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Usabilidade e fatores de confiança na procura e compra de livros em livrarias on-line

Date post: 16-Nov-2023
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Textos Selecionados de Design 3
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Textos Selecionados de Design 3

UERJUniversidade do Estado do Rio de JaneiroReitorProfessor Doutor Ricardo Vieiralves de CastroVice-ReitorProfessor Doutor Paulo Roberto Volpato Dias

SR2Sub-Reitoria de Pós-graduação e PesquisaSub-ReitoraProfessora Doutora Mônica da Costa Pereira Lavalle Heilbron

CTCCentro de Tecnologia e CiênciasDiretoraProfessora Doutora Maria Georgina Muniz Washington

ESDIEscola Superior de Desenho IndustrialDiretorProfessor Rodolfo Reis e Silva CapetoVice-DiretorProfessor Mestre Luiz Antonio de Saboya

PPDESDIPrograma de Pós-graduação em DesignCoordenadorProfessor Doutor Guilherme Silva da Cunha LimaCoordenadora AdjuntaProfessora Doutora Ligia Maria Sampaio de Medeiros

3

Guilherme Cunha Lima(Org.)

Rio de JaneiroPPDESDIUERJ2013

selecionadostextos

designde

Todos os direitos reservados aos autores individualmente.

Ficha catalográ!ca

Lima, Guilherme CunhaTextos Selecionados de Design 3/ Guilherme Cunha Lima, Organizador/ Rio de Janeiro: PPDESDI UERJ, 2008. 240p.; 148s210mm; il.

1. Design 2. Brasil 3. Crítica 4. História1. Título

ISBN 978-85-99992-04-3

Universidade do Estado do Rio de JaneiroPPDESDIPrograma de Pós-graduação em DesignRua Evaristo da Veiga, 95 Lapa20031-040 Rio de Janeiro, RJ Brasil

Tel 55 21 2332 6910 e Tel Fax 55 21 2332 [email protected]

Projeto Grá!co Guilherme Cunha Lima

Editoração EletrônicaGisela Pinheiro Monteiro

CoordenaçãoAlmir Mirabeau

Apresentação

Nesta nova publicação da série textos selecionados de design, agora no seu terceiro número, apresentamos mais uma vez textos produzidos por nossos mestres e seus orientadores, dentro das linhas de pesquisas existentes em nosso Programa de Pós-graduação em Design da ESDI.

Este livro que ora lançamos, é uma coletânea de textos, que tem a !nalidade de promover um intercambio entre os programas existentes no país, no sentido de divulgar o teor das pesquisas realizadas.

Convictos que estamos desta tarefa, sentimos com o nosso dever cumprido.

Guilherme Cunha LimaCoordenador PPDESDI

Sumário

página 9 Usabilidade e fatores de con!ança na procura e compra de livros em livrarias on-line

Sydney Freitas, DSc Adriano Bernardo Renzi, MSc

página 41 On-air look Futura: Em busca de uma identidade nacional

Guilherme Cunha Lima, PhD Axel Sande, MSc

página 72 Branding: passado, presente e futuro da construção das identidades através da marca

Filipe Chagas, MSc

página 98 O design como criador de existências Lucy Niemeyer, DSc Raquel Ponte, MSc

página 114 A Tipogra!a Houaiss Guilherme Cunha Lima, PhD

Bruno Schneider, MSc

página 126 Espaço de venda: um elemento de comunicação, um produto de design.

Lucy Niemeyer, DSc Stella Hermida, MSc

página 152 Luis Latt e Cia Ltda. Um estudo de caso sobre sistemas de pré-impressão na indústria grá!ca brasileira durante a década de 1930.

Guilherme Cunha Lima, PhD Almir Mirabeau, MSc

página 187 A tipologia da Cristaleria Cá d’Oro. Guilherme Cunha Lima, PhD

Edna Cunha Lima, DSc

Gil Haguenauer, MSc

página 217 Dinâmicas de construção da imagem impressa para a simulação do original.

Washington Dias Lessa, DSc Helena de Barros, MSc

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Usabilidade e fatores de con!ança na procura e compra de livros em livrarias on-lineSydney Freitas, DSc Adriano Bernardo Renzi, MSc

1 Usabilidade e con!abilidadeA presença de diversos sites de venda que oferecem produtos e serviços similares e a integração da internet no dia-a-dia das pessoas vem alterando cada vez mais as expectativas do usuário consumidor. Uma boa performance e uma usabilidade adequada, que atendam a essas expectativas, mostram-se como diferencial importante no processo decisório de procura e compra de produtos em ambientes on-line. Considerando-se que uma insatisfação durante o processo de busca de produtos podem levar o consumidor a abandonar o site com apenas um clique do mouse para provavelmente não voltar mais (Nielsen, 2000). A loja on-line, diferente da loja física, não impõe o constrangimento social de se abandonar um produto no meio do processo de compra (Miranda, 2005).

Os pesquisadores Banati, Bedi e Grover (2006) relacionam usabilidade centrado no usuário com con!abilidade ao site. Apontam sua relacão como auto-estimulatória, exempli!cando:

1 a boa reputação de um site de vendas pode atrair usuários a visitar o website pela primeira vez. Se a experiência mostrar-se muito satisfatória e com navegação de boa usabilidade, o usuário irá retornar (mesmo que não tenha comprado na

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primeira vez) e estreitará sua relação com o site, derivando em aumento de con!ança na loja on-line; 2 por outro lado, a navegação exploratória de um usuário pode levá-lo à mesma loja on-line pela primeira vez. Se o site mostrar-se com usabilidade amigável trazendo boa experiência em sua visita, o usuário satisfeito irá retornar outras vezes e alimentará a boa reputação da loja on-line.

Os autores apontam através de grá!co (!gura 1) que a aplicação de boa usabilidade leva à aumento de con!ança no site e por sua vez, a boa reputação de um site leva à implementação de boa usabilidade.

Figura 1: Relação entre usabilidade e con!ança proposto Banati, Bedi e Grover (2006).

Apresentam ainda outro grá!co em forma de triângulo especi!cando a construção de con!ança e boa reputação de lojas on-line através da usabilidade, onde o primeiro passo para construção da con!ança de sites tem base na usabilidade e funcionalidade (com erros controlados) para atingir efetividade e e!ciência das tarefas do usuário. O degrau seguinte para a construção da con!ança relaciona-se com o aprendizado e

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memória cognitivos pela aparência e arquitetura do site. O terceiro e último degrau apontado pelos autores galga-se na satisfação emocional com os resultados da compra (que abrangem até o recebimento e uso do produto comprado – !gura 2).

Figura 2: Triângulo de construção de con!abilidade de Banati, Bedi e Grover (2006).

Lumsden e Mackay (2006, p. 473) com base em suas pesquisas sobre comportamento humano, indicam que atitudes e decisões de pessoas são afetadas e determinadas por sinais cognitivos captados do ambiente físico a sua volta, que derivam em uma base de con!abilidade, ou não, em determinada situação. Segundo os autores, os humanos analisam o ambiente e a natureza de sua própria vulnerabilidade para determinar a amicidade ou hostilidade de outros. Considerando não ser possível interagir !sicamente com lojas on-line para uma instintiva análise defensiva de con!ança no ambiente, designers tem o trabalho de criar um ambiente favorável para o desenvolvimento desta con!abilidade no usuário. Com base em estudos antecedentes de Yang (2005), Akhter (2004) e Jarvenpaa (1999), os autores identi!caram alguns “gatilhos de con!abilidade” (trust triggers) que auxiliam no desenvolvimento da con!ança do consumidor com a loja on-line (!gura 3). Os pesquisadores separam os gatilhos de con!abilidade

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em dois grupos de acordo com o tempo de efeito. Os gatilhos imediatos são os que geram efeito assim que o internauta visualiza a loja on-line, enquanto que os gatilhos de interação necessitam de um tempo de interação do usuário com o site para que tenha efeito sobre a formação de con!abilidade.

Figura 3: Gatilhos de con!abilidade imediatos e de tempo de interação, por Lumsden e Mackay (2006).

Usuários ponderam os benefícios e riscos associados à compra on-line antes de efetuá-la de fato (Chau, Hu, Lee e Hau, 2006, p. 175). Preocupações rodeiam os consumidores quanto à segurança e privacidade de seus dados disponibilizados, possibilidade de cobrança indevida por custos adicionais não

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revelados pelo site e ainda, atitude oportunista por parte da loja vendedora com dados revelados na efetuação do pagamento. Quando o consumidor acredita que a loja tem mais a perder do que ele próprio, com alguma atitude desonesta, está mais apto a con!ar no site (ibdem).

De acordo com pesquisa efetuada pelos autores (ibdem 2006, p. 178), onde usuários pesquisados deveriam procurar e comprar celulares através de um site protótipo, foi constatado que a medida que as pessoas avançavam nas fases de procura, análise, comparação e compra do celular, o número de desistências aumentava. Chegou em seu ápice na fase de compra, com 81% de desistências. A tabela da !gura 4 mostra a porcentagem ascendente da desistência dos consumidores na pesquisa.

Figura 4: Estágios de procura e compra e respectivas desistências em pesquisa de Chau, Hu, Lee e Hau (2006).

Como indicado na pesquisa, a fase de compra mostrou-se com signi!cativo efeito na con!abilidade do consumidor. Os autores sugerem utilização de certi!cados digitais de segurança com visualização fácil e direta, garantias de reembolso explícitas, garantia de qualidade do serviço, tecnologia de segurança, selos de segurança e privacidade reconhecidos internacionalmente.

Tamini, Sebastianelli e Rajan (2006, p. 38), expõem resultados de pesquisa efetuada com consumidores norte amerticanos, com

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aplicação de valores de 1 a 5 (com 5 sendo muito importante e 1 sendo muito pouco importante). Estes valores foram atribuidos representativamente ao grau de importância de fatores a serem utilizados na exposição de produtos em lojas on-line (!gura 5). Todos os fatores se mostraram acima do valor mediano 3, sendo cálculo correto do preço total da compra considerado o mais importante com 4.74 pontos, seguido de habilidade de adicionar e remover produtos do carrinho da compras virtual (4.63 pontos) e disposição separada de todos os preços inclusos na compra (4.58 pontos).

Figura 5: Fatores de qualidade na etapa de compra on-line, exposto por Tamini, Sebastianelli e Rajan (2006, p. 38).

Com base nas teorias antecedentes e respectivos resultados, buscou-se aprofundar o conhecimento sobre os fatores, ou gatilhos, que podem desencadear con!ança ou descon!ança de internautas com experiência em compra on-line e especialistas em estudos e assuntos de nicho especí!co de conhecimento. O médoto Think-aloud Protocol mostra-se como uma ferramenta que possibilite

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aprofundar ações dos usuários. As tarefas propostas e participantes escolhidos tiveram base em resultados decorrentes de pesquisas anteriores: Renzi, Santos e Freitas (2008) e Renzi e Freitas (2010).

2 Aplicação do método Think-aloud ProtocolObjetivando observar usuários durante navegação, procura de produtos e passos de efetuação de compra foi utilizado a técnica Think-aloud Protocol com seis usuários. A técnica consiste em observá-los realizando tarefas e ações especí!cas, dentro de um ambiente especí!co. Estas ações são descritas pelos participantes em voz alta em tempo real. São observadas por um moderador, que grava ações tomadas pelo participante. O registro das ações pode ser efetuado através de anotações escritas, !lmagem ou gravador de voz. Escolheu-se a utilização de registro escrito e gravador de voz digital para criar um ambiente de observação mais descontraído aumentando as possibilidades de aprofundamento das informações fornecidas pelo participante. O gravador digital de voz serviu como apoio à observação e documentação e as gravações foram transcritas para análise de detalhes colhidos e comparação com informações documentadas. As sessões gravadas duraram entre 30 minutos e 1 hora. Escolheu-se ambiente simulatório de modo a oferecer maior conforto aos participantes de acordo com suas disponibilidades de tempo a !m de manter a aplicação da sessão o mais próximo possível da realidade de cada respondente. Os browsers utilizados foram de acordo com a preferência e familiaridade de cada participante a !m de se evitar distorções nas percepções do usuário quanto a facilidades e di!culdades de usabilidade durante navegação.Seguiu-se direcionamentos e indicações de Villanueva (2004, p. 62) para identi!car como o usuário utiliza uma interface ou ferramenta onde cada opção escolhida, botão clicado, leitura de

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informação, grá!co vislumbrado etc. é verbalizado, bem como, o que o participante estiver pensando durante o processo. Preparou-se o desenvolvimento da técnica com base em direcionamento de Genise (apud Villanueva, 2004, p. 62):

1 organiza-se um pequeno número de usuários (por volta de 4);2 o pesquisador encontra-se com os usuários;3 o pesquisador provê um protótipo de interface para o usuários aplicarem uma lista de tarefas pré-de!nidas;4 pesquisador instrui os usuários de verbalizar seus pensamentos enquanto !zer suas ações no sistema para !nalizar as tarefas;5 o pesquisador noti!ca quaisquer mudanças que devam ser consideradas quando for efetuada revisão do design da ferramenta.

Sempre que observado relutância dos participantes em verbalizar pensamentos ou ações, buscou-se instigá-los com perguntas gerais e pontuais à ação decorrente. O direcionamento instigador tem base em experimento de Xiao (2000, p. 177-184) para testar a usabilidade da interface da biblioteca on-line da Texa A & M University. De acordo com o pesquisador, a medida que cada usuário avançava, aplicaram-se perguntas gerais como “o que você acha deste programa?”, “você entendeu o processo?”, “Você tem dúvidas sobre o tour?”, “Você tem sugestões?”. A avaliação ajudou a identi!car problemas que pudessem atrapalhar usuários dos mais variados graus de habilidade com o sistema virtual, bem como obter idéias construtivas para aprimoramento da ferramenta.

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2.1 PopulaçãoO per!l dos respondentes para o teste visou representar o público leitor mais atuante e experiente em compras on-line com faixa etária entre 30 a 40 anos. Buscaram-se participantes preferencialmente com mestrado ou doutorado completo, participantes com especialização pro!ssional também foram convidadas a participar da metodologia. Os respondentes totalizaram seis pessoas, sendo uma com doutorado, duas com mestrado (doutorando) e 3 especialistas pro!ssionais abrangendo as áreas de belas artes, direito, antropologia, marketing, publicidade e usabilidade.

As duas tarefas executadas pelos participantes forma: (1) procurar 1 livro relacionado ao próprio nicho de conhecimento pro!ssioanal; (2) procurar um segundo livro a partir de do primeiro livro encontrado, preferencialmente utilizando links de recomendação e correlacão das livrarias on-line. Os respondentes deviam indicar o título e/ou autor do livro em questão antes de iniciar a busca. Restringiu-se o livro escolhido a títulos que cada especialista não tivesse comprado ainda, mas que fosse um livro que houvesse interesse de compra em curto/médio prazo. No entanto, poderiam escolher-se livros com obtenção prévia de informações relevantes quanto ao visual da capa, assunto abordado e indicações de terceiros. Aplicaram-se perguntas gerais abertas com direcionamento informal para auxíliar os respondentes a não se desviarem da verbalização das ações, como sugerido por Xiao (2000).

Os livros procurados foram:

das Américas, de Heloisa Buarque de Holanda.

artigos) – Segregação urbana e desigualdades educacionais

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na América Latina, de Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro e Ruben Kaztman. Editora Letra Capital.

Flow, de Mihaly Csikszentmihalyi; A sabedoria das multidões: por que muitos são mais inteligentes que alguns e como a inteligência coletiva pode transformar os negócios, a economia, a sociedade e as nações, de James Surowiecki.

Green graphic design, de Brian Dougherty; Na toca dos leões, de Fernando Moraes.

de Oliveira. Editora Lume Juris. Respondente 6: Halo effect, de Phil Rosenzweig; Cultura da

Convergência, de Henry Jenkins.

2.2 As livrarias on-lineConsiderando que os livros são os produtos mais vendidos pela internet e os resultados coletados a partir de questionário on-line (Renzi, Santos e Freitas 2008), analisaram-se especi!camente livrarias on-line para identi!car alguns gatilhos de con!abilidade e descon!ança durante procura e compra de livros. As três livrarias on-line com respectiva rami!cação física do negócio selecionadas foram: Livraria Travessa, Livraria Siciliano e Livraria Nobel.

As três lojas escolhidas apresentam características complementares e relevantes para a pesquisa. A livraria Travessa é um negócio local (Rio de Janeiro), a livraria Siciliano é de âmbito nacional e a livraria Nobel é de âmbito internacional. Apesar de Siciliano e Nobel serem vinculadas às editoras, os selos da Siciliano não carregam seu nome (Caramelo, ARJ Jovem), diferente da Nobel (editora Nobel). Ao contrário das outras duas, a Nobel é uma livraria franqueada. As características similares das três escolhas basearam-se em disponibilidade de variedade

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de assuntos, possibilidade de pagamento por cartão de crédito e entrega de livro em âmbito nacional. Algumas livrarias similares foram descartadas da pesquisa, como por exemplo a livraria Saraiva. Apesar da similaridade entre Siciliano e Saraiva, esta última foi descartada por oferecer produtos de varejo muito variados e por atualmente ambas serem do mesmo grupo comercial. Considerando os recursos disponíveis e a necessidade de presença física nas livrarias físicas para outras etapas da pesquisa descartou-se também a livraria Cultura (similar em diversos aspectos com a Travessa) cujas lojas não incluem o Rio de Janeiro.

3 Resultados do Think-aloud ProtocolVeri!cou-se diversos fatores de desistência e descon!ança relacionados a usabilidade de!ciente e falta de informação adequada. As relutâncias e desistências anunciadas pelos usuários durante o teste apareceram em todas as etapas utilizadas para busca e compra de livros. As etapas de análise do produto e compra tiveram o maior índice de fatores indicados para desistência, rea!rmando estudos de Chau, Hu, Lee e Hau (2006).

Como não houve nenhuma restrição quanto a origem da publicação, quatro dos seis participantes iniciaram busca por livros importados que normalmente buscariam na Amazon.com. Veri!cou-se, no entanto, que nenhum dos livros importados escolhidos para busca foi encontrado em nenhum das três livrarias. Acrescenta-se às tentativas frustradas de se encontrar livros importados, alguns resultados bastante equivocados do procedimento de busca, como por exemplo, a busca do livro Flow (um livro relaciondado a usabilidade, de Mihaly Csikszentmihalyi) pelo especialista em usabilidade. O resultado da busca apresentou 127 publicações relacionadas à "ores e

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"oricultura (sistema reconheceu a palavra "ow como parte da palavra "ower). Segundo o respondente, “ter esse tipo de resultado é desestimulante. Eu pararia a procura por aqui mesmo”. Após constatação de resultados negativos para livros importados, os respondentes seguiram com a tarefa em busca de publicações nacionais.

Todos os livros nacionais especí!cos de áreas atuantes dos respondentes foram encontrados pela ferramenta de busca em pelo menos uma das três livrarias. O site com menor sucesso de busca foi da livraria Nobel, com apenas um resultado correto: “Na toca dos leões”. Apesar do resultado positivo na procura por títulos nacionais dentro de áreas de estudo especí!co, todos os livros se apresentaram fora de estoque durante a aplicação do método, com exceção do livro “Cultura da convergência”. A informação de livros fora do estoque mostrou-se desestimulante para os usuários, que apontaram não ter interesse em fazer a encomenda dos livros. Todos os usuários mostraram-se mais inclinados a visitar outra livraria on-line concorrente para nova busca, confirmando frase de Nielsen (2000) onde “se o usuário não acha, não compra”.

A sessão de análise dos sites sempre se iniciou pela homepage para simular as etapas de navegação em ambiente real. Apesar dos participantes alentarem para o incômodo da quantidade de informação “piscante” na homepage das três livrarias on-line, esse não se mostrou como fator de desistência da busca. No entanto, a quantidade de produtos dispostos em forma visual de anúncios desproveu a possibilidade dos usuários se interessarem pelos lançamentos exibidos. Os respondentes demonstraram ignorar os anúncios laterais e superiores, criando-se uma atenção seletiva automática, termo associado por Barber e Legge (apud Miranda 2005) aos fatores de

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vigilância, nível de ativação, disposição ou prontidão e análise-por-síntese. Estudos de Nielsen em seu artigo de 2007 “Fancy Formatting, Fancy Words = Looks Like a Promotion = Ignored” (formatação e palavras piscantes = parece uma promoção = ignorado), mostrou que usuários falham em encontrar informações em consequência de layout estar reproduzido em letras piscantes, parecidas com promoção e posicionada em local de pouca atenção. Algumas declarações enfatizam esse problema:

se tivesse informação em apenas um lado. Parece tudo muito cheio de propaganda. Um pouco cheio demais.”

banner é tão grande que empurra os livros para baixo. Não gosto disso.”

banner atrapalha a visualização. É indiferente, apesar da propaganda Harry Potter ser repetida na sessão rotativa.”

Todos os participantes mostraram-se inclinados a iniciar busca por livros e sair o mais rapidamente da tela inicial. Todos iniciaram procura pelos títulos pré-determinados utilizando a ferramenta de busca. A maioria dos usuários mostrou-se encontrar e utilizar a ferramenta de busca intuitivamente e naturalmente considerando suas experiências prévias com compra on-line de livros. Porém, veri!cou-se que apesar de experiências anteriores na utilização da ferramenta, alguns participantes demoraram para encontrá-la e demonstraram vasculhar com o cursor repetidas vezes a área superior (navegação global) da homepage na procura pela ferramenta.

Apesar da experiência na utilização da ferramenta com dominância, alguns demonstraram frustração com indicação de erros nos resultados. Em alguns livros, como o “Relações de gênero e diversidade cultural das Américas” de Heloisa Buarque

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de Holanda, apresentou resultado negativo quando procurado na Travessa, mas trouxe retorno positivo pela busca avançada. Veri!cou-se que a busca simples da Travessa limita-se a procura apenas por título de livros e título de DVDs, não reconhecendo por vezes a utilização de nomes de escritores e artistas. Nenhum respondente notou a existência do link “busca re!nada” ao lado da busca simples. E sem a percepção da possibilidade de procura re!nada, é necessário o usuário errar uma primeira tentativa para só então ter acesso a busca re!nada. Os participantes que obtiveram resultado negativo na primeira busca apontaram desistência de compra se não estivessem participando do teste.

Todos os resultados positivos obtidos na busca do primeiro livro foram con!rmados serem corretos pela visualização da imagem da capa. Todos os respondentes já tinham informação e indicação prévia (por grupos de referência) sobre os livros especí!cos que indicaram para busca. No entanto, apesar dos livros nacionais terem sido encontrados (majoritariamente na livraria Travessa), todos se apresentaram fora do estoque e sem previsão concreta de entrega. Com exceção do livro Cultura da convergência, de Henry Jenkins.

O site da livraria Nobel foi o menos analisado neste aspecto considerando que trouxe apenas um resultado positivo em todas as procuras, di!cultando a sequência de análises. Este único resultado positivo da Nobel (Na toca dos leões) não apresentou sinopse ou indicação de sua existência em estoque. Somente entrando na sessão de carrinho de comprar e iniciando processo de compra do referido livro obtêm-se a informação (escondida) de que se trata de uma compra somente sob encomenda, possivelmente por sua não alocação em estoque.

A presença de imagem da capa nos resultados mostrou-se de grande valia pelos participantes para con!rmação positiva

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dos livros. A possibilidade de ampliação das imagens foi bem recebida, mas expôs-se que as ampliações deveriam ser maiores em alguns livros para melhor visualização. Indicou-se frustração durante uma das procuras no site da Siciliano, onde o resultado apresentado da busca não expunha foto da capa. Em consequência, o respondente indicou ter dúvidas quanto ao livro ser correto e possivelmente não faria a compra.

Os usuários indicaram satisfação na disposição e design da apresentação dos resultados dos livros encontrados. No entanto, nem todos clicaram intuitivamente na imagem da capa dos livros para obter maiores informações sobre o título. De acordo com um dos participantes, seguindo intuitivamente a convenção cultural estabelecida pela Amazon de ao clicar na capa dos livros tem-se acesso a folheá-los digitalmente, não se clicou intuitivamente nos livros resultantes da busca dos sites utilizados no teste.

Vale acrescentar que no site da livraria Siciliano, em algumas tentativas de busca os resultados apresentam-se sob forma de subcategorias, trazendo confusão para os internautas. Durante procura do título “Na toca dos leões” expuseram-se duas categorias sem qualquer relação com o assunto publicidade do livro (segundo a respondente): (1) linguística; (2) literatura nacional. A participante declarou que desistiria da procura neste ponto por interpretar que o site como ine!ciente na busca. Quando instigada a continuar a sequência de procura do título veri!caram-se resultados que aumentaram descon!ança da usuária. Ao clica-se na categoria “literatura nacional”, o único resultado apresentado foi o “kit” (pacote) de venda de dois livros: O mago + Na toca dos Leões. Dois livros de assuntos muito diferentes, sendo o ponto único em comum serem ambos biogra!as escritas pelo mesmo escritor. Na apresentação do kit de compra não foi possibilitado tentar-se comprar os livros separadamente. Por

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outro lado, quando se adentra na categoria “liguística” obtém-se a opção de compra unitária do livro Na Toca dos Leões. Em consequência dos resultados e procedimentos, indicados confusos pela respondente, expressou-se falta de con!abilidade no site para efetuar compra.

Na página de informações sobre os livros selecionados, alguns respondentes indicaram que a sinopse se mostrava “fraca”. Os usuários acrescentaram durante Think-aloud Protocol que se estes não fossem livros indicados previamente por grupos de referência, não arriscariam comprá-los. Declarações gravadas durante o procedimento exempli!cam a frustração dos respondentes:

conhecesse, teria duvidas por se tratar de uma coletânea de livros com diversos autores e artigos. Neste aspecto a informação de sinopse é pouca. Seria bom ter acesso ao sumário.”

quem são os entrevistados, informação muito importante no caso deste livro. A sinopse esta mais focada no autor do que no assunto.”

(ano de publicação) já estava exposto nas características do livro. As sinopses são sempre horríveis.”

Todos os participantes indicaram frustração quanto a localização da sinopse e respectivas características dos livros estarem situadas abaixo da parte superior da página, necessitando utilizar o scroll down para acessá-la. Em um primeiro momento, alguns participantes não tinham certeza da existência da sinopse,

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por esta estar “escondida” ao !nal da página informativa. Vale acrescentar que ter acesso a sinopse foi considerado o critério mais importante ao se procurar livros em livrarias on-line, como resultado observado anteriormente na aplicação de Matriz de Prioridade (Renzi e Freitas 2010). Os participantes acharam interessante ter acesso a dados e características do livro: “quando se procura livros para exposição. As medidas precisam bater com a altura das prateleiras”. Algumas observações relevantes relativas a design da página e posicionamento da sinopse foram selecionadas para exempli!car as opiniões dos usuários:

clicar no link ‘dados do produto’ (Siciliano) para ter acesso a essa informação. Deveria estar disponibilizado diretamente, sem precisar ter de clicar no link.”

livro ao invés de precisar clicá-lo intuitivamente para maiores detalhes. Não há indicação de saiba mais...”

Veri!cou-se grande frustração por todos os participantes quanto às informações de prazo de entrega e preço de frete. Perceberam-se informações por vezes contraditórias: na página informativa apresentavam-se prazos de postagem (e não de entrega) padrão, enquanto na página de etapa de compra mostravam-se prazos diferentes. Todos os usuários expressaram frustração, e por vezes irritação, com o desencontro de informações nos sites.

postagem. Dá a impressão que não quererem se comprometer.”

entrega, que é uma informação importante.”

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Observou-se que os dados de entrega se apresentavam mais confusos no site da Travessa, que apesar de dispor informações em diferentes processos de busca e compra e ainda em diversos pontos de uma mesma página, as informações mostram-se repetitivas e por vezes contraditórias. “Não esta coerente com o que ele (Travessa) disse antes. Isso me irrita. O que me importa saber o prazo de postagem? Eu preciso mesmo é saber o prazo de entrega. Isto é uma forma de passar a responsabilidade para os correios”.

A dúvida quanto a dados de postagem e entrega se intensi!cou com a contradição da exposição de prazos quando nem sempre o livro escolhido se apresentava em estoque. Em livros fora de estoque era indicado que a efetuação da compra deveria ser somente sob encomenda. Para os usuários !cou a dúvida da veracidade dos prazos apresentados, acrescendo a perda de credibilidade no site para se comprar.

Veri!cou-se ainda a disponibilização explícita de informações de entrega somente em âmbito municipal (apesar das entregas serem para todo o território nacional) resultando em informação incompleta para outras regiões. No site da Livraria Siciliano apresenta-se, automaticamente à entrada no procedimento de compra, o prazo de envio para grande São Paulo. A opção “consulte seu CEP”mostrou-se difícil de acessar o prazo de entrega para endereço fora de São Paulo. É preciso entrar em outra página para con!rmar endereço e salvar a informação para ter a data de entrega atualizada. Uma respondente se mostrou sem paciência: “porque eu vou querer saber de frete e entrega para São Paulo? Eu não moro em São Paulo!”.

Outro fator considerado negativo por uma participante foi o disclamer “os produtos sob encomenda podem ter seus preços alterados”. Segundo a respondente, perceber esta informação

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disponibilizada de forma pequena e escondida aumentou sua descon!ança com o site.

As informações de preço de frete e prazo de postagem mostraram-se mais confusas quando apresentavam erro sem qualquer prevenção ou indicação de como corrigí-lo, como indicado por respondente: “Isso é muito frustrante. Cada vez que aparece que você fez alguma coisa errada você vai se sentindo mais burra.”

A falta de correção automática de erros de CEP mostrou-se negativamente para participante e os repetidos apontamentos de erros apontavam para uma possível desistência de compra.

Percebeu-se que nenhum dos sites apresenta visivelmente política de devolução e troca de livros, parecendo obrigatório contatar as lojas físicas para auxílio. No site da livraria Siciliano é possível encontrar algo a respeito, mas é necessário entrar no link “Ajuda” (que intuitivamente indicaria atendimento ao cliente ou formas de contatar funcionários para auxílio), onde se apresentam diversos iténs como um FAQ (frequently asked questions). Um desses itens apresentados, o de número 8, é sobre política de troca e devolução da empresa. Apesar da existência, o item é redundante e super!cial. Não indica procedimentos:

“Nosso objetivo é oferecer para nossos clientes sempre os melhores produtos, garantindo a qualidade dos itens comercializados pela siciliano.com.br. Para que você se sinta completamente satisfeito com nossos serviços, contamos com uma Política de Troca e Devolução.”

Nenhum participante conseguiu desvendar esse caminho para chegar a informação de devolução e troca.

O site da livraria Travessa mostra-se igualmente difícil para se acessar essa informação: é necessário entrar no link

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“Atendimento”, onde também aparecem itens explicativos como uma lista. Deve-se acrescentar que não foi observado qualquer informação sobre devolução e desistência no site da Nobel.

Seguindo resultados observados por Tamini, Sebastianelli e Rajan (2006, p. 37) onde consumidores atribuem como mais importante a apresentação do preço junto ao produto, as três livrarias mostraram-se de acordo com expectativas dos e-consumidores (consumidores que compram on-line). No entanto, outros itens indicados com importância próxima ao item preço mostraram-se confusos nos sites de livrarias pesquisados: (1) descrição do produto mostrou-se abaixo das expectativas dos participantes pela necessidade de “scroll down” para visualizar informações importantetes sobre os livros; (2) indicação visível de produto fora de estoque nem sempre mostrou-se simples ou coerente com prazos de entrega.

As informações sobre os autores dos livros mostraram-se restritos a apenas exibir outras publicações recentes de mesma autoria através de links nos nomes dos escritores. Nenhum dos sites pesquisados apresentou informações especí!cas sobre os autores. Considerando que parte dos livros procurados durante aplicação do Think-aloud Protocol estão relacionados com nichos especí!cos de pesquisadores, ter informações sobre os autores e seu enquadramento no âmbito internacional torna-se muito importante, segundo os próprios respondentes:

“seria muito importante ter informações ou um resumo sobre a vida do autor, considerando que neste caso o autor é o responsavel pelas pesquisas de mídia do MIT (Massachussets Institute of Tecnology)”... “se uma pessoa está navegando e esbarra no livro, descobrir que o autor é o chefe de mídia no MIT certamente será um grande ponto positivo para decidir comprar o livro”.

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Quando perguntados sobre que outras informações do livro gostariam de ter acesso, todos os participantes indicaram a necessidade de manusear o livro digitalmente. Especialmente para ter acesso a informações de índice, considerando que alguns dos livros procurados eram coletâneas de artigos de diversos autores. Além do sumário do livro, declarou-se grande importância a ter acesso também a informações do primeiro capítulo. No caso de livros com imagens, como livros infantis, todos indicaram interesse em ter acesso à imagens internas.

comprando livros para adotar como professora... lá fora (compra internacional). Aí eu não queria comprar 10 livros para analisar. Então eu fui fazendo uma seleção pelos índices para ver qual conteúdo tinha alí dentro. O livro tem haver com o que eu quero?”

autores e artigos participam do livro. Folhear digitalmente seria interessante para disponibilizar esse tipo de informação.”

!lha (2 anos) e não sei como é dentro.”

Dentro do âmbito das livrarias on-line observadas nesta metodologia, apenas a Travessa oferece a possibilidade de manusear livros digitalmente. Trata-se de um aplicativo do google. No entanto, apenas o participante especialista em usabilidade teve a oportunidade de testar a ferramenta. O link para a simulação de folhear localiza-se em local de difícil percepção e nem todos os livros estão disponíveis para esta possibilidade. Houve di!culdades para encontrar a ferramenta e apesar de considerar interessante a existência do manusear digitalmente na livraria on-line, observou-se incomodo com o design da

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ferramenta e suas limitações. Além de não simular a passagem de página horizontalmente como seria com um livro físico (a passagem de páginas é feita verticalmente como uma lista), o layout apresentado possui o formato horizontal impossibilitando visualizar por completo uma página inteira do livro vislumbrado. Para se ter acesso a parte inferior de cada página é necessário usar o scroll down. O mesmo procedimento é feito para se mudar de página:

“Seria melhor se pudesse virar as páginas como num livro. Ter que usar o scroll down para ver o resto da página é chato. É preciso ver a altura da página para se ter uma melhor sensação do livro.”

No mesmo livro (Sabedoria da multidões) é possível olhar quais os capítulos do índice e acessá-los diretamente através de links. O participante considerou esta possibilidade muito positiva.

Todos os participantes se mostraram interessados na possibilidade de ter acesso a reviews. Considerado-se que os livros procurados eram provenientes de recomendações de grupos de referência, o reviews para as procuras efetuadas na aplicação do Think-aloud Protocol não traria diferença na decisão de compra. Um dos respondentes acrescentou que seria muito interessante ter a disponibilização de reviews positivos e negativos em proporcionalidade.

3.1 Resultados na busca do segundo livro de mesmo assuntoA segunda tarefa da metodologia baseou-se na possibilidade de se esbarrar em outros livros relacionados com a primeira busca objetiva a partir da utilização de sistemas de recomendação automática (Murthi e Sakar 2003, p. 1344 e Senecal e Nantel 2003, p. 162-165) com base em dados coletados de visitas prévias

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dos internautas ao site e correlaçano com escolhas similares de outros usuários com aplicação de Marketing one-to-one (Peppers e Roger 1997, p. 63). Segundo os autores, a possibilidade do leitor “esbarrar” em um segundo livro de interesse pode duplicar intenções de compra.

