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O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E AS FUNÇÕES ... - Bahia

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126 Estudos IAT, Salvador, v.5, n.1, p. 6-15, abr., 2020. http://estudosiat.sec.ba.gov.br O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E AS FUNÇÕES EXECUTIVAS: CONTRIBUIÇÕES DA NEUROPSICOLOGIA NA COMPREENSÃO DO TRANSTORNO AUTISTIC SPECTRUM DISORDER AND EXECUTIVE FUNCTIONS: CONTRIBUTIONS OF NEUROPSYCHOLOGY TO UNDERSTANDING DISORDER ___________________________________________________________________ Diana Maria Pereira Cardoso Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Pedagoga; Psicóloga; Especialista em Psicopedagogia, em Educação Especial, em Neuroeducação e em Neuropsicologia. E-mail: [email protected] Bruno Penas Seara Pitanga Doutor e Mestre na área de Neurociência, pela Universidade Federal da Bahia; Graduado em Ciências biológicas e Docente da FSBA. E-mail: [email protected] RESUMO O presente estudo consiste em uma revisão bibliográfica sobre as funções executivas em crianças e/ou adolescentes com Transtorno do Espectro Autista (TEA), cujo objetivo foi verificar, na literatura científica, quais componentes das funções executivas são abordados nas pesquisas realizadas com crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista, destacando quais das características do transtorno sugerem relação com as funções executivas. O estudo foi realizado a partir de revisão bibliográfica e de outras fontes de pesquisa publicadas pela BVS Psicologia Brasil e BVS em Saúde, na base de dados INDEXPSI e LILACS, pelo Repositório Institucional da UFBA e pelo Repositório Digital Institucional da UFPR, no período de 2014 a 2016, no Brasil e em países da América Latina. Os resultados sustentam a hipótese de que as funções executivas estão prejudicadas nas crianças e adolescentes com TEA, principalmente nos componentes executivos: flexibilidade cognitiva, controle inibitório, atenção seletiva, planejamento, fluência verbal e baixo desempenho no componente visuoespacial da memória de trabalho. Além disso, os resultados sugerem relação com os padrões restritos e repetitivos de comportamento abordados pelo Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM 5. Tendo em vista a importância do tema, é preciso desenvolver mais estudos empíricos sobre o funcionamento das funções executivas em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista. Palavras-chave: Funções executivas. Crianças. Adolescentes. Transtorno do Espectro Autista. ABSTRACT This study consists of a bibliographic review of the executive functions in children and/or teenagers with Autism Spectrum Disorder (ASD), which aimed to verify in the scientific literature which components of executive functions are addressed in the research conducted with children and adolescents with autism spectrum highlighting which of the characteristics of the disorder suggest a relation with the executive functions. The study was carried out based on a bibliographical review and other research sources published by BVS Psicologia Brasil and BVS in Health in the
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Estudos IAT, Salvador, v.5, n.1, p. 6-15, abr., 2020. http://estudosiat.sec.ba.gov.br

O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E AS FUNÇÕES EXECUTIVAS: CONTRIBUIÇÕES DA NEUROPSICOLOGIA NA COMPREENSÃO DO

TRANSTORNO

AUTISTIC SPECTRUM DISORDER AND EXECUTIVE FUNCTIONS: CONTRIBUTIONS OF NEUROPSYCHOLOGY TO UNDERSTANDING DISORDER ___________________________________________________________________

Diana Maria Pereira Cardoso Doutora e Mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia, Pedagoga; Psicóloga;

Especialista em Psicopedagogia, em Educação Especial, em Neuroeducação e em Neuropsicologia. E-mail: [email protected]

Bruno Penas Seara Pitanga

Doutor e Mestre na área de Neurociência, pela Universidade Federal da Bahia; Graduado em Ciências biológicas e Docente da FSBA. E-mail: [email protected]

RESUMO O presente estudo consiste em uma revisão bibliográfica sobre as funções executivas em crianças e/ou adolescentes com Transtorno do Espectro Autista (TEA), cujo objetivo foi verificar, na literatura científica, quais componentes das funções executivas são abordados nas pesquisas realizadas com crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista, destacando quais das características do transtorno sugerem relação com as funções executivas. O estudo foi realizado a partir de revisão bibliográfica e de outras fontes de pesquisa publicadas pela BVS Psicologia Brasil e BVS em Saúde, na base de dados INDEXPSI e LILACS, pelo Repositório Institucional da UFBA e pelo Repositório Digital Institucional da UFPR, no período de 2014 a 2016, no Brasil e em países da América Latina. Os resultados sustentam a hipótese de que as funções executivas estão prejudicadas nas crianças e adolescentes com TEA, principalmente nos componentes executivos: flexibilidade cognitiva, controle inibitório, atenção seletiva, planejamento, fluência verbal e baixo desempenho no componente visuoespacial da memória de trabalho. Além disso, os resultados sugerem relação com os padrões restritos e repetitivos de comportamento abordados pelo Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM 5. Tendo em vista a importância do tema, é preciso desenvolver mais estudos empíricos sobre o funcionamento das funções executivas em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista. Palavras-chave: Funções executivas. Crianças. Adolescentes. Transtorno do Espectro Autista. ABSTRACT This study consists of a bibliographic review of the executive functions in children and/or teenagers with Autism Spectrum Disorder (ASD), which aimed to verify in the scientific literature which components of executive functions are addressed in the research conducted with children and adolescents with autism spectrum highlighting which of the characteristics of the disorder suggest a relation with the executive functions. The study was carried out based on a bibliographical review and other research sources published by BVS Psicologia Brasil and BVS in Health in the

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database INDEXPSI and LILACS, by the Institutional Repository of UFBA and by Institutional Digital Repository of UFPR, from 2014 to 2016 in Brazil and in Latin American countries. The results support the hypothesis that executive functions are impaired in children and adolescents with ASD, especially in the executive components: cognitive flexibility, inhibitory control, selective attention, planning, verbal fluency and low performance in the visuospatial component of working memory. In addition, the results suggest a relationship with the restricted and repetitive patterns of behavior addressed by DSM 5. Considering the importance of the topic, it is necessary to develop further empirical studies on the functioning of executive functions in children and adolescents with autism spectrum disorder. Keywords: Executive functions. Children. Teenagers. Autistic Spectrum Disorder.

INTRODUÇÃO

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um dos transtornos do

neurodesenvolvimento caracterizado por comprometimento significativo na interação

social, associado à déficit na comunicação verbal e não verbal, bem como

manifestações clínicas relacionadas a padrões restritos e repetitivos de

comportamentos estereotipados, inflexíveis, direcionados a interesses, atividades e

ações específicas e rotineiras (APA, 2014). Essas dificuldades estão presentes em

múltiplos contextos, podendo ser manifestadas atualmente ou por histórias prévias,

ocasionando, ao longo da vida do indivíduo, prejuízos no funcionamento pessoal,

familiar, acadêmico, social e profissional.

A partir da 5ª edição do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos

Mentais, DSM 5, os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD), categoria

utilizada pela 4ª edição revisada do manual, DSM-IV-TR, passaram a ser

denominados apenas como Transtorno do Espectro Autista (TEA). Isto é, o que

antes era designado como transtorno autista, transtorno de Rett, transtorno

desintegrativo da infância, transtorno de Asperger e transtorno global do

desenvolvimento, sem outra especificidade (incluindo autismo atípico), passaram a

ser classificados como TEA, exceto a síndrome de Rett (APA, 2014). A falta de

uniformidade clínica e o grau de comprometimento dos sintomas presentes nos

indivíduos representam a diversidade do transtorno através do termo espectro.

O TEA se manifesta na infância em idade muito precoce, entretanto, há casos

em que os sinais de atraso ou estagnação do desenvolvimento sugestivos para o

transtorno se tornam perceptíveis no primeiro ano de vida, por volta de 1 ano e 8

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meses. Visando a identificação precoce dos sinais do TEA no Brasil, a partir de

2017, torna-se obrigatória a adoção de protocolos pelo Sistema Único de Saúde

(SUS) que estabeleça padrões para a detecção do transtorno, conforme descrito no

5º parágrafo da Lei nº 13.438, de 26 de abril de 2017:

É obrigatória a aplicação a todas as crianças, nos seus primeiros dezoitos meses de vida, de protocolo ou outro instrumento construído com a finalidade de facilitar a detecção, em consulta pediátrica de acompanhamento da criança, de risco para o seu desenvolvimento psíquico (BRASIL, 2017 [sem paginação].

É importante destacar que, antes dessa Lei ser publicada no Brasil, Guilhardi

et al. (2011) já discutiam a importância da identificação precoce dos primeiros sinais

de autismo, a fim de possibilitar à criança uma intervenção precoce.

