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Graziele Ferreira

Date post: 10-Jan-2017
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O CIRCUITO COMERCIAL DA PESCA - EXTRAÇÃO, CRIAÇÃO E VENDA DO PESCADO E SUAS INTERFACES NO LAGO DE ITAIPU E NA COLÔNIA Z11. Graziele Ferreira Mestre em geografia - Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus Francisco Beltrão. [email protected] Edson Belo Clemente de Souza Geógrafo, professor da graduação e do mestrado em geografia da Unioeste - Universidade Estadual do Oeste do Paraná. [email protected] 1. Introdução O artigo 1 faz parte da pesquisa de mestrado sobre a Comunidade de Pescadores Artesanais no Lago de Itaipu, concluída em 2014, pela Unioeste Francisco Beltrão-PR, tem por objetivo analisar o circuito comercial da pesca no Lago de Itaipu- Pr, mais especificamente na Colônia Z11 de São Miguel do Iguaçu-PR. Buscou-se discutir, a pesca extrativista praticada no Lago, que tenta sobreviver nesse território onde os esforços estão centrados na aquicultura (tanques-rede 2 ), bem como entender todo o processo da comercialização deste pescado. Esse circuito está fragilizado frente a realidade do sistema da Colônia Z11 e da instabilidade do estoque pesqueiro do reservatório, precisando ter investimentos e aportes políticos, para ser reestruturado.Muitos são os conflitos que se delineiam na lógica da comercialização, lutas e divergências ocorrem e são discutidas no artigo. A partir do processo de formação do Lago de Itaipu, em 1982, constituído por uma área de 1.350 km² (Ver figura 1), configurou-se uma nova realidade territorial, do que antes eram áreas agrícolas; agora é um lago aproveitado para a pesca artesanal de várias comunidades no seu entorno 3 , além de produzir energia e favorecer o turismo. 1 Este estudo constitui-se num desdobramento de pesquisas desenvolvidas no Grupo de Estudos Fronteiriços (GEF) e no Laboratório de Estudos Regionais (LABER), da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) e da pesquisa de Dissertação de Mestrado intitulada: Comunidade de Pescadores Artesanais no Lago de Itaipu - Conflitos territoriais na Colônia Z11 de São Miguel do Iguaçu/PR. 2 São estruturas retangulares que flutuam na água e confinam peixes em seu interior. Esse equipamento é constituído basicamente por flutuadores (galões, bombonas, isopor, etc.) que sustentam submersos na água arames galvanizados ou redes. São distribuído pela Itaipu. 3 São 8 colônias e 2 associações: Colônia de Pescadores Profissionais Z12-Foz do Iguaçu; Colônia de Pescadores Profissionais Itaipulandiense - Itaipulândia; Colônia de Pescadores Profissionais Nossa Senhora dos Navegantes-Santa Helena; Colônia de Pescadores Profissionais São Francisco-Entre Rios do Oeste; Colônia de Pescadores Profissionais Z15- Marechal Cândido Rondon; Colônia de Pescadores Profissionais Z13-Guaíra; Colônia de Pescadores Profissionais de Santa Terezinha de Itaipu; Associação
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O CIRCUITO COMERCIAL DA PESCA - EXTRAÇÃO, CRIAÇÃO E VENDA DO PESCADO E SUAS INTERFACES NO LAGO DE ITAIPU E NA

COLÔNIA Z11. Graziele Ferreira

Mestre em geografia - Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus Francisco Beltrão.

[email protected]

Edson Belo Clemente de Souza

Geógrafo, professor da graduação e do mestrado em geografia da Unioeste - Universidade

Estadual do Oeste do Paraná.

[email protected]

1. Introdução

O artigo1faz parte da pesquisa de mestrado sobre a Comunidade de Pescadores

Artesanais no Lago de Itaipu, concluída em 2014, pela Unioeste Francisco Beltrão-PR,

tem por objetivo analisar o circuito comercial da pesca no Lago de Itaipu- Pr, mais

especificamente na Colônia Z11 de São Miguel do Iguaçu-PR. Buscou-se discutir, a

pesca extrativista praticada no Lago, que tenta sobreviver nesse território onde os

esforços estão centrados na aquicultura (tanques-rede2), bem como entender todo o

processo da comercialização deste pescado.

