RENÚNCIAS FISCAIS DECORRENTES DO ART. 1º DA LEI Nº 13.586/2017 E O PRÉ-SAL COMO
FONTE DE EMPOBRECIMENTO DO NORDESTE
Paulo César Ribeiro Lima PhD em Engenharia pela Universidade de Cranfield
Ex-Consultor Legislativo do Senado Federal
Ex-Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados
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1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 3
2. DESCRIÇÃO DO ART. 1º DA LEI Nº 13.586/2017 ........................................ 3
3. ART. 12 DO DECRETO-LEI Nº 62/1966 ........................................................ 5
4. COMENTÁRIOS SOBRE A LEI Nº 4.506/1964 ............................................ 11
5. LEI Nº 12.351/2010 ...................................................................................... 12
6. CONTRATO DE PARTILHA DE PRODUÇÃO NO BRASIL ......................... 21
7. ANÁLISE DO ART. 1º DA LEI Nº 13.586/2017 ............................................ 26
8. POTENCIAL REDUÇÃO DE ARRECADAÇÃO DE IRPJ E CSLL ................ 44
9. IMPACTO NAS RECEITAS DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS ..................... 57
10. OS ROYALTIES DO PRÉ-SAL E O EMPOBRECIMENTO DO NORDESTE ..................................................................................................... 59
11. CONCLUSÕES .......................................................................................... 63
12. BIBLIOGRAFIA .......................................................................................... 68
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1. INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo demonstrar que pode haver
uma grave situação de conflito entre o art. 1º da nova Lei nº 13.586, de 28 de
dezembro de 2017, e a Lei nº 12.351, de 22 de dezembro de 2010, que deu
embasamento legal ao regime de partilha de produção e ao contrato de Libra,
primeiro bloco licitado sob esse regime.
Esse conflito pode gerar uma perda de arrecadação de R$ 1
trilhão de Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica – IPRJ e de Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido – CSLL. Como parte do IPRJ pago pelas
empresas petrolíferas é distribuída para Estados e Municípios, grande pode ser
o impacto fiscal sobre esses entes federativos.
O capítulo 10 deste trabalho estima a potencial perda de
arrecadação dos Estados e Municípios da Região Nordeste apenas em
decorrência da dedução dos royalties do Pré-Sal do IRPJ.
2. DESCRIÇÃO DA LEI Nº 13.586/2017
A Lei nº 13.586/2017 trata, basicamente, das seguintes
matérias:
− dedução das despesas de exploração e de produção de petróleo e gás
natural no Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e na
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), nos termos do art. 1º;
− Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) nas remessas ao
exterior para pagamento de frete de embarcações;
− parcelamento de débitos tributários (Refis) de IRRF nas remessas ao
exterior para pagamento de frete de embarcações;
− IRPJ e CSLL sobre lucros no exterior com atividades e serviços no setor
petrolífero; e
− regime especial de importação com suspensão de tributos federais.
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O foco deste trabalho é o art. 1º da Lei nº 13.586/2017,
transcrito a seguir:
Art. 1º Para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), poderão ser integralmente deduzidas as importâncias aplicadas, em cada período de apuração, nas atividades de exploração e de produção de jazidas de petróleo e de gás natural, definidas no art. 6º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, observado o disposto no § 1º deste artigo.
§ 1º A despesa de exaustão decorrente de ativo formado mediante gastos aplicados nas atividades de desenvolvimento para viabilizar a produção de campo de petróleo ou de gás natural é dedutível na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
§ 2º Para fins de apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, poderá ser considerada a exaustão acelerada do ativo de que trata o § 1º deste artigo, calculada mediante a aplicação da taxa de exaustão, determinada pelo método das unidades produzidas, multiplicada por dois inteiros e cinco décimos.
§ 3º A quota de exaustão acelerada de que trata o § 2º deste artigo será excluída do lucro líquido, e o total da exaustão acumulada, incluídas a normal e a acelerada, não poderá ultrapassar o custo do ativo.
§ 4º A partir do período de apuração em que for atingido o limite de que trata o § 3º deste artigo, o valor da exaustão normal, registrado na escrituração comercial, deverá ser adicionado ao lucro líquido para efeito de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
§ 5º Quanto às máquinas, aos equipamentos e aos instrumentos facilitadores aplicados nas atividades de desenvolvimento da produção, a depreciação dedutível, para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, deverá ser realizada de acordo com as taxas publicadas periodicamente pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, para cada espécie de bem, em condições normais ou médias.
§ 6º Sem prejuízo do disposto no § 5º deste arttigo, fica assegurado ao contribuinte o direito de computar a quota efetivamente adequada às condições de depreciação das suas máquinas, equipamentos e instrumentos facilitadores aplicados nas atividades de desenvolvimento da produção, desde que
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faça prova dessa adequação, quando adotar taxa diferente da publicada pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.
O caput do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 trata de deduções
opcionais e integrais das importâncias aplicadas nas atividades de exploração
e produção de jazidas de petróleo e de gás natural. Dessa forma, podem ser
deduzidos, a critério do contribuinte, os custos exploratórios, de extração e
operação, de manutenção, entre outros, em cada período de apuração.
Registre-se que esses custos representam parte significativa do custo dos
produtos vendidos.
Há restrição apenas em relação às atividades de
desenvolvimento da produção, cujos gastos estão associados a despesas de
exaustão de jazidas decorrentes da formação de ativos, nos termos do § 1º.
Poderá ser considerada a exaustão acelerada do ativo, nos termos do § 2º. Os
parágrafos § 3º e 4º detalham as regras da exaustão.
Os parágrafos 5º e 6º do art. 1º, também referentes às
atividades de desenvolvimento, disciplinam o cálculo, para fins de
determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, da depreciação
dedutível de máquinas, equipamentos e instrumentos.
3. ART. 12 DO DECRETO-LEI Nº 62/1966
Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 9, de 1995, a
União passou a poder contratar, com empresas estatais ou privadas, a
pesquisa e a lavra de jazidas de petróleo e gás natural, além do refino,
transporte, importação e exportação. A regulamentação dessa possibilidade se
deu com a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, que representou o fim do
monopólio executivo da Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras nessas atividades.
Com o fim desse monopólio e a participação crescente de
outras empresas nas atividades de exploração e produção de petróleo, ficou
clara a necessidade de adequação da legislação fiscal, principalmente em
relação ao art. 12 do Decreto-Lei nº 62, de 21 de novembro de 1966, transcrito
a seguir:
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Art. 12. A Petróleo Brasileiro S. A. - PETROBRÁS - poderá deduzir, para efeito de determinação do lucro sujeito à tributação, as importâncias aplicadas em cada exercício na prospecção e extração do petróleo cru.
Esse artigo representa, de fato, um privilégio para a Petrobras,
empresa que, como monopolista, tinha como um de seus objetivos o aumento
da produção nacional de petróleo. Em razão do exercício do monopólio
executivo e do controle governamental sobre a Petrobras, optou-se, à época,
por uma redação extremamente abrangente e imprecisa para esse dispositivo
legal, pois, em última análise, caberia à União, que tem o controle sobre as
decisões da Petrobras, optar ou não pelas deduções de que trata o art. 12 do
Decreto-Lei nº 62/1966.
O Congresso Nacional deveria, há 20 anos, ter realizado uma
ampla discussão nacional sobre o papel estratégico da Petrobras e do
tratamento tributário a ser dado à estatal e também a outras empresas
petrolíferas envolvidas com as atividades de exploração e produção, a partir da
promulgação da Lei nº 9.478/1997.
Em vez disso, o Regulamento do Imposto de Renda – RIR,
Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999, incorporou, com pequenos ajustes,
o art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966, nos seguintes termos:
Art. 416. O Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRAS poderá deduzir, para efeito de determinação do lucro líquido, as importâncias aplicadas, em cada período de apuração, na prospecção e extração de petróleo cru (Decreto-Lei nº 62, de 21 de novembro de 1966, art. 12).
Segundo Barbosa (2008), tal dispositivo do RIR/1999 é
claramente inconstitucional, pois afronta o princípio da isonomia e da livre
concorrência, não sendo justificável garantir-se à Petrobras tratamento tão
vantajoso na apuração do imposto de renda devido.
Ela destaca, ainda, a falha na redação do dispositivo que, por
ser posterior à Lei nº 9.478/1997, deveria manter coerência nos termos
técnicos utilizados, ou seja, a expressão “prospecção e extração” deveria ter
sido substituída por “exploração e produção”.
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Barbosa (2008) ressalta que a impossibilidade de tratamento
tão desigual é garantia constitucional, in verbis:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...)
......................................................................................................
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.
Apesar da incorporação indevida do art. 12 do Decreto-Lei nº
62/1966 ao RIR/1999, a Receita Federal do Brasil – RFB não permitia que as
despesas da Petrobras nas etapas de desenvolvimento da produção fossem
deduzidas em cada período de apuração. Isso levou a Petrobras a recorrer ao
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF.
De acordo com o Alerta Tributário da Campos Mello
Advogados1, a RFB considerava que tais despesas deviam ser “ativadas e
deduzidas nos períodos subsequentes, tendo em vista que o art. 12 do
Decreto-Lei 62/1966 (art. 416 do RIR/99) não mais vigorar em razão do término
do monopólio estatal no setor resultar na inconstitucionalidade da norma”.
Em 12 de maio de 2017, a Petrobras informou que foi
notificada de decisão do CARF definitiva e favorável à companhia, em
processo administrativo fiscal que aborda o momento da dedutibilidade dos
gastos incorridos pela Petrobras com o desenvolvimento da produção de
petróleo e gás, para fins de apuração do Imposto sobre a Renda da Pessoa
Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL),
referente ao exercício de 2009, no valor atualizado de R$ 5,8 bilhões.
Em relação ao exercício de 2010, a Petrobras informou, em 19
de outubro de 2017, que o CARF proferiu, nos temos do Acórdão nº 1201-
001.419, de 18 de outubro de 2017, por unanimidade, decisão favorável à
1 Disponível em https://pt.slideshare.net/CamposMelloAdvogados/alerta-tributrio-petrleo-gs. Acesso em 9 de novembro de 2017.
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companhia em processo administrativo fiscal no valor de R$ 7,8 bilhões, que
aborda o momento da dedutibilidade dos gastos incorridos pela Petrobras com
o desenvolvimento da produção de petróleo e gás, para fins de apuração IRPJ
e da CSLL, referentes ao exercício de 2010.
Transcreve-se, a seguir, a decisão desse Acórdão:
É vedado à Fiscalização afastar a aplicação de normativo plenamente vigente, sob a alegação de inconstitucionalidade, ainda que sob pretexto interpretativo de adequação à ordem constitucional ulterior à sua edição. O lançamento tributário é atividade vinculada.
É devida a presunção de constitucionalidade das normas pela Administração Tributária, devendo aplicá-las de ofício, cabendo somente ao Poder Judiciário a verificação de sua compatibilidade com o texto constitucional, quando devidamente provocado, pelas vias adequadas.
................................................................................................
A autorização de dedução de despesas contida art. 416 do RIR/99 (art. 12 do Decreto-Lei nº 62/66) não foi suprimida ou alterada após a edição da Lei nº 9.478/97. E, desde a sua veiculação, foram contemplados na sua autorização de dedução os gastos percebidos com a etapa de desenvolvimento dos campos de petróleo.
................................................................................................
Ao que tudo indica, a Petrobras terá, ainda, outras bilionárias
decisões favoráveis junto ao CARF. Essas decisões decorrem do fato de o art.
12 do Decreto-Lei nº 62/1966 não ter sido revogado desde a promulgação da
Lei nº 9.478/1997.
Juntamente com essa revogação, deveria ter sido analisada e
aprovada no Congresso Nacional lei para disciplinar, com clareza e
detalhamento, o modelo tributário a ser aplicado tanto à Petrobras quanto a
outras empresas em relação às atividades de exploração e produção de
petróleo e gás natural.
Vale ressaltar, contudo, que, no caso de campos de petróleo
explorados sob o regime de concessão e sujeitos ao pagamento de
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participação, há legislação específica que inviabiliza a dedução dos gastos na
etapa de desenvolvimento em cada exercício.
Trata-se do art. 50 da Lei nº 9.478/1997, que estabelece que o
edital e o contrato de concessão estabelecerão, nos casos de grande volume
de produção, ou de grande rentabilidade, o pagamento de uma participação
especial, a ser aplicada sobre a receita bruta da produção, deduzidos os
royalties, os investimentos na exploração, os custos operacionais, a
depreciação e os tributos previstos na legislação em vigor.
A Resolução ANP nº 12, de 21 de fevereiro de 2014, trata
especificamente da depreciação dos bens utilizados nas atividades de
exploração e produção de petróleo e gás natural. Transcrevem-se, a seguir,
trechos da Seção XIII do Capítulo IV que trata das deduções da receita bruta
da produção, para fins de pagamento de participação especial:
Seção XIII
Depreciação de Bens
Art. 29. Em cada período-base, poderão ser deduzidos, no cálculo da receita líquida da produção do campo, os encargos da depreciação de bens utilizados nas atividades de exploração das jazidas de petróleo e gás natural e de perfuração de poços e nas atividades de desenvolvimento e produção, de que tratam respectivamente o inciso VIII do art. 15 e o inciso XII do art. 17, decorrente do desgaste pelo uso, ação da natureza ou obsolescência normal, desde que seja o concessionário quem suporte o encargo econômico do desgaste ou obsolescência, de acordo com as condições de propriedade, posse ou uso do bem.
§ 1º Os encargos de depreciação de um bem serão dedutíveis a partir da data em que o bem for instalado, posto em serviço ou em condições de produzir.
......................................................................................................
§ 5º Deverão ser objeto de depreciação os poços utilizados na fase de produção, compreendendo os gastos incorridos na perfuração e completação de poços produtores de petróleo e gás natural ou de poços de injeção, incluindo a reperfuração, aprofundamento e recompletação.
......................................................................................................
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Quota de Depreciação
Art. 30. Os encargos de depreciação serão apropriados, em cada período-base, em quotas trimestrais, determinadas mediante a aplicação de uma taxa trimestral de depreciação sobre o custo de aquisição dos bens depreciáveis.
§ 1º Em nenhuma hipótese, o montante acumulado das quotas de depreciação poderá ultrapassar o custo de aquisição ou de construção do bem.
......................................................................................................
Taxa de Depreciação
Art. 31. A taxa trimestral de depreciação, a que se refere o caput do art. 30, será fixada em função do prazo de vida útil admissível do bem, durante o qual se possa esperar a sua utilização econômica pelo concessionário na sua atividade produtiva.
......................................................................................................
Observa-se, então, que, no caso dos principais campos
produtores de petróleo e gás natural sob o regime de concessão, já há, desde
a Lei nº 9.478/1997, menção explícita à depreciação e, a partir da Resolução
ANP nº 12/2014, regras claras sobre a forma de como deve ocorrer a dedução
dos custos de depreciação da receita bruta da produção.