Os resultados observados nos três sites mostraram-se abrangentes e de direcionamentos diferentes. De um modo geral os respondentes expressaram insatisfação e frustração dentro de suas expectativas. Em alguns casos, o segundo livro trouxe dúvidas quanto a primeira escolha e desistência da compra. O site da livraria Travessa não apresenta recomendação automática e baseia suas possibilidades de “esbarrar” em outros livros pelo autor, tradutor ou ilustrador dos livros primeiramente encontrados. No entanto, em pesquisa anterior utilizando o método Matriz de Prioridade (Renzi e Freitas, 2010) foi observado que leitores se mostraram muito interessados em ter informações relevantes sobre os autores.

Os respondentes precisaram clicar no nome do autor para tentar descobrir que outras obras havia correlacionadas à mesma autoria. Considerando que as buscas foram focadas em livros especí!cos (e em sua maioria fora de estoque), nem sempre havia outras obras do mesmo autor pra mostrar. Isso se mostrou confuso para alguns usuários:

“Deu a entender que no site todo só havia dois livros da autora: o de ‘Gênero e Diversidade Cultural’ e este novo livro ‘Cultura em Trânsito’. E eu só cliquei no nome da autora porque você me perguntou se eu ia pesquisar mais sobre esta área de conhecimento. Eu mesma já não teria clicado, porque como abaixo só veio uma opção de livro, eu ia achar que no site só haveria estas duas opções de livros”... e acrescenta:

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“O sistema de recomendação da Travessa foi um problema nesse caso especi!co, pois como eu procurava livros da autora e só me apresentou mais um, eu pressupus que só existiam dois, então eu deixei de !car pesquisando sobre outros livros. Não necessariamente este livro me interessava, mas outros livros da autora me interessariam e não foi exatamente o que apareceu na sugestão.”

Notou-se que na diagramação da página de informações dos livros, a livraria Travessa apresenta na parte direita uma sessão de mais vendidos. Cinco dos seis respondentes ignoraram inicialmente a existência da sessão e con!rmaram que os livros apresentados não tinham relação alguma com o primeiro livro procurado durante a aplicação do Think-aloud Protocol. Apenas uma participante indicou que um (Educação Básica no Brasil) dos quatro livros da sessão “mais vendidos” tinha correlação com o primeiro livro que ela procurou. Os outros três, apesar de pertencerem a mesma categoria educação de “A cidade contra a escola – Segregação urbana e desigualdades educacionais na América Latina”não se mostraram condizentes com as expectativas da usuária. Resultados trouxeram títulos equivocados, como por exemplo, “Nana nenê – como resolver o problema de insônia de seu !lho”.

Como os usuários ignoravam a existência da sessão “mais vendidos”, a maioria buscou outros meios de encontrar livros correlatos às suas respectivas primeiras escolhas. Uma ação comum observada durante o teste de usabilidade foi a tentativa de pelo menos metade dos usuários clicar, sem sucesso, no breadcrumbs (situado no topo da página) com intenção de procurar um segundo livro por assunto similar. Mas como o breadcrumbs do site da Travessa não são links, não obtiveram nenhum resultado

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positivo. A mesma intenção levou os respondentes a experimentar clicar em “segmento” dos livros, exposto em vermelho na página de resultados dos respectivos títulos. A exposição da palavra em cor vermelha induziu os respondentes a pensar que se tratava de um link. Tentou-se também iniciar nova procura por livros através de navegação local por categorias de assuntos (situado à esquerda), mas os resultados trouxeram títulos de lançamento não condizentes com a primeira busca e em quantidade exagerada de resultados, desanimando os usuários a vasculharem as páginas e páginas de opções. O comentário de um dos participantes ilustra bem a situação: – “os links do autor não condizem com o primeiro livro. Vou te falar que perdi um pouco a certeza de estar comprando o (primeiro) livro correto”.

O site da livraria Siciliano apresenta, dentro da página de informações dos livros, “produtos relacionados”, “produtos do mesmo artista” e “produtos de mesma área”. Apesar da abordagem positiva, os resultados não se mostraram condizentes com os primeiros livros buscados e muito aquém das expectativas dos usuários. Observou-se que a categorização dos livros se mostra na maioria das vezes equivocada trazendo resultados frustrantes, e até cômicos, para os participantes. Cita-se como exemplo o livro “Sabedoria das multidões” trazer indicações como a “Arte da Guerra” e “O monge e o executivo”, ambos os resultados foram considerados pelo usuário como não condizentes com sua primeira busca. O livro na “Toca dos leões”, sobre os fundadores da W/Brasil trouxe indicações consideradas desassociadas. As indicações apresentadas mostram-se relacionadas ao segmento comunicação e biogra!as resultando em correlações como “O corpo fala comunicaçao não-verbal”. A participante declarou como – “nada a ver! Não tenho nenhum interesse de comprar um segundo livro com essas indicações”.

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Mesmo quando direcionados pelo autor, ainda assim o sistema apresentou falhas por conta de livros escolhidos pertencerem a nichos especí!cos não apresentando nenhuma outra publicação do mesmo autor ou apresentando livros de mesma autoria, mas de temas extremamente díspares. O resultado mais curioso foi proveniente do erro de inserção do nome da tradutora junto ao escritor de Cultura da Convergência, de Henry Jenkins, pelo site: ao clicar-se em “produtos do mesmo artista”, resultados mostraram apenas outras obras da tradutora (pois não haviam outros livros de mesmo autor), como o “Almanaque Jornada nas Estrelas”que atendem a um público completamente diferente. Em meio a sua risada a participante complementa: – “Não tem nada a ver com o livro!”. Todos os participantes demonstraram frustração com as correlações e não se sentiram seguros para comprar um livro indicado. Algumas situações trouxeram incerteza da primeira escolha, mostrando-se um fator relevante para con!ança de compra nos sites.

O site da livraria Nobel mostrou-se o mais difícil de averiguar o sistema de recomendações, dado que quase todos os livros de nicho pesquisados não foram encontrados no site. O único livro encontrado foi “Na Toca dos Leões”. A partir da primeira busca, a opção “clique aqui para ver outros produtos deste assunto”é di!cilmente notado pelos usuários por ter um aparência muito similar com o link próximo acima “clique aqui para saber qual o prazo de entrega para sua cidade”. Além da similaridade, as opções clicáveis não seguem as convenções culturais de links e são confundidos frequentemente por texto estático. Nota-se que veri!cações relativas a esta sessão durante o Think-aloud Protocol con!rmam dúvidas apresentadas durante aplicação da Matriz de Prioridade (Renzi e Freitas 2010), com usuários não encontrando intuitivamente as indicações. Os livros apontados pelo site seguem

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categorização de livros, mas apresenta-se com uma associação de segmento e assuntos mais simplista, resultando em indicações muito díspares da primeira busca e com grande número de resultados, desanimando os usuários a procurarem além da primeira página de sugestões de títulos. Os títulos correlacionados com “Na toca dos leões” mostraram-se incoerentes com o assunto. Vale citar como indicações desassociadas os livros “Cem líderes espirituais que mudaram o mundo”, “48 variações sobre Bach” e “A 600 graus Celsius”. A usuária complementa: “Os livros não tem nada a ver. Eu não clicaria em nenhum destes”.

Apesar dos sites observados abordarem indicação de livros a partir de uma primeira escolha com direcionamentos diferentes, veri!cou-se que o ponto comum é a insatisfação do usuário e impossibilidade de “esbarrar” em outros livros a partir de uma primeira busca objetiva. O problema é agravado pelo fato das indicações inconsistentes das três livrarias gerarem dúvidas quanto a veracidade da primeira busca objetiva, trazendo resultados negativos para con!abilidade do usuário no site.

4 Dicussão e conclusãoObservou-se que os usuários, participantes do Think-aloud Protocol, demonstraram propensão a desistência de compra durante as tentativas de execução das tarefas propostas. Fatores relacionados a planejamento equivocado da usabilidade e falta de informação objetiva nas três livrarias on-line mostram-se principais agentes de incertezas quanto a compra. Respondentes explicitaram continuar a executar as tarefas propostas por se tratar de uma simulação, mas que em situação real de procura e compra de livros não !nalizariam as etapas e desistiriam da compra nos sites resultando em 100% de desistências.

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Entre os fatores indicados como gatilhos de descon!ança e incerteza que resultariam em desistência citam-se: (1) resultados de busca errados ou em forma de listas de categorias, (2) falta de imagem de capa, (3) associação errada de autoria, (4) disposição confusa sobre frete e valores nas etapas de compra, (5) correlação equivocada de livros que levam incerteza de primeira escolha, (6) informação de sinopse longa e sem conteúdo relevante, (7) di!culdade de se encontrar relação de autores envolvidos em publicação, (8) di!culdade de se encontrar livro através de autoria, (9) resultado de livro com possibilidade restrita para compra em conjunto (Na toca dos leões + O mago).

Notaram-se também fatores que geraram incerteza nos participantes e aumentaram descon!ança nos sites, mas que não necessariamente interromperiam a compra. No entanto, o acúmulo de incidência poderia gerar desistência. Dentre os gatilhos de descon!ança mencionados citam-se: (1) informações importantes dispostas em letras miúdas na etapa de compra, (2) muitas páginas de resultado de livros sem ligação com o livro procurado, em tentativa de prevenção de erro de digitação, (3) erro de CEP sem indicação precisa, (4) utilização do termo “prazo de postagem” ao invés de “prazo de entrega” de livros, (5) aplicação equivocada de selo de desconto e selo de frete grátis, (6) falta de sinopse em primeiro contato visual com o livro.

Os problemas de usabilidade e diagramação observados na homepage não in"uiram diretamente em desistências ou descon!ança. Mostraram-se a princípio ignorados pela utilização prioritária da ferramenta de busca. Quando pedidos para comentar sobre o primeiro impacto visual do site, todos os respondentes mostraram incomodados com o atropelamento cognitivo de informações.

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Assim, como exposto em pesquisa anterior de Banati, Bedi e Grover (2006), a aplicação da técnica Think-aloud Protocol aponta a correlação entre usabilidade de um sistema e con!abilidade dos usuários, onde problemas de usabilidade podem acionar gatilhos de descon!ança que tragam a desistência de compra pelos usuários e busca dos produtos em lojas concorrentes. Mesmo sendo os livros itens relativamente de menor preço e não apresentarem o perigo de mal funcionamento ou defeito, os respondentes mostraram-se inclinados a não arriscar de comprar um livro errado ou que apresentasse alguma possibilidade de erro no processo.

Em contrapartida uma experiência de navegação objetiva e satisfatória que não traga dúvidas nas informações dispostas podem auxiliar na construção da con!ança no sistema e incrementar as possibilidades de compra. A técnica Think-aloud Protocol mostra-se como ferramenta e!caz para apontamento e aprofundamento de problemas de usabilidade. Acrescenta-se a indicação de seleção qualitativa e correta de participantes do método para que não haja distorções na observação ou expectativas diferentes do usuário direto do sistema.

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Sobre os autoresSydney Freitas, DScProfessor Adjunto da Esdi/Uerj [email protected]

Adriano Bernardo Renzi, MScEsdi/Uerj, 2010.Professor da Faculdade da [email protected]

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On-air look Futura: Em busca de uma identidade nacionalGuilherme Cunha Lima, PhD

Axel Sande, MSc

O foco deste capítulo é o processo de criação de projetos de identidade corporativa na área do motion graphics e suas relações com o campo de estudo do design grá!co. A escolha do projeto de identidade corporativa desenvolvido para o Canal Futura é explicável tanto por suas características singulares quanto pela relevância da emissora na formação da nossa identidade nacional. Tentaremos identi!car os obstáculos para a inserção de projetos grá!cos “em movimento” na história do design grá!co brasileiro.

Atualmente, as possibilidades geradas pelo sinal digital aliadas aos avanços tecnológicos fazem com que precisemos reinventar as relações com os meios eletrônicos de comunicação em larga escala. Já podemos planejar a assistência de um programa televisivo e determinar uma série de funções não lineares moldadas a interesses pessoais. Funções interativas permitem uma verdadeira radicalização no conceito de “compressão tempo-espaço” e pro!ssionais de comunicação estão tentando prever como os canais de TV poderão se comunicar com seus espectadores diante de tamanha liberdade. A processo de convergência das mídias parece irreversível e nos assombra na mesma medida em que nos estimula a buscar novos caminhos de interação. Contudo, diante do cenário que se apresenta há espaço para a atuação dos designers grá!cos? Acreditamos que a análise dos processos de identi!cação do Canal Futura nos auxilia na aproximação das

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atividades contemporâneas voltadas à aquisição de informações em sistemas, analógicos ou digitais, de comunicação.

O Canal Futura - suas relações e in"uênciasEm 2007, quando o Canal Futura completou 10 anos de exibição, seu projeto de identidade corporativa era praticamente o mesmo do seu lançamento. O caso é uma exceção aos parâmetros televisivos nacionais, tanto em relação às TVs abertas quanto para canais por assinatura, nos quais muitas emissoras desenvolvem uma política de reapresentação periódica de suas identidades visuais. A manutenção não se deve à falta de recursos materiais ou humanos, uma vez que a emissora é !nanciada por 12 grupos privados brasileiros de grande porte, dentre eles, a Rede Globo. Por ter sido concebido e implementado pela Fundação Roberto Marinho, o projeto pôde contar com a estrutura da Globosat, empresa responsável pela produção e exibição de canais por assinatura e integrada às Organizações Globo. O principal argumento para a criação do Canal Futura era a possibilidade de transformá-lo no espaço de propagação dos três principais objetivos de atuação da Fundação Roberto Marinho: a preservação do patrimônio histórico brasileiro; a criação de uma consciência ecológica nacional; e a democratização de conteúdos educativos de qualidade para toda a população do país. Tais objetivos, administrados em conjunto, deveriam contribuir para a construção de um conceito de brasilidade mais abrangente e multicultural, evitando idealizações e estereótipos previamente impostos pelos discursos dominantes. O Canal Futura deveria re"etir a imagem de um Brasil resultante dos embates entre os mais diversos fenômenos culturais e as várias identidades étnicas encontradas em solo nacional. Todavia, como qualquer outro canal televisivo, sua identidade corporativa deveria sobreviver à competitividade

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do mercado, ao mesmo tempo que se relacionasse com as mais diferentes linguagens visuais, advindas da busca pelos discursos menos dominantes. Como seria possível evitar con"itos ou incongruências no relacionamento entre uma enorme diversidade de linguagens? Como projetar uma identidade corporativa televisiva consistente que simultaneamente atendesse à !loso!a institucional de valorização da diferença? Como prever uma linguagem audiovisual que fomentasse a convivência dialógica e produtiva?

Um projeto social da iniciativa privada e do interesse públicoNo dia 22 de setembro de 1997, às 19h, o Canal Futura iniciou suas transmissões. Era a concretização de mais um projeto da Fundação Roberto Marinho em parceria com organizações da iniciativa privada. A Fundação bene!ciava-se da liberação de espaço em canais de televisão, rádios, revistas e jornais vinculados às Organizações Globo. Isso impulsionava o seu poder de implementação de projetos como o Telecurso 2º Grau (para alunos do ensino médio) que havia viabilizado, de forma pioneira, um sistema educativo de grande magnitude através da rede comercial de televisão. Tal projeto gerou imediata notoriedade às ações no campo da teleducação. Em 1981, o Projeto Telecurso passou a atuar também com conteúdos dirigidos ao ensino fundamental e em 1998, no ano seguinte ao lançamento do Canal Futura, a Fundação já havia desenvolvido uma estrutura capaz de mobilizar mais de 13 milhões de alunos em 12.600 escolas públicas brasileiras, além de encontrar-se conveniada a todas as secretarias de educação do Brasil.

Ainda durante a fase de pesquisas para a escolha do nome desse novo canal televisivo, foi constatada uma certa resistência à ideia de vinculá-lo a conceitos diretamente relacionados à

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educação. Termos como “sala de aula”, “professor”, “quadro-negro” e “escola” eram vinculados a modelos antiquados ou negativos, impostos por autoridades governantes. A partir dessa percepção, a Fundação havia assumido cautela em relação ao posicionamento do projeto. Acreditava-se que o telespectador brasileiro vivia uma “relação de amor e ódio” com a educação nacional e tenderia a se afastar de programas com conteúdo explicitamente educativo. O Canal Futura teria então mais um objetivo, o de reverter esse condicionamento e fazer coincidir audiência com conteúdo relevante. Como em outros projetos da Fundação Roberto Marinho, o Canal Futura deveria ser viabilizado na forma de parceria com a iniciativa privada. As parcerias para o !nanciamento da emissora contam com 12 grupos privados brasileiros de grande porte através de um sistema de gestão de mantenedores, o que possibilita a criação de uma estrutura privada, todavia não comercial. Dentro do modelo de gestão escolhido, as empresas que o viabilizam !nanceiramente assumem um lugar no Conselho Consultivo do Canal Futura e auxiliam nas diretrizes do conteúdo da programação e na avaliação dos resultados dos projetos desenvolvidos. Suas marcas institucionais são incluídas nas peças grá!cas veiculadas no ar assim como no material grá!co produzido e nas peças promocionais em diferentes mídias. As ações sociais dos mantenedores recebem cobertura nos telejornais do canal e passa a ser permitida a utilização da marca do Futura em seus produtos e campanhas de comunicação institucional. Os mantenedores também têm o direito de veiculação dos seus acervos voltados a temas educacionais dentro da grade regular da emissora. Dentro desse modelo de gestão, as empresas mantenedoras assumem o compromisso de uma doação anual que seja su!ciente para a manutenção estrutural do canal. O setor privado sustenta o

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projeto sem a necessidade da venda ou veiculação direta de espaços comerciais.

GloboSat e a reconstituição histórica da televisão por assinatura no BrasilEm 1997, as únicas duas instalações físicas da Fundação voltadas à comunicação visual eram o Centro de Pós-produção (CPP), onde se produziam as chamadas dos programas Globo Ciência, Globo Ecologia e Telecurso 2º Grau, e o Setor de Programação Visual, responsável pela concepção e execução de peças grá!cas impressas. A estrutura envolvia um número reduzido de pro!ssionais especializados. A transmissão do sinal do Canal Futura estava a cargo da Globosat, parceira indispensável para a concretização do projeto, tanto em relação a equipamentos quanto a recursos humanos.

Figura 1: Marcas dos canais Globosat.

Na época, a Globosat atuava na elaboração de conteúdo e na distribuição de seus quatro canais nacionais em funcionamento: Multishow, Top Sports (que, no ano seguinte, passaria a chamar-se SporTV), GNT e Telecine (Figura 1), mais tarde transformado em uma joint-venture com quatro distribuidores de !lmes de Hollywood: Universal Pictures, Paramount, 20th Century Fox e Metro-Goldwyn-Mayer. Na década de 1990, os canais por assinatura ainda eram recentes no mercado brasileiro e historicamente muito diferentes da estrutura norte-americana,

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iniciada na década de 1940. A transmissão a cabo deixara gradativamente de ser considerada apenas uma solução de acesso a comunidades distantes para tornar-se uma frente de negócios bastante lucrativa e direcionada a milhões de possíveis consumidores, principalmente, em grandes centros urbanos brasileiros. Os novos canais por assinatura deveriam oferecer conteúdos dirigidos a um determinado público-alvo e explicitando a temática a ser veiculada. Essa diferença em relação às TVs abertas determinaria a busca pela abordagem mais adequada que partia de uma questão: Como convencer o público brasileiro a pagar pelo acesso a alguns canais, enquanto os principais canais nacionais estavam disponíveis para a maioria da população, gratuitamente? A resposta parecia estar na transformação dos canais por assinatura em algo completamente diferente dos canais já existentes no mercado brasileiro, tanto no conteúdo quanto em sua aparência. Se a referência principal de identidade corporativa para a TV aberta no Brasil, era (e ainda é) a Rede Globo, pode-se encontrar, por oposição, alguns parâmetros que determinariam a e!ciência da linguagem escolhida para os canais por assinatura nacionais. O Canal Futura foi forjado dentro deste ambiente e deveria encontrar sua própria identidade no universo da mídia.

O projeto de identidade FuturaPara podermos dar continuação a esse capítulo, devemos apresentar alguns termos recorrentes no repertório semântico dos pro!ssionais atuantes no meio televisivo. Senhora e senhores, uma pausa para o nosso pequeno glossário!

Broadcast design: Broadcast já representou especi!camente o processo de radiodifusão – isto é, a propagação de ondas

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moduladas através do espaço –, utilizado para a transmissão do sinal das TVs abertas e rádios. Atualmente as transmissões para grandes números de receptores podem ocorrer por meio de dispositivos distintos, como satélite, cabos, !bras ópticas e linhas telefônicas, por isso o termo broadcast passou a ser utilizado de maneira mais genérica e literal, se referindo a “transmissão em larga escala”. Broadcast design seria, então, a atividade do design voltado ao projeto de peças eletrônicas de comunicação em larga escala. Flip book: Coleção de imagens organizadas sequencialmente, em geral no formato de um livreto para ser folheado dando a impressão de movimento e criando uma sequência animada sem a ajuda de uma máquina.Motion graphics: Engloba as peças de comunicação que utilizam a sugestão de movimento a partir do fenômeno ótico da persistência da visão. Uso de tecnologia de produção de cinema, vídeo ou animação para gerar grá!cos. As produções de motion graphics costumam ser veiculadas em mídias eletrônicas e combinadas ao uso de áudio; porém, a criação de um "ip book pode ser considerada parte da atividade que, traduzida ao pé da letra, quer dizer “grá!cos em movimento”.On-air look: Denominação de um tipo especí!co de projeto de motion graphics. Sua função é determinar a linguagem audiovisual de um canal televisivo e aplicá-la às mais variadas peças de motion graphics. Seria então, o melhor termo para designar o projeto de identidade corporativa de um canal televisivo.Persistência da visão: Fenômeno ligado ao olho humano, que retém uma imagem por frações de segundo após seu desaparecimento. Com isso, nosso cérebro é levado a perceber uma rápida sucessão de imagens estáticas como uma imagem

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contínua. Esse breve período durante o qual cada imagem persiste sobre a retina permite que imagens consecutivas sobreponham-se, criando a sensação de continuidade. Com base neste fenômeno, a técnica da animação pôde ser concebida.Take: Tomada. Inicia-se quando se liga a câmera e dura até que ela seja desligada.Videogra!smo: O uso do termo é frequente no meio televisivo brasileiro. Parece ser uma versão para motion graphics, o que tornaria seu emprego indicado para textos em português. Tanto videogra!smo quanto motion graphics referem-se a projetos grá!cos para produtos audiovisuais, mas o termo restringe os projetos à produção em vídeo, o que limitaria a sua aplicabilidade. Os principais dicionários da lingua portuguesa não reconhecem o termo videogra!smo, da mesma forma que omitem o termo cinegra!smo. Este último é empregado como sinônimo de cinegra!a ou cinematogra!a. Se partirmos do mesmo raciocínio, aparentemente lógico, e considerarmos videogra!smo sinônimo de videogra!a, colocaríamos todo o processo de concepção e execução da mensagem transmitida alheia à atividade do videogra!smo. Interpretação su!ciente para derrubar a adequação do termo às necessidades taxonômicas dessa pesquisa.Wipe (transição): É um efeito de mudança gradual de uma imagem para outra, com margem distinta que forma uma !gura. Uma margem simples, uma !gura geométrica ou o ato de virar uma página são todos exemplos de transições.

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On-air lookEm 1997, a agência de design Gédéon foi convidada a projetar a identidade corporativa do Canal Futura. Hans Donner, responsável pela linguagem grá!ca da Rede Gobo, o designer novaiorquino Martin Hara e a empresa brasileira Estudio Noz também chegaram a ser contactados para o desenvolvimento do projeto mas as negociação não avançaram. Havia uma pré-disposição para a escolha da empresa francesa que havia projetado, dois anos antes, o on-air look do Canal Telecine (Na época existia apenas um canal que exibia vários gêneros de !lmes). Muitos dos pro!ssionais responsáveis pela implantação do Canal Futura haviam sido recrutados entre os executivos da Globosat. Era necessário escolher o nome do novo canal antes de ser concebido seu projeto de identidade visual corporativa. Alguém do alto escalão das Organizações Globo teria proposto “TV Zé” e argumentava que qualquer nome funcionaria contanto que a divulgação fosse feita através da Rede Globo. A palavra “Futura” foi sugerida pelo jornalista Fritz Utzeri em uma das muitas reuniões sobre o tema e onde inúmeras opções foram analisadas. Depois de previamente selecionado “TV Futura” houve negociações para a obtenção de seu direito de uso, pois uma agência de publicidade paulista detinha o registro do nome, e con"itava com o campo de atividade do canal a ser implantado. Depois de concluído o processo de registro nominal, deu-se início à preparação do projeto francês. Representantes da Gédéon vieram ao Brasil para apresentar a primeira proposta. As opções de marca já haviam sido apresentadas e variavam apenas nas combinações de cor. O logotipo círcular continha em sua área interior central a palavra Futura alinhada à direita. O PANTONE 354C tornou-se a cor institucional do canal podendo ser usada com a tipogra!a vazada em fundo branco ou preto (Figura 2).

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Figura 2: Proposta de marca Futura.

A primeira versão do on-air foi considerada inadequada. Era radical demais para a estética brasileira e continha elementos grá!cos em preto sobre fundos branco que pareciam remerte-se a um gra!smo urbano ou a produções de experimentalismos cinéticos (Figura 3). Era visualmente impactante porém, divergia em muito do discurso grá!co produzido nas campanhas institucionais da Fundação Roberto Marinho. Uma segunda proposta foi desenvolvida e logo aprovada, sendo colorida e mais dirigida a um discurso de “brasilidade” do que a opção anterior.

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Figura 3: Peça de motion graphics Canal Futura (1ª versão).

Nos mesmos termos acordados no projeto Telecine dois anos antes, a Gédéon deveria concluir o on-air look Futura com equipamentos e mão de obra nacionais. Para isso, foram trazidos para o Brasil três coordenadores, que deveriam !nalizar a produção do projeto junto aos pro!ssionais brasileiros. Na época, a tecnologia voltada ao motion graphics era muito inferior à atual, e as estruturas aptas à !nalização de projetos desse porte eram bastante reduzidas. Em 1997 eram necessárias, em média, duas semanas para produzir-se 40 segundos animados no 3D Studio,

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versão 3.11. Esse era o único software disponível para modelagem e manipulação de grá!cos tridimencionais e oferecia apenas dois canais simultâneos para composição, um para o áudio e outro para o vídeo. Os melhores equipamentos disponíveis estavam nas instalações da RBS TV, parceira da Rede Globo no estado do Rio Grande do Sul, e para onde dirigiram-se franceses e brasileiros a !m de !nalizar o projeto.

Um timing re"exivoA trilha sonora do projeto !cou por conta do maestro Zezinho Mutarelli e seria produzida em São Paulo. O projeto apresentava várias semelhanças com o on-air look Telecine (Figura 4), com a valorização de composições visuais simples e arejadas.

Figura 4: Projeto Gédéon para Canal Telecine.

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Por se tratar de um canal voltado à educação, investiu-se na legibilidade dos elementos na tela. Em sua maioria, as palavras eram escritas em minúsculas na cor preta sobre fundo branco. Tanto as imagens quanto a trilha sonora deveriam seguir um ritmo mais lento e re"exivo. O objetivo era fazer com que o espectador reconhecesse o canal através da diferença na velocidade do movimento e do áudio. A grade de programação ainda estava sendo de!nida, assim como a estratégia de apresentação que deveria ser adotada para um canal privado de teleducação. Tudo era muito novo. Por isso mesmo, a identidade visual concebida pela Gédéon precisaria prever várias modi!cações, de forma a abarcar possíveis redirecionamentos. A vinheta de assinatura do Canal Futura apresentava a marca (Figura 5), não como uma esfera, mas como uma pastilha achatada que virava sobre o próprio eixo, ora formando a !gura de um círculo, ora uma elipse vertical, totalmente verde. Algumas imagens foram selecionadas pela Fundação Roberto Marinho para representar o conceito de brasilidade. Elementos como o berimbau e imagens do folclore brasileiro seriam inseridos ao projeto de lançamento. Estava abolida qualquer imagem que se remetesse diretamente à educação, como caderno, lápis ou quadro-negro. Os valores da escola tradicional seriam questionados, assim como suas representações simbólicas. A valorização do conhecimento viria através da apresentação de imagens interessantes, isto é, que valessem a pena ser conhecidas. Ursos polares e "ores silvestres seriam veiculados junto a centros urbanos e corridas automobilísticas. O on-air look da nova emissora tentaria deixar clara a ideia de tolerância. O Canal Futura deveria transformar-se em um espaço de convivência pací!ca.

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Figura 5: Vinheta de assinatura Canal Futura.

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Normalmente as peças de um on-air look podem ser divididas entre promocionais e institucionais. As primeiras são referentes à divulgação da grade de programação, como por exemplo: chamadas “a seguir”, “daqui a pouco”, “ainda hoje”, enquanto a segunda diz respeito a ações de autopromoção corporativa, como teasers, vinhetas institucionais e marcas d’água (ID Bug). Sua coerência narrativa deve permitir que o telespectador identi!que o momento especí!co do intervalo dentro da grade de programação e assimile os conceitos que de!nem o posicionamento do canal. Ainda em relação às peças promocionais, encontramos aquelas dirigidas a cada programa em particular, como aberturas e encerramentos. Elas envolvem a programação, seguindo a lógica do packaging para produtos, separando-os em unidades reconhecíveis e consumíveis (Costa, 2005). Uma qualidade em relação ao termo “on-air look” é direcionar nossa compreensão para o fato de que a imagem mais importante para um canal televisivo é aquela recebida por seu espectador diante de uma tela. É a parte do projeto que “vai ao ar” e engloba necessariamente o uso de áudio e imagens em movimento. As peças institucionais impressas tendem a ser percebidas como subordinadas ao on-air look.

Implantação e administraçãoAssim que o projeto foi !nalizado na RBS TV, duas !tas Beta foram entregues, uma para ser arquivada e outra para o uso da emissora. A !ta master permitia que as peças grá!cas fossem colocadas no ar, depois de feitas as alterações necessárias. No caso de peças informativas, referentes à divulgação da grade de programação (chamadas “a seguir”, “daqui a pouco”, “ainda hoje” etc.) fazia-se uma cópia da !ta master e inseria-se os caracteres diretamente na ilha de edição. Como os recursos de manipulação

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eram bastante limitados e os controladores das máquinas, muitas vezes, não compreendiam as especi!cidades do projeto de design, pequenas mudanças começaram a ocorrer na aplicação das fontes. Trocava-se bold por itálico, alteravam os corpos e composições preestabelecidas. O risco de descaracterização do projeto de identidade fez com que os coordenadores do Canal Futura colocassem sob a responsabilidade de um pequeno grupo de designers a administração, adaptação e desenvolvimento das peças do on-air look. A antiga ilha grá!ca, onde esses pro!ssionais trabalhavam, foi transformada em um núcleo de videogra!smo. O núcleo contava com dois computadores IBM 486 e produzia as alterações no CorelDraw 6, utilizando-se dos recursos de máscaras e camadas (layers alpha). O programa vetorial Illustrator ainda não havia sido lançado em versão compatível com os sistemas operacionais Windows e mantinha-se inacessível para computadores IBM. Na ilha de edição eram feitos os encaixes determinados. Posteriormente, o núcleo de videogra!smo assumiu, além da supervisão e desenvolvimento do projeto de identidade, a produção de aberturas de programas e a construção de peças piloto. A emissora ainda estava sendo estruturada e os designers passaram a projetar as identidades visuais dos novos programas. Basicamente, tais projetos consistiam de uma abertura, um encerramento e algumas cartelas para o miolo dos episódios.

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Figura 6 – Peças institucionais Canal Futura (station id’s).

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A !ta master originalA !ta master continha aproximadamente 35 minutos de gravação e iniciava-se com um kit para a produção de peças institucionais (station id’s). As peças institucionais partiam de uma composição geométrica formada por círculos, colocados lado a lado, sobre a tela branca. Nos primeiros exemplos apresentados, de 10”, sete círculos formam uma faixa central. Essa tarja ocupava toda a largura e 20% da altura visíveis. Em cada círculo era inserido um take diferente. A combinação das sete imagens gerava uma composição multicolorida e praticamente abstrata. Halos na cor preta (em out line) eram sobrepostos aos círculos. Cada halo tinha sua escala ampliada e desfocava-se gradativamente, dando a impressão de mover-se na direção frontal até sair do campo visual do espectador (Figura 6). O take inserido no círculo central, o 4º numa !la de 7, era reutilizado numa escala maior e su!ciente para ocupar toda a tela (640 x 480 pixels). A passagem dava-se em corte seco no 4º segundo, contudo, a movimentação dos halos funcionava como um mecanismo de transição da narrativa, reforçada pela permanência do vídeo até retornar em corte à composição anterior, formada pelos 7 círculos. Essa segunda composição era descortinada da esquerda para a direita. Esse wipe !nal era seguido pela assinatura animada do canal. Dez exemplos de peças institucionais foram apresentados, seguidos de duas máscaras-guia que ofereciam uma in!nidade de opções diferentes para composições com círculos.

Uma outra fase do projeto de identidade trazia o título original “Futura on air promo system” e apresentava as peças promocionais de motion graphics. Era um segundo kit voltado à produção de chamadas para um ou mais programas. A master oferecia três exemplos de chamada. No primeiro, as imagens escuras exigiam a aplicação de textos na cor branca, a segunda chamada era o caso inverso, com aplicação de texto na cor preta,

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seguida de um exemplo de chamada para múltiplos programas. Nessas peças, um gabarito também determinava quais fontes tipográ!cas, corpos e entrelinhas deveriam ser usados nas informações referentes aos dias da semana, meses do ano, títulos dos programas e textos complementares, como “ainda hoje”, “a seguir”, “hoje à noite”, “segunda a sexta”, “amanhã”, “amanhã à noite” e “estreia”.

O projeto havia sido pensado para que todas as peças de motion graphics funcionassem como interfaces entre as mais diversas mudanças no repertório visual do canal. A alternância dos vídeos, dentro das máscaras geométricas, preparam o espectador para o próximo corte, resultado da saída da peça grá!ca e da entrada de algo diferente e fora do controle dos designers responsáveis pela concepção do on-air look.

A parte impressa do projeto de identidadeA Gédéon também desenvolveu um guia para o uso de peças grá!cas impressas, chamado de “Graphic manual”. Nele estavam apresentados a família tipográ!ca Helvetica neue extended, projetos grá!cos para papel de carta, envelopes, cartões de visita e possíveis brindes como canetas com o logotipo da emissora.

Maior identi!cação do breakA necessidade de identi!car melhor os horários do intervalo aliada ao surgimento de novos programas grá!cos, que permitiam maior intervenção nas peças, intensi!caram a produção de motion graphics. Como já explicado anteriormente, o modelo de gestão, com as empresas mantenedoras, sustentava o projeto Futura sem a necessidade da veiculação direta de espaços comerciais. Isso acarretava um efeito negativo que era o excesso de homogeinidade na linguagem audiovisual da emissora. Algumas pesquisas feitas

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com espectadores do Canal Futura indicavam a di!culdade de perceber a diferença entre os conteúdos institucional e a grade de programação. A solução encontrada era o investimento nas identidades visuais de seus programas. A identidade corporativa do Canal Futura deveria contrastar o su!ciente para ser percebida, e isso era um convite a experimentações.

