio fundamental da Lei dos pobres - o
princípio da menor elegibilidade - visava
disciplinar a classe operária, garantindo
que a alternativa ao trabalho - a institui-
ção conhecida como a Casa de Trabalho,
ou Casa do Pobre - fosse tão terrível que
os trabalhadores aceitariam qualquer
emprego em quaisquer condições. Como
um dos autores da Lei do Pobre, Sir Ge-
orge Nicholls, disse, "Eu gostaria que a
Casa do Pobre fosse vista com medo pe-
las classes trabalhadoras, e a censura por
ser dependente da mesma deve estender-
7 Rogers (1993, p. 11-12). A recente, e totalmente
atípica, promoção de refeições escolares gratuitas
universais pelo Secretário de Educação Michael
Gove é melhor entendida como um exemplo des-
sa mesma preocupação.
se de pai para filho... Pois, sem isso, onde
est{ o estímulo | indústria?‛ (O’BRIEN,
2000, p. 26).
Da mesma forma, o filósofo Jeremy Ben-
tham, que desenvolveu o conceito de
‚menos elegibilidade‛, segundo o qual o
alívio do pobre deve estar sempre defini-
do num nível de renda abaixo do dos pio-
res pagos, argumentou que ‚[...] apenas a
tarifa mais barata deve ser dada para a
casa: uma tarifa ampla pode ser dada
apenas se ‘não tornar a condição dos po-
bres onerosos mais desejável do que a do
pobre que se sustenta’‛ (O’BRIEN, 2000,
p. 27).
Essa necessidade de moldar a força de
trabalho molda até mesmo as formas po-
sitivas de bem-estar que são fornecidas. A
introdução na Grã-Bretanha de educação
em massa, em 1870, por exemplo, pode
ser vista como um ganho para a classe
trabalhadora: ela produziu trabalhadores
alfabetizados que tiveram acesso à gran-
de literatura e ideias, inclusive ideias so-
cialistas. Foi também, no entanto, uma
forma de incutir valores de respeito e
obediência das crianças da classe traba-
lhadora aos seus senhores.
Mas, se as ações sociais são impulsiona-
das pela necessidade de capital e para a
garantia de reprodução da força de traba-
lho, além de moldar a classe trabalhadora
para atender às necessidades do capital,
um terceiro fator também é de grande
importância - a pressão sobre a classe
dominante que está debaixo, acima de
tudo, da luta de homens e mulheres da
classe trabalhadora, estes que lutam para
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obter uma vida melhor para si e suas fa-
mílias, ou muitas vezes, simplesmente
para sobreviver. Essa luta, que tomou
uma miríade de formas na Grã-Bretanha
ao longo dos últimos duzentos anos, tan-
to em nível local quanto nacional, é tam-
bém a luta por uma jornada de trabalho
mais curta na década de 1840, a luta em
greves de aluguel durante a Primeira
Guerra Mundial – fato que obrigou o go-
verno a fazer uma legislação com restri-
ção para aluguéis, que permaneceu vi-
gente por mais de 30 anos. Essas batalhas
duram desde então e até hoje – e uma luta
contra o fechamento de hospitais e cen-
tros de dia para adultos com dificuldades
de aprendizagem (MOONEY; LAVALE-
TTE, 2000).
Como Marx nota em relação ao primeiro
destes movimentos: ‚O estabelecimento
de um dia de trabalho normal é o resul-
tado de séculos de luta entre o capitalista
e o oper{rio‛ (MARX, 1976, p. 412).
Sem essas lutas e as reformas não haveria
progresso social, mesmo que muitas des-
sas tenham, nos últimos anos, também
envolvido um desafio ideológico à ma-
neira negativa e degradante em que gru-
pos, incluindo pessoas com deficiência,
são construídos (SLORACH, 2011). O pa-
pel fundamental que tais lutas desempe-
nham na construção da classe trabalhado-
ra são a autoconfiança e a auto-
organização, e é por isso que Rosa Lu-
xemburgo insistiu que os revolucionários
devem ser os melhores lutadores para
reformas (LUXEMBURG, 1999).
Ao mesmo tempo, o que esses ganhos
também destacam é a natureza contradi-
tória das reformas sob o capitalismo. Por-
que, assim como os representantes de
mais visão da classe dominante sempre
reconheceram, a reforma social, se feita
de forma limitada, também pode desem-
penhar um papel fundamental no descon-
tentamento social, e isso desencadeia na
prevenção de um desafio revolucionário
muito mais profundo com a ordem exis-
tente (HARVEY, 2010, p. 158). Como o
membro do parlamento conservador
Quentin Hogg (mais tarde um ministro,
durante o governo de Margaret Thatcher,
entre 1979-1983) argumentou em um de-
bate sobre a proteção social em 1943,
‚Devemos dar-lhes a reforma ou eles vão
nos dar a revolução‛.8 Grande parte do
mesmo ponto de vista havia sido obser-
vada há mais de meio século antes por
outro líder conservador chamado Joseph
Chamberlain, quando ele fez a pergunta
‚que resgate pagaremos pelo preço da
segurança?‛ (SAVILLE, 1957-1958, p. 14).
O ‚resgate‛, argumentou, seria uma ver-
são inicial do Estado social, na forma de
municipalização dos serviços.
Do ponto de vista da classe dominante,
então, as ações sociais podem desempe-
nhar um papel importante na estabiliza-
ção do sistema, especialmente durante
períodos de intensa luta de classes. Mes-
mo assim, no entanto, tais reformas nun-
ca foram admitidas de bom grado. Como
o historiador marxista John Saville obser-
va,
8 Hansard (17 Feb. 1943).
Austeridade no Reino Unido
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As reformas, sejam grandes ou pequenas,
sempre se opuseram por alguma seção ou
grupo dentro da classe dominante, e é raro
que qualquer reforma seja feita sem modifi-
cação nos interesses da classe proprietária
ou dentro de um curto período de tempo...