A menção explícita à depreciação, ainda no ano de 1997, e a
inconstitucionalidade do art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966 podem impedir junto
ao Poder Judiciário as mencionadas perdas bilionárias para o Poder Público,
em razão das decisões do CARF favoráveis à Petrobras. Cabe, então, à União
recorrer ao Poder Judiciário, pois não há razões técnicas para essas decisões.
Importa registrar, ainda, que nem a Lei nº 9.478/1997 nem a
Resolução nº 12/2014 fazem menção à quota de exaustão de jazida.
Não há, contudo, como negar a urgência e a gravidade da
situação decorrente da não revogação do art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966 há
20 anos.
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4. COMENTÁRIOS SOBRE A LEI Nº 4.506/1964
De acordo com o item 3.5 da Exposição de Motivos – EM nº
00100/2017 MF, de 15 de agosto de 2017, relativa à Medida Provisória – MPV
nº 795/2017, que foi convertida na Lei nº 13.586/2017, “o entendimento da
Administração Tributária é no sentido de que se admite a dedução, a título de
despesas, das importâncias aplicadas em cada período na fase de pesquisa de
petróleo, conforme § 1º do art. 53 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964,
que autoriza a dedução das despesas com prospecção e cubagem de jazidas
ou depósitos, realizadas por concessionários de pesquisa ou lavra de
minérios”.
Transcreve-se, a seguir, o caput e o § 1º do art. 53 da Lei nº
4.506/1964:
Art. 53. Serão admitidas como operacionais as despesas com pesquisas científicas ou tecnológicas inclusive com experimentação para criação ou aperfeiçoamento de produtos, processos, fórmulas e técnicas de produção, administração ou venda.
§ 1º Serão igualmente dedutíveis as despesas com prospecção e cubagem de jazidas ou depósitos, realizadas por concessionários de pesquisas ou lavra de minérios, sob a orientação técnica de engenheiro de minas.
Não se julga adequado, tecnicamente, esse entendimento da
Administração Tributária, pois o caput do art. 53 da Lei nº 4.506/1964 dispõe
sobre dedução de despesas com pesquisas científicas ou tecnológicas e o § 1º
desse artigo trata de prospecção e cubagem de jazidas ou depósitos,
realizadas por concessionários de pesquisas ou lavra de minérios, sob a
orientação técnica de engenheiro de minas. Atualmente, as concessões
minerais são regidas pelo art. 176 da Constituição Federal.
Dessa forma, a permissão dessa dedução não diz respeito a
despesas com pesquisa e lavra de petróleo e gás natural, que são atividades
tratadas pelo inciso I do art. 177 da Constituição Federal. Registre-se que tais
atividades constituem monopólio da União.
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Ressalte-se, ainda, que no regime de partilha de produção em
áreas do Pré-Sal e áreas estratégicas, introduzido pela Lei nº 12.351/2010, não
há que se falar em concessões minerais. Nesse regime, não há sequer
concessionários.
5. LEI Nº 12.351/2010
A Lei nº 12.351/2010 introduziu o regime de partilha de
produção no Brasil. Esse regime é aplicável ao polígono do Pré-Sal e às áreas
estratégicas.
As descobertas, na província petrolífera do Pré-Sal, estão entre
as mais importantes em todo o mundo nas últimas décadas. Essa província é
composta por grandes acumulações de óleo leve, de excelente qualidade e alta
produtividade, o que coloca o Brasil em posição estratégica frente à demanda
mundial por petróleo e gás natural.
A “área” do Pré-Sal foi estabelecida como sendo a região do
subsolo formada por um prisma vertical de profundidade indeterminada, com
superfície poligonal definida pelas coordenadas geográficas de seus vértices,
estabelecidas em Anexo à Lei nº 12.351/2010, bem como outras regiões que
venham a ser delimitadas em ato do Poder Executivo, de acordo com a
evolução do conhecimento geológico.
A descoberta dessa província pode representar a agregação de
reservas de 176 bilhões de barris de petróleo (Jones e Chaves, 2015), volume
significativamente maior que as atuais reservas nacionais, que, em 2014, eram
de 16,2 bilhões de barris de petróleo.
No regime de partilha de produção, os contratados têm direito a
se apropriar de parcela do óleo produzido para cobrir o custo em óleo, nos
termos do art. 2º da Lei nº 12.351/2010. Já o art. 42, § 1º, veda em qualquer
hipótese, o ressarcimento dos royalties ao contratado bem como sua inclusão
no cálculo do custo em óleo; o § 2º, por sua vez, dispõe que o bônus de
assinatura não integra o custo em óleo, sendo vedado, em qualquer hipótese,
seu ressarcimento ao contratado. Esses dispositivos são a seguir transcritos:
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Art. 2º Para os fins desta Lei, são estabelecidas as seguintes definições:
I - partilha de produção: regime de exploração e produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos no qual o contratado exerce, por sua conta e risco, as atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento e produção e, em caso de descoberta comercial, adquire o direito à apropriação do custo em óleo, do volume da produção correspondente aos royalties devidos, bem como de parcela do excedente em óleo, na proporção, condições e prazos estabelecidos em contrato;
II - custo em óleo: parcela da produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, exigível unicamente em caso de descoberta comercial, correspondente aos custos e aos investimentos realizados pelo contratado na execução das atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento, produção e desativação das instalações, sujeita a limites, prazos e condições estabelecidos em contrato;
III - excedente em óleo: parcela da produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos a ser repartida entre a União e o contratado, segundo critérios definidos em contrato, resultante da diferença entre o volume total da produção e as parcelas relativas ao custo em óleo, aos royalties devidos e, quando exigível, à participação de que trata o art. 43; (grifo nosso)
......................................................................................................
Art. 42. O regime de partilha de produção terá as seguintes receitas governamentais:
I - royalties; e
II - bônus de assinatura.
§ 1º Os royalties, com alíquota de 15% (quinze por cento) do valor da produção, correspondem à compensação financeira pela exploração do petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos líquidos de que trata o § 1º do art. 20 da Constituição Federal, sendo vedado, em qualquer hipótese, seu ressarcimento ao contratado e sua inclusão no cálculo do custo em óleo.
§ 2º O bônus de assinatura não integra o custo em óleo e corresponde a valor fixo devido à União pelo contratado, devendo ser estabelecido pelo contrato de partilha de produção
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e pago no ato da sua assinatura, sendo vedado, em qualquer hipótese, seu ressarcimento ao contratado. (grifo nosso)
Como evidenciado pelos incisos I e II do art. 2º da Lei nº
12.351/2010, o contratado tem direito à apropriação do custo em óleo, que é a
parcela da produção correspondente aos custos e aos investimentos realizados
pelo contratado na execução das atividades de exploração, avaliação,
desenvolvimento, produção e desativação das instalações. O inciso III do art.
2º dispõe que cabe ao contratado parcela do excedente em óleo, que é a
tradução da expressão profit oil, adotada internacionalmente nos contratos de
partilha de produção.
Dessa forma, a Administração Tributária deveria considerar o
custo em óleo como as deduções, relativas às atividades de exploração e
produção, para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da
CSLL.
Dessa forma, o custo dos produtos e serviços vendidos para se
determinar o lucro bruto, utilizando-se terminologia apresentada pela
Petrobras2, deveria ter o custo em óleo como parâmetro. Poderiam ser
permitidas deduções específicas do lucro bruto relativas às atividades de
exploração e produção, além dos itens que integram o custo em óleo, mas com
muita parcimônia.
Nos termos do art. 42, fica evidenciado, ainda, que os royalties
e o bônus de assinatura não integram o custo em óleo. Além disso, não pode
haver qualquer tipo de ressarcimento desses pagamentos. Desse modo, esses
custos não podem ser deduzidos para fins de determinação do lucro real e da
base de cálculo da CSLL, pois isso caracterizaria um ressarcimento ao
contratado.
A Figura 5.1 apresenta a Demonstração do Resultado –
Consolidado da Petrobras nos anos de 2015 e 2016, na qual são mostrados os
lucros brutos e as deduções do lucro para fins de cálculo do lucro líquido a ser
ajustado para se determinar a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
2 Disponível em http://www.investidorpetrobras.com.br/pt/resultados-financeiros/holding. Acesso em 17 de janeiro de 2018.
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Figura 5.1 – Demonstração do Resultado Consolidado da Petrobras nos anos de
2015 e 2016.
Fonte: Petrobras
É importante registrar que o regime de partilha de produção é
novo no Brasil. Santos e Silva (2013) muito bem ressaltam diversas dúvidas
referentes ao regime de partilha de produção.
Transcreve-se, a seguir, trecho de Santos e Silva (2013):
Um ponto importante a destacar é que a Lei n.º 12.351/2010 não alterou a legislação tributária vigente, fato que enseja diversas dúvidas, tais como: o resultado que servirá de base para cálculo do imposto de renda será o apurado na partilha ($26.775 mil) ou o apurado normalmente pela contabilidade ($41.398)? E os impostos e contribuições, como ICMS, PIS, Cofins, poderão ser recuperados (compor o custo óleo)? E quando da transferência do óleo da empresa privada para a PPSA, estados e municípios irão taxar essa movimentação de mercadoria/prestação de serviço (transporte do óleo)? Ou seja, são questões que ainda exigirão um esforço legislativo muito
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intenso, com vistas a viabilizar a exploração do pré-sal, uma vez que essas questões, entre outras, impacta decisivamente a decisão dos investidores em entrarem numa empreitada de grande magnitude como são os projetos de exploração e produção de petróleo. (grifo nosso)
Nos anos de 2015 e 2016, merecem destaque, como mostrado
na Figura 5.1, as deduções feitas pela Petrobras de, respectivamente, R$
110,9 bilhões e R$ 72,9 bilhões, com destaque para as despesas de vendas,
as despesas gerais e administrativas, os custos exploratórios para extração de
petróleo e gás (áreas não comerciais), a reversão/perda no valor de
recuperação de ativos – Impairment e as outras despesas.
A Figura 5.2 mostra as perdas por desvalorização de ativos
(impairments), realizadas pela Petrobras, nos anos de 2015 e 2014 de,
respectivamente, R$ 47,7 bilhões e R$ 44,5 bilhões. Do impairment de R$ 47,7
bilhões de 2015, R$ 33,7 bilhões referem-se a campos de produção de petróleo
e gás natural de diversas unidades geradoras de caixa (UGC) no Brasil.
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Figura 5.2 – Impairments realizados pela Petrobras em 2015 e 2014.
Fonte: Petrobras
Os fluxos de caixa futuros da Petrobras consideraram
premissas e orçamentos; e taxa de desconto pós-imposto em moeda constante
de 8,3% ao ano, que deriva da metodologia do WACC (weighted average cost
of capital) para o setor de exploração e produção. Essas perdas por impairment
do segmento de exploração e produção em bilhões de Reais estão
relacionadas, predominantemente, aos campos de Papa-Terra (R$ 8,723), Polo
Centro-Sul (R$ 4,605), Polo Uruguá (R$ 3,849), Espadarte (R$ 2,315),
Linguado (R$ 1,911), Polo CVIT – Espírito Santo (R$ 1,463), Piranema (R$
1,333), Lapa (R$ 1,238), Bicudo (R$ 0,937), Frade (R$ 0,773), Badejo (R$
0,740), Pampo (R$ 0,355) e Trilha (R$ 0,327), em função da revisão de
premissas de preço, decorrente da queda das projeções dos preços do
petróleo no mercado internacional que ocasionaram redução nas reservas de
óleo e gás e nos fluxos de caixa dos projetos, bem como pelo aumento da taxa
de desconto e revisão geológica do reservatório de Papa-Terra.
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Observa-se, então, que, de certa forma, o valor dos ativos a
serem depreciados ou exauridos estão associados a julgamentos sobre
reservas petrolíferas que, em última análise, são bens da União.
Essa questão será analisada em estudo técnico específico,
pois, salvo melhor juízo, as “despesas a título de impairment” foram deduzidas
pela Petrobras para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da
CSLL. A ausência de pagamento de IRPJ e CSLL está associada aos elevados
prejuízos contábeis apresentados pela Petrobras nos anos de 2016 e 2015 de,
respectivamente, R$ 13,1 bilhões e R$ 35,1 bilhões, mostrados na Figura 5.1,
que foram, em parte, decorrentes de impairments.
Se parte dos custos desses ativos já havia sido deduzida para
fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL em cada
período de apuração, o impairment significa uma duplicidade de dedução. No
regime de partilha de produção, os custos e despesas recuperáveis, como
custo em óleo, não estão sujeitos à duplicidade de dedução.
De acordo com Hein (2017), impairment são despesas para
fins de livro contábil, mas nunca dedutível para fins de imposto. Trasncreve-se,
a seguir, trecho desse trabalho:
Impairment of oil and gas properties are expensed for book but are never deductible for tax.
Na Noruega, por exemplo, os impairments podem contribuir
para prejuízos contábeis em determinados anos, por exemplo, da Statoil
Petroleum AS. Esses prejuízos, no entanto, não significam que não haverá
pagamento de imposto de renda. A Figura 5.3 mostra que essa subsidiária
integral da Statoil ASA teve prejuízo antes do imposto de renda de US$ 131
milhões e US$ 435 milhões nos anos de, respectivamente, 2016 e 20153.
3 Disponível em https://www.statoil.com/content/dam/statoil/documents/debt-and-credit-ir/statoil-petroleum-2016-2.pdf. Acesso em 29 de janeiro de 2018.
19
Figura 5.3 – Declaração de Renda da Statoil.
Fonte: Statoil
Mesmo tendo apresentado prejuízos antes do imposto de
renda, a Statoil Petroleum AS pagou imposto de renda de US$ 2,4 bilhões e
US$ 5,3 bilhões nos anos de, respectivamente, 2016 e 2015. Em razão do
pagamento de imposto, os prejuízos contábeis do período aumentaram de R$
131 milhões para US$ 2,5 bilhões e de US$ 435 milhões para US$ 5,8 bilhões
nos anos de, respectivamente, 2016 e 2015.
Em suma, a própria legislação tributária deveria levar em conta
a Lei nº 12.351/2010 e os contratos de partilha de produção para fins de
estabelecimento do custo em óleo como os custos e despesas dedutíveis para
fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL. É isso que
ocorre em países que adotam o regime de partilha de produção.
Esse regime foi concebido na Indonésia. Desde sua
concepção, esse país adota o princípio da uniformidade, segundo o qual os
20
custos e despesas dedutíveis como custo em óleo (cost oil) são os mesmos
adotados para cálculo do imposto sobre a renda4.
