Editor: Éditos Prometaicos – Portugal Iberian Journal of Clinical and Forensic Neuroscience – IJCFN
ISSN: in attribution process Year 0, Vol. I, nº 1, 2013
ISSN: in process
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Iberian Journal of Clinical and Forensic Neuroscience – IJCFN
Revista Ibérica de Neurociências
Diretor-in-Chief
Luis Alberto Coelho Rebelo Maia
Associated Editores
Hélder Lopes Rodrigues
Humberto Mendes Faria Rodrigues
Propriedade
Editora Éditos Prometaicos
GNPF Gabinete de Neuropsicologia, Psicopedagogia e Formação Profissional
Avenida da ANIL nº 7, 1º piso, Escritórios 8; 6200-502 Covilhã
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Edição
Éditos Prometaicos
ISSN
In attribution process
Editor: Éditos Prometaicos – Portugal Iberian Journal of Clinical and Forensic Neuroscience – IJCFN
ISSN: in attribution process Year 0, Vol. I, nº 1, 2013
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Author Guidelines
The Iberian Journal of Clinical and Forensic
Neuroscience publish papers on a broad range of topics
of general interest to those working on the
neuroscientific field.
The Journal of Clinical and Forensic
Neuroscience publishes theory-driven patient studies,
studies about forensic field applied to neuroscience as
well as basic studies in the large neuroscience area.
The journal publishes group and case studies addressing
fundamental issues concerning the brain functional
relations with behavior, epidemiology, basic science, etc.
The journal is dedicated to a fast and proficient turn-
around of papers, targeting to complete reviewing in
under 60 days. Submissions should be made in a word
format document (editable) to
(Luis Maia, Editor in Chief), or
Papers will be valued by the Editorial Board and referees
in terms of scientific value, readability, and importance
to a wide-ranging circulation.
Papers should be submitted following APA norms (APA
Publication Manual published by the American
Psychological Association), and preferentially presented
in written English language. Abstracts should be available
in English, Portuguese and Spanish idiom as well as key
words.
The Journal operates in a policy of anonymous peer
review.
Each submission should follow the procedure of sending
by email two documents: a) a Title page with all
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the correspondent author; b) a second document,
containing the entire article, WIHTOUT ANY
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that the copyright are totally trespassed to Iberian
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Orientações para autores
O Iberian Journal of Clinical and Forensic
Neuroscience publica trabalhos acerca de uma ampla
gama de tópicos de interesse geral para aqueles que
trabalham no vasto campo das neurociências.
O Journal of Clinical and Forensic Neuroscience publica
estudos teórico e / ou práticos orientado para pacientes,
estudos sobre o campo forense aplicado às
neurociências, bem como estudos básicos na vasta área
das neurociência.
O Jornal publica ainda estudos de casos e de grupos,
abordando também questões fundamentais relativas às
relações funcionais do cérebro com o comportamento,
epidemiologia, ciência básica, etc.
O jornal é dedicado a uma rápida e proficiente edição de
artigos, ponderando-se uma revisão completa em menos
de 60 dias. As submissões devem ser feitas enviando um
ficheiro em formato word (editável) para
(Luis Maia, Editor in Chief), ou
Os artigos serão avaliados pelo Conselho Editorial e por
“revisores cegos”, em termos do valor científico,
legibilidade e importância para uma ampla circulação.
Os artigos devem ser submetidos de acordo com as
normas APA (APA Publication Manual, publicado pela
American Psychological Association), e,
preferencialmente, apresentado no idioma Inglês escrito.
Os resumos devem estar disponíveis nos idiomas Inglês,
Português e Espanhol, bem como as palavras-chave.
O Jornal segue uma política de revisão por pares
anónimos
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pode dois documentos de e-mail: a) uma página de
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autores e indicações do autor correspondente; b) um
segundo documento, contendo o artigo inteiro, SEM
QUALQUER IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES, para
assegurar o processo de revisão cega
Após a efetiva publicação dos artigos, os autores
assumem que os direitos autorais são totalmente
cedidos à Editora do Iberian Journal of Clinical and
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Índice
Editorial - Uma nova era nas Neurociências em Portugal
Luis Maia 1
Artigo Especial de Opinião - Neurociências, cérebro e xadrez
José Manuel Paulino 3
Original Article - Enviesamento Atencional no Abuso de Substâncias: O Papel da Carga Cognitiva.
Humberto Rodrigues, Sandra C. Soares, Paulo Rodrigues, Aldina Martins e Luis Maia 14
Original Article - Estudo de Caso Controlo: 68 sujeitos Emparelhados, Reclusos a cumprir Pena por
ter cometido Crime Passional Comparados com Sujeitos Normativos
Celina Ribeiro e Luis Maia 39
Caso Clínico - O Síndrome Wernicke-Korsakoff sobre o prisma da neuropsicologia
Mónica Sousa 57
Caso Clínico - A “Aceitação da Diferença” pós-AVC, pela Psicologia Cognitiva Narrativa
Hélder Lopes e Luis Maia 66
Estudos de Casos Clínicos - Alterações neuropatológicas entre indivíduos com
Doença de Alzheimer e Portadores de Trissomia 21
Maria João e Luis Maia 74
A Saúde mental nos cuidadores dos doentes de Alzheimer
Daniel Martins e Luis Maia 87 Clinical Case – Neuropsychology applied to psychiatry
Obsessive Compulsive Disorder, Schizoaffective Disorder, or nothing at all?
A 19 year old patient with an awkward diagnosis
Luis Maia 95
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Editorial
Uma nova era nas Neurociências em Portugal
Luis Maia
Auxiliar Professor - Beira Interior University; Clinical Neuropsychologist, PhD (USAL - Spain); Neuroscientist, MsC (Medicine School of Lisbon - Portugal)
Medico Legal Perit (Medicine Institute Abel Salazar - Oporto, Portugal); Graduation in Clinical Neuropsychology (USAL - Spain); Graduation in Investigative
Proficiency on Psychobiology (USAL - Spain); Clinical Psychologist (Minho University - Portugal); Professional Card from Psychologyst Portuguese norm,
number 102.
_________________________________________________________________________________
Com o lançamento de um novo periódico que se
pretende científico e acessível a todos os leitores
(cientistas ou não) temos consciência que a empreitada a
que nos propomos é de grande imponência.
Fazemo-lo, pois que não é compreensível que em
Portugal (em particular), e na Península Ibérica, bem
ainda como no mundo inteiro, não existam muitos
motivos para referirmos que as iniciativas de
Portugueses ao nível de projetos de investigação e
subsequente divulgação possam sobejar.
Muito menos podemos referi-lo se mencionar-mos a
iniciativa privada de um grupo de colegas do sector
público e privado sem representação e sustentação de
uma instituição pública (como uma Universidade,
Instituto ou uma Fundação).
Com este primeiro exemplar do Iberian Journal of Clinical
and Forensic Neuroscience pretendemos iniciar um novo
ciclo.
Somos um grupo humilde, suportado por uma editora
ainda mais humilde (Éditos Prometáicos), todavia temos
a noção do nosso valor. O pouco que nos queiram
atribuir, e ao mesmo tempo, o muito que consigamos
trabalhar e demonstrar cativando os nossos colegas e
amigos… mais ainda…. Somos tão humildes e pequenos,
mas ao mesmo tempo tão pequenos, como aquilo que o
nosso olhar consegue alcançar: a infinidade!
O Iberian Journal of Clinical and Forensic Neuroscience
será publicado online, bimensalmente, estando em
processo de atribuição o respetivo ISSN. A pesquisa do
sítio da Revista na Internet
http://luismaiagabinete.wix.com/iberianneuroscience,
permitirá aos colegas compreenderem as nossas linhas
de orientação editorial. Procurar-se-á alcançar o máximo
de público possível e por isso procuraremos que, com o
tempo, se desenvolva a cultura da publicação dos artigos
em língua inglesa, podendo optar ainda por uma edição
bilíngue, inglês - português, dado a versatilidade que a
publicação online permitiria.
Convidamos assim, qualquer pessoa, mesmo qualquer
pessoa, a submeter os seus artigos à nossa publicação
para os emails [email protected] e
[email protected]. As únicas condições que
colocamos e ao mesmo tempo asseguramos é que
apenas serão publicados artigos com elevada qualidade
científico – literária, podendo vir de vários quadrantes e
colaborações (estudantes, autodidatas, investigadores,
professores, etc.). Uma coisa vos garantimos, estamos
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cansados de “Vacas Sagradas”, e neste palco, como
referia Chaplin, todos devem apresentar a sua ária o
mais rapidamente possível, antes que, quando se deem
conta, as cortinas já se tenham encerrado, o público já
tenha abandonado a plateia e os “Detentores do Saber”
se assustem com a escuridão da sua própria solidão!
Temos uma política de revisão dos artigos duplamente
cega e apenas serão publicados aqueles que forem
aceites por pelo menos dois revisores especialistas na
área do artigo.
Terminamos com a alusão a um dos mais conhecidos
Neuropsicólogos do Mundo, para muitos, o verdadeiro
Pai da Neuropsicologia: Alexander Romanovich Luria –
Um neuropsicólogo deve ser capaz de avaliar um
paciente apenas com aquilo que consegue carregar na
própria bata! Assim, também aqui deixamos um desafio,
um Neurocientista deve ser capaz de apresentar
neurociência apenas com aquilo que mais tem de valioso,
a sua mente, e por conseguinte, o seu SNC, o seu
encéfalo, ou, se quisermos, em linguagem comum,
apenas precisa da sua cabeça!
Um beijo e um abraço neurocientífico a todos
Do colega
Luis Maia, PhD, Editor-in-Chief, Iberian Journal of
Clinical and Forensic Neuroscience.
Covilhã, 24 de Julho de 2013.
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Artigo Especial de Opinião
Neurociências, cérebro e xadrez
José Manuel Paulino
Clinical Psychologist; MSc in Neuropsychology and Neuroscience. Actual FIDE player (ELO) 2039; International FIDE rating, 1901176. All correspondence
about this article should be sent to email: [email protected].
_________________________________________________________________________________
Neurociência e funcionamento cerebral
O Campo da Neurociência Cognitiva recebeu esse nome
pela primeira vez em finais dos anos 70 do século
passado, no banco de trás de um táxi em New York,
quando Michael S. Gazzaniga e o brilhante Psicólogo
Cognitivo George A. Miller se dirigiam a um “jantar-
encontro” no Hotel Algonquin que estava sendo
realizado pelas equipas de cientistas das universidades
de Rockefeller e Cornell, que se tinham reunido para
debater precisamente essa temática que ainda não tinha
uma designação satisfatória. Fora do táxi surgiu, então,
essa designação de Cognitive Neuroscience que haveria
de ser bem acolhida pela comunidade científica. Agora a
questão seguinte que se punha seria qual o significado a
atribuir a este termo? : “Qual o significado deste termo”?
Em resposta a esta questão teríamos que voltar atrás e
ver, não só história do Pensamento Humano, como
também a história da ciência em disciplinas como a
Medicina, a Psicologia, ou mesmo a Biologia. Para
compreender as propriedades e miraculosas
características do funcionamento cerebral, é preciso
admitir que foi a Mãe natureza a construir o cérebro e
não uma equipa de técnicos engenheiros.
Cronologicamente pode-se fazer uma ideia de como a
Terra se formou há cerca de 5 biliões de anos, a vida
sobre ela começou há cerca de 3,5 biliões de anos, o
cérebro de um primata evoluiu desde há 20 milhões de
anos e o cérebro humano na sua presente forma há
“apenas” 100.000 anos, e a Natureza corre o seu curso,
construindo e desenvolvendo o cérebro capaz de um
sem número de feitos brilhantes e geniais mas também
capaz dos factos e atos mais banais e cruéis.
A disciplina das neurociências que estuda o cérebro tem
raízes imemoriais, a espécie humana sempre esteve
muito ocupada a pensar sobre o próprio Pensamento,
sobre o que são e de onde derivam os processos do
nosso cérebro que nos permitiu adaptar ao meio onde
vivemos, inventar a agricultura de subsistência,
domesticar animais, enfim, tudo aquilo o que nos tem
permitido sobreviver como espécie e chegar até este
momento da nossa civilização e evolução. À medida que
a sobrevivência foi sendo assegurada sem grandes
sobressaltos mais o Homem ficou libertado para refletir
sobre estes fenómenos. Desde a antiga Grécia,
Mesopotâmia, e Egipto, que se sabe que o Homem
reflete e teoriza sobre as motivações da nossa espécie e
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os desígnios do Universo onde estamos inseridos. Os
nossos mecanismos cerebrais permitiram criar inúmeras
teorias acerca da natureza do Homem e
consequentemente do seu próprio cérebro. Søren Aabye
Kierkegaard afirmava em 1846 “que o Homem deveria
pura e simplesmente admitir que não compreende como
e quando é que a Consciência apareceu na sua
Existência”, mas que apesar disso o Homem deve guindar
os seus olhos para a reflexão e ação de forma a tentar
compreender as suas reais motivações! No seculo XIX
assistiu-se finalmente a grandes avanços no estudo do
funcionamento cerebral, tentando estabelecer-se um
nexo de causalidade entre comportamentos e sintomas
resultantes de diversas lesões cerebrais e as diferentes
zonas do cérebro que lhes estavam subjacentes. Tudo
começou com os chamados Frenologistas, liderados por
Franz Joseph Gall (1758-1828) e J.G. Spurzheim (1776-
1832) que declararam que o cérebro humano era
organizado à volta de 35 funções específicas. Essas
funções cognitivas básicas do cérebro iam desde as mais
básicas como, por exemplo, a linguagem e a perceção da
cor, até às mais subjetivas capacidades humanas de
sentir autoestima ou esperança, que se pensava ter
localizações específicas no cérebro. Acreditava-se que se
a pessoa usasse com mais frequência algumas destas
suas capacidades, a parte do cérebro responsável por
essas faculdades desenvolvia-se mais em relação às
outras. Gall era um médico neuroanatomista Austríaco,
apesar disso as suas ideias eram empíricas e não eram
suportadas nem validadas por experimentação científica
nessa época. Dedicou a sua vida a estudar e refletir sobre
o córtex cerebral e defendeu a ideia de que as diferentes
funções cerebrais estavam localizadas em áreas
específicas do cérebro.
A Frenologia estudava, assim, nos inícios do seculo XIX a
morfologia do crânio humano, afirmando existir uma
relação direta entre as diferentes formas e
protuberâncias do cérebro e o carácter, características
de personalidade e até o grau de criminalidade de uma
pessoa, contribuindo assim desse modo para a ideia de
que a certas regiões do cérebro correspondiam
determinadas funções cerebrais.
No continente Europeu o neurologista inglês John
Hughlings Jackson (1835-1911), tornou-se o primeiro a
sugerir a distinção de funções dos hemisférios direitos e
esquerdo do cérebro, cabendo ao direito a relação com
as emoções e, ao esquerdo, com a linguagem. Depois em
meados de finais dos anos 50 do século XIX o francês
Paul Broca (1824-1880), talvez o mais famoso
neurologista da Historia, reportava o caso de um homem
que havia sido vítima de uma lesão cerebral na parte
frontal do lado esquerdo do cérebro. Após esta lesão
este homem conseguia compreender a linguagem mas
não se conseguia expressar oralmente, estas evidências
eram consistentes com as teorias de Jackson sobre os
hemisférios cerebrais. A partir daí, a área descrita ficou
designada pela área cerebral de Broca que também
designa a Afasia com o mesmo nome. O impacto destas
descobertas foi enorme e permitiu compreender que
certos aspetos diferentes da linguagem tinham
correspondência com regiões específicas do cérebro.
Posteriormente, o neurologista alemão Carl Wernike
(1848-1905) contribuiu decisivamente na continuação do
estudo desta temática ao dar a conhecer o caso de um
paciente com uma lesão similar à do paciente relatado
por Broca. A lesão do paciente de Wernike apesar de se
localizar no mesmo lado, o esquerdo, localizava-se numa
região posterior à do paciente de Broca, o paciente
conseguia falar, ao invés do paciente de Broca, mas o
que falava não fazia sentido e nem o próprio o
compreendia. Assim através desta dissociação de
sintomas dos dois pacientes narrados por Broca e
Wernike, nascia a compreensão de duas localizações
diferentes do cérebro (Área de Broca e Área de Wernike,
e as afasias com os mesmos nomes) que se relacionavam
diretamente com diferentes défices de linguagem e
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capacidades cognitivas. Estas constatações seriam fáceis
de ver hoje em dia em alguns segundos usando métodos
de Neuroimagem que há 150 anos não existiam. Passado
pouco tempo destas descobertas alguns cientistas
alemães, nomeadamente Gustav Fritsch (1938-1937) e
Eduard Hitzig (1939-1907) usaram técnicas como a
estimulação elétrica cerebral em cães, e como esta
estimulação produzia determinados comportamentos
nos animais. Estas descobertas levaram os
neuroanatomistas a mais detalhadas análises acerca do
córtex cerebral e a sua organização celular. Por causa da
aceitação de que determinadas regiões cerebrais são
responsáveis por comportamentos e funções específicas,
começou-se a centrar a investigação nos diferentes níveis
de organização celular do cérebro. No seguimento destas
ideias, o alemão Korbinian Brodman (1868-1918), deu
uma contribuição enorme na designação e divisão das
diferentes áreas cerebrais (Fig.1), usando o microscópio,
designadas as 52 áreas de Brodmann.
Fig. 1 As 52 áreas cerebrais de Brodman (1909)
Um dos critérios era a diferenciação celular das
diferentes áreas cerebrais, designada arquitetura
cerebral, onde o Italiano Camillo Golgy (1843-1926) e o
espanhol Santiago Ramon y Cajal (1852-1934), co-
vencedores do premio Nobel em 1906, deram o seu
contributo na chamada “doutrina neuronal”, na
identificação de células neuronais e de como estas
propagavam a informação nervosa entre as células
nervosas. Golgy, enquanto defendia a posição
reticularista, devido à insuficiente técnica utilizada na
altura, manifestava dúvidas em como os neurónios
propagavam a informação, pensando que se fundiam uns
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nos outros; Cajal finalmente, e no seguimento das
pesquisas de Golgy, usando tecnologia mais avançada,
conseguiu finalmente concluir que a informação nervosa
dos neurónios se dava só na direção dos dendritos para
os axónios.
A história do estudo do cérebro não parou desde aí e
hoje em dia é central como disciplina das neurociências.
(Gazzaniga, Ivry & Mangun, 2002).
O Xadrez
Tal como Montaigne afirmava que o jogo de xadrez é
“Muito jogo para ser ciência e muita ciência para ser
jogo”, também o poeta Goethe destacava o aspeto nobre
do jogo ao dizer que o xadrez é a “ginástica da
inteligência”, mas há também aqueles que tentam
relativizar, ou mesmo minimizar, a sua importância,
como o escritor Bernard Shaw, que ironizava admitindo
que o xadrez desenvolve a inteligência para jogar xadrez!
Polemicas à parte, o certo é que algumas disciplinas das
neurociências e das tecnologias da Cognição, como por
exemplo a “Inteligência artificial”, a Psicologia, ou
mesmo a Ciência Cognitiva de uma forma geral (Varela,
2006), encontram nesta nobre modalidade um terreno
fértil para a investigação de fenómenos tais como os
processos do funcionamento cerebral, suas funções e
aptidões cognitivas várias.
O xadrez é um jogo que exprime a capacidade artística,
criativa e científica de quem o pratica. Um espelho do
Cosmos que se projeta num microcosmos onde o
funcionamento cerebral lida com regras estabelecidas a
priori, numa linguagem simbólica e abstrata mas também
muito concreta e hierarquizada pelos conceitos de
Matéria, Tempo e Espaço nele existentes, e que apela
por exemplo a um rol de determinadas capacidades
cognitivas como a Memória, a atenção, a capacidade de
decisão, a capacidade visou-espacial, a abstração, mas
também a capacidade de sintetizar, e também aspetos
éticos e morais. Algumas das questões que se poderão
pôr, dizem a ver com a idade e o género. Será que a
idade e o género são fatores determinantes que
interagem com a capacidade cognitiva e
consequentemente com a performance dos jogadores de
xadrez? Que fatores cognitivos ou biológicos poderão
estar subjacentes ao melhor funcionamento cerebral que
permite uma maior performance destes jogadores?
Testosterona, capacidade visou-espacial, memória,
pensamento abstrato, capacidade emocional, ou que
tipos de inteligência caracterizam estas diferenças que
proporcionam a alguns se tornarem Mestres e outros
não? Respostas a estas e a outras questões similares
permitiriam conhecer alguns dos mecanismos que estão
subjacentes a uma melhor capacidade de raciocínio e até
de performance cognitiva dos xadrezistas de competição,
que extrapolados para a população em geral permitiria,
enfim, compreender até que ponto certos tipos de
substâncias potencializam ou não determinadas
capacidades cognitivas. É sabido que atualmente nas
competições escaquísticas (xadrezistas) existe já um
controlo antidoping que permite detetar substâncias
proibitivas, como por exemplo a cafeína, o álcool, e um
rol de substâncias legais e ilegais que têm gerado
polémica em meios tanto de leigos como académicos
devido ao pouco conhecimento da comunidade científica
sobre as reias substâncias que efetivamente poderão
ajudar o jogador de xadrez a melhorar as suas
performances; nada há de concreto sobre o assunto,
apesar de existir já um determinado número de
substâncias proibidas que o são, não por essa razão, mas
apenas talvez por muitas delas serem de consumo ilegal.
Sendo o xadrez um jogo que apela às reais capacidades
cognitivas de quem o pratica, uma das questões que
pretendemos levantar é se haverá um limite de idade
mínima no que concerne à capacidade de um jovem se
tornar Grande Mestre, ou seja, atingir o mais elevado
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patamar no que diz respeito ao grau de grau de
hierarquia do Xadrez. Calcula-se que haja centenas de
milhões de pessoas no mundo a praticar o jogo de
xadrez, seja de forma ocasional ou regular, e que mais de
dois biliões saibam o nome ou o movimento das peças
que compõem este jogo! Apesar disso, existem apenas
cerca de 1500 Grandes Mestres no Mundo (Gutman,
2005). Por estes números se percebe bem o quão difícil é
para o comum dos mortais a obtenção de um título desta
natureza.
A seguir publicamos duas tabelas, atuais, com os cem
melhores ratings do mundo, em masculinos e femininos
“World Chess Federation” (http://ratings.fide.com/).
Constatamos que apenas existe uma mulher nos cem
melhores, a Húngara Judite Polgar, no posto número 52
que vive atualmente nos Estados Unidos! A estatística de
haver mais homens a jogar xadrez em termos absolutos
do que mulheres, ou fatores contextuais e sociais, ou
culturais, são argumentos que poderão não estar longe
de explicar a realidade dos factos, mas pessoalmente
também partilhamos a ideia deste jogo apelar a
capacidades biológicas inatas, mais estruturais do que
contextuais e que explicam alguma desta diferença na
performance da generalidade do género. Não nos
referimos a casos particulares, mas uma análise
estatística elaborada não terá dificuldade em provar isso
mesmo! Mais uma vez frisamos que nos estamos a
referir à média na generalidade das mulheres, em
relação à média na generalidade dos homens, essa
diferença de performance acentua-se mais no top da
pirâmide e esbate-se mais na base! Claro que haverá
mulheres que jogam muito melhor do que os homens,
não nos referimos a casos particulares, mas se
atentarmos mais uma vez nos cem melhores ratings os
números falam por si!
Tabela 1.
Melhores cem jogadores mundiais
Rank Name Title Country Rating Games B-Year
1 Carlsen, Magnus g NOR 2862 9 1990
2 Aronian, Levon g ARM 2813 0 1982
3 Caruana, Fabiano g ITA 2796 20 1992
4 Kramnik, Vladimir g RUS 2784 9 1975
5 Grischuk, Alexander g RUS 2780 11 1983
6 Karjakin, Sergey g RUS 2776 9 1990
7 Nakamura, Hikaru g USA 2775 20 1987
8 Anand, Viswanathan g IND 2775 9 1969
9 Gelfand, Boris g ISR 2773 9 1968
10 Topalov, Veselin g BUL 2767 11 1975
11 Kamsky, Gata g USA 2763 11 1974
12 Mamedyarov, Shakhriyar g AZE 2761 9 1985
13 Dominguez Perez, Leinier g CUB 2757 11 1983
14 Ponomariov, Ruslan g UKR 2756 22 1983
15 Wang, Hao g CHN 2752 4 1989
16 Svidler, Peter g RUS 2746 11 1976
17 Adams, Michael g ENG 2740 0 1971
18 Leko, Peter g HUN 2737 0 1979
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19 Morozevich, Alexander g RUS 2736 20 1977
20 Giri, Anish g NED 2734 0 1994
21 Vitiugov, Nikita g RUS 2734 0 1987
22 Ivanchuk, Vassily g UKR 2733 11 1969
23 Radjabov, Teimour g AZE 2733 0 1987
24 Andreikin, Dmitry g RUS 2727 9 1990
25 Korobov, Anton g UKR 2720 11 1985
26 Vachier-Lagrave, Maxime g FRA 2719 12 1990
27 Nepomniachtchi, Ian g RUS 2717 0 1990
28 Navara, David g CZE 2715 19 1985
29 Bacrot, Etienne g FRA 2714 17 1983
30 Ding, Liren g CHN 2714 9 1992
31 Alekseev, Evgeny g RUS 2714 0 1985
32 Jakovenko, Dmitry g RUS 2713 3 1983
33 Le, Quang Liem g VIE 2712 0 1991
34 Naiditsch, Arkadij g GER 2710 5 1985
35 Areshchenko, Alexander g UKR 2709 11 1986
36 Malakhov, Vladimir g RUS 2709 4 1980
37 Tomashevsky, Evgeny g RUS 2709 0 1987
38 So, Wesley g PHI 2708 18 1993
39 Fressinet, Laurent g FRA 2708 11 1981
40 Riazantsev, Alexander g RUS 2708 0 1985
41 Almasi, Zoltan g HUN 2707 0 1976
42 Vallejo Pons, Francisco g ESP 2706 0 1982
43 Wang, Yue g CHN 2705 15 1987
44 Eljanov, Pavel g UKR 2702 14 1983
45 Van Wely, Loek g NED 2701 18 1972
46 Wojtaszek, Radoslaw g POL 2701 11 1987
47 Moiseenko, Alexander g UKR 2699 14 1980
48 Kasimdzhanov, Rustam g UZB 2699 13 1979
49 Movsesian, Sergei g ARM 2699 0 1978
50 McShane, Luke J g ENG 2697 0 1984
51 Shirov, Alexei g LAT 2696 1 1972
52 Polgar, Judit g HUN 2696 0 1976
53 Rublevsky, Sergei g RUS 2695 0 1974
54 Rapport, Richard g HUN 2693 17 1996
55 Jobava, Baadur g GEO 2693 4 1983
56 Akopian, Vladimir g ARM 2691 0 1971
57 Bruzon Batista, Lazaro g CUB 2689 9 1982
58 Volokitin, Andrei g UKR 2688 20 1986
59 Short, Nigel D g ENG 2688 11 1965
60 Berkes, Ferenc g HUN 2687 0 1985
61 Li, Chao b g CHN 2686 11 1989
62 Laznicka, Viktor g CZE 2684 0 1988
63 Grachev, Boris g RUS 2683 0 1986
64 Ragger, Markus g AUT 2680 8 1988
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ISSN: in attribution process Year 0, Vol. I, nº 1, 2013
65 Harikrishna, P. g IND 2680 0 1986
66 Inarkiev, Ernesto g RUS 2680 0 1985
67 Granda Zuniga, Julio E g PER 2679 0 1967
68 Kryvoruchko, Yuriy g UKR 2678 11 1986
69 Cheparinov, Ivan g BUL 2678 0 1986
70 Gareev, Timur g USA 2676 0 1988
71 Bologan, Viktor g MDA 2672 0 1971
72 Sargissian, Gabriel g ARM 2671 0 1983
73 Nisipeanu, Liviu-Dieter g ROU 2670 9 1976
74 Dreev, Aleksey g RUS 2668 0 1969
75 Fedorchuk, Sergey A. g UKR 2667 8 1981
76 Onischuk, Alexander g USA 2667 0 1975
77 Matlakov, Maxim g RUS 2665 0 1991
78 Bu, Xiangzhi g CHN 2664 24 1985
79 Shimanov, Aleksandr g RUS 2664 0 1992
80 Smirin, Ilia g ISR 2663 0 1968
81 Edouard, Romain g FRA 2662 11 1990
82 Romanov, Evgeny g RUS 2662 0 1988
83 Ni, Hua g CHN 2661 13 1983
84 Zhigalko, Sergei g BLR 2661 0 1989
85 Petrosian, Tigran L. g ARM 2660 17 1984
86 Safarli, Eltaj g AZE 2660 0 1992
87 Sasikiran, Krishnan g IND 2660 0 1981
88 Sutovsky, Emil g ISR 2660 0 1977
89 Zvjaginsev, Vadim g RUS 2659 0 1976
90 Khairullin, Ildar g RUS 2658 0 1990
91 Khismatullin, Denis g RUS 2658 0 1984
92 Nielsen, Peter Heine g DEN 2658 0 1973
93 Yu, Yangyi g CHN 2657 24 1994
94 Efimenko, Zahar g UKR 2657 11 1985
95 Kurnosov, Igor g RUS 2657 0 1985
96 Lysyj, Igor g RUS 2656 0 1987
97 Gharamian, Tigran g FRA 2655 0 1984
98 Motylev, Alexander g RUS 2655 0 1979
99 Tiviakov, Sergei g NED 2654 10 1973
100 Gajewski, Grzegorz g POL 2653 11 1985
Tabela 2.
Melhores cem jogadoras mundiais
Rank Name Title Country Rating Games B-Year
1 Polgar, Judit g HUN 2696 0 1976
2 Koneru, Humpy g IND 2607 11 1987
3 Hou, Yifan g CHN 2600 15 1994
4 Muzychuk, Anna g SLO 2594 11 1990
p.7
9
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5 Dzagnidze, Nana g GEO 2558 11 1987
6 Zhao, Xue g CHN 2553 4 1985
7 Lagno, Kateryna g UKR 2542 0 1989
8 Ju, Wenjun wg CHN 2531 2 1991
9 Kosintseva, Nadezhda g RUS 2531 0 1985
10 Kosintseva, Tatiana g RUS 2528 11 1986
11 Sebag, Marie g FRA 2528 11 1986
12 Cramling, Pia g SWE 2524 0 1963
13 Khotenashvili, Bela m GEO 2512 11 1988
14 Gunina, Valentina g RUS 2507 4 1989
15 Ruan, Lufei wg CHN 2501 0 1987
16 Ushenina, Anna g UKR 2500 11 1985
17 Stefanova, Antoaneta g BUL 2497 19 1979
18 Cmilyte, Viktorija g LTU 2497 12 1983
19 Zhu, Chen g QAT 2494 0 1976
20 Harika, Dronavalli g IND 2489 11 1991
21 Kosteniuk, Alexandra g RUS 2489 0 1984
22 Huang, Qian wg CHN 2487 4 1986
23 Muzychuk, Mariya m UKR 2484 4 1992
24 Krush, Irina m USA 2480 9 1983
25 Tan, Zhongyi wg CHN 2478 15 1991
26 Pogonina, Natalija wg RUS 2478 9 1985
27 Zatonskih, Anna m USA 2473 0 1978
28 Zhukova, Natalia g UKR 2471 0 1979
29 Danielian, Elina g ARM 2470 11 1978
30 Hoang, Thanh Trang g HUN 2467 21 1980
31 Javakhishvili, Lela m GEO 2465 4 1984
32 Galliamova, Alisa m RUS 2458 0 1972
33 Mkrtchian, Lilit m ARM 2454 9 1982
34 Paehtz, Elisabeth m GER 2454 2 1985
35 Munguntuul, Batkhuyag m MGL 2452 4 1987
36 Alexandrova, Olga m ESP 2449 0 1978
37 Hunt, Harriet V m ENG 2449 0 1978
38 Dembo, Yelena m GRE 2448 0 1983
39 Guo, Qi wg CHN 2446 15 1995
40 Moser, Eva m AUT 2446 0 1982
41 Khurtsidze, Nino m GEO 2443 11 1975
42 Skripchenko, Almira m FRA 2441 11 1976
43 Bodnaruk, Anastasia m RUS 2440 0 1992
44 Cori T., Deysi wg PER 2439 7 1993
45 Peptan, Corina-Isabela m ROU 2439 0 1978
46 Girya, Olga wg RUS 2437 11 1991
47 Socko, Monika g POL 2436 9 1978
48 Ding, Yixin wg CHN 2432 15 1991
49 Tania, Sachdev m IND 2430 18 1986
50 Atalik, Ekaterina m TUR 2430 8 1982
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51 Melia, Salome m GEO 2428 11 1987
52 Gomes, Mary Ann wg IND 2423 9 1989
53 Zaiatz, Elena m RUS 2423 0 1969
54 Guramishvili, Sopiko m GEO 2421 11 1991
55 Bojkovic, Natasa m SRB 2415 0 1971
56 Matnadze, Ana m ESP 2412 0 1983
57 Rajlich, Iweta m POL 2411 0 1981
58 Kovalevskaya, Ekaterina m RUS 2407 0 1974
59 Shen, Yang m CHN 2405 15 1989
60 Batsiashvili, Nino wg GEO 2405 11 1987
61 Bulmaga, Irina wg ROU 2403 0 1993
62 Vega Gutierrez, Sabrina m ESP 2402 2 1987
63 Goryachkina, Aleksandra wg RUS 2401 0 1998
64 Wang, Jue wg CHN 2399 15 1995
65 Karavade, Eesha m IND 2398 9 1987
66 Houska, Jovanka m ENG 2398 0 1980
67 Pham, Le Thao Nguyen m VIE 2397 0 1987
68 Milliet, Sophie m FRA 2396 12 1983
69 Li, Ruofan m SIN 2396 0 1978
70 Wang, Pin wg CHN 2394 2 1974
71 Vijayalakshmi, Subbaraman m IND 2393 14 1979
72 Zawadzka, Jolanta wg POL 2393 9 1987
73 Gaponenko, Inna m UKR 2393 0 1976
74 Peng, Zhaoqin g NED 2389 0 1968
75 Foisor, Cristina-Adela m ROU 2387 0 1967
76 Ovod, Evgenija m RUS 2386 9 1982
77 Michna, Marta wg GER 2385 1 1978
78 Arakhamia-Grant, Ketevan g SCO 2385 0 1968
79 Melamed, Tatjana wg GER 2384 1 1974
80 Lujan, Carolina m ARG 2383 9 1985
81 Nemcova, Katerina wg USA 2382 0 1990
82 Szczepkowska-Horowska, Karina wg POL 2380 9 1987
83 Matveeva, Svetlana m RUS 2380 0 1969
84 Shadrina, Tatiana wg RUS 2377 0 1974
85 Vojinovic, Jovana wg SRB 2376 0 1992
86 Zhang, Xiaowen wg CHN 2375 15 1989
87 Majdan-Gajewska, Joanna wg POL 2375 0 1988
88 Khukhashvili, Sopiko m GEO 2374 11 1985
89 Repkova, Eva m SVK 2374 9 1975
90 Kovanova, Baira wg RUS 2371 0 1987
91 Vasilevich, Irina m RUS 2370 0 1985
92 Kononenko, Tatiana m UKR 2369 0 1978
93 Savina, Anastasia m RUS 2368 7 1992
94 Paikidze, Nazi m GEO 2368 0 1993
95 Romanko, Marina m RUS 2368 0 1986
96 Schleining, Zoya wg GER 2368 0 1961
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97 Sukandar, Irine Kharisma wg INA 2365 18 1992
98 Daulyte, Deimante wg LTU 2363 5 1989
99 Fierro Baquero, Martha L. m ECU 2362 9 1977
100 Kachiani-Gersinska, Ketino m GER 2362 0 1971
101 Sudakova, Irina wg RUS 2362 0 1982
102 Stockova, Zuzana m SVK 2359 0 1977
103 Wang, Yu A. m CHN 2359 0 1982
104 Linares Napoles, Oleiny wg CUB 2358 0 1983
105 L'Ami, Alina wg ROU 2356 13 1985
106 Ciuksyte, Dagne m ENG 2355 0 1977
107 Nakhbayeva, Guliskhan wg KAZ 2354 9 1991
108 Charkhalashvili, Inga wg GEO 2353 0 1983
109 Batchimeg, Tuvshintugs wg MGL 2351 11 1986
110 Lomineishvili, Maia m GEO 2351 11 1977
111 Kursova, Maria wg ARM 2351 0 1986
112 Manakova, Maria wg SRB 2351 0 1974
113 Purtseladze, Maka m GEO 2349 11 1988
114 Gara, Ticia wg HUN 2349 0 1984
115 Vajda, Szidonia m HUN 2349 0 1979
116 Medvegy, Nora Dr. m HUN 2346 0 1977
117 Ubiennykh, Ekaterina wm RUS 2344 0 1983
118 Pokorna, Regina wg SVK 2343 0 1982
119 Guichard, Pauline wg FRA 2342 8 1988
120 Gvetadze, Sofio m GEO 2341 11 1983
Quais as causas que estarão na génese destes fenómenos
concretos e reais no que concerne ao topo da tabela dos
melhores “ratings”? Será que o jogo de xadrez a exemplo
de outros desportos, neste caso mais físicos, apela a
fatores biológicos cognitivos influenciados pela diferença
de género? (e.g. o xadrez também apela a uma excelente
condição física para que se obtenham bons resultados;
nos antigos matchs de candidatos para o Titulo Mundial,
Karpov – Korchnoi chegaram a fazer-se estudos que
indicavam que os jogadores perdiam em media alguns
kilos durante o jogo que chegava a demorar mais de 5
horas). Essa diferença de género contribuirá para a
obtenção de diferentes resultados na competição do
jogo de xadrez? Será necessário aos melhores jogadores
do mundo possuírem níveis elevados de testosterona
para obterem uma maior agressividade no jogo que lhes
permita melhores performances? E quanto à capacidade
visou-espacial tão necessária à prática deste desporto
que muitos pretendem mais desenvolvida no homem do
que na mulher? Estas serão algumas das hipóteses entre
tantas outras que se podem pôr para explicar estas
diferenças estatísticas encontradas na performance do
desporto de xadrez entre homens e mulheres.