A maior qualidade dos dois projetos desenvolvidos pela agência Gédéon (para os canais Telecine e Futura) era a capacidade de valorizar as linguagens mais diversas no momento em que estas eram introduzidas. Podemos citar como exemplos as vinhetas para a divulgação de episódios dos programas Mundo.doc (Figura 7), Globo Ecologia (Figura 8) e Teca na TV (Figura 9). A cada intervalo, durante e entre programas, o objetivo seria a divulgação de sua grade de programação e da mensagem institucional da emissora. Neste momento o canal funcionaria como um veículo dirigido aos assuntos abordados pela programação, o que permitiria aos espectadores apreender informações ligadas ao tema e à data de cada episódio, assim como valorizar o local onde tais episódios viriam a ser apresentados. Fora dos intervalos o canal seria transformado no espaço onde, de fato, tais programas são expostos. Para o projeto de identidade concebido para o Canal Futura, cada programa precisaria construir uma identidade visual própria e criar um vínculo direto com seus espectadores. As peças promocionais do on-air look seriam projetadas para adaptar-se ao repertório grá!co do programa a ser divulgado, e posteriormente exibido, se bene!ciando da variedade de linguagens veiculadas. As transições entre a linguagem visual do Canal Futura e a dos diferentes programas se dão em corte seco auxiliadas por composições de aros circulares em movimento e fundo branco. Muitas soluções poderiam ser encontradas para atingir o mesmo objetivo porém,

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Figura 7: Vinheta de passagem Mundo.doc.

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Figura 8 – Vinheta de passagem Globo Ecologia.

pode-se a!rmar que a simplicidade da receita aqui apresentada mostra-se e!caz, impactante e atemporal. Nos casos dos episódios Tubarão – deus ou demônio? do programa Mundo.doc e Bacia do piracicaba do programa Globo Ecologia, o gra!smo institucional de interseção é integrado à linguagem grá!ca dos programas, mesmo estes sendo absolutamente distintos.

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Figura 9: Vinheta de passagem Teca na TV.

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Figura 10 – Redesenho do on-air look Futura.

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MudançasO on-air look original, com seus círculos e repetições de vídeos, permaneceu inalterado por mais de uma década contudo, há menos de um ano, um projeto de redesenho da identidade corporativa começou a ser veiculado. A adaptação do projeto está sendo feita pelo departamento de videogra!smo da emissora. O maior argumento para a mudança foi o impedimento de uso da marca fora dos fundos chapados branco ou preto. O logotipo também foi levemente modi!cado, e a família tipográ!ca Helvetica (Figura 10), considerada conservadora demais para os padrões atuais, foi substituída pela FF Clan. A proposta de redesenho ainda está em fase de avaliação e abre mão do uso do fundo branco nas transições entre diferentes linguagens.

ConclusãoO on-air look desenvolvido para o Canal Futura representaria um projeto em sintonia com questões relevantes para o mercado do design de comunicação contemporâneo. Veri!camos sua relevância, em primeiro lugar, pelos fatos relacionados à sua implantação. O projeto do novo canal era a concretização de um espaço de convergência e aprofundamento das ações da Fundação Roberto Marinho em prol de um Brasil mais moderno e auto consciente. Desde o !nal da década de 1980, o termo “brasilianização” passara a ser utilizado por autores europeus e norte-americanos para designar sociedades marcadas por processos extremos de heterogeneização (Cocco, 2009, p. 27). O movimento de globalização pós-fordista teria gerado uma nova relação entre o Brasil e as potências centrais, passando-nos gradativamente da representação de “país do futuro” para “o futuro do mundo globalizado”. Brasilianização apontava para o crescimento de questões ligadas à fragmentação social e perda

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de direitos em centros urbanos onde a favelização coexistia no mesmo espaço com condomínios de classes sociais privilegiadas. A posição de que o futuro do mundo globalizado evoluiria para uma estrutura próxima a encontrada nas metrópoles brasileiras parecia atrelar-nos à um sistema bastante combatido. Se o futuro de todos era a desigualdade encontrada no Brasil dos anos 1990, o futuro brasileiro não poderia ser diferente, assumindo para nós brasileiros a impossibilidade de transcender tal destino. O projeto de um canal chamado “Futura” surgiria para tentar reverter tais impasses. A nova emissora seria !nanceiramente viabilizada através de um grupo de mantenedores formado por empresas do setor privado. Tal estrutura liberou o Canal Futura da necessidade de veiculação comercial e permitiu assumir um viés mais experimental.

Durante os 10 primeiros anos, o Canal Futura transformou-se em um agente articulador de comunicação fundamentado pela convivência dialógica e valorização da diversidade narrativa. Seu projeto de identidade corporativa foi desenvolvido para adaptar-se à abrangência do repertório grá!co da grade de programação. A di!culdade de ilustrar a ideia mais ampla de “conhecimento”, evitando o uso de elementos relacionados aos métodos tradicionais de ensino, como lápis, caderno ou quadro-negro, talvez tenha contribuído para a escolha de um sistema dialógico de identidade corporativa. Compreender os desa!os impostos a um projeto de design pode ser tão imprescindível para sua avaliação quanto o questionamento dos resultados obtidos. “O design precisa ser reconhecido como uma atividade presente na nossa história, [...] como um elemento formador da nossa cultura, como interface entre as necessidades de uso e a tecnologia”. (Lima, 2005) A partir de um projeto de design, pode-se compreender e até revisitar acontecimentos passados,

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da mesma maneira que introduz a re"exão sobre necessidades futuras. A criação da identidade corporativa do Canal Futura, projetado em 1997, nos parece bastante representativa. A “hipersemantização” das imagens das empresas, apontada em 1988 por Norberto Chaves como um fenômeno crescente, tornou-se a meta norteadora dos projetos de concepção e administração de identidades corporativas nas últimas duas décadas. O consumismo passara a ser apresentado como a forma tardia do capitalismo (Barber, 2007, p. 288) transformado no passaporte para uma in!nidade de “mundos possíveis”, cada vez mais distantes do conceito objetivo de utilidade. Como analisadas no primeiro capítulo, as identidades contemporâneas, individuais e coletivas, viveriam intensa subjetivação e multiplicariam as possibilidades de construção da cultura material global. Nunca tanta informação esteve disponível em tantos meios aptos para propagá-la. Enquanto as discussões em torno dos valores pós-modernos e hipermodernos são igualmente questionáveis, pode-se garantir que a contemporaneidade foi transformada por uma revolução digital. Vivemos na Era da Informação. O adensamento do campo informacional passou a exigir a formulação de parâmetros para a análise de identidades corporativas dirigidas especi!camente a meios de comunicação. Enquanto as imagens de pessoas e produtos são forjadas sob uma estrutura maleável e inconstante, o efeito contrário parece poder determinar a e!ciência de empresas veiculadoras de grandes quantidades de conteúdo. Isto indicaria uma reinterpretação dos conceitos de objetividade nas estratégias de projetos de identidade corporativa.

Os argumentos formulados neste capítulo têm o objetivo de contribuir com um processo que deveria determinar à agência Gédéon, assim como ao Canal Futura, um papel de destaque na construção histórica do design brasileiro. Contudo, para que isso

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ocorra, devemos intensi!car a inserção histórica de projetos de motion graphics compreendendo suas particularidades e intensa efemeridade.

Efêmeros digitaisPara o campo de estudo do design grá!co são considerados “efêmeros” os impressos de curta validade, como embalagens, cartazes e folheteria em geral. O valor deste tipo de impresso desapareceria de forma abrupta, passando de vital a inútil de um momento para o outro. Na dissertação Cinco décadas de litogra!a no Recife, Edna Cunha Linha aprofunda-se no tema. Para ela, efêmeros seriam os itens manufaturados com uma !nalidade temporal especí!ca, normalmente usados e jogados fora. Contudo, a pesquisa baseou-se em peças de coleção, e esse dado nos parece revelador. Muitos impressos considerados efêmeros foram, e são, cuidadosamente guardados e conservados. Maurice Rickards teria explicado sua motivação para reconstituir a história de determinados impressos, ditos efêmeros, com base no crescente mercado de coleções, leilões e exposições deste tipo de peças grá!cas. As coleções estariam sendo alavancadas pelo reconhecimento dos valores associados a produções de efêmeros aliado à alta qualidade e quantidade de impressos preservados. Um bilhete de bonde, ou a entrada para uma apresentação teatral, pode ser mantido intacto por décadas, se tomadas algumas poucas precauções.

No caso das produções audiovisuais a situação é distinta. Se comparada à preservação de peças grá!cas impressas, a complexa estrutura de manuseio e documentação de projetos grá!cos “em movimento” exige uma maior demanda de recursos. Já fala-se em “arqueologia de obras cinematográ!cas”, dada a di!culdade de manter-se produções relevantes ou de resgatá-

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las da ação corrosiva do tempo. A di!culdade se dá tanto em relação às técnicas tradicionais de !lmagem, baseadas no processo fotográ!co com o uso de sais de prata, quanto virtuais e armazenadas em discos rígidos, DVDs e !tas digitais.

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Sobre os autoresGuilherme Cunha Lima, PhDProfessor Adjunto da Esdi/[email protected]

Axel Sande, MScEsdi/Uerj, 2010. [email protected]

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Branding: passado, presente e futuro da construção das identidades através da marcaFilipe Chagas, MSc

Já conhecemos a estonteante velocidade das mudanças em nosso mundo, que nos oferta uma multiplicidade de inovações. Algumas coisas que pertencem ao nosso cotidiano acabam rapidamente parecendo obsoletas, enquanto outras atingem seu auge em momentos especí!cos. Estudiosos de design institucional, por exemplo, acreditam que a prática do branding já existia na Antiguidade, ou seja, bem antes de “estar na moda”. Dessa forma, podemos dizer que toda pesquisa sobre um assunto qualquer será incompleta – se não, impossível – se não levar em conta seu contexto. Falando, então, em marcas que designam e caracterizam empresas e produtos, devemos colocá-las em seu próprio contexto de mercado. De acordo com os estudos do designer espanhol especialista em comunicação social Joan Costa, é possível traçar uma linha cronológica de raciocínio que vai desde a pecuária no Antigo Egito aos dias de hoje, apresentando quatro momentos claros de transformação mundial que nos fornecem subsídios para um entendimento convergente de como as marcas e as teorias clássicas de identidade institucional passaram a ser vistas como o branding.

“De objetal a subjetal, a marca é o que faz ser o sujeito contemporâneo”. Com essa frase do pesquisador e professor italiano Andrea Semprini (2006, p. 12), começamos a ver que a construção das identidades é responsável por um cruzamento entre o design e o branding. Ambos necessitam ser analisados em

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um contexto ampliado por conceitos históricos e sociológicos, extrapolando os limites do quadro econômico/comercial.

É preciso deixar claro que em nenhum momento busca-se encontrar uma de!nição única para o branding. Deve-se ter em mente que viver em uma sociedade mergulhada em possibilidades exige uma análise paciente e contínua da realidade e do modo como os indivíduos estão nela inseridos. Qualquer tentativa de criar uma política que possa solidi!car as identidades sociais transitórias e incertas do momento em que vivemos levaria o pensamento crítico a um !m sem solução. Portanto, ser determinista dentro do design, considerando sua interdisciplinaridade e seu paralelismo às tendências socioculturais, signi!caria abandonar a constante evolução humana e gerar um resultado datado e obsoleto. O objetivo é desenvolver uma análise da identidade através da constituição das marcas e das identidades institucionais, para entender o branding e reposicionar o design na contemporaneidade.

Primeiro momento: o nascimento da marcaUm estudo etimológico da palavra branding pode nos dar uma ideia exata de seu signi!cado: branding vem da palavra de origem inglesa brand (“marca”). É o gerúndio do verbo to brand, que signi!ca “marcar”, utilizado para denominar o ato de marcação em animais, pedra ou barro. E a história da marca está ligada diretamente a estes fatos.

Na Antiguidade, as marcas se caracterizavam por seu modo de inscrição, fosse por incisão ou por escritura (assinatura). Os monogramas, por exemplo, eram construções que uniam a escrita ao signo grá!co. Ainda distantes do espírito mercantil, eram signos marcadores de identidade pessoal. As funções de marcar, selar e assinar se reuniram às noções de identidade, autenticidade

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e garantia, e se consolidaram no mundo comercial com a prática da marcação.

O tipo de marca que estamos examinando começa a aparecer três mil anos a.C., no Egito Antigo, onde foram encontrados rebanhos marcados a ferro para indicar o pertencimento dos animais a um determinado dono. Em templos e outras construções egípcias e gregas também foram encontradas simples marcas indicativas para posicionar e encaixar pedras umas com as outras. Estas marcas de tipo técnico não tinham a intenção de comunicar a identidade do autor. No entanto, cada o!cina tinha seu repertório próprio de símbolos e !guras.

Figura 1: Ilustração de pintura hieroglí!ca datada de 1900 a.C. encontrada na tumba de um faraó egípcio, que mostra um homem usando uma corda para puxar um boi marcado à ferro. Fonte: MOLLERUP, 1999, p. 27.

Com a atividade comercial consolidada foi preciso algo que facilitasse a identificação de origem das mercadorias e o responsável por sua circulação, uma vez que o produto era anônimo e genérico (vinho, azeite, temperos etc.) e o número de

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roubos e falsi!cações era enorme. Essa responsabilidade !cou para a embalagem: as ânforas. Descobrimentos arqueológicos romanos evidenciaram mais de seis mil marcas de oleiros e mercadores de ânforas do século VI a.C., que indicavam a localidade, o nome do oleiro ou do mercador por meio de signos alfabéticos e !guras. Além disso, por si mesmas, as ânforas já declaravam sua procedência, fosse por seu formato ou por sua cor. A combinação destes elementos constituía uma prova de reconhecimento da qualidade dos produtos, associada às marcas correspondentes e aos seus países de origem, formando uma das bases de valor das futuras marcas.

Figuras 2 e 3: Ilustração dos formatos variados de ânforas (Fonte: COSTA, 2004, p. 45) e ânforas de cores diferentes encontradas nas escavações da cidade de Delos, na Grécia (Fonte: Arquivo pessoal).

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Segundo momento: surge a marca medieval com o corporativismo e a heráldicaUma série de transformações contextuais complexas afetou a ordem sócio-política e econômica na Europa feudal. E dois elementos importantes acabaram por alterar o panorama das marcas na Idade Média, in"uenciando tanto suas funções de mercado quanto as de identi!cação: as corporações artesanais e a heráldica.

O surgimento de agremiações e sociedades de artesãos criou o conceito de corporativismo, graças ao novo e rígido direito de propriedade individual e à proibição da concorrência. De acordo com esse novo regime, a marca da corporação era imprescindível e obrigatória, destinada a garantir certas qualidades de fabricação nos procedimentos utilizados e a!rmar a conformidade do produto com a exigência regulamentar. Assim, a marca dos artesãos que integravam a corporação deveria aparecer como uma assinatura e também um selo de garantia em caso de reclamação da peça. Dessa forma, era possível encontrar até quatro marcas diferentes em um único produto, por exemplo, uma tela: do tecelão, do tintureiro, das autoridades de controle de fabricação e do pintor. As peças que eram destinadas a exportação ainda levavam a marca de reconhecimento do mercador.

A heráldica constituiu uma nova !guração identitária no mundo militar, que alcançou o âmbito civil e mercantil, e se disseminou na época das Cruzadas. Como as armaduras deixavam os combatentes irreconhecíveis e, portanto, impossíveis de se diferenciar aliados de inimigos, todos os cavaleiros que partiram para a Terra Santa adotaram a mesma vestimenta. Agruparam-se sob uma mesma bandeira por razões linguísticas e culturais, mas também por razões psicológicas (solidariedade, sentido da missão, união de forças etc.). O brasão – no caso das

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Cruzadas, somente uma cruz vermelha – se concentrava no escudo e no peitoral da armadura, as maiores superfícies planas do armamento, que assumiu, assim, o papel de portadores das marcas de reconhecimento. Combinavam-se ainda outros instrumentos para a comunicação e a identi!cação em um sistema estruturado de códigos, como cores1, toque de chamada, formato do escudo, estandartes, bandeiras, penachos dos elmos etc. Tornaram-se “armas” indispensáveis nas batalhas campais, simbolizando a origem dos guerreiros, demarcando espaços conquistados, dando sentido de unidade aos exércitos.

Esse repertório foi estendido à nobreza e ao clero como sinais de reconhecimento independentes das batalhas, uma assinatura. Em seguida, os escudos decorativos começaram a ser utilizados e re!nados pelas corporações como marcas em seus produtos. Sendo a maioria da população da época analfabeta, a heráldica inseriu uma função sociocultural às marcas como identidade e hierarquia, paralela às funções de assinatura e propriedade.

Portanto, é possível dizer que o código heráldico foi além das marcas de reconhecimento, pois expressava propriedade e origem, assinalava posses, fazia reconhecer produtos e serviços, e funcionava hierarquicamente,

Figuras 4 e 5: Ilustrações que apresentam o conjunto heráldico utilizado nas Cruzadas Fonte: Internet.

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como as marcas de nosso tempo. Além disso, possui até hoje uma estrutura signi!cante que articula a identi!cação. É, talvez, o embrião dos sistemas de identidade institucional. E o caráter de “arma de guerra” também se mantém, transferindo-se dos campos abertos para os mercados globalizados, competitivos, interdisciplinares, totalmente conectados e de indivíduos sociais descentralizados.

Terceiro momento: liberdade à marca comercialA relação entre o sistema feudal e as corporações sempre foi tensa, uma vez que o poder já não vinha mais somente da terra, mas também dos materiais transformados em bens regulamentados de uso e de troca. No século XVII, agitações populares estouraram por toda a Europa e foi proclamada a liberdade do comércio e da indústria: emergia o liberalismo econômico. Com a livre concorrência, as corporações foram se desmantelando, junto com suas marcas obrigatórias, e os artesãos começaram a procurar seu novo lugar na sociedade. As marcas se tornaram uma garantia da procedência do produto, um ativo que permitia atrair e conservar a clientela. O dono da marca era seu único responsável e poderia fazer uso dela de qualquer maneira, sob a única condição de não ser fraudulenta. E, assim, a marca perdurou durante a Revolução Industrial.

Com a produção aprimorada, fatores inerentes aos modismos e ao interesse individual por mercadorias e serviços foram considerados condições intimamente ligadas às variáveis de mercado e à atribuição de valores aos produtos. Foi necessário mudar as técnicas de vendas – da imagem !nal dos produtos ao ambiente das lojas e da aparência ao comportamento dos vendedores – e criar padrões que ordenavam o que vestir, usar e possuir. As vontades, necessidades, desejos e interesses do

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indivíduo tornaram-se centrais tanto nos discursos da economia moderna quanto nos da lei moderna.

Fabricantes do ramo alimentício e de uso cotidiano foram os primeiros a se bene!ciar das mudanças. Vimos que, na Antiguidade, esses produtos eram vendidos a granel em ânforas. Mas, no início do século XIX, esses fabricantes apresentaram aos consumidores produtos já embalados, com peso comprovado, em condições higiênicas e com suas marcas estampadas como garantia. Reduziu-se o poder do mercador intermediário e deu-se maior relevância à distribuição. Nascia, assim, a concepção de marca autônoma que adicionou à função de identi!cação, uma função promocional, persuasiva, vendedora. A Procter & Gamble foi uma das primeiras a capitalizar esse novo uso da marca.

Por um capricho do destino William Procter e James Gamble uniram seus pequenos negócios de velas e sabonetes e fundaram a Procter & Gamble em 1837, nos Estados Unidos. Quando passaram a enviar mercadorias por transporte "uvial, as alfândegas portuárias carimbavam suas caixas com uma estrela. A empresa logo notou que seus clientes reconheciam a estrela nas caixas que continham suas mercadorias. Depois que as estrelas foram re!nadas e acrescidas de um !no rosto lunar, a marca se tornou um símbolo de qualidade, e os comerciantes só aceitavam as “caixas estreladas”.

Figura 6: Evolução da marca da Procter & Gamble: do desenho “estrelado” ao logotipo atual. Fonte: MOLLERUP, 1999, p. 88.

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E nesta efervescência de marcas, apareceu uma iniciativa insólita no mundo industrial. Em 1907, na Alemanha, a gigantesca empresa AEG (Allgemeine Elektricitäts-Gesellschaft) se adiantava na integração dos elementos para sua identi!cação. Incorporou à sua equipe dois pro!ssionais até então absolutamente distantes da estrutura empresarial: o arquiteto e artista grá!co alemão Peter Behrens2 e o sociólogo austríaco Otto Neurath. Ambos se encarregaram de conceber uma identidade para a empresa que alcançaria tanto a produção e a comunicação quanto as relações internas e externas, comerciais e institucionais. Behrens e Neurath criaram uma imagem unitária, uma expressão coerente, um plano completo: estava-se forjando uma sólida cultura de empresa. Era a empresa adquirindo uma nova forma de expressão que poderia ser impressa – literalmente – na arquitetura de sua sede e em seus produtos e serviços.

Logo em seguida, em 1919, veio a inauguração da Bauhaus com toda sua ideologia reativa ante a falta de racionalidade e sentido funcional do sistema industrial. Com uma vocação integradora dos movimentos artísticos e depuradora da produção, a força inovadora da escola se estendeu às artes, à fotogra!a, ao artesanato, ao design e à arquitetura, que se adaptaram aos princípios de uma nova expressão ligada à indústria. Exigia-se funcionalidade, geometria, contraste, boa forma e pregnância para o que era essencial. Outros imperativos de e!cácia vinham impostos pela necessidade de consolidação em mercados cada vez mais competitivos. Impressa em qualquer tamanho, uma marca deveria sempre vencer a concorrência de forma contundente no menor espaço de tempo.

O progresso técnico ainda coincidiu com a explosão do marketing. Costa (2004, p. 78) acredita que “o desenvolvimento

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e a potência da marca não aconteceria até o momento que fosse possível sua promoção” e, com isso, dá à publicidade um papel importante. As marcas não precisavam da publicidade apenas para difundi-las, mas também se apoiavam na criação de necessidade para estimular seu consumo. A força da publicidade e da propaganda se transformou na condição necessária para a movimentação rápida da engrenagem capitalista e a manutenção de seu modo de produção. O marketing tomou decisivamente o papel de argumentar, informar, motivar e persuadir, e as marcas ganharam notoriedade e aumentaram seu valor de mercado. A marca de automóveis Dodge, por exemplo, foi vendida em 1924 por 74 milhões de dólares.

Mas isso também trouxe reveses para a sociedade: a saturação das marcas e das possibilidades de identidade. A todo momento estamos sujeitos a propagandas cada vez mais invasivas e coercivas. Uma estatística no Canadá garante que seus cidadãos “experimentam” mais de dezesseis mil marcas em um dia comum. Se considerarmos oito horas normais de sono, os canadenses são bombardeados por aproximadamente mil impressões de marcas por hora!

A partir da década de 40, os conceitos de “identidade institucional” e “imagem de marca”, lançados por Behrens com a AEG, ganharam força no cenário mundial a ponto de serem criados escritórios especializados no assunto. Walter Landor, por exemplo, abriu a Landor Associates (1941) reconhecendo que o bom design podia gerar valor econômico ao estabelecer uma comunicação visual efetiva. Ele acreditava que os criadores tinham o poder de falar ao coração do povo e que marcas podiam ser construídas através de sua imagem percebida. Até hoje a Landor investe em pesquisa, design e modelos de consultoria olhando as marcas como bons negócios.

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Na década de 50, emergiu uma vibrante cultura adolescente que desejava um visual próprio que os distinguissem das gerações relacionadas com as guerras mundiais, e, portanto, exigiam uma nova linguagem para roupas, comportamento, música etc. Os fabricantes reconheceram o poder de compra desses novos consumidores, ávidos por mudanças e variedades ao invés de permanência e uniformidade. Surge assim a chamada “obsolescência planejada”: na falta de uma inovação real no produto, retocava-se a embalagem, atualizava-se a marca ou se inventava um novo ingrediente exclusivo que nunca se explicava em quê consistia, para intensi!car o consumo. Perpetuava-se, então, a novidade pela novidade. As vendas aumentaram, porém, o desperdício tornou-se uma questão a ser investigada (até hoje).

Quarto momento: na era do intangívelNa segunda metade do século XX era possível enxergar uma transição do quantitativo para o qualitativo, de uma economia de extração de valor para uma economia de criação de valor. Entendia-se que o melhor resultado !nanceiro vinha através de estratégias que se baseavam no pleno conheci mento da cultura, da identidade e do propósito institucional, expres sas na consistência de suas crenças e sua !loso!a nas ações do dia-a-dia. Foi na expressão da marca que a empresa encontrou o que podia sintetizar os fatores capazes de criação de valor, oferecendo um suporte para uma série de outras manifestações simbólicas construídas pelos indivíduos que se relacionam com a marca. De acordo com a World Intellectual Property Organization (WIPO), esses fatores são convencionalmente chamados de ativos intangíveis3.

A marca – que começou sendo um sinal de reconhecimento (Antiguidade), depois foi um discurso (Idade Média) e um

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sistema (economia industrial) – tinha agora de expressar as mais originais e complexas estruturas empresariais. Sabemos do papel preponderante e imprescindível do design na construção das marcas, mas !cou evidente que toda a classe de disciplinas, técnicas e suportes da comunicação estavam implicadas na vida social delas. Ela saiu da exclusividade do design e passou ser também um assunto das ciências sociais. Aprofundar-se na marca passou a ser penetrar no imaginário social, na psicologia cotidiana, no mundo pessoal das aspirações e das emoções. Percebe-se que, dessa forma, o indivíduo já não é mais somente receptor-passivo-comprador-consumidor: é também emissor-ativo-interpréte-ator.

Num contexto competitivo onde se disputa a preferência do consumidor, a marca passa a se referir, então, à imagem que o público possa ter dela. São nesses casos que a marca se transforma em uma geradora de padrões de comportamento e conhecimentos que impregna do cliente ao funcionário, do acionista ao fornecedor, num ciclo de produção e consumo permanente que gera valor e sustentabilidade, utilizando ferramentas adaptáveis e sensíveis às mudanças particulares da sociedade. O consultor em planejamento estratégico e professor de semiologia Norberto Chaves (2005, p. 12-14) indica a ocorrência de um reposicionamento do valor do produto (objeto) para o produtor (sujeito), tendo o valor agregado da mercadoria recaindo sobre atributos da entidade responsável pelo produto, suscetíveis de funcionar como canais de comunicação.

Assim, esse deslocamento redireciona o conteúdo da comunicação para a identidade do emissor. É a subjetivação da comunicação e o início da inegável formação de uma sociedade dos intangíveis.4 Com isso, a de!nição etimológica do branding começa a ganhar força de mercado: o ato de marcar a ferro os gados transformou-se em marcar a vida dos indivíduos.

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Desenvolve-se o BrandingDe maneira crescente, a globalização que se deu a partir da década de 80 alterou o panorama mundial. Num mundo de fronteiras em dissolução e de continuidades em ruptura, ela contestou os contornos estabelecidos pelas velhas certezas e hierarquias da identidade nacional. As tradições foram fundamentalmente desa!adas pelo imperativo de se forjar uma nova auto-interpretação baseada nas responsabilidades culturais. Quanto mais a vida social se tornava mediada pelo mercado global de estilos, viagens internacionais, imagens da mídia e sistemas de comunicação interligados, mais as identidades se tornavam desvinculadas de tempos, de lugares, de histórias e de tradições especí!cos.

Com o !m da Guerra Fria, a consolidação da União Europeia e, principalmente, a abertura da Internet ao grande público, o mundo se conectou e favoreceu a transmissão intelectual de uma forma global. Houve maior difusão, armazenamento e processamento de informação o que, consequentemente, mexeu com as capacidades produtivas e comunicacionais da sociedade. A anulação tecnológica das distâncias polarizou a condição humana com uma produção fragmentada de códigos culturais numa multiplicidade efêmera de estilos em escala global. Novas formas de representação e expressão se tornaram possíveis, não só como um fenômeno individual, mas também como um fenômeno de massa.

A invocação dos nomes de marcas para dar status deixou de ser uma forma de criar ilusão de realidade: tornou-se identidade, ou seja, a própria realidade. O anonimato visual tornou-se fatal, pois o consumidor deixou de con!ar no produto anônimo ou no serviço despersonalizado. Os emissores sociais – seja um indivíduo ou uma empresa – agora tinham que se fazer ler,

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entender, diferenciar, participar, em meios absolutamente distintos aos conhecidos previamente. A qualidade e a performance dos produtos passaram a ser condições sine qua non de competição, e não mais representavam uma vantagem competitiva. Era necessária uma mudança qualitativa nos modelos de comunicação convencionais e, principalmente, nos processos de identi!cação.

Na sociedade dos intangíveis, o design está profundamente calcado no desejo humano de que as coisas tenham signi!cado, importância. Para constituir e desenvolver sua própria identidade dentro do cenário plural e fragmentado – um possível quinto momento da marca descrito magistralmente pelo teórico cultural jamaicano Stuart Hall e pelo sociólogo polonês Zygmunt Bauman –, foi preciso que o indivíduo escolhesse um conjunto de valores que correspondessem às suas opiniões e desejos em uma linguagem internacional. Composta por um número variável de elementos diversos que interagem entre si, as marcas receberam essa função de estruturar as identidades: elas se tornaram líquidas.

Para Bauman (2001, pp. 7-9), a qualidade "uída dos líquidos mostra que eles sofrem constante mudança de forma quando submetidos a uma tensão. Portanto, os líquidos não !xam um espaço ou se prendem ao tempo, são de!nidos por momentos móveis, inconstantes, leves. Essa ideia coloca a modernidade como sendo líquida desde sua concepção, uma vez que é preciso mudar e se moldar para alcançar suas próprias ambições. Esse momento líquido da modernidade questiona os padrões de comunicação e coordenação entre as políticas de vida conduzidas individualmente e as ações de coletividade humana. Para os "uxos da globalização e o comércio serem livres por novos meios, a territorialidade precisa ser liquefeita, fronteiras devem ser apagadas. Qualquer rede densa e enraizada de laços sociais torna-se um obstáculo.

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O olhar endógeno clássico da identidade institucional teve que mudar seu foco para uma identidade cultural exógena adaptando-se ao mundo ao seu redor. De mecânica, rígida e hierárquica, a estrutura de gestão tornou-se mais "exível e orgânica, determinada pela demanda do mercado onde atua e fundamentada pela visão estratégica. A responsabilidade social passou de simples !lantropia para a cultura da instituição. Tudo para permitir que in"uenciasse e se adaptasse rapidamente às mudanças de mercado.

Para uma instituição, a marca deve sintetizar seus valores essenciais – seja dela própria, de um produto ou serviço – que chegam a um indivíduo ou a um grupo de pessoas na forma de uma identidade. Com a comunicação transformada em um mecanismo progressivo de criação de entidades imaginárias no coletivo social, pode apelar para quantos recursos de identi!cação e de valorização estiverem à disposição: da manifestação visual de sua essência (logotipo, símbolo, cores, etc.) a personi!cação de uma característica desejada, assim como comportamento ético, o ambiente e a percepção do consumidor. Todas as atividades institucionais se tornam canais de imagem, ou seja, de identidade. É preciso compreender, então, que a sociedade se tornou mais interdependente, pressupondo a interatividade das pessoas e a fragmentação de suas identidades. O McDonald’s, por exemplo, pela primeira vez em sua história, lançou uma marca diferente de seus famosos arcos dourados, voltada exclusivamente para um produto e público especí!cos, mostrando adaptação ao mundo líquido.

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Figuras 7 e 8: Embalagens e fachada da nova investida do McDonald’s no Japão (2008). Disponível em http://inventorspot.com/articles/mcdonalds_japan_goes_nobrand_with_quarter_pounder_shops_19505.

A designer e professora Lucy Niemeyer (2006, pp. 99 e 109-10) coloca que, para atingir o sucesso, as instituições buscam agora exprimir a heterogeneidade humana e exercitar a identidade individual articulada à cultura material, utilizando o design para reinserir os valores humanos e a sensibilidade humana no mundo material, fazendo nossas interações com ele menos impessoais e estritamente funcionais. Nunes e Haigh (2003, p. 74) acreditam que isso é a evolução pelo design, sendo o branding um estágio atual mais maduro de cultura da marca e um resultado de sua consolidação como uma área de conhecimento. O branding parece realmente se apresentar dessa forma como um processo ético de construção de signi!cados que permite ao designer a re"exão sobre o impacto de seu trabalho no mundo e gera uma reformulação constante, progressiva e positiva de seu próprio signi!cado.

O que vem por aí?

Design se torna identidade, identidade se torna branding, branding se torna vivência (Peter Knapp)

Os grandes pensadores dizem que a melhor forma de predizer o futuro é criando-o. Enquanto as marcas estão aqui para !car, pode ser difícil de!nir para onde elas se dirigem uma vez que as

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variáveis de construção das identidades humanas são inúmeras e imprevisíveis. As conclusões tiradas por Bauman em seus livros não são muito otimistas. Ele acredita que “a abundância dos compromissos oferecidos, mas principalmente a fragilidade de cada um deles, não inspira con!ança em investimentos de longo prazo no nível das relações pessoais ou íntimas”. Cria-se uma sociedade insegura, cheia de medos e incertezas, ambos alimentados por maquinações sócias, culturais e econômicas. O psicanalista e !lósofo francês Félix Guattari segue a mesma linha quando diz que a relação da subjetividade com sua exterioridade está comprometida em uma espécie de movimento geral de implosão:

O planeta Terra vive um período de intensas transformações técnico-cientí!cas, em contrapartida das quais engendram fenômenos de desequilíbrios ecológicos que, se não forem remediados, no limite, ameaçam a vida em superfície. Paralelamente a tais perturbações, os modos de vida humanos individuais e coletivos evoluem no sentido de uma progressiva deterioração. As redes de parentesco tendem a se reduzir ao mínimo, a vida doméstica vem sendo gangrenada pelo consumo da mídia, a vida conjugal e familiar se encontra frequentemente “ossi!cada” por uma espécie de padronização dos comportamentos, as relações de vizinhança estão geralmente reduzidas a sua mais pobre expressão... (GUATTARI, 2007, p. 7)

Para Guattari o sujeito não é mais evidente como proclama Descartes: não basta pensar para ser, já que inúmeras outras maneiras de existir se instauram fora da consciência. Então, ele aposta na ecoso!a, uma articulação ético-política entre três registros ecológicos fundamentais: o do meio ambiente, o das relações sociais e o da subjetividade humana. Para ele, não haverá verdadeira resposta à crise sem que aconteça uma autêntica

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revolução política, social e cultural, reorientando os objetivos da produção de bens materiais e imateriais, ou seja, atingindo não só as forças tangíveis, mas também aos domínios da sensibilidade, da inteligência e do desejo. Isso seria, no !m das contas, a reinvenção da existência humana em novos contextos históricos.

O !lósofo ainda acha que o processo tende a começar pelo econômico, pois “o capitalismo pós-industrial está descentrando seus focos de poder das estruturas de produção de bens e de serviços para as estruturas produtoras de signos, de sintaxe e de subjetividade, por intermédio, especialmente, do controle que exerce sobre a mídia, a publicidade etc.” Esse deslocamento do capitalismo fará com que as relações humanas sejam reconstruídas em todos os níveis, ampliando seu domínio sobre o conjunto da vida social, econômica e cultural do planeta e se in!ltrando no seio dos mais inconscientes estratos subjetivos da vida cotidiana e da ética pessoal.

O indivíduo será levado a reinventar sua relação com o corpo, com o inconsciente e com o tempo. Será preciso encontrar alternativas para a uniformização midiática, o conformismo das modas e as manipulações da opinião pela publicidade. E o lado ambiental da articulação de Guattari assume que uma empresa responsável deve gerenciar suas atividades de maneira a identi!car os impactos sobre o meio ambiente, buscando minimizar aqueles que são negativos e ampli!car os positivos.