Quando confrontados com um desafio que
desestabilize sua posição privilegiada, a
classe dominante na Grã-Bretanha sempre
recuou (SAVILLE, 1957-1958, p. 10).
E em períodos como o atual, quando o
sistema está em crise profunda e o nível
da luta de classes está em um nível baixo,
essa classe vai partir para a ofensiva para
recuperar tudo o que cedeu nas reformas
que sofreu em períodos anteriores.
O Estado social do pós-guerra
O estado social que surgiu na Grã-
Bretanha após o final da Segunda Guerra
Mundial foi um enorme ganho para a
classe trabalhadora em dois aspectos
principais. Materialmente, ele previu pela
primeira vez a extensão de um conjunto
de prestações de serviços de segurança
social a toda a população. Estes incluíram
o aumento da idade que figura abandono
escolar, o estabelecimento de um serviço
de saúde abrangente, pensões de reforma
e auxílios familiares. Sejam quais foram
suas limitações, estas foram as reais re-
formas. Mas o estado social também
trouxe ganhos em um segundo sentido,
ainda que contraditórios. Porque o fato
de as reformas terem sido introduzidas
na Grã-Bretanha sob um governo traba-
lhista, que havia sido eleito com uma
maioria enorme que apontava a derrota
do fascismo, isso significava que a classe
trabalhadora sentiu um verdadeiro senti-
do de posse pelas reformas. Elas eram o
produto de suas lutas, e, portanto, eles
tinham direito a esses novos serviços
(uma visão que tem apoio respeitável na
noção de ‚direitos sociais‛ apresentada
por um dos principais teóricos do estado
social) (MARSHALL, 2006).
A esse respeito, como argumentam Cliff e
Gluckstein, o resultado foi um fortaleci-
mento da consciência reformista dentro
da classe trabalhadora. A consciência re-
formista é uma faca de dois gumes; nega-
tivamente, significa que os trabalhadores
pensam que podem melhorar as suas vi-
das sem a necessidade de derrubar o ca-
pitalismo; positivamente, no entanto, sig-
nifica que os trabalhadores acreditam que
não só a reforma é possível, mas que eles
têm o direito de gozarem dos frutos des-
sas reformas: ‚Muitos dos os ganhos de
1945-1951 não se devem aos esforços tra-
balhistas, o período plantou na classe tra-
balhadora a ideia de que os trabalhadores
tinham direito a um emprego, o direito à
moradia digna e à saúde. Era dever da
sociedade proporcionar-lhes esses direi-
tos‛ (CLIFF; GLUCKSTEIN, 1988, p. 254).
Essa ideia de estado social como um di-
reito continua representando problemas
reais para o governo de coalizão e isso
será discutido mais adiante neste artigo.
Além disso, em um sentido muito real, o
estado social era um produto da luta de
classes que mudou o equilíbrio de forças
na Grã-Bretanha. Por enquanto é verdade
que o nível de ataque na Grã-Bretanha no
período imediato ao pós-guerra foi muito
menor do que tinha sido no final da Pri-
meira Guerra Mundial; os diferentes tipos
de pressão das camadas populares, no
Iain FEGUSON
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
74
entanto, foram de fundamental importân-
cia na formação do novo estado social.
Estes incluíram a percepção de que a Se-
gunda Guerra Mundial foi uma ‚Guerra
do Povo‛ contra o fascismo (GLUCKS-
TEIN, 2012), a determinação generalizada
de que não devia haver retorno à pobreza
e as auditorias (que confirmavam se as
pessoas podiam participar de programas
de auxílio financeiro do governo) que
eram feitas em 1930, e uma série de mo-
tins no exército no fim da guerra, que
trouxe de volta memórias para a classe
dominante do ano 1919, quando a Grã-
Bretanha estava mais perto de revolução
que do que esteve durante todo o século
XX (GLUCKSTEIN, 2012; ROSENBERG,
1995).
A organização Mass Observation, por
exemplo, descobriu que já em agosto de
1942, uma em cada três pessoas havia
mudado suas opiniões políticas, se tor-
nando esmagadoramente esquerdistas
(TIMMINS, 1996, p. 37). Foi uma mudan-
ça de consciência que se refletiu na recep-
ção extasiada dada ao Relatório Beverid-
ge (o modelo para o estado social), quan-
do foi publicado em 1942, com mais de
600.000 cópias vendidas (TIMMINS, 1996,
p. 23).
Sessenta e cinco anos após a sua funda-
ção, o SNS, em particular, continua a
ocupar um lugar muito especial dentro
da consciência da classe trabalhadora bri-
tânica, refletido, por exemplo, em sua
descrição como um componente-chave do
‚anglicismo‛ na cerimônia de abertura
das Olimpíadas de 2012 em Londres, con-
cebida por outro diretor de cinema,
Danny Boyle.
Em face do ataque mais amplo que já
aconteceu ao estado social desde a sua
fundação, defender os ganhos ideológicos
e materiais do período pós-guerra é sem
dúvida uma tarefa fundamental não só
para a esquerda, mas para todos os en-
volvidos na prestação de serviços de as-
sistência social.
Dito isto, é importante também reconhe-
cer as limitações do estado social criado
no governo trabalhista de 1945-1951 e da
extensão real do desafio que este impôs
as estruturas do capitalismo, deixado de
lado o envolvimento da realização do
socialismo. Porque, se a criação do estado
social pode justificadamente ser vista co-
mo a representação do ponto alto da de-
mocracia parlamentar britânica, ela tam-
bém destaca vividamente suas fraquezas
e limitações.