De referir apenas que esta modalidade tem como
critérios de rating um sistema que se chama de “rating
Elo”, (http://pt.wikipedia.org/wiki/Rating_ELO) em
homenagem ao matemático que inventou este sistema
de classificação hierárquico que permite haver uma
hierarquização no universo dos jogadores de xadrez
discriminado as performances obtidas em torneios.
Quanto ao à variável “idade” é sabido que o mais jovem
Grande Mestre de sempre obteve a sua norma definitiva
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com 12 anos, não se conhecendo nenhum jogador abaixo
desta idade que o tenha conseguido até hoje. Aqui
queremos introduzir a hipótese dos estadios de
desenvolvimento cognitivos de Piaget poderem explicar
satisfatoriamente o fenómeno de nunca um jovem com
menos de 12 anos, por exemplo, (até aos dias de hoje)
ter alcançado o maior título da escala hierárquica da
competição de xadrez, o título de grande Mestre.
É só no Estadio de Inteligência Operatória Formal (± a
partir de 11/12 anos Piaget, 1947) que parece que o Ser
Humano está apto a reflexões abstratas e onde o
pensamento se caracteriza por ser um pensamento que
reflete sobre si próprio, ou seja, sobre o próprio
pensamento, coisa que no estadio anterior não parece
possível. Aliando esta constatação ao facto de ser nesta
idade que se produzem certos rearranjos neuronais na
criança adolescente que permitirão estes desempenhos
proibitivos numa fase e idade anteriores. Este
desempenho na idade mínima em que ambos os géneros
obtêm a norma definitiva de Grande Mestre é mais ou
menos idêntico, mas à medida que se sobe na Pirâmide
Hierárquica dos melhores ratings do mundo da
modalidade de xadrez acentua-se a diferença entre
géneros na capacidade de performance exprimida em
termos de pontuação de rating FIDE (Federação Mundial
de Xadrez).
Nota editorial: quem quer contribuir neuro - cientificamente para esta
discussão?
Referências
Gazzaniga, M., Ivry, R. & Mangun, R. (2002). The Biology
of the Mind: Cognitive Neuroscience (3rd Edition). New
York: WW Norton, pp. 1-3.
Gutman, R.D. (2005). Metáforas de ajedrez: La Mente
Humana Y la Inteligencia Artificial. Madrid: Editorial
La casa del Ajedrez, pp. 62.
Piaget, J. (1975). O nascimento da inteligência na criança
(2ª Edição). Rio de Janeiro: Zahar.
Piaget, J. (1958). Psicologia da inteligência (2ª Edição).
Rio de Janeiro: Fundo de Cultura (1958, 1947).
Varela, F. (1994) (2006). Conhecer as ciências cognitivas
tendências e perspectivas. Lisboa: Instituto Piaget.
Edições Piaget, pp. 20.
World Chess Federation (2013). Retrieved from website:
http://ratings.fide.com/ in 21-07-2013.
Wikipedia (2013). Retrieved from website:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Rating_ELO in 22-07-
2013.
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Original Article
Enviesamento Atencional no Abuso de Substâncias: O Papel da Carga Cognitiva.
Humberto Rodrigues (1), Sandra C. Soares (2), Paulo Rodrigues (3), Aldina Martins (4), Luis Maia (5)
(1) Clinical Neuropsychologist; MSc in Psychology. All correspondence about this article should be sent to email: [email protected].
Universidade de Aveiro UA-Aveiro; (2) Universidade de Aveiro UA-Aveiro, IBILI, Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra; (3) Universidade da
Beira Interior UBI-Covilhã; (4) Projecto Homem-Braga; (5) Universidade da Beira Interior UBI-Covilhã.
_________________________________________________________________________________
Abstract
Substance dependence involves an attention bias (AB) in the face of drug-related stimuli (e.g., heroin), being this, one of the main factors associated with
relapse. However, it is yet unknown what the role of cognitive load in this context. We intended to evaluate in this study if AB in individuals with a history of
addiction to heroin is already verifiable in low cognitive load condition (i.e., when there are cognitive resources that enable processing of attention bias
stimuli). Subjects performed a task to use attention to discrimination of letters that could arise either individually or in a set of other letters (lower and high
cognitive load, respectively), with and without presentation of attention bias stimuli. The results just revealed a main effect of cognitive load. The exposure
time used in this study (500ms) may have contributed to the avoidance of distractors and justify the absence of significant effects involving the distractor and
group type.
Keywords: Heroin, attentional bias, craving, selective attention, perceptual load.
Resumo
A dependência de substâncias envolve um enviesamento atencional (EA) face a estímulos relacionados com as drogas (e.g., heroína), sendo este um dos
principais fatores associado às recaídas. Contudo, desconhece-se qual o papel da carga cognitiva neste contexto. Pretendemos avaliar no presente estudo se o
EA em indivíduos com historial de dependência de heroína apenas se verifica na condição de baixa carga cognitiva (i.e., quando existem recursos cognitivos
que possibilitam o processamento de estímulos distratores). Apresentou-se uma tarefa atencional de discriminação de letras que podiam surgir isoladamente
ou num conjunto de outras letras (baixa e alta carga cognitiva, respetivamente), com e sem apresentação de estímulos distratores. Os resultados apenas
revelaram um efeito principal da carga cognitiva. O tempo de exposição usado no presente estudo (500ms) poderá ter contribuído para o evitamento dos
distratores e justificar a ausência de efeitos significativos envolvendo o tipo de distrator e o grupo.
Palavras-chave: Heroína, enviesamento atencional, craving, atenção seletiva e carga cognitiva.
Resumen
La dependencia de sustancias implica un sesgo para utilizar atención (SA) ante estímulos relacionados con las drogas (e.g., heroína), siendo este uno de los
principales factores asociados con la recaída. Sin embargo, aún sea desconocido cual el papel de la carga cognitiva en este contexto. Tenemos la intención de
evaluar en este estudio si el SA en individuos con antecedentes de adicción a la heroína ya son verificables en condiciones de baja carga cognitiva (es decir,
cuando hay recursos cognitivos que permiten el procesamiento de estímulos que críen sesgo). Los sujetos realizaron una tarea para utilizar la atención a la
discriminación de las letras que pudieran surgir, individualmente o en un conjunto de otras letras (baja y alta carga cognitiva, respectivamente), con y sin la
presentación de estímulos creadores de sesgo. Los resultados revelaron sólo un efecto principal de carga cognitiva. El tiempo de exposición utilizado en este
estudio (500ms) puede haber contribuido a la evitación de elementos interactivos y justificar la ausencia de efectos significativos que involucran el tipo de
distractor y tipo de grupo.
Palabras clave: Heroína, sesgo atencional, deseo de consumir, atención selectiva, carga perceptiva.
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“São todos maus descobridores, os que pensam que não há terra quando conseguem ver apenas o mar”. Francis Bacon
Introdução
A dependência de substâncias acarreta diversos sintomas
cognitivos, comportamentais e fisiológicos. Estes
manifestam-se através do uso contínuo de uma
determinada substância (e.g., heroína). O desejo
incontrolável de repetir a administração de uma
substância psicoativa enquadra um padrão que implica
tolerância (i.e., diminuição do efeito da mesma dose da
substância que leva ao aumento das doses para obter o
mesmo efeito), abstinência (i.e., sintomas físicos e
psicológicos provocados pela ausência da substância no
organismo), e comportamentos compulsivos de procura
da substância (DSM-IV-TR, 2002).
De acordo com os dados da Observatório Europeu da
Droga e da Toxicodependência - OEDT (2011) referentes
à população adulta europeia com idades entre os 15 e os
64 anos (inquéritos realizados entre 2001 e 2010),
relativamente à cannabis, à cocaína, ao ecstasy e às
anfetaminas, regista-se uma prevalência de consumo ao
longo da vida de cerca de 78 milhões (23,2%), 14,5
milhões (4,3%), 11 milhões (3,2%) e de 12,5 (3,8%),
respetivamente. Relativamente à heroína, estima-se que
o seu consumo envolva 1,3 a 1,4 milhões de
consumidores europeus. Os dados da OEDT (2011)
revelam ainda que cerca de 700 000 consumidores de
opiáceos receberam tratamento de substituição em
2009, tendo a heroína sido referida como a droga
principal em mais de 50% do total de pedidos de
tratamentos de toxicodependências. Para além disso,
foram relatadas cerca de 7 600 mortes induzidas por
drogas, tendo sido detetados opiáceos em cerca de três
quartos dos casos europeus (OEDT, 2011). Os resultados
do segundo inquérito nacional de substâncias psicoativas
na população portuguesa, com idades entre os 15 e os 64
anos, indicam que o álcool e o tabaco são as substâncias
lícitas mais usadas, sendo o cannabis, a cocaína e o
ecstasy as substâncias ilícitas com maior prevalência ao
longo da vida (11,7%, 1,9% e 1,3%, respetivamente),
(European Monitoring Center for Drugs and Drug
Addiction - EMCDDA, 2010). Contudo, verificou-se uma
estabilização do uso de substâncias psicoativas ilícitas no
ano de 2009, com a exceção da cocaína, da heroína e do
LSD, cujas prevalências aumentaram (EMCDDA, 2010).
Em 2010, verificou-se que a heroína continua a ser a
droga principal a nível de procura de tratamentos e
mortalidade, tendo sido apontada por 77% dos utentes
em ambulatório na rede pública de tratamento e por
55% dos novos utentes. Paralelamente, foi assinalada
como a droga de eleição de 49% dos utentes das
comunidades terapeutas públicas e licenciadas em
Portugal (46% exclusivamente com heroína e 3% de
casos de heroína e cocaína concomitantemente).
Relativamente ao sexo, as maiores prevalências face ao
consumo desta substância verificam-se nos homens
(Instituto da Droga e Toxicodependência - IDT, 2010).
Segundo o último relatório anual sobre a evolução do
fenómeno da droga na Europa verificou-se um recente
declínio do consumo de heroína no contexto de um
aumento da oferta de tratamento (OEDT, 2012). Mais de
metade dos 1,4 milhões de consumidores regulares de
opiáceos que se estima haver na Europa, tem atualmente
acesso a tratamentos de substituição (OEDT, 2012).
Contudo, apesar do relatório salientar um menor número
de novos consumidores europeus de heroína e menor
oferta da substância devido a um maior número de
apreensões desta substância, existem países como a
Finlândia onde o abuso de Buprenorfina (um opiáceo
sintético muito utilizado no tratamento de substituição)
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ISSN: in attribution process Year 0, Vol. I, nº 1, 2013
é o mais mencionado pelas pessoas que iniciam o
tratamento (OEDT, 2012).
A autoadministração das drogas fora do âmbito
terapêutico e prescrição profissional é provavelmente
tão antiga quanto a cultura e civilização humana e atesta
os seus efeitos “reforçadores1” positivos (Johanson,
1978). Por outro lado, a propriedade de elicitar
sentimentos agradáveis também é indicativo de que as
drogas são de facto recompensadoras (Di Chiara, 1999).
As propriedades recompensadoras das drogas não
consistem necessariamente em sensações puras de
simples prazer (euforia) ou ao efeito imediato e intenso
que se segue à administração por via intravenosa ou
fumada (e.g., heroína ou cocaína), mas podem assumir
formas intermédias de hedonismo, tais como: o alívio da
tensão, a redução da fadiga, o aumento do “arousal”,
melhores desempenhos, entre outras. Estas ações
positivas podem explicar, “per se”, o porquê das drogas
serem usadas, mas não o porquê do seu abuso e
dependência (Di Chiara, 1999), condição caracterizada
por um comportamento compulsivo, de recaída e foco
em comportamentos motivados para a droga, com os
consequentes problemas sociais, familiares e problemas
de saúde que acarretam (Marissen, 2005). Podemos
argumentar que é a especificidade de como a
recompensa da droga é produzida que constitui a
diferença face às recompensas convencionais. De facto,
enquanto as recompensas convencionais atuam
primariamente como estímulos sensoriais, as drogas
atuam diretamente no encéfalo e distribuem-se pelo
plasma com capacidade de penetração na barreira
hematoencefálica por difusão passiva. Assim, as drogas
não dependem da estimulação dos recetores sensoriais
periféricos, tal como os reforçadores convencionais para
a indução dos seus efeitos motivacionais (Di Chiara,
1999). Deste modo, a adição pode ser conceptualizada
1 Iremos utilizar o termo “reforçadores” ao invés de reforços, tal como propõe (Silva, 2006, p. 78)
como uma perturbação da motivação que se caracteriza
por um controlo excessivo sobre o comportamento,
exercido pelas drogas e pela aquisição de estímulos
secundários, estímulos condicionados que atuam como
incentivos ao comportamento do consumo da droga (Di
Chiara, 1998). Cada vez mais, a adição é vista como uma
condição crónica, sendo a abstinência de substâncias um
objetivo difícil e de longo prazo (McLellan, Lewis, O'Brien,
& Kleber, 2000). Os problemas causados pelo abuso e
dependência de substâncias assumem-se como um dos
mais difíceis de resolver nas sociedades atuais (e.g.,
OEDT, 2011). Os problemas associados ao consumo
prolongado da heroína, em particular, são severos e
envolvem, entre outros, altos índices de problemas de
saúde, envolvimento criminal e maior dependência de
serviços de saúde pública (Smyth, Hoffman, Fan, & Hser,
2007). As taxas de recaída entre dependentes de heroína
depois de tratamentos residenciais rondam os 60%,
sendo que a maioria das recaídas iniciais ocorrem no
primeiro mês após o tratamento (Gossop, Stewart,
Browne, & Marsden, 2002). A alta taxa de recaída entre
os consumidores de substâncias tem motivado de forma
contínua muitos investigadores desta área a procurar
desenvolver e testar novos modelos explicativos com a
finalidade de desenvolver tratamentos mais eficazes
(Marissen, 2005).
Conceções teóricas da dependência
A teoria do processamento automático
Em 1990, Tiffany propôs uma visão alternativa sobre o
comportamento aditivo enfatizando os aspetos
cognitivos. Até essa data, a maioria dos modelos de
adição era caracterizada tendo em conta os sintomas de
abstinência (e.g., tremores, agitação e ansiedade) como
sendo a genesis dos impulsos e do craving para o
consumo (Tiffany, 1990). Por exemplo, o modelo de
abstinência condicionada de Wilker (1973) refere que
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quando um adito está sob sintomas de abstinência, estes
ficam associados aos estímulos presentes no decorrer
desses episódios de abstinência (e.g., contextos
terapêuticos) (Wikler, 1973). Por sua vez, a teoria do
processo de oposição de Siegel (1983) foca-se nas
respostas compensatórias das drogas para manter a
homeostasia. Desta forma, na presença de estímulos
associados à droga, o organismo preparar-se-ia para o
consumo da droga e produziria sintomas desconfortáveis
de oposição à droga, o que poderia ser experienciado
como um episódio de abstinência ou de craving (Siegel,
1983).
Ao longo deste trabalho, referimo-nos a craving como
um estado motivacional experienciado de forma
subjetiva que flutua ao longo do tempo e não ao
evitamento de um estado motivacional, tal como
sugerem Field, Munafò e Franken (2009). Esta definição
de craving esta direcionada para as drogas psicoativas,
no entanto, esta não implica necessariamente que o
craving relacionado com o consumo de substâncias seja
qualitativamente ou quantitativamente diferente de
outros tipos de craving (e.g., associado à alimentação)
(Nijs, Franken, & Muris, 2007).
Neste modelo do comportamento aditivo (Tiffany, 1990),
o autor propõe que o consumo de droga de uma pessoa
adita é controlado por processos automáticos, i.e., que
envolvem esquemas de ação automáticos que contêm
informação adequada para a iniciação e coordenação de
sequências complexas que levam ao comportamento do
consumo. O comportamento de procura da droga é
controlado por processos automáticos aprendidos, ao
invés de pensamentos conscientes. Assim, o uso de
drogas torna-se um hábito, um processo que ocorre de
forma progressivamente automática e que não é
necessariamente intencional (Tiffany, 1990). De acordo
com este modelo, o craving é um processo cognitivo não
automático que só é ativado pela interrupção do
comportamento automático de procura da substância
(Tiffany, 1990). Portanto, ocorre quando esses esquemas
são interrompidos, seja de forma voluntária (quando
uma pessoa decide parar os consumos de drogas) ou
involuntária (quando a droga não está disponível para o
fazer). Deste modo, o comportamento aditivo pode
começar e terminar sem intenção, sendo que, na
presença de estímulos relacionados com a droga (e.g.,
imagens, sons, odores) que passam a integrar uma rede
associativa armazenada na memória, os esquemas são
ativados, determinando uma forte necessidade e desejo
de consumir drogas, dificultando assim o evitamento do
consumo nesta condições (Tiffany, 1990).
A teoria incentivo-sensibilização
A teoria da Incentivo-Sensibilização propõe que o
comportamento aditivo é devido em grande parte a
neuro-adaptações progressivas e persistentes causadas
pelo uso repetido da droga (Robinson & Berridge, 1993).
É proposto que as drogas induzem alterações no sistema
nervoso, manifestando-se ao nível neuro-químico e
comportamental através do fenómeno da sensibilização
(Robinson & Berridge, 2008). O princípio central desta
teoria é que a administração repetida da substância de
abuso produz uma resposta dopaminérgica que se torna
sensibilizada (i.e., progressivamente maior) em cada
nova administração (Field & Cox, 2008). Como
consequência, estes circuitos neuronais podem tornar-se
permanentemente hipersensíveis (sensibilizados) para os
efeitos específicos da droga e respetivos estímulos
associados ao seu consumo. O sistema neuronal que
cede hipersensibilidade para ativar estímulos admite a
hipótese de mediar uma função psicológica específica
envolvida no processo incentivo motivacional, designado
de “atribuição de saliência do incentivo” (Robinson &
Berridge, 2004). A sensibilização deste sistema neuronal
pelas drogas resulta num desenvolvimento patológico do
sistema de saliência de incentivo (Robinson & Berridge,
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2001). Deste modo, através dos consumos repetidos,
estes tornam-se cada vez mais atrativos (Robinson &
Berridge, 1993). Em suma, os sistemas associados ao
núcleo accumbens (NAC) vão mediar as funções básicas
motivacionais do incentivo e, em particular, são
responsáveis pela saliência dos estímulos. A
sensibilização neuronal produz mudanças psicológicas
que fazem com que as representações associadas à
droga adquiram uma excessiva saliência, desenvolvendo-
se um “querer” patológico pela substância. A ativação
destes sistemas hiper-sensibilizados pode expressar-se
em comportamentos de procura da droga, mesmo sem
que o individuo tenha emoções ou objetivos conscientes
dessa procura (Robinson & Berridge, 2004). Nesta teoria,
o “querer” (wanting) é diferente de “gostar” (liking) e a
sensibilização aumenta apenas o “querer”, ou seja, a
incentivo-sensibilização produz um enviesamento
atencional para os estímulos associados à droga e uma
motivação patológica para as drogas (“querer”
compulsivo) (Robinson & Berridge, 2008). Os indivíduos
são assim controlados por estímulos que representam
incentivos associados à droga. Assim, através da saliência
do incentivo, um estímulo neutro torna-se um estímulo
saliente que capta a atenção em detrimentos de outros
estímulos, dificultando a capacidade de dirigir ou focar a
atenção para outras atividades o que, por sua vez, elícita
uma aproximação comportamental para o consumo.
Deste modo, se o consumo de drogas é causado apenas
pelo “querer”, e o “querer” é apenas causado pela
exposição às substâncias ou aos estímulos
condicionados, então o consumo de drogas é um
comportamento controlado pelo estímulo
incondicionado - EI (o consumo) e pelo estímulo
condicionado - EC (estímulos relacionados com o
consumo), e não pelo estímulo reforçador, ou seja, pelas
consequências. Portanto, é a saliência do incentivo que
determina o valor do estímulo (Berridge & Robinson,
2003). De acordo com a teoria da incentivo-
sensibilização, os estímulos condicionados à droga
potenciam a estimulação da dopamina no NAC (Robinson
& Berridge, 1993). De facto, parece que o aumento da
dopamina não está relacionado com a recompensa per
se, como se pensava, mas sim com a previsão da
recompensa (Schultz, Tremblay & Hollerman, 2000),
assim como com a saliência dos estímulos no ambiente,
o que facilita a aprendizagem condicionada (Lu, Grimm,
Shaham, & Hope, 2003).
Uma extensão da teoria da incentivo-sensitização
(Robinson & Berridge, 1993) sugere que o EA surge como
uma consequência do condicionamento clássico
(Franken, 2003). Segundo este autor, o EA é um
importante intermediário cognitivo entre os estímulos
condicionados ao consumo, ao craving e, eventualmente
à recaída. Através do EA, os estímulos relacionados com
as drogas são assinalados mais facilmente, sendo mais
difícil desviar a atenção destes (e.g., Franken, 2003). Ou
seja, o EA ocorre devido à saliência automática dos
estímulos relacionados com a droga, deixando poucos
recursos aos consumidores para aplicarem estratégias
apropriadas de coping (Franken, 2003). Paralelamente,
Franken (2003) sugere igualmente que o craving
subjetivo e o EA têm relações mútuas excitatórias. Isto é,
quando os estímulos relacionados com as drogas se
tornam o foco da atenção, o craving subjetivo aumenta e
isto, por sua vez, aumenta a captura de atenção, e assim
por diante, até que finalmente a substância é procurada
e autoadministrada (Franken, 2003).
De forma a integrar a teoria da incentivo-sensibilização
de Robinson e Berridge (1993) e o modelo do
processamento cognitivo automático de Tiffany (1990),
que enfatizam a capacidade dos estímulos relacionados
com a droga capturarem a atenção do consumidor em
detrimento de outros estímulos, Di Chiara (2000) sugeriu
que o incentivo e o hábito podem desempenhar
diferentes papéis no início e na manutenção da adição,
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variando conforme o nível de dependência. Nos estágios
iniciais da dependência (e.g., de heroína), a adição seria
controlada por um processo de aprendizagem do
incentivo associado à ativação dopaminérgica (i.e., teoria
da incentivo-sensibilização) e, em estágios superiores
(i.e., níveis de dependência maiores) o comportamento
aditivo seria determinado por respostas baseadas no
hábito aprendido, como propõe o modelo do
processamento automático (Di Chiara, 2000).
Atenção seletiva nas dependências
A atenção seletiva é a capacidade mental de selecionar
apenas uma pequena parte de informação contida no
ambiente em detrimento de uma quantidade de
estímulos disponíveis ao nosso redor, ou pelo menos
suprimi-los ou atenuá-los (Driver, 2001). De acordo com
as teorias atuais do comportamento aditivo, os
consumidores de heroína e de outras substâncias
tendem a direcionar a sua atenção para estímulos do
ambiente, associados ao consumo (substância),
vulgarmente chamado de EA (Field & Cox, 2008). Os
estímulos ambientais associados aos reforçadores que as
substâncias propiciam adquirem saliência e capturam a
atenção do consumidor, em detrimento de outros
estímulos (e.g., Field & Cox, 2008; Field, Mogg, &
Bradley, 2004; Field, Mogg, Zetteler, & Bradley, 2004;
Lubmand, Peters, Moog, Bradley, & Deakin, 2000). A
saliência conferida a estes estímulos condicionados pode
enviesar a atenção dos consumidores em tarefas
quotidianas não relacionadas com os consumos,
podendo este enviesamento, como consequência,
resultar no aumento de preocupações e pensamentos
intrusivos relacionados com a droga ou mesmo aumento
de irritabilidade e dificuldade de concentração
(Lubmand, et al., 2000). Assim, o EA para estímulos
associados à heroína, parece desempenhar um papel
importante na transição do uso ocasional à dependência,
assim como na recaída (Robinson & Berridge, 1993;
Tiffany, 1990). Os estudos têm revelado que indivíduos
aditos em diversas substâncias (e.g., cocaína,
anfetaminas, cannabis, nicotina) demonstraram prejuízo
no funcionamento da atenção sustentada (Bolla et al.,
2002; Durazzo, Meyerhoff, & Nixon, 2012; Jovanovski,
Erb, & Zakzanis, 2005; Simon, Dean, Cordova,
Monterosso, & London, 2010). Por sua vez, a atenção
sustentada tem uma interação bidirecional com o
craving. Por exemplo, o craving para as substâncias exige
recursos atencionais e retira a atenção dos estímulos não
relacionados com as substâncias, resultando num
comprometimento do desempenho nas tarefas de
atenção sustentada (Sayette, Schooler, & Reichle, 2010).
Lapsos de atenção durante a abstinência inicial estão
relacionados com as recaídas, possivelmente por
reduzirem a inibição comportamental (de Wit, 2009),
conduzindo a um aparente “sequestro” do cérebro pelos
estímulos relacionados com as substâncias (Sofuoglu,
DeVito, Waters, & Carroll, 2013).
Paradigmas utilizados para investigar o EA na adição
(e.g., heroína)
Entre os principais paradigmas usados para investigar o
EA relacionado com substâncias estão a tarefa de Stroop,
a tarefa Dot-Probe, os procedimentos Dual-task e os
potenciais evocados (ERPs) (Field, et al., 2009). De entre
os paradigmas mais usados para testar o EA encontra-se
a versão modificada do teste stroop clássico. O teste
stroop no contexto aditivo pode ser entendido como
uma variante do teste stroop emocional (Cox, Fadardi, &
Pothos, 2006). Durante a tarefa são apresentadas
palavras em diferentes cores. Tipicamente são
apresentadas duas categorias de palavras (relacionadas
com a substância de consumo e neutras) e essas duas
categorias são emparelhadas ao nível de variáveis como
o comprimento da palavra e o número de sílabas (Cox, et
al., 2006). Através deste paradigma demonstrou-se que
os indivíduos dependentes ou abstinentes (em
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tratamento) apresentam tempos de reação maiores
quando expostos a este tipo de estímulos emocionais
(Franken, Kroon, Wiers, & Jansen, 2000; Marissen et al.,
2006; Waters, Sayette, Franken, & Schwartz, 2005). No
entanto, existe um consenso sobre a necessidade de
avaliar o EA através de estímulos mais naturais (i.e., com
maior validade ecológica), como por exemplo através de
fotografias da parafernália ligada às substâncias do
consumo, ao invés do uso de estímulos como simples
palavras (Lubmand, et al., 2000). Deste modo, outro
método que tem sido utilizado neste domínio é a tarefa
Dot-Probe, introduzida por MacLeod e colaboradores
(1986). Nesta tarefa, um par de estímulos (e.g.,
fotografias, um estímulo relacionado com a substância
de consumo e um estímulo neutro) é apresentado num
monitor em simultâneo (lado a lado). Quando os
estímulos desaparecem, o local de um deles é
imediatamente substituído por uma seta, por exemplo.
Os participantes devem indicar o mais rapidamente
possível o lado em que a seta aparece. Os tempos de
reação são comparados e o EA para o estímulo
emocional verifica-se quando este apresenta uma
latência menor (Field, et al., 2009). A presença deste EA
para indivíduos consumidores e abstinentes de heroína
foi observada em vários estudos (e.g., Bearre, Sturt,
Bruce, & Jones, 2007; Lubmand, et al., 2000). Nos
procedimentos Dual-task, os participantes são expostos a
estímulos relacionados com um determinada substância
enquanto desempenham uma tarefa cognitiva (Field, et
al., 2009). Por exemplo, Sayette e Hufford (1994)
expuseram indivíduos fumadores a estímulos
relacionados com a substância ou face a estímulos
neutros e deram-lhes instruções para responder
rapidamente a estímulos auditivos apresentados em
simultâneo. Os participantes foram mais lentos a
responder quando eram apresentados os estímulos
emocionais relativamente aos neutros, o que pode
indicar que os estímulos emocionais foram o foco da
atenção nessa altura (Sayette & Hufford, 1994).
Adicionalmente, vários estudos com ERPs têm revelado
ondas lentas (tardias) e positivas (e.g., o P300) em
resposta a estímulos relacionados com substâncias,
comparativamente com estímulos neutros, tendo em
consideração grupos de consumidores, quando
comparados com sujeitos de controlo, o que sugere um
enviesamento atencional para estímulos emocionais nos
consumidores (e.g., Field, et al., 2009; Franken, Stam,
Hendriks, & Brink, 2003; Lubman, Allen, Peters, & Deakin,
2008). A latência do P300 tem sido relacionada com a
duração do processamento percetivo e a magnitude com
a intensidade do esforço de atenção envolvido em
tarefas visuais (Ila & Polich, 1999).
Objetivo
O EA envolve um sistema automático de alerta para os
indivíduos dependentes de substâncias relativamente a
estímulos relacionados com a(s) sua(s) droga(s) de
eleição (Tiffany, 1990). Este enviesamento atencional
pode prejudicar o desempenho em tarefas quotidianas e
ter uma variedade de consequências negativas (e.g., na
transição do uso ocasional de substâncias, à dependência
ou mesmo à recaída). Estudos recentes têm revelado que
o processamento de estímulos aversivos (e.g., cobras e
aranhas) está dependente da carga cognitiva envolvida
na tarefa (e.g., Öhman, Soares, Juth, Lindström, &
Esteves, 2012; Soares, 2010). De acordo com a teoria
“Perceptual Load Theory” (Lavie, 1995; Lavie, 2005), os
estímulos distratores presentes no ambiente podem ser
excluídos da perceção quando o nível da carga cognitiva
no processamento de estímulos relevantes para a tarefa
em que estão envolvidos os indivíduos é suficientemente
alto ao ponto de esgotar a capacidade percetiva,
deixando de haver capacidade disponível para processar
os estímulos distratores. No entanto, e de acordo com
esta teoria, nas situações de baixa carga cognitiva (BCC)
uma capacidade de reserva de recursos cognitivos vai
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possibilitar o processamento de distratores (Forster &
Lavie, 2008; Lavie, Hirst, de Fockert, & Viding, 2004).
Uma questão em aberto é se o EA para os estímulos
emocionalmente apetitivos (e.g., heroína) podem ser
ignorados em alta carga cognitiva (ACC) ou se, conforme
postula a Teoria de Lavie (e.g., 1995) estes estímulos são
processados apenas em BCC, o que será alvo de análise
no presente estudo. Desta forma, pretendemos avaliar o
papel da carga cognitiva no processamento atencional de
estímulos motivacionalmente apetitivos, como é o caso
das drogas (e.g., heroína) em indivíduos com registo de
dependência (grupo em tratamento e grupo de altas
terapêuticas). Com base no modelo Lavie (1995),
esperamos que nos grupos de consumidores,
comparativamente com indivíduos sem registo de
consumo de drogas, ocorra EA apenas na condição de
BCC, i.e., maior interferência com a tarefa de atenção
(tempos de resposta mais longos e maior taxa de erros)
quando surgem estímulos irrelevantes para a tarefa de
atenção (discriminação de letras) mas relacionados com
o consumo, comparativamente com estímulos neutros.
