+ All Categories
Home > Documents > Anuario V2 Anexos - Centro de Direito...

Anuario V2 Anexos - Centro de Direito...

Date post: 28-Jan-2019
Category:
Upload: trantuyen
View: 215 times
Download: 0 times
Share this document with a friend
251
Transcript

IIIAnuário Brasileiro

de Direito Internacional

VOLUME 2

Brazilian Yearbook of International Law

Annuaire Brésilien de Droit International

2008

Copyright © 2008 by Leonardo Nemer Caldeira Brant/CEDINTodos os direitos reservados

ISSN 19809484

Centro de Direito Internacional - CEDIN

PRESIDÊNCIALeonardo Nemer Caldeira Brant

CONSELHO CONSULTIVO E EDITORIAL DO CEDINAdemar G. Bahadian, Alain Pellet, André de Carvalho Ramos, Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros, Antônio Remiro Brotóns, Arthur José Almeida Diniz, Bruno Simma, Celso Lafer, Eduardo Grebler, Francisco Orrego Vicuña, Francisco Rezek, Gilberto Giullaume, Ireneu Cabral Barreto, José Henrique Fischel, Laurence Boisson de Chazournes, Luigi Condorelli, Thomas M. Franck, Vicente Marotta Rangel, Welber Barral.

PRODUÇÃO EXECUTIVALuciana Diniz Durães Pereira

TRADUÇÃO DOS ARTIGOS EM LÍNGUA FRANCESAFernanda Araújo Kallas

COLABORADORESDaniela Rodrigues Vieira, Délber Andrade Lage, Demian da Cunha Pereira França Magalhães, Karina Marzano Franco, Marinana Andrade e Barros, Pedro Ivo Ribeiro Diniz, Thiago Andrade Neves

Submissão de artigos para publicação | Articles submissionsData limite para entrega dos artigos | Deadline: 04/2009E-mail | [email protected] / [email protected]

PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃOAlexander Oliveira e Rosana Martins da Costa Diniz

APOIOCentro Universitário UNA (www.una.br)Fundação Alexandre de Gusmão - FUNAG (www.funag.gov.br)Fundação Konrad Adenauer - FKA (www.adenauer.com.br)Ramo brasileiro da International Law Association - ILA (www.ilabrasil.org.br)

Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

A636 Anuário Brasileiro de Direito Internacional = Brazilian Yearbook of International Law = Annuaire Brésilien de Droit International / Coordenador: Leonardo Nemer Caldeira Brant - v.1, n.1, 2006 - Belo Horizonte: CEDIN, 2006

Semestral 1. Direito Internacional. I. Centro de Direito Internacional II. Brant, Leonardo Nemer Caldeira. III. Título: Brazilian Yearbook of International Law. IV. Título: Annuaire Brésilien de Droit International.

CDU: 341

SUMÁRIO

11 O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo

ALBERTO DO AMARAL JÚNIOR

34 Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process?

CELSO EDUARDO FARIA CORACINI

46 Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul CLÓVIS BRIGAGÃO LEONARDO PAZ NEVES

62 The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

FABIANA DE OLIVEIRA GODINHO

78 O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional JACOB DOLINGER

114 On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law

JOSÉ H. FISCHEL DE ANDRADE

137 Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes LAURENCE BOISSON DE CHAZOURNES

151 A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil PAULO ROBERTO DE ALMEIDA

ANEXOS

193 Anexo I - Jurisprudência relativa ao Direito Internacional no Supremo Tribunal Federal (STF) Pesquisadores: Cynthia Danielle Siqueira, Kalki Zumbo Coronel Guevara e Patrícia Luciane de Carvalho

205 Anexo II - Jurisprudência relativa ao Direito Internacional no Superior

Tribunal de Justiça (STJ) Pesquisadores: Agda Silveira Machado e André Luiz Cosme Ladeia

223 Anexo III - Casos Contenciosos e Pareceres Consultivos da Corte

Internacional de Justiça (CIJ) Pesquisadores: Cláudio Antônio Júnior e Raquel Faria Pinto Coelho

229 Anexo IV - Tratados Internacionais Pesquisadores: Aziz Tuffi Saliba, Bernardo Hoffman Versieux, Camilla Capucio, Kalki Zumbo Coronel Guevara, Patrícia Luciane de Carvalho e Túlio César Mourthé de Alvim Andrade

245 Anexo V - Tabelas e dados relativos ao artigo “Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul” Autores: Clóvis Brigagão e Leonardo Paz Neves

APRESENTAÇÃO

A partir do diálogo entre o meio acadêmico e a sociedade civil, o Anuário Brasileiro de Direito Internacional tem como finalidade estabelecer no país, em definitivo, uma publicação semestral, com inserção internacional, engajada na promoção e consolidação de uma visão brasileira do Direito Internacional. Visa-se, assim, simultaneamente, contribuir para uma melhor compreensão do sistema normativo internacional, bem como assegurar um espaço para reflexão acerca de seus recentes desafios.

Neste terceiro número foram incluídos anexos que trarão jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça relativa ao Direito Internacional. Ainda, a citação dos casos conteciosos e dos pareceres consultivos da Corte Internacional de Justiça dos anos de 2003 a 2007, bem como referência aos tratados internacionais celebrados pelo Brasil no ano de 2007.

O objetivo é permitir a ampliação da pesquisa referente ao Direito Internacional e suas fontes, tanto no âmbito interno como no âmbito internacional.

Esta iniciativa é resultante da visão empreendedora do Centro de Direito Internacional - CEDIN, e conta com o relevante apoio da Fundação Alexandre de Gusmão - FUNAG, da Fundação Konrad Adenauer - FKA, do ramo brasileiro da International Law Association - ILA e do Centro Universitário UNA.

Leonardo Nemer Caldeira Brant

Belo Horizonte, julho de 2008.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 11

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo

ALBERTO DO AMARAL JÚNIOR*

Resumo

O presente artigo visa analisar os novos conflitos de normas advindos da sua expansão da regulamentação a partir do século XX devido à globalização. Com o risco da fragmentação, gerado por esta expansão, o presente estudo utiliza o novo método, denominado diálogo das fontes, para trazer subsídios na reconstrução da coerência do Direito Internacional contemporâneo. Argumenta, para tanto, a concepção de que o direito internacional constitui de um sistema que não se confunde com um mero conglomerado de regras, dispostas aleatoriamente, sem critérios que as organizem em um todo coerente.

Abstract

The current article has the purpose of analyse the new conflicts of norms brought about with the regulamentation expansion initiated in the 20th century due to the globalization phenomena. With the risk of being fragmented, brought about by this expansion, this study uses a new method, named as the dialogue of the sources, to contribute for the reconstruction of the contemporanean International Law coherence. In doing so, it is argued that the international law constitutes a system that is not confounded with a single set of rules randomly established without a criteria that would organize them as a consistent whole.

Introdução

No limiar do século XXI os efeitos da mundialização causados sobretudo pela revolução nas comunicações estendem-se indistintamente a todos os domínios da vida contemporânea. A cooperação por sua vez, adensou-se em setores tão variados quanto o comércio internacional, os direitos humanos, a exploração dos recursos marinhos e a preservação do meio ambiente. Combinados, estes fatores irão atingir fortemente o direito internacional.

É ainda fato inquestionável que as últimas décadas conheceram extraordinária expansão das normas jurídicas internacionais acompanhada da formação de hierarquia

* Alberto do Amaral Júnior é Professor de Direito Internacional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

12 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

normativa no direito internacional graças ao reconhecimento do jus cogens pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados.

Essa impressionante proliferação normativa entreabriu a probabilidade de conflitos normativos e aprofundou a tendência de fragmentação do direito internacional em múltiplos subsistemas dotados de lógica própria e fins específicos. Esses fatos suscitam a preocupação com a coerência do direito internacional, já que a presença de antinomias é indesejável não apenas por colocarem o intérprete diante de alternativas inconciliáveis, mas também porque impedem a realização da justiça.

Considero, na esteira de Norberto Bobbio, que a coerência não é condição de validade, mas é sempre uma condição para o justo ordenamento. As exigências de certeza (que corresponde ao valor da paz ou da ordem) e justiça (que corresponde ao valor da igualdade) desaparecem se o intérprete puder, indiferentemente, aplicar regras contraditórias. Se duas normas antinômicas coexistirem o ordenamento jurídico não conseguirá garantir nem a certeza, entendida como possibilidade de prever com exatidão as conseqüências de dada conduta, nem a justiça, entendida como igual tratamento entre aqueles que pertencem à mesma categoria.

Na tentativa de formular critérios que contemplem as múltiplas interações normativas, contesto, outrossim, o ponto de vista de que o direito internacional é um conglomerado de subsistemas desvinculados entre si. Proponho, ao contrário, um novo método, intitulado “diálogo” das fontes, sob a inspiração do trabalho pioneiro desenvolvido por Eric Jayme no âmbito do direito internacional privado. Longe de ignorar o ingente trabalho dos juristas para resolver as antinomias, que a doutrina consolidou em princípios comumente aceitos, indico a necessidade de um segundo método, que coexista com as soluções tradicionais. Trata-se de aplicar, simultânea, coerente e coordenadamente, as várias fontes do direito internacional de modo a eliminar a norma incompatível somente quando se verificar que a contradição que ela causa é insuperável. A coordenação flexível das fontes restabelece a coerência ao identificar complementaridades, convergências e harmonias. Nessa tarefa, a presunção contra o conflito, enfatizada por Wilfred Jenks há mais de meio século, cumpre função essencial. O “diálogo” das fontes vislumbra a totalidade das normas internacionais sem esquecer, obviamente, as especificidades que marcam os subsistemas particulares. O que se deseja é perceber o direito internacional como um sistema no qual a busca de unidade não faz desaparecer a singularidade das partes que o constituem, e que ele se sujeita a princípios que organizam os elementos individualmente considerados. Este artigo discute, pois, três questões:

1. o risco de fragmentação das normas internacionais causado pela existência de variados subsistemas;

2. a reconstrução da coerência do ordenamento jurídico internacional por intermédio do “diálogo” das fontes; e

3. o vínculo entre os vários tipos de “diálogo” das fontes e o tema da justiça no direito internacional contemporâneo.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 13

O Risco de Fragmentação do Direito InternacionalA aceleração da interdependência engendrada pelo advento da mundialização

alargou o campo regulatório do direito internacional a domínios que outrora pertenciam exclusivamente às relações diplomáticas. Esse processo, que se iniciou antes mesmo que a globalização se aprofundasse, ganhou vigor diante do imperativo de se buscar solução para os múltiplos problemas propostos pelas interações econômicas, sociais e políticas. Houve, em praticamente todos os setores da vida internacional, a produção de normas obrigatórias, dotadas de precisão, que delegam a um terceiro a tarefa de resolver os conflitos mediante a aplicação de regras jurídicas1.

Normas cada vez mais numerosas são necessárias para regular áreas que vão das telecomunicações à proteção do meio ambiente, da cooperação judiciária à instituição de cortes jurisdicionais, do aproveitamento dos recursos marinhos à proteção dos direitos humanos, do combate ao terrorismo à não proliferação de armas nucleares, do comércio multilateral aos acordos econômicos regionais. As regras de alcance universal convivem com a tendência de diferenciação com base no domínio das normas, na especificidade que possuem e no grau de desenvolvimento dos Estados.

A intensa regulação jurídica das relações internacionais contribuiu para elevar, de forma inusitada, a probabilidade de conflitos normativos. Joost Pauwelyn, ao examinar os fatores responsáveis pela proliferação dos conflitos entre as normas internacionais na atualidade, discrimina ao todo oito fatores, dos quais quatro são inerentes à formação das regras internacionais e quatro decorrem das transformações do direito internacional contemporâneo. No primeiro grupo2 merecem destaque:

a) A descentralização da produção normativa. Não é de se estranhar que na esfera internacional, marcada pela descentralização do poder, os conflitos normativos sejam até certo ponto naturais em função do crescente número de Estados. Os obstáculos para a obtenção do consenso estimulam a elaboração de normas vagas, passíveis de múltiplas interpretações, conforme a natureza dos interesses em jogo. A probabilidade de consenso diminui à proporção que um grande número de Estados participa das negociações de novos tratados, como sucede na OMC, circunstância que favorece o aparecimento de normas conflitantes no interior do mesmo regime ou entre regimes jurídicos diferentes.

b) O tempo. O fato de as normas internacionais terem, fundamentalmente, o mesmo valor normativo faz do tempo uma variável de grande relevância. A variedade e diversidade dos interesses estatais tornam o surgimento das normas uma conseqüência natural da passagem do tempo.

c) O processo de formação das normas internacionais. Afora as particularidades da vida internacional, a realidade interna dos Estados pode encorajar os conflitos normativos.

1 GOLDSTEIN, Judith et al. Introduction: legalization and world politics. In: ______ et al. (Org.). Legalization in world politics. Cambrid-ge: MIT Press, 2001. p.3. Cf. KAHLER, Miles. Conclusion: the causes and consequences of legalization. In: GOLDSTEIN, Judith et al. (Org.). op. cit., p.271-299. Cf. LEJBOWICZ, Agnès. Phiposophie du droit international: l´impossible capture de l´humanité. Paris: PUF, 1999. p.277-398.

2 PAUWELYN, Joost. Conflict of norms in public international law. op. cit., p.13-17.

14 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

No plano nacional, as negociações para a conclusão de tratados internacionais se fazem acompanhar de discussões que reúnem diplomatas, especialistas e representantes dos setores sociais interessados. Esses debates ampliam extraordinariamente o grau de especialização das questões e desenvolvem um estilo específico de abordar os problemas. Organizações não-governamentais, defensoras do livre-comércio ou da preservação do meio ambiente, pressionam para que sejam acolhidos os interesses que defendem.

As pressões avolumam-se, também, quando o parlamento aprecia um tratado já concluído a fim de inseri-lo no ordenamento jurídico doméstico. A disseminação dos grupos organizados, que privilegiam uma visão segmentada da realidade, fomenta os conflitos entre tratados. Este fenômeno contagia o direito internacional costumeiro, que depende da ampla aceitação dos destinatários.

d) A ausência de uma corte com jurisdição geral e compulsória encarregada de zelar pela aplicação das normas internacionais. A carência de um órgão centralizado impede, em muitos casos, a gestão adequada das relações internacionais por intermédio da solução pacifica das controvérsias. A pluralidade de instâncias jurisdicionais cria o risco de que os conflitos venham a ser resolvidos de forma diversa e até mesmo contraditória.

Afora esses fatores, Joost Pauwelyn acrescenta as seguintes causas dos conflitos de normas internacionais3:

1º) A passagem das normas de coexistência para as normas de cooperação. Os enfoques tradicionais vinculados à soberania territorial, às relações diplomáticas e aos domínios da guerra e da paz deram lugar à cooperação nas áreas do comércio, meio ambiente e direitos humanos. O vertiginoso aumento do número de tratados multilaterais precipitou não só os conflitos entre normas de diferentes subsistemas, a exemplo do que acontece entre os acordos da OMC e os tratados ambientais, mas também entre as regras de um mesmo subsistema, como se verifica entre as regras da OMC.

2º) A globalização. A aceleração da interdependência, efeito imediato do processo de globalização, potencializou a perspectiva de novos conflitos entre tratados internacionais, que obedecem a motivos os mais variados. Acordos de liberalização comercial colidem com normas internacionais instituídas para garantir objetivos de caráter social.

3º) A hierarquia de valores. O conceito de jus cogens, previsto pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, exprime a convicção de que as normas internacionais não se encontram no mesmo patamar. O reconhecimento de que certas normas são superiores às demais é uma causa potencial de conflitos.

4º) A ampliação da solução jurídica das controvérsias. A generalização dos meios jurídicos de solução dos litígios repercute nos conflitos entre as normas de direito internacional. Julgamentos proferidos em determinadas instâncias, como a OMC, tendem a afetar setores que ultrapassam o comércio propriamente dito.

3 PAUWELYN, Joost. Conflict of norms in public international law. op. cit., p.17-23.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 15

Outras razões militam, ainda, em prol da intensificação dos conflitos entre tratados. O regionalismo comandou a formação, em todos os continentes, de múltiplos acordos sobre uma gama rica e complexa de temas. A cooperação regional possibilita, muitas vezes, a adoção de medidas que não seriam factíveis em escala mais ampla. Jenks4 aponta as possíveis vantagens dos acordos regionais: tratar de problemas a respeito dos quais é prematuro ou pouco significativo estabelecer regras de alcance mundial; prescrever standards mais elevados e medidas de maior abrangência, além de aprofundar o grau de unificação do direito; fortalecer a uniformidade do direito em uma região e possibilitar a ação concertada tendo em vista a execução de um instrumento internacional que imponha certas obrigações. O regionalismo trouxe à baila a perspectiva de conflito entre os tratados regionais e os tratados universais que lidam com matérias idênticas. Nem sempre é fácil compatibilizar os acordos subscritos pelos componentes de uma sub-região e os acordos regionais com os quais eles se relacionam.

No direito internacional, a antinomia se caracteriza pela existência de normas incompatíveis, de sorte que o intérprete não pode aplicar as duas regras ao mesmo tempo. As incompatibilidades são de três tipos:

1. entre uma norma que ordena um comportamento e uma norma que proíbe o mesmo comportamento;

2. entre uma norma que ordena fazer algo e outra que permite não fazer; e3. entre uma norma que proíbe fazer e outra que permite fazer.As antinomias aparentes são aquelas resolúveis pela aplicação dos critérios

cronológico, hierárquico e de especialidade. Já as antinomias insolúveis são as que se identificam pela falta de critérios para sua resolução ou pelo conflito entre os critérios hierárquico e de especialidade, concebidos como critérios fortes em relação ao critério cronológico. Aventa-se, a título ilustrativo, a hipótese de conflito entre uma norma superior-geral (norma de jus cogens) e uma norma inferior-especial. Em princípio, deve prevalecer a norma de jus cogens, que integra parte da ordem pública internacional e é expressão dos valores essenciais para a convivência coletiva, mas não se descarta que, na prática, a exigência de adaptar os princípios gerais de direito internacional às novas situações culmine com a preponderância da norma especial.

Uma das mais sérias dificuldades que as antinomias ensejam prende-se ao caráter do contencioso internacional. Este é, nas palavras de Rousseau, um contencioso de interpretação ou de indenização, jamais, diretamente, um contencioso de anulação. Isto quer dizer que haverá sempre uma certa margem de incompatibilidade quase insuperável, em conformidade com os procedimentos técnicos do direito positivo.

O direito internacional experimentou na segunda metade do século XX intenso processo de fragmentação, responsável pelo aparecimento de múltiplos regimes normativos, muitos dos quais incompatíveis entre si. Vários fatores concorreram para potencializar a força irradiadora desse fenômeno, a saber: a proliferação das regras internacionais; o aumento da fragmentação política (justaposta à crescente

4 JENKS, Wilfred. Conflict of law-making treaties. British Yearbook of International Law, London, v.30, p.401, 1953.

16 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

interdependência global e regional em áreas como a economia, o meio ambiente, a energia, a saúde e a expansão das armas de destruição em massa); a regionalização do direito internacional em virtude do aumento de instâncias regionais de produção normativa; a emancipação dos indivíduos em face dos Estados nacionais e a especialização da atividade regulatória internacional5.

A fragmentação atinge, indistintamente, as normas primárias e as normas secundárias do direito internacional. A probabilidade de conflitos normativos se acentua com o avanço do regionalismo, pois o sistema normativo criado no plano regional é, muitas vezes, mais específico que os regimes globais e mais abrangente que os regimes domésticos. Diversas regras internacionais podem, desse modo, ser aplicadas à mesma situação, fato que entreabre a perspectiva de colisão entre as obrigações que incumbem aos Estados. Esta circunstância exige argumentos complexos para se identificar qual norma deverá prevalecer, e ameaça provocar mais conflitos que aqueles resolvidos pela criação de regimes particulares.

Concomitantemente, a fragmentação alcança as normas procedimentais na medida em que o foco do direito internacional se desloca da produção de normas substantivas de natureza geral para o desenvolvimento de mecanismos voltados à solução de disputas. A multiplicação das regras secundárias enseja a possibilidade de soluções divergentes capazes de corroer a autoridade e a credibilidade das instituições e do próprio direito internacional. Hafner menciona que a fragmentação tem efeitos positivos ao elevar o grau de obediência às normas internacionais. Nesse sentido, os Estados estariam mais inclinados a obedecer às regras particulares que melhor refletem as especificidades de determinado setor. Os efeitos negativos da fragmentação, por outro lado, se fazem sentir na visibilidade das contradições do processo regulatório expressa sobretudo na previsão de obrigações incompatíveis.

Em instigante reflexão sobre o tema, Günther Teubner e Andréas Fischer-Lescano partem da hipótese formulada em 1971 por Niklas Luhmann, para quem o direito global se fragmentaria ao longo de linhas sociais e setoriais e não ao longo de linhas territoriais. O motivo seria a transformação das expectativas normativas (como as expectativas políticas, morais e religiosas) em expectativas cognitivas, nos campos da tecnologia, da ciência e da economia; essa transformação ocorre na transição das sociedades nacionalmente organizadas para a sociedade global. Segundo Teubner e Fischer-Lescano, a fragmentação do direito global é mais profunda que qualquer perspectiva reducionista de natureza jurídica, política, econômica ou cultural. Ela é, para os autores citados, o reflexo efêmero da fragmentação multidimensional da sociedade global dos nossos dias6. A aspiração de unidade normativa estaria, em princípio, condenada ao fracasso, já que não existe um metanível que solucione os conflitos jurídicos na sociedade global. Na opinião de Teubner e Fischer-Lescano

5 HAFNER, Gerhard. Pros and cons: ensuing from fragmentation of international law. Michigan Journal of International Law, Ann Arbor, v.25, n.4, p.849-850, 2004.

6 TEUBNER, Günther; FISCHER-LESCANO, Andreas. Regime-collisions: the vain search for legal unity in the fragmentation of global law. Michigan Journal of International Law, Ann Arbor, v.25, n.4, p.999-1046, 2004. Cf. TEUBNER, Günther. Globlal Bukowina: legal pluralism in the world society. In: ______ (Org.). Global law without a state. Aldershot: Darmouth, 1997. p.3-28.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 17

não se pode combater a fragmentação ora existente, mas apenas buscar uma fraca compatibilidade normativa dos diferentes fragmentos. Este fato depende, contudo, da habilidade das regras de conflito para estabelecer uma rede específica que reduza os efeitos das unidades colidentes7. Seja como for, o risco de fragmentação obriga o investigador a examinar se existe, efetivamente, possibilidade de coerência no direito internacional contemporâneo.

O “Diálogo” das Fontes No Curso Geral ministrado na Academia de Haia, em 1995, Erik Jayme enfatizou

que a pluralidade das fontes, própria do direito pós-moderno, requer a coordenação das leis no interior do sistema jurídico. Esta é uma condição para a eficiência e a justiça numa época marcada pela tendência de se legislar sobre matérias as mais variadas, muitas vezes convergentes, tanto no direito interno quanto no direito internacional8.

A doutrina mais recente não esconde a intenção de buscar a harmonia entre as normas, solução preferida à mera exclusão de uma delas pelos critérios tradicionais para a resolução das antinomias. Trata-se, pois, da “coerência derivada ou restaurada”, necessária para a eficiência funcional do sistema plural e complexo dos nossos dias. Erik Jayme não abdica do labor secular dos juristas para resolver as antinomias, mas sugere um segundo método, a coordenação das fontes, que deve coexistir com as soluções tradicionais9.

A coerência se restabelece pela coordenação flexível e útil das fontes: a descoberta da finalidade das normas se dá por meio da convivência e do “diálogo” entre elas. Jayme batizou de “diálogo” das fontes a aplicação simultânea, coerente e coordenada de fontes legislativas convergentes10. Essa expressão, para além do seu tom quase poético, aponta para um novo modo de encarar a coexistência das normas. A eliminação da norma incompatível não é abandonada mas é uma via extrema a ser usada quando todos os outros recursos falharam. Em artigo pioneiro, Claudia Lima Marques11, de forma magistral, transpôs a concepção de Jayme à realidade brasileira para analisar a relação entre o Código de Defesa do Consumidor e o Novo Código Civil de 2002.

As idéias seminais do grande mestre de Heidelberg, concebidas no âmbito do direito internacional privado, caem como uma luva para explicar as interações entre as regras que compõem um subsistema específico e a totalidade das normas do direito internacional público. Nos últimos tempos, tratados nos mais diferentes domínios se multiplicaram em escala vertiginosa e deram origem a subsistemas normativos que reclamam coordenação, sob pena de causarem a fragmentação e a perda de unidade do direito internacional. A pluralidade, a complexidade, a fluidez e o dinamismo se tornaram características das normas internacionais. Nesse ambiente o “diálogo” das

7 TEUBNER, Günther; FISCHER-LESCANO, Andreas. op. cit., p.999-1046.8 JAYME, Erik. Identité culturelle et intégration: le droit international privé postmoderne. Recueil des Cours, Leiden, v.251, p.60, p.251,

1995.9 JAYME, Erik. op. cit., p.60.10 Ibid., p.259.11 MARQUES, Claudia Lima. Diálogo entre o Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil: do “diálogo” das fontes no combate

às cláusulas abusivas. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, n.45, p.71-99, jan.-mar. 2003.

18 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

fontes é instrumento de grande valia porque facilita a comunicação dos subsistemas entre si e com as regras gerais do direito internacional.

A utilidade que proporciona reside em captar o modo de relacionamento entre normas pertencentes a subsistemas diversos segundo o princípio de coerência, que, numa era de proliferação normativa, busca conferir harmonia ao processo de aplicação do direito internacional. Consiste em recurso hermenêutico precioso para compreender a complexidade e o alcance das relações normativas surgidas a partir da expansão regulatória do direito internacional na última metade do século XX e no limiar do século XXI.

O “diálogo” das fontes tem lugar entre regras horizontais, que se encontram no mesmo nível hierárquico. Difere, assim, da relação normativa hierárquica, que passou a dominar o direito internacional com o reconhecimento do jus cogens pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados. Nesse caso não há, a rigor, um “diálogo”, mas um “monólogo”, porque as regras superiores preponderam necessariamente sobre aquelas que se situam em patamar inferior. Conclui-se, por isso, que os tratados de um subsistema particular se sujeitam às normas de jus cogens em razão da superioridade que preside o relacionamento entre tais regras.

Com efeito, o “diálogo” das fontes não é estranho à tradição do direito internacional público, fato que a presunção contra o conflito, formulada há mais de meio século por Wilfred Jenks, tão bem espelhou. A presunção contra o conflito radica na suposição de que a nova norma é compatível com o direito internacional que vigia antes da sua criação. Pressupõe-se que os Estados, quando a produção normativa se consuma, levam em conta as regras em vigor na esperança de buscar harmonia entre o velho e o novo direito.

A conseqüência imediata que deflui desse raciocínio é a necessidade de referência expressa por parte da nova norma editada ao desejo de regular de modo diferente a matéria em questão. A falta de menção clara nesse sentido não autoriza a presumir a intenção dos Estados em se afastar da disciplina jurídica que vigorava. Nessas condições, por ser a coerência a situação de normalidade, compete à parte que alegar o conflito a incumbência de prová-lo. O intérprete deve preferir a interpretação capaz de harmonizar o significado das duas normas se estiver diante de outras alternativas que tornem inevitável a colisão normativa.

Essa presunção compreende, ao mesmo tempo, as cláusulas pertencentes a dado compromisso e a relação entre tratados diferentes. Parece legítimo presumir que, em princípio, as disposições de um tratado, elaboradas amiúde ao final de exaustivas negociações, sejam harmônicas entre si e não contrariem os tratados previamente celebrados. Obrigações contraditórias dificultam a inteligibilidade do que foi acordado e ameaçam, quase de forma irremediável, o cumprimento integral das finalidades originariamente perseguidas12.

Presume-se que os governos não pretendam envolver-se em enlaces incompatíveis com os tratados existentes, salvo se, sem nenhum rodeio, deixarem patente essa

12 JENKS, Wilfred. op. cit., p.401-453.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 19

intenção. Foge à razoabilidade acreditar que os Estados, voluntariamente, despendam demorados esforços para produzir regras incompatíveis que, na prática, colocam por terra tudo quanto os entendimentos diplomáticos conseguiram projetar. Não se imagina, por igual, que os Estados, ao se engajarem em múltiplos vínculos convencionais, venham a estabelecer obrigações que se entrechoquem e possam erodir a unidade finalística da política externa. A presunção que evita o conflito seria uma aplicação detalhada dos princípios fundamentais da interpretação dos tratados, como o princípio da razoabilidade, o princípio da boa-fé e a presunção de compatibilidade no direito internacional13. Ao contrário da posição defendida por Jenks, não vinculo a presunção contra o conflito à definição restritiva de antinomia. É plausível enfatizar o relevo da presunção contra o conflito e defender um conceito amplo de antinomia, mais apto para abarcar as diferentes hipóteses de colisão normativa.

A jurisprudência da CIJ acolheu, de forma ampla, a presunção contra o conflito na interpretação do direito internacional. No caso Direito de Passagem, a CIJ estimou que: “It is a rule of interpretation that a text emanating from a Government must, in principle, be interpreted as producing and as intended to produce effects in accordance with existing law and not in violation of it.” 14 A Corte reiterou esse entendimento no caso Certas Despesas em relação aos atos provenientes das organizações internacionais. “When the organization takes action which warrants the assertion that it was appropriate for the fulfillment of one of the stated purpose of the United Nations the presumption such action is not ultra vires the Organization”15.

No plano da OMC o painel do caso Indonesia – Autos16 e o Órgão de Apelação nos casos Canada – Periodicals, EC – Bananas III e Guatemala – Cement I17 fizeram uso da presunção contra o conflito para sublinhar a coerência interna dos acordos que integram o sistema multilateral de comércio. No caso Argentina – Textiles and Apparel, o Órgão de Apelação afirmou inexistir conflito entre os tratados da OMC e as obrigações que a Argentina assumira perante o FMI.

Em que pese a manifesta utilidade, a presunção contra o conflito não se aplica indistintamente em todas as circunstâncias. Ela sofre limitações que lhe restringem a abrangência, mas que não lhe diminuem o valor hermenêutico para a interpretação das normas internacionais. A presunção contra o conflito, ao postular a continuidade, não pode tolher a mudança por meio da interpretação restritiva das obrigações violadas. Trata-se aqui de procurar equilíbrio entre a estabilidade e a evolução, duas exigências que acompanham inexoravelmente o desenvolvimento de qualquer sistema normativo.

Além disso, a presunção contra o conflito não é absoluta, pois não se aplica a toda e qualquer situação. Não prevalece, lembra Jenks, contra a linguagem clara ou a clarividência da intenção das partes. Não será, também, suficiente para reconciliar dispositivos claramente irreconciliáveis. Se duas normas vierem a colidir não é

13 JENKS, Wilfred. op. cit., p.401-453.14 Caso Direito de Passagem, p.142.15 Caso Certas Despesas, p.168.16 Panel Report, Indonesia – Autos, par. 14.29-14.36, 14.97-14.99.17 Appellate Body Report, Guatemala – Cement I, par. 65.

20 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

possível, pela interpretação de qualquer dos dispositivos, superar o conflito que se anunciava. O intérprete, não raro, fracassa na consecução desse intento. A presença de normas irreconciliáveis reclama a existência de um critério que sirva, efetivamente, de orientação ao julgador. O critério em causa pode encontrar-se na cláusula de conflito inserida em um tratado ou numa regra de direito internacional geral, como o artigo 30 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados.

É fácil perceber que a presunção contra o conflito é eficaz para resolver as situações em que não há uma verdadeira incompatibilidade e a interpretação é hábil para conciliar as normas antagônicas. Não elimina, contudo, os conflitos reais que postulam critérios diferentes para a sua resolução.

Essa desejabilidade intrínseca confronta-se com a pluralidade de demandas formuladas por grupos sociais domésticos que acabam por resultar na conclusão de tratados com cláusulas contraditórias, cuja conciliação é impossível.

O “diálogo” das fontes, que a presunção contra o conflito favorece, pressupõe compreender o direito internacional como um sistema, dotado de um repertório e de uma estrutura. O repertório é composto pelas normas internacionais: tratados, costumes e princípios gerais de direito, além das definições e da ordem em que os elementos aparecem em uma norma; já a estrutura é um conjunto de regras que determinam o relacionamento entre os elementos do repertório. Tais regras têm origem empírica, lógica e valorativa, pois se baseiam, respectivamente, na soberania, vertente da ordem internacional de Westfália, no postulado lógico de não-contradição e no valor da hierarquia, que recomenda a obediência às normas superiores. A presunção contra o conflito é uma regra estrutural, já que deriva do princípio de não-contradição, pressuposto para a coerência das normas internacionais.

O “diálogo” das fontes é condição necessária para a ordem e a justiça do direito internacional ao enfatizar a coerência das normas que o integram. É sabido que a paz, a estabilidade e a previsão dos comportamentos estão associadas ao valor da ordem na vida social; tais objetivos não se realizam se normas contraditórias fornecerem aos homens orientações opostas, deixando-os em situação de permanente incerteza. A justiça, por outro lado, no pensamento filosófico ocidental, guarda estreita relação com a igualdade: todos concordam que ser justo é tratar da mesma forma os seres que possuem a mesma característica, razão pela qual é possível agrupar os detentores dessa característica em uma única classe ou categoria. A justiça consistirá, pois, na atribuição de igual tratamento aos sujeitos que pertencerem a essa classe ou categoria. Essa é uma acepção formal ou abstrata da justiça porque se contenta em vedar as distinções sem dizer, por exemplo, quando dois seres fazem parte da mesma classe nem como é preciso tratá-los. A incoerência entre as normas jurídicas é fonte de injustiça ao dispensar consideração desigual àqueles que pertencem à mesma classe ou categoria. O “diálogo” das fontes restabelece a coerência, requisito da justiça formal, não ao eliminar a norma incompatível, como acontece com os critérios tradicionais para a solução das antinomias, mas na importância dada à compatibilidade entre os elementos que compõem o sistema normativo.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 21

O “diálogo” das fontes é útil, também, para a realização da justiça concreta, entendida como a estipulação do valor que organiza as relações sociais e define o que é legítimo em determinado momento histórico. Esse fato se verifica, especialmente, quando uma das normas que dialoga apresenta conteúdo variável, vago ou indeterminado, sendo necessário, por isso, recorrer às valorações internacionais predominantes para garantir a sua aplicação. Expressões como moralidade pública, proteção à vida ou à saúde humana, vegetal ou animal e recursos naturais, entre outras, reclamam o apelo a valores, experiências e conceitos que transcendem o ordenamento jurídico propriamente dito e o colocam em contato direto com o sistema social no qual ele se insere. A elucidação do significado de tais normas obriga o intérprete a analisar o sentido das normas posteriormente criadas e os valores que se cristalizaram na vida internacional para saber o que deve ser aceito ou recusado. Amplia-se, em conseqüência, a legitimidade do direito internacional na medida em que ao processo de interpretação se incorporam expectativas, conhecimentos e valores surgidos após o aparecimento da norma. Não é difícil perceber nesse procedimento a natureza aberta, flexível e dinâmica do direito internacional manifestada na capacidade de adaptação às mudanças posteriormente ocorridas. A justiça concreta se realiza, nesse caso, pela ação direta do intérprete e não como fruto do processo criador de novas normas jurídicas. Sem nenhuma pretensão de exaurir o assunto, distingo, no direito internacional, três “diálogos”, mas reconheço que, conforme o ângulo adotado, outros “diálogos” poderão ocorrer.

O “Diálogo” Sistemático de CoerênciaEste “diálogo” surge quando um tratado, por revestir caráter geral, fornece

os conceitos básicos para aplicação de um tratado específico constitutivo de um subsistema de normas que não é materialmente completo, a exemplo da aplicação das regras sobre validade, retroatividade, interpretação e conflitos entre tratados. É irrecusável, sob esse aspecto, o papel que a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados cumpre na solução dos litígios que envolvem a violação dos compromissos firmados no âmbito da OMC. A vitalidade do “diálogo” sistemático de coerência deflui dos próprios instrumentos constitutivos do sistema multilateral de comércio quando estes invocam outras normas internacionais, numa confissão explícita da incompletude que os caracteriza.

O preâmbulo do Acordo sobre Medidas Sanitárias e Fitossanitárias estimulou a adoção pelos governos de providências com base em normas, guias e recomendações elaboradas pelas organizações internacionais competentes, entre as quais a Comissão do Codex Alimentarius, o Escritório Internacional de Epizootias e as organizações internacionais e regionais que operam no contexto da Convenção Internacional sobre Proteção Vegetal. “Presumir-se-ão como necessárias à proteção da vida ou da saúde humana, animal e vegetal, assim como serão consideradas compatíveis com as disposições pertinentes do presente Acordo e do GATT 1994 as medidas sanitárias e fitossanitárias que estejam em conformidade com normas, guias e recomendações

22 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

internacionais” (artigo 3.2). Os membros podem introduzir ou manter medidas sanitárias e fitossanitárias que resultem em nível mais elevado de proteção sanitária ou fitossanitária do que se alcançaria com medidas baseadas em normas, guias ou recomendações internacionais competentes, se houver uma justificação científica, ou como conseqüência de padrões mais rigorosos que as autoridades domésticas venham a instituir (artigo 3.3). O artigo 2º do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio, por sua vez, dispõe:

1. Com relação às Partes II, III e IV deste Acordo, os Membros cumprirão o disposto nos Artigos 1 a 12, e 19, da Convenção de Paris (1967).

2. Nada nas Partes I a IV deste Acordo derrogará as obrigações existentes que os Membros possam ter entre si, em virtude da Convenção de Paris, da Convenção de Berna, da Convenção de Roma e do Tratado sobre a Propriedade Intelectual em Matéria de Circuitos Integrados.

O “Diálogo” de Coordenação e AdaptaçãoO referido “diálogo” decorre da necessidade de coordenar tratados isolados e

subsistemas normativos de modo a constituírem um todo dotado de sentido. Se a eclosão de conflitos entre tratados não pode ser totalmente suprimida,

algumas providências têm o condão de diminuir a sua incidência. A realização de consultas mútuas auxilia a descobrir possíveis contradições entre instrumentos internacionais que versam matérias análogas.18 Esse expediente não é, por certo, apanágio exclusivo de diplomatas e funcionários governamentais que negociam em nome e no interesse de Estados determinados. As organizações internacionais têm se valido dele com freqüência cada vez maior nas últimas décadas. No passado, a OIT o utilizou na preparação de convenções sobre temas pertencentes à área de atuação da FAO, UNESCO e OMS.

A colaboração interorganizacional estimulada por múltiplos acordos de cooperação favorece a circulação de informações, eleva o grau de transparência e facilita o conhecimento das atividades de outras instituições. Conseqüentemente, é muito mais fácil saber quais instrumentos se encontram em vigor na esfera em que atuam a fim de atenuar os riscos de conflitos futuros. É sabido que a cooperação interorganizacional traz benefícios para a governança internacional ao incentivar a harmonia decisória, fator essencial para aliviar o efeito das dissonâncias cognitivas no campo das relações internacionais.

A OMC celebrou a esse respeito acordos de cooperação com o FMI, o Banco Mundial e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual. A divulgação ampla de informações sobre o teor dos acordos que os Estados firmaram pode prevenir conflitos que fatalmente ocorreriam com a intensa produção de normas internacionais. Medida salutar nessa direção consta no artigo 102 da Carta da ONU, que impõe o registro e a publicação pelo Secretariado dos tratados e acordos internacionais de que sejam partes os membros da Organização das Nações Unidas.

18 PAUWELYN, Joost. Conflict of norms in public international law. op. cit., p.237-240.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 23

Salmon comenta que as declarações de compatibilidade desejam tornar compatível o novo tratado com acordos anteriores ou futuros que cuidem da mesma matéria. É até certo ponto comum a inserção no texto convencional de critérios hierárquicos indicativos da ordem de prioridade entre os tratados. As cláusulas assim redigidas primam por declarar que os tratados não são incompatíveis, de modo que a interpretação de um dos instrumentos não afetará os direitos e obrigações que o outro estabelece. Se um dos compromissos contiver semelhante declaração que lhe dá, na hipótese, uma condição de inferioridade, o artigo 30, parágrafo 2º, da Convenção de Viena, exige que ele seja interpretado com o propósito de se buscar a compatibilidade com o tratado superior. Se esse esforço interpretativo fracassar, a preponderância do tratado superior é a solução que naturalmente se impõe em conformidade com o artigo 30, parágrafo 2º. Elaborado para contornar eventuais antagonismos normativos, o artigo 21 do Pacto da Sociedade das Nações indicou: “Os compromissos internacionais, tais como os tratados de arbitragem, e os acordos regionais, como a doutrina de Monroe, destinados a assegurar a manutenção da paz, não serão considerados como incompatíveis com nenhuma das disposições do presente Pacto.”

A Carta da ONU afirmou, mais de uma vez, que os artigos nela constantes não afetam outros acordos existentes. O artigo 51 deixou claro:

Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva, no caso de ocorrer um ataque armado contra um membro das Nações Unidas, até que o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais. As medidas tomadas pelos membros no exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente ao Conselho de Segurança e não deverão de modo algum atingir a autoridade e a responsabilidade que a presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito, em qualquer tempo, a ação que julgar necessária à manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais.

Na esfera das declarações de compatibilidade entre os tratados põe-se, não raro, o problema da preservação dos direitos de terceiros. O artigo 22 da Convenção sobre Diversidade Biológica diz que:

1. As disposições desta Convenção não devem afetar os direitos e obrigações de qualquer Parte Contratante decorrentes de qualquer acordo internacional existente, salvo se o exercício desses direitos e o cumprimento dessas obrigações cause grave dano ou ameaça à diversidade biológica.

No mesmo sentido o artigo 311, § 3º, da Convenção de Montego Bay sobre o Direito do Mar, afirma:

Dois ou mais Estados Partes podem concluir acordos, aplicáveis unicamente às suas relações entre si, que modifiquem as disposições da presente Convenção ou suspendam a sua aplicação, desde que tais acordos não se relacionem com nenhuma disposição cuja derrogação seja incompatível com a realização efectiva do objeto e fins da presente Convenção e desde que tais acordos não afectem a aplicação dos princípios

24 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

fundamentais nela enunciados e que as disposições de tais acordos não afectem o gozo por outros Estados Partes dos seus direitos ou o cumprimento das suas obrigações nos termos da mesma Convenção.

O artigo XXIV do GATT previu, como exceção ao artigo I relativo à cláusula de nação mais favorecida, a formação de áreas de livre-comércio e uniões aduaneiras.

Os acordos concluídos deveriam ser notificados ao GATT, a quem incumbia examinar a compatibilidade com o artigo XXIV e sugerir os ajustes que se fizessem necessários. Aqui o que se busca é compatibilizar o direito definido no plano mundial e as regras estabelecidas pelos subconjuntos e atribuir à OMC a supervisão dessa compatibilidade19. Há, nessa perspectiva, uma coerência lógica na medida em que o direito mundial é concebido como superior, e uma coerência econômica, pois o regionalismo aberto aparece como estágio intermediário do processo de globalização.

No plano das normas secundárias é possível reconhecer a existência de coordenação entre os meios de solução de disputas previstos pelos tratados multilaterais ambientais e as regras sobre solução de controvérsias na Organização Mundial do Comércio. Assim, por exemplo, as decisões tomadas no âmbito dos procedimentos de controle de não execução das obrigações dos tratados ambientais, desde que vinculantes para os membros da OMC, serão levadas em conta pelos painéis e pelo Órgão de Apelação de acordo com o artigo 31.3 (c) da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados. Considerações acerca do cumprimento dos tratados ambientais, bem como as conclusões obtidas pelos órgãos criados para esse fim, serão úteis para julgamento de casos na OMC. A ausência de consulta prévia no contexto de um acordo ambiental não só comprova a má-fé do Estado que age de forma unilateral como também viola o princípio do devido processo, em contradição com o caput do artigo XX do GATT.

Convém lembrar que o artigo 13 do ESC habilita os painéis a solicitar às partes ou a alguma outra instância informações relevantes, como as evidências colhidas pelos órgãos que se ocupam da solução de controvérsias em jurisdições diferentes. O exame a ser procedido deve ponderar os fatos produzidos para que se tenha a noção exata do comportamento das partes em face das restrições comerciais decretadas em virtude da violação das obrigações contidas nos tratados ambientais. O respeito ao procedimento que comprova a não execução das obrigações dos tratados ambientais é um símbolo indicativo da prática estatal, útil para aferir o cumprimento das obrigações contraídas. A eventual imposição de restrições comerciais, nos termos do tratado ambiental, seria um importante argumento para legitimar a aplicação do artigo XX do GATT.

A participação de um membro da OMC no mecanismo que verifica o cumprimento dos tratados ambientais assinala a boa-fé para negociar uma solução que pode evitar a disputa e a conseqüente imposição de sanções pelo órgão institucional criado para esta finalidade. Os painéis da OMC podem, igualmente, requerer informações ao Secretariado sobre um acordo ambiental ou usar as análises e dados coletados durante o controle de não execução das obrigações. Nada proíbe que os painéis se refiram a

19 FABRI, Hélène Ruiz. La contribution de l’Organisation Mondiale du Commerce à la gestion de l’espace juridique mondial. op. cit., p.363-364.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 25

afirmações de testemunhas ou a outros elementos produzidos graças à atuação dos procedimentos contemplados pelos tratados ambientais e sujeitos à obrigação de confidencialidade. O artigo 13.2 e o Anexo 4 do ESC dispõem que os painéis podem se socorrer das opiniões e conselhos de grupos de especialistas sobre as matérias fáticas, científicas ou técnicas abordadas em qualquer disputa proposta perante a OMC. Este artigo é um importante instrumento a ser empregado pelos painéis para obter informações colhidas pelos órgãos dos tratados ambientais.

Apesar do pronunciamento de outras instâncias jurisdicionais sobre o caso, cai por terra qualquer possibilidade de se alegar coisa julgada por ocasião de uma controvérsia suscitada na OMC, porque, a despeito da identidade das partes e da conexão das matérias discutidas, as obrigações, o procedimento e as sanções aplicáveis são diferentes, fato que inutiliza a argüição de coisa julgada pelo simples motivo de que os mecanismos de solução de controvérsias são disciplinados por tratados diversos.

Em virtude do disposto no artigo 23 do ESC é improvável que os painéis da OMC declinem a jurisdição que lhes foi concedida ou venham a acatar as decisões prolatadas por outros tribunais. Tais decisões confirmam a existência de regras relevantes de direito internacional público aplicáveis entre as partes que deveriam ser consideradas quando da interpretação dos dispositivos dos tratados da OMC. É legítimo buscar os órgãos jurisdicionais da OMC antes ou depois que uma instância específica tenha abordado os aspectos ambientais da questão.

O “Diálogo” Sistemático de ComplementaridadeVerifica-se, nesse caso, sempre que couber, a aplicação complementar das normas

e dos princípios que as informam. Observa-se com freqüência, nos tratados de direitos humanos, o uso de cláusulas, inseridas em instrumentos mais antigos, para a interpretação de dispositivos semelhantes de acordos posteriormente celebrados. O primeiro parecer da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que veio à luz em 1982, enfatizou a interação entre os instrumentos universais e regionais que vigoram nesse domínio. O décimo parecer da Corte, emitido em 1989, retoma o assunto ao mencionar que as regras sobre direitos humanos da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA) devem ser integradas à Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem de 1948. Esse procedimento acentua a uniformidade interpretativa e a precisão das obrigações convencionais, efeitos que realçam a preocupação com a unidade finalística das normas existentes. O princípio da interpretação teleológica repudia, igualmente, que se circunscreva o alcance de dispositivo, constante em um tratado em vigor, nos termos das cláusulas de limitação de direitos que figurem em outra convenção sobre direitos humanos firmada pelo mesmo Estado. A complementaridade, assim percebida, deseja oferecer aos seres humanos protegidos a mais ampla tutela dos seus interesses e se funda na interpretação restritiva das cláusulas que venham a limitar os direitos já instituídos.

A unidade entre os tratados de direitos humanos é perceptível, também, na aplicação do critério da norma mais favorável às vítimas de alguma violação

26 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

eventualmente perpetrada. A polêmica entre monistas e dualistas sobre a primazia do direito internacional ou do direito interno não parece, nesse plano, ter relevância, já que prevalece a norma mais favorável às vítimas, a despeito da sua origem. Surge assim uma nova permeabilidade normativa a diluir a separação absoluta entre o direito internacional e o direito doméstico, motivo de previsão expressa em vários tratados recentes. O artigo 5(2) do Pacto dos Direitos Civis e Políticos impede a restrição ou derrogação aos direitos humanos reconhecidos ou vigentes em qualquer Estado parte, em razão de outras convenções, ou de leis, regulamentos ou costumes, “a pretexto de que o presente Pacto não os reconheça ou os reconheça em menor grau”. A Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados (artigo 5) e a Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas (artigo 5) determinam que as suas disposições não prejudicarão os direitos e vantagens conferidos aos refugiados e aos apátridas por outras normas.

A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher e a Convenção sobre os Direitos da Criança declaram, no mesmo sentido, respectivamente, nos artigos 23 e 41, que as estipulações nelas contidas não restringirão as disposições tendentes a favorecer a igualdade entre homens e mulheres e a realização dos direitos da criança consagradas nas leis de um Estado parte ou em qualquer outra convenção, tratado ou acordo internacional vigente nesse Estado. O mesmo espírito orientou, na esfera regional, a elaboração dos artigos 17(1) da Convenção Européia para Prevenção da Tortura e Tratamento ou Punição Desumano ou Degradante e do artigo 60 da Convenção Européia de Direitos Humanos, bem como do artigo 29 da Convenção Americana Sobre Direitos Humanos e do artigo 4º do Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, denominado Protocolo de San Salvador. Ao atenuar a perspectiva de conflito, o critério de aplicação da norma mais favorável coordena os tratados que se inspiram nos mesmos propósitos. Referida coordenação tem lugar, tanto no nível vertical, entre tratados e leis domésticas, quanto no nível horizontal entre dois ou mais tratados. O objetivo primordial é, em todos os casos, verificar qual é a norma que dispensa maior proteção às vítimas de violações dos direitos humanos.

O “diálogo” sistemático de complementaridade exibe enorme relevância quando se trata de relacionar as normas sobre comércio internacional, sobre a preservação do meio ambiente e a proteção dos direitos humanos. O artigo XX do GATT de 1994 favorece o “diálogo” com os demais subsistemas do direito internacional, designadamente com os tratados multilaterais ambientais e com as convenções que protegem os direitos humanos.

Muitos tratados ambientais afetam, direta ou indiretamente, a atividade econômica, mas poucos ousaram estatuir sanções comerciais para punir os comportamentos indesejados. Despontam, entre essas convenções, o Protocolo de Montreal sobre as Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio (Protocolo de Montreal), a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies em Extinção

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 27

da Fauna e Flora Silvestre (CITES) e a Convenção de Basiléia sobre o Controle do Movimento Transfronteiriço de Resíduos Perigosos (Convenção de Basiléia). Tais pactos procuraram assegurar a fiel execução das obrigações, por intermédio da punição aos Estados que acaso descumprirem as decisões tomadas pelos meios de solução de controvérsias. O Protocolo de Montreal trouxe uma lista indicativa de medidas que a Reunião das Partes poderá adotar para responder às violações perpetradas. A esta altura, põe-se o problema de saber se tais sanções não colidem com as normas da OMC, interessadas em salvaguardar o mais amplo acesso ao mercado interno do membro importador.

Gabrielle Marceau procura conciliar a interpretação do artigo XX com os instrumentos multilaterais sobre a proteção do meio ambiente. À falta de iniciativas diplomáticas para compatibilizar comércio e meio ambiente, a jurisprudência da OMC, em certo sentido, é apta para cumprir esta função, ao efetuar o julgamento dos casos concretos. As medidas de cunho comercial impostas ou autorizadas pelos tratados multilaterais ambientais são compatíveis com a OMC, em virtude da natureza permissiva do artigo XX20. A invocação, por um membro, de um compromisso ambiental sugere a necessidade de se interpretar o artigo XX para afastar o conflito e garantir a efetividade do acordo em questão. O artigo XX faculta a adoção de medidas unilaterais para proteger o meio ambiente, mesmo na ausência de convenções específicas nesse setor. Seria ilógico se um membro da OMC, que é também parte de uma convenção multilateral sobre meio ambiente, ao planejar e executar a política governamental, se encontrasse em uma posição mais desvantajosa do que a que resultaria se nenhum acordo ambiental existisse.

Gabrielle Marceau examina seis situações que, potencialmente, ensejariam o conflito entre as regras da OMC e os tratados multilaterais ambientais21. As três primeiras formam o grupo que abrange os acordos ambientais celebrados por todas as partes da disputa e compreendem os casos em que:

1) a medida é exigida por um acordo multilateral ambiental; 2) a medida não é exigida mas é expressamente autorizada; e3) a medida é adotada para promover os objetivos do acordo multilateral

ambiental. As três últimas formam o grupo que abarca os acordos ambientais que não

contam com a adesão de todas as partes que litigam. Essas situações englobam: 4) a medida exigida por um acordo multilateral ambiental;5) a medida não exigida mas explicitamente autorizada;6) a medida é adotada para promover os objetivos de um acordo multilateral

ambiental. A probabilidade da ocorrência de dano ambiental estimula a reflexão em

torno dos meios hábeis para combatê-lo. Nesse contexto, as restrições comerciais

20 MARCEAU, Gabrielle. Conflicts of norms and conflicts of jurisdictions. op. cit., p.1096. Cf. também MARCEAU, Gabrielle. A call for coherence in international law: praises for the prohibition against “clinical isolation” in WTO dispute settlement. Journal of World Trade, Geneva, v.33, n.5, p.106-152, Oct. 1999.

21 MARCEAU, Gabrielle. Conflicts of norms and conflicts of jurisdictions. op. cit., p.1096-1100.

28 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

estão entre as opções que os Estados cogitam sempre que decidem negociar uma nova convenção. Se um tratado multilateral ambiental requerer, em determinadas circunstâncias, a imposição de sanções comerciais, é preciso averiguar, inicialmente, se as partes são também membros da OMC. Presume-se, em caso positivo, que a medida comercial exigida pelo tratado sobre meio ambiente satisfaz, plenamente, os requisitos do artigo XX. O acordo multilateral ambiental pode, ainda, ser relevante quando, ao invés de ser exigida, a medida é simplesmente autorizada. Seria possível concluir que o artigo XX autorizou as restrições ao comércio especificadas pelo acordo multilateral ambiental. Marceau reconhece que a dificuldade se agrava se a medida não é exigida ou autorizada, mas busca, simplesmente, promover os objetivos do acordo multilateral ambiental. Apesar disso, o acordo multilateral ambiental poderá vir a ser uma regra relevante do direito internacional a ser considerada na interpretação do artigo XX reivindicada por um membro da OMC.

Nas situações 4), 5) e 6) enunciadas acima, em que os Estados litigantes não são partes de ambos os tratados, o acordo multilateral ambiental não é uma regra relevante na relação entre as partes. A participação em tais acordos pode, contudo, evidenciar que os interesses protegidos pela medida são vitais para um membro da OMC. Nesse caso, a existência de um acordo multilateral ambiental serve como parte da análise das circunstâncias factuais de uma disputa e das razões que levaram um membro a adotar a medida em tela. A referência a um acordo multilateral ambiental ou meramente ao seu cumprimento seria um dos fatores na consideração de que a aplicação da medida não é injustificável ou que ela não se caracteriza como uma restrição disfarçada ao comércio internacional para os propósitos do caput do artigo XX22. Por último, é necessário lembrar que as convenções multilaterais ambientais são diretamente aplicáveis na OMC se não aumentarem os direitos e obrigações dos membros.

No caso Gabcikovo-Nagymaros, que concerne aos riscos ecológicos derivados da construção de barragens no Rio Danúbio, previstas pelo tratado bilateral firmado pela Hungria e Tchecoslováquia, em 1977, a CIJ estimou que, quando o tratado inclui obrigações contínuas, o intérprete deve atentar para as normas surgidas posteriormente. De modo similar, o Órgão de Apelação, no caso US – Shrimp23, interpretou de forma evolutiva o sentido da expressão “recursos naturais exauríveis”, que se encontra no artigo XX (g) do GATT de 1994.

O relatório fez referência à Convenção sobre Diversidade Biológica, ao Acordo CITES e à Convenção sobre o Direito do Mar. O disposto no preâmbulo do Tratado Constitutivo da OMC de que o uso dos recursos mundiais respeitará o princípio do desenvolvimento sustentável desempenhou papel significativo para formar a convicção dos julgadores de que o artigo XX (g) do GATT de 1994 não recobre unicamente os recursos naturais não exauríveis.

22 MARCEAU, Gabrielle. Conflicts of norms and conflicts of jurisdictions. op. cit., p.1098.23 Appellate Body Report, US-Shrimp, par. 129-130.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 29

O GATT manteve-se isolado das instituições internacionais do pós-guerra. Apesar desse isolamento institucional, o artigo XX representou uma via de comunicação com os demais subsistemas do Direito Internacional, que não foi devidamente utilizada.

O final da Rodada Uruguai testemunhou a celebração de tratados que, implicitamente, se ocuparam dos direitos humanos, a exemplo do que se passa com o Acordo sobre os Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Referido acordo é emblemático, entre outras razões, porque repercute na efetividade dos direitos humanos, especialmente do direito à saúde. Os países em desenvolvimento resistiram à celebração de um tratado nessa matéria, até o momento em que as nações desenvolvidas concordaram em negociar compromissos que importavam na redução das barreiras às exportações provenientes de tais países. O TRIPs criou regras básicas de proteção à propriedade intelectual garantidas pelo sistema de solução de controvérsias da OMC.

Avulta, entre as mudanças que o TRIPs introduziu, o compromisso assumido pelos membros de conceder patentes aos produtos e processos que representem inovação e sejam suscetíveis de aplicação industrial. Até o final dos anos 80, cerca de 40% dos países em desenvolvimento, incluindo os mais populosos, não possuíam sistemas de patente para os medicamentos em geral.

Esse fato causou, no campo da indústria farmacêutica, a súbita elevação do preço dos medicamentos, com conseqüências ruinosas para extensas camadas da população das nações em desenvolvimento. A dificuldade de acesso aos medicamentos comprometeu, gravemente, o direito à saúde, pois impediu o tratamento adequado de inúmeras moléstias em várias partes do mundo. O problema assume proporções alarmantes se considerarmos que mais de 90% dos portadores do vírus da AIDS não dispõem dos recursos suficientes para a aquisição dos medicamentos anti-retrovirais de que necessitam24. Acresce notar que nos países em desenvolvimento, a par da expansão vertiginosa do vírus da AIDS, diversos tipos de doenças infecciosas acometem a população pobre, a saber: a tuberculose, a malária, as infecções respiratórias, a diarréia e o mal de Chagas25. A este rol se juntam o diabetes, a asma, as doenças cardíacas e mentais, cuja periculosidade se amplia pelo acesso restrito aos medicamentos que as combatem26.

Essa situação pode ser minorada se houver o emprego adequado das exceções contidas no Acordo TRIPs para conformar políticas públicas que assegurem a eficácia do direito à saúde. O artigo 7º preconiza que o regime dos direitos de propriedade intelectual deve contribuir para promover a inovação, a transferência e a disseminação da tecnologia capazes de conduzir ao bem-estar econômico e social. Já o artigo 8º indica que os Estados podem adotar as medidas necessárias para proteger a saúde pública e a nutrição, bem como para promover o interesse público em setores vitais para o desenvolvimento social, econômico e tecnológico.

24 BAKER, Brook K. Arthritic flexibilities for accessing medicines: analysis of WTO action regarding paragraph 6 of the Doha Declaration on the trips agreement and public health. Indiana International and Comparative Law Review, Indianapolis,v.14, p.613, 2004.

25 Ibid., p.614.26 Ibid., p.614.

30 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Na esteira desses dispositivos, o artigo 27.2 autoriza os membros a restringir a concessão de patentes se as invenções causarem risco à vida humana ou à saúde. A leitura conjugada dos artigos 7o e 30 leva à conclusão de que cabe aos Estados compatibilizar a proteção dos direitos do detentor da patente e a necessidade de se considerar o interesse legítimo de terceiros27. Manifestação eloqüente da flexibilidade que o Acordo TRIPS proporciona para a execução de políticas públicas no campo da saúde, a licença compulsória é um meio poderoso para ampliar a oferta de medicamentos a preços reduzidos.

Trata-se de autorização a um terceiro para fabricar, usar ou vender uma invenção patenteada sem o consentimento do titular da patente, em circunstâncias claramente estabelecidas, mediante remuneração previamente fixada28. Ela não será exclusiva e terá a finalidade precípua de suprir o mercado doméstico em situações excepcionais. A licença compulsória será concedida, nos termos do artigo 31, se ocorrer abuso do poder de monopólio outorgado pela patente, ou quando o exigir o interesse público. Nesse caso, é tarefa da legislação interna definir o interesse público e as situações de emergência nacional que reclamam a emissão da licença compulsória29.

Graças à iniciativa pioneira do Brasil, a Declaração de Doha de 2001, ao manter essa flexibilidade, assim se expressou30:

We stress the importance we attach to implementation and interpretation of the Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights (TRIPs Agreement) in a Manner supportive of public health, by promoting both access to existing medicines and research and development into new medicines and, in this connection, are adopting a separate declaration.

De modo análogo, observou-se que os membros da OMC podem definir o que constitui emergência nacional ou outras circunstâncias de extrema urgência. A falta de capacitação tecnológica da indústria local cria obstáculos muitas vezes insuperáveis para que a licença compulsória sirva à finalidade que a determinou. Para tanto, o Conselho Geral da OMC, em decisão de 30 de agosto de 2003, permitiu aos membros da OMC a importação de medicamentos produzidos sob licença compulsória se a indústria doméstica não dispuser de condições para suprir as necessidades do mercado interno. Temerosa de abusos, a Decisão do Conselho Geral fixou as exigências a serem cumpridas pelos países que pleitearem essa autorização.

A Declaração de Doha converteu-se no instrumento privilegiado para interpretar o Acordo TRIPs, notadamente as ambigüidades que cercam a aplicação dos artigos 30 e 31. A meta é, portanto, conceder aos Estados a liberdade necessária para a adoção de iniciativas que favoreçam o acesso aos medicamentos a extensas camadas

27 CULLET, Philippe. Patents and health in developing countries in law and development: facing complexity in the 21st century. London: Cavendish, 2003. p.83.

28 SCHERER, F. M.; WATAL, Jayashree. Post-TRIPS options for access to patented medicines in developing nations. Journal of Internatio-nal Economic Law, Washington, v.5, n.4, p.913-919, Dec. 2002.

29 CORREA, Carlos M. Integrating public health concerns into patent legislation in developing countries. Geneva: South Centre, 2000. Disponível em: <http://www.southcentre.org/publications/ publichealth/publichealth-12.htm#P1449_146569>. Acesso em: 08 ago. 2006.

30 Declaration on the TRIPS agreement and public health, adopted on 14 November 2001, WT/MIN(01)/DEC/2, par. 17.

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 31

da população pobre. Com isso, evitar-se-ia o conflito entre o Acordo TRIPs e o artigo 12 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Uma via interessante para harmonizar comércio e direitos humanos é efetuar a interpretação dos artigos XX e XXI do GATT à luz do disposto no artigo 31.3 (c) da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, que alude a quaisquer regras relevantes de direito internacional aplicáveis às relações entre as partes. As normas de direitos humanos que vinculam todos os membros da OMC ou que reflitam a sua intenção constituem parte valiosa deste material interpretativo. Já as convenções sobre direitos humanos que não contam com a adesão de todos os membros da OMC são úteis como informação fática ou evidência em apoio a uma reivindicação de que uma medida é necessária para proteger a moralidade pública.

Por esse motivo, o intérprete deve buscar compreender o sentido da expressão “moralidade pública”, contida no artigo XX (a) do GATT de 1994 com apoio nos parâmetros fornecidos pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados.

A lição a extrair do caso US – Shrimp é a de que as expressões de conteúdo variável e indefinido, como “recursos naturais exauríveis”, não podem ser interpretadas tendo em conta, exclusivamente, o sentido que os redatores pretenderam conferir ao tratado no momento da sua elaboração.

Tais expressões refletem as mudanças axiológicas que se processam ao longo do tempo de modo a facilitar a interação entre o ordenamento jurídico e a realidade social. Além disso, a linha de equilíbrio muda em função das características e peculiaridades do caso. As conclusões do Órgão de Apelação caem como uma luva para a interpretação do artigo XX (a) ao demonstrarem grande sensibilidade em relação às demais normas do direito internacional.

O artigo XX (a) exibe potencialidade inequívoca para lidar com graves violações aos direitos humanos. Restrições comerciais que, ordinariamente, não são aceitas por contrariarem a letra e o espírito do GATT, ganham legitimidade na medida em que atentam contra a moralidade pública.

Janelle Diller e David Levy incluíram no mínimo ético recoberto pela moralidade pública as normas de jus cogens que proíbem a escravidão, a venda ou o tráfico de crianças e o trabalho realizado sob tortura31. A expressão moralidade pública deve ser interpretada sob influência das normas que adquiriram caráter de jus cogens e das regras internacionais costumeiras, que contam com a adesão generalizada da comunidade internacional.

Conclusão

O conflito de normas, tema de há muito conhecido no direito interno, desperta na atualidade crescente interesse dos internacionalistas. Esse fato está associado

31 DILLER, Janelle M.; LEVY, David A. Child labor, trade and investment: toward the harmonization of international law. The American Journal of International Law, Washington, v.91, n.4, p.694, Oct. 1997.

32 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

à intensa produção normativa verificada nas últimas décadas, que alargou de forma inusitada o campo regulatório do direito internacional. O avanço da globalização, na segunda metade do século XX, imprimiu força e vigor à regulação jurídica internacional, devido ao aumento da interdependência entre os países e à necessidade de se encontrar solução para questões de natureza comum. Temas globais, que afetam o gênero humano, originaram convenções, em áreas distintas, dotadas de indiscutível singularidade pelas técnicas que empregam e pelos objetivos que perseguem. O volume de tratados, em expansão vertiginosa, traz à baila a probabilidade de conflito entre normas incompatíveis, cuja coexistência é motivo de receios e preocupações. A multiplicação de subsistemas com lógicas próprias e finalidades aparentemente contraditórias, como é o caso do sistema multilateral de comércio, dos tratados sobre a preservação do meio ambiente e a proteção dos direitos humanos, agravou ainda mais o problema.

Devido ao risco de fragmentação, que a doutrina mais recente anuncia, busquei por intermédio de um novo método, denominado “diálogo” das fontes, trazer subsídios para reconstruir a coerência do direito internacional contemporâneo. Funda a tese aqui defendida a concepção de que o direito internacional constitui um sistema que não se confunde com um mero conglomerado de regras, dispostas aleatoriamente, sem critérios que as organizem em um todo coerente. Esse sistema compreende não apenas normas, mas também regras estruturais, de variada procedência, que definem o modo e relacionamento das normas no interior de um conjunto mais amplo.

Nesse contexto, a regra lógica de não-contradição permitiu ao jurista, no curso dos séculos, desenvolver princípios para a resolução das antinomias. Os critérios cronológico, hierárquico e de especialidade correspondem ao esforço despendido para manter o sistema coeso pela eliminação de uma das normas incompatíveis. Não obstante a utilidade intrínseca desses critérios, a regulação jurídica da vida internacional e a perspectiva de fragmentação nela implícita sugerem uma metodologia alternativa, voltada para a identificação da convergência entre as normas, de tal sorte que os princípios tradicionais para resolver as antinomias sejam um recurso extremo a ser usado quando outras vias vierem a falhar. O “diálogo” das fontes concebe o direito internacional como um sistema em que as partes componentes estão intimamente relacionadas. A presunção contra o conflito, decorrência da regra de não-contradição, facilita a convergência normativa nas situações em que, muitas vezes, o conflito se afigura inevitável.

A coordenação solidária, e não o antagonismo disfuncional, passa a ser a nota dominante quer na relação entre normas isoladas, quer em tratados que pertencem ao mesmo subsistema ou a subsistemas diferentes. É comum, também, que certos compromissos, por revestirem caráter geral, forneçam os conceitos para a aplicação de um tratado específico constitutivo de um subsistema de normas que não é materialmente completo. O “diálogo” das fontes possibilita, assim, a aplicação de normas particulares, coordena compromissos que obedecem à mesma diretriz e descobre a complementaridade finalística entre instrumentos que, em princípio,

O “Diálogo” das Fontes: Fragmentação e Coerência no Direito Internacional Contemporâneo 33

se mostram incompatíveis. O termo “diálogo”, aqui empregado, descreve a relação recíproca entre normas diversas na qual cada uma delas comunica a solução do caso concreto. A descoberta do fim a que servem é guia valioso para identificar a existência de propósitos comuns que as aproximam. Ao invés de optar por uma única regra graças aos princípios clássicos para a superação das antinomias, o intérprete aplica, simultaneamente, duas ou mais normas. O “diálogo” das fontes restaura a coerência do ordenamento, condição necessária para a ordem e a justiça, ao garantir tanto a previsibilidade das condutas quanto igual tratamento àqueles que pertencem à mesma categoria. A ordem e a justiça, dois valores caros ao sistema jurídico internacional, dependem da coerência interna das normas que o integram. Um sistema incoerente é injusto e não propicia a paz e a estabilidade, que estão sempre associadas ao estabelecimento da ordem. Por último, o “diálogo” das fontes assegura a realização da justiça concreta ao permitir a atualização do direito internacional.

34 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process?

CELSO EDUARDO FARIA CORACINI *

Resumo

Partindo da análise do princípio da distinção entre combatentes e terroristas, bem como da relação existente entre o Direito Internacional Humanitário e Direitos Humanos, o objetivo deste trabalho é responder ao questionamento da compatibilidade ou não dos direitos à vida e ao devido processo legal no caso de indivíduos suspeitos de atividades terroristas serem considerados alvos militares durante conflitos armados.

Abstract Based on an imperative analysis of the distinction between combatents and

terrorists, and the relation between International Humanitarian Law and Human Rights, the purpose of this article is to answer whether it is compatible or not to consider suspects of terrorist activities as military targets during armed conflicts with the right to live and the due legal process.

1. Introduction

International humanitarian law (‘IHL’) and human rights law (‘HRL’) share a common basis, which is “the recognition of the dignity of the person”.1 Such a statement, notwithstanding all that has been written about the interplay between these two bodies of law,2 seems at odds with the fact that the law of armed conflict contains rules on situations and circumstances in which fighters may be lawfully targeted, and in which collateral damage in the form of civilian casualties is an acceptable consequence of military action guided by considerations of necessity and proportionality.

* Master (University of Sao Paulo), Ph.D.-candidate (University of Vienna) and Research Assistant at the University of Graz. This paper was selected for presentation at the XVth International Congress on Social Defense (Toledo, Spain, September 2007).

1 Rodríguez-Villasante, Terrorist acts, armed conflicts and international humanitarian law, in Fernández-Sánchez (ed.), The new challenges of humanitarian law in armed conflicts: In honour of Professor Juan Antonio Carrillo-Salcedo (2005), at 44-5.

2 See, e.g., Meron, Human rights in internal strife: Their international protection (1987), at 3-70; Cançado Trindade, Tratado de direito internacional dos direitos humanos: Vol I (1997), at 269-349; Heintze, On the relationship between human rights law protection and inter-national humanitarian law, 86:856 International Review of the Red Cross 789 (2004); Lubell, Challenges in applying human rights law to armed conflict, 87:860 International Review of the Red Cross 737 (2005), at 737-8.

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process

35

It is clear that IHL is the result of a compromise. Obviously, its protective character does not stem from the implied authorisation to kill in wartime, or from the right to detain enemies until the end of the hostilities, which is customarily inherent to the very concept of warfare. The humane face of IHL derives from the regulation of means and methods of warfare, as well as the protection of people who are not or are no longer taking direct part in the hostilities, including the definition of categories of persons that may be lawfully targeted and the situation in which this is allowed.3 This is the essence of the jus in bello. To affirm the dignity – unchanged in times of belligerency – of all persons, civilians and combatants of the different parties to a conflict, contributes to the clarification of both legal regimes’ protective character, and to the legal inadmissibility of loopholes of legal protection.

Let aside the lack of broad agreement over a definition of terrorism, an important assumption to be made preliminarily refers to the application of IHL to terrorism, which shall be demystified and examined on legal grounds. First, not every terrorist act is committed in the context of an armed conflict, and therefore humanitarian law shall not be presumed to apply to every alleged situation of terrorism. Furthermore, it shall not be taken for granted that every military action amounts to an armed conflict triggering the application of IHL, even if it is often the case.4 Finally, military action, whether or not in the context of an armed conflict, is neither necessarily a lawful nor an adequate response to the commission of acts of terrorism, which most often are adequately dealt with by law enforcement agents.5

There is, undoubtedly, a factual background for the discussion about the lawfulness of targeted killings. It is reported that “[s]ince 9 November 2000 the Israeli Defence Force (IDF) has actively pursued a policy of deliberately targeting those alleged to have carried out, or to have planned to carry out, violent attacks against Israelis”.6 In the United States, Executive Order n. 12333, drafted in the mid-1970s, prohibits the act of state-sponsored killing,7 but many voices since the

3 See Rona, Interesting times for international humanitarian law: Challenges from the “war on terror”, 27:2 The Fletcher Forum of World Affairs 55 (2003), at 57.

4 See Kretzmer, Targeted killing of suspected terrorists: Extra-judicial executions or legitimate means of defence?, 16:2 European Journal of International Law 171 (2005), at 171-2, on the November 2002 destruction by a US missile of a car in Yemen, killing six suspected mem-bers of Al Qaeda. This is a typical example of military action occurred outside the context of an armed conflict. The absence of resistance or even dissent by the Yemeni government not only prevented the triggering of IHL, but it meant that the prohibition on the use of force was not violated. However, under applicable HRL, Yemen and USA are both responsible for human rights violations in the context of that action, in grades that vary depending on the degree of control of each state over the procedural aspects and results of the operation.

5 Furthermore, it should be recalled that terrorist acts shall be considered as criminal, disregard of whether they were committed during an armed conflict of an international character (as war crimes) or of an internal character (rebels would normally respond for common crimes within the domestic legislation; but it is noteworthy that the 1998 Statute of the International Criminal Court has for the first time recognized a wide range of war crimes committed in conflicts not of an international character, in Art. 8(2)(c) and 8(2)(e)), and notably also during peacetime.

6 Amnesty International, Israel and the Occupied Territories: State Assassinations and Other Unlawful Killings, AI Index: MDE 13/005/2001, February 2001, at 1 (available at http://web.amnesty.org/library/pdf/MDE150052001ENGLISH/$File/MDE1500501.pdf; last visited 23 July 2007). See also Kretzmer, supra note 4, at 172-173; Ben-Naftali and Michaeli, ‘We must not make a scarecrow of le law’: A legal analysis of the Israeli policy of targeted killings, 38 Cornell International Law Journal 233 (2003), at 239-41; Amnesty International, Israel and the Occupied Territories: Israel must end its policy of assassinations, AI Index: MDE 15/056/2003, 4 July 2003 (available at: http://web.amnesty.org/library/pdf/MDE150562003ENGLISH/$File/MDE1505603.pdf; last visited 23 July 2007).

7 Canestaro, American law and policy on assassinations of foreign leaders: The practicality of maintaining the status quo, 26 Boston College International and Comparative Law Review 1 (2005), at 2. See also Ulrich, The gloves were never on: Defining the President’s authority to order targeted killing in the war against terrorism, 45 Virginia Journal of International Law 1029 (2005).

36 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

attacks of 11 September 2001 “contend that the ability to eliminate key targets will be a necessary tool [… for the USA] to prosecute its new war against terrorism”.8 The mentioned Executive Order has not prevented the unlawful practice of targeted killing, which, however, has not always been acknowledged as such by the government.9 Nonetheless, this paper will as much as possible not discuss specific country situations, and even less the targeting of specific persons, but focus on the discussion of the legal framework in which targeted killings take place, and its compatibility with rights enshrined in applicable IHL and HRL norms.

The neutral term “targeted killing” will be preferred to the expression “targeted assassination”, because assassination is generally understood as the killing of a particular individual for political reasons.10 The more general expression “targeted killing” includes assassinations, but may also refer to the unlawful killing of protected persons, no matter their political position. It is “a lethal attack on a person that is not undertaken on the basis that the person concerned is a ‘combatant’, but rather where a state considers a particular individual to pose a serious threat as a result of his or her activities and decides to kill that person, even at a time when the individual is not engaged in hostile activities”.11 The objective of this paper is to evaluate in which circumstances killing is unlawful during an armed conflict.

For this purpose, the paper will first examine general criteria for determining the IHL categories of persons under which suspected terrorists may fall. Then, the relationship between the regimes of human rights law and of humanitarian law will be briefly discussed, with a view to asserting the applicable legal regime during an armed conflict. The paper will subsequently focus on the situations in which so called terrorists may be legitimate targets, and thus killed in the context of military operations, in an attempt to define the scope of the right to life in times of armed conflict. Finally, the matter of targeted killings will be analysed through the lenses of the right to a fair trial, taking into account the different standards of protection made available by IHL.

2. Defining “suspected terrorists” and the principle of distinction of combatants and civilians

The basic customary rule of distinction obliges combatants to distinguish themselves from civilians, who should not be targets of military attacks. The same rule obliges the parties to a conflict to distinguish between military and civilian 8 Ibid. But see Godfrey, Authorization to kill terrorist leaders and those who harbor them: An international analysis of defensive assassina-

tion, 4 San Diego International Law Journal 491 (2003), at 491-2, on the explicit October 2001 authorization of President Bush for the CIA “to carry out covert missions to assassinate Osama Bin Laden and his supporters around the globe, which in effect has lifted the United States’ twenty-five-years ban on such activities”.

9 See supra note 4; Rona, supra note 3, at 62; Duffy, The ‘war on terror’ and the framework of international law (2005), at 336-7 and 340-4.

10 See Canestaro, supra note 7, at 11 et seq. See also Kretzmer, supra note 4, at 173, arguing that “the term ‘assassinations’ should be reserved for deliberate killing of political figures, rather than killing of suspected terrorists” (ibid.), and noting that the Israeli authorities do not release evidence regarding the activities of the persons targeted. On the customary prohibition of assassinations, see Doswald-Beck, The right to life in armed conflict: does international humanitarian law provide all the answers?, 88:864 International Review of the Red Cross 881 (2006), at 900-2.

