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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS Instituto de … Figueira 2011.pdf · se encontrava no poder...

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS Instituto de Ciências Humanas e Letras Programa de Pós-Graduação em História – PPGH RICKSON FRANÇA FIGUEIRA IMPRENSA, POLÍTICA E PODER: A SUCESSÃO GOVERNAMENTAL DO AMAZONAS EM 1920 Manaus – Amazonas 2011
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS Instituto de Ciências Humanas e Letras

Programa de Pós-Graduação em História – PPGH

RICKSON FRANÇA FIGUEIRA

IMPRENSA, POLÍTICA E PODER:

A SUCESSÃO GOVERNAMENTAL DO AMAZONAS EM 1920

Manaus – Amazonas

2011

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RICKSON FRANÇA FIGUEIRA

IMPRENSA, POLÍTICA E PODER:

A SUCESSÃO GOVERNAMENTAL DOAMAZONAS EM 1920

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Márcia Eliane Alves de Souza e Mello

Manaus – Amazonas

2011

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em História, como requisito

para obtenção do título de Mestre em

História Social.

Linha de Pesquisa: Política, Instituições e

Práticas Sociais.

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Ficha Catalográfica

(Catalogação realizada pela Biblioteca Central da UFAM)

F

475i

Figueira, Rickson França

Imprensa, Política e Poder: A Sucessão Governamental do

Amazonas em 1920 / Rickson França Figueira. - Manaus: UFAM,

2011.

117 f.

Dissertação (Mestrado em História Social) –– Universidade

Federal do Amazonas, 2011.

Orientadora: Profª. Dra. Márcia Eliane Alves de Souza e Mello

1. Amazonas (AM) – Imprensa e Política 2. Eleições – Amazonas

(AM) 3. História política – Amazonas (AM) I. Mello, Márcia Eliane

Alves de Souza e (Orient.) II. Universidade Federal do Amazonas III.

Título IV.

CDU 981.13(043.3)

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS Instituto de Ciências Humanas e Letras

Programa de Pós-Graduação em História – PPGH

RICKSON FRANÇA FIGUEIRA

IMPRENSA, POLÍTICA E PODER:

A SUCESSÃO GOVERNAMENTAL DO AMAZONAS EM 1920

BANCA EXAMINADORA

Prof.ª Dr.ª Márcia Eliane Alves de Souza e Mello

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

Prof. Dr. Hideraldo Lima da Costa

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

Prof.ª Dr.ª Kátia Cilene do Couto

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

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Dedicatória

À senhora Sara Odaléa França mãe,

Viviane esposa, e Rickson II filho, com grande carinho e muita satisfação.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do

Amazonas pelo apoio institucional ao desenvolvimento dessa dissertação, na pessoa da

professora Dr.ª Márcia Eliane Alves de Souza e Mello, pela orientação deste trabalho e que

me ajudou com inúmeras, oportunas e minuciosas observações para redigir tal material.

À professora Dr.ª Patrícia Sampaio, pelas orientações durante o exame de

qualificação, como sugestões e observações importantes para revisões do texto.

Agradeço duplamente ao Prof. Dr. Hideraldo Lima da Costa por todas as

contribuições dadas ao trabalho, com suas críticas e instigação durante o exame de

qualificação, como também, durante a defesa.

À professora Dr.ª Kátia Cilene do Couto, pelas observações, intervenções e

sugestões, feitas no decorrer da defesa.

Agradeço ainda à Prof.ª Dr.ª Eloína Monteiro, pela generosidade em ler a

dissertação, e por me ajudar a entender melhor os embates políticos do Amazonas durante a

República Velha, que pra mim foi de grande importância.

Aos professores das disciplinas que cursei durante o curso, que me ajudaram a

escrever melhor as ferramentas para o meu objeto de pesquisa.

Ao Distrito VII da zona rural, da Secretaria Municipal de Educação (Semed), aos

senhores Rosélio de Souza, Paulo Reinaldo e outros que entenderam a minha situação e

possibilitaram para que eu fizesse as disciplinas e as pesquisas.

Aos professores das escolas em que trabalho, uma vez que sou professor itinerante e

de três e três meses troco de escola: Francisco, Roterdã, Dinalva, Kaline, Almir, Raimundo,

Fátima, Rosangela, Gilson, Irley, Clayton, Yone e Socorro, e de todos os funcionários pela

ajuda em compreender a importância deste trabalho.

Aos meus alunos do campo, da zona ribeirinha da cidade de Manaus, que entenderam

a minha situação, e comigo chegaram ao final do curso.

Aos amigos Marineide, Jorgemar, Alda, Rosineide, Erilene, à professora Msc.

Elisângela Socorro Maciel Soares, que acreditaram neste estudo, de cuja dedicação foi todo

meu esforço para que ele se tornasse real.

Aos funcionários do Arquivo Público do Estado, Centro Cultural dos Povos da

Amazônia, Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas, Museu Amazônico, agradeço a

todos pela paciência que tiveram comigo para a organização dos materiais coletados, em

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particular a senhora Vera Muniz da Divisão de Documentação da Biblioteca da Universidade

Federal do Amazonas.

Agradeço também às pessoas da Biblioteca da Universidade Federal da Paraíba, dos

Arquivos Públicos e Instituições em geral da cidade de João Pessoa, que me deram toda a

atenção e gentileza na hora das pesquisas sobre Epitácio Pessoa.

À minha família em especial, por acreditar em mim, e nos meus sonhos: pai, mãe,

irmãos, todos, e, claro, minha eterna namorada e agora esposa, pela paciência em ouvir as

minhas problemáticas em como fazer este estudo.

Obrigado e muito obrigado a todos pela realização deste trabalho – que é

inesquecível.

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RESUMO

Este trabalho versa sobre as articulações internas da política no Amazonas para a sucessão de 1920, na qual encontramos pela primeira vez, fortes oposições ao cargo de governador. Verificamos que a sucessão governamental foi marcada por uma série de irregularidades, entre elas a coação aos eleitores e adulteração de atas eleitorais. Situação agravada pelos discursos contraditórios dos jornais locais, que colocaram a população em dúvida quanto à escolha do melhor candidato e quanto aos resultados da eleição. Em face deste panorama, propomos neste trabalho uma análise através das discussões teóricas dos trinta primeiros anos da República no Amazonas, que se expressa nas ações da oligarquia local e no seu desejo de ampliar o seu domínio sobre a política do Estado, o que marcou os traços políticos do Amazonas na década de 1920.

Palavras-chave: Amazonas republicano; eleições de 1920; Sucessão governamental.

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ABSTRACT

This study discusses the internal political articulation in the State of Amazonas, Brazil, with a view to the 1920 succession, in which for the first time we find strong opposition to the post of governor. The gubernatorial succession was clearly marked by a series of irregularities, such as voter coercion and ballot fraud. The situation was compounded by the contradictory opinions expressed in the local press, which left the population in doubt as to the best candidate and as to the results of the election. In view of this, we propose an analysis based on theoretical discussion of the first thirty years of the republic in Amazonas as manifested in the actions of the local oligarchy and in its desire to expand its political hold over the State, thus marking the political landscape of Amazonas in the 1920’s.

Keywords: Republican Amazonas, Brazil; the 1920 elections; gubernatorial succession

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SUMÁRIO

RESUMO

ABSTRACT

INTRODUÇÃO...................................................................................................................12 CAPÍTULO I AMAZONAS: AS ORGANIZAÇÕES POLÍTICAS DO ESTADO............................

18

1.1 Manaus, panorâmica da cidade: da província à década de 1910................................ 1.2 A retração da economia gumífera e a sua influência nos conflitos oligárquicos no

Amazonas.................................................................................................................... 1.3 A política dos governadores – um instrumento de estabilidade do domínio das

oligarquias estaduais durante a República Velha......................................................... 1.4 A formação das facções: Nery, Antony, Bacelar..........................................................

18 24 33 38

CAPÍTULO II IMPRENSA E POLÍTICA: UM OLHAR SOBRE A SUCESSÃO GOVERNAMENTAL DE 1920.......................................................................................

46

2.1 A conjuntura política do ano de 1920........................................................................... 2.2 O discurso por meio dos periódicos............................................................................. 2.3 As facções e seus órgãos de imprensa.......................................................................... 2.3.1 O Amazonas – Órgão do partido republicanoliberal................................................. 2.3.2 A Imprensa – Órgão do partido republicano amazonense......................................... 2.3.3 A Reação – Órgão da união republicana amazonense...............................................

46 49 51 52 59 67

CAPITULO III O RESULTADO DO PLEITO E SUAS CONTRADIÇÕES DO NOVO GOVERNADOR ELEITO...............................................................................................

75

3.1 O pleito de 14 de julho................................................................................................. 3.2 Os vários resultados do pleito por meio das facções e seus órgãos de imprensa.............................................................................................................................. 3.3 O posicionamento do governo federal na escolha do novo governador....................... 3.4 Amazonas e suas contradições na sucessão governamental de 1920...........................

75 79 91 98

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CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................... FONTES...........................................................................................................................

105 110

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA...............................................................................

112

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INTRODUÇÃO

O presente estudo corresponde ao exame do processo político no Estado do

Amazonas no ano de 1920. E surge da necessidade de se investigar as bases e a estrutura do

poder local, afim de verificar até que ponto essa força teria atuado nas manifestações do pleito

de 14 de julho de 1920.

As eleições no Amazonas aconteciam dentro de um contexto de uma política

sumamente elitista1, marcadas sempre por uma série de irregularidades ocorridas pela

intervenção constante daqueles que tinham nas mãos alguma espécie de poder. A facção que

se encontrava no poder contava com a cobertura das autoridades nomeadas pelo governo

central para exercer os seus desmandos. Enquanto a oposição buscava apoio para impor-se e

eleger-se.

O objetivo central a que nos propomos neste trabalho foi o de realizar um estudo das

relações políticas do Estado do Amazonas com o governo central no período de 1920,

observando o contexto político e as características do processo da retração da economia

gumífera nos grupos oligárquicos que disputavam o governo local.

Partindo das interpretações da historiografia regional, ainda que poucos historiadores

locais tenham se debruçado sobre o episódio eleitoral de 1920, temos como referência o

trabalho de Eloína Monteiro dos Santos – A Rebelião de 1924 em Manaus, cuja análise do seu

estudo refere-se ao governo de Rego Monteiro e à moralização política pregada pelo

movimento tenentista. Nessa obra, a autora faz um panorama das duas primeiras décadas do

século 20, sendo um dos poucos trabalhos que relata as questões políticas do Amazonas na

República Velha, e que chama a atenção para as sucessões governamentais que foram

decisivas para as discussões das facções políticas do Estado, na década de 10, e

principalmente na década de 20. A autora ainda percebe algumas contradições da sucessão

governamental de 1920 no Amazonas. Contudo, sua apreciação prende-se muito à questão da

passividade das organizações políticas do Estado diante do poder central.2

Outro autor de referência regional, que comenta a conjuntura política dos anos 20, é

Antônio Loureiro, na sua obra Tempos de Esperança (1917-1945). Para ele, o Amazonas

1O termo elite compreende os comitês executivos dos partidos estaduais, os governadores, os membros do governo federal em nível ministerial e, mais acima, os líderes parlamentares e os comandantes da região militar. Os membros da elite política pertenciam a uma classe socioeconômica mais ampla, cujos interesses eles defendiam quando no governo. LOVE, Joseph. O Regionalismo Gaúcho (1882-1930). São Paulo: Perspectiva, 1989. p. 13. 2SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus. 3.ª ed. revista. Manaus: Editora Valer, 2001. p. 46.

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sofreu muito com a retração da economia gumífera e que esse abalo foi determinante para as

discussões não somente econômicas como políticas no Estado.3 Sob o ponto de vista político,

Loureiro diz que a vida do Estado foi bastante movimentada e rica em acontecimentos,

acompanhando a instabilidade econômica reinante, exemplo disso foram as diversas

candidaturas apoiadas por diferentes poderes locais:

Rego Monteiro era candidato situacionista às eleições de 14 de julho de 1920, ao cargo de governador para o período de 1920/1924. Por sua vez, a facção Nery lançou a candidatura do juiz Wortingen Ferreira, enquanto a facção Guerreiro Antony a do marechal Thaumaturgo de Azevedo.4

Antonio Loureiro, contudo, prende-se na narrativa dos documentos e às suas fontes

estatísticas; não há uma ação onde se verifique as contradições apontadas entre os documentos

e as interrogações de Loureiro, que é um observador passivo. Esse positivismo do autor

permite ver o documento como absoluto. Esse tipo de observação nos permite questionar o

método apresentado, pois temos de saber perceber as lacunas no processo de reconstrução do

acontecimento histórico, para não cairmos no convencimento de que o documento oficial é

absoluto, quanto mais se tratando da questão da borracha e também das bases de organizações

e facções políticas do Amazonas em 1920.

Voltando-se para a historiografia nacional, para fazer um contraponto ao contexto

regional, citamos a obra de Edgar Carone, A República Velha – Evolução Política (1889-

1930), pois a análise de cada período estudado por Carone é feita de modo a demonstrar a

relação entre a política federal e as lutas partidárias nos Estados, em que as questões políticas

se reorganizaram em torno do equilíbrio entre civis e militares. O que nos chama a atenção

nessa obra é que, quando analisa as eleições de 1920 no Amazonas, o autor escreve a palavra

‘convencimento’ ao referir-se ao presidente Epitácio Pessoa, no que diz respeito à candidatura

de Rego Monteiro. Conforme o autor, Epitácio tinha sido convencido pelo governador Pedro

Bacelar a declarar Rego Monteiro governador, para acabar com as controvérsias da apuração.

De acordo com Eloína Monteiro, o eleito tinha sido o juiz Wortingem Ferreira, mas

Bacelar boicotou o resultado eleitoral.5 Ao referir-se a esse episódio, ela utilizou os mesmos

termos usados por Carone – boicote e convencimento –, uma vez que parece claro que

Bacelar convenceu o presidente a declarar Rego Monteiro governador.

3LOUREIRO, Antonio José Souto. Tempos de Esperança (1917-1920). Manaus: Ed. Sérgio Cardoso, 1994. 4LOUREIRO, Antonio José Souto. Tempos de Esperança, p. 15. 5SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 47.

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Todavia, face as lacunas apresentadas na historiografia local e face as contraditórias

análises sobre os episódios que cercam as eleições de 1920, procuramos neste trabalho,

estimular uma reflexão mais apurada dos acontecimentos, a partir de novos questionamentos.

Por exemplo: O que levou Bacelar a convencer o presidente a declarar Monteiro governador?

Eloína Monteiro não deixou isso muito claro; enquanto Edgar Carone explica que era

simpatia, mas uma simpatia duvidosa, já que Epitácio Pessoa dizia isso para os três

candidatos. A situação do Amazonas era turbulenta no ano de 1920. Pela primeira vez se

reuniram três candidatos ao cargo de governador; as facções eram divididas e o governador

não tinha como controlá-las. Carone nos diz que “então caberia ao chefe da nação determinar

o novo governador e este optou pelo candidato do governador Bacelar para pôr fim às

dissensões partidárias”.6

Há uma construção diferenciada, no contexto da representação das facções políticas

no Amazonas, principalmente dos historiadores Edgar Carone e Eloína Monteiro, e do

ensaísta Antonio Loureiro, porque nenhum dos três detalhou a questão da sucessão

governamental, mas concordam eles que houve uma corrupção eleitoral nessa sucessão e que

o governador eleito foi o juiz Wortingen Ferreira e não o senador Rego Monteiro. Por outro

lado, nenhum dos três se preocupou em observar os órgãos da imprensa – que eram

comandados por facções internas da região.

Carone não comentou a interferência da imprensa local no resultado do pleito; Eloína

Monteiro trabalhou um pouco com a imprensa, mas não tornou claros os conflitos; e Antônio

Loureiro também não apresentou as contradições dos jornais da época. E o porquê do apoio

desses jornais a determinados grupos políticos e quais eram os interesses dos jornais

dominados pelas oligarquias. As fontes documentais demonstram dúvidas sobre os bastidores

dos órgãos de imprensa, sobre quais tinham cunho político e interesses particulares entre si.

A historiografia regional pouco explorou os jornais da época que representavam

justamente a fala das facções. Nesse caso, propomo-nos a analisá-los, verificando os discursos

da imprensa no quadro da desconstrução da temática selecionada nos jornais A Reação,7A

Imprensa8 e o Amazonas.9 Sendo que as facções políticas organizadas nessa sucessão

6CARONE, Edgar. A República Velha – Evolução Política (1889-1930). 4.ª ed. São Paulo: Difel, 1983. p. 339. 7Órgão da União Republicana amazonense. Jornal A Reação (1920-?). Tinha como subtítulo: “Dentro da lei representamos o direito, queremos a liberdade. Todos unidos, a força nos conduzia à vitória!”. Diretores do jornal: Dr. Francisco Gomes de Oliveira e Dr. Elviro Dantas Cavalcante. Gerente: Anselmo Chaves. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas (1851-1950). Catálogo de Jornais, 2.ª ed. revisada. Manaus: Edua, 1990. p. 122. 8Órgão do Partido Republicano Amazonense. O jornal A Imprensa passou a ser impresso em Manaus no ano de 1917. Cf. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas (1851-1950), p. 113.

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formaram um discurso de salvamento nos seus jornais, que eram os elos de divulgação e

manipulação dos interesses dos grupos políticos formados por Bacelar, Nery e Antony.

Os candidatos eram agentes diretos das ações das facções envolvidas, de forma que a

disputa governamental ganhou certa complexidade que se refletiu nos resultados do pleito. O

foco dos três jornais, em geral, centrava-se na defesa dos grupos que no momento detinham o

poder político ou daqueles que pretendiam alcançá-lo. Com isso, percebemos a hegemonia10

desses grupos políticos significando domínio e liderança.

A conjuntura política do Amazonas aqui analisada se revela através da importância e

da necessidade de se procurar compreender as contradições das facções e seus interesses em

assumir o novo governo. Uma possível resposta se encontra no fato de que as decisões das

facções dentro da sociedade passaram pelas instâncias do político, do econômico e foram

definidas em nível ideológico. Aparentemente, para o povo, foi o discurso dos jornais que

funcionou como instrumento de construção de grupos políticos tendenciosos em ganhar a

simpatia dos eleitores, que usavam a propaganda de seus periódicos para mobilizar a massa

em benefício próprio.

Todos os grupos políticos e seus comandantes, de acordo com Eloína Monteiro,

“procuraram artimanhas e interesses de ganhar o pleito”.11 Com isso, temos as identificações

das facções, com a fluidez das situações, com uma pluralidade de estilos e a multiplicidade de

resultados com que cada jornal direcionava para si resultados favoráveis. Para Edgar Carone,

a fragmentação duvidosa dos votos explicava a desordem e a perplexidade que foi essa

disputa governamental, e a contestação dos grupos políticos “querendo a todo modo o apoio

do presidente da República, Epitácio Pessoa”.12

Contudo, fazendo análises mais afinadas, percebemos que não houve um racha entre

os partidos locais, e sim uma separação momentânea, porque elas organizavam-se juntas,

embora apresentassem certas divergências partidárias aparentemente contrárias. Havia essa

9Órgão do Partido Republicano Liberal. Jornal que circulou em Manaus pela primeira vez em 9 de julho de 1866. Caracterizou-se por uma postura crítica à política local, fazendo oposição em 1913, às facções Nery e Pedrosa. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas (1851-1950), p. 35. 10“Nas condições modernas, argumenta Gramsci, uma classe mantém seu domínio não simplesmente através de uma organização específica da força, mas por se capaz de ir além de seus interesses corporativos estreitos, exercendo uma liderança moral e intelectual e fazendo concessões, dentro de certos limites, a uma variedade de aliados unificados num bloco social de forças que Gramsci chama de bloco histórico. Este bloco representa uma base de consentimento para uma certa ordem social, na qual a hegemonia de uma classe dominante é criada e recriada numa teia de instituições, relações sociais e ideias. Essa textura de hegemonia é tecida pelos intelectuais que, segundo Gramsci, são todos aqueles que têm um papel organizativo na sociedade”. BOTTOMORE, Tom (ed.). Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. p. 177. 11SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 47. 12CARONE, Edgar. A República Velha – Evolução Política (1889-1930), p. 340.

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separação, em que se originavam atitudes e atividades próprias dos partidos. Suas convicções

independentes é que ajudam, em parte, a explicar certas rebeldias extemporâneas.

O limite da ação e de independência desses partidos, porém, formando facções em

relação a certos governos, é a questão mais complexa deste estudo, para entender por que

tantas confusões acerca do governador eleito de 1920? O porquê do posicionamento de jornais

em favor de elites fortes? O que estava por detrás do simples comando de um governo, os

beneficiamentos de determinadas facções? E qual foi a reação da sociedade observando essa

disputa pelo poder maior do Estado?

O saber histórico preocupa-se, sobretudo, em formular problemáticas que interessam

a nossa forma de pensar e investigar as diferentes maneiras de elaboração dos conceitos

envolvidos, com os quais a linguagem do historiador institui, no processo histórico, uma

forma peculiar e original de interrogar-se sobre a verdade das palavras, das coisas e do ser.

Este trabalho está rodeado de interrogações, entendendo estas como o ponto principal para

analisar a conjuntura política do Amazonas na sucessão governamental de 1920. A temática

da pesquisa é justamente voltada para essas análises e diretrizes aqui apresentadas.

Dessa forma, o trabalho está dividido em três capítulos. Sendo o primeiro capitulo

denominado Amazonas: As organizações Políticas do Estado, que tem por finalidade

demonstrar as circunstâncias das organizações políticas do Amazonas na década de 1910, com

suas facções tituladas como esfera política de uma oligarquia estadual diante do governo

federal, sendo que o federalismo da República Velha era uma maneira de garantir o domínio

oligárquico em cada Estado. Identificando a economia como uma possível causa de oposição

política numa Manaus embelezada com a borracha, que depois se tornou discurso de descaso

regional e nacional.

No segundo capítulo – Imprensa e Política: Um Olhar Sobre a Sucessão

Governamental de 1920 – tentamos compreender as discussões da sucessão governamental

por meio dos discursos das facções nos jornais estabelecidos no ano de 1920. Procurando ter

uma visão crítica, uma vez que sendo um meio influente, os periódicos têm sido analisados

em seu papel de formador da opinião pública ligado a interesses variados e, como órgãos da

denominada “imprensa livre”, faziam parte do jogo político e do poder da época dos grupos

oligárquicos para chegar ao poder se beneficiando dos órgãos de imprensa, que não vão

esconder os seus partidos e apoio a certos candidatos. Esses órgãos de imprensa vão conviver

lado a lado com o jornalismo político ou a imprensa de opinião, que vão também intitular-se

órgãos independentes; porém uma análise mais profunda dos conteúdos de suas matérias,

editoriais e artigos demonstram que apenas se utilizavam de uma forma mais sutil de

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conquistar o apoio da opinião pública. E nessa linha podem ser enquadrados justamente os

jornais Amazonas, A Reação e A Imprensa.

Finalmente, no terceiro capítulo – O Resultado do Pleito e Suas Contradições do

Novo Governador Eleito – procuramos demonstrar as contradições do resultado do pleito e as

várias versões de como Rego Monteiro ganhou essa eleição. Percebendo os pensamentos

políticos locais e nacionais contemporâneos aos acontecimentos que desenvolveram a ideia de

que os Estados do Norte, diferentes economicamente dos do Sul, eram pouco capazes de

resistirem às determinações oriundas da capital da República, dadas as suas poucas

relevâncias políticas. Percebemos nessa visão como os historiadores Edgar Carone e Eloína

Monteiro consideraram a eleição de 1920, no Amazonas, passiva em relação ao governo

federal. Vale ressaltar o caráter da complexidade da conjuntura política do período, objeto

deste estudo, que era bastante tumultuada. Nela, os poderes em vigência se articulavam e se

desarticulavam.

Em tal estudo, buscamos ferramentas metodológicas e documentação possível para

realizar este trabalho, por vezes exaustivo, por não encontrar determinados documentos,

irremediavelmente perdidos numa cidade sem preservação de seus acervos documentais,

posto que por conta disso, não podemos saber ao certo quem foi realmente o candidato eleito

pelas urnas. Mas o esforço foi grande para entender até que ponto a conjuntura política do

Amazonas se articulou num pleito marcado por contrastantes resultados transmitidos

especialmente por órgãos de imprensa que funcionavam como grandes veículos de políticos

locais. E até onde pesava a escolha do presidente ao governador empossado.

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1. CAPÍTULO. AMAZONAS: AS ORGANIZAÇÕES POLÍTICAS DO

ESTADO

A história de fato não vive fora do tempo em que é escrita, ainda mais

quando se trata da história política: suas variações são resultado tanto das

mudanças que afetam o político como das que dizem respeito ao olhar que o

historiador dirige ao político. Realidade e percepção interferem.13

1.1. Manaus, panorâmica da cidade: da província à década de 1910.

Nas quase quatro décadas de vida provincial, a sociedade amazonense passou por

sensíveis mudanças. Com a elevação do Alto Amazonas à categoria de Província, a Barra do

Rio Negro (Manaus, a partir de 1856) tornou-se definitivamente capital da mais nova unidade

política e administrativa do Brasil.14 Com o advento da República, capital do Estado do

Amazonas.

Se, no período de 1852 a 1870, ainda mantinha os resquícios do período anterior à

instalação do aparato provincial e se debatia, não só com a dependência política, mas também

econômica em relação ao Pará, a partir dos meados de 1870, começou a experimentar um

novo momento com a ascensão da borracha.15

Sua composição étnica e demográfica modificou-se com a imigração nordestina,16

que se espraiou pelos mais diferentes rincões da província. Testemunhou, ainda, o início de

uma clara diferenciação entre as demais localidades do Amazonas, e Manaus tornou-se

símbolo de prosperidade do novo momento.17

Situada numa área em que a maioria dos europeus e muitos brasileiros consideravam

imprópria para a vida humana, a urbe tinha de tornar-se um centro urbano civilizado, que

13RÉMOND, René. Uma História Presente. In: RÉMOND, René. (org.). Por uma História Política. Tradução: Dora Rocha. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 22. 14“Apesar de ter sido criada em 1850, a Província do Amazonas só foi oficialmente instalada em 1.º de janeiro de 1852, com a posse de seu primeiro presidente, que deu início ao processo que deveria efetuar em termos políticos e administrativos a integração da nova província ao Império do Brasil. Na nova condição de Província do Império, o Amazonas poderia agora avançar em busca de sua autonomia por meios oferecidos pelo aparato administrativo provincial”. LIMA, Regina Márcia de Jesus. O Partidarismo Político e as Eleições no Amazonas (1868-1889). Amazônia em cadernos. Manaus: Imprensa Universitária, vol 2, n. 2/3, p. 33-57, 1993/1994. 15“O Brasil, possuidor da maior reserva mundial de seringueiras nativas, verá assim abrir-se mais uma perspectiva econômica de vulto. A exportação da borracha vem em contínuo aumento desde 1827, quando se registra um primeiro e modesto embarque de 31 toneladas, e atinge em 1880 cerca de 7.000. A partir de então o crescimento se acelera”. PRADO JÚNIOR, Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo: Editora Brasiliense, 2003. p. 236. 16“Em consequência da grande seca no interior nordestino que durou de 1887 a 1880, estabelece-se uma forte corrente migratória daí para o Amazonas. Ela se empregará na extração da borracha cuja exportação se eleva em 1887 para mais de 17.000 toneladas”. PRADO JÚNIOR, Caio. História Econômica do Brasil, p. 236. 17REIS, Arthur Cézar Ferreira. O Seringal e o seringueiro. 2.ª ed. revisada. Manaus: Edua, 1997. p. 76.

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oferecesse todas as comodidades da vida moderna aos seus habitantes de classe média e alta,

ou continuar para sempre numa posição secundária em relação à capital paraense.18 Esse

processo remonta aos fins da década de 1870, quando a elite amazonense iniciou sua luta para

tirar Manaus da sombra de Belém.

A vertiginosa ampliação dos negócios que a borracha proporcionou ao Amazonas

acarretava, consequentemente, o que Regina Márcia de Jesus Lima chamou de “delírios do

látex”.19 A imagem serve como evidente alusão à euforia causada pelas possíveis mudanças

qualitativas que a província iria ter no cenário regional, em relação ao Pará, e no âmbito

nacional, em relação ao Império.

O comportamento eufórico dos administradores do Amazonas já era bastante visível

no final da década de 1870 e início da de 1880, quando os presidentes da província dessa

época consideravam o estado das finanças provinciais lisonjeiro e as reservas do tesouro em

franca ascensão. Outro indicador da euforia dos governantes pode ser notado no período de

1880 a 1881, quando as concessões de terras, juntamente com a expedição de títulos de

propriedade, foram maiores do que as registradas nas primeiras décadas da província. O que

demonstra a ansiedade de uma elite em defender interesses próprios diante da política que

envolvia a ascensão gumífera.20

Um segundo e importante desdobramento da expansão do setor gumífero refletiu-se

no imaginário da elite, que criara fortes vínculos com o Amazonas. Tornava-se imperioso

criar um símbolo que manifestasse o novo momento que o Estado passava a viver. Nesse

contexto, Manaus, por ser a capital da província, apresentava condições de transformar-se no

almejado símbolo da euforia amazonense.

A necessidade de reformar a capital foi um dos temas mais debatidos na Assembleia

Provincial, pois, somente assim, sua cidade poderia parecer com as demais capitais do

Império, uma vez que, para os parlamentares, tudo deveria estar condigno com sua civilização

e desenvolvimento.21 Essas observações eram extensivas a algumas vilas do interior, que, por

sua vez, irradiariam a civilização da borracha por todo o Amazonas.

Antes mesmo, porém, que a borracha alcançasse a projeção que veio a ter em fins da

década de 1870, a elite que se arraigara no Amazonas, principalmente sua parcela domiciliada

18WEINSTEIN, Barbara. A Borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920). Tradução Lólio Lourenço de Oliveira. São Paulo: Hucitec/Edusp, 1993. p. 221. 19LIMA, Regina Márcia de Jesus. A Província do Amazonas no Sistema Político do Segundo Reinado (1852-1889). Dissertação de Mestrado. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 1978. p. 09. 20LIMA, Regina Márcia de Jesus. A Província do Amazonas no Sistema Político do Segundo Reinado (1852-1889), p. 10. 21LIMA, Regina Márcia de Jesus. A Província do Amazonas no Sistema Político do Segundo Reinado (1852-1889), p. 12.

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em Manaus, começava a nutrir o desejo de expurgar do espaço urbano todos os elementos que

consideravam indesejáveis.

A cidade sofreu, a partir de 1890, seu primeiro grande surto de urbanização, graças

aos investimentos propiciados pela acumulação de capital, via economia agrária extrativista-

exportadora, especialmente a economia da borracha.22 Em fins da década de 1890, a cidade

possuía um dos primeiros sistemas de bondes movidos à eletricidade da América Latina.

Possuía gás e água encanados, iluminação pública elétrica e um excelente porto artificial.23

Os aumentos sucessivos das exportações e o elevado preço dos produtos exportados,

principalmente a goma elástica, propiciaram ao Estado uma enorme receita, contribuindo,

com isso, para uma grande euforia por parte dos administradores estaduais, que consideraram

as condições financeiras do Estado como as mais promissoras.

Essa promissão ditou a ordem do dia aos governantes amazonenses: viver a

modernidade.24 Modernizar, embelezar, buscar a civilização25 e adaptar Manaus às exigências

econômicas e sociais da época da borracha passou a ser objetivo maior dos administradores

locais. Era necessária que a cidade se apresentasse moderna, limpa e atraente, para aqueles

que a visitavam a negócios ou que pretendessem nela estabelecer-se definitivamente.

Um levantamento em estudo recente feito sobre a cidade de Manaus, no final do

século XIX para o início do século XX, onde são mostrados os seus aspectos de cidade

pequena antes da economia gumífera, até o seu momento de apogeu do látex comercializado

no mercado mundial, concluiu que as transformações foram inevitáveis e necessárias para

uma grande cidade que estava crescendo:

22DIAS, Edinea Mascarenhas. A Ilusão do Fausto – Manaus 1890-1920. 2.ª ed. Manaus: Editora Valer, 2007. p. 38. 23PINHEIRO, Maria Luiza Ugarte. A Cidade sobre os ombros: trabalho e conflito no porto de Manaus – 1889-1925. 2.ª ed. Manaus: Edua, 2003. p. 37. 24

Belle époque – “trata-se de um período localizado do final do século 19 às primeiras décadas do século 20. Esse período foi marcado por uma efervescência intelectual e cultural, e uma busca acelerada da chamada modernidade, refletindo-se em todos os setores da atividade humana. Tal movimento irradia-se a partir da França, refletindo-se em quase todos os países do Ocidente [...]. O sinônimo da belle époque na Amazônia é traduzido pelas reformas urbanas das cidades de Manaus e Belém [...]. A belle époque em Manaus substituiu a madeira pelo ferro, o barro pela alvenaria, a palha pela telha, o igarapé pela avenida, a carroça pelos bondes elétricos e pelos automóveis, a iluminação a gás pela luz elétrica, expande a navegação, desenvolve a imigração, civiliza índios”. DIAS, Edinea Mascarenhas. In: SANTOS, Francisco Jorge dos; SAMPAIO, Patrícia Melo (Orgs.). Estado do Amazonas em Verbetes. Manaus: Editora Novo Tempo, 2001. p. 33-34. 25A propósito da expressão “civilização da borracha”, o autor Leandro Tocantins fez algumas considerações, e indagou: “É possível o emprego da palavra civilização para caracterizar uma época em que houve predominância econômica de determinado produto, originando novas relações de cultura e uma visível manifestação de progresso material? O açúcar, o ouro, o café, o gado, a borracha, todos estes e outros produtos-reis que, nas constantes ondulações e mudanças caracterizantes da economia brasileira, imprimiram um novo ritmo de evolução ao país, impeliram massas humanas a ocupar territórios, fizeram deslocar a moving frontier, criaram, enfim, riqueza material e espiritual. É possível unir a borracha a essa palavra rica de conteúdo sociológico e de ressonâncias emotivas, como é o vocábulo civilização?”. TOCANTINS, Leandro. Amazônia – Natureza, Homem e Tempo. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982. p. 118.