Método
Participantes
Este estudo foi realizado com uma amostra de 60
participantes (54 homens, 90%; e 6 mulheres, 10%), com
idades compreendidas entre os 18 e os 61 anos (M =
36.73 anos; SD = 8.94). Sendo assim, constituíram-se três
grupos: o grupo tratamento (GT) com 20 indivíduos em
tratamento (18 homens e 2 mulheres, M = 32,35 anos,
SD = 7,75), o grupo de altas terapêuticas (GAT),
constituído por 20 indivíduos abstinentes há pelo menos
cinco anos (18 homens e 2 mulheres, M = 41,55; SD =
5,08) e o grupo controlo (GC), constituído por 20
indivíduos que nunca foram consumidores/dependentes
de substâncias (18 homens e 2 mulheres, M = 36,30; SD =
10,83). O GT e o GAT foram recrutados em colaboração
com a Comunidade Terapêutica Projecto Homem (CTPH)
(todos da zona Norte de Portugal). Desta forma, trata-se
de uma amostra de conveniência, tendo os grupos sido
emparelhados em função da idade, nível de escolaridade
e sexo. Os critérios de inclusão para o GT foram: ter
idade igual ou superior a 18 anos; estar em tratamento
pelo menos há uma semana; entendimento suficiente da
língua Portuguesa; consumo de heroína
preferencialmente de forma intravenosa (IV) e ou
fumada; fornecimento de consentimento informado.
Para além disso, todos os indivíduos preencheram os
critérios de dependência de heroína (DSM-IV-TR, 2002),
conforme avaliação pela equipa da CTPH. Os critérios de
exclusão para o GT incluíam o facto de os participantes
apresentarem algum problema oftalmológico não
corrigido (por óculos ou lentes), apresentarem história,
sinais ou sintomas que fossem suspeita de existência de
Perturbação Esquizofrénica, ideação suicida ou doença
mental severa. Para os indivíduos do GAT os critérios de
inclusão foram: historial de dependência e de consumo
preferencialmente de forma IV e ou fumada de heroína;
abstinência há pelo menos cinco anos; ter idade igual ou
superior a 18 anos; entendimento suficiente da língua
Portuguesa; fornecimento de consentimento informado.
Os critérios de exclusão foram os mesmos do GT. Para o
GC os critérios de inclusão foram: ter idade igual ou
superior a 18 anos; entendimento suficiente da língua
Portuguesa e o fornecimento do consentimento
informado. Os critérios de exclusão foram os mesmos
que os aplicados aos grupos anteriores, adicionando
presença de historial de dependências de drogas. Foram
excluídos três participantes (um de cada grupo). No GT
um participante não completou a tarefa por questões de
saúde (tremores intensos), no GAT uma pessoa queixou-
se de cansaço visual e não possuía os seus óculos no
momento da realização da tarefa, e no GC o participante
foi excluído por ter sido interrompido enquanto se
encontrava a realizar a tarefa experimental.
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Desenho experimental
Este estudo é de natureza quantitativa e transversal
(Almeida & Freire, 2007), tendo sido aprovado pela
Comissão de Ética da Universidade de Aveiro. Este
estudo foi concebido como um desenho factorial misto
2x3x3, onde os fatores intra-sujeitos são a carga
cognitiva (alta ou baixa), e o tipo de imagem (emocional,
neutra ou sem imagem), e o fator inter-sujeitos é o tipo
de grupo em estudo (GT, GAT e GC). Como variáveis
dependentes foram definidas as taxas de acertos (TA) e
os tempos de resposta (TRs).
Materiais e apresentação de estímulos
Foram usadas diversas fotografias (14 imagens
emocionais) relacionadas com o consumo de heroína
(e.g., um homem não identificado a preparar e a injetar
heroína, colheres, sacos de heroína, seringas), assim
como um conjunto de fotografias de controlo (14
imagens neutras; e.g., peças de legos, cenas de uma
pessoa não identificada a construir um modelo de
comboio em lego, carris, etc.). Para os ensaios de treino,
foram apresentadas apenas imagens neutras alternativas
(e.g., uma bola, diversas frutas, uma caneca, um vaso
com uma flor). Todas as imagens foram as mesmas
usadas por Lubmand, et al., (2000). A programação da
tarefa foi desenvolvida através do software E-Prime 2.0
Professional (Schneider, Eschman, & Zuccolotto, 2002).
Todos os estímulos foram apresentados através de um
computador portátil ASUS-K42J, com um monitor de 14,0
polegadas. Os participantes foram sentados a uma
distância de 50 cm do monitor, o que implicou um ângulo
6º até ao centro de cada imagem. Os sujeitos foram
instruídos a desempenhar uma tarefa na qual foram
avaliadas as variáveis TRs e TA, respetivamente. Foi
realizada uma tarefa de escolha forçada em que foi
solicitado aos participantes que identificassem uma letra
alvo (X ou N) o mais rapidamente e preciso quanto
possível, pressionado essas mesmas teclas dependendo
da letra alvo presente no monitor (X ou N). Na condição
BCC, apresentada em 50% dos ensaios, aparecia no
monitor apenas uma letra (X ou o N), enquanto que na
condição ACC, apresentada nos restantes 50% dos
ensaios, surgiam seis estímulos no monitor, i.e., seis
letras dispostas em circulo à volta do ponto de fixação. A
posição da letra alvo foi aleatória entre as seis posições
possíveis em cada ensaio. Cada ensaio foi iniciado com a
apresentação de um ponto de fixação central (uma cruz)
sobre um fundo branco com a duração de 750 ms,
seguido de imediato pela exposição do(s) estímulo(s)
(letra ou conjunto de letras) que permanecia no monitor
por 500ms. De seguida era apresentado um fundo
branco por 700 ms (independentemente da resposta do
participante), surgindo novamente o ponto de fixação e
assim sucessivamente. Em cerca de 14% dos ensaios
surgia um estímulo distrator (i.e., irrelevante para a
tarefa e, como tal, que os participantes deveriam
ignorar). Os estímulos distratores constituíam as imagens
já enunciadas (emocionais e neutras) que foram
apresentadas no campo visual parafoveal, dispostas em
quatro possíveis posições (cima, baixo, direita,
esquerda). Estes estímulos distratores foram
apresentados em simultâneo com os estímulos alvo, i.e.,
a letra ou o conjunto de letras. A ordem de apresentação
das diferentes condições (carga cognitiva, presença ou
ausência de imagem distratora) e os estímulos (ausência
ou presença do tipo de imagem distratora, letra alvo e
letras não alvo) foram apresentadas aleatoriamente para
cada participante. No início da tarefa, os participantes
completaram 60 ensaios de prática (em 12 ensaios foram
apresentadas imagens neutras e nos restantes ensaios
não foram apresentadas imagens distratoras), com
imagens neutras alternativas à tarefa experimental (e.g.,
vaso com flor, caneca, maquina fotográfica, bola)
(Lubmand, et al., 2000) e foi disponibilizado um feedback
ao participante consoante o seu desempenho: “Bom
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trabalho, não respondeu ou precisa ser mais rápido”. De
seguida, foram apresentados 840 ensaios experimentais
(420 em AAC e 420 em BCC), 118 dos ensaios eram
acompanhados de imagens distratoras (14 emocionais e
14 neutras) e 722 ensaios não tinham qualquer distrator.
A tarefa experimental foi constituída por um total de 6
blocos de ensaios experimentais (140 ensaios/bloco),
intercalados com 5 pausas para descanso.
Instrumentos de Avaliação
Questionário Sociodemográfico
Este questionário integrou questões com vista à recolha
de dados sociodemográficos do participante, tais como o
sexo, a idade, a residência, o estado civil, a escolaridade
e a situação profissional para todos os grupos em estudo.
Numa segunda parte, a qual foi preenchida apenas pelos
grupos GT e GAT, foram recolhidos dados referentes aos
consumos, nomeadamente a idade de início dos
consumos, o tempo de consumo, os meses ou anos em
abstinência, a(s) substância(s) de dependência e/ou de
eleição, o número de tratamentos efetuados em
comunidades, assim como outros tratamentos efetuados
(e.g., casa).
The Severity of Dependence Scale (SDS)
Uma das escalas mais utilizadas para a medição do
construto (dependência) é a Severity of Dependence
Scale2 (SDS) (Gossop & Darke, 1995), e o seu objetivo é
medir os componentes psicológicos e comportamentais
da dependência. Consta de 5 itens que avaliam de forma
dimensional e situam os indivíduos num continuum
segundo o seu grau de severidade (Gossop & Darke,
1995). A escala é de autoresposta e é dada numa escala
ordinal de 4 posições. Cada item é pontuado numa escala
2 As seguintes escalas - SDS e DDQ foram submetidas a um processo de tradução e retroversão por indivíduos bilingues não familiarizados com os instrumentos, estando neste momento em processo de validação para a população Portuguesa (Soares, Martins & Rodrigues).
de zero a três pontos (0, nunca/quase nunca; 1, às vezes;
2, muitas vezes; 3, sempre/quase sempre) e (0, fácil; 1,
difícil; 2, muito difícil; 3, impossível) para a questão cinco.
A pontuação da SDS varia entre o mínimo (0) e o máximo
(15) pontos. A escala apresenta boas características
psicométricas (Gossop & Darke, 1995) e tem sido objeto
de vários estudos psicométricos levados a cabo em
diversas amostras de consumidores (Kay & Darke, 2002;
Lawrinson, Copeland, Gerber, & Gilmour, 2007; Martin,
Copeland, Gates, & Gilmour, 2006; Topp & Mattick,
1997). Incluímos este instrumento com o objetivo de
comparar o grau de severidade de dependência entre o
GT e o GAT.
The Desires for Drug Questionnaire (DDQ)
O DDQ é um questionário de autorresposta com 13
itens, útil para medir os aspetos dimensionais do craving
instantâneo (momento presente). Trata-se de uma escala
multi-item do tipo Likert que avalia diferentes dimensões
do craving presente (Franken, Hendriks, & van den Brink,
2002). O questionário é constituído por 13 itens, com
resposta em escala de Likert, em que o indivíduo assinala
uma das 7 possíveis (0=discordo fortemente a
6=concordo fortemente). As dimensões da DDQ são: (1)
Desejo e Intenção, (2) Reforço Negativo, e (3) Controlo.
Esta escala apresenta boas características psicométricas.
O primeiro factor inclui sete itens que refletem o desejo
e a intenção de consumir heroína (e.g., Neste momento
consideraria consumir heroína) (α=.81), o segundo
(α=.84) consiste em quatro itens que se referem ao alívio
de estados negativos (e.g., se consumisse heroína agora
sentir-me-ia menos tenso), o terceiro factor (α=.79)
refere-se a itens que retratam o controlo percebido
sobre o consumo de heroína (e.g., facilmente conseguiria
limitar a quantidade de heroína se consumisse agora)
(Franken, et al., 2002). Opámos pela inclusão deste
questionário porque demonstra boa uma fiabilidade e
validade dimensional. Paralelamente, também é indicado
23
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em estudos de reatividade a estímulos relacionados com
substâncias, onde o craving é avaliado antes a após a
exposição aos estímulos (e.g., neutros e emocionais).
Deste modo, o objetivo foi usar a média de cada
dimensão como índice da intensidade do craving antes e
após a tarefa atencional.
Procedimento
Os procedimentos neste estudo foram constituídos por
quatro fases:
Fase de Seleção
Primeiro contacto. Nesta fase, contactou-se
pessoalmente a direção da Comunidade Terapêutica
Projecto Homem (CTPH) para averiguar a possibilidade
de efetuar o estudo com a sua colaboração. Após
consentimento da CTPH, efetuaram-se duas reuniões:
uma com a equipa da fase de comunidade terapêutica e
outra com a equipa da fase de reinserção, tendo-se
elaborado os respetivos grupos (GT e GAT) para o
estudo. Caso os participantes cumprissem os critérios de
inclusão/exclusão e facultassem o seu consentimento
oral (presencial no GT e por contacto telefónico no GAT)
recebiam instruções sobre o objetivo geral do estudo.
Após a apresentação do objetivo geral aos participantes
(de que se tratava de um estudo que tinha por finalidade
estudar populações com historial de consumo de drogas,
heroína em especial), revelou-se que o estudo consistia
em duas fases: primariamente o preenchimento de um
conjunto de questionários que teria a duração de cerca
de 20 minutos (para os gupos GT e GAT) e de 10 minutos
(para o GC) e uma segunda fase que envolvia uma tarefa
de atenção, cujo objetivo era a discriminação de letras
apresentadas num monitor (destinada a todos os
grupos). Esta última tarefa, com a duração de 20
minutos, seria agendada num horário que fosse favorável
ao experimentador e ao participante. Não foram dadas
mais explicações sobre os objetivos do estudo,
remetendo-se a explicação detalhada para o final da
tarefa experimental. Pediu-se a todos os participantes
que guardassem sigilo sobre o conteúdo do estudo (para
evitar o efeito de contágio) aos outros participantes.
Todos os indivíduos participaram voluntariamente no
estudo. Os indivíduos que constituíram o GC não tinham
qualquer ligação à instituição CTPH e foram abordados
pessoalmente para participar neste trabalho.
Fase de Avaliação Subjetiva
Posteriormente ao contacto inicial, solicitou-se o
preenchimento das medidas de autorrelato aos
participantes. A bateria de instrumentos incluía
instruções básicas iniciais, e um formulário de
consentimento informado. A bateria de testes foi
apresentada pela seguinte ordem: O questionário
sociodemográfico e o SDS. Sempre que necessário, o
investigador clarificava dúvidas sobre o preenchimento
dos questionários. Uma vez finalizada esta tarefa, era
agendada uma data para a fase experimental. Os
participantes que tinham disponibilidade imediata,
realizavam de seguida a tarefa de atenção, situação que
evitámos ao máximo pelo cansaço associado,
acontecendo apenas pontualmente com participantes
dos grupos GAT e GC.
Fase experimental: Tarefa de atenção
Nesta fase, os participantes do GT deslocaram-se para
uma sala apropriada facultada pela CTPH. O
procedimento foi similar com os restantes grupos (salas
que tivessem o mínimo de interferência acústica, uma
temperatura amena e poucos estímulos sensoriais
envolventes). Pediu-se a todos os participantes que
desligassem o telemóvel antes de iniciar a tarefa.
Posteriormente, os participantes sentavam-se em frente
de uma secretária onde preenchiam o DDQ (momento-
24
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1). De seguida, explicou-se a tarefa em detalhe (“a sua
tarefa é pressionar a tecla X ou N mediante a letra alvo X
ou N, as letras alvo podem aparecer sozinhas ou
acompanhadas de outras letras, podem aparecer
imagens ou não, deve ignorar as imagens e concentrar-se
apenas nas letras N ou X ”). Os participantes não foram
informados acerca do conteúdo das imagens distratoras.
Nessa altura, esclareceram-se quaisquer dúvidas que
poderiam surgir e permitiu-se aos participantes um
intervalo de tempo para descanso antes de iniciarem a
tarefa experimental. Dava-se início à tarefa experimental
com uma fase de treino. Nesta fase o investigador
sentava-se ao lado do participante, onde pontualmente o
reforçava (e.g., “isso”!) quando acertava nas letras alvo
ou pressionava a tempo as teclas X ou N (algo que
também acontecia através de informação no monitor,
nos ensaios de treino, conforme previamente referido).
Quando terminava a tarefa de treino, os participantes
eram informados que o feedback informativo (“Bom
trabalho, não respondeu ou precisa ser mais rápido”) não
iria surgir durante a tarefa experimental propriamente
dita. Os participantes foram ainda informados de que
iriam dispor de cinco períodos de intervalo ao longo da
tarefa para descanso. Neste período, o investigador
ausentava-se da sala por forma a reduzir o efeito de
interferência do experimentador. Finalizada a tarefa
atencional, os participantes preenchiam a escala de
craving (DDQ momento-2) já referida previamente.
Entrevista pós-experimental (Debriefing)
Neste momento explicou-se aos participantes o porquê
de não terem sido revelados previamente os detalhes
acerca dos objetivos da investigação. Os participantes
permaneceram com o investigador durante algum tempo
de modo a esclarecer quais os objetivos do estudo,
esclarecer dúvidas e para que a sua atividade fisiológica e
eventual craving diminuísse, de modo a salvaguardar o
bem-estar dos participantes. Contudo, se estes se
mantivessem muito ativados, eram encaminhados à
equipa terapêutica que prestaria apoio com o intuito de
diminuir esta ativação, o que aconteceu com quatro
participantes.
Análise de Dados
As análises estatísticas foram realizadas de acordo com
as características das distribuições, as dimensões das
amostras e o tipo de variáveis. Para o efeito, usou-se o
software informático de análise estatística, o IBM SPSS
Statistics 19.
Resultados
Amostra
Participaram neste estudo 60 indivíduos (54 homens,
90% e 6 mulheres, 10%), com idades compreendidas
entre os 18 e os 61 anos (M = 36, 73 anos; SD = 8,94). No
que se refere ao distrito de residência, 80% dos
participantes residem na região norte e 20% da região
centro de Portugal. Mais especificamente, 34 (56%) dos
participantes são de Braga, 12 (20%) de Coimbra, 10
(16,7%) do Porto, 2 (3,3%) de Famalicão, 1 (1,7%) de
Bragança e 1 (1,7%) de Viana do Castelo. Quanto ao
estado civil, a maioria dos participantes era solteiro 28
(46,7%), 22 (36%) era casado ou vivia em união de fato, 9
(15%) era separado ou divorciado e um (1,7%) era viúvo.
No que diz respeito ao nível de escolaridade, a maioria
dos participantes possuía o ensino preparatório 27
(45%), 24 (40%) tinha o ensino secundário completo ou
técnico, 4 (6,7%) frequentava o ensino universitário, 3
(5,0%) possuía o ensino universitário completo, 1 (1,7%)
tinha habilitações ao nível do ensino primário e um
participante (1,7%) o ensino primário incompleto. No
que concerne à situação profissional, 30 (50%) dos
participantes encontrava-se empregado, 25 (41%)
desempregado, 3 (5%) estavam reformados e 2 (3,3%)
eram estudantes. A média de idade de início dos
25
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consumos dos participantes dos grupos GT e GAT era de
16,33 anos (SD = 4.68), com um tempo médio de
consumos de 14,39 anos (SD = 6.68). A média do tempo
de tratamento em meses foi de 15,41 (SD = 10.83) e a
média do tempo de abstinência em meses foi de 69,03
(SD = 77.73). Relativamente ao número de tratamentos
realizados em comunidades a média foi de 1,58 (SD =
0.90), sendo que 39 participantes assinalaram outros
tratamentos/desintoxicações (e.g., em casa), verificando-
se uma média de 4,82 (SD = 4.91). Quanto à substância
de dependência dos participantes, 40 (100%) eram
dependentes de heroína. Relativamente aos
policonsumos, 10 (25%) afirmaram consumir canábis, 18
(45%) cocaína, 17 (42%) Speedball, 5 (13%) ecstasy e 7
(18%) álcool. No que diz respeito ao modo do consumo
de heroína referido antes de iniciarem o tratamento, 8
(20%) injetavam e fumavam, 12 (30%) injetavam e 20
(50%) fumavam.
Cada grupo foi constituído por 18 homens e 2 mulheres.
Relativamente à idade, o grupo controlo (GC) apresenta
uma média de 32.32 (SD = 7.75) anos, o grupo de altas
terapêuticas (GAT) de 41.55 (SD =5.08) anos e o grupo
controlo (GC) de 36.30 (SD = 10.83). Desta forma, o GAT
apresentou uma média significativamente mais elevada
de idades. Quanto ao número de anos de escolaridade, o
GT apresenta uma média de 10,15 anos (SD = 2.54), o
GAT de 11.40 (SD = 2.09) e o GC de 10.70 anos (SD =
2.52). De seguida, por forma a compararmos algumas
médias de vários parâmetros, aplicamos o teste
estatístico t-student para amostras independentes. Os
grupos GT e GAT não diferem significativamente quanto
à idade de início dos consumos nem relativamente ao
tempo de consumo de substâncias (Tabela 1). No que diz
respeito ao tempo sem consumir (em meses) os grupos
diferem de forma significativa, sendo que o GAT, como
esperado, não consome há mais tempo que o GT. Em
relação ao tempo de tratamento em meses na CTPH
existe evidência estatística para afirmar que o GAT
esteve mais tempo em tratamento relativamente ao GT.
De facto, conforme referido pela equipa terapêutica, os
tempos de tratamento eram mais elevados no passado,
independentemente do GT ainda se encontrar em
tratamento. Quanto ao número de tratamentos (em
comunidades e outros), os grupos em causa não
apresentaram diferenças estatisticamente significativas,
apesar do GT apresentar números mais elevados. No que
concerne à média da pontuação da SDS existe evidência
estatística para afirmar que o GAT apresenta maiores
valores no índice de gravidade de dependência. Apesar
dos grupos GT e GAT terem historial de policonsumos,
eram apenas dependentes de heroína.
Tabela 1.
Características dos Grupos GT e GAT.
GT GAT
(N = 20) (N = 20)
Média (SD) Média (SD) T P
Idade de início de consumo
(anos)
15.60 (2.80) 17.05 (6.00) -.980 ns
Tempo de consumo (anos) 14.88 (7.98) 13.90 (5.24) .457 Ns
Tempo sem consumir (meses) 7.40 (5.09) 130.70 (66.20) -8.302 <.001
Tempo de tratamento (meses)
CTPH
7.18 (4.68) 23.65 (8.72) -7.446 <.001
NúmeroTratamentos em
comunidades
1.70 (1.03) 1.45 (0.76) .873 ns
Outros tratamentos (e.g., em
casa)
5.79 (4.87) 3.90 (4.89) 1.209 ns
SDS 10.15 (2.08) 11.70 (2.23) -2.273 <.05
26
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0
2
4
6
Desejo e Intenção Reforço Negativo Controlo
GT
GAT
Resultados referentes ao índice de craving (DDQ)
Para averiguarmos se existiam diferenças significativas
entre os grupos em relação ao craving presente, avaliado
pelas dimensões Desejo e Intenção, Reforço Negativo e
Controlo, a partir da Escala DDQ (momento-1), utilizámos
o teste t-student para amostras independentes, para os
dados avaliados antes da tarefa atencional.
A média de craving subjetivo para a dimensão “Desejo e
Intenção” foi superior no GT (M =.81; SD =.91),
comparativamente com o GAT (M=.04; SD =.91), sendo
esta diferença estatisticamente significativa [(t(58)=
3.1658, p< .01)]. No mesmo sentido, e em relação à
dimensão “Reforço Negativo”, a média do GT foi
igualmente superior (M = 1.93; SD = 1.51) à do GAT (M
=.53; SD = 1.40), sendo a diferença estatisticamente
significativa, [(t (38)=3.039, p<.01)]. Contudo, na
dimensão “Controlo” a média do GT foi inferior (M =
1.18; SD = 1.41) à do GAT (M =1.58;SD = 2.03) apesar das
diferenças não serem estatisticamente significativas, [(t
(38) = -.72, p= .47)] (ver Figura 1).
Figura 1. Média do Craving (DDQ) nas três dimensões antes da Tarefa de Atenção para os grupos GT e GAT.
Para verificarmos eventuais diferenças significativas após
a tarefa atencional entre os grupos relativamente ao
craving presente, avaliado pelas dimensões anteriormente
referidas da mesma escala (DDQ momento-2), efetuámos
o mesmo teste estatístico.
Os resultados após a tarefa atencional revelaram maiores
níveis de “Desejo e Intenção” no grupo GT (M= .69; SD =
.95), comparativamente com o grupo GAT (M=.00; SD =
.00), sendo as diferenças estatisticamente significativas,
[(t (38)= 3.24, p <.01)]. Os resultados foram congruentes
para a dimensão Reforço Negativo, relevando níveis
superiores para o grupo GT (M=1.56, SD= 1.56), [t(38)=
2.34, p<.05)]. Contudo, relativamente à dimensão
Controlo, o grupo GAT (M= 1.43; SD=2.34) revelou
resultados superiores face ao grupo GT (M=1.35;
SD=1.69), apesar da ausência de significância estatística,
[(t(38)= -.13, p=.90)] (ver Figura 2).
Figura 2. Média do Craving (DDQ) nas três dimensões após a Tarefa de Atenção para os grupos GT e GAT
27
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450
470
490
510
530
550
570
590
610
630
SemImagem TR
ImagemNeutra TR
ImagemEmocional
TR
TRs
(ms)
ACC
GT
GAT
GC
450470490510530550570590610630
SemImagem TR
ImagemNeutra TR
ImagemEmocional
TR
TRs
(ms)
BCC
GT
GAT
GC
Tempos de Resposta
Com o intuito de avaliar o papel da carga cognitiva no
processamento atencional de estímulos
motivacionalmente apetitivos (e.g., heroína) nos grupos
em estudos (GT, GAT e GC) foram calculados para cada
participante os tempos médios de resposta (TRs) e de
taxas de acerto (TA) em função da carga cognitiva (alta
ou baixa) e do tipo de distrator (emocional, neutro ou
sem imagem) posicionados no campo visual parafoveal,
tendo-se efetuado análises da variância mista (ANOVAS)
(ver Figura 3).
Os resultados revelaram um efeito principal da carga
cognitiva, verificando-se que os TRs diferiram consoante
a condição da carga cognitiva (ACC ou BCC), F(2,57) =
40.36, p<.001, com TRs mais elevados (i.e., maior
interferência na tarefa atencional) em ACC (M=577) e
menores em BCC (M=502), tal como esperado em função
da teoria de Lavie (e.g., 1995) (ver Figura 3.1). Contudo,
os resultados não revelaram qualquer interação deste
fator (carga cognitiva) com os restantes fatores, i.e., o
tipo de grupo e o tipo de estímulo, (p >.05). No entanto,
os resultados revelaram que os TRs eram diferenciados
em função do estímulo distrator apresentado, F(2,114) =
4.39, p<.05, verificando-se TRs menores relativamente às
condições sem imagem distratora (M=531),
comparativamente com as condições que em era
apresentado um estímulo neutro (M=546) ou um
estímulo emocional (M = 542), tendo os testes post-hoc
Tukey revelado diferenças estatisticamente significativas
entre a condição sem estímulo distrator e a condição
estímulo distrator neutro (ver Figura 3.2). Contudo, e ao
contrário do esperado, não se verificou qualquer
interação significativa entre os fatores tipo de estímulo e
os grupos. Por último, os resultados demonstraram que o
GAT (M = 567) apresentava uma média de TRs
significativamente mais elevada do que o GT (M = 535) e
o GC (M = 517), conforme relevado pelo efeito principal
significativo, F(1,57) = 3.44, p<.05 (ver Figura 3.3).
Figura 3. Médias de TRs em função da Alta Carga Cognitiva e Baixa Carga Cognitiva e do tipo de estímulo
distrator nos diferentes grupos (GT, GAT e GC)
Figura 3.1 Médias dos TRs em função da Carga Cognitiva (ACC e BCC)
480500520540560580600
ACC BCC
TRs
(ms)
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84%85%86%87%88%89%90%91%92%93%94%95%
SemImagem AC
ImagemNeutra AC
ImagemEmocional
AC
% A
cert
os
BCC
GT
GAT
GC72%73%74%75%76%77%78%79%80%81%82%
SemImagem
AC
ImagemNeutra AC
ImagemEmocional
AC
% A
cert
os
ACC
GT
GAT
GC
480
500
520
540
560
580
600
Sem Imagem Imagem Neutra Imagem Emocional
TRS
(ms)
Figura 3.2 Média dos TRs em função do tipo de estímulo distrator (sem distrator, com distrator neutro e com distrator
emocional).
Figura 3.3 Média dos TRs em função do tipo de grupo (GT, GAT e GC)
Taxas de Acertos
Os resultados referentes às taxas de acerto na tarefa
atencional, i.e., discriminar corretamente as letras
alvo (X ou N) foram, de um modo geral, consistentes
com os resultados dos TRs (ver Figura 4). Verificou-
se um efeito principal da carga cognitiva, que
demonstrou que os participantes tinham TA
superiores na condição BCC (M= 92%),
comparativamente com a condição ACC (M = 78%),
F(1,57) = 80,72, p<.001 (ver Figura 4.1). Contudo, e
tal como nos resultados relativos aos TRs, não se
verificou qualquer interação desta variável com os
fatores tipo de estímulo e tipo de grupo, ao contrário
do esperado. Adicionalmente, também não foi
verificado qualquer efeito principal com o tipo de
estímulo e com o tipo de grupo, contrariamente ao
que se verificou nos TRs.
Figura 4. Média de TA em função da Alta Carga Cognitiva e Baixa Carga Cognitiva tendo em conta os diferentes
tipo de estímulos nos diferentes grupos (GT, GAT e GC)
480
500
520
540
560
580
600
GT GAT GC
TRs
(ms)
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Figura 4.1 Percentagem da Taxa de Acertos em função da carga cognitiva (ACC e BCC)
Discussão e Conclusão
Os resultados do presente estudo não foram de forma
geral consistentes com a nossa hipótese. O objetivo
principal deste estudo foi averiguar pela primeira vez qual
o papel do EA no abuso de drogas em populações com
historial de dependência, tendo por base a teoria da carga
cognitiva proposta por Lavie (1995). Contudo, os
resultados não revelaram diferenças significativas no EA
em função do tipo de estímulo e do tipo de grupo, i.e., não
revelaram que os grupos GT e GAT apresentavam
maiores TRs e menores TA (maior interferência com a
tarefa de atenção) nas condições em que eram
apresentadas imagens distratoras relacionadas com o
consumo, comparativamente com as condições em que
eram apresentadas imagens neutras ou em que não eram
apresentadas quaisquer imagens distratoras. Mais
relevante para a nossa hipótese era o facto de este EA
ocorrer especificamente nas condições de BCC, conforme
prevê a teoria de Lavie (1995). Contudo, e ao contrário do
esperado, apenas obtivémos um efeito principal da carga
cognitiva, revelando maior interferência na tarefa de
atenção nas condições de AAC, um resultado que é
consistente com os estudos em que a carga cognitiva é
manipulada (e.g., Soares, 2012). Quanto aos TRs perante
o fator tipo de imagem (sem imagem, neutro e
emocional), apenas se verificaram diferenças
significativas relativamente às condições sem imagem
distratora, comparativamente com as condições em que
era apresentado um distrator neutro. Contudo, e de modo
surpreendente, verificaram-se TRs estatisticamente
significativos e mais elevados no GAT, sendo que os
grupos GT e GC não diferiram entre si. Relativamente ao
craving subjetivo avaliado pelas subescalas do DDQ,
verificaram-se índices menores após a tarefa de atenção.
Nesta perspetiva, o modelo de Franken (2003) é
congruente com os nossos resultados globais, pois sugere
que o craving subjetivo e o EA têm relações de ativação
mútuas, i.e., quando os estímulos relacionados com as
substâncias se tornam o foco da atenção, o craving
subjetivo aumenta e vice-versa (Franken, 2003).
Entretanto, a literatura reporta um estudo entre
consumidores de heroína que investigou os efeitos dos
estímulos relacionados com a heroína, comparativamente
com estímulos neutros em tempos diferentes de
abstinência (1, 3, 12 e 24 meses), no qual o craving
avaliado foi significativamente maior nos dois primeiros
tempos de abstinência, comparativamente aos últimos
dois (12 e 24 meses) (Wang et al., 2012), tal como
apontam os nossos resultados, pois o craving também é
menor no GAT.
A inclusão do grupo de altas terapêuticas com um mínimo
de cinco anos de abstinência teve como substrato de
sustentação um estudo longitudinal conduzido ao longo
de 33 anos com populações dependentes de heroína (242
sujeitos), o qual demostrou que pelo menos cinco anos de
abstinência reduzia substancialmente a probabilidade de
futuras recaídas. Contudo, um quarto dos participantes
recaiu após 15 anos de abstinência (Smyth, et al., 2007).
No entanto, estes resultados não foram ao encontro dos
registados por Vaillant (1996), que demostrou que a
recaída após cinco anos de abstinência entre
60%
80%
100%
ACC BCC
% T
A
30
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consumidores de álcool era muito rara (Vaillant, 1996), o
que sugere que a adição de heroína pode ser uma
condição para toda a vida, o que nos conduziu à
expetativa de que este grupo poderia, conjuntamente com
o grupo em tratamento, apresentar EA para os estímulos
relacionados com o consumo (Smyth, et al., 2007). De
facto, no nosso estudo não se verificou o EA para os
estímulos emocionais (heroína), e os resultados do
craving ao invés de aumentarem após a exposição, como
demonstram diversos estudos com diversos paradigmas
atencionais (e.g., Field & Cox, 2008; Field, Mogg, &
Bradley, 2004; Franken, et al., 2000; Lubmand, et al.,
2000), diminuíram. Esta diminuição, pode eventualmente
explicar parte dos resultados nulos obtidos no nosso
estudo.
A teoria da carga cognitiva propõe dois mecanismos de
atenção seletiva: o primeiro refere que os estímulos
distratores na condição de ACC são excluídos dos
mecanismos atencionais pela insuficiente capacidade de
processamento em tais condições, e o segundo diz
respeito um processo atencional de controlo mais ativo
que é necessário para rejeitar os estímulos distratores
mesmo quando estes são percecionados (na condição
BCC) (Lavie & Tsal, 1994). Desta forma, a atenção
seletiva pode ser dissociada através dos efeitos opostos
dos diferentes tipos de carga cognitiva que deverão
interferir com os estímulos distratores (Lavie, et al.,
2004). Assim, na condição de ACC era esperada uma
redução da interferência dos estímulos distratores, e na
condição de BCC era esperado um aumento da
interferência desses mesmos estímulos, o que não se
constatou. Contrariamente à maioria dos estudos
efetuados com este paradigma atencional, no nosso
estudo, e com este tipo de população em concreto, não
foram observadas diferenças estatisticamente
significativas no EA para estímulos relacionados com
substâncias (e.g., heroína) quando comparados os grupos
do estudo (GT, GAT e GC). Aliás, não se encontrou
qualquer interferência significativa dos estímulos
distratores (sem imagem, neutro ou emocionais), tendo
em conta a carga cognitiva (ACC ou BCC) quando
comparados os grupos em estudo, a não ser quanto aos
TRs, que foram maiores e estatisticamente significativos
para a condição sem imagem distratora,
comparativamente com as condições em que o estimulo
distrator era neutro ou emocional. Adicionalmente, não se
verificaram diferenças significativas entre os sujeitos do
grupo tratamento (i.e., o grupo como um todo), nem nos
restantes grupos, relativamente ao EA para estímulos
distratores em qualquer das condições. Torna-se, contudo,
pertinente assinalar que o GAT apresentou TRs mais
elevados e estatisticamente significativos. De facto, a
idade pode ter sido uma variável diferenciadora neste
domínio, pois a média de idades do GAT foi
significativamente mais elevada, e uma vez que os TRs
aumentam à medida que a idade vai avançando, conforme
tem sido demonstrado por muitos investigadores como
um fenómeno comum a todas as tarefas que envolvam
velocidade de movimentos, independentemente dos
estímulos sensoriais ou respostas motoras envolvidas,
nomeadamente face a estímulos visuais (Nebes, 1978).