11 The definition, used by the experts of the meeting of the University Centre for International Humanitarian Law, Geneva, 1-2 September 2005, is brought about by Doswald-Beck (supra note 10, at 894).

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process

37

objects. In this context, whereas attacks against civilian objects are forbidden, the use of violence against military objectives would need to be commensurate with the purpose of obtaining military advantage.12

Most importantly, this does not mean that the treatment of persons is similar to that of objects. There should not be an identification of combatants with the notion of military objects, to which attacks shall be limited (Art. 52(2) AP I).13 Doswald-Beck very consistently elaborates on the risks that the confusion of these intrinsically distinct concepts would entail, recalling that the attack of an object “does not require that the object uses, or is on the point of using, force, but only whether it effectively contributes to the military action of the enemy and attacking it gives one a direct military advantage”.14 The attack on persons, in particular those that do not classify as combatants, is only justified when they directly participate in hostilities. This has to be seen against the general prohibition on attacks against the civilian population (Article 51 AP I and Art. 13 AP II15).

The designation of “suspected terrorist” poses a troubling initial problem, which arises less from the rather vague expression “terrorist” than from the qualification as “suspected” of being a terrorist. Even without an internationally agreed definition of terrorist acts,16 which may be prosecuted and punished on the national level under various criminal designations, such as murder, taking of hostages, crimes against humanity and, in the context of an armed conflict, war crimes,17 one may concede that it involves “acts or threats of violence the primary purpose of which is to spread terror among the civilian population” (Articles 51(2) AP I, and 13(2) AP II).18 In this sense, it is useful to bear in mind that terrorists are usually seen as persons who do not abide by rules on conflict situations, and do not accept any kind of constraint on their methods: they “do not spare ‘civilians’, but apply violence indiscriminately and without any concern whatsoever for persons who are foreign to the motives behind the act of terrorism”.19

12 Art. 48 AP I: “In order to ensure respect for and protection of the civilian population and civilian objects, the Parties to the conflict shall at all times distinguish between the civilian population and combatants and between civilian objects and military objectives and accordingly shall direct their operations only against military objectives”. See Cassese, Expert opinion on whether Israel’s targeted killin-gs of Palestinian terrorists is consonant with international humanitarian law, available at www.stoptorture.org.il/eng/images/uploaded/publications/64.pdf (last visited 23 July 2007), at 2 et seq. See Sassòli, Targeting: The scope and utility of the concept of “military objec-tives” for the protection of civilians in contemporary armed conflicts, in Wippman and Evangelista (eds.), New wars, new laws?: applying the laws of war in twenty-first century conflicts (2005), 181-210.

13 Protocol Additional to the Geneva Conventions of 12 August 1949, and relating to the Protection of Victims of International Armed Con-flicts, 8 June 1977, UN Doc. A/32/144 Annex I (‘AP I’). See also Oeter, Methods and means of combat, in Fleck (ed.) The handbook of humanitarian law in armed conflicts (1995),at 153 et seq.

14 Doswald-Beck, supra note 10, at 891.15 Protocol Additional to the Geneva Conventions of 12 August 1949, and relating to the Protection of Victims of Non-International Armed

Conflicts, 8 June 1977, UN Doc. A/32/144 Annex II (‘AP II’).16 Gasser, Acts of terror, “terrorism” and international humanitarian law, 84:847 International Review of the Red Cross 547 (2002), at

550-4.17 See Cassese, International criminal law (2003), at 125-31. See supra note 5.18 Sandoz, L’applicabilité du droit international humanitaire aux actions terroristes, in Flauss (ed.), Les nouvelles frontières du droit inter-

national humanitaire (2003), at 51-2, on the fact that the word ‘terrorism’ is not largely used in the Geneva Conventions and its Protocols; the author lists the occurrences of the prohibition of its practice and explains its limitations (e.g. IHL often refers only to spreading terror among the civilian population). See, in particular, Art. 33, GC IV (Convention relative to the Protection of Civilian Persons in Time of War, 12 August 1949): “No protected person may be punished for an offence he or she has not personally committed. Collective penalties and likewise all measures of intimidation or of terrorism are prohibited”.

19 Stein, How much humanity do terrorists deserve?, in Delissen and Tanja (eds.) Humanitarian law of armed conflict: Challenges ahead: Essays in honour of Frits Kalshoven (1991), at 568.

38 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

The difficulty raised by the term “suspected terrorist” lies in the assumption of an uncertified criminal charge, not based on disclosed evidence, which cannot and is not meant to be challenged before a competent tribunal, unless the alleged terrorist is brought before court. All that can be known a priori about a suspected terrorist, in the context of targeted killings during an armed conflict, is that he or she may be either a person falling under the category of a combatant (a legitimate target as long as he is not hors de combat),20 or of a civilian.21 In most cases involving targeted killings by state authorities, the victims are civilians, most of whom may have taken part in hostilities, or combatants who fail to meet the requirements necessary to be entitled to the prisoners-of-war status (Art. 44(4) AP I).

The distinction is somehow blurred in situations of internal armed conflicts, in which IHL does not attribute a formal status to rebels, in order to prevent any kind of international recognition to the fighters.22 In this case, most of the rules on the use of lethal force and the treatment afforded to captured rebels would have to be filtered through the applicable human rights framework, taking into account Article 3 common to the four 1949 Geneva Conventions and AP II, where applicable.

In armed conflicts of an international character, however, it must be kept in mind that “civilians shall be protected from any acts of violence (Arts. 13 and 27 GC IV; Art. 46 HagueReg23)”,24 and that in case of doubt as to whether a person is a civilian or a combatant, he or she shall be treated as a civilian (Art. 50(1), in fine AP I). References to suspected terrorists are often based on missing reliable and public evidence of the commission or preparation of terrorist acts (making it impossible to challenge the validity of this presumption in a court of law). This categorisation also indicates that those persons are civilians or that at least there are doubts about their status. Therefore, they are entitled to be treated as civilians.

Civilians shall refrain from taking direct part in hostilities.25 It is extremely relevant to note that civilians who actually engage in hostilities do not lose their status as civilians. “However for factual reasons they may not be able to claim the protection guaranteed to civilians, since anyone performing hostile acts may also be opposed, but in the case of civilians, only for so long as they take direct part in hostilities (Art. 51(3) AP I).”26 Moreover, contrary to combatants, civilians that do engage in hostilities may be criminally prosecuted and punished for acts practiced during the conflict and for the simple participation in the hostilities.

20 Art. 41(1) AP I.21 Civilians are defined as those who do not fall under the category of combatants. See Art. 50(1), AP I. 22 Doswald-Beck, supra note 10, at 889; Meron, Internal strife: applicable norms and a proposed instrument, in: Delissen and Tanja (eds.),

Humanitarian Law of Armed Conflict: Challenges Ahead: Essays in honour of Frits Karlshoven 249-66 (1991).23 Regulations annexed to the 1907 Hague Convention IV Respecting the Laws and Customs of War on Land, 18 October 1907.24 Gasser, Protection of the civilian population, in Fleck, The handbook of humanitarian law in armed conflicts (1995), at 248.25 Except in cases of levée en masse (Art. 4A, para. 6 GC III [Convention relative to the Treatment of Prisoners of War, 12 August 1949]).

On the lack of clarity of the expression “direct” participation in hostilities”, and on the fact that civilians may provide support, to some extent, to combatants, see Watkin, Humans in the cross-hairs: Targeting and assassination in contemporary armed conflict, in Wippman and Evangelista (eds.), New wars, new laws?: applying the laws of war in twenty-first century conflicts (2005), at 154-7. See Gasser, supra note 24, at 211.

26 Ibid.

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process

39

Pursuant to the law of international armed conflict, all persons who are not combatants are civilians, and enjoy the protection of Geneva Convention (IV) relative to the Protection of Civilian Persons in Time of War of 1949, which applies also in the event of occupation. It is said of civilians who engage in the conflict, that they forfeit some of their rights under this Convention and “become lawful targets for the duration of their engagement in hostilities. These civilians retain the same protection as combatants during the conduct of hostilities (e.g. protection from attack if hors de combat) except for immunity from prosecution”.27 Furthermore, according to Article 45(3) AP I, a person who falls in the hands of the enemy, and “has taken part in hostilities, who is not entitled to prisoner-of-war status and who does not benefit from more favourable treatment in accordance with the Fourth Convention shall have the right at all times to the protection of Article 75 of this Protocol”, which sets forth fundamental guarantees applicable to international armed conflicts. AP II, on its turn, applies to non-international armed conflicts that qualify as such according to its Article 1. Even in non-international armed conflicts that do not reach the threshold of AP II, a minimum set of rights contained in common Article 3 to the four Geneva Conventions applies.

On the other hand, a fighter is required to fulfil a certain number of conditions28 in order to be considered as a combatant. As an integral feature of his status, a combatant is a lawful target at all times, except when he or she is hors de combat. Moreover, when a combatant falls into the power of the enemy he is entitled to the protection of Geneva Convention (III) relative to the Treatment of Prisoners of War and the respective provisions of 1977 AP I. Furthermore, if a combatant kills, respecting the law of armed conflict, other combatants, or civilians taking direct part in hostilities, he or she is not criminally liable for those acts. A combatant may be punished only for violating the laws of war.

3. Considerations on the relationship between the IHL and HRL regimesThe fact that IHL is the body of rules designed for application during armed

conflict does not mean that HRL is only applicable in peacetime. Even if the “humane” component of both HRL and IHL do not have common roots, the consideration of their relationship has proved to be useful insofar as they may apply at the same time and under extreme circumstances, i.e. during an international armed conflict in which a state exercises jurisdiction or control over the territory in which the conflict takes place; in most situations of occupation, also categorised as an international armed conflict; and in times of non-international armed conflicts.29 It has also been said that IHL contains many norms granting rights to states, and to individuals on account of their nationality, while HRL attributes rights to individuals as such. However, it is undeniable that IHL also contains norms protecting human rights,30 in a direct or

27 Cassese, supra note 12, at 5.28 See Art. 4, GC III, in conjunction with Arts. 43 and 44 AP I; see also Arts. 1, 2 and 3 HagueReg.29 See Doswald-Beck, supra note 10.30 Dinstein, The conduct of hostilities under the law of international armed conflict (2004), at 20.

40 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

indirect manner, and its role in human rights monitoring and human rights decision-making, in particular by UN bodies,31 is an evidence of this interface.

The interplay of IHL and HRL derives from three undisputed assumptions: i. HRL does not cease to apply in time of public emergency that threatens the life of the nation, such as armed conflict, notwithstanding the possibility let open to each state to derogate from certain rights, following a prescribed procedure;32 ii. IHL is the lex specialis in time of armed conflict, whatever its causes or nature are.33 It provides guidance for the interpretation of applicable HRL in armed conflict, or borrows concepts from HRL that are not defined in IHL, with an interpretation that takes into account the context;34 iii. The context of armed conflict in which the state finds itself, as well as its capacity to maintain a structure towards the realization of human rights, are often taken into account for the setting and evaluation of human rights standards.

With few exceptions, based for example on “imperative military reasons, or military necessity, or reasons of security (…), as well as specific derogations with regard to particular persons (…), derogations rather similar to limitation clauses under the Political Covenant”,35 IHL admits no derogations based on emergency, for it is meant to be applicable precisely in situations of extreme emergency.36

However, even the consideration of the context of armed conflict, implying a certain adjustment of the meaning of rules governing human rights, depends on a previous declaration and notification of public emergency, which might or not provide information about permissible derogations under the ICCPR.37 Accordingly, if a state has not strictly followed the required procedure,38 it would mean that the conflict, from the government’s perspective, has not achieved proportions that would preclude the state from ensuring the observation of human rights rules applicable in peacetime.39

On the other hand, it cannot be denied that the jus in bello has evolved so as to apply in de facto situations, with no need for a declaration of war.40 Therefore, IHL may apply notwithstanding the absence of notification to the other Parties (of the ICCPR) about permissible derogations of HRL. The fact that IHL entails a more 31 Van Boven, Reliance on norms of humanitarian law by United Nations’ organs, in Delissen and Tanja (eds.) Humanitarian law of armed

conflict: Challenges ahead: Essays in honour of Frits Kalshoven (1991), at 495-513.32 See Art. 4 International Covenant on Civil and Political Rights (‘ICCPR’, UN General Assembly Res. 2200A (XXI), 16 December 1966),

Art. 15 European Convention on Human Rights (‘ECHR’, Convention for the Protection of Human Rights and Fundamental Freedoms, 4 November 1950), Art. 27 American Convention on Human Rights (‘ACHR’, San José, 22 November 1969). The African Charter on Human and Peoples’ Rights (‘AfCHPR’, Nairobi, 27 June 1981) does not contain a derogation clause, meaning that its provisions bind the parties at all times. See Henckaerts and Doswald, Customary international humanitarian law: Rules, vol. 1 (2005), at 299 et seq. On the derogatory clause, see Fitzpatrick, Human rights in crisis: the interventional system for protecting rights during states of emergency (1994). See also Inter-American Court of Human Rights’ Advisory Opinions No. 8 of 30 January 1987 (Habeas Corpus in Emergency Situations) and No. 9 of 6 October 1987 (Judicial Guarantees in States of Emergency), on the need to assure that certain procedural safeguards (not explicitly non-derogable) are not suspended in order to protect substantial rights non subject to derogation.

33 Rodríguez-Villasante, supra note 1, at 14.34 See Doswald-Beck, supra note 10, at 898-900.35 Meron, The humanization of humanitarian law, 94 American Journal of International Law 239 (2000), at 267.36 Ibid.37 Pocar, Human rights under the International Covenant of Civil and Political Rights and armed conflicts, in Vohrah et al. (eds.), Man’s

inhumanity to man: Essays on international law in honour of Antonio Cassese (2003), at 729-40.38 I.e. Art. 4(1) and (3) ICCPR require an official proclamation of public emergency which threatens the life of the nation as pre-condition

to the adoption of derogatory measures, which would imply the necessary notification of the other Parties, through the UN Secretary-General.

39 Pocar, supra note 37.40 Greenwood, Scope of application of humanitarian law, in Fleck (ed.), The handbook of humanitarian law in armed conflicts (1995), at

39-44.

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process

41

restrictive approach to the scope of application of human rights norms might create difficulties of interpretation, which would require a case-by-case analysis.

As already mentioned, in a situation of non-international armed conflict, governed by a limited set of rules (i.e. Article 3 common to the four Geneva Conventions of 1949, and in some cases Additional Protocol II of 1977), human rights norms remain particularly important with regard to the way the government is authorised to repress the opponent forces, and to the protection of the civilian population affected by the conflict.

4. The scope of application of the right to life during an armed conflictProtection against arbitrary deprivation of life is a fundamental feature of

international law, at all times. The right to life and not to be arbitrarily deprived of one’s life, under human rights instruments41 and customary international law, is not derogable.42 The very limited possibilities of permissible deprivations must be subjected to the most stringent controls.43 The ICCPR brings about a limitation clause allowing countries that have not yet abolished capital punishment to maintain the death penalty as a consequence of a trial that respects all guarantees of the defence.44

It is also clear that the right to life aims to protect the individual from arbitrary deprivation of life by the state, and that it is not meant to protect unreservedly life itself.45 In the example of a person possessing a bomb ready to be detonated, state authorities are allowed to shoot this person in order to protect the life of other persons in the area.46 Considerations of necessity (related to the perception of a concrete threat) and proportionality, apply to such cases, composing the main criteria that indicate whether an arbitrary deprivation of life has taken place.

The same is valid with regard to armed conflict situations in which HRL remains applicable, such as non-international armed conflicts, situations of calm occupation within an international armed conflict, and even international armed conflicts in which a state is able to exercise jurisdiction. There is a strong point in conditioning the use of lethal force against enemies to the factual impossibility of arresting the “suspected terrorists” due to unreasonable risk to the lives of the state authorities performing the arrest or of other civilians nearby, for instance if the persons to arrest are armed or detain explosive material.47 This comprises the duty for state authorities to plan

41 See Art. 6(1) ICCPR, Art. 2 ECHR, Art. 4 ACHR, Art. 4, AfCHPR. On the distinct facets and manifestations of the right to life, see Ra-mcharan, The concept and dimensions of the right to life, in Ramcharan (ed.), The Right to life in international law (1985), at 1-32.

42 See Gormley, The right to life and the rule of non-derogability: Peremptory norms of jus cogens, in Ramcharan (ed.) The Right to Life in International Law (1985), at 120-59. It is also noteworthy that “[i]n their statements before the International Court of Justice in the Nuclear Weapons case and Nuclear Weapons (WHO) case, several States which were not at the time party to the main human rights treaties stressed the elementary and non-derogable character of the right to life” (Henckaerts and Doswald, supra note 31, at 313).

43 Ramcharan, supra note 41, at 21.44 See Art. 6.(2), (4), (5) and (6) ICCPR.45 Gomien, Short guide on the European Convention on Human Rights (1998), at 9.46 This problem was examined in McCann and Others v. the United Kingdom, European Court of Human Rights, Judgment (5 September 1995).47 Doswald-Beck, supra note 10 (exposing a rich analysis and bringing up a number of decisions by international and regional human rights

bodies in support of her thesis). The same conclusion was reached by Dworkin, Military necessity and due process: The place of human rights in the war on terror, in: Wippman and Evangelista (eds.), New wars, new laws?: applying the laws of war in twenty-first century conflicts (2005), at 69-70. This viewpoint is compatible with the only human rights treaty norm that expressly addresses the issue, i.e. Art. 2(2) ECHR: “Deprivation of life shall not be regarded as inflicted in contravention of this article when it results from the use of force which is no more than absolutely necessary: a) in defence of any person from unlawful violence; b) in order to effect a lawful arrest or to prevent the escape of a person lawfully detained; c) in action lawfully taken for the purpose of quelling a riot or insurrection”.

42 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

the operation so as to minimize the need to use force against individuals.48 HRL also obliges states to undertake independent investigations in case of suspicion of unlawful use of violence against protected persons with a view to punish those responsible.49

During an international armed conflict, “as far as the right to life is concerned, […] a person would be arbitrarily deprived of his right to life only if the death is inflicted in violation of the principles and rules of humanitarian law”,50 which then plays the role of lex specialis. The International Court of Justice (‘ICJ’), in its Advisory Opinion on the Use of Nuclear Weapons, reached a similar conclusion.51

Under IHL, “unlawful killings can result, for example, from a direct attack against a civilian (see Rule 1), from an indiscriminate attack (see Rule 11) or from an attack against military objectives causing excessive loss of civilian life (see Rule 14), all of which are prohibited by the rules on the conduct of hostilities”.52

Therefore, targeted killings are prohibited not only when the victims are “suspected terrorists”, but as a consequence of the general rules on the lawfulness of killings. Firstly, killings are unlawful when the targeted victim, disregard of his or her qualification as a terrorist, is a civilian who is not directly participating in hostilities, or a combatant when hors de combat.53 Secondly, targeted killings are also prohibited depending on the means and methods of warfare employed, considering that attacks shall never be indiscriminate (Art. 51(4) and (5) AP I) or undertaken with perfidy (see Art. 37 AP I).54 Thirdly, taking into account the context, targeted killings are also unlawful when they take place within residential areas or with high chances of civilian casualties, or out of a situation of real conflict presenting concrete danger to the life of state authorities or other persons. Even the killing of a combatant or a civilian directly participating in hostilities shall be planned so as not to pose a threat to the life of a disproportionate number of civilians. Those are all examples of grave breaches of IHL (Art. 85(3), AP I).55

Some may argue that the use of human shields is prohibited, and there should be a way to counter fighters who engage in this practice.56 This is a true statement that does not, however, lead to the conclusion that adversaries who use this strategy may be targeted by any means. Military operations may take place even in areas where protected persons are present, if stringently necessary, but there would still be the duty to engage in all possible efforts to prevent excessive civilian losses previously to the attacks.

48 Doswald-Beck, supra note 10, at 883-7.49 Doswald-Beck, supra note 10, at 887-9.50 Pocar, supra note 37, at 743.51 Legality of the threat or use of nuclear weapons, Advisory Opinion, 1996 ICJ REP. 226 (8 July 1996), par. 25. See also Henckaerts and

Doswald, supra note 32, at 300; Watkin, Controlling the use of force: A role for human rights norms in contemporary armed conflict, 98 American Journal of International Law 1 (2004), at 2.

52 Henckaerts and Doswald, supra note 32, at 314. “Rules” refer to the customary rules elaborated by the International Committee of the Red Cross.

53 See Watkin, Land Mines, Terrorism, Military Objectives and Targeted Killing, 15 Duke Journal of Comparative and International Law 281 (2005), at 309-313, well framing the discussion but concluding with an excessively restrictive interpretation of the scope of the expression “unless and for such time” in Art. 51(3) AP I.

54 See Gasser, supra note 16, at 557.55 See Casey, Breaking the chain of violence in Israel and Palestine: Suicide bombings and targeted killings under international humanita-

rian law, 32 Syracuse Journal of International Law and Commerce 311 (2005), at 324-6.56 Arts. 23(2) GC III; 28, GC IV; 51(7) AP I. See Arzt, Can law halt the violence? Palestinian suicide bombings and Israeli “targeted assas-

sinations” under international humanitarian law, 11 ILSA Journal of International & Comparative Law 357 (2005), at 361.

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process

43

Finally, some authors raise the need of states to conduct targeted killings as a means of “self-defence”, invoking Article 51 of the UN Charter.57 This arguments is misplaced, bearing in mind that absolutely no provision of the UN Charter deals with the use of force against individuals, and even if the use of force in “pre-emptive” self defence against non-state actors would find a way through the UN system, which is far from being accepted,58 the Charter certainly does not suggest in any way that the use of force may be performed in disregard of conventional and customary rules of IHL and HRL.

5. The right to fair trial during an armed conflictTerrorist acts committed in the context of an armed conflict may constitute war

crimes.59 It should be borne in mind that the prosecution and punishment of such acts is of utmost importance for the enforcement of international humanitarian law,60 no matter how questionable it is whether persons charged with terrorism could receive a fair trial at all, due to the hostile ambiance that surrounds this sort of trials.61

The right to a fair trial62 is one of the rights that may be partially suspended in a situation of emergency under HRL, though it cannot be eliminated. A well-established norm of conventional63 and customary international humanitarian law states that “[n]o one may be convicted or sentenced, except pursuant to a fair trial affording all essential judicial guarantees”.64 References to fair trial in the context of IHL are often in connection with war crimes charges, or the charge of unlawful participation in hostilities.

It must be remembered that civilians may face criminal procedures as a legal consequence of directly participating in hostilities, as long as it is determined that they are not combatants and are not entitled to the prisoner-of-war status. Even in this case, the minimum rules applicable to non-international armed conflict contain the prohibition, “at any time and any place” of “the passing of sentences and the carrying out of executions without previous judgement pronounced by a regularly constituted court, affording all the judicial guarantees which are recognized as indispensable by civilized peoples” (Article 3(1)(d), common to the four Geneva Conventions).65 Regarding armed conflicts of an international character, “civilians whose rights under the Fourth Geneva Convention are restricted or denied, including nationals of States

57 Godfrey, supra note 8, at 495-512; Canestaro, supra note 7, at 14-8; Kendall, Israeli counter-terrorism: “targeted killings” under interna-tional law, 80 North Carolina Law Review 1069 (2002); Guiora, Targeted killing as active self-defense, 37 Case Western Reserve Journal of International Law 319 (2005).

58 Gazzini, The changing rules on the use of force in international law (2005), at 149-53. To be sure, the current framework on state respon-sibility “allows to attribute the terrorist activities to the State that supports, encourages or merely tolerates them” (Ibid., at 203). See also Gray, International law and the use of force (2004), at 159-94 (on the non subsistence of the argument of a change in the regime prohibiting intervention without clear authorisation of the UN Security Council).

59 See supra note 5.60 Sandoz, supra note 18, at 67-8.61 Robertson, Fair trial for terrorists?, in Wilson (ed.), Human rights in the ‘war on terror’ (2005), 169-83.62 See Art. 14 ICCPR; Art. 6 ECHR; Art. 8 ACHR; Art. 7 AfCHPR.63 Arts. 49(4) GC I (Convention for the Amelioration of the Condition of the Wounded and Sick in Armed Forces in the Field, 12 August 1949);

50(4) GC II (Convention for the Amelioration of the Condition of Wounded, Sick and Shipwrecked Members of Armed Forces at Sea, 12 August 1949); 102-108 GC III; 5 and 66-75 GC IV; 71(1) and 75(4) AP I; 6(2) AP II.

64 Henckaerts and Doswald, supra note 32, at 352 et seq.65 See Van Boven, supra note 31, at 502-3, on the conclusion taken by the ICJ (case of Nicaragua v. the United States of America) that com-

mon Article 3, as part of customary law, constitutes a ‘minimum yardstick’ applicable to all armed conflicts.

44 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

who are not parties to a conflict and persons who are denied the status of prisoners of war, enjoy the fundamental guarantees set out in Article 75 of the First Additional Protocol of 1977”.66 Therefore, persons who do not benefit from a more favourable treatment (prisoner-of-war status)67 are entitled to the right not to be found “guilty of a penal offence related to the armed conflict except pursuant to a conviction pronounced by an impartial and regularly constituted court respecting the generally recognized principles of regular judicial procedure” (Article 75(4) AP I), comprising the right to be presumed innocent until proved guilty according to the law.

Furthermore, the argument according to which the application of IHL would prevent authorities from obtaining information of persons to whom “prisoner-of-war” status has been granted, because Article 17 GC III indicates that such a person shall not be further questioned in the beginning of his captivity, is misplaced. This rule certainly does not prevent an interrogation in conformity with applicable rules of criminal procedure from taking place, on any person accused of having committed a war crime (including a terrorist act).68

It seems rather evident that targeted killings of “suspected terrorists” not only represent a deviation from IHL norms, which entitle any non-combatant deemed to be in breach of the rules of warfare to a fair trial, but it also potentially constitutes itself a war crime. No one dares to challenge that in peacetime the authorities of a state are not allowed to order the killing of dangerous criminals (even if this may take place in the course of a confrontation); their duty is to “bring them to justice”, to use a very disseminated expression. During an armed conflict, combatants may be targeted as long as they are not hors de combat, but civilians shall not be killed “unless and for such time as they take a direct part in hostilities” (Article 51(3) AP I). It is clear that if the killing were unavoidable because of a confrontation or the imminence thereof, the killing would not happen because the persons targeted committed or would be suspected to have committed terrorist acts or war crimes. Their death would occur in the context of the armed conflict, and as long as this would happen in respect of norms of IHL, and of HRL where applicable, it would not constitute an unlawful targeted killing. Therefore, the targeted killing of suspected terrorists amount to unlawful executions, or an “instant death penalty”,69 which arbitrarily deprives victims from their right to life and to have their guilt determined according to the law.

It should be kept in mind that, despite how convinced one might be of somebody’s responsibility for terrorist acts, to guarantee the right to a fair trial matters as much during armed conflicts as it does in peacetime. The plain elimination of terrorists when these persons are not combatants and do not offer an immediate and concrete threat, i.e. they are not directly participating in hostilities, is also a denial and violation

66 Rodríguez-Villasante, supra note 1, at 43, on the residual protection offered by IHL. By the same token, Gasser affirms that “Article 75, Protocol I clearly ‘borrows’ universally accepted standards from the body of international rules on human rights” (supra note 16, at 559).

67 Ipsen, Combatants and non-combatants, in Fleck, The handbook of humanitarian law in armed conflicts (1995), at 68.68 Sandoz, supra note 18, at 69. The author further affirms: “Le sens de cette règle est de ne pas mettre le prisonnier dans une situation qui

l’obligerait à trahir la partie au conflit pour laquelle il s’est battu en livrant des secrets militaires et qui, de ce fait, rendrait son retour et sa réinsertion à la fin du conflit extrêmement difficiles” (ibid.).

69 Doswald-Beck, supra note 10, at 891.

Targeted Killing of Suspected Terrorists During Armed Conflicts: Compatibility with the Rights to Life and to a Due Process

45

of their fundamental guarantees, and constitutes extra-judicial killings, in violation of both IHL and HRL regimes.

6. Conclusion The targeted killing of persons suspected of performing terrorist activities is

not compatible with the right to life and to a due process, neither in peacetime nor within the context of armed conflicts, may they be of an international character or of a non-international character. In order to promote the dignity of the person, IHL protects combatants and civilians taking part in hostilities from arbitrary and unlawful deprivation of life. It determines that these persons shall be punished only after adequate judicial procedures, put in place to assess violations of IHL or criminal responsibility, for engaging in hostilities without being entitled to do so, for war crimes, or for common crimes. Moreover, the civilian population in general is also protected from indiscriminate attacks and from acts of war estimated to cause an excessive number of civilian casualties. Therefore, it can only be concluded that no person affected by an armed conflict is deprived from a certain protection under IHL,70 and that to argue in favour of legal loopholes of protection is definitely against the object and purpose of both bodies of IHL and HRL norms.71

Notwithstanding the limits of this paper, the legal analysis of targeted killing, as a state policy, could not lead to different conclusions. Terrorists are individuals who happen to be criminally liable for their acts, in times of armed conflict as well as in peacetime. Evidence should be brought against them to support criminal charges, and they should be punished as a consequence of proceedings that respect basic standards of fair trial. No theoretical construction whatsoever, attempting to enlarge the number of hypothesis of admissible killings of “suspected terrorists” under IHL and HRL, leads to the respect and enforcement of binding international law. The choice not to uphold the rule of law cannot be deemed to bring any benefits for the prevention of new terrorist acts.

Moreover, even with – not necessarily new – challenges to humanitarian law offered by persons who do not abide by IHL in the preparation and performance of terrorist acts, the urgent need to revise IHL is not envisaged. On the contrary, states shall more than ever feel the pressing need to preserve and enforce the existing rules,72 for “it is one, if not the strength of a State governed by the rule of law, to stick to these rules even under extreme circumstances”.73

70 Sandoz, supra note 18, at 68.71 Art. 31(1) Vienna Convention on the Law of Treaties (22 May 1969): “A treaty shall be interpreted in good faith in accordance with the

ordinary meaning to be given to the terms of the treaty in their context and in the light of its object and purpose”.72 See Sandoz, supra note 18, at 70-1. Also Gasser, supra note 16, at 566-70.73 Stein, supra note 19, at 579.

46 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do SulCLÓVIS BRIGAGÃO *LEONARDO PAZ NEVES **

Resumo

O presente trabalho visa retomar o conceito de corrida armamentista no contexto da América do Sul, questionando se haveria nessa região um processo de aquisição nos moldes do ocorrido nos grandes mercados armamentistas, como os Estados Unidos, alguns países europeus e a Rússia. Para tanto, analisar-se-á se a política de compra de armas e munições feita pelo Governo Chávez contribui para desestabilizar a região, conhecida por sua relativa estabilidade, e configurar uma corrida armamentista na América do Sul.

Abstract

This work is aimed on recapture the concept of armamentist race within South America context, questioning if there would be in this region a process of acquisition with the same pattern of what happened inside the great armamentist markets, as the United States, some European countries and Russia. In doing so, it will be analysed if the purchase politics for arms and munnition made by Chavez government contributes to unstabilize the region known for its relative balance, and to configurate an armamentist race in South America.

Introdução

O tema da corrida armamentista, ora vem à tona do noticiário internacional com intensidade, ora entra no limbo, como se deixara de existir. Fala-se inclusive que depois da grande corrida armamentista da Guerra Fria, teríamos hoje uma “espécie” de soft arms race, na qual a proliferação das armas e de seus negócios continuam a aumentar independente do crescimento dos esforços da comunidade internacional de tentar diminuí-la através dos mecanismos da resolução de conflitos por meios pacíficos. O cenário de fundo continua sendo a volumosa e fabulosa soma de recursos e investimentos, principalmente, gastos pelo atual governo dos EUA, como o recente

* Clóvis Brigagão: Notório Saber em Relações Internacionais. Cientista Político, especialista em temas de Paz e Segurança Internacional, é diretor-Adjto. do Centro de Estudos das Américas (CEAs) e Coordenador do Grupo de análise de Prevenção de Conflitos Internacionais (GAPCon), IH-UCAM.

** Leonardo Paz Neves é Mestrando em Ciência Política pelo IUPERJ, Coord. do Grupo de Trabalho III (Paz e Segurança Regional), do GAPCon. Colaborou na edição final do artigo as estudantes de graduação do curso de relações internacionais, IH-UCAM, Fernanda Fernandes e Maria Carolina Arruda.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 47

pacote de 60 bilhões de dólares para o Oriente Médio. Dessa forma a curva da corrida armamentista no mundo continua em ritmo ascendente.

Nosso artigo será sobre o tema da corrida armamentista na América do Sul. A primeira pergunta é: está ocorrendo, atualmente, na América do Sul o mesmo fenômeno nos moldes de uma clássica ou convencional corrida armamentista que existe nos grandes mercados de armas movidos pelos Estados Unidos, por alguns Estados europeus e pela Rússia. É consenso que a região latino-americana, comparada com regiões como o Oriente Médio, boa parte da região asiática e com o continente africano, está muito aquém de oferecer riscos à paz e segurança internacional, do ponto de vista de uma corrida armamentista. Em geral, na América do Sul mantém certo equilíbrio de poder, em termos de compra e aquisições de armamentos para as Forças Armadas.

Em nosso artigo realizaremos uma análise sobre a atual conjuntura sul-americana para observar e verificar se as políticas de compra de armas e munições feitas pelo governo de Hugo Chávez tem, de fato, contribuído para a desestabilização e para criar possibilidades de uma corrida armamentista na América do Sul. O artigo será dividido em três partes.

Na primeira parte apresentaremos os antecedentes sul-americanos em relação a investimentos militares, as tensões inter-estatais que podem eclodir e as principais medidas de confiança mútua implementadas. Na segunda parte abordaremos a conjuntura atual sobre os gastos militares venezuelanos, que têm causado apreensão regional e internacional sobre o seu crescimento. Iremos detalhar os principais acordos militares realizados pelo governo de Chávez e compará-los com os dados de defesa com outros principais países da região. Por ultimo, as conclusões sobre os possíveis motivos para a efetivação desses acordos e se, de fato eles estariam gerando uma corrida armamentista na região.

I. AntecedentesA história das relações entre Estados vizinhos na América do Sul tem alternado

períodos de entendimento e cooperação com outros de tensões, ameaças e o próprio conflito armado. Felizmente, a região soube construir razoável registro de soluções pacíficas para suas controvérsias, principalmente, através da mediação de várias naturezas. Na maior parte dos casos, essas tensões são frutos de disputas fronteiriças mal resolvidas datadas ainda da época dos processos de Independência. Dentre os principais e mais recentes focos de tensão na região destacamos três: o conflito entre Chile e Peru em função de desacordos fronteiriços, em 1975; entre Argentina e Chile relativo à disputa da soberania das ilhas no canal Beagle, em 1978 e a tensão entre a Colômbia e a Venezuela referente ao Golfo da Venezuela em 1987. Apesar do acirramento de ânimos dessas crises, nenhuma delas chegou a resultar em conflitos armados claros.

Contudo, em alguns casos os esforços para conciliação não lograram êxito e as disputas resultaram em conflitos abertos. Aqui destacam-se dois casos, como mais

48 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

importantes. O primeiro, entre o Equador e o Peru, em 1981, em função de desacordos acerca da demarcação de fronteiras na Cordilheira do Condor. O conflito durou apenas oito dias e terminou com a assinatura de cessar fogo. Quatorze anos depois (1995) o conflito foi reiniciado, desta vez com enfrentamentos de maior porte. Contudo, a questão mais uma vez foi resolvida através da mediação de terceiros (Argentina, Brasil, Chile e Estados Unidos). A reconciliação veio como resultado do acordo de paz e na demarcação definitiva da fronteira entre os dois países. O segundo conflito ocorreu em 1982, entre a Argentina e o Reino Unido, conflito de natureza extracontinental, sobre a disputa da soberania da Ilhas Falklands/Malvinas. O conflito terminou com a vitória dos britânicos que mantiveram a posse das ilhas.

A ocorrência dessas tensões e conflitos, por vezes, gerou alteração no delicado equilíbrio militar da região, na medida em que os países se armaram para enfrentar suas disputas. Entretanto, ainda que tenha, de fato, ocorrido alguns aumentos significativos nos investimentos militares de alguns países não houve uma preparação para a guerra em escala total. Na realidade o último conflito armado de grande escala no subcontinente foi a Guerra do Paraguai em meados do século XIX. Diante desse recorde de baixa conflitividade inter-Estatal, a região é considerada pacífica. Além disso, há baixo índice de investimentos em defesa, se comparada com os índices das demais regiões como Oriente Médio, África e Ásia. De acordo com a publicação anual do SIPRI, SIPRI Yerabook of 2006, a América do Sul gastou cerca de 24 bilhões de dólares em investimentos militares, cifra essa que correspondeu a apenas 2,4% do gasto mundial do mesmo ano (ênfase nossa)1. Dados como esses ajudam a atestar que tal tipo de militarização não faz parte das prioridades das agendas políticas dos países da região, principalmente com o fim dos regimes militares.

Tal tendência de baixos investimentos em recursos militares é resultado de alguns importantes fatores. Por um lado, existe relativa tranqüilidade dos países quanto aos conflitos com os seus vizinhos. Por outro lado, as mudanças do ambiente internacional contribuíram para significativa intensificação das chamadas “novas ameaças”. Apesar de sempre terem estado presentes, as “novas ameaças” passaram a ganhar mais espaço e terem mais ‘escala’ pela utilização das tecnologias eletrônicas (celulares, internet, etc.), fomentadas pelos recursos da globalização. Na América do Sul, essas novas ameaças passaram a ser consideradas prioritárias na agenda de segurança dos Estados, uma vez que as hipóteses de conflitos inter-estatais praticamente foram reduzidas a sua menor probabilidade. Afinal, existe uma sensação de “tranqüilidade” na região. Essa tranqüilidade foi traduzida pelos parlamentos dos Estados sul-americanos como uma espécie de ´cabo eleitoral´ na limitação de recursos financeiros para programas de reaparelhamento das Forças Armadas. A grande maioria dos Estados canaliza seus investimentos para as chamadas “novas ameaças”, em detrimento de um maior investimento nas Forças Armadas.

1 STÅLENHEIM, P., FRUCHART, D., OMITOOGUN, W. and PERDOMO, C., Military expenditure, in SIPRI Yearbook 2006, Oxford University Press, Oxford, 2006, pp. 316.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 49

Pode-se exemplificar. Entre os anos de 2000 e 2004 os países que mais investiram em suas Forças Armadas foram o Brasil, Chile e Colômbia. Em valores absolutos a Argentina investiu mais que a Colômbia e Chile nos dois primeiros anos (2000-1). Contudo, a crise econômica que o país viveu em 2001-2002 fez com que seus investimentos em defesa caíssem cerca de 60%: 1% do PIB foi investido em 20042. Apesar de o Brasil ser responsável por cerca de 50% dos gastos em defesa do subcontinente, esse investimento não representa grande fardo para sua economia, que significa 50% do total da região. O Brasil gasta 1,8% do PIB em defesa (dados de 20043). Os casos do Chile e da Colômbia são distintos. Tradicionalmente, esses dois países possuem os maiores investimentos em recursos de defesa, em termos percentuais, da América do Sul. No período 2000-2004, o Chile e a Colômbia investiram em suas Forças Armadas uma média de 2,8% e 3,2% respectivamente, bem acima da média do percentual da região.

Argumentamos que esse alto investimento chileno e colombiano ocorre mais em função de questões de política interna do que de política externa, embora as fronteiras, no caso de defesa, sejam muito flexíveis e interdependentes. No caso do Chile, o alto investimento ocorre em razão da Ley del Cobre Reservado, criada em 1958 e alterada por Pinochet. Ela prevê que 10% dos dividendos da Corporación Nacional del Cobre de Chile (CODELCO), empresa estatal de mineração de cobre, sejam repassados para as Forças Armadas. Pela Ley del Cobre Reservado, as Forças Armadas chilenas contam com grande e constante fonte de investimento em armas, situação bem diferente vivida pelas outras forças sul americanas.

O caso colombiano é mais complexo. Seus governos, desde a década de 1960, convivem com a guerra civil que atenta contra a unidade nacional. Por essa razão gastam mais para que as Forças Armadas possam lidar com os movimentos revolucionários dentro de suas fronteiras.

Outro fator para a “boa fama” da região são os recentes esforços em matéria de desenvolvimento de medidas de confiança mútua. A primeira foi o Tratado de Tlatelolco, de 1967, que proibia as armas nucleares na região. A partir daí, uma série de medidas começou é desenvolvida para dar conta das tensões entre os Estados. A partir da década de 1990 podemos perceber significativo aumento no estabelecimento de novas medidas, sejam multilaterais ou bilaterais. Dois exemplos se destacam. O primeiro é o acordo para uso pacífico da energia nuclear entre a Argentina e o Brasil. Esse o processo foi iniciado com o a Declaração Conjunta para Política Nuclear de 1985 e teve seu ápice em 1991 com a criação da Agência Brasileira-Argentina de Contabilidade e Controle Nuclear (ABACC). Este ciclo foi encerrado com a assinatura do Acordo Quatripartite, em que ambos os Estados, mais a ABACC e a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), consolidaram um padrão de salvaguardas e fiscalizações para o programa nuclear de ambos os

2 Military Balance, 2004-2005. International Institute for Strategic Studies (IISS), London, 2004.3 Idem, Ibid.

50 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

países. Esse acordo é considerado uma das mais originais e sui generis medidas de transparência e confiança mútua do mundo. O segundo exemplo foi a adoção do Instrumento de Informação Padronizado sobre Gastos Militares pelos governos argentino e chileno. Trata-se de metodologia criada pela CEPAL para intercâmbio de informações de defesa, principalmente, medição de gastos militares.

Contudo, é interessante ter atenção em algumas especificidades das medidas de confiança mútua desenvolvidas no subcontinente sul americano. O estudo do Real Instituto Elcano: CBM en América Latina y el efecto de la adquisición de armas por parte de Venezuela4 indica que o desenvolvimento das medidas de confiança mútua na América Latina diferencia-se da experiência européia por dois principais motivos. O primeiro é a falta de estabilidade e previsibilidade dos Estados sul americanos. Acordos eficazes, segundo os autores, dependem da previsibilidade de que não haja alteração no status quo de um determinado país, resultando na adoção de políticas contraditórias com as acordadas previamente. As reformas constitucionais promovidas por países como a Venezuela, Bolívia e Equador podem ser consideradas um exemplo. Outro exemplo de instabilidade é o alto índice de renuncia de presidentes nos últimos dez anos. O estudo indica que na América Latina as medidas de confiança mútua ainda são entendidas como políticas de governo e não políticas de Estado. O segundo motivo refere-se à dificuldade de ser fixados objetivos claros e de implementação das medidas. O estudo indica que as medidas latino-americanas costumam incorporar tanto as de caráter militar quanto as não militares. Elas perderiam o enfoque e, pela sua diversidade, dificultariam a obtenção de conclusões satisfatórias. Isso ocorre em razão da prevalência maior das “novas ameaças”. Os autores do estudo acreditam, contudo, que as iniciativas latino-americanas têm avançado bastante nos últimos anos.

Outro elemento interessante no âmbito das medidas de confiança mútua na América Latina é o avanço desigual do seu desenvolvimento na região. Primeiramente, é importante notar que existe uma preponderância quantitativa e qualitativa das medidas bilaterais sobre as medidas multilaterais. Nota-se que a região do cone sul apresenta o maior conjunto, e mais eficaz, de medidas de confiança mútua do que as demais regiões. O Estudo do Real Instituto Elcano atribui essa distinção a distribuição irregular das “novas ameaças” (estas exercem maior pressão nos países da região andina); a estabilidade política dos países do cone sul e; as melhores condições econômicas desses países (um bom indicador é o maior sucesso do modelo de integração econômica do cone sul, o MERCOSUL).

II. A Nova Conjuntura Política: A Questão Militar Esse delicado equilíbrio parece ter sido abalado pelas recentes políticas do

presidente venezuelano Hugo Chávez, notadamente suas aquisições de armas

4 BROMLEY, Mark., PERDOMO, Catalina. CBM em América Latina y el efecto de la adquisición de armas por parte de Venezuela. Docu-mento de Trabalho 41/2005, Real Instituto Elcano, 2005.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 51

convencionais. Desde sua vitória à Presidência no pleito de 1998, a Venezuela passa por profundas transformações políticas. Nesses quase dez anos no poder, Chávez tem deflagrado uma ativa política doméstica e desempenhado, com vigor, uma política externa considerada bastante controvertida. Beneficiado pelos recentes recordes no preço internacional do petróleo, Chávez tem utilizado esses dividendos para financiar sua “revolução bolivariana” na Venezuela e também para apoiar países como a Bolívia, Equador, etc. Durante seu primeiro mandato, os venezuelanos presenciavam importantes mudanças na política de seu país. A Constituição foi reescrita, inclusive mudando o nome do país para Republica Bolivariana da Venezuela. Criou-se um Congresso unicameral e aumentou o mandato do presidente para seis anos. Ainda, os venezuelanos viram Chávez sofrer um golpe e dar um contragolpe, retornando ao poder. Finalmente, foram as urnas em dois processos eleitorais bastante controvertidos. No primeiro, “re” elegeram Chávez após a ratificação da nova Constituição. No segundo, em função de um boicote da oposição, elegeram um Parlamento 100% favorável à Chávez.

O segundo mandato não tem sido menos conturbado. O presidente Venezuelano oferece, cada vez mais, ênfase à sua retórica antiamericanista, aproximando-se dos rivais dos EUA no cenário internacional, como Irã, Cuba e, em certa medida, Rússia. Além disso, tem tomado medidas aumentando a concentração do seu poder e, para muitos, enfraquecendo as instituições democráticas venezuelanas. Medidas como o fechamento da principal estação de televisão venezuelana (RCTV) e suas propostas de reformas constitucionais tem gerado contundentes críticas dentro e fora da Venezuela, como as de atentar contra a democracia em seu país. Mas o ponto de desequilíbrio que queremos detacar são os seus investimentos em recursos militares. Desde 2005 a Venezuela tem realizado grandes acordos de compras de armas, principalmente, com a Rússia, causando incômodo ao governo americano, o que resultou no embargo de recursos e serviços de defesa dos EUA à Venezuela. Os EUA acusam o regime de Caracas de desestabilizar o equilíbrio militar da região, ação que, segundo alguns analistas, poderá a causar uma corrida armamentista entre os países sul-americanos que, porventura, se sintam ameaçados. Uma segunda crítica revela a preocupação quanto à possibilidade de Chávez utilizar esses recursos bélicos para apoiar alguns grupos armados ilegais, notavelmente os grupos colombianos.

Até agora nos preocupamos em apresentar breve idéia sobre os antecedentes sul americanos em relação às políticas militares, como a tendência de investimentos em defesa, principais tensões e a questão das medidas de confiança mútua. Posteriormente, fizemos rápida reflexão sobre a polêmica e conturbada trajetória da presidência de Chávez. Os eventos mais relevantes para essa análise têm início em 2005. O governo da Venezuela anunciou novo plano estratégico para a defesa integral do país, baseado em três pilares: (1) fortalecimento do país; (2) fortalecimento do aparato militar e; (3) maior integração da união civil militar. Esse último ambiciona aumentar a participação da população na defesa da nação, com a expansão dos reservistas de 50 para 100 mil e a criação de unidades de defesa civis para dar apoio militar ao povo.

52 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Essa nova doutrina militar venezuelana muda o eixo estratégico militar do país. Até então a política de defesa voltava-se, unicamente, para um cenário de conflitos no subcontinente sul americano, ou seja, a preocupação das Forças Armadas era com os seus vizinhos. A nova doutrina, anunciada por Chávez, muda essa rationale: passa o contexto de invasão por uma ou mais potências, especificamente pelos Estados Unidos e seus aliados.

Chávez inicia, então, a renovação do arsenal de suas Forças Armadas. Na primeira metade de 2005, firmou quatro importantes acordos de importação de armas. Um deles foi com o governo brasileiro para a aquisição de aviões leves de ataque Super Tucanos. O segundo com a Espanha firmava a compra de 12 aviões C-295, sendo 10 de transporte e 2 de vigilância. Esse contrato continha uma grande aquisição naval constituída de 4 botes patrulheiros, 4 corvetas e alguns cargueiros. Os outros dois acordos foram com a Rússia. O primeiro acertava a compra de 13 helicópteros tanto de transporte como de combate. O segundo foi o que mais chamou a atenção, que previa a compra de 100.000 fuzis AK-103 e AK-194 e mais um grande números de munição. Nele incluía-se o licenciamento para a construção de duas fabricas no território venezuelano, uma para produzir os Fuzis AK e a outra para produzir munição para os fuzis5.

A assinatura desses acordos levou o governo americano a protestar contra investimentos tão altos, inclusive, questionando a necessidade dessa quantidade de equipamentos apenas para a sua auto defesa. A aquisição dos fuzis AK e o licenciamento das fábricas foi o que causou a maior reação. O então Secretário de Defesa, Donald Rumsfeld afirmou que esse “excedente” de armas poderia acabar na mão de grupos terroristas como as FARCs colombianas. A reação norte americana à política de investimentos militares de Chávez não permaneceu na retórica. No início de 2006, o governo americano tomou duas fortes medidas para conter as aquisições venezuelanas. A primeira foi pressionar a Espanha e o Brasil para que ambos não levassem a diante seus acordos com a Venezuela. Mais tarde, os Estados Unidos vetariam tais acordos: grande parte dos equipamentos exportados para a Venezuela possuía tecnologia americana, daí a sua interferência nos acordos. A segunda ação impedia o repasse de peças de reposição para as armas (aviões, tanques, embarcações, etc.) que a Venezuela já possuía em virtude de acordos antigos com os próprios Estados Unidos. Essas medidas foram justificadas pelo governo norte americano como reação ao (1) estreitamento das relações entre a Venezuela, Cuba e Irã; (2) a não cooperação do governo venezuelano no combate ao terrorismo, ao tráfico de drogas na região andina e; (3) ao receio de que parte dos equipamentos importados, principalmente os fuzis AK, fossem repassados para grupos rebeldes como as FARC colombiana.

Essas medidas americanas reascenderam ainda mais a retórica de Chávez, que acusava os EUA de tentarem debilitar as forças militares venezuelanas para que pudessem então invadir o país. A reação de Chávez foi a de buscar novas fontes para seus armamentos que não necessitasse da ratificação dos americanos. A solução mais

5 BROMLEY e PERDOMO, 2005.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 53

prática foi a de firmar acordos militares com a Rússia. Em 2006, os dois países assinaram a compra de 24 caças de combate Sukhoi Su-30 MK, acordo esse que ultrapassa a cifra de 1 bilhão de dólares, e a remessa de helicópteros de combate dos modelos Mi-17, Mi-26 e Mi-35.6 7 Em 2007 suspeita-se que Chávez intenciona comprar pequena frota de submarinos, também da Rússia. A compra teria como objetivo substituir os antigos U-Boats alemães com mais de 30 anos. Se o acordo for firmado, a Venezuela passará a possuir a maior frota de submarinos da América Latina superando assim as do Brasil e do Chile8. A Venezuela ascenderia à posição de segundo maior parceiro, em acordos militares com os russos, apenas atrás da Argélia que, também, firmou ambicioso pacote de recursos militares de aproximadamente 7,5 bilhões de dólares.9

A Venezuela tornou, assim, um dos principais destinos para importação de armas, em função dessa nova política de investimentos militares de Chávez. Segundo estimativas do governo americano, a Venezuela já investiu cerca de 4 bilhões de dólares em aquisição de recursos militares10. Com esses vultosos investimentos, a Venezuela atingiu a sexta posição no ranking de maiores acordos de importações de armas por países em desenvolvimento no período 2003-2006 e a quarta posição em 2006, superando tradicionais mercados como o iraquiano e o israelense, como mostra as tabelas abaixo.

Table 1I. Arms Transfer Agreements of Developing Nations, 2003-2006: Agreements by the Leading Recipients

(in millions of current U.S. dollars)RANK ReCIPIeNT AgReeMeNTS VALue 2003-2006

1 Índia 14,9002 Saudi Arábia 12,4003 Pakistan 8,1004 China 6,4005 Egypt 5,7006 Venezuela 4,4007 Israel 4,2008 U.A.E. 3,7009 Algeria 2,40010 Malaysia 2,400

Source: U.S. Government11

6 GRIMMETT, Richard F. Conventional Arms Transfers to Developing Nations, 1999-2006. Report for Congress, Washington, Setember 26, 2007.

7 Para informações mais detalhadas em relação às aquisições militares venezuelanas ver o anexo I8 HILL, Christian. Venezuela Wants Sub Fleet for Conflict with U.S. News Max.com, 19/02/2007. Fonte: http://www.globalsecurity.org/org/

news/2007/070219-venezuela-subs.htm9 Venezuela to buy Russian submarines, air defense systems. Agência NOVOSTI - 18/06/2007. Fonte: http://www.globalsecurity.org/military/

library/news/2007/06/mil-070618-rianovosti01.htm10 ROMERO, Simon. Venezuela Spending on Arms Soars to World’s Top Ranks, The New York Times, 25/02/2007. Fonte: http://www.global-

security.org/org/news/2007/070225-venezuela-arms.htm11 GRIMMETT, 2007

54 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Table 1J. Arms Transfer Agreements of Developing Nations, 2006: Agreements by Leading Recipients(in millions of current U.S. dollars)

RANK ReCIPIeNT AgReeMeNTS VALue 20061 Pakistan 5,1002 India 3,5003 Saudi Arabia 3,2004 Venezuela 3,1005 Algeria 2,1006 Israel 2,1007 Brazil 1,1008 Iraq 9009 Indonesia 60010 South Korea 500

Source: U.S. Government12

A política de reestruturação e investimentos nas Forças Armadas de Chávez altera o status quo da capacidade militar venezuelana. Apesar de possuir a terceira maior economia da América do Sul, impulsionada pela abundancia do petróleo, a Venezuela, tradicionalmente, relega às Forças Armadas investimentos modestos que a classificavam até 2005 como sexta força do subcontinente13. Seus investimentos em defesa também não costumavam a ocupar um lugar de destaque no ranking sul americano. Conforme as tabelas abaixo, podemos constatar que os investimentos venezuelanos tradicionalmente ficaram na quinta posição dos gastos absolutos e ainda permanecendo nas ultimas colocações quando são comparados os percentuais do PIB destinados para a defesa. Esses dados contrastam com os dados que temos observado nos últimos dois anos, em função das recentes aquisições militares.

12 Idem.13 De acordo com o ranking da Military Power Review. Fontes: http://www.militarypower.com.br/ranking.htm; http://www.militarypower.

com.br/frame4-ranking2004.htm

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 55

gastos Militares de los Países de Sudamérica 2000-2004(Montos en miles de millones de Dólares)

2000 2001 2002 2003 2004Argentina 4.800 4.500 1.500 2.020 1.590 Bolivia 0.128 0.138 0.136 0.151 0.145 Brazil 14.400 10.700 9.700 9.300 9.200 Chile 3.100 2.900 2.700 2.530 3.150 Colombia 3.100 2.900 3.000 3.230 3.900 Ecuador 0.480 0.518 0.483 0.640 0.588 Guyana 0.007 0.006 0.005 0.006 0.006 Paraguay 0.090 0.078 0.051 0.044 0.052 Perú 0.888 0.913 0.914 0.883 0.899 Suriname 0.013 0.009 0.009 0.008 0.008 Uruguay 0.378 0.358 0.141 0.125 0.135 Venezuela 1.400 1.900 1.400 1.280 1.050

Fuente: International Institute for Strategic Studies (IISS), The Military Balance 1970-200514

gastos Militares como porcentaje del Producto Bruto Internode los Países de Sudamérica 2000-2004

2000 2001 2002 2003 2004Argentina 1.70 1.67 1.47 1.57 1.05Bolivia 1.52 1.73 1.74 1.86 1.67Brazil 2.30 2.12 2.10 1.84 1.58Chile 4.10 4.37 4.00 3.72 3.62Colombia 3.92 3.49 3.74 4.04 4.08Ecuador 3.36 2.88 1.99 2.36 1.95Guyana 0.90 0.91 0.72 0.75 0.67Paraguay 1.17 1.10 0.91 0.74 0.79Perú 1.68 1.69 1.60 1.46 1.35Suriname 3.25 1.80 0.86 0.94 0.70Uruguay 1.89 1.96 1.14 1.13 1.05Venezuela 1.16 1.46 1.48 1.50 1.30

Fuente: International Institute for Strategic Studies (IISS), The Military Balance 1970-200515

14 NÚÑEZ, Rafael F. A. Z. Los gastos en defensa en los paises sudamericanos y su influencia en el ambiente de seguridad y defensa. Disser-tação de Mestrado, Universidad del Salvador Buenos Aires, Argentina, 8 de maio de 2006.

15 Idem.

56 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

III. Análise e Projeção do Poder Militar Venezuelano O conjunto de ações de Chávez, tanto as reformas políticas quanto os investimentos no

campo militar, suscitam diversas críticas. As críticas domésticas se concentram nas ações que aumentam o poder de Chávez. A oposição acusa Chávez de estar enfraquecendo as instituições democráticas para poder permanecer no poder indefinidamente. As medidas que mais atingiram a oposição foram as reformas políticas, como a aprovação da nova Constituição em 1999 e a sua possível alteração no final de 2007. Uma segunda questão também criticada pela oposição foi o cancelamento da licença da emissora RCTV, essa medida foi considerada um atentado à liberdade de expressão na Venezuela. Em relação aos investimentos militares, o ponto crítico foi o terceiro pilar da nova doutrina de defesa, a união cívico-militar. A oposição receia que esse aumento de reservistas, armados com os novos fuzis AK, sirvam para agir como um grupo paramilitar contra revolucionário do regime de Chávez, aumentando assim a sua base de sustentação pela coerção.

Já as criticas externas podem ser divididas em dois segmentos. O primeiro é o grupo mais incisivo e constante composto, principalmente, pelos Estados Unidos. O segundo grupo é, geralmente, mais cauteloso, heterogêneo e manifesta-se em situações específicas. Esse grupo é formado por entidades internacionais que contestam as políticas antidemocráticas de Chávez, tais como a violação de direitos humanos. São críticas oriundas de governos de países da América do Sul, que se manifestam de maneira ad hoc: cautelosos como os colombianos na ocasião da compra dos caças russos Sukhoi ou, de forma um pouco mais energética, como no episódio entre Chávez e o Senado brasileiro na questão da extinção da RCTV.

Existem também grupos que acreditam que a aquisição de recursos militares não necessariamente relaciona-se com a ameaça à estabilidade e à segurança regional. Quanto à política de investimentos em defesa, tanto Chávez quanto oficias de seu governo têm anunciado publicamente os motivos de cada uma dessas compras.

Destacamos as principais justificativas do governo venezuelano:Segundo o General Melvin López16 a nova doutrina é centrada em uma “guerra

assimétrica” baseada em táticas de guerrilha com a participação da população geral para enfrentar invasão da potência norte-americana;

Outra justificativa citada por oficiais do governo venezuelano é a necessidade de renovar os equipamentos militares então deficientes em função dos baixos investimentos que haviam sido feitos no passado recente. Informes independentes e governamentais17 afirmam que as Forças Armadas venezuelanas eram uma “estrutura oca”, pois não possuíam recursos básicos para suas ações de rotina. O seguimento mais afetado era o dos agrupamentos fronteiriços, carentes de equipamentos básicos como botas e capacetes. Das oito aeronaves G-222 de patrulha fronteiriça com a Colômbia, apenas duas estavam em funcionamento, fato, frequentemente, criticado pelo governo colombiano, pela falta de efetividade no combate aos grupos rebeldes que circulam pela fronteira dos dois países;

16 Secretário do Conselho de Defesa Nacional de Venezuela. BROMLEY e PERDOMO, 2005.17 Idem.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 57

Sobre a compra dos aviões-caça Sukhoi da Rússia. O veto americano às compras na Espanha e no Brasil, seguido do embargo comercial americano a recursos de defesa para a Venezuela, teria obrigado Chávez a buscar novas fontes para importações de recursos militares. A força aérea venezuelana é composta, principalmente, de aviões americanos (F-16 em sua maioria)18. Com o embargo norte americano, a Venezuela ficou impossibilitada de ter acesso a peças de reposição. Segundo o governo venezuelano ele foi “forçado” a adquirir considerável número de caças que não sofresse veto norte americano. O episódio da compra dos Sukhoi reflete o objetivo de diversificar seus provedores e deixar de lado a sua dependência tecnológica militar americana.

É possível fazer algumas conjecturas e estabelecer motivações alternativas sobre a política de Chávez. Poderíamos citar uma de caráter doméstico e outra de caráter externo, embora, claro, as duas dimensões sejam interdependentes. Quanto à primeira, existe relação com o golpe sofrido em 2002. Com tais investimentos Chávez estaria agradando as Forças Armadas e, assim, transformando-a em aliada para o caso de nova crise. O aumento dos reservistas e o possível estabelecimento da “milícia popular Bolivariana” poderiam servir como ponto de apoio alternativo contra movimentos que desestabilizariam seu governo.

O motivo externo seria o de ampliar a capacidade de projeção do poder no subcontinente sul americano, dentro de sua retórica para contrapor seu poder ao dos EUA. Chávez, com sua ideologia bolivariana, estaria promovendo alternativa para os países amigos, aumentando assim o número de aliados na América do Sul. Essa tendência pode ser explicada pelo enorme apoio de Chávez à Evo Morales, da Bolívia e, em menor grau, à Rafael Correa, do Equador.

Considerações FinaisA tarefa de analisar e elaborar cenários conjunturais é extremamente difícil e

arriscada. Os analistas possuem apenas os dados dos fatos ocorridos, as justificativas informadas pelos órgãos oficiais e as críticas dos oposicionistas. Os analistas cruzam esses dados com a sua análise de conjuntura a fim de estabelecer “motivações alternativas”, que podem ou não serem explícitas e, com isso, elaborar a projeção dos cenários mais prováveis.

Segundo dados fornecidos pelo SIPRI, é possível perceber que, apesar dos gastos desproporcionais do governo venezuelano no período de 2005-07 (em relação aos anos anteriores), países como o Chile e o Brasil também têm feito consideráveis aquisições de equipamentos militares durante esses mesmos anos. O Chile, inclusive, supera a Venezuela em 2006 em volume de armamentos19. Em princípio não existe relação causal entre gás tos militares do Chile do Brasil com os gastos militares venezuelanos. No caso do Chile, pode refletir o bom momento da situação econômica, que em 18 Para se ter uma idéia da preponderância dos equipamentos militares americanos na Venezuela, dos 277 aviões da força aérea venezuelana

177 são de fabricação norte americana. Fonte: http://www.globalsecurity.org/org/news/2006/060517-venezuela-arms-ban.htm19 A metodologia utilizada pelo SIPRI nesta tabela se faz pelo volume de armamentos e não pelos valores dos acordos. Esse recurso é bastante

útil para evitar distorções que podem ser causadas por situações de intercâmbio de tecnologia militar, auxílio militar, formas diferenciadas de pagamento e serviços que possam estar presentes nos acordos, mascarando assim o valor pago pelos equipamentos bélicos. Para maiores informações sobre os dados do SIPRI, ver o Anexo II.

58 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

função do aumento do preço do cobre chileno que pela sua relação direta, poderá estar criando um ambiente de elevação de gastos militares. No caso brasileiro, não se deduz que, pelo bom momento econômico haja, imediatamente, uma reação para o aumento de gastos em defesa.

Há um contraste a ser observado. O aumento de gastos, por parte desses países mencionados, pode também contrastar com tendências na América do Sul de otimização e redução de gastos militares por alguns outros países. Um exemplo é a Argentina que passa por processo de reorganização, chamado Plan 2000. Esse plano foi concebido tendo em vista as necessidades futuras de defesa do território argentino, a nova conjuntura internacional e a atual realidade econômica vivenciada pelo país. Em termos práticos, o governo argentino optou por reduzir seus efetivos e investir na profissionalização. O destaque é para a modernização das forças terrestres que são, em sua maioria, composta de tropas leves e aerotransportadas (tendo em vista as necessidades das missões de paz internacionais, as quais a Argentina é freqüente contribuinte). Dessa forma, a Argentina, atualmente, tem um dos menores investimentos, em termos percentuais, no campo da defesa da América do Sul.

O Chile é caso especial nesse debate. Se, por um lado, ele é um dos principais investidores, em termos percentuais, em recursos militares da região, é também um dos países tende a reduzir os investimentos militares. O Chile, através da Ley del Cobre Reservado, tem sido um dos principais importadores de armas no subcontinente como já foi aqui mencionado e pode ser observado na tabela do . Entretanto, existem movimentos dentro do governo da Presidente Bachelet com o objetivo de alterar ou até extinguir tal lei. Se isso for real, o Chile reduzirá seus investimentos em defesa!

Os investimentos venezuelanos, por enquanto, parecem não estar funcionando como uma ameaça ao que se poderia designar de uma corrida armamentista na América do Sul. Mas cuidado! Investimentos como os que estão sendo executados por Chávez em todas as esferas como aqui analisadas, podem sim, levar à corrida armamentista entre vizinhos e, até mesmo, ameaçar à estabilidade regional, que se comportava com razoável estabilidade. Não existe ainda uma percepção clara de que os investimentos em defesa feitos por Chávez estejam alarmando seus vizinhos, a fim de que eles “corram” às armas a fim de equiparação à situação venezuelana20. Também, parece alarmante, o fato de Chávez estar criando a ´militarização´ da população civil para enfrentar tanto a oposição interna, em caso de um Golpe, como uma ́ invasão´ externa. A Antropóloga Francine Jácome expõe em seu artigo “Venezuela 2006: avances em la doctrina de suguridad y sus impactos regionales”21, três objetivos possíveis para essa política de aquisições: a primeira seria aproximar suas relações com a Rússia em detrimento dos seus antigos laços com as Forças Armadas americanas, a segunda refletiria o interesse de fortalecer simbolicamente as Forças Armadas da Venezuela

20 Cf. opinião do cientista político Andrés Serbin, Presidente da Coordenação Regional de Investigação Econômica e Social (CRIES) em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, 4 de fevereiro de 2007.

21 JÁCOME, Francine. Venezuela 2006: avances em la doctrina de suguridad y sus impactos regionales. Caracas, Instituto Latinoamericano de Investigaciones Sociales, Julio, 2007.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 59

convertendo-a em uma força ideologizada e a terceira seria a participação cubana nos treinamentos dos militares venezuelanos.

A principal preocupação em relação às compras venezuelanas partiu do governo colombiano, no caso dos aviões-caça Sukhoi. Por outro lado, é interessante notar que, parte das aquisições como dos helicópteros e barcos de patrulha foram bem recebidos pelo governo colombiano. O governo da Colômbia traduziu essas aquisições como parte de um esforço para controlar melhor a fronteira entre os dois países: exigência antiga do governo colombiano em relação à Venezuela.

Comenta-se, como o Real Instituto Elcano, a aparente transparência em que esses acordos de Chávez têm sido efetivados. As informações publicadas, por si só, podem ser consideradas avanços sobre as medidas de confiança mútua regional. Um exemplo dessa transparência é o episódio de maio de 2005. O próprio Embaixador norte americano William Brownfield recebeu informações do governo venezuelano quanto ao acordo de aquisição dos fuzis AK-47. O embaixador afirmou na ocasião: “Agora já sabemos a quantidade e o modelo dos fuzis de assalto, assim como uma serie de outros detalhes que antes desconhecíamos”22.

Contudo, uma preocupação legítima tanto do governo norte americano quanto do colombiano é com relação à possibilidade de grupos como as FARC terem acesso a esses recursos militares adquiridos pela Venezuela. Por mais que o apoio a grupos rebeldes de outros países não seja uma política do governo venezuelano, elementos corruptos podem contrabandear parte desses recursos através da fronteira dos dois países23. Esta situação é de fato potencializada com a instalação das fábricas russas de fuzis e de munições no território venezuelano. Contudo, é preciso também ter em mente que esse tipo de contrabando (por elementos corruptos) não é novidade na região. Aliás, contrabando de armas (e com ele de drogas) acontece nas fronteiras de vários países: Colômbia, Equador, Peru, Bolívia, Paraguai e até mesmo na imensa fronteira brasileira.

Resumidamente. A Venezuela está gastando muito em decorrência de fatores internos (militarização do projeto Bolivariano) e externos (confrontação com os EUA). Pode-se levantar a hipótese que os mais afetados pelas políticas de Chávez são, ainda, os próprios venezuelanos. As grandes aquisições de material bélico não parecem ameaçar militarmente à região sul americana. O últimos episódios com a entrada em cena da reforma constitucional que dá poderes ditatoriais a Chávez, traz novos ingredientes à crise venezuelana. O ex-ministro da Defesa de Chávez, que o trouxe de volta ao poder pós-golpe de 2002, já se inclina para a oposição. Suas manifestações públicas contra Chávez explicita novos movimentos internos com repercussões na região e até mesmo no plano internacional. O Chile gasta muito em virtude da dependência da Ley del Cobre Reservado. Será que o governo de Bachelet irá reduzir os gastos em defesa ou, mesmo com a extinção da Ley, elas continuarão crescendo?

22 Fonte: http://english.peopledaily.com.cn/200505/20/eng20050520_186006.html. 23 Andrés Serbin lembra: os fuzis AK-47, além da Venezuela, são utilizados pelas Forças Armadas cubanas e pelas FARC colombianas. Ele

pergunta: “onde irão os fuzis FAL - os fuzis americanos usados pelas Forças Armadas Venezuelanas – trocados pelos AK-47? Na Favela da Rocinha?” , O Estado de São Paulo, 4/02/07.

60 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

O Brasil, como anda? Para o ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos da Presidência, Mangabeira Unger, “se queremos ser um grande país, capaz de nos defender e não nos deixar intimidar, precisamos nos armar”. E dá a receita: “não há estratégia de desenvolvimento nacional sem estratégia nacional de defesa... Uma das questões é como conciliar as responsabilidades atuais das Forças Armadas, como monitoramento de fronteiras, do território e do mar jurisdicional - com a necessidade de se preparar para a “ provável evolução futura da guerra”24. È necessário atentar sobre os próximos desenvolvimentos e, então, observar se os altos investimentos em defesa poderão estimular a corrida armamentista na América do Sul ou não ?

** Para visualização das tabelas citadas neste artigo, ver o Anexo V deste Anuário às páginas 245 a 251.

Bibliografia

Artigos e Documentos

BROMLEY, Mark., PERDOMO, Catalina. CBM em América Latina y el efecto de la adquisición de armas por parte de Venezuela. Documento de Trabalho 41/2005, Real Instituto Elcano, Madrid, 2005. GRIMMETT, Richard F. Conventional Arms Transfers to Developing Nations, 1999-2006. Congress Report Service (CRS), Report for Congress, Washington, September 26, 2007.MCDERMOT, J. t. Colombia Struggles to Counter Arms Smuggling, Jane’s Intelligence Review, Londres, Dezembro de 2004, p. 36. NÚÑEZ, Rafael F. A. Z. Los gastos en defensa en los paises sudamericanos y su influencia en el ambiente de seguridad y defensa. Dissertação de Mestrado, Universidad del Salvador, Buenos Aires, Argentina, 8 de maio de 2006. OEA, “Reunión de Expertos sobre Medidas de Fomento de la Confianza y la Seguridad”, Consejo Permanente de la Organización de Estados Americanos, Comisión de Seguridad Hemisférica, OEA/Ser. G, CP7CHS-528/02, rev. 3, 28/I/2003 OLHERO, Nelson., SULLIVAN, Mark. Venezuela: Political Conditions and U.S. Policy. CRS, Report for Congress, Washington, Setember 4, 2007. PESSIN, Al. Rumsfeld Compares Venezuela’s Chávez to Hitler. Pentagon, 2 de fevereiro de 2006. Fonte: http://www.globalsecurity.org/military/library/news/2006/02/mil-060202-voa10.htm STÅLENHEIM, P., FRUCHART, D., OMITOOGUN, W. and PERDOMO, C., Military expenditure, in SIPRI Yearbook 2006, Oxford University Press, Oxford, 2006

Dados estatísticos

Stockholm International Peace Research Institute – SIPRI – SIPRI Yearbook 2004; 2005; 2006; 2007, Oxford University Press, Londres.Portal Nation Máster. Fonte: http://www.nationmaster.com/index.php Portal Military Power Review. Fontes: http://www.militarypower.com.br/ranking.htm e http://www.militarypower.com.br/frame4-ranking2004.htm International Institute for Strategic Studies, London. Military Balance, 2002-2003; 2004-2005; 2006-2007, Oxford University Press, Londres.

Mídia

“Chávez Military Buildup Creating ‘Imbalance’”, Miami Herald, Miami, 27/IV/2005.“Colombia Upset at Venezuela”, Federal News Radio, 11/IV/2005, http://www.federalnewsradio.com/index.php?nid=25&sid=249463 “Doubts over Venezuela’s Arms Deal Cleared: US Official”, Xinhua News Agency, 20/V/2005, Fonte: http://english.people.com.cn/200505/20/eng20050520_186006.html “Treating Chávez as a Regional Threat”, Latin American Security & Strategic Review, SSR-05-03, 9/III/2005.“Venezuela: A New Security Doctrine”, Stratfor, Premium Global Intelligence Brief, 7/II/2005, Fonte: http://www.stratfor.com/

24 Palestra no VIII Encontro Nacional de Estudos Estratégicos (ENEE), Brasília, 7 de Novembro 2007, cf. O Globo, 8 de novembro de 2007.

Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul 61

“Venezuelans Buying and Planning to License-produce AK-103s and AK-104s”, Flash News, 6/XII/2004, Fonte: http://www.fav-club.com/flash/fn35.htm “Venezuela to buy Russian submarines, air defense systems”. Agência NOVOSTI - 18/06/2007. Fonte: http://www.globalsecurity.org/military/library/news/2007/06/mil-070618-rianovosti01.htmFORERO, J. “Arms Buying by Venezuela Worries US”, New York Times, NY, 15/II/2005. HILL, Christian. Venezuela Wants Sub Fleet for Conflict with U.S. News Max.com, 19/02/2007. Fonte: http://www.globalsecurity.org/org/news/2007/070219-venezuela-subs.htm ROMERO, Simon. Venezuela Spending on Arms Soars to World’s Top Ranks, The New York Times, NY, 25/02/2007. Fonte: http://www.globalsecurity.org/org/news/2007/070225-venezuela-arms.htm

62 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

FABIANA DE OLIVEIRA GODINHO*

Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Indígenas e o desenvolvimento do Direito Internacional, especificamente os direitos dos indígenas.

Abstract

The present article has as objective the analysis of the United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the development of International Law, specifically the rights of indigenous peoples.

Table of Contents

I - Introduction and Historical BackgroundII - Conceptual Framework A - Indigenous’ Status of “Peoples” B - Individual and Collective RightsIII - The Contents of the Declaration: an OverviewIV - A delicate balance between indigenous’ demands and States’ integrity in the

Declaration: indigenous peoples’ right to self-determination A - Right to Autonomy or Self-government B - Right to Political ParticipationV - The Declaration on Indigenous Peoples’ Rights and International LawVI - Conclusion

I - Introduction and Historical Background

After more than 20 years of intensive discussions and drafting works1, the United Nations General Assembly adopted the UN Declaration on the Rights of Indigenous

* Research Fellow at the Max Planck Institute for Comparative Public Law and International Law in Heidelberg, and Doctoral Candidate at the Ruprecht-Karls-Universität Heidelberg, Germany.

1 For an overview of the drafting works and the positions of the various States about the different issues see R. L. Barsch, “Indigenous Peoples and the UN Commission on Human Rights: A Case of the Immovable Object and the Irresistible Force”.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

63

Peoples (hereinafter the Declaration) on the 13th of September 20072. The Declaration is intended to summarize the minimum standard of rights and principles, which are necessary to provide for indigenous peoples worldwide a life with dignity and cultural autonomy.

The first significant step within the United Nations concerning the specific issue of indigenous’ rights goes back to an expert study on the problem of discrimination faced by indigenous persons3. This study was conducted for more than 10 years by a Special Rapporteur (Mr. Jose R. Martinez Cobo) nominated by the Human Rights Sub-Commission on Prevention of Discrimination and Protection of Minorities4 (hereinafter Sub-Commission). Its findings were documented in a broad report5 which led to the establishment of a Working Group on Indigenous Populations6 (hereinafter Working Group). This Working Group was especially mandated to “review developments pertaining to the promotion and protection of the human rights and fundamental freedoms of indigenous populations”, by means of analyzing information collected by the UN Secretary-General, and considering “both similarities and the differences in the situations and aspirations of indigenous populations throughout the world”7.

The Working Group activities can be summarized as a large forum where representatives of the various interested parties, including States, intergovernmental and non-governmental organizations, and different indigenous communities could express their concerns8. The decision on the necessity of elaborating a declaration on indigenous rights was taken in 1985 and some leading principles were then formulated in preliminary wording. At its 11th session, in July 1993, the Working Group agreed on a final text for the so-called “Draft UN-Declaration on the Rights of Indigenous Peoples”, which was composed of 45 operational articles9. This draft was then submitted to the Sub-Commission for its adoption, which happened in 199410.

A significant event regarding the growing focus on indigenous issues within the United Nations was the declaration of the decade 1994-2004 as the first “World Decade on the Rights of Indigenous Peoples”11. The goal of the decade was defined as “the strengthening of international cooperation for the solution of problems faced by indigenous in such areas as human rights, the environment, development, education and health”12. In the context of this decade, the (former) Commission on Human Rights established another working group – the so-called “Working Group on the Draft Declaration” – with the attribution to review the text of the draft declaration

2 GA Resolution 61/295, 13 September 2007.3 This study was authorized by the UN Economic and Social Council in 1971. See ECOSOC Resolution 1589, 21 May 1971.4 See Resolution 8 (XXIV) of the Sub-Commission, 18 August 1971.5 See Study of the problem of discrimination against indigenous populations, Jose R. Martinez Cobo, E/CN.4/Sub.2/1986/7.6 See Resolution 1982/34 of the Economic and Social Council, 7 May 1982.7 Ibidem.8 Further information on participation in the Working Group of the Commission, see R.L. Barsch, “Indigenous Peoples and the UN Commis-

sion on Human Rights: A Case of the Immovable Object and the Irresistible Force”, p. 783-786.9 Report of the WGIP on its 11th session (E/CN.4/Sub.2/1993/29).10 Resolution 1994/45, 26 August 1994.11 GA Resolution 48/163, 21 December 1993. After the first decade, the second decade was also declared, comprehending the years of 2005-

2015 – See GA Resolution 59/174 (2005).12 Ibidem, Paragraph 2.