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A prosperidade começaria a mostrar-se em Manaus na última década do século XIX. A renovação dos prédios públicos, as construções monumentais, os aterros e desaterros, a abertura de ruas e avenidas foram acompanhadas pela incorporação, em alguns casos pioneira, de tecnologias urbanas modernas como o sistema de bondes, a iluminação elétrica, a comunicação telefônica, sistema de galerias para drenagem de águas e esgotos, além da abertura de espaço destinados ao lazer refinado, hipódromo, teatro, clubes etc.26

Dessa forma, Manaus passaria, com essas transformações, de uma simples vila, que

chegou até meados do século XIX, a uma cidade atrativa para as empresas internacionais que

viam na economia gumífera uma alta produção lucrativa. Em função do contexto de expansão

da economia gumífera, cedo se fez necessário dotar a cidade de uma infraestrutura portuária

adaptada às necessidades dessa nova configuração assumida por Manaus – a de entreposto

comercial.27

Durante esse processo de metamorfose, uma verdadeira febre de construção tomou

conta da cidade, varrendo tudo aquilo que poderia evocar os povos indígenas. Ergueram-se

prédios públicos monumentais, como o Teatro Amazonas, o Palácio da Justiça, a Biblioteca

Pública, a Alfândega, instalações do porto flutuante. Surgiram estabelecimentos bancários e

lojas com os nomes franceses como: Louvre, Au bom marche, A La Ville de Paris, além de

algumas residências majestosas, vilas, palacetes, bares, restaurantes, hotéis e cabarés,

contendo, em seu interior, móveis e tapetes europeus.28

Tudo para que a cidade servisse com eficiência aos seus novos donos, que se

encarregaram diretamente de promover essas transformações de acordo com seus interesses,

que nem sempre coincidiam com os interesses do conjunto da população. Por outro lado, na

cidade, no início do século XX, praticamente todos os serviços urbanos estavam, por

concessão, nas mãos de firmas inglesas, que passaram a agenciar melhoramentos ou mesmo

criar serviços até então inexistentes nela, e “que começaram a fazer parte do cotidiano da

população manauara”.29

Uma boa descrição de Manaus, de 1910, após a febre da economia da borracha a

transformou em uma cidade populosa, moderna e cosmopolita, foi feita por E. Bradford

Burns, que assim a descreve:

26PINHEIRO, Maria Luiza Ugarte. A Cidade sobre os ombros, p. 37. 27PINHEIRO, Maria Luiza Ugarte. A Cidade sobre os ombros, p. 39. 28FREIRE, José Ribamar Bessa. Manáos, Barés e Tarumãs. Amazônia em cadernos. Manaus: Imprensa Universitária, vol 2, n. 2/3, p. 159-178, 1993/1994. 29Empresas como: “Manáos Markets, Manáos Tramways and Light, Manáos Improvements, Amazon Engineering, Amazon Telegrafh, Booth Line e Amazon River”. Cf. PINHEIRO, Maria Luiza Ugarte. A Cidade sobre os ombros, p. 42.

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Em 1910, Manaus reinava como a capital mundial da borracha. Mais de vinte anos de produção crescente, exportação contínua e de preços em elevação, haviam criado a prosperidade, da qual a cidade era a evidência mais ampla. Nesse ano, Manaus progredia, com os preços atingindo novas alturas e toda a atmosfera da cidade altamente próspera [...]. Manaus alardeava com orgulho todas as civilidades de qualquer cidade europeia de seu tamanho ou mesmo maior. Um excelente sistema portuário, um serviço de coleta e disposição de lixo eficiente, eletricidade, serviços telefônicos, belos edifícios públicos, residências confortáveis atestavam o estado de modernização da cidade.30

O Estado do Amazonas, de acordo com Burns, contava em 1910 com uma população

de 378.476 habitantes, em sua maioria índios ou mamelucos, enquanto que Manaus somava

cerca de 50.000 habitantes. Diferente do restante do Estado, a cidade possuía uma composição

étnica bastante cosmopolita, pois a colônia estrangeira era bastante numerosa e diversificada,

formada por ingleses, franceses, alemães e portugueses que estavam envolvidos com a direção

dos negócios da borracha; e os espanhóis, italianos, sírios e libaneses se dedicavam a outros

tipos de atividades na capital. A cidade vivia sob forte influência estrangeira, consumindo

numerosos produtos, tais como: “revólveres Smith and Wesson, terçados Collins, sapatos

Walk-over, relógios Omega, leite condensado Fussel, motores Otto, máquinas de escrever

Sun, e tantos outros produtos”.31

Na vida comercial, a supremacia dos ingleses era notável. Eles comercializavam a

maior parte da borracha. Foram, no entanto, o gosto e o estilo franceses que muito fizeram

para a formação dos hábitos diários dos donos da borracha, suas esposas, amantes e

seguidores. Esse grupo jactava-se que sua cidade possuía o espírito alegre da vida parisiense.

Talvez, por isso, preocupado com as fortes influências inglesas e francesas, conforme

Burns: “O governo federal tratou de estreitar os contratos entre o Rio de Janeiro e Manaus

através de comunicações telegráficas ligando as duas capitais. Havia uma linha de vapores

para passageiros e carga, com a frequência de cinco partidas mensais”.32

O Rio de Janeiro acompanhava essa situação de perto, para evitar o enfraquecimento

dos laços políticos que o ligavam ao Norte. Não havia dúvidas, entretanto, de que,

politicamente, Manaus estava ligada ao Rio, comercialmente dependia de Londres, e

culturalmente, em parte, de Paris.

Na década de 1910, a capital perdeu o centro do monopólio comercial da borracha.

Os seringueiros não estavam preparados para a retração gumífera, o surto provocou

30BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão. Manaus: Governo do Amazonas, 1966. p. 5. 31BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 6-7. 32BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 8.

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desequilíbrio interno nos setores de companhias estrangeiras e Manaus deixou de viver seus

sonhos de grande cidade internacional.

Ao iniciar-se a década de 1920, a cidade de Manaus foi afetada profundamente com a

queda dos preços da borracha no mercado internacional, segundo Eloína Monteiro, tal efeito:

Manifestava reflexos visíveis na estrutura urbana mostrando sinais de decadência que contrastavam com o processo urbanístico vivido na década anterior. Na pauta de sua exportação, através do porto da cidade, constatava-se ainda a preponderância da borracha, acompanhada em escala reduzida de outros produtos extrativos.33

Manaus procurou recuperar sua economia com outro produto de exportação, mas a

carência dos efeitos da borracha parecia não permitir que a cidade se desenvolvesse, por falta

de atividade governamental, que era inócua.

A economia gumífera, que durou cerca de vinte anos, não desapareceu sem deixar a

sua profunda marca no Amazonas. A atividade dos intrépidos seringueiros tirou o vale

amazônico da letargia secular. Em três décadas, a população do Amazonas triplicou.34 Um

dos sinais mais visíveis da mudança da região foi a transformação de Manaus, passando de

uma sonolenta vila a uma cidade cosmopolita.

Com o fim da pompa, porém, regada pelo leite da seringa e pelo suor de seringueiro,

muitas casas comerciais fecharam suas portas ou pediram falência. A crise da economia da

borracha fez-se presente em todos os setores da vida urbana e da rural: na cidade de Manaus,

por exemplo, causou desemprego nos vários ramos de serviços, gerando como uma de suas

consequências a inadimplência nos contratos de aluguéis. Tal fato promoveu o deslocamento

desse inquilinato, uma parte saiu do centro da cidade para o subúrbio, enquanto que a outra

retornou à sua terra de origem, esvaziando a cidade completamente.35

Já na zona rural, a crise provocou um movimento demográfico no sentido contrário

ao que ocorreu nos momentos de rush da economia da borracha. O contingente de

trabalhadores dos seringais e de outros pontos do interior do Estado, buscando alternativas de

melhores condições de vida, aos poucos, a partir de 1920, foi construindo em Manaus a

33SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 34. 34Segundo o Censo de 1890, o Amazonas possuía uma população de 147.915, e Manaus contava com 38.720 habitantes, passando para o ano de 1900 a uma população de 249.756 o Amazonas, enquanto Manaus para 52.040 habitantes. Já no ano de 1920, o Censo mostra o Estado com uma população ainda ascendente de 363.166, e a capital Manaus 75.704. (CENDAP/ UFAM, obras digitais, Censos). 35COSTA, Francisca Deusa Sena da. Quando viver ameaça a ordem urbana, trabalhadores urbanos em Manaus (1890-1915). Dissertação de Mestrado. São Paulo: PUC, 1997. p. 147.

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chamada cidade flutuante, que se consolidou na década de 1960. Esse aglomerado urbano

formava uma verdadeira favela fluvial no porto de Manaus.36

Essa depressão econômica acentuou-se após 1914, manifestando-se na década de

1920 de modo crítico, fazendo com que os extratores abandonassem os seringais:

Sulcando os rios em bandos turbulentos, depredando e destruindo as propriedades que iam encontrando a sua passagem. Em sua grande maioria, esse contingente humano era constituído de nordestinos que procuravam regressar aos seus Estados de origem. Os anos de 1914 e 1915 assinalaram o ponto máximo desse êxodo, levando o governo federal a conceder-lhes transporte gratuito nos navios do Lloyd Brasileiro.37

De acordo com Eloina Monteiro, os amazonenses e os imigrantes, que ficaram não

apresentavam, naquele momento, nenhuma possibilidade de luta pelas questões de interesses

regionais, sendo pouco lembrados pelo Poder Central.38 Já os comerciantes tinham relutâncias

em culpar seus métodos de produção ineficientes e causais. Ao invés disso, procuravam por

causas mais remotas. Acusavam o governo federal de dedicar as suas atenções para o café e

de negligenciar o restante da economia brasileira.

Manaus vivenciou riqueza e prosperidade, mas a certeza dos seringalistas e dos

governantes de que tal cidade seria a única na alta produção da borracha, permitiu que ela

chegasse à década de 1920, pobre e marginalizada pelos órgãos do governo central, ou seja,

mais uma vez esquecida, porque sem a riqueza da borracha, o governo federal pouco se

importava com ela.

1.2. A retração da economia gumífera e a sua influência nos conflitos oligárquicos no

Amazonas.

A economia brasileira era essencialmente agrícola. Em 1920, quase 70% da

população em atividade trabalhavam na agricultura.39 A economia e a política eram unidas

nas discussões no contexto das primeiras décadas da República.

O Amazonas, por volta de 1880 a 1911, controlou o mercado mundial da borracha.40

As oligarquias se fortaleceram. Grupos políticos se favoreceram com a riqueza local. Mas na

36COSTA, Francisca Deusa Sena da. Quando viver ameaça a ordem urbana, p. 147. 37SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 33. 38SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p.34. 39Censo Geral de 1920 – Sobre a População Brasileira em Atividade. In: FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 2001. p. 282.

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década de 1910, a situação mudou por conta dos mecanismos de monopólio, mais do que um

crescimento do volume de produção, assim, em 1911, a borracha de plantação, cultivada no

Extremo Oriente, foi lançada no mundo, os preços caíram e a borracha natural perdeu o

mercado, causando apreensão e dúvida sobre o futuro da borracha:

As flutuações enormes da borracha nesses últimos anos não lhe parecem que sejam a consequência lógica de maior ou mais intensa procura nos mercados consumidores, mas sim um efeito claro e insofismável de especulação desenfreada e de pânico que estão possuídos os produtores da Amazônia, com os preços baixos atuais comparados com os altíssimos que se caracterizam no ano anterior.41

O capital estrangeiro ligado à comercialização e distribuição da borracha no exterior

abandonou a Amazônia, em busca dos lucros mais seguros nas plantações do Oriente.42

Uma análise acerca da agonia da economia da borracha da Amazônia foi feita nos

seguintes termos, por Maria Lígia Prado e Maria Helena Capelatto: as colônias inglesas e

holandesas, com suas vastas plantações de seringueiras, dispondo de mão de obra abundante e

barata, fretes reduzidos e transportes fáceis, desarticularam a frágil estrutura de produção da

borracha no vale amazônico. O custo da produção na Ásia era inferior ao da Amazônia, onde

as técnicas de extração do látex, de coagulação e de preparação da borracha eram primitivas e

imutáveis, o transporte era oneroso e o rendimento do trabalho solitário do seringueiro, em

busca das árvores dispersas em longas distâncias, de difícil acesso e controle, era muito

pequeno. Enquanto um trabalhador da Malásia podia recolher, num só dia, três quilos de

borracha, um seringueiro local recolhia um quilo, de oito a quinze dias.43

A produção da borracha da Amazônia caiu vertiginosamente em relação à produção

asiática, sem que ninguém tomasse medidas eficazes para evitar a derrocada dessa atividade

econômica. Quando tudo já estava se consumando, entretanto, os produtores, por meio da

Associação Comercial do Amazonas, organizaram, em 1910, em Manaus, o “Congresso

40Consumo mundial de borracha, em números redondos: 1890-1910 / Ano 1880 – Toneladas 15.000 a 18.000; Ano 1895 – Toneladas 36.000; Ano 1900 – Toneladas 52.000; Ano 1906 – Toneladas 66.000; Ano 1910 – Toneladas 76.000. In: SANTOS, Roberto. História Econômica da Amazônia (1890-1920). São Paulo: T. A. Queiroz, 1980. p. 235. 41Revista da Associação Comercial do Amazonas (ACA). Ano IV, n.º 40, de 10 de outubro de 1911. p. 1. 42Para E. Bradford Burns: “Os comerciantes de Manaus inclinavam-se a subestimar a causa mais importante de sua desdita: a plantação em larga escala da Ásia, que podia produzir mais, e mais barato, que o Amazonas. Na realidade, a Ásia havia conseguido quebrar o monopólio há tanto tempo mantido pelo Brasil, de maior produtor mundial de borracha”. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão. Manaus: Governo do Amazonas, 1966. p. 15. 43PRADO, Maria Lígia Coelho; CAPELATO, Maria Helena Rolim. A borracha na economia brasileira da Primeira República. In: FAUSTO, Boris. História Geral da Civilização Brasileira, III – O Brasil Republicano (1889-1930). 2.ª ed. São Paulo: Edusp, 1997.

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Comercial, Industrial e Agrícola”, onde, conforme Burns, proprietários de seringais, técnicos

e economistas concluíram que a solução fundamental para o problema da borracha seria

investimentos na heveicultura.44 Os resultados práticos, no entanto, foram nulos.

Em janeiro de 1911, foi criado um sindicato de “valorização” do produto pelos

membros da Liga dos Aviadores, com o apoio do Banco do Brasil, à semelhança do que havia

sido feito com o café anos antes, que redundou no famoso “Convênio de Taubaté”, em 1906.45

Mais uma vez, os resultados obtidos foram nulos e a iniciativa se constituiu num

fracasso absoluto. Outros projetos foram elaborados pelo governo federal e estadual, na

expectativa de que o problema pudesse ser superado, o que infelizmente foram em vão.

Em 1912, por sugestão dos governos do Pará e do Amazonas, o governo federal

encampou um programa – Plano de Defesa da Borracha– no governo de Hermes da Fonseca,

preocupado com os indícios de queda da exploração da Hevea brasiliensis, e que editou

medidas para enfrentar a concorrência das plantações asiáticas e da borracha sintética.

Deve-se esclarecer que o desenvolvimento econômico e social, porventura, ocorrido

na Amazônia em fins do século XIX e início do século XX, com o famoso boom da borracha,

não foi produto de um planejamento governamental, mas de um movimento econômico

externo provocado pela demanda da borracha silvestre sob o impacto das necessidades

oriundas da Segunda Revolução Industrial.

Conforme Barbara Weinstein, o boom foi utilizado indiscriminadamente na literatura

econômica da borracha amazônica. Para uns, o período do boom da borracha se estendeu por

cerca de três décadas; para outros, foi apenas o primeiro semestre de 1910. A referida autora,

entretanto, considera os últimos anos da década de 1870 como os que assinalam o início da

expansão da borracha.46

Voltando ao Plano de Defesa da Borracha, este se compunha, de acordo com Burns,

de um extenso programa de estímulo à produção e industrialização da borracha, à imigração, à

saúde, ao setor de transportes, à produção agrícola alimentar e à pesca. O plano destinava-se

não somente à área da Amazônia, mas também aos Estados onde a produção de goma elástica

não era importante, como Minas Gerais, Bahia e Paraná.47 Mas a falta de gente e de capital,

somada a metas muito ambiciosas desse plano, fizeram com que ele, após um ano de

funcionamento, fosse abandonado. Das sete estações experimentais de seringueiras

44BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 32. 45BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 34. 46WEINSTEIN, Barbara. A Borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920), p. 89. 47BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 37.

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projetadas, a última que sobrevivia na circunvizinhança de Manaus foi definitivamente

cancelada em 1916.

Para alguns autores tal iniciativa tem origens diferentes. Assim, para Arthur Reis,48

o Plano de Defesa da Borracha, de 1912, foi o primeiro planejamento em grande estilo de

iniciativa do governo central para o domínio do espaço amazônico. Foi mandado executar por

dois diplomas legais: o primeiro, tratava-se da Lei n.º 2.543-A, de 5 de janeiro de 1912, que

continha um extenso programa de desenvolvimento; o segundo, Decreto n.º 9.521, de 17 do

mesmo ano, regulamentava as diretrizes necessárias ao soerguimento da região.

Mas, para Antonio Loureiro,49 tanto a lei quanto o decreto foram baseados nas

proposições do congresso de Manaus, realizado dois anos antes, sob a direção da Associação

Comercial do Amazonas (ACA). Nesse planejamento, portanto, havia a contribuição da elite

dirigente da Amazônia.

Ainda de acordo com Arthur Reis, o Plano de Defesa da Borracha, na verdade, não

se reduzia a uma ação política do poder público sobre aquele produto, pois consubstanciava

todo um amplíssimo programa visando tirar a Amazônia da posição de mera produtora de

matéria-prima florestal, enquadrando-a em novo estilo de vida. Pedro Martinello50 corrobora

com essa ideia, quando afirma que tal plano, porém, levava muito mais em conta o

desenvolvimento geral da região do que a recuperação da borracha propriamente dita.

Durante alguns anos, a borracha brasileira dominava o mercado internacional. A

produção da borracha da Amazônia decolou em função do aumento da demanda estrangeira

do produto bruto, numa época em que a região era o único fornecedor mundial.51 A economia

de exportação, resultante dessa confluência de forças econômicas e ambientais, gerou um

crescimento comercial e demográfico sem precedente na Amazônia, e fez de uma área

esquecida e muito atrasada num dos mais promissores centros de comércio do Brasil.

Depois, exatamente no momento em que os preços da borracha silvestre chegavam

ao nível mais alto, a borracha cultivada na Ásia pelos ingleses começou a surgir em grande

quantidade no mercado mundial. Com custos de produção e de transporte mais baixos, a

borracha cultivada virtualmente expulsou o produto amazônico do mercado, e a economia

regional entrou praticamente em colapso num prazo de poucos anos.52

48REIS, Arthur Cézar Ferreira. Temas Amazônicos. Manaus: Imprensa Oficial do Estado do Amazonas, 1983. 49LOUREIRO, Antonio José Souto. A Grande Crise (1908-1916). Manaus: T. Loureiro & Cia., 1985. 50MARTINELLO, Pedro. A Batalha da Borracha na Segunda Guerra Mundial e suas consequências para o Vale Amazônico. Rio Branco: Ufac (Caderno UFCA, n.º I), 1988. 51WEINSTEIN, Barbara. A Borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920), p. 15. 52WEINSTEIN, Barbara. A Borracha na Amazônia: expansão e decadência (1850-1920), p. 16.

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Antonio Loureiro, em sua obra Tempos de Esperança (1917-1945), faz um balanço

dos acontecimentos no Amazonas após a grande crise que periodiza de 1907-1916. Para ele, o

Estado sofreu muito com a retração da economia gumífera, e que esses abalos foram

determinantes para as discussões econômicas e políticas locais, pois, a partir de 1917, os

preços dos diferentes tipos de borracha começaram a cair baixando até 30% durante o

período. A situação era difícil para o Amazonas, tendo o governador Pedro Bacelar solicitado

a interferência do governo federal, com pedido de um empréstimo, assim “O pleito foi

parcialmente atendido, começando o Banco do Brasil a efetuar compras em Belém, a 3$700, o

que só ocorreria com a agência de Manaus, em janeiro de 1918”.53

O Poder Central comportava-se de modo a permitir que o Amazonas solicitasse

proteção, para os seus problemas, uma vez que seus conflitos internos, ou seja, as disputas

entre as facções oligárquicas não chegavam a alterar o jogo do poder dos Estados fortes. Para

Eloína Monteiro: “O Amazonas pedia auxílio e o governo federal, em momentos mais

críticos, apenas minorava a situação com empréstimos que resultavam em endividamentos

maiores”.54

A superação da produção da borracha amazônica pela produção asiática provocou

queda nos preços e iniciou o colapso da economia regional em 1912. Para o economista

Sylvio Mário Puga Ferreira, o governo brasileiro, por necessitar de receitas de exportação,

buscou:

Contornar a crise, pois do ponto de vista fiscal, Amazonas e Pará, ao lado de São Paulo e Minas Gerais, respondiam, no período 1889-1909, por mais de 50% das receitas fiscais estaduais, resultado do modelo de economia primário-exportadora.55

Puga afirma que como a borracha atendia à demanda externa, sua dinâmica era

determinada de fora para dentro, em que o produto ficava à mercê do jogo especulativo. O

Amazonas no ano de 1920 era esquecido, só que esse Estado tinha sido uma atração para o

governo federal por causa da produção da borracha que gerava impostos para o governo

central, principalmente no início do século XX. E que o lucro ficava no exterior e no

53LOUREIRO, Antonio José Souto. Tempos de Esperança (1917-1920). Manaus: Ed. Sérgio Cardoso, 1994. p. 15. 54SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 46. 55FERREIRA, Sylvio Mário Puga. Federalismo, economia exportadora e representação política: o Amazonas na República Velha: 1889-1914. Manaus: Editora da Universidade Federal do Amazonas, 2007. p. 233.

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embelezamento da capital, nesse momento no Rio de Janeiro, e o que sobrava para o

Amazonas servia apenas para sua subsistência.

Todos os governadores, de 1912 a 1924, administraram sob a intensa pressão dos

juros e das amortizações de uma fabulosa dívida, tanto externa como interna, que o Estado

não tinha condições de pagar, pela queda de suas arrecadações, ante a crise da borracha. Com

a retração do produto, passamos a ter no Amazonas uma instabilidade econômica.

Os problemas enfrentados pela borracha no mercado internacional afetaram a receita

de exportação local, não somente no Amazonas, mas também no Pará.56 O problema

provocou uma mudança de postura entre as lideranças políticas, principalmente as

amazonenses, que, no período de bonança gumífera, buscavam, nos limites da legalidade,

extrair o máximo de vantagens sobre a borracha exportada.

A conjuntura política57 do Amazonas, na sucessão governamental de 1920, foi

turbulenta. As organizações e as facções internas do Estado formularam uma disputa acirrada

quando a economia gumífera local estava num processo de retração, uma vez que os preços da

borracha haviam despencado depois do pico de 1910, sob o impacto do rápido crescimento da

oferta proveniente das novas plantações coloniais inglesas e holandesas do sudeste da Ásia,

que contavam com mercado diferencial de produtividade em seu favor.

No quadro nacional, a conjuntura é marcada por uma crise de retração do capitalismo

internacional. A crise de 1920, refletida imediatamente nos países periféricos por uma

retração do volume das exportações e do preço dos produtos primários, sendo que “As

exportações brasileiras de café diminuíram de 13 milhões, em 1919, para 11,5 milhões, em

1920”.58

Os marcos estruturais mais gerais em que se insere a conjuntura do ano de 1920, que

nos preocupa especificamente, são dados pela vigência no Brasil de uma sociedade

agroexportadora, fornecedora de produtos primários para os países capitalistas centrais, e

essencialmente dependente da demanda externa para sua expansão e desenvolvimento. O

grande e recorrente problema de política econômica, durante a Primeira República, consistiu

56FERREIRA, Sylvio Mário Puga. Federalismo, economia exportadora e representação política, p. 229. 57A palavra ‘política’ não pode ser entendida separada da ideia de poder. O poder, por sua vez, é confundido com o Estado, instituição normatizadora da vida em sociedade. Entretanto, o poder não é unicamente o Estado, pois está disseminado por toda a sociedade. E também a atividade política não se dá exclusivamente no Estado. SILVA, Kalina Vanderlei e Silva; MACIEL, Henrique. Dicionário de Conceitos Históricos. São Paulo: Contexto, 2005. p. 335. 58FORJAZ, Maria Cecília Spina. Tenentismo e Política: tenentismo e camadas médias urbanas na crise da Primeira República. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. p. 34.

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em isolar a economia de profundos desequilíbrios macroeconômicos59 provocados por

alterações bruscas na posição externa a que o Brasil estava sujeito por razões estruturais.

Deve ser notado, portanto, que o debate sobre as opções de gestão econômica não

ocorria num vácuo político, mas em um sistema peculiar de relações entre o governo central e

um grande e heterogêneo conjunto de interesses estaduais, consolidado no fim da primeira

década republicana, que permitia o funcionamento relativamente estável de um regime onde o

parlamento, apesar de manter suas prerrogativas formais, subordinava-se quase que

inteiramente aos desígnios do presidente da República.

O funcionamento estável desse sistema baseava-se na maior estabilidade da liderança

dos grupos hegemônicos nos grandes Estados, e também em interesses econômicos mais

poderosos em âmbito nacional, e, por outro, na enorme influência que o apoio do governo

federal dava às oligarquias dominantes, nos menores Estados, para obter o favor dos coronéis

locais e, portanto, o voto:

O pacto oligárquico, como ficou conhecido esse sistema de controle político e centralização de poder consolidado na Presidência Campos Salles, tinha, entretanto, três importantes fontes de instabilidade. A primeira originava-se nas possíveis divergências entre as elites políticas dos Estados dominantes – São Paulo e Minas Gerais, sobre aspectos fundamentais da política econômica federal. A segunda fonte de instabilidade era a dificuldade ocasional de contentarem-se os Estados intermediários com substancial poder de representação política e peso econômico, como o Rio de Janeiro, o Rio Grande do Sul, a Bahia e Pernambuco, que nutriam legítimas ambições de possuir voz mais ativa no governo federal. Finalmente havia o protesto insistentemente veiculado por uma minoria de políticos dissidentes, intelectuais e setores da imprensa independente contra a natureza antidemocrática e centralizadora do regime.60

Esse descontentamento foi, de fato, a fonte de recorrentes crises políticas e,

justamente com as profundas divergências entre os Estados dominantes durante a sucessão

presidencial de 1930 e o impacto devastador do início da grande depressão, contribuiu de

forma decisiva para o colapso da Primeira República.

A economia brasileira, que permanecia, no fundamental, atrelada à produção cafeeira

e à sua comercialização, ingressava, portanto, numa fase de acentuada carestia de vida, de

aumento do desemprego e de dificuldades crescentes para amplos setores da população. Tal

59HADMAN, Francisco; LEONARDI, Victor. História da indústria e do trabalho no Brasil: das origens aos anos 20. São Paulo: Global, 1982. p. 57. 60FRITSCH, Winston. Apogeu e Crise na Primeira República: 1900-1930. In: ABREU, Marcelo de Paiva. Cem anos de política econômica republicana 1889-1989. Rio de Janeiro: Campus, 1990. p. 36.

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conjuntura, marcada pelo agravamento da situação econômica e social do país, contribuía para

que se aprofundasse a crise estrutural que vinha solapando os alicerces da Primeira República:

Quem fazia política eram as oligarquias e seus representantes. Da mesma forma que no período imperial, as lutas políticas davam-se em nível da classe dominante, sem que os demais setores sociais tivessem condições de influir de maneira significativa nas decisões tomadas no seio dos grupos restritos das elites que governavam o país tanto regional quanto nacionalmente.61

A estrutura política dessa etapa histórica do desenvolvimento brasileiro é marcada

pela dominação de oligarquias agrárias, aliadas sob a hegemonia do setor economicamente

preponderante, ou seja, o cafeicultor. A União expressava diretamente os interesses desse

setor e legitimava as oligarquias regionais dos setores exportadores de menor produtividade.

Essa aliança do poder não pressupunha a ausência total de oposições entre os diferentes

setores oligárquicos e muitas vezes são as dissidências interoligárquicas que possibilitaram às

camadas médio-urbanas aliadas poderosas contra a facção oligárquica hegemônica. Dessa

forma:

As oligarquias estaduais controlavam os coronéis municipais que, por sua vez, dominavam a grande a massa da população rural, deles dependente social, econômica e politicamente, e portanto participando do processo político de forma totalmente subordinada. Dessa forma, a democracia representativa vigente era apenas formal e a possibilidade de representação política de outros setores sociais, que não as oligarquias, era bastante reduzida.62

Como explica Maria Cecília Forjas, os tradicionais mecanismos defensivos da

economia cafeeira são postos em prática, ou seja, a desvalorização cambial; e pela terceira vez

é realizada a operação valorizadora do café, por meio de emissões e empréstimos externos. É

amplamente conhecido o efeito de socialização das perdas e privatização dos lucros para o

setor cafeicultor que ambas as medidas acarretam, e daí o aguçamento das tensões regionais

das oligarquias dominantes, assim como da insatisfação dos setores médios e populares

urbanos.

O mecanismo de relações do Estado do Amazonas com o poder central caracterizava

a dimensão da complexidade das relações, fundadas em fatores tais como prestígio pessoal,

61PRESTES, Anita Leocádia. Os militares e a reação republicana: as origens do tenentismo. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1993. p. 24-25. 62FORJAZ, Maria Cecília Spina. Tenentismo e Política, p. 19.

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influência junto às oligarquias dos Estados fortes, capacidades de ajustes e concessões

partidárias. Tais fatores pesavam na forma como o poder central tentava equacionar os

problemas políticos, a sucessão governamental de 1920 e a valorização da borracha. Dessa

maneira:

À proporção que a borracha decaía, a receita minguava, como o Estado havia organizado um aparelho administrativo relativamente luxuoso, surgiram despesas elevadas. Para conseguir a moratória das despesas, na expectativa de crescimento econômico, os administradores apelavam para o crédito externo. As receitas, entretanto, desciam cada vez mais e o câmbio caía, determinando assim um serviço de juros de importância nominal maior, numa receita muito menor. Aliás, a receita do Amazonas caiu a 18 mil contos em 1910, a 7 mil em 1915, a 6 mil em 1920, e a 3 mil em 1921. Os movimentos comerciais e bancário acusaram por sua vez baixa considerável. O valor das exportações, que foi de 78 mil contos em 1913, caiu a 39 em 1921 e as importações, também, de 21 mil contos a 7 mil contos.63

Durante o governo de Bacelar, assegura Eloína Monteiro que houve uma situação

caótica no Amazonas. Tal situação foi o resultado da propaganda de crise dos preços da

borracha e dos efeitos da Primeira Guerra Mundial.64 Para as facções em disputa, entretanto, a

política regional desenvolvia-se em constantes acusações entre os oligarcas, denunciando a

corrupção administrativa e fazendo do ataque a esta uma arma para atingir o poder. A questão

da borracha ficou prejudicada pela falta de unidade de interesses regionais.

No rastro da crise econômica, vieram as crises políticas, pois os membros da débil

oligarquia amazonense começaram a desentender-se e a repartirem-se em facções políticas no

interior da mesma tendência partidária.

Enquanto que na maior parte do território brasileiro o poder residia nas mãos dos

donos das terras, no Amazonas esse poder permaneceu sob o controle das camadas mais

representativas na vida urbana. Essa vida urbana, entretanto, era bastante incipiente, pois as

funções que lhe são próprias tiveram o desenvolvimento dificultado pelo extrativismo que

interferiu na fixação das populações. Os núcleos municipais que surgiram eram poucos,

pequenos e muito isolados.

63SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 36. 64“Após a Primeira Guerra, o mundo entrou em crise econômica e o Amazonas, encravado na selva amazônica, não fugiu à regra. Na segunda década do século 20, a queda vertiginosa dos preços da goma elástica no mercado internacional, com a perda da exclusividade na exportação mundial desse produto, trouxe consigo o desemprego e a fome para a capital da borracha que, até aquele momento, procurou sobreviver, apesar dos atropelos. O comércio em Manaus quase fechou as portas, sendo seguido pelo mercado imobiliário que desfalecia com a debandada dos grandes investidores vendendo seus imóveis a qualquer preço”. FEITOSA, Orange Matos. Sob o Império da Lei: o amanhecer da República no Amazonas (1892-1893). Manaus: Laureate; Uninorte; Fundação Encontro das Águas, 2008. p. 54-55.

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O poder político local, portanto, teve bases econômicas muito frágeis. Sua área de

influência foi muito restrita, sem irradiação para o centro. A força ou importância desse poder

não foram suficientes para que ele enfrentasse os ímpetos centralizadores da política

republicana, o que resultaria naquele processo de mediação que caracterizou o relacionamento

do governo central com outros subsistemas políticos republicanos.

Para Eloína Monteiro, a queda dos preços da borracha prejudicava a Amazônia,

empobrecendo cada vez mais as oligarquias que dominavam a região. Essa situação

provocava divergências entre os grupos ou facções que apenas procuravam manipular o poder

para servir aos seus interesses particulares. Assim, “A intensificação de tais disputas marcou

de modo agitado a política local e se expressou através dos seus órgãos de imprensa”.65

A economia gumífera, com suas características de fortalecimento do Estado, foi

mecanismo de dependência entre o governo central e o regional, com isso as facções que se

formaram na década de 1910 usavam diversas vezes nos seus órgãos impressos (Amazonas, A

Reação e A Imprensa) discursos de “salvar” o Amazonas do caos econômico reinante da

retração gumífera.

