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Shakespeare: do teatro ao cinema

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8/8/2019 Shakespeare: do teatro ao cinema http://slidepdf.com/reader/full/shakespeare-do-teatro-ao-cinema 1/55 Adelle Soares dos Anjos ADAPTAÇÃO Shakespeare: do teatro ao cinema Belo Horizonte Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH) 2010 
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Adelle Soares dos Anjos

ADAPTAÇÃO

Shakespeare: do teatro ao cinema

Belo Horizonte

Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH)

2010 

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Adelle Soares dos Anjos

ADAPTAÇÃO

Shakespeare: do teatro ao cinema

Monografia apresentada ao Curso de Comunicação Social, doDepartamento de Ciência da Comunicação do Centro Universitário deBelo Horizonte - UNI-BH, como requisito parcial para obtenção detitulo de bacharel em Jornalismo.

Orientador: Luiz Henrique Magalhães

Belo Horizonte

Centro Universitário de Belo Horizonte (UNI-BH)2010

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................. 4 

2 TEATRO ........................................................... ........................................................... ....................................... 6 

2.1 Breve História do Teatro/Panorama Histórico ................................................................................................. 6  

2.2 Elementos teatrais ........................................................................................................................................... 12 2.2.1 Texto ............................................................................................................................................................. 12 2.2.2 Tempo e espaço ............................................................................................................................................ 14 2.2.3 Personagem .................................................................................................................................................. 15 2.2.4 Cenário ......................................................................................................................................................... 17 

2.3 Características próprias de Shakespeare ........................................................... ............................................. 18 2.3.1 O Autor ......................................................................................................................................................... 18 2.3.2 Inglaterra na época de Shakespeare ............................................................................................................ 19 

2.3.3 Suas peças .................................................................................................................................................... 21 3 CINEMA ........................................................................................................................................................... 24 

3.1 História do Cinema ......................................................................................................................................... 24 3.1.1 Introdução .................................................................................................................................................... 24 3.1.2 Criação dos primeiros aparelhos ................................................................................................................. 24 3.1.3 Cinema mudo e a sincronia dos sons nos filmes .......................................................................................... 26 

3.2 Princípios básicos do cinema .......................................................................................................... ................ 28 3.2.1 Linguagem cinematográfica ......................................................................................................................... 28 3.2.2 Gêneros ........................................................................................................................................................ 30 3.2.3 Movimento de câmera e ângulos .................................................................................................................. 31 3.2.4 Montagem ..................................................................................................................................................... 32 

3.2.5 O personagem............................................................................................................................................... 33 3.2.6 Tempo e espaço no cinema ........................................................................................................................... 34 3.2.7 O texto .......................................................................................................................................................... 35 

3.3 Adaptação ........................................................ ........................................................... ..................................... 36  3.3.1 Elementos da adaptação............................................................................................................................... 36 3.3.2 Reaproveitamento do texto teatral no cinema .............................................................................................. 38 

4 ROMEU E JULIETA  – DA PEÇA AO FILME ............................................... ............................................. 40 

4.1. Metodologia.................................................................................................................................................... 40 

4.2 Baz Luhrmann ................................................................................................................................................. 40 4.2.1 História......................................................................................................................................................... 40 4.2.2 Características do diretor Luhrmann ........................................................................................................... 42 

4.3 Romeu e Julieta ............................................................................................................................................... 42 4.3.1 Vestimenta .................................................................................................................................................... 44 4.3.2 Espaço e tempo............................................................................................................................................. 45 4.3.3 Costumes ...................................................................................................................................................... 47 4.3.4 Linguagem .................................................................................................................................................... 48 4.3.5 Final ............................................................................................................................................................. 50 

5 CONCLUSÃO .................................................................................................................................................. 52 

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................................. 54 

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1 INTRODUÇÃO

Nesta monografia buscamos estudar a adaptação de uma obra teatral para o cinema. O objeto

que escolhemos para análise foi a clássica história de Romeu e Julieta, tomando como

referência a peça teatral de Shakespeare, que foi escrita entre os anos de 1591 a 1595, e o

filme de Baz Luhrmann, produzido em 1996, nos EUA.

O tema é de grande importância para o estudante de comunicação social, que deve buscar uma

compreensão a mais ampla possível dos produtos culturais que são também objeto de

veiculação nas mais diversas mídias. Compreender como as estruturas dessas mídias impõem

formas diferentes de construção dos discursos é de fundamental interesse para aqueles que

trabalham nesse universo, principalmente para os jornalistas.

Converter a história criada para ser transmitida em uma mídia e veiculá-la em outra, esta é a

arte da adaptação. No entanto, não basta mudar a mídia de veiculação, é preciso também fazer

algumas mudanças no enredo, ou até mesmo nas técnicas utilizadas de acordo com os

recursos que a outra mídia possui. “Assim, o primeiro trabalho do adaptador é descobrir como

fazer para adequar o material original a parâmetros de tempos diferentes.” (SEGER, 2007, p.

18).

No caso dos objetos que tomamos para análise, a história de Romeu e Julieta, de Shakespeare,

que se destacou por narrar a vida de dois jovens que se apaixonaram e tiveram um romance

impossível, devido a rivalidade de suas famílias, a ambientação original, os costumes e as

vestimentas são características do momento em que o autor vivia, final dos anos de 1500 e

tudo isso precisou ser adaptado para que a história pudesse ser contada e situada na sociedade

contemporânea, no final do século XX.

A adaptação desta peça para o cinema já tinha sido levada a cabo por Zefirelli, em 1968, que,

com uma proposta diferente da de Luhrmann, é a reprodução mais fiel à história de

Shakespeare, sem inovações, apenas trazendo-a para uma outra mídia, o cinema. O contexto

histórico original foi mantido, bem como o figurino, entre outros elementos. No caso do filme

que escolhi , Romeu + Julieta (1996), o diretor optou por inovar, trazendo a peça para os dias

atuais: mudando figurino, costumes, vícios, incorporando objetos que na época de

Shakespeare não eram utilizados ou ainda não existiam, entre outros. Inclusive, isso me

motivou a escolher esse filme, por acreditar que possibilita uma análise mais rica, que dê

conta de destacar mais elementos e ampliar o meu entendimento sobre o tema adaptação.

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O percurso que escolhi estruturou a monografia em três partes. Dois capítulos teóricos,

resultados de um levantamento bibliográfico sobre os temas: cinema, teatro e adaptação. No

primeiro capítulo trabalhamos com as características e os elementos de uma obra teatral, a

partir de estudiosos do assunto, tais como: Margot Berthold (2004), Jean-Jacques Roubine

(1998), Jean-Pierre Ryngaert (1995), Sábato Magaldi (2004), Caroline Spurgeon (2006),

Linda Seger (2007), entre outros. Fizemos o mesmo no segundo, porém, trabalhando as

características próprias do cinema e da adaptação de obras oriundas de determinado meio para

outro, a partir dos seguintes autores: Marcel Martin (2003), David Howard, Edward Mabley

(1996), Jean- Claude Carrière (1995), entre outros. O terceiro capítulo é de análise

propriamente dita.

Na análise, após apresentarmos a peça e o filme a partir de uma descrição detalhada,

buscamos identificar quais as inovações Luhrmann traz para seu filme e o que é mantido do

original de Shakespeare. Este estudo se deu a partir da análise comparativa da peça com o

filme, buscando compreender as soluções criadas para que a adaptação obtivesse êxito, sem

empobrecer um texto clássico.

Ainda com relação à análise empreendida, buscou-se explorar as inferências simbólicas e os

desarranjos que atitudes „ousadas‟ de diretores e roteiristas de cinema, causam na

reescrituração de textos clássicos quando os adapta para um ambiente estranho ao original. No

filme, por exemplo, a espada, que antes era utilizada como arma na peça de Shakespeare, é

substituída por um revólver. A história, que antes se passava em Verona, no filme é levada

para Verona Beach. Destacamos principalmente os quesitos: tempo, espaço, personagens,

costumes e linguagem.

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2 TEATRO

2.1 Breve História do Teatro/Panorama Histórico

De acordo com Magaldi (2004) a palavra teatro pode ser entendida a partir de duas

perspectivas: o espaço e a arte da representação. “O significado primeiro, na linguagem

corrente, liga-se à ideia de edifício, um edifício de características especiais, dotado

basicamente de platéia e palco. [...] e o segundo uma representação, feita por atores, bailarinos

ou mimos”. (MAGALDI, 2004, p. 7)

Segundo Amaral (1976), o teatro, como é conhecido hoje no ocidente, nasceu na Grécia, noséculo VI a.C.. A arte surgiu das festas realizadas em homenagem ao deus Dionísio, deus do

vinho, do teatro e da fertilidade. Estas festividades eram consideradas como rituais sagrados,

que duravam muitos dias, e que aconteciam uma vez por ano na primavera, no período da

colheita da uva e da fabricação de vinho.

O teatro grego surgiu de um acontecimento inusitado, quando um participante desse ritual

sagrado, chamado Téspis – que passou a ser considerado como o primeiro ator da história do

teatro ocidental  – resolveu colocar uma máscara humana, ornada com cachos de uvas, subiu

no tablado em praça pública, e disse, em alto e bom som para que todos escutassem, que ele

era Dionísio. Depois de arriscar transformar o sagrado em profano, o acontecimento ficou

considerado como o marco inicial da ação dramática, e provou para todos que poderíamos

representar alguém que, na realidade, não somos. Surgiu então a arte de representar: o teatro.

(AMARAL, 1976).

Ainda de acordo com a autora, com o passar do tempo a vestimenta, a máscara, as luzes e asformas de encenação utilizadas por Téspis foram adaptadas e novas formas passaram a ser

utilizadas. No século V a.C., a carroça de Téspis (onde ele fazia suas representações) foi

substituída por uma plataforma fixa, um palco aonde se organizava o espetáculo, e onde

atores, coro e espectadores se apresentavam. Mais tarde, o palco foi substituído por um lugar

fixo e maior, o chamado théatron1.

1 “lugar de onde se vê”. AMARAL (1976).  

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Logo após as duas guerras pérsicas (490 a.C. e 480-79 a.C.) surgiu a tragédia grega,

documentada por Ésquilo, soldado e poeta que escreveu Os Persas (472 a.C.), obra onde ele

descreve a vitória de Atenas sobre Xerxes.

Segundo Amaral (1976), a primeira estética da arte dramática, a Poética, é construída por

Aristóteles, onde são encontrados os seis principais elementos do teatro: o pensamento, a

fábula, o caráter, a linguagem, a melodia e a encenação. Mas, para o próprio Aristóteles, a

linguagem e a encenação são as características que mais dizem respeito ao teatro e que dão a

ele o seu poder criador.

O próximo elemento atribuído por Aristóteles como fundamental ao teatro é a fábula, que é

constituída da trama, onde o dramaturgo apresenta e desenvolve os acontecimentos, com o

seu devido clímax e o desenlace tão esperado por seus espectadores. Outro elemento é o

caráter de cada personagem, que será representado por dois extremos, considerados no teatro

grego como o protagonista (herói) e o antagonista (vilão).

Já a melodia era imprescindível, era através dela que se apresentava principalmente o coro 2.

Mas, de acordo com Amaral (1976), essa melodia não sobreviveu à tragédia e, por mais de

mil anos ela destoava da estrutura dramática do texto. Com o Simbolismo, no final do séculoXIX, no teatro moderno foram incorporados efeitos musicais nos dramas, porém, foi com o

dramaturgo Bertold Brecht (1898  – 1956), que a melodia voltou a ter sua importância e ser

fundamental nas representações teatrais. Este dramaturgo utilizava a música como forma de

quebrar a tensão e de trazer os espectadores de volta ao mundo real, entendendo que a

representação no palco não passava de ficção.

A comédia, que surgiu da parte mais alegre do ditirambo3 , era uma das responsáveis por

mostrar ao público que o teatro diz respeito ao mundo da representação, a um mundo irreal,

da ficção, das brincadeiras. “A comédia era responsável por fechar os festivais atenienses e

em suas apresentações trazia personagens bastante irreverentes, que faziam representações

cômicas e às vezes até ofensivas” (AMARAL, 1976, p. 28). Estas representações serviam de

crítica para instituições e pessoas notáveis da época. Nem mesmo os deuses eram poupados.

2 Grupo responsável por fazer os comentários sobre as cenas e sobre o comportamento dos personagens.AMARAL (1976)3 Cântico improvisado que era feito durante as procissões dionisíacas. AMARAL (1976)

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Ao entrar em contato com os gregos, os romanos aprenderam mais sobre esta possibilidade de

se fazer o teatro. Após apagar da comédia grega algumas características, tais como os traços

políticos e religiosos, os romanos também aderiram ao gênero da comédia. No entanto, na

comédia romana, os principais temas trabalhados eram os problemas que se passavam dentro

das casas dos povos romanos, histórias de crianças que eram abandonadas e assuntos

românticos. (AMARAL, 1976)

“A comédia latina preferiu utilizar as influências dos espetáculos circenses e mimos

improvisados em sua forma”. (AMARAL, 1976, 28). Os maiores representantes foram

Andronicus, Plauto (254-184 a.C.) e Terêncio (190-159 a.C.), que logo foram aceitos pelo

povo romano. As comédias latinas podem ser consideradas como as mais ousadas da históriado teatro, uma vez que utilizavam de muitos disfarces, vestimentas provocantes, cenários

bastante coloridos, truques circenses, muita intriga e cenas com caráter mais obsceno.

De acordo com Amaral (1976), mesmo com os problemas políticos de Roma  –  expansão

política e decadência do Império – , o teatro popular manteve o seu público. Nem a adoção do

Cristianismo foi capaz de mudar de imediato os costumes do povo e o seu gosto pelo teatro.

No século V, como forma de acabar com o teatro, a Igreja passou a excomungar os atores  –  

medida que também não foi suficiente para por fim às representações teatrais. Já no século

seguinte, séc. VI, os donos de teatros se viram obrigados a fecharem seus espaços de

representações teatrais.

Enquanto a Igreja tentava levar todos a Cristo, proibindo as representações teatrais pagãs,

muitos atores se viram na obrigação de procurar seu público pelas estradas, ou nas feiras, ou

até mesmo restringir suas representações para dentro dos castelos senhoriais. Nos séculos

seguintes, séculos VIII e IX, não foi diferente. Os atores continuavam viajando atrás de seupúblico, e desenvolvendo novas atividades dentro do teatro. Eles faziam de tudo um pouco:

eram músicos, dançarinos, dramaturgos, atores, palhaços e acrobatas.

Na Idade Média(476 d.C. a 1453 d.C.), quando a propriedade agrária passou a ser a única

forma de se adquirir dinheiro, a Igreja também dominara a cultura. A partir de então, as peças

teatrais apresentavam apenas o caráter religioso. Através destas peças, era ensinada a Palavra

de Deus. “E foi no século X que a Igreja conseguiu atingir seu objetivo principal, ao pregar 

sobre o fim do mundo, o julgamento final e a morte, conseguindo fazer com que as pessoas

vivessem de acordo com o que a Igreja pregava”. (AMARAL, 1976, p.33)  

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No Brasil, o teatro estritamente religioso aconteceu na época da colonização, com influência

do jesuíta e poeta espanhol José de Anchieta (1534-1597), que utilizava o teatro como

instrumento de catequização. Assim como em outros países, eram utilizadas partes da Bíblia

nas encenações que mostravam de forma sensacionalista a consequência do pecado na vida

das pessoas.

