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Fisioterapia em mastologia oncológica: rotinas do Hospital ... · 97 Fisioterapia em mastologia...

Date post: 14-Nov-2018
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97 Fisioterapia em mastologia oncológica: rotinas do Hospital do Câncer III / INCA Physical Therapy in Breast Cancer: clinical protocol at the Cancer Hospital III / INCA 1 Fisioterapeuta, Doutora em Ciências da Saúde - ENSP/FIOCRUZ 2 Fisioterapeuta, Especialista em Fisioterapia em Cancerologia - SBFC 3 Fisioterapeuta, Especializada em Fisioterapia em Oncologia - INCA 4 Fisioterapeuta, Especializada em Fisioterapia em Oncologia - INCA 5 Fisioterapeuta, Especializada em Fisioterapia em Oncologia - INCA Trabalho realizado no Serviço de Fisioterapia do Hospital do Câncer III / Instituto Nacional de Câncer Endereço para correspondência: Anke Bergmann - Rua Visconde de Santa Izabel, 274. Serviço de Fisioterapia / HCIII / INCA. E-mail : [email protected] - [email protected] Anke Bergmann 1 , Maria Justina Padula Ribeiro 2 , Elisangela Pedrosa 3 , Erica Alves Nogueira 4 , Ana Cristina Gonçalo Oliveira 5 Resumo Após o tratamento do câncer da mama, várias complicações vêm sendo relatadas na literatura. A fisioterapia desempenha um importante papel na prevenção, minimização e tratamento dos efeitos adversos do tratamento do câncer da mama. A implantação da rotina de atendimento fisioterapêutico para pacientes submetidas a tratamento para câncer da mama tem como objetivo principal a prevenção de complicações através de condutas e orientações domiciliares, e o diagnóstico e intervenção precoce, visando melhorar a qualidade de vida e a redução dos custos pessoais e hospitalares. Além disso, possibilita a formação de um banco de dados contendo informações sobre fatores de risco e incidência de complicações, avaliação de condutas empregadas e o planejamento do serviço. As condutas aqui apresentadas sofrem constantes modificações de acordo com o incremento de técnicas fisioterapêuticas, disponibilidade de recursos materiais e humanos. A nossa proposta é divulgar o trabalho realizado, para que possa ser conhecido e discutido entre os outros profissionais e serviços de fisioterapia oncológica. Palavras-chave: Neoplasia mamária; Fisioterapia; Reabilitação; Complicações. Abstract Various complications following breast cancer treatment have been reported in the literature. Physical therapy plays an important role in prevention, reduction, and treatment of adverse effects from breast cancer treatment. The implementation of routine physical therapy for patients undergoing breast cancer treatment aims to prevent complications through homecare measures and orientation as well as early diagnosis and intervention, seeking to improve quality of life and reduce personal and hospital costs. It also allows the formation of a database on risk factors and incidence of complications, evaluation of various approaches, and service plans. The approaches shown here undergo constant changes aimed at improving physical therapy techniques and availability of human and material resources. Our aim is to publicize the work accomplished to date for its discussion by other professionals as well as by physiotherapy services in other cancer centers. Key words: Breast cancer; Physical therapy; Rehabilitation; Complications. Condutas do INCA Fisioterapia em Mastologia Oncológica Artigo submetido em 4/7/05; aceito para publicação em 1/9/05 Revista Brasileira de Cancerologia 2006; 52(1): 97-109
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Fisioterapia em mastologia oncológica: rotinas do Hospital doCâncer III / INCAPhysical Therapy in Breast Cancer: clinical protocol at the Cancer Hospital III / INCA