O designer canadense Robert L. Peters acredita que o designer tem papel vital na era atual, pois é capaz de “criar sucesso econômico, moldar comunidades e formar culturas”. Para ele,

informação, ideias e comunicação são a moeda no mundo virtual de hoje. [...] Fica claro, que o designer tem o poder, considerando sua responsabilidade sobre como as coisas serão consumidas, como as pessoas serão retratadas, como as mídias serão

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distribuídas e, ultimamente, qual forma o futuro terá. (PETERS, 2005, p. 11. Tradução pessoal)

Peters parece acompanhar as palavras do historiador Rafael Cardoso, que coloca o design como “principal desenvolvedor dos objetos que constituem a paisagem arti!cial do mundo moderno e possui importante in"uência semiótica no que diz respeito à transmissão da informação e à ordenação dos meios de comunicação”. Entende-se, assim, a necessidade de reposicionar o design nesse novo “mundo líquido”.

O design, reduzido à sua essência, pode ser de!nido como a tendência humana a modelar e transformar o ambiente circundante de maneiras que não encontram precedente na natureza, para atender nossas necessidades e dar sentido às nossas vidas. (HESKETT, 2002 apud PINK, 2005, p. 63)

O branding terá cada vez mais que se preocupar com a autenticidade e a veracidade das identidades e com a crescente expectativa que as empresas se comprometam e sejam responsáveis com a sociedade, uma vez que os efeitos da globalização continuarão dominando. Seu posicionamento deverá ser ainda mais "exível e polifacético: de individual a coletivo, de singular a associado. A crença de Nunes e Haigh na evolução do branding pelo design se comprova.

As tecnologias de informação e comunicação tendem a evoluir de maneira ilimitada, pois ainda não existe um questionamento ético desse progresso – que pode se tornar invasivo, misantropo e esquizofrênico. As possibilidades virtuais permitem que o indivíduo crie uma ilusão de intimidade e um simulacro de comunidade que, em alguns casos, substitui de forma irremediável a constituição sólida da identidade pessoal. Essas tecnologias

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também aumentam a desterritorialização do indivíduo e a interatividade exigida. Empresas já são criadas diretamente no mundo virtual com sistemas que fazem com que cada indivíduo navegue por ela escolhendo o melhor caminho sem necessitar da ajuda de uma pessoa, um funcionário ou qualquer conexão com o mundo real. Mas muitos estudiosos não acreditam que essa virtualidade eliminará a presença humana por completo. Chamadas eletrônicas com sistemas automáticos e formulários virtuais podem não satisfazer todas as necessidades e sente-se a necessidade de falar com alguém que possa entender seu caso particular.

Antes mirando em grandes segmentos da população, as empresas já estão alterando sua percepção do indivíduo, respondendo com uma proposta mais individual, de gostos e atitudes. O auge desse novo mercado individual está na customização, que é a personalização de um produto por uma escolha do indivíduo. Muitas vezes o que é lançado não condiz com a real necessidade da comunidade a que foi dirigido. Sendo assim, ou o produto cai no anonimato e no esquecimento, até seu desaparecimento total, ou ele sofre uma customização, ou seja, adapta-se de acordo com o desejo ou necessidade. Fabricantes, então, podem recriar o produto com a customização inclusa. Mas hoje, além desse movimento, algumas empresas já investem no próprio ato de customizar como diferencial de mercado, pois ele aposta na necessidade de singularização do indivíduo. Temos como exemplos a enorme quantidade de restaurantes self-service ou que oferecem opções para alterar pratos; as montadoras de automóveis que oferecem diversas opções para modi!car o carro antes de comprá-lo; ou, então, a empresa Converse All-Star de calçados que lançou uma versão branca de seus famosos tênis que vem junto com canetas coloridas para que o usuário possa fazer com que seu All-Star seja diferente de qualquer outro que exista.

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Isso exige também a melhoria dos produtos e na especi!cidade de serviços extras. É possível encontrar lojas de roupas com bistrôs, supermercados com correios e grandes estabelecimentos comerciais com creches. Tanto Melissa Davis (2006, p. 136) quanto Daniel Pink (2005, pp. 167-185) crêem que esse é um movimento de busca do lúdico, do divertido, do lazer. É uma forma de melhorar a experiência comercial

e causar uma boa impressão, seja para seu público externo ou interno. A marca encontra aqui uma nova abertura: se é con!ável, pode introduzir novas linhas de produtos em segmentos fora de sua oferta principal ou até mesmo intocados, como setores de caridade, clubes de futebol e países.

Apesar dessas novidades, sabe-se que a tutela da marca havia se tornado sinônimo de uniformidade – reforçada por rígidas orientações de design com uso extenuante da marca. A reprodução consistente de uma marca pode entediar um consumidor hoje em dia. Estamos menos encantados com uma empresa que espera que atuemos como cartazes ambulantes, propagando sua marca para todos os cantos. Davis (2006, p. 219) indica que a simpli!cação e a sutileza são o caminho futuro das marcas, após a saturação explícita e o consumismo que Naomi Klein crítica tanto em seu livro Sem Logo. Todo o branding desenvolvido pela Apple é expressão mais contemporânea desse processo.

O branding deve se voltar para as relações internas. Funcionários são vistos como os mais importantes embaixadores que o produto ou o serviço pode ter. Eles garantem a interação humana com o núcleo de seu público, o consumidor, assim

Figura 9: Tênis All-Star Converse para customização. Foto de divulgação.

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como os investidores, os analistas e os fornecedores. Davis ainda coloca que o boca-a-boca e a recomendação pessoal de produtos e marcas serão as novas táticas de abordagem ao invés de forçar um consumo por meio da reiteração constante. As marcas deverão ser mais acessíveis para acompanhar o papel mais ativo que o sujeito vem desempenhando. O valor intangível de uma marca já é medido por seu compromisso com o público, enquanto os valores humanos e identidades entram em cena. Podemos ver que as pessoas se envolvem mais quando podem intervir na criação de uma marca, mesmo que essas marcas sejam passageiras. Este compromisso coloca os indivíduos como atores na decisão sobre a direção das marcas e até das empresas, que precisam responder imediatamente de acordo com os resultados.

Esses são alguns dos caminhos de maior investimento no indivíduo que já aparecem para modi!car o design no cenário líquido. As marcas precisam atravessar uma crescente variedade de plataformas para atingir públicos especí!cos ou, algumas vezes, múltiplos. Precisam ser capazes de carregar uma nova oferta de negócios e captar improváveis parceiros com um branding forte e "exível. Mas Bauman (1999, p. 86) diz que “não há linha de chegada óbvia para essa corrida atrás de novos desejos, muito menos de sua satisfação”. Então, serão dois os grandes desa!os do design: em primeiro, consolidar-se como área de metaconhecimento de características interdisciplinares intrínsecas, forjando novos paradigmas ético-estéticos referentes à subjetividade; e em segundo, construir novas identidades de marca considerando o veloz surgimento de novos suportes midiáticos globalizados, sem diluí-las ou impor barreiras para sua "uidez e ainda conseguir diferenciá-las de identidades com valores semelhantes.

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Notas1 A aparição da cor nos escudos foi uma das contribuições mais relevantes da heráldica para a história da marca, uma vez que o ato de marcação não possuía qualquer interferência cromática.2 Considerado por muitos o primeiro “designer institucional” da História.3 Os ativos intangíveis também podem ser visto como capital intelectual, tecnologia, patentes, invenções, músicas, trademarks, copyrights, lealdade de cli entes, entre várias outras formas.4 Nunes e Haigh utilizam a expressão “sociedade do conhecimento”. Preferi chamar de “sociedade dos intangíveis” para incluir outros fatores, como o consumo e as características institucionais. (NUNES & HAIGH, 2003)5 Em 1968, Nakanishi já colocava o design como estratégia de sua empresa Paos, investindo nos campos da teoria, da gestão e da metodologia do design. Com o conceito Good design is good business, fundou em 2000 a World Good Design, onde o design é o denominador comum de todas as áreas.

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TWITCHELL, James B. Lead us into temptation: The triumph of american materialism. EUA: Columbia University Press, 1999.

Sobre o autorFilipe Chagas, MScEsdi/Uerj, [email protected]

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O design como criador de existênciasLucy Niemeyer, DSc Raquel Ponte, MSc

Peirce e FenomenologiaO filósofo americano Charles Sanders Peirce (1839-1914), filho de um matemático, formou-se em Química, mas se dedicou a vários outros campos científicos durante sua vida: Astronomia, Física, Biologia etc. (SANTAELLA, 2005, p.30). Legou uma obra extensa, embora nunca tenha terminado ou editado um livro. Seus escritos se compõem apenas de ensaios publicados em periódicos e de manuscritos, que se encontram na Universidade de Harvard, parte deles publicada em coletâneas e parte – a maior, cumpre frisarmos –, não tendo sido sequer transcrita. Mais conhecido por seus estudos em Semiótica, também chamada por ele de Lógica, e em Pragmatismo, depois rebatizada por ele de Pragmaticismo, desenvolveu uma arquitetura filosófica complexa, que compreende Fenomenologia, Metafísica, Estética, Ética, Cosmologia, entre outros campos de estudo. Sempre em diálogo com outros filósofos, não se limitou a criticar as respostas dadas por seus antecessores, das quais discordava, mas também apresentou soluções que a ele pareciam melhor representar o universo em que vivemos.

Em sua divisão das ciências, Peirce estabeleceu a Fenomenologia como a primeira subdivisão da Filosofia:

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1 Matemática2 Filoso!a 2.1 Fenomenologia 2.2 Ciências normativas 2.2.1 Estética 2.2.2 Ética 2.2.3 Semiótica ou Lógica 2.3 Metafísica3 Ciências especiais

Segundo o pensamento peirceano, há uma ordem decrescente de abstração nessa divisão. Quanto mais abstrata a ciência, como a Matemática, por exemplo, maior sua capacidade em servir de base para as menos abstratas. Desta forma, podemos perceber que a Fenomenologia fundamenta a Metafísica e as Ciências Normativas, nas quais se incluem a Estética, a Ética e a Semiótica – subdivisão que mantém esta mesma lógica, sendo a Estética esteio para as demais. Mas apesar de estabelecer a Fenomenologia como uma divisão da Filoso!a, suas categorias perpassam toda sua obra, por serem modos de ser dos fenômenos observados.

Peirce buscou, durante muitos anos, categorias universais que explicassem a multiplicidade dos fenômenos experienciáveis, não se contentando com as respostas a que tinham chegado os demais !lósofos anteriores e ele, como, por exemplo, Aristóteles, Kant e Hegel.

Portanto a Fenomenologia, ou Faneroscopia – termo cunhado por Peirce para se distinguir das demais fenomenologias desenvolvidas –, “se propõe afetuar um inventário das características do faneron [...]” (IBRI, 1996, p.4), que pode ser entendido como tudo aquilo que está presente a uma mente, seja concreto ou abstrato (um sonho, uma ideia etc.). Peirce concluiu

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que toda a variedade dos fenômenos se reduzia a três categorias gerais: Primeiridade (Firstness), Secundidade (Secondness) e Terceiridade (Thirdness). Peirce de!ne experiência como resultado cognitivo da vida, pautando-a assim como o fator corretivo de seu pensamento !losó!co. Desta forma, qualquer pessoa pode praticar a pesquisa fenomenológica, bastando desenvolver três faculdades: ver (contemplar o que está diante dos olhos sem qualquer interpretação), atentar para (discriminar) e generalizar.

A Secundidade é uma das mais evidentes categorias na experiência quotidiana. Como diz Peirce, estamos continuamente colidindo com os fatos duros (CP, 1.324), pois estamos sempre nos confrontando com a Realidade, que foge ao nosso controle, independe da nossa vontade. Essa relação de dualidade, a contraposição de duas coisas, uma agente e uma reagente, compreende a noção de Secundidade. Essa experiência não mediatizada consiste, portanto, na ideia do outro, da alteridade, da negação, do não-ego, daquilo que se interpõe ao sujeito. Assim, Peirce afasta-se do cartesianismo, pois o ego se dá pela oposição ao não-ego, não se originando de uma dúvida formulada. Além destes conceitos, também está implícita na ideia de Segundo a individualidade – a singularidade – visto que a experiência de ação e reação é sempre única, não reprodutível. De forma concisa, podemos compreender a Segunda Categoria como uma relação lógica de contraposição de um Segundo em relação a um Primeiro.

Do ponto de vista metafísico, que visa entender o que há por trás dos fenômenos para que as coisas apareçam tais como são, a Existência é o modo de ser da Secundidade no mundo, que serve como uma hipótese explicativa para o nosso próprio caráter de individuais, hipótese essa baseada na experiência direta, como Peirce sempre fundamenta sua !loso!a. A Existência caracteriza-se, assim, pelo seu caráter dual, de oposição ao outro. Daí pode-se

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concluir que os objetos da imaginação não existem, neste sentido do termo.

A Primeiridade exclui a experiência de alteridade. O Primeiro é “aquilo que é sem referência a qualquer outra coisa” (PEIRCE, 2008, p.24): uma qualidade de sentimento, liberta do "uxo de tempo, uma talidade (suchness). Por estar fora da experiência temporal, distingue-se do factual, sendo apenas um estado de consciência, uma possibilidade. Para estar em tal estado de presentidade, requer-se a faculdade de ver, que pode ser compreendida como contemplação ou um olhar poético. Porém esse sentimento se perde se a mente busca compreender a talidade, pois analisar é comparar (Secundidade) e generalizar (Terceiridade).

A Categoria de Primeiridade não pode ser entendida apenas como experiência interior, uma vez que a Fenomenologia considera faneron tudo aquilo que se apresenta à mente, real ou não. A variedade e a multiplicidade da natureza aparecem sob o aspecto do Primeiro, como manifestação da liberdade. A espontaneidade gera criação na natureza, produzindo, de acordo com o ponto de vista evolucionista de Peirce, a diversidade das coisas. A Primeiridade constitui uma miríade de possibilidades passíveis de serem realizadas.

Já a Terceiridade con!gura-se como a categoria da generalidade e da mediação, em que um Primeiro em relação a um Segundo gera um Terceiro. Não se compreende, na !loso!a de Peirce, generalidade em oposição a diversidade, uma vez que esta última está embutida na ideia da primeira, já que toda Terceiridade pressupõe Secundidade, que, por sua vez, se funda na Primeiridade. “Parece haver na mente uma tendência à generalização que busca subsumir ao conceito um número maior de fenômenos, tornando-o, por isso, mais geral” (IBRI, 1996,

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p.14). A mediação consiste em uma síntese, que aponta para o futuro, tendo assim um sentido de aprendizagem cognitiva. O elemento cognitivo desse processo será uma representação, que Peirce associa diretamente ao conceito de Terceiridade. Visto que o impulso efetivamente criador está na categoria de Primeiridade, com sua diversidade, espontaneidade e liberdade na geração de singularidades em sua multiplicidade, “[...] a generalidade da Terceiridade é representação de particulares e mediará a ação futura [...]” (IBRI, 1996, p.15).

Peirce e SinequismoA Terceiridade con!gura-se como condição para a possibilidade do pensamento, pois a mediação necessita de uma generalidade real. Para acontecer, o pensamento precisa do inteligível, “[...] um objeto que, experienciado, se põe como sujeito do pensamento na construção de seu próprio conceito” (IBRI, 1996, p.56), que por isso deve ter natureza eidética. Conclui-se, assim, que compreender o objeto como real e da natureza do pensamento é entendê-lo como geral (representa o individual), alter (destitui a representação do poder de estatuir o objeto) e eidético (possibilita sua inteligibilidade). Diferentemente da Existência, que possui apenas um modo de ser da Secundidade, a Realidade, além do caráter de alteridade de insistência contra a consciência, abrange a Terceiridade, pois tal insistência a coloca num "uxo de tempo e sua apreensão apresenta uma regularidade, que requer uma mediação por um intelecto a !m de reconhecer as relações entre as ocorrências, generalizando-as.

Logo, o !lósofo estende a qualidade eidética para a exterioridade, não se limitando aos objetos interiores à consciência, de forma que ela seja uma condição para a mediação. Peirce escreve, a natureza só nos parece inteligível na medida

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em que nos parece racional, ou seja, na medida em que seus processos são similares a processos de pensamento (CP, 3.422). Diferentemente de um pensamento que demarca uma clara separação entre sujeito e objeto, Peirce compreende o interno e o externo como adjacências. Sendo assim, a terceira categoria, quando contemplada pelo lado externo, é denominada Lei. Porém, se olhada tanto interna quanto externamente, chama-se pensamento. Desta forma, a Realidade tem natureza intelectual.

O !lósofo refuta a independência entre leis físicas e psíquicas, defendendo que a matéria deriva da mente, sendo assim mente esgotada. O argumento central do Idealismo Objetivo peirceano é a concepção do universo material como uma forma de mente, uma vez que ele é provido de hábitos de conduta em forma de leis naturais. Tanto leis físicas quanto psíquicas constituem regras gerais de conduta de individuais, com a diferença que as primeiras são hábitos cristalizados, enquanto as segundas apenas tornam um sentimento especí!co mais propenso a surgir. Rompendo com a dualidade mente/matéria, Peirce apresenta um conceito-chave em sua metafísica: o de continuidade, apresentado em sua doutrina do Sinequismo (do grego synechés, contínuo). Desta forma, há uma continuidade entre mente e matéria, assim como há entre lado interior e exterior.

Para o !lósofo, continuidade não é uma pluralidade de individuais (Secundidade), mas uma generalidade, um modo de ser de um todo, representando assim a Terceiridade, pois as ideias de aprendizagem, crescimento, inteligência e generalidade, todas elas subsumidas à terceira categoria, pressupõem um continuum. O individual, o elemento discreto, perde sua identidade na generalidade, tornando-se impossível identi!car sua !nitude no continuum, já que ele é uma descontinuidade, imbuída da

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Secundidade. Logo, a generalidade de um continuum é totalmente inde!nida com relação a qualquer individual.

Porém, para Peirce, a noção de continuidade não se limita apenas à categoria de Terceiridade, sendo também aplicável à Primeiridade no conceito de possibilidade. A possibilidade ainda não concretizada, não realizada na existência, tem um sentido de inde!nição, uma vez que é impossível distinguir unidades individuais sem identidade, sendo “o possível necessariamente geral [...]” (PEIRCE apud IBRI, 1996, p.66). Assim, tanto Primeiridade quanto Terceiridade trazem uma ideia de generalidade, relacionando-os à concepção de continuidade, diferentemente da Secundidade, que, por seu caráter singular, se refere ao descontínuo da existência.

Podemos perceber que a primeira e a terceira categorias devem ser inferidas por meio da segunda. É na existência que percebemos a Primeiridade e a Terceiridade, uma vez ser impossível individualizar possibilidades ainda não realizadas e apontar o geral. Só se pode de!nir aquilo que é determinado, singular. Assim a relação entre o continuum de Primeiridade – possibilidade – e de Terceiridade – necessidade – se realiza na factualidade da Secundidade – existência. “[...] O se fazer real requer, necessariamente, o se exteriorizar para um teatro de reações, que é a própria condição de possibilidade da evolução. [...] Do sonho à realidade há [...] a passagem pelo cinzel da Existência” (IBRI, 1996, p.111).

Design como CriaçãoO Design, como campo criativo, trabalha com a exteriorização intencional de ideias. A primeira categoria fenomenológica transparece na miríade de possibilidades de realização de um projeto. Qualidades podem ser arranjadas em uma sintaxe própria

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da Primeiridade (SANTAELLA, 2005). Como nos diz Peirce, toda a evolução evolui do vago para o de!nido (CP, 6.191), e é necessária uma de!nição a !m de fazer emergir uma existência. Uma potencialidade não realizada, portanto, torna-se inútil. Uma ideia de design, que não se materializa em um produto, não existe, pois não passa do nível de Primeiridade para o de Secundidade, como uma condição para uma realização inteligente. Porém “a existência envolve escolha [...]” (IBRI, 1996, p.84), e toda uma série de possibilidades aventadas na primeira etapa da criação deve ser descartada para dar espaço à possilibilidade escolhida que irá se concretizar.

O caráter de liberdade e espontaneidade do processo criativo, pautado no sentimento, remete à inferência abdutiva que Peirce postulou. A Abdução, diferentemente da Indução e da Dedução, é o único argumento realmente responsável pela inovação. Porém, diferentemente da Arte, que utiliza o método abdutivo e não necessita de uma validação, o Design busca resultados, isto é, objetiva comunicar da maneira mais e!ciente sua mensagem, atender à necessidade do cliente e satisfazê-lo por meio de seus produtos existentes. Por isso, além da Primeiridade, compõe o processo criativo a categoria da Terceiridade, pois a pura possibilidade, como potencialidade, [...] pode se fazer ato no futuro, mas não intenciona, necessariamente, o ato presente para um futuro, como, de outro modo, o faz a potencialidade da lei.” (IBRI, 1996, p.77).

A razão, afeita à terceira categoria, medeia nossa relação com os fatos duros, buscando sua generalidade por meio da sua redundância, a !m de melhor nos conformar a eles. Essa mediação se traduz na previsão de eventos futuros, de forma que possamos melhor nos preparar para a realidade. O Design busca transmitir um argumento a um destinatário que irá consumir

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o produto. Porém, por se tratar de um processo que pressupõe grande reprodutibilidade – produção em larga escala na maior parte das vezes – o Design deseja atingir não apenas um indivíduo singular, mas um grupo que compartilhe semelhanças: o público-alvo. De!nir um público-alvo, nada mais é que generalizar, determinando uma regra geral, da qual podemos deduzir as respostas individuais de cada consumidor. Como se deseja e!ciência na peça criada, mostra-se necessário compreender o caráter geral do público – seus desejos, suas necessidades, seus códigos, seus repertórios –, mesmo sabendo que nem todos os elementos do grupo podem reagir da mesma forma. Mas em um processo indutivo, será possível prever uma provável resposta esperada, que só poderá ser comprovada na experiência, por testes ou pela utilização do produto pronto. Além disso, a Terceiridade também faz-se presente nos conceitos que servem de base para a criação da peça de Design, considerando que Peirce associa a generalidade de um signi!cado à terceira categoria.

Depois de criado o produto, podem-se inferir, por meio de sua existência, as possibilidades de qualidades e sentimentos escolhidos e realizados, subsumidos à primeira categoria, e a generalidade dos conceitos transmitidos bem como do público ao qual se destina, uma vez que os objetos de Design são planejados a !m de serem realizados numa “[...] conjunção de uma terciaridade (sic) com uma primaridade (sic) para produzir uma secundaridade [...] que [...] representam o esquema peirceano de criação” (WALTHER-BENSE, 2000, p.91).

Pela ótica do Sinequismo, podemos compreender tal determinação de uma peça de design como o lado exterior de uma ideia ou pensamento, visto que sujeito e objeto não constituem elementos estanques na !loso!a peirceana. O que existe é um continuum entre interioridade e exterioridade.

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Para o Pragmatismo, a ação é um estágio do pensamento. Mas a !m de não incorrermos em um erro interpretativo quanto a essa metodologia proposta por Peirce, compreendendo o signi!cado do conceito como relativo a uma pluralidade de atos, reduzindo-o, assim, à Secundidade, vale citar um trecho do !lósofo: “[...] não quero dizer que atos, que são mais estritamente-singulares que qualquer coisa, poderiam constituir o propósito ou a própria adequada interpretação de qualquer símbolo” (PEIRCE apud IBRI, 1996, p.97). Peirce, na verdade, associa a generalidade de um signi!cado à Terceiridade, refutando a ideia de ação como !m do homem e defendendo que é a ação que necessita de um !m – !m este, similar a ideias gerais. Compreender a ação como !m, desconsiderando o pensamento veiculado por ela, seria a!rmar que não existe um propósito racional – hipótese inconcebível.

Logo podemos compreender a ação como mero aspecto exterior das ideias – o !m de um pensamento é uma ação cujo !m é um pensamento. Desta ideia decorrem duas implicações: que os conceitos têm propósito e que seus signi!cados consistem em suas concebíveis consequências práticas sobre a conduta (CP, 8.322). Assim, há algo de intelectual na conduta intencionada, que se exprime na racionalidade do pensamento em relação a um futuro possível. Esse ser in futuro rea!rma a Terceiridade relativa à concepção do signi!cado, já presente em sua generalidade.

Tal ideia de continuidade que transparece nas relações de mente e matéria, de ação e pensamento, de interioridade e exterioridade, que se fundamentam no Sinequismo e no Idealismo Objetivo peirceano, deixa evidente o traço evolucionista do !lósofo. A determinação da peça de design na Existência pelas imbricações entre Primeiridade e Terceiridade no processo criativo põe em movimento a continuidade, gerando crescimento e complexi!cação. Esta materialização do pensamento em produto

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de design é a externalização de um signo interno para o mundo da existência, considerando que todo pensamento é signo na concepção de Peirce. Desta forma, pode-se compreender o Design como um processo semiótico.

Design como SemioseA Semiótica, ainda que circunscrita à terceira subdivisão das Ciências Normativas – pautada na Estética, primeira subdivisão, e na Ética, a segunda – perpassa toda a !loso!a peirceana, visto que a inteligibilidade do universo depende de sua generalidade ser mediada. Aquilo que medeia a relação entre o objeto real e uma mente interpretadora é um signo e dá-se a esse processo o nome de semiose. Esta mente, como abordado anteriormente, não se restringe à humana, já que o Idealismo Objetivo postula que tudo é mente, até mesmo a matéria, que deriva dela.

São três os elementos constituintes do signo: representâmen, ou signo em si, objeto e interpretante.

O representâmen é o primeiro correlato da relação triádica do ponto de vista lógico, pois medeia a relação de representação, sendo por meio dele que o intérprete tem contato com o signo. Assim, o representâmen pode ser entendido como o aspecto perceptivo do signo, como a forma pela qual o signo se apresenta. No caso do produto de design, criamos um sistema sígnico, que é o próprio produto individual na existência. Esse sistema compõe-se de diferentes signos, que podem ser apenas visuais – caso de desenvolvimento de símbolos de uma identidade corporativa – ou uma mistura de signos (visuais, verbais, sonoros, olfativos, táteis e até gustativos), o que normalmente se mostra mais comum em nosso quotidiano, caracterizando o Design como uma linguagem híbrida (SANTAELLA, 2005). Projetos de motion design se baseiam nas matrizes sonora, visual e verbal, por exemplo, enquanto

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design de objetos tridimensionais buscam signos táteis que permitam uma melhor relação usuário-produto. Mas a tendência atual, sempre que possível, é a de integrar cada vez mais diferentes signos que estimulem todos os sentidos do destinatário em um mesmo projeto (LINDSTROM, 2007).

Esse primeiro correlato é determinado por um segundo, seu objeto, que se apresenta a ele numa relação de Secundidade. Como nos diz Peirce, o signo representa algo, não em todos os sentidos, mas em referência a um certo tipo de ideia (CP, 2.228). Assim, o signo só pode representar parcialmente seu objeto, de outra forma ele seria o próprio objeto e não sua representação. Importante frisar que esse segundo correlato não corresponde apenas a um objeto material existente do universo físico, mas pode ser imaterial, do universo do pensamento, tal qual uma ideia, um sonho etc.

Na criação de um novo projeto de design, tem-se um objeto conceitual, geralmente os elementos de marca (branding) do produto a ser projetado. Essa conexão com tal objeto abstrato mostra-se fundamental, pois garante a coerência do produto com a marca. No caso de diferentes aplicações de uma mesma identidade corporativa, é a ancoragem nesse objeto conceitual que permite que cada produto separadamente represente da melhor forma seus conceitos. Isso também ocorre quando se trabalha em novos produtos para extensão da linha de alguma marca. Em ambos os casos, mostra-se importante criar cada peça a !m de que, individualmente, melhor possa representar os conceitos que se deseja transmitir. Mas como toda representação é sempre parcial, torna-se fundamental, em situações em que há uma série de peças vinculadas à mesma marca, que elas, no conjunto, rea!rmem e fortaleçam os conceitos, reforçando os pontos fortes de cada individual para ampliar a visão do objeto.

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O terceiro elemento, o interpretante, são os efeitos que o signo desperta na mente interpretadora. Visto que as peças de design criadas passarão por uma interpretação por parte do destinatário, mostra-se necessário conhecer o público a que elas se destinam com o objetivo de conhecer seus códigos e particularidades – sua regra geral, como explicado anteriormente. No ato de interpretação, atuam “!ltros !siológicos (acuidade de percepção), !ltros culturais (ambiente, experiência individual) e emocionais (atenção, motivação)” (NIEMEYER, 2007, p.27). Isto !ca evidente na teoria da percepção triádica peirceana (SANTAELLA, 1998), em que o percepto – algo externo, comumente chamado de estímulo – se interioriza em um percipuum, gerando um juízo perceptivo: “São os esquemas conceituais que trazem consigo os elementos interpretativos gerais que permitem a identi!cação e o reconhecimento do percepto” (SANTAELLA, 2005). Pode-se também complementar, baseando-se na teoria da comunicação, que o repertório, entendido aqui como “uma espécie de vocabulário, de estoque de signos conhecidos e utilizados por um indivíduo” (COELHO NETTO, 2007, p.123), relacionado ao já citado !ltro cultural, também in"uencia na interpretação.

Tendo em vista os três elementos componentes do signo, o designer deve, na criação, preocupar-se em estabelecer três âmbitos para a determinação da peça: como o signo designa – relação com representâmen –, o que designa – relação com objeto –, e com que !m designa – relação com interpretante (WALTHER-BENSE, 2000, p.80).

De!nidos os três elementos da tríade sígnica, vale acrescentar que, para Peirce, cada um desses elementos constitui um signo. Assim o objeto – um signo – determina um signo, que determina, por sua vez, um interpretante – também signo. Esta seria a semiose genuína, claramente relacionada com a categoria de

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Terceiridade, que impulsiona o crescimento e a continuidade, pois se um interpretante é um signo, ele passa a determinar um novo interpretante (igual ou mais desenvolvido) e assim sucessivamente. Da mesma forma, um objeto é um signo que tem outro objeto determinando-o, numa regressão in!nita. Este processo contínuo denomina-se semiose ilimitada.

O processo semiótico, no entender de Peirce, depende, portanto, de uma mente interpretadora, sendo o elemento interpretante imprescindível para a realização do signo. Para ele, a tríade constitui o signo como um representâmen de que algum interpretante é a cognição de uma mente (CP, 2.242). Por isso, a semiótica peirceana é diretamente vinculada com as ciências cognitivas, pois, na semiose ilimitada, todo signo-pensamento é traduzido ou interpretado por um subsequente (CP, 5.284).

Assim, podemos entender o processo de design como uma semiose ilimitada. Seus sistemas sígnicos – as peças geradas – representam conceitos – interpretantes frutos do pensamento no mundo interno, que por sua vez podem ser efeitos de outros pensamentos ou açõ,,kes, em um continuum em regressão in!nita. Tal materialização das possibilidades de pensamento em existências reais, por sua vez, gerará novos interpretantes – pensamentos e ações – em malha contínua ad in!nito.

ConclusãoEste artigo buscou analisar o Design sob a ótica do pensamento !losó!co peirceano, compreendendo seu processo como semiose ilimitada, em que há um continuum entre pensamento e realização na existência. Trabalhando as possibilidades e qualidades da Primeiridade, não perdendo de vista a generalidade necessária da Terceiridade, a peça criada materializa-se no teatro da existência da Secundidade. A peça de design pode ser compreendida,

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portanto, como uma realização externa de um pensamento interno: signo ou sistema sígnico que gerará novos signos interpretantes – signos-pensamentos estes que poderão gerar novas ações, por sua vez, em um processo contínuo evolutivo, que proporcionará um enriquecimento e uma crescente complexi!cação da cultura material.

Como criador intencional de existências na realidade, o Design acarreta consequências práticas para o universo experienciável. Por isso, enquanto semiose, pautando-nos na divisão das ciências de Charles Sanders Peirce, o Design deve almejar o admirável estético, sem perder de vista os fundamentos éticos quando de seu processo de criação.

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WALTHER-BENSE, Elisabeth. A Teoria Geral dos Signos. São Paulo: Editora Perspectiva, 2000.

Sobre as autorasLucy Niemeyer, DSc PProfessor Adjunto da Esdi/[email protected]

Raquel Ponte, MScEsdi/Uerj, [email protected]

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A Tipogra!a HouaissGuilherme Cunha Lima, PhD Bruno Schneider, MSc

1 Introdução A Tipogra!a Houaiss foi encomendada para utilização exclusiva no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. O dicionário foi lançado em 2001 – apoiado por uma equipe de mais de 150 especialistas (lexicógrafos, redatores, etimólogos, professores, datadores, revisores) – resultado de um trabalho iniciado em 1986 por Antônio Houaiss, seu criador.

Antônio Houaiss (1915-1999) foi tradutor, crítico, escritor, lexicógrafo, diplomata, membro da Academia de Ciência de Lisboa, presidente da Academia Brasileira de Letras e Ministro da Cultura no Brasil. Houaiss também trabalhou como organizador das enciclopédias Delta-Larousse e a Mirador Internacional no Brasil e foi autor de dois dicionários bilíngues inglês-português.

Apesar da sua morte em 1999, o trabalho de desenvolvimento do Dicionário Houaiss foi concluído por sua equipe, hoje reunida no Instituto Antônio Houaiss de Lexicogra!a, no Rio de Janeiro. A publicação foi reconhecida pelo governo português como obra de referência da língua e contou com apoio de órgãos o!ciais do governo português para uma edição local, apesar de ser um dicionário concebido e elaborado por um !lólogo brasileiro.

Em relação ao conteúdo, o dicionário trouxe algumas novidades. Uma delas foi o registro da origem das palavras, através da data em que cada palavra começou a ser usada na

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língua e a fonte dessa datação. Também houve a preocupação de tornar a obra uma referência da língua portuguesa falada em todo o mundo. Foram incluídas palavras do português utilizado nos Açores, Ilha da Madeira, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola, Moçambique, Macau e Timor Leste.

A atenção com o projeto grá!co e o acabamento do dicionário também marcaram o lançamento da obra. Victor Burton, autor de uma série de projetos no ramo editorial, realizou o projeto grá!co do Houaiss, com a assistência de Angelo Allevato Bottino. A criação da Tipogra!a Houaiss foi do designer grá!co Rodolfo Capeto. O dicionário foi impresso na cidade de Bolonha, Itália, no ano de 2001.

2 A importância da tipogra!a nos dicionários

Micro tipogra!a e macro tipogra!aA tipogra!a trouxe grande contribuição para a consulta e!caz em dicionários. Quando se fala em tipogra!a para dicionários, é importante tratá-la em dois níveis: a macro tipogra!a e a micro tipogra!a. A primeira contribui para facilitar a tarefa do leitor de “navegação” pelo dicionário. A segunda está relacionada à diferenciação dos elementos estruturais do conteúdo. Os grupos de duas ou três letras normalmente localizadas no alto das páginas para marcar a sequência alfabética são um exemplo de macro tipogra!a. Já a micro tipogra!a organiza o conteúdo dentro de um verbete, diferenciando exemplos de uso, acepções, subacepções etc.

Ao longo dos tempos, o uso de tipografia nos dicionários caminhou para uma maior diferenciação entre os elementos estruturais. Se, por um lado, as tradições da boa tipografia apontavam para a busca de uma uniformidade na textura formada pela composição de uma página impressa, nos dicionários a

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complexidade e natureza do conteúdo tornaram inevitável o uso de diferentes pesos e tipos de letras na mesma página.