Durante a Idade Média não havia um local próprio de apresentação teatral, as representações

eram feitas dentro ou nos pátios das igrejas. Mais tarde elas ganharam um lugar retangular -

uma espécie de tablado - e eram realizadas em praça pública, onde o público ficava mais a

vontade e comparecia em maior número. Durante estas representações eram utilizadas

máquinas para a troca e movimentação dos cenários, estas eram responsáveis porproporcionar ao público a ilusão de milagres e aparições de santos e diabos. Com a

composição dos cenários, surgiu a necessidade de melhorar também os demais elementos do

teatro, entre eles o figurino, que passou a utilizar de vestimentas de alto luxo.

No teatro Medieval surgiu a figura do menestrel4; que foi substituído por atores contratados

pelos senhores, no final da Idade Média. No Natal e em celebrações matrimoniais esses atores

encenavam peças escritas especialmente   para estas datas. “Os „atores domésticos‟, como

ficaram conhecidos, são herdeiros dos menestréis e dos bobos da corte, e também trazem em

suas características um pouco dos profissionais do Barroco, da Renascença e da Idade

Moderna”. (AMARAL, 1976, p. 36) 

No período da Renascença (Entro o século XIII e meados do Século XVII), quando as

famílias começaram a perder seus poderes e quando o poder real começou a ser fortalecido, os

atores se viram na obrigação de buscar, por eles mesmos, seu sustento. No entanto, nesta

mesma época, ocorreu um fortalecimento maior da cultura em cidades como Florença,Londres, Madrid e Paris, surgindo a oportunidade da formação de companhias de teatro. Foi

na Renascença também que as artes se ligaram à filosofia humanista e se viram livres dos

dogmas da Igreja. (AMARAL, 1976)

A Comedia Nueva, que era encenada nos Corrales5, trouxe algumas mudanças à forma de se

fazer teatro: “[...]o número de atos é reduzido a apenas três, os elementos trágicos e cômicos

são fundidos, a ação e a intriga dinamizadas, as unidades aristotélicas de tempo e lugar são

4 Ator responsável por divertir seu público com danças, músicas, acrobacias, palhaçadas, mas também contarhistórias tristes e poesias. AMARAL (1976)5 Teatros públicos urbanos surgidos na Espanha, a céu aberto e rodeados por casas. AMARAL (1976)

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repelidas, as comédias passam a dar mais importância ao dinamismo da ação do que à

caracterização sociológica” (AMARAL, 1976, p. 37). As representações não duravam muitos

dias, como era nos espetáculos encenados na corte ou pela Igreja, e eram repetidas duas ou

três vezes por semana. Foi na Itália que esta nova cultura artística se desenvolveu mais

rapidamente.

“A commedia dell’arte, conhecida como o „teatro do povo‟, foi responsável por vulgarizar a

trama, as intrigas e as situações vividas na época, esta liberdade para os atores encenarem tais

temas se dava uma vez que eles se „escondiam‟ atrás de máscaras e trajes carnavalescos”.

(AMARAL, 1976, p. 39).  Neste gênero, o ator, que passou a ser considerado como o

elemento mais importante do teatro, tiveram total liberdade de utilizar da improvisação. Elefoi conhecido em toda a Itália como o mais importante, devido à exploração dele pelas

companhias itinerantes. Contudo, de acordo com a autora, a commedia dell’arte apresentava

uma pobreza muito grande no texto teatral, o que contribuiu para a sua decadência.Apesar da

decadência, este gênero foi considerado como o ponto de partida para as diferentes formas de

teatro que surgiram, e que fizeram chegar até o drama shakespeariano.

O teatro de Shakespeare (1564-1616) constituía-se de uma literatura teatral vinculada aos

aspectos populares da arte na época medieval. Se o teatro religioso era marcado pela aparição

de heróis religiosos e santos, neste novo teatro os heróis eram seculares. Shakespeare utilizava

da estrutura medieval, onde a mistura de efeitos cômicos e trágicos era permitida e onde

também as unidades de tempo, lugar e ação não eram muito rígidas.

O drama medieval, que consistia principalmente em festas públicas e pantomimas, foratransformado pelos humanistas num trabalho de arte literária. Shakespeare adotou essainovação, conservando ainda a separação medieval entre palco e platéia, além damobilidade de ação do drama religioso. Mas no conteúdo e na tendência, seu teatro foi

determinado pela estrutura política e social da época  – a época do realismo político, queleva o conflito dramático da própria ação à alma do herói. (AMARAL, 1976, p. 42)

Amaral (1976) ressalta que, nesse período, conhecido como elizabetano, a Inglaterra era

governada pela rainha Elizabeth I (1558-1603) e passou a ser a potência política e econômica.

Durante este período, muitos talentos universitários começaram a aparecer. Os dramaturgos

profissionais, que antes escreviam especificamente para a corte, passaram a apresentar suas

histórias em pequenos teatros de Londres, que foram construídos com características

especificas para receber a dramaturgia elizabetana. Nesta época, atores e dramaturgos já

podiam representar diariamente, sem precisar se preocupar com os ataques do clero. A platéia

era cada vez mais heterogênea, apesar de ser assistido, em maior parte, pelos representantes

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de classes superiores. “Mas esse teatro não consegue sobreviver a Shakespeare e a Igreja vol ta

a interromper a história do teatro inglês. Em 1642 os teatros são oficialmente fechados”.

(AMARAL, 1976, p. 42). Somente vinte anos depois a dramaturgia inglesa voltou aos palcos,

com George Etherege (1634-1691), John Dryden (1631-1700), entre outros nomes.

Quando o teatro renasceu em Londres, autores franceses expressam suas críticas ao teatro e às

características instituídas por Shakespeare. Os franceses abominavam a ideia de excluir as

regras aristotélicas: quando elementos trágicos com os cômicos eram misturados, a falta de

rigidez com os elementos tempo e espaço.

Eles acreditavam que, juntos, trágico e cômico violentavam a unidade de ação. Outra crítica

feita por eles ao teatro de Shakespeare se deve pela não rigidez quanto à unidade de tempoe espaço. Acontece então de o classicismo francês invadir os palcos ingleses e o teatroshakespeariano teve que se enquadrar nas regras francesas. (AMARAL, 1976, p. 42)

Logo depois, e ainda utilizando convenções herdadas do classicismo, surgiu o drama burguês,

o qual apresentava o indivíduo em sua realidade cotidiana. A tragédia romântica do século

XIX passou a explorar a ideia do herói, aquele que vence toda e qualquer adversidade. “Nesta

época, o teatro passa por uma elitização, ao tornar-se obscuro e intelectualizado. As técnicas

do palco, a ação e as personagens perdem sua simplicidade e passam a se distanciar do teatro

 popular” (AMARAL, 1976, p. 47). Com o desenvolvimento científico, na segunda metade do

século XIX, intelectuais começaram a utilizar de heróis criados a partir de mitos e a

introduzirem o Naturalismo e o Realismo em suas peças.

Os pioneiros do teatro moderno transitavam de um extremo a outro: do ultra-realismo dosprimeiros naturalistas ao realismo fantástico sugerido pela revolução que se operava nasartes plásticas da época. Refletindo mais uma vez as preocupações sociais do momento, oteatro não pode escapar às pinceladas do Abstracionismo, Dadaísmo e Surrealismo.Importante ruptura com a dramaturgia tradicional foi devida a esses movimentos, querejeitaram qualquer compromisso com o teatro realista convencional. (AMARAL, 1976, p.

50)

O trabalho do encenador, que antes já estava em evidência, a partir dos últimos anos do século

XIX passou a ser o mais importante elemento do teatro. “Ao colocar  seu estilo pessoal na

história que ele está dirigindo, o diretor acabou reinventando o teatro, por trazer novas

características que foram aceitas pelos demais profissionais da área”. (AMARAL, 1976, p.

52). No teatro moderno o primeiro grande encenador foi André Antoine (1859-1943), que

introduziu o realismo na encenação e foi também o fundador do Teatro Livre de Paris (1887)

e do Teatro Antoine (1896). Sua pretensão era de incluir todos os elementos da vida real emsuas encenações. Para isso, ele utilizou de recursos de iluminação e cenários inovadores, que

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transformavam o palco naquilo que ele queria que parecesse. Dos atores ele exigia que

vivessem o personagem, e não apenas o representassem. Foi ele quem inventou o termo

„quarta parede‟ – uma parede imaginária construída logo na frente do palco, onde o público

ficava, a fim de que o ator pudesse de certa forma ignorar o público e agir da forma mais

natural possível.

As ideias de Antoine influenciaram profundamente o teatro que surgiu na Europa e nos

Estados Unidos,e acabaram por substituir as ideias naturalistas de Antoine pelo Simbolismo,

utilizando mais da imaginação e menos da realidade. “De modo geral, pode-se dizer que todos

os grandes encenadores empregaram os recursos de seu tempo para melhor atingir o público”.

(AMARAL, 1976, p. 55)

Desde o fim da Primeira Guerra Mundial foram aparecendo novas tendências para o teatro. A

partir de então, muitos dramaturgos e encenadores começaram a lutar politicamente pela

transição da característica do homem no teatro, expressando as relações do homem com a

sociedade, e não mais a relação dele com Deus ou consigo mesmo. (AMARAL, 1976)

Em 1960, o polonês Jerzy Grotovski (1933), diretor do Teatro-Laboratório de Wroclaw,

influenciado por Antonin Artaud (1896-1948), poeta e diretor teatral francês,propôs o teatro pobre, aquele que se sustenta apenas na relação ator-espectador, rejeitando as

características cênicas.

Para Grotovski tornou-se possível manter uma infinidade de relações a partir da idéia deque o teatro não é senão o encontro do espectador com o ator. [...] Procurando reinventarum mundo de magias e desnudar a realidade, o teatro moderno tenta seencontrar o aspectoritualístico de sua origem. (AMARAL, 1976, p. 62)

A partir de então, o espaço passa a não ser tão importante, uma vez que as encenações podem

acontecer também ao ar livre.

2.2 Elementos teatrais

2.2.1 Texto

Um texto preguiçoso, difícil de ser lido, mas que permite ao leitor estabelecer o que ele

significará e qual será o seu desenvolvimento. Esse é o significado que Ryngaert (1996)atribui ao texto de teatro.

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Esse estatuto de “máquina preguiçosa” devolve a bola para o campo do leitor. Compete aele descobrir a maneira de alimentar a máquina e inventar sua relação com o texto.Compete a ele imaginar em que sentido os “espaços vazios” do texto pedem para seremocupados. (RYNGAERT, 1996, p. 3)

Nos primeiros anos do teatro o texto era o seu principal elemento, mas, com o tempo, acabou

perdendo espaço para a encenação. O texto, que antes era incompleto e cheio de buracos

passou a ser preenchido pela encenação e todo e qualquer texto pode ser transformado em

espetáculo. Essa liberdade que o texto do teatro proporciona ao leitor não é aceita de forma

negativa por autores e críticos, muito pelo contrário, segundo Ryngaert (1996), essa

possibilidade de criar, inventar, explorar os limites dos gêneros do teatro é muito positiva.

Os gêneros  – que são divididos em: tragédia, drama, tragicomédia  – não indicam apenas as

formas de escrita, mas também a ação dos personagens, os temas tratados. Na Idade Média, a

definição dos gêneros não era prioridade. Nesta época, optava-se pela mistura de um pouco de

cada gênero. Era normal que um drama religioso tivesse cenas impróprias para o contexto

religioso, a junção de temas permitia isso. No teatro contemporâneo não é muito diferente, a

maioria dos textos é criada sem rótulos, ou seja, sem um gênero determinado.

De acordo com Magaldi (2004), ao escrever a peça, o dramaturgo já deve pensar no

espetáculo como um todo, já vendo a sua forma bruta, determinando qual será o estilo dos

personagens, o tipo de figurino, o cenário, entre outros. Além do mais, o texto precisa ser

encenado, para aí, sim, ser considerado como uma peça teatral.

Os diálogos precisam sugerir que são os únicos que poderiam ser pronunciados, naquelasituação. A fala harmoniza-se com o conjunto do desempenho, não sufocando o ator, pelademasia, até amarrar-lhe os gestos e os movimentos. A síntese poderosa capta o públicopelo choque. (MAGALDI, 2004, p 22)

Nos anos de 1970, o texto de teatro perdeu importância. Muitas peças tinham suas encenações

tiradas de romances, sem nenhum tipo de adaptação para a linguagem teatral. “Essa

dissociação entre o „dizer‟ e o „fazer‟, e a desconfiança para com qualquer redundância,

confirma que é cada vez menos importante que o texto considere ou programe ações,

sobretudo se estas não criam nenhuma fratura entre o texto e a representação.” (RYNGAERT,

1996, p 11)

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Nenhuma representação explica milagrosamente o texto. A passagem do texto ao palcocorresponde a um salto radical. Claro que o espectador experimenta a necessidade e oprazer de voltar ao texto, assim como o leitor de assistir a uma representação. Mas osnumerosos laços existentes entre o texto e o palco não podem satisfazer-se com a ilusãomecanista de uma simples complementaridade. (RYNGAERT, 1996, p 11)

Hoje, o texto não é mais considerado como menos importante, necessitando de complemento.

Daí, a importância da representação.

2.2.2 Tempo e espaço

Assim como as outras artes foram se modernizando, o teatro também sofreu grandes

mudanças, o que o fez crescer no gosto das pessoas. O palco do teatro, onde sempre

aconteciam as apresentações, além de sofrer alterações, perdeu lugar para estações, auditórios,

trens, prisões. Com o passar do tempo, todo e qualquer lugar poderia servir como palco para

uma apresentação teatral. De acordo com Carrière (1995), o teatro, ao contrário do cinema,

não tem como espaço a ilusão, ele pode acontecer onde o autor desejar. Além da evolução do

espaço, o teatro também sofreu alterações no roteiro, nas encenações, no seu tempo, na

postura dos personagens, entre outros.

A representação, elemento fundamental na complementação do texto, depende de algunsunidades aristotélicas para acontecer: espaço e o tempo. Segundo Ryngaert (1996), eles são o

signo da estética do texto teatral.

O espaço e o tempo são categorias abstratas, difíceis de captar à leitura do texto, e que noentanto afetam radicalmente a representação. Os diretores sabem o quanto a escolha doespaço determina seu trabalho ulterior e que o ritmo de uma representação é um dadovariável, que frequentemente escapa às melhores intenções. Portanto, é uma espécie deparadoxo pretender assinalar no texto dados que serão, de todo modo, irreconhecíveis nopalco. (RYNGAERT, 1996, p 75)

No teatro, assim como no cinema, tempo e espaço andam juntos, fazendo com que anos de

história se resumam a algumas horas de espetáculo e a um mesmo lugar (palco e sala de

cinema). Mas, diferente do cinema, que substitui a presença pela imagem, no teatro, público e

ator estão frente a frente. Neste caso, o espectador precisa sentir as sutilezas do ator ali, na

hora.

Na França, nos anos de 1630, surgiu o palco, lugar único onde todo o desenrolar da história sepassa. Esta adaptação foi uma complicada tarefa para os autores que não estavam

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acostumados a esse tipo de estrutura. “Nos primeiros tempos de sua aplicação, os autores se

esforçavam, nos prefácios, para provar que cumpriam as regras, às vezes ao preço de uma

distorção exigida por um enredo decididamente difícil de se moldar ao esquema das

unidades.” (R YNGAERT, 1996, p 78)

“[...] se o espaço cênico adotado na representação concretiza todas as escolhas espaciais

operadas anteriormente, o mesmo não acontece em relação ao tempo, cujas marcas estão

como que diluídas no texto, no espaço, nas personagens, no ritmo do espetáculo.”