1.3. A Política dos Governadores – um instrumento de estabilidade do domínio das

oligarquias estaduais durante a República Velha

Durante o Império, o governo central impunha seu poder às províncias, nomeando

quem iria governá-las. Com o advento da República a situação mudou, as famílias poderosas

de cada Estado – as oligarquias locais – subiram ao poder e lá mantiveram por meio de um

esquema político-eleitoral.66 Com isso, temos os embates oligárquicos, o domínio do governo

federal e os traços de relação de poderes dos âmbitos estaduais e federais. Nesse contexto, o

Amazonas não está de fora, embora tenha as suas especificidades culturais e a sua

representatividade política não apontasse no jogo político nacional os rumos do país, não

podemos afirmar que essa representação fosse precária e passiva, porque os conflitos internos

refletiam nas organizações federais.

A situação econômica e política do Brasil pouco mudaram, depois da Proclamação

da República.67 A oligarquia cafeeira predominaria enquanto o café fosse o principal produto

65SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 36. 66TREVISAN, Leonardo. A República Velha. São Paulo: Global, 1982. p. 23. 67“Por República entende-se a organização política de um Estado. A república no Brasil surge em meio a modificações de natureza econômico-sociais, provocadas pelo fim da escravidão negra, pelo processo de imigração, pela industrialização, pela urbanização, pela revolução das ideias, sem falar do ideal republicano

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de exportação brasileiro. Assim, dentro do sistema prevalecia o setor agrícola monocultor e a

economia concentrada nas mãos de poucas pessoas, predominando também politicamente essa

camada social, como uma herança do período colonial.68

O governo republicano, que se iniciava pelas mãos de Deodoro da Fonseca,

mostrava-se conservador; e como governo provisório tomou algumas providências, como

transformar as províncias em Estados, separar o poder da Igreja do poder do Estado,

extinguindo o “Padroado”, sistema pelo qual a Igreja estava submetida ao Estado.69 Foi criada

uma bandeira republicana, que substituía a bandeira do Império. Os três poderes, Executivo,

Legislativo e Judiciário, deveriam relacionar-se de modo harmônico e independente. Contudo,

conforme afirma Marieta Ferreira:

Nem a carta de 1891, contudo, nem as alternativas buscadas nos anos seguintes foram capazes de dar forma a um sistema político que respondesse a três problemas fundamentais: o da geração de atores políticos, o das relações entre os poderes Executivo e Legislativo e o da interação entre poder central e poderes regionais.70

Como era de esperar-se, a hegemonia política dos grandes Estados gerou insatisfação

entre os que lutavam pelo fim da representação proporcional. Além disso, no interior dos

Estados, oligarquias rivais lutavam entre si pelo poder. Os deputados federais e senadores que

perdessem o poder no Estado passavam a fazer oposição ao governo federal, o que gerava

instabilidade política.

Segundo a autora, a República brasileira só conseguiria lançar bases para sua

estabilidade, pelo equacionamento dessas questões, com a criação em 1898 do pacto político

conhecido como política dos governadores ou política dos Estados, como preferia denominá-

lo Campos Sales, seu idealizador. Na prática, era um acordo entre os governantes estaduais e

o governo central, pelo qual os grupos políticos que governassem os Estados dariam apoio

irrestrito ao governo federal, que, em troca, só permitiria a vitória eleitoral de deputados

comandado pelos partidos que defendiam essa forma de organização política. Na Província do Amazonas, os propagadores das ideias republicanas tinham diversas origens profissionais, indo do caixeiro (comerciário da época), passando por professores, jornalistas e políticos profissionais, reunidos em torno do Clube Republicano e tendo seu ideário divulgado na imprensa diária da capital da província”. In: SANTOS, Francisco Jorge dos; SAMPAIO, Patrícia Melo (Orgs.). Estado do Amazonas em Verbetes. Manaus: Editora Novo Tempo, 2001. p. 141. 68 FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 2001. p. 292. 69CARONE, Edgar. A Primeira República. Texto e Contexto (1889-1930). 2.ª ed. São Paulo: Difel, 1973. p. 23. 70FERREIRA, Marieta de Moraes. A Crise dos Anos 1920 e a Revolução de 1930. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília (Orgs.). O Brasil Republicano: O tempo do Liberalismo Excludente. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 390.

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federais pertencentes a esses grupos estaduais, impedindo a posse de deputados eleitos pelos

partidos de oposição. Com a política dos governadores, os grupos oposicionistas perdiam

qualquer possibilidade de ganhar eleições, só lhes restando como alternativa juntar-se à

situação. Essa análise fica bem clara nas discussões apresentadas por Marieta Ferreira:

A política dos governadores teve como objetivo confinar as disputas políticas no âmbito de cada Estado, impedindo que conflitos intraoligárquicos transcendessem as fronteiras regionais, provocando instabilidade política no plano nacional; chegar a um acordo básico entre a União e os Estados; e pôr fim às hostilidades existentes entre Executivo e Legislativo, controlando a escolha dos deputados.71

Assim, no condomínio oligárquico em que se transformou a política brasileira, havia

oligarquias de primeira e segunda grandeza, além dos chamados Estados satélites.72 Como

resultado concreto desse modelo vigente durante grande parte da Primeira República, os

conflitos políticos, embora não eliminados, foram minimizados e as sucessões presidenciais

marcadas por disputas controladas, sendo o candidato da situação aquele que a priori tinha

garantida sua eleição, salvo alguns momentos excepcionais, conforme ocorridos na disputa

presidencial de 1909-1910, que deram origem à campanha civilista.

Dessa forma, a política dos governadores harmonizou as relações entre as oligarquias

estaduais e o governo federal, criando uma estabilidade que durou até 1920, quando a

República Velha começou a entrar em crise.

Nesse processo de política de compromisso relacionada com a política de

governadores, a situação eleitoral era esquecida ou manipulada por meio da votação

controlada por seus caciques políticos regionais, uma vez que, durante o Império, só uma

pequena parcela de brasileiros participava das eleições políticas. Para ser eleitor era preciso

ter rendimentos anuais de, no mínimo, 100 mil-réis. Nas últimas décadas do Império, o país

tinha uma população de aproximadamente 10 milhões de habitantes, dos quais apenas 1%

participava do processo eleitoral.73

Com a República, decretaram-se leis que alteraram as regras eleitorais. Acabou o

voto censitário e foi instituído o voto masculino para os maiores de 21anos. Continuaram,

entretanto, sem direito a voto as mulheres, os analfabetos, os padres e os soldados. De acordo

71FERREIRA, Marieta de Moraes. A Crise dos Anos 1920 e a Revolução de 1930, p.390. 72Os Estados de primeira grandeza seriam: São Paulo e Minas Gerais, o de segunda grandeza seriam: Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia e Rio Grande do Sul; já os Estados satélites seriam, por exemplo, Maranhão, Distrito Federal, e outros Estados do Norte e Nordeste. Verificar com maior atenção essa separação em FERREIRA, Marieta de Moraes. A Crise dos Anos 1920 e a Revolução de 1930. 73CENDAP, Censo de 1872. População brasileira calculada em 9.930.478 habitantes.

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com os dados do Censo de 1920,74 tínhamos uma população total representada por mais de 30

milhões de habitantes. Este seria, conforme Boris Fausto, o povo do censo que, pelo menos

em tese, possuía direitos civis.

Mas quantos desses cidadãos civis eram também cidadãos políticos? Quantos

pertenciam ao corpo político da nação? O historiador José Murilo de Carvalho afirma que,

para que haja um cálculo correto do Censo de 1920, por exemplo, sobre quem poderia

realmente votar, temos de primeiro deduzir do total os analfabetos, que, por lei, eram

proibidos de votar:

O analfabetismo, na época, atingia 75,5% da população. Feito o cálculo, restam 7,5 milhões. Depois, é preciso descontar as mulheres. Embora a lei não lhes negasse explicitamente o direito do voto, pela tradição não votavam. Ficamos com mais 4,5 milhões. Os estrangeiros também não tinham o direito do voto. Nosso número cai para 3,9 milhões. Finalmente, os homens menores de 21 anos também não votavam. Ficamos reduzidos a míseros 2,4 milhões de brasileiros legalmente autorizados a participar do sistema político por meio do voto. Ficam fora do sistema, excluídos, 28,2 milhões, 92% da população.75

Assim, embora a Constituição de 1891 tenha ampliado juridicamente a participação

política pelo voto e pelo direito de associação e reunião, a realidade que se impõe é uma

verdadeira negação da ideia de participação política. Desse modo, se justifica que a violência

contida em um enorme aparato repressivo manifesta-se pela desqualificação e preconceito

contra negros e imigrantes pelo:

Viés de uma certa ciência que relaciona tipos sociais a criminosos em potencial; pelo aparato de violência e repressão a quaisquer tipos de manifestações sociais; por uma visão atávica de que a questão social é caso de polícia; pelo falseamento das eleições; pela criminalização da capoeira, entre outras manifestações pontuais e representativas de um olhar preconceituoso sobre a população do país.76

Dessa forma, verifica-se que, ao instituir o regime representativo democrático, as leis

da República abrem juridicamente a participação no processo político, ao mesmo tempo em

74Censo Geral de 1920. In: FAUSTO, Boris. História do Brasil, p. 281. 75CARVALHO, José Murilo de Carvalho. O Pecado Original da República. Revista de História da Biblioteca Nacional. Ano I, n.º5, 2005. p. 22. 76RESENDE, Maria Efigênia Lage de. O Processo Político na Primeira República e o Liberalismo Oligárquico. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília (Orgs.). O Brasil Republicano: O tempo do Liberalismo Excludente. 3.ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 102.

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que cerceiam, na prática, seu funcionamento.77 A Constituição de 1891 deixou no limbo toda

e qualquer ação, visando à construção do processo de participação dos cidadãos no exercício

do poder, que José Murilo observou muito bem a elite sobre o povo:

Nossa República, passado o momento inicial de esperança de expansão democrática, consolidou-se sobre um mínimo de participação eleitoral, sobre a exclusão do envolvimento popular no governo. Consolidou-se sobre a vitória da ideologia liberal pré-democrática, darwinista, reforçadora do poder oligárquico.78

A Primeira República, em seus 41 anos de existência, não fez jus às promessas da

propaganda de promover a ampliação da participação política, o autogoverno do povo. Não

unificou os três povos,79 não os incorporou, não os transformou em cidadãos. A ausência de

povo representou marcas profundas na vida política do país nas primeiras décadas República.

Analisando o contexto da República Velha, uma das primeiras coisas que nos chama

a atenção é que o processo de destruição do regime monárquico e de institucionalização da

República não foi uma obra consensual. Na verdade, existiam diversas perspectivas a respeito

de como deveria ser organizado o país. Maria de Lourdes Janotti nos fala que “os grupos

dominantes que disputaram o poder, a partir de 1889, tinham diferentes concepções a respeito

da República a ser implantada e, consequentemente, diferentes expectativas sobre seu destino

político”.80

Com isso, temos a representação do Amazonas, em âmbito nacional, que não

representou passividade, como afirma Eloína Monteiro:

Decorria com a inexpressão a vida política local e regional, sem qualquer conteúdo programático. Aliás, a política regional, sempre dependente e a reboque da política de Estado Forte, sofria, consequentemente, com os arranjos que ocorriam em nível nacional.81

77RESENDE, Maria Efigênia Lage de. O Processo Político na Primeira República e o Liberalismo Oligárquico, p.102. 78CARVALHO, José Murilo de. Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. p. 161. 79Até 1930, pode-se dividir o povo da República em três partes: primeiro, o povo excluído que estava fora da participação direta do voto; segundo, o chamado povo político que tinha direito de voto; o terceiro seria a subdivisão do segundo, isto é, aquela parcela da população que realmente votava. Maiores informações ver: CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. 80JANOTTI, Maria de Lourdes. A República. Oposições e Consolidação. In: LAPA, José Roberto do Amaral. História Política da República. Campinas: Papirus, 1990. p. 53. 81SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 39.

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Na verdade, os chefes políticos locais determinavam seus grupos internos sem a

interferência federal. Para o presidente, o que importava era que os governadores de Estado

podiam dar seu apoio ao governo federal, ajudando a eleger deputados federais e senadores

favoráveis ao presidente, que em retribuição apoiava os governadores com mais verbas,

empregos e favores para seus aliados políticos.

A política dos governadores procurava reproduzir, no plano federal, a rede de

compromissos e o clientelismo que já ligava os coronéis (chefes políticos municipais) e os

governadores dentro dos Estados.

1.4. A Formação das Facções: Nery, Antony, Bacelar

A década de 1910 foi um período de profundas transformações na sociedade

brasileira e mundial, especialmente no caso das relações internacionais no pós-Primeira

Guerra: um período histórico que se estendeu de 1919 a 1929, geralmente denominado

entreguerras,82 que assinalou a crise da sociedade liberal, sociedade criada desde o início do

século XIX, com a afirmação do capitalismo.

O decênio (1919-1929) foram anos de ilusão da paz. Os governos europeus

procuravam mantê-la por meio de tentativas de desarmamento e pacificação, criando, com

isso, em 1919, a Liga das Nações, empenhada em resolver os problemas internacionais, assim

parecia corresponder aos ideais liberais e democráticos que se acreditava terem triunfado.

Mais eis que as ilusões de paz foram totalmente postas de lado: em 1929 ocorreu uma grande

crise econômica (a quebra da Bolsa de Valores dos Estados Unidos) que atingiu todos os

países capitalistas.83

No ano de 1920 manifestou-se no Brasil uma crise intraoligárquica, demanda de

maior participação dos setores urbanos, uma insatisfação dos segmentos militares, que foram

jogados na sucessão presidencial de 1922, em que houve o confronto entre os grandes Estados

e os Estados intermediários. Esse confronto assumiu sua forma plena por meio da formação

da Reação Republicana, em junho de 1921, movimento que lançou a candidatura dissidente de

Nilo Peçanha em oposição à candidatura oficial de Arthur Bernardes.84

Evento político-chave, a Reação Republicana permite-nos captar a cultura política, o

comportamento, as aspirações e demandas dos diferentes segmentos do sistema político

82HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. Tradução: Marcos Santarrita. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 42. 83HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Extremos, p.91. 84FERREIRA, Marieta de Moraes. A Crise dos Anos 1920 e a Revolução de 1930, p. 394.

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brasileiro na República Velha. O estabelecimento da política dos governadores havia

instaurado no país uma cultura política que se consolidou, congelando a competição,

neutralizando as oposições e domesticando os conflitos políticos de 1921.85 A Reação

Republicana representou exatamente um momento de contestação desse sistema, inaugurando

um clima de questionamentos da ordem vigente.

O cenário nacional da Primeira República era marcado pela exclusão de ex-escravos,

mulheres, camponeses, operários, classe média e outros. Alguns governos vão administrar

com o estado de sítio, porque não vai haver uma oposição forte. A Primeira República sempre

tentou eliminar os conflitos e as oposições, sendo alimentada pelo coronelismo,86 pelo voto de

cabresto, degola (prática comum nas instâncias legislativas da República Velha, quando as

comissões de verificação de poderes, comprometidos com o situacionismo, exerciam o poder

de veto aos candidatos eleitos pelas oposições) e consequentemente pelas fraudes.

Em trabalho especifico, Edgar Carone87 se propôs a ordenar e interpretar o primeiro

grande período da história republicana, de 1889 a 1930. Nessa obra, temos uma análise

factual, feita de modo a permitir que, quem a está lendo, perceba quais são as linhas de força e

os processos estruturais que tomam corpo no desenrolar da história.

A análise de cada período estudado por Carone é feita de modo a mostrar a relação

entre a política federal e as lutas partidárias nos Estados: em que as questões políticas se

organizaram em torno do equilíbrio entre civis e militares, entre o Exército e a Marinha, e

também entre a pequena burguesia urbana e a burguesia agrária e mercantil. Para ele, os

alinhamentos políticos não correspondiam a um padrão imediato de relação entre as classes.

O Amazonas, durante as duas primeiras décadas do século XX, era comandado por

oligarquias88 fortes e ambiciosas aqui existentes, como o caso da família Nery. Consoante

85REZENDE, Maria Efigênia Lage de. O processo político na Primeira República e o liberalismo oligárquico. In: FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucília (Orgs.). O Brasil Republicano: O tempo do Liberalismo Excludente, p. 119. 86Segundo Vítor Nunes Leal, o coronelismo é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras. “O coronelismo atua no reduzido cenário do governo local, seu hábitat são os municípios rurais, ou predominantemente rurais; sua vitaliciedade é inversamente proporcional ao desenvolvimento das atividades urbanas, como seja o comércio e a indústria. Consequente, o isolamento é o fator importante na formação e manutenção do fenômeno”. LEAL, Vítor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. São Paulo: Alfa Ômega, 1978. p. 251. 87CARONE, Edgar. A República Velha – Evolução Política (1889- 1930). 4.ª ed. São Paulo: Difel, 1983. 88Uma oligarquia é um grupo social, um grupo de elite, e, logo, o governo oligárquico é também um governo de elite. Assim, para o melhor entendimento do papel do conceito de oligarquia aqui existente, temos de compreendê-lo em conexão com o conceito de elite. No Brasil, há bastante tempo a historiografia tem se voltado para o estudo das elites em geral e das oligarquias especificamente. Alguns trabalhos clássicos foram escritos sobre o assunto, em especial para os séculos 19 e 20. Esse é o caso da obra de José Murilo de Carvalho, A

construção da ordem, que estuda a formação das elites políticas no Brasil imperial. Murilo de Carvalho busca resposta do por que a independência do Brasil manteve o novo Estado nacional unido, ao passo que as antigas

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Leôncio Basbaum, os chefes de alguns clãs políticos, uma espécie de caudilhos locais, eram

conhecidos e respeitados. Sua força estava no domínio da terra e da vida dos que nela

habitavam a mercê de sua graça. Para o autor, era dessa maneira que o Amazonas estava nas

mãos dos Nery.89

Silvério Nery90 era um grande articulador na política regional do Estado do

Amazonas, gozava de grande prestígio com o governo central, sendo reeleito senador diversas

vezes. O grupo dirigido por Silvério Nery dominava a política do Amazonas desde a primeira

década do século XX. Silvério governou o Estado entre 1900 a 1903, sucedido por seu irmão,

tenente-coronel Constantino Nery, no período de 1904 a 1907.91

No governo de Antônio Bittencourt, que governou no quadriênio 1908-1912, houve

uma convenção em 1910, que visava destituir Silvério Nery da chefia do Partido Republicano

Federal. De acordo com E. Bradford Burns, a preocupação com os direitos aduaneiros, taxas,

produção e preços internacionais absorvia toda a atenção e energia da elite. Somente uma vez,

em 1910, tiveram eles a sua atenção desviada momentaneamente da borracha:

Uma rixa política explodiu em outubro e logo envolveu toda Manaus. Há décadas a família oligárquica dos Nery controlava a política do Amazonas. Haviam colocado no governo o governador Antônio Clemente Ribeiro Bittencourt, para cedo descobrir que este mostrava uma tendência desconcertante para ações independentes. Os Nery resolveram removê-lo e procuraram a ajuda de seu poderoso amigo político, Pinheiro Machado, o gaúcho fazedor de presidentes. Pinheiro Machado prontamente obteve o envio para Manaus de um oficial do exército, de confiança, transferido do Rio Grande do Sul, para assumir o comando das forças federais.92

colônias da América hispânica se fragmentaram em muitas nações diferentes, se ambas as regiões tinham um passado de colonização comum? E para responder a essa questão, Carvalho elabora um estudo das elites políticas na passagem da Colônia para o Império; para ele, a decisão de constituir uma monarquia, e não uma república, no Brasil, foi uma decisão política e se explica pela formação da elite política brasileira, bem diferenciada das elites políticas hispânicas. Segundo Carvalho, um grupo de elite se distingue tanto da massa quanto de outros grupos de elite, e também é definida pelo contexto histórico em que vive, o que nos impede de utilizá-lo como explicação única para as transformações sociais. CARVALHO, José Murilo de. A construção da ordem e o teatro das sombras. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. 89BASBAUM, Leôncio. História Sincera da República. São Paulo: Alfa Ômega, 1976. p. 190. 90“O Dr. Silvério José Nery, natural do Amazonas, nasceu em Coari, a 8 de outubro de 1858, falecendo em Manaus, a 23 de junho de 1934.[...], começou a ser atraído pelos interesses da política, então mais idealista e menos destemperada. A sua carreira política não teve solução de continuidade. A sua ascensão foi feita normalmente. Primeiro vereador municipal da Monarquia; depois, deputado estadual, várias vezes, na República; deputado federal, reeleito; governador do Estado, chefe de partido, de grande prestígio e respeitado pelos próprios adversários; senador federal, em várias legislaturas. Eleito e sempre reeleito primeiro-secretário do Senado. Presidiu várias vezes o Senado Federal”. Em BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias: vultos do passado. Rio de Janeiro: Conquista, 1973. p. 458-459. 91LOUREIRO, Antonio José Souto. Síntese da História do Amazonas. Manaus: Imprensa Oficial, 1978. p. 249. 92BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 32.

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Com esse apoio, conforme Burns, os Nery convenceram o Legislativo estadual,

sempre obediente, a depor o governador por conflitos de interesses. Antônio Bittencourt, no

entanto, recusou-se a deixar o cargo:

As forças armadas, logo após, bombardearam a cidade no dia 8 de outubro. O governador fugiu no dia seguinte para poupar a cidade de novos ataques. O imprudente bombardeio chocou e revoltou todo o Brasil. O presidente Nilo Peçanha, pessoalmente contrário a Pinheiro Machado, tomou o lado do governador Bittencourt contra os Nery. Os oficiais culpados pelo bombardeio foram chamados ao Rio de Janeiro, e o governador voltou triunfalmente para Manaus. O tumulto foi puramente político em suas causas e efeitos.93

Para Burns, os comerciantes haviam demonstrado preocupação e repulsa aos

acontecimentos, mas tão logo o presidente Nilo Peçanha interveio para serenar as águas

politicamente conturbadas, concentraram-se novamente na exploração do látex e voltaram a

tratar exclusivamente de seus assuntos econômicos.94

Segundo Eloína Monteiro foi a partir dos desacordos entre Silvério Nery e Antônio

Bittencourt que resultou a “cisão do partido, originando-se então a facção política liderada

pelo último, Antônio Bittencourt”.95

As diferenças entre Nery e Bittencourt vão continuar até a deposição de Bittencourt

em 1912. Silvério Nery procurou ganhar apoio das forças federais aquarteladas em Manaus,

procedendo a críticas e denúncias à administração de Bittencourt, que por seu lado fazia

acusações à facção Nery sobre o plano de deposição.

Na década de 1910 a política no Amazonas foi marcada pelas brigas de facções;96

facções essas que se formaram muitas vezes, pelo atual governo, como no caso a facção do

governador Jonathas de Freitas Pedrosa97 que tinha como vice Antônio Guerreiro Antony.98

As eleições de 1912 foram formadas por manobras políticas, sob uma forte pressão eleitoral.

Elegeu-se Jonathas Pedrosa, que apesar da constatação de sua vitória, feita pela oposição,

93BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 33. 94BURNS, E. Bradford. Manaus 1910: retrato de uma cidade em expansão, p. 33. 95SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 40. 96O termo facções, utilizado neste trabalho, é para designar os grupos políticos formados nas organizações dos partidos (Republicano Liberal, Republicano Amazonense, União Republicana Amazonense) e seus principais líderes: Antony, Nery e Bacelar, que fizeram divergências e dissensões partidárias entre si na sucessão governamental de 1920. 97Governou no período de 1.º de janeiro de 1913 a 1.º de janeiro de 1917. LOUREIRO, Antonio José Souto. Síntese da História do Amazonas, p. 271. 98“O coronel Guerreiro Antony, chefe do partido e da convenção, que referendou a aceitação da candidatura Jonathas Pedrosa para o cargo de governador do Estado, no período de 1.º de janeiro de 1913 a 1.º de janeiro 1917. Por aclamação, não menos vibrante, foi indicada a candidatura do coronel Guerreiro Antony ao cargo de vice-governador”. Em BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 252.

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participava de uma eleição direta no Estado, pois até então só haviam existido candidatos

únicos.99

O interessante de perguntar-se é quem era a “oposição” nesse momento, nas eleições

de 1912, uma vez que Antônio Loureiro não a especificou claramente. Enquanto para Eloína

Monteiro, a escolha do sucessor de Bittencourt se fez marcada de profundas divergências

entre os membros do Partido Republicano Federal, ocorrendo a indicação do senador Jonathas

Pedrosa, como uma candidatura de conciliação entre as brigas de Bittencourt e Nery.

No governo de Jonathas Pedrosa vai surgir outra facção, a do seu vice-governador

Guerreiro Antony, que se caracterizou por atos de violência, especialmente depois de

concretizada a reforma da Constituição de 1910,100 em 20 de outubro de 1913, que entre

outras determinações alijava o coronel Antony do seu cargo. A facção política liderada por

Guerreiro Antony exerceu oposição sistemática por todo o período Pedrosa, de 1913 a 1917.

Conforme afirma Eloína Monteiro:

Guerreiro Antony, através do seu jornal O Liberal, criticava a oligarquia Pedrosa, que manipulava o poder. Provocava, portanto, o acirramento das rivalidades manifestadas em atos de violência como as tentativas malogradas de 15 de junho de 1913 e de 19 de agosto de 1915.101

Na sucessão governamental de 1916, a facção Pedrosa, que governou o Amazonas no

quadriênio 1913-1916, une-se à facção Nery sob a direção de Pedro de Alcântara Bacelar,102

que ganhou o cargo de governador no quadriênio 1917-1920. No entanto, a facção Antony

perdeu com seu candidato Thaumaturgo de Azevedo.

As oligarquias do Amazonas, a exemplo de outras oligarquias regionais,

manipulavam o poder para servir aos seus interesses, o que se realizava por via de alianças

99LOUREIRO, Antonio José Souto. Tempos de Esperança, p. 11. 100Durante o governo do Sr. Jonathas de Freitas Pedrosa, foi promulgada a sexta Constituição do Amazonas – de 20 de outubro de 1913, por representantes do Senado e da Câmara dos Deputados do Estado do Amazonas – novidade bicameral que nascera com a carta anterior e seria extinta por deliberação unânime de seus pares para dar lugar a uma corporação denominada Assembleia Legislativa do Estado, composta de trinta membros denominados deputados. Além de tornar extinto o cargo de vice-governador, essa carta marcou eleições municipais para 1.º de dezembro de 1913 e de deputados estaduais para 2 de janeiro de 1914. Amazonas. Assembleia Legislativa do Estado. Constituição 1891 a 1989. Manaus: Estado do Amazonas, 2002. p. 6. 101SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 44. 102“O Dr. Alcântara Bacelar, retirando-se da Bahia para o Amazonas, fixou residência na cidade de Humaitá, no rio Madeira, a 4 de outubro de 1905. Ali exerceu a Medicina e entrou na política. Foi nomeado superintendente (prefeito) municipal, realizando um governo que muito agradou aos seus jurisdicionados. Ao findar o Dr. Jonathas Pedrosa o seu mandato governamental, foi lembrado, para o substituir, no quatriênio seguinte, o nome do Dr. Pedro de Alcântara Bacelar, que, eleito em 14 de julho de 1916, é reconhecido e declarado governador do Amazonas, pela Assembleia Legislativa, em 5 de setembro do mesmo ano. Tomou posse do governo a 1.º de janeiro de 1917”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 42.

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com os donos do poder. Pedro de Alcântara Bacelar tomou posse, contando com a intervenção

das forças federais. A facção Guerreiro Antony era por todos os meios sufocada.103

Sob o ponto de vista político, a vida do Estado foi bastante movimentada e rica em

acontecimentos, acompanhando a instabilidade econômica reinante. O período caracterizou-se

de 1912 a 1924, pela existência de uma oposição relativamente forte, chefiada pelo coronel

Guerreiro Antony, que não conseguiu chegar ao poder, e por uma incontrolável corrupção

eleitoral.104

Durante o governo de Pedro Bacelar (1917-1920), as lutas entre as facções que

disputavam o poder tornaram-se intensas, mesmo sufocadas pelo situacionismo que

condenava toda oposição ao afastamento das funções políticas. A facção Guerreiro Antony só

se reanimou com a divergência que provocou o rompimento entre Bacelar e a facção de

Silvério Nery; que se deu durante o próprio governo de Bacelar, onde houve uma cisão de

poderes locais entre a facção Bacelar contra a facção Nery. O resultado dessa cisão vai

aparecer claramente na sucessão governamental de 1920:

Rego Monteiro era o candidato situacionista às eleições de 14 de julho de 1920, ao cargo de governador para o período de 1920/1924. Por sua vez, a facção Nery lançou a candidatura do juiz Wortingen Ferreira, enquanto a facção Guerreiro Antony a do marechal Thaumaturgo de Azevedo.105

No período eleitoral de 1920, as divergências partidárias continuaram se

fortalecendo, em grupos oligárquicos, por meio de fatores impressos em jornais, buscando

ganhar força em discursos convincentes.

No desenvolvimento deste trabalho, iremos examinar as bases do sistema político

predominante no Amazonas no início da República, sendo que, para isso, é necessário

identificar os elementos que dão sustentação à formação e afirmação do poder106 das facções,

que fazem os elos de mecanismos para entender-se até que ponto determinada facção

almejava o poder, ou seja, o governo.

103SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 45. 104 LOUREIRO, Antonio José Souto. Tempos de Esperança, p.18. 105SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 47. 106A palavra política não pode ser entendida separada da ideia de poder. Para a sua definição, segundo Bobbio, a palavra poder designa a capacidade e possibilidade de agir, de produzir efeitos, e pode ser referida a indivíduos e a grupos. BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINHO, Gianfranco. Dicionário de Política. Tradução: Carmen C. Varriale. et. al.Brasília: Ed. UnB; Linha Gráfica, 1991. p. 933. Já para Weber, o poder é uma relação assimétrica entre pelo menos dois atores, quando o primeiro tem a capacidade de forçar o segundo a fazer algo que este não faria voluntariamente e que só o faz conforme as sugestões e determinações do primeiro. A relação de poder, todavia, não gera necessariamente conflito, podendo haver negociação entre as partes. Essas relações de poder mostram-se em todo o lugar, em todo o corpo social. WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: Ed. UnB, 1994.

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Na análise das facções, inclui-se, também, a dinâmica do jogo de interação entre o

poder do Estado e os interesses oligárquicos coincidentes ou conflitantes. Tem-se como

princípio norteador o fato de que o balanço das eleições dos grupos, no período em tela, quase

sempre favorável aos interesses ou acordos entre Nery e Bacelar, escondem-se também

difíceis negociações entre as respectivas oligarquias, muitas vezes ampliada pela participação

de outras oligarquias, no caso a de Antony. A impossibilidade de acordo das facções abre

espaço a inúmeros conflitos e, finalmente, o confronto aberto, de que resulta a ruptura do

sistema oligárquico verificado nas eleições de 1920.

No Amazonas, a disputa pelo poder estava mais institucionalizada, os partidos das

facções funcionavam como uma estrutura de agregação e congregação de interesses de grupos

familiares dominantes. No período que vai de 1910 até 1924, digladiaram-se as facções

políticas lideradas por Silvério Nery, Antônio Bittencourt, Jonathas Pedrosa, Guerreiro

Antony e Pedro Bacelar.

Era um embate entre a facção política que estava no poder e da oposição. Essa última

resumia-se a um grupo que contestava as afirmações do outro, denunciando também sua

inoperância e corrupção. Tais reações eram mascaradas pela moralização política, sempre

atacando a situação; e como esta exercia o poder, era por tudo responsabilizada.107

As facções do Amazonas estavam presentes nos partidos (Republicano Liberal,

Republicano Amazonense, União Republicano Amazonense), como nos revela Serge Bestein:

“Um partido é antes de tudo uma reunião de homens em torno de um objetivo comum, e é em

primeiro lugar sobre aqueles que reúne que ele é capaz de nos esclarecer”.108 É claro que um

partido político vê coexistirem em seu interior gerações diferentes, cujas experiências são

múltiplas e, por conseguinte, os polos de referência são diversos.

A questão que legitimamente pode observar-se é a de saber como as facções se

distribuíram no interior dos partidos, nas diversas gerações presentes e, mais precisamente,

saber qual era o seu papel dentro dos organismos dirigentes que determinaram as linhas das

formações dos grupos oligárquicos.

As facções políticas do Amazonas, no final da década de 1910, vão sendo formadas

pelas sucessões governamentais. No ano de 1920, as organizações políticas estão formadas

entre Guerreiro Antony, que havia feito oposição ao governo de Pedrosa (1912 a 1916) e

também ao governo de Bacelar (1917 a 1920); assim como ele, Silvério Nery também se opõe

107SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 38. 108BESTEIN, Serge. Os Partidos. In: RÉMOND, René. (org.). Por uma História Política. Tradução: Dora Rocha. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 72.

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ao atual governador. Logo, essas três facções – Nery, Antony e Bacelar – vão ditar as ordens

da sucessão governamental de 1920.

Dessa forma, traçado o perfil do cenário político-econômico no Amazonas na

primeira década do século XX, levanta-se a preocupação com o estudo das eleições de 1920 e

a compreensão dos comportamentos eleitorais vigentes, que iremos avaliar no próximo

capítulo deste estudo.

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2. CAPÍTULO. IMPRENSA E POLÍTICA: UM OLHAR SOBRE A

SUCESSÃO GOVERNAMENTAL DE 1920

A nossa formação histórica fez-se de maneira dispersa e desconexa. A falta

de centralização resultou em liberdades locais e no fortalecimento de

instituições sociais peculiares: o poder torna-se privilégio de uma camada

social que possui os bens de produção, a terra e a liderança política.109

2.1. A conjuntura política do ano de 1920

No ano de 1920 crescia no Amazonas a agitação em torno do novo sucessor do

governador Pedro de Alcântara Bacelar, que escolheu para sucedê-lo o senador Rego

Monteiro. As facções contrárias, no entanto, reagiram contra essa continuidade governativa:

os candidatos de oposição eram o juiz Luiz Wortingen Ferreira, que tinha o apoio do senador

Silvério Nery, e o marechal Thaumaturgo de Azevedo, apoiado pelo coronel Guerreiro

Antony.

A sucessão governamental do Amazonas de 1920 foi uma das mais disputadas na

República Velha. As facções políticas disputavam com fervor essa sucessão, onde

encontramos acusações, fraudes e interesses particularizados de órgãos de imprensa.