Essas fraquezas e limitações foram con-
vincentemente identificadas em um arti-
go escrito por John Saville menos de dez
anos após a criação do SNS. Ao identifi-
car a relação do Estado Social na realiza-
ção do socialismo como ‚um problema
central das políticas de trabalho contem-
por}neas‛, Saville desafiou os argumen-
tos daqueles que argumentaram que a
criação do estado social (ao lado da ‚re-
volução gerencial‛ e o pleno emprego)
significou o fim do capitalismo. Contra
isso, Saville argumentou que, embora a
luta da classe trabalhadora tenha sido um
fator-chave na criação do estado social,
dois outros fatores também foram impor-
Austeridade no Reino Unido
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
75
tantes, seriam eles as exigências do capi-
talismo industrial (‚e, em particular, a
necessidade de uma força de trabalho
altamente produtiva‛) e também o preço
que a classe dominante estava preparada
para pagar pela segurança política (SA-
VILLE, 1957-1958). Subestimar esses dois
fatores, segundo ele, seria ‚aceitar a ilu-
são de que as mudanças têm maior im-
portância do que realmente têm, assim
como descaracterizar o caráter essencial
do capitalismo contempor}neo‛ (SAVIL-
LE, 1957-1958, p. 6).
Em relação ao primeiro ponto, Saville
destacou ‚[...] a relativa facilidade com
que a legislação social foi aprovada de-
pois de 1945, em grande parte porque as
propostas representavam um mínimo que
os conservadores já tinham aceitado em
princípio‛ (SAVILLE, 1957-1958, p. 16).
Em termos semelhantes, a história tradi-
cional mais influente do estado social re-
fere-se a sua introdução como ‚[...] uma
revolução muito britânica [...]‛, com o
deputado conservador Quentin Hogg
descrevendo o Relatório Beveridge como
‚[...] um documento relativamente Con-
servador‛ (TIMMINS, 1996, p. 47). Isso
refletiu numa crescente aceitação do esta-
do social pelas camadas mais progressis-
tas da classe dominante, sobre a necessi-
dade de envolvimento do Estado na eco-
nomia e na sociedade. Em parte, esse re-
conhecimento resultou do fracasso das
políticas econômicas neoclássicas na
Grande Depressão dos anos 1930, em par-
te com a experiência de New Deal de Roo-
sevelt nos EUA, de regulação estatal da
economia britânica durante a guerra (in-
cluindo o racionamento) e da crescente
popularidade do keynesianismo como
uma teoria econômica de ambos os prin-
cipais partidos.
Em segundo lugar, Saville argumentou,
longe do estado social ser um produto
único do socialismo britânico, a necessi-
dade do capitalismo avançado para o so-
cial se reflete no fato de que muitos ou-
tros estados ocidentais tinham desenvol-
vido semelhantes estados sociais no perí-
odo pós-guerra, muitas vezes com auxílio
mais generoso do que na Grã-Bretanha:
Se a Grã-Bretanha fosse comparada com os
países da Europa Ocidental... As técnicas e
a estrutura essencial dos sistemas de segu-
rança social seriam consideradas compará-
veis em toda sua importância
Saville não contestou o papel central da
luta de classes na formação de auxílio
social. Pelo contrário, ele argumentou
que,
Em última instância, o fator determinante
para a evolução do estado social será o grau
de organização, e a determinação em insis-
tir na mudança, por parte dos próprios tra-
balhadores (SAVILLE, 1957-1958, p. 9).
Sua preocupação, no entanto, estava em
destacar a natureza contraditória do esta-
do social, incluindo também beneficio
que classe dominante teve com ele, e para
desafiar a ideia de que o estado social
pode ser equiparado com a conquista do
socialismo.
Durante grande parte da década de 1950
e 1960, o argumento não pareceu ter
grande importância. Enquanto o sistema
estava se expandindo e os padrões de
Iain FEGUSON
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
76
vida em ascensão, como fizeram no Long
Boom entre o final dos anos 1940 e início
dos anos 1970, então era possível que os
governos da maioria dos países capitalis-
tas avançados (incluindo o Japão) não só
mantivessem muitas destas reformas,
mas que também as estendessem inde-
pendentemente se governos socialdemo-
cratas ou conservadores estavam no po-
der (GOULD, 1993). No entanto, como
Chris Harman observou,
[...] uma vez que a dinâmica ascendência do
crescimento começou a enfraquecer, os cus-
tos do estado social se tornaram um pro-
blema crucial. As duas funções - de aumen-
tar a produtividade e de comprar consen-
timento - já não eram complementares. O
capital teve que tentar reduzir o custo de
manutenção e aumentar a produtividade,
mesmo que isso perturbasse seus mecanis-
mos antigos de manutenção do controle so-
bre a classe trabalhadora (HARMAN, 1984,
p. 107).
Assim, os primeiros ataques sérios ao es-
tado social na Grã-Bretanha não vieram
em 2008, e nem mesmo com a eleição de
Margaret Thatcher em 1979, mas vários
anos antes, com a eleição do governo tra-
balhista de 1974. O partido trabalhista
assumiu o cargo após a re-emergência de
uma crise econômica mundial ocorrida no
ano anterior e que resultou em altos ní-
veis de desemprego e inflação galopante.
Apesar de ter sido eleito após uma greve
de mineiros que derrubou o governo con-
servador de Edward Heath, a primeira
prioridade do novo governo foi o de res-
taurar a saúde do capitalismo. Em respos-
ta à pressão do Fundo Monetário Interna-
cional, o governo impôs cortes sem pre-
cedentes sobre o gasto público, o que Ni-
cholas Timmins identifica como ‚[...] a
primeira grande fissura no estado social
da Grã-Bretanha‛ (TIMMINS, 1996, p.
315). Para citar Cliff e Gluckstein,
Em 1976-1978 os níveis de gastos públicos
foram reduzidos em incríveis 9,5 por cento
em termos reais sobre a inflação. Nenhuma
área social estava a salvo. Dezenas de hos-
pitais foram fechados e escolas, casas e es-
tradas sofreram com o ato. Nada do que
Thatcher fez depois se equiparava com a
carnificina causada pelo governo trabalhis-
ta de 1977 (CLIFF; GLUCKSTEIN, 1988, p.
325-326).
Como Peter Riddell, o editor de política
do jornal Financial Times comentou alguns
anos mais tarde, ‚se houve um experi-
mento de Thatcher, ele foi lançado por
Denis Healey [ministro das Finanças no
governo de 1974-1979 do partido traba-
lhista]‛ (CLIFF; GLUCKSTEIN, 1988, p.