64 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

submitted to it by the Sub-Commission13. One of the noteworthy results of the decade was the establishment of a Permanent Forum on Indigenous Issues as a subsidiary organ of the Economic and Social Council, in July 200014. The forum’s mandate is defined as to “discuss indigenous issues within the mandate of the Council relating to the economic and social development, culture, the environment, education, health and human rights15”.

A final agreement on the text of the draft declaration was only reached in 200616. The draft was one of the first instruments then adopted by the newly established Human Rights Council, by 30 votes to 2 (Canada and Russian Federation), and 12 abstentions, in June 200617. Following this event, the draft was brought before the UN General Assembly for its consideration and adoption, but a final decision on this respect was first postponed in order to “allow time for further consultations thereon”18. One year later, the UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples was finally adopted with 143 votes in favour, 4 votes against (Australia, Canada, New Zealand and United States of America) and 11 abstentions19.

This long process reflects the difficulties in overcoming the historical neglect of indigenous interests and in reconciling these peoples’ claims with the interests of the various States. The main obstacles to an agreement were set by the issues of indigenous peoples’ collective rights, the right to self-determination and land rights. The question of a reasonable and far reaching definition for the term “indigenous peoples” also raised strong discussion and represented a stumbling block20.

Bearing in mind this difficult and long evolution, the intention of this essay is not to provide a full commentary on the Declaration. It is, rather, to take a closer look into the final UN document, enlightening its content and scope, as well as appointing its controversial issues, and thereby to highlight the potential significance of the Declaration by the development of an international body of rights for the peoples concerned. For that purpose, the document’s conceptual framework (II) will be analyzed at first as it provides the background, which is reflected in the various provisions of the Declaration. In particular, the indigenous communities’ status of “peoples” (A) and their entitlement to collective rights (B) are the main issues to be contemplated in this context. The article will also provide an overview of the concrete provisions of the document and the themes embraced therein (III). Following, the analysis shall focus on the right to self-determination of indigenous peoples established in the Declaration (IV). The agreement reached between representatives

13 ECOSOC Resolution 1995/32, 25 July 1995.14 ECOSOC Resolution 2000/22, 28 July 2000.15 Ibidem, Paragraph 2.16 UN Doc. E/CN.4/2006/79, 22 March 2006.17 Further details in UN Doc. A/HRC/1/L.10, 30 June 2006.18 GA Resolution 61/178, 20 December 2006.19 GA Resolution 61/295, 13 September 2007. Abstentions: Azerbaijan, Bangladesh, Bhutan, Burundi, Colombia, Georgia, Kenya, Nigeria,

Russian Federation, Samoa, Ukraine. Absent States: Chad, Côte d’Ivoire, Equatorial Guinea, Eritrea, Ethiopia, Fiji, Gambia, Grenada, Gui-nea-Bissau, Israel, Kiribati, Kyrgyzstan, Marshall Islands, Mauritania, Montenegro, Morocco, Nauru, Palau, Papua New Guinea, Romania, Rwanda, Saint Kitts and Nevis, Sao Tome and Principe, Seychelles, Solomon Islands, Somalia, Tajikistan, Togo, Tonga, Turkmenistan, Tuvalu, Uganda, Uzbekistan and Vanuatu.

20 See comments in part II, A, of this essay.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

65

of indigenous communities and of States depended much on the configuration of this specific issue, which is delineated by different articles of the document. The main elements of the exercise of indigenous peoples’ self-determination, i.e. the right to autonomy or self-government (A) and the right to political participation (B) will be concerned. Finally, an attempt will be made in order to highlight the meaning of the UN Declaration to the whole corpus of international law by establishing innovative international legal standards on the rights of indigenous peoples (V).

II - Conceptual FrameworkThe UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples is better understood as

an instrument which combines the most developed standards of international law, especially the ones related to human rights, and to the rights of groups and minorities, to new formulas regarding the specific rights of indigenous peoples. As such, the Declaration calls upon States to comply with the various existing international instruments and, in this context, to consider the new document as a “further important step forward for the recognition, promotion and protection of the rights and freedoms of indigenous peoples”21. Bearing in mind the “historic injustices”22 suffered by these peoples, the States have accorded in the Declaration a set of rights which delineate a “standard of achievement to be pursued in a spirit of partnership and mutual respect”23.

A leading notion in the Declaration that also defines the desirable status of indigenous peoples could be expressed as equality in the diversity. That means, the Declaration goes from the assumption that all peoples have the right to be different, to consider themselves different and to be respected as such. Under this premise, it affirms that indigenous peoples are “equal to all other peoples”24. Many of the operational provisions in the Declaration go back to this central notion, reinforcing, on the one hand, the right of indigenous groups to exist and to be protected from every kind of discrimination or physical or cultural violence, and, on the other hand, addressing their right to self-determination. The Declaration reflects thus an approach of equality that values the differences in the societies and encompasses “cultural integrity as well as individual integrity”25 of indigenous.

As a product of real debate amongst the various interested parties, the Declaration is also determined to “enhance harmonious and cooperative relation between the State and indigenous peoples, based on principles of justice, democracy, respect for human rights, non-discrimination and good faith”26. The attempt to establish a reasonable balance between States powers and indigenous peoples’ autonomy is also a pivotal notion that characterizes the various provisions in the Declaration. 21 Paragraph 11 of the Preamble.22 Paragraph 6 of the Preamble.23 Paragraph 24 of the Preamble.24 Paragraph 2 of the Preamble.25 Anaya confronts the notions of equality meaning “diversity” vs. equality meaning “sameness” when analyzing the 2006 Shoshone decision

of the Committee on the Elimination of Racial Discrimination (CERD). See S. James Anaya, “Keynote Address: Indigenous Peoples and their Mark on the International Legal System”, p. 269.

26 Paragraph 18 of the Preamble.

66 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

A - Indigenous’ Status of “Peoples”Although the Declaration clearly recognizes indigenous groups as peoples, who are

equal to all other peoples, it does not offer a definition of the term “indigenous peoples” under its content27. The question has been indeed a contentious issue during the drafting of the text. The absence of a definition reflects on the one hand the difficulties met in formulating a common, far-reaching and flexible notion, suitable to the different realities of the most various indigenous communities throughout the world, and at once capable of expressing their identity features without weakening or diluting the issue28. On the other hand, the silence of the Declaration in this regard can be interpreted as an option and respect for the criteria of self-identification29 “as an essential aspect of individual and group freedom”30, an aspect of their self-determination.

The self-identification perspective is expressed in the Declaration by the right of indigenous individuals and peoples to belong to an indigenous community31 and the paralell right of indigenous peoples to determine their own identity or membership, according to their customs and traditions32. Together, these provisions lead to the conclusion that the Declaration, when stressing the self-identification criteria, places the individual choice under the condition of a collective element, namely the necessary recognition of the individual membership by the generality of the community.

At this point, one could criticize the excessive collective approach of the Declaration, in the sense that it could weaken the self-identification freedom of an individual and open the possibility of group pressures or denial of rights33. Nevertheless, Article 1 of the Declaration34 represents a general guarantee for the respect of the rights and freedoms established in the international human rights documents and therefore it should offer the necessary protection of individuals against collectivities abuses.

While the openness of the document in regard to the definition of “indigenous peoples” could raise the possibility of a variety of peoples benefiting from its provisions35, it can be inferred from the text that this document embraces the

27 In contrast, the ILO Convention 169 concerning Indigenous and Tribal Peoples in Independent Countries contains a definition of both tribal and indigenous peoples. According to it, tribal peoples are: “peoples whose social, cultural and economic conditions distinguish them from other sectors of the national community, and whose status is regulated wholly or partially by their own customs or traditions or by special laws or regulations” (Article 1,1,(a)). Indigenous peoples are defined as “peoples who are regarded as indigenous on account of their descent from the populations which inhabited the country, or a geographic region to which the country belongs, at the time of conquest or colonization or the establishment of present State boundaries and who, irrespective of their legal status, retain some or all of their social, economic, cultural and political institutions” (Article 1,1,(b)).

28 See B. Kingsbury, “Indigenous Peoples” in International Law: A Constructivist Approach to the Asian Controversy”. See also the Working Paper prepared by the Chairperson-Rapporteur, Mrs. Erica-Irene A. Daes, on the concept of ‘indigenous peoples’, E/CN.4/Sub.2/AC.4/1996/2 paragraphs 9 and 72.

29 The self-identification criteria has also been addressed in the ILO Convention 169 concerning Indigenous and Tribal Peoples in Indepen-dent Countries (Article 1,2) and also in different discussions within the Committee on the Elimination of Racial Discrimination (CERD).

30 See P. Thornberry, Indigenous Peoples and Human Rights, p. 15.31 Art. 9 of the Declaration.32 Art. 33, 1 of the Declaration.33 A. Xanthaki points out, that arguments regarding this concern have been put forward by the States. See Indigenous Rights and UN Stan-

dards, p. 105.34 Article 1 says: “Indigenous peoples have the right of full enjoyment, as a collective or as individuals, of all human rights and fundamental fre-

edoms as recognized in the Charter of the United Nations, the Universal Declaration of Human Rights and international human rights law”.35 See P. Thornberry Indigenous Peoples and Human Rights, p. 376.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

67

protection “of groups displaying specific features as to their organization, political and economic institutions, culture, beliefs, customs and language, other than those of dominant society, and further sharing a common experience of marginalization and discrimination deeply rooted in historical events”36. Considering these guidelines and the strong link between indigenous peoples’ rights and their traditional experiences and traditional resources and lands, which is a fundamental notion in the Declaration, the next question would be the sufficiency of the self-identification criteria for the inclusion under the remits of the Declaration of those individuals and groups who have undergone cultural developments or processes of deviation from their original cultural backgrounds37.

An answer to this question can be provided by two aspects of the framework rights established in the Declaration38. First, the clear recognition of a right of indigenous peoples to development, according to their own needs and interests39. Second, the parallel establishment of minimum standards for the exercise of ordinary extra-communal activities, which are also open to indigenous’ choice40. These statements extend the scope of the Declaration to encompass and provide guarantees also for those indigenous groups and individuals who, for some reason, do not share the traditional life anymore41.

B - Individual and Collective RightsAnother central concept in the Declaration is the indigenous communities’

entitlement to collective rights. This issue was also heavily debated during the drafting works and strong rejected by some State’s representatives42. Nevertheless, the final text of the document places the indigenous groups’ rights in a very central position, following from the recognition of their status of “peoples”.

The very first articles of the Declaration reveal significant general principles in this regards. In Article 2, it becomes clear that indigenous peoples are, along with individuals, also bearer of rights43. According to this provision, indigenous groups may exercise their rights in a free and non-discriminatory manner.

36 See S. Errico, “The Draft UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples: An Overview”, p. 746.37 Amongst these individuals and groups, one can mention “groups undergoing processes of cultural adaptation or development” or others

“who suffered cultural diffusion, acculturation, depletion on resources and habitat and who therefore may feel indigenous by self-identifi-cation rather than through attachment to a traditional community”. See P. Thornberry, Indigenous Peoples and Human Rights, p. 377.

38 See P. Thornberry, Indigenous Peoples and Human Rights, p. 377. See also Xanthaki, Indigenous Rights and United Nations Standards, p. 106.39 This right can be recognized mostly in Art. 3, which comprehends the indigenous peoples’ right to “freely determine their political status

and freely pursue their economic, social and cultural development”. Similar provisions are found in articles 11 (“past, present and future manifestations of their cultures”), 23 (“right to determine and develop priorities and strategies for exercising their right to development”), 34 (right to “promote, develop and maintain their institutional structures and their distinctive customs, spirituality, traditions”), inter alia.

40 For example, in article 15 (indigenous peoples’ right of dignity and diversity in the State’s education and public information system); article 17 (indigenous individuals’ right to enjoy the rights established under domestic labour law); article 21 (indigenous peoples’ right to the improvement of their economic and social conditions, in the areas of education, employment, (…) health and social security); article 33 (indigenous individual’s right to obtain citizenship of the States in which they live), inter alia.

41 See on this topic P. Thornberry, Indigenous Peoples and Human Rights. United States: Juris Publishing, Manchester, 2002, p. 376-378.42 Some States, like France and Japan even denied the existence of collective rights in international law. See UN Doc. E/CN.4/1997/102,

paragraphs 108-113. Like this document shows, many other States were concerned with the proper protection of individual rights vis-à-vis the group rights.

43 This view is shared by Gayim, S. 9. Article 2 says: “Indigenous peoples and individuals are free and equal to all other peoples and individu-als and have the right to be free from any kind of discrimination, in the exercise of their rights, in particular that based on their indigenous origin or identity”.

68 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

In addition (and in an innovative manner), Article 1 suggests the indigenous peoples’ entitlement to the collective exercise of the rights and fundamental freedoms prescribed in the international human rights instruments44. Especially this latter provision advances the wide extent of the collective approach in the Declaration. The document not only opens to the collectivity, in line with Article 2, the enjoyment of proper collective rights, but also apparently extends to them, as collective entities, the international framework of individual human rights45.

These notions are supported by a series of specific indigenous collective rights explicitly recognized in the Declaration46. Amongst them, the right “to live in freedom, peace and security as distinct peoples”47, the right “to practice and revitalize their cultural traditions and customs”48, the right “to the lands, territories and resources which they have traditionally owned or otherwise occupied”49, the right to determine their own identity or membership in accordance with their customs and traditions”50 and the broad and controversy right to self-determination51.

Other provisions follow the formulation from Article 2 and encompass rights which are at the same time individual and collective, such as the right “not to be subjected to forced assimilation or destruction of their culture”52, the right “to belong to an indigenous community or nation, in accordance with the traditions and customs of the community or nation concerned”53, and the right “to enjoy fully all rights established under applicable international and domestic labour law”54.

The recognition of this broad spectrum of collective rights represents indeed a further step in the protection and promotion of indigenous peoples’ interests and existence under international documents55. It carries, however, a challenge, namely the question of how to conciliate group rights with the individual rights of the communal members which are proclaimed in the various international human rights instruments and in the Declaration itself.

44 Article 1: „Indigenous peoples have the right to the full enjoyment, as a collective or as individuals, of all human rights and fundamental freedoms as recognized in the Charter of the United Nations, the Universal Declaration of Human Rights and international human rights law“.

45 Wenzel calls it a „Kollektivierung der Individualrechte der menschenrechtlichen Instrumente“ (a “collectivization” of the individual rights in the human rights instruments). See Das Spannungsverhältnisse zwischen Gruppenschutz und Individualschutz im Völkerrecht, p. 88. This view is also supported by Gayim, The UN Draft Declaration on Indigenous Peoples: Assessment of the Draft Prepared by the Working Group on Indigenous Populations, p. 9. According to them, indigenous peoples would be able to invoke, as a collective, those individual rights, insofar as their nature allows their application to groups. Although Thornberry agrees, that “it is ‘indigenous peoples’ who are recognized as holding rights under the UN Charter, the UDHR, and international human rights law”, he does not go so far and concludes that “what the text perhaps tries to say or should say is that nothing therein should be interpreted to lower existing standards on the rights of peoples and individuals”. See Indigenous Peoples and Human Rights, p. 380.

46 See an overview of the content of the Declaration in part III of this essay.47 Article 7, 2 of the Declaration.48 Article 11, 1 of the Declaration. 49 Article 26 of the Declaration50 Article 33, 1 of the Declaration.51 Article 3 of the Declaration.52 Article 8, 1 of the Declaration.53 Article 9 of the Declaration.54 Article 17 of the Declaration.55 Specific indigenous groups’ rights were also established in the ILO Convention 169 (1989). However, they were set in a much narrower

scope and grade of consent (the Convention was only ratified by 17 States) than the Declaration.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

69

The problem of balancing collective and individual rights is a well-known issue among scholars56 and international bodies57 and was also addressed by many States during the debates58. The excessive collective weight of some provisions of the Declaration caused concern among them59. Nevertheless, the Declaration itself contains guidelines which help reconciling these categories of rights.

First of all, the already mentioned article 1 of the Declaration invokes the individual rights established in the international human rights instruments, which may be enjoyed by all indigenous peoples and individuals in a full, free and non-discriminatory manner. The international human rights framework constitutes then a clear state of dignity and freedom that every indigenous individual (and collectivity) must enjoy and therefore may not be disrespected by communal practices.

Article 34 sets another boundary to the outcomes of indigenous peoples’ powers by expressly binding the exercise of their communal traditions and practices, and the development of their own institutions, to the international human rights standards60. Although the real scope of the provision is still unclear61, one cannot deny its potential value for the protection of individual rights62.

Finally, Article 22 calls upon States to take measures, together with indigenous peoples, to guarantee the protection of indigenous women and children against violence and discrimination63. This provision is a clear attempt to ensure protection to women and children against offending communal practices.

All these provisions in the Declaration are still formulated in a vague and limited wording. Further interpretive and implementing developments are necessary to clarify the constellation drawn in the document regarding the harmonization of indigenous’ collective and individual rights64.

III - The Contents of the Declaration: An OverviewThe UN Declaration is an instrument of wide scope, which goes further than former

international documents regarding indigenous rights by embracing a great variety of issues and merging their different aspects.

56 For a complete study on this issue, see N. Wenzel, Das Spannungsverhältnis zwischen Gruppenschutz und Individualschutz im Völkerre-cht.

57 See, for example, the Lovelace case under the ICCPR in UN Doc. CCPR/C/OP/1 - 1988.58 See Report of the 1996 session in UN Doc.E/CN.4/1997/102, paragraphs 108-113.59 One example is article 35: “Indigenous peoples have the right to determine the responsibilities of individuals to their communities”. Article

33, which declares indigenous peoples’ right to “determine the structures and to select the membership of their institutions in accordance with their own procedures” is another example. On this topic, see A. Xanthaki, Indigenous Rights and United Nations Standards, p. 108.

60 Art. 34: “Indigenous peoples have the right to promote, develop and maintain their institutional structures and their distinctive customs, spirituality, traditions, procedures, practices and, in the cases where they exist, juridical systems or customs, in accordance with internatio-nal human rights standards.”

61 Wenzel questions the scope of this provision, especially when confronted to the next article in the Declaration. Article 35 determines: “Indigenous peoples have the right to determine the responsibilities of individuals to their communities”. See N. Wenzel, Das Spannungs-verhältnis zwischen Gruppenschutz und Individualschutz im Völkerrecht, p. 476.

62 Thornberry even remind us that this provision has been opposed by representatives of indigenous peoples who feared a wider limitation to their exercise of self-determination. See Indigenous Peoples and Human Rights, p. 380.

63 Article 22, 2 reads: “States shall take measures, in conjunction with indigenous peoples, to ensure that indigenous women and children enjoy the full protection and guarantees against all forms of violence and discrimination”.

64 Further discussion on this topic in S. J. Anaya, Indigenous Peoples in International Law, p. 133. See also A. Xanthaki, Indigenous Rights and United Nations Standards, p. 107-109; see also P. Thornberry, Indigenous Peoples and Human Rights, p. 378-381. Both mention the Lovelace case under the ICCPR and the employment of the principles of necessity and proportionality, equity and balance of rights to the relationship between collective and individual rights (UN Doc. CCPR/C/OP/1 - 1988).

70 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Following the establishment of the already mentioned general principles in articles 1 and 2, the Declaration stipulates:

a) A wide protection against physical and cultural forms of violence and against discrimination and the corresponding right to live in freedom, peace and security (Arts. 7-10);

b) Cultural rights, including the right to manifest, practice, develop, revitalize and teach their traditions and customs (Arts. 11–14), and the right to maintain, control, protect and develop their cultural heritage, traditional knowledge and traditional cultural expressions (Art. 31);

c) Right to dignity and diversity in education, public information/media and labour and non-discriminatory access to these areas (Arts. 15-17);

d) Economic rights, which comprehend the right to the improvement of their economic and social conditions (Art. 21), and the right to development, including active involvement in developing and determining health, housing and other economic and social programmes affecting them (Art. 23), non-discriminatory access to all social and health services, as well as the employment of their traditional medicines and practices (Art. 24);

e) Land rights, encompassing the right to own, use, develop and control the lands, territories and resources that they possess by reason of traditional ownership or other traditional occupation or use (Arts. 25-29)65. These rights also include the prohibition of military activities in the lands or territories of indigenous peoples (Art. 30).

f) The right to the recognition, observance and enforcement of treaties and agreements concluded with States (Art. 37);

g) And last but not least, the right to self-determination (Art. 3), which shall be considered in conjunction with two further different but at the same time complementary groups of rights: the participation rights (Art. 18-20) and the autonomy rights (Arts. 32-36)66.

The Declaration also incorporates remedies for violations of rights67 and provisions regarding the text interpretation and implementation by the States (Arts. 38-46).

IV - The delicate balance between indigenous’ demands and States’ integrity in the Declaration: indigenous peoples’ right to self-determinationOne of the most significant outcomes of granting indigenous communities the status

of “peoples” in the Declaration is the recognition of their right to self-determination68. The inclusion or not of an express provision on this issue in the document was one 65 An interesting aspect of the Declaration regarding land rights is the close link made between indigenous culture and possession of their lan-

ds. Article 8 aims to protecting indigenous peoples from acts leading to “forced assimilation” and “destruction of their culture”, including “any action which has the aim or effect of dispossessing them of their lands, territories or resources” (Paragraph 2,(b)).

66 Amongst these rights, it is interesting to note the protection provided to nomadic peoples in Article 36. 67 It establishes, for example, the right to redress (Art. 8, 2; Art. 28, 1), the right to just and equitable compensation (Art. 28, 1 and 2), the right

to restitution (Art 28, 1), and the right to restoration (Art. 29, 3). 68 In contrast, the ILO Convention 169 rejects any link between the expression “indigenous peoples” and any implications under international

law. See article 1.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

71

of the main controversial items during the drafting debates69, as it touches very fundamental concepts for both indigenous communities and States70. Nevertheless, the final text of the Declaration assembles a variety of provisions, which, directly and indirectly, declare the indigenous peoples’ right to self-determination and also delineate its scope.

The primary provision on this right - Article 371 – offers just the starting point for the comprehension of the content of “self-determination” under the Declaration. It establishes an “unqualified” right at first sight, which makes no reference to the principle of State’s territorial integrity or political unity, in contrast to other international instruments dealing with the same issue72. The wording used can be understood as a reflex from the fact, that the Declaration is the first UN document of this nature, which was formulated with active participation of the peoples concerned. That might explain why the central provision on self-determination is presented (and was agreed) in a stronger, supportive, and apparently unilateral formulation.

Any uncertainty that could have been caused by the wording of article 3 was, however, dissipated after the insertion of some last amendments to the text on the level of the UN General Assembly73. After various proposals were made, the final text of the Declaration was adopted with a very significant sentence in Art. 46, paragraph 1. Besides determining, as a general interpretation principle, that “nothing in this Declaration may be interpreted as implying for any State, people, group or person any right to engage in any activity or to perform any act contrary to the Charter of the United nations”, this provision further rejects interpretations “construed as authorizing or encouraging any action which would dismember or impair, totally or in part, the territorial integrity or political unity of sovereign and independent States”. The rationale of this provision is also expressed in the Preamble which reinforces the link between the right to self-determination in the Declaration and the framework of international law74.

Irrespective of these clear statements, a systematical analysis of the Declaration would lead to one same conclusion: the exercise of indigenous peoples’ right to self-determination, in the manner described in the document, presupposes 69 For an overview on this debate, see the Reports of the Commission Working Group at UN Doc. E/CN.4/year/ (for example, UN Doc. E/

CN.4/2000/84). See also P. Thornberry, Indigenous Peoples and Human Rights, p. 382-385.70 Indigenous representatives considered the right to self-determination to be “the heart and soul” of the declaration. On the other hand, States

were from the beginning concerned with the impacts of this right on their territorial integrity. See, for example, discussions on Article 3 within the Working Group on the Draft Declaration, UN Doc. E/CN.4/2004/81.

71 Article 3: “Indigenous peoples have the right to self-determination. By virtue of that right they freely determine their political status and freely pursue their economic, social and cultural development”.

72 Article 3 repeats the same wording of common article 1 of the UN Human Rights Covenants (International Covenant on Civil and Political Rights, 1966, and International Covenant on Economic, Social and Cultural Rights, 1966). Nevertheless, the provisions in the Covenants expressly bind this right to the framework of international law and especially to the framework of the United Nations Charter, where State territorial integrity is promoted.

73 The President of the 61st session of the UN GA appointed a “facilitator” (the Permanent Representative of the Philippines to the United Nations in New York, H.E. Hilario G. Davide Jr.) entitled to conduce further consultations on the draft Declaration (June 2007).

74 The Preamble reads as following: “Acknowledging that the Charter of the United Nations, the International Covenant on Economic, Social and Cultural rights and the International Covenant on Civil and Political Rights as well as the Vienna Declaration and Programme of Ac-tion, affirm the fundamental importance of the right to self-determination of all peoples,…”. Further: “Bearing in mind that nothing in this Declaration may be used to deny any peoples their right to self-determination, exercised in conformity with international law” (Paragraphs 16 and 17, respectively).

72 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

the context of a life within the framework of a State75. There is nothing in the declaration that could imply a right to secession, or the so-called right to external self-determination.

In this context, it seems correct to affirm that once indigenous communities are “peoples”, who are “equal to all other peoples”, they may also make use of the secession mechanism in the strict cases allowed by international law if they find themselves in the contexts contemplated by these cases76. The Declaration is intended, in the first instance, to respect and preserve the international (human) rights standards that might concern indigenous life, never diminishing or extinguishing them77. On the other hand, however, the Declaration intends to go further, establishing a specific international framework for indigenous peoples78. That means the Declaration sets the specific indigenous peoples’ right to self-determination79. This specific right does not comprehend sovereignty; considering the indigenous peculiar cultural identity, it establishes, first, “qualitative standards”80 to be achieved under two premises: indigenous peoples’ self-government and political participation. These are the notions that merge indigenous’ and States’ concerns into one convergent notion of self-determination, better apprehended against the background-problematic of internal governance and coexistence of various (but equal) groups within the State.

A - Right to Autonomy or Self-GovernmentThe first facet of the exercise of self-determination in the Declaration is the

indigenous peoples’ right to autonomy or self-government expressly established in Article 481. The wording of this provision is not so enlightening. Nevertheless, other provisions in the Declaration clarify the content of this right. According to them, the right to autonomy entitles indigenous peoples to maintain, develop and exercise the various features, which form their cultural identity, “in matters relating to their internal and local affairs”82. For that purposes, indigenous peoples have the right to develop and enjoy their own political, legal, economic, social and cultural

75 Article 33 even stresses the idea of “citizenship” of the States in which the indigenous peoples live. It reads: “Indigenous peoples have the right to determine their own identity or membership in accordance with their customs and traditions. This does not impair the right of indigenous individuals to obtain citizenship of the States in which they live”. According to S. Errico, the right to self-determination would imply a “constitutional formulae” to accommodate indigenous aspirations. See “The Draft UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples: An Overview”, p. 749.

76 It would be especially the case of indigenous peoples living under colonial and alien domination or under racist oppression. See C. E. Foster, “Articulating Self-Determination in the Draft Declaration on the Rights of Indigenous Peoples” about the development of Self-Determination in International Law and its relation to indigenous peoples – p. 143-150.

77 Article 37, 2 even declares that “Nothing in this Declaration may be interpreted as diminishing or eliminating the rights of indigenous peoples contained in treaties, agreements and other constructive arrangements”.

78 Article 43 states that “the rights recognized herein constitute the minimum standards for the survival, dignity and well-being of the indige-nous peoples of the world”.

79 See S.J. Anaya, Indigenous Peoples in International Law, p. 97-128. See also J. Gilbert, “Indigenous Rights in the Making: the United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples”, p. 219-220.

80 See A. Quentin-Baxter’s commentary on S. J. Anaya’s position in “The UN Draft Declaration on the Rights of Indigenous Peoples – The International and Constitutional Law Contexts”, p. 91.

81 Article 4: “Indigenous peoples in exercising their right to self-determination, have the right to autonomy or self-government in matters relating to their internal and local affairs, as well as ways and means for financing their autonomous functions”.

82 Article 4 of the Declaration.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

73

institutions83, and “ways and means for financing their autonomous functions”84, always “in accordance with international human rights standards”85.

In particular, this right embraces, for example, the right “to establish and control their (indigenous) educational systems”86, the right “to maintain their health practices”87, the right “to maintain and develop their political, economic and social systems or institutions, to be secure in the enjoyment of their own means of subsistence and development”88, inter alia89.

Practiced under these terms, indigenous peoples’ autonomy is to be possible in the context of a “multicultural State”, where dialogue and negotiation, also required by the Declaration, would offer the solid ground for its development90.

B - Right to Political ParticipationThe right to autonomy, as mentioned above, is just one outcome of the right to

self-determination in the Declaration. In the document, however, autonomy is not intended to place indigenous peoples in social or political isolation and in consequent vulnerability91. On the contrary, besides being entitled to self-government, indigenous peoples enjoy the right to participate “fully” in the “political, economic, social and cultural life of the State”92.

It has been stressed that the wording of the Declaration, as establishing for indigenous communities the possibility to participate in the framework of the State “if they so choose” is weak and could give this right a second role93. The “choice approach”, however, could be simply interpreted as an implication of the self-determination right in the sense that the self-government is not an imposition. Indigenous communities might also determine the grade of their integration in the life of the State, taking into account the wish or necessity of preservation of their own cultural identity. This approach can play a significant role in countries like Brazil, where indigenous groups still choose to live in isolation94.

83 Article 5: “Indigenous peoples have the right to maintain and strengthen their distinct political, legal, economic, social and cultural insti-tutions, while retaining their right to participate fully, if they so choose, in the political, economic social and cultural life of the State”.

84 Ibidem. Article 34 adds: “Indigenous peoples have the right to promote, develop and maintain their institutional structures and their dis-tinctive customs, spirituality traditions procedures, practices and, in the cases where they exist, juridical systems or customs, in accordance with international human rights standards”.

85 Article 34 of the Declaration.86 Article 14 of the Declaration.87 Article 24 of the Declaration.88 Article 20, 1 of the Declaration.89 Although the concept of indigenous autonomy is also reflected in cultural rights, these rights are better understood in the broader concept

of “cultural diversity”. See part V of this essay.90 S. Errico reminds us that the concrete realization of “autonomy” can only be assessed in a case-by-case perspective. She mentions “the

establishment of the Sami Parliaments in the Nordic countries, the arrangement for the comarca in Panama, the creation of the autonomous region of Nunavut in Canada and the self-governing territory of Greenland in Denmark”. See “The Draft UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples: an Overview”, p. 749. See also E. A. Daes, “The Concept of Self-Determination and Autonomy of Indigenous Peoples in the Draft United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples”, p. 268. See also S. J. Anaya “International Human Rights and Indigenous Peoples: The Move toward the Multicultural State”.

91 See E. A. Daes, “The Concepts of Self-Determination and Autonomy of Indigenous Peoples in the Draft United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples”.

92 Article 5 of the Declaration.93 See S. Errico, “The Draft UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples: an Overview”, p. 751.94 Nowadays there are references of about 63 indigenous groups living in isolation in Brazil. Further information in www.funai.gov.br.

74 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Indigenous peoples are, at first sight, entitled to participate like other peoples and citizens in the economic, social and cultural life of the State95. The Declaration cares for non-discrimination and equality in this respect, and also invokes for the indigenous the standards established by the international human rights instruments.

More than being protected from discrimination within the community of a State, however, indigenous peoples may, according to the Declaration, effectively participate in the decision-making process affecting their interests and rights96. This political participation constitutes the second aspect which builds the self-determination right of indigenous peoples. It might be exercised “through representatives chosen by themselves in accordance with their own procedures”97. Moreover, the political participation comprehends the indigenous peoples’ right to “free, informed and prior consent”, to be obtained by States “before adopting and implementing legislative or administrative measures that may affect them”98.

Although the participation in the decision-making and the consultation appear in various provisions of the Declaration99, it is controversy if they could really promote indigenous interests. Concern is expressed in relation to States in which decisions are taken by majority (and indigenous peoples constitute a minority), or where decisions are not taken by truly democratic processes100. Nevertheless, the Declaration states clearly that policies or legislation adopted on the basis of mere consultation could not anymore be considered legitimate under the international standards of indigenous peoples’ rights.

V - The Declaration on Indigenous Peoples’ Rights and International LawRegardless of its further concrete impact on the domestic legal systems and

policy-making, the UN Declaration must be seen as a leading document that codifies and develops a specific area of international law: the rights of indigenous peoples101. Whether this development was really needed or not is still a controversy matter102. Nevertheless, one cannot deny that the Declaration cares for a wider scope of protection and better development of the peoples concerned, based on the main framework of collective rights. Furthermore, it establishes guidelines for the relation between indigenous peoples and States by the accommodation of the formers’ rights.95 It is important to notice that the Declaration is inspired in the assertion that indigenous peoples have suffered many abuses throughout

history and still live in disadvantage, which justify the “special” rights established in the document. Therefore, these rights do not intend to place indigenous peoples in a privileged position in the society, but first to guarantee some equality among the different citizens. See S. Errico, “The Draft UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples: An Overview”, p. 745-746. See also A. Quentin-Baxter, “The UN Draft Declaration on the Rights of Indigenous Peoples – The International and Constitutional Law Contexts”, p. 92-95.

96 The issue of indigenous previous consent was also stressed by the Committee on the Elimination of Racial Discrimination in its General Recommendation 23 on indigenous peoples. See UN Doc. CERD/C/365.

97 Article 18 of the Declaration.98 Article 19 of the Declaration. 99 See Articles 10, 11, 18, 19, 29, 32 of the Declaration. One should note that the majority of these provisions deal with the right to be con-

sulted, leaving the right to decide or determine a secondary role.100 In this regard, see A. Quentin-Baxter, “The UN Draft Declaration on the Rights of Indigenous Peoples – The International and Constitutio-

nal Law Contexts”, p. 95.101 It is important to notice, that the former international binding documents, which provide specific rights for indigenous peoples are the ILO

Convention 107 (1957) and the ILO Convention 169 (1989). The former one still reflects the old assimilation approach and the latter one counts on only 17 ratifications. This places the new UN Declaration in a very central position among these documents.

102 About this discussion, see J. Gilbert, “Indigenous Rights in the Making: the United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peo-ples”, especially pages 209-212.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

75

An aspect that must be highlighted is that by placing indigenous cultural identity in the foreground and by declaring indigenous communities’ status of “peoples”, the Declaration also offers principles for a more coherent application of other international human rights instruments to the indigenous reality. The human rights general approach, despite its mainly individualistic essence, might be flexible enough to encompass indigenous peoples’ claims; but experience has shown that the development of a specific body of provisions dealing with the indigenous issue builds a substantial ground for the proper interpretation of human rights obligations of States regarding indigenous peoples103.

In particular, the UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples enlightens the notion and content of the right to self-determination in international law. The Declaration reinforces the idea that this right serves to a much wider context and purpose than the decolonization and sovereignty one stressed in other documents. It comprehends first an autonomous and participatory way of life in the context of a State.

Finally, the Declaration can be defined as the expression of a concept that has characterized the latest debates worldwide and has inspired developments in the interpretation and formulation of international (and also domestic) law: cultural diversity104. This notion is clearly expressed in the Preamble, which recognizes the “right to all peoples to be different” and highlights the “diversity and richness of civilizations and cultures, which constitute the common heritage of mankind”105. Even though they still represent standards of achievement to be pursued, the provisions in the Declaration envisage the constitution of real multicultural States106, grounded on respect, dialogue and cooperation, and free from discrimination. They reflect a highly update human rights approach towards diversity and establish new standards for the treatment of citizens in a State.

Although impelling international law developments, the UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples is not legally binding on States, what constitutes maybe its main weakness107. Even though, there might rest few reasons to believe that this document, which is a product of debate and consent on a first level, would not become at least an important guide for international and national courts, human rights treaty bodies and lawmakers worldwide when assessing the indigenous issue.

103 This idea is properly addressed by J. Gilbert, when he comments the strategy used by the Inter-American Court of Human Rights in the Awas Tingni case. He stresses: “Thus, the ‘indigenisation’ of the general right to property was based on more specific instruments on the rights of indigenous peoples. (…) From the judges’ point of view, there is an emerging corpus of international law on the rights of indi-genous peoples and the ‘indigenisation’ of Article 21 of the American Convention was a reflection of this development”. See “Indigenous Rights in the Making: the United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples”, p. 211. On this decision see also S. J. Anaya, “Keynote Address: Indigenous Peoples and their Mark on the International Legal System”, p. 264-267.

104 See S. J. Anaya, “International Human Rights and Indigenous Peoples: the Move Toward the Multicultural State”. Further on this issue: J. W. Dacyl (ed.) Governance of Cultural Diversity; J. Firestone. “Cultural diversity, human rights and the emergence of indigenous peoples in international and comparative environmental law”; M. Iovane, “The universality of human rights and the international protection of cultural diversity”; D. Kugelmann. “The protection of minorities and indigenous peoples respecting cultural diversity”.

105 Paragraphs 2 and 3 of the Preamble.106 Article 15 is a good example of provision promoting indigenous peoples “dignity and diversity”. States are called upon to “combat preju-

dice and eliminate discrimination, and to promote tolerance” within their society. 107 The Declaration was set by a General Assembly’s resolution. It is well-known that these resolutions are not binding on States. It could be

the case if the Declaration would be understood as addressing customary law. However, this discussion does not suit the purposes of this essay.

76 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

VI - Conclusion

The United Nations Declaration is a milestone document in the development of international law regarding indigenous peoples. It entails, moreover, a further achievement in the development of the international human rights regime grounded on the Universal Declaration of Human Rights.

The constitution of an international regime for indigenous groups has gone over a long path, moving along the levels of covert exclusion and punctual protection. The Declaration is the first international document that recognizes to these groups the status of “peoples” and extracts from this statement the entitlement to broad collective rights (as well as to collective exercise of individual rights) and, even further reaching, to a contextualized right to self-determination.

This regime celebrates the cultural diversity and systematizes guiding rights and principles for its achievement. Regarding indigenous peoples, who have suffered from years of neglected interests and violated rights, the way towards equality under a diversity approach is set: protection, maintenance and development of their cultural identity, which shall be conducted and supported by their own institutions (Autonomy); participation, free from discrimination, in the public life of a State, mainly, participation in the decision-making processes taken within a State (Political Participation).

The potential strength of this document, formulated on intentional basis, should not be underestimated. Other declarations, such as the United Nations Human Rights Declaration and the American Declaration of Human Rights have proved their essential influence on the establishment of international legal regimes. The document on indigenous peoples’ rights is a result of first agreements reached through a broad debate, of no precedents in this context, and shows that conciliation is in some extent possible. The participation of representatives from the most different regions of the world lays the basis for a universal and systematical approach that may now be accessed and further developed by international and national courts, human rights treaty bodies, law- and policy-makers when contemplating the indigenous issue.

Actually, the Declaration leaves a trace of unresolved questions and uncertainties. It is, for example, still not clear how the protection of individual rights will be in fact accommodated to the expanded groups power recognized in the document. Another uncertain issue is the implications of the indigenous peoples’ rights for the social cohesion of the community of the State as a whole. One aspect of this question is how to conciliate indigenous peoples’ rights (especially the political ones) and other peoples’ and individuals’ claims within the State. A second aspect would be how to support indigenous autonomy and at the same time provide for their integration in the broader community of the State.

All these questions represent a significant challenge for the success of the Declaration. The document sets the leading principles but it is clear that the ways of their implementation will be first established on a case-by-case solution, grounded on dialogue and respect, and, especially, concerning the peculiarities of each region and each indigenous community.

The United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples and the Development of International Law

77

ReFeReNCeS

- ANAYA, S. James. “Keynote Address: Indigenous Peoples and Their Mark on the International Legal System” American Indian Law Review 31 (2006/2007), 2, 257-272.

- ________________ “International Human Rights and Indigenous Peoples: The Move toward the Multicultural State” Arizona Journal of International and Comparative Law, 21 (2004) 1, 13-61.

- ________________ Indigenous Peoples in International Law. New York: University Press, 2nd Edition, 2004.- BARSCH, Russel Lawrence. “Indigenous Peoples and the UN Commission on Human Rights: A Case of the Immovable Object and the

Irresistible Force” Human Rights Quarterly 18 (1996) 782-813.- BURGER, Julian. “Indigenous Peoples and the United Nations” in: COHEN, Cynthia Price (ed.) Human Rights of Indigenous Peoples,

Ardsley, New York: Transnational Publ., 1998, 3-16.- CARINO, Joji. “Indigenous Peoples’ Right to Free, Prior, Informed Consent: Reflections on Concepts and Practice” Arizona Journal of

International and Comparative Law, 22 (2005) 1, 19-39.- CASTELLINO, Joshua (ed.). International Law and Indigenous Peoples. Leiden: Nijhoff, 2005.- CLAVERO, Bartolomé. “The Indigenous Rights of Participation and International Development Policies” Arizona Journal of International

and Comparative Law, 22 (2005) 1, 41-51.- DACYL, Janina W. (ed.). Governance of Cultural Diversity. Stockholm: Swedish National Commission for UNESCO (i.a.) 2000.- DAES, Erica-Irene A. “The Concepts of Self-determination and Autonomy of Indigenous Peoples in the Draft United Nations Declaration

on the Rights of Indigenous Peoples” St. Thomas Law Review, 14 (2001) 2, 259-274.- DEBELJAK, Julie. “Barriers to the Recognition of Indigenous Peoples’ Human Rights at the United Nations” Monash University Law

Review, 26 (2000) 1, 159-202.- ERRICO, Stefania. “The Draft UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples: An Overview” Human Rights Law Review 7:4 (2007),

741-755.- _______________ “The UN Declaration on the Rights of Indigenous Peoples is Adopted: An Overview” Human Rights Law Review 7:4

(2007), 756-759.- FIRESTONE, Jeremy. “Cultural Diversity, Human Rights and the Emergence of Indigenous Peoples in International and Comparative

Environmental Law” American University International Law Review, 20 (2004) 2, 219-292.- FOSTER, Caroline E. “Articulating Self-determination in the Draft Declaration on the Rights of Indigenous Peoples” European Journal of

International Law, 12 (2001) 1, 141-157.- GAYIM, Eyassu. The UN Draft Declaration on Indigenous Peoples: Assessment of the Draft Prepared by the Working Group on Indigenous

Populations. Rovaniemi: University of Lapland Printing Services, 1994.- GILBERT, Jérémie. “Indigenous Rights in the Making: the United Nations Declaration on the Rights of Indigenous Peoples” International

Journal on Minority and Group Rights 14 (2007) 207-230.- IOVANE, Massimo. “The universality of human rights and the international protection of cultural diversity” International Journal on

Minority and Group Rights, 14 (2007) 2/3, 231-262.- KINGSBURY, Benedict “Indigenous Peoples’ in International Law: A Constructivist Approach to the Asian Controversy”, 92 American

Journal of International Law 92 (1998) 3, S. 414-457.- KUGELMANN, Dieter. “The protection of minorities and indigenous peoples respecting cultural diversity” Max Planck Yearbook of United

Nations Law, 11 (2007), 233-263.- QUENTIN-BAXTER, Alison. “The UN Draft Declaration on the Rights of Indigenous Peoples – The International and Constitutional Law

Contexts” Law Review/Victoria University of Wellington 29 (1999), 1, 85-110.- THORNBERRY, Patrick. Indigenous Peoples and Human Rights. United States: Juris Publishing, Manchester, 2002.- VENNE, Sharon Helen. Our Elders Understand Our Rights: Evolving International Law Regarding Indigenous Rights. Penticton: Theytus,

1998.- WENZEL, Nicola. Das Spannungsverhältnis zwischen Gruppenschutz und Individualschutz im Völkerrecht. Berlin-Heidelberg (u.a.):

Springer, 2008.- XANTHAKI, Alexandra. Indigenous Rights and United Nations Standards. Cambridge (u.a.): Cambridge University Press 2007.

78 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional

JACOB DOLINGER * **

Resumo

O presente artigo, fruto de palestra ministrada em Belo Horizonte, no dia 16 de julho de 2007, em ocasião do III Curso de Inverno de Direito Internacional, objetiva discutir o terrorismo internacional como ameaça ao direito internacional. Partirá da idéia de que em qualquer tema de direito internacional público, o jurídico e o político encontram-se intimamente entrelaçados, sendo impossível examiná-los à luz da normativa jurídica sem considerar seus aspectos políticos. No caso do terrorismo, pesam ainda outros fatores, geralmente ausentes no ius gentium, como o religioso e o teológico. Neste sentido, fica clara a complexidade do problema, a dificuldade de se encontrar uma solução e a possibilidade de acentuados pontos de divergência.

Abstract

This article was produced from a lecture at the III International Law Winter Course on July 16th, 2007, in Belo Horizonte, and it is aimed on discussing international terrorism as a threat to International Law. It is based on the idea that, in every topic of International Public Law, the juridical and political aspects are intimately connected, and it would be impossible to examine them only in the light of the juridic normative line without considering political elements. In the case of terrorosim, there are still other factors that are not usually present in the ius gentium, as those from religious and teleological influences. Thus, the complexity of the problem, the difficulty of finding a solution and the possibility of pronounced divergent points are clear in this case.

* Professor aposentado da UERJ, Professor Visitante da School of Law da Universidade de Miami, Conferencista da Academia de Direito Internacional da Haia. O autor agradece Mayra Mayor e Gabriel Reis, bacharelandos da UERJ, pela colaboração na pesquisa às fontes e à bacharel Vanessa Macharette pela constante, dedicada colaboração.** Conferência pronunciada em16 de julho de 2007, no III Curso de Inverno de Direito Internacional organizado pelo CEDIN – Centro de Direito Internacional, em Belo Horizonte.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 79

Sumário

- I. Introdução- II. Definição do Terrorismo- III. Causas do Terrorismo - O terrorismo interno - O terrorismo internacional- IV. Islam da Paz ou Islam da Guerra- V. Britânia Ingênua - VI. O Papa Perde Grande Oportunidade- VII. Europa Acovardada- VIII. Direitos Humanos- IX. O Direito Internacional Público- X. A Questão Palestina- XI. A Solução Alternativa para Falta de Definição do Terrorismo- XII. O Terrorismo Internacional Perante o Direito Internacional Público- XIII. A Esperança

I. Introdução

Em qualquer tema de direito internacional público, o jurídico e o político encontram-se intimamente entrelaçados, sendo impossível examiná-los à luz da normativa jurídica, sem considerar os aspectos políticos; no caso do terrorismo, pesam ainda outros fatores, geralmente ausentes no ius gentium, como o religioso e o teológico. Daí a complexidade do problema, a dificuldade de se encontrar uma solução e a possibilidade de acentuados pontos de divergência.

E o que pretendo expor hoje, neste entardecer em Belo Horizonte, por ocasião do 3º Curso de Inverno de Direito Internacional organizado pelo Centro de Direito Internacional – CEDIN – por cujo convite expresso minha sincera gratidão – é uma análise acentuadamente em divergência com o que se vem publicando nos últimos tempos no Brasil e no exterior.

Basta dizer que pretendo divergir de importantes documentos produzidos pelas Nações Unidas, baterei de frente com o ex-secretario geral da ONU, sr. Koffi Anan, divergirei em certo ponto do ilustre chanceler brasileiro, meu mestre e amigo, Professor Celso Lafer, bem como de outros eminentes estudiosos do direito internacional público, inclusive de trabalhos publicados aqui, pelo CEDIN, em 2003, no livro “Terrorismo e Direito”, coordenado pelo Professor Leonardo Nemer Caldeira Brant1.

De maneira que a única coisa que posso prometer é que não vos entediarei pela monotonia, porque pretendo ser contestador e crítico severo, apresentando pontos de

1 Leonardo Nemer Caldeira Brant (coord.), “Terrorismo e Direito – Os impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil: Perspectivas político-jurídicas”, Forense, 2003.

80 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

vista que para uns parecerão reacionários, para outros soarão heréticos, e para alguns talvez sirvam para mostrar uma luz no final do longo e perigoso túnel, que é este tão jovem e já trágico século XXI.

II. Definição de TerrorismoRios de tinta já foram gastos sobre a problemática em torno da definição de

terrorismo. Incontáveis fórmulas foram apresentadas para defini-lo, mas nenhuma conseguiu aprovação da comunidade internacional. Não estando definido, falta-lhe tipificação penal e, portanto, não haveria como punir o terrorista.

Dentre as 13 convenções existentes sobre o terrorismo, dirigidas a áreas específicas, existem definições corretas e adequadas; a lei britânica, Terrorism Act 20002 encerra uma definição apropriada e satisfatória, mas no plano internacional ainda não se conseguiu chegar a uma definição genérica, abrangente que satisfaça a comunidade internacional. Esta seria a principal explicação porque o terrorismo não foi incluído na competência do Tribunal Penal Internacional, criado pelo Estatuto de Roma3.

Em relatório apresentado ao Secretário Geral das Nações Unidas por uma Comissão de Alto Nível sobre Ameaças, Desafios e Mudança, a falta de acordo para uma definição clara do terrorismo foi considerada fator que mina a posição normativa e moral contra este crime, representando uma mancha na imagem da ONU, havendo um imperativo político no sentido da aprovação de uma convenção compreensiva, genérica sobre o terrorismo que inclua uma definição clara deste crime4.

O principal motivo para a falta de consenso sobre a definição, explica o relatório, provem da objeção formulada no sentido de que povos que se encontram sob ocupação estrangeira têm o direito de resistir, e uma definição de terrorismo não deveria afetar este direito. Outros, acrescenta o relatório, negam o direito à resistência.

A objeção relativa ao direito de resistência de povos sob ocupação é encontrada em muitas fontes sob o dito “one man’s terrorist is another man’s freedom fighter”, ou seja, o que para uns é um terrorista, para outros é um batalhador pela liberdade”.

Escreveu recentemente o Professor José Cretella Neto:Para a maioria dos países ocidentais, atentados violentos, politicamente

motivados, inclusive os cometidos por grupos palestinos em Israel, constituem indubitavelmente atos de terrorismo e é precisamente a contrariedade islâmica a essa posição o fator que impede a adoção de definição universalmente aceita para o terrorismo internacional5.

2 O “Terrorism Act 2000” contém a seguinte informação acerca de sua publicação: “Printed in the UK by The Stationery Office Limited under the authority and superintendence of Carol Tullo, Controller of Her Majesty’s Stationery Office and Queen’s Printer of Acts of Parliament”.

3 Rome Statute of the International Criminal Court, adopted July 17, 1998, International Legal Materials 1998, pp. 999-1069, versão verna-cular em Denise de Souza Soares e Jacob Dolinger, “Direito Internacional Penal”, Renovar, 2006, pp. 1295-1351.

4 “A more secure world: Our shared responsibility – Report of the Secretary-General’s High-level Panel on Threats, Challenges and Chan-ge”, United Nations, 2004, p. 51, par. 159.

5 José Cretella Neto, “Dos Fundamentos Jurídicos do Combate ao Terrorismo Internacional”, S. Paulo 2006, Tese.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 81

O Professor italiano Antonio Cassese considera que de fato existe uma definição de terrorismo no direito internacional, persistindo discordância apenas com relação a certas exceções a esta definição, como a dos freedom fighters . E acrescenta:

... constituiria um êrro de lógica dizer que porque não existe consenso sobre a exceção, não dispomos de uma noção geral. Isto equivaleria a dizer que como em direito penal há dúvidas se o homicídio sob coerção pode ser excepcionalmente justificado, não se pode definir homicídio6.

Ou seja, mesmo que haja dúvida se o ato dos palestinos que atacam e matam velhos, mulheres e crianças, num restaurante, numa pizzaria, em um mercado, ou em qualquer lugar público, constitui ou não terrorismo – que Cassese chama de exceção – isto não afeta a definição de terrorismo sobre outros atos.

Entendo que o Professor Cassese está redondamente equivocado, por três motivos:

a) praticamente falando, a exceção a que ele se refere – os freedom fighters - não constituem exceção mas a regra: se excluirmos os atentados terroristas praticados nos últimos decênios invocando a luta pela libertação do povo palestino, executados não só em Israel, mas em diversas partes do mundo, inclusive em Nova York, verificaremos que a existência do Estado de Israel se constitui em um dos principais móveis da sociedade internacional de terroristas, como veremos adiante das declarações de Osama bin Laden;

b) os palestinos que vivem na faixa de Gaza e na Cisjordânia, estão muito longe de serem freedom fighters, conforme igualmente demonstrarei mais adiante;

c) mesmo que freedom fighters fossem e que sua luta fosse de libertação, não há luta por libertação que justifique matar crianças em um jardim de infância, atletas durante as Olimpíadas internacionais, passageiros civis em um ônibus inter municipal, jovens entrando para dançar numa boate, velhos sentados em um hotel para celebrar a noite de Páscoa israelita. Estes atos são indubitavelmente terroristas; não há como considerá-los exceção como quer Cassese.

Voltarei mais adiante a diversos aspectos do problema palestino. Por ora vejamos o status de uma definição para o crime de terrorismo.

O Relatório da Comissão de Alto Nível apresentou proposta para uma definição que aqui reproduzo, devidamente traduzida:

A definição de terrorismo deverá incluir os seguintes elementos:a) (...)b) declaração de que os atos enumerados nas 12 convenções anteriores sobre

terrorismo constituem terrorismo e uma declaração de que eles constituem crimes de acordo com o direito internacional ...;

c) referência às definições contidas na Convenção de 1999 sobre Supressão de Financiamento de Terrorismo e a Resolução do Conselho de Segurança n. 1566 de 2004;6 Karima Bennoune, em resenha bibliográfica ao livro Enforcing International Law Norms Against Terrorism, editado por Andréa Bianchi,

que inclui um trabalho do Professor Cassese, resenha esta publicada no American Journal of International Law, 2006, pp. 507-513..A referência ao trabalho de Antonio Cassese aparece à p. 511.

82 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

d) descrição do terrorismo como “qualquer ação, além dos atos já especificados nas convenções existentes sobre aspectos do terrorismo, a resolução do Conselho de Segurança n. 1566 de 2004, que intenta causar morte ou graves danos físicos a civis ou não combatentes, quando o objetivo de tal ato, por sua natureza ou contexto, é intimidar a população ou forçar um governo ou uma organização internacional a fazer ou se abster de fazer algum ato”7.

Temos decisões de tribunais nacionais e internacionais que condenaram acusados por crime de terrorismo, sem maiores preocupações sobre falta de definição, como um julgado pela Corte Suprema do Canadá e uma condenação do Tribunal Penal Internacional para a Iugoslávia no caso Prosecutor v. Gali8, em que o tribunal rejeitou críticas de que condenar uma pessoa com base nesse crime, violaria o princípio nullum crimen sine lege.

As mais veementes demonstrações de que a pretensa falta de definição continua impedindo progresso nesta área, constituindo-se em uma questão vexatória, é a não inclusão deste crime na competência do Tribunal Penal Internacional e a impotência da ONU em aprovar uma Convenção abrangente do crime de terrorismo, que deveria, justamente, incluir uma definição satisfatória para o número mínimo de membros exigido para a aprovar um tratado ou convenção internacional.

O chanceler Celso Lafer publicou um artigo no Estado de São Paulo9 em que endossa a proposta de Koffi Anan, com base na Convenção de 1999 para a supressão de financiamento ao terrorismo, a que aludimos acima, e que conceitua o terrorismo como:

Todo ato que obedeça a intenção de causar a morte ou graves danos corporais a civis não combatentes com o objetivo de intimidar uma população ou obrigar um governo ou uma organização internacional a realizar ou abster-se de realizar um ato

Considera o Professor paulista: ... inequívoca a força moral e política desta definição que, juridicamente,

deslegitima a prática terrorista, que foi respaldada nas conclusões da Cúpula de Madri e deve ser seguida pela diplomacia brasileira, que nela encontra um caminho preciso para cumprir, como deve, o principio constitucional do repudio aos terroristas10.

Esta definição coincide com a fórmula proposta pela Comissão de Alto Nível em seu já aludido relatório para o Secretário Geral da ONU.

III. Causas do TerrorismoPrecisamos de uma definição do terrorismo a fim de poder processar e julgar os

terroristas. Mas, é evidente que detectar, prender e levar a julgamento alguns terroristas não resolverá o problema, não evitará o perigo que pesa sobre toda humanidade, pois não estamos longe do momento em que o terrorismo internacional adquirirá armas nucleares, armas químicas, armas bacteriológicas e outras armas de destruição em

7 Nota 3, p.52, par. 164.8 Ibid.9 Celso Lafer, “A Cúpula de Madri e o Terrorismo”, O Estado de São Paulo, 20 de março de 2005.10 Ibid.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 83

massa, com o objetivo de causar desgraças monumentais, das quais povo algum sobre a terra estará a salvo.

Cabe, por isto estudar as causas do terrorismo, a fim de examinar se existiria algo que possa ser empreendido para minorar o perigo e quiçá, um dia, eliminá-lo de todo.

E isto me leva a traçar uma distinção que considero importante: o terrorismo interno e o terrorismo internacional.

1. O Terrorismo InternoAs Brigadas Vermelhas, na Itália, o Baader- Meinhof da Alemanha, os Montoneros

na Argentina, os Tupamaros no Uruguai, vieram, aterrorizaram e desapareceram. Foram difíceis momentos da história destes povos que deixaram marcas de grandes sofrimentos, mas que felizmente pertencem ao passado.

O IRA, na Inglaterra, encontra-se, aparentemente em processo de definitiva extinção, o ETA, na Espanha, ainda atuante, os movimentos terroristas na Colômbia e em outros países latino-americanos, todos causaram e continuam causando dor e sofrimento nas sociedades nacionais afetadas, mas não se expandem para fora de seus territórios, pois seus objetivos são efetivamente internos.

Na Argélia, há mais de uma década, o Grupo Islâmico Armado vem massacrando aldeãos, intelectuais, policiais, numa campanha de intensa crueldade. Os assassinatos de muçulmanos moderados e budistas no sul da Tailândia e outras campanhas bárbaras em certos pontos do mundo praticadas por islamistas, fundamentalistas, fanáticos, chocam o mundo civilizado. Serão igualmente manifestações de terrorismo interno.

Há opinião de que estas facetas do terrorismo praticado por muçulmanos enlouquecidos demonstram que não se trata apenas de uma luta intercivilizacional, mas também intracivilizacional11. Observo minha discordância com esta colocação, assim como não assimilo o conhecido “Choque de Civilizações”, pois o que temos hoje é o embate entre a civilização, por mais incoerente, injusta e desequilibrada que ela seja, de um lado, com a pura barbárie fanatizada de outro lado.

2. O Terrorismo InternacionalAinda que a distinção entre terrorismo interno e terrorismo internacional não seja

sempre fácil, sugiro classificar como terrorismo internacional todo aquele que tem ligação, total ou parcial, com questões políticas que extrapolam o território em que os respectivos atos são perpetrados e cujos objetivos sejam transnacionais.

Assim, o ataque aos atletas israelenses nas Olimpíadas de Munique, os ataques operados contra instalações americanas no Líbano, as explosões nas embaixadas americanas no Kenya e na Tanzania, o ataque contra o “USS Cole”, o paraplégico Klinghoffer, numa viagem turística pelo navio Achile Laura, arrancado de sua cadeira de rodas e jogado ao mar, os ataques a turistas no Egito, os incêndios causados a poços petrolíferos do Oriente Médio, a derrubada das Torres Gêmeas em Nova York e o ataque ao Pentágono em Washington, são inegavelmente atos terroristas internacionais.

11 Id., p. 508

84 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Assim também as explosões nos trens de Madrid, no metrô e nos ônibus de Londres, bem como as tentativas de explosões de duas semanas atrás em Londres e no aeroporto de Glasgow, todos constituem terrorismo internacional. De certa forma também se integram nesta categoria as violências praticadas pela juventude muçulmana nas ruas de Paris e de outras cidades francesas causando grandes prejuízos ao país e aos particulares.12 E, naturalmente, os ataques terroristas dos árabes aos israelenses, que, como veremos adiante, longe estão de visarem a criação do Estado palestino, pois visam exclusivamente a destruição do Estado de Israel.

São atentados que não se ligam a objetivos locais, mas que visam chamar a atenção, atemorizar, aterrorizar os povos do Ocidente, para finalidades que o grande líder terrorista fez questão de divulgar aos quatro cantos da terra.

Em 12 de outubro de 1996, Osama bin Laden lançou a seguinte proclamação:É a obrigação de toda tribo na península arábica de empreender guerra santa e

limpar a terra destes ocupantes cruzados ...Meus irmãos muçulmanos, seus irmãos na Palestina e na terra dos dois Lugares

Sagrados (Arábia Saudita) clamam por vossa ajuda e vos pedem que participem na guerra contra o inimigo, os americanos e os israelenses. Eles vos pedem para fazer tudo que possais para expulsar os inimigos dos locais santos do Islam13.

Em fevereiro de 1998 Bin Laden assinou um fatwa – um comando religioso - dirigido a todos muçulmanos no sentido de que assassinar americanos e seus aliados civis e militares é uma obrigação religiosa para todo muçulmano, a ser executada em qualquer país em que se encontrem, até que a mesquita Al Aqsa em Jerusalém seja liberada deles e até que seus exércitos tenham deixado terras muçulmanas14.

Mais recentemente, Osama proclamou que haveria paz quando o Ocidente reconhecesse a verdade proclamada por Maomé e se convertesse ao Islam.

Aqui cabem duas observações, uma de caráter econômico-militar, a outra de caráter histórico-religioso.

Econômico-Militar - A presença militar americana na Arábia Saudita se dá a pedido do seu governo. Só que Osama e as classes dirigentes deste país estão rompidos e ele pretende aparecer como o defensor da soberania saudita, contra o interesse dos príncipes sauditas que se concentram nos poços de petróleo, cuja exploração é feita em parceria com as companhias americanas.

Histórico-Religioso – Jerusalém, onde se encontra a mesquita Al Aqsa não aparece uma vez sequer no Corão, porque, contrariamente à lenda da subida de Maomé de Jerusalém para o céu, ele lá nunca esteve. Maomé nasceu em 570, morreu em 633. A Mesquita foi construída em 709. Já na Bíblia, Jerusalém aparece mais de 700 vezes.

12 Dominique Custos em”Secularism in French Public Schools”, American Journal of Comparative Law, 2006, escreve à p. 397 – “While the vast majority of its believers practice or embrace a peaceful Islam, since the 1980s., a minority of Islamic fundamentalists has subjected France to a strategy of destabilization of secularism in particular, and terrorism against the Sate, in general”.

13 D. J. Harris, “Cases and Materials on International Law”, 6a. ed., 2004, nota 22, à p. 944.14 Ibid.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 85

Mas para convocar um jihad não há necessidade de verdade histórica ou econômica. Qualquer pretexto serve para incitar, porque a incitação ao ódio, à guerra, ao terrorismo é baseada, fundamentalmente, na mentira, na falsidade e na perversidade.

IV. Islam da Paz ou Islam da guerra?Todos aqueles que têm se interessado pela filosofia política do Islam já observaram

a ambigüidade, as manifestas contradições das interpretações do que seria o Islam, qual seu olhar para o resto do mundo. Como vê a guerra e será que acredita na paz?

Uma escola de pensamento é de que o Islam é uma religião de paz e de que somente admite a guerra em três circunstâncias: defesa do Islam, auto defesa e defesa dos oprimidos. Portanto jihad al qital (guerra) é limitada, e o estado normal da vida é a paz.

A outra escola considera o Islam como uma religião da guerra: jihad é o meio para expandir o Islam. Os clássicos como al Mawdudi consideram que o jihad é uma obrigação e que a universalização do Islam é o objetivo15.

Não é difícil situar o pensamento de Osama bin Laden e também não é difícil saber qual a escola que está prevalecendo na atualidade. De maneira que enfrentamos uma guerra aberta ao Ocidente, a nós todos infiéis, sejamos cristãos, judeus, budistas, ou ateus, e enquanto não aceitarmos a veracidade da profecia de Maomé e tudo de negativo que ele escreveu (ou mandou escrever) a respeito das outras religiões monoteístas, somos réus confessos e merecemos morrer pela espada da jihad. Este é hoje o foco central da liderança muçulmana que se faz ouvir, e a manifestação básica do terrorismo internacional.

V. Britânia IngênuaEm livro publicado no ano passado, meses depois das explosões ocorridas em

Londres, que custaram mais de 50 vidas e fizeram centenas de feridos, uma destemida jornalista britânica publicou um livro sob o título “Londonistan”, em que mostra como Londres se transformou em um Afganistão.

Neste livro ela narra como os muçulmanos adquiriram extraordinário poder político no país, conseguindo impor suas vontades, ficar isentos de controle e ter seus criminosos incitadores ao ódio e à guerra santa se manterem impunes ao longo de anos.

Conta que de acordo com números oficiais, há em torno de 15.000 cidadãos britânicos muçulmanos que estão ativamente engajados ou apóiam atividades terroristas, enquanto que três mil já passaram pelos campos de treinamento de al Qaeda, entre os quais algumas centenas de jovens preparados para atacar seu próprio país.

Entre muitos absurdos que ocorreram na Inglaterra nos últimos anos, narra que o terrorista Abu Hamza foi finalmente preso em fevereiro de 2006, por incitar ao ódio racial e advogar o assassinato, e só então o público inglês ficou sabendo que durante anos

15 Anicée van Engeland, “Humanitarin Law and Islamic Humanitarian Law”, American Society of International Law - Proceedings of the 100th. Annual Meeting, March-April 2006, p. 156.

86 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

permitiu-se que ele operasse de uma mesquita londrina como figura central do movimento terrorista britânico, enquanto as autoridades britânicas permaneciam inertes. Além de incitar ao ódio e à morte, Hamza amealhou dentro da sua mesquita um enorme arsenal de armas para serem utilizadas nos acampamentos de treinamento dos terroristas. Por meio de seu violento discurso em prol da jihad, Hamza radicalizou um número incalculável de muçulmanos ingleses, inclusive três dos autores dos atentados de Londres16.

A autora discorda da opinião de muitos de que as bombas de Londres foram causadas pelo apoio britânico à guerra no Iraque. Isto não é a realidade, diz Melanie Phillips, pois o terror islâmico precedeu à guerra no Iraque e tem sido dirigido contra países que nada têm com a mesma, como a Indonésia, ou que se colocaram ativamente contra a invasão daquele país, como a França17.

Apesar de tudo que aconteceu, a principal preocupação da mídia e da intelectualidade inglesas é evitar o que passaram a chamar de Islamofobia. Qualquer tentativa da sociedade britânica de defender seus valores, seja através de leis anti-terroristas, seja pela reafirmação da supremacia dos valores ocidentais, é denunciada como Islamofobia. Falar em “terrorismo islâmico” é considerado altamente islamofóbico18.

Melanie Phillips se refere ao temor que existe entre a massa de muçulmanos que gostariam de se manifestar contra a ideologia jihadista, mas temem por suas vidas.

No entanto, há exceções. Assim, Shi Abd al-Hamid al-Ansari, ex-reitor da Faculdade de Sharia da Univesidade de Qatar, escreveu no Al Hayat, o diário árabe publicado em Londres, na sua edição de 2 de agosto de 2004, o seguinte:

Porque não aproveitamos a oportunidade do aparecimento do relatório da Comissão sobre o 11 de setembro para refletir porque nossa sociedade foi apoderada pela cultura da destruição, da violência? Porque não aproveitamos esta oportunidade para reconsiderar nosso sistema educacional, nosso currículo, inclusive o religioso e nosso discurso cultural, que levam nossa juventude a viver em constante tensão com o mundo?19

Mansour Ijaz escreveu no Financial Times de 11 de julho de 2005, depois da primeira série de atentados londrinos:

É hipócrita da parte dos muçulmanos que vivem nas sociedades ocidentais exigir direitos civis garantidos pelo estado e depois tentar justificar sua inércia contra os terroristas que se escondem entre nós, alegando viver numa comunidade islâmica sem fronteiras. É chegada a hora de nos levantarmos e agir como cidadãos modelos antes que o terror nos consuma a todos20.

Estas vozes se fazem ouvir também em outras partes do mundo. Em novembro de 2001, Iszat Majeed, escritor paquistanês, publicou no “The Nation”, jornal

16 Melanie Phillips, “Londonistan”, Encounter Books, New York, 2006, p. xi.17 Id, p. xvi.18 Id, p. xxi.19 Id, pp. 185/6.20 Ibid.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 87

diário paquistanês uma carta aberta a Osama bin Laden, em que diz, entre outras coisas.

A última coisa que precisamos é a escuridão crescente de tuas cavernas... O Santo Profeta Maomé, ao retornar de uma batalha, disse: ‘Retornamos de um pequeno Jihad para um Jihad maior’. A verdadeira jihad hoje não reside em seqüestrar aviões, mas em construí-los21.

VI. O Papa Perde grande OportunidadeEm 12 de setembro de 2006, o Papa Benedito XVI deu uma aula na Universidade

de Regensburg, na Alemanha, onde fora professor de teologia. A aula teve como título “Fé, Razão e a Universidade – Memórias e Reflexões”.

Depois de expor suas recordações da época em que ensinava na Universidade e de suas reflexões sobre fé e razão, o Sumo Pontífice assim se expressou:

Lembrei-me de tudo isto recentemente quando eu lia a edição do Professor Theodoro Khoury (Munster) sobre parte do diálogo mantido – provavelmente em 1391, nas barracas perto de Ankara – pelo erudito Imperador bizantino Manuel II Paleologus e um estudioso persa, sobre a questão do Cristianismo e o Islã e a verdade de ambos. Presumivelmente foi o próprio imperador que registrou este diálogo durante o cerco de Constantinopla entre 1394 e 1402; e isto explica porque seus argumentos estão descritos em maior detalhes do que os de seu interlocutor persa. O diálogo se relaciona grandemente com as estruturas de fé (structures of faith) contidas na Biblia e no Corão, e trata especialmente da imagem de Deus e do homem, aludindo repetidamente ao relacionamento entre as três “Leis” ou “regras da vida”: o Velho Testamento, o Novo Testamento e o Corão. Não tenho intenção de discutir este tema na presente aula; aqui só gostaria de discutir um ponto apenas – que em si é marginal ao diálogo como um todo – que achei interessante no contexto do tema de “fé e razão”, e que poderá servir de ponto de partida para minhas reflexões sobre este tema.

Na sétima conversação editada pelo Professor Khoury, o imperador toca no tema da guerra santa. O imperador devia saber que a sura 2, 256 diz: “Não há coerção (compulsion) em religião”. De acordo com alguns especialistas, este é provavelmente uma das suras do período inicial, quando Maomé ainda não tinha poder e estava sob ameaça. Mas, naturalmente, que o imperador também conhecia as instruções desenvolvidas mais tarde e registradas no Corão concernentes à guerra santa. Sem descer aos detalhes, ele se dirige a seu interlocutor de maneira surpreendentemente brusca, numa atitude que consideramos inaceitável, sobre a questão central relativa a relacionamento entre religião e violência em geral dizendo: “Mostre-me o que Mohamed trouxe de novo, e aí você só encontrará coisas más e desumanas, como o seu comando para espalhar a fé que ele pregava pela espada Depois de se expressar tão fortemente (forcefully) passa a explicar em detalhe as razões porque espalhar a fé

21 “The New York Times”, 16 de novembro de 2001, edição eletrônica, cópia em poder do autor.

88 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

através da violência não é razoável. A violência é incompatível com a natureza de Deus e a natureza da alma. A Deus não agrada o sangue, ele diz, e agir não razoavelmente é contra a natureza de Deus. A fé nasce da alma, não do corpo. Aquele que quer conduzir outrem para a fé precisa ter a habilidade de falar bem e ponderar apropriadamente, sem violência, sem ameaças.... Para convencer uma alma razoável, não se precisa de um braço forte, ou armas de qualquer espécie ou qualquer outro meio para ameaçar a pessoa com a morte ..”.

A colocação decisiva neste argumento contra a conversão violenta é a seguinte: não agir de acordo com a razão é contrário à natureza de Deus ....

Como todos lembram seguiu-se uma grita no mundo islâmico. Parecia que a guerra cristã-muçulmana iria irromper. Nisto a diplomacia entrou em ação. Não era bem assim ... O Papa não quis criticar o Islam. Apenas uma referência à opinião do Imperador bizantino do longínquo século XIV. O Papa não se identificava com esta posição, etc. etc. E a situação foi se acalmando.

Perdeu o Papa uma esplendida oportunidade de dizer aos muçulmanos do mundo todo que sua religião era realmente da paz, mas que um grupo de fundamentalistas havia se infiltrado em suas mesquitas, em suas comunidades, combatendo a liberdade de pensamento e de expressão, não admitindo qualquer crítica dirigida à religião muçulmana, mas comportando-se sem qualquer freio quando se trata das religiões dos outros, incitando à violência, à guerra mundial, e que chegara a hora das forças sadias e pensantes do mundo muçulmano extirparem o mal de dentre si e manter-se fiel à mensagem pacífica do Corão, como muitos dentre eles sustentam ser a verdadeira mensagem de sua religião.

Possivelmente teríamos tido uma forte reação dos fanáticos, mas pelo menos a oportunidade teria sido dada aos intelectuais pacifistas dentre os muçulmanos e às suas massas pacíficas e ordeiras - que constituem a maioria absoluta - de se rebelar contra o ódio que lhes vem sendo instilado por uma minoria enlouquecida.

VII. europa AcovardadaUma observação da jornalista Melanie Phillips aponta para um perigoso

denominador comum verificado em países do Ocidente europeu que tem acentuada presença muçulmana.

Diz ela que o governo britânico corre o perigo de cair na mesma armadilha do que os franceses. Quando a comoção provocada pelos muçulmanos na França no outono de 2005 chegava ao auge, o governo francês, impotente para readquirir o controle da situação, dirigiu-se em desespero de causa àqueles mesmos que haviam radicalizado a juventude e imploraram deles que restabelecessem a ordem. O resultado foi um enorme aumento no poder político da Irmandade Muçulmana.

A situação em Paris, assim como em Marseille e em outras cidades francesas, tornou-se altamente explosiva. Um grupo de árabes seqüestrou no ano passado um jovem francês, judeu, submeteu-o a torturas durante dias, telefonando para seu pai a fim de que ouvisse os gritos de seu filho, e finalmente quando já estava à morte,

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 89

jogaram-no a rua, onde expirou. O Presidente Chirac fez um discurso bonito e as autoridades policiais francesas estariam à procura dos terroristas, teriam solicitado a extradição do chefe do grupo, foragido no exterior, mas o clima, o risco de que isto se repita, cresce dia a dia. Naturalmente que a imprensa mundial não se preocupa em documentar fatos desta natureza.

Agora os britânicos estão fazendo a mesma coisa. Ao invés de exilar os radicais, prender os incitadores, que envenenam o espírito dos jovens e lhes dão armas na mão, esperam que estes acalmem a situação, o que é uma brutal irresponsabilidade.

Na verdade, esta é a situação ora reinante nos vários países que durante o último quartel do século XX foram aceitando mais e mais trabalhadores estrangeiros e imigrantes de religião muçulmana. Quando estas comunidades cresceram em larga escala, pois, com base nas legislações imigratórias, iam trazendo suas famílias, criou-se uma infinidade de problemas econômicos, choques sociais, com forte elevação no índice de violência, de parasitismo, de exploração da previdência social, e de anti-semitismo virulento. O assassinato do cineasta Van Gogh, numa rua de Amsterdam, na Holanda, por ter produzido um filme crítico ao comportamento dos imigrantes muçulmanos, repercutiu no mundo, mas outros assassinatos, milhares de incidentes anti-semitas e racistas nas ruas da França, da Bélgica, da Inglaterra e de outros países europeus não chegam sequer às páginas dos jornais ou as telas de televisão. E os governos se acovardaram. Basta dizer que as escolas públicas britânicas acabam de excluir a narrativa do Holocausto de seus livros didáticos, a fim de não irritar a população muçulmana, em prol de cujas suscetibilidades o governo britânico tem feito as mais incríveis concessões. O perigo terrorista decorrente do grande número de imigrantes muçulmanos e suas numerosas famílias, já nascidas nos países que os acolheram, se concentra na Espanha, França, Inglaterra, Holanda, Bélgica e Dinamarca.

Em 2 de dezembro de 2005, Mathias Dopfner, presidente da grande editora Axel Springer AG, publicou no “Die Welt”, o principal jornal da Alemanha, um vibrante artigo sobre a acomodação, o apaziguamento que se tornou a tônica da política dos europeus frente ao terrorismo e à violência muçulmana em seus territórios, a ponto que na sua Alemanha se planeja acalmar esta massa, pela introdução de um novo feriado, o “muslim holiday”.

Depois de narrar o custo para a Europa do apaziguamento de Hitler por Chamberlain que depois da reunião com Hitler, em Munique, 1938, proclamou “Peace in our time”, diz o seguinte:

Nós europeus nos apresentamos, em contraste àqueles ‘arrogantes americanos’ como os campeões mundiais da tolerância. Porque? porque somos tão morais? Temo que é porque somos tão materialistas, tão destituídos de compasso moral. Nos preocupamos com nossa previdência social, em reduzir a semana de 35 horas de trabalho, com a cobertura previdenciária do tratamento dentário ou com nossas férias pagas de 4 semanas. ... Ouça os pastores da TV pregarem sobre a necessidade de “estender a mão aos terroristas.... compreender e perdoar”.

90 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Apaziguamento? Europa, teu nome é Covardia22.Esta política de apaziguamento, a Europa repete poucas décadas depois de ter

contemporizado com Hitler, causando com sua covardia a catastrófica Segunda Guerra Mundial, que custou cinqüenta milhões de vidas e sofrimentos inenarráveis; sob outra vestimenta, em circunstancias diferentes, a história se repete. Como foi lamentável ver o Vaticano receber o arqui-terrorista Arafat, o mesmo ocorrendo na Casa Branca de Bill Clinton.

Um valoroso político americano se recusou a receber o carrasco palestino, dizendo alto e bom som que Nova York não receberia um terrorista – Rudi Giuliani, prefeito da cidade, que anos depois iria se conduzir valorosamente durante a catástrofe das torres gêmeas. Alguns semanas depois do 11 de setembro, o bilionário Príncipe Alwaleed bin Talal, membro da nobre casa privilegiada da Arábia Saudita, depois de fazer uma ronda nas ruínas do World Trade Center, entregou ao prefeito um cheque de dez milhões de dólares e disse a Rudi que já era tempo para se chegar às raízes do terrorismo, que ele definiu como a falha dos Estados Unidos em forçar Israel a fazer paz com os palestinos e impedí-la de massacrá-los. Mr. Giuliani ouviu e devolveu o cheque. Daqui a pouco ouvireis algo sobre o conflito árabe-israelense.