Diante da iminência de confusões e controvérsias acerca do novo governador, já que

os três candidatos se consideravam eleitos no pleito do dia 14 de julho, o então governador

Pedro Bacelar havia declarado Rego Monteiro eleito na apuração final, que se deu no dia 5 de

setembro, fazendo com que as facções contrárias ao governador reagissem e também se

declarassem vencedoras da eleição.

Diante dessas contradições, Pedro Bacelar pede auxílio federal, e há um acordo entre

o governador Bacelar e o presidente Epitácio Pessoa. Tal acordo deveria ser pacificador entre

as oligarquias do Estado, que estavam muito agitadas. Para o presidente, era mais correto

permanecer um sucessor direto do governador.110

Entretanto, acreditamos que esse acordo não foi representativo de paz e sim de

interesses tanto estadual, pois permitia a permanência de poder da facção Bacelar, quanto

federais, uma vez que o presidente ditava a ordem de cada governador eleito, cuja:

109CARONE, Edgar. A Primeira República, p. 66. 110CARONE, Edgar. A República Velha, p. 343.

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Dependência econômica e social originada no fato de que são essas mesmas elites que dominam a máquina administrativa federal e dos Estados e, portanto, controlam as possibilidades de acesso de grupos de seus interesses.111

Como elucida Maria Cecília Forjaz, é nos efeitos da dominação pessoal que deve ser

procurada a explicação para a asfixia da consciência política, pois “a submissão a este poder

molda a consciência para uma percepção muito parcelada da realidade social e só permite que

seja aprendida com significados sempre redutíveis aos atributos de um sujeito dado”.112

A estrutura do Governo do Amazonas, no ano de 1920, aparece distinta nesse

episódio da sucessão governamental. A organização política era mais complexa, a

subordinação das classes liberais aos chefes políticos era total, e a colaboração entre forças

locais e o governo federal era fortuita, obedecendo a um desejo de colaboração e não a de

uma relação entre subalternos e superiores. Para a Eloína Monteiro, havia uma relação de

dependência entre o Amazonas e o governo federal e passividades dos políticos locais.113

A flexibilidade do sistema oligárquico do Amazonas do ano de 1920 era mínima,

sendo que a liberdade de seus componentes era ilusória, pois todos tinham de aceitar o

controle rígido de seus atos. O partido era o organismo que veiculava a vontade de uns

poucos, revestindo-a de legalidade. Seu controle pelos grupos mais fortes permitia premiar

partidários e coagir oponentes.

E dentro do próprio partido o limite da ação era variável na maioria dos Estados

oligárquicos. A vontade do chefe era praticamente dominante, naturalmente este se apoiava

em outros elementos para as grandes decisões, mas a iniciativa quase sempre lhe coube, e toda

a ligação federal dependia dele. Nessa relação percebemos a ligação direta entre o presidente

Epitácio Pessoa com o governador Bacelar.

Apesar da Constituição de 1891 ter consolidado o federalismo no Brasil, o que

deveria permitir a descentralização administrativa e a maior autonomia de Estados e

municípios perante o governo central, esse princípio não foi muito bem-sucedido por conta do

poder das oligarquias brasileiras.114 Assim, a República Velha é conhecida por ter sido

dominada por uma política de compromissos entre diferentes oligarquias regionais, que

faziam acordos para manter o poder. Tal política das oligarquias controlava principalmente os

111FORJAZ, Maria Cecília Spina. Tenentismo e Política: tenentismo e camadas médias urbanas na crise da Primeira República. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. p. 21. 112FORJAZ, Maria Cecília Spina. Tenentismo e Política, p. 22. 113SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 47. 114JANOTTI, Maria Lourdes. Coronelismo: uma política de compromisso, p. 10.

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períodos eleitorais e distribuía o poder regionalmente de acordo com os grupos oligárquicos

aliados.

O federalismo da Constituição de 1891 tinha como meta derrubar a excessiva

centralização de poder que havia imperado no Segundo Reinado e distribuir melhor o poder

regionalmente.115 Mas isso só teria sucesso, como esclarece Maria Lourdes Janotti, “se as

estruturas socioeconômicas tivessem sido alteradas, ou seja, se os senhores rurais, que até

então controlavam a política brasileira e que constituíam as oligarquias, tivessem sido alijados

do poder”.116

Como isso não ocorreu, o país continuou a ser predominantemente rural, e as

oligarquias rurais continuaram no comando, apenas tendo agora de dividir espaço com novas

oligarquias regionais. Essa aliança entre diferentes oligarquias regionais constituiu a chamada

“Política dos Governadores”, na qual as oligarquias controlavam determinados Estados e

definiam o resultado das urnas por meio do clientelismo e do voto de cabresto.

Para Edgar Carone, quem compunha essas oligarquias rurais eram os famosos

coronéis, na maioria das vezes proprietários de latifúndios, sempre importantes chefes

políticos:

As oligarquias diferenciam-se por matizes: naquela como as do Ceará, Alagoas, Mato Grosso e outros Estados pobres, o processo está ligado mais diretamente ao predomínio familiar e grupal: Maltas, Aciolis, Ponces, os grupos Álvaro Machado e Rosa e Silva – governam pessoalmente ou através de pessoas de sua confiança; partido é sinônimo de controle pessoal. Já nos outros Estados, onde a máquina governamental é mais complexa, o partido representa poder controlador e distribuidor, mas as exigências estatais, o manejo das oposições e o fortalecimento da variedade dos grupos, fazem haver equilíbrio maior entre o individual e o coletivo. Apesar disto e da importância destas diferenças, é o controle das oligarquias o tema mais importante da história da Primeira República.117

Tal situação aglutinadora deu-se porque, tradicionalmente, na maior parte do

território brasileiro, o poder residia nas mãos dos donos da terra, e esta se constituía na maior

fonte de poder. A força dos proprietários rurais, ao longo do processo histórico brasileiro,

115A partir da implantação do regime republicano, o Poder Executivo passou às mãos dos governadores de Estado, auxiliados pelos secretários de Estado e o Poder Legislativo ficou a cargo das Assembleias Legislativas estaduais. Essa configuração da administração pública só se alterou quando mudanças políticas instauraram estados de exceção, como, por exemplo, as que levavam à nomeação de interventores estaduais, durante o governo Vargas, com a suspensão de direitos políticos e fechamento das instâncias legislativas nacionais e locais. In: SANTOS, Francisco Jorge dos; SAMPAIO, Patrícia Melo (Orgs.). Estado do Amazonas em Verbetes, p. 19. 116JANOTTI, Maria Lourdes. Coronelismo: uma política de compromisso, p. 10. 117CARONE, Edgar. A Primeira República, p. 66.

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deslocou-se no tempo e no espaço, de acordo com a ascensão dos diferentes produtos nas

diversas zonas geográficas. Essa periferia conseguia impor-se na medida em que a promoção

de interesses gerais necessitava de apoio dos grupos regionais. Estes, por sua vez, procuravam

arrancar concessões do governo central em troca do apoio que poderiam conceder.

Nesse aspecto, a região do Amazonas esteve longe de enquadrar-se nos moldes

tradicionais do poder oriundo dos grandes proprietários, apresentando-se como um caso à

parte, uma vez que o poder local concentrava-se mais nos comerciantes. Tinha este pouca

expressão no cenário econômico nacional, se comparados aos latifundiários do Centro-Sul.

Assim, como área política periférica, a região do Amazonas não poderia oferecer apoio aos

interesses do Centro, por não ter bases econômicas sólidas para isso. O Centro, por sua vez,

não precisava fazer concessões à região, não se caracterizando, portanto, o processo de

mediação que marcou o relacionamento do centro político com as áreas políticas da periferia,

durante os primeiros trinta anos da República.

Em outros termos, pela debilidade econômica do Amazonas, no ano de 1920, o

governo central não necessitaria fazer concessões à elite regional para conseguir em troca

apoio para a manutenção de seus interesses. Esse contexto de fraqueza da região ante o poder

central oportunizaria que o Estado fosse explorado politicamente por grupos alheios à região.

Mas com todo esse cenário do governo central com as políticas regionais da Primeira

República, as eleições do Amazonas do ano de 1920 marcam bem os momentos da luta pelo

poder entre os grupos oligárquicos estaduais (Nery, Bacelar e Antony), em que a posse pelos

postos-chave do Executivo e Legislativo era necessária para o benefício próprio dessas

facções e o melhor controle delas. A facção que ganhasse a eleição fazia pressão à oposição,

como Bacelar fez com o coronel Guerreiro Antony após as eleições de 1916.118

2.2. O discurso por meio dos periódicos

De acordo com Regina de Luca, “as renovações no estudo da história política, por

sua vez, não poderiam dispensar a imprensa que cotidianamente registra cada lance dos

embates na arena do poder”.119 Para ela, a imprensa devia ser entendida como uma fonte

118“Na administração Bacelar, sucedeu na madrugada de 1.º de janeiro de 1917, que um grupo de oficiais da polícia, munidos de canhões, bombardeasse, a 15 metros de distância, a residência do coronel Guerreiro Antony, apenas permitindo que saíssem da casa os hóspedes que lá se encontravam menos os chamados capangas do coronel”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 253. 119LUCA, Tânia Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005. p. 128.

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preciosa de uma análise crítica, e quando analisamos essa imprensa no campo político, temos

de ter cuidado com os discursos e suas ideologias:

Os jornais não são, no mais das vezes, obras solitárias, mas empreendimentos que reúnem um conjunto de indivíduos, o que os torna projetos coletivos, por agregarem pessoas em torno de ideias, crenças e valores que pretende difundir a partir da palavra escrita.120

A imprensa se baseia na relação do discurso ao convencimento do leitor. Com a pós-

modernidade e o crescimento da interdisciplinaridade na História, a análise do discurso se

tornou um método de pesquisa dos mais difundidos no Brasil do início do século XXI. Tal

análise é uma metodologia derivada de disciplinas que, conforme Dominique Maingueneau,121

como a semiótica e a linguística que têm como objetivo interpretar o discurso, este definido

como a forma por meio da qual os indivíduos proferem e apreendem a linguagem como uma

atividade produzida historicamente determinada.

Para Eni Pulcinelli Orlandi,122 uma das principais estudiosas da análise do discurso

no Brasil, o discurso é a prática da linguagem, isto é, uma narrativa construída baseada em

condições históricas e sociais específicas. Para ela, todo discurso materializa determinada

ideologia na fala a partir de um idioma específico. Desse modo, todo discurso possui uma

ideologia, e é a língua que permite aos indivíduos compreenderem e assimilarem tal ideologia.

Dos principais componentes do discurso, como fala ou narrativa, são os significados

históricos presentes no imaginário de quem o elabora. Cada discurso é, assim, uma

representação do imaginário no qual seu autor está inserido.

Mas embora todo discurso seja proferido por alguém, um indivíduo ou vários, esse

sujeito, que pode ser o autor de um texto, por exemplo, não é responsável pelos significados

que existem em seu discurso, uma vez que nenhum discurso é de autoria exclusiva de seu

autor, já que todos os indivíduos fazem parte da mesma memória coletiva. Ou seja, um

discurso não é fruto de opiniões e visões particulares, mas uma partícula do imaginário

dominante que abarca cada indivíduo e, conforme Orlandi, pode ser usado para reformular as

relações sociais.

Mas nem todos os trabalhos sobre o imaginário descreem totalmente do real. Roger

Chartier, por exemplo, afirma que toda representação do mundo social é construída pelos

interesses do grupo que a elaborou, sendo necessário observar as representações e o discurso a

120LUCA, Tânia Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos, p. 140. 121MAINGUENEAU, Dominique. Termos-chave da análise do discurso. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2000. 122ORLANDI, Eni Pulcinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999.

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partir da posição social de quem os utiliza, para ele, assim como existe luta econômica pela

hegemonia da sociedade, também existe luta de representações, cada grupo tentando impor

seus valores aos outros. Além disso, Chartier acredita que não existe distinção entre a

objetividade das estruturas e a subjetividade das representações.123

Esses elementos básicos do discurso tornam-no onipresente no cotidiano, pois viver

em sociedade exige a produção de muitos discursos. Assim, a análise do discurso constitui

uma metodologia que tem como objetivo explicar como o discurso funciona historicamente e

como transmite uma ideologia.

Em outros termos, analisar um discurso não é ler um texto buscando as informações

trazidas por ele. Esse é o método da análise de conteúdo, que, conforme Orlandi, amplamente

empregado na História e nas ciências humanas em geral. Para a análise do discurso, o

importante não é saber o que um texto quer dizer, mas como ele diz o que diz, ou seja, como

os elementos linguísticos, históricos e sociais que o compõem fazem sentido juntos.

Esse questionamento, de acordo com Maingueneau, vem do fato de que a língua não

é autônoma, e tanto ela quanto os indivíduos são muito afetados pelas condições sociais e pelo

imaginário que os cerca.124 Além disso, o indivíduo não tem controle sobre como essas coisas

o afetam, o que o isenta de responsabilidade pelos sentidos produzidos no discurso, uma vez

que esses são diretamente influenciados pelo meio social e pelo contexto histórico, que fogem

ao seu controle.

Todas essas considerações só confirmam quanto é importante entendermos os

significados impregnados em termos e expressões utilizados pela História, uma vez que as

palavras carregam sentidos que são definidos historicamente. Conhecer os significados por

trás dos conceitos é conhecer a historicidade das palavras, a forma pela qual foram entendidas

ao longo do tempo por diferentes sociedades; é aprofundar o conhecimento da própria

História, entendendo como ela age sobre os indivíduos pela produção, na maioria das vezes

imperceptível de significados.

2.3 As facções e seus órgãos de imprensa.

No ano de 1920, certos jornais como, por exemplo, A Reação, A Imprensa e O

Amazonas vão estar vinculados a certas facções, e com isso vamos perceber os interesses

123CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Difel/Bertrand Brasil, 1988. p. 183. 124MAINGUENEAU, Dominique. Termos-chave da análise do discurso, p. 36.

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desses periódicos, observando as divergências na sucessão governamental, pois encontramos

esses jornais preocupados em dissimular os seus posicionamentos políticos e ideológicos,

utilizando-se de uma pretensa neutralidade, mas geralmente vinculados a um partido

político.125 E nessa linha podem ser enquadrados justamente os jornais – A Reação, A

Imprensa e principalmente O Amazonas, que era um órgão inicialmente do Partido

Conservador e depois do Partido Republicano

Na leitura atenta dos periódicos, é possível perceber os conflitos entre os próprios

jornais e, principalmente, entre as facções e seus interesses na sucessão governamental, sendo

que as discussões acerca desse novo governador foram marcadas por conflitos de resultados.

Para melhor observar estes discursos conflitantes, iremos analisar cada um dos periódicos e

suas facções separadamente, de modo a poder observar melhor os discursos apresentados.

2.3.1 O Amazonas – Órgão do Partido Republicano Liberal

.

O jornal O Amazonas – órgão do Partido Republicano Liberal126– o decano dos

jornais amazonenses - reapareceu em 25 de abril de 1920, pois já alguns anos haviam

suspendido a sua publicação. Depois de muitas lutas com o governador Bacelar, fazendo

críticas a esse governo e sendo impedido por certos momentos de circular na cidade de

Manaus, o que de fato ocorre praticamente após a eleição governamental de 1916. O

periódico tinha como diretor político o coronel Bento Brasil, e já trazia no seu primeiro

exemplar o apoio ao marechal Thaumaturgo de Azevedo ao cargo de governador do

Amazonas:

Depois de um interregno de quase um lustro, reaparece o Amazonas [...]. Quanto embate havido entre a villeza de opiniões antagônicas e a consciência irrevogável nos seus sentimentos de fidelidade a um credo político professorado e mantido sem apphobrido [...]. O fim a que veio

125“O partido compreende formações sociais assaz diversas, desde os grupos unidos por vínculos pessoais e particularistas às organizações complexas de estilo burocrático e impessoal, cuja característica comum é a de se moverem na esfera do poder político [...]. Daí que, na noção de partido, entrem todas as organizações da sociedade civil surgidas no momento em que se reconheça teórica ou praticamente ao povo o direito de participar na gestão do poder político. É com este fim que ele se associa, cria instrumentos de organização e atua”. BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política, p. 899. 126Jornal que circulou em Manaus pela primeira vez em 9 de julho de 1866, sendo o 8º a circular nesta cidade em substituição ao Estrela do Amazonas. A partir do número 6, de 10 de agosto de 1866, passou a ser publicado com o nome de Amazonas. A primeiro de janeiro de 1873, começa a ser publicado diariamente recebendo o nome de Diário do Amazonas, e só a partir de 1914 passou a ser denominado de Amazonas – órgão do Partido

Republicano Liberal. Caracterizou-se por uma postura crítica à política local, fazendo oposição em 1913 às facções, Nery e Pedrosa. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas (1851-1950). Catálogo de Jornais. 2.ª ed. revisada. Manaus: Edua, 1990. p. 35.

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explica-o a importância do momento: a sucessão governamental [...]. O Partido Republicano Liberal do Amazonas acaba de lançar ao suffragio do eleitorado livre e independente, o nome do inclyto Marechal Gregório Thaumaturgo de Azevedo, para o cargo de chefe do Estado, no quatriennio que se inicia a primeira de janeiro do anno próximo.127

O Jornal O Amazonas, no ano de 1920, começou se juntando no mês de abril ao

processo eleitoral local, tendo como base o coronel Guerreiro Antony128 e suas articulações

políticas preocupadas em derrotar o candidato de Pedro Bacelar. O jornal fez elogios ao

marechal Azevedo e sua conduta política de homem honrado e digno, sendo uma propaganda

forte, pedindo voto para seu candidato:

O Marechal Thaumaturgo de Azevedo, cidadão brioso, culto, militar que sempre tem marchado ao lado dos fracos, guiando os desprotegidos, seguindo na vanguarda dos oprimidos, desencadeando os prisioneiros innocentes, é, incontestavelmente, o chefe que deveis escolher para governador do Estado, no próximo quadriênio. Não elegemos o indivíduo: elegemos os princípios sãos de Marechal Thaumaturgo de Azevedo!Ás urnas, povo!129

É interessante observar as articulações políticas desse jornal e suas conjunturas na

sucessão governamental, pois apresentava uma entrevista do senador Rego Monteiro ainda

pré-candidato ao governo, falando sobre seu entusiasmo ao ver o marechal Azevedo eleito.

Como diz o próprio jornal: “O candidato amazonense, marechal Thaumaturgo de Azevedo, é

elogiado pelo ilustre senador Rego Monteiro: – Se assim acontecer, será a felicidade do

Amazonas, que precisa de um governador da sua envergadura”.130

O senador Rego Monteiro no final do mês de abril, no entanto, ainda não era o

candidato oficial do governador Bacelar; este estava indeciso quanto ao nome do seu

sucessor, mas o jornal Amazonas, guiado pelo coronel Guerreiro Antony, misturava os nomes

127Biblioteca Pública do Estado do Amazonas (BPA). Jornal Amazonas, 25 de abril de 1920. Ano LVI, n.º 1, p. 1. 128“Para esclarecimento dos fatos e melhor compreensão dos desígnios políticos, é preciso saber que o coronel Bittencourt, desde que foi investido no governo do Estado, deixou completamente a direção do seu partido aos próceres do coronel Antony. Já residia, com a família, na rua Henrique Antony. Não se tratava de um prédio espaçoso, mas suficientemente amplo para um conforto relativo. O coronel Guerreiro Antony estabelece sede do seu partido; aí funda as oficinas de O Liberal, órgão oficial da agremiação; aí, hospeda amigos íntimos e redatores daquele órgão, os Drs. Manoel Francisco Machado (barão do Solimões) e o vibrante jornalista Joaquim Gondim”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 253. 129BPA, Jornal Amazonas, 28 de abril de 1920, Ano LVI, n.º 4, p. 1. 130BPA, Jornal Amazonas, 29 de abril de 1920, Ano LVI, n.º 5, p. 1.

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dos possíveis candidatos, uma vez que o primeiro nome lançado para o cargo de governador, e

possível candidato declarado, foi o marechal Azevedo.131

No Amazonas era de praxe que cada governo que começava tratasse logo de formar

o seu grupo à parte. Era lógico, portanto, que estava condenada a ser posta à margem toda

bagagem do governador Bacelar. A bancada amazonense, no entanto, do Partido Republicano

do governador estava em crise, faltando dois meses para o pleito, com o próprio nome do

senador Rego Monteiro ao cargo de governador, pois este tinha dito que não seria candidato.

Logo, outros nomes surgiram e Bacelar teve de descartá-los para impor o nome de Rego

Monteiro.

O órgão oficial do Partido Republicano Amazonense tinha, nos últimos meses antes

da eleição, se preocupado muito com a atitude de sua bancada em face da candidatura Rego

Monteiro. De fato, não deixava de ser estranho, principalmente, a atitude dos seus deputados

federais em relação ao deputado federal Monteiro de Souza.132 Sobre esse, pois, era que

deveria recair todas as queixas do situacionismo, justamente magoado com o procedimento

indisciplinar de um dos seus membros de maior relevo político, e que deveria ser o primeiro a

dar o exemplo de obediência partidária ao partido, o que não ocorria naquele momento.

Outros deputados federais estavam insatisfeitos, eram os casos de Ephigênio

Salles133e Antônio Nogueira.134 O primeiro era o porta-bandeira da corrente unionista no

Estado e, portanto, agia por conta própria, sem audiência do governismo de Bacelar. O

segundo também, depois do rompimento do senador Silvério Nery com o governo Bacelar, a

quem desacompanhou para continuar incorporado ao velho silverismo, encontrava-se

131“O general Gregório Thaumaturgo de Azevedo nasceu no Piauí em 17 de novembro de 1851 [...]. Por mais de meio século seu nome encheu de vibração os faustos das atividades militares, civis e políticas, sobretudo do Estado a que ele, quase sempre, esteve ligado [...]. Como engenheiro militar e bacharel em Direito, exerceu, revestido da mais alta responsabilidade, várias comissões importantíssimas [...]”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 481. 132“O professor Antônio Monteiro de Souza foi um cidadão dos mais atuantes do Amazonas, no sentido cultural, social e político. Em 1909, abria-se uma vaga de senador na representação do Amazonas. É eleito para preenchê-la o deputado federal Jorge de Moraes, que, desse modo, deixa desocupada sua cadeira na Câmara. Para o lugar é eleito Monteiro de Souza, candidato sem competidor. No interregno do mandato, Monteiro de Souza apresentava muitos projetos de lei, em maioria sufragados pela Câmara. Foi eleito várias vezes deputado federal”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 85-87-88. 133“Nascido a 16 de agosto de 1879, no Serro do Frio, tradicional cidade mineira. Ephigênio Salles foi eleito deputado federal pela primeira vez em 1911, vindo a ser reeleito, ininterruptamente, desde aquela data até 1925. Nessa condição exerceu, durante dez anos consecutivos, o cargo de secretário da Câmara Federal. Além de outras comissões, fez sempre parte, como membro efetivo, da Comissão de Instrução Pública”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 17-19. 134“Natural de Fortaleza (Ceará), membro de numerosa e tradicional família do seu sobrenome. Antônio Nogueira bacharelou-se em Direito em 1911, pela Faculdade do Rio de Janeiro. No Amazonas, exerceu diversos cargos. Foi deputado estadual de 1901 a 1906, depois deputado federal. Exerceu o jornalismo, como tal, foi redator do Jornal do Brasil”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 90.

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igualmente com os movimentos livres, podendo, de acordo com o seu antigo chefe, tomar a

direção do partido que julgava mais conveniente aos interesses de sua facção.

Restava o deputado Dorval Porto135que, apesar de dever a sua eleição para deputado

federal ao prestígio do próprio governador, estava por várias vezes fazendo profissão de fé em

favor da candidatura de Rego Monteiro ao governo, embora ao mesmo tempo se

desmanchasse em favor do deputado Virgílio Ramos, prevendo uma hipótese de seu colega

Monteiro de Souza vir a ser o indicado ao cargo de governador. Essa discussão de sucessão

provocou o rompimento do Partido Republicano Amazonense, quando os seus quatro

deputados federais: Ephigênio Salles, Antônio Nogueira, Monteiro de Souza e Dorval Porto

se desvinculam do partido, pois não concordavam com a candidatura imposta pelo governador

Bacelar ao senador Rego Monteiro, para governador do quadriênio 1921 a 1924. Com isso,

apoiavam a candidatura de Wortingen Ferreira, ou seja, a facção Nery.

O candidato marechal Azevedo, que governara o Amazonas no curto período de oito

meses, entre os anos de 1891 e 1892, foi declarado candidato ao governo no dia 18 de março,

pelo Partido Republicano Liberal, tendo todo o apoio do coronel Guerreiro Antony e seu

grupo político, que não colocara empecilhos, pois o marechal Azevedo nem estava em

Manaus, encontrava-se no Rio de Janeiro e após dez dias é que aceitava a candidatura ao

Governo do Amazonas no quadriênio 1921 a 1924:

Dez dias depois da aclamação de meu nome, resolvi responder aos meus amigos, aceitando a minha indicação, razão porque deliberei emprehender viagem até Manáos onde assistirei a eleição de julho vindouro – Marechal Thaumaturgo de Azevedo.136

Esse discurso do marechal Azevedo, de mostrar-se um homem que cumpre com a

palavra, foi a propaganda principal do jornal Amazonas, que reproduzia uma mensagem do

período em que o marechal tinha sido governador do ano de 1891, comentando sobre suas

obras, seu trabalho de organização do Estado, afirmando também a sua vinda ao Amazonas, e

sobre a participação do povo em apoiar a candidatura do marechal Azevedo:

Podemos garantir ao povo amazonense que o venerando Marechal Gregório Thaumaturgo de Azevedo, absolutamente não veio ao Amazonas solicitar

135“Do Dr. Dorval Pires Porto sabe-se que era natural de Rio Grande do Sul e que ali fizera a sua cultura, dirigindo-se para o Amazonas, aportando em Manaus no início do século 20. De acordo com Agnello Bittencourt, o Dr. Dorval Porto era astuto, entrando na política, educado, mesureiro. No Amazonas, assumiu todos os escalões da política, deputado estadual, prefeito, deputado federal, governador”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 192-193-194. 136BPA, Jornal Amazonas, 1.º de junho de 1920, Ano LVI, n.º 33, p. 1.

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lugar de senador ou deputado do Congresso Nacional. Acha-se aqui a chamado de seus amigos e da quase totalidade do povo, que ansioso pelo progresso de que tanto carece o nosso grandioso Estado, o deseja para ocupar o cargo de seu primeiro magistrado, no quadriênio que se inicia a 1 de janeiro próximo vindouro.137

O jornal Amazonas, por outro lado, não especificou bem esse povo e parecia se

referir não só ao povo de Manaus, mas também de outros municípios:

Que o povo faça nas urnas proclamar a sua vontade, sagrando o nome daquele que, em seu governo, fará representar-se no Legislativo todas as classes e há de dar ao operariado todas as franquias até hoje reclamadas em vão. Para isto fala bem alto a crença no homem digno, que a nossa vontade designará como o governador de que carecemos. Esse administrador será Thaumaturgo de Azevedo, nome que para o povo é um syllabario de fé pura e de crença sincera.138

A questão do povo139 no Amazonas, do ano de 1920, é bem complicada, se partirmos

da ideia dos jornais e em particular do jornal Amazonas, o povo corresponde àquelas pessoas

que estão insatisfeitas com o governo Bacelar e com a situação econômica que o Estado

estava passando; o povo visto pelo jornal Amazonas era muito mais uma pequena elite

insatisfeita com os caminhos que o Estado estava atravessando, uma vez que,por conta de

uma retração da economia gumífera, o recurso do governo federal era mínimo ou quase

nulo.Assim, esse povo não correspondia a toda a sociedade, pois estamos analisando um

contexto da República Velha, em que só uma minoria votava e os interesses das facções eram

individuais; portanto, esse povo representado pelo jornal Amazonas deve ser observado por

meio da questão da representação do voto na República Velha e como se correspondia esse

voto na política dos governadores, em que o poder das oligarquias era desde o âmbito

municipal até o federal:

137BPA, Jornal Amazonas, 2 de junho de 1920,Ano LVI, n.º 34, p. 1. 138BPA, Jornal Amazonas, 3 de junho de 1920,Ano LVI, n.º 35, p. 1. 139“A História Social, a História Cultural, a História das Mentalidades, ou seja, as principais abordagens metodológicas da historiografia atual, em geral, têm o povo como um de seus principais objetos de estudo, aparecendo normalmente na forma de grupos sociais específicos. Apesar disso, a definição de povo utilizada pela História pouco difere das definições linguísticas tradicionais reproduzidas nos dicionários, o que nos mostra que há pouco interesse dos historiadores em definir o termo. Assim, o povo é em geral definido, primeiro, como um conjunto de pessoas que vivem em sociedade; segundo, como um conjunto de indivíduos que integram uma nação específica ou têm uma origem étnica comum. E não é raro o termo significar ainda o conjunto dos indivíduos mais pobres de uma sociedade, daí derivando o adjetivo “popular”. O conceito de povo, por exemplo, é amplamente empregado pela nova historiografia política, que estuda, entre outras coisas, como os políticos de determinados contextos históricos usavam a propaganda para mobilizar a massa em benefício próprio”. SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Marciel Henrique. Dicionários de Conceitos Históricos. São Paulo: Contexto, 2005. p. 272.

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Assim como nas relações estadual-federais, imperava a política dos governadores, também nas relações estaduais e municipais. Através do compromisso típico do sistema, os chefes locais prestigiavam a política eleitoral dos governadores e deles recebiam o necessário apoio para a montagem das oligarquias municipais.140

O voto havia se estendido a uma ampla parcela da população e poderia ser uma arma

fundamental no processo de transformação da sociedade. Mas a pouca politização das

camadas populares, aliada à utilização de toda forma de violência por parte, por exemplo, dos

coronéis, terminaram por transformá-lo em uma mercadoria de barganha. A votação era

aberta, ou seja, permitia que os chefes políticos locais formassem os currais eleitorais,

controlando o voto em função dos interesses das oligarquias estaduais:

No regime representativo o voto é um dos elementos necessários do jogo de força. Mas, com o controle da mesa eleitoral, o voto torna-se muitas vezes uma farsa, o que permitia à situação e à oposição dizerem comumente que ambos tinham ganho a eleição.141

Tal análise é importante porque o jornal Amazonas ligava o povo à questão do voto.

Para o jornal, o governador escolhido tinha de ser pela vontade popular, ou seja, “o eleito pelo

voto do povo”.142 O marechal Azevedo comentava a importância do Partido Republicano

Liberal no Amazonas, sendo um partido de lutadores e de arraigadas convicções políticas,

que, de acordo com o marechal, ninguém comprava e nem manejava ao sabor de interesses

subalternos.O marechal trazia um discurso de ideias de um homem pronto e capaz de

governar o Estado, e que seria o governador do povo, ao contrário dos seus adversários.O

jornal Amazonas expõe esse discurso:

O nosso candidato foi mais sincero dizendo – apresente-me candidato por um partido que é a expressão verdadeira de uma força; por que é um partido popular; e não vem fazer conchavos, porque não transaciono sacrificando meus amigos: eleito, zelarei pelo futuro do Amazonas, fazendo um governo de justiça e de honestidade, sem ódios nem paixões; serei do povo, em cuja alma eu estou há muito tempo; farei um governo cuidadoso do bem público, e não de conveniências pessoais ou partidárias.143

O discurso do marechal era representativo do homem que visava salvar o Amazonas

do descrédito nacional, um Estado amarrado em dívidas que em quatro anos sofreu um

140LEAL, Vítor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. São Paulo: Alfa Ômega, 1978. p. 102. 141CARONE, Edgar. A Primeira República, p.117. 142BPA, Jornal Amazonas, 4 de junho de 1920, Ano LVI, n.º 36, p. 1. 143BPA, Jornal Amazonas, 10 de junho de 1920, Ano LVI, n.º 41, p. 1.

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descaso na sua economia. O jornal Amazonas apresentava esse discurso, e todo tempo eram

reproduzidas críticas ao governo de Bacelar e ao seu candidato ao governo Rego Monteiro. As

brigas entre determinadas facções aumentavam, quanto mais se aproximava a eleição

governamental. O governo de Bacelar recebia críticas a respeito de má administração,

especialmente sobre as finanças do Estado que eram péssimas, e que o futuro do Estado

necessitava, para o marechal, de mudanças imediatas e soluções rápidas.144

Chegando-se próximo ao dia do pleito de 14 de julho,145 o jornal Amazonas trazia

discussões acerca da neutralidade do presidente Epitácio Pessoa. Assim, o presidente da

República não tinha candidato à eleição governamental, tampouco prestava o seu apoio a

nenhum dos que disputavam a vitória no dia 14 de julho. Esse jornal manifestou-se contra

uma possível ajuda do presidente a certo candidato. Conforme o periódico, havia

controvérsias em relação a qual candidato o presidente estava apoiando e liberando dinheiro.

O jornal não deixou bem claro esse apoio, porque, para ele, o que o presidente dizia era que:

O que sua excelência, o Presidente da República, disse aos que lhe procuraram e tem dito repetidamente é que o seu interesse, para a boa marcha do seu governo e para o bem, não só do nosso Estado, e como de todo o paiz, é ver eleito um cidadão de energia comprovada, que se não deixe dominar pelos inúmeros aventureiros que não tenha ligações alguma com os politiqueiros parasytas, que só fitam avançar no que ao povo pertence por força de seu trabalho e o que se acha nos cofres do nosso Thesouro Público. O que sua excelência tem dito e faz questão absoluta é que o futuro governador seja um cidadão eleito pela vontade do povo.146

O jornal Amazonas fazia questão de dizer que o presidente da República queria o

melhor para o Amazonas, e que sua neutralidade mostrava seu interesse ao bem do Estado, e

que o presidente aceitava a vontade do povo amazonense do seu candidato eleito por esse

próprio povo. Esse jornal, mais uma vez, repetia a questão da vontade do povo, mas uma

vontade de eleger o seu candidato, o marechal Azevedo, dessa forma sempre ligava o povo ao

seu candidato e ampliava isso também a vontade do presidente.