Esse circuito está fragilizado frente a realidade do sistema da Colônia Z11 e da

instabilidade do estoque pesqueiro do reservatório, precisando ter investimentos e

aportes políticos, para ser reestruturado.Muitos são os conflitos que se delineiam na

lógica da comercialização, lutas e divergências ocorrem e são discutidas no artigo.

A partir do processo de formação do Lago de Itaipu, em 1982, constituído por

uma área de 1.350 km² (Ver figura 1), configurou-se uma nova realidade territorial, do

que antes eram áreas agrícolas; agora é um lago aproveitado para a pesca artesanal de

várias comunidades no seu entorno3, além de produzir energia e favorecer o turismo.

1Este estudo constitui-se num desdobramento de pesquisas desenvolvidas no Grupo de Estudos Fronteiriços (GEF) e no Laboratório de Estudos Regionais (LABER), da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) e da pesquisa de Dissertação de Mestrado intitulada: Comunidade de Pescadores Artesanais no Lago de Itaipu - Conflitos territoriais na Colônia Z11 de São Miguel do Iguaçu/PR. 2São estruturas retangulares que flutuam na água e confinam peixes em seu interior. Esse equipamento é constituído basicamente por flutuadores (galões, bombonas, isopor, etc.) que sustentam submersos na água arames galvanizados ou redes. São distribuído pela Itaipu. 3 São 8 colônias e 2 associações: Colônia de Pescadores Profissionais Z12-Foz do Iguaçu; Colônia de Pescadores Profissionais Itaipulandiense - Itaipulândia; Colônia de Pescadores Profissionais Nossa Senhora dos Navegantes-Santa Helena; Colônia de Pescadores Profissionais São Francisco-Entre Rios do Oeste; Colônia de Pescadores Profissionais Z15- Marechal Cândido Rondon; Colônia de Pescadores Profissionais Z13-Guaíra; Colônia de Pescadores Profissionais de Santa Terezinha de Itaipu; Associação

A construção da Hidrelétrica de Itaipu e seu reservatório artificial,

reconfigurou a região oeste paranaense e suas relações socioeconômicas,

comprometendo 101.093 hectares do território. As águas do lago inundaram áreas

urbanas e rurais, resultando na desapropria

Figura 1: Localização da Área em Es

Base Cartográfica: IBGE (2003). Elaboração REOLON, Cleverson A. Organizado por:

Esse território em estudo não é apenas produto da intervenção do Estado

(criação da Itaipu), mas também expressão de vida de relações sociais, culturais,

políticas, econômicas, ambientais e institucionais dos agentes produtivos que produzem

Bragadense de Pescadores- Pato Bragado; Associação dos pescadores Artesanais de Guaíra (AGUA)Guaíra.

A construção da Hidrelétrica de Itaipu e seu reservatório artificial,

região oeste paranaense e suas relações socioeconômicas,

comprometendo 101.093 hectares do território. As águas do lago inundaram áreas

urbanas e rurais, resultando na desapropriação de 44 mil famílias (RIBEIRO,

Localização da Área em Estudo - Reservatório do Lago de Itaipu

Base Cartográfica: IBGE (2003). Elaboração REOLON, Cleverson A. Organizado por:

FERREIRA, Graziele.

Esse território em estudo não é apenas produto da intervenção do Estado

, mas também expressão de vida de relações sociais, culturais,

políticas, econômicas, ambientais e institucionais dos agentes produtivos que produzem

Pato Bragado; Associação dos pescadores Artesanais de Guaíra (AGUA)

A construção da Hidrelétrica de Itaipu e seu reservatório artificial,

região oeste paranaense e suas relações socioeconômicas,

comprometendo 101.093 hectares do território. As águas do lago inundaram áreas

ção de 44 mil famílias (RIBEIRO, 2006).