1 Fisioterapeuta, Doutora em Ciências da Saúde - ENSP/FIOCRUZ2 Fisioterapeuta, Especialista em Fisioterapia em Cancerologia - SBFC3 Fisioterapeuta, Especializada em Fisioterapia em Oncologia - INCA4 Fisioterapeuta, Especializada em Fisioterapia em Oncologia - INCA5 Fisioterapeuta, Especializada em Fisioterapia em Oncologia - INCATrabalho realizado no Serviço de Fisioterapia do Hospital do Câncer III / Instituto Nacional de CâncerEndereço para correspondência: Anke Bergmann - Rua Visconde de Santa Izabel, 274. Serviço de Fisioterapia / HCIII / INCA. E-mail:[email protected] - [email protected]

Anke Bergmann1, Maria Justina Padula Ribeiro2, Elisangela Pedrosa3, Erica Alves Nogueira4, Ana Cristina Gonçalo Oliveira5

ResumoApós o tratamento do câncer da mama, várias complicações vêm sendo relatadas na literatura. A fisioterapia desempenhaum importante papel na prevenção, minimização e tratamento dos efeitos adversos do tratamento do câncer damama. A implantação da rotina de atendimento fisioterapêutico para pacientes submetidas a tratamento para câncerda mama tem como objetivo principal a prevenção de complicações através de condutas e orientações domiciliares,e o diagnóstico e intervenção precoce, visando melhorar a qualidade de vida e a redução dos custos pessoais ehospitalares. Além disso, possibilita a formação de um banco de dados contendo informações sobre fatores de riscoe incidência de complicações, avaliação de condutas empregadas e o planejamento do serviço. As condutas aquiapresentadas sofrem constantes modificações de acordo com o incremento de técnicas fisioterapêuticas, disponibilidadede recursos materiais e humanos. A nossa proposta é divulgar o trabalho realizado, para que possa ser conhecido ediscutido entre os outros profissionais e serviços de fisioterapia oncológica.Palavras-chave: Neoplasia mamária; Fisioterapia; Reabilitação; Complicações.

AbstractVarious complications following breast cancer treatment have been reported in the literature. Physical therapyplays an important role in prevention, reduction, and treatment of adverse effects from breast cancer treatment.The implementation of routine physical therapy for patients undergoing breast cancer treatment aims to preventcomplications through homecare measures and orientation as well as early diagnosis and intervention, seeking toimprove quality of life and reduce personal and hospital costs. It also allows the formation of a database on riskfactors and incidence of complications, evaluation of various approaches, and service plans. The approachesshown here undergo constant changes aimed at improving physical therapy techniques and availability of humanand material resources. Our aim is to publicize the work accomplished to date for its discussion by other professionalsas well as by physiotherapy services in other cancer centers.Key words: Breast cancer; Physical therapy; Rehabilitation; Complications.

Condutas do INCAFisioterapia em Mastologia Oncológica

Artigo submetido em 4/7/05; aceito para publicação em 1/9/05

Revista Brasileira de Cancerologia 2006; 52(1): 97-109

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Bergmann A, et al

INTRODUÇÃO

Em decorrência do tratamento do câncer da mama,várias complicações têm sido relatadas na literatura. Ascomplicações cirúrgicas ocorrem, com diferenças deintensidade e incidência, tanto nas técnicasconservadoras como nas radicais. O tratamentoadjuvante, seja ele radioterápico, quimioterápico ouhormonioterápico, se sobrepõe às seqüelas cirúrgicas,aumentando os riscos de complicações1.

A fisioterapia, quando iniciada precocemente,desempenha um importante papel na busca da prevençãodas complicações advindas do tratamento do câncer damama, favorecendo o retorno às atividades de vidadiária, e melhor qualidade de vida2,3,4,5.

O programa de fisioterapia deve ser realizado emtodas as fases do câncer da mama: pré-tratamento(diagnóstico e avaliação); durante o tratamento(quimioterapia, radioterapia, cirurgia, ehormônioterapia); após o tratamento (período deseguimento); na recorrência da doença e nos cuidadospaliativos. Em cada uma dessas fases, é necessárioconhecer e identificar as necessidades do paciente, ossintomas e suas causas, e o impacto desses nas atividadesde vida diária. A conduta fisioterapêutica deve, então,ser traçada através de orientações domiciliares etratamentos específicos6,7.