Na literatura brasileira, o percentual de crianças diagnosticadas com esse

transtorno, em uma amostra de 1.470 crianças, na idade entre 7 a 12 anos, é

equivalente a 0,3% (PAULA et al. 2011, apud CZERMAINSKI et al., 2014).

Especialmente no estado da Bahia, com base no Censo Escolar de 20151, o número

de alunos com TEA matriculados em escolas regulares das redes pública e privada

de ensino corresponde a um quantitativo de 2.111 alunos, sendo 536 matriculados

na educação infantil, 1.484 no ensino fundamental, 24 no ensino médio e 67 na

educação de jovens e adultos. Na cidade de Salvador, o número de alunos com TEA

matriculados no ensino fundamental corresponde a 309, sendo 93 alunos

distribuídos nas escolas privadas, 200 nas escolas da rede municipal de ensino e 16

nas escolas da rede estadual (BRASIL, 2016 apud CARDOSO, 2016).

Até hoje não se tem certeza do que realmente possa desencadear na criança

o TEA, entretanto, além dos estudos que investigam a influência de fatores

genéticos, ambientais e neuropsicológicos associados ao autismo, também existem

teorias cognitivas, tais como a teoria da mente, a teoria da coerência central e a

teoria das funções executivas, que tentam explicar a relação entre o funcionamento

do cérebro de indivíduos com TEA e os prejuízos relacionados à comunicação e à

interação social e aos padrões restritos e repetitivos de comportamento

característicos do transtorno. Entre os anos 80 e 90 e até hoje, vários estudos

1 BRASIL. Censo Escolar – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Disponível em: <http://portal.inep.gov.br/básica-censo>. Acesso em: 12 abr. 2016.

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sugerem relação entre as dificuldades enfrentadas pelas crianças e adolescentes

com TEA e o comprometimento das funções executivas (SURIAN, 2010; BOSA,

2001). Com relação às funções executivas, de acordo com Talero-Gutiérrez et al.

(2015), as habilidades comprometidas no TEA são: flexibilidade cognitiva,

capacidade de planejamento, controle inibitório, bem como, memória de trabalho.

No sentido de aprofundar mais sobre o tema em questão, foi feita uma revisão

da literatura publicada no Brasil e em países da América latina, entre os anos de

2014 a 2017. No entanto, é importante destacar que não foram encontrados estudos

empíricos produzidos em 2017. Assim, a intenção deste estudo foi averiguar quais

são os componentes das funções executivas abordados nas pesquisas realizadas

com crianças e adolescentes que apresentam o TEA e, a partir dos achados,

destacar quais das características do transtorno sugerem relação com as funções

executivas.

O presente estudo foi estruturado em cinco capítulos: além desta introdução,

que constitui o primeiro capítulo, tem-se, no segundo capítulo, a exposição da

metodologia adotada; o capítulo 3 refere-se à etiologia do transtorno autista; o

capítulo 4 aborda as características do TEA à luz das três teorias cognitivas: teoria

da mente, teoria da coerência central e teoria das funções executivas; no capítulo 5,

serão apresentados e discutidos os resultados de quatro estudos empíricos

produzidos no Brasil e em países da América Latina no período de 2014 a 2016; e,

por fim, no capítulo 6 são expostas as considerações finais.

METODOLOGIA

A pesquisa bibliográfica foi conduzida em dois momentos, o primeiro se

constituiu em uma revisão ampla da literatura, por meio da leitura de artigos

científicos, teses, dissertações, monografias e capítulos de livros que abordaram

sobre a etiologia do TEA, as teorias cognitivas que tentam explicar e compreender o

funcionamento cognitivo de indivíduos que apresentam esse transtorno, bem como,

averiguar, através das publicações, o que se tem investigado a respeito das funções

executivas envolvendo crianças e adolescentes com TEA.

No segundo momento, foi feita uma busca realizada pela BVS Psicologia

Brasil e pela BVS em Saúde, através dos termos: “funções executivas autismo” e

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“función ejecutiva autismo”. Foram localizados, na base de dados LILACS, o estudo

latino-americano do autor Talero-Gutiérrez et al. (2015) e, na base de dados

INDEXPSI, o estudo brasileiro dos autores Czermainski et al. (2014). No Repositório

Institucional da UFBA, foi encontrada a tese escrita por Cardoso (2016) e, no

Repositório Digital Institucional da UFPR, a dissertação elaborada por Gonçalves

(2014).

Como critérios de escolha, foram selecionados artigos com acesso completo,

disponibilizados sem custo e estudos publicados no Brasil e em países da América

Latina, envolvendo crianças e/ou adolescentes com TEA, realizados no período de

2014 a 2016. Vale ressaltar que, em 2017, até a presente data da realização desta

pesquisa, não foi encontrado nenhum estudo relacionado às funções executivas

envolvendo a população referida.

Em seguida, foi feita uma leitura detalhada dos quatro estudos selecionados

no intuito de verificar quais componentes das funções executivas são abordados nas

pesquisas realizadas com crianças e/ou adolescentes que apresentam diagnóstico

de transtorno do espectro autista, destacando quais das características do

transtorno sugerem relação com as funções executivas.

Considerando as bases de dados consultadas, a análise foi feita a partir da

leitura de uma tese, uma dissertação e de dois artigos científicos, um do Brasil e

outro da Colômbia. Deste modo, o presente artigo pôde trazer uma revisão da

literatura sobre funções executivas envolvendo crianças e/ou adolescentes com

TEA.

Atendendo ao objetivo deste estudo, seguem os capítulos que constituem o

referencial teórico, seguido dos resultados e discussões e, por fim, as considerações

finais.

ETIOLOGIA DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: O QUE OS ESTUDOS REVELAM?

Encontrar uma única explicação para o TEA é o desejo de pais e de todos os

profissionais que trabalham com crianças e adolescentes que apresentam esse

transtorno. Ao longo do tempo, a ciência proporcionou alguns avanços sobre o

transtorno, entretanto, saber o que realmente causa o autismo e o que determina a

diversidade do grau de comprometimento e a variabilidade dos comportamentos nos

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indivíduos acometidos ainda é algo a ser descoberto e representa um grande

desafio para os pesquisadores que há anos se debruçam em pesquisar sobre o

transtorno.

O TEA é um transtorno multifatorial resultante de diversos fatores

relacionados, tais como: genéticos, ambientais e neurobiológicos. Sendo o TEA um

transtorno multifatorial, afasta a possibilidade de o transtorno ser desencadeado por

uma única etiologia e reforça a complexidade e a variabilidade das apresentações

clínicas em relação aos déficits de comunicação e interação social, bem como,

comportamentos, interesses e atividades restritas e repetitivas.

No que tange aos fatores genéticos, estudos sugerem fortes evidências de

bases genéticas para o TEA, no entanto, ainda é um enigma encontrar um gene

específico do autismo (ASSUMPÇÃO JÚNIOR; KUCZYNSKI, 2015). Durante

décadas, investigar a etiologia do TEA tem sido um desafio constante para os

pesquisadores que tentam esclarecer a genética do autismo.

Quanto aos fatores ambientais, em estudo de revisão realizado por Posar e

Visconti (2016), foram encontradas evidências científicas que sugerem como

hipótese a associação entre a poluição atmosférica e o autismo. São esses os

estudos que corroboram com essa hipótese, abordados por esses dois autores:

Volk et al. (2013) concluíram que, a gravidez e o primeiro ano de vida são

períodos críticos, pois, a exposição à poluição atmosférica relacionada ao

tráfego, dióxido de nitrogênio, MP2,5 e MP10, podem estar associados ao

autismo.

Os resultados do estudo desenvolvido por Jung et al. (2013) sugerem que a

exposição das crianças, entre 1 a 4 anos de idade, aos quatro poluentes

(ozônio, monóxido de carbono, dióxido de nitrogênio e dióxido de enxofre)

pode aumentar o risco de desenvolvimento de TEA.

Robert et al. (2013) concluíram que a exposição a poluentes atmosféricos

durante o período perinatal, como partículas de diesel, chumbo, manganês,

níquel e cádmio podem aumentar o risco de desenvolver o TEA e sugerem

estudos que possam investigar a associação entre cada gênero, pois foi

encontrado um número mais significativo de poluentes no gênero masculino

que no feminino.

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Von Ehrenstein et al. (2014), ao investigarem os riscos de autismo

relacionados à exposição a poluentes atmosféricos monitorados durante a

gravidez, concluíram que os riscos poderão aumentar após a exposição do

útero a tóxicos do ar atmosférico relacionados aos poluentes do tráfego e aos

poluentes industriais, a exemplo de chumbo, solventes aromáticos,

percloroetileno e formaldeído.