Também em Angola, somente as despesas recuperáveis como
custo em óleo são dedutíveis para fins de imposto de renda, cuja alíquota é
50%. Transcreve-se, a seguir, trecho do trabalho de Graça e Lima (2017) sobre
a tributação das empresas petrolíferas em Angola:
PIT is assessed on a ring-fencing basis and corresponds to the crude oil produced net of the cost oil (deductible expenses) and the National Concessionaire’s share. Only recoverable expenses under the PSA are tax-deductible. The tax rate is 50 per cent.
Ressalte-se, ainda, que, em Angola, o imposto sobre a renda
petrolífera (petroleum income tax – PIT) é calculado a partir de determinada
área contratada sob o regime de partilha de produção. Dessa forma, não são
permitidas deduções de custos e despesas de outras áreas para fins de
imposto de renda (ring-fencing).
O nível de ring-fencing pode ser tão baixo quanto um campo,
uma área de contrato ou, em alguns casos, toda uma região. É comum que
mais de um campo seja descoberto em um bloco contratado sob o regime de
partilha de produção.
O ring-fencing também pode agir como incentivo fiscal para
atividades adicionais. Se um país fica com 80% do excedente em óleo, por
exemplo, a perfuração de um novo poço exploratório significa que o governo
está também pagando 80% dos custos de exploração. Por essa razão, alguns
países são relutantes em adotar determinado tipo de ring-fencing já que ele
pode reduzir, significativamente, sua receita no curto prazo5.
Importa transcrever trecho de artigo de Sunley et al. (2002),
preparado para a Conferência do Fundo Monetário Internacional sobre
4 Disponível em https://www2.deloitte.com/content/dam/Deloitte/global/Documents/Energy-and-Resources/gx-er-oilandgas-indonesia.pdf. Acesso em 29 de janeiro de 2018. 5 Disponível em http://blogs.bakerhughes.com/reservoir/2011/06/18/types-of-international-petroleum-fiscal-regimes-ring-fencing-reserve-treatment/. Acesso em 29 de janeiro de 2018.
21
implementação e formulação de políticas fiscais em países produtores de
petróleo:
The split of profit oil is often fixed—60 percent for the government and 40 percent for the investor, for example. It may vary by level of production, the price of crude oil, or the internal rate of return earned on the project. Contractors often pay income tax on their share of production.
Em suma, o Brasil, para não ser um caso à parte, deveria ter
adotado o princípio da uniformidade, adotando o custo em óleo para fins de
estabelecimento dos custos e despesas dedutíveis para fins de determinação
do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
6. CONTRATO DE PARTILHA DE PRODUÇÃO NO BRASIL
Até o momento, foram realizadas três Rodadas de Licitação no
polígono do Pré-Sal, sob o regime de partilha de produção. Na 1ª Rodada de
Partilha de Produção, realizada em outubro de 2013, foi ofertada a área de
Libra; na 2ª, foram ofertadas as áreas de Norte de Carcará, Entorno de
Sapinhoá, Sul de Gato do Mato e Sudoeste de Tartaruga Verde; e, na 3ª, foram
ofertadas as áreas de Peroba, Pau-Brasil, Alto de Cabo Frio-Oeste e Alto de
Cabo Frio-Central. Para o ano de 2018, está prevista a 4ª Rodada do Pré-Sal,
na qual serão ofertadas as áreas de Uirapuru, Três Marias, Saturno, Dois
Irmãos e Itaimbezinho.
Na 1ª Rodada do Pré-Sal, participou apenas um consórcio, que
venceu a licitação. Esse consórcio foi liderado pela Petrobras, que tem 40% de
participação. As parceiras da Petrobras em Libra são Shell, Total, CNPC e
CNOOC.
Toma-se como exemplo, para analisar o regime de partilha de
produção, o contrato de Libra, assinado em 2 de dezembro de 20136. O
contrato de partilha de produção de Libra será denominado apenas como
contrato de partilha de produção. A partir desse contrato, já foram perfurados
6 Disponível em http://www.ebc.com.br/noticias/brasil/2013/12/primeiro-contrato-para-exploracao-do-pre-sal-sera-assinado-hoje. Acesso em 27 de novembro de 2017.
22
12 poços exploratórios e já entrou em operação, no dia 26 de novembro de
2017, o FPSO Pioneiro de Libra, que é uma unidade estacionária de produção
flutuante que produz, armazena e transfere petróleo (floating, production,
storage and offloading – FPSO)7.
Em Libra, o completo desenvolvimento da área de 727 km2
deverá requerer pelo menos 10 FPSOs8. Dessa forma, os custos e os
investimentos serão altos, mas apropriados pelos contratados na forma de
custo em óleo.
O contrato de partilha de produção de Libra9, com vigência de
35 anos, dispõe, em sua Cláusula Quinta, sobre a recuperação do custo em
óleo. Em caso de descoberta comercial, o contratado terá direito a receber,
como custo em óleo, uma parcela da produção de petróleo e gás natural
produzido.
O contratado, a cada mês, poderá recuperar o custo em óleo,
respeitando o limite de 50% do valor bruto da produção nos dois primeiros anos
de Produção e de 30% desse valor nos anos seguintes, para cada módulo da
etapa de desenvolvimento10.
Após o início da produção, caso os gastos registrados como
custo em óleo não sejam recuperados no prazo de 2 anos a contar da data do
seu reconhecimento como crédito para o contratado, o limite de 30% será
aumentado, no período seguinte, para até 50% até que os respectivos gastos
sejam recuperados.
Nos termos do parágrafo 3.1 do contrato de partilha de
produção de Libra, compõem o custo em óleo os gastos realizados pelos
contratados na área do contrato, aprovados no Comitê Operacional e
reconhecidos pela Gestora, relativos às atividades de:
7 Disponível em http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/iniciamos-producao-de-libra.htm. Acesso em 27 de novembro de 2017. 8 Disponível em https://dokumen.tips/documents/offshore-july-2013.html. Acesso em 27 de novembro de 2017. 9 Disponível em http://www.brasil-rounds.gov.br/round_p1/portugues_p1/edital.asp. Acesso em 8 de janeiro de 2018. 10 Nos termos do contrato de partilha de produção, é definido como módulo individualizado, composto por instalações e infraestrutura para Produção de Petróleo e Gás Natural de uma ou mais Jazidas de determinado Campo, segundo o Plano de Desenvolvimento aprovado pela ANP.
23
3.1.1 Exploração e Avaliação;
3.1.2 Desenvolvimento;
3.1.3 Produção;
3.1.4 Desativação das instalações; e
3.1.5 Pesquisa e Desenvolvimento e Inovação contratados nos
termos dos parágrafos 7.2 e 7.3 da Cláusula Sétima -
Despesas Qualificadas como Pesquisa e Desenvolvimento e
Inovação, do Contrato.
Desde que relacionados com as atividades elencadas no
parágrafo 3.1 os seguintes gastos, dentre outros, serão passíveis de
reconhecimento como custo em óleo:
3.2.1 Aquisição de insumos consumidos nas Operações;
3.2.2 Aluguel, afretamento e arrendamento mercantil de bens e
equipamentos utilizados nas operações;
3.2.3 Aquisição, processamento e interpretação de dados de
geologia, geofísica e geoquímica;
3.2.4 Valor dos bens incorporados aos ativos fixos adquiridos e
utilizados nas operações;
3.2.5 Conservação, manutenção e reparo de bens,
equipamentos, instalações e reposição de bens ou
equipamentos perdidos pelo contratado na execução das
operações em conformidade com as melhores práticas da
indústria do petróleo, ressalvado o disposto no parágrafo
3.14.10;
3.2.6 Aquisição e manutenção de seguros aprovados pelo
Comitê Operacional;
3.2.7 Operações de embarcações e aeronaves;
3.2.8 Inspeção, armazenamento, movimentação e transporte
de materiais e equipamentos;
3.2.9 Obtenção de permissões, servidões e desapropriação de
imóveis e assemelhados;
24
Observa-se, então, que os gastos de afretamento e
arrendamento serão recuperados como custo em óleo. Com relação aos ativos
fixos, somente o valor dos bens adquiridos serão recuperados como custo em
óleo. Assim sendo, o contrato de partilha de produção não permite que o valor
de um bem arrendado, por exemplo, integre o custo em óleo.
É muito importante destacar, ainda, que, nos termos do
parágrafo 3.14, não integram o custo em óleo, entre outros: os royalties, o
bônus de assinatura, os royalties comerciais pagos a afiliadas, os encargos
financeiros e amortizações de empréstimos e financiamentos; despesas de
pesquisa, desenvolvimento e inovação contratados nos termos do parágrafo
7.5; gastos com ativos imobilizados que não estejam diretamente relacionados
com as atividades de exploração e avaliação, desenvolvimento, produção,
desativação das instalações; gastos relacionados com custas judiciais e
extrajudiciais, conciliações, arbitragens, perícias, honorários advocatícios;
multas, sanções e penalidades; gastos com a reposição de bens, equipamento
e insumos que forem perdidos, danificados ou inutilizados em virtude de caso
fortuito, bem como de dolo, imperícia, negligência, ou imprudência por parte do
operador; tributos sobre a renda; e gastos com comercialização ou transporte,
excluídos todos os gastos relacionados ao escoamento da produção.
Nos termos do parágrafo 3.3 do contrato de partilha de
produção de Libra, incluem-se nas atividades de exploração e avaliação:
3.3.1 Levantamento, processamento, reprocessamento e
interpretação de dados de geologia e geofísica;
3.3.2 Perfuração, completação e abandono de poços
exploratórios;
3.3.3 Execução de testes de formação e de produção para a
avaliação da descoberta; e
3.3.4 Implantação de instalações utilizadas para apoiar os
propósitos acima, incluindo serviços e obras de engenharia
civil.
As atividades de desenvolvimento, nos termos do parágrafo
3.4, incluem:
25
3.4.1 Estudos e projetos de implantação das instalações;
3.4.2 Perfuração e completação de poços de produção e
injeção; e
3.4.3 Instalação de equipamentos e embarcações de extração,
coleta, tratamento, armazenamento e transferência de petróleo
e gás natural.
a) Tais instalações compreendem: plataformas marítimas,
tubulações, unidades de tratamento de petróleo e gás natural,
equipamentos e instalações para medição da produção
fiscalizada, equipamentos para cabeça de poço, tubos de
produção, linhas de fluxo, tanques e demais instalações
exclusivamente destinadas à extração, bem como oleodutos e
gasodutos diretamente ligados ao escoamento da produção, e
suas respectivas estações de compressão e bombeio.
b) Ramais secundários de distribuição que não tenham a
finalidade de escoamento de produção não deverão ser
considerados como atividade de Desenvolvimento.
Registre-se, por fim, que nos termos do parágrafo 5.7 do
contrato de partilha de produção de Libra, eventual saldo positivo da conta
custo em óleo ao final do prazo contratual não gerará direito a indenizações ou
restituições aos contratados. Desse modo, garante-se que, no mínimo, 50% do
valor bruto da produção serão destinados aos royalties (15%) e ao excedente
em óleo (35%), a ser dividido entre a União e os contratados.
Observa-se, então, que, no regime de partilha de produção, há
muita clareza e detalhe na definição das deduções que integram o custo em
óleo. São essas deduções que deveriam ser utilizadas para determinação do
lucro real e da base de cálculo da CSLL.
Conclui-se, então, que a legislação tributária poderia definir as
deduções fiscais a partir do custo em óleo; outras deduções relativas às
atividades de exploração e produção poderiam ocorrer, mas com muito rigor,
clareza e parcimônia. Decorre disso as críticas às possibilidades de deduções
26
generalizadas e em duplicidade permitidas pelo art. 1º da Lei nº 13.586/2017,
que será analisado a seguir, no capítulo 7.
7. ANÁLISE DO ART. 1º DA LEI Nº 13.586/2017
O caput do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 é muito semelhante ao
art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966, que foi revogado pelo art. 11 dessa própria
Lei. No entanto, esse artigo apresenta seis parágrafos, todos relativos às
atividades de desenvolvimento da produção.
O grande mérito da Lei nº 13.586/2017 é, de fato, a revogação
do art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966. No entanto, não houve somente sua
revogação. Esse artigo foi modificado, principalmente pelo acréscimo de
parágrafos, e incluído na Lei nº 13.586/2017, nos termos do caput do seu art.
1º.
Se o art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966 fosse simplesmente
revogado, o setor petrolífero teria o mesmo tratamento tributário que qualquer
outro setor da economia nacional e não haveria os conflitos e as mencionadas
decisões do CARF favoráveis à Petrobras, que podem impor perdas bilionárias
aos cofres públicos.
Além dessa revogação, a Lei nº 13.586/2017 poderia utilizar
todo o conhecimento, objetividade, clareza e detalhamento referente ao regime
de partilha de produção e respectivo contrato para definir, em lei, as deduções
para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL. A
própria legislação do regime de concessão poderia ser utilizada para as
deduções de IRPJ e CSLL para os contratados sob esse regime.
Desse modo, caberia ao art. 1º da Lei nº 13.586/2017 apenas
citar ou reproduzir a legislação do setor petrolífero e estabelecer possíveis
deduções adicionais relacionadas com as atividades de exploração e produção
de petróleo e gás natural, mas com muita parcimônia, no sentido de evitar que
atividades rentáveis não gerem a devida arrecadação de tributos sobre a
renda.
27
Entretanto, o Poder Executivo adotou um caminho que se
considera equivocado quando da edição do art. 1º da MPV nº 795/2017, que
deu origem ao art. 1º da Lei nº 13.586/2017. A visão da Receita Federal do
Brasil – RFB parece ter sido a criação de um modelo tributário a partir do art.
12 do Decreto-Lei nº 62/1966, sem o detalhamento e a clareza necessários a
tão complexa matéria.
Na visão da RFB, salvo melhor juízo, o art. 1º da Lei nº
13.586/2017, a partir de poucas “linhas”, deve ser o modelo tributário para as
atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural. Modelo esse
que utiliza a expressão “poderão ser integralmente deduzidas”.
Dessa forma, tal modelo permite que o contribuinte “escolha”
como comporá o custo dos produtos e serviços vendidos em cada período de
apuração. Permite, ainda, que o contribuinte “escolha” deduções do lucro bruto
para se chegar ao lucro líquido antes do IRPJ e CSLL.
Seria adequado que o custo dos produtos e serviços vendidos
e o lucro líquido antes do IRPJ e CSLL possam ser determinados a partir de
deduções opcionais?
Nesse contexto, apresenta-se, a seguir, análise detalhada do
art. 1º da Lei nº 13.586/2017.
As principais diferenças entre o caput do art. 1º da Lei nº
13.586/2017 e o art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966 dizem respeito ao fato de o
art. 12 aplicar-se exclusivamente à Petrobras e à presença da expressão
“observado o disposto no § 1º”, que é inadequada em termos de redação
legislativa, pois não há hipótese de todos os parágrafos de determinado art.
não serem observados.