(RYNGAERT, 1996, p 92)

Outra característica importante no teatro é o tempo do enredo e as alterações que este foi

sofrendo com o passar dos anos. Foi necessário diminuir o tempo das peças, o que trouxe

bastante dificuldade, uma vez que era preciso manter a qualidade e a fidelidade à história.

2.2.3 Personagem

Outro elemento fundamental do teatro é o personagem. De acordo com Araújo (2008), na

época dos tragediógrafos gregos, eles mesmos representavam o que escreviam, porém, mais

tarde, Sófocles começou a desfazer este elo entre autor e ator. As encenações passaram então

a variar de acordo com a cultura na qual os atores estavam inseridos.

No teatro oriental, por exemplo, o ator é envolvido por rituais e cerimônias religiosas. Já naChina, o ator precisa dominar o gestual, o canto e a palavra, devido à simplicidade docenário e também por causa da tradição da linguagem simbólica da cultura chinesa. Asmulheres, desde o início do teatro, eram impedidas de encenar. Os papéis femininos eramrepresentados por homens que se vestiam e maquiavam como mulheres. E é somente na“Commedia dell’ Arte” que elas começam a atuar no teatro de rua. (ARAUJO, 2008, web)6 

O ator tem um trabalho difícil: „incorporar‟ uma pessoa que ele não é, e fazer isso de maneira

convincente.Além do mais, ele precisa causar algum tipo de sentimento nos espectadores, e

traduzir de forma clara quem é o seu personagem e qual sua influência na história. “Construir 

sua personagem, entrar na pele da personagem, estar na pele da personagem, trabalhar sua

personagem, eis algumas expressões que falam de uma espécie de face a face entre o ator e

aquele que será seu duplo”. (RYNGAERT, 1996, p. 125) 

6www.infoescola.com

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O ator de teatro precisa adaptar-se a algumas exigências técnicas durante a encenação da

peça: a forma como ele demonstrará os sentimentos do seu personagem, o gestual a ser

utilizado por ele, etc. No caso do cinema, caso seja necessária alguma mudança ou introdução

de algum efeito especial, isto será feito durante a montagem do filme e não durante a

apresentação.

De acordo com Pavis (2003), o ator não só empresta seu corpo, a sua aparência, a sua voz, a

sua afetividade, mas ele se faz passar por uma pessoa de verdade, tal como as pessoas que

convivemos no nosso dia-a-dia. O espectador, no seu papel, identifica-se com este

personagem, a partir do momento em que descobre nele semelhanças de caráter, de

experiência de mundo, das emoções e dos valores morais e filosóficos. Logo, este espectadoresquece-se que está em um teatro, assistindo a uma representação e mergulha no universo

que ela representa.

Segundo Roubine (1987), no teatro, as emoções dos atores devem ser visíveis, legíveis, e de

acordo com algumas convenções de representação ou até mesmo a tradição e cultura de

determinada região de origem deste teatro. Para poder passar as emoções do personagem para

os espectadores, o ator precisa de alguns efeitos, de uma vestimenta adequada ao seupersonagem, do texto, e de liberdade para poder ir além dos limites impostos e colocar um

pouco do seu caráter naquele “espírito” que seu corpo está prestes a “encarnar”. 

Além da preocupação em encarnar o seu personagem, o ator precisa também treinar

incessantemente as técnicas vocais, gestuais, corporais, e as faciais, uma vez que ele não

precisa, necessariamente, imitar uma pessoa real, ele pode apenas sugerir ações através de sua

fala ou dos gestos. O treino também é importante para que o ator se mantenha no “corpo” dopersonagem até o final da representação.

Grandes autores discutiram quanto á forma que o ator deveria usar para conseguir interpretar

determinado personagem. A maioria deles sempre acreditou que se tratava da sensibilidade,

controlada por ela mesma ou pelo cérebro do ator. Os próprios atores resolveram a questão

colocando a técnica como a responsável pelo sucesso na hora da representação. Com

Konstantin Stanislavski (1863-1938) a técnica começou a receber destaque e a ser valorizada

como o único meio capaz de permitir a total intimidade entre ator e personagem.

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Para alguns autores, como Bertold Brecht (1898  – 1956), era necessário que o ator primeiro

mostrasse a personagem, não apenas a representando, e depois ele deveria mostrar a todos que

aquilo não passava de uma representação teatral. Esse tipo de atitude não era presente nos

poetas trágicos gregos, que sempre procuravam imprimir o caráter religioso em suas

representações, passando ao público a ideia de que aquilo era realmente verdade, e não apenas

uma representação de ficção. Mas, a convenção exigia que ao final de todas as representações

o autor colocasse em cena alguns traços que levassem o público a acreditar que se tratava

apenas de uma representação e que, a partir daquele momento, eles poderiam voltar para a

realidade.

De acordo com Pavis (2003), o ator está situado na essência do acontecimento teatral.Ajustes, nuances que se modificam a cada apresentação. Ele é o vínculo vivo entre o texto do

autor (diálogos ou indicações da encenação), as sugestões de representação passadas pelo

encenador e a interpretação atenta do espectador.

2.2.4 Cenário

O cenário é outro importante elemento do teatro e um dos principais responsáveis pela

aceitação do público de determinada peça, além do mais, ele é responsável por determinar o

espaço e o tempo da ação teatral.

O espaço representado pode ser geográfico (uma paisagem, montanhas, cachoeiras), podeser social (uma praça, prédios, ruas) ou pessoal (emoções, paixões, sonhos). Já o tempo érepresentado a partir da época histórica, estações do ano, momentos do dia. Os recursoscenográficos também podem estar no desempenho do ator, no ruído, no vestuário e nailuminação. (OLIVEIRA, 1998, web)

De acordo com Magaldi (2004), a invenção da luz elétrica, que foi aplicada ao teatro a partir

de fins do século passado, alterou fundamentalmente o conceito de cenário, contribuindo para

uma maior valorização do espetáculo.

Para a construção do cenário são utilizadas duas ferramentas: a arquitetura e a pintura. O

cenário é composto também por mobiliários  – mesa, cadeira, sofá, cama  – e, eventualmente,

são utilizadas esculturas, entre outros artigos de decoração. Outro importante fator que

completa o cenário são os figurinos dos atores, estes variam de acordo com a história a ser

contada  –  vão desde modernos a antigos, robustos e mais simples. “O tratamento do espaço

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cênico decorre, portanto, na sua concepção geral, de um trabalho de análise da peça e da

definição, feita de comum acordo com o encenador, de uma opção dominante que regerá a

totalidade do espetáculo”. (ROUBINE, 1998, p. 129) 

Existe também a cenografia sonora, que deve, assim como o figurino e as demais estruturas

do cenário, estar de comum acordo com o estilo da obra que será apresentada. “Quando

manejadas com sutileza, elas conferem ao espetáculo um extraordinário peso de realidade, e

quando combinam plenamente com as exigências ou as possibilidades da obra, multiplicam

consideravelmente os seus potenciais expressivos e emocionais”. (ROUBINE, 1998, p. 157) 

2.3 Características próprias de Shakespeare

2.3.1 O Autor 7  

Nascido no ano de 1564, em Stratford-on-Avon-Inglaterra, em uma família de classe média,

que com o tempo foi melhorando as condições financeiras, mas logo perdeu quase tudo o que

tinha, William Shakespeare não teve a oportunidade de ingressar em uma carreira

universitária, pois, ainda aos treze anos, se viu na obrigação de ajudar o pai a trazer dinheiropara casa. Aos 18 anos, Shakespeare teve que se casar com sua então noiva, Anne Hathaway,

que estava grávida. Três anos após o nascimento de sua primeira filha, Susana, Shakespeare

recebeu novamente a notícia de que seria pai. Nasceram então os gêmeos Hamlet e Judith.

Onze anos depois, seu único filho homem morreu.

Em 1592, Shakespeare iniciou sua carreira de ator, produtor e dramaturgo, em Londres,

quando associou-se à Companhia de Lorde Strange, que mais tarde se transformou naCompanhia do Chamberlain, um bem sucedido grupo de teatro.  Dois anos depois, ele

continuou com seus trabalhos dramatúrgicos, escrevendo para diversas companhias. Escreveu

Ricardo III ( Richard III , 1594) que é uma continuação de  Henry VI , escrito ou adaptado em

1951. Ele escreve também Titus Andronicus, uma peça de vingança na tradição Sêneca-Kid ,

onde ele retoca o que já havia sido criado; e sua Comedy of Errors, uma adaptação livre dos

 Menaechmi, de Plauto.

7www.wikipedia.com.br

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Mesmo sem estudos mais especializados sobre teatro, poesia, a arte de atuar, entre outros,

Shakespeare produziu obras de alta qualidade, que o transformaram em um autor de grande

renome, conhecido mundialmente.

Seu conhecimento da paisagem inglesa, das flores e dos pássaros, pode ter sido adquiridocom facilidade durante suas peregrinações pelo campo. Um conhecimento do coraçãohumano e do comportamento humano deve ser atingido sem grandes barreiras um jovemobservador que partilhou das vicissitudes de sua família, ainda moço conquistouconsiderável experiência nos negócios ao invés de estar encerrado numa universidade, setornou pai aos dezoito anos e um viajador errante aos vinte e dois. Então, chegando àcosmopolita Londres, encontrara um novo mundo abrindo-se à sua frente. Ao tempo deShakespeare todas as influências do velho e do novo encontravam-se e confundiam-se, e ocompleto ecletismo e confusão de seu tempo conferiram-lhe aquela universalidade que elepartilhou com tantos elisabetanos. (GASSNER, 1974, p. 246)

De acordo com Gassner (1974), Shakespeare vivia em uma ambiente onde existia um vasto

material para a sua profissionalização. Bastava ele observar e trabalhar com outros

profissionais mais experientes. Assim como o dom da imagística e da musicalidade verbal,

Shakespeare também possuía o dom da poesia, dom este que foi desenvolvido sob a

influência de uma época onde o verso lírico e branco estava sendo constantemente utilizado e

aperfeiçoado. Outra importante característica de Shakespeare, que o diferencia dos demais

mestres do teatro, é sua sensibilidade e o amplo conhecimento do ser humano.

Sem tocar os tambores de uma democracia inexistente ou abraçar a causa dos deserdadoscamponeses elisabetanos e denunciar os ultrajes das bárbaras leis penais da rainha,Shakespeare é o maior humanista que jamais escreveu para o teatro. [...] A habilidade deShakespeare em criar personagens infinitamente humanos brota de um abrangente amorpelo homem que nenhum grau de pessimismo em seu período de apogeu poderia obliterar.(GASSNER, 1974, p. 252)

Após escrever peças que o imortalizaram, tais como Romeu e Julieta, Hamlet , Sonho de uma

noite de verão, entre outros, nos seus últimos anos de vida, Shakespeare passou a fazer

trabalhos pequenos, grande parte como colaborador. Depois de 1613, Shakespeare nãoescreveu mais. Ele voltau para Stratford como um próspero cidadão e passou a cultivar seus

  jardins. E, no dia 23 de abril de 1616, quando completava 52 anos, Shakespeare faleceu.

(Wikipédia)

2.3.2 Inglaterra na época de Shakespeare

De acordo com estudo do professor e jornalista Schilling (2002), “Pode -se dizer queShakespeare viveu o cenário histórico polêmico de Elizabeth I (1558  –  1603)”. O século XVI,

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na Inglaterra, onde quem governava era a rainha Elizabeth, foi conhecido como o momento de

ouro da dramaturgia britânica. Época esta dominada pelas sabedorias de Shakespeare e de

seus companheiros da Companhia Camarlengo. A rainha, que era conhecida pelo povo como

„Good Queen Bess’ , reinou por 45 anos. Durante este período, Elizabeth enfrentou diversos

problemas vindos de dentro de sua própria casa – quando sua prima Mary Stuart foi escolhida

pela população como um nome forte para sucedê-la, uma vez que ela era católica e Elizabeth

era herética – e também enfrentou problemas vindos de longe. “Seu reino foi palco de vários

conflitos religiosos e teológicos que separavam os católicos (papistas), os calvinistas

(puritanos) e os que seguiam a religião oficial da Inglaterra (anglicanos)”. (SCHILLING,

2002, web)

Quando Elizabeth soube que sua prima poderia sucedê-la, mandou matá-la, o que gerou uma

enorme insatisfação na população católica, que queria a todo custo excomunga-la. Quando o

Papa Pio V descobriu o que Elizabeth havia feito, ele autorizou que todos os católicos que

quisessem poderiam participar da excomunhão de Elizabeth, ou até mesmo de sua morte. A

Inglaterra via-se então ameaçada pela Espanha, maior potência católica do mundo. Em 1588,

o então rei da Espanha, Felipe II organizou uma poderosa ocupação naval-militar, com o

objetivo de invadir a Inglaterra. Mas a operação fracassou,e, neste momento da história,

Shakespeare recolhia material para a encenação de suas peças patrióticas. Este acontecimento

histórico foi registrado por Shakespeare na sua peça intitulada Cimbelino (ato III, cena I).

Shakespeare utilizava da história e dos momentos que a Inglaterra estava enfrentando para

escrever suas peças. Ele escreveu aquela que mais chocou seu público: Henrique V , onde ele

narra a história de um jovem rei inglês que, juntamente com seu exército, conseguiu vencer

seus inimigos, que eram em maior número, na batalha de Azincourt, em 1415, durante a

Guerra dos Cem Anos, disputada contra a França.

De acordo com Schilling (2002), em 1599, Shakespeare, juntamente com a Companhia

Camarlengo, construiu o Globe Theatre, espaço onde as peças de Shakespeare eram

apresentadas ao público no verão, uma vez que o espaço não era coberto e, nas demais

estações do ano é impossível, em países onde as estações frias são muito severas, ficar muito

tempo em espaços abertos. Em 1613, três anos antes da morte de Shakespeare, este teatro foi

destruído por um incêndio, iniciado por uma fagulha de um canhão que caiu sobre o telhado

de palha do teatro, durante a representação de   Henrique VIII . Em 1642, com o início da

Revolução Puritana, todos os teatros receberam ordem para serem fechados e só em 1661,

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com a volta dos Stuarts ao poder – desta vez quem estava reinando era Carlos II -, os teatros

foram novamente reabertos ao público.

Em 1601, Shakespeare e seus colegas da companhia foram envolvidos em um golpe, liderado

pelo conde Essex, que também queria derrubar o governo de Elizabeth. A partir de então,

Shakespeare passou a incorporar em suas peças elementos mais sombrios, entre eles, os

cenários com características puramente góticas. Estas peças foram consideradas como as

melhores composições shakesperianas: Otelo, Rei Lear e Macbeth. (SCHILLING, 2002)

No século XVI, a Inglaterra passaou por um problema econômico, quando grande parte dos

aristocratas feudais foram mortos durante a Guerra das Duas Rosas (1455-1485) – durante aqual duas famílias, Lancaster e York,brigaram pelo poder. O outro acontecimento que marcou

a Inglaterra desta época, foi a ruptura da monarquia com a Igreja Católica, quando o rei

Henrique VIII, invocando razões de Estado, quis divorciar-se da rainha Catarina de Aragão.