Talbott et al. (2015) concluíram que a exposição ao MP2,5 nos períodos pré-

natal e pós-natal na primeira infância, está relacionada ao aumento de risco

de TEA.

Dickerson et al. (2015) averiguaram que há, hipoteticamente, uma relação

entre a prevalência de TEA e a proximidade residencial das instalações

industriais que emitem poluentes atmosféricos, tais como arsênio, chumbo ou

mercúrio, pois constataram maior número de casos de TEA.

Kalkbrenner et al. (2015) verificaram que a exposição a MP10 proveniente de

tráfego, fumaça de madeira e usinas de energia durante o terceiro trimestre, e

não no início da gestação, tende a desencadear um risco maior da criança vir

a desenvolver o autismo.

Os estudos de Raz et al. (2015) também estabelecem associação entre

poluentes atmosféricos e TEA. Esses autores verificaram que durante a

gravidez, especialmente no terceiro semestre, uma exposição maior da

gestante ao MP2,5 aumenta as chances de a criança desenvolver o TEA.

Apesar de o número de estudos ainda serem insuficientes e faltarem dados

conclusivos que confirmem a ocorrência e prevalência de casos de TEA, os

resultados sugerem relação entre fatores ambientais e o autismo e mostram o

quanto é importante e necessária uma atmosfera saudável do ar para o

desenvolvimento benéfico das crianças e gestantes.

Além dos poluentes atmosféricos, Posar e Visconti (2016) abordaram também

estudos que associaram o TEA a outros fatores ambientais, como os desreguladores

endócrinos, presentes na maioria dos produtos domésticos e industriais,

principalmente os pesticidas, no entanto, não há resultados conclusivos sobre essa

relação, apesar de os estudos terem corroborado. Enfim, os autores sustentaram a

hipótese de que os desreguladores endócrinos causaram um aumento no risco de

TEA, no entanto, ainda se mostra necessária a confirmação experimental.

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Na década de 80, quando não se tinha acesso aos recursos tecnológicos e

aos exames de neuroimagem, a exemplo da ressonância magnética, da tomografia

computadorizada, dentre outros mais sofisticados e sensíveis às informações sobre

o cérebro de indivíduos com TEA, os dados eram obtidos por meio de estudos

realizados post-mortem, o que limitava o número da amostra e restringia a

compreensão do transtorno.

Damásio e Maurer (1979) foram os primeiros pesquisadores a descreverem

as inúmeras estruturas cerebrais comprometidas no TEA, como: o lobo frontal, o

lobo temporal, os gânglios da base e o tálamo. Além destas áreas, estão envolvidas

também outras estruturas cerebrais, como: a amígdala, o hipocampo e o cerebelo

(GIRODO, NEVES, CORREIA, 2008; PEREIRA, 2007).

Em estudo realizado por Ecker (2017), crianças com TEA, entre as idades de

2-4 anos, apresentam alterações, do tipo: volume cerebral ampliado

(COURCHESNE, 2002, HAZLETT et al., 2005 apud ECKER, 2017), circunferência

da cabeça aumentada (LAINHART et al., 1997 apud ECKER, 2017), persistindo até

5-6 anos de idade (COURCHESNE et al., 2001). Os estudos longitudinais apontam

para o aumento no volume cerebral durante o desenvolvimento inicial e diminuição

significativa na fase da adolescência e da idade adulta (LANGE et al., 2015 apud

ECKER, 2017).

No tocante à neuroanatomia do TEA, as evidências científicas revelaram um

desenvolvimento cerebral atípico, comparado aos indivíduos típicos, que não

apresentam o transtorno. Esse dado foi percebido através de estudos longitudinais

realizados em indivíduos com TEA que detectaram crescimento excessivo do

cérebro durante o desenvolvimento inicial, seguido de diminuição ou crescimento

interrompido durante a infância, ocorrendo diminuição significativa em todo o volume

cerebral na fase da adolescência e na vida adulta (LANGE et al., 2015 apud ECKER,

2017).

Nesse sentido, Hazlett et al. (2011 apud ECKER, 2017) detectaram um

aumento no volume geral do cérebro de 5% em crianças de 2 a 4 anos de idade.

Esta mesma pesquisadora cita também o estudo de Lainhart et al. (1997) para

referir-se ao aumento da circunferência da cabeça de crianças com TEA em idade

de 5-6 anos.

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De acordo com Amaral et al. (2008 apud ECKER., 2017), os estudos de

neuroimagem possibilitaram compreender melhor o cérebro da pessoa com TEA,

assim, puderam perceber que não é apenas uma única região envolvida, pelo

contrário, as anormalidades estruturais ocorrem em vários sistemas neurais, tais

como:

Regiões do sistema límbico como: amígdala, hipocampo, tálamo e as regiões

cinguladas.

Regiões fronto temporal e fronto parietal, como o córtex medial, orbtofrontal,

frontal inferior, córtex parietal superior, sulco temporal superior e giro

fusiforme.

Circuito fronto-estriatal, incluindo partes dos gânglios basais, córtex cingulado

anterior, córtex pré-frontal dorsolateral e o cerebelo.

A Figura 1 ilustra algumas das regiões do cérebro que estão alteradas no

indivíduo com TEA. Figura 1 – Regiões cerebrais alteradas no indivíduo com TEA

Fonte: Pinterest (2016)2.

Quanto aos dados neurobiológicos, estudos revelam a presença de maior

quantidade de líquido cefalorraquidiano em bebês de 6-9 meses (SHEN et al., 2013,

apud ECKER, 2017).

O aumento do volume de substância branca também foi encontrado em

cérebro de pessoas com TEA (CARPER et al., 2002; HAZLETT et al., 2005;

SCHUMNN et al., 2010, apud ECKER., 2017).

2 Disponível em: <http://docplayer.com.br/docs-images/14/51410/images/16-0.jpg>. Acesso em: 10 nov. 2017.

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Apesar dos avanços obtidos ao longo de várias décadas, ainda há muito a ser

descoberto sobre a complexa interação entre os fatores genéticos, ambientais e

neurobiológicos, pois o que se têm publicado, até o presente momento, são dados

obtidos através de estudos científicos que suscitam hipóteses que tentam explicar a

etiologia do TEA.

No sentido de compreender o TEA, o próximo capítulo aborda as teorias

cognitivas que tentam explicar os déficits relacionados à interação social e à

comunicação, bem como, os padrões restritos e repetitivos de comportamento

relacionados a esse transtorno.

UM OLHAR DAS CARACTERÍSTICAS DO TEA À LUZ DAS TEORIAS COGNITIVAS: TEORIA DA MENTE, TEORIA DA COERÊNCIA CENTRAL E TEORIA DAS FUNÇÕES EXECUTIVAS

Quanto às teorias cognitivas ou neuropsicológicas que tentam explicar os

comportamentos que caracterizam o transtorno, foram destacadas, neste estudo,

três: teoria da mente, teoria da coerência central e teoria das funções executivas.

Cada uma dessas teorias tenta esclarecer alguns dos comportamentos

presentes nos indivíduos com TEA, no entanto, não há uma única teoria que

explique de modo absoluto os comportamentos relacionados aos prejuízos de

interação social e comunicação, bem como, os comportamentos repetitivos,

estereotipados e interesses restritos e inflexíveis presentes nos indivíduos que

apresentam esse transtorno.

Para esclarecer melhor esse assunto, foi elaborada uma síntese dessas três

teorias cognitivas. A primeira refere-se à teoria da mente. Esta teoria está

relacionada à habilidade que o ser humano tem de poder fazer a leitura do contexto

social, isto é, compreender a comunicação verbal e não verbal e as diversas formas

do indivíduo expressar sentimentos, desejos, intenções, emoções, pensamentos,

antecipar e prever as próprias intenções e reações e as dos outros (BARON-

COHEM et al., 2011; SURIAN, 2010). Quando essas habilidades estão

comprometidas, há impactos na interação social, pois o indivíduo não consegue

reagir adequadamente às situações presentes no convívio social, tomando

consciência do seu próprio estado emocional, comportamental e das pessoas

envolvidas, dificultando, assim, a interação social.

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Estudiosos ressaltam que essa habilidade começa cedo nas crianças que

apresentam desenvolvimento típico. Por volta dos 3 e 4 anos de idade, as crianças

começam a perceber alguns estados mentais presentes nas outras pessoas, como:

desejos, crenças, intenções e o modo como a pessoa se sente em determinada

situação. Segundo Baron-Cohen et al. (2011), é nessa idade que as crianças

começam a entender que uma determinada emoção pode ser causada por uma

situação ou por um desejo.