O jornal Amazonas criou ou tentou criar um salvador do Amazonas, antes da eleição

de 14 de julho. O marechal Azevedo seria o homem que iria salvar o Estado das más

administrações, da incompetência dos governadores da década de 1910:

144BPA, Jornal Amazonas, 18 de junho de 1920, Ano LVI, n.º 48, p. 1. 145Segundo a Constituição política do Amazonas, promulgada em 21 de março de 1910, seção II, capítulo II, artigo 48, parágrafo primeiro – A eleição terá lugar ao dia 14 de julho do último ano do período governamental e o Congresso fará a apuração no dia 5 de setembro, com qualquer número de membros presentes. (CENDAP, História do Poder Legislativo do Amazonas: Constituições – 1891, 1892 e 1895. Vol. 1. Manaus: Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas, 2002. p. 9.) 146BPA, Jornal Amazonas, 4 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 62, p. 1.

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Orgam que somos do Partido Republicano Liberal, em nome do illustre Marechal Dr. Thaumaturgo de Azevedo, dos liberaes e demais adeptos da candidatura deste distincto estadista, empenhado todos na insofismável Victoria de 14 do corrente mês da qual está dependendo a libertação e a felicidade geral do povo do Amazonas.147

À primeira vista parece que as atividades do jornal Amazonas de pensamento e a

atividade de comunicação são autônomos e que os resultados de uma são simplesmente

traduzidos nos procedimentos do outro. Nesse caso, nomear os conteúdos pensados desse

jornal seria uma mera tradução, conforme convenções convenientes. Temos de verificar o

discurso acerca do posicionamento do periódico em apoiar o marechal Azevedo; portanto, a

operação de representação de ideias na linguagem do jornal era uma operação que visava à

nomeação do candidato Azevedo e da sua essência de homem ilustre, que não consistia

apenas numa mudança de código do jogo político para códigos externos da linguagem.

Mas o pensamento do jornal Amazonas, que era privado, pressupõe, ao que tudo

indica o jogo de interesses em chegar ao governo, e a linguagem que o jogo de comunicação

do jornal põe em atividade pressupõe o pensamento político. A própria organização do diário

entrava em atividade sem as necessidades sociais expressas numa linguagem mais

fundamental que a linguagem verbal: a linguagem das trocas de acusações do jornal

Amazonas contra o jornal A Imprensa, do governador Bacelar. Por outro lado, o jornal A

Imprensa se defendia das acusações feitas pelo Amazonas, principalmente da péssima

administração de Bacelar, onde o jornal Amazonas comentava sempre sobre a falta de

organização do governo.

2.3.2 A Imprensa – Órgão do Partido Republicano Amazonense

O jornal A Imprensa – órgão do Partido Republicano Amazonense148– servia de base

à facção do governador Bacelar, que apoiou a candidatura de Rego Monteiro para governador

no quadriênio de 1921 a 1924. O jornal tinha como diretor político o médico Dr. Alfredo da

Matta, que junto com Bacelar articulava a campanha de Rego Monteiro. A Imprensa trazia

todo dia na primeira página “O dia governamental”, onde comentava a vida do governador, as

suas obras feitas no Estado e também as questões políticas e econômicas não só do Estado

147BPA, Jornal Amazonas, 10 de julho de 1920, Ano LVI, n.º67, p. 1. 148O Jornal A Imprensa circulou inicialmente em setembro de 1916 com o título “A Imprensa Hontem”, que teve o seu primeiro número impresso no Piauí. A partir de 20 de setembro de 1916, passou a ser impresso em Manaus e em 1917 mudou seu título para A Imprensa. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas, p.113.

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como do âmbito nacional. O chefe do jornal era justamente o governador Bacelar, que

também era diretor do Partido Republicano Amazonense.

No começo do ano de 1920, o jornal A Imprensa estava interessado em eleger o

médico Antônio Ayres de Almeida Freitas para deputado estadual, o que foi realizado no dia

29 de fevereiro. Em todo esse mês, até o dia da eleição para o Amazonas escolher o seu

candidato, o jornal fazia um discurso na primeira folha, pedindo para a população votar em

Ayres de Almeida.149

Com toda sua campanha para eleger Ayres de Almeida, Bacelar faz comentários

diversos sobre o médico, que acaba ganhando a eleição de Álvaro Maia. Sendo o resultado

final da apuração dos votos, de acordo com A Imprensa: “Antônio Ayres de Almeida obteve

2.168 votos, Álvaro Maia, 407 votos”.150

A vitória de Ayres deu força para o governador Bacelar, que até então não tinha

dito quem seria o seu candidato para sucedê-lo, lembrando que a eleição para o cargo de

governador estava bem próxima.

A Imprensa só apresentou o nome de Rego Monteiro faltando menos de três meses

para o pleito, falando exclusivamente do seu aniversário, contando da vinda para o Amazonas,

como juiz de Direito da Comarca de Tefé, fazendo uma biografia completa até dos seus atos

de senador para o Brasil e em especial para o Estado do Amazonas.151

O governador Bacelar também não perdeu tempo em fazer uma propaganda forte do

seu candidato, comentando a respeito das suas qualidades em um artigo do jornal intitulado

“Sucessão Governamental do Estado – Partido Republicano Amazonense, manifesto político

ao eleitorado do Amazonas”, que era uma resposta ao jornal Amazonas e ao seu candidato

Thaumaturgo de Azevedo:

Político militante de lealdosa solidariedade ao Partido e que se filiou, correligionário da esfrenuo de inquebrantável disciplina, o candidato apontado que tem sido e é um dos apondes amigos da generosa e hospitaleira terra amazonense, só bem tem merecido do Estado, e bem merece por certo Partido.152

O jornal A Imprensa funcionava como elemento-chave para a candidatura Rego

Monteiro, pois era um diário que trabalhava diretamente em favor dos interesses do

governador Bacelar. O jornal era o ímã do Partido Republicano Amazonense, nele os

149 Museu Amazônico (MA). Jornal A Imprensa, 11 de fevereiro de 1920, Ano IV, n.º 1.189, p. 1. 150MA, Jornal A Imprensa, 29 de março de 1920, Ano IV, n.º 1.236, p. 1. 151MA, Jornal A Imprensa, 20 de abril de 1920, Ano IV, n.º 1.258, p. 1. 152MA, Jornal A Imprensa, 22 de abril de 1920, Ano IV, n.º 1.260, p. 1.

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discursos do partido se tornavam os mecanismos de divulgação no jornal, onde os elos eram

fundamentais na formação do grupo dirigido por Bacelar:

Para o fim de deliberar sobre a escolha do candidato ao governo estadual no quadriênio administrativo de 1921 a 1924, visto de se realizar a 14 de julho do corrente anno a eleição respectiva, resolveu homologar a indicação em tal sentido feita pelo Exmo. Sr. Dr. Pedro de Alcântara Bacelar, honrado governador actual, chefe supremo e presidente do Directório do mesmo partido [...]. O governador andou patrioticamente inspirado indo buscar a tribuna do parlamento brasileiro a egrégia personalidade do Exmo. Sr. Desembargador César do Rego Monteiro, senador federal por este Estado, para a consagração do voto popular na justa política a se ferir no próximo 14 de julho.153

O Partido Republicano Amazonense se juntava numa indicação direta do governador

Bacelar, indicando a candidatura de Rego Monteiro, sendo que a convenção do partido era

dirigida por delegados municipais do Estado, que funcionavam como caciques políticos

municipais no processo eleitoral do ano de 1920. O governador Bacelar declarava num

periódico da cidade que buscou um candidato de personalidade nacional e que o Amazonas,

para ele, necessitava de um nome ilustre diante do governo federal. Sendo assim, nada melhor

do que um senador federal:

Ao mesmo tempo, olhando simplesmente o bem futuro do Estado, o crédito, o progresso e o engrandecimento do Amazonas, endereçamos idêntico apello ao eleitorado em geral, que sabe cultuar o verdadeiro mérito e fazer justiça aos mais dignos, porquanto, dentre estes indubitavelmente ressalta esse personagem insinuante que é o Exmo. Sr. Senador Desembargador César do Rego Monteiro, varão ensino cujo nome impoluto aqui deixamos insculpido como divisa de combate para o próximo pleito da sucessão governamental a se verificar em 14 de julho do corrente ano. Às urnas, pois eleitorado do Amazonas. Às urnas, destemerosos correligionários e amigos do Partido Republicano Amazonense! Pelo mérito real e incontestavelmente de César do Rego Monteiro, às urnas concidadãos.154

Essa mensagem retrata a continuidade do que seria o governo de Rego Monteiro, um

governo de progresso e esperança, de créditos nacionais e auxílio federal. No final da

mensagem do Partido Republicano Amazonense, editada em A Imprensa, havia um pedido ao

eleitorado amazonense, que precisava votar no bom andamento do governador Bacelar e que

esse eleitorado saberia dar valor à campanha de Rego Monteiro. Esse discurso foi direcionado

aos delegados municipais do Estado e se repetiu todos os dias no jornal até o dia da eleição.

153MA, Jornal A Imprensa, 5 de maio de 1920,Ano IV, n.º 1.273, p. 1. 154MA, Jornal A Imprensa, 5 de maio de 1920,Ano IV, n.º 1.273, p. 1.

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Analisando o Jornal do Comércio,155 que tem como diretor Vicente Reis,156

percebemos que a campanha de Rego Monteiro não foi como relatou o jornal A Imprensa, de

forma calma e tranquila, mas sim conturbada, especialmente por causa dos conflitos do

próprio Partido Republicano Amazonense. Como verificamos no Jornal do Comércio, que

traz uma discussão sobre a oposição que a bancada amazonense fez ao senador Rego

Monteiro:

Os jornaes do Rio affirmam que os senadores Silvério Nery e Lopes Gonçalves, esquecendo resentimentos, se uniram aos deputados Ephigênio Salles, Dorval Porto, Monteiro de Souza e Antonio Nogueira, com o fim de apoiados pelo Cattête, escolher para a futura governança do Amazonas, um candidato de oposição ao senador Rego Monteiro.157

Ficou claro que a disputa governamental ganhou complexidade de descrição de atos

contrários ao governo de Pedro Bacelar. O Jornal do Comércio relatava que os deputados

federais e senadores não estavam satisfeitos com a candidatura de Rego Monteiro ao governo,

e procurou descrever nos seus discursos um entendimento sobre o conflito da bancada

amazonense com o senador Rego Monteiro. De acordo com o Comércio:

O senador Rego Monteiro declarou ao correspondente da Folha do Norte que as notícias espalhadas sobre a sua atitude relativamente à sucessão do Sr. Pedro Bacelar, no governo do Amazonas, são infundadas, pois que sempre esteve disposto a entrar em accordo com os deputados amazonenses que, nas conferencias realisadas, não suggeriram um nome para negociações, parecendo que o seu único propósito era a sua desistência.158

Para o jornal, Rego Monteiro tentava afirmar que o seu nome ao cargo de governador

era o único na lista de Bacelar, que os deputados federais em nenhum momento lançaram um

outro nome à sucessão. E ainda que essa discussão ficasse a cargo do presidente, que

resolveu:

155O primeiro número é de 2 de janeiro de 1904. Suspendeu a publicação em 16 de janeiro de 1906, com o número 644. Reapareceu em 15 de abril do mesmo ano, com o número 645. Teve como principais diretores: Henrique Rubim na segunda fase, Vicente Reis e Rocha dos Santos na terceira fase. Todos presentes entre as décadas de 1910 e 1920. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas, p.120-121. 156“Natural da cidade do Rio de Janeiro. Nasceu a 15 de setembro de 1870. Formou-se em Direito e dividia-se entre as funções do seu cargo e a literatura teatral. Dirigiu-se para Manaus em 1904. Em 1906, comprou ao jornalista Rocha dos Santos, com recursos que lhe dera o coronel Cosme Alves Ferreira, seu sogro, a tipografia do Jornal do Comércio, velho e conceituado órgão de imprensa de Manaus. Dr. Vicente Torres da Silva Reis, fundador, em Manaus, da Associação Amazonense de Imprensa”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p.493-494-495-496. 157Centro Cultural dos Povos da Amazônia (CCPA). Jornal do Comércio, 25 de maio de 1920, Ano XVII, n.º 5.771, p. 2. 158CCPA, Jornal do Comércio, 1.º de junho de 1920, Ano XVII, n.º 5.778, p. 3.

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Deliberar que os ministros determinem a todos os subordinados, no Amazonas, que se colloquem no terreno da mais absoluta neutralidade, em suas repartições, com relação ao pleito governamental a ferir-se no estado a quatorze de julho próximo, de modo que cada um exerça livremente o seu direito de voto.159

O Jornal do Comércio estampava notas oficiosas relativamente à atitude do

presidente Epitácio Pessoa sobre a sucessão amazonense. Conforme elas, Epitácio fora

procurado pelos representantes do Amazonas, que solicitaram a sua intervenção amistosa para

dar definitiva solução à questão da sucessão de Pedro Bacelar. O presidente declarou que

adotaria um candidato de harmonia com as correntes políticas, sem ligações partidárias e

nessas condições tendo plena liberdade para administrar com independência.160 Para isso

ocorrer, porém, era necessária a desistência do senador Rego Monteiro, mas desde que a sua

candidatura foi mantida, tornou-se impossível qualquer acordo.

Defrontando depois com candidaturas de combate, o presidente afastou a sua

interferência, disposto, como estava a manter absoluta neutralidade no caso:

O presidente Epitácio Pessoa resolveu que, para tornar bem patente a sua completa neutralidade no caso da sucessão governamental, no Amazonas, nenhuma nomeação federal será feita, para esse estado, nestes mezes mais próximos.161

Para o Comércio, o presidente seria neutro com os conchavos e rivalidades dos

grupos oligárquicos no pleito governamental. Na análise dos discursos do jornal, deve-se

preparar e codificar os textos selecionados, os artigos dos diários em função dos objetivos da

pesquisa do programa realizado e das possibilidades de leitura que encontramos.

Percebemos que existia um discurso do jornal de não apresentar um nome de apoio

ou ajuda a certo candidato, mas nas suas entrelinhas, o apoio existia a certo grupo político que

o jornal escondia a todo o momento. Isso ficou evidente quando o próprio Jornal do

Comércio procurou dizer que a bancada amazonense em geral apoiava o juiz Wortingen

Ferreira ao cargo de governador, ou seja, a facção Nery:

A bancada amazonense foi hoje ao palácio do Cattête apresentar ao presidente Epitácio Pessoa o dr. Wortingen Luiz Ferreira. E que o deputado Ephigênio Salles, logo que seja dada a discussão do projecto de intervenção

159CCPA, Jornal do Comércio, 12 de junho de 1920, Ano XVII, n.º 5.789, p. 2. 160CCPA, Jornal do Comércio, 12 de junho de 1920, Ano XVII, n.º 5.789, p. 3. 161CCPA, Jornal do Comércio, 14 de junho de 1920, Ano XVII, n.º 5.791, p. 3.

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federal no Espírito Santo, apresentará uma emenda, tornando a medida extensiva ao Amazonas.162

O governador Bacelar era visto pelo jornal como sufocado pela não aceitação da

bancada amazonense do nome de Rego Monteiro para sucedê-lo. As intrigas do Comércio

eram para desestruturar o governo de Bacelar. Mas, para ele, tais intrigas do Comércio e do

Amazonas não afetavam sua política de dominação, tanto que em 10 de julho de 1920,

faltando quatro dias para a eleição governamental, na sua mensagem lida perante a

Assembleia Legislativa do Estado, discutia a questão do aspecto econômico, e principalmente

a sucessão governamental. No aspecto econômico, o governador ainda apostava na

valorização da borracha no mercado mundial:

Já vos disse o que, referentemente à borracha, pensa o meu governo. Continuo na insistência do seu plantio methodico e em grande escala, barateando-se o custo pela doação de medidas racionaes [...]. E mantendo quanto tenho expendido relativamente ao sempre magro assunto da arvore que é a riqueza do nosso vale e a qual devemos o evoluir accelerado que tivemos.163

Bacelar tentava dar incentivo à produção da borracha, por mais que os índices do

valor no Amazonas caíssem. Para o governador, o Estado necessitava imediatamente de uma

ajuda federal, para que a borracha pudesse concorrer com a produção asiática, para quem

perdeu o monopólio da produção a partir de 1910, e que o Amazonas teve seu auge com ela e

que era um meio de sustento econômico da região.

Já na questão da sucessão governamental, ele comentava sobre a importância do

futuro governador em resgatar o Amazonas num setor econômico forte, diante dos outros

Estados nacionais e que, para a sucessão, o governador eleito teria de ser competente e

conseguir recursos para a economia local:

Dentre os múltiplos e delicados problemas justapostos à solução do momento, um dos que me preocuparam com superior cuidado foi o tocante à sucessão governamental. As precaríssimas condições econômicas – financeiras do Estado requerem seja chamado a presidir os seus destinos um patrício de incontestável valor moral e cívico, com a elevada competência para o trato dos negócios públicos, tendo o perfeito conhecimento desses mesmos negócios, de maneira a, criteriosamente, solucioná-los de harmonia com os interesses privados em concomitância.164

162CCPA, Jornal do Comércio, 25 de junho de 1920, Ano XVII, n.º 5.802, p. 3. 163MA, Mensagem do Governador Pedro Bacelar à Assembleia Legislativa, de 10 de julho de 1920, p. 34-35. 164MA, Mensagem do Governador Pedro Bacelar à Assembleia Legislativa, de 10 de julho de 1920, p. 18.

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Na mensagem, Bacelar afirmava que o candidato perfeito era o então senador

Monteiro, sendo uma pessoa que saberia lutar pelo Estado, e que até então já tinha feito isso

como senador e muitos benefícios já tinha trazido para a região, que era um homem honrado e

respeitado e com a sua grandeza o Amazonas andaria seguro e no caminho certo da

prosperidade:

Se bem que assim o seja, coube, entretanto, ao egrégio Sr. Desembargador César do Rego Monteiro, que no Senado da República, com raro brilho e excepcional destaque, desempenha, com operosidade notável e distinta aptidão, o honroso mandato que lhe conferiu o povo do Amazonas, a insigne preferência para o cargo de governador no quatriennio de 1921 a 1924. Aliás, é meu grato testemunhar ter sido com justiça o applaudido acerto, proclamada a sua candidatura, sincera e enthusiasticamente pelos elementos de maior prestigio num solennismo reconhecimento às suas virtudes cívicas e privadas e aos valiosíssimos serviços por elle prestados à causa pública.165

A eleição nem tinha ocorrido e o governador já dava como certa a vitória ao senador

Monteiro. Assim, a sua confiança punha em dúvida o processo eleitoral, mas o próprio

governador garantia a total estabilidade de livre votação às pessoas. Assim como o jornal

Amazonas, que colocava em pauta a participação do povo apoiando o seu candidato, o

marechal Azevedo, Bacelar também tentava induzir o povo a votar no senador Monteiro,

colocando-o como o único dos três candidatos capaz de trazer melhorias ao Amazonas:

Dessarte entregue, como está, ao sufrágio do povo do Amazonas o nome do laureado e impoluto do sr. Senador César do Rego Monteiro, é convicção minha de que sahirá victorioso das urnas eleitoraes, traduzindo-se assim numa grata realidade as fagueiras esperanças que todos nutrimos, de que o seu governo muito se esforçará a favor do soerguimento das nossas forças econômicas, abrindo-lhes o largo caminho de suas prosperidades.166

E para encerrar a questão da sucessão governamental na sua mensagem, Bacelar

tentava induzir os deputados da Assembleia, confirmando que o futuro governador saberia

corresponder à confiança do povo, e que esse povo, reconhecendo o seu trabalho, daria a

vitória ao seu candidato, e esse, sim, aclamado por esse povo, era o eleito confirmado por

Bacelar, para a prosperidade do crescimento econômico do Amazonas. O governador repete

seguidas vezes o fator da economia no seu discurso como grande questionamento do futuro

econômico do Estado:

165MA, Mensagem do Governador Pedro Bacelar à Assembleia Legislativa, de 10 de julho de 1920, p. 20-21. 166MA, Mensagem do Governador Pedro Bacelar à Assembleia Legislativa, de 10 de julho de 1920, p. 21.

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Encerrando este capítulo, permita-me senhores Deputados a Assembleia Legislativa, que eu desde já me congratulei convosco pelo resultado do pleito a ferir-se a 14 do corrente mez, pois, convicção minha é que o eminente cidadão que for eleito para exercer a dignificante missão de governar o Estado, saberá corresponder com excessiva vantagem á confiança do povo do Amazonas, propugnando, incansavelmente, sob carinhosa solicitude pelo seu bem estar, colimando as suas prosperidades.167

O povo discutido na visão do governador Bacelar estaria ligado na relação do Estado

e da família, um Estado pertencente a uma política de favorecimento às famílias carentes, uma

vez que a maioria do povo estava presente nos municípios mais distantes e que esse aparelho

estatal se organizava para conquistar votos dessas pessoas.

É importante compreendermos a distribuição de funções entre os dois níveis de

construção artificial da unidade da sociedade brasileira nas duas primeiras décadas do século

XX, quais sejam o nível do discurso ideológico e o nível do poder do Estado (do governante).

Os indivíduos eram educados por meio de discursos ideológicos eficazes para sentir que a sua

individualidade estava diretamente vinculada à generalidade do seu conhecimento, sem a

intermediação das particularidades da classe social a que pertenciam; e ao mesmo tempo era

posto diante dessa generalidade sob a forma de um poder centralizado no Estado, que

aparecia, então, como a imagem visível da unidade social.

Assim, o problema da sociabilidade durante a República Velha era resolvido pela

ação combinada do discurso da ideologia e pelo poder, no sentido de força e de dominação,

do Estado. O governante Bacelar fazia a imposição do seu poder de governador do Estado

diante dos seus adversários.

Tanto o discurso d’A Imprensa quanto a mensagem de Bacelar demonstravam o

interesse em eleger Rego Monteiro governador, por um discurso formulado de um governo

competente e de um partido que assumiria a responsabilidade de mudar o cenário econômico

do Amazonas. Conforme Serge Bestein:

O partido é o lugar da mediação política, já que entre um programa político e as circunstâncias que o originaram, há sempre uma distância considerável porque passamos então do domínio do concreto para o do discurso, que comporta uma expressão das ideias e uma linguagem codificadas.168

É no espaço entre o problema e o discurso que se situa a mediação política, e essa é

obra das forças políticas, que tem como uma de suas funções primordiais precisamente

167MA, Mensagem do Governador Pedro Bacelar à Assembleia Legislativa, de 10 de julho de 1920, p. 23-24. 168BESTEIN, Serge. Os Partidos. In: RÉMOND, René. (org.). Por uma História Política. Tradução: Dora Rocha. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 61.

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articular, na linguagem que lhes é própria, as necessidades ou as aspirações mais ou menos

confusas das populações. Por isso, para Bestein, a mediação política assume o aspecto de uma

tradução e, como esta, exibe maior ou menor fidelidade ao modelo que pretende exprimir.

2.3.3. A Reação – Órgão da União Republicana Amazonense

A discussão acerca da sucessão governamental do Amazonas no ano de 1920 faz

com que analisemos todas as organizações das facções formadas, além do jornal A Imprensa e

do jornal Amazonas, temos ainda o posicionamento d’A Reação, que era um jornal totalmente

de cunho político. Fundado em 1920, um mês antes da eleição governamental, estabelecido

por personagens importantes da política amazonense, tinha como diretor o senhor Elviro

Dantas Cavalcante e era comandado pelo senador Silvério Nery, um dos grandes personagens

do Amazonas na Primeira República. A Reação servia de base à facção Nery e ao seu

candidato o juiz Luiz Wortingen Ferreira.169

O jornal A Reação – órgão da União Republicana Amazonense170– iniciou seus

trabalhos no dia 4 de junho de 1920, e logo no seu primeiro exemplar trazia toda uma

discussão acerca das condições do Amazonas e todo um discurso da sucessão governamental.

Também era um jornal que, assim como A Imprensa e O Amazonas, comentava a participação

do povo na eleição, e que só ele, portanto, poderia mudar o rumo do Estado:

A Reação entra na arena jornalística do Amazonas, trazendo como programa capital a defesa dos interesses e direitos do povo amazonense. As condições tristíssimas em que nos encontramos, reclama agora mais do que nunca uma parcella da actividade de cada cidadão, dedicada exclusivamente ao bem geral. O Amazonas precisa tomar um rumo, de modo a poder, com firmeza, encarar a gravidade de sua situação e encaminhar-se com segurança para os destinos que lhe competem. Representamos a opinião que anseia pela mudança radical dos altos processos administrativos, lutamos pelo revigoramento econômico-financeiro do Estado, e sendo sobre uma base de incorruptível moral. Vamos defender o povo do Amazonas: com ele estamos e temos como certo que ele está conosco.171

169Luiz Wortingen Ferreira – juiz de Direito, alheio às lutas partidárias, conseguiu o apoio da representação federal do Amazonas (Monteiro de Souza, Antônio Nogueira, Efigênio Salles, Dorval Porto, deputados federais; e dos senadores Silvério Nery e Lopes Gonçalves) na sua candidatura a governador para o quatriênio 1921-1924 [...]. In: SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 47. 170Jornal A Reação (1920-?). Tinha como subtítulo: “Dentro da lei representamos o direito, queremos a liberdade. Todos unidos, a força nos conduzia à vitória!”. Diretores do jornal: Dr. Francisco Gomes de Oliveira e Dr. Elviro Dantas Cavalcante. Gerente: Anselmo Chaves. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas, p.122. 171Biblioteca Pública do Estado do Amazonas (BPA). Jornal A Reação, 4 de junho de 1920, Ano I, n.º 1, p. 1.

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A Reação mesclava as questões das atividades políticas do Amazonas com as

situações, diz ele, precárias da administração Bacelar, Da mesma forma o Amazonas, também

fazia acusações severas ao governador e também ao seu candidato Monteiro e ao jornal A

Imprensa. Para A Reação, o jornal A Imprensa era totalmente do governador Bacelar e

procurava, com isso, ajudar a eleger o seu candidato que precisava e muito de uma campanha

forte para haver a troca de cadeiras de dois candidatos, que não respeitavam as condições

precárias do povo e nem solucionavam seus problemas:

A Imprensa, órgão do partido de que é chefe o Sr. governador, projectou-se sobre o nosso illustre candidato e sobre os representantes federais do Amazonas, aquele pelo fato de não ser preferido, estes por não terem homologado a escolha do senador Rego Monteiro, feita pelo sr. Bacelar, a neurastenia da confreira – A Imprensa assenta na previsão da sua derrota. O povo do Amazonas, por amor de quem o desestima tanto como o sr. Bacelar, não pode levar o seu sacrifício, cuja medida é a tolerância com quem tem sofrido os erros de um administrador confessadamente elevado à curral governamental, que o nome do seu candidato o sr. Rego Monteiro, desapoiado pelo governo federal, acabaria de afundar o Amazonas. Si estamos victoriosos, é que o nosso candidato se impõe a confiança do povo do Amazonas por ser portador daquellas grandes qualidades que o recomendaram ao sr. Presidente da República.172

A Reação mostrava os caminhos perdidos do governador Bacelar, que, para o jornal,

estava apoiando um candidato que o presidente da República não dava apoio e que o

governador estaria irritado com o apoio da bancada amazonense ao juiz Wortingen Ferreira.

Nos dois primeiros dias da publicação d’A Reação, predominaram discursos para desarticular

a campanha do candidato Monteiro diante do governo federal, permitindo assim afirmar ao

povo amazonense que o candidato do governador não tinha apoio algum do chefe da nação,

logo o juiz Wortingen, um homem que o presidente tinha certa simpatia, era o candidato certo

e o único que poderia conseguir recursos para o Estado.

Mas o jornal A Reação não estava sozinho nas críticas contra Bacelar e com o apoio

à candidatura de Wortingen Ferreira, tinha a seu favor o jornal Gazeta da Tarde173 e o seu

diretor, tenente-coronel Aggêo da Costa Ramos. Conforme o próprio jornal, a sua fundação

172BPA, Jornal A Reação, 5 de junho de 1920, Ano I, n.º 2, p. 1. 173Em seu primeiro número dirige aos leitores a sua mensagem editorial: “Jornal de linha ideológico-política, sem compromisso, imparcial, somos combatentes a peito descoberto [...]. Durante o ano de 1914, sofreu quatro empastelamentos, além de vários atentados contra seu diretor. Em 1915, circulou com editorial denominado ‘Gazetinha’, onde constava a opinião sobre os mais variados assuntos, com destaque para a guerra. Em 1916, foi acrescentado um novo subtítulo ‘Vespertino de maior circulação’. Aproximadamente em 1923, durante o governo Rego Monteiro, o proprietário foi forçado a vender o seu jornal aos elementos do situacionismo [...]”. SANTOS, Francisco Jorge dos. et. al. Cem anos de Imprensa no Amazonas, p.103.

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ocorreu num momento agudo da vida política amazonense,174 sendo um vespertino de

Manaus, dizia-se admirado com a estima do povo, e que tinha influência diretamente na

marcha dos negócios políticos, administrativos, econômicos e sociais do Estado.

O jornal circulou no ano de 1920 fazendo duras críticas ao governo de Bacelar, à

falta de organização e administração eram as mais visíveis, na escrita do jornal:

Semelhante vergonha, que se passa em nossos dias, nesta administração immoral do mais desumano dos governadores, é o prenuncio do descalabro e da anarchia, que vão caracterizar o seu termino de deixar este infeliz Estado reduzido a uma condição de ruína irremediável.175

Para o jornal, Bacelar não tinha capacidade para governar o Amazonas. E isso era tão

claro que, no ano da eleição estadual, o governador não tinha prestígio de escolher o seu

sucessor perante o presidente da República:

A última pá de terra no prestígio do sr. Alcântara Bacelar estava reservada para o momento da escolha do seu sucessor; não havia quem ignorasse que caso não se desse a intervenção federal, de accordo com artigo 6ª da Constituição, seria imposta pelo Presidente da República, indicando ao sr. Bacelar o nome do candidato a ser apoiando pelos poderes centraes. Foi o que aconteceu o dr. Epitácio Pessoa em telegrama dirigido, hontem, ao sr. Bacelar, impôs três nomes para a próxima sucessão governamental, os quaes são os dos senador Cezar do Rego Monteiro, deputado Antônio Monteiro de Souza, e dr. José Francisco da Cunha Mello.176

Conforme o jornal, Bacelar teria de aceitar essas indicações pelo momento ruim de

seu governo. E que dos três nomes impostos pelo presidente, Bacelar escolheu o senador

Rego Monteiro, porque estaria de olho na cadeira do atual senador:

Parece que a convenção do pseudo partido que apoia a actual administração reunir-se-á sempre no próximo dia 21 do corrente mês a fim de escolher o candidato à sucessão governamental do Estado, antecipadamente que o candidato é o senador Rego Monteiro. Nutrindo a esperança irrealizável de sentar-se numa cadeira federal, a custa de uma torpe negociata política, na ganância doentia de entrar para a Câmara ou para o Senado, o governador não quer saber das responsabilidades grandes assumidas.177

174As críticas formuladas pelo jornal Gazeta da Tarde começavam no ano de 1918 ao governador Bacelar. A 20 de março de 1918, o governador do Estado decretou arbitrária e violentamente a censura para este vespertino que viu a sua liberdade acalcanhada durante seis dias. Instituto Geográfico Histórico do Amazonas (IGHA). Jornal Gazeta da Tarde, 3 de janeiro de 1920, Ano VII, n.º 1.938, p. 1. 175IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 14 de fevereiro de 1920, Ano VII, n.º 1.978, p. 1. 176IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 20 de fevereiro de 1920, Ano VII, n.º 1.982, p. 1. 177IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 16 de abril de 1920, Ano VIII, n.º 2.034, p. 1.

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Para a Gazeta da Tarde, Rego Monteiro seria o salvador de Bacelar, e procurou

desmembrar essa organização política, comentando da renúncia de Rego Monteiro ao cargo

de governador pela indicação de Bacelar:

O gesto do ilustrado senador Rego Monteiro renunciando à indicação de seu nome para o cargo de governador deste Estado, todo aquelle que for amigo desta terra deve ver no acto do nosso brilhante representante federal a manifestação mais acabada de seu acendrado patriotismo, por colocar acima de conveniências pessoais os altos interesses da collectividade amazonense.178

De acordo com esse periódico, Bacelar ainda tinha a pretensão de continuar com a

candidatura de Rego Monteiro, mesmo sem a vontade do senador. Isso pôs em dúvida a

sucessão do atual governo, que para o diário não tinha nenhum outro nome à altura. Mas no

dia 17 de maio, a Gazeta teve a surpresa: Rego Monteiro confirmava sua candidatura:

Francamente fica-se no mundo das congecturas em face de tão extranhavel resolução de ultima hora. Não há mais quem ignore que essa candidatura vem sendo trabalhada de muito longe. Entre o sr.Bacelar e o senador Rego Monteiro tem havido, desde longa data uma assídua correspondência epistolar e telegráfica sobre o assumpto.179

A Gazeta, em resposta à afirmação Monteiro ao cargo de governo no quadriênio

1921 a 1924, tentava explicar a desordem que o Amazonas estava passando, porque os

membros do Partido Republicano Amazonense, do candidato indicado, não apoiavam sua

candidatura: “O senador Rego Monteiro, inteligente, pena que seu nome não tenha attrahido

as correntes políticas oppositivas e não conte com o apoio de todos os bons elementos de seu

partido. epistolar e telegráfico sobre o assumpto”.180

O jornal mostrava a fragilidade da candidatura Rego Monteiro, pois o Partido

Republicano Amazonense estava dividido, e não tinha apoio dos deputados Antônio

Nogueira, Monteiro de Souza, Ephigênio Salles e Dorval Porto. O rompimento desses

deputados com Monteiro estaria ligado, para o matutino, à sua renúncia, o que abriu vaga para

um outro candidato; contudo, depois reconsidera confirmando sua candidatura. Isso teria

revoltado alguns membros do seu partido. Como resposta, conforme a Gazeta, os deputados

apoiam na sucessão governamental a candidatura de Wortingen Ferreira:

178IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 15 de maio de 1920, Ano VIII, n.º 2.061, p. 2. 179IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 17 de maio de 1920, Ano VIII, n.º 2.063, p. 2. 180IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 18 de maio de 1920, Ano VIII, n.º 2.064, p. 1.