Reservatório do Lago de Itaipu

Base Cartográfica: IBGE (2003). Elaboração REOLON, Cleverson A. Organizado por:

Esse território em estudo não é apenas produto da intervenção do Estado

, mas também expressão de vida de relações sociais, culturais,

políticas, econômicas, ambientais e institucionais dos agentes produtivos que produzem

Pato Bragado; Associação dos pescadores Artesanais de Guaíra (AGUA)-

o território da pesca. Assim, de acordo com Haesbaert (2006, p. 121), o território é fruto

de “uma relação desigual de forças, envolvendo o domínio ou o controle político-

econômico do espaço e sua apropriação simbólica, ora conjugados e mutuamente

reforçados, ora desconectados e contraditoriamente articulados”.

Metodologicamente, a análise abrange uma revisão bibliográfica sobre a pesca

no Lago de Itaipu, a apreciação dos dados fornecidos pela Itaipu/UEM (Universidade

Estadual de Maringá), entrevistas realizadas com os pescadores e as visitas in loco.

O texto está organizado no seguinte sentido: além desta breve introdução, a

discussão da realidade pesqueira no Lago de Itaipu, inserindo brevemente as

circunstâncias da formação, os circuitos de comercialização do pescado,usos e conflitos,

e, para concluir, as considerações finais com alguns apontamentos.

2. A realidade pesqueira no Lago de Itaipu e a Colônia Z11

Historicamente as políticas públicas na pesca trazem um caráter ideológico de

justificativas dos projetos criados, enfatizando a importância do pescador e da pesca na

economia nacional, porém, demonstram muitas vezes que não vão ao encontro das reais

necessidades dos pescadores, essas políticas demagogas manipulam os resultados

conforme o interesse de grupos seletos, o governo e empresários. Muitas ainda

priorizam apenas a criação de peixes: aquicultura.

Nesse sentido discute-se a realidade pesqueira do Lago de Itaipu,

especificamente em uma das Colônias de Pesca, a Colônia Z11, caracterizada pela

atuação de 180 pescadores artesanais pela captura simples e artesanal do pescado, que

são cadastrados no MPA (Ministério da Pesca e Aquicultura) como profissionais.

Vivem da pesca, auxiliada por diversas outras atividades, principalmente a agricultura

de subsistência, pois a renda do pescado não e suficiente para sobreviverem.

A Itaipu Binacional, devido essa escassez de peixes nas aguas do reservatório,

vem incentivando o cultivo de peixes em tanques-rede, através do programa “Mais

peixe em nossas Águas”, pelo projeto Cultivando Água Boa, que segundo o discurso,

tem o objetivo de proporcionar uma fonte de renda aos pescadores e suas famílias de

forma sustentável.

O Programa Cultivando Água Boa (CAB) é uma ampla iniciativa

socioambiental concebida a partir da mudança na missão institucional da Itaipu

Binacional, promovida em 2003. Trata-se de uma estratégia local para o enfrentamento

dos problemas relacionados à água e seus usos múltiplos (a produção de alimentos e de

energia, o abastecimento público, o lazer e o turismo), problemas estes que a própria

Itaipu foi responsável no momento da criação do Lago artificial, consequência da

barragem.

Na verdade, esse programa é uma iniciativa para conservar as margens do Lago

evitando a erosão que acabaria com a vida útil do reservatório. Os novos objetivos

estratégicos da empresa são ligados à sustentabilidade socioambiental (para

conscientizar a sociedade), buscando excelência/eficácia operacional e principalmente

para a geração/distribuição de energia. “Gerar energia elétrica de qualidade, com

responsabilidade social e ambiental, impulsionando o desenvolvimento econômico,

turístico e tecnológico, sustentável, no Brasil e no Paraguai” (ITAIPU BINACIONAL,

2013).

No CAB são desenvolvidos 20 programas e 65 ações4 que vão desde a

recuperação de microbacias, a proteção das matas ciliares e da biodiversidade, até a

disseminação de valores e saberes que contribuem para a formação de cidadãos dentro

da concepção da ética do cuidado e do respeito com o meio ambiente.

Dentre os vários programas do CAB existe o programa “Mais Peixes em

Nossas Águas” tem busca melhoria na qualidade de vida para diversas comunidades

pesqueiras da região da Bacia do Paraná 3. A aquicultura tornou-se uma alternativa de

renda para muitas das famílias do entorno do Lago. Além disso, muitos pescadores, que

viam sua atividade se deteriorar a cada ano, passaram a fazer, também, o cultivo de

peixes, o que tem aumentado o volume pescado e, consequentemente, a renda mensal

(CULTIVANDO ÁGUA BOA, 2013).