Como o papa não concordou com o divórcio, uma vez que a Bíblia não é a favor deste ato, o

rei proclamou-se soberano sobre a religião por meio da Ata da Supremacia, em 1534 -. A

partir de então, ele cria o anglicanismo, o que fez com que as propriedades de mosteiros

fossem vendidas à nobreza e à burguesia.

Schilling (2002) ressalta que, nesta época, tanto os campos como as cidades inglesas eram

marcados por uma grande pobreza. “Isso se dava por causa da política de enclausuramento, do

cercamento das terras coletivas e a apropriação dessas terras pelos criadores de ovelhas, uma

vez que a indústria de produção de lã estava crescendo nos Países Baixos”. (SCHILLING,

2002, web). Para a criação de ovelhas, os nobres poderosos expulsaram camponeses e aldeões

para pegar suas terras. Estas pessoas viram-se obrigadas a se mudarem para as grandes

cidades, em busca de trabalho e lugar para morar. Devido a esta mudança, Londres, por

exemplo, chegou a ter 150 mil habitantes na época de Shakespeare, fazendo dela uma das

cidades mais habitadas do mundo.

2.3.3 Suas peças

Estudando mais precisamente as características de Shakespeare, através de suas obras,

Spurgeon (2006) acredita que através da imagem podemos descobrir muito a respeito da

história que nos será contada. E, ainda de acordo com a autora, através da análise da mesma,

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podemos também ter acesso à personalidade do autor de determinada história, como é o caso

de Shakespeare.

O autor pode ser, e no caso de Shakespeare o é, quase que integralmente objetivo em seuspersonagens dramáticos, seus pontos de vista e suas opiniões, mas mesmo assim, como ohomem que, sob tensão emocional, não demonstra o mínimo sinal dela no olhar ou naexpressão facial mas a revela por meio de alguma tensão muscular, o poeta, sem o saber,deixa a descoberto seus gostos e desgostos, observações e interesses, associações de idéias,atitudes mentais e crenças mais profundas, em suas imagens e através delas, os retratosverbais que desenha a fim de iluminar algo completamente diferente nas falas e nospensamentos de seus personagens. (SPURGEON, 2006, p. 4)

Começando a análise específica das imagens de Shakespeare, Spurgeon (2006) destacou o

tipo de imagem comum nas obras de Shakespeare: pássaros, plantas, jardinagem, o tempo e o

convívio doméstico das pessoas.

[...] seus pés estão sempre bem plantados nesta “boa estrutura, a terra”, seus olhos semprefocados na vida cotidiana ao redor, e nada lhe escapa do vôo de um pássaro, dodesenvolvimento de uma flor, das tarefas de uma dona de casa ou das emoções escritas norosto humano. (SPURGEON, 2006, p 13)

Ao fazer esta análise sobre o tipo de imagem mais utilizada nas obras de Shakespeare,

Spurgeon (2006), chega à conclusão de que ele era um apaixonado pelo movimento das

pessoas no dia-a-dia.

“Vemos, entre muitos outros aspectos, que Shakespeare era um observador intensamenteinteressado em coisas e eventos concretos do dia-a-dia, especialmente na vida ao ar livre nocampo e na rotina doméstica da casa, e que seus sentidos eram anormalmente aguçados ereativos”. (SPURGEON, 2006, p. 14) 

Além disso, ainda de acordo com a autora, Shakespeare se inspirava nas sensações ao criar as

histórias e visualizar as imagens para as mesmas. “Ele visualiza os seres humanos como

sendo plantas e árvores, sufocadas por ervas daninhas, ou bem podados e preparados e dando

frutos maduros, de perfume doce como o da rosa ou nocivo como de uma erva daninha.”

(SPURGEON, 2006, p. 17)

Grande conhecedor do ser humano e de seus desejos, como a ele é atribuído pelo escritor John

Gassner, os temas trabalhados por Shakespeare diziam respeito ao cotidiano humano:

problemas de governo, as glórias e os fracassos de personagens históricos, os direitos dos reis,

política exterior, filosofia humanista, ciência, entre outros. Ao trabalhar estes assuntos em

suas obras, Shakespeare mostrava para seu público, sua opinião sobre determinadosacontecimentos de sua época, além de elementos de sua experiência e reflexão, de seus

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sentimentos e diversão. “É crítico em relação ao feudalismo, retratando seu fracasso em

 Henrique VI, Henrique IV e Henrique V ; também não tolera a monarquia irresponsável ou

incompetente tal como é exemplificada por um oscilante  Rei João e um estouvado  Ricardo

 II”. (GASSNER, 1974, p. 250)

O tempo em que seus personagens viveram era facilmente identificado, uma vez que eles

traziam as características de sua época estampadas em suas vestimentas, falas e em suas

formas de expressão. Shakespeare também era universal. Em suas obras ele utilizava de

pessoas das mais variadas classes econômicas: príncipes e nobres, mercadores, oficiais

subalternos, soldados, ladrões e vagabundos. Além dos homens, Shakespeare também fazia

questão de utilizar em suas obras personagens femininas, as quais ele fazia questão de colocarem papéis de honra.

A vida vivida com intensidade é o principal ingrediente das obras shakespearianas. Esse

gosto do autor pela vida era demonstrada através de risos e lágrimas, ambição, a incessante

busca pelo prazer, além da persistência em vencer as adversidades. A indagação sobre o seu

futuro também é uma característica muito presente nos personagens de Shakespeare.

Ao utilizar de um personagem que teve uma grande importância histórica, política ou social,

Shakespeare, que era considerado um homem simples, o trata como um ser humano normal,

nada de privilégios. “Seus governantes e conquistadores não são senão carne, não importa o

quão gloriosa seja, em última análise acabará por se transformar em cinza inglória”.

(GASSNER, 1974, p. 253)

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3 CINEMA

3.1 História do Cinema

3.1.1 Introdução

A criação artística e a necessidade de documentar acontecimentos surgiram juntamente com

os desenhos e as pinturas nas paredes das cavernas, ainda no início da humanidade. Depois

disso, as demais demonstrações artísticas foram incorporando um pouco da anterior e fazendo

pequenas mudanças. De acordo a crítica de cinema, Farias (2004), o jogo de sombras do

teatro de marionetes oriental é considerado um dos mais antigos precursores do cinema.

“Nesta arte, que surgiu na China, por volta de 5.000 a.C., a projeção das sombras era feita em

paredes ou em panos, e formavam, através de sombra, figuras humanas, animais, entre

outros”. (FARIAS, 2004, web) Com o passar do tempo e com o desenvolvimento de estudos

sobre máquinas capazes de tornarem a arte cinematográfica possível, logo surgiram

experiências com a Câmera Escura e a Lanterna Mágica.

De acordo com Bilharinho (1996), o uso da câmara escura teve início com Leonardo Da

Vinci, no século XV e foi desenvolvido pelo físico napolitano Giambattista Della Porta, noséculo seguinte. Este invento nada mais era que uma caixa fechada, com um pequeno buraco

coberto por uma lente, por onde os raios refletidos por objetos que se encontravam no

ambiente externo entravam e se cruzavam, produzindo a imagem, que era projetada de forma

inversa, no fundo da caixa. Já a lanterna mágica foi criada pelo alemão Athanasius Kirchner,

na metade do século XVII e “[...]tratava-se do projeto inverso da câmara escura”

(BILHARINHO, 1996, p. 55). Ela era composta por uma caixa cilíndrica, iluminada por uma

vela, que projetava as imagens em uma lâmina de vidro.

3.1.2 Criação dos primeiros aparelhos

De acordo com Sadoul (1963), como já havia sido descoberto que eram necessários meios

ópticos para que a projeção e reprodução de imagens em movimento fosse possível, foram

construídos vários aparelhos baseados no fenômeno da persistência retiniana (tempo em que a

imagem permanece na retina, trata-se de fração de segundo), que teve o estudo esboçado por

 Newton e o Cavaleiro D‟Arcy, nos séculos XVII e XVII, e mais tarde aperfeiçoado por Peter 

Mark Roger, inglês de origem suíça, em 1826. Com a aplicação destes estudos, em 1830, um

físico britânico construiu a Roda Faraday, citada em todos os tratados de física. John Herschel

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também estava trabalhando em uma nova criação física quando fez nascer o primeiro aparelho

óptico a empregar desenhos.

Ainda segundo Sadoul, em 1826, surgiu então o primeiro aparelho a reproduzir imagens emmovimento, o Taumatrópio. Criado por Fitton e o doutor Paris, o aparelho nada mais era que

um disco de papelão que continha na face e no verso dois desenhos, que se superpõem aos

olhos quando girados rapidamente. O avanço destes estudos e do próprio cinema vieram com

a fotografia, desenvolvida simultaneamente por Louis-Jacques Daguerre e Joseph Nicéphore

Niepce, e também das pesquisas de captação e análise do movimento.

Outro aparelho criado foi o Fenacistoscópio, em 1832. Criado pelo físico belga Joseph-

Antoine Plateau, ele foi o primeiro a medir o tempo da persistência retínica. Através dele  –  

aparelho formado por um disco com várias figuras desenhadas em posições diferentes, que ao

ser girado, passavam as figuras em movimento - uma série de imagens fixas davam a ilusão

de movimento.

Mais tarde, foi criado o aparelho responsável pela projeção de imagens desenhadas sobre fitas

transparentes em telas. A criação recebeu o nome de Praxinoscópio, e foi inventado pelo

francês Émile Reynaud, em 1877. A princípio foi considerado como uma máquina muitoantiquada, composta por objetos que poderiam ser considerados como lixo: uma caixa de

biscoitos e um único espelho. Mas, como descrito no site Webcine8 , “ele foi aperfeiçoado com

um sistema mais elaborado de espelhos que permitiam efeitos de relevo, multiplicando as

figuras desenhadas e, com a adaptação de uma lanterna de projeção, era possível realizar

truques que também davam a ilusão de movimento”. 

Em 1878, o fisiologista francês Étienne-Jules Marey desenvolveu o fuzil fotográfico, que

nada mais era do que um tambor forrado por dentro com uma chapa fotográfica em formato

de círculo.Mais tarde, em 1887, Marey desenvolveu um novo sistema, Cronografia,

responsável pela fotografia de várias fases de determinado corpo em movimento. (Webcine)

Em 1894, o norte-americano Thomas Alva Edison inventou o filme perfurado e passou a

produzir uma série de pequenos filmes em seu estúdio, o Black Maria, primeiro da história do

cinema. Os filmes rodados por ele eram assistidos através

8 www.webcine.com.br/historia1.htm

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do Cinetoscópio, criado pelo próprio Edison, um ano depois. Este aparelho tinha uma

desvantagem, as imagens só podiam ser vistas por um espectador de cada vez. (Webcine)

Mas, com um pouco mais de estudos, esse problema foi resolvido pelos irmãos Auguste eLouis Lumière, ao desenvolverem o Cinematógrafo, em 1895. O aparelho era movido a

manivela e utilizava negativos perfurados. (Webcine)

3.1.3 Cinema mudo e a sincronia dos sons nos filmes

De acordo com um artigo publicado no site Webcine, a apresentação ao público dos pequenos

filmes exibidos pelo Cinematógrafo, marcou oficialmente o início da história do cinema. A

primeira exibição da nova arte aconteceu em 28 de dezembro de 1895, em Paris, quando osirmãos Lumière apresentaram A saída dos operários das usinas Lumière, A chegada do trem

na estação, O almoço do bebê e O mar, alguns dos filmes criados por eles. Este filmes foram

considerados como pequenos documentários sobre o dia a dia das pessoas, com cerca de mais

ou menos 1 minuto de projeção. Eles eram filmados ao ar livre e sem som sincronizado à

imagem.

Com a Primeira Guerra Mundial, a produção cinematográfica européia teve que dar um

tempo, o que fez com que a criação de filmes se concentrasse em Hollywood, na Califórnia.

Lá surgiram os primeiros grandes estúdios: Keystone Company, de Mack Sennett, em 1912,

Famous Players (futura Paramount), também em 1912. Já em 1915, foi criada a Fox Films

Corporation.

A sincronia entre imagem e fala/som só chegou às projeções cinematográficas três décadas

depois, no final dos anos de 1920, quando, em 1926, a Warner Brothers comprou o aparelho

do americano Lee de Forest, desenvolvido em 1907, que fazia a gravação magnética empelícula e daí produziu o primeiro filme com som.  Don Juan (Don Juan, 1926, EUA), do

diretor Alan Crosland, foi produzido pela companhia, no mesmo ano da compra do aparelho.

O primeiro filme com passagens faladas e cantadas, do mesmo diretor, foi produzido noano seguinte e recebeu o título de O Cantor de Jazz (The Jazz Singer, 1927,EUA ), e tinhaem seu elenco o grande nome da Broadway, o ator Al Jolson. Já o primeiro filmetotalmente falado foi Luzes de Nova York , de Brian Foy ( Lights of New York, 1928, EUA). 9 

Entre os anos de 1938 e 39, logo após a Depressão, quando a indústria  –  e não só a

cinematográfica – se recuperou, foram criados grandes clássicos do cinema como A Dama das

9www.webcine.com.br/historia1.htm

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Camélias (Camille, 1937, EUA), E o Vento Levou (Gone with the Wind, 1939, EUA), O

  Morro dos Ventos Uivantes (Wuthering Heights, 1992, EUA) e Casablanca (Casablanca,

1942, EUA). A partir de então, novos recursos técnicos, tais como a modernização dos

aparelhos de captação de imagem e de aperfeiçoamento desta, além dos aparelhos que

possibilitam o trabalho nesta imagem (efeitos sonoros e imagísticos) possibilitaram o

desenvolvimento dos gêneros e da indústria cinematográfica em si. (Webcine)

Acostumados com as outras artes (teatro, literatura, pintura), quando o cinema chega,

diferente das outras expressões, as pessoas demoraram um pouco para se adaptarem a ele, e

ainda mais para compreendê-lo. No começo, as pessoas não conseguiam associar os objetos

que já conheciam com a ação e a história que os roteiristas criavam. Sem o áudio, oexplicador10 era quem narrava a história, ao contrário do teatro, que era ao vivo e a narração

era feita pelos próprios atores. Diferente também dos livros, que oferecem a história já pronta.

“[...] Porque o cinema criou uma nova –  absolutamente nova  –  linguagem, que poucos

espectadores podiam absorver sem esforço ou ajuda”. (CARRIÈRE, 1995, p. 14) 

Mas assim como as outras artes surgiram baseadas em antecessoras expressões, o cinema

utilizou um pouco de cada arte que veio antes dele: a fala dos escritores, a cor das pinturas, o

som com os músicos e os cenários foram elaborados com ajuda de arquitetos, entre outros. E

depois, o cinema acabou copiando dele mesmo, e através destas cópias, ele foi sendo

aperfeiçoado, e rapidamente chegou ao que vemos hoje.

O filme, que no começo era apresentado em uma sequência de tomadas estáticas, ganhou

cenas através do nascimento das técnicas de montagem e edição. Junto com as cenas, o

cinema ganhou um novo vocabulário jamais visto nas demais mídias. Através destas técnicas,

o filme leva seus espectadores para onde eles devem ir, e permite que eles interpretem e

sintam a história tal como o autor deseja. “Se, nesse momento, o marido for filmado do ponto

de vista da mulher, diretamente de baixo para cima, inevitavelmente vai parecer ameaçador,

todo-poderoso. Apenas a posição da câmera produzirá esse efeito independente de nossos

 próprios sentimentos”. (CARRIÈRE, 1995, p. 16) 

10Responsável por narrar a história na época em que ainda não existia a tecnologia para transmitir áudio eimagem juntas. (CARRIÈRE, 1995, P. 15)

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De acordo com Carrière (1995), é que, assim como tudo que nos cerca, o cinema também

precisa ser iniciado de novo. É essa a busca que ele fala que o cinema e as pessoas que estão

envolvidas com a arte sempre devem ter, a de inovar sempre a linguagem.