Um pouco de HistóriaAs bases da tipogra!a para dicionários foram estabelecidas

pelo impressor francês Robert Estienne (1498–1559) (LUNA, 2004). Nas composições realizadas por Estienne, já se observa recursos de micro e macro tipogra!a para auxiliar o leitor na leitura dos dicionários. A disposição do texto em diferentes blocos (parágrafos) e mudanças no tamanho de letra eram formas de auxiliar a “navegação” por páginas e verbetes. Mudanças no tipo de letra eram os mecanismos para diferenciar os elementos estruturais de um mesmo parágrafo.

Num segundo momento, as mudanças trazidas pelo desenvolvimento da lexicogra!a no século XVIII impuseram uma maior so!sticação dos recursos tipográ!cos para aplicação em dicionários. Ao invés de uma simples lista com as diferentes acepções de uma palavra, os dicionários começaram a ser publicados com exemplos de uso das palavras. Esta mudança, simples à primeira vista, re"ete uma maior preocupação com o leitor. O formato geral das publicações começa a mudar de uma “pilha” de de!nições por palavra para um parágrafo mais rico e com mais camadas de leitura no interior de cada verbete. O inglês Samuel Johnson (1709-1784) é quem melhor representa as mudanças desse período, no seu trabalho A Dictionary of the English Language (LUNA, 2004).

Num terceiro estágio, a complexidade das páginas requereu o domínio no uso de diferentes fontes tipográ!cas na mesma publicação e parágrafos distintos para os diversos signi!cados de um verbete. No século XIX, esse domínio foi atingido no trabalho do lexicógrafo escocês James Murray (1837-1915) para o Oxford

[117]

English Dictionary (OED) (LUNA, 2004). O design desse dicionário apoiou-se na variedade de tipos utilizada, ao contrário das limitações no uso de diferentes tipos à época de Johnson.

Finalmente, é importante ressaltar que os recursos da macrotipogra!a no arranjo espacial dos elementos no dicionário revelaram-se na história a maneira mais e!ciente para atingir a boa leitura. No entanto, as limitações de espaço disponível nas páginas por razões de custo ou necessidade de publicações compactas e portáteis restringiram a utilização desses recursos e coube à micro tipogra!a a tarefa de diferenciar os elementos estruturais do conteúdo.

3 A tipogra!a Houaiss

O início do trabalhoA encomenda de um desenho de letra exclusivo para o Dicionário Houaiss foi uma iniciativa de Victor Burton, autor do projeto grá!co. A tipogra!a Houaiss foi desenhada pelo designer Rodolfo Capeto (ESDI), num período de dois anos de trabalho não contínuo.

A partir de um contato com Mauro de Salles Villar – membro da Academia Brasileira de Filologia e responsável maior pelo Houaiss – e Burton, foi preparada e posteriormente aceita uma proposta de trabalho de Rodolfo Capeto.

Inicialmente, foram encomendados um desenho de letra com serifa nas versões normal, itálico, bold e bold itálico e uma versão sem serifa na versão black. Posteriormente, veri!cou-se a necessidade de uma versão black itálico para completar a família tipográ!ca. O trabalho foi realizado em etapas e as reuniões para discussão e aprovação dos resultados eram normalmente entre Rodolfo, Mauro Villar e Burton.

[118]

Requisitos para uma tipogra!a de dicionárioOs dicionários são livros com características muito especí!cas

pois são publicações de consulta, ao contrário dos livros para uma leitura contínua. Além disto, deve-se considerar a grande quantidade de texto numa mesma página nos dicionários, o que levou aos seguintes requisitos de projeto no desenho da tipogra!a Houaiss:

ou seja, a necessidade de acomodar o maior número possível de caracteres numa mesma linha e o maior número possível de linhas de texto numa página (inicialmente o Houaiss seria publicado em dois volumes; no entanto, a maior aceitação comercial do formato de um só volume reforçou ainda mais a preocupação com o bom rendimento da tipogra!a).

palavras que o consultante desconhece podem estar sendo lidas pela primeira vez, ao contrário da “varredura” rápida feita na leitura contínua de textos com termos já conhecidos.

caso do Houaiss).

De que forma os requisitos para o desenho de letra foram atendidosPara dar conta destas necessidades, o design da tipogra!a Houaiss incorporou as seguintes características:

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dos caracteres e, consequentemente, grande altura-x para boa legibilidade.

1 Olhos.

interferência mais discreta na “massa” de texto de cada página.

2 Serifas.

light ou bold.

3 Letras.

vertical.

4 Ascendentes e descendentes

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Também é interessante comentar que não foi possível desenhar ligaturas para a Houaiss (duas ou mais letras agrupadas no mesmo caractere), pois o processo de produção desse dicionário utilizou um software de editoração eletrônica que não permitia esse recurso. Os dicionários são montados pela integração de um software de editoração com um banco de dados que contém os verbetes. Num primeiro momento, as páginas são montadas automaticamente pelo programa de editoração a partir da base de dados dos verbetes. Na sequência, o resultado é revisado para avaliar se os padrões tipográ!cos e a diagramação das páginas atingiram o resultado esperado. Esta forma de produção é muito especí!ca e as ferramentas utilizadas não acompanham o desenvolvimento do restante da indústria de software, o que explica a impossibilidade de uso das ligaturas.

5 Impossibilidade do uso das ligaturas.

Outros atributos da tipogra!a HouaissPara a variação de pesos da família tipográ!ca, o autor Rodolfo Capeto optou por aumentar a espessura dos traços sem modi!car a largura das serifas na base de cada letra. Na progressão da versão normal à black, pode-se veri!car que a espessura dos traços da letra cresce sobre a serifa.

6 Variação de pesos da família.

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Para o desenho !nal da versão black, removeu-se totalmente o que restava da serifa. O resultado foi uma variante black sem serifa utilizada posteriormente para a abertura dos verbetes.

Respondendo uma pergunta sobre classi!cação para a família tipográ!ca Houaiss, o autor posicionou o trabalho na tradição das Romanas Antigas (Old Style), porém com uma marcada economia formal. Esta simpli!cação da forma pode ser relacionada aos requisitos para uma boa leitura em corpos de letra reduzidos nos dicionários e também está associada a uma tendência de geometrização dos !ns da década passada.

4 Aplicação da tipogra!a Houaiss

Principais aplicações:black normal sem serifa 1 foi utilizada para a

abertura de cada verbete; a utilização de versões com e sem serifa e a variação de pesos é uma tendência nos dicionários, pois a lexicogra!a evoluiu para muitas camadas de informação relacionadas a cada verbete e para uma necessidade de diferenciar todas essas informações.

verbete.

exemplos de uso de um verbete; marca a mudança do discurso das de!nições para o de aplicações em casos concretos.

bold com serifa 4 foi aplicada nas locuções e nos numerais que distinguem as acepções.

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7 Principais aplicações da tipogra!a Houaiss.

5 Outros projetos semelhantes

No exteriorO exemplo mais marcante de tipogra!a para dicionários atualmente é a Lexicon – desenhada em 1992 por Bram de Does. Esta tipogra!a foi projetada para uso em tamanhos bastante reduzidos e/ou impressão laser ou de baixa resolução.

A Lexicon está dividida em dois grupos principais: Lexicon No.1 e Lexicon No.2. A Lexicon No.1 tem ascendentes e descendentes curtos; a Lexicon No.2 tem ascendentes e descendentes “normais”. Os dois grupos utilizam a mesma largura nos caracteres, o que possibilita a troca de fontes sem o deslocamento do texto.

Outra característica desta fonte é a grande variedade de pesos de letra. Cada grupo principal tem doze variantes disponíveis (seis em itálico).

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<< 8 Tipogra!a Lexicon.

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Um segundo exemplo de tipogra!a muito utilizada em dicionários é a Nimrod, da Monotype. A legibilidade em tamanhos reduzidos, boa variação de pesos e uma certa neutralidade justificam essa escolha.

A Nimrod foi desenhada por Robin Nicholas no período de 1978 até 1980. Esta fonte foi planejada para uso em jornais e pequenos anúncios. Foi utilizada pelos jornais Leicester Mercury, The Guardian e The Daily Telegraph e, posteriormente, retrabalhada para boa legibilidade em tela.

Em 1982, Nicholas desenvolveu uma fonte sem serifa para impressoras a laser de baixa resolução que foi aprimorada e acabou transformando-se na família tipográ!ca Arial.

No BrasilA Tipogra!a Houaiss, desenhada para uso exclusivo na publicação que se transformou no maior dicionário brasileiro, é um exemplo pioneiro no país.

No entanto, um outro projeto de grande complexidade e que pode ser apontado como referência na área de tipogra!a foi o desenvolvimento de uma fonte exclusiva para a Folha de São Paulo. O trabalho foi conduzido passo a passo por Eliane Stephan e, além do desenho da tipogra!a Folha Serif por Erik Spiekerman – inicialmente consultor tipográ!co do projeto e, posteriormente, designer da fonte exclusiva – envolveu o redesenho de todo o processo de produção grá!ca da Folha de São Paulo, entre 1993 e 1994.

6 Conclusão O pioneirismo da Houaiss propiciou uma boa repercussão do trabalho na comunidade ligada ao design e à tipogra!a. Num circuito mais amplo, a ausência de uma cultura mais desenvolvida

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sobre as possibilidades da atividade de design provavelmente explica a divulgação mais tímida. No entanto, este tipo de projeto contribuiu positivamente para vincular o design ao projeto de bens úteis e duráveis.

ReferênciasBOAG, A. (2004). Case study, New Oxford Dictionary of English.BRINGHURST, R. (1992). Elements of typographic style.HOUAISS, A. e VILLAR, M. de S. (2001). Dicionário Houaiss da

Língua Portuguesa.LARSON, K. (2005). The Science of Word Recognition.LUNA, P. (2004). Not Just a Pretty Face: The Contribution of

Typography to Lexicography.PAPAZIAN, H. (2005). The Bouma Supremacy.THOMSON, M. (2004). Microtypography, Designing the new Collins

dictionaries.

Sobre os autoresGuilherme Cunha Lima, PhDProfessor Adjunto da Esdi/[email protected]

Bruno Schneider,Esdi/Uerj

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Espaço de venda: um elemento de comunicação, um produto de design.Lucy Niemeyer, DSc Stella Hermida, MSc

O artigo ora proposto visa compreender, delinear o ponto de venda como um elemento de comunicação do discurso de identidade de uma marca, portanto, membro do sistema-produto de comunicação e um produto de design. Para tanto, iniciaremos nosso percurso estabelecendo as relações entre o campo do design e os aspectos signi!cativos do produto, para posteriormente delinearmos nosso objeto em si, o ponto de venda, ou espaço de venda como o caracterizamos nesse artigo.

“O produto carrega expressões das instâncias de elaboração e de produção: cultura e tecnologia. Quando ele entra em circulação, além de portar essas expressões, passa a ser um elemento de comunicação – não só portando informações objetivas mas passando a ser suporte também de mensagens do usuário para si próprio e para os outros.(...) Assim, o produto, além das funções prática, estética e de uso, tem a função signi!cativa. O produto difunde valores e características culturais no âmbito que a tinge.” (Niemeyer, 2008, p. 18).

O produto seria um elemento comunicante. Atuaria participando aspectos da identidade de marcas e indivíduos no ambiente social. Portanto, o mesmo também seria cultura material transmitindo signi!cações sobre uma determinada época e sobre algo que representa. Desta forma, promove o diálogo entre indivíduos-consumidores e o domínio da produção e assim,

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estabelece a interface entre o produzido e o simbólico, entre os domínios da produção e do consumo.

De acordo com Rocha (1995, p. 66-67) o domínio da produção seria caracterizado pela ausência da marca humana. Tal fato ocorre, pois nele o homem se encontra alienado. Alienado por exemplo, do resultado de seu trabalho. Para explicar melhor essa questão utilizaremos o exemplo a seguir. Quando pensamos num objeto feito pela mão do homem, a partir de seu trabalho manual, o resultado desse processo expressaria a capacidade daquele individuo de produzi-lo, o conhecimento prévio necessário para execução daquele objeto assim como, marcas de ferramentas utilizadas para sua manufatura. Seria nesse sentido, a partir da produção industrial, que o resultado desse processo, o produto em si, não atestaria sua execução por um homem. Sendo assim, o homem estaria alienado do resultado !nal de seu trabalho. No domínio da produção o produto !nal, o que foi produzido, não seria atestado de compromisso entre o trabalhador e sua criação. Nesse modo de produção, segundo Rocha baseado na crítica que Marx faz do modo de produção capitalista, (Rocha, 1995, p. 65),

“o processo de trabalho é, a um só tempo, um processo de criação de mais valia e é onde o operário não utiliza seu instrumental de trabalho. Antes, pelo contrário, é por ele utilizado e, diante desse instrumental, torna-se um elemento substituível.(...) No domínio da produção o mecanismo da fábrica retira a marca humana do produto e transforma o homem em força motriz. Para Marx, quando o homem começa a ser limitado ao papel de força motriz substituível, sua função deixa de se fazer sobre o objeto do seu trabalho. Nesse sentido, a força muscular humana passa a ser meramente acidental no processo. Podem substituí-la o

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vento a água, o vapor, etc. Neste circuito a marca do humano se neutraliza.”

No domínio do consumo, segundo o autor, “o homem é rei”. Seria nesse domínio em que as vontades, necessidades, “o gosto” de cada indivíduo entram em cena. Estabelecem-se ligações afetivas, emocionais entre usuário, consumidor e produtos consumidos. Seria também nesse domínio onde os signi!cados presentes em objetos produzidos são lidos, compreendidos e construídos no meio social. Na lógica do consumo, segundo Rocha (2009, p. 143-160), aprendemos a enxergar, a validar o lado signi!cativo de um objeto por meio do reconhecimento de quem o consumiu e de seus pares. Seria nessa instância onde produtos, por exemplo, comunicam quem somos, o que conquistamos e em que acreditamos.

Essas características pessoais, individuais, são apresentadas no meio social, podendo ser adquiridas e assim comunicadas por outros indivíduos. Desta forma, a igualdade social, no domínio do consumo, pode ser adquirida.

Na Modernidade, o domínio da produção estava caracterizado pela ausência da marca humana, do traço humano. Vejamos o porquê.

A sociedade moderna transformava-se de uma sociedade agrícola e de bens de consumo manufaturados para uma sociedade industrializada. Novas ideologias, tecnologias de construção e de produção eram apresentadas (Lipovetsky, 1989, p. 166-167).

Nesse contexto, o desenho industrial participava e contribuía fornecendo métodos e técnicas que colaboravam na viabilidade do processo de industrialização. Ele originava produtos cujas formas eram adaptadas às necessidades e às funções da época, porém,

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eram também compatíveis a uma produção industrial moderna. (Lipovetsky, 1989, p. 167).

A comunicação, então de caráter elucidativo (Soares, 2009), demonstrava a necessidade, os benefícios obtidos pela aquisição de bens industrializados. Assim, a comunicação sociabilizava para o consumo os “produtos-marcas”. Denominamos de “produtos-marcas”, pois tanto os produtos estavam sendo apresentados ao mercado quanto as suas marcas.

Até então, o desenho industrial contribuía por meio de técnicas e métodos colaborando com a viabilização da industrialização. A comunicação cooperava estabelecendo um código necessário entre objetos industrializados e indivíduos para assim, possibilitar o consumo, pois segundo Rocha (2000, p. 22) para haver consumo é necessário haver um “código, um sistema simbólico que complete objetos, produtos, atribuindo-lhes usos e razões”. A comunicação agiria sociabilizando a produção para o consumo por meio da elucidação de aspectos funcionais dos bens produzidos e benefícios que estes proporcionariam à vida cotidiana de seus consumidores. A concepção de marca, na Modernidade se mesclava com o produto recém lançado. O produto denominava a marca e a marca denominava o produto estabelecendo desta forma, um produto/marca. Iniciava-se assim, o processo da marca como entendemos atualmente. A marca seria um campo semântico, um campo composto por elementos signi!cantes (Chaves, 2008, p. 124), um sistema complexo, que envolve a empresa, corporação ou instituição seus elementos identi!cadores da identidade institucional, o processo de semiose institucional, ou seja, o processo de comunicação do discurso identi!cador da instituição assim como, o resultado desse processo comunicacional, um fenômeno de opinião - a imagem externa à entidade.

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A partir da segunda metade do século XX, intensi!cam-se essas relações e é gerada outra lógica de coexistência entre essas partes, a segunda fase do Capitalismo Moderno, que Lipovetsky denomina de sociedade “hipermoderna” (2004).

Para o autor, houve um momento de ruptura, a sociedade presentista Pós-Moderna, sede lugar a outra sociedade com seus valores ainda mais exacerbados, a “Sociedade Hipermoderna”. Nela, cada domínio apresenta uma vertente excrescente, desmesurada, “sem limites”. A escalada paroxística do “sempre mais” se imiscui em todas as esferas do conjunto coletivo (Lipovetsky, 2004, p. 55).

O controle social exercido pelo estado, pela religião e a família sede lugar a um cenário cujos instrumentos sociais reguladores são gerados pelos próprios indivíduos por meio do universo funcional da técnica (sistemas de segurança, câmeras por toda parte, radares controladores de velocidade no trânsito, portas magnéticas, carros blindados são alguns exemplos desse universo).

Para Lipovetsky, a economia centrada no eixo produção-trabalho transforma-se numa economia do consumo e da comunicação de massa.

Outra questão que o autor apresenta e que julgamos relevante é a que aborda o fator tempo. Na Modernidade, com seu capitalismo de produção, a obsessão pelo tempo estava relacionada ao trabalho. Acreditava-se que pelo trabalho o futuro próspero almejado se tornaria possível. Na sociedade hipermoderna, a visão de futuro já não é tão previsível, o indivíduo ideológico-político, heróico, cede lugar a um indivíduo projetivo e preventivo, com a instabilidade rondando-o nas suas relações sociais, no trabalho, em sua vida privada. Esse ambiente

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instável pela presente economia de consumo e de comunicação de massa globalizados desenvolveria uma obsessão com o tempo não mais submetida ao trabalho, mas vinculada aos critérios de produtividade. Desta forma, o tempo se imiscuiria na eterna busca da estabilidade em varias esferas do conjunto social.

Compreendemos que essas transformações foram geradas a partir de uma intensi!cação de atuação dos variados domínios que compõem o conjunto social, ou seja, cada domínio apresentou uma vertente excrescente (Lipovetsky (2004, p. 55) denominou de desmesurada, “sem limites”). Utilizaremos no presente artigo a terminologia proposta por Rocha (Rocha, anotações de aula, 2009), a “sociedade moderno-contemporânea”, quando nos referirmos ao atual momento social. Contudo, embora ambos os autores utilizem terminologias variadas e justi!cadas cada uma em si, ao tratarem do período contemporâneo, convergem para o mesmo ponto em relação ao consumo: sua centralidade no tecido social.

Como o campo do design, o domínio da produção, o campo da comunicação relacionam-se entre si quando o fenômeno do consumo torna-se central para o entendimento da sociedade contemporânea?

Como mencionamos ao iniciarmos o presente artigo, o domínio da produção é caracterizado pela ausência da marca humana, o domínio do consumo, então nesse sentido é justamente o oposto, nele o “homem é rei”.

Seria no domínio do consumo onde o objeto produzido se antropomor!za, ou seja, toma forma humana por meio de códigos culturais organizados e disseminados socialmente pela comunicação de massa. Seria nesse domínio, no momento do ato de consumo onde características humanas interagem com o produto em si. No momento do consumo de um produto, os signi!cados, as sensações, as emoções que aquele produto

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emana dialogam com o repertório daquele individuo que tem a intenção de consumi-lo. Seria nesse sentido, que o produto é antropormo!zado. Assim sendo, na esfera do consumo são transmitidas mensagens e signi!cados que fornecem valores e categorias pelos quais concebemos diferenças entre produtos, objetos e entre seres humanos que os portam. Desta forma, seria nesse domínio em que a vida social contemporânea vai sendo classi!cada.

Desta forma, na sociedade moderno-contemporânea, quando o consumo torna-se central, não mais o Desenho Industrial contribui apenas no processo de industrialização viabilizando-a. Ele torna-se Design (Ferrara, 2009), planejando essa produção na relação homem/produto, para assim, viabilizar o consumo desses bens produzidos atualmente. A necessidade não está mais em planejar bens de forma que eles possam ser fabricados em série, mas de comunicar por meio de produtos, emoções, signi!cados que dialoguem com personalidades, com as identidades de consumidores e de marcas. O campo do design vem contribuir nessas relações, planejando-as desde o âmbito de projeto.Desse modo, o design antropomor!za antes mesmo do domínio da produção, na esfera de planejamento de produtos.

Ao adquirimos um produto de design então, consumimos um objeto cuja “a marca humana” é novamente atestada em sua produção. Seja por meio da ergonomia desse objeto, seja por sua fácil interação - sua usabilidade, seja pelo o que nos comunica de forma clara, ou emocional, o produto de design retoma a forma humana ao universo do produto. Não mais agora, pelo traço humano que denota uma ferramenta utilizada num produto artesanal, mas por antropomor!zar e assim, suscitar a con!ança de que aquele produto “foi pensado, planejado para mim”.

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Contudo, como dissemos anteriormente, uma das características da sociedade em que vivemos, seria o fator excesso.

Ou seja, intensi!cam-se relações, o caráter desmedido atinge o conjunto da sociedade. Nesse contexto, as relações entre os domínios de produção e consumo e o design também se torna mais intensa.

Quando o fator tempo passa a ser relacionado à produção, ou seja, passamos a avaliar a quantidade produzida e o tempo demandado para produzi-la e não mais o trabalho como na sociedade moderna e essa relação tempo-produção se excede, tornando-se desmedida, a dinâmica entre produtos e mercado consumidor se estabelece de outra forma.

O design, por meio de uma abordagem estratégica, passa não mais a atuar somente no planejamento do produto em si, mas em todas as relações que serão estabelecidas pelo produto no meio social.

Ou seja, quando o domínio do consumo torna-se central, “o homem torna-se rei” e a partir de então, a permanência ou não daquele bem produzido no contexto social, torna-se decisão sua. Esse indivíduo atua como mensageiro social dos signi!cados contidos em um produto, mas também como seu agente constituinte e deste modo, transformador de sua imagem identi!cadora. O produto estabelece relações com o meio urbano no qual está sendo produzido, com o meio ambiente quando pensamos em seu descarte, com as pessoas que o produzem, com as pessoas que o consomem e em todas essas relações o que as permeia, o que as vinculam, são os signi!cados, a coerência semântica estabelecida por aquele produto, por aquela marca com seus outros elementos de comunicação. Nesse sentido, o produto constitui, um sistema de signi!cações, um campo semântico que é difundido, lido socialmente. Portanto, com essa dinâmica

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instaurada, o design passa a planejar de uma forma humana todas as relações que esse objeto e os outros elementos de comunicação passarão a exercer.

Para Moraes (2009) o design estratégico não é visto somente como atividade projetual, mas vem considerado de forma dinâmica e complexa por intermédio da estreita interação entre produto, comunicação, mercado e serviço, ele é o mediador. Moraes acrescenta que essa dinâmica seria no mínimo calcada em um tripé: o produto, a comunicação e a distribuição, havendo entre eles uma coerência semântica que garantiria assim, sua e!cácia como sistema. Nesse sentido, todos os elementos relacionados ao produto (a produção, o produto, a distribuição, as peças publicitárias, a embalagem, a distribuição, os pontos de venda, por exemplo) seriam elementos que compreenderiam e comunicariam socialmente os mesmos signi!cados, portanto, seriam também elementos comunicadores desses signi!cados. Sendo assim, estariam vinculados pela coerência semântica formando um sistema, um sistema-produto.

Reyes (2009) ao dissertar sobre o design estratégico contribui: “o design amplia o espectro semântico incluindo as imaterialidades além das materialidades, incorpora o sentido de processo”. Esse “sentido de processo” acreditamos ser justamente a estratégia, pensar em todo o sistema-produto, antes mesmo de sua produção. As imaterialidades, para nós referem-se justamente aos signi!cados, aos valores que o produto de design aportará no meio social. Por intermédio do design estratégico não somente o produto seria antropomor!zado em sua concepção, mas todos os elementos comunicantes que constituem seu universo simbólico, ou seja, todas as suas relações na esfera social.

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Assim, a relação entre os domínios da produção, do consumo e os campos da comunicação existente na sociedade moderna, transforma-se num “organismo vivo”, tão complexo quanto. A lógica social antes vigente era linear (Moraes, 2009): eu trabalho, produzo, comunico, vendo, obtenho lucro e cresço. Agora, com a participação do indíviduo no processo de constituição da imagem desse produto, torna-se dinâmica; necessitando de acompanhamento constante ao longo do tempo.

Deste modo, o design de abordagem estratégica atuaria sobre duas vertentes:

ainda numa fase de planejamento e projeto, antes do domínio da produção;

universo simbólico, o sistema-produto, seus elementos de comunicação, no conjunto social ao longo do tempo.

Sendo assim, a imagem identi!cadora desse produto seria gerida contemporaneamente.

O ponto de venda seria um elemento do sistema-produto. Pretendemos nesse artigo, delinear seus aspectos

comunicativos e, portanto, julgamos necessário classi!cá-lo com vista á participação do usuário em seu espaço construído.

Ao tratarmos de espaço, poderíamos tecer múltiplos caminhos para desenvolver o artigo ora proposto. O espaço, por seu caráter interdisciplinar e sua complexidade, nos possibilita diversas investigações em variadas áreas de conhecimento como em trecho exposto de Ferrara (2002, p. 95) a seguir:

(...) “A arquitetura se ocupa do espaço enquanto ambiente construído e funcional; a demogra!a estuda o adensamento populacional no espaço; as

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análises sociológicas e históricas estudam-no enquanto campo de lutas de movimentos sociais preocupados com a divisão do trabalho e das riquezas acumuladas no tempo; a política é atraída pelo espaço urbano porque nele encontra um campo propício para a divulgação de programas, ideologias e poder; as especulações da economia estudam as explorações das riquezas materiais e produtivas que têm o espaço como cenário; o governo observa o espaço territorial e social, organizado ou não.”

E o design, ocupa-se do espaço? Para responder esta questão aqui propomos uma abordagem do espaço construído relacionada com o fator comunicativo e suas signi!cações, portanto, acreditamos ser essa uma discussão própria do domínio do design, do campo de conhecimento do design de interiores.

O espaço de venda constitui-se como uma particularidade do ponto de venda. Particularidade essa, que buscaremos a seguir apresentar.

Como um ambiente construído, o espaço de venda é composto por “elementos arquitetônicos” (Ferreira, 2004, p. 721), como piso, fechamentos laterais (por exemplo: paredes, displays, vitrines) coberturas, sua composição volumétrica, sua inserção na cidade e também, citando os autores Kotler e Keller (2006, p. 276), por ser um elemento de uma marca.

Por estabelecer-se como um ponto de venda, sentimos a necessidade então, de criar uma terminologia própria, que evidencie a característica que pensamos ser diferenciadora do espaço de venda em relação aos pontos de vendas.

O espaço de venda proporciona a inserção de consumidores em um ambiente interno de venda e assim, oferece a “vivência” dos valores da marca que representa.

Portanto, estamos descrevendo um objeto construído que gera um ambiente interno e ambos são capazes de transmitir ao seu

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usuário signi!cações de uma marca. Signi!cações essas, que são oriundas da vivência por esse indivíduo desse lugar da marca. O fato de ser transmissor de signi!cados entranha no espaço de venda sua função comunicativa própria de um produto de design. O fator comunicacional o vincula à marca, por conter e transmitir

seus conceitos, constituindo-se assim, um elemento seu.A semiótica, por meio de suas fundamentações e de técnicas

aplicáveis nela baseada, pode nos auxiliar na concepção de produtos de design, que tornem explícitos os valores de uma marca presentes no processo de comunicação entre o produto e seu destinatário (Niemeyer, 2006, p. 102). Se dotarmos, portanto, a imagem corporativa de uma empresa com os fundamentos teóricos semióticos, pensamos que assim, poderemos facilitar ou evidenciar, a transmissão de representações de valores dessa corporação entre os elementos de sua marca e seus destinatários. “Os elementos de marca são aqueles recursos próprios da marca que servem para identi!cá-la e diferenciá-la. A maioria das marcas fortes emprega diversos elementos de marca.” (Kotler & Keller, 2006, p. 276).

Bense, em sua teoria do objeto (Max Bense, apud Walther-Bense 2000, p. 90), caracteriza os objetos de design como sendo construídos, pois não são “dados” como os da natureza; são antecipáveis, isto é, são planejados, mas não são completamente determinados pelas suas funções técnicas. A indeterminação ocorre, porque os objetos de design possuem um conteúdo estético responsável por uma diferenciação do produto de design, dos produtos com estética convencional. Seria, a nosso ver, o conteúdo estético também responsável - entre outros fatores - pela comunicação de sensações próprias de uma primeiridade; de um olhar que leva em consideração as “aparências” do signo;

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que possuem como fundamento qualidades de aparência do signo, que podem se assemelhar a outras qualidades de aparência (Santaella, 2007, p. 17), ou seja, as experiências singulares de vivência do cotidiano de cada destinatário, gerando emoções por similaridades, gerando prazer.

Bense (apud Walther-Bense, 2000, p. 90), propõe outras classi!cações para o objeto de design. Para ele, esse objeto se apresenta como um signo complexo, que abrange as três classes sígnicas principais. Trata-se de um objeto que possui três referências:

A dimensão material, também chamada de “hilética”, contempla os meios materiais empregados no objeto de design. É classi!cada como um qualisigno-icônico-remático, que associa um qualisigno a um ícone na referência a seu objeto e a um rema na referência ao seu interpretante. Referimo-nos nesse caso à primeiridade.

A dimensão morfética, ou semântica, abrange o campo da secundidade. É classi!cada como sinsigno-indexicálico-dicêntico, ou seja, associa na sua referência ao objeto um sinsigno a um índice e um dicente na relação ao seu interpretante.

A dimensão sintática, ou sintética, está relacionada com a funcionalidade técnica do objeto de design. Podemos classi!cá-la como um legisigno-simbólico-argumênico.

As três dimensões acima descritas aliadas ao esquema de criação de Peirce (Bense, apud Walther-Bense, 2000, p. 91), onde uma terceiridade unida a uma primeiridade cria uma secundidade, nos conduz à dimensão pragmática do objeto de

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design, sua cadeia de produção. Tratamos, então, da dimensão sintética, que abrange as condições funcionais do objeto em estudo, somada à dimensão hilética, que contempla os meios materiais empregados, gerando a dimensão morfética, isto é a produção efetiva do produto de design, podendo ser usada e consumida. (Bense, apud Walther-Bense 2000, p. 91).

Em analogia à teoria de Bense aplicada a um espaço de venda, os materiais empregados se relacionariam com os valores da marca numa relação de primeridade. Não tratamos aqui de uma apreciação do espaço correlacionando-se com a marca por similaridade direta (por exemplo: a aplicação das mesmas cores da marca no ambiente ou no mobiliário), senão, de uma visibilidade. “A visibilidade, ao contrário, é propriamente semiótica, pois é compatível com a cognição perceptiva como alteridade que caracteriza e desa!a a densidade sígnica.” (Ferrara, 2002, p. 101).

Como citado anteriormente, a primeiridade sugere um olhar que leva em consideração as aparências do signo. Como tal, seu fundamento ocorre por similaridade. Similaridade essa, que está intimamente relacionada com as sensações. Ou seja, a primeridade em um espaço de venda está relacionada com as interpretações do usuário desse ambiente, que compreende os valores da marca por meio de analogia às experiências vividas por ele mesmo.

No presente artigo !ca exposto que ao analisarmos semioticamente um espaço de venda, não abordaremos a dimensão hilética no que tange as possibilidades de interpretações do usuário desse ambiente, pois a nossa intenção com a análise proposta é de compreenção do processo de comunicação entre os elementos comunicantes de um discurso identi!cador de uma mesma marca presente em seu ambiente construído e não as interpretações de usuários desse espaço.

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Assim sendo, a dimensão hilética que leva em consideração as aparências do signo por meio dos materiais empregados no produto de design - o espaço de venda, será aqui interpretada quando se relacionará com o discurso identi!cador da marca, com a estratégia da marca em estudo.

Ao tratarmos da terceiridade aplicada no mesmo espaço - sempre em relação aos valores da marca representada - devemos pensar nos valores regulares presentes nesse ambiente, pois “O argumento é o signo de uma conexão de signos completa, regular (legal), na qual os objetos são designados simbolicamente (...).” (Walther-Bense, 2000, p. 33). Nesse caso, em um espaço de venda, o que se pretende evidenciar é a sua indução ao consumo, à venda propriamente dita. A sua função técnica é a venda dos produtos de sua marca. Como então, está representada nesse ambiente essa ação de consumo? Por meio da distribuição espacial de seus componentes (mobiliário, produtos em exposição, ambientes internos [estoque, cabines, vitrines, etc.]), seus percursos tanto quanto seus "uxos, a disposição de seus produtos, sempre com a intenção clara de proporcionar ou facilitar a aproximação e o consumo dos produtos da marca.

A secundidade está vinculada à ideia de ação e reação. “(...) um objeto ou acontecimento da experiência direta, que como signo, proporciona informação sobre seu objeto que é um fato atual ou um estado de coisas atual.’”(Walther-Bense, 2000, p. 32). Correlacionando ao Esquema de criação de Peirce à dimensão morfética, isto é, a produção efetiva do produto de design, na dissertação ora proposta, o espaço de venda em si seria a sua representação. Um produto de design, um elemento da marca, podendo ser usado e consumido.

O espaço de venda, por ser a criação do processo de adição da terceiridade com a primeiridade resulta em um ambiente que ao

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ser projetado estabeleceu-se a intenção direta de incentivo ao ato de consumo, sua função técnica dentro do conjunto dos elementos de sua marca. No entanto, esse mesmo ambiente, pela distribuição espacial de seus componentes, seus percursos tanto quanto seus "uxos, a disposição de seus produtos, comunica a seu usuário signi!cações daquela marca. Signi!cações essas que podem se destacar umas às outras de acordo com fatores ambientais e temporais presentes em seu intérprete no momento do processo de semiose. Ou seja, um espaço de venda é um elemento da marca projetado com uma determinada função técnica, aliada à escolha de materiais e diretrizes de ordenamento do espaço, mas que, ao transmitir os valores de sua marca, está sujeito às interpretações de cada indivíduo que o vivenciará.

Penso que tal fato, faz da teoria semiótica um instrumental teórico aplicável ao design de interiores, pois nos fornece meios de ver o intangível, de verbalizar signi!cados e assim de sermos talvez mais coerentes ao projetarmos esses espaços. Espaços esses, que transmitirão sensações, que serão susceptíveis a inúmeras interpretações, mas que, no entanto, penso que por meio da semiótica proporcionarão coesão de signi!cados entre os elementos comunicacionais da marca que representa.

Um espaço de venda, como um produto de design, por meio de analogias, na relação com o seu usuário, evidencia e ignora a cada instante signi!cados da marca que representa. Seu signi!cado não é simbólico, ditatorial de interpretações, senão capaz de sugerir múltiplas possibilidades e descobertas em sua relação com o receptor desse processo de comunicação. Estabelece-se assim, um ambiente de visibilidade1 da marca. (Ferrara, 2002, 101), um “momento de verdade” (Demetresco, 2007, p. 202), na relação da marca com seu consumidor.

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Ao tratarmos de sistemas de identidade visuais institucionais ou seja, logotipos, símbolos, marcas, cores institucionais e os alfabetos institucionais deveríamos incluir o espaço de venda como mais um membro desse sistema e parte integrante da imagem corporativa. O mesmo, como justamente citou Demetresco (2007, p. 202), constitui-se um “momento de verdade”, a exposição - ao público !nal - de todos os valores pensados na concepção de um sistema de identidade visual institucional. Deste modo, entendemos os espaços de venda como um campo possível de atuação pro!ssional, ensino e pesquisa na área de design no Brasil.