322). Estes permaneceram como sendo os
cortes mais graves para estado social até
que houve os cortes do governo de coali-
zão em 2010.
Juntamente com as políticas de contenção
salarial, que resultaram na maior queda
que o século já teve nos padrões de vida,
esses ataques ao estado social sendo feitos
por um governo trabalhista produziu
profunda amargura e desmoralização da
classe operária, e pavimentou, assim, o
caminho para o retorno dos conservado-
res sob Thatcher. Deve-se notar, no entan-
to que estas não foram as primeiras oca-
siões em que o partido trabalhista colocou
as prioridades do capitalismo acima das
necessidades de saúde e de assistência
social de pessoas da classe trabalhadora.
Já em 1951, o então governo trabalhista
Austeridade no Reino Unido
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
77
tinha reintroduzido taxas de prescrição e
para dentaduras e óculos, a fim de ajudar
a financiar a Guerra da Coréia. Como
comenta Timmins, ‚dentro de três anos
de seu nascimento, o serviço de saúde
deixou de existir de forma totalmente
abrangente e livre‛ (TIMMINS, 1996, p.
158).
Thatcher, neoliberalismo e estado social
Ao contrário da crença popular, o des-
mantelamento do estado social não era
uma prioridade fundamental para Mar-
garet Thatcher após sua eleição em 1979
(TIMMINS, 1996, p. 372). Havia três ra-
zões para isso. Primeiro, ela tinha peixes
maiores para fritar, que eram os sindica-
tos. Em segundo lugar, com as pesquisas
da agência British Social Attitudes (atitu-
des sociais britânicas) mostrando altos
níveis de apoio popular para o Estado
social e, sobretudo, o SNS durante todo
seu mandato, ir contra isso levaria dire-
tamente a riscos eleitorais enormes. Em
terceiro lugar, ao contrário dos mitos do
"thatcherismo" como uma ideologia coe-
rente cultivada por alguns da esquerda
na década de 1980, Thatcher não tinha
ideia clara sobre o que fazer com o estado
social.
Foi só então no seu terceiro mandato, em
1987, que Thatcher e seus assessores (no-
meadamente o Chefe do Executivo da
Sainsbury Sir Roy Griffiths) começaram a
desenvolver as ideias que seriam desen-
volvidas depois pelo Novo Partido Traba-
lhista de Tony Blair - o Estado como
comprador ao invés de provedor de ser-
viços, a terceirização e privatização dos
serviços de saúde e assistência social, a
introdução da concorrência e uma ética
de negócios em serviços públicos na for-
ma de gerencialismo e da Nova Gestão
Pública, e a reformulação dos pacientes
como clientes.
Como Chris Harman argumentou, o obje-
tivo dessas mudanças foi tanto político
quanto econômico:
A extração de mais-valia competitiva exige
a continuação de parte do estado social. As
realidades políticas de manutenção do po-
der através de regra da democracia burgue-
sa desmantelam o restante. Este é o lugar
aonde os mercados internos, testes de mer-
cado, a terceirização, privatização, o incen-
tivo de pensões privadas e todo o resto
vêm. Eles são mecanismos que se destinam
a despolitizar o processo de previdência so-
cial, por um lado, para torná-lo mais fácil
de recusar para aqueles considerados como
não merecedores dele, e por outro, para re-
primir os trabalhadores do setor de previ-
dência (HARMAN, 2007, p. 116).
Seria tolice subestimar as mudanças que
mais de duas décadas de neoliberalismo
trouxeram ao estado social britânico.
Aqui vou focar apenas no exemplo da
assistência social9.
Áreas como as de cuidados médicos resi-
denciais são agora predominantemente
feitos pelo setor privado, um estudo que
sugere que ‚[...] a privatização dos servi-
ços de assistência social é sem dúvida a
mais extensa das terceirizações de um
serviço público que já foram realizadas
no Reino Unido‛ (GOSLING, 2011, p. 8).
9 Esta sessão é inteiramente retirada de Ferguson e
Lavalette (2013).
Iain FEGUSON
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
78
Em contraste, no entanto, a pretensões
neoliberais para o aumento da escolha e
do controle, a introdução da concorrência
em assistência social residencial resultou
na dominação do mercado de um peque-
no número de muito poderosas corpora-
ções multinacionais (incluindo, por
exemplo, a Royal Bank of Scotland e o Fun-
do de Investimento do Qatar) cujas prin-
cipais preocupações não concernem o
bem-estar dos moradores nas casas que
eles possuem, mas sim a maximização de
seus lucros. Quando eles não conseguem
obtê-los de maneira suficiente ou quando
existem lucros maiores que podem ser
alcançados em outros lugares, então eles
simplesmente saem, criando uma enorme
instabilidade no setor e prejudicando a
continuidade dos serviços, que são um
elemento-chave da assistência social de
boa qualidade. O colapso em 2011, da
Southern Cross, até então a maior prove-
dora de cuidados residenciais para os
idosos no Reino Unido em 2011, é sim-
plesmente o exemplo mais gritante disso
(SOUTHERN<, 2011).
O aumento do papel do setor privado na
assistência social também não resultou na
melhoria da qualidade do atendimento
que havia sido prometida. Uma investi-
gação do Financial Times em 2011 mostrou
que a qualidade do atendimento de um
em cada sete centros de cuidados privada
na Inglaterra foi classificado como ‚po-
bre‛ ou ‚adequado‛ pelo órgão regulador
do governo. A baixa aceitação indica pro-
blemas potencialmente graves, como uma
falha na alimentação ou na limpeza de
doentes que precisam do atendimento.