4Além de um projeto ambiental, o CAB é um movimento de participação permanente, que envolve a atuação de aproximadamente dois mil parceiros, dentre órgãos governamentais, ONGs, instituições de ensino, cooperativas, associações comunitárias e empresas. Interessante ponderar que a Itaipu usou uma estratégia muito inteligente, envolvendo a sociedade e demais segmentos em prol dos objetivos, assim se tornam responsáveis e cuidadores do Lago para a empresa.

Segundo a Itaipu, muitas foram as ações que beneficiaram os pescadores,

como:

•Compatibilização da faixa de preservação permanente que protege as margens do reservatório com a atividade pesqueira, o programa obteve o devido licenciamento junto ao IBAMA. São 63 pontos de pesca licenciados; •Disponibilização de mais de 500 tanques-rede às colônias de pescadores para o cultivo de peixes (piscicultura), juntamente com um trabalho de capacitação e orientação técnica. •Produção de mais de 50 mil peixes juvenis da espécie pacu, para povoamento dos tanques-rede. •Capacitação de mais de 650 pescadores e suas famílias. •Edição e distribuição de mais de 2 mil exemplares da cartilha Boas Práticas de Manejo em Aquicultura. •Demarcação e licenciamento de três parques aquícolas, que juntos têm potencial para produzir mais de 6 mil toneladas de peixe por ano. •Estruturação e manutenção de uma estação de pesquisa com 70 tanques-rede no Refúgio Biológico Santa Helena, por meio de um convênio entre Itaipu, Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste – campus de Toledo) e a Seap. •Adequação de 15 pontos de pesca com módulo de uso coletivo, com o objetivo de proporcionar melhores condições de higiene e limpeza para o manejo do pescado. As prefeituras participaram com a instalação da rede de água, enquanto a energia elétrica foi viabilizada pelo programa Luz para Todos, do Governo Federal.5

Apesar de o programa demonstrar inúmeros resultados positivos na visão da

Itaipu, muitos pescadores relatar que a realidade é outra, ao adotar essa prática de

criação de peixes, ficaram impossibilitados de praticar a pesca extrativista (preferida

pelos pescadores) como antes da formação do Lago, e, ainda a criação exige muito

tempo e possui custo alto. Além disso, o projeto foi imposto sem discussão e aprovação

dos pescadores. “A Itaipu ajudaria os pescadores de verdade se soltasse mais alevinos

no lago e, se não baixassem as águas, parece que sempre baixa na piracema, quando o

peixe se reproduz” diz o pescador SP.

A Itaipu, com suas práticas, segue com o discurso e tenta mostrar sua

preocupação com a preservação do meio-ambiente e a solução de problemas sociais da

pesca:

A grande inovação foi apresentar aos pescadores o processo de cultivo de peixes, uma alternativa sustentável à pesca extrativista. É um programa que

5 CULTIVANDO Água Boa. Disponível em: <http://www.cultivandoaguaboa.com.br/>. Acesso em: 21

dez. 2013.

promove a inclusão social, valoriza os pescadores e melhora a qualidade de vida daqueles que tiram o sustento das águas. “De quebra a população toda da região passou a contar com maior produção pesqueira” (destaque nosso) o que tornou esse importante alimento, de alto valor nutritivo, mais acessível aos consumidores.6

Constata-se aqui a preocupação com a causa dos pescadores, mas aliada ao

aumento da produção e consumo do pescado, indicando que o projeto tanque-rede está

inserido numa dinâmica industrial capitalista. Portanto, os objetivos da estatal visam

promover a industrialização do pescado na região.

Os pescadores relatam que existem pressões políticas, em especial, as oriundas

da Itaipu, cujas orientações de seu plano produtivo desprezam a forma de trabalho do

pescador artesanal profissional, desqualificando seu modo de trabalho - seja nas formas

de relações de trabalho, captura ou manejo – e induzindo-o a enquadrar-se na ocupação

de aquicultor. Apesar de todo o estudo de viabilização do projeto realizado pela Itaipu,

os pescadores relataram participar por falta de opção e de renda na pesca extrativa.