Transcrevem-se, a seguir, as redações desses dispositivos:
Art 12. A Petróleo Brasileiro S. A. - PETROBRÁS - poderá deduzir, para efeito de determinação do lucro sujeito à tributação, as importâncias aplicadas em cada exercício na prospecção e extração do petróleo cru.
28
Art. 1º Para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, poderão ser integralmente deduzidas as importâncias aplicadas, em cada período de apuração, nas atividades de exploração e produção de jazidas de petróleo e de gás natural, definidas no art. 6º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, observado o disposto no § 1º.
O caput do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 apresenta alterações
pouco significativas em relação ao art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966 que são a
substituição da expressão “prospecção e extração do petróleo cru” por
“exploração e produção de jazidas de petróleo e de gás natural, definidas no
art. 6º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997”; a substituição da expressão
“em cada exercício” por “em cada período de apuração”; e a substituição da
expressão “determinação do lucro sujeito à tributação” por “determinação do
lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido –
CSLL”. Destaque-se, ainda, a inclusão, no art. 1º da Lei nº 13.586/2017, da
expressão “integralmente”.
Assim, a grande diferença entre o art. 12 do Decreto-Lei nº
62/1966 e o art. 1º da Lei nº 13.586/2017 é a presença dos parágrafos 1º ao 6º,
que tratam exclusivamente das atividades de desenvolvimento da produção.
Portanto, à exceção das atividades da etapa de desenvolvimento da produção,
todas as empresas petrolíferas terão, grosso modo, o tratamento privilegiado
que a Petrobras tinha como monopolista.
Desse modo, todas as empresas petrolíferas terão à sua
disposição “opções de dedução” para fins de determinação do lucro real e da
base de cálculo da CSLL. O contribuinte, a seu critério, poderá, de certa forma,
escolher o patamar de pagamento do IRPJ e da CSLL. Isso pode até fazer
sentido para uma empresa estatal monopolista, mas não deve ser considerado
adequado para empresas petrolíferas em geral.
A redação do caput do art. 1º permite às empresas petrolíferas
deduzirem ou não, em cada período de apuração, as “importâncias aplicadas”
nas atividades de exploração, avaliação, extração e operação, e desativação.
29
Como já mencionado, nos termos da Lei nº 12.351/2010, não
integram o custo em óleo, por exemplo, os royalties e os bônus de assinatura.
As empresas podem interpretar que royalties e bônus de assinatura são
“importâncias aplicadas” nas atividades de exploração e produção e, assim,
deduzirem esses valores da base de cálculo do IRPJ e da CSLL em cada
período de apuração.
No regime de partilha de produção, é vedado, em qualquer
hipótese, o ressarcimento dos royalties ao contratado e sua inclusão no cálculo
do custo em óleo. Se os royalties, cuja alíquota é 15%, forem deduzidos da
base de cálculo do IRPJ e da CSLL, haverá um ressarcimento ao contratado de
respectivamente, 25% e 9% de 15% do valor da produção.
Assim sendo, a “alíquota efetiva” dos royalties seria, de fato,
9,9% do valor da produção, pois haverá uma redução correspondente a 5,1%
do valor da produção na arrecadação desses tributos; 5,1% correspondem a
34% (25% + 9%) da alíquota de royalties de 15%.
No caso de Libra, o bônus de assinatura foi de R$ 15 bilhões.
Se esse valor for deduzido para fins de base de cálculo do IRPJ e da CSLL, o
“valor efetivo” do bônus de assinatura será de R$ 9,9 bilhões, pois R$ 5,1
bilhões seriam ressarcidos aos contratados.
No caso da licitação sob o regime de partilha de produção dos
excedentes da cessão onerosa, os bônus de assinatura podem chegar a R$
80,5 bilhões11. Se esses bônus forem deduzidos da base de cálculo do IRPJ e
da CSLL, a redução de arrecadação será de R$ 27,37 bilhões apenas no ano
da assinatura dos contratos.
Caso a RFB não permita que os gastos com royalties e os
bônus de assinatura sejam deduzidos, em cada período de operação, para fins
de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, uma empresa
petrolífera poderá questionar junto ao CARF e, eventualmente, junto ao Poder
Judiciário, para que tais gastos possam ser deduzidos, pois pode ser
interpretado que eles são “importâncias aplicadas” nas atividades de
11 Disponível em https://oglobo.globo.com/economia/sem-acordo-com-petrobras-venda-da-eletrobras-receita-da-uniao-pode-encolher-22287766. Acesso em 13 de março de 2018.
30
exploração e produção. Como o art. 1º da Lei nº 13.586/2017 é posterior ao art.
42 da Lei nº 12.351/2010, poderá prevalecer o entendimento de que é possível
essa dedução.
Os custos com levantamento, processamento,
reprocessamento e interpretação de dados de geologia e geofísica, ao
contrário dos royalties e do bônus de assinatura, integram o custo em óleo. Nos
termos do contrato de partilha de produção, o custo dessas atividades somente
será recuperado a partir da efetiva produção.
O caput do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, por sua vez, permite
que esses custos sejam deduzidos em cada período de apuração, em absoluta
falta de sintonia com o contrato de partilha de produção. O mesmo raciocínio é
válido para outros custos de exploração e avaliação.
Nos termos do contrato de partilha, há um limite de 50% ou
30% do valor bruto da produção para recuperação do custo em óleo. Desse
modo, em razão das diferenças entre receitas e custos, a recuperação dos
custos de exploração, avaliação, desenvolvimento e extração poderá ser mais
rápida ou mais lenta12.
Destaque-se, ainda, que, como já mencionado, não há
possibilidade de não haver excedente em óleo, de no mínimo 35% do valor
total da produção, e de royalties, na alíquota de 15% do valor total da
produção, sem possibilidade de qualquer tipo de ressarcimento ao contratado.
Isso garante, em qualquer situação, uma importante receita governamental.
Entretanto, nos termos do caput do art. 1º da Lei nº
13.586/2017, os bônus de assinatura, os royalties, os custos exploratórios, os
custos de extração e operação, entre outros, poderão ser deduzidos, sem
limites, em cada período de apuração, para fins de determinação do lucro real
e da base de cálculo da CSLL, em absoluta incompatibilidade com os termos
da Lei nº 12.351/2010 e com o contrato de partilha de produção. Dessa forma,
esse caput pode gerar deduções muito maiores do que as que integram o custo
em óleo.
12 Disponível em http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/preco-do-petroleo-respostas-ao-valor-economico.htm. Acesso em 8 de janeiro de 2018.
31
Os parágrafos 1º ao 6º da Lei nº 13.586/2017 tratam das
atividades de desenvolvimento da produção. Os parágrafos 1º ao 4º tratam da
despesa de exaustão decorrente de ativo formado mediante gastos aplicados
nas atividades de desenvolvimento para viabilizar a produção de campo de
petróleo ou de gás natural, que é dedutível na apuração do lucro real e da base
de cálculo da CSLL.
Poderá ser considerada a exaustão acelerada desses ativos,
calculada mediante a aplicação da taxa de exaustão, determinada pelo método
das unidades produzidas, multiplicada por 2,5. A quota dessa exaustão
acelerada será excluída do lucro líquido, e o total da exaustão acumulada,
incluídas a normal e a acelerada, não poderá ultrapassar o custo do ativo.
Os parágrafos 5º e 6º tratam da dedução da depreciação das
máquinas, equipamentos e instrumentos facilitadores aplicados nas atividades
de desenvolvimento da produção. Fica assegurado ao contribuinte o direito de
computar a quota efetivamente adequada às condições de depreciação das
suas máquinas, equipamentos e instrumentos facilitadores aplicados nas
atividades de desenvolvimento da produção, desde que faça prova dessa
adequação.
Importa ressaltar, incialmente, que o valor dos ativos
imobilizados para desenvolvimento da produção será excluído do lucro líquido
mediante quotas de exaustão. Além disso, não fica claro se as máquinas e
equipamentos instalados em uma plataforma de produção também terão que
formar um ativo, separadamente.
Assim, uma plataforma de petróleo, por exemplo, seria
submetida à exaustão. Mas os equipamentos nela instalados seriam
submetidos à depreciação? E no caso de plataforma arrendada incluída no
valor do ativo imobilizado, com todas as máquinas e equipamentos, qual será o
tratamento tributário?
32
Fez-se, então, uma pesquisa das Resoluções do Conselho
Federal de Contabilidade – CFC, no sentido de buscar esclarecer a situação;
não se encontrou norma, em vigor, que trate de exaustão13.
A Resolução CFC nº 1.027/2005 aprovou a Norma Brasileira de
Contabilidade – NBC T 19.5, que tratava da depreciação, amortização e
exaustão, mas essa norma foi revogada pela Resolução CFC nº 1.177/2009,
que aprovou a NBC TG 27 – Ativo Imobilizado. A NBC TG 27 (R4) é a
consolidação mais recente dessa norma.
Nos termos do item 3 da NBC TG 27 (R4), esta Norma não se
aplica a:
(a) ativos imobilizados classificados como mantidos para
venda de acordo com a NBC TG 31 – Ativo Não Circulante
Mantido para Venda e Operação Descontinuada;
(b) ativos biológicos relacionados com a atividade agrícola
que não sejam plantas portadoras (ver NBC TG 29 – Ativo
Biológico e Produto Agrícola). Esta norma aplica-se às plantas
portadoras, mas não se aplica aos produtos dessas plantas
portadoras; (Alterada pela NBC TG 27 (R3))
(c) reconhecimento e mensuração de ativos de exploração e
avaliação (ver a NBC TG sobre Exploração e Avaliação de
Recursos Minerais); ou
(d) direitos sobre jazidas e reservas minerais tais como
petróleo, gás natural, carvão mineral, dolomita e recursos não
renováveis semelhantes.
Contudo, esta Norma aplica-se aos ativos imobilizados usados
para desenvolver ou manter os ativos descritos nas alíneas (b)
a (d).
Importa registrar que a NBC TG sobre Exploração e Avalição
de Recursos Minerais, de que trata a alínea (c) não foi editada pelo CFC14 e
13 Disponível em http://cfc.org.br/tecnica/normas-brasileiras-de-contabilidade/normas-completas/. Acesso em 18 de janeiro de 2018. 14 Disponível em http://cosif.com.br/mostra.asp?arquivo=nbct1909ind. Acesso em 18 de janeiro de 2018.
33
que a NBC TG 27 (R4) aplica-se aos ativos imobilizados usados para
desenvolver as atividades descritas na alínea (d), que trata dos direitos sobre
jazidas e reservas de petróleo e gás natural.
Dessa forma, deveria ser utilizada a NBC TG 27 (R4) para o
tratamento tributário dos ativos imobilizados utilizados para desenvolver os
ativos relativos a esses direitos.
A NBC TG 04 (R4) trata dos ativos intangíveis, mas não faz
menção à exaustão; essa norma trata, de fato, da amortização. No entanto, os
custos para a formação dos ativos intangíveis a serem utilizados nas atividades
de desenvolvimento da produção, nos termos dos parágrafos 1º ao 4º, também
seriam ativos sujeitos a quotas de exaustão.
Apenas para fins históricos, apresenta-se o tratamento contábil
dado à exaustão pela NBC T 19.5, revogada pela Resolução CFC nº
1.177/2009. As definições estabelecidas por essa Norma eram as seguintes:
19.5.2.1. Depreciação é a redução do valor dos bens pelo desgaste ou perda de utilidade por uso, ação da natureza ou obsolescência.
19.5.2.2. Amortização é a redução do valor aplicado na aquisição de direitos de propriedade e quaisquer outros com existência ou exercício de duração limitada, ou cujo objeto sejam bens de utilização por prazo legal ou contratualmente limitado.
19.5.2.3. Exaustão é a redução do valor de investimentos necessários à exploração de recursos minerais ou florestais.
Observa-se, então, que era adotada uma definição muito vaga
para exaustão, como sendo a redução do valor de investimentos necessários à
exploração de recursos minerais ou florestais. A depreciação, por sua vez, era
definida de maneira mais clara, como sendo redução do valor dos bens pelo
desgaste ou perda de utilidade por uso, ação da natureza ou obsolescência.
Como a Resolução CFC nº 1.177/2009, que revogou a NBC T
19.5, aprovou a NBC TG 27 – Ativo Imobilizado, buscou-se na NBC TG 27 (R4)
34
a definição de exaustão, mas não se encontrou essa expressão, pois essa
Norma trata, basicamente, de depreciação.
De acordo com a NBC TG 27 (R4), depreciação é a alocação
sistemática do valor depreciável de um ativo ao longo da sua vida útil, sendo
valor depreciável o custo de um ativo ou outro valor que substitua o custo,
menos o seu valor residual. O ativo imobilizado, por sua vez, é o item tangível
que é mantido para uso na produção ou fornecimento de mercadorias ou
serviços, para aluguel a outros, ou para fins administrativos; e se espera utilizar
por mais de um período.
Em termos legais, a exaustão é tratada no art. 59 da Lei nº
4.506/1964, in verbis:
Art. 59 Poderá ser computada como custo ou encargo, em
cada exercício, a importância correspondente à diminuição do
valor de recursos minerais e florestais, resultante da sua
exploração.
§ 1º A quota anual de exaustão será determinada de acôrdo
com os princípios de depreciação a que se refere o § 1º do art.
57, desta lei, com base:
a) no custo de aquisição ou prospecção, corrigido
monetáriamente, dos recursos minerais explorados; (...)
Observa-se, então, que o conceito de exaustão aplica-se ao
custo de aquisição ou pesquisa dos recursos minerais explorados e está
relacionada à diminuição do valor desses recursos, não propriamente ao valor
dos ativos imobilizados destinados às atividades de desenvolvimento da
produção.
Na ausência de lei anterior e norma contábil brasileira para se
analisar os parágrafos 1º ao 4º do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, que tratam da
exaustão, recorreu-se à tese de doutorado de Kurdi (2010). De acordo com
essa tese, o Generally Accepted Accounting Principles (United States) – US
GAAP exige que as empresas petrolíferas utilizem o método das unidades
produzidas para cálculo da exaustão anual de compra de bens e de custos de
35
desenvolvimento e exploração. Importa registrar que esse é o método previsto
no parágrafo 2º do art. 1º da Lei nº 13.586/2017.
Segundo Kurdi (2010), a aplicação do método de unidades
produzidas varia, dependendo do tipo de custos capitalizados a serem
exauridos e do método usado para contabilizar o petróleo e o gás. O anexo A
do trabalho de Kurdi (2010) apresenta uma discussão detalhada das diferentes
aplicações desse método na prática.
No entanto, segundo ele, independentemente de como o
método de unidades produzidas é aplicado, sua fundamentação contábil é
“casar” os custos capitalizados com as receitas geradas pela produção e venda
de petróleo e gás natural em dado ano fiscal.