Como este paradigma atencional nunca foi usado em
populações desta natureza, e correndo o risco de alguma
incongruência ao compararmos estes resultados a outros
realizados através de diferentes paradigmas atencionais,
teremos contudo de o fazer, pois que sendo um paradigma
objetivo deverá ser replicado em estudos futuros, e
portanto exposto a uma crítica racional, tal como os
demais.
A literatura demostra que os estímulos distratores
apresentados no ponto de fixação (fóvea) são mais difíceis
de ignorar do que os distratores na área parafoveal e
periférica da visão (Beck & Lavie, 2005). Os estímulos
apresentados na fóvea recebem uma representação visual
mais apurada (e.g., ativam mais células no córtex visual e
são percebidos com maior acuidade visual)
comparativamente com os estímulos localizados na
parafovea e no campo visual periférico (Beck & Lavie,
2005). Ao analisarmos a literatura sobre o EA nas
adições, encontramos resultados semelhantes aos do
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nosso resultados ainda que através do recurso a outros
paradigmas atencionais. Estes resultados foram
encontrados em estudos com populações abstinentes de
álcool, onde não se encontraram diferenças significativas
entre o grupo de controlo e o grupo de abstinentes,
quando expostos a estímulos emocionais (i.e. relacionados
com o álcool) com a duração de 500 ms (e.g., Field,
Moog, Mann, Bennett, & Bradley, 2012; Noël et al.,
2006; Townshend & Duka, 2007), mas não com outros
tempos de exposição, o que sugere que o EA pode estar
associado a tempos específicos de exposição. Assim, os
resultados sugerem que os indivíduos abstinentes (em fase
de tratamento) têm a capacidade para evitar os estímulos
emocionais (e.g., heroína), quando estes têm uma duração
de apresentação de 500 ms. Adicionalmente, um estudo
que investigou o EA numa população com distúrbios
alimentares demonstrou que os estímulos emocionais
(comida) eram evitados aos 500 ms. No entanto, aos 1500
ms não ficou demonstrado um processo atencional
diferenciado, comparativamente com os estímulos neutros
(Veenstra, de Jong, Koster, & Roefs, 2010). A literatura
tem demostrado que perante a exposição de estímulos
emocionais (e.g., álcool, alimentação) com a duração de
500 ms, é possível desviar a atenção (e.g., Field, et al.,
2012; Veenstra, et al., 2010). Assim, se for observado um
EA, este pode refletir uma atenção sustentada ao invés de
uma vigilância inicial (Field & Cox, 2008). Uma
característica dos participantes que pode ter contribuído
para os resultados do nosso estudo foi a duração do tempo
em abstinência. Por exemplo, alguns estudos
demonstraram o evitamento aos estímulos relacionados
com o álcool com tempos de apresentação de 500 ms em
tempos de abstinência de cerca de duas semanas ou mais,
mas não em participantes abstinentes há menos de duas
semanas (Noël, et al., 2006; Vollstädt-Klein, Loeber, von
der Goltz, Mann, & Kiefer, 2009). Deste modo, torna-se
plausível a possibilidade de que o evitamento cognitivo
dos estímulos emocionais se possa desenvolver
progressivamente consoante o aumento dos períodos de
abstinência e de tratamento, tal como sugerem Field, et al.
(2012). De facto, o tempo médio de abstinência dos
grupos do nosso estudo é muito superior a duas semanas.
Estudos longitudinais são necessários para clarificar esta
questão, que entretanto não se coloca pelo menos de
forma direta aos resultados do nosso estudo, pois não
foram verificadas diferenças no EA entre o GT (média de
abstinência de 7.40 meses) e o GAT (média de
abstinência de 130.70 meses). Contudo, é pertinente
referir que na CTPH o tratamento administrado privilegia
o evitamento dos estímulos (internos e externos)
relacionados com substâncias durante toda a fase de
tratamento. Desta forma, estes resultados podem indicar
que o treino do evitamento atencional desses estímulos
pode eventualmente ter resultados benéficos na
manutenção da abstinência, tal como sugerem (Field, et
al., 2012). Entretanto, por forma a avaliar a relevância
clínica do EA para estímulos relacionados com heroína,
um estudo teve como objetivo principal verificar se este
EA poderia ser reduzido ou eliminado através da terapia
de exposição aos estímulos emocionalmente apetitivos
(Marissen, 2005). Os resultados deste estudo longitudinal
de três meses com 109 participantes mostraram que a
exposição aos estímulos (com vista ao processo de
extinção da resposta) relacionados com a heroína (durante
9 sessões) não reduziu o EA, comparativamente a um
grupo controlo (Marissen, 2005). O efeito nulo da terapia
de exposição sugere que o EA atencional para estímulos
motivacionalmente apetitivos (e.g., heroína) associados ao
“wanting”, é mais difícil de extinguir através de
tratamentos comportamentais do que o EA associados ao
“avoiding”. Por exemplo, o EA relacionado com
estímulos ansiogénicos pode ser reduzido ou eliminado
através da terapia cognitivo-comportamental pelo uso de
técnicas de exposição (e.g., Lavy, van den Hout, & Arntz,
1993; Mathews, Mogg, Kentish, & Eysenck, 1995; Watts,
McKenna, Sharrock, & Trezise, 1986). Paralelamente,
podemos sugerir que as cognições associadas ao avoiding
são facilmente auto-desmistificadas após as técnicas de
exposição, “ não evitei a aranha, deixei-a caminhar na
minha mão e continuo vivo”, enquanto que as cognições
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que acompanham os estímulos emocionalmente apetitivos
(e.g., heroína) continuam racionais após a técnica de
exposição, “ posso não consumir heroína, mas se
consumisse sentir-me-ia muito bem” (Marissen, 2005).
Adicionalmente, a teoria da incentivo-sensitização
(Robinson & Berridge, 1993) pode fornecer algumas
explicações para o porquê das terapias baseadas na
extinção não serem eficazes ou até provocarem prejuízos
(isto porque houve uma taxa mais elevada de desistência
dos participantes que fizeram parte deste processo no
estudo referido) (Marissen, 2005). Os autores da teoria da
incentivo-sensibilização afirmam que através dos
consumos repetidos, ocorrem neuroadaptações cerebrais,
o que pode tornar os adictos hipersensíveis às drogas ou
aos estímulos associados. Deste modo, pode ser que
através do processo de extinção as neuroadaptações em
camadas superficiais do cérebro responsáveis pela
sensibilização sejam extintas. Por sua vez, supõe-se que
as neuroadaptações atuais mais profundas sejam
resistentes à extinção e por isso persistam (Robinson &
Berridge, 1993).
No presente estudo, os estímulos foram apresentados com
uma duração de 500 ms e, por isso, disponíveis
conscientemente (i.e., estímulos supraliminares),
permitindo uma potencial oportunidade para a aplicação
de processos mentais estratégicos de evitação,
influenciando assim a atenção visual. Em conformidade,
podemos sugerir que o evitamento perante os estímulos
emocionais pode ter surgido como uma forma de
prevenção do craving para estímulos “proibidos”, tal
como sugerem Veenstra, et al., (2010). Deste modo, os
resultados nulos do nosso estudo podem eventualmente
ser consistentes com a teoria do processamento
automático de Tiffany (1990), ou seja, pela interrupção
dos esquemas habituais de ação aprendidos, que poderão
ter sido contrariados pelo evitamento cognitivo
(demostrando ausência do EA), derivados da terapia
ministrada na CTPH que privilegia de certa forma o
evitamento perante os estímulos associados ao consumo
durante o tratamento, como referido anteriormente.
Podemos ainda argumentar que a disparidade relativa ao
tamanho e características físicas dos estímulos usados, tal
como as cores policromáticas dos estímulos distratores vs
cores monocromáticas para os estímulos alvo, a distância
entre os estímulos, os tempos de exposição e,
essencialmente, a perceção resultante da pressão que a
tarefa impunha aos participantes (pois tinham a perceção
de um tempo limite de resposta, 500ms), possam ter
interagido para os resultados nulos do nosso estudo.
Tendo em conta uma limitação deste estudo (ausência do
grupo de consumidores), uma questão interessante para
futuras investigações seria analisar se a inclusão de um
grupo de consumidores para comparação conduziria a
resultados diferentes, assim como averiguar se a
manipulação dos estímulos distratores e dos estímulos
alvo, isto é, se se apresentassem os estímulos distratores
no ponto de fixação (fóvea) e se colocássemos os
estímulos alvo na parafovea (e.g., 50% dos ensaios em
cada condição, sem a pressão do tempo de resposta antes
de se passar para o ensaio seguinte), os resultados seriam
os mesmos ou se seriam diferentes.
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Original Article
Estudo de Caso Controlo: 68 sujeitos Emparelhados, Reclusos a cumprir Pena por ter
cometido Crime Passional com Normativos
Celina Ribeiro (1) & Luis Maia (2)
(1) Clinical Psychologist; MSc in Psychology (Beira Interior University). All correspondence about this article should be sent to email: [email protected]
(2) Beira Interior University PhD in Neuropsychology by Salamanca University – Professor at Beira Interior University.
_________________________________________________________________________________
Abstract
The present investigation focus is on the theme of crimes of passion, the act of committing a crime of passion, which finds its relevance in the fact that
it’s a crime often practiced in Portuguese society and finds their characteristics and particularities unexplored. In this sense, the objective of this study
is to assess the guilt, impulsivity and personality characteristics in inmates who are serving sentences for committing some kind of crime of passion, in
five prisons in the country. In addition to having explored the variables of the sample of prisoners was still held a pairing of inmates, who committed
this type of crime, with individuals within the normative population, by gender, age and education. We proceeded to further comparison of the sample
of passion offenders with a broader sample of normative subjects. In carrying out the study, we managed to gather up a global sample of 124 subjects,
all males, 34 individuals who had committed a crime of passion, with a mean age of 46.56 years (SD = 10.5) and 90 subjects of the normative
population, with an average of 42.57 years (SD = 10.82). We administered a sociodemographic questionnaire, the Multidimensional Scale of Guilt,
Barratt’s Impulsiveness Scale and the Mini-Mult (shortened version of the Minnesota Multiphasic Personality Inventory). In overall, it was found that
subjects who were convicted for having committed a crime of passion have high levels of guilt, which was not observed in subjects of the normative
sample. Inmates have low impulsivity, and no statistically significant differences in relation to the normative sample. Regarding personality, passion
criminals have higher levels of depression, psychasthenia, paranoia, schizophrenia and high anxiety, and there are marked differences in relation to the
normative sample, in respect to the deviation range of psychopathic, both samples have high score. This study draws attention to the need to intervene
at a psychological level in prison context, specifically in the subjects who commit crimes of passion.
Key-words: Crime of passion, inmates, guilt, impulsivity, personality.
Resumo
A presente investigação incide na temática do crime passional, ato de cometer um crime por paixão, que encontra a sua relevância no
facto de ser um crime frequentemente praticado na sociedade portuguesa e que encontra as suas características e particularidades
pouco exploradas. Neste sentido, o objetivo deste estudo será o de avaliar a culpa, impulsividade e características de personalidade em
reclusos que se encontram a cumprir pena por terem cometido algum tipo de crime passional em cinco estabelecimentos prisionais do
pais, desta forma, para além de se terem explorado as variáveis da amostra de reclusos foi ainda realizado um emparelhamento dos
reclusos que cometeram o tipo de crime em questão com indivíduos da população normativa, por género, idade e escolaridade.
Procedeu-se ainda à comparação da amostra dos criminosos passionais com uma amostra mais alargada de sujeitos normativos. Para a
concretização do estudo, conseguiu recolher-se uma amostra global de 124 sujeitos, todos do género masculino, 34 sujeitos que tinham
cometido crime passional, com uma média de idades de 46,56 anos (DP =10,5) e 90 sujeitos da população normativa, com uma média de
42,57 anos (DP=10,82). Aos sujeitos foram aplicados um questionário sociodemográfico, a Escala Multidimensional da Culpa, Escala de
Impulsividade de Barratt e o Mini-Mult (versão reduzida do Minnesota Multiphasic Personality Inventory). De forma muito genérica,
verificou-se que os sujeitos que cumprem pena por terem cometido crime passional apresentam níveis elevados de culpa, que não se
verifica nos sujeitos da amostra normativa. Os reclusos apresentam impulsividade baixa, não existindo diferenças estatisticamente
significativas em relação à amostra normativa. Em relação à personalidade, os criminosos passionais apresentam maiores níveis de
depressão, psicastenia, paranoia, esquizofrenia e ansiedade elevada, havendo diferenças marcadas em relação à amostra normativa, em
relação à escala de desvio psicopático, ambas as amostras pontuam de forma elevada. Este estudo chama a atenção para a necessidade
de intervir a nível psicológico no contexto prisional, especificamente nos sujeitos que cometem crime passional.
Palavras-chave: Crime passional, reclusos, culpa, impulsividade, personalidade.
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Resumen: Esta investigación se centra en el tema del crimen pasional, el acto de cometer un crimen de pasión, que encuentra su relevancia en eso ser
un crimen a practicada menudo en la sociedad portuguesa y encontrar sus características y circunstancias aún poco explorada. En este sentido, el
objetivo de este estudio es evaluar la culpabilidad, impulsividad y características de la personalidad en los internos que están cumpliendo pena por
haber cometido algún crimen pasional, encarcelados en cinco prisiones del país, de esta manera, además de haber explorado las variables de la
muestra de prisioneros aún se realizó un emparejamiento (por género, edad y escolaridad) de criminosos con sujetos de la población normativa. Se
realizó la comparación de la muestra de los criminosos pasionales con una amplia muestra de sujetos normativos. Para la realización del estudio, hemos
logrado recolectar una muestra de 124 sujetos, todos varones, 34 sujetos que habían cometido el crimen de pasión, con una edad media de 46,56 años
(SD = 10,5) y 90 sujetos de la población normativa, con un promedio de 42,57 años (SD = 10,82). A los sujetos se aplicaron un cuestionario socio-
demográfico, la escala Multidimensional de la culpabilidad, la impulsividad de Barratt y Mini-Mult (personalidad). De forma genérica, se verificó que los
sujetos que cumplían pena por haber cometido graves delitos pasionales, presentaron también niveles más elevados de culpa, que no es el caso en el
tema de la muestra normativa. En lo que toca a la impulsividad no se verificaron diferencias estadísticamente significativas en relación con la muestra
normativa. En relación con la personalidad, criminosos pasionales tienen niveles más altos de depresión, psicastenia, esquizofrenia y paranoia, alta
ansiedad, con marcadas diferencias en relación con la muestra normativa; en relación con la escala de desviación psicopática, ambas muestras
resultados superiores de la Moda estadística esperada. Este estudio llama la atención sobre la necesidad de intervenir a nivel psicológico en el contexto
de las prisiones, específicamente en los sujetos que cometen un crimen pasional.
Palabras clave: Crimen pasional, prisioneros, culpabilidad, impulsividad, personalidad.
_________________________________________________________________________________
Introdução
O crime passional apresenta-se como um assunto de
considerável relevância, tendo em conta a sua frequência
na nossa sociedade, trata-se de um fenômeno que
sempre existiu e sempre existirá em qualquer cultura, em
qualquer sociedade e em qualquer época da história da
humanidade. A literatura evoca frequentemente a ideia
de que qualquer pessoa poderá ser afetada por este
crime, como vítima ou como sendo o próprio criminosos,
uma vez que este se refere essencialmente a um ato que
pode ser cometido no “calor” do momento, aquando de
um momento de grande excitação emocional. Parece,
neste sentido, pertinente avaliar a impulsividade dos
reclusos de diversos estabelecimentos prisionais do país,
a cumprir pena por ter cometido um crime passional, de
modo a verificar se este tipo de crime será de facto
cometido dependendo das circunstâncias.
O termo “crime passional” dá entender que este tipo de
crime tem na sua base a paixão, remetendo para esta
como sendo o principal indicador, no entanto, conceber
este tipo de crime reduzindo-o ao contexto da paixão,
será bastante rudimentar (Mazzuchell & Ferreira, 2007).
Quando se pensa na agressão passional normalmente
pensa-se que esta será estritamente direcionada contra a
pessoa que se ama, quando o relacionamento está em
fase de rompimento ou quando este já chegou ao fim,
todavia, este tipo de crime não se cinge apenas àquele
que é objeto da paixão, pois pode dirige-se aos seus
rivais, como companheiros ou companheiras da ou do
ex-companheiro, mulheres com que o companheiro
mantem um caso extraconjugal, ou pode mesmo
estender-se aos próprios filhos, ou a outras pessoas mais
próximas (Santiago & Coelho, 2010).
A literatura aponta para o facto de que existem outos
fatores, além da paixão, que estão implicados nos atos
criminosos passionais, considerando esta ser uma
problemática complexa. O ciúme é das variáveis que
mais interferem neste tipo de crime, bem como outras,
nomeadamente o sentimento de posse, humilhação,
desonra, ódio, inveja (Santiago & Coelho, 2010).
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Fundamentação Teórica - O criminoso passional
Concetualização do crime passional
A Expressão “crime passional” provém da palavra passio
(paixão), e juridicamente remete para o ato que se
comete por paixão, este acontece aquando de uma
irreflexão por parte do indivíduo. Esta paixão advém dos
ciúmes, da possessão e geralmente da incapacidade de
aceitar o término de um relacionamento amoroso
(Ribeiro, 2008).
A paixão pode ser definida como uma emoção
prolongada, crónica e enraizada ao psiquismo do ser
humano, que poderá levá-lo a matar, ocorrendo o
homicídio passional. O termo “passional “ refere-se a
qualquer facto que se produz no indivíduo a partir de
uma emoção intensa e prolongada. Deste modo, pode
derivar do amor, ódio, ira, ou até da própria mágoa e
reflete toda a emoção capaz, pela sua intensidade e
persistência, de desenvolver alterações na reflexão da
pessoa, exaltando-o e podendo levá-lo à violência (Alves,
1999). A conceção do conceito de “paixão” pode ser
explorada de acordo com ideias histórico-filosóficas,
Aristóteles concebe a paixão como sendo intrínseca ao
ser humano, o homem não escolhe as suas paixões e por
isso não é responsável por elas, no entanto é responsável
pela influência que estas têm nas suas ações, podendo se
julgar a ética do indivíduo por aí e neste sentido não
concorda que um comportamento passional é
involuntário. Para o autor o homem deve ser capaz de
equilibrar a paixão com o logos, ou seja o conhecimento
e a razão, pois acredita que é suscetível de ser educada.
Por outro lado, o estoicismo é uma corrente filosófica
que não concorda com a possibilidade de se poder usar a
paixão em benefício do logos, pelo contrário, defende
que esta é um obstáculo à razão e que o apaixonado é
irresponsável pelo que faz. Em suma, para Aristóteles
pode tirar-se proveito da paixão, podendo retirar algo
positivo desta e defende que o adulto deve ser
responsabilizado pelas suas paixões e pelos seus maus
atos enquanto o estoicismo a considera como uma
doença, algo patológico, devendo ser destruída, sendo
que a culpabilidade do sujeito fica reduzida aquando de
um crime passional. Atualmente a linha que separa o
passional do patológico tem-se mostrado cada vez mais
estreita, entendendo cada vez mais a paixão não como
algo que faz parte do indivíduo e que ele controla, mas
como algo perturbador e que foge ao controlo do
indivíduo (Ceccarelli, 2003).
Atualmente entende-se por paixão um sentimento forte,
absorvido de uma emoção violenta e até colérica, uma
dependência do outro, necessidade de ter a pessoa
pretendida sempre sob controlo e por perto, de modo a
vigiar os seus passos. A possessividade e a dominação
são características predominantes nos homicidas
passionais (Pena, 2007).
A violência passional pode ocorrer contra a mulher
amada, quando o relacionamento está em fase de
rompimento ou quando já terminou, pode dirige-se aos
seus rivais, como companheiros da ex-companheira,
pode estender-se aos filhos, ou mesmo a outras pessoas
mais próximas (Santiago & Coelho, 2010). Segundo
Lagache (1986), tendencialmente, no crime passional em
casais heterossexuais a mulher é, na maioria das vezes, a
vítima. Por outro lado, quando é a mulher que comete o
crime, em geral o alvo prioritário do ataque é a rival, e
não o marido ou o companheiro que cometeu adultério.
Neste sentido, existe um emparelhamento entre a
atuação criminal de homens e mulheres, pois ambos,
preferencialmente, atacariam um terceiro do sexo
feminino, seja esta a amada infiel ou a rival da mulher
traída. Esta ideia faz supor que a mulher representa com
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mais intensidade o objeto a ser eliminado (Arreguy,
2012).
A expressão de “crime passional” pressupõe que as
circunstâncias que envolvem o crime em questão são a
expressão de uma paixão ou de um amor, sendo que
esse ato criminoso é cometido pelos mais diversos
motivos, nomeadamente pela impossibilidade da
realização e da continuidade desse amor, essencialmente
do ponto de vista da pessoa que comete o crime. O
termo “crime passional” dá entender que a paixão
permanece como indicador principal, levando a que
outras variáveis passíveis de estar relacionadas com o
gesto (violência conjugal, psicopatologia, etc.) percam o
seu valor. Ao colocar de parte as outras explicações
possíveis para o crime (psicológicas, criminais, etc.) e ao
reduzir o crime ao contexto da paixão, este crime é
percecionado como um ato que é passível de ser
cometido por qualquer pessoa, desde que seja
transcendido pela paixão, como se qualquer indivíduo,
numa situação idêntica de exacerbação emocional pela
força passional irresistível e comum a todos, pudesse
efetivamente cometer o mesmo tipo de comportamento.
Todavia, as investigações realizadas na área são
concordantes ao afirmarem que existem outos fatores,
além da paixão, que estão implicados e influenciam os
crimes passionais, considerando esta ser uma
problemática complexa. A referência ao crime passional
faz-se essencialmente nos casos em que o ciúme é
considerado como estando na base principal do crime
(Borges, 2011).
A violência doméstica também pode ser enquadrada no
tipo de crime passional, caracterizando-o tipicamente,
quando se verificar que a agressão cometida se enquadra
num âmbito passional (Santiago & Coelho, 2010), pois o
crime passional engloba as agressões físicas e morais que
são cometidas em nome do sentimento ‘paixão’, contra
pessoas com quem se possui ou com quem já se tenha
possuído um vínculo afetivo ou sexual, e a que se dá
também o nome de violência doméstica (Pena, 2007).
Este tipo de violência ocorre no âmbito familiar ou
doméstico, entre quaisquer dos membros da família e
abrange diversas formas de violência que podem ocorrer
nesse espaço (Silva, Coelho & Caponi, 2007). A violência
doméstica pode ser definida como sendo qualquer ação
não acidental, por parte de um membro da família, que
provoca prejuízo físico, psicológico ou outros, a outro
membro da família, sendo que a violência pode
estabelecer-se entre o homem ou mulher e
companheiro, entre pais e filhos, pais e avós, ou entre
irmãos (Verde & Cortés, 2007).
Controvérsia na caracterização do criminoso passional
No que se refere à caracterização do criminoso passional,
a literatura não apresenta consensualidade, pelo
contrário, se por um lado estes indivíduos são vistos
como pessoas “normais”, que cometem o crime
totalmente sob influência da situação, por outro, são
várias vezes descritos com características específicas.
Após uma vasta análise da literatura, verifica-se que o
criminoso passional é frequentemente
desresponsabilizado pelo próprio crime, acredita-se que
o indivíduo é provocado pelas palavras ou ações de outra
pessoa, que acabam por fazer com que o infrator
prejudique a vítima. Neste sentido, perceciona-se que
aquele que comete um crime desta natureza não tem
necessariamente um mau caráter, pois acredita-se que
qualquer pessoa, na mesma situação, poderia acabar por
ter atitudes semelhantes, o que pode, de certo modo,
tornar este crime num ato compreensível, de acordo com
as circunstâncias (Calder, 2003). Neste sentido, a
literatura aponta que não raras vezes, a nível jurídico,
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este tipo de crime é percecionado como sendo menos
grave, e por existir a ideia de que um crime passional
qualquer um pode cometê-lo, acabando assim por não
ser um crime condenado com rigor. Neste sentido,
advém a ideia de que a paixão pode privar o indivíduo
dos seus sentido ou consciência a um ponto que pode
levar qualquer pessoa a cometer um crime passional
(Blay, 2003), sendo que este ato deveria ser
percecionado como um deslise transitório (Cançado,
2002). Há poucas dezenas de anos atrás, a sociedade
admitia que o homem castigasse fisicamente a mulher, o
que tinha também repercussões a nível da justiça,
revelando uma certa tolerância relativamente a este tipo
de crime, sendo que estes factos e costumes passados
podem ter influência no criminoso passional dos tempos
atuais, que perceciona uma atitude de aceitação social
aquando de perder o controlo e violentar a mulher, isto
quando se fala no criminoso passional do sexo masculino
(Silva, 1991). Ainda na sociedade atual, os homens
traídos são qualificados de forma pejorativa, que é
produto de uma sociedade patriarcal e machista. Tudo
isto contribui para o descontrolo emocional, perda da
autoestima e imaturidade dos indivíduos face a uma
sensação de derrota, quando se sentem abandonados ou
rejeitados (Pena, 2007). A cultura machista, ainda
vigente em muitos estratos sociais, contribui, ainda que
menos que nos anos passados, para justificar o ato de
matar em nome do amor (Santiago & Coelho, 2010).
Por outro lado, o criminoso passional é caracterizado
como sendo possuidor de sentimentos exagerados,
anormais, capazes de se prejudicarem a si próprios e aos
outros, reagem de maneira brusca às emoções, são
ansiosos, sensíveis e emotivos. Segundo Júnior (2004),
depois do crime ser cometido o indivíduo não apresenta
preocupação com a opinião alheia, preocupa-se
principalmente com a sua honra e sentimento pessoal
(Ribeiro, 2008). Possuem uma personalidade vaidosa,
ciumenta, possessiva e insegura, são sobretudo
possessivos, o que os impede de conseguir viver sem
aquilo que realmente querem. Neste sentido, acredita-se
que o crime é motivado essencialmente por posse e não
tanto por ciúme ou amor e que por vezes pode ser
premeditado, deixando de certa forma de lado a
impulsividade do momento como impulsionadora
(Santiago & Coelho, 2010).
Outros autores definem o criminoso passional como
alguém que se toma a si mesmo como objeto de amor,
amando-se por meio do outro (Kaufmann, 1996, cit. in
Santiago & Coelho, 2010). Ou seja, é um narcisista que
elege a si próprio, em preferência a outros (Eluf, 2003,
cit. in Santiago & Coelho, 2010), este não possui
autocrítica e quer ser admirado, mesmo que seja por
qualidades que não possui (Santiago & Coelho, 2010).
Quando é rejeitado, sente-se desprezado, frustrado, num
quadro de profundo sofrimento, acabando por cometer
atos criminosos que envolvem violência psicológica,
lesão corporal, homicídio efetivo ou homicídio na forma
tentada. Estes criminosos têm uma grande necessidade
de autoafirmação, querem mostrar o poder do
relacionamento muitas vezes através do sofrimento que
provocam ao outro (Ribeiro, 2008).
Tendencialmente, são atribuídos aos criminosos
passionais, como causa do crime: o amor, o estado de
grande excitação emoção e a defesa da honra,
esquecendo que muitas vezes existem distúrbios
psicológicos, como perturbações da personalidade, que
podem estar na base do crime. Os indivíduos que
cometem um crime passional podem ser bastante
diferentes, a nível psicopatológico (Sousa, 2004).
Segundo Ferri (1996), o criminoso passional é aquele que
comete o crime motivado por uma paixão social, movido
também pela impulsividade e afetividade. A literatura
refere que se verifica que a nível do crime passional, os
indivíduos após cometerem o crime geralmente sentem
remorso/culpa, ficam bastante perturbados perante os
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atos que cometeram, acabando, muitas vezes, por
cometerem suicídio. Devido à grande carga emocional,
tendencialmente não se lembram dos detalhes do crime
(Habermann, 2010).
Este tipo de crime parece estar mais relacionado com
alguma “normalidade” e não com a marginalidade ou
traços de psicopatia, esta ideia é reforçada pelo fato de
que os indicadores tradicionais de homicídio
(desorganização social, pobreza, etc.) serem geralmente
irrelevantes para este tipo particular de homicídio, bem
como para a violência doméstica (Mercader, 2004).
Em suma, pode dizer-se que não existe um conjunto de
características físicas ou psicológicas que definam um
criminoso passional, cada um possui características
idiossincráticas e impercetíveis que, normalmente, só
depois de ocorrerem determinados acontecimentos ou
situações é que acabam por ser exteriorizadas (Ribeiro,
2008). Tendo em conta que o conceito “passional” está
associado à expressão de um transbordamento
“amoroso”, parece que as diferentes conceções do crime
“dito passional” dão a entender que a expressão não faz
jus à complexidade da problemática estudada (Borges,
2011).
Estudo Empírico
Apresentação do estudo
A presente investigação tem como principal objetivo
avaliar a impulsividade, a culpa a um nível
multidimensional e características de personalidade em
indivíduos do sexo masculino, que estejam a cumprir
pena, por terem cometido crime passional, em alguns
estabelecimentos prisionais do país, emparelhando-os
com sujeitos normativos com características
semelhantes, especificamente em relação à idade,
escolaridade e género.
O presente estudo classifica-se como sendo um estudo
comparativo, descritivo, correlacional, exploratório e
transversal. A presente investigação dispensa do
levantamento de hipóteses, uma vez que se caracteriza
como um estudo exploratório, todavia foram
desenvolvidas, com base nos objetivos do estudo,
algumas questões principais de investigação, são elas: a)
Terão os sujeitos que cometeram crime passional
maiores níveis de culpa, relativamente à amostra
normativa?; b) Que tipo de culpa será mais exacerbada
nos participantes que cometeram crime passional?; c)
Terão os sujeitos que cometeram crime passional
maiores níveis de impulsividade, relativamente à
amostra normativa?; d) Quais as características
personalísticas mais marcadas nos participantes que
cometeram crime passional?; e) Terão os sujeitos que
cometeram crime passional maiores níveis de psicopatia,
em relação à amostra normativa?.
Metodologia
Caracterização da amostra
A amostra de reclusos contempla 34 sujeitos e foi
recolhida em cinco estabelecimentos prisionais, da
Covilhã, Lisboa, Carregueira, Guarda e Castelo Branco. A
amostra referente à população normativa, também
contempla 34 sujeitos, foi recolhida presencialmente e
em alguns casos via internet, para maior comodidade,
Ambas as amostras foram recolhidas tendo em conta
uma amostragem por conveniência.
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Os 34 homens que constituem a amostra criminosa
apresentam uma média de idades de 46,56 anos, que se
encontra entre os 28 e os 68 anos. Relativamente ao
estado civil, uma grande percentagem da amostra é
divorciada, o que corresponde a uma totalidade de 16
indivíduos (47,1%). Quanto à escolaridade da amostra, os
reclusos apresentam instrução escolar da primeira classe
até à licenciatura, sendo que a nível geral apresentam
uma escolaridade relativamente baixa, a moda é a quarta
classe. No que concerne à profissão da amostra de
reclusos, constata-se que apesar da grande variabilidade
de atividades profissionais referidas, houve uma especial
prevalência de duas profissões, nomeadamente a
construção civil e a operação de máquinas (que
conjuntamente representam 35,2% da amostra).
Relativamente à natureza do crime, a presente amostra é
constituída por 15 indivíduos que cometeram homicídio
relacionado com crime passional, 15 que estão a
condenados por violência doméstica /agressão e cinco
que cometeram homicídio na forma tentada. Em relação
à vítima, 20 reclusos referem ter sido a esposa (58,8%),
em nove dos casos a vítima foi a companheira/namorada
(26,5%), apenas dois indivíduos cometeram o crime
contra a sua parceira de relacionamento extramarital e
dois contra o companheiro ou marido da mulher com
quem mantinham um caso extraconjugal (5,9%
respetivamente) e um indivíduo diz que foi a família,
englobando os filhos (2,9%).
Quanto aos motivos referidos pelos reclusos, verificou-se
que as razões apresentadas foram sobretudo o ciúme, o
medo ou o facto de não quererem a separação e o facto
de suspeitarem de adultério por parte da companheira.
Os filhos parecem estar frequentemente na base deste
tipo de crime. Outros motivos foram apresentados,
normalmente em conjunto com os suprarreferidos,
especificamente, a desconfiança em relação às
companheiras, o dinheiro, a discórdia em diversos
assuntos e o abuso de álcool. Outras razões foram
apontadas com menos frequência, como o facto da mãe
da companheira interferir na relação, agir por legítima
defesa, querem a separação mas a companheira não
aceita, o roubo de droga e o controlo exercido pela
companheira.
Em relação ao local do crime, na grande maioria este foi
praticado em casa, em 25 casos (73,5%), e os restantes
nove foram na rua (26,5%).
Instrumentos
Para a concretização dos objetivos da presente
investigação, recorreu-se a um questionário
sociodemográfico, que permitiu recolher variáveis
sociodemográficas e dados acerca dos crimes cometidos
pelos reclusos. Através do Mini-Mult, traduzido para a
língua portuguesa por Lopes (1985), pretendeu-se avaliar
as características do funcionamento mental, sendo que
permite uma avaliação objetiva da personalidade,
determinando o grau de severidade das várias escalas
clínicas (Corsello, 2008). O Mini-mult apresenta boa
consistência interna quando aplicado à amostra de
reclusos e à normativa, tendo um alpha de 0,835 e 0,844,
respetivamente.