Fica evidente a fragilidade da pesca extrativista, que tenta sobreviver no Lago

de Itaipu, pois os esforços estão centrados na aquicultura. Mesmo frente às investidas da

Itaipu pela produção de peixe (aquicultura), que revela um novo foco de modernização

na pesca e, talvez, uma violência simbólica contra os pescadores e seu modo de vida,

estes tentam manter os traços tradicionais da pesca e as relações intergrupo. Ficou

explícito em muitas entrevistas e relatos, que os pescadores preferiam pescar, extrair do

Lago seu sustento, porém pela instabilidade do estoque é preciso criar meios para

sobreviver como os tanques-rede. A foto a seguir mostra esses tanques-rede no lago, e o

pescador trabalhando na atividade.

Figura 2: Tanques-rede no Lago de Itaipu

6CULTIVANDO Água Boa. Disponível em: <http://www.cultivandoaguaboa.com.br/>. Acesso em: 21

dez. 2013.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2012.

Toda essa lógica de extração e produção de peixes está ligada ao processo de

comercialização, que se analisa a partir de agora. Para essa análise foram utilizadas as

informações colhidas durante as observações e entrevistas, além de levantamentos de

outros estudos sobre a pesca no reservatório e, o relatório da UEM/NUPÉLIA/ITAIPU.

Segundo o SEBRAE, o processo de criação e industrialização do pescado teve

início no Estado do Paraná: “O Estado pioneiro foi o Paraná, que imprimiu um ritmo

empresarial à atividade, estruturando a produção. Começaram a surgir os primeiros

frigoríficos específicos para o beneficiamento da tilápia, nos municípios de Toledo e

Assis Chateaubriand”.7

Segundo Sanfelice (2012) existem sete (7) frigoríficos em funcionamento na

Mesorregião Oeste e, o peixe mais produzido para o abate é a tilápia. Segundo

levantamento realizado, o pescado abatido nos frigoríficos é fruto da atividade criatória

de tanque-rede e tanque-terra (escavado) e não da pesca extrativista. Em São Miguel do

Iguaçu o frigorifico não compra peixe dos pescadores artesanais devido a instabilidade

do pescado. Existe ainda existe a transformação do peixe pacu em polpa, destinado para

a merenda escolar, mas atualmente no município essa atividade não ocorre devido a

inexistência de Inspeção sanitária:

A produção de polpa de pacu deriva da produção/cultivo de peixes pacus em tanque-rede, no Lago de Itaipu. São produtores, pescadores e piscicultores cadastrados no Programa Nacional de Fortalecimento à Agricultura Familiar

7 SEBRAE. Disponível em: http: <//www.biblioteca.sebrae.com.br/bdsBDS.nsf/pdf>. Acesso em: 13

maio 2013.

(Pronaf), pelas Colônias e Associações dos Municípios Lindeiros. Os mentores estão em conversação com os prefeitos para que o produto seja incluído definitivamente na merenda das escolas.8

Esse modelo de produção (tanques-rede) projetado pela Itaipu traz consigo uma

série de problemas. Segundo relato dos pescadores a criação do pacu em tanques-rede

não foi bem sucedida, os resultados não agradam devido à conversão (engorda) de o peixe

ser baixa e, devido ao fato deste possuir muito espinho, o que dificulta a venda. A espécie

de peixe tilápia seria melhor opção financeira, em função de uma rápida e intensa conversão

alimentar.

Em entrevista, a maioria dos pescadores demonstrou insatisfação com a

produção de pacu em tanques-rede, o que causou a desistência dessa produção. Isso

pode ser percebido no relato do pescador da Colônia Z11.

“Olha eu tive tanque rede, mas eu gastava tudo em comida. Tive que pegar dinheiro

emprestado para paga ração e comida, era todo dia cozinhar a lavagem deles e levar lá, ai nem dava tempo de pescar no lago. Quando vendi o peixe, que muitos nem gostam, faltou o dinheiro que emprestei...acredita...Eu nem quero mais tanque rede, só se fosse de tilápia, que os cara da Itaipu falaram que ele come menos e engorda mais.”9 Para os pescadores a melhor opção seria criar a tilápia, porém, por se tratar de

uma espécie exótica, não é permitida no Lago. Existe um tratado bilateral entre os países,

Brasil e Paraguai, tendo como meta preservar as espécies nativas, a tilápia é considerada um

peixe invasor. Os pescadores manifestam-se a favor da criação de tilápias pelo sistema de

tanques-rede em áreas do reservatório, pois a espécie seria mais rentável e aceita por

frigoríficos. A reivindicação dos pescadores é antiga e o projeto não avançava justamente em

função de entraves que estariam do lado paraguaio.