Outra exceção é a Austrália. Peter Costelo, membro do gabinete australiano foi à televisão há alguns meses atrás e, dirigindo-se aos muçulmanos que vivem no país, lhes disse: “Se estes não são seus valores, se vocês querem um país regido pela Sharia ou um estado teocrático, a Austrália não é para vocês”.

O primeiro ministro John Howard falou sobre as agencias do governo australiano que controlam o que acontece nas mesquitas e disse: “São os imigrantes, não os australianos, que tem que se adaptar”.

VIII. Direitos HumanosNa literatura sobre terrorismo, estrangeira e nacional e, principalmente, nos

documentos produzidos pelos órgãos da ONU e por seu ex-Secretário Geral, há uma constante preocupação de que na luta contra o terror, os direitos humanos deixem de ser respeitados. Nos documentos da ONU estão sempre justapostas duas questões, uma relativa ao que seria a causa do terrorismo e a outra sobre o cuidado que se deve ter no processo de sua erradicação. Reproduzo alguns trechos importantes que nos dão uma idéia do duplo tema.

No Relatório do Secretário Geral da ONU de 27 de abril de 2006, sob o título “Uniting against terrorism: recommendations for a global counter-terrorism strategy”23, assim escreveu Kofi Anan:

Os atos terroristas constituem violações ao direito à vida, liberdade, segurança, bem estar e liberdade de temor. Por isto, os Estados estão obrigados a adotar e

22 Mathias Döpfner, “Europe – Thy Name is Cowardice”, Die Welt, 12 de dezembro de 2005, colhido no www.freerepublic.com/focus/f-news/1532876/posts, em 30 de abril de 2007.

23 United Nations General assembly, Sixtieth session, 27 de abril de 2006, documento A/60/825 e vide outro documento sob o título “Adop-ting a global counter-terrorism strategy” em http:/www.un.org/terrorism/framework.shtml.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 91

implementar medidas efetivas contra o terrorismo, na defesa dos direitos humanos de seus cidadãos.

Ao mesmo tempo, na luta contra o terrorismo, nunca podemos sacrificar nossos valores e baixar nossos padrões aos dos terroristas. A cooperação internacional na luta contra o terrorismo deve ser conduzida em total conformidade com o direito internacional, inclusive a Carta das Nações Unidas e as relevantes convenções e protocolos. Os Estados estão obrigados a garantir que toda medida tomada para combater o terrorismo esteja de acordo com suas obrigações segundo o direito internacional, especialmente a lei sobre os direitos humanos, a lei sobre refugiados e o direito internacional humanitário.

Somente colocando o contra-terrorismo dentro de um quadro legal (rule of law) poderemos salvaguardar os padrões internacionalmente valorizados que proscrevem o terrorismo, reduzir as condições que possam gerar ciclos de violência terrorista e cuidar dos ressentimentos que podem conduzir ao recrutamento terrorista. Comprometer a proteção dos direitos humanos poderá dar aos terroristas a vitória que eles não conseguiriam por si mesmos. E quando os direitos humanos são desrespeitados como parte da campanha contra o terrorismo, os terroristas exploram o abuso para mobilizar recrutas e procuram mais ainda justificar suas ações24. Por isto os Estados devem ratificar e implementar os instrumentos internacionais sobre os direitos humanos e aceitar a competência dos órgãos nacionais e internacionais que monitoram os direitos humanos, inclusive aqueles encarregados de controlar todos os lugares onde pessoas sofrem privação de sua liberdade.

Peritos em direitos humanos no plano internacional continuam expressando preocupação de que muitas medidas contra terroristas infringem direitos humanos e liberdades fundamentais. De acordo com as resoluções da Assembléia Geral 57/219, 58/187 e 59/191 eu submeti relatórios sobre proteção de direitos humanos e liberdades fundamentais na luta contra o terrorismo25.

Quero fazer as seguintes observações sobre esta colocação de Kofi Anan:1) Imaginemos um momento crítico em que o Estado tenha que tomar medidas para

evitar um desastre de grandes proporções, como a explosão de um aeroporto, a destruição de um edifício com milhares de pessoas, a implosão de uma escola com centenas de crianças, ou o lançamento de um artefato nuclear ou de uma bomba química que poderão matar milhares, dezenas de milhares, centenas de milhares de pessoas, trazendo escuridão, miséria, fome, epidemias: se neste momento o Estado toma uma ou outra medida que não obedece às formalidades processuais do direito público, ao sofisticado ritual exigido pelos princípios dos direitos humanos, esta decisão de salvar milhares em perigo iminente, mediante o sacrifício de algum direito humano do terrorista, poderá ser muito difícil, terrivelmente delicado, mas quiçá absolutamente necessário. Entendo que nenhuma ONU, nenhum Secretário Geral das Nações Unidas tem o direito de me dizer como agir ou como me omitir.

24 O destaque é meu.25 Id., parágrafos 111 a 114.

92 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

E estou falando de um Secretário Geral da ONU, cuja organização, que poderia ter salvo grande parte dos 800 mil seres humanos sacrificados em Rwanda pela barbárie terrorista interna, nada fez, absolutamente nada fez, pior ainda - no momento crítico retirou suas tropas do país. Nesta catastrófica ocorrência do final do século XX houve muito mais, descomunal maior ofensa ao direito humano à vida, à liberdade, à segurança, ao bem estar, à sobrevivência de velhos, mulheres, homens indefesos e crianças, do que qualquer medida preventiva que um Estado possa tomar para evitar uma catástrofe e que, de uma forma ou outra, afete o direito humano do terrorista. Vide o resumo do que ocorreu em Rwanda e a tremenda irresponsabilidade do sr. Kofi Anan na tragédia ali ocorrida consultando o trabalho do ilustre mestre desta Universidade, o Professor de Direito Internacional Público, Arthur J. Almeida Diniz, publicado no livro do Professor Caldeira Brant, sob o título de “Terrorismo: O Espectro da Morte em Massa”26.

2) Não aceito que medidas severas de combate ao terrorismo que possam de alguma maneira ferir determinada regra de conduta no plano dos direitos humanos repercutam de qualquer maneira na mentalidade, na atitude, na capacidade de recrutamento de terroristas. Quando Kofi Anan diz que somente conduzindo a guerra ao terrorismo de acordo com a rule of law poderemos proteger o padrão internacional de valores que proscreve o terrorismo e reduzir o ciclo de violência terrorista, está partindo de uma premissa absurda de que para o terrorista existe uma rule of law, que ele se revolta contra qualquer transgressão ao estado do direito, que ele dá qualquer importância aos direitos humanos, que ele, sequer esteja consciente desta conquista dos últimos dois séculos.

O terrorista, deveria o sr. Kofi Anan saber, vive na era medieval, na mais escura era medieval, na era da tortura, na era da força bruta, da conquista impiedosa, e quanto mais delicado e cuidadoso o inimigo, mais delicioso se torna para ele a execução de seus nefandos planos.

Não estou advogando que desçamos para o nível dos terroristas, longe disto, mas me parece ridículo que as reações do terrorista, do movimento terrorista, do pensamento de Osama bin Ladden tenham alguma relação de causa e efeito com o nosso comportamento. Devemos tudo fazer para respeitar o direito humano do terrorista porque não queremos conspurcar nossas almas, nossas mentes, com a barbárie dele, mas esta é uma posição exigida por nossa moral, por nossa cultura, por nossa religião, por nossa civilização, por acreditarmos na santidade de todo ser humano, mas não porque com isto diminuímos o perigo, a potencialidade do terrorismo internacional. Qualquer desrespeito aos direitos humanos não terá o menor reflexo no que eles, terroristas, pensam e irão fazer. E eles não recrutam novos terroristas por causa de nosso comportamento mais ou menos respeitoso, pelo contrário, nosso respeito pelos direitos humanos é visto por eles como sinal de fraqueza e como incentivo a mais e maiores empreendimentos mortíferos e facilitam seu poder de recrutamento. Vide o Egito e a Arábia Saudita como conseguem dominar seus terroristas internos

26 In Caldeira Brant, op. cit., pp.360-361.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 93

e vereis que não é com respeito aos direitos humanos... Aliás, o berço dos terroristas internacionais se concentra na Arábia Saudita, na Síria, no Paquistão e no Afganistão. De lá já saem recrutados, envenenados e treinados. Alguma diferença para eles como nós nos comportamos em matéria de direitos humanos? E Kofi Anan tinha alguma esperança de que seu discurso teria qualquer influência sobre estes países que produzem os grandes terroristas?

3) Neste, como em muitos outros documentos, Kofi Anan e os órgãos da ONU se referem às causas do terrorismo, que elas devem ser examinadas e consideradas, e assim, diminuir-se-á a adesão ao terrorismo. E aí aparece o discurso de que os muçulmanos na França, na Inglaterra, os palestinos com suas organizações terroristas e os demais focos de terrorismo internacional resultam da pobreza, da miséria, da indigência, do desemprego, como dito pelo Secretario Geral e por outros “especialistas”. Em outro local de seu relatório (par. 145) Kofi Anan diz que o terrorismo floresce em ambientes de desespero, humilhações, pobreza, opressão política, extremismo e abuso de direitos humanos e também floresce no contexto de conflito regional e ocupação estrangeira.

Nunca, em tempo algum, se fez tanto por imigrantes como a França, a Inglaterra, a Alemanha fizeram nos últimos 30-40 anos por suas minorias de imigrantes.

Os muçulmanos na Europa têm duas, três mulheres em casa, e um batalhão de filhos, muitos dos quais, ao invés de procurar trabalho, vivem às custas da previdência social. Depois saem às ruas queimando caros e ingressando no movimento terrorista.

No mesmo relatório (parágrafo 35) Kofi Anan diz que a exclusão ou discriminação com base de origem étnica ou crença religiosa e a falha de muitos países de integrar as minorias ou os imigrantes criam ressentimentos, conducentes ao recrutamento de terroristas.

Mais oportunidades do que as oferecidas aos imigrantes da Europa Ocidental nos últimos decênios é difícil de imaginar.

O terrorismo internacional decorre da guerra do fundamentalismo islâmico ao Ocidente, nada, absolutamente nada tem a ver com o conforto ou o desconforto das massas de imigrantes que, aliás tudo fizeram – elas mesmas – para não se integrar na sociedade maior – seja por motivos religiosos ou por outras considerações.

Osama bin Laden inspira os terroristas e exige que renunciemos a nossos valores, nossas crenças, nossa religião ou nosso ateísmo, em favor do que ele acredita ser a religião verdadeira, sem nos explicar, no entanto porque tanta luta, tanta guerra, tanta matança entre os muçulmanos sunis e seus correligionários shiitas. E isto Koffi Anan e outros não conseguem ou não querem ver.

Veja-se a história da imigração para os Estados Unidos e para o Brasil no século XIX e no século XX. O imigrante se esforçava por integrar-se na sociedade maior pelo menos política e economicamente e era bem sucedido. Mantinha sua religião, sua cultura, suas tradições dentro de casa, no seu templo, no seio da sua família, mas na escola, no trabalho, na sociedade maior, participava do esforço coletivo em prol da nova pátria. E assim houve integração pacífica e satisfatória para todos.

94 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Assim, americanos naturalizados chegaram ao posto de Ministros de Estado e foram indicados para as mais altas cortes internacionais, e no Brasil refugiados de guerra conquistaram as mais prestigiosas posições na arte, nas ciências, na cultura, na cátedra. O que impede que isto aconteça com os vinte milhões de muçulmanos que se encontram na Europa, imigrantes e seus filhos? Porque jovens nascidos na Inglaterra, educados em escolas britânicas conseguiram colocar bombas em trens e ônibus de Londres para matar seus compatriotas? Pobreza, falta de integração, reclamações de natureza social e econômica, ou fanatismo, ódio instilado desde a infância, a ponto de estarem prontos para o martírio, para imolar-se e levar consigo o maior numero possível de vitimas?

Os terroristas que mataram mais de três mil pessoas no dia 11 de setembro de 2001 eram todos da classe média, a maioria tinha boa escolaridade, alguns freqüentaram universidades européias e tinham vivido alguns anos fora de seus países de origem. Certamente não eram vítimas de desespero, de humilhação, de pobreza de opressão política, nem haviam sido machucados, por leve que fosse, em seus direitos humanos.

A absoluta maioria dos muçulmanos que se encontram em suas pátrias de origem, vivem sob regimes ditatoriais, na rua e em casa. Na rua, por seus governos, em casa porque o marido comanda tudo sobre sua mulher e seus filhos, tendo direito sobre sua vida e morte, como nós conhecemos no estudo do direito antigo. Não há direito humano algum na educação, na vida do muçulmano. Subitamente quando chega ao Ocidente passa a ser doutor em direitos humanos e, se vingar a tese de Kofi Anan e seus burocratas na ONU e em outras organizações internacionais, o eventual desrespeito a seus direitos humanos em Paris, em Londres, em Bonn, em Amsterdam, em Bruxelas, em Copenhagen (repita-se que não existe este desrespeito) pode levá-los ao paroxismo do ato terrorista.

Ainda em seu longo relatório diz o ex-secretário geral da ONU (par. 146) que em seus pronunciamentos a Al Qaida apontou as Nações Unidas como o maior obstáculo a seu objetivo, definindo a organização como um de seus inimigos.

Pergunto: 1) qual a relação das Nações Unidas com a humilhação, o desespero, a pobreza, a opressão política e o abuso de direitos humanos, que justamente a ONU condena? 2) Não teriam as Nações Unidas de Kofi Anan lutado para minorar o sofrimento dos povos oprimidos? 3) Não estariam as Nações Unidas sob o controle do somatório dos países árabes e países muçulmanos, aos quais se aliam os países não alinhados, formando uma maioria absoluta na Assembléia Geral da ONU e não são justamente estes países muçulmanos e árabes, as fontes do terrorismo internacional? 4) Como pode a Al Qaeda cometer tamanha injustiça à ONU, justamente quando era dirigida por Kofi Anan, o grande protetor dos direitos humanos dos terroristas? 5) Não seria o pronunciamento da Al Qaeda uma declaração de guerra à moderna civilização ocidental, a tudo que ela representa, um chamamento para um movimento mundial de conversão ao islamismo, uma guerra santa como alguns deles pensam que seu profeta idealizou? E nada, nada do que Kofi Anan disse neste mesmo relatório em matéria de cuidados com os direitos humanos, de proteção aos interesses das minorias, de

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 95

sua integração nos países para onde imigraram, nada disto tem qualquer relação com o objetivo da Al Qaeda, de Osama bin Laden, dos mullahs, dos sheiks, dos imans, que pregam o ódio e a guerra em suas mesquitas no Oriente e no Ocidente, adquirem armas e arrebanham vítimas para o martírio.

No discurso que pronunciou em Madrid a 10 de março de 2005 por ocasião do International Summit on Democracy, Terrorism and Security, Kofi Anan disse o seguinte:

As Nações Unidas devem insistir que na luta contra o terrorismo não podemos comprometer os valores básicos que enumerei. Particularmente os direitos humanos e a rule of law precisam ser sempre respeitados. Como eu vejo, o terrorismo em si é um ataque direto aos direitos humanos e a rule of law. Se sacrificamos estes em nossa resposta, estaremos concedendo a vitória aos terroristas27.

Como dito, os terroristas não conhecem e não querem conhecer os direitos humanos. A luta contra o terrorismo é vista por eles por um prisma apenas: sucesso ou insucesso, eles são derrotados ou permanecem atuantes. Os direitos humanos – repito - queremos e devemos respeitar para nosso bem, não por que eles contam de alguma maneira para os terroristas ou tem qualquer influência sobre o recrutamento de jovens para o terrorismo.

No mesmo espírito do Secretario Geral, a Comissão de Alto Nível que ele nomeou, diz em seu relatório (parágrafo 148, letra a) que as Nações Unidas devem dissuadir o terrorismo trabalhando para reverter as causas que motivam o terrorismo, inclusive através de promoção dos direitos sociais e políticos, a rule of law e a reforma democrática.

Onde quer a Comissão que a ONU ajude a instituir a rule of law e a reforma democrática para dissuadir o terrorismo – no Egito, na Arábia Saudita, na Síria, no Afganistão, no Paquistão - ou na França, na Inglaterra, na Alemanha? Nestes últimos nada há que a ONU possa melhorar além dos que os ingênuos governos, acovardados e amedrontados, já fizeram, e naqueles outros países, ditatoriais, totalitários, torturadores, regimes medievais, que se cuide o funcionário da ONU que ouse entrar neles para estudar, examinar a fim de tentar implementar reformas democráticas. Veja-se o que aconteceu aos americanos que foram em missão bushiana para ensinar os iraquianos os princípios da liberdade e da democracia!

Há miséria em países africanos, há fome na Índia, há falta de quase tudo em várias regiões sul e centro americanas e não vimos delas emergir qualquer movimento terrorista de caráter internacional. Como seria isto explicado pelos preocupados democratas e defensores de direitos humanos da ONU que pretendem que as condições de miséria levam ao desespero, à revolta e daí ao terrorismo?

Passo para a manifestação de um mestre, por quem nutro a maior consideração e admiração, um brasileiro que dedicou toda sua vida ao estudo do direito e da filosofia,

27 No original: “By the same token, the United Nations must continue to insist that, in the fight against terrorism, we cannot compromise the core values I have listed. In particular, human rights and the rule of law must always be respected. As I see it, terrorism is in itself a direct attack on human rights and the rule of law. If we sacrifice them in our response, we will be handing victory to the terrorists”. Este trecho está inserido em texto divulgado pela ONU sob o título “Madrid, Spain, 10 March 2005 – Secretary General’s keynote address to the Closing Plenary of the International Summit on Democracy, Terrorism and Security – A Global Strategy for Fighting Terrorism”.

96 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

que serviu e continua servindo nossa pátria com extrema dedicação, que propaga o valor de seus grandes mestres – entre outros Miguel Reale no Brasil e Hanna Arendt no exterior – que transmite para seus alunos e para todos que o lêem, as lições da sabedoria antiga e das conquistas modernas do pensamento humano, inspirado em Bobbio e em outros vanguardeiros dos direitos humanos, refiro-me ao duas vezes chanceler do Brasil, o professor de direito e de filosofia, Celso Lafer, que tem se preocupado com o problema do terrorismo internacional e sobre o mesmo fez algumas manifestações no Brasil e no exterior.

Seleciono a conferência por ele pronunciada em 23 de setembro de 2005, no Encontro Internacional sobre os Desequilíbrios do Terror promovida pela Universidade de Turim e pela Fundação Istituto Piemontese Antonio Gramsci, na sessão que teve como tema central “La difesa della civilta democrática (da se stessa?)”28, da qual extraio os seguintes trechos e faço minhas observações.

Depois de examinar os princípios inseridos na Constituição brasileira sobre o terrorismo, o Professor Lafer assim se pronunciou:

.... Pode-se dizer que a tendência que se verifica nos Estados Unidos, mas também na Europa, da suspensão sem limites da ordem jurídica com o objetivo de combater o terrorismo, compromete esse requisito. Enseja arcana imperii e fortalece o que Bobbio denomina o cripto governo – ou seja, a atuação na sombra dos serviços secretos, quanto aumenta o risco do “poder onividente” ex parte principis, que fiscaliza e controla as pessoas sem as apropriadas garantias de um Estado democrático de direito (cf. Norberto Bobbio, Il futuro della democrazia, cit. p. 108-110)29.

Não desejo neste momento examinar detidamente a atuação do governo norte-americano no combate ao terrorismo, as medidas instituídas pelo Patriot Act e os múltiplos problemas que se criaram com a atuação da intelligence americana, tão criticada por seus próprios políticos e acadêmicos.

Mas, realmente, quando o Professor Lafer critica os governos da Europa, de que teriam suspenso a ordem jurídica “sem limites” não posso concordar. Parece-me que se os governos europeus pecaram foi, ao contrário, por excesso de cuidados com as suscetibilidades das minorias muçulmanas, mesmo depois de ter ficado manifesto seu animus beligerandi, aplicando-lhes critérios benévolos, de tolerância não aplicada ao cidadão comum, permitindo que se reunissem em suas mesquitas para planejar a morte de seus concidadãos. Houve excesso de zelo democrático, houve covardia, houve displicência, houve falta de intelligence, houve de tudo, menos, no meu entender, desrespeito pelos direitos humanos.

No final de sua exposição, o ministro Celso Lafer, referindo-se à convenção que Kofi Annan advogou se aprovasse com uma definição clara do terrorismo, diz que:

Uma Convenção deste tipo, para voltar ao início desta exposição, é perfeitamente congruente como o art. 4o da Constituição de 1988 do Brasil e com o princípio do repúdio ao terrorismo aplicado em conjunto com a da prevalência dos direitos

28 Política Externa, volume 14, n. 4, março/abril/maio de 2006, pp. 127 e ss.29 Id., p. 130.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 97

humanos e da solução pacífica de conflitos. ... Uma proposta de Convenção, tal como cogitado por Kofi Annan, tem a sustentá-la, no plano moral, para concluir com Bobbio, o repúdio do mal passivo, vale dizer, a inaceitabilidade do sofrimento dos que padecem com a ação terrorista, uma pena sem culpa e visa à contenção do mal ativo, representado pela prepotência sem medida da violência infligida (cf. Norberto Bobbio, Elogio dela mitezzaa e altri scritti morali).

Uma Convenção genérica sobre o terrorismo, consagrando uma definição no estilo do que já se encontra formulado, que penalize severamente os autores dos atos hediondos e seus mandantes, é necessária e, eventualmente, acabará se materializando, mas poderá demorar devido à obstrução dos países que pretendem elevar os terroristas palestinos ao patamar de freedom fighters, excluindo-os da categoria, o que, conforme veremos adiante, é um absurdo total. Já a preocupação com o que Lafer, inspirado em Bobbio, denomina de mal ativo, não se justifica, porque os países democráticos respeitam os direitos humanos por força de sua legislação interna, como no caso do Brasil, que plantou o princípio na própria constituição. Já os regimes totalitários – os mesmos países que vem obstruindo a materialização da convenção – têm mais uma razão para não aprová-la, porque as normas derivadas do princípio dos direitos humanos vão contra seus padrões humanos e humanitários. Portanto, insisto em que colocar no mesmo patamar e dar na Convenção a mesma importância aos dois aspectos – ao mal passivo e ao mal ativo - é, por um lado desnecessário e por outro lado, contraproducente.

Não chego ao extremo de deixar a cada país os critérios a serem aplicados no combate ao terror, mas considero que a convenção tem que se concentrar no mal passivo, a ponto de não permanecer dúvida sobre a possibilidade de se processar os terroristas em qualquer tribunal internacional ou nacional, e estabelecer o princípio do respeito aos direitos humanos na luta contra o terror, sim, mas sem entrar nos detalhes, nas minúcias, pois estas devem ficar a cargo dos governos de cada país.

No artigo publicado em “O Estado de São Paulo”, o Professor Lafer se refere ao discurso proferido pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso na cúpula de Madri, em que criticou ações unilaterais ao arrepio da ONU, das normas do Direito Internacional e das soluções multilaterais.

Se um país, vitimado por ataques terroristas tiver de depender do beneplácito da ONU, em cuja Assembléia Geral impera uma maioria comprometida com determinados preconceitos, maioria esta controlada por um grande e forte grupo de países que não tem a menor consideração pelos direitos humanos, e em cujo Conselho de Segurança, se desenrola o jogo das divergências entre os portadores do direito de veto, órgão máximo do qual já participaram países que apóiam o terrorismo como a Síria, este país vítima poderá sofrer terríveis conseqüências. Mais adiante ao tratar do muro de proteção construído por Israel, veremos como pode ser perigoso depender dos critérios dos órgãos das Nações Unidas, inclusive da Corte Internacional de Justiça. Por isto discordo de Fernando Henrique Cardoso, principalmente porque não confio na ONU.

98 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Quanto ao pleno funcionamento dos direitos humanos em momentos críticos de combate ao terrorismo, é natural que se possa recorrer a medidas de emergência, a instituições como o estado de sitio, com o objetivo de proteger a população de fatalidades visadas pelos terroristas. E nisso cada democracia tem suas regras, seu ritual, seu equilíbrio entre os poderes governamentais, não sendo factível uniformizar esta parte por meio de convenções ou de resoluções da ONU. Isto representaria uma intromissão indevida, além de injustificada.

Confortou-me o fato de que em sua contribuição ao livro organizado pelo Professor Caldeira Brant, o professor Jorge Miranda, de Lisboa, sob o titulo “Os Direitos Fundamentais perante o Terrorismo” tenha cuidado das “situações de exceção ou de necessidade, resultantes de perturbações de maior ou menor vulto, de origem interna ou externa,” circunstâncias nas quais “têm de ser adotadas formas de organização e providencias também de caráter excepcional”30.

Todos os que viajam, principalmente em viagens internacionais, já nos habituamos a uma seqüência de controles em nossa bagagem, em nossa vestimenta, em nosso corpo, que em tempos e em circunstancias normais, consideraríamos como invasão de nossa privacidade. E no entanto, submetemo-nos de bom grado a este controle, porque queremos voar em segurança e com tranqüilidade. Ora, medidas semelhantes poderão ser necessárias em outros aspectos de nossa vida. Quando no mais recente capítulo do terrorismo internacional, foram encontrados em Londres alguns automóveis repletos de explosivos, carregados de pregos e outros objetos para criar mais sofrimento nos que iriam morrer lentamente pelas explosões que se seguiriam e, no dia seguinte, um veículo com três terroristas, repleto de explosivos incendiou-se no aeroporto de Glasgow, ambos atentados milagrosamente evitados, por fatores alheios à vontade e ao empenho das forças de segurança, alguém dentre nós ficaria chocado se no momento seguinte a polícia, ajudada pelo exército, realizasse uma busca de casa em casa dos bairros suspeitos, para tentar descobrir os responsáveis. Algum de nós, vivendo neste momento em Londres, não abriria sua casa com compreensão e simpatia pela necessidade de se chegar o mais rapidamente aos responsáveis, que desta vez não foram bem sucedidos, mas que na próxima poderão fazer explodir no Hyde Park, ou em qualquer lugar publico de Londres a mim, ou a alguém de minha família. E, no entanto, esta busca domiciliar de urgência, sem mandado judicial, não é exatamente o que se admite na teoria e na pratica do respeito ao rule of law.

Que cada um de nós julgue por si e para si, até onde estaria disposto a sacrificar de seu conforto, de seu direito, na prevenção contra a repetição do ato bárbaro.

Evidentemente, que para um empreendimento mais demorado, haver-se-ia de recorrer ao Legislativo para decretar o estado de emergência, em que se definiria objetivos, duração e tudo mais. Mas num momento crítico, em que cada minuto pode ser decisivo, em que a vida de centenas, de milhares, poderá estar em jogo no dia seguinte, na hora seguinte?

30 Jorge Miranda, “Os Direitos Fundamentais perante o Terrorismo”, in Caldeira Brant, op. cit., pp. 62/3.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 99

Que quer o terrorista naquele momento? Que a democracia funcione com todo rigor, ficando ele protegido da inspeção imediata. Que quer o democrata? Que cada um nesta sala responda para si mesmo.

Concordo com Jorge Miranda quando escreve no referido trabalho:O pior que poderia acontecer aos regimes liberais e pluralistas do Ocidente seria,

a pretexto do terrorismo, afastarem-se dos grandes princípios jurídicos que tanto custaram a conquistar e a sedimentar nas suas Constituições, nas suas leis e nas suas culturas cívicas. O pior que poderia acontecer seria, afinal a pretexto do terrorismo, ficarem abalados os fundamentos do Estado de Direito31.

Duas observações: nesta matéria, como ficou dito, a ONU não deve interferir. Cada povo conquistou sua democracia e cabe-lhe por ela zelar por si e para si.

E cada democracia deverá saber quando abrir as exceções que se tornem necessárias, através de medidas de emergência, para salvaguardar não só a democracia, mas toda a estrutura do Estado e a sobrevivência do povo. E se ocorrer alguma circunstância em que algum ritual da rule of law tenha que ser desrespeitado por alguns momentos, mesmo sem a decretação do estado de exceção, por se tratar de uma emergência imediata, caberá a cada democracia decidir por si mesma, pois como nos lembra o próprio Jorge Miranda salus populi suprema lex32.

Outra manifestação que me traz algum consolo é a conferência do Ministro Nilson Naves, do Superior Tribunal de Justiça pronunciada em maio de 2002, durante congresso organizado pela Escola Superior da Magistratura, em Brasilia. Assim se pronunciou S.Excelência:

Quero enfatizar, e este é mais um prisma relevante a ser discutido, que somente o primado da ordem legal, constitucional pode fornecer meios legítimos para a defesa da integridade dos indivíduos e dos Estados. Emerge desta afirmativa uma questão importante: em face do horror e da impotência provocados pela seqüência de mortes, mutilações, destruições, parece criar-se um ambiente propício para que as pessoas apóiem uma legislação mais severa e sumária, mesmo que isso signifique suspender certos direitos arduamente conquistados. As imagens de crianças mutiladas, feridas, mortas, a dor estampada no rosto dos que sobrevivem, preparam o terreno propício ao florescimento da idéia de que a suspensão de direitos facilitaria a punição dos culpados.

Afigura-se-me uma ilusão, às vezes alimentada por oportunistas, a crença de que a previsão de punições mais severas – a penas de morte, por exemplo – ou a suspensão de direitos solucionariam o problema. A História, no entanto, é pródiga em demonstrar que ambientes desprovidos do reconhecimento das garantias individuais têm sido campo fértil para o terror do Estado, com seqüelas que se estendem por gerações.

Hoje, quando a ordem social se instala com base no Estado de direito, é intolerável a atitude do Estado que pretenda sobrepor-se aos direitos individuais, aos quais, inclusive, compete-lhe com firmeza proteger.

31 Id., p. 67.32 Id., p. 63.

100 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Naturalmente, há que se dotar o Estado de instrumentos normativos para sua defesa, sem, no entanto, causar dano às garantias individuais.

Cabe à sociedade definir em que medida pode a lei, na defesa da segurança estatal, suspender o direito dos cidadãos sem que isso se torne uma ameaça à defesa do próprio cidadão. Felizmente quer-nos parecer, essa tem sido a tônica seguida pelos governos de modo geral.

A Constituição brasileira, por exemplo, prevê que, em caso de período de suspensão de garantias – estado de sítio – o decreto que o instaurar deve especificar quais garantias serão suspensas e por quanto tempo.

Como vemos, o Ministro Nilson Naves não tolera qualquer quebra do estado de direito, mas reconhece que a necessidade de proteção poderá levar a decretar “a suspensão do direito dos cidadãos sem que isto se torne uma ameaça à defesa do próprio cidadão”.

E para finalizar esta parte ouçamos uma das mais ilustres vozes do direito internacional da atualidade – a professora inglesa Rosalyn Higgins, atual Presidente da Corte Internacional de Justiça em seu discurso central – o keynote address - na 100ª Reunião Anual da American Society of International Law (que comemorou no ano passado seu centenário) sob o lema “A Just World Under Law” – Um Mundo Justo sob Égide da Lei”. Assim falou a Professora Higgins:

What does ‘justice’ tell us about line drawing, when the perceived demands of security apparently require limitations to be placed upon rights? Which rights may be qualified? And to what extent, and with what checks and balances? And which may not?33

ou seja:O que nos diz a ‘justiça’ sobre a delimitação a ser traçada, quando as exigências

de segurança aparentemente exigem limitações a serem impostas aos direitos? Que direitos podem ser restringidos? E até que limite e com que controles? E quais direitos não podem ser restringidos?

Ela não respondeu, mas me satisfaz que deixou a questão no ar, que reconheceu que o problema existe, que há um dilema, e que precisamos ser criativos. Faço o mesmo, deixo a pergunta no ar e sejamos todos criativos.

IX. O Direito Internacional Público Sou um estudante de direito internacional privado. Só que estudo em voz alta e

assim meus colegas mais jovens na UERJ passaram a ouvir e aprender alguma coisa junto comigo. Assim acabei me tornando professor da disciplina aqui no Brasil e em mais alguns lugares do mundo.

Ao direito internacional público sinto-me ligado não só por se tratar de uma disciplina com certas afinidades à minha, como porque experimentei em minha vida a catástrofe da Segunda Guerra Mundial, de maneira que sempre tive de perguntar o que dizia a lei que rege, ou que deveria reger, a sociedade das nações.

Alain Pellet, ex-presidente da Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas trouxe valiosa contribuição ao livro organizado pelo Professor Caldeira 33 The American Society of International Law, Proceedings of the 100th. Annual Meeting, March 29-April 1, 2006, p. 388.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 101

Brant, no título I da obra, “O Papel das Nações Unidas na Luta contra o Terrorismo Internacional”, denominando seu artigo “Terrorismo e Guerra. O que fazer das Nações Unidas?”, em que diz o seguinte:

... deve-se admitir que o direito internacional em vigor não está adaptado à nova dimensão e às novas formas utilizadas pelo terrorismo internacional.

Os juristas são como as forças armadas – sempre atrasados frente a uma guerra. A Carta das Nações Unidas foi concebida em função da Segunda Guerra Mundial, da mesma forma que o Pacto do Atlântico Norte seguiu-se logo ao inicio da Guerra Fria.

Mesmo em situações de crise como esta, algo de bom pode surgir. Os grandes avanços do direito internacional sempre foram fruto de grandes crises.Neste sentido, o doloroso desabamento das Torres Gêmeas poderia oferecer a dramática oportunidade de se começar a construir o direito internacional do século XXI34.

Este um ponto cardinal. Enquanto o direito em geral funciona de maneira prospectiva, estabelecendo normas para situações futuras que deverão obedecer ao regulamento pré-estabelecido, o direito internacional público resulta de tratamento retrospectivo dos grandes problemas ocorridos nas relações internacionais e, via de regra suas fórmulas não mais se adequam para as situações que se irão desenrolar no futuro.

Interessantemente, Sara Pellet, na mesma obra, em seu artigo “Ambigüidade da Noção de Terrorismo” diz que as legislações internas são freqüentemente editadas para facilitar a luta contra os fenômenos terroristas já ocorridos”35.

Isto tudo leva a outra constatação - o direito internacional público, principalmente nas áreas mais graves e importantes, como o jus ad bellum e o jus in bello não é uma disciplina muito obedecida – e isto é um understatement - haja vista o direito humanitário internacional, geralmente desrespeitado, tanto assim que as normas criadas depois da 1ª Guerra Mundial não foram respeitadas durante a 2ª Guerra e o que ficou estabelecido depois desta, dificilmente encontrou durante a segunda parte do século XX algum país, algum exército, que tenha cumprido suas normas humanitárias. Basta ler o relato do Tribunal de Honra criada por Bertrand Russel para julgar o comportamento do exército norte americano no Vietnam36. Ou veja-se o que a Rússia tem feito nestes últimos anos na Chechênia.

X. A Questão PalestinaChegamos, a final, à questão do conflito árabe-israelense. Ora expressamente,

ora veladamente, ela transpira em toda discussão sobre o terrorismo internacional. Aqui em Belo Horizonte falaremos abertamente, sinceramente, para alguns talvez chocantemente, sempre atentos ao fato que o direito internacional público caminha de mãos dadas com a ciência das relações internacionais e esta se inspira, se rege

34 In Terrorismo e Direito, p. 178.35 Id. p.. 1736 “Against the Crime of Silence – Proceedings of the Russel International War Crimes Tribunal – Stockholm-Copenhagen” edited by John

Duffett, introduction by Bertrand Russel, Bertrand Russel Peace Foundation, New York-London, O’Hare Books, 1968.

102 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

e se corrompe pela política e pela economia. E hoje sofre o inusitado embate do fundamentalismo religioso, o grande complicador da atualidade internacional.

Lembremos que a Comissão de Alto Nível nomeada pelo Secretário Geral da ONU referiu-se em seu relatório à objeção levantada a uma definição do terrorismo por força do argumento de que povos sob ocupação estrangeira têm o direito à resistência e que uma definição sobre terrorismo não deve anular este direito.

O ilustre Professor Caldeira Brant em sua Introdução ao livro sobre direito e terrorismo fala na

Obrigação de se esvaziar um dos principais fundamentos do discurso terrorista mediante uma solução razoável e satisfatória para a questão palestina.

Será o assim chamado militante palestino um freedom fighter – um guerreiro pela liberdade? O freedom fighter se define por dois requisitos: a luta por uma justa causa e por meios justos. Ocorre que a causa dos palestinos não é justa porque não objetivam a criação de seu Estado, mas tão simplesmente a destruição do Estado de Israel. Recusaram todas as ofertas de paz que lhes foram estendidas nos últimos decênios, inclusive aquela que o Primeiro Ministro Ehud Barak apresentou a Arafat, na presença de Bill Clinton, em Camp David, quando o chefe do governo israelense ofereceu aos palestinos 97% das terras que consideram ocupadas por Israel; Arafat, sem pestanejar, sem sequer apresentar uma contraproposta, abandonou a conferência, voltou para a Cisjordânia e pouco depois lançou a Intifada II que levou a morte a milhares de israelenses e palestinos. Antes disto desrespeitaram os acordos de Oslo de 1993, pois enquanto Israel ia desocupando os territórios, entregando-os à administração da OLP, esta continuou com sua política de incitamento ao ódio, à luta armada e, efetivamente, não suspendeu seus atos violentos, terroristas, contra o Estado de Israel.

E os meios também não são justos porque sua tática principal é atacar civis indefesos, famílias nos seus automóveis nas estradas, crianças, jardins de infância, restaurantes, festas de casamento, festividades religiosas, utilizando-se de homens bombas, de mulheres bombas e, finalmente, até de crianças bombas.

Vejamos a causa, para a qual leio trechos da Constituição do Hamas:O conflito é de caráter religioso-político entre os muçulmanos e os judeus infiéis;

toda a Palestina é terra muçulmana e ninguém tem o direito de abrir mão dela. Um jihad sem concessões deve ser movido contra Israel e qualquer acordo reconhecendo seu direito de existir precisa ser totalmente oposto”.

Os inimigos (os Judeus) tem esquematizado por muito tempo e tem acumulado riquezas grandes e influentes. Com seu dinheiro, tomaram controle da mídia internacional. Com seu dinheiro, provocaram revoluções em várias partes do globo. Estavam atrás da Revolução francesa, da revolução comunista e a maioria das revoluções de que ouvimos. Com seu dinheiro formaram organizações secretas - como os maçons, o Rotary, o Lions – que estão se espalhando pelo mundo, a fim de destruir sociedades e concretizar os interesses sionistas ... Eles estavam atrás da 1ª Guerra Mundial e formaram a Liga das Nações através da qual poderiam controlar o mundo. Eles estavam atrás da 2ª Guerra Mundial, através da qual tiveram lucros

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 103

enormes. Não há guerra alguma em qualquer lugar sem que seu dedo esteja nela. O Dia do Julgamento só virá quando os muçulmanos lutarem contra os judeus e matarem-nos. Então, os judeus se esconderão atrás das rochas e das árvores, e as rochas e as árvores gritarão: - Ó muçulmano, há um judeu se escondendo atrás de mim, venha e mate-o”37.

Vejamos agora a Carta da OLP, a tal que é tida como moderada, dirigida até pouco tempo pelo arqui-terrorista Arafat e atualmente por seu antigo assessor Abu Mazen, conhecido pela imprensa como Mahmoud Abas, titular de um doutorado, em cuja tese defendeu a teoria de que não houve Holocausto e que não é verdade que as câmaras de gás no campo de concentração de Auschwitz serviram para asfixiar milhões de judeus.

Diz a carta da OLP:Apenas os judeus que viviam na Palestina antes de 1917 poderão permanecer

(artigo 6);Somente os árabes palestinos possuem o direito a autodeterminação e o país inteiro

pertence a eles (artigos 3 e 21);Rejeição de qualquer solução que não inclua a libertação total do país. Esta meta não

pode ser alcançada politicamente; só pode ser realizada militarmente (artigos 9 e 21);A guerra contra Israel é legal, a auto-defesa de Israel é ilegal (artigo 18);Basta observar que Arafat levava na sua lapela um mapa da Palestina que ia

do Mar Mediterrâneo ao rio Jordão, ou seja, sem reconhecer Israel, nem sequer geograficamente. E este é o mapa que as crianças nas escolas palestinas têm diante de si. Israel não existe, é apenas a “entidade sionista”. Os acordos de Oslo, que encantaram as esquerdas israelenses e a maioria dos observadores, ingênuos e hipnotizados, não passaram de engodo. Basta recordar que dias depois de assiná-los, Arafat falou a seu povo e lhes assegurou que a luta, o jihad continuaria, nem que um milhão de palestinos devessem morrer, mas que as terras de Israel seriam por eles retomadas. Este discurso foi gravado, divulgado e jamais negado por Arafat, que repetidamente desmentia em seu discurso em árabe o que havia prometido nos documentos assinados na Casa Branca, em cerimônia que o mundo admirou, e levou-o a receber o Premio Nobel da Paz, juntamente com Itzhak Rabin e Shimon Peres.

De maneira que a causa deles não é criar um Estado palestino, mas destruir o Estado de Israel. Quisessem um Estado teriam proclamado-o em 1948, quando Israel proclamou seu Estado no pequeno pedaço de terra que lhe foi atribuído pela ONU no Plano de Partilha aprovado em 1947, aceito pelos judeus, recusado de plano pelos árabes. Quisessem um Estado e teriam proclamado-o entre 1949 e 1967 quando não havia um israelense na Cisjordânia e na faixa de Gaza. Dezoito longos anos estiveram os palestinos sem ver um soldado israelense, um colono israelense, e que fizeram, ao invés de criar seu Estado?: incursões sobre incursões no território israelense, para levar a morte e a destruição. Nenhuma iniciativa positiva, nada de construir um país novo, levantar o orgulho de uma nação, educar uma juventude para o trabalho e o progresso. Somente ódio, atentados terroristas, matanças. E dinheiro nunca lhes faltou – os países europeus e os Estados Unidos investiram bilhões no povo palestino ao

37 Artigos 7 e 22 da Carta do Hamas.

104 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

longo destes anos todos, dinheiro este que Arafat e sua camarilha desviaram para a compra de armas e para suprir contas bancárias particulares.

E – o ponto cardinal da política dos países árabes - garantir que os assim chamados refugiados continuassem nos campos de refugiados, não permitindo que eles reiniciassem uma vida nova como os 700 000 judeus expulsos dos países árabes, que se dirigiram, em sua maioria para Israel, que foram acolhidos, integrados na vida e na economia israelenses. O século XX viu milhões de seres humanos deslocados de seus países de origem por causa das guerras, das perseguições, e todos se integraram na vida de outros países, nos Estados Unidos, na Inglaterra, nos países da Europa Ocidental, no Brasil, nos demais países da América Latina. O Presidente Roosevelt tinha um programa radiofônico semanal nos anos 30 em que ele começava assim: “Fellow immigrants”, ou seja, companheiros imigrantes. Pois além dos índios todos americanos eram imigrantes. E quantos destes eram, verdadeiramente, refugiados. Milhões de coreanos, vietnamitas, africanos, latino americanos de todas partes fugiram de suas pátrias de origem e se instalaram em outros continentes, vivendo bem, integrando-se nas sociedades locais.

Só os 650.000 árabes que partiram em 1947-48 do território que hoje é Israel - e a maioria partiu porque os países árabes em suas emissões radiofônicas urgia-os para assim fazer, a fim de facilitar a invasão do novo Estado e a liquidação de toda sua população. E dali em diante foram mantidos nos campos de refugiados, sem que os países árabes os acolhessem em suas sociedades, sem que nas terras da Cisjordânia e na faixa de Gaza iniciassem uma vida normal. E a ONU abraça a bandeira de defesa destes “refugiados”, em verdade, na sua absoluta maioria, filhos e netos dos que deixaram o território que é hoje Israel, para facilitar o extermínio de sua população judaica pelos exércitos invasores do Egito, Transjordânia, Arábia Saudita, Síria, Líbano e Iraque. Este é o cúmulo da hipocrisia. Por outro lado, os 600 mil árabes que não fugiram, que permaneceram em Israel, são cidadãos do país, trabalham, vivem bem, tem representação no Parlamento de Israel e em sua grande parte desejam a paz naquela região.

E aqueles líderes palestinos que se aproximaram de Israel – e houve vários - visando negociações sérias e honestas para alcançar a paz, foram sumariamente mortos ou transformados em inválidos para o resto da vida, por seus próprios irmãos palestinos.

XI. Solução Alternativa para Falta de Definição do TerrorismoJá que o mundo tem tanta dificuldade em chegar a um consenso definidor do

terrorismo em termos genéricos, apresenta-se para o terrorismo internacional uma solução simples e fácil.

Para os atos terroristas inspirados na filosofia de Bin Laden não se faz necessária uma definição de terrorismo para punir seus executores, uma vez que os mesmos se enquadram perfeitamente no crime de genocídio. Verifique-se o disposto na respectiva Convenção de 1948, que assim dispõe:

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 105

Artigo II Entende-se por genocídio qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção

de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, tal como: assassínio de membros do grupo.

Artigo IIISerão punidos os seguintes atos;o genocídio c) a incitação direta e pública a cometer o genocídiod) a tentativa de genocídioe) a cumplicidade no genocídioO mesmo se verifica do Estatuto do Tribunal Penal Internacional, em que se lê:Artigo 6Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por “genocídio” qualquer um

dos atos que a seguir se enumeram, praticados com intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso, enquanto tal:

a) homicídio de membros do grupoArtigo 7Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por “crime contra a humanidade”

qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil havendo conhecimento desse ataque:

HomicídioSe Arafat, ontem, e seus sucessores hoje, e se Hanieh do Hamas, como

Nasralah do Hizbulah, hóspede do governo libanês, declaram, proclamam e deixam claramente documentado que seu objetivo é aniquilar o povo judeu que se encontra no Estado de Israel e fora dele e, se partindo para a ação, lançam foguetes Katiushas do Líbano, foguetes Kassam de Gaza, entram em território israelense para fazer explodir civis inocentes como o fizeram em milhares de atentados ao longo dos anos, se invadem uma sinagoga em Istanbul e matam judeus durante suas orações sabáticas, se explodem o edifício da organização central da comunidade judaica de Buenos Aires, matando dezenas de pessoas, se aterrorizam os judeus na França e seqüestram um deles para torturá-lo até a morte, enfim, se empreendem ações inteiramente condizentes com suas manifestações de vontade, conforme consta em suas Constituições e conforme anunciam em suas manifestações públicas, isto resulta na prática de genocídio exatamente como previsto na respectiva convenção, devendo ser levados ao Tribunal Penal Internacional para julgamento.

O mesmo com os terroristas que executam as ordens de Bin Laden, pois se este proclama que seu objetivo é matar os americanos, e seus seguidores efetivamente matam americanos, temos o crime de genocídio perfeitamente caracterizado e a competência do Tribunal Penal Internacional se torna mansa e pacífica.

106 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Os atos terroristas também podem ser enquadrados na categoria dos crimes contra a humanidade, como assinalado por vários autores, inclusive pelo Professor Jorge Miranda, no trabalho já por nós aludido38.

XII. O Terrorismo Internacional perante o Direito Internacional PúblicoAssim, chego ao tema central de minha exposição, da minha análise e da minha tese,

que simplesmente sugere que o direito internacional público fracassou inteiramente diante do terrorismo internacional. E isto por meio do seu mais elevado e prestigioso órgão - a Corte Internacional de Justiça, quando concedeu a Opinião Consultiva que lhe foi solicitada pelo Conselho de Segurança. Sob o título “Conseqüências Jurídicas da Construção de um Muro no Território Palestino Ocupado” a Corte opinou, em sessão realizada a 9 de julho de 2004, por 14 votos contra um, que a construção do muro por Israel é contrária ao direito internacional39.

Antes de uma análise mais detalhada, me seja permitido recordar que a medida pacífica que Israel empreendeu visou impedir a entrada de homens bomba que vinham causando centenas de mortes e milhares de feridos em território israelense, de velhos, civis, mulheres e crianças, por meio da construção de um muro que separa hermeticamente todos os pontos estratégicos entre os dois territórios, sendo que à época do julgamento pela Corte, o muro já havia impedido grande número de infiltrações de terroristas. A Corte não estava julgando represálias, assassinatos de líderes terroristas, bombardeios de fortalezas do Hamas, nada disto, só um muro de separação. E isto, opinou a Egrégia Corte Internacional seria contra o direito internacional.

O Juiz Thomas Buergenthal, voto vencido40, declarou que a Corte não tinha suficiente informação diante de si para dar uma “legally sound opinion”, e que “a Corte não tinha diante de si todos os fatos relevantes relacionados diretamente com as questões do direito de Israel à legítima defesa, suas necessidades militares e de segurança, diante dos repetidos ataques terroristas fatais a que Israel tem sido e continua sendo submetido”. E mais disse o juiz Buergenthal:

A natureza destes ataques e o impacto sobre Israel e sua população não foram seriamente examinados pela Corte e o dossier submetido à Corte pelas Nações Unidas sobre o qual a Corte, em grande medida, baseia suas conclusões, praticamente não toca neste assunto”.

Assim, conclui o juiz Buergenthal, as conclusões da Corte não estão “legally well founded” e a Opinião carece de credibilidade.

A Corte não teve alternativa senão relatar algo dos antecedentes históricos ligados ao fato e fê-lo, no entender da Juiza Higgins, na época membro da Corte, atualmente sua Presidente, de maneira “neither balanced nor satisfactory”41.

A juiza não elaborou, mas digo-lhes eu que uma lista abreviada dos antecedentes incluiria, pelo menos:

38 Jorge Miranda in Caldeira Brant, op. cit., p. 68.39 “International Court of Justice:Legal Consequences of the Constructon of a Wall in the Occupied Palestinian Territory”, International

Legal Materials, 2004, pp.1009-1098.40 Id, pp. 1078-1081.41 A opinião da Juíza Higgins encontra-se às p. 1058-1065.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 107

- o Mandato sobre a Palestina, outorgado à Inglaterra pela Liga das Nações e seus termos;

- a sistemática recusa pelos árabes, ao longo da década de 30, de sentar a uma mesa com os judeus, sob a coordenação do governo britânico, para decidir o futuro daquela terra;

- a Resolução 181 da A.G. da ONU, de novembro de 1947 sobre a Partilha da Palestina;

- a terminação do mandato, a proclamação da independência de Israel no dia 14 de maio de 1948, na mais estrita conformidade com a Resolução da ONU;

- a recusa dos árabes em aceitar a Partilha e os eventos que conduziram imediatamente à guerra de invasão árabe em 1948, antecedida de inúmeras incursões ao longo de 1947;

- as conseqüências desta guerra, entre as quais a criação do problema de refugiados;

- os antecedentes e as conseqüências da Guerra de 1967, os termos da Resolução 242 do Conselho de Segurança, a Intifata I, os Acordos de Oslo, a Intifada II e tudo que aconteceu depois de Oslo que impediu sua operacionalização.

A Corte diz em sua Opinião, no par. 71, e leio primeiramente no original porque se trata de algo muito sério:

In 1948 Israel proclaimed its independence on the strength of the G.A. resolution; armed conflict then broke out between Israel and a number of Arab Sates and the Plan of Partition was not implemented…

(Note-se os termos imprecisos: “broke out” – “number or Arab states”) Traduzindo:Em 1948 Israel proclamou sua independência baseada na resolução da Assembléia

Geral e um conflito armado estourou entre Israel e alguns estados árabes e o plano de partilha não foi implementado.

Ora, seis paises árabes atacaram e invadiram o minúsculo Estado de Israel para destruí-lo no seu nascedouro, conforme se pode verificar em todos os jornais do mundo daquela época, em centenas de programas radiofônicos irradiados naqueles dias de dezenas de estações árabes, documentado em centenas de livros da história, mas, .... para a Corte a guerra simplesmente, “broke out”.

Veja-se no livro organizado pelo Professor Caldeira Brant o artigo de Gilbert Guillaume, antigo Juiz Presidente da Corte de Justiça Internacional e Professor do Institut d’Études Politiques de Paris:

No dia anterior à data fixada (para o encerramento do mandato britânico) Israel proclama sua independência e os Estados árabes vizinhos se engajam em uma ação militar contra Israel42.

Esta descrição não é perfeita, mas está bem mais consentânea com a verdade histórica.

42 “Terrorismo e Direito”, p. 72.

108 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

A linha verde resultante do armistício de 1949 foi desrespeitada entre este ano e 1967 pelos paises árabes por centenas e centenas de vezes, com as invasões periódicas dos fedayen, causando morte e invalidez na população israelense.

A Corte Internacional de Justiça, ao referir-se à Resolução 242 do Conselho de Segurança, de 1967 (adotada na conformidade do capitulo VI da Carta que não é obrigatória) enfatiza o constante no Preâmbulo de que é inadmissível a aquisição de território por guerra, mas não dá importância ao parágrafo operacional que se refere à necessidade de garantias de fronteiras seguras e reconhecidas, livres da ameaças de atos de força, e também não reconheceu a Corte que a Resolução não determinou que Israel se retirasse de todos os territórios (the territories) restringindo-se a se referir a territórios (territories), e que exigiu dos árabes que garantissem uma paz duradoura, ao que eles sistematicamente se recusaram, como continuam se recusando.

Como o Juiz Burgenthal frisou, o Secretario Geral enviou um relatório à Corte anexando a declaração de Israel na qual expunha sua posição, mas a Corte só se baseou nos sumários do Secretario Geral e dos relatores da ONU, praticamente não se referindo aos sumários apresentados por Israel.

A Corte, diz o ilustre Juiz Burgenthal, anteriormente Presidente da Corte Inter-Americana de Direitos Humanos, só se ocupa em descrever o prejuízo que a cerca causa e a várias normas de direito internacional humanitário e de direitos humanos, concluindo que estes direitos estariam sendo violados. Mas quantas vidas foram sacrificadas pelas incursões dos terroristas em território israelense e quantas já tinham sido salvas antes mesmo do muro ficar completamente pronto, isto para a Corte não era importante analisar.

A opinião está repleta de declarações no sentido de que “a Corte está convencida ou não está convencida disto ou daquilo”. Como diz Burgenthal são as conclusões a que a Corte chegou que não são convincentes.

No parágrafo 141 da opinião da Corte se lê o seguinte: É fato que Israel tem enfrentado inúmeros atos mortíferos (deadly acts) de violência contra sua população civil. Tem o direito e até o dever de responder a fim de proteger a vida de seus cidadãos. Mas as medidas a serem tomadas precisam remanescer em conformidade com o direito internacional aplicável.

Duas observações:1) a Corte não diz donde provem os “deadly acts”.2) a Corte não enumera, especifica, detalha que tipos de “deadly acts” são estes,

também não nos dá a menor idéia de que medidas defensivas ela consideraria, no alto de seu saber político-jurídico-estratégico-militar, como aceitáveis na conformidade do direito internacional aplicável.

A Corte diz no parágrafo 137 de sua opinião:Resumindo, do material que está disponível, a Corte não está convencida que o

curso especifico que Israel escolheu para o muro era necessário para alcançar seus objetivos de segurança.

para, logo em seguida, dizer, no mesmo parágrafo:

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 109

as infrações resultantes da rota não podem ser justificadas por exigências militares ou por necessidade de segurança nacional ou ordem pública.

Como se pode decidir baseado no não convencimento? Quem não está convencido, não julga, não opina.

E nada elaborou a Corte quanto à proporcionalidade, conceito tão em moda no atual direito internacional, aliás nem sequer detalhou quais seriam estas exigências militares e requisitos da segurança nacional. Pergunto: a Corte ordenou uma perícia militar imparcial para saber se existem ou não exigências militares justificadoras do roteiro do muro? Como pode um tribunal opinar sobre matéria altamente especializada sem recorrer aos especialistas? Um juiz de pequena comarca do interior do Brasil saberia melhor como processar questão de tamanha complexidade fática e temática.

Ouçamos o parágrafo 149 da Opinião da Corte:Ademais Israel deve garantir liberdade de acesso aos Lugares Santos que ficaram

sob seu controle em decorrência da Guerra de 1967 (vide par. 129).Antes, no referido parágrafo 129, a Corte narra os acordos de 1949 quanto ao

acesso aos locais santos das três religiões, com estipulação de obrigações para Israel e a Jordânia. Jerusalém antiga, que contem o Templo do Rei Salomão, reedificado pelo Rei Agripas, ficou na posse da Jordânia, de 1949 a 1967, e os jordanianos vedaram aos judeus todo acesso aos lugares santos e o multi-secular cemitério judaico de Monte Oliveiras foi totalmente destruído com a retirada de 90% das suas lápides que os árabes utilizaram para construir trechos de uma estrada; a Jordânia desrespeitou flagrante e cruelmente a determinação da ONU sobre os lugares santos.

Diversamente, quando Israel retomou a cidade antiga de Jerusalém - a Jerusalém do rei David, do Rei Salomão e dos seus descendentes, a Jerusalém do 1o e 2o Templos do povo judeu, a Jerusalém referida 700 vezes na Bíblia e nenhuma vez no Corão, a Jerusalém na qual Jesus Cristo caminhou, orou e falou ao povo hebreu - ela concedeu, como continua concedendo, de 1967 até o dia de hoje, livre acesso a todos lugares santos para os membros de todas as religiões e para os turistas de todas proveniências, dando-lhes proteção e assistência. Israel entregou as chaves das Mesquitas de Jerusalém aos muçulmanos quando podia ter mantido controle sobre as mesmas. Hoje os muçulmanos não permitem acesso dos judeus à Mesquita Al Aqsa como narrado há três semanas atrás pelo árabe brasileiro, o ilustre jornalista Ali Kamel, nas paginas de “O Globo”.

Qual o sentido, pergunto, de recomendar que Israel precisa assegurar livre acesso? Porque recomendar algo que vem sendo feito há 40 anos ininterruptamente, numa demonstração da mais absoluta boa fé, com a melhor boa vontade internacional e respeito pelas outras religiões? Porque não destacar elogiosamente este fato? E sem referir ao comportamento dos palestinos que, ao receberem – há alguns anos atrás - o controle sobre a cidade de Jericho, incendiaram o túmulo de José e que, ao receberem a Faixa de Gaza há dois anos atrás, incendiaram todas as sinagogas que ali encontraram. Estamos falando de atos bárbaros, praticados por vítimas de

110 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

uma educação recebida desde a mais terna idade, doutrinados para o ódio, para a destruição, e treinados para o terrorismo, para o genocídio.

Como pode a Corte dizer no parágrafo 159 que a construção da cerca criou uma situação ilegal? Como pode ser ilegal se a Corte apenas declarou não estar convencida se a cerca era a solução necessária para evitar ataques. E se peritos militares israelenses, ou de qualquer outra nacionalidade considerarem que a cerca, como construída, era necessária para salvar vidas, a opinião de quem prevaleceria?

Que vale mais – a proteção da vida de uma população civil ou as dificuldades de acesso de casa ao trabalho, de casa ao colégio, de uma localidade a outra, para as populações de cujo meio saem os terroristas, os homens bomba, as crianças bomba?

Pode-se negar que os terroristas estão sendo muito bem sucedidos, quando a mais alta corte internacional segue cegamente a política dos órgãos da ONU controlados pela maioria composta dos membros árabes e muçulmanos e dos países que, acovardados, ou interessados, seguem cegamente as pretensões deste grupo?

Diz o parágrafo 73 da Opinião da Corte No conflito armado de 1967, forças israelenses ocuparam todos os territórios que

haviam constituído a Palestina sob mandato britânico inclusive aqueles conhecidos como a Margem Ocidental, a leste da Linha Verde.

Nem uma palavra sequer sobre a coordenada agressão do Egito, Síria e Jordânia em maio/junho de 1967: o Egito fechando o Estreito de Tiran à navegação israelense – clássico caso de guerra – ordenando ao Secretário geral da ONU, sr. U Thant, a retirada das tropas da ONU do deserto de Sinai e avançando com seu exército até a fronteira meridional de Israel, e proclamando diariamente em suas estações radiofônicas que se preparava para atacar e jogar todos os judeus ao mar, a Síria invadindo Israel do Norte e a Jordânia pelo leste, o que resultou na famosa guerra dos seis dias de 1967, na fragorosa derrota dos exércitos árabes, em que Israel rechaçou todos os três exércitos invasores e ocupou legalmente, repito legalmente, os territórios de onde partiram os ataques coordenados dos três países. Isto porque de acordo com todas autoridades de direito internacional publico, o país atacado tem direito de se manter no território donde partiu o ataque até receber garantias absolutas de paz, que é exatamente o que diz a resolução 242 do Conselho de Segurança – devolução de territórios mediante garantias de paz. Nada disto se encontra na Opinião da Corte em sua parte narrativo-histórica.

Também não faz a Corte referência alguma ao fato histórico que os territórios invadidos e mantidos por Israel pertenciam, em substancial parte ao planejado Estado árabe que a ONU decidira fosse criado pelo Plano de Partilha, e que o mesmo foi ilegalmente ocupado na guerra de 1948 pelo Egito (Faixa de Gaza) e pela Jordânia (margem ocidental do rio Jordão). Assim, não tendo os árabes palestinos criado o Estado que lhes fora oferecido pela ONU, e tendo o correspondente território sido ocupado por Egito e Jordânia, este território passara de território sob mandato da Grã Bretanha a território ocupado ilegalmente por estes dois países árabes, que, sendo

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 111

derrotados na guerra por eles iniciada, os territórios passaram ao status de terra de ninguém, o que é conhecido em direito internacional como “vácuo de soberania”. Em outras palavras, Israel – para se defender da agressão simultânea de três países (Egito, Jordânia e Síria) - ocupou uma área que estava ilegalmente ocupada por dois deles (Egito e Jordânia), que abandonaram-na quando sua guerra contra Israel fracassou. Portanto, tratava-se de uma área que não era soberana, que não se constituíra em um Estado em tempo algum, eis que os palestinos não a aceitaram quando a ONU lhes ofereceu que nela criassem seu Estado.

Stephen Schwebel, antigo Presidente da Corte Internacional de Justiça assim escreveu:

Quando o Estado que tinha posse de um território adquiriu esta posse ilegalmente, o Estado que subseqüentemente toma o território no exercício de legitima auto-defesa, tem melhor titulo do que o anterior.

A história é muito simples: dia 5 de junho de 1967 – 10 horas da manhâ – a artilharia jordaniana que se colocara na linha de armistício de 1949 abre fogo sobre território israelense. Israel pede a intercessão da ONU que comunica a Jordânia às 11 horas que cesse fogo, mas os jordanianos continuam atacando. Israel inicia sua ação militar as 12.45. Dias depois não havia mais um soldado da Jordânia na margem ocidental do rio Jordão, ou seja retornaram com seus canhões para seu país e o exército de Israel achou-se dono do que se chama hoje margem ocidental, ou Cisjordânia, mas que aqueles que conhecem a história chamam de Samaria e Judéia, as regiões que durante mais de um milênio estiveram sob a soberania do povo de Israel até que as legiões romanas expulsaram-no para um exílio que durou do ano 130 até o final do século XIX quando judeus de todas as partes do mundo começaram a retornar e trabalhar a terra, convertendo um deserto total, deserto de gente, deserto de cidades, deserto de terras cultivadas, deserto de civilização, em kibutzim, vilarejos, cidades, fábricas, hospitais, universidades, e os árabes da Síria, do Líbano, da Arábia, da Armênia e de muitos outros locais vieram vindo, em busca de empregos, de uma vida melhor.

E no parágrafo 75 a Corte diz: O Conselho de Segurança, depois de lembrar várias vezes o princípio de que não

é admissível a aquisição de território por conquista militar, condenou estas medidas e, por meio da resolução 298 confirmou nos termos mais claros que:

“todas as ações legislativas e administrativas tomadas por Israel para mudar o status da cidade de Jerusalém, inclusive a expropriação de terra e propriedades, transferência de populações, e legislação visando a incorporação da seção ocupada, são totalmente inválidas e não podem mudar aqueles status.

Ora, Jerusalem fora conquistada pela Jordânia à força, na Guerra de 1948. A recusa dos árabes em proclamar seu estado, em aceitar a partilha, nulificou a respectiva resolução, que dividia a cidade santa entre três soberanias – israelense, palestina e internacional - de maneira que Jerusalém, assim como os territórios passaram a se constituir em territórios ocupados ilegalmente por Egito e Jordânia, ocupação contrária

112 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

a resolução n. 181, que partilhara o país e partilhara a cidade de Jerusalém, ocupação árabe esta, aliás, jamais condenada pelo Conselho de Segurança.

Como conseqüência da guerra de 1967, iniciada justamente pelos países ocupantes - Egito e Jordania (além da Síria) - Israel desocupou Jerusalém, reconstruiu-a, transformou-a em uma cidade moderna e anexou-a a seu território.

O Conselho de Segurança, órgão político, não tem autoridade para decidir sobre legalidade, ilegalidade, validade ou invalidade do status de Jerusalém.

A Corte perdeu uma oportunidade de ouro para estudar esta situação à luz do direito internacional público, à luz do que os autores clássicos escreveram sobre agressão, sobre ocupação, sobre uti possidetis, e sobre uma série de consagradas teorias do direito das gentes, mas, ao invés disto, seguiu cegamente a “jurisprudência política” do Conselho de Segurança.

Com esta opinião da Corte, coonestando todas as resoluções ilegais do Conselho de Segurança, contrárias aos princípios do direito internacional, fica este direito na orfandade, não havendo quem o proteja, quem possa fazê-lo funcionar43.

É a lamentável vitória do terrorismo, do terrorismo da Fatah e se suas milícias, sob o comando do “moderado” sr. Abbas, do terrorismo do Hamas, do Hizbullah, apoiados pelo Irã, pela Síria e, segundo certas fontes, também pela Al Qaeda, enfim a vitória de todas as forças contrárias ao democrático, moderno, científico, artístico, humanitário Estado de Israel, vitória deles sobre o direito internacional.

De nada adiantará a doutrina de Kofi Anan ou de quem venha seguir sua linha na ONU, de nada adiantarão as resoluções do Conselho de Segurança, de nada servirão opiniões deste jaez da Corte Internacional de Justiça. Enquanto a democracia não vencer sobre a ditadura, enquanto o país em que se vive na mais pleno gozo dos direitos individuais não for protegido contra as forças totalitárias que comandam e subjugam os povos do Oriente Médio, enquanto a história for tão flagrantemente deturpada e o direito à vida de uns valer menos do que de outros, enquanto a Europa não acordar de seu longo sono e não superar sua covardia, enquanto aos imigrantes e a seus filhos não se disser claro e bom som que assim como foram bem recebidos, devem respeitar a cultura dos povos que os acolheram, enquanto terroristas não forem levados à barra da Corte Penal Internacional como genocidas e autores de crimes contra a humanidade, estaremos caminhando para uma nova fase da história, que se caracterizará por desastres de proporções catastróficas das quais ninguém escapará.

XIII. A esperançaNada mais me resta dizer senão expressar a opinião de que, por enquanto, o direito

internacional público, naquilo que ele representa de mais importante – a proteção da humanidade da guerra, do terrorismo, das catástrofes - falhou por completo.

43 A opinião consultiva da Corte Internacional de Justiça foi objeto de um “Agora” publicado no American Journal of International Law, 2005, pp. 1-141, no qual participaram 11 internacionalistas, americanos, israelenses e árabes. A “Israel Law Review”, órgâo da Faculdade de Direito da Universidade Hebraica de Jerusalem, dedicou um número especial à opinião da Corte Internacional de Justiça e a um julga-mento da Suprema Corte de Israel, que ordenou algumas alterações no roteiro do muro em determinada área, o caso Beit Sourik: Israel Law Review 2.005, números 1-2.

O Terrorismo Internacional como Ameaça ao Direito Internacional 113

Resta-me a esperança de que as lideranças religiosas cristãs, começando pelo Papa no Vaticano, pelo Arcebispo da Cantuária, o Primaz de Constantinopla e as demais grandes autoridades da Cristandade, principalmente seus intelectuais, se unam e trabalhem para estimular as lideranças muçulmanas corretas, que professam uma religião de paz, para que levantem suas vozes, firmem sua autoridade visando a reconduzir nossos irmãos muçulmanos à razão, ao amor, a fraternidade de todos os homens e mulheres que caminham sobre este planeta.

Tenho um amigo em Jerusalém, ilustre filósofo e teólogo, o Rabino Professor David Hartman, que pergunta: será que o Islam, o Cristanismo e o Judaísmo poderão se convencer que Deus fala em árabe às sexta feiras, em hebraico aos sábados e em latim aos domingos, e que Ele recebe os diferentes seres humanos que se aproximam através de sua própria história, por meio de sua própria língua e de sua específica herança cultural? Será que fanatismo centrado em si mesmo é uma necessidade para a paixão e a sobrevivência religiosa ou será que podemos ter uma visão multicultural do Divino - a noção de que Ele não se exaure apenas por um caminho religioso.

Com esta visão, poderíamos abrir para a Humanidade, um novo horizonte, um mui Belo Horizonte.

114 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law

JOSÉ H. FISCHEL DE ANDRADE*

Resumo

Este artigo traça o desenvolvimento do conceito de “perseguição” dentro do Direito Internacional dos Refugiados. Após uma reflexão, o artigo analisa o desenvolvimento doutrinário e jurisprudencial do conceito de “perseguição” e identifica seus elementos centrais.

Abstract

This article tracks the development of the concept of ‘persecution’ in International Refugee Law. After a historical reflection, the article analyses the doctrinal and jurisprudential development of the concept of ‘persecution’ and identifies its core elements.

Initial Remarks

The existence of ‘refugees’ dates back to time immemorial. Their internationally accepted legal definition, however, was only developed in mid-20th century and is reflected in the Convention relating to the Status of Refugees1.

The refugee definition applied today by most countries is based on the 1951 Convention; but just like the Convention refugee definition builds upon the experience and events which occurred between the First and Second World Wars and the immediate post-1945 period, in subsequent decades the interpretation of the refugee definition has progressively developed.

A key aspect of the refugee definition is the notion of ‘persecution’. Although the term ‘persecution’ is not codified under International Refugee Law, it has evolved significantly by means of doctrine and case law.

This article tracks the development of the concept of ‘persecution’ in International Refugee Law. The first three sections of the article show that although the notion of ‘persecution’ did not figure explicitly in interwar refugee instruments, it started to become apparent at that time; that in the immediate post-1945 period the notion of ‘persecution’ began to take a normative form as one of the ‘valid objections’ that

* LLM (USP, São Paulo), PhD (UnB, Brasília), MSt (Cambridge), CAPES/PSIO Post-Doctoral Fellow (HEID, Genève).1 See 189 United Nations Treaty Series [UNTS] (1954), pp. 137-221; hereinafter “1951 Convention”.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 115

would justify a refugee’s resolve not to return to his or her country of origin, and hence a need for international protection; and that the 1951 Convention consolidated the importance of the notion of ‘persecution’ vis-à-vis the refugee definition. After this historical reflection, the article analyses the doctrinal and jurisprudential development of the concept of ‘persecution’ and identifies its core elements by answering the following questions: Who carries out the persecution and who is considered a victim of persecution? How is it carried out? What are the putative reasons advanced as grounds for persecution? When is it carried out? Which rights are (to be) violated in cases of persecution?

Inter-war periodAlthough refugees have been a common feature of European history, it was not

until after the First World War and particularly following the 1917 Revolution in Russia and the exchange of populations between Greece and Turkey that this continent was faced for the first time with massive flows of refugees amounting to millions in need of international protection. Several international legal instruments dealt directly or indirectly with the legal and logistical aspects regarding their situation2.

Russian refugees were mostly denationalised and numbered between 1,500,000 and 2,000,000 persons3. The League of Nations decided to act on their behalf and on November 1st, 1921, Dr. Fridtjof Nansen took office as High Commissioner for Russian Refugees4. On the July 5th, 1922 an agreement5 was concluded with a view to protecting Russian refugees by means of documenting them. A definition of who should be considered a Russian refugee was not given.

An influx of some 300,000 to 400,000 Armenian refugees mainly to Europe in the early 1920s prompted the League of Nations to assist them. They came under the ratione personae jurisdiction of Dr. Nansen’s office. Between May 10th and 12th, 1926 a Conference regarding Russian and Armenian refugee questions was convened in Geneva. The result was the conclusion of an international instrument on the issuance of identity documents to both Russian and Armenian refugees6. Beneficiaries were defined as follows:

2 See, inter alia, “Agreement between the Latvian Democratic Republic and the Ukranian Socialist Soviet Republic Regarding the Repatria-tion of Latvian Refugees who are at Present in the Territory of the Latter”, 17 League of Nations Treaty Series [LNTS] (1923), pp. 306-315; “Protocol Relating to the Settlement of Refugees in Greece and the Creation for this Purpose of a Refugees Settlement Commission”, 20 LNTS (1923), pp. 29-39; “Declaration Relating to the Settlement of Refugees in Greece and the Creation for this Purpose of a Refugees Settlement Commission”, 20 LNTS (1923), p. 43; “Treaty of Peace”, 28 LNTS (1924), pp. 13-113; “Additional Act to the Protocol of Sep-tember 29, 1923, Relating to the Settlement of Greek Refugees”, 30 LNTS (1924-25), pp. 413-419; “Convention concerning the Exchange of Greek and Turkish Populations and Protocol”, 32 LNTS (1925), pp. 75-87; “Declaration of Amnesty and Protocol”, 36 LNTS (1925), pp. 145-151; and “Protocol Concerning the Settlement of Refugees in Bulgaria”, 58 LNTS (1926), pp. 245-257.

3 For a survey of several estimates regarding the Russians who left Russia in late 1910s and early 1920s, see G. Ginsburgs, “The Soviet Union and the Problem of Refugees and Displaced Persons 1917-1956”, 51(2) American Journal of International Law (1957), p. 326.

4 Cf. G.J. van Heuven Goedhart, “The Problem of Refugees”, 82(I) Recueil des Cours de l’Académie de Droit International (1953), p. 271; and J.H. Simpson, The Refugee Problem: report of a survey, London, Oxford University Press/Royal Institute of International Affairs, 1939, p. 200.

5 See “Agreement with Regard to the Issue of Certificates of Identity to Russian Refugees”, 13 LNTS (1922), pp. 237-242.6 See “Arrangement Relating to the Issue of Identity Certificates to Russian and Armenian Refugees, supplementing and amending the

previous Arrangements dated July 5, 1922, and May 31, 1924”, 89 LNTS (1929), pp. 47-52.

116 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Russian [refugee]: Any person of Russian origin who does not enjoy or no longer enjoys the protection of the Government of the Union of Socialist Soviet Republics and who has not acquired another nationality.Armenian [refugee]: Any person of Armenian origin formerly a subject of the Ottoman Empire who does not enjoy or no longer enjoys the protection of the Government of the Turkish Republic and who has not acquired another nationality7.

In the late 1920s other groups of refugees needed international protection. Hence on June 28th, 1928 a Conference was convened in Geneva by the League of Nations High Commissioner for Refugees. In execution of a resolution previously adopted on June 7th, 1928 by the Council of the League of Nations, the governments represented at the conference decided to adopt an international instrument8 by which the measures on behalf of the Russian and Armenian refugees would be extended to other groups of refugees so defined:

Assyrian, Assyro-Chaldaean and assimilated refugee. Any person of Assyrian or Assyro-Chaldaean origin, and also by assimilation any person of Syrian or Kurdish origin, who does not enjoy or no longer enjoys the protection of the State to which he previously belonged and who has not acquired or does not possess another nationality;Turkish refugee. Any person of Turkish origin, previously a subject of the Ottoman Empire who under the terms of the Protocol of Lausanne of July 24, 1923, does not enjoy or no longer enjoys the protection of the Turkish Republic and has not acquired another nationality9.

These four definitions merit comment. Firstly, they were embodied in non-binding instruments and hence did not have legal force between the parties, since the agreements were not treaties but rather mere recommendations10. Secondly – and most notably for the purpose of this article – not one of the four definitions of a ‘refugee’ made any mention of ‘persecution’. While ‘lack of protection’ is offered as a criterion for granting refugee status, ‘lack of protection’ did not imply or even import ‘persecution’ for definitional purposes11. Nor was there in these definitions any constituent element that could be directly related to persecution.

Until the mid-1930s there had been no development of a general, more comprehensive definition of ‘refugee’. At its Brussels session in 1936, L’Institut de Droit International defined a ‘refugee’ as any person who, because of political events arising in the state of which he is a national, has left or remains outside the territory

7 Ibid., p. 49; emphasis in the original.8 See “Arrangement concerning the Extension to other Categories of Refugees of certain Measures taken in favour of Russian and Armenian

Refugees”, 89 LNTS (1929), pp. 63-67.9 Ibid., pp. 65 and 67; emphasis in original.10 Some French courts, however, dissented from this understanding; in this regard, see J.H. Simpson, op. cit. supra, p. 244.11 It may be inferred from the drafting history of the ‘refugee’ definition that the term ‘protection’ meant ‘diplomatic protection’, i.e. the

protection accorded by States to their nationals abroad, and not the protection that the State must provide within its territory to victims or potential victims of persecution; see A. Fortin, “The Meaning of ‘Protection’ in the Refugee Definition”, 12(4) International Journal of Refugee Law (2000), pp. 548-576. Although this interpretation of the term ‘protection’ may be challenged nowadays, it can be concluded by the analysis of the travaux preparatoires that in the 1920s ‘lack of protection’ was not indeed tantamount to ‘persecution’.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 117

of that state, has not acquired another nationality and does not enjoy the diplomatic protection of another state12. The ‘lack of protection’ standard still prevailed.

It was only in 1938 that a criterion of ‘persecution’ first appeared in an international legally binding instrument. Article 1 of the Convention Concerning the Status of Refugees coming from Germany13, signed in Geneva on February 10th, 1938, stated that

1. For the purpose of the present Convention, the term ‘refugees coming from Germany’ shall be deemed to apply to:(a) Persons possessing or having possessed German nationality and not

possessing another nationality who are proved not to enjoy, in law or in fact, the protection of the German Government;

(b) Stateless persons not covered by previous Conventions or Agreements who have left German territory after being established therein and who are proved not to enjoy, in law or in fact, the protection of the German government.

2. Persons who have left Germany for reasons of purely personal convenience are not included in this definition14.

The first part of the Convention follows the pattern of the previous instruments by generally defining as a ‘refugee’ someone who no longer enjoys the protection of his or her state of nationality, nor has become a national of another state. The difference in Article 1 of the 1938 Convention, as opposed to the preceding instruments, is that it has a differently worded exclusion clause, which leaves out from the definition of ‘refugee’ persons who left Germany for reasons of purely personal convenience, and not merely those who have acquired another nationality.