Os prejuízos da teoria da mente presentes em crianças com autismo foram

observados por Baron-Cohen, Leslie e Frith por meio do Teste Sally e Anne (1985

apud PADOVANI; MENDOZA; ROSSETTI, 2015). Nesse estudo, além das crianças

com autismo, estiveram presentes as que apresentavam desenvolvimento típico e

Síndrome de Down. Os resultados obtidos nesse experimento levaram os

pesquisadores a sugerirem uma relação entre os prejuízos de socialização das

pessoas com TEA e um déficit de teoria da mente; contudo, concluíram que essa

dificuldade não depende do nível intelectual, pois as crianças com autismo que

participaram da pesquisa possuíam boa capacidade cognitiva. Outro aspecto

presente em indivíduos com TEA, relacionado ao empenho deficitário da teoria da

mente, refere-se ao comprometimento da percepção facial e emocional, as

dificuldades para inferir segundas intenções, compreender olhares, desejos e

condutas de outras pessoas (RUGGIERI, 2015).

Outro estudo realizado por Baron-Cohen e colaboradores citado por Surian

(2010) envolvendo pessoas com TEA refere-se à aplicação do Teste do Olhar que

consistia em visualizar a expressão dos olhos a partir de uma série de fotografias de

semblantes de pessoas. Nesse estudo, os indivíduos com TEA apresentaram baixo

desempenho. Em outro estudo, esses pesquisadores modificaram este teste,

substituindo as fotografias por gravações curtas extraídas de peças de teatro, em

que o indivíduo teria que identificar através de adjetivos qual seria o estado mental

da pessoa que falava. Nesse estudo, as pessoas com síndrome de Asperger

apresentaram desempenho inferior ao grupo controle, pareado com a mesma

capacidade intelectual.

No estudo brasileiro, Assumpção Júnior et al., (1999) perceberam que as

crianças com TEA apresentavam dificuldade na capacidade de percepção das

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expressões faciais, habilidade imprescindível nos relacionamentos sociais e durante

uma conversação.

Cruz, Camargos Júnior e Facchin (2013) dão alguns exemplos de

comportamentos presentes em indivíduos com TEA que, provavelmente, possam

estar relacionados ao déficit da teoria da mente, como, por exemplo: incapacidade

ou dificuldade para perceber os sentimentos e interesses das outras pessoas,

dificilmente sabem ou percebem quando e como devem confortar alguém, expressar

afeto e cooperar com uma pessoa, costumam não demonstrar malícia ao se

aproximarem de pessoas estranhas ou “suspeitas”, não ajustam os seus

comportamentos em relação às expressões afetivas das outras pessoas e

demonstram dificuldade para compreender regras sociais implícitas e explícitas.

Enfim, é importante que o psicólogo e outros profissionais envolvidos conheçam a

teoria da mente para compreender algumas das atitudes e comportamentos

presentes nas crianças com TEA, que possam comprometer a comunicação e a

interação social.

Outra teoria que tenta encontrar explicações para determinados

comportamentos do TEA é a teoria da coerência central. Esta se baseia no foco

atencional, isto é, indivíduos com autismo prestam mais atenção aos detalhes e não

conseguem integrar as partes da informação para formar o todo. Uta Frith foi quem

primeiro levantou a hipótese de que pessoas com TEA têm comprometimento na

coerência central, no entanto, Kanner, na década de 40, já tinha observado em seus

estudos a tendência da criança com autismo em fixar a atenção para partes do

objeto (SURIAN, 2010).

Milne e Szczerbinski (2009) citados por Cruz, Camargos Júnior e Facchin

(2013) mencionam que há duas possibilidades para compreender a teoria da

coerência central, ou seja, se o foco do indivíduo com TEA está direcionado no que

é essencial à tarefa, isto pode revelar uma forte coerência e, se o foco estiver no

detalhe, tende a revelar uma fraca coerência. Deste modo, Milne e Szczerbinski não

mencionam em seus estudos a teoria da coerência central como sendo um déficit,

pois, na opinião desses autores, ter forte ou fraca coerência central pode trazer

vantagens e desvantagens, o que determinará é a situação ou contexto. Os mesmos

exemplificam como sendo vantajosa para os profissionais da área de exatas a

capacidade para focar naquilo que é essencial e, por outro lado, a fraca coerência

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pode trazer prejuízos para o indivíduo com TEA, isto é percebido quando não

consegue abranger o sentido global de um texto, pelo fato de ater apenas no detalhe

sem a compreensão do todo.

Dando continuidade aos trabalhos citados por Cruz, Camargos Júnior e

Facchin (2013), a relação entre a fraca coerência central e o estilo de

processamento visual pode ser vista nos estudos de Kline e colaboradores (2002) e

Schultz e colaboradores (2003), que abordam a dificuldade que os indivíduos com

TEA têm de olhar nos olhos das pessoas e focarem mais na região da boca, sem

considerar o contexto da face, o conjunto de expressões faciais que representa o

todo na situação de comunicação e interação com as pessoas.

A terceira e última teoria neuropsicológica, tema central deste artigo, refere-se

à função executiva, esta teoria diz respeito às habilidades cognitivas complexas e

superiores específicas da espécie humana e envolve vários componentes como:

memória operacional, atenção, planejamento, controle inibitório, flexibilidade

cognitiva, dentre outras habilidades indispensáveis na realização de tarefas do

cotidiano, na aprendizagem e na interação social (BARROS; HAZIN, 2013).

O termo funções executivas surgiu no século XX, foi Muriel Lezak (1982)

quem primeiro utilizou essa terminologia para fazer referência aos quatro domínios

cognitivos: volição (motivação), planejamento, ação intencional, desempenho efetivo

(habilidade de autocorreção, monitoramento e regulação do comportamento)

(UEHARA; CHARCHAT-FICHMAN; LANDEIR-FERNANDEZ, 2013). Esse conceito

surgiu com base nos estudos clínicos realizados com pacientes adultos que

sofreram lesão no lobo frontal, especialmente na região pré-frontal. Deste modo, “os

lobos pré-frontais são considerados como os alicerces neuroanatômicos das funções

executivas” (GILLET, 2015).

Todavia, vale destacar que, antes de Lezak, Luria foi o primeiro

neuropsicólogo a abordar as habilidades cognitivas como atenção, memória,

planejamento, dentre outras habilidades específicas da espécie humana, através do

termo “funções psicológicas superiores” ou “funções mentais superiores” (UEHARA;

CHARCHAT-FICHMAN; LANDEIR-FERNANDEZ, 2013).

Apesar de Luria não ter desenvolvido sua teoria, com base na expressão

“funções executivas”, ele e seus colaboradores descobriram que há uma interação

entre os sistemas funcionais linguísticos e o executivo, ao perceberem que

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pacientes com lesão na região pré-frontal, no momento em que reproduziam

verbalmente as instruções, tendiam a executar a ação corretamente. Para esse

pesquisador, a linguagem exercia uma importante função na atividade cerebral

(LURIA, 1992).

Com o passar dos anos, Russell-Smith e colaboradores (2014 apud

CARDOSO, 2016), desenvolveram um estudo envolvendo 17 crianças com TEA e

18 controles, em que constataram que as crianças com TEA, ao realizarem tarefas

executivas, não utilizavam discurso interior com a mesma eficácia das crianças que

apresentavam desenvolvimento típico. Esse dado sugere pensar que, em virtude

das pessoas com TEA não utilizarem a voz interior para guiar o próprio

comportamento, a habilidade de planejamento fica comprometida, como também, a

capacidade de regular e alternar suas próprias ações, isto é, influencia

negativamente o controle inibitório e a flexibilidade cognitiva, dois dos componentes

executivos importantíssimos e presentes na interação social, no processo de

aprendizagem e em diversas situações do cotidiano.

Para Silva, Gaiato e Reveles (2012, p. 41) as funções executivas “são

processos neurológicos que permitem que a pessoa planeje coisas, inicie uma

tarefa, se controle para continuar na tarefa, tenha atenção e, finalmente, resolva o

problema”.

Malloy-Diniz e colaboradores (2008), por sua vez, definem as funções

executivas como um conjunto de processos e habilidades cognitivas que, de forma

integrada, permitem ao indivíduo direcionar comportamentos a metas, avaliar a

eficácia e a adequação destes comportamentos, abandonar estratégias ineficazes

em prol de outras mais eficientes e, desse modo, resolver problemas imediatos, de

médio e de longo prazo.

Por serem as funções executivas habilidades cognitivas peculiares da espécie

humana e pela importância que o meio exerce, é imprescindível que sejam

disponibilizadas à criança formas variadas de se relacionar com os estímulos

externos, através das vias sensoriais, para que mantenha uma relação com

diferentes registros de conhecimento: linguísticos, visuoespaciais e socioemocionais.