3.2 Princípios básicos do cinema

3.2.1 Linguagem cinematográfica

A linguagem é fundamental para que haja a comunicação dos seres. Ela surgiu junto com o

homem, da sua necessidade de se comunicar e se expressar. Para isso, Martin (1963) define a

linguagem como sendo um veículo de ideias para a comunicação entre seus semelhantes ou

como um produto da arte.

Quanto ao cinema, "[...] se pode dizer que o cinema, mais do que qualquer outro meio de

expressão artística, é a linguagem do ser, é talvez mesmo a linguagem por excelência e que,

além disso, evidentemente, ele é um ser." (MARTIN, 1963, p. 12). Assim como o cinema

também é um veículo de informação, ele necessita da linguagem para se comunicar e se

expressar.

A linguagem cinematográfica não se baseia somente na palavra, ou seja, na linguagem verbal,

mas em vários outros elementos que a completam. Principalmente na imagem, que é

denominada como "[...] o material básico da linguagem cinematográfica". (MARTIN, 1963,

p. 17)

Outra ferramenta exclusiva do cinema é a transposição dos pensamentos de seus personagens – pelo menos com a transposição em imagens. Nesta arte, com o uso de algumas técnicas, o

filme pode nos levar diretamente para o que o personagem está pensando, sentindo,

imaginando ou sonhando. “O cinema cria, assim, um novo espaço, com um simples

deslocamento do ponto de vista”. (CARRIÈRE, 1995, p. 17) 

De acordo com Carrière (1995), a linguagem é manipulada de diversas formas, dependendo

de qual sentimento e impressão o espectador deve ter da história. Uma destas formas de

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manipulação da linguagem é a câmera, que pode levar o espectador para aonde o diretor do

filme quiser.

Ao contrário da escrita, em que as palavras estão sempre de acordo com um código que

você deve saber ou ser capaz de decifrar (você aprende a ler e a escrever), a imagem emmovimento estava ao alcance de todo mundo. Uma linguagem não só nova, como tambémuniversal: um antigo sonho. (CARRIÈRE, 1995, p. 19)

Um problema que podemos destacar é o que diz respeito à pausa, que não pode existir no

cinema, uma vez que pode causar um mal estar no espectador e fazer com que ele desista de

assistir o filme e, no caso de estar assistindo ao filme na TV, mudar de canal. Em

comparação com a literatura, temos a possibilidade que o livro nos permite, de dar uma pausa

na história, sem perder o interesse de seu leitor, o que não ocorre no cinema.

Ao comparar o cinema com o teatro, Carrière (1995) destaca que no nascimento da sétima

arte, os atores do cinema ainda não tinham uma linguagem própria de representação, por isso,

precisavam exagerar em seus movimentos, na maquiagem, nos sentimentos demonstrados.

Mas nem tudo foi herdado do teatro e, se há algo que difere o cinema da arte apresentada em

palcos  –  além das técnicas, de tempo e espaço  – , é também a sensação que o cinema

proporciona ao seu espectador de fazer parte da história. Esta sensação de colocar oespectador dentro da telona, sendo representado pelos atores, de se emocionar com a história,

de o colocar no lugar daquele ator que sofre, isto é típico e particular do cinema. No teatro,

por mais que o público se emocione, ele sempre estará dentro do teatro. Esta sensação de

transportar seu público para dentro da história, que encontramos na literatura, que transporta

seu leitor ao imaginário vindo da sua própria cabeça, no cinema acontece a partir das imagens

pré-determinadas pela equipe técnica do filme.

O cinema pode (ou pôde em certa época) literalmente nos possuir: ele se apodera de nós,nos domina e manipula; e ainda nos absorve, nos ilude. Aqui temos um paradoxo. O cinemafaz uso da ilusão precisamente por ser uma sequência de fotografias postas em movimento,sonorizadas e então projetadas em uma determinada área: precisamente por ser uma áreabaseada na realidade, como se, ao explorar a ilusão, ele reconhecesse sua inabilidade emcompreender e reconstruir essa estranha que até os cientistas hesitam em nomear.(CARRIÈRE, 1995, p. 76- 77)

E com a mais poderosa arma de persuasão, a imagem, o cinema nos faz entrar dentro da

história, fazendo com que nos esqueçamos que aquilo não é realidade, mas sim ficção. “A

ficção, a própria natureza do filme, as técnicas da filmagem e da projeção – tudo é esquecido,

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afastado pelo poder físico da imagem falada, aquela máscara barulhenta colocada sobre o

semblante da realidade”. (CARRIÈRE, 1995, p. 52) 

Transformar esta magia em realidade é outro fundamento importante da imagem. As cenas

que podem ser vistas nas telonas são uma realidade daquilo que é falado ou que a história

quer contar. O próprio som é outro fator importante que ajuda na transposição do imaginário

em real para o público que assiste ao filme. “No cinema, não nos encontramos mais no

mundo, obrigados a nos guardar de seus golpes e das suas ameaças, mas ante ele, protegidos,

anônimos e disponíveis: diante do filme, somos absolutamente livres por uma completa

 participação.” (MARTIN, 1963, p. 21) 

Martin (1963) ressalta que o cinema precisa de efeitos especiais para mostrar uma imagem

mais precisa da realidade: como acontece em filmes de guerras, caso não saísse sangue dos

corpos dos soldados quando eles tomassem um tiro, nós, espectadores, ficaríamos

insatisfeitos. Já no teatro, talvez esta mesma encenação, sem o sangue, já não nos

decepcionaria tanto, uma vez que o que nos faz embarcar na história do teatro é a nossa

imaginação.

Além da sua importância em transmitir de maneira mais realista para o espectador, segundo

Martin (1963), a imagem também é responsável por mostrar aquilo que realmente seja

significativo.

3.2.2 Gêneros

Os primeiros filmes produzidos traziam características dos gêneros documentário e ficção.

Como já foi dito, de certa forma, o documentário surgiu juntamente com o cinema mudo, com

os irmãos Lumière, em 1895. Já a ficção e suas características tem como marco o americano

Edwin Porter, com o filme Vida de um bombeiro americano (Life of an American Fireman,

1902, EUA), e consolidado no ano seguinte, com O grande roubo do trem (The great train

robbery, 1903, EUA), considerado como o primeiro grande clássico do cinema americano.

Em 1912, Mack Sennett, o maior produtor de comédias do cinema mudo - responsável pela

descoberta de nomes como Charles Chaplin e Buster Keaton -, inaugurou sua produtora, a

Keystone Company. Esta nova produtora impulsionou ainda mais os avanços da comédia, que

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  já existia no teatro e no cinema mudo. “Na década de 1920, a comédia, inspirada nas sátiras

do dia a dia e na comédia tipo „pastelão‟, é consolidada no cinema e incorpora novos nomes à

sua lista de estrelas como Chaplin, Keaton, e também Harold Lloyd e Ben Turpin”. (Webcine)

O musical ganha força em Hollywood na década de 1930, juntamente com o desenvolvimento

da sonorização na indústria cinematográfica. Este gênero é caracterizado por roteiros musicais

que mesclam música, dança e canto. No seu início, era fortemente influenciado pelos musicais

do teatro. O primeiro filme destaque do gênero foi Melodia da Broadway ( Broadway Melody,

1929, EUA). Este gênero teve, também, outros inúmeros clássicos, tais como: O Mágico de

Oz (The Wizard of Oz, 1939, EUA), Caçadoras de Ouro (Gold Diggers, 1933, EUA), Diário

de Um Homem Casado (A Guide for the Married Man, 1967, EUA), entre outros. (Webcine)

Além do musical, durante a década de 1930 também foram criados os gêneros western

(Faroeste), policial e terror. Nos filmes de faroeste, era apresentada a história do oeste

americano, envolvendo caubóis, xerifes, armas, cavalos, entre outros. A produção de grandes

filmes deste gênero começou em 1932, e um deles foi o Jornadas Heróicas (The Plainsman, 

1937, EUA), de Cecil B. de Mille.

Já o filme policial surgiu na França, no começo do século XX, mas foi nos Estados Unidos, nadécada de 1930, que ele se desenvolveu. Destacam-se Scarface, a vergonha de uma nação

(Scarface, 1932 EUA), de Howard Hawks e Relíquia Macabra / Falcão Maltês (The Maltese

Falcon, 1941, EUA), de John Huston. (Webcine)

3.2.3 Movimento de câmera e ângulos

Outro fator bastante importante no cinema são os movimentos de câmera, transposição de um

espaço para o outro, que, para Martin (1963), resumem o significado da arte. "A representação

do movimento é a razão de ser do cinema, sua faculdade mestra, a expressão fundamental do

seu gênio". (MARTIN, 1963, p. 17). Através da imagem, o cinema apresenta também a

montagem, que é definida pelo autor como o mais importante fundamento da linguagem

fílmica, responsável pela organização dos planos do filme com suas condições de ordem e

tempo.

Outra especificidade que influencia um filme e sua narrativa são os movimentos de câmera.São eles: travelling  –  onde a câmera se desloca, mas o ângulo permanece constante -, a

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panorâmica  – rotação da câmera em torno do seu eixo vertical ou horizontal sem deslocar o

aparelho  – , e a trajetória  – que é a combinação dos dois movimentos anteriores. Estes três

movimentos básicos também podem ser divididos em dois: subjetivos e objetivos. “[...] todo

movimento se diz „subjetivo‟ quando o aparelho toma o lugar do olho de um dos personagens

da ação, e „objetivo‟ quando a câmera exprime o ponto de vista do espectador, testemunha

exterior e imparcial.” (MARTIN, 1963, p. 34) 

Já os ângulos são identificados como: contre-plongée – quando o ator é filmado de baixo para

cima, o que dá uma impressão de superioridade, exaltação e de triunfo e o plongée  – ator é

filmado de cima para baixo, tem o efeito contrário ao primeiro.

3.2.4 Montagem

De acordo com Martin (1963), a montagem é dividida em narrativa e montagem-expressão. A

primeira trata da criação e organização da história. Aquela que move a ação do filme através

do tempo cronológico ou psicológico. O outro tipo de montagem, a montagem-expressão, que

é a organização das imagens, que por si já dizem qual a mensagem que o autor quer trensmitir

ao seu público, sendo essa montagem responsável pela montagem faz um paralelo de uma

imagem a outra para explicar melhor a ação do filme, o desenrolar da história. Esse

paralelismo pode ser fundado sobre uma analogia ou sobre um contraste.

Situado numa sucessão, cada plano quase não influi por si mesmo isolado dos outros: amontagem age pelo conjunto, por sua totalidade e tonalidade. Isto se manifesta pela criaçãode um efeito importante: o ritmo, determinado em parte pelo conteúdo dinâmico dosplanos, mas, sobretudo pela organização temporal de sua sucessão. (MARTIN, 1963, p.136)

Assim como a montagem necessita dos outros elementos, com a linguagem cinematográfica

não é diferente. Ela é composta pela imagem e pelo texto, que apresentam também o seu

conjunto, que vai desde o posicionamento da câmera, os ângulos das tomadas, os

enquadramentos, os ruídos, a metáfora e etc. Movimentos, montagem, posição de câmera,

imagem, entre outros, são elementos fundamentais na elaboração do filme, mas nada adianta

se não tiver um bom roteiro, um bom texto.

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3.2.5 O personagem

É preciso ter um bom roteiro para se ter uma boa história. Assim como é necessário ter

imagens interessantes, efeitos sonoros e de imagens. É preciso também ter bons atores noelenco. Mas, para uma história ser considerada pelo público como boa, outros fatores são

imprescindíveis.

[...] não precisa haver uma empatia  –  e simpatia, que é seu fruto  –  total entre público epersonagem; mas alguma empatia, ainda que mínima, é preciso. Além do mais, opersonagem precisa tentar fazer alguma coisa: tentar não fazer alguma coisa ou tentarimpedir que algo aconteça também significa fazer algo. Tentar salvar uma vida, ganhar umacorrida, pintar um quadro, evitar de ser convocado para o exército, escapar de ser tocado outocada, todas essas atividades são “desejos” que podem funcionar com o personagemcorreto. Mas é preciso haver obstáculos que impeçam tal personagem de atingir facilmenteo que quer. Se for fácil salvar uma pessoa, ganhar uma corrida ou pintar um quadro, opúblico dirá: E daí? O desinteresse do público é resultado da falta de dificuldade nacircunstância. (HOWARD; MABLEY, 1996, p. 50)

Segundo Howard e Mabley (1996), muitas das vezes o protagonista é o seu próprio

antagonista, por não conseguir viver com ele mesmo e suas características. Por isso, muitas

histórias relatam a batalha pessoal de um personagem com o seu eu.

Uma fonte de conflito externo, numa história onde o grande conflito é essencialmenteinterno, ajuda a tornar visíveis e palpáveis os dois lados do personagem; esse equilíbrio lhedá “vida própria”. Na verdade, este é o grande nó, o fundamental na roteirização: comomostrar ao público o que vai por dentro do personagem central  –  ou de qualquerpersonagem. (HOWARD; MABLEY, 1996, p. 59 - 60)

Outro fator que o roteirista deve estar atento é para a incorporação do personagem por parte

dos atores e atrizes. Eles devem conhecer muito do personagem e interiorizar aquelas

características que o roteirista determinou que aquele personagem teria, para passar, da

melhor forma possível para os espectadores. O ator precisa também saber como o personagemque ele está interpretando é, e quais os seus sentimentos mais íntimos. De acordo com

Howard e Mabley (1996), o público gosta disso, de se sentir íntimo do personagem e de viver

as mesmas emoções que o personagem vive.

É muito melhor dar ao espectador um gostinho da vida interior do personagem através deações. Uma dessas ações é falar, mas o diálogo só carrega parte do fardo. Se um  personagem diz: “Estou muito bravo com você”, a frase é meio fraca e pode nem ser verdadeira. Se esse personagem agarra o outro pelo colarinho e joga o fulano contra a

parede, em geral dá para se ter uma idéia do que vai pelo interior do primeiro sem o apoiodo diálogo. (HOWARD; MABLEY, 1996, p. 61 - 62)

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De acordo com Howard e Mabley (1996), exatamente por termos acesso aos sentimentos mais

íntimos dos personagens, acabamos por nos envolver mais com as dores e alegrias deles e nos

importar com o que vai acontecer com eles no decorrer da história. Pelo mesmo motivo, o

final do filme e como a história de determinado personagem acabará, terá influencia na

opinião do público sobre o filme ser bom ou não.

3.2.6 Tempo e espaço no cinema

No cinema, diferente das outras artes, as relações espaço-tempo do mundo real são

demonstradas com mais exatidão. Nele, o tempo (duração) é percebido imediatamente, já o

espaço necessita de técnicas (como movimento de câmera, por exemplo) para ser sentido pelo

espectador.