By including this newly-worded exclusion clause, its drafters singled out for the first time the forced migration character of refugee status. In previous definitions forced migration was not an explicit let alone a fundamental element of the definition. Undoubtedly the intention of this new wording was to insert – albeit timidly – in the definition of ‘refugee’ the reasons which prompted both the flight15 and the lack of – and therefore the need for substitutive – protection. In doing so the component ‘persecution’ surfaced, although implicitly.

From the summary records of the Inter-Governmental Conference of 1938, which adopted the Convention, it is quite clear that a condemnation of German policies at that time was exactly what the Conference wanted to make16. The discussions that took place in the Inter-Governmental Conference clearly indicate that the persons envisaged by the exclusion clause of paragraph 2 of Article 1 were those “who had left Germany for economic reasons but without being compelled to do so, or [who]

12 “Tout individu qui, en raison d’événements politiques survenus dans son Etat d’origine, fuit le territoire de cet Etat, soit qu’il quitte le pays volontairement ou sous le coup d’une expulsion, soit que, séjournant à l’étranger, il n’y revienne pas, et qui, au surplus, n’a pas acquis d’autre nationalité et ne jouit pas de la protection diplomatique d’un autre Etat”; see “Projet de Resolutions et Commentaires”, in Annuaire de l’Institut de Droit International (1936), p. 46.

13 See 192 LNTS (1938), pp. 59-81; hereinafter “1938 Convention”.14 Ibid., p. 63; emphasis added.15 Cf. P. Hartling, Concept and Definition of ‘Refugee’ – legal and humanitarian aspects (II Nordic Seminar on Refugee Law, Copenhagen,

23.IV.1979), Geneva, UNHCR, 1979, p. 3 (mimeo), and ibid., 48(1/4) Nordic Journal of International Law (1979), pp. 126-127.16 L.N. Doc. Conf. C.S.R.A./P.V.4, p. 10, apud G. Melander, “The Protection of Refugees”, 18 Scandinavian Studies in Law (1974), p. 160.

118 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

had gone abroad in order to evade taxation”17, and therefore not the victims of race- or politically-based economic sanctions or proscription imposed by the Nazi regime.

The association which one finds in the 1938 Convention between the refugee’s flight and the requirement that the flight cannot be based on reasons of purely personal convenience has significantly evolved since. In the 1938 Convention the inclusion clause does not mention the reasons on which flight is grounded; it rather makes reference to two reasons which are not to be taken into account when recognizing someone as a refugee – namely personal convenience and protection by another state. In the ensuing instruments the reason justifying the need for protection evolved gradually until its current construction emerged, i.e. ‘well-founded fear of persecution’. In this process the 1938 Convention played an important role. As one leading commentator puts it, “the relationship between the concept of ‘well-founded fear of being persecuted’ with the concept of reasons other than those ‘of purely personal convenience’ in the 1938 Convention is apparent”18.

During the Second World War the Allies realized the need to establish an organization aimed inter alia at assisting persons displaced on account of the conflict, and at carrying out a major international reconstruction and rehabilitation program. On November 9th, 1943 the Charter of the United Nations Relief and Rehabilitation Administration (UNRRA), the very first international organization to incorporate the words ‘United Nations’ in its title, was signed19.

Once established, the UNRRA was confronted with the question of its ratione personae competence, i.e. of who was eligible for its assistance. The uprooted were divided into three categories, refugees being one of them20. Refugees were initially defined as persons who had left their native countries of their own free will to escape persecution or the ravages of war21. Soon after, the definition was extended to “other persons who have been obliged to leave their country or place of origin or former residence”22. This wording displeased the Eastern European countries as too far-reaching and was heavily criticized by them. The refugee policy of the UNRRA established by interpretation of Resolution 71 was focused on individual as distintic from group concerns23 which prevailed in the 1920s and 1930s. The policy was further narrowed by a July 1946 directive24 which required applicants of post-war refugee status to establish “concrete evidence” of persecution before being admitted to the care of UNRRA. As a result, only persons suffering objectively demonstrable incompatibility with their state of origin could receive the benefits of refugee status25.

17 Cf. Provisional Minutes of the International Conference for the Adoption of a Convention concerning the Status of Refugees coming from Germany, League of Nations Doc. Conf./C.S.R.A./P.V.1-4 (1938), apud J.C. Hathaway, op. cit. supra, p. 365.

18 Cf. A. Grahl-Madsen, op. cit. supra, p. 216.19 It existed until 1946, when its mandate was taken over by newly established UN organs.20 Cf. J.G. Stoessinger, The Refugee and the World Community, Minneapolis, University of Minnesota Press, 1956, pp. 49-51.21 UNRRA Council Resolutions on Policy, Resolution 40, July 1945, p. 9; apud ibid. p. 49.22 UNRRA Resolution 71, UNRRA Journal (1945), p. 152; apud J.C. Hathaway, op. cit. supra, p. 373.23 J.C. Hathaway, op. cit. supra, p. 377.24 UNRRA European Region Order 40(I), 3 July 1946; apud ibid., p. 373.25 J.C. Hathaway, op. cit. supra, pp. 373-374.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 119

Under the UNRRA regime applications for refugee status were to be individually determined. Such status was to be granted to those who succeeded in objectively demonstrating that they were victimized by persecution. Hence the trend to define a refugee as someone who had been persecuted as an individual, due to his or her particularities, and no longer for being a member of a collectivity, was gaining ground.

The majority of refugees entitled to international assistance and protection between the world wars were victims of international and non-international armed conflict. It is significant that the international instruments which were initially adopted termed as ‘refugees’ persons coming from a certain origin, i.e. Russian, Armenian, Assyro-Chaldaean and Turkish. There was no individual criterion in the definition. In the era of the League of Nations, refugees were outside their former home countries for a variety of reasons which may or may not have amounted to ‘persecution’ as this term is now understood26.

In conclusion, it may be stated that the notion of ‘persecution’ did not figure explicitly in pre-Second World War international instruments relating to refugees. It was, however, in the inter-war period that the notion of ‘persecution’ became apparent – though implicitly – as a constituent element in the definition of a ‘refugee’.

Immediate post-1945 periodThe term ‘persecution’ first figured in the draft Constitution of the International

Refugee Organization (IRO). It was introduced by the Special Committee on Refugees and Stateless Persons, established by the United Nations Economic and Social Council (ECOSOC) in 1946. Its purpose was to define the ‘valid objections’ which would entitle a refugee not to return to his or her country of origin and thus become the concern of the Organization. Hence the notion of ‘persecution’ was not introduced in order to restrict the ‘refugee’ concept as hitherto understood27. It had come to play a vital role in the question of the recognition of refugeehood, and had been added to the prewar requirement that a person enjoyed no protection from his or her own country.

The records of the Special Committee do not indicate why this particular term – ‘persecution’ – was chosen28. Some observers assert that since the intention was to protect persons from countries under Communist domination, the definition was meant to describe the situation in those countries – thus a strong political element had been inserted when defining the term ‘refugee’29.

Annex I, Part I, Section A (Definition of Refugees) to the IRO Constitution30, which was open for signature on the 15th of December 1946, defined a ‘refugee’ inter alia as someone26 Cf. I.C. Jackson, “The 1951 Convention relating to the Status of Refugees: a universal basis for protection”, 3(3) International Journal of

Refugee Law (1991), p. 405.27 Ibid., p. 406.28 Ibid., p. 405.29 Cf. G. Melander, “The Concept of the Term ‘Refugee’”, in A.C. Bramwell (ed.), Refugees in the Age of Total War, London, Unwin Hyman,

1988, p. 9.30 “Constitution of the International Refugee Organization and Agreement on interim measures to be taken in respect of refugee and displaced

persons”, 18 UNTS (1948), pp. 3-24.

120 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

3. [...] who, having resided in Germany or Austria, and being of Jewish origin or foreigners or stateless persons, were victims of nazi [sic] persecution and were detained in, or were obliged to flee from, and were subsequently returned to, one of those countries as a result of enemy action, or of war circumstances, and have not yet been firmly resettled therein.31

Apart from meeting the inclusion clauses of the IRO Constitution, to become the concern of the Organization refugees should

3. […] have definitively […] expressed valid objections to returning to those countries [of nationality or former habitual residence].(a) The following shall be considered as valid objections:(i) persecution, or fear, based on reasonable grounds of persecution because of

race, religion, nationality or political opinions […].(iii) […] compelling family reasons arising out of previous persecution […]32.

The complexity of the definitional provisions was the result of an attempt to reconcile the divergent views of Member States voiced in a myriad of organs and committees which participated in the eighteen-month drafting process33. Ultimately, the definitions laid down in the IRO Constitution were regarded as a “mixture of geographic or pragmatic and ideological concepts”34. Some commentators assessed them as artificial and formalistic, having stated that in practical application many of these definitions were very often broken down35.

This rather pessimistic appraisal should not prevail. In fact, the definition of ‘refugee’ laid down in the IRO Constitution represented a two-fold innovation, namely the individualisation of the term ‘refugee’36, and the listing of the reasons upon which persecution was grounded, which had never been spelt out in full before. Association of those reasons with a partly subjective element, namely ‘fear’, based on well-founded grounds of persecution, was further innovative. Consequently, from then on, every refugee would have to substantiate the fear he or she invoked by providing some proof based both on objective data and on the personal factors which made him or her fear persecution in the future, even if he or she had not been persecuted in the past37.

It must be noted that this innovation was incorporated mutatis mutandis by the Universal Declaration of Human Rights, which spelt out in its Article 14.1: “Everyone has the right to seek and to enjoy in other countries asylum from persecution”38.

Although some 1,600,000 refugees and displaced persons had benefited from the IRO’s ratione personae mandate, its planned extinction was to leave some 410,000 persons in

31 Ibid., p. 18; emphasis added.32 See Annex I, Part I, Section C (Conditions under which ‘refugees’ and ‘displaced persons’ will become the concern of the Organization),

ibid., p. 19; emphasis added.33 J.C. Hathaway, op. cit. supra, p. 374.34 Cf. P. Hartling, op. cit. supra, p. 4 and p. 127, respectively.35 Cf. D.B. Fowler, “The Developing Jurisdiction of the United Nations High Commissioner for Refugees”, 7(1) Revue des Droits de

l’Homme (1974), p. 124.36 The collective aspect of the ‘refugee’ phenomenon ceased to be decisive in granting refugee status, emphasis being placed henceforth on

the situation of the individual.37 Cf. S. Aga Khan, “Legal Problems relating to Refugees and Displaced Persons”, 149(I) Recueil des Cours de l’Académie de Droit Interna-

tional (1976), p. 297.38 See UN GA Res. 217, adopted on December 10th, 1948; emphasis added.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 121

need of protection and assistance39. Accordingly, shortly before the winding up of the IRO40, the preparations for the establishment of the Office of the UNHCR began.

On December 3rd, 1949 the United Nations General Assembly [UN GA] decided to establish a High Commissioner’s Office for Refugees as of January 1st, 195141. On December 14th, 1950 the UN GA adopted Resolution No. 428 (V), which embodied the Statute of the UNHCR. Under Chapter II (Functions of the High Commissioner), it is laid down that

6. The competence of the High Commissioner shall extend to:[…](ii) Any person who […] owing to well-founded fear of being persecuted for reasons of race, religion, nationality or political opinion, is outside the country of his nationality and is unable or, owing to such a fear or for reasons other than personal convenience, is unwilling to avail himself of the protection of that country […]42.

Strictly construed, the UNHCR Statute’s definition of ‘refugee’ calls for individualised determination of eligibility of refugee status based upon an evaluation of the subjective and objective elements necessary to establish a well-founded fear of persecution. The subjective element requires that the fear be well-founded in the sense that it is sincere and reasonable rather than feigned or imaginary.

From a logistical standpoint, the need to establish a well-founded fear of persecution on an individualised, subjective basis risked restriction of UNHCR’s ability to aid large groups of refugees. This was especially the case where a lack of huge administrative machinery rendered impracticable a procedure for determining the individual eligibility of all the members of large groups of refugees43. Over the years UNHCR, acting as pragmatism dictates, has found it necessary to bypass its statutory restrictions. It no longer confines itself to the original definition of ‘refugee’ and to its criterion of ‘well-founded fear of persecution’: since the mid 1970s the UN GA has broadened the mandate of the UNHCR44. The conduct of a large number of refugee-receiving states has not, however, matched the UN GA’s magnanimity.

The innovation of the IRO was therefore being irradiated to several international instruments. Apart from the Universal Declaration of Human Rights and the UNHCR Statute, this was also the case with the 1951 Convention, as will be seen below.

39 Cf. M. Moussalli, “The Evolving Functions of the Office of the High Commissioner for Refugees”, in V. Gowlland & K. Samson (eds.), Problems and Prospects of Refugee Law (Colloquium of Geneva, 23-24.V.91), Geneva, Graduate Institute of International Studies, 1992, p. 85.

40 The IRO concluded its operations on behalf of refugees and displaced persons on January 31st, 1952 and went on liquidation on March 1st, 1952; cf. L.W. Holborn, The International Refugee Organization – a specialized agency of the United Nations. Its history and work, 1946-1952, Oxford, Oxford University Press, 1956, p. 565.

41 See UN GA Res. No. 319 (IV).42 Statute of the Office of the United Nations High Commissioner for Refugees, UN Doc. A/1775 (1950), in Collection of International

Instruments and Legal Texts Concerning Refugees and Others of Concern to UNHCR, Vol. 1, Geneva, UNHCR, 2007, p. 6.43 D. Hull, “Displaced Persons: the new refugees”, 13(3) Georgia Journal of International and Comparative Law (1983), p. 765.44 Cf. J.I. Garvey, “Toward a Reformulation of International Refugee Law”, 26(2) Harvard International Law Journal (1985), p. 489. See,

inter alia, UN GA res. 3143 (XXVIII), 14 December 1973; UN GA res. 1673 (XVI), 18 December 1961; UN GA res. 2294 (XXII), 11 December 1967; UN Economic and Social Council [ECOSOC] Res. 2011 (LXI), 2 August 1976; UN GA res. 31/55, 30 November 1976; UN GA res. 36/125, 14 December 1981; UN GA res. 44/150, 15 December 1988; and UN GA res. 48/118, 20 December 1993.

122 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

The 1951 ConventionRight after the commencement of the activities of the UNHCR on January 1st,

1951 an obvious need was recognised for a legally binding normative framework both defining the term ‘refugee’ and listing their rights and duties. Following the UN Conference of Plenipotentiaries held in Geneva from July 2nd to 25th, 1951 for the purpose of drafting a new international instrument, the text of the 1951 Convention was adopted on July 28th that year and entered into force on April 22nd, 1954.

Article 1 (Definition of the term ‘refugee’) of the 1951 Convention laid down in its inclusion clauses inter alia that

A. For the purposes of the present Convention, the term ‘refugee’ shall apply to any person who:[…]2) As a result of events occurring before 1 January 1951 and owing to well-

founded fear of being persecuted for reasons of race, religion, nationality, membership of a particular social group or political opinion, is outside the country of his nationality and is unable, or owing to such fear, is unwilling to avail himself of the protection of that country; or who, not having a nationality and being outside the country of his former habitual residence as a result of such events, is unable or, owing to such fear, is unwilling to return to it.45

Two comments are appropriate. Firstly, it must be noted that Western states, which initially saw the admission of refugees to be consistent with their more general political goals, found the persecution-based definition to be quite capable of embracing virtually all émigrés from the socialist states of Europe. Moreover, determining that refugees faced ‘persecution’ in their state of origin supported efforts to ascribe inappropriate behavior to the ideological adversaries of the East46. It may be thus accurately stated that in a widely prevalent Western view of the time, refugee movements were good, as long as they provided the receiving countries with the means of attacking an adversary as well as manpower for reconstruction and development47.

Secondly, Article 1A(2) was originally intended to deal exclusively with existing refugees. The concept of ‘refugees’ whom the 1951 Convention was initially designed to protect was therefore very limited and not at all universal, but rather European. The phrase “as a result of events occurring before 1 January 1951” was retained until the adoption of the Protocol Relating to the Status of Refugees48, by which the temporal clause was eliminated49.

45 Emphasis added.46 Cf. J.C. Hathaway, “A Reconsideration of the Underlying Premise of Refugee Law”, 31(1) Harvard International Law Journal (1990), p.

169.47 G. Coles, The Human Rights Approach to the Solution of the Refugee Problem: a theoretical and practical enquiry (Mar. 1988) (unpubli-

shed manuscript, available at the Refugee Law Research Unit, Osgoode Hall Law School, Ontario, Canada), pp. 14-15, apud id. ibid.48 See 606 UNTS (1967), pp. 268-277; hereinafter “1967 Protocol”.49 On the 1967 Protocol, see P. Weis, “The 1967 Protocol Relating to the Status of Refugees and some Questions of the Law of Treaties”,

42 British Yearbook of International Law (1967), pp. 39-70; G.S. Goodwin-Gill, “The Relationship between the 1951 Convention and the 1967 Protocol Relating to the Status of Refugees”, 13 Thesaurus Acroasium (1987), pp. 939-953; and S.K.N. Blay & B.N. Tsamenyi, “Reservations and Declarations under the 1951 Convention and the 1967 Protocol relating to the Status of Refugees”, 2(4) International Journal of Refugee Law (1990), pp. 527-561.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 123

Although the 1951 Convention seems considerably to limit the scope of ‘refugee’ by enumerating five factors – i.e. race, religion, nationality, social group and political opinion – as the reason for their persecution, in fact it establishes rather broad categories. It should also be especially noted that while general International Law referred at that time to actual persecution, the 1951 Convention talked of the ‘fear of being persecuted’. The ‘fear of being persecuted’ indicated the mental state of putative refugees, showing the terror of persecution and their anxiety or misgivings at the likelihood of persecution. To use their state of mind as the criterion in establishing their refugeehood is a subjective requirement, and the term ‘well-founded’ was added to make the yardstick more objective; i.e. the test is subjective, the evidence required is not. The adjective ‘well-founded’ was meant to signify that a “person has either been actually a victim of persecution or can show good reason why he fears persecution”50.

Doctrinal and jurisprudential developmentThe 1951 Convention and 1967 Protocol have been ratified or adhered to by

signatories who together constitute the majority of the international community: on December 31st, 2007 there were 147 State Parties to one or both of these instruments51. The concept of ‘refugee’ adopted by domestic legislation in these states as well as by non-signatory states has been inspired by – when not literally reproduced from – the 1951 Convention and the 1967 Protocol.

Despite the variety of phrasing used by domestic legislation and regional instruments in defining ‘refugee’, ‘persecution’ figures in most of them as the element of causation of refugee exodus52. However, since ‘persecution’ has not been defined in normative terms in International Refugee Law, its meaning has been developed by a substantial body of academic, administrative and judicial interpretations, there being no uniform scholarly definition or practice.

Scholars normally refrain from defining the term ‘persecution’. They would rather analyse its various components. One of the few definitions of ‘persecution’ by a leading Refugee Law expert describes it as “the sustained or systemic violation of basic human rights demonstrative of a failure of state protection”53. A similar definition, based on a

50 N. Robinson, Convention Relating to the Status of Refugees – its history, contents and interpretation, New York, Institute of Jewish Affairs, 1953, p. 48. For a comprehensive review of the historical background that led to the adoption of the term ‘well-founded fear’, as well as of the interpretative state practice in several countries, see T.N. Cox, “‘Well-Founded Fear of Being Persecuted’: the sources and application of a criterion of refugee status”, 10(2) Brooklyn Journal of International Law (1984), pp. 333-379. As explained above, this article is limi-ted to analyzing the development of the concept of ‘persecution’, and hence it does not dwell into how it can be objectively established.

51 Cf., for a list of these countries, “States Parties to the 1951 Convention relating to the Status of Refugees and the 1967 Protocol”, 26(4) Refugee Survey Quarterly (2007), pp. 313-317.

52 Two exceptions are the Organization of African Unity (OUA) Convention governing the specific aspects of refugees problems in Africa, of September 10th, 1969 (1969 African Convention) and the non-binding Cartagena Declaration on Refugees, of November 22nd, 1984 (1984 Cartagena Declaration); for these texts, see Collection of International Instruments and other Legal Texts concerning Refugees and Displaced Persons, vol. II (Regional Instruments), Geneva, UNHCR Division of International Protection, 1995, pp. 3-9 [esp. 4], and pp. 206-211 [esp. 208], respectively. The definitions of a ‘refugee’ adopted in the 1969 OAU Convention and in the 1984 Cartagena Declara-tion are the only salient challenges to the proposition that ‘persecution’ is an essential criterion for refugeehood. Both of them recognized, as the UN definition does not, that the normal bond between the citizen and the state can be severed in diverse ways – such as generalized violence, foreign or external aggression or domination, occupation, internal conflict and serious violation of human rights –, persecution being but one; see A.E. Shacknove, “Who is a refugee?”, 95(2) Ethics (1985), pp. 275-276.

53 J.C. Hathaway, The Law of Refugee Status, Toronto, Butterworths, 1991, pp. 104-105.

124 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

decision by the House of Lords is that “‘persecution’ means the failure (or absence) of State protection against a serious harm, including persistent discriminatory acts”54.

Notwithstanding the meritorious goal of widening the scope of refugee status beneficiaries, these broad definitions would serve almost no purpose in the real world, particularly if national migration authorities responsible for determination of eligibility of asylum-seekers use a rather restrictive interpretation of what constitutes ‘basic human rights’ and ‘failure of state protection’55.

To avoid the perils of restrictive interpretation, principles of International Human Rights Law have been shaping the way ‘persecution’ is interpreted and determined. Increasingly scholars56 and national adjudication authorities57 are using human rights norms as a framework for analysing which types of harm amount to ‘persecution’. Thus harm to the individual should be assessed in light of International Human Rights instruments; recognition of an international human rights standard for assessing whether a feared harm is persecutory does not, however, eliminate all the complexities of such determination.

In a doctrinal endeavor to develop interpretation of the term ‘persecution’ by relating it to Human Rights values, the UNHCR claims that there are several forms of harm that amount to persecution, including:

(i) serious physical harm, loss of freedom, and other serious violations of basic human rights as defined by international human rights instruments58;(ii) discriminatory treatment which lead to consequences of a substantially prejudicial nature (for instance, serious restriction on the applicant’s right to earn his or her living, to practice his or her religion, to access normally available education facilities)59; and(iii) a combination of numerous harms none of which alone constitutes persecution but which, when considered in the context of a general atmosphere in the applicant’s country, produces a cumulative effect which creates a well-founded fear of persecution60.

Parallel with doctrinal development, administrative and judicial case law on refugee status determination has developed distinct – and often contradictory – views on several

54 H. Lambert, “The Conceptualization of ‘Persecution’ by the House of Lords: Horvath v. Secretary of State for the Home Department”, 13 (1/2) International Journal of Refugee Law (2001), p. 30.

55 This used to be the case e.g. in the United States, where it was stated that “U.S. policy ought to be much more sensitive to the level of political violence in other countries in making refugee/asylum decisions than it has in the past”; cf. M. Gibney, “A ‘Well-Founded Fear’ of Persecution”, 10 Human Rights Quarterly (1988), p. 120.

56 See e.g. C. Apodaca, “Human Rights Abuses: precursor to refugee flight?”, 11(1) Journal of Refugee Studies (1998), pp. 80-93; G.J.L. Coles, “Refugee and Human Rights”, in Bulletin of Human Rights (1991/1), Geneva/New York, Centre for Human Rights/UN, 1992, pp. 63-73; P. Nobel, “Blurred Vision in the Rich World and Violations of Human Rights - a critical assessment of the human rights and refugee linkage”, in Bulletin of Human Rights (1991/1), Geneva/New York, Centre for Human Rights/UN, 1992, pp. 74-84; and A.F. Bayefsky & J. Fitzpatrick (eds.), Human Rights and Forced Displacement, The Hague, Martinus Nijhoff Publ., 2000, 320p.

57 The denial of a core human right as the appropriate benchmark for determining what ‘persecution’ is has been explicitly recognised in the jurisprudence of several common law jurisdictions including Canada (see Canada (Attorney General) v. Ward [1993] 2 S.C.R. 689; New Zealand, Refugee Appeal No. 2039/93 e MN, of February 12th, 1996.) In its review of State practice the Human Rights Nexus Working Party (HRNWP) of the International Association of Refugee Law Judges (IARLJ) concluded that some signatory States like Canada, New Zealand, Australia and the United Kingdom explicitly refer to human rights instruments when assessing whether the situation facing the claimant is persecutory, and most countries implicitly incorporate a human rights approach in their analysis.

58 Handbook on Procedures and Criteria for Determining Refugee Status, Geneva, UNHCR, 1979, § 52.59 Ibid., § 54.60 Ibid., § 53.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 125

features related to the content of ‘persecution’. Some of these features may be used in an attempt to establish its essential, core elements in International Refugee Law.

In order to identify what the core elements of the content of ‘persecution’ are, the following questions ought to be answered: who carries out the persecution and who is considered a victim of persecution? How is it carried out? What are the putative reasons advanced as grounds for persecution? When is it carried out? Which rights are (to be) violated in cases of persecution? These questions will be taken in turn61.

1. Who are the perpetrators of persecutory acts?It is widely accepted that, as a rule, persecution is carried out by State actors.

When it comes to recognizing non-state actors as persecutors, case law is divided. Austrian case law upholds that persecution must be attributable to state authorities, there being no guarantee of protection when the persecution is private or in connection with rebel activities62. In Switzerland, if persecution is the work of private individuals, it must be imputed to the state in order to produce the effects leading to recognition, which happens only if the asylum-seeker has solicited the protection of the state and the latter did not grant it63. Belgian case law indicates that the agent of persecution need not be limited to the authorities of the country of origin, and that there may also be third parties if acts committed by them are consciously tolerated by the authorities or against which the authorities are incapable of offering protection64. The same principle is followed in Danish case law, where not only conscious tolerance of the state, but also its refusal and/or inability to offer protection may lead to the recognition of acts perpetrated by private agents as persecutory65. One may conclude, therefore, that perpetrators of persecution are no longer restricted to state actors. Case law has consistently and increasingly considered non-state agents to be perpetrators of persecution66.

There is no requirement that the persecutor must intend to harm the person in order for the treatment to be considered persecutory. The fact that the persecutor does not intend to persecute does not change the character of his or her actions. For example, a law that prohibits the practice of a certain religion may be persecutory even thought

61 When answering these questions, the case law analysis will not be exhaustive but rather limited to few examples on each topic. Some of the cases used in this article were obtained from the following publications: J.-Y. Carlier et al. (eds.), Who is a Refugee? A Comparative Case Law Study, The Hague, Kluwer, 1997, 794p.; N. Sitaropoulos, Judicial Interpretation of Refugee Status – in search of a principled methodology based on a critical comparative analysis, with special reference to contemporary British, French and German Jurisprudence, Athens/Baden-Baden, Ant. N. Sakkoulas Publ./Nomos Verlag (Human Rights Series, vol. 2), 1999, 521p.; and K. Musalo et al. (eds.), Refugee Law and Policy – a comparative and international approach, 2nd ed., Durham, Carolina Academic Press, 2002, 990p. The other cases were obtained from the official sites of the New Zealand Refugee Status Appeals Authority; the University of Michigan Law School Refugee Caselaw Site; the Immigration and Refugee Board of Canada; the Federal Court of Canada; the Federal Court of Appeal of Cana-da; the Belgium Commission permanente de recours des réfugiés; the Australasian Legal Information Institute; and the French Commission des recours des réfugiés.

62 Verwaltungsgerichtshof (VwGH), 11.03.1993, 93/18/0083, and VwGH, 08.07.1993, 93/18/0283, 0284.63 Office fédérale des réfugiés (ODR), 24 June 1992, N 249 173.64 Commission permanente de recours des réfugiés (C.P.R.) (1 ch), 21 November 1991, F035; also C.P.R., 8 November 1990, F015.65 Refugee Appeals Board (R.A.B.), 18 October 1991, No. 21-2827; R.A.B., 18 December 1991, No. 21-2574; R.A.B., 30 January 1992, No.

21-2546, R.A.B., 18 February 1993, No. 21-3861.66 For scholarly analysis of case law and recent trends, see C. Phuong, “Persecution by Third Parties and European Harmonization of Asylum

Policies”, 16 Georgetown Immigration Law Journal (2001-02), pp. 81-97; R. Marx, “The Notion of Persecution by Non-State Agents in German Jurisprudence”, 16 Georgetown Immigration Law Journal (2001-02), pp. 447-461; and W. Kälin, “Non-State Agents of Persecu-tion and the Inability of the State to Protect”, 16 Georgetown Immigration Law Journal (2001-02), pp. 415-431.

126 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

the legislators firmly believe that it is best for those who adhere to the proscribed religion to convert to the dominant faith. Similarly, a father who insists his daughter must marry, contrary to her protected right not to be forced into marriage, may be doing so in the belief it is genuinely in her interests.

2. Who are the victims of ‘persecution’?As mentioned in the previous sections, the collective aspect of the ‘refugee’

phenomenon ceased to be decisive in granting refugee status, the emphasis being placed during the 1940s and henceforth on the individual situation of the asylum-seeker. Hence, strictly construed the UNHCR Statute’s and the 1951 Convention’s definitions of ‘refugee’ call for determination of refugee status on the merits of each case. In the same vein, and as decided by a French Appeals Board, the granting of refugee status is subject to examination of the fear of individual persecution67. As a consequence, the same Board dismissed situations in which the asylum-seeker was the victim of the non-discriminatory application of general legislation68. It is worth noting that the Board has sometimes taken into consideration the general context in order to ascertain whether the personal fear stated by the asylum-seeker was well-founded69. Persecution does not need to be directed against the asylum-seeker. As German case law indicates, violation of the rights of one member of a family as an intimidation measure may give rise to a right of asylum for others70. Granting refugee status to a member of the asylum-seeker’s family may not lead to recognition of the asylum-seeker’s status as refugee, since each request is examined on its merits. However, the assertions of an asylum-seeker may be considered more credible once it has been confirmed that a close relative has been granted asylum on account of suffering a similar persecution71. According to Portuguese case law an asylum-seeker may establish reasonable fear of persecution on the basis of allegation and proof of a situation of persecution suffered by compatriots72. Similarly, the German Federal Constitutional Court has coined the notion of “individual persecution due to membership of a group”, which may not meet the criteria of group persecution, but where the fate of other members of a certain group is evidence of persecution73. Thus although refugee status must be individually determined, the asylum-seeker may substantiate his or her fear on evidence of incidents experienced by family members or compatriots.

3. How is ‘persecution’ carried out?There are three basic persecutory methods: physical, psychological and economic.

According to Belgian case law, serious assault on physical integrity are regarded

67 Commission des recours des réfugiés (CRR), 19 February 1988, 30.022.68 CRR, 13 March 1989, R. 71.993, and CRR, 30 November 1987, 67.040.69 CRR, 7 June 1982, 14.243.70 Bundesverfassungsgericht (BVerfG) (2nd senate) 11 May 1992, 2 BvR 1549/91.71 Verwaltungsgericht (VG) Stuttgart (7th division) 21 September 1992, A 7 K 1369/91.72 Supremo Tribunal Administrativo (S.T.A.), 1a secção, Acordão, 17 May 1984.73 Bundesverfassungsgericht (BverfG) (2nd senate) 23 January 1991, 2 BvR 902/85.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 127

as ‘persecution’74. Additionally, murder and physical maltreatment are necessarily elements of persecution, according to rulings upheld by the Council of State of The Netherlands75. Against the backdrop of the fundamental rights to freedom from arbitrary deprivation of life and protection against torture or cruel, inhuman or degrading punishment or treatment, a range of measures has been recognized as persecutory. These include arbitrary detention, torture, beatings, forced sterilization, forced abortion, and female genital mutilation.

That measures have been carried out to further a legitimate social policy may not render the measures less persecutory. So, for example, the beating and torture of individuals in detention during anti-terror campaigns has been held to be persecutory. In addressing this point, the Canadian Federal Court of Appeal stated in Thirunavukkarasu that “(…) the State of emergency in Sri Lanka cannot justify the arbitrary arrest and detention as well as beating and torture of an innocent civilian at the hands of the very government from whom the claimant is supposed to be seeking safety”76. As stressed by another Canadian court, “brutality in the furtherance of a legitimate end is still brutality”77.

Similar findings have been reached in some cases which have considered whether forced sterilization and forced abortion were persecutory when carried out as a broad population control policy. Courts have held that the means were disproportionate to the worthy objectives sought, in that they constituted extreme violations of basic rights to reproductive freedom, security of the person and freedom from cruel, inhuman and degrading treatment78. The social policy objectives were held not to render the measures less persecutory79.

Other forms of gender-related physical harm such as rape, dowry-related violence, female genital mutilation, domestic abuse and trafficking are acts which have been regarded as infliction of physical and mental pain and suffering thus held to constitute ‘persecution’ within the Refugee provisions80.

Forms of psychological harm may amount to ‘persecution’. The 1984 Convention Against Cruel, Inhuman and Degrading Treatment or Punishment expressly defines ‘torture’ for purposes of the Convention as including the intentional infliction of

74 C.P.R. (1 ch.), 21 May 1992, F095.75 Raad van State, Afdeling Rechtspraak (ARRvS), 29 June 1982, R.V., 1982, 3; ARRvS., 12 July 1982, R.V., 1982, 7.76 Thirunavukkarasu v. Canada (Minister of Employment and Immigration) [1994] 1 F.C. 589 (C.A.) § 22.77 Cheung v. Canada (Minister of Employment and Immigration), [1993] 2 F.C. 314 (C.A.) 323.78 In the context of a mentally disabled person, the Supreme Court of Canada has forbidden non-therapeutic sterilization as a grave “intrusion

on the physical and mental integrity of the person”, and, as a “grave intrusion of a person’s right [leading to] certain physical damage”, E.(Mrs.) v. Eve, [1986] 2 S.C.R. 388, pp. 434 and 431. The Court of Appeal applied the same reasoning to forced sterilization within refu-gee context noting that there is “no doubt, then, that the threat to forced sterilizatrion can ground a fear of persecution within the meaning of Convention refugee under the Immigration Act...”, Cheung v. Canada (Minister of Employment and Immigration), [1993] 2 F.C. 314 (C.A.), § 18.

79 For similar reasons the court noted that “forced abortion, being an invasion of a woman’s body, is equivalent to or worse than forced steri-lization”; cf. Lai, Quang v. M.E.I. (F.C.T.D., no. IMM-307-93), McKeown, 20 May 1994. For a pertinent comment on a similar decision, see A.D. Sealove, “Shu-Hao Zhao v. Schiltigen: persecution on acccount of political opinion – inconsistencies and ambiguities”, XXIII(1) Brooklyn Journal of International Law (1997), pp. 309-337.

80 Lazo-Majano v. INS 813 F2d 1432, 1434 99th Cir., 1987). See also Matter of Sharmin, A73-556-883 (IJ Dec. New York, NY, 27 September 1996). See also M. Randall, “Refugee Law and State Accountability for Violence against Women: a comparative analyses of legal approa-ches to recognizing asylum claims based on gender persecution”, 25 Harvard Women’s Law Journal (2002), pp. 281-318; and M. Mulligan, “Obtaining Political Asylum: classifying rape as a well-founded fear of persecution on account of political opinion”, 10(2) Boston College Third World Law Journal (1990), pp. 355-380.

128 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

“severe pain or suffering whether physical or mental”. Forcing an individual e.g. to watch the torture of a family member in order to compel the subject to make a confession is ‘persecutory’. So may be less intrusive forms of harm if, as a result, the individual suffers mental anguish. Depending on the age and personality profile of the putative victim, actions that may not cause serious psychological harm on some may on others81. Frequent interrogation, false accusation, or persistent threats to detain do not deprive a person of liberty or livelihood but may in the long term cause injurious psychological stress amounting to ‘persecution’ depending on the person concerned.

Psychological persecution may thus take various forms. British jurisprudence found unreasonable and equated to persecution the finding of fact that a former Trade Union leader had to give up his lifelong activities, live apart from his wife and family in the capital and withdraw to a remote part of the country to avoid the attention of the authorities82. In Germany, an attempt at forced conversion was held to constitute psychological persecution83.

Discrimination in economic and social matters may also be an element of the threat directed against the claimant, although economic misfortune alone is not a valid basis for a refugee claim. Economic measures that are directed at a particular group and have serious prejudicial effects may be persecutory. These include restricting trading rights, discriminatory or excessive taxation, and denial of work permits. The applicant must show that the economic deprivation at issue is a consequence of discrimination on the basis of a recognised ground such as that the hardship is “specific in its oppressive impact”84 and that it is severe.

Economic deprivation, while relevant in this context is not the sole measure of harm. In certain circumstances the prohibition from pursuit of a profession, in which the applicant is committed and trained, may be persecutory. This was the conclusion of the court in He85, which held that being forced into an occupation which is fundamentally unsuitable as a punishment for expressing political opinion was persecutory. In that case the applicant participated in a pro-democracy demonstration for which she was arrested, detained and, in addition, her teaching job was terminated and her request for a work card permitting her to do other work was denied. She was forced to live in a rural farming community and to make a living as a farmhand. The court held that “permanently [to] deprive a teacher of her profession and forever convert an educated young woman into a farm hand and a garment worker constituted persecution”. In contrast, the loss of property, even where confiscated in a discriminatory manner, has

81 In Ammery, Poone v. S.S.C. (F.C.T.D., no. IMM-5404-93), MacKay, 11 May 1994, the court noted that persecution did not necessarily involve physical harm and found that the Board had erred in failing to consider whether repeated visits by the authorities to the elderly applicant’s home and their numerous interrogations of her amounted to persecution. In a similar vein, the Federal Court in Gragagnini-Ore, Gianina Evelyn v. S.S.C (F.C.T.D., no. IMM-2243-93), Pinard, 4 February 1994, recognized that psychological torment may be an aspect of persecution and that the claimant had been persecuted when she was detained by the Peruvian authorities, physically mistreated and repeatedly told she should be free only to continue the detention.

82 R. v. Immigration Appeals Tribunal (I.A.T.), Ex parte Jonah, [1985] Immigration Appeals Report (Imm. A.R.) 7 Court of Appeal (C.A.).83 Verwaltungsgericht Hessen (VGH) (12th senate) 21 December 1992, 12 EU 1847/89.84 See J.C. Hathaway, The Law of..., op. cit. supra, p. 118, and Handbook, op. cit. supra, §§ 63 and 64. See also Desir v. Ilchert, 840 F.2d 723

(9th Cir. 1988); Rivera v. INS, No. 94-70706, 1996 U.S. App. LEXIS 27783 (9th Cir., 10 October 1996).85 He v. Canada (Minister of Employment and Immigration) (1994), 25 Imm. L.R. (2d), 128 (F.C.T.D.)

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 129

not been readily recognized as persecutory where the consequences have not been so severe as to deprive the person of a livelihood or a means of support”86.

Thus, when determining the claim of an asylum-seeker several aspects of his or her experience have to be taken into account. Although physical persecution may be the most common, it is not the only criterion.

Finally, the cumulative effect of putative incidents of ‘persecution’, which must be considered as a whole, may indicate that the applicant’s fear is ‘well-founded’87, for just as the duration of ill treatment is relevant, so too is the cumulative effect of individual harmful acts88. Imprisonment and torture years before the applicant’s departure may be relevant where, combined with more recent but lesser acts of harassment, they cumulatively establish the well-foundedness of the applicant’s fear. Similarly, discriminatory treatment at school and at work, occasional beatings and threats from unknown assailants, while not emanating from the same source and so seemingly isolated acts, may cumulatively constitute persecution and support the claimant’s fear of prospective risk89.

4. What are the grounds for ‘persecution’?Five reasons are identified by the 1951 Convention and the 1967 Protocol, as

well as by the large majority of domestic refugee Acts: race, religion, nationality, membership of a particular social group or political opinion. Persecution must accordingly be based on at least one of these five grounds90.

Race is a broad concept including not only those of common genealogy but also those who share a common historical, national, linguistic or cultural heritage91. The racial reason, for instance, was well accepted by Greek courts, particularly in cases related to Kurdish people in Turkey and Assirian and Chaldian people in Iraq92. Other examples of claims based on race include those made by Amharas from Ethiopia, Tamils from Ski Lanka, Jews from Russia and the Ukraine, ethnic Indians from Guyana and Fiji, Sikhs from India, Darods from Somalia, Tutsis from

86 See e.g. Ramirez, Rosa Etelvina v. S.G.C. (F.C.T.D., no. IMM-1192-94), Rouleau, 9 December 1994, where the state expropriated the home of an elderly lady because of her daughter’s refusal to participate in the local militia; and Chen, Yo Long v. M.C.I. (F.C.T.D. no. IMM-487-94), Richard, 30 January 1995, where the applicant feared, under threats to his life, having to give up without compensation a parcel of his land to a neighbour.

87 See Handbook…, op. cit. supra, § 201.88 In Retnam v. Canada (Minister of Employment and Immigration) (1991), 132 N.R. 53 (F.C.A.), MacGuigan stated that a “Board’s failure

to deal with the cumulative effect of the persecution the claimant alleged is a patent error of law”. In these cases, the Board had selected an incident or incidents in isolation, but not given consideration to the overall impact of a number of ‘smaller’ occurrences.

89 This point was emphasised in Iossifov, Svetoslav Gueorguiev v. M.E.I. (F.C.T.D., no. A-854-92), McKeown, 8 December 1993, where the court made clear that it is insufficient for the decision-maker to list a series of facts in their decision “without determining whether the acts taken cumulatively constituted persecution and whether the applicant had a reasonable prospective fear of persecution by reason of these previous acts”.

90 The limitation to these five reasons has been criticised. For instance, it was held that “[t]he current definition (…) is inadequate because it limits eligibility for asylum (…). This definition does not address the problem of persons facing random, indiscriminate oppression or persecution for unspecified reasons. In order to correct this deficiency, the cognizable grounds should be eliminated, leaving the experience or fear of persecution as the operative qualification for refugee status”, cf. D.P. Gagliardi, “The Inadequacy of Cognizable Grounds of Persecution as a Criterion for According Refugee Status”, 24(1) Stanford Journal of International Law (1987), p. 286.

91 Arguments in support of a broad interpretation of ‘race’ within the refugee context can be found in G.S. Goodwin-Gill and J. McAdam, The Refugee in International Law, 3nd ed., Oxford, Oxford University Press, 2007, p. 70; and J.C. Hathaway, The Law of..., op. cit. supra, p. 142. The Handbook…, op. cit. supra, § 68, refers to race in this connection as having to be “understood in its widest sense to include all kinds of ethnic groups that are referred to as ‘races’ in common usage”.

92 First Instance Penal Court of Chios, No. 233, 19 April 1993; Court of Appeal of Thessaloniki, no. 337, 17 May 1993.

130 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Rwanda, Roma from the Czech and Slovak Republic, and African-Americans from Colombia.

The identification of a racial group in the refugee context is relatively straightforward and does not draw the same level of complexity in interpretation, as do political opinion or social group grounds. That is not to say that the determination of such claims is without difficulty, for while the nexus requirement is often not an issue, whether the treatment feared amounts to persecution frequently is.

For example, the determination often centers on whether actions such as poor treatment at school, restrictions on employment opportunities, prohibitions on language instruction or cultural celebrations, and/or random assaults either alone or in combination amount to persecution or are discriminatory conduct insufficiently grave to be considered persecutory. Also, where the conduct feared is from non-state actors, the question arises as to whether state protection is available.

Restriction on a person’s religious freedom may be persecutory. There are four broad categories of cases that fall within this ground. The first one relates to prohibitions on practice or expression of religious beliefs. For example, religious minorities all over the world, from Jehovah Witnesses in Ghana, Bahai’s in Iran to the Falon Ghong in China, have had their refugee claims recognized on the basis of their having been prevented by law from holding religious services and possessing religious materials pertaining to their faith. That the person may still be permitted to practice in private does not mitigate the infringement of his or her basic right to worship freely with others93.

The second category involves discrimination against religious minorities, i.e. those who may not be prevented in law from practising their faith, but are at risk of harm on account of their religious affiliation. This may take the form of physical harassment, discrimination in cultural and economic spheres, and restriction on civil entitlements.

Individuals who fear persecution through forced conversion to another faith comprise a third group of cases advanced under the religion ground. Recognized claims of this nature are generally from countries where renunciation of the Islamic faith is punishable by law, and where such punishments are severe enough to constitute persecution. Similarly, laws and customs that impose religious conversion as precondition to recognition of fundamental civil entitlements enjoyed by members of the dominant faith have been found to be persecutory where the person concerned opposes such conversion94.

A fourth category of cases involves persons who fear persecution for failing to follow religious codes of behaviour to which they do not subscribe. The most common examples are claims made by women who oppose religiously-based state-imposed strictures on their education, employment and rights under Family Law. Frequently claims brought under this category are also made on the social

93 Fosu v. Canada (M.E.I.) [1994] F.C.J. No. 1813.94 Refugee Appeal No. 70283/96 Re KJ and FS, New Zealand Status Appeals Authority (RSAA).

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 131

group ground95. This category of cases also includes those who fear persecution for refusing to join a religious association or take compulsory religious instruction and/or indoctrination, since freedom of religion includes the freedom to choose whether or not to join a religion and freedom from being coerced into participating in another’s religious observances96.

Persecution following the choice of nationality made by the asylum-seeker may also lead to recognition of refugee status, according both to French97 and Portuguese98 case law. It is frequently acknowledged that ‘nationality’, within the context of ‘refugee’ definition, means more than ‘citizenship’. To define it narrowly would make little sense since as a practical matter persons are not persecuted in their own state simply on account of their citizenship there. Moreover, as regards residents’ fearing persecution because of their foreign citizenship, they can avail themselves of the protection of their own state.

Nationality then, as a Convention refugee ground is, like race, regarded as associated with ethnicity. In fact Convention refugee claims based on race often include nationality as an alternative ground for fear, to the extent that a distinction may be drawn between the two. Nationality as the sole basis of a refugee claim tends to appear most frequently in situations where the persecution stems from the association of the person with another nation state rather than with a social or cultural group. For example, claims brought by ethnic Russians from various Republics formerly within the former Soviet Union, or by ethnic Croats and Albanians from Yugoslavia are often based on fear of persecution because of their nationality.

As with claims based on race, the identification of the group is usually not problematic. The determination frequently rests on whether the treatment complained of amounts to persecution and/or whether state protection from the harm feared is available.

Membership in a particular social group is arguably the least developed of all the Convention grounds. Inconsistency in its application and the search for a consensus on its definition have been the focus of literature and discussion99. Most commentators note that its intended meaning is not apparent from the travaux preparatoires100.

The most comprehensive analysis of the particular social group ground has been made in several common law jurisdictions, most notably Australia, Britain, Canada, New Zealand and the United States101. Various interpretative tools have been employed in an attempt to delineate its boundaries, including the identification of three common principles.

95 E.g., where religious opposition is perceived as a challenge to the State’s authority the persecution may be on account of political opinion as well. Where discriminatory laws against women are justified on religious grounds, the claim has also been brought on the basis of social group grounds, the social group being ‘women’; cf. NZRSA, No. 2039/93, and no. 71427/99.

96 Okere v. Minister for Immigration and Multicultural Affairs (1998), 157 A.L.R. (Australian High Court).97 CRR, 13 March 1986, 34.126, in F. Tiberghien, La protection des refugiés en France, Paris, Economica, 1988, p. 318.98 S.T.A., 1a secção, Acordão, 5 June 1986.99 See, inter alia, M. Fullerton, “A Comparative Look at the Refugee Status Based on Persecution Due to Membership in a Particular Social

Group”, 26 Cornell International Law Journal (1993), pp. 505-563; and A.C. Helton, “Persecution on Account of Membership in a Social Group As a Basis for Refugee Status”, 15(2) Columbia Human Rights Law Review (1984), pp. 39-67.

100 See G.S. Goodwin-Gill, op. cit. supra, p. 46; and J.C. Hathaway, The Law of..., op. cit. supra, p. 156.101 In civil law jurisdictions the ground is less developed, more emphasis being placed on whether the applicant’s fear is well-founded.

132 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

The first one states that a ‘social group’ cannot arise solely from fear of persecution. There is general agreement that the ground was not intended to be open-ended, covering all persons who face persecution, for that would render the other grounds superfluous and extend the obligations of state parties far beyond what they agreed. Moreover, since persecution must be by reason of membership of the particular social group, that social group cannot be defined solely by the persecution feared. As stated by Justice Dawson of the Hight Court of Australia in Applicant A:

There is more than a hint of circularity in the view that a number of persons may be held to fear persecution by reason of membership of a particular social group where what is said to unite those persons into a particular social group is their common fear of persecution102.

This does not mean, however, that the persecution in question cannot help to define the group. McHugh J in Applicant A illustrates this as follows:

(…) while persecutory conduct cannot define the social group, the actions of the persecutors may serve to identify or even cause the creation of a particular social group in society. Left-handed men are not a particular social group. But if they were persecuted because they were left-handed, they would no doubt quickly become recognizable in their society as a particular social group. Their persecution for being left-handed would create a public perception that they were a particular social group. But it would be the attribute of being left-handed and not the persecutory acts that would identify them as a particular social group103.

The second common principle is that individuals do not need to associate voluntarily with a particular social group in order to be members of it. There is substantial agreement that the individual need not be in a voluntary association with other members of the particular social group or that the group be cohesive or homogeneous104. Rather the association exists by virtue of a common characteristic shared by members of the group whether voluntary or not. To suggest otherwise would be to read into the Convention requirements that are not supported by the language of its provisions. It would exclude, for example, persons who are persecuted because of their family membership (involuntary) or gender or sexual orientation105 (involuntary and not a cohesive group). It would also exclude those who may not want to be associated with the particular group but who are because of perceptions of others in society. In this regard, Lord Hope observes in his ratio decidendi in Islam and Shah that the group may have been created by the norms and customs of society and contrary to the wishes of those who comprise it106.

102 Applicant A v. Minister for Immigration and Ethnic Affairs. (1997) 190 Commonwealth Law Reports (C.L.R.) 225.103 Ibid.104 The contrary view, however, was taken in the decision of the United States Court of Appeal, 9th Circuit, in Sanchez-Trujillo v. Immigration

and Naturalization Service (1986) 801 F.2d 1571, where it was held that “particular social group implies a collection of people closely affiliated with each other”. Although other courts in the 9th Circuit have followed the decision, it has not been followed in other circuits in the United States and the proposition has been rejected by high courts in Australia, Canada, and the United Kingdom.

105 On this particular ground, see D. McGhee, “Persecution and Social Group Status: homosexual refugees in the 1990s”, 14(1) Journal of Refugee Studies (2001), pp. 20-42.

106 Lai, Quang v. M.E.I. (F.C.T.D., no. IMM-307-93), McKeown, 20 May 1994.

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 133

The third and last common principle, which serves as an interpretative tool employed to delineate the boundaries of what constitutes a ‘social group’, is that the claimant need not prove that every member of the group with which he or she is associated also fears persecution. As with the other grounds, evidence that one is of a certain race, nationality, political opinion or a member of a particular social group will not substantiate a claim. Nor, however, will a claim be defeated simply because not all persons of the same characteristic are persecuted. What is relevant is that the persecution stems from or is ‘by reason of’ the ground. That some members of the group are able to avoid or are not exposed to the persecution feared by the applicant does not diminish the applicant’s claim that the persecution feared is on account of membership of the group, although it may affect the determination of whether the fear of persecution is well-founded.

Finally, what constitutes political opinion raises a number of difficult interpretative issues. Simply holding a particular political opinion is not a sufficient basis for a claim to refugee status. As with all Convention grounds, the applicant is required to show that there is a serious threat of persecution on this ground.

Also, as with the other Convention grounds, the reason for the threatened harm is central. The persecution must be because of the applicant’s perceived political opinion, regardless of whether that putative political opinion is accurate or not. It is the perception of the persecutor that is at issue, for that is what incites the persecution. International protection extends therefore to situations where the claimant faces persecution on account of his or her perceived political opinions even where that perception is erroneous. The perception of the persecutor may be on account of the person’s expressed opinion but also on the basis of the person’s actions to which the persecutor imputes a political opinion. So, for example, a person who is engaged in social justice work in a repressive state and faces arrest and maltreatment by the authorities in consequence may be able to establish a claim under political opinion on the basis that his or her actions are perceived to be a threat to the state.

The person need not belong to a formal political group or hold an official title or office. The focus is always on the de facto attribution “notwithstanding the objective unimportance of the claimant’s political acts, her own inability to characterize her actions as flowing from a particular ideology or even an explicit disavowal of the views ascribed to her by the state”107. Moreover, it must also be kept in mind that an act, which might not be considered political in the state of asylum, may well be seen as such in the applicant’s nation state108.

As is the case with other grounds, individuals are not required to hide their political opinions to avoid persecution. Thus even in situations where the person’s political opinions are not known, refugee status may be accorded if the person is inhibited from expressing genuinely held political opinions because of the threat of serious harm. This follows from the fact that the right freely to express one’s political views 107 Cf. J.C. Hathaway, The Law of..., op. cit. supra, pp. 155-156.108 Jerez-Spring v. Canada (Minister of Employment and Immigration) [1981] 2 F.C. 527 (C.A.), and Osorio v. INSI 18 F. 2d 1143 (2nd Cir.

1994).

134 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

is an internationally protected human right109. Similarly, persons who have been able to conceal their political opinion in the past but can show that their views will find expression in the future may meet the ‘refugee’ definition provided they can establish a serious risk of persecution as a result110. Related to this are cases of those who decide to exercise their right to a political opinion after they have left their country. They will fall within the Convention’s definition of ‘refugee’ if they can establish that in consequence they will face persecution or reprisal upon their return home111.

5. When is ‘persecution’ carried out? The most frequent claim is that lodged by an asylum-seeker who has him/herself

already suffered, or is related to someone who has already suffered, persecution. A claimant need not have suffered incidents of persecutory treatment in order to show a risk of future harm, and past persecution may not substantiate a prospective risk112. However, where there is evidence of past harm, the decision-maker must consider whether it supports a finding that there is a reasonable threat of future persecution113.

Decision-makers must also consider evidence of past persecution of others similar to the applicant. The suffering of those who share the applicant’s racial, religious, political or other protected characteristics, for example, may well substantiate the applicant’s own fear and be the best indicator of possible harm.

Related to this is the necessity of viewing the harm complained of within the context of the conditions prevailing in the applicant’s country. This is particularly so where documentary evidence shows that the treatment suffered and feared by the applicant is part of a larger phenomenon of widespread discrimination in the state114.

Austrian jurisprudence points to the need that the well-founded fear of persecution continue until the moment of departure. Hence if the time between persecution and leaving becomes too long, the required link is missing115. However, the occurrence of persecution prior to departure from the country of origin is not a sine qua non requirement. It may occur that an application for refugee status be based on likelihood of persecution following departure – for any other reason – of the asylum-seeker. According to Canadian jurisprudence, because refugee status turns upon the presence of a prospective risk of persecution, the country conditions relevant to a claim are those existing at the time of the hearing or adjudication of the claim116. A decision-maker must not therefore restrict him- or herself to those conditions prevailing at the time of the claimant’s departure117. Since refugee status is expected to be granted to

109 See Article 19 of the 1948 Universal Declaration of Human Rights, and art. 19 of the 1966 International Covenant of Civil and Political Rights.

110 Ahmed v. Secretary of State for Home Department, [1999] E.W.J. No. 5882 (English Court of Appeal).111 Urur v. Canada (Minister of Employment and Immigration) (1988), 91 N.R. 146 (Fed. C.A.).112 Salibian v. Canada (M.E.I.) [1990] 3 F.C. 250 (C.A.). In this regard, see. S.C. Vance, “An Enduring Fear: recent limitations on the past

persecution ground for asylum”, 91 Kentucky Law Journal (2002-03), pp. 957-1003.113 Oyarzo v. Canada (Minister of Employment and Immigration), [1982] 2F.C. 779 (C.A.).114 Lerer, Iakov v. M.C.I. (F.C.T.D., no. IMM-7438-93), Cullen, 5 January 1995.115 Bundesasylamt (BAA), 25.11.1993, 93 04 295.116 Canada v. Johan, [1993] Federal Court Judgments (F.C.J.) No. 130 Quick Law on-line legal databases (QL); Longia v. Canada, [1990] 3

F.C. 288 Federal Court of Appeal (F.C.A.), 10 Immigration Law Reports (Imm.L.R.) (2d) 312.117 Canada v. Malgorzata [1991] F.C.J. No. 337 (QL).

On the Development of the Concept of ‘Persecution’ in International Refugee Law 135

someone who has well-founded fear of persecution, and not merely to one who has been the object of persecution, the previous experience of an asylum-seeker – though relevant in many instances – is not a crucial constituent determinant. A positive refugee status determination may therefore be decided upon balance of probability of persecution as the case is examined or upon the asylum-seeker’s return to his or her country of origin.

‘Fear’ of persecution, consequently, is a subjective element that plays a decisive role particularly in the review of an application lodged by an asylum-seeker who has not yet been persecuted.

6. Which rights are (to be) violated in cases of ‘persecution’?Article 33 of the 1951 Convention speaks of the right to life and freedom. As

to discrimination, its existence is not per se a reason to claim persecution, since it ought to be connected to a specific right in order to be regarded as a Human Rights violation118. It must be noted that when giving guidance on the interpretation of the 1951 Convention, UNHCR affirmed that discrimination will only amount to persecution if the alleged measures of discrimination lead to consequences of a substantially prejudicial nature for the person concerned119; it went even further to observe that “[d]ifferences in the treatment of various groups do indeed exist to a greater or lesser extent in many societies. Persons who receive less favorable treatment as a result of such differences are not necessarily victims of persecution”120.

Not all violations of human rights are, therefore, persecutory. A distinction is frequently made between discriminatory and persecutory acts. When determining whether treatment is discriminatory or persecutory, one must consider its effect on the individual. Where the consequences are of ‘a substantially prejudicial nature’ they may be found to be persecutory. Here reference to the Human Rights standards will help to identify the significance of the infringement that must be assessed according to the circumstances of the case. So too will the duration of any harm suffered. So, for example, harassment in some circumstances may constitute persecution if sufficiently serious and if it occurred over such a long period of time that it may be said that a claimant’s physical or moral integrity is threatened121.

Administrative and judicial jurisprudence has widely addressed the 1951 Convention’s restrictive reference to the right to life and to freedom by referring to other Human Rights, and has also largely weighed the issue of discrimination. Swiss jurisprudence accepts that the general situation in a state may serve as in indicator of violation of human rights, but there must be a real (or at least a highly probable) threat to the asylum-seeker122. Moreover, precise reference to one Human Right or one 118 Some scholars, however, have claimed that the best way to unify and inject coherency, consistency and certainty in Refugee Law is to

make discrimination the sole criterion of persecution; see M. Bagaric & P. Dimopoulos, “Discrimination as the touchstone of persecution in refugee law”, 32 International Journal of the Sociology of Law (2004), pp. 303-331.

119 Handbook…, op. cit. supra, § 54.120 Id. ibid.121 Rajudeen v. Canada (1984), 55 N.R. 129, §129; Retnam v. Canada (M.E.I.), A-470-89, 6 May 1991; Ovakimoglu v. Canada (M.E.I.)

(1983), 52 N.R. 67, § 69.122 ODR, 31 January 1992.

136 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

fundamental freedom is a widespread practice of courts in Canada and The Netherlands. While serious limitations to freedom of expression and speech123 and lack of fair trial guarantees124 may lead to recognition of refugee status by the Council of State of The Netherlands, Canadian case law assembles various decisions based upon international human rights instruments including the Universal Declaration of Human Rights125, the Convention on the Rights of the Child126, and the Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination against Women127. Austrian case law, following the rationale of the 1951 Convention, has asserted that discrimination will be equivalent to persecution only in particular circumstances, e.g. when discriminatory measures have serious detrimental consequences128. The attitude of national authorities is decisive in this respect, according to German case law. The state must offer protection against unrestrained discrimination, which must exceed a certain level in order to be considered persecution129. On the other hand, systematic official discrimination, particularly accounting for serious prejudicial consequences to the asylum-seeker, may also be an element in determining in favour of persecution, as US jurisprudence indicates 130.

Concluding RemarksThe 1951 Convention refugee definition has been captured in national refugee

legislation in a majority of countries that are State Parties thereto. The provisions of the refugee acts pertaining to the concept of ‘refugee’ have maintained reference to ‘persecution’.

The importance of the term ‘persecution’ and the lack of a definition thereof by an International Refugee Law legally binding instrument has prompted doctrinal approaches to advance the concept. Likewise and more significantly, case law of various countries has been progressively developing the concept of ‘persecution’ by analyzing various of its constitutive elements.

The identification of the constitutive elements of the term ‘persecution’ and the understanding of how these elements have been interpreted by doctrine and case law should contribute to a dynamic, progressive and yet harmonious interpretation of the refugee definition.

123 ARRvS., 20 December 1979, G.V., D12-37.124 ARRvS., 15 June 1993, R.V., 1993, 8.125 Arguello Garcia v. Canada, [1993] F.C.J. No. 635 (QL).126 B. (P.V.) (Re), [1994] C.R.D.D. No. 12 (QL).127 Ibid.128 C.P.R. (2 ch.), 3 July 1992, R716.129 BverfG (2nd senate) 23 January 1991, 2 BrV 1827/89.130 Matter of Salama, 11 I & N Dec. 536 Board of Immigration Appeals (B.I.A 1966).

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 137

Le Droit International de L’eau: Tendances Récentes

LAURENCE BOISSON DE CHAZOURNES*

Resumo

O presente artigo trata de questões ligadas ao acesso e à gestão das águas interna-cionais sob a ótica de princípios, estratégias e mecanismos jurídicos que vêm dando novos contornos ao direito internacional das águas. Dentre os temas abordados, são analisados o papel das decisões proferidas pelos mecanismos institucionais específi-cos na evolução do regime; os efeitos das exigências de proteção ao meio ambiente e de promoção do desenvolvimento sustentável na regulamentação existente na matéria; as consequências da utilização econômica dos rios internacionais do ponto de vista do comércio internacional e do direito dos investimentos; e, finalmente, a emergência do reconhecimento de um direito do homem à água.

Abstract

This article deals with the access and the management of international waters in the light of the principles, the strategies and the juridical mechanisms that have been crediting a new outlook for International Water Law. Within the topics taken under consideration, it is analyzed the role of the decisions made by specific institutional mechanisms over this regime evolution; the effects of the demands for protecting the environment and the promotion of sustainable development on this subject existent regulation; the consequencies of international rivers economic use from the inter-national trade and investment law point of view; and, finnaly, the emergence of the recognition of a human right to water.

ab

L’eau est une ressource dont la répartition n’est pas naturellement répartie de ma-nière «équilibrée». L’inégalité qui prévaut quant à l’approvisionnement naturel et la variabilité des besoins, entre pays industrialisés ou en développement, ou entre sec-teurs urbains et ruraux, ajoutées aux questions relatives aux changements climatiques posent des problèmes quant à la distribution et aux utilisations de cette précieuse ressource. L’accès à l’eau est devenu dans ce contexte un enjeu tant économique que social et politique, tant au niveau national qu’à l’échelon international.

L’eau constitue la ressource la plus abondante de la planète puisqu’elle recouvre environ les trois quarts de sa superficie. Toutefois 97% de ce volume ne peuvent ni être consommés, ni être utilisés pour l’irrigation, ni même être employés pour des usages industriels, en raison de leur teneur trop élevée en sel. Du petit pourcentage d’eau douce

138 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

restant, deux-tiers sont constitués de glace dans les zones polaires et dans les glaciers. De ce fait, seul 1% de l’eau douce est disponible pour la consommation humaine.

Les utilisations de l’eau sont nombreuses et la question d’une répartition équita-ble entre celles-ci devient cruciale. Alors que l’irrigation des terres absorbe déjà 70 % des ressources en eau, la nécessité d’accroître la production agricole pour nourrir les populations se fait toujours plus pressante. En outre, 10 % de l’eau sont consa-crés à des fins industrielles et 10% aux usages municipaux et domestiques (dont la part ne peut que croître au cours des prochaines décennies). Le reste est affecté à la production énergétique, à la navigation et aux loisirs. La protection de l’environ-nement n’a été que très peu objet d’attention. Les besoins en ce domaine se font maintenant croissants. La multiplication des utilisations de l’eau et la croissance de la population au cours des dernières décennies ont contribué à l’augmentation de la consommation en eau et les projections de celle-ci ne cessent d’aller vers la hausse.1

La croissance démographique, les besoins de plus en plus importants des pays en voie de développement et des pays industrialisés, ainsi que les aléas climatiques exacerbent le caractère vital de l’eau.2 Pour les pays en voie de développement, la mauvaise qualité de l’eau - vecteur d’innombrables maladies - et sa rareté mettent en danger la vie de millions de personnes et participent au problème de la pauvreté.3 Les problèmes de qualité et de quantité d’eau ne concernent toutefois pas les seuls pays du Sud. Il n’y a en effet pas une seule région dans le monde qui ne soit pas affectée par des problèmes de pollution ou de pénurie d’eau.

L’empreinte du droit international s’est avant tout et surtout réalisée dans le domaine des ressources en eau partagées entre plusieurs Etats. C’est là le champ traditionnel de l’application de ce que l’on dénomme, le droit international de l’eau. Avec plus de 250 cours d’eau internationaux, une centaine de lacs et un grand nombre d’eaux souterraines partagées par deux Etats ou plusieurs Etats, l’intérêt et l’importance du droit internatio-nal deviennent des éléments cruciaux. La pratique a connu une recrudescence d’accords relatifs à des cours d’eau internationaux. D’autres problèmes liés à l’accès et à la gestion de l’eau émergent et font place à de nouveaux principes, stratégies et mécanismes juridi-ques, donnant ainsi de nouveaux contours au droit international de l’eau.

* Professeur et Directrice du Département de droit international public et organisation internationale, Faculté de droit, Université de Genève.

1 On a pu observer qu’en 1995 la Chine et les Etats-Unis prélevaient des quantités en eau supérieures de 10% à 20% à leurs ressources dispo-nibles et les scénarios prévus pour 2025 prévoient une augmentation jusqu’à 40%. Voir : World Business Council for Sustainable Develop-ment, Business in the World of Water, WBCSD Water Scenarios to 2025, 2006, http://www.wbcsd.org/DocRoot/Q87vukbkb5fNnpbkbLUu/h20-scenarios.pdf

2 Le Panel intergouvernemental sur les changements climatiques a souligné la rareté de l’eau et le lien direct entre le changement climatique et l’augmentation du nombre et de l’intensité des catastrophes naturelles, telles les inondations et l’aridité des sols. Voir Intergovernmental Panel on Climate Change, Climate Change 2007: The physical science basis, Summary for Policy-Makers, Contribution of Working Group I to the Fourth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change, 2007, p.8, http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar4/wg1/ar4-wg1-spm.pdf.

3 Les problèmes liés au manque d’accès à de l’eau salubre affectent la santé de l’être humain. Ainsi, l’Organisation mondiale de la santé (OMS) indique que plus de 2 millions d’êtres humains meurent à cause des maladies liées à l’eau. WHO, UNICEF, Water Supply and Sani-tation Collaborative Council, Global Water Supply and Sanitation Assessment Report 2000, p. V. Voir aussi le Rapport du Programme des Nations Unies sur le développement humain de 2006, Au-delà de la pénurie ; pouvoir, pauvreté et crise mondiale de l’eau, 2006. pp.42-47, http://hdr.undp.org/en/media/hdr06-complete.pdf.

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 139

Pour appréhender ces développements, on mettra en lumière certaines caractéristi-ques: un processus de juridicisation particulier (I), une imprégnation des exigences de l’environnement (II), une emprise croissante du droit international économique (III), en même temps qu’une attention de plus en plus soutenue pour les besoins humains, ce qui soulève la question d’un droit de l’homme à l’eau (IV). Ces quatres dimensions permettent de souligner les éléments les plus importants de l’évolution récente du droit international de l’eau.

1. un processus de juridicisation particulier Par leurs fonctions de stabilité et prévisibilité, les principes et règles du droit inter-

national jouent un rôle important dans le domaine de l’eau. Toutefois le processus de juridicisation revêt des contours particuliers, et cela est notamment dû au paradoxe de la généralité qui doit faire place aux spécificités. Le droit international de l’eau pré-sente des traits d’universalité et de généralité. Certains de ses principes relèvent ainsi du corpus juris du droit international général, constitué de coutumes et d’accords à vocation universelle mais le droit international de l’eau doit également faire place à de nombreux particularismes. De nombreuses règles à caractère spécifique l’alimentent, participant au développement des normes générales en même temps qu’elles permet-tent de prendre en compte des situations particulières.4

Les principes et règles qui composent le droit international de l’eau sont en partie issus de pratiques qui se sont forgées au XIXème siècle. Les Etats ont alors été très soucieux de voir reconnaître leurs prérogatives de souveraineté eu égard aux cours d’eau internationaux. Le droit en ce domaine s’est forgé dans les interstices des re-vendications de souveraineté.

Un grand nombre d’instruments internationaux font recours aux cours d’eau et aux lacs comme référence naturelle pour fixer une frontière entre les Etats. L’emplacement de celle-ci peut être générateur de tensions et de différends entre pays riverains. La jurisprudence de la Cour internationale de Justice (CIJ) a pu apporter sa contribution à leur règlement. Ainsi, dans l’affaire Kasikili/Sedudu, la CIJ a fait observer que

«Les traités ou conventions qui définissent des frontières dans les cours d’eau désignent généralement aujourd’hui le thalweg comme frontière lorsque le cours d’eau est navigable et la ligne médiane entre les deux rives lorsqu’il ne l’est pas, sans que l’on puisse toutefois constater l’existence d’une pratique totalement cohérente en la matière».5

Dans l’Affaire de la frontière terrestre et maritime entre le Cameroun et le Nigéria, la CIJ a pris en compte non seulement des instruments internationaux, mais aussi les travaux de la Commission du bassin du Lac Tchad (CBLT), ainsi que les résultats des plébiscites de 1961 tenus au Cameroun septentrional et au Cameroun méridional,

4 L. Boisson de Chazournes, « Sur les rives du droit international de l’eau: entre universalité et particularismes », in Kohen, M., La promotion de la justice, des droits de l’homme et du règlement des conflits par le droit international, Liber Amicorum Lucius Caflisch, Koninklijke Brill NV, Leiden, 2007, pp. 685-700.

5 Affaire de l’Ile Kasikili/Sedudu (Botswana/Namibie), C.I.J. Recueil 1999, p.1062, par.24. Voir aussi l’Affaire du différend frontalier entre le Bénin et le Niger où la Cour conclut que : « la frontière entre le Bénin et le Niger suit le chenal navigable principal du fleuve Niger ». Affaire du différend frontalier (Bénin/Niger), C.I.J. Recueil 2005, p.133, par.103.

140 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

«afin de déterminer les aspirations des habitants … au sujet de leur avenir» (résolution 1350 (XIII) de 1’Assemblée générale du 13 mars 1959) ».6 La Cour en a conclu :

«qu’il ressort des instruments applicables que, à partir de 1931 à tout le moins, la frontière dans la région du lac Tchad avait bien été délimitée et approuvée par la Grande-Bretagne et la France. En outre, la Cour ne peut manquer d’ob-server que le Nigéria fut consulté lors des négociations qui précédèrent son in-dépendance, puis à l’occasion des plébiscites par lesquels allait être déterminé l’avenir des populations du Cameroun septentrional et du Cameroun méridional […], et qu’il ne laissa entendre a aucun moment que, en ce qui concernait tant la région du lac Tchad que d’autres secteurs, les frontières restaient à délimiter. La Cour estime en outre que les travaux menés par la CBLT entre 1983 et 1991 confirment cette interprétation ».7

La délimitation frontalière a un impact sur les populations riveraines concernées. Ainsi, dans l’affaire Kasikili/Sedudu, la Cour a fait référence au communiqué de Kasane des présidents du Botswana et de la Namibie du 24 mai 1992 qui proclamait que le statut juridique de l’île Kasikili/Sedudu ne doit pas affecter : « l’interaction sociale existante entre la population namibienne et celle du Botswana », « les activités économiques comme la pêche » et a précisé que « la navigation devait rester sans entrave et, entre autres, les touristes devaient pouvoir se déplacer librement ».8 Dans le différend frontalier entre le Bénin et le Niger, la Cour a souligné que la question de l’appartenance des îles dans le fleuve Niger « est sans préjudice de tous droits privés qui pourraient être détenus sur celles-ci ».9

Aux côtés de la question des frontières, l’une des premières utilisations appré-hendée par le droit international a été la navigation. Ainsi, au travers l’Acte final du Congrès de Vienne de 1815 et l’Acte général de la Conférence de Berlin de 1885, la liberté de navigation a été reconnue aux navires battant pavillon d’Etats parties, rive-rains et non riverains, sur toute l’étendue navigable d’un cours d’eau.10 Cette vision libérale a culminé avec le Traité de Versailles conclu le 28 juin 191911 et le Statut de Barcelone sur le régime des voies navigables d’intérêt international du 20 avril 1921.12 L’avènement de régimes autoritaires en Europe dans les années trente et par la suite la guerre froide vont battre en brèche l’interprétation libérale du principe de la liberté de navigation.13 Ainsi, la Convention relative au régime de la navigation sur le

6 Affaire de la frontière terrestre et maritime entre le Cameroun et le Nigéria, (Cameroun c. Nigéria ; Guinée Equatoriale (intervenant)), C.I.J Recueil 2002, p. 332, par.35.

7 Ibid., pp.341-342, par. 52-53. 8 Affaire de l’Ile Kasikili/Sedudu (Botswana/Namibie), op.cit., pp.1106-1107, par. 102. 9 Affaire du différend frontalier (Bénin/Niger), op.cit., pp.140-141, par. 118. 10 Voir, notamment les articles 108 à 117 de l’Acte final du Congrès de Vienne du 9 juin 1815. Voir aussi l’Annexe XVI B de l’Acte final

portant sur les « Règlements pour la libre navigation des rivières » in C. Parry (éd), Consolidated Treaty Series, Dobbs, Ferry, NY, Oceana, 1967, vol.64, 1815, p.453. Voir Acte général de la Conférence de Berlin, dans Jules Hopf, Recueil général de traités et autres actes relatifs aux rapports de droit international, deuxième série, Tome X, Göttingen, Librairie de Dietrich, 1885, pp. 416- 418.

11 Voir les articles 327 et 331 à 362 du Traité de Versailles dans G.-F. De Martens, Nouveau recueil général de traités, 3e série, vol.11, p.323.

12 En particulier voir l’article 2 du Statut de Barcelone sur le régime des voies navigables d’intérêt international, Société des Nations, Recueil des Traités, vol. VII, p. 50.

13 Voir : L. Caflisch, « Règles générales du droit des cours d’eau internationaux », Recueil de Cours de l’Académie de droit international de La Haye, 1989-VII, t.219, p.42.

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 141

Danube de 194814 a restreint la liberté de navigation sur le fleuve aux seuls pavillons des Etats riverains d’Europe orientale. Les riverains du Rhin ont imposé des limita-tions analogues aux Etats d’Europe de l’Est.15 La fin de la guerre froide a entraîné dans son sillage la fin de ces limitations, en reconnaissant aux navires de tous les Etats riverains un droit de navigation.

Hormis l’adoption de la Convention relative à l’aménagement des forces hydrau-liques intéressant plusieurs Etats adoptée sous l’égide de la Société des Nations en 1923,16 l’œuvre de codification universelle dans des domaines autres que la navigation n’a été poursuivie qu’à partir des années 1970, à la suite d’une demande faite par l’As-semblée générale des Nations Unies à la Commission du droit international (CDI). Un instrument conventionnel est résulté. Les travaux de cet organe qui se sont déroulés pendant plus de vingt ans ont permis l’adoption de la Convention sur le droit relatif aux utilisations des cours d’eau internationaux à des fins autres que la navigation le 21 mai 1997 par l’Assemblée générale des Nations Unies (ci-après la Convention de 1997).17 L’objectif de cet instrument est de fournir un cadre de référence normatif en matière de gestion des cours d’eau internationaux. Une approche intégrée est prônée, en liant la répartition et l’utilisation des ressources en eau à des mécanismes d’échan-ges d’informations et de coopération, à des exigences de protection de l’environne-ment ainsi qu’à la promotion du règlement pacifique des différends.18

La Convention de 1997 est une convention cadre qui a pour vocation de poser les fondations de l’architecture globale d’un régime juridique pour les eaux douces. Celles-ci doivent nécessairement être consolidées au travers d’instruments de portée universelle mais surtout par le biais d’accords conclus à l’échelon régional ou au niveau d’un bassin fluvial. Les négociations ayant entouré l’adoption de la Convention démontrent aisément que les normes formulées au plan universel ne peuvent revêtir qu’un contenu très général. Elles constituent néanmoins des arrimages pour des développements plus spécifiques.

La Convention de 1997 n’est pas encore entrée en vigueur et pourrait d’ailleurs ne jamais l’être. Cette situation ne la départit pas de son rôle d’instrument de codification. La référence faite par la Cour international de Justice dans son arrêt relatif au Projet Gabčíkovo-Nagymaros au principe de l’utilisation équitable et raisonnable tel que codifié dans cet instrument en témoigne.19

14 Convention relative au régime de la navigation sur le Danube, Belgrade 18 août 1948, Recueil ONU, vol. 33, p.196. 15 Voir le Protocole additionnel n°2 à la Convention révisée pour la navigation du Rhin du 17 octobre 1979 (RO 1985, p.229).16 Convention relative à l’aménagement des forces hydrauliques intéressant plusieurs Etats du 9 décembre 1923, Société des Nations, Recueil

des Traités, vol. 36, p.75.17 Le texte de la Convention est reproduit en L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M. Mbengue et C. Romano, Protection internatio-

nale de l’environnement, Pedone, Paris, 2005, pp.297-312.18 Voir L. Boisson de Chazournes, « Eaux internationales et droit international: vers l’idée de gestion commune » in L. Boisson de Chazour-

nes, Salman M. A. Salman (dir.), Les Ressources en eau et le droit international, Centre d’étude et de recherche de droit international et de relations internationales, Académie de droit international de La Haye, Kluwer Law International, La Haye, 2005, pp. 3-43.