Segundo Gillet (2015 apud CARDOSO, 2016), as habilidades cognitivas que

caracterizam as funções executivas mantêm uma relação estreita com esses três

registros de conhecimento.

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A história do menino selvagem de Aveyron, que viveu etapas importantes do

desenvolvimento infantil no convívio com animais selvagens, é um excelente

exemplo para reforçar o quanto o contexto e a estimulação social, bem como, a

mediação com objetos, a linguagem e o convívio humano exercem importância no

desenvolvimento das funções executivas e são cruciais para o desenvolvimento

infantil.

A hipótese abordada nos estudos de BOSA (2001) a respeito da relação

entre as dificuldades comportamentais características das crianças e adolescentes

com TEA e o comprometimento das funções executivas foi investigada

anteriormente pelos pesquisadores Damásio e Maurer (1979), Ozonoff et al. (1991),

Russer (1999). Entretanto, na década de 70, Damásio e Maurer (1979) foram os

precursores em cogitar a presença de disfunção no lobo pré-frontal em pessoas com

TEA. Assim, essa hipótese surgiu em decorrência da semelhança de

comportamentos encontrados em pessoas que sofreram lesões nas regiões do

córtex pré-frontal e em indivíduos com diagnóstico de TEA.

Segundo Alonso e Adrover (2013), o primeiro estudo sobre funções

executivas e TEA procedeu de uma pesquisa realizada em 1984 por Steel, Golman

e Flexman envolvendo um adulto autista.

Além do estudo de Bosa (2001), na revisão sistemática realizada pelas

pesquisadoras Czermainski, Bosa e Salles (2013), ao analisarem estudos nacionais

e internacionais publicados no período de 2001 e 2011, envolvendo avaliação

neuropsicológica das funções executivas em crianças e adolescentes com TEA, foi

constatado que existem prejuízos associados ao funcionamento executivo

abarcando os seguintes componentes: controle inibitório, planejamento, flexibilidade

cognitiva, fluência verbal e memória de trabalho.

Para ilustrar de modo didático esses componentes e facilitar o entendimento

da hipótese de que pessoas com TEA têm comprometimento nas funções

executivas, foi elaborado um quadro a partir do referencial teórico utilizado por

Cardoso (2016). É importante esclarecer que o modo como foram expostos os

componentes executivos, descritos no quadro, representa apenas uma organização

didática de apresentação das funções executivas, pois no cérebro tudo acontece de

modo integrado e não separadamente.

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Quadro 1 – Componentes executivos e os comportamentos do TEA Componente

executivo prejudicado

Comportamentos específicos do TEA que sustentam a hipótese da relação com as funções executivas

Flexibilidade cognitiva Refere-se à habilidade que o indivíduo tem de alterar o pensamento, seu próprio ponto de vista e o do outro, bem como modificar a ação ou estratégia de resolução em função dos acontecimentos, situações ou experiências do ambiente (GONZÁLEZ, 2012; ALONSO; ADROVER, 2013; GILLET, 2015).

Tendência a comportamento perseverativo (PADOVANI et al., 2015). Interesses restritos e repetitivos, preferência pela rotina e por tarefas repetitivas e sequenciais, dificuldade para manter um diálogo (troca de turno, sequência de ideias) (IBRAIM, 2013). Persistem nas mesmas respostas inúmeras vezes, quando demonstram pensamento rígido e inflexibilidade cognitiva ao reavaliar estratégias utilizadas, dificuldades para aceitar mudanças de ação ou seguir novas estratégias por meio de feedback (IBRAIM, 2013). Cometem muitos erros de persistência (RUSSEL et al., 1991 apud PENNINGTON et al., 1999) Comprometimento na capacidade de gerar novas soluções (SURIAN, 2010). Rigidez de pensamento, apego à rotina, dificuldade para se ajustar às mudanças inesperadas (MOORE, 2005). Diante de situações inusitadas, podem exibir sentimento de ansiedade e medo através de comportamentos estereotipados (MOORE, 2005). Rituais simples: estereotipias sensório-motoras – balançar o corpo, bater palmas, fazer e desfazer, ordenar e desornenar. Rituais mais elaborados: apego a objetos que são carregados a todos os lugares, controle rigoroso de situações do ambiente ou da rotina e rígido perfeccionismo (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010). Comportamentos de ordem inferior: correspondem às ações motoras de movimentos estereotipados, manipulação repetitiva de objetos e formas repetitivas de comportamento autoagressivo. Comportamentos de ordem superior: estão relacionados aos comportamentos cognitivos, como – rituais e rotinas, insistência pela mesmice, interesses por temas específicos (SZATMARI et al., 2006; BOYD; MC DONOUGH; BODFISN, 2012). Nieto e Huertas (2012, apud CARDOSO, 2016, p. 64) alertam que é questionável a hipótese se realmente há uma relação entre a disfunção executiva e as estereotipias motoras, pois estas parecem responder a um nível de funcionamento muito mais básico que há de provocar algum tipo de efeito nas entradas de estímulos sensoriais, enquanto que os rituais ou as obsessões são condutas em que é necessário o controle sobre ações que implicam uma sequência. Padrões repetitivos: insistência nas mesmas coisas, uso de objeto ou fala estereotipados ou repetitivos, adesão

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inflexível a rotinas ou padrões rígidos de pensamento (DSM 5, APA, 2014). Insistem em fazer sempre o mesmo trajeto de casa para a escola, querem que móveis, objetos domésticos ou brinquedos estejam sempre na mesma disposição e se irritam quando são alterados (DOURADO, 2012).

Planejamento Refere-se à habilidade de elaborar e executar um plano de ação, de “pensar antes” e de estipular os passos necessários para atingir um objetivo (SEABRA, 2013).

Falha no estabelecimento de estratégias para alcançar um objetivo (PADOVANI et al., 2015).

Controle inibitório Refere à capacidade humana de inibir comportamentos, pensamentos e estímulos do ambiente que possam distrair o indivíduo, interrompendo o curso eficaz de sua ação ou tarefa (BARKLEY, 2002).

Dificuldade na inibição de respostas repetitivas (PADOVANI et al., 2015). Controle inibitório pouco funcional nas verbalizações e ações (IBRAIM, 2013). Alto grau de repetições e as invariáveis condutas repetitivas (NIETO; HUERTAS, 2012; TURNER, 1999). Para Turner (1997, apud NIETO; HUERTAS, 2012) o déficit de controle inibitório pode explicar as dificuldades de alterações de conduta flexível, como: comportamentos repetitivos relacionados aos movimentos repetitivos e aos interesses limitados, uso repetitivo da linguagem e condutas imutáveis.

Memória de trabalho Consiste na habilidade de organizar uma quantidade de informações na mente por alguns segundos, no máximo poucos minutos, até a realização de uma tarefa, trabalho ou de uma ação (COSENZA; GUERRA, 2011).

Não há uma unanimidade, para Martos-Péres e Paula-Péres (2011) pessoas com TEA apresentam comprometimento na memória de trabalho, no entanto, Crsmerotti e Turrini (2013) apresentam controvérsias, pois essas pessoas costumam apresentar boa capacidade de memória de trabalho e memória visuoespacial nos testes de Corsi e nas provas de procura visual.

Atenção seletiva Corresponde à habilidade de selecionar apenas o que será importante para determinada

Superseletividade do estímulo refere-se à tendência que a pessoa com TEA apresenta em manter-se atenta, por muito tempo, a um estímulo específico (LOVAAS, 2002).

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tarefa em dado momento, de focar a atenção e não se distrair com os diversos estímulos do ambiente (SEABRA, 2013). Fonte: CARDOSO (2016).

Conforme o exposto, são inúmeros os comportamentos que sugerem em

relação às funções executivas. Decerto, o comprometimento das funções executivas

em crianças e adolescentes com TEA é um tema que requer aprofundamento pelo

fato de o cérebro infantil estar em processo de desenvolvimento e ser necessário

exercitá-lo nos espaços clínicos e educacionais. Para Richaudeau (2014, apud

CARDOSO, 2016) as funções executivas surgem e amadurecem em diferentes

etapas da vida humana, que vão desde o crescimento intrauterino até os 20 anos de

idade, entretanto, a autora destaca três momentos em que ocorre um intenso

desenvolvimento das funções executivas: entre os 5 e os 7 anos, os 9 e os 12 anos

e na adolescência.