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Contra candidatura oficial que não contará qualquer hypothese apoio político-financeiro da união, apresentamos o nome: Wortingen Ferreira, que levará ao Estado toda collaboração moral e material imprescindível do ressurgimento do Amazonas. Nome do candidato contará com o apoio dos representantes federaes, benefícios da collectividade assignado: Antônio Nogueira, Monteiro de Souza, Ephigênio Salles e Dorval Porto. Accordes, senadores Silvério Nery, Lopes Gonçalves.181

Além da confirmação dos deputados da bancada do Partido Republicano

Amazonense, o jornal, que até então não revelava seu candidato, afirmava seu apoio à

bancada da União Republicana Amazonense: “Resta o candidato da nossa bancada – dr.

Wortingen Ferreira, que symbolisa no momento a harmonia da família política amazonense e

preencher os desejos ou o pensamento capital do Presidente da República”.182

A Gazeta, a partir do dia 30 de maio, deixava claro seu apoio ao governo de

Wortingen Ferreira, portanto, à facção Nery, com uma possível ajuda do presidente. E era

mais um jornal que fazia oposição ao governo de Bacelar e sua administração econômica no

Estado.

Já A Reação, do dia 9 de junho, comunicava, na primeira página, que os eleitores

teriam de tomar cuidado com o atual governo, que Bacelar estaria plantando a continuidade de

seu governo pelo senador Rego Monteiro, e que A Imprensa funcionava como propaganda

oficial desse governo. De acordo com o jornal, o governador não respeitava a vontade do

povo e muito menos a fome desse povo, e que só engordou o seu bolso e o povo pagou caro

com fome e miséria.

O periódico chamava a atenção para o povo estar ciente e ver que o governador,

apelando ao povo para votar em Monteiro, fazendo agrados, não tentava mais que iludi-lo,

porque, passando a eleição, voltaria a passar fome de novo. Para o jornal A Reação, o

interesse de Bacelar pelo povo era só na questão do voto no seu candidato e, fazendo-o eleito,

zombaria dos pobres cidadãos e dos seus filhos; que o discurso de Bacelar, dizendo que, dos

três candidatos, Monteiro era o único que salvaria o Estado, era uma propaganda enganosa:

Para elle eleitores do Amazonas! Procurar a maneira de suavizar as vossas penas, de retirar os andrajos de vossas esposas e de vossos filhos, obtendo o meio de vos ser pago o que vos é devido, para o Sr. Bacelar e para – A Imprensa, essa obra que muitos mais de meramente política, é de caridade christã, para elle que está gordo; para o homem que cevou no governo, transaccionando immoralissimamente como os bens do Estado para o Sr. Bacelar e para A Imprensa, eleitores do Amazonas! Trabalhar pelo fim do

181IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 30 de maio de 1920, Ano VIII, n.º 2.075, p. 1. 182IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 30 de maio de 1920, Ano VIII, n.º 2.075, p. 2.

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vosso martyrio é fazer appello ao appetite. Isso fazem agora elles – elle e o seus – enquanto o vosso voto livre, o vosso suffragio é o elemento é a força que os manterá ou os afastará das posições. Passando o pleito eleitoral, quando não precisarão de vós para coisa alguma, que não dirão e que não farão esses algozes, que riem do vosso supplicio e dos vossos filhos? Cuidado eleitores! Hoje, elles ainda estão sob a dependência do vosso voto, e nem assim, enxergam vosso tormento.183

A Reação mostrava-se solidária com o alarme do povo, dizendo-se contrário ao

governo de Bacelar e a sua administração precária, que esquecia o povo e só se lembrava dele

no processo eleitoral.

A Imprensa e o governador Bacelar já estavam em pé de guerra com o avanço do

jornal A Reação e com o seu candidato, juiz Wortingen Ferreira, que estava ganhando apoio

importante e entusiasmo da população amazonense, portanto o governador não tinha como

impedir isso:

O adhesismo ambicioso prossegue pela A Imprensa, numa verdadeira effusão suppurativa. Sente-se a fúria com que é ali defendida a candidatura Rego Monteiro, cuja ascensão à cadeira governamental do Estado é o meio único de se levarem a effeito as enormes dilapidações preparadas ao Amazonas, em cujas rendas reduzidas pretendem haver alimento ao seu fausto. Dia a dia, ao passo que a candidatura Wortingen cresce no conceito da população, a defesa da candidatura Rego Monteiro, desse sonho louco do Sr. Bacelar, mais esperneia, mais se enraiva e mais ejacula parvoíces e grosseiras sobre os adversários.184

O jornal A Reação deixava claro o projeto do diretório da União Republicana

Amazonense, sendo um órgão a mais de opção ao eleitorado, que aparentemente mostrava-se

novo diante dos outros dois matutinos, porém mostrava-se experiente, pois tinha líderes

importantes e seu o discurso era ofensivo ao governo de Bacelar:

Diante disso, o diretório da União Republicana Amazonense, usando de sua prerrogativa partidária, adoptou sem relutâncias essa candidatura, porque além do mais, sendo o candidato da representação federal alheio às facções militantes no Estado, reúne em torno de sua individualidade edificantes elementos de combatividade para resolver, a contento da communhão social, neste momento de agitações, o caso da sucessão governamental.185

Há algumas controvérsias nessa mensagem do diretório da União Republicana

Amazonense, ainda mais quando dizem que eram alheias às facções militantes no Estado.

183BPA, Jornal A Reação, 09 de junho de 1920, Ano I, n.º5, p. 1. 184BPA, Jornal A Reação, 17 de junho de 1920, Ano I, n.º 12, p. 1. 185BPA, Jornal A Reação, 22 de junho de 1920, Ano I, n.º 16, p. 1.

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Como eram alheios se o diretório tinha como liderança política o senador Silvério Nery, que

articulava em torno do discurso do jornal A Reação a campanha do juiz Wortingen? Outro

ponto importante da mensagem no periódico era a questão da individualidade do partido. Um

partido que se fechava em torno de uma bancada e que esta, destituindo-se de pretensões,

conforme o partido foi buscar fora um homem que pudesse vir ao Amazonas, sem ódios nem

preferências no Estado, e ao qual o presidente da República tivesse a confiança requerida por

suas necessidades, de um homem honrado e, para o partido, era o que o Amazonas estava à

espera, para enveredar no trilho de seus grandes destinos.

Esse homem era, para o diretório do partido, Wortingen Ferreira, que deveria ser

sagrado pelo voto na eleição de 14 de julho:

Nestas condições, a indicação de seu nome, neste momento angustioso e de aprehensões para o Amazonas, é o prenúncio de melhores dias para o Estado que desde muito vem marchando para o anniquilamento. Prestigiar, portanto, o candidato da representação amazonense, é testemunhar grande amor a esta terra: suffragar o seu nome nas urnas é amparar o Amazonas de imminente ruína. É assim, o directório da União Republicana Amazonense espera que os seus dignos correligionários e amigos cumpram o seu dever, votando no Dr. Wortingen Luiz Ferreira para o cargo de governador do Estado. As urnas, pois, concidadãos!186

Essa mensagem, publicada em A Reação no dia 22 de junho, foi sendo editada nele

todos os dias, até o pleito de 14 de julho. Tentando todo tempo ganhar a simpatia da

população, A Reação era a propaganda dos interesses políticos do diretório comandado por

Silvério Nery, a função do jornal era desmembrar as bases das outras facções e com isso

conseguir a confiança da população para votar no candidato Wortingen Ferreira.

Para concluir, poderíamos dizer que os sentidos buscados nos discursos, pelos meios

de comunicações, como os jornais O Amazonas, A Reação e A Imprensa , aqui analisados,

tinham interesses particulares dos partidos de suas determinadas facções (Antony, Nery e

Bacelar). Os discursos desses jornais têm a ver não somente com o que foi dito, mas também

com o que não foi dito e com o que poderia ser dito. Devendo-se então perguntar: por que

essas palavras e não outras? Por que essa forma de apresentar a mensagem e não outra?

Perguntas que nos levam a pensar para além do conteúdo.

Para René Rémond, os meios de comunicação não são políticos, mas podem tornar-

se objeto ou veículo da política:

186BPA, Jornal A Reação, 23 de junho de 1920, Ano I, n.º 17, p. 1.

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Com mais forte razão, os meios de comunicação não são por natureza realidades propriamente políticas: podem tornar-se políticos em virtude de sua destinação, como se diz dos instrumentos que são transformados em armas.187

Ainda para o Rémond, se o político é uma construção abstrata, assim como o

econômico ou o social, é também a coisa mais concreta com que todos se deparam na vida,

algo que interfere na sua atividade profissional ou se imiscui na sua vida privada.188

Os jornais O Amazonas, A Imprensa e A Reação foram determinantes nas suas

propagandas, e antes do mês do pleito, apresentavam-se junto com os seus candidatos como

uma solução para os problemas do Estado. Os seus discursos totalmente tendenciosos eram

marcados por seus líderes políticos que tentavam, pelos seus órgãos de imprensa, manipular o

eleitor, dizendo que o seu candidato era o ideal para governar o Amazonas.

187RÉMOND, René. Do Político. In: RÉMOND, René. (org.). Por uma História Política. Tradução: Dora Rocha. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 441. 188RÉMOND, René. Do Político, p. 442.

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3. CAPÍTULO. O RESULTADO DO PLEITO E SUAS

CONTRADIÇÕES DO NOVO GOVERNADOR ELEITO

Com mais forte razão, os meios de comunicação não são por natureza

realidades propriamente políticas: podem tornar-se políticos em virtude de

sua destinação, como se diz dos instrumentos que são transformados em

armas.189

3.1. O pleito de 14 de julho

O mês de julho foi decisivo para os grupos oligárquicos se organizarem no

Amazonas, além de ser o mês da eleição foi também o mês de provocações intensas e

acusações constantes. Os embates internos dos grupos determinaram o andamento da sucessão

governamental, marcada por contrastes e questionamentos de como ela funcionou e quem

foram os beneficiados nesse jogo político de interesses das facções por meio da sucessão

governamental.

Embora enfatizando o papel político desses grupos, não podemos entendê-los em um

processo de rupturas, porque embora os interesses fossem individuais, as organizações

determinavam bem os futuros aliados nas eleições seguintes. As divergências dos grupos

políticos formados por Bacelar, Nery e Antony refletem os comportamentos deles ao chegar

ao poder; um poder organizado em um discurso de salvamento do Amazonas que as três

facções utilizavam nos seus jornais.

Assim, quando ocorreram as eleições em 14 de julho de 1920 em Manaus, para a

escolha do governador, as crises intestinas já haviam começado entre os três partidos.

Faltando alguns dias para a eleição o Amazonas fazia críticas ao candidato Rego Monteiro:

O senador Cesar do Rego Monteiro é inelegível: não renunciou o cargo de senador 3 mezes antes da eleição e até agora não o fez e ausente do Estado se acha há mais de 5 annos. Além do mais, sua saúde é precária tornando-o incapaz para o trabalho. É um vencido da vida. Assim, os votos que por ventura lhe sejam dados, ainda que se elevem em milhões serão perdidos. Recusem-lhe, pois, o voto: comerciantes, industriaes, operários, funccionarios publicos, eleitores independentes, todos, para evitarem a continuação das desgraças do Amazonas. Ás urnas! Pela Salvação do Amazonas. Votem no nome do Marechal dr. Thaumaturgo de Azevedo.190

189RÉMOND, René. Do Político. In: RÉMOND, René. (org.). Por uma História Política. Tradução: Dora Rocha. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 441. 190BPA, Jornal Amazonas, 11 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 68, p. 1.

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Essas críticas ao candidato Rego Monteiro eram justamente contra a questão da

moradia do marechal Thaumaturgo de Azevedo. O senador Rego Monteiro acusava o

marechal Azevedo de não viver no Amazonas no mínimo dois anos, com isso não poderia ser

candidato. E o Amazonas rebatia essas críticas de Rego Monteiro também dizendo de sua

ausência no Estado, e de sua saúde que não era boa, e que também ainda não tinha renunciado

o cargo de senador, logo, de acordo com o jornal, não poderia concorrer ao cargo.191

O mesmo diário um dia antes do pleito denunciava um episódio de corrupção

eleitoral:

Denunciamos à vista de uma carta que recebemos de eleitor de São Gabriel, Rio Negro, o juiz municipal Hermogenes Madanhil, por declarar só serem apurados os votos dados ao senador Rego Monteiro, isto por ordem do governo, os outros candidatos não os teriam custe o que custassem.192

O jornal pedia providências ao governador Pedro Bacelar contra esse ato, e que

estavam tomando notas desses episódios para levá-los ao presidente da República, que, para o

matutino, saberia manter a verdade do regime republicano e a soberania do eleitorado

amazonense. O jornal comentava ainda as possíveis fraudes nessa eleição, dessa forma, pelo

resultado do pleito, se não fosse favorável ao candidato desse noticiário, eles poderiam

recorrer a uma intervenção federal, impedindo o candidato do governador de assumir o

governo.

Por outro lado, A Imprensa, dois dias antes do pleito, só fazia confirmar o prestígio

do senador Rego Monteiro no alto cargo de governador. Trazia notas do Partido Republicano

Amazonense pedindo voto do povo, e alegando que o povo do Amazonas já tinha escolhido

seu candidato:

Partido organizado que é o nosso, tendo altas e grandes responsabilidades, quando escolheu a candidatura Rego Monteiro a Governador do Estado, fel-o consultando os interesses do Amazonas e agindo em obediência ao que é das boas práticas do regime. É uma candidatura nossa, isto é, do Povo, do Estado, uma candidatura que pela sua formação, apoio razão de ser, estabilidade e triunfo, representa a nossa vontade autônoma [...]. Somente o candidato do Partido Republicano Amazonense, o Sr. Senador Rego Monteiro se apresenta sob as exigências honrosas para o commentimento de

191O Jornal Amazonas fazia seu discurso baseado na Constituição de 1913, que dizia: “São inelegíveis para o cargo de governador os parentes consanguíneos e afins, do primeiro e segundo graus, do governador e do seu substituto que estiver em exercício no momento da eleição, ou que o tenha deixado até seis meses antes”. Amazonas. Assembleia Legislativa do Estado. Constituição 1891 a 1989. Manaus: Governo do Amazonas, 2002, p. 30. 192BPA, Jornal Amazonas, 13 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 70, p. 1.

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tão altas funções. Sua personalidade e seu partido tem as credenciais necessárias para a recomendação do candidato [...]. As urnas eleitores, pela victoria do emérito senador amazonense que, com dignidade e altivez, saberá no governo do Estado, agir em defesa dos nossos interesses, trabalhar pela nossa grandeza e prosperidade.193

Os dois jornais, tanto Amazonas quanto A Imprensa, movimentavam-se em torno dos

discursos dos seus respectivos partidos e se organizavam no sentido de promover a

participação do povo. Os dois sempre comentavam que o povo estava apoiando seus

aspirantes ao cargo eletivo.

Lembrando que em momento nenhum os dois jornais especificaram esse “povo”, que

seriam na análise das leituras deles: pequenos comerciantes, operários,194 funcionários

públicos e eleitores independentes.

Para A Reação, os conflitos das oligarquias partidárias entre o Partido Republicano

Amazonense e o Partido Republicano Liberal estavam tomando rumos contraditórios,

principalmente das acusações eleitorais que, conforme o periódico, o resultado era enganoso

visto pelos Amazonas e A Imprensa: “Os factos desenrolados em torno da questão succesorial

do governo, demonstram o contrário do que as duas negregadas famílias oligarchicas

procuram incutir no animo dos de fácil credulidade”.195

A Reação punha-se neutro nos embates dos grupos políticos entre Bacelar e Antony

no caso da sucessão governamental, dizia-se imparcial e que estava mais preocupado em

ajudar as necessidades do povo e que as brigas dessas facções só atrapalhavam os ânimos dos

eleitores. Mas todo esse discurso de neutralidade era contraditório, porque o posicionamento

do jornal era de claro ataque às duas facções e aos dois órgãos de divulgação dos grupos, e

que o próprio A Reação era de um grupo, mas a oratória dele era sempre de ser informativo e

prestador de serviço à população amazonense.

Um dia antes da eleição, A Reação chamava a atenção do povo para o futuro do

Estado, um discurso afirmando o homem certo para ganhar o pleito governamental, o seu

candidato, Wortingen Luiz Ferreira:

Amanhã, o povo do Amazonas vai decidir da sua sorte. Varias vezes temos alludido, nesta coluna à situação de miséria em que nos achamos. Coberto de

193MA, Jornal A Imprensa, 12 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.341, p. 1. 194De acordo com o trabalho de dissertação de Francisca Deusa, os operários apoiaram “na disputa eleitoral pelo governo do Estado, em 1920, o candidato Gregório Thaumaturgo de Azevedo, do Partido Republicano Liberal Amazonense, pela conduta aparentemente progressista deste militar”. COSTA, Francisca Deusa Sena da. Quando viver ameaça a ordem urbana, p. 185. 195BPA, Jornal A Reação, 8 de julho de 1920,Ano I, n.º 30, p. 1.

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débitos, sobre que pesam os encargos de juros vultosíssimos: forçados a effectuar a amortização da divida externa, e a empregar nesse pagamento a metade das nossas rendas annuaes.196

O periódico A Reação alertava o povo das dívidas imensas do Estado, que os juros

eram altos, por falta de uma administração segura do governador, e este queria eleger seu

sucessor. Caso isso ocorresse, a dívida seria paga pelas pessoas mais carentes pelos juros de

dois governantes sem preocupação alguma com o povo; um que estava saindo (Bacelar) e o

outro que queria entrar a qualquer custo no Poder Executivo (Rego Monteiro).

Nesse mesmo pensamento de oratória, encontramos o jornal Gazeta da Tarde, que no

dia 13 de julho publicou uma nota com referência ao apoio do presidente Epitácio Pessoa ao

candidato Wortingen Ferreira, fazendo críticas não só a Rego Monteiro, como também ao

marechal Thaumaturgo de Azevedo:

O eleitorado amazonense sabe que tanto quanto nós, como não ignora que é ao dr. Wortingen Luiz Ferreira que o eminente dr. Epitácio Pessôa se comprometteu ja dar todo auxilio monetario que carece o Amazonas. O eleitorado amazonense não desconhece que, com o marechal Thaumaturgo, o Presidente da República nem sobre o assumpto tratou, como não é novidade tambem para ele que, sobre o caso, foi o próprio senador Rêgo Monteiro quem nol-o divulgou, dizendo positivamente que não nutre esperança de auxilio econômico da parte do governo federal. Diante disso o eleitorado amazonense ou vota no marechal Thaumaturgo de Azevedo ou no senador Rêgo Monteiro, para continuar na vida de miseria que vamos levando, ou vota no dr. Wortingen Ferreira para vêr a casa abastecida, a família alegre e o Estado do Amazonas prospero e feliz.197

O matutino faz um apelo à sociedade pedindo voto ao seu candidato, que só votando

nele o Estado teria recursos do governo federal e auxílio do presidente.

Da mesma forma, o Jornal do Comércio diz a respeito do apoio do presidente da

República, mas sobre o dia do pleito:

O Presidente Epitácio Pessoa ordenou que os respectivos ministros recomendassem a todos os funcionários federaes e officiaes da guarnição, em Manáos, a mais absoluta neutralidade na eleição que, a quatorze do corrente, se vae realizar, no Amazonas, para o cargo de governador do referido estadodo Amazonas.198

196BPA, Jornal A Reação, 13 de julho de 1920, Ano I, n.º 34, p. 1. 197IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 13 de julho de 1920, Ano VIII, n.º 2.114, p. 1. 198CCPA, Jornal do Comércio, 10 de julho de 1920, Ano XVII, n.º 5.817, p. 3.

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O Comércio faz uma apreciação da preocupação do chefe da Nação com a eleição, e

procurou no dia 14 relatar os candidatos e seus respectivos posicionamentos políticos. Não

identificou, no entanto, o seu posicionamento:

Fere-se hoje, em todo o Estado, o pleito para o cargo de governador, no futuro quatriennio. São candidatos: pelo partido situacionista, o senador Cesar do Rego Monteiro, pelos grupos oposicionista colligados, o dr. Wortingen Luiz Ferreira, e pelos políticos liberaes, o marechal Gregorio Thaumaturgo de Azevedo.199

Nessa euforia e ao mesmo tempo ânsia dos partidos políticos e seus respectivos

órgãos, o dia da eleição seria conturbado, pois disputavam a função suprema do Amazonas,

simultaneamente, três candidatos pertencentes a três grupos políticos divergentes naquele

momento. Mas, apesar da concorrência dos três, os jornais registraram na capital uma eleição

sem desordem como afirmaram: o Jornal do Comércio: “na melhor ordem realisou-se,

hontem, em todo o território amazonense, o pleito para a sucessão governamental, no futuro

quatriênio”200 e o Gazeta:

Num pleito libérrimo onde todas as garantias constitucionais foram asseguradas, pelo menos nesta capital [...]. Nenhum dos candidatos concorrentes às eleições tem motivo de queixa quanto a lisura que presidira aos trabalhos electivos, bem como em relação a compressão da liberdade do cidadão [...]. Corroborando a regularidade existente nos trabalhos eleitoraes, e a acção elogiável da polícia, ahi está o venerando militar, o próprio Marechal Thaumaturgo, de que não ouvimos o menor protesto neste sentido.201

Ambos não se declaravam abertamente apoiando nenhum dos concorrentes. O pleito

de 14 de julho correspondeu a uma disputa oligárquica pelo poder que depois se transformou

a vários resultados opostos transmitidos pelos órgãos de imprensa de cada facção que

disputavam pelo alto cargo do Estado.

3.2. Os vários resultados do pleito por meio das facções e seus órgãos de imprensa

Após três dias do pleito, Amazonas, que estava confiante antes da eleição de 14 de

julho, em que o marechal Thaumaturgo de Azevedo seria o novo governador do Estado,

199CCPA, Jornal do Comércio, 14 de julho de 1920, Ano XVII, n.º 5.821, p. 1. 200CCPA, Jornal do Comércio, 15 de julho de 1920, Ano XVII, n.º 5.822, p. 1. 201IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 15 de julho de 1920, Ano VIII, n.º 2.116, p. 1.

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começou a identificar fraudes, em alguns municípios do Amazonas. No caso Parintins, onde

o marechal Azevedo só tinha recebidos seis votos, inferior e muito inferior aos outros dois

candidatos que foram apresentados em A Imprensa: “Eleição para Governador, resultado em

andamento em Parintins – Rego Monteiro 359 votos, Thaumaturgo 6 votos, Wortingen

Ferreira 76 votos”.202 O Amazonas não acreditava nessa apuração e publicou um artigo com o

seguinte tema – “Um appelo ao ilustre Presidente da República”, que dizia:

Não se conformando com a nossa estrepitante victoria, alcançada a 14 de julho corrente [...], andam agora os nossos adversários completamente desorientados, atordoado pelos ruidosos vivas e urhas que têm echoado por toda a cidade, pela eloquente voz de toda a família amazonense, conforme testemunhou o sr. Dr. Governador do Estado [...], adulterando os resultados das eleições procedidas no interior, à medida que vem chegando, cambalachando cada um, a maioria de votos para o seu lado e nos considerando como os menos votados, em logares aonde contamos com a sympathia e a confiança da maior parte dos eleitores. É um processo ignominioso, vil, infamante e deprimente, que de certo, não produzirá o efeito desejado junto ao ilustre Presidente da República, dr. Epitácio Pessoa, a quem confiamos a solução decisiva desse intricado caso, e que, com justiça que illumina o seu espírito de observador, há de concluir repellindo esses manejos illícitos fortes em prática para desnorteal-o e assim, usurparem o triumpho que o nobre eleitorado nos legou [...].203

A acusação do Amazonas ao governador e suas possíveis manobras de fraudes em

favor do seu candidato fizeram com que o periódico apelasse para o presidente da República,

e este, antes da eleição dizia-se neutro ao pleito governamental local, logo o recurso do

Partido Republicano Liberal de revisão de votos não foi atendido e a cada apuração dos

municípios e seções na capital, mostrava o candidato Azevedo com poucos votos, sendo dos

três concorrentes o menos votado. Nem por isso o Amazonas se entregava a esses resultados

duvidosos, como ele afirma:

Accresce que, estando nós convencidos de que a victoria será incontestável do Exmo. Dr. Thaumaturgo de Azevedo, tanto mais quanto os resultados parciaes das eleições, vindos dos municípios do interior, estão visivelmente viciados e contradictorios, por isso que cada um dos dois candidatos se julga com votação superior ao outro, – ainda esperamos as provas finaes da votação real para então, publicamos o total certo de cada alludido candidato [...].204

202MA, Jornal A Imprensa, 16 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.345, p. 1. 203BPA, Jornal Amazonas, 17 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 74, p. 1. 204BPA, Jornal Amazonas, 22 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 78, p. 1.

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O governador tinha prometido paz e calmaria no dia da eleição aos candidatos e seus

partidos, mas só na capital, porque, conforme o jornal Amazonas, nos municípios a corrupção

foi violenta e apuração foi alterada em favor de seu candidato.

A Imprensa, dois dias após a eleição, publicava uma nota dizendo da satisfação do

povo amazonense, onde o governador tinha deixado a lei prosseguir corretamente, que

nenhum tumulto foi relatado no dia do pleito, que as acusações do jornal Amazonas não eram

válidas e que a votação foi sim em paz não só na capital como nos demais municípios:

Sua exc. o sr. Dr. Alcântara Bacelar, honrado governador do Estado, recebeu, ante-ontem do povo amazonense expressiva e valiosa manifestação de apreço que é a victoriosa consagração de sua atitude política, de sua ação governamental e de sua severa obediência da exigência da lei.205

Bacelar, no entanto, não gostava nada das insinuações que faziam de uma possível

aproximação entre o partido de oposição (Republicano Liberal do coronel Guerreiro Antony)

e o seu partido (Republicano Amazonense). De acordo com A Imprensa:

Podemos assegurar que não há, nunca houve acordo político nem de qualquer outra natureza entre o Partido Republicano Amazonense de que é chefe supremo o exmo. Sr. Dr. Alcântara Bacelar e o Partido Republicano Liberal que apresenta o sr. Marechal Thaumaturgo de Azevedo, candidato a governador. Esta declaração que fazemos devidamente autorizado servirá para contrariar a exploração que por ahí anda visando armar ao eleito o que não conseguiram.206

E ainda que o governador estava ciente da vitória do seu candidato, principalmente nas

apurações que se seguiam após quatro dias da eleição, e que o comentário da possível junção

dos partidos Republicano Amazonense e o Liberal, e que ele tinha um acordo político com o

marechal Thaumaturgo eram simplesmente comentários maldosos de seus adversários. Essa

notícia era para confundir o processo da apuração, que, para o governador, era favorável ao

seu candidato e que o jornal A Imprensado seu partido começava a publicar os seguintes

resultados:

Eleição para Governador, resultado parcial – Rego Monteiro 1.320 votos; Marechal Thaumaturgo de Azevedo 732 votos; Wortingen Ferreira 959 votos; apurados nos seguintes municípios – Capital, Manacapuru, Parintins, Porto Velho, Borba, Itacoatiara, Barreirinha, Urucará e Codajás.207

205MA, Jornal A Imprensa, 16 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.345, p. 1. 206MA, Jornal A Imprensa, 17 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.346, p. 1. 207MA, Jornal A Imprensa, 18 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.347, p. 1.

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Para o governador Bacelar, esse resultado só provava a vitória do seu Partido

Republicano Amazonense e do seu candidato, o senador Rego Monteiro, que a votação foi

justa e que os seus adversários não acreditavam na superioridade do partido, que tinha um

concorrente de qualidades honrosas, logo era o vencedor do pleito de 14 de julho:

Através da expressão incontestável da verdade no resultado do pleito de 14 de julho para Governador, a victoria coube ao Partido Republicano Amazonense. Nem era de aguardar resultado diverso nem outro poderia ser a afirmação do eleitorado, visto como o candidato do nosso partido possuidor das qualidades e dos requisitos superiores dos homens públicos [...].208

O Partido Republicano Amazonense exaltava a vitória do senador Rego Monteiro nas

urnas e que a campanha tinha sido vitoriosa. Afirmando que o eleitorado fez a escolha certa

do futuro do Amazonas de prosperidades. A imprensa se carregava de publicar as notas do

partido de já vencedor, antes da própria apuração que se deu no dia 5 de setembro, mostrando

sempre o resultado que se dizia parcial da apuração ao seu candidato:

De todos os pontos do interior do Estado, a todos os instantes chegam telegramas e actas dando o resultado exato das eleições verificadas a 14 do corrente, para a sucessão governamental, reunindo até agora o ilustre candidato do Partido Republicano Amazonense, senador César do Rego Monteiro, maioria tão absoluta que não pode mais haver duvida que é verdade, o governador eleito do Amazonas [...]. Resumo dos resultados da eleição apurados; Capital, Manacapuru, Parintins, Porto Velho, Borba, Itacoatiara, Barreirinha, Urucará, Codajás, Maués, Benjamin Constant, Floriano Peixoto, Moura e Rio Branco. Rego Monteiro 1.864 votos, Thaumaturgo 886 votos, Wortingen Ferreira 1.014 votos.209

N’A Imprensa era o divulgado oficial não só do Partido Republicano Amazonense

como também das intenções do governador de mostrar para a sociedade que o Estado já tinha

um vencedor e este era o seu candidato eleito por maioria absoluta de votos, que o povo assim

o quis. Por outro lado, é bem interessante ser observado o que o Amazonas dizia das

contradições das apurações, principalmente as apresentadas pel’AImprensa e pel’A Reação,

onde cada candidato, Rego Monteiro e Wortingen Ferreira, julgava-se vencedor:

É realmente para admirar o desenvolvimento que entre nós, de algum tempo a esta parte, vem tomando o regimen indecoroso das falsidades, em quase todos os actos de mais relevo social [...]. Referimo-nos ao que alguns jornaes desta capital, destemida e escandalosamente estampam, já nas suas

208MA, Jornal A Imprensa, 18 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.347, p. 1. 209MA, Jornal A Imprensa, 22 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.351, p. 1.

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columnas, já nos seus placards, quanto ao resultado das eleições procedidas no interior do Estado, por ocasião do ultimo pleito que se feriu a 14 do expirante [...]. Vejamos, por acaso, o que a propósito do assumpto aqui vertente, disseram os jornaes, a nossa confreira – A Imprensa deu o seguinte resultado: Rego Monteiro 1.864 votos, Thaumaturgo de Azevedo 886 votos, Wortingen Ferreira 1.014 votos. Nestes algarismos diz a referida folha ter incluído a votação de Manáos, Manacapuru, Parintins, Porto Velho, Borba, Itacoatiara, Barreirinha, Urucará, Codajás, Maués, Benjamin Constant, Floriano Peixoto, Moura e Rio Branco. Já A Reação deu o seguinte resultado: Rego Monteiro 974 votos, Thaumaturgo de Azevedo 835 votos, Wortingen Ferreira 1.669 votos. Inclusive Manáos, Manacapuru, Parintins, Porto Velho, Borba, Itacoatiara, Barreirinha, Urucará (não falam em Codajás, Maués, Benjamin Constant, Floriano Peixoto, Moura e Rio Branco), Lábrea, Urucurituba, Humaythá e Silves. Estas quatro ultimas localidades não foram referidas ainda pela A Imprensa [...]. Como se vê, cada jornal publica apenas o resultado dos logares que mais lhe convem. Quanto as localidades onde seus candidatos tiveram minoria de votos, ou onde as eleições não poderiam ser falsificadas a seu favor, conservam-se quedos e silenciosos, como a esphynge egypcia [...].210

O Amazonas se apresentava como o único noticiário ciente das apurações e que

esperava o momento certo de fazer a publicação do resultado verdadeiro. Preocupava-se ele

em chamar a atenção do povo ao descrédito que os outros jornais faziam no caso da apuração,

tentando ocultar, conforme o jornal, o proveito exato da eleição, quem realmente estava

ganhando. Para o periódico, o público não podia deixar iludir-se pelas falsidades de resultados

de vitória de certos jornais, e que por isso havia as contradições do pleito formulado pel’A

Imprensa e A Reação, onde cada órgão apresentava uma vitória para o seu candidato.

Um dia após a eleição, A Reação também publicava uma nota sobre o processo

eleitoral, afirmando a vitória do seu candidato, o juiz Wortingen Ferreira, uma vitória

esmagadora na capital e que por isso já era reconhecido o novo governador:

O nosso candidato, o último dos três contendores a aparecer na lista, foi aureolado por uma victoria extraordinária cujo maior valor esta na liberdade de que se revestiu a peleja [...]. Entretanto, a victoria da capital decidiu a sorte da eleição. Dissemos muitas vezes que o Dr. Wortingen Luiz Ferreira seria o eleito do povo: e elle o foi – dissemos que será reconhecido e empossado no cargo para que o povo hontem o elegeu: sê-lo-á [...].211

Como afirma A Reação, o pleito na capital foi decisivo para eleger e confirmar o novel

governador. Publicava ele o resultado na capital, mostrando as diferenças dos votos, e mais

210BPA, Jornal Amazonas, 24 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 80, p. 1. 211BPA, Jornal A Reação, 15 de julho de 1920, Ano I, n.º 36, p. 1.

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uma vez, assim como o Amazonas e A Imprensa, era o seu candidato que tinha a maioria dos

votos:

A apuração do pleito de hontem, na capital, às 14 horas estava terminada e conhecida de toda a população, através dos placards da Reação. O Dr. Wortingen Ferreira candidato da bancada amazonense, da União Republicana Amazonense, do município de Manáos [...], havia batido seus competidores, deixando o illustre Marechal Thaumaturgo distanciado de cem votos, e o senhor Rego Monteiro com uma diferença esmagadora de 260 votos [...]. Dr. Wortingen Ferreira 695 votos; Thaumaturgo 595 votos; Rego Monteiro 426 votos.212

A Reação trazia o discurso do Partido da União Republicana Amazonense totalmente

intencionado em controlar o resultado da eleição em favor do seu candidato, e comentando o

repúdio da população ao candidato do governo, o senador Rego Monteiro.