19 Affaire relative au Projet Gabčíkovo-Nagymaros (Hongrie/Slovaquie), C.I.J. Recueil 1997, p.80, par.147. Dans cette affaire, la Cour a affirmé : « Le rétablissement du régime conjoint reflétera aussi de façon optimale le concept d’une utilisation conjointe des ressources en eau partagées pour atteindre les différents objectifs mentionnés dans le traité et ce, conformément au paragraphe 2 de l’article 5 de la convention sur le droit relatif aux utilisations des cours d’eau internationaux à des fins autres que la navigation, aux termes duquel : «Les Etats du cours d’eau participent à l’utilisation, à la mise en valeur et à la protection d’un cours d’eau international de manière équitable et raisonnable. Cette participation comporte à la fois le droit d’utiliser le cours d’eau et le devoir de coopérer à sa protection et à sa mise en valeur, comme prévu dans les présents articles.» (Assemblée générale, doc. A/51/869 du 11 avril 1997.) ». Voir aussi l’Opinion séparée du juge Kooijmans jointe à l’Affaire de l’Ile Kasikili/Sedudu, op.cit. par.25 et ss.

142 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Tant les travaux de la CDI ayant précédé l’adoption de la Convention de 1997 que la Convention ont exercé une influence sur l’adoption d’autres instruments. Ainsi en est-il de la Convention sur la protection et l’utilisation des cours transfrontières et des lacs in-ternationaux de 199220 et de l’Accord sur la coopération pour le développement durable du bassin du Mékong de 199521.

Faisant suite à l’adoption de la Convention de 1997, de nouveaux accords ont été conclus ou sont en cours de négociation. Ils prennent pour appui la Convention de 1997, même si celle-ci n’est pas encore entrée en vigueur, tout en mettant l’accent sur les spé-cificités des cours d’eau qui font l’objet de la réglementation. Tel est le cas du Protocole révisé sur les cours d’eau partagés dans la Communauté de développement de l’Afrique australe conclu le 7 août 2000, ou encore du projet de convention-cadre entre les dix Etats riverains du Nil, élaboré avec le soutien de la Banque mondiale, du Programme des Nations Unies pour le développement (PNUD) et d’autres bailleurs de fonds. D’autres accords, tels le Protocole relatif au développement durable du bassin du lac Victoria conclu en 2003 entre le Kenya, la Tanzanie et l’Uganda,22 et la Charte des eaux du fleuve Sénégal adoptée en 200223 développent plus avant les principes et règles de la Convention de 1997 au regard des préoccupations des Etats signataires et parties, de même qu’ils les complètent en ajoutant d’autres principes et règles de comportement.

Le droit international de l’eau fait place à une dynamique intéressante dans les relations entre universalisme et régionalisme. L’universalisme fait appel au régiona-lisme pour renforcer la portée des principes universels. Les données physiques et géographiques favorisent ce mouvement. La mise en place de régimes juridiques spé-cifiques à chaque cours d’eau tient beaucoup aux caractéristiques propres à chaque cours d’eau. Ceux-ci approfondissent, voir spécifient, les contours des principes de portée universelle.

Le droit institutionnel joue aussi un rôle. Les mécanismes institutionnels, aussi dénommés Commissions mixtes ou organismes de bassin, permettent de développer à l’échelon d’un bassin les régimes mis en place. Certaines institutions ont été dotées du pouvoir d’adopter des décisions à portée obligatoire. C’est le cas de la Commission mixte internationale établie entre les Etats-Unis et le Canada par le Traité de 1909 re-latif aux eaux limitrophes.24 Ces organes peuvent également participer à la prévention et au règlement des différends qui surgissent entre les Etats riverains. Ainsi, l’Accord sur le Mékong de 1995 prévoit l’intervention de la Commission afin que les Etats puissent régler le différend, et le Traité du Rio de la Plata et sa frontière maritime

20 Convention sur la protection et l’utilisation des cours d’eau transfrontières et de lacs internationaux, Helsinki, 17 mars 1992, Nations Unies, doc. ENWA/R.53 et Add.1. Ce texte est reproduit notamment dans L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M Mbengue et C. Romano, op.cit., pp.275-279.

21 Agreement on the Cooperation for the Sustainable Development of the Mekong River Basin, ILM, vol. 34, 1995, p. 865.22 Protocole relatif au développement durable du bassin du Lac Victoria, 29 novembre 2003, article 4 (f) et (g) http://www.eac.int/lvdp/

Protocol_LV_Basin.pdf.23 Le texte de la Charte est reproduit dans L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M. M. Mbengue et C. Romano, op.cit., pp.297-312. 24 Article VIII du Traité entre les États-Unis et la Grande-Bretagne relatif aux eaux limitrophes et aux questions originant le long de la fron-

tière entre les États-Unis et le Canada, Washington 11 janvier 1909. Nations Unies, Textes législatifs et dispositions de traités concernant l’utilisation des fleuves internationaux à des fins autres que la navigation, Traité n° 79, 1963.

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 143

y afférente de 1973 ainsi que le Statut du fleuve Uruguay de 1975 ont doté leurs Commissions de pouvoirs de conciliation.25

2. une imprégnation des exigences de protection de l’environnementLes exigences de protection de l’environnement et de promotion du développement

durable tendent de plus en plus à imprégner la réglementation relative aux ressources en eau douce, même si beaucoup reste à faire pour mettre en œuvre les principes de la Déclaration de Rio de 1992 au sein des divers régimes des cours d’eau.

La notion d’écosystème en matière de protection de l’environnement des cours d’eau prône une acception plus large que la conception juridique de cours d’eau inter-nationaux.26 Une attention particulière doit être portée à certains écosystèmes spécifi-ques comme les zones humides, les forêts et les zones côtières. Certains Etats sont très réticents à cette intrusion des exigences de la protection de l’environnement car elle exige des pays riverains de prendre des engagements dans la gestion des territoires. Qui plus est, cette approche est fondée sur la considération selon laquelle le fleuve constitue une unité qui inclut l’air, la terre, l’eau et les organismes vivants. 27

Le rôle de la coopération entre les pays riverains est essentiel pour assurer la pro-tection de l’environnement des cours d’eau. Les organismes communs de gestion des cours d’eau internationaux jouent un rôle significatif pour le monitorage et la coordi-nation des activités des Etats. Ainsi la Commission mixte internationale établie entre le Canada et les Etats-Unis évalue les progrès accomplis pour préserver l’intégrité des eaux de l’écosystème du bassin des Grands Lacs et elle peut faire des recommanda-tions aux Parties.28 Les organismes communs peuvent aussi développer des normes relatives à la qualité des eaux. Ainsi en est-il de la Commission Administrative du fleuve Uruguay ou de la Commission du Mékong.

Les exigences de développement durable font place à l’émergence de la notion d’approche intégrée. Afin d’assurer la protection des cours d’eau internationaux et de leur écosystème, la notion d’approche intégrée a pour unité un bassin hydrographi-que. Le programme d’action Agenda 21, adopté à Rio en 1992, précise que:

« Pour mettre en valeur et gérer les ressources en eau, il convient d’adopter une approche intégrée qui tienne compte des besoins à long terme comme des besoins immédiats. Tous les facteurs, qu’ils soient écologiques, économiques

25 Article 34 de l’Accord du Mékong de 1995; article 68 du Traité du Rio de la Plata de 1973 et article 58 du Statut du fleuve Uruguay de 1975. Agreement on the Cooperation for the Sustainable Development of the Mekong River Basin, op.cit.; Traité concernant le Rio de la Plata et la frontière maritime y afférente, 19 novembre 1973, Nations Unies, Recueil des Traités, vol.1295, p.319-330 ; Statut du fleuve Uruguay, 26 février 1975, Nations Unies, Recueil des traités, vol.1295, pp.348-355

26 Selon la Convention des Nations Unies de 1997, l’expression « cours d’eau » s’entend « d’un système d’eaux de surface et d’eaux souter-raines constituant, du fait de leurs relations physiques, un ensemble unitaire et aboutissant normalement à un point d’arrivée commun » et l’expression “cours d’eau international” s’entend « d’un cours d’eau dont les parties se trouvent dans des États différents ». Article 2 (a) et (b) de la Convention de 1997.

27 L’approche écosystémique caractérise l’Accord relatif à la qualité de l’eau dans les Grands Lacs de 1978 entre le Canada et les Etats-Unis. Il indique l’engagement de ces deux pays à « rétablir et [à] conserver l’intégrité chimique, physique et biologique de l’écosystème du bassin des Grands Lacs ». Article 2 de l’Accord de 1978 entre le Canada et les Etats-Unis relatif à la qualité de l’eau des Grands Lacs, tel que modifié par le Protocole du 16 octobre 1983, http://www.ijc.org/fr/activites/consultations/glwqa/waterqualityF.pdf.

28 Article 7.3 de l’Accord de 1978 entre le Canada et les Etats-Unis relatif à la qualité de l’eau des Grands Lacs. En 2006, suite à la demande faite par les deux Etats, la Commission a recommandé l’adoption un nouvel accord. Selon la Commission, le texte devrait être plus court et pragmatique et prévoir un plan d’action binational avec des échéanciers. Des informations sur ce processus d’examen de l’Accord sont disponibles : http://binational.net/glwqa_2006_f.html

144 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

ou sociaux, devront donc être pris en considération dans l’optique d’un déve-loppement durable. Il faudra pour cela considérer les besoins de tous les usa-gers et la nécessité de prévenir et d’atténuer les risques liés à l’eau, approche qui doit faire partie intégrante du processus de planification du développement économique ».29

L’approche intégrée demande que les considérations économiques, environne-mentales et sociales soient prises en compte ensemble pour satisfaire aux besoins des générations présentes et futures. C’est l’approche préconisée par le Millenium Ecosystem Assessment.30 Chacun des éléments doit être pris en compte si on veut évi-ter des dommages irréversibles aux ressources en eau, en particulier dans le cas des eaux souterraines.31 Le cri d’alarme lancé par le WWF en mars 2007 quant à l’état des écosystèmes de dix grands fleuves met en garde contre les graves risques de pollution et de surexploitation des rivières internationales.32

Un certain nombre d’Accords environnementaux multilatéraux (AEM) énon-cent des obligations visant à une meilleure protection des ressources en eau. Ainsi, la Convention sur la diversité biologique de 1992 et la Convention de Ramsar sur la conservation des zones humides de 1971 contribuent à appréhender l’eau en tant que ressource faisant partie intégrante de l’écosystème naturel.33 Le principe de l’utilisation durable des ressources en eau est prôné. Ce principe fait partie inté-grante du développement durable et d’une approche écosystémique de la gestion des ressources en eau.34 Ce principe est d’autant plus important dans des milieux sensibles, comme par exemple, les eaux souterraines. En outre, d’autres instru-ments internationaux favorisent la participation du public à la gestion des cours

29 Agenda 21, par.18.16. 30 Ce dernier affirme que la protection de l’eau doit être réalisée: “by balancing the objectives of economic development, ecosystem needs,

and human well-being”, Millennium Ecosystem Assessment, Ecosystems and Human Well-Being, vol. I, 2005, p.199. 31 La vulnérabilité des ressources en eau souterraines a été soulignée par la Commission du droit international qui a noté : « [L]es eaux sou-

terraines […] sont plus fragiles et, une fois polluées, plus lentes à purifier que les eaux de surface. Les activités humaines de surface, par exemple l’enfouissement des déchets, peuvent polluer un aquifère. Les eaux souterraines polluées d’un côté d’une frontière internationale peuvent en atteindre l’autre. En cas de pollution, la dépollution d’un aquifère est longue et coûteuse. Il peut également s’avérer onéreux d’établir la répartition souterraine de la pollution. L’une des différences entre les ressources en eaux de surface et en eaux souterraines est que, dans le cas de ces dernières, il faut parfois plus longtemps pour déceler la pollution. S’agissant des formations aquifères, il est possible qu’un dommage causé par la génération actuelle ne soit décelé que dans plusieurs générations. […] Même lorsque des eaux souterraines ne sont contaminées que par une petite quantité de polluants, les dommages causés peuvent être qualifiés de significatifs si la contamination a un effet irréversible ou durable ». Deuxième rapport sur les ressources naturelles partagées : les eaux souterraines transfrontières, présenté par M. Chusei Yamada, Rapporteur spécial, 2004, A/CN.4/539, p.8, par.25.

32 Le rapport du WWF note que la pollution et la dégradation de ressources en eau demandent de nouvelles approches en matière de gestion de l’eau. Le déversement de contaminants par les industries dans les eaux des fleuves, les sites urbains ainsi que certaines pratiques agricoles comme l’utilisation des herbicides et de fertilisants dégradent la qualité des écosystèmes des ressources en eau. Voir : WWF, World’s top 10 rivers at risk, 2007, http://assets.panda.org/downloads/worldstop10riversatriskfinalmarch13.pdf

33 Les textes de ces deux Conventions sont reproduits en L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné et C. Romano, Protection internationale de l’environnement. Recueil d’instruments juridiques, Pedone, Paris, 1998, pp.147-154 et L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M. Mbengue et C. Romano, op.cit., pp.118-139.

34 Ainsi, la Convention sur la diversité biologique formule l’obligation pour les Etats parties de ne pas entraîner l’« appauvrissement à long-terme » des écosystèmes terrestres, maritimes, aquatiques et de la diversité des espèces. Autrement dit, au sens de la Convention sur la diversité biologique, le principe de l’utilisation durable se caractérise par une obligation de ne pas causer un appauvrissement à long terme des ressour-ces biologiques et de l’écosystème naturel (article 2 de la Convention sur la diversité biologique). Une telle logique transparaît également de la Convention de Ramsar sur les zones humides. Lors de la neuvième Conférence des Parties de la Convention de Ramsar tenue en 2005 à Kampala, il a été expliqué que « l’utilisation rationnelle » des zones humides est définie par « le maintien de leurs caractéristiques écologiques obtenu par la mise en ’uvre d’approches par écosystème dans le contexte du développement durable ». Voir : Résolution IX.1 et son annexe A : Cadre conceptuel pour l’utilisation rationnelle des zones humides et le maintien de leurs caractéristiques écologiques, neuvième Conférence des Parties, Kampala 8-15 novembre 2005.

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 145

d’eau35 ou encore demandent la conduite d’études d’impact pour des projets rela-tifs à un cours d’eau afin de prévenir les atteintes à l’environnement.36

3. une emprise croissante du droit international économiqueL’eau a toujours été une source des bénéfices économiques. Les rivières et les lacs ont été et constituent des voies de communication privilégiées. La navigation sur les fleuves internationaux a, dès le début du XIXème siècle, fait l’objet de traités interna-tionaux et constitue aujourd’hui encore un intérêt stratégique vital pour de nombreux pays, notamment pour les Etats enclavés. Dès le début du XXème siècle, le droit international va être appelé à appréhender des activités économiques autres que la navigation. La Convention relative à l’aménagement des forces hydrauliques intéres-sant plusieurs Etats de 1923 et la Convention des Nations Unies de 1997 incluent des activités économiques telles la production d’énergie hydroélectrique et les utilisations industrielles et agricoles.

La jurisprudence internationale illustre l’importance des utilisations économiques des fleuves internationaux. Ainsi par exemple, l’affaire relative à la Juridiction Territoriale de la Commission internationale de l’Oder présente des contours économiques. Ce dif-férend porté devant la Cour permanente de Justice Internationale, avait trait à l’étendue du régime international de la liberté de navigation aux affluents du fleuve Oder situés en territoire Polonais.37 L’affaire relative au Projet Gabčíkovo-Nagymaros a porté sur la construction et le fonctionnement d’un système de barrages sur le Danube afin de produc-tion d’électricité. La détermination d’expert de 2007 relative au différend entre l’Inde et le Pakistan sur le barrage Baglihar avait également des contours économiques. 38

La question des échanges internationaux d’eau en vrac est objet d’attention.39 Dans la relation entre eau et règles de libre-échange, la question est celle de savoir si et quand l’eau devient marchandise ou produit. A l’échelon de l’OMC, cette interro-gation n’est encore que prospective, tant dans le contexte des négociations que dans le cadre du règlement des différends. 35 Voir la Convention sur l’accès à l’information, la participation du public au processus décisionnel et à l’accès à la justice en matière

d’environnement de 1998 adoptée sous les auspices de la Commission économique des Nations Unies pour l’Europe, reproduite en L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M. Mbengue et C. Romano, op.cit., pp.38-56. A cet égard, il est intéressant de faire mention que la Conférence des Parties de cette Convention a mis en place un Comité de non-respect qui confère aux particuliers le droit d’accéder à ce mécanisme (Décision I/7, Rapport de la première réunion des Parties, Lucques, 2002, ECE/MP.PP/2/Add.8). Une plainte à été portée devant ce mécanisme par une organisation non gouvernementale ukrainienne Ecopravo Lviv, relative au projet de l’Ukraine de construire un canal navigable dans le delta du Danube. En 2005, le Comité d’Aarhus a conclu qu’« en n’ayant pas assuré la participation du public, au sens de l’article 6 de la Convention, l’Ukraine n’a pas respecté l’alinéa a du paragraphe 1 de l’article 6, les paragraphes 2 à 8 de l’article 6 et la seconde phrase du paragraphe 9 de l’article 6 ». Décision II/5 b adoptée à la deuxième réunion des Parties, 25-27 mai 2005, ECE/MP.PP/2005/2/Add.8).

36 Tel est le cas de la Convention sur l’évaluation d’impact sur l’environnement dans un contexte transfrontière (Espoo, 25 février 1991) et de son Protocole sur l’évaluation de l’impact sur l’environnement dans un contexte transfrontière, relatif à l’évaluation stratégique environ-nementale (Kiev, 2003) (reproduits en L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M. Mbengue et C. Romano, op.cit., pp.56-73) adoptés sous les auspices de la Commission économique des Nations Unies pour l’Europe, de même que de la Convention sur la biodiversité de 1992 (art.14).

37 Juridiction Territoriale de la Commission internationale de l’Oder, (Allemagne, Danemark, France, Royaume-Uni, Suède et Tchécoslova-quie/Pologne), arrêt du 10 septembre 1929, C.P.J.I. Recueil, série A No.23. Voir aussi l’Affaire Oscar Chinn, (Royaume Uni/Belgique), arrêt du 12 décembre 1934, C.P.J.I. Recueil, série A/B No. 63, Affaire des prises d’eau à la Meuse (Belgique/Pays Bas) arrêt du 28 juin 1937, C.P.J.I. Recueil, série A/B No. 70.

38 Un résumé de la détermination d’expert du 12 février 2007 est diponible : http://siteresources.worldbank.org/SOUTHASIAEXT/Resources/223546-1171996340255/BagliharSummary.pdf

39 E. Brown Weiss, « Water Transfer and International Trade Law », in E. Brown Weiss, L. Boisson de Chazournes, N. Bernasconi-Osterwal-der (eds.) Fresh Water and International Economic Law, Oxford University Press, Oxford, 2005, pp. 61-92.

146 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Au sein de l’Accord de libre-échange nord-américain (ci-après ALENA), le Canada, les Etats-Unis et le Mexique ont traité de la question de l’eau en relation avec cet accord de libre-échange.40 En 1993, les trois gouvernements ont adopté une déclaration:

« L’ALENA ne crée aucun droit aux ressources en eau naturelle de l’une ou l’autre Partie. […] L’eau qui se trouve à l’état naturel dans les lacs, les rivières, les réser-voirs, les aquifères, les bassins hydrographiques, etc. n’est ni une marchandise ni un produit, ne se vend pas dans le commerce et, par conséquent, n’est pas et n’a jamais été visée par les conditions d’un accord commercial quel qu’il soit ».41

Malgré le fait que cette déclaration semble exclure l’eau du champ d’application de l’ALENA, en 1998, un différend opposant une compagnie privée américaine, Sun Belt, au Canada a été porté au titre du chapitre 11 de l’ALENA.42 En 2002, au titre du même instrument, une plainte a été déposée par un groupe de cultivateurs des Etats-Unis. Ces derniers ont accusé le Mexique d’avoir porté atteint à leur « inves-tissement », constitué par leurs droits de propriété sur l’eau, protégé par l’accord de l’ALENA.43 L’interprétation donnée de la notion d’« investissement » n’a toutefois pas été retenue par le Tribunal CIRDI/ALENA. Le Tribunal en considérant que les plaignants devraient démontrer que « they have made an investment in Mexico », a souligné que « [i]n our view it is clear that they do not ».44 Le Tribunal est parvenu à la conclusion qu’il n’était pas compétent.

Le droit international relatif aux investissements met en éclairage d’autres aspects de la dimension économique de l’eau. Il en est ainsi de la conclusion de contrats de concession par lesquels un gouvernement charge des compagnies privées d’assurer des services publics tels ceux relatifs à l’approvisionnement en eau. Plusieurs affaires portées devant des tribunaux arbitraux établis au sein du Centre international pour le règlement des différends relatifs aux investissements (CIRDI) ont traité de cet as-

40 Accord de libre-échange nord-américain, janvier 1994, http://www.international.gc.ca/trade-agreements-accords-commerciaux/agr-acc/nafta-alena/texte/index.aspx?lang=fr&menu_id=50&menu=.

41 Déclaration faite en 1993, par les gouvernements du Canada, du Mexique et des Etats-Unis, http://www.scics.gc.ca/cinfo99/83067000_f.html.

42 La question des transferts internationaux d’eau à grande échelle a fait l’objet de débats, notamment au Canada. Dans ce pays, les compag-nies privées considèrent avec intérêt les profits potentiels qui pourraient dériver de la réalisation des transferts internationaux d’eau vers les Etats-Unis. En 1991, la province de la Colombie-Britannique au Canada avait donné des autorisations à des compagnies canadiennes pour effectuer des transferts d’eau en vrac par navire-citerne. Une de ces compagnies constitua un joint-venture avec une compagnie amé-ricaine, Sun Belt, pour approvisionner en eau la ville californienne de Goleta. Avec l’adoption au niveau fédéral d’un moratoire en 1999, la Colombie-Britannique retira les concessions données. Devant le retrait de la concession, la compagnie Sun Belt déposa une plainte au titre du Chapitre 11 de l’ALENA, en invoquant des dommages pour plus de 200 millions de dollars. Voir : Affaire Sun Belt Inc. c. Canada, Notice of claim and demand for arbitration, 12 octobre 1999, http://www.naftaclaims.com/disputes_canada/disputes_canada_sunbelt.htm. Cette affaire est encore pendante.

43 Les plaignants ont considéré avoir payé pour acquérir leurs droits de propriété sur l’eau et que cela constituait un investissement au titre de l’article 1139 (g) de l’ALENA. Le Mexique aurait violé les droits de propriété sur l’eau en diminuant les quotas d’eau que les Etats-Unis, et donc indirectement les cultivateurs, doivent recevoir au titre de l’accord sur le Rio Grande de 1944. Pour les plaignants : « From 1992 to 2002, Mexico has captured, seized, and diverted to the use of Mexican farmers, the foundation of the Investment (approximately 1,219,521 acre-feet of irrigation water) located in Mexico and owned by Claimants. By diverting Claimants’ water to Mexican fanners, Mexico dramatically increased its irrigated agricultural production on the Mexican side of the Rio Grande River, while the crops of United States farmers in the Rio Grande Valley shriveled (pp.32-33). Affaire Bayview Irrigation District c. Mexico (Texas Water Claims), Notice of arbitration, 19 janvier 2005, pp.32-33, http://naftaclaims.com/Disputes/Mexico/Texas/TexasClaims_NOA-19-01-05.pdf

44 Affaire Bayview Irrigation District c. Mexico (Texas Water Claims), award, 12 juin 2007, pp.24-25, par. 108-112, http://www.naftaclaims.com/Disputes/Mexico/Texas/Bayview_Jursdictional_Award_19-05-07.pdf. En septembre 2007, les plaignants ont déposé une demande d’annulation de la décision. Notice of Application for Annulment, 17 septembre 2007, http://www.naftaclaims.com/Disputes/Mexico/Texas/Bayview-Mexico-Annulment-Notice.pdf

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 147

pect.45 Ainsi, la décision Azurix c. Argentine de 2006 d’un Tribunal du CIRDI a mis en relief l’importance de la problématique de la privatisation des services de l’eau et des enjeux de l’expropriation en ce domaine.46 Elle a permis d’élucider certains contours du concept d’expropriation indirecte. Il en est ainsi des critères permettant de distin-guer les réglementations légitimes ne donnant pas lieu à expropriation et indemnisa-tion, des expropriations donnant lieu à une indemnisation.47 Le Tribunal a fait recours à une méthodologie empruntée à la Cour européenne des droits de l’homme. 48 Lors de l’analyse des mesures d’expropriation subies par des individus, la Cour de Strasbourg prend en compte tant l’objectif légitime d’utilité publique que le « rapport raisonna-ble de proportionnalité entre les moyens employés et le but visé ».49 Sur la base de cette approche, l’objectif des mesures gouvernementales, l’impact de ces mesures sur l’investisseur et la proportionnalité de ces mesures au but visé sont appréhendés. Le Tribunal en a conclu que la mesure adoptée par l’Argentine n’équivalait pas à une expropriation.50 En d’autres circonstances, des tribunaux arbitraux ont considéré qu’il y avait expropriation.51 Ainsi que le montre la décision Azurix, sont en jeu des problèmes soulevés par la question de l’étendue du pouvoir de réglementation d’un Etat et de ses effets, eu égard à la fourniture d’un un service public indispensable à une communauté. Ce sont ques-tions complexes dans lesquelles plusieurs facteurs sont liés les uns aux autres, qu’il s’agisse de la protection de l’investissement, de l’exigence de protéger une ressource indispensable à la vie de l’homme et de la protection de l’environnement.

4. Un droit de l’homme à l’eau?La question de l’accès à l’eau et aux services d’assainissement est de plus en plus présente sur l’agenda international. L’un des objectifs du Millénaire est de « Réduire de moitié, d’ici à 2015, le pourcentage de la population qui n’a pas accès de façon

45 Voir: Azurix Corp. c. Argentine (Affaire No. ARB/01/12), décision du 14 juillet 2006; Suez, Sociedad General de Aguas de Barcelona S.A. et Vivendi Universal S.A. c. Argentine, (Affaire No. ARB/03/19), décision sur la compétence du 3 août 2006; Aguas Provinciales de Santa Fe S.A., Suez, Sociedad General de Aguas de Barcelona S.A. et InterAguas Servicios Integrales del Agua S.A. c. Argentine (Affaire No. ARB/03/17), décision sur la compétence du 16 mai 2006; Biwater Gauff (Tanzania) LTD. c. Tanzanie (Affaire No. ARB/05/22).

46 Le concept d’expropriation peut revêtir différentes formes. L’expropriation peut être directe ou indirecte. L’expropriation directe est liée à un processus de nationalisation des ressources naturelles par un Etat. La notion d’expropriation indirecte a été définie par l’article 1110 de l’ALENA qui prévoit que: « Aucune des Parties ne pourra, directement ou indirectement, nationaliser ou exproprier un investissement effectué sur son territoire par un investisseur d’une autre Partie, ni prendre une mesure équivalant à la nationalisation ou à l’expropriation d’un tel investissement («expropriation»), sauf : a) pour une raison d’intérêt public; b) sur une base non discriminatoire; c) en conformité avec l’application régulière de la loi et le paragraphe 1105 (1) ; et d) moyennant le versement d’une indemnité ». Voir l’Etude de l’OECD, L’expropriation indirecte et le « droit de réglementer dans le droit international de l’investissement », Septembre 2004.

47 Voir Décision Azurix, op.cit., par. 311-312. 48 Cette méthodologie avait déjà été utilisée par un autre Tribunal arbitral CIRDI dans l’affaire Tecnicas Medioambientales Tecmed S.A. c.

Mexico, décision du 29 mai 2003, par.122, http://icsid.worldbank.org/ICSID/FrontServlet, par.122.49 Selon la Cour de Strasbourg : « Il ne suffit pas qu’une mesure privative de propriété poursuive, en l’espèce comme en principe, un objectif

légitime “d’utilité publique”; il doit aussi exister un rapport raisonnable de proportionnalité entre les moyens employés et le but visé. (James et Autres c. Royaume-Uni, arrêt du 21 février 1986, par.50) L’arrêt Sporrong et Lönnroth a exprimé la même idée en des termes différents: il parle du «juste équilibre» à ménager entre les exigences de l’intérêt général et les impératifs des droits fondamentaux de l’individu équilibre rompu si la personne concernée a eu à subir «une charge spéciale et exorbitante», Sporrong et Lönnroth c. Suède, arrêt du 23 septembre 1982, par. 69 et 73. .

50 Le Tribunal CIRDI a toutefois affirmé « To conclude, the Tribunal, having held that the Respondent failed to provide fair and equitable treatment to the investment, finds that the Respondent also breached the standard of full protection and security under the BIT». Décision Azurix, op.cit., par. 408.

51 Voir: CIRDI, Técnicas Medioambientales, Tecmed S.A. c. Mexico, sentence du 29 mai 2003, op.cit., par.116.

148 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

durable à un approvisionnement en eau potable ».52 Dans ce contexte, un lien étroit est forgé avec l’investissement privé, nécessaire pour améliorer l’accès aux services d’approvisionnement en eau et d’assainissement. Les liens entre dimensions écono-mique et humaine de l’eau apparaissent dans toute leur acuité.

L’engagement d’améliorer l’accès à l’eau potable est allé de pair avec l’adop-tion de plusieurs instruments demandant la reconnaissance d’un droit à l’eau pour toute personne. On peut évoquer l’Observation générale n°15 relative au droit à l’eau adoptée par le Comité des Nations sur les droits économiques, sociaux et culturels en 2002,53 le Projet de directives sur la réalisation du droit à l’eau et aux services d’assai-nissement adoptés par la Sous-Commission de la promotion et protection des droits de l’homme en 200554 et la décision du Conseil des droits de l’homme de 2006,55 deman-dant au Haut Commissariat aux droits de l’homme de préparer une étude détaillée sur le contenu et le champ d’application d’un droit à l’eau. La conclusion de cette étude, publiée en août 2007, met en lumière que les Etats sont de plus en plus nombreux à considérer que la question de l’accès à l’eau doit être comprise dans le cadre juridique relatif au droit international des droits de l’homme.56

L’émergence de la reconnaissance du droit à l’eau ne relève pas exclusivement des instruments des droits de l’homme. Des Conventions relatives au droit des cours d’eau internationaux tel le Protocole sur l’eau et la santé de 1999 à la Convention d’Helsinki de 199257 ainsi que la Charte des eaux du fleuve Sénégal de 2000 évoquent ce droit.58

Le Comité des droits économiques, sociaux et culturels a défini le droit à l’eau comme « un approvisionnement suffisant, physiquement accessible et à un coût abor-dable, d’une eau salubre et de qualité acceptable pour les usages personnels et domes-tiques de chacun ».59 Trois éléments le caractérisent: disponibilité, qualité et accessibi-lité. La notion de disponibilité signifie que l’eau doit être suffisante et constante pour les usages personnels et domestiques de chaque personne. En outre, l’eau doit être salubre et l’accès aux services d’eau doit être accessible sans discrimination. 60

52 Déclaration du Millénaire, 2000, A/RES/55/2. 53 Comité des Nations Unies sur les droits économiques, sociaux et culturels, Observation générale n°15 sur le droit à l’eau (arts.11 et 12 du

Pacte international relatif aux droits économiques, sociaux et culturels), E/C.12/2002/11. 54 Sous-commission sur la promotion et la protection des droits de l’homme, Projet des directives pour la réalisation du droit à l’eau potable

et à l’assainissement, 11 Juillet 2005, E/CN.4/Sub.2/2005/25. 55 Décision 2/104, Conseil des droits de l’homme, 27 Novembre 2006. 56 Report of the United Nations High Commissioner for Human Rights on the scope and content of the relevant human rights obligations

related to equitable access to safe drinking water and sanitation under international human rights instruments, 2007, A/HRC/6/3, http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/G07/136/55/PDF/G0713655.pdf?OpenElement.

57 Articles 1, 4, par. 2 (a) et (b) et 6, par. 1 (a) et (b). Le Protocole sur l’eau et la santé de 1999 à la Convention d’Helsinki de 1992 est re-produit en L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M. Mbengue et C. Romano, Protection internationale de l’environnement, Pedone, Paris, 2005, pp.269-283.

58 La Charte des eaux du fleuve Sénégal de 2002 dispose que : « Les principes directeurs de toute répartition des eaux du Fleuve visent à assurer aux populations des États riverains, la pleine jouissance de la ressource, dans le respect de la sécurité des personnes et des ouvrages, ainsi que du droit fondamental de l’homme à une eau salubre […] » (art.4). La Charte des eaux du fleuve Sénégal est reproduite en L. Boisson de Chazournes, R. Desgagné, M.M. Mbengue et C. Romano, Protection internationale de l’environnement, Pedone, Paris, 2005, pp.285-300.

59 Observation générale n°15 sur le droit à l’eau, par.2. 60 UN, Report of the United Nations High Commissioner for Human Rights on the scope and content of the relevant human rights obligations

related to equitable access to safe drinking water and sanitation under international human rights instruments, 2007, A/HRC/6/3, p.13, par.22-23.

Le Droit International de L’Eau: Tendances Récentes 149

Le droit à l’eau est étroitement associé au respect du principe de non-discrimi-nation, et cela pour promouvoir l’accessibilité physique et économique à l’eau pour les couches de la population les plus vulnérables ou pour celles qui sont marginali-sées. L’équité joue également un rôle pour déterminer un prix de l’eau qui prenne en compte la distinction entre les groupes sociaux les plus aisés et les groupes défavori-sés.61 Approche économique et droits de l’homme se rencontrent. La mise en œuvre des principes de non-discrimination et d’équité contribuent à la promotion du droit à l’eau. L’interruption, le refus injustifié d’accès aux services d’eau, ou encore des hausses disproportionnées du prix de l’eau sont considérés comme des violations de ces principes et du droit à l’eau.62

La protection de la santé humaine participe aussi à l’«humanisation» de la ges-tion de l’eau. Ainsi par exemple, l’Organisation Mondiale de la Santé a adopté des Directives sur la qualité de l’eau de boisson. Ces dernières sont « destinées à servir de principes de base pour l’élaboration de normes nationales qui, si elles sont correcte-ment appliquées, assureront la salubrité de l’eau de boisson grâce à l’élimination des constituants connus pour leur nocivité ou à la réduction de leur concentration jusqu’à une valeur minime ».63

Des instruments sur les cours d’eau internationaux font aussi place à la santé, comme le Protocole sur l’eau et la santé de 1999.64 Certains instruments spécifiques portant sur la préservation de la qualité des eaux ont pour objectif de protéger tant la santé humaine que l’environnement. Tel est le cas de l’Accord entre le Canada et les Etats-Unis qui dans ses Annexes prévoit des règles particulières sur la concentration de polluants dans l’eau.65

Le droit à l’eau inclut des questions de participation du public et d’accès à l’infor-mation.66 Les particuliers doivent pouvoir participer au processus de prise de décision et avoir accès, en toute égalité, aux informations dont les autorités publiques ou les tiers disposent concernant l’eau, les services d’approvisionnement en eau et la protec-tion de l’environnement.

Certaines procédures de règlement des différends ont fait place à des interventions du public au travers de la procédure de soumission de mémoires d’amicus curiae. Cette procédure consiste en ce que des personnes non parties à un litige puissent fournir au cours d’une procédure judiciaire, des informations sur des points de droit, voire des éléments factuels, par la soumission de mémoires d’amicus curiae. Des tri-bunaux, considérant que la gestion de l’eau soulève des questions d’intérêt public qui 61 L’Observation générale n°15 affirme : « Le prix des services doit être établi sur la base du principe de l’équité, pour faire en sorte que ces

services, qu’ils soient fournis par des opérateurs publics ou privés, soient abordables pour tous, y compris pour les groupes socialement défavorisés. L’équité exige que l’eau ne représente pas une part excessive des dépenses des ménages les plus pauvres par rapport aux ménages plus aisés » (par.27).

62 Observation générale n°15, par.44 (a). 63 Directives de qualité pour l’eau de boisson, 3e éd., vol. 1 à 3 (OMS, Genève, 2006). Citées par l’Observation générale n°15. 64 Le Protocole sur l’eau et la santé prévoit : « Les Parties prennent, en particulier, toutes les mesures appropriées pour assurer : a) Un approvi-

sionnement adéquat en eau potable salubre […] ; b) Un assainissement adéquat d’une qualité propre à permettre de protéger suffisamment la santé de l’homme et l’environnement » ( article 4.2 (b).

65 Voir les douze annexes de l�Accord relatif à la qualité de l�eau dans les Grands Lacs de 1978 entre le Canada et les Etats-Unis. Un autre exemple est l’annexe II à l’Accord sur le Danube de 1994 qui prévoit une liste des substances dangereuses (sans toutefois en établir le niveau des concentrations comme dans l’Accord entre les Etats-Unis et le Canada).

66 Voir : Observation générale n°15, par.12, c), iv).

150 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

intéressent la société civile, ont autorisé l’intervention d’amicus curiae.67 Ils ont dans leurs ordonnances souligné l’intérêt public attaché à l’objet des différends portant sur des contrats de concession, en soulignant que des questions de droit international, y compris des considérations relatives aux droits de l’homme, étaient en jeu.68

Conclusions

Ressource essentielle pour satisfaire les besoins de l’être humain, l’eau douce est au cœur de la protection de l’environnement. Sa gestion ne peut pas être appréhendée en droit international comme celle d’autres ressources naturelles. En même temps, l’eau est une composante du développement des Etats. Le besoin d’accroître les services d’approvisionnement et d’assainissement relèvent des politiques de développement économique. Le rapport du Programme des Nations Unies pour le Développement (PNUD) de 2006 a souligné que les questions d’accès à l’eau et l’assainissement sont au cœur des priorités et préoccupations du développement.69 Un équilibre doit être trouvé entre les dimensions environnementales, sociales et économiques de la gestion de l’eau.

Autre caractéristique, l’eau est une ressource très vulnérable aux atteintes causées par les activités humaines. Le rapport déjà cité du WWF a tiré une sonnette d’alarme, s’agissant des dix fleuves « les plus en danger au monde » qui ne constituent que « les meilleurs exemples des menaces qui pèsent sur tous les cours d’eau ».70 Les ressour-ces en eau subissent des dégradations multiples liées à leur surexploitation.

Le défi est celui de gérer ces ressources de manière intégrée. Le droit international peut apporter sa contribution, mais il faut en retenir une vision large. C’est une lecture harmonieuse et d’ensemble des différents corps de normes du droit international qui est exigée

67 Suez, Sociedad General de Aguas de Barcelona S.A. and Vivendi Universal S.A. v. Argentine, (Affaire No. ARB/03/19), Order in response to a petition for transparency and participation as amicus curiae, 19 Mai 2005, Aguas Provinciales de Santa Fe S.A., Suez, Sociedad Gene-ral de Aguas de Barcelona S.A. and InterAguas Servicios Integrales del Agua S.A. v. Argentina (Affaire No. ARB/03/17), Order in response to a petition for participation as amicus curiae, 17 Mars 2006; Biwater Gauff (Tanzania) LTD. v. United Republic of Tanzania (Affaire No. ARB/05/22), Procedural Order n°5, 26 Mars 2007.

68 Ainsi un Tribunal arbitral a souligné : « The factor that gives this case particular public interest is that the investment dispute centers around the water distribution and sewage systems of urban areas in the province of Santa Fe. Those systems provide basic public services to hundreds of thousands of people and as a result may raise a variety of complex public and international law questions, including human rights considerations. Any decision rendered in this case, whether in favor of the Claimants or the Respondent, has the potential to affect the operation of those systems and thereby the public they serve ». Aguas Provinciales de Santa Fe S.A., Suez, Sociedad General de Aguas de Barcelona S.A. and InterAguas Servicios Integrales del Agua S.A. v. Argentina (Affaire No. ARB/03/17), Order in response to a petition for participation as amicus curiae, 17 Mars 2006; p.8, par.18.

69 PNUD, Au-delà de la pénurie : pouvoir, pauvreté et crise mondiale de l’eau, Rapport sur le développement humain, 2006, http://hdr.undp.org/en/media/hdr06-complete.pdf.

70 Dupont, G., « Menaces sur les grands fleuves », Le Monde, 5 avril 2007. Voir aussi : WWF, World’s top 10 rivers at risk, 2007, http://assets.panda.org/downloads/worldstop10riversatriskfinalmarch13.pdf. Voir l’ar

* Doutor em Ciências Sociais, Mestre em Planejamento Econômico, Diplomata de Carreira desde 1977; Professor de Economia Política Internacional no Mestrado em Direito do Centro Universitário de Brasília – Uniceub. ([email protected]; www.pralmeida.org)

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

151

A Ordem Política e econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

PAULO ROBERTO DE ALMEIDA*

Resumo

Este ensaio tem por objetivo apresentar e discutir alguns dos problemas considera-dos mais importantes das relações internacionais contemporâneas da agenda mundial, ao início do século XXI, e discutir suas implicações para o Brasil, enquanto ator ou espectador de alguns dos processos ou eventos enfocados.

Abstract

This essay has as its purpose present and discuss some problems considered more important for the contemporary international relations of world agenda in the begin-ning of the 21st century. The consequences for Brazil both as an actor and as an obser-ver of the processes and events taken into account are debated.

ab

Este ensaio tem por objetivo apresentar e discutir alguns dos problemas relevantes da agenda mundial, ao início do século XXI, e discutir suas implicações para o Brasil. Trata-se de uma exposição descritiva, que não se pretende abrangente, sistemática ou completa, mas que cubra, ainda assim, os problemas considerados mais importan-tes das relações internacionais contemporâneas, introduzindo, para cada um deles, sua interação ou impacto para o Brasil, enquanto ator ou espectador de alguns dos processos ou eventos enfocados. Pode ser considerada uma “digressão livre”, pelo fato de que não pretende fundamentar a análise dos tópicos tratados em remissões exaustivas, baseadas em fontes documentais relativas aos casos selecionados ou em referências bibliográficas completas; mas a lista de leituras indicativas, apresentada ao final, oferece, ainda assim, um guia de informação complementar para a maior parte dos problemas abordados no texto.

O ensaio recolhe algumas décadas de atento estudo das questões internacionais e a experiência adquirida no trato profissional de vários dos assuntos nele abordados. O texto foi organizado em três seções, apresentadas a seguir. Cada uma delas foi de-dicada a um conjunto de questões com relevância internacional, nos planos político e econômico, para as quais são mencionadas as implicações ou o seu significado para o Brasil. A terceira seção aborda com maior grau de detalhe o impacto da presente

152 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

ordem política e econômica mundial para o país. Este texto analítico-descritivo está assim estruturado:

1) A ordem política mundial: novos problemas, velhas soluções? 1.1. Segurança estratégica 1.2. Relações entre as grandes potências 1.3. Conflitos regionais 1.4. Cooperação política e militar nos hot-spots;2) A ordem econômica mundial: velhos problemas, novas soluções? 2.1. Regulação cooperativa das relações econômicas internacionais 2.2. Assimetrias de desenvolvimento 2.3. Cooperação multilateral e Objetivos do Milênio3) A ordem política e econômica mundial e o Brasil 3.1. Crescimento econômico 3.2. Investimentos 3.3. Acesso a mercados 3.4. Integração regional 3.5. Recursos energéticos 3.6. Segurança e estabilidade

1) A ordem política mundial: novos problemas, velhas soluções?

A primeira observação que compete fazer a respeito desta seção, tem a ver com o contraste oferecido em relação à seção seguinte, no sentido da inversão de caráter entre o velho e o novo. No caso da ordem política, acredito que o mundo enfrenta novos problemas, e eles não se situam apenas em supostas “ameaças globais”, como os problemas do meio ambiente ou da ameaça do terrorismo fundamentalista. A curta visão histórica das gerações presentes tende a crer que o “aquecimento global” tem sido produzido pela Revolução industrial ou pelas atividades “civilizatórias” de modo geral, esquecendo que, em escala geológica, o planeta Terra já enfrentou ciclos de aquecimento e de resfriamento globais que impactaram profundamente – em alguns casos fatalmente – o destino de sociedades humanas inteiras (ver Jared Diamond, Armas, Germes e Aço e Colapso). Da mesma forma, independentemente do fato de que os atuais fundamentalistas islâmicos matam, atualmente, um “pouco mais” de gente do que os anarquistas de um século atrás – que tendiam a se concentrar em lideranças políticas –, a violência indiscriminada como arma política está conosco há muito tempo, sendo que as guerras globais do século XX foram insuperáveis em sua obra homicida (Niall Ferguson: The War of the World).

Os problemas são novos no sentido em que, depois dessas matanças indescritíveis do século XX, tão bem descritas por Ferguson, o mundo parece encaminhar-se para um período de “relativa paz” no que se refere aos grandes sistemas imperiais. Minha

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

153

leitura do problema da paz e da guerra – certamente situada na tradição aroniana (Raymond Aron: Paz e Guerra entre as nações), mas dela divergindo quanto à na-tureza dos conflitos contemporâneos, que me parecem retroceder em relação ao panorama de guerras totais, de estilo clausewitziano, que ele contemplava – pode ser resumida da seguinte forma. As grandes nações guerreiras deixaram o cenário de pequenas guerras de posição, muitas vezes travadas com o recurso eventual a tropas mercenárias, típicas dos séculos XV e XVI, para as guerras de conquista e ocupação, conduzidas pelos Estados-nacionais em formação dos séculos XVII e XVIII. Importantes inovações táticas e estratégicas foram introduzidas pelo estilo napoleônico de conduzir os combates, envolvendo a mobilização de forças nacio-nais em larga escala, o que dominou o cenário mundial na era dos grandes impérios nacionais (basicamente o século XIX, até a Primeira Guerra Mundial). O século XX conheceu, sob a forma das guerras globais (em duplo sentido), uma inacreditável explosão de violência, que não mais poupou instalações ou populações de espécie alguma, até o advento da arma atômica, que sinalizou um limite para o exercício dessa violência. É minha crença – talvez subjetiva e otimista, mas ainda assim fun-damentada numa certa percepção objetiva dos “custos” da guerra para os atuais “impérios” – que as superpotências não mais voltarão a se enfrentar diretamente, em grandes guerras totais, mas procurarão se acomodar mutuamente com o recurso às negociações ou, quando for necessário, às guerras localizadas e aos conflitos militares por procuração – proxy wars – que não mais envolverão a escalada final, isto é, a destruição completa do inimigo (pois isso poderia significar a sua própria destruição, quando não uma hecatombe em escala planetária).

Por outro lado, o desaparecimento do socialismo, que significava um messianismo em bases universalistas, retira um dos mais poderosos indutores a um conflito global no plano militar, pois, como disse Francis Fukuyama (“The End of History?”) – e nisso estou em acordo com ele –, não existe mais uma alternativa credível aos sis-temas de mercado e ao capitalismo, ainda que as democracias demorarão um pouco mais para atingir a universalidade. Ou seja, os “impérios” porventura existentes – americano, europeu, chinês, russo, indiano – se encontrarão na interdependência do capitalismo global, ainda que possam ter suas divergências econômicas, políticas e militares, e mesmo conflitos localizados, mas todos eles equacionáveis diplomatica-mente em bases de mútua conveniência.

Os problemas são, portanto, “novos”, pois o recurso à guerra total já não é mais possível na era nuclear, com a crescente interpenetração dos “impérios” regionais. Isto não quer dizer que o direito internacional – e suas manifestações institucionais, como a ONU e outras agências intergovernamentais – venha a prevalecer sobre a von-tade dos Estados-nacionais e, sobretudo, acima desses impérios: a ameaça do uso da força deve permanecer como a ultima ratio da política internacional durante um bom tempo ainda, enquanto, pelo menos, a lógica westfaliana continuar a prevalecer (e isto pode durar mais um século e meio, aproximadamente). As soluções são, portanto, “velhas”, por isso mesmo: a lógica imperial e o uso da força continuarão conosco pelo

154 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

futuro previsível, e esta me parece a base da segurança e da estabilidade do mundo que conhecemos, que não corre nenhum risco de tornar-se “kantiano” antes de três ou quatro gerações, pelo menos. A soberania continuará com os Estados-nacionais pelo futuro previsível; menos na Europa, que está construindo sua própria soberania co-munitária (mas este será um processo longo, pois os europeus não parecem acreditar muito na força bruta, sendo, neste caso, suplantados pelos chineses e indianos, que com russos e americanos continuarão a dominar o panorama da segurança estratégica nas próximas décadas).

Quanto à ordem econômica, que me parece apresentar os mesmos “velhos” pro-blemas de sempre – desigualdades de acesso e de riqueza entre as nações, diferenciais de renda e de prosperidade, com convergências e divergências operando em ritmo muito lento para eliminar os ainda imensos bolsões de miséria abjeta –, algumas no-vas soluções parecem estar em curso; elas se situam justamente na interdependência crescente dos sistemas econômicos nacionais. Neste caso, o sistema “westfaliano” já saltou pelos ares e o nacionalismo econômico parece uma coisa tão antiquada quanto o machado de bronze e a roca de fiar. A internacionalização crescente das atividades produtivas e de circulação de bens tangíveis e intangíveis me parece constituir a base de uma sociedade global que existirá antes na prática do que no direito, este ainda dominado pelos nacionalismos de base política que são duros de morrer. Aprofundarei estes temas na seção pertinente.

Feita esta introdução de caráter geral, vejamos agora os problemas da agenda po-lítica mundial.

1.1. Segurança estratégicaNa equação estratégica contemporânea, a detenção de artefatos nucleares continua

a ser o elemento dominante, em ultima ratio, do jogo do poder. Existem, obviamente, outros vetores de poder, em especial o tecnológico e o econômico, este constituin-do, em última instância – segundo o modelo analítico marxista, que neste particular conserva plena validade –, o elemento crucial de afirmação de supremacia, de modo continuado. Não se compreende, aliás, o desenvolvimento e a posse de artefatos nu-cleares senão ao cabo de certo grau de avanço científico e tecnológico, que costuma estar ligado ao nível de desenvolvimento econômico do país.

Certamente que países economicamente poderosos estão em condições de assegu-rar um modo de vida satisfatório aos seus cidadãos, podendo influenciar decisivamen-te a agenda política e econômica mundial e contribuir, no mundo contemporâneo, para o desenvolvimento econômico e social de outros povos e países. Isso é plenamente verdade. Mas, se formos decidir, em determinados momentos, sobre a paz e a guerra, e definir quem, no momento decisivo, é capaz de impor sua vontade – ou de impedir que outros imponham a sua própria vontade –, então, a posse de armas nucleares torna-se o diferencial absoluto de poder, independentemente do poder econômico relativo de cada um dos contendores.

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

155

Como regular, então, as relações internacionais, ou melhor, as relações de poder, nesse contexto da “arma de última instância”? O mundo dispõe de um acordo que não é mundial, mas tão somente internacional, que regula parcialmente o problema, que é o TNP, o tratado de não-proliferação nuclear (Washington-Moscou-Londres, 1968). Esse tratado não é certamente universal e, sobretudo, não é multilateral, uma vez que apenas três países o negociaram e depois o “ofereceram” à comunidade internacional. Ele foi posteriormente “estendido” ao resto do mundo, na ausência – talvez na opo-sição – dos dois outros únicos países nucleares à época, que eram a França e a China (que a ele só aderiram no início dos anos 1990). Essa extensão se fez sob os olhos por vezes invejosos, outras vezes preocupados, de outros países, alguns deles interessados em desenvolver seus próprios artefatos nucleares, alguns outros temerosos de que a proliferação indevida dessas terríveis armas pudesse conduzir ao holocausto nuclear.

De fato, vários outros países tentaram – alguns continuam tentando – desenvolver a tecnologia nuclear, para fins de dissuasão ou para simples manifestação primária de poder. Entre esses países se encontravam, na América Latina, o Brasil e a Argentina, sob a escusa, pouco credível, de sua utilização para fins exclusivamente pacíficos, ou civis. Vez por outra, algum “estrategista”, aqui mesmo no Brasil, levanta a hipótese do desenvolvimento de um artefato nuclear, mesmo na presença do obstáculo constitu-cional, com a justificativa de que as condições externas poderiam exigi-lo para fins de “defesa”. Por certo, vários países estariam em condições de desenvolver rapidamente um artefato nuclear, se a decisão política assim o determinasse; entre eles poderiam figurar: Alemanha, Japão, Canadá, Suécia, Espanha, Itália e outros atores menores. Brasil, Argentina, Egito e alguns outros demorariam mais tempo, em função de lacu-nas tecnológicas ou de insuficiência do “combustível” nuclear.

A questão nuclear, no seu sentido amplo, estratégico, apresenta três aspectos que não estão necessariamente conectados entre si de modo estrutural, mas que foram conceitualmente reunidos pelo próprio instrumento que “regula” a questão no plano internacional: (a) a não-proliferação, que é obviamente o aspecto principal subjacente às intenções dos proponentes do TNP; (b) a cooperação nuclear para fins civis, ou pacíficos, que representa uma promessa e uma garantia das potências nuclearmente armadas em direção de todas as outras; (c) o desarmamento, que é uma hipótese fan-tasiosa inventada pelos proponentes do TNP para atrair – enganar seria o termo mais exato – os demais países a esse instrumento discriminatório e desigual. Em relação a esta terceira dimensão da questão nuclear, se poderia repetir o velho argumento tantas vezes utilizado em outras circunstâncias: em relação ao desarmamento, nós – ou seja, as potências nuclearmente armadas –, fingimos que vamos desarmar, um dia, e todos os demais fingem que acreditam nessa hipocrisia. De fato, parece difícil reverter a si-tuação ao status quo ante: uma vez que o “gênio” nuclear saiu da sua lâmpada militar, é praticamente impossível fazê-lo retornar à sua “inexistência” anterior.

Para todos os efeitos práticos, o que vale, para as potências do TNP é a garantia de não-proliferação, com alguma cooperação na dimensão da cooperação – sob o olhar vigilante da AIEA – e a total desconsideração da dimensão desarmamento. Para todos

156 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

os “nucleares”, portanto, essa questão apresenta dois aspectos: o da projeção da força e o da dissuasão. O primeiro aspecto, depois de Hiroshima e Nagasaki, não mais voltou ao cenário internacional (a despeito de alguns “ensaios”, como em Cuba, em 1962). A arma nuclear não mais voltou a ser usada como arma de terreno para abreviar o final de uma guerra, ainda que ela tenha sido cogitada em alguns cenários ou teatros possíveis de operação (como a sugestão do general MacArthur, em face da ofensiva chinesa durante a guerra da Coréia, e talvez algum outro general “maluco” por ocasião da guerra do Vietnã). Mesmo no caso de Cuba, quando os dois grandes contendores da fase pré-TNP parecem ter chegado “to the brink”, não estavam reunidas todas as condições para que o jogo de pôquer, naquelas circunstâncias, chegasse a uma “solu-ção final”, ao estilo do filme Dr. Strangelove.

A arma nuclear é usada, portanto, para fins essencialmente dissuasórios, e é como tal que Israel a concebe, em face de uma coalizão agressiva de Estados árabes que gostariam de varrê-lo do mapa. Existem, certamente, militares, que concebem alguma utilização tática da arma nuclear; mas os estadistas responsáveis e planejadores sen-satos dos países nuclearmente “capazes” – e não apenas daqueles nuclearmente arma-dos – assim imaginam sua equação nuclear nacional. De fato, repassando a lista dos nucleares, veremos que eles sempre tiveram em mente algum perigo estratégico, para o qual se buscou a solução de última instância.

Com a possível exceção da França – que estava exercendo uma opção de “orgulho nacional”, depois de tantas humilhações sofridas desde o século XIX – e, possivel-mente, da África do Sul – que se sentia acuada por todos os demais países africanos no momento do apartheid –, todos os demais países tinham algum contendor em mente no desenvolvimento do seu programa nuclear. A China se armou contra os EUA e contra a própria URSS; a Índia o fez contra a China, menos do que contra o Paquistão; o Paquistão contra a Índia, with a little help from China; Israel contra os países árabes, e eles eram muitos; a Coréia do Norte contra os EUA (e possivelmente o Irã, também, mais do que contra o Iraque). As aventuras nucleares de Saddam Hussein (ditador do Iraque até sua derrubada pelos EUA em março de 2003) e as do coronel Kadhafy, da Líbia (estas, finalizadas depois de duras sanções contra o país), entram nesta equação a título de bizarrice, embora o ditador do Iraque tivesse o “inimigo” iraniano no seu planejamento militar. De todos esses países, o único que desarmou voluntariamente foi a África do Sul; mas ela o fez no momento da transição para o regime de maioria negra, e esse elemento pode ter entrado no cálculo estratégico da liderança branca que assim decidiu no início dos anos 1990. Quanto à Coréia do Norte, a supor que ela desarme, efetivamente, tal fato pode ser atribuído à dupla pressão da China e dos EUA, nessa ordem.

Parece haver uma teoria das relações internacionais contemporâneas – mas não testada na prática – que afirma que os Estados que se tornam nuclearmente armados passam a se comportar de modo mais responsável e condizente com suas novas res-ponsabilidades no plano internacional. Este foi certamente o caso da China, de Israel, da Índia, embora haja desconfianças em relação ao que possam algum dia fazer o

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

157

Paquistão, a Coréia do Norte e, eventualmente, o Irã. Mesmo com relação à China, se questiona se seu papel foi responsável, uma vez que ela pode ter sido decisiva na capacitação nuclear do Paquistão, que por sua vez foi, em parte, negligente com o seu programa: um físico desse país está na origem de uma das mais importantes redes de disseminação de tecnologia e materiais nucleares, num contexto de “proliferação” por empreendimento individual, um pouco como faziam os piratas de antigamente, que também podiam servir de corsários para seus Estados respectivos. Alguns cenários podem ser preocupantes, nessa hipótese de uma proliferação não controlada pelos atores responsáveis, o que poderia ser o caso do Paquistão, da Coréia do Norte e do Irã, precisamente.

Mesmo quando um país nuclearmente “capaz” não parece ameaçar a paz mundial, cenários de conflito são sempre imprevisíveis, pois as fontes podem emergir não da situação objetiva de um país determinado, em seu contexto geopolítico próprio, mas como resultado da paixão dos homens, falíveis por definição. Imaginemos, por um instante, uma ocupação das Malvinas por tropas argentinas respaldadas por um arte-fato nuclear que teria sido previamente desenvolvido pela ditadura militar. A história poderia ter sido bastante diferente.

O TNP vem se “universalizando” nos últimos anos, em que pese sua notória falta de legitimidade intrínseca. Por outro lado, mais países estão se tornando nuclearmente capazes, quando não nuclearmente armados. A Índia já criou uma situação nova e vem sendo aceita como uma potência nuclear de fato, ainda que não o venha a ser de di-reito. O grande responsável por essa transformação foi, a rigor, a potência garantidora, por excelência, do TNP e aquela teoricamente mais engajada na não-proliferação: os EUA. A dissuasão e o cálculo estratégico estão aqui bem presentes. As boas relações entre Índia e EUA, nesse terreno, têm a ver com a China, embora equivocadamente considerada como a fonte possível de desafios estratégicos para os EUA. O acordo nuclear entre EUA e Índia vale estritamente para fins civis, e não tem o poder de qualificá-la para o clube formal das potências nucleares, o que de toda forma exigiria reforma do TNP, algo praticamente impossível de ocorrer nessas bases.

O TNP precisa, sim, de reformas, mas elas teriam de ser bem mais radicais do que poderiam admitir os cinco privilegiados da atualidade. Nem eles poderiam admitir o seu desarmamento, o que obviamente não ocorrerá, nem eles vão querer estimular em demasia o desenvolvimento nuclear – ainda que para fins eminentemente pacíficos – dos demais países. Assim, parecem existir poucas chances de progresso institucional na questão nuclear, com base nos instrumentos atualmente disponíveis, em primeiro lugar o TNP. Haverá, portanto, muita hipocrisia e muito more of the same nesta agenda.

Não se concebe, com efeito, as potências nuclearmente armadas favorecendo o ingresso de países “candidatos” no clube nuclear. Eles precisariam “forçar a porta” e garantir o seu ingresso, mas sempre serão passageiros incômodos, por não disporem do bilhete desde a partida. Em outros termos, não haverá nenhum levantamento de restrições à transferência de tecnologia. Mas os próprios países que aspiram ingressar no grande jogo estratégico terão de buscar sua equiparação progressiva – embora rudi-

158 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

mentar – com os cinco grandes, com base em sua própria capacitação. Esta dependerá em grande medida do aprendizado próprio – ou seja, ciência e indústria, com base em tecnologia endógena ou copiada –, da política dirigida ao comércio de materiais sensíveis, alguma cooperação bilateral e um pouco de espionagem.

Quanto ao problema da reforma da Carta das Nações Unidas e a ampliação do seu Conselho de Segurança, esse processo não tem a ver, diretamente, com a posse de al-gum artefato nuclear. O Japão – potencialmente capaz de desenvolver a arma, mas que prefere, por enquanto, viver castrado nessa dimensão – e a Índia são, teoricamente, os dois únicos países que estariam na lista dos EUA para ingresso no CSNU, mas não por algum cálculo de natureza estratégica que envolva a posse de armas nucleares. De toda forma, o alegado desejo dos países membros e dos candidatos em promover uma “democratização” das estruturas de poder internacional não passa de uma hipótese pouco credível para quem acompanha a realidade das relações internacionais. Os cin-co permanentes atuais não desejam a reforma e não pretendem diluir o seu poder com novos candidatos. O status quo lhes convém e assim será mantido até que novos dados da realidade alterem substancialmente a equação estratégica do cenário internacional contemporâneo. Uma coisa é certa: o “gênio” nuclear continuará fora da garrafa.

E o Brasil, como se situa ele, neste cenário de unilateralismo arrogante, de arranjos oligárquicos e de pressões sobre os países “desviantes”? Ele mesmo poderia ser in-cluído nessa categoria, ao persistir sua recusa do Protocolo adicional ao TNP, mesmo depois de aceitar relutantemente esse instrumento discriminatório em 1996. É certo que, na origem, isto é, nos anos 1950, o Brasil mantinha concepções otimistas – talvez ingênuas – sobre a utilização do poder nuclear, tanto sob a forma de energia, como em aplicações médicas e mesmo em obras de engenharia civil. Depois ele alimentou o sonho de aceder à tecnologia de processamento e de sua eventual utilização militar, ao empreender, entre outros programas, a cooperação nuclear com a Alemanha (que, junto com o Brasil, foi objeto de intensas pressões dos EUA). Sua capacitação interna foi prejudicada por insuficiência de recursos e de vontade política, independentemente do eventual sucesso tecnológico do acordo com a Alemanha, que não foi conduzida a termo. Foi, provavelmente, melhor assim, pois o espectro de uma corrida nuclear com a Argentina foi afastado e ambos os países terminaram não apenas acedendo ao TNP, como também desenvolveram um programa exemplar de cooperação em salvaguardas nucleares que pode servir de modelo para outras situações do gênero (talvez no sul da Ásia, com o impasse indo-paquistanês ainda pendente).

Continuam pendentes, portanto, o problema da recusa brasileira ao Protocolo adi-cional ao TNP – que parece ter a ver com uma hipotética “tecnologia original” utili-zada na fábrica de processamento de Resende – e a questão da postura em relação à “doutrina nuclear” de Bush, que envolve o controle das atividades civis, em todos os seus aspectos (comerciais, tecnológicos, produtivos). Tendo em vista o nacionalismo e o soberanismo brasileiros, não haverá progresso sensível no futuro imediato, mas essa questão não é crucial no plano da segurança estratégica para a ordem política mundial:

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

159

afinal de contas, o Brasil não é um elemento desestabilizador da ordem internacional e o mundo pode facilmente conviver com esse tipo de nacionalismo “nuclear”.

Existem outros vetores de segurança estratégica no cenário mundial e eles têm a ver com os esquemas regionais (ou geopolíticos) de defesa e de aliança militar: o único esquema que sobreviveu à Guerra Fria e que continuou a se expandir glorio-samente foi a OTAN, que teve um notável sucesso em suas novas roupagens “ca-maleônicas” de “pau para toda obra”, ao incorporar em seu programa temas como direitos humanos e defesa do meio ambiente (incrível, mas verdadeiro). A OTAN não é mais “atlântica”, mas mundial, pois que suas tropas estão no Afeganistão, como poderiam estar em outros cenários, sempre e quando o comando americano assim o decida. A Eurásia continua a ser, como nos tempos de Mackinder, o elemento-chave do equilíbrio estratégico mundial, mas os europeus continuam numa encruzilhada de vocações: eles não sabem se retomam suas antigas tradições imperiais – afogadas desde os antigos desvarios nazistas e ameaças do hoje inexistente inimigo soviético, parcialmente revivido no novo czarismo russo – ou se continuam atados ao guarda-chuva nuclear da OTAN (de fato americano). Sua proverbial incapacidade de engajar recursos consideráveis em tecnologia bélica promete continuar reduzindo-os a nada mais do que assistentes militares do império americano, o que muito os desgosta (mas eles não fazem muita coisa para mudar a situação).

No plano global, de toda forma, essas indecisões européias são irrelevantes para o equilíbrio estratégico internacional: a dissuasão continua a funcionar e o mundo é mais seguro do que jamais o foi no decorrer do século XX. No plano regional, os cenários de conflito potencial continuam situados em zonas periféricas e empobreci-das da Ásia, da África e do Oriente Médio, pois não se imagina que as regiões dinâ-micas e os países mais engajados na globalização (e, ipso facto, de alto crescimento econômico) venham a se deixar envolver em uma escalada de enfrentamentos que possam precipitar algum conflito de grandes proporções.

A América Latina continua a ser uma região isenta de grandes enfrentamentos e o TIAR (1947) continuará a exibir sua inoperância relativa (o que não representa um problema para o Brasil, talvez, antes, uma solução). Depois dos “anos clássicos” de alinhamento ideológico, mas fora do cenário de enfrentamentos, durante a Guerra Fria, o que menos interessa ao Brasil é ter a América Latina como o teatro de uma cor-rida armamentista (que poderia ser protagonizada por novos candidatos a caudilho). Os novos desafios se situam inteiramente na evolução democrática do continente e na sua integração física, base indispensável para o desenvolvimento da integração econômica. O único desafio “militar” na região parece ser o anacrônico problema da narcoguerrilha, que na verdade se confunde com o crime organizado e está, portanto, mais próximo de um problema policial do que da segurança estratégica no conceito tradicional do termo. A paz relativa na América do Sul, ou seja, a ausência de focos declarados de tensão inter- ou intra-estatais (a despeito mesmo da afirmação indige-nista em alguns países e, portanto, potencialmente um fator de fragmentação nacio-nal), deve contribuir para o baixo nível de dispêndio militar na região. Mas a recusa

160 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

das Forças Armadas em assumir o novo papel de “caçadores de traficantes” – que lhes pretendem atribuir os EUA – pode continuar a ajudar a preservar os focos de instabi-lidade localizada da narcoguerrilha, que ameaça extravasar para o sistema político e “invadir” as cidades (se já não o fez).

Um pouco de “futurologia” na questão estratégica global permitiria antecipar uma mudança, já em curso, nos cenários: dos velhos enfrentamentos entre Estados aos conflitos assimétricos típicos da contemporaneidade, ou seja, conflitos geralmente regionais, de baixa intensidade e localizados, tipicamente envolvendo lutas civis (ét-nicas, religiosas) e um ou outro enfrentamento territorial. O que pode já estar em curso, também, é o novo intervencionismo militar com base em pressões da opinião pública nos centros imperiais democráticos (pois não se imagina os “impérios” não democráticos atendendo a apelos de ONGs humanitárias): a questão que se coloca é a de saber se esse tipo de limitação ao “direito de massacrar o seu próprio povo” – tal como exercido por alguns “ditadores de opereta” (eles ainda existem) – representa o começo do fim da soberania estatal. A outra questão que se coloca, e que representa um problema para o Brasil, é a de saber se ele, ou pelo menos o seu establishment militar e diplomático, está preparado para esse tipo de missão. Provavelmente não, pois isso exigiria, mais do que a simples capacitação técnica – em armas e táticas de combate –, uma verdadeira revolução conceitual, difícil para um país que tem em Rui Barbosa o seu paradigma de comportamento soberanista.

1.2. Relações entre as grandes potênciasAs relações entre as grandes potências – ou, como querem alguns, as guerras entre

os impérios – sempre estiveram no centro da política mundial, por qualquer prisma que se examine a agenda internacional. No plano estrito dos equilíbrios estratégicos, esta é uma verdade quase absoluta, embora a natureza desse relacionamento – e suas possíveis conseqüências no plano militar – tenha evoluído ao longo do tempo. Os antigos sistemas imperiais estavam baseados: na conquista militar, na extração de recursos e a conseqüente escravização ou submissão de povos submetidos ao poder incontrastável de sistemas políticos unificados, dotados de meios militares relativa-mente mais avançados ou de técnicas de dominação mais condizentes com a vontade de poder de seus dirigentes.

Foi assim que “povos bárbaros” conquistaram sistemas imperiais aparentemente fortes e até mesmo seculares: esse destino alcançou o Egito, a Assíria, a Pérsia, o império criado por Alexandre, a China e Roma clássica. Por outro lado, a ineficiência econômica, o atraso tecnológico e erros políticos levaram à decadência os impérios ibéricos que dividiram o mundo entre os séculos XVI e XVIII; paralelamente, desapa-reciam de cena os impérios árabe, mogul e, em nossa época, o otomano, antecedendo a fragmentação da comunidade multinacional dos Habsburgos e o irresistível declínio dos britânicos, dentre uma longa lista de sucessões hegemônicas ao longo dos tempos (que inclui, por exemplo, os holandeses, embora estes não tenham decaído absoluta-

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

161

mente, mas, sim, souberam unir-se aos ingleses na preservação de uma prosperidade alimentada pelo comércio).

Os modernos sistemas “imperiais” baseiam-se bem menos na dominação direta ou na extração forçada de recursos – e, obviamente, não mais na escravização ou coloni-zação direta de populações mais “atrasadas” – e mais na organização da produção, no controle dos circuitos de distribuição e na “extração” de ganhos quase-monopolistas derivados dos fluxos de capitais financeiros, de tecnologia proprietária e de rendas diversas obtidas a partir, justamente, de sua posição dominante ou hegemônica. O re-cente debate sobre a natureza do “império” americano – que Niall Ferguson pretende ser um império de fato, mas envergonhado de sê-lo e, por isso mesmo, um pouco desastrado – obscurece um pouco a questão de saber se vivemos, inevitavelmente, sempre sob a égide de sistemas imperiais, ou se tudo se desenvolve num continuum que se caracteriza, simplesmente, pela sucessão de hegemonias políticas, alimentadas por fatores temporários – embora alguns possam durar séculos – de preeminência eco-nômica ou tecnológica. O livro de Ferguson sobre o “império” americano (Colossus) é mais um alinhamento de argumentos em favor de uma tese do que propriamente uma prova irrefutável da natureza imperial do sistema americano atual, dominante e hegemônico como ele pode ser.

Da mesma forma, a natureza precisa do “império soviético” – ele, sim, em grande medida derivado das ambições territoriais dos Romanoff ao longo dos séculos XVIII e XIX, depois alimentado por Stalin com base nas vitórias militares da segunda guerra mundial e na sua paranóia de uma nova invasão alemã, ou ocidental – carece, ainda, de uma definição e de estudos similares aos efetuados pelos historiadores e cientistas políticos ocidentais para os “impérios” ibéricos, da Europa central, otomano, britâ-nico e americano. Os velhos sistemas imperiais europeus não resistiram ao impacto de suas próprias idéias – liberdade, direitos humanos, autonomia nacional – bem como à criação do sistema político multilateral do pós-guerra: autodeterminação e a soberania estatal são dois princípios fundadores das Nações Unidas, tanto quanto a resolução pacífica dos conflitos, a defesa dos direitos humanos e a cooperação em prol do de-senvolvimento.

Por maior que seja, atualmente, o predomínio da força do direito sobre o direito da força, as grandes potências não renunciam, obviamente, à projeção de poder militar, cada vez que seus interesses maiores sejam ameaçados. O cenário contemporâneo mudou muito desde o declínio dos velhos impérios, a partir da primeira guerra mun-dial, com a emergência simultânea das duas grandes potências do pós-guerra. De 1945 até o final da Guerra Fria, o mundo viveu em bipolaridade estrita; mas de 1947 a 1972, a tensão situou-se em níveis elevados, começando pelo conflito em torno de Berlim, a guerra da Coréia (1950-53) e o problema de Cuba (1962), que levou a uma “quase-confrontação” nuclear entre as duas superpotências. Durante os anos 1950, após a conquista da paridade nuclear (1949) e termo-nuclear (1954) pela União Soviética, as relações estratégicas entre as duas potências inimigas foram enfeixadas sob a doutrina MAD, Mutually Assured Destruction, o que significa que, em caso de escalada, a

162 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

confrontação poderia levar à aniquilação total dos dois contendores. Nesse período, o alinhamento do Brasil aos EUA e ao “Ocidente” de modo geral, foi indefectível, mesmo se no final dessa fase (1961-64) o crescimento do movimento neutralista e não-alinhado tenha contribuído para criar no país propostas de uma diplomacia alter-nativa, materializada na chamada Política Externa Independente.

Desde a crise dos mísseis russos em Cuba (1962), mais concretamente a partir da presidência Nixon (1969-1974), ensaios de coexistência pacífica foram feitos, le-vando à distensão nuclear e à negociação de diferentes acordos de controle de ar-mas entre os EUA e a URSS, com o aprofundamento do processo nos anos 1980 e a conclusão de alguns tratados de redução de mísseis balísticos. O Brasil, ao longo do período, bateu-se pela chamada agenda dos três “d” que, nos anos 1960, equivaliam à descolonização, desarmamento e desenvolvimento, tendo sido o primeiro “d” subs-tituído, nos anos 1990, pelos direitos humanos. O Brasil esperava que, com o ocaso do socialismo e o surgimento de uma nova ordem mundial, nos anos 1990, da nova distensão criada entre as grandes potências emergiriam os chamados “dividendos da paz” para o desenvolvimento; mas não foi exatamente o que ocorreu. A ordem política mundial, depois do desaparecimento da URSS, passou a ser caracterizada pela assim designada “unipolaridade imperial”, com o domínio dos EUA sobre os problemas mundiais desde 1992 e durante a maior parte da década, enquanto a Rússia atravessa uma das maiores crises de sua história. A lacuna política criada nas relações entre as grandes potências persistiu até que novos desafiantes surgissem no jogo imperial, na figura da China.

Persiste, em todo caso, um equilíbrio instável entre os objetivos econômicos e os políticos da nova ordem; os primeiros orientados para a interdependência econômica, nos quadros da globalização; os segundos sempre marcados pela rivalidade implícita entre os interesses nacionais das grandes potências. Para o Brasil, os desafios agora colocados são os da sua adequação à nova ordem da globalização, que são todos de-rivados de reformas internas nos aspectos fiscais e no sistema educacional. No que se refere à construção de cenários externos para a atuação de uma potência média como o Brasil, não existem, propriamente, novos desafios para o país, senão aqueles deriva-dos de uma diplomacia presidencial especialmente ativa, feita de novas orientações e novos parceiros, todos eles situados na direção do Sul e da América do Sul. Não há, contudo, obstáculos estruturais à ascensão do Brasil na ordem econômica mundial, uma vez que o sistema globalizado se apresenta como essencialmente aberto a novos participantes, o que não é exatamente o caso da ordem política, cujos requisitos de in-gresso dependem de capacitação específica no plano estratégico e militar, o que ainda parece distante de ser atingido pelo Brasil.

1.3. Conflitos regionaisO que há de novo no atual cenário da ordem política internacional é que a antiga

confrontação global deixa de ser dominante, subsistindo focos de conflito poten-cial; bem mais em âmbito local ou regional do que em escala continental, ou entre

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

163

alianças militares (de resto, quase nenhuma conserva importância, sendo que a mais relevante, a OTAN, transcende agora seu antigo âmbito geográfico de atuação). A organização mais recente no plano da estabilidade e da segurança estratégica, a OSCE, derivada da antiga Conferência sobre segurança e cooperação na Europa, do tempo da Guerra Fria, tem hoje uma agenda de trabalho bem mais voltada para construção democrática do que para dissuasão de conflitos militares, embora o as-pecto de confidence building continue relevante, em vista do novo endurecimento político-militar registrado na Rússia. De fato, a Rússia pós-Ieltsin (ou seja, de Putin) vem dando sinais crescentes de retomada de suas antigas pretensões a “redistribui-dora de cartas” na Europa sul-oriental e na Ásia central, numa tendência à crescente afirmação de sua preeminência militar, que ela vê, em essência, como um projeto anti-hegemônico aos EUA.

Já no período anterior ao final do comunismo, os conflitos inter-estatais tam-bém eram predominantemente regionais, e não globais; mas mesmo esses conflitos regionais, agora mais freqüentes, perdem o vetor ideológico da época da Guerra Fria, para adquirir contornos de guerras civis ou de conflitos de natureza étnica. Na verdade, os principais focos de tensão continuam inter-estatais: Israel-países ára-bes, conflito indo-paquistanês em torno da Cachemira, as duas Coréias. Mas são os conflitos internos aos Estados que provocam atualmente o maior número de mortos, de deslocamento de populações e de violações de toda ordem aos direitos huma-nos: a África, obviamente, continua a oferecer vários exemplos do gênero, mas em regiões da Ásia Pacífico, na Ásia do sul e central são constantes, igualmente, as erupções de violência com grandes perdas humanas. Na América Latina, a despeito de uma ou outra questão de fronteiras ainda não resolvida – Guiana-Venezuela, Chile-Peru-Bolívia e outras menores –, a única situação militar que ainda cobra um preço em termos de vidas humanas é a anacrônica “guerra civil” da Colômbia, que já descambou, na verdade, para o crime organizado em torno das drogas e a indús-tria de seqüestros.

Para o Brasil a diminuição dos focos de tensão e o desaparecimento do ma-niqueísmo da Guerra Fria são pontos positivos e bem-vindos, na medida em que alinhamentos daquela época se tornam anacrônicos. Um ponto preocupante, para países ciosos de seus direitos soberanos sobre os recursos naturais com impacto global, como é o caso da Amazônia brasileira, é o desenvolvimento de um novo tipo de intervencionismo de feição humanitária, mas também ecoló-gica, que tem suscitado preocupações – e também alguma paranóia – em setores nacionalistas temerosos de que o princípio possa vir a ser algum dia aplicado no sentido da “internacionalização” dos recursos da biodiversidade amazônica. Não parece credível, contudo, que esse novo intervencionismo venha se esten-der para as vertentes política ou militar, com implicações para a soberania do Brasil, que de resto possui, como observado várias vezes, poucos “excedentes de poder”, isto é, capacidade de ação e meios militares compatíveis com suas dimensões e importância regional.