A arquitetura, a escultura, o teatro e a dança são artes no espaço: ao contrário  –  e adiferença é essencial – o cinema é uma arte do espaço. Quero dizer que o cinema reproduzde maneira bastante realista o espaço material, mas que cria à parte um espaço estéticoabsolutamente específico, do qual pus em relevo seu caráter artificial, construído, sintético.[...] o espaço fílmico é um espaço vivo, figurativo, tridimensional, dotado tanto detemporalidade como de espaço real, o qual a câmera explora como nós fazemos narealidade. (MARTIN, 1963, p.196)

Segundo Martin (1963), é exatamente esta dualidade espaço-tempo que faz o cinema ser

plenamente realista, o que a torna uma arte bastante assistida, uma vez que a artificialidade

não é apreciada pelos espectadores. E se o cinema tem o poder de tornar as coisas reais para o

seu público, outro poder que ele tem é o de dominar o tempo. Com a câmera é possível

adiantar, retardar ou inverter um acontecimento.

Pode-se falar de três tipos de tempo: o de projeção (duração do filme), o da ação (duração da

história), e o tempo da percepção (que é a impressão de duração sentida pelo espectador).

Além dos tipos, existem as estruturas temporais da narração, que são: tempo condensado,

tempo fiel, tempo abolido e tempo invertido. O primeiro coloca os acontecimentos em forma

linear e condensa aquilo que não faz parte do filme, para que os espectadores possam ter uma

idéia do todo. O segundo, tempo fiel, é quando o tempo da ação é respeitado, ou seja, ele é

apresentado sem cortes. Já o tempo abolido é quando os personagens relembram ou imaginam

o que pode vir a acontecer. Por último, o tempo invertido, que é quando a narração é feita de

forma invertida, não se começa do início.

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Se o tempo pode influenciar as características da narrativa de um filme e se ele pode ser

dominado pelo cinema, o espaço também pode. “Certamente o cinema é a primeira arte que

 pôde, com bastante plenitude, assegurar o domínio do espaço.” (MARTIN, 1963, p. 185)  

Assim como o tempo é tratado de diversas formas, o espaço é reproduzido ou “produzido”.

Os responsáveis pelo cenário podem reproduzir determinado local, ou eles podem “produzi-

lo”, ou seja, criar um espaço onde as diversas cenas que não têm nenhum tipo de ligação

estética estão juntas. Os autores passam de um cenário para o outro quando a cena muda, e

isso não é percebido pelos espectadores, graças aos efeitos técnicos: aceleração no tempo,

corte de cenas, ligações entre os atos, entre outros.

3.2.7 O texto

Não apenas escrever. Para se fazer um roteiro de qualidade, é preciso estar atento às técnicas,

é preciso trabalhar em conjunto com as demais áreas envolvidas na criação de um filme, estar

atento às vontades e desejos de todos os personagens da trama e também as do público. De

acordo com Howard e Mabley (1996), é necessário, às vezes, utilizar de técnicas de outras

artes que deram certo e que podem ajudar na construção de um belo roteiro e um excelente

filme. “[...] a história do teatro é farta de ensinamentos para o roteirista. A roteirização é fruto

direto da dramaturgia; ela adapta muitas das mesmas ferramentas e convenções do teatro a

uma nova tecnologia, a uma nova maneira de passar a história para o público”. (HOWARD;

MABLEY, 1996, p. 30)

De acordo com Howard e Mabley (1996), a função do roteirista vai muito além de escrever

diálogos. Ele deve estar atento e criar todo o ambiente onde a história se passará, preocuparcom os atores e como eles deverão se portar para passar as características de seus personagens

tal como o roteirista o criou, a iluminação, a música, entre outros.

O conceito com que todo roteirista deve lidar é o da visão fundamental da seqüência deeventos, e isso inclui não só os diálogos ditos pelos atores como também a atividade físicaque exercem, o ambiente que os cerca, o contexto dentro do qual a história se desenrola, ailuminação, a música e os efeitos sonoros, os figurinos, além de todo o andamento e ritmoda narrativa. Mas não termina aí o trabalho do roteirista porque, além de todas essasconsiderações, o roteiro precisa ter clareza suficiente para que diretor, fotógrafo, técnico desom, e todos os outros profissionais criem um filme que se assemelhe às intenções originaisdo roteirista. (HOWARD; MABLEY, 1996, p. 30)

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Mas, para ser considerado bom pelo público, o texto não pode apenas ser bom, é preciso

também ter a ordem do enredo. Howard e Mabley (1996) trabalham com a ideia de separar o

enredo em três atos: o primeiro ato é aquele que apresenta a história, introduz os personagens,

define o conflito e fornece as informações que o espectador precisa saber antes que a história

possa prosseguir; no segundo ato, o escritor deve desenvolver a história; e no terceiro, o mais

importante, o escritor desenrola a história e coloca o clímax final.

Além dos filmes com histórias inventadas ou baseadas em fatos reais, também existem

aqueles que são originalmente criadas para uma mídia diferente, mas que podem ser

adaptadas, como é o caso de adaptações feitas da literatura e do teatro para o cinema, como é

o caso do objeto estudado no presente trabalho.

3.3 Adaptação

3.3.1 Elementos da adaptação

Ao optar por fazer uma adaptação, ou seja, converter a história criada para ser transmitida em

uma mídia e veiculá-la em outra, o diretor deve estar atento a algumas alterações que deverãoser feitas na estrutura do texto ou até mesmo nas técnicas utilizadas para a montagem do

filme. “Assim, o primeiro trabalho do adaptador é descobrir como fazer para adequar o

material original a parâmetros de tempos diferentes.” (SEGER, 2007, p. 18)

De acordo com Seger (2007), transformar uma história criada para palcos, ou para o

imaginário dos livros, em algo comercial e viável para as mídias eletrônicas não é fácil.

Muitas das histórias precisam ser simplificadas, a linha dramática deve ser modificada, alémdisso, devem-se evitar os personagens ambíguos, tornar os enredos mais claros - uma vez que

no cinema não é possível voltar para a página anterior e rever aquilo que não ficou muito

claro, como acontece quando lemos um livro. “Na verdade, a adaptação é um novo original,

onde o adaptador busca o equilíbrio entre preservar o espírito do original e criar uma nova

forma” (SEGER, 2007, p. 26) 

Para ser realizada uma adaptação, a mesma necessita que o seu contexto original seja alteradode uma forma que atenda às expectativas que a nova mídia exige. Por exemplo, uma peça de

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teatro filmada, seria um filme. Mesmo que não atinja o sucesso desejado como filme, a

gravação do teatro deixaria de ser uma peça teatral. “É da essência do teatro se dissipar , sem

deixar nada mais além da lembrança da experiência vivida no palco.” (SEGER, 2007, p. 53) 

Para fugir do fracasso, os adaptadores devem atentar também para como a história original

será contada. É preciso colocá-la dentro de um formato dramático. A adaptação exige escolha,

afirma Seger (2007). Para isso, o adaptador precisa conhecer o seu público para escolher as

partes da história e a forma como ele passará aquilo de uma forma que eles entendam e

gostem do que foi contado.

A expectativa do público é sempre de acompanhar o desenrolar de uma linha dramática que

conduza a um clímax, ou a um “grande final”, e que torne o final da história empolgante,intenso, e/ou emocionantemente satisfatório. Este último ato intensifica o conflito, aumentaos risos, e conduz a uma conclusão inevitável. (SEGER, 2007, p. 109)

Para uma adaptação fazer o mesmo sucesso que a história original fez  –  seja ela tirada do

teatro ou da literatura  – , é preciso que o escritor da reapresentação conheça bem o público-

alvo deste novo enredo. Além de se preocupar também com a captação das características

chave da época na qual a história será apresentada. Se for preciso, deve até mesmo alterar o

final do drama. Tudo é válido para que o sucesso seja alcançado. Como de uma forma geral aadaptação não é fácil de ser realizada, a de teatro também apresenta algumas dificuldades.

Adaptar uma peça não é o mesmo que adaptar um romance ou conto, pois estes são formasartísticas em si mesmas, ao passo que a peça não é uma forma de arte enquanto não passapela transformação mágica, que só acontece no momento da apresentação, na sala deespetáculos. (SEGER, 2007, p. 52)

No teatro, o público tem maior contato com a história que lhe está sendo apresentada. Por

isso, ele deverá ser mais temático que o cinema, não podendo tratar de vários assuntos aomesmo tempo, para evitar que o espectador acabe confundindo os acontecimentos e não

entendendo a peça. “Quando o teatro tenta ultrapassar seus limites, indo além do foco na

condição humana, acaba perdendo sua energia, o que faz com que o público fique perdido e

desinteressado. Consequentemente, a magia do teatro desaparece.” (SEGER, 2007, p. 54) 

Ainda de acordo com a autora, existem peças que jamais poderiam ser adaptadas para o

cinema. As mudanças que são necessárias para a nova reapresentação, ou a perda dos

elementos primordiais do teatro, poderiam fazer com que a história perdesse sua essência. “O

espaço cênico, o espetáculo em si e a troca de energia entre autores e o público  – enfim, tudo

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aquilo que faz com que estas peças sejam excelentes  – é algo impossível de ser traduzido para

o cinema.” (SEGER, 2007, p. 55) 

Ao contrário dos filmes, para a criação das peças teatrais não são necessários altos

investimentos no cenário, ele não precisa ser uma representação literal da realidade. “Ao

entrarmos no teatro, deixamos de lado a descrença, e damos asas à imaginação [...] Na

verdade, a presença de realismo pode interromper a ação e destruir a magia do teatro”.

(SEGER, 2007, p. 56)

Outra comparação que podemos fazer com o cinema é a sua característica imagética. Nesta

mídia, ao contrário do teatro, o diálogo não é o mais importante para levar a história para seu  público. No teatro, “[...] o foco de sua atenção concentra-se na interação entre o tema, o

personagem, o subtexto e a linguagem, e não na história”. (SEGER, 2007, p. 57) 

3.3.2 Reaproveitamento do texto teatral no cinema

Assim como o cinema utiliza de muitas técnicas do teatro na criação do roteiro, muitos

roteiristas optaram por utilizar algumas histórias do teatro para criarem seus filmes; assim

como filmes já foram criados baseados em livros, séries, entre outros. Mas, para que a

adaptação dê tão certo quanto a história original, o roteirista deve atentar para alguns detalhes.

De acordo com Howard e Mabley (1996), deve haver fidelidade à história original, uma vez

que o público fica frustrado quando isso não acontece, mas também deve trazer algo mais

para chamar a atenção dos espectadores.

O autor de um livro pode entrar em digressões filosóficas, psicológicas, pessoais, pode falarde algo regional, fazer trocadilhos, exercer toda aquela magia da língua, impossível de setranspor para a tela da mesma forma. São esses aspectos da voz do autor que podem frustraras tentativas de adaptação até dos melhores roteiristas, e pelos mesmos motivos queseduziram o leitor: o autor está provocando a imaginação do leitor de um jeito que o filmenão consegue fazer. O que é mostrado na tela é “real” para o espectador; os atores são aspersonagens, os lugares e fatos parecem tão reais quanto o cineasta consegue fazê-losparecerem reais. Já o leitor evoca imagens de pessoas, lugares e fatos que ele próprio temna mente e encanta-se com os apartes e reflexões do autor. (HOWARD; MABLEY, 1996,p. 38)

Ao fazer um panorama comparativo entre o cinema e o teatro, Carrière (1995) vai mais longe,

ele apresenta a herança que o cinema recebe do teatro e que foi muito presente no seu

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começo, quando os atores de cinema precisavam exagerar em seus movimentos, na

maquiagem, nos sentimentos demonstrados.

Mesmo utilizando de algumas técnicas do teatro e tendo muito da linguagem teatral na

história cinematográfica, as duas artes se diferem em diversos aspectos. A começar pela

questão do espaço, uma peça é passada num mesmo lugar: o palco do teatro. Em um filme

não, a história pode começar em uma casa, depois ir para a praia, depois para o hospital e

assim sucessivamente. Mas não é só pelo espaço que as duas artes se diferem. Outra diferença

está no diálogo, na forma como as palavras são ditas, como elas são expressas. “[...] no palco

o ator ou atriz conseguem tornar suas emoções palpáveis ao público, e no cinema, não. A

força do teatro é a fraqueza do cinema” (HOWARD; MABLEY, 1996, p 34) 

A produção cinematográfica se difere da teatral. No teatro, os personagens, às vezes, têm

longas falas. Algo inviável no cinema, uma vez que poderia deslocar a atenção do público. No

teatro, o escritor precisa detalhar a cena para seu público, já no cinema os detalhes podem vir

através de imagens, e não por palavras.

O cinema depende de outros fatores para funcionar, além do diálogo e dos atores. Dependedas imagens e do contexto que cercam os atores, e é um meio controlado pelo diretor. Já oteatro é um meio controlado pelos atores e pelo escritor, no qual os grandes diálogostornam visível o que é invisível, ao revelar ideias importantes e criar personagensmarcantes. (SEGER, 2007, p. 58)

Outra diferença entre as duas artes é a posse do imaginário. No teatro, os atores podem

simplesmente interpretar seu personagem e, em uma de suas falas levar aqueles que o

assistem ao imaginário. Já o cinema, cuja maior riqueza é a imagem, não dispõe desta

facilidade. Se o ator fala que está vindo uma onça atrás dele, é preciso mostrar, caso contrário,

o espectador pode se frustrar. “No cinema, a imaginação fica menos alerta, mais passiva. Ela

acredita e confia na técnica.” (CARRIÈRE, 1995, p. 78) 

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4 ROMEU E JULIETA – DA PEÇA AO FILME

4.1. Metodologia

O objetivo deste trabalho é analisar a adaptação da história Romeu e Julieta, de Shakespeare,

para o cinema, na versão do diretor Baz Luhrmann (Romeo + Juliet, 1996, EUA),

observando-se as adaptações dos fatores tempo, espaço, personagem e eventos. Recorremos

também, somente a título de ilustração dos elementos da peça teatral, à adaptação mais antiga

de Romeu e Julieta (Romeo and Juliet, 1968, Itália), do diretor Franco Zefirelli, onde os

elementos utilizados e até mesmo o texto são mais fidedignos aos de Shakespeare, se

comparada à obra de Luhrmann.

Assim, a partir das considerações teóricas sobre os elementos que compõem uma peça teatral,

destacamos a questão do tempo, do espaço e dos personagens, aí incluindo a vestimenta e os

costumes. Estudamos também os elementos fundamentais que constituem a linguagem

cinematográfica e questões relativas à adaptação de obras de uma mídia para outra. Passamos

então à leitura do texto original de Shakespeare e assistimos o filme de Luhrmann, buscando

verificar como tais elementos foram tratados por este diretor. O filme não foi analisado por

cenas específicas, mas buscamos tecer considerações mais gerais, abordando a adaptação

como um todo.

A escolha do presente drama se deu pelo fato de ser um clássico influente e responsável pelo

crescimento de duas formas de expressão da arte: teatro e cinema.

4.2 Baz Luhrmann

4.2.1 História11

 

Mark Anthony Luhrmann nasceu no dia 17 de setembro de 1962, em Sydney, Austrália. Filho

de Leonard Luhrmann, dono de um posto de gasolina e de uma sala de cinema e de uma dona

de loja de roupas e professora de dança de salão. O pai de Luhrmann pode ser considerado

como a responsável pela carreira dele, uma vez que fez com que ele se encantasse com o

11 www.filmereference.com/film/28/Baz-Luhrmann.html

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poder de contar histórias. Em 1997, se casou com Catherine Martin, designer de produção de

todos os seus filmes.