Estudos mostram que além do TEA, os prejuízos relacionados às funções

executivas estão presentes também no transtorno de déficit de atenção e

hiperatividade, nos transtornos de aprendizagem, e, também em casos de

esquizofrenia, epilepsia do lobo frontal, síndrome de Tourette e nos distúrbios de

conduta, portanto, não são exclusivos do TEA (BAUSELA-HERRERAS, 2012; GIL,

2005; BOSA, 2001; SURIAN, 2010, apud CARDOSO, 2016).

Em estudo de revisão sobre avaliação neuropsicológica e cognitiva dos TEA

realizado por Linhares (2012), foi constatado que, entre os anos de 2005 e 2012, o

tema funções executivas foi o mais estudado pelos pesquisadores, no entanto,

demonstrou um número reduzido de publicações nas bases de dados nacionais.

Nesse estudo, constatou-se a carência de protocolos padronizados e instrumentos

de avaliação neuropsicológica que possam avaliar as funções executivas desse

público tão heterogêneo, considerando as especificidades das crianças e

adolescentes com TEA em idade e níveis variados do transtorno.

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A próxima sessão destina-se à abordagem e discussão dos resultados dos

quatro estudos selecionados, considerando os critérios de busca que foram

abordados na metodologia.

FUNÇÕES EXECUTIVAS: UMA ANÁLISE DE ESTUDOS PRODUZIDOS NO BRASIL E EM PAÍSES DA AMÉRICA LATINA

Após ter abordado de modo amplo os estudos publicados sobre as possíveis

disfunções executivas encontradas na avaliação neuropsicológica em crianças e/ou

adolescentes com TEA, o presente trabalho seguirá abordando sobre o tema a partir

da análise de quatro estudos publicados, nos últimos três anos, 2014 a 2016, nas

bases de dados publicados no Brasil e em países da América Latina. No entanto,

vale ressaltar que dos estudos selecionados apenas um não foi direcionado à

avaliação neuropsicológica, e sim para o campo educacional, especificamente para

o atendimento educacional especializado – AEE realizado com crianças com

diagnóstico de TEA.

O Quadro 2 detalha informações relevantes dos estudos empíricos

encontrados nas bases de dados consultadas, cujo objetivo consistiu em verificar

quais componentes das funções executivas são abordados nas pesquisas realizadas

com crianças e/ou adolescentes com TEA, destacando quais das características do

transtorno sugerem relação com as funções executivas a partir dos estudos

analisados. Nesse sentido, foram elaborados quatro quadros para apresentar os

estudos empíricos que abordam as funções executivas em crianças e/ou

adolescentes com TEA.

Quadro 2 – Artigo: Funções executivas em crianças e adolescentes com transtorno do

espectro autista - Brasil/2014 Autores CZERMAINSKI Fernanda R.; RIESGO, Rudimar dos S.;

GUIMARÃES, Luciano Santos P.; SALLES, Jerusa F. de; BOSA, Cleonice A.

Objetivo Avaliar as funções executivas e a memória de trabalho em crianças e adolescentes com TEA.

Amostra Crianças/adolescentes com diagnóstico de TEA – 11 (5 com transtorno autista e 6 com síndrome de Asperger) e 19 com desenvolvimento típico – com idade entre 9 a 15 anos.

Teste, Matrizes progressivas Coloridas de Raven, Teste Stroop, Teste de

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tarefa ou instrumento

Trilhas, Figuras Complexas de Rey, NEUROPSILIN – INF: Span de Dígitos, Span de Pseudopalavras, Memória de trabalho visuoespacial, Fluência verbal (ortografia e semântica), Go/no go Questionário - histórico socioeconômico e de desenvolvimento.

Resultado Prejuízos de funções executivas no grupo clínico (TEA), em especial na capacidade de planejamento, flexibilidade cognitiva, inibição, além do componente visuoespacial da memória de trabalho.

Quadro 3 – Dissertação: Intervenção neuropsicológica para flexibilidade cognitiva em adolescentes

com transtorno do espectro do autismo - Brasil/2014 Autores GONÇALVES, Yanne Ribeiro. Objetivo Propor e avaliar a efetividade de um programa de intervenção para

flexibilidade cognitiva para adolescentes com TEA. Amostra 06 adolescentes com diagnostico de TEA, com idade entre 12 e 18

anos. Teste, tarefa ou instrumento

Questionário de comportamento restrito e repetitivo; Entrevista sobre flexibilidade cognitiva; Instrumentos neuropsicológicos padronizados: subtestes da Escala Wescheler para crianças (WISC III- Wechsler Intelligence Scale for Children) – Procurar símbolos e Código, Teste Stroop de cores e palavras; Teste Wisconsin de classificação de cartas – WCST; Teste de inteligência geral não verbal – TIG, Teste das trilhas coloridas; Teste de fluência de desenhos; Teste de atenção por cancelamento.

Resultado O estudo sugere a eficácia do programa proposto além de discutir a sensibilidade de alguns testes para a avaliação da flexibilidade cognitiva.

Quadro 4 – Artigo: Transtorno del espectro autista y función ejecutiva. - Colômbia/2015

Autores TALERO-GUTIÉRREZ, Claudia; PALACIO, Carlos M. E.; QUIÑONES, Pablo S.; RUBIO, Genoveva M.; VÁLEZ-VAN-MEERBEKE, Alberto.

Objetivo Avaliar o desempenho dos testes de função executiva em uma população de crianças com TEA.

Amostra 08 crianças com diagnóstico de TEA, com idade de 8 e 9 anos, Teste, tarefa ou instrumento

Escala CARS (Chilhood Autism Rating Scale) ENI – bateria de avaliação neuropsicológica validada na Colômbia.

Resultado Alterações significativas nas funções executivas. Desempenho insatisfatório na flexibilidade cognitiva, na memória de trabalho e na fluência gráfica não semântica. Essa disfunção correlaciona com a gravidade do autismo e varia de acordo com a idade.

Quadro 5 – Tese: Funções executivas: habilidades matemáticas em crianças com

Transtorno do Espectro Autista (TEA) - Brasil/2016

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Autores CARDOSO, Diana Maria Pereira. Objetivo Verificar e analisar as habilidades básicas da matemática do 1º

ciclo de aprendizagem do ensino fundamental I presentes na amostra de crianças com TEA e os componentes que sugerem relação com as funções executivas, observados por meio de atividades de matemática utilizadas no Atendimento Educacional Especializado (AEE) realizado no Centro de Atendimento Educacional Especializado Pestalozzi da Bahia (CAEEPB).

Amostra 04 crianças com diagnóstico de TEA, com idade entre 8 e 10 anos Teste, tarefa ou instrumento

Não foram utilizados instrumentos da neuropsicologia, e sim 4 atividades de matemática produzidas pela pesquisadora. Atividades matemática: “Cabides numerados”, “Piões coloridos”, “Cartões de contagem”, “Potes coloridos: aprendendo a classificar e a contar”.

Resultado Além de demonstrarem quais habilidades matemáticas às crianças pesquisadas dominam, também foi possível perceber comportamentos e atitudes que sugerem relação com as funções executivas: flexibilidade cognitiva, controle inibitório, memória de trabalho e atenção seletiva.

No primeiro estudo, Czermainski et al. (2014) abordaram que as pesquisas

direcionadas à avaliação neuropsicológica contribuíram para a compreensão do

TEA, fornecendo informações sobre a existência de uma relação entre as alterações

nas funções executivas e o transtorno, no entanto, ainda não há um consenso

gradual sobre quais componentes executivos estão mais afetados nesta população.

São considerados por Jurado e Rosselli, (2007 apud CZERMAINSKI et al., 2014) os

quatro componentes executivos mais investigados em indivíduos com TEA: controle

inibitório, planejamento, flexibilidade cognitiva e fluência verbal. Além destes, esses

autores citam também a memória de trabalho, pelo fato dela também estar inclusa

na avaliação neuropsicológica relacionada às funções executivas (NEE et al., apud

CZERMAINSKI et al., 2014).

Czermainski et al. (2014) trazem uma informação relevante ao abordarem a

dificuldade de encontrar um modelo teórico de função executiva diante de uma

variedade de modelos que tentam explicar o funcionamento executivo e seus

componentes, e, destacam que ainda não foi encontrado um modelo, considerado

padrão-ouro, específico para esse público, crianças e adolescentes com TEA. A

esse respeito, Linhares (2012) também havia abordado quando realizou o estudo de

revisão sistemática das publicações brasileiras entre 2005 e 2012.

No entanto, os autores Czermainski et al. (2014) adotaram três modelos de

funcionamento executivo: o modelo de um sistema triplo de atenção e controle

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executivo de Stuss e Benson (1986), o modelo de integração temporal de Fuster

(2008) e o modelo de funções executivas relacionadas à inteligência de Duncan,

Burgess e Emslie (1995); Duncan, Emslie, Williams, Johnson e Freer (1996);

Sternberg (1984). Os resultados desse estudo indicaram que as crianças e

adolescentes com TEA apresentaram menor desempenho em vários processos

cognitivos.