Por outro lado, os baixos índices se apli-
cam apenas em uma em cada onze cen-
tros geridos por organizações sem fins
lucrativos ou autarquias. O relatório cita
um inspetor do organismo regulador da
Comissão de qualidade de cuidados, que
quis manter o anonimato, dizendo: ‚Fun-
damentalmente, agora chegou a um pon-
to em que é perigoso [para os pacientes] -
e vai piorar. Se eu tivesse um parente que
precisasse de um serviço de atendimento,
eu estaria preocupado‛ (O’CONNOR;
O’MURCHU, 2011)‛.
Um inquérito realizado pela Comissão
para a Igualdade e Direitos Humanos
(EHRC) a respeito dos direitos humanos
das pessoas idosas que recebem cuidados
em casa expressou preocupação seme-
lhante. Enquanto cerca de metade das
pessoas mais velhas, amigos e membros
da família que deram provas ao inquérito
disseram estar satisfeitos com os cuida-
dos que vêm recebendo, o inquérito tam-
bém revelou muitos exemplos de violação
dos direitos dos mais velhos, incluindo o
abuso físico ou financeiro, a desconside-
ração de sua privacidade e dignidade,
falta de auxílio para comer ou beber, tra-
tamentos que os tornava invisíveis, e
pouca atenção às suas necessidades. Al-
guns ficaram surpresos ao saber que po-
diam falar sobre como haviam sido mal-
tratados (EQUALITY AND HUMAN
RIGHTS COMMISSION, 2011).
Ao passo que os trabalhadores do setor
de cuidados sociais tenham historicamen-
te sempre estado em condições precárias
e recebendo uma remuneração baixa, a
introdução da concorrência ao longo dos
últimos vinte anos em assistência social
Austeridade no Reino Unido
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
79
levou-os a uma ‚corrida para o fundo do
poço‛ (CUNNINGHAM, 2008). A remu-
neração, condições e formação dos funci-
onários deste setor sem dúvida, se deteri-
oraram, e a investigação do FT mostra
que o setor privado paga salários mais
baixos, em média, do que os setores pú-
blicos e sem fins lucrativos, além de ter
taxas de rotatividade de pessoal mais ele-
vadas.
Um aspecto desta - e um tema que se re-
pete ao longo do Relatório EHRC - é a
quantidade muito limitada de tempo que
os cuidadores têm permissão para gastar
com seus clientes. O relatório cita um
exemplo da filha de uma idosa com a do-
ença de Huntington, que descreveu as
graves consequências de sua mãe não ter
recebido ajuda para comer ou beber (os
autores do relatório defendem que isso
pode ser chamado de tratamento desu-
mano e degradante na acepção do artigo
3 º da EHRC):
Os prestadores de cuidados deveriam ali-
mentar e dar bebidas, mas simplesmente
deixou de lado uma pessoa que estava fisi-
camente incapaz de alimentar-se, porque
tinham que ir para o seu próximo cliente.
Minha mãe perdeu 7 quilos. Alguém com
doença de Huntington precisa de uma hora
por refeição para engolir a comida e a bebi-
da, e um cuidado especial quando tudo cai
fora de sua boca, e eles ficam muito úmidos
e sujos. Eles também precisam de 4.000 ca-
lorias por dia para manter o peso corporal
devido aos movimentos de coreia que cons-
tantemente gastam sua energia‛ Filha de
mulher idosa, sul da Inglaterra (EQUALITY
AND HUMAN RIGHTS COMMISSION,
2011, p. 45).
Esta não foi, no entanto, uma questão que
se tratasse de funcionários indiferentes. O
relatório cita vários cuidadores que parti-
lhavam da frustração dos seus clientes
dada a falta de tempo ao qual eles tinham
sido autorizados para realizar suas tare-
fas de assistência. Por um lado: ‚‘O me-
nos satisfatório é não ter tempo suficiente,
você tenta não apressá-los [os idosos] (ou
tenta fazer com que eles não saibam que
você não tem tempo suficiente), mas você
está ciente de que o seu próximo cliente
está olhando para o relógio e esperando
por você para chegar’ funcion{rio de
atendimento em domicílio - provedor
setor de voluntariado, South West‛
(EQUALITY AND HUMAN RIGHTS
COMMISSION, 2011, p. 72).
2008 e depois – o fim do estado social?
Mesmo antes do início da crise financeira
de 2008, então, grande parte do estado
social já havia sido transformada pela
aplicação de políticas neoliberais em am-
bos os governos conservador e trabalhis-
ta. O período desde a eleição do Governo
de coalizão Con-Dem em 2010, no entan-
to, viu o ataque mais grave sobre o estado
social desde a sua fundação, a começar
pelo feito pelo chanceler George Osborne
na Revisão de gastos de 2010 (YEATES et
al, 2011; LAPAVITSAS, 2012). A revisão
cortou £ 80 bilhões de gastos do setor pú-
blico, £ 18 bilhões dos quais vieram de
gastos sociais. Em junho de 2013, mais £
11.5 bilhões foram cortados, incluindoos
£ 2.6 dos orçamentos das autoridades
locais.
Iain FEGUSON
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
80
Houve três elementos principais para que
este ataque ao estado social acontecesse.
Em primeiro lugar, há os cortes nos servi-
ços municipalizados. Em contraste com o
SNS, onde, em sua maior parte, os servi-
ços foram prestados gratuitamente quan-
do necessários (e financiados através de
impostos em geral), os serviços de assis-
tência social são prestadas para pessoas
que não podem pagar, já auditadas, e de
maneira discricionária. Confrontados
com os cortes da coalizão de 33 por cento
ao longo de um período de 3 anos e pelo
aumento da demanda, além do número
de pessoas que enfrentam cortes em bene-
fícios, do envelhecimento da população e
de outros fatores, a resposta dos conse-
lhos de todo o Reino Unido tem sido o
racionamento dos serviços através de ca-
da vez mais apertados critérios de elegibi-
lidade (geralmente invocando critérios
‚substanciais‛ ou ‚críticos‛). O resultado
é que muitas pessoas que antes teriam
recebido um serviço agora são simples-
mente recusadas ou são direcionadas pa-
ra organizações do setor voluntário, como
Citizens Advice Bureaux ou bancos de ali-
mentos.