Ainda adolescente, ele decidiu seguir carreira de ator e conseguiu um papel no cinema ao lado

de Bryan Brown e Judy Davis em "Winter of Our Dreams" (1981), escrito e dirigido por John

Duigan. Depois de inúmeros papeis na TV, matriculou-se na prestigiada National Institute of 

Dramatic Arts. Em 1989, Luhrmann encenou Dance Hall, que recria a aparência de

estabelecimentos culturais nos anos de 1940, período da Guerra Mundial.

Já em 1986, ele escreveu e encenou uma peça de 30 minutos, intitulada como "Strictly

Ballroom". Mais tarde, depois de formar um grupo teatral, ele e seus colegas apresentaram aversão completa desta peça, que foi um sucesso por toda a Austrália. Em 1992, a história foi

adaptada para as telonas, em parceria com os roteiristas Andrew Bovell e Craig Pearce. O

material foi adaptado em um conto de quadrinhos de excêntricos australianos obcecados com

o mundo da dança de salão competitiva e Paul Mercurio, que se atreveu a romper com a

tradição, criando suas rotinas espontâneas. Neste trabalho como diretor, Baz Luhrmann

conseguiu conciliar várias histórias de uma forma que manteve o público envolvido. Ele

também mostrou sua dependência em usar a música para movimentar a trama. O filme Vem

dançar comigo (Strictly Ballroom, 1992, Austrália) foi um sucesso de bilheteria na Austrália,

e vencedor de oito Australian Film Institute Awards, incluindo Melhor Filme e Melhor

Diretor. Em sua versão americana, o filme conseguiu muitos elogios de críticos.

Depois do sucesso conquistado no teatro, Luhrmann foi se aventurar no cinema, onde dirigiu,

até hoje, quatro filmes: Austrália (Autralia, 2008, EUA), Moulin Rouge – Amor em vermelho

(Moulin Rouge, 2001, EUA), Romeu + Julieta (Romeo + Juliet, 1996, EUA) e Vem dançar comigo (Strictly Ballroom, 1992, Austrália). Sendo os três últimos as principais obras do

diretor, intituladas por ele mesmo como „Cortina Vermelha‟. 

Em 1996, foi lançado o filme Romeu e Julieta ( Romeo + Juliet, EUA), uma adaptação da

clássica história romântica de Shakespeare. Estrelado por Leonardo di Caprio e Claire Danes.

A história se passa na Flórida contemporânea, com muita música, cenários e vestuários

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bastante inovadores e chamativos. De acordo com o site  Adorocinema.com12, o filme

arrecadou cerca de U$ 46 milhões nas bilheterias, só nas bilheterias norte-americanas.

4.2.2 Características do diretor Luhrmann

Filho de uma dançarina de dança de salão e de um dono de uma sala de cinema, Luhrmann

não poderia exercer outra profissão, a não ser um diretor que utiliza a dança e a música em

seus filmes. Mas, além da influência dentro de casa, ele também sofreu influências da ópera

italiana, como é claramente percebido em seus trabalhos, principalmente em  Moulin Rouge. 

Outra influência fica por conta do teatro, onde Luhrmann iniciou sua carreira no mundo das

artes.

Em seus filmes, Luhrmann utiliza das coisas simples para chamar a atenção das pessoas para

características essenciais do filme, elementos simples, mas com forte significado. Muitas das

vezes os finais de suas criações não são nada inovadores, ele prefere investir na criação de um

mundo fantástico, exagerado, como é facilmente encontrado no teatro. Os filmes de Baz são

visualmente ricos, contando com dispositivos como a dança, a música, poesia e o mundo

imaginário. (Yahoo! Movie)

4.3 Romeu e Julieta

São vários os filmes baseados, ou adaptados, em grandes livros da literatura, em grandes

clássicos dos palcos mundiais. O filme de Baz Luhrmann, Romeu e Julieta (Romeo + Juliet  –  

Estados Unidos – 1996), é um exemplo. Ele é adaptado da peça escrita por Shakespeare entre

os anos de 1591 e 1595.

“Romeu e Julieta” se destacou por narrar a história de dois jovens que se apaixonam e acabam

tendo um romance impossível devido a rivalidade de suas famílias (Montecchio e Capuleto,

respectivamente). Romeu e Julieta é, provavelmente, a história de amor mais conhecida da

literatura ocidental. Na verdade, a trama de Romeu e Julieta não foi inventada por William

Sheakespeare, a peça é a dramatização do poema “A Trágica História de Romeu e Julieta” de

12www.adorocinema.com.br

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Arthur Brooke, de 1562. Porém, Shakespeare enriqueceu a história adicionando alguns

detalhes aos personagens.

No filme, a história não é alterada. Romeu (Leonardo di Caprio) e Julieta (Claire Danes)

continuam lutando contra a reprovação de seus familiares do amor inabalável dos dois. O

casal se conhece na noite em que o pai de Julieta (senhor Capuleto) oferece uma festa à

população de Verona (ou Verona Beach, local onde se passa a história no filme). Foi amor à

primeira vista. Mesmo descobrindo que eles eram filhos de inimigos, os dois decidem levar o

romance adiante e, para isso, eles contam com a ajuda de Frei Lourenço, que realiza a

cerimônia de casamento dos dois secretamente, e da Ama de Julieta, responsável por levar os

recados de Julieta até Romeu. Paris, um solteiro nobre da cidade, apresenta seu interesse emse casar com a única filha dos Capuleto. Mesmo considerando Julieta nova para tal

responsabilidade, o pai dela decide aceitar a proposta do belo e rico rapaz. Mas, quando o

senhor Capuleto conta isso para Julieta, ela já está casada com Romeu. Então, ela, com a

ajuda do Frei, decide tomar uma espécie de sonífero que a fizesse aparentar estar morta. O

Frei promete a Julieta que cuidaria de avisar Romeu que ela estava apenas dormindo, para que

ele fosse até ao cemitério e a resgatasse, para que os dois pudessem fugir e viverem felizes

para sempre. Nesta época, Romeu estava refugiado em Mântua, um lugarejo próximo à suacidade de origem, como forma de punição pelo crime que ele cometera, ao matar o primo de

Julieta, Tebaldo, para se vingar pelo assassinato de seu melhor amigo, Mercúcio, que fora

morto por Tebaldo. Porém, a tentativa de comunicação entre o Frei e Romeu não foi bem

sucedida. Romeu recebe, de seu Criado, Baltasar, a notícia de que Julieta estava morta. Por

este motivo, ele retorna à Verona, compra um vidro com veneno, com o propósito de

interromper sua vida, e foi atrás de sua amada, onde ele pretendia juntar seu corpo ao dela.

Mas, quando Romeu chega ao local onde o corpo de Julieta repousava (no mausoléu de suafamília – na peça e na igreja  – no filme), ele se depara com Paris, que o impede de chegar

próximo à Julieta. Os dois começam a brigar e Romeu mata Paris. Antes mesmo que o efeito

do sonífero de Julieta acabasse, Romeu toma do veneno e morre. Ao acordar e ver seu amado

morto (ou quase morto, como acontece no filme), ela se mata com um punhal (no filme ela

utiliza o revólver, que foi utilizado por Romeu para matar Paris). No final, ao ver seus filhos

mortos, as duas famílias selam um pacto de paz diante do príncipe Escalo, figura mais

poderosa da história (no filme, ele é delegado).

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As mudanças feitas, se comparado à obra de Shakespeare, são de constituição do espaço,

personagens, e a utilização de alguns objetos/ elementos que ainda não existiam na época em

que a peça foi escrita, além de outros fatores que serão considerados no decorrer desta análise.

As variações feitas são também resultantes do desenvolvimento da própria linguagem

cinematográfica e da proposta do diretor de ambientar a história medieval no mundo

contemporâneo. Arquitetura, produção e efeitos especiais são alguns dos recursos que o

cinema ganhou no decorrer dos anos. Além das transformações na linguagem, estruturação de

textos e desenvolvimento. No filme, por exemplo, a espada, que antes era utilizada como

arma na peça de Shakespeare, é substituída por um revólver. A história, que antes se passava

em Verona, no filme é levada para Verona Beach, onde as vestimentas e os costumes/hábitosde vida não são os mesmo da história de Shakespeare.

Uma adaptação, segundo, Seger (2007), é caracterizada por algumas mudanças de tempo,

espaço, conteúdo, ambientação, linguagem, entre outros elementos, que precisam ser alterados

para contextualizar o espectador, leitor ou telespectador. Logo no início do filme de

Luhrmann, notamos uma diferença comparativamente à peça de Shakespeare. O prólogo da

história, ou seja, a introdução da mesma, é feita por uma apresentadora de um telejornal local(Verona Beach), diferentemente da peça, onde o coro apresenta a história aos espectadores.

Esta diferença se deve a uma característica própria do teatro (coro), que não causará o mesmo

efeito no cinema, ou seja, não será visualmente agradável. Durante a peça, o coro entra todas

as vezes que é iniciado um novo ato, com uma espécie de resumo do que acontecerá nas cenas

seguintes.

4.3.1 Vestimenta

A vestimenta, assim como outros elementos do filme, tem as características do mundo

ocidental contemporâneo, uma vez que o filme de Luhrmann é filmado e ambientado em

1996. Na adaptação, os personagens se vestem de calça jeans, saias curtas, tops, vestidos mais

colados e mais curtos que os utilizados na peça de Shakespeare, entre outros.

O famoso baile das máscara que consta da peça de Shakespeare, no filme é uma festa àfantasia e a mãe de Julieta se veste de Cleópatra, enquanto Paris, o então pretendente de

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Julieta, está fantasiado de astronauta. O amigo de Romeu, Mercúcio também inova em sua

fantasia, durante o baile ele aparece de drag queen. Astronauta e drag queen são vestimentas

impensáveis para o século XVI, quando a peça foi escrita, mas que pode é mais aceitável nos

dias de hoje.

Outra questão que podemos destacar, relativa à vestimenta, é o modo diferenciado das duas

famílias  – Capuleto e Montechio  –  se vestirem. Como já foi falado, as duas famílias eram

inimigas e suas histórias são marcadas por brigas, confusões, intrigas. Na obra de Luhrmann,

esta rivalidade é mostrada até mesmo na forma bastante diferenciada que os primos de Romeu

e os de Julieta se vestem. Os primos de Julieta são mais moderninhos: usam gel no cabelo,

roupas mais para o Punk, estilo mais urbano (jaquetas de couro pretas, botas de couro, calçasmais apertadas), já os primos de Romeu utilizam da moda praia: bermudas grandes e

soltinhas, camisetas abertas e florais, chinelos, entre outros. Como se as famílias fossem

gangues, uma mais urbana e a outra praiana. Comprovando o que Roubine (1998) fala sobre a

capacidade de o figurino demonstrar emoções e despertar no seu espectador as emoções

pretendidas pelo diretor ou autor de determinado filme ou peça.

No filme de Luhrmann, Romeu e Julieta também são diferenciados dos demais personagens apartir, também, da forma como se vestem. Os dois usam roupas mais comportadas, sem

evidenciar muito o corpo, têm um jeito mais sério e inocente. Por este motivo não seria

apropriado se vestirem de forma mais ousada, assim como outros personagens.

Outro estilo bastante irreverente é o do Frei Lourenço que, mesmo sendo padre, se veste de

uma forma bastante jovial: camiseta com o peito à mostra, bermudas e sandálias, quando não

está dentro da igreja. O que pode nos permitir concluir que ele é um padre menos rígido, atéporque, um padre tradicional não apoiaria Romeu e Julieta a se casarem sem a permissão de

seus pais, e nem daria cobertura para que os dois se encontrassem e tivessem sua noite de

núpcias.

4.3.2 Espaço e tempo

Como já foi dito neste trabalho, uma das diferenças entre o teatro e o cinema está napossibilidade do segundo em ter um espaço mais amplo, uma vez que, em um mesmo filme,

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podem ser gravadas cenas tanto externas como internas, ao contrário do teatro, onde o diretor

terá que escolher uma das duas opções para a apresentação. Podemos perceber isso

claramente no filme, onde vários são os cenários da adaptação: praia, posto de gasolina, ruas,

igreja, sauna, casa dos Capuleto, local onde as pessoas estacionam seus trailers, entre outros.

No filme, percebemos também que os lugares onde os acontecimentos se passam não são os

mesmos escritos por Shakespeare, ou pelo menos grande parte deles ganha um novo

ambiente. Um exemplo é a cena clássica de Shakespeare, quando os jovens apaixonados se

encontram na varanda do quarto de Julieta e fazem suas juras de amor eterno, logo após o

baile das máscaras, onde os dois se conheceram. No filme, estas juras são feitas enquanto os

dois estão dentro da piscina, localizada no jardim dos Capuleto.

Logo no início do filme, assim como na peça, o primeiro acontecimento é a briga dos primos

de Romeu com os de Julieta. Na peça, essa briga acontece nas ruas de Verona. Já no filme, ela

se inicia em um posto de gasolina, o qual é explodido, devido ao arrebentamento da

mangueira, uma vez que, ao tentar fugir dos Capuleto, os Montechio saem com o carro do

posto, sem retirar a mangueira de combustível do tanque, fazendo com que o combustível

vaze e, em contato com o fogo do palito de fósforo jogado no chão por Tebaldo, primo deJulieta, ao ascender seu cigarro, provoca a explosão, machucando algumas pessoas. A briga

continua pelas ruas de Verona Beach. Nesta mesma cena, ocorre uma diferença da criação da

peça para o filme. Na história de Shakespeare, terceiros acabam entrando no meio da briga e

tomando partido daqueles que eles preferem (Montecchio ou Capuleto). Já no filme, isto não

acontece, uma vez que a briga fica restrita aos inimigos declarados.

Outro exemplo é a cena onde Mercúcio – amigo de Romeu e primo do Príncipe de Verona (nofilme ele continua sendo um representante da lei e da justiça, porém, agora ele não é mais o

príncipe de Verona Beach, mas, sim o delegado da cidade), é morto por Tebaldo. Na peça de

Shakespeare, essa cena se passa em uma praça, já no filme, ela acontece na areia da praia,

próximo às ruínas do teatro.

Outra diferença pode ser encontrada no tempo da ação de determinada cena, comparando o

filme à peça. Como por exemplo, nesta mesma cena de briga entre os Capuleto e os

Montechio, onde Mercúcio e Tebaldo são mortos. Durante a peça, as duas mortes acontecem

logo em seguida, já no filme, Romeu, que é quem mata Tebaldo, pega o carro e persegue o

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assassino de seu amigo de carro, já à noite, tal como uma perseguição entre inimigos de

gangues  – situação normal nas metrópoles de agora, e até mesmo de 1996. Após fazer com

que o carro onde Tebaldo se encontrava capote, os dois começam a brigar, até que Romeu

atira no primo de Julieta com a arma do mesmo.

4.3.3 Costumes

Criado cinco séculos após o original, o filme de Luhrmann traz uma realidade bastante

diferente da realidade apresentada por Shakespeare. No filme, as mulheres fumam, se exibem,

é possível encontrar prostitutas se oferecendo para os homens em plena luz do dia, drag

queens se expondo publicamente, vários estilos de vida e diferentes formas de se vestir, como

a punk, por exemplo. Os homens do filme também são bastante diferentes se comparados aos

de Shakespeare: usam tatuagens, aparecem sem camisa na rua, se drogam, jogam sinuca etc.