O presente artigo tem como objetivo divulgar ascondutas empregadas no serviço de fisioterapia doHospital do Câncer III, unidade responsável peloatendimento exclusivo de pacientes com câncer da mamado Instituto Nacional de Câncer.

DESCRIÇÃO DAS ROTINAS DO SERVIÇO DE FISIOTERAPIAOs atendimentos de rotina são realizados de acordo

com a figura 1.

Pré-operatório

População alvo: todas as pacientes com indicaçãocirúrgica de linfadenectomia axilar, biópsia do linfonodosentinela e reconstrução mamária.Atendimento: individualObjetivos: estabelecimento do contato fisioterapeuta xpaciente; avaliação (anamnese e exame físico);orientações para o pós-operatório imediato; indicaçãode fisioterapia pré-operatória.Conduta: apresentação do profissional e dos objetivosda fisioterapia junto ao paciente e esclarecimento daconduta cirúrgica indicada; avaliação fisioterapêutica;orientação em relação aos cuidados iniciais com omembro superior (MS), exercícios a 90O com o MS atéa retirada dos pontos e retorno gradativo às atividadesde vida diária (AVD's).

Pós-operatório imediato (1o PO)

População alvo: todas as pacientes submetidas àlinfadenectomia axilar, biópsia do linfonodo sentinela ereconstrução mamária.Atendimento: individual (avaliação) e em grupo (conduta).Objetivos: prevenção de complicações e melhora desintomatologias.Conduta: avaliação; orientação quanto aos cuidados como membro superior, exercícios a 90O com o MS até a

Figura 1. Figura 1. Figura 1. Figura 1. Figura 1. Rotina de Fisioterapia em Mastologia Oncológica / HC III - INCA

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retirada dos pontos, retorno gradativo às AVD's eposicionamento no leito; relaxamento cervical;cinesioterapia ativo-assistida de baixa amplitude comos membros superiores; cinesioterapia respiratória etratamento sintomatológico.

Consultas de seguimento (trinta dias e seis meses)

População alvo: pacientes submetidas à linfadenectomiaaxilar, biópsia do linfonodo sentinela e reconstruçãomamária com 30 e 180 dias de pós-operatório.Atendimento: individual.Objetivos: detecção precoce de complicações.Conduta: avaliação fisioterapêutica; orientações específicassegundo sintomatologia apresentada; adaptação de órtesese próteses (quando indicadas); encaminhamento aos gruposde tratamento, quando necessário.

Atendimento fisioterapêutico ambulatorial parareavaliação de seguimento

Entre os períodos de seguimento, as pacientes quenecessitam de atendimentos fisioterapêuticos sãoorientadas a marcar consulta com a fisioterapia, atravésdo encaminhamento de qualquer profissional de saúdeda instituição. É realizada avaliação padronizada econduta específica segundo a sintomatologia apresentada.Quando necessário, as pacientes são encaminhadas paraos grupos de tratamento específico.

Atendimento fisioterapêutico nas internações clínicasDurante a internação clínica, as pacientes são

encaminhadas à fisioterapia através de parecer emitidopelos profissionais de saúde. São realizados atendimentosfisioterapêuticos específicos abrangendo todas as clínicas(pneumo-funcional, neurológica, ortopédica, oncológicaetc.). Quando necessário, são adaptadas órteses epróteses visando estabilização segmentar.