Analisado o circuito de produção e venda do pescado, ficam explícitos muitos

problemas. Além da questão da necessidade de mudar a espécie produzida em tanque

rede, é preciso adequar os 15 módulos de manejo primário do pescado construídos pela

Itaipu.Estes módulos não estão sendo devidamente utilizados pela falta de proximidade

8 PISCICULTORES colocam no mercado a polpa do pacu. Disponível em: <http://www.opresente.com.br/geral/piscicultores-colocam-no-mercado-a-polpa-do-pacu-5114/>. Acesso em: 5 ago. 2012. 9 Entrevista cedida pelo pescador TH em 22/05/2013.

da gestão pública municipal com a atividade da pesca. As prefeituras precisam dar

certificação do produto via Vigilância Sanitária e isso não está acontecendo.

Segundo a Itaipu, o objetivo do tanque-rede é proporcionar condição de

complementação de renda para os pescadores através de uma alternativa de cultivo de

peixe. Entretanto, se o produtor não tiver para quem vender a sua produção, esta será

inviável.

Não existindo comercialização certificada para o peixe, resta a pesca

extrativista um circuito de comercialização bem pequeno. O pescador artesanal se torna

responsável por todo o processo de venda do pescado na grande maioria das vezes, ou

se submete a intermediários que acabam explorando-o.

O relatório da Itaipu/UEM (2011) menciona que atualmente as etapas

envolvidas na comercialização do pescado desembarcado no reservatório de Itaipu

apresentam marcantes variações, tanto no número de intermediários, entre o pescador e

o consumidor, como na importância que cada sujeito representa no processo (volume

comercializado).

Primeiramente, é relevante considerar que o consumo de pescado entre os

pescadores e seus familiares é muito frequente. Todos se valem do pescado em suas

refeições, pelo menos uma vez por semana. O pescado destinado à alimentação dos

pescadores e familiares pertence a categorias variadas, porém, sempre de baixo valor

comercial.

O pescador comercializa parte da produção com os atravessadores10, e parte

vende direto aos consumidores, denominada “picado”. O pescador atua como vendedor

ambulante, percorrendo o trajeto de bicicleta. Alguns colocam anúncio em frente a sua

casa, realizando as vendas em seu próprio domicílio. É frequente, também, a venda nos

pontos de desembarque.

A pesca na Colônia Z11 está com os circuitos de comercialização fragilizados,

pela escassez de peixe, pela inviável criação de pacu, pelo abandono do poder público

municipal, por não fornecer o SIM (Sistema de Inspeção Municipal), impossibilitando o

consumo na merenda escolar e a venda no comércio local de forma regularizada ou

10 Atravessador se refere ao indivíduo que compra o pescado do lago e revende na cidade.

ainda em frigorífico. Assim observam-se nos mercados locais peixes oriundos de outros

lugares, enquanto poderia ser vendido o peixe do Lago de Itaipu se estivesse

regularizada a venda.

O descaso dos gestores políticos públicos como prefeito e vereadores no

município é notável. Restando aos pescadores lutar unidos com a Colônia pelas

melhorias necessárias para garantir seu modo de vida e estruturar um circuito de

extração e produção pesqueira satisfatório.

3. Considerações finais

Pelo estudo percebe-se que, os embates políticos são muitos, principalmente

entre interesses estatais e dos pescadores.

No jogo de interesses presentes no Lago de Itaipu, percebeu-se as intenções da

Itaipu em desenvolver projetos idealizados em função da busca pela sustentabilidade

econômica e ambiental. Mas na realidade, é pertinente para a Itaipu a existência dos

pescadores, pois estes se tornam cuidadores do lago enquanto vivem nele.