Além disso, a mudança para personaliza-
ção ou apoio autodirigido, uma política
com origens progressistas no movimento
de ações para os portadores de deficiên-
cias e que visa dar a essas pessoas uma
maior escolha e controle sobre os servi-
ços, está sendo usada por muitos conse-
lhos como um pretexto para o corte de
serviços e para dar às pessoas subsídios
individuais que muitas vezes não lhes
permite pagar nem mesmo pelos serviços
de centro de dia dos quais eles faziam uso
anteriormente (FERGUSON; LAVALET-
TE, 2013).
Depois, há os ataques aos benefícios soci-
ais. No topo das alterações anteriores a
benefícios por incapacidade, o mês de
abril 2013 viu a introdução de um ‚im-
posto de quarto‛, que forçou milhares de
pessoas a pagar um extra de £ 60-80 por
mês apenas para permanecer em suas
casas, simplesmente por elas terem um
quarto ‘extra’. O imposto afeta as pessoas
que vivem em habitação social cujos fi-
lhos cresceram e se mudaram, os casais
que compartilham o cuidado de seus fi-
lhos separados e, acima de tudo, as pes-
soas com deficiência que necessitam de
quartos especialmente adaptados . Além
disso, houve cortes de benefícios fiscais
do conselho, um limite para a quantidade
total de benefícios que um requerente
pode receber, independentemente de suas
circunstâncias, bem como a introdução de
Crédito Universal, que irá substituir uma
série de outros benefícios (DUNK, 2013).
Enquanto o governo afirma que ninguém
vai perder, uma avaliação de impacto
revelou que 2,8 milhões de pessoas vão
receber menos do que recebe atualmente,
depois que o Crédito Universal for lança-
do nacionalmente em outubro de
2013(RAMESH, 2012). Em junho, Osborne
impôs um limite total da despesa em be-
nefícios, além de impedir que os traba-
lhadores desempregados reivindiquem
qualquer benefício na primeira semana
de desemprego.
Finalmente, há um aumento da privatiza-
ção. A privatização do SNS, tornada pos-
sível pelo ato da Saúde e Assistência So-
Austeridade no Reino Unido
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
81
cial de 2012, representa a ameaça mais
imediata (DAVIS; TALLIS, 2013), mas o
objetivo do Programa de Serviços Públi-
cos Aberto da Coalizão é abrir todos os
serviços públicos (exceto o sistema judici-
al e os serviços de segurança) à concor-
rência de ‚qualquer fornecedor qualifica-
do‛; a terceirização serviços, em outras
palavras, se tornará a posição padrão
(OPEN< , 2011).
Tomados em conjunto, o que estes ata-
ques mostram é que a Coalizão está real-
mente explorando a crise para promover
mudanças que teriam sido mais difícil em
tempos ‚normais‛ para, nas palavras de
Charlie Kimber ‚[...] inserir ainda mais o
mercado na sociedade, aumentar a priva-
tização, enfraquecer a força coletiva dos
trabalhadores e colocar o estado social a
serviço de capital, ao invés de cumprir
qualquer uma das necessidades da maio-
ria‛ (KIMBER, 2011).
Mas até onde esses ataques podem ir? É
objetivo geral dos conservadores desman-
telar o estado social completamente? E se
assim for, pode um Estado capitalista
moderno realmente sobreviver e competir
sem uma força de trabalho qualificada e
saudável e um nível relativamente eleva-
do de proteção social? Para o ex-ministro
da Saúde do Trabalho, terminar com o
Estado social é precisamente o objetivo
dos conservadores. O ataque atual ao es-
tado social, Michael Meacher argumen-
tou, representa a realização de um sonho
de longa data do Thatcherismo de direita
do Partido Conservador:
[...] o crash financeiro de 2008-09 deu a eles
a chance que estavam esperando durante 70
anos para encerrar a nossa pós-guerra soci-
al-democrática e substituí-la pelo seu obje-
tivo final: um estado de mercado. Osborne
deve saber, bem como qualquer pessoa, que
a sua política é completamente falha; a úni-
ca razão racional para a qual ele persista em
sua política deve ser sua intenção de redu-
zir o Estado e minimizar ou eliminar a rede
de segurança social, e essa tarefa ainda não
está terminada 10.
O argumento de que a coalizão está mui-
to interessada na eliminação do Estado
social do pós-guerra está aberta a duas
objeções principais. Em primeiro lugar,
subestima as enormes dificuldades, tanto
econômicas quanto políticas, que os con-
servadores enfrentam no corte de pro-
gramas sociais. Os gastos com o SNS sob
a coalizão, por exemplo, embora não en-
volvendo os aumentos de décadas anteri-
ores de 4 por cento anuais, manteve-se
constante (teve até mesmo um ligeiro
aumento com a Revisão de gastos de Os-
borne’s..., (2013). Segundo o altamente
respeitado Instituto de Estudos Fiscais
(IFS):
Mesmo que o orçamento dos serviços de
saúde tenha sido congelado depois de
2014/15, em 2017/18 ele ainda representaria
uma parcela da renda nacional semelhante
à de 2007/08 (CRAWFORD; EMMERSON,
2012).
De modo mais geral e, mais uma vez de
acordo com as IFS, saúde, cuidados de
longa duração e de segurança social fo-
ram responsáveis por um terço de todo o
gasto público em 1978-79. Agora, eles são
responsáveis por metade dos gastos. Adi- 10 Carta ao Guardian, 31 May 2013.
Iain FEGUSON
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
82
cione a educação e o Estado social ‚cen-
tral‛ - educação, juntamente com saúde,
segurança social e assistência social - é
responsável por cerca de dois terços dos
gastos públicos a partir da metade do fi-
nal da década de 1970 (CRAWFORD;
JOHNSON, 2011). Os cortes de Osborne
são realmente draconianos, mas ainda há
um longo caminho a percorrer antes que
estes possam significar o fim do Estado
social.