Ambulatório para tratamento fisioterapêutico dascomplicações

Cinesioterapia GeralPopulação alvo: pacientes com amplitude incompletade movimento (AIM).Atendimento: grupo.Objetivos: recuperar a amplitude articular demovimento (ADM) dos membros superioresConduta: cinesioterapia ativo-assistida; alongamentoglobal; relaxamento cervical e orientações específicas.Consultas semanais: umaTempo de atendimento: 1 hora

Cinesioterapia para radioterapiaPopulação alvo: pacientes com AIM, não apresentandoposicionamento adequado para início do tratamentoradioterápico.Atendimento: grupo.Objetivos: proporcionar ganho da amplitude articularpara posicionamento na radioterapiaConduta: cinesioterapia ativa-assistida; alongamentoglobal; relaxamento cervical e orientações específicas.Consultas semanais: duasTempo de atendimento: 1 hora

LinfedemaPopulação alvo: de acordo com o protocolo detratamento do linfedema.Atendimento: individual.Objetivos: minimizar e controlar o volume do membro.Conduta: auto-massagem linfática; exercícioslinfomiocinéticos; enfaixamento compressivo eorientações específicas relacionadas aos cuidados coma pele.Consultas semanais: duasTempo de atendimento: 30 minutos

DorPopulação alvo: pacientes com quadro álgico, semresposta à orientação domiciliar.Atendimento: grupo.Objetivos: minimização do quadro álgico.Conduta: cinesioterapia ativo-assistida; alongamentoglobal; relaxamento cervical; auto-massagem linfática;descolamento cicatricial e orientações específicas.Consultas semanais: umaTempo de atendimento: 1 hora

AVALIAÇÕES FISIOTERAPÊUTICASA avaliação fisioterapêutica deve ser iniciada no pré-

operatório, objetivando conhecer as alterações pré-existentese identificar os possíveis fatores de riscos para as complicaçõespós-operatórias (figura 2)7. Quando necessário, é instituídotratamento fisioterapêutico nessa etapa, visando minimizar eprevenir as possíveis seqüelas identificadas.

No pós-operatório imediato, a avaliação deve buscaridentificar alterações neurológicas ocorridas durante oato operatório, presença de sintomatologias álgicas, edemalinfático precoce, e alterações na dinâmica respiratória(figura 3). No período de seguimento, e durante a terapiaadjuvante, a avaliação deverá priorizar a detecção precocede complicações, sejam elas linfáticas, posturais,funcionais, motoras e/ou respiratórias (figuras 4 e 5).

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CONDUTAS E ORIENTAÇÕES FISIOTERAPÊUTICAS

As condutas fisioterapêuticas são realizadas atravésde orientações domiciliares e tratamentos específicosambulatoriais e hospitalares, segundo fase de tratamentoe sintomatologias apresentadas. Apresentamos umquadro resumido das condutas fisioterapêuticas nasprincipais complicações do tratamento do câncer damama (quadro 1)2,6,8,9 .

Posicionamento e mudanças de decúbito

O posicionamento adotado no pós-operatórioimediato deverá ser o mais confortável possível; omembro superior homolateral à cirurgia pode ser elevadoa +- 30º utilizando apoio de travesseiros, não havendonecessidade de mantê-lo em posição de drenagemconstante. As mudanças de decúbito são orientadas aserem realizadas em decúbito lateral (DL) oposto. Paraas pacientes submetidas à reconstrução com retalhomiocutâneo do músculo reto abdominal, oposicionamento adequado é com a cabeceira elevada esemi-flexão de joelhos6.

Mobilização do membro superior

A aderência dos retalhos cutâneos e a cicatrizaçãoda ferida operatória são prejudicadas pelas forçastensionais provocadas pelas incursões respiratórias emovimentos do ombro. A contração muscular aumentaa circulação de retorno, fazendo com que a drenagemlinfática fisiológica preencha o espaço morto,favorecendo o acúmulo de líquido na cavidade. Aimobilização total do MS favorece a aderência das bordascirúrgicas, diminuindo a formação do seroma, entretantoleva a retrações importantes, limitando a ADM,aumentando risco de outras complicações6, 8, 9, 10.