A fórmula geral usada para computar a exaustão anual é:
�������������ã� = ������ã���������������������í���
����������������� �����çã���������í���× �#��çã���#����#í��� (1)
Importa registrar que um custo capitalizado é reconhecido
como parte de um ativo imobilizado, em vez de ser caracterizado como uma
despesa ocorrida no período15.
De acordo com Kurdi (2010), o cálculo da despesa de exaustão
por meio da equação (1) mostra pelo menos um método potencial que os
gerentes podem usar para superestimar a despesa anual de exaustão e, assim,
reduzir o lucro para o período. Especificamente, eles podem reduzir suas
estimativas de reservas provadas restantes. Essa prática permite aos gerentes
mover a exaustão futura para o período atual. O resultado seria uma maior
despesa de exaustão e menores ganhos.
A complexidade associada ao processo de estimativa de
reservas faz com que a detecção de manipulação de qualquer dessas
estimativas seja menos provável que para outros métodos e, por isso, o uso
dessa abordagem torna-se mais interessante para as empresas petrolíferas.
15 Disponível em https://www.accountingtools.com/articles/what-is-a-capitalized-cost.html. Acesso em 24 de janeiro de 2018.
36
Outros potenciais métodos de gestão de ganhos incluem os
níveis atuais de produção de petróleo e gás ou estimativas de custos a serem
incluídos no conjunto de custos capitalizados.
Importa destacar, ainda, que a taxa de exaustão, nos termos
do parágrafo 2º do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 poderá ser multiplicada por
2,5.
A Figura 7.116 apresenta os custos capitalizados pela
Petrobras, nos anos de 2016, 2015 e 2014, referentes às atividades de
exploração e produção de petróleo e gás, juntamente com as correspondentes
depreciação, depleção (exaustão) e amortização acumuladas, e provisões para
abandono.
Figura 7.1 – Custos capitalizados pela Petrobras na s atividades de E&P.
Fonte: Petrobras
No ano de 2016, os custos capitalizados brutos, compostos por
reservas não provadas e provadas, totalizaram, no Brasil, R$ 580 bilhões. Os
16 Disponível em https://www.conjur.com.br/dl/petrobras-notas-explicativas-balanco.pdf. Acesso em 29 de janeiro de 2018.
37
custos capitalizados líquidos totalizaram R$ 398,9 bilhões. São justamente
esses custos capitalizados que formam os ativos, inclusive reservas, a serem
depreciados, exauridos ou amortizados.
A Figura 7.217 mostra os ativos da Petrobras relativos ao
segmento de exploração e produção – E&P nos anos de 2016 e 2015.
Figura 7.2 – Ativos da Petrobras da área de E&P em 2016 e 2015.
Fonte: Petrobras
Conforme mostrado na Figura 7.2, o ativo imobilizado da
Petrobras na área de negócio E&P, em 31 de dezembro de 2016, era de R$
401 bilhões, o que equivale, praticamente, aos custos capitalizados de R$
398,9 bilhões mostrados na Figura 7.1.
Na plataforma continental, as sondas de perfuração e as
unidades estacionárias de produção são os principais ativos para o
desenvolvimento da produção. Em águas profundas, as sondas de perfuração
são navios-sondas e as unidades são compostas de plataformas semi-
submersíveis ou navios do tipo unidades flutuantes de produção, estocagem e
17 Disponível em www.investidorpetrobras.com.br/download/4861. Acesso em 29 de janeiro de 2018.
38
descarga (floating, produciton, storage and offloading – FPSO). Essas unidades
são, em geral, arrendadas ou afretadas.
Para se demonstrar a dificuldade do tratamento a ser dado a
uma plataforma de produção de petróleo e gás natural, utiliza-se, como
exemplo, a plataforma da Petrobras P-52, que é arrendada, mas compõe o
ativo imobilizado da estatal18. Desse modo, essa e outras plataformas que
compõem o ativo imobilizado poderão estar sujeitas à exaustão ou
depreciação.
A construção da P-52 contou com financiamento do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES de US$ 378
milhões. As empresas Fels Setal S/A (75%) e Technip Engenharia S/A (25%)
constituíram em Cingapura a joint-venture FSTP Pte. Ltd., que firmou com a
Petrobras Netherlands BV o contrato de construção dessa plataforma19.
A operação do BNDES foi aprovada no âmbito do Programa
Exim Pós-Embarque, na modalidade buyer credit à empresa Petrobras
Netherlands B. V., subsidiária da Petrobras na Holanda, cujo principal objetivo
é desenvolver atividades de compra, venda, arrendamento, aluguel e
afretamento de embarcações e equipamentos para exploração e produção de
petróleo.
A FSTP Brasil Ltda foi responsável pela construção e
montagem do topside e fez a exportação da P-52 para a joint-venture FSTP
Pte. Ltd., que depois entregou a plataforma à Petrobras Netherlands BV. Ou
seja, a FSTP Brasil foi subcontratada pela FSTP de Cingapura e recebeu os
recursos do BNDES, por conta e ordem de sua subsidiária holandesa
Petrobras Netherlands BV, que arrendou a plataforma P-52 à Petrobras.
Essa plataforma teve um custo total estimado de US$ 895
milhões, dos quais US$ 758 milhões referiam-se à construção e montagem,
com US$ 137 milhões reservados aos módulos de geração elétrica e
18 Disponível em http://www.econoinfo.com.br/governanca-corporativa/ativos?codigoCVM=9512. Acesso em 29 de janeiro de 2018. 19 Disponível em http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,bndes-aprova-financiamento-para-plataforma-da-petrobras,20041110p23601. Acesso em 19 de janeiro de 2018.
39
compressão de gás, que seriam fornecidos pela Petrobras Netherlands BV
para serem incorporados à plataforma.
Ainda com relação à P-52, a Petrobras informou que foi
desembolsado, no dia 8 de março de 2016, o montante de US$ 1 bilhão pelo
Industrial and Commercial Bank of China Leasing – ICBC Leasing, proveniente
da estrutura de leasing financeiro da plataforma.
Nessa modalidade de financiamento, as plataformas são
alienadas ao banco em troca do desembolso do montante combinado. A dívida
é paga por meio do aluguel das unidades e, ao final do repagamento da dívida,
a plataforma volta a ser propriedade da Petrobras. A operação tem prazo de 10
anos.
Também arrendada é a plataforma P-6320, instalada no campo
de Papa-Terra que, como já mencionado, foi objeto de impairment, nos termos
da apresentação feita pela Diretoria da Petrobras21:
Slide nº. 11. A gente faz uma abertura dos principais projetos de E&P atingidos pelo impairment e a gente vê que Papa-Terra, com 8,7 bilhões, é o maior deles e, como visto, isso foi uma questão geológica, uma revisão geológica do reservatório de Papa-Terra. Os demais projetos estão basicamente associados ao menor preço do petróleo, em combinação com a maior taxa de desconto utilizada nos testes de imparidade.
O campo de Papa-Terra, onde está arrendada a P-63, tem
participação da Petrobras, com 62,5%, e da Chevron, com 37,5%22.
Diante do complexo quadro das plataformas arrendadas,
pergunta-se: quem é o proprietário do bem arrendado, o arrendador ou o
arrendatário? Um bem arrendado deveria compor o valor do ativo imobilizado
de uma empresa arrendadatária?
20 Disponível em http://www.econoinfo.com.br/governanca-corporativa/ativos?codigoCVM=9512. Acesso em 29 de janeiro de 2018. 21 Disponível www.investidorpetrobras.com.br/download/3812. Acesso em 29 de janeiro de 2018. 22 Disponível em http://www.argusmedia.com/pages/NewsBody.aspx?id=1209510&menu=yes. Acesso em 29 de janeiro de 2018.
40
Além disso, de certo modo, as empresas tratam os
reservatórios ou as reservas neles presentes como se fossem “propriedades”
da empresa. Entretanto, nos termos do art. 20 da Constituição Federal, as
reservas e acumulações de petróleo e gás natural são bens da União.
A Figura 7.3 mostra a evolução do valor dos ativos imobilizados
e intangíveis da Petrobras no período de 2009 a 2016 do segmento de
exploração e produção. Em razão da descoberta do Pré-Sal, houve grande
aumento no valor desses ativos, que passou de R$ 116,4 bilhões, em 2009,
para R$ 428,5 bilhões, em 2015.
Figura 7.3 – Evolução dos ativos imobilizados e int angíveis da Petrobras.
Fonte: elaboração própria
Em relação ao valor contábil do ativo imobilizado, transcreve-
se, a seguir, trecho do RELATÓRIO DO AUDITOR INDEPENDENTE SOBRE
AS DEMONSTRAÇÕES CONTÁBEIS da Petrobras de 2016, elaborado pela
PricewaterhouseCoopers, Auditores Independentes, CRC 2SP000160/O-5 "F"
RJ, de 21 de março de 2017:
41
Em 31 de dezembro de 2016, os ativos classificados no grupo do imobilizado somavam o montante de R$ 571.876 milhões.
Potenciais perdas por redução do valor recuperável (impairment) de bens do ativo imobilizado são determinadas com base em estimativas do valor em uso desses ativos.
O cálculo do valor em uso requer o exercício de julgamentos relevantes sobre determinadas premissas, tais como: (i) estimativa do volume das reservas de petróleo e gás natural; (ii) estimativa de preços futuros de petróleo e gás natural; (iii) taxa média de câmbio (Reais/dólares estadunidenses); e (iv) definição da taxa de desconto.
Adicionalmente, a definição das Unidades Geradoras de Caixa (UGC) também demanda julgamentos relevantes por parte da administração, bem como o estabelecimento de controles de revisão de alterações dessas UGC. Mudanças na agregação ou desagregação de ativos que compõem as UGC podem resultar em reversões ou perdas de impairment adicionais.
Observa-se, então, que o registro contábil do ativo imobilizado
depende do cálculo do valor em uso que requer o exercício de julgamentos
relevantes: estimativa do volume das reservas, estimativa de preços futuros,
taxa de câmbio, e taxa de desconto. Desse modo, o valor do ativo imobilizado é
extremamente subjetivo.
Com relação aos bens arrendados pela Petrobras, como, por
exemplo, unidades estacionárias de produção compostas por plataformas
semi-submersíveis e FPSOs e respectivas máquinas e equipamentos, é
importante citar a dissertação de Oliveira (2009).
No caso do arrendamento mercantil internacional, essa
dissertação cita o trabalho de Ring23, que “explica que o double dip leasing
ocorre quando, diante de um contrato de arrendamento mercantil internacional,
duas jurisdições distintas especificam de forma diferente quem é considerado
proprietário do bem arrendado. Por exemplo, em um determinado Estado,
entende-se que o arrendatário é o proprietário do bem, enquanto no outro
23 Disponível em http://lawdigitalcommons.bc.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=2221&context=bclr. Acessado no dia 28 de janeiro de 208.
42
Estado a propriedade pertence ao arrendador. Dessa forma, dependendo da
legislação interna de cada um desses Estados, ambos, o arrendador e o
arrendatário, poderão ter direito a deduções pela depreciação acelerada do
bem arrendado, além de outros benefícios que podem ser concedidos, como
créditos pelo investimento”.
Segundo Oliveira (2009), “o resultado é converter uma simples
despesa em uma dupla dedução (double-dip)”.
Nos termos do contrato de partilha de produção, são
reconhecidos como recuperáveis como custo em óleo os gastos com aluguéis
e afretamentos, bem como as contraprestações pagas ou creditadas pelo
contratado arrendatário por força de contrato de arrendamento mercantil de
bens. Na apuração do custo em óleo, os gastos com aluguéis, afretamentos e
arrendamentos mercantis somente serão contabilizados no período em que o
bem ou o direito for utilizado no campo. Dessa forma, esses gastos somente
podem compor o custo em óleo em cada período de apuração.
Se os gastos com aluguéis, afretamentos e arrendamentos
mercantis compuserem os custos operacionais em cada período de apuração e
se também houver a formação de ativo imobilizado submetido à quota de
exaustão acelerada a ser excluída do lucro líquido, haverá duplicidade de
dedução. No caso do arrendamento mercantil internacional poderá haver,
ainda, tripla dedução, pois a arrendadora internacional poderá ter direito à
depreciação.
A possibilidade de tripla dedução será analisada em estudo
técnico específico. Neste trabalho, será considerada apenas a possibilidade de
duplicidade de dedução.
Se a RFB não permitir dupla dedução, as empresas petrolíferas
poderão recorrer ao CARF e, eventualmente, ao Poder Judiciário.
Dada a complexidade do tema, seria muito importante que a
redação do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 explicitamente caracterizasse o tipo
de ativo formado por bens próprios, arrendados e afretados, além dos
43
diferentes cenários de dedução para fins de determinação do lucro real e da
base de cálculo da CSLL, de modo a impossibilitar mais de uma dedução.
Mas as dúvidas não se restringem aos parágrafos 1º ao 4º; os
parágrafos 5º e 6º também podem gerar muitas dúvidas. As máquinas e
equipamentos arrendados poderão formar ativos imobilizados? Esses ativos
estarão sujeitos a depreciação ou exaustão? Se máquinas e equipamentos
forem depreciados, as quotas de depreciação serão excluídas do lucro líquido
como ocorre com as quotas de exaustão? As empresas poderão optar por
arrendar as máquinas e equipamentos e submetê-los à exaustão em vez da
depreciação, de modo a gerar quotas a serem excluídas do lucro líquido?
Observa-se, então, que tanto o caput quanto os parágrafos do
art. 1º da Lei nº 13.586/2017 deveriam apresentar um nível muito maior de
detalhamento das deduções ou adotar o princípio da uniformidade, no caso do
regime de partilha de produção, para se ter o custo em óleo como o parâmetro
para as deduções.
Em suma, em vez de revogar o art. 12 do Decreto-Lei nº
62/1966 e instituir um modelo tributário claro e detalhado para as atividades de
exploração e produção de petróleo, que poderia ter como base a legislação
específica do setor, o Poder Executivo optou por revogar esse artigo e reeditá-
lo, com modificações, mas sem a clareza e o detalhamento exigidos pela
complexidade das atividades do setor petrolífero.
Assim sendo, o art. 1º da Lei nº 13.586/2017, decorrente da
conversão da MPV nº 795/2017, poderá gerar inúmeros conflitos tanto na
esfera administrativa quanto na esfera jurídica, a exemplo dos já provocados
pelo art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966.
O art. 1º da Lei nº 13.586/2017, em vez de representar um
avanço, pode significar um retrocesso para a situação jurídica do setor
petrolífero nacional, apesar das possíveis boas intenções do Poder Executivo e
da RFB.
44
8. POTENCIAL REDUÇÃO DE ARRECADAÇÃO DE IRPJ E CSLL
O objetivo deste capítulo é, apresentar uma estimativa
detalhada da potencial redução da receita tributária de IRPJ e CSLL decorrente
do art. 1º da Lei nº 13.586/2017. Para isso será adotada, apenas como
hipótese, a integral aplicação desse artigo ao bloco de Libra.