Em segundo lugar, o argumento de Mea-
cher ignora o alto grau de continuidade
entre as reformas do estado social da coa-
lizão e as que aconteceram nos governos
trabalhistas anteriores. A promoção do
setor privado no SNS, o dogma de que ‚o
trabalho é o caminho para sair da pobre-
za‛ e a introdução de workfare 11 (e sua
terceirização para empresas como a Serco
e G4S), o ataque a benefícios por incapa-
cidade (incluindo a odiada Avaliação da
capacidade de trabalho) foram todas as
medidas introduzidas no âmbito do go-
verno de Tony Blair e Gordon Brown. E,
como resposta à Revisão de gastos de Os-
borne de 2013, o chanceler Ed Balls do
Partido Trabalhista, para mostrou que é
essa a continuidade que agora se estende
para o compromisso de manter quase
todos os cortes em serviços e benefícios
impostos por Cameron e Osborne (FER-
GUSON, 2013). O novo governo traba-
lhista, então, lançou as bases para o ata-
que à atual coalizão por meio do estado
social; enquanto isso, sua incapacidade
em oferecer uma alternativa coerente com
11 Oposto ao estado social, que oferece bem-estar
como direito constitucional, o workfare oferece
bem-estar como direito trabalhista.
a austeridade é uma das principais razões
para que Cameron e Osborne estejam
tendo facilidade para manter suas políti-
cas.
O que é verdade, porém, é que os conser-
vadores estão de fato buscando alterar
aspectos fundamentais o estado social
para reverter elementos-chave, ideológi-
cos e estruturais, do acordo pós-guerra.
Em primeiro lugar, há a agressão ideoló-
gica. Como observado anteriormente, o
estado social do pós-guerra implantou na
cabeça de milhões de pessoas da classe
trabalhadora que eles tinham o direito à
habitação, à saúde, à educação - em ou-
tras palavras, que eles valiam a pena. É
essa convicção que David Cameron está
tentando minar quando argumenta con-
tra o que ele chamou de ‚cultura de direi-
tos‛, soletrada em um discurso em 2012:
Criamos de certa forma, uma lacuna social
no país - entre aqueles que vivem em longo
prazo recebendo auxílio e os que estão fora
dele. Aqueles dentro dela crescem com uma
série de expectativas: você pode ter uma ca-
sa própria, o estado irá apoiar qualquer que
sejam as decisões que você tome; você sem-
pre será capaz de retirar, não importa o que
você investiu. Isso me deu indícios ruins.
Aquele que pagam para não trabalhar. Que
você está deve algo por nada. A previdên-
cia deu-nos milhões de pessoas em idade de
trabalhar e que sentadas em casa em bene-
fícios, mesmo antes da recessão. Criou-se
uma cultura de direitos (SPENCER, 2012).
Não há, é claro, nenhuma base em nada
disso. A alegação do governo, por exem-
plo, de que a maioria dos problemas soci-
ais da Grã-Bretanha decorre do compor-
tamento de 120.000 famílias ‚problem{ti-
cas‛ foi exposta pela líder da política so-
Austeridade no Reino Unido
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
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cial acadêmica Ruth Levitas como ‚[...] a
formulação de políticas de anedota, mais
parecidas com o jornalismo sensacionalis-
ta do que com investigação séria‛, que
funde um pequeno número de famílias
disfuncionais com números muito maio-
res que são simplesmente pobres (LEVI-
TAS, 2012). Em segundo lugar, longe de
pessoas que vivem de benefícios que não
querem trabalhar, o ‚trabalhador pobre‛,
aqueles que trabalham, mas recebem be-
nefícios porque o seu salário é muito bai-
xo, já ultrapassa o número daqueles que
estão desempregados (ALDRIDGE et al,
2012).
E em terceiro lugar, o fato de que apenas
5,3 por cento das pessoas em benefício
por incapacidade foram ajudadas a arru-
mar emprego durante pelo menos seis
meses de programa de trabalho do go-
verno durante seu segundo ano de opera-
ção (bem abaixo da marca referência de
desempenho mínimo do governo de 16,5
por cento) mostra que a questão é falta de
emprego, não falta de vontade de traba-
lhar. Nada disso, é claro, impede que o
governo e a mídia de direita demonizem
aqueles em benefício. E se Cameron e Os-
borne ganharem a discussão, e essa noção
de um direito a previdência for perdida,
em seguida, a Grã-Bretanha se voltará
para a ética da Lei dos Pobres dos que
merecem e dos que são indignos, de insti-
tuições de caridade, servilismo e bancos
de alimentação (já utilizados por meio
milhão de pessoas).
Essa mesma mentalidade da Lei dos Po-
bres também é evidente nas mudanças
estruturais para a proteção social. Como
Harman argumentou, a história da previ-
dência ao longo dos últimos 180 anos tem
sido:
A história das tentativas para separar a dis-
posição do que é necessário para o capital,
da mesma forma que os pagamentos salari-
ais são e aquilo que é desnecessário, mas
forçado sobre ele por sua necessidade de
conter o descontentamento popular
(HARMAN, 2009, p. 138).
Como ele passa a explicar, em períodos
de crise, a necessidade de os Estados rees-
truturarem suas operações para que estas
estejam de acordo com a lei do valor sig-
nifica,
[...] tentar impor esquemas de mensuração
do trabalho e de pagamento sobre os traba-
lhadores do setor de previdência semelhan-
tes àquelas dentro das empresas industriais
mais competitivas. Por outro lado, significa
cortes em prestações de serviços sociais, de
modo a restringi-los tanto quanto possível
para servirem como força de trabalho que é
necessária para a acumulação de capital - e
fazê-lo de tal maneira que aqueles que for-
necem esta força de trabalho estarão prepa-
rados para fazê-lo pelos salários que são
oferecidos (HARMAN, 2009, p. 137-138).