Aplicou-se a Escala Multidimensional de Culpa,
construída e validada para a língua portuguesa por
Aquino e Medeiros (2009), tem como objetivo avaliar o
nível de sentimento de culpa que o indivíduo experiencia
em relação a dimensões afetivas, cognitivas e
comportamentais (Aquino & Medeiros, 2009). A
consistência interna da escala multidimensional da culpa,
aplicada à amostra de reclusos, a cumprir pena, por
terem cometido crime passional, revela-se razoável, com
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um alpha de 0,704. Relativamente à amostra normativa a
consistência interna mostra-se muito boa, com um alpha
de 0,907.
Aplicou-se a Escala de Impulsividade de Barratt,
traduzida para a língua portuguesa por Leandro Malloy-
Diniz e colaboradores, que mede a impulsividade, a nível
atencional, motor e de planeamento (Malloy-Diniz,
Mattos, Leite, Abreu, Gabriel, Coutinho, et al., 2010). A
consistência interna desta escala, aplicada à amostra de
reclusos, a cumprir pena, por terem cometido crime
passional, revela-se boa, com um alpha de 0,813.
Relativamente à amostra normativa a consistência
interna mostra-se razoável, perto de boa, com um alpha
de 0,78.
Procedimentos
Após a escolha dos instrumentos e da amostra, foi
redigida uma carta para a DGSP, de modo a pedir
autorização para efetuar a recolha de dados em diversos
estabelecimentos prisionais do país, nomeadamente
estabelecimento prisional de Lisboa, estabelecimento
prisional de Monsanto, estabelecimento prisional da
Carregueira, estabelecimento prisional de Tires,
estabelecimento prisional da Guarda, estabelecimento
prisional de Castelo Branco e estabelecimento prisional
da Covilhã.
Em todos os estabelecimentos prisionais foram
previamente selecionados e listados os reclusos que se
encontravam a cumprir pena por crime passional pela
pessoa com que se estabeleceu contacto de modo a
organizar a recolha de dados. Apesar de previamente
listados e selecionados os sujeitos considerados pelo EP
como tendo cometido crime passional, aquando da
recolha de dados eram exploradas as motivações do
crime, de forma a verificar se o crime era passional, para
enquadrar o crime cometido no âmbito passional
considerou-se que na sua base do crime deveria existir
ciúme, a não-aceitação do término da relação ou a não-
aceitação da separação, adultério ou suspeita de
adultério e necessidade de posse sobre a companheira,
namorada, mulher ou sobre aquela com quem mantinha
um relação extraconjugal.
Relativamente à amostra constituída pelos reclusos, os
questionários foram aplicados individualmente, tendo
sido explicados previamente os objetivos da investigação
e pedido o consentimento informado, que foi assinado
pelos participantes.
Resultados relativos ao emparelhamento dos criminosos condenados por cometerem crime passional com a amostra
normativa
Os 34 reclusos foram emparelhados com 34 outros
indivíduos da amostra normativa global recolhida, por
idade, género e escolaridade, com variância de mais ou
menos dois nos parâmetros da idade e escolaridade.
Como se pode verificar na tabela 1, não existem
diferenças estatisticamente significativas entre a idade e
escolaridade nos participantes que cometeram crime
passional e nos participantes da amostra normativa, com
os quais forma emparelhados, o que agregado à variável
fixa género, assegura-nos uma homogeneidade coerente
nas características dos participantes, que cometeram
crime passional e que não cometeram, tornando estes
dois grupos de participantes altamente comparativos.
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Tabela 1
Resultados obtidos na verificação da variância na idade e escolaridade dos participantes condenados por cometerem crime passional e dos participantes que pertencem à amostra normativa com os quais foram emparelhados.
Sujeitos Média Desvio-Padrão t P
Idade Reclusos 46,559 10,497 -1,045 0,304
Normativa 46,353 10,292
Sujeitos Média Desvio-Padrão Z P
Escolaridade Reclusos 6,382 3,182 -0,867 0,386
Normativa 6,794 2,931
No que diz respeito à Escala Multidimensional da Culpa,
verificou-se que na culpa global os reclusos obtiveram
uma média de 40,294 e DP=5,901 e a amostra normativa
obteve média de 32,206 e DP=10,646, observando-se
uma grande diferença estatisticamente significativa (t=-
3,896; p=0,000), sendo que a média da diferença de
pares foi de -8,088 e DP=12,107. Quanto à dimensão
culpa subjetiva, os reclusos obtiveram média de 10,853,
DP=2,754, e os sujeitos normativos tiveram média de
9,29, DP=3,713, com uma média de diferença de pares
de -1,559, DP=4,882, não se tendo verificando diferenças
estatisticamente significativas (t=-1,862; p=0,72). Na
culpa objetiva, os criminosos tiveram média de 15,147,
s=3,192 e os indivíduos da amostra normativa 11,471,
DP=4,336, tendo-se verificado grandes diferenças
estatisticamente significativas (t=-4,25, p=0,000) e uma
média de diferença de pares de -3,676 e DP=5,044. Em
relação à culpa temporal, os sujeitos reclusos obtiveram
média de 18,0589 e DP=2,974, e os sujeitos normativos
tiveram média de 14,265, DP=4,608, com uma diferença
de média de -3,794 e DP=5,912, sendo que se verificaram
diferenças estatisticamente significativas (t=-3,742;
p=0,001), tal como se pode observar na tabela 2.
Verificou-se que os reclusos pontuaram acima da
mediana teórica em todas as dimensões, exceto na culpa
subjetiva, enquanto os indivíduos da amostra normativa
pontuaram abaixo da mediana teórica em todas as
dimensões.
Tabela 2
Resultados obtidos do emparelhamento, em relação à Escala Multidimensional da Culpa
Dimensões Sujeitos Média Desvio-Padrão t P
Culpa global Reclusos 40,294 5,901 -3,896 0,000
Normativos 32,206 10,645
Culpa subjetiva Reclusos 10,853 2,754 -1,862 0,072
Normativos 9,294 3,713
Culpa objetiva Reclusos 15,147 3,192 -4,250 0,000
Normativos 11,471 4,336
Culpa temporal Reclusos 18,059 2,974 -3,742 0,001
Normativos 14,265 4,608
Relativamente aos resultados obtidos do
emparelhamento, referentes às dimensões da Escala de
Impulsividade de Barratt, verificou-se que na dimensão
de impulsividade global os criminosos obtiveram 62,618,
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DP=6,214 e os da amostra normativa obtiveram média
de 60,853, DP=10,765, não se verificando diferenças
estatisticamente significativas, a média da diferença de
pares foi -1,765 e DP=13,237. Em relação à impulsividade
de planeamento, os reclusos obtiveram média de 26,353
DP=3,283 e os normativos apresentaram média de
25,559 e DP=5,082 e também não se verificaram
diferenças estatisticamente significativas, tendo a média
da diferença de pares sido -0,794; DP=6,452. Em relação
à impulsividade atencional, os reclusos obtiveram média
de 15,971, DP=2,611 e os normativos obtiveram média
de 15,147, DP=3,735, com uma média de diferença de
pares de -0,824 e DP=4,681, não se verificando
diferenças estatisticamente significativas, como se pode
observar na tabela 4. Relativamente à impulsividade
motora, observou-se uma média de 20,294, DP=3,958
para os reclusos e uma média de 20,147, DP=4,164 para
os indivíduos da amostra normativa, existindo uma
média de diferença nos pares de -0,147 e DP=5,774, não
se encontrando diferenças estatisticamente
significativas, tal como se pode verificar na tabela 3.
Constata-se que, em todas as dimensões do questionário
de impulsividade, tantos os reclusos como os sujeitos da
amostra normativa, pontuaram abaixo do ponto de
corte, evidenciando baixa impulsividade nas diversas
vertentes, ainda que se verifique, em todas as
dimensões, médias ligeiramente mais elevadas nos
reclusos.
Tabela 3
Resultados obtidos do emparelhamento, através do teste paramétrico dos sinais, em relação às dimensões impulsividade global, impulsividade de planeamento (ou não planeamento) e impulsividade motora
Dimensões Sujeitos Média Desvio-Padrão T P
Impulsividade global Reclusos 62,618 6,214 -0,777 0,442
Normativos 60,853 10,765
Não planeamento Reclusos 26,353 3,283 -0,718 0,478
Normativos 25,449 5,082
Impulsividade motora Reclusos 20,294 3,958 -0,149 0,883
Normativos 20,147 4,164
Tabela 4
Resultados obtidos do emparelhamento, através do teste não-paramétrico Wilcoxon, em relação à dimensão impulsividade atencional
Dimensão Sujeitos Média Desvio-Padrão Z P
Impulsividade
atencional
Reclusos 15,971 2,611 -0,841 0,401
Normativos 15,147 3,735
No que diz respeito às escalas clínicas do Mini-Mult,
quanto à hipocondria, os reclusos obtiverem média de
61,677 e DP=10,901 e os sujeitos normativos obtiveram
média de 60,382 e DP=11,217, não se tendo verificado
diferenças estatisticamente significativas. No caso da
depressão, os reclusos apresentam uma média de
64,647, DP=9,918 e os sujeitos da amostra normativa
obtiverem média de 58,529, DP=12,911, verificando-se
diferenças estatisticamente significativas (t=-2,329;
p=0,026), com uma diferença de média entre pares de -
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6,118 e DP=15,314. Na escala clínica de histeria, verifica-
se que a média dos reclusos é de 63,471, DP=7,952 e a
dos indivíduos normativos é 62,265, DP=10,737, não se
obtendo diferenças estatisticamente significativas, tal
como no caso da psicopatia, onde os criminosos
obtiverem média de 66,2941, DP=9,1966 e os sujeitos da
amostra normativa obtiveram média de 66,2353,
DP=8,2574, ressaltando uma pontuação mais elevada do
que seria expectável, no caso dos reclusos e amostra
normativa. Relativamente à paranoia, observou-se uma
média de 66,618, DP=10,554 para os reclusos e de
62,382, DP=10,877, para os sujeitos normativos, não se
verificando diferenças estatisticamente significativas. Em
relação à psicastenia, pode-se verificar que a média dos
criminosos é de 59,177, DP=11,175 e a dos sujeitos
normativos é de 50,824, DP=11,668, tendo-se
encontrado elevadas diferenças estatisticamente
significativas (t=-3,298; p=0,002), com uma média de
diferença de pares de -8,353, DP=14,769, onde os
reclusos obtêm uma pontuação consideravelmente mais
elevada que os sujeitos da amostra normativa, apesar de
esta não ser mais elevada que o esperado tipicamente.
No caso da esquizofrenia, verificou-se uma média de
73,677, DP=15,137 para os criminosos e uma média de
66,029, DP=14,923 para os indivíduos normativos, com
uma média de diferença de pares de -7,647 e DP=20,316,
tendo-se encontrado diferenças estatisticamente
significativas (t=-2,195; p=0,035), verifica-se que, em
ambos os casos, as pontuações nesta escala apresentam
valores mais elevados que o esperado normalmente,
todavia, os reclusos apresentam uma média
consideravelmente mais elevada. Na escala de
hipomania, encontrou-se uma média de 54,500,
DP=9,475 nos reclusos e de 52,794, DP=10,132 nos
indivíduos da amostra normativa, não se verificando
diferenças estatisticamente significativas, tal como se
pode observar na tabela 5.
Tabela 5
Resultados obtidos do emparelhamento, através do teste paramétrico dos sinais, em relação às Escalas Clínicas do Mini-Mult
Dimensão Sujeitos Média Desvio-Padrão t P
Hipocondria Reclusos 61,677 10,901 -0,493 0,625
Normativos 60,382 11,217
Depressão Reclusos 64,647 9,918 -2,329 0,026
Normativos 58,529 12,911
Histeria Reclusos 63,471 7,952 -0,531 0,599
Normativos 62,265 10,737
Psicopatia Reclusos 66,294 9,197 -0,033 0,974
Normativos 66,235 8,257
Paranoia Reclusos 66,618 10,554 -1,686 0,101
Normativos 62,382 10,877
Psicastenia Reclusos 59,177 11,175 -3,298 0,002
Normativos 50,824 11,668
Esquizofrenia Reclusos 73,677 15,137 -2,195 0,035
Normativos 66,029 14,923
Hipomania Reclusos 54,500 9,475 -0,787 0,437
Normativos 52,794 10,132
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Ainda no que diz respeito ao Mini-Mult, averiguou-se o
comportamento de outras escalas que não clínicas, no
emparelhamento dos reclusos com indivíduos da
população normativa. Nomeadamente, quanto à escala
de mentira (L), verificou-se que os reclusos apresentam
uma média de 53,912, DP=13,187, e os indivíduos
normativos apresentam uma média de 51,000,
DP=11,357, com uma média de diferença de pares de -
2,912, DP=12,939, não se verificando diferenças
estatisticamente significativas, tal como se pode
observar na tabela 6, ainda que os criminosos
apresentem uma pontuação ligeiramente acima dos
sujeitos da amostra normativa, os pares mostram índices
de mentira típicos e normais. Em relação ao índice de
ansiedade, observou-se uma média de 61,503,
DP=17,041 para os reclusos e uma média de 47,146,
DP=22,042, para os sujeitos normativos encontrando-se
grandes diferenças estatisticamente significativas (t=-
3,337; p=0,002) e uma média de diferença de pares de -
14,357, DP=25,089, ao que parece, os indivíduos da
amostra normativa apresentavam níveis de ansiedade
relativamente baixos e normativos, enquanto os
criminosos apresentaram níveis de ansiedade
exacerbados, distanciando significativamente do que é
tipicamente esperado. Quanto ao índice de
internalização, verificou-se uma média de 1,01,
DP=0,099, para os reclusos e uma média de 0,934,
DP=0,0998 para os outros sujeitos, com uma média de
diferença de pares de -0,076, DP=0,139, encontrando-se
diferenças estatisticamente significativas marcadas (t=-
3,207, p=0,003), evidenciando que os reclusos
apresentam um locus de controlo externo, tendendo a
atribuir os acontecimentos sobretudo a causas externas.
Relativamente ao índice de simulação, constata-se que
os reclusos apresentam uma média de 0,971, DP=7,578,
enquanto os indivíduos normativos apresentam uma
média de -3,147, DP=7,287, verificando-se uma média de
diferença entre pares de -4,118, DP=9,374, sendo
encontradas diferenças estatisticamente significativas
(t=-2,561; p=0,015), reveladoras de que, apesar do índice
de simulação indicar valores esperados e normativos no
caso dos reclusos e da amostra normativa, verifica-se
que os sujeitos da amostra normativa apresentam
também uma relativa tendência para a simulação, no
sentido de criaram uma melhor imagem de si mesmo.
Tabela 6
Resultados obtidos do emparelhamento, através do teste paramétrico dos sinais, em relação à escala de mentira, índice de ansiedade, índice de
internalização e índice de simulação do Mini-Mult.
Dimensão Sujeitos Média Desvio-Padrão t P
Mentira Reclusos 53,912 13,187 -1,312 0,199
Normativos 51,000 11,357
Ansiedade Reclusos 61,503 17,041 -3,337 0,002
Normativos 47,146 22,042
Internalização Reclusos 1,01 0,099 -3,207 0,003
Normativos 0,934 0,0998
Simulação Reclusos 0,971 7,578 -2,561 0,015
Normativos -3,147 7,287
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Discussão dos Resultados
De seguida serão debatidos os resultados encontrados
aquando do emparelhamento entre os participantes que
cometeram crime passional com indivíduo da amostra
normativa que possuem características semelhantes,
especificamente a nível do género, idade e escolaridade.
Verificou-se, de uma forma bastante significativa, que os
sujeitos que cometeram crime passional apresentam
níveis de culpa bastante mais elevados, face a sujeitos da
população normativa, com características semelhantes,
sendo estes resultados corroborados pelo estudo de
Alvim e Souza, (2005), ainda que o seu estudo incidisse
de forma geral em agressores de violência doméstica.
Também a literatura refere, de modo geral que, ao nível
do crime passional, o ofensor geralmente sente culpa ou
remorso, ficando bastante perturbado com o ato que
cometera, o que por vezes leva ao suicídio (Habermann,
2010), salientando que diversos participantes do
presente estudo, que cometeram crime passional,
referiram ter cometido tentativa de suicídio ou ter
pensado em cometer tal ato. Ora, os sujeitos presos
apresentam culpa global, objetiva e temporal elevada,
todavia apresentam baixa culpa subjetiva, estes dados
não vão ao encontro da ideia defendida por Junior
(2004), segundo o qual, depois do crime cometido, o
indivíduo preocupar-se essencialmente com a sua honra
e sentimento pessoal, pois neste sentido, seria de
esperar que os sujeitos que cometeram o crime
apresentassem maiores níveis de culpa subjetiva, que se
relaciona com sentimento de remorso, vergonha e
autocondenação. Todavia, estes sentem sobretudo
vergonha a um nível mais objetivo, que surge quando
uma regra é quebrada e o transgressor é culpado, estes
resultados podem ver a sua explicação sustentada no
facto de se tratar de sujeitos que se encontram
condenados e presos, tendo sido oficialmente
considerados culpados (Aquila et al., 2010). Desta forma
os sujeitos terão maior tendência para sentir com maior
intensidade o julgamento dos outros, do que o
julgamento da própria consciência, que objetiva a culpa e
passa para segundo plano o remorso que sentem e a
vergonha dos seus atos, dando maior importância ao que
os outros pensam, por terem sido condenados e
considerados culpados. Para Eluf (2003) o criminoso
passional, ao matar, mostra à sociedade que a sua
reputação não foi atingida impunemente, restaurando o
respeito perdido (Figueiredo & Neto, 2010), o que revela
a sua preocupação com a sua honra e com aquilo que os
outros pensam a seu respeito. Relativamente à culpa
temporal, explica-se pelo facto de estes, pelo ato
criminoso que cometeram, se verem privados de
desfrutar de mais tempo junto das suas famílias e de
quem mais gostam, bem como de realizarem atividades
importante (Tavares & Menandro, 2008), e pelo facto de
no passado talvez terem tido a oportunidade de
passarem mais tempo junto dessas pessoas e de realizar
essas atividades e não terem usufruído dela,
provavelmente julgando que teriam tempo num futuro
que se revelou limitador a esse nível, por culpa de
comportamento do próprio sujeito (Tavares &
Menandro, 2008). Além disso mesmo, poderão ter a
perceção de que quando cumprirem a pena será difícil
retomar a vida normal e realizarem os seus projetos de
vida também devido à estigmatização a que se
encontram sujeitos e da qual aqueles que cometeram
crime passional, tendem a ter perceção (Santiago &
Coelho, 2010).
Relativamente à impulsividade, verificou-se que esta é
bastante homogénea nos dois grupos de participantes
comparados, nomeadamente nos que se encontram a
cumprir pena por crime passional e os que não
cumprem, obtendo-se valores baixos, nas diversas
dimensões da impulsividade. Estes resultados são de
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certa forma contraditórios com aqueles encontrados na
literatura, pois esta revela que os “crimes de paixão”
estão sobretudo associados a altos níveis de
impulsividade ou reatividade emocional (Woodworth &
Porter, 2002), assim como mostram os resultados de um
estudo brasileiro levado a cabo por Santiago e Coelho
(2010), em que os participantes do estudo estavam
detidos por terem cometido crime passional e todos
afirmaram ter cometido o crime por impulso, sendo que
desta forma, esperar-se-ia que os sujeitos com maiores
níveis de impulsividade estivessem mais predispostos e
com mais probabilidade de virem a cometer um crime
passional, o que não foi verificado comparando os
sujeitos que cometeram este tipo de crime com outros
que apresentam características semelhantes, mas não
cometeram crime passional. Uma explicação para estes
dados será o facto destes indivíduos, apesar de não
serem personalisticamente mais impulsivos que os
outros, terem sim outras características que
aumentaram a sua predisposição para cometer o crime
naquele momento. Pode ainda acontecer que, uma
determinada situação, com uma carga emocional,
excecionalmente elevada, poderá ter potenciado a que
agissem, naquele momento, por impulso, podendo dizer-
se que pode ter sido uma impulsividade pontual, o
sujeito pode geralmente ter capacidade de controlar os
seus impulsos, mas naquele momento específico não
teve essa capacidade, devido à carga afetiva e à grande
excitação emocional a que esteve submetido, sendo que
qualquer pessoa poderia ter tido um ato semelhante
perante uma situação idêntica, mais ainda se portador de
outras características potenciadoras de um ato criminoso
(Calder, 2003). O facto dos níveis de impulsividade serem
relativamente semelhantes nos sujeitos que cometeram
o crime passional, e nos que pertencem à amostra
normativa, leva-nos a aproximar da ideia de Blay (2003),
que defende que a paixão pode privar o sujeito dos seus
sentidos ou consciência, de forma que, qualquer pessoa
possa cometer um crime passional em determinadas
circunstâncias, podendo o crime acontecer numa
situação de impulsividade pontual.
No que concerne às características clínicas, verificou-se
que os reclusos apresentam, de forma mais expressiva,
valores mais elevados de depressão, psicastenia,
esquizofrenia e ansiedade. Salientando-se que a
literatura vai ao encontro dos resultados, na medida em
que diversos estudos demonstram que a sintomatologia
depressiva e de ansiedade é a mais predominante na
população reclusa, sendo que um estudo levado a cabo
em Portugal, por Ventura e David (2001) demonstrou
que 88% dos reclusos apresentavam níveis de ansiedade
elevados e associado a esta sintomatologia tendem a
ocorrer quadros do tipo psicótico, como a esquizofrenia,
com alterações de imagem de si e delírios (Marques,
2010). Os participantes delituosos, deste estudo,
encontram-se mais deprimidos, o que pode facilmente
indicar falta de esperança e insatisfação com o momento
atual, uma vez que estes se encontram numa situação de
reclusão, privados a todos os níveis, especialmente de
contacto com as pessoas mais importantes e de
realização de atividades ou projetos, o que
invariavelmente aumenta a tristeza e sofrimento do
indivíduo (Tavares & Menandro, 2008). Os valores mais
elevados na escala de psicastenia, face aos sujeitos da
amostra normativa com características semelhantes,
ainda que se encontre dentro de um valor típico e
normativo, podem estar relacionados com a depressão e
consequentemente com uma apreensão ou preocupação
dos reclusos, tendo em conta a situação em que se
encontram, grandemente desprovida de suporte familiar
e social, o que potencia a presença da ocorrência de
medos variados, que se relacionam com ansiedade
elevada e dúvidas ruminantes, uma vez que estes se
encontram num contexto repleto de desafios,
obstáculos, dificuldades e de difícil adaptação (Snow,
2002), referindo-se que diversos reclusos afirmaram que
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tinham constantemente a impressão de que tentavam
prejudica-lo dentro da prisão. A ansiedade, nos reclusos,
para além destes aspetos, pode ainda ter sido
potenciada, devido a poderem pensar que se
encontravam num contexto de alguma forma avaliativo.
Salientam-se ainda os valores marcadamente mais
elevados na escala de esquizofrenia, revelando a
presença de pensamentos e comportamentos bizarros e
confusos que podem ser consequência do contexto
emocionalmente instável onde estes sujeitos se inserem.
A literatura aponta que indivíduos com esquizofrenia
tenham maior probabilidade de serem violentos,
relativamente à população geral (Binder, 1999; Walsh,
Buchanan & Fahy, 2001, cit. in Teixeira & Dalgalarrondo,
2008), sendo ainda importante referenciar que os
sujeitos normativos apresentam também eles resultados
nesta escala ligeiramente mais elevados que o esperado.
Em última análise, estas características parecem ser
comuns à população de reclusos, podendo não estar
ligadas, de forma exclusiva com o tipo de crime em
questão.
Considera-se importante referir o facto de não terem
ocorrido diferenças proeminentes entre os pares de
reclusos e sujeitos normativos, a nível da escala de
psicopatia, sendo que em ambos os casos as médias
obtidas foram mais elevadas que o tipicamente
esperado, revelando que, tanto os reclusos que
cometeram o crime passional como os que pertencem à
amostra normativa, revelam características de certa
forma amorais e associais, com alguma desconsideração
pelas normas sociais, bem como pelos direitos dos
outros. Estes resultados podem ser fruto do facto dos
indivíduos apresentarem sobretudo uma escolaridade
mais baixa, não esquecendo que a literatura refere
amplamente que o comportamento criminoso está
positivamente relacionado com uma escolaridade baixa
(Thornberry, Moore & Christenson, 2006), e como um
dos parâmetros utilizados para emparelhar os sujeitos da
amostra normativa com os reclusos, foi a escolaridade,
então estará explicado, neste sentido, a tendência maior
destes para a psicopatia. E desta forma, reforça-se a ideia
já bastante presente na literatura, que refere que os
crimes passionais geralmente não são cometidos por
indivíduos que tenham maiores traços de psicopatia, tal
como o demonstra os estudos de Williamson, Hare e
Wong (1987), pois os valores de psicopatia não de
destacam nos sujeitos que cometeram o crime em
questão, pois este, tal como defende Mercader (2004),
parece estar mais relacionado com alguma
normatividade, e não com marginalidade ou traços
psicopáticos. Estes resultados apontam, mais uma vez,
para a ideia de que o crime passional tende a ser
cometido de forma pontual e que pode ser cometido por
qualquer indivíduo, neste caso, independentemente dos
traços psicopáticos como defende Cançado (2002).
Os resultados obtidos do emparelhamento
evidenciaram ainda que, os sujeitos que cometeram
crime passional apresentam um locus de controlo
externo, enquanto que os indivíduos que fazem parte da
população normativa apresentam um locus de controlo
mais interno. Ou seja, os participantes que cometeram
crime passional tendem a perceber mais que os
acontecimentos não são contingentes com o seu
comportamento, apresentam maior probabilidade de
realizar atribuições como a sorte, destino ou imprevisto e
acreditam mais que os acontecimentos da sua vida estão
fora do seu controlo. Estes dados vão ao encontro do
estudo realizado por Verde e Cortés (2007), com
agressores domésticos em que salienta que aqueles que
cometeram homicídio atribuem os seus atos a fatores
externos como o álcool ou conflitos. O locus de controlo
externo, nestes indivíduos, pode estar relacionado com
um sentimento de frustração que deriva do facto do
indivíduo ter cometido o crime de uma forma
inesperada, sem que nada o fizesse prever, e mais uma
vez aproximamo-nos da ideia de que o crime passional
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pode acontecer de forma pontual, num ato de
impulsividade que também ele pode ser pontual. Neste
sentido, o sujeito cometeu um crime de forma tão
inesperada, que tal ato, o poderá fazer sentir que afinal
não consegue ter controlo sobre os acontecimentos que
ocorrem, podendo estes facilmente ocorrerem de forma
imprevista, como refere a literatura (Cançado, 2002). Em
relação ao índice de simulação, constatou-se que tanto
os sujeitos que cometeram o crime, como os que
pertence à amostra normativa, revelam valores típicos e
normais, ainda que os da amostra normativa revelam
maior tendência para simular uma imagem de si mais
positiva. Quanto à escala de mentira os resultados
revelam que os participantes que cometeram o crime
não apresentam maior tendência para mentir, obtendo-
se resultados relativamente semelhantes.
Conclusões
Os sujeitos, condenados por terem cometido crime
passional, apresentam maior culpa objetiva e de gestão
de tempo. Estes não apresentam maior impulsividade em
relação aos participantes normativos, nem níveis de
psicopatia significativamente mais elevados. Apresentam
maiores níveis de psicastenia, esquizofrenia, depressão e
ansiedade, e ainda um locus de controlo mais externo.
Conclui-se que os sujeitos que cometem crime passional
são sujeitos, com tendência para apresentar baixa
escolaridade, que à partida estão mais predispostos a
comportamentos desviantes, e daí apresentarem valores
na escala de psicopatia ligeiramente mais elevados em
relação aos participantes normativos com mais
escolaridade e que não cometeram o crime.
Parece que a presença de determinadas características
personalísticas, em conjugação com um historial
criminal, um historial de psicopatologia e uma motivação
passional, criando-se uma determinada situação de
grande carga emotiva, poderá aumentar fortemente a
predisposição dos sujeitos a cometerem um crime
passional.
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Caso Clínico
O Síndrome Wernicke-Korsakoff sobre o prisma da neuropsicologia
Mónica Sousa
Clinical Psychologist; MSc in Psychology. Neuropsychologist at Peroneo - Vida e Saúde. All correspondence about this article should be
sent to email: [email protected].
___________________________________________________________________________
Resumo
O presente artigo tem como objetivo abordar e descrever as diversas etapas do processo de avaliação neuropsicológica de um paciente com
o síndrome Wernicke-Korsakoff. São ainda tecidas algumas considerações em torno do mesmo.
Palavras-Chave: Neuropsicologia, Estudo de caso; Wernicke-Korsakoff.
Abstract
This article aims to address and describe the various stages of the neuropsychological evaluation of a patient with Wernicke-Korsakoff syndrome. Finally,
some considerations are further weaved around it.
Keywords: Neuropsychology, Case Study, Wernicke-Korsakoff syndrome.
Resumen
Este artículo tiene como objetivo abordar y describir las diferentes etapas de la evaluación neuropsicológica de un paciente con el síndrome de Wernicke-
Korsakoff. Por último, algunas consideraciones más se tejen a su alrededor.
Palabras clave: Neuropsicología, estudio de caso, síndrome de Wernicke-Korsakoff.
___________________________________________________________________________
Introdução
A neuropsicologia, como área de estudo e de intervenção, é
recente, todavia, o desenvolvimento da sua fundamentação
científica é fruto de várias décadas de investigação (Maia,
Leite & Correia, 2009). De acordo com Lezak, Howieson e
Loring (2004), a neuropsicologia pode ser definida como o
estudo da relação entre a função do cérebro humano e o
comportamento. Céspedes e Tirapu-Ustarroz (2008)
acrescentam que o neuropsicólogo deverá ser capaz de: (a)
descrever as perturbações mentais em termos do
funcionamento cognitivo; (b) definir os perfis clínicos que
caracterizam os diferentes tipos de perturbações que
concursam com as alterações neuropsicológicas; (c)
contribuir para a clarificação diagnóstica, sobretudo nos
casos em que não se detetam alterações em provas de
neuroimagem; (d) construir programas de reabilitação
individualizados, a partir do conhecimento das limitações do
sujeito, mas também das capacidades conservadas; (e)
realizar avaliações médico-legais.
Para Andrade, Santos e Bueno (2004) na neuropsicologia
inclui-se o estudo das alterações associadas ao uso de
substâncias, tais como o álcool e outras; contribuindo,
assim, para o esclarecimento de questões diagnósticas bem
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como para a definição de um processo reabilitativo que têm
por objetivo a recuperação ou minimização dos défices
neurocognitivos identificados.
A encefalopatia de Wernicke (EW) é uma desordem
neuropsiquiátrica aguda causada pela deficiência da
vitamina B1 (Tiamina), fortemente associada aos hábitos
etílicos. Esta é classicamente descrita pela tríade de
alterações do estado mental, oftalmológicas e atáxicas. A
EW pode evoluir para a síndrome de Korsakoff (SK),
desordem também associada ao alcoolismo e à deficiência
nutricional, que se manifesta específicamente pelos défices
mnésicos.
A síndrome Wernicke Korsakoff (WKS) é hoje considerada
como o resultado da união do complexo de sintomas
presentes na EW e na SK.
Mais de um século após as descrições iniciais, o WKS
permanece interlaçado a um diagnóstico difícil. Num estudo
conduzido por Harper (1983), através de autópsias,
verificaram que mais de 80% dos casos não foram
diagnosticados em vida. Esta dificuldade reside no facto da
sensibilidade da sintomatologia anteriormente referida ser
reduzida. Caine, Halliday, Kril e Harper (1997) identificaram
97 alcoólatras em que a WKS foi diagnosticada pela primeira
vez na autópsia. Noutro estudo com a mesma população
alvo, apenas 15% apresentaram os três sinais clássicos, 29%
dois sinais, 37% um sinal e 19% nenhum sinal (Harper, Giles
& Finaly-Jones, 1986). Nos mesmos estudos, as alterações
mentais foram relatadas em 82% dos casos, os sinais
oculares em 29% dos pacientes e a ataxia foi identificada em
23% dos pacientes.
Outros dados que complexificam o diagnóstico relacionam-
se com o facto dos exames laboratoriais disponíveis para a
medição da tiamina não serem rápidos nem utlizados como
exames de rotina para a WE (Isenberg-Grzeda, Kutner &
Nicolson, 2012).
Face ao que foi referido, o exame clínico auxiliado pela
tomografia computadorizada e ressonância magnética
permitirão a efetuação de um diagnóstico com maior
exatidão, uma vez que se encontra descrito na literatura que
a WE implica lesões na porção medial do tálamo e
mesencéfalo, dilatação do terceiro ventrículo e atrofia dos
corpos mamilares (Charness & De la Paz, 1987; Lishman,
1990; Yokote, Miyagu, Kuzuhara,Yamanouchi & Yamada,
1991).
No presente artigo debruçamo-nos sob um caso clíncio de
um paciente com síndrome de Wernicke-Korsakoff,
instituicionalizado num lar de idosos da região de Coimbra.
Descreve-se o protocolo de avaliação neurospicológica e os
dados dai extraídos, fundamentando o caso clínico
apresentado de acordo com os postulados teóricos da
neuropsicologia.
Apresentação do caso clínico
Dados sociodemográficos: Sujeito do sexo masculino de
nacionalidade portuguesa com 54 anos, solteiro, reformado
por incapacidade.
Dados Clínicos Relevantes: Alcoolismo crónico. Anemia
Macro lítica.
Medicação: Tiaprida 100mg, Folicil 5 mg, Oxazepam 15 mg,
Fenabarbital 100mg e Pantaprazol 40mg.
Antecedentes Pessoais e História de Desenvolvimento
A. apresenta muita dificuldade na explanação da sua linha
biográfica, particularmente em precisar as atividades
laborais que desempenhou, a duração dessas ou a idade que
tinha durante o início ou término dessas atividades. Parece
preencher as lacunas mnemónicas com confabulações, o
que implica a criação de uma outra história de vida, não
coincidente com a que é fornecida pela Assistente Social que
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acompanha o caso. Embora refira “Não me lembro” (sic),
acaba por contar a sua história da sua vida.
Desconhece se andou na escola até à 3 classe e se reprovou
ou não. Todavia, no segundo momento de avaliação afirma
convicto que andou na escola até ao terceiro ano, virando a
cabeça para o lado em sinal de reprovação quando foi
confrontado com essa informação. Aponta que aos 10 anos
foi trabalhar para a serração (Indústria madeireira).