Os prejuízos presentes no transtorno relacionados aos componentes

executivos abordados nesse estudo foram: memória de trabalho (lentidão,

velocidade de execução, dificuldade no componente fonológico, componente

visuoespacial), flexibilidade cognitiva (capacidade de mudar as sequências de

estímulos – letras e números), fluência verbal ortográfica e semântica prejudicadas,

controle inibitório (comete mais erros e omissões, dificuldade para inibir as palavras

do léxico que vem à mente e não cumprem o critério solicitado pelo examinador) e a

capacidade de planejamento (memória visuoespacial).

O segundo estudo refere-se a um trabalho de dissertação produzida por

Gonçalves (2014), cujo objetivo foi propor e avaliar a efetividade de um programa de

intervenção voltado para a flexibilidade cognitiva em adolescentes com TEA.

Gonçalves (2014) postulou em sua pesquisa dois modelos teóricos das

funções executivas, o modelo de Mateer (1999), citado por Sohlberg e Mateer

(2009), e o modelo teórico de flexibilidade cognitiva, proposto por Miller (2013). É

importante destacar que ambos os modelos não foram criados para a população

com TEA, pois, até o momento não há um modelo elaborado exclusivamente para

essa população, e isso, acaba restringindo o público de TEA a ser investigado, pois,

na maior parte dos estudos participam, geralmente, aqueles que possuem grau leve

do transtorno, considerado pelo DSM 5 como grau 1.

Os componentes executivos envolvidos no modelo de Mateer (1999 apud

Gonçalves, 2014) são: iniciação e direção (comportamento de iniciativa); resposta

inibitória (comportamento de parada); persistência na tarefa (manutenção do

comportamento); organização (organizar ações e pensamentos); pensamento

criativo (criatividade, fluência, flexibilidade cognitiva); conscientização (monitoração

e modificação do próprio comportamento). Já o modelo teórico de flexibilidade

cognitiva proposto por Miller (2013 apud Gonçalves, 2014) entende a flexibilidade

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cognitiva de um modo mais abrangente, como pode ser observado no quadro a

seguir:

Quadro 6 – Modelo teórico de flexibilidade cognitiva (Miller, 2013 apud Gonçalves, 2014)

Jogo e desenvolvimento

social

Pensamento e compreensão

conceitual

Adaptabilidade

Jogo exploratório Uso e compreensão do contexto

Fazer escolhas

Jogo simbólico Amplo leque de interesses

Lidar com transições

Jogo criativo Generalização de habilidades aprendidas

Aceitar mudança e diferença

Jogo imaginativo “Links” semânticos e conexões

Adaptação de comportamento social

Resposta à interação Conceitos abstratos Planejamento e organização

Iniciação de interação Habilidades de linguagem de “ordem

superior”

Resolução de problemas

“Rapport” e atenção compartilhada

Linguagem complexa e implícita

Uso de habilidades de forma flexível

(adaptabilidade) Compreensão de

emoções

Compreensão dos outros

Fonte: Gonçalves (2014, p. 26).

Nesse estudo, Gonçalves (2014) abordou que os adolescentes com TEA

apresentaram, antes da intervenção do programa para flexibilidade cognitiva,

desempenho abaixo da média nos testes: Código, nas três fases do teste de

Atenção por cancelamento, na Fluência de desempenho e na primeira fase do

Stroop. Segundo a autora, esse resultado, aliado à dificuldade no Wisconsin, sugere

dificuldade na flexibilidade cognitiva, bem como, dificuldades nas funções de

atenção seletiva e velocidade de processamento.

Em suma, Gonçalves (2014) salienta que parte dos comportamentos

presentes no TEA como, por exemplo, a rigidez de comportamento possa estar

relacionada com déficit no desenvolvimento das funções executivas, principalmente,

com a flexibilidade cognitiva. Nesse sentido, a autora propôs um plano de

intervenção direcionado para a melhoria da flexibilidade cognitiva em adolescentes

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com TEA, com idade entre 12 e 18 anos. Quanto à intervenção, verificou-se que a

repetição e a generalização são imprescindíveis para o aprendizado dessa

população. A autora também salientou como ponto negativo do seu estudo a

utilização de testes neuropsicológicos sem normatização brasileira e abordou como

fator relevante o não entendimento de algumas consignas destes testes, isso aponta

para a necessidade de instrumentos específicos e sensíveis para esse público.

Nesse sentido, a autora sugere que a testagem padrão não deve ser utilizada como

única forma de avaliação de avaliação de funções executivas para indivíduos com

TEA.

O estudo realizado por Talero-Gutiérrez et al. (2015) teve por objetivo avaliar

o desempenho dos testes de função executiva em uma população de crianças com

TEA, em que participaram 8 crianças, com idade de 8 e 9 anos. Como resultado

desse estudo, os pesquisadores encontraram correlação entre um alto índice de

CARS e um mau desempenho nos componentes executivos, como: flexibilidade

cognitiva, memória de trabalho, fluência gráfica não semântica. Isso significa que

crianças com TEA apresentam prejuízos significativos em tarefas relacionadas às

funções executivas, esse dado, hipoteticamente, tenta explicar a tendência que as

pessoas com TEA têm de querer persistir na mesma coisa, o que, decerto sugere

inflexibilidade cognitiva, que está relacionada à dificuldade ou incapacidade que o

indivíduo com TEA tem de mudar critérios e comportamentos estereotipados. Os

pesquisadores também destacaram como variáveis que essas dificuldades estão

relacionadas ao grau do transtorno e varia de acordo com a idade da criança.

Além do CARS, também foi utilizado nesse estudo um instrumento de

avaliação neuropsicológica infantil (Bateria - ENI), validada em Colômbia. Segundo

Talero-Gutiérrez et al. (2015), essa bateria é aplicada em indivíduos de 5 a 16 anos

de idade. No estudo analisado, foram aplicadas as seguintes subprovas: fluência

verbal (semântica e fonética), fluidez gráfica (semântica e não semântica),

flexibilidade cognitiva (classificação de tarefas), planejamento e construção

(pirâmide de México), habilidades gráficas (desenho da figura humana – cópia da

figura completa), memória de trabalho (cópia da figura completa), memória –

evolução de estímulos visuais (recuperação da figura completa).

Quanto ao comportamento que insinuam comprometimento das funções

executivas, Talero-Gutiérrez et al. (2015) destacaram que a incapacidade para

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seguir instruções sugerem manifestação de alterações na flexibilidade cognitiva e

em outras habilidades cognitivas como planejamento e organização.

Outro aspecto importante abordado neste estudo refere-se à necessidade de

planejar estratégias de reabilitação que permitam desenvolver as funções executivas

em pessoas com TEA, independentemente da idade e severidade do transtorno.

No quarto estudo selecionado, Cardoso (2016) diverge dos estudos

abordados quando propôs como objetivo verificar e analisar as habilidades básicas

da matemática do 1º ciclo de aprendizagem e a presença de comportamentos que

sugerem relação com as funções executivas presentes na amostra de crianças com

diagnóstico de TEA. Fizeram parte desse estudo 4 crianças, com idade entre 8 e 10

anos, sendo 3 do sexo masculino e 1 do feminino. Vale destacar que as 4 crianças

apresentavam o diagnóstico de TEA, no entanto, três apresentavam, como

comorbidade, diagnóstico de deficiência intelectual.

Um dos aspectos a considerar a respeito desse estudo refere-se a não

escolha de um modelo de função executiva. São duas as possibilidades que

conduziram a autora pela não adoção de um modelo: uma refere-se à ausência de

um modelo de função executiva que atendesse ao objetivo do estudo proposto, isto

é, voltado para o campo educacional e não clínico, direcionado para a avaliação

neuropsicológica. Outro ponto a considerar refere-se aos instrumentos que foram

utilizados na pesquisa, pois não foram aplicados testes neuropsicológicos

padronizados de relevância científica, entretanto, as atividades: “Cabides

numerados”, “Piões coloridos”, “Cartões de contagem” e “Potes coloridos

aprendendo a classificar e a contar” corroboraram o objetivo do estudo, visto que,

além de verificar as habilidades matemáticas de domínio das quatro crianças, essas

atividades subsidiaram a pesquisadora em verificar a presença de comportamentos

que sugerem relação com as funções executivas presentes nas quatro crianças que

participaram da amostra do estudo.