Aplicando esta análise para a situação
atual, o objetivo mais abrangente da es-
tratégia de coalizão - restaurar a rentabi-
lidade do capitalismo britânico - deve ser
alcançado através da redução dos custos
de previdência através da remoção de
serviços e benefícios, obrigando os doen-
tes e deficientes a aceitarem trabalhos mal
pagos ou empregos inexistentes (mesmo
quando os números da workfare mos-
tram que não faz sentido econômico em
fazer isso); e usar os custos da força de
Iain FEGUSON
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
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trabalho através da criação de um clima
de medo, o que significa que os trabalha-
dores estarão preparados para aceitar
cortes nos salários e péssimas condições a
fim de permanecerem no emprego. Este é
o equivalente da Lei dos Pobres ‚de estí-
mulo | indústria‛ do século 19 no século
21. O fato de que desde 2010 os trabalha-
dores britânicos vêm sofrendo uma que-
da sem precedentes em seus salários de
em média de 5,5 por cento por hora, a
quarta pior queda em 27 países europeus,
mostra que essa é uma estratégia que está
claramente desfrutando de algum sucesso
(UK WAGES<, 2013).
Conclusão
O Estado social do pós-guerra na Grã-
Bretanha e em outros países europeus foi
um enorme ganho para a classe trabalha-
dora. Com todas as suas limitações, ele
forneceu-lhes um grau de segurança do
qual eles nunca haviam desfrutado e re-
moveu grande parte do medo, que seu
arquiteto William Beveridge chamava de
‚os cinco gigantes‛ da ‚Necessidade, Do-
ença, Ignorância, Imundice e Ociosida-
de‛. Não surpreende, portanto, defender
esses ganhos, incluindo as noções de cole-
tivismo e universalismo, num momento
em que eles estão sob ataque como nunca
antes, é visto como uma prioridade-chave
para muitas pessoas, e não só os da es-
querda política. Mas a história sugere
que, se eles quiserem defender esses ga-
nhos com sucesso, então existem três
principais lições que devem ser aprendi-
das.
Em primeiro lugar, o estado social sob o
capitalismo é sempre provisório. Como
Saville argumentou há quase 60 anos
atr{s, ‚As reformas, sejam grandes ou
pequenas, sempre se opuseram por al-
guma seção ou grupo dentro da classe
dominante, e é raro que qualquer reforma
seja feita sem modificação nos interesses
da classe proprietária ou dentro de um
curto período de tempo‛ (SAVILLE, 1957-
1958, p. 10). Enquanto o sistema está em
expansão reformas podem ser concedi-
das; quando, no entanto, o sistema estiver
em crise, então a classe dominante vai
fazer o possível para recuperar tudo o
que cedeu nas reformas que sofreu em
períodos anteriores.
Em segundo lugar, o compromisso dos
partidos socialdemocratas para trabalhar
dentro da estrutura do capitalismo signi-
fica que não se pode confiar que esses
partidos defendam o Estado social. Isto é
tão verdadeiro para o Velho Partido Tra-
balhista como para o Novo, para a Es-
querda, bem como Direita, a democracia
Nórdico-social, e o Trabalhista britânico.
Ao não defender a previdência, o líder
trabalhista Ed Miliband e o chanceler Ed
Balls fizeram parte de uma longa e (des)
honrosa tradição. Já em 1948, Sir Stafford
Cripps, um chanceler do Trabalho que
veio da esquerda do Partido e que tinha
sido expulso nos anos de 1030 pela lide-
rança de direita disse ao TUC: ‚H{ ape-
nas um determinado tamanho de bolo. Se
um monte de gente quer uma fatia maior
do que pode, só pode obtê-lo se estiver
com os outros‛ (BASKETTER, 2007). Ele,
então, apresentou um orçamento de aus-
teridade que mudou a tributação do im-
posto de renda para o precursor do IVA,
que atinge os trabalhadores e os pobres.
Austeridade no Reino Unido
Argumentum, Vitória (ES), v. 5, n.2, p. 65-88, jul./dez. 2013.
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Nem o ‚modelo nórdico‛ oferece um ca-
minho a seguir. Como um recente artigo
sobre a Suécia observou, Quando se trata de privatização dos servi-
ços públicos, Estocolmo sai na frente de
Westminster. É por isso que Michael Gove
adora sua escola livre e sistema de vales, e
por que George Osborne gosta de ser foto-
grafado ao lado de seu colega sueco Anders
Borg. The Economist... recentemente escre-
veu: ‚As ruas de Estocolmo estão inundado
com o sangue de vacas sagradas‛
(CHAKRABORTTY, 2013).
Finalmente, mesmo no seu melhor, o es-
tado social não pode fazer mais do que
oferecer proteção contra os estragos de
um sistema baseado na exploração, pro-
teção e guerra. Revendo a experiência do
novo Estado social, em 1957, John Saville
argumentou que ‚ [...] a relação entre o
estado social e a realização do socialismo
é um problema central das políticas de
trabalho contempor}neas‛. Da mesma
forma, hoje, nossos horizontes precisam
estender para além da experiência, seja o
Governo Trabalhista de 1945-1951 ou da
socialdemocracia escandinava. E para
entender essa relação entre o estado social
e o socialismo nós poderíamos fazer pior
do que olhar para o poema de Bertolt
Brecht 'Uma cama para a noite’, escrito na
década de 1930 em um momento em que,
como hoje, o capitalismo global estava em
crise, a extrema-direita estava em ascen-
são e as pessoas estavam com medo do
futuro de si mesmos e o de suas famílias.
A bed for the night
I hear that in New York
At the corner of 26th Street and Broadway
A man stands every evening during the win-
ter months
And gets beds for the homeless there
By appealing to passers-by.
It won’t change the world
It won’t improve relations among men
It will not shorten the age of exploitation
But a few men have a bed for the night
For a night the wind is kept from them
The snow meant for them falls on the ro-
adway.
Don`t put down the book on reading this,
man.
A few people have a bed for the night
For a night the wind is kept from them
The snow meant for them falls on the roadway
But it won’t change the world
It won’t improve relations among men
It will not shorten the age of exploitation.
Bertold Brecht
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