164 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

1.4. Cooperação política e militar nos hot-spots;Um dos temas mais debatidos, logo no início dos anos 1990, em torno da ordem

política internacional que teria emergido com o fim da Guerra Fria, foi o de saber se o colapso dos países socialistas representava algo como o “fim da História”. O “introdutor” do conceito foi um cientista social americano que durante certo tempo trabalhou para o Departamento de Estado, mas que já vinha observando os desenvol-vimentos políticos na União Soviética desde o início dos anos 1980, pelo menos. A esquerda marxista, ou o que restou dela, fez pesadas críticas a essa “tese”, de vaga ins-piração hegeliana, sem ter aparentemente registrado que o artigo original – publicado em meados de 1989 na revista The National Interest – comportava um significativo “?” em seu título, e que as menções à URSS não previam, em absoluto, seu desapare-cimento ou mesmo a derrocada completa do socialismo de tipo autoritário. As críticas foram, em sua maior parte, superficiais, e se contentaram em “desmentir” Fukuyama por meio do “contra-argumento” banal de que a história não poderia, obviamente, ter terminado, aduzindo esses críticos, então, inumeráveis “exemplos” sobre a “crise” do capitalismo e da própria globalização.

O fato é que Fukuyama, em nenhum momento, pretendia “decretar” o fim da História como tal. O que ele fez, apenas, foi consolidar seu entendimento conceitual de que, depois da adesão de Gorbatchev a valores democráticos universais e a prin-cípios da economia de mercado, e depois da conversão dos comunistas chineses em aprendizes de capitalistas, não havia mais sentido considerar que pudesse haver, no sentido teórico ou mesmo prático, alternativas credíveis às democracias liberais de mercado (haveria, em suas palavras, “total exhaustion of viable systematic alternati-ves to Western liberalism”). Seu argumento “filosófico” não foi, até agora, desmentido no plano da racionalidade instrumental. Isso não impede, obviamente, que continuem existir ditaduras, autocracias ou outras formas de regimes autoritários, assim como sistemas econômicos nacionais que se distanciam consideravelmente dos mecanismos de mercado. Isso tampouco elimina o fato de que os mercados mundiais funcionam, em grande medida, de modo relativamente uniforme (ou seja, segundo a velha lei da oferta e da procura, a despeito mesmo de alguns cartéis que se empenham em mani-pular os preços de algumas commodities).

A maior relevância da “tese” de Fukuyama, porém, seria, teoricamente, no plano dos conflitos globais, que segundo seu argumento tenderiam a perder sua roupagem ideológica, abrindo caminho a uma cooperação cada vez maior entre as grandes po-tências e os países responsáveis no plano da política mundial pela manutenção da paz, da segurança, isolando ditadores e outros “vilões” do status quo. Não foi obviamente o que ocorreu – nem mesmo depois da implosão da URSS – e os processos sob exame do Conselho de Segurança continuaram a ter uma tramitação tão complicada quanto antes, ainda que o “cálculo” quanto ao “enfraquecimento” do “império opositor” não mais se aplique no caso das duas grandes superpotências. Em outros termos, se acre-ditava que, com o “fim da história”, conflitos como os do Oriente Médio ou de outros

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

165

pontos quentes do planeta poderiam conhecer uma negociação “abreviada” ou, até mesmo, ter uma “solução” à vista em questão de meses, senão de semanas.

Na verdade, a tese sobre o fim da história não requer que todos os países se conver-tam em democracias liberais, com o que, supostamente, nenhum conflito mais seria possível entre eles; apenas que não exista mais, no plano das sociedades, pretensões à existência de formas de organização política e social superiores à democracia liberal. Mas como adverte o próprio Fukuyama, o nacionalismo e a religião são forças bem mais consistentes – e, portanto, difíceis de serem “diluídas” no cadinho comum das sociedades – do que o foram, em suas épocas, o fascismo e o comunismo, que atuaram bem mais na superfície das coisas, algo como a superestrutura das sociedades, em ter-mos marxistas. Por isso mesmo é tão difícil conseguir a eliminação dos conflitos entre sociedades ou a cooperação entre algumas delas para diminuir, ou mesmo suprimir, alguns dos conflitos mais deletérios em termos de violações dos direitos humanos e de perda de vidas.

Uma cooperação política e militar entre as principais potências nos hot-spots do mundo implicaria, antes mesmo de algum entendimento sobre a forma de resolver um conflito em especial, uma visão comum quanto aos seus interesses nacionais, o que não parece fácil conseguir no horizonte previsível. Não foi assim no decorrer do século XX, ainda que os sessenta anos depois da conclusão da Segunda Guerra Mundial não mais assistiram às terríveis mortandades de sua primeira metade (ver Niall Ferguson, The War of the World), quase tanto quanto o período de paz relativa que dominou o cenário europeu desde o fim das guerras napoleônicas até a Primeira Guerra Mundial. Algumas interpretações pretensamente marxistas sobre os dois conflitos mundiais do século XX colocam suas raízes em supostas “contradições interimperialistas” entre as principais potências européias, que teriam subido aos extremos pela disputa por mer-cados coloniais e o acesso a matérias-primas. Na verdade, os conflitos entre Estados, antes de se tornarem globais, são sempre regionais como demonstrado, justamente, pelos conflitos europeus do terrível século XX (ver Arno Mayer, The Persistence of the Old Régime).

Tampouco tem sido assim no pós-comunismo. Os conflitos continuam regionais, ou mesmo nacionais, e não há concordância entre as grandes potências para diminuir ou eliminar seu caráter destruidor. A convergência de “opiniões”, não sendo possível no plano regional, seria ao menos presumível no âmbito do sistema de segurança mundial, ou seja, nas competências e atribuições do órgão encarregado, por excelên-cia, da paz internacional? Tal possibilidade passa, eventualmente, pela reforma da Carta da ONU e uma hipotética ampliação de seu Conselho de Segurança, o que tem se revelado uma missão impossível.

A despeito de declarações favoráveis à reforma por parte dos atuais membros permanentes do CSNU, provavelmente hipócritas, o fato é que nenhum deles está verdadeiramente interessado na reforma e na ampliação do número desses membros permanentes. Em primeiro lugar, porque qualquer expansão do órgão significaria a di-luição do seu próprio poder; em segundo lugar porque as potências não se entendem,

166 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

justamente, sobre o equilíbrio regional da nova composição, tanto no plano de seus in-teresses nacionais, quanto no âmbito da representação política das próprias potências regionais. Várias delas têm enormes problemas com o ingresso de um ou outro dos candidatos regionais, sejam eles amigos ou “inimigos”, assim como os candidatos po-dem ter vizinhos recalcitrantes em relação à sua admissão. A China, por exemplo, não considera que o Japão tenha feito o seu dever de casa no que se refere ao reconheci-mento dos crimes de guerra (e contra a humanidade) cometidos desde as primeiras in-vasões da Manchúria e depois da própria China nos anos 1930. França e Grã-Bretanha têm resistências em ver admitido mais um europeu, no caso a Alemanha, uma vez que a pressão para uma representação da UE, em lugar desses países, individualmente, se tornaria irresistível. A Índia tem contra si o Paquistão, assim como o Brasil não conta com a boa-vontade – para dizer o mínimo – da Argentina para sua candidatura. Os africanos, por sua vez, não se entendem sobre quais seriam os possíveis dois candi-datos do continente, que para a União Africana deveriam ser três, todos dispondo do direito de veto. Nem os EUA, nem a Rússia, a despeito das tergiversações habituais, apreciariam, na verdade, qualquer ampliação do CSNU, embora os EUA afirmem apoiar o Japão e mais uma candidatura – possivelmente a Índia, ambos potencial-mente para diluir o poder da China – num processo de ampliação limitado.

Em outros termos, o imbróglio não parece perto de uma solução viável e aceitável para todos, e o mais provável é que simplesmente não ocorra nenhuma reforma da Carta – pelo menos para a ampliação do seu Conselho de Segurança – e que o impasse sobre o número exato de “mais iguais” permaneça não resolvido pelo futuro pre-visível. Isto não impede, obviamente, cooperação no CSNU – entre os permanentes e os rotativos – para o encaminhamento de diversas questões atinentes à paz e à esta-bilidade mundial. Grandes potências tendem ao conservadorismo, uma vez que elas assumem a liderança de alguns processos e não pretendem colocar em risco situações consolidadas em suas próprias regiões. Também parece haver entre elas a consciência – e nisso vai toda a diferença com os impérios do passado e com os candidatos a novos hegemons ainda no século XX – de que não existem ganhos garantidos no enfrenta-mento direto com as outras potências.

Mas a cooperação entre as grandes potências para a solução de conflitos regionais nem sempre é garantida, tampouco, tudo dependendo de como elas mesmas percebem seus interesses vitais no problema em questão: o oportunismo é de rigor e diversos fatores entram na equação complexa que traça cada uma para si mesma na conside-ração de uma questão específica vis-à-vis as estratégias que podem ser mobilizadas para defender os seus interesses. Alguns problemas regionais são percebidos como ameaça para todos, daí as possibilidades de cooperação entre eles; outros problemas os colocam em posições opostas, daí os impasses prováveis; outros problemas sequer os atingem, diretamente, daí a indiferença relativa com que esses problemas se arras-tam sem solução aparente durante longos anos, com o “desengajamento ativo” – se a expressão é aceitável – das grandes potências, salvo forte movimento de pressão da opinião pública para fazê-las mover-se.

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

167

Alguns exemplos, nessas diversas categorias, podem ilustrar as possibilidades de cooperação, ou não, entre as grandes potências no tratamento de conflitos regionais. A primeira guerra do Golfo, em janeiro de 1991, por exemplo, apresentou-se quase como uma “cruzada” de liberação do pequeno Kuwait, invadido pelo vilão Saddam Hussein em agosto do ano anterior. Foi possível ter o acordo de todas as potências do CSNU para a aprovação de uma resolução que demandava a retirada sem condições do Iraque do país invadido, sob pena dessa retirada ter de ser efetuada por todos os meios adequados, isto é, pela força, se necessário. Curioso que a coalizão de “willing nations” que participou da operação não o fez sob comando de uma força onusiana de “imposição de paz”, mas sim sob o comando exclusivo das forças militares dos EUA, que estabeleceram sua própria estratégia e linhas de atuação para essa “expulsão” do vilão do território de um membro da ONU. Na verdade, esse é o padrão das forças de “imposição” de paz – em oposição às operações de peace keeping, apenas, na quais o comando onusiano é possível – que ficam sob o controle da potência interessada, que obviamente não abdica do comando militar (a guerra da Coréia é o exemplo típico dessa situação, que confirma a quase impossibilidade de a ONU vir a dispor de forças armadas próprias).

Já o quadro de massacres interétnicos ocorridos em Ruanda pouco tempo depois, com milhares de mortos antes de qualquer intervenção humanitária, bem como as guerras civis e a situação deplorável dos direitos humanos em diversos países afri-canos, arrasados em conflitos que se arrastam durante meses e anos, ilustra perfeita-mente a “negligência irresponsável” – se o termo também se aplica – da comunidade internacional no caso de problemas que não afetam nenhum dos interesses vitais das grandes potências. A ação multilateral para pacificar o país dos tutsis e hutus demorou enormemente, assim como outras guerras civis se prolongam na quase indiferença de grandes e médias potências. A ONU não pode ser considerada responsável por essas lamentáveis situações, pois não dispõe de autonomia sequer para decidir qualquer tipo de intervenção e, ainda que dispusesse, não teria condições efetivas – ou seja, tropas próprias – para fazê-lo.

A mesma impotência involuntária da ONU revelou-se nos diversos conflitos dos Bálcãs, ao longo dos anos 1990, desde as primeiras separações traumáticas – Eslovênia e Croácia – até o caso ainda não resolvido do Kossovo, passando, obviamente, pela terrível fragmentação da Bósnia-Herzegovina, onde foram perpetrados os piores mas-sacres vistos na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, geralmente da população islâmica pelos sérvios. A ONU e os próprios europeus da UE se revelaram incapazes de pacificar os contendores ou de evitar as piores violações humanitárias, que ocorre-ram no caso da capital da Bósnia, Sarajevo, e de alguns outros enclaves de composi-ção mista, nos quais os sérvios passaram à ofensiva. Nos Bálcãs, a Europa se revelou uma anã militar; não fosse pelo forte clamor da opinião pública, não teria havido envolvimento da OTAN, sob a forte liderança militar americana, para terminar com a terrível situação da população civil. A mesma situação se colocou no Kossovo, em-bora por razões e circunstâncias diferentes. Mais uma vez as exações sérvias perma-

168 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

neceram impunes pelos europeus e pela ONU até que o poderio aéreo americano, sob a bandeira da OTAN, conseguiu pacificar a província rebelde, criando uma situação de autonomia de fato em relação à República iugoslava da Sérvia e do Montenegro. Esta última república, por fim, também se declarou autônoma, em janeiro de 2006, confirmando a vocação histórica daquela região e fechando um ciclo que trouxe os Bálcãs de volta ao sentido original de província fragmentada entre impérios.

A segunda guerra do Golfo, envolvendo novamente o Iraque, trouxe um ele-mento novo no que se refere ao papel da ONU. Chamado a endossar uma decisão que já estava tomada pela cúpula conservadora americana – o presidente Bush e seus neocons –, o CSNU, depois de longos debates de procedimento e de substância, recusou-se a se curvar às exigências dos EUA no sentido de obter uma autorização para o uso da força contra o regime de Saddam Hussein, sob o pretexto – que depois se revelou falso – de que ele estaria desenvolvendo armas de destruição em massa, que poderiam, segundo alegou a administração americana, ser colocadas à disposi-ção de grupos terroristas. A invasão do Iraque, já decidida desde o dia seguinte aos ataques terroristas contra alvos nos EUA, em 11 de setembro de 2001, deu-se de qualquer forma em março de 2003, e o governo e o exército iraquianos foram efeti-vamente aniquilados em questão de dias pelo ataque maciço do maior poder militar existente no mundo contemporâneo.

Pode-se considerar o episódio como um “fracasso” da ONU no sentido de evitar ou prevenir o uso da força fora das situações previstas no direito internacional, ou seja, a própria Carta da ONU e as decisões do CSNU (que são, obviamente, emi-nentemente políticas e não necessariamente a expressão do direito internacional, pelo menos não no sentido estrito da palavra). De fato, a ONU não tem esse poder de evitar o recurso à força por parte de Estados que se colocam à margem do direito internacional, pelo menos não num caso como este, envolvendo uma grande potên-cia. Mas, pode-se também interpretar o evento como uma confirmação da vontade da comunidade internacional no sentido de não se dobrar à vontade dos poderosos em quaisquer circunstâncias. Pouco mais adiante, incapaz de administrar a situação caótica que ele mesmo criou no país ao desmantelar todas as estruturas de Estado existentes no Iraque, o governo americano foi obrigado a novamente fazer apelo à ONU, para tentar criar uma aparência de normalidade no país, sem que a pacifi-cação tenha tido êxito e sem que os grupos terroristas fossem intimidados em sua vertigem assassina (ao contrário). A lição a ser tirada de todo esse doloroso processo é, ao mesmo tempo, de uma constatação de relativa impotência da ONU e de seus órgãos nas tarefas de prevenção de conflitos e de manutenção da paz e da segurança, conjugada, no plano conceitual pelo menos, ao reconhecimento de sua legitimidade para a tomada de decisões em todas as questões que envolvem o uso da força nas relações internacionais.

Quanto ao Brasil, quais seriam as implicações desses episódios no que se refere aos seus interesses nacionais, bem como à expressão desses interesses no plano regional e no contexto internacional? Candidato a ingressar no CSNU desde a for-

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

169

matação original da estrutura das Nações Unidas, sem ter logrado tal ambição à época da discussão da Carta, em 1945 (de forma algo similar à candidatura frustrada ao Conselho da Liga das Nações, em 1926), o Brasil sempre teve uma participação ativa nas deliberações do Conselho, tendo sido um dos países que mais vezes figu-rou naquele órgão na condição de membro temporário, não se eximindo, em várias oportunidades, de participar, com forças de interposição ou com observadores mi-litares, de operações de manutenção da paz. Nunca houve, por razões de ordem política e constitucional, decisão em favor da participação do Brasil em operações de imposição da paz (peace making). Mas não está excluída tal evolução conceitual se a opinião interna no país se manifesta claramente em favor da assunção de um maior protagonismo mundial para o Brasil.

A candidatura ao CSNU ganhou novo alento depois da redemocratização do país em 1985, mais concretamente quando o presidente Sarney, em pronunciamento feito na Assembléia Geral em 1989, postulou essa pretensão, então apresentada como o desejo de o país assumir maiores responsabilidades com a cooperação e a manuten-ção da paz no âmbito internacional, sem que tal postulação significasse a exigência de concessão do direito de veto no CSNU. O Brasil se apresentava, então, como uma espécie de candidato “natural” a essa elevação de status no plano mundial, em função de seu papel positivo no contexto regional e internacional, como aderente estrito às regras do direito internacional e seu respeito às normas da convivência pacífica, do respeito à soberania e aos princípios da não interferência nos assuntos internos e da solução pacífica de controvérsias políticas entre os Estados. Tendo em vista objeções previsíveis, já manifestadas no passado, entre alguns vizinhos, a essa pretensão, o Brasil não colocava sua candidatura como uma expressão da vontade “regional”, mas seria inevitável que a questão da representação em nível regional fosse colocada durante os debates em torno da reforma da Carta. Mesmo tendo feito intensa campanha em favor de sua candidatura, na nova administração surgida em 2003, o Brasil não viu ainda contemplada sua aspiração. Quando ela o seria? Difícil dizer, em vista do quadro complicado não apenas em torno das representações re-gionais, mas igualmente em função de visões divergentes entre os cinco membros permanentes – talvez, convergentes, todos eles, em uma única consideração: a do desinteresse completo pela ampliação do CSNU a novos membros permanentes –, o que torna essa questão uma das incógnitas mais evidentes de toda a agenda inter-nacional da atualidade.

Concluindo esta seção sobre a ordem política mundial, a questão que se coloca é a de saber se poderia ser confirmado o diagnóstico feito ao início, de que se trata de novos problemas e de velhas soluções. Provavelmente sim, no sentido em que o mundo já não parece mais enfrentar o terrível espectro de um holocausto militar global, que seria desta vez “definitivo”, a partir dos novos instrumentos de morte e de destruição maciços trazidos pelos artefatos nucleares e termonucleares, “refu-giando-se” agora em conflitos de mais baixa intensidade, mas continua a ser regido pelo direito dos mais fortes e pela imposição da vontade das grandes potências sobre

170 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

a maioria, numa reprodução das velhas vocações imperiais do passado. A situação atual não é, obviamente, similar à sucessão de impérios e de hegemonias como no passado, uma vez que o mundo caminhou para a gradual afirmação da força do di-reito sobre o direito da força e, mesmo que a ONU não seja, ainda, o “Parlamento da Humanidade” – como pretenderia Paul Kennedy –, ela, sem dúvida, está mais próxima de atingir o objetivo de aumentar o grau de cooperação voluntária entre os Estados membros da comunidade internacional do que jamais esteve, em qualquer época, a Liga das Nações ou esquemas similares de equilíbrio de poderes. A paz e a concórdia universal ainda não estão plenamente asseguradas, mas a guerra e o uso ilegítimo da força tendem a se tornar cada vez mais raros no cenário contem-porâneo. Esta é, talvez, mais a manifestação de uma aspiração do que a expressão concreta da situação real nas relações internacionais contemporâneas; mas há fortes razões para acreditar que as bases para tal desejo estejam efetivamente se consoli-dando no cenário mundial.

Seria esta uma situação “definitiva” ou incontornável? Difícil dizer, uma vez que nos assuntos humanos o imponderável sempre está presente. Mas existem fortes chances de que, pelo menos entre os dirigentes atuais (e supostamente entre os futu-ros, também) das grandes potências, a racionalidade instrumental tenda a se impor sobre os velhos impulsos guerreiros que levaram seus antecessores a se enfrentar nos campos de batalha. Finalmente, das cinco grandes potências que existiam um século atrás – Reino Unido, França, Alemanha imperial, Rússia e Áustria-Hungria –, duas já deixaram de existir em seu formato original (Alemanha imperial, liderada pela Prússia, e a Áustria-Hungria); uma (Rússia) ascendeu, decaiu e viu seu impé-rio ser reduzido consideravelmente, e as duas primeiras (Reino Unido e França) deixaram, efetivamente, de contar entre as mais fortes do globo, amputadas que foram de seus vastos domínios coloniais e de sua vocação imperial, para assumirem papéis mais modestos no atual cenário estratégico. As duas potências então “peri-féricas” – Rússia e EUA – ascenderam no domínio global durante cerca de duas gerações a partir do final da Segunda Guerra Mundial, ao cabo da qual elas, de certo modo, “partilharam” o mundo (tendo Ialta representado uma espécie de tratado de Tordesilhas da modernidade).

O fato dominante em nossa época é que os EUA “reinam” quase “incontes-táveis” no cenário estratégico contemporâneo, mas a China vem emergindo paula-tinamente em seu encalce. Pretende ela forçar a porta do clube dos “mais iguais”? De certa forma, ela já faz parte desse conselho de poderosos, mesmo ainda man-tida formalmente à margem do G-8. Duvidoso que a China, mesmo militarmente mais forte, se lance em uma corrida para a “conquista” de poder político e de hegemonia estratégica sobre seus competidores atuais, como o fizeram dirigentes imperiais de um passado não muito distante. A razão não está tanto em que a na-tureza humana mudou sensivelmente nas últimas décadas (ou séculos), mas em que a nova ordem econômica, caracterizada pela interdependência efetiva entre

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

171

as nações, impõe limites às vocações imperiais. É o que caberia examinar a partir de agora.

2) A ordem econômica mundial: velhos problemas, novas soluções?

Em que sentido, a ordem econômica é caracterizada por velhos problemas e novas soluções? Os velhos problemas são, indiscutivelmente: os da miséria e da prosperi-dade; o da manutenção do crescimento econômico com estabilidade (isto é, sem infla-ção e com o máximo de pleno emprego possível); o da repartição social das riquezas assim criadas; o do acesso às matérias-primas e aos recursos essenciais aos processos produtivos, entre os quais as fontes de energia e de água são estratégicos; os da aber-tura de mercados aos bens e serviços em condições de livre concorrência; enfim, o da manutenção da dinâmica econômica com transparência nas regras do jogo, de maneira a oferecer oportunidades mais ou menos iguais para todos os agentes econômicos.

Sobre esses “velhos” problemas, que já ocupavam os “pais” da economia política antes mesmo da formulação dessa disciplina, nos quadros do Iluminismo escocês, alguns novos problemas vieram se agregar às preocupações dos estadistas contempo-râneos: o da transformação estrutural dos sistemas produtivos (inovação tecnológica) com garantia de preservação da riqueza proprietária; o acesso a fontes de informação em condições igualitárias; os efeitos ambientais nefastos das atividades produtivas humanas; a escassez crescente de fontes de energia não renovável e da própria água; a pressão humana sobre os recursos da biodiversidade e os desequilíbrios constante-mente criados pela dinâmica econômica em condições de assimetria de informação (fluxos de capitais não controlados, crises de oferta ou de demanda de determinados insumos), para não se referir ao crescimento do crime transnacional estimulado pela própria globalização capitalista.

E quais seriam as “novas” soluções que são mencionadas no título da seção? São de duas ordens: uma geográfica, a outra institucional. A primeira é mais geopolítica, do que propriamente geográfica, mas vale aqui o contraste com a história. Não é ver-dade, obviamente, que a história tenha terminado; tal compreensão restrita do proces-so histórico jamais passou pela mente do formulador original desta “tese”, Fukuyama. O que ele considerou, como já se mencionou, seria a inexistência prática de alterna-tivas viáveis aos sistemas democráticos de mercado, o que nos parece ser uma “tese” basicamente correta, nas condições atuais da economia e da política internacional. Ocorre que, se o processo histórico continua a sua dinâmica de poderes ascensionais e outros em declínio, com conflitos residuais ou remanescentes entre muitos deles, a geografia, por seu lado, parece ter alcançado seus limites propriamente “geográficos”. Vejamos isto com maior grau de detalhe.

No início do século XX, as cartas da África e de certas partes da Ásia (para nada dizer do imenso espaço amazônico) mostravam imensos espaços em branco, as cha-madas terras incógnitas (rios, seus afluentes e mesmo cadeias inteiras de montanhas). Tudo isso foi sendo incorporado aos domínios imperiais e objeto de cartografias mais

172 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

ou menos confiáveis, com a ajuda de aventureiros, exploradores, missionários e sol-dados. Mapeada a superfície da Terra, o mundo permaneceu, entretanto, dividido e fragmentado, tanto pela existência de projetos “imperiais” rivais – como podem clas-sificados o mundo capitalista e seu contestador socialista – como pela própria irrele-vância de certas áreas para fins de “exploração” capitalista, ou para sua “conquista” pelo sistema socialista. Aliás, o próprio socialismo era “irrelevante” – salvo em pou-cas matérias primas – em termos de mercados de bens, serviços, capitais, tecnologia, enfim, em produtos inovadores e desejados pelos consumidores. Como diria Marx, as relações socialistas de produção tinham se tornado anacrônicas e prejudiciais ao desenvolvimento das forças produtivas; tinham de ser abolidas, pois representavam grilhões para o desenvolvimento econômico. Foram abolidas e, com isso, a globali-zação retomou a marcha triunfal que tinha começado com Marco Pólo e Colombo, vários séculos antes.

O que assistimos, portanto, na década final do século XX, foi um verdadeiro “fim da geografia”, com o desaparecimento do socialismo – para todos os efeitos práticos, a China não mais pode ser contada com um representante da espécie – e a unifica-ção do mundo conhecido em torno de regimes mais ou menos abertos ao sistema de mercados capitalistas: com exceção daqueles poucos países auto-excluídos das trocas mundiais – como podem ser Cuba, Coréia do Norte e alguns poucos territórios africanos –, já não mais existem “terras incógnitas” para fins dos mercados capitalis-tas. Trata-se, portanto, de uma “solução geográfica” (ou geopolítica) ao problema do acesso desimpedido às fontes de matérias primas e recursos naturais: com exceção de alguns poucos setores ainda oligopolizados ou cartelizados – como é o da produção de petróleo, por exemplo – a maior parte das commodities (inclusive algumas industriais, como são os circuitos integrados) tem os seus preços fixados nos mercados de futuros, pelo livre jogo das leis da oferta e da procura. Um problema, portanto, que conduziu alguns impérios do passado às guerras de conquista e a conflitos por garantia de aces-so a insumos e mercados, já está praticamente resolvido com a unificação capitalista do mundo (ainda incompleta, por certo, mas cada vez mais “global”).

A nova solução “institucional” aos velhos problemas da ordem econômica está, justamente, na existência de organismos intergovernamentais que regulam a coope-ração entre Estados de uma forma como nunca foi possível em épocas anteriores à unificação capitalista do mundo. Não pretendo aprofundar-me na exposição sobre a emergência e o desenvolvimento do multilateralismo econômico, já tratado em al-guns dos meus livros (ver Paulo Roberto de Almeida, O Brasil e o multilateralismo econômico). Bastaria dizer que esse movimento também foi irregular e submetido às injunções políticas do cenário mundial nos últimos 150 anos. Surgidas desde meados do século XIX, para responder aos desafios da ampliação dos mercados (patentes ou padronização de produtos) e da conexão transfronteiriça de meios de transportes e de comunicações (ferrovias e fios telegráficos), as “uniões” ou “associações internacio-nais” logo se desenvolveram a partir dos núcleos originais europeus, para alcançar virtualmente todo o “mundo civilizado” (e regiões então inóspitas também). A coope-

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

173

ração intergovernamental – algumas vezes puramente privada – implicava, de certo modo, a uniformização dos meios de pagamento (como o franco-ouro, por exemplo) ou o estabelecimento de um padrão comum para as compensações internacionais (daí a aceitação rápida do padrão-ouro no final do século XIX).

Após uma breve interrupção por ocasião da Primeira Guerra Mundial e sua reto-mada pela Liga das Nações, no entre-guerras, o movimento “cooperativo” mundial ganhou impulso com a ONU e a criação de suas muitas agências especializadas no pós-Segunda Guerra. Especial preeminência para o tema que agora nos ocupa tive-ram as chamadas instituições de Bretton Woods – o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial –, que deveriam ter sido complementadas, logo em seguida, por uma entidade especialmente dedicada ao intercâmbio comercial, a Organização Internacional do Comércio, efetivamente criada na conferência de Havana de 1947-48, mas que não logrou entrar em vigor por falta de ratificações dos Estados membros. O GATT, acordo geral sobre tarifas, cumprindo algumas das funções concebidas para a OIC, permaneceu provisoriamente em vigor durante 50 anos, até finalmente ser in-corporado à OMC, criada ao final da Rodada Uruguai (1986-1993) do GATT.

Este é, portanto, o quadro jurídico através do qual se desenvolvem as relações econômicas internacionais, objeto da digressão que segue abaixo. É importante re-gistrar, desde logo, que nem todos os países membros da ONU foram membros ou afiliados às suas muitas agências reguladoras, sobretudo as de caráter econômico e financeiro, uma vez que a maior parte dos países socialistas – estes, durante algumas décadas, estavam representados por dezenas de países, cobrindo boa parte da super-fície geográfica do globo e quase 2/3 da população mundial – se manteve a margem dos mercados capitalistas de bens, serviços e capitais, que por sua vez representavam o grosso dos intercâmbios mundiais. Com o fim do socialismo, e dos exageros nacio-nalistas em outros países protecionistas (geralmente em desenvolvimento), o quadro de membros de órgãos como o FMI tende por vezes a superar o próprio número de países membros da ONU.

2.1. Regulação cooperativa das relações econômicas internacionaisO “mundo” de Bretton Woods – isto é, o do gerenciamento das taxas de câmbio

pelo FMI e da adoção de um padrão de câmbio ouro-dólar, fixado como obrigação do governo dos EUA em 1944 – funcionou, se tanto, durante cerca de dez anos, em sua forma clássica, isto é, depois da conversibilidade das moedas européias, no final dos anos 1950 até o final dos anos 1960, quando a inflação americana, o déficit comercial dos EUA e o excesso de dólares circulando nos mercados internacionais foram responsáveis, conjuntamente, pela decisão do governo daquele país de sus-pender unilateralmente esse regime. Entre 1971 – quando o governo Nixon anuncia que não mais converteria dólares em ouro, como estipulado na convenção original – e 1973, quando o FMI finalmente emenda seu instrumento constitutivo para dele não mais constar a supervisão sobre a taxa de câmbio das moedas nacionais, o mundo de Bretton Woods viveu o que poderia ser chamado de end of illusions, isto

174 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

é, a crença – economicamente irracional – de que as economias poderiam conviver indefinidamente com taxas cambiais mais ou menos estáveis e a promessa de um padrão fixo para o ouro.

A conseqüência, simplesmente, foi a flutuação generalizada das moedas, a queda imediata do valor do dólar nos mercados internacionais – e, portanto, do valor de to-das as commodities cotadas nessa moeda, entre elas o petróleo – e o recrudescimento da inflação (combinada ao crescimento do desemprego, que gerou a keynesianamente impossível stagflation). O aumento brutal dos preços do petróleo em 1973 e o choque de oferta que seguiu imediatamente após, foram os impactos mais visíveis do “fim” de Bretton Woods. A repercussão mais importante, porém, foi o estabelecimento de um novo regime cambial, no quadro de um “não-sistema” financeiro internacional, cujos resultados, no médio e longo prazo, seriam a suspensão dos controles sobre os movimentos de capitais e o aumento da volatilidade financeira nos mercados interna-cionais. Datam dessa época as propostas de uma taxa sobre os movimentos de capitais puramente especulativos, algo inaplicável, na prática, pois suporia uma coordenação de políticas macroeconômicas e uma convergência de interesses fundamentais das economias nacionais que nem mesmo o G-7, depois de trinta anos de experiências, é capaz atualmente de assegurar.

Essa “regulação cooperativa” das relações econômicas internacionais é, portan-to, sempre tentativa e sujeita às “chuvas e trovoadas” do sistema financeiro interna-cional. No plano do comércio internacional, a forte expansão dos intercâmbios nos primeiros trinta anos do pós-guerra não impediu o recrudescimento de sentimentos protecionistas nos países desenvolvidos, à medida que mais e mais países em desen-volvimento ascendiam na escala do desenvolvimento industrial, passando a oferecer produtos manufaturados a preços competitivos nos mercados desenvolvidos. Esse neoprotecionismo gerou, como era previsível, novos desafios ao sistema multilate-ral de comércio, até então regido exclusivamente pelo GATT e por arranjos ad hoc que tendiam a segmentar e a proteger determinados mercados segundo critérios claramente mercantilistas (têxteis e confecções, produtos siderúrgicos, mercados agrícolas em geral).

Depois de várias rodadas de negociações comerciais preferencialmente voltadas para tarifas e acesso a mercados, o regime multilateral de comércio embarcou no mais ambicioso ciclo de negociações, a Rodada Uruguai (1986-1993), da qual resultou a então criada OMC, no quadro de um sistema mais previsível e também mais amplo do que o GATT, inclusive por incluir arranjos específicos para serviços (GATS), para propriedade intelectual (TRIPs), para investimentos (TRIMs) e um acordo sobre agri-cultura, basicamente insatisfatório do ponto de vista dos países em desenvolvimento e dos países exportadores agrícolas não subvencionistas (como Brasil, Argentina e vários outros). Por outro lado, a dificuldade de se lograr acordos multilaterais abran-gentes, com o elevado número de participantes do sistema de comércio – que passou de duas dezenas, em 1947, a mais de 150, atualmente, sendo o mais recente a Ucrânia, depois de 14 anos de negociações –, levou vários membros a traçar estratégias “mini-

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

175

lateralistas”, que contornam as regras multilaterais existentes e redundam no elevado número de exceções ao princípio básico da “nação-mais-favorecida”, sob a forma dos acordos regionais. Os perdedores são todos os excluídos desses instrumentos de libe-ralização do comércio em escala restrita, em geral países em desenvolvimento com volume reduzido de comércio. Da mesma forma, não há dúvida sobre a questão de saber quem perde mais, com os impasses da atual rodada Doha da OMC.

Do ponto de vista do Brasil, pode-se dizer que ele é um “usuário” modesto das or-ganizações econômicas internacionais, sobre as quais seu poder normativo é pequeno, muito embora se tenha beneficiado, de modo satisfatório, com as regras relativamente abertas que presidiram – de certa forma ainda presidem – às relações econômicas in-ternacionais no último meio século. A participação do Brasil nas trocas internacionais sempre foi modesta, tendo ele se beneficiado como free-rider de alguns dos meca-nismos existentes, tanto no plano do comércio – acesso aos mercados desenvolvi-dos, sem necessariamente conceder abertura equivalente – como no financeiro, tendo absorvido a poupança externa, mas mantido estrito controle de capitais, para fins de equilíbrio do balanço de pagamentos. A abertura econômica e a liberalização comer-cial conduzidas nos anos 1990 – parcialmente revertidas desde então – fizeram mais pela modernização de seu sistema produtivo do que décadas anteriores de projetos desenvolvimentistas; mas o país ainda hesita entre as estratégias regionais e multila-terais de inserção econômica internacional, pois cada uma tem custos diferenciados e oportunidades específicas, em função das políticas que as acompanham. O Brasil é ofensivo em agricultura e defensivo em bens e serviços, como corresponde às suas vantagens comparativas aparentes; mas hesita ainda quanto à abertura de seu sistema produtivo nacional, pois mantém a idéia de que, na era da globalização, deveria conti-nuar a lutar por “políticas de desenvolvimento nacional”, segundo os cânones de um passado julgado positivo no plano industrial.

No período recente, o Brasil aumentou seu grau de envolvimento na regulação cooperativa das relações econômicas internacionais, assumindo um maior poder sobre os mecanismos decisórios, mesmo se a sua participação nos fluxos de comércio conti-nua modesta (com maior interface de absorção no que se refere aos investimentos diretos estrangeiros, em função da dimensão do seu mercado interno e do esquema de integração no Mercosul). Essa responsabilidade acrescida – através do G-20, nas ne-gociações comerciais da OMC, por exemplo – ou a pretensão de vir a ser o centro fo-cal de um espaço econômico integrado na América do Sul, significam novos desafios para sua elite diplomática, na medida em que a noção restrita de interesse nacional – isto é, projetos puramente nacionais de desenvolvimento – tem de ser compatibilizada com essas novas missões assumidas no plano regional ou mundial (o que significa maior dispêndio externo ou maior abertura de sua economia).

2.2. Assimetrias de desenvolvimentoA ordem econômica internacional é certamente caracterizada pelas chamadas as-

simetrias de desenvolvimento entre os países que a compõem, processo resultante

176 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

da “grande divergência” ocorrida nos últimos dois ou três séculos entre economias de alta e de baixa produtividade. Atualmente, quando as teorias da “exploração” ou as teses sobre o “intercâmbio desigual” já estão completamente desacreditadas – por sua inconsistência teórica ou total contradição com a própria realidade histórica –, o que se requer é que os países em desenvolvimento se insiram nessa nova ordem econômica internacional do capitalismo globalizado sem qualquer camisa de força ideológica, como as do passado, que os faziam tratar as multinacionais como ameaça à soberania estatal, impondo-lhes, em conseqüência, controles e restrições que não mais se justificam nestes tempos de “fim da história” e de globalização como oportu-nidade, não como risco.

Não obstante os notáveis progressos registrados nas últimas duas décadas, em termos de avanços na interdependência econômica mundial, não seria supérfluo re-cordar que continua inexistente qualquer regulação multilateral dos investimentos estrangeiros, o que constitui, sem dúvida, uma das mais notórias falhas do sistema econômico multilateral. Os países recorrem aos famosos acordos bilaterais de pro-teção e de promoção dos investimentos estrangeiros (APPIs) ou dispõem, entre eles, de regras de adesão voluntária que liberalizam amplamente esses fluxos, de acordo com a cláusula do tratamento nacional (como nos códigos existentes na OCDE). O Brasil, que sempre disse sim aos capitais estrangeiros – mas não aos capitalistas, propriamente –, assinou mais de uma dúzia desses instrumentos bilaterais, mas não colocou nenhum em vigor, por temor de que eles diminuíssem sua capacidade de regular políticas públicas num sentido “desenvolvimentista”, sempre privilegiado. Assim, a despeito das novas configurações da economia mundial, com o surgimento de emergentes dinâmicos – como os BRICs, entre os quais o próprio Brasil é co-locado – a diplomacia econômica do país continua a ostentar pouca disposição em prol de maior liberalização no âmbito da OMC, sobretudo naqueles setores nos quais supõe ser sua baixa capacidade competidora (serviços, ramos industriais de ponta, investimentos e propriedade intelectual).

A razão das hesitações do Brasil (e de outros países em desenvolvimento) em face de maiores propostas de abertura é o temor que esta possa resultar no aprofundamento dessas assimetrias; sobretudo porque a agenda da “graduação”, tal como colocada pelos países ricos, vem condicionada à contrapartida de que os emergentes devem pagar um preço pela redução do protecionismo agrícola e a maior abertura dos mer-cados avançados, com a redução de suas próprias barreiras ao comércio de produtos industriais, aos serviços e aos investimentos. Para muitos países em desenvolvimento, as assimetrias são típicas distorções derivadas dos mercados livres, que só podem ser corrigidas por “adequadas políticas públicas”, de tipo setorial (geralmente industrial, mas também apoiadas em uma política comercial de tipo protecionista). O Brasil teve relativo sucesso em suas políticas “substitutivas”, que mobilizaram, justamente, esse tipo de instrumento; mas a partir de certa etapa do seu processo de desenvolvimento, as mesmas políticas que tinham sido responsáveis pela ascensão de sua capacitação industrial, levaram, em combinação com choques externos e com graves descontroles

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

177

no plano fiscal, à estagnação do seu crescimento econômico: o protecionismo exa-cerbado gerou distorções no perfil distributivo da população e várias debilidades na competitividade externa da indústria brasileira.

Não deveria haver, a rigor, nenhuma razão para insistir em políticas de claros efei-tos distorcivos no plano industrial e em seu impacto social; mas persiste uma adesão política a velhas práticas do passado, como, no âmbito multilateral, a defesa acirrada da manutenção, para o país, do tratamento preferencial para países em desenvolvi-mento, de nítida feição oportunista. As chamadas assimetrias estruturais poderiam ser vistas, nessa perspectiva, mais como uma oportunidade para uma maior inserção desses países no sistema internacional, do que como um impedimento a essa inte-gração, na medida em que elas são, de certo modo, “vantagens comparativas” que podem ser mobilizadas em seu favor num mundo caracterizado pela alta mobilidade de fatores de produção, em todos os níveis e direções. Os fenômenos de “out-sour-cing” e de “off-shoring” representam dois aspectos, justamente, desses processos de intensa deslocalização da produção que estão beneficiando intensamente países como China e Índia, que decidiram se inserir de modo mais ativo nas correntes dinâmicas da globalização capitalista.

2.3. Cooperação multilateral e Objetivos do MilênioA ordem internacional compreende, também, projetos e programas de cooperação

econômica multilateral que todos eles visam reduzir os imensos gaps de desenvolvi-mento que ainda caracterizam o mundo. Existem dúvidas fundadas, explicitadas ainda nos anos 1950 por economistas como Peter Bauer, sobre se a ajuda externa promove, de fato, o desenvolvimento; ou se ela, ao contrário, diminui as chances de um país pobre alcançar seu próprio estilo de crescimento e de inserção econômica internacio-nal, com base em estímulos de mercado, geralmente baseados no comércio, mais do que com base em (ou em substituição a) programas de ajuda externa. O Brasil, por exemplo, tornou-se uma potência industrial graças às iniciativas de seus empreende-dores nativos, aos aportes voluntários de investimentos estrangeiros e ao papel indutor do Estado; os dois primeiros basicamente guiados pelos retornos de mercado, tendo a cooperação bilateral com países avançados se dado essencialmente no capítulo da formação de recursos humanos.

Não se quer, com isto, dizer que a crença na cooperação internacional seja uma ilusão completa – uma vez que a cooperação técnica pode representar uma contri-buição extremamente benéfica, justamente, para os países menos capacitados; mas o fato é que o processo de desenvolvimento precisa ter bases genuinamente endógenas, do contrário ele não seria capaz de gerar efeitos indutores extensivos para o resto da economia e para a sociedade como um todo. Uma demonstração prática do caráter meramente subsidiário – e alguns críticos diriam até nefasto – da ajuda oficial ao de-senvolvimento seria o fato de que, após várias “décadas do desenvolvimento” oficial-mente patrocinadas pela ONU, ademais dos imensos aportes financeiros transferidos para países africanos ao longo dessas décadas, muito poucos países em desenvolvi-

178 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

mento conseguiram efetivamente alçar-se de sua antiga condição “subdesenvolvida” para manter um processo sustentado de crescimento econômico e de transformação estrutural, com distribuição social desses benefícios do crescimento. Aqueles que o fizeram – muito poucos, na verdade –, em absoluto deveram seu desenvolvimento à cooperação externa.

Qualquer que seja o julgamento intelectual – e prático – que se possa ter sobre os modestos resultados (se algum) da ajuda ao desenvolvimento, o fato é que a comunidade internacional firmou, em 2000, um compromisso formal com as “Metas do Milênio”, um conjunto de oito grupos de objetivos a serem alcançados até 2015, no sentido da redução da pobreza, das desigualdades sociais e de gênero, de acesso a meios básicos de vida e de saúde e educação. Não é seguro que as metas do milênio sejam alcançadas pela maioria dos países a que elas se destinam. O problema maior não está exatamente na falta de fi-nanciamento para se atingir essas metas, embora este possa ser também um problema no provimento de medicamentos básicos e serviços essenciais em países que carecem das mais elementares estruturas de Estado. A questão é justamente esta: vários dos países-alvo das metas entraram numa linha de desestruturação dos serviços públicos essenciais que os qualificam para figurar na categoria dos “Estados falidos”, num momento em que vários dos países doadores podem estar passando por uma situação de retração que já foi identificada como donors fatigue. Em outros termos, a questão da crise da ajuda oficial pode não ser mais uma simples questão de dinheiro – embora isto também possa estar em causa – ou de recursos materiais vindos de fora; mas de uma avaliação realista quanto às carências de governança nos próprios países objeto da ajuda. Muito deles, em especial os africanos, estão praticamente vivendo de assistência pública internacional, quando não ocorre desses recursos serem em parte desviados por elites pouco comprometidas com a causa do desenvolvimento nacional.

A diplomacia brasileira recente engajou-se, no mais alto nível, aliás – isto é, com o envolvimento do próprio presidente –, num ambicioso programa mundial de redução da fome e da pobreza extrema, com modestos resultados na prática. Na verdade, não existe propriamente carência de programas oficiais de combate à fome, assim como os meios de financiamento não são, exatamente, o obstáculo principal a tal programa. O problema está, justamente, em fazer more of the same, ou seja, tentar tornar factível a mobilização multilateral em favor dos países mais pobres segundo linhas mais do que tradicionais de ação, que supõem, de um lado, a coleta de fundos e, de outro, seu direcionamento para os “necessitados”. Diversos economistas – entre eles William Easterly, que trabalhou mui-tos anos para o Banco Mundial, na África – já reduziram as expectativas em relação a esse tipo de ação que tende a recriar as mesmas estruturas de dependência desses países da ajuda internacional. O único caminho correto, como já tinha identificado Peter Bauer bastante tempo antes, seria a mudança estrutural dessas economias e sua integração plena nos circuitos do comércio internacional, para o que os países desenvolvidos, em primeiro lugar as ex-potências coloniais européias, deveriam imperativamente abrir seus mercados e eliminar os aspectos mais nefastos da política agrícola comum: os subsídios à produção interna e as subvenções às exportações.

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

179

3) A ordem política e econômica mundial e o Brasil

Está na hora de repassar os grandes temas da agenda internacional em relação às suas implicações para o Brasil, com destaque para os temas econômicos, que compõem o essencial da agenda do nosso relacionamento externo. O Brasil não tem – parece óbvio, mas cabe repetir – grandes demandas por segurança que de-rivem de ameaças externas, ainda que os próprios militares possam “descobrir” toda uma série de ameaças potenciais que poderiam fragilizar nosso país, caso surjam “imprevistos” na Amazônia – sempre ameaçada de “internacionalização”, não se sabe bem por parte de quem, mas se supõe que seja supostamente do grande império do norte –, nas plataformas de petróleo off shore, aparentemente ameaça-das por terroristas aquáticos, por parte de guerrilheiros vizinhos convertidos em narcotraficantes; enfim, não faltariam perigos rondando o Brasil, para os quais soluções “tecnologicamente sofisticadas” sempre serão necessárias. À falta de ameaças credíveis, percebidas ou não, resta o papel acessório que o país poderia desempenhar nos esquemas de segurança internacional sob a égide da ONU, até aqui de peace keeping, mas eventualmente também de peace making (para o quê uma evolução conceitual, e constitucional, seria desejável).

As grandes questões da interface externa do Brasil são, antes de tudo, questões de economia; e antes de economia interna do que propriamente internacional, como um simples argumento pode demonstrar. O ambiente econômico interna-cional, mesmo sem a continuidade da atual fase de bonança – com o crescimento sustentado de vários países emergentes, que tendem senão a substituir, pelo menos compensar várias das antigas locomotivas do crescimento mundial, como os EUA, o Japão ou a Alemanha – ofereceu e continua a oferecer oportunidades excelentes a um país capitalista como o Brasil (que nunca foi socialista como a China, tendo, portanto, instituições de mercado plenamente funcionais, e nem tão nacionalista e estatizante quanto a Índia). O Brasil é um país notoriamente carente de inves-timentos, algo que a economia internacional tem de sobra para economias que se abrem a parceiros estrangeiros. Tampouco existe falta de liquidez nos mercados financeiros internacionais, onde a captação e os preços se dão em função dos ris-cos percebidos pelos provedores, riscos oferecidos por determinadas economias, algo, portanto, que depende basicamente delas mesmas. Enfim, todas as variáveis que se possam conceber no plano econômico internacional parecem favoráveis ao Brasil, cabendo ao próprio país fazer o seu “dever de casa” em termos de prepara-ção para o crescimento e o desenvolvimento sustentado.

Em uma expressão: todas as questões de economia política internacional do Brasil são, antes de tudo, problemas de política econômica nacional e é com essa compreensão que deve ser avaliada a discussão que vem oferecida nesta seção final deste ensaio. Não obstante, algumas outras questões da agenda internacional que interessam ao Brasil de perto serão examinadas, independentemente de seu caráter ou interface internacional.

180 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

3.1. Crescimento econômicoO problema básico do Brasil, como para a maioria dos paises emergentes, é o do

crescimento econômico, capaz de sustentar um processo de transformação produtiva, com vistas a ganhos de produtividade que, por sua vez, contribuirão para a competiti-vidade dos nossos produtos nos mercados internacionais, produzindo, assim, riquezas e empregos internos. O mundo está ajudando de maneira excepcional nessa tarefa: pela primeira vez em 30 anos, é registrado o mais forte crescimento na economia mundial, com taxas nos países emergentes jamais igualadas por quaisquer outras eco-nomias, salvo em curtos períodos sem continuidade ou consistência. Infelizmente, o Brasil e a América Latina crescem muito pouco, abaixo da média mundial e três vezes menos que os emergentes mais dinâmicos. Esta modéstia no ritmo de crescimento se dá a despeito dos mais altos preços nas commodities exportadas pela região – que é, como se sabe, abundante em recursos naturais – e da grande demanda externa por esses produtos (o que confirma, mais uma vez, que pode haver alguma “maldição” na dependência de recursos naturais).

O baixo crescimento do Brasil e da América Latina também se dá a despeito da maior disponibilidade de capitais de risco e da menor vulnerabilidade financeira ex-terna (pelo menos aparentemente): estaria a região, de fato, imune a novas crises? Por um lado, as reservas internacionais desses países nunca foram tão altas – para algo serviram as crises financeiras dos anos 1990 – e, por outro, as taxas de juros e spreads cobrados nos empréstimos e lançamentos de bônus internacionais desses países também se situam em patamares historicamente baixos, não necessariamente devido à nova onda de “confiança irracional” dos mercados financeiros nesses países, mas porque há, de fato, abundância de liquidez nesses mercados.

O que, então, explicaria as baixas taxas de crescimento do Brasil e de grande parte dos vizinhos? (Alguns dos países que estão crescendo, a exemplo da Argentina e da Venezuela, o fazem em razão da recuperação e da saída de crises incorridas no período recente, ou devido à demanda elevada puxada por gastos estatais, no caso das receitas de petróleo.) Basicamente, em virtude do baixo nível dos investimentos externos, resultado de uma “despoupança estatal” visível no caso brasileiro – com uma carga fiscal igual à de países desenvolvidos, para uma renda per capita seis vezes menor – e de desequilíbrios fiscais que lançam dúvidas aos olhos dos investidores privados, sobre as perspectivas futuras de crescimento, tendo em vista as trajetórias da dívida interna e dos juros reais. Ou seja, a despeito de que a estabilidade macroeconômica, duramente conquistada no passado recente, permitiu criar essa sensação de good fun-damentals, as percepções de risco ainda estão presentes, o que limita o volume total de investimentos na economia.

Cabe descartar aqui os fatores tradicionalmente invocados para justificar as baixas taxas de crescimento na economia brasileira, que seriam a ameaça de estrangulamento externo em função dos desequilíbrios cambiais e da famosa volatilidade dos capitais especulativos. Capitais financeiros são, por definição voláteis, e não há nada que se possa fazer quanto a isso, seja uma grande economia desenvolvida, seja uma pequena

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

181

economia em desenvolvimento. Esses capitais se movimentam continuamente, de que são prova os movimentos cambiais contínuos entre as principais moedas de reserva internacionais. Por outro lado, o câmbio nunca esteve tão valorizado no Brasil – uma taxa muito superior àquela registrada nos tempos da banda cambial administrada (1995-1998), que a oposição atualmente no poder caracterizava como sendo “popu-lismo cambial” – e, no entanto, não cessam de crescer, ano a ano, as exportações brasileiras. Quanto à volatilidade, uma coisa precisa ser clarificada: ela é, na ver-dade, inerente à natureza dos capitais “especulativos”, mas só produz efeitos nefastos quando a política econômica é, por sua vez, volátil, o que soe acontecer de maneira muito freqüente nos países latino-americanos, sobretudo em razão de desequilíbrios orçamentários, que se traduzem em crises fiscais.

Caracterizada, portanto, a natureza inteiramente interna dos problemas brasileiros de crescimento e de “volatilidade”, caberia examinar quais seriam, dentre os fatores internos e externos de crescimento dos BRICs – entre os quais o Brasil está incluído, malgré lui, isto é, a despeito de ser o atrasado do pelotão –, as causas do desempenho modesto de sua economia. Dentre os fatores endógenos de crescimento sempre podem ser encontrados: o adequado provimento de insumos básicos, dos quais o Brasil pare-ce adequadamente bem provido; energia barata e abundante; mão-de-obra suficiente, barata e adequada, isto é, adestrada; infra-estrutura de transportes e comunicações à altura das necessidades dos agentes privados; mercado de capitais funcional, líquido e a custos razoáveis; judiciário expedito ou instrumentos ágeis de solução de disputas (o que pode significar arbitragem privada), o que representa baixos custos de transação; regras do jogo estáveis, transparentes e com o mínimo de intrusão possível por parte dos “rentistas” sempre existentes no setor público, em seus vários níveis. Com relação a esses fatores, sabemos que o Brasil padece terrivelmente de deficiências notórias em vários deles, a começar pela tributação excessiva e pela intervenção exacerbada do Estado na vida dos agentes econômicos privados (e não só pelo lado fiscal, mas burocrático também).

Essas deficiências pelo lado regulatório, tributário, burocrático, pelas carências de infra-estrutura e de mão-de-obra competente e competitiva – seja pelo lado dos salários, seja pelo lado da produtividade – e por vários outros fatores, que estão, na maior parte, ligados às responsabilidades governamentais, explicam, provavel-mente, a longa e lenta marcha do Brasil para o investment-grade na classificação de risco das agências mundiais de rating. Essa classificação será sem dúvida atingida, em prazo intermediário, inclusive porque o Brasil é uma grande economia em escala mundial e vem consolidando as bases de sua estabilidade macroeconômica (com algum dever de casa a ser feito no lado fiscal). Não obstante esse lado positivo cabe registrar que, no contexto das novas configurações da economia mundial, com a ascensão fulgurante da China em quase todos os grandes mercados de importância – produtivo e manufatureiro, por certo; como demandante de commodities e outras matérias-primas, sobretudo energéticas; financeiro e tecnológico de modo crescente; sem esquecer o lado militar e político –, seguida de perto pela Índia e alguns outros

182 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

parceiros (tanto ricos, como em desenvolvimento), o Brasil aparece como um small player no cenário econômico e estratégico internacional, em vista de sua modesta capacidade de influenciar decisivamente qualquer processo ou evento dotado de im-pacto mundial. Isso não diminui suas chances de vir a integrar um possível G-13, caso este seja formado em algum momento nos próximos anos. Mas a pergunta que se coloca seria: deseja o Brasil realmente vir a integrar tal clube restrito, em vista das mudanças inevitáveis que isso implicaria para sua atual condição de país em desenvolvimento?

Trata-se de uma questão relevante, que não será respondida nos quadros deste en-saio, mas que permanece como um dos elementos-chave na conformação presente e futura da diplomacia econômica brasileira e de sua estratégia de inserção internacional.

3.2. InvestimentosOs investimentos estrangeiros diretos sempre foram parte integrante do cenário

econômico brasileiro, assumindo um papel decisivo em seu processo de industria-lização. De resto, trata-se de fator preponderante em qualquer economia aberta que pretenda obter ganhos tecnológicos em prazos relativamente curtos, ocorrendo uma contrapartida na balança de serviços pelo fato das remessas das “rendas do capital”, a título de dividendos, lucros, royalties, pagamentos técnicos de natureza diversa e outras transferências. Seus efeitos, mesmo com algum peso no balanço de pagamen-tos, são eminentemente positivos, em face da incorporação de know-how e dos gan-hos de produtividade que ele permite. O Brasil sempre foi um beneficiário, bastando consultar a lista da Forbes das 500 maiores empresas mundiais, para constatar que mais de quatro quintos desse número já se encontram instaladom no Brasil, nos dife-rentes ramos da economia, direta ou indiretamente. Podem causar estranheza, assim, as reações que o capital estrangeiro desperta ainda no país.

Não existe, como se sabe, uma regulação multilateral atinente aos investimentos estrangeiros diretos, assim como não existe um único instrumento mundial discipli-nando as relações entre investidores privados e Estados receptores desses investimen-tos diretos. A Carta de Havana (1948), não ratificada, previa algumas poucas regras a esse respeito, que nunca foram colocadas em vigor, oportunamente implementadas de modo bilateral e parcialmente nos acordos de promoção e proteção de investimen-tos negociados entre os exportadores e os importadores de capitais (os países ricos possuindo, quanto a eles, regras inscritas no código de liberalização de investimentos da OCDE, que segue, tanto quanto possível, os princípios de NMF e de tratamento nacional). As lacunas legais e as carências regulatórias são, assim, supridas de ma-neira ad hoc por instrumentos diversos, geralmente seguindo um modelo padrão re-lativamente uniforme, que sustentou, desde os anos 1950, a proliferação de acordos bilaterais conhecidos como APPIs. Não obstante ter assinado mais de uma dúzia, sem ter ratificado nenhum – em virtude de forte oposição nacionalista interna –, o Brasil possui uma legislação abrangente, que confere relativa estabilidade e abertura ao ca-pital estrangeiro, estando ela em vigor desde meados dos anos 1960. Os registros e as

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

183

autorizações de movimentação são conferidos de modo praticamente automático pelo Banco Central, e não parecem existir reclamações no plano puramente instrumental.

Subsistem, contudo, algumas restrições ao investimento estrangeiro na economia brasileira, assim como permanece certa insegurança jurídica quanto a eventuais dis-putas que possam ocorrer entre o investidor estrangeiro e parceiros nacionais ou entre aquele e o Estado brasileiro. Na segunda metade dos anos 1990, o Brasil participou do exercício do MAI – Multilateral Agreement on Investments – na OCDE, frustrado em sua conclusão em virtude de desentendimentos entre os próprios países partici-pantes – notadamente os EUA e a França – e não em função das manifestações dos antiglobalizadores, como equivocadamente se considera em certos meios. Permanece, assim, uma situação de impasse quanto ao tema investimentos na agenda multilateral, uma vez que são poucos e insuficientes os dispositivos existentes no âmbito da OMC (acordo de TRIMs). O Brasil participa ativamente (ma non troppo) das discussões, mas não pretende avançar muito no terreno negociador, uma vez que tem restrições aparentemente “filosóficas” a essa regulação, já que pretende preservar os famosos policy spaces internamente.

3.3. Acesso a mercadosAcesso a mercados é o grande tema da diplomacia econômica brasileira, que

considera que as promessas da Rodada Uruguai permaneceram sem implementação prática, em especial no setor agrícola. Tendo concedido sua aprovação a novas regras em novos campos (serviços, propriedade intelectual, investimentos), e sentindo-se frustrado pela não-reciprocidade efetiva, o Brasil apreciaria dispor de maior abertura nos mercados desenvolvidos para seus produtos competitivos. Ele mantém, notoria-mente, uma atitude mais ofensiva do que defensiva em aceso a mercados, em especial na agricultura, tendo liderado o movimento que resultou na formação do chamado G-20 na reunião de Cancún da Rodada Doha (2003). Depois disso, e não apenas por sua insistência numa agenda do desenvolvimento, ocorreram diversos impasses reais e de procedimento em reuniões nas quais o Brasil sempre foi um protagonista de primeiro plano, junto com a Índia, os EUA e UE: em Hong-Kong, em Potsdam e em Genebra, não havendo, até o início de 2008, certeza quanto às possibilidades de conclusão da Rodada nos próximos meses.

As implicações para o Brasil são de ordem não apenas comercial, uma vez que a diplomacia econômica do país considera que, em função do grau de abertura que ele será obrigado a conceder nas áreas de forte demanda ofensiva dos desenvolvidos, dependerá o sucesso, ou, até, a manutenção de seu projeto de desenvolvimento indus-trial, considerado em bases essencialmente nacionais. Não se conhecem avaliações independentes quanto aos custos da liberalização, embora os industriais sejam sempre alarmistas quanto aos limites da abertura que eles estão dispostos a conceder. O setor de serviços, tradicionalmente protegido da concorrência externa, tampouco se mobi-liza ativamente para o sucesso das negociações, ao passo que o agronegócio, expor-

184 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

tador competitivo, parece ser o único a demandar abertura ampliada dos mercados, nos dois sentidos.

O Brasil vem insistindo na estratégia multilateralista e já recusou acordos par-ciais de acesso a mercados – como os compromissos em matéria de liberalização de produtos eletrônicos, firmados no âmbito do Information Technology Agreement, adotado em Cingapura, em 1996 – que o confrontem diretamente a países mais com-petitivos no plano industrial. Tampouco foi possível concluir acordos limitados de acesso a mercados com países desenvolvidos, a exemplo do projeto hemisférico da Alca – recusada formalmente por “inconveniente”, no seu modelo americano – e do acordo interregional entre o Mercosul e a UE, não só por motivo de dificuldades de compatibilização das demandas ofensivas em matéria agrícola e defensiva na área industrial, mas também porque os parceiros desenvolvidos pretendem um pouco mais do que o simples acesso a mercados, adentrando em áreas regulatórias ou sistêmicas que encontram oposição na atual diplomacia brasileira.

3.4. Integração regionalTrata-se, provavelmente, da prioridade estratégica mais relevante da diplomacia bra-

sileira, desde o início dos anos 1990, ou talvez até antes, desde as primeiras tentativas de formação de um mercado comum bilateral com a Argentina, na segunda metade dos anos 1980. Essa integração das duas grandes economias da América do Sul é vista como a base indispensável para a conformação de um grande espaço econômico integrado em todo o continente, havendo, em conseqüência, um enorme investimento diplomático do Brasil na consecução dessa idéia. Essa prioridade não impede, obviamente, a existência de disputas comerciais entre os dois países, com cláusulas de salvaguarda aplicadas de modo aparentemente abusivo pela Argentina contra produtos brasileiros.

Todo o processo do Mercosul – constituído pelo Tratado de Assunção, de março de 1991, sob a forma de uma união aduaneira em implementação progressiva – vem sendo apresentado como parte de um esforço de “regionalismo aberto”, ou seja, dis-posto a incorporar os vizinhos progressivamente. Mas o fato é que as tentativas de ampliação do bloco acabam resultando na criação de novas e crescentes exceções na-cionais tanto à zona de livre-comércio (ZLC) como à união aduaneira (UA). De fato, a primeira funciona com algumas exceções setoriais, notadamente no setor de açúcar (fortemente protegido na Argentina) e na indústria automotiva, onde vigora um acor-do de compensação baseado em quotas que vem sendo prolongado com alterações desde o início. Diversos acordos de liberalização comercial foram concretizados entre o Mercosul e os vizinhos andinos da CAN, com cláusulas de exceção, dispositivos de origem ou regras de acesso limitado que muitas vezes se exercem no plano bilateral dos países envolvidos.

Os novos candidatos ao ingresso pleno no Mercosul – sendo que até o momento três países são associados à sua ZLC: Chile e Bolívia, desde 1996, Peru, desde 2003 – sempre reivindicam exceções especiais à ZLC e flexibilidade na aplicação da Tarifa Externa Comum (TEC) da UA. A Bolívia, por exemplo, gostaria de ingressar ple-

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

185

namente no Mercosul sem ter de adotar a TEC, ao passo que a Venezuela, admitida politicamente em 2006 na esdrúxula condição de “membro pleno em processo de adesão”, apresenta notórias dificuldades para aceitar o conjunto de regras já adotas pelo Mercosul, como, provavelmente, para incorporar a TEC de modo pleno. Não se prevê, no futuro imediato, progressos sensíveis no capítulo comercial, mas os países vêm expandindo uma agenda não comercial que envolve, crescentemente, grande nú-mero de atores sociais, nas áreas cultural, educacional, trabalhista e outras.

Conferindo alta prioridade à integração da América do Sul, a diplomacia brasileira se lançou em iniciativas ambiciosas, como a constituição de uma Comunidade Sul-Americana de Nações, efetivamente criada em dezembro de 2004, mas substituída, em abril de 2007, pela União de Nações Sul-Americanas, com um tratado constitutivo previsto para ser assinado em junho de 2008 e um secretariado a ser instalado em Quito. Trata-se da recuperação parcial, mas com maior significado político, do projeto lançado em setembro de 2000, a convite do presidente Fernando Henrique Cardoso, no sentido de ser constituída a Iniciativa de Integração Regional Sul-Americana (IIRSA), com vistas a favorecer a vinculação física e grandes obras de infra-estrutura entre os países da região.

Independentemente do maior ou menor êxito de todos esses projetos, o fato é que os países da região estão quase todos unidos informalmente por uma rede de acordos comerciais de liberalização econômica que tem no seu centro os EUA, o promotor original da idéia da Alca, recusada por Argentina, Brasil e Venezuela. Os EUA, numa estratégia ofensiva de conquista de mercados, que os levou do antigo multilateralismo ao minilateralismo de fato, a pretexto de oferecer acesso ao seu enorme mercado a países que dispõem de pequena base industrial ou até agrícola, acabam patrocinando ampla discriminação contra os países mais competitivos da região, que são justa-mente os do Mercosul. As implicações para o Brasil são importantes, uma vez que a estratégia dos EUA pode levar o Mercosul a uma maior introversão do que seria recomendável, bem como ao aumento dos conflitos bilaterais como regra de “convi-vência”. Não se trata, obviamente, de cenário desejado pelo Brasil ou pelo Mercosul, que são, assim, obrigados a empreender uma disputa para o estabelecimento de redes de acordos paralelos.

Com esse tipo de comportamento, os dois mais importantes países do hemisfé-rio, EUA e Brasil, acabam contribuindo, voluntariamente ou não, para o reforço de uma das piores deformações do sistema multilateral de comércio na atualidade: o chamado spaghetti bowl – ou seja, um emaranhado de acordos comerciais não neces-sariamente compatíveis entre si, mas convivendo no mesmo “prato” – de que fala o economista indiano da Columbia University, Jagdish Bhagwati. O cenário previsível é o do aumento dos conflitos e um stress inevitável no sistema de solução de disputas da OMC, onde diversos casos têm sido concluídos, sem que os resultados finais ten-ham sido acatados pela parte perdedora, geralmente poderosa (como no exemplo do algodão, desrespeitado solenemente pelos EUA, contra interesses legítimos do Brasil e de muitos outros países exportadores do produto).

186 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

3.5. Recursos energéticosA economia mundial já sofreu com os “velhos” e volta a conviver com novos

choques do petróleo: as diferenças entre uns e outros podem estar na natureza do elemento provocador, um choque de oferta, nos anos 1970, um choque de demanda, atualmente. Mas os impactos para os importadores líqüidos são sempre prejudiciais, refletindo pressões inflacionárias sobre todos os preços vinculados a essa mercadoria estratégica e conduzindo a novas transferências líqüidas de renda de consumidores para produtores. O Brasil dispõe de recursos energéticos diversificados, mas sua de-pendência do petróleo, como combustível e insumo industrial, continua significativa, agora diminuída em função do aumento da oferta nacional. Subsistem, contudo, fra-gilidades, em razão da estrutura industrial do refino (ainda fortemente baseada em petróleo importado).

A alegada auto-suficiência, na verdade, não é um ganho permanente, mas um pro-cesso que deve ser perseguido constantemente, com base nos investimentos de risco em exploração – agora compartilhados com o capital estrangeiro – e na diversifica-ção dos usos industriais, como princípio: tipos e fontes de combustíveis fósseis vêm sendo ampliados em bases nacionais e até mesmo regionais, não sem riscos de inves-timentos, como os casos da Bolívia e do Equador demonstram de maneira eloqüente. De toda forma, novas alternativas vêm sendo buscadas, não apenas para contemplar nossa própria matriz energética – com base no consagrado etanol de cana-de-açúcar e em novas fontes de biocombustível de origens diversas – como também na coope-ração com parceiros em realidades geopolíticas relativamente inéditas do novo mapa petrolífero mundial (Ásia central e do sul, costas da África, etc.).

A equação energética brasileira dificilmente conseguirá assegurar a autonomia completa em combustíveis fósseis: a busca constante de fontes internas, de petróleo ou de gás, terá de ser necessariamente complementada em fontes regionais, e aqui a geopolítica é bastante complicada pela emergência de forças nacionalistas que colo-cam em risco os investimentos já realizados ou planejados da grande estatal brasileira do setor (Petrobras). O cenário para o Brasil passa a ser o de apostar na boa convivên-cia com vizinhos por vezes difíceis (como a Bolívia), ao mesmo tempo em que conti-nua a sua busca por fontes próprias de fósseis ou por soluções tecnológicas eficientes em renováveis. Neste último terreno, tendo em vista sua dotação favorável de fatores, o Brasil tem todas as condições de aparecer no mundo como um major player (apenas não se sabe se “politicamente correto”, em vista dos problemas continuados de devas-tação ambiental nas fronteiras agrícolas e pecuárias da Amazônia).

3.6. Segurança e estabilidadeFinalmente, no que se refere aos cenários geopolíticos de possíveis conflitos – e,

talvez, de novas hecatombes humanas, em vista da proliferação nuclear e do terro-rismo fundamentalista –, existem dúvidas sobre se o Brasil será chamado a desem-penhar um papel de relevo na segurança internacional, embora ele conserve bastante importância no plano regional. A América do Sul parece ser uma região relativamente

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

187

imune aos riscos mais evidentes de envolvimento em conflitos de grandes proporções; mas ela não pode ser considerada ao abrigo de seus efeitos indiretos, sobretudo quan-do esses riscos assumem novas formas, para as quais não existem fatores credíveis de dissuasão.

O terrorismo de cunho fundamentalista islâmico, que parece ser a fonte mais pro-vável das novas ameaças às potências ocidentais, não deve fazer da América do Sul uma base de operações, embora não se possa descartar tanto o proselitismo religioso, como a mobilização de recursos de tipos diversos entre as comunidades de uma mes-ma afinidade religiosa ou étnica. Os riscos de grandes ataques terroristas, no plano mundial, continuarão a ser combatidos – sobretudo sob comando dos EUA – pela conjunção de operações de inteligência com a repressão pura e simples, o que promete muitas vítimas no futuro de médio prazo. A diplomacia brasileira atual tem afirmado sua preferência por atuar sobre causas das ameaças terroristas, o que pode revelar uma incompreensão quanto à natureza do fenômeno e as possibilidades de “dissuasão preventiva”, pelo menos no curto prazo. Não deverá ocorrer evolução significativa no tratamento dessa questão antes de novos desenvolvimentos, talvez dramáticos, do fenômeno terrorista.

No que se refere à não-proliferação nuclear e aos regimes restritos para o controle de tecnologias sensíveis, existem novos desafios, igualmente, que tampouco serão resolvidos com base na pressão pura e simples ou na chantagem econômica, como parece ser o método habitual das grandes potências. Ao não oferecerem promessas credíveis de desarmamento efetivo e de não recurso aos artefatos de que dispõem em caso de conflitos graves, elas deixam aberta a porta para alguns proliferadores estatais. Em todo caso, existem atores nesse processo, nem todos estatais, que são imunes a quaisquer tipos de “persuasão” antinuclear: ditadores megalomaníacos e terroristas profissionais estarão sempre dispostos a enveredar pelo caminho atômico, ainda que de uma “bomba suja”. As possibilidades que se abrem em alguns países – o Paquistão, desestabilizado pela anarquia política interna, aparece como um dos “ventres sensíveis” da proliferação descontrolada, mas a própria Rússia e países da Ásia central podem entrar no jogo involuntariamente – são por demais preocupantes e fazem com que essa questão se mantenha no topo da agenda das grandes potências no futuro previsível.

O papel do Brasil nesse tipo de questão é propriamente marginal, a não ser como membro temporário do CSNU ou permanente da Conferência do Desarmamento, se é que questões desse tipo podem ter tratamento eficaz nesses foros de discussão políti-ca. Outras instâncias podem ser acionadas para o encaminhamento sigiloso de alguns casos; a participação do Brasil em discussões ou medidas práticas dependerá de quão confiável ele pode aparecer aos olhos dessas grandes potências para seu envolvimento nesses casos.

Também permanecerá na agenda internacional, durante muitos anos à frente, e na pauta diplomática brasileira, a questão da reforma do CSNU: quem entraria, exatamente, e quais seriam as bases de alguns acertos regionais, inevitáveis, realis-

188 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

ticamente falando? O Brasil aparece como um eterno candidato, com os sucessos e frustrações de uma luta de longo curso, na qual pequenos compromissos táticos são o preço a pagar por alguma grande vitória estratégica mais à frente. Durante algum tempo, se considerou que sua participação em missões de paz da ONU, a exemplo da Minustah, no Haiti, poderia representar uma espécie de bilhete de ingresso no CSNU, o que não é obviamente o caso. No jogo das grandes potências, boa vontade política e disposição para a cooperação desinteressada não parecem ser, necessariamente, re-quisitos qualificadores. Apenas a manifestação de poder, em bases próprias, qualifica para o exercício de responsabilidades mundiais, como parece pensar a Índia. Abre-se, aqui, uma possível fonte de desentendimentos políticos – com conseqüências práticas – entre soldados e diplomatas, os primeiros, presumivelmente, considerando que a detenção de artefatos nucleares confere respeitabilidade e, portanto, “aceitabilidade” de candidatos ao clube dos grandes, os segundos procurando pautar-se pela letra dos tratados e das obrigações internacionais.

De toda forma, a questão parece ter sido definitivamente resolvida pelo pacto constitucional, que submete todas as atividades nucleares à sua utilização pacífica, o que veda, em princípio, seu desvio para outras finalidades. Não se vê, de toda forma, em quê a posse de um artefato nuclear poderia adiantar a causa do Brasil no plano internacional. Suas causas básicas são as do desenvolvimento econômico, da coope-ração técnica, da luta pelos direitos humanos e, presumivelmente, da democratização do sistema mundial de poder. A segurança internacional exige um pouco mais do que isso, pois depende, também, de meios adequados para o exercício da força e de von-tade política e capacidade de decisão para querer e poder utilizá-la, em circunstâncias determinadas, supostamente sempre de acordo com as regras do direito internacional e do respeito às instituições que conferem legitimidade ao seu uso. Em qualquer hi-pótese, o Brasil precisaria dispor de condições adequadas e efetivas para entrar nesse “jogo de grandes”: os requisitos indispensáveis para isso, sem que a ferramenta nu-clear entre necessariamente em linha de conta, seriam soldados e capacidade econô-mica. O Brasil precisaria se preparar para isso, consciente de que esses requisitos são construídos inteiramente dentro de sua própria casa.

Leituras Complementares:

- Almeida, Paulo R.: Os Primeiros Anos do Século XX: o Brasil e as relações internacionais contemporâneas (São Paulo: Paz e Terra, 2001)- _______ : O Brasil e o multilateralismo econômico (Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999)- Aron, Raymond: Paz e Guerra entre as Nações (São Paulo: IMESP, 2002)- Bauer, Peter Thomas: Economic Analysis and Policy in Under-developed Countries (Cambridge: Cambridge University Press. 1957) - _______ : Dissent on Development: Studies and Debates in Development Economics (Londres: Weidenfeld & Nicolson, 1971)- _______ : Equality, the Third World and Economic Delusion (Londres: Weidenfeld & Nicolson, 1981)- _______ : Reality and Rhetoric: Studies in the Economics of Development (Londres: Weidenfeld & Nicolson, 1984)- Baumann, Renato (org): O Brasil e a Economia Global (Rio de Janeiro: Campus, 1996)- Beinhocker, Eric D.: The Origin of the Wealth: Evolution, complexity, and the Radical Remaking of Economics (Boston: Harvard Business

School Press, 2006)- Biderman, Ciro e Paulo Arvate (orgs.): Economia do Setor Público no Brasil (Rio de Janeiro: Campus, 2004)- Carvalho, Maria Izabel Valladão; Santos, Maria Helena de Castro (orgs.): O século 21 no Brasil e no mundo (Bauru, SP: Edusc, 2006)- Casella, Paulo Borba e Mercadante, Araminta de A. (orgs.): Guerra Comercial ou integração mundial pelo comércio: a OMC e o Brasil (São

Paulo: LTr, 1998)- Diamond, Jared: Armas, Germes e Aço: os destinos das sociedades humanas (9ª ed.: Rio de Janeiro: Record, 2007)

A Ordem Política e Econômica Mundial no Início do Século XXI: Questões da Agenda Internacional e suas Implicações para o Brasil

189

- _______ : Colapso: como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso (3ª ed.; Rio de Janeiro: Record, 2006)- Easterly, William: The White Man’s Burden: Why the West’s Efforts to Aid the Rest Have Done So Much Ill and So Little Good (New York: - Penguin Press, 2006) - _______ :The Elusive Quest for Growth: Economists’ Adventures and Misadventures in the Tropics (Cambridge, Mass.; The MIT Press,

2001)- Eichengreen, Barry: A Globalização do Capital (São Paulo: Editora 34, 2002)- Ferguson, Niall: The War of the World (Londres: Penguin, 2006)- _______ : Empire: How Britain Made the Modern World (London: Allen Lane, 2003)- _______ : Colossus: The Price of America’s Empire (New York: Penguin Press, 2004)- Franco, Gustavo H. B.: Crônicas da convergência: ensaios sobre temas já não tão polêmicos (Rio de Janeiro: Topbooks, 2006)Frieden, Jeffrey: Global Capitalism: Its Fall and Rise in the Twentieth Century (New York: Norton, 2006)- Fukuyama, Francis. “The End of History?”, The National Interest (nr. 16, Summer 1989, p. 3-18)Johnson, Paul: A History of Modern World from 1917 to the 1980’s (London: Weidenfeld and Nicholson, 1983); ed. americana: Modern Times: the world from the twenties to the eighties (New York: Harper and Row, 1985); ed. Brasileira: Tempos Modernos: o mundo dos anos 20 aos 80 (2ª ed.; Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1998)Kennedy, Paul: The Parliament of Man: a history of the United Nations (New York: Random House, 2007)Keylor, William R.: The Twentieth-Century World: an international history (Oxford: Oxford University Press, 1996)Lacerda, Antonio Correa de: O Impacto da Globalização na Economia Brasileira (São Paulo: Contexto, 1998) _______ (org.): Crise e oportunidade: o Brasil e o cenário internacional (São Paulo: Lazuli, 2006)Lafer, Celso. A OMC e a regulamentação do comércio internacional: uma visão brasileira (Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998)Landes, David S.: A Riqueza e a Pobreza das Nações: por que algumas são tão ricas e outras são tão pobres (Rio de Janeiro: Campus, 1996)Magnoli, Demétrio: Relações Internacionais: teoria e história (São Paulo: Saraiva, 2005) Magnoli, Demétrio: História das Guerras (São Paulo: Contexto, 2006)Mayer, Arno. The Persistence of the Old Régime: Europe to the Great War (Londres: Croom Helm, 1981; edição brasileira: Editora Campus)McWilliams, Wayne; Piotrowski, Harry: The World Since 1945: a history of international relations (Londres: Lynne Riner, 1997)Oliveira, Henrique Altemani; Lessa, Antônio Carlos (orgs): Relações internacionais do Brasil: temas e agendas (São Paulo: Saraiva, 2006, 2 vols)Saraiva, José Flavio Sombra (org.): História das relações internacionais contemporâneas: da sociedade global do século XIX à era da globali-zação (São Paulo: Saraiva, 2006)Reynolds, David: One World Divisible: a global history since 1945 (New York: Norton, 2000)Warsh, David: Knowledge and the Wealth of Nations: a History of Economic Discovery (New York: Norton, 2006)Yergin, Daniel; Stanislaw, Joseph: The Commanding Heights: The Battle for the World Economy (New York: Touchstone, 2002)

ANeXOS

Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF 193

ANeXO I

Jurisprudência relativa ao Direito Internacional no Supremo Tribunal Federal - STF

PesquisadoresCynthia Danielle Siqueira

Kalki Zumbo Coronel Guevara Patrícia Luciane de Carvalho

Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF 195

I. extradição

eXT1074 Tema: ExtradiçãoJulgamento: 08 de março de 2007Publicação: 22 de março de 2007Ementa: Pedido de prisão cautelar e extradição de Mike Buttner, pelo Governo da

República Federal da Alemanha. Persecução penal por diversos delitos de fraude na Alemanha. Inexistência de tratado de extradição entre Brasil e República Federal da Alemanha. Promessa de reciprocidade de trata-mento ao Brasil. Mandado de prisão expedido.

eXT1008 Tema: ExtradiçãoJulgamento: 21 de março de 2007Publicação: 17 de agosto de 2007Ementa: Extradição: Colômbia: crimes relacionados à participação do extradi-

tando (então sacerdote da Igreja Católica) em ação militar das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Questão de ordem. Reconhecimento do status de refugiado do extraditando, por decisão do comitê nacional para refugiados - CONARE: pertinência temática entre a motivação do deferimento do refúgio e o objeto do pedido de extradição: aplicação da Lei 9.474/97, art. 33 (Estatuto do Refugiado).Pedido de ex-tradição não conhecido, extinto o processo, sem julgamento do mérito e determinada a soltura do extraditando.

eXT 998Tema: Extradição Julgamento: 22 de março de 2007Publicação: 13 de abril de 2007Ementa: Condições de admissibilidade. Inexistência de tratado bilateral. Promessa

de reciprocidade em condições de ser cumprida. Competência exclusiva da justiça brasileira. Inexistência. Processo no Brasil. Fatos diversos. Família no Brasil. Súmula 421. Pedido deferido.