Os três diários, após a eleição, diziam-se vencedores e mostravam resultados sempre

contrários: cada um com sua determinada facção fazia crer que trazia resultados corretos, mas

na verdade era uma maneira de dominar os assuntos da política e de valorizar os seus

candidatos para a sociedade e, principalmente, cada jornal dizendo que a vontade do povo era

ver eleito os seus respectivos representantes. Havia todo um interesse em afirmarem os

concorrentes na capital, onde Manaus correspondia ao centro decisivo para o futuro

governador ser considerado o vencedor do pleito.

As contradições da apuração vão sendo cada vez mais determinantes nos conflitos

diretos dos jornais e seus discursos ofensivos um contra o outro. No dia 27 de julho, por

exemplo, o Amazonas discutia o processo de apuração do dia 14 de julho:

Posto que não tenhamos as provas de falsificação de actas, em alguns municípios do interior, outras temos que nos levam a restabelecer a verdade, em relação ao numero de votos, que coube a cada um dos candidatos: não tendo, portanto, nenhum valor o total publicado pelos jornaes desta capital e muito menos o mandado por telegramas para o Rio de Janeiro, que só agora conhecemos por outros de lá expedidos. D’ahi a nossa demora em protestar contra a fraude, em um pleito que devia correr livremente [...].213

O Amazonas estava discutindo a questão da fraude em alguns municípios do Estado,

como no caso de Parintins, onde houve, de acordo com o jornal, atas falsificadas antes do dia

do pleito e divergências de votos para os candidatos Wortingen Ferreira e Rego Monteiro. Na

apuração desses dois concorrentes em Parintins, a primeira parcial indicava que “Rego

212BPA, Jornal A Reação, 15 de julho de 1920, Ano I, n.º 36, p. 1. 213BPA, Jornal Amazonas, 27 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 82, p. 1.

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Monteiro tinha 359 votos contra 74 para Wortingen, na segunda apuração Wortingen tinha

371 votos contra 76 de Rego Monteiro”.214

Os periódicos da capital, para o Amazonas, estavam em contradições, por isso não

tinham como saber quem era que estava ganhando a eleição. Para o jornal, com todas essas

incoerências, o que estava valendo era a apuração do dia 15 de julho:

Na capital dando como verdadeiros os votos publicados pela A Imprensa, antes que tivéssemos recebidos os resultados das 22 secções, acceitamos o que ella afirmou em seu número de 15 de julho e foi confirmada por telegrama do dr. Bacelar ao Presidente da República e a imprensa do Rio. Por essa publicação oficial é este o resultado: Marechal Thaumaturgo 631; Dr. Wortingen 625 votos; Senador Rego Monteiro 462 votos.215

O jornal Amazonas, na primeira publicação oficial sobre o resultado da eleição, levou

em consideração a capital e confirmava o resultado publicado pel’A Imprensa, mas conforme

ele, era nos municípios que estava a grande confusão e controvérsias da eleição. Além de o

jornal citar o exemplo de Parintins, citava ainda o município de Tefé, em que A Imprensa

divulgava que Rego Monteiro tinha 114 votos contra 50 de Thaumaturgo e 22 para

Wortingen. Para o Amazonas, a parcial dos votos em Tefé correspondia “114 para o marechal

Thaumaturgo contra 50 do senador Rego Monteiro”.216

Em contradição as notícias do Amazonas, publicadas no final de julho, A Imprensa se

defendia com o discurso do Partido Republicano Amazonense, dizendo que o pleito foi igual

em todos os municípios, que a oposição não queria reconhecer a vitória do seu partido e que o

posicionamento do jornal Amazonas, no desespero de sua derrota, inventava infâmia e não

aceitava a vitória do senador Rego Monteiro:

[...]. Nas eleições da capital, como nos demais municípios de que já temos noticia, o Partido Republicano Amazonense conquistou o mais lidimo triumpho, correndo calmamente sem empecilhos á livre manifestação da vontade do eleitorado, não temos necessidade de adulterar os resultados da eleição do dia 14, mesmo porque a nossa victoria está assegurada, ampla e legitimamente no insophismavel testemunho dos documentos referentes ao processo eleitoral [...].217

O resultado da eleição era confuso, porque cada jornal de interesse de sua facção se

denominava o primeiro nas apurações. Mas observando outros periódicos como, por exemplo,

214BPA, Jornal Amazonas, 27 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 82, p. 2. 215BPA, Jornal Amazonas, 27 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 82, p. 1. 216BPA, Jornal Amazonas, 31 de julho de 1920, Ano LVI, n.º 86, p. 1. 217MA, Jornal A Imprensa, 31 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.360, p. 1.

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o Comércio, que divulgou o seguinte resultado das 22 secções da capital, apontava:

“Wortingen 695 votos, Thaumaturgo 595 votos, Rego Monteiro 426 votos”.218 O Comércio

colocava em primeiro lugar, em Manaus, o candidato Wortingen Ferreira, demonstrando uma

possível vitória desse candidato, ou seja, do grupo Nery.

Outro jornal que também trazia o resultado geral do pleito na capital, dizendo que o

candidato Wortingen estava eleito e aproveitava para fazer crítica da derrota do concorrente

de Bacelar e sua desorganização administrativa de governo, era o Gazeta da Tarde:

Pleito de hontem e o resultado das vinte e duas secções – Dr. Wortingen Luiz Ferreira 695 votos; Marechal Thaumaturgo de Azevedo 596 votos; Senador Rego Monteiro 426 votos. [...]. A estrondosa victoria do integro juiz dr. Wortingen Ferreira e a considerável votação obtida pelo Marechal Thaumaturgo de Azevedo, vieram confirmar as nossas previsões de que o sr. Bacelar havia de pagar caro a sua desconsideração para com os seus amigos e correligionários e a sua ausencia absoluta de tino e de moralidade na direcção dos negocios publicos [...].219

O resultado dos jornais, do Comércio e Gazeta da Tarde, era idêntico, pondo em

primeiro lugar Wortingen Ferreira. Ainda mais do Gazeta, que no dia 30 de julho já dava

como certa a vitória de Wortingen. Além de publicar o resultado da capital, formulava agora o

resultado total também do interior: “Resultado das vinte e duas secções da capital e do

interior: Dr. Wortingen Luiz Ferreira 1.792 votos; Marechal Thaumaturgo de Azevedo 961

votos; Senador Rego Monteiro 1.072 votos”.220

Mas ao mesmo tempo em que mostrava a vitória do seu candidato, a Gazeta da Tarde

acusava o governo de fraude eleitoral no interior do Estado:

No interior do Amazonas campeou e campea infrene. Cada resultado de eleição daquela procedência traz a marca visível da falsificação. O orgão official do governo não publica uma apuração dos municípios que não esteja inquinada de vícios[...].221

O jornal, mesmo dizendo da fraude nos municípios do Estado, confirmava a vitória de

Wortingen Ferreira:

218CCPA, Jornal do Comércio, 15 de julho de 1920, Ano XVII, n.º 5.822, p. 1. 219IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 15 de julho de 1920, Ano VIII, n.º 2.116, p. 1. 220IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 30 de julho de 1920, Ano VIII, n.º 2129, p. 1. 221IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 3 de agosto de 1920, Ano VIII, n.º 2.132, p. 1.

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O que tranquillisa a todos amazonenses dignos deste nome, e áquelles que escolheram esta terra para seu segundo berço, é que o pivot do pleito ferido a 14 de julho findo é a eleição da capital. Pelo resultado libérrimo della está incontestavelmente eleito o dr. Wortingen Ferreira, portanto, ao poder competente cabe agora reconhecel-o e proclamal-o governador, satisfazendo alem de um direito sagrado, as aspirações publicas [...].222

A Gazeta tentava de todos os meios dar a vitória a Wortingen Ferreira, fazendo

pressão ao governo, que só publicaria o resultado final no dia 5 de setembro.

Para enfrentar a oposição, o médico e deputado estadual da época, Alfredo da

Matta,223que era o grande articulador político do Partido Republicano Amazonense e diretor

d’A Imprensa, formulava discurso na imprensa que o grande vencedor da eleição era o

senador Rego Monteiro e que, junto com Bacelar, determinavam uma oratória de

convencimento do eleitorado por meio dos resultados parciais que publicava, tentando a todo

tempo derrubar os seus opositores:

A fim de que se conheça o resultado completo das eleições procedidas a 14 de julho findo para governador do Estado, faltam o de poucos municípios, o que não alterará o resumo geral de votação que estamos publicando. Por esses resultados, o candidato do nosso partido, o sr. Senador Rego Monteiro, obtendo a maioria dos votos, está eleito governador do Estado e quando tal asseguramos é baseado na verdade eleitoral, nas provas documentadas da votação havida nos collegios eleitoraes e na manifestação positiva e incontestável da vontade popular que se verificou a favor da personalidade respeitável do digno representante amazonense, candidato do Partido Republicano Amazonense à sucessão governamental do Estado [...]. Resultado apurados: Rego Monteiro 2.608 votos; Wortingen Ferreira 1.255 votos; Marechal Thaumaturgo 1.003 votos.224

O Amazonas rebatia esses discursos de vencedor do pleito formulado por Alfredo da

Matta. O coronel Guerreiro Antony, junto com o coronel Bento Brasil e Souza Brasil,

procurava desarticular o discurso de convencimento do jornal A Imprensa. Os articuladores do

Amazonas, principalmente o diretor político, coronel Bento Brasil, publicava notas

desmentindo os resultados editados pel’A Imprensa:

Já nos cansa a paciência e nos abala os nervos o acervo de doêstos, mais ou menos encobertos, e as mentiras que reedita A Imprensa, diariamente, em defesa da candidatura do seu vencido da vida, ao cargo de governador deste

222IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 3 de agosto de 1920,Ano VIII, n.º 2.132, p. 1. 223O Dr. Alfredo da Matta foi eleito deputado à Assembleia Legislativa do Estado durante os anos de 1916 a 1920, ocupando o cargo da Presidência, de 1917 a 1920. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 56. 224MA, Jornal A Imprensa, 6 de agosto de 1920,Ano IV, n.º 1.366, p. 1.

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Estado; e é por taes deslealdades em contrário ao nosso procedimento sempre cortez e sincero, que não podemos mais calar o nosso protesto contra os processos inconfessaveis que têm lançado mão esses adversários que assim pretendem encobrir a verdade e imbair a bôa fé dos incautos, afirmando, como têm feito, que o seu candidato já tendo obtido a maioria dos sufrágios, está de certo, eleito governador! Quando se sabe que isto é uma mentira que revolta ao mais frio temperamento. Porquanto se conhece positivamente que de muitos municípios vieram actas falsificadas e de outro onde houve eleição regular, foi o senador Rego Monteiro derrotado vergonhosamente, começando por esta capital, sede do governo [...].225

Os chefes políticos do Amazonas, comandados por Guerreiro Antony, atingiam o

governo de Bacelar criticando a sua administração e, principalmente, seu candidato Rego

Monteiro. Já o chefe político d’A Imprensa, médico e deputado Alfredo da Matta, era acusado

pelos líderes do Amazonas de apresentar números fantásticos e contraditórios, furtando votos

de outros candidatos para aumentar os do seu, apresentando também somas erradas. O

Amazonas pregava um discurso de combate às fraudes d’A Imprensa, mas também não

deixava de serem contraditórios os resultados apresentados pelo Amazonas, que reconhecia

divergências na votação, essencialmente nos municípios do Estado. O jornal só contava os

votos quando recebia os documentos de comprovação dos municípios dos eleitores que

tinham realmente votado:

[...]. A nossa votação relativa sommente à Capital, Manacapuru, Porto Velho, Borba, Itacoatiara e Barreirinha, únicas que consideramos validas, dá o seguinte resultado: Rego Monteiro 824 votos; Wortingen Ferreira 708 votos; Marechal Thaumaturgo 762 votos. Mais uma vez se verifica a divergência na votação, sendo certo que cada vez mais se vae aggravando o que mostrará concludentemente quando recebermos os documentos dos outros municípios. Donde se segue que algumas das eleições do interior não podem ser consideradas validas – umas por não terem sido realisadas, cujas actas são falsificadas e outras por haver duplicatas que também não merecem fé.226

A Reação, comandado pelo seu diretor chefe, Sr. Elviro Dantas Cavalcante,227que era

o personagem principal do jornal, trazia um discurso também de vencedor e tentava

convencer o eleitorado que o juiz Wortingen Ferreira tinha ganhado a eleição. Para o

225BPA, Jornal Amazonas, 7 de agosto de 1920, Ano LVI, n.º 92, p. 1. 226BPA, Jornal Amazonas, 7 de agosto de 1920, Ano LVI, n.º 92, p. 2. 227“O Dr. Elviro Dantas Cavalcante, tratando-se de política, em cuja atividade havia entrado com independência e desassombro, distou-se na oposição, de acordo com a sua índole, não combatia para alcançar um posto elevado no planalto do Olimpo da administração ou representação. Nunca se apresentou como candidato, mas sempre ajudando os correligionários do seu partido [...], por mais de 40 anos exerceu o jornalismo sendo, por vezes, redator-chefe de jornais notáveis, entre outros: Amazonas, O Jornal (fase antiga), Diário de Manaus, Jornal do

Comércio, O Liberal, União Portuguesa”. BITTENCOURT, Agnello. Dicionário Amazonense de Biografias, p. 199-200.

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Amazonas, A Reação também reconhecia divergências na votação, mas aclamava o seu

candidato legítimo governador, apresentava números absurdos de voto e contradições na

apuração, além de somas erradas entre Rego Monteiro e Wortingen Ferreira:

[...]. As sommas dos resultados parciaes para cada candidato publicado pela A Imprensa até o dia 17 de julho são as seguintes: Rego Monteiro 1.356; Wortingen 889; Thaumaturgo 768. Agora sommando os resultados publicados pela A Reação para os mesmos municípios teremos: Rego Monteiro 883; Wortingen Ferreira 1.306 e Marechal Thaumaturgo 774.228

Para A Imprensa, os discursos dos chefes políticos d’A Reação e do Amazonas eram

de perdedores, que queriam provocar distúrbios na sociedade. Para o líder político Alfredo da

Matta, facções ambiciosas jogavam desonestamente, publicando resultados errôneos e

confusos, mas a vitória já tinha sido realizada e a oposição, desesperada, só restava para ela

criticar os resultados publicados pel’A Imprensa:

Quem quer que deseje perder o seu precioso tempo e lança a vista sobre o que escrevem os jornais que combatem a candidatura Rego Monteiro e atiram todas as settas envenenadas contra a situação amazonense, verificará, desde logo, que ideal algum, alto e grandioso, ou qualquer escopo alevantado anima o troço revoltado contra as bôas normas e contra os verdadeiros princípios republicanos. Relegando tudo para o plano pessoal e ingrato, na salvaguarda apenas dos pequeninos interesses que prejudicam os da collectividade, os nossos adversários não discutem, não arrasam elevação, não expõemideias, não defendem princípios, mas insultam e injuriam, descendo-a todas as baixezas, arrastando-se por todas as indigrudades. [...]. Que continuem a atividade da opposição, na grita desesperada da insensatez e da infâmia, é o signo inilludível da sua derrota, é o traço eloquente do naufrágio de suas aspirações indefensáveis. À nós, basta-nos a nossa victoria, que o voto popular tornou um facto incontestável e a opinião pública prestigia e assegura. E, conquistando o triumpho que conquistamos, nem os apercebemos da debandada que já se verifica, na egrejinha desmantelada desse macabro ajuntamento opposicionamento que se dissolve a olhos vistos.229

Os três diários procuravam confundir a opinião pública fazendo crer que os seus

candidatos eram vitoriosos. Como verificamos primeiramente no A Reação, que publicou uma

nota do resultado só confirmando a vitória de Wortingen Ferreira:

O pleito de 14 de julho. Eleição para governador do Estado. A victoria do candidato dos partidos colligados. O resultado das vinte e duas secções da

228BPA, Jornal Amazonas, 7 de agosto de 1920, Ano LVI, n.º 92, p. 2. 229MA, Jornal A Imprensa, 9 de agosto de 1920, Ano IV, n.º 1.369, p. 1.

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capital foi o seguinte: Dr. Wortingen Luiz Ferreira 695 votos; Marechal Thaumaturgo de Azevedo 595 votos; Senador Rego Monteiro 426 votos. Do interior – Parintins, Labrea, Barreirinha, Porto Velho, Itacoatiara, Manacapuru, Borba, Urucurituba, Humaythá, Silves, Urucara, Canutama, Coary, Teffe, São Gabriel, Barcellos e Floriano Peixoto: Dr. Wortingen Luiz Ferreira 1.312 votos; senador Rego Monteiro 757 votos; Marechal Thaumaturgo de Azevedo 403 votos. Resumo: Wortingen Ferreira 2.007 votos; Rego Monteiro 1.183 votos; Thaumaturgo de Azevedo 998 votos.230

Depois temos A Imprensa, não distante do jornal A Reação, também publicava uma

nota confirmando a vitória de Rego Monteiro:

[...]. Resumo dos resultados na Capital, Manacapuru, Parintins, Porto Velho, Borba, Itacoatiara, Barreirinha, Urucara, Codajas, Maués, Benjamin Constant, Floriano Peixoto, Moura, Rio Branco, Humaythá, Manicoré, Teffe, Coary, Canutama, Carauary e São Fellipe: Rego Monteiro 3.028 votos; Wortingen Ferreira 1.317 votos; e Marechal Thaumaturgo 1.084 votos.231

Em 21 de agosto, o Amazonas dizia que trazia também o resultado final da eleição

com o título “As Eleições Verdadeiras”:

As eleições verdadeiras – O resultado final da eleição procedida no dia 14 de julho nesta Capital e em Itacoatiara, Urucará, Silves, Barreirinha, Urucurituba, Canutama, Labrea, Manacapurú, Teffé, Moura, Bacellos, Bôa-Vista, Borba, Humaythá, Porto Velho e São Felipe, é o seguinte: Marechal Dr. Gregório Thaumaturgo de Azevedo 1.398 votos. Senador Dr. Cezar do Rego Monteiro 1.331 votos; Dr. Wortingen Luiz Ferreira 1.046 votos.232

Os chefes políticos dos órgãos de imprensa da época tentavam mostrar uma

imparcialidade que era impossível, tanto no Amazonas quanto na A Reação e A Imprensa. Os

resultados da eleição e a discussão do candidato eleito nos matutinos eram para refutar a

opinião dos que votaram em determinados concorrentes, os interesses dos jornais era chamar

a atenção para o seu candidato individual.

O Amazonas dizia que o marechal Thaumaturgo era o candidato do povo, usava as

contradições dos jornais dos outros candidatos para mostrar a briga de poderes entre Nery e

Bacelar, e que esses dois não respeitavam a vontade popular, de ver no governo o marechal

Thaumaturgo. Enquanto A Reação queria desmascarar o governo de Bacelar e os interesses do

coronel Guerreiro Antony de comandar o governo, se caso Thaumaturgo fosse eleito; já A

230BPA, Jornal A Reação, 14 de agosto de 1920, Ano I, n.º 65, p. 1. 231MA, Jornal A Imprensa, 27 de agosto de 1920, Ano IV, n.º 1.387, p. 1. 232BPA, Jornal Amazonas, 21 de agosto de 1920, Ano LVI, n.º 104, p. 1.

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Imprensa destacava a força do governo de Bacelar, mostrando que a eleição foi justa e sem

fraude, e que prevaleceu a vontade do povo de ver no governo o senador Rego Monteiro.

As discussões desses jornais em torno do novo governador registraram bem a

conjuntura política do Amazonas em 1920, onde as facções usavam mecanismos de poderes

para se articularem na questão da sucessão. O que estava por detrás dela não era o simples

governador eleito e, sim, a nova facção que iria se formar e comandar o Estado por mais

quatro anos; os interesses envolviam poderes de comando como nos casos: aspectos

econômicos que envolviam o fortalecimento da retração da borracha, de uma possível ajuda

do governo federal e principalmente do político, que poderia gerar uma nova hegemonia de

facção para fortalecer-se na década de 1920.

3.3. O posicionamento do governo federal na escolha do novo governador

Na situação de verdadeira penúria em que se encontrava o Amazonas, não se

compreendia os três candidatos sem a certeza de merecer do governo federal o apoio moral e

financeiro, sem o qual seria impossível uma administração proveitosa aos interesses do

Estado.

Um candidato de conciliação poderia fazer com que o apoio financeiro da União

viesse desde já, ao passo que havendo luta esse apoio só viria depois de empossado o futuro

governador e se este mereceria a confiança do presidente.

Como olhava o governo federal para o Amazonas no caso da sucessão governamental

de 1920? O presidente Epitácio Pessoa, no início de 1920, dizia-se neutro em relação às

disputas pelo governo estadual. Mas era uma neutralidade invisível, porque no fim Epitácio

pôs no comando do Estado o então senador Rego Monteiro.

O historiador Edgar Carone diz a respeito de vários conflitos sobre disputas

governamentais em algumas partes do Brasil, como o no Amazonas e na Bahia, que pareciam

idênticas pelos embates oligárquicos, e que o presidente se dizia neutro nessas eleições de

1920, em determinados Estados. Para Carone, essa neutralidade não existiu porque Epitácio

Pessoa ditava as ordens de cada governador eleito.233

Após a Primeira Guerra Mundial, as oligarquias brasileiras já não conseguiam

manter o controle político da Nação. A República, que de acordo com a Constituição de 1891,

deveria ser democrática, representativa e federativa. Havia ela, no entanto, se transformado,

233CARONE, Edgar. A República Velha, p. 338.

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na prática, em uma imensa fazenda administrada de conformidade com os interesses político-

econômicos das oligarquias rurais.234O sistema político da República Velha era totalmente

controlado por elites regionais, que controlavam eleições, partidos e juízes, utilizando a

violência e a corrupção. Nem mesmo essa estrutura política, no entanto, conseguiria frear as

transformações que na década de 20poria em xeque a política do “café com leite”.

De acordo com Anita Prestes, as dificuldades de importação facilitavam o

crescimento de estabelecimentos industriais, principalmente no eixo Rio-São Paulo. Com

isso, aumentou o contingente de população urbana. As forças sociais cresciam e se

manifestavam contrárias à política oligárquica da República Velha.235 Fatores determinantes

para a derrocada da Primeira República, contudo, foram as divisões das oligarquias no interior

do bloco dominante. O longo predomínio das oligarquias paulista e mineira passou a ser

contestado de maneira frontal por grupos de outras regiões, notadamente no Rio Grande do

Sul, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro:

Na sucessão do presidente Rodrigues Alves, que viera a falecer, em janeiro de 1919, logo no início do mandato que sequer assumira, ainda fora possível aos grupos oligárquicos dominantes alcançar a unidade em torno do nome de Epitácio Pessoa, neutralizando assim a tentativa de uma nova campanha civilista, levada a efeito por Rui Barbosa. Mas na sucessão do próprio presidente Epitácio, marcada para março de 1922, a cisão da classe dominante torna-se inevitável. Certamente, a conjuntura de crise econômica e social contribuía para o agravamento dos conflitos interoligárquicos.236

Edgar Carone apresentou algumas abordagens como o início dos problemas militares –

no caso a revolução – usando o termo que utiliza de 1920 para a Bahia. Para o autor, a

oposição dos grandes Estados tornou-se, em pouco tempo, uma atitude crítica que levou o

governo a um impasse sem solução. Ao mesmo tempo em que se dão os choques iniciais entre

governo e as lideranças civis e começam os primeiros desentendimentos com os militares,

surge o problema da sucessão baiana.237Aparentemente igual a todos os problemas

234JANOTTI, Maria Lourdes. Coronelismo: uma política de compromisso, p.10. 235PRESTES, Anita Leocádia. Os militares e a reação republicana: as origens do tenentismo, p. 24. 236PRESTES, Anita Leocádia. Os militares e a reação republicana: as origens do tenentismo, p. 25. 237De acordo com o presidente Epitácio Pessoa: “Quaes os factos que attestavam a subversão da forma republicana na Bahia? Não teriam acaso sido eleitos os poderes legislativo e executivo do Estado? Oppunha-se o Governador ao livre exercício dos outros poderes constitucionaes? Estava absorvendo-lhes as atribuições, ou recusando execução aos seus actos ou decisões? Procurava a Bahia separar-se da União? Disputavam entre si o poder dois governadores ou duas assembléas? Estava o governo do Estado tolhendo aos cidadãos o livre exercício dos seus direitos? Foi só depois da eleição de governador que se começou a falar em intervenção. Foi, portanto, o pleito que occasionou a subversão da ordem republicana federativa no estado”. Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba–BCUFPB. Mensagem apresentada ao Congresso Nacional na Abertura da Terceira Sessão da Décima Legislatura pelo Presidente da República Epitácio Pessoa. Rio de Janeiro, de 3 de maio de 1920, p. 90.

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sucessórios, logo ele se complicou e levou as graves lutas armadas no Estado. O que piora a

situação era a pretensa neutralidade de Epitácio Pessoa a todo o momento proclamado por

ele.238

Assim como na Bahia, essa neutralidade era apresentada aqui no Amazonas,

principalmente pelos jornais das facções: A Reação, A Imprensa e o Amazonas:

[...]. Conferenciei com o Presidente Epitácio Pessoa, affirmando-me S. Excia, não intervir na questão das candidaturas à successão governamental, telegraphando neste sentido ao governador, agradecendo a honra conferida, recommendando também assegurar a liberdade do eleitorado. Declarou-me apoiar um candidato capaz de resolver a crise que atravessa o Estado, sem preocupações partidárias [...], confio na lealdade do Presidente da República. Podem publicar manifesto. Saudações. Thaumaturgo de Azevedo.239

O Amazonas, de todos os meios que lhe eram possíveis, tentava mostrar ao eleitorado

amazonense que o presidente não tinha candidato próprio à sucessão local, e com isso tentava

fazer do marechal Thaumaturgo candidato do governo federal:

[...]. No presente momento em que o Estado sem credito, se debate na mais profunda agonia, somente um espírito superior e enérgico como o do Marechal Thaumaturgo de Azevedo poderá empunhar as rédeas da administração porque, de certo, merecerá os applausos unânimes do Paiz e apoio incondicional do Chefe da Nação [...].240

Esse periódico apostava em um discurso da péssima administração de Bacelar,

chamando sempre a atenção do eleitorado, sendo que o marechal Thaumaturgo era o único

que teria crédito junto ao governo federal. O Amazonas, antes do pleito, só confirmava em seu

favor o apoio do presidente da República e que a neutralidade dele representava também o

apoio para o Thaumaturgo.

Epitácio Pessoa, por outro lado, não dizia nada sobre a administração de Bacelar, aliás

fazia comentários relevantes da borracha:

[...]. Continúa a ser precario o estado dessa industria que, apesar de tudo, ainda constituiu o anno passado, embora com valor menos considerável, o segundo dos nossos productos de exportação. O desenvolvimento das plantações inglesas do Oriente representou para nós um concorrente formidável, apoiado na barateza da mão d’obra e na facilidade das colheitas, resultante da concentração das plantas em zonas próximas. Não obstante

238CARONE, Edgar. A República Velha, p. 339. 239BPA, Jornal Amazonas, 25 de abril de 1920, Ano LVI, n.º 1, p. 1. 240BPA, Jornal Amazonas, 25 de abril de 1920, Ano LVI, n.º 1, p. 2.

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isso, a nossa fina do Pará continuou a lograr uma preferencia que nunca foi abatida [...]. O governo não se descuida desse problema, que forma a base principal da vida de dois Estados e do território do Acre, e procurará dar-lhe o auxílio que estiver em suas forças [...].241

O presidente deixou claro seu apoio à produção da borracha e esperava que esse

comércio ainda melhorasse, mas em nenhum momento, quando discursou no Congresso

Federal a sua mensagem anual, comentou sobre a sucessão governamental local, e muito

menos sobre seu possível apoio a determinados grupos políticos do Estado.

Mas nessa disputa de conseguir o auxílio do presidente, A Imprensa não estava de

fora. Bacelar, na sua mensagem lida à Assembleia Legislativa, já comentava da possível ajuda

do presidente, onde, na fala do governador, o Estado tinha lhe dado uma grande quantia de

votos no pleito presidencial do ano de 1919:

O Amazonas, numa devida homenagem ao preclaro estadista, lhe sufragou o nome na referida eleição (no dia 13 de abril de 1919), dando-lhe significativa maioria, sob a effectivação das garantias legaes, que o meu governo sempre assegura para tornar respeitada a livre manifestação da vontade popular [...].242

O governador tentava chamar a atenção do presidente quanto a sua vitória presidencial

contra Rui Barbosa, onde o Estado ajudou-o a consagrar-se presidente da República, com isso

tentando conseguir o apoio de Epitácio Pessoa. A Imprensa comentava também, assim como o

Amazonas, da neutralidade do presidente, dizia que o governo federal iria manter a máxima

neutralidade no pleito em tela, que a declaração já era esperada de uma atitude de absoluta

personalidade firme do presidente, no caso da sucessão governamental amazonense e que o

jornal já tinha anunciado várias vezes essa neutralidade.243

Antes da eleição, A Imprensa publicou uma nota dizendo da satisfação do presidente

Epitácio Pessoa em reconhecer o senador Rego Monteiro como um homem honrado e um

ótimo senador da República:

No Senado como se vê, o sr Senador Rego Monteiro nosso candidato a governador do Estado com sua ilustração, com sua respeitabilidade, reflectiu a palavra da nação, tornando victoriosa o desejo do sr dr. Epitácio Pessoa, na alta comarca do pais. São pois, os fatos e não as palavras a mostrar que o candidato do partido Republicano Amazonense, goza de absoluta confiança

241BCUFPB, Mensagem apresentada ao Congresso Nacional na Abertura da Terceira Sessão da Décima Legislatura pelo Presidente da República Epitácio Pessoa. Rio de Janeiro, de 3 de maio de 1920, p. 140-141. 242MA, Mensagem do Governador Pedro Bacelar à Assembleia Legislativa, de 10 de julho de 1920, p. 5. 243MA, Jornal A Imprensa, 7 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.336, p. 1.

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do sr. Presidente da Republica, o que se evidencia por forma tão eloquente.244

Para A Imprensa, o presidente reconhecia o valor determinante de Rego Monteiro em

ser o novo governador. Conforme o jornal, Epitácio aceitava com bons olhos a candidatura do

senador para o cargo de governador.

Além de A Imprensa, Amazonas, o jornal A Reação, da bancada amazonense no

Congresso Federal, também afirmava o apoio do presidente da República para o candidato

Wortingen Ferreira:

É consoante ao desejo do primeiro magistrado da nação, que almejava á testa dos negócios do Amazonas um homem de bem e alheio aos partidos, capaz de sobrepor os altos interesses da administração as subalternidades da politicagem, surgiu à candidatura Wortingen, em inteiro accordo com as sugestões presidenciaes [...].245

De acordo com A Reação, o candidato do desejo do presidente era o juiz Wortingen,

sendo ele o indicado do presidente, e tal discurso vai sendo publicado até o dia do pleito.

Os três diários titulavam-se como seus os candidatos do presidente. Conforme Carone,

a neutralidade presidencial era confusa, porque Epitácio não era neutro às eleições, tinha o seu

posicionamento, mas se mostrava neutro. Com isso, as facções internas locais se

aproveitavam para o aclamarem os seus candidatos como o escolhido do presidente:

O caso é que Epitácio Pessoa, embora afirmando neutralidade intervém contínua e parcialmente, o que leva as partes a desaprovarem sua ação. Em maio, o presidente da República é procurado e lhe pedem que encontre um candidato de conciliação, pois Rego Monteiro é um dos indicados e a oposição procura obstar seu nome; ainda mais, afirma os oposicionistas que se ele persistisse na sua indicação procurariam um outro nome para apoiar.246

A indicação de Rego Monteiro ao governo do Estado se apresentava como uma

continuidade do governador Bacelar, e as facções locais, como a do Silvério Nery, não

aceitavam tal continuidade. A facção Nery era a grande bancada representativa do Amazonas

no Congresso.

Epitácio Pessoa, então, procurava de todos os meios acalmar os embates partidários,

mas sua conduta de ser mostrar neutro só provocava distúrbios nos partidos, uma vez que os

244MA, Jornal A Imprensa, 13 de julho de 1920, Ano IV, n.º 1.342, p. 1. 245BPA, Jornal A Reação, 8 de julho de 1920, Ano I, n.º 29, p. 1. 246CARONE, Edgar. A República Velha, p. 343.

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três se consideravam por ele apoiados. O resultado da eleição, para Carone, é boicotado pelo

governo, o que levou cada uma das três partes a se reunir em espaços diferentes e declarar-se

vencedora. Dessa vez, forma-se triplicidade de Assembleia, mas a verdade era que o

governador mandou ocupar, pela força, o prédio da Assembleia e conseguiu convencer

Epitácio a não intervir no Estado, como fora pedido por Thaumaturgo de Azevedo. Diante dos

fatos e conforme Carone, da “simpatia federal”, Rego Monteiro tornou-se governador do

Amazonas.247

E o que iria fazer o interventor no Amazonas? Em tese, o que se queria com a

intervenção é que fosse impedir a posse do candidato governista de Bacelar e empossar o

adversário, no caso, Thaumaturgo de Azevedo. Mais tarde, as pretensões moderaram um

pouco; o interventor deveria anular a eleição e mandar proceder outra. De maneira que o que

os apóstolos do constitucionalismo pleiteavam é que o governo da União, pelo só fato de

afirmar um grupo político, que vencera a eleição de governador, interviesse violentamente,

depusesse o governador em exercício, assim como o Poder Legislativo, e assumindo funções

de ambos, anulasse a eleição e convocasse novamente os comícios eleitorais. Mas a

intervenção desejada pela oposição não ocorreu.