Diz ter sido escriturário numa fábrica, “Escriturário. (minha
questão) Apontava o que levam, o material. O que faltava.
Escrevia. Apontava. O material” (sic). Não sabe precisar com
que idade, mas pensa que depois dessa atividade foi para
uma fábrica de vidro na Marinha Grande, durante pouco
tempo, tendo a função de colocar vedante. Refere, sem
precisar a sua função, ter trabalhado perto de Lisboa
durante alguns anos numa fábrica de Margarina. Acrescenta
que foi despedido dessa fábrica e regressou ao trabalho da
resina, mas como o patrão não lhe pagava, abandou o
emprego. Note-se que um outro colega do lar refere que
nunca o viu na empresa, embora A. afirme ter trabalhado
com ele.
Aprendeu a ler e a escrever por iniciativa própria em adulto,
concluindo a 4ºclasse nessa altura.
Raramente aborda a questão da sua dependência alcoólica.
Todavia, afirma a existência de um ambiente negativo em
casa devido ao consumo de bebidas alcoólicas por parte dos
seus pais. Note-se que refere com alguma imparcialidade
“Eles bebiam. É normal beber. Bebiam, mas trabalhavam.”
(sic). Diz ser o primogénito da família de 5 irmãos, referindo
com alguma tristeza a morte de dois irmãos, um devido a
hábitos etílicos, outro devido ao consumo exagerado de
álcool e tabaco. Afirma que consumia bebidas alcoólicas à
refeição e que “sozinho não bebia” (sic), indo sempre para
um café (estabelecimento) beber com os amigos. Não sabe
precisar a quantidade de bebida que ingeria por dia, mas
mais revela que quando não bebia termia muito e vomitava
um líquido amarelado. Quando voltava a beber sentia-se
melhor, mas sabia que assim as coisas não estavam bem.
“Não tenho ninguém, mãe ou mulher para fazer-me as
coisas, vim para o lar.” No entanto, de acordo com a técnica
de assistência social, a principal razão deve-se aos hábitos
etílicos e à falta de condições habitacionais, factos
desvalorizados e negados por A. Não sabe precisar quando é
que veio para o lar, tendo a suspeita que já fez dois anos em
regime de internamento. A razão de ainda estar vivo, diz,
dever-se ao lar, pois se não tivesse entrado estava “com os
pés juntos” (sic).
Afirma apenas ter tido conhecimento que tomava uma
medicação para o alcoolismo em Dezembro de 2012, pois
perguntou à enfermeira qual era a medicação que estava a
fazer (não ficando esclarecido).
Atualmente nega o consumo de álcool, todavia contradiz-se
ao dizer que “Basta um copo ou dois para tombar uma
pessoa. Não estou já habituado” (sic).
Processo / Resultados de Avaliação
Observação do Comportamento
Anteriormente ao início do primeiro momento da avaliação
efetuou-se uma breve explicação dos objetivos da avaliação
neuropsicológica, referindo também as questões éticas e
deontológicas inerentes a qualquer avaliação psicológica.
Posteriormente esclareceu-se algumas questões que
surgiram a A.
Em ambos os momentos de avaliação, A. apresentou-se
vestido de acordo com a sua idade e estatuto
socioeconómico. A. apresentou-se desperto, relativamente
atento, como capaz de obedecer a ordens verbais ou escritas
simples. Transversalmente a ambas as sessões foi incapaz de
seguir instruções complexas, de recordar-se das perguntas
ou dos testes que foram sendo administrados
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Processo / Procedimento de avaliação
Quadro 1 – Síntese do protocolo de avaliação neuropsicológica.
Avaliação Duração
(min)
Instrumentos Utilizados Objetivo de avaliação/ Domínio
avaliado
1º Sessão 70 Anamnese neuropsicológica Análise geral/específica da situação do sujeito
Exame do Estado Mental
Escala da Depressão Geriátrica Avaliação socio-afetiva
Inventário de Ansiedade Geriátrica
Series gráficas de Luria – Forma A Avaliação neuropsicológica
2º Sessão
60 MoCA
WAIS-III Figura Complexa de Rey
Rey 15 Item Test
Processo / Resultados de Avaliação
Exame do estado mental
Descrição geral (Trepacz & Baker, 2001): Consciente,
orientado alopsiquicamente, no espaço, embora estivesse
ligeiramente desorientado no tempo e auto-psiquicamente.
Idade aparente correspondente à idade cronológica.
Posição, postura e vestuário normal. Higiene algo cuidada e
sem dificuldade em manter contacto visual. Possui
estrabismo convergente. Sem anomalias físicas bizarras,
todavia com anomalia física evidente (coluna vertebral
escoliose). A expressão facial é normal, contudo quando não
percebe o que é pedido; parece parar no tempo, ficando
com os olhos muito arregalados, sugerindo a presença de
bradifrenia. Apresenta um nível de atividade reduzida com
alguma lentificação psicomotora, deslocando-se lentamente
numa marcha ebriosa, o que revela ataxia. Não apresenta
movimentos anormais. Mantém uma postura amigável,
atenta, interessada e divertida. Reduzido insight para as
situações do quotidiano.
Humor e afecto (Trepacz & Baker, 2001): Fala
voluntariamente dos seus sentimentos, apresentando um
afeto congruente ao humor.
Emoções (Trepacz & Baker, 2001): Adequa as respostas
emocionais às situações que descreve, manifestando uma
intensidade, mobilidade e uma reatividade normal.
Linguagem (Trepacz & Baker, 2001): Normal para indivíduos
de baixa escolaridade e baixo nível socioeconómico.
Percepção (Trepacz & Baker, 2001): Nega alucinações e
ilusões
Pensamentos (Trepacz & Baker, 2001): Quanto ao processo
avaliado, este apresenta-se maioritariamente lógico e
coerente, embora por vezes desagregado, sendo que o
conteúdo centra-se nas doenças (autorreferência
hipocondríaca).
Avaliação Breve do estado Mental
A. alcançou dezanove (19) pontos no MMSE, um resultado
que sugere deficit cognitivo (Guerreiro, 1998).
MoCA
A. obteve um resultado total de treze (13) pontos.
Recorrendo aos valores normativos portugueses (Freitas,
Simões, Alves & Santana, 2011) e tendo por base a variável
idade e anos de escolaridade (Me= 21.78; =2.86), pode-se
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considerar que o examinado obteve resultados inferiores à média por aproximadamente três desvios padrão ( 3 ).
Figura 1 - Resultado obtido por A. Em apenas uma parte do MoCA
WAIS-III
No que concerne ao subteste de Composição de Objetos,
Informação, Matrizes, Cubos e Memória de Dígitos, A.
alcançou o resultado bruto de 0, 6, 7, 15 e 3,
correspondendo ao valor padronizado de 1, 6, 9, 6 e 3,
respetivamente. Todos estes resultados sugerem um
desempenho inferior à média (Wechsler, 2008).
Inventário Ansiedade Geriátrica
A. obteve uma pontuação de catorze (14) o que o situa
acima do ponto de corte para a população portuguesa,
sugerindo a presença de sintomas de ansiedade grave
(potencialmente patológicos) (Ribeiro, Paúl, Simões &
Firmino, 2011).
Escala de Depressão Geriátrica
A. situa-se no extremo direito do intervalo normativo
correspondente à presença de depressão ligeira, uma vez
que obteve o resultado de quinze (15) (Simões, Sousa,
Firmino, Andrade, Ramalho, Martins et al., 2010).
Series gráficas de Luria – Forma A
Apresenta um padrão desatento e impulsivo, denotando
dificuldade mnésicas (Maia, Loureiro & Silva, 2002).
Figura Complexa de Rey
Na Figura Complexa de Rey - Cópia, A. efetuou uma
Reprodução Tipo VII, obtendo um resultado de 0.5 pontos.
Com base nas normas estrangeiras (Spreen & Strauss, 1991)
pode-se concluir que para a sua idade (M = 31.19; =3.68)
A. obteve um desempenho muito inferior à média por
aproximadamente oito desvios padrão ( 8).
Na Figura Complexa de Rey - Evocação Diferida, o
examinando obteve o resultado de 0 pontos, referindo não
se recordar da imagem que lhe tinha sido anteriormente
apresentada, “Qual figura? Não desenhei nenhuma figura.”
(sic). Atendo às mesmas normas estrangeiras (Spreen &
Strauss, 1991) para a idade (M = 14.88; =6.95), conclui-se
que A. obteve um resultado muito inferior à média por
aproximadamente três desvios padrão ( 3).
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Figura 2 – Prestação de A. na Figura Complexa de Rey.
Figura Complexa de Rey – Forma A (Adultos) - Modelo
Resultado da Figura Complexa de Rey Cópia
Resultado da Figura Complexa de Rey - Evocação Diferida
Não se recorda da figura.
Rey 15 Item Test
A. obteve um resultado total de cinco (5), não sendo capaz de evocar os dez (10) elementos (omissões), embora não haja
preservações nem erros reversíveis (Simões, Sousa, Duarte, Firmino, Pinho, Gaspar et al. (2010b).
Figura 3 - Resultados alcançados por A. Na Rey 15 Item Test
Rey 15 Item Test – Cartão de estímulo
Rey 15 Item Test Rey 15 Item Test – Reconhecimento
Discussão e integração do processo avaliativo
Nas duas sessões de avaliação realizadas, procedeu-se à
avaliação psicológica de vários domínios, nomeadamente, o
sócio-afectivo/sintomatologia e o neuropsicológico.
Para a formulação do caso foram considerados os resultados
quantitativos obtidos nos testes, a respetiva análise
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qualitativa dos mesmos, bem como as informações obtidas
na anamnese neuropsicológica efetuada.
Verificou-se que A. apresenta relativa dificuldade em
compreender instruções mais complexas, todavia a
evocação simplificada, por parte da psicóloga, facilitou a
compreensão.
Considera-se, ainda, que o processamento linguístico, tanto
a nível recetivo como expressivo, encontra-se algo
deficitário em A., sendo por vezes difícil perceber a relação
entre as ideias que apresenta (confabulação). Esta
dificuldade torna-se ainda mais evidente a nível escrito,
possuindo disortografia e uma estrutura lógico-gramatical
incorreta. Por outras palavras, a linguagem, oral e escrita,
utilizada por A. apresenta um padrão de resposta típico de
sujeitos com baixa escolaridade e funcionamento intelectual
concreto.
Tendo como referência Simões et al., (2010b), considera-se
ausente a hipótese de fadiga, reduzida cooperação ou
malingering (simulação).
Reportando para a avaliação neuropsicológica, dentro do
MoCA, e numa análise qualitativa, A. obteve um
desempenho máximo apenas num teste de um subteste
(linguagem, especificamente na repetição de frases). Tendo
com valores de referência a sua idade e escolaridade, estes
resultados sugerem o declínio das funções cognitivas de A
(Freitas, Simões, Alves & Santana, 2011).
A. apresenta capacidade de aprendizagem, sendo esta
dificultada por mecanismos de interferência. O processo de
retenção e recuperação, mediado por um processo de
interferência encontra-se totalmente prejudicado. Possui
também uma afeção das dimensões mnésicas, no que
concerne à amnésia anterógrada e amnésia retrógrada e
defeito do aprendizado. A memória imediata está intacta,
estando a memória de curto prazo comprometida. O defeito
de aprendizagem é o aspeto que leva à incapacitação do
paciente na sociedade, o qual fica apto para executar
somente tarefas simples e habituais (Maia, Correia & Leite,
2009). Um exemplo destes dados está patente no forte
défice de reprodução por memória que apresenta na Figura
Complexa de Rey - Evocação Diferida (Spreen & Strauss,
1991). Embora não haja o comprometimento das funções
motoras, estes resultados sugerem défices na aptidão viso-
construtiva, na análise espacial e na capacidade de
planeamento do desenho, na memória visual, na memória
seletiva, na consolidação de memória a longo prazo. Por
outras palavras, ao nível da memória de curto e de longo
prazo, A. possuiu um desempenho deficitário em todo o
processo de avaliação. Destaca-se que na Figura Complexa
de Rey, a cópia defeituosa e a pobreza da reprodução é tão
evidente que se pode colocar a suspeita de défice de
memória de etiopatogenia neurológica.
Os resultados reforçam, também, o distúrbio de consciência
e do estado mental, bem como o estado confusional, uma
vez que não são coincidentes os dados do diagnóstico
clínico, obtido por meio da anamnese neuropsicológica com
dados fornecidos pela técnica assistente social.
Apresenta, também, défices na meta memória e uma ligeira
compreensão do funcionamento da sociedade, juízo crítico e
social, possivelmente relacionado com o seu nível fraco de
aquisição da informação geral.
Sublinha-se o pobre insight e fraca capacidade de encontrar
o seu equilíbrio emocional e social, de acordo com o seu
nível etário e sócio laboral. Tais aspetos produzem prejuízo
significativo no desempenho quotidiano de A.
Crê-se que os dados acima referidos, os hábitos etílicos,
associados à presença de sintomatologia depressiva e
ansiosa em A., sugerida pela Escala de Depressão Geriátrica -
GDS (Simões et al., 2010a), e pelo Inventário de Ansiedade
Geriátrica - GAI (Ribeiro, Paúl, Simões & Firmino, 2011),
estarão a comprometer o seu funcionamento cognitivo.
Face ao que foi anteriormente mencionado, assim como ao
nível de funcionamento cognitivo pré-mórbido, nível
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socioeconómico, história profissional e dependência
alcoólica estipula-se que A. Vê-se acometido por Síndrome
de Wernicke-Korsakoff.
Considerações finais
Os baixos resultados apresentados nos testes
neuropsicológicos e as elevadas pontuações obtidas na
avaliação do domínio sócio-afectivo (GDS e GAI), podem ser
explicados pela presença de um quadro fenomológico típico
do que é classicamente denominado por Síndrome
Wernicke-Korsakoff, o que se traduz na dificuldade em
efetuar uma auto-bibliografia (fortemente marcada pela
confabulação), afeção das dimensões mnésicas e de
manutenção de níveis acentuados de atenção e
concentração deficitários (Isenberg-Grzeda, Kutner &
Nicolson, 2012).
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Agradecimentos
Ao Peroneo - Vida e Saúde.
Conflito de interesses
A autora declara não ter nenhum conflito de interesses
relativamente ao presente artigo.
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A “Aceitação da Diferença” pós-AVC, pela Psicologia Cognitiva Narrativa
Hélder Lopes (1) & Luis Maia (2)
(1) Clinical Psychologist; MSc in Psychology (Coimbra University). All correspondence about this article should be sent to email: [email protected].
(2) Beira Interior University PhD in Neuropsychology by Salamanca University – Professor at Beira Interior University.
_________________________________________________________________________________
Abstract
The combination of a functional severity with the triggering emotional distress and installed, which are interwoven with human weakness evidenced on
dependence "versus" independence, produces an emotional distress almost inaccessible and often overlooked in the field of emotional understanding. The
new functional, sensory and cognitive reality mirrors an unchangeable Difference that requires an Acceptance. The Acceptance is directly linked to the process
of personalization. All the personalization process is intertwined with the Narrative relational competence by writing a story to which the caller calls "I". The
Narrative system allows you to access the underlying processes of self-representation; that is essential to understand the Organization of personality, or in the
case of a patient that have suffered a Stroke (CVA), after the accident, understand the reconstruction of personal identity and inevitably in the acceptance of
Difference.
The world is not what exists, but what happens. Happens is the main element of the narrative. Based on this statement we presented this clinical case which
demonstrates the efficacy and efficiency of application of cognitive psychology in accepting the Narrative difference in a patient victim of stroke without
cognitive sequelae, but with standard dysfunctional emotional antecedent to CVA and post stroke, increased functional dependency, with significant
evolutionary positive prognosis. We applied the narrative descriptive model Prototype of basic events in personal life, whose construction requires a collection
of elements from various other consequential or previous narratives of the main narrative. The therapy took place in 17 weekly sessions that resulted in the
acquisition of functional and balanced emotional behaviors, either in the family context, whether socially, sleep longer, suitable acceptance of difference,
acquisition of decision-making capacity, intervention and participation in individual or oriented group tasks. The narrative produced along the therapy resulted
in a representative story of an era in the history of Portugal of very difficult times and full of emotions that will be published soon.
Keywords: acceptance of Difference, CVA, cognitive psychology.
Resumo
A conjugação de uma severidade funcional com o sofrimento emocional desencadeante e instalado, que se entrelaçam com a fragilidade humana evidenciada
na dependência “versus” independência, produz um sofrimento emocional quase inacessível e muitas vezes negligenciado no campo do entendimento
emocional. A nova realidade funcional, sensitiva e cognitiva espelha uma Diferença inalterável que necessita de uma Aceitação. A Aceitação está diretamente
ligada ao processo de personalização. Todo o processo de personalização confunde-se com a atualização da competência Narrativa pela redação relacional de
uma história a que o interlocutor chama de “eu”. A Narratividade permite aceder a processos latentes de autorrepresentação essenciais para compreender a
organização da personalidade, ou no caso do doente pós-Acidente Vascular Cerebral (AVC), na reconstrução da identidade pessoal e inevitavelmente na
Aceitação da Diferença.
O Mundo não é o que Existe, mas o que Acontece. Acontece é o elemento principal da Narrativa. Sustentados nesta afirmação desenvolveu-se o presente Caso
Clínico onde se demonstra a eficácia e eficiência da aplicabilidade da Psicologia Cognitiva Narrativa na Aceitação da Diferença no doente vítima de AVC sem
sequelas cognitivas, mas com padrão emocional disfuncional antecedente ao AVC e potencializado pós-AVC e de significativa dependência funcional com
prognóstico evolutivo positivo. Aplicamos a Narrativa Protótipo, modelo descritivo de acontecimentos basilares da vida pessoal, cuja construção exige uma
recolha de elementos de vários outras narrativas consequentes ou precedente da narrativa principal. A terapia decorreu em 17 sessões semanais de que
resultou a aquisição de comportamentos emocionais funcionais e equilibrados, quer em contexto familiar, quer socialmente, o sono mais longo e recuperador,
observa-se adequada aceitação da diferença, aquisição da capacidade de tomada de decisão, intervenção e participação nas tarefas de cariz individual ou em
grupo. Da narrativa produzida ao longo da terapia resultou uma história representativa de uma época da Historia de Portugal de tempos muito difíceis e cheios
de emoções que irá ser publicada brevemente.
Palavras-chave: Aceitação da Diferença, AVC, Psicologia Cognitiva Narrativa.
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Resumen
La combinación de una severidad funcional con la activación emocional e instalada, que se entrelazan con la debilidad humana, evidenciada en dependencia
"versus" independencia, produce una angustia emocional casi inaccesible y a menudo pasado por alto en el campo de la comprensión emocional. La nueva
realidad funcional, sensorial y cognitiva refleja una diferencia inmutable que requiere una Aceptación. La Aceptación está directamente relacionada con el
proceso de personalización. Todo el proceso de personalización se entrelaza con la escrita de una narrativa y competencia relacional en una historia a que el
narrador llama "Yo". El sistema de narración permite acceder a los procesos subyacentes de auto-representación, esencial para entender la organización de la
personalidad, o en el caso de enfermos con accidente cerebrovascular (ACV), después del accidente, entender la reconstrucción de la identidad personal e
inevitablemente la aceptación de la Diferencia.
El mundo no es lo que ya existe, pero lo que pasa. Sucede que esto es el elemento principal de la narrativa. Basado en esta declaración hemos presentado este
caso clínico que demuestra la eficacia y la eficiencia de aplicación de la psicología cognitiva en aceptar la diferencia narrativa en un paciente víctima de CVA sin
secuelas cognoscitivas, pero con el antecedente emocional disfuncional estándar y dependencia funcional con pronóstico evolutivo significativo positivo.
Aplicamos el modelo descriptivo narrativo prototipo de eventos básicos de vida personal, cuya construcción requiere una colección de elementos de varias
otras narrativas consecuentes o anteriores de la narración principal. La terapia tuvo lugar en 17 sesiones semanales que resultó en la adquisición de
comportamientos emocionales funcionales y equilibrados, sea en el contexto de la familia, socialmente, dormir más, aceptación conveniente de la diferencia,
adquisición de la capacidad de toma de decisiones, intervención y participación en relaciones individuales o grupales. La narración se produce a lo largo de la
terapia y resultó en una historia representativa de una época en la historia de Portugal de tiempos muy difíciles y llena de emociones que se publicará pronto.
Palabras clave: aceptación de la psicología cognitiva de la Diferencia, VCA.
_________________________________________________________________________________
Introdução
Percorrendo pela compreensão entre as emoções
desencadeantes após o Acidente Vascular Cerebral (AVC) e
as emoções instaladas pela história de vida do indivíduo são
determinantes na planificação técnica para a reabilitação,
reorganização cognitiva e funcional do doente. A conjugação
de uma severidade funcional com o sofrimento emocional
desencadeante e instalado que se entrelaçam com a
fragilidade humana evidenciada na dependência versus
independência produz um sofrimento emocional quase
inacessível e muitas vezes negligenciado no campo do
entendimento emocional.
A conceção da diferença faz desencadear novas dinâmicas
emocionais mas também deixam mais expostas as
anteriores porque as resistências estão com défice; este
fenómeno faz desencadear ansiedades persecutórias,
manifestadas por comportamentos de culpa, repugnância,
negação e a incapacidade de verbalizar o sofrimento
intrínseco aumentado ao existente e de forma significativa.
A nova realidade funcional, sensitiva e cognitiva espelha
uma Diferença inalterável que necessita de uma Aceitação. A
Aceitação está diretamente ligada ao processo de
personalização. Todo o processo de personalização
confunde-se com a atualização da competência Narrativa
pela redação relacional de uma historia a que o interlocutor
chama de “eu”. A Narratividade permite aceder a processos
latentes de autorrepresentação essenciais para
compreender a organização da personalidade ou no caso do
pós-AVC na reconstrução da identidade pessoal e inevitável
“Aceitação da Diferença”
A Psicoterapia Cognitiva Narrativa é um processo que
concede aos pacientes o poder de potencializar as histórias
vividas através da complexidade dos seus próprios Mundos.
A utilização deste modelo de abordagem psicológica
contribui efetivamente e eficazmente no acesso aos
processos de autorrepresentação do doente, resultantes
pela conjugação das emoções antecedentes e as
consequentes ao Acidente Vascular Cerebral e
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consequentemente na reestruturação da Personalidade
Consequente.
O presente Caso Clínico demonstra a eficácia e eficiência da
aplicabilidade da Psicologia Cognitiva Narrativa na Aceitação
da Diferença no doente vítima de Acidente Vascular Cerebral
(AVC) de consequência cognitivas ligeiras mas de
significativa dependência funcional.
O Mundo não é o que Existe, mas o que Acontece. Acontece
é o elemento principal da Narrativa, (Gonçalo, 2002).
Sustentado nesta afirmação desenvolveu-se o presente Caso
Clínico onde se demonstra a eficácia e eficiência da
aplicabilidade da Psicologia Cognitiva Narrativa na Aceitação
da Diferença no doente vítima de AVC de sequelas cognitivas
ligeiras, de padrão emocional disfuncional mantido pós-AVC
e de significativa dependência funcional com prognóstico
evolutivo positivo. Aplicamos a Narrativa Protótipo, modelo
descritivo de acontecimentos basilares da vida pessoal, cuja
construção exige uma recolha de elementos de vários outras
narrativas consequentes ou precedente da narrativa
principal. Suportado em 3 fases terapêuticas: a Recordação
onde o objetivo principal é o de intencionalizar o trabalho
terapêutico ao nível da estrutura da narrativa tendo em vista
a diferença do seu grau de coerência.
A coerência narrativa por sua vez é correlativa da presença e
diferenciação de quatro elementos fulcrais nesta fase
terapêutica são eles: a orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e a integração. De seguida a
Adjetivação que está focalizada nos elementos de
objetivação, subjectivização emocional e cognitiva e
metaforização para que no processo narrativo o grau de
complexidade seja crescente e finalmente a Projeção nesta
última fase procura-se a organização o trabalho
desenvolvido nos contexto dos conteúdos das narrativas
realizadas motivando o paciente a introduzir elementos de
ampla diversidade que sejam indicadores de retractivos e
proactivos de uma existência diversa e flexível, para isso
sustenta-se o objetivo em quatro elementos a diversidade
temática, a de personagens, de ações e de contextos.
Caso Clínico
O Sr. JVL um individuo do sexo masculino com 67 anos
atualmente, vive com a esposa em casa própria, individuo
sem hábitos tabágicos ou alcoólicos, reformada de industria
vidreira e a frequentar a Licenciatura em Restauro no
Instituto Politécnico de Tomar. Em 27 de junho de 2011 o Sr.
JVL foi vítima de AVC isquémico associado a Hipertensão
Tensão Arterial. Vem referenciado da Consulta de Medicina
Física e Reabilitação com sequelas de AVC isquémico,
acontecido em 27/06/2011; apresentava uma hemiparesia
direita com associação de afasia, evidenciado por TAC CE de
entrada realizada em 27/06/2011, registando-se em
relatório de alta ausência de anomalias intra-
parenquimatosas focais sugestivas de lesão vascular
isquémica ou hemorrágica. O sistema ventricular, sulcos
corticais e cisternas basais apresentam-se permeáveis, a
estrutura da linha média sem deformação ou qualquer
desvio posicional.
Sr. JVL está colaborante, orientado e afável, apresenta
labilidade persistente, as palavras saem com dificuldade, a
ansiedade está presente, assim como o desânimo, a
desesperança e o sentir-se só. A revolta e a auto depreciação
são rígidas, o discurso é coerente, responde com prontidão a
todas as perguntas.
Foi realizada a avaliação psicológica, emocional e cognitiva
através dos testes IACLADE, SCL-90R e AVALIAÇÃO
COGNITIVA de ADDENBROOKE.
Pela avaliação inicial realizada o Sr. JVL apresentava um
adequado nível cognitivo 79 pontos (pontuação máxima 100
pontos) na Avaliação Cognitiva de Addenbrooke,
caracterizado por boa capacidade funcional de Atenção e
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Orientação espaço temporal 13 pontos (pontuação máxima
18 pontos). Para a Memoria imediata, anterógrada e
retrógrada obteve 20 pontos (pontuação máxima 26
pontos), na Fluência Verbal pontuou 8 (pontuação máxima
14 pontos), mostrou défice na produção de palavras com
ordem. A Linguagem é de discurso coerente e fluente
responde de forma correta a todas as tarefas, obteve 23
pontos (pontuação máxima 26 pontos) observa-se défice
ligeiro particularmente na retenção e repetição para as
palavras fora do uso comum e superiores a cinco silabas.
Responde com boa qualidade a ordens e utiliza com destreza
e facilidade a caneta para os movimentos finos nas provas
viso - espacias, respondendo com boa qualidade nas provas
do desenho. Emocionalmente pelas provas realizadas
apresenta Perturbação do Estado de Humor de quadro
semiológico caracterizado por tristeza, com labilidade
persistente, pessimismo, fracasso, culpa acentuada,
comportamentos hesitantes, desvalorização, com forte
recurso ao próximo para todas as tarefas e decisões. A
hostilidade que é confirmada pela esposa, é caracterizada
por irritabilidade, isolamento, indecisão, dificuldade para
tomar a iniciativa para vários contextos e o sono é
superficial, agitado, curto no tempo e com forte dificuldade
para o iniciar. Verifica-se ainda a existência de pensamentos
perturbantes sobre si próprio.
No Sr. JVL está presente a vulnerabilidade nos estados de
ânimo, contestatário na maior parte do tempo, recurso ao
isolamento, significativa irritabilidade sempre que as coisas
não lhe correm a “jeito”, focalização persistente na
experiencia militar passada há mais de 20 anos. Durante o
sono que é muito perturbante também fala sobre o mesmo
assunto. É mantido desde há muito um mal-estar psicológico
persistente que é antecedente ao AVC, relato corroborado
pela esposa. O pensamento negativo generalizado e de
julgamento negativo particularmente sobre os
acontecimentos sociais são persistentes e recorrentes.
Observa-se um estado de luta/fuga ao longo de toda a
entrevista clínica de avaliação; bem como um estado de
alerta e de reação impulsiva sobre a maioria dos
acontecimentos. Na correlação dos resultados obtidos na
avaliação Psicoemocional, podemos afirmar que o Sr. JVL
apresenta uma perturbação do Estado de Humor Grave de
etiologia Depressiva Grave cuja epidemiologia é Stress pós-
traumático mantido desde a experiencia militar vivida para
mais de 20 anos.
O Sr. JVL foi um combatente da Guerra do Ultramar e esteve
na Guiné. Num cenário de Guerra que descreve como muito
difícil e perturbante, que ainda hoje passados mais de 20
anos, recorda como se tudo estivesse a acontecer agora.
Percebe-se que o padrão emocional instalado tem forte
influência no padrão emocional consequente ao AVC e que o
primeiro está incluso nas emoções resultantes de um
conjunto vasto de episódios marcantes decorridos neste
período de vida. Cognitivamente apresenta boa
funcionalidade o que permite o recurso a uma modelo de
intervenção terapêutica focado na reabilitação dos
comportamentos de resposta. A periodicidade foi semanal e
a abordagem psicoterapêutica utilizada foi a narrativa-
protótipo funcionando também como reabilitadora
emocionalmente e cognitivamente para os comportamentos
resposta. Com o objetivo principal de reabilitar o Sr. JVL nos
comportamentos de resposta sobre as relações internas e
externas, promover a Aceitação para o novo Eu e
redirecionar os desejos e as expectativas; Restaurar a
motivação a integração no meio familiar e social, reabilitar a
capacidade para a tomada de decisão e promover o
aumento do grau de independência para as atividades da
vida diária; Implementar a capacidade de adaptabilidade
para que a nova condição do Self não possa ser impeditiva
na concretização das conquistas desejadas.
O Sr. JVL teve um programa de estimulação/reabilitação
através da realização em consulta e em atividades em casa
através de jogos direcionados para as atividades de função
executiva, gnosias, atenção e concentração, linguagem,
memoria e praxia. Para além de realizar em casa uma
abordagem escrita sobre a experiencia militar, através de
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um relato por onde passou, as várias ações em que
participou, quer em contexto de formação militar, quer em
contexto de guerra, assim como as datas correspondentes.
Tudo deve estar contextualizado sobre si-próprio;
participação, intervenção e as emoções desencadeantes em
cada momento e foi alvo de discussão em cada consulta.
No decurso da proposta, o Sr. JVL mostra forte emoção ao
falar no tema ao mesmo tempo que faz resistência através
da referência a vários elementos incapacitantes para a
concretização da tarefa. Nas consultas seguintes
continuamos a abordagem ao tema também como forma de
solidificar a relação terapêutica e consequentemente a
confiança.
O tema começou a ganhar corpo e é observável o
entusiasmo para a tarefa, nas consultas consequentes, o Sr.
JVL apresenta-se com uma narrativa resumida em forma de
hierarquia de acontecimentos, representativa da recordação
sobre os acontecimentos importantes no percurso militar,
discutimos várias partes da narrativa escolhidas pelo Sr. JVL.
Constata-se o padrão de escolha sempre focado naquelas
que envolveram maior perigo, maior exposição e um maior
grau de destruição e perda, mas também um maior grau de
intervenção sua, face ao grupo. Cognitivamente está a
aumentar a qualidade da palavra dita, a sua articulação
fonética e também a qualidade da escolha da palavra.
Apresenta melhor apreciação sobre si-próprio, a motivação
está presente, as tarefas sobre as atividades de estimulação
e reabilitação cognitivas são realizadas com boa qualidade,
Conclui-se a I fase da terapia,
Na Fase II reduzimos a realização dos jogos de reabilitação
das funções cognitivas e aumentamos a produção da
narrativa, o Sr. JVL tem agora que dar à narrativa os aspetos
ou elementos sensoriais, como as emoções e as cognições
colocando a caracterização das pessoas locais, as cores do
meio ambiente onde estavam inseridos, os cheiros, os
sentimentos e as emoções despertos em cada
acontecimento e os significados assimilados.
Toda a riqueza de pormenor explicita em cada descrição
verbal muito entusiasmada e entusiasmante, (confesso),
fosse colocada na narrativa.
O Sr. JVL recebe e cumpre com entusiasmo a nova tarefa, a
esposa referencia que os comportamentos do Sr. JVL são
mais equilibrados, mostrando uma nova vontade sobre a
vida, a importância sobre si-próprio está a recuperar e é
efetiva.
Mostra maior organização, melhora o planeamento e
acontece o “descarregar” das emoções instaladas. Através
da Adjetivação é possível observar a intensidade de como as
emoções instaladas e antecedentes ao acontecimento de
AVC tem um papel influenciador dos comportamentos atuais
de resposta. Para isso subdividimos o processo Adjetivação
em três subgrupos; a Objetivação com o papel de
desenvolver uma complexificação sensorial de toda a
experiencia adquirindo uma forma de detalhe, não só para o
próprio como também um processo de co construção para o
exterior, é como que uma porta de entrada para a
sensorialidade da narrativa, construindo os alicerces para
querer a Subjetivação, a conquista do ambiente interno do
paciente que através do detalhe é possível exteriorizar e
clarificar os processos emocionais e cognitivos intrínsecos à
experiencia traumática, esta também constitui um processo
de discriminação progressiva da significação da experiencia
vivida que nos leva aos processos emocionais mais internos,
finalmente pelo terceiro grupo a Metaforização que são
formas de condensação do significado sobre cada elemento.
O Sr. JVL é convidado a introduzir na construção narrativa
elementos de forte multiplicidade de significados, cores,
cheiros e sons para que seja clarificado o sentido da
experiencia e desta forma conseguir sair significativamente
do estado de embotamento pelos processos de significação.
Durante a discussão da narrativa produzida é possível
observar uma diminuição do grau de hostilidade embora
esta já pontual e na maioria das vezes focada na Historia a
produzir. As relações conjugais tomam um novo rumo, a
frustração é melhor gerida durante uma boa parte do
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tempo. Na discussão mantem o mesmo foco escolhe, textos
ricos de significado, onde descreve os acontecimentos de
forte agressividade e onde o JVL tem um papel importante
no desenrolar da ação. A discussão faz-se de forma muito
viva e intensa e chama novos detalhes que são
transportados para a nova realidade instalando
comportamentos adaptativos e motivadores para o novo
futuro.