Demonstra-se, inicialmente, que o quadro ilustrativo com a
síntese do entendimento da RFB, frente aos procedimentos adotados pela
Petrobras, apresentado na Figura 8.1 e extraído do já mencionado Acórdão do
CARF nº 1201-001.419/2017, apenas mostra o procedimento adotado pela
estatal. Em razão do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, as empresas petrolíferas
poderão adotar procedimento completamente diferente da estatal.
Além disso, os gastos mostrados na Figura 8.1 referem-se à
exploração e produção de petróleo sob o regime de concessão e mostram-se
incompatíveis com o regime de partilha de produção.
Figura 8.1 – Quadro ilustrativo do entendimento da RFB e da Petrobras.
Fonte: CARF
A Figura 8.1 apresenta cinco naturezas de gasto de exploração
e produção. Os gastos de natureza 1 dizem respeito à aquisição dos direitos de
45
exploração, que se denominam bônus de assinatura. De acordo com essa
Figura, para fins contábeis, os bônus de assinatura são contabilizados no ativo
intangível e amortizados com base no método de unidades produzidas; para
fins fiscais, são despesas com amortização dedutíveis.
Como já mencionado, nos termos do caput do art. 1º da Lei nº
13.586/2017, o bônus de assinatura pode ser interpretado como uma
“importância aplicada” que pode ser integralmente deduzido em cada período
de apuração.
No regime de partilha de produção, nos termos do § 2º do art.
42 da Lei nº 12.351/2010, é vedado, em qualquer hipótese, o ressarcimento do
bônus de assinatura ao contratado. Dessa forma, nesse regime, o bônus não
seria um gasto dedutível, como mostrado na Figura 8.1.
Os gastos de natureza 2 foram desmembrados em gastos de
duas naturezas: 2.1 a 2.2. Os gastos com pesquisas geológicas e geofísicas,
de natureza 2.1, são contabilizados diretamente como despesas.
Nos termos do contrato de partilha de produção, o
levantamento, processamento, reprocessamento e interpretação de dados de
geologia e geofísica integram o custo em óleo, mas somente serão
recuperados em caso de descoberta comercial e a partir do início da produção.
Dessa forma, no regime de partilha de produção, os gastos com pesquisas
geológicas e geofísicas não seriam despesas dedutíveis como mostrado na
Figura 8.1.
Os gastos com a perfuração de poços exploratórios, de
natureza 2.2, são contabilizados no ativo imobilizado, mas não são sempre
depleciados/depreciados com base no método de unidades produzidas, como
mostrado na Figura 8.1. Se os poços exploratórios não forem convertidos em
poços produtores e injetores, haverá baixa contábil e não serão
depleciados/depreciados.
Ao contrário do mostrado na Figura 8.1, todos os gastos
exploratórios, não somente de poços exploratórios, poderão ser interpretados
como “importância aplicadas” nas atividades de exploração e, por isso, serem
46
deduzidos em cada período de apuração, nos termos do art. 1º da Lei nº
13.586/2017. Assim, não serem depleciados/depreciados.
O fato de a Petrobras adotar o procedimento mostrado na
Figura 8.1 não quer dizer que a ela não é permitido o procedimento previsto no
caput desse artigo. Também não quer dizer que outras empresas vão adotar os
mesmos critérios de dedução da Petrobras, em razão da flexibilidade e falta de
clareza da redação do art. 1º da Lei nº 13.586/2017.
Ressalte-se, ainda, que os gastos de arrendamento ou
afretamento de sondas poderão ser deduzidos como despesas operacionais do
exercício. Se os poços exploratórios formarem ativos de poços produtores ou
injetores a serem exauridos, nos termos dos parágrafos 1º ao 4º, a quota de
exaustão poderá ser excluída do lucro líquido. Assim, haveria duplicidade de
dedução.
No regime de partilha de produção não há depreciação ou
exaustão de ativos formados. Todos os custos exploratórios de poços
comerciais serão recuperados como custo em óleo a partir da efetiva produção
de petróleo, o que pode ocorrer muitos anos depois da perfuração.
Os gastos de desenvolvimento, de natureza 4, são
contabilizados no ativo imobilizado e são, contabilmente,
depleciados/depreciados com base no método das unidades produzidas. A
Petrobras, para fins fiscais, reivindicou o direito, com base no art. 12 do
Decreto-Lei nº 62/1966, de excluir integralmente o gasto no ano em que
ocorrido. Dessa forma, é boa a intenção da RFB de não permitir isso.
No entanto, os gastos de arrendamento e afretamento são
custos de extração e operação que compõem o custo dos produtos vendidos
em cada período de apuração. Dessa forma, as plataformas e equipamentos
arrendados que compõem o ativo imobilizado não podem ser submetidos à
quota de exaustão acelerada a ser excluída do lucro líquido. Nesse caso,
haverá duplicidade de dedução. Considera-se, então, inadequada a redação do
art. 1º da Lei nº 13.586/2017, que não veda explicitamente essa duplicidade de
dedução.
47
De acordo com a Figura 8.1, os gastos de produção, de
natureza 5, são contabilizados de acordo com os critérios utilizados na
contabilidade de custos.
O art. 13 do Decreto-Lei nº 1.598, de 26 de setembro de 1977,
que altera a legislação do imposto sobre a renda, define a composição do custo
de produção, nos termos descritos a seguir:
Art. 13. (.....)
§ 1º O custo de produção dos bens ou serviços vendidos
compreenderá, obrigatoriamente:
a) o custo de aquisição de matérias-primas e quaisquer outros
bens ou serviços aplicados ou consumidos na produção,
observado o disposto neste artigo;
b) o custo do pessoal aplicado na produção, inclusive de
supervisão direta, manutenção e guarda das instalações de
produção;
c) os custos de locação, manutenção e reparo e os encargos
de depreciação dos bens aplicados na produção;
d) os encargos de amortização diretamente relacionados com a
produção;
e) os encargos de exaustão dos recursos naturais utilizados na
produção.
Observa-se, então, que essa legislação sobre imposto de
renda estabelece as bases obrigatórias para a composição do custo dos
produtos e serviços vendidos como muito mais clareza e precisão do que as
bases opcionais do art. 1º da Lei nº 13.586/2017.
É muito importante destacar que os parágrafos 3º e 4º do art.
13 do Decreto-Lei nº 1.598/1977, ao contrário do art. 1º da Lei nº 13.586/2017,
vedam, explicitamente, a duplicidade de dedução no caso de arrendamento:
Art. 13 (.....)
48
§ 3º O disposto nas alíneas “c”, “d” e “e” do § 1º não alcança os
encargos de depreciação, amortização e exaustão gerados por
bem objeto de arrendamento mercantil, na pessoa jurídica
arrendatária.
§ 4º No caso de que trata o § 3º, a pessoa jurídica deverá
proceder ao ajuste no lucro líquido para fins de apuração do
lucro real, no período de apuração em que o encargo de
depreciação, amortização ou exaustão for apropriado como
custo de produção.
Assim sendo, se, nas votações do Congresso Nacional, o art.
1º da MPV nº 795/2017 fosse simplesmente suprimido e mantido o art. 10, que
revoga o art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966, o País teria uma legislação sobre o
IRPJ e CSLL mais adequada que o art. 1º da Lei nº 13.586/2017, que, a
depender da sua interpretação, pode gerar elevada perda de arrecadação
desses tributos.
No entanto, melhor que a simples revogação do art. 12 do
Decreto-Lei nº 62/1966 e adoção da legislação tributária convencional seria o
País utilizar o princípio da uniformidade que ocorre em países que adotam o
regime de partilha de produção.
As estimativas de redução de arrecadação de IRPJ e CSLL
apresentadas a seguir têm como fundamentação o fato de o Brasil não ter
adotado esse princípio, segundo o qual somente as despesas recuperáveis
como custo em óleo são dedutíveis para fins de imposto de renda.
O custo em óleo pode ser estimado a partir da análise dos
custos da Petrobras no segmento de exploração e produção. A Figura 8.1
mostra a evolução desses custos e a distribuição das receitas desse segmento
de 2001 a 2010. Tais custos, além de antigos, utilizam terminologia contábil do
US GAPP.
No entanto, eles foram utilizados em razão da ausência de
dados de distribuição do preço de realização do barril de óleo doméstico e do
preço de realização, em 2010, ter sido de cerca de US$ 63 por barril, que é
compatível com os preços atuais. Serão feitas, contudo, observações sobre os
49
custos mostrados na Figura 8.2 para fins de determinação da base de cálculo
do IRPJ e da CSLL em relação a custos de produção mais recentes.
De acordo com a Figura 8.2, os itens de custo da Petrobras
são o custo exploratório; o custo de depreciação, exaustão e amortização
(DD&A); o custo de extração; o custo de vendas; o custo de pesquisa e
desenvolvimento (R&D); outras despesas gerais administrativas (DGA); outros
e participação governamental.
Figura 8.2 – Distribuição do preço de realização do barril da Petrobras.
Fonte: Petrobras
Conforme mostrado na Figura 8.2, para um preço de realização
por barril de US$ 63, os custos por barril, em 2010, foram da ordem de:
− extração: US$ 12;
− depreciação, exaustão e amortização: US$ 8;
− exploratórios: US$ 2,6;
− outras despesas gerais, administrativas e de vendas US$ 2,6; e
50
− participação governamental: US$ 13.
A primeira questão que surge em relação à redução de
arrecadação é se os royalties, de cerca de US$ 6,3 por barril em 2010,
deveriam ser deduzidos da base de cálculo do IRPJ e CSLL. No caso do
regime de concessão, há base legal para isso.
No entanto, no caso do regime de partilha de produção, a Lei
nº 12.351/2010 estabelece, no § 1º do art. 42, que é vedado ressarcimento a
título de royalties ao contratado, além de sua inclusão no cálculo do custo em
óleo. Como nesse regime a alíquota de royalties é de 15%, para um preço de
referência estimado de US$ 70 por barril, a dedução da base de cálculo do
IRPJ e CSLL seria de US$ 10,5 por barril.
Interpreta-se que o art. 1º da Lei nº 13.586/2017 poderá
permitir a dedução dos royalties da base de cálculo do IRPJ e da CSLL em
cada período de apuração.
Nos termos do contrato de partilha de produção, os custos
exploratórios de áreas não comerciais não podem ser recuperados como custo
em óleo. No caso de áreas comerciais, os custos exploratórios integram o
custo em óleo e, assim, serão deduzidos do valor total da produção. Até o
momento, já foram perfurados 12 poços exploratórios24, conforme mostrado na
Figura 8.225.
Em 30 de novembro de 2017, a Petrobras, em nome do
consórcio, declarou à ANP a comercialidade da área noroeste do bloco de
Libra, cujo campo foi denominado Mero, mostrado na Figura 8.3. Durante a
fase exploratória e de avaliação, 8 poços de extensão foram perfurados,
identificando reservatórios com óleo de boa qualidade e alto valor comercial.
O consórcio planeja dar continuidade ao desenvolvimento da
produção por meio de quatro novos sistemas de produção a serem instalados
no campo de Mero e dará continuidade à fase exploratória do restante da área
de Libra, cujo prazo foi estendido por mais 27 meses.
24 Disponível em https://petronoticias.com.br/archives/106709. Acesso em 15 de janeiro de 2018. 25 Disponível em http://www.investidorpetrobras.com.br/pt/apresentacoes/plano-de-negocios-e-gestao. Acesso em 15 de janeiro de 2018.
51
Figura 8.3 – Poços exploratórios em Libra.
Fonte: Petrobras
Nos termos do contrato de partilha de produção, os custos dos
poços exploratórios mostrados na Figura 8.3 serão recuperados como custo
em óleo somente a partir da entrada em produção de cada módulo. Interpreta-
se que o art. 1º da Lei nº 13.586/2017 permitirá a dedução do custo
exploratório em qualquer área e quando ocorrido. Além disso, permite que o
custo de todos os poços exploratórios, comerciais ou não, possam ser
deduzidos, quando ocorrido, para fins da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Desde o fim do ano passado, o consórcio de Libra vem
produzindo o campo de Mero, por meio de um teste de longa duração (TLD),
executado pelo FPSO Pioneiro de Libra, afretado do consórcio OOG/ Teekay26.
Instalado na parte Noroeste, o sistema vem produzindo em vazão controlada
cerca de 17,5 mil barris por dia de óleo, através do poço 3-RJS-739A. Em
2018, a expectativa é de que o projeto atinja a marca de 40 mil barris por dia, a
partir da interligação do poço injetor, o 3-RJS-742. O atual TLD deve ficar em
operação por cerca de um ano. Ao todo, a região receberá investimentos da
ordem de US$ 2,3 bilhões somente da Petrobrás, isso sem contar com os
recursos dos demais parceiros da estatal na exploração da área. O FPSO Mero
26 Disponível em http://www.camaras.org.br/site.aspx/Detalhe-Noticias-CSENO?codNoticia=ztnfaafdrEE=. Acesso em 15 de janeiro de 2018.
52
1, que será construído pela Modec, entrará em operação em 2021. Já Mero 2
deve iniciar suas atividades em 2022.
Nos termos do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, os poços 3-RJS-
739-A (produtor) e 3-RJS-742 (injetor) poderão ter seus custos deduzidos em
cada período da apuração, pois são custos de exploração. A partir do momento
que os poços exploratórios se tornam poços produtores ou injetores, eles
passam a compor o ativo imobilizado para as atividades de desenvolvimento da
produção.
Como esse ativo imobilizado estará sujeito à quota de exaustão
acelerada a ser excluída do lucro líquido, poderá haver duplicidade de dedução
para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL.
Se os poços exploratórios não se transformarem em poços
produtores ou injetores, por não estarem associados à produção de uma jazida,
eles serão baixados contabilmente. Se os custos, por exemplo, das sondas
afretadas ou arrendadas para perfuração dos poços foram deduzidos como
custos de exploração ou operação, também poderá haver duplicidade de
dedução.
Em relação ao contrato de partilha de produção, o custo dos
poços, independentemente de serem exploratórios, injetores ou produtores,
somente será recuperado como custo em óleo a partir da produção do
respectivo módulo. No caso de não haver descoberta comercial, esse custo
não será deduzido do profit oil (excedente em óleo).
Em 18 de dezembro de 2017, a Petrobras comunicou que
assinou contrato com o Grupo Modec para o afretamento do primeiro sistema
de produção definitivo do campo de Mero. O projeto contempla a interligação
de até 17 poços à plataforma, do tipo FPSO, que terá capacidade de processar
até 180.000 barris por dia de petróleo e 12 milhões de metros cúbicos de gás
por dia. A unidade será operada pela Modec, empresa responsável pela
construção, e afretada por 22 anos27.