Visando prevenir complicações relacionadas àrestrição articular e linfedema, sem aumentar o riscoda formação do seroma, a mobilização do braço deveser iniciada no primeiro dia após a cirurgia, limitada a90º de flexão, abdução e rotação externa do ombrohomolateral à cirurgia, respeitando o limite de tolerânciada paciente. Após a retirada dos pontos e do dreno, nãohavendo intercorrências proibitivas, orientamos amobilização completa da amplitude articular6-10.

Controle de sintomas álgicos

As pacientes devem ser encorajadas a iniciar osmovimentos ativos de membro superior (limitado a 90ºaté a retirada dos pontos), relaxamento cervical emobilização escapular desde o 1o pós-operatório. Se

houver presença de parestesia em região inervada pelointercostobraquial, a dessensibilização com diferentestexturas pode ser realizada. Pode-se ainda fazer uso daTENS, corrente interferencial e diadinâmica,crioterapia, e drenagem linfática manual (DLM) paramelhora dos sintomas6, 11, 12.

Prevenção e tratamento de alterações posturais

As pacientes devem ser orientadas a andar com acoluna ereta, cabeça na linha do horizonte, e braçospendentes ao lado do corpo. Para as pacientessubmetidas à mastectomia, a prótese mamária desilicone externa deve ser adaptada após a alta do curativo.Antes, pode ser utilizada prótese de espuma ou materialsimilar (mais leve), o mesmo ocorrendo durante aradioterapia. As mulheres submetidas à cirurgiaconservadora podem requerer uso de prótese parcial, afim de proporcionar simetria mamária.6

As diversas técnicas e condutas fisioterapêuticasaplicadas para melhora da postura (RPG, Pilates, anti-ginástica, cinesioterapia etc.) podem ser empregadas,evitando-se peso do corpo sobre o braço (exercícios dequatro apoios), movimentos rápidos e de repetição eatividades com carga e/ou resistência.

Prevenção e tratamento do linfedema do membrosuperior

A prevenção do linfedema pode ser conseguida atravésde uma série de cuidados, que se iniciam a partir dodiagnóstico de câncer da mama. Após o tratamento cirúrgico,as pacientes devem ser orientadas sobre os cuidados com apele do membro superior homolateral ao câncer da mama,a fim de evitar possíveis traumas e ferimentos (quadro 2).Os cuidados, entretanto, devem ser repassados de formacriteriosa para que não haja um sentimento de incapacidadee impotência física. As orientações com relação à vidadoméstica, profissional e de lazer devem ser direcionadas àsrotinas das pacientes e condutas alternativas devem serensinadas quando forem realmente necessárias. Os exercíciosdevem ser iniciados precocemente. A auto-massagem linfáticadeverá ser ensinada (quadro 4), visando melhorar as viassecundárias de drenagem da linfa. Os recursosfisioterapêuticos que provocam calor superficial e profundo(ondas curtas, micro-ondas, infravermelho, turbilhão, fornode Bier, compressa quente) não devem ser utilizados no ladoafetado, pois favorecem a ultrafiltração arterial para ointerstício podendo desencadear o linfedema.6,11,12 Asmulheres devem ter conhecimento sobre os sinais e sintomasiniciais dos processos infecciosos e do linfedema, para quecomuniquem ao médico assistente e uma correta condutaterapêutica seja implantada13. A equipe de saúde deve estarpreparada para diagnosticar e intervir precocemente.

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Quadro 1. Quadro 1. Quadro 1. Quadro 1. Quadro 1. Resumos das principais complicações do câncer da mama e suas respectivas condutas

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O tratamento do linfedema está baseado em técnicasjá bem aceitas e descritas na literatura mundial, conhecidacomo CPT (Complex Physical Therapy), sendo que noBrasil é chamada de TFC (Tratamento Físico Complexo)ou Linfoterapia. Esse tratamento consiste da combinaçãode várias técnicas que atuam conjuntamente, dependendoda fase em que se encontra o linfedema, incluindo:cuidados com a pele, drenagem linfática manual (DLM),contenção na forma de enfaixamento ou por luvas/braçadeiras e cinesioterapia específica. O tratamento édividido em duas fases, sendo que na primeira o objetivoé a redução do volume do membro, tendo a duração de 2a 6 semanas, e a segunda é a fase de manutenção e controledo linfedema. Outros tratamentos têm sido descritos naliteratura, porém seus resultados não são satisfatóriosquando comparados ao TFC6, 9, 13, 14, 15.