A III fase da terapia é centralizada apenas na narrativa do
acontecimento vivido; é introduzido o elemento fulcral da
terapia: a Projeção, que se trata de um processo que visa
lidar com os conteúdos da narrativa, personagens, ações e
situações vividas. Trata-se da exploração do vivido é como
que um refazer a história com a nova experiencia adquirida.
Em todos os processos da construção narrativa fizeram
desencadear novos sentimentos e com eles é avaliado e
refeita a historia vivida. Esta fase terapêutica tem subjacente
o objetivo fulcral de proporcionar ao Sr. JVL a não
manutenção na contemplação narcísica da experiencia
vivida, de tomar consciência de que o único elemento que se
manterá é o da Mudança, ao mesmo tempo interromper de
forma eficaz e eficiente o recurso persistente à redundância
de elementos, tema e sentimentos incutindo-o a utilizar na
narrativa produzida novas formas para descrever os
contextos e as dinâmicas emocionais vividas. O Sr. JVL sente
a mudança e esta é explícita e consistente. Os temas agora
escolhidos para debate na terapia são já tratados de forma
pedagógica, ao invés de meras descrições empolgadas,
mostra cuidados em passar a mensagem e aceita o debate.
A relação com o exterior é mais capaz, a tolerância nos
comportamentos e atitudes na relação conjugal é agora
sólida, existe bom reconhecimento da família. Sr. JVL deseja
publicar a sua historia, e está determinado a faze-lo, mostra
forte disponibilidade para relançar a sua vida, constrói
desejos, reflete sobre eles e apresenta-os de forma
estruturada e adequadamente planeada.
Foi realizada nova avaliação psicologia e emocional
utilizando os mesmos instrumentos pelo que o estado de
tristeza, pessimismo, fracasso, culpa, foi substituído por
dinamismo, auto reconhecimento, aumento da auto estima
e vontade em realizar pequenos trabalhos domésticos como
o aproveitamento de um espaço na sua casa para a criação
de um ginásio como forma de dar continuidade aos
exercícios físicos realizados no âmbito da fisioterapia. A
hostilidade e a irritabilidade estão significativamente
diminuídas, a tolerância está presente e sólida, não existe
recurso ao isolamento, a tomada de iniciativa está presente
e o sono passou a ser restaurador e repousante.
O pensamento negativo generalizado e de julgamento
negativo particularmente sobre os acontecimentos sociais
que eram persistentes e recorrentes, observados no início
da terapia deram lugar a uma nova forma de se relacionar
com o Mundo exterior, melhor observador, mais cuidado na
análise através de uma melhor escuta e consequentemente
melhoria na qualidade da mensagem produzida. Observa-se
uma postura geral mais equilibrada e cuidada na forma de
relação com o Exterior.
Discussão/Conclusão.
O presente caso clinico torna-se importante porque no
processo de avaliação dos danos cognitivos e emocionais
subjacentes ao pós-AVC foi percetível a presença de uma
etiologia ligeira dos danos cerebrais de bom prognóstico e
uma sintomatologia neuropsicológica associada mas
também revelou uma outra sintomatologia instalada para
mais de 20 anos cuja etiologia é Perturbação Traumática de
Guerra.
A avaliação psicoemocional realizada ao doente corrobora
com os resultados obtidos pelos estudos desenvolvidos com
ex-combatentes dos Estados Unidas da América
participantes na Guerra do Vietname que confirmam a
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presença de défices neuropsicológicos ao nível da memória,
atenção, aprendizagem e défices executivos (Vasterling,
Duque, Brailey, Constans, Allain &Sutker, 2002), assim como
também os défices emocionais estão presentes e suportados
igualmente pelos resultados dos estudos realizados em PTSD
onde se confirma a atrofia do hipocampo, o mau
funcionamento da amígdala, entre outros, que
desencadeiam processos comportamentais de irritabilidade,
suspeição, hostilização para com o exterior, impaciência e
auto isolamento social como forma mais confortável de
bem-estar, para além de anedonia persistente, baixa auto
estima e auto-depreciação. O sono é geralmente
intermitente fragmentado, agitado e pouco eficaz o mesmo
observado no doente. Apesar de o quadro semiológico do
doente ter forte sustentabilidade na conceptualização
teórica observa-se que o padrão emocional instalado tem
forte influência no padrão emocional consequente ao AVC e
que o primeiro está incluso nas emoções resultantes de um
conjunto vasto de episódios traumaticamente marcantes
decorridos no período de vida correspondente à
participação do doente na Guerra do Ultramar.
A opção pelo modelo de intervenção terapêutica Narrativa-
Protótipo tem o objetivo principal de reabilitar o doente nos
comportamentos sobre as relações interoceptivas e
exteroceptivas, promover a Aceitação para o novo Eu ao
mesmo tempo que redireciona os desejos e as expectativas.
A sustentabilidade teórica deste modelo de abordagem
psicológica em associação com a reabilitação cognitiva
sustentada em jogos para as atividades funcionais, alicerça-
se no que Couto (2000) sustenta:
- O Mundo não é o que existe, mas o que acontece, o que faz
com que todo o indivíduo em cada momento possa ser o
responsável do resultado da interpretação que faz sobre o
acontecimento.
A Narrativa é o constructo do acontecimento, onde o foco
está no acontecimento, logo impõe-se que no exercício da
intervenção psicológica o recurso ao conceito da ação
sustentada no conhecimento como execução
ecologicamente e temporalmente situado é essencial. Pio de
Abreu (2000) conceptualiza, que, pela linguagem se constrói
intencionalmente a experiencia de cada indivíduo e esta
através da sua configuração narrativa constitui
simultaneamente o meio e o fim de um processo
terapêutico. Ao mesmo tempo que conceptualizado por
Gonçalves (2000), o conhecimento coabita num processo
ativo desencadeado pela transformação ininterrupta do
meio ambiente pertença de cada indivíduo, todos os seres
vivos são organizações de conhecimento, mas só o Homem e
através das funções cerebrais capazes de organizar as nossas
próprias experiencias no que concerne à linguagem, sendo
através destas que é possível construir significações de
duplo sentido in e out (Fischer, 1987). Também será por este
recurso que é possível sociabilizarmos o conhecimento
adquirido, isto é, a linguagem toma um papel mediador intra
e interpessoal permitindo a construção cooperada de
significados.
Ao fazermos a proposta ao doente para narrar os
acontecimentos vividos inclusos no período de vida
correspondente à sua participação na Guerra do Ultramar
particularmente na Guiné foi possível promover a
exteriorização de uma atividade introversiva cujas
resistências tornaram-se mais frágeis. A exteriorização desta
atividade sustentada no Modelo Narrativa-Protótipo
resultou numa alteração interpretativa dos vários
acontecimentos vividos. O reencontro com a história vivida
veio igualmente promover a exteriorização e abordagem de
alguns acontecimentos vividos que devido ao sofrimento
significativamente severo associado eram frequentemente
negados e repudiados. O encontro narrativo feito com o
mundo interno, promoveu um equilíbrio nunca atingido com
o mundo externo ao mesmo tempo que os défices
psicoemocionais associados aos pós AVC tornaram-se
residuais e de fácil controlo.
A Narratividade permitiu aceder aos processos latentes de
autorrepresentação essenciais para compreender a
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organização da personalidade do Sr. JVL, e desta forma
contribuir eficazmente na reconstrução da identidade
pessoal e inevitavelmente na Aceitação da Diferença. A nova
realidade funcional, sensitiva e cognitiva espelha uma
Diferença inalterável que necessita de uma Aceitação foi
atingida e é mantida por um conjunto de atividades diárias
ligadas a esta mesma historia como também na aplicação de
conhecimentos adquiridos na construção de pequenos
aparelhos de exercícios físicos para a manutenção física em
casa.
Referencias Bibliográficas
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Estudos de Casos Clínicos
Alterações neuropatológicas entre indivíduos com Doença de Alzheimer e Portadores de
Trissomia 21
Maria João (1) & Luis Maia (2)
(1) Child Education Degree (Coimbra University). All correspondence about this article should be sent to email: [email protected]. (2) Beira
Interior University PhD in Neuropsychology by Salamanca University – Professor at Beira Interior University.
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Abstract
In the last years have been published several works of avant-garde and international recognition, which try to identify genetic factors of
neuropathologic connection between dementia Alzheimer type and trisomy 21. This study follows a design of exploratory analysis variance blending
qualitative and quantitative data. The sample was composed through a casual methodology for accessibility or convenience sampling (patient with
Alzheimer's Type dementia and people with Trisomy 21). It is expected to have given a contribution to the understanding of the features common to
the subjects referred to populations using robust recognized instruments and a mixed analysis methodology. It would be interesting to continue this
study with a wider sample and subject of both genders, because the data that met with empirical research refer to the practice of
Neuropsychological rehabilitation for the need to slow the memory deficits in Patients with Trisomy 21 in Alzheimer's Patients.
Resumo
Nos últimos anos tem sido vários os trabalhos de ponta, de reconhecimento internacional, que identificam fatores de ligação genética e
neuropatológica entre a demência tipo Alzheimer e Trissomia 21. O presente estudo segue um desenho correlacional exploratório com recurso a
uma metodologia de análise de dados mista qualitativa e quantitativa. A amostra foi composta através de uma metodologia não aleatória mas por
amostragem por acessibilidade ou conveniência (paciente com Demência de Tipo Alzheimer e portadores de Trissomia 21). Espera-se ter dado um
contributo para a compreensão das características comuns aos sujeitos das populações referidas com utilização de instrumentos de reconhecida
robustez e uma metodologia de análise mista. Seria interessante dar continuidade a este estudo com uma amostra mais alargada e sujeitos do
género masculino, pois os dados que se encontraram com investigação empírica remetem a nível da prática da reabilitação neuropsicológica para a
necessidade de retardar os défices na memória tanto nos Portadores com Trissomia 21 como nos Doentes de Alzheimer.
Resumen
En los últimos años han sido publicados varios trabajos de vanguardia y reconocimiento internacional, que buscan identificar factores genéticos de la
conexión neuropatológica entre demencia tipo Alzheimer y trisomía 21. El presente estudio sigue un diseño de varianza con una metodología de
análisis exploratorio mezclando datos cualitativos y cuantitativos. La muestra fue compuesta tomando una metodología que permitiese la
accesibilidad por conveniencia a los enfermos (Demêcia de tipo Alzheirmer y enfermos con trisomía 21). Se espera que el contenido que se refiere a
las poblaciones utilizando instrumentos de robustez reconocida y una metodología de análisis mixta haya dado una contribución a la comprensión de
las características comunes de las dos enfermedades. Sería interesante continuar este estudio con una muestra más amplia y con sujetos masculinos,
porque los datos que se reunieron con esta investigación empírica se refieren a la práctica de la rehabilitación neuropsicológica y llaman la atención
para la necesidad de reducir los déficits de memoria en enfermos con trisomía 21 y en enfermos con Alzheimer.
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Introdução
“As alterações neuropatológicas de pessoas com Trissomia 21 são idênticas às observadas nos indivíduos com Doença de
Alzheimer, surgindo em idades relativamente precoces (...).” (Paula Breio, 2012).
Nos últimos anos têm sido vários os trabalhos de ponta,
de reconhecimento internacional, que identificam
fatores de ligação genética e neuropatológica entre a
demência de tipo Alzheimer e Trissomia 21.
A Doença de Alzheimer (DA) é uma doença neuro-
degenerativa do Sistema Nervoso Central, sendo a forma
mais comum de demência, cujos primeiros sintomas são
a perda de memória “demência amnésica” e da
capacidade de atenção que culminam em défice
cognitivo.
A característica fisiopatológica mais importante da DA é
a formação de placas neuríticas, cujo principal
componente é o peptídeo β-amilóide (Aβ). O Aβ é um
peptídeo formado a partir da proteína percursora do
amilóide (APP), responsável pela regulação do
desenvolvimento celular. Esta proteína está localizada no
cromossoma humano 21 (de Mendonça & Maia, 2002;
Maia, 2001; Maia e de Mendonça 2002 a, b).
Os portadores de Trissomia 21 possuem uma cópia extra
do cromossoma 21, apresentando uma expressão
elevada de APP, e por isso irão apresentar as lesões
anatomopatológicas características da DA (Goldgaber,
Lerman, McBride, Saffiotti & Gajdusek, 1987).
Neste sentido algumas pesquisas têm demonstrado a
relação da Trissomia 21 com a predisposição de acúmulo
precoce de APP e o aparecimento da DA, e,
paralelamente, estudos recentes têm demonstrado uma
maior incidência de indivíduos com demência entre os
portadores de Trissomia 21, principalmente em idades
superiores a 35 anos (Rehens, 2011). O avançar da idade
para estas pessoas é um fator de risco importante.
Notavelmente, pacientes com Trissomia 21 desenvolvem
alterações neuropatológicas semelhantes às de pacientes
com a DA, diferindo apenas na idade precoce de início
(Zanaigh, 2006). A partir dos 40 anos, parte dos
portadores de Trissomia 21 apresentam, nos exames de
ressonância magnética, alterações compatíveis com a
DA, sugerindo declínio cognitivo. O quadro clínico,
porém, só é percetível mais tarde (Robbins & Cotran,
2005).
Segundo o estudo de Goldgaber et al. (1987) a
característica genética do Alzheimer ou FAD (Familial
Alzheimer Disease) pode apresentar no mínimo cinco
mutações de genes que causam a doença de Alzheimer.
A posição de um destes genes (FAD1) encontra-se no
cromossoma 21, o que justifica o fato dos portadores de
Trissomia 21 possuírem uma maior predisposição para
manifestar Alzheimer.
Um estudo do Instituto de Neurociências de Castilla e
León (2010), recorda a ligação genética entre a DA e a
Trissomia 21 em modelos experimentais que usam
animais, (e.g., os camundongos). Segundo este estudo,
existem distintos modelos de camundongos transgênicos
que detêm um gene ou vários com variadas cópias
análogas às da síndrome de Down. No caso do
camundongo Ts16, estes têm uma parte do cromossomo
16 “triplicada”. Uma linhagem de camundongos
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apresenta trissomia no cromossoma 16 (equivalente ao
cromossoma 21 em seres humanos) e diversas
características dos portadores de Trissomia 21. A
principal vertente destes trabalhos é o tema do
envelhecimento e o surgimento da patologia de
Alzheimer.
Outro estudo do Instituto de Biociências da Universidade
de São Paulo chegou à conclusão que portadores de
Trissomia 21 apresentam um risco mais elevado para
desenvolver a doença de Alzheimer do que a população
em geral, pois o cromossoma extra 21 abriga genes
associados à doença neuro-degenerativa. O Este estudo
teve como objetivo analisar a expressão de microRNAs
associados à doença de Alzheimer no hipocampo de
camundongos, modelos da trissomia do cromossoma 21
humano, a fim de entender a relação dos miRNAs com a
agregação proteica característica da neurodegeneração
(Ferrarri, 2013; Robbins & Cotran, 2005).
Neuropsicologia na Doença de Tipo Alzheimer
A DA é uma patologia neuro-degenerativa que tem como
causa principal uma diminuição gradual de tecido
nervoso central, acompanhado de perda de funções
cerebrais. É a mais frequente das demências que afetam
o sistema nervoso com uma progressiva desorganização
das funções psíquicas (de Mendonça & Maia, 2002; Maia,
2001; Maia e de Mendonça 2002 a, b).
Inicialmente os doentes apresentam perdas de memória
pontuais que se confundem com as alterações normais
do processo de envelhecimento. À medida que a
patologia evolui acentuam-se os problemas relacionados
com a memória, bem como o declínio de outras funções
cognitivas (e.g., atenção, concentração, linguagem,
pensamento). Este quadro é resultado da perda de
comunicação entre neurónios (células nervosas) de
diferentes áreas cerebrais e, eventualmente, a morte de
muitas destas células. À medida que estas lesões se
propagam para várias regiões cerebrais, existe um
agravamento do quadro clínico (Robbins & Cotran, 2005;
Maia, 2001).
Sendo uma degeneração progressiva, a DA é
caracterizada por alterações da personalidade e ou do
comportamento; estados de ansiedade ou depressão,
deterioração progressiva das funções psíquicas
superiores, perturbações da memória, do
reconhecimento (gnosia), da orientação no espaço e no
tempo, de todas as formas de pensamento e da
linguagem (afasia), e dificuldades da motricidade (praxia)
que podem ser profundas (Maia, 2001).
A DA está dividida em 3 estadios evolutivos (dependendo
das várias classificações internacionais, sendo todavia
esta a que nos faz mais sentido aqui fazer referência): a)
DA Ligeira, em que o doente de Alzheimer apresenta
pequenos problemas de memória, como lembrar eventos
recentes, nomes de familiares ou localização de objetos;
b) DA moderada que consiste na perda de memória e
desorientação que se tornam cada vez mais evidentes.
Os doentes apresentam dificuldades em reconhecer
amigos e familiares, desorientação no tempo e no
espaço, e a capacidade de raciocínio e julgamento
também está comprometida; c) DA severa, é o último
estadio da doença, no qual o paciente deixa de reagir a
estímulos. Nesta fase o doente necessita de apoio em
todas as suas atividades diárias, sendo incapaz de
reconhecer familiares e amigos; a sua capacidade de
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comunicação é muito limitada podendo a linguagem
expressiva estar completamente comprometida (Maia,
2001).
No sentido de aliviar alguns dos sintomas e melhorar a
sua qualidade de vida, estes pacientes tomam medicação
para atrasar o desenvolvimento da doença e tratar as
perturbações e alterações comportamentais associadas a
esta (Robbins & Cotran, 2005).
Reabilitação
Na DA os sintomas e a progressão do declínio das
funções variam de paciente para paciente, não só devido
às características da personalidade do doente, mas
também aos níveis de estruturação cerebral anterior à
doença.
Assim, numa primeira fase é feito um estudo com o
suporte de baterias de investigação neuropsicológica,
que determina as funções nervosas superiores afetadas e
a extensão da degeneração. Com base nesta primeira
avaliação, é definido um plano de reabilitação composto
por exercícios específicos para cada sistema funcional
que é trabalhado com o paciente de Alzheimer
individualmente. É comum, entre outros défices, uma
degeneração inicial nos sistemas pré-frontais com
impacto no planeamento do pensamento, ação, inibição
e sequenciação. Este défice resulta numa incapacidade
dos doentes com Alzheimer em desenvolver atividades
dirigidas, em inibir comportamentos repetitivos e
emoções, assim como, em evocar e registar memórias
(Maia, 2001).
Deste modo, a reabilitação neuropsicológica nos doentes
com Alzheimer possibilita o retardamento dos processos
degenerativos ao nível funcional, com implicações
profundas na vida ativa dos pacientes e na sua relação
com o mundo e com os outros.
Considera-se, face ao exposto, que a neuropsicologia
tem competências próprias no tratamento de doentes de
Alzheimer.
Neuropsicologia na Trissomia 21
A Trissomia 21 é uma das patologias classificadas de
Deficiência Mental, não sendo possível predeterminar o
desenvolvimento de cada portador (Leitão, 2000; Palha,
2002).
O médico inglês John Langdon Down descreveu um
conjunto de características fenotípicas observadas nas
crianças internadas num asilo, e desde então a patologia
passou a designar-se de Síndrome de Down (Palha,
2001).
A partir de 1959, com a evolução da Ciência e da
Medicina, o Dr. Lejeune descobriu que se tratava de uma
doença genética causada pela existência de três
cromossomas do par 21 (Palha, 2001). No cariótipo de
um portador de Trissomia 21 em vez dos habituais 46
cromossomas, as células apresentam 47, existindo no par
21 um cromossoma supra-numerário; daí a designação
mais correta e atual para esta patologia ser Trissomia 21
(Palha, 2001).
A importância de se estudar a Trissomia 21 reside na
elevada incidência de portadores com esta patologia que
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beneficiaria ao nível do aumento da sobrevivência e
melhor qualidade de vida.
A Trissomia 21 é resultado de uma alteração na
distribuição cromossómica entre as células, podendo
ocorrer em diferentes fases do processo de divisão
celular; o que acontece logo após a conceção (Palha,
2001). Através de estudos científicos é possível observar
que as células do corpo de um feto com Trissomia 21 não
se dividem tão rápido como nos bebés ditos “normais”, e
como tal tendem a ser menores do que a média (Leitão,
2000). A migração das células que formam diferentes
partes do corpo é afetada, especialmente na área
cerebral, o que resulta num atraso de desenvolvimento
(Palha, 2001).
No que diz respeito à manifestação cromossómica na
Trissomia 21, é possível distinguir três tipologias: a)
Trissomia 21 livre (sendo a mais frequente, cerca de 95%
dos casos), em que as crianças possuem um cromossoma
21 suplementar o que perfaz um total de 47
cromossomas no seu cariótipo, ou seja 47 cromossomas
em todas as células do seu corpo; b) Mosaico (cerca de
1% dos casos), em que algumas células possuem 46
cromossomas e outras 47 e c) Translocação (cerca de 3%
dos casos), em que o braço do cromossoma 21 extra está
partido e agarrado a um outro cromossoma (Leitão,
2000; Palha, 2001).
Existem várias características e sinais associados à
Trissomia 21, tais como: cabeça menor que a média,
prega epicântica a nível dos olhos, ou seja, apresentam
fendas palpebrais oblíquas e a íris pode apresentar
pequenas manchas brancas, mãos curtas e grosseiras,
grande espaço entre o 1º e 2º dedo, orelhas displásticas
(sendo os canais auditivos mais estreitos, o que pode
levar a dificuldades auditivas), nariz hipoplástico, face
achatada, língua proeminente, aumento do tecido
subcutâneo do pescoço, anomalia da forma do palato
(palato estreito), entre outras (APPACDM, 2002; Bautista,
1997; Pueschel, 1993). Podem surgir, ainda, outras
patologias e/ou dificuldades, designadamente:
cardiopatias congénitas, infeções do trato respiratório
superior, perda de audição, deficiência visual
(estrabismo, cataratas congénitas, nistagmo, miopia e
hipermetropia), hipotiroidismo, hipotonia muscular e
dificuldades no controlo tónico-postural, entre outras
(APPACDM, 2002; Bautista, 1997; Pueschel, 1993). Por
conseguinte, a criança com Trissomia 21 tem um
desenvolvimento similar mais lento, comparativamente
com a criança sem esta problemática. Com efeito, a
velocidade de desenvolvimento e as características
morfológicas da criança com Trissomia 21 fazem com
que apresente dificuldades generalizadas nas várias
áreas de desenvolvimento, incluindo perturbações
psicomotoras e fracas competências motoras, ao nível da
tonicidade muscular, da postura, do equilíbrio e das
coordenações práxicas (global e fina) (Morato, 2002;
Pueschel, 1993).
Reabilitação
Para uma intervenção eficaz deverá ter-se em conta as
particularidades neuropsicológicas das crianças com
Trissomia 21, como por exemplo: dificuldades de
discriminação auditiva, deficit na discriminação visual,
dificuldades na interação social, memória auditiva de
curto prazo prejudicada, dificuldade na memória de
trabalho, atraso no desempenho linguístico verbal (no
que concerne à intencionalidade comunicativa precoce,
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poderá concluir-se que embora os portadores de
Trissomia 21 adquiram a linguagem do mesmo modo que
as crianças ditas “normais”, parecem experimentar
atrasos, sobretudo no que se refere ao desenvolvimento,
e mais especificamente no que se refere à linguagem
expressiva (Morato, 2002; Pueschel, 1993).
É ainda importante não descurar a aquisição dos
comportamentos sociais convencionais, uma boa
autonomia, o desenvolvimento de formas de
comunicação eficazes, uma motricidade funcional e uma
cognição que lhe permita a melhor operacionalidade
possível; sem esquecer a promoção da orientação
vocacional e comunitária e o exercício do lazer (Palha,
2001).
Para alcançar os objetivos mencionados defende-se a
intervenção precoce, com apoios educativos diretos e
indiretos adequados a cada criança. Esta abordagem tem
por finalidade melhorar os atrasos evolutivos da
Trissomia 21 nas crianças, favorecendo o seu
desenvolvimento biológico e cognitivo, e visa
acompanhar e orientar desde o mais cedo possível e
consecutivamente dar apoio às famílias e integrar cada
criança no jardim-de-infância. A intervenção precoce
possibilitou uma nova visão de cada uma das crianças,
como um ser ativo com inúmeras capacidades (Palha,
2001; Peixoto, 1999). Quanto mais cedo se intervém (se
possível desde o nascimento) maiores são os progressos.
As pessoas com Trissomia 21 apresentam certas
limitações físicas e intelectuais, e através da intervenção
precoce essas limitações poderão ser ultrapassadas.
Ludlow e Allen referem “que crianças com Trissomia 21,
que beneficiaram de um programa de intervenção
precoce entre os dois e os cinco anos de idade, obtiveram
níveis de desenvolvimento superiores a outras crianças
com a mesma deficiência que só aos cinco anos
começaram a ser ajudadas.” (cit in Courtiade, 1993,
p.29).
De forma geral, o principal objetivo consiste em
proporcionar ao educando a formação necessária ao
desenvolvimento das suas potencialidades e desenvolver
habilidades e conhecimentos práticos que o levem a
descobrir valores que favoreçam o seu comportamento
em casa, na escola / jardim-de-infância e na sociedade.
Metodologia
Amostra
A amostra do estudo apresentado é composta por quatro
sujeitos do género feminino (100%). As participantes
mais novas possuem 18 (sujeito 2) e 24 anos (sujeito 1)
respetivamente, e são portadoras de Trissomia 21. As
participantes mais velhas têm 75 anos (sujeito 3) e 78
anos (sujeito 4), e foram diagnosticadas com Doença de
Alzheimer. No que diz respeito às habilitações literárias,
pode-se considerar que esta amostra apresenta um nível
de escolaridade baixo, na medida em que, à exceção do
sujeito 2 que completou o 10º ano de escolaridade,
todas as participantes completaram apenas o primeiro
ciclo de escolaridade.
De notar que as duas participantes com Trissomia 21
habitam com a sua família e que dentro do grupo de
pacientes com diagnóstico de Alzheimer, o sujeito 3
habita sozinho e o sujeito 4 está institucionalizado.
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Procedimento
O estudo segue um desenho correlacional exploratório
com recurso a uma metodologia de análise de dados
mista, qualitativa e quantitativa. A amostra foi composta
através de uma metodologia não aleatória mas por
amostragem por acessibilidade ou conveniência.
Efetivamente, foi através da rede de contactos informal
da investigadora principal que se procedeu ao contacto
com as pacientes. Num primeiro passo foi apresentado o
pedido de colaboração no estudo que contemplava uma
breve explicação dos seus objetivos e processos, a
salvaguarda de que esta participação era completamente
voluntária podendo desistir a qualquer momento e,
sendo ainda, clarificado que este estudo respeitava as
normas éticas que regulam a investigação em psicologia,
nomeadamente aquelas que se referem à
confidencialidade e anonimato dos dados.
Após a recolha do consentimento informado cedido
pelos cuidadores iniciou-se o processo de recolha de
dados que percorreu os meses de Março e Abril de 2013.
A recolha decorreu em espaço reservado na ausência dos
cuidadores e durou cerca de 1 hora por sujeito.
Após um diálogo e entrevista a cada sujeito, a primeira
prova aplicada foi o MMSE (Mini Mental States
Examination) (Folstein,1973; adaptado por Guerreiro,
1993), seguida da prova de Memória de Dígitos da Wais
(Wechsler, CEGOC, 1996), a Figura Complexa de Rey (Rey
1941; Osterrieth, 1944; adaptada por CEGOC, 1988;
Simões, Xavier & Fonseca, 1997), e por fim a Escala de
Memória da Bateria de Luria Nebraska (Golden, Purish &
Hammeke,1995 adaptado por Maia, Loureiro & Silva,
2002).
Tendo-se analisado previamente qual o constructo a
avaliar, optou-se pela memória, por ser fundamental na
sequência deste estudo.
Instrumentos
Mini Mental State Examination (Folstein,1973; adaptado
por Guerreiro, 1993) – MMSE – é um dos instrumentos
mais utilizados para o rastreio do Défice Cognitivo
(Morgado, Rocha, Maruta, Guerreiro & Martins, 2009).
Esta prova aborda muitos constructos, apresentando
uma capacidade fenomenológica de avaliar
cognitivamente o sujeito. Ao longo de 30 questões este
teste avalia seis domínios: orientação (temporal e
espacial), atenção e cálculo, evocação, linguagem e
habilidade construtiva. Cada item pode ser pontuado de
0 a 1 valor e a pontuação total varia entre 0 e 30 valores,
correspondendo 0 ao desempenho mais baixo e 30 ao
desempenho mais elevado. A cotação do instrumento
pode contemplar cada domínio de modo isolado ou o seu
conjunto.
Memória de Dígitos da Wais-III (Wechsler, CEGOC, 1996)
- A WAIS – III permite avaliar o QI por meio de 14 escalas.
O sub-teste da WAIS – III referente à Memória de Dígitos
é composto por oito séries de dígitos para a ordem direta
e sete séries para a ordem inversa, havendo um aumento
gradual da quantidade de dígitos em cada série que
contém respetivamente dois ensaios cada uma. Aplica-se
primeiramente a ordem direta, e de seguida a ordem
inversa (independentemente do desempenho na
anterior). No que diz respeito à estrutura e cotação do
teste, este é composto por dois conjuntos de dígitos que
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representam duas tentativas: a pontuação máxima é de
30 pontos; 16 para a ordem direta e 14 para a inversa.
Figura Complexa de Rey-Osterrieth (Rey 1941;
Osterrieth, 1944; adaptada por CEGOC, 1988; Simões,
Xavier & Fonseca, 1997) – FCRO - é um teste que permite
avaliar a perceção visual, a elaboração da perceção e a
atividade da memória visual. Este teste avalia
paralelamente, o nível de desenvolvimento das seguintes
áreas: organização visuo-espacial, organização percetiva,
aptidão visuo-espacial construtiva, memória visual,
atenção, planificação, resolução de problemas e função
motora. Trata-se de um teste que comporta uma figura,
a ser observada, memorizada e reproduzida
graficamente pelos sujeitos em duas etapas. A etapa
“cópia” e etapa “memória” são separadas por um
intervalo de três minutos. A figura para cotação é depois
decomposta em 18 elementos, cada uma. Cada elemento
correto e bem colocado do teste vale 2 pontos, cada
elemento correto e mal colocado vale 1 ponto, cada
elemento deformado ou incompleto mas reconhecível e
bem colocado vale 1 ponto, se não estiver bem colocado
vale meio ponto.
Subscala de Memória da Bateria Neuropsicológica de
Luria Nebraska (Golden, Purish & Hammeke, 1995
adaptado por Maia, Loureiro & Silva, 2002) - BNLN –
avalia onze funções neuropsicológicas tais como:
habilidade motora, ritmo, habilidade tátil, habilidade
visual, linguagem expressiva, linguagem recetiva, leitura,
escrita, raciocínio matemático, memória e funções
intelectuais (no sentido da resolução de problemas). Ao
todo o instrumento contém 11 subscalas com mais de
700 itens. No presente estudo apenas foi utilizada a
escala de memória que contempla 13 itens e pode ser
cotada de 0 até 2, correspondendo 0 a uma resposta
correta e 2 a uma resposta incorreta.
Resultados
MMSE Memória Dígitos Figura Complexa de Rey Escala de Luria
Total Diretos Inversos Cópia Memória Memória (Total)
Sujeito 1 18 3 2 2 0 12
Sujeito 2 18 3 0 23,5 12,5 13
Sujeito 3 23 6 1 2 0 18
Sujeito 4 16 5 2 10 0 19
Sabe-se que na prova MMSE é considerado indicador de
défice cognitivo, a pontuação menor ou igual a 21
pontos, até 11 anos de escolaridade, o que realmente
acontece com os sujeitos analisados (Folstein, Folstein &
McHugh, 1975; Guerreiro, 1993)
A influência das variáveis idade e literacia na pontuação
total do MMSE encontra-se bem documentada.
Tabela 1. Resultados obtidos nas provas utilizadas
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Indivíduos com maior escolaridade ou menor idade
apresentam pontuações mais elevadas, existindo maior
variabilidade na pontuação dos grupos etários mais
idosos e nos grupos menos escolarizados.
Como podemos observar na tabela 1, dos 4 sujeitos
avaliados somente o sujeito 3 apresenta uma pontuação
maior ou igual ao valor de 21 pontos (Sujeito 3 = 23). No
âmbito da prova MMSE, pode considerar-se que este
sujeito não apresenta défice cognitivo e que os restantes
sujeitos (Sujeito1=18; Sujeito2=18; Sujeito4=16)
apresentam, pois encontram-se abaixo do nível
normativo.
No que diz respeito ao subteste Memória de Dígitos da
Wais III, a pontuação de referência para a avaliação do
funcionamento patológico calcula-se através da “Magic
Number Seven” – fórmula de George Miller (1965). Sabe-
se que um valor superior a 5 já é considerado patológico.
Tal como se analisa na tabela 1, nos valores referentes à
série direta dos 4 sujeitos observados, somente o sujeito
3 apresenta uma pontuação superior a 5, sendo
considerado que se situa num nível normativo. Os
restantes sujeitos (Sujeito1=3; Sujeito2=3; Sujeito4=5)
figuram abaixo do limite normativo, sendo considerado
que o funcionamento da sua memória se parece
patológico. Nos valores referentes à série inversa todos
os sujeitos analisados (Sujeito1=2; Sujeito2=0;
Sujeito3=1; Sujeito=2) encontram-se abaixo do nível
normativo, isto é, num nível patológico.
Relativamente à FCRO os resultados são enquadrados em
percentis. Segundo o manual da Figura Complexa de Rey-
Osterrieth (CEGOC, 1988; Simões, Xavier & Fonseca,
1997), nos resultados obtidos na etapa “cópia” todos os
sujeitos avaliados encontram-se no percentil 10, o que
significa que 90 % da população portuguesa está acima
destes pacientes. Na etapa “memória” somente o sujeito
2 se enquadra no percentil 10. Todos os restantes
sujeitos se encontram abaixo do percentil 5.
Uma vez que os percentis apresentados são baixos, não
se torna necessário reportar o tempo na realização da
prova (etapa “cópia” e etapa “memória”).