Diferente dos três estudos abordados anteriormente, vale ressaltar que o

referido estudo não teve a intenção de avaliar as funções executivas, no entanto,

com o olhar de psicopedagoga e professora do atendimento educacional

especializado (AEE) do CAEEPB e envolvida com estudos relacionados a

neuropsicologia e a neuroeducação, Cardoso (2016) descreveu os comportamentos

que sugerem relação com as funções executivas, como: flexibilidade cognitiva,

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controle inibitório, memória de trabalho e atenção seletiva, observados nas quatro

crianças com TEA durante o cumprimento das atividades de matemáticas: “Cabides

numerados”, “Piões coloridos”, “Cartões de contagem”, “Potes coloridos: aprendendo

a classificar e a contar”. Desse modo, os dados encontrados nesse estudo sugerem

relação com os componentes das funções executivas, hipoteticamente, prejudicadas

e preservadas (Cf. Quadro 7).

Quadro 7 – Atitudes e comportamentos que sugerem relação com as funções executivas:

flexibilidade cognitiva, controle inibitório, memória de trabalho e atenção seletiva

Criança Atitudes e comportamentos que sugerem relação com as funções executivas: flexibilidade cognitiva, controle inibitório,

memória de trabalho e atenção seletiva HB Persistiu no erro e não alterou sua resposta.

Tendência em desviar a atenção para coisas insignificantes, irrelevantes à tarefa. Dificuldade para lidar com imprevistos (ex: pião quebrado, um pegador extra). Manteve na mente e, simultaneamente, manipulava as informações (cor, numeral, quantidade), enquanto realizava as atividades. Boa percepção visuoespacial (busca visual) para encontrar a cor correspondente, apesar dos distratores (cores diferentes) Ex: encontrar a bola de uma determinada cor no meio de tantas outras de diferentes cores. Modificou a estratégia adotada anteriormente quando retirou e colocou as bolas dentro dos potes com base nos números novos inseridos.

IC Desviar a atenção para algo irrelevante à tarefa, interromper a atividade para fazer outra coisa, persistir em girar objetos, excesso de “organização”; dedicar um tempo significativo alinhando as bolas removidas. Se agita e apresenta comportamentos estereotipados quando não tem o controle da situação (Ex: pegador). Alterou sua resposta ao remover o pegador que estava a mais no cabide de número 9, quando removeu as bolas, adaptando a maneira de resolver a atividade aos números novos inseridos na atividade “Potes coloridos: aprendendo a classificar e a contar”. Quando mudou o critério removendo as bolas, adaptando a maneira de resolver a atividade “potes coloridos ...” a partir dos números novos inseridos. Manteve na mente informações (cor, numeral, quantidade) enquanto, simultaneamente, realizava as atividades. Boa percepção visuoespacial (busca visual) para encontrar a cor correspondente, apesar dos distratores (cores diferentes) Ex: encontrar a bola de uma determinada cor no meio de tantas outras de diferentes cores.

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JS Dificuldade em focar na atividade, pois não conseguia inibir o comportamento, desviava a atenção constantemente para outra coisa não relacionada à atividade. Cometia erros, pois, agia sem parar para observar, comparar semelhança e diferença (cores dos piões). Quando recebia a ajuda verbal parava para observar as duas cores e classificar.

PN Persistência em manter as mesmas respostas, resistência à mudança de estratégia, nem sempre aceitava algum tipo de intervenção ou feedback vinda da pesquisadora (costumava reagir com autoagressividade). Baixa tolerância para frustração. Tendência pela repetição, insistência em seguir padrões e na maneira “particular” de querer que os números fossem ditos pela pesquisadora. Na atividade “potes coloridos...” ignorou o feedback e persistiu colocando apenas uma bola em cada pote, sem estabelecer algum tipo de critério: cor e quantidade. Conseguia manter a atenção na atividade, sem dispersar-se. Utilizou-se da busca visual quando procurou os números correspondentes à sequência numérica e na atividade “cartões de contagem”.

Fonte: Cardoso (2016).

Dos quatro estudos abordados, Czermainski et al. (2014) foi o que manteve

como amostra um número maior de crianças e/ou adolescentes com TEA, no

entanto, pela relevância que tem as funções executivas na vida cotidiana e na

aprendizagem, verifica-se a necessidade de ampliação dessa população, bem como,

a produção de outros estudos empíricos.

Os estudos analisados contribuíram para o conhecimento e a compreensão

de comportamentos específicos do TEA. Contudo, ainda não há na literatura um

consenso que determine, com precisão, quais dos componentes executivos são os

mais afetados e ou preservados nessa população, em decorrência de uma série de

fatores, como: a metodologia da pesquisa, o grau de comprometimento do

transtorno, os instrumentos utilizados, que na maioria das vezes não costumam ser

adequados e sensíveis para crianças e adolescentes com TEA. Entretanto, os

resultados demonstraram que não se pode descartar a hipótese de que há

comprometimento das funções executivas nessa população que, provavelmente,

responda a alguns dos comportamentos do transtorno, como já foi mencionado

pelos pesquisadores citados neste artigo nos quadros 1 a 4, quando foram descritos

os componentes executivos e os comportamentos do TEA.

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Em suma, a partir dos quatros estudos analisados, os resultados sugerem

que a inflexibilidade cognitiva e o prejuízo no controle inibitório foram os mais

abordados pelos pesquisadores, conforme descreveram através de

comportamentos, como a dificuldade na capacidade de mudar as sequências de

estímulos – letras e números, enquanto que os comportamentos relacionados ao

controle inibitório parecem estar conexos aos erros cometidos e omissões,

dificuldade para inibir as palavras do léxico que vem à mente e não cumprem o

critério solicitado pelo examinador (CZERMAINSKI et al., 2014); rigidez de

comportamento (GONÇALVES, 2014); incapacidade para seguir instruções, querer

persistir na mesma coisa, dificuldade na mudança de critérios e comportamentos

estereotipados (TALERO-GUTIÉRREZ et al., 2015); persistir no erro e não querer

alterar a resposta, dificuldade para lidar com imprevistos (ex: presença de um pião

quebrado, um pegador extra), persistência em manter as mesmas respostas,

resistência a mudança de estratégia, resistência para aceitar algum tipo de

intervenção ou feedback, insistência em seguir padrões e em estabelecer uma

maneira “particular” dos números serem ditos pela pesquisadora, tendência em

desviar a atenção para coisas irrelevantes não relacionada à atividade ou tarefa,

interromper a atividade para fazer outra coisa, persistir em girar objetos, dedicar um

tempo significativo alinhando as bolas (CARDOSO, 2016).

Outros comportamentos presentes no TEA, como: rigidez de pensamento,

repetição excessiva de ações, maneirismos, comportamentos repetitivos e

estereotipados, parecem ter relação com a dificuldade no controle inibitório e

dificuldade na flexibilidade cognitiva (CZERMAINSKI et al., 2014).

Enfim, apesar da heterogeneidade metodológica, dos modelos de funções

executivas adotados nas pesquisas, da diversidade de instrumentos utilizados e

diante do que foi explanado neste estudo, constata-se a hipótese de que há prejuízo

nas funções executivas em crianças e adolescentes com TEA, envolvendo vários

componentes executivos, como: flexibilidade cognitiva, controle inibitório, atenção

seletiva, planejamento, fluência verbal e baixo desempenho no componente

visuoespacial da memória de trabalho. E, sendo as funções executivas habilidades

cognitivas prejudicadas nas crianças e adolescentes com TEA, ressalta-se a

necessidade de desenvolvê-las e disponibilizar formas variadas de exercitá-las tanto

no contexto clínico como no contexto educacional.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como se pôde perceber pelo quantitativo de estudos produzidos no Brasil e

em países da América Latina e pela relevância do tema, é preciso desenvolver

outros estudos sobre as funções executivas voltados para crianças e adolescentes

com TEA.

Enfim, mesmo que o comprometimento que envolve o TEA sustente a

hipótese do envolvimento de outras teorias cognitivas, pelo fato das fontes

bibliográficas abordarem que há um comprometimento nas funções executivas em

crianças e adolescentes com TEA, os dados encontrados nos quatro estudos

empíricos reforçaram essa hipótese e trouxeram algumas contribuições para a

compreensão do funcionamento cognitivo e comportamental dos indivíduos que

apresentam esse transtorno.

Vale ressaltar que, além dos dados obtidos terem contemplado a intenção do

presente estudo, tudo que foi analisado desencadeou reflexões sobre a importância

do psicólogo se especializar em neuropsicologia e o quão é necessário, para a

formação acadêmica deste profissional, se aprofundar no conteúdo da neurociência,

disciplina que compõe a matriz curricular do curso de bacharelado em Psicologia.

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Recebido em 27/12/2019 Aprovado em 20/02/2020


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