Quanto a criação de peixe em tanques-rede, projeto incentivado pela Itaipu visa

a produção em quantidade, porém os pescadores, em sua maioria, preferem extrair o

pescado mantendo seu modo de vida, não criar o pescado, mas, pela falta de estoque

natural no reservatório e pela necessidade econômica, acabam realizando a atividade.

Outro embate se refere aos circuitos da comercialização da pesca que estão

fragilizados. A Colônia Z11 busca a criação do Sistema de Inspeção Municipal em São

Miguel do Iguaçu, convênios com a Prefeitura Municipal e luta pela liberação de peixes

do gênero Tilapia para a venda em frigorífico.

Um dos graves problemas da pesca artesanal é o estoque natural de peixe e a

questão da rede de comercialização deste produto, que em geral é realizada com a

presença de intermediários e que se apropriam da renda dos pescadores artesanais. É

preciso fazer com que a cadeia de produção se estruture no sentido de capacitar e

fortalecer os pescadores artesanais. Com mais autonomia no processo produtivo, os

pescadores teriam condições de vida mais dignas.

No entanto depara-se com uma realidade difícil, a escassez do pescado no

Lago, o que promove uma política divergente dos anseios do modo de vida artesanal.

Do ponto de vista da pesca, a execução de políticas (principalmente o projeto

Mais Peixes em Nossas Águas) preveem a organização e a modernização do setor no

Lago e na Colônia, estariam em busca da produtividade, onde os pescadores artesanais

são levados a enxergá-la como alternativa adequada (geralmente única) para a resolução

do problema, numa tentativa de disciplinar o pescador para a atividade criatória de

peixe, mesmo o pescador do Lago preferindo extrair o pescado do reservatório.

Os pescadores artesanais do Lago de Itaipu, da Colônia Z11 estão inseridos em

um contexto de mudanças na pesca contemporânea− mudanças marcadas pelo avanço

do capitalismo, e que acabam sendo aceitas pela condição do pescador, pois sem

pescado não pode ficar.

Isso demonstra uma realidade nacional presente no Lago de Itaipu, de fomento

à aquicultura e à pesca industrial e, que estaria, “sob um viés produtivista, legitimado

tanto pela necessidade de formalização do emprego dos trabalhadores que já se

encontram nessas atividades, quanto para os pescadores artesanais, que são levados a

enxergá-las como alternativa adequada (geralmente, única) de emprego e renda”

(Valencio et al, 2003, p. 283).

4. Referencias Bibliográficas CULTIVANDO ÁGUA BOA. Disponível em:

<http://www.cultivandoaguaboa.com.br/>. Acesso em: 21 dez. 2013. ENTREVISTA COM PESCADORES. 2013. HAESBAERT, Rogério. Territórios Alternativos. 2. Ed. São Paulo: Contexto, 2006. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidades> Vários acessos. INCENTIVO A AQUICULTURA. ITAIPU Disponível em: <https://i3gov.planejamento.gov.br/textos/livro2/2.4_Incentivo_a_aquicultura.pdf>. Acesso em: 5 maio 2013.

PISCICULTORES colocam no mercado a polpa do pacu. Disponível em: <http://www.opresente.com.br/geral/piscicultores-colocam-no-mercado-a-polpa-do-pacu-5114/>. Acesso em: 5 ago. 2012. RIBEIRO, Maria de Fátima Bento. Itaipu, a dança das águas: histórias e memórias de 1966 a 1984. Tese de Doutorado em História. Campinas, 2006. SEBRAE. Disponível em: http: <//www.biblioteca.sebrae.com.br/bdsBDS.nsf/pdf>.

Acesso em: 13 maio 2013. UEM/NUPÉLIA/ITAIPU BINACIONAL. Monitoramento do Rendimento e da Socioeconômica da pesca no Reservatório de Itaipu. Relatório Geral de 2009. Por A. A. Agostinho et al, Maringá, 2011. 234 p. VALENCIO, N. F. L. da S. et al. Da tarrafa ao tanque-rede: o processo político-institucional de extinção de uma categoria de trabalhadores das águas Uso e gestão dos recursos hídricos no Brasil: desafios teóricos e político-institucionais. São Carlos: Editora Rima. 2003. 271-293.


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