Seguindo o raciocínio apresentado anteriormente, o ponto venda, ou espaço de venda como achamos mais oportuno classi!cá-lo, seria então, um elemento constituinte desse sistema-produto. Portanto, ele comunicaria aspectos signi!cativos daquele produto e consequentemente, a identidade da marca que o produto e os outros elementos formadores desse sistema representam. Segundo Moraes (2009), seria somente a coerência semântica entre todos esses elementos que garantiria a e!cácia dessas relações como sistema, sistema de comunicação.

A gênesis dessa questão estaria relacionado ao fato de que, segundo Moraes (2009) nem sempre os pontos de venda atuariam como elementos que comunicam as identidades de suas marcas, dito de outra forma, nem sempre os espaços de venda fariam parte do sistema-produto. Portanto, sob essa ótica, a da comunicação, nem sempre os espaços de venda seriam objetos de design, elementos que foram trabalhados, planejados estrategicamente em relação à e!cácia de todo um sistema de comunicação de signi!cados, de comunicação de valores de uma marca. Desta forma, o objeto construído, o espaço de venda, permeia o campo do design, por meio da sua função comunicativa e não somente

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de sua função técnica (a função técnica do espaço de venda como objeto de design é a da venda dos produtos de sua marca).

A partir de então, iniciaremos o trajeto proposto nesse artigo- a abordagem do objeto construído com foco em seu aspecto comunicativo, ou seja, atuando no campo do design, do design de interiores.

Discorremos a seguir sobre o campo do design, ainda que de uma forma sucinta, pois acreditamos que cada abrangência nesse campo institui atuações e signi!cações próprias que fogem do objeto do artigo ora proposto, mas que, no entanto, mostram-se necessárias aqui expressá-las para que possamos compreender o design de interiores relacionando-o à área do conhecimento em design.

Durante as aulas do curso de pós-graduação stricto senso em design na ESDI (Escola Superior de Desenho Industrial - UERJ), a convivência no ambiente acadêmico relacionado ao campo do design, assim como, as leituras executadas durante o curso e as palestras assistidas no programa de mestrado durante o período de 2008 a 2009, acreditamos que o campo do conhecimento do design abordaria questões como o planejamento, por exemplo, ao de!nirmos estratégias de gestão de marcas (Design Estratégico); técnicas industriais de produção, quando pensamos em projetos de mobiliários, de produtos produzidos em série e industrialmente (Design de Produto); aspectos comunicativos, quando executamos por meio de recursos grá!cos ou midiáticos a comunicação de uma instituição, de um produto, de uma marca, a partir da criação de um sistema de identidade visual, por exemplo, (Design Grá!co), a relação homem/produto, quando planejamos o produto de uma forma ergonômica (Ergonomia), quando pensamos nos recursos visuais e funcionais que proporcionarão o uso de um produto por um indivíduo (Usabilidade), quando

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elaboramos num produto por meio da aplicação de materiais, cheiros, texturas, sensações; emoções que esses bens produzidos poderão transmitir a quem os consumir (Design atitudinal).

Sendo assim, voltamos a ressaltar, ainda que de uma forma breve, o campo do design abrangeria questões relacionadas à:

Logo, ao pensarmos em uma abrangência do campo do design (o design grá!co, design de produto, o design de interiores, etc.), pensamos relacionando-a a alguns dos aspectos listados anteriormente.

Para relacionarmos a atividade pro!ssional de design de interiores com o campo de design procuraremos a seguir, primeiramente de!ni-lo a partir de instituições que o representem socialmente.

A atividade do Designer de Interiores existe no Brasil desde o início do século 20, segundo a ABD (Associação Brasileira dos Designers de Interiores). Hoje, no Brasil, existem 70 cursos técnicos, 47 tecnólogos e 10 bacharelados na área de Design de Interiores (ABD, 2010).

Apesar de não ser ainda uma pro!ssão regulamentada, o Design de Interiores tem sua atividade listada na CBO - Classi!cação Brasileira de Ocupações, além dos seus cursos de formação serem reconhecidos pelo MEC (Ministério da Educação) (ABD, 2010).

A CBO - Classi!cação Brasileira de Ocupações, é um documento que reconhece, nomeia títulos e descreve as características das ocupações do mercado de trabalho brasileiro.

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Essa classi!cação do Ministério do Trabalho e Emprego orienta a uniformização de ordem administrativa das ocupações, servindo assim, para o planejamento da educação pro!ssional e das requali!cações ocupacionais (ABD, 2010).

Por meio da CBO, o Ministério do Trabalho reconhece as pro!ssões de Técnico em Design de Interiores e Bacharel em Design de Interiores sob os códigos Designer de Interiores (nível Superior) 2629 e Designers de Interiores (nível Médio) 3751 (ABD, 2010).

Esses pro!ssionais seriam responsáveis por, segundo a ABD:

A mesma instituição, a ABD de!ne o Design de Interiores como sendo “uma carreira pro!ssional relacionada à melhoria da qualidade de vida das pessoas através da criação e execução de projetos que assegurem conforto e qualidade estética em ambientes públicos e privados”.

Buscamos outras instituições internacionais de representação dessa atividade pro!ssional com o intuito de coletar mais dados sobre o que seria o Design de Interiores, seriam elas:

Nacional Council for Interior Design Quali!cation, dos Estados Unidos.

Conceil Français des Architectes d’Intérieur, da França.

De acordo com a NCIDQ (2010), Nacional Council for Interior Design Quali!cation, instituição de ensino em Design de Interiores nos Estados Unidos da América, o Design de Interiores seria

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uma pro!ssão abrangente, cujo pro!ssional por meio de soluções técnicas e criativas trabalharia o ambiente interno construído. Essas soluções, esteticamente atrativas, seriam funcionais e ressaltariam o estilo de vida e a cultura de seus ocupantes, ao mesmo tempo estariam coordenadas com a parte externa da edi!cação e com sua localização urbana.

Segundo a CFAI (2010), Conceil Français des Architectes d’Intérieur, (na França o designer de interiores é denominado de arquiteto de interiores- architect d’interieur) acrescenta que “criar um espaço, no interior de uma edi!cação, é respeitar a arquitetura levando-a a sua !nalização. É analisar as restrições de um edifício em uma escala diferente da do arquiteto: a do indivíduo. (...) Assim, o designer de interiores, no coração da arquitetura, identi!ca os territórios e de!ne os caminhos utilizados pelos seres humanos. (...) a atividade do arquiteto de interiores inclui, além do ordenamento do espaço, uma variedade de disciplinas desde o design de produto e de mobiliário, design grá!co e de sinalização até o design têxtil, ou o estudo das cores, contudo, seria a relação prioritária dessas disciplinas com o espaço que de!ne essa área de atuação pro!ssional, o Design de Interiores.

Poderíamos entender a partir das de!nições propostas pelas três instituições que o Design de Interiores abrangeria a atividade de planejamento e projeto relacionados a um ambiente interno construído. Esse projeto ao mesmo tempo respeitaria a arquitetura em que está inserido, completando-a, como coloca a CFAI. Outra questão abordada seria a relação homem/produto, como de!nimos quando nos referirmos anteriormente sobre as questões que abrangem o campo de conhecimento de design. Assim como, ao projetar um produto de design aspectos da relação homem/produto (ergonomia, usabilidade, o design atidudinal) são planejados, no design de interiores o seu produto,

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o ambiente interno construído, também seria projetado seguindo essa relação. Na citação da CFAI “É analisar as restrições de um edifício em uma escala diferente da do arquiteto: a do indivíduo.” Entendemos, que “essa escala do indivíduo” seria a preocupação de se estar projetado pensando no homem, em suas dimensões, relações com esse ambiente, seu estilo de vida e sua cultura, como de!ne a NCIDQ.

Acrescentamos em relação à comunicação, que essa “relação homem/produto” do produto de design de interiores, a “escala do indivíduo”, como cita a CFAI, estaria relacionada também à identidade desse indivíduo. Identidade essa, presente em seu estilo de vida em sua cultura (NCIDQ, 2010).

Desta forma, acreditamos que um ambiente interno construído como produto de design de interiores, no caso de uma residência, por exemplo, comunicaria a identidade de seu proprietário, desse indivíduo.

A atividade pro!ssional do designer de interiores, segundo a ABD, compreende os ambientes internos construídos públicos e privados, ou seja, espaços comerciais, residenciais e institucionais. Seguindo essa lógica, como um produto de design de interiores da segmentação de atuação residencial comunica a identidade de seu proprietário, um produto de design de interiores da segmentação de atuação comercial ou institucional, comunicaria o discurso identi!cador de uma marca ou os valores daquela instituição.

Compreendemos então, que um ambiente interno construído, sendo um produto de design de interiores, assim como um produto de design, participa como elemento de comunicação a partir do momento que expressa no meio social, características próprias de indivíduos, marcas ou valores de uma instituição.

A partir das questões levantadas anteriormente, de!nimos um ambiente interno construído como um produto do Design e do

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Design de Interiores e, portanto, um elemento de comunicação do discurso de identidade de sua marca.

Continuaremos nosso percurso no artigo ora proposto, delineando ainda mais o espaço de venda com vista à comunicação de identidade, vejamos a seguir.

De acordo com Pereira Barretto e Castilho (2008, p. 4252) os espaços institucionais, pontos de vendas, estandes, espaços de relacionamentos, por meio do design constituir-se-iam como ambientes onde o indivíduo interagiria com produtos, mas, principalmente com a marca e suas “promessas”, ou seja, seus valores. Ainda segundo as autoras, seria a partir da análise do universo da marca e de aspectos como a cultura local, referências do mercado e de empresas concorrentes assim como, o comportamento de compra dos indivíduos, que o projeto de design de espaços institucionais como manifestação da marca seria iniciado e legitimado.

Pereira Barretto e Castilho (2008, p. 4252) contribuem, explanando que a partir desse repertório, de reunidas as informações necessárias sobre a marca e seu universo, seria de!nido, em projeto, o objeto construído por meio de:

Ou seja, entendemos a partir de então, que todos esses elementos atuariam como elementos comunicantes do discurso identi!cador da identidade de uma marca. Desta forma, a exposição do produto, o layout dos mobiliários existentes, o percurso originário nesse espaço por meio da localização desses móveis, assim como as cores, e formas constituintes dos mesmos e do objeto construído em si, fariam parte da comunicação de signi!cados, do discurso de identidade de suas marcas em um espaço institucional, em um espaço de venda.

Sendo assim, acreditamos no presente artigo termos identi!cados os meios pelos quais o design de interiores de

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segmento de atuação comercial comunica o discurso de identidade de uma marca contemporânea. Desta forma, pretendemos contribuir com a construção teórica do campo do design, especi!camente do Design de Interiores no Brasil.

Nota1 (...) A visibilidade, ao contrário, é propriamente semiótica, pois é compatível com a cognição perceptiva como alteridade que caracteriza e desa!a a densidade sígnica (...) (cf. Ferrara, Lucrécia D’Alessio. Design em espaços. 2002, pág. 101.

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[151]

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Sobre as autorasLucy Niemeyer, DSc Professor Adjunto da Esdi/[email protected]

Stella Hermida, MScEsdi/Uerj, [email protected]

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Luis Latt e Cia Ltda. Sistemas de pré-impressão na indústria grá!ca brasileira durante a década de 1930Guilherme Cunha Lima, PhD Almir Mirabeau, MSc

Nosso objetivo neste trabalho é investigar como os meios de produção da indústria grá!ca brasileira se organizavam na primeira metade do século XX e analisar as relações entre esses meios de produção e as atividades projetuais do mesmo período. Não é comum encontrar referências abordando o tema, e menos ainda referências que relacionem design e tecnologia em livros sobre a história do Brasil, o que demonstra a urgência em resgatar a história de indústrias que implementaram novas tecnologias para atender a demandas projetuais e mercadológicas.

Sediada na cidade do Rio de Janeiro, a clicheria Luis Latt e Cia era sinônimo de qualidade. Fundada em 1926 por um grupo de imigrantes austríacos, pouco se conseguiu apurar sobre a vida deles antes de sua chegada ao Brasil. Graças aos depoimentos de ex-empregados e familiares, sabe-se que eles já eram pro!ssionais atuantes nas artes grá!cas no seu país de origem, porém não conseguimos nenhum documento ou testemunho que evidenciasse qual foi a sua formação e onde praticavam a pro!ssão. Como indícios, temos algumas provas de impressão ou provas de prelos, produzidas por Alois Michael Latt na Europa (!g. 1), que apontam na direção de que a Wiener Werkstätte, é possivelmente uma instituição onde Alois Latt recebeu treinamento, trabalhou ou teve algum tipo de aproximação. Segundo depoimento de Margareth Latt (2009 #), essa empresa

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Figura 1 – Prova produzida por Alois Michael Latt na Áustria. Refere-se à Wiener Werkstätte Gesellschaft mit beschränkter Haftung “Workshops de Viena Sociedade de Responsabilidade Limitada.” (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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Figura 2 – Prova produzida por Alois Michael Latt na Alemanha. À esquerda se lê “viaje para o sul” e “informações (nome de uma agência de viagens)” (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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era citada pelo pai, juntamente com a Escola Vienense de Artes Aplicadas, como uma referência de qualidade.

Margareth Latt (2009 $), completa que estes exemplares (!gs. 2 e 3) podem ser tanto exercícios ou provas de ofício quanto trabalhos comerciais feitos por Alois Michael Latt. E a!rma que todos foram executados na Europa e integravam o portfólio pro!ssional do mesmo.

Assim, acreditamos que tendo vivência pro!ssional nas artes grá!cas em Viena nesse período e participado do mesmo contexto histórico destas instituições, não é improvável que Alois Michael Latt tenha tido alguma aproximação, mesmo que de modo indireto, ou com a Escola Artes Aplicadas de Viena, ou com o Wiener Werkstätte.

Figura 3 – Prova produzida por Alois Michael Latt na Áustria, à direita abaixo temos a assinatura Kunze (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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A chegada ao BrasilConforme registrado em carta endereçada por um dos técnicos

vindos da Áustria, Josef Zaufal, a Orlando da Costa Ferreira, o grupo de austríacos foi contratado para trabalhar na Photogravura Fabian e a chegada teria ocorrido no dia do centenário da Independência do Brasil em sete de setembro de 1922. Porém, ao confrontarmos essa informação com os registros de desembarque do vapor D. Baden, veri!camos que a data correta de chegada ao Rio de Janeiro foi doze de setembro de 1922. A discrepância pode ter sido motivada pelo fato de as comemorações do centenário da Independência terem se estendido pelo último quarto de 1922 (M%&#$'#(. 2010).

Nesses documentos podemos con!rmar que os seguintes técnicos imigraram para o Brasil em 1922 (Fig. 4):

1 Alois Michael Latt: nascido em Viena, 8/4/1886. Faleceu em 22/2/1958. Especialidade, Fotogravador em Cores e Buril Xilográ!co. 2 Johan Mildner: nascido em Viena, 12/1/1889. Faleceu em 18/3/1965. Especialidade, Gravador de Clichê, Litogra!a e Técnico em Geral.3 Joseph Zaufal: nascido em Viena, 9/1/1901. Faleceu em 26/6/1974. Especialidade, Fotogra!a em geral e Uvacromia (n.a. Processo semelhante a Tricomia ou impressão a partir de três cores básicas). 4 Wilhelm Stangl: nascido em 1892. Faleceu em 22/2/1958. Especialidade, Fotogra!a. 5 Leopold Nickolei: nascido em 1901. Sem registro de falecimento. Especialidade, Fotogravador a traço. 6 Albert Meier: nascido em Viena. Voltou para Viena em 1926. Sem registro de falecimento. Especialidade, Fotogravador em Cores.

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Figura 4 – Imigrantes austríacos contratados para prestar serviços à Revista da Semana. Local Rua Navarro nº 88. Em pé da esquerda para a direita: Leopold Nickolei, Joseph Zaufal, Desconhecido, Johan Mildner, Desconhecido, Wilhelm Stangl. Sentados da esquerda para a direita: Alois Michael Latt, Albert Meier, Desconhecida, Alois Fabian, Desconhecido. (Fonte: Acervo Margareth Latt).

Abertura da EmpresaSegundo depoimento de Margareth Anna Latt ()#**, +,,- #), Alois Fabian, tinha sua empresa situada na Rua Uruguaiana, local onde o grupo de austríacos trabalhou nos primeiros anos.

Em 30 de abril de 1926, motivados por uma quebra de contrato, três deles, Alois Michael Latt, Johan Mildner e Josef Zaufal, decidem fundar a Luis Latt & Cia, Ltda. [Photogravura Vienense] Entretanto, segundo registros coletados no Diário O!cial da União (DOU), a empresa foi constituída o!cialmente em 14 de junho de 1926 e seu primeiro endereço foi Rua União nº 30 (M%&#$'#(. 2010).No início da década de 1930, a empresa se mudou para o endereço onde permaneceu até a sua falência em 1980, Rua do Lavradio 162-166, (Fig. 5).

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Figura 5 – Fachada da Luis Latt e Cia. Ltda. Rua do Lavradio 162-166. (Fonte: Acervo Margareth Latt).

A década de 1930 é apontada por Margareth Latt ()#**, +,,- $) como o primeiro momento de grande expansão da empresa. Apesar de termos encontrado pouca documentação relativa à companhia dentro desse período, para corroborar essa a!rmação, procuramos investigar alguns fatores que podem ter contribuído para essa expansão.

Para entender melhor o contexto da época, vamos recorrer a Lauro Cavalcanti, (2007: 12), que no seu livro Moderno e Brasileiro a!rma que “O Brasil atravessava, durante os anos de 1930, um momento de certa pujança econômica, notabilizando-se pelo esforço governamental no sentido da modernização.” Segundo Hallewell (1985: 336-337), nesse período estava em curso o início, tanto de uma rea!rmação nacionalista, quanto de um movimento de bases desenvolvimentistas. Nesse sentido, Celso Furtado (passim, 1970) a!rma que, até 1930, o desenvolvimento do setor industrial brasileiro havia sido um re"exo da necessidade de exportação. Isso aliado aos efeitos catastró!cos da depressão mundial iniciou um processo de crescimento do mercado interno quando, entre 1930 e 1937, o produto industrial brasileiro teve incremento de quase 50%. A partir de 1937, a ditadura do Estado Novo isentou de impostos a produção de papel e foram abertas linhas de crédito no Banco do Brasil para dar incentivo a indústrias de papel e celulose.

Outros autores como Wilson Suzigan (passim, 2000: 17-23) e Shozo Motoyama (passim, 1994: 16-21) ao explorar com profundidade as relações econômicas na história da indústria e da

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tecnologia brasileira, estão em concordância com essas a!rmações, porém acrescentam ainda que, além da industrialização impulsionada pelo mercado exportador, das políticas de incentivo à industrialização promovidas por governos e da in"uência do mercado internacional, outro fator importante, que deve ser levado em consideração é o próprio modelo de capitalismo tardio que foi implantado no Brasil.

Voltando nosso olhar para os segmentos diretamente ligados ao nosso objeto de estudo, detectamos alguns sinais de crescimento. Apesar da produção e venda de livros atravessarem “um período de pouca signi!cação” na década de 1920 (.#))'/')), 0-12: 334), isso não se repetia em outros produtos da indústria grá!ca. Vejamos o que nos diz Rafael Cardoso, sobre periódicos editados nas décadas anteriores:

“Com os avanços tecnológicos das décadas de 1910 e 1920 – incluindo a difusão da impressão fotográ!ca e a introdução do offset no Brasil – as mudanças passaram a se atropelar. Em nichos especí!cos, detentores de forte poder econômico, apareceram periódicos de padrão grá!co surpreendente para a época” (5#&6787, +,,-: 41)

Esta a!rmação encontra eco no livro A História da Imprensa no Brasil, onde o historiador Nelson Werneck Sodré (1999: 427) a!rma que “O terceiro decênio do século foi de grande desenvolvimento da imprensa, particularmente no sentido de consolidar sempre a estrutura empresarial.” Esta categoria de impressos, os periódicos, constituía juntamente com outros impressos efêmeros, o principal nicho de mercado atendido pela Luis Latt & Cia.. Posto isso, podemos observar como tanto o mercado editorial, quanto o mercado publicitário estavam à procura de soluções para atender às suas demandas, mesmo antes da década de 1930.

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Outro fator que deve ser levado em consideração é o crescimento urbano. Concordamos com o alerta de Hardman e Leonardi (1991: 121), onde “Não se pode estabelecer uma relação casual mecânica entre urbanização e industrialização no Brasil”. Entretanto, podemos acrescentar que principalmente no caso especí!co de uma capital administrativa como o Rio de Janeiro, o crescimento dos centros urbanos cria condições favoráveis ao desenvolvimento industrial. Como os pesquisadores a!rmam, não se pode negar que uma base de serviços necessários à distribuição de mercadorias, um sistema !nanceiro e serviços de energia elétrica são facilitadores do desenvolvimento industrial (.#&69#: ' )'7:#&6%,0--0: 0++). Além disso, o crescimento populacional proporciona um aumento do mercado de trabalho livre assalariado e, consequentemente, do mercado consumidor.

Com isso em mente, podemos a!rmar que esse momento abria novas perspectivas para diversos setores econômicos, entre eles a indústria grá!ca, o que facilitava o investimento em novas instalações e equipamentos para aquisição de tecnologias. Esse contexto, em que a empresa atravessa um período de rápida expansão, com a contratação de novos técnicos, ampliação de suas instalações e aquisição de equipamentos, tendo em sua carteira de clientes empresas como Esso, Brahma, Nestlé, Coty, Moinho Inglês, além de agências de publicidade e indústrias têxteis e cafeeiras, ()#**, +,,- #), revela um cenário que coloca a Luis Latt & Cia como uma empresa de ponta na indústria grá!ca do Rio de Janeiro naquele período.

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Seções da Empresa, década de 1930Durante a pesquisa, digitalizamos uma série de fotos que integram o acervo particular de Margareth Anna Latt, quando poderemos veri!car quais eram as seções da empresa utilizadas para a produção de clichês. Datamos essas imagens como sendo da primeira metade da década de 1930, a partir dos seguintes dados:

anteriores à década de 1950 (;')*&%, +,,- $; &#6')8$'&<'&, +,,- $),

estereotipia e galvanotipia, iniciadas em 1936 conforme veremos adiante,

Latt na empresa, em 1931 ()#**, +,,- $),

parede da Seção de Provas (Fig. 33), exemplares de anúncios da empresa Aeropostale (Figs. 6 e 7). Essa empresa aérea atuou no Brasil entre 1927 e 1932. (#'&7=78*#), 2009)

Figura 6 - Detalhes da foto da Seção de Prova. (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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igura 7 - Cartaz exposição Memórias da Aeropostal, (Mémoire d’Aéropostale) de 2009.

Esse material foi produzido por um fotógrafo pro!ssional para divulgação da empresa ()#**, +,,- $) e retrata um momento quando podemos observar, o "uxo de trabalho e o contexto onde a empresa está inserida. Analisando as imagens percebemos algumas características que se repetem e demonstram qual a imagem que a empresa pretendia passar para seus clientes.

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Em alguns momentos, o responsável pelo setor vestido de gravata como os outros funcionários, supervisiona o trabalho na o!cina e/ou faz algum controle de qualidade, demonstrando que a companhia zela pela qualidade e que os trabalhos são acompanhados de perto por pro!ssionais especializados. Em outros, a análise do padrão de qualidade é feita por um dos proprietários, o que além de indicar que a clicheria foi fundada por técnicos que acompanham todas as etapas da produção, ressalta que a preocupação com a qualidade é uma política dos sócios.

Funcionários de jaleco e com boa apresentação, utilizando máquinas para fazer as matrizes e provas de prelo, trazem a ideia de que a clicheria utilizava o equipamento mais moderno disponível. Na maioria das fotos, vemos aprendizes praticando, o que demonstra uma preocupação com a formação de pro!ssionais capacitados que possam seguir carreira na empresa e manter seu padrão de qualidade.

Na foto que representa a etapa inicial do "uxo de trabalho da empresa, (Fig. 8), vemos um dos fundadores José Zaufal, em pé ao telefone e Margareth Anna Latt sentada atrás do balcão de atendimento. As principais funções dos responsáveis pelo atendimento eram: orientar o cliente sobre o clichê mais adequado, fazer o orçamento, receber os originais e, posteriormente, apresentar as provas de prelo. Para executar essas tarefas, era necessário conhecer os processos de produção de matrizes e repassar essas informações ao cliente. Após fazer uma ordem de serviço, o trabalho era encaminhado ao setor de produção. O original após ser analisado pelo chefe da o!cina era entregue, ou à Seção de Retoque a Traço (Fig. 9) ou à Seção Gravuras e Clichês para ser retocado, caso necessário. ()#**, +,,- #)

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Figura 9 – Seção de Retoque a Traço (Fonte: Acervo Margareth Latt).

Figura 8 – Balcão de atendimento. Em pé, Joseph Zaufal, sentada, Margareth Anna Latt (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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Podemos observar ainda que na foto da Seção de Retoque a Traço aparecem pelo menos três aprendizes, sendo que um deles está recebendo orientações do responsável pela seção. Segundo testemunhos de ex-funcionários, o treinamento de aprendizes sempre foi uma política da empresa e tinha o objetivo de preparar futuros técnicos para atender as necessidades da clicheria. Com a ordem de serviço e o original retocado, o trabalho revisado seguia para a Seção de Fotogra!a (Fig. 10). Segundo Riat, podemos de!nir fotogra!a como:

“Todos os procedimentos que são baseados em uma mudança permanente de determinados produtos químicos, sob a in"uência da luz ou de outro tipo de radiação eletromagnética são relativos à fotogra!a” (RIAT, 2006: 13).

Figura 10 – Seção de Fotogra!a (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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Figura 11 – Seção de Gravação e Câmera Escura. (Fonte: Acervo Margareth Latt).

Nessa seção, onde os originais eram fotografados, era possível copiar, reduzir, ampliar, fazer cortes e separação de cores dos originais e o que mais fosse necessário. Eram utilizadas máquinas fotográ!cas especialmente desenvolvidas para essa !nalidade e conhecidas como Câmeras de Reprodução ou Fotomecânicas. Em seguida esses !lmes ou fotolitos que podiam ser positivos ou negativos, dependendo do tipo de clichê a ser produzido, eram revelados na Seção de Gravação e Câmara Escura (Fig. 11), que também era utilizada na sensibilização das chapas de metal, em geral de zinco, que são utilizadas para produzir, por meio de banhos químicos, os clichês.

Ao chegar à Seção de Fotolito (Fig. 12), o trabalho passava por mais uma revisão, recebia os retoques necessários e era submetido aos procedimentos indicados na ordem de serviço. Nesta imagem observamos novamente a presença de um aprendiz e de técnicos

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controlando a qualidade das provas, ao fundo vemos as portas que levam a Seção de Gravação e Câmara Escura.

A partir deste ponto, chegamos ao momento em que, com o fotolito pronto e as chapas sensibilizadas, era executado o registro do original, a gravação. Com original copiado sobre a chapa de metal, esta recebia uma camada ácido-resistente que aderia às áreas correspondentes à informação contida no original. Quando as matrizes recebiam o banho de ácido, o ácido agia sobre as áreas não protegidas e o clichê começava a ser formado.

Após o primeiro banho as chapas eram levadas ou para Seção de Gravuras e Clichês (Fig. 13) ou para Seção de Retoque a Traço caso fosse um retoque simples, onde eram retocadas com buril e o

Figura 12 - Seção de Fotolito (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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desenho recebia outra camada ácido-resistente com a !nalidade de sempre manter protegida a face do registro.

Os banhos e retoques são repetidos até que o ácido consiga atingir a profundidade necessária. A meta principal da etapa de gravação era conseguir um clichê “piramidal” (Fig. 14), onde a base mais larga possibilitava sustentação ao relevo e garantia a qualidade e durabilidade da matriz.

Figura 13 – Seção de Gravuras e Clichês (Fonte: Acervo Margareth Latt).

Figura 14 – Fotogra!a ampliada de clichês com reticula de meio-tom, onde se lê: A) Ponto em meio-tom com boa forma, limpeza, "anco íngreme com boa profundidade. B) Ponto em tom de alta com boa forma, limpeza, "anco íngreme com boa profundidade. (Fonte: Moderne chemiegraphie in theorie und praxis, 1957: 245).

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Na Seção de Provas (Fig. 15), eram executadas as provas de prelo que iriam ser apresentadas ao cliente. Ao fundo, é possível observar várias provas de capas de revistas e com a marca de grandes fornecedoras de material fotográ!co (AGFA) e companhias de aviação (Aeropostale), o que relaciona a clicheria com empresas de ponta, ligadas às tecnologias mais avançadas da época. Essas provas eram um modelo !el ao resultado !nal que seria obtido na impressão. Após as provas de prelos serem aprovadas pelo cliente, a chapa de metal era montada sobre uma placa de compensado naval com a altura necessária para a impressão tipográ!ca (Fig. 16). Neste ponto o clichê estava terminado e era entregue ao cliente pela Seção de Expedição.

Figura 15 – Seção de Provas (Fonte: Acervo Margareth Latt).

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Figura 16 – Seção de Montagem. (Fonte: Acervo Margareth Latt).

É importante observar que podemos dividir o processo de produção de um clichê em seis fases básicas: Atendimento, Retoque no original, Confecção de fotolito, Gravação, Prova e Montagem do clichê. Essas fases dividem-se em quinze etapas, sendo que dentre elas temos quatro etapas de revisão interna, com a análise de provas intermediárias ou supervisão do responsável do setor, e uma revisão externa com a apresentação de uma prova de prelo ao cliente.

Analisando as imagens, vemos como o discurso da empresa prezava pela a!rmação da qualidade em seus serviços. Com esse resumo do setor de produção da Luis Latt & Cia, esperamos demonstrar de forma sucinta, como o sistema de produção de matrizes para impressão da empresa era encadeado, facilitando o entendimento do conjunto de processos que constituía o "uxo de trabalho da empresa na década de 1930 (Fig. 17).

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Figura 17 – Fluxo de trabalho no setor de produção da Luis Latt & Cia. Ltda., década de 1930.

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Desdobramentos: Designers e Indústria Grá!ca. Ontem e HojeNo campo do design, a importância do estudo de temas relacionados à indústria grá!ca é, ao mesmo tempo, periférica e central. Periférica porque trata de uma pequena e especial parcela das questões ligadas às atividades projetivas de produtos grá!cos e não dita regras gerais aplicáveis fora do âmbito das artes grá!cas. Central porque, se todo produto grá!co nasce a partir de um projeto, devemos reconhecer a relação design grá!co e indústria grá!ca como intrínseca e fundamental, pois esta carrega uma tradição que antecede até mesmo a própria imprensa.

O conceito proposto por Vilém Flusser onde: “Tudo, e em particular a ciência, a política, a arte e a religião [...] Pode ser reconstituído a partir da organização das fábricas.” (>)(88'&, +,,?: 32), re"ete bem o objetivo deste trabalho. O objeto de estudo dessa pesquisa apresenta a interessante característica de poder ser tomado de modelo para o entendimento de diversos aspectos da relação entre designers e indústria grá!ca, tanto pelo viés histórico, quanto pelo tecnológico. Por fazer parte do setor industrial, de origem familiar, prestadora de serviços, fundada por ex-operários que imigraram para trazer novas tecnologias, ela retrata diversos aspectos especí!cos que podem servir para generalizações, indo do particular para o geral ou vice-versa.

Um aspecto dos mais interessantes que identi!camos foi que, ao longo da trajetória da empresa, os "uxos de trabalho eram modi!cados dependendo do tipo de matriz que era produzida, entretanto essas mudanças não alteravam signi!cativamente o posicionamento do cliente em relação à empresa. Se tomarmos como exemplo as etapas necessárias para produção de um clichê de autotipia e de estereotipia, vemos que o segundo possui cinco etapas a mais, porém todas as outras 15 são exatamente iguais (Fig. 18), ou seja, uma é um desdobramento da outra.

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Figura 18 – Exemplos de "uxos de trabalho para produção de matrizes de autotipia e estereotipia.

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Ainda neste exemplo, observamos que a aquisição de tecnologia, promovida por Joseph Mayer na década de 1930, acrescentou novas seções, mas não modi!cou a espinha dorsal da empresa. Para o cliente, houve um aumento da oferta de serviços oferecidos, entretanto ele continuava trazendo um original, o projeto e todo trabalho era executado pela clicheria, só cabendo a ele a revisão de determinadas etapas.

Trazendo essa discussão para o âmbito da relação design e tecnologia, é possível veri!car uma mudança de posicionamento da atividade do designer em relação à indústria grá!ca no século XX. Ao comparar alguns exemplos de "uxo da empresa ao longo do recorte do trabalho com um "uxo de produção de matrizes nos dias atuais, veremos que diversas funções que antes eram de responsabilidade da empresa que fabricava matrizes, agora estão nas mãos do designer.

Uma comparação entre o processo para fabricação de um estéreo na década de 1930 e outro para produção de uma matriz offset, o Computer to Plate (CTP), traz a tona algumas evidências. O CTP consiste na impressão laser de um arquivo digital diretamente sobre a matriz, “do computador para a chapa”, sendo muito utilizada nos dias atuais, já dominando cerca de 70% do mercado brasileiro de produção de matrizes (#$%<&#>, +,,-: 0+2).

É importante frisar que não temos a intenção de comparar as tecnologias, o que não seria apropriado neste espaço, e sim comparar o posicionamento do designer em relação à produção de uma matriz monocromática para impressão em 1930 e nos dias atuais (Fig. 19). Usaremos um modelo genérico para descrever o processo de produção de chapa CTP (ABIGRAF, 2006: 125).

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Figura 19 – Exemplos de "uxos de trabalho para produção de matrizes de Lattoplast e CTP.

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Ao comparamos o "uxo da década de 1930 com o atual, é possível apontar inúmeras diferenças, entretanto iremos nos ater apenas àquelas relacionadas às funções executadas durante os processos. Supondo que o cliente seja o responsável pela conceituação do projeto grá!co, é possível apontar funções que antes eram exercidas por pro!ssionais especí!cos altamente treinados e, atualmente, são de responsabilidade do designer.

Portanto, as funções que foram transferidas para o designer são: a digitalização [fotogra!a/fotolito], retoque [de imagens], composição [tipográ!ca] e controle de qualidade [revisões internas]. Outras funções foram aglutinadas na etapa do operador de computador, como a impressão das provas e a gravação da matriz, ambas totalmente automatizadas, sem qualquer interferência humana.

Assim, torna-se evidente que o posicionamento do designer, tanto como prestador de serviços, quanto como cliente direto mudou radicalmente. Talvez neste ponto resida o maior desa!o para a pro!ssão nos dias atuais: pensar como se preparar para atender as novas especi!cidades que essas mudanças trouxeram. Cabe ressaltar que nas últimas duas décadas, o campo de design grá!co tem apresentado um crescimento signi!cativo, entretanto parte do seu conhecimento está se democratizando. Muito dessa democratização também é decorrente da introdução de novas tecnologias, segundo o professor Guilherme Cunha Lima:

“[...] programas grá!cos têm evoluído muito [...] a grande produção vem barateando o custo das máquinas. Por isso, para as tarefas mais simples de comunicação visual, qualquer usuário, uma secretária mesmo, será capaz de resolver rapidamente problemas de diagramação com muito mais e!ciência do que nos tempos da máquina de escrever.” ()%9#, 0--2: 32)

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O diferencial do designer não está em dominar um instrumental e o vocabulário especí!co que possibilita a execução de produtos grá!cos. As ferramentas estão ao alcance de todos. A especi!cidade da pro!ssão está, como nunca antes, ligada a conceituação, ao domínio sobre o ato projetar e ao conhecimento dos meios de produção. Esses estão cada vez mais acessíveis, pois qualquer designer tem sobre a mesa do seu escritório um instrumental que permite preparar todo o projeto, chegando ao ponto de entregar apenas um original digital com todas as características de produção pré-de!nidas, deixando para a indústria apenas a fabricação do produto.