Como o percentil dos sujeitos avaliados é baixo, é
importante obtermos uma classificação qualitativa do
seu desempenho. Desta forma, vale a pena referir que o
sujeito 1 na cópia encontra-se na tipologia V, ou seja, o
grafismo é pouco estruturado. Na memória este mesmo
sujeito situa-se na tipologia VI, reduzindo a figura a
esquemas familiares. No sujeito 2, a cópia encontra-se na
tipologia II, em que os detalhes da figura são englobados
na estrutura. Na memória este mesmo sujeito situa-se na
tipologia III, sendo que o contorno é geral, isto é, o
grande retângulo é colocado depois de alguns detalhes, o
que dificulta o ajuste das linhas. No sujeito 3, a cópia
enquadra-se na tipologia V e a memória é inexistente. No
sujeito 4, a cópia encontra-se na tipologia IV,
apresentando uma justaposição de detalhes. Na
memória este sujeito situa-se na tipologia VIII,
apresentando garatujas, sem forma nem detalhes
reconhecíveis.
No que se refere à BNLN, segundo o estudo de Maia
(2012) para a população portuguesa, valores no subteste
memória que se encontrem acima da pontuação bruta
de 11 denotam um nível patológico. Tal como se observa
na tabela 1, todos os sujeitos apresentam um
funcionamento patológico (Sujeito1=12; Sujeito2=13;
Sujeito3=18; Sujeito4=19).
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Discussão e Conclusões
Após análise dos resultados e respetivas aplicações, e
tendo em conta a população estudada (Portadores de
Trissomia 21 e Doentes de Alzheimer), conclui-se que na
prova MMSE o sujeito 3 apresenta um valor ligeiramente
acima do valor normativo, e que o sujeito 4 se encontra
próximo do nível de iliteracia. O que significa que é
necessário a aplicação de mais provas para uma
avaliação mais fidedigna de cada sujeito.
Na prova memória de Dígitos, os Portadores de Trissomia
21 apresentam valores ligeiramente mais baixos na série
direta, relativamente ao Doentes de Alzheimer,
enquanto que na série inversa as diferenças existentes
são insignificantes.
Na Figura Complexa de Rey conclui-se que apesar dos
percentis serem os mesmos em todos os sujeitos
avaliados, a pontuação bruta do sujeito com maior
escolaridade é significativamente mais elevada tanto na
cópia como na memória.
Na BNLN, verifica-se que os portadores de Trissomia 21
apresentam resultados significativamente melhores que
os sujeitos com Alzheimer.
Assim, os resultados encontrados vão de encontro ao
que sugere a literatura sobre os fatores de ligação
genética e neuropatológica entre a Demência tipo
Alzheimer e portadores de Trissomia 21.
A par disto conclui-se que sujeitos de idades díspares
partilham algumas características semiológicas, no que
diz respeito, maioritariamente, ao défice cognitivo. É de
salientar que os sujeitos referidos, dificilmente se irão
encontrar na vida, por terem idades tão díspares. Este
aspeto já foi sublinhado por Zanaigh (2006), ao indicar
que portadores de Trissomia 21 desenvolvem alterações
neuropatológicas semelhantes a pacientes com a doença
de Alzheimer, diferindo na idade precoce de início.
Segundo a literatura sobre a patologia de Alzheimer, esta
é caracterizada pela evolução dos problemas
relacionados com a memória, bem como pelo declínio de
outras funções cognitivas (e.g., atenção, concentração,
linguagem, pensamento) (Maia, 2001). Neste estudo
verificou-se que os sujeitos diagnosticados por
profissionais de saúde com esta doença apresentam
problemas de memória devidamente evidenciados pela
análise das provas de avaliação aplicadas.
Segundo Pueschel (1993), a velocidade de
desenvolvimento e as características morfológicas dos
portadores de Trissomia 21, fazem com que estes
pacientes apresentem dificuldades generalizadas nas
várias áreas de desenvolvimento, entre as quais a área
psicomotora, cognitiva e das coordenações práxicas.
Neste estudo os sujeitos com Trissomia 21 apresentam
baixos resultados na prova Figura Complexa de Rey, que
avalia a coordenação práxica. Com os restantes
instrumentos observou-se o que diz o estudo supracitado
acerca do desempenho cognitivo nesta população.
Através da análise das provas aplicadas a cada sujeito,
pode-se concluir que as alterações neuropatológicas
entre portadores de Trissomia 21 são semelhantes às
observadas nos doentes tipo Alzheimer, e que surgem
em idades relativamente precoces.
No que diz respeito às limitações deste estudo, começa-
se por apontar a escassa existência de estudos acerca da
temática para suportar a parte de revisão teórica. Assim
é fundamental sugerir o investimento nesta área
inovadora em que a Neuropsicologia pode desempenhar
um papel fundamental tanto no aumento da qualidade
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de vida de portadores de Trissomia 21 como de doentes
de Alzheimer.
Espera-se ter dado um contributo para a compreensão
das características comuns aos sujeitos das populações
referidas com utilização de instrumentos de reconhecida
robustez e uma metodologia de análise mista. Seria
interessante dar continuidade a este estudo com uma
amostra mais alargada e sujeitos do género masculino,
pois os dados que se encontraram com investigação
empírica remetem ao nível da prática da reabilitação
neuropsicológica para a necessidade de retardar os
défices na memória tanto nos Portadores com Trissomia
21 como nos Doentes de Alzheimer.
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ISSN: in attribution process Year 0, Vol. I, nº 1, 2013
A Saúde mental nos cuidadores dos doentes de Alzheimer
Daniel Martins (1) & Luis Maia (2)
(1) Clinical Psychologist; Neuropsychologist (Coimbra University). All correspondence about this article should be sent to email: [email protected]
(2) Beira Interior University PhD in Neuropsychology by Salamanca University – Professor at Beira Interior University.
_________________________________________________________________________________
Abstract
The aging of population has taken place in recent decades and is accompanied by the increased prevalence of Alzheimer's disease (AD). AD is a type of
dementia that causes a global, progressive and irreversible deterioration of cognitive functions (memory, attention, concentration, language, thought, among
others). The aim of this work was to evaluate a number of factors related to the problem of mental health of family caregivers of patients with DA, knowing
that the well-being of caregivers will be reflected, necessarily, in the welfare of who receive care from caregivers. A total of 10 family caregivers participated in
the study who responded to some questionnaires. Were administered the "List of Symptoms of Hopkins" (Derogatis, 1977), the "Inventory of clinical Evaluation
of Depression" (Vaz Serra, 1994) and the "Inventory of State-trait Anxiety", which allowed us to sketch a psychopathologic profile of caregivers. This study,
although not fully convergent in its conclusions, the need to intervene psychologically with the Alzheimer's patient caregivers, in order to alleviate as much as
possible the negative impact the disease has on the caregivers.
Keywords: Mental Health; Caregivers; Alzheimer's disease; Aging
Resumo
O envelhecimento populacional que vem ocorrendo nas últimas décadas é acompanhado do aumento da prevalência da Doença de Alzheimer (DA). A DA é um
tipo de demência que provoca uma deterioração global, progressiva e irreversível de diversas funções cognitivas (memória, atenção, concentração, linguagem,
pensamento, entre outras). O objetivo do presente trabalho é avaliar alguns fatores relacionados com a problemática da saúde mental, dos cuidadores
familiares de pacientes com DA, sabendo que o bem-estar dos cuidadores se irá refletir, necessariamente, no bem-estar dos que deles recebem cuidados.
Participaram no estudo 10 cuidadores familiares que responderam a alguns questionários. Foram administrados a “Lista de Sintomas de Hopkins” (Derogatis,
1977), o “Inventário de Avaliação Clínica da Depressão” (Vaz Serra, 1994) e o “Inventário de Estado-Traço de Ansiedade”, que nos permitiu esboçar um perfil
psicopatológico dos cuidadores. Este estudo, apesar de não totalmente convergente nas suas conclusões, torna notória a necessidade de intervir
psicologicamente junto dos cuidadores de doentes de Alzheimer, de forma a minorar o mais possível o impacto negativo que a Doença tem, também, nos
cuidadores.
Palavras-chave: Saúde mental; Cuidadores; Doença de Alzheimer; Envelhecimento
Resumen
El envejecimiento de la población ha tomado lugar en las últimas décadas e es acompañado por la creciente prevalencia de la enfermedad de Alzheimer (EA).
La EA es un tipo de demencia que provoca un deterioro global, progresivo e irreversible de las funciones cognitivas (memoria, atención, concentración,
lenguaje, pensamiento, entre otros). El objetivo de este trabajo es evaluar una serie de factores relacionados con el problema de salud mental de los
cuidadores familiares de pacientes con EA, sabiendo que el bienestar de los cuidadores se reflejará, necesariamente, en el bienestar de los que reciben sus
cuidados. Participaron en lo estudio 10 cuidadores familiares que respondieron a algunos cuestionarios. Se administraron la "Lista de síntomas de Hopkins"
(Derogatis, 1977), el "inventario de evaluación clínica de la depresión" (Vaz Serra, 1994) y el "Inventario de ansiedad estado-rasgo", que permitió esbozar un
perfil psicopatológico de los cuidadores. Este estudio, aunque no totalmente convergente en sus conclusiones, plantea la necesidad de intervenir
psicológicamente con cuidadores de pacientes de la enfermedad de Alzheimer, para aliviar lo más posible el impacto negativo que la enfermedad tiene sobre
los cuidadores.
Palabras clave: salud mental; Cuidadores; Enfermedad de Alzheimer; Envejecimiento
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Introdução
As demências constituem um problema de saúde pública
e social da maior importância, afetando ambos os sexos e
todos os grupos sociais. A demência geralmente leva a
uma diminuição acentuada nas habilidades cognitivas,
mentais e físicas da pessoa afetada, que, ao longo do
tempo requer uma aumento de cuidados, auxílio e apoio.
Cerca de 1 em cada 20 pessoas acima dos 65 anos e 1 em
cada 5 pessoas dos 80 anos sofrem de demência, sendo a
doença de Alzheimer responsável por cerca de metade
desses casos (Jacobson & Jacobson, 1997). Estima-se que
em Portugal, existam 153 mil pessoas com demência, 90
mil das quais com doença de Alzheimer. Face ao
envelhecimento da população na União Europeia, os
especialistas preveem uma duplicação destes valores
(Leitão, Manuela & Paula, 2006).
A Doença de Alzheimer é uma doença degenerativa
progressiva, que envolve o sistema nervoso central (SNC),
caracterizada pelo declínio cognitivo e funcional. Os
primeiros sinais clínicos são diminuição da memória,
desorientação, confusão, alterações da personalidade,
diminuição de capacidades cognitivas como julgamento,
raciocínio abstrato, cálculos e habilidades visuais, afasia e
anomia. Em estágios mais avançados verifica-se grande
alteração do ciclo sono/vigília, agitação, irritabilidade,
ansiedade, depressão, alucinações, perda da capacidade
de atender suas necessidades pessoais, como vestir-se e
alimentar-se, dificuldade de andar, falar e deglutir
(Alzheimer Portugal, 2013).
A etiopatogénese, ainda não está esclarecida. No entanto,
foram já identificados alguns fatores de risco que elevam
a possibilidade de vir a sofrer-se da doença, tais como: a
tensão arterial alta, colesterol elevado e homocisteína;
baixos níveis de estímulo intelectual, atividade social e
exercício físico; obesidade e diabetes; graves ou repetidas
lesões cerebrais. A idade continua a constituir o maior
fator de risco, muito embora não seja causadora da
doença. Este facto coloca importantes desafios, em
virtude do aumento da esperança de vida. Num muito
reduzido número de famílias, a doença é causada por um
problema genético e hereditário (normalmente
desenvolve-se entre os 35 e os 60 anos) (Leitão, et al.,
2006). Não existe um único teste que determine se
alguém está afetado pela doença de Alzheimer. É
diagnosticado, preferencialmente, através de um
processo de exclusão de critérios clínicos, assim como
através de um exame minucioso do estado físico e mental
da pessoa, em vez da deteção de uma prova biomédica da
doença (Alzheimer Portugal, 2013).
Diante de tantas manifestações clínicas e complicações da
doença torna-se evidente o impacto desta, na vida não só
do paciente como também na do cuidador. Brown e Setz
(cit. por Brito, 2002) consideram que a prestação de
cuidados requer um esforço contínuo a nível cognitivo,
emocional e físico.
De acordo com Brito (2002) vários estudos têm vindo a
sugerir que as pessoas que prestam cuidados a familiares
durante longos períodos, como acontece na maior parte
dos casos de familiares com doentes de Alzheimer,
frequentemente sofrem alterações adversas em várias
áreas importantes da sua vida: alterações na vida familiar
e social, problemas económicos e laborais, cansaço e
desgaste prolongados, a nível físico e psíquico.
Este conjunto de condições, frequentemente vivenciadas
num complexo contexto de preocupação constante, de
conflito, perda, luto, raiva, culpa e ressentimento,
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rapidamente conduzem a situações de morbilidade
aumentada nessas pessoas. Com efeito, a situação de
prestação de cuidados parece poder afetar a saúde física
dos cuidadores, mas é sobretudo na área da saúde mental
que os efeitos da prestação de cuidados a familiares com
doença de Alzheimer mais se fazem notar, com níveis de
depressão e ansiedade superiores aos da população em
geral (Brito, 2002).
A saúde mental é sistematicamente mencionada como a
dimensão mais afetada pelo papel de cuidador de
doentes com demência (Gallant & Connell, 1998; Roig
Abengózar & Serra, 1998) associada a elevação de
sintomatologia depressiva e ansiosa. A prestação de
cuidados a pessoas demenciadas tende a despoletar
níveis elevados de angústia emocional, associado a
sintomas comportamentais e ao enfraquecimento
cognitivo do doente (Crespo, Crespo, López & Zarit, 2005).
O bem-estar dos cuidadores informais e a sua promoção,
assim como a prevenção de situações extremas, requer
por parte dos profissionais de saúde uma atenção
particular, uma vez que deles dependem os doentes de
que cuidam e a sua permanência saudável na
comunidade.
Torna-se, portanto, interessante e, principalmente
necessário o estudo acerca dos problemas de saúde,
nomeadamente, queixas somáticas presentes nestes
cuidadores, uma vez que sofrem um imenso desgaste
físico e emocional em consequência da doença dos
doentes dependentes.
Após o exposto anteriormente, o principal objetivo é
verificar o estado de saúde mental, no que concerne ao
perfil psicopatológico dos cuidadores de doentes com
demência de Alzheimer, tendo em conta o nível de
informação existente sobre a Doença de Alzheimer e as
instituições existentes que junto a estes prestam apoio.
Metodologia
A finalidade do estudo foi o de verificar a saúde mental,
relativamente ao perfil psicopatológico dos cuidadores,
tendo em conta a existência de instituições que apoiam os
familiares dos doentes com DA. A sua aplicação foi
aleatória, isto é, selecionaram-se pessoas que se
mostraram disponíveis para participar, garantindo
confidencialidade e anonimato dos resultados e
participantes. Antes de iniciar o preenchimento dos
questionários, foi explicado aos sujeitos que o objetivo do
estudo era meramente académico, inserindo-se na
conclusão da Pós-Graduação. Após consentimento
informado, preencheram-se os questionários: SCL-90-R,
STAI-Forma Y1 e Y2 e IACLIDE. Na folha de rosto do
questionário foram recolhidos alguns dados
sociodemográficos: sexo, idade, habilitações literárias,
naturalidade, estado civil e situação profissional.
Amostra
Este estudo contou com a participação voluntária de 10
sujeitos residentes no concelho de Pombal, com idades
compreendidas entre os 48 e os 80 anos, com uma média
de 63,4 anos de idade. Relativamente à distribuição por
género, responderam 8 sujeitos do sexo feminino e 2 do
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sexo masculino. Desta amostra, 20% está empregado e os
restantes estão aposentados-reformados. No que
concerne ao estado civil dos sujeitos inquiridos, a amostra
apresenta na sua maioria dos sujeitos casados (90%) e 10
% de sujeitos solteiros. Quanto às habilitações literárias, o
maior número de sujeitos refere ter completado o 9º ano
de escolaridade (50%), seguido o grupo com a 4ª classe e
ensino superior (20%) e por fim o ensino secundário
completo com 10%. Considerando o relacionamento
familiar, 70% dos sujeitos são cônjuges e 30% são filhos.
Todos os sujeitos têm apoio de instituições, no que
concerne a apoio psicológico, serviços de apoio
domiciliário e alguns dos doentes frequentam Centros de
Dia.
Instrumentos
Os instrumentos utilizados para a traçar o perfil psicopatológico foram os seguintes:
Lista de Sintomas de Hopkins (SCL-90-R),
(Derogatis, 1977)
É constituído por noventa itens de autoavaliação de
sintomas de desajustamento psicoemocional e avalia a
psicopatologia em função de nove dimensões primárias
de sintomas: Somatização, Obsessões-Compulsões,
Sensibilidade Interpessoal, Depressão, Ansiedade,
Hostilidade, Ansiedade Fóbica, Ideação Paranóide e
Psicoticismo. Os noventa itens que a compõem são
respondidos numa escala tipo Likert de cinco pontos, que
varia entre 0 (nunca) e 4 (extremamente). A informação
do número de sintomas com a sua intensidade, o número
de sintomas positivos (numero de sintomas presentes) e
índice de sintomas positivos (medida de intensidade
ajustada para o número de sintomas presentes) são
combinados no Índice Geral de Sintomas.
Inventário de Avaliação Clínica da Depressão -
IACLIDE
Foi criado e desenvolvido por Vaz Serra (1994). Trata-se
de uma escala de autoavaliação, de tipo Lickert, para
medir a intensidade dos quadros depressivos, sendo,
constituída por 23 questões, que se referem a quatro
tipos distintos de sintomas presentes nos quadros das
Perturbações Depressivas: Biológicas, Cognitivas,
Interpessoais e de Desempenho de tarefa. Segundo Vaz
Serra (1994), “significam a relação que o sujeito deprimido
estabelece com o corpo, consigo próprio como pessoa,
com os outros e com o trabalho” (p.11). O ponto de corte
entre indivíduos normais e deprimidos corresponde à
nota global de 20. Esta mesma pontuação ascende, nos
casos de Depressão leve, moderada e grave, para os
valores médios, respetivamente, de 28, 45 e 58.
Inventário de Estado-Traço de Ansiedade (STAI) –
Adaptado por Danilo Silvo
Para analisar os níveis de ansiedade-estado utilizou-se o
inventário de Spielberger e colaboradores – STAI. A escala
de medida STAI, está dividida em STAI-Y, STAI-X e STAI
para crianças. A STAI-Y diferencia a ansiedade-estado
(STAI-Y1) da ansiedade-traço (STAI-Y2) (Tilton, 2008). Esta
escala é constituída por 20 itens numerados que são
classificados por intensidade, por outras palavras, o
sujeito indica como se sente naquele momento através de
uma escala tipo Lickert, de 4 pontos, ou seja, numerada
desde 1 (sem ansiedade) até 4 (muita ansiedade). Desta
forma, os resultados variam entre 20 no mínimo e 80 no
máximo, sendo que, a valores mais altos correspondem
níveis de ansiedade mais elevados. No entanto, a fim de
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evitar a tendência não pretendida dos sujeitos darem
respostas num dos extremos da escala (responder sempre
1e/ou 4), alguns dos itens estão pontuados de forma
inversa, ou seja, respostas marcadas com 1, 2, 3 ou 4 são
cotadas de forma inversa passando respetivamente a
valer 4, 3, 2 ou 1 ponto. O nível de ansiedade é
determinado posteriormente à soma dos resultados das
20 afirmações. Relativamente à STAI-y1, os itens
invertidos são os correspondentes às afirmações 1, 2, 5, 8,
10, 11, 15, 16, 19 e 20 (Rocha & Correia, 2005).
Procedimento
Foi solicitada a colaboração da Associação Portuguesa de
Familiares e Amigos de Doentes de Alzheimer – Delegação
de Pombal na identificação de cuidadores disponíveis
para participarem no estudo. Mediante o seu
consentimento informado e a garantia da
apropriabilidade do estudo os cuidadores preencheram
uma folha de dados demográficos (idade, sexo, estado
civil, situação profissional, habilitações literárias,
naturalidade) e dados relativos ao estado de saúde, pelo
SCL-90-R para avaliar o ajustamento emocional, pelo
IACLIDE para avaliar os quadros depressivos e pelo STAI
forma Y-1 e Y-2 para avaliara o nível de ansiedade.
Resultados
Os resultados, relativamente ao Inventário de Avaliação
Clínica da Depressão, demonstram que, embora a maioria
dos 10 cuidadores de DA inquiridos não apresentarem
níveis de depressão significativos, existem alguns
cuidadores em que se verifica um grau de depressão
moderado (40% da amostra) enquanto que a maioria não
manifestam sintomas depressivos (60%). Dos sintomas
depressivos que os cuidadores mais evidenciaram (numa
escala de 0 a 4) a perturbação do sono é a mais evidente,
isto é, a dificuldade em iniciar o sono e/ou de o manter
(1,6 pontos). De seguida temos os sintomas que traduzem
a dificuldade do desempenho da tarefa, associados a
queixas biológicas e cognitivas que correspondem à
clássica depressão endógena (1,1). Verificam-se ainda
sintomas que evidenciam elementos da constelação
suicida (0.93 pontos). Com 0,79 pontos encontramos
sintomas que evidenciam que o sujeito apresenta uma
personalidade obsessiva subjacente, pronta a censurar-se,
hesitante e pessimista, desenvolvendo sintomas
cognitivos em que está patente uma relação perturbada
do indivíduo consigo próprio. E por último, com 0,6
pontos, sintomas que evidenciam instabilidade emocional
e dependência em relação aos outros.
Quadro 1 – Quadros clínicos depressivos
Dimensões IACLIDE N Valor
Mínimo
Valor
Máximo
Valor
Medio
Depressão Endógena 10 0 3 1,08
Relação Perturbada do
indivíduo consigo próprio
10 0 4 0,79
Elementos da constelação
suicida
10 0 4 0,93
Instabilidade emocional e
dependência
10 0 3 0,6
Transtorno do sono 10 0 4 1,6
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,000,250,500,750
1,0001,2501,5001,7502,0002,2502,5002,7503,0003,2503,5003,7504,000
1 2 3 4 5 6 7 8 9
Relativamente ao perfil sintomatológico dos cuidadores,
estes possuem níveis depressivos, de sensibilidade
interpessoal, somatização e de ideação paranoide
ligeiramente superior aos valores de referência para a
população portuguesa, respetivamente, 1,08, 1,03, 0,60 e
0,97. Os níveis de obsessões-compulsões são iguais à
média (0,98). Por outro lado, os níveis de ansiedade,
hostilidade, ansiedade fóbica e psicoticismo apresentam
valores abaixo da média, respetivamente, 0,54, 0,52, 0,06.
Gráfico 1 – Perfil sintomatológico
Tendo por base o índice da população geral (IPG) do
instrumento, constata-se o maior número de indivíduos
com valores superiores à média na dimensão Depressão
(6). As dimensões com menor número de indivíduos com
valores acima da média são a Hostilidade (2) e o
Psicoticismo (2).Observando os dados do Inventário de
Estado-Traço de Ansiedade, averiguamos que os sujeitos
têm pontuações de ansiedade-estado e ansiedade-traço
idêntica, respetivamente, 44,5 e 44,8. O que significa que
os indivíduos não revelam Estado de Ansiedade e “Não
revela Traço”.
Quadro 2 – Estado-Traço de ansiedade
Dimensões STAI N Valor
mínimo
Valor
Máximo
Valor
Medio
Desvio-
padrão
Ansiedade - Estado (Y1) 10 27 76 44,5 17,2
Ansiedade -Traço (Y2) 10 34 54 44,8 8,3
Legenda:
1. SOMATIZAÇÃO
2. OB. COMPULSÕES
3. S. INTERPESSOAL
4. DEPRESSÃO
5. ANSIEDADE
6. HOSTILIDADE
7. ANS. FÓBICA
8. ID. PARANÓIDE
9. PSICOTICISMO
Acima
Abaixo
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Discussão
Prestar cuidados a um doente de Alzheimer está
associado a uma grande prevalência de manifestações
depressivas nos cuidadores. Contudo, o grau de
prevalência de sintomas depressivos nos cuidadores de
doentes de Alzheimer, varia consoante os estudos, a
prevalência de depressão varia entre os 18% e os 83% em
alguns estudos, enquanto que noutros trabalhos varia
entre os 41% e 55% (Redinbaugh, MacCallim & Kiecolt-
Glaser, 1995). Neste caso, demonstra-se que a
percentagem de sujeitos (40%) que evidenciam sintomas
depressivos se encontra dentro dos valores dos outros
estudos.
Por outro lado, Cavaleiro e Teixeira (1999) verificaram que
embora a maioria dos 30 cuidadores de Doentes de
Alzheimer inquiridos, não apresentassem níveis de
depressão significativos, existiam alguns cuidadores em
que se verificava um grau de depressão moderado (17%
da amostra). Já segundo Cavaleiro e Ribeiro (2002),
apenas 3% dos 258 cuidadores estudados apresentavam
níveis significativos de depressão, enquanto que 6%
apresentavam um grau de depressão moderada e 24%
dos cuidadores apresentassem níveis de depressão leve.
O nosso estudo vem comprovar os mesmos factos, já que
60 % da amostra não manifestaram sintomas depressivos.
Certos estudos sugerem que alguns cuidadores
apresentem níveis elevados de stress, incluindo
ansiedade, hostilidade, sintomas obsessivo-compulsivos e
histeria (Haley, West, Wadley, Ford, White, Barret, Harrel
& Roth, 1995). Os dados do nosso estudo não comprovam
esta afirmação, já que os valores apresentados se
encontram dentro da média dos valores apresentados
pela população normal.
Conclusão
O envelhecimento da população e o aumento da
esperança de vida, aumenta o risco dos idosos virem a
padecer de uma síndrome de demência de Alzheimer.
Atualmente, a DA é incurável e irreversível e, apesar de
poder afetar, muito esporadicamente, indivíduos de faixas
etárias variadas, afeta principalmente os idosos.
Estes estudos, apesar de não totalmente convergentes
nas suas conclusões, tornam notória a necessidade de
intervir psicologicamente junto dos cuidadores de
doentes de Alzheimer, de forma a minorar o mais possível
o impacto negativo que a Doença tem, também, nos
cuidadores.
Ter a noção de que as situações vivenciadas por alguém
que cuida de um doente de Alzheimer, são suscetíveis de
desencadear níveis de depressão / stress que aconselham
um acompanhamento psicológico adequado; é também,
um ato de ajuda ao doente porque esse
acompanhamento pode proporcionar ao cuidador um
melhor equilíbrio emocional que se refletirá na qualidade
dos cuidados prestados. Por outro lado, é importante
referir que este equilíbrio emocional terá resultados
positivos não só em relação aos cuidados prestados ao
doente, mas também em relação à forma como o
cuidador se relaciona com a sua família e os seus amigos,
e principalmente na forma como se relaciona consigo
próprio.
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Tendo em conta que os indivíduos da nossa amostra têm
apoio, prestado pelos diversos técnicos de diversas áreas,
da Associação Portuguesa de Familiares e amigos de
Doentes de Alzheimer – Delegação de Pombal e dos
próprios doentes estarem a frequentar Centros de Dia,
propicia-se assim uma saúde mental mais positiva no seio
familiar.
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Clinical Case – Neuropsychology applied to psychiatry
Obsessive Compulsive Disorder, Schizoaffective Disorder, or nothing at all? A 19 year old
patient with an awkward diagnosis
Luis Maia
Auxiliar Professor - Beira Interior University; Clinical Neuropsychologist, PhD (USAL - Spain); Neuroscientist, MsC (Medicine School of Lisbon - Portugal)
Medico Legal Perit (Medicine Institute Abel Salazar - Oporto, Portugal); Graduation in Clinical Neuropsychology (USAL - Spain); Graduation in Investigative
Proficiency on Psychobiology (USAL - Spain); Clinical Psychologist (Minho University - Portugal); Professional Card from Psychologyst Portuguese norm,
number 102. All correspondence about this article should be sent to [email protected].
_________________________________________________________________________________
This is a Challenge for Our readers - We hope you enjoy it!
Este é um desafio para os nossos leitores - esperamos que vocês gostem!
Esto es un reto para nuestros lectores - esperamos que os guste!
_________________________________________________________________________________
Introduction
The importance of neuroscientific knowledge and the
Neuropsychology in particular, to be applied in
psychotherapeutic processes (diagnosis, intervention,
relapse prevention, etc.) is being enforced as time make
all of us to understand that patient multidisciplinary
approach is not a choice anymore: it’s a moral obligation!
(see Hoffman & DyerTrash, Baylis, 2006; 2010; Lusebrink,
2004).
With this central idea in mind we present this challenge
to the readers: I have attended recently a male patient,
19 years old, diagnosed with Obsessive Compulsive
Disorder (OCD) by clinical staff from National Health
Services. The symptoms strengthened in the last 12
months (and in those 12 months the patient received
health care by local health services – psychiatrist,
psychologist, etc.).
The major current symptoms identified in his clinical file
were:
- Rituals concerning with OCD: excessive cleaning,
organization of personal belongings, make sure
that all windows in the house were well closed
before go to bed, etc.;
- Decreased interest in social activities (passing
from a normal described young guy to an actual
isolated one – in the frame time of 12 months);
- Decreased mood (depressive
symptomatology?);
- Strong muscular spasms;
- Strong anxiety (the usual symptoms of a panic
attack);
- Progressive change by open rituals to extreme
delusional experiences (“People are trying to do
wrong things to me”; “I’m been followed when I
walk on the street alone”; “All my neighbors
talk about me and are planning to surprise me
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with something bad”; “People could harm me,
so I prefer to stay alone in my room”, etc.);
- In the course of the last 12 months the patient
started to presented a lack of care about your
on personal image: he only take a bath, once a
week, if his mother insists whit him (and before
that he was described by his parents has being a
very handsome person, always concerned with
his appearance); his hygienic habits are reduced
to unbearable level (“he doesn’t shave, doesn’t
change under ware, doesn’t take care of his
hair” – making that the mother herself stated
that sometimes, most of the times “he seems
like a bad smelling homeless…”);
- In the course of the last 12 months the patient
started to present a decrease in his intellectual
skills, being described, at this moment, as, no
more than a big child;
- The patient does not smoke and do not used
alcoholic drinks or drugs at all in a regular basis
(ever did!);
- Patient is very polite, very obedient, very nice, I
should say;
- Although she was also diagnosed with another
“Psychiatric Condition”, psychiatrists never
wanted to explain what could be the most
adequate diagnosis (the mother interest is only
understand what is going wrong whit her sun, so
that the best clinical help, could be provided).
- Panic attack when he understands that the bus
he will take is green or the bus driver is a
particular one.
- Present fear in using computer (avoid Internet,
Facebook, etc.).
Results of important Complementary Means of
Diagnosis
EEG: normal; ECG: normal; CAT: normal; RM: normal;
analytic blood, urine, etc.: normal.
Mother’s report about major characteristics of the
patient since he was a child
According to family, the patient, already as a child, was
not kin of affections, avoided close relationships, was
only involved with one girl and never liked to go on a
date (note: he is clearly heterosexual). His life seems to
be empty and meaningless. He also seemed like a
frightened and sad person and never had a great success
in school. Nevertheless, in the last 12 months, according
to the patient and his mother, all of this got very worst!
Major medications prescribed in the last 12 months
Victan (benzodiazepine); Anafranil (Clomipramine);
Remeron (Mirtazapine); Fluvoxamine (SSRI) and
Risperidone (anti-psychotic).
Some results of neuropsychological tests
Since the very first moment, and as the initial session (3
hours), a different paint was being built in front of me:
OCD? No, thank you!
Let’s analyze some of the examples of several tests
At a glance, the patient has a normal writing skill. It is not
true! I asked about what football club he is fan: Benfica
(was his answer. Then I ask him to write down a phrase
with the word Benfica. The only word that he was able to
write was “Benfica”. After I gently insist, I said: “Ok…
what if a say something about Benfica and then you just
have to write it down?” I said to him “Benfica is one of
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the best football clubs in Portugal”. The patient stared at
me, and with a huge effort, started to write the phrase
“Benfica is one of the greatest of Portugal” (Question for
the readers: what do you think about that?).
I asked to perform the Luria series (Form B). The four first
items were drawn by me, in front of the patient, and the
rest were made by the patient (Question for the readers:
what do you think about that?).
In Rey figure (Form B), the patient had this performance
(please, follow the indications of colors in the superior
left corner and you will understand how patient copied
the model (Question for the readers: what do you think
about that?).
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In the next image we have the reproduction by memory, only 3 minutes after the copy process. The patient stated “I do not
remember anything else!” (Question for the readers: what do you think about that?).
When patient was invited to draw a clock and put the
pointers, with a huge effort,, this is the result of the 1st
trial. When I asked if it was well drawn, the answer was a
laconic “Yeah, it is ok. It is like a Wall clock!” (Question
for the readers: what do you think about that?).
When patient was invited to draw a second clock and put the pointers, again with a huge effort, this is the result of the 1st
trial. When I asked if it was well drawn, the answer was not secure: “I do not know if it is good” (it is important to note that
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patient took about 10 minutes to draw each clock, always showing a strong indecision attitude) (Question for the readers:
what do you think about that?).
When I draw a clock, with all numbers, and asked to patient to draw the pointers in order to be a given hour (18:30 in red,
and 12:50 in blue this was the result. When I asked if it was well drawn, the answer was a laconic “That like the clock is
fine!” (Question for the readers: what do you think about that?).
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The same happened in the following example (Question for the readers: what do you think about that?).
In terms of go-no-go tasks (see next authentic pictures), the patient is unable to realize simple tasks as alternate patterns
(e.g. close a hand while other is opened), or change hands in a so called “hands in palm down – palm up” task (Question for
the readers: what do you think about that?).
Go-no-go hand task (requested position) Go-no-Go hand task patient’s performance
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Patient’s hands in the so called “hands in palm down – palm up” task
By the way, just a little dare: whose are the doctor’s hands (and of course, why)?
Challenge four our readers
With all the information provided here, I strongly believe
that we are in the presence of the development of a
Schizoaffective Disorder. If the patient continues to be
treated as an OCD, strong difficulties could be yield in his
future.
We will be very happy if we receive your opinion and
question for the readers: what do you think about that?
(Please, take into consideration that only part of
information was presented here. The idea is to promote
discussion parting from pathognomonic symptoms and
clinical signals – as we use to do since a long time ago –
see Maia, 2011a,b; 2006; Maia, Correia & Leite, 2009;
Maia & Leite, 2009).
See you next challenge!
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