27 Disponível em https://petronoticias.com.br/archives/106709. Acesso em 15 de janeiro de 2018.
53
Segundo publicação do Sindicato Nacional da Indústria da
Construção e Reparação Naval e Offshore, a taxa diária de Mero 1 deve ser de
cerca de US$ 600 mil28. Sem atualização a valor presente, os gastos com
afretamento serão de US$ 4,8 bilhões.
De acordo com Henrique (2006), “o bem, objeto do afretamento
deve ser considerado como ativo da empresa, e depreciado em função de sua
vida útil ou proporcionalmente ao volume consumido da reserva desenvolvida”.
Se isso ocorrer, poderá haver duplicidade de dedução.
Como já mencionado, nos termos do parágrafo 3.2.2 do
contrato de partilha de produção, comporão o custo em óleo o aluguel,
afretamento e arrendamento mercantil de bens e equipamentos utilizados nas
operações. O pagamento dessa taxa deverá ser incluído nos custos de
extração e operação, que compõem o custo dos produtos e serviços vendidos.
Além disso, os bens arrendados, como a P-52, formam o ativo
imobilizado para as atividades de desenvolvimento da produção, e, assim,
poderão estar sujeitos à quota de exaustão acelerada a ser excluída do lucro
líquido. A fim de obter benefícios fiscais, os equipamentos, máquinas e
instrumentos dessas unidades poderão ser também arrendados, de forma que
grande parte do ativo imobilizado possa ser exaurida.
A depender da legislação do país arrendador, os custos de
depreciação da plataforma também poderão ser deduzidos, podendo haver
uma tripla dedução, que não será examinada neste trabalho.
Conforme mostrado na Figura 7.2, o valor dos ativos
intangíveis da Petrobras, no segmento de E&P, é muito menor que o dos ativos
imobilizados. Nos períodos de 2010 a 2013, os ativos intangíveis tiveram valor
mais alto devido à cessão onerosa, de que trata a Lei nº 12.276, de 30 de
junho de 2010. No entanto, essa foi uma operação atípica que não deve se
repetir. Além disso, de 2014 a 2016, o valor permaneceu praticamente
constante. É razoável, então, admitir ser muito pequena a amortização do ativo
28 Disponível em http://sinaval.org.br/2017/08/modec-deve-levar-fpso-de-libra/. Acesso em 16 de janeiro de 2018.
54
intangível na potencial redução da base de cálculo de IRPJ e CSLL. Também é
razoável admitir que as máquinas e equipamentos serão arrendados.
No ano de 2016, de acordo com o Formulário 20F apresentado
à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos da América, as
despesas de DD&A no Brasil foram de US$ 10,1 bilhões. Nesse ano, a
produção nacional de petróleo foi de 782 milhões de barris. Desse modo, as
despesas de DD&A foram de US$ 13 por barril de petróleo. Nesse contexto, é
plausível admitir-se uma duplicidade de dedução de US$ 8 por barril de
petróleo.
Os encargos financeiros pagos pelas empresas petrolíferas
também formam seus ativos imobilizados e, desse modo, estão sujeitos a
quotas de exaustão. Em 2016, os encargos financeiros capitalizados pela
Petrobras foram de US$ 1,73 bilhão, o que corresponde a US$ 2,1 por barril de
petróleo. Entretanto, apenas uma parcela desses encargos refere-se ao
desenvolvimento da produção. Assim, será considerada uma dedução de US$
1 por barril.
Vale ressaltar, ainda, que o contrato de partilha de produção
veda que sejam deduzidos do profit oil (excedente em óleo), royalties
comerciais pagos a afiliadas, gastos não incentivados com pesquisa e
desenvolvimento; gastos com ativos imobilizados que não estejam diretamente
relacionados com as atividades de exploração e avaliação, desenvolvimento,
produção, desativação das instalações; gastos relacionados com custas
judiciais e extrajudiciais; gastos com a reposição de bens, equipamento e
insumos que forem perdidos, danificados ou inutilizados em virtude de caso
fortuito, bem como de dolo, imperícia, negligência, ou imprudência por parte do
operador; tributos sobre a renda; e gastos com comercialização ou transporte,
excluídos todos os gastos relacionados ao escoamento da produção.
Admite-se, que todos esses gastos, além de outros, a
depender da criatividade das empresas, poderão ser considerados
“importâncias aplicadas” nas atividades de exploração e produção de petróleo
e, assim, deduzidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Desse modo, é
possível admitir que US$ 3 por barril, a título de outros custos e outras
55
despesas gerais, administrativas e de vendas, possam ser deduzidos
adicionalmente da base de cálculo desses tributos.
Dessa forma, em relação ao custo em óleo, que deveria ser o
total dos custos e despesas dedutíveis para fins de determinação da base de
cálculo do IRPJ e CSLL, o art. 1º da Lei nº 13.586/2017 poderá significar uma
redução de arrecadação de US$ 23,5 por barril, composta dos seguintes itens:
− duplicidade de dedução: US$ 8;
− encargos financeiros: US$ 1;
− custos exploratórios de áreas não comerciais: US$ 1;
− outros custos e outras despesas gerais, administrativas e de vendas US$
3; e
− royalties: US$ 10,5.
Nessa potencial redução tributária de US$ 23,5 por barril, não
foram incluídos os bônus de assinatura, que no caso de Libra foi de R$ 15
bilhões. No caso da licitação sob o regime de partilha de produção dos
excedentes da cessão onerosa, os bônus de assinatura podem chegar a R$
80,5 bilhões. Se os bônus dos excedentes da cessão onerosa forem deduzidos
da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, a redução de arrecadação, de 34%,
será de R$ 27,37 bilhões apenas no ano da assinatura dos contratos.
Dessa forma, o valor monetário do custo total de produção da
Petrobras, sem participação governamental, de cerca de US$ 22 por barril,
poderá ser menor que as deduções fiscais de US$ 23,5 por barril, em razão do
art. 1º da Lei nº 13.586/2017.
A visão da RFB, que indica não haver possibilidade de ocorrer
duplicidade de dedução, poderá ser questionada junto ao Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais – CARF e, eventualmente, junto ao Poder
Judiciário. Ressalte-se, ainda, que, mesmo não sendo permitida a duplicidade
de dedução, de US$ 8 por barril, ainda assim o contribuinte poderia deduzir,
adicionalmente, US$ 15,5 por barril.
56
Nessa redução de arrecadação de IRPJ e CSLL de US$ 23,5
por barril não foi considerada a possibilidade de dedução do bônus de
assinatura, que, como já mencionado, é vedada pelo § 2º do art. 42 da Lei nº
12.351/2010. Entretanto, caso isso ocorra, a dedução pode ser superior a US$
23,5 por barril.
Admitindo-se que as empresas petrolíferas adquiram o direito à
dedução de US$ 23,5 por barril e que ocorra uma produção de 40 bilhões de
barris nos próximos 25 a 30 anos, a dedução total será de US$ 940 bilhões, o
que representa uma redução de US$ 319,6 bilhões na arrecadação de IRPJ e
CSLL, sem atualização a valor presente. Essa redução de US$ 319,6 bilhões é
obtida a partir das alíquotas de IRPJ e CSLL de, respectivamente, 25% e 9%, o
que totaliza 34%.
Assim sendo, a potencial redução de arrecadação de IRPJ e
CSLL é superior a R$ 1 trilhão, calculada a partir dessa dedução de US$ 23,5
por barril, da produção de 40 bilhões de barris de petróleo equivalente e de
taxa de câmbio de 3,2 Reais por Dólar, sem atualização a valor presente.
Excluída a duplicidade de dedução, de US$ 8 por barril, ainda assim haveria
uma potencial redução de arrecadação de IRPJ e CSLL de cerca de R$ 650
bilhões, em relação às deduções como custo em óleo, sem considerar a
dedução dos bônus de assinatura.
Como já mencionado, as reservas do Pré-Sal, segundo Jones
e Chaves (2015), podem chegar a 176 bilhões de barris de petróleo
equivalente. Assim sendo, é conservadora a produção de 40 bilhões de barris
de petróleo equivalente.
Se for utilizada uma taxa de desconto, a potencial redução de
arrecadação tributária será reduzida. É importante destacar, contudo, que a
parcela do excedente em óleo destinada ao Fundo Social será destinada
preferencialmente a ativos no exterior, nos termos do parágrafo único do art. 50
da Lei nº 12.351/2010. Esses ativos são geralmente títulos do tesouro dos
Estados Unidos ou de países europeus que apresentam baixíssima
rentabilidade.
57
Dessa forma, o rendimento dessa parcela, como já ocorre com
o rendimento das reservas cambiais do Brasil, da ordem de US$ 380 bilhões,
deverá ser próximo a zero. Assim sendo, o custo de oportunidade da União
pode ser considerado muito baixo.
Registre-se, ainda, que a potencial redução de arrecadação de
IRPJ e CSLL está vinculada a um valor em Dólar por barril, e que esse valor
poderá ser crescente ao longo do tempo.
9. IMPACTO NAS RECEITAS DOS ESTADOS E MUNICÍPIOS
A potencial renúncia fiscal de IRPJ poderá ter grande impacto
nas receitas de Estados e Municípios, em razão da distribuição de parte de
tributo para esses entes federativos. Transcreve-se, a seguir, o disposto no art.
159 da Constituição Federal:
Art. 159. A União entregará
I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, 49% (quarenta e nove por cento), na seguinte forma:
a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal;
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios;
c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando assegurada ao semi-árido do Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer;
d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano;
e) 1% (um por cento) ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de julho de cada ano; (...)
58
Admitindo-se uma redução de receita de R$ 1 trilhão de IRPJ e
CSLL, em decorrência do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, a parcela do IRPJ seria
de cerca de R$ 742 bilhões. Desse valor, 46% são distribuídos para Estados e
Municípios e 3% para programas das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
Assim, a perda de Estados e Municípios seria de 46% de R$ 742 bilhões, o que
corresponde a cerca de R$ 341 bilhões.
Importa registrar, ainda, que os campos sob o regime de
concessão também poderão ser impactados pelo art. 1º da Lei nº 13.586/2017,
pois da mesma forma que o regime de partilha de produção, eles estão sujeitos
a bônus, encargos financeiros, arrendamento e afretamento de bens etc.
No regime de concessão, os royalties não deveriam ser objeto
de ressarcimento, a exemplo do que ocorre no regime de partilha de produção.
No entanto, essa dedução é permitida pelo art. 71 da Lei nº 4.506/1964.
Dessa forma, a alíquota efetiva de royalties para o conjunto da
arrecadação governamental do País é de 6,6%, em razão do ressarcimento de
IRPJ e CSLL, que representam 34% de 10%.
O que há, de fato, é uma visão inadequada da sociedade
brasileira de que os royalties gerados por campos altamente rentáveis sob o
regime de concessão são de 10%. Na realidade, os royalties representam uma
receita governamental efetiva de apenas de 6,6%.
Se esse ressarcimento de 34% dos royalties fosse vedado, a
exemplo do que ocorre no regime de partilha de produção, e admitido um valor
de US$ 70 por barril, haveria um aumento na arrecadação de IRPJ e CSLL de
US$ 2,38 por barril apenas pelo fato de os royalties serem caracterizados como
custo não dedutível para fins desses tributos.
Admitindo-se um aumento de arrecadação de US$ 2,38 por
barril e que serão produzidos 25 bilhões de barris de petróleo equivalente
decorrentes de novos contratos de concessão, chega-se a um aumento de
arrecadação de IRPJ e CSLL, sem atualização a valor presente, de US$ 59,5
bilhões.
59
Observa-se, então, que para não haver grandes benefícios
fiscais para as empresas petrolíferas seria importante o estabelecimento do
princípio da uniformidade, de modo que o custo em óleo seja o parâmetro para
os custos e despesas dedutíveis para fins de IRPJ e CSLL tanto para o regime
de partilha de produção quanto para novos contratos de concessão.
Da potencial perda de arrecadação de R$ 341 bilhões de todos
os Estados e Municípios, R$ 159,38 bilhões deixariam de ser distribuídos para
Estados; R$ 181,62 bilhões seriam perdidos pelos Municípios.
Em suma, a flexibilidade e abrangência das deduções previstas
no caput do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, decorrente da expressão “poderão
ser integralmente deduzidas” e a imprecisão dessas deduções decorrente da
expressão “importâncias aplicadas”, além da deficiente redação dos parágrafos
desse artigo poderá gerar uma redução no potencial arrecadatório dos Estados
e Municípios de R$ 341 bilhões, sem considerar o regime de concessão e sem
considerar os bônus de assinatura.
10. OS ROYALTIES DO PRÉ-SAL E O EMPOBRECIMENTO DO N ORDESTE
A descoberta da província do Pré-Sal na plataforma continental
brasileira pode representar a agregação de reservas de 176 bilhões de barris
de petróleo (Jones e Chaves, 2015), volume significativamente maior que as
atuais reservas nacionais de petróleo de 12,7 bilhões de barris, em 31 de
dezembro de 2016, segundo a ANP.
Os royalties do Pré-Sal, sob o regime de partilha de produção,
têm alíquota de 15% do valor da produção. Admitindo-se que essa província
produzirá 100 bilhões de barris de petróleo, sob tal regime, os royalties
equivalem ao valor de 15 bilhões de barris. Admitindo-se um valor do barril de
US$ 65, as receitas de royalties seriam de US$ 975 bilhões.
Se esse valor de US$ 975 bilhões for deduzido da base de
cálculo do IRPJ (25%) e da CSLL (9%), a renúncia fiscal seria de 34%, o que
corresponde a US$ 331 bilhões. Com essa dedução, a alíquota efetiva de
60
royalties para o Brasil não seria 15%, mas 9,9%, o que equivale a 15% menos
5,1% (34% de 15%).
Adotando-se uma taxa de câmbio de apenas 3,2 Reais por
Dólar, a renúncia fiscal de IRPJ e da CSLL seria de R$ 1,06 trilhão. Ou seja, o
art. 1º da Lei nº 13.586/2017 permite que somente os royalties do Pré-Sal
gerem uma perda de arrecadação da União, Estados e Municípios da ordem de
R$ 1 trilhão, sem atualização a valor presente.
Com relação aos bônus de assinatura, eles podem ser de R$
80,5 bilhões somente no ano de 2018, apenas pela licitação dos excedentes da
cessão onerosa29. Se esse valor for deduzido da base de cálculo do IRPJ e da
CSLL, como permitido pelo art. 1º da Lei nº 13.586/2017, haverá uma renúncia
fiscal de R$ 27,2 bilhões.
A interpretação lógica é de que os royalties e os bônus de
assinatura, antes da promulgação da Lei nº 13.586/2017, não poderiam ser
deduzidos, em razão do já mencionado e transcrito art. 42 da Lei nº
12.351/2010.
Em razão do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, penso que tanto os
royalties quanto os bônus de assinatura, além de outras importâncias, poderão
ser deduzidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Entre essas outras
importâncias, destaco os valores dos ativos referentes a plataformas e
equipamentos arrendados, determinados custos de exploração e avaliação, os
gastos com encargos financeiros e os impairments. Dessa forma, R$ 1 trilhão é
uma estimativa conservadora de potencial renúncia fiscal.