Desse modo, entendemos que, mais do que nunca, não é possível conceber o design grá!co como um elemento que atue em separado da indústria grá!ca. O design e os sistemas produtivos industriais são atores que formam uma rede de interrelações em que cada elemento não deve ser encarado como um fator limitante, mas sim como ferramentas para conformação de produtos inovadores e efetivos.

Considerações !naisAtravés deste estudo, foi possível tocar em alguns aspectos da relação entre design grá!co e indústria grá!ca. Nunca tivemos a ambição de esgotar o tema, nossa meta foi, desde o início, pontuar momentos onde fosse possível levantar questões relevantes para o design, enquanto área de conhecimento.

O objetivo desta pesquisa foi fazer um resgate da história da indústria grá!ca a partir de um corpus de pesquisa, baseado em depoimentos e acervos de sócios, funcionários e clientes de uma empresa. Durante esse processo constatamos ser possível utilizar as tecnologias e os próprios produtos como uma rica fonte de informações e através delas, criar correlações entre o projeto e

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o fazer, analisando onde um condiciona o outro e veri!cando quando acontecem quebras de paradigmas, tanto conceitualmente, quanto tecnologicamente.

Esperamos que este trabalho possibilite demonstrar, de alguma forma, como o estudo dos meios de produção é fundamental para a compreensão da rede de interrelações das cadeias produtivas da indústria grá!ca, onde o campo design grá!co se insere, é um ator fundamental e mantém uma área de intercessão de importância inquestionável.

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RADELSBERGER, Ludwig. Ludwig Radelsberger: entrevista. Rio de Janeiro, 2009. Entrevista concedida a Almir Mirabeau da Fonseca Neto, em 17 de outubro. 2009 b.

LATT, Margareth Anna. Margareth Anna Latt: entrevista. Rio de Janeiro, 2009. Entrevista concedida a Almir Mirabeau da Fonseca Neto, em 22 de janeiro. 2009 a.

LATT, Margareth Anna. Margareth Anna Latt: entrevista. Rio de Janeiro, 2009. Entrevista concedida a Almir Mirabeau da Fonseca Neto, em 01 de abril. 2009 b.

VELTRI, Sylvio. Sylvio Veltri: entrevista. Rio de Janeiro, 2008. Entrevista concedida a Almir Mirabeau da Fonseca Neto, em 25 de junho. 2008.

VELTRI, Sylvio. Sylvio Veltri: entrevista. Rio de Janeiro, 2009. Entrevista concedida a Almir Mirabeau da Fonseca Neto, em 20 de janeiro. 2009.

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Sobre os autoresGuilherme Cunha Lima, PhDProfessor Adjunto da Esdi/Uerj [email protected]

Almir Mirabeau, MScEsdi/Uerj, [email protected]

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A Tipologia da Cristaleria Cá d’OroGuilherme Cunha Lima, PhD

Edna Cunha Lima, DSc

Gil Haguenauer, MSc

IntroduçãoEsse artigo se caracteriza por ser uma pesquisa histórica sobre parte da obra comercial de Mário Seguso e sua empresa a cristaleria Cá d’Oro. Nesse artigo são abordados os diferentes grupos de produtos que levaram a criação da tipologia da produção de cristais da cristaleria Cá d’Oro, através de um levantamento de dados na produção, entrevistas, e observação em loco do funcionamento da empresa, tendo como foco as linhas de produzidas e comercializadas no ano de 2010.

Com o resultado dessa pesquisa, foi possível relacionar aspectos de design e de fabricação, que deram origem a criação de grupos e famílias de produtos distintas e que fazem parte da !loso!a de atuação da empresa no mercado nacional e internacional.

A cristaleria Cá d’Oro tem como mestre, Mário Seguso, de origem italiana, e com uma família de tradicionais vidreiros desde o século XIII instalados em Murano.

Sua trajetória tem início com a carreira de gravador na arte do vidro e cristal, em Veneza. Tendo concluído o 1º grau na sua cidade natal, matricula-se no “Regio Instituto D’Arte” de Veneza, em 1941. Seguso ao mesmo tempo, durante os anos de 1947 a 1948, faz um estágio no mesmo instituto onde executa seus primeiros trabalhos como pro!ssional. Aos 18 anos, abre seu

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próprio atelier em Murano em 1949, onde faz gravações para as mais renomadas empresas especializadas no comércio de cristal artístico, como Salviati, Gino Cenedese e Fischer, fornecendo peças encomendadas especialmente para exportação, como taças e troféus para importantes eventos e competições.

Seguso participa de várias exposições destacando-se entre elas a exposição realizada na Galleria Bevillacqua La Masa”, em Veneza. Em 1953 executa, com desenho de Oscar Kokoschka, uma gravação para a “Mostra Internazionale” promovida pelo “Centro do Vidro Moderno de Murano”, que tinha sido fundado naquela época. Com esse trabalho, recebe o convite, em 1954,, do Dr. Jorge da Silva Prado para um contrato de dois anos na Fábrica Cristais Prado, em São Paulo.

Sempre pensando em expandir e criar novos horizontes, e com a escassez de modelos formais em cristal para serem gravados, resolve fundar sua própria cristaleria. Assim poderia não só soprar os cristais aos quais posteriormente gravaria suas próprias criações.

A cristaleria Cá d’Oro, fundada em 1965 com dois amigos e sócios, em Poços de Caldas, tem seu início de fabricação com a utilização de um forno comprado de uma indústria desativada. Logo estes deixam o negócio, !cando Mário Seguso no comando dessa indústria até a data de hoje, completando 46 anos de empreendimento, sem nenhuma interrupção em sua produção.

Mário Seguso se utilizou de ferramentas oferecidas no campo da engenharia e do design, formatando a linha de produção e criando uma tipologia própria, que permite uma maximização formal e decorativa de seus produtos, dando agilidade assim a sua produção. A criação do laboratório, ”Fogo e Arte”, é uma dessas inovações em sua empresa. É nesse laboratório que os projetos de concepção, desenvolvimento de peças, adequação da linha de

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produção, criação de famílias, desenvolvimento da formulação de sua própria massa e pigmentos que compõem os bastões de cores para o fabrico do cristal são desenvolvidos. Para obtenção das cores os óxidos são macerados manualmente e elaborados os bastões coloridos, com coe!cientes de dilatação próprios para o emprego em sua produção.

Dessa forma a não dependência de empresas estrangeiras para importação desses bastões, torna sua empresa auto-su!ciente, evitando correr riscos, tanto na importação como na incompatibilidade da formulação dos mesmos, que poderiam dani!car suas peças (rachaduras, trincos e outros), além dos custos e de toda logística envolvida no processo.

Mário Seguso é tido hoje como um expoente da arte e design em vidro e cristal no Brasil e no exterior, tendo realizado ao longo de sua carreira, inúmeras exposições no Brasil e exterior.

No Brasil as cristalerias ocupam hoje um lugar de destaque no ranking dos artigos para mesa e de decoração manufaturados em cristal. Um desses exemplos é dado por Mário Seguso a frente da cristaleria Cá d’Oro, num contínuo processo de inovação e concepção de linhas diferenciadas de produtos manufaturados.

A Tipologia da Cristaleria Cá d’OroAbaixo são apresentadas as três linhas comerciais da Cristaleria Cá d’Oro, e que serão abordados nesse artigo.

Revival

As linhas apresentadas estão sujeitas a serem modi!cadas, dada à descontinuidade de alguns produtos e a criação de outros. Portanto, vamos focalizar as linhas como se apresentavam entre 2008 e 2010.

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Dessas linhas, uma delas, produtos comerciais de linha de frente- Línea Cá d’Oro, apresenta diferenças quanto ao processo de fabricação.

Para o estudo das peças dessa linha adotamos os seguintes critérios: produtos ocos e produtos maciços (Demonstrados logo após as considerações gerais). Posteriormente examinamos cada uma das linhas, escolhendo os critérios que melhor de!nem as questões de design e fabricação de cada uma delas. Para examinarmos as duas linhas restantes partimos das seguintes considerações sobre cores, formas, famílias e dimensões dos produtos.

A obtenção das coresAs cores são obtidas por meio do maceramento de óxidos minerais, tais como ferro, magnésio, prata, misturados à composição do vidro para obtenção de cada cor. O vidro transparente é colocado dentro do cadinho com os óxidos, aquecido em forno. Após derretimento e o tingimento do vidro transparente em fusão, este é colhido e transformado em bastões, cada um de uma cor. Esses bastões são guardados, no estoque, para futura utilização como pigmentos que irão colorir o vidro (ADRIANO, 2010).

Produção das cores Para a produção desses bastões, eles são levados à produção e postos nos cadinhos com vidro transparente em fusão. Os bastões fundem junto com a massa vítrea transparente no cadinho do forno, e se tem uma quantidade de vidro colorido. Para tanto, é utilizado um cadinho para cada cor a ser trabalhada. A utilização de cores nos produtos da Cristaleria Cá d’Oro se dá de acordo com um padrão preestabelecido.

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As fórmulas de obtenção das cores são de propriedade e segredo industrial de cada cristaleria. Ao o!cial vidreiro cabe a decisão de preparar seu padrão de cores diário, e guardá-los em estoque ou na falta desses simplesmente pedir a manufatura para importá-los de fornecedores estrangeiros, tais como Uroboros, Kugler colors, Espectrum glass, empresas fabricantes de pigmentos para vidros, dentre outras. Ao importador basta apenas indicar ao fornecedor a compatibilidade da massa vítrea utilizada (tipo de vidro e coe!ciente de expansão COE). No caso da Cristaleria Cá d’Oro, as cores e bastões são preparados pela própria cristaleria. (SEGUSO, 2009).

Utilização das coresAs cores para o vidro ou cristal são de dois tipos, opacas ou transparentes, e se apresentam sob duas formas: bastões coloridos previamente elaborados ou em pó com grãos de diferentes tamanhos. É necessário demonstrar aqui, que essa é uma descrição básica para os pigmentos de vidro e que, segundo Mario Seguso, cabe ao designer elaborar suas concepções. Nem sempre o resultado obtido por meio da utilização de um determinado pigmento será o mesmo, pois existem variações na atmosfera do forno que modi!cam totalmente a cor do objeto nele aplicado. Para isso, o designer precisa ter o conhecimento necessário ao elaborar qualquer projeto e concepção de produto.

FerramentasAlém da cana de sopro, geralmente em aço inox, outras ferramentas são usadas pelos vidreiros, muitas delas criadas por eles próprios, de acordo com suas necessidades e adaptação ao tipo de trabalho. Entre elas, estão a mu"a.

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Ela é feita agrupando várias folhas de jornal, num tamanho médio de 20 cm por 20 cm com 3 cm de espessura, (Figura 1). Essas folhas são agrupadas em lotes pequenos, cruzando-se as !bras do jornal para aumentar sua resistência, até formar um bloco. Esse é bem úmido e serve para formatar o vidro.

Figura 1 - Vidreiro usando mu"a. Foto Gil Haguenauer

Formas e dimensões dos produtos Ao conceber um produto, torna-se necessário avaliar vários fatores ligados à produção desse objeto, como forma e dimensão. Estes estão ligados diretamente ao esforço do vidreiro ao realizar peças de grande porte. O trabalho normalmente é feito em conjunto com outros vidreiros. Assim sendo, a Cristaleria Cá d’Oro, mantém um tamanho máximo nos produtos de linha comercial, conforme observado em loco, sendo a altura máxima dos vasos de 33 cm.

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A utilização de moldes para formataçãoSão usados moldes de madeira, pois sua fabricação é muito mais barata que os moldes em aço, além do fato do peso do transporte pelos operários, conforme observado em visita a empresa.

Linhas Produto oco Produto maciço

Comercial de Frente-Línea Cá d’Oro

Moldesopro livre +

trabalho de pinça

Comercial assinada Molde

Revival Molde

Produtos gravados e assinadosmolde + gravação

técnica livre + gravação

Laboratório Fogo e Arte sopro livretécnicas livres

associadas

Tabela 1- utilização de moldes nas linhas

Os moldes podem ser divididos em dois grupos: moldes para formatação da dimensão externa e moldes com desenhos.

Moldes para formatação da dimensão externaSão utilizados unicamente para manter preservadas as larguras dos objetos, para que estes não tenham diferenças. Quanto às alturas, essas são realizadas pelo setor de lapidação que corta e dá acabamento nos vidros de acordo com os padrões de cada linha.

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Moldes com desenhosOs moldes com desenhos são utilizados na fabricação de toda a linha Revival, que tem em seus vasos !guras e outras decorações em alto relevo.

Linhas de Produto

Produtos Comerciais de linha de frente – Línea Cá d’OroEssa linha apresenta dois tipos de con!guração de produto. São elas: Produtos maciços e Produtos ocos, grupados por famílias. Com relação aos produtos maciços da línea Cá d’Oro, a realização de um ou outro item depende única e exclusivamente da habilidade do vidreiro, das cores disponíveis no dia e do auxiliar que colhe e formata a primeira bola de vidro. Essa é uma concepção livre e, assim sendo, esse trabalho é ágil, não requer moldes, e o objeto pode ser alterado como sua cor inclusa. Observamos que estes objetos, animais e anjos, são !nalizados por um único vidreiro. Esse obtém a auxílio de um ajudante que colhe a massa no forno, dimensionando a quantidade de cristal colorido, necessária de acordo com o objeto a ser produzido. Elabora a primeira bola de cristal, e a formata na forma básica. Em seguida é colhida pelo mesmo vidreiro, uma camada superposta à primeira, de cristal transparente, formatando através de vários movimentos, contra uma bancada plana, a massa a ponta da cana. Essa é entregue ao vidreiro !nalizador que dá a forma ao animal ou outra peça, puxando o vidro com pinças e outras ferramentas. Esse processo de coleta de pequenas bolas, ou pequenas quantidades de cristal é realizado, quantas vezes forem necessárias ao vidreiro !nalizador, que as cola ao corpo inicial, e através de ferramentas, vai formatando o objeto.

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Os produtos maciços !gurativos aparecem na linha comercial de frente, chamada pela cristaleria de Línea Cá d’Oro No caso dos objetos ocos, dessa mesma linha, a transformação formal é possível, porém, por serem produtos soprados em moldes, não têm a mesma "exibilidade dos produtos maciços, feitos a partir do sopro livre e concepção com a utilização de pinças. Essa é uma característica dessa linha, a qual possui uma diversidade de produtos. Em observação feita no local, nota-se que a característica principal dessa linha é a diversi!cação de produtos, baseada na escolha certa do processo produtivo, o qual fornece um amplo espectro de possibilidades, atendendo plenamente a demanda criada.

Essa linha é constituída de produtos de mesa e produtos de uso decorativo, os quais são identi!cados por etiquetas e não assinados, constituindo-se de séries em cada item, com um padrão de cores e tamanhos diferenciados, formando cada série um grupo especí!co de itens.

Ao veri!car o padrão das cores nessa linha, notam-se cores transparentes, ou seja, que permitem uma transposição da parede do objeto de vidro ou cristal sob a luz, a qual prevalece em 90 % dos produtos dessa linha. Observa-se, ainda, nessa mesma linha de produtos, uma gama de cinco cores empregadas na confecção desses produtos: amarelo, verde, azul, vermelho e rosa, todos esmaltes transparentes.

A utilização de cores transparentes confere ao produto, uma aparência de maior leveza e brilho, transmitida ao consumidor logo à primeira vista. A transparência das cores permite mais rápida inspeção do produto e suas características, sem a necessidade ao toque. Seguido a isso, segue o fato de que os produtos em questão são condicionadores de líquidos e produtos

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sólidos (como balas e biscoitos), permitindo ao usuário uma rápida avaliação do produto acondicionado.

No que diz respeito ao acondicionamento de gêneros alimentícios (azeite, vinagre e vinhos, dentre outros), é muito importante a transparência do material condicionador, pois o produto nele contido expressa sua identi!cação por meio da própria cor e densidade, elementos facilitadores para o usuário na maioria das vezes, sem a necessidade de utilização de rótulos ou marcas.

As cores opacas são empregadas raramente, dada a di!culdade de transparência, a tendência a escurecer o objeto, dando-lhe uma aparência volumétrica maior e lhe conferindo maior peso visual. No caso da cor branca, opta-se pela transparência do vidro, dada a di!culdade de obtenção e graduação de esmaltes brancos transparentes, como também, como citado acima, na questão de condicionamento de gêneros alimentícios. (Figura 2,3).

Cabe ainda mencionar que a Cristaleria Cá d’Oro prepara as próprias cores, utilizando-se de fornos com cadinhos para o trabalho diário, sendo que estes cadinhos são trocados em média a cada seis meses, dado ao alto poder de corrosão do vidro, dani!cando-os. Para tanto, em vez de serem importados, são fabricados pelas indústrias refratárias Togny, parceiros e conterrâneos de Mario Seguso em Poços de Caldas, uma das grandes indústrias de refratários do Brasil, fornecedores também para a indústria vidreira.

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Figuras 2 e 3 - Produtos ocos da Linea Cá d’Oro Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

Quanto aos produtos ocos soprados em molde, agrupados por famíliasObservando inicialmente os produtos ocos constantes da Línea Cá d’Oro, temos três situações de fabricação das quais duas dependem de molde, além das peças que usam apenas moldes de conformação. Apresentamos a seguir na tabela 2 a Tipologia da Linha Comercial de Frente- Línea Cá d’Oro – Produtos Ocos.

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Tabela 2. Tipologia Line Cá dóro, Produtos Ocos

Veri!camos que é comum o uso de um mesmo molde para resultados de formas diferentes. No caso das garrafas, cuja forma inicial é a mesma, mas em sua !nalização mudam o gargalo, o mesmo acontecendo com as respectivas tampas.(!guras 4, 5, 6)

Figuras 4, 5 e 6 - Produtos ocos da Linea Cá d’Oro – Garrafas

Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

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O mesmo ocorre com os vasos, !guras 7, 8, cuja diferenciação se dá basicamente no momento em que são lapidados, ou seja, cortados e polidos.

Figuras 7 e 8 - Produtos Ocos da Línea Cá d’Oro – Vasos

Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

O grupo que vamos comentar a seguir é fabricado a partir de moldes especiais em sua forma. Esse grupo apresenta peças com cantos vivos e devem ser soprados sempre nesses moldes. Os vasos do tipo solitário, (Figura 9), ou seja para uma única "or, de design sinuoso tem a mesma característica dos mencionados anteriormente, cantos vivos. Esse ainda possui uma segunda característica, seu formato, que o obriga a serem soprados em moldes bi partidos. Esses moldes são feitos em duas partes e só são abertos para retirar o objeto soprado.

Figura 9 - Produtos ocos da Linea Cá d’Oro – Vaso tipo solitário Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

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As saladeiras também são fabricadas com molde especial, (Figura10),porém não necessitam de molde bi partido.

Figura 10 Saladeiras Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

O mesmo ocorre, com os vasos com tampas, (Figura 11,12), potes com tampas, e os baleiros, que apresentam tampas em metal. Todos necessitam de moldes bi partidos.

Figura11 Potes com Tampas Figura12 Baleiros Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

Ocorre também à necessidade de dois moldes especiais para a confecção de um só produto, como é o caso das lamparinas (Figura 13), cuja base é feita em um molde bi partido e a cúpula em outro sem ser bi partido.

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Figura13 Lamparinas Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

Finalmente a família de cinzeiros que é mostrada na !gura 14, fabricada a partir do que se caracteriza por molde de conformação, isto é, um tipo de molde que permite erguer uma peça a partir de uma forma básica, e cujos sulcos são realizados pela lapidação.

Figura 14 Cinzeiros Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

Como em toda a cristaleria as cores usadas fazem a atração e o sucesso dos cristais, sendo que nas famílias citadas encontramos tanto cores transparentes como opacas, (Figura 15). Sendo que os produtos para conter alimentos e bebidas são sempre fabricados em cores transparentes.

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Figura 15 Vasos opacos e transparentes Fonte: www.cristaiscadoro.com.br

Tratamos a seguir dos produtos maciços sopro livre grupados por técnicas mistas de produção. Nesse grupo de famílias são encontradas quatro formas básicas, são elas: forma de esfera, cilindro, ovaladas, e de arco. Só o anjo não constitui a família dos pesos de papel.

Apresentamos a seguir na tabela 3 a Tipologia da Linha Comercial de Frente- Línea Cá d’Oro – ProdutosMaciços.

Tabela 3. Tipologia Line Cá dóro, Produtos Maciços

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Cabe explicar aqui que existem muitas técnicas para feitura desses pesos para papel, (aqui serão apresentadas apenas cinco delas), inclusive a de mil"ores, técnica de Murano de complexas etapas de elaboração e não fazem parte dessa linha.

A primeira a ser apresentada é a forma de esfera, cuja técnica consiste em extrair um pouco de massa vítrea na ponta de uma cana, e formatá-la com auxílio de um bloco de madeira, cujo

interior é côncavo.A seguir, três formas diferentes, sendo que o processo inicial

básico se dá com vidro transparente, que recebe o pigmento em pó colocado alheatoriamente numa bancada plana onde a esfera é rolada sempre atada á ponta da cana. A elaboração da forma ovalada e de esfera achatada se faz rolando a bola de cristal transparente na mesma mesa, sem os pigmentos, até obter a forma desejada.

Os pesos de papel são fabricados a partir de um molde de conformação, o optical mold, esse é usado para criar as bolhas de ar no interior do vidro ordenadas. Essa é uma ferramenta que pode ser criada com uma variedade grande de posicionamento e número de bolhas. Ela consiste em um cilíndro de ferro oco, com várias pontas localizadas na parte interior das paredes. O vidreiro colhe a massa vítrea na ponta da cana, formata a primeira esfera, e a insere dentro do molde. Isso faz com que as pontas da parede interior causem pequenos furos no vidro. Em seguida o vidreiro, colhe mais uma quantidade do mesmo vidro que se sobrepõe a massa anterior cobrindo super!cialmente os furos, não os tapando. Esse fato se dá pela viscosidade do vidro em fusão, que se apresenta um pouco mais grosso que o mel.

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Os pesos de papel de com bolha aleatória e aplicação de cor, são feitos da mesma forma, apenas colhendo se primeiramente a cor e posteriormente o cristal transparente, que sobrepõe à cor inicial. Em seguida é arranhado aleatoriamente, sem uso do optical mold, apenas com uma ferramenta de ponta, nos lugares onde se quer as bolhas. O passo seguinte é formatar o cristal na bancada da mesma forma utilizada nas !guras anteriores mostradas.

A inserção decorativa de cores nos pesos de papel, é feita intercalando-se camadas de vidro transparente e cores do cadinho, repetindo-se por várias vezes a operação. A formatação é feita da mesma forma dos outros pesos de papel. Os pesos que contém "ores são feitos elaborando-se primeiro a "or a ser inserida, recobrindo-a com cristal transparente e repetindo essa operação como no processo do peso de papel anterior. As peças mostradas a seguir, pequenos pratos, cuja feitura também depende da habilidade e movimentação do vidreiro. Essas peças são feitas com um processo inicial semelhante ao peso de papel de bolhas aleatórias. Ao invés de formatar o vidro na bancada, o vidreiro gira a cana em movimentos de rotação até o cristal por processo centrífugo se espalhar criando um disco, no tamanho desejado. Esse disco grudado à ponta da cana é colocado de cabeça para baixo, fazendo com que o peso das bordas por gravidade curve o objeto até atingir a medida desejada.

Todas as formas obtidas por esse processo dependem do bom manejo do vidreiro com a cana de sopro. A prática leva a confecção de formas exatas e regulares.

Os produtos maciços !gurativos de sopro livre e técnica de pinça, são apresentados a seguir como animais, frutas e anjos

Essas famílias, são caracterizadas por serem compostas por peças !gurativas.

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Animais e furtas são fabricadas com o mesmo processo inicial dos pesos de papel com bolha aleatória, sendo que cada peça exige um formato inicial básico, feito pelo vidreiro ajudante. Posteriormente, outro vidreiro as formata com pinças e outras pequenas ferramentas.Da mesma forma que as famílias de !guras de animais e frutas, os anjos são feitos com o uso de pinças e outras ferramentas construindo aos poucos os elementos que constituem sua !gura.

Os produtos da Linha RevivalEssa linha faz parte de um repertório da década de vinte, e

tem características muito similares aos vasos criados por René Lalique, que utilizava motivos de fauna, "ora e ninfas. Por esse motivo a linha Revival, será grupada aqui segundo seus motivos decorativos.

O termo Revival tem sido empregado toda a vez que um design conhecido é retomado mais tarde. A ideia de reviver é base da retomada do repertório criado pelo designer René Lalique (1860- 1945).

René LaliqueLalique, (Figura 16), possuia habilidades como desenhista e aquarelista. Foi pintor de formação, fez seus estudos no Lycée Turgot em Paris, até os catorze anos e depois foi para uma escola de arte em Fontenay sous Bois. Dedicou-se a joalheira, tendo como mestre Louis Aucoc, que já era renomado joalheiro, onde aprendeu e aplicou as técnicas de esmalte. Após sua consagração com joalheiro e em sua trajetória, aprendeu técnicas de lapidação, se tornando exímio talhador, e conhecendo muito bem as técnicas de gravação e o trabalho com óxidos. Finalmente trabalhou como decorador e mestre vidreiro, sendo que estas duas últimas

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atividades reforçaram a sua consagração, e o destacaram no mundo do design em cristal e vidro.

Figura 16 Foto de René Lalique Fonte: www.rlalique.com

Curioso o fato que Lalique teve um percurso semelhante à história do desenvolvimento do vidro, passando em sua carreira pro!ssional, primeiro por técnicas de vitri!cação e esmaltes até chegar ao trabalho com cristal.

Foi o criador de inúmeras técnicas, mas as aqui referenciadas tratam unicamente da concepção de vasos.

Lalique trabalhava com duas técnicas, cera perdida e de cristal prensado em molde.

A técnica de cerra perdida é exatamente como a da fundição de bronze, e resulta em peças únicas, pois os moldes devem ser quebrados para retirar a peça. Ela consiste em um primeiro passo, na preparação de um modelo em cera.

Feito o modelo é preparado um molde de forma que seja su!cientemente resistente para aguentar o calor da massa de vidro em fusão e ao mesmo tempo paradoxalmente, deve ser quebrado

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facilmente para retirar o cristal. Essa técnica segundo Mirbeck (1992 p. 69,70 e 71), amplamente utilizada para confecção de peças em pasta de vidro.

Já a segunda técnica de vidro prensado em molde, consistia na preparação de um modelo em argila, do qual posteriormente se fazia o molde. Este molde possuía duas peças, uma para conformação externa e uma segunda para a interna.

O cristal era vertido dentro do molde de conformação externa e era prensado com o molde interno, forçando o cristal contra as paredes do molde externo. Isso lembra a conformação de uma fruta cortada ao meio. Por exemplo, um pêssego, onde a pele é o molde externo, a polpa, o cristal derramado e o caroço o molde interno. Utilizava-se de uma estrutura em ferro, a qual segurava o molde externo, sendo que o molde interno era !xo na parte superior da estrutura. O movimento de cima para baixo com o molde interno sobre o molde externo, fazia com que o cristal fosse prensado contra a as suas paredes. Essa técnica foi muito utilizada por Lalique, na sua produção seriada, pois o molde resistia a uma pequena tiragem e não necessitava ser quebrado (Dermant, 1986).

René Lalique criava seus modelos com detalhes muito bem trabalhados, no que diz respeito à forma, proporção, e nível de detalhes do motivo esculpido. Posteriormente, usava outras técnicas para re!nar os motivos.

Seus vasos foram muito copiados, e uma fábrica da Pensilvânia, a Consolidated Lamp Glass Company, resolve lançar uma linha similar a de Lalique. Em 1920, o designer Reuben Haley, trabalhando na empresa, lança a linha chamada de Martele. Durante os anos de 1932 a 1936 a fábrica da Consolited Glass !ca fechada temporariamente, e vende alguns moldes da linha Martele a Phoenix Company, que os reproduz e comercializa sob o nome Reuben Line. (Pina. et al, 1999. p.6, 8, 10).

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Essa linha tinha motivos !gurativos, "orais. As ninfas, sempre foram motivo de representação dos artistas

dessa época. Os motivos de fauna com o vaso representando gaivotas, que tem como motivo periquitos. O que podemos notar é uma grande semelhança entre o vaso da linha Revival, e o vaso em cristal feito por Lalique.

A linha da Consolited é semelhante á de René Lalique, porém elaborada sem a mesma qualidade e com técnicas diferentes de fabricação. As fábricas americanas trabalhavam com sopro em moldes, e.utilizavam para essa linha um tipo de vidro chamado Milk Glass. Não era cristal, e sim um vidro leitoso branco, usado para parte interna do vaso, e uma camada adicional de cor externa. O inverso também era o possível (Pinã,1999).

Fica evidente a diferenciação na obtenção dos resultados conseguidos entre as técnicas de vidro prensado e sopro dentro de moldes.

A técnica de sopro em moldes não tem detalhes nítidos, enquanto a de vidro prensado possibilita uma maior nitidez e de!nição, e ainda recebe acabamentos re!nando os seus detalhes. A seguir alguns exemplos da linha da Consolited Glass Company, com motivos de Fauna, Flora, e Ninfas.

A linha Revival da Cristaleria Cá d’Oro segue o mesmo princípio da Consolited Glass Company, mantendo uma diferença no tocante ao processo de fabricação e o resultado obtido.

Assim é a linha Revival da Cristaleria Cá d’Oro. Portanto temos um exemplo que con!rma as palavras de Cardoso (2007, p. 27).

“na falta de soluções, o designer recorre ao passado, recriando modelos”.

Todos os produtos dessa linha são ocos e soprados em moldes bipartidos, tendo referências muito similares ao design original de René Lalique.

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A seguir apresentamos a Tabela 4 com a Tipologia de produtos ocos da Linha Revival.

Tabela 4. Tipologia Linha Revival, Produtos Ocos.

Os produtos ocos soprados em moldes grupados por motivos decorativos formam uma linha com quatro grandes grupos de acordo com suas características estético-formais: geométrica, misto-geométrica, "oral e !gurativa. Fabricada em três cores, amarelo, lilás claro e branco, sendo todos de cores opacas leitosas, com revestimento externo de vidro transparente, responsável pelo brilho das peças.

O conjunto de que falamos é constituído por peças de até 25 centímetros de altura, ou seja, pequenas e médias.

A família geométrica se compõe de vasos, com nervuras que aparecem em alto e baixo relevo

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Os vasos abaulados com nervura em alto relevo, são apresentados ladeando um outro, em forma de paralelepípedo,com decoração em baixo relevo.

Os castiçais em formato de coluna com as hastes apresentando caneluras em alto relevo, são terminados em capitéis, que servem de base para a inserção das velas.

O terceiro grupo geométrico tem vasos de seção quadrada, cujo corpo é decorado com semicírculos concêntricos, cujo centro se localiza na quina lateral da peça, tanto na frente quanto no verso da mesma.

A categoria das peças misto geométricos, apresenta decorações geométricas e não !gurativas.

Todas as peças têm forma geométrica bem de!nida, sejam paralelepípedos, ou cônicas e seus derivados, As decorações se apresentam em alto relevo.

A família "oral, que é constituída por quatro grupos, mantendo vasos com formato de boca com o diâmetro seguindo o corpo do vaso, e outros com estreitamento de boca, formando um gargalo.

Dessas se destaca o grupo de vasos de formato de paralelepípedo com linhas decorativas verticais.

Os vasos com motivos !gurativos apresentam ninfas como o tema favorito dessas peças. Elas aparecem dançando, moldadas na superfície dos vasos.

A ninfa conforma a base da taça, mostrando-se um elemento decorativo e estrutural ao mesmo tempo.

Temos ainda saladeiras compostas ladeira pela a decoração da cabeça de um anjo moldado em faces opostas.

Observando as peças da linha Revival comparando-as com os originais de René Lalique, temos uma perda apreciável na qualidade do design, com falta de de!nição dos motivos em alto e baixo relevo.

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A Cristaleria Cá d’Oro apresenta uma linha diferenciada de produtos assinados Seguso. A gravação da assinatura é feita à ponta de diamante na parte inferior das peças. Todas essas peças dessa linha são feitas em cristal.

A seguir apresentamos a tabela 5 da Tipologia da linha comercial assinada- Produtos Ocos.

Tabela 5 . Tipologia Linha Comercial, Produtos Assinados.

A maior parte dos vasos corresponde a formas similares, possibilitando numa mesma forma aplicar efeitos decorativos diferenciados, cujos per!s apresentamos a seguir.

A partir de uma forma básica se torna possível a inserção de decorações diferenciadas, gerando assim produtos diferentes, agilizando a produção e maximizando o tempo gasto na produção da forma de um único modelo de vaso.

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Podemos concluir que o grupamento por famílias, a partir de uma única forma vem a corroborar para a criação de vários produtos diferenciados pela decoração e acabamento.

Os Vasos demonstram o que parece ser o resultado de experimentos do laboratório Fogo e Arte de Mário Seguso, permitindo uma "exibilização da linha, explorando efeitos decorativos compatíveis com a possibilidade de fabricação da Cristaleria Cá d’Oro.

Considerando os grupos que apresentam forma semelhante, encontramos vários tipos de decoração, nem todas partilhando da mesma técnica para sua confecção.

Formalmente as listas verticais são similares, e resultam de uma técnica parecida. Para obter esse efeito, são depositadas tiras de cristal de igual espessura e na ordem de cor desejada, sobre o vaso de cristal, e posteriormente todas as tiras colocadas, recoberto com outra camada do mesmo cristal. Esse processo é feito a quente, sempre tendo o vidreiro que caldear a peça, isto é, colocá-la no forno de caldear para aquecê-la, pois esta operação requer sempre que o cristal esteja na temperatura de trabalho. O vidreiro sabe distinguir pela coloração da massa, quando esta vai !cando fria, muda da cor laranja para um tom abaixo tendendo a !car quase transparente.

No caso das listas horizontais, temos vasos cuja decoração é realizada com a adição de vidro colorido no vaso em movimento de rotação. Essa é feita colhendo-se vidro colorido e colocando-o sobre o vaso de cristal, como se fosse um barbante a enrolar em um cilindro. Essa operação é feita com dois tipos de controle: o vaso de cristal preso a cana de sopro faz um movimento de giro, e o segundo vidreiro controla o enrolar do !o de cristal colorido formando uma espiral. Logo após o vaso é adoçado com a mu"a, eliminando as saliências deixadas pelo !o espiral.

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A lista decorada horizontal que adorna os vasos, tem seu começo de fabricação com um vaso soprado na cor branca, na qual são colocados dois !os de cristal preto, um de cada vez, em movimentos alternados, para cima e para baixo, sempre com o vaso girando, e o segundo vidreiro colocando o !o. O processo é o mesmo dos vasos com tiras em espiral.A decoração malhada, presente nesses vasos, quanto nas petisqueiras,, é obtida com pigmentos diferentes espalhados sobre a bancada do vidreiro, sobre a qual o objeto rola, sendo impregnado pelos pigmentos no cristal quente.