O tratamento fisioterapêutico do linfedema emnosso serviço é uma adaptação da TFC, devido àscaracterísticas da população assistida e do serviço, sendoadotadas as seguintes condutas:· Pacientes que apresentam diferença entre os membrossuperiores de 2,00 a 3,00 cm em um ou mais pontos,ou diferença de 3,00 a 5,00 cm sem fibrose linfoestática:adaptação de malha compressiva (tamanho padrão ousob medida), e orientação domiciliar quanto à auto-massagem linfática e cinesioterapia ativa. O retorno para

reavaliação é de 30 dias com retorno para reavaliação acada 6 meses. Na falha da minimização e controle dovolume do membro, a paciente é encaminhada para oenfaixamento compressivo.· Pacientes refratárias ao tratamento domiciliar,perimetria com diferença de 3,00 a 5,00 cm com fibroselinfoestática e diferença maior que 5 cm: o tratamentoé realizado duas vezes por semana, por um períodoaproximado de 30 a 60 dias, constando de enfaixamentocompressivo com ou sem dedos, auto-massagem linfáticae cinesioterapia ativa. Após redução máxima do volumedo membro, é adaptada braçadeira padrão ou sobmedida. As orientações domiciliares são mantidas. Oretorno para reavaliação é realizado com 30 dias e revistoa cada 6 meses.

ORIENTAÇÕES PARA A PACIENTE APÓS LINFADENECTOMIAAXILAR

As pacientes devem ser informadas em relação aoscuidados com o membro superior homolateral àcirurgia (quadros 2 e 3). Entretanto, deve-se tomar ocuidado para não provocar sensação de incapacidadee impotência funcional. Elas devem ser encorajadas aretornarem as AVD's, e devem ser informadas sobreas opções para os cuidados pessoais (cutículas,depilação, etc)7.

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Quadro 2. Quadro 2. Quadro 2. Quadro 2. Quadro 2. Orientações após linfadenectomia axilar

Orientações para a paciente após reconstruçãomamária

As pacientes submetidas à reconstrução mamáriaimediata ou tardia, com o uso de extensores, prótesemamária e retalho do grande dorsal, devem ser orientadasda mesma maneira que as pacientes submetidas àlinfadenectomia axilar. Quando submetidas à reconstruçãocom retalho miocutâneo do reto abdominal (TRAM), sãoorientadas segundo quadro 4 3.

ORIENTAÇÃO FISIOTERAPÊUTICA PARA AS PACIENTES EM CURSODE TRATAMENTO ADJUVANTE

Durante a radioterapia, devido à lesão cutâneaprovocada pelo tratamento, as pacientes são orientadasa usar roupas de algodão e evitar massagem no local

Quadro 3.Quadro 3.Quadro 3.Quadro 3.Quadro 3. Orientação para auto-massagem linfática

irradiado até o término da irradiação. Os exercícios domembro superior são mantidos até a amplitude máximatolerada pela paciente. A atividade física regular, comocaminhadas, devem ser incentivadas, visando minimizara fadiga. Em caso de linfedema prévio de membrosuperior ou instalado durante a vigência da radioterapia,a fisioterapia específica pode ser iniciada, respeitando-se os cuidados com o local irradiado4.

Na vigência de tratamento sistêmico comquimioterapia e/ou hormonioterapia, as pacientes sãoorientadas a manter atividade física regular, exercíciosativos para relaxamento cervical e exercícios respiratórios.