Dessa renúncia de R$ 1 trilhão, R$ 735 bilhões são relativos
ao IRPJ e R$ 265 bilhões relativos à CSLL. A potencial renúncia fiscal de IRPJ
poderá ter grande impacto nas receitas de Estados e Municípios, pois parte
desse tributo é transferida para esses entes federativos, em razão do art. 159
da Constituição Federal.
29 Disponível em https://oglobo.globo.com/economia/sem-acordo-com-petrobras-venda-da-eletrobras-receita-da-uniao-pode-encolher-22287766. Acesso em 4 de maio de 2018.
61
Da renúncia de R$ 735 bilhões, 46% são perdas de Estados e
Municípios e 3% são perdas referentes a programas das Regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste. Desse modo, a perda direta de Estados e Municípios
seria de 46% de R$ 735 bilhões, o que corresponde a cerca de R$ 338 bilhões.
Dessa potencial perda de arrecadação de R$ 338 bilhões de
todos os Estados e Municípios, R$ 158 bilhões seriam perdidos pelos Estados
e R$ 180 bilhões seriam perdidos pelos Municípios.
Com base nas Decisões Normativas – TCU nº 150, de 23 de
março de 2016, e nº 157, de 30 de novembro de 2016, são apresentadas
estimativas de redução de receitas, respectivamente, dos Estados e Municípios
da Região Nordeste, em razão de os royalties do regime de partilha serem
deduzidos da base de cálculo do IRPJ.
Da perda de arrecadação de todos os Estados, de R$ 158
bilhões, 49% seriam perdidos pelos Estados de Região Nordeste, o que
representa uma perda de R$ 77,4 bilhões.
Da perda de arrecadação dos Municípios brasileiros, de R$ 180
bilhões, 86,4% são perdas dos Municípios do interior; 10%, das capitais; e
3,6%, dos Municípios destinados à Reserva.
Assim sendo, dessa perda de arrecadação total de Municípios
de R$ 180 bilhões, 86,4% seriam perdidos por todos os Municípios brasileiros
do interior, o que corresponde a R$ 155,5 bilhões. Todos os Municípios do
interior da Região Nordeste perderiam uma arrecadação de 34% de R$ 155,5
bilhões, o que corresponde a uma perda de R$ 53 bilhões.
Da perda de arrecadação total de Municípios de R$ 180
bilhões, 10% seriam perdidos por todas as capitais brasileiras, o que
corresponde a R$ 18 bilhões. Todas as capitais da Região Nordeste perderiam
uma arrecadação de 48% de R$ 18 bilhões, o que corresponde a uma perda de
R$ 8,6 bilhões.
Da perda de arrecadação total de Municípios de R$ 180
bilhões, 3,6% seriam perdidos por Municípios destinados à Reserva, o que
corresponde a uma perda de R$ 6,5 bilhões. No caso da Região Nordeste,
62
esses Municípios perderiam arrecadação de 36,4% de R$ 6,5 bilhões, o que
corresponde a uma perda de R$ 2,4 bilhões.
A Tabela 10.1 apresenta um resumo da potencial perda de
arrecadação de todos os Estados e Municípios do Brasil e da Região Nordeste,
apenas em razão de os royalties do Pré-Sal, sob o regime de partilha de
produção, serem deduzidos da base de cálculo do IRPJ.
Tabela 10.1 – Perda de arrecadação de Estados e Municípios em razão de
apenas os royalties do Pré-Sal serem deduzidos do IRPJ
Perda de receita Todos
(R$ bilhões)
Região Nordeste
(R$ bilhões)
Estados 158,0 77,4
Municípios do interior 155,5 53,0
Capitais 18,0 8,6
Interior 6,5 2,4
Total 338,0 141,4
Em suma, a flexibilidade e abrangência das deduções previstas
no caput do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 poderá gerar uma perda de recursos
dos Estados e Municípios pode ser de R$ 338 bilhões e a da União pode ser de
R$ 662 bilhões, apenas pelo fato de os royalties serem deduzidos da base de
cálculo do IRPJ. Se forem consideradas as deduções dos bônus de assinatura,
de bens arrendados, de impairments e de outros itens, essa perda pode ser
muito maior.
No caso da Região Nordeste, a produção da província do Pré-
Sal, sob o regime de partilha de produção, poderá significar uma perda de
receitas de R$ 141,4 bilhões decorrentes da ausência de repasses do IRPJ.
Assim sendo, a tão celebrada descoberta do Pré-Sal pode significar um
empobrecimento dos Estados e Municípios do Nordeste.
63
11. CONCLUSÕES
A Lei nº 13.586/2017 estabeleceu um novo “modelo tributário”
para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL aplicável
às atividades de exploração e produção de petróleo e gás no Brasil que é
opcional, impreciso e incompleto.
Desprezando-se todas as “inovações” do art. 1º da Lei nº
13.586/2017 e do art. 12 do Decreto-Lei nº 62/1966, o Brasil já conta com uma
legislação relativamente consolidada para fins de IRPJ e CSLL.
O lucro bruto das empresas é obtido a partir da receita líquida
de vendas menos o custo dos produtos e serviços vendidos, conforme
determina a Lei nº 6.404/1976 e o Decreto nº 3.000/1999, denominado
Regulamento do Imposto de Renda – RIR.
O art. 290 do RIR, a partir do a partir do parágrafo 1º do art. 13
do Decreto-Lei nº 1.598/1977, estabelece os critérios obrigatórios para se
determinar, com rigor, os custos a serem subtraídos para fins de determinação
do real lucro bruto da empresa. Afinal de contas, o resultado do exercício não
pode ser uma escolha da empresa petrolífera.
Nos termos do art. 13 do Decreto-Lei nº 1.598/1977, o custo de
produção dos bens ou serviços vendidos compreenderá, obrigatoriamente: o
custo de aquisição de matérias-primas e quaisquer outros bens ou serviços
aplicados ou consumidos na produção; o custo do pessoal aplicado na
produção; os custos de locação, manutenção e reparo e os encargos de
depreciação dos bens aplicados na produção; os encargos de amortização
diretamente relacionados com a produção; e os encargos de exaustão dos
recursos naturais utilizados na produção.
De acordo com o parágrafo § 3º desse artigo não podem ser
incluídos no custo de produção os encargos de depreciação, amortização e
exaustão gerados por bem objeto de arrendamento mercantil.
Assim, os custos a serem considerados para fins de cálculo do
lucro real são apenas os efetivamente relacionados com a produção. Subtraído
o custo de produção dos bens ou serviços vendidos, passa-se à dedução das
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despesas e encargos, que são detalhadamente tratados nos arts. 299 a 304 do
Regulamento do Imposto de Renda – RIR.
A depreciação de bens do ativo imobilizado é detalhadamente
tratada nos arts. 305 a 312 do RIR; a depreciação acelerada incentivada é
detalhadamente tratada nos arts. 313 a 322 do RIR; a amortização é
detalhadamente tratada nos arts. 324 a 329 do RIR; e a exaustão de recursos
minerais é detalhadamente tratada nos art. 330 a 333 do RIR. Assim, o País
conta com detalhada legislação para fins de determinação do lucro real e da
base de cálculo da CSLL.
O art. 1º da Lei nº 13.586/2017 estabelece que para fins de
determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL poderão ser
integralmente deduzidas as importâncias aplicadas, em cada período de
apuração, nas atividades de exploração e de produção, observado o disposto
no parágrafo 1º desse artigo, que trata apenas da etapa de desenvolvimento,
assim como os demais parágrafos.
Ao contrário do modelo tributário vigente no Brasil, esse artigo,
em razão da ausência de definições, permite que tudo seja opcionalmente
deduzido: bônus de assinatura, encargos financeiros, royalties, etc. Além disso,
permite a duplicidade de dedução de ativos formados: ativos exploratórios;
plataformas, máquinas e equipamentos arrendados; impairments, etc.
Os parágrafos 1º ao 6º, que imporiam restrições em relação ao
período de apuração para as atividades de desenvolvimento da produção, são
muito mal escritos, o que gera muitas dúvidas com relação, por exemplo, à
“despesa de exaustão decorrente de ativo formado”.
Nos termos do art. 59 da Lei nº 4.506/1964, a quota anual de
exaustão será determinada de acordo com os princípios de depreciação, com
base no custo de aquisição ou prospecção dos recursos minerais explorados,
ao contrário do novo “modelo tributário”, que sequer trata de amortização e de
ativos intangíveis. Também não está claro o tratamento dado às máquinas e
equipamentos que também formam ativos. Em suma, sobram dúvidas e
críticas.
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Fundamental, também, é ressaltar que, com a implantação do
regime de partilha de produção na província petrolífera do Pré-Sal, introduziu-
se no Brasil o conceito do custo em óleo (óleo custo).
A Lei nº 12.351/2010, estabelece que custo em óleo é uma
parcela da produção apropriada pelo contratado, a partir do qual se determina
o excedente em óleo (óleo lucro). Esse custo é detalhadamente tratado em
cada contrato de partilha de produção.
Nos termos do parágrafo 1º do art. 42 dessa Lei, os royalties,
com alíquota de 15% do valor da produção, correspondem à compensação
financeira, sendo vedado, em qualquer hipótese, seu ressarcimento ao
contratado e sua inclusão no cálculo do custo em óleo.
O parágrafo 2º, por sua vez, estabelece que o bônus de
assinatura não integra o custo em óleo e corresponde a valor fixo devido à
União pelo contratado, devendo ser estabelecido pelo contrato de partilha de
produção e pago no ato da sua assinatura, sendo vedado, em qualquer
hipótese, seu ressarcimento ao contratado.
Importa registrar, ainda, que os países que adotam o regime de
partilha de produção geralmente adotam o princípio da uniformidade, segundo
o qual os custos e despesas deduzidos como custo em óleo são os mesmos
deduzidos para fins de imposto de renda.
Isso até por uma questão de racionalidade administrativa, pois
não são necessárias duas estruturas de Estado: uma para apurar o custo em
óleo e outra para apurar os custos e despesas dedutíveis para fins de imposto
de renda. No Brasil, as duas estruturas de Estado são a Pré-Sal Petróleo S.A.
– PPSA e a Receita Federal do Brasil – RFB.
Com a introdução do regime de partilha de produção, várias
opções estavam disponíveis para o Brasil:
− 1ª opção: adotar o princípio da uniformidade, como os outros países;
− 2ª opção: adotar a legislação tributária “convencional”; ou
− 3ª opção: introduzir um novo modelo tributário “não opcional, preciso e completo” para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL aplicável às atividades de exploração e produção de petróleo e gás.
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A racionalidade técnica indica que o Brasil deveria ter adotado
o princípio da uniformidade, que é a 1ª opção. No entanto, as 2ª e 3ª opções
são também tecnicamente defensáveis.
No entanto, o Brasil “criou” uma 4ª opção: um novo modelo
tributário “opcional, impreciso e incompleto”, nos termos do art. 1º da Lei nº
13.586/2017.
Ressalte-se, ainda, que custos de muitas naturezas não são
dedutíveis como custo em óleo, mas são dedutíveis nos termos desse artigo.
Entre esses custos, destacam-se os royalties, os encargos financeiros e os
bônus de assinatura.
Com relação à formação de ativos imobilizados, a redação dos
parágrafos 1º ao 6º do art. 1º da Lei nº 13.586/2017 permite diferentes
interpretações. Ao mesmo tempo em que um custo de arrendamento é
dedutível no período em que ocorrido, ele gera um ativo imobilizado que, anos
depois, poderá ser baixado desse ativo ou convertido em um poço produtor ou
injetor a ser exaurido, o que poderá levar à duplicidade de dedução.
Em relação ao custo em óleo, o art. 1º da Lei nº 13.586/2017
apresenta elevado potencial de renúncia fiscal conforme mostrado na Tabela
11.1.
O custo de arrendamento de uma plataforma de produção pode
ser deduzido como de extração e operação. Como essa plataforma arrendada
compõe o ativo imobilizado, poderá haver a interpretação de que, como se trata
de um ativo, ela será exaurida. Nesse caso, haverá duplicidade de dedução.
As deduções adicionais e as duplas deduções decorrentes de
possíveis interpretações do art. 1º da Lei nº 13.586/2017, poderão chegar, sem
considerar a possível dedução de bônus de assinatura, a US$ 23,5 por barril,
assim composto:
− duplicidade de dedução: US$ 8;
− encargos financeiros: US$ 1;
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− custos exploratórios de áreas não comerciais: US$ 1;
− outros custos e outras despesas gerais, administrativas e de vendas US$
3; e
− royalties: US$ 10,5.
Tabela 11.1 – Diferença entre o custo em óleo e o art. 1º Lei nº 13.586/2017
Natureza do custo Custo em óleo Art. 1º da Lei 13.586
Bônus de assinatura Não dedutível Dedutível no período em
que ocorrido
Custos de exploração Dedutível ao longo da
produção
Dedutível no período em
que ocorrido
Custos de
desenvolvimento
Dedutível apenas para
os bens adquiridos
Dedutível pela formação
de ativo
Custos de produção Dedutível ao longo da
produção
Dedutível no período em
que ocorrido
Royalties Não dedutível Dedutível no período em
que ocorrido
Encargos financeiros,
custo de venda e outros
Não dedutível Dedutível no período em
que ocorrido
Impairment Não dedutível Dedutível no período em
que ocorrido
Dessa forma, há potencial redução de arrecadação de IRPJ e
CSLL superior a R$ 1 trilhão, calculada a partir de deduções de US$ 23,5 por
barril, da produção de 40 bilhões de barris e de taxa de câmbio de 3,2 Reais
por Dólar, sem atualização a valor presente. Se fosse considerada a dedução
dos bônus de assinatura, essa redução de arrecadação seria ainda maior.
No caso da licitação sob o regime de partilha de produção dos
excedentes da cessão onerosa, que pode ainda em 2018, os bônus de
assinatura podem chegar a R$ 80,5 bilhões. Se os bônus dos excedentes da
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cessão onerosa forem deduzidos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, a
redução de arrecadação será de R$ 27,37 bilhões.
Destaque-se, por fim, que os Estados e Municípios do
Nordeste poderão ter uma redução de R$ 141 bilhões nos repasses do FPE e
do FPM em razão apenas de os royalties do Pré-Sal serem deduzidos do IRPJ.
Assim sendo, o Pré-Sal, em vez de enriquecer, pode empobrecer ainda mais
essa Região, onde vivem mais de 8 milhões de pessoas abaixo da linha de
pobreza extrema.
Diante do exposto, o art. 1º da Lei nº 13.586/2017 é
tecnicamente inadequado e deve, urgentemente, ser revisto pelo Congresso
Nacional.
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