No filme, Romeu também foi um dos que se drogou. Indo para o baile de fantasias, oferecido

pelo senhor Capuleto, seu fiel amigo, Mercúcio lhe oferece a pílula do amor  – que pode ser

identificada como tal pílula pelo desenho de coração que ela traz pintado. Romeu toma e, logo

em seguida, sente os efeitos da droga, o que tem se mostrado freqüente em festas e boates de

grandes centros urbanos, invadidas por drogas químicas.

Os objetos cênicos e as técnicas de filmagem e de montagem utilizadas também demarcam

uma diferença entre a obra original e sua adaptação. No filme, a espada já não é utilizada, e os

homens de Verona Beach usam revólveres como armas, objeto comum de se ver nas mãos

deles, ou junto às roupas. A prova desta alusão, é quando os As belíssimas escadas dividem a

atenção com os elevadores. Para sair da casa dos Capuleto, logo após o baile, os convidadosprecisam passar por um detector de metais, como forma de protegerem sua riqueza, além do

mais, o palacete continha objetos muito valiosos, e os Capuleto recebiam pessoas de todo o

tipo. Ao fazer a busca por Romeu, que voltara para se matar junto à Julieta, que estava

desacordada na igreja, a polícia utiliza um helicóptero. Os cavalos são substituídos por

automóveis conversíveis. Paris e o senhor Capuleto frequentam uma sauna, onde eles têm a

conversa sobre a possibilidade de Paris se casar com Julieta.

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A sociedade inspirada por Luhrmann já é consumista, preocupada apenas com a fama e o

status. As famílias Montecchio e Capuleto são as mais ricas da cidade. Isso pode ser

concluído a partir da análise do filme, quando uma imagem através do helicóptero que

sobrevoa a cidade mostra os prédios das duas famílias como destoantes dos demais.

Símbolos referentes ao cristianismo e imagens de santos, mais precisamente do catolicismo,

são muito presentes no obra de Luhrmann. Não que no texto de Shakespeare eles não existam,

mas, no filme de Luhrmann, eles estão por toda parte: nos revólveres dos primos de Julieta e

de Romeu, no quarto de Julieta, na igreja (como não poderia ser diferente), em uma estátua

erguida no centro da cidade, entre outros lugares. Estes símbolos tendem a passar uma

imagem de sagrado, temente a Deus, santo. Um exemplo onde a câmera foca um destessímbolos é quando Romeu mata o primo de Julieta, Tebaldo. Logo após ele disparar o tiro, o

revólver de Tebaldo, o qual Romeu utilizou para atirar em seu inimigo, é focado bem na parte

onde a imagem da Virgem Maria está estampada.

4.3.4 Linguagem

A linguagem utilizada por Luhrmann é a mesma de Shakespeare: poética, repleta de rimas,

bonita de se ouvir, romântica por si só. O texto é basicamente o mesmo, exceto por alguns

cortes de cenas menos interessantes que o diretor e roteirista, Luhrmann, fez para evitar que o

filme ficasse cansativo para seu público. De acordo com alguns críticos e estudiosos do

cinema, tais como a doutora em teoria da literatura Venturella (2010), Luhrmann utiliza desse

artifício de modernizar o imagético do filme, mas permanecer com o texto intacto, como

forma de manter intactas as intenções de Shakespeare.

Sem deixar de reverenciar o passado clássico, o diretor, ao criar um mundo shakespearianocompatível com os novos tempos, o absorve e reinterpreta. Longe de se deixar intimidarpela genialidade do dramaturgo inglês, demonstra compreender profundamente seu textoemocionante, energético e lírico que é, em última instância, uma história escrita para todosos públicos  –  do mais sofisticado ao mais simples  –  sobre a juventude e seus conflitos,ímpetos e paixões. A engenhosidade do filme reside, assim, na transposição da força dasintenções dramáticas da peça original pra o jogo de efeitos visuais que revoluciona o textosem abafá-lo, atualizando e complementando-o. (VENTURELLA, 2010, web)

A história, como já foi dito, permanece a mesma, marcada por: amor e ódio, violência e

banalização, pecado e virtude, destino e o acaso. E se ele preferiu manter o texto intacto e

inovar apenas nas imagens, Howard e Mabley (1996), justificam a escolha dos diretores que

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trabalham com adaptação, ao falarem que, neste tipo de trabalho, são necessárias algumas

mudanças, assim como Seger (2007) também trabalhou esta ideia, porém, deve haver

fidelidade à história original, uma vez que o público fica frustrado quando isso não acontece.

Ao considerarmos especificamente a peça, encontramos uma metáfora pouco usada pelo autor

em suas obras: a luz. Romeu e Julieta, um casal de jovens que se apaixona perdidamente um

pelo outro, mas que, devido à rivalidade de suas famílias, têm de lutar por seu amor e, ao

mesmo tempo, esconder o mais lindo sentimento que os dois já tinham sentido. Os dois, muito

romanticamente, declaram o seu amor um ao outro como a luz de suas vidas.

Para Julieta, Romeu é “dia na noite”; para Romeu, Julieta é o sol que se levanta no oriente,e, quando eles sobem até o êxtase do amor, cada qual por sua vez retrata o outro como umaestrela no céu, irradiando tal brilho que envergonha os próprios corpos celestes(SPURGEON, 2006, p. 291)

A metáfora da luz é presente em toda a peça, e não apenas quando Romeu e Julieta estão se

referindo um ao outro, mas também é utilizada pelos demais personagens. Mas, segundo

Spurgeon (2006), o que se pode inferir é que a luz do sol, das estrelas, da lua, das velas, são,

na peça de Shakespeare, sinônimos de amor, juventude e beleza. Já a escuridão, as nuvens, a

névoa, a chuva, relâmpagos, fogo e a noite são considerados como dor, tristeza e morte. Aindade acordo com a autora, ao substituir as palavras pelas diferentes formas de luzes,

Shakespeare utiliza de sua extraordinária susceptibilidade, dando à obra uma requintada

beleza.

Mas, embora Shakespeare tenha tomado a idéia de seu original, nem seria necessário dizerque, ao tomá-la, ele transformou uns poucos símiles convencionais e óbvios de pouco valorpoético em uma imagem recorrente, contínua e constante, de requintada beleza, construindoum quadro definido e uma atmosfera de brilho repentinamente extinto, que afeta

profundamente a imaginação do leitor. (SPURGEON, 2006, p. 296)

A luz é novamente citada na história, desta vez como sinônimo da rapidez com que se

conheceram, se apaixonaram, e se casaram. A própria Julieta, em uma passagem da peça,

utiliza a luz para expressar a rapidez de seu romance. “[.. .] é muito ousado, impensado, por

demais rápido. Muito semelhante ao relâmpago, que se extingue antes que se possa dizer Ele

reluz. (SPURGEON, 2006, p. 293)

Não pode haver dúvida, creio eu, de que Shakespeare via a história, na sua rápida e trágicabeleza, como um clarão repentino que quase cega, inesperadamente aceso e, com a mesmarapidez, apagado. Ele, com exata deliberação, comprime a ação de nove meses para a

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brevidade quase inacreditável de um período de cinco dias; de modo que os amantes seconhecem no domingo, casam-se na segunda, separam-se na madrugada de terça e sereúnem na morte na noite de quinta. (SPURGEON, 2006, p. 293)

Shakespeare, que gosta de utilizar palavras e gestos mais rebuscados no lugar de outros muitocomuns, ao mostrar que os jovens Romeu e Julieta se encontram apaixonados um pelo outro,

não utiliza apenas a palavra paixão, mas sim palavras que demonstram a leveza do

sentimento: asas, pombas. “As imagens do amor célere, que voa alto, têm origem no antigo

mito de Cupido e suas asas, porém, como quase sempre acontece com Shakespeare, ele pega

uma imagem ou uma idéia surrada e a transforma completamente”. (SPURGEON, 2006, p.

140)

Não diferente de Shakespeare, Luhrmann também utiliza de objetos bastante luminosos, que

estão relacionados, assim como na peça, à rapidez do amor dos dois, mas também à pureza

deste sentimento que eles sentem e à pureza dos dois, por si só. Um exemplo disso é quando,

  já no final do filme, Romeu entra na igreja onde Julieta está repousando. A igreja está toda

iluminada: com velas em volta de Julieta e luzes em formato de cruz, desde a entrada da igreja

até o altar. Esta iluminação, como já foi dito, representa o amor puro e grande que os dois

tinham. E a quantidade exacerbada de iluminação seria uma espécie de prêmio ao casal: um

leito de morte tão bonito, iluminado e puro, como sempre foi o amor dos dois.

4.3.5 Final

O final é a parte do filme onde as mudanças ocorreram com maior intensidade. Sem alterar o

contexto original da peça, já que Romeu e Julieta também morrem, Luhrmann recria o

ambiente, os objetos, o tempo e o espaço.

Na peça, Romeu, ao pensar que sua amada está morta  –  uma vez que ele não recebeu o

comunicado enviado pelo Frei – toma do veneno encomendado por ele mesmo e sussurra suas

últimas palavras de amor para Julieta: “Eis para meu amor. (Bebe.) Ó boticário veraz e

honesto! Tua droga é rápida. Deste modo, com um beijo, deixo a vida. (Morre.)”.

(SHAKESPEARE, 2004, p. 175). Logo depois ele morre. Julieta, após acordar do sono

profundo que o remédio indicado pelo Frei causou, pergunta a ele onde está seu amado, mas

ele não responde, diz apenas que eles precisavam sair dali correndo. Antes de sair, Julieta se

depara com o corpo de Romeu no chão. Diz então ao Frei que não sairá dali jamais e que era

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para ele ir embora. Quando o Frei sai do local, ela saca o punhal utilizado por Romeu para

matar seu então pretendente a marido, Paris, enfia-o no peito e morre, caída sobre o corpo de

Romeu.

Esta parte do filme é bastante diferente, por isso rendeu um tópico. Na história de Luhrmann,

o mensageiro é um carteiro, que deixa a correspondência dependurada no trailer, Romeu não

vê. Baltasar, o servo de Romeu chega de carro e conta para ele que havia visto Julieta sendo

velada na catedral de Verona Beach. Romeu, que estava em Mantua, cidade vizinha,

rapidamente entra no carro e segue em direção à cidade onde sua amada estava. Ele chega ao

local, já a noite, assim como na peça, porém, no filme ela passa primeiro por uma perseguição

policial, quando mata Paris, que estava indo à igreja visitar Julieta, com um tiro. Logo depoisele entra na igreja e percebe o corpo de Julieta. Ele se junta a ela, faz alguns elogios, profere

palavras de amor para ela, e logo pega o veneno que comprara e bebe. Antes mesmo que ele

tomasse o primeiro gole do veneno, Julieta já mostrava sinais de despertar, porém, Romeu

não viu, e tomou do veneno. No filme, outra inovação de Luhrmann foi o diálogo de Romeu e

Julieta antes que ele morresse. Logo depois, Julieta olha para os lados e avista o revólver

utilizado por Romeu para matar Paris, e atira contra sua cabeça.

Logo após que as famílias são avisadas da morte de seus filhos, na peça, todos se encontram

no cemitério, onde Frei Lourenço, Baltasar e o pajem de Paris são apanhados e dão seus

depoimentos sobre o que sabem da morte dos dois. No filme, esta parte é cortada.

Outra parte importante do final de ambas é a reconciliação das duas famílias que,

infelizmente, só acontece depois que seus filhos morreram. Na peça, o pacto de paz entre as

famílias Montecchio (representada apenas pelo seu senhor, uma vez que sua mulher haviafalecido na noite anterior  – o que também não existe no filme de Luhrmann) e Capuleto, é a

promessa do pai de Romeu em fazer e expor em Verona uma estátua, em ouro puro, de

Julieta, e o juramento do senhor Capuleto em tornar o nome de Romeu conhecido e admirado

por todos em Verona.

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5 CONCLUSÃO

Mudanças no tempo, no espaço, nos personagens, nos costumes acontecem de forma

significativa na adaptação de Luhrmann. Essas mudanças fizeram com que este filme ficasse

conhecido como o que mais se distancia das características originais da peça de Shakespeare.

Mas isso não pode ser apontado como algo negativo, uma vez que esta adaptação conquistou

alguns prêmios e indicações importantes, tais como: Indicado ao Oscar 1997, na categoria

melhor direção de arte; recebeu os prêmios de melhor direção, melhor filme musical, melhor

roteiro adaptado, melhor desenho de produção, além de ser indicado às categorias de melhor

fotografia, melhor edição e melhor som, pelo BAFTA (Reino Unido), também em 1997. Já no

Festival de Berlim, Luhrmann recebeu o prêmio de melhor diretor, Leonardo DiCapriorecebeu o Urso de Prata de melhor ator e o filme foi indicado ao Urso de Ouro de melhor

filme, em 1997. Além de ser, também, indicado ao melhor filme estrangeiro da  Australian

Film Institute, no mesmo ano.

A partir de tanta premiação, podemos então, concluir que as mudanças feitas por Luhrmann

foram aceitas de forma positiva por seus espectadores e críticos do cinema. Talvez, pelo fato

de ele ter mantido o mais importante: o texto e a essência shakespeariana para este romance,

atualizando apenas as características imagéticas, que se tornaram necessárias, uma vez que

elas tendem a atrair um número maior de pessoas, ao trazer algo novo daquilo que as pessoas

 já conhecem bem: a trágica história de amor de Romeu e Julieta.

Segundo Seger (2007), a adaptação exige algumas mudanças no roteiro original, ao ser

convertido para uma outra mídia de divulgação, para se adequar às características exigidas

pela nova arte onde o novo conteúdo será exibido.

Visando isto, podemos concluir que Luhrmann cumpriu bem o seu papel de adaptador, uma

vez que ele trouxe para os dias atuais a história que tanto sucesso fez na época de

Shakespeare, mas, sem perder o que a peça tinha de mais puro, que era seu texto.

Para outros, esta mesma questão de mudar o conteúdo imagético e manter o texto poético de

Shakespeare pode não ser visto com bons olhos, mas, deve-se levar em conta que a poética de

Shakespeare, mesmo não sendo necessariamente a mais apropriada para os dias atuais e

contendo termos pouco usuais que nos levariam a consultar um dicionário para entendermos o

seu significado, é o elemento responsável por embelezar a adaptação. Mas, para os norte-

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americanos a manutenção do texto literal foi um problema, uma vez que, ao contrário dos

filmes criados para serem exibidos em outros países, ele não continha o texto de Shakespeare

passando nas legendas. Assim como o contrário pudesse também não ser aprovado

(permanecer com todas as características de Shakespeare: texto e imagem), uma vez que não

traria nada de novo para o cinema, assim como a obra de Franco Zefirelli (1968), considerada

como a obra mais fiel à história de Shakespeare.

Outra consideração que pode ser feita está na análise de público. A obra de Zefirelli foi feita

com o intuito de alcançar os apaixonados pela obra de Shakespeare e todos os seus elementos,

mas que gostariam de vê-la através das telonas. Já Luhrmann, quis conquistar um novo

público, que também é amante da história de Romeu e Julieta, mas que não gosta tanto defilmes épicos, prefere os filmes da atualidade, com as características desta época que estamos

vivendo.

E, quem conhece os trabalhos do diretor Baz Luhrmann, que também dirigiu:  Austrália

(Autralia, 2008, EUA),  Moulin Rouge –  Amor em vermelho (Moulin Rouge, 2001, EUA) e

Vem dançar comigo (Strictly Ballroom, 1992, Austrália), já esperava que mudanças

significativas seriam incorporadas em seu trabalho, uma vez que ele é conhecido por inovar

sempre e surpreender seus espectadores e os críticos da arte.

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