ORIENTAÇÃO PARA PROFISSIONAIS DE SAÚDERecursos fisioterapêuticos de eletro e termoterapia que

produzam calor, tais como parafina, infra-vermelho, ultra-

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Quadro 4. Quadro 4. Quadro 4. Quadro 4. Quadro 4. Orientações após reconstrução mamária (TRAM)

som, ondas curtas, micro-ondas, forno de Bier, compressasquentes e turbilhão, devem ser evitados nas áreas dedrenagem para a axila homolateral, devido ao aumento dorisco de desenvolvimento de linfedema porque provocamvasodilatação local. Nas regiões distantes, desde que nãohaja neoplasia em atividade, os recursos podem serrealizados, seguindo as devidas precauções1,11,12.

As punções venosas, vacinas e injeções devem serevitadas no membro superior homolateral, bem comoaferição da pressão arterial.

FISIOTERAPIA NO CUIDADO PALIATIVO

Linfedema por obstrução tumoralO tratamento do linfedema ocasionado por obstrução

tumoral pode ser realizado através do enfaixamentocompressivo, desde que não haja trombos tumorais oucarcinomatoses difusas infiltrativas. A redução do volumeé útil para melhora dos sintomas (dor, desconforto,alteração da sensibilidade, função do membro etc.)15.

Metástase ósseaO tratamento visa alívio da dor, prevenção de fraturas

patológicas, melhora da locomoção e conseqüente melhorada qualidade de vida. A fisioterapia deve proverestabilização das articulações acometidas, controle álgico(TENS, mobilização passiva, técnicas de relaxamentomuscular), manutenção e/ou melhora da funçãorespiratória, otimização da independência funcional,ganho de força muscular, treinamento de marcha eequilíbrio (quando indicado). As pacientes devem serorientadas em relação ao uso de órtese, posicionamentono leito, independência nas AVD's e exercíciosdomiciliares para desenvolvimento da força muscular.

CONCLUSÃO

A implantação da rotina de atendimentofisioterapêutico para pacientes submetidas a tratamentopara câncer da mama tem como objetivo principal aprevenção de complicações através de condutas eorientações domiciliares, e o diagnóstico e intervençãoprecoce, visando melhorar a qualidade de vida e aredução dos custos pessoais e hospitalares. Além disso,possibilita a formação de um banco de dados contendoinformações sobre fatores de risco e incidência decomplicações, avaliação de condutas empregadas e oplanejamento do serviço.

As condutas aqui apresentadas sofrem constantesmodificações, de acordo com o incremento de técnicasfisioterapeuticas, disponibilidade de recursos materiaise humanos. A nossa proposta é divulgar o trabalhorealizado, para que possa ser conhecido e discutido entreos outros profissionais e serviços de fisioterapiaoncológica. Vale ressaltar que as condutas estão baseadasna nossa população alvo, com os recursos e condiçõesdo nosso serviço.

AGRADECIMENTOS

As autoras agradecem as funcionárias do serviço deFisioterapia, Sra Penha Cristina Motta de Mello e SraZuleika Cabral da Vitória de Sousa, por tornarempossível a realização deste trabalho, pelo apoio irrestrito,pela dedicação e carinho sempre presentes.Agradecemos, também, a Sra Nairzete Firmino da Silvapelo suporte ao nosso serviço, e por tornar nossoambiente de trabalho muito acolhedor.

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Figura 2.Figura 2.Figura 2.Figura 2.Figura 2. Avaliação fisioterapêutica pré-operatória

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Figura 3. Figura 3. Figura 3. Figura 3. Figura 3. Avaliação fisioterapêutica pós-operatória imediata

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Figura 4.Figura 4.Figura 4.Figura 4.Figura 4. Avaliação fisioterapêutica pós-operatória 30 dias

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Figura 5. Figura 5. Figura 5. Figura 5. Figura 5. Avaliação fisioterapêutica pós-operatória 30 dias

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