Há também algumas contradições que temos de analisar sobre a questão do termo que

Carone utilizou – simpatia federal – para eleger Rego Monteiro, porque o Amazonas também

apresentava a simpatia do seu candidato com o presidente:

[...]. Votando todo nesse respeitável nome Thaumaturgo de Azevedo um homem de envergadura moral reconhecida, um homem de pulso forte como o dr. Epitácio Pessoa, cuja promessa de respeito a soberania popular aos seus direitos do cidadão livre e independente, já está empenhado junto ao nosso candidato. Portanto, confiado na sublime expressão do pensamento do sr. Presidente da República, o povo poderá, patrioticamente votar no nome do dr. Thaumaturgo de Azevedo.248

O Amazonas, assim como A Imprensa e A Reação, declarava-se com a simpatia do

presidente e este, no início, confirmava-a. Mas após o pleito, afirma Carone, o presidente

tinha sido convencido por Bacelar a declarar Rego Monteiro governador para acabar com as

controvérsias da apuração. De acordo com Eloína Monteiro, o eleito tinha sido Wortingen

Ferreira, mas Bacelar boicotou o resultado eleitoral.249 Monteiro utilizou a mesma pronúncia

247CARONE, Edgar. A República Velha, p. 344. 248BPA, Jornal Amazonas, 28 de abril de 1920, Ano LVI, n.º 4, p. 1. 249SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p.47.

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de Carone – boicote e convencimento de Bacelar ao presidente a declarar Rego Monteiro

governador.

Neste trabalho, objetivamos investigar os acontecimentos partindo de questões que

haviam sido descuradas pelos autores que trataram da temática. Por exemplo, o que levou

Bacelar a convencer o presidente a declarar Rego Monteiro governador? Eloína Monteiro não

deixou isso muito claro; enquanto Edgar Carone explica que era simpatia, mas uma simpatia

duvidosa, já que Epitácio dizia isso para os três candidatos. A situação do Estado era

turbulenta em 1920. Pela primeira vez se reuniram três candidatos ao cargo de governador, as

facções eram divididas e o governador não tinha como controlá-las. Carone nos diz que

“então caberia ao chefe da Nação determinar o novo governador e este optou pelo candidato

do governador Bacelar para pôr fim às dissensões partidárias”.250

O cenário nacional do ano de 1920, no entanto, era confuso. Conforme Carone,

Epitácio Pessoa, representante do pequeno Estado da Paraíba, assumiu o poder num clima

generalizado de confiança e otimismo, quando as oligarquias dominantes de São Paulo e

Minas Gerais o haviam escolhido como candidato de conciliação, aceito também pela maioria

dos demais grupos oligárquicos regionais; o Amazonas era um deles.

As dificuldades econômicas advindas da crise desencadeada em 1920, aliadas aos

laivos de independência do presidente em relação a essas mesmas oligarquias, que o levavam

a tentar resistir às imposições feitas, principalmente pelos interesses ligados à cafeicultura,

contudo, contribuíram decisivamente para o desgaste e o isolamento político do primeiro

mandatário da Nação.251 Resistir às pressões da burguesia cafeeira de São Paulo, que contava

com o apoio dos grupos dominantes de Minas Gerais, era, enfim, difícil, pois esses setores

detinham o poder político na Primeira República. Estava-se em plena vigência da política do

café com leite. E Epitácio Pessoa, que havia sido eleito por esses grupos econômicos, deveria

fazer a política deles, muito mais numa conjuntura de grave crise da cafeicultura nacional.

Assim, o governo federal acabaria intervindo a favor dos interesses de São Paulo e Minas

Gerais.

Já na sua mensagem lida ao Congresso Nacional em 1921, Epitácio fez uma grave

crítica à política brasileira daquele momento:

A nossa educação política não consagrou ainda a pratica de pôr-se o Presidente da República em frequente contacto com o povo, para explicar os seus actos e defender-se das increpações que lhe são feitas. Por outro lado,

250CARONE, Edgar. A República Velha, p. 339. 251CARONE, Edgar. A República Velha, p. 339.

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nem sempre resta tempo ao Governo para informar a opinião imparcial ou a imprensa bem orientada da verdade dos factos, que a leviandade ou a má fé se comprazem em deturpar. Finalmente, a noção que tenho dos meus deveres não me permite assalariar jornaes para tel-os ao serviço incondicional da administração, e evitar assim que para eles o meu governo seja realmente uma decepção e um desastre [...].252

As eleições de 1920, que ocorreram em várias regiões do país, eram determinantes

para a questão da sucessão presidencial de 1922. Os interesses federais eram de influências

estaduais. Para Carone, a oposição dos grandes Estados a Epitácio Pessoa se fez de modo cada

vez mais radical, o que levou a tentar unir os Estados do Norte para contrabalançar o poderio

legislativo do Sul.253 Epitácio tinha consciência do desgaste que sofreu e de suas causas, mas

manifestou publicamente a oposição contra aqueles que o elegeram e o criticaram.

3.4. Amazonas e suas contradições na sucessão governamental de 1920

A conjuntura política do Amazonas na sucessão de 1920 foi marcada por

diferenciações de facções, tanto que no mês de setembro, onde sairia o resultado final do

pleito de 14 de julho, os grupos oligárquicos se determinavam vencedores. Com isso, temos

uma confusão acerca desse governador eleito, porque o governo de Bacelar e seus membros

partidários tinham anunciado escolhido o senador Rego Monteiro:

Considerando que sommadora os votos constantes das autheticas e boletins, é este o resultado total da eleição effectuadas em todo o Estado – Desembargador César do Rego Monteiro (2.941) votos; Doutor Wortingen Ferreira (1.185) votos; Marechal Doutor Gregório Thaumaturgo de Azevedo (1.000) votos. Considerando que é insofismável a maioria de votos obtidos pelo candidato desembargador César do Rego Monteiro, mesmo que se admittisse, como simples argumento, que somente fosse apurável o resultado das secções eleitoraes fiscalizadas pelos dois outros candidatos, porquanto ainda sim, aquelle candidato teria grande maioria sobre os seus competidores, evidenciados no seguinte resultado – César do Rego Monteiro 1.773 votos; Wortingen Ferreira 1.036 votos; Thaumaturgo de Azevedo 954 votos.254

Por outro lado, a facção Nery reconhecia no seu órgão partidário e no seu jornal A

Reação a vitória de Wortingen Ferreira: “Resultado Geral da Capital e Interior – Dr.

252BCUFPB, Mensagem apresentada ao Congresso Nacional na Abertura da Primeira Sessão da Décima Primeira Legislatura pelo Presidente da República Epitácio Pessoa. Rio de Janeiro, de 3 de maio de 1921, p. 6. 253CARONE, Edgar. A República Velha, p. 340. 254MA, Jornal A Imprensa, 6 de setembro de 1920,Ano IV, n.º 1.397, p. 1.

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Wortingen Ferreira 2.062 votos; Senador Rego Monteiro 1.747 votos; Marechal Thaumaturgo

de Azevedo 1.118 votos”.255

Já o Amazonas apresentava o seguinte resultado que dava a vitória da eleição ao seu

candidato: “Marechal Thaumaturgo de Azevedo 1.398 votos; Senador Rego Monteiro 1.331

votos; Wortingen Luiz Ferreira 1.046 votos”.256

Temos então três candidatos eleitos, ou que se diziam eleitos, mas com o domínio

central em mãos e com a questão política em jogo federal, coube ao presidente Epitácio

Pessoa reconhecer como legítimo governador o senador Rego Monteiro e, com isso, a facção

Bacelar se julgava vencedora da disputa.

Bacelar atacava as outras facções, acusando-as de desordem e querendo provocar

distúrbios no Amazonas. Conforme ele, a eleição foi tranquila e livre, sendo o senador Rego

Monteiro eleito no dia 14 de julho e a apuração o confirmava para governador. As outras

facções não aceitavam Monteiro eleito e tentavam provocar revoltas na capital do Estado.257

Para o Amazonas, o governador estava sendo indecoroso, porque não justificava a sua

ação incorreta, era acusado pelo jornal de praticar ações contrárias aos seus discursos, de que

as eleições seriam em paz, sem fraudes e que iria prevalecer a vontade popular. A prática, no

entanto, do governante era de controvérsias, diz o Amazonas, porque mandando o governador

assegurar o direito de votos e a liberdade no dia do pleito, a sua ação foi de suborno e de

coação que foram as medidas empregadas: “Se a coação física plena e propriamente dita, não

houve as ameaças constantes de perda de empregos e de perseguições, foram comuns”.258

Os três grupos oligárquicos, que disputavam as eleições, formularam uma disputa

acirrada, onde pelos seus periódicos faziam suas propagandas de favorecimentos próprios,

com isso a sucessão foi conturbada e cheia de contestações nas suas apurações diárias.

Assim, verificando-se o resultado do dia 5 de setembro, pela Gazeta da Tarde,

encontramos mais resultados contraditórios, em relação A Imprensa e ao Amazonas, mas de

igual acordo ao d’A Reação:

A Assembleia Legislativa do Estado, apoiada pela União Republicana Amazonense, reuniu hoje, ás 9 horas, em sessão especial sob a presidência do coronel Bernardo de Azevedo da Silva Ramos, afim de apurar as eleições procedidas no dia 14 de julho para governador do Estado, no próximo quatriennio.

255BPA, Jornal A Reação, 5 de setembro de 1920, Ano I, n.º 81, p. 1. 256BPA, Jornal Amazonas, 3 de setembro de 1920, Ano LVI, n.º 114, p. 1. 257MA, Jornal A Imprensa, 8 de setembro de 1920, Ano IV, n.º 1.399, p. 1. 258BPA, Jornal Amazonas, 24 de setembro de 1920, Ano LVI, n.º 132, p. 1.

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Feita a referida apuração, foi verificado o seguinte resultado: dr. Wortingen Luiz Ferreira 2.062 votos, senador Cezar do Rego Monteiro 1.747 e Marechal Gregório Thaumaturgo de Azevedo 1.118 votos. Nessas condições, foi reconhecido e proclamado governador o dr. Wortingen Luiz Ferreira.259

O Gazeta não aceitava a publicação oficial da vitória do candidato do governo, que só

foi eleito naquele momento por causa da força do governador, mas que o partido da União

Republicana Amazonense, junto com alguns membros da Assembleia, reconhecia Wortingen

Ferreira governador:

[...]. O Sr. Pedro Bacelar encerrou hoje a sua comédia eleitoral, mandando reconhecer o sr. Rego Monteiro à força governador. Desde hontem, á noite, o edifício da Assembleia Legislativa do Estado foi transformado em verdadeira praça de guerra, havendo sido impedida a entrada ás pessôas que não gosavam das sympathias do governador, inclusive os deputados dissidentes. Numerosa força postada em frente do edifício obrigava a retrocederem todos aquelles que não reconduziam o cartão que a polícia distribuiu aos seus preferidos [...].260

O jornal criticava que nem todas as pessoas podiam participar do processo do

resultado do pleito, e que o governador fazia de tudo para impedir a verificação correta da

eleição. O periódico focou apenas a disputa de Rego Monteiro e Wortingen Ferreira, em

nenhum momento citava o marechal Azevedo no pleito.

Percebemos que o Gazeta da Tarde, assim como A Reação, trabalhavam juntos para

desarticular o governo de Bacelar e mostravam também uma conjuntura política do pleito

eleitoral duvidosa, posto que, nas suas publicações diárias, sempre o resultado do pleito era

favorável ao candidato Wortingen Ferreira, ou seja, ao grupo liderado por Nery.

O Jornal do Comércio, por sua vez, publicava que, da mesma forma que os outros

periódicos, o resultado da eleição com votos opostos. Ele, um dia após o resultado final do

pleito, apresentou nas suas páginas, do dia 6 de setembro, três descrições de candidatos eleitos

começando por Rego Monteiro:

[...]. Assim: considerando que todas as autheticas e boletins examinados pela comissão se acham revestidos das formalidades legaes, evidenciando, além disto, que, na sua maioria as secções eleitoraes a que se referem foram fiscalizadas. O resultado total da eleição effectuadas em todo o Estado: Desembargador Cesar do Rego Monteiro, magistrado aposentado, residente em Manáos, dois mil novecentos e quarenta e um votos (2.941); doutor

259IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 5 de setembro de 1920, Ano VIII, n.º 2.161, p. 1. 260IGHA, Jornal Gazeta da Tarde, 5 de setembro de 1920, Ano VIII, n.º 2.161, p. 2.

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Wortingen Luiz Ferreira, magistrado em disponibilidade, residente na Capital Federal, mil cento e oitenta e cinco votos (1.185); Marechal dr. Gregório Thaumaturgo de Azevedo, engenheiro militar, residente na Capital Federal, mil votos (1.000).261

O Comércio apresentou a mesma votação d’A Imprensa, para declarar Rego Monteiro

governador, mas ao mesmo tempo também apresentava a vitória da eleição ao candidato

Wortingen Ferreira:

A esse tempo também do resultado de Rego Monteiro pela Assembleia, houve outra reunião política. No prédio numero quinze da rua Conselheiro Paes de Andrade, presentes seis deputados da União Republicana Amazonense, coronéis Bernardo Ramos, Hildebrando Antony e José da Costa Crespo, drs. Elviro Dantas, Epaminondas de Albuquerque e Francisco Malveira, assumiu a presidência o coronel Bernardo Ramos, secretariado pelos drs. Elviro Dantas e Francisco Malveira. Em seguida reconheceram e proclamaram governador do Estado, no futuro quatriênio, o dr.Wortingen Luiz Ferreira [...].262

O Comércio não publicava os números da votação para declarar Wortingen eleito, só

apresentava uma reunião do partido da União Republicana Amazonense, impondo o seu

candidato ao cargo de governador, a mesma coisa foi referida ao marechal Thaumaturgo pelo

periódico:

[...]. No prédio numero trinta e um da rua Luiz Antony, onde funciona a Assembleia guerreirista, realisou-se hontem ás nove e meia horas a sessão para o fim de serem apuradas as eleições para os cargos de governador deste Estado [...]. Presidiu os trabalhos o coronel Bento Brasil, secretariado pelos srs. Benjamin Valle e Jayme Ramos, Doriano de Castro e Souza Guimaraes. O presidente nomeou duas comissões afim de elaborarem seus respectivos relatórios [...]. A primeira comissão apresentou o seu parecer ás onze horas e a segunda, ás doze horas, ambas reconhecendo o governador do Estado para o quatriênnio vindouro respectivamente o marechal Gregório Thaumaturgo de Azevedo.263

Esse mesmo matutino não apresentou o candidato eleito, mas deixou transparecer que

o resultado final do dia 5 de setembro era contraditório, mais ainda que na sua publicação só

apareceu a contagem dos votos de Rego Monteiro, e dos outros dois candidatos, não. Era

como se o jornal quisesse dizer que os votos válidos só pertenciam ao candidato Monteiro,

logo, o mais confiante eleito dos três concorrentes.

261CCPA, Jornal do Comércio, 6 de setembro de 1920, Ano XVII, n.º 5.875, p. 1. 262CCPA, Jornal do Comércio, 6 de setembro de 1920, Ano XVII, n.º 5.875, p. 1. 263CCPA, Jornal do Comércio, 6 de setembro de 1920, Ano XVII, n.º 5.875, p. 2.

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O jornal trazia ainda a opinião do presidente Epitácio Pessoa, dando como certa a

vitória do senador Rego Monteiro:

Nos círculos políticos considera-se liquidado o caso do Amazonas. O presidente Epitácio Pessoa, sem nenhuma interferência no assumpto, deixou que o caso politico tivesse a sua solução dentro da ordem constitucional no Estado. O senador Rego Monteiro embarcará para Manáos, no dia cinco de dezembro, afim de assumir, no dia primeiro de janeiro futuro, o exercício do cargo de governador, para o qual foi eleito e reconhecido.264

E mais, conforme o periódico, o presidente iria garantir a ordem pública da cidade de

Manaus, sem tumulto no dia da posse de Rego Monteiro:

O presidente Epitácio Pessoa, depois de uma longa conferencia com o senador Rego Monteiro, mandou chamar ao palácio do Catête o dr. Pandiá Calogeras, ministro da guerra, com quem combinou medidas no sentido de ser garantida pela tropa federal a ordem publica, em Manáos, até o dia da posse do senador Rego Monteiro, no governo do Amazonas.265

O Jornal do Comércio, após o pleito, procurou fazer uma altercação de debates do

novo governador, mostrando, a todo tempo, conflitos em torno do nome de Rego Monteiro.

Além de fazer discussões aleatórias da política amazonense, transcrevendo sempre na sua

escrita uma disputa eleitoral do possível governante.

Os jornais das facções funcionavam como órgãos informativos, alguns deles

preocupados com as informações que afetavam a vida da comunidade. Com isso, as pessoas

de alguns municípios podiam reclamar pela falta de atenção por parte dos governantes,

questões tais como o extrativismo, agricultura, educação, saúde, meios de transportes etc. Mas

o foco dos três jornais, em geral, era defender os grupos que no momento detêm o poder

político ou aqueles que pretendiam alcançá-lo.

Geralmente optavam por um discurso de contraposição ao poder como os jornais A

Reação e o Amazonas contra A Imprensa do governador Bacelar, defendendo a moralização

dos seus interesses, assim como uma maior participação daqueles que se encontravam à

margem das decisões políticas.

Os discursos dos periódicos eram totalmente tendenciosos e manipuladores, os jornais

A Reação e o Amazonas faziam críticas às pessoas de destaque no cenário político do grupo

264CCPA, Jornal do Comércio, 30 de novembro de 1920, Ano XVII, n.º 5.958, p. 3. 265CCPA, Jornal do Comércio, 5 de dezembro de 1920, Ano XVII, n.º 5.963, p. 3.

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oligárquico de Bacelar, bem como ao comportamento de dirigentes de repartições públicas e

outras instituições do governo.

Já o periódico A Imprensa, do governador, procurava desarticular esses jornais, e os

três eram dotados não raro de um sentido de crítica, que merecem uma análise mais

aprofundada. É muito complicado tornar o discurso dos políticos concretos nesses jornais,

analisar as altercações deles, principalmente, é muito difícil e foram os discursos das facções

nos periódicos que ficaram à mercê dos interesses dos políticos em ganhar a simpatia do

eleitorado amazonense na eleição de 1920.

Mas na República Velha e nas organizações políticas do Amazonas, o discurso

ideológico funcionava como mecanismo de dominação, essencialmente do Estado, do qual se

encontrava o governador. Assim, caberia às outras facções criticar o governo, tentando

convencer o eleitorado a votar numa mudança, mas elas faziam parte dos embates

oligárquicos do Amazonas nos anos 20. O que estava em jogo no campo político da sucessão

governamental era a dominação de uma facção sobre a outra.

O que existiu localmente foi a predominância total das oligarquias estaduais (liderado,

por exemplo, pela família Nery), o que não significou completa identidade entre todas elas. O

traço de diferenciação existe e aparece acentuado no seu comportamento, forma política e

domínio.

Podemos perceber no Amazonas, no campo político da sucessão, traços de crescente

autonomia partidária e ideológica das lideranças políticas do ano de 1920, no caso: Guerreiro

Antony. Apesar de persistente na política de longo tirocínio, Guerreiro representou sempre

uma figura de proa, sem ascendente explicável na direção das correntes da opinião pública,

seu nome serviu de bandeira e foi explorado por muitos políticos, como Jonathas Pedrosa no

processo eleitoral de 1912 e depois pelo marechal Thaumaturgo de Azevedo em 1916. Já

Nery representou sempre um líder político do Amazonas, que vinha desde o final do Império

até o final da Primeira República, elegendo-se e indicando candidatos eleitos. Bacelar, no

entanto, era um incidente político de Silvério Nery após as eleições de 1916, quando a chefia

do Partido Republicano Amazonense passou a ser do atual governo.

A terminologia, porém, usada por eles– democracia e voto livre – foi no interesse de

ganhar confiança dos eleitores e por isso camuflaram divergências que cresciam, mas não

significavam posições sociais antagônicas, que aparecem claramente nas suas manifestações

políticas e partidárias.

Os grupos oligárquicos locais nasceram de exigências especificamente contrárias a

interesses de certa facção que dominavam o Estado durante a década de 1910. Com os

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governos de Jonathas Pedrosa e Pedro de Alcântara Bacelar, formam-se grupos contrários a

esses governos, contra suas administrações e principalmente por facções, como a do coronel

Guerreiro Antony, que estava fora das coligações partidárias de Pedrosa e Bacelar, que depois

houve rompimento entre Bacelar e Nery. Com isso, vamos ter no Amazonas, na eleição de

1920, três grupos oligárquicos contrários entre si, mas não de rupturas, porque os interesses

individuais de cada grupo eram pelo governo no período da sucessão. Após esse período, as

articulações políticas eram retomadas entre os governos e entre as facções que fizeram

oposição.

Todos os grupos políticos e seus comandantes, conforme Eloína Monteiro,

“procuraram artimanhas e interesses de ganhar o pleito”.266 A par disso, temos as

identificações das facções, com a fluidez das situações, com uma pluralidade de estilos e a

multiplicidade de resultados, que cada jornal direcionava para si resultados favoráveis. De

acordo com Edgar Carone, a fragmentação duvidosa dos votos explicava a desordem e a

perplexidade que foi tal disputa governamental e a contestação dos grupos políticos

“querendo a todo modo o apoio do presidente da República, Epitácio Pessoa”.267 Mas fazendo

as análises necessárias, percebemos que não houve um racha entre os partidos locais, e sim

uma separação momentânea, porque elas organizavam-se juntas e apresentavam certas

divergências partidárias contrárias, havia essa separação, em que se originavam atitudes e

atividades próprias dos partidos. Suas convicções independentes é que ajudam, em parte, a

explicar certas rebeldias extemporâneas.

O limite da ação e de independência desses partidos, porém, formando facções em

relação a certos governos, é a questão mais complexa. Eles aparecem claramente nas

reivindicações contrárias ao governo de 1920, de Pedro Bacelar, e que as facções oscilavam

entre um maior ou menor radicalismo, nunca, porém, preconizando o fim do domínio

existente, mas sempre pedindo maiores aberturas políticas e sociais.

266SANTOS, Eloína Monteiro dos. A Rebelião de 1924 em Manaus, p. 47. 267CARONE, Edgar. A República Velha – Evolução Política (1889-1930), p. 340.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo, a chave principal dos questionamentos foram os discursos ideológicos

dos partidos, pelos seus jornais, dentro de um estado de interesses próprios e relacionados a

grupos dominantes de oligarquias ambiciosas por poderes locais, no recorte cronológico da

pesquisa do ano 1920, no Amazonas. O historiador Serge Bestein explica que, para a maioria

dos membros de um partido político, “a base doutrinária da ideologia não é algo evidente, na

maior parte dos casos, é sob a forma de uma cultura política difusa que a ideologia se impõe

aos membros de uma formação”.268

Por isso, surgem os partidos políticos representando partes da sociedade diante do

Estado, procurando influir nas decisões deste em favor de interesses, projetos e reivindicações

sociais de que são portadores. Ele começa a fazer publicidade de determinadas ideias e

programas de ação, tendo em vista que um determinado público se reconheça nesse espelho

ideológico, participando de um jogo de projeção, identificação e poder. Mas é preciso

examinar com mais cuidado a questão do poder, pois uma coisa é o poder do Estado em sua

forma repressiva, outra coisa são as diversas relações de poder que existem entre as inúmeras

instâncias da sociedade, e mesmo nas relações cotidianas que os indivíduos mantêm entre si.

O estudo aqui apresentado foi produzido tendo por meio algumas fontes especificas

de pesquisa, no caso os jornais da época, contudo, procurando ter uma visão crítica que, como

sendo um meio influente, os periódicos foram analisados em seu papel de formador da

opinião pública, ligado a interesses variados e como órgão da denominada “imprensa livre”,

faziam parte do jogo político e do poder da época. Nesse contexto, foram analisados em

vários momentos com destaque as suas diferenças de discursos de um para o outro.

E no desenvolvimento deste trabalho, o objetivo proposto foi de examinar as bases

do sistema político predominante no Amazonas no início da República, sendo que, para isso,

era necessário identificar os elementos que dão sustentação à formação e afirmação do poder

das facções, que fazem os elos de mecanismos para se entender até que ponto determinada

facção almejava o poder, ou seja, o governo.

Na análise das facções, incluiu-se, também, a dinâmica do jogo de interação entre o

poder do Estado e os interesses oligárquicos coincidentes ou conflitantes. Tem-se, como

princípio norteador, o fato de que os balanços das eleições dos grupos, no período que se

examina, quase sempre favorável aos interesses ou acordos entre Nery e Bacelar, escondem-

268BESTEIN, Serge. Os Partidos. In: RÉMOND, René. (org.). Por uma História Política. Tradução: Dora Rocha. 2.ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 88.

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se também difíceis negociações entre as respectivas oligarquias, muitas vezes ampliada pela

participação de outras oligarquias, no caso a de Antony. A impossibilidade de acordo das

facções abre espaço a inúmeros conflitos e, finalmente, o confronto aberto, de que resulta a

ruptura do sistema oligárquico verificado nas eleições de 1920.

No Amazonas, a disputa pelo poder estava mais institucionalizada. Os partidos das

facções funcionavam como uma estrutura de agregação e congregação de interesses de grupos

familiares dominantes. No período que vai de 1910 até 1924, digladiaram-se as facções

políticas lideradas por Silvério Nery, Antônio Bittencourt, Jonathas Pedrosa, Guerreiro

Antony e Pedro Bacelar.

Era um embate entre a facção política que estava no poder e da oposição. Essa última

resumia-se a um grupo que retrucava as afirmações do outro, denunciando também sua

inoperância e corrupção. Tais reações eram mascaradas pela moralização política, sempre

atacando a situação; e como esta exercia o poder, era por tudo responsabilizada.

Com isso, procuramos analisar os conflitos entre as facções e os conchavos dos

grupos dominantes que disputaram o poder, a partir de 1920, que tinham diferentes

concepções e, consequentemente, diferentes expectativas sobre seu destino político, a partir

do posicionamento de determinados jornais na escolha do novo governador.

Os jornais Amazonas, A Imprensa e A Reação eram determinantes nas suas

propagandas e, antes do mês do pleito, apresentavam-se junto com os seus candidatos como

uma solução para os problemas do Estado; seus discursos, totalmente tendenciosos, eram

marcados por seus líderes políticos que tentavam, por seus órgãos de imprensa, manipular o

eleitor, dizendo que o seu candidato era o ideal para o governo estadual.

Esses órgãos de imprensa vão conviver lado a lado com o jornalismo político ou a

imprensa de opinião, que vão também intitular-se órgãos independentes. Uma análise mais

profunda, porém, dos conteúdos de suas matérias, editoriais e artigos demonstram que apenas

se utilizavam de uma forma mais sutil de conquistar o apoio da opinião pública. E nessa linha

podem ser enquadrados justamente os jornais Amazonas, A Reação e A Imprensa.

O Amazonas servia de base ao órgão do Partido Republicano Liberal, pertencente ao

coronel Guerreiro Antony, e fez oposição sistemática ao governo de Bacelar. Utilizando-

se,assim, pois tinha todo um cunho político na sua linguagem para tentar eleger o marechal

Thaumaturgo de Azevedo. Em suas leituras, percebemos a criação de um salvador, uma vez

que o jornal tentava de todas as formas convencer o povo que o seu candidato era o melhor.

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E nesse item procuramos estabelecer o foco do jornal A Imprensa, que funcionava

como elemento-chave para a candidatura de Rego Monteiro. Esse jornal trabalhava

diretamente em favor dos interesses do governador Bacelar.

Já na análise de A Reação, percebemos que ele mesclava as questões das atividades

políticas do Amazonas com as situações precárias da administração do governo de Bacelar.

Portanto, seu discurso era para desarticular a campanha de Rego Monteiro diante do governo

federal, permitindo assim afirmar que o melhor candidato ao governo era o do seu partido, o

senhor Wortingen Ferreira. Mas o jornal A Reação não estava sozinho nas críticas contra

Bacelar, tinha a seu favor a Gazeta da Tarde que, sendo um jornal vespertino de Manaus,

dizia-se admirado com a estima do povo e que tinha influência diretamente na marcha dos

negócios políticos, administrativos, econômicos e sociais do Estado.

O Amazonas, por sua vez, dizia que o marechal Thaumaturgo era o candidato do

povo, usava as contradições dos jornais dos outros candidatos para mostrar a briga de poderes

entre Nery e Bacelar. Enquanto A Reação queria desmascarar o governo de Bacelar e os

interesses do coronel Guerreiro Antony, em comandar o governo, caso o marechal

Thaumaturgo fosse eleito. Já A Imprensa destacava a força do governo de Bacelar, mostrando

que a eleição foi justa, sem fraude e que prevaleceu a vontade popular de ver no governo o

senador Rego Monteiro. Como podemos analisar cada grupo disputava o poder do governo

utilizando discurso de convencimento ou por vezes discurso competitivo.

Uma vez que a imprensa se baseia na relação do discurso ao convencimento do

leitor, entender esse discurso jornalístico possibilitou-nos identificar o estudo da linguagem e

a escrita que os jornais selecionados nos propuseram. Com isso, tentamos estabelecer alguns

critérios a respeito dos principais componentes do discurso, como fala ou narrativa, que são os

significados históricos presentes no imaginário de quem os elabora.

Cada discurso é, assim, uma representação do imaginário no qual seu autor está

inserido. Ou seja, um discurso não é fruto de opiniões e visões particulares, mas uma partícula

do imaginário dominante que abarca cada indivíduo e pode ser usado para reformular as

relações sociais.

Com isso, percebemos os conflitos entre os jornais e, principalmente, entre as

facções e seus interesses na sucessão governamental; e que as discussões acerca desse novo

governador foram marcadas por conflitos de resultados.

Este trabalho visa demonstrar as articulações internas da política amazonense no ano

de 1920, em que vamos encontrar, pela primeira vez, oposições fortes ao cargo de

governador. Verificando que a sucessão governamental foi marcada pelos discursos

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contraditórios dos jornais que colocaram a população em dúvida quanto à escolha do melhor

candidato e quanto aos resultados.

Os resultados desse pleito eleitoral tão tumultuado, no entanto, foram marcados por

uma série de irregularidades. Ambos os lados se acusavam de forjar atas, coagir eleitores,

enfim, de lançar mão de todos os meios ilícitos para conseguir a vitória de seus candidatos.

Assim, coube ao presidente determinar o novo governador. Por essa escolha, percebemos a

existência de conchavos dentro da República Velha que a historiografia regional não deixou

muito claro em entender quem seria realmente o eleito.

Os conflitos das facções permeiam as bases oligárquicas do Amazonas, que passou

durante a Primeira República unida em torno de um único nome. Com as dissensões no ano

de 1910, as oposições se afirmam contra postulados mecanismos de domínio dos Nery. Com

isso, encontramos três grupos se digladiando pelo governo estadual.

As controvérsias dos grupos oligárquicos, em determinar quem seria o melhor

candidato para o Amazonas, provocaram uma formação política de separação de determinadas

facções dentro dos favores do contexto da Constituição Federalista de 1891, em que o peso da

escolha das organizações partidárias permitia a descentralização administrativa e a maior

autonomia dos Estados. Com isso, o Amazonas desejava ganhar força diante do poder central.

Neste estudo, procuramos especificar as facções políticas do Amazonas de 1920, que

nasceram de exigências especificamente contrárias a interesses de certas facções que

dominavam o Estado durante a década de 1910. Tentamos, assim, demonstrar suas convicções

independentes que ajudam, em parte, a explicar certas rebeldias extemporâneas.

Propomos com isso neste trabalho uma melhor análise pelas discussões teóricas dos 30

primeiros anos da República no Amazonas, expressando-se de uma ordem em que cada

oligarquia local queria ampla liberdade para dominar o Estado; portanto, essa conjuntura

marcou os traços políticos locais no contexto da Primeira República, onde as lutas políticas no

Estado não estavam isoladas desse período e nem estiveram desembaraçadas das decisões do

poder central.

As fontes analisadas, sobre a questão da conjuntura política na sucessão

governamental do Amazonas, no ano de 1920, são as raízes da problemática dos

questionamentos, das reflexões necessárias para procurar nas entrelinhas do objeto de

pesquisa espaços abertos às discussões.

Todas essas considerações só confirmam quanto é importante entendermos os

significados impregnados em termos e expressões utilizados pela História, uma vez que as

palavras carregam sentidos que são definidos historicamente. Conhecer os significados por

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trás dos conceitos é conhecer a historicidade das palavras, a forma pela qual foram entendidas

ao longo do tempo por diferentes sociedades; é aprofundar o conhecimento da própria

História, entendendo como ela age sobre os indivíduos pela produção, na maioria das vezes

imperceptível, de significados.

Finalmente, poderíamos dizer que os sentidos buscados nos discursos, pelos meios de

comunicações como os jornais: Amazonas, A Reação e A Imprensa, tinham interesses

particulares dos partidos de suas determinadas facções (Antony, Nery e Bacelar). Os discursos

desses jornais têm a ver não somente com o que foi dito, mas também com o que não foi dito

e com o que poderia ser dito. Devendo-se então perguntar por que essas palavras e não outras?

Por que essa forma de apresentar a mensagem e não outra? Perguntas que nos levam a pensar

para além do conteúdo.

A especificidade do tema engloba, ou procurou englobar, conforme Marc Bloch269 e

Lucien Febvre, uma “história-problema”. Um problema de perceber o obscuro da sucessão

governamental do Amazonas de 1920. Ao perguntar no presente pelo passado, a História tenta

responder à inquietude da busca do sentido de nossa vida individual e da coletividade. Assim,

afirma o historiador Ciro Flamarion Cardoso, “cada época tem determinadas perguntas ao seu

passado, perguntas que refletem os problemas e perplexidades em que o presente se

debate”.270

269BLOCK, Marc Leopoldo Benjamim. Apologia da História ou Ofício do historiador. Prefácio, Jacques Le Goff; apresentação à edição brasileira, Lilia Moritz Schwarcz; tradução André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. 270CARDOSO, Ciro Flamarion. Uma nova história? In: Ensaios Racionalistas. Rio de Janeiro: Campos, 1998. p.109.

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FONTES

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outubro de 1911.

Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba (BCUFPB).

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maio de 1920.

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Centro Cultural dos Povos da Amazônia (CCPA).

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CENDAP (Centro de Documentação e apóio a pesquisa, PPGSCA/UFAM).

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AMAZONAS. AMAZONAS. Assembléia Legislativa do Estado. Constituição 1891

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1341, 1342, 1345, 1346, 1347, 1351, 1360, 1366, 1369, 1387, 1397, 1399.

Mensagem do Sr. Dr. Pedro de Alcântara Bacellar. Governador do Estado do

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