Os vasos que apresentam listas decoradas são inicialmente são coloridos integralmente, com cores transparentes ou opacas e depois recebem cristal em pequenas linhas que são adoçadas posteriormente com a mu"a, sem deixar saliências entre o corpo do vaso e o vidro colorido aplicado.

Temos ainda as petisqueiras, espécie de pratos rasos de formato elíptico que podem ser lisos, ou malhados. As últimas peças são vasos cujos formatos repetem outros da própria empresa, diferenciados pelas decorações que apresentam. Essas são transparentes ou malhadas, e seu processo foi anteriormente

descrito.A observação dessas linhas para esse artigo foi feita nos anos

de 2009 e 2010, in loco na Cristaleria Cá d’Oro, e sugere que parte desta família é fator de otimização na produção, pois são poucas as diferenças formais, possibilitando número maior de processos de decorativos em toda a linha. Isto posto, faz com que um único design de um produto, vem a dar certa agilidade na produção, criando maior "exibilidade para atender as demandas de mercado criadas.

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Assim sendo ao descrever a tipologia dessa linha podemos perceber que uma de suas características principais, está vinculada a possibilidade de se unir famílias, conforme o demonstrado anteriormente, tornando o mesmo produto único em cada uma das famílias.

O setor de lapidação da empresa ainda contribui para o polimento, lapidação ou outras formas de acabamento através do corte e lapidação de tais produtos

ConclusãoA Cristaleria Cá d’Oro, hoje com 46 anos de sucesso, vem adaptando o seu parque produtivo às novas realidades de mercado, através de conceitos de arranjos físicos, tão empregados nas areas de engenharia de produção, bem como se utiliza de ferramentas do design, na criação de famílias de linhas de produtos e de conceitos de séries e, linhas dentre outros.

Além desses, o conhecimento de Mário Seguso, ligado à tradição do fazer, traz o saber de sua trajetória e de outras indústrias, adaptando-se a uma nova realidade, rompendo com a tradição de Murano e ao mesmo tempo, aplicando todo esse conhecimento no design de produtos e na formatação de sua linha de produção. Mário Seguso caminha lado a lado com a produção, criando vínculos que unem o conceito de concepção com o de transformação.

Mário Seguso, mantém na própria empresa um laboratório de pesquisa ”Fogo e Arte, onde desenvolve conceitos e pesquisas relativas aos materias e formas criando assim seus próprios bastões de cores, com os coe!cientes de dilatação necessários a cada produto, tornando-o independente das grandes indústrias fornecedoras no estrangeiro.

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Tais conceitos e ferramentas do design, "exibilizam e agilizam sua produção, permitindo uma maior adaptação ás novas realidades de mercado.

A partir da observação dos métodos e conceitos, aplicados na Cristaleria Cá d’Oro, veri!ca-se que os resultados obtidos por esta indústria manufatureira são fruto da utilização desses processos, assim como do conhecimento neles envolvido.

ReferênciasBLOCH-DERMANT, Janine. Le Verre en France D’Émille Gallé a nos

Jours. Paris: Les Éditions de L’amateur.1986. CAPPA, Giuseppe. Le Génie Verrier de L’Europe. Liége: Pierre

Mardaga Éditeurs, 1998.CARDOSO, Rafael. Do Fetichismo dos Objetos à Semântica do produto,

e Além*. São Paulo: Anablume. Desígnio. V7/8, p. 11-32. 2007.MILLER, Judith. Le Verre du XX Siécle. Gründ: Paris, 2006.

MIRBECK, Xavier. Technique du Verre. Dessain et Toira: Turin, 1992.PIÑA, Leslie & OCKENER, Paula. Depression era décor glass.

Atgen: Schiffer Publishing ltd. 1999.

EntrevistasSEGUSO, Adriano: entrevista. Poços de Caldas Cristaleria

Cá d’Oro, Poços de Caldas. 2010. Entrevista concedida a Gil A. Haguenauer, em 13 de Abril. 2010.

SEGUSO, Mário Seguso: entrevista. Poços de Caldas Cristaleria Cá d’Oro, Poços de Caldas. 2009. Entrevista concedida a Gil A. Haguenauer, em 13 de Fevereiro. 2009.

Siteswww.cristaiscadoro.com.br acessado em 22/5/2008

www.rlalique.com acessado em 12/6/2009

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Sobre os autoresGuilherme Cunha Lima, PhDProfessor Adjunto da Esdi/Uerj. [email protected]

Gil Haguenauer, MScEsdi/Uerj, [email protected]

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Dinâmicas de construção da imagem impressa para a simulação do originalWashington Dias Lessa, DSc

Helena de Barros, MSc

1. IntroduçãoEste trabalho situa-se dentro da área de produção da imagem, concentrando-se na imagem seriada e especi!camente na imagem impressa. O conceito de impresso se conecta diretamente com os conceitos de matriz e de original, segundo os quais original e reprodução apresentam diferentes características e possuem valor simbólico diferenciado. Nele nos propusemos a repensar a imagem impressa, considerando a riqueza técnica de sua capacidade de simulação ótica como fundamento para uma nova compreensão do objeto impresso que pode adquirir, por referencial qualitativo, valor simbólico equivalente à um original, especi!camente quando se trata de impressos de época, ou produzido pelas novas tecnologias de impressão de arte.Objetivou-se entender mais profundamente os atributos grá!cos das técnicas de impressão de imagem, as transformações que elas determinaram e situá-las de um ponto de vista lógico, formal e produtivo, na compreensão do objeto de imagem impressa, sob ótica qualitativa, dentro do campo do design.

Tratamos, portanto, de uma investigação sobre a ‘capacidade’ da imagem impressa em termos de simulação ótica, localizando nos modos de formalização e produção a correspondente possibilidade de riqueza perceptiva da imagem. Esta investigação

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partiu da uma vivência do presente para enriquecê-la com a leitura do passado, estabelecendo referências comparativas entre algumas das principais técnicas históricas e atuais de impressão de imagem.

Ao longo da pesquisa foram reunidas como fontes primárias, amostras de diferentes técnicas de impressão de primeira geração. A partir deste corpus de estudo, tendo em vista as características visuais e táteis de cada impresso, foi feita uma seleção de 22 amostras. Cobrindo um período que vai de 1730(c.) a 2007, estão exempli!cadas as técnicas de impressão mais relevantes apontadas pela pesquisa. A micro-estrutura dinâmica de construção da imagem foi identi!cada através de coleta de dados, conta-!os e microscópio de 10 e 25X. A técnica de impressão foi con!rmada através de microscópio de 50X. As reproduções dessas amostras podem ser vistas na dissertação correspondente, defendida no PPDESDI em 2008. Este artigo apresenta parte do referencial teórico-analítico utilizado e as conclusões do trabalho.

2. A impressão da imagemConsidera-se impressão o processo que transforma textos e

imagens únicos em cópias múltiplas. Por princípio, o processo visa a difusão da informação contida nesses textos e imagens para um maior número de pessoas, portanto está diretamente ligado ao desenvolvimento de quase todas as áreas do conhecimento. A grande maioria de textos e imagens em papel com que lidamos atualmente são impressos.

A maior vantagem oferecida pelos sistemas de impressão foi não só a velocidade e a viabilidade de um grande número de cópias, mas principalmente a garantia de que todos os seus múltiplos apresentam exatamente a mesma forma e características visuais. Isso só foi possível porque todo sistema de impressão

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se baseia na elaboração prévia de uma mídia mestra, a matriz, que transfere ou ‘recria’ a imagem ou texto sobre outro suporte. São as características da matriz que garantem a !delidade da informação, transmitida de forma quase invariável para todos os seus múltiplos. Técnicas distintas foram capazes de oferecer, ao longo da história, diferentes níveis de elaboração e complexidade grá!ca aos impressos.

Uma das peculiaridades do desenvolvimento dos processos de impressão é que texto e imagem derivaram de estratégias diferentes de reprodução e não raro determinam também diferentes áreas de estudo (Twyman, 1999: 16). A produção de texto estabelece sua lógica de construção a partir da ordenação das unidades mínimas da escrita alfabética (caracteres ou letras), que se organizam progressivamente em palavras, sentenças e páginas. A sistemática e evolução da lógica tipográ!ca, incluindo o posterior desenvolvimento de maquinário especí!co voltado para a produção e reprodução do texto, se organizam também da partícula para o todo.

O discurso imagético, pelo contrário, se organiza do todo para o detalhe. Com raras exceções, vemos uma imagem primeiro como um todo e só depois nos detemos nas suas partes componentes. Podemos começar esta análise em qualquer parte da imagem e proceder em qualquer direção, numa situação completamente oposta do que ocorre com as palavras. Do ponto de vista produtivo, os elementos mínimos da tipogra!a são as letras, enquanto os elementos mínimos da imagem são menos reconhecíveis e de signi!cado menos especí!co. São pontos, traços e linhas que exigem uma articulação mais complexa. As relações entre esses elementos não se dá de forma tão isolada, esquemática e linear como ocorre com o texto, necessitando de outra abordagem construtiva.

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Os recursos técnicos e a expressão pessoal do autor foram, durante muito tempo, fatores comprometedores na reprodução de imagens, correspondendo a um in!nito de sutilezas que não poderia ser replicado facilmente. Assim, a reprodução de um enunciado imagético depende a maior parte das vezes de um repertório técnico muito mais complexo de !delidade e detalhamento, sob pena de distorção, descaracterização ou até mesmo perda total do conteúdo informacional (Ivins, 1953). Esta foi uma das maiores di!culdades enfrentadas pela tecnologia de reprodução de imagens, que só foi capaz de atingir autonomia a partir dos procedimentos fotomecânicos.

3. Conceitos básicos utilizadosA partir da delimitação do tema na produção seriada de

imagens e do foco na imagem estática (não-temporalizada) em mídia impressa, descartando-se qualquer outra forma de difusão, como a internet, elegemos alguns aspectos essenciais, a sabe

3.1 Conceitos ligados à natureza da produçãoO impresso se conecta com o conceito de original, seja para !ns

de reprodução ou produção. Na reprodução está implícito um original pré-existente, enquanto a produção determina o original através do desenvolvimento da matriz (ou seja, a confecção direta de matrizes especi!camente para !ns de reprodução, como ocorre na gravura artística). Ambos os casos têm como !nalidade “multiplicar” um original.

Por estarmos mais interessados aqui nas !delidade de representação que a técnica oferece do que na capacidade de expressão artística, estaremos, a maior parte das vezes, tratando da reprodução de um original pré-existente ou de produções comerciais, evitando tratar da subjetividade das gravuras de arte.

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3.2 Critérios para a produçãoA produção seriada de um impresso tem a in"uência de dois

vetores determinantes: a quantidade e a qualidade. A evolução técnica almeja a satisfação de ambos, mas embora

sejam critérios idealmente complementares, se mostram na prática frequentemente em pólos antagônicos. Em raras ocasiões o aumento da quantidade esteve associado ao aumento da qualidade grá!ca.

O modo de gravação da matriz pode viabilizar ganhos qualitativos, mas a técnica pode impor limitações de quantidade.

A busca quantitativa normalmente está associada à praticidade e velocidade da produção e as limitações de caráter técnico podem alterar de tal maneira o conteúdo original a ponto de o transformar em uma informação distinta em forma, estilo grá!co, cor, volume, contraste ou textura, atributos tão intrínsecos à constituição de uma imagem que podem chegar a modi!car a própria informação visual veiculada.

Na busca qualitativa, diferentes técnicas perseguiram e perseguem o aumento da riqueza de propriedades grá!cas ou a reprodução !dedigna. A maior parte das vezes o aumento de qualidade exige processos mais complexos que aumentam a mão de obra e os custos da produção. Em consequência, a reprodução de alta qualidade, dependendo da técnica utilizada, pode se restringir a tiragens pequenas para um público seleto ou a tiragens altíssimas que diluam o investimento inicial.3.3 Conceitos ligados à gravação da matriz

A gravação de uma matriz para impressão pode ser viabilizada essencialmente de duas maneiras: artesanal manual ou por dispositivo técnico.

Historicamente, até o século XIX, qualquer forma de impressão dependia da gravação da matriz por processos artesanais. A

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reprodução por dispositivo técnico (analógico e digital) se torna possível apenas depois da descoberta da fotogra!a , na primeira metade do século XIX.

O dispositivo técnico libera a reprodução da interpretação artesanal e ao mesmo tempo lhe confere um caráter mais prático, verossímil e cientí!co. A partir do século XX, as reproduções de originais passam a ser feitas exclusivamente por dispositivos técnicos, enquanto as técnicas artesanais !cam reservadas à produção da gravura artística.

Um dos aspectos que confere qualidade à matriz é o sistema estrutural adotado na gravação da imagem, que aqui nomeamos de ‘dinâmica de construção’.

3.4 Dinâmica de construção da imagemA dinâmica de construção se subdivide em duas categorias

principais: a modulação espacial e a composição da cor.Estabelecemos essas categorias seguindo um raciocínio

retroativo, baseado em conceitos atuais, utilizados na computação grá!ca. No domínio digital a qualidade técnica de uma imagem é determinada pelos conceitos de resolução espacial (ou resolução geométrica) e resolução de cor (ou de profundidade). O processo de digitalização de uma imagem implica na transformação de toda a informação contínua em unidades discretas, estanques e mensuráveis no universo computacional. A resolução espacial é determinada pelo processo de amostragem, enquanto a resolução de cor é determinada pelo processo conhecido por quantização (Velho e Gomes, 2002).

A amostragem determina a quantidade de unidades (pixels) que compõe uma imagem digitalizada. Como pixels são unidades que tem tamanho físico relativo, a amostragem associada a densidade de resolução indica a frequência de pixels por unidade linear de medida (vertical X horizontal). Assim, quanto maior

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for a freqüência de amostragem espacial, mais detalhes terá a imagem. A quantização, por sua vez, permite que um conjunto contínuo de cores seja convertido em um conjunto discreto de cores, identi!cado num espaço de cor matemático. A partir desses aspectos do universo digital, podemos estabelecer um paralelo lógico com os sistemas de impressão de modo geral.

Partindo do conceito contemporâneo de resolução espacial, temos que as primeiras técnicas de impressão de imagem contemplavam apenas imagens sintéticas, com contornos e traços. Mas ao contrário do corpo do texto, que na maior parte das vezes pode ser resolvido com preto absoluto ou cores chapadas, a reprodução de imagem necessita de uma escala tonal mais ampla para representar volumes, luzes e sombras. Matrizes de reprodução porém, independente da técnica utilizada, são capazes de imprimir apenas uma única tinta. Não é possível transpor para a matriz misturas de tintas e transições gradativas de forma precisa como se faz na pintura. É necessário que se recorra então a simulações. Para reproduzir uma imagem natural por um sistema de impressão, a informação contínua de luminosidade precisa ser codi!cada em áreas de impressão e de não-impressão.

Devido às propriedades perceptivas da visão humana, grupos de linhas, hachuras, pontos e grãos, quando observados a certa distância, dependendo do seu tamanho e concentração, da proporção entre espaços de impressão e não-impressão, causam a ilusão de tonalidades diferentes. Em todos os meios de reprodução mecânica, mesmo os que contam com a mais moderna tecnologia, variações tonais são representadas dessa forma, por estruturas fragmentadas, modulares ou não. São na verdade tons óticos, pois a percepção de variação de valor se dá apenas dentro do olho. Podemos chamar as unidades que compõem essas tonalidades na matriz de unidades discretas de dois níveis,

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já que elas são designadas apenas pelo valor do preto ou branco – impressão existente ou não-existente – em oposição as in!nitas gradações do tom-contínuo de uma imagem natural. Recursos grá!cos especí!cos foram desenvolvidos para a representar gradações tonais adequados a cada sistema de impressão. Eles são determinados de acordo com as possibilidades e ferramentas de execução de cada técnica. De acordo com a evolução técnica, esses sistemas de representação, responsáveis pelas modulação e reprodução da imagem na impressão, tendem a ser cada vez mais complexos e imperceptíveis ao olho nu, se aproximando do tom-contínuo.

Como partimos de um conceito atual para avaliar um panorama histórico e estamos falando de um conjunto muito heterogêneo de procedimentos, o termo resolução espacial não seria adequado, por exemplo, para tratar de técnicas artesanais. Estamos lidando com um problema complexo, que diz respeito a própria estrutura e diversidade dos sistemas de impressão. Não se trata apenas, como no caso de pixels, da quantidade de unidades por área, mas da forma e do sistema de conjugação dessas unidades. Assim, no lugar de resolução espacial, adotamos o termo ‘modulação espacial de unidades discretas’, ressaltando-se que a lógica que seguimos, no entanto, é guiada pelo conceito de resolução, ou seja, a de dar conta dos métodos que codi!cam a imagem a ser reproduzida em unidades capazes de determinar o seu nível de detalhes e informação.

A modulação espacial de uma única matriz é capaz de simular uma imagem de tom-contínuo monocromática, mas para uma imagem colorida, é necessário um procedimento mais complexo. No computador, o termo resolução de cor se refere a identi!cação e conversão numérica das cores em espaços de cor matemáticos , de acordo com a intenção de uso. Alguns desses espaços

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matemáticos se destinam a interpretar valores compatíveis com dispositivos de reprodução, como o monitor de vídeo ou impressoras, mas alguns deles são espaços de cor essencialmente teóricos e que se aplicam apenas ao universo da computação. Em processos de impressão, considerando, como já foi dito, que cada matriz trabalha com apenas uma tinta, é necessário um procedimento de conversão semelhante, mas em vez de coordenadas matemáticas, as cores são transpostas para um elenco restrito de tintas e corantes especí!cos. Para a impressão de uma imagem colorida, é necessário que se coordene algumas matrizes com áreas de impressão e não-impressão diferenciadas, cada uma delas imprimindo uma única cor. A justaposição da impressão dessas matrizes em cores diferentes será responsável pela simulação da imagem colorida, no que chamamos de síntese cromática. Dada a complexidade técnica desta operação, quanto mais restrito for o elenco de cores, mais prático será o processo de impressão. O efeito multicolorido da síntese cromática só foi viabilizado na impressão através da adaptação de estudos cientí!cos e tecnológicos da cor a partir do século XVIII (Grasselli, 2003).

Por estar associado diretamente a espaços de cor matemáticos, o termo resolução de cor também não seria adequado para a abrangência dos sistemas analógicos e artesanais de separação de cor. Mas o que temos em mente é uma questão de ordem muito semelhante: a interpretação do original – a partir de uma prática de desenho/pintura, e/ou de técnicas fotográ!cas, e/ou de uma compreensão cientí!ca da cor – visando a produção de matrizes. O termo gamute de cor, que no universo digital dá conta da limitação e da amplitude cromática de cada dispositivo em seu respectivo sistema de cor, oferece também um conceito bastante pertinente. No âmbito deste trabalho não estamos falando apenas

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de dispositivos associados a sistemas matemáticos, mas o elenco de cores adotado numa técnica de impressão, a constituição e propriedade das tintas e dos papéis, sua conjugação e comportamento sobre o papel, também enquadram determinadas possibilidades de amplitude e limitação cromática. Assim, em vez de resolução de cor ou gamute, adotamos o termo mais abrangente de ‘composição da cor’. Nele está implícita a idéia de que trata-se sempre dos modos de interpretação do original referidos acima, assim como o fato de que o elenco de cores escolhido, associado às características materiais do processo de produção, determina o intervalo e a abrangência cromática da representação.

4. Modulação espacial e composição da cor Trabalhamos sobre alguns fatores da evolução qualitativa dos

processos de impressão de imagem, especi!camente, as duas categorias apontadas no conceito de dinâmica de construção, onde o objetivo principal foi o de descrever e analisar as principais estruturas construtivas que viabilizaram o aprimoramento da reprodução da imagem, seguindo o encadeamento cronológico das principais técnicas de impressão comercial. Nos concentramos em investigar os aspectos técnicos que contribuíram para ampliação de recursos de reprodução da imagem inseridos no domínio da área do design grá!co, desconsiderando aspectos expressivos da gravura na criação de obras originais, ou o juízo de valor artístico, que seriam do domínio da arte.

Primeiramente abordamos o desenvolvimento de estratégias de modulação espacial da imagem para a simulação do tom-contínuo monocromático e como diferentes estratégias (técnicas de reprodução artesanal, mecânica e digital ) são utilizadas para proporcionar a ilusão de ótica do meio-tom.

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Em seguida abordamos o desenvolvimento das estratégias de composição da cor. Tratamos de como se dá a idealização e transposição da imagem colorida para o meio impresso. Apresentaremos o percurso, diversidade, transição de estratégias manuais para tecnologias mecânicas e digitais de separação de cor e sua relação com o resultado impresso.

Com a apresentação desses percursos de ordem espacial e cromática, procuramos formar um panorama de como a articulação de estruturas de elementos mínimos e cores primárias é capaz de dar conta da representação de gradações tonais e do espectro colorido na imagem impressa. A conjugação desses elementos na lógica de representação de imagens é um padrão recorrente nas mais diversas técnicas de impressão, que evolui com tecnologias e necessidades de cada época, mas mantêm conceitos estruturais básicos, como a articulação de fonemas num vocabulário, podendo oferecer discursos sintéticos e objetivos ou prolixos e minuciosos, acomodando uma extensa gama de nuances perceptivas e expressivas.

4.1 Estratégias de modulação espacial para a simulação de tom-contínuo

Partindo da estrutura conceitual de antecedentes artesanais acerca da racionalização da reprodução, aborda-se como culturas antigas lidaram com a composição da imagem através de sua fragmentação em partículas, citando-se o mosaico e a tapeçaria como exemplos de estratégias de construção. As técnicas de impressão propriamente dita se realizam através de entalhe de alto relevo (xilogra!a) ou incisão na superfície da matriz (gravura em metal) nos séculos XV, XVI e XVII. Recursos esquemáticos de

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sintaxe visual se desenvolvem na Europa ocidental, com diferentes abordagens de acordo com a tradição cultural de cada país.

No século XVIII implementam-se novas de técnicas de gravação objetivando a verossimilitude. Algumas simulam o meio tom da pintura (meia-tinta e água-tinta), outras o efeito grá!co de desenhos (maneira giz, maneira lápis, maneira crayon, etc.). O !m do século XVIII traz também o aumento do nível de de!nição da imagem em xilo proporcionado pela gravação de topo que anuncia o substancial aumento da produção que se seguiria no século XIX, marcado também pela prática da litogra!a. Esta última se demonstra a técnica mais próxima da representação pictórica, impregnada pela força do gesto e do índice, com técnicas de gravação direta com crayon, pincel e bico de pena. Registra-se também a adaptação na cromolitogra!a da técnica de ponteado da gravura em metal, com estratégias de concentração, dispersão, contorno e volume, e a sistematização de estruturas grá!cas com as chablonas e mídias de sombreamento de benday.

Também no século XIX, o padrão fotográ!co se !rma como novo paradigma, desa!ando diversas tentativas de adaptação para indústria grá!ca, em métodos de baixa tiragem ou com poucos recursos grá!cos (colótipo, fotolitogra!a, fotogravura) até o desenvolvimento de!nitivo de uma técnica industrial fotomecânica de modulação da imagem baseada na retícula de linha cruzada gerada por telas de cristal.

A difusão da imagem e seu impacto na cultura de massa propiciada pela retícula de amplitude modular se con!rma como principal sistema de modulação empregado durante todo o século XX, quer seja na tipogra!a, no off-set ou na calcogra!a, sem praticamente nenhuma variação conceitual. A partir da década de 1980 registra-se a transição para o sistema de processamento digital de imagens, impulsionando as pesquisas de imagem de

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alta de!nição e a demanda por novas propostas de retícula sem grade !xa, porém ainda sem condições de implantação comercial.

A evolução da computação possibilita o desenvolvimento da retícula estocástica que chega ao mercado através de grandes corporações, mas ainda sem grande sucesso comercial. Na década de 1990 o CTP viabiliza novas propostas de algoritmos de retícula con!gurando imagens de maior qualidade técnica e sinalizando a retomada da retícula estocástica. Técnicas de retícula fantasia propõem a simulação de resultados com sintaxe visual da gravura. A partir do CTP, considera-se também as altas lineaturas de retícula convencional como outra possibilidade de aumento de qualidade. Os equipamentos sob demanda com tecnologia de retícula estocástica se estabelecem para pequenas tiragens de impressão de arte (giclée) e como perspectiva para o século XXI (Oliver, 2006; Johnson, 2004).

4.2 Estratégias de composição da cor para impressão de imagens coloridas

As primeiras impressões coloridas são realizadas com cores isoladas (a la poupée), e as primeiras técnicas de impressão de síntese cromática são realizadas em tricromia e seu desenvolvimento é registrado no trabalho de diversos impressores franceses no Século XVIII.

No século XIX, é signi!cativa a in"uência cultural dos trabalhos de teoria da cor como os de Newton, Goethe, Chevreul, Helmholtz e Rood, que resulta na pintura neo-impressionista no !m do século XIX e coincide com a popularização da cor na imagem impressa. Realizam-se algumas propostas que de xilogravura colorida pura ou conjugada com a gravura em metal (Baxter prints) mas a consagração da cor impressa é alcançada com o sucesso comercial da cromolitogra!a. O complexo

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processo de separação manual da cor utilizado na execução da cromolitogra!a, com utilização de até 40 cores, é realizado pelo cromista por interpretação subjetiva.

A partir do século XX a interpretação da cor passa a ser realizada de forma sistemática, por !ltragem ótica e com a retícula de amplitude modular, que estabelece a tricromia e posteriormente a quadricromia (cyan, magenta, amarelo e preto - CMYK) como padrão de reprodução de imagens coloridas. Com a posterior transição para o sistema digital, estabelecem-se espaços de cor distintos (Lab, RGB, CMYK, etc.) para cada dispositivo e a necessidade de padronização de codi!cação destes sistemas, através dos per!s ICC.

Na década de 1990, a retícula estocástica possibilita o aumento do espectro cromático através de sistemas de cor de alta !delidade, com propostas que utilizam de 6 a 12 cores especiais na síntese cromática.

Em áreas especializadas como a impressão sob demanda de alta qualidade, ou impressão de arte (fotogra!a digital e giclée), o gerenciamento de cor exige trabalho especializado e customizado, com conhecimentos técnicos especí!cos adaptados à esfera computacional, que possam traduzir a expectativa do artista para os resultados esperados, num trabalho colaborativo (Ashe, 2001).

5. ConclusãoCom base no cruzamento entre fundamentação teórica e a fase

analítica do estudo, seguem as conclusões do trabalho.Observando-se o desenvolvimento histórico de técnicas de

elaboração de matrizes de impressão – da incisão artesanal à fotomecânica e à tecnologia digital – no que diz respeito a simulação do tom contínuo e do espectro cromático, pode-se

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identi!car uma alternância de comportamentos em termos de diretrizes de linguagem visual.

Num primeiro momento, a xilogravura, e a gravura a buril consagram linhas simples e o cruzamento de hachuras para simulação do meio-tom nas primeiras formas de difusão quantitativa da imagem. Esse tipo de interpretação tem um caráter geometrizante, imposto pela natureza das ferramentas utilizadas no processo de reprodução. Segundo outra diretriz, outras técnicas de gravura em metal e a litogra!a introduzem ponteados e texturas mais orgânicas, marcando a busca pelo aumento de de!nição e qualidade técnica da imagem. Essa abordagem procura estabelecer um outro padrão de técnica de reprodução, simulando melhor os originais, sejam eles desenhos ou pinturas. As primeiras técnicas de impressão da fotogra!a, como o colótipo ou a fotogravura, também seguem esta tendência. A introdução da retícula de amplitude modular no !nal do século XIX, proporciona a popularização do padrão fotográ!co por meios mecânicos gerando novos parâmetros quantitativos para circulação de imagens, sem precedentes na sociedade. Nesse caso, a interpretação modular geométrica da imagem garante um resultado genérico de simulação mais verossímil, mas que ao mesmo tempo caracteriza esta imagem como resultado inequívoco de um processo de reprodução automatizado. Com a retícula estocástica, observa-se mais uma vez a busca de bases orgânicas de interpretação visual, que apresentem resultados de imagem de alta de!nição e hiper-realismo. A textura orgânica ressurge como artifício de valorização da reprodução, mais uma vez, tentando lhe atribuir as características de um original. Paralelamente, a modulação geométrica é também introduzida a nível microscópico através da retícula de amplitude modular de alta frequência,

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oferecendo uma vertente conciliatória entre a alta qualidade e quantidade.

O repertório de recursos disponível em cada técnica se manifesta nas concepções grá!cas e estilos de cada época. Assim como a sintaxe de linha predominava nos impressos do século XVII e XVIII, a retícula fotomecânica caracteriza boa parte da estética grá!ca da primeira metade do Século XX. Repertórios de cor e de!nição ampliados pelas novas tecnologias de retícula e computação grá!ca motivam uma vertente estética atual dominada pela imagem de alta de!nição. O desenvolvimento tecnológico aproxima a retícula de uma escala microscópica e da lógica atômica, no paradoxal objetivo de construir imagens ‘tão reais quanto a realidade’. Manifesta-se a expressão máxima da visualidade pela invisibilidade da técnica.

Na dinâmica de construção da imagem impressa, padrões geométricos conotam a técnica industrial e a reprodução quantitativa, enquanto padrões orgânicos são o artifício da simulação e da reprodução qualitativa.

A comparação visual de amostras ampliadas de técnicas totalmente distintas e distantes historicamente, como o ponteado, a litogra!a a crayon, a litogra!a ou a tipogra!a de pontilhado, o colótipo, a fotogravura de água-tinta, o offset com retícula de frequência modular e a giclée, identi!ca uma mesma linhagem de construção visual. Esta dinâmica de construção de base orgânica orienta-se no sentido de promover a qualidade visual numa simulação naturalista do tom contínuo do original.

Ao mesmo tempo, podemos encarar a pluralidade de soluções de base orgânica, como indicativo de fragilidade de suas propostas e ine!ciência prática, em oposição a objetividade, hegemonia e segurança oferecida por métodos quantitativos como

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a gravura a buril, a xilogravura de topo, a tipogra!a e o offset com retícula de amplitude modular.

A alternância dessas polaridades, que continua a ocorrer atualmente, indica a necessidade de soluções distintas para problemas diferenciados. Não existem valores absolutos. Determinadas soluções genéricas de grande e!ciência mercadológica, como o offset com retícula de amplitude modular, não excluem a busca de soluções especí!cas de alta qualidade, a!rmadas pelo desenvolvimento de pesquisas e soluções associadas a retícula de frequência modular.

A partir do estabelecimento da tecnologia digital, podemos perceber que um determinado padrão de ordem geométrica, o pixel, começa a coordenar a geração de sub-padrões orgânicos. A retícula estocástica, por exemplo, é gerada pela subdivisão de módulos da imagem digitalizada em módulos menores com organização randômica para impressão.

Ao mesmo tempo, no caso da rotogravura e do offset com retícula AM de alta frequência, os padrões geométricos assumem proporções tão diminutas que desaparecem a olho nu, proporcionando resultados que podem ser visualmente tão satisfatórios quanto os de estruturação orgânica. Esses exemplos podem ser considerados indicadores de dominância e e!ciência da lógica geométrica na coordenação da aparência orgânica.

Em relação à composição de cor, um comportamento semelhante ao da modulação espacial pode ser percebido. A síntese de cor com um elenco mínimo de tintas (de 3 a 4 cores de seleção) con!gura uma preocupação com a racionalidade da produção, enquanto a pluralidade de tintas con!gura a preocupação com a representação vívida, vibrante e !el ao original.

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Assim como ocorre com a modulação espacial, podemos perceber que este não é um percurso de evolução sistemática. A tricromacia estabeleceu o azul, o amarelo e o vermelho como cores primárias de impressão, mas foi um princípio de investigação restrita e experimental no Século XVIII, seguida por técnicas como a maneira giz e a maneira lavada que combinavam até 6 cores básicas. No Século XIX, mesmo com a tentativa de Engelmann de implantar as quatro cores (preto, azul, amarelo e vermelho) na cromolitogra!a, a prática conduziu ao uso de uma in!nidade de cores customizadas tanto nas impressões Baxter (que utilizavam uma média de 10 cores), como na cromoxilogra!a, cromotipogra!a e cromolitogra!a (podendo chegar a mais de quarenta cores). A tricromia e posteriormente a quadricromia só voltariam a ser praticadas e se estabelecer como norma produtiva, com a objetividade de seleção de cores proporcionada pelos processos fotomecânicos no início do Século XX.

A tecnologia digital continua a perpetuar este modelo, mas nos últimos anos retomam-se as pesquisas e implementações tecnológicas para um modelo cromático de representação mais ampla com 6, 7, 8 e até 12 cores de seleção. É o que ocorre nos sistemas de HiFi color e giclée. Apesar de trabalhar com menos cores do que a cromolitogra!a, esses sistemas são capazes de reproduzir um gamute de cor muito amplo, graças ao pragmatismo da !ltragem fotográ!ca (em oposição à interpretação manual da cor). Assim como no caso da retícula estocástica, esta é uma tendência associada à impressão de alta qualidade, voltada para um público seleto que busca um produto requintado e diferenciado e se manifesta sobretudo na impressão de arte. Esta é mais uma característica análoga à produção do século XVIII e XIX, já que as ‘pinturas impressas’ em meia tinta colorida, as

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impressões Baxter e a cromolitogra!a também almejavam este mercado.

Constata-se uma alternância de ciclos de padrões de estruturação geométrica e de síntese de cores primárias para padrões de estruturação orgânica e pluralidade de cores. Essa alternância é motivada em primeira ordem pelo aumento quantitativo da produção, que, assim que se estabelece, motiva um segundo movimento em direção ao ganho de qualidade.

Dois vetores balizam esta alternância: a) a busca por imagens que se façam onipresentes, através do maior número possível de reproduções, movimento que se torna imperativo a partir da Revolução Industrial; b) a busca pela qualidade e riqueza da produção.

Se a impressão genérica do século XX sofreu restrição de parâmetros qualitativos em função da praticidade e aumento da produção, podemos constatar pelo mapeamento teórico e pela análise das fontes primárias apresentadas nesta pesquisa, que essa é uma tendência não só do nosso tempo, mas um movimento cíclico na história da impressão. No entanto, a retomada atual deste movimento parece estar se valendo da tecnologia para implementar a qualidade técnica de maneira mais acessível e proveitosa que a praticada anteriormente.

No que diz respeito à impressão de arte sob demanda, podemos notar uma ascensão vigorosa. A impressão de arte atual feita em impressoras jato de tinta de alta qualidade com tintas a base de pigmento (giclée), conta com um sistema controlado de produção objetiva, estável, durável e que agrega qualidades materiais sem precedentes na história.

Acreditamos que a restrição de qualidade da produção média atual justi!ca-se pela operacionalidade quantitativa que promove o acesso amplo à informação. Por outro lado a impressão de arte de

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alta qualidade que se desenvolve atualmente, se insere corretamente num mercado próprio, bem mais restrito. O desenvolvimento da impressão de arte sob demanda em oposição à impressão de massa do mercado grá!co industrial não se caracteriza, portanto, como uma derrota da qualidade. Enquanto o offset é funcional na dinâmica cultural das sociedades industrial e pós-industrial, a giclée experimenta na simulação do original, dispondo um novo enquadramento de expressão de qualidade e contribuindo para novas visões e novas compreensões da imagem impressa.

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Sobre os autoresWashington Dias Lessa, DScProfessor Adjunto da Esdi/Uerj. [email protected]

Helena de Barros ,MScEsdi/Uerj, [email protected]

Este livro foi composto emPalatino Linotype e diagramado no Adobe InDesign CS6, pelo Programa de Pós-graduação em Design da Esdi/Uerj.Foi impresso e acabado pelaArtis Artes Grá!casRio de Janeiro, 2013.


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