196 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

eXT 999Tema: ExtradiçãoJulgamento: 17 de maio de 2007Publicação: 26 de junho de 2007Ementa: Condições de admissibilidade. Inexistência de tratado bilateral com a

República Federal da Alemanha. Promessa de reciprocidade em condi-ções de ser cumprida. Competência exclusiva da justiça brasileira. Inexistência. Processo no Brasil. Fatos diversos. Pedido Deferido.

eXT 1077 Tema: ExtradiçãoJulgamento: 20 de junho 2007 Publicação: 03 de agosto de 2007Ementa: Extradição instrutória. Prisão preventiva decretada pela justiça Alemã.

Pedidio formulado com promessa de reciprocidade. Atendimento aos re-quisitos da lei n. 6815/80. Extraditando investigado pelos crimes de re-ceptação e lavagem de dinheiro: dupla tipicidade atendida. Extraditando com família constituída no Brasil: aplicação da súmula 421 do Supremo Tribunal Federal. Extradição deferida.

Observação: atende o disposto no art. 78, inc. I, da Lei n. 6.815/80 e com o prin-cípio de direito penal internacional da territorialidade da lei penal. A constituição de família no Brasil não impede o deferimento da extradição.

eXT 1039Tema: Extradição – suposta prática do delito de lavagem de dinheiro (inexistência

de tratado de extradição entre Brasil e Alemanha).Julgamento: 21 de junho de 2007Publicação: 23 de novembro de 2007Ementa: Extradição passiva de caráter instrutório. Suposta prática do delito de

lavagem de dinheiro. Inexistência de tratado de extradição entre o Brasil e a República Federal da Alemanha. Promessa de Reciprocidade. Fundamento jurídico suficiente. Necessidade de respeito aos direitos bá-sicos do súdito estrangeiro. Extradição deferida. Inexistência de tratado de extradição e oferecimento de promessa de reciprocidade por parte do Estado requerente.

Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF 197

eXT 1063Tema: ExtradiçãoJulgamento: 09 de agosto de 2007Publicação: 06 de setembro de 2007Ementa: Extradição: Uruguai: admissibilidade: a ausência de processo contra o

extraditando no Uruguai não constitui óbice ao deferimento da extra-dição, conforme a jurisprudência do Tribunal (Ext. 873, Pertence, DJ 05.03.2004), que se aplica ao Tratado de Extradição hoje em vigor, fir-mado entre os Estados Partes do MERCOSUL (DL 4.657/42, art. 2º, § 1º). Extradição: inviabilidade, quanto aos delitos de associação criminosa e lavagem de ativos, dado que o Extraditando responde a processo no Brasil pelos mesmos fatos. Decisão do tribunal por unanimidade: indefe-rido pedido extradicional.

eXT 960 – Confederação HelvéticaTema: Extradição Julgamento: 03 de setembro de 2007Publicação: 10 de setembro de 2007Ementa: Prisão domiciliar em território brasileiro de cidadão suíço que possui tam-

bém nacionalidade brasileira. Família brasileira. Pedido de Extradição.

eXT 1047Tema: ExtradiçãoJulgamento: 10 de outubro de 2007Publicação: 14 de novembro de 2007Ementa: Fundada na promessa de reciprocidade, ante a inexistência de tratado

entre o Brasil e o Líbano. Incerteza, quanto ao cumprimento promessa, gerada pelo texto do artigo 30 do Código Penal Libanês, segundo o qual “ninguém pode ser entregue a um Estado estrangeiro fora dos casos esta-belecidos pelas disposições do presente código, se não é por aplicação de um tratado tendo força de lei”. 2. Hipótese em que a Missão Diplomática Libanesa, instada a esclarecer o alcance do preceito, permaneceu inerte. Decisão do tribunal: extradição indeferida.

198 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

II. Prisão Preventiva para extradição

PPe 588 Tema: Prisão Preventiva para Extradição - PanamáJulgamento: 22 de maio de 2007Publicação: 28 de maio de 2007Ementa: Trata-se de pedido de revogação da prisão preventiva para fins de ex-

tradição deduzido por Eduardo Nunes de Souza em favor de FREDDY EUSEBIO RINCÓN VALENCIA, a qual foi decretada, a pedido do Governo panamenho, em 7/5/2007. Indeferimento do pedido de revoga-ção.

III. Ação Cível Originária

ACO - AgR. 645 - SPTema: Execução fiscal de Estado Estrangeiro (França). Imunidade de JurisdiçãoJulgamento: 11 de abril de 2007Publicação: 17 de agosto de 2007Ementa: Ação Cível Originária. 2. Execução Fiscal contra Estado estrangeiro.

Imunidade de jurisdição. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

ACO 673Tema: Ação civil originária - execução fiscal Julgamento: 09 de abril de 2007Publicação: 16 de abril de 2007Ementa: Execução fiscal de dívida ativa. Imunidade de Estado Estrangeiro.

Precedente. Negativa de seguimento.

ACO 973Tema: Ação civil originária - execução fiscalJulgamento: 18 de maio de 2007Publicação: 25 de maio de 2007Ementa: Execução fiscal de divida ativa ajuizada pela União, contra a Embaixada

dos Estados Unidos da América. Inviabilidade. Imunidade do Estado es-trangeiro em processo de execução, tendo em consideração as Convenções de Viena de 1961 e 1963. Pedido indeferido.

Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF 199

IV. Ação Cível Originária - Agravo

ACO - AgR 633 - SPTema: Execução fiscal promovida pela União contra Estado Estrangeiro.Julgamento: 11 de abril de 2007Publicação: 22 de junho de 2007Ementa: Execução fiscal de Estado Estrangeiro (Coréia). Litígio entre o Estado

brasileiro e Estado estrangeiro: observância da imunidade de jurisdição, tendo em consideração as Convenções de Viena de 1961 e 1963. Agravo não provido.

Observação: A execução fiscal contra a República da Coréia. A defesa da imunida-de de jurisdição tem como fundamento jurídico convenção internacional. Entretanto, com base na teoria, legitima-se a imunidade jurisdicional relativa com plena submis-são do Estado estrangeiro à jurisdição doméstica, ao poder judiciário nacional.

V. Mandado de Segurança

MS 26600 Tema: Medida Cautelar do Mandado de Segurança - Suspensão da tramitação no

Congresso do projeto de resolução nº03 de 2007 – MercosulJulgamento: 04 de maio de 2007. Publicação: 10 de maio de 2007.Ementa: Mandado de segurança. Ausência dos requisitos previstos no art. 7º, II, da

Lei nº 1.533/51. Liminar indeferida. Pedido de informações.

MS 26664Tema: Mandado de Segurança – Petrobrás versus BolíviaJulgamento: 16 de junho de 2007Publicação: 26 de junho de 2007Ementa: Mandado de segurança. Liminar. Negócios jurídicos. Petrobrás versus

Bolívia. Suspensão liminar. Impropriedade. Indeferimento.

200 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

VI. Habeas Corpus

HC 88420 Tema: Habeas Corpus. Duplo grau de jurisdição garantido por tratado internacio-nal. Convenção Interamericana de Direitos Humanos. Julgamento: 17 de abril de 2007 Publicação: 08 de junho de 2007Ementa: HABEAS CORPUS. Processo penal. Sentença condenatória. Recurso de

apelação. Processamento. Possibilidade. Desnecessidade de recolhimen-to do réu à prisão. Decreto de custódia cautelar não prejudicado. Prisão preventiva subsistente enquanto perdurarem os motivos que a motiva-ram. Ordem concedida.

HC 92566Tema: Habeas CorpusJulgamento: 09 de outubro de 2007Publicação: 16 de outubro de 2007Ementa: Decisão depositário infiel. Prisão. Controvérsia sobre o alcance do Pacto

de São José da Costa Rica. Relevância da matéria. Liminar deferida.

HC 87219 Tema: Habeas CorpusJulgamento: 14 de junho de 2006Publicação: 04 de agosto de 2006 Ementa: 1. EXTRADIÇÃO. Passiva. Admissibilidade. Extraditando. Brasileiro

naturalizado. Naturalização posterior aos fatos que, como crimes comuns, motivaram o pedido. Aplicação do art. 5º, LI, da CF, e art. 77, I, da Lei nº 6.815/80. Pode ser extraditado o brasileiro naturalizado que adquiriu a nacionalidade após a prática do crime comum que fundamenta o pe-dido de extradição. 2. EXTRADIÇÃO. Passiva. Pedido formulado pelo Governo Austríaco. Falta de tratado específico. Irrelevância. Promessa formalizada de reciprocidade. Processo válido. HC denegado. Aplicação do art. 76 da Lei nº 6.815/80. Precedentes. Sem tratado específico, po-derá ser concedida extradição quando o governo requerente prometer ao Brasil a reciprocidade.

Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal - STF 201

VII. Medida Cautelar no Habeas Corpus

HC 90751 Tema: Medida Cautelar no Habeas CorpusJulgamento: 08 de março de 2007Publicação: 26 de março de 2007 Ementa: Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Convenção Americana

sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica. Art. 5o, inciso LXVII, da Constituição. Prisão civil do depositário infiel. (Para maiores informações: http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia)

HC 92817 Tema: Medida Cautelar no Habeas CorpusJulgamento: 24 de outubro de 2007Publicação: 05 de novembro de 2007Ementa: “Habeas corpus. Depósito judicial. Infidelidade. Prisão civil.” Constituição

Federal artigos 1º, III e 5º, § 3º. Equivalência à emenda constitucional aos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, quando aprovados, por ambas as Casas do Congresso observado o quorum de três quintos. (Para maiores informações: http://www.stf.gov.br/portal/ju-risprudencia)

VIII. Recurso extraordinário

Re 538541Tema: Recurso ExtraordinárioJulgamento: 22 de maio de 2007Publicação: 22 de junho de 2007 Ementa: Discute-se no presente recurso extraordinário a competência para proces-

sar e julgar os crimes praticados contra a organização do trabalho [artigo 149 do CP]. A União ratificou convenções e tratados internacionais que têm por objetivo reprimir e erradicar o trabalho escravo, bem assim que a prática do crime aludido viola também a Previdência Social. (Para maio-res informações: http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia)

202 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Re 351181Tema: Recurso Extraordinário Julgamento: 30 de outubro de 2007Publicação: 27 de novembro de 2007Ementa: Isonomia tributária entre mercadoria importada, proveniente de país si-

gnatário do GATT, e o similar nacional. 2. A controvérsia pertinente à concessão, ou não, de isenção do ICMS à mercadoria importada de país signatário do GATT - Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, em face da existência de benefício concedido a produto similar nacional. Fixou-se o entendimento no sentido de que a isenção de ICMS concedida pelo GATT foi recepcionada pela Constituição do Brasil, eis que o preceito do artigo 151, III, da CB/88, não se aplica às hipóteses em que a União atua como sujeito de direito na ordem internacional. Nego seguimento ao recurso, com fundamento no disposto no artigo 21, § 1º do RISTF. Publique-se. Brasília, 30 de outubro de 2007. Ministro Eros Grau – Relator.

IX. Suspensão de Segurança

SS 3102 Tema: Suspensão de SegurançaJulgamento: 02 de maio de 2007Publicação: 10 de maio de 2007 Ementa: Projeto de Educação do Estado da Bahia. Empréstimo firmado com o

Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD. Resolução nº 16/2003 do Senado Federal. (Para maiores informações: http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia)

X. Ação Direta de Inconstitucionalidade

ADI 2456 Tema: Ação Direta de InconstitucionalidadeJulgamento: 31 de outubro de 2007Publicação: 12 de novembro de 2007 Ementa: Decisão do Decreto N. 3.658/2000, que dispõe sobre imposto de expor-

tação sobre armas e munições, revogado pelo Decreto N. 3.852/2001. perda superveniente de objeto. Ação Direta De Inconstitucionalidade ar-quivada.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 205

ANeXO II

Jurisprudência relativa ao Direito Internacional no Superior Tribunal de Justiça - STJ

PesquisadoresAgda Silveira Machado

André Luiz Cosme Ladeia

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 207

I. Sentença estrangeira Contestada

SeC Nº 349 - eX (2005/0023892-2) Tema: Homologação de Sentença Arbitral EstrangeiraJulgamento: 21 de março de 2007Publicação: 21 de maio de 2007Ementa: SENTENÇA ESTRANGEIRA – JUÍZO ARBITRAL – CONTRATO

INTERNACIONAL ASSINADO ANTES DA LEI DE ARBITRAGEM (9.307/96).

SeC Nº 2.593 - eX (2007/0046207-6) Tema: Homologação de Divórcio por decisão de Autoridade AdministrativaJulgamento: 08 de maio de 2007Publicação: 15 de maio de 2007Decisão: Conforme jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal, é cabí-

vel a homologação de divórcio por decisão de autoridade administrativa se, no país de origem, é esta a forma como se processa o referido ato.

SeC Nº 843 - LB (2005/0035094-1) Tema: Competência de Jurisdição na SucessãoJulgamento: 21 de março de 2007Publicação:28 de maio de 2007Ementa: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. RECONHECIMENTO

DE HERDEIRO. INVENTÁRIO E PARTILHA. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DA JURISDIÇÃO BRASILEIRA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO NA JUSTIÇA DE ORIGEM. REQUISITOS INDISPENSÁVEIS NÃO ATENDIDOS. HOMOLOGAÇÃO INDEFERIDA.

SeC Nº 1.210 - De (2006/0185918-6) Tema: Cláusula Compromissória de Juízo ArbitralJulgamento: 20 de junho de 2007Publicação: 06 de agosto de 2007Ementa: SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. HOMOLOGAÇÃO.

REQUISITOS. LEI 9.307/96 E RESOLUÇÃO 9/2005 DO STJ. CONTRATO DE COMPRA E VENDA. CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM. EXISTÊNCIA. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. ANÁLISE DE CONTROVÉRSIA DECORRENTE DO CONTRATO. JUÍZO ARBITRAL. POSSIBILIDADE. MÉRITO DA DECISÃO ARBITRAL. ANÁLISE NO STJ. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À ORDEM PÚBLICA. PRECEDENTES DO STF E STJ.

208 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

SeC Nº 563 / eX (2006/0106906-8)Tema: O Consentimento na Adoção de MaioresJulgamento: 16 de agosto de 2007Publicação: 03 de setembro de 2007Ementa: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. ALEMANHA.

ADOÇÃO DE PESSOAS MAIORES DE IDADE. CITAÇÃO DO REQUERIDO NO PROCEDIMENTO NO EXTERIOR. PROVA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO. ASSINATURA DO JUIZ. DESNECESSIDADE.

SeC Nº 1.397 / eX (2006/0185712-9)Tema: Acordo sobre Imóvel no BrasilJulgamento: 15 de agosto de 2007publicação: 03 de setembro de 2007Ementa: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. IMÓVEL SITUADO

NO BRASIL. ACORDO ENTRE AS PARTES. POSSIBILIDADE. MATÉRIAS OBJETO DE CONTESTAÇÃO. ART. 9º DA RESOLUÇÃO Nº 9 DO STJ. TRÂNSITO EM JULGADO. CARIMBO ATESTANDO ARQUIVAMENTO DOS AUTOS.

SeC Nº 421 / eX (2005/0172232-8)Tema: Partilha de Imóveis Localizados no BrasilJulgamento: 16 de maio de 2007Publicação: 03 de setembro de 2007Ementa: SENTENÇA ESTRANGEIRA. DIVÓRCIO. HOMOLOGAÇÃO.

DEFERIMENTO. PARTILHA DE BENS. IMÓVEL SITUADO NO BRASIL. OFENSA À SOBERANIA NACIONAL. INEXISTÊNCIA. SEPARAÇÃO DE FATO. NOME. ALTERAÇÃO. QUESTÃO NÃO DECIDIDA NA DECISÃO HOMOLOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO.

SEC Nº 1745 / eX (2006/0228122-0)Tema: Homologação de Divórcio ConsensualJulgamento: 21 de novembro de 2007Publicação: 03 de dezembro de 2007Ementa: HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA. REPÚBLICA

FEDERAL DA ALEMANHA. DIVÓRCIO CONSENSUAL. REQUERIDO EM LUGAR IGNORADO. CITAÇÃO EDITALÍCIA. NOMEAÇÃO DE CURADOR ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 209

II. Sentença estrangeira

Se Nº 2.630 - De (2007/0063764-8) Tema: Homologação de Sentença Estrangeira de AdoçãoJulgamento: 02 de abril de 2007Publicação: 11 de abril de 2007Decisão: 1. Pedido de homologação da sentença estrangeira de adoção da me-

nor P. K. C. dos S., filha natural da segunda requerente, proferida pelo Tribunal de Justiça de Stuttgart, em 22/11/2005. O requerentes pediram, ademais, a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, a fim de possibilitar a representação da adotanda nos atos da vida ci-vil, em particular sua matrícula em estabelecimento de ensino. 2. A concessão de tutela antecipada somente é cabível em casos excep-cionais, mormente em face dos princípios constitucionais do devido pro-cesso legal, do contraditório e da ampla defesa. No caso, não se verifi-cam os elementos para a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional pretendida, nos termos do art. 273 do CPC.

Com efeito, não se vislumbram, na hipótese, as dificuldades alegadas pelos reque-rentes, uma vez que a menor, de nacionalidade brasileira, encontra-se em compa-nhia de sua mãe biológica, também brasileira. Portanto, os atos civis necessários à garantia e à defesa dos interesses da adotanda podem ser praticados por sua geni-tora, o que afasta a possibilidade de eventual ocorrência de dano irreparável.Posto isso, indefiro o pedido de tutela antecipada.

3. Ao Ministério Público Federal.

Se Nº 1467 (2005/0180958-0)Tema: Homologação de Divórcio ConsensualJulgamento: 15 de agosto de 2007Publicação: 24 de setembro de 2007Decisão: (...) 2. Conforme jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal, é ca-

bível a homologação de divórcio por decisão de autoridade administrativa se, no país de origem, é esta a forma como se processa o referido ato. 3. Posto isso, homologo o ato administrativo estrangeiro.

210 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

III. Recurso especial

Resp Nº 667.025 - RJ (2004/0086618-6) Tema: Aplicação Imediata de Acordo Internacional - TRIPSJulgamento: 14 de dezembro de 2006Publicação: 12 de fevereiro de 2007Ementa: RECURSO ESPECIAL - PROPRIEDADE INDUSTRIAL - PATENTE -

TRIPS - VIGÊNCIA - PRECEDENTES.

Resp Nº 621.128 - RS (2003/0221653-3) Tema: Cobrança de ICMS na Importação de LeiteJulgamento: 24 de abril de 2007Publicação: 10 de maio de 2007Ementa: TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ICMS. IMPORTAÇÃO DE

LEITE. PAÍSES SIGNATÁRIOS DO GATT. ISENÇÃO.

Resp Nº 727.825 - SC (2005/0029967-0)Tema: Cobrança de Imposto de Importação de TecidosJulgamento: 12 de dezembro de 2006Publicação: 15 de fevereiro de 2007Ementa: CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL.

IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. VALORAÇÃO ADUANEIRA. MÉTODO DE AFERIÇÃO. SÚMULA 7 DO STJ. ACÓRDÃO FUNDADO EM INTERPRETAÇÃO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL.

Resp 416.077 – SP (2002/0021853-5)Tema: Insenção de ICMS de Produto Importado Similar ao NacionalJulgamento: 27 de junho de 2006Publicação: 02 de agosto de 2006Ementa: RECURSO ESPECIAL. ART. 105, INCISO III, ALÍNEAS “A” E “B”

DO INCISO III DO ART. 105 DA CF. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. TRIBUTÁRIO. ICMS. COMINHO IMPORTADO DE PAÍS SIGNATÁRIO DO GATT. ISENÇÃO. SÚMULA N. 20 DO STJ.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 211

Resp 325.587 / RJ (2001/0057455-5)Tema: Competência Internacional para Regulamentação de VisitasJulgamento: 06 de setembro de 2007Publicação: 24 de setembro de 2007Ementa: RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. VIOLAÇÃO DOS

ARTS. 31 E 34 DO CC/1916. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. ARTS. 88, II, DO CPC E 12 DA LICC. DIREITO DAS OBRIGAÇÕES. IMPERTINÊNCIA À SITUAÇÃO DOS AUTOS. ART. 7º DA LICC. CONFLITO DE LEIS (“DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO”). AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA JUSTIÇA BRASILEIRA. ART. 88, INCISOS I E III DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSO NÃO CONHECIDO.

Resp 653.357 / DF (2004/0060352-8) Tema: Complementação Salarial de Diplomata no Exercício em Organismo InternacionalJulgamento: 12 de setembro de 2006Publicação: 15 de outubro de 2007Ementa: SERVIDOR PÚBLICO. DIPLOMATA. EXERCÍCIO DE CARGO

EM ORGANISMO INTERNACIONAL. COMPLEMENTAÇÃO SALARIAL. DECRETO-LEI Nº 2.116/84. INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO EM PRESTAR COLABORAÇÃO. DEMONSTRAÇÃO. REQUISITOS. ATENDIMENTO.

Resp 963.625 / RS (2007/0146403-0)Tema: Revalidação de Diploma Expedido por Instituição de Ensino EstrangeiraJulgamento: 25 de setembro de 2007Publicação: 30 de outubro de 2007Ementa: ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. CURSO REALIZADO NO

EXTERIOR. EXIGÊNCIA DE REVALIDAÇÃO DO DIPLOMA POR UNIVERSIDADE PÚBLICA BRASILEIRA. DIREITO ADQUIRIDO. INEXISTÊNCIA.

Resp 937.759 / PR (2007/0072127-0)Tema: Incidência de CPMF sobre Operação Simbólica de CâmbioJulgamento: 06 de setembro de 2007Publicação: 11 de outubro de 2007Ementa: TRIBUTÁRIO. INCIDÊNCIA DE CPMF SOBRE OPERAÇÃO

SIMBÓLICA DE CÂMBIO. LEI N. 9311/98. EXISTÊNCIA DE FATO GERADOR. TRIBUTO DEVIDO.

212 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Resp 878.827 - SP (2006/0187013-8)Tema: Desoneração de ICMSJulgamento: 27 de novembro de 2007Publicação: 10 de dezembro de 2007Ementa: TRIBUTÁRIO. ICMS. MERLUZA. IMPORTAÇÃO. PAÍSES

SIGNATÁRIOS DO GATT. ART. 333, I, DO CPC. SÚMULA 7/STJ. ART. 111, II, DO CTN. SÚMULA 211/STJ. MÉRITO. SÚMULAS 20 E 71/STJ.

Resp 934.520 / RJ (2007/0055331-5) Tema: Comprovação de Pagamento de ICMS para Desembaraço Aduaneiro - BacalhauJulgamento: 27 de novembro de 2007Publicação: 10 de dezembro de 2007Ementa: RECURSO ESPECIAL. BACALHAU IMPORTADO DA NORUEGA.

DESEMBARAÇO ADUANEIRO. ICMS. COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. APELO NÃO CONHECIDO. SÚMULA 211/STJ.

IV. Recurso Ordinário

RO Nº 42 - RJ (2004/0162435-0) Tema: Ação de Cobrança Honorários AdvocatíciosJulgamento: 07 de dezembro de 2006Publicação: 23 de abril de 2007Ementa: AÇÃO DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS DE ADVOGADO.

ALEGAÇÃO DE CONTRATO VERBAL DE TRABALHO. ESTADO ESTRANGEIRO.

RO 13 / Pe (2001/0008276-9) Tema: Ação de Indenização por Tratamento Discriminatório e Deportação de BrasileirosJulgamento: 19 de junho de 2007Publicação: 17 de setembro de 2007Ementa: INTERNACIONAL, CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO DE

INDENIZAÇÃO MOVIDA CONTRA A REPÚBLICA DE PORTUGAL. TRATAMENTO DISCRIMINATÓRIO E DEPORTAÇÃO DE CIDADÃOS BRASILEIROS POR INSPETORES DA IMIGRAÇÃO EM DESEMBARQUE AEROPORTUÁRIO. DANOS MORAIS. DEMANDA MOVIDA PERANTE A JUSTIÇA FEDERAL DE

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 213

PERNAMBUCO. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. POSSIBILIDADE DE RELATIVIZAÇÃO, POR VONTADE SOBERANA DO ESTADO ALIENÍGENA. PREMATURA EXTINÇÃO DO PROCESSO AB INITIO. DESCABIMENTO. RETORNO DOS AUTOS À VARA DE ORIGEM PARA QUE, PREVIAMENTE, SE OPORTUNIZE AO ESTADO SUPLICADO A EVENTUAL RENÚNCIA À IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO.

V. Carta Rogatória

CR Nº 1.987 - uS (2006/0168898-4) Tema: Embargo ao cumprimento do ExequaturJulgamento: 10 de abril de 2007Publicação: 17 de abril de 2007Decisão: 1. Trata-se de embargos ao cumprimento do exequatur, previstos no art.

13, § 1º, da Resolução n. 9/2005, deste Tribunal. O Tribunal Distrital dos Estados Unidos da América, Comarca de Nova Jersey, solicitou, median-te esta carta rogatória, que se procedesse à citação de Sólon Teixeira de Resende Júnior em ação civil ajuizada na Justiça americana, conforme pe-dido rogatório de fls. 3-161. A intimação prévia via postal restou frustrada, pois o interessado mudou-se do endereço informado na comissão (certidão de fl. 170-v). Publicada a intimação no Diário da Justiça de 06-09-2006 (fl. 172), o interessado não apresentou impugnação à rogatória (fl. 174).

Enviados os autos ao Ministério Público Federal, este opinou pela concessão do exequatur (fl. 176-v). Concedido o exequatur (fl. 178), os autos foram remetidos à Justiça Federal do Estado de São Paulo. À fl. 196, o oficial de justiça responsável certificou a citação do interessado (ciente à fl. 195). Opostos os embargos, sustenta o interessado, preliminarmente, nulidade do processo por ausência de nomeação de curador especial, figura prevista no art. 9º, § 3º, da Resolução n. 9/2005. No mérito, aduz haver previsão contratual para que as controvérsias entre as partes sejam resol-vidas por decisão arbitral. Às fls. 243-259, a empresa Arthur Schuman Inc., autora da ação ajuizada na Justiça rogante, manifestou-se contrariamente ao alegado nos embargos. 2. Inicialmente, a devolução da intimação prévia não gerou cerceamento

de defesa, pois assegu da a manifestação do interessado nas oportu-nidades previstas nos parágrafos 1º - oposição destes embargos - e 2º - interposição de agravo regimental - do art. 13 da Resolução n. 9/2005, deste Tribunal. Ademais disso, a obrigatoriedade da nomeação de cura-dor especial, prevista no art. 9º, § 3º, da Resolução n. 9/2005, refere-se apenas ao processo de homologação de sentença estrangeira.

214 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

De outra face, o pedido rogatório de citação, por si só, não apresenta qualquer situ-ação de afronta à ordem pública ou à soberania nacional, pois está destinado a dar conhecimento da ação em curso, permitindo a defesa do interessado. A esta Corte cumpre verificar, apenas, se há autenticidade dos documentos e observância dos requisitos da Resolução n. 9/2005, deste Tribunal, o que, no caso, ocorreu. Por fim, quanto à alegada existência de cláusula de arbitragem, a análise do tema cabe apenas à Justiça estrangeira, uma vez que na concessão do exequatur não cabe a esta Corte examinar matéria de defesa a ser decidida no exterior (nesse sentido: CR-AgR 8346/EU, relator Ministro Carlos Velloso, DJ de 7-12-2000). 3. Ante o exposto, rejeitos os embargos.

CR 438 / eX (2005/0015196-0)Tema: Quebra de Sigilo Bancário no ExequaturJulgamento: 15 de agosto de 2007Publicação: 24 de setembro de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. DILIGÊNCIAS. BUSCA E APREENSÃO.

QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DO EXEQÜATUR.

VI. Agravo de Instrumento

Ag 930075 / RS (2007/0171229-0)Tema: Competência para Julgar Banco Estrangeiro PrivadoJulgamento: 22 de agosto de 2007Publicação: 28 de agosto de 2007Decisão: (...) pretende a agravante seja reconhecida a competência da Justiça Federal

para o julgamento do feito, tendo em vista que o Export Import Bank of the United States se constituiria em “órgão do governo americano, funda-do com dinheiro público e empresta dinheiro público com a chancela do Congresso Americano”. (...) Não há, porém, como identificar o agravado como organismo internacional na medida em que não atua como órgão de soberania estrangeira, mas sim, como qualquer outra instituição financeira brasileira que busca receber seus créditos. (...) Nesse contexto, não estando o banco estrangeiro representando seu país, não havendo conflito acerca da soberania dos envolvidos, nem estando a pretensão sendo regida pelo Direito Internacional, mas restrita a questões privadas, não há como se re-conhecer a competência da Justiça Federal para o julgamento do feito.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 215

VII. embargo de Declaração

eDcl na SeC Nº 507 - eX (2005/0209540-1)Tema: Homologação de Sentença Arbitral EstrangeiraJulgamento: 06 de dezembro de 2006Publicação: 05 de fevereiro de 2007Ementa: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 535

DO CPC. AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. LEI 9.307/96. APLICAÇÃO IMEDIATA. CONSTITUCIONALIDADE. UTILIZAÇÃO DA ARBITRAGEM COMO SOLUÇÃO DE CONFLITOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO À ORDEM PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DO MÉRITO DA RELAÇÃO DE DIREITO MATERIAL. OFENSA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. INEXISTÊNCIA. FIXAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. ART. 20, § 4º DO CPC. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

EDcl na SEC Nº 968 - CH (2005/0053918-3)Tema: Homologação de Sentença Arbitral EstrangeiraJulgamento: 06 de dezembro de 2006Publicação: 05 de fevereiro de 2007Ementa: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO.

INOCORRÊNCIA.PREQUESTIONAMENTO. DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE.

eDcl na SeC Nº 611 - uS (2005/0055688-0)Tema: Impossibilidade dos Embargos de Declaração Julgamento: 18 de abril de 2007Publicação: 07 de maio de 2007Ementa: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC.

NÃO-OCORRÊNCIA. REEXAME DE MATÉRIA JÁ DECIDIDA. IMPOSSIBILIDADE.

216 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

VIII. Agravo Regimental

AgRg nos eDcl na CARTA ROgATÓRIA Nº 808 - CR (2005/0068344-2)Tema:Embargos Declaratórios em Carta RogatóriaJulgamento: 01º de fevereiro de 2007Publicação: 26 de fevereiro de 2007Ementa: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NA CARTA

ROGATÓRIA. DISTINÇÃO ENTRE OS EMBARGOS DO ART. 13, § 1º DA RESOLUÇÃO Nº 09/2005 E OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PRAZO.

AgRg na CR Nº 998 - IT (2005/0114782-0) Tema: Solicitação de Quebra de Sigilo Bancário pelo Ministério Público Italiano Julgamento:06 de dezembro de 2006Decisão: 30 de abril de 2007Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. CARTA ROGATÓRIA. COOPERAÇÃO

JURÍDICA. BRASIL. ITÁLIA. DILIGÊNCIAS. VÍCIOS FORMAIS. INEXISTENTES. QUEBRA SIGILO BANCÁRIO. SOBERANIA. ORDEM PÚBLICA. PARCIAL PROVIMENTO.

AgRg na CR Nº 1.461 / eX (2006/0030080-0)Tema: Citação sem documentos que acompanham a inicialJulgamento: 16 de maio de 2007Publicação: 06 de agosto de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. DILIGÊNCIA

ROGADA. CITAÇÃO. DOCUMENTOS QUE ACOMPANHAM A INICIAL. PREJUÍZO À DEFESA, OFENSA À ORDEM PÚBLICA E SOBERANIA NACIONAL. INOCORRÊNCIA. ELEIÇÃO DE FORO. QUESTÃO A SER ANALISADA PELA JUSTIÇA ROGANTE. REPRESENTAÇÃO EM JUÍZO.

AgRg na CR 571 / eX (2005/0020548-2)Tema: Perseguição Penal no BrasilJulgamento: 06 de junho de 2007Publicação: 06 de agosto de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. ALEGADA

AMPLIAÇÃO INDEVIDA DAS DILIGÊNCIAS PREVISTAS NO EXEQUATUR E ATUAÇÃO EXTRA PETITA DESTA CORTE. INOCORRÊNCIA. CRIME PERPETRADO NO EXTERIOR. AUTORIA IMPUTADA A BRASILEIRO. POSSIBILIDADE DE PERSECUÇÃO PENAL NO BRASIL. ART. 7º, INC. II, “B”, E § 2.º, DO CÓDIGO PENAL.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 217

CONVERSÃO DO FEITO EM NOVAS DILIGÊNCIAS. AUSÊNCIA DE NECESSIDADE. FATOS DEVIDAMENTE DESCRITOS NOS DOCUMENTOS JUNTADOS PELA JUSTIÇA ROGANTE.

AgRg na CR 2.069 / eX (2006/0195585-0)Tema: Quebra de Sigilo Bancário Requerido por ExequaturJulgamento: 16 de maio de 2007Publicação: 06 de agosto de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. PEDIDO DE

QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DA PRÁTICA DO DELITO.

AgRg na CR 1.589 / eX (2006/0043281-7)Tema: Competência da Justiça Estrangeira e Regularidade na Relação ProcessualJulgamento: 16 de maio de 2007Publicação: 06 de agosto de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. AUTENTICAÇÃO

E TRADUÇÃO JURAMENTADA. TRÂMITE POR MEIO DE AUTORIDADE CENTRAL. DILIGÊNCIA ROGADA. CITAÇÃO. DOCUMENTOS QUE ACOMPANHAM A INICIAL. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO À DEFESA, OFENSA À ORDEM PÚBLICA OU SOBERANIA NACIONAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTRANGEIRA E REGULARIDADE NA RELAÇÃO PROCESSUAL. QUESTÕES A SEREM ANALISADAS PELA JUSTIÇA ROGANTE.

AgRg na CR 2.116 / eX (2006/0219354-3)Tema: Competência ConcorrenteJulgamento: 16 de maio de 2007Publicação: 06 de agosto de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. PROCURAÇÃO.

REQUISITO DO ART. 202 DO CPC. APLICAÇÃO APENAS ÀS CARTAS ROGATÓRIAS ATIVAS. ARTS. 88 DO CPC. HIPÓTESE DE COMPETÊNCIA CONCORRENTE DA JUSTIÇA BRASILEIRA.

AgRg no Resp 699871 / DF (2004/0131923-0)Tema: Onerosidade Excessiva Decorrente de Variação CambialJulgamento: 07 de agosto de 2007Publicação: 20 de agosto de 2007

218 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ARRENDAMENTO MERCANTIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VARIAÇÃO CAMBIAL. ONEROSIDADE EXCESSIVA. CONDENAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA REDIMENSIONADA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO, COM OBSERVAÇÃO.

AgRg na CR 2449 / eX (2007/0063231-9)Tema: Prejuízo na Defesa Decorrente da CitaçãoJulgamento: 15 de agosto de 2007Publicação: 17 de setembro de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. DILIGÊNCIA

ROGADA. CITAÇÃO. ALEGADO PREJUÍZO NA DEFESA. OFENSA À ORDEM PÚBLICA E À SOBERANIA NACIONAL. INOCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO E FRAUDE À LEI. QUESTÕES A SEREM ANALISADAS PELA JUSTIÇA ROGANTE.

AgRg no Resp 936974 / RS (2007/0063743-4)Tema: Revalidação de Diploma Expedido por Instituição de Ensino EstrangeiraJulgamento: 20 de setembro de 2007Publicação: 03 de outubro de 2007Ementa: ADMINISTRATIVO – ENSINO SUPERIOR – DIPLOMA EXPEDIDO

POR UNIVERSIDADE ESTRANGEIRA – REVALIDAÇÃO – NECESSIDADE DE PROCEDIMENTO – TÉRMINO DO CURSO NA VIGÊNCIA DO DECRETO N. 3.007/99 – INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO – RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO PARA JULGAR IMPROCEDENTE A AÇÃO.

AgRg nos eDcl na Se 1.554 / eX (2005/0203076-0)Tema: Jurisdição brasileira afastada na Guarda de MenoresJulgamento: 19 de setembro de 2007Publicação: 22 de outubro de 2007Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. SENTENÇA ESTRANGEIRA. HOMOLOGAÇÃO.

INDEFERIMENTO.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ 219

AgRg no Resp 843.004 - Pe (2006/0090166-6) Tema: Crédito-Prêmio de IPIJulgamento: 13 de novembro de 2007Publicação: 03 de dezembro de 2007Ementa: TRIBUTÁRIO. IPI. CRÉDITO-PRÊMIO. DECRETOS-LEIS 491/69, 1.724/79,

1.722/79, 1.658/79 E 1.894/81. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. EXTINÇÃO DO BENEFÍCIO. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA PELA PRIMEIRA SEÇÃO. VIGÊNCIA DO ESTÍMULO FISCAL ATÉ 04 DE OUTUBRO DE 1990. RESSALVA DO ENTENDIMENTO DO RELATOR.

AgRg na CR 2497 / eX (2007/0081158-3)Tema: Autenticidade de DocumentosJulgamento: 07 de novembro de 2007Publicação: 10 de dezembro de 2007Ementa: CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. AUTENTICIDADE

DOS DOCUMENTOS. QUESTÕES DE MÉRITO. ANÁLISE PELA JUSTIÇA ROGANTE. COMPETÊNCIA RELATIVA. DILIGÊNCIA ROGADA. CITAÇÃO. ALEGADA OFENSA À ORDEM PÚBLICA E À SOBERANIA NACIONAL. INOCORRÊNCIA.

IX. Mandado de Segurança

MS 12.401 / DF (2006/0254683-8)Tema: Pensão Alimentícia para Auxiliar de Comissão Diplomática BrasileiraJulgamento: 26 de setembro de 2007Publicação: 25 de outubro de 2007Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. AUXILIAR

LOCAL DE COMISSÃO DIPLOMÁTICA BRASILEIRA NO EXTERIOR. ENQUADRAMENTO. ART. 243 DA LEI. 8.112/90. SERVIDOR PÚBLICO. PRECEDENTES DO STJ. PENSÃO POR MORTE. CABIMENTO.

MS 12.510 / DF (2006/0281357-5)Tema: Declaração da Condição de RefugiadoJulgamento: 08 de setembro de 2007Publicação: 10 de setembro de 2007Ementa: MANDADO DE SEGURANÇA. LEI 9.474/97. DECLARAÇÃO DA

CONDIÇÃO DE REFUGIADO. BRASILEIRO NATURALIZADO. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE ATO ILEGAL PRATICADO PELA AUTORIDADE IMPETRADA QUE TENHA VIOLADO DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO DEMANDANTE. SEGURANÇA DENEGADA.

220 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

X. embargo de Divergência

eResp 696713 / RS (2005/0101705-0)Tema: Tributação similar ao país signatário do GATTJulgamento: 27 de junho de 2007Publicação: 03 de setembro de 2007Ementa: TRIBUTÁRIO. ICMS. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO NAS

SAÍDAS INTERNAS DE PRODUTOS QUE COMPÕEM A CESTA BÁSICA DO RIO GRANDE DO SUL. RICMS, ARTIGO 23, II, LIVRO I. CONVÊNIO ICMS 128/94. IMPORTAÇÃO DE PRODUTO SIMILAR DE PAÍS SIGNATÁRIO DO GATT (ATUAL OMC). EXTENSÃO DO BENEFÍCIO FISCAL AO SIMILAR IMPORTADO NO MOMENTO DO DESEMBARAÇO ADUANEIRO.

XI. Habeas Corpus

HC 60.382 / SP (2006/0120079-5)Tema: Desnecessidade de Intérprete Oficial na Oitiva de TestemunhaJulgamento: 02 de outubro de 2007Publicação: 22 de outubro de 2007Ementa: ROUBO E SEQÜESTRO – VÍTIMAS ESTRANGEIRAS –

POSSIBILIDADE DE SER OUVIDA COMO TESTEMUNHA A PESSOA QUE AJUDOU A AUTORIDADE POLICIAL A ENTENDER AS VÍTIMAS, ESTRANGEIRAS., POSTO QUE NÃO AGIU COMO ADVOGADO. DESNECESSIDADE DE INTÉRPRETE OFICIAL NAQUELA OPORTUNIDADE. REGIME INTEGRALMENTE FECHADO – INCONSTITUCIONALIDADE. ORDEM DENEGADA, MAS CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA MODIFICAR O REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE.

XII. Conflito de Competência

CC 86.021 / SP (2007/0121829-7)Tema: Conflito de Competência Penal – Tráfico de EntorpecentesJulgamento: 08 de agosto de 2007Publicação: 03 de setembro de 2007Ementa: CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE

ENTORPECENTES. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA TRANSNACIONALIDADE DA CONDUTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. PRECEDENTES DESTA CORTE.

Casos Contenciosos e Pareceres Consultivos da Corte Internacional de Justiça – CIJ 223

ANeXO III

Casos Contenciosos e Pareceres Consultivos da Corte Internacional de Justiça - CIJ

(2003 - 2007)

PesquisadoresCláudio Antônio Júnior

Raquel Faria Pinto Coelho

Casos Contenciosos e Pareceres Consultivos da Corte Internacional de Justiça – CIJ 225

1) (1992) RePÚBLICA ISLÂMICA DO IRÃ versus eSTADOS uNIDOS DA AMÉRICA

(CASO RELATIVO ÀS PLATAFORMAS PETROLÍFERAS)Julgamento: dia 06 de novembro de 2003

2) (2002) eL SALVADOR versus HONDURAS – NICARÁRGUA INTeRVeNIeNTe

(AÇÃO DE REVISÃO DO JULGAMENTO DE 11 DE SETEMBRO DE 1992 NO CASO ENVOLVENDO A CONTROVÉRSIA ACERCA DA FRONTEIRA TERRESTRE, INSULANA E MARÍTIMA)Julgamento: dia 18 de dezembro de 2003

3) (2003) MÉXICO versus eSTADOS uNIDOS DA AMÉRICA(AVENA E OUTROS NACIONAIS MEXICANOS)Julgamento: dia 05 de fevereiro de 2003 e dia 31 de março de 2004

4) (2004) PAReCeR CONSuLTIVO (CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DA EDIFICAÇÃO DE UM MURO NO TERRITÓRIO PALESTINO OCUPADO)Emissão: dia 09 de julho de 2004

5) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus ALEMANHA(LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

6) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus BÉLgICA (LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

7) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus CANADÁ(LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

8) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus FRANÇA(LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

9) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus ITÁLIA(LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

226 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

10) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus PAÍSeS BAIXOS (LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

11) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus PORTugAL(LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004 12) (1999) SÉRVIA e MONTeNegRO versus ReINO uNIDO(LEGALIDADE DO USO DA FORÇA)Julgamento: dia 15 de dezembro de 2004

13) (2001) LEICHTESTEIN versus ALEMANHA (CERTA PROPRIEDADE)Julgamento: 10 de fevereiro de 2005

14) (2002) BeNIN versus NÍgeR (CONFLITO ACERCA DA FRONTEIRA)Julgamento: dia 12 de julho de 2005

15) (2002) REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DO CONGO versus RuANDA (ATIVIDADES ARMADAS NO TERRITÓRIO DO CONGO - NOVA DILIGÊNCIA INICIADA EM 2002)Julgamento: dia 03 de fevereiro de 2006

16) (1993) BÓSNIA-HERZEGOVINA versus SÉRVIA e MONTeNegRO (CASO RELATIVO À APLICAÇÃO DA CONVENÇÃO DE PREVENÇÃO E REPRESSÃO AOS CRIMES DE GENOCÍDIO)Julgamento: dia 26 de fevereiro de 2007

17) (1999) NICARÁGUA versus HONDURAS (DISPUTA TERRITORIAL E MARÍTIMA NO MAR DO CARIBE)Julgamento: dia 08 de outubro de 2007

** Para visualização, na língua portuguesa, da íntegra do resumo e da tradução dos casos e pareceres acima listados, acessar o endereço eletrônico do Centro de Direito Internacional - CEDIN, qual seja, www.cedin.com.br

Tratados Internacionais 229

ANeXO IV

Tratados Internacionais

PesquisadoresAziz Tuffi Saliba

Bernardo Hoffman VersieuxCamilla Capucio

Kalki Zumbo Coronel GuevaraPatrícia Luciane de Carvalho

Túlio César Mourthé de Alvim Andrade

Tratados Internacionais 231

I. Integração Regional

Ata de Retificação do Segundo Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 58, entre os Governos da República Federativa do Brasil, da República Argentina, da República do Paraguai e da República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e o Governo da República do Peru, celebrado em Montevidéu, em 19 de dezembro de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.324, de 27 de dezembro de 2007, publicado no D.O.U. de 28 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a retificação de erro de digitação da versão em português do texto do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Quadragésimo Sétimo Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 35, entre os Governos da República Argentina, da República Federativa do Brasil, da República do Paraguai e da República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e da República do Chile, celebrado em Montevidéu, em 13 de agosto de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.213, de 26 de setembro de 2007, publicado no D.O.U. de 27 de setembro de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Sexagésimo Sexto Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 2, entre os Governos da República Federativa do Brasil e da República Oriental do Uruguai, celebrado em Montevidéu, em 9 de julho de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.197, de 22 de agosto de 2007, publicado no D.O.U. de 23 de agosto de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), referente ao intercâmbio de produtos do setor automotivo.

Primeiro Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 55, entre os Governos da República Federativa do Brasil, da República Argentina, da República do Paraguai, da República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e dos Estados Unidos Mexicanos, celebrado em Montevidéu, em 10 de julho de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.196, de 22 de agosto de 2007, publicado no D.O.U. de 23 de agosto de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), referente ao programa de liberalização comercial de bens.

Sexagésimo Sétimo Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 2, entre os Governos da República Federativa do Brasil e da República Oriental do Uruguai, celebrado em Montevidéu, em 26 de julho de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.195, de 22 de agosto de 2007, publicado no D.O.U. de 23 de agosto de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da

232 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), referente à política automotiva comum entre os dois países.

Ata de Retificação do Acordo de Complementação Econômica nº 59, entre os Governos da República Federativa do Brasil, da República Argentina, da República do Paraguai e da República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e os Governos da República da Colômbia, da República do Equador e da República Bolivariana da Venezuela, celebrado em Montevidéu, em 19 de dezembro de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.178, de 1º de agosto de 2007, publicado no D.O.U. de 2 de agosto de 2007. Dispõe sobre a retificação de erro de digitação da versão em português do texto do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Trigésimo Sétimo Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica n° 14, entre os Governos da República Federativa do Brasil e da República Argentina, celebrado em Montevidéu, em 20 de junho de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.143, de 3 de julho de 2007, publicado no D.O.U. de 4 de julho de 2007. Dispõe sobre a extensão da vigência do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Vigésimo Primeiro Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica no 35, entre os Governos dos Estados Partes do MERCOSUL e o Governo da República do Chile, celebrado em Montevidéu, em 19 de outubro de 1999. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.142, de 3 de julho de 2007, publicado no D.O.U. de 4 de julho de 2007. Dispõe sobre o Regime de Solução de Controvérsias adotado entre os países no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Terceiro Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 53, entre os Governos da República Federativa do Brasil e dos Estados Unidos Mexicanos, celebrado em Montevidéu, em 4 de maio de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.121, de 13 de julho de 2007, publicado no D.O.U. de 14 de julho de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Sexagésimo Quinto Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 2, entre os Governos da República Federativa do Brasil e da República Oriental do Uruguai, celebrado em Montevidéu, em 29 de dezembro de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.088, de 23 de abril de 2007, publicado no D.O.U. de 24 de abril de 2007. Dispõe sobre a extensão da vigência e aplicação do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Tratados Internacionais 233

Acordo de Complementação Econômica nº 62, entre a República Federativa do Brasil, a República Argentina, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e a República de Cuba, celebrado em Montevidéu, em 21 de julho de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.068, de 26 de março de 2007, publicado no D.O.U. de 27 de março de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI).

Quarto Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº 59, entre os Governos da República Federativa do Brasil, da República Argentina, da República do Paraguai e da República Oriental do Uruguai, Estados Partes do MERCOSUL, e os Governos da República Bolivariana da Venezuela, da República da Colômbia e da República do Equador, celebrado em Montevidéu, em 18 de agosto de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.052, de 28 de fevereiro 2007, publicado no D.O.U. Edição Extra de 28 de fevereiro de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), referente ao programa de liberalização comercial.

Sexagésimo Quarto Protocolo ao Acordo de Complementação Econômica nº 2, entre os Governos da República Federativa do Brasil e da República Oriental do Uruguai, celebrado em Montevidéu, em 30 de agosto de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.051, de 28 de fevereiro de 2007, publicado no D.O.U. Edição Extra de 28 de fevereiro de 2007. Texto retificado publicado no D.O.U. de 22 de março de 2007. Dispõe sobre a execução do acordo celebrado no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), referente à expansão da integração energética entre os dois países.

II. Mercosul

Mercosul: Protocolo Constitutivo do Parlamento do MERCOSUL, aprovado pela Decisão no 23/05 do Conselho do Mercado Comum, assinado pelos Governos da República Federativa do Brasil, da República Argentina, da República do Paraguai e da República Oriental do Uruguai, celebrado em Montevidéu, em 9 de dezembro de 2005. Aprovado pelo Decreto-Legislativo nº 408, de 12 de setembro de 2006. Ratificado em 23 de novembro de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.105, de 30 de abril de 2007, publicado no D.O.U. de 2 de maio de 2007. Dispõe sobre a criação, organização e competências do Parlamento do MERCOSUL.

Mercosul: Acordo sobre o Benefício da Justiça Gratuita e Assistência Jurídica Gratuita entre os Estados Partes do MERCOSUL, celebrado em Florianópolis, em 15 de dezembro de 2000. Aprovado pelo Decreto-Legislativo nº 146, de 6 de fevereiro de 2004. Ratificado em 21 de maio de 2004. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº.

234 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

6.086, de 19 de abril de 2007, publicado no D.O.U. de 20 de abril de 2007. Dispõe sobre regras que garantam a justiça gratuita e a assistência jurídica gratuita para os cidadãos dentro do território do MERCOSUL.

III. Direitos Humanos

Organização das Nações Unidas – ONU: Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, adotado em Nova York, em 18 de dezembro de 2002. Aprovado pelo Decreto-Legislativo nº 483, de 20 de dezembro de 2006. Ratificado em 11 de janeiro de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.085, de 19 de abril de 2007, publicado no D.O.U. de 20 de abril de 2007. Dispõe sobre um sistema de visitas regulares efetuadas por órgãos nacionais e internacionais independentes a lugares onde pessoas são privadas de sua liberdade, com a intenção de prevenir a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes.

* Corte Interamericana de Direitos Humanos

Medida Provisória emitida em 03 de julho de 2007, na qual a Corte Interamericana de Direitos Humanos emitiu resolução referente às medidas provisórias com respeito com respeito à República Federativa do Brasil acerca do “assunto das crianças e adolescentes privados de liberdade no complexo do Tatuapé da Fundação CASA”.

Autorização para o cumprimento da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Damião Ximenes Lopes, expedida em São José, em 4 de julho de 2006. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.185, de 13 de agosto de 2007, publicado no D.O.U. de 14 de agosto de 2007. Dispõe sobre o cumprimento da sentença, em especial a indenização pelas violações dos direitos humanos aos familiares da vítima, como estabelecido na sentença.

* Comissão Interamericana de Direitos Humanos

Em 20 de dezembro de 2007, a Comissão apresentou demanda perante a Corte contra o Brasil referente ao caso nº. 12.353 “Arley Escher e outros”.

Em 24 de dezembro de 2007 a Comissão apresentou demanda perante a Corte contra o Brasil no caso nº. 12.478 “Sétimo Garibaldi”.

Em 1º de agosto de 2007, a Comissão apresentou um comunicado à imprensa, de nº. 40/07, em que analisou a situação das mulheres afro-brasileiras.

No comunicado de imprensa nº. 54/07, foi exposto a situação dos descendentes

Tratados Internacionais 235

de escravos fugidos durante o período colonial (“quilombolas”) no Brasil e sobre os internos do Presídio de Urso Branco.

O informe 38/07 admitiu a petição 12.263 “Márcia Barbosa de Souza versus Brasil”, em 26 de julho de 2007.

Em 25 de julho de 2007, foi publicado o informe 59/07, que não admitiu a petição 12.293 de “Carlos Roberto Moreira versus Brasil”.

IV. Rede Diplomática

* embaixadas

Montenegro: Criação da Embaixada do Brasil na República do Montenegro, com sede em Podgorica, cumulativa com a Embaixada em Belgrado. Autorizada pelo Decreto nº. 6.152, de 10 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 11 de outubro de 2007.

Congo: Criação da Embaixada do Brasil na República do Congo, com sede em Brazzaville. Autorizada pelo Decreto nº. 6.235, de 11 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 15 de outubro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Embaixada em Libreville, Gabão.

Mauritânia: Criação da Embaixada do Brasil na República Islâmica da Mauritânia, com sede em Nouakchott. Autorizada pelo Decreto nº. 6.236, de 11 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 15 de outubro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Embaixada em Dacar, Senegal.

Bukina Faso: Criação da Embaixada do Brasil na República do Bukina Faso, com sede em Uagadugu. Autorizada pelo Decreto nº. 6.237, de 11 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 15 de outubro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Embaixada em Acra, Gana.

Mali: Criação da Embaixada do Brasil na República do Mali, com sede em Bamako. Autorizada pelo Decreto nº. 6.238, de 11 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 15 de outubro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Embaixada em Abidjã, Costa do Marfim.

eslováquia: Criação da Embaixada do Brasil na República Eslovaca, com sede em Bratislava. Autorizada pelo Decreto nº. 6.244, de 19 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 22 de outubro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Embaixada em Viena, Áustria.

236 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

eslovênia: Criação da Embaixada do Brasil em na República da Slovênia, com sede em Liubliana. Autorizada pelo Decreto nº. 6.246, de 1º de novembro de 2007, publicado no D.O.U. de 05 de novembro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Embaixada em Viena, Áustria.

Santa Lúcia: Criação da Embaixada do Brasil em Santa Lúcia, com sede em Castries. Autorizada pelo Decreto nº. 6.305, de 14 de dezembro de 2007, publicado no D.O.U. de 17 de janeiro de 2007. Fim da Embaixada Cumulativa com a Missão junto à Organização dos Estados Americanos (OEA).

* Outros órgãos do Serviço exterior

Canadá: Criação do Consulado-Geral do Brasil no Canadá, com sede em Vancouver. Autorizada pelo Decreto nº. 6.113, de 15 de maio de 2007, publicado no D.O.U. de 16 de maio de 2007.

guiana: Criação do Vice-Consulado do Brasil na República da Guiana, com sede em Lethem. Autorizada pelo Decreto nº. 6.153, de 10 de outubro de 2007, publicado no D.O.U. de 11 de outubro de 2007.

V. Cooperação Técnica

Comunidade européia: Promulga o Acordo de Cooperação Científica e Tecnológica entre o governo da República Federativa do Brasil e a Comunidade Européia, celebrado em 19 de janeiro de 2004. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 476, de 22 de novembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.112, de 10 de maio de 2007, publicado no D.O.U. de 14 de maio de 2007.

Sudão: Promulga o Acordo de Cooperação Técnica entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Sudão, celebrado em Brasília em 11 de maio de 2005. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 304, de 13 de julho de 2006. Promulgado no Decreto nº. 6.141, de 03 de julho de 2007, publicado no D.O.U. de 04 de julho de 2007.

VI. Segurança

França: Promulga o Acordo para Cooperação na Área da Aeronáutica Militar entre o Governo da República Federativa do Brasil e a República Francesa, celebrado em Paris, em 15 de julho de 2005. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 410, de 12 de setembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.011, de 05 de janeiro de 2007, publicado no D.O.U. de 08 de janeiro de 2007.

Tratados Internacionais 237

Argentina: Promulga o Acordo Quadro de Cooperação em Matéria de Defesa entre a República Federativa do Brasil e a Argentina, celebrado em Puerto Iguazú, em 30 de novembro de 2005. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 484, de 20 de dezembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.084, de 19 de abril de 2007, publicado no D.O.U. de 20 de abril de 2007.

Índia: Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Índia sobre Cooperação em Assuntos Relativos à Defesa, celebrado em Nova Delhi, em 1o de dezembro de 2003. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 475, de 22 de novembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.111 de 10 de maio de 2007, publicado no D.O.U. de 11 de maio de 2007.

Organização dos estados Americanos – OeA: Promulga a Convenção Interamericana sobre Transparência nas Aquisições de Armas Convencionais, celebrada na Cidade da Guatemala, em 7 de junho de 1999. Aprovada pelo Decreto Legislativo nº. 474, de 22 de novembro de 2006. Promulgada pelo Decreto nº. 6.060, de 12 de março de 2007, publicado no D.O.U. de 13 de março de 2007.

VII. Internalização de Resoluções do Conselho de Segurança das Nações unidas - ONu

Decreto nº 6.150, de 10.7.2007 Dispõe sobre a execução no Território Nacional da Resolução no 1.753, de 27 de abril de 2007, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que altera o regime de sanções à Libéria.

Decreto nº 6.118, de 22 de Maio de 2007. Dispõe sobre a execução no Território Nacional da Resolução n° 1.747, de 24 de março de 2007, do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU), a qual aprofunda as sanções previstas na Resolução n° 1.737 (2006) do CSNU - incorporada ao ordenamento jurídico interno pelo Decreto n° 6.045, de 21 de fevereiro de 2007, e, entre outras disposições, conclama os Estados partes a absterem-se de novos compromissos no que se refere à concessão de doações, assistência financeira e empréstimos ao Irã; proíbe o fornecimento, venda ou transferência de armas pelo Irã ou seus nacionais; e exorta os Estados partes a restringirem o fornecimento, venda ou transferência àquele País de carros de combate, veículos blindados, sistemas de artilharia de grosso calibre, aviões de combate, helicópteros de ataque, navios de guerra e mísseis.

Decreto nº 6.045, de 21.2.2007. Dispõe sobre a execução no Território Nacional da Resolução no 1.737, de 23 de dezembro de 2006, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a qual, entre outras disposições, proíbe a transferência de quaisquer itens, materiais, equipamentos, bens e tecnologia que possam contribuir para atividades levadas a cabo pela República Islâmica do Irã relacionadas a enriquecimento, novo

238 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

processamento e a projetos de água pesada, bem como para o desenvolvimento de vetores de armas nucleares, e estabelece o congelamento de fundos, ativos financeiros e recursos econômicos de indivíduos e entidades.

Decreto nº 6.034, de 1º.2.2007. Dispõe sobre a execução no Território Nacional da Resolução no 1.731, de 20 de dezembro de 2006, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que, entre outras providências, renova, por um ano, o embargo de armas e restrições de viagem e, por seis meses, o embargo à importação de diamantes em estado bruto procedentes da Libéria, bem como reafirma as medidas de congelamento de fundos, ativos financeiros e recursos econômicos de determinados indivíduos e entidades.

Decreto nº 6.033, de 1º.2.2007. Dispõe sobre a execução no Território Nacional da Resolução no 1.727, de 15 de dezembro de 2006, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que, entre outras providências, renova, até 31 de outubro de 2007, o embargo de armas à Costa do Marfim, bem como as restrições de viagem e o congelamento de fundos, ativos financeiros e recursos econômicos de determinados indivíduos e entidades.

VIII. emenda Constitucional nº 54 de 20 de setembro de 2007

Dá nova redação à alínea c do inciso I do art. 12 da Constituição Federal e acrescenta art. 95 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, assegurando o registro, nos consulados, de brasileiros nascidos no estrangeiro.“As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional: Art. 1º A alínea c do inciso I do art. 12 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 12 ...................................................................................I - .............................................................................................c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira;.................................................................................................”(NR)Art. 2º O Ato das Disposições Constitucionais Transitórias passa a vigorar acrescido do seguinte art. 95: “Art. 95. Os nascidos no estrangeiro entre 7 de junho de 1994 e a data da promulgação desta Emenda Constitucional, filhos de pai brasileiro ou mãe brasileira, poderão ser registrados em repartição diplomática ou consular brasileira competente ou em ofício de registro, se vierem a residir na República Federativa do Brasil.”

Tratados Internacionais 239

IX. Tratados Internacionais Diversos

Bélgica: Convenção Adicional à Convenção entre a República Federativa do Brasil e o Reino da Bélgica para Evitar a Dupla Tributação e Regular Outras Questões em Matéria de Impostos sobre a Renda e o Protocolo Final, assinados em Brasília em 23 de junho de 1972, celebrado em Brasília, em 20 de novembro de 2002. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 266, de 04 de outubro de 2007. Promulgado pelo Decreto nº. 6.332, de 28 de dezembro de 2007, publicado no D.O.U. de 31 de dezembro de 2007. Dispõe sobre alterações na Convenção e no Protocolo, com vistas a otimizar a eficácia dos mesmos.

China: Tratado entre a República Federativa do Brasil e a República Popular da China sobre Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal, celebrado em Pequim, em 24 de maio de 2004. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 296, de 12 de julho de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.282, de 03 de dezembro de 2007, publicado no D.O.U. de 04 de dezembro de 2007. Dispõe sobre cooperação judiciária entre os países, em matéria penal.

Romênia: Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da Romênia sobre Isenção Parcial de Vistos, celebrado em Bucareste, em 16 de outubro de 2004. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 281, de 04 de outubro de 2007. Promulgado pelo Decreto nº. 6.279, de 29 de novembro de 2007, publicado no D.O.U. de 03 de dezembro de 2007. Dispõe sobre a cooperação mútua para facilitar a entrada de nacionais de um Estado no território do outro Estado.

Organização Internacional do Trabalho – OIT: Convenção nº 167 e a Recomendação nº 175 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre a Segurança e Saúde na Construção, adotadas em Genebra, em 20 de junho de 1988, pela 75ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho. Aprovados pelo Decreto Legislativo nº. 61, de 18 de abril de 2006. Ratificada em 19 de maio de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.271, de 22 de novembro de 2007, publicado no D.O.U. de 23 de novembro de 2007. Dispõe normas necessárias à segurança dos trabalhadores na construção civil.

Organização Internacional Do Trabalho – OIT: Convenção nº 176 e a Recomendação nº 183 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Segurança e Saúde nas Minas, adotadas em Genebra, em 22 de junho de 1995, pela 85ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 62, de 18 de abril de 2006. Ratificada em 18 de maio de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.270, de 22 de novembro de 2007, publicado no D.O.U. de 23 de novembro de 2007. Dispõe normas necessárias à segurança dos trabalhadores nas minas.

240 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

França: Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa, relativo à Construção de uma Ponte Rodoviária sobre o Rio Oiapoque ligando a Guiana Francesa e o Estado do Amapá, celebrado em Paris, em 15 de julho de 2005, e sua Emenda, de 21 de outubro de 2005. Aprovados pelo Decreto Legislativo nº. 24, de 14 de fevereiro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.250, de 06 de novembro de 2007, publicado no D.O.U. de 07 de novembro de 2007. Dispõe sobre a construção de específica ponte sobre o Rio Oiapoque.

Organização das Nações unidas para educação, Ciência e Cultura – unesco: Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, celebrada em Paris, em 20 de outubro de 2005. Aprovado pelo Decreto-Legislativo nº 485, de 20 de dezembro de 2006. Ratificado em 16 de janeiro de 2007. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.177, de 1º de agosto de 2007, publicado no D.O.U. de 2 de agosto de 2007. Dispõe sobre normas de proteção e promoção da diversidade cultural.

Organização Marítima Internacional – OMI: Convenção para a Supressão de Atos Ilícitos contra a Segurança da Navegação Marítima e o Protocolo para a Supressão de Atos Ilícitos contra a Segurança de Plataformas Fixas Localizadas na Plataforma Continental, celebrados em Roma, em 10 de maio de 1988. Aprovados pelo Decreto-Legislativo nº 921, de 15 de setembro de 2005, com reservas ao item 2 do artigo 6o, ao artigo 8o e ao item 1 do artigo 16 da Convenção, bem como ao item 2 do artigo 3o do Protocolo. Ratificados em 25 de outubro de 2005. Promulgado pelo Decreto Legislativo nº. 6.136, de 26 de junho de 2007, publicado no D.O.U. de 27 de junho de 2007. Dispõe sobre a supressão de delitos cometidos a bordo, que coloquem em risco, respectivamente, navios e plataformas fixas.

México: Promulga a execução do Terceiro Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica nº. 53, entre os Governos da República Federativa do Brasil e dos Estados Unidos Mexicanos, de 4 de maio de 2007. Promulgado pelo Decreto nº. 6.121 de 13 de junho de 2007, publicado no D.O.U. de 14 de junho de 2007. Dispõe sobre a alteração da preferência tarifária brasileira quanto ao ácido tereftálico e seus sais disposto no Acordo de Complementação Econômica nº. 53.

Associação de estados Ibero-Americanos para o desenvolvimento das bibliotecas nacionais nos países Ibero-Americanos – Abinia: Ata Constitutiva da Associação de Estados Ibero-Americanos para o Desenvolvimento das Bibliotecas Nacionais dos Países Ibero-Americanos - ABINIA, celebrado em Lima, em 12 de outubro de 1999. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 35, de 22 de fevereiro de 2006. Adesão à ata em 30 de novembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.109, de 04 de maio de 2007, publicado no D.O.U. de 07 de maio de 2007. Dispõe sobre a a criação e organização do organismo intergovernamental.

Tratados Internacionais 241

Portugal: Acordo sobre Serviços Aéreos entre a República Federativa do Brasil e a República Portuguesa, celebrado em Lisboa, em 11 de novembro de 2002. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 477, de 22 de novembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.058, de 08 de março de 2007, publicado no D.O.U. de 09 de março de 2007. Dispõe sobre a cooperação na área do transporte aéreo e o estabelecimento das bases necessárias para a operação “aéreos regulares”.

Organização de Aviação Civil Internacional – OACI: Promulga a criação da Delegação Permanente do Brasil junto à Organização de Aviação Civil Internacional (OACI). Promulgado pelo Decreto nº. 6.055, de 06 de março de 2007, publicado no D.O.U. de 07 de março de 2007. Dispõe sobre a criação da Delegação Permanente com sede em Montreal, Canadá. A Delegação fica ainda responsável pelos temas referentes à Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB) e ao Fundo Multilateral para Implantação do Protocolo de Montreal.

França: Acordo para Cooperação na Área da Aeronáutica Militar entre o Governo da República Federativa do Brasil e a República Francesa, celebrado em Paris, em 15 de julho de 2005. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 410, de 12 de setembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.011, de 03 de janeiro de 2007, publicado no D.O.U. de 04 de janeiro de 3007. Dispõe sobre o fortalecimento da cooperação na área de defesa e, em especial, na área da aeronáutica militar, tendo em vista interesses operacionais, industriais e políticos.

China: Promulga o Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Popular da China sobre o Fortalecimento da Cooperação na Área de Implementação de Infra-Estrutura de Construção, celebrado em Pequim, em 5 de junho de 2006. Aprovado pelo Decreto Legislativo nº. 409, de 12 de setembro de 2006. Promulgado pelo Decreto nº. 6.009 de 03 de janeiro de 2007, publicado no D.O.U. de 04 de janeiro de 2007. Dispõe sobre a cooperação econômica e comercial bilateral nos campos de infra-estrutura de construção, energia elétrica, conservação de recursos hídricos, petróleo e gás natural. Além disso, o acordo prevê um intercâmbio de conhecimento, informação, e tecnologia nesses respectivos campos.

X. Organização Mundial do Comércio – OMC

Brasil versus estados unidos: caso dos subsídios de algodão – DS267 – em 18 de dezembro de 2007, a OMC emitiu o relatório do painel de adimplemento sobre a petição do Brasil contra os subsídios de algodão dos Estados Unidos.

Brasil versus estados unidos: caso das garantias internas e créditos de exportação para produtos agrícolas – DS365 – em 11 de julho de 2007, o Brasil requereu audiências com os Estados Unidos acerca de duas categorias distintas de medidas

242 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

agrícolas americanas: (i) apoio doméstico para produtos agrícolas e (ii) garantias de créditos de exportação para produtos agrícolas.

Argentina versus Brasil: caso das medidas anti-dumping sobre importações de certas resinas da Argentina – DS355 – em 7 de junho de 2007, a Argentina requereu o estabelecimento do painel, após as audiências realizadas com o Brasil em 2006 sobre medidas anti-dumping aplicadas pelo Brasil sobre a importação de certas resinas de politereftalato de etileno (PET) argentinas. Em 20 de junho de 2007, foi deferido o estabelecimento do painel. As Comunidades Européias, o Japão, a China e os Estados Unidos reservaram os seus direitos como terceiros.

Comunidade européia versus Brasil: caso dos pneus – DS332 – em 12 de dezembro de 2007 foi emitido o relatório com as conclusões do painel sobre o caso.

Tabelas e Dados Relativos ao Artigo “Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul” 245

ANeXO V

Tabelas e Dados Relativos ao Artigo “Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul”

AutoresClóvis Brigagão

Leonardo Paz Neves

Tabelas e Dados Relativos ao Artigo “Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul” 247

Anexo I

Transfers of major conventional weapons: sorted by recipient. Deals with deliveries or orders made for year range 2003 to 2006

Note: The ‘No. delivered/produced’ and the ‘Year(s) of deliveries’ columns refer to all deliveries since the beginning of the contract. Deals in which the recipient was involved in the production of the weapon system are listed separately. The ‘Comments’ column includes publicly reported information on the value of the deal. Information on the sources and methods used in the collection of the data, and explanations of the conventions, abbreviations and acronyms, can be found at URL http://armstrade.sipri.org. The SIPRI Arms Transfers Database is continuously updated as new information becomes available.

Source: SIPRI Arms Transfers DatabaseInformation generated: 11 June 2007

Recipient/ Supplier (S) or licenser

(L)

No. ordered

Weapon designation

Weapon description

Year of order

licence

Year of deliveries

No. delivered/ produced

Comments

China 3 JYL-1 Air surv radar 2005 2006 1

Part of $150 m programme for military-

civilianair-

surveillance system

France 8AS-350/AS-550 Fennec

Light Helicopter 2003 2004-2005 8

$50 m deal; AS-550C2

Fennec version

Spain 4 Serviola OPV 2005

Part of EUR1.2 b

deal; delivery by 2010

Spain 4 Navantia-1700t OPV 2005

Part of EUR1.2 b

deal; delivery by 2010

Israel 54 Python-4 BVRAAM 2003 2004 54$7.5 m deal; for F-16A

combat aircraft

Netherlands 3 Flycatcher MK-2

Fire control radar 1999 2005-2006 3

Part of Defender

SAM system (with ADAMSlaunchers and Barak SAM from Israel);

optionon 3 more

248 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

Netherlands 8 MIRADORAir surv system 2006

For 4 Navantia-1700 and 4 Serviola

OPV from Spain

Netherlands 8 ScoutSea surv

radar 2006

For 4 Navantia-1700 and 4 Serviola

OPV from Spain

Netherlands 8 STING Fire control radar 2006

For 4 Navantia-1700 and 4 Serviola

OPV from Spain

Netherlands 4 SMART Air surv radar 2006

For 4 Navantia-1700

OPV from Spain,

SMART Mk-2 version

Russia 3 Mi-24P/Mi-35P/Hind-F

Combat helicopter 2005 2006 3

Part of $120 m deal;

Mi-35M-2 version;

Venezuelan designation

Caribe

Russia 1 Mi-26/Halo helicopter 2005 2006 1

Part of $120 m deal; Mi-26T2

version;Venezuelan designation

Pemon

Russia 9 Mi-8/Mi-17/Hip-H helicopter 2005 2006 9

Part of $120 m deal; Mi-

17-1V armed version;

Venezuelan designation

Panare

Russia 6 An-74/Coaler-B

Transport aircraft 2006

$72 m deal; delivery from 2007; contract

not yetsigned

Russia 7 Mi-24P/Mi-35P/Hind-F

Combat helicopter 2006 2006 5

Mi-35M-2 version;

Venezuelan designation

Caribe; delivery

2006-2007

Tabelas e Dados Relativos ao Artigo “Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul” 249

Russia 2 Mi-26/Halo helicopter 2006

Mi-26T2 version;

Venezuelan designation

Pemon; delivery 2007

Russia 11 Mi-8/Mi-17/Hip-H helicopter 2006 2006 11

Mi-17-1V armed version;

Venezuelan designation

Panare

Russia 150 R-73/AA-11 Archer

SRAAM 2006 2006 20For Su-30MKV

combat aircraft

Russia 100 R-77/AA-12 Adder

BVRAAM 2006

For 24 Su-30MKV combat

aircraft; statusuncertain

Russia 24 Su-30MK/Flanker

FGA aircraft 2006 2006 2

$0.8-1.5 b deal; Su-

30MKV (Su-30MK-2)version; delivery

2006-2008

UK 2 Shorts-360 Transport aircraft 2005 2005 2 Second-hand

Anexo II

TIV of arms imports to Argentina by category, 2000-2006Generated: 10 October 2007Source: SIPRI Arms Transfers DatabaseFor more information, see: http://www.sipri.org/contents/armstrad/output_types_TIV.html

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 TotalAircraft 65 2 3 12 82

Armoured Vehicles 5 5Artillery 4 4Engines 8 1 7 1 5 22Missiles 12 12 24Sensors 14 3 28 24 45Ships 127 127 36 290Total 223 2 16 12 162 4 53 472

250 III ANUÁRIO BRASILEIRO DE DIREITO INTERNACIONAL | V. 2

TIV of arms imports to Brazil by category, 2000-2006Generated: 10 October 2007Source: SIPRI Arms Transfers DatabaseFor more information, see: http://www.sipri.org/contents/armstrad/output_types_TIV.html

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 TotalAircraft 63 126 58 20 57 73 127 524

Armoured Vehicles 13 13Artillery 15 4 4 23Engines 13 9 15 15 22 74Missiles 11 16 6 5 5 15 58Others 9 9Sensors 27 62 84 37 48 55 18 331Ships 10 300 140 450Total 126 530 165 71 125 143 322 1.482

TIV of arms imports to Chile by category, 2000-2006Generated: 10 October 2007Source: SIPRI Arms Transfers DatabaseFor more information, see: http://www.sipri.org/contents/armstrad/output_types_TIV.html

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 TotalAircraft 3 16 4 353 376

Armoured Vehicles 145 19 11 50 225Artillery 1 14 15Engines 5 1 1 7Missiles 7 7 23 34 28 103 92 294Sensors 3 3Ships 17 17 17 141 11 366 614 1183Total 178 43 63 175 50 470 1124 2103

TIV of arms imports to Colombia by category, 2000-2006Generated: 10 October 2007Source: SIPRI Arms Transfers DatabaseFor more information, see: http://www.sipri.org/contents/armstrad/output_types_TIV.html

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 TotalAircraft 56 234 163 121 11 8 30 623

Armoured VehiclesArtilleryEngines 3 3MissilesSensors 6 27 1 34Ships 6 6Total 62 261 163 128 11 8 33 666

Tabelas e Dados Relativos ao Artigo “Impactos da Nova Doutrina de Segurança Venezuelana na América do Sul” 251

TIV of arms imports to Venezuela by category, 2000-2006Generated: 10 October 2007Source: SIPRI Arms Transfers DatabaseFor more information, see: http://www.sipri.org/contents/armstrad/output_types_TIV.html

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 TotalAircraft 52 11 2 13 4 7 357 446

Armoured VehiclesArtilleryEngines 5 8 13Missiles 29 10 9 9 12 69Sensors 8 8 35 11 19 81Ships 45 45Total 89 79 45 13 13 27